OPresidente de importânci deste livro. est a, a' medida d destagran e questão · t ULMEIRO - Editora [[) ULMEIRO ORliAos DE PODER POPULAR AEXPER1tNc1A DE MATANZAs

A VCNOA DISTRIBUIDORA NAS LIVRARIAS o SECULO Director: Natália Correia ELEIÇÕES: Caderno Especial Chefe de Redacção: p.,111 1'1 Figueira A eleição do novo Presidente da República domina, como é natural, este s11bchefe de Redacção: nl.mero da "Vida Mundial". Num caderno Carlos Plan tier esoecial, que ocupa metade da revista (pãgs. 17 a 48), incluímos, além da reportagem Secretário de Redacção: completa do acto eleitora l, um coniunto de M. Manuela de Sousa Rama análises que ajudam a situar o perfil humano ideia aproximada da fidelidade dos votantes e político do novo Presidente. às indicações dos respectivos partidos. REDACÇÃO: Completando o serviço "especial Ainda sobre o tema das eleições, duas Afo nso Manta, Carlos Pinto Coelho, Dórdio eleições", inserimos ainda uma retrospectiva seCÇões habituais ("Os que r iem e ... os que Guimarães, Feliciana Ferreira, F. Guerra. dos anteriores actos eleitorais e uma análise choram" e "A la minuta") e um anedotário João de Almeida, José Machado, Jos ,~ comparativa dos resultados das presidenciais - porque, mesmo em matéria de eleições, N. Fernandes, Tomás Ribas e das legislativas - o que permitirá uma "tristezas n§o pagam dívidas" ...

fotografia: Abel Fonseca AS LEIS EM REVISÃO Secretariado: ~faria Manuela Andrade O País tem uma nova Constituição. Modificada a lei básica, fundamental da Colaboradores: Nação, todo, ou quase todo, o direito A.C. Monteiro, Egídio Álvaro (Artes Plásti­ vigente tera de ser revisto. São primeiros cas), João Costa (Economia), Jorge Guima­ objectos dessa revisão o Direito da Família e rães (Livros), Philipe de Saint-Robert a Lei Penal, para o que se constitu Iram já (Paris), Sérgio Lima (Televisão) comissões de reestruturação. Sobre o projecto de reforma do Direito Preço: 15 SOO Penal, "VM" falou com o dr. Figueiredo Dias, professor da Faculdade de Direito de Assinaturas: e um dos responsáveis peta revisão em curso. (Pág. 3) Via ord imir ia Continente e Ilhas - 3 meses: 175$50, 6 meses: 351 SOO , 12 meses: 702$ 00; Angola, Moça~bique, Cabo Verde, S. Tomé e Pr(nci­ pe, Macau, Timor, Espanha e Brasil - 6 meses: 351$00, 12 meses: 702$00; o utros sumário pa(ses - 6 meses: 455$00, 12 meses: 91 0SOO. A lei penal em revisão ...... 3 Os surdos ...... 8 !- Via aérea O contradicionista ...... 9 12 meses: Ilhas Adjacentes - 764$00; An­ Imprensa: o n6 do problema ...... 10 gola, MoçambiAue, Cabo Verde, S. Tomé e Energia atómica: sim ou não? ...... 13 Príncipe, Macaµ e Timor - 1201 SOO; Es­ Caricatura: convite à "balsa" ...... 16 panha - 7 64 S 00; Brasil - l 284 S 00; pa(ses europeus (excepto Espanha) - 1034 SOO ; ESPECIAL ELEIÇÕES ...... 17 outros países - 1493$00. Bolchoi: 200 anos ...... 49 Redacção e Administração: Mu seu da Nazaré ...... 50 Rua de "O Seculo'', 63 - Telef. PBX Música: "pop" e drogas ...... 51 36 27 5115. Cinema ...... 52 Composição e Impressão: O baile dos bombeiros ...... 56 Rua de "O Seculo", 41 - Lisboa-2. A África tem medo ...... 58 Propriedade: Economia: medida errada ...... 63 Sociedade Nacional de Tipografia. Multinacional chinesa? ...... 64

Sai às quintas-feiras. 1 ALFREDO COELHO CUNHA, de 22 anos, lni· ciou a sua profissão em "O Seculo Il ustrado", cm 1972. Colaborou tam­ bém na "Vida Mundial" e na revista ºMulherH. Em 197 3, foi galaidoado co m o prémio Joshua Be­ nolicl, de reportagem fo. tográfica, instituído aos repórteres fotográficos da Sociedade Nacional de Tipografia. Esta é a segunda edi-' ção do seu livro "Vidas . Alleias".

2 Justica flgueiredo Dias: .. CRIMES POLITICOS NAO SAO OMESMO QUE ACTOS TERRORISTAS'' Mudam os tempos, as vontades. As estruturas, as instit uições. do Código Penal foi, então, encarrega­ A sociedade e os seus sustentáculos. Como a Lei. do o professor Eduardo Correia, qúe Lei b.ásica, fundamental, Portugal tem já, conquista do 25 de apresentou, entre 1963 e 1966, o projecto da parte geral e da parte Abril, uma nova Constituição. O Direito de Família, o Direito especial do novo Código. Este projecto Penal virão.a seguir. não viria, porém, a encontrar aprova­ Sobre a revisão da legislação penal, em curso desde princípio ção por parte do Governo. O Código de Maio último, a "Vida Mundial" contactou o professor de 1852 continuava, essencialmente, Figueiredo Dias, um dos seus principais responsáveis. em vigor. "Usando da autorização concedida ao Governo pelo artigo quinto da Carta de Lei de 14 de Junho de 1884: hei por bem, em nome de El-Rei, aprovar, para todos os efeitos, a nova publicação oficial do Código Penal, que com este baixo assinado pelo ministro e secretário de Estado dos negócios eclesiásticos e de justiça." Foi em resultado desta autorização que o Governo promulgou o decreto de 16 de Dezembro de 1886, que aprovou a nova publicação oficial do Código Penal. O Código Penal Português foi aprovado por decreto de 10 de Dezembro de 1852, contendo 489 artigos, distribuídos por dois livros. Em 1867, uma refonna penal e prisional altera profundamente o siste­ ma das penas de Código, com particu­ lar relevo para a abolição da pena de morte, que se mantém, todavia, na legislação penal militar. Em 1884, uma proposta de lei, da autoria de Sampaio "Na minha opinião, o sistema que A crescente intervenção do Estado e Melo, vem dar origem à Nova propõe o uso de menor severidade na vida social vem, entretanto, aumen­ Refonna Penal. Assim, a redacção para o crime polltíco não pode ser tar assustadoramente a proliferação de fundamental do nosso actual Código usado quanto aos actos terroris· leis penais - avulsas - que alteram, em Penal é a do Código de 1852, com a tas" parte, a Lei Penal, sem nunca virem a nova publicação oficial de 1886, em troduzidas. Em 1961, a proliferação de ser sistematizadas, englobadas numa que· foram introduzidos os princípios ambas viria a fazer sentir a necessidade refonna de conjunto. A aplicação da da Nova Reforma Penal de 1884. de um novo Código, que sistematizas­ lei pelos tribunais torna-se cada vez Muitas leis avulsas, várias refonnas se, eficientemente, a Lei Penal. Da mais difícil e morosa. Finalmente, o , parciais foram, entretanto, sendo in- elaboração de um projecto de refonna 25 de Abril, com todas as profundas / 3 Justica- ; transformações estruturais e conjuntu­ foram acompanhados, motivo por que ' rais que imprime à sociedade portugue­ hoje se encontra muito desactualizada. sa, vem a exigir, inapelavelmente, a Acresce que o aumento da criminalida­ reestruturação da lei mestra da maté­ de em todos os países - Portugal ria. incluído - se deve, em boa parte, à Em 4 de Maio do ano corrente, uma criminalidade de menores, que, infeliz. comissão constituída pelos professores mente, como sabem, aumentou de Eduardo Correia e Figueiredo Dias e forma extraordinária. pelo consellleiro do Supremo Tribunal Um outro ponto sobre o qual de Justiça, dr. António Miguel Caseiro, incidirá, também, a reforma é o regime são recebidos pelo ministro da Justiça, prisional, ou, de uma forma mais lata, dr. Pinheiro Farinha, e pelos Secretá­ haverá que fazer uma nova lei de rios dos Assuntos Judiciários e da execução da pena, a qual substituirá a Recuperação Social. O encontro cons­ nossa reforma prisional, que, embora tituía a primeira reunião de trabalho proveniente da ditadura, era uma lei da comissão encarregada da revisão da muitíssimo bem feita e extremamente legislação penal. progressiva, da autoria do prof. Beleza Sobre os principais objectivos dessa dos Santos, que hoje está, 40 anos reforma, sobre o que poderá vir a ser o volvidos. evidentemente ultrapassada. novo Código Penal Português, ouvimos o professor doutor Figueiredo Dias, da " i; IMPORTANTE DIVERSIFICAR Faculdade de Direito de Coimbra. O ARSENAL POLITICO" membro da comissão de revisão. V.M. - Poderá, desde já, indicar-no!> V .M. - Falou de aumento enorme quais serão os principais pontos de cri minalidade. Em sua opinião, que visados pela reforma? medidas poderão pôr travão a esse F .D. - Ainda não existe um plano aumento, agora que a Lei Penal está a muito claro, neste momento. o ser revista? "Factor que reputo de maior entanto, algo vos posso dizer sobre o F.D. - Parece-me importante, antes importância no agravamento da assunto: numa tentativa de reforma da de· tudo, fazer uma distinção: o criminalidade é a falta de controlo Lei Penal, é evidente que o objectivo problema político da criminalidade - que existe, de hã pouco, em primeiro é o Código Penal, espécie de não confundir com criminalidade polí• relação às armas de fogo" lei mestra da matéria. Simplesmente, tica - é, fundamentalmente, um existe, entre nós, muito desenvolvido, problema daquilo que nós chamamos arsenal político. Portugal, não sei o costume de fazer leis independentes criminalidade violenta, real, efectiva. cxactamente porquê, teve sempre uma daquele - a legislação avulsa ou que acarreta intranquilidade para as certa propensão para se manter na extravagante. Essas leis, aos milhares, pessoas. Eu creio que, se pudermos primeira fila mundial dos meios de serão, agora, também, objecto de fazer a "descriminalização" de certas combate à criminalidade: no século reformulação. actividades laterais, é possível dirigir os XIX,. a nossa ciência penal, como a Para além disto, existem, ainda, dois meios policiais com maior eficácia. Em nossa ciência penitenciária, eram das pontos fundamentais: o primeiro é o suma, primeiro que tudo é preciso, mais avançadas do mundo e a legisla­ Código de Processo Penal, um dos com tanta urgência ou maior ainda que ção sobre menores, 1911, de que já códigos mais profundamente tocados a reformulação da própria legislação falámos, seguiu-lhes as passadas. Deixá­ por qualquer alteração constitucional, penal, reformular a estrutura e a mo-nos agora, infelizmente, ultrapas­ quanto mais por uma nova Constitui­ orgânica dos chamados órgãos de sar. Como penas temos hoje, unica­ ção, como é o caso, neste momento, controlo social, nomeadamente as mente, a prisão, a multa, e quase mais entre nós. Quanto a este, é quase fatal polícias. É preciso dirigi-las contra nada, enquanto lá fora se ensaiam. a necessidade de se elaborar um novo. aquilo que causa a intranquilidade das constantemente novas formas de com­ O segundo diz respeito à delinquên­ pessoas, contra o crime violento, bate ao crime: prisão aos fins-de-sema­ cia de menores. Esta oportunidade sefá procurando aproveitar, o melhor possí• na, por exemplo. aproveitada, ainda, para reformular a vel, os meios que se tem à disposição. Por outro lado, parece-me funda­ legislação relativa a menores delin­ Um segundo ponto que também me mental - e espero que seja essa a quentes. Devo dizer, aliás, que Portu­ parece: muito importante é o da característica mais marcada da reforma gal tinha, em 1911 , quanto a esta investigação científica do fenómeno que processamos - atentar em que a matéria, uma legislação extremamente do crime, infelizmente em estado pena de prisão está julgada e condena­ progressiva, uma das mais progressivas rudimentar no nosso país. da pela História, embora ainda se não do mundo. Sõ que o seu desenvolvi· Reputo também de muita importân• saiba como substituí-la integralmente e mento e progresso posteriores não cia diversificar e sofisticar o próprio continue a ser um mal necessário. 4 'l :· ' .. "i/(f. t ~ Aliás, há séculos atrás, também não se A nossa atenção vai debruçar-se. mal se sabe qual a legislação revogada e sabia como substituir os suplícios do fundamentalmente, como é evidente. qual a que está em vigor. É urgente, potro e do fogo, o decepar dos sobre o Código Penal e as chamadas pois, que possa ter-se uma visão de membros ou a exposição no pelouri­ leis complementares, portanto essa lei conjunto. Não sei qual a orientação nho. Por enquanto, tenho, pelo menos, de menores delinquentes e, provavel­ que a comissão terá em mente, mas, na a esperança de que a comissão se mente, ainda, sobre uma lei geral que maioria dos países nos quais se têm orientará não só no sentido de possa congregar toda a legislação processado reformas deste tipo, a melhorar as condições de cumprimen­ extravagante de que já falámos e que, técnica geralmente utilizada é a seguin­ to da pena de prisão mas, sobretudo, sobretudo de há uns anos para cá, te: marca-se aquilo que nós chamamos no sentido de limitá-la, na sua durante os quais o Estado intervém uma longm "vacatio legis" - período aplicação, através da utilização de mais directamente na vida social, tem que decorre entre a promulgação e a outros meios, como, por exemplo, o crescido extraordinariamente. "A casa entrada em vigor de uma lei. Na Suíça sistema anglo-saxónico da "proba­ está muito desarrumada", até porque, e na Alemanha Federal, por exemplo, tion", ou cumprimento da pena em nos últimos anos do regime anterior, optou-se por um período de cinco liberdade, orientada por um assistente fizeram-se algumas alterações à legisla­ anos. Com este longo espaço intermé­ social especializado, que tem provado ção penal e do Processo Penal, mas que dio, pretende o legislador que, entre­ muito bem em experiências tentadas. nunca foram englobadas numa reforma tanto, se vá procedendo às outrás Simplesmente - e uma vez mais - de conjunto. Desta forma, a situação reformas consideradas necessárias. Será tudo isto implica uma profunda tornou-se muito complicada para a essa, provavelmente, a técnica a alteração de estruturas, com a forma­ aplicação da lei e, não poucas vezes, adoptar entre nós. ção, neste caso, de assistentes sociais V.M. - Encara-se a hipótese de especializados. Esperemos que o Minis­ "O aumento da criminalidade elaboração de um novo Código Penal? tério da Justiça providencie nesse deve-se, em boa parte, à criminali­ F. D. - Será praticamente inevitável sentido, pois parece-me uma condição dade de menores" e compreensível. Por várias razões. Em sine qua non de êxito do futuro primeiro lugar, um Código Penal é Código Penal. constituído por uma parte geral, mais Aliás, a grande vantagem deste técnica, com menos interesse para o sistema de penas não institucionais - público, que procura traduzir o estado que não se cumprem numa instituição científico de aproveitamento da ciên­ - para além de outras, até económicas cia do Direito Penal, e por uma parte - pois é um sistema que sai incompa- especial, onde estão "desenhados", ravelmente mais barato ao Estado -, descritos, os diversos crimes. Esta reside justamente no facto de facilitar segunda parte do nosso Código Penal, em extremo a recuperação social do ainda hoje essencialmente em vigor no delinquente, não o retirando da nosso país, data de 1852. Pode influência da sociedade. argumentar-se que essa parte é a Por fim, e como factor que reputo tradução, aliás pouco feliz, do Código da maior importância no agravamento Penal Napoleónico de 1810, que ainda da criminalidade, a falta de controlo vigora em França. De qualquer forma, que existe, de há pouco, em relação às não pode haver dúvidas de que é um armas de fogo. É necessário, imprescin­ código extremamente desactualizado, dível, que ele volte a existir. E em particular no que toca às relações urgentemente. sociais, que têm hoje uma complexida­ de impossível de comparar com as " A CASA ESTÁ existentes em meados do século XIX. MUITO DESARRUMADA" Por outro lado, é evidente que o Movimento do 25 de Abril, com todas V.M. - Falar de um plano em as suas repercussões, todas as transfor­ relação à revisão é ainda prematuro, mações que operou na sociedade não é verdade? portuguesa, exige uma reestruturação F .D. - Segundo uma reunião que radical da segunda parte do Código tivemos com o senhor Ministro da Penal. Um dos aspectos que, por Justiça, há alguns dias, fomos por ele exemplo, surge desde logo, no espírito informados que uma comissão estava das pessoas, é o que diz respeito aos encarregada de elaborar o projecto do crimes políticos. Do mesmo modo, os chamado Código de Instituição Crimi­ "crimes de perigo comum", isto é, a nal, ou seja, uma parte do futuro possibilidade de criar perigo para a ' Código do Processo Penal. sociedade através, nomeadamente, da / 5 Justiça

1 utilização da energia atómica, de certas contra a segurança do Estado". Será V.M. - Quanto às estruturas prisio­ praticar abortos mas, tão-somente", que :, fonnas sofisticadas da industrialização. assim? nais, parecem-lhe carentes de grandes aqueles não serão puníveis se pratica­ Estes são assuntos que, pela sua F.D. - Efectivamente, assim é. A modificações? dos por médicos e em instituição gravidade, num país que se pretende parte do Código Penal que diz respeito F .D. - Embora não tenha um própria.) A resposta não é fácil de dar. em transição para o socialismo, neces­ à criminalidade política não pode ser a conhecimento muito pormenorizado Outra hipótese será, pelo menos, sitam um tratamento muito diferente mesma num país democrático e num . do assunto, posso dizer-lhe que a tornar clara uma ambiguidade funda­ do que se lhes poderia dar há alguns país não democrático, numa forma de execução da pena, de uma maneira mental que existe no nosso direito e anos atrás. governo democrático e numa forma de geral - não falo, evidentemente, dos que consiste em definir se o aborto Para além de tudo isto, há outros governo não democrático. Não quero criminosos políticos, que eram entre­ terapêutico é ou não um crime, em problemas do conhecimento público com isto dizer que democracia possa gues a instituições especializadas - , Portugal. Sobre este ponto não restam que será bom rever, como sejam os significar eliminação pura e simples da nas principais penitenciárias, não con­ dúvidas de que não poderá, nem relacionados com a sexualidade, a criminalidade política. A democracia, tinha certas fonnas de cumprimento deverá, ser classificado como tal. O criminalização ou não do aborto, e costuma dizer-se, afirma a liberdade de penas particularmente duras, comó primeiro problema . - liberalização outros, impostos pela Constituição, mesmo quando a nega, isto é, mesmo acontece na maioria dos países euro~ total - é de muito maior complexida­ nomeadamente o tratamento igualitá­ quando a nega aos adversários da peus. Recordo uma visita que fiz, há de. A comissão pronunciar-se-á oportu­ O Tormento do Fogo. Gravura do rio da mulher e do homem, nem própria ideia democrática, pois ela, em 0 crime político não pode ser usado alguns anos, à única prisão aberta da namente sobre ele. sempre respeitados pelo antigo Código suma, tem de defender-se dos seus século XVI. quanto aos actos terroristas - tem que Alemanha Federal, a Gustav Radle­ V.M. - Voltando à reforma nesté Penal - recordamos, por exemplo, a inimigos. Por conseguinte, na legisla­ Definitivamente julgadas e conde· seguir a lei comum, se não sofrer, ruch's Haus, em Francoforte. Nela momento em curso, sob o ponto de nadas pela História, as torturas ção de todos os países democráticos se mesmo, qualquer agravan1ento. pude observar células disciplinares vista da sua execução prática, como irá delinquência sexual, punida de forma físicas não pareciam, séculos discriminatória em função do sexo. prevêem os crimes contra a própria atrás, passíveis de substituição muito mais duras do que as que aqui funcionar a comissão dela encarrega­ V.M. - O vosso plano de reestrutu­ democracia. Só que os crimes contra o "ASSOCIAÇÃO DE MALFEITORES": temos, como uma alimentação absolu­ da? ração inclui, portanto, desde já, um Estado democrático não são os mes­ delinquente pune-se não só para lhe UM SACO VAZIO tamente imprópria para seres huma­ F .D. - O prazo previsto para a sua projecto de novo Código Penal? mos que contra um Estado ditatorial, fazer sentir a sua culpa mas, sobretu­ nos. execução é de seis meses, durante os F.D. - Principalmente isso. Estamos reflectidos claramente no nosso Códi­ do, para recuperá-lo, socialmente. V.M. - Houve, nos tempos do Um aspecto em relação ao qual terá quais a comissão reunirá duas vezes a começar por aí. Tomado como base go Penal, uma vez que as normas a eles Talvez com razão, há quem entenda gonçalvismo, uma "figura" de que se que haver grande modificação é o que por semana. Estou convencido que, do nosso trabalho o projecto apresen­ respeitantes não eram já as de 1852 - que este ponto não tem aplicação no usou e abusou, sempre que se preten­ diz respeito aos direitos do recluso: dentro de pouco tempo, teremos tado, em 1963, pelo dr. Eduardo portanto provenientes do liberalismo que diz respeito ao crime político: deu imobilizar alguém, ao sabor das contactos com advogados, recepção de terminado a revisão da parte geral do Correia, a nossa missão é, antes de - mas, na sua maior parte, feitas no aqui não há marginais, há actuantes conveniências do momento - a "asso­ familiares, segredo de correspondência, Direito Penal e passaremos à especial. mais, revê-lo do princípio ao fim. período ditatorial · de Salazar. Por por convicção. A pena não deveria, ciação de malfeitores". Este conceito etc. É necessária uma maior preserva­ Pôr-se-á o problema, então, de saber se V.M. - Existia, na legislação penal conseguinte, essa é uma parte a ser portanto, ter um carácter de mal, de irá manter-se, pelo menos da forma tão ção dos seus direitos fundamentais. a nova organização económica do País portuguesa, um único caso de pena de reformulada: ponto por ponto. castigo, mas apenas de segurança. desprovida de conteúdo, como antiga­ Outras ideias novas deverão ser consi­ deve já reflectir-se se, porventura, morte, a aplicar em tempo de guerra e V.M. - Mantendo-se, muito embo­ Daqui o tratamento excepcional, me­ mente? deradas. Estou a lembrar-me das existir, nessa altura, uma organização "no próprio teatro da guerra", nas . ra, os conceitos de crime político, de nos duro, a aplicar ao criminoso F.D. - Devo dizer-lhe, antes de células para casais, por exemplo, dos económica, entenda-se. palavras da lei. Mantém-se tal disposi­ criminoso político? ... político. mais, que a intenção com que se falava países nórdicos, onde aqueles se Há ainda um aspecto, muito impor­ ção? F.D. - Sim num sentido e não Qualquer dos sistemas poderá, futu­ nessa época da "associação de malfei­ encontram certos dias; como do tante, a ter em consideração: a nova F.D. - Esse problema tem de ser noutro. O que eu quero dizer com isto ramente, ser adaptado. O que esta tores" não estava, de maneira nenhu­ problema sexual dos detidos, de tão Constituição da República Portuguesa ·encarado ao nível da reforma da · é o seguinte: por vezes, a conotação comissao não aceitará, de forma ma, de acordo com o conceito contido graves implicações, nomeadamente nas afirma que a definição das penas-tipos legislação penal militar, uma vez que que se dava ao crime político consistia alguma, será qualquer forma de trata­ no nosso velho Código; era preciso prisões de menores. · crime é da competência exclusiva da aquela matéria foi reservada ao poder em submetê-lo a um regime de mento discriminatório que desfavoreça alargar, de fonna ilegítima, aquele, Assembleia da República. A partir militar. Está, portanto, fora do nosso excepção. Repare-se, por exemplo, que o criminoso político. para transformá-lo numa bolsa onde O ABORTO i: UM CRIME? daqui, as coisas poderão passar-se de .âmbito. Todavia, creio que essa dispo­ eles eram praticamente os únicos a que Convém, no entanto, fazer aqui uma cabiam todos os inimigos políticos do três formas: o nosso projecto de sição deverá, hoje, ser inconstitucional, se aplicavam medidas de segurança, distinção, ·que me parece fundamental, regime gonçalvista. ' · · ,. V.M. - No âmbito do nosso actual Código Penal pode ser apresentado uma vez que o problema foi considera­ apesar de o delinquente ser imputável. entre os crimes políticos em sentido O problema que põe é importante Código Penal, o aborto é considerado pelo Governo à Assembleia, pode ser do, especificamente, pela Assembleia Isto desapareceu logo após o 25 de estrito - os crimes contra a ordem porque corresponde a um fenómeno crime e, como tal, punido por lei. Será tomado por um ou mais partidos que Constituinte, a qual decidiu que a Abril. Agora, o crime político não será democrática - e os que se conhecem cujo tratamento é difícil e que pode de admitir, num futuro Código, tal decidam apresentá-lo à Assembleia ou proibição absoluta da pena de morte mais do que uma parte do crime vulgarmente por "actos terroristas" - colocar-se em relação a outras figuras discriminação? pode ocorrer uma terceira hipótese abrangia também este caso, deixando, comum, não deve ter nenhum regime isto é, crimes subjectivamente políti• como a de "vadio'', "mendigo", F.D. - O Ministério da Justiça que consistirá no pedido por· parte do portanto, de existir qualquer vestígio especial nem ser julgado em tribunais cos, cuja finalidade é política mas que "prostituta", "rufião'', o que pratica apresentou, recentemente, sobre o Governo à Assembleia no sentido de daquela na Lei portuguesa. especiais. A não ser que se considere - surgem como crime comum. Como "actos contra a natureza". A minha aborto dados estatísticos que compu­ esta conceder uma autorização especial e isso será uma questão a discutir - deve ser tratado este tipo de crime é Opinião, que vai, aliás, ao encontro do tavam em 100 mil o total anual para aquele publicar o Código Penal. "A DEMOCRACIA AFIRMA que o criminoso político deverá ser um problema que tem sido muito que já estava no projecto de 1963, é de português. Em 1972, apenas 7 pessoas Em todas as hipóteses, terá, forçosa• A LIBERDADE objecto de tratamento mais benevolen­ debatido: se deve, também, usufruir de que é preciso fazer de todas essas foram condenadas por aquele crime. mente, que existir uma actividade, MESMO QUANDO A NEGA" te do que o criminoso de direito qualquer espécie de privilégio como figuras crimes em sentido estrito, Isto demonstra, à saciedade, que se mais ou menos extensa, da Assembleia comum. crime político, ou ser tratado como portanto perfeitamente delimitados e torna inadiável a reforma deste ponto. da República. Quanto ao Código de V.M. - Um ponto<-que, à primeira Há sistemas que consideram como crime comum ou, ainda, ser eventual­ nã"o, como existem entre nós, meras Será a liberalização total o sistema Processo Penal, terá de ser a própria vista, parece passível de grande refor­ ponto fundamental do Direito Penal mente agravado pelas suas característi• emanações de uma filosofia puramente preterível? (Note-se que com esta Assembleia a promover não só as suas ma, porque muito alterado em incidên­ moderno e progressivo o da chamada cas. Na minha opinião, o sistema que ditatorial, sacos vazios passíveis de expressão queremos significar não a bases gerais, como todas as alterações. cia e perspectivas, é o dos "crimes "recuperação social do delinquente": o propõe o uso de menor severidade para qualquer recheio. possibilidade de quem quer que seja e \1ANUELA DE SOUSA RAMA 6 7 Os surdos O RESULTADO DO VOTO

O desejo de cura é uma verdade o evoluir dos "operacionais" e o inegável. Assim como a saúde é um arrumar na gaveta das armas dos bem incomparável; desejo de todos "revolucionários" feitos à pressa. os que dela não gozam, a cura é, ou caricatura de revolução armada, em por outra, costuma ser a maior que só a surdez política dos vontade do doente. intervenientes podia levar a tal fim. E dizemos costuma ser, pois, na Nos dias que se seguiram, o nossa história de hoje nada se passa nosso homem desapareceu no meio assim. do "estado de sítio", não havendo, Primeiro porque o nosso ho­ na realidade, sítio onde o encon­ no chamado "dia de reflexão", em mem, logo após o 25 de Abril de trar, de tal maneira o susto pôs fim que a sua simpatia por Otelo se 74, começou - aliás como a ao idi1io armado, ao alienante exteriorizava já sob forma de mai.ona das personagens destas romance de capa e G-3 ensaiado pequenas convulsões quando dele se crónicas - a mudar de aspecto pelo nosso protagonista. falava, mas, mercê de esforço ou exterior. Depois, foi de novo com espanto tratamento, se mantinha aparente­ E não foi sem espanto que o que o voltámos a ver. Calmo, mente liberto da surdez que antes vimos, no 28 de Setembro, a calado, retomando o trabalho, cultivara alegremente. revistar carros e barricar as ruas, a alheio às palhaçadas políticas que Mas, surpresa das surpresas. "ensurdecer" devagar mas decisiva­ outra vez se desenhavam nas elei­ Após o voto, eis que o vejo mente. ções legislativas. Enfim, era outro nervosíssimo, olhos fora das órbi• Já não nos admirámos quando, homem! Lentamente, de surdo tas, desgrenhado, e que se me no 11 de Março e, consequentemen­ aparentemente incurável, eram visí• dirige, em termos mais ou menos te na época áurea do "gonçalvis­ veis os progressos que o nosso como se seguem: mo", víamos o nosso personagem homem fazia na reintegração no "Eh pá, eu não quero ser o primeiro a chegar a todo o mundo dos que alguma coisa fazem ouvu. 1.... " lado onde a confusão fosse maior, para ouvir, para entender o que, à Espantados, retorquímos, com onde necessário fosse discursar sua volta, ainda se desenha. paciência, tentando acalmá-lo e demagogicamente, alienar os que No princípio da campanha elei­ perceber o que o preocupava, que com ele partilhassem as pesadas toral, era praticamente um cidadão não havia razão para agitações, uma correntes da já tão nossa conhecida normal, aguentando pachorrenta­ vez que apenas restava a confirma­ surdez política. mente o desenrolar do tempo para ção dos resultados eleitorais, aliás, Mas, no auge da desestabilização, depositar na urna o voto no para breve. em que o nosso surdo se tornava o Presidente escolhido. - "Mas é por isso que eu quero reflexo dos que, da contestação do O modo com que seguia as ser surdo ... " VI Governo Provisório, faziam apresentações televisivas dos candi­ Em vão o tentámos distrair, razão de vida, impulsionador de datos era praticamente normal, dissertando sobre todas as mudan­ greves a todos os níveis, "FURan­ apenas traído por um certo ruminar ças positivas que nele encontráva­ do" o "sistema" sem um outro quando o major Otelo aparecia nos mos e que não podíamos vê-lo objectivo que não fosse fazer do pequenos "écrans". De resto, nada destruir, de um momento para o dia-a-dia um absurdo carrocei de mais indicava vestígios da agitação outro. asneira, de tumulto e confusão. passada, que parecia cicatrizada e Ainda assim, perguntámos o Mas, dizíamos, surge o 25 de reflectida numa surdez política porquê do desejo de ensurdecer Novembro. quase ultrapassada. Mas, com os novamente, uma vez cumprido o E, nesse dia, o nosso homem foi últimos dias da campanha, o des­ direito de voto e feita a opção também dos primeiros a acorrer às controlo era de novo visível no através do papelinho lançado na ruas, alinhando ao lado dos "chai­ nosso amigo, aliás compreensível mesa eleitoral, que por acaso até mites", com uma arma "caída do pelo "suspense" de que se rodeia a sabíamos ter recaído a sua escolha céu", nas suas "boas mãos". importante votação, agravado pela no major Otelo. Mas, novo "mas" nesta história, sua escolha de candidato. - "Mas é por isso. Quero ser a meio da manhã, já o nosso surdo Foi já com pequenos sinais que surdo. NÃO QUERO OUVIR OS era um homem derrotado, escondi­ lhe conhecíamos anteriormente que RESULTADOS! ... " do em casa, a tentar ouvir na rádio o vimos na véspera .~a ida às urnas, OTO RINO

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9 Imprensa

pelo nosso país, afirmou: "A Suécia investiu, no ano passado, no orçamen• to para os jornais, uma verba próxima de 1 milhão e meio de contos e, este ano, vai dar-lhes mais de 2 milhões".

AS RAZÕES CRISE DO SECTOR DA CR ISE PORTUGUESA Os jornais são deficitários, isto é, o preço de custo de um jornal é superior OU DA DEMOCRACIA ? ao seu pmço de venda (em Portugal, como no estrangeiro). A diferença é, de uma maneira geral, coberta pelas receitas provenientes da publicidade inserida. esta a circunstância que es­ As intervenções públicas do ~ tá na base da crise económica vivida ministro Almeida Santos e a po­ pelas empresas jornalísticas. A crise lé mica gerada à volta delas reavi­ económica internacional (uma das varam, junto do público, alguma maiores depois da de 1929-33) afecta da problemática da tão falada cri­ o volume de publicidade vendida aos se da Imprensa. Será, no entanto, jornais, determinando défices orça• correcto sanar-se o sector da 1n­ mentais que, a não serem cobertos pe­ formação (declarado sector em lo Estado (o que é corrente no estran­ crise) independenteme nte dos geiro), obrigam as empresas à falência. factores que determinaram essa Por outro lado, e em parte conse­ crise? Deverá o Estado eximir-se quência da mesma crise geral, os pre­ às responsabilidades de ser o do­ ços de custo dos meios de Informação tendem a subir, quer em consequência no da Imprensa (estatizada)? Al­ do aumento da massa salarial para gumas perguntas a exigir respos­ acompanhar o montante do custo de t as do Ministério da Comunica­ vida quer em consequência do aumen­ ção Social. to do preço da matéria-prima (papel, tintas), da maquinaria, além dos custos A propalada crise da Imprensa de distribuição. ameaça converter-se num álibi. Para es­ Ora, se o número de leitores de um camo tear o facto fundamental, a saber: dado jornal em regra não cresce (ou que a tal "crise da Imprensa" (da co­ não cresce de maneira compensadora), nrunicação em geral, seria melhor di­ se as receitas de publicidade di.mi­ zê-lo) apenas é o reflexo da crise eco­ nuem, se o preço dos jornais não sobe nómica e política ao nível da Informa­ (por determinação do mercado e da ção. Para endossar sobre os ombros de função social da Informação, não pode quem na Imprensa trabalha as respon­ subir proporcionalmente), se o preço sabilidades e as consequências da dita Na França, na Itália, na Bélgica, na de custo se agrava, que fazer? crise. Alemanha, na Inglaterra, na Holanda, Não faltará quem sugira que, nos O documento que recebeu o nome na Suécia, nos Estados Unidos, etc., o países onde o Estado se apropriou dos de Almeida Santos ("esquema imereci­ número de empresas jornalísticas em meios de produção, os jornais não têm damente baptizado com o meu nome", crise tende a alargar-se; a falênciá de publicidade e vivem. g certo. Aí, o escreveu o actual ministro da Comuni­ empresas deste tipo entra na curva as­ Estado, que detém os meios de Infor­ cação Social) e a discussão que, à sua cendente; a concentração monopolista, mação, paga as custas e não refila com volta, se gerou têm um denominador característica dos períodos de crise, os défices. E o público lê o que lhe dão comum: fugir da essência do problema processa-se. Um exemplo, entre mui­ e, igualmente, não refila, por razões como o diabo da cruz. E, no entanto, tos: na Inglaterra, em 1974, só três em absoluto contrárias às do Estado para ninguém é segredo que a crise da jornais diários e três dominicais não (não será necessário recordá-las). Informação não é uma "originalidade" tiveram défices; em 1975, apenas qua­ Em Portugal, todavia, vive-se o liris­ nossa - originalidade é só a via que até tro diários e um dominical tiveram lu­ mo das "originalidades": o Estado ex­ ela conduziu. cros. Um ministro sueco, de passagem propriou, em grande parte, o capital 10 - privado e assenh:oreou-se, por c~n se­ outros jornalistas do grupo dos "vinte espaço ao aparecimento de empresas quência, dos meios de Informaçao ; a e quatro"); o sistemático boicote à di­ jornalísticas privadas, cujos jornais ob­ crise económica, já então existente, recçã'o do Sindicato dos Jornalistas por tiveram, então, tiragens relativamente precipitou-se em resultado da estatiza· d e terminadas correntes partidárias grandes. A recessão de lei tores dos jor­ ção apressada (retracção do investi­ (desde a sua tomade de posse até Abril nais estatizados, cumulativamente à mento privado e estrangeiro, quebra da de 1976), forçaram à realização de 30 quebra da publicidade, empurrou a su­ função motora do lucro, .burocratiza· assembleias gerais, à média de 4 por bida dos défices. ção do aparelho económico, etc.); a mês!). E não ficaremos, certamente, Quando hoje se fala na crise da Im­ crise afectou as fontes de receitas dos por aqui. prensa, não se pode perder de vista jornais e levou à subida, em flecha, dos Se a instabilidade política se sobre· estes factores. Ignorá-los é abrir as por­ défices; o Estado, por pressa-o da opi· pôs à instabilidade económica em toda tas à demagogia fácil. Que ninguém nião pública, legislou a proibição de a sociedade, sobrepôs-se, igualmente, e pense em resolver o problema da Infor­ despedimentos; os senhores que no Es­ em particular, nas empresas jornalísti· mação portuguesa, independentemente tado mandam são (afirmam ser) contra cas. O monolitismo informativo dos e à revelia da situação polftica e econó• a reprivatizaçãÓ do capital estatizado; jornais durante o consulado gonçalvis• mica do País. Não é apenas a Imprensa declaram-se contra o encerramento de ta levou a um divórcio entre o público que está em causa mas toda a democra­ jornais; não têm dinheiro para o ree­ (consumidor da Informação); abriu-se cia que em Portugal se pretende. A.M .' · quipamento e modernizaçã'o das unida­ des tipográficas; e, finalmente, protes· tam contra o financiamento dos jor­ nais, contra a obrigatoriedade de co­ Sem rei nem lei brir os défices! O Ministério da Comunicação So­ cial, que escamoteia do público as coordenadas da crise, pinta os profis­ OS TÍTULOS "PIRATAS" sionais da Informação, o Sindicato dos Jornalistas, o Conselho da Imprensa, COMECAM A SURGIR os trabalhadores dos jornais, como "marcianos". De facto, no "manicó­ A nova lei de Imprensa, promulgada em Perante a existência de duas revistas mio autogestionário português", o rea­ Fevereiro de 1975, sob a égide do ministro com o mesmo titulo, dirigimo-nos ao Mi· lismo é coisa de outro mundo. Vltor Alves, omite, pura e simplesmente, nistério da Comunicação Social para saber um artigo segundo o qual "todos os perió­ até que ponto uma situação como esta é dicos terlio um titulo ... que não poderá permitida por lei. Surpreendeu-nos saber AS RAZÕES POLITICAS confu ndir-se com os dos já existentes". que, de facto, a lei não proíbe que sejam Dai a previsão, a curto praw, de dois " O publicados jornais e revistas com t ítulos A disputa dos meios de Informação Seculo" três " Diãrio de Noticias" ou qua­ semelhantes. pelas correntes partidárias reflexo ao tro " A Capital" ... Vejamos o que aconteceu: no artigo 41 nível da Imprensa da sua disputa pelo do Decreto 15(). 72 (antiga lei de Impren­ Poder, contribuiu para o descrédito Sempre em bolandas, a Imprensa deste sa) dizia-se que "todos os periódicos terão dos jornais junto do público - muito pa ís continua a dar que falar. Desta feita, um título, que faz 'parte integrante destes mais que a péssima qualidade do jorna· levanta·se a questão dos t ítulos. e que não poderá confundir·se com os dos lismo que por cá se faz . A ins tabilidade Através de uma carta de Maria Helena já existentes". Ch arulla, administradora do semanário Com este articulado, salvaguardava-se, que na Imprensa se viveu desde o 25 " Noticia", de Angola, ao Conselho de Im­ portanto, a existência de tftulos singulares. de Abril foi reflexo da instabilidade prensa e a vários órgãos de Informação, Já na nova lei de Imprensa, promulgada política: "saneamentos", boicotes, gre· viemos a saber que, em Lisboa, t inha sido a 26 de Feverei ro de 1975, sob a égide do ves, tutti quanti. editado um novo semanário, o qual, nas ministro Vítor Alves, este artigo , pura e Infelizmente, estamos ainda longe pal avras da autora da carta, "i lu de a boa-fé simplesmente, é omitido. da desejada estabilização: provam-no dos leitores, induzindo-os deliberadamente O resultado está à vista: se m rei nem lei, os julgamentos em série de jornalistas a admitir que o " Notícia" que mu itos co­ os títulos "piratas" começam a surgir. E, (Vera Lagoa, Fernando Barradas); a nheceram e, durante anos (em Angola e desde já, o jornalista põe-se a pensar no ameaça de as "espingardas" investirem Portugal) , se habituaram a adquirir, tem que será a existência de dois "O Seculo", pelos jornais; os atentados bombistas continuidade no que presentemente circu­ três "Diário de Noticias", quatro " A Capi· la em território português". tal" e assim por diante. (contra o "Comércio do ") ; a Isto porque o novo semanário tenta, em Imaginação? Nem tanto. Apenas mais proibição de publicações (caso de "Se­ tudo, assemelhar-se ao publicado na ex-co­ uma fal ha de uma lei discutida e tão d iscu· culo-Hoje"); o reerguer de certas .con­ lónia. Desde o título ao formato, passando t lvel. Que se debrucem, de vez. sobre ela e testações partidárias dentro de alguns pela apresentação gráfica da capa, a cópia fechem todos os "buracos" ai existentes, jôrnais (o "célebre" turno da noite do é nítida, mesmo ao olhar menos atento do os nossos votos. F .F. "Diário de Notícias", opondo-se ao leitor mais distraído. reingresso de Manuela de Azevedo e 11 Trabalho servido pelo Decreto. Se parece líqui­ do que o Governo deseja verdadeira­ ACABARAM OS SANEAMENTOS? mente fazer um pouco de paz social. A lei que proíbe os despedimen­ também, fomentar a colaboração útil. não é menos certo que este 'decreto tos por motivos po líticos ou Do número de pessoas ilegalmente agora promulgado vai ser motivo para ideológicos (vu lgo "saneamen­ afastadas e a partir de agora legalmente incidentes em muitos locais de traba­ tos") foi publicada no dia 14, reintegradas, poderemos inferir qual lllo. O que sucedeu no "Diário de No­ mas as suas consequências práti­ dos sectores ideológicos foi mais bem tícias" é um exemplo apenas. cas são difíceis de prever. • F.S.

O Decreto-Lei 471 -76, que. preten­ A possibilidade de praticar Artes de acabar com os despedimentos sem justa causa "ou por motivos políticos Orientais ao seu alcance ou ideológicos" não vem, pode dizer­ -se, inovar grandemente no campo das ENCICLOPÉDIA -CURSO DE ARTES leis escritas, uma vez que todos os des­ pedimentos efectuados em desrespeito DE COMBATE ORIENTAIS pelas nonnas imperativas sobre cessa­ ção de contrato de traballlo se encon­ travam, por isso mesmo, interditos. O Decreto declara "inexistentes" os saneamentos efcctuados nos úl timos dois anos à margem das leis vigentes. Alguns deles poderão ser confirmados por despacho do ministro do Trabalho "quando se prove a existência de fac­ tos integradores de justa causa para despedimento". Afirmando que é objectivo do Go­ verno fazer respeitar as leis, o Decreto critica o facto de muitos despedimen­ tos terem sido efectuados sem a au­ diência prévia dos arguidos e estabele­ ce que daqui em diante os arguidos de processos de despedimento poderão re­ correr, inclusivamente para o Supremo Tribunal Administrativo. As decisões expressas nesta lei vêm contemplar a situação de muita ge nte pertencente ao funcionalismo, aos sec­ tores da construção civil, indústria ho­ teleira, Imprensa, etc. Muita gente que se encontrava afastada do seu trabalho por motivos políticos. Gen te perten­ ccn te a diversos sectores ideológicos, bastante diferentes alguns deles. Gente que se encontrava afastada do processo de recuperação económica do País, gente de certo modo marginalizada, fo. REVISTA MENSAL co de revolta permanente. O Decreto pretende. Mas poderá DE ARTES MARCIAIS consegui-lo? A dúvida é pertinente se tivermos em mente que, se o problema À VEN'DA EM TODO O PAíS se põe hoje, é porque outras leis, igual­ A('~ mente publicadas, não foram cumpri­ das. O Governo parece partir do prin­ ·~ ·)lf..,. distribuidora o SECULO cípio de que se marginalizar é, de algu­ ma maneira, criar inimigos, integrar é, 12 - Polémica ENERGIA ATOMICA -uma carta do prof. Delgado Domingos

Do prof. J.J. Delgado Domingos, docente do Instituto Superior Técnico, recebemos uma carta em que rebate o artigo intitulado "Energia Atómica - Maquina­ ções Políticas por detrás da Cen­ tral", que publicámos na " VM" de 27 de Maio último. Tal como fizemos no último nú­ mero, relativamente à carta que, sobre o mesmo assunto, nos en ­ viou Eu rico da Fonseca, publica­ mos em seguida a posição do prof. Delgado Domingos - acom­ panhada, desta vez, da resposta do autor do texto, o nosso cama­ rada de redacção José Machado. Aq ui as deixamos à consideração do leitor.

1. Energia Nuclear: inteligência ou sub­ serviência nacional "Energia Atómica Maquinações Políticas por detrás da Central" é o título de um artigo publicado na "Vi­ da Mundial" de 27-5-76. O apareci­ mento de artigos deste tipo insere-se seguros da sua "verdade" e da sua mento, que em Agosto desse mesmo na lógica dos interesses em jogo. Só me (in)competência que até as normas ele­ ano (em que foi o 25 de Abril de surpreende que não ·tenham aparecido mentares de civismo deixaram de res­ 1974) houve um depósito de 50 mil mais cedo. Também é comum escolher peitar, anulando à úJtima hora discus­ contos nos EUA para assegurar o for­ o seu autor o anonimato, neste caso sões públicas onde se comprometeram necimento posterior de urânio enrique- sob as iniciais J .M. ~ lamentável que o a estar presentes. A última foi no pro­ . cido, que em Novembro de 1975 du­ faça. Na democracia que pretendemos grama "Confronto" do dia 18-5-76 na rante um Encontro Nacional de espe­ as responsabilidades assumem-se e as TV. cialistas a opção nuclear foi seriamente afirmações subscrevem-se. O sr. J .M. O sr. J.M. fala em "maquinações posta em causa em face dos primeiros escolheu defender membros do Gover­ políticas". Terá as suas razões. A opi­ elementos concretos fornecidos, que no e altos responsáveis de uma das nião pública não andará longe de pen­ em Março de 1976 o Governo determi­ maiores empresas nacionalizadas em sá-lo ao ir sabendo, sucessivamente, nou à CPE que procedesse à abertura que a noção de responsá~ilidade para que no relatório do Conselho de Admi­ de concurso público, e que no final de com o País que deviam servir se expri­ nistração da CPE correspondente a Maio de 1976 um membro da Comis­ me limpidamente no secretismo de que 1972 se prevê a instalação do primeiro sã'o de Gestão da CPE declarou em rodearam todo a assunto, e na fuga reactor nuclear em 1981, que em Mar­ público que não tivera conhecimento permanente a um debate aberto peran­ ço de 1974 estava tudo preparado para ainda dos estudos, mas que a referida te a opinião pública. Responsáveis tão o lançamento do concurso de forneci- Comi~ão tivera em contrapartida a vi- 13 sita de um alto responsável do projecto nham, pelo menos, um mínimo de res­ reactores, de instalações de enriqueci­ nuclear que exigiu, sem quaisquer ele­ peito pela sua inteligência. mento ou de reprocessamento (de urâ• mentos de base, um pronunciamento nio). Trata-se de impedir os comprado­ imediato a favor ou contra o Nuclear! 2. Portugal pensa-se com os Portugue­ res de beneficiar de divergências (entre Para os "responsáveis" pelo progra­ ses os fornecedores) ... " ma energético portµguês que o sr. J .M. O sr. J .M. coloca-nos na "barrica­ A mesma notícia foi referida pela louvaminha não houve 25 de Abril de da" do económico. Louva-se no "Newsweek". Confio na inteligêncjia 1974. Os mesmos, prosseguem exacta­ dr. Jaime de Oliveira para nos rebater, da opinião pública para extrair as ila­ mente a mesma política que seguiam louvando-se ambos na competência ções. 1 antes. Em termos de energia, conti­ dos técnicos do Gabinete de Planea­ 4.Política Energética Portuguesa I nuani a raciocinar e proceder exacta­ mento Económico da C.P.E. para reba­ Contrariamente ao que o sr. J .M. men te como procediam antes. A sua ter a nossa afirmação de que em Portu­ pode levar a inferir, a primeira vez que 1 política energética é a mesma incon­ gal o Kwh obtido por via nuclear não é abordámos o problema do Nuclear em gruente política de produção de elec­ mais económico que o obtido por ou­ Portugal fizemo-lo no contexto do tricidade. A sua política de poupança é tras soluções. Curiosamente, ambos "Problema Energético Português", di­ l exactamente a mesma do tempo do mostram não ter compreendido os nú­ vulgado em 1975. A maioria dos ór• .. marcelismo: aumentar as tarifas, au­ meros que figuram no relatório elabo­ gãos de informação conhece-o. E os mentar os combustíveis, aumentár os rado por aquele Gabinete, nem sequer responsáveis governamentais também. transportes públicos! Faltava a cúpula: o significado do adjectivo custos actua­ Simplesmente, o estudo, embora inaca­ faltava o Nuclear! Para cobrir um erro, lizados. Compreende-se a falha. De bado, é incómodo para muitos. Como comete-se outro maior. Para que a opi­ economia não abarcam sequer os con­ incómoda foi a proposta de criação de nião pública o aceite, dá-se-lhe um tom ceitos fundamentais. Não se compreen­ um Departamento de Energia na Uni­ de cientismo e exploram-se os comple­ de é que citando sem perceber e lou­ versidade Nova de Lisboa, os cursos de xos de inferioridade legados pelo fas­ vando-se na competência de quem ela­ pós-licenciatura e os cursos de especia­ cismo. Inculca-se a subserviência de­ borou o relatório, não o tenham ao lização e reciclagem, os quais, se tives­ fendendo que os estrangeiros sabem menos lido todo. Pois é, exactamente, sem entrado em funcionamento na al­ melhor que nós o que nos convém, e se o Gabinete cuja competência conside­ tura planeada teriam contribuído já o todo não for suficiente agita-lhe o ram indiscutível que escreve no relató• para poupar substancialmente algo dos espantalho do comunismo ou do anti­ rio que citam: 12 milhões de contos que importamos comunismo primãrio. "Importa frisar, para concluir, que em combustíveis e certamente também Denegrindo um imperialismo apon­ a via nuclear impõe, naturalmente, que para criar muitos empregos e activida­ ta-se o outro como o paraíso da nossa não se perca tempo nas decisões quan­ des novas. salvação. As atitudes são idênticas e to ao processo de consulta e encomen­ Infelizmente, é mais fácil maquinar igualmente fascizantes. Ambas prefe­ da do grupo nuclear, pois quanto nos corredores que trabalhar, mais fá­ rem a subserviência â inteligência na­ maior for o tempo gasto nestas deci­ cil falar em democracia que exigir res­ cional. Ambas falam em independência sões, mais difícil será dispensar os gru­ ponsabilidades, mais fácil deixar subir nacional, ambas raciocinam em termos pos III e IV de Setúbal e, portanto, o custo de vida do que prejudicar a de "maquinações políticas". Ambas maior será a probabilidade de se cair "imagem política" ou o carreirismo nos pretendem vender a todos por um na via convencional". conivente de tantos. Esperamos, since­ prato de lentilhas. Se o próprio Gabinete de Estudos ramente, que a inteligência nacional O sr. J.M. advoga um imperialismo. Económicos da C.P.E. reconhece que prevaleça e que Portugal seja pensado Raciocina naturalmente em termos das os encargos financeiros farão pender a por todos os Portugueses. Se nos entre­ maquinações do outro. Esqueceu-se de balança do económico para a via con­ garmos ao iluminismo de minorias tec­ um pormenor: nos defensores do Nu­ vencional se houver demora na decisão nocratas-fascizantes, o futuro que nos clear "â outrance", há preferência por e na construção, que pretendem os de­ espera é inelutável: uma exploração um imperialismo ou outro sobrepõe-se fensores do Nuclear ao citar custos pa­ pior que a anterior sob um fascismo uma característica comum: são tecno­ ra outros países quando nem sequer a modernizado. • . cratas e na sua visão tecnocrática do estrutura dos custos no caso português poder concentracionário, a ideologia é conseguem discernir? 3. Independên­ em muitos um oportunismo de oca­ cia Nacional sião. É por isso que a questão energéti­ ca portuguesa, sendo uma questão pro­ 3. Independência Nacional A carta que acima publicamos, de fundamente política, ultrapassa larga­ Transcrevemos de "Le Monde" de autoria do professor Delgado Domin­ mente o espartilho partidário em que 31-1-1976: gos, mereceu do nosso redactor José tantos se esforçam em metê-la. O Povo "Os representantes dos sete pai"ses Machado as seguintes considerações: Português merece mais que isto: o Po­ exportadores de tecnologia nuclear vo Português exige que depois de uma (. .. ) chegaram a um acordo ( ... ) para O artigo da "Vida Mundial" a que o exploração de 50 anos, não venham harmonizar a sua polüica de exporta­ professor Delgado Domingos se refere agora explorá-lo a pretexto de progres­ ção de materiais e tecnologia nuclea­ inseria o problema da central nuclear sismo e democracia. Exige que te· res, quer se trate de combustíveis, de no contex ~o geral do problema energé- 14 -

Explosão de uma bomba atómica francesa em Mururoa: a energia nuclear nio é s6 isto tico português. Dizia-se que a evolução houver demora na decisão"? O que posta" do professor Delgado Domin­ do consumo exigiria a adopção de qualquer mortal compreende no rela­ gos é colmatada por uma série de medidas radicais no campo da produ­ tório é que a CPE tem de tomar uma amáveis epítetos com que o seu autor ção de energia eléctrica. Face aos decisão rápida. O consumo cresce e a mimoseia governantes, técnicos e o condicionalismos existentes e às vanta­ capacidade de resposta, ao nível da articulista. gens oferecidas pelas centrais nuclea­ produção de electricidade, estã posta As atitudes "fascizantes" e de res, em menores custos para a energia em causa. Devido à seca, Portugal defesa do imperialismo que o senhor produzida, em valores mais baixos para importou 4,3 mil . contos de energia professor nos atribui são acusações a totalidade de encargos e para a saída eléctrica em 1974. No ano seguinte, risíveis. i: do conhecimento público de divisas, justificava-se a montagem aquele montante atingiu a casa dos que os defensores do "nuclear" no de reactores nucleares para a produção 287,4 mil contos. Nos três primeiros nosso país são "minorias tecnocratas­ de energia eléctrica no nosso país. meses do ano em curso, o gasto de ·fascizantes" e acabados agentes do A "resposta" do professor Delgado divisas com esta importação atingiria a imperialismo. Começando, é claro, Domingos não esclarece este pequeno verba de 312,7 mil contos. Além disso, pelo actual ministro da Indústria e da pormenor: limita-se a remeter-nos para dentro de poucos anos, nem que Tecnologia, eng. Walter Rosa e sua o seu estudo "inacabado" datado de tenhamos todas as barragens cheias e equipa, e acabando, com certeza, nos 1975, de cujo conhecimento os nossos cumprido o plano de instalação de responsáveis pelos programas económi· leitores ficam, dessa forma, privados. novas unidades produtoras projectadas cos de governo editados, quer pelo PS, Mas o senhor professor levanta, e em construção, encontramo-nos na quer pelo PPD, antes das eleições para afi nal, no seu arrazoado calunioso, posição de importadores. Caso a a Assembleia da República. Valha-nos uma questão concreta relacionada com decisão de instalar a primeira central Deus, senhor professor! O público jã o problema de fundo: a evolução nuclear demore, diz a CPE, há que não vai na chantagem baixa que tantos provável do montante de encar!fos montar mais centrais térmicas tradicio­ oportunistas e "antifascistas" do pós• fin anceiros inerente a cada uma das nais. i: óbvio. E a CPE mostra-se ·25 de Abril utilizaram contra as forças opç6es em jogo (nuclear e térmica contrária a esta decisão, "porque ela democráticas, para se colocarem nos clássica). Do alto da cãtreda, o senhor acarreta maiores encargos financeiros e postos que pretendiam l professor fulmina-nos com a sua mais elevados dispêndios de divisas." Ó Finalmente e para ajudar o senhor sapiência: "De economia não abarcam senhor professor! Tínhamos vontade professor a desmontar a tenebrosa sequer os conceitos fundamentais." de insinuar que o senhor, de português conjura envolvida pelo "anonimato" Muito humildemente, pedimos ao não abarca sequer os princípios ele­ do autor do artigo que não lhe agrada, senhor professor que se digne reler o mentares. Mas não o fazemos porque fazemos-lhe uma sugestão: experimen­ texto do Gabinete da CPE, transcrito tal não é verdade. Afirmamos apenas te dar uma vista de olhos sobre o na sua própria "resposta". Onde que não é honesto pôr argumentos na quadro redactor"ial da revista, inserido descobriu o senhor professor que a boca dos outros, sabendo que estes em cada número da mesma. Se quiser CPE "reconhece que os encargos defendem precisamente posições con­ mais dados, dirija-se-nos directamente. financeiros farão pender a balança do trárias. Prometemos não assumir atitudes económico para a via convencional se A falta de argumentação na " res- qui.xotescas! J.M. e 15 --GALERIA

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13 PRESIDENTES 21 MANDATOS 17 A 5 de Outubro de 19 10, após quase meio século de intensa e fecunda campanha para derrubar a monarquia, foi implantada a República. Iniciava-se, assim, um novo período na 1listória dé Portugal. Contudo, o novo regime, tão almejadarnente aguar­ dado como salvador dos destinos da pátria, em breve se tornaria pasto de violentas lutas de vários partidos políticos pelo acesso ao Poder, os quais, ao fim e ao cabo, representavam revolução, a vida política portuguesa 1911, o dr. Manuel de Arriaga, primeiro os in tcresses de diferentes classes. A tem sido agitada por inúmeros aconte­ Presidente da República Portuguesa, sai do 1 República em Portugal duraria ape­ cimentos e, por vezes, a democracia e a Parlamento, S1Judado pelo povo, no dia 24 nas dezasseis anos. liberdade voltaram a estar ameaçadas. de Agosto, após a sua eleição para a As forças rcaccionárias e representa­ Se do passado histórico do País Presidência da República tivas de detenninadas camadas burgue­ alguma lição, hoje, os portugueses te, em nome da Nação, proclama que sas haviam aguardado o momento para podem colher, essa é, sem dúvida, a do foi eleito Presidente da República derrubar a democracia, ou seja, a desejo inquebrantável de não deixar ' Portuguesa o cidadão Manuel de República. E esse momento chegou comprometer a democracia e a liberda­ Arriaga." em 1926, quando o general Gomes da de que o 25 de Abril de 1974 nos Renunciou do cargo a 27 de Maio Costa, tentando acabar com a anarquia devolveu. A maneira altamente cívica e del915. dos vários e consecutivos Governos da decidida como a nação se portou nas E assim sucedeu em 29 de Maio República e regenerar a governação, eleições para a Assembleia da Repúbli· de 1915, em que foi eleito Teófilo desencadeia o movimento do 28 de ca, é o garante de que ela, a nação, Braga, tendo Manuel de Arriaga Maio, logo aproveitado por todos quer a democracia e a liberdade, na desempenhado o alto cargo 1374 dias. aqueles que ansiavam pela instauração ordem, na paz, no respeito e no Ainda ocupou os cargos de procura­ de um regime ant-democrático, ditato­ trabalho, condições imprescindíveis dor-geral da República e Reitor da rial, que se integrasse, de certo modo. para a construção dessa democracia e Universidade de Coimbra. nas correntes políticas dos regimes da liberdade que nos as.5egurarão a Faleceu em Lisboa, com 77 anos, a autoritários de alguns Estados euro­ independência. T.R. 5 de Março de 1917. peus. De 1926 a 1933, instaurada cm Portugal a ditadura militar, concebeu­ TEÓFILO BRAGA -se e organizou-se o Estado corporativo e o regime antidemocrático e antipo­ Teóftlo Braga nasceu em Ponta pular preconizado por Salazar. Um Delgada, a 24 de Fevereiro de 1843. regime pró-fascista que mergulhou o Completou o curso de Direito na País numa ditadura que se arrastou por 48 dolorosos e angustiantes anos. Designado de "República", o regime de Salazar não foi, de facto, uma República, apesar de nesses 48 anos terem sido - nas vergonhosas condi­ ções que todo o povo português conhece - eleitos 3 Presidentes da República, que desempenharam 9 mandatos: 3 Presidentes da República MANUEL DE ARRIAGA e 9 mandatos em 48 anos de história de um País é bem a expressão de um Nasceu a 8 de Julho de 1840, na regime autoritário e ditatorial. cidade da 1Iorta. Professou logo de A ditadura de Salazar e Caetano fo i muito novo ideias republicanas. Licen­ derrubada em 25 de Abril de J974 ciou-se cm Direito na Universidade de pelo "movimento dos capitães" logo Coimbra, cm 1875. apoiado entusiasticamente pelo povo, No ano de 1911, contava já 71 anos, pela grande maioria da nação. quando na sessão da Assembleia A nação e o seu povo saudaram a Nacional Constituinte, a 24 de Agosto, República e a democracia restaurada foi lida e aprovada a seguinte procla­ pela Revolução do 25 de Abril. mação: Ao longo destes dois anos de "A Assembleia Nacional Constituin- 18 Universidade de Coimbra, em 1867. depois, no Partido Regenerador. major Sidónio Pais. doutorando-se a 26 de Julho de 1868. t:m 1882, foi eleito deputado, por A segunda vez que foi Presidente da Foi lente do Curso Superior de Letras Lamego; em 1886, novamente deputa­ República, foi por ter renunciado o da Universidade de Lisboa. do, por Coimbra; cm 1890, o corpo Presidente e, Pertenceu desde muito novo ao catedrático da Universidade elegeu-o como reparação, o Partido Democráti­ Partido Republicano Português e, par do reino, cargo que também co co nseguiu novaménte que o dr. Ber­ como tal, tomou parte activa cm ocupou em 1894. nardino Machado fosse eleito, mas comícios e conferências de propaganda Um ano antes 1893, foi ministro das também por pouco tempo, apenas republicana. Obras Públicas, mm1 gabinete presidi­ 172 dias, pois foi eleito a 11 de Implantada a República em Portu­ do por l lintze Ribeiro. Dezembro de 1925, para, em 28 de gal, na manhã de 5 de Outubro Implantada a República, foi logo Maio de 1926, ser novamente expulso, de 1910, foi escolllido Teófilo Braga ministro dos Negócios Estrangeiros e, pelo que a 31 de Maio entregou todas para chefe do Governo Provisório da com a resignação do dr. ~lanucl de as prerrogativas ao almirante ~ l endes República, mandato que exerceu até Arriaga, foi eleito o dr. Bernardino Cabeçadas. 1911, ano cm que foi eleito o primeiro Machado (Bernardino Luís Machado Uma vez mais no estrangeiro, não Presidente da República Portuguesa, Guimarães), a 6 de Agosto de 1915, deixou nunca de conspirar contra a recaindo a escolha, no dr. Manuel de Presidente da República. nova política. Regressando a Portugal. Arriaga. Tomou posse do cargo o dr. Bernar­ morre sossegadamente a 29 de Abr il Tendo o dr. Manuel de Arriaga dino Machado a 5 de Outubro de 1944, com 93 anos, na casa de renunciado, foi eleito, a 29 de Maio de 1915, mas, ao fim de 245 dias, teve saúde do dr. Alberto Gonçalves, no de 1915, Teófilo Braga, por 98 votos, de resignar por um decreto emanado Porto. Presidente da República, cujo cargo da Junta Revolucionária de 11 de exerceu até 5 de .Outubro do mesmo Dezembro de 1917, movimento revo­ ano. lucionário que rebentou em Lisboa, Teófilo Braga faleceu a 28 de contra o Partido Democrático, a 5 de Janeiro de 1924. Dezembro de 1917, sob a chefia do

191 5, a uma das janelas do Parla· m e nt o , o d r. Tebfilo Braga saúda o povo de Lisboa no dia 29 de Março, apbs a sua eleição para P resid ent e da República

BERNARD INO MACHADO SIDÓNIO PA IS

Nasceu na cidade do Rio de Janeiro Sidónio Pais nasceu na vila de a 28 de Março de 1851, de pais Caminha a l de Maio de 1872. portugueses. Vindo muito novo para Lente na Universidade de Coimbra, Portugal, aqui estudou no Porto e na era formad o em Filosofia e dou torado Universidade de Coimbra. em Matemática e tinha ainda o curso A 17 de Abril de 1879, foi nomeado de Artilharia da Escola do Exército, lente catedrático de Filosofia e, em concluindo os seus cursos cm 1898. 1883, era lente de Agricultura Geral De muito novo, professou ideais Zootécnica e Economia Rural na republicanas. Foi dos poucos que oitava cadeira do curso filosófico. assinou um manifesto académico redi­ Durante alguns anos manteve-se gido em 1891 por João de Meneses. r: afastado das lides políticas, filiando-se, Logo que foi implantada a República, 19 Sidónio Pais foi eleito deputado. depois, ministro dos Negócios Estran­ geiros e, mais tarde, passou ao corpo diplomático, sendo nomeado nosso ministro na Alemanha. Em 1917, chefiou um movimento revolucionário contra o Partido De­ mocrático, detentor quase sempre do Poder, o que originou a expulsã'o do alto cargo de Presidente da República nuou a prestar altos serviços, como o dr. Bernardino f\tachado. presidente do Tribunal de Marinha. Triunfante a revolução de 5 de chefe do Estado-Maior Naval e chance­ Dezembro de 1917 e destituído das ler da Torre e Espada. funções o dr. , foi Em Outubro de 1918, Sidónio Pais, Sidónio Pais investido no alto cargo, Presidente da República, escolheu-o com as atribuições constantes do para ministro da· Marinha e, com a . artigo 47 da Constituição e pelo 1918, o dr. Sidbnio Pais, terceiro Presidente morte trágica daquele, e embora não Decreto de 27 de Dezembro de 1917 e da República, agradece, da janela da Câmara abdicasse das suas convicções monár­ Lei Eleitoral de 30 de Março de 1918. Municipal de Lisboa, a manifestação popular quic&s, foi eleito Presidente da Repú­ O dr. Sidónio Pais foi o primeiro de que foi alvo no dia da sua proclamação blica, pelo Congresso, a 16 de Dezem­ Presidente da República eleito por bro de 1918, findando o seu mandato voto directo. As eleições realizaram-se a 5 de Outubro de 1919. a 9 de Maio de 1918, alcançando Logo que deixou de ser Presidente 513 958 votos. CANTO E CASTRO da República, recolheu a sua casa, O acto da proclamação efectuou-~~· alheando-se por completo da política. a 9 de Maio pelas 14 horas, no salão João de Canto e Castro Silva Morreu em Lisboa, a 14 de Março nobre da Câmara Mu1úcipal de Lisboa. Antunes nasceu em Lisboa, a 19 de de 1934. Porém, a 14 de Dezembro de 1918, Maio de 1862. quando Sidónio Pais se preparava para Assentou praça como aspirante de tomar o comboio que o havia de levar Marinha, em 1881, e durante 51 anos à cidade do Porto e onde lhe estava serviu-a dedicadamente. ANTÓNIO JOSE DE A LMEIDA reservada urna apoteótica recepção, Em 1917 era contra-almirante e uma bala o prostou na estação do almirante por distinção em 25 de Nasceu no Vale da Vinha (Penaco­ caminho-de-ferro do Rossio. Outubro de 1919. va), a 18 de Julho de 1866. E, com este trágico fim, acabou o Serviu muitos anos no Ultramar, Formou-se em 1895 em Medicina na "Consulado Sidónio Pais". onde desempenhou altos cargos, e foi Faculdade de Medicina de Coimbra. Foi no seu curto mandato que foi companheiro de Serpa Pinto nas suas De muito novo abraçou os ideais assinado o armistício da primeira explorações em terras de Moçambique. republicanos e, logo que saiu médico, .. guerra mundial. Regressando a Portugal, aqui conti- embarcou para São Tomé, onde 1 20 exerceu clínica até 1903. Em J 906. entrou na C'âmara de Deputados. precedido de grande fama corno orador revolucionário e académi- co. Logo que foi implantada a Repúbli­ ca. o dr. António José de Almeida tornou conta da pasta do ~linistério do Interior. Logo que o almirante C'anto e ('astro findou o seu mandato, realiza­ ram-se cm 1919 as eleições para o novo Chefe de Estado. Foram indigitados, além de António José de Almeida, Duarte Leite, Teixei­ ra Gomes, Alves da Veiga, Magalhães de Lima e Azevedo Silva. A eleição rea lizou-se no Congresso TEIXEIRA GOMES da República a 6 de Outubro de 19 19, sendo eleito Prcsiden te da República o Manuel Teixeira Gomes nasceu em dr. António José de Almeida. Portimão, a 27 de Maio de 1860, e foi Foi o único Presidente da República industrial e escritor. dos eleitos de 1910 a 1926 que esteve Após o triunfo da implantação da todo o tempo que mandava a Consti­ República, substituiu em Londres o tu ição da República Portuguesa, muito embaixador marquês de Soveral, de quem era amigo pessoal. 1926, Mendes Cabeçadas, então comandan· Terminado o mandato do dr. Antó• te, à salda do Palâcio de Belém, depois de nio José de Almeida, a eleição para o ter recebido do general Gomes da Costa o novo Chefe de Estado, realizou-se a 6 encargo de formar governo de Agosto de 1923. Ainda alcançaram alguns votos os drs. Bernardino ~tachado, Duarte Lei­ te, Augusto Soares, Magalhães de Lima - mas o eleito foi Manuel Teixeira Gomes, que exerceu o cargo 1157 dias, pois renunciou a 11 de Dezembro de 1925. Exilou-se voluntariamente em Bou­ gie, Marrocos Francês-Argélia, onde faleceu a 18 de Outubro de 1941. Não mais voltou a Portugal, mas. cm 1950, por iniciativa do "Diário de Lisboa" (dr. orberto Lopes), foram os seus restos mortais transladado~ para Portimão, sua terra natal, onde um barco de guerra português, o embora no período presidencial ~" "Dão", os conduziu, com todas a~ terem dado graves e até sangrentos honras e homenagens, a 18 de Outubro acontecimentos políticos, como o de

GOMES DA COST A

Nasceu em Lisboa, a 14 de Janeiro de 1863, Manuel de Oliveira Gomes da Costa e as.5entou praça na anna de A NTÓNIO O. FRAGOSO Artilharia em Novembro de 1880; CARMONA quatro anos depois era aspirante. Nas terras da Flandres, no CEP, António óscar Fragoso Cannona, firmou o seu prestígio de militar, que nasceu a 24 de Novembro aureolado já nas campanhas de África, de 1869, em Lisboa, foi quatro vezes ao lado de Mouzinho, e na índia. 1926, o general Gomes da Costa quando reeleito para o cargo de Presidente da Dotado duma rebeldia insatisfeita, assumiu a chefia d o movimento militar do República. em 1921 envereda pela política e 28 de Maio e d o Governo Em 1926 (28 de Maio), o general 22 Gomes da Costa proclama uma nova candidato da oposiçtro toi dada pelo que a S de Junho, numa mensagem · política no País e arranca de Braga Supre.mo Tribunal de Justiça a 17 de que dirigiu à nação, afirma não aceitar sobre Lisboa para impor essas novas Dezembro de 1948. o mais alto cargo que muitos sectores directrizes políticas com o apoio do Carmona, só a 20 de Dezembro de pretendiam que aceitasse. Passados almirante Cabeçadas e do general 1948 foi considerado candidato da apenas 20 dias, a Comissão Executiva óscar Carmona, que comandava a União Nacional, para a continuação do da União Nacional dá a conhecer a IV Divisão, em tvora. cargo que desempenhava, e a sua todo o País que o seu candidato é o Depois dos acontecimentos que se proclamação oficial seria dada II Con­ general Francisco l ligino Craveiro passaram com o almirante Mendes ferência da Uniã'o Nacional, que se Lopes, que comandava, nessa altura, a Cabeçadas e o general Gomes da Costa, realizava no Porto, nos dias 7 a 9 de Região Militar, com sede em Tomar, e foi designado Carmona para chefiar o Janeiro de 1949, para depois, a 1 de nascera em Lisboa a 12 de Abril de novo Governo, com atribuições de Fevereiro, ser apresentada novamente 1894. Chefe de Estado. a sua candidatura no Supremo Tribu­ Consolidada a política iniciada em nal, subscrita por 548 nomes, sendo o 28 de Maio de 1926 e para que o País primeiro o de Salazar. entrasse no regímen constitucional, foi A propaganda das eleições foi logo o nome do general Cannona intensa, quer da parte do candidato da apontado para Presidente da República oposição quer da parte do candidato por meio de um plebiscito que se oficial. Porém, a 12 de Fevereiro de realizou a 25 de Março de 1928 e no 1949 o general Nórton de Matos qual obteve 738 065 votos. resolve desistir, sendo eleito o general A aclamação do novo Presidente da Carmona. República efectuou-sc a 15 de Abril. Faleceu em 1951. Terminado o rnandato, realizaram-se novas eleições presidenciais a 17 de Fevereiro de 1935, sendo Carmona CRAVEIRO LOPES novamente eleito. Carmona, que devia tomar posso do No dia 18 de Abril de 1951 falecia o alto cargo de Presidente da República Presidente da República, marechal pela segunda vez a 15 de Abril de António óscar Fragoso Carmona, 193 5, não foi empossado por se sendo investido no alto cargo, enquan­ encontrar ·doente, sendo por isso :.i to não se realizassem as eleições para o cerimónia adiada. novo Chefe de Estado, o Presidente do Em presença deste facto, Salazar, Conselho, António de Oliveira Salazar, Presidente do Conselho, assumiu a 16 1958, o general de Abril os poderes de Chefe de Craveiro Lopes Estado. A posse do general Cannona - cujas relações só se efectuou a 26 de Abril, prestando com Salazar nem compromisso na Assembleia Nacional. sempre foram As eleições que levaram Cannona amistosas - , vo· pela terceira vez ao mais alto cargo da tando nas elei· magistratura da nação realizaram-se a 8 ções que deram de Fevereiro de 1942 e a posse teve fim ao seu man· lugar a 16 de Abril de 1942 na dato Assembleia Nacional, terminando este mandato em 1949. Em 1949 as novas eleições nã'o se revestiram de tanta calma como as anteriores; em nenhuma delas se tinha apresentado qualquer candidato da oposição, o que nã'o aconteceu com esta, pois, a 9 de Julho de 1948 apresentou-se à candidatura de Presi­ dente da República o general José Mendes Ribeiro Nórton de Matos, político muito conhecido, alto-comis­ sário em Angola, embaixador em Londres e ministro da Guerra, na primeira guerra mundial. A confirmação de ser ilegível o 23 13 presidentes 21 mandatos

- DR. MANUEL DE ARRIAGA (de 11 de Outubro de 1911 a 27 de Maio de 1915) ANTÓNIO DE SPINOLA - DR. TEÓFILO BRAGA (de 29 de Maio de 1915 a 5 de 1974 a 30 dé Outubro do mesmo ano) - DR. BERNARDINO MACHADO • AMÉRICO DE DEUS (de 5 de Outubro de 1915 a 11 de ' RODRIGUES TOMÁS Dezembro de 1917) - DR. SIDÓNIO PAIS Nasceu em Lisboa a 19 de Novem­ (de 9 de Maio de 1918 a 14 de bro de 1894. Assentou praça no Corpo Dezembro do mesmo ano) de Alunos da Armada em 7 de - ALMIRANTE CANTO E CASTRO Novembro de 1914, tendo concluído o (de 16 de Dezembro de 1918 ea 5 de Outubro de 1919) curso da Escola Naval em 30 de - DR. ANTÓNIO JOSÉ DE ALMEIDA Dezembro de 1916. (de 6 de Outubro de 1919 a 6 de Em 6 de Setembro de 1944 foi Agosto de 1923) nomeado ministro da Marinha, cargo - MANUEL TEIXEIRA GOMES que exerce até 1958. Em 9 de Agosto (de 6 de Agosto de 1923 a 11 de de 1958 foi eleito Presidente da Dezembro de 1925) República. Os seus mandatos foram - DR. BERNARDINO MACHADO sucessivamente renovados até 25 d,, 12º. mandato - de 11 de Dezembro Abril de 1974. de 1925 a 28 de Maio de 1926) - ALMIRANTE MENDES CABEÇA­ Após a revolução foi exilado para P COSTA GOMES DAS Brasil, onde se encontra presentemen· (não eleito, foi Chefe de Estado, por te. Eleito em 30 de Setembro de 1974. um golpe reaccionârio, de 28 de Maio a Capa do número 17 de Junho de 1926) da revista "Ar· - GENERAL GOMES DA COSTA quivo Nacional" (de 17 de Junho de 1926 a 9 de Julho dedicado às elei· do mesmo ano) ções presiden· - GENERAL ANTÓNIO O. F. CARMO­ ciais de 1935 NA (de 9 de Julho de 1926 a 15 de Abril de 1928; de 15 de Abril de 1928 a 17 de Fevereiro de 1935; de 26 de Abril de 1935 a 8 de "' Fevereiro de 1942; de 8 de Fev~reiro de 1942 a 12 de Fevereiro de 1949; de 12 de Fevereiro de 1949 a 18 de Abril de 1951) - GENERAL CRAVEIRO LOPES (de 9 de Agosto de 1951 a 1958) - ALMIRANTE AMÉRICO TOMÁS (de 9 de Agosto de 1958 a 1965; 1965 a 1972; 1972 a 25 de Abril de 1974) - GENERAL ANTÓNIO DE SPINOLA (de 15 de Maio de 1974 a 30 de Setembro dfl 1974) - GENERAL COSTA GOMES (eleito em 30 de Setembro de 1974) 24 l 1 editorial

Por Natália Correia

UM HOMEM DE EXCEPCAO PARA UMA SITUACAO EXCEPCIONAL

niai'>. coube a Presidência da República a Gonçalvista e de ambiguidades que forta· um homem que se prestigiara como mili· leceram o fôlego das esquerdas golpistas. lar e cuja voz algo contribuiu para fazer Segue-;e. pois. que. desde Dezembro entrar o regime nas vascas da agonia. de 1925. os portugueses não tiveram o :-.;ão sendo Presidente eleito pela von­ "seu Presidente" mesmo na figura daque­ tade do povo. Spínola. então carismado les que ocuparam esse cargo já à luz das pela fama que lhe trouxera o seu livro liberdades outorgadas pelo 25 de Abril. "Portugal e o Futuro" e pelas atitudes E eis consumado o facto que. dobrado assumidas em prol do restabelecimento meio século. confere ao povo a faculdade das liberdades. foi saudado pelo entusias· de projectar a sua vontade e as suas espe· mo popular.. Meteórico brilho que a 29 ranças num Chefe do Estado livremente F'\ccde meio século o período que vai de Setembro de 74 se apagou numa des· eleito. destas eleições presidenciais :is que. cm pedida dramática na qual perpassaram Não fora já de si enorme a importân· Oc1cmbro de 1925. comh11iram 3 Prcsi· negros augúrios que infortúnios ulterio­ eia de ter finalmente a República Portu· dência da República Bern:1rdino Macha· res desgraçadamente confirmaram. guesa um Presidente legitimado pela von· do. Retirado que foi o cenário deste Presi· tade popular, acresce ainda um aspecto . Quem hoje ler o que então Raul dente mais talhado para as glórias milita· que agiganta as responsabilidades do ho· Proença escreveu na "Seara Nova" sobre rcs do que para a praxis dos arranjos mcm que convenceu a maioria da popu· a degradação do regime implantado cm 5 políticos. seguiu-se no cargo Costa Go· lação portuguesa de que incarna os méri· de Outubro descortina por entre a amar· mes. Presidente. também não eleito, de tos que esta e'ige ao "seu Presidente". gura dessas p;íginas :1 fatal 1uo,imidade recurso. num contexto que o designou Ramalho Eanes é a última oportunidade da liquidação das esperanças republica· como sucessor de um Presidente que dada à democracia para subsistir em Por· nas e dos errm que as frustraram. E- a 28 claudicara. a este outro general foi reser· tugal. Uma situação e'\Ccpcional e de ev de Maio de 1926. rompe cm Braga o vado enfrentar na Presidência os embates ccpção terá de ser aquela que aceitou movimento. de início politicamente he· mais duros da travessia revolucionária. A presidir ao destino da Nação. Seja a cora· terogéno que viria a formali1aMe na ho­ ambivalência de que deu provas fez dele gem que levou Eanes a suportar o fardo mogeneidade de uma ditadura imposta uma figura controversa. Conciliador mais da e'\cepcionalidade de que terá de dar ao País até 25 de \bril de 1974. do que seria desejável com forças que provas. o sinal seguro da sua fortaleza de Durante esse longo rapto das liberda· tudo fizeram para e'\ terminar as conquis· ânimo. Porque. a partir de agora. a firme· des. os Presidentes da República mais tas democráticas. saudou-o a este título a za do PR é a coluna 'ertebral de uma não foram que decorações presidenciais esquerda pêcêpista e revolucionária co· democracia que. sem esse esteio. não po­ de uma ditadura que. pela vontade de mo o negociador que evitou a guerra derá avançar. F é bom não esquecer que um homem superdot:1do para e'\crcer o civil. Na inversão desta perspcctiva. ou a esquerda que ateou a fogueira do cha· poder totalitário se foi progr<'ssivamente -.cja. do ponto de vista da população mado gonçalvismo não só aumentou nu· volvendo numa autocracia. Deposta, esta aglutinada pelos três partidos maioritá­ mericamente nestas eleições ccomo pro­ por sua ve7, sem resistência. já pela lei rios. Costa Gomes foi alvo de uma decla· mete pôr à prova o pulso do décimo universal do cansaço do Poder, já pela rada impopularidade sendo acusado dl· quarto Presidente da República Portu· corrosão prod111ida pelas guerras colo- capitulacionismo durante a intempéril· guesa.

25 seu voto cm Eanes. Duas ou três VINTE HORAS COM EANES mulheres reconhecem-na e abraçam-se a ela. Uma mãe estende (tradicionalis­ ta) uma criança para dar um beijinho NO DIA DA VITORIA ao general. Outra adianta-se e compri­ me-o num abraço '"maternal". Aos poucos, a multidão vai saindo. Perguntamos à mulher de Eanes se pensa continuar a trabal har depois de -- o marido se r eleito. (É funcionária do 09 .30 - Dois polícias à porta e t rê' gcnl.!ral. Ele e o genro votam no \IEIC.) curiosos na esquina assinalam o núnw· 1111.'Smo S Ít io. ro 2 da rua O. José de Bragança. no 11.50 Fernando Ramos. capitão M.R.E. - Penso continuar. embora 13airro da !\ladre de Deus, cm Lisboa. de Ca\'alaria e chefe da segurança do talvez com 11111 horário di fe rente. onde mora o tenente-coronel (hoje gcnl.!ral. L'ntra, acompanhando Rau l " VM" Vão ficar a viver na vossa general) Ramalho Eanes. A casa. de Rego. mandatário da candidatura. o casa? rés-do-chão e primeiro andar. cst;í qual n;io tem a sua famosa boina. M.R.E. Pensamos que sim. Só o ainda adormecida. Cá fora, cm frente ""Est:í muito calor", e.\.plica ele. não faremos se se revelar inconvenien­ da porta. o Volkswagcn azul do 11.51 A porta da moradia é te. general ("ultimamente quem tem an­ aberta para deixar sair António e Saíram. Cá fora, dois grupos distin· dado com ele tem sido a dra. Jo.lanucla. .\lanuela Eanes. Raul Rego e Fernando tos. Além dos partidários do general a mulher do sr. general". explica um Ramos. \lanucla Eanes senta-se no havia uma concentração de pessoas dos polícias encarregados da guarda da ban..:o de tds. Raul Rego no "lugar do favoráveis a Otelo. Estes desataram a casa). morto,. e Eanes. depois de ter fechado berrar: " Pinochet! Pinochct! Fascista! 09 .40 - Chega um enorme ramo de a porta ao dircctor de "A Luta", Fascista!". flores. Quem o envia escondeu o nome instala-se ao volante do Volkswagen A mulher diz-lhe em voz baixa: dentro de um envelope. .\largarida a?ul. a caminho da Escola Preparatória "Não ligues importância ! Deixa lá!" aparece à porta. É alentejana e Luís \ ntónio \'crnc) (ali a dois Os partidários de Eanes. entretanto, empregada da casa. Comenta: '"\!an­ passos). onde uma multidão heterogé· não ficaram calados. Virados para os dam estes cnonncs ramos de ílorcs. nea o aguardava. "otelistas" gritavam: "Vão trabalhar! como se alguém tivesse morrido aqui Rodeado pelos homens da seguran­ Vão trabaU1ar!". A segurança velava. cm casa!" ça, Eanl.!s fura (é o termo) por entre a Não houve recontros. Uma curiosida· 10.00 - O número de pessoas que mult id;io que se comprime junto à de : os defensores de Otelo não se espera. perto da casa. a saída do porta d.i escola. Dirige-se à sua secção aperceberam de que o homem de candidato, cresceu um pouco. 1l á dois de rnto. no rés-do-chffo, onde come­ meia-idade, vestido com um fato grupos de mirones que aproveitam as çou por cumprimentar os membros da escuro, que, calado, no meio deles, sombras para conversar. O Sol já vai mesa. O presidente desta lê então: seguia toda a cena, era ·o próprio sogro alto. Num café perto. meia dú7ia de "António dos Santos Ramalho Ea· do ge neral. fregueses do bairro gozam a manhã de nes!". ,\ secretária anota na lista dos 12.30 - Eanes dirige-se para o domingo em que podem ir até ao café. eleitores ins..:ritos. l:anes foi fazer a Volkswagen azul. onde sua mulher Pessoas passam na rua a caminho da crn1.inha para a cabina. Regressou à toma assento no banco de trás e Raul secção de voto. Na casa. uma das mesa. entregou o voto, voltou a Rego se instala à direita cio general. persianas está já subida. Ao lado, no cumprimentar e saiu. Os três seguem então da Madre de jardim, um homem trabalha já, imper­ Começam as aclamações a subir de Deus para a Avenida da República turbável. como sempre. Cultiva o tom. '\o meio de uma multidão onde, num prédio de cinco andares, jardim há anos. desde que Eanes veio comprimida que berrava "Eanes! Ea­ funcionam os serviços da candidatura. para aquela casa depois de casar, edil nes 1". o general disse, à porta, umas O general vai ali para se informar do que o general costuma ajudá-lo e palavras de circunstância para os modo como estão a decorrer as conversa com ele. O jardineiro mos tra jornalistas. Ao mesmo tempo, no eleições cm todo o País. A estas horas um certo pudor cm falar da vida na primeiro andar, l\lanucla Ramalho pouco movimento há ainda na candi· casa. Eanes saía completamente sozinha datura. a rccepção espera-se que 11.20 - O general sai para o jardim. (ladeada por dois agentes de seguran­ durante a tarde o movimento aumente pela porta da ma rquise em mangas de ça). da décima quarta secção de voto. bastante. Uma placa anuncia um camisa e gravata de riscas. Vai falar Encontdmo-la no corredor e pcrgun tá· próximo jantar de homenagem a com o jardineiro. Mantém-se no jardim mos-lhe se ia almoçar a casa e que Eanes. por uns momentos a conversar. Encos­ almoço i.1 ser o seu naquele dia: "Vai 13.15 Chegam Diogo Freitas do tados ao portão observamos a cena: ser simples. cm. casa. como nom1al­ Amaral e a mulher. Interrogado sobre "l\leus senhores, bom dia!", atira· mentl.!. Sopa. ·carne assada, vinho, se considerava a candidatura de Eanes -nos de dentro o general enquanto se enfim. o costume", terminou a rir. uma candidatura do socialismo demo­ retira para dentro de casa aparente­ Acompanhámo-la enquanto descia crático, o presidente do CDS diz que a mente para tomar o pequeno-almoço. .is escadas. Em baixo. no átrio da considerava não uma candidatura dos 11 .45 - Entra na casa o sogro do escola. centenas de pessoas gritam o socialistas mas uma canadidatura dos 26 democratas. Sobe ao qu,into andar. enquanto Maria José Freitas do Ama­ ral fica à porta, sentada numa cadeira, na recepção. J 3.30 - Sai o general com a mulher e Raul Rego. Arrancam no carro azul e, a caminho da casa deste último, o general resolve parar junto do Instituto Superior Técnico, para ver o mural gigante que o MRPP pintou na fachada do edifício. 13.35 - Eanes retoma o caminho para casa de Raul Rego, sempre ao volante do Yolkswagen azul. Rego, ã porta, despede-se afcctuosamente do casal Eanes. Manuela Eanes passa para o banco da frente e os dois vão para casa. 13.45 - O general chega a casa com a mulher. Convida-nos a entrar e a beber alguma coisa, pois está muito calor. Servem-nos água do Luso. Em casa, na sala de estar, Eanes conversa com a "VM", a minutos do Conversamos. Eanes mostra não dese­ almoço. Ao mesmo tempo, por todo jar o PCP no Governo definitivo. o Pais, as eleições que, de madrugada, Perguntamos-lhe se Melo Antunes faria lhe dariam a vitória continuavam a parte dele. Remeteu a questão para o processar-se futuro Primeiro-Ministro, Mário Soa­ res, mas admitiu que alguns elementos do GIS pudessem ser incluídos na equipa ministerial. Conversamos de pé, informalmente. Ao lado, numa mesi­ Ao volante do seu Volkswagen nha, a colecção de relógios antigos de azul·eléctrico, Eanes sai da secção de bolso de Ramalho Eanes. A sala é voto a caminho da sede de candidatu· pequena e dá para a marquise. Eanc~ ra

diz que passado este mandato "de modo nenlmm me voltarei a candida­ tar". Antes de entrarmos em casa o general tinha-nos dito: "Vão ficar desiludidos com a minha casa." É uma residência remediada, com rés-do-chão e primeiro andar (onde são os quartos). Arranjada, limpa, cuidada . Uma casa parecida com tantas outras, da classe média. Naquele dia, porém, não era uma casa vulgar. Lá fora, a segurança velava. Aquela era a casa do homem que nessa noite estaria eleito para ocupar o mais alto cargo do País. O filho do casal, ainda criança, está cm C'astelo Branco, "para não sofrer os choques destes dias", diz o pai, que pensa reunir-se-lhe dentro de dias para descansar de uma campanha estafante.

Quase um dia como os outros (na aparência, ao menos): o casal Eanes senta-se para almoçar 27 J\ dra . f\lanucla, ao lado, está calada. Por esta altura, fala-se ;\ porta d:1 1oda a gcnlL' quer ctmiprimentar o \inda os acompan hamos até à casa de sede da candidatura na recen te re un i;lo !'residente tio dia seguin te. ian tar onde uma tigela com azei tonas do CR . Algu ns julgam que dcved IL'1 Intelectuais. políticos (do PS. PPD l' cm cima da pequena mesa re donda sido abordado o proble ma de Costa CDS). jornalistas. militares. AI varo ... parece destinada a entreter a espera da Gomes. Reina a convicc:io de que scr:í <.uerra. Sousa l".1Yarcs. \larlins Carcia. sopa que não tarda. O general senta-se colocado num gabinete de rela~·iic' rirmino \liguei. G::ircia tios Santos. à mesa e tira a gravata depois de ;1 diplomá ti cas com as c:..-colónias . \lanucl :\lcg1c. Jorge \liranda. Pedro mu lher lhe fazer notar que está rnu it\> l"hcmudo de Castro e Custavo Soro­ 19 .30 "Vf\ I" . no terceiro andai calor. El a passa-lhe o prato da sopa e mcnho era111 algumas das pessoas que do edifício. ouve "as últ imas·· dos senta-se também à mesa. ali est:l\alll. Conccicão Sü tia Bandeira resultados que vã o chegando. :\csll' Despedimo-nos. e a sua ~1.1u

03.4S iova reuniao com a .:omissão. Julga-se que Eanes já não vai :1 Gulbenkian, dado que está j:í marcada uma conferência de Imprensa. no dia seguinte. 04 .00 - Eanes está há 9 horas e 45 minutos na sede da sua candidatu­ ra. 04.45 - Eanes grava uma declara~ão ao País que a Televisão deve transmit i1 dentro de meia hora. 04.5S Sai Aventino Teixeira, que diz à "VM": "O general Eanes sai daqui a meia hora." Aventino erroú por 5 minutos. OS. l S - O general vem ao rés-do­ -chão do edifício da candidatura e Amaro da Costa sai do edifício. "Nestas eleições, a tese proposta pelo Partido Comunista fracassou'', diz à "V~I" o vice-pres idente do CDS. OS.30 - Ramalho Eanes sai, final­ mente, da sede da candidatura. Uma vez cá fora, cumprimenta as pessoas e os funcionários dos serviços da candi­ datura. Com ele sai a mullier, "bastan­ te cansada", como diz. "VM" - Como é que se sente? Contente? R.E. - Sinto que estou no limiar de novas e grandes responsabilidades. televisão enquanto conversa connosco afirmações de ~laria Barroso foram Creio que tenho de me organizar a e descansa. Prepara-se para a confcrên­ afirmações partidárias e não de Ulll.1 mim mesmo para lhes fazer face e .:ia de Imprensa que vai dar, possivel­ apoiante da candidatura de Eanes." conto que as dificuldades serão ultra­ mente, na Gulbenkia n. ós estamos a 02.SO - Jaime Neves, que entretan­ passadas com a colaboração de todos. ensaiá-lo fa ze ndo-lhe as perguntas que to tinha entrado, sai do edifício, Mesmo com a colaboração daqueles mais provavelmen te lhe vão ser fe itas" . depois de ser cumprimentado efusiva­ que continuam a empenhar-se em 01.0S Vasco Lourenço sai. Eanes mente pela maioria dos elementos da utopias e em esquemas que são descansa numa sala, sozinho, com a segurança de Eanes. inviáveis neste país e que não servem muU1er. 03.00 - O general está atrasado em para ninguém. Nem para eles. 01 .20 Sá Carneiro chega à relação às previsões que davam como "VM" Pensir descansar uns dias na candidatu ra nu m \lercedcs preto. certa uma conferência de Imprensa, na 13eira 13aixa? Pe rgun tamos-lhe se, como líder do Gulbenkian , às duas horas. R.E. - É natural que vá passar uns partido socia l-democrata português, 03.40 - Manuel Alegre entra de dias em Castelo Branco. tinha algum comentário a fazer às novo. Diz-nos que "nem o general 05.35 Ramalho Eanes e a mul11er declarações de Maria Barroso. no De Gaulle fo i eleito por uma percenta­ seguem para sua casa, onde pouco comício de apoio a Lanes. na Fonte gem tão grande". depois, à porta, se despediram da Luminosa, segundo as quais quem não Junto de nós aparece o brigadeiro comitiva. António dos Santos Rama­ gosta da palavra socialismo não deve Charais (que fo i cumprimentado fria­ lho Eanes era já (podia dizer-se) o estar junto de Eanes. "Como sociais­ mente por Eanes) e comenta assim o décimo quarto Chefe do Estado -democratas respondeu Sá Carneiro triunfo deste: "Julgo que era de português. la descansar finalmente. identificamo-nos com o socialismo esperar que, sendo o 2S de Abril Depois de 18 horas de trabalho e de democrático. não dogmático. n

zer". Em todas as hipóteses, o que for menos fonnal. Essa a sua única exigên­ cia quando a mulher vai "vesti-lo". Porque tem de ser Maria Manuela a ocupar-se das suas compras. Para peças um pouco menos "obri­ gatórias" - um casaco curto de camur­ ça que lhe vimos no comício da Ala­ meda - a mulher tem de escolher oca­ sião em que ele as não possa recusar. O Natal ou o aniversário são dos poucos álibis que consegue encontrar. Tam­ bém para a Manuela ou para o Manel, o filho, o general não gosta de esco­ lher, embora não prescinda da sua opi­ nião nem abdique do seu gosto. Sem EU, ser um desportista, Ramalho Eanes praticou natação e foi instrutor de gi­ nástica da Academia Militar. A equita­ ANTÕNIO RAMALHO EANES ção conta-se, também, entre os seus passatempos. Portugal tem o seu mais novo Presi­ quando casaram. Datava de há cerca de Sempre que pode, nos escassos laze­ dente. E um homem como nós. Final­ um ano o seu primeiro encontro, num res que uma vida demasiado preenchi­ mente. jantar na Academia Militar. Depois, da lhe deixa, o general refugia-se entre Para trás fica cm definitivo ultrapas­ concertos e espectáculos de bailado na as suas obras favoritas: o ensaio, obras sada a imagem do Chefe de Estado Gulbenkian - os seus locais de encon­ de fonnação política, o teatro, a poe­ intangível, longínquo, hierático. Do tro habituais. Neles se foram desco­ sia. Alguns dos seus serões, em casa, governante que, de comum com os go­ brindo mutuamente, em defeitos e são assim ocupados: lendo, conversan­ vernados, tem, apenas, a espécie huma­ qualidades. Poucos meses passados, do, ouvindo música .. Ou recebendo os na - tão pouco! - e a nacionalidade. Ramalho Eanes é mobilizado para a amigos. Vamos poder encontrar por aí o Guiné. E, durante um ano, o namoro Sem ser, de modo algum, desatento, nosso Presidente, na mesa ao lado do prossegue, por carta, de Lisboa para a o general Ramalho Eanes não é dema­ restaurante cm que almoçamos, no Jar­ Guiné, da Guiné para Lisboa. Um ano siado interveniente na vida familiar: na dim Zoológico, cm tarde de sábado. es. Toda a gente sabe quem vai primeira volta. (A uma pergunta sobre para a Presidência da República da ganhar ... os resultados de Otelo) São significati­ Fundação Gulbenkian, foi, na noite vos da capacidade que Otelo tem em e na madrugada de 27 para 28 de Horas: 23. Azeredo Perdigão (com dinamizar as massas populares. Ainda Junho, um corropio constante de indisfarçado mau humor): nao sei, não bem que assim é, porque denota que gente. Gente essa ligada aos órgãos sei nada dessas coisas. Não tenho está tudo desperto. de informação, predominantemente previsões. das imprensas europeias (incluindo Horas: 23.40. Sousa e Castro ( defensi­ as nossas, claro) e de personalidades Horas: 23.15. Victor Alves (positiva­ vamente correcto): Penso que o Eanes políticas, civis e militares, que não mente peremptório): Ganha o general é capaz de ganhar à la. volta. Quanto cessou de perscrutar o ponto fulcral Ramalho Eanes à la. volta, mas aos votos para Otelo, estes, pelo das atenções gerais, o lugar de ignoro, rigorosamente, com que per· menos, enquadram-se nas minhas pre­ encontro com as mais díspares centagem. visões. Acho que até agora tem tudo correntes de opinião. corrido bem. Foram longas horas de intenso Horas: 23.30. Pezarat Correia (humo­ vaivém. De brevíssimos diálogos. De radamente inquieto): Olhe, as minhas espontâneos acenos, nimbados da previsões estão ali (aponta para o curiosidade mútua e sagaz que quadro televisivo). Olhe, estão a sempre anima situações em que o crescer. Não sei, eu nunca faço nervo e a inquietação predominam previsões. Nunca joguei no Totobola. a razão e o senso. Horas de emoção, de encontrões fortuitos, de palavras Horas: 23.30. Almeida Santos (com­ apressadas travadas entre os i nterva­ pondo pausadamente o seu veredicto): los dos "écrans" sem resultados. O Já temos dados que não são previsões. deambulatório em que não se sabe O Ggneral Ramalho Eanes ganha à quem espera e quem chega, se o la. volta. A percentagem vai manter-se jornalista, se o ministro, se o que nos 65 por cento. Estou contente, anda à procura de notícias, se o que visto que o povo português assim o ciranda à procura de impressões. quer. É o que tem de fascinante esta grande vigília que se viveu nos salões e corredores da Gulbenkian. Com todos nós, portugueses e momentaneamente "os mais" res­ Pezarat Corrooa: nunca JOgueo. .. ponsáveis, suspensos da magia mas­ siva que nos mobiliza e justifica. Fernando Rosas: vitória à primeira voltil AI i, em correrias nevróticas, suspi· rando uma palavra, um sinal, um número, uma evidência. É deste tropel de mudanças e rostos que damos nota nestas páginas, para que se sofra, medite e registe. D.G. 1-

Horas: 23.45. Gomes Mota (com estilo literário): O general Eanes está a fazer o seu passeio eleitoral. O que é preciso é saber qual será o resultado da declaração de voto. (Otelo vem sempre à baila) Otelo? Quando muito, calcu­ laria que ele tivesse resultados na ordem dos 1O por cento, mesmo assim, únpares no contexto político da -1 Vitor Alves: ganha Eanes... Europa. 31 Horas: 23.50. Mário de Aguiar (muito concreto): Vitória à 1a. volta de Eanes. ·A lncõgnita de acordo com todas as previsões.

Horas: 23.55. Femando Rosas (diri­ gente do t\IRPP, muito atento aos QUE VOTOS PARA "écrans"): Vitória de Eanes à la. volta . o que é bastante importante se AZEVEDO E OTELO? considcrannos que estamos a assistir à Pinheiro de Azevedo obteve 14 por cento dos votos. Simulta­ preparação de uma série de golpes neamente, verifica-se um acréscimo de votos na esquerda revolu­ inspirados pelo partido social-fascista, cionária que ultrapassa largamente a soma de votação que esta mas que assim se vê amplamente recolhe u nas leg islativas e dos votos do P.C.P., que passaram derrotado. parn Otelo. "De onde provêm estes votos e como encarn este fenómeno?" - foi a pergunta que dirigimos a vá rias personali­ Horas: 23.55. Piteira Santos · (algo dades presentes na Gulbenkian. circunspecto): Não há lugar para previsões. É claríssimo que o general MARCELO CURTO 5ª constatação: esta é a primeira Eanes vai ganhar à 1a. volta, que o vitória eleitoral do PPD e do CDS e major Otelo ficará cm 2o. lugar e o Nós temos de examinar as eleições não sei se não será a primeira derrota almirante Pinhei ro de Azevedo em presidenciais à luz de outros critérios, do PS 3o. l\las tudo parece indicar que se este que não os mesmos da eleição para a 63 constatação: a votação do PC não tivesse tido o acidente haveria' Assembleia da República. O agrupa­ por reduzida. pode ajudar a destruir o '.!a. volta. mento eleitoral não se faz da mesma mito do "partido disciplinado e coeso" 1lora s: 00.00. Vitor Crespo (pondera­ forma. O que se verifica de extraordi­ e pôr em risco as suas constantes aspi­ do e consell1eiral): Por ora a votação nário é que a força polarizadora do PC rações ele in tcgração de uma maioria está a decorrer. Penso que os resulta­ nao revelou uma coesão como nós es­ de esquerda e ele partido no seu dos obtidos não estão a divergir das perávamos. Não há dúvida que o apoio ponto de vista mais de órgão do que previsões que entre os elementos do ao Otelo poderia ser um grande apoio partido do Governo. Consclllo da Revolução se faziam . Os se fosse um apoio organizado. resultados vão ser ainda corrigidos. A questão está em que Pinheiro de SÁ BORGES Azevedo arrastou com ele, e o Otelo também, forças que apoiavam o PS Entendo que essa deslocação de um como simpatizantes mas nunca de mili­ sector da massa eleitoral afccta ao PS tantes. face à manifesta ambiguidade da candi­ datura do general Eanes, que não do LUCAS PIRES candidato, merece dos apoios clara­ mente de direita, nus casos, e noutros Ao contrário do que se disse quanto casos admito até que de direita não às eleições legislativas, não há ainda cm democrática. apresentando-se ao gene­ Portugal conservadorismo do eleitora­ ral Eanes em situação de manifesta re­ do. Isto é, "fidelidades" estritas de serva mental como o tempo o demons­ clientelas determinadas a um respecti­ trará. vo partido. A primeira constatação é portanto a de que o eleitorado conti­ MANUEL SERRA nua a ser muito móvel. A '.!ª· constatação: a ele uma radica­ É natural porque a votação em Ote­ lização das opções eleitorais, facto que lo representa efectivamcntc uma con­ não é estranho e é até consequente testação ao desvio que houve ao pro­ com a degradação crescente da vicia cesso desencadeado pelo 25 de Abril. Ferreira da Cunha: a imagem dum povo económica. Representa igualmente para o povo 3ª· constatação: a grande votação português uma saída na construção da Horas: 00.01. Ferreira da Cunha cm Otelo assinala no fundo um certo sociedade nova que o povo português (tolerante e cortês): Os resultados das apetite ele evasão - que pode não se sempre ambicionou. Representa tam­ eleições presidenciais, tal como os distinguir, em certos casos de irrespon­ bém uma consciencialização que atra­ resultados das eleições para a Assem­ sabilidade. em relação a uma situação vés da sua unidade. dos seus interesses bleia da República, deram a imagem cada vez mais repetitiva e desinteres­ de povu trabalhador e que nesta fase dum povo mais politizado do que os sante. lústórica o Otelo representa. observadores políticos afirmavam, mas 4ª constatação: o PS perde grande Não estou admirado com a votação os resultados tanto num caso como no parte da sua força moral e política e cm Otelo Sara iva de Carvalho porquan­ outro não fa1.:ilitaram os problemas tem que se render totalmente à maio­ to por toda a movimentação da cam­ nacionais. D.G. e ria presidencial. panha eleitoral e a adesão que as mas- 32 to a imagem do partido como força política e veio ainda debilitar a sua posição negocial face ao futuro gover­ no.

MEDEIROS FE RR EIRA

Primeiro, não está dito que venham do PS, porque há muitos votos para Pinheiro de Azevedo que com certeza vêm com a mesma probabilidade quer do PPD quer do PS quer mesmo do CDS, dado que a campanha que Pi­ nheiro de Azevedo fez foi uma cam­ panha dirigida aos valores individuais de coragem, de coerência, e até com uma certa tónica poujadista que pode­ rá ter levado a que alguma clientela Manuel Serra: contestação ao desvio do eleitoral PPD e CDS tenha votado em processo desencadeado pelo 25 de Abril Pinheiro de Azevedo. Quanto ao fenómeno Otelo, trata-se sas lhe deram, era de prever estes resul­ de algo que diz muito mais respeito tados. aos votos do PC e à própria existência Para mim, embora não seja surpresa PC, dado que de certa maneira Otelo representa todavia uma derrota para os Saraiva de Carvalho é r • herdeiro das partidos que julgavam que o somatório tempestades que o PC andou a semear dos seus votos se ia repercurtir na vota­ durante estes dois anos. ção para a Presidência da República, o É evidente que a campanha eleitoral que significa que as massas populares de Otelo Saraiva de Carvalho, feita perceberam, nestes 2 anos, que esses com .a utilização de todos os símbolos partidos não foram capazes de dar res­ do 25 de Abril, terá levado a um voto posta aos seus anseios, às suas necessi­ senti.mental para todos aqueles portu­ dades. Temos esperanç1 que o povo gueses que reconhecem no 25 de Abril português organizadamente consiga o momento mais alto da fraternidade e travar a recuperação que as forças do da esperança entre os portugueses. passado se preparan1 para fazer. Em relação ao PS essa votação não põe problemas especiais dado que ·~ós SOTTOMAYOR CARDIA somos um partido também com grande capacidade de espontaneidade, visto Pinheiro de Azevedo fez uma cam­ que somos um partido de massas e na panha em parte de apelo ao populismo Medeiros Ferreira: "Somos um partido com nossa acção governativa fatura teremos de esquerda, mas por outro lado uma grande capacidade de espontaneidade" cm contra-indicação eleitoral expressa campanha abertamente voltada para a uma grande diferença de votos entre o captação dos votos da direita, de modo RUIMACHETE candidato Otelo e o candidato Octávio que este ponto de partida, que é indis­ Pato. cutível, anula a interpretação que os Como explicação é muito simples. votos de Pinheiro de Azevedo prove­ Quer dizer que as bases do PS nao COSTA NEVES nham da esquerda. Quanto a Otelo Sa­ obedeceram às directrizes dos seus diri­ raiva de Carvalho tem os votos de ex­ gentes e apoiaram o Otelo e o Pinheiro Para mim até certo ponto é wna trema-esquerda e tem também os votos de Azevedo. As consequências disso é surpresa, muito embora eu estivesse à do que resta da imagem do homem do que são mais complexas de tirar, mas espera que ele tivesse um apoio consi­ 25 de Abril. uma delas é que, para já, o fu turo derável, mas de qualquer maneira não Mas o que para min1 é muito signifi­ governo minoritário do PS ficará mais previa que esse apoio atingisse um re­ cativo é que um candidato obtenha minoritário. Quanto ao Otelo Saraiva sultado tão sensível. O major Otelo uma tão elevada votação como se veri­ de Carvalho, ele excedeu um pouco a soube aproveitar-se da imagem do ho­ fica em torno do general Eanes. Não minha expectativa e isso resultou es­ mem do 25 de Abril que quanto a mim posso afirmar peremptóriamente, mas sencialmente do apoio que lhe foi da­ foi bastante bem utilizada pela comis­ duvido que alguma vez na Europa Oci­ do por algumas bases do PS e do PCP são de apoio. Por outro lado, julgo que dental, em eleições com estas caracte­ Um aspecto importante foi a percenta­ teve também importância o facto de se .... rísticas, o vencedor tenha obtido tão gem reduzida de votos obtida pelo can­ ter criado no País um certo ambiente impressionante percentagem. didato do PCP, que veio diminuir mui- de descrédito em relação ao PCP. e 33 os que riem... 1

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O SORRISO QUE ALEGRA os PORTUGUESES

Concorde-se que não deixa de constituir motivo de consolação para um candidato que, na melhor das hipóteses, s6 dentro de 3 meses voltará à actividade normal, ter recolhido mais de 14 por cento do' votos depositados nas urnas para eleger o PR. Trata-se, bem entendido, de uma votação sentimental. Um ramalhete de votos que os fiéis à imagem do Almirante sem mêdo colocaram no seu quarto de doente. Para quem em nenhuma circunstância alcançaria a vitória, este prémio de consolação ~entimental não deixa de ser uma vitória afectiva.

34 r

O PS nao só festeja o triunfo do Presidente da República em que apostou como o seu \ecretário-geral e já confirmado Primciro-)linbtro do próximo governo. Mário Soares é o arcaboiço que terá de aguentar a tremenda responsabilidade de formar um governo que complete o papel que cabe ao PR na defesa da democracia. E a aguda consciência política do \Ccrctário-geral do PS não poderá deixar de reconhecer que, a par dos motivos de satisfação, as eleições presidenciais revelaram a existência de uma esquerda que se amplia·, reorganiza e se declara disposta a repor o 24 de Novembro. Mário Soares sorri. J.las o sentido das responsabilidades que o aguardam põe uma sombra de aprccn~ão no \CU sorriso. 1.-

Seria difícil ser mais largo o sorri~o de Sá Carneiro à saída da Gulbenkian, quando a noite já se avizinhava do dia que veria nascer o Presidente da República que o PPD se antecipou a apoiar. Mas não só esse triunfo previamente garantido alegrava Sá Carneiro. De facto, o dirigente do PPD sorria especialmente para a Madeira e Açores. onde as eleições para as Assembleias Regionais confirmaram a supremacia daquele partido nos arquipélagos. Surge assim uma hipótese que baila no sorriso de Sá Carneiro: se o PS se pode dar ao luxo de formar Governo sozinho no Continente, o PPD poderá responder-lhe nas Ilhas. L, a confirmar·'c a resposta, o partido de S:í Carneiro dispõe de uma carta valiosa para a jogar na devida altura.

Um Otelo risonho parecia. na Conferência de Imprensa que deu na Gulbenkian, o triunfador das eleições para a PR. E se o seu acesso a Belém estava naturalmente vedado pela sensatez do eleitorado, não há dúvida de qu.: o cspcctacular major não deu cm vão o ..show" de uma vitória: o resultado obtido nas urnas outorga-lhe a auréola de ter ampliado as hostes esquerdistas. Otelo surge pois como o "homem providencial" que as esquerdas esperavam. Mas, como no poema de Pessoa, este deus é .. homem de outro Deus maior" o qual, no Olimpo das suas manobras, maneja os cordéis que dando a vitória a Otelo também poderão apeá-lo quando a missão estiver cumprida. Entretanto, Otelo goza os louros da incontestável liderança que uma eminência parda pôs nas suas mão\ ávidas e irrequietas. ... e os que choram

Octávio Pato exibiu um rosto perturbado na Conferência de Imprensa que. altas horas da noite. ·- decorreu na Gulbenkian. Mas não sejamos ingénuos. Não é crível que. cm dois meses, praticamcnt<· metade do eleitorado do PCP tenha pcsertado deste partido para se entregar à liderança de Otelo. S<· IÕsscmos desconfiados (e neste caso apetece sê-lo) faríamos o seguinte raciocínio: esta fuga de deitorado que não afccta a base parlamentar que serve de apoio à tese de maioria de esquerda do PCP. aumenta uma área esquerdista há pouco dotada com a votação de 3.5. Adicionados os votos saído' logicamente das bases esquerdistas do PS, o partido potencial de Otelo adquire uma exprc>são qu,· ultrapassa as previsões. Assim, a rédea da ofensiva das massas já anunciada por Otelo é colocada pelo PCP nas mãos do c'-comandantc do COPCON. L'm alívio para o partido de Cunhal que se desembaraça de liderar a antipáhca missão de tudo fazer para desassossegar o Governo e o PR. Mas esta vantagem tem o seu reverso: um PCP absurdamenk diminuído em dois meses. O desprestígio é inevitável. E Octávio Pato é a face que tem de aguentar<• ricochete dos benefícios que os comunistas colhem quando passam votos para Otelo. Uma aphcaçfo facial que Octávio Pato não conseguiu esconder de um público qquc acolheu com gargalhadasº' \Cu' apuros.

35 a la minuta

A QUEM SERVE O PAPÃO segurança rodeou-lhe a figura. Aplau­ DA FUR Ã FRU DA "EXTREMA-ESQUERDA"? sos. Nas escadas, a vaia, de resposta ü encenação montada, quase foi abafada Na madrugada de 28, o Movimento A percentagem relativamente gran­ no cortejo triunfal. de Esquerda Socialista divulgou o seu de de votos alcançados pelo major Ote­ Metade das gentes que enchiam as propósito de impulsionar a constitui­ lo Saraiva de Carvalho cria condições instalações destinadas aos jornalistas ção de uma soit-disante Frente Revolu­ para que o papão da "extrema-esquer­ era. afinal, a corte otelista. Supondo cionária Unida, FRU. Alicerçado numa da" se erga, imponente, na cena políti• que eram jornalistas, comprovava-se. soma de votos não desprezível, o ote­ ca portuguesa, nos tempos mais próxi• pela abundância, a preocupação de cer­ lismo faz-se eufórico e surge o triunfa­ mos. Dir-sc-ia, se tal acontecesse, que a tos Conselheiros da Revolução: a infor­ lismo. Ressurge o projecto das frentes fortuna batia, uma vez mais, à porta mação está a ser assaltada pelo rcaccio­ unitárias rotuladas de revolucionaris­ do PC'P, na António Serpa. Quando a narismo. mo. ta epopeia, o grito, o assalto. linguagem dos votos parece, à primei­ O certo é que, acarinhado, amima­ Lembrados estamos dos tempos em ra, desferir um duro golpe na táctica do e louvado, Otelo lá foi conduzido que da CODICE, do SDCI, do COP­ pcccpista, as atenções desviam-se con­ ao anfiteatro das Conferências de Im­ CON, do PCP, do MDP e tutti quanti tra o "mostrengo esquerdista", pou­ prensa. E botou discurso: nasceu uma FUP gonçalvista (Frente pando o cunhalismo. dando-lhe ensejo - Saúdo os jornalistas presentes, Unida Popular), imediatamente deriva­ para recuperar o fôlego e lamber as mesmo os que fizeram "uh" em vez de da numa FUR (Frente Unida Revolu­ feridas. me aplaudir, começou por dizer. cionária). Nelas participou, e deixou Posta a questão nestes tim1os, re­ Foi o mote. A obrigatoriedade de de participar, o partido do dr. Cunhal. sulta a pergunta: a quem serve o papão aplaudir ficou depois demonstrada, A agora anunciada FRU exclui, parece, da "extrema-esquerda"? quando a claque otelista mostrou o o PCP. À superffcie, pelo menos, para que valia. Jornalista que não fosse da sermos cxactos. cor (o jornalista tinha de se identifi­ Enfim, da FUR à FRU. J\ludam-sc E OBRIGATÓR IO car), que fizesse perguntas menos con­ os tempos, trocam-se as letras. APLAUDIR OTELO venientes, era insultado. A claque batia as palmas às respostas. A claque, iden­ A LUZ Quando o major Otelo - teatral no tificada com o "V" de visitante, fazia TAMBÉM FA LTOU ... seu cabelo branco. no gesto largo e perguntas, esclarecia-se a si mesma, no sublinhado, na voz declamante e puxa­ estilo das perguntas e respostas dos Faltava a luz nos candeeiros da Ave- da do peito, como mandam as regras catecismos. 1lida Defensores de Chaves, frente à entrou no auditório Gulbenkian, a cla­ Ficámos a saber. I: obrigatório porta da FSP, perdão. da Comissão de que confluiu. Em rodopio, em bicha. aplaudir Otelo. O ritual de Nero já se \poio à Candidatura de Otelo, na noi­ cm torvelinho. O respectivo serviço de impôs naquela corte ... te das eleições. Pergunta-se: seria para não se ver a cara triste dos que saíam? Ou para justificar a clandestinidade de um can­ didato cm pena suspensa?

CALIXTO FOI CALIXTO Na conferência de Imprensa que os porta-vozes dos três candidatos, excep­ to Eanes, deram ao princípio da noite de domingo, o representante da candi­ datura de Pinheiro de Azevedo, Fer­ nando Calixto, pôs os auscultadores das traduções simultâneas. E pô-los ao que parece por ver os outros fazê-lo, pois ligou-os no canal da tradução inglesa e, às tantas, a uma pergunta de um repórter cm portu­ guês. Calixto "ouviu-a" em inglês. Pe­ rante o pasmo e o riso geral, cm vez de resposta deu um " I do not speak en­ glish" ... 36 mente de "expressão francesa" este de­ sabafo que traduzimos: "É inacreditável! Ele reúne tudo o que os PC's têm de pior. Nunca pensei poder ouvir, cm 1976, um comunista ainda falar assim!"

RECORD A-SE A ANEDOTA DA HIE­ NA Uma das mais bem dispostas indivi­ dualidades que estavam presentes no Centro ela Fundação Gulbenkian du­ rante o apuro elos resultados das elei­ ções presidenciais era J\1anuel Serra ... que ria, ria, ria. O seu riso redobrou quando, cm frente de um dos muitos aparelhos de televisão espalhados pelo Centro. se­ PATO REA L Tudo isto diz muito do que aquela guia a conferência de Imprensa que conferência teve. Octávio Pato estava dando. E tornou­ O único restaurante aberto nas pro­ -se verdadeira e salutanncntc desopi­ \.Unidadcs da Fundação Gulbenkian, a QUE IMPRENSA lante quando Oct<ívio Pato se \'iu "a­ cerca de 100 111, chamava-se curiosa­ PREOCUPA O CR? trapall1ado" para explicar a percenta­ mente Pato Rea l. Coincidência? Ou gem e a proveniência ele votos de Otelo contradição do PPM? Mal Otelo irrompeu na Gulbenkian, Saraiva de CarvaU10 e afirmou que não a Imprensa ovacionou-o com delírio. só esses votos poderiam cm data próxi• PRATO DA NOITE: Tímidas vaias faziam-se ouvir entre os ma reverter a favor do PCP como tam­ PATO COM ASNEIRA fogosos aplausos. A mesma cena repe­ bém que Otelo estava tentando criar tiu-se na Conferência de Imprensa que um novo partido político. A conferência de Imprensa do can­ se seguiu. Apenas Otelo abria a boca E como Manuel Serra continuasse :1 didato Octávio Pato foi um autêntico fervilhavan1 as palmas mas desta vez os rir csfuziantcmcntc recordamos a vellia festival. protestos eram praticamente inaudí• anedota da lúena. Começando com a afirm«·~ão de vcis. E pensar que o ConscU10 da Revo­ que estas eleições presidenciais fnrmn lução está muito preocupado com a mais uma vitória da esquerda, justifi­ escalada da Imprensa rcaccionária. A A MOSCA E O PATO cando-a perante as gargalhadas dos pre­ nao ser que também considere rcaccio­ No Centro da Fundação Gulbcn· se ntes, e concluindo com a frase-chave nária a Imprensa que serve e impõe k.ian na noite e madrugada que se se­ com o mesmo significado da primeira Otelo. guiram ao dia adas eleições presiden­ "mostrou-se uma tendência do eleito­ ciais, Luís Sttau l\1onteiro estava junto rado para a esquerda" ... JA CASE SABIA do bar enquanto Otelo Saraiva de Car­ ·- \las, no "quente" da sala a inter­ valho dava uma conferência de Im­ venção de uma jornalista brasileira não a Conferência de Imprensa dada prensa no Auditório 2, à qual se seguiu passou despercebida. Começando por por Otelo na Gulbenkian, "Pági­ urna outra conferência dada por Oct.i­ discursar cm tom de "internacionalis­ na Um" destacou-se como pergunta­ vio Pato. Antes desta se iniciar, Sttau mo prolcttírio", concluiu muito natu­ dor. E já que se trata de perguntar, Monteiro perguntava para alguém a seu ralmente que tudo o que se passou se perguntamos: porquê perguntar o que lado: deveu a que "a esquerda portuguesa já se sabe? "É o Pato, agora? É! Então vou fosse uma esquerda de m .... "! ouvi-lo. Este in tcrcssa-mc." Mas continuando com afirmações C'EST INCROY ABLE E foi. E esteve até ao fun. monolíticas e descabidas, mereceu de No final da conferência de Impren­ Reconhece-se neste episódio o ho­ um outro jornalista a frase: "Cala-te, sa dada por Octávio Pato no Centro da mem que na "Mosca" recomendava os fascista !" Fundação Gulbenkian, um jornalista melliores restaurantes de Lisboa e arre­ Ao que ele não se fez rogado cm francês, tirando dos ouvidos os auscul­ dores além de que ficamos a saber qual retorquir: " Fascista é a p ... que o pa­ tadores da tradução simultânea, con­ o prato preferido por Sttau Monteiro "'- riu ... " fiou, boquiaberto, a um colega igual- Questões de gastronomia. 37 O FIM DOS MITOS RESULTADOS FINAIS RAMALHO EANES ...... 2 967 484 - (61,54 por cento) OTELO S. CARVALHO... 796 392 - (16,52 por cento) Uma grande deslocação de PINHEIRO DE AZEVEDO 692 382 - (14,36 por cento) áreas de influência caracterizou o OCTÁVIO PATO ...... 365 371 - ( 7,58 por cento) resultado final destas eleições pa­ ra a Presidência da República. .,. N v "B ln ()O e: Junho trouxe novidades, das quais a M v o 2: ,... o ~ mais relevante foi o agrupamento de ()O- ,... ,... o v v M Q. (D algumas forças, dispersas na. anterior (D ô -vN - ida às urnas, à volta de Otelo Saraiva e:., ELEIÇÕES. de Carvalho. N ~ - o ô LEGISLATIVAS O facto é que Otelo alcançou 16,52 - a. e:., ID M u por cento, colocou-se em segundo lu­ "'M M. gar e foi o único candidato que conse­ ln~ ELEIÇÕES º guiu ultrapassar Eanes à cabeça de um PRESIDENCIAIS distrito - Setúbal. Do nosso ponto de vista, interessa analisar o porquê de Otelo ter alcança• do tal percentagem, na medida em que esta candidatura, com o seu conse­ quente resultado, pode vir a servir de ponto de clivagem no futuro do pro· cesso político português. Uma primeira conclusão a tirar dos números finais refere-se à transferência do eleitorado potencial de Octávio Pa­ to para Otelo. É notório que cerca de metade dos que votaram PCP em Abril o ô deram, agora, o seu apoio a Otelo. Mas e., e., u u já deixa de ser tão claro que isto repre­ o sente uma grande derrota para o parti· e:., do de Cunhal. u Na láctica geral do Partido Comu· nista, resulta positiva esta deslocação, já que as forças que envolvem o major Otelo podem vir a ser responsabiliza­ das pelas futuras contestações, ao pas­ so que o PCP tem, a partir de resulta­ dos percentuais tão reduzidos, a cober­ tura de "bem comportado" e democrá­ ELEITORES VOTANTES VOTOS VOTOS NULOS BRANCOS tico, tão útil nesta altura de negocia­ INSCRITOS ções governamentais. E não nos esqueçamos que, por mais triunfalistas que se mostrem os na que tende a agudizar-se. Do bloco ram confümar mais dois aspectos: pri· eleitores de Saraiva de Carvalho, quem unitário de Abril, vemos agora um PS meiro, uma certa garantia de fidelidade continua a ter 40 lugares no Parlamen­ tripartido. Embora a maioria tivesse do eleitorado do PPD, que, pratica­ to e posições-chave no aparelho poltti­ votado Eanes, uma boa margem mente, não dispersou os seus votos pe­ co-militar de Portugal é o PCP. Ou apoiou Pinheiro de Azevedo, e outra, los vários candidatos, mostrando as­ seja, na prática, os 7,58 por cento de Otelo Saraiva de Carvalho. Esta franja, sim, ser o partido democrático mais Octávio Pato não alteram, no essencial, defensora da tese da "maioria de es­ coeso; em segundo lugar, que as per­ o poder de manobra do PCP. É certo querda", engrossou consideravelmente centagens obtidas por Eanes nos distri­ que perderam votos, mas arriscamos os votos de Otelo. A curto prazo, o tos alentejanos e em Braga deitam por perguntar se já não contavam com is­ resultado destas eleições pode vir a ter terra a conhecida tese cunhalista de so ... reflexos importantes dentro do partido uma divisão geográfico-política do Quanto ao Partido Socialista, estas de Mário Soares. País. eleições vieram confirmar a crise inter- Por outro lado, tais resultados vie- • F.F. H A cultura foi um tema que dos bens que constitui o cerne do que Ramalho Eanes põe a tóniça no ocupou significativamente o dis­ programa do PR. Também o respeito valor identificante da cultura. E, como curso de Ramalho Eanes no pela liberdade de criação achava-se noção consequente, vemo-lo subenten­ decorrer da sua campanha. É implicitamente patente na consagração der na base de uma expressão cultural mesmo forçoso reconhecer-se das liberdades fundamentais que dão genufua a outorga de urna completa substância à democracia política perfi­ liberdade à actividade criadora e ao que, de todos os candidatos, foi lhada por Eanes como ponto de pensamento humano. Tal é o sentido ele o único que deu amplo lugar partida para a democracia económica. das palavras proferidas pelo então nos seus discursos e entrevistas à Mas aquele que viria a assumir a candidato numa entrevista concedida a questão cultural. chefia do Estado quis ir mais longe, "Jornal Novo" (8-6-76): "~na diversi­ reservando à cultura um papel decisivo dade de pensamento que se forjam a Porquê esta acentuação suplemen­ nas linhas ora lançadas para a reorgani­ dignidade e o poder criativo dos povos tar da importância concedida à cultura zação da vida nacional. E, de todas as capazes de alicerçar em genuínos na reconstrução da sociedade portu­ suas afirmações alusivas à questão valores culturais o seu progresso social, guesa? Quando dizemos suplementar cultural, extrai-se a preocupação domi­ político e eoonómico." queremos fazer notar que o encareci­ nante de que a cultura é uma Também numa outra entrevista mento da cultura se inscrevia natural­ componente fundamental da indepen­ dada a "VM'' (17-6-76) o entã'o CEME , mente na ordem de democratização dência da Nação. ~ nesta perspectiva reforça o seu apreço pelo papel da ~ 39 cultura como factor personalizante de PR surpreendeu a assistência, recusan-­ existência a nível cultural de proble­ um povo. "A cultura - diz Eanes é, do-se a exprimir-se noutra língua que mas graves que "a não serem enfrenta­ sem dúvida, o primeiro valor que não a sua e exigindo mesmo tradução dos, poderão acarretar consequências defines uma identidade nacional. De­ para português de todas as perguntas funestas no futuro". Referia-se o PR à fendê-la como expressão autêntica de inclusive as que eram feitas em "crise generalizada e permanente no um povo, preservar os seus diversos espanhol. O significado dessa atitude sistema de ensino, à intoxicação elementos, tomá-la viva e sentida por foi de. resto sublinhado com o seguinte ideológica a que tem estado submeti­ todos e não a penas por qualquer comentário de alguém que a interpre­ do, ao desprezo a que foi votada a "elite", fazê-la conhecida no confron­ tou correctamente: "Finalmente apare­ nossa história, tanto pelo regime de to de outras culturas eis a obrigação de ce um que não mostra subserviência Salazar - que dela se serviu com quem se pretende um verdadeiro cultural perante os estrangeiros." intuitos obscurantistas - como pelos patriota." É ainda Ramalho Eanes que, em revolucionários de papel, ignorantes De facto, não pode ser de todos Coimbra, num breve improviso, esco­ acerca do povo que diziam ir libertar. Destacámos nas palavras que duran­ uma cultura que não seja o desenvolvi­ lhe como tema de fundo a evocação de mento das suas infra-estru turas, que Camões. Porquê? Porque - disse - na te a sua campanha eleitoral, Ramalho Eanes dedicou à situação e perspecti­ não converta em valores estéticos, situação dramãtica que Portugal atra­ valores sentidos pela alma colectiva. vessa parecia-lhe necessário invocar vas da cultura portuguesa (e não foram poucas) as passagens que articulam Lucidamente Eanes toca neste pas­ "esse homem independente, militar e uma visã'o certíssima da questão so um aspecto fulcral do que se deve sobretudo português que foi e cantou posta · no grande plano da indepen­ entender por democratização da cultu­ com os nossos defeitos e as nossas dência nacional. ra. virtudes não apenas vitória e batalhas É subentendido da sua perceptiva a Na perspectiva que em literatura e mas sobretudo o povo". E rematou arte tomou o nome de realismo propondo que nos identificássemos valorizaçã'o de uma linha cultural escamoteada pelo regime anterior e socialista e no plano pedagógico com Camões porque isso equivalia a submete os métodos de ensino à identificarrno-nos com o povo portu­ pelos tais "revolucionários de papel" veiculação dos interesses do Estado guês. que secundaram o fascismo num totalitário, o que se chama democrati­ Deste extracto do discurso do dirigismo alienante. Nela avultam as zação da cultura exerce-se no sentido general Eanes salienta-se ter ele posto instituições democráticas que se afir­ de impor ideias concebidas por uma em realce uma situação dramática. maram ao longo da nossa história e a elite. O elitismo disfarça-se em noções Temos aqui uma alusão ao risco de se luta pela liberdade que, logo no tais como "literatura proletária", "le­ perder a independência nacional, sen­ dealbar da nacionalidade se manifestou var a cultura ao povo", etc. C'on tudo do a cultura portuguesa expoentizada no combate à prepotência clerical. no próprio conceito de levar ao povo em Camões considerada o grande Completa-se esta óptica na compreen­ exprime-se a ideia de que os valores agente de integração do homem são de que a liberdade criadora que se transportados lhe são alheios. português na sua realidade psicológiéa materializa em cultura é o nó da e histórica. Neste ponto cultura e dignidade nacional quer no que respei­ A democratização cultural tal como independência nacional coincidem to­ ta à vida interna da sociedade quer no a define Ramalho Eanes, não leva ao talmente. E eis porque, na entrevista que concerne à independência da povo porque não é condutora do sentir · que deu a "VM" Eanes aponta a Nação. e do pensar populares. Faculta, sim, ao • N.C. povo a liberdade de se exprimir livremente, dando forma à sua apetên- cia criadora, forma essa na qual se o t 1 fixam os padrões culturais da socieda- s ac os e as pa.avras de que se rege espiritualmente por eles. - · Completan1ente, a democracia econó- O percurso político da candidatura candidatura, em 19 de Maio, até aos mica estabelece o acesso do povo à do general Ramalho Eanes, embora discursos proferidos durante a última cultura superestruturada que dele apresentando uma direcção definida semana da campanha, tudo aquilo que emana. com o correr das semanas, não deixou se apresentava vago e abstracto para o Cultura de características fortemen- de ter os seus acidentes. Acidentes eleitor ganhou precisão e objectivida- te identificantes, repetimos que fun- que, em termos políticos, se manifesta- de. Ramalho Eanes teve a qualidade de ciona como elo entre o homem e o seu ram por uma certa imprecisão dos se defmir perante os cidadãos, de meio espiritual e físico. objectivos, patente em determinada mostrar que aqueles princípios gerais Torna-se assim compreensível que altura, mais precisamente aquando da que apontara no início - princípios Ramalho Eanes valorize primacialmen- divulgação, pelo general, do seu que até poderiam ser subscritos por te a dignidade da língua pátria. Com Manifesto eleitoral. - outros candidatos com opções políti- efeito, logo na sua primeira conferên- Da comunicação de Ramalho Eanes cas totalmente diversas da sua - eia de Imprensa o então candidato a à Comissão Nacional de Apoio à sua correspondiam, de facto, a uma linha 40 -

objectivos que se propunha defender de Novembro pôs termo a um clima de intransigentemente: a institucionaliza­ golpismo e de anarquia, que só poderia ção da democracia, a garantia da conduzir de novo Portugal à miséria e independência nacional e a coesão das à ditadura" era pouco como remate de Forças Armadas. Estes fundamentos um texto em que se alinhavam (ou significavam algo de muito importante. deveriam alinhar) as directrizes progra­ Contudo, o comum dos portugueses máticas do possível futuro Presidente vira-os apregoados, durante meses e da República. meses, pelos próprios sectores que A ambiguidade na linguagem e na lançavam a anarquia, ;uneaçando seria­ definição de posições que caracteriza mente, com essa actuação, a indepen­ certas formações políticas, cujo papel dência e a liberdade. O general tem sido o de constituir charneira avançou, nessa mesma altura, a divisa entre dois períodos ou duas situações que constitui, afmal, o trunfo inesti­ em que as forças antidemocráticas são mável da sua campanha. Divisa e afastadas da cena, parecia ser evidente trunfo que ele viria a repetir, mais para os analistas políticos. Os cidadãos tarde, perante milhões de portugueses, sentiam que havia algo que não ao encerrar a sua intervenção na mesa caminhava bem. Por experiência, já se redonda promovida pela televisão, sabia que as "charneiras" representa­ poucos dias antes do início da vam nada mais do que a tentativa de campanha: Sou um homem a quem a prolongamento da situação anterior, vida ensinou a avaliar o seu semelhante agora sob outra forma e com outros mais por aquilo que faz, do que por nomes. Falou-se no GIS. F~ou -se em aquilo que diz . Gostaria que o Povo personalidades próximas dessa forma­ Português me julgasse pelo mesmo ção que estariam colocadas em luga­ critério. Ainda era cedo para o res-chave dds serviços da candidatura. eleitorado poder compreender e aderir Falou-se, ainda, em membros de um a esta divisa. Faltava-lhe o conheci,, partido, conhecidos por desenvolver, mento concreto, palpável das soluções dentro deste, teses muito próximas das propostas pelo candidato para os de outro candidato presente na corrida problemas mais importantes da vida para Belém - mais concretamente, de nacional. Faltava-lhe poder aferir essas Octávio Pato. soluções com a actuação passada de Estas posições - ou infiltrações, Eanes. f;'altava-lhe, ainda, a possibilida­ conforme a perspectiva que se tiver de de compará-las com as propostas dos acontecimentos - não fizeram '· dos outros candidatos. E as duas carreira na candidatura. Passada uma semanas que se seguiram mostraram semana sobre o Manifesto, a campanha que, em Eanes, os actos correspondiam viria a tomar a sua característica às palavras. definitiva. Poucos dias antes, Eanes ' As palavras de Ramalho Eanes em 1 dera um passo muito importante nessa de Junho não constituíram o passo direcção: recusara publicamente o que se esperava para a completa apoio do PCP para a sua candidatura. A vantagem duma linguagem não clarificação do seu Programa. O A possibilidade de uma colagem aberta ambígua Manifesto ameaçou lançar a confusão deste partido ao candidato melhor em sectores bem vastos dos apoios à colocado na corrida presidencial, ac­ programática que grande parte do candidatura. Certos observadores vi­ tuação bem provável devido à situação eleitorado ansiava, como expressão das ram nele o perigo de se apresentar wn algo delicada em que o partido do dr. suas aspirações mais sentidas, para o novo caso de viragem repentina, a que Cunhal se encontra, ficou, assim, período que se abre na vida política do nos haviam habituado ttmtm militares seriamente comprometida. Na confe­ País. no pós-25 de Abril. Os graves proble­ rência de Imprensa de 8 de Junho, em A 19 de Maio, o cidadão António mas a resolver, a forma como se Lisboa, Eanes precisa a sua posição Ramalho Eanes, chefe do Estado­ abordava questões tão importantes retomando o tema. O PCP, diz Eanes, ·Maior do Exército, vencedor do 25 de . como as da Reforma Agrária, do sector não tivera ao longo deste processo uma Novembro, ex-presidente do Conselho público, da participação dos trabalha­ prática realmente democrática, porque de Administração da RTP e figura dores na gestão eram colocados sem o não tinha havido coincidência entre a imensamente prestigiada no seio das devido contraponto. Onde se encontra­ prática objectiva diá ria do partido e as F'orças Armadas, anuncia à Comissão vam precisamente os erros? Quem afirmações dos seus dirigentes. O de Apoio da sua candidatura os eram os responsáveis? Dizer que "o 25 general havia esclarecido o seu concei- 41 to de democracia na alocução de indispensável. A esperança de um a cérebro da derrota da tentativa falhada abertura proferida nesse dia. É um verdadeira Reforma Agrária revive nas de 25 de Novembro, após a qual as va lor fundamental, dissera. E precisan­ propostas do candidato. Forças Armadas deixaram de consti­ do, acrescentara: É necessário defen­ O golpismo, a sua denúncia e o seu tuir aquele fermento de instabilidade e dê-la de todos aqueles que a utilizam ... combate constituem, talvez, o traço anarquia que ameaçava a independên­ prostituindo-a. É necessário, portanto, mais relevante das intervenções de cia e::a democracia. ter em consideração o comportamento Eanes por todo o País. Em comícios e Os discursos de Eanes e o seu de todos os grupos que, antes e depois nas breves intervenções fe itas aqui e programa ganharam em clareza e do 25 de Abril, pretenderam não ali, onde as solicitações eram mais definição com os ataques de Pinheiro considerar a democracia( ... ). É eviden­ prementes, Eanes combateu com vee­ de Azevedo e Saraiva de Carvalho. A te que aqueles que tiveram tal mência todas as manifestações do 22, em Coimbra, Otelo é acusado por comportamento terão de ficar sob chamado "poder popular". As leis não Eanes de ser responsável pelo estado controlo, sob vigilância. Respondendo serão desrespeitadas por min orias, não miserável a que este país chegou. O a um jornalista, Eanes diria que haverá mais a imposição de modelos de confronto televisivo proposto por pretendia que o PCP se integrasse nó sociedades contrárias à vontade do Eanes e que não teve lugar devido à jogo democrático, mas se a integração povo e não mais se repetirão situações inesperada enfermidade que vitimou não se fizesse e a prática antidemocrá­ como as verificadas antes do 25 de Pinheiro de Azevedo revelaria, por tica persistisse, não teríamos pejo Novembro, asseverou Eanes em Faro certo, mais pormenores dos fabricantes nenhum em actuar com determinação. nos primeiros dias da campanha, de golpes e seus envolvimentos. Esse Esfumam-se as ambiguidades. O que enquanto no exterior do recinto repto, aliás, demonstra precisamente o é branco é branco e o que é preto é elementos da segurança se envolviam à-vontade do general. A iniciativa preto. Esta passará a ser a norma do em cenas de pugilato com provocado­ pertence-lhe porque o seu passado é candidato. Não mais falará da demo­ res que tentavrun desmobilizar os intocável, porque. não se recusou a cracia e das liberdades sem denunciar participantes no comício. Na Covilhã, enfrentar os assuntos da campanha os perigos que a ameaçam, sem dizer Eanes fora mais claro: ao lembrar o 25 duma forma aberta chamando as coisas donde eles vêm e sem apontar o de Novembro. o general referiu a pelo seu nome, apresentando clara­ remédio para esse mal. Não importa possibilidade de o repetir "caso voltas­ mente" as soluções que se impõem e transferir a dependência do homem se a ser necessário". Durante a última que o eleitorado deseja ver tomadas. que trabalha a terra, do patrão para semana da campanha, o perigo do Paralelamente ao combate ao golpis­ patrões, diz Eanes, referindo-se ao golpismo foi insistentemente apontado mo, Ramalho Eanes defendeu insisten­ importante problema da Reforma por Eanes. Os ataques tempestuosos de temente a reconstrução do País. É Agrária, tão mistificado por certas Otelo e Pinheiro de Azevedo levaram necessário relançar a economia, condi­ forças e que os partidos democráticos Eanes a revelar o comprometimento de ção necessária para a melhoria das não têm sabido ou querido enfrentar ambos em situações golpistas durante condições de vida do povo português. com firmeza e detemlinação. Os os dois anos decorridos desde o 25 de A perigosidade de uma ruptura neste "novos patrões" instalados nos sindica­ Abril. O conhecimento pelo grande campo éS!JOSta em termos da indepen­ tos e nas unidades colectivas de eleitorado das situações em que o País dência nacional. Terei a maior preocu­ produç!i'o são o nó da questão. Há que foi sucessivamente metido para que pação em defender aquilo que faz com começar por os denunciar e dizer uma minoria pudesse ficar em condi­ que os povos possam defender e viver claramente o que são. Em Évora, ções de dominar o poder de Estado os seus projectos de maneira capaz­ aquando dos graves incidentes aí não é ainda claro e completo. Os mente livre. E isto é a independência registados que culminaram com a cidadãos compreenderam que a técnica nacional. Eanes demarcou com preci­ tentativa de alvejamento de Eanes, este do golpe foi usada sistematicamente são a situação de Portugal no concerto apontou como responsáveis certos para esse efeito. O 11 de Março, o 28 internacional, não fazendo depender a homens que já não trabalhavam antes de Setembro continuam por esclarecer nossa soberania quer dos Estados do 25 de Abril, não continuam a em termos oficiais. O próprio 25 de Unidos (como aconteceu com "gaffe" trabalhar agora e entre os quais se Novembro ainda se encontra com monumental de Pinheiro de Azevedo) encontram alguns trabalhadores que muitos pontos por esclarecer apesar da quer da União Soviética. Relativamen­ deixaram de trabalhar. Os alentejanos maioria ter compreendido plenamente te• d esta, ·chegou a apostrofar aqueles sabem quem são estes homens. E a o carácter do golpe e identificar quais que estavam dispostos a vender a no~ Imprensa noticiou o entusiasmo, a as forças nele comprometidas. Eanes é liberdade a sóis que não nos aquecem. inesperada afluência registada nos o candidato que, para além de se A união com os países europeus é comícios do general Eanes em terras afirmar contrário ao golpismo, surge apontada e preconizada, materializan­ alentejanas. Eanes nã'o teria desaponta­ aos olhos do eleitorado como o único do assim uma tendência dominante no do os seus ouvintes ao anunciar que que não se encontra envolvido em Velho Continente e que, conjugada teria de ser revisto com rapidez o caso qualquer dessas maquinações que mar­ com o desenvolvimento económico dos trabalhadores que ocupam lugares cam o ziguezagueante caminho do nacional, poderá propiciar grandes para os quais não têm a qualificação pós-25 de Abril. Mais ainda: ele foi o vantagens para o nosso país. e J. M. 42 - : ESBOCO POLITICO E BIOGRAFICO DE RAMALHO EANES

António dos Santos Ramalho Eanes tem 41 anos e nasceu no dia 25 de Janeiro de: 1935, na Beira Baixa. A inf'ancia viveu-a, junto de seus pais e irmãos, em Alcains, sua terra natal, no Um "curriculum" acima de tudo concelho de Castelo Branco. de honestidade Em Outubro de 1950, depois de ter concluído o Curso Geral dos Liceus, ingres;ou na Escola do Exército. Alferes de Infantaria em Agosto de 1957, é, sucessivamente, tenente (1959), capitão (1961); graduado em major em 1970 é promovido a este posto em 1973 e a tenente-coronel em 1974. No cumprimento de inúmeras co­ particularmente ao liderar de maneira major. Contudo, a rectidão de seu missões de serviço, esteve no Estado da firme o movimento de protesto contra carácter desagrada àqueles que preten­ fudia (1958 a 1960), em Macau (1962) a farsa do Congresso dos Combatentes, diam monopolizar os órgã:os de Comu­ de onde seguiu para Moçambique organização de intenções ultrafascistas. nicação Social e que, por isso, tentam, (1964 a 1966 e, depois, em 1968) e Além disto, a sua presença salientou­ por todos os meios, desacreditar a para a Guiné, em 1971, tendo-se -se, ainda, em movimentos de reivindi­ figura de Ramalho Eanes. Inutilmente, ocupado de um prohecto socioeconó• cação de carácter profissional, bem porém. A sua honestidade ficou mico para a área de Teixeira Pinto, a como nas reuniões preparatórias que inequivocamente demonstrada no in­ mais duramente batida pela brutalida­ deram origem ao Movimento dos quérito às actividades exercidas na de da guerra. Em Portugal, depois de Capitães, nomeadamente em casa do RTP, por ele próprio exigido. Feita ter sido instrutor de educação física na então capitão Vasco Lourenço e de justiça, és colocado no Estado-Maior Academia Militar, foi, mais tarde, Nuno dos Santos. A sua honestidade, General das Forças Armadas, já com o chefe da Direcção dos Serviços Cultu­ porém, levou-o a não fazer parte do posto de tenente-coronel, colaborando rais, na mesma Academia, cargo cujo grupo que ~ liderou esse movimento, também nos Serviços de Apoio ao desempenho mereceu, da parte do pois, mobilizado para o Ultramar, Conselho da Revolução. Neutralizada a comandante general, rasgado louvor poderia partir em qualquer altura, não tristemente famosa Quinta Divisão, foi público. lhe sendo possível, desse modo, incumbido da sua reestruturação. Du­ Além do Curso da Escola do assumir as responsabilidades que lhe rante o Verão quente de 1975, foi um - Exército, que completou em 1956. caberiam, mantendo-se , no entanto, dos resistentes ao gonçalvismo e obteve ~diplomas do curso em Métodos em contacto estreito com os seus subscritor do "Documento dos Nove", de Instrução (1961) e Instrutores de camaradas. embora, como ele próprio afirma só Educação Física, assim como frequen­ Derrubado o fascismo, foi Ramalho concorde com algumas das ideias de tou estágios de Guerra Subversiva no Eanes imediatamente chamado a Por­ Melo Antunes: "Com algumas delas CICE (1962), de Acção Psicológica no tugal para fazer parte da comissão sim, mas só com aalgumas." No dia IAEM (1969) e de Actualização para "ad-hoc" para os meios de Comunica­ crucial de 25 de Novembro foi a ele, Oficial Sllperior (1973). Paralelamen­ ção Social; seguidamente, como ho­ em grande parte, que o povo português te , frequentou, também, a Faculdade mem de confiança do MF A, é ficou a dever a liberdade que continua de Direito de Lisboa e o Instituto nomeado, director de programas da a desfrutar, evitando a implantação de Superior de Psicologia Aplicada. RTP e, em 28 de Setembro, presidente um novo fascismo. Nesse dia, de facto, O 25 de Abril de 1974 apanhou-o do Conselho de Administração, lugar a sua acção foi decisiva, quer como em Angola. Entretanto, a sua acção que aceita mediante certas condições, dirigente militar quer como político, para o derrubamento do fascismo, em concretamente a de continuar a junto de Costa Gomes, obrigando-o a > Portugal, tinha-se feito já sentir, receber simplesmente o vencimento de decidir-se pela oposição aos rebeldes. 43 Posteriormente, depois de coroadas valorosa, apta a defender a liberdade e' compete. E também a questão de saber de êxito as acções militares de a independência nacional. qual o grau possível da sua viabilidade. neutralização dos contra-revolucioná­ Ramalho Eanes ficará, sem dúvidJ. cm tennos de um necessário (indispen­ rios, ocupou as funções de chefe de na Úistória de Portugal. como figura sável) realismo político e económico. Estado-Maior do Exército, lugar para ligada às lutas do povo português por Por outro lado, "a iniciativa privada que foi escolhido pelos seus camara­ uma sociedade melllor. - disse Eanes - terá, também, neste das. Neste seu novo cargo, como é do processo de transformação, o seu lugar conhecimento de todos, empenhou-se • J.A. próprio bem definido e a sua função cm tornar o Exército uma instituição de estímulo competitivo". Ou seja, a ao serviço do povo, prestigiada e concorrência entre os dois sectores, fundamentando-se no pressuposto de oportunidades e condições idênticas. Na conferência de Imprensa por ele Eanes dada em 8 de Junho, acentuou que a • iniciativa privada é "imperativamente e os factos ec,onõmicos necessária neste país", apontando-lhe uma "contribuição socialmente inte­ grada". Contudo. subsistindo uma economia A CONSCIENCIA DO DIFICIL de mercado, os dois sectores atrás "Teremos de resolver problemas da as linhas gerais da Constituição mos­ referidos existem como pólos de uma maior gravidade: o aumento do custo tram ineq1.úvocamente a compreensão contradição que, até à data, não de ~vida, a ausência de investimentos, o de essencial de que este presidente mereceu dos nossos economistas e desemprego, o desequilíbrio nas balan­ quer dar provas de ter. E ela é a políticos a indicação de pistas para ças comercial es de pagamentos ... " - garantia primeira de que a nau uma solução eficaz. Um sector privado são palavras do Manifesto apresentado governativa poderá ser conduzida com "socialmente integrado" pode pressu­ ao País pelo general Ramalho Eanes, eficiência. Porque se os poderes do por, nas condições actuais. a depen­ no decurso da sua vitoriosa campanha Presidente são constitucionalmente li­ dência absoluta do sector estatizado. eleitoral. Ficou nelas patente a gravida­ mitados (Pato "dixit"), não são, na com a agravante deste se encontrar de da situação económica em que a Constituição e na prática, nulos. falido. Se assim for, a iniciativa privada nação portuguesa se debate. ECONOMIA ESTATAL não poderá ser um estímulo e o seu Mas já na comunicação de 19 de E SE CT OR PRI VADO lugar continuará indefinido ... ou, na Maio, na qual anunciou a candidatura, pior das hipóteses, demasiadamente o general Eanes tinha sublinhado "a Numa sociedade em que os ran1os bem definido, relegado a um plano urgência de nos encaminharmos para a básicos da actividade económica estão secundaríssimo. Restará então saber se construção económica do País, actual­ estatizados, em que largas zonas da isso é compatível com as estruturas mente à beira de taxas de inflação produção e da distribuição e a banca económicas internacionais nas quais o alarmantes, de uma precária política caíram sob alçada do Estado, o nosso país se insere. de investimentos públicos e privados, chamado "sector público e nacionali­ Caso contrário, deparar-se-á com a de ausência de planificação e de zado" não podia ser omitido nas necessidade de inverter a actual relação elevado índice de desemprego". preocupações de um presidente. Toda­ entre os dois sectores (estatizado e Dos quatro candidatos presentes na via, Ramalho Eanes, nas intervenções privado). Com as consequências políti• corrida a Belém, Eanes foi praticamen­ de campanha, apenas referiu a sua cas daí derivantes. Com o despontar de te o único a não recear a abordagem da existência - no Manifesto eleitoral: tensões e rupturas políticas e sociais melindrosa questão económica; foi o "O sector público e nacionalizado que só um Estado forte poderá único a não temer olhar de frente os terá de encontrar os caminhos da sua resolver. problemas concretos do País real de viabilidade, deixando de ser um Interessa ver aqui o esforço de que, por vontade popular, se tornou encargo e passando a desempenhar, de Eanes para a reabilitação do empresá­ Presidente. facto, o papel dinâmico que lhe rio. De maneira pouco ortodoxa (para incumbe no desenvolvimento do País." os sensíveis ouvidos de Otelo Saraiva É facto que o tratamento da É pouco. É o constatar das dificul­ de Carvalho, sobretudo), o Presidente questão económica que, ao longo da dades, sem indicação de causas, sem o Eanes elevou o empresário à categoria campanha, fez, não ultrapassou a seu indispensável enquadramento no de "trabalhador" num país de verbo generalidade dos tópicos, talvez por­ contexto político. Fica a questão de socialista a sua reabilitação nestes que, como disse, não compete "ao saber as razões pelas quais este sector tennos era quase uma inevitabilidade. Presidente da República a definição de até agora não encontrou o "caminho De referir ainda. que o Manifesto um programa de Governo". Mas os da viabilidade", não desempenhou o eleitoral de Ramalho Eanes sugere o tópicos avançados, coincidentes com "papel dinâmico" que, em teoria, Uie desenvolvimento e consolidação de um 44 A coragem de encarar de frente a crise económica portuguesa

eia política e económica. A institucio­ nalização da democracia será isso, ou ficará reduzida a um "slogan" (mais um), esvaziado de conteúdo. Só o Estado, nas condições políticas actuais, poderá conseguir o compro­ misso do capital e do trabalho na reconstrução económica (a tal "paz social"), sem o que nenhuma indepen­ dência nacional é possível. E será bom admitir que tanto o capital como as . classes trabalhadoras não trairão o País. Se sabemos que o proletariado, como classe, não o faz, sabemos todavia que muitos do que em seu nome falam o podem fazer. Infelizmente, as palavras do general Ramalho Eanes (aqui situou-se no terceiro sector, o "movimento coope­ Os passos transcritos omitem a prolongamento do discurso economi­ rativo'', "forma organizada de realiza­ contradição fundame.ntal da nossa co-político do pós-25 de Abril) não ção dos interesses dos produtores e dos estrutura económica - repartida em puseram o dedo na ferida da crise que consumidores". dois sectores distintos que a acção de atravessamos. Porque é necessário determinadas forças políticas tornou ganhar-se a consciência de que a nossa O PLANO quase antagónicas. A reabilitação da crise económica é específica, ainda que FACTOR DE iniciativa privada, empreendida pelo se insira na crise internacional. Esta, RACIONALIZAÇÃO Presidente Eanes, poderá ajudar a ainda agora o sublinharam os peritos ultrapassar a actual desarticulação dos da OCDE, é uma crise de superprodu­ A articulação dos diversos sectores sectores, o que é decisivo uma vez que ção, e a superprodução em Portugal, se económicos, na visão de Eanes ( coinci­ o Plano, só por si, não poderá fazê-lo. existiu, foi fictícia. Porque o nosso dente em absoluto com o firmado na A política (uma política clara e aparelho económico e fictício, estrutu­ Constituição), será conseguida através realista) terá de assumir o comando do rado a partir de um mercado colonial de um Plano, simultaneamente factor Plano e de toda a economia. Ou, na que já não temos. de racionalização e instrumento para alternativa, teremos o suicídio da Daí, o imperativo da reconversão as "transformações económicas e so­ democracia, senão mesmo de Portugal económica, com base nas nossas ciais" pretendidas. No Manifesto elei­ como País independente. viabilidades e nas nossas forças. Daí, o toral, o general Ramalho Eanes distin­ Não se vê o papel que o Estado, imperativo da "paz social", tanto mais gue esse Plano dos "instrumentos principal detentor dos meios de que o erário público está exaurido e o tecnocráticos de crescimento" caracte­ produção e disfribuição, é chamado que resta nos cofres não consente mais rísticos dos países de economia estati­ aqui a desempenhar. O modo como a a turbulência social e política. Na zada do Leste europeu. vontade estatal (há que ter em conta as negativa, resta-nos o adeus às ilusões: Na sua perspectiva, o Plano "deverá flutuações políticas dessa vontade) se de uma democracia que queremos, de também constituir a síntese harmonio­ vai inserir na mecânica da planificação, uma independência por que lutamos. sa das escolhas individuais e colectivas será o critério real da reabilitação Claro que quer o Manifesto quer os dos padrões de vida dos portugueses". efectiva do sector privado da econo­ diversos di.rcursos, declarações e entre­ ~ a interpretação sua de wn passo da mia. Serão os factos a demonstrá-lo. vistas do Presidente Eanes durante a Constituição (art. 94, 2.): "A elabora­ campanha contêm "afirmações genéri­ ção do Plano é coordenada por um A CONDIÇÃO cas", passíveis portanto de "várias Co nselho Nacional do Plano e nela FUNDAM ENTA L interpretações" - isso foi evidenciado devem participar as populações, atra­ pelo próprio em entrevista dada ao. vés das autarquias e comunidades Mas é sobretudo a outro nível que "Jornal Novo". Claro que Eanes é locais, as organizações das classes ·as palavras do Presidente Eanes são Presidente da República e não Gover­ trabalhadoras e entidades representati­ tranquilizantes: a promessa de reabili­ no. Mas espera-se que cumpra a sua vas de actividades económicas." tação do .Estado, garante da democra- única promessa: a de cumprir. AM. 45 Estilo Um .. discurso polltico" inteligente... SINGULARIDADE austeridade que se desprende deste IMPLÍCITA discurso. Note-se que, por exemplo no "Manifesto", a insistência em formas Pede-me a "VM" uma apreciação do política, teremos de procurá-la em verbais que veiculam a obrigatorieda­ "estilo" dos discursos de Ramalho homens cuja actividade polftica é de, a par de um grande número de Eanes. Gostaria de apresentar uma secundária. O pensamento político verbos no futuro. actuam no sentido breve nota introdutória, em três desses homens não visa uma rentabili­ de comprometer (no bom sentido) o alíneas. dade imediata, mas sim a construção candidato. Desta íntima relação entre dum encadeamento de argumentos que austeridade e obrigatoriedade, resulta se deseja o mais irrefutável possível. É como que garantia. A linguagem, 1) A elevada consideração que o caso da oratória sacra, dum Bossuet, sóbria, a verticalidade da posição tenho pela "VM:'', pela sua directora e ou dum António Vieira. É também o assumida, a tentativa de se acentuar o pelos elementos (os que conJlCço) da caso do pensamento revolucionário do carácter do candidato são outros equipa que trabalha nessa revista, século XVIII, com especial destaque tantos ingredientes que tornam vero­ leva-me a responder afirmativamente para a argumentação cerrada de símil a obrigatoriedade. ao propósito referido. Não posso, Montesquieu. Todos sabemos que os partidos todavia, deixar no olvido um facto Um fanático admirador de Robes­ políticos e os homens públicos prome­ muito significatiY'o: o último órgão de pierre Louis Blanc - afirmou que o tem mundos e fundos para obter o Informação onde publiquei algumas último discurso proferido por Robes­ poder. .Mas, se a .POiítica tem memória páginas de "crítica literária" foi pierre na Convenção constituía um curta, a memória dos "políticos", precisamente a "VM", em 1974. Foi monumento imorredouro. Eis um tomados individualmente, é em geral graças a essa actividade que pude ir exemplo do logro em que caem os catastrófica (os ingleses dizem que os observando o crescimento da imbecili­ admiradores da política, apesar de conservadores, na oposição, são mais dade neste pobre país. Por um lado, os Louis Blanc ser uma inteligência progressistas que os trabalhistas, no livros que me ehviavam para crítica superior (e um pensador medíocre) a poder). i: contra esta proverbial podiam quase todos enquadrar-se na qualquer das "inteligências" que, entre leviandade política que o discurso de torrente de verborreia demagógica, ao nós, enalteceram V asco Gonçalves. No Ramalho Eanes sugere (mais do que serviço duma orquestração cujos efei­ fundo, Robespierre era um indivíduo explicita) uma garantia. tos são agora bem visíveis. Por outro desprovido de capacidade argumentati­ Ao fun e ao cabo, todo esse discurso lado - e dada a inflexibilidade da va. Também Trotsky, considerado por corrobora, o slogan "Muitos prome­ minha posição, enquanto crítico -, a muitos como um orador que arrastava tem, Eanes cumpre", enunciado que, provocação rasteira atingiu-me. Voltei mui ti dões, não denota qualqer capaci­ devido a certas leis do discurso, tem as costas a tudo isso e, de lá até hoje, dade de articular argumentos. Esses implícito (logo invisível) uma palavra­ nunca mais me pronunciei criticamen­ oradores, ditos brilhantes, são apenas insuportável. A nossa pobreza oratória Se tivermos em conta o discurso Esta linguagem, por vezes percorrida -chave: "só". Se muitos prometem, só te sobre a obra de ninguém. Saturação, manipuladores ao nível da retórica. O é de tal ordem que Vasco Gonçalves i4emagógico que tem vigorado entre por séries de enumerações (de problc· Eanes cumpre. Repare-se na debilidade desgosto, náusea. êxito dos seus "discursos" deve.se a chegou a entusiasmar pessoas de quem Jós, podemos afirmar que o "discurso mas, de conflitos, de dificuldades, de que a introdução do "só" introduz no uma fogosa expans.ro de lugares-co­ se esperaria um comportamento mais político" de Ramalho Eanes (ou de projectos), é uma linguagem centrada enunciado. 2) É certo que urna apreciação do mu ns (coisa sempre acessível e de sereno, mais lúcido, mais distanciado. Ramalho Eanes e da equipa com quem no substantivo e no verbo, onde é Não admira pois que, ao nível do discurso político - seja ele da autoria efeito quase garantido) numa determi­ O princípio da repetição - talvez mal o general trabalha) funciona em certa raríssima qualquer concessão à reróri• explícito, o discurso político de de quem for - não constitui, a bem nada conjuntura, cujas linhas de força assimilado de alguma escola dramática, medida como um antídoto. ca, onde o apelo ao bom senso Ramalho Eanes seja quase desprovido dizer, um exercício de "crítica literá­ eles vislumbram num relai:ice intuitivo. quem sabe? - foi entre nós tão Sem pretender cair em análises predomina e onde qualquer apelo de argumentação, facto que se traduz ria". Pelo menos, hoje em dia. Bem sei Por isso o famoso discurso que praticado que só se pode responder-lhe "técnicas" da linguagem, tenho de conta mais com a inteligência do numa ausência quase total de agressivi­ que alguns dos mais valiosos textos de Shakespeare põe na boca de Marco com o bocejo. A tentativa de ensaiar chamar a atenção para o carácter receptor do que com os meios dade. A agressividade é a tónica dos Cícero - literariamente valiosos - António, após o assassínio de Júlio em público tais espectáculos, confun­ predominantemente referencial da lin­ propriamente apelativos. Por outro outros, dos que só prometem. Como poderiam facilmente considerar-se co­ César, não tem a mínima probabilida­ dindo o drama com a vida, será IUagem utilizada por Ramalho Eanes lado. o fraco grau emotivo deste só Eanes cumpre, situa-se num escalã'o mo amostragens do "discurso políti• de de existência fora do espaço cénico. porventura mais um dos tais equívocos no seu "manifesto", bem como numa discurso parece ripostar à histeria moral incompatfvel com o ataque co~'. Acontece, porém, que nos chama­ É um modelo de argumentação que, cm que este país é fértil. Conferência de Imprensa, ou até em tantas vezes presente na expressão menos digno. dos séculos clássicos das literaturas no real quotidiano, acarretaria o Atendendo, porém, ao que fica dito entrevistas onde, naturalmente, os irresponsável de alguns agrupamentos Em suma: um "discurso político" europeias, já não é propriamente o linchamento do orador. na alínea 1), passo à exposição dum desvios do "tema" são sempre numero­ políticos. inteligente, dentro das limitações ine­ "dircurso político" que constitui ma­ "parecer" acerca do discurso favorável sos, por razões que são do conJ1eci­ A escassez da adjectivação - quase rentes ao nosso circunstancialismo. téria literária. Se quisermos encontrar 3) Aqui e agora, o "discurso a Ramalho Eanes - cujo autor talvez tnento de entrevistados e entrevistado­ sempre reduzida ao mfnimo indispen­ a expressa-o mais alta da argumentação político" é, regra geral, duma chateza seja colectivo, não importa! res. sável reforça a impressão de • JOS~ MARTINS GARCIA 46 47 torne' efectiva, há que respeitar os órgãos da vontade dós trabalhadores. Reprimi-los ou demagogicamente ma­ nipulá-los é ir contra a democracia e contra qualquer tentativa de recupera­ ção económica do País. Dentro desta recuperação económi• ca surge, em seguida, o papel da iniciativa privada. Disse Eanes que "a iniciativa privada terá, também, neste processo de transformação, o seu lugar próprio bem definido e a sua função de estímulo competitivo. Os pequenos e médios empresários, esmagados até ao 25 de Abril por um capitalismo monopolista, que não voltará a este país, merecem todo o apoio que a sua actividade justifica". No que respeita à questão campone­ sa, surge como esteio de toda uma visão do problema a ligação do homem com a terra. Assim, "a Reforma Agrária terá de ser, e será, tempo e modo de desalienação do homem que trabalha a terra ou a ela está directamente ligado pela sua activida­ de. Será executada com tenacidade, "Os d ireitos dos trabalhad o res consumando-se a eliminação do feuda­ serão por mim intrans1· lismo latifundiário, corrigindo-se todos gentemente defendidos" os excessos cometidos e impedindo que outros venham a verificar-se". Ou seja, há que eliminar o feudalis­ FALAR DE TRABALHO mo latifundiário, sem permitir, por outro lado, o surgimento de uma nova SEM DEMAGOG.IA classe dominante, saída da aristocracia No conjunto das principais declara­ Eanes é claro quando diz que sindical, IRA (Instituto da Reforma ções de Ramalho Eanes ao País, chegou "o momento de os trabalhado­ Agrária) ou outra coisa qualquer, merecem particular atenção os proble­ res se tornarem os sujeitos da sua susceptíVel de reeditar em novos mas laborais. Pedra de toque de um própria emancipação e de assumirem molde$ a já conhecida exploração programa, as perspectivas que Eanes as suas responsabilidades na gestão das anterior. ofereceu aos trabalhadores portugueses empresas e nos destinos do País". E Como dissemos, Eanes ·recusou o surgiram como o resultado frio e isto está directamente ligado a outra estilo envolvente em detrimento da realista da análise que o general fez do afirmação por ele feita em que garante objectividade e contundência. Poderia, actual momento polltico. que "os direitos fundamentais dos se tivesse optado . pelo primeiro, Repudiando a demagogia, nãç cain­ trabalhadores, tão penosame!'ltC ·especular e oferecer, no que toca às do nunca no estilo fácil e populista, conquistados, e agora consagrados na questões laborais, uma falsa imagem Eanes assentou a sua campanha em Constituição, serão por mim intransi­ do que nos espera. Escolhendo a alguns pontos básicos que foi divulgan­ gentemente defendidos". segunda hipótese, traçou, clara e do no decorrer das muitas sessões de Esta garantia de que o trabalhador firmemente, os pontos de honra a esclarecimento e comícios. português deve continuar a ter um serem desenvolvidos. Deste modo, no que respeita às papel activo nos destinos do País e não Pensamos que, a partir de agora, há questões de trabalho, foram definidos mais reduzir-se a um simples objecto que seguir com atenção o evoluir três campos fundamentais: o trabaJha­ de exploração parece-nos a primeira destes pontos. Porque da sua aplicação dor da cidade e a sua responsabilidade grande questão de princípio definida na realidade socioeconómica de Portu­ ·na gestão das empresas, o trabalhador por Eanes. E isto, repetimos, sem a gal é que resultará, de facto, o rural e a Reforma Agrária, e o papel da cobertura demagógica tão a gosto de impedimento de uma política golpista iniciativa privada no quadro geral da outros candidatos à Presidência. e demagógica que os trabalhadores não economia portuguesa. Na prática, para que esta garantia se estão mais dispostos a aceitar. • 'F:-F. 48 Arte Museu da Nazaré ASPIRACAO O ediflcio do Museu Etnogràfico e Arqueológico Dr. Joaquim Manso no CONCRETIZADA ' dia da inauguração oficial " Um povo sem museu é um povo sem tradição e sem alma", muitos, a ideia aventada por António disse Luc Benoist.e é-nos agora recordado no catálogo de Museu Montês teve o seu primeiro impulso Et nográfico e Arqueológico do dr. Joaquim Manso, na Nazaré, quando Eurico de Castro e Silva, que com amor e paciência recolhera a0 recentemente inaugurado. longo da sua vida um belo espólio Numa cerimónia que decorreu ao povo português que, a partir deste etnográfico e arqueológico, o legou longo de um ensoalhado e azul momento, conta com um museu que para que ele constituísse o núcleo domingo e que teve, simultaneamente, lhe é inteiramente consagrado e do básico do futuro museu. Encarregado aspectos de acto oficial e de festa qual se pretende fazer não um mero e de guardar e catalogar o espólio legado cultural com o regozijo popular, fez-se simples reportório de obras e objectos por Eurico de Castro e Silva, o a evocação sentimental de um homem, - o que em si já é assinalável - mas dr. João Saavedra Machado, então o dr. Joaquim Manso, grande jornalista um verdadeiro centro de acçã'o e director do Museu José Malhoa, !'lão só da democracia e fundador do "Diário dinamizaçã'o cultural e artística, enten­ recebe com entusiasmo a incumbência de Lisboa'', que, de tal modo se dida no melhor sentido e significado como logo, com alguns amigos nazare­ enamorou da linda vila piscatória da expressão. nos, inicia nova recolha de obras de (também tornada cartaz de turismo) arte e documentos que foram engros­ da Nazaré e do seu povo, ali tinha a CONJUGAÇÃO DE ESFORÇOS sar o espólio inicial. Reunidas algumas sua casa de Verão e descanso e ali se dezenas de peças e documentos toma­ refugiava sempre que a sua vida lho A ideia de conceder à Nazaré um va-se necessário encontrar um local permitia. museu onde se evocasse o seu passado para as fazer funcionar como meio de O povo da Nazaré, tão arreigado aos arqueológico e histórico e os tão cultura. Este parecia o mais difícil seus usos e costwnes, tão poderoso na característicos usos, costumes e tradi­ obstáculo a vencer. sua vincada personalidade e apaixona­ ções dos nazarenos e onde, simultanea­ E foi um filho da Nazaré, o do pela sua terra e pelo seu mar, viu mente, se reunissem obras e testemu­ industrial Amadeu Gaudêncio - que, agora concretizada uma das suas velhas nhos de todos os que àquela vila e às amigo de Joaquim Manso, outrora o aspirações: a abertura ao público do suas gentes consagraram algo do seu levara a descobrir aquela terra - , quem seu Museu Etnográfico e Arqueológi• amor e da sua obra remonta de 1943 e toma possível a concretização do co, instituiçã'o cultural e artística que foi lançada por António Montês, o projecto ao oferecer generosamente a enriquece não só a região como saudoso fundador e primeiro director casa que pertenceu a Joaquim Manso, também o património espiritual nacio­ do Museu José Malhoa, das Caldas da no Sítio; mais tarde, apoiariam com nal. Rainha. largos subsídios as necessárias obras de Mais do que o poyo da Nazaré é o Logo aceite com entusiasmo por adaptaçã'o da casa a museu. Conseguira-se, assim, institucionali­ zar em 1968 o Museu Etnográfico e Arqueológico do dr. Joquim Manso, entregando-se, em 1972, a sua direcção ao dr. Saavedra Machado, que de alma e coração, num esforço cheio de entusiasmo, foi a verdadeira alavanca que .impulsionou o andamento das O secretàrio de Estado da Cul· obras e a ampliação das colecções, tura, acompanhado do dr. Saa· trabalho em que contou com a vedra Machado, durante a visi­ colaboração e auxílio da boa gente da ta ao Museu Nazaré, do Sítio e da Pederneira. Assim se conseguiu transformar a casa de Verã'o do Dr. Joaquim Manso, 49 Arte Teatro

Interior da Casa da Estiva, com o Ili.. ~ A luxuosa sala do Bolchoi, famosa Actualmente, o grupo pe~anente antigo escritório da Arte do Galeão ,. ~ pelas suas excepcionais qualidades do teatro, constituído por cantores, acústicas, tem capacidade para cerca de 2 mil espectadores bailarinos e músicos, é um dos maiores do mundo: mais de um milhar de elementos. Interior do Teat ro Chaby Pinheiro. Desde então, grandes talentos e Do reportório do Teatro Bolchoi Um t eatrinho li italiana com um inspirações, cantores, bailarinos, músi­ fazem parte hoje em dia 28 óperas e romãntico pano de boca de cena cos, artistas plásticos, honraram a sua 22 bailados. Com espectáculos de pintado~ sala: Maria Taglioni - a primeira diversas épocas, de diversos autores e bailarina a dançar "em pontas" - e a orientações, pode dizer-se, no entanto sua contemporânea Sankovskaia, Pa­ - pelo menos em relação ao "ballet" vlova, Nijinsky, Karsavina, Oulanova, -, que o Bolchoi abandonou os temas Nureiev, estrelas do mundo do bailado. "revolucionários", para cultivar, essen­ Stravinski e Debussy, Ravel, Prokofiev, cialmente, os grandes clássicos russos e Beethoven, Tchaikovski, Verdi, De estrangeiros, nos quais patenteia um Falla. Cantores como Cralapin e realismo minucioso em cenários e pelos Amigos do Museu; e, ao mesmo Nejdanov. Grandes da pintura e figurinos, um conservadorismo que tempo, a Comissão Administrativa da decoração, como Bakst, Benois Picas­ não deixa -Oe surpreender num país' Câmara Municipal da Nazaré depositou so, Matisse; Braque. E tantos ~utros. onde tudo vive sob o signo do no museu, o precioso Foral da Vila da "progresso". Talvez, apenas, o isolacio­ Pederneira, concedido por D. Ma­ nismo, que tem sido atitude constante No gigantesco palco do Bolchoi, da URSS em relação ao resto do nuel l. revivem as obras geniais de Stravinski, Reunida em cinco amplas salas, nos Ravel, Beethoven, Tchaikovski, De mundo, possa, cabalmente, explicá-lo. corredores e nas escadas, com inteli­ Falla gente e criterioso sentido museológico, M.S.R. a colecção do Museu da Nazaré é constituída por um total de cerca de mil peças, objectos, documentos e obras de arte "cientificamente" agru­ pados em secções temáticas: Vida Infantil, Religião, Superstição, Alimen­ de carne e osso, por entre uma centena tação, a Casa e o seu Arranjo, Trajo, de bailarinos e músicos, ou jorrar Profissões, Vida Social, Vida Intelec­ 05200 cascatas naturais do alto de penhascos tual (com um belo conjunto de textos de espelho. de Teatro de Cordel) e Pesca; docu­ Foi em 1776 que o príncipe mentos arqueológicos: pré-história, ANOS Ouroussov, procurador da província de neolítico e época do bronze; e uma Moscovo, recebeu das mãos do czar o ( no Sítio, num belo museu, criteriosa­ extensa colecção de obras plásticas - privilégio de explorar um teatro mente concebido, devendo-se o projec­ pintura, desenho, escultura, cerâmica, DO naquela província. Associando-se a um to ao arquitecto Eugénio Correia. tapeçaria, fotografia, etc. - de vários engenheiro inglês, construiu, então, Poderemos, pois, afumar que o artistas: F. Xavier Costa, Cristino da uma sala que viria a ser inaugurada, em Museu da Nazaré é uma realidade para Silva, Juan Ovalos, Victorino Laranjo, "BOLCHOI" 1780, com o nome de Teatro Petrov­ a qual contribuíram, desde o início, a Jorge Monteiro, Rosa Mendes, Maria .... ski . atenção das entidades oficiais, o Roque Gameiro, Júlio Pomar, Coelho. O Bolchoi - que quer dizer Como aconteceu a muitos teatros generoso apoio de Amadeu Gaudêncio, · da Silva, Eurico de Castro e Silva, "grande", o grande teatro - seus contemporâneos, o Petrovski a actividade do dr. Saavedra Machado Lázaro Lozano, Paul Giro!, Guilherme • considerado, na URSS, como o ard eu em 1805. Vinte anos depois, e, sobretudo, a colaboração e as Filipe, Manuel Fernandes, Berta Bor­ Olimpo da ópera e do bailado, reconstruído no mesmo local, o dádivas do povo 'da Nazaré. ges, J . Scherbeck, Irene Sá Natividade, completa, este ano, 200. .<1nos de Bolchoi era inaugurado como teatro Finalmente, a esplêndida e larga Leopoldo de Almeida, Henrique Mo­ existência. imperial. colecção reunida foi, agora, aumentada reira, Lino António, José da Beca, etc. De estilo clássico, as suas colunatas com mais algumas dádivas: a cabeça ~ impossível dar uma imagem deste Orgulho dos moscovitas, a sua sala e o frontão triangular, encimado pela em bronze do dr. Joaquim Manso, valioso repositório de peças e docu­ magnífica, famosa pelas excepcionais quadriga de Apolo, esculpida em escultura de F. Costa, oferecida pelo mentos que evocam um povo na sua qualidades acústicas, possui uma capa­ bronze, faz recordar a frontaria re­ "Diário de Lisboa" e seus traballiado­ vida, na sua arte, no seu trabalho, nos cidade superior a 2 mil espectadoces. cém-construída no nosso Teatro Na­ res; a cabeça em bronze de Amadeu seus usos e costumes, nas suas velhas No palco - de área quase igual à da cional de D. Maria II. Como ele, Gaudêncio, obra de mestre Barata tradições, um povo que, igualmente, sala - um complexo sistema mecânico também o Bolchoi voltou a ser pasto Feyo, oferecida pelo seu autor e cujo serviu de inspiração a muitos artistas. possibilita montagens sumptuosas, on­ ..,- - das chamas e novamente reconstruído suporte em mãrmore foi oferecido e T.R. de não raro se vêem galopar cavalos de em 1856. 50 51 MCísica

Quando este modelo é de qualidade "POP"E DROGAS (um Pink Floyd, um Amon Duul, um Hendrix ... ) então o problema é idênti­ co ao que se põe nos conservatórios: os Cada festival, cada concerto, cada tribunal, deliquência droga, polícia anos que as repetições implicam para ensaio, são denotações do sistema psiquiatria ... reproduzir uma sonata de Beethoven, organizado da nossa música "pop" - A nossa proposta é: liberdade, por exemplo - achamos legítimo que uma música de massas por excelência, desporto, estética, a droga (nefasta) este processo de criação de música se música que pertence indubitavelmente sucumbe a estes termos, e só a estes. realize; dá, além do mais, a possibilida­ ao mundo estético das novas gerações. Cito a propósito alguém que dizia: de de ouvirmos e vermos construir Aqui, em Portugal, ela sofre como "cada polícia que prende um dos música "pop" na incapacidade econó• em nenhum outro lado - é perseguida nossos companheiros redobra em nós a mica de trazennos a Portugal grupos pelo puritanismo pequeno-burguês, ar­ solidariedade e a necessidade de nos estrangeiros consagrados. rasada pelo repressivismo policial ou-e unirmos contra a polícia - o mal não é O conjunto Pesquisa é o chefe-de-fi­ militarista, expurgada pela "boa cons­ eliminado". la deste estilo e conseguiu atingir a ciência" das gerações mais concreta­ Mas porquê falar destes problemas fidelidade aqui exigida. mente submetidas ao conservadorismo quando nos propusemos criticar a Um conjunto a ouvir e com futuro. e:à moral cristã. "pop" nacional? A segunda espécie de criação musi­ Mas a música "pop", prossegue as Porque a "pop" e o uso de cal "pop" diz respeito a utilizações suas vias e!:lluto-edifica uma arquitectu­ estupefacientes ou drogas estão aliados pouco ortodoxas ·da nova matéria ra socio-musical com a personalidade - pertencem a novas formas de instrumental adquirida. Convém abrir qudhe::é própria. realização - e não se iluda quem aqui um parêntisis acusatório: os Os instrumentos musicais são cada afirma serem estes problemas da classe conservatórios nacionais de música vez mais caros, o baile tradicional burguesa. Não: o jovem trabalhador situam-se instrumentalmente no sécu­ (onde o par de ~ dança realizava o mais também participa, gosta da música lo XIX. Efeitos electrónicos, recorrên­ sublimado e recalcado dos encontros "pop'', está a ser dia a dia condenado cias actualizadas de novas séries sexuais) está para terminar: novos ao subterfúgio da droga - porque a instrumentais (os sintetizadores, o conceitos e práticas de comunicação sociedade que lhe é oferecida apenas piano eléctrico, a guitarra eléctrica, as erótica se instituem, a mulher ganha a apresenta políticas de ocasião, desem­ amplificações, etc ... ) são reaccionaria­ sua independência, e o homem a sua prego, injustiça. mente recusados, tidos como sub liberdade - é na juventude, na camada O preço exorbitante dos instrumen­ produtos; defende-se a técnica arcaica jovem, que isto se passa - e hoje um tos musicais, suportanto bárbaros contra o prazer contemporâneo, hu­ concerto musical é para se ouvir e ver, impostos, é o "melhor argumento" milha-se a inovação a favor do jamais para remediar frustrações. para afastar a juventude da música. antiquado, repudia-se a nova geração Paradoxalmente, os moralistas da Mas voltemos então à nossa música em prol de putrefacções anódinas.gera• repressão instituída não compreendem "pop". ção em prol de putrefacções anódinas. ou não querem compreender,,e Eode­ Tem os seus êxitos e já atingiu Estes músicos "pop" têm de, mos com ã vontade afirmar que algumas posições de privilégio. forçosamente, ser autodidactas, vence­ nenhum concerto "pop" neste país se Há três tipos de estruturação: rem por si próprios, saberem astuciosa­ eximiu dos laivos ameaçadores da Simulação de estilos/trechos/frase mente ultrapassar os espartilhos da força policial. .provenientes dos grandes grupos es­ arte burguesa - mas estes músicos são Hoje, o argumento é a droga. Mas trangeiros consagrados pela sua con­ populares ("pop"), tocam para as qualquer sociólogo e:qualquer psicólo­ cepção " pop" . massas - nos conservatórios toca-se go sabe que o combate à droga não se Aqui o processo é exigente, embora para círculos elitistas de velhos carun­ faz com perseguições mórbidas de seja criticado asperamente pelos ouvin­ chosos de meninos-bem imbecis e polícias, com diabólicas engrenagens tes que mais acesso têm a um fascistizantes. A pop music portuguesa de burocracia burguesa. A solução gira-discos e discos em casa própria. dá urna .lição de inovação cultural e está, repito, na própria organização No desenvolvimento desta linguagem abolição de preconceitos burgueses, social: dê-se liberdade sexual, dê-se a conta-se: a manipulação rigorosa de abre-se ao povo. possibilidade de:comunicação entre os diversos instrumentos electrónicos Esta segunda espécie de criação jovens, reconheça-se o direito de criar (sempre a surgirem como solicitações musical é difícil; luta pelo original, ãs novas gerações e abram-se a esta embriantes e a imporem as particulari­ procura urna via autónoma. juventude as portas da saúde física e dades estilísticas de cada grupo). O grupo Artes e Ofícios é um dos· do jogo: o desporto é a meu ver a mais Práticas que criteriosamente se repe­ melhores exemplos de originalidade. certa solução. Os tribunais apenas tem, que saturantemente se depuram, Se o seu vocalista está ultrapassado, o avivam frustrações, acentuam os me­ que obstinadamente se aperfeiçoam. A violinista Leonel é uma figura meteóri• dos, vincam o terror - e a reacção faz finalidader.é dar ao auditor uma réplica ca da nossa "pop" e uma esperança. parte do círculo vicioso: droga.polícia, impecável dum modelo estrangeiro. Um grupo seguro em que o vanguardis- 51 mo do violinista prende a atenção da perseguidas, mas que na sua proposta crítica. (subversiva) estimulam e adoptam Outro ramo da "pop" portuguesa é novos padrões de cultura. aq uele que segue a via do "show-man". Very Nice é o músico "pop" que, o músico "pop" encontra a sua sem dúvida, serve de melhor exemplo personalidade - impõe ao público um da "pop" nacional. conceito particular do mundo (lembre­ Seria a máxima injustiça ignorar os mos um Dylan, um Jagger, um Lou maiores nomes da nossa música "pop": Reed); é a vedeta da música popular. Zé Nabo e Zé da Cadela - que neste O Papa (Ringo Starr) no não-casa· Os seus poemas, as suas obscenida­ momento se refugiaram em certo mento de liszt com a princesa des, a sua tomada pública, as suas anonimato, mas que (disso estamos Carolynn réplicas vanguardistas. seguros) trará as mais ausp1c1osas São figuras malditas, não gratas, novidades. • LIMA BARRETO exceptuando um ou outro sinal positi­ vo na actuação de Paul Nicholas (Wagner), em que a contradição e inconsequência das imagens não nos· dão a certeza do que é imaginação ou "LISZTOMAN IA": improviso. Com algum erotismo primá­ rio (cena da castração no castelo da A IMAGINACAO E O LIMITE princesa Carolynn), até ao romantismo infantil despropositadamente sublinha­ pelos circunspectos senhores dos mea­ do noutras cenas (de que "Sonho de "Lisztomania", realização e dos do século passado, mas por amor" é honrosa excepção), o que nos argumento de Ken Russell. Pro­ irrequietas meninas de chapéu de abas fica é um vazio, resultado da superfi­ • dução de Roy Bayard e David e fitas, a gritar e a chorar histericamen­ cialidade com que tudo é abordado. Puttman, de 1975. 1nterpretado te, como o público "fan" dos músicos Resta-nos a müsica. por Roger Daltrey ( Liszt), Sara "rock" de hoje em dia. Ouvimos atentamente o disco após Kestelman (Princesa Carolynn), Wagner, o músico objectivo, em que termos visto o filme. E, então, a Paul Nicholas (Wagner), Ringo a sua müsica é a razão base de vida, o música soou de maneira diferente, Star (O Papa), Fiona Lewis fim a atingir, sem olhar a meios. relembrando cenas, tridimensionando (Marie ), Veronica Ouilligan (Co­ ~ destas suas personalidades, uma a os sons que antes ouvíramos, distraida­ sima) e Rick Wakeman (Thor). eficácia, o génio e o amor (Liszt), mente, na rádio. 105 minutos. Música de liszt, outra a ideológica, objectiva e material "Love's Dream", o tema "Liebes­ Wagner e Rick Wakeman. Distri­ (Wagner), que Russel parte para os traume", com letra de Benson e buição Columbia e Warner. Em caminhos difíceis que nos levam a Daltrey, retoma novo aspecto, se exibição no Cinema Caleidoscó­ imaginar Liszt a compor romances e recordarmos a cena bem conseguida pio, de Lisboa. lindas melodias, enquanto Wagner que por ela é sublinhada.no filme. constrói muralhas, melhor, trincheiras A canção de "Orfeu", de Liszt, é e tanques com o rigor da sua música. bem interpretada e ricamente orques­ "Lisztomania" é imaginação. Imagi­ e, pois, do antagonismo das duas trada por Rick Wakeman, em que o nação deslocada neste tempo e aqui, personalidades que Russel parte para o valor da melodia é enriquecido pelas para este público, demasiado ocupado argumento. palavras de Daltrey e Benson. ~ para se lembrar que a imaginação Sublinhado pela música - que não Aliás, com base em temas de Liszt ex iste. Deslocada, ainda, pois Ken conseguimos (não queremos) dissociar (Dante Period, Hell e Funerailles, por Russel realiza em cinema a imaginação do filme - Wagner assume vãrias exemplo) e Wagner (Master Race e prensada em álbuns de música popular facetas, bem demarcadas: do iniciado Rapé, Pillage and Clap), Rick Wake­ dos fins da década de 60 (desde o que apresenta peças ao mestre (Liszt), man consegue um trabalho, senão "Sargent Peppers", dos Beatles, a tudo passando pelo revolucionarismo comu­ perfeito, bem adequado. quanto se seguiu). nista, fugido à "justiça" em casa do Isto, se tivermos presente o filme. E baseado, ou melhor, apoiado em mestre, até ao Drácula que suga, no Um disco que ganha em vendas com l iszt e na sua música, Russel partiu sangue de Liszt, o talento necessário à quem vê o filme. O que, como banda para um. argumento em que Liszt e sua composição, ao isolamento no sonora que é, se conclui que cumpriu a Wagner são o pretexto para todo o castelo em práticas satânicas, até ser o sua missão. caminho de crítica e divagação ~obre monstro frankensteiniano nacional-so­ Disco Warner Brothers - 33 rota­ tudo o que assalta o homem (o cialista, o próprio Hitler, a dizimar ções. Música de Liszt, Wagner e Rick lllúsico) do nosso século. judeus inocentes com a sua música. Wakeman. Arranjos de Rick Wakeman. ) Liszt (Roger Daltrey), o amor das Um filme confuso, em que a fraca Interpretações de Roger Daltrey. lllulheres, a sua arte apreciada não presença de Roger Daltrey não o salva, e F.G. 53 cinema• UM FUNERAL DEMAGÕGICO

"O Funeral do Patrão". Realiza· ção de Eduardo Geada. lnterpre· • tado por Artur Semedo, lo Apoloni, Ângela Ribeiro, etc. Produção portuguesa. Distribu Í· da por Animatógrafo. Em exibi· ção no Cinema Universal, de Lisboa.

Necessariamente que fazer cinema para a TV não é o mesmo que para as grandes pantalhas. Em TV, a lingua­ gem tem outro vocabulário, outra sintaxe, outra eficácia. Destina-se, de ganda p~tidária , nunca como um "O Funeral do Patrão", passado ao uma só vez, a atingir 4 milliões de trabalho que se integre nos modelos cinema (ou exposto como tal) enferma espectadores e não 1000, deve fascinar que atrás defendemos e estão ao ainda mais de forma e conteúdo. variadíssimas parcelas de público, serviço de uma democrática maneira Toma-se grotesco, insípido, malbarata­ arrebatá-las e, mais do que isso, de, chegando ao povo, o defender e do. Tecnicamente, a sua pobreza educá-las. Educá-las num sentido de promover cultural e recreativamente. aflige, a sua concepção entristece-nos, informação e de formação, pedagogia "O Funeral do Patrão" é um filme tão o tratamento romanesco e de persona­ essa que deve abranger não apenas os a gosto de sectores que entendem a gens, ruboriza-nos. O cinema portu­ ângulos político e social mas, sobretu­ arte e a cultura como veículo de · guês tem obrigações e uma ética a do, o estético. Deve mexer a pele, os chantagem social e de golpismo. Aqui, cumprir. De qualidade e de democra­ sentidos, a imaginação e a razão desse alto! Temos de atacar seriamente a cia. Sã, pluriforme, com dois únicos telespectador com tantos rostos quan­ produção nacional que desvirtua o arquétipos - a arte e o homem. tas sensibilidades. Mas, ao distraí-lo e espírito adulto por que se luta. O Cinema ao serviço do homem. Como ao emocioná-lo, deve simultaneamente cinema, como fenómeno de cultura um todo, uma dialéctica, um mergulho cultivá-lo, sem teorizações nem dema­ que é, não pode estar ao serviço de na sua unidade e contradições. Este gogia. Não é de conceitos que aqui partidos ou de correntes ideológicas. filme de Eduardo Gea'da trai estes falart}OS mas de uma prática que há a Tem de estar ao serviço do povo que princípios universais. executar com responsabilidade e pro­ serve, suprapartidariamente, livre co­ fissionalismo. mo uma nódoa de água que baptiza os "O Funeral do Patrão", de Eduardo tecidos rigidamente tensos. E jamais ao e DÓRDIO GUIMARÃES Geada, foi um filme feito para a TV. serviço de qualquer ideário demagógi• Daí a óptica a ter em conta ao co, forçador de opiniões e de compor­ observá-lo como trabalho de cinema. tamentos socioestéticos. Portanto, são dois níveis que utiliza­ mos como senso de apreciação. Uma dupla focagem sobre a sua natureza e eficácia. Uma película que se desdobra OS ABUTRES DO CINEMA do pequeno écran para a tela do l,Jniversal. . .. Abutres na Cidade". Reali· sustentar essa ideia. A capital despo­ Enquanto televisão, o filme era • zação de Peter Hyams. 1nterpre­ voa-se em virtude · das férias, não decepcionante, maçudo, monocórdico tado por Elliot Gould, Robert apetece encerrarmo-nos num casarão e, pior do que tudo, uma autêntica Blake, Allen Garfield e Antonio por duas ou três horas, apesar do ar lavagem ao cérebro no estilo de 24 de Fargas. Produção norte-america­ refrigerado, as próprias distribuidoras Novembro, de situações burlescas, na. Distribuída em Portugal por reservam uma programação com os melhor, em tom de palh~adtt tão Rank, Filmes de Portugal. Em filmes mais banais que adquiriram no própria de certos movimentos de exibição no cinema São Jorge, decurso da época. Filmes destinados a opção de classe. Farsa de costumes de Lisboa. modestas receitas de bilheteira. Portan­ proletários · tão em voga, em que a to, neste período do ano, mentaliza. . / burguesia é um mal fascista. Basta! Já ~voz corrente dizer-se que, durante mo-nos para ver películas medíocres, na TV vimos o silficiente. Este filme o tempo quente, as salas de cinema se assistidas por um público que podemos estaria certo. como panfleto de propa- esvaziam. E há bons motivos para contar pelos dedos. 54 Porém, isto não corresponde, rigo­ de um público e de o reconciliarem torno do crime, da violência e do sexo, rosamente, ao que se passa. Senão com a "prata da casa'', que tanto se bem apoiado pela máquina que o ; vejamos: "Abutres na Cidade", produ­ denodou em melhorar de qualidade, distribui e inculca uma imagem atracti- · ção caracterizada pela violência, enche atiçam-n

De Cuba, posto avançado do mundo Kissinger e Julius Nyêrere (Tanza. socialista, vem o seguinte desafio, feito nia) por Che Guevara: "Para bater o imperialismo ocidental, provocaremos quantos Vietnames forem necessá­ rios." Onze anos mais tarde tomba o próprio Che na Bolívia, um dos seus Vietnames, pelo qual sonhava abraçar o continente sul-americano. Mas foi em África que os cubanos, conquistan­ do Angola, por conta dos soviéticos, venceram o Ocidente. Esta demissão assustou uma certa África: a dos "sá­ bios". Aquela mesma África de Léo­ pold Senghor e Houphouet-Boigny. O presidente da Costa do Marfim veio partilhar esta sua inquietação a Valéry Giscard d'Estaing. Como o fez perante Georges Suffert, do "Point", numa en­ trevista que publicámos, em exclusivo: "A menos que vós, europeus, não este­ jais fascinados pela URSS, é preciso acordar-vos, se é que já nã'o é tarde, e se nlío vos conformais com palavras de À espera dos dias diffceis, mulheres rodesianas treinam-se no tiro ao alvo détente." firme, conduzir a América para o cam­ do Sudoeste rodesiano. O seu estilo e a Sobre esta palavra e respecHva filo­ po daqueles que querem abater o últi­ presença de soldados envergando "ca­ sofia, construiu Henry .Kissinger a sua mo bastiã'o branco da África negra, muflados'', que entre duas cervejas se diplomacia, sabendo, porém, o alarmis­ começando pela Rodésia, antes talvez entretêm a jogar aos dardos dos mo que daí poderá advir. Subitamente, da África do Sul. "Pub's" britânicos, são, até 500 km de o secretário de Estado norte-americano Salisbúria, os únicos sinais visíveis da dedica duas semanas ao continente CILADA presente insegurança que se vive no negro (antes de se encontrar no Eliseu PARA 4 MILHÕES país. com Valéry Giscard d'Estaing). DE BRANCOS Esta pequena cidade tipo "Far­ Ele queria acalmar os africanos e -West" é um índice da vida na Rodésia, reconquistar a confiança que a política "Vê bem o que dizes! Uma palavra a tanto mais que está situada a poucos americana, desde Kennedy até Ford, mais e será talvez amanhã um carniãoa quilómetros da antiga colónia portu­ tinha abalado. Só que, desta vez, para mais que saltará sobre uma mina." Es­ guesa de Moçambique, que recente­ nã'o deixar ao único campo socialista, te cartaz mostra bem o ambiente de mente fez a sua declaração de guerra como em Angola, o benefício do su­ ~erra que se vive no Sudoeste da Ro­ ao regime de lan Smith. porte aos movimentos de libertaçã'o, désia; está colocado no bar do único Um colono francês, Gérard Farge, Kissinger conseguiu, contrafeito, mas hotel de Chipinga, pequena povoaçã'o ex-combatente em várias guerras terro- 58 nstas, proprietário, agora, de uma tugueses. sianos mais esclarecidos apelem já para quinta perto do território moçambica .. Tudo passou a ser feito na Rodésia, os seus vizinhos do Sul para que se no, disse-nos que "a minoria branca , e somente se raciona a gasolina. Os defendam em bloco da invasão comu­ não se assemelha em nada aos portu­ problemas económicos - dizem os ro­ nista. gueses apavorados e desmoralizados de desianos com optimismo - são os mes­ Pelo contrário, a África do Sul, de­ Angola e Moçambique". Farge rela­ mos que os de qualquer país exporta­ pois do exemplo português, prefere se­ tou-nos ainda a eficiência do sistema dor. de. produtos agrícolas e de maté- guir outra política: em vez de criar electrónico de alerta, que coloca todos rias-prunas. mais wn Estado revolucionário à sua os proprietários de 250 quintas em As dificuldades foram-lhes duramen­ volta,, aconselha a transição pacífica contacto directo entre si, e com wna te mostradas na Páscoa, quando os ter­ para um governo negro moderado em central que comanda a entrada em ac­ roristtas fizeram saltar a única linha de Salisbúria. Enquanto a primeira solu­ ção dos helicópteros em 1O minutos. caminho-de-ferro que os liga à África ção poderia criar uma excitação peri­ O ataque de Fevereiro último, com do Sul. Outro problema que o tempo gosa nos seus "afrikaanders", a segun­ fogu etões, obrigou-os a novas precau­ poderá concretizar é constituído pela da dav(l-lhes o tempo necessário para ções: projectores potentes, gradeamen­ dezena de milhar de guerrillieiros que, fazer o arranjo social que se impõe tos, o uso, até durante a noite, das suas neste momento, recebem instrução cu- . dentr? da sua própria casa. próprias armas; e as parelhas de senti­ baria e soviética nos campos de Mo­ A Africa do Sul resolveu intervir em nelas fornecidas pelos reservistas da çambique. Angola para protecção à barragem do Armada, rendidas de 18 em 18 dias. Esta situação faz com que os rode- Ruacaná. Com 1200 homens, os seus

E•acuação de Angola: uma situa. çlo insustentável

Neste país em que a guerrillia se limita a operações de fustigação das zonas fronteiriças, é um f actor impor­ tante a solidariedade entre os 280 mil brancos e a sua tenacidade tipicamente britânica. O seu moral, que lembra o elistente em Londres durante a pri­ llleira guerra, explica não só a sua posi­ A barragem de Ruacaná: 11agres­ Çlo face ao terrorismo como a sua são sul-africana" eatóica resistência perante as sanções económicas impostas pelo resto do AML Panhard, que pela primeira vez se ll1Undo, já há mais de dez anos. iriam defrontar com os T-34 soviéti­ O encerramento da fronteira de Mo· cô~s , e com o seu perfeito conhecimen- Çlinbique estrangulou ainda mais a Ro­ . to do terreno. Em algumas semanas désia, porque as correntes comerciais infligiram 300 baixas, das quai.S 87 cu­ _ ~ a Beira e Lourenço Marques dimi· Félix Houphouet-Boigny, presi­ banas, e 400 prisioneiros. Os comunis- > lllíram muito com a partida dos por- dente da Costa do Marfim tas foram repelidos para Luanda. Esta 59 internacional '. acção sul-africana não foi compreendi­ da no resto do mundo como eles espe­ Kissinger-Vorster ravam, mas razões de honra, disse M. Botha, "impedem-me de revelar que nlío foi tomada isoladamente, mas AS GRANDES MANOBRAS sim dentro do jogo que o Ocidente ger. O "querido Henry" dificil­ previra". mente explicará às recentes simpa­ Mas a guerra em Angola levou outro tias ganhas em África como curso: o Ocidente, pela boca dos ame­ combina duas opiniões tão antagó• ricanos, recusava créditos militares. e nicas: à UNCTAD fez saber há pouco que é importante boicotar a África do Sul e as suas tentativas para manter o barco, já com navegação tão difícil, do entendi­ As grandes manobras quanto à mento supra-racial a favor da África Austral desenrolam-se efec­ prorrogação da ordem branca em tivamente entre Kissinger e Vôr­ Pretória. A Vorster fará saber da ster, por muitas dllvidas que as permanente importância estratégi­ reticências americanas ao encon­ ca do Ccabo da Boa Esperança, tro tenham deixado sugerir. agora tão sujeito a ventos fortes Muito ocupados com as eleições de prometedora viragem do clima domésticas, os EUA fin~iram político. Porém, expor isso a convencer-se de que o tema Africa Vorster será fácil, enquanto for do Sul não entrava já na sua tida como definitiva a influência agenda sobrecarregada. Mas, ter­ ocidental em terras do Rand. A minadas as primárias, eis o eleito­ funda encrustrada no cotovelo de rado atento ao encontro do seu África está pronta a disparar, em subscretário com o maioral das qualquer altura, conforme as pres­ minorias brancas. E, com ele, o sões forem sucedendo. E Vorster mundo. precisa saber - e também o Despertados para a questão do mundo, à escuta - qual a direcção fortalecimento das posições sul-a­ da pedra que lançará na ocasiã'p fricanas, com a recente compra de certa. Na África do Sul: ressentimentos transformadores nucleares de Isso foi Kissinger dar a saber. O mútuos energia, os "falcões" europeus mundo já sabe da oportuna para todo o mundo em Angola havia viram-se parciahnen te defraudados eclosão de confrontos rácicos só uma "agressão sul-africana". nos seus negócios: os alemães tremendos, nestas duas últimas Abandonados, e com as suas forças queriam vender e não o consegui­ semanas, a marcar a saída do a 3 mil quilómetros da base, os sul-afri­ ram, acabando por receber a político do "apartheid". Sinais canos resolveram retirar e dificilmente "bomba" em plenas mãos: a disso, houve-os, logo que se perdoarão ao Ocidente. presença do parceiro que não desenhou no calendário o presu­ conseguiram ter a subscrever li­ mível, e tão negado na altura, O "APARTHEID" nhas de crédito. À França coube encontro dos dois pólos confluen­ aceitar a polémica que a venda dos tes. Saber da força dessa massa Na África do do Sul existe o "apar­ transK>rmadores ocasionou. Mas, lançada sobre o correr da história theid" ou desenvolvimento separado. para além da Mancha, outros do continente africano, quando Há várias explicações para este fenó• desígnios se alevantam, e Simons­ ela vem partindo por ricochete de meno sociológico. A primeira é históri• town continua pendente para o muito longe, da ponta austral, ca, pois a zona era desabitada quando Ocidente, enquanto a tecnologia sobre o esquema geopolítico mais os pioneiros brancos aí se instalaram, for britânica e a influência ameri­ vasto dum mundo também em vindo mais tarde os zulus, considera­ cana. manobras, será a última e resplan­ dos e mantidos como estrangeiros. A Perdidos os passos no pretexto descente parcela do "show" atira­ segunda é de ordem demográfica, pois curioso da troca de informações do à curiosidade dos espectadores o aumento crescente da população diplomáticas, a partir de Bona, e artistas, num momento de negra, numa progressão mais acelerada, John Vorster acaba discutindo desorganização dos mundos em­ cria o medo no meio dos brancos. A questões prementes com Kissin- penhados em promovê-lo. L.R. e terceira é de ordem religiosa: a tradi­ ção da Igreja Refôrmista 119landesa fá- 60 p .)os respeitar as tradições, tanto da A África do Sul é hoje uma potente Bíblia como do "apartheid". naçã'o que interessa ter como aliado, e Este problema gera situações cho­ há a imperiosa necessidade de não cor­ cantes, como por exemplo a de uma tar com o Terceiro Mundo. A União p0rtuguesa branca, casada com um Soviética esforçou-se por criar este di­ "afrikaander", os quais, sentados à lema da escolha, não tanto por desejar 111esma mesa de chá, são servidos de a África mas para asfixiar a Europa, ao 111aneira diferente. . cortar-lhe as principais fontes de apro­ Nem todos os habitantes deste terri­ visionamento. tório vêem a solução do problema da Em Salisbúria, capital da Rodésia: • J.S. F. 111esma forma que o seu próprio gover­ pollcias por todo o lado no. Uma recente sondagem do "Rand Daily Mail" dá 80 por cento dos seus leitores a desejarem uma abertura nas Viaje com o seu carro facilidades a conceder aos negros. Parece que o sentimento de os ne­ de comboio gros se considerarem residentes tempo­ rários e portanto, obrigatoriamente passivos perante qualquer agressão à África do Sul, se modificou um pouco ~boah com as injustiças da ONU. Começam •idLis~ agora a tornar-se solidários com o seu pafs. Este episódio parece dar razão ~Madi. LisboaMadrid Lisbo~ .Madrid LisboaMadricl .._ Lisbo,Madrid Lisbo,~ Madrid LisboaMadr' .. 4tLiSb' .4:f3t'~ Lisbc ~rrn."· .-boaMadrid LisboaM. Gérard Farge: preparado para tudo ~1adriMisbqaMa.drid L ,..-.:àqueles que acreditam que antes de dar ~sboa adr1d L1sbo'M aos negros o direito de voto é preciso 'Clri LisboaMadr1dl dar-lhes o direito de possuir terra, para terem o sentimento de haver qualquer 4)ªMªit coisa a perder. · dLis , Uma solução original para este pro­ '1a ri~ blema racial parece ser a descoberta de criar no interior das suas fronteiras Es­ tados negros independentes. No entan­ to, os negros contestam, chamando­ lAutoExpresso} ·lhes "reservas de indígenas". O destino do último bastilro branco ~ África negra não pode deixar de lllteressar ao Ocidente, que tem de se ,.,... Caminhos de Ferro ,,_ esforçar por encontrar uma solução -.I" Portugueses original. 61 nacional

- Lá pedir, pediu ele, mas no dia Economia seguinte à publicação da portaria já muita gente se dedicava a estudar todos os escaninhos da lei na esperança OUTRA MEDIDA FALHADA de descobrir uma alínea que lhe permitisse "furá-la". Imediatamente após a saída da lei, A liberdade de deslocação dos "Estima-se que em 1975 - dizia muitos pensaram descobrir nela a portugueses foi cerceada e o ele- o produto nacional tenha conhe­ maneira de serem contemplados nas escudo sofreu uma sensível des­ cido uma quebra de 3 por cento ( ... ). suas excepções. valorização no mercado negro Por outro lado o elevado nível de Outra coisa, porém, aconteceu: o desemprego que o País já conhecia foi escudo tremeu ligeiramente fora do logo que foi publicada a portaria País. Mais uma vez. No mercado negro, que restringe as despesas turísti• fortemente agravado com o regresso das ex-colónias de 200 mil militares e em curto espaço de tempo, o marco cas dos adultos no estrangeiro a 7 de 600 mil residentes". A taxa ·de alemão, que custava 14 escudos, mil escudos por ano. inflação ter-se-á situado em cerca de passou a custar 16, e o dólar, que 20 por cento, disse ainda o secretário estava a 34, passou para 37S50. A portaria insere-se • nwna série de de Estado que concordou que embora Pequenas consequências, fatais em medidas que têm vindo a ser tomadas existam expectactivas de rendibilidade, toda a parte, de todas vezes que se para tentar reequiliorar a balança de "ninguém deseja participar na criação pretendem tomar medidas de relança• pagamentos. Em 1974, os portugueses ou desenvolvimento de uma unidade mento da economia como as que gastaram em viagens turísticas no económica sem direcção nem responsá­ parecem estar a ser tomadas em estrangeiro 6,5 milhões de contos. No veis". Portugal. No entanto, não falta já ano seguinte, as expectativas de Depois de referir "os expressivos quem acuse a portaria de ser tenden­ grandes poupanças foram por terra, défices da balança de pagamentos", cialmente anticonstitucional na medi­ dado que a redução nos gastos foi de Santos Silva acabou por declarar que o da em que limita a liberdade de apenas 11 por cento e 5 ,5 milhões de seu ,equilíbrio "terá de constituir o movimentos das pessoas - fonnalmen­ contos saíram as fronteiras. "Para o objectivo prioritário porque dele de­ te consagrada na Constituição - que corrente ano - diz o preâmbulo da pende a viabilidade futura do nosso no tempo dos romanos era apontada portaria - os dados disponíveis não se país". como exemplo de falta de liberdade mostram mais favoráveis." política. Conclusão: a Secretaria de Estado AS MEDIDAS DESAGRADÁVEIS Não tanto, apesar de tudo, como os do Tesouro (Santos Silva) achou que servos medievais, uma vez que os era chegada: a altura de arrepiar De entre as medidas tomadas para portugueses continuam a poder afas­ caminho e de reduzir para 7 os 20 resolver a situação, Santos Silva tar-se da gleba nacional, embora só até contos que podíamos gastar nas férias enumerou várias delas: planeamento de uma dis.tância de 7 mil escudos. "lá fora". O dr. Oliveira Costa, do um maior investimento nas infrastrutu­ Bancô de Portugal, estudou o as~'llnto ras; limitação qa intervenção do • F. S. com wna equipa de técnicos e, no dia Estado "às empresas que ameaçam 18, o Ministério das Finanças publicou encerramento"; publicação de um a portaria 374-A/76 que restringe para Código de Investimentos Estrangeiros; um terço a capacidade (que já não era redução do consumo de bens importa­ MULTINACIONAL famosa) de deslocação, em recreio, dos · dos através da taxação; medidas portugueses no estrangeiro-. tendentes a desincentivar as importa­ Um adulto pode levar 7, um ções. CHINESA? adolescente 4 e uma criança 2 mil "Limitou-se do mesmo modo a escudos. Ressalvam-se as viagens de realização de despesas de turismo - trabalho, de negócios e por motivos de disse ele, no meio da exposição das Logo após a tomada de posse do V saúde. medidas tomadas - e introduziram-se Governo Provisório, Silas Chou, em mais fortes restrições a negociação de nome da Wmsdor, empresa com O TRISTE PANORAMA escudos-nota no estrangeiro." fábricas em muitas partes do mundo e O secretário de Estado bem pediu a com sede em Hong-Kong, proprietária Esta portaria foi publicada quatro compreensão dos portugueses para em Portugal da fábrica têxtil Valfar, dias antes de o dr. Santos Silva, nlll)Y todas estas medidas e, de entre elas, teve, no Centro de Sociologia Militar, discurso denso, ter explicado a pou<\o para aquela que restringe os gastos dos uma reunião com alguns responsáveis brilhante situação em que o País se turistas, "atenta a nossa grave situação da política portuguesa de então. encontra. cambial". Estiveram presentes, além do senhor 62 Chou, um representante do primeiro­ operários deixando-os em precária ou os golpismos do PCP, ficam mudos -ministro Vasco Gonçalves, do Ministé­ situação económica, nomeadamente e:;quedos perante as mentiras difundi­ rio da Coordenação Económica (a com salários em atraso". das por outros órgãos de Informação esposa do dr. Mário Murteira), econo­ É evidente que a televisão "pode" que eles consideram progressistas, rniStas dos Serviços de Apoio ao divulgar as opiniões dos operários com como é .. o caso da TV - o mais conselho da Revolução, além do quem simpatiza, mas não venha depois importante meio de comunicação general Pinto Soares, Vasco Lourenço, o major Melo Antunes dizer que se social. Tanto mais que a notícia em Varela Gomes e outros. ainda não se estabeleceu relações questão, pela sua falsidade, não facilita A reunião, efectuada a pedido de diplomáticas com aquele país comunis­ em nada uma aproximação de um país, s. Chou, serviu para este apresentar a ta é:;por culpa da alguma imprensa e com o qual, pela posição que ocupa no p0sição da Winsdor em relação aos grupos pseudo-progressistas. contexto das nações, muito interessa­ seus interesses em Portugal: Vvsto Melo Antunes e outros que tão ria a Portugal manter relações de Portugal ter escolhido a via para o indignados se mostram quando alguns amizade ou, pelo menos, diplomáticas. socialismo, o governo deveria naciona­ 'jornais democráticos denunciam muito lizar a Valfar, empresa adquirida em justamente o que se passa em Angola • J.A. - 1973, por 100 mil contos. No entanto, o representante da Winsdor prontificou-se a ficar à dispo~ sição do Governo até os gestores a nomear por este ficarem a par dos Greves meandros da produção e comercializa­ ção internacional. Isto para que - frisou ele - não pudessem atacar o AS INCÓGNITAS DO MOMENTO país de que ele pessoalmente era originário, a República Popular da China. Há uma semana as eleições presi-· que denunciar aquele surto como No relatório que apresentou na denciais estavam à porta. No campo do podendo servir para pescadores de altura, a Winsdor declarava-se disposta trabalho e, mais especificamente, das águas turvas. O PCP jogava então na a discutir qualquer proposta do Gover­ greves, uma novidade: a movimentação "maioria de esquerda" e, face à no português com vista à nacionaliza­ não cessou. Umas semanas antes das derrota sofrida no 25 de Novembro, ção da Valfar, frisando, no entanto, eleições para a Assembleia da Repúbli­ era necessário manter um comporta­ que como firma comercial não estava ca as greves, algo preocupantes para mento "educado". As greves deixaram no seu espírito continuar a suportar certos sectores políticos, foram conde­ de constituir preocupação e desapare­ por muito mais tempo os prejuízos · nadas. De facto, o surto grevista então . ceram das páginas dos jornais durante que ~ depois do 25 de Abril somavam já registado só podia ter uma explicação: a campanha eleitoral. 40 mil contos, impondo-se portanto desestabilização. Há duas semanas, a impopular greve > uma nacionalização rápida da fábrica. Para as forças democráticas, havia dos motoristas do Norte atingiu o seu No mesmo relatório, onde estava exposto um estudo da situação dos mercados internacionais, previa-se um período de dois anos com prejuízos da ordem dos 2500 contos mensais, findos os quais, corh a subi~a prevista "" de preços no mercado internacional, a empresa teria grandes perspectivas. Isto foi o que se passou. E o que fez o Governo de então? Onde estão os relatórios e propostas apresentadas? Porém, há dias, a televisão; que é isenta e progressista (qualidade esta, aliás, que seguramente se irá acentuar depois da já concretizada reintegração dos golpistas do 25 de Novembro), difunde nos seus "écrans" uma notícia recolhida num plenário de trabalhado­ res, e:que em resumo foi a seguinte: "O administrador da finna têxtil ... Yalfar, fábrica pertencente a uma multinacional chinesa, abandonou os Função P(Jblica: embrião de movimentos mais amplos? 63 nacional ,

)) o valor estratégico --~:.:-:.: · ~ , do governo das esquerdas

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