Sucursal Das Incertezas
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José de Souza Castro ________________________________________________________ SSSUCURSAL DAS IIINCERTEZAS A história vista por um jornalista dos tempos do telex ponta a ponta 1 É preciso aprender a navegar em um oceano de incertezas em meio a arquipélago de certezas. Edgar Morin 2 © 2007 by José de Souza Castro Capa: Cristina Moreno de Castro Edição: Cristina Moreno de Castro Revisão: Ivonilde Miranda Moreno de Castro TODOS OS DIREITOS RESERVADOS 3 SumáriSumárioooo Apresentação 6 O sumiço das sucursais 8 O Impulso inicial 11 Isolamento mineiro 14 O fundador 15 Prisão de Guy 17 Mercado restrito 20 O subversivo JB 22 Copidesque 26 Amordaçados 28 Censura x Arte 31 O bando de Zeferino 37 Arremedo de democracia 39 A saída de Dines 43 Pensando grande 45 A boa notícia 48 Afrouxamento 50 Sucursal de Minas 51 Notícias indesejadas 54 Jogo pesado 56 Craques 60 Chefes de Reportagem 61 Sartana não perdoa! 63 Correspondente de guerra 67 Tiros na janela 70 O contista 72 Manifesto contra a censura 76 Despacho fulminante 79 Um certo Minhoca 81 Pautas recorrentes 85 Espaço nobre 89 Lembranças dos anos de chumbo 94 Verso e reverso 102 Preocupação ambiental 105 Veredas mortas 108 Olho vivo 111 Fracassos 113 Cem anos de perdão 116 Os intocáveis 120 Bode de bicheira 125 TV Jornal do Brasil 129 Tempos difíceis 132 Filme reprisado 134 4 De Papa e de bombas 137 Normas de Redação 139 Censura começa em casa 141 Teoria da Libertação 143 Pedra no caminho 145 Refúgio de Aureliano 147 Revolução pelo voto 149 Esquema furado 151 Estadista britânico 155 Proconsult 157 O que nos deixa indignados 159 Uma potência 161 Renovação 165 Nova esperança 166 A grande frustração 168 Força da mulher 170 A despedida 172 Em busca da felicidade 175 Meu amigo, o bandido 178 Os senhores das Gerais 180 A volta dos que não foram 182 Chave da cadeia 185 Turbulências 189 Retoque na biografia 192 Um epitáfio 194 Aqui se paga 197 Dedo no nariz 200 Megalomanias 201 Notícia soterrada 204 As garras do bicho 207 Barragens da Cemig 208 Memória traiçoeira 211 Referências 213 Apêndice 214 5 Apresenta çãoãoão O jornalista José de Castro é um mineiro típico, nascido em 1944 na zona rural de Luz, no Oeste de Minas. Filho de família numerosa, começou a trabalhar muito cedo, ainda na fazenda do pai, onde nasceu e viveu até os nove anos, até se mudar para Lagoa da Prata, quando pisou pela primeira vez numa sala de aula. Depois, aos 15, nas alfaiatarias de Eurico Teixeira Malta, onde aprendeu a costurar calças, e de Luiz Duarte (nesta, também ajudava a administrar a primeira banca de revistas da cidade). Finalmente, na Refinaria Gabriel Passos, na qual terminou no cargo de operador de utilidades, na subestação elétrica. Só aos 25 anos foi estudar jornalismo, na UFMG. Com a sensibilidade à flor da pele, numa conversa, escuta mais do que fala. Oralmente, se expressa às vezes pouco, outras com (aparente) dificuldade, como qualquer mineiro que se preza. Sua memória é de elefante, mas é sua. Quem sou eu, então, para julgá-la? Digamos apenas que eu possa ter, a respeito de alguns dos episódios relatados em seu livro, uma visão algo diferente, que não mudaria muito as coisas. Como seu companheiro, mas forçado pelo destino a assumir funções de comando (fui diretor regional do JB durante 23 anos), tinha acesso a outras informações. Quem estaria certo, então? Os dois, imagino. É preciso dizer, antes de tudo, que o jornalista José de Castro jamais traiu sua memória, muito menos sua consciência. Limitou-se a dizer aquilo que, à sua maneira, observou, leu, ouviu e viu. Objetivo, seu texto é escorreito, digno do profissional que sempre foi. Só que, a partir de agora, dá sinais evidentes de que, em silêncio, por trás do repórter arguto, se escondia o escritor, que trata, com graça e respeito, a sua matéria-prima – o texto, que é tanto de um quanto de outro. Seu livro, que se lê de uma só tacada (em mim, provocou uma enxurrada de lembranças), contém lições importantes de jornalismo, pois foi isso – jornalista – que ele soube ser, em todos os instantes, a ponto de ter transmitido a duas filhas a (ingrata?) vocação. O livro interessa ao leitor de um modo geral e, em particular, aos profissionais e estudantes de jornalismo. 6 O título do livro vem das incertezas da sua profissão (ou, quem sabe, da própria vida), sobretudo em um país que tem passado, ao longo de sua história, por repetidas turbulências institucionais. Como a última, que durou mais de duas décadas, na qual, em grande parte, tivemos que engolir juntos, e da qual, sempre que falamos dela, sentimos engulhos. Só que, da parte dele, há pelo menos uma certeza: com independência e destemor, durante mais de 30 anos, só buscou, na profissão que abraçou e da qual sempre soube guardar uma visão também crítica, a verdade, nada mais. Busca, aliás, que deveria ser de todos os seres humanos, independentemente de qualquer profissão. Não tenham dúvidas, Viviane e Cristina, que abraçaram o jornalismo, e Henrique e Mônica, que optaram pela odontologia: o pai de vocês não nos contou apenas um pouco de sua experiência, nem pretendeu ser somente útil (principalmente) aos dois que lhe seguiram os passos. Além das lições de vida, fez literatura, e da boa, utilizando-se da memorialística. Seu primeiro livro é apenas um aviso de que outros virão. Acílio Lara Resende 7 O sumi ço das sucursais Quando fui trabalhar na sucursal mineira do Jornal do Brasil , em junho de 1972, uma das coisas que me impressionou foi como era fácil transmitir nossos textos para a sede, no Rio, através de um telex ligado ponta a ponta. Havia dois aparelhos de telex, mas um deles tinha que ser discado. Num tempo em que interurbano exigia o auxílio de uma telefonista e a ligação, geralmente, demorava, para completar-se, minutos ou horas, aquele ponta a ponta de ligação instantânea era fantástico. Com o ponta a ponta nas sucursais dos grandes jornais e revistas, Minas não vivia isolada do resto do país e do mundo. Mas a década de 90 representou o fim das sucursais de jornais do Rio e São Paulo em Belo Horizonte. A primeira a fechar foi a do Estado de S. Paulo, um dos efeitos do Plano Collor. O jornalista Luiz Carlos D’Avila relembra 1: “O fim das sucursais em Belo Horizonte, nos anos 1992 e 93, foi mais ou menos assim: no Estadão éramos seis repórteres, entre eles, desde 1986, eu. Aí, após já uns dois anos do advento da informática na redação, apareceram, em 91, uns caras caretas de terno e super sorridentes, lá de Sampa. Vinham esses homens "pra ajudar a melhorar tudo pra nós", armados pelos mais vastos conhecimentos da moderníssima qualidade total 2. Assim acreditamos e assim respondíamos a todas perguntas, mais pra entusiasmados do que pra desconfiados com as "mudanças". (...) “Vejam vocês que, exatamente em plena véspera de Natal de 1991, quatro de nós foram demitidos. Ficou eu e Paulinho Assunção. Em março seguinte, só restava Paulinho, pouco depois substituído por um correspondente. Fim da sucursal”. Não muitos anos depois, fecharam as sucursais do Jornal do Brasil e de O Globo . Em 2003, existiam ainda as sucursais da Folha de S. Paulo , chefiada pelo jornalista Paulo Peixoto e auxiliado apenas por um repórter recém-formado, e a da Gazeta Mercantil , dirigida por Durval Guimarães, e que empregava quatro jornalistas. A Veja mantinha um escritório do departamento de publicidade, chefiado por Vânia Passolongo, com quatro contatos publicitários. O correspondente da revista, José Edward Lima, fechou, no fim de 2002, o escritório da Savassi, onde o aluguel era caro, e passou a trabalhar em casa, para reduzir custos. 1 PQN, 8/6/2006 2 Eram agentes da Booz Allen, empresa multinacional de consultoria e auditoria que promoveu as primeiras levas de demissões em massa, privatização e alienações de patrimônio público em todo o Brasil e ao redor de todo o mundo nos últimos vinte anos. 8 Chefiava a sucursal há cinco anos, mas além dele havia apenas dois jornalistas freelances fixos. Em 2000, ficou com apenas um, que foi demitido no ano seguinte. Outro jornalista empregado no Grupo Abril, o correspondente da revista Exame , José Maria Furtado, o Deca, passou também a trabalhar em casa, por economia. Mesmo assim, foi demitido em janeiro de 2003. Porém, as agências Estado e AJB e o jornal Valor Econômico continuavam com correspondentes em Belo Horizonte. A situação mais curiosa era a do correspondente da AJB, que trabalhava como frila. Seu telefone para contato era o da rádio onde trabalhava e o da sala de imprensa da Assembléia Legislativa. O correspondente da Agência Estado era Evaldo Magalhães, que trabalhava em casa. Pouco depois, ele aceitou convite de Flamínio Fantini, que em 1989 entrara em meu lugar para chefiar a redação da sucursal do JB, para trocar de jornal. Não foi uma boa opção. A sucursal começou a ser fechada em junho de 1992, com a demissão de Flamínio. O coordenador Nairo Alméri já havia saído. O repórter Fernando Lacerda passou a responsabilizar-se pela redação, sem nomeação oficial e sem acréscimo salarial. Com ele, trabalhavam apenas dois repórteres, Evaldo Magalhães e Roselena Nicolau, que se afastou por licença maternidade, sendo substituída interinamente por Cláudia Lemos. O fotógrafo Waldemar Sabino, o Mazico, continuava na sucursal, bem como os chefes dos departamentos Comercial e Administrativo, Francisco Noronha Braga e José Milton Eça de Faria. Antes de decidir fechar a sucursal, o JB ainda tentou, por duas vezes, trazer de volta Acílio Lara Resende, como diretor regional.