# 32 – dezembro 2013

Boca no trombone A bênção, poeta

Testemunha : “Quando comecei a trabalhar com Vinicius, em junho de 1970, ele ainda evitava viajar de avião. De repente, estava a bordo de um navio junto com , um ser humano grandioso de quem eu só conhecia o que ele tinha escrito e cantado por aí. Sei que na primeira noite no navio eu passei muito mal, no meu quarto, enjoado, com tudo a balançar por todos os lados. E Vinicius sentado a uma

escrivaninha, segurando o copo para que ele este ano em que se comemora o não caísse, conversando naturalmente, sem centenário do nascimento de Vinicius se alterar. Ficou lá ao meu lado, como um de Moraes, CasaDoBrasil decidiu pai, ou melhor, como alguém com pretensões N de se fazer amigo. Nossa relação começou homenageá-lo através do Ciclo Cultural “Vivendo Vinicius: Poetinha Poetão”, assim, e logo de cara eu passei a vê-lo um revisitando e descobrindo, para velhas e pouco como irmão, porque ele não sabia ser novas gerações, uma pequena parte da velho, o que na realidade ele não era”. monumental obra do “único poeta que viveu como poeta”, tal como algum dia disse “Jamais enxerguei Vinicius como um pai de Drummond. postura paternal e protetora. Mesmo porque ele não agia assim nem com os próprios Assim, começamos assistindo a “Uma noite filhos. A feição de pai surgia por sua grande com ”, exibindo e comentando os filmes sabedoria de vida. E, ao mesmo tempo, baseados na peça escrita em 1954 (ver quando se via diante de um pescador, por JornalDaCasa #22), continuamos batendo exemplo, me falava cheio de emoção: „Não um papo sobre “Os sonetos de Vinicius” e sei absolutamente nada da vida perto de seu modo de enxergar o sentimento amoroso, uma pessoa assim‟”. capaz de congregar em si o instante e o infinito (ver JornalDaCasa #25), nos “É que ele carregava o tempo inteiro o garoto embarcamos numa “Maratona de leitura” de que ele era, o jovem disposto e disponível à alguns de seus mais queridos e sentidos vida; que arriscava nas coisas, que chegava poemas, para a qual os alunos também tarde para acordar cedo, e acordava cedo; escreveram suas próprias poesias (ver que ficava como um Buda, sentado na capota JornalDaCasa #28), e assistimos a “Vinicius”, do carro do Bardotti, em Firenze, dando um filme com a essência criativa do artista e voltas pela mesma praça, depois de algumas filósofo do cotidiano, com raras imagens de garrafas de vinho no jantar; que bebia até arquivo, entrevistas e interpretação de muitos mais tarde sem problemas de ressaca no dia de seus clássicos (ver JornalDaCasa #29). seguinte. Muito mais resistente que eu nesse aspecto. Mas, por mais controvertido que E para encerrar o Ciclo, o professor Álvaro pareça, foi ele quem me ensinou a ser Tabárez não só ofereceu uma palestra sobre profissional, a cumprir horários, a observar “Vinicius & Toquinho”, mas cantou –e fez compromissos, a respeitar as pessoas. Isso cantar a todos os que acompanhamos– as reflete as contradições desse grande poeta. eternas músicas dessa parceria maravilhosa. „O cotidiano é a ferrugem da vida‟, ele dizia”.

JornalDaCasa é uma publicação de CasaDoBrasil | Editor: Leonardo Moreira Web: www.casadobrasil.com.uy | Twitter: @casadobrasiluy | Mail: [email protected] # 32 – dezembro 2013

Cantos com encanto Museu Afro Brasil mostra riqueza da cultura negra

As peças que integram a exposição permanente do museu estão distribuídas em seis núcleos. O primeiro é dedicado aos povos africanos e reúne uma bela coleção de máscaras rituais e representações do continente produzidas por artistas europeus entre os séculos 15 e 19. O segundo trata do período da escravidão e busca ressaltar os conhecimentos trazidos pelos africanos que contribuíram para o desenvolvimento econômico do Brasil. Esta seção reúne diversos objetos históricos, como moinhos utilizados nas fazendas e engenhos de açúcar, além de contar a história da Brasil é um país negro. De acordo com resistência ao cativeiro no país. O terceiro e o o Censo de 2010, nada menos que 97 quarto núcleos são dedicados ao mundo O milhões de pessoas se declaram religioso: o primeiro mostra como muitas pretas ou pardas (contra 91 milhões que se festas populares do país nasceram da declaram brancas), o que faz do Brasil a apropriação que os negros fizeram do segunda nação com a maior população catolicismo; o segundo trata das religiões afrodescendente do mundo (e a maior fora afro-brasileiras, e traz uma bela coleção de da África), só perdendo para a Nigéria, que figuras de orixás e objetos rituais. Por fim, o tem mais de 170 milhões de habitantes, 95% quarto e o quinto núcleos prestam deles negros. Apesar desses números, a homenagem aos negros brasileiros maior cidade do país só ganhou seu primeiro propriamente ditos, reunindo relatos e museu totalmente dedicado à cultura negra biografias de importantes personagens em 2004. A espera, no entanto, valeu a pena. afrodescendentes da história do país e obras O Museu Afro Brasil, em São Paulo, logo se de arte produzidas por negros e mulatos. tornou uma referência internacional de preservação e pesquisa da cultura trazida da Além da exposição permanente, o Museu Afro África por mais de 4 milhões de escravos e Brasil organiza inúmeras mostras reinventada pelos seus milhões de temporárias dedicadas à cultura negra e às descendentes, que hoje formam a maior artes em geral no Brasil, e conta com uma parte da população do país. biblioteca com mais de 11 mil publicações. O museu funciona de terça-feira a domingo, das Instalado no Pavilhão Padre Manuel da 10h às 17h, e a entrada é gratuita. Nóbrega, um espaço de 11 mil m2, dentro do Parque do Ibirapuera (entrada pelo portão 10), o museu conta com um acervo de mais de 6 mil obras, das quais 3.440 se encontram atualmente em exibição. Essa grande coleção é formada por pinturas, esculturas, gravuras, objetos rituais, roupas, peças de artesanato, objetos históricos, livros, fotografias, vídeos, documentos e muitos outros itens que contam a história da formação e do desenvolvimento da cultura negra no Brasil. # 32 – dezembro 2013

Estilos musicais : a música brasileira em sua essência

medicina (ver JornalDaCasa #9) e o ex-estudante de direito , que redimensionam o estilo através de obras memoráveis. Com a explosão da era do rádio a partir dos anos 30, o samba ganha enorme difusão através de cantores como Francisco Alves, Orlando Silva, Silvio Caldas, Mário Reis, –que consegue projetá-lo internacionalmente a partir do cinema– e mais adiante Dalva de Oliveira, Aracy de Almeida, Elizeth Cardoso, entre outros.

Novas adesões como a do refinado baiano (ver JornalDaCasa #24), além

das harmonias elaboradas de Custódio ênero básico da Música Popular Mesquita, o molejo de Pedro Caetano, o Brasileira, o samba tem origem afro- figurino tropicalista de Assis Valente (ver baiana de tempero carioca. Ele nasceu G JornalDaCasa #15), a sobriedade de Sinval nas casas das "tias" baianas da Praça Onze, Silva, o populismo luxuoso de Herivelto no centro do (com extensão à Martins e o sotaque interiorano arrastado de chamada "pequena África", da Pedra do Sal à Ataulfo Alves conduzem o samba para outros Cidade Nova), descendente do lundu (ver caminhos já ao sabor da indústria musical. A JornalDaCasa #19), nas festas dos terreiros ideologia do Estado Novo de Getúlio Vargas entre umbigadas (semba) e pernadas de contamina o cenário e do malandro capoeira, marcado no pandeiro, prato-e-faca convertido (O Bonde São Januário, de Ataulfo e na palma da mão. Embora antes de Pelo e Wilson Batista) se chega ao samba- Telefone, assinada por Ernesto dos Santos, o exaltação cujo carro-chefe, Aquarela do (com Mauro de Almeida) em 1917, Brasil, de Ary Barroso (ver JornalDaCasa #8), outras gravações tenham sido registradas torna-se o primeiro hino brasileiro no exterior. como samba, foi esta que fundou o gênero – apesar da autoria discutida e da proximidade Empurrada pela especulação imobiliária, a com o aparentado maxixe. Também nesse Pequena África já se espalha por diversos estilo ambíguo são as principais composições morros e primitivas favelas de onde brotam de José Barbosa da Silva, o Sinhô, novos bambas como (ver autointitulado "o rei do samba", que junto JornalDaCasa #12), Carlos Cachaça e com Heitor dos Prazeres, Caninha e outros posteriormente (ver pioneiros estabelecem os primeiros JornalDaCasa #28) e Geraldo Pereira, na fundamentos do setor, que ganharia uma Mangueira, Paulo da , Alcides feição mais definitiva com a chamada "turma Malandro Histórico, Manacé e Chico Santana, do Estácio". na Portela, Molequinho e Aniceto do Império

Serrano, entre inúmeros outros. O samba Formada por Alcebíades Barcellos, o Bide, ganha status de identidade nacional através Armando Marçal, Newton Bastos e Ismael do reconhecimento de intelectuais como Villa- Silva e mais os malandros/sambistas Baiaco, Lobos, que organiza uma histórica gravação Brancura, Mano Edgar, Mano Rubem (uma com o maestro erudito americano Leopold brodagem bem anterior aos manos do hip Stokowski no navio Uruguai, em 1940, de hop), essa corrente injeta uma cadência mais que participam Cartola, Donga, João da picotada no samba e tem o endosso de filhos Baiana, e Zé da Zilda. da classe média como o ex-estudante de # 32 – dezembro 2013

Depois da fundação da Deixa Falar por , Miltinho, Luis Bandeira, Ed em 1928 (ver JornalDaCasa Lincoln, Luis Antonio, Djalma Ferreira e #16), a partir da reunião de blocos do vários. Dissidências internas na bossa Estácio, o fenômeno das escolas de samba geraram os afro- de e toma conta do cenário. E propulsiona Vinicius de Moraes. Além disso, parte do subgêneros, do partido-alto cantado como movimento (re)aproximou-se do samba desafio nos terreiros ao samba-enredo, trilha tradicional, revalorizando sambistas ditos "de para desfile das agremiações. Iniciadas nos morro" como o portelense Zé Kéti, Cartola, moldes dos ranchos, as escolas –Mangueira, Nelson Cavaquinho, Elton Medeiros e mais Portela, Império e Salgueiro e depois adiante Candeia, Monarco, Monsueto e o Mocidade Independente, Beija-Flor e iniciante . Imperatriz Leopoldinense– cresceriam até dominar o carnaval transformando-se em O show Rosa de Ouro, do produtor Hermínio show bizz, com forte impacto no movimento Bello de Carvalho, revela, além da dama do turístico. teatro de revista Araci Cortes, , elo perdido das origens afro do samba. As concentrações urbanas que provocaram o A exemplo de seu xará Paulo Benjamim de aparecimento das primeiras danceterias Oliveira da mesma escola Portela –que populares, as gafieiras, também produzem intermediou as relações do morro com a seu estilo próprio, o samba-choro ou samba cidade quando o samba era perseguido– de gafieira, crivado de síncopas. Viceja ainda Paulinho da Viola, com sua pegada autoral desde a década de 30, o samba de breque– mesclada ao choro, se transformaria num com pausas preenchidas por falas– que embaixador do gênero tradicional diante do consagraria o personagem malandro criado público mais vanguardista, incluindo os por Moreira da Silva e o samba canção, mais tropicalistas. Também no interior da bossa lento, a partir de Ai Ioiô (Linda flor) por Araci apareceria um modificador do samba, Jorge Cortes, em 1929, posteriormente Ben com seu estilo "misto de maracatu" e influenciado pelo bolero com enredos uma inclinação para o rhythm & blues sentimentais de que seria expoente o gaúcho americano, que mais adiante suscitaria o Lupicínio Rodrigues (ver JornalDaCasa #13). aparecimento de um subgênero apelidado Em outras praças, como São Paulo, onde suingue. pontificaria o satírico Adoniran Barbosa (ver JornalDaCasa #19), ou Bahia, terra dos A princípio afastado do foco principal na era enredos tristes de Batatinha, o samba universitária dos festivais, o gênero teria sua incorporava sotaques regionais. revanche num certame específico, a Bienal do Samba e veria no final dos 60 o Após a Segunda Guerra, a influência cultural aparecimento do divisor de águas Martinho americana motiva o aparecimento da bossa da Vila (ver JornalDaCasa #21). Além de nova, um modo diferente de dividir o fraseado popularizar o partido-alto (Casa de Bamba, do samba, agregando influências do Pequeno Burguês), este fluminense de Duas impressionismo erudito e do jazz, inaugurado Barras compactou o samba-enredo –forma por João Gilberto, Tom Jobim (ver consagrada por autores como Silas de JornalDaCasa #12) e Vinicius de Moraes (ver Oliveira (ver JornalDaCasa #17) e Mano Décio JornalDaCasa #18), após precursores como da Viola– ampliando sua potencialidade no , João Donato e músicos como Luís mercado. No começo dos 70, novo surto de Bonfá e Garoto. O gênero teria toda uma revalorização do samba projetaria com altas geração de discípulos-cultores como Carlos vendagens três divas Alcione, Lyra, Roberto Menescal, Durval Ferreira e e (ver JornalDaCasa #26), além grupos como Tamba Trio, Bossa 3, Zimbo Trio do cantor Roberto Ribeiro e dos compositores e os pioneiros vocais Os Cariocas. Na mesma João Nogueira, e Wilson Moreira. época um ramal popular turbinado conhecido Descendente dos estilos de violão de Gilberto por sambalanço projetava o teleco-teco de Gil (que endereçou o petardo Aquele Abraço # 32 – dezembro 2013 para a ditadura), Baden Powell e Dorival "Na Baixa do Sapateiro", mas nunca havia Caymmi, João Bosco em dupla com o poeta posto os pés na Bahia. Esta foi a data que ele Aldir Blanc, renovaria o samba tradicional visitou Salvador pela primeira vez. A festa foi (inclusive o de enredo), algo que Aldir se espalhando pelo Brasil e virou uma continuaria a fazer com novos parceiros como comemoração nacional. e Moacyr Luz, na década de 90. Ainda no fim dos 70, Beth Carvalho começaria a Atualmente duas cidades costumam frequentar rodas de samba do bloco Cacique comemorar o Dia do Samba, Salvador e Rio de Ramos, onde descobriria o emergente de Janeiro. Sob a batuta do músico Edil movimento do , desvelado em seu Pacheco, Salvador sempre tem promovido disco De Pé no Chão, de 1978. grandes shows no Pelourinho com os ótimos e injustamente desconhecidos sambistas Este ramal do samba, movido a partido-alto, locais. Gente como Riachão, Ederaldo Gentil, pontuado pelo banjo e pela percussão do Nelson Rufino, Roque Ferreira, Walter tantan, seria uma resposta ao ocaso do Queiroz, o próprio Edil, e o falecido Batatinha, samba no início dos 80 que obrigaria os recebendo convidados mais famosos, como participantes a reunirem-se em fundos de Paulinho da Viola, e Beth quintal para mostrar suas novas composições Carvalho (ambas na foto). diante de uma plateia de vizinhos. Os primeiros discos solos desses pagodeiros No Rio a divertidíssima festa fica por conta saíram em plena redistribuição de renda do do Pagode do Trem. No Dia do Samba o Plano Cruzado e projetaram de imediato as pessoal se reúne na Central do Brasil, lota artes de (o único que se um trem e vai tocando e cantando até a firmaria no fim da onda inicial), , Estação Oswaldo Cruz. Durante o percurso, Jovelina Pérola Negra e o Grupo Fundo de Velhas Guardas das principais Escolas e Quintal, que revelaria ainda a dupla Arlindo bambas como e Tantinho da Cruz e Sombrinha. Também partideiro, o Mangueira se apresentam nos vagões. pernambucano Bezerra da Silva nesse Chegando na Oswaldo Cruz, diversas rodas mesmo período emplacaria seus de samba instaladas no bairro animam a sambandidos com enredos que documentam galera. Depois que começou, descobriu-se a guerra civil da sociedade partida. que já havia sido criado há décadas antes por uma das mais importantes figuras do bairro, O rótulo pagode seria usado também na Paulo da Portela. Naquela época o samba era década seguinte para denominar uma perseguido pela polícia. Os sambistas faziam espécie de samba-pop inspirado na balada suas reuniões e promoviam animadas rodas romântica que geraria –a partir do sucesso dentro dos vagões do trem. Hoje o Pagode do de grupos como o Raça Negra, Negritude Jr., Trem faz parte do calendário oficial da cidade Art Popular e Só Pra Contrariar– o do Rio de Janeiro. É que o samba, agoniza, aparecimento de um número incalculável de mas não morre. clones com diferentes graduações de proximidade com o samba de raiz. O tronco principal, no entanto, sobrevive alimentado pela revalorização de antigos bambas como Nelson Sargento, Monarco, Noca da Portela, , Walter Alfaiate e as Velhas Guardas da Portela e Mangueira, além do trabalho persistente de ativistas como Nei Lopes, Luis Carlos da Vila e Wilson Moreira.

Cada 2 de dezembro comemora-se o Dia Nacional do Samba, em homenagem ao Ary Barroso. Ary já tinha composto seu sucesso # 32 – dezembro 2013

Ao pé da letra Jura

uando “Jura” foi gravada pelo iniciante de revista. Músicas de sua autoria, como “O Mário Reis em 1928 e virou um sucesso Pé de Anjo” e “Burucuntum”, foram Q estrondoso, José Barbosa da Silva já era responsáveis pelo lançamento de nomes Sinhô, o “rei do samba”. Mulato pobre, como Francisco Alves e Carmen Miranda. Foi nascido no ano da abolição da escravatura, assim, e já dois anos antes da sua morte por em 1888, Sinhô viveu em um Rio de Janeiro tuberculose, que em 1930 ele assistiu ao pós-Império. Filho de um pintor de paredes sucesso de “Jura”, resultado de uma das que o queria ver flautista, acabou muitas dores-de-cotovelo que teve no enveredando para o piano e, viúvo muito envolvimento com mulheres. cedo, aos 26 anos se tornou boêmio profissional. Projetou-se tocando em clubes, Jura como o Cananga do Japão, frequentado pelas Jura, jura pelo Senhor classes mais pobres, isoladas do centro da Jura, cidade, ocupado pela nascente burguesia. Pela imagem da Santa Cruz do Redentor Sem muita opção para sobreviver na música Pra ter valor –já que naquela época da Primeira República A tua jura, as rádios não existiam e a indústria Jura, jura de coração fonográfica e o cinema mudo ainda não Para que um dia estavam consolidados–, fazia demonstrações Eu possa dar-te o meu amor em casas de instrumentos musicais e tocava Sem mais pensar na ilusão em cafés e nas peças do teatro de revista. Daí então dar-te eu irei Um beijo puro na catedral do amor Foi com o lançamento de “Pelo Telefone”, de Dos sonhos meus, Donga e Mauro de Almeida, em 1916, marco Bem juntos aos teus inicial do samba, que Sinhô começaria a Para fugir das aflições da dor delinear seu caminho. Frequentava todos os cariocas, onde o samba surgia nas vozes e nos instrumentos dos descendentes de escravos africanos, que cantavam o chamado “partido alto”. Começou a estilizar aquele ritmo ao violão e ao piano, dando corpo ao samba. Já em 1918, Sinhô tinha montado a própria banda e participava de todas as festas importantes no Rio de Janeiro. Com um grande senso de autopromoção, ele passou a oferecer suas composições diretamente aos grupos de foliões das grandes sociedades carnavalescas. Foi assim que emplacou seu primeiro sucesso, “Quem São Eles?”, no Carnaval carioca de 1918.

Sinhô costumava dizer que “samba é como Discos onde ouvir passarinho, é de quem pegar”; assim não se Clementina de Jesus, Araci Cortes e Conjunto furtou de se apropriar de algumas melodias Rosa de Ouro – Rosa de Ouro (1965) que ouvia. As polêmicas não conseguiram Sinhô – Vol. 1. O pé de anjo (1999) afetar a extrema popularidade de Sinhô, um Mário Reis – Raízes do samba (2000) dos compositores mais requisitados no teatro Zeca Pagodinho – Acústico MTV (2003) # 32 – dezembro 2013

O mundo é uma bola Pedro Rocha, ídolo de Peñarol e São Paulo

Ester, Pedro chegou a jogar com o pai e com o irmão Hermes, no time de sua cidade natal, Salto.

Em 1960, ingressou ao Peñarol, que era campeão uruguaio e tinha um de craques. O meia-atacante, que se revelou habilidoso e goleador (81 gols em 159 jogos), tinha um chute fortíssimo, cabeceios arrasadores e excelente visão de jogo, conquistou oito campeonatos uruguaios (1959, 60, 61 e 62 –completando o famoso "quinquênio"– 64, 65, 67 e 68), três Libertadores de América (1960, 61 e 66) e dois Mundiais Interclubes (1961 e 66).

Na Libertadores do 1966, Pedro marcou cinco gols em dois jogos seguidos, com diferença de 20 dias, contra o grande rival Nacional, e na final, contra o River Plate, ele ajudou a mudar o apelido do clube argentino. Seus torcedores, que gostam de ser chamados de milionários, tiveram de se acostumar com o apelido de "galinhas" após a virada por 4 x 2, com gols de Spencer e Rocha.

m 16 de julho de 1950, os habitantes de Salto, então com 50 mil habitantes, E a 500 quilômetros de Montevidéu e a 120 quilômetros de Uruguaiana, no Brasil, comemoraram –como todos os 2,6 milhões de uruguaios– a façanha do Maracaná. Garotos que participavam de uma pelada, também. E um deles, com oito anos, disse em voz alta com muito orgulho: "Dentro de dez anos, vocês vão gritar meu nome porque eu é que estarei vestindo a camisa da Celeste".

Pedro Virgilio Rocha Franchetti, o garoto que previu seu futuro com muito menos detalhes gloriosos do que ele realmente teria, morreu o 2 de dezembro, um dia antes de completar 71 anos, vítima de uma doença degenerativa que o acompanhava há cinco anos. Filho de Eutério Rocha, brasileiro que havia emigrado para o Uruguai com um ano e meio, e Ana # 32 – dezembro 2013

Pela seleção uruguaia, Rocha estreou no como ele jogava: caminhava com a bola, pelo Centenário, em 29 de novembro de 1961 – meio, e lançava o centroavante, continuando onze anos depois de sua previsão de garoto– a correr. Quando recebia a bola, tinha com uma derrota contra a União Soviética de facilidade em marcar. Tocava para um dos Yashin. Único uruguaio a disputar quatro Copas pontas e corria para a área. A defesa se do Mundo (1962, 1966, 1970 e 1974), o preocupava com o centroavante e era ele Verdugo –como era apelidado, pela facilidade quem cabeceava. Quando não havia a em fazer gols– inflou as redes 17 vezes em possibilidade do passe, ele segurava a bola, 52 jogos, entre elas, o gol da vitória por 1 a 0 chegava perto e chutava muito forte, de 30 sobre a Argentina, que garantiu ao Uruguai a metros de distância. De esquerda ou de Copa América de 1967. direita, como no final da Copa América de 67, quando fomos campeões. Se o ponta Chegou ao São Paulo em 15 de setembro de esquerda sofria uma falta, Rocha cobrava 1970, para juntar-se a Gérson e Toninho com o pé direito no canto esquerdo do Guerreiro, duas grandes contratações que o goleiro". São Paulo havia feito para buscar um título paulista. O clube, que construía seu estádio, Muricy Ramalho, atual técnico do São Paulo e estava há 13 anos sem vencer. No Morumbi, companheiro de Rocha, assim o definiu: "Ele começou na reserva, mas era muito educado, um cara diferente no rapidamente assumiu a camisa 10 e futebol. Caladão, não era de muita conquistou a torcida tricolor, aliando a brincadeira e gostava muito de jogar sinuca. tradicional garra charrua com uma técnica Era invencível, tinha uma precisão para refinada. Ao lado do amigo Pablo Forlán, defender e atacar, até parecia que estava abriu caminho para outros jogadores jogando futebol. Para ficar perto dele, uruguaios brilharem com a camisa do São comecei a jogar sinuca também. Melhorei Paulo, como Darío Pereyra e, mais muito mas nunca consegui vencer Pedro recentemente, Diego Lugano. Rocha. Mas estava ali, perto dele. Era a prova de que estava vencendo na vida. O cara era Nos sete anos de sua passagem pelo clube, um gênio da bola". Pedro marcou 113 gols em 375 jogos e venceu os campeonatos paulistas de 1971 e O escritor uruguaio Eduardo Galeano definiu 75 e o Brasileirão de 1977. Mesmo jogando assim a sua relação com a bola: "Pedro como armador, conquistou 17 gols no Rocha fazia o que queria com a bola, e ela Brasileiro de 1972, sendo o primeiro acreditava totalmente nele". estrangeiro a ser artilheiro do torneio, ao lado de Dadá Maravilha, do Atlético Mineiro. Pedro tinha admiração de Pelé, que o considerava um dos cinco maiores jogadores Em 1977, deixou o São Paulo, por não se de todos os tempos. adaptar ao estilo imposto por Rubens Minelli. Foi para o Coritiba e ganhou o campeonato paranaense. Antes de aposentar-se em 1980, teve passagens por Palmeiras, Bangu, Monterrey do México e terminou a carreira na Arábia Saudita. De regresso ao Brasil, trabalhou como treinador em equipes como Mogi Mirim, Portuguesa, Internacional, Ponte Preta e XV de Piracicaba.

Pablo Forlán, seu companheiro de Peñarol, de seleção e de São Paulo, assim descrevia o modo de Rocha atuar: "É o maior jogador uruguaio dos últimos 50 anos. Vou dizer