A Modernidade Em Cyro Dos Anjos
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ANANDA NEHMY DE ALMEIDA A MODERNIDADE EM CYRO DOS ANJOS: CONFLITOS DE UM AMANUENSE Dissertação apresentada ao Curso de Pós- Graduação em Estudos Literários da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Letras. Área de Concentração: Teoria da Literatura Linha de Pesquisa: Poéticas da Modernidade Orientador: Prof. Dr. Reinaldo Martiniano Marques (UFMG) Belo Horizonte Faculdade de Letras da UFMG 2009 1 Livros Grátis http://www.livrosgratis.com.br Milhares de livros grátis para download. À memória de Daniel Nehmy de Almeida 2 AGRADECIMENTOS Ao Projeto Acervo de Escritores Mineiros, da Universidade Federal de Minas Gerais; Ao CNPq (Fapemig), pela bolsa de Iniciação Científica; A Reinaldo Martiniano Marques, que com sua orientação perspicaz, incentivou o uso teórico de Max Weber na abordagem do tema do intelectual; À equipe de pesquisadores e funcionários do Acervo de Escritores Mineiros: o coordenador do projeto Wander Melo Miranda, as pesquisadoras Eneida Maria de Souza e Constância Lima Duarte; A Márcio Flávio Pimenta, funcionário do acervo e fonte de inspiração; Aos professores, meus colegas de trabalho no Estado, outra fonte de inspiração; Aos amigos Vânia, Alvany, Silvia, Rodrigo, Amanda, Yara, Luciana, Thaís, entre outros; À minha família, meu pai Charles, meus irmãos Inácio e Bárbara, à memória de minha mãe Eliana; A Carlos Ferdinando, pelo amor e companhia; À minha avó Alice Veiga, que me contava sempre as mesmas histórias dos carnavais de rua em Belo Horizonte. 3 Um perfil? Você começa por um pedido difícil. Para ser exato, o perfil há de abarcar o indivíduo no tempo, e eu não sei até que ponto o meu perfil de agora se assemelharia aos das quadras passadas. A gente muda como as águas do rio de Heráclito, não acha? Cyro dos Anjos 4 RESUMO Esta pesquisa realizada no Acervo de Escritores Mineiros observa como a recepção crítica do romance O amanuense Belmiro, de Cyro dos Anjos, compõe uma imagem heterogênea do intelectual moderno ao interpretar a figura do narrador como funcionário público. As entrevistas do escritor mineiro, os livros de sua coleção bibliográfica e a fortuna crítica permitem estabelecer novas figuras e metáforas teóricas que associam aspectos linguísticos, biográficos e sociais na composição do objeto literário. Como arcabouço teórico, faço recurso ao conceito de modernidade em Max Weber, que concebe o Estado como uma empresa capitalista, à noção de conflito em George Simmel, e às concepções de narrativa, drama e história em Walter Benjamin. No estudo da figura do intelectual, procuro relacionar os objetos do acervo de Cyro dos Anjos aos estudos críticos do romance e aos teóricos citados. Palavras-chave: Recepção crítica, conflito, burocracia, drama e história. 5 RESUMEN Esta investigación que se realiza en el Acervo de Escritores Mineiros observa como la recepción crítica de la novela O amanuense Belmiro, de Cyro dos Anjos, forma una imagen heterogénea del intelectual moderno cuando se interpreta la figura del narrador en la condición de un empleado público. Las entrevistas del escritor minero, los libros de su colección bibliográfica y la fortuna crítica permiten que se establezcan nuevas figuras y metáforas teóricas que asocian aspectos linguísticos, biográficos y sociales en la composición del objeto literario. Como fundamento teórico, utilizo el concepto de modernidad de Max Weber, que concibe el Estado como una empresa capitalista, la noción de conflicto de George Simmel, y las concepciones de narrativa, drama e historia de Walter Benjamin. En el estudio de la figura del intelectual, intento relacionar los objetos del acervo de Cyro dos Anjos a los estudios críticos de la novela y a las ideas de los teóricos citados. Palabras clave: Recepción crítica, conflicto, burocracia, drama e historia. 6 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO................................................................................................... 9 2. O LEITOR DE DIÁRIOS.................................................................................. 15 2.1 A recepção crítica no jornal.................................................................................. 15 2.2 A recepção acadêmica.......................................................................................... 31 3. UM AMANUENSE EM CONFLITO............................................................. 41 3.1 O leitor e o tempo............................................................................................... 41 3. 2 Drama e burocracia............................................................................................. 46 3. 2 Ficção burocrática.............................................................................................. 56 4. CARNAVAL EM BELO HORIZONTE....................................................... 67 4. 1 Uma crônica familiar........................................................................................ 68 4. 2 O código da família........................................................................................... 73 4. 3 Datas especiais.................................................................................................. 83 5. CONCLUSÃO............................................................................................... 98 BIBLIOGRAFIA........................................................................................... 104 ANEXOS........................................................................................................ 110 7 8 1. INTRODUÇÃO Edla Van Steen inicia a entrevista a Cyro dos Anjos pedindo que traçasse um perfil em poucas palavras. Para o escritor mineiro, trata-se de um pedido difícil já que sua descrição abarcaria as transformações do indivíduo no tempo. Nessa entrevista, o perfil sintético de Cyro dos Anjos retoma a característica básica de seus narradores que, assim como o escritor mineiro, são analistas e autocríticos: “Investigo-me, estraçalho- me. Para resumir: sou um anti-Narciso.”1 Mesmo fazendo ressalvas quanto à descrição de um perfil na entrevista, é possível perceber que Cyro dos Anjos se apresenta sob uma perspectiva biográfica, informando ao leitor quais são os processos de criação do romance, seu vínculo com a escrita jornalística e o serviço público, sua aproximação com o grupo de intelectuais mineiros liderado por Carlos Drummond de Andrade ou com políticos do Estado Novo no trabalho em gabinetes. O escritor se define a partir das instituições que serviram de origem ou que deram condições materiais para efetivar a sua produção literária. A imagem ambivalente do escritor como funcionário público da ditadura estadonovista, no plano biográfico, faz parte da composição de seu romance de estreia. Os amigos de Cyro dos Anjos perceberam que suas crônicas nos jornais A Tribuna e Estado de Minas pareciam compor um romance em fragmentos. A insistência desse boato despertou sua vontade de escrever, mas as tarefas no serviço público dificultavam a escrita literária. Além de escrever para vários jornais de Belo Horizonte em 1930, Cyro dos Anjos trabalhou como funcionário público em gabinetes de políticos – os do governador de Minas Gerais, de secretários, ministros e presidente da República –, foi professor universitário e ocupou cargos burocráticos no Tribunal de Contas do Distrito Federal a pedido de Juscelino Kubtischek. O escritor dedicava pouco tempo à literatura em comparação com a sua atividade como ghost-writer no Estado, escrevendo entrevistas e discursos políticos. Publicado em 1937 pelo próprio autor, O amanuense Belmiro foi concluído quando Benedito Valadares, governador do Estado de Minas Gerais, foi a Poços de Caldas para receber o presidente Getúlio Vargas. Cyro dos Anjos, que escrevia apenas nos dias de folga ou nas férias, liberou-se do trabalho como oficial 1 ANJOS, 1982, p. 13. 9 de gabinete do governador por trinta dias, finalizando o seu primeiro romance memorialista. A recepção crítica compara, inicialmente, a escrita de Cyro dos Anjos à tradição machadiana. Eduardo Frieiro2 é o primeiro crítico que aproxima os autores citados ao observar o “senso de humor” como característica comum, diferenciando apenas Belmiro da visão desencantada presente no narrador de Quincas Borba. Seguindo a crítica de Frieiro, Otávio Tarquínio3 destaca a influência de Machado de Assis nos planos temático e estilístico da obra de Cyro dos Anjos. Em “Poesia e ficção na autobiografia”, Antonio Candido identifica as nuances da autobiografia, poética e ficcional, que apresenta uma espécie de “dupla leitura”, ou “leitura de dupla entrada”, podendo ser lida como recordação, como documento da memória ou como obra criativa. O artigo define o autor mineiro como “memorialista de elevado teor literário”, com elaboração estilística e evidente objetivo autobiográfico. A escrita de Cyro dos Anjos estaria, assim, mais próxima de Machado por sua elaboração estilística e literária do romance de memórias. Contudo, ao realizar uma breve historiografia da produção literária em Minas, no século XVIII, o crítico lembra que essa literatura surgiu “com um acentuado cunho de universalidade; e o fato dos mineiros gostarem de literatura em primeira pessoa, em particular, a autobiografia”4. Nesse sentido, é possível observar que Cyro dos Anjos se filia também à tradição memorialista mineira, que inclui autores como Carlos Drummond de Andrade e Pedro Nava. Na entrevista, Cyro dos Anjos afirma que procurou estabelecer uma amálgama da realidade de dentro com a de fora, distraidamente observada e transfigurada, ao compor o