As Crônicas De Lobo Antunes

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As Crônicas De Lobo Antunes PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS VESTÍGIOS DO ESTRANHO NO FAMILIAR: AS CRÔNICAS DE LOBO ANTUNES Suzana Márcia Dumont Braga Belo Horizonte 2007 Suzana Márcia Dumont Braga VESTÍGIOS DO ESTRANHO NO FAMILIAR:AS CRÔNICAS DE LOBO ANTUNES Tese de doutorado apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Letras da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para a obtenção do título de Doutor em Literaturas de Língua Portuguesa. Orientadora: Profa. Dra. Lélia Maria Parreira Duarte Belo Horizonte 2007 FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia universidade católica de minas Gerais. B 813 v Braga, Suzana Márcia Dumont Vestígios do estranho no familiar: as crônicas de Lobo Antunes. Belo Horizonte, 2007 206f. Orientadora: Profa. Dra. Lélia Maria Parreira Duarte Tese (doutorado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Letras. Bibliografia 1. Crônicas portuguesas. 2. Antunes, António Lobo, 1942-. 3. Psicanálise. 4. Memória. 5. Desamparo (Psicologia). 6. Escritura. I. Duarte, Lélia Maria Parreira Duarte. II. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduaçao em Letras. III. Título. CDU:869.0-94 Suzana Márcia Dumont Braga Vestígios do estranho no familiar: as crônicas de Lobo Antunes, Banca examinadora da tese de doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais: ___________________________________________________ Dra. Ana Maria Portugal Maia Saliba – Escola Letra Freudiana- Rio de Janeiro _____________________________________________ Dra. Cleonice Paes Barreto Mourão - UFMG _____________________________________________ Dra. Ivete Lara Camargos Walty - PUC Minas _____________________________________________ Dra. Suely Maria de Paula Silva Lobo - PUC Minas _____________________________________________ Dra. Lélia Maria Parreira Duarte (Orientadora) - PUC Minas _____________________________________________ Prof. Dr. Hugo Mari Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Letras da PUC Minas À força de Terezinha, minha mãe, e à leveza de José, meu pai. AGRADECIMENTOS Em primeiro lugar quero agradecer à Lélia Maria Parreira Duarte que me acompanhou durante este percurso e soube ser, ao mesmo tempo, rigorosa e terna, como convém a quem aposta no crescimento do outro. Também sou grata a Ana Maria Portugal, Cleonice Mourão e Ivete Walty pelas indicações de caminhos teóricos quando me via perdida; aos outros professores do Programa de Pós-Graduação em Letras da PUC Minas pelo convívio acadêmico e, particularmente, a Maria Nazareth Fonseca que me acolheu em minha chegada e a Suely Lobo pelas contribuições no exame de qualificação; ao grupo “As Máscaras de Perséfone: figurações da morte na literatura portuguesa e brasileira contemporâneas”, cujas contribuições teóricas e discussões foram preciosas, particularmente ao Eugênio, Zahira e Glaura; à Carol, pela revisão do texto; à Rosária, por tantos favores prestados ao longo desse tempo de construção. Outras pessoas foram imprescindíveis, entre elas: Fernanda Martins, minha amiga d’além mar, encontrada no percurso desta tese; Celeste, ao interessar-se por este escrito; Malco, Isadora e Anna Carolina por terem crescido e, hoje, cada um a seu modo, ajudar-me a crescer; João e Matheus, cujos sorrisos têm gosto de amanhecer; Isabel, Jacira, Nívea, Sandra, Bruno, Maria Síria, Pedro e Cláudio pela amizade de ontem, hoje e sempre; Márcia Rosa, que acolhe e dá contorno a minha palavraágua; meus colegas do IEPSI, com quem partilho minhas produções; Carlos pela torcida, compreensão e pelo carinho tão intenso. Agradeço, por fim, ao Programa de Capacitação Docente da PUC Minas, cujo apoio foi fundamental para que esta tese fosse escrita. Assim Ao poeta faz bem Desexplicar – Tanto quanto escurecer acende os vagalumes. Manoel de Barros RESUMO Esta tese apresenta como corpus de leitura os três volumes de crônicas do escritor português António Lobo Antunes e tem como objetivo investigar os vestígios do estranho evidenciado no que aparece como familiar nesses pequenos textos. Para isso inicia com uma reflexão sobre o gênero crônica e faz um esclarecimento sobre o que seria o estranho – conceito freudiano para se referir a um tipo particular de produção literária que excede os domínios do princípio do prazer, espaço anteriormente atribuído por Freud à literatura. O estranho estaria associado ao Registro do Real que, de acordo com Lacan, diz respeito ao que não cabe no campo do simbólico, funcionando como causa da escrita e ao mesmo tempo se fazendo presente nela pela via da enunciação. O conceito de estranho também aproxima-se das considerações de Blanchot e Barthes sobre o que é literatura. Pelo fato de ter nascido no jornal e ainda permanecer nele, a crônica costuma ser vista como uma produção literária de menor importância, destinada apenas ao entretenimento. Entretanto, o cronista pode utilizar-se de temas tidos como triviais e familiares para, a partir deles, mostrar o estranho nas fissuras do real. Dessa maneira, a crônica pode revelar verdades mais contundentes do que as que circulam normalmente nos jornais, tematizando questões fundamentais do ser humano. Essa conclusão é válida, tanto para os cronistas de um modo geral, quanto, particularmente para Lobo Antunes. Apesar de desvalorizadas pelo autor, suas crônicas têm uma dimensão importante por si mesmas e no contexto de sua obra. A forma com que o escritor lida com os temas do dia-a-dia se faz pela via dos vazios, fragmentando as noções do tempo cronológico e mesclando memória e fantasia. Os relatos da infância, apesar de marcados pela vida pessoal do autor, ultrapassam a noção de autobiografia e mostram um passado perdido que não é recuperado pela memória nem dá coerência ao presente. O passado é buscado porque se sabe inexoravelmente perdido. Também as relações do narrador consigo mesmo e com o Outro são marcadas pela vivência de perda e ausência de sentido, destituindo qualquer esperança de que o amor, seja em que nível for, constitua uma garantia para o desamparo inerente à condição humana. Por sua vez, a morte é contraponto da vida, sendo impossível conceber a existência sem ela. O estranho vai se fazer presente também na própria escrita, tida como experiência de perda, ela parte de um não-saber e chega a um não-lugar. Lobo Antunes, ao fazer uso do humor e da ironia, aponta uma insubordinação em relação às normas do mundo contemporâneo, assim como em relação à própria linguagem, que, ao ser machucada pela via do estranhamento, apresenta outras possibilidades. Essas viagens ao que falta sentido, pela via da escrita, têm o poder de evidenciar o objeto poético, em sua consistência absolutamente singular, revelando uma verdade que só a arte é capaz. Palavras chave: literatura, psicanálise, estranho, real, memória, desamparo, escritura. ABSTRACT The reading corpus of this thesis comprises the three volumes of chronicles by Portuguese writer António Lobo Antunes, published in 1998, 2002 and 2006, respectively. It aims at investigating how the uncanny can arise between the lines of what appears to be familiar in these short texts. It begins with a reflection on chronicles as a literary genre, and clarifies the meaning of 'uncanny': a term coined by Freud to refer to a particular type of writing that goes beyond the domains of the pleasure principle, later associated with the Registry of the Real, which, according to Lacan, refers to that which does not fit in the field of representation. The Uncanny and the Real are also related to Blanchot’s, Barthes’s and Deleuze’s ideas about literature. Lobo Antunes uses day-to-day issues to show the uncanny in the cracks of the real, dealing with fundamental human questions through textual strategies such as the fragmentation of chronological time, which mixes memory and fantasy and goes beyond the notion of autobiography to show a lost past that is neither recovered by memory nor brings coherence to the present. The narrator's relations with himself and with the Other are marked by the abandonment inherent to the human condition, in which love is linked to loneliness and death is the counterpoint of life. The writing itself, focused inwardly, seeks the (lack of) reasons for writing. The presence of fragmentation in the text, as well as of humor and irony, demonstrate an insubordination to the rules of the contemporary world and to those of language itself, showing that no pre-established truth is capable of explaining the precariousness of living. One concludes that, by revealing this emptiness, writing becomes, in an inside-out manner, a way to deal with abandonment – negativity comes to be viewed as a possibility of life, which reaffirms the contact between psychoanalysis and literature. Key words: literature, chronicle, psychoanalysis, the uncanny, the real, memory, abandonment, writing. SUMÁRIO INTRODUÇÃO........................................................................................................................10 CAPITULO 1 – A CRÔNICA E O ESTRANHO REAL ........................................................16 1.1 – O lugar das crônicas na obra de Lobo Antunes...........................................................16 1.2 – Estratégias textuais ......................................................................................................25 1.2.1 – O tempo fora do tempo.........................................................................................26 1.2.2 – O eu fora
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