1 a Guerra Da Cisplatina E O Início Da Formação Do Estado Imperial Brasileiro
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1 A GUERRA DA CISPLATINA E O INÍCIO DA FORMAÇÃO DO ESTADO IMPERIAL BRASILEIRO Luan Mendes de Medeiros Siqueira (PPHR/ UFRRJ) Marcello Otávio Neri de Campos Basile Palavras- chave: Estado Nacional, Nação e Guerra da Cisplatina. Este trabalho é parte da minha pesquisa de mestrado que por sua vez tem como tema: As relações internacionais entre o Império do Brasil e as Províncias Unidas do Rio da Prata durante a Guerra da Cisplatina (1825- 1828). Procuramos compreender nesse presente estudo a consolidação do poder por parte deles sobre a região do Prata, já que era fundamental estruturar uma identidade na formação de tais Estados. A Guerra da Cisplatina, entretanto, pode ser considerada como o primeiro conflito em nível regional a ser resolvido pelo Brasil e Argentina em suas agendas de política externa e como um entrave também entre as suas áreas de litígio. Além disso, se quisermos nos aprofundar sobre a história da diplomacia entre tais países, elas terão suas origens majoritariamante nesse conflito. Daí, a necessidade de se pesquisar cada vez mais as relações internacionais de ambos os países nesse confronto. Neste trabalho, temos como referencial teórico o conceito de Relações Internacionais dos cientistas políticos Jean Baptiste Duroselle e Pierre Renouvin. Segundo eles, esse termo engloba uma série de elementos, dentre eles: territorialidade, condições demográficas, relevo, soberania e fronteiras políticas.1 A Guerra da Cisplatina pode-se inserir nesse campo teórico uma vez que o fator dos limites de fronteiras esteve intrinsecamente ligado à eclosão do conflito. A disputa pelo domínio da província Cisplatina, além de sua importância econômica, foi marcada também por um outro tópico componente do conceito de relações internacionais desses autores: Soberania. O que estava em jogo nesses anos da Guerra Cisplantina era a tentativa da criação de um corpo político nacional, isto é, a busca de um Estado autônomo. 1 RENOUVIN, Pierre e DUROSELLE, Jean- Baptiste. Introdução à história das Relações Internacionais. São Paulo: Difel, 1967, p. 15. 2 Neste trabalho, analisamos especificamente o documento Manifesto de declaração de Guerra do Brasil Às Províncias Unidas do Rio da Prata2, de 10 de dezembro de 1825, publicado pela imprensa do diário da Corte do Rio de Janeiro na data mencionada, onde percebemos a questão territorial da Cisplatina, como estratégica e fundamental na configuração do Império. Além disso, uma série de elementos o governo imperial discorria nesse documento, dentre eles, a questão de limites entre os dois Estados, as incursões e revoltas na Banda Oriental, dentre outras razões que levaram ao Brasil a declarar guerra às Províncias do Prata: Julga dever a sua Dignidade, e a Ordem, que occupa entre as Potencias, Expor leal, e francamente à face do Universo, qual tenha sido, e dêva ser agora o meu procedimento a respeito d`aquelle Estado limitrophe, a fim de que aos Nacionaes, e Extrangeiros de um, e outro hemispherio, e ainda a mais remota posteridade seja patente a justiça da causa, em que só a defesa da Integridade do Imperio o poderia empenhar.3 Aline Pinto Pereira, em sua tese, afirma que a soberania era vista no Brasil como um fenômeno social e comenta a ideia de que ela era um elemento de disputas entre o Imperador e a Câmara dos Deputados no Primeiro reinado.4 Além disso, Pereira também diz que havia uma disputa entre os útlimos sobre quem comandaria a construção do Estado e inclusive de algumas questões internacionais, dentre elas, a Guerra da Cisplatina5. Uma das contribuições centrais dessa historiadora foi a de problematizar a questão da soberania não somente como algo de cima, imposto pelo governo imperial mas como um assunto da agenda política do poder legislativo. Além disso, a soberania passava também pela disputa da área de fronteiras. Quando o mencionado trecho do Manifesto cita: Estados limítrofes, vimos que a fronteira é um dos elementos condicionantes para a formação e consolidação de um determinado Estado. No que diz respeito a chamada integridade do Império, citado também no trecho acima, refere-se a defesa das fronteiras do país a partir dos interesses políticos do governo estabelecidos na orientação de sua política externa na região do rio da Prata. 2 Manifesto de declaração de Guerra do Brasil às Províncias Unidas do Rio da Prata [ Diário da Corte do Rio de Janeiro]– 10 de dezembro de 1825. Arquivo Histórico Palácio do Itamaraty – Rio de Janeiro. 3 Ibidem, p. 1. 4 PEREIRA, Aline Pinto. A monarquia constitucional representativa e o locus da soberania no Primeiro Reinado: Executivo versus Legislativo no contexto da Guerra da Cisplatina e da Formação do Estado no Brasil. Niterói: Programa de Pós-Graduação em História – Universidade Federal Fluminense, 2012, p. 52. 5 Ibidem, p. 52. 3 Por conseguinte, Pereira trabalha com a análise dos discursos dos deputados e senadores, retratando suas insatisfações frente aos posicionamentos do Imperador e do Conselho de Estado , órgão consultivo do monarca e que era o grande responsável pelas questões externas do Brasil Império. Dentre os elementos essenciais na formação do Estado imperial brasileiro, Aline Pinto Pereira afirma que são: o reconhecimento da Independência por Portugal, a manutenção de laços com a Inglaterra e a campanha pela manutenção da província Cisplatina.6 Para a historiadora Gabriela Nunes Ferreira, mesmo com fim da Questão Cisplatina, as disputas entre Brasil e Argentina não acabaram7. Ferreira comenta que tais recentes países que estavam em formação de seus respectivos estados nacionais, continuariam a brigar pelo monopólio sobre o comércio nessa região e principalmente pela hegemonia sobre a área platina8. Na concepção da autora: O importante a enfatizar é o fato de que, em meados do século, não estava ainda definido qual “projeto nacional” vingaria entre as Repúblicas vizinhas ao Império. O cerco de Montevidéu pelas forças de Oribe e Rosas durava desde 1843 e a possibilidade da anulação das independências paraguaia e uruguaia permanecia em pauta. O Império, por sua vez, era ainda vulnerável em vários aspectos; aquele conturbado contexto platino e a incerteza quanto ao futuro desenho territorial da região traziam ameaças à ordem construída na primeira metade do século XIX. A consolidação do Estado imperial dependia, em grande medida, do rumo seguido pelas repúblicas vizinhas.9 No trecho referente ao Manifesto, deparamo-nos com a seguinte palavra: Estado. Os diferentes projetos políticos em torno da construção de um Estado Imperial não deixavam a Cisplatina em segundo plano. Pelo contrário, toda a importância política, geopolítica e comercial que ela apresentava, faziam parte dos planos expansionistas do governo imperial, sendo um deles, a hegemonia sobre a região platina. Gabriela Ferreira traz como marca central em seu trabalho a análise da formação do estado Imperial brasileiro em consonância com os interesses expansionistas no estuário platino. Ferreira discute não somente o Brasil como também a formação dos outros Estados platinos a partir das disputas no Prata, dentre eles: Argentina e Uruguai. 6 Ibidem, p. 52. 7 FERREIRA, Gabriela Nunes. O rio da Prata e a consolidação do Estado imperial. São Paulo: HUCITEC, 2006, p. 64 8 Ibidem, p. 64. 9 Ibidem, p. 69. 4 O Império do Brasil aspirava uma centralização política monárquica não apenas dentro do jogo político como também na formação de seu estado territorial, implicando assim na expansão dos seus domínios. A região Cisplatina, por sua vez, estava incluída nesse projeto político. Esta mesma região, conhecida pelas Províncias do Prata como Banda Oriental, fazia parte também dos interesses da futura Argentina já que nesse período, um dos objetivos centrais era a formação de uma República das Províncias do Prata, submetida ao domínio centralista de Buenos Aires e um possível reestabelecimento do antigo vice-reinado do Rio da Prata. Há também a presença de um poder simbólico10 travado entre os dois Estados sulamericanos no conflito. A região platina não era apenas imensa em seu aspecto geográfico e territorial mas também em seu aspecto simbólico. Conquistá-la por uma das partes representava assegurar uma hegemonia sobre o Prata, não somente pela sua importância econômica ou estratégica, mas o que ela representava historicamente desde o período da colonização. Para Bordieu, o poder simbólico: Esse poder invisível o qual só pode ser exercido com a cumplicidade daqueles que não querem saber que lhe estão sujeitos ou mesmo que o exercem […] Poder subordinado, é uma forma transformada, quer dizer, irreconhecível, transfigurada e legitimada, das outras formas de poder: só se pode passar para além da alternativa dos modelos energéticos que descrevem as relações sociais como relações de força.11 A partir do trecho acima, podemos afirmar que o poder simbólico consiste em uma construção da realidade, invisível, onde dentro dessa estrutura ocorre um confronto de sistemas ideológicos mas também há uma produção simbólica e sistemas simbólicos, sendo este último, uma estrutura de dominação. A construção desse simbólico, segundo Bordieu, se dá através de um corpo de especialistas, integrantes das classes ou frações de classe dominante, no qual utilizam diversas meios para concretizar o seu padrão de estruturação sobre a sociedade, podendo ser por meio da: linguagem, religião, ideologia e a arte.12 A construção simbólica em torno da região do Rio da Prata e da Cisplatina se fez presente também nas prerrogativas dos discursos do Império do Brasil em suas orientações para a política externa. O Estado Imperial brasileiro pautava a sua soberania 10BORDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002, p. 15. 11 Ibidem, p. 15. 12 Ibidem, p. 12. 5 sobre o Estuário platino, conforme mencionado acima, baseada na doutrina das fronteiras naturais, o que se verá mais adiante neste presente trabalho. As disputas de fronteiras na Questão Cisplatina foi um dos principais fios condutores que levaram ao acirramento de tensões entre o governo imperial e as Províncias do Prata, tendo como início do conflito a declaração de guerrra por parte do Brasil através do bloqueio dos portos do Prata ao comércio portenho.