A Maria Da Fonte E a Patuleia. Alguns Problemas *

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A Maria Da Fonte E a Patuleia. Alguns Problemas * E DEBATES A Maria da Fonte e a Patuleia. Alguns problemas * Aborda o 11resente artigo alguits dor problemas Esta dualidade entre pólos teóricos oponíveis lei3antados pelo estz~doda Marja da Fonre e da Pn- - espontaneidade e enquadramento político - ruleia enquanto renipos de Kuerra civil eni que as constitui um item útil para nortear a análise das principais forças soci~olítk'osse exprimem. pro- várias fases da Maria da Fonte e da Patuleia se bem hlenias esres.frequentemei?tedisciit~dos pela biblio- que seja evidentemente improvável ou mesmo im- dadelenquodi.an~e~?topolítjcn na Maria da Fonte e A espontaneidade ' é um tópico dificilmente na Paruleio, a natureza destes movimentos e a abordável na medida em que os seus vestígios são roririnuidade ou náo entre eles -que o presente assar vagos. Ela não será definida, como à partida arfigo foi esri~itiirado. poderia parecer ser possível, pela inexistência de coordenação da acção colectiva. Considerarei, sim, como seus elementos balizadores, por um lado, a I. A dicotomia espontaneidade1 concertafão da acção apenas no quadro das comuni- Ienquadramento político na Maria dades locais ' e. oor outro. a autonomia ideolóeica- da Fonte e na Patuleia face às correntes políticas organizadas então exis- tentes e actuantes. A dicotomia espontaneidadelenquadramento Já o enquadramento político é um tópico bas- político na Maria da Fonte e na Patuleia é um tema tante mais passível de ser trabalhado pois consubs- muito discutido pela historiografia recente sendo tancia-se em organizações ou movimentações que pertinente a sua análise. Neste sentido, tentarei rea- deixam vestígios mais palpáveis, traços materiais lizar um teste da validade desta dicotomia ao longo mais nítidos. O enquadramento político parece ter- destes movimentos, antes de mais numa perspectiva -se efectuado essencialmente através das Juntas temática embora utilizando os marcos da história Govemativas - a formacão de Juntas foi tão sieni- política tradicional. Assim, considerarei a primeira ficativa que terá iniciado, segundo a historiografia, fase da Maria da Fonte como decorrente do seu uma nova fase da rebeliáo "- e ainda através de eclodir à formação da primeira Junta e demissão de outras formas de actuacão das forcas, .~olíticas orea- Costa Cabral; a segunda fase da Maria da Fonte nizadas (miguelistas, setembristas e outros anti-ca- como a verificada desde a formação da primeira bralistas) - para além da sua atitude nas Juntas, Junta e queda de Costa Cabral até ao golpe contra- estas correntes exprimiram-se na imprensa em geral -revolucionário de 6110/1846; e a Patuleia como e nos cargos políticos e militares ocupados, a nível delimitada por este golpe contra-revolucionário e central, desde a demissão do governo cabralista até pela derrota popular assumida na Convenção do à Emboscada, e a nível da administração local, Gramido. mesmo nas áreas onde náo se constituíram Juntas. - - - * ~stetexto é urna adaptação de alguns capítulos do relatório da lição que constitui &componentepedagógica das Provas de Aptidão Pedagógica e Capacidade Científica defendidas em Julho de 1987 no I.S.C.T.E. 159 Dadas as características apontadas dos itens cipação feminina nas práticas religiosas, mais inten- .espontaneidade>> e renquadramento político>>,o siva nesta época do que a masculina, talvez contri- segundo será naturalmente bastante mais desenvol- bua ainda para explicar o maior peso das mulheres vido ao longo do texto do que o primeiro. na obstaculização ao cumprimento das Leis da Saúde. Na segunda fase da Maria da Fonte, verifica-se I. 1. Espontaneidade uma maior clareza política com a formação genera- lizada de Juntas e com o sucesso de uma das rei- Na primeira fase da Maria da Fonte, a partici- vindicações (políticas) da Maria da Fonte: a demis- oação.. popular.. é grande, viva e sentida. são dos Cabrais. Tanto os campos como as cidades, embora com Porém, no Verão de 1846, realidades como a obiectivos diferenciados e de forma diversa. se re- persistência de guerrilhas no Norte e a resistência voltaram e armaram. Nos campos do Norte, surgi- ao desarmamento e à dissolução de várias Juntas ram as guerrilhas. Vilas e cidades - como, por parecem manifestar a continuidade de formas de exemplo, Guimarães e Braga - foram invadidos acção e comportamentos que se situam do lado da por populares empunhando armas assiin como ins- «espontaneidade» humentos de trabalho, verificando-se também mo- As guerrilhas sobreviventes do Norte foram vimentações no interior dos centros urbanos. frequentemente dirigidas por eclesiásticos, nomea- A própria pluralidade de explosões, as suas diferen- damente mieuelistas.- salientando-se entre elas. a do ciadas motivações e a diversidade de objectivos Padre Casimiro. Este padre de Vieira do Minho expressos manifestam o carácter em larga me- chegou a comandar ceica de 3000 homens na re- dida espontâneo dos primeiros tempos da Maria da -eião. Primeiramente aclamado ~IntendenteGeral da Fonte. Comarca da Póvoan. intitulou-se posteriormente No Norte rural, as mulheres e o clero tiveram «Defensor das Cinco Chagas e Comandante Geral uma acção relevante das Forgas Populares do Minho e Trás-os-Mon- Membros do clero, sobretudo dos escalões tem ', mantendo a sua guerrilha em acção desde o mais baixos da hierarquia, dirigiram guerrilhas e detonar da Maria da Fonte até ao fim da Patuleia. áreas sublevadas Os eclesiásticos eram frequente- Foi precisamente no Verão de 1846 que o Padre mente importantes notáveis locais, tendo um grande Casimiro manifestou, numa carta por si escrita e prestígio e autoridade e um papel mediador essen- depois aprovada pelos populares, algumas reivindi- cial. Destacaram-se eclesiásticos miguelistas e se- cações dos partidários da rebelião: entre outras coi- tembristas assim como cabralistas. Ficaram conheci- sas, reclamava contra o govemo e os tributos - dos nomes como, por exemplo, os do cónego Mon- nomeadamente a propósito das estradas -, lembra- talverne, do padre José das Taipas, do abade de va o govemo de D. João VI e de D. Miguel, pedia Priscos, do padre António Teixeira das Quintas e um sufrágio eleitoral alargado apenas limitado pelo sobretudo o do Padre Casimiro '. analfabetismo e uma reorganização da Guarda Na- Perdurou também, na memória culta e popular cional, onde seria facilitada a entrada e onde os o papel das mulheres na rebeliáo A própria desig- oficiais seriam escolhidos por votação no seu inte- nação da revolta - Maria da Fonte - evoca a rior 'O. Ora estas reivindicaiões dificilmente podem importância das mulheres, designação tanto mais ter resultado aoenas de um enauadramento ~olitico curiosa quanto se trata, segundo a historiografia, de miguelista, mesmo admitindo que as formas deste. uma designação mítica. menos conhecidas, possam ter sido mais subterrâ- As mulheres tiveram frequentemente um papel neas e mais próximas de uma dinâmica local de essencial nos motins populares do Antigo Regime concertação da acção colectiva. que foi em parte o caso da Maria da Fonte. Para Refira-se, agora, a resistência ao desinembra- além disso, a mulher tinha uma posição relevante mento das Juntas. Por um lado, houve uma resis- na vida e no trabalho no Noroeste Atlântico. Sendo tência a dissolução de certas Juntas encabeçada por uma região de emigração, o peso das mulheres acti- elas próprias enquanto náo estiveram seguras de vas era, em consequência, importante. Era também alguns dos seus objectivos terem sido atingidos ou uma área em que a pequena exploração agrícola estarem em vias de sê-lo - como, por exemplo, exigia a participação no trabalho rural do maior nos casos das Juntas de Coimbra, Santarém e Evo- número de membros da família camponesa. A parti- ra ". Todavia. por outro lado, poderá ter havido uma resistència que escapou ao enquadramento de que será exemplo a marcha dos pulares sobre Lis- boa detida por Passos Manuel I'. São, pois, numerosos os indícios da continua- ção de uma participaçáo popular espontânea forte na segunda fase da Maria da Fonte. Na Maria da Fonte, constituiran-se Juntas em Na Patuleia, apesar do carácter mais efectivo Viana do Castelo, Braga, Penela (Barcelos), Guima- do enquadramento politico, a espontaneidade conti- rães, Vila Real, Aveiro, Lamego, Viseu, Guarda, nua a existir. Coimbra. Leiria, Porto de Mós. Nazaré. Batalha, Dela serão manifestações, por exemplo, o Alcobaça, Caldas da Rainha, Lourinhã, Torres Ve- comportamento das massas populares mais exalta- dras, Santarém, Portalegre, Évora. Setúbal. Santiago das no Porto aquando da prisão do Duque da Ter- do Cacéin, Beja, Loulé. Alcantarilha. Faro ". As ceira, as movimentaçòes rurais na área de Sintra Juntas distribuíam-se, pois, por todo o país, haven- pouco depois da Emboscada, e certas actuaçòes de do porém mais Juntas no litoral do que no interior guerrilhas e de batalhões de voluntários I'. Contu- - coincidindo com a área de maior concentração do, estes «excessos. poderão não ser sintomáticos de centros urbanos (e mais importantes); contudo, de espontaneidade: não estariam os setembristas in- nas principais vilas e cidades do interior, formaram- teressados na agitação popular no Porto? Para alem -se geralmente Juntas. disso, muitas guerrilhas foram lideradas por indivi- A primeira Junta, a de Vila Real, surgiu a 10151 dualidades políticas assim como os batalhões de vo- 1846; ora, tendo a Maria da Fonte tido inicio entre luntários foram apoiados e utilizados pelas forças 19 de Março e meados de Abril (consoante as anti-cabralistas organizadas. Todavia, nestas situa- várias versòes). decorreu entre um a, no máximo, ções parecem ter continuado a existir comportamen- dois meses entre os primeiros motins e a formação tos populares em larga medida autónomos. de órgãos de poder alternativo lc. Enquanto a primeira Junta surgiu a 101511846, a última consti- tuída, a de Penela, aliás um caso tardio, formou-se a 141611846". Foi, pois, relativamente rápida quer I. 2. Enquadramenfo Político a constituição das Juntas quer a sua difusão. Na Patuleia, foi no Porto que surgiu a primeira Junta, que veio aliás a liderar as forças anti-gover- namentais. Logo. em seguida, constituiram-se Jun- Apchir J<icn.pJrdncnti~ puliti:~ rjpida c cfi- ri, cm \ luna .i*>(.'~\tcl.~.
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    113 Nacionalismo e antiliberalismo em Portugal. Uma visão histórico-política (1820-1940)Ï Profesor Asociado del Departamento de Historia e investigador del Centro de Historia de Facultad de Letras de la Universidad de Lisboa (Portugal). Licenciado en Historia, magíster y doctor en Historia Contemporánea de la misma Universi- dad. Entre sus publicaciones recientes se encuentran: Partidos e Programas. O Campo Partidário Republicano Português (1910-1926) (Coimbra: Imprensa da Universidade Ernesto de Coimbra, 2008); “Abel Varzim, o Catolicismo Social e a Crítica dos Totalita- Castro Leal rismos”, en Poder e Moralidade. O Totalitarismo e outras Experiências Anti-liberais na Mo- dernidade, ed., José Maurício de Carvalho (São Paulo: Annablume/Universidade Federal de São João del Rei, 2012), 91-104; “Modernistas Portugueses e Ideias de Europa. Entre o Cosmopolitismo e o Nacionalismo”, en Repensar a Europa. Europa de Longe, Europa de Perto, eds., José Eduardo Franco, Beata Cieszynska y Teresa Pin- heiro (Lisboa: Gradiva, 2013), 131-138. [email protected] Artículo recibido: 03 de febrero de 2014 Aprobado: 12 de junio de 2014 Modificado: 18 de junio de 2014 DOI: dx.doi.org/10.7440/histcrit56.2015.05 Ï El presente artículo es producto de una pesquisa mayor titulada “Nacionalismo e Antiliberalismo em Portugal, 1789-1945”, la cual no recibió ningún tipo de financiamiento. Aspectos preliminares de este artículo fueron presentados en “Antiliberalismo. Vias de pensamento e de acção”, em Dança dos Demónios. Intolerância em Portugal (Antissemitismo, anticlericalismo, anti-islamismo, antijesuitismo, antifeminismo, antiliberalismo, antiprotestantismo, antimaçonismo, anticomunismo, antiamericanismo), eds. António Marujo e José Eduardo Franco (Lisboa: Círculo de Leitores/Temas e Debates, 2009), 484-533.
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