América Do Sul E Geografia Da Vida: Comparação De Algumas Propostas De Regionalização
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Capítulo 2 América do Sul e Geografia da Vida: Comparação de Algumas Propostas de Regionalização Juan J. Morrone Introdução Cabrera e Yepes A biota da América do Sul tem sido e continua sendo Cabrera e Yepes3, baseando-se na distribuição dos ma- fundamental para a investigação em biogeografia. Basta míferos sul-americanos, reconheceram as sub-regiões recordar que Darwin1 iniciou a Origem das Espécies da propostas por Sclater15 para a região Neotropical: sub- seguinte maneira: -região guiano-brasileira e sub-região patagônica. “Quando estava a bordo do H.M.S. Beagle como natu- ralista, fiquei muito impressionado com certos fatos da Sub-região Guiano-brasileira distribuição dos habitantes da América de Sul e das Corresponde à parte tropical da América do Sul. Nela relações geológicas entre os habitantes atuais e passa- predominam planícies com selvas ou bosque chaquenho dos desse continente. Parecia-me que estes fatos e savanas com pequenos planaltos. As maiores elevações lançavam alguma luz sobre a origem das espécies — esse se situam ao noroeste da sub-região e estão constituídas mistério dos mistérios, como tem sido chamado por um pelos Andes equatorianos e colombianos e as serras do dos nossos principais filósofos”. norte da Venezuela. Na parte oriental se encontra o pla- Durante o último século e meio foram levadas a cabo nalto do Mato Grosso. Seu limite meridional segue uma numerosas análises biogeográficas para América de Sul, linha mais ou menos oblíqua, do noroeste ao sudeste, tanto referentes a propostas de regionalização como a que parte do norte do Peru e através do leste da Bolívia análise de padrões ecológicos e evolutivos. Da análise e o norte da Argentina alcança o delta do Rio Paraná. exaustiva dessas contribuições, com certeza, surgirão chaves para compreender a evolução da pesquisa biogeo- Sub-região Patagônica gráfica sul-americana. Compreende o restante do continente ao sul da sub-re- As regionalizações biogeográficas constituem ele- gião Guiano-brasileira, abrangendo a maior parte do mentos fundamentais que resultam da investigação Peru, Bolívia, Argentina e toda a região do Chile. Esta biogeográfica. Elas são utilizadas por investigadores que unidade foi denominada por Sclater15 e Wallace16 como precisam descrever a distribuição de um determinado sub-região Chilena, mas Cabrera e Yepes3 preferem a táxon, estabelecer comparações bióticas entre áreas di- denominação de sub-região Patagônica. ferentes ou referir-se a essas áreas para conservação. Por Cabrera e Yepes3 também determinaram divisões de isso, constituem sistemas de referência que são utilizadas menor hierarquia, as quais designaram distritos (consi- pelas mais diversas disciplinas2. derados pelos autores como equivalentes a províncias), Neste capítulo, pretendo fazer uma contribuição à com base em características fisiográficas e a presença historiografia da biogeografia da América do Sul. Do de certas espécies de mamíferos. De acordo com esses vasto material disponível, selecionei 12 propostas de autores, sua proposta é muito similar à de Mello-Leitão17, regionalização3-14. Meu objetivo é analisar criticamente fundamentada nos aracnídeos. Os 11 distritos reconhe- e discutir essas regionalizações. cidos para América do Sul são os seguintes (Fig. 2.1): América do Sul e Geografia da Vida: Comparação de Algumas Propostas de Regionalização – 15 90º 80º 70º 60º 50º 40º 20º 20º 1 10º 10º 1 11 1 2 0º 0º 2 11 10 8 3 10º 10º 2 5 11 3 10 3 20º 20º 5 4 4 10 8 9 5 30º 30º 6 4 7 6 9 6 1. Savânico 2. Amazônico 40º 40º 8 3. Tropical 4. Subtropical 5. Tupi 7 6. Pampásico 9 7. Patagônico 8. Subandino 9. Chileno 10. Andino 50º 50º 11. Incásico 978-85-7241-896-6 7 Escala 500 0 500 1.000 km 90º 80º 70º 60º 50º 40º Figura 2.1 – Mapa com os distritos biogeográficos de Cabrera e Yepes3. 16 – Histórico e Conceitos • Distrito Savânico: norte e centro da Venezuela e leste animais sobre os quais as suas divisões se baseiam sejam da Colômbia, em toda a zona de influência do Rio diferentes (aracnídeos e mamíferos, respectivamente), Orinoco, onde predomina a savana. as zonas delimitadas são muito similares entre si, cor- • Distrito Amazônico: centro do Brasil, nas bacias dos respondendo às principais formações de paisagens do rios Amazonas e Madeira, desde as Guianas e a cos- continente. Apesar de aceitar as sub-regiões Guiano- ta atlântica até o leste da Bolívia, Peru, Equador e -Brasileira e Andino-Patagônica, ele considerou que Colômbia. Corresponde à maior parte da zona Guia- estas eram difíceis de serem delimitadas com segurança, no-Amazoniana de Mello-Leitão17. em decorrência de áreas de transição entre elas. Fittkau4 • Distrito Tropical: leste do Brasil, incluindo o Mato apresentou 13 províncias zoogeográficas, considerando Grosso e o Chaco Boreal do Paraguai e Bolívia. que elas são muito similares aos distritos de Cabrera e • Distrito Subtropical: sul do Paraguai, Uruguai, parte Yepes3, mas levemente modificadas (Fig. 2.2): limitante do Brasil e a maior parte da bacia do Plata até o noroeste da Argentina dentro da formação • Província da América Central: parte da província chaquenha. Centro-americana da sub-região Guiano-Brasileira. • Distrito Tupi: sudeste do Brasil. Corresponde à porção Área de florestas chuvosas tropicais da costa do Pa- oriental da zona Tupi-Guaraniana de Mello-Leitão17. cífico no noroeste da Colômbia. • Distrito Pampásico: litoral e centro da Argentina, • Província de Caquetío: bacia do Orinoco na Venezue- através das pampas de Buenos Aires, Santa Fé e o la e oeste da Colômbia, onde predominam as savanas. leste de Córdoba e La Pampa. Corresponde à porção Corresponde ao distrito Savânico de Cabrera e Yepes3. ocidental da área Tupi-Guaraniana de Mello-Leitão17. • Província da Hileia: região de florestas chuvosas • Distrito Patagônico: alcança o limite mais austral de tropicais dentro da área dos rios Amazonas e Orinoco. todos os distritos, compreendendo toda a estepe Corresponde ao distrito Amazônico de Cabrera e patagônica e os planaltos ocidentais até as proxi- Yepes3. midades da cordilheira meridional, continuando até • Província Bororo: savanas e estepes desde o norte do o interior da Argentina, com forma de cunha entre os Chaco até a cabeceira do Rio Tocantins e o Rio Para- distritos Pampásico e Subandino. guai. Corresponde a parte do distrito Tropical de • Distrito Subandino: ocupa a maior parte dos vales in- Cabrera e Yepes3. teriores e zonas de elevação média na Argentina, desde • Província Cariri: nordeste do Brasil, distrito semiári- 45º S até o altiplano da Bolívia e Peru. Na Argentina do na região dos rios Paranaíba e São Francisco. corresponde em sua maior parte ao Monte ocidental. Corresponde a parte do distrito Tropical de Cabrera Pode dividir-se em uma zona norte e outra ao sul. e Yepes3. • Distrito Chileno: ocupa a maior parte dos vales e alti- • Província Tupi: florestas costeiras do sul do Brasil, tudes menores do Chile, exceto o extremo sul, que é desde o sul da Bahia até Santa Catarina. uma continuação do distrito Patagônico, e a parte mais • Província Guarani: sul do Paraguai, sul do Brasil, setentrional, que pertence ao Andino ou ao Incásico, Uruguai e nordeste da Argentina. É uma área de segundo as zonas de altitude. transição entre as sub-regiões Guiano-Brasileira e • Distrito Andino: grandes altitudes da Cordiheira dos Andino-Patagônica, que inclui formações florestadas, Andes, desde o oeste da província de Mendoza (Ar- savanas e estepes. gentina) até o sul do Equador através dos cumes entre • Província Incásica: áreas de transição entre as regiões Argentina, Chile, Bolívia e várias cadeias montanho- Guiano-Brasileira e Andino-Patagônica, e a província sas do Peru. da América Central. Estende-se desde as áreas cos- • Distrito Incásico: extremo norte do Chile, na zona de teiras baixas no norte do Chile, através dos vales menor altitude, junto com a parte pacífica do Peru, alinhados na Bolívia e no Peru, até as regiões monta- Equador e Colômbia, e adentrando até o noroeste na nhosas da Colômbia e o oeste da Venezuela. porção montanhosa da Venezuela. • Província da Pampa: estepes das áreas centrais e costeiras da Argentina. • Província da Patagônia: estepe patagônica e Monte Fittkau setentrional. • Província Subandina: lado oriental e áreas de altitude Fittkau4 analisou as propostas de Mello-Leitão17 e Ca- moderada na Argentina, desde 45º S até o altiplano brera e Yepes3, encontrando que, mesmo que os grupos da Bolívia e do Peru. América do Sul e Geografia da Vida: Comparação de Algumas Propostas de Regionalização – 17 80º 70º 60º 50º 40º 10º 10º 1 2 8 0º 0º 3 10º 10º 5 4 13 20º 11 20º 6 7 30º 30º 9 Províncias Zoogeográficas Sub-região guiano-brasileira 12 1. América Central 2. Caquetío 40º 3. Hileia 40º 4. Bororo 10 5. Cariri 6. Tupi 7. Guarani 8. Incásica 978-85-7241-896-6 Sub-região andino-patagônica 9. Pampa 50º 10. Patagônia 50º 11. Subandina 12. Chile 13. Andes 90º 80º 60º 50º 40º 30º 20º Figura 2.2 – Mapa com as províncias zoogeográficas de Fittkau4. 18 – Histórico e Conceitos • Província do Chile: vales e áreas de altitude modera- • Terras Altas da Guiana e Brasil: altitudes de 1.000m, da no Chile, exceto nos extremos norte e sul. alcançando altitude máxima de 3.000m. • Província dos Andes: áreas altas dos Andes desde o • Leste não Tropical: desde a bacia do Paraná-Paraguai norte da Argentina até o Equador. até os Andes, sem exceder os 200m de altitude. Tem- peratura média no inverno de 10 a 20ºC e 1.000 a 1.500mm anuais de chuva. A vegetação característica Kuschel é floresta seca, com cactos e arbustos (Chaco). Kuschel5 reconheceu duas sub-regiões, baseando-se na distribuição de insetos da ordem Coleoptera. A sua pro- Oeste Andino posta é muito similar à de Sclater15 e de Wallace16.