Cuidado Parental Em Leptodactylus Natalensis (Amphibia, Anura
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Cuidado parental em Leptodactylus natalensis (Amphibia, Anura... 491 Cuidado parental em Leptodactylus natalensis (Amphibia, Anura, Leptodactylidae) Ednilza Maranhão dos Santos1 & Fabiana Oliveira de Amorim2 1. Pós-graduação em Psicobiologia, Departamento de Fisiologia, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 59078-970 Natal, RN. ([email protected]) 2. Laboratório de Ecofisiologia e Comportamento Animal, Departamento de Morfologia e Fisiologia Animal, Universidade Federal Rural de Pernambuco, 52171-900 Recife, PE. ([email protected]) ABSTRACT. Parental care behaviour in Leptodactylus natalensis (Amphibia, Anura, Leptodactylidae). The present paper reports one more species of the family Leptodactylidae presenting parental care behaviour, Leptodactylus natalensis Lutz, 1930, in which females were observed attending eggs and schools of tadpoles in two temporary ponds in the Atlantic forest of the State of Pernambuco, Brazil. KEYWORDS. Parental care, behaviour, Leptodactylus natalensis, Atlantic forest, Brazil. RESUMO. O presente trabalho registra mais uma espécie pertencente à família Leptodactylidae apresentando cuidado parental, Leptodactylus natalensis Lutz, 1930. Fêmeas foram observadas em assistência a ovos e cardumes de girinos em duas poças temporárias na mata Atlântica do Estado de Pernambuco, Brasil. PALAVRAS-CHAVE. Cuidado parental, comportamento, Leptodactylus natalensis, Mata Atlântica, Brasil. O cuidado parental é constituído por um repertório MATERIAL E MÉTODOS de comportamentos exibidos pelos pais para com sua prole com o objetivo de assegurar a sobrevivência de Foram feitas observações mensais sobre o seus descendentes. Todavia, o custo com o cuidado comportamento de Leptodactylus natalensis entre parental pode reduzir a capacidade dos pais em investir setembro de 2002 e novembro de 2003, em duas poças em outras proles (TRIVERS, 1972). Em anuros, o cuidado temporárias localizadas em borda de mata de duas parental pode ser facultativo (MARTINS et al., 1998), localidades do Estado de Pernambuco, Brasil: Estação maternal, paternal ou biparental (DUELLMAN & TRUEB, Ecológica do Tapacurá (EET), localizada no município de o o 1986; BICKFORD, 2004). Apenas 6% dos anuros, São Lourenço da Mata (8 02’S, 35 11’W) (Poça A) e distribuídos em 17 famílias, apresentam o comportamento Refúgio Ecológico Charles Darwin (RECD), localizado no o o de cuidado à prole, nas fases de ovos e larvas (CRUMP, município de Igarassu (7 49’S, 34 56’W) (Poça B). Os 1996). Relatos de cuidado com a desova e/ou com girinos animais foram capturados manualmente, medidos com aquáticos (e.g., DOWNIE, 1996), principalmente com paquímetro (CRA, comprimento rostro-anal), pesados com espécies brasileiras (e.g., MARTINS, 2001), são raros. dinamômetro portátil (Pesola) e marcados através da Entre as famílias que apresentam cuidado parental, amputação de falanges (MARTOF, 1953) e colocação de Leptodactylidae é a mais diversificada e possui ampla cinto inguinal (EMLEN, 1968). Os indivíduos marcados distribuição nas Américas Central e do Sul. Nessa família, foram soltos posteriormente nos seus respectivos locais o gênero Leptodactylus tem como característica a de coleta. Foram utilizados como métodos amostrais a deposição de ovos em massa de espuma flutuante na varredura e o animal focal (MARTIN & BATESON, 1986), no lâmina d’água ou em câmaras escavadas no solo qual o foco era a fêmea, em janelas amostrais de 20 minutos (DUELLMAN & TRUEB, 1986; PRADO et al., 2002). ao longo de um turno de observação de seis horas Leptodactylus natalensis Lutz, 1930 tem sua consecutivas. Foram realizados quatro turnos mensais ocorrência restrita ao Brasil, tendo sido registrado pela para cada área, cada um com seis horas diárias primeira vez na localidade de Rio Baldo, município de consecutivas e em horários complementares, de modo a cobrir as 24 horas do dia. Durante a noite, os animais Natal, Estado do Rio Grande do Norte, ocorrendo nas foram observados com auxílio de uma lanterna com filtro localidades litorâneas do Nordeste até o Rio de Janeiro vermelho. Estacas e pegadores amarelos foram utilizados (HEYER, 1994). OLIVEIRA & LÍRIO-JR. (2000) forneceram uma para marcar os locais onde as fêmeas eram encontradas. breve descrição do girino desta espécie e HEYER & Foram registrados dados quanto ao tipo de CARVALHO (2000) descreveram dois tipos de canto. De um comportamento, localização e o deslocamento da fêmea e modo geral, dados sobre a biologia da espécie em apreço suas larvas. Algumas larvas dos cardumes observados são incipientes. O presente trabalho tem como objetivo foram coletadas para identificação dos estágios de relatar o comportamento de cuidado parental em desenvolvimento, utilizando a tabela de GOSNER (1960). Leptodactylus natalensis em duas áreas de Mata Atlântica Todos os dados foram registrados em fichas e caderneta no Estado de Pernambuco. de campo. Iheringia, Sér. Zool., Porto Alegre, 96(4):491-494, 30 de dezembro de 2006 492 SANTOS & AMORIM RESULTADOS uma bacia coberto por folhedo e uma fêmea (F9) em cuidado parental, ambos distantes da Poça A (cerca de Foram capturadas 65 fêmeas, sendo possível 1,15 m), devido à diminuição do nível da água. Durante o observar cuidado parental em 39 delas. Observamos o turno noturno (das 18 à 00 h), observamos que a fêmea cuidado à prole em 12 desovas e 27 cardumes de girinos em assistência ao ninho, construía um túnel sob o folhedo (Tab. I). Apenas um macho foi registrado próximo às em solo úmido, ligando o ninho até a lâmina d’água mais larvas durante seis horas em 24 de novembro de 2002. próxima (uma poça pequena, distante 0,43 m). No turno Durante nossas observações, foram registrados machos da manhã do dia seguinte (das 5 às 11 h), encontramos a de L. natalensis construindo bacias (n=6), que serviam F9 com o cardume na borda da poça central (poça A). como sítio de vocalização e posteriormente sítio de Também constatamos que havia outro túnel de 0,68 m, ovipostura. que ligava a poça pequena à poça central e que algumas Inicialmente, foram registrados três tipos de larvas deslocavam-se por esse túnel até chegarem comportamento relacionados ao cuidado parental: próximo à fêmea. Comportamento similar foi observado assistência, bombeamento (exibidos por fêmeas em para uma outra fêmea (F15), na mesma poça (A) em maio atenção às desovas e/ou larvas) e comportamento de 2003. etepimelético (exibido pelas larvas como resposta à Os eventos (n=1.032) registrados com as fêmeas e assistência dispensada pelas fêmeas; ver GALLARDO, 1964 suas proles ocorreram tanto no período diurno quanto ou VAZ-FERREIRA & GERHAL, 1975). A assistência consistiu no noturno. Na maioria das vezes (n=612), os eventos na permanência da fêmea junto a desovas e/ou larvas, aconteciam quando a fêmea era observada durante o dia, sugerindo representar uma vigilância contra predadores, escondida entre a vegetação emergente (Poaceae, uma vez que, durante esta permanência, a fêmea ficava Cyperaceae, Curcubitaceae, Acanthaceae) ou atenta a qualquer movimento e defendia o cardume parcialmente submersa entre a vegetação flutuante através de exibições agonísticas como arquear o corpo (Laminaceae e Araceae) ou folhedo (folhas secas), sempre ou deslocar-se para outro ponto da poça (esse na borda da poça ou dentro d’água (profundidade de deslocamento variou de 0,01 a 1,00 m); quando a 0,02 a 0,15 m). Ocorreram poucos registros (n=36) de assistência era com a desova, as fêmeas podiam se fêmeas fora d’água realizando cuidado parental; nesses, posicionar ao lado, em frente ou embaixo do ninho de as fêmeas foram observadas no solo ou sobre o folhedo, espuma. O comportamento de bombeamento próximas ou junto ao ninho ou afastadas das larvas caracterizou-se por uma série de movimentos (que variou quando elas já estavam em estágio intermediário (31–40, de 1–21), lentos ou rápidos, de erguer e abaixar a parte GOSNER, 1960) (cardume observado na borda da poça – posterior do corpo, agitando a superfície da água e profundidade de 0,03 m). produzindo ondulações. O bombeamento era seguido ou Além dos três principais comportamentos não de deslocamento, que variava de curto a longo (0,05 (assistência, bombeamento e comportamento a 0,70 m). Após esse comportamento, o cardume seguia a etepimelético), foram registrados para L. natalensis mais fêmea movendo-se em pequenos aglomerados, seis: (1) arquear o corpo: levantar os membros anteriores geralmente formando dois ou três cardumes menores, até e posteriores (observado quando invertebrados, aranhas chegarem todos próximos ou junto à fêmea. Na maioria e/ou insetos, se aproximavam do cardume ou da desova das vezes (n=116), as larvas faziam contato corporal com ou ainda, quando folhas secas caíam); (2) esconder-se: a fêmea, raspando com a boca ou esfregando suas partes geralmente embaixo das folhas secas, plantas aquáticas ventrais ou laterais, em movimentos bastante rápidos ou entre as plantas emergentes (nesse evento a fêmea (comportamento etepimelético, ver GALLARDO, 1964). era seguida pelas larvas); (3) vocalizar: emissão de sons Após esse comportamento, ocorria mais um deslocamento semelhantes a gemidos, que ocorria quando as larvas se da fêmea e, conseqüentemente, outro deslocamento das afastavam ou se aproximavam da fêmea e/ou começavam larvas até ela. Observamos que as fêmeas deslocavam-se a raspar a sua pele com a boca; (4) deslocar-se: menos e ficavam mais próximas, ou em contato com os caminhando ou pulando na água ou da água para o solo; cardumes, quando estes estavam no estágio inicial de (5) mergulhar: pulos na água; geralmente após uma seção desenvolvimento (23-30) do que no estágio intermediário de bombeamento; (6) construção de canais: as fêmeas (31-40). No estágio final (41-46) não foi observada a fêmea construíam túneis sob o folhedo em solo úmido, através junto ou próximo ao cardume (Tab. II). de movimentos do focinho, corpo e membros posteriores Em novembro de 2002, registramos um ninho em ligando o ninho à lâmina d’água mais próxima. Tabela I. Parâmetros das fêmeas de Leptodactylus natalensis observadas entre setembro de 2002 e setembro de 2003, na Estação Ecológica do Tapacurá (EET) e Refúgio Ecológico Charles Darwin (RECD).