16 MAI | 2012 ano brasil - homenagem a Marcelo caldi trio 22:00 SALA 2

Marcelo Caldi voz e acordeão Fábio Luna flauta e bateria Nando Duarte violão de sete cordas

Luiz Gonzaga (1912‑1989)­ demorou algum tempo a perceber a sua missão de cantar as mágoas do povo nordestino pelo Brasil fora. Eram testemunhos de adversidades, como os que transportava o famoso pássaro sobre as suas asas bran‑ cas, mas era também o espírito da festa popular, da dança e dos ritmos do sertão. O músico tinha absorvido tudo isso no sopé da Serra de Araripe, na fronteira entre Pernambuco e Ceará, onde nasceu, mas afastou‑se­ da música ao ingres‑ sar na vida militar, onde permaneceu até aos 27 anos e que o levou a participar em cinco revoluções – sem nunca dar um tiro. O reencontro com a sanfona – o acordeão típico nordes‑ tino – deu‑se­ nessa altura, porque, afinal, a saída do exército obrigava‑o­ a procurar um meio de subsistência. O músico que chegou ao Rio de Janeiro no dealbar dos anos 40 não era ainda o Lua, como ficaria conhecido. No Mangue, o bairro da perdição dos homens da cidade e dos marinheiros estrangeiros, Gonzaga tocava sambas, choros, valsas, os géneros que faziam sucesso, passava o pires para recolher a recompensa, até que alguém lhe sugeriu que to‑ casse música do seu Nordeste. Ainda criança, o seu profes‑ sor tinha sido Januário, seu pai, e com ele tinha aprendido a Luiz Gonzaga ©DR música dos forrós típicos, posta de lado com a vida militar. «A saga do pássaro fabuloso da ribaçã que, quando voa No entanto, julgava que essa era música menor e que nin‑ e o sol incide sobre ele, fica com a asa alvinitente, daí guém a quereria ouvir na capital. Concorria aos concursos o nome de asa branca; ela é a última a deixar a terra de novatos, especialmente o de , mas só quando calcinada do sertão, que está em fogo, que vira foguei‑ mostrou o seu frenético Vira e Mexe, em 1941, é que o céle‑ ra de São João, é a última que deixa. Tanto que, quan‑ bre compositor lhe deu ouvidos e se deixou conquistar. do ela sai de um estado para outro, no outro estado é O resto da história conta‑se­ com os inúmeros sucessos, chamada de pombinha estrangeira, porque vai como já que Luiz Gonzaga se dedicou totalmente aos ritmos e anunciadora da desgraça, da fome, da seca que está se toadas do Nordeste, ainda desconhecidos no Brasil da alastrando, está indo de um lugar para outro lugar.» época. Tornou‑se­ o Rei do Baião, género que rapidamen‑ te passou a dominar os bailes e as rádios em todo o país. (Humberto Teixeira, parceiro de Luiz Gonzaga na composição Passou a apresentar‑se­ com os trajes típicos do Nordes‑ do êxito Asa Branca e de mais de uma centena de canções) te, com chapéu de vaqueiro, e acompanhado apenas por

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MECENAS CASA DA MÚSICA APOIO INSTITUCIONAL MECENAS PRINCIPAL CASA DA MÚSICA Marcelo Caldi zabumba (um tambor tradicional que produz em simultâ‑ Marcada pela fusão inusitada de estilos, formas e tendên‑ neo o som grave do bombo e, com uma vareta, outro mais cias, a obra de Marcelo Caldi expressa um sentimento de agudo) e triângulo, enquanto assumia a voz e o acordeão liberdade e ousadia, e aponta para quais serão os cami‑ – constituição que Luiz Gonzaga associava à chula portu‑ nhos do fazer musical no início do século XXI. Ao romper guesa, levada para o Nordeste com a colonização. as fronteiras do erudito com o popular, aproximar o tango Segundo Humberto Teixeira, o letrista (e também com‑ argentino do forró brasileiro e apresentar­‑se como can‑ positor) natural do Ceará que se tornou o parceiro de elei‑ tor e ao mesmo tempo instrumentista virtuoso, além de ção de Gonzaga, o músico introduziu conscientemente os compositor e arranjador, o artista tornou‑se­ reconhecido géneros nordestinos no Rio de Janeiro, moldando­‑os com como um dos mais brilhantes da nova geração brasileira. o intuito de conquistar os ouvidos urbanos. E conseguiu­ É um dos responsáveis pela revitalização da sanfona ‑o em larga escala, destronando o reinado dos sambinhas (acordeão) no cenário contemporâneo. Criou uma lingua‑ e das marchinhas até meados dos anos 50. Depois veio gem jovem e cosmopolita para o tradicional timbre ser‑ o samba­‑canção, logo a bossa nova e o tropicalismo, e a tanejo, harmonizando‑o­ com distorções de guitarra eléc‑ história mudou o seu rumo. No entanto, Lua permane‑ trica, rock’n’roll, jazz e até drum and bass. Requintado e ceu como uma influência transversal, marcada em com‑ moderno, sem, contudo, perder de vista o legado brasi‑ posições de figuras como , , leiro, resgatou o antigo elo do instrumento de fole com o , e Guinga, uns rein‑ choro, samba, pagode, valsa e salsa, entre outros. terpretando, outros modernizando, mas todos prestando Pianista de formação clássica, aliou a técnica apurada homenagem ao valioso legado de Luiz Gonzaga. à aprendizagem autodidacta do acordeão. Nomes como O baião tem algumas particularidades que o tornam fa‑ Luiz Gonzaga, Sivuca e passaram a figu‑ cilmente identificável. No aspecto rítmico, o compasso é rar no seu repertório, ao lado de Bach, Liszt e Villa­‑Lobos. de dois tempos e tem uma acentuação característica an‑ Num dos seus discos mais recentes, Cantado (MP,B, tecipando o segundo tempo. A melodia pode ser maior 2009), apresenta­‑se pela primeira vez como cantor solis‑ ou menor, mas o âmbito mais distintivo é a escala maior ta, resultado de anos de participação em grupos vocais, com a 7ª menor e a 4ª aumentada. com destaque para o BR6 – considerado uma das melho‑ res formações de jazz a cappella do mundo, segundo o fernando pires de lima Contemporary A Cappella Recording Award. A concepção do CD, bem como todas as composições e arranjos, levam a assinatura de Marcelo Caldi. Assim como em outros ál‑ buns, uma das marcas de Cantado é a presença de tan‑ gos e baiões. A influência do ritmo argentino é herdada da mãe, a pianista portenha Estela Caldi, de quem apren‑ deu praticamente tudo o que sabe de piano. Forró e Choro Vol. 1 (Delira, 2008) é o disco de maior su‑ cesso do artista, nomeado para o Prémio de Música Brasi‑ leira 2009. Feito em parceria com o multi­‑instrumentista Fábio Luna, é uma celebração da grandiosidade da músi‑ ca brasileira. O disco sintetiza um século de história, des‑ de Ernesto Nazareth, Pixinguinha e Jacob do Bandolim a Radamés Gnatalli e , entre outros, cul‑ minando nas composições originais de Marcelo e Fábio. Já o CD Nesse Tempo (Delira, 2006) é o reflexo das com‑ posições de início da carreira, enquanto o seu primeiro disco, Intrometidos (Independente, 2003), em parceria com o irmão e saxofonista Alexandre Caldi, já revela a sua veia de compositor. Em doze anos de carreira, Marcelo Caldi participou em concertos e gravações ao lado dos maiores nomes da mú‑ sica brasileira, como , Elza Soares, Simo‑ ne, , Geraldo Azevedo, Mart’nália, Zélia Duncan, Wando, Yamandu Costa, Hamilton de Holanda, Marcelo Caldi Léo Gandelman, entre muitos outros.

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