Do Penhor À Pena : Estudos Do Mito De Don Juan, Desdobramentos E Equivalências / Jorge De Souza Araújo
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1 2 Ilhéus-BA 2005 3 Direitos desta edição reservados à EDITUS - EDITORA DA UESC Universidade Estadual de Santa Cruz Rodovia Ilhéus/Itabuna, km 16 - 45650-000 Ilhéus, Bahia, Brasil Tel.: (073) 680-5028 - Fax: (073) 689-1126 http://www.uesc.br/editora e-mail: [email protected] GOVERNO DO ESTADO DA BAHIA PAULO GANEM SOUTO - GOVERNADOR SECRETARIA DE EDUCAÇÃO ANACI BIspO PAIM - SECRETÁRIA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SANTA CRUZ JOAQUIM BASTOS - REITOR LOURICE LEssA - VICE-REITORA diretora da editUS MARIA LUIZA NORA ProJeto GRÁFico E capa ADRIANO LEMOS IMAGEM DA CAPA DETALHE DA OBRA O BEIJO, ÓLEO SOBRE TELA, DE GUSTAV KLIMT (1907/08) Equipe Editus Diretor de Política Editoral: JORGE MORENO; Revisão: MARIA LUIZA NORA E ALINE NASCIMENTO; Supervisão de Produção: MARIA SCHAUN; Coord. de Diagramação: ADRIANO LEMOS; Design Gráfico: ALENCAR JÚNIOR. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) A663 Araújo, Jorge de Souza. Do penhor à pena : estudos do mito de Don Juan, desdobramentos e equivalências / Jorge de Souza Araújo. - Ilhéus, Ba : Editus, 2005. 484p. Inclui bibliografia. ISBN: 85-7455-096-5 1. Mito na literatura. 2. Don Juan (Personagem lendário) - Literatura. 3. Sedução na literatura. 4. Ensaios brasileiros. I. Título. CDD 809.93351 Ficha catalográfica: Silvana Reis Cerqueira - CRB5/1122 4 Estudo do mito de Don Juan (com seus substratos de amor erótico, sedução e burla) e de elementos de donju- anismo na literatura brasileira, a partir de textos, direta ou indiretamente, inscritos na absorção temática do mito universal de Don Juan Tenório. 5 6 A José Carlos Lisboa, Mestre: Lamento ter ficado tão gigante o que eu quisera apenas fascinante. Mas quem me apresentou a Don Juan a este o mor castigo, o duplo afã. 7 8 Quando chover mulher, quero uma goteira na minha cama. (Parachoque de caminhão de Itabaiana – SE, rodovia Salvador – Aracaju, 14.7.80). Não se pode dormir com todas as mulheres do mundo, mas deve-se fazer esforço. (Provérbio do cais da Bahia, pórtico de Os pastores da noite, de Jorge Amado). As mulheres me criminam, Por eu ser muito pidão: Eu peço porque careço, E elas... por que me dão? (Cantadores, pórtico de “Venturas e desventuras do cai- xeiro-viajante Ezequias Vanderlei Lins, seu Quequé para os íntimos”, do livro Pensão Riso da Noite, de José Condé). 9 Í N D I C E APRESENTAÇÃO, 13 INTRODUÇÃO: QUATRO SÉCULOS DE SEDUÇÃO E BURLA, 17 SOBRE MITO E O MITO DON JUAN, 21 SOBRE O ERÓTICO OU OS PREDICADOS DA TRANSGRESSÃO, 43 SOBRE DON JUAN E DONJUANISMO, 93 SOBRE O MITO DE DON JUAN NA LITERATURA BRASILEIRA, 245 No teatro, 260 Na poesia, 275 Na ficção, 322 No ensaio, 378 BIBLIOGRAFIA, 413 ANEXOS, 421 10 11 12 APRESENTAÇÃO Do penhor à pena: estudos do mito de Don Juan, desdobramen- tos e equivalências, de Jorge de Souza Araujo, parece-nos predestinado a ocupar espaço singular na moderna ensaística brasileira e, quiçá, universal. Trabalho tão extenso quanto denso revelar-nos-ia, se já não conhecêssemos o autor e sua obra, um pesquisador incrivelmente apaixonado e um exegeta incansável. A figura do Don Juan, aqui tão intelectualmente trabalhada, suportada em teorias e interpretações de nomes qualificados em várias esferas do conhecimento, passando pela crítica literária, pela psicanálise, pela filosofia e pela antropologia é, na verdade, figura incrustada no universo dos mortais comuns, alvo de observações irônicas e, na maioria das vezes, obviamente pejorativas. O nosso ensaísta percorre em várias direções, das territoriais às subjetivas, a presença desse sedutor e encantador - o Don Juan - mas essencialmente “falso” em suas ações e intenções. Don Juan, o burlador, demonstra-nos Jorge Araujo, presentifica-se em todas as culturas. Logicamente, nesse cotejo a que se propôs o autor, o don Juan Tenório tem a sua intenção primeira. E a partir daí, dessa presença em todas as culturas, o autor passa a indagá-lo sob os aspectos do mito (discutindo-o com significativa amplitude), vinculando-o ao erótico e às clássicas antinomias do profano e do sagrado, do humano e do divino. Assim, a figura do sedutor burlesco, elevada a “mito do eterno sedutor”, consagrada no imaginário coletivo, ganha relevo ao abrir-se como possibilidade de maior compreensão da natureza humana e de seus ainda enigmáticos recônditos. Perguntas são impostas à luz de teóricos que buscam iluminar esses recônditos. O burlador sedutor não seria mais que a expressão de uma alma homossexual? Por aí vai determinada interpretação psi- canalítica, enquanto o próprio Jorge Araujo, discordante disso, indaga 13 se “não seria um perfil mais humano da própria tragédia pessoal: a angustiada procura de infinitos?” Em seu caminho pedregoso o ensaísta procede a análises e revi- sões sobre a marca do erótico em expressiva extensão da literatura uni- versal de ocidente a oriente, procurando enxergá-la em sua intenção com os interditos estabelecidos pelas religiões, pelas crenças e pelos costumes. Essa visão leva naturalmente ao sentido da transgressão. E daí estaria o don juanismo. Valendo-se do imortal mito grego de Eros, o ensaísta relem- bra-nos que o erótico é, pois, ambíguo: “ora a força perniciosa que conduz à ruína, ora o poder saudável que leva à virtude”. Aí estariam representadas as contradições inerentes ao humano: dor/prazer, vida/ morte. Jorge Araujo, a partir disso, refere que “Eros rege a nossa existência mobilizando as nossas energias para o discurso temporal e memorial, de nossas mais caras expressões emocionais”. Quer ele, com isso, concluir que essa “impregnação” perene de Eros dá o “suporte para a legitimação do percursos de Don Juan nas fronteiras entre o erótico e o interdito”. Mito e erotismo se aproximam, nessa visão desenvolvida pelo autor, pelo fato de que o impulso erótico estaria contido na energia mítica. Desse modo, arriscar-se-ia facilmente a conclusão: Don Juan seria a representação mítica dessa ambigüidade erótica. Essa linha de análise faria, por entender o Don Juan como expressão mítica pré-civilizatória, figura demoníaca, arcaica e instintiva, própria das culturas nas quais eleva-se o interdito. O nosso sôfrego pesquisador, porém, não apenas satisfeito com a inquirição cortante sobre a natureza do Don Juan, suas caracterís- ticas e suas vinculações, procede a uma rigorosa revisão da presença do don juanismo na literatura ocidental e, ainda, especificamente, na literatura brasileira. Revisita o ensaio, a poesia, a ficção e o tea- tro, demonstrando que o “burlador sedutor” emerge, em distintas dimensões e enfoques, nessa rica literatura de um povo ardente e transgressor sob muitos aspectos. Obra de fôlego, Do penhor à pena abre-se a leitores sequiosos de maior compreensão da natureza humana, das relações entre o sagrado e o profano, das dimensões psíquicas constitutivas dessa humanidade, das representações simbólicas que intentam explicar a complexidade da alma e do comportamento humanos. 14 O autor afirma em sua Apresentação que a “complexida- de do tema impede conclusões definitivas”. Concordes com ele, permitimo-nos augurar que trabalho dessa monta reabrirá novas discussões nas esferas acadêmicas e literárias, fazendo vislumbrar amplas possibilidades de leitura do tema e, quem sabe, engendrará novos admiradores da polêmica figura do Don Juan, “esse usur- pador egoístico, ególatra do prazer...” e, ainda, continuando no empréstimo ao autor, “ator de um múltiplo de ações condensadas de insatisfação existencial”. Margarida Cordeiro Fahel Professora aposentada do Departamento de Letras e Artes da Universidade Estadual de Santa Cruz - UESC Salvador, 13 de junho de 2005. 15 16 INTRODUÇÃO DON JUAN, QUATRO SÉCULOS DE SEDUÇÃO E BURLA Coube ao frade mercedário espanhol Gabriel Téllez (1584-1648) — que, com o pseudônimo de Tirso de Molina, completa a trindade do século de ouro no teatro de Espanha (os outros dois são Lope de Vega e Calderón de La Barca) — trazer à luz do eterno debate uma das mais originais e permanentes criações da literatura universal: o Don Juan Tenório. O mito do eterno sedutor foi gerado por Tirso a partir de uma peça trágica, El burlador de Sevilla y el convidado de piedra, aí por volta de 1630. Desde então, o mito se consagrou no imaginário coletivo, passando-se a quase todas as literaturas conhecidas no mundo e tam- bém à ópera (Don Giovanni, de Mozart, o exemplo mais reconhecido). À evocação do religioso de Las Mercedes, sua imortal criação logo avulta, tendo como referência impositiva o fenômeno da infração donjuanesca sublevando, ainda hoje, corações e mentes. O sedutor sem escrúpulos, o burlador iconoclasta — mesmo após ter sofrido mutações e até a insinuação psicanalítica (de um espanhol, o médico Gregorio Marañon, da geração de 98) de que por trás de toda sedução e burla se esconderia uma alma homossexual — permanece condutor de corrupções morais, em prejuízo de um perfil mais humano da pró- pria tragédia pessoal: a angustiada procura de infinitos, a inquirição metafísica permeada pelo satanismo e sensualismo, tudo posto em linha de caracteres dualistas em que entram também as antinomias antidonjuanistas na sociedade hipócrita de hoje. Grandes nomes já se debruçaram sobre o mito Don Juan. Além de Marañon, Ramiro de Maeztu, Ortega y Gasset, Mercedes Saenz -Alonso, em Espanha; Fidelino de Figueiredo e Urbano Tavares Ro- drigues, em Portugal; outros estudiosos na Itália, França, Inglaterra, Alemanha... No Brasil, ensaístas de peso como José Carlos Lisboa, 17 José Carlos de Macedo Soares, Edmundo Moniz, Cláudio de Souza, Guilherme Figueiredo, Osvaldo Orico. E, mais recentemente, Renato Mezan, Renato Janine Ribeiro, entre outros. De nossa parte, sob o ponto de vista do universo mítico don- juanesco, estudamos o seu percurso na literatura brasileira (teatro, poesia, ficção e ensaio), de cuja perspectiva analítica extraímos o presente ensaio. Antes, nos três primeiros capítulos, empenhamos nossa investigação no conhecimento um tanto mais apurado sobre os conceitos de mito, seu perfil, sua estruturação, elaboração e seus modelos, inclusive na perspectiva da sociedade moderna (cap.