O Lado Feminino Da Revolução Dos Cravos Rivista Di Storia E Storiografia Contemporanea Online
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Storia e Futuro O lado feminino da Revolução dos Cravos Rivista di Storia e Storiografia Contemporanea online http://storiaefuturo.eu/lado-feminino-revolucao-dos-cravos/ O LADO FEMININO DA REVOLUÇÃO DOS CRAVOS Posted on 9 Luglio 2014 by Storia e Futuro Categories: Articoli, Numero 25 - Articoli, Numero 25 - Febbraio 2011 Page: 1 Storia e Futuro O lado feminino da Revolução dos Cravos Rivista di Storia e Storiografia Contemporanea online http://storiaefuturo.eu/lado-feminino-revolucao-dos-cravos/ Marco Gomes Abstract Lo scopo principale di questo lavoro è quello di mostrare come la partecipazione attiva delle donne portoghesi alla vita pubblica è cambiato dopo il crollo del regime autoritario. A partire dalle modalità di azione e di comunicazione che hanno caratterizzato la presenza femminile nella rivoluzione del 25 di aprile 1974, per arrivare al ruolo svolto da migliaia di donne nella sfera politica, sociale e culturale, vengono analizzati i molti canali di espressione e di intervento che dalla Rivoluzione dei garofani hanno avuto origine, imprimendo una forte accelerazione al processo di emancipazione femminile. Alcune rivendicazioni delle donne si sono materializzate. Altre no. Tuttavia in Portogallo la transizione verso la democrazia ha avviato un percorso evolutivo che a tutt’oggi non si è ancora fermato. Abstract english The main purpose of this paper is to show how Portuguese women’s life changed after the collapse of the authoritarian regime. We intend to describe the ways of action and communication that characterized women participation during the revolution started on 25 April 1974. Thousands of women played an active role in society, in the political, social and cultural spheres. The extraordinary liberation that came out of the “Carnation Revolution” has originated many channels of expression and intervention. Some desires had materialized. Others had not. However the Portuguese transition to democracy started an evolutionary course that has not yet stopped. A conspiração do dia 25 de Abril de 1974 marcou o início de uma profunda ruptura com as estruturas político-sociais dominantes em Portugal. Os militares colocaram um ponto final na mais longa ditadura europeia do século XX e assumiram a função de agentes de mudança no contexto da realidade histórica. Essa acção fracturante contribuiu em larga escala para o aparecimento de um dos aspectos mais específicos do processo revolucionário português: os movimentos populares. Milhares de mulheres e homens decidiram lutar por uma cidadania até ao momento negada. Imaginaram um país capaz de realizar sonhos e colocaram em marcha uma dinâmica social que impressionou pela vitalidade, pela participação, pela dimensão associativa, constituindo para muitos uma escola cívica. No entanto, a outra face desta exteriorização popular remete também para as contradições geradas por décadas de autoritarismo, obscurantismo e repressão. Portugal foi abalado por fortes tensões políticas e sociais. Decorrente do combate contra a injustiça e a intolerância, ganhou força a problemática relacionada com a desproporção de poder que desde Page: 2 Storia e Futuro O lado feminino da Revolução dos Cravos Rivista di Storia e Storiografia Contemporanea online http://storiaefuturo.eu/lado-feminino-revolucao-dos-cravos/ sempre regulou as relações masculino-femininas, a desigualdade entre os dois sexos. A mulher portuguesa que acordou no dia 25 de Abril de 1974 vibrou com a acção dos soldados revoltosos. Chegara o momento de destruir – ou pelo menos minimizar – os obstáculos que os demais períodos históricos haviam colocado à afirmação do género feminino. Um desafio não desprovido de dificuldades. A mulher ocupou então o espaço público e partiu em busca da sua identidade, direitos, dignidade e respeito por uma incontornável alteridade. O restabelecimento das liberdades de expressão, pensamento e associação desempenhou um papel nuclear no combate por estes desígnios. Num dos importantes contributos para os Estudos de Género em Portugal, Manuela Tavares (2000, 55) fala na existência de uma “cidadania feminina”, consequência das mutações sociais e políticas que se seguiram à queda do Estado Novo. Integrada nummodus vivendi profundamente heterogéneo, a mulher conquistou espaços de intervenção e participou nos grandes debates/confrontos suscitados pelo período revolucionário. Essa necessidade de expressão, potência comunicativa, versou o âmbito político, social e cultural. E recorreu a diversos tipos de linguagens (verbal, cinésica, iconográfica) e canais de transmissão (jornais, boletins, revistas, manifestos). Mesmo considerando que os movimentos sociais em que esteve inserida nem sempre traduziram as reivindicações intrínsecas à “questão feminina”, o 25 de Abril mexeu com o íntimo da mulher, mobilizou o seu talento e capacidades, deu-lhe a palavra nas greves e nas manifestações, nos sindicatos ou nas assembleias de trabalhadores. E se falamos deste excitante mergulho discursivo, espontâneo ou pensado, é porque existiu um tempo anterior. Um tempo onde a condição feminina sofreu com o conservadorismo de uma organização política e social resistente à mudança e que atribuía aos homens e às mulheres funções sociais “naturalmente” dissemelhantes. Esse foi o tempo do Estado Novo. Em O Segundo Sexo, Simone de Beauvoir (1974, 26) insurgiu-se contra o pensamento que encara o conceito de passividade como um dado biológico da mulher. Beauvoir preferiu antes afirmar que esse destino passivo lhe era “imposto pelos seus educadores e pela sociedade”. As palavras da filósofa assumem um carácter axiomático quando revisitamos a sociedade arquitectada por Oliveira Salazar. De facto, o regime corporativista procurou, insistentemente, instrumentalizar a diferença entre os sexos em favor de determinados estereótipos mentais, confinando a mulher às funções domésticas e familiares. Esta reconfiguração da diferença definiu e acentuou-lhe o estatuto subalterno. E nem mesmo a Revolução de Abril facilitou a assimilação consistente de uma nova perspectiva de género. Durante muito tempo escasseou o conhecimento sobre a acção e o pensamento de importantes figuras e movimentos internacionais feministas: das mulheres darevolução francesa combatentes pela liberdade aos grupos de 1840 saídos da Convenção de Sêneca Falls, das anarco- Page: 3 Storia e Futuro O lado feminino da Revolução dos Cravos Rivista di Storia e Storiografia Contemporanea online http://storiaefuturo.eu/lado-feminino-revolucao-dos-cravos/ feministas Emma Goldman e Voltairine de Cleyre às timoneiras da segunda vaga do feminismo, já no século XX, passando por Simone de Beauvoir, Betty Friedan, ou pelos Women Liberation Movement. A sociedade patriarcal, as suas representações simbólicas e a memória colectiva dos portugueses não podiam ruir de um dia para o outro. Um dos exemplos significativos desta incompreensão surgiu da evocação de uma queima de soutiens não confirmada numa manifestação no Parque Eduardo VII, em Janeiro de 1975. Sobre a iniciativa feminina, destinada a reivindicar o direito à liberdade sexual e ao aborto, logo recaíram comentários pejorativos, deturpações de alguns jornais e, no local, impropérios verbais e físicos por parte do sexo oposto. Maspor agora o objectivo desta reflexão é bem mais modesto: demonstrar como a mulher desempenhou um papel relevante durante o processo revolucionário português; focar a dimensão criativa dos signos e dos meios de comunicação utilizados; e aludir às principais alterações que afectaram o seu quotidiano. Estado Novo: a mulher “naturalmente” diferente e ausente Mais do que “pessoas individuais, detentoras de direitos”, a ideologia do Estado Novo assemelhava as mulheres a “seres mitificados” (Vicente 2009, 455). As directivas educadoras confinavam a mulher ao lar, local de eleição para desenvolver a sua actividade de esposa atenta e mãe sacrificada. O trabalho feminino fora de casa não era apreciado porque perturbava a coesão familiar. A submissão em relação ao homem, ao qual devia obediência, figurava nos documentos jurídicos. O conservadorismo católico regulava os costumes e a moral. E a censura, longe de se resumir ao sistema anedótico do corte acéfalo e do óbice imbecil, modelava as ideias e procurava conservar o ethos cultural definido. Salazar investiu forte na criação de estruturas direccionadas para inculcar um determinado sistema de valores. Importava acabar com o “declínio social” provocado por anos de demoliberalismo. A Obra das Mães pela Educação Nacional e a Mocidade Portuguesa Feminina desempenharam essa função de formatação ideológica. As duas organizações nasceram no biénio 1936-1937, anos da inspiração fascista, e colocaram em prática aquilo que Patrick Champagne (1990, 22) designa por “trabalho de imposição”, sempre com o intuito de formular uma verdadeira “crença política”. A oposição feminista ao sistema autoritário caracterizou-se essencialmente por um “discurso de lamento”. O pensamento da mulher recuou para “posições de defesa e de resistência”, procurando “sobreviver aos sucessivos ataques de que foi alvo” (Vicente 2009, 455). É preciso recuar ao tempo em que Salazar ainda não tinha disseminado as “categorias” que viabilizam uma determinada “percepção do mundo social”, utilizando a terminologia de Pierre Bourdieu (1999), para encontrar uma relevante geração de mulheres feministas. Tal como na Europa e nas Américas elas surgiram no século XIX, destacando-se, através da escrita, os nomes de Antónia Pusich (1805-1883), Maria Amália Vaz de Carvalho (1847-1921) ou Carolina Michaëlis (1851-1925),