RESENHA DE NOTÍCIAS CULTURAIS

Edição Nº 63 [ 10/11/2011 a 16/11/2011 ] Sumário

CINEMA E TV...... 4 O Estado de S.Paulo - Festival de diversidade...... 4 Folha de S. Paulo - 'Amanhã Nunca Mais' mostra embate entre o protagonista e a cidade...... 5 Folha de S. Paulo - 'Tropa 2' dá início a campanha por estatueta...... 6 Correio Braziliense - Garotos-propaganda ...... 6 Correio Braziliense - Brasília... Ação! ...... 7 Correio Braziliense - Um sonho de liberdade...... 8 Folha de S. Paulo - Evento em Berlim exibe dez filmes brasileiros recentes...... 10 Folha de S. Paulo – TV: Série relembra época industrial das pornochanchadas em SP...... 10 TEATRO E DANÇA...... 10 Correio Braziliense - Sopro de vida ...... 10 Folha de S. Paulo - O avesso da ópera...... 12 Correio Braziliense - Nas sombras da ditadura...... 13 ARTES PLÁSTICAS...... 15 O Estado de S. Paulo - A aventura de Piza pela escala diminuta...... 15 O Estado de S. Paulo - Nos leilões de Nova York, uma festa latina...... 16 O Globo - Uma vitrine para a novíssima arte contemporânea brasileira...... 18 O Estado de S. Paulo - Na feira Pinta, mais Brasil...... 19 Estado de Minas - Estereótipos atuais...... 20 FOTOGRAFIA...... 21 Jornal de Brasília - A arte em spray ...... 21 Estado de Minas - Rastros urbanos...... 23 O Estado de S. Paulo - Uma casa para imagens...... 24 MÚSICA...... 25 Folha de S. Paulo - Nova OSB mostra bom potencial na estreia...... 25 Correio Braziliense - Brasileirinho ...... 26 Correio Braziliense - Bamba de fino trato...... 27 O Globo - Tesouros do ...... 28 O Globo - Poder dos velhos tempos / Crítica...... 29 O Globo - De choro no jardim a concerto no Municipal...... 29 O Globo - Caruru, livros e muito samba nos 70 anos de João Nogueira ...... 30 O Globo - Clube da Esquina se reúne em festival...... 31 O Globo - O mesmo Lupicínio, mas filtrado de duas maneiras diferentes...... 32 O Globo - A música passeia pelos trens cariocas...... 33 El País - El carioca enamorado...... 33 O Estado de S. Paulo - Osesp em partes...... 34 Agência Brasil - Encontro inédito reúne no Rio bandolinistas do Brasil e do exterior...... 35 O Globo - O fenômeno Jau tenta ir além da Bahia ...... 36 Correio Braziliense - Gata extraordinária ...... 37 Correio Braziliense - A fonte que nunca seca...... 38 Folha de S. Paulo - Pegoraro mostra pop suave e poético em CD...... 40 Folha de S. Paulo - Bixiga 70 sacode a cena com disco de "afrotudo" à brasileira...... 41 Folha de S. Paulo - Instrumental vive momento de frescor...... 41 Folha de S. Paulo - Expatriados esperam por oportunidades...... 42 LIVROS E LITERATURA...... 42 O Estado de S. Paulo - Escritor das horas vagas...... 42 Correio Braziliense - O filósofo da Colina...... 43 O Globo - Rubens Figueiredo vence o Portugal Telecom de Literatura...... 44 Correio Braziliense - A feira possível ...... 45 Correio Braziliense - Brasília sempre viva...... 47 Folha de S. Paulo - Fliporto homenageia Freyre e o Oriente...... 48 O Estado de S. Paulo - A moderna antropologia de uma discreta feminista...... 48 O Estado de S. Paulo - Inovações teóricas e na militância...... 50

2 O Estado de S. Paulo - Fernando Henrique destaca o papel de vanguarda de Ruth Cardoso.....52 O Estado de S. Paulo - Engenho e arte de entreter...... 53 Agência Brasil - Sustentabilidade é tema da 30ª Feira do Livro em Brasília...... 54 Folha de S. Paulo - Show com Augusto de Campos abre a Balada Literária...... 55 ARQUITETURA E DESIGN...... 55 Folha de S. Paulo - Filme desvenda utopias do arquiteto Affonso Reidy...... 55 O Estado de S. Paulo - Raízes mineiras...... 56 POLÍTICA CULTURAL...... 59 Agência Brasil - Ministério da Cultura define áreas prioritárias para 2012...... 59 O Globo - Na contramão...... 60 MODA...... 61 O Estado de S. Paulo - 'A Issa é um grito colorido no meio do preto e branco'...... 61 GASTRONOMIA...... 65 Folha de S. Paulo - Casas do norte - a última conquista...... 65 OUTROS...... 66 O Globo - Na correnteza do rio ...... 66 Correio Braziliense - Mulheres batalhadoras...... 67 Folha de S. Paulo - Exposição reconstrói lendas e vida no sertão...... 68 Estado de Minas - Ponto chique natalino...... 69

3 CINEMA E TV

O ESTADO DE S.PAULO - Festival de diversidade

Mix Brasil, que tem início hoje, vai exibir 120 filmes, além de peças teatrais

MARCIO CLAESEN

(10/11/2011) Se 2010 marcou sua maioridade, este é o ano em que o Festival Mix Brasil da Diversidade Sexual passa a dar espaço à cultura e não mais só ao cinema, resume ao Estado André Fisher, um dos diretores do evento, que hoje chega à sua 19.ª edição.

O braço teatral está de volta. Na quarta exibição do Dramática em Cena há a chance de rever espetáculos que dialogam com o público LGBT. Alguns deles passaram rapidamente pelos palcos paulistanos, como Dentro da Noite, dirigido pelo cantor Ney Matogrosso. Outros foram reverenciados por crítica e público, como As Três Velhas, que reuniu o trio Maria Alice Vergueiro, Pascoal da Conceição e Luciano Chirolli. Há até uma opção infantil, O Menino Teresa, de Marcelo Romagnoli, que nasceu de um quadro do extinto programa da TV Cultura Rá-Tim-Bum.

As peças estarão no Centro Cultural São Paulo, que será tomado pelo festival nos próximos dias. Isso inclui também a sala de projeções e o foyer, que recebe uma instalação com figurinos e pertences da performer Claudia Wonder. Representante da noite e da cultura underground paulistana, a transexual, morta em 2010, virou tema do documentário Meu Amigo Claudia, atração do evento há dois anos, e ainda inédito no circuito comercial, que ganha reexibição no festival.

Transgênero. Não é por acaso que Claudia é mais uma vez lembrada. A Diversidade É Para Todos, tema do evento este ano, celebra especialmente a transexualidade, que assume papel central no Mix 2011. Seja em documentários ou ficções, esses iconoclastas da masculinidade e da feminilidade ganharam retratos contundentes, sensíveis e, por que não?, históricos nesta edição.

Se Garotos Não Choram (1999) e Transamerica (2005) estão na lista das produções mais recomendadas para entender a trajetória e conflitos dos transgêneros, Romeus, longa de estreia de Sabine Bernardi, merece estar no mesmo patamar. A produção alemã conta a história de Lukas (Rick Okon), um transexual masculino (mulher biológica com sexo mental de homem) que se apaixona por Fabio (Maximilian Befort), rapaz que é seu ideal de beleza. O filme pode embaralhar a cabeça de alguns ao mostrar que identidade de gênero não tem necessariamente a ver com orientação sexual. Lukas, de 20 anos, é um transexual gay.

Dentre os destaques no mesmo tema, há Tomboy - escolhido para a abertura do festival - que fala do assunto numa idade ainda mais tenra. Laure, garota de 10 anos, passa-se por menino durante as férias de verão. Assim como Lukas, Laure também está em fase de descobertas importantes na vida correndo o risco de se machucar emocionalmente.

Da 35.ª Mostra de São Paulo vêm os celebrados Cuba Libre, de Evaldo Mocarzel, e Olhe pra Mim de Novo, de Kiko Goiffman. O primeiro mostra o retorno da atriz transexual Phedra de Córdoba, do grupo teatral Os Satyros, a seu país e as mudanças pelas quais a ilha passou em relação aos direitos gays. Olhe pra Mim de Novo acompanha o transexual Syllvio Luccio em uma viagem por cidades do sertão nordestino investigando como as famílias lidam com a diversidade quando ela está em suas casas.

Política. Vem da Suécia mais uma vez uma comédia em torno de um assunto delicado. Em Patrick, Idade 1,5, de 2008, a adoção de filhos por casais gays era o tema a ser discutido. Agora, política é o foco em O Próximo Mandato. Um candidato a primeiro-ministro do país, casado há 20 anos, se vê interessado em outro candidato, este abertamente homossexual. O romance aflora e David terá de lidar com uma vida que ele não conhecia e saber se está preparado para assumir o novo relacionamento.

O assunto também é o mote de Diferente de Quem?, de Umberto Carteni. Entretanto, a situação é oposta. Neste, Piero (Luca Argentero) também é candidato - a prefeito de uma cidade ao Norte de Roma - mas já saiu do armário. Em relacionamento estável com o companheiro há 14 anos, ele é

4 obrigado a aturar Adele (Claudia Gerini) como parceira na campanha por imposição do partido. A moça é uma espécie de Sarah Palin, luta a favor da família e tem ojeriza a homossexuais. A convivência forçada entre os dois gera afinidades eleitorais e também afetivas. Eles passam a ter um romanece, que, se revelado, levará Piero a perder as eleições.

Arco-íris italiano. Em comemoração ao ano da Itália no Brasil, esta edição do festival oferece um breve panorama do atual produção de filmes sobre o tema no país. Um dos destaques é Anjos no Corredor da Morte, coprodução com o Irã que trata da pena de morte imposta pelo país do Oriente Médio aos homossexuais e o rastro de dor e inconformismo que a sentença deixa em parte da população.

Com 120 filmes, o Mix, que depois faz uma itinerância mais enxuta pelo Brasil, mostra que ainda é relevante e aprofunda cada vez mais a discussão em torno de todas as letras da sigla LGBT.

FOLHA DE S. PAULO - 'Amanhã Nunca Mais' mostra embate entre o protagonista e a cidade Cinema - CRÍTICA COMÉDIA

Lázaro Ramos faz anestesista que se divide entre atender a chamado de trabalho e buscar o bolo de aniversário da filha RICARDO CALIL, CRÍTICO DA FOLHA

(11/11/2011) O começo de "Amanhã Nunca Mais", longa-metragem de estreia de Tadeu Jungle, não é muito animador.

Na Praia Grande, litoral sul de São Paulo, uma família -o anestesista Walter (Lázaro Ramos), sua mulher (Fernanda Machado), sogra e filha- tenta ter um momento de lazer, enfrentando o sol escaldante, a sogra farofeira, a lotação na areia e no mar.

Em meio ao humor da situação, há um olhar severo para aquela família: Walter é o outro, o pobre coitado, o objeto de estudo da classe média -uma visão não muito diferente da de outra comédia paulista recente, "Família Vende Tudo".

Mas, então, Walter recebe um chamado de seu chefe para voltar ao trabalho e a São Paulo -e o filme começa lentamente a engatar.

Enquanto tenta se livrar de mais um plantão, o anestesista se compromete com a mulher a pegar o bolo para o aniversário da filha. Mas uma série de incidentes -o trânsito da cidade, a briga com o chefe, os encontros com um travesti e uma alcoólatra- o impede de cumprir a missão.

"Amanhã Nunca Mais" torna-se, então, um filme sobre o embate entre Walter e a cidade, um pesadelo urbano na linha de "Depois de Horas" (1985), semelhança que outros críticos já apontaram, ou de seu reverso rancoroso, "Um Dia de Fúria" (1993).

O pacato Walter, o homem incapaz de dizer não, vai se enervando -e se humanizando- ao longo do filme.

Em dado momento, ele deixa de ser o outro para se tornar um pouco de cada um de nós, deixa de ser um tipo de classe para se tornar um espelho que reflete a inviabilidade da metrópole e o preconceito de seus habitantes.

É uma transição que se efetiva diante dos olhos do espectador graças à atuação precisa -de um minimalismo virtuosístico, repleta de detalhes quase invisíveis- de Lázaro Ramos.

Renovador da linguagem da TV brasileira nos anos 80, Jungle mostra que se tornou não só um bom diretor de atores mas uma espécie de esponja audiovisual, absorvendo outras obras e diferentes estilos para chegar a um resultado sólido, homogêneo.

5 A única parte que destoa no conjunto é a trilha sonora incidental, que nos lembra a todo momento, talvez de olho no mercado, que estamos vendo uma comédia -embora "Amanhã Nunca Mais" seja também, de um modo particular, um filme de horror.

FOLHA DE S. PAULO - 'Tropa 2' dá início a campanha por estatueta Filme estreia hoje nos EUA de olho no impulso que o Globo de Ouro pode dar ao Oscar LÚCIA VALENTIM RODRIGUES, DE SÃO PAULO

(11/11/2011) Depois de ser visto por mais de 11 milhões de brasileiros, "Tropa de Elite 2" tenta conquistar corações e mentes norte-americanos.

O filme de José Padilha estreia hoje nos EUA e lança sua campanha pela indicação ao Oscar de filme estrangeiro.

O circuito começa por Nova York. No dia 18, é a vez de Los Angeles ver o longa. No dia 25, outras 15 cidades recebem o título.

Sem divulgar valores, o produtor Marcos Prado diz que o lançamento vai ser modesto, em apenas três salas. Ele contratou uma empresa local para montar a campanha publicitária do filme nos EUA. "Resolvemos jogar na mão de quem sabe fazer."

Basicamente, a estratégia consiste em fazer exibições especiais para convencer o máximo de pessoas entre os cerca de 6.000 membros da Academia a ver o filme.

Padilha, que já está nos EUA para discutir a produção do novo "Robocop", vai participar de jantares e sessões de perguntas e respostas.

Outra porta de divulgação será o Globo de Ouro, em janeiro, em que o filme pleiteia vaga de longa estrangeiro.

O produtor Luiz Carlos Barreto tentou, sem sucesso, emplacar "Lula, o Filho do Brasil" no Oscar de 2010. Ele diz que uma campanha "que não seja mixa" custa entre US$ 250 mil e US$ 300 mil (de R$ 440 mil a R$ 528 mil).

"Oscar é uma corrida de Fórmula 1. Todos ficam de olho para ver quem consegue chegar ao pódio", afirma.

Ele diz que "Tropa 2" tem uma estratégia "esperta" de estrear agora para ser bem divulgado e "poupar no que teria de gastar lá na frente".

Foi também o que fez Cao Hamburger com "O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias" em 2008. Por pouco não conseguiu o que queria: ficou entre os nove finalistas, antes dos cinco indicados.

"Tropa 2" terá outro desafio: superar o preconceito da Academia contra sequências. "Não é um segundo filme comum", defende Prado. "E contamos com a acolhida que tivemos nos festivais de Sundance e de Berlim."

CORREIO BRAZILIENSE - Garotos-propaganda

Diretores de peças publicitárias, Nando olival e Tadeu Jungle experimentam o desafio de estrear o primeiro longa-metragem em circuito comercial

Dois longas-metragens de linguagens diversas e um ponto em comum. Amanhã nunca mais e Os 3 poderiam passar desassociados um do outro, na estreia de hoje nos circuitos comerciais, não fosse um detalhe: os dois diretores são publicitários que debutam à frente de um longa-metragem. “A publicidade foi algo que chegou logo e me carregou. Cinema ainda era algo muito restritivo”, conta Nando Olival (de Os 3), formado em cinema pela Fundação Armando Álvares Penteado e à frente de carreira recheada de 400 comerciais. Contando, em comum, com o mesmo diretor de fotografia de Nando Olival, Ricardo Della Rosa, Tadeu Jungle, reconhecido pela multifacetada carreira (com ênfase

6 na publicidade, no videoclipe e nas artes plásticas), comemora o momento, com a “liberdade maior de contar uma história dada pelo cinema”, ao comentar Amanhã nunca mais.

Ao lado do colega cineasta Tadeu Jungle (Amanhã nunca mais, estrelado por Lázaro Ramos ), Nando Olival tem especial apreço pela circunstância que o coloca em posição de estreante. “Quando filmei, pela dedicação ao universo criado, não vi o filme como um produto, diretamente. Mas pensava no público quando fazia uma cena mais sensual. Não queria abrir mão de conquistar pessoas na faixa dos 14 anos. Quem quiser fazer filme pensando em não ter espectadores em escala, deveria filmar festa de casamento”, brinca o cineasta.

CORREIO BRAZILIENSE - Brasília... Ação!

A Capital é um dos sets principais do novo longa-metragem do cineasta carioca Murilo Salles. Filme mostra como a política é uma extensão da cidadania

Pedro Brandt

(13/11/2011) O alarme de incêndio da Câmara dos Deputados está ligado, mas não há fogo. O sinal sonoro foi disparado por engano. O intervalo forçado pelo dispositivo de segurança não tira a concentração de Murilo Salles e da equipe cinematográfica, a postos, para uma cena na esteira rolante, que liga os anexos 2 e 4. O barulho cessa. “Beleza, vamos voltar”, orienta uma assistente de direção. “Todo mundo nas posições”, grita a jovem. “Vai, esteira”, ela diz para que outro integrante da equipe faça-a funcionar. “Ação!”. Pessoas passam apressadas. Uma mulher discute ao celular. A movimentação dura poucos minutos. Corta. “Foi lindo, Cíntia!”, elogia o diretor sobre a atuação da atriz Cíntia Rosa. Mas Salles quer mais algumas tomadas. Todos voltam às posições iniciais e repetem tudo outra vez. E outra vez. E outra vez. Cinema é assim. Recriar a realidade exige paciência.

“Cada vez mais, eu gosto de fazer ficção pela pegada documental, tentando ser o mais realista possível”, comenta o cineasta carioca, 61 anos, em entrevista ao Correio. “Acho que você constrói uma bela ficção sendo um bom documentarista. E só se torna um bom documentarista fazendo ficção”, afirma. No último dia 5, depois de rodada a sequência da esteira, Salles tinha duas cenas para fazer no Senado. No dia seguinte, ele e a equipe voltaram ao local para filmar. E voltarão para lá em futuras datas. É que o Congresso é pano de fundo para O fim e os meios, novo longa-metragem de Salles.

Apesar do cenário, o filme não é sobre política, ainda que o assunto permeie a trama. “O brasileiro tem essa coisa de ‘eu não tenho nada a ver com política’. Como assim? O ato de você comprar uma água mineral da marca X ou Y é um ato político. Se você fuma ou não… Se dirige acima de 100km por hora na cidade… São atos políticos. Tudo o que você faz, todas as suas decisões interferem no outro”, reflete o diretor. Seguindo essa linha de pensamento, Murilo Salles considera esse seu projeto mais explicitamente político — ainda que as relações humanas, ele pondera, sejam o escopo do filme.

Amores de gabinete O título do longa dá pistas sobre as inspirações do diretor. “Quero mostrar que não existe fim, existem os meios. A vida é o meio. E o meio é a mensagem do filme.” A ganância desmedida por poder, dinheiro e sucesso, diz Salles, pode desandar a vida de uma pessoa. “Essas coisas projetam as contradições da ambição, da desmesura da alma humana”, observa.

No filme, Marco Ricca interpreta Hugo, jornalista paulistano, assessor de imprensa de um senador veterano em busca de melhorar sua imagem pública para tentar a reeleição. “O meu personagem é gente boa, mas não consegue ouvir muito não. Se precisar, ele te mata!”, brinca o ator, 48 anos. Para a campanha do senador, Hugo contrata o jovem publicitário carioca Paulo Henrique (papel de Pedro Brício), que vem do Rio para Brasília com a mulher, a jornalista Cris Moura (Cíntia Rosa), e a filha pequena. “Eles estão juntos por causa da menina, não por amor”, detalha a atriz, 31 anos. A personagem enxerga a vinda para a cidade como uma oportunidade de crescer na profissão, trabalhando na cobertura jornalística política. “Paulo vai trabalhar com o senador em Alagoas, que é o estado base dele, e abandona a mulher em Brasília. E Cris começa uma relação muito apaixonada com o patrão do marido, o Hugo”, adianta Murilo Salles.

7 O elenco de O fim e os meios ainda conta com Murilo Grossi, Emiliano Queiroz, Hermila Guedes, Jonas Bloch e Elisa Lucinda. Além de Brasília, as filmagens passarão por Rio de Janeiro e Maceió.

Nos festivais A trajetória do cineasta carioca Murilo Salles começou a ser construída no fim da década de 1960. Seu primeiro longa-metragem de ficção é Nunca fomos tão felizes (1984), premiado como melhor filme no Festival de Brasília. Outro longa do diretor, Como nascem os anjos (1996), também levou o troféu Candango de melhor filme. Salles atuou como diretor de fotografia em diversas produções, entre elas Dona Flor e seus dois maridos (de Bruno Barreto), Eu te amo (de Arnaldo Jabour) e Árido movie (de Lírio Ferreira).

Laços candangos

O roteiro original do cineasta — que passou por oito tratamentos até o começo das filmagens — foi premiado nos editais da Petrobras, da Oi Futuro, da Eletrobras e do Comitê Gestor do Fundo Setorial do Audiovisual (Finep/ Ancine). O fim e os meios é coproduzido pela produtora brasiliense Pá Virada Filmes, integrante do coletivo Casa 30 (que conta com mais três produtoras da cidade). “A gente conheceu o Murilo no 41º Festival de Brasília. Ele era do júri e foi prestigiar a Mostra Brasília. Murilo gostou de um filme do Iberê Carvalho (Para pedir perdão), meu sócio”, lembra o cineasta Jota Procópio, da Pá Virada. A filmagem, ele conta, é o resultado de dois anos de conversas e preparação.

Para Procópio, a coprodução reflete o bom momento do cinema brasiliense. “Uma parceria dessas, para uma produtora local, é muito estimulante. Os filmes do Murilo conseguem distribuição nacional, depois passam na tevê. Brasília está abraçando um tipo de projeto que vai além dos festivais. Estamos vendo o quanto uma situação incentivadora gera resultados”, comemora.

O fim e os meios não tem previsão de conclusão. Murilo Salles gostaria de estreá-lo no ano que vem, para coincidir com as eleições de 2012. “Às vezes, fico encrencado com a montagem… Tem filmes que eu monto em três meses. O Nome próprio, meu último longa, eu levei um ano montando. Mas como eu filmo de seis em seis anos, não trabalho com essa questão de data. O importante é o filme ficar bom.”

CORREIO BRAZILIENSE - Um sonho de liberdade

1ª Jornada do Cinema Negro de Brasília reúne filmes que discutem a representação do afrodescendente na sociedade brasileira. Com entrada franca, a mostra ocupa simultaneamente cinco cidades do DF

Yale Gontijo

8 Dama do teatro, do cinema e da tevê, Léa Garcia é uma das estrelas do premiado As filhas do vento, de Joel Zito Araujo: atração da 1ª Jornada do Cinema Negro de Brasília (Riofilme/Divulgação)

(16/11/2011) Parte da história do Brasil será revista pela 1ª Jornada do Cinema Negro de Brasília. Até domingo, uma amostra da produção cinematográfica brasileira de temática negra será exibida no Plano Piloto, em São Sebastião, no Varjão, na Estrutural e em Ceilândia. Hoje, às 20h, o longa- metragem de Joel Zito Araujo (Cinderelas, lobos e o príncipe encantado) e o curta de Jaqueline Fernandes (Afrobrasilienses) abrem a maratona no Cine Brasília. Na Ceilândia, o filme Brodér, de Jefferson De, é a atração principal no CED, às 19h30. Em comum, essas obras são imbuídas pelo desejo de discutir identidades negras no país.

Viés muito diferente do praticado no Brasil no início do século 20, quando os negros eram representados como criaturas “idiotizadas e mesquinhas”. Naquela época, era “natural” que atores brancos pintassem os rostos de tinta preta e ocupassem os papéis de negros. Essas contradições suscitaram dúvidas elementares. Se nos primórdios do cinema, no final do século 19, a imagem era captada em preto e branco, por que insistir na inferiorização do negro na representação cinematográfica?

No livro O negro brasileiro no cinema, o pesquisador João Carlos Rodrigues traça a história da representação do afrodescendente no cinema brasileiro e aponta evoluções. “Os personagens negros ou eram subservientes ou eram cômicos como os de Grande Otelo. Hoje em dia, não tem praticamente esse tipo hilário. As tramas passaram a ser mais realistas. Além disso, o negro passou da frente das câmeras para atrás. A coisa mais interessante foi isso. Eles se tornaram diretores e roteiristas”, enumera.

Na esteira das reivindicações sociais das décadas de 1960 e 1970, em que o movimento do Cinema Novo filiou-se a grandes intérpretes como Milton Gonçalves e Ruth de Souza, os negros puderam encarnar papéis de destaque em tramas que discutiam a situação social brasileira.

Cinema elitista Outros nomes despontaram na mesma época. O carioca Zózimo Bulbul, 74 anos, iniciou a carreira como ator de teatro no Centro Popular de Cultura (CPC), da UNE. Bulbul construiu uma sólida carreira com participações em praticamente todos os títulos marcantes do cinema brasileiro negro. Seu nome figura nos créditos de filmes importantes como Terra em transe (1967), de Glauber Rocha. Ele é um dos primeiros diretores a trabalhar com o tema da consciência negra. Em um dos curtas- metragens que dirigiu, A alma no olho, de 1973, atua num monólogo sobre a história da escravidão

9 no Brasil. Nele, a cor do protagonista é contrastada com um fundo totalmente branco. A fita foi censurada pela ditadura.

Em 1988, Bulbul fez um balanço crítico dos 100 anos de assinatura da Lei Áurea, no documentário de longa-metragem Abolição. “Eram os 100 anos da lei e ninguém falava nada. Parecia até que não tinha negro no Brasil”, relembra. Atualmente, ele preside o Centro Afrocarioca de Cinema. Qualquer ator, roteirista e diretor no Brasil com o mesmo currículo de Bulbul chegaria aos 50 anos de carreira com o mínimo de prestígio adquirido com a experiência. Não é o que o veterano alega encontrar.

Em conversa telefônica, o artista liberou parte da indignação por não conseguir filmar um longa- metragem há mais de 20 anos. “Bato na porta dos ministérios e secretarias e me olham de cara feia. Tudo mudou para pior. A cada edição, é mais complicado conseguir verba para realizar o Encontro de Cineastas Negros da América do Sul e Caribe. Um contigente enorme de negros não acredita no que eu estou fazendo e os brancos consideram que é uma ousadia. Gostaria de exercitar mais a minha profissão. Mas o cinema é um lugar branco, racista e elitista”, ressente-se.

FOLHA DE S. PAULO - Evento em Berlim exibe dez filmes brasileiros recentes (16/11/2011) DE SÃO PAULO - A Première Brasil Berlim exibe na capital alemã de hoje ao dia 27 dez filmes brasileiros, entre os quais "VIPs", de Toniko Melo, e "Transeunte", de Eryk Rocha.

O diretor Hector Babenco será homenageado com exibição de três de seus filmes no evento, que acontece pela terceira vez em Berlim.

Cacá Diegues e os jovens cineastas que realizaram com ele o documentário "5 X UPP" também viajaram à Alemanha para falar sobre o filme e discutir a ocupação de favelas.

FOLHA DE S. PAULO – TV: Série relembra época industrial das pornochanchadas em SP Cineastas da Boca do Lixo faziam cinema sem incentivo GABRIELA LONGMAN, DE SÃO PAULO

(16/11/2011) Entre a rua dos Gusmões e a rua do Triunfo, nos arredores da Estação da Luz, dispunham-se lado a lado com a prostituição as principais produtoras dos anos 60, 70 e 80. Na sexta-feira, o Canal Brasil exibe o primeiro episódio de "Boca do Lixo ", com entrevistas que relembram a produção de pornochanchadas em ritmo industrial no centro paulistano. Financiamentos, roteiros e parcerias eram acertados nas mesas do lendário bar Soberano, que juntava técnicos, cineastas e atrizes. Os filmes viviam submetidos à censura e à escassez de recursos. "O grande mérito do cinema brasileiro é transformar a falta de condições em elemento de criação", sugere Carlos Reichenbach. A série intercala depoimentos de uma geração que fazia cinema sem Lei Rouanet. "O cinema era bem melhor quando os produtores tinham que tirar o dinheiro do bolso", defende David Cardoso. O pecado do documentário é apostar no saudosismo, esquecendo-se de que a profissionalização e os avanços técnicos não fizeram tão mal ao cinema nacional. TEATRO E DANÇA

CORREIO BRAZILIENSE - Sopro de vida

Dois importantes festivais de dança contemporânea oxigenam a parca produção local e ampliam a possibilidade de formação de plateia na cidade

Mariana Moreira

10 Bailarinos da carioca Focus Cia de Dança, atração do festival Paralelo 16: no palco, uma narrativa fragmentada sobre memória, que brinca com a percepção do público

Brasília já foi reconhecida como celeiro do rock, do choro, exportou craques do esporte para o estrelato, atores para a cena artística nacional, mas nunca foi propriamente a pátria das sapatilhas, solos e improvisos. Nos anos 1980, o Endança reverberou na cidade e no país, abrindo um nicho que se mantém atuante, a exemplo de companhias como baSiraH, Alaya e Antistatusquo, entre outras. Essas iniciativas, porém, não se traduziram em tradição que chame atenção no território nacional. O momento, no entanto, é de bons ventos. Até o próximo domingo, a cidade recebe dois festivais de renome nacional no universo da dança: na Funarte, é a vez do Paralelo 16, que, depois de três edições em Goiânia, estende seus domínios à capital federal. No Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), o carioca Panorama, com 20 anos de existência, traz atrações internacionais para a cidade.

Brasília pode estar entrando na rota de passagem de diversos espetáculos de dança, mas a apreciação do gênero ainda não ganhou lugar cativo na programação do brasiliense. Enquanto neste fim de semana a apresentação do bailarino irlandês Colin Dunne (com o solo Out of time) lotava o teatro do CCBB, na Funarte, o Teatro Plínio Marcos estava vazio para a performance dos cariocas da Cia. Focus, que apresentaram Ímpar. "Em Brasília, há pouca coisa acontecendo na dança. É um núcleo pequeno, fechado, não há tantas companhias e pessoas na ativa. Fazer os dois festivais ao mesmo tempo acabou dividindo o público. Você acaba tendo que escolher", avalia a estudante Isabella Motta Cardoso, 22 anos.

Vindo de Recife há cinco meses, o analista de redes (e estudante de dança) Lucas Tiné, 19 anos, afirma que a cena em Pernambuco é mais efervescente. Ainda assim, encontra opções de cursos e oficinas para continuar se aprimorando. "O problema não é dos profissionais, há muita gente boa aqui. Mas a cidade ainda é um bebê. A cena vai crescer muito em pouco tempo", profetiza. Para a estudante de artes cênicas Jéssica Madeira, 23 anos, o momento favorável à dança em Brasília tem razão de ser: recentemente, foi aberto o primeiro curso de licenciatura em dança, no Instituto Federal Brasília (IFB). "A graduação dá mais fôlego para a criação na cidade. Se tem mais gente estudando, tem mais gente na plateia", acredita. "O curso profissionaliza o bailarino e cria público", completa a amiga Dayana Casagrande, 30 anos. Praticantes de dança contemporânea e árabe, respectivamente, as duas fazem o périplo das atrações em cartaz na cidade, em busca de inspiração para coreografias.

Professor, bailarino e ator, Leandro Menezes, 28 anos, acredita que o público do DF, mais acostumado aos espetáculos teatrais, começa a dar valor à dança. E os motivos para essa valorização, segundo ele, são apoio mais sólido à realização e mais intercâmbio entre os artistas. Menezes também percebe que as plateias, antes tomadas por artistas ligados ao mundo das

11 coreografias, agora estão cheias de rostos desconhecidos, e curiosos. "Os dois festivais juntos trazem a chance de mostrar para curadores que existe uma produção local de qualidade, bailarinos profissionais, companhias com produção ininterrupta. Já está mais do que na hora de mostrar que a dança existe aqui", afirma.

Linguagens próprias

No último fim de semana, os dois festivais ofereceram uma amostra da produção carioca e irlandesa ao público de Brasília. Na Funarte, a montagem Ímpar, da Focus Cia. de Dança, trouxe sete bailarinos em cena para falar de memória. Juntos, eles interferiram na movimentação uns dos outros e evoluíram em uma demarcação matemática e fluida. A narrativa, dividida em nove momentos, é fragmentada. Cenas já vistas voltam a surgir no palco, despertando a sensação de déjà vu no espectador. Já o virtuose Colin Dunne, que desde a infância encanta a Irlanda com seu sapateado, mostrou os dotes de bailarino no CCBB. Em uma apresentação vigorosa, que mistura o verbal (Dunne explica algumas tradições de seu país) aos movimentos da dança, o vídeo entra como um complemento sofisticado, revelando artistas de outros tempos que tornaram célebre a arte de sapatear.

FOLHA DE S. PAULO - O avesso da ópera

'A Valquíria', de Wagner, estreia em SP, em montagem com elementos brasileiros

IRINEU FRANCO PERPETUO

(15/11/2011) No primeiro ato, um apartamento de uma moderna cidade brasileira, como São Paulo ou Rio de Janeiro; no segundo, os ex-votos de Aparecida do Norte (SP); e, no terceiro, as cavalhadas de Pirenópolis (GO).

O diretor cênico André Heller-Lopes encheu de signos brasileiros a encenação de "A Valquíria", de Richard Wagner (1813-1883), que estreia na próxima quinta no Theatro Municipal de São Paulo.

A ideia, contudo, foi fugir dos estereótipos mais óbvios de brasilidade.

"Não vai ter saci-pererê ou iara passeando pelo palco. Isso seria reduzir a ópera, e redução eu não faço", afirma o diretor, que, até 2014, pretende levar ao Municipal todas as óperas baseadas na mitologia nórdica que formam a tetralogia wagneriana "O Anel do Nibelungo".

Segunda das quatro óperas do "Anel", "A Valquíria" não é encenada em São Paulo desde 1959.

Além da histórica ligação da cidade com a ópera italiana, uma ausência tão prolongada pode ser explicada, ainda, pelas demandas de concentração, fôlego e dificuldade técnica que as quatro horas de música representam para todos os envolvidos.

"Tanto regente quanto músicos e cantores são levados a uma prova de resistência física, técnica e mental em uma obra como 'A Valquíria'", explica o maestro Luiz Fernando Malheiro.

Ele regeu o título no Festival Amazonas de Ópera em 2002 e, desde então, transformou Manaus em um centro de referência em montagens de Wagner no Brasil.

"A preparação deve ser bastante cuidadosa, e o ideal é que o período de ensaios seja longo em dias, e não em horas para não levar os envolvidos a um ponto de exaustão que certamente implicará um rendimento insatisfatório nas apresentações."

"Pessoalmente, procuro me cuidar mais durante um período como este, cuidando um pouco da alimentação, evitando totalmente as bebidas alcoólicas durante o período de ensaios e de apresentações [até a noite da última récita] e dormindo pelo menos duas horas de sesta antes delas", conta.

12 O elenco traz nomes internacionais, como o alemão Stefan Heidemann (Wotan) e os norte- americanos Janice Baird (Brünnhilde) e Gregory Reinhart (Hunding), ao lado dos brasileiros Denise de Freitas (Fricka) e Martin Mühle (Siegmund).

"Após o período inicial de aprendizado da partitura, passei um período em Viena trabalhando diariamente com preparadores da Wiener Staatsoper, como David Aronson e, principalmente, Thomas Lausmann, um especialista em Wagner, que, inclusive, preparou Plácido Domingo para o Siegmund em Nova York", conta Mühle, que, para descansar a voz, preferiu dar seu depoimento à Folha por e-mail.

CORREIO BRAZILIENSE - Nas sombras da ditadura

Mariana Moreira

Andreia Horta e Kelzy Ecard (abaixo) durante a peça Breu: um lugar de criação em que tudo pode ir se alterando (Paula Huven/Divulgação)

(16/11/2011) Breu, texto inédito do ator, diretor e dramaturgo carioca Pedro Brício, que faz sua estreia nacional em Brasília, ganhou versão teatral por meio de uma ação entre amigos. Ele recebeu o argumento inicial das diretoras Mywa Yanagizawa e Maria Sílvia Siqueira Campos, e adicionou temas que o interessam, como ditadura e memória. A esse caldeirão de referências, some-se a participação

13 das atrizes e da equipe envolvida no desenvolvimento do figurino, da trilha sonora e do cenário. “A narrativa foi se transformando durante o processo. É um diálogo artístico entre todos os envolvidos”, destaca Mywa. O resultado do processo coletivo (que passou por mudanças mesmo depois de chegar a Brasília) poderá ser visto de amanhã a 18 de dezembro, às 20h, no Teatro II do Centro Cultural Banco do Brasil. (CCBB).

Na trama, duas mulheres desconhecidas, de gerações distintas, têm um encontro revelador. Uma delas precisa entregar uma grande remessa de cachorro-quente e contrata uma ajudante de cozinha. “É uma lente de aumento, humanamente falando, no encontro entre essas duas pessoas”, destaca a atriz Andréia Horta, que estrelou a minissérie Alice, do canal HBO, e viveu a Bartira na novela global Cordel do fogo encantado, entre outros trabalhos.

A história se passa em uma casa de subúrbio, durante os anos de chumbo. “A ditadura é uma atmosfera que está sempre rondando”, esclarece Mywa. “É um espetáculo que trata do extraordinário, mas também do cotidiano. Às vezes, a vida da gente é surpreendida pela estranheza e por pequenas violências”, afirma Pedro Brício. Uma condição especial de uma das personagens exigiu que toda a equipe mergulhasse em uma preparação diferente para entrar em cena. Mas não estraguemos a surpresa.

“Queríamos chegar a uma dramaturgia com outras vias de percepção, que a história proporcionasse outros lugares sensoriais para o público. Não é teatro de sensações, mas sim tirar coisas do invisível, contar a história sem usar só a referência visual”, explica Mywa, veterana do teatro e da televisão, conhecida do grande público após o papel de Tomie (mãe da atriz Danielle Suzuki na novela Viver a vida, de Manoel Carlos).

Narrativa “De todos os meus textos, este talvez seja o mais aberto. Queria proporcionar espaços para que elas inserissem suas próprias criações”, conta Brício. Apesar das camadas surgidas durante o processo, há trabalho para o público. “O olhar do espectador é muito importante. Ele é que vai criar sua própria narrativa”, avisa Kelzy Ecard, que divide a cena com Andreia, e recentemente montou Meu caro amigo, musical com canções de Chico Buarque. “O texto não se conclui ou define. Não há certezas, mas um lugar de criação em que tudo pode ir se alterando”, avisa Mywa. “É como um tecido sendo trançado”, complementa Andréia.

As cadeiras dos espectadores ficam no mesmo nível do cenário, que reproduz a cozinha de uma antiga casa de subúrbio, com estantes, paninhos de prato, horta, além de uma janela que se abre para o quintal, que deixa entrever garrafas velhas, varais e uma árvore, trazida do Rio de Janeiro. De tão cheio de detalhes, o palco virou ponto de visitação de funcionários do espaço. “Poderíamos transformar em museu”, brinca a diretora Maria Sílvia.

Música no ar Responsável pela trilha, que mescla composições inéditas a clássicos (há uma vitrola em cena que toca uma canção de Billie Holiday, por exemplo), o músico Felipe Storino encarou um desafio diferente neste trabalho. “A música carrega bagagem emocional, sempre te leva longe, te faz viajar. Nesta peça, o grande exercício era te deixar neste lugar”, afirma. Para compôr os temas da montagem, ele também participou dos ensaios. “A peça é um molho, em que todos colocaram ingredientes”, comenta.

Breu Dramaturgia de Pedro Brício. Direção de Mywa Yanagizawa e Maria Sílvia Siqueira Campos. Com Andréia Horta e Kelzy Ecard. De quinta a domingo, às 20h, no Teatro II do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB — SCES Trecho 2, Conjunto 22 - 3108-7600). Ingressos a R$ 6 e R$ 3 (meia). Classificação indicativa livre.

Preparação Como o nome sugere, Breu tem cuidado especial com as alterações de luminosidade, e essa característica exigiu uma entrega dos atores e da produção a situações inusitadas. Sem ser avisada, Andreia Horta precisou entrar em um teatro completamente escuro. Mesmo conduzida pela mão, foi

14 tomada pelo pavor. “Sempre tive medo de escuro. Mas sempre pensei que, com tantas mulheres reunidas, esse Breu só pode ser interessante”, revela. Para que todos se adequassem ao espaço, uma cozinha idêntica foi montada em uma sala de ensaio. O elenco chegou a Brasília seis dias antes da estreia, para se adaptar à nova disposição do cenário. ARTES PLÁSTICAS

O ESTADO DE S. PAULO - A aventura de Piza pela escala diminuta

Na Galeria Raquel Arnaud, artista exibe composições inéditas e Carlos Fajardo abre a mostra Tenue

CAMILA MOLINA

(10/11/2011) Mesmo na persistência de um vocabulário que articula formas geométricas como triângulos e retângulos, o uso de malhas de arame, zinco, e a criação de relevos como prática de um pensamento espacial oriundo da gravura, o artista Arthur Luiz Piza, de 83 anos, está a surpreender na exposição Desordem Criativa, que inaugura hoje na Galeria Raquel Arnaud. Piza, um dos mais consagrados criadores brasileiros, aventurou-se agora na criação da escala diminuta. "Hoje todo mundo faz tudo enorme e eu, ao contrário", afirma. Pequenas caixas, como casulos, guardam agora em tamanho pequeno as composições que o artista vem realizando há anos com fragmentos de arame e figuras de cor - e há versões escultóricas ainda dessas obras, sobre bases. "Economia", diz.

Paulistano, Arthur Luiz Piza vive em Paris desde a década de 1950, mas sempre volta à sua cidade natal para exibir criações recentes. Desta vez, é na Galeria Raquel Arnaud que expõe pela primeira vez o conjunto de obras diminutas, às quais vem se dedicando há cerca de um ano. "A escala vem de resolver o pequeno como uma espécie de renascimento, de necessidade", afirma o artista. E apesar de tanto apego a um vocabulário e a uma geometria que ele não considera pura, Arthur Luiz Piza preza, afinal, a liberdade.

Está contente com as pequeninas obras, que o fazem citar as miniaturas do circo que o pai dos móbiles, Alexander Calder criou em Paris na década de 1920. Ou os "brinquedos" que Picasso realizou e que, na opinião do brasileiro, "são os melhores Picassos". "Criei essas obras com as sobras de madeira de outros materiais de meu ateliê", conta o artista. De certa forma, aventurou-se nessa experimentação por sugestão de seu ajudante, que fez uma das caixinhas de madeira como suporte para esses novos trabalhos. A construção geométrica "se renova e se reinventa" nas obras de Piza, define o crítico Paulo Venancio Filho.

Arthur Luiz Piza não faz mais gravuras, por uma dificuldade técnica, mas desenha todos os dias em cadernos e com canetas que leva consigo todos os dias. Está criando, ainda, cerâmicas de dimensões medianas, esculturas de mármore de Carrara. Pelo lado formal, o artista "nos coloca problemas da superfície: como do bidimensional irrompe o tridimensional e surge a primeira manifestação do relevo", afirma Paulo Venancio, mas, mais ainda, Piza é um colorista. "Sai de um surrealismo, de algo expressionista que era algo muito interior, no começo da minha vida artística me impressionou Van Gogh", conta o artista - isso, antes de se mudar para a França. O vocabulário construtivo, a partir da gravura, o levou a composições que não são puras - "quando é muito puro acho que acaba ficando muito pobre" -, de uma geometria livre. As composições de Piza, entre o relevo e a escultura, assim, se fazem também em escalas livres, como se pode ver na exposição.

Espelhos. "Sem imaginação não haveria semelhança entre as coisas". A frase do filósofo francês Michel Foucault é citada pelo artista Carlos Fajardo já de prontidão para tratar da mostra Tenue, que ele inaugura hoje também na Galeria Raquel Arnaud. A imagem espelhada - nem sempre a de nós mesmos -; o pensamento de pintura; a disparidade de materiais em composições com feltro, vidros, seda, malhas de aço, por exemplo, em "tensão", fotografias, fotogramas: tudo isso se reúne na complexidade e precisão das questões colocadas por Fajardo, numa exposição que, em seu título, Tenue, indica, ainda, uma certa "sensualidade". "Velar e desvelar, a pintura é desvelar para a verdade", diz o artista, interessado em promover um incessante jogo de imagem valendo-se de um pleno afinamento formal.

15 O ESTADO DE S. PAULO - Nos leilões de Nova York, uma festa latina

Tamayo e Di Cavalcanti são destaques em vendas na Christie's e na Sotheby's

TONICA CHAGAS , ESPECIAL PARA O ESTADO , NOVA YORK - O Estado de S.Paulo

Para levantar fundos destinados a novas aquisições, o Museum of Modern Art (MoMA), de Nova York, colocou em leilão na Sotheby's uma obra-prima de Rufino Tamayo (1899- 1991) que está na sua coleção desde 1953. Pela procedência que tem, o quadro Watermelon Slices, de 1950, deve alcançar valor entre US$ 1,5 milhão e US$ 2 milhões - e lidera as vendas públicas de arte latino- americana na cidade ao longo desta semana.

Na Christie's, a maior estimativa de preço é para uma das três edições do bronze Dancers, executado em 2007 pelo colombiano Fernando Botero e cuja avaliação de preço está na mesma faixa de Watermelon Slices. Criado no ano em que o pintor mexicano participou da Bienal de Veneza, Watermelon Slices representa uma de suas marcas registradas: fatias de melancias cujas cores lembram as da bandeira de seu país. O tema também tem um significado pessoal na obra de Tamayo, que na juventude ajudava uma tia a vender frutas na capital do México. O quadro integra uma pequena retrospectiva do artista na Sotheby's, que oferece mais sete pinturas dele consignadas por outros colecionadores e marchands.

O casal de dançarinos que está no topo da lista de preços na Christie's é um daqueles bronzes monumentais de Botero, medindo 318,1 x 200 x 160 cm. A estatura do par, que é praticamente a mesma, o diferencia dos casais pintados pelo colombiano, nos quais um dos parceiros é bem menor que o outro - detalhe que aponta a importância de cada um na relação, como no quadro Dancing Couple, de 1982, à venda também na Christie's, com preço estimado entre U$ 700 mil e US$ 1 milhão.

Levantamento. Tamayo, com 13 obras, e Botero, com 9, encabeçam a lista dos autores das 61 pinturas que alcançaram preço acima de US$ 1 milhão nos mais recentes leilões de arte latino- americana realizados em Nova York, segundo levantamento feito pelo crítico chileno Gonzalo Fontanés. Ele não inclui leilões de outras categorias e, por isso, não cita o escultor brasileiro Sérgio Camargo (1930-1990) e as brasileiras Beatriz Milhazes e Adriana Varejão, que ultrapassaram a marca em vendas públicas de arte contemporânea.

Da relação de Fontanés, Botero, de 81 anos, é o único ainda vivo e, nos leilões desta semana, ele tem chances de ultrapassar as estatísticas de Tamayo. Na pesquisa do crítico, o México lidera o grupo com oito pintores, cinco à frente do Chile, o segundo colocado, e tem os nove mais caros entre os 61 quadros. O recorde de preço, por enquanto, é de Trovador, pintado por Tamayo em 1945 e vendido na Christie's por US$ 7,2 milhões em maio de 2008.

Visibilidade. Artistas brasileiros ganham mais visibilidade em Nova York nesses grandes leilões, que impulsionam também a realização de exposições e eventos como a feira de arte latino-americana Pinta (leia texto abaixo). Colecionadores demonstram preferência por produções da década de 1940, ainda segundo Fontanés, que enumerou no seu levantamento 17 delas produzidas naquele período. Este é mais um ponto a favor da obra mais cara entre os lotes de arte brasileira, a Natureza Morta, com peixes, frutas e garrafas pintada por Di Cavalcanti (1897- 1967) por volta de 1945 e oferecida na Sotheby's. Segundo informação no catálogo da casa, o quadro vem de coleção particular brasileira e tem preço calculado entre US$ 450 mil e US$ 650 mil.

A obra que ilustra a capa do catálogo da Christie's também é um Di: o óleo sobre tela O Homem e a Máquina, feito em 1966 por encomenda da Olivetti do Brasil, cotado entre US$ 200 mil e US$ 300 mil. Essa estimativa é um pouco menor da que os leiloeiros dão para Mulata Sentada na Frente da Mesa com Pandeiro, do mesmo Di Cavalcanti. A Christie's espera que este óleo sobre tela pintado em 1954 alcance preço em torno de US$ 350 mil e US$ 450 mil (o quadro já havia sido arrematado no leilão daquela casa, em novembro de 2007, por US$ 301 mil).

A Olivetti também está oferecendo em leilão Bandeirinhas Estruturadas, um Volpi da mesma época que a pintura de Di, com preço estimado entre US$ 250 mil e US$ 350 mil. O leilão da Christie's

16 ocorre em uma sessão hoje à noite e outra amanhã de manhã; o da Sotheby's é dividido em sessões amanhã à noite e na quinta-feira de manhã.

Mulata Sentada. O quadro de Di Cavalcanti pode alcançar cerca de meio milhão de dólares

Watermelon Slices.Óleo sobre tela do mexicano Rufano Tamayo (1899-1991) deve servendido por até US$ 2 milhões

17 Pequenas Bandeiras. Pintura de 1966 do ítalo brasileiro Alfredo Volpi foi oferecida por preço entre US$ 250 mil e US$ 350 mil

Dancing Couple. Pintado por Fernando Botero em 1982, o óleo está entre as ofertas da Christie’s, com valor estimado de US$ 700 mil

O GLOBO - Uma vitrine para a novíssima arte contemporânea brasileira

Catharina Wrede

(11/11/2011) É provável que o público nunca tenha ouvido falar neles, mas, nos bastidores da arte, Alvaro Seixas (RJ), Clara Benfatti (SP), Guilherme Dable (RS), Hugo Houayek (RJ), Luciana Paiva (DF), Túlio Pinto (RS) e Virgílio Neto (DF) vêm começando a chamar a atenção. Nos últimos anos, os sete artistas plásticos se destacaram em editais, prêmios, salões, residências artísticas e produções acadêmicas, e agora estão reunidos na exposição coletiva “(Des) equilíbrios e (im) perfeições”, aberta ao público a partir de hoje na também iniciante galeria Coleção de Arte, inaugurada no ano passado, no Flamengo.

Diálogo com o modernismo

18 Segundo o curador Marcus Lontra, os artistas selecionados, com seus diversos suportes e técnicas, têm como referência diferentes movimentos e períodos da história da arte, transitando, sobretudo, entre o modernismo e a produção contemporânea, sem temer conflitos entre os dois.

— São figuras emergentes, que, por algum motivo, ainda não tinham tido visibilidade no mercado — diz Lontra.

— Comecei a pensar em nomes para uma coletiva na galeria e achei que esses jovens mereciam uma mostra.

É muito interessante esse tipo de produção que discute o modernismo sem achar aquilo um horror, sem uma ruptura brusca. Eles dialogam muito bem e com um certo humor pela tradição e pelo contemporâneo.

Atualmente em residência na Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), Túlio Pinto, de 37 anos, que acaba de ser premiado no Salão do Mato Grosso do Sul deste ano com o trabalho “Confidentes”, expõe esculturas que dialogam com heranças construtivas. E Guilherme Dable, 35 anos, constrói, nos seus desenhos e pinturas, vastos espaços bidimenssionais, determinados pela linha e pela cor.

Nascido em Niterói, Alvaro Seixas, 29 anos, que participou do Rumos Itaú Cultural Artes Visuais de 2009, expõe telas a óleo que questionam a prática da pintura hoje.

O mesmo questionamento sobressai na obra de Hugo Houayek, 32 anos, vencedor do 1º Prêmio Projéteis de Arte Contemporânea da Funarte e também com passagem pelo Rumos em 2006.

Também de Niterói, ele expõe uma série de pequenos quadrados coloridos de plástico inflável, que, juntos, formam painéis, como se fossem telas.

Luciana Paiva, 29 anos, que integrou a primeira seleção do Prêmio Pipa 2011, expõe colagens com textos e capas de livros, misturadas a desenhos, que chamam a atenção pelo minimalismo e delicadeza. E Virgílio Neto, 25 anos, selecionado pelo Rumos 2011 e Ibeu Novíssimos também deste ano, trabalha com ilustrações em que um universo onírico e aterrorizante se misturam.

Completando o time, a paulistana Clara Benfatti, 27 anos, trabalhou na direção de arte de filmes como “Chega de saudade”, de Laís Bodanzky, e “Capitães da areia”, de Cecília Amado. Na exposição, ela apresenta desenhos ligados à arquitetura e ao espaço, brincando com diferentes escalas.

Com o intuito de discutir essa novíssima arte contemporânea, amanhã, às 11h, a galeria organiza um debate com Marcus Lontra e os curadores Fernando Cocchiarale e Angélica Moraes. O encontro conta com a participação de todos os sete artistas.

O ESTADO DE S. PAULO - Na feira Pinta, mais Brasil

NOVA YORK - O Estado de S.Paulo

Plataforma comercial para a produção latino-americana moderna e contemporânea, a feira de arte Pinta deu destaque ao Brasil na sua 5.ª edição anual em Nova York, realizada no fim de semana. Como artista convidado, apresentou o luso-carioca Antonio Manuel, que também tem na cidade a sua primeira individual nos Estados Unidos, em exibição até o próximo dia 10 na sede da Americas Society. A participação brasileira foi acentuada na feira pela escolha de Jacopo Crivelli Visconti, ex- curador da Fundação Bienal de São Paulo, que fez a curadoria de projetos nesta edição.

Para contrastar com o recorte político da exposição na Americas Society, que focaliza principalmente obras produzidas no período de ditadura militar brasileira, Antonio Manuel mostrou 3 dos 15 quadros de uma série erótica que criou em 1984. "Feiras como esta, a de Basileia (Suíça) e a Arco (Espanha) estão com qualidade cada vez maior e participar delas é somar público ao meu trabalho", disse o artista.

19 Na feira Pinta, Jacopo Crivelli Visconti procurou mostrar a desconstrução da linguagem pura do modernismo e do concretismo como ponto em comum de gerações diferentes. O curador selecionou obras da brasileira Lygia Pape (1927-2004), do uruguaio Rómulo Aguerre (1919-2002) e do venezuelano Claudio Perna (1938-1997) para simbolizar a primeira delas. E apontou relações com a ruptura iniciada por eles em vídeos, fotos e instalações dos argentinos Patricio Larrambebere e da dupla Faivovich & Goldberg, do venezuelano Ivan Candeo, do mexicano Jonathan Hernandez, e dos brasileiros Fernanda Gomes e Eder Santos, numa colaboração com Leandro Aragão.

Sem pretender que o público percebesse sutilezas em tendências análogas entre esses escolhidos, Visconti encontrou questões que se entrelaçam nos trabalhos da maioria deles, como a herança da colonização europeia e crítica a situações políticas semelhantes. Para ele, a feira de arte é uma oportunidade única de visibilidade internacional e, mesmo sem ter ainda a tradição de eventos semelhantes, a Pinta "tem a vantagem de estar em Nova York, que é o centro do mundo da arte".

Seis galerias brasileiras participaram entre as 50 de vários países das Américas, da Europa e dos Estados Unidos que ocuparam, por quatro dias, o 11.º andar de um edifício na frente do Empire State. O argentino Diego Costa Peuser, fundador e diretor da feira (que é realizada também em Londres, no primeiro semestre), falou da intenção de expandir seu mercado, incluindo nela artistas espanhóis e portugueses, transformando-a numa feira ibero-americana. / T.C.

Antonio Manuel. Homenagem no evento emostra individual

ESTADO DE MINAS - Estereótipos atuais

Gracie Santos

20 Desenho de Ana Ricciardi (Reprodução)

(16/11/2011) Ana Ricciardi, de 29 anos, é formada em psicologia, tem pós-graduação em psicanálise, mas anda trafegando pelo universo das artes. Não por acaso. Seu trabalho de conclusão da pós teve como tema “Arte e sublimação”. “Parei de teorizar e me tornei prática”, ela diz, contando que foi parar na Escola Guignard (forma-se em um ano) por causa da psicanálise. Também por isso, por enxergar além do óbvio, as formas humanas criadas pela artista são disformes e desproporcionais. Os traços feitos em nanquim sobre papel canson são a base dos desenhos de Ana, que faz sua primeira exposição no Café com Letras.

A mostra, com abertura hoje, é composta por duas séries de desenhos, Marias e Urbano, ambas “representando estereótipos da sociedade contemporânea.” No caso das Marias, a leitura ganha leveza. “Elas traduzem de forma divertida o universo feminino. Gosto da linha disforme. Fiz várias bonecas que são bonitinhas mas também esquisitinhas. Mostro a necessidade de se construir um saber sobre o que é ser mulher e, nesse ponto, todas são iguais, são Marias”, afirma.

Na série Urbano, também está presente a figura humana. Desta vez, o que está em cena é “o ser solitário que habita as metrópoles. Viver em grandes centros urbanos pode significar viver só, mesmo quando se está rodeado de pessoas. Por isso, os seres urbanos são duros, tensos e apagados”, explica, falando sobre a dificuldade de se fugir da rotina diária de trabalho, casa, televisão, sono, círculo vicioso que a todos engole.

Para criar os desenhos de Marias, Ana se valeu da técnica nanquim. Já Urbano foi feito em serigrafia. A artista é defensora do menos é mais. “Daí a escolha das linhas em lugar das manchas". Para completar a mostra, Ana vai fazer um desenho inédito diretamente na parede do Café com Letras. FOTOGRAFIA

JORNAL DE BRASÍLIA - A arte em spray

Fotógrafo registra painéis urbanos na exposição Grafitar Para Não Pichar

Camilla Sanches

(15/11/2011) A arte espalhada pelos muros de Santa Maria e a diferença entre pichação e grafite. É isso que o fotógrafo Salveci dos Santos quer mostrar na exposição Grafitar Para Não Pichar, em

21 cartaz a partir de hoje até 4 de dezembro, no Terminal Interestadual de Brasília (Via Epia, em frente ao ParkShopping), com entrada franca. As fotos estão dispostas pelo saguão da nova Rodoviária, mais precisamente entre as áreas de embarque e desembarque.

“Quero apresentar para o maior número de pessoas possível a diferença entre estes dois conceitos. Eu penso que o grafite quer revelar a beleza, enquanto a pichação é um desabafo ou uma tentativa de entrar em conflito“, comenta o responsável pelas 60 fotografias que compõem a mostra – selecionadas entre 150 clicadas. Segundo ele, a ideia surgiu depois de uma tarde em que observava alguns grafiteiros, na cidade onde mora.

O local em questão é a Região Administrativa de Santa Maria, cenário de todas as fotografias. “S u rg i u o interesse de mostrar não só o trabalho deles pelas ruas, mas também as técnicas utilizadas e como estes desenhos têm modificado a paisagem da localidade”, explica. Na opinião do fotógrafo, as imagens têm trazido mais harmonia aos muros.

Funcionário público da Novacap, requisitado para o Palácio da Alvorada, Salveci, de 47 anos, se profissionalizou na fotografia em 2009. “Sempre fiz fotos de natureza, árvores e coisas do gênero”, diz ele, que começou como amador. “Nesta oportunidade, o objetivo é divulgar o trabalho artístico escondido por trás daqueles rabiscos, muitas vezes abstratos, e levar ao conhecimento do público a arte desenvolvida por alguns destes artistas anônimos”.

ARTISTAS

Neste caso, nem tão anônimos assim. Os desenhos registrados são de Tiago Alberto de Oliveira e Carlos Eduardo Sabóia, dois jovens de Santa Maria. “A maioria das pinturas já estava pronta quando as fotografei. Só acompanhei um processo criativo, que deu origem ao rosto de um negro usando boné”, conta. A figura recebeu o nome de Raça Negra.

Os principais espaços utilizados pelos artistas da rua, segundo observou o funcionário público, são escolas, residências e paredes de lojas. Ainda de acordo com ele, alguns trabalhos são remunerados, mas outros são voluntários. “Eles me garantiram que nunca foram pichad o re s ”, ressaltou o autor das fotos.

Nos muros das cidades

A gratificação em realizar a mostra foi tanta que Salveci dos Santos já pensa em uma próxima série, desta vez contemplando todas as regiões administrativas do DF. “A ideia é retratar o grafite de cada uma das cidades e representá-lo por meio de uma foto. Ao meu ver, este novo modelo de pintura é uma arte contemporânea”, comenta.

“Não sei o que os inspira, mas pelas cores usadas – muito verde –, creio que façam referência aos elementos da natureza”. Para o fotógrafo, a intenção destes pintores, desenhistas ou, simplesmente, grafiteiros, é transmitir paz, amor, segurança e liberdade.

Grafitar Para Não Pichar pode ser visitada de segunda a domingo. A Rodoviária Interestadual funciona 24 horas e recebe, diariamente, cerca de sete mil pessoas. “Fotografar é colocar na mesma mira a cabeça, o olho e o coração. É isso que tento fazer”, resume. A iniciativa é realizada em parceria com o Consórcio Novo Terminal, responsável pela administração do Terminal Interestadual de Brasília.

Grafitar Para Não Pichar – Exposição Fotográfica de Salveci dos Santos. De hoje a 4 de dezembro, todos os dias da semanas, 24 horas por dia. No Saguão do Terminal Interestadual de Brasília (Epia, em frente ao ParkShopping). Entrada franca. Classificação livre.

SAIBA +

Salveci dos Santos faz exposições em Brasília desde 2007. A primeira foi Jardim da Alvorada, que ocupou, entre 3 e 18 de setembro deste ano, o mesmo saguão do Terminal Interestadual.

22 Ela reunia imagens dos jardins da residência oficial da Presidente Dilma Roussef, o Palácio da Alvorada.

As 60 fotos da mostra Grafitar Para Não Pichar ficarão dispostas em dez painéis. São 45 imagens coloridas e 15 em preto e branco.

ESTADO DE MINAS - Rastros urbanos

23 (Élcio Paraíso/divulgação)

(16/11/2011) Rastro é o nome da exposição de fotos de Élcio Paraíso, que será aberta hoje, às 19h, no Restaurante 2011, na Savassi. A mostra reúne imagens que registram marcas no ambiente urbano deixadas pelo homem.

A série Cemitério de automóveis (foto) exibe 10 fotos clicadas com equipamento digital e câmera Rolleiflex. Paraíso expressa sua visão sobre a sociedade de consumo. “Há 10 anos venho registrando esses sinais da passagem do homem pelas cidades. Ruínas, grafites, rabiscos, edificações e restos mostram como os centros urbanos vão se destruindo, mas também se construindo e se reinventando”, conta ele.

Ficarão expostas imagens clicadas em Belo Horizonte, na estrada São João del-Rei/Tiradentes e na BR-040. Elcio já fez as mostras Fantasias de Fidel, Pula fogueira e Para ouvir com os olhos.

O Restaurante 2011 fica na Rua Levindo Lopes, 158. A mostra poderá ser conferida até 13 de dezembro, de terça-feira a sábado, das 12h às 16h e das 19h às 2h.

O ESTADO DE S. PAULO - Uma casa para imagens

A fotografia ganha espaço cultural no centro da cidade

CAMILA MOLINA

Entre a década de 1910 e até hoje, a Casa da Imagem passou por 13 endereços, mas só agora a instituição que guarda o acervo de fotografia da Prefeitura de São Paulo inaugura um espaço que marca o resultado de um cuidadoso processo de estruturação para que sua coleção possa ser vista pelo público. Um casarão do século 19, de três andares, abrigado na antiga Rua do Carmo - hoje Rua Roberto Simonsen, ao lado do Páteo do Colégio -, passou por restauro desde 2009 para ser a sede da Casa da Imagem. Ela será inaugurada no sábado, com a exposição Guilherme Gaensly, O Fotógrafo Cosmopolita, que apresenta São Paulo e suas transformações por meio de imagens registradas entre 1890 e 1920 pelo suíço-brasileiro.

A Casa da Imagem é responsável por um acervo de 710 mil fotografias e negativos da capital paulistana, realizados nos últimos 150 anos. É uma das 12 unidades do Museu da Cidade de São Paulo, órgão do Departamento do Patrimônio Histórico/Secretaria Municipal de Cultura que é uma

24 rede com sede no chamado Solar da Marquesa de Santos, casarão também localizado na Rua Roberto Simonsen e que passou por restauro. A Prefeitura de São Paulo promove, assim, no sábado, a inauguração, para o público, do complexo com três espaços culturais na região: a Casa da Imagem com a mostra de Gaensly, que tem curadoria de Rubens Fernandes Junior (acompanhada de livro editado pela Cosac Naify); o Solar, com a ampla exposição A Marquesa de Santos: Uma Mulher, Um Tempo, Um Lugar, concebida por Heloisa Barbuy, da USP; e o Beco do Pinto, abrigado entre os dois edifícios e ocupado com a instalação No Ar, da artista Laura Vinci.

Como diz a diretora do Museu da Cidade, Regina Ponte, a Casa da Imagem é a primeira instituição que foi estruturada como tal dentro da rede de casas e espaços do órgão municipal. "O acervo iconográfico tem muita procura", diz Regina. O novo espaço para a fotografia é dirigido por Henrique Siqueira, que está trabalhando no projeto da Casa da Imagem desde 2008.

"Foram três anos de trabalho de recuperação, documentação e pesquisa do acervo", diz Siqueira, completando que 100% da coleção está restaurada e conservada, devidamente acomodada em reserva técnica. Do acervo de 710 mil imagens, que teve origem na gestão do prefeito Washington Luís (1914-1919), 120 mil obras já estão digitalizadas para consulta. As imagens representam tanto o desenvolvimento iconográfico urbanístico de São Paulo quanto as fotografias do gabinete do prefeito. Os destaques desse material são 150 negativos de vidro do fotógrafo Militão Augusto de Azevedo (1837-1905) e coleções com obras de Gaensly, Aurélio Becherini (1879-1939), Benedito Junqueira Duarte (1910-1995) e Ivo Justino, representado por fotos dos anos 1960 e 70.

A mostra de Gaensly (1843 -1928), que ocupa todas as salas expositivas da Casa da Imagem, apresenta o "trabalho requintado, de composição clássica e sintonizada com os grandes fotógrafos paisagistas do final do século 19 do mundo", diz Rubens Fernandes. A partir do próximo ano, conta Siqueira, mostras e livros sobre Militão e Justino poderão ser feitos - mas a instituição também promoverá exposições de fotógrafos convidados. "A previsão orçamentária para programação de 2012 é de R$ 820 mil", afirma o diretor curador. MÚSICA

FOLHA DE S. PAULO - Nova OSB mostra bom potencial na estreia

CRÍTICA MÚSICA ERUDITA

Ao lado de Hamilton de Holanda e Yamandu Costa, Orquestra Sinfônica Brasileira se apresentou renovada em SP

SIDNEY MOLINA, CRÍTICO DA FOLHA

(10/11/2011) Uma OSB (Orquestra Sinfônica Brasileira) enxuta, renovada, muito diferente do grupo que se apresentou aqui em 2010: foi o que se viu na Sala São Paulo na última terça-feira. A nova orquestra não tem ainda -nem poderia, dado o pouco tempo de trabalho- a experiência e o entrosamento que eram característicos do time anterior, mas mostra bom potencial e surpreende pela desenvoltura. O repertório escolhido -que incluiu uma trilha de cinema e a estreia de obra encomendada aos virtuoses Hamilton de Holanda (bandolim de dez cordas) e Yamandu Costa (violão de sete cordas)- poderia parecer inadequado para este momento. Mas, ao ouvir a "Suíte Psicose", versão sinfônica da trilha de Bernard Herrmann (1911-1975) para o famoso filme de Hitchcock (1899-1980), ficou clara a intenção de dar padrão ao grupo. As 16 pequenas seções exigem das cordas todo tipo de articulações e efeitos. E o maestro Roberto Minczuk -titular da orquestra carioca- já procura desenhar com clareza a voz de cada linha, busca matizes sem perder a força da massa. A "Sinfonia Inacabada" de Schubert (1797-1828) foi o ponto máximo de expressividade e desenvolvimento: o primeiro movimento saiu bem, mas no segundo ficou perceptível que o amálgama das madeiras com cordas e metais pode ser aprimorado. Concebida por Hamilton e Yamandu e orquestrada por Paulo Aragão, a "Suíte Interiores" é uma peça singela. Se o som percussivo do violonista tende a sumir diante da orquestra, a emissão encorpada do bandolinista casa com perfeição com o fraseado sinfônico.

25 Mas o "Jongo" final deixou o duo solto para improvisar, o que tornava a orquestra um luxo quase dispensável. Os músicos levantaram a plateia, que ganhou bis do movimento final e uma inesquecível "Pastorinhas" (Noel Rosa/Braguinha).

CORREIO BRAZILIENSE - Brasileirinho

O Espaço Cultural do Choro abre as portas da nova sede e renova o papel de difusor da boa música

Irlam Rocha Lima

10/11/2011 - A música de Brasília está em festa com a inauguração do Espaço Cultural do Choro. Com a assinatura de Oscar Niemeyer, o prédio — construído no Setor de Divulgação Cultural (Eixo Monumental) — passa a ser, a partir de hoje, além da mais nova referência arquitetônica da capital, um centro de preservação e difusão do gênero tido como gênese da MPB.

Para celebrar a data, foi elaborada uma programação bem equilibrada com a participação de grupos responsáveis por trabalhos com características próprias: o brasiliense Choro Livre, que terá como convidado especial o bandolinista e guitarrista baiano Armandinho Macedo; e a paulistana Banda Mantiqueira. Os shows de hoje serão só para convidados.

Na abertura, apresenta-se o Choro Livre, o mais antigo conjunto regional da cidade. Com quatro discos lançados e carreira internacional, o grupo é liderado por Reco do Bandolim (presidente do Clube do Choro) e tem, em sua formação, Henrique Neto (violão sete cordas), Rafael dos Anjos (violão seis cordas), Márcio Marinho (cavaquinho) e Valério Xavier (pandeiro).

Convidado do Choro Livre, Armandinho tem íntima e fundamental ligação com o Clube do Choro. Na primeira metade dos anos 1990, ele e o violonista Raphael Rabello (que dá nome à Escola de Choro) fizeram um show na Sala Villa-Lobos. A renda obtida foi destinada à entidade, que pôde estruturar sua antiga sede e, em seguida, deu início às atividades artísticas. O bandolinista integrou todos os projetos realizados naquela sala, a partir de 1997. “Participar do show de inauguração do Espaço Cultural do Choro é algo revestido de simbolismo. Minha relação com o Clube do Choro é histórica. Aqui, venho e sempre recebo acolhida carinhosa do público, o que me faz sentir em casa. Dessa vez, estarei ao lado do renovado Choro Livre, que tem como líder meu amigo fraterno Reco do Bandolim e é formado por jovens músicos cuja evolução acompanho desde o começo da carreira deles”, comemora. Armandinho retornou terça-feira do Reino Unido, onde tomou parte do Celtic Festival, na Irlanda.

Latin jazz Outra atração, a Banda Mantiqueira fará, hoje, no Espaço Cultural do Choro a segunda apresentação em Brasília e mostrará o seu latin jazz. A primeira foi há 10 anos, na Sala Villa-Lobos do Teatro Nacional, na companhia do compositor e violonista Guinga. Nailor Azevedo, o Proveta (clarinetista, saxofonista, compositor e arranjador e criador do grupo), porém, tocou duas vezes no Clube do Choro — uma delas, na companhia de Henrique Cazes.

Com 20 anos de carreira, integrada por 14 músicos, a Mantiqueira recebeu influência de grandes nomes do jazz e da música instrumental brasileira, entre os quais Louis Armstrong, Miles Davis, Charlie Parker, Dizzy Gillespie, John Coltrane, Ron Carter, Moacir Santos, Raul de Souza, Laércio de Freitas, Heraldo do Monte e Edson Machado. Individualmente, os músicos exercem intensa atividade em estúdios de gravação.

Embora toque mais em São Paulo, a Mantiqueira tem se apresentado em outras cidades brasileiras e no exterior, participando de festivais de jazz na Europa e nos Estados Unidos. De sua discografia, constam três álbuns. O primeiro de 1997 é totalmente instrumental, mas os dois seguintes, lançados em 2000 e 2005, tiveram a participação das cantoras Luciana Souza Mônica Salmaso, respectivamente. “Com o Aldeia, nosso primeiro CD, fomos finalista do Grammy, na categoria latin jazz”, lembra Proveta.

“Fizemos vários concertos com a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp) e, dessa parceria, surgiu a possibilidade de gravarmos um CD ao vivo na Sala São Paulo, sob a regência do

26 maestro John Neschling, e com a participação de Mônica Salmaso. Com e choros de mestres do gênero, saiu pela Biscoito Fino”, conta Proveta.

Casa de aconchegos Construído numa área de mais de 2 mil metros quadrados, o Espaço Cultural do Choro possui sala de concertos com capacidade para receber 420 espectadores. Da estrutura, faz parte o mezanino, onde ficam a cabine de som, luz e vídeo. Há ainda um camarote para autoridades e convidados especiais. Os músicos terão dois camarins ligados à sala por elevador. Na entrada do prédio, fica o Centro de Convivência, com café. O Ministério da Cultura, por meio do Fundo Nacional da Cultura, financiou a aquisição dos equipamentos de som, iluminação, vídeo, computadores e mobiliário.

CORREIO BRAZILIENSE - Bamba de fino trato

Rosualdo Rodrigues

10/11/2011 - O estúdio Visom, em São Conrado, no Rio de Janeiro, esteve movimentado na primeira semana de outubro. Nesse tempo, passaram por lá, entre outros, Zeca Pagodinho, Djavan, Beth Carvalho, Marcelo D2, Lenine, Martinho da Vila, Mart’nália, Fundo de Quintal, Alcione, Ivan Lins, Jorge Aragão, Teresa Cristina e Arlindo Cruz, todos recepcionados por Diogo Nogueira. O motivo era a gravação de um songbook — a ser lançado em CD e DVD — dedicado à obra de João Nogueira, pai de Diogo e um dos grandes nomes da história do samba carioca. “Enquanto o Rock in Rio acontecia, nós estávamos celebrando o samba no estúdio (risos). Agora, estamos iniciando a fase de masterização, sem contar a parte de edição de imagens, que está sendo feita pelo Canal Brasil”, conta Diogo.

Toda a movimentação em torno do tributo ocorre justamente à época do 70º aniversário de nascimento de João — comemorado no próximo sábado. O pai de Diogo compôs os primeiros sambas para os blocos carnavalescos do Méier, bairro onde morava, e, em 1968, teve sua primeira música, Espera, ó nega, gravada por um grupo de sambistas. Mas ele sempre considerou o registro de Corrente de aço, feito por Elizeth Cardoso, em 1970, seu ponto de partida como compositor profissional. Depois de Elizeth, intérpretes importantes como Elis Regina, Clara Nunes, Emílio Santiago, Beth Carvalho e Alcione incluíram no repertório músicas do sambista, integrante da ala dos compositores da Portela e fundador da escola de samba Tradição.

Fãs declarados A homenagem a João Nogueira é o primeiro projeto da Musickeria, produtora criada por Diogo em parceria com Luiz Calainho, Sergio Baeta e Afonso Carvalho. Inaugura também a série Samba book, que pretende revisitar as obras de grandes nomes do samba. Na lista dos empresários, constam nomes como Martinho da Vila, Paulinho da Viola, Zeca Pagodinho, Arlindo Cruz e Jorge Aragão. A ideia é resumir essas obras em CD duplo com 24 faixas, DVD, livro com discografia e partituras, minidocumentário, além de um portal pelo qual será possível baixar partituras e aplicativos para telefones e tablets. “A música sempre existirá na vida de todos. O que muda é a forma de produzir, comercializar e difundi-la”, afirma Calainho.

Sobre o elenco selecionado para o Samba book, de João Nogueira, Diogo diz que a intenção foi convidar artistas que, de alguma forma, tivessem a ver com a obra do músico. “Alguns tocaram com ele, outros foram influenciados pela obra maravilhosa que ele nos deixou. Beth Carvalho, Alcione, Martinho da Vila eram próximos, tinham que estar no projeto; já D2 e Seu Jorge, por exemplo, conhecem as músicas e são fãs declarados. Eu e o Afonso Carvalho fomos listando os sucessos e logo pensávamos nos nomes. Sugerimos duas músicas para que cada um escolhesse a preferida e deu certo.”

Djavan, por exemplo, escolheu Nó na madeira. “João foi um verdadeiro bamba. Ele foi um dos introdutores no samba daquela divisão oscilante que só quem tem muita musicalidade é capaz de fazer. Infelizmente, não tive convivência frequente com ele”, diz o alagoano. Lenine também lamenta o fato de não ter convivido com o homenageado. “Eu o conheci pela tevê, pelo rádio. João Nogueira está no inconsciente coletivo de todos nós. Mais tarde, acabei me aproximando mais da obra dele por conta do Paulo César Pinheiro”, afirma o pernambucano, que gravou Pimenta no vatapá.

27 Previsto para sair em março, o Samba book conta também com participações de Monarco e Velha Guarda da Portela, Sombrinha, Mariene de Castro, Revelação, Dudu Nobre, Hamilton de Holanda, Gisa Nogueira e Leny Andrade, além do próprio Diogo, que em uma das faixas usa os recursos tecnológicos para fazer um dueto com o pai em João e José.

O GLOBO - Tesouros do samba

Em novo CD, Beth Carvalho grava raridade de Nelson Cavaquinho garimpada em um acervo de mais de 4,5 mil músicas, reunidas por ela desde os anos 1970

Leonardo Lichote

(11/11/2011) Beth Carvalho aperta o play em seu computador e Nelson Cavaquinho, acompanhado por seu inconfundível violão de cordas beliscadas, canta versos como “Eu não errava quando te dizia/ A mão que acaricia é a mesma que apedreja”. A gravação caseira de “Palavras malditas”, parceria obscura de Nelson e Guilherme de Brito, foi descoberta em meio às mais de 600 fitas cassete do acervo da artista, guardadas em gavetas num quarto de sua casa — e saiu dali para seu novo CD, “Nosso samba tá na rua” (EMI).

— Quando ouvi, achei que fosse inédita — conta Beth, que, ao ouvir a voz de Nelson mostrando o samba, sorri e canta junto. — Depois descobrimos que havia sido registrada uma vez apenas, num 78 rotações de Ari Cordovil (de 1957). Considero inédita. O arquivo tem muitas outras preciosidades — de canções inéditas de artistas como o próprio Nelson, Wilson Moreira, Almir Guineto, Monarco e Jorge Ben Jor a diálogos da cantora com Cartola, Tom Jobim e Martinho da Vila — e, digitalizado, promete mais frutos.

— Ainda vai sair muito disco daquilo. Íamos passando as músicas para o computador e Beth dizia: “Vou ter que fazer uns 15 discos para dar conta disso tudo” — conta o músico Paulinho Bicolor, responsável pela digitalização do acervo.

Composições recentes

A cantora confirma a força do arquivo: — Podia ter feito meu disco só do acervo (a única a entrar foi “Palavras malditas”), mas quis mostrar samba novo — diz, referindo- se às canções inéditas de artistas como Almir, Arlindo, Leandro Fregonesi, Zeca Pagodinho e Luana Carvalho, filha da cantora. — No show (que estreia no dia 19, no Vivo Rio, e chega no dia 26 a SP, no HSBC Brasil), vou cantar todas as músicas do CD.

O acervo começou a se formar na década de 1970, com as fitas (e, a partir dos anos 1990, CDs) que Beth recebia de compositores que queriam ver suas obras na sua voz. Além de ganhar fitas, ela também ia com seu gravador atrás dos compositores.

De uma dessas ocasiões vem o registro de Cartola, em casa, apresentando à cantora as então inéditas “As rosas não falam” (lançada por ela em 1976) e “O mundo é um moinho”. Na mesma linha, há Tom Jobim ensinando a Beth “Matita perê”, que ela pretendia gravar — num encontro entre ela, o maestro e seu parceiro na canção, Paulo César Pinheiro. E Martinho passando à cantora a letra e a música de “Enamorada do sambão”, que fez para ela.

A digitalização do arquivo começou em dezembro de 2009, quando Paulinho foi convidado por Beth para o trabalho.

— Beth sempre falava do baú como um tesouro, e eu insistia para que fizéssemos algo com ele — lembra o músico. — Até que me chamou. Ela precisava de alguém que tivesse um conhecimento, porque havia fitas sem identificação nenhuma. Ouvindo, fui reconhecendo Wilson Moreira, Nei Lopes, Delcio Carvalho, Arlindo Cruz... Tem até uma inédita do Ben Jor.

O material foi separado, basicamente, entre compositores da velha guarda e da geração Cacique de Ramos — os nomes desconhecidos ou pouco conhecidos foram unidos numa terceira categoria. O trabalho de digitalização gerou cerca de 4,5 mil arquivos — 3,6 mil extraídos das fitas cassete, mais 900 de CDs.

28 Beth passeia com prazer e orgulho indisfarçável entre eles, mostrando suas preciosidades: — Esse aqui é o Silas de Oliveira cantando “Ciência do samba”... Ouve só o Argemiro...

Olha o Arlindo (o compositor, na fita, brinca com a hora da gravação: “Beth Carvalho, 1h30m da manhã... Só você mesmo”)...

Há ainda uma parte inexplorada do acervo. Além das fitas com músicas, há dezenas de registros agrupados numa quarta categoria. São encontros de compositores em festas na casa de Beth, diálogos soltos e coisas como a fita com a etiqueta “Nelson Cavaquinho filosofando”. Ela mostra o artista falando, de forma confusa, boêmia e bem-humorada, sobre a vida — revelando Nelson mais pela forma do discurso do que pelo seu sentido.

— São cerca de 200 fitas, mas, como esse material exige mais tempo para saber que canções estão ali, não mexemos nele ainda — diz Paulinho. Além de usar o acervo para garimpar repertório de futuros discos, Beth tem um projeto ambicioso.

Ela sonha em montar o Instituto do Samba Beth Carvalho, que abrigaria o arquivo, entre outras atribuições:

— O projeto inclui um teatro, uma rádio e o Bethquim, para eventos menores — explica a cantora. — Já conversei com Eduardo Paes, que ficou de marcar uma reunião para avaliarmos se a Prefeitura pode me ceder um terreno, provavelmente na região do Cais, segundo ele. Guardaria ali minha história e a de outros artistas do samba.

O GLOBO - Poder dos velhos tempos / Crítica

(11/11/2011) Após 27 anos, Beth Carvalho volta a trabalhar com o produtor e arranjador Rildo Hora. Após 15, está lançando novamente um disco quase todo de inéditas. Fosse nos anos 1970 ou 80, “Nosso samba tá na rua” seria um arsenal de sucessos. Hoje, com CDs vendendo pouco e o estreitíssimo funil das rádios, será curioso ver o que acontecerá com tantos sambas poderosos.

O poder está mais no potencial de comunicação com o público do que no excesso de qualidade — são boas composições, mas não há qualquer obra-prima. Ainda assim, “Chega” (Leandro Fregonesi/ Rafael dos Santos), mesmo não sendo um “Vou festejar”, é capaz de levantar qualquer baile de carnaval.

“Samba mestiço” (Ciraninho/ Fregonesi/Rafael) tem força para incendiar pagodes. “Verde e rosa de paixão” (Claudinho Guimarães) pode ser testada na quadra da Mangueira e usada até para esquentar a escola antes dos desfiles.

A reverência ao próprio samba aparece também na faixa- título (Roberto Lopes/Canário/ Alamir/Nilo Penetra) e em “Arrasta a sandália” (Dayse do Banjo/Luana Carvalho) — em duo com Zeca Pagodinho. Beth optou por um CD “para cima”, com poucos sambas lentos — “Colabora” (Serginho Meriti) e “Tô feliz” (Edinho do Samba) estão entre as exceções — e pontuado por crônicas do cotidiano, como em “Guaracy” (Zec a Pagodinho / Arlindo Cruz/Sombrinha), “galego com nome de índio”, e “Se vira”, narrado por uma ex-mulher de malandro.

É claro que não se choca com essa Beth leve “Palavras malditas”, um obscuro Nelson Cavaquinho/ Guilherme de Brito interpretado por quem tem notório saber no assunto e com introdução de tango. Já “Isso acontece” (Wanderley Monteiro/Jorgito Sápia/Agenor de Oliveira) ganha de Rildo um peso sonoro excessivo.

O fecho com “Minha história”, tão marcada na voz de Chico Buarque, prova que as escolhas de Beth são sempre bem pessoais, o que dá identidade a seus discos, mesmo sem obras-primas aparentes.

Cotação Bom

O GLOBO - De choro no jardim a concerto no Municipal

29 49o- Festival Villa-Lobos começa hoje com mais de 60 atrações pela cidade

Catharina Wrede

(11/11/2011) Apesar da educação rigorosa que teve no Rio de Janeiro durante a infância, em que a cultura europeia ditava as regras do bom gosto, Heitor Villa-Lobos sempre se cercou de pessoas que viviam de música popular.

Além de aprender com o pai a tocar clarinete e violoncelo, a cena popular carioca, das ruas e das rodas de choro, foi fundamental para sua formação como compositor. São esses dois lados de Villa que o 49o- Festival Villa-Lobos quer mostrar, de hoje ao dia 27, com uma programação que vai desde encontros de jovens músicos de choro no Jardim Botânico aos domingos à apresentação da Orquestra Sinfônica da Bahia, no Teatro Municipal, dia 26. São mais de 60 atrações espalhadas pela cidade, em espaços como o Museu Villa-lobos, o Espaço Tom Jobim, o Jardim Botânico e os teatros Municipal e Carlos Gomes.

— Desde 2009 o festival já vem mudando e ampliando sua programação. A ideia é transformá-lo num evento de grande porte, à altura da grandiosidade da obra do Villa — diz Marcelo Rodolfo, diretor artístico do evento.

O destaque da parte clássica desta edição é a estreia em solo carioca da Orquestra Sinfônica da Bahia, numa única apresentação no Municipal, dia 26, às 21h, quando ela recebe a pianista baiana Cristina Ortiz. O concerto também marca o primeiro espetáculo no Rio do maestro Carlos Prazeres como regente titular.

Já no lado popular, chama a atenção a série “Música sem fronteiras”, em que, no dia 24, no Espaço Tom Jobim, às 20h30m, o pianista e compositor André Mehmari toca com o bandolinista Hamilton de Holanda.

Em relação à pouca familiaridade que os brasileiros têm com a obra de Villa-Lobos, Marcelo afirma:

— Não temos a pretensão de preencher a lacuna da educação, mas queremos que as pessoas comecem a se interessar pela música clássica brasileira, e que os pais levem seus filhos. Vamos plantar sementes.

O GLOBO - Caruru, livros e muito samba nos 70 anos de João Nogueira

Comemoração começa hoje com festa para convidados no Bola Preta

Leonardo Lichote

(12/11/2011) Amigos e familiares sempre lembram-se de João Nogueira como um grande festeiro, que costumava promover em sua casa reuniões tão grandiosas quanto íntimas, que varavam a madrugada. Se estivesse vivo, portanto, o compositor (morto em 2000, vítima de um enfarte) ficaria satisfeito com o que foi preparado para seu aniversário de 70 anos. Nascido em 12 de novembro de 1941, ele será celebrado hoje com o “Caruru do João”, evento para convidados na sede do Bola Preta. A festa continua nos próximos meses com o ambicioso projeto do “Samba book” (uma reunião de CDs, DVD, livro e partituras, além de site e aplicativos para celulares e tablets sobre sua obra) e a biografia “É disso que o povo gosta — A história e as histórias de João Nogueira”.

— Ele gostava de fazer a comida nas festas de aniversário dele, e geralmente era caruru — lembra a compositora Gisa Nogueira, irmã de João. — Agregava amigos de infância, vizinhos, o pessoal da arte, do futebol, da política, da música...

Hoje, filme e roda de samba

Na festa, será exibido o curta- metragem “Carioca, suburbano, mulato e malandro”, de Jom Tob Azulay, sobre João. E, claro, haverá muita música. Além da roda de samba, seus parceiros — uma lista que inclui Carlinhos Vergueiro, Cláudio Jorge, Edil Pacheco e Ivor Lancellotti — farão uma apresentação recordando sua produção com o homenageado.

30 — Vou tocar coisas como “Bela cigana”, gravada por João com Clara Nunes, e “Dinheiro nenhum”, que é praticamente a história dos shows que a gente fazia — brinca Lancellotti.

Com lançamento previsto para o fim de janeiro, a biografia “É disso que o povo gosta” é um projeto de José de La Peña, amigo de João e cofundador do Clube do Samba. Ele convocou o jornalista Paulo Henrique de Noronha para apurar e redigir o livro. De parentes e amigos a parceiros, o autor entrevistou 40 pessoas — entre elas, Paulo César Pinheiro, Diogo Nogueira, Beth Carvalho, Monarco e Adelzon Alves.

— O livro será o que eu chamo de uma biografia informal — explica Noronha. — É uma parte significativa da história do João contada por seus amigos, sua família e seus parceiros.

O “Samba book” (Musickeria), mais amplo, também engloba uma parcela biográfica, num livro que acompanha a trajetória de João através de seus discos. Editado pela Casa da Palavra e escrito por Luiz Fernando Vianna, repórter do Segundo Caderno do GLOBO, ele terá 22 capítulos, 20 dedicados a discos — 18 de carreira e dois especiais (“O grande presidente” e “Esquina carioca”). Os outros dois capítulos se referem à fase pré-discográfica de João e ao fim de sua vida.

O “Samba book” — previsto para ser lançado em março de 2012 — terá ainda um fichário com 60 partituras destacáveis, CDs com 24 canções do compositor na voz de artistas como Seu Jorge, Arlindo Cruz, Marcelo D2, Zeca Pagodinho, Mart’nália e Diogo Nogueira — filho de João e um dos sócios do projeto, ao lado de Luiz Calainho, Sérgio Baeta e Afonso Carvalho.

— Selecionamos 30 músicas e mais de 40 artistas, a maior parte nomes ligados ao samba e à história do João — conta Afonso. — O Zeca Pagodinho, por exemplo, adorou cantar “Do jeito que o rei mandou”, que é menos conhecida. A mesma coisa com “E lá vou eu”, gravada pelo Jorge Aragão.

Todo o processo de gravação gerou um DVD/ Blu Ray (a ser exibido pelo Canal Brasil):

— O material está muito rico, gravamos cada música com 24 câmeras — conta Diogo Nogueira. — Os dias de gravação foram marcados por muita emoção e até lágrimas, como aconteceu com o Jorge Aragão e a Beth Carvalho.

O site www.sambabook. com.br entra no ar hoje. A ideia é que o “Samba book” de João seja o primeiro de uma série.

— Estamos iniciando as conversas com o Martinho da Vila. Seria uma honra muito grande tê-lo como próximo homenageado — diz Calainho.

O GLOBO - Clube da Esquina se reúne em festival

Evento começa hoje em Lumiar e terá Milton, Beto Guedes e Lô Borges

(11/11/2011) A letra de Ronaldo Bastos já contém um convite: “Anda, vem jantar/ Vem dormir, vem sonhar, pra viver/ Até chegar Lumiar”. O autor da melodia, Beto Guedes, estará no distrito de Nova Friburgo homenageado na canção. Dividindo o palco com ele, ainda estarão outros protagonistas do Clube da Esquina: , Lô Borges, Toninho Horta e Wagner Tiso.

A reunião histórica dos artistas que saíram de Minas para mudar a paisagem da música brasileira na virada dos anos 1960 para os 1970 acontecerá na próxima segunda- feira, por ocasião do Serra Sons Festival. O encontro raro possibilitou ao evento ser ampliado e a seus organizadores sonharem alto.

— Queremos transformar Lumiar na capital nacional da música brasileira — diz o produtor cultural Anderson Pomar. — Foi muito importante ter o apoio de Milton Nascimento.

Quando convidávamos outros artistas, eles perguntavam: “Quem vai?”. O nome de Milton abria as portas. Lulu Santos faz hoje o show de abertura. Amanhã, cantam Nó Cego, Zeca Baleiro e Alceu Valença. No domingo é a vez de Boca Livre, Guilherme Arantes e Flávio Venturini. E, passada a noite do Clube da Esquina, o feriado de 15 de novembro terá Rio Maracatu, Inimigos do Rei e o bloco

31 Sargento Pimenta. Beto Guedes se apresentou em Lumiar em 16 de julho, para comemorar os 35 anos da música que fez com Ronaldo Bastos. O letrista já ganhou até homenagem em Friburgo por causa dos versos, mas só conheceu Lumiar muitos anos depois de escrevê-los.

— A família de Ronaldo tinha uma fazenda em Friburgo, e ele conhecia a fama de Lumiar — lembra Beto. — É uma região bonita, montanhosa, com cachoeiras. Fiz a melodia a partir do que ele me falou.

A arena de 7 mil metros quadrados tem capacidade para 5 mil pessoas. Apesar da atmosfera hippie, há banheiros químicos, seguranças, locais de alimentação, estacionamento, posto de saúde e uma UTI. Os ingressos custam entre R$ 25 e R$ 150. (L.F.V.)

O GLOBO - O mesmo Lupicínio, mas filtrado de duas maneiras diferentes

Show e DVD mostram compositor ao mesmo tempo moderno e moído pela raiva

Leonardo Lichote

(16/11/2011) Um autor de canções cool e modernas, que deslizam sobre bases eletrônicas. Um louco, moído pelo sentimento de vingança, pelo desespero, pela raiva. Os dois são o mesmo Lupicínio Rodrigues, olhado com filtros diferentes. Na visão de Thedy Corrêa e Sacha Amback — que apresentam o show “Loopcínio” hoje e amanhã, às 19h30m, na Caixa Cultural —, há um sofisticado poeta, tão contemporâneo que permite que sua música se abra para timbres e gêneros que nasceram, muitas vezes, anos após sua morte. Arrigo Barnabé — que lança hoje, às 21h30m, no Cine Áurea (tradicional cinema pornô de São Paulo), o DVD “Caixa de ódio”, também sobre a obra do gaúcho — vê um homem tomado pelo “desejo de morte e de dor”, com uma voz que se alterna entre a rouquidão do surto e a suavidade afetada de quem esconde fantasmas.

‘Som Brasil’ motivou shows

Os caminhos que levaram a dupla Thedy e Sacha e Arrigo a Lupicínio correram paralelos — e não foram curtos. O projeto “Loopcínio” foi lançado como um CD em 2005.

— Eu e Sasha somos amigos desde 1990, e da amizade surgiu a ideia de fazer um projeto de música eletrônica — conta Thedy, vocalista do Nenhum de Nós. — Eu tinha muito forte a questão do Lupicínio como letrista, como poeta. Como compositor, busco a comunicação de coisas como “Volta”, profundamente moderna. Queria trazer Lupicínio e música eletrônica juntos para apresentar essa riqueza e as possibilidades dela. Era o projeto ideal, pelo gosto dos dois e a força das canções.

Na época do lançamento, “Loopcínio” teve poucos shows. Ele chega ao Rio agora, pela primeira vez, motivado pela participação da dupla no programa “Som Brasil” em homenagem ao compositor gaúcho, exibido no ano passado. A partir dali, começaram os pedidos de show.

“Caixa de ódio” também andou num tempo próprio. Arrigo pensou pela primeira vez em trabalhar sobre as canções de Lupicínio ao ouvir um disco de Itamar Assumpção, seu parceiro de Vanguarda Paulistana:

-— Quando Itamar gravou Ataulfo Alves (em 1996), pensei em algum dia fazer aquilo sobre Lupicínio. Achava que aquelas canções davam possibilidade de leituras mais crocodilescas — diz, referindo-se a seu clássico disco pop-vanguardista “Clara Crocodilo”. — Em 1999, fui chamado para um projeto em Porto Alegre no qual teria que cantar algo de Lupicínio e, em 2002, estive em outro projeto só sobre o compositor, em São Paulo. Fiquei com essa ideia e, em 2009, resolvi fazer o show na Casa de Francisca (onde foi gravado o DVD e onde o artista se apresenta de amanhã até domingo).

“Clara Crocodilo” é citada no show, num noticiário de rádio que evoca a narração original. — Em 2009, Arthur Nestrovksi, que é gaucho, assistiu ao show sobre Lupicínio. Ele me disse: “Ele era a Clara Crocodilo antes de você inventá-la” — diz Arrigo, que aproveita o momento da narração para fazer referência a outro artista que também bebeu de Lupicínio. — Lembrei da capa do “Nervos de aço”, do Paulinho da Viola, e, na narração, falo que tem um boêmio bêbado, olhando para a lua, com

32 um ramalhete de flores na mão e lágrimas nos olhos que diz para o monstro: “Você sabe o que é ter um amor?”. Sonho fazer um show que, nesse momento, Paulinho entre no palco com as flores na mão.

Arrigo está envolvido em outro projeto sobre o gaúcho, como protagonista do filme de ficção que Maurice Cappovila faz inspirado em canções de Lupicínio, para estrear em 2012. É o diretor de um grupo que monta um espetáculo sobre músicas do compositor e acontecem situações como as das canções A viagem de “Loopcínio” — que no palco, além de Thedy e Sacha, tem o baterista Jongui — é mais musical do que cênica.

E passeia por new bossa, hip hop climático, dub... — Nas programações que fiz, a inspiração maior veio do Massive Attack — conta Thedy. O músico vê como natural o fato de o disco soar hoje tão novo quanto quando foi lançado. — Para nós, a música eletrônica não se resume ao que acontece hoje nas pistas da Europa.

Ela começa antes mesmo do Kraftwerk. Teve um tempo em que as pessoas queriam modernizar e simplesmente metiam um drum‘n’bass, algo que datou. Nosso disco tem pitadas de Laurie Anderson. Pô, Laurie Anderson não é moda! Arrigo também sai do trilho clássico de Lupicínio. Ao lado de Paulo Braga (piano) e Sérgio Espíndola (violão e baixolão), ele passeia por Jovem Guarda, jazz de cabaré e chá-chá-chá, tudo dentro da discussão sobre o bom e o mau gosto na MPB que permeia o DVD.

O GLOBO - A música passeia pelos trens cariocas

Quarteto Radamés Gnattali lança hoje, no Odeon, uma ode às estações

Catharina Wrede

(16/11/2011) Quem lê o nome do disco, “As quatro estações cariocas”, tende a pensar que se trata de uma temática frequente na música clássica: o verão, o outono, o inverno e a primavera, aplicadas ao Rio de Janeiro. Vivaldi já fez isso, Haydn e Piazzolla, idem. Mas o CD que o Quarteto Radamés Gnattali e o violonista Zé Paulo Becker lançam hoje, às 20h, no palco do Cine Odeon, não é uma ode às estações climáticas, mas sim uma homenagem às estações ferroviárias da cidade.

A ideia curiosa surgiu num brainstorming do quarteto, formado por Carla Rincón, Hugo Pilger, Fernando Thebaldi e Francisco Roa, com o violonista convidado Zé Paulo Becker. — Eles disseram que estavam pensando em algo como fazer as quatro estações, só que em música popular — diz a violinista venezuelana Carla. — Mas aí eu logo disse: “Vocês não têm as quatro estações bem definidas aqui no Brasil! Muito menos no Rio! Não podemos fazer isso!” Os quatro concordaram e começaram a lembrar de lugares clássicos da cidade onde o samba e o choro surgiram. Chegaram à Mangueira e, logo depois, a Madureira.

E viram que ali tinham duas estações de trem famosas do Rio. — Aí foi só pensar também na Central do Brasil e na Leopoldina. Tínhamos, por acaso, nossas quatro estações, só que de um jeito diferente. — conta Carla. As músicas foram encomendadas, então, aos compositores Maurício Carrilho, Paulo Aragão, Sérgio Assad e Jayme Vignoli, que buscaram referências. Na Leopoldina, a inspiração veio das heranças do Brasil imperial; na Central do Brasil, a torre de babel de informações e códigos da cultura brasileira foi o objeto inspirador da composição; em Madureira, a busca foi pelas características da cultura suburbana, onde o jongo e ritmos da cultura africana se firmaram no Brasil. E, na Mangueira, a importância e representatividade de um dos gêneros musicais mais populares da cultura brasileira, o samba.

O espetáculo de hoje à noite é gratuito. Amanhã e sexta-feira, o quarteto e o violonista se apresentam nas estações de Deodoro, Madureira, Bonsucesso e Central do Brasil.

EL PAÍS - El carioca enamorado

Marcelo Camelo revoluciona la escena musical brasileña

IKER SEISDEDOS - Madrid - 12/11/2011

33 La popular brasserie Jobi, situada en el barrio tan sofisticado sin esfuerzo de Leblon, en Río de Janeiro, lucía una reciente mañana de domingo la misma agitación somnolienta de la música del último y sensacional disco de Marcelo Camelo, que fue cantante y compositor de Los Hermanos, pionera banda brasileña de rock alternativo. Toda una celebración de la vida en fin de semana: los camareros se escurrían entre las mesas sin derramar la cerveza, las risas de las garotas lo alborotaban todo y Camelo, habitual de Jobi, explicaba inclinado sobre un plato de carne cocinado en el cielo que la atmósfera del álbum habría que buscarla en realidad en el bullicio de São Paulo.

Carioca de Jacarepaguá, se marchó hace dos años a vivir a la megalópolis rival "por amor, la única razón por la que merece la pena mudarse". Camelo, de 33 años, conoció a los 30 a una chica, cantante y famosa como él, llamada Mallu Magalhães. Un pequeño detalle: entonces ella tenía 16 años. Superada la novedad para la prensa amarilla, desoídos los consejos familiares y digerido el lío en general, la relación continúa y el grandullón de la barba descuidada y fama de tipo hosco aún está colado por la chica espabilada de la generación MySpace. Que el disco se titule Toque dela (Universal), el toque de ella, podría contar como otra prueba más.

"Mi debú en solitario se compuso en soledad en mi apartamento de Río, un lugar en el que, de tan silencioso, se escuchan las enredaderas crecer", recuerda Camelo. Con aquel trabajo, afloró en su obra el gusto, siempre latente en la música de Los Hermanos, por la MPB (siglas de Música Popular Brasileira) de Chico Buarque, Jorge Ben o Tamba Trío, músicos todos de los que nuestro hombre habla con devoción. Aunque Toque dela vaya más lejos que el anterior al añadir riqueza en los arreglos y exuberancia en las instrumentaciones.

Con la seguridad de haber encontrado su voz, el cantante está en condiciones de admitir lo que todos saben hace tiempo: el presunto paréntesis en la trayectoria de Los Hermanos, banda que fundó cuando era un estudiante de periodismo con ínfulas de reportero de rock (aún recuerda con espanto el día en que, en una entrevista, vertió un vaso de agua en la chaqueta de cuero de Joey Ramone) suena a estas alturas a separación en toda regla. "Dejamos de tener intereses comunes y sí, vendíamos un montón de discos [más de 300.000 de su homónimo debú de 1999], pero ¿qué significaría eso ahora? Aquí la industria está aniquilada por la piratería, los discos se ofrecen gratis en los blogs de los grandes periódicos", cuenta el músico brasileño.

Conviene no confundir este con el típico alegato contra las descargas del artista millonario. Camelo no es de los que lamentan el cierre de los estudios, hace tiempo que dejó de "creer en los objetos" y celebra "la enorme cantidad de bandas que descubre cada semana". Como The Growlers, combo californiano con el que actuó durante el segundo fin de semana del festival Rock in Rio. "Todo lo que sea acercar la música a los oyentes es bueno", afirma. "Porque ¿cuál es la misión divina de un compositor? Proveernos de canciones. Buenos temas para hacer el amor, para discutir, para trabajar, para ducharse o para un domingo por la mañana como este".

O ESTADO DE S. PAULO - Osesp em partes

Orquestra lança dois primeiros álbuns de música de câmara; uma herança bendita da era Neschling

JOÃO MARCOS COELHO , ESPECIAL PARA O ESTADO - O Estado de S.Paulo

Aos poucos, percebe-se concretamente o alcance da era Neschling na Osesp. Um planejamento tão bem feito que levou a orquestra, nos últimos dois anos, já sem ele, a conquistar inúmeros prêmios e distinções nas publicações internacionais por gravações concebidas e/ou realizadas em seu período. É um fertilíssimo baú - herança bendita do maestro que reinventou a Osesp e a elevou ao patamar que ora desfruta. Agora mesmo, a orquestra chancela seus dois primeiros lançamentos de música camerística em CDs do selo Biscoito Fino.

Num deles, o Quarteto Osesp, acompanhado pelo pianista Ricardo Castro, interpreta os quintetos para piano e cordas de Schumann e Dvorák. No outro, o spalla da orquestra e também líder do Quarteto Osesp Emmanuele Baldini interpreta três sonatas de Camargo Guarnieri, acompanhado pela pianista da casa, Dana Radu.

34 A bem-vinda iniciativa combina em doses equilibradas o grande repertório europeu com um notável compositor brasileiro. Alimenta-se de registros feitos entre julho de 2008 e abril de 2009 na Sala São Paulo (Neschling foi demitido em janeiro de 2009). É uma avenida que precisa ser estimulada com outros CDs.

A Osesp gravou seis sinfonias e três aberturas de Guarnieri. E agora, com três das sete sonatas para violino e piano, adentra na criação mas íntima do compositor. Guarnieri estudou violino desde menino, e talvez seja este o motivo de sua grande produção para o instrumento: além das sonatas, uma sonatina para violino e piano; e dois concertos e um choro para violino e orquestra.

Sua mais falada sonata é a segunda, de 1933, que provocou violentas críticas de Mário de Andrade por afastar-se do ideário nacionalista e flertar com dissonâncias agressivas e o atonalismo. Guarnieri abandonou o gênero por 17 anos e só retornou a ele em 1950, no meio do tiroteio provocado por sua Carta Aberta contra as vanguardas capitaneadas por Hans-Joachim Koellreutter.

A quarta sonata, que abre esta excelente gravação onde brilham os talentos e a perfeita integração entre o violino de Baldini e o piano de Dana, é uma de suas obras camerísticas mais conhecidas. Composta em 1956, afasta-se das inevitáveis síncopes nacionalistas nos dois primeiros movimentos mas mergulha inteira num samba no terceiro movimento, um Allegro appassionato.

Com a quinta e a sexta, de 1961-63, elas compõem um grupo de obras que exibe escrita harmônica mais áspera, mais sólida em avanços estruturais e demonstra compromisso menor com demonstrações de brasilidade explícita. Além disso, o domínio de escrita é fabuloso, confirmando que, para além das polêmicas inúteis, Guarnieri foi compositor de domínio técnico composicional indiscutível. E, ainda por cima, moderno - coisa que a vanguarda não soube enxergar naquele momento.

O registro dos quintetos para piano e cordas de Schumann e Dvorák é importante porque dá chance a músicos brasileiros de gravar as obras do repertório internacional. São eles, neste CD, os dois spallas da Osesp - Baldini e Cláudio Cruz, este empunhando a viola -, e o violinista David Graton, além o alemão Johannes Gramsch, spalla dos violoncelos.

Para o ótimo pianista baiano Ricardo Castro, a iniciativa representa oportunidade de realizar, em seu país, uma gravação camerística de nível internacional. Ao menos no quinteto de Schumann, Castro comanda praticamente um concerto de câmara, tamanho o predomínio do seu instrumento. O Allegro inicial começa com um tema imperial e brilhante e continua no vasto desenvolvimento em estilo concertante - um momento particularmente bem-sucedido desta gravação, com Castro alçando-se acima das cordas, sem eclipsá-las, como pianistas incautos fazem. Um bom exemplo desta integração perfeita sente-se no vertiginoso scherzo molto vivace.

O quinteto de Dvorák inverte a relação. Desta vez, violino e viola mantêm as rédeas. São entusiasmantes as leituras de duas danças folclóricas checas contrabandeadas pelo compositor no quinteto: uma melancólica dumka no Andante e uma vibrante furiant no scherzo, também molto vivace. Ambas, como aliás muitas do quinteto de Schumann, com melodias memoráveis. Há centenas de ótimas gravações destes quintetos no catálogo internacional. Mas esta nada fica a dever às mais incensadas.

AGÊNCIA BRASIL - Encontro inédito reúne no Rio bandolinistas do Brasil e do exterior

Paulo Virgilio

35 (13/11/2011) Rio de Janeiro - Pela primeira vez no Brasil, um encontro vai reunir músicos do país e do exterior que têm como instrumento o bandolim. Iniciativa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o Momento Rio Bandolim 2011 será aberto hoje (12), às 14h, no Centro Cultural Justiça Federal (CCJF), no centro do Rio. Além dos concertos no CCJF e na Escola de Música da UFRJ, também no centro, o evento terá palestras e workshops sobre o instrumento.

Além dos brasileiros Joel Nascimento, Ronaldo do Bandolim, Afonso Machado, Marco César e Paulo Sá, vão se apresentar até quarta-feira (16) o italiano Ugo Orlandi, considerado um dos principais nomes do bandolim no cenário internacional, e os norte-americanos Don Stiernberg, Barry Mitterhoff e Marilynn Mair. Nos Estados Unidos, o instrumento está vinculado a diversos gêneros musicais, do jazz ao pop e ao bluegrass, passando pela música para crianças.

A origem do instrumento remonta ao século 17, em concertos de música barroca e clássica. “O compositor italiano Antonio Vivaldi foi autor de concertos para bandolim”, lembra Paulo Sá, também curador do evento e um dos poucos bandolinistas do mundo com doutorado em seu instrumento. Atualmente ele é professor na Escola de Música da UFRJ, que desde o ano passado oferece bacharelado em bandolim.

“O bandolim foi trazido para o Brasil no século 18, mas só por volta da década de 40 do século passado é que se consolidou como instrumento por excelência do choro”, diz Sá. Segundo ele, a partir desta primeira iniciativa, a intenção é tornar o Rio Bandolim um evento anual da agenda cultural da cidade. “Desta vez não deu para reunir todos os gêneros, mas nas próximas versões vamos mostrar o bandolim no fado e no rock”, promete.

Todas as atividades do evento são gratuitas. A programação completa pode ser conferida no site www.momentoriobandolim.com.br.

O GLOBO - O fenômeno Jau tenta ir além da Bahia

Sucesso local, compositor chama a atenção em CD com músicos do pop e da MPB

Leonardo Lichote, Enviado especial • SALVADOR

JAU, em Salvador: fechando shows de Caetano e Jorge Ben Jor

O executivo da Som Livre chegou a Salvador para conhecer uma banda e se decepcionou. A música ouvida pelo taxista, porém, chamou a sua atenção. “Quem é esse?”, perguntou. O motorista, algo incrédulo, respondeu: “Rapaz, é Jau!” No hotel, procurando o que fazer, soube que, óbvio, o melhor era o ensaio pré-carnavalesco do artista — que reúne, semanalmente, milhares de pessoas. O resultado da “descoberta” (ou da evidência) se materializou no CD “Aplausos para o sol”, recém- lançado pela gravadora.

36 Jau é cantor e compositor, tem 40 anos e já foi atração na passagem por Salvador de Nando Reis, Maria Rita, Seu Jorge, Jorge Ben Jor, Caetano Veloso e Maria Gadú, entre outros. Mais do que isso: foi convidado para fechar as noites. Sua popularidade, a princípio injustificável para quem vê a música brasileira a partir do eixo Rio-São Paulo, passa por uma estrada longa — de integrante do Olodum aos 17 anos (com o grupo, ele tocou com Paul Simon no Central Park) a compositor gravado por grupos e cantores na Bahia, integrante do projeto Afrodisíaco (novidade baiana há alguns anos) e voz que dueta com Caetano na trilha de “Ó paí, ó”.

Seu status hoje também se explica pela adequação de sua música a artistas tão diferentes e a seus fãs — um som cheio da baianidade e do apelo popular do axé, mas que bebe da MPB e do pop-rock. Uma alquimia que Jau constrói com consciência. Assim como se refere com empolgação de artista jovem às participações que conseguiu reunir no CD — lista que inclui Leila Pinheiro, Tutty Moreno, Lincoln Olivetti, Marcelo Jeneci, Davi Moraes, Esguleba, Dadi, Trio Mocotó, Kassin, Funk Como Le Gusta e Olodum —, Jau fala de seu trabalho em termos como “produto” e “mercado”.

— Faço comércio, mas sem abdicar da arte. Sou puro quando componho e gravo, mas sou também um empresário que entende esse mercado. Identifiquei que Olodum e Timbalada estavam “em repouso” e que cabia um trabalho percussivo, neotropicalista (qualificação dada pela imprensa, mas que Jau abraçou) como o Afrodisíaco. “Aplausos para o sol” (produção de Alê Siqueira) reafirma sua fala, ao combinar força popular e busca por qualidade artística — resultado exatamente do trabalho que fez, ao lado de Pierre Onassis, no Afrodisíaco.

— O que queríamos era música com tambor, violino, baixo acústico, piano e letras que fossem bonitas sem fugir do entendimento popular. E sem apelos escrachados. Música que pudesse ser ouvida por crianças, idosos, pobres, ricos — diz.

‘Agora falta o Grammy’

Ele cita “Café com pão” (“Óculos escuros/ Na parede, na parede, na parede do meu sonho/ Ela pintou alegria/ Arrumou tudo em mim”), sucesso da dupla, e “Flores da favela” (“Nas cores da janela, flores da favela/ Tudo é ela”), lançada por Cláudia Leitte. Do CD — o segundo oficial (antes, teve só “edições de divulgação” pirateadas nas banquinhas) — podem ser pinçadas outras, como “Agô” (“Boca é pra beijar/ Fogo é pra queimar/ E vida é pra viver”) e “Gente” (“Eu não gosto de gente que não olha no olho/ Gente que reclama da vida/ Gente que aperta a mão assim sem apertar”). Próximo de Caetano, com quem fez a turnê de “Ó paí, ó”, o “neotropicalista” se afina também com Gil, que sempre lembrou, provocativo, que fez uma música chamada “Essa é pra tocar no rádio”. E mira em outros aspectos da carreira de Gil.

— Agora falta o Grammy — brinca, entre o bom humor do artista e a produtividade do empresário.

CORREIO BRAZILIENSE - Gata extraordinária

Às vésperas dos 10 anos de morte, Cássia Eller é lembrada com o lançamento de CDs, incluindo uma coletânea produzida por Nando Reis, com três gravações inéditas. Em Brasília, quatro cantoras fazem show em homenagem a ela, hoje, no Espaço Cultural do Choro

Cássia Eller, em 29 de dezembro de 2001, deixou órfã uma legião de fãs de todo o país. Pessoas de diferentes idades, gêneros e segmentos viam na cantora mineira — que iniciou a carreira em Brasília — uma extraordinária intérprete e a admiravam, também, por características marcantes de sua personalidade, como a irreverência, a rebeldia e um certo toque de sensualidade.

Próximo da passagem dos 10 anos de morte de Cássia, quatro cantoras brasilienses vão reverenciá- la no show Relicário (o título é o mesmo da coletânea recém-lançada), que será apresentado hoje, às 21h, no Espaço Cultural do Choro. São elas: Janete Dornellas, Sam Defor, Ivani Ferreira e Vicky Brito. No palco, elas terão a companhia da banda formada por Ricardo Batista (guitarra), Cairo Vitor (violão), Paulo Dantas (baixo elétrico), Davi Miranda (percussão) e Renato Vieira (percussão).

Idealizadora do show, Lanna Aguiar integra o imenso fã-clube do qual fazem parte, sem nenhum registro oficial, milhares de moradores da cidade. Alguns, como ela, foram conquistados pelo talento,

37 pelo canto, pela performance cênica, pela espontaneidade e pela sinceridade da cantora, ao assistir suas apresentações ao vivo. “Estava na plateia de todos os shows que Cássia fez em Brasília, inclusive na do último, na Sala Villa-Lobos, no primeiro semestre de 2001”, lembra a produtora.

Entre as convidadas por Lanna para homenagear a “ídola”, a única que integrou o ciclo de amizades da cantora foi Janette Dornelas. “Éramos adolescentes quando nos conhecemos e nos tornamos amigas. Foi fácil me aproximar dela. Nós duas formávamos, com Marcelo Saback e Márcio Faraco, um grupo de irresponsáveis que só queriam saber de música e de ir para o Beirute tomar cerveja”, recorda Janette, que atualmente se dedica ao canto lírico.

A cantora dividiu o palco com Cássia no show Dose dupla, na Sala Martins Pena, em setembro de 1985, e participou do musical Gigolôs, protagonizado pela amiga e por Saback, com direção de Alexandre Ribondi. “Aqui, o espetáculo passou pelas salas Funarte e Martins Pena, e foi apresentado no Cabaret Mineiro, em Belo Horizonte, entre 1986 e 1987”, lembra. “Quando ela abria a boca para cantar, o mundo parava”, acrescenta, emocionada.

“Três das canções que selecionei para cantar no show, me lembro de ter ouvido ela cantar apenas em shows ou em reuniões de amigos. Tenho quase certeza de que não as gravou”, diz, referindo-se a Blues do iniciante (Cazuza), Açúcar candy (Sueli Costa e Tite de Lemos) e Ne me quitte pas (Jacques Brell). Janette também cantará Por enquanto (Renato Russo), gravada por Cássia no disco de estreia, de 1990.

Cantoras fãs Sam Defor, cantora há 11 anos, revela que Violões — Cássia Eller ao vivo, de 1996, relançado em DVD no ano passado, é seu disco preferido. “Ouço esse CD acústico com frequência para me inspirar. Assisti a um show da Cássia, de quem sempre fui fã, em 2001, na Sala Villa-Lobos, mas não consegui ir ao camarim para falar com ela.” Para o show de hoje, Sam escolheu duas “lado B”, Maluca (Luiz Capucho) e Mapa do meu nada (Carlinhos Brown), e duas bem conhecidas, Nós (Tião Carvalho) e Gatas extraordinárias, que Caetano Veloso fez para Cássia.

Violões também é a referência maior da obra de Cássia para Ivani Ferreira, que solta a voz em palcos da cidade há 15 anos. “Cheguei, de forma mais aprofundada, à música da Cássia quando era aluna da Escola de Música. Lá tinha como professores de violão Paulo André Tavares e Ricardo Batista, que tocaram com ela. Embora não tenha tido aulas com a Janette Dornellas, a conheço e sei da relação de amizade entre as duas”, comenta. Malandragem (Cazuza e Roberto Frejat), E.C.T. (Carlinhos Brown, Nando Reis e Marisa Monte), Partido alto (Chico Buarque) e Milagreiro (Djavan) são as músicas que ela interpretará no palco.

Das quatro cantoras envolvidas na homenagem à Cássia Eller, Vicky Brito é a que tem menos tempo de carreira. “Canto na noite há três anos e no meu repertório há sempre canções imortalizadas por Cássia. Da discografia dela, o que mais me chama a atenção é o Acústico MTV. Ali percebo como ela era irreverente e agressivamente sensual”, afirma. Palavras ao vento, de Marisa Monte e Moraes Moreira, é uma das músicas escolhidas por Vicky para cantar no show de hoje.

CORREIO BRAZILIENSE - A fonte que nunca seca

Lô Borges lança Horizonte vertical, o quarto disco de inéditas desde 2003, gravado com a participação de Milton Nascimento, Samuel Rosa e Fernanda Takai

(16/11/2011) Às vésperas dos 40 anos do Clube da Esquina, Lô Borges lança seu 11º disco solo, Horizonte vertical, e o dedica ao filho Luca e à sua geração. Luca tem 13 anos e gosta mesmo é de AC/DC. Lô tinha 18 quando estreou como cantor e compositor, ao lado de Milton Nascimento, dando início ao movimento mineiro que marcou a MPB. Hoje, aos 59, acha muito bacana ter participado do antológico álbum duplo de 1972 — diz até que subiria ao palco para eventuais comemorações (“se o convite partir de Milton”), mas está mais interessado em mostrar ao filho que não ficou parado no tempo. Nos últimos oito anos, ele compôs pelo menos 60 canções, registradas em quatro CDs de inéditas. “Daqui a dois meses, já devo começar outro disco”, ri.

Lô Borges sempre gostou de transitar entre diferentes gerações. “Milton, mesmo, era 10 anos mais velho do que eu, tínhamos formações musicais bem diferentes”, comenta o compositor, que, aos 17

38 anos, chegou a tocar (no violão) Um girassol da cor do seu cabelo para Dorival Caymmi e, na década de 1990, teve a honra de ser gravado por Tom Jobim (O trem azul, uma das faixas do Clube da Esquina, entrou no álbum Antonio Brasileiro, o último do maestro). “Quando fui morar no Rio, as pessoas que me encontravam muito no Sacha’s eram o (cantor) Cyro Monteiro e o (compositor) Fernando Lobo, pai de .”

Em Horizonte vertical, além de contar com a participação de Milton Nascimento, Samuel Rosa e Fernanda Takai em várias das 12 faixas, Lô inicia uma parceria um tanto especial para ele, com a escritora e musicista Patrícia Mães. Cinco letras do novo CD são assinadas por ela. Letrista bissexto (“Sou muito arranjador”, justifica), ele conta que estava com sete músicas prontas quando Patrícia, à época sua namorada e moradora de São Paulo, foi visitá-lo em Belo Horizonte. “Ela escreveu em dois dias as cinco letras que faltavam. Adorei as letras e isso acabou sendo motivador para a gente levar uma vida junto e tal”, revela. (Sim, eles hoje moram juntos.)

Entre amigos Compostas de um ano e meio para cá, as 12 faixas do novo álbum incluem duas parcerias com Ronaldo Bastos (De mais ninguém e On Venus, esta em inglês) e duas com o irmão Márcio Borges (Antes do sol e Quem me chama), além da faixa-título, composta por ele e Samuel Rosa com letra de Nando Reis (o mesmo trio de Dois rios, sucesso do Skank). Samuel, aliás, já é “companheiro velho de guerra”. Ele e Lô fizeram cerca de 70 shows juntos — o primeiro foi em 1999 —, um cantando as músicas do outro. Estão sempre compondo e são amigos do tipo que saem para brincar com as crianças (o vocalista do Skank tem um filho da idade de Luca).

No CD, além de aparecer nos créditos como coautor, Samuel Rosa canta, toca violão e guitarra em três faixas. Já Milton Nascimento comparece em duas. Uma é Mantra Bituca, presente para ele (que, afinal, foi quem “descobriu” Lô) com direito a coro infantil (incluindo as vozes de Luca e do filho de Samuel). “Milton retribuiu a homenagem na mesma gravação. Enviei o arquivo e ele me mandou de volta com aquela cantiga no fim: ‘Oi, Lô!’”, comenta. A outra é Da nossa criação, uma “balada beatle”, como ele diz. Beatlemaníaco, do tipo que ia para a porta da loja esperar o disco do quarteto chegar, Lô afirma que, mesmo quando não faz música para os rapazes de Liverpool (fez 12), eles estão lá, “no DNA do compositor”. “Aprendi com eles a cantar, a compor, a arranjar.”

Surpresa, mesmo, foi a presença de Fernanda Takai em quatro músicas do disco. Lô diz que eles não se conheciam até uns dois anos atrás, quando cantaram juntos O girassol da cor do seu cabelo num show na Praça da Liberdade, em Belo Horizonte. “Quando eu estava compondo, ficava escutando uma voz feminina”, lembra. “Até que me veio isto: ‘Ah, é a Fernanda’. Aí, fui com jeitinho, chamei para uma faixa, ela topou. Quando chegou ao estúdio, contei que ficava imaginando uma voz feminina em algumas músicas. E tudo que mostrei, ela gravou (risos).”

O título do CD quem deu foi Nando Reis, ao batizar a canção. Mas Lô gosta de brincar com significados. “Horizonte é a minha composição, e vertical, a minha determinação de continuar compondo”, diz ele, que no estúdio teve a companhia de apenas dois músicos, Barral e Robinson Matos. Chegou a gravar uma faixa com banda completa, mas não gostou do resultado. “Queria arranjos mais meticulosos, não era 1, 2, 3, 4 e todo mundo tocando. Aí resolvi fazer só com os dois, que são multi-instrumentistas”, explica. Lô ficou com o violão e o piano acústico, enquanto Barral revezou-se nas guitarras, nos sintetizadores e no baixo, e Robinson, na bateria e na percussão.

Qualquer dia desses, Luca, quem sabe, entra na banda. Já toca um pouco de guitarra e violão e, vez ou outra, segundo o pai, insere Clube da Esquina nº 2 entre uma do Jimi Hendrix e outra do Guns’N’Roses.

39 HORIZONTE VERTICAL Décimo-primeiro álbum solo de Lô Borges, produzido por ele e Barral. Independente/ Natura Musical, 12 faixas. Preço: R$ 23,90. (Pedro David/Kélio Rodrigues/Divulgação)

Três perguntas - Lô Borges

Em Horizonte vertical, você retomou o piano como instrumento de composição... Por quê? Eu vinha compondo só no violão, mas em Harmonia, disco que lancei em 2009, entraram duas músicas feitas no piano. E pensei: “Ah, o piano sempre foi tão generoso comigo... Chegou a sua vez, cara”. Para Lennon e McCartney e O girassol da cor do seu cabelo, por exemplo, são dois sucessos do início da carreira que fiz no piano. É um instrumento mais completo, para fora, comparado ao violão, que é mais introspectivo. Mas, para mim, piano é uma nascente de canções. Só uso para compor. Instrumentista, mesmo, eu só me considero com a guitarra ou o violão. Nesses, consigo tocar todos os gêneros, do axé à , de Chico Buarque a Jimi Hendrix. Já no piano, além das minhas músicas, só sei The long and winding road (risos).

Você faz da composição um exercício, tem alguma rotina para isso? Sim, a gente tem que estar disponível pra música. Para compor o tanto que compus de 2000 pra cá, e eu praticamente dobrei minha produção como autor, é preciso ter dedicação. E, diferentemente do que o pessoal imagina, que músico é notívago e tal, comigo é o oposto. Gosto de dormir às 23h e acordar às 7h. Às 9h, já estou compondo. Meu horário de composição é das 9h ao meio-dia.

Você tem um “baú”, costuma guardar pedaços de canções para terminar depois? Praticamente nem uso gravador. Algumas coisas, às vezes, gravo num celular para não perder. Tenho um ritmo: componho e, depois que a música ficou pronta, ligo para o estúdio e marco a gravação. Não gosto de ficar com música parada dentro de casa.

FOLHA DE S. PAULO - Pegoraro mostra pop suave e poético em CD "Táxi Imã" tem arranjos suaves, influência afrobeat e letras com imagens de pipa no céu, verão e samambaia

Músicos Luisa Maita e Kiko Dinucci fazem participações no disco coproduzido pelo cantor Bruno Morais RONALDO EVANGELISTA, COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

40 (16/11/2011) Tantos sons disputam nossa atenção o tempo inteiro, tanta música é produzida e lançada a cada instante que nossos ouvidos reservam um prazer especial a discos que conseguem fazer o tempo parar um segundo para propor sonoridades e poéticas. O recém-lançado "Táxi Imã", do músico e produtor paulistano Pipo Pegoraro, 33, tem um quê de tranquilidade que transborda em temas e arranjos. Faz pop brasileiro esperto e suave, coloquial e altamente musical. Além das letras com imagens de pipa no céu, radinho de pilha, verão e samambaia, o clima de suavidade e espontaneidade também dita os arranjos: a banda passeia com traquejo por reggae, bossa, bolero e rock. Há também um afrobeat de acento brasileiro a permear todo o disco. Explica-se: a gravação, no estúdio Traquitana, no Bixiga, foi a semente para o nascimento da big band Bixiga 70. Além de naipes de sopro, solos de flauta e piano elétrico, sons de viola e bandolim, o álbum tem participações pontuais de músicos como Luisa Maita e Kiko Dinucci e coprodução do cantor Bruno Morais. "O disco tem densidade, mas é muito leve", define Pipo. "A intenção era mesmo buscar a leveza das coisas, os próprios arranjos feitos de maneira colaborativa, todo mundo chegando com ideia, com vontade de colocar algo." Seguindo construção poética livre, as canções passeiam por navegações e paisagens e se deliciam com termos como Gâmbia e Bondali, Arapuê e Muganguê. "É uma coisa simples, uma brincadeira com a sonoridade das palavras", diverte-se Pipo. "Muitas ideias vieram de sonhos: eu acordava pensando em palavras, elas me acompanhavam e de repente viravam canção".

FOLHA DE S. PAULO - Bixiga 70 sacode a cena com disco de "afrotudo" à brasileira

MAYRA MALDJIAN, DE SÃO PAULO

(16/11/2011) O portão do nº 70 da rua Treze de Maio, no bairro paulistano do Bexiga, mal parava fechado. Um entra e sai de mentes fervilhantes dava conta de que ali, no estúdio Traquitana, um batuque diferente ganhava contornos. Décio 7, Cris Scabello e outros oito músicos paulistanos compartilhavam naquele endereço o resultado de suas apuradas pesquisas musicais para criar uma sonoridade autoral e dar uma sacudida na cena instrumental. Desses encontros nasceu o disco de estreia da big band Bixiga 70, lançado neste mês. Tão vigoroso quanto os shows da trupe, o álbum destila influências que vão além do afrobeat, rótulo que persegue a banda (montada aos moldes das orquestras afro). Desde os primeiros shows, no fim de 2010, a ligação com o Africa 70, grupo do nigeriano Fela Kuti, foi imediata. "Era muita sincronia para a gente desprezar", brinca Cuca Ferreira, sax barítono. "Mas [a classificação] acaba não dizendo tudo sobre a gente", faz questão de acrescentar o guitarrista Scabello. O espectro de referências do conjunto se estende desde o afrojazz do etíope Mulatu Astatke até o djembê de Famoudou Konate, desde o candomblé até o calypso. Vai de Gilberto Gil a Nação Zumbi. "Somos filhos desse 'afrotudo' do Brasil", define o baixista Marcelo Dworecki. Dizem também que foi naquele mesmo nº 70 que Benito di Paula compôs "Retalhos de Cetim" e que Stevie Wonder deu uma canja. Décadas depois, a bênção da "igrejinha", apelido do estúdio, se perpetua: Gilles Peterson, DJ da rádio BBC, anda tocando o som do Bixiga 70 na Inglaterra.

FOLHA DE S. PAULO - Instrumental vive momento de frescor Revitalização do gênero atrai público para sonoridades ainda pouco exploradas FABRICIO VIEIRA, COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

(16/11/2011) Free jazz, afrobeat, o som dos terreiros ou mesmo o "avant-garde" erudito. Embebido por referências diversas, o formato instrumental tem vivido um momento de muito frescor, como atestam novos discos e projetos conduzidos por artistas brasileiros. Essa revitalização do gênero musical tem ajudado a derrubar certos preconceitos e atraído um público atento a sonoridades envolventes e pouco exploradas. "A cidade vive um momento grandioso na música instrumental, autoral. O público está procurando novos sons para curtir, especialmente ao vivo, o que tem permitido o desenvolvimento de uma relação bastante instigante", afirma à Folha o baterista Flávio Lazzarin.

41 Ao lado de André Calixto (sax), ele conduz o duo FLAC que, após o explosivo álbum "Vol. 3", desenvolveu um trabalho de resgate do universo de velhas cantigas de roda. O resultado, "Cirandas Brasileiras", é um conjunto de incendiárias releituras free jazzísticas de temas como "Atirei o Pau no Gato" e "Cai, Cai, Balão". PARA DANÇAR

Em uma via mais dançante, desponta o saxofonista Thiago França. Seu mais recente projeto, o Sambanzo, explora elementos do samba, a improvisação jazzística e o suingue africano -música para não ficar parado.

"Os grupos instrumentais estão conquistando cada vez mais público. Mas não no sentido de que o público está sendo convertido à música instrumental. O público já está aí há muito tempo esperando essas bandas aparecerem", avalia França.

PARA O SILÊNCIO

Em uma concepção diversa, para ser apreciado em silêncio, está o Moksha Trio.

Apoiado em piano, baixo e bateria, o trio se define como oriundo de fontes do jazz e do erudito contemporâneo, permeado por estruturas rítmicas afro-brasileiras.

Apesar da relativa sofisticação, Gilberto Ferri, pianista do trio, diz que tem sido "mais bem aceito pelos não iniciados em música do que pela maioria dos músicos".

A busca por novos rumos no instrumental tem resultado em vários outros exemplares com um tipo de luz própria, como Otis Trio, JPG Quarteto e Michel Leme.

Na seara mais tradicional do gênero, merece atenção João Rabello, talentoso jovem nome do violão.

FOLHA DE S. PAULO - Expatriados esperam por oportunidades

COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

(16/11/2011) A maior agitação na cena instrumental brasileira tem chamado a atenção de expatriados, que esperam oportunidades para mostrar seu trabalho por aqui. O saxofonista pernambucano Alípio C. Neto é um desses. Cinco anos depois de partir para a Europa, ele ganhou espaço na cena jazzística local, assinando como autor ou coautor cerca de dez álbuns. Mas ainda aguarda um convite para tocar no Brasil. "Há uma profunda desinformação sobre quem somos, como contribuímos e que tipo de experiência trazemos para a música brasileira", diz o músico. Nos EUA, história parecida vive outro saxofonista, Ivo Perelman. Com uma discografia de mais de 30 títulos, o paulistano consolidou seu nome na terra do jazz nos anos 1990. Porém só recentemente estreou em sua cidade natal. "O cenário para esse tipo de música tem começado a melhorar nesses anos, amparado pelo surgimento de um público novo." (FV) LIVROS E LITERATURA

O ESTADO DE S. PAULO - Escritor das horas vagas

Tradutor e autor, Rubens Figueiredo leva o 1º lugar do Portugal Telecom

MARIA FERNANDA RODRIGUES

(10/11/2011) Rubens Figueiredo é escritor nas horas vagas e só se anima em escrever quando tem algo a dizer, deixando de lado inspirações e abstrações. Tradutor de importantes obras, como a recente edição de Guerra e Paz, de Liev Tolstoi, feita pela primeira vez diretamente do russo, já lançou oito livros, dois deles premiados com o Jabuti. Seu último romance Passageiro do Fim do Dia (Companhia das Letras) lhe tomou quatro anos. Experimentava aqui, abandonava o livro ali para

42 adiantar uma tradução, e tanto tempo de dedicação e preciosismo resultaram no livro vencedor do Prêmio Portugal Telecom de Literatura, anunciado na terça-feira, em São Paulo, e no prêmio de R$ 100 mil.

"Procurei abordar coisas cotidianas e sem nexo à primeira vista, algumas banais e triviais, para encontrar nelas sinais de processos vitais que percorrem toda a sociedade", disse. A história, que se passa em um único dia dentro de um ônibus, já havia sido considerada a melhor do Prêmio São Paulo de Literatura em agosto, quando Rubens Figueiredo ganhou R$ 200 mil.

Em festa comandada por Débora Bloch e José Wilker na Casa Fasano, que se revezavam com os próprios finalistas na leitura de trechos dos dez livros selecionados, o português Gonçalo M. Tavares e Marina Colasanti também foram premiados.

Vencedor do Prêmio Portugal Telecom em 2007 com Jerusalém (Companhia das Letras), Tavares conquistou o segundo lugar e levou R$ 35 mil. Uma Viagem à Índia (LeYa), vencedor de quatro prêmios em Portugal, não é livro fácil e à primeira vista pode assustar. São 480 páginas de uma narrativa sem estilo definido - não é romance e não é poesia - e o leitor mais desavisado pode imaginar que a história se passa na época das grandes navegações.

O livro conta sim a saga de um português, Bloom, que vai à Índia. Mas a viagem acontece hoje e ele segue em busca de um mestre espiritual que acabará se revelando mais materialista que o próprio protagonista. "Há dois percursos importantes hoje: do Ocidente para o Oriente à procura do espírito e do Oriente, que parte para o Ocidente à procura da matéria. E os dois se chocam", comentou. Antes da revelação dos vencedores, ele disse que não se preocupava com prêmios e que seu trabalho era escrever. Talvez por isso Tavares seja um dos escritores mais premiados e festejados do momento, e tenha recebido de José Saramago um elogio para deixar qualquer escritor com inveja: "Gonçalo M. Tavares não tem o direito de escrever tão bem aos 35 anos. Dá vontade de lhe bater", disse o Nobel na entrega do Prêmio José Saramago concedido a Tavares em 2005.

Marina Colasanti, que volta a São Paulo no fim do mês para receber o Jabuti pelo juvenil Antes de Virar Gigante e Outras Histórias (Ática), ficou feliz com o terceiro lugar, mas depois bateu a culpa. "Olho para meus companheiros e penso que alguém vai ficar triste porque não ganhou ou que outras pessoas precisavam mais do dinheiro", comentou a escritora que ganhou R$ 15 mil. Mas ela considera que o prêmio de um escritor é a circulação do livro. "E a importância de um prêmio é que eles carregam o livro. É disso que o Brasil precisa."

Já em sua 9.ª edição, o Prêmio Portugal Telecom reconhece o melhor livro escrito em língua portuguesa lançado no Brasil no ano anterior à premiação. Nove dos dez finalistas participaram da festa e três deles vieram da Europa especialmente para isso - Gonçalo Tavares e João Tordo, de Portugal, e João Almino, da Espanha. Tordo, aliás, vai ter de se explicar em casa. "Minha mãe me proibiu de voltar a Portugal sem o prêmio", brincou.

CORREIO BRAZILIENSE - O filósofo da Colina

Evento celebra a passagem dos 100 anos do nascimento de Eudoro de Sousa, mestre que formou uma geração de cabeças brilhantes e deixou um rico legado em ensinamentos e obras

Severino Francisco

10/11/2011 - Darcy Ribeiro dizia que só se fazem sábios com sábios. E um dos mestres que ele trouxe para a Universidade de Brasília foi o filósofo português Eudoro de Sousa. A esquerda dizia que ele era de direita e a direita o acusava de ser de esquerda. O fato é que ele respondeu a inquérito policial militar durante o período da ditadura instaurada a partir de 1964, e o seu projeto do Centro de Estudos Clássicos foi totalmente destruído, reduzido a uma sala com livros na biblioteca da UnB. Mas Darcy Ribeiro tinha razão. Apesar do aparente fracasso, Eudoro formou em Brasília uma geração de mestres brilhantes e o seu legado permanece vivo, inspirando as novas gerações ao estudo da cultura clássica. Na passagem dos 100 anos do nascimento do filósofo, será realizado, hoje e amanhã, no Auditório Dois Candangos da UnB, das 14h às 21h, o evento 100Eudoro.

43 A homenagem começa às 14h com o VideoEudoro, de Reginaldo Gontijo e Luiz Fernando Suffiati, um precioso depoimento de 40 minutos, gravado com o filósofo pouco antes de sua morte, em setembro de 1987. Na sequência, a mesa com o tema memória terá as participações de Ordep Serra, José Santiago Naud e João Ferreira. A programação prossegue com o debate “Filosofia neo-helênica no Brasil e na América Latina” e as intervenções de Constança Marcondes César e Júlio Cabrera. Na sequência, Constança Marcondes, Walter Menon e Leonel Antunes discorrem sobre a questão “Filosofia e complementaridade em Eudoro de Souza”.

Espírito anárquico Detentor de uma erudição espantosa, Eudoro era animado por um espírito anárquico e iconoclasta. Só acreditava que poderia existir uma universidade séria quando ela não concedesse diplomas, pois seria frequentada apenas pelos que verdadeiramente amassem o saber. Em Brasília, apesar de todos os problemas políticos decorrentes do golpe militar de 1964, Eudoro formou uma geração de cabeças brilhantes: Emanuel Araújo, Ronaldes de Melo e Souza, José Xavier Carneiro e Ordep Serra, entre outros. Ordep Serra, professor da Universidade Federal da Bahia, considera Eudoro um dos maiores estudiosos do helenismo que o Brasil já teve e um filósofo original: “Tive a honra de ser aluno dele. Suas aulas eram magistrais. Os auditórios da UnB ficavam lotados, com todo mundo em silêncio”.

Ordep descarta sumariamente a acusação de que Eudoro seria de direita. Traumatizado com a ditadura salazarista e com o nazismo na Alemanha, o filósofo português não queria se meter com política. Apesar disso, ele assistia às assembleias estudantis e era amigo de Honestino Guimarães. Foi denunciado por um falso professor e respondeu a um inquérito policial militar: “Depois disso, o Centro de Estudos Clássicos foi destruído”, conta Ordep Serra. “A direita achava que ele era de esquerda e a esquerda também o via com desconfiança. Mas eu era de esquerda, fui seu discípulo e ele nunca interferiu em nada da minha formação política.”

Depoimento precioso Reginaldo Gontijo e Luiz Fernando Suffiati, os dois dos diretores do VideoEudoro, sabiam que o filósofo já havia se recusado a participar de um documentário. Mas, ardilosamente, eles procuraram Eudoro com a proposta de que falasse sobre o filósofo pré-socrático Heráclito. “Eudoro respondeu com uma frase de Heráclito: ‘O filósofo vive em um tão atento estado de vigília que toda a vigília da humanidade é sono’. Disse que estava pronto para fazer o filme”, observa Gontijo. No vídeo, Eudoro afirma que a filosofia morreu e foi substituída pela tecnologia, a informática e a robótica.

Bruno Borges, de 29 anos, entrou em contato com Eudoro ao jogar xadrez com o neto do filósofo: “Ele dizia que o avô era muito estudioso.” Quando estudava letras, Bruno ganhou uma bolsa para estágio na biblioteca da Universidade de Brasília e conheceu o acervo de livros deixado por Eudoro. A partir daí, viajou até Portugal e iniciou uma pesquisa sobre a trajetória do fundador do Centro de Estudos Clássicos da UnB. “A maioria das pessoas não sabe que Eudoro foi um dos criadores da Universidade de Brasília. O Centro de Estudos Clássicos era chamado de ‘Alexandria’ pelos alunos do Eudoro”, comenta Borges. “O sentido desse evento é lutar contra o apagamento da história de Eudoro na Universidade de Brasília.”

O que ele disse “Só acredito em uma universidade séria quando elas passarem a não conferir mais diplomas. Aí, ela seria frequentada apenas por quem amasse o saber”

“A erudição serve, muitas vezes, para enfeitar os burros. É preciso pensar com os próprios miolos”

“A filosofia viveu o seu esplendor e morreu. Foi substituída pela tecnologia e pela informática. A filosofia não faz mais parte da cultura”

“O que existe hoje são estudiosos da filosofia. Mas, filósofos, não vi mais nenhum”

“A filosofia tem os seus marginais, mas talvez eles se vinguem algum dia”

Eudoro de Sousa, filósofo e fundador do Centro de Estudos Clássicos da UnB

O GLOBO - Rubens Figueiredo vence o Portugal Telecom de Literatura

44 Autor e tradutor carioca leva prêmio de R$ 100 mil; Gonçalo Tavares fica em segundo

Gilberto Scofield Jr.

(10/11/2011) Antes de ser anunciado como o vencedor do prêmio Portugal Telecom de Literatura 2011, entregue anteontem à noite numa festa na Casa Fasano, em São Paulo, o escritor carioca Rubens Figueiredo subiu ao palco com aquele jeitão tímido de professor de português para falar do romance vitorioso, “Passageiro do fim do dia” (Companhia das Letras). Trata-se de uma narrativa sobre o percurso de ônibus do protagonista, Pedro, até a periferia de uma cidade e o que se passa por sua cabeça durante o trajeto. A cerimônia homenageava, com uma série de pequenas performances ao vivo ou em vídeo, os dez finalistas do prêmio, num espetáculo roteirizado ora simpático ora ligeiramente constrangedor.

Marina Colasanti em terceiro

A atriz e apresentadora Débora Bloch tascou a pergunta: “Você fez mesmo o trajeto de Pedro no ônibus?” Figueiredo, um dos maiores tradutores de russo do país, respondeu com um fiapo de voz:

— Durante boa parte da minha vida como professor, peguei dois ônibus para ir e para voltar do meu destino. No livro, o trajeto é imaginário, mas aquele processo de reflexão, não — disse ele.

Mais tarde, já com o troféu de primeiro lugar na mão — o segundo lugar ficou com o escritor luso- angolano Gonçalo M. Tavares, com o romance “Uma viagem à Índia” (Editora Leya), e o terceiro, com Marina Colasanti pelo livro de memórias “Minha guerra alheia” (Record) — Figueiredo tentou explicar o sucesso de crítica de “Passageiro do fim do dia” também vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura, em agosto:

— Existem cenas cotidianas e triviais, como pegar um ônibus, que são repetidas e parecem desprovidas de significado. Mas essas cenas encontram ali processos que percorrem toda a sociedade e que, às vezes, determinam toda a vida. Um ônibus é um lugar de reflexão e acho que todo mundo que já pegou um longo trajeto de ônibus sabe disso — afirmou.

— O livro do Rubens é ao mesmo tempo simples e sofisticado, uma narrativa que encontra reconhecimento de todo mundo e ainda feita com extrema qualidade — complementou o editor Luiz Schwarcz, da Companhia das Letras. Mais feliz estava o português Gonçalo M. Tavares, autor de “Uma viagem à Índia” (Editora Leya), uma epopeia em versos sobre a viagem de um herói mau- caráter à Ásia.

— Meu desejo era recriar um gênero que parecia extinto, a epopeia, mas trazendo a narrativa para um estilo deste século — disse.

Desta vez, o grupo de finalistas não causou o rebuliço do ano passado, quando o cantor e escritor Chico Buarque foi o vencedor com o romance “Leite derramado”, também premiado com o Jabuti. Na época, muitos protestaram, chamando a premiação de midiática e alegando que outros romances eram mais merecedores por suas qualidades literárias.

— A lista de finalistas era honesta, e a qualidade dos escritores, mais homogênea — avaliou um executivo de uma grande editora presente à festa. — Qualquer um merecia ganhar. O prêmio Portugal Telecom de Literatura 2011 avaliou 380 romances, contos, poesias, biografias e dramaturgia em português publicados no Brasil em 2010. O vencedor embolsou R$ 100 mil. Além de Rubens Figueiredo, Gonçalo M. Tavares e Marina Colasanti, a lista de finalistas incluiu João Tordo, com “As três vidas” (Língua Geral), José Castello, com “Ribamar” (Bertrand), João Almino, com “Cidade livre” (Record), Alberto Martins, com “Em trânsito” (Companhia das Letras), Elvira Vigna, com “Nada a dizer” (Companhia das Letras), Ricardo Aleixo, com “Modelos vivos” (Editora Crisálida) e Donizete Galvão, com “O homem inacabado” (Portal/Dobra Editorial).

CORREIO BRAZILIENSE - A feira possível

10/11/2011 - O principal evento literário de Brasília começa amanhã, apesar da falta de recursos e de planejamento. Entre as atrações estão o francês Philippe Davaine e o camaronês Boniface Ofogo.

45 Nahima Maciel

10/11/2011 - Assim como no ano passado, a feira ocupará o Pavilhão de Exposições do Parque da Cidade até o dia 20 (Arte de Sever sobre fotos de Aduto Cruz/CB/D.A Press - 9/10/10/ Rafael Ohana/ CB/D.A Press - 6/10/2011 / Kléber Lima/CB/D.A Press - 11/10/11) Assim como no ano passado, a feira ocupará o Pavilhão de Exposições do Parque da Cidade até o dia 20

A 30ª Feira do Livro de Brasília ocupa a partir de amanhã o Pavilhão de Exposições do Parque da Cidade com uma edição reduzida, abalada pelas brigas políticas que estremeceram a Câmara do Livro do Distrito Federal e os efeitos do corte de verbas. Mais uma vez, não foi fácil montar a feira. A Câmara do Livro ainda não tem em mãos os R$ 250 mil de uma emenda parlamentar. A programação foi montada com o dinheiro obtido da venda dos estandes e da boa vontade resultante de uma peregrinação por sete embaixadas em busca de parceria, além de uma contribuição da Petrobras. “A maior dificuldade que tivemos com a feira foi a liberação de recursos”, constata Íris Borges, curadora do evento.

A Secretaria de Cultura ficou de fora do evento, mas o Governo do Distrito Federal contribuiu com apoio para publicidade e desconto de 80% no aluguel do Pavilhão de Exposições. Nem mesmo a secretaria de Educação, que em outras edições teve participação importante com a inclusão de alunos da rede pública nas atividades da feira, participou desta 30ª edição.

Hamilton Pereira, secretário de Cultura, avisa que está concentrado em fazer “políticas públicas” e que a feira é evento do setor privado. Pereira lançou este ano o Plano do Distrito Federal do Livro e da Leitura e pretende, em 2012, realizar uma Bienal do Livro com editoras de todo o Brasil e do exterior. “Nós temos o plano do livro, estamos procurando dar conta da reestruturação interna do setor público, dentro de limites muito severos do ponto de vista orçamentário.”

Homenagem Este ano, a feira tem como patronesse a jornalista e escritora Dad Squarisi, colunista do Diversão&Arte, e homenageia o autor Ronaldo Cagiano. Será uma edição concentrada na literatura infantojuvenil. A lista de convidados tem quantidade significativa de autores e ilustradores, o que ajuda a configurar um perfil, ainda que tímido, para a 30ª edição. Marina Colasanti, Bartolomeu Campos de Queirós, Laura Muller, Nicolas Behr, Margarida Matriota, Ilan Brenman, Tino Freitas, Lucília Garcez e Carlos Maltz integram a lista de brasileiros.

Entre os estrangeiros, os convidados são praticamente desconhecidos em solo brasileiro. Muitos deles nem sequer publicaram em português e quase todos foram escolhas das embaixadas dos respectivos países. Como os organizadores da feira não contavam com orçamento suficiente para permitir margens de negociação, precisaram aceitar as propostas. “Com todas as dificuldades, estamos conseguindo fazer a feira possível”, avisa Íris.

Entre os 65 estandes do evento, apenas 19 são realmente de livrarias. Os outros foram ocupados por lojas ou instituições que aproveitam para realizar campanhas de divulgação e vender suas publicações. De acordo com Íris, o cenário é reflexo do mercado livreiro de Brasília. A curadora também tentou trazer para a feira as livrarias de rede instaladas na cidade. “Mas é difícil para eles quebrarem o padrão do funcionamento. Não podem montar um estande simples, precisam montar com o padrão da loja e não têm infraestrutura para fazer isso”, explica.

30ª Feira do Livro de Brasília Abertura amanhã, às 19h30, no Pavilhão de Exposições do Parque da Cidade. Visitação até 20 de novembro, diariamente, das 10h às 22h.

Destaques da programação

Instituto Cervantes » O instituto participa da feira pela primeira vez com programação que inclui lançamentos de livros, contação de histórias em espanhol, oficinas de jogos e palestras destinadas a educadores e profissionais da área do livro.

46 Philippe Davaine e Lenny Werneck » O ilustrador francês trabalhou com a escritora brasileira em Onde está você, Iemanjá? e se apaixonou pelo Brasil. O livro conta a história de uma menina que sai em busca de Iemanjá na noite de ano-novo. Davaine ilustrou o livro. Na França, o artista ilustrou edições importantes de clássicos como Poil de carrotte (Jules Renard) e Cyrano de Bergerac (Edmond Rostand).

Boniface Ofogo » Nascido na República de Camarões e radicado na França, Ofogo é autor de O leão Kandinga e outros livros infantis, a maioria sobre afro-descendência, tema que deve guiar a conversa durante o encontro com leitores na Feira do Livro.

Laura Muller » Especialista em livros sobre sexo para crianças e adolescentes, a autora é rosto frequente em programas de televisão destinado a jovens. Psicóloga e educadora sexual, ela mantém três colunas sobre o tema em jornais de São Paulo e publicou 500 perguntas sobre sexo do adolescente.

Eloisa Cartonera » Formado por uma cooperativa de autores e leitores do bairro Boca, de Buenos Aires, o grupo recolhe papéis juntados por catadores de rua, recicla e imprime livros que vão desde clássicos até autores contemporâneos. Para a feira, os argentinos prepararam oficinas e palestras, além de um bom estoque da produção própria.

Marina Colasanti » Autora de mais de 30 livros e ganhadora do Prêmio Jabuti do ano passado por Passageira em trânsito, a escritora tem vasta bibliografia destinada ao público infantojuvenil.

CORREIO BRAZILIENSE - Brasília sempre viva

Felipe Moraes

10/11/2011 - Quando o baiano João Gabriel Lima Cruz Teixeira iniciou a pesquisa que resultaria em seu terceiro livro solo, Brasília 50 anos: arte e cultura (Editora UnB), ele pensava em responder a uma interrogação antiga sobre a capital do país. “Dizia-se muito, naquela época, que, apesar de jovem, a cidade já havia se tornado celeiro de talentos, nas artes e nos esportes. Daí tive a ideia de montar um projeto para mostrar se isso era verdade mesmo. Mas verifiquei que não teria indicadores sociais suficientes para comprovar isso”, diz o pesquisador. Ele, com dois pós-doutorados em sociologia da arte, firmou o trabalho em cima de conversas com personalidades culturais nascidas ou formadas na cidade e reflexões sobre o relacionamento entre sociedade e suas representações artísticas. O estudo será lançado hoje, às 17h30, na livraria do Centro de Vivência da Universidade de Brasília.

“Comecei a entrevistar pessoas de destaque da cultura daqui. E comecei a chamá-las de ‘excelências’, em contraste com as excelências da Esplanada dos Ministérios. Eles, os artistas, se distinguem pela contribuição que dão à cidade no sentido de renová-la, de atribuir a ela uma autoestima”, continua João Gabriel, residente em Brasília desde 1980. No ano seguinte, a convite da UnB, associou-se ao Departamento de Sociologia da instituição.

Variedade Para o autor, o lugar que ajudou a compor a trajetória de nomes como Cássia Eller, Ney Matogrosso e Zélia Duncan nunca teve problemas de identidade. Pelo contrário: a variedade geográfica sempre jogou a favor da cultura local. “Diziam que Brasília era uma cidade sem gente, sem calor humano. São coisas que chamo de maledicências, ditas por gente que não gosta de Brasília ou que tem preconceito. Independentemente do que digam, se a capital deu ou não certo, ela tem vida própria”, analisa.

Escrevendo também sobre a sua própria experiência no Planalto Central, João Gabriel fala sobre outros assuntos: a solidão, os espaços vazios produzidos por um plano urbanístico de curvas e retas generosas, o ar místico que sempre envolveu o cotidiano das pessoas e a condição de síntese de um estado que representa um país inteiro. “Esse livro é um pleito de gratidão, mostrando que, a despeito de tudo que se fala dessa cidade, ela continua aberta. É patrimônio cultural do país”, constata.

47 Trechos do livro “Associada à mitologia fundadora de Brasília, conta-se que a professora e diretora de teatro Dulcina de Moraes, quando ainda residindo no Rio de Janeiro, depois de haver tentado infrutiferamente a transferência de sua escola de teatro para Brasília, teria recebido “passes” da senhora Aida Ferreira, genitora da atriz Bibi Ferreira, que era médium. (…)”

“Entre outras narrativas acerca das artes cênicas envolvendo Dulcina de Moraes, conta-se, por exemplo, que, no teto do referido prédio, mais precisamente no seu quinto andar, há uma mandala com a figura de um triângulo, versos inscritos e cristais. (…)”

FOLHA DE S. PAULO - Fliporto homenageia Freyre e o Oriente Festa Literária de Pernambuco, que acontece pela segunda vez em Olinda, espera atrair 80 mil até a terça-feira

Organizado por irmão do governador de PE, encontro debaterá influências orientais na literatura brasileira FABIO VICTOR, DE SÃO PAULO

(11/11/2011) Em sua sétima edição, a Fliporto (Festa Literária Internacional de Pernambuco) começa hoje, em Olinda, tendo como homenageados a literatura do Oriente e o sociólogo Gilberto Freyre.

A conferência de abertura, às 19h, será do médico e guru de autoajuda indo-americano Deepak Chopra -"o toque pop" de que todo festival literário necessita, segundo o curador da programação literária, Mario Helio.

A Fliporto traz ainda o antilhano Derek Walcott, Nobel de Literatura em 1992, o paquistanês Tariq Ali e a libanesa Joumana Haddad -referência na emancipação da mulher árabe-, entre outros.

E o que Freyre (1900-1987) tem a ver com o Oriente?

"É preciso redescobrir o orientalismo de Freyre", diz Mario Helio, "não só o lusotropicalismo, e sim o que escreveu de modo pioneiro sobre China e Índia, além dos textos em que aponta para a irrupção do islamismo".

"Desde 'Sobrados e Mucambos', de 1936, Freyre mostrou com riqueza de detalhes a relação Oriente- Ocidente no Brasil", afirma Mario Helio.

"Gilberto viu ainda uma luta de racionais (ocidentais) versus mágicos ou intuitivos (orientais), que marca o imaginário do embate Oriente-Ocidente", completa o curador-geral da Fliporto, o advogado e escritor Antônio Campos, irmão do governador de PE, Eduardo Campos (PSB).

O parentesco ajuda a Fliporto? "Ajuda, mas também atrapalha. Todos os nossos cuidados são redobrados. A Fliporto já existia antes de Eduardo ser governador."

Segundo Antônio Campos, a festa -iniciada em 2005 em Porto de Galinhas, mas que em 2010 se mudou para Olinda- custa "cerca de R$ 2,7 milhões, 2/3 de patrocinadores privados e 1/3 de patrocínio público e incentivado".

O ESTADO DE S. PAULO - A moderna antropologia de uma discreta feminista

Livro reúne textos acadêmicos de Ruth Cardoso, que começou sua carreira nos anos 1950 com um estudo pioneiro sobre imigração japonesa

Antonio Gonçalves Filho

Para definir a modernidade da antropóloga e professora paulista Ruth Cardoso (1930- 2008), casada com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso por 55 anos, sua aluna Teresa Pires do Rio Caldeira, hoje lecionando na Universidade de Berkeley, EUA, recorre

48 a uma frase do filósofo francês Michel Foucault (1926-1984): ela, como todos os modernos, sentia compulsão por se inventar. Talvez por isso, poucos tenham conseguido acompanhar o ritmo camaleônico de alguém que, segundo a organizadora do livro Ruth Cardoso - Obra Reunida, agora lançado pela Editora Mameluco, "criou um espaço de reflexão e interrogação do presente para forçar limites, procurar alternativas". Ruth conservou-se assim: foi uma feminista de primeira hora, incentivadora de outros movimentos sociais emergentes nos anos 1970, nascidos entre descendentes de escravos, favelados e homossexuais, sem medo de provocar os conservadores, mesmo quando assumiu - contra sua vontade - a condição de primeira-dama do Brasil.

Com a chegada do marido à Presidência, ela investiu contra a herança getulista do assistencialismo (ou clientelismo), ao extinguir a LBA (Legião Brasileira de Assistência) e inventar o Comunidade Solidária, projeto conduzido com a ajuda de empresários e apoiado pelo governo para enfrentar a pobreza e a exclusão social. O fim da LBA provocou polêmica. Anteriormente, em 1994, quando FHC fazia alianças visando à Presidência, ela já havia provocado o establishment político ao imprecar contra Antonio Carlos Magalhães. O episódio é lembrado na biografia da antropóloga, Ruth Cardoso - Fragmentos de uma Vida (Editora Globo) pelo autor Ignácio de Loyola Brandão, colunista do Caderno 2: "Ruth, certo dia, afirmou publicamente não entender como o marido se aliava a um político como ACM, figura que trazia todos os vícios do autoritarismo e da prepotência da ditadura". A explicação: o poder do baiano, capaz de manter a aliança PFL/PSDB.

Ruth Cardoso, que insistia em se manter autônoma e apartidária, parou de falar mal de ACM. Em contrapartida, um dos seus primeiros atos como primeira-dama foi levar para Brasília antigas companheiras da batalha feminista para fortalecer o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, estrutura básica da Secretaria de Políticas para as Mulheres, criada em 2003. Em A Mulher e a Democracia, um dos textos selecionados por Teresa Caldeira para o livro, ela afirma que o processo de democratização da sociedade passa necessariamente pela ideia da igualdade entre os sexos.

A luta por uma relação simétrica entre homens e mulheres, defendia a antropóloga, não se dava na porta dos sindicatos nem nas sedes de partidos, formas rotineiras (e manipuladoras) de fazer política, segundo ela. A dificuldade para as mulheres penetrarem nesse mundo, escreve, eram enormes - pelo menos eram quando o texto foi produzido, em 1987 - e por isso o movimento feminista teria um caráter exemplar entre todos os outros nascidos depois do histórico Maio de 1968.

"O trabalho intelectual de Ruth não se dissociava da intervenção no debate político, no qual se engajava como antropóloga", diz Teresa Caldeira no livro que reúne parte de sua produção acadêmica, mais de meio século de trabalho intelectual que exigiu da discípula três anos de pesquisas para selecionar os textos - o mais antigo de 1959 e o mais novo, de 2004. O primeiro, é, além de tudo, um estudo pioneiro e original sobre a imigração japonesa no Brasil, tema de sua tese de doutorado (de 1972), publicada em 1995 (pela editora Primus). O volume organizado por Teresa Caldeira reúne, pela primeira vez, os artigos acadêmicos da antropóloga em forma cronológica. Como o objetivo era apresentar o pensamento crítico, autoral, de Ruth Cardoso, ele só não contempla a produção da época em que ela ocupou o posto de primeira-dama, justifica a organizadora. Foi um período em que, mais discreta do que nunca, a antropóloga evitou expor publicamente suas opiniões.

Seis textos do livro são inéditos em português. Alguns foram produzidos um ou dois anos antes do exílio forçado do casal Cardoso no Chile e na França, após o golpe militar de 1964. São poucos. A maioria dos textos foi produzida nas décadas de 1970 e 1980, quando, novamente fixados no Brasil, a professora recebia encomendas de artigos ou convites para participar de seminários como As Mulheres e as Políticas Alimentares (França, 1985). Todos esses escritos ficaram aos cuidados do sociólogo, historiador e

49 sócio-fundador da Mameluco, Jorge Caldeira, encarregado da missão de digitalizar todo o acervo da antropóloga, trabalho que começou duas semanas após sua morte e resultou na descoberta de diversos cadernos que traziam anotações de suas pesquisas de campo. A irmã do editor organizou esses textos, separando versões preliminares das finais.

Atenção especial merecem os artigos escritos em parceria com a antropóloga e cientista política Eunice Ribeiro Durham. Ela escreve um depoimento emocionado sobre a influência que Ruth exerceu em sua formação, destacando seus múltiplos interesses culturais (cinema, filosofia, literatura, história, teatro). "Eu admirava muito e invejava um pouco essa minha colega", admite Eunice, lembrando como as duas inventavam e adaptaram novos métodos didáticos trabalhando com estudantes. A amiga Ruth, "que conhecia o marxismo bem melhor que eu", realizou - com sucesso, segundo Eunice - o casamento da sociologia com a ciência política. No livro, o mais ambicioso texto escrito pelas duas analisa o processo acelerado de urbanização (em 1977) e o desequilíbrio provocado pela migração interna no Brasil.

Um ano depois, a antropóloga ousaria ainda mais, avançando no campo sociológico para desafiar o discurso dominante ao falar da marginalização da população trabalhadora em países de industrialização tardia. Em pesquisas de campo junto a trabalhadores favelados de São Paulo, quase todos migrantes, Ruth descobriu que eles não se viam como marginais - esses, para os entrevistados, eram os "vagabundos" ou doentes, os verdadeiros excluídos da sociedade. Recorrendo a Richard Hoggart, que definiu os trabalhadores de Leeds como crentes na evolução contínua da sociedade industrial (embora nem tanto na ascensão social), a antropóloga afirma que os favelados paulistanos acreditavam ainda mais na mobilidade social que os operários ingleses.

Hoggart, acadêmico inglês cuja participação no julgamento de O Amante de Lady Chatterley foi decisiva para a liberação de obra de D.H. Lawrence, desconfiava (já em 1957) que a cultura de massas iria impor novos padrões de comportamento e fortalecer preconceitos sociais. Ruth Cardoso detecta, de fato, num ensaio sobre consanguinidade e educação em famílias de favelas, que uma favelada negra havia adotado um bebê branco, dispensando todo carinho e atenção a ele, enquanto desprezava os dois filhos biológicos. Contra o discurso politicamente correto, a antropóloga demonstra que a adoção nas classes urbanas menos favorecidas seguia, para falar o mínimo, uma lógica um tanto perversa.

"Mais que Lévi-Strauss, cujos seminários frequentou nos anos 1960 e foi uma influência importante, Hoggart e Paul Willis inspiraram muito essas análises das entrevistas com residentes em favelas", observa Teresa Caldeira. "Importava a ela qual a relação que o entrevistado tinha com essas falas pesquisadas", diz a organizadora, acenando com um segundo volume para abrigar textos que ficaram de fora no livro. Professora e orientadora dedicada, segundo ela, Ruth Cardoso chegou a visitar a aluna diversas vezes em São Miguel Paulista, bairro em que se fixou para escrever sua tese.

Graças a esse corpo a corpo com a vida nas periferias, os meios de comunicação de massa e os jovens passam a ser seus "temas estratégicos para entender as mudanças políticas e culturais" nos anos 1970. "Ela era contra o conceito de subcultura, queria mostrar como os favelados estavam a par de tudo e sempre foi uma feminista convicta, fascinada pelo seriado Malu Mulher, de Regina Duarte, justamente por forçar os limites e ter, surpreendentemente, uma imensa aceitação pública", diz Teresa Caldeira.

O ESTADO DE S. PAULO - Inovações teóricas e na militância

Ensaios revelam a precisão das ideias da intelectual Ruth Cardoso relativas ao método antropológico e aos movimentos sociais

José de Souza Martins

50 A Obra Reunida, de Ruth Cardoso, em boa hora organizada, a partir de laboriosa garimpagem, por Teresa Pires do Rio Caldeira, coloca ao alcance dos estudiosos e do grande público textos preciosos e dispersos da conhecida antropóloga. Uma densa apresentação da organizadora do volume situa compreensivamente a rica diversidade da obra da autora dos textos, cinco dos quais escritos em colaboração com colegas de pesquisa e de profissão, várias delas suas antigas alunas. Um depoimento de Eunice Ribeiro Durham, que foi amiga e colega de Ruth desde que ambas se tornaram assistentes da Cadeira de Antropologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, constitui um esclarecedor e apropriado preâmbulo afetivo e intelectual. Uma contribuição à história das ciências sociais entre nós, da qual ambas se tornaram destacadas protagonistas, como cientistas e professoras, formadoras de toda uma geração de cientistas sociais.

O bem apresentado e anotado volume cumpre a função decisiva de propiciar e facilitar o retorno à obra de uma autora que, por discreta e competente, preocupou-se pouco com sua visibilidade pública, apesar da reconhecida importância teórica de seus escritos. Importância que se desdobra na inovadora concepção de militância política no marco da atuação acadêmica, a de colocar sua vocação de docente e de cientista também a serviço dos desvalidos, no reconhecimento da legitimidade de suas demandas, representações e visão de mundo, como protagonistas de mudanças, mas também como referência de conhecimento. Pela época de sua morte, através do Comunidade Solidária, Ruth desenvolvia um trabalho na periferia de São Paulo, na Cidade Tiradentes. Dava continuidade a pesquisas em favelas e bairros pobres, tema pelo qual se interessara em função da importância que passaram a ter, desde os meados dos anos 1970, os movimentos populares, as chamadas populações marginais e o protagonismo político dos excluídos. O novo caminho da ação política.

A boa ordem na organização dos textos deste livro dá ao leitor o que é também uma biografia intelectual da autora, demarcada pelos momentos significativos de seu crescimento como cientista, do funcionalismo ao estruturalismo de Claude Lévi-Strauss, passando antes pela dialética de Marx. Momentos e temas que expressam uma história pessoal de vivência plena e inconformada das graves vicissitudes desta nossa trágica América Latina. Longe de vivê-los como tormentos pessoais, ainda que na experiência do exílio, Ruth só cresceu na adversidade política, como intelectual inquieta em face dos desafios de compreensão e de interpretação do que via também como desafios sociais e políticos. Poucos na história do pensamento social e político brasileiro tiveram a oportunidade de atar e interpretar tão bem os fios desatados da história sem rumo.

Neste volume, Ruth expõe o quanto teve e ainda tem a dizer sobre desafios interpretativos das ciências sociais, não só da Antropologia, aceitando-os antes que fossem percebidos por muitos outros. Seus estudos sobre o mundo juvenil das famílias japonesas imigradas para o Brasil, dos nisseis em face dos isseis, dos jovens em face dos velhos, indicavam uma escolha teórica e metodologicamente acertada, na referência empírica apropriadamente problematizada.

Sua reflexão teórica sobre a questão do método na antropologia é precisa e está presente nos explícitos cuidados que tinha quanto a isso, qualquer que fosse o tema a ser tratado. Ela era cientista rigorosa mesmo em relação a temas que, parecendo "leves" ou "da moda", supostamente dispensavam o rigor crítico do verdadeiro pesquisador. É o que se vê em suas análises relativas aos movimentos sociais e particularmente sobre um tema que se mantém controvertido até hoje, o dos movimentos populares e o das comunidades eclesiais de base. Ruth, na perspectiva crítica, joga com o reconhecimento de sua legitimidade, do novo que anunciam, das mudanças sociais e políticas positivas que por meio deles se propõem. Na sequência, remete-os ao plano propriamente teórico para apontar o que neles desafia a tentação do absoluto, da interpretação fechada, do conhecimento reificado. Retomado de maneira politicamente criativa, o conceito de

51 comunidade revela mas acoberta, joga para baixo do tapete, como ela diz, as perturbações do comunitário, as tensões que, disfarçadas no homogêneo, o desdizem e nem por isso o invalidam.

Um tema forte de vários de seus estudos, tratado com grande propriedade teórica, é o da militância, que invadiu as ciências sociais sem maior cuidado. Ruth foi das primeiras a apontar o afã de arriscada cumplicidade entre o pesquisador e as populações estudadas, certo álibi científico para legitimar as lutas sociais, a interpretação como camisa de força, mas também um certo álibi social e político para legitimar a pesquisa científica, sem os necessários cuidados com os requisitos próprios dos cânones da ciência. O ensaio sobre a armadilha do método, um clássico da antropologia brasileira, como que centraliza e "amarra" o volume. Não só porque analisa de maneira erudita os impasses históricos da nossa antropologia e das nossas ciências sociais, mas também porque situa precisamente esses impasses como impasses da produção do conhecimento no diálogo criativo com a realidade, expostos os disfarces para um "ser de dentro" que continua a confinar o cientista nas ciladas do "ser de fora".

JOSÉ DE SOUZA MARTINS É SOCIÓLOGO, PROFESSOR EMÉRITO DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO E AUTOR DE UMA ARQUEOLOGIA DA MEMÓRIA SOCIAL (ATELIÊ), ENTRE OUTROS LIVROS

O ESTADO DE S. PAULO - Fernando Henrique destaca o papel de vanguarda de Ruth Cardoso

'Ela não gostava da política partidária', afirma o ex-presidente da República

A antropóloga Ruth Cardoso conheceu o marido no vestibular da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, onde se formou em 1952. Não demorou para que ela e o futuro presidente Fernando Henrique Cardoso ficassem conhecidos como a "turma da biblioteca" (os dois não saíam da Mário de Andrade), dividindo o tempo entre leituras e sessões do recém-fundado TBC (Teatro Brasileiro de Comédia, criado em 1948). Foi lá que o jovem estudante, de jaquetão e colete, assistiu ao lado da namorada a uma peça de William Saroyan (The Time of Your Life, de 1939, aqui traduzida como Nick Bar... Álcool, Brinquedos e Ambições). O norte-americano Saroyan (1908-1981), hoje injustamente esquecido, ganhou o Pulitzer com a peça, mas não aceitou, alegando que o dinheiro do comércio jamais podia financiar a arte. Para estudantes fascinados pelo discurso marxista, como os jovens Ruth e Fernando, Saroyan era um autor e tanto, ainda mais que sua alegórica peça era repleta de gente fora do eixo - ou détraqué, como se dizia na época.

Pois foram justamente os marginalizados que logo atraíram a atenção da antropóloga em formação, ela que seria pioneira em pesquisas de campo, estudando a vida na periferia de São Paulo. O ex-presidente, em entrevista ao Sabático, corrige: "Para ela, não se tratava de marginalizados, mas de pessoas que queriam se integrar". Ele lembra que, antes de escrever a dissertação de mestrado em sociologia sobre o papel das associações juvenis na aculturação dos japoneses, em 1959, ela já estudava os hábitos de consumo de uma família de favelados do Jockey Club. "Ruth descobriu a razão de ser o açúcar o primeiro produto que compravam quando tinham algum dinheiro", conta. "É que, além de dar energia, podia ser dividido com outras famílias". Pode ter surgido ali, há meio século, o embrião da Comunidade Solidária.

"Nós conversamos muito sobre isso nos anos 1960 quando, no exílio, ficamos amigos de Foucault e discutíamos assuntos como a microfísica do poder, as formas de sociabilidade, a politização dos movimentos sociais". Ruth Cardoso, então, já era vanguarda. "Quando os antropólogos lidavam exclusivamente com os povos primitivos, ela já se dedicava à antropologia urbana, tendo um papel importante na disseminação do pensamento de Lévi-Strauss no Brasil".

52 No livro, analisando as "marcas" deixadas pelo trabalho do colega antropólogo, Ruth diz que "sua preocupação com as estruturas de significado e o sentimento oculto dos produtos culturais formam o núcleo de seu legado". No entanto, mostra-se pouco entusiasmada com os estruturalistas, revelando maior afinidade com a antropologia cultural do britânico Victor Turner (1920-1983) que, de certa forma, abriu para seus discípulos a possibilidade de politizar a antropologia com seu conceito particular de communitas - uma comunidade não estruturada em que todos são iguais - e interpretações nada ortodoxas do Maio de 1968 e dos hippies.

Ruth Cardoso sempre se interessou por esses movimentos espontâneos e pelos jovens, confirma o ex-presidente. "De política partidária ela não gostava, não tinha paciência para falar com deputados". Preferia conversar com mendigos, descer o Amazonas num barco pequeno para ver como viviam as populações ribeirinhas, segundo Fernando Henrique. O episódio da extinção da LBA (Legião Brasileira da Assistência), diz , revela como nenhum outro a aversão que a antropóloga tinha pelo assistencialismo, pelo clientelismo eleitoral, sendo ela defensora da autonomia dos movimentos sociais.

Assim como Teresa Caldeira, a organizadora da obra reunida da antropóloga, FHC afirma que foi esse seu maior legado, o de respeitar a autonomia dos grupos comunitários para decidir seu futuro e fugir da tutela estatal e de instituições - ainda que, num dos ensaios do livro, admita que essa autonomia jamais poderá ser total, relembrando o papel da Igreja ao longo dos anos da ditadura.

A vida acadêmica da antropóloga foi prejudicada pelo papel de primeira-dama e eclipsada pela imagem gigantesca do chefe da Nação? O ex-presidente admite que sim. Modesta, ela publicou pouco durante o período em que o marido dirigiu o País, pressionada pelos compromissos políticos dele aqui e no Exterior. "Mas ela foi uma grande professora, que tinha paixão por seus alunos, formando muita gente boa, como Teresa Caldeira, que hoje dá aulas em Berkeley".

Essa história vai ser contada no livro A Soma e o Resto, que o ex-presidente lança ainda em novembro pela Editora Civilização Brasileira. O título é o mesmo de um artigo publicado no Estado quando Fernando Henrique completou 80 anos, no dia 19 de junho. "Não gosto de memórias, mas este é uma longa entrevista (de dez horas) em que falo de minha mãe, do meu pai, das minhas relações pessoais, de família, drogas, enfim, dos meus sentimentos, uma visão retrospectiva de alguém que, aos 80 anos, se deu o direito de falar francamente". Além desses temas, outros sobre os quais raramente falou - espiritualidade, morte - estão presentes em A Soma e O Resto.

O ESTADO DE S. PAULO - Engenho e arte de entreter

VINICIUS JATOBÁ É CRÍTICO LITERÁRIO - O Estado de S.Paulo

VINICIUS JATOBÁ

Com a publicação de O Verso do Cartão de Embarque, Felipe Pena se firma como um escritor peculiar no cenário da literatura brasileira contemporânea. De um lado, é um dos poucos autores que encara a edição sucessiva de livros, ainda que díspares entre si, como a edificação de um projeto coerente. Ter projeto literário hoje é algo ridicularizado, e é notável esbarrar com um escritor que ambiciona provocar um debate com o conjunto de seu trabalho. Por outro, Felipe Pena investe em uma clara tentativa de estabelecer uma narrativa de entretenimento de qualidade, e tanto sua versatilidade de técnicas e de registros como seu excesso de imaginação o colocam em posição privilegiada para cumprir esse objetivo. Ainda assim, é preciso que se diga: há um porém.

53 Em O Verso, Antonio Pastoriza, personagem-chave de todos os romances de Pena - que compõem a Trilogia do Câmpus, que inclui ainda Fábrica de Diplomas (2011) e O Marido Perfeito Mora ao Lado (2010) -, está desaparecido, ou foragido, e duas leitoras de sua última e bela crônica, que dá título ao livro, se lançam ao desafio de descobrir seu paradeiro e investigar o que outras pessoas sabem dele. O livro é conduzido, em meio a descrições do narrador de uma patética burocracia acadêmica, por relatos desencontrados da vida de Pastoriza por colegas de trabalho. O problema do livro torna- se logo evidente: quando um escritor percebe que tem a capacidade de fazer tudo o que deseja tecnicamente, ele corre o risco de ser mais de um ao mesmo tempo - e é isso o que acontece com O Verso do Cartão de Embarque. Chega um momento em que o romance é sobre a notável técnica de Pena, as engenhosas citações de outras obras que ele engendra, e a criativa linguagem usada no livro. E tanto Pastoriza quanto o amor de suas duas leitoras são sequestrados e subtraídos pelo imenso talento do autor.

Esse impasse, comum a todos os romances de Pena, é mais geral do que se pensa. Como ser escritor de entretenimento no Brasil é não existir para a comunidade literária, poucos autores com talento para livros ágeis e engenhosos conseguem encontrar um balanço entre aquilo que suas histórias suportam e precisam e aquilo que o meio literário autoriza, de forma pouco velada, como qualidade. O Verso do Cartão de Embarque é um romance cujo texto dramatiza esse impasse. As personagens são interessantes e há um senso de humor ferino que torna a vida universitária uma espécie bizarra de circo mambembe. Contudo, o narrador faz o leitor perceber, seja por elipses ou mudanças bruscas de estilo e de linguagem, que aquela não é uma simples narrativa de amor quando - é bem possível - ser uma simples história de amor bastaria para tornar a leitura de O Verso uma experiência mais intensa. Há certos momentos que menos é mais, e os livros de Pena ganhariam em vigor emocional se investissem mais na clareza do enredo e contorno das personagens.

AGÊNCIA BRASIL - Sustentabilidade é tema da 30ª Feira do Livro em Brasília

(13/11/2011) Brasília - O tema da 30° Feira do Livro de Brasília, aberta neste fim de semana, é a sustentabilidade. Montada nos últimos anos na área externa de um dos principais shoppings da capital federal, a segunda mais antiga feira do país (só perde para a Feira do Livro de Porto Alegre, que está na 57ª edição), este ano mudou de lugar e ficou maior. Os exporitores contam, agora, com os 6,6 mil metros quadrados (m²) do Pavilhão de Exposições do Parque da Cidade, também no Plano Piloto.

“Sustentabilidade é a palavra de ordem, estamos descobrindo que o planeta não suporta tanta exploração, que há a perspectiva de faltar água, papel... Então, vivemos em um mundo em que se consome mais do que se possa consumir e a Feira do Livro, ao tratar desse tema, chama a tenção para o assunto”, disse à Agência Brasil a jornalista e escritora Dad Squarisi, patrona da feira.

Dad falou, também, sobre a emoção que sentiu ao receber o convite para ser patrona do evento. “É igual a [emoção] que senti ao ter sido convidada para ser cidadã honorária de Brasília, é uma honra para qualquer pessoa, mas, para mim, que sou estrangeira [nascida no Líbano], tem um sabor especial”.

A feira, este ano, conta com uma programação bastante variada, que soma mais de 120 horas de atrações, entre oficinas, palestras, conversas com escritores e sessões de contação de histórias para as crianças. A novidade, este ano, é a oficina da maturidade, para entreter o público com mais de 50 anos de idade.

Além de autores nacionais, como Marina Colasanti, uma das vencedoras do Prêmio Jabuti de literatura deste ano, escritores estrangeiros também farão parte do evento, como Boniface Ofogo, da República de Camarões; Yoram Meltzer (Israel); Kngni Alem e Phillipe Davaine (França); Álamo Oliveira e Cristina Taquelim (Portugal); Joe Hayes (EUA); e Wellington Cucurto e Cristian de Nápoli (Argentina).

54 A curadora da Feira do Livro, Iris Borges, falou sobre a importância de um evento como esse para o público da capital do país. “Voltei este ano com a intenção de retomar o conceito da feira com uma programação cultural muito rica, com toda acessibilidade, e espero que as pessoas tenham vontade de vir para cá, compartilhar esse mundo que é encantado, essa é a ideia”.

A entrada na feira é gratuita e, além de oficinas e debates, estão previstas apresentações musicais com artistas locais e nacionais. A programação completa pode ser conferida na página da Feira do Livro de Brasília na internet.

FOLHA DE S. PAULO - Show com Augusto de Campos abre a Balada Literária Homenageado deste ano, o poeta mostra 'Poemúsica' acompanhado de seu filho e de Adriana Calcanhotto

Evento segue até domingo com mesas literárias, exposições, música e poemas concretos espalhados MARCIO AQUILES, COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

(16/11/2011) Tem início hoje a Balada Literária 2011. Em sua sexta edição, o evento homenageia o poeta Augusto de Campos. A abertura terá o homenageado ao lado do filho, Cid Campos, e da cantora Adriana Calcanhotto, na "showversa" "Poemúsica", às 21h, no Sesc Pinheiros (os ingressos estão esgotados). "O show apresenta uma perspectiva da poesia concreta a partir da música. Um trabalho em que eu projeto a materialidade da poesia sem desprezar o significado. Coloco em evidência não só o aspecto visual mas também o sonoro", diz Augusto. Na década de 1950, o artista lançou as bases da poesia concreta ao lado do irmão Haroldo de Campos (1929-2003) e de Décio Pignatari. A poesia concreta absorveu elementos poéticos de autores do cânone literário, como Stéphane Mallarmé, Ezra Pound, James Joyce e e.e. cummings. Augusto acaba de voltar ao Brasil, depois de ser homenageado na Bienal de Lyon e no festival de artes Europalia, na Bélgica. "Não sou muito fã de homenagens, mas tenho que assumi-las. Estou mais preocupado em apresentar um tipo de trabalho que não encontra muitas possibilidades de ser exibido", afirma Augusto. PROGRAMAÇÃO

O escritor Marcelino Freire, criador e curador da festa, destaca a intenção de celebrar os 80 anos do poeta.

"O homenageado sempre norteia a curadoria do evento. Cada balada tem sua cara", afirma Marcelino.

Buscando diálogo com o conceito "verbivocovisual" (que dá igual importância a palavra escrita, oralidade e aspecto gráfico de um texto), adotado pelos concretos, a balada terá eventos literários, musicais e de artes visuais.

"Teremos Jorge Mautner, criador do Movimento Kaos; Walter Franco, apadrinhado por Augusto numa época em que ninguém entendia sua música; e Glauco Mattoso, que não encontra Augusto há 18 anos", destaca Marcelino.

Todos os eventos (com exceção do show de abertura) têm entrada franca.

"Isso é outra marca do festival. Não usamos nenhuma lei de incentivo, temos apenas os apoiadores, que nos permitem realizar um evento gratuito", diz Marcelino.

ARQUITETURA E DESIGN

FOLHA DE S. PAULO - Filme desvenda utopias do arquiteto Affonso Reidy

ALEXANDRE AGABITI FERNANDEZ, COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

55 (11/11/2011) O arquiteto e urbanista Affonso Eduardo Reidy (1909-1964) é um dos responsáveis por marcos da paisagem carioca como o Museu de Arte Moderna, o Aterro e o Parque do Flamengo. Mas é pouco conhecido do grande público, o que faz deste documentário uma obra oportuna.

Sem recorrer ao didatismo, Ana Maria Magalhães oferece uma visão panorâmica das ideias de Reidy, alinhavando imagens de suas obras e projetos, depoimentos de colegas como Lucio Costa (1902- 1998), Paulo Mendes da Rocha, além de textos do próprio arquiteto.

Sua arquitetura convoca arte, ciência e técnica para produzir uma beleza que valoriza contato com a natureza, bem-estar e significado público, cheia de implicações éticas e políticas.

Pioneiro na habitação popular no país, Reidy projetou conjuntos habitacionais que até hoje são referência no assunto, tema que o filme destaca muito bem. Como diz Lucio Costa em seu depoimento, Reidy "era o mais civilizado dos nossos arquitetos".

O ESTADO DE S. PAULO - Raízes mineiras

BRUNA TIUSSU, MARIANA - O Estado de S.Paulo

Pode chegar de mansinho, como é costume por ali, e observar sem pressa cada detalhe da estação ferroviária de Mariana. Repare na arquitetura recém revitalizada do casarão, e como os detalhes em madeira branca, as delicadas arandelas de luzes amarelas e os elementos barrocos da torre já começam a dar o gostinho da viagem aguardada. Vindo lá de longe, o apito estridente anuncia que logo, logo o cenário estará completo para a partida. E não tarda para o trem de fato surgir. Pequenino a princípio, mas de repente, em toda aquela imensidão que desliza pelos trilhos. Arrancando sorrisos e deixando boquiaberto até o mais desconfiado dos mineiros.

Há apenas seis anos - e após dez sem atividade turística - o trecho ferroviário Mariana-Ouro Preto voltou a fazer parte da lista de atrativos aos visitantes da região. O passeio é feito de sexta-feira a domingo, a bordo de uma composição que data de 1956 e foi toda recuperada pelo projeto Trem da Vale - a Fundação Vale também se encarregou da restauração de cada estação e do percurso. Seus cinco vagões de passageiros mantêm o desenho dos antigos, com interior de madeira, e percorrem os nostálgicos 18 quilômetros de distância entre as cidades em uma hora.

Uma verdadeira viagem no tempo. Mas com toques refinados de modernidade. Pagando um pouco mais (R$ 60 ida e volta, enquanto o comum custa R$ 35), você faz o trajeto diante das imensas janelas do vagão panorâmico. Com total visibilidade da paisagem, não há como perder os detalhes do ribeirão que acompanha todo o caminho, das cachoeiras que surgem nas montanhas e a tão simpática lagoinha em formato de coração.

Também é possível ter uma noção real de como são gigantescos os paredões recortados justamente para dar passagem à composição. Além de ser mais fácil tomar aquele sustinho bom com a escuridão repentina a cada vez que se adentra um dos três túneis da rota - o último, com 115 metros de extensão.

Antes de alcançar o destino final, a estação de Ouro Preto, vê-se outras duas: Vitorino Dias e Passagem de Mariana, ambas fundadas em 1914 e com importância histórica para Minas Gerais. Enquanto a primeira atendia às necessidades da fábrica de tecidos Companhia Industrial Ouro- Pretana, era na segunda que chegavam equipamentos e produtos destinados à Mina da Passagem (leia mais abaixo), uma das mais antigas do Estado.

Mariana. A experiência do passeio de trem, a riqueza histórica preservada, a cultura barroca ou o desafio de percorrer a Estrada Real. Seja qual for o motivo que leve a Mariana, há alguns pontos que todo turista deve visitar.

Pequenininha e sem grandes segredos, a cidade está ali para ser explorada a pé. Agradeça desde já: suas ladeiras são levinhas se comparadas às das outras cidades históricas.

56 Comece pela Basílica da Sé, uma das mais ricas em ouro do País. Em um ambiente onde o barroco predomina, é curioso notar pinturas chinesas em alguns altares, obras de portugueses que viveram em Macau. Elas também estão presentes no belíssimo órgão de origem alemã, do século 18, que segue em funcionamento. Vá as sextas-feiras, às 11h30, ou domingos, às 12h15 para reviver um pouco do ambiente musical do ciclo do ouro. Outras duas importantes igrejas, de São Francisco de Assis e Nossa Senhora do Carmo, ficam lado a lado na Praça de Minas Gerais, com mais riquezas coloniais.

Para seguir explorando a cultura do Estado, há o museu arquidiocesano. E os constantes eventos que são marca registrada do destino. Se estiver lá durante algum deles, não hesite. São festivais, peças teatrais e tradições folclóricas que destacam história, alegria e cores. Uma opção de viagem ao encantador universo das cidades históricas, com toques precisos de atualidade.

Muita história e simpatia no sobe e desce das ladeiras de Ouro Preto

OURO PRETO

Olhando do alto, você avista uma, duas, três... e logo perde a conta de quantas igrejas despontam na paisagem. Sai caminhando ladeira acima, ladeira abaixo, e quer parar diante de cada casarão - para se deslumbrar com as fachadas e recuperar o fôlego, porque ninguém é de ferro. Cinco dias, por baixo, é o tempo necessário para esmiuçar as mais notórias riquezas de Ouro Preto, Patrimônio Cultural da Unesco desde 1980, justamente por reunir o maior conjunto de arquitetura colonial preservado.

Suas ruelas de paralelepípedo exalam história, guardam obras-símbolo do barroco mineiro, de Aleijadinho ao mestre Ataíde. Também encantam pela falta de pressa dos que passam, o cheirinho de café caseiro vindo das janelas, os mais espontâneos acenos de bom dia e boa tarde. Mistura que coloca a cidade entre os destinos mais simpáticos do País.

Você escolhe se deve começar a desbravá-lo pelas igrejas - a fachada tridimensional e o teto da de São Francisco de Assis merecem um olhar atento, assim como os azulejos portugueses que decoram o altar da Nossa Senhora do Carmo -, ou pelos museus. Também vale intercalar tudo, incluindo, de quebra, a Casa da Ópera, o mais antigo teatro em funcionamento no Brasil, construído em 1769, e aberto à visitas (a entrada custa R$ 2).

Quando montar seu roteiro, assinale ainda as famosas pontes da cidade. Como a do Suspiro, que ganhou este nome depois que Tomás Antônio Gonzaga descreveu sua Marília ali suspirando de amores.

A tática de intercalar um pouco de tudo também vale no quesito gastronômico - apesar de o conselho ser o de aproveitar ao máximo todas as delícias da cozinha mineira. Depois de um almoço inesquecível à base de feijão tropeiro, tutu e torresmo no Restaurante Bené da Flauta (benedaflauta.com.br), por exemplo, vá, no dia seguinte, provar as massas e filés do Café Geraes (cafegeraes.com). E não esqueça jamais do cafezinho para terminar a refeição com tradição. / B.T.

Relíquias barrocas, pontes românticas e um carisma notável são atrativos do Patrimônio Cultural da UNESCO

57 58 POLÍTICA CULTURAL

AGÊNCIA BRASIL - Ministério da Cultura define áreas prioritárias para 2012

Renata Giraldi

(14/11/2011) Brasília – O Ministério da Cultura definiu quatro frentes de atuação no setor cultural que se dividem nos programas Cultura Viva, Mais Cultura e os que serão executados a partir de 2012, o Praças dos Esportes e da Cultura e o Usinas Culturais. Em comum todos têm o estímulo à participação população e a valorização da cidadania, segundo disse à Agência Brasil o secretário executivo do ministério, Vítor Ortiz.

No Cultura Viva, as entidades selecionadas pelo ministério recebem recursos, em cinco parcelas semestrais, para executar seus projetos. A ideia é desenvolver atividades de arte, cultura, educação, cidadania e economia solidária. O dinheiro pode ser utilizado na compra de material, inclusive equipamentos de multimídia, e contratação de profissionais.

O projeto, segundo o ministério, reúne cerca de 4 mil pontos de cultura em 1.122 municípios do país. Em decorrência às atividades mantidas pelo programa 8,4 milhões de pessoas em vários municípios brasileiros participam direta e indiretamente das ações.

No programa Mais Cultura, o objetivo é valorizar e incentivar as ações desenvolvidas nas comunidades carentes, regiões de periferias e aquelas que reúnem características culturais próprias, como os indígenas. Os responsáveis por essas atividades são premiados desde que se comprometam a investir o dinheiro recebido no projeto.

Os valores dos prêmios variam de R$ 9 mil a R$ 17 mil. Ortiz disse que um dos focos em 2012 será a região da Bacia São Francisco – que engloba 521 municípios em Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Goiás, Minas Gerais, na Bahia e no Distrito Federal.

A implantação do projeto Praças dos Esportes e da Cultura está definido no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Ortiz disse que o objetivo é criar 400 praças em vários municípios do país, nas quais haverá sala de espetáculos e uma biblioteca contemporânea – com equipamentos de tecnologia, além de quadras poliesportivas e um Centro de Atendimento Social.

59 No programa Usinas Culturais, há parcerias com as prefeituras para que elas dêem a estrutura física – prédio ou casa já existente. Nesses locais são montados centros de formação para multiplicadores culturais que trabalharão na comunidade com projetos de desenvolvimento artístico, preservação da memória e cultura digital, entre outros.

O GLOBO - Na contramão

Verba destinada ao Ministério da Cultura, que teve sete anos de alta na gestão Lula, pode cair 16% em 2012, na maior redução da última década

André Miranda

Os investimentos federais em cultura no Brasil podem ser reduzidos em 2012, o que representaria a segunda queda consecutiva num setor que sempre foi considerado o patinho feio dos governos, mas que ganhou algum prestígio durante a presidência de Luiz Inácio Lula da Silva. Enviado ao Congresso no fim de agosto, o projeto da Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2012 indica uma redução de 16% nas verbas destinadas ao Ministério da Cultura (MinC), a maior queda dos últimos dez anos.

O orçamento da pasta vinha de sete anos seguidos de alta nas duas gestões Lula, mas teve uma redução justamente no primeiro orçamento feito para o governo de Dilma Rousseff, passando de R$ 2,29 bilhões em 2010 para R$ 2,13 bilhões em 2011. Já para o ano que vem, o valor previsto pelo governo para o MinC é ainda menor: R$ 1,79 bilhão. Os responsáveis pelo ministério acreditam que a verba será aumentada no Congresso pelas emendas parlamentares, mas deputados ouvidos pelo GLOBO lembram que a falta de apoio da ministra Ana de Hollanda junto aos movimentos culturais e a baixa execução orçamentária do MinC em 2011 podem dificultar as negociações e prejudicar a Cultura.

O primeiro orçamento do MinC no início da gestão petista, em 2003, foi de R$ 397,4 milhões. Já no último ano do segundo mandato de Lula, chegou a R$ 2,29 bilhões, um valor mais robusto, mas ainda longe da promessa inicial do expresidente de que elevaria os investimentos da pasta para 1% do orçamento da União: incluindo gastos com pessoal, custeio e investimentos, em 2003 o percentual do MinC era de 0,08% do total; em 2010, foi de 0,23%.

Os movimentos culturais esperavam que a tendência de alta continuasse no governo Dilma. Sobretudo porque, durante a campanha presidencial de 2010, a então candidata recebeu apoio público de artistas e intelectuais num encontro no Teatro Casa Grande, no Rio. Entre outros, estiveram presentes Chico Buarque, Oscar Niemeyer, Elba Ramalho e Alceu Valença. Mas nem isso evitou a queda.

O MinC, por sua vez, acredita que a rodada de negociações no Congresso para a votação da LOA, em dezembro, aumentará a previsão orçamentária da pasta por meio das emendas parlamentares, como tem ocorrido nos últimos anos. Seu secretário- executivo, Vitor Ortiz, fala na possibilidade de emendas entre R$ 300 milhões e R$ 600 milhões. O problema é combinar com os parlamentares.

O assunto é tratado com reservas em Brasília, mas os boatos de que Ana de Hollanda não se manterá no cargo após a primeira reforma ministerial, esperada para janeiro, devem dificultar as conversas com o Congresso. Além disso, Ana foi bastante criticada no primeiro semestre por frear a condução da reforma da Lei do Direito Autoral.

— A ministra foi muito maltratada injustamente no início da gestão. Isso a colocou numa situação recuada em relação ao parlamento — diz o deputado federal Raul Henry (PMDB-PE), integrante da Frente Parlamentar da Cultura. — A postura defensiva da ministra dificulta na briga por mais investimentos. As bancadas querem ajudar, mas ela precisa mudar de atitude, precisa buscar mais articulação. O orçamento é uma guerra, e, se ela não se articular com os movimentos culturais e com os deputados, ela não vai conseguir alterar o valor atual.

Mais um ponto que deve prejudicar a atuação de MinC junto ao Congresso é a taxa de execução do orçamento da pasta. Os números consolidados do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal indicam que o MinC empenhou apenas 20,9% de seu orçamento para custeio e investimentos até o fim de setembro.

60 O percentual é o menor da pasta nos últimos cinco anos para o mesmo período, e fica bem abaixo da média do Poder Executivo em 2011, que até setembro estava em 66%.

— A gestão atual do MinC é inábil e não consegue visualizar quais campos podem crescer. Falta solidez política e há incapacidade de gestão — diz Pablo Capilé, do grupo Fora do Eixo, uma rede de coletivos de cultura. — Além disso, a relação com a sociedade civil é ruim. O diálogo é fraco. Vamos entrar em 2012 com o cenário de um MinC fragilizado, de um orçamento menor e com a sociedade civil insatisfeita. O secretário-executivo do MinC, contudo, espera não apenas que o orçamento cresça no Congresso como atribui a redução no projeto da LOA a um novo modelo de gestão do governo.

— Embora o número que temos agora para 2012 seja inferior ao número deste ano, eu garanto que é um orçamento melhor. Acontece que o orçamento do ano que vem vai passar por uma nova metodologia de gestão do governo federal — argumenta Ortiz. — A gente trabalhava com mais folgas no orçamento, superestimando as receitas federais.

Agora vamos trabalhar dentro de um quadro mais realista. Outros ministérios, porém, mesmo com o novo modelo de gestão indicado por Ortiz, tiveram alta na LOA para 2012. O projeto prevê, por exemplo, aumento de 13% na Educação e de 11% na Saúde.

— Todo governo tem prioridades, e é daí que vêm as variações de cada pasta — diz Ortiz. — Sobre a execução do MinC em 2011, acontece que a maior parte de nossos investimentos é feita a partir de editais.

Eles estão lançados, mas os empenhos só podem ser feitos depois que houver todo o processo de licitação, o que costuma ocorrer em novembro e dezembro. Em 2010, a execução deve ter sido acelerada por causa das eleições. Hoje estamos num fluxo normal e vamos chegar até dezembro com 90% do orçamento empenhados.

A elaboração do projeto da LOA de 2012 também traz uma novidade para o MinC: R$ 300 milhões, 16% do total, estão reservados para praças esportivas e culturais do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

— As praças terão equipamentos de esporte, mas também terão bibliotecas, salas de espetáculo e áreas de oficina. A meta é implantar 800 delas até 2014 — afirma Ortiz.

— A gente está preocupado em qualificar a gestão. Ninguém mais reclama que o MinC não paga isso ou aquilo. Não há um edital na rua que não tenha recurso guardado para pagar todo mundo. Isso vai fazer diferença na qualificação do resultado final. Não dá para se ter uma ideia maravilhosa, idealista do que são os investimentos na Cultura e depois o resultado não ser o prometido. MODA

O ESTADO DE S. PAULO - 'A Issa é um grito colorido no meio do preto e branco'

Daniella Helayel, estilista radicada em Londres, fala sobre o sucesso depois de vestir Kate Middleton

MARILIA NEUSTEIN - O Estado de S.Paulo

61 Desde novembro do ano passado, quando Kate Middleton apareceu de vestido azul no anúncio de seu noivado com o príncipe William, a vida de Daniella Helayel não é mais a mesma. "Eu era mais conhecida só no mundo da moda", afirma a estilista, dona da marca Issa, novo xodó das celebridades.

Fluminense de Niterói, Daniella construiu seu caminho profissional fora do Brasil. E desde que a imagem do famigerado vestido foi replicada nas capas de jornais e revistas do mundo inteiro, a estilista ganhou novos clientes, fãs, projetos de crescimento e uma sócia de peso, Camilla Al-Fayed, cujo pai foi dono da tradicional loja inglesa Harrods. E o irmão, Dodi, namorado fatídico de Lady Di.

A recente sociedade empolga Daniella. Não é para menos: proporciona a possibilidade de expandir a marca para outros países. E ela escolheu o Brasil para abrir sua loja primogênita. Prevista para o primeiro semestre do ano que vem, a estilista confirmou, em rasante por São Paulo semana passada, que será no Shopping Cidade Jardim.

Antes de embarcar para o Brasil, Daniella recebeu a coluna em sua casa, um prédio de três andares de frente para o rio Tâmisa, no bairro de Chelsea, um dos mais elegantes de Londres.

Despojada e já com hábitos ingleses assimilados, serviu um chá da tarde e falou sobre os novos rumos da marca, enquanto brincava com seus dois cachorros, Monster e Snowball.

Sobre Kate Middleton, a designer fala pouco, prefere manter a discrição. Mas não deixa de se orgulhar de carregar o título de estilista da princesa: "Ah, é uma honra, né? Ela é linda. Por dentro e por fora".

A seguir, os melhores momentos da conversa.

Como nasceu a Issa?

Nasceu porque eu não conseguia achar roupas pra mim. Só comprava roupas vintage. Não tinha uma roupa nova no meu closet. Já havia trabalhado com moda em NY, como consultora para algumas marcas brasileiras. Quando me mudei para Londres, não sabia o que queria fazer. Dali pra frente, foi algo totalmente intuitivo. Aconteceu. Mas eu sempre soube que queria trabalhar com beleza, com algo relacionado à moda.

E o nome da marca?

62 Quando eu morava no Rio, pegava onda e os surfistas gritavam "issa".

Você fez sua carreira fora do Brasil. Começou em NY, depois foi para Londres.

Fui para NY e fiquei lá ate agosto de 99. Um mês antes, terminei um namoro de 5 anos e pensei que precisava mudar. Estava enjoada dos americanos, fui viajar e vim parar em Londres. "Issa it's a London thing". Não teria acontecido em outro lugar do mundo. Mas a experiência de NY foi importante, porque me deu know-how e meios para me financiar.

Muita gente que nunca tinha ouvido falar na Issa a conheceu porque Kate Middleton usou um vestido da marca no anúncio do noivado com o príncipe William. Qual o impacto disso?

Ela foi capa de jornais e revistas de todo o mundo usando aquele vestido. E todo mundo falou sobre isso. Porque o anel era antigo, pertencera à princesa Diana, mas o vestido era novo (risos). Foi um impacto enorme. Agora, por exemplo, eu estava em Hong Kong e um homem da área de finanças perguntou: "Você é da Issa, aquela do vestido azul?"(risos). Eu era conhecida no meio da moda. Abriu um leque de novos consumidores.

Você sabia que ela usaria o vestido no anúncio? Ela ligou encomendando?

Eu não tinha a menor ideia. Foi total surpresa. Estava na ginástica e, quando voltei, havia algumas mensagens dizendo que o noivado ia ser anunciado. Aí começaram a ligar lá no escritório perguntando se ela ia usar alguma coisa da Issa. Quando Kate apareceu na TV, as meninas no escritório começaram a gritar, comemorando. E o telefone não parou mais.

Muitos se referem a você como a estilista da princesa. Como vê essa designação?

Ah, é uma honra, né? Ela é linda por dentro e por fora. Tem uma personalidade incrível. Mas é só. Não costumo falar das minhas clientes. Meu negócio é fazer roupa.

Mas, e os boatos de que ela teria anorexia?

Isso é ridículo. O Rupert Murdoch perdeu o império dele por conta desse tipo de fofoca. Da invasão de privacidade. Acho isso péssimo, muito feio. Mas a verdade sempre vem à tona.

Muitas celebridades usam seus vestidos. Tem alguma que você ainda gostaria de vestir?

Várias. A primeira é a Michelle Obama. Acho ela o máximo. Inteligente, linda, culta, se cuida. Anda de shorts, descalça. A elegância está na postura. Adoro essa coisa despojada.

Suas roupas têm cores fortes, que não correspondem à clássica mulher inglesa. Como foi entrar nesse mercado?

Fui muito bem aceita. Aqui todo mundo usa preto. Eu queria colorir o mundo, deixar todos felizes. Para mim, moda é para enfeitar. As pessoas têm de se sentir para cima. Então, a Issa é um grito colorido nesse mundo preto e branco. Com certeza tem a ver com as minhas raízes brasileiras. Por ter nascido em Niterói. Por ter a vista do Rio.

Outra marca registrada são os vestidos acinturados. Você disse que não conseguia comprar roupa. Acha que valoriza o corpo?

As mulheres adoram. A gente sempre quer ter uma cinturinha mais fina (risos). Procuro deixar o colo bonito, afinar a cintura, disfarçar o quadril. Isso são coisas que a roupa pode fazer para valorizar a mulher. A roupa tem de destacar o seu melhor. Ninguém quer parecer um saco de batatas.

Como foi feita sua última coleção, "I Love Rio"?

Começamos com Cuba. Mas eu não estava gostando das estampas. Aí pensei em falar do Rio. Todos os meus amigos estrangeiros estavam apaixonados pelo Rio. Como já tínhamos feito uma

63 pesquisa de silhuetas que eram meio Cuba, super elegantes, resolvi misturá-las às imagens do Rio nas estampas.

E as modelos que você escolhe?

Têm de ter a ver com a coleção. Androginia não funciona para mim, por exemplo. Só servem as lindas. Eu vendo beleza. Issa "it's about beauty", felicidade. Você não vai ver nada esquisito nas minhas coleções nunca. Porque eu não gosto.

Você vendeu 51% da marca para a Camilla Al-Fayed. Por quê?

Estávamos conversando há um tempo, nos conhecemos há oito anos e somos amigas. A Harrods foi uma das primeiras lojas a comprar Issa. Aí aconteceu. A Camilla veio com a parte administrativa e financeira. Que é tudo de bom, né? Eu fico mais com a criação. Agora, o céu é o limite. A Camilla traz toda uma infraestrutura. O acesso a mão de obra, consultores e pessoas que eu não teria como conseguir antes dela.

Quais os planos estratégicos para o crescimento da Issa?

Quero fazer muitas coisas com o Brasil. Vamos abrir uma loja no Shopping Cidade Jardim. Estamos estudando a melhor estratégia. Se será uma joint venture, um franchise... Mas, como as taxas de importação são muito altas, queria fazer uma linha que fosse made in Brazil. Algo de linha praia com as Havaianas... verão o ano inteiro.

E projetos na Europa?

Adoraria fazer uma colaboração com a H&M, por exemplo. Algo do tipo "Issa Holiday para H&M". Mas ainda não surgiu nenhum convite.

Você tem fábrica na China?

Sim. Mantenho essa fábrica desde a primeira coleção que vendemos bastante. Os chineses são os melhores. E o mais bacana é que a qualidade de vida lá está melhorando muito. O horário é respeitado, os salários mais que dobraram.

Qual a posição da China no mercado da moda?

O mercado é totalmente novo. E o poder de compra deles é impressionante. Estão inflacionando o mercado. São muito poderosos. Fui pela primeira vez a Hong Kong em 1996, depois voltei em 2004. Desde então, vou pelo menos três vezes por ano. E a cada viagem, tudo muda. É incrível. O mercado onde a Cartier mais cresce é lá. Eles estão abrindo lojas em cidades que a gente nunca ouviu falar. As vendas dobram a cada ano.

Londres é considerada, hoje, um dos polos de criação da moda. Acha que está mais em evidência do que Paris e NY?

Tudo é importante. Mas existe uma coisa criadora com Londres. Virou uma coisa 'boomy'. Era alternativa e, de repente, os designers pensaram que também têm de vender. Então, há uma fusão entre criatividade e comercial.

O que acha das londrinas?

Excêntricas (risos). O homem londrino usa muito terno. Já as inglesas sempre vão dar um twist no visual. Colocar um broche, um acessório.

Qual é, na sua opinião, um pecado fashion?

Cada um faz o que quer. Não existe pecado... (hesita, pensativa), exceto "ugg boots". São aquelas botas que têm pelinho, parecem patas de elefante (risos). Não tenho nenhuma, mas, aparentemente, é bem quentinha e confortável. Para ficar em casa, escondida, pode.

64 O que te inspira na hora de criar suas coleções?

Sempre quis criar o time dos meus sonhos. Porque não fazemos nada sozinhos. Inclusive, tenho um funcionário que é meu segredo (risos). Tenho um segredo na minha equipe. É um modelista, um gênio. Vocês deviam fazer uma foto dele. Mr. Leslie Poole (na foto ao lado). Existem as minhas tentativas antes e depois de encontrar o Leslie.

Onde busca referências?

Nunca vejo revista de moda, por exemplo. Busco muito mais em livros, na internet. Trabalho com referências antigas, coisas que vejo nas minhas viagens também. Mas a marca da Issa será sempre a roupa acinturada, não importa a tendência.

Vocês seguem tendências, fazem pesquisa de mercado?

A única pesquisa que fazemos é de preços dos concorrentes. Para equalizar com os nossos. A gente detesta tendência. Estamos na contramão, sempre. GASTRONOMIA

FOLHA DE S. PAULO - Casas do norte - a última conquista

Com a valorização dos ingredientes nativos por chefs brasileiros, e apostando em qualidade e sabor, esses verdadeiros empórios de produtos regionais conquistam cada vez mais os não descendentes

JULIANA A. SAAD, COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

PRISCILA PASTRE-ROSSI, EDITORA INTERINA DO COMIDA

(10/11/2011) O nome é casa do norte. Os produtos são nordestinos. E a freguesia é cada vez mais... paulistana. "Aqui o movimento já é 50% a 50%", diz Valter José dos Santos, dono da casa do norte Vitória, no Jardim Brasil, em São Paulo, sobre a clientela, metade nordestina, metade paulistana. "Há 11 anos, quando abri a loja, vinham praticamente só nordestinos", conta. Nas seis casas do norte visitadas, a resposta foi parecida. A reportagem acompanhou a movimentação. Comprou bacon, linguiça, carne-seca, paio, farinha, feijão e queijo de coalho. Levou para casa. Cozinhou. Provou. E aí ficou fácil descobrir o que mais atrai novos e velhos habitués a esses empórios: o sabor, incomparável ao dos produtos industrializados. O segredo, garantem os donos, está na origem dos produtos. O mato-grossense de ascendência árabe Oagi Alle Hassan, 50, há 27 anos no balcão da casa do norte Malagueta, no Ipiranga, diz que a seleção dos produtos que entram na loja depende da sua região de procedência. "Trazemos o que avaliamos que existe de melhor em cada lugar", diz. Ali, a rapadura chega de Juazeiro do Norte (CE), o bolo de mandioca, de Bezerros (PE) e o biju de tapioca, de Jequié (BA). Mariana Maronna, coordenadora de gastronomia do Senac, resume o segredo da qualidade dos produtos numa expressão francesa: "Nas casas do norte a gente encontra o 'terroir' brasileiro", diz. Para Maronna, parte dessa nova invasão paulistana se explica pelo fato de jovens chefs estarem cada vez mais divulgando e fazendo pratos com ingredientes regionais. Josué Costa Medina, 25, vê isso no dia a dia da loja. Ele conta que há muitos novos fregueses que entram na casa pela primeira vez em busca de um ingrediente que viram um chef usar na televisão ou no restaurante. "Aí eles veem que é mais gostoso comprar aqui do que no supermercado. O atendimento é mais informal. E o cliente acaba voltando." Se a maior parte dos ingredientes sai do Nordeste, por que o nome é casa do norte? O professor Pedro Paulo Funari, do departamento de história da Unicamp, explica que, antes da divisão das regiões brasileiras pelo IBGE, tudo que estava acima do Rio de Janeiro era Norte. E tudo que ficava abaixo era Sul.

65 "A expressão 'Nordeste' foi criada somente no fim dos anos 1930, início dos 1940. E a migração nordestina para RJ e SP, quando essas casas começaram a ser abertas, data do fim do século 19", diz. OUTROS

O GLOBO - Na correnteza do rio

Exposição sobre o São Francisco ocupa o Palácio Capanema

(14/11/2011) Ao ver o chão do Palácio Capanema coberto de sal grosso como parte de uma instalação, convidados da exposição “Rio São Francisco, um brasileiro”, de Ronaldo Fraga, tiraram o sapato para pisar nas pedrinhas salgadas. Virou uma espécie de sessão de descarrego.

“Vamos energizar!”, dizia a artista plástica Adriana Tavares, descalça sobre as pedrinhas que compunham a instalação “Memória e devoção”. O povo também interagiu com bonecas que, ao serem abraçadas, soltavam a voz da cantora Maria Bethânia declamando o poema “Águas e mágoas do Rio São Francisco”, de Carlos Drummond de Andrade.

“É uma exposição de pegada popular, mas com recursos tecnológicos”, resumia o artista plástico Xico Chaves. Ronaldo Fraga contava que aonde vai recebe vídeos, objetos e ouve histórias de pessoas que tem alguma relação com o rio. “Há uma ciranda amorosa em torno do São Francisco”, dizia ele.

“É o rio que mais afeta os brasileiros”, continuava Fraga. Ele transformou garrafas pet recolhidas naquelas águas em piranhas coloridas que decoram parte do teto da exposição. O custo para levar a mostra de uma cidade para outra — ela já passou por Belo Horizonte e São Paulo — é de R$ 800 mil. “Começamos sempre do zero”, dizia o estilista.

Presidente da Funarte, Antonio Grassi se empenhou para levar a mostra ao Palácio Capanema. “É uma joia do Centro do Rio que os cariocas precisam conhecer mais”, dizia. “Nem os taxistas sabem aonde fica”. Grassi acha que a ocupação com a exposição de Fraga é o pontapé inicial para a revitalização definitiva do espaço.

Mineiro, Ronaldo Fraga, caiu de amores pelo lugar na primeira vez que esteve lá. “Chorei quando vi os painéis do Portinari sendo restaurados”, lembrava. “É um bem do Brasil e serve de exemplo para outras cidades que estão vendo seus centros se deteriorarem”.

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CORREIO BRAZILIENSE - Mulheres batalhadoras

Gabriela de Almeida e Maíra de Deus Brito

Músicos, artistas plásticos e pesquisadores discutem, cantam e vivem a cultura afro até o dia 25 deste mês, pelo projeto Cara e Cultura Negra. O evento promove debates, oficinas, shows e exposições em comemoração ao Dia da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro.

A programação espalha-se pela cidade. O ciclo de debates Mulheres que Brilham, na Câmara Legislativa do Distrito Federal, discutirá temas como A mulher no Mercado de Trabalho, Violência Contra as Mulheres, Liderança e Participação Política e Saúde da Mulher, todos tendo o negro como figura principal. Na música, nomes já conhecidos dos brasilienses como Renata Jambeiro, Dhi Ribeiro, Orquestra Marafreboi e Patubatê se unem a Nãnan Matos, Zebulon Fyah, Pegada Black e a maranhense Rita Ribeiro para um dia de muita festa no Setor de Diversões Sul, neste sábado.

Hoje, será inaugurada a exposição fotográfica As Dilmas, na Câmara Legislativa do Distrito Federal. Imagens de Luiz Alves, Marcelo Dischinger e Ronaldo Liva homenageiam 51 mulheres importantes na construção e consolidação da capital. “São donas de casa, garis, juízas, advogadas, motoristas, líderes comunitárias. Mulheres batalhadoras que enfrentam o preconceito todos os dias. Daí a importância de celebrá-las”, argumenta Flávia Portela, idealizadora e coordenadora do Cara e Cultura Negra. A mostra poderá ser visitada até 25 de novembro, das 10h às 18h.

O fotógrafo Luiz Alves, nascido em Resende, Rio de Janeiro, só conheceu o pai por meio de um retrato. O carioca sabe o poder que tem um bom clique. Aos 52 anos, ele é autor de uma das imagens que integram a mostra, com a foto da Mãe Baiana, uma das figuras mais pulsantes e representativas na cidade quando o assunto é afrorreligiosidade. O tema é tratado com carinho por Luiz, que atua contra a intolerância religiosa. “A intolerância é um mal da alma. As pessoas precisam entender que somos seres humanos e merecemos ser respeitados. A Mãe Baiana é um ícone, uma guerreira que luta em defesa das religiões de matriz africana. Ela sofreu muito, mas nunca esmoreceu. Ela vive da religiosidade”, elogia o fotógrafo.

Defensor de uma sociedade justa, Luiz Alves acredita que a mostra As Dilmas é um importante passo na busca pela igualdade. “Essa mostra tem como objetivo promover uma transformação na sociedade. Gostaria que as pessoas não separassem as situações por gênero, raça ou condição social”, comenta. Ainda pelo Cara e Cultura Negra, trabalhos de alunos de escolas públicas vão passear pela cidade em uma exposição itinerante educacional. As obras serão expostas até sexta- feira, nas estações do Metrô.

“Um evento como esse é de absoluta importância e não devia acontecer somente em novembro, mês da consciência negra. Tem que ocorrer sempre. Se as pessoas desconhecem a cultura africana, surgirá nelas um preconceito e temos que acabar com isso. Eu desmistifico o desconhecido no palco, fazendo o público cantar e dançar”, destaca a cantora brasiliense Renata Jambeiro, uma das atrações do show de encerramento. O repertório terá canções com temáticas afro e músicas do DVD Sambaluayê, lançado pela cantora no fim do ano passado.

67 Stella Pinheiro e Nãnan Matos fecham a programação com a oficina de percussão tradicional Mandeng, na sexta e no sábado. Nas aulas, os participantes terão aulas de técnicas básicas com djembê e dunun, tambores típicos da África, e de cantos africanos. As inscrições gratuitas (e limitadas) devem ser feitas na Prefeitura do Conic (3321-7100).

Mãe baiana, foto de Luiz Alves para a exposição As Dilmas

FOLHA DE S. PAULO - Exposição reconstrói lendas e vida no sertão

Sem preconceitos, Museu Afro Brasil usa tecnologia para recriar a caatinga e ajuda a compreender cultura nacional

FABIO CYPRIANO, CRÍTICO DA FOLHA

(15/11/2011) O momento é de exaltação econômica do país, quando até em propaganda de bebida importada o "gigante adormecido" acorda, e a arte contemporânea brasileira se torna hipervalorizada, como forma de inserção no mercado globalizado.

Neste sentido, a mostra "O Sertão: Da Caatinga, dos Santos, dos Beatos e dos Cabras da Peste", em cartaz até abril do ano que vem no Museu Afro Brasil, em São Paulo, funciona como o filme "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (1964), de Glauber Rocha: relembra uma faceta não tão conveniente do país.

Essa faceta -da intensa religiosidade mística, da existência à margem da lei e da simplicidade do viver, tão características do sertão- até parece não se encaixar bem nessa fase de ufanismo mercadológico.

Mas, assim como apontava o longa de Glauber, ela é fundamental para a compreensão da cultura brasileira.

Em 800 peças, com curadoria do diretor do museu, Emanoel Araújo, a instituição reconta a vida de personagens lendários, como os cangaceiros Lampião e Maria Bonita, o padre Cícero e Antonio Conselheiro, líder da saga de Canudos.

No entanto, não se trata de uma mostra que mimetize o sertão em suas características áridas.

68 A exposição usa da tecnologia para reconstruir esse espaço geográfico e mítico, assim como mistura o erudito e o popular, sem preconceitos -eixo cenográfico, aliás, que caracteriza o próprio Museu Afro Brasil.

VIDA NA CAATINGA

A seção dedicada aos vaqueiros, por exemplo, projeto museográfico de André Scarlazzari, é das mais contundentes.

Suas pequenas casas são reconstruídas de forma detalhista e dramática, permitindo que o visitante tenha uma experiência real da vida na caatinga.

Mas aí também estão imagens de fotógrafos contemporâneos, como Maureen Bisilliat em sua histórica série dos vaqueiros dos anos 1960, ao lado de novas imagens de Márcio Vasconcelos, em sua impressionante "Na Trilha do Cangaço", série vencedora de uma recente premiação da Funarte.

O Museu Afro Brasil, que com essa exposição inicia as comemorações de seu sétimo aniversário de fundação, vem se caracterizando por dar visibilidade a uma história do Brasil que não costuma ser a mais corrente.

"O Sertão: Da Caatinga, dos Santos, dos Beatos e dos Cabras da Peste" serve como mais um ótimo capítulo desse itinerário.

ESTADO DE MINAS - Ponto chique natalino

Voluntárias da Apae abrem hoje lojinha para venda de artesanato. Novo espaço será permanente

Sacolonas montadas com tecidos de tapeçaria boas para verão (Ricardo F. Lopes/Divulgação)

(16/11/2011) Desde os tempos em que Heloísa Azeredo assumiu a presidência da Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae), a entidade saiu do limbo e conquistou lugar ao Sol. Diferentemente do que ocorre neste país, os que vieram depois dela não só deram continuidade a seu trabalho como criaram outras atividades. Uma delas é o bazar de Natal, que está em sua 11ª edição e será aberto hoje. Para ser maior e mais completo, foi criado o Ponto Chique, desta vez dentro da Apae – na Praça Duque de Caxias, 143, Santa Tereza – para a venda dos produtos. Não custa repetir o fato que deu origem a esse bazar, onde deságuam os produtos confeccionados na

69 Casa do Voluntariado. Como grande parte das mães dos atendidos pela Apae não voltava para casa, esperando o filho sair do tratamento e das aulas, foi criado esse voluntariado que as acolhe e ensina trabalhos, que rendem grana extra para a família.

Participam do projeto, com bom gosto e conhecimento, coordenadas por Santa Rodrigues Chagas, as voluntárias Cleusa Gonçalves, Elisa Keiko, Ida Paiva, Iolanda Braga, Arlete Nasser e Maria Inês Lobo, com o apoio de Judith Monteiro, Heraldo Dutra e Denise Chaves. O resultado pode ser visto no bom gosto das peças criadas durante o ano: toalhas de mesa, porta-panetones, porta-garrafas, peseiras de cama e saias para árvore de Natal. Destaque para as almofadas feitas com rendas em alto relevo doadas por Iorane Rabello, e as toalhas de lavabo com aplicações em linho bordado. Os jogos americanos em patchwork, já tradicionais nos bazares da entidade e que têm clientes cativos, estão cada vez mais bonitos e são peças únicas para uma mesa que encanta os olhos em qualquer ocasião.

Agora, a novidade que poucos conhecem é que o Ponto Chique é um espaço permanente da entidade para comercialização de produtos novos doados por empresas e seminovos doados por pessoas físicas, todos exercendo sua responsabilidade social e solidariedade no apoio ao Movimento Apaeano. Atualmente, o Ponto Chique passa por um processo de revitalização e modernização conduzido por Cyntia Mansur Zambaldi, coordenadora de planejamento estratégico da Apae-BH, com a colaboração de Karina Kelly, com resultados expressivos para o levantamento de fundos para a entidade.

A partir de hoje, portanto, todos os produtos confeccionados pela Casa do Voluntário serão comercializados no Ponto Chique permanentemente. Além disso, a Apae-BH tem recebido grande apoio de empresas com a doação de produtos, como é o caso da Planeta dos Macacos, e muitas outras já estão selecionando suas doações para encaminhamento à entidade. Vale a pena prestigiar a Apae-BH, adquirindo em sua lojinha não só presentes natalinos como para seu próprio uso. Os preços são superacessíveis e os produtos de muito bom gosto. Todo o recurso é integralmente aplicado na prestação de serviços às pessoas com deficiência intelectual e múltipla e às suas famílias atendidas pela entidade.

É bom destacar, mais uma vez, o trabalho da entidade, que não só atende pessoas com deficiência como também suas famílias – até onde dá para saber, essa é a única entidade que se preocupa com o que ocorre na casa de seus assistidos.

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