Breve História Matemática Da Dinâmica Populacional
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Nicolas Bacaër com José Paulo Viana & Paulo Doutor Breve História Matemática da Dinâmica Populacional Breve História Matemática da Dinâmica Populacional Nicolas Bacaër com José Paulo Viana & Paulo Doutor Nicolas Bacaër Institut de recherche pour le développement [email protected] José Paulo Viana [email protected] Paulo Doutor Universidade Nova de Lisboa [email protected] Os leitores que desejem adquirir a versão em papel deste livro podem enviar uma mensagem para [email protected]. Fotos da capa: a Casa de Portugal - André de Gouveia e a Casa do Brasil na Cidade Internacional Universitária de Paris. Titre original : Histoires de mathématiques et de populations © Cassini, Paris, 2008 Pour l’édition portugaise : © Nicolas Bacaër, 2021 ISBN : 9791034371778 Dépôt légal : mai 2021 Introdução A dinâmica populacional é a área da ciência que tenta explicar de uma forma mecanicista simples as variações temporais do tamanho e da compo- sição de populações biológicas, tais como as dos seres humanos, animais, plantas ou microrganismos. Está relacionada, mas sendo bastante distinta, com a área mais descritiva das estatísticas demográficas. Um ponto comum é que fazem um uso extensivo da linguagem matemática. A dinâmica populacional está na intersecção de vários campos: mate- mática, ciências sociais (demografia), biologia (genética e ecologia da po- pulação) e medicina (epidemiologia). Devido a isto, não é frequentemente apresentada como um todo, apesar das semelhanças entre os problemas en- contrados em várias aplicações. Uma notável exceção em francês é o livro Teorias matemáticas das populações1 de Alain Hillion, que apresenta o as- sunto do ponto de vista do matemático, distinguindo vários tipos de modelos: modelos de tempo discreto (t = 0;1;2...) e modelos de tempo contínuo (t é um número real), modelos determinísticos (os estados futuros são conheci- dos com exatidão se o estado actual for conhecido exatamente) e modelos estocásticos (onde as probabilidades desempenham um papel importante). O livro considera por isso modelos determinísticos discretos, modelos deter- minísticos contínuos, modelos estocásticos discretos e modelos estocásticos contínuos. Neste livro tentei discutir o mesmo assunto, mas de um ponto de vista histórico, com a investigação a ser explicada no seu contexto,incluindo pe- quenas biografias de cientistas. Isto deve facilitar a leitura do livro para os menos familiarizados com a matemática e pode normalmente ajudar a com- preender a origem dos problemas em estudo. Mas este livro não é apenas sobre história. Pode também servir como uma introdução à modelação mate- mática. Pareceu importante incluir os detalhes da maioria dos cálculos para que o leitor possa realmente ver as limitações dos modelos. As partes técnicas são enfatizadas em caixas cinzentas e podem ser ignoradas numa primeira lei- tura. O último capítulo centra-se nos numerosos problemas contemporâneos da dinâmica populacional que se podem tentar analisar de um ponto de vista matemático. Para quem queira saber mais, as listas de referências no final de cada capítulo também incluem sítios web a partir dos quais podem ser descarregados os artigos originais. 1Presses Universitaires de France, Paris, 1986. ii Não foi possível, num livro desta extensão, dar uma imagem completa de todo o trabalho desenvolvido até agora ou falar de todos os cientistas que contribuíram para o assunto. A escolha feita contém necessariamente uma componente arbitrária, particularmente para as últimas décadas. Espero, no entanto, que a amostra escolhida seja suficientemente representativa, e que as pessoas, que trabalham neste campo e cujo trabalho não é mencionado, não fiquem aborrecidas. O público ideal para este livro inclui: • Estudantes do ensino secundário e universitário que se interroguem so- bre que ligações podem existir entre os cursos de matemática que têm de frequentar e o mundo à sua volta, ou estudantes que preparem traba- lhos pessoais sobre um tema relacionado com a dinâmica populacional. • Professores de Matemática que tentam tornar o seu curso mais atrac- tivo. O conhecimento das quatro operações elementares é suficiente para compreender a maioria dos capítulos 1, 2 e 5. O capítulo 3 pode servir como introdução às aplicações de logaritmos. Este livro também cobre: equações de recorrência nos capítulos 1, 3, 8, 11, 14, 21, 23, 24; equações diferenciais nos capítulos 4, 6, 12, 13, 16; equações às derivadas parciais nos capítulos 20, 25; uma equação integral no capí- tulo 10; e aplicações da teoria das probabilidades nos capítulos 20, 25: Halley, 7, 8, 9, 15, 16, 17, 18, 19, 22. • Pessoas já familiarizadas com demografia, epidemiologia, genética ou ecologia e dispostas a comparar a sua área favorita com outras que pos- sam envolver modelos matemáticos semelhantes; leitores interessados na história da ciência. Este livro é essencialmente uma tradução da edição francesa publicada por Cassini (Paris) em 2008 sob o título Histoires de mathématiques et de po- pulations. Alguns capítulos foram reorganizados ou reescritos e acrescentaram- se quatro figuras. Foram corrigidos alguns erros de impressão e aumentaram- se e atualizaram-se as listas de referências no final de cada capítulo. Estas listas incluem sítios web que mostram as obras originais. Uma referência seguida de um URL (endereço de rede) significa que pode ser facilmente en- contrada através de uma pesquisa na World Wide Web. Foi publicada uma tradução inglesa com o título A Short History of Mathematical Population Dynamics (Springer, 2011). Algumas pessoas fizeram observações sobre as várias versões do livro, forneceram referências e imagens ou discutiram questões de direitos de au- tor. Pela tradução portuguesa, estou muito grato a José Paulo Viana e Paulo Doutor, que reviram e corrigiram a tradução automática do software DeepL. Capítulo 1 A sequência de Fibonacci (1202) Em 1202, Leonardo de Pisa, também conhecido como Fibonacci, pu- blicou um livro que popularizou na Europa o sistema numérico decimal indiano que já tinha sido adotado pelos matemáticos árabes. Entre os muitos exemplos dados no livro, um refere-se ao crescimento de uma população de coelhos. É um dos exemplos mais antigos de um modelo matemático para a dinâmica de uma população. Leonardo de Pisa, conhecido como Fibonacci muito depois da sua morte, nasceu por volta de 1170, na República de Pisa, quando esta estava no auge do seu poder comercial e militar no mundo mediterrânico. Por volta de 1192, o pai de Fibonacci foi enviado pela República para o porto de Bejaia, agora na Argélia, para dirigir um posto de comércio. O filho juntou-se a ele pouco depois para se preparar para ser comerciante. Leonardo começou a apren- der o sistema numérico decimal que os árabes tinham trazido da Índia e que ainda hoje está em uso quase na mesma forma: 0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8 e 9. Quando, por questões de negócios, viajava pelo Mar Mediterrânico, compa- rou os diferentes sistemas numéricos e estudou matemática árabe. De volta a Pisa, terminou em 1202 um livro em latim intitulado Liber abaci (Livro de Cálculo) no qual explicou o novo sistema numérico e mostrou como utilizá- lo em contabilidade, conversões de pesos e moedas, taxas de juro e muitas outras aplicações. Compilou também a maior parte dos resultados de álgebra e aritmética conhecidos pelos árabes. Fibonacci analisou no seu livro o que hoje se chamaria um problema de dinâmica populacional, mas apresentou-o apenas como um exercício com- putacional no meio de outros assuntos não relacionados: a secção anterior do livro é sobre números perfeitos que são a soma dos seus divisores, como 28 = 14+7+4+2+1, e a secção seguinte é um problema sobre a partilha de dinheiro entre quatro pessoas que é equivalente a um sistema linear de quatro equações. Eis aqui esse problema, numa tradução do latim: «Um homem tinha um casal de coelhos num certo lugar fechado. Queremos saber quantos coelhos serão criados a partir deste par ao fim de um ano, quando é a natureza deles gerar outro par num único mês e aqueles que nasceram gerarem também a partir do seu segundo mês.» 2 Se houver um par de coelhos recém-nascidos no início do primeiro mês, este par ainda não será fértil após um mês, continuando a haver apenas um par de coelhos no início do segundo mês. Este par de coelhos irá dar à luz outro par no início do terceiro mês, pelo que haverá dois pares no total. O par inicial de coelhos dará novamente à luz um outro par no início do quarto mês. Mas o segundo par de coelhos ainda não será fértil. Haverá apenas três pares de coelhos. Usando notações modernas, seja Pn ser o número de pares de coelhos no início do mês n. O número de pares de coelhos Pn+1 no mês n + 1 é a soma do número Pn de pares no mês n e do número de pares de recém-nascidos no mês n + 1. Mas só os pares de coelhos com pelo menos dois meses dão à luz novos pares de coelhos no mês n + 1. Estes são os pares que já lá estavam no mês n − 1 e o seu número é Pn−1. Por isso Pn+1 = Pn + Pn−1: Temos aqui uma relação de recorrência, que nos dá a população no mês n+1 em função da população nos meses anteriores. Por conseguinte, Fibonacci poderia facilmente construir a seguinte tabela, onde 1 + 1 = 2, 1 + 2 = 3, 2 + 3 = 5, 3 + 5 = 8, etc. n 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 Pn 1 1 2 3 5 8 13 21 34 55 89 144 233 De facto, Fibonacci considerou como condição inicial a situação no mês n = 2. Como P14 = 144 + 233 = 377, obtendo-se 377 pares de coelhos doze meses após o início. Salientou ainda que esta sequência de números poderia continuar indefinidamente. Depois de 1202, Fibonacci escreveu vários outros livros, tais como Prac- tica geometriae em 1220 e Liber quadratorum (Livro dos Quadrados) em 1225.