UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE CENTRO DE CIENCIÂS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE CURSO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS

Ariane Miranda de Freitas Juliana Lopes Mussolini

Transtorno do Espectro Autista: estudo de uma série de casos com alterações genéticas

São Paulo 2016

UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE CURSO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS

Ariane Miranda de Freitas Juliana Lopes Mussolini

Transtorno do Espectro Autista: estudo de uma série de casos com alterações genéticas

Monografia apresentada ao Centro de Ciências Biológicas e da Saúde, da Universidade Presbiteriana Mackenzie como parte dos requisitos exigidos para a conclusão do Curso de Bacharelado em Ciências Biológicas.

Área: Citogenética Humana

Orientador: Prof.º Dr.º Decio Brunoni

São Paulo 2016

“ No fim do dia não sonhamos nossas vidas...nós vivemos elas! ” Anthony Ianni

Agradecimentos

Agradecemos, primeiramente, à Universidade Presbiteriana Mackenzie por nos proporcionar um excelente curso, com professores excepcionais e atenciosos, que nos guiaram, inspiraram e proporcionaram uma visão mais humana e ética da Biologia.

Ao nosso orientador Prof.° Dr. Decio Brunoni, que nos orientou e ensinou tanto nesse último ano, crucial para nossas vidas acadêmicas e profissionais.

Um agradecimento especial ao coordenador do curso, Prof.° Dr. Adriano Monteiro de Castro, pelo apoio, carinho, atenção e conselhos quando decidimos enfrentar essa última etapa do curso juntas.

Agradecemos imensamente aos nossos queridos pais, Andréa e Juliano, Adriana e Paulo, por todo o carinho, suporte, paciência e, acima de tudo, amor por nós. Aos demais familiares, um muito obrigada, por nos acompanhar por toda essa trajetória, pelos abraços, risadas, lágrimas e, agora, estarem presentes em mais uma vitória em nossas vidas.

Um obrigada muito especial para os nossos namorados, José Valério e Danilo, pelo apoio, pela paciência, compreensão e estarem sempre ao nosso lado, independente do que houver nos nossos caminhos.

Um grande agradecimento à UNIFESP e à Dra. Thais Zanolla por nos receber e conceder conhecimentos imprescindíveis ao nosso trabalho.

À Dra. Leslie Kulikowski e toda a sua equipe por nos receber, ensinar e inspirar do começo ao fim nessa difícil trajetória que foi esse último ano.

Resumo

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um distúrbio do neurodesenvolvimento com acometimento na comunicação e interação social, além de comportamentos e atividades restritos e repetitivos. Afetando cerca de 1% da população o TEA possui um quadro clínico heterogêneo, além de diversas síndromes e psicopatias em comorbidade. Entre os fatores causais sabe-se que as causas genéticas representam até 20% sendo que as copy number variations (CNVs) na forma de microdeleções e microduplicações são as principais. Estas alterações citogenômicas envolvem dezenas de . O objetivo do presente trabalho é o descrever uma amostra de conveniência das alterações genéticas encontradas em 6 pacientes com TEA. Os pacientes foram averiguados na Clínica TEA da Universidade Presbiteriana Mackenzie e os testes genéticos foram realizados em laboratórios comerciais. Cinco pacientes foram diagnosticados pelo array genômico e um pelo sequenciamento do exoma. A interpretação das coordenadas genômicas foi realizada com ferramentas de bioinformática usuais como o genome browser. As regiões cromossômicas envolvidas foram: 3p26.3; 6q; 7q31.3; 7q36.3; 9p21.1; 17q22 e os possíveis genes relevantes na manifestação do quadro clínico são: B4GALT1, PTPRN2, CNTN4, CNTN6, OXTR, GRM7, SETD5, BZRAP1, SYNGAP1 e IMMP2L. Estes resultados já foram publicados em outros pacientes com TEA. Centenas de amostras de pacientes com TEA são relatadas na literatura internacional. Os indivíduos que apresentam alterações genéticas similares aos dos pacientes aqui estudados tem em comum a deficiência intelectual. Assim essa característica clinica deve ser a principal indicação para investigar uma comorbidade de causa genética em pacientes com TEA.

Palavras-Chave: Autismo, TEA, CNVs, aCGH-Array, alterações genéticas, genes candidatos.

Abstract

The Autism Spectrum Disorder (ASD) is a neurodevelopmental disorder with communication and social interaction impairments, also repetitive and restricted behaviors. Affecting about 1% of population, ASD has a heterogeneous clinical picture, besides several syndromes and psychopathies in comorbidity. Between the causal factors, it’s known that the genetic causes represent up to 20% being that the copy number variations (CNVs) in microdeletions and microduplications forms are the principal ones. These citogenomic alterations involve dozens of genes. The objective of this present work is to describe a convenience sample found in 6 ASD patients. The patients were investigated in the Clínicas TEA of Universidade Presbiteriana Mackenzie and the testes were performed in comercial laboratories. Five patients were diagnosed by MicroArray and one by exoma sequencing. The genomic coordinates interpretation was performed with usual bioinformatics tools, like Genome Browser. The cromossomic regions involved were: 3p26.3; 6q; 7q31.3; 7q36.3; 9p21.1; 17q22 and the possible relevant genes in the manifestation of the clinical picture were: B4GALT1, PTPRN2, CNTN4, CNTN6, OXTR, GRM7, SETD5, BZRAP1, SYNGAP1 e IMMP2L. These results were already been published in other patients with ASD. Hundreds of ASD patients samples are mentioned in international literature. Individuals who present genetic alterations similar to the studied patients has in common the intelectual desability. Thus, this clinical feature should be the main indication to investigate a genetic cause comorbidity in patients with ASD.

Key-Words: Autism, ASD, CNVs, MicroArray, genetic alterations, candidate genes.

Índice

QUADRO 1. CARACTERIZAÇÃO DO TEA SEGUNDO O DSM-V...... 10 QUADRO 2. AUTISMO SINDRÔMICO COM CNVS RECORRENTES...... 12 QUADRO 3. GENES CANDIDATOS PARA TEA...... 13 QUADRO 4. RESULTADOS GERAIS ...... 18

Sumário

1. INTRODUÇÃO ...... 8

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ...... 9

2.1. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS ...... 9

2.2. CAUSAS GENÉTICAS ...... 11

2.3. TESTES GENÉTICOS ...... 14

3. MÉTODO E CASUÍSTICA ...... 15

3.1. CASUÍSTICA ...... 15

3.2. MÉTODOS ...... 16

4. RESULTADOS ...... 17

5. DISCUSSÃO ...... 19

5.1. CASO 1 ...... 19

5.2. CASO 2 ...... 19

5.3. CASO 3 ...... 20

5.4. CASO 4 ...... 23

5.5. CASO 5 ...... 23

5.6. CASO 6 ...... 24

6. CONCLUSÃO ...... 25

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...... 26

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1. INTRODUÇÃO

Segundo o DSM-V, Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, o Transtorno do Espectro Autista é um distúrbio do neurodesenvolvimento, com déficits persistentes na comunicação e interação social e padrões restritos e repetitivos de comportamento. Com um fenótipo muito heterogêneo, os sintomas começam a se manifestar aos três anos, de tal maneira que já é possível o seu diagnóstico.

Intensa pesquisa interdisciplinar, principalmente a partir dos anos de 1970, estabeleceu o TEA como um transtorno que afeta principalmente indivíduos do sexo masculino. Possui prevalência em torno de 1% da população, sem predileção com antecedentes étnicos e com ampla diversidade sintomatológica na área cognitivo comportamental. Os quadros variam de muito graves, nos quais prepondera a deficiência intelectual, até os casos clínicos cujos indivíduos têm inteligência normal e razoável capacidade adaptativa. Têm sido estabelecidas, também, diversas comorbidades com TEA, como a epilepsia, o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividades e diversas síndromes genéticas e ambientais (ABRAHMS, GESCHWIND, 2010; APA, 2002; APA, 2013; CID 10, 2000; DAGLI, MUELLER, WILLIAMS, 2015; FOMBONNE, 2009; GRABRUCKER, 2013; JESTE, GESCHWIND, 2014).

Quanto as causas do TEA temos as conhecidas na forma de comorbidades com síndromes genéticas e ambientais, em torno de 20%. Entre as causas genéticas há três grupos que se destacam: mutações de único; copy number variation (variação no número de cópias) e aberrações cromossômicas. A maioria responde por um mecanismo com causa multifatorial, que pressupõe vulnerabilidade genética dada pela adição de variantes poligênicas somada a intercorrências perinatais que atuam epigeneticamente. (ABRAHAMS, GESCHWIND, 2010; CARTER, SCHERER, 2013; FAKHOURY et al, 2015; PINTO et al, 2010).

Entre as comorbidades genéticas, apresentam papel central as microdeleções e microduplicações, genericamente designadas como variação do número de cópia, ou CNVs. Estas são definidas como número de cópias submicroscópias anormais de segmentos de DNA do genoma humano. Podem ser herdadas ou uma mutação esporádica, ou seja, de novo. De acordo com o seu tamanho, sua localização e os genes 9 envolvidos ela pode ser considerada patogênica, benigna ou VOUS, Variants of uncertain clinical significance, ou seja, são variações que ainda é incerta a sua patogenicidade (ERIKSSON et al, 2015; ZANOLLA et al, 2015).

O objetivo do presente estudo é o de descrever as características genéticas de uma série de casos de pacientes com TEA nos quais foram detectadas alterações genéticas.

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, DSM-V (APA, 2015), indivíduos com TEA tendem a ter déficits de comunicação, como respostas inapropriadas em conversas, entendimento errôneo de interações não verbais, e dificuldade de desenvolver amizade com pessoas da mesma idade. Somado a isso, são dependentes de suas rotinas, muito sensíveis a mudanças do ambiente, e intensamente focados em coisas incomuns. Os sintomas e comportamentos de pessoas com esse transtorno pode variar sendo em determinado indivíduo mais grave, e em outro, mais ameno. A gravidade do caso é baseada nos prejuízos na comunicação social e nos padrões de comportamento.

No âmbito da linguagem há diversas alterações como ecolalia, inversão pronominal e frases inapropriadas. Consequentemente, essas perturbações afetam a comunicação não verbal resultando em comportamentos estereotipados, interesses restritos e transtornos das capacidades sociais (VELLOSO et al, 2011).

No quadro 1 é apresentado as principais características do TEA, divididas nos dois critérios do DSM-V (APA, 2013). No critério Comunicação e Interação Social são descritos os transtornos referentes a essa área, como pouco contato visual, ausência de expressão facial, déficit na interação verbal e não verbal e falta de reciprocidade emocional. No critério Comportamentos, Interesses ou Atividades Repetitivos e Restritos são descritos os transtornos referentes a comportamentos inadequados, movimentos

10 repetitivos e interesses restritos, como estereotipias motoras e apego excessivo a objetos incomuns.

Quadro 1. Caracterização do TEA segundo o DSM-V.

Caracterização TEA A) Comunicação e - Dificuldades na interação verbal e não-verbal; Interação Social. - Acentuada falta de reconhecimento da existência ou dos sentimentos dos demais; - Pouco contato visual; - Déficit no entendimento e uso de gestos; - Ausência de expressão facial; - Falta de habilidade em iniciar ou manter uma conversa; - Dificuldade em desenvolver relações com outros da mesma idade; - Falta de reciprocidade emocional; B) Comportamentos, - Atração por partes específicas de um objeto; interesses ou - Difícil adaptação a mudanças na rotina e rituais; Atividades, Repetitivos - Padrões ritualizados de comportamento; e Restritos. - Estereotipias motoras; - Ecolalia; - Frases idiossincráticas; - Apego excessivo com objetos incomuns; - Interesses limitados e persistentes; - Insensibilidade a dor; -Brincadeiras inapropriadas com objetos e brinquedos;

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2.2. CAUSAS GENÉTICAS

Em todos ou, pelo menos, na maioria dos indivíduos com TEA, acredita-se que causas genéticas desempenham importante papel causal. Podem ser principais, nas quais a alteração genética deve ser responsável inteiramente pelo quadro clinico: são as aberrações cromossômicas, quase sempre reconhecidas clinicamente; as síndromes monogênicas, diagnosticadas pelo quadro clínico ou através da pesquisa de mutações específicas e as microdeleções, microduplicações e outras variações do número de cópias, diagnosticas pelo array genômico. Em todas estas causas, em torno de 15% dos indivíduos com TEA, o denominador comum clínico é a deficiência intelectual (DI). De fato, a DI está tão associada com as comorbidades genéticas no TEA que está presente em praticamente todos os indivíduos com uma alteração genética principal. No entanto, na maioria das vezes, cerca de 80% dos casos de TEA a responsabilidade causal repousa no modelo multifatorial com interação epistática (ZANOLLA, 2015).

Os primeiros estudos sobre a genética do autismo se basearam em síndromes como X Frágil, Fenilcetonúria, Síndrome de Angelman. Nestas clássicas síndromes genéticas monogênicas, os pacientes apresentam comorbidade com TEA em proporção maior do que o esperado pelo acaso. Dezenas de estudos focaram nesta comorbidade, nos últimos anos, indicando genes candidatos em diversos cromossomos e dezenas de loci. Atualmente cerca de uma centena de loci são apontados como envolvidos. Existem dezenas de artigos sobre estas síndromes em comorbidade com o TEA, fugindo do objetivo desta revisão a descrição destes quadros. Um artigo que faz uma revisão com boa relação entre a alteração genética e o fenótipo é o de Geste e Geschwind, 2014.

No TEA, a variação do número de cópias (CNVs) representa a causa genética mais frequente. Além deste, outras psicopatias também estão relacionadas às essas CNVs, como, por exemplo, epilepsia, déficit de atenção, deficiência intelectual e esquizofrenia (Quadro 2). As principais regiões cromossômicas afetadas pelas CNVs e que causam autismo são 1q21, 2p15-2p16.1, 15q13, 16p11.2. Tanto deleções quanto duplicações causam diferentes consequências orgânicas para o indivíduo, majoritariamente afetando, também, o intelecto (ZANOLLA, 2015).

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Quadro 2. Autismo sindrômico com CNVs recorrentes.

Região Del/Dup Sinais e Sintomas Cromossômica Autismo, déficit de atenção, hiperatividade, Del 1q21 comportamento anti-social. Dup Autismo, déficit de atenção, hiperatividade, epilepsia, DI. Autismo, atraso no desenvolvimento, microssomia, 2p15-2p16.1 Del microcefalia. Autismo, déficit de atenção, hiperatividade, agressão, Del ansiedade. 15q13 Autismo, ansiedade, transtorno bipolar, DI, atraso no Dup desenvolvimento. Autismo, Síndrome de Asperger, déficit de atenção, Del hiperatividade. 16p11.2 Autismo, déficit de atenção, hiperatividade, ansiedade, Dup epilepsia. Fonte: ZANOLLA et al (2015, p. 33).

Diversas pesquisas apontam genes candidatos para o TEA, porém é difícil afirmar se são inteiramente responsáveis pela doença. Há muitos fatores envolvidos no desenvolvimento do TEA, além de um espectro muito amplo de fenótipos. Assim, relacionar esses genes com os fenótipos é trabalhoso. Foram relatados na literatura genes associados ao TEA (quadro 3), como por exemplo: SHANK3, CNTN4, CNTN6, RELN, OXTR, SYNGAP1, ADNP; CNTNAP2, entre outros (RIBEIRO et al, 2013; GRISWOLD, et al, 2012; ALVAREZ-MORA, et al, 2016; PINTO et al, 2010)

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Quadro 3. Genes Candidatos para TEA.

Região GENE Comorbidades Referência Cromossômica Síndrome de Phelan- ZANOLLA, 2015; McDermid ERIKSSON, 2015; SHANK3 22q13.33 Transtorno Bipolar FREITAG; 2010; Epilepsia PINTO, 2014; LIU, TAKUMI, 2014; RELN 7q22.1 Epilepsia FREITAG, 2010; RUBEIS, 2015; ADNP 20q13.13 Epilepsia IOSSIFOV, 2015; RUBEIS, 2015; CHD2 20q13.12 TDAH PINTO, 2014; LIU, TAKUMI, 2014; OXTR 3p25.3 DI FREITAG, 2010; LIU, TAKUMI, 2014; CNTN4 3p26.3-p26.2 DI FREITAG, 2010; HU, 2015; MERCATI, 2016; CNTN6 3p26.3 TDAH HU, 2015 TDAH Esquizofrenia ERIKSSON, 2015; NRXN1 2p16.3 Transtorno Bipolar PINTO, 2014; Epilepsia LIU, TAKUMI, 2014; SYNGAP1 6p21.32 Epilepsia ERIKSSON, 2015; PINTO, 2014; TDAH Esquizofrenia LIU, TAKUMI, 2014; CNTNAP2 7q35-q36.1 Transtorno ERIKSSON, 2015; Obsessivo FREITAG, 2010 Compulsivo ZANOLLA, 2015; TSC1/TSC2 9q34.13/16p13.3 Esclerose tuberosa FREITAG, 2010; LIU, TAKUMI, 2014 X-Frágil ZANOLLA, 2015; FMR1 Xq27.3 Epilepsia LIU, TAKUMI, 2014; TDAH Transtorno PINTO, 2014; SETD5 3p25.3 Obsessivo GROZEVA, 2014 Compulsivo Esquizofrenia MAKOFF, 1996; GRM7 3p26.1 Transtorno Bipolar YANG, PAN, 2013; BZRAP1 17q22 DI BUCAN, 2009;

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2.3. TESTES GENÉTICOS

O MicroArray é uma técnica laboratorial que detecta perdas e ganhos cromossomais ao nível de kilobases e é feita a partir da comparação da intensidade de hibridação das amostras teste e controle. Com esse método foi possível detectar microdeleções e microduplicações, como CNVs e SNPs (single necleotide polimorfism), dissomia uniparental e perda de heterozigodade. A técnica revolucionou a citogenética com sua alta resolução, que levou a um aumento de diagnósticos de indivíduos com defeitos congênitos, autismo e deficiência intelectual não detectados pelos métodos convencionais de citogenética, como a banda G. Além disso o Array-CGH analisa DNA extraído de diversos tipos de células não cultivadas, reduzindo os requisitos de qualidade da amostra. Porém, alguns métodos citogenéticos, como o FISH são necessários depois de realizado o Array-CGH para confirmar os resultados e identificar translocações ou inserções, visto que o Array-CGH não detecta arranjos balanceados como translocações equilibradas, inversões e inserções balanceadas, mutações de ponto e baixo nível de mosaicismo (>30%) (BI et al, 2012; KULIKOWSKI, 2013; FAN et al, 2013).

Assim como o MicroArray, o sequenciamento do exoma é um método utilizado para identificar perdas e ganhos genômicos, ou seja, alterações microscópicas ao nível de um par de bases em alta resolução, apenas nas porções codificantes do DNA, o Exoma. O material genético é corrido por uma máquina específica, onde passa por um polímero especial, no qual é realizada a sua leitura. A máquina separa a amostra por tamanho e é analisada a sua fluorescência. O resultado é obtido na forma de gráfico ou cromatogramas. Esses dados, então, passam por uma análise pelo software, que vai comparar as informações obtidas com uma amostra controle. É possível observar, assim, picos, mostrando as bases alteradas (KULIKOWSKI, 2013; BUXBAUM et al., 2012).

Na internet há diversos bancos de dados e ferramentas específicas para auxiliar a interpretação das variantes genômicas encontradas em testes citogenômicos, como o MicroArray. Entre eles, os principais são: Database of Chromosomal Imbalance and Phenotype in Humans Using Ensembl Resources (DICIPHER, 2009), Genome Browser

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(UCSC GENOME BROWSER, 2002), Database of Genomic Variants (MACDONALD, 2013) e o Nacional Center for Biotetechnology Information (NCBI) (GEER, 2010).

O SFARI, Simon Foundation Autism Research Initiative, é um site voltado para o suporte de projetos científicos inovadores para doenças do desenvolvimento, em especial o TEA. Disponibiliza gratuitamente trabalhos científicos voltados para essa área e recruta indivíduos com TEA e suas respectivas famílias para participarem de estudos como sujeitos de pesquisa. Além de outros recursos, o SFARI Gene disponibiliza um banco de dados online em evolução que auxilia cientistas a acompanharem e utilizarem como referência em suas pesquisas os avanços da genética do TEA e fatores de risco (ABRAHAMS, 2013).

O Genome Browser é imprescindível para análises do genoma humano. Possui acesso fácil e rápido a pesquisas relacionadas a qualquer região de interesse do genoma. Há diversas ferramentas, cada qual com sua especificidade e base de dados de acordo com o que é pedido. Além disso, o site oferece um mapa completo do genoma humano, com genes, doenças relacionadas, possíveis causas e relatos de pesquisas anteriores referentes à aquela região para servir como referência para trabalhos futuros (UCSC GENOME BROWSER, 2002).

O OMIM, do inglês Online Mendelian Inheritance in Man, é outra base de dados online, que compila diversos dados sobre genes, suas respectivas doenças e outras informações (OMIM, 2016).

O GeneCard também compila informações sobre genes, suas doenças, mapeamento cromossômico, entre diversos outros aspectos (GENECARD, 2016).

3. MÉTODO e CASUÍSTICA

3.1. Casuística

A casuística compreendeu seis pacientes com o diagnóstico de TEA, de ambos os sexos, averiguados na Clínica de Transtornos do Espectro do Autismo da Universidade

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Presbiteriana Mackenzie. Os sujeitos são agendados na clínica e estudados de acordo com o protocolo de Velloso e cols (2011). Os testes genéticos necessários são solicitados e as famílias que dispõem de Planos de Saúde utilizam Laboratórios Comerciais. Em todas as crianças o quadro clínico de TEA foi considerado grave.

É importante salientar, que trata se uma amostra de conveniência, ou seja, uma técnica que seleciona uma amostra da população que seja de fácil acesso para determinada pesquisa que está em andamento. Geralmente essa conveniência representa uma maior facilidade operacional e baixo custo de amostragem, mas tem como consequência a incapacidade de fazer afirmações gerais com rigor estatístico sobre a população. Em nosso trabalho, é possível observar essa dificuldade de dados estatísticos justamente pelo número pequeno de amostras selecionadas para o estudo.

3.2. Métodos

Todos os pacientes foram avaliados da Clínica TEA-MACK ou do Centro de Genética Médica da UNIFESP e seus representantes legais deram o consentimento informado segundo o protocolo aprovado (CEP-UPM:910/03/06).

Após a avaliação realizada pelas clínicas citadas, foram pedidos testes genéticos realizados por laboratórios comerciais como o MicroArray, no qual foi possível detectar erros em cinco, dos seis casos e o Sequenciamento do Exoma que foi utilizado em apenas um dos casos, o seis. A partir, então, da análise desses testes genéticos, conseguimos identificar um ou mais genes descritos em cada caso. E o entendimento de cada gene, sua função, onde ele atua e quais comormidades são associadas a ele, se deu mediante às ferramentas informatizadas: o Genome Browser, OMIM, SFARI e o GeneCard, que possuem uma biblioteca online de genomas e/ou genes para consulta acadêmica, compartilhando resultados de pesquisas genéticas, citogenéticas e citogenômicas que contribuem para um melhor conhecimento de doenças envolvendo o genoma humano.

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4. Resultados

No quadro 4 estão descritos os casos da casuística, sendo descritos os endereços genômicos, os genes candidatos encontrados e suas respectivas funções. Foi um caso do sexo feminino e 5 do sexo masculino, com idades entre 4 e 16 anos e com os seguintes cromossomos afetados: 3, 6, 7, 9 e 17. As regiões cromossômicas foram analisadas segundo diversos bancos de dados online, como o GENOME BROWSER (UCSC GENOME BROWSER, 2002), SFARI (ABRAHAMS, 2013), OMIM (2016) e GeneCards (GENECARDS, 2016). Ainda no quadro 4 é possível visualizar os genes: B4GALT1, PTRN2, CNTN4, CNTN6, OXTR, GRM7, SETD5, BZRAP1, SYNGAP1 e o IMMP2L. Todos os indivíduos possuem o exame de MicroArray realizado por laboratórios comerciais com selo de qualidade. O caso 5, porém, se trata de um sequenciamento do Exoma.

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Quadro 4. Resultados Gerais

Genes Função do Caso Sexo Idade Endereço Genômico Candidatos Gene

arr[GRCh37] 9p21.1p13.3 Enzima 1 Masculino 4 anos B4GALT1 (33,141,051-33,250,767)x3 Galactosiltranferase

arr[GRCh37]7q36.3 Proteína receptor 2 Masculino 5 anos (158.215.549-158.649.005)x3 PTPRN2 tirosina-fosfatase

CNTN4 Diversas proteínas CNTN6 relacionadas à adesão arr[GRCh37] 3p26.3p25.3 celular, receptores de 3 Masculino 4 anos OXTR (61,495-9,769,043)x3 neurotransmissores, GRM7 plasticidade e SETD5 manutenção neuronal.

arr[GRCh37]17q22q223.1 Receptor de 4 Feminino 5 anos BZRAP1 (57,408,181-57,742,624)x3 Benzodiazepina

Ativação sináptica 5 Masculino 16 anos Chr6: 33,405,539 SYNGAP1 específica do cérebro

proteína envolvida no arr[hg19] 7q31.1 processamento das 6 Masculino 6 anos IMMP2L sequências de (110,931,993-111,309,975) x1 peptídeos de sinal para as mitocôndrias 19

5. Discussão

5.1. Caso 1

O gene B4GALT1, localizado no cromossomo 9p, traduz a enzima galactosiltransferase e é um dos sete beta-1,4-galactosil-transferase (beta4GalT genes). Codificam glicoproteínas tipo II ligadas a membrana. Esse gene é único entre os genes beta4GalT, pois codifica uma enzima que participa tanto no glicoconjugado, quanto na biossíntese da lactose. Catalisa a reação que envolve a UDP-galactose e N-acetilglicosamina para a produção de galactose beta-1,4-N- acetilglicosamina. A enzima galactosiltransferase pode formar, também, um heterodímero em conjunto com a proteína regulatória alfa-lactobumina para formar a lactose sintetase. A galactosiltransferase pode ser um componente da membrana plasmática, funcionando no reconhecimento e adesão celular (OMIM, 2016; ABRAHAMS, 2013; GENECARDS, 2016). Segundo o estudo de Van der Zwaag et al (2009), para se obter uma coorte uniforme, o grupo analisado foi dividido em dois: autismo-complexo e autismo-não complexo, sendo o primeiro, casos com CNVs sobrepostas, enquanto que o segundo, casos não sobrepostos. No grupo não-complexo, foi encontrada CNVs na região do gene B4GALT1. Defeitos nesse gene pode causar diversas doenças, como distúrbios congênitos de glicosilação. Van der Zwaag et al (2009) constatou que houve uma grande representação de genes relacionados a glicosilação no grupo não-complexo. Sugere que as alterações de dosagem destes genes podem contribuir para o fenótipo de TEA. O estudo conclui que os genes envolvidos nas vias da glicosilação estão diretamente envolvidos no desenvolvimento cerebral, e que perdas ou ganhos nessas regiões podem levar a consequências orgânicas graves no sistema nervoso.

5.2. Caso 2

O gene PTPRN2 codifica uma proteína com a sequência semelhante à da proteína do receptor tirosina fosfatase. PTPRN2 contém uma região extracelular, uma única 20 região transmembranar e um único domínio catalítico intracelular. Estudos sugerem que a proteína codificada pode funcionar como uma fosfatase fosfatidilinositol com a capacidade de desfosforilar a fosfatidilinositol-3-fosfato e fosfatidilinositol 4.5- difosfato, e esta função pode estar envolvida na regulação da secreção de insulina (OMIM, 2016; GENECARDS, 2016). Ele possui um papel importante nos processos de secreção, mediada por vesículas, ou seja, é necessário para que haja o acúmulo das mesmas contendo insulina e impedir sua degradação. É preciso que tenha uma quantidade normal de neurotransmissores de noradrenalina, dopamina e serotonina no cérebro. Segundo um estudo, o gene PTPRN2 junto com mais sete genes, é encontrado na região 7q causando uma deleção e podendo estar associada a deficiência intelectual, microcefalia, malformações. Além disso, a proteína codificada pelo PTPRN2 é um membro da família de proteína-tirosina-fosfatase (PTP) que são moléculas de sinalizam que regulam uma variedade de processos celulares, incluindo crescimento celular, diferenciação, ciclo mitótico e transformação oncogênica (WU, et al. 2010).

5.3. Caso 3

O gene CNTN6, localizado no cromossomo 3p, traduz a contactina 6, que é membro do subgrupo da família das imunoglobulinas. É um glicosilfosfatidilinositol (GPI) – proteína de membrana ancorada - que medeia as interações de superfície de célula durante o desenvolvimento do sistema nervoso (OMIM, 2016; ABRAHAMS, 2013; GENECARDS, 2016). É regulado pelo T- Brain 1, uma proteína de risco para o TEA (CHUANG, H.; HUANG, T.; HSUEH, 2015) e que interage com a molécula de adesão celular L1-like, outra proteína associada com deficiência intelectual e dificuldades na fala (TASSANO et al, 2014). Além dessas associações, o CNTN6 faz interação com o gene NOTCH1, que promove a ativação deste, através da liberação do Domínio Intercelular Notch (NICD, do inglês notch intercellular domain). E traduz a proteína Notch 1, para a geração de oligodendrócitos, células responsáveis pela produção e manutenção da bainha de mielina dos axônios. Por

21 desempenhar um papel na formação de ligação de axônio no sistema nervoso em desenvolvimento e, embora tenha poucos estudos sobre a prevalência, há relatos que relacionam esse gene mutado com indivíduos com TEA (MERCATI, et al, 2016).

O gene CNTN4, localizado no cromossomo 3p, traduz a contactina 4, proteína de adesão associada ao axônio, da família das imunoglobulinas que possui um importante papel na manutenção e plasticidade das redes neuronais funcionais. A contactina 4 é um glicosilfosfatidilinositol, uma proteína de membrana ancorada, com função de formação de ligações de axônios no sistema nervoso em desenvolvimento por isso, está mais expressa no cérebro, principalmente no cerebelo, tálamo, amigdala e cótex cerebral (OMIM, 2016; ABRAHAMS, 2013; GENECARDS, 2016). Roohi et al (2009) descreveu variações de número de cópias (CNVs) em três casos de indivíduos com TEA que interromperam o gene CNTN4. Essas mutações resultaram em recombinações desiguais, mediadas pela sequência Alu. Sequências Alu são repetições curtas de DNA não codificante, fazem parte da família SINE (do inglês, short interspersed nuclear elements) e são consideradas retrotransposóns (BATZER & DEININGER, 2002).

A proteína codificada pelo gene OXTR, localizado no cromossomo 3p, pertence à família dos receptores acoplados a proteína G e atua como um receptor de oxitocina no qual desempenha um papel importante no útero durante o parto, na lactação e ligação hormônio peptídeo, sendo um potente modulador de comportamentos sociais e reprodutivos. Está associada a peptídeos receptores de ligação e a via de sinalização AMPc. Sua atividade é mediada por proteína G, que também ativa o sistema de segundo mensageiro fosfatidilinositol- cálcio (OMIM, 2016; ABRAHAMS, 2013; GENECARDS, 2016). Foram identificados diversos tipos de variações no gene OXTR relacionados com o TEA, como rs2254298 e rs53576 (WU et al., 2005; JACOB et al., 2007; LIU et al., 2010; WERMTER et al., 2010).

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Tost et al (2010) estudou mais de 200 indivíduos saudáveis com polimorfismos “G- to-A” no intron 3 (rs53576). O alelo “A” foi associado a uma deficiência no domínio comportamentos sociais, portanto, sujeitos homozigotos para esse alelo de risco foram caracterizados por um nível de sociabilidade baixo, além de comportamentos parentais comprometidos. O estudo concluiu que o polimorfismo está ligado a distúrbios de comportamento, alterações morfológicas no hipotálamo, amígdala e na massa cinzenta. Além disso, os achados foram consistentes com dados anteriores que associam o alelo de risco ao TEA.

Gene GRM7, localizado no cromossomo 3p, codifica um receptor acoplado à proteína G para glutamato. O L-glutamato é o principal neurotransmissor excitatório no sistema nervoso central, e ativa os receptores de glutamato ionotrópicos e metabotrópicos. A neurotransmissão glutamatérgica está envolvida na maioria dos aspectos da função cerebral normal e pode ser perturbada em muitas condições neuropatológicas. Os receptores metabotróficos de glutamato são de uma família de receptores acoplados a proteina G que foram divididos em três grupos com base na homologia de sequência, mecanismos putativos de transdução de sinal e propriedades farmacológicas. O gene GRM7 está inserido no grupo III, receptores ligados à inibição da cascata do AMPc. (OMIM, 2016; GENECARDS, 2016). A via do glutamato tem sido considerada como desempenhando papéis importantes na plasticidade neural, desenvolvimento neural e neurodegeneração e, através de modelos animais e estudos neuroquímicos e neurofarmacológicos, o autismo tem sido proposto ser um distúrbio que envolve a concentração alterada de glutamato (YANG, PAN, 2013). Makoff (1996) concluiu que esse gene foi expresso em várias áreas do cérebro humano: hipocampo, cerebelo e o córtex cerebral ao encontrar o mRNA nessas regiões.

Gene SETD5, localizado no cromossomo 3p, é um gene previsto para codificar a enzima metiltransferase, com base na sequência de homologia de outras proteínas SET (OMIM, 2016; GENECARDS, 2016). Embora esteja ativamente presente em

23 vários mamíferos e expresso no cérebro, sua função ainda é pouco conhecida. Com base nos outros membros da família de proteínas SET, a SETD5 pode ser importante no controle das histonas do DNA e age como reguladora de transcrição. Genes que codificam especificamente metiltransferases e genes que codificam modificadores de histonas são altamente reconhecidos por ter uma contribuição no fenótipo de deficiência intelectual (GROZEVA et al, 2014). Mutações de novo de perda de função nesse gene são uma importante causa de deficiência intelectual moderada a grave, além de ser um forte gene candidato para a síndrome de deleção do 3p, devido aos fenótipos similares (SZCZAŁUBA et al, 2016).

5.4. Caso 4

Gene BZRAP1, localizado no cromossomo 17q, codifica o receptor periférico de benzodiazepina, associado a proteína. É uma molécula de adaptação considerada como reguladora da transmissão sináptica, ao liberar a maquinaria responsável pela liberação de vesículas de cálcio (Ca2+) para os canais dependentes (BUNCAN et al, 2009). Gene candidato ao autismo com um score de 4 (evidência mínima) no SFARI.

5.5. Caso 5

Gene SYNGAP1, localizado no cromossomo 6p, codifica uma proteína Ras GTPase de ativação sináptica específica do cérebro, a SynGAP, majoritariamente localizada nas árvores dendríticas de neurônios piramidais neocorticais. É um componente do complexo receptor-NMDA (N-Metil-D-Aspartato), que atua juntamente com o mesmo, bloqueando a inserção do AMPA (ácido alfa-amino-3-hidroxi-5-metil-4- isoxazol propiônico) na membrana pós-sináptica por inibição da via RAS-ERK. Acredita-se que interrupções nos mecanismos moleculares e função controladora da estrutura glutamatérgica de sinapse estão relacionadas a determinados distúrbios do desenvolvimento neurológico e da cognição como a deficiência intelectual e o TEA. Entretanto, ainda é desconhecido como uma disfunção sináptica

24 resultante de mutações patogênicas impacta o desenvolvimento e o comportamento (OMIM, 2016; GENECARDS, 2016; CLEMENT et al, 2012; HAMDAM et al, 2011)

5.6. Caso 6

O gene IMMP2L (Inner Mitochondrial Membrane Peptidase Subunit 2), localizado no cromossomo 7q, codifica uma proteína envolvida no processamento das sequências de peptídeos de sinal utilizadas para direcionar proteínas mitocondriais para as mitocôndrias. A proteína codificada reside nas mitocôndrias e é uma das necessárias para a atividade catalítica do complexo mitocondrial peptidase de membrana interna (IMP). Duas variantes que codificam a mesma proteína foram descritas para este gene, a IMP1 e IMP2 (OMIM, 2016; ABRAHAMS, 2013; GENECARDS, 2016). Segundo alguns estudos, o gene IMMP2L pode estar associado ao TEA isoladamente, mas de acordo com o score do SFARI, é um gene candidato de baixa expressão. No entanto, há uma forte ligação com a Síndrome de Tourette, apesar das causas não serem elucidadas (MIRANDA; ROMANO-SILVA; TEIXERA, 2007).

Em resumo esta série de casos mostrou alguns aspectos característicos de casos descritos na literatura: maior número de meninos afetados e apresentação na forma de síndromes dismórficas com DI (Zanolla et al). Quanto às regiões cromossômicas envolvidas, todas já foram descritas na literatura. A região 7q é a mais recorrente e em relação aos genes, CNTN6, CNTN4 e o SYNGAP1 são os mais vistos, também.

Os mecanismos neurais envolvidos nos TEA são migração neuronal, formação de sinapses e neurotransmissores. Em relação aos neurotransmissores, sabe se que as deficiências de alguns deles, como a dopamina e a serotonina, agravam sintomas como a apatia, inercia, irritabilidade e desinibição por serem hormônios associados a comportamentos sociais que, se defeituosos, resultam em anomalias nestes. E, consequentemente, gerando uma pré-disposição para o autismo (PEREIRA ET AL, 2012). A formação de sinapses está relacionada a atividades neuronais importantes para o desenvolvimento cognitivo do indivíduo. Por isso, se

25 houver alguma ocorrência nesse processo, é possível que a aprendizagem, memória, percepção e equilíbrio sejam de algum modo afetados. E, dependendo da gravidade, podemos classificar o indivíduo como autista (INSTITUTO NEUROLÓGICO, 2016). Como visto na discussão de cada caso, encontramos em nosso estudo os genes B4GALT1, CNTN6, CNTN4, GRM7, BZRAP1 e o SYNGAP1 cujos mecanismos envolvidos com o TEA são dependentes principalmente de enzimas, proteínas, neurotransmissores e formação de sinapses. Logo podemos associar estes fatores a atividades do sistema nervoso que podem ser responsáveis pela ocorrência desse transtorno. Os casos também mostram que o teste genético mais resolutivo para pacientes com este perfil clínico é o array Genômico. De fato, apenas em um paciente (caso 5) o MicroArray não conseguiu descobrir a alteração, tendo sido necessário um teste NGS (do inglês, New Generation Sequencing), o sequenciamento do Exoma.

6. Conclusão

Após analisar uma série de pacientes e estudos de caso, encontramos diversos genes candidatos, sendo todos envolvidos com o TEA, além de diversos outros distúrbios do desenvolvimento, deficiência intelectual, TDAH, TOC, esquizofrenia, epilepsia e déficit de cognição. Ao longo do trabalho foi possível notar uma escassez de material e pesquisas relacionadas a alguns genes, como por exemplo, o gene IMMP2L e o gene PTPRN2. O primeiro, talvez pela sua função complexa no organismo, fazendo com que haja menos estudos relacionados a ele. E o segundo, por estar mais associado a deficiência intelectual do que ao TEA propriamente dito, o que dificulta achados sobre o mesmo. Podemos concluir também que ambos os testes genéticos mais utilizados em nosso estudo, o MicroArray e o Sequenciamento do Exoma são de grande utilidade e de grande importância para as áreas de citogenética e citogenômica devido a sua alta resolução, e pela facilidade de detectar erros que outras técnicas não conseguiriam. Mas embora ambos os testes tenham sido bem-sucedidos, no caso 5 o erro foi

26 detectado apenas por sequenciamento, o que mostra que a técnica de Array não é 100% eficiente em determinados casos. Diante do exposto fica claro que o estudo de casos deve ser ampliado utilizando os testes genéticos já disponíveis clinicamente. Este conhecimento vai melhorar o entendimento das modificações provocadas pelas alterações genéticas em indivíduos com TEA.

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