384 a REVOLTA DOS Marinhemos • 1910 Helio Leoncio Martins a Revolta Dos Marinheiros Foi Um Dos Maiores Abalos ,Que Sofreu a Sociedade Brasileira
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A REVOLTA DO MARIN . .' IROS HÉLIO LEÔNCIO MARTINS ·brasiliana volun1e 384 A REVOLTA DOS MARINHEmos • 1910 Helio Leoncio Martins A Revolta dos Marinheiros foi um dos maiores abalos ,que sofreu a sociedade brasileira. O povo que chegou a chorar de emoção patrió• tica ao ver entrar à barra o Minas Gerais - o maior encouraçado do mundo - acordou subitamente sa bendo que aquele objeto do orgulho nacional estava com os canhões vol tados para a ciuade, ameaçando bombardear o Rio de Janeiro. A surpresa, o pânico generali zaram-se e a crise se resolveu, afi nal, por uma anistia votada a toque de caixa com o apoio da oposição. O episódio tem sido objeto de vários estudos, nem sempre isentos de paixão. Este que hoje aparece é resultado de uma investigação honesta e profunda nos documentos originais, nos relatórios oficiais e no noticiário da época. O Vice-almirante da Reserva da Marinha Helio Leoncio Martins nasceu no Rio de Janeiro em 1915 e, apenas formado na Escola Naval, especializou-se em Hidrografia e Navegação. Após cursos de aper f eiç~amento no Brasil e nos Esta dos- Unidos, foi o autor do levanta mento hidrográfico da costa de vários estados brasileiros. Pertence a diversas instituições científicas e é autor de diversos estudos de his tória naval. Dirige ou assessora atualmente várias empresas técnicas privadas. A.J.L. H~LIO LEONCIO MARTINS O autor, Vice-almirante Refor mado Helio Leoncio Martins, nas ceu no Rio de Janeiro, em 1915, formou-se na Escola Naval e espe cializou-se em Hidrografia e Nave gação. Nesta especialidade, traba lhou muitos anos no levantamento das cartas marítimas e fluviais brasileiras. Além dessas atividades, fez cursos de aperfeiçoamento no Brasil e nos Estados Unidos e comandou diversos navios, entre eles um caça-submarinos na Segun da Guerra Mundial, tomando parte na Campanha do Atlântico Sul, e foi o primeiro comandante do Navio-Aeródromo Minas Gerais, em 1960. :e membro do Instituto de Geografia e História Militar, tendo produzido uma série de estudos, livros e conferências rela cionados com a História Naval brasileira. Depois que deixou a Marinha ativa, dirigiu e assessorou empre sas privadas e foi Diretor do Insti tuto de Administração e Gerência da Pontifícia Universidade Cató• lica do Rio de Janeiro. SERVIÇO DE DOCUMENTAÇÃO GERAL DA MARINHA COMPANHIA EDITORA NACIONAL ISBN 85-04-00218-7 A REVOLTA DOS MARINHEIROS 1910 BRASILIANA Volume 384 Direção de AMl!RICO JACOBINA LACOMBE Ministro da Marinha Almirante-de-Esquadra Henrique Saboia Secretário-Geral da Marinha Almirante-de-Esquadra Henrique Octávio Aché Pillar Diretor do .Serviço de Documentação Geral da Marinha Max Justo Guedes Hélio Leôncio Martins A REVOLTA DOS MARINHEIROS 1910 SERVIÇO DE DOCUMENTAÇÃO GERAL DA MARINHA COMPANHIA EDITORA NACIONAL Dados de Catalogação na Publicação (CIP) Internacional (Câmara Brasileira do ·uvro, SP, Brasil) ., Martins, Hélio Leôncio. M343r A Revolta dos Marinheiros, 1910 / Hélio Leôncio Martins. - São Paulo : Editora Nacional ; (Rio de Janeiro) : Serviço de Documentação Geral da Marinha, 1988. (Brasiliana ; v. 384) ISBN 85-04-00218-7 l. Brasil. Marinha - História 2. Brasil - História - Revolta da Esquadra, 1910 3. Brasil - História naval I. Título. II. Série. CDD-'::jL056 88-1807 -359.00981 índices para catálogo sistemático: 1: Brasil : História naval 359.00981 2. Revolta da Chibata : Brasil : História 981.056 3. Revolta da Esquadra : Brasil : História 981.056 4. Revolta de João Cândido : Brasil : História 981.056 5. Revolta dos Marinheiros, 1910 : Brasil : História 981.056 INTRODUÇÃO O ano de 1910 apareçia com a perspectiva de se constituir em um marco na vida e na eficiência bélica da Marinha brasileira, substituindo fase que se caracterizou pela estagnação de suas ati vidades. Terminada a Guerra do Paraguai, não havendo maiores pro blemas internacionais a serem considerados, juntamente com as dificuldades fin!}nceiras por que passava o Império, e mais a Re volução Industrial que se implantara nas nações adiantadas, que não tivemos capacidade técnica e cultural para acompanhar, de tudo isto resultou a Marinha brasileira atravessar um período de lamentável decadência. Houve· esforços isolados para modificar essa situação, adqui rindo-se os Encouraçados Aquidabã e Riachuelo e criando-se a chamada Esquadra de Evoluções, que pouco durou como organiza ção. Alguns almirantes existiam de grande capacidade intelectual e profissional, comó Custódio José de Mello, Saldanha da Gama, Arthur Silveira da Motta (Barão de Jaceguay), Balthazar da Silveira, mas o atraso e a obsolescência da Armada eram sensíveis em todos os aspectos. A Revolução de 1893, seqüela de outros movimentos políticos menores desde 1891, terminou por cindi-la em dois partidos adver sários. Ao mesmo tempo, seu equipamento, por falta de orientação, devido inclusive à confusão provocada pela transição por que os instrumentos da guerra naval passavam, e nossa dependência de s suprimento estrangeiro, compunha-se de um conjunto heterogêneo de navios a vela, mistos ou já metálicos e mecânicos, de proveniên cias diversas, não obedecendo à Política .definida, mal mantidos e operados por guarnições tecnicamente inferiores. Em 1904, contudo, as exigências da Polícia Internacional se guida pelo Barão do Rio Branco, Ministro das Relações Exteriores, provocaram enérgica reação a tal estado de coisas, permitida por relativa recuperação das finanças do País. O programa de reapa relhamento naval, elaborado pelo Almirante Júlio de Noronha, Mi nistro da Marinha na época, aprovado no Congresso graças aos esforços do Deputado Laurindo Pitta, e modificado pelo ministro que o sucedeu, Almirante Alexandrino de Alencar, representou completa remodelação de nossas forças do mar, de forma homogê nea e obedecendo aos mais modernos ditames da indústria bélico naval. Também os resquícios da desunião e dos ódios criados pela RevÓlUção de 93 haviam praticamente desaparecido com a anistia geral de 1895. Não mais se sentia distinção entre legalistas e revo lucionários, ao ponto de um destes últimos ter ocupado o ministé rio até o dia 15 de novembro de 1910. As unidades da moderna Esquadra, projetadas de acordo com as concepções táticas do tempo, iam chegando todos os meses. Os dois maiores vasos de guerra existentes, semelhantes ao protótipo inglês Dreadnought, que caracterizou nova era para a construção bélico-marítima, já se achavam na Baía da Guanabara, juntamente tom a quase totalidade dos outros navios destinados a constituir sua cortina de proteção: os velozes scouts e destroyers, como ainda se chamavam os cruzadores-ligeiros e os contratorpedeiros. Inesperadamente, este quadro, refletindo otimismo, perspecti vas excelentes, rompeu-se ·com violência: uma revolta de marinhei ros eclodiu na noite de 22 de novembro, com o imediato domínio dos dois novos encouraçados, além do antigo Deodoro -e de um dos scouts, o Bahia, obrigando a que todas as outras unidades, que não se rebelaram, se afastassem ou fossem abandonadas ante a ameaça dos poderosos canhões dos sublevados. A estrutura disciplinar, básica em uma organização militar, fendeu-se de alto a baixo. Oficiais foram assassinados, expulsos ou retirados de bordo, e as maiores autoridades do país, desde o Presi dente da República e o Ministro da Marinha, intimadas a conceder 6 modifjcações no sistema de pumçoes e no regime de trabalho vi gentes, sob pena de verem destruída a cidade do Rio de Janeiro. Ante o pânico que alvoroçou o Congresso e, através da im prensa, a população, concluindo-se pela impossibilidaélé dé haver uma reação que dominasse os rebeldes, em três dias a nação cedeu aos amotinados, sendo apressada uma anistia votada no Senado e na Câmara e sancionada pelo Presidente. Os oficiai~- voltaram aos seus navios, naturalmente em clima· disciplinar insustentável. Mas lentamente foram as unidades navais sendo desarmadas e afastados os· elementos mais radicais. Era um processo que,· a longo prazo, modificaria o ambiente de desconfian ça, de suspe1ção, àe expectativa de dias piores, que dominava ofi ciais e guarnições. Foi quandb novo movimento rebelde explodiu, no início de dezembro, este sem· apresentar justificativa ou finalidade, no outro scout, o J,?.io Grand~ db Sul, e no Batalhão Naval. Esperavam os amotinados- receberem a adesão dos rebeldes de novembro, o que já não era possível nem desejado, à vista do desarme dos navios e do fato de sua· principal exigência ter sido atendida: o fim dos cas tigos co11porais. Sem contar com qualquer apoio, o surto rebelde foi facilmente dominado e deu ensejo a reação violenta contra todos os amoti nados, os de novembro e os de dezembro, sem que se atendesse a ditames jurídicos, lamentavelmente com aspectos de desforra. Na realidade, a Revolta dos Marinheiros, que tnarcou doloro samente a evolução definitiva da Marinha da vela para a da má quina, com sangue, degradação, indisciplina, criou, por outro lado, condições para que daí por diante houvesse maior preocupação em se adaptar o elemento humano naval às exigências modernas. Novo tipo de recrutamento, novas escolas, novos sistemas disciplinar e de trabalho, foram formando marinheiros aptos e capazes, moral e tecnicamente, de guarnecer a Marinha que se ia modificando ace leradamente, com o impulso dado por duas guerras mundiais e o tre mendo desenvolvimento científico que se verificou a seguir. Esta fase da vida da Marinha brasileira, de conseqüências tão transcendentes, tem sofrido, ao ser analisada e descrita, uma dupla deformação. Os oficiais, vítimas de agressões físicas, do rompimento brusco da disciplina a que estavam condicionados, de ataques can dentes, injustos, desmedidos, oriundos do Congresso e da- opinião pública comandada pela imprensa, ao narrarem e comentarem os fatos ocorridos, ativeram-se principalmente ao que eles representa ram de primitivo, de subalterno, de feroz, mantendo sempre atitu de defensiva em relação à própria honorabilidade e à da Marinha. Não houve preocupação, e se houve foi muito pouca, de se estudar o que mediatamente teria causado aquela explosão, e se ela teria sido evitável. Não se estenderam a respeito dos possíveis benefícios que, dolorosamente embora, pudessem ter resultado como conse qüência.