A Ingerência Militar Na República E O Positivismo
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A INGERÊNCIA MILITAR NA REPÚBLICA E O POSITIVISMO Arsênio Eduardo Corrêa AGRADECIMENTO Cabe ressaltar que todo o trabalho exigiu de mim perseverança e paciência, no entanto mais ainda daquelas pessoas que junto à minha vida exercem de uma forma ou de outra, papéis relevantes. Diante disso agradeço a Marlene, Paulo, Ana, Antonio, Pedro, Lauro, Ângela e especialmente ao professor Antonio Paim pelas horas dispensadas na discussão do tema por mim desenvolvido; alguns anos se passaram e o seu incentivo, colaboração e crítica se incorporaram ao trabalho. 2 SUMÁRIO PREFÁCIO ...................................................................... 5 INTRODUÇÃO ................................................................ 8 Capítulo I O Processo de Constituição da Doutrina do Comte 14 1 – O “Curso de filosofia positiva” como sistematização da 14 Ciência moderna 2 – A proposta de um positivismo pedagógico 25 3 – O apelo ao sentimento 38 4 – Religião da humanidade 43 5 – Conclusão 62 Capítulo II Fracassa a Tentativa dos Militares de se Manterem 64 Sozinhos no Poder 1 – Sumário da situação nas primeiras décadas 65 republicanas 2 – O caráter liberal da oposição ao regime militar no começo 70 da República, comprovado pela análise de documentos da década 3 – A imprensa na primeira década republicana 78 4 – O corolário do processo: “A política dos governadores” 89 5 – O civilismo e a nova tentativa de se manterem 93 Sozinhos no poder Capítulo III Como se Estruturou e Conseqüências da Aliança com 117 Os Castilhistas 1 – A aparente vitória da profissionalização 117 3 2 – Hipótese relativa à nova feição assumida pela ingerência 121 Militar na política nos anos 20 3 – A natureza e o papel do tenentismo 128 4 – A doutrina castilhista 135 5 – A aliança com os castilhistas 140 Capítulo IV O Ambiente que Conduziu á Aliança com os Liberais 145 1 – A eleição de Vargas em 50 e o surgimento da facção 146 Nacionalista e sua antípoda 2 – Insistência numa candidatura militar, inconformismo e 152 pronunciamentos militares na segunda metade dos anos 50 3 – Razões da instabilidade política nos anos 50 156 4 – A eleição e renúncia de Jânio Quadros, pretextos para 160 novos pronunciamentos militares 5 – O movimento político-militar de 64 e o governo 162 Castello Branco Capítulo V Como Evoluiu a Fundamentação Doutrinária da 167 Ingerência Militar na Política e sua Crítica 1 – A interpretação do comtismo por Benjamin Constant 167 2 – O cerne da doutrina tenentista – possibilidade de sua 169 Conciliação com a interpretação precedente 3 – O cerne da doutrina castilhista – possibilidade de sua 171 Conciliação com a plataforma Benjamin Constant 4 – O substrato doutrinário de 64: o denominado 172 autoritarismo Instrumental 5 – Condição de sucesso da profissionalização 174 BIBLIOGRAFIA 179 4 PREFÁCIO A obra de Arsênio Eduardo Corrêa desenvolve interessante análise acerca do papel que desempenharam os militares na história republicana brasileira, destacando os fundamentos doutrinários em que se alicerçou a sua participação e as perspectivas que, neste final de milênio, se descortinaram no que tange à profissionalização das Forças Armadas. Em cinco capítulos o autor percorre os momentos principais dessa participação, partindo da análise dos fundamentos doutrinários do comtismo. O título dos capítulos já revela a abrangência do estudo: “O processo de constituição da doutrina de Comte” (Capítulo I); “Fracassa a tentativa dos militares de se manterem sozinhos no poder” (Capítulo II); “Como se estruturou e conseqüências da aliança com os castilhistas” (Capítulo III); “O ambiente que conduziu à aliança com os liberais” (Capítulo IV) e “Como evoluiu a fundamentação doutrinária da ingerência militar na política e sua crítica” (Capítulo V). A análise desapaixonada sobre o fundamento culturológico da participação dos militares na vida política brasileira tem merecido, a bem da verdade, poucos estudos. Depois das clássicas obras Militares e civis: a ética e o compromisso, de Paulo Mercadante e, Os militares na política, do brasilianista Alfred Stepan, publicadas na década de 70, são relativamente escassas as contribuições nesse terreno. Merece destaque, entre as análises recentes, a empreendida pelo brigadeiro Murillo Santos na sua obra intitulada O caminho da profissionalização das Forças Armadas (1991). Num momento em que o Brasil aspira a ver amadurecidas as suas instituições democráticas, é de capital importância o estudo dos fundamentos culturais do comportamento militar. Justamente na medida em que pretendemos sair de uma concepção estatizante da segurança nacional, para elaborar uma concepção em função da segurança cidadã, esse estudo é impostergável. A obra de Arsênio Eduardo Corrêa vem responder a essa inquietação e terá, decerto, ampla acolhida de parte do público leitor. 5 Considero particularmente valioso o estudo que ora apresento, porque constitui capítulo fundamental da análise mais larga do Estado patrimonial brasileiro. Embora o autor se refira en passant à questão do neopatrimonialismo, não é difícil traçar os elos de ligação entre os fundamentos doutrinários do comportamento militar e a dinâmica do nosso Estado patrimonial. Max Weber distinguiu, nos seus estudos acerca do patrimonialismo, duas modalidades de organização social: a patrimonial pura e a patrimonial estamental. A primeira consistiria na consolidação da dominação política a partir da hipertrofia de um poder patriarcal original, que alargaria a sua dominação doméstica sobre territórios, pessoas e coisas extrapatrimoniais, que passariam a ser tratados como propriedade patrimonial (familiar) do governante. As relações de autoridade entre dominante e dominados pautar-se-iam pelo código da piedade filial. O melhor exemplo deste tipo de organização seria, entre nós, o “engenho real” descrito por Antonil e estudado por Oliveira Viana em Populações meridionais do Brasil (1920) e Instituições políticas brasileiras (1951). Raymundo Faoro, em sua obra clássica Os donos do poder (1958), estudou a forma em que se deu este tipo de patrimonialismo paternalista no Portugal do século XIV, quando o Mestre de Avis organizou o Estado, após a revolução de 1385, como alargamento de sua domus. A segunda consistiria na organização do Estado como instância doméstica do governante, mas auxiliado no alargamento do seu poder sobre territórios, pessoas e coisas extrapatrimoniais por uma organização pré-burocrática, que lhe garantiria um mínimo de racionalidade administrativa e um máximo de fidelidade à sua pessoa. Karl Wittfogel, no seu conhecido estudo intitulado O despotismo oriental (cuja primeira edição data dos anos 50), analisou a forma em que se consolidou esse estamento nas sociedades hidráulicas e formulou a lei que preside o seu funcionamento, identificando-a como “Lei da racionalidade variável”, ou seja: o estamento pré-burocrático patrimonialista possui um mínimo de racionalidade que permita ao soberano fazer aquelas reformas sem as quais o seu poder discricionário correria perigo, mas somente na medida em que se mantenha o status quo, ou seja, não estimulando, de parte da sociedade, o surgimento de “sentimentos de nobreza”, ou de independência de alguns setores face ao soberano. Exemplo dessa organização pré-burocrática seria, entre nós, a Guarda Nacional, conforme foi amplamente estudada por Fernando Uricoechea em sua obra O minotauro imperial (1978). Karl Wittfogel estudou a maneira como 6 funcionou o patrimonialismo estamental no Antigo Egito e no império czarista. A questão das Forças Armadas insere-se, no caso brasileiro, nesse contexto. Elas foram, já no final do Império, após a eclosão da chamada “Questão Militar”, as porta-vozes de propostas cientificistas, de caráter modernizador, que não eram novas na nossa cultura, posto que o momento pombalino tinha já dado ensejo a um modelo de neopatrimonialismo, como ficou claro após as análises de Simon Schwartzman (em São Paulo e o estado nacional, 1975, e Bases do autoritarismo brasileiro, 1984) e de Antônio Paim (em A querela do estatismo, 1978). A doutrina que melhor exprimiu o élan modernizador das Forças Armadas no Brasil foi, primeiramente, o positivismo comtiano na versão de Benjamin Constant Botelho de Magalhães e ulteriormente, o castilhismo (que constituía uma modalidade de positivismo heterodoxo), o nacionalismo tenentista, o socialismo autoritário e o autoritarismo instrumental de inspiração udenista. Na atual transição do Estado patrimonial para uma forma não patrimonial de Estado, inspirada no ideário liberal, tornou-se insuficiente a justificativa doutrinária que inspirou as nossas Forças Armadas nas suas intervenções políticas. A única alternativa para elas, num Estado liberal de direito, correspondente à moderna democracia, é o caminho da profissionalização, na forma em que tem sido estudado esse fenômeno pelos professores Samuel Huntington e Robert Dahl, e dando prosseguimento á reforma proposta pelo marechal Castello Branco, que encontrou acolhida em amplos setores das Forças Armadas, tanto no plano institucional (as reformas efetivadas pelo governo Geisel dão prova disso), quanto do ângulo teórico (a obra do brigadeiro Murillo Santos, atrás mencionada, testemunha esse fato). O estudo, ora apresentado, de Arsênio Eduardo Corrêa, contribui, de forma criativa, a esse esforço institucional e teórico. Ricardo Vélez Rodrigues 7 INTRODUÇÃO Na História do Brasil, como de Portugal, os militares sempre tiveram uma grande ingerência na política, na condição de parcela proeminente de uma elite burocrática de que se pode dizer, sem riscos de exagero,