Mulheres Na Aviação: Menos Pose, Mais Ação Women in Aviation: Less Posing, More Action
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January-June 2014 • Volume 5 • Number 1 • p. 25-37 ORIGINAL ARTICLE Open Access http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/aviation : http://dx.doi.org/10.15448/2179-703X.2014.1.18536 Mulheres na aviação: menos pose, mais ação Women in aviation: less posing, more action Patrícia Almeida de Rezende1, Thainá Marinho da Silveira2 1 Mestre em Linguística Aplicada. Técnica Administrativa na Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), Rio de Janeiro, RJ, Brasil. [email protected] 2 Estagiária na na Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), Rio de Janeiro, RJ, Brasil. [email protected] RESUMO Apesar da participação crescente da força de trabalho feminina na aviação, a representação midiática da mulher nessa área é tendenciosa e utiliza-se de uma linguagem carregada de estereótipos. No presente trabalho são demonstrados alguns recursos imagéticos e linguísticos de manutenção desses estigmas sociais. Os resultados deste estudo evidenciam o uso de uma linguagem que reforça a assimetria na participação de homens e mulheres no mercado de trabalho e favorece determinado perfil profissional em detrimento de outros, bem como de imagens não condizentes com a situação real da mulher atuante na indústria aeronáutica nos tempos modernos. PALAVRAS-CHAVE: Mulher na aviação; Imagens midiáticas; Linguagem e cultura ABSTRACT Despite the growing participation of the female labor force in aviation, the media representation of women in this area is biased and uses a language full of stereotypes. In this paper we demonstrate some imagistic and linguistic resources for maintaining those social stigmas. The results of this study suggest the use of a language that consolidates the asymmetry between men and women in the market and favors certain professional profile at the expense of others, as well as images which are not consistent with the real situation of women in the aeronautical industry nowadays. KEYWORDS: Woman in aviation; Media images; Language and culture Pontifical Catholic University of Rio Grande do Sul Corresponding Author: Porto Alegre, RS, Brazil Patrícia Almeida de Rezende [email protected] Editor Thaís Russomano Received: September 11, 2014 Microgravity Center PUCRS, Brazil Accepted: November 13, 2014 Executive Editor © 2014 EDIPUCRS Rafael Reimann Baptista Faculdade de Educação Física e Ciências do Desporto, PUCRS, Brazil This work is licensed under a Creative Commons-Attribution 4.0 International. e-ISSN: 2179-703X http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/ ORIGINAL ARTICLE Rezende PA, Silveira TM – Mulheres na aviação 1 Introdução como força de trabalho secundária presente no imaginário social, empresarial, sindical e da própria Sabe-se que nos últimos dez anos a mulher está mulher, bem como na formulação das políticas públicas, cada vez mais presente no mercado de trabalho, tanto constitui elemento de subordinação de gênero e não em países desenvolvidos como em desenvolvimento. condiz com a realidade da presença feminina no Aparentemente, conforme assinala Probst (2003: 1), mercado. Certamente a posição da mulher na aviação o mundo anda apostando em profissionais do sexo reflete a “subvaloração social e econômica do papel da feminino cujo perfil inclui a multifuncionalidade, mulher na sociedade”, colocada nos termos de Abramo a capacidade de trabalho em equipe, a persuasão (2007: 8). e a cooperação. Hoje elas ocupam altos postos nas Consta que a primeira mulher na história da aviação grandes empresas e até pilotam jatos, embora ainda a receber licença para pilotar foi Raymond de Laroche, haja desigualdade salarial entre homens e mulheres em 1910, tendo sido também a primeira mulher a (Barboza, 2014: 62-63). fazer um voo solo, em Paris, no mesmo ano (Stochero, Segundo Probst (2003), apesar da participação 2011). Mais tarde, a norte-americana Amélia Earhart feminina representar um número significativo no aventurou-se a atravessar o oceano Atlântico em voo mercado, somente 24% das mulheres ocupam cargos solo (Zwerdling, 2013). Desde então um número cada superiores e recebem apenas 71% do salário dos vez maior de mulheres vêm-se inserindo nos mais homens. Parece que esse percentual geral de mulheres variados setores da aviação, inclusive como avia- no mercado mantém-se em cada ambiente corporativo doras no comando de aviões e helicópteros em todo isoladamente. Por exemplo, de acordo com dados da o mundo. Controladoria Geral da União1, cerca de 26% do total atual de cargos comissionados nas funções de assessor, 1.1 Mulher brasileira gerente, diretor e demais funções de liderança da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) são A entrada da mulher como piloto na aviação ocupados por mulheres. Se considerarmos apenas os brasileira deu-se na década de 30. Entre as pioneiras concursados (situação ativo permanente), o percentual da aviação no Brasil destacam-se a aviadora acrobata de mulheres nomeadas para cargos comissionados é Joana Martins Castilho D’Alessandro (1924-1991), ainda menor, em torno de 17%. Um levantamento Thereza de Marzo (1903-1986), possivelmente a das nomeações divulgadas no Diário Oficial da União primeira a receber o brevê (licença e habilitação), de janeiro de 2011 até agosto de 20142 indica que o em 1922, Anésia Pinheiro Machado (1904-1999), percentual total de mulheres nomeadas na ANAC segunda a receber o brevê no mesmo ano, e Ada Leda nos últimos três anos está em torno de 28%. Por Rogato (1910-1986), primeira mulher a obter licença conseguinte, qualquer que seja a instância considerada, como paraquedista, a pilotar um planador e a terceira vê-se que há um desequilíbrio no percentual de homens a possuir o brevê em avião. Ada Rogato também se e mulheres em cargos de liderança. notabilizou por suas acrobacias aéreas e por ter sido a De acordo com Abramo (2007: 7), é fun- primeira piloto agrícola do País, bem como a primeira damental desvendar os mecanismos que repro- a cruzar a floresta amazônica em voo solo, num avião duzem essas desigualdades. A autora informa que, de pequeno porte, sem rádio (Rodrigues & Lima, 2009; no Brasil, as mulheres representam mais de 40% Zwerdling, 2013). da população economicamente ativa, são mais Em 2006, formou-se a primeira oficial aviadora na escolarizadas e têm participação maior que 50% Força Aérea Brasileira (FAB). Atualmente a FAB conta no mercado, embora persistam as desigualdades com mais de 20 mulheres no comando de aeronaves, de rendimento por hora trabalhada em relação aos inclusive as de grande porte, que atuam principalmente homens, principalmente nas faixas superiores de no transporte de tropas e na busca e salvamento. Desde escolaridade(Abramo, 2007: 6). 2011 há relatos de voos comerciais pilotados por A despeito da participação maciça da mulher no mulheres com uma tripulação inteiramente feminina mercado de trabalho, pelo menos no âmbito da aviação no Brasil, constituída de piloto, copiloto, chefe de a mulher ainda tem muito o que conquistar. Conforme cabine e comissárias, conforme relatado por Stochero assinala Abramo (2007. p. 3), a situação da mulher (2011). Esses voos, entretanto, apenas são reportados na mídia associados a ocasiões especiais, como o Dia 1 Dados obtidos pelas autoras deste artigo em agosto de 2014, em Internacional da Mulher, como estratégia inovadora consulta ao Portal da Controladoria Geral da União. de marketing das companhias aéreas, dada a raridade 2 Dados obtidos pelas autoras deste artigo em agosto de 2014, em consulta ao Portal da Imprensa Nacional. com que ocorrem. Aviation in Focus 2014; 5(1): 25-37 26 ORIGINAL ARTICLE Rezende PA, Silveira TM – Mulheres na aviação Segundo divulgado por Peng (2010) e Stochero O Corpo Feminino tem muitos usos. Tem sido (2011), com base em dados do Portal de Transparência usado como aldrava, abridor de garrafa [...]. Vende da ANAC, a cada ano aumenta consideravelmente carros, cerveja, loção de barbear, cigarros, bebidas alcoólicas; vende planos de dieta e diamantes, e a participação feminina na aviação. Em 2009 foram desejos em pequenas garrafas de cristal. É essa a expedidas 44 licenças para pilotos do sexo feminino no face que lançou mil produtos? Brasil, sendo 35 para piloto privado, oito para piloto comercial e uma para comandante de linha aérea – 1.2 Sobre as representações midiáticas o nível masl alto da carreira na aviação civil, para o qual são necessárias pelo menos 1.500 horas de voo Partindo do ponto de vista de que o discurso (Stochero, 2011). No ano seguinte, esse número de estímulo ao consumo, ao mesmo tempo em que quadruplicou, tendo sido expedidas 193 licenças de reflete os padrões de consenso, consolida os valores da piloto para mulheres: 51 de piloto privado, 65 de modernidade-mundo, Trindade (2005: 81-95) admite piloto comercial e 15 de piloto de linha aérea (Peng, que a propaganda e a publicidade podem constituir-se 2010). Somem-se a essas, outras 32 licenças emitidas em importantes instrumentos de inclusão ou exclusão para mulheres pilotos de helicóptero em 2010 (Peng, social. Para tanto, conforme afirma o mesmo autor, 2010). A Polícia Militar atualmente conta com mais a publicidade faz uso intencional da combinação de de 30 mulheres no comando de helicópteros, além vários signos, verbais e não verbais (imagens), que das que cuidam de assuntos administrativos e atuam contribuem, em última instância, para o processo de na assistência às operações de patrulha aérea e de mundialização das culturas. resgate e salvamento (Ferro et al., 2013). Na visão de Em seu estudo sobre a função da fotografia na Stochero (2011), a tendência é que novos recordes sociedade, Buitoni (2011) afirma que, no Brasil, desde sejam alcançados nos próximos anos. os anos 1900 deu-se o início do casamento entre a Em princípio, nada impede que a mulher exerça fotografia e a mídia impressa com o lançamento da qualquer atividade na aviação. De fato, tanto o conceito Revista da Semana no Rio de Janeiro. Segundo a de mulher associado à fragilidade quanto os papéis autora, para entender como a fotografia transforma sociais normalmente atribuídos à mulher vêm sendo a cultura humana é preciso desenvolver uma forma questionados.