Perfil da LITERATURA AMERICANA ¦ EDIÇÃO REVISADA

SUMÁRIO LITERATURA AMERICANA EDIÇÃO REVISADA

Período Inicial Publicado pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos da América e Colonial Americano até 1776 3

CORPO EDITORIAL Origens Democráticas e Escritores Revolucionários, Escrito por: Kathryn VanSpanckeren 1776-1820 14 Editor Executivo: George Clack Editor-Chefe: Paul Malamud Editor Colaborador: Kathleen Hug Período Romântico, 1820-1860: Diretor de Arte / Designer: Ensaístas e Poetas 26 thaddeus A. Miksinski, Jr. Editor de Imagens: Joann Stern Traduzido por: Márcia Biato Período Romântico, Revisado por: Vera Galante 1820-1860: Ficção 36 Editor Gráfico da Tradução: elizabeth de Souza

Ascensão do Realismo: Capa: © 1994 Christopher Little 1860-1914 47

O Modernismo e SOBRE A AUTORA Kathryn VanSpanckeren a xperimentação E : 1914-1945 60 é professora de inglês na Universidade de Poesia Americana, Tampa, fez palestras sobre literatura americana em vários países e foi de ntitradição 1945-1990: A A 79 diretora do programa de Literatura Americana no Instituto de Verão A Prosa Americana, da Fulbright para estudantes internacionais. Seus trabalhos de 1945-1990: publicados incluem poesia e Realismo e Experimentação 97 conhecimento. Ela graduou-se pela Universidade da Califórnia, em Berkeley, e fez doutorado na oesia mericana ontemporânea P A C 121 Harvard University.

Literatura Americana Contemporânea 136

Glossário 157

Índice 163 Os seguintes textos não podem ser reproduzidos sem a permissão do detentor dos direitos autorais: “In a Station of the Metro” [Numa Estação do Metrô] (pág. 63), de Ezra Pound. De Personae, de Ezra Pound. Copyright © 1926 de Ezra Pound. Traduzido e reproduzido com a permissão de New Directions Publishing Cor- poration. “Stopping by Woods on a Snowy Evening” [Parando no Bosque numa Noite de Neve] (pág. 65) de Robert Frost. De The Poetry of Robert Frost [A Poesia de Robert Frost], editado por Edward Connery Lathem. Copyright 1923, © 1969 de Henry Holt and Co., Inc., © 1951 de Robert Frost. Reproduzido e traduzido com a permissão de Henry Holt and Co., Inc. “Disillusionment of Ten O’Clock” [Desilusão das Dez Horas] (pág. 66) de Wallace Stevens. De Selected Poems [Poemas Selecionados] de Wallace Stevens. Copyright 1923 e prorrogado em 1951 por Wallace Stevens. Repro- duzido com a permissão de Alfred A. Knopf, Inc. “The Red Wheelbarrow” [O Carrinho de Mão Vermelho] (pág. 66) e “The Young Housewife” [A Jovem Dona de Casa] (pág 66) de William Carlos Williams.. Collected Poems, 1909-1939. Vol. I. [Coletânea de Poemas, 1909- 1939. Vol.1] Copyright 1938 New Directions Publishing Corp. Reproduzido com a permissão de New Directions. “The Negro Speaks of Rivers” [O Negro Fala de Rios] (pág. 69) de Langston Hughes. De Selected Poems [Coletânea de Poemas], de Langston Hughes. Copyright 1926 de Alfred A. Knopf, Inc.e renovado em 1954 por Langston Hughes. Reproduzido com a permissão do editor. “The Death of the Ball Turret Gunner” [Morte do Artilheiro da Torre de Tiro] (pág. 80) de Randall Jarrell em Randall Jarrell: Selected Poems [Randall Jarrell: Poemas Selecionados]; © 1945 de Randall Jarrell, © 1990 de Mary Von Schrader Jarrell, publicado por Farrar Straus & Giroux. Permissão concedida por Rhoda Weyr Agency, Nova York. “The Wild Iris” [A Íris Selvagem] (pág. 125) de The Wild Iris por Louise Glück. Copyright © 1993 por Louise Glück. Reproduzido com a permissão de HarperCollins Publishers Inc. “Chickamauga” (pág. 126) de Chickamauga por Charles Wright. Copyright © 1995 por Charles Wright. Repro- duzido com a permissão de Farrar, Straus and Giroux, LLC. “To The Engraver of my Skin” [Para o Gravador de minha Pele] (pág. 129) de Source por Mark Doty. Copyright © 2001 por Mark Doty. Reproduzido com a permissão de HarperCollins Publishers Inc. “Mule Heart” [Coração de Mula] (pág. 130) de The Lives of The Heart [As Vidas do Coração] por Jane Hirshfield. Copyright © 1997 por Jane Hirshfield. Reproduzido com a permissão de HarperCollins Publishers Inc. “The Black Snake” [A Cobra Negra] (pág. 131) copyright © 1979 por Mary Oliver. Usado com permissão de Molly Malone Cook Literary Agency. “The Dead” [O Morto] (pág. 132) de Questions About Angels [Perguntas sobre Anjos] por Billy Collins, © 1991. Reproduzido com a permissão de University of Pittsburgh Press. “The Want Bone” [O Osso do Desejo] (pág. 133) de The Want Bone [O Osso do Desejo] por Robert Pinsky. Copyright © 1991 por Robert Pinsky. Reproduzido com a permissão de HarperCollins Publishers Inc. Yusef Komunyakaa, “Facing It” [Encarando-o] (pág. 134) de Dien Cai Dau in Pleasure Dome: New and Collec- ted Poems [Dien Cai Dau na Cúpula do Prazer: Coletânea e Novos Poemas], © 2001 por Yusef Komunyakaa e Reproduzido com a permissão de Wesleyan University Press.

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As opiniões expressadas nesta publicação não refletem necessariamente as opiniões e políticas do governo dos EUA.

4 tras regiões, contavam-se histórias de um deus ou cultura superior. Não há, porém, longos­ ciclos­ CAPÍTULO religiosos padronizados em torno­ de uma divin­ dade suprema. Os equi­valentes­ mais pró­ximos­­ das narra­tivas espiri­tuais do Velho­ Mun­do seriam relatos das inicia­ ­ções e viagens dos xamãs. Fora isso, há histó­rias sobre he­róis cultu­ ­rais, como o Ma­na­bozho, da tribo Ojibwa, ou o Coyote, da tribo PERÍODO1 INICIAL E Navajo. A esses trapaceiros­ são dados diferentes­ COLONIAL ATÉ 1776 graus de respeito.­ Numa lenda, po­dem agir como heróis,­ enquan­to que nou­tra, poderão parecer literatura americana se inicia com a trans­ ego­ístas­ ou tolos. Em­bora­ autoridades do pas­sado, missão oral dos mitos, lendas, histórias como o suíço Carl Jung, tenham desapro­vado A e letras (sem­pre canções) das cul­­turas­ histó­rias sobre trapaceiros,­ tachando-as de expres­ indígenas. Não havia literatura escri­ta nas mais de sões do lado inferior e amoral da psique,­ ou­tros 500 diferentes línguas indí­ge­nas e culturas tribais estudiosos contempo­ râ­ neos­ — alguns,­ índios ame­ da América do Norte antes da chegada dos pri­ ricanos — ressaltam que Ulisses e Prometeu, heróis mei­ros europeus.­ Como resultado, a litera­­ ­­­tura oral re­ve­ren­ciados pelos gregos,­ eram, em essência, dos ameri­canos nativos é bem diversificada. As trapaceiros também. nar­ra­ti­vas de culturas caçadoras­ quase nômades, Exemplos de quase todo gênero oral podem co­­mo os Navajo, diferem das histórias conta­ ­das ser encontrados na literatura indígena americana:­ por tribos agrícolas, como os Acoma, que viviam letras de canções, cânticos, mitos, contos­ de fada, em pueblos (aldeias). Histórias dos ha­bitantes­ anedotas, encantamentos,­ enigmas, provérbios, épi­ dos lagos do Norte, como os Ojibwa,­ muitas vezes cos e lendas. São muitos os registros­ de migrações diferem radicalmente­ das con­ta­­das por tribos do e de ancestrais, bem como cantos de visões e de deserto, como os Hopi. cura e lendas sobre trapaceiros. Algumas histórias As tribos mantinham sua própria religião­ — ado­ da criação são particularmente populares.­ Numa ravam deuses, animais, plantas­ ou pes­soas sagra­ das mais co­nhe­cidas, con­tada em várias tribos das. Os sistemas de governo incluíam democracias, com variações, uma tartaruga­ susten­ ta­ o mundo. conselhos de anciãos e até teocracias.­ Essas varia­ Numa versão Cheyenne da lenda, o criador Maheo ções tribais aparecem tam­bém na litera­tura oral. tem quatro chances­ para modelar o mundo­ a partir Mesmo assim, é possível fazer algumas gene­­ de um universo aquoso. Ele manda quatro aves ralizações. As histórias indígenas, por exem­­plo, aquáticas mergulharem para tentar trazer terra do brilham com reverências à natu­reza como mãe fundo. O ganso da neve, o mergulhão-do-norte e o espiri­tual e física. A natureza está viva e dotada pato selvagem­ voam até bem alto­ e depois mergu­ de forças espiri­tuais; os princi­pais per­sona­ gens­ lham, sem conseguir alcançar o fundo; o pequeno podem ser animais ou plan­tas ou freqüen­ ­temente galei­rão, contudo, que não pode voar, consegue­ totens associados a tribos,­ a grupos­ ou indivíduos. trazer um pouco de lama em seu bico. Apenas­ uma Na literatura americana­ mais recente,­ o que mais se criatura, a humilde Vovó Tartaruga,­ possui as formas apro­xima do sen­tido sagrado indígena é a “Over- necessárias para sustentar­ o mundo de lama que Soul” [Sobre-Alma] transcendental de Ralph Waldo Maheo forma sobre­­ seu casco — por isso o nome­ Emer­son, que permeia toda vida. indígena para­ a América, ‘Ilha da Tartaruga’. As tribos mexicanas reverenciavam o divino As canções ou poesias, como as narrativas,­ vão Quetzalcoatl, deus dos toltecas e astecas e, nou­ do sagrado ao leve e humorístico:­ há cantigas de

5 ninar, cantos de guerra, canções de amor e canções e Mon­treal. especiais para jogos infantis,­ jogos de azar, várias Porém, os primeiros exploradores­ da Améri­ ca­ tarefas, cerimônias de magia ou de dança. Em geral, não foram ingleses, espanhóis ou franceses.­ O pri­ são canções repe­titivas. Curtas can­ções-poema meiro registro europeu de exploração­­ da América­ rece­bidas em sonhos podem às vezes transmitir­ as está numa língua escan­ di­­­ nava.­ Vinland Saga [A Saga imagens­ claras e o clima sutil associados ao haicai de Vinland] conta como Leif Eriksson e um bando japonês ou à poesia imagística influenciada­ pelo de nórdicos errantes se fixaram brevemen­ te­ na costa Oriente. Uma canção Chippewa diz: nor­deste­ da América — talvez na No­va Escócia, no Canadá — na primeira década­ do século 11, quase Pensei que fosse um mergulhão 400 anos antes da próxima descoberta­ européia Mas era o remo registrada do Novo Mundo. do meu amor O primeiro contato conhecido continuado entre­ a batendo na água. América e o resto do mundo começou, porém, com a famosa viagem do explorador­ italiano, Cristóvão Canções de visões, bem curtas, são outra forma­­ Colombo, financiada pelos­ reis espanhóis, Fernão e caracte­rística. Aparecendo­ em sonhos ou visões, Isabela. “Epístola”, o diário­ de Colombo, publicado às vezes sem aviso, podem ser canções­ de cura, em 1493, conta o drama da viagem — o terror dos caça ou de amor. Muitas vezes são pessoais, como homens, que temiam monstros­ marinhos­ ou cair da neste canto Modoc: borda do mundo; o quase motim;­ como Colombo alterou os diários­ de bordo para que os homens Eu não soubessem quão longe­ tinham viajado além o canto de qualquer outro; e a primei­ ra­ visão da terra, ao eu caminho aqui. chegarem à América. Bartolomé de las Casas é a mais rica fonte de A tradição oral indígena e sua relação com a informação sobre os primeiros contatos entre­ ín­ literatura americana como um todo é um dos temas dios americanos e euro­peus. Como jo­vem padre, mais ricos e menos explorados nos estudos ameri­ ele ajudou a conquistar­ Cuba, transcreveu­ o diário canos. A contribuição dos índios à América é maior de Colombo e, já no fim de sua vida, produziu a do que se supõe.­ As cente­ ­nas de palavras indígenas extensa e vivaz History of the Indians [História dos in­corpo­ra­das ao inglês­ incluem ‘canoe’ [canoa],­ Ín­dios], que critica a escravização dos índios pelos ‘to­bac­­co’ [taba­co], ‘potato’ [batata], ‘moc­casin’ espa­nhóis. [mocassim], ‘moose’ [alce], ‘persimmon’ [caqui], As tentativas inglesas iniciais de colonização­ fo­ ‘racoon’ [guaxinim], ‘tomahawk’ [machadinha]­ e ram desastrosas. A primeira­ colônia foi funda­ da­ em “totem”. A literatura americana indígena contem­­ 1585, em Roanoke, no litoral da Carolina do Norte; porânea, discutida no capítulo­ 8, também contém os colonos desapareceram e até hoje contam-se obras de grande­ beleza. lendas sobre índios Croatans­­ de olhos azuis, naquela região. Durou mais a segun­ da­ colônia: Jamestown, A LITERATURA DE EXPLORAÇÃO fundada em 1607. Resis­­ tiu­­ à fome, à brutalidade­ e e a história tivesse seguido outro rumo, os ao mau governo.­ A literatura­ da época, entretanto, Estados Unidos poderiam facilmente ter sido pinta a América­ com cores vibrantes,­ como a terra Sparte dos grandes­ im­­pé­rios da Espanha ou das riquezas­ e oportunidades.­ Relatos­ das coloniza­ França. Seus habi­ ­tantes pode­riam falar espanhol ções tornaram-se mundial­mente conhe­cidos. e formar uma nação com o México ou fran­cês e A explo­ração do Roanoke foi cuidadosamente unir-se aos fran­cófonos cana­denses de Quebec regis­trada por Thomas Hariot em A Brief and True­ ­ 6 Report of the New-Found Land of Virginia [Um O PERÍODO COLONIAL Breve e Verdadeiro Relatório sobre a Terra Recém­ - NA NOVA INGLATERRA Descoberta da Virgínia] (1588). O livro de Hariot alvez não tenha havido na história mun- logo foi traduzido­ para o latim, francês e alemão; o dial outro grupo de colonos tão intelec- texto e as ilustrações,­ transfor­ mados­ em gravuras, Ttualizados quanto os Puritanos. Entre 1630 foram reproduzidos por mais de 200 anos. e 1690, havia tan­tos colonos diplomados em O principal relato da colônia de Jamestown,­ os universidades no nordes­te dos Estados Unidos, escritos do Capitão John Smith, um de seus líderes,­ na região­ da Nova Inglaterra, quanto­­ no país mãe é o oposto­ do trabalho preciso e cientí­fico­ de Hariot. — fato notável, considerando-se que a maio­­ria das Smith, romântico incorrigível,­ pare­ ­­ce ter floreado pessoas educadas da épo­ca eram aristo­cratas suas aventuras.­ A ele devemos­ a famosa estória­ da pouco dispos­tos a arris­car suas vidas em con­ jovem índia Pocahon­ tas.­ Fato ou ficção, ela está dições primitivas. Os Puritanos­ au­to­­di­datas, que arraigada­­ no imaginário­ histórico americano. A len­ venceram por seus próprios méritos, constituíam­ da conta como Pocahontas, filha predileta­ do Chefe notável exceção.­ Eles que­riam a edu­cação para Powhatan, salvou a vida do Capitão­ Smith enquanto com­preender e executar a von­tade de Deus no prisioneiro­ do chefe. Mais tarde, quando os ingle­ pro­cesso de colonização da Nova Inglaterra. ses persuadiram­ Powhatan a entre­ ­gar Pocahontas A definição puritana de boa leitura era aquela como refém, sua suavidade, inteligência e beleza­ que transmitia a plena consciência da im­por­tân­ impres­­sio­naram os ingleses. Em 1614, ca­sou-se com cia de se adorar a Deus e os perigos espiri­ ­­tu­ais John Rolfe, cavalheiro inglês, o que deu início a um enfrentados pela alma na Terra. O estilo­ puritano­ período de paz de oito anos­ entre­ colonos e índios, variava muito — da poesia metafísica e complexa assegurando a sobre­vivên­ cia­ da nova colônia. até diários caseiros­ e relatos histó­ ­ricos religiosos No século 17, piratas, aventureiros e explo­ tremenda­ ­mente pedantes. Mas a despeito do radores abriram caminho para uma nova onda de es­ti­­lo ou gênero,­ certos temas­ eram cons­tantes. colonos permanentes, que traziam suas famílias, A vida era vista como pro­­va; o fracasso levava implementos agrícolas­ e ferramentas de artesãos. à conde­nação eterna e ao fogo do inferno e o A litera­tura inicial da ex­plo­ração, formada por sucesso, recom­pensado­ com o êx­tase celestial. diários, cartas, relatos de viagens, diários de O mundo era a arena de combate­ constante­ entre bordo e relatórios aos financiadores dos colonos as forças de Deus e as hostes de Satanás, inimigo — governantes euro­peus ou, no caso­ da Inglaterra terrível com vá­rios disfarces. Muitos Puri­tanos­ e da Holanda mercantilistas, insti­tuições societá­ aguardavam ansiosa­ mente­ a chegada do “milênio”, rias — foi, aos poucos, substituída­ por relatos dos quando Jesus voltaria à Terra, aca­ba­ria com a próprios colonos. Como a Inglaterra­ acabou por miséria humana e inauguraria 1000 anos de paz e apoderar-se das colônias da América do Norte, prosperidade. a literatura mais conhecida e documen­tada é a Os estudiosos vêm, há muito, mos­tran­­do a inglesa. Como a literatura das minorias ameri­ ligação entre o puritanismo­ e o capi­ ta­­ lis­­ mo:­ ambos­ canas ainda flores­ ­ce no século 20 e a sociedade fundamen­ tam­ -se na ambição,­ no traba­ lho­ árduo e americana tor­na-se cada vez mais multicultural, na busca incessante­ do sucesso. Embora, individual­ os estudio­ ­sos estão redescobrindo a importância mente, os Puritanos­ não pudessem­ saber, em termos de sua herança cultural mista. Em­bora a literatura teológicos, se estavam ‘salvos’ e portanto­ entre os americana passe agora a concentrar­ -se nos relatos eleitos ao para­ ­­íso, eles tendiam­ a sentir que o suces­ ingleses, é importante­ reconhecer­ seus primórdios so terreno­ era sinal de eleição. Riqueza e status não ricamente cosmopolitas. eram alme­ jados­ por si sós, mas como reafirmação­ de saúde espiritual e promes­ sa­ de vida eterna.

7 Pintura, cortesia da Smithsonian Institution

The First Thanksgiving” [O Primeiro Dia de Ação de Graças], quadro de J.L.G. Ferris, retrata os primeiros colonos americanos e os americanos nativos celebrando uma colheita abundante. Além disso, o conceito de consciência admi­ ‘da aliança’ (cove­nant­ed) — que jura­ ­vam lealdade nis­trativa estimulava o sucesso. Os Puritanos ao grupo­ e não ao Rei. Conside­ rados­­ traidores­ do in­­ter­pretavam todas as coisas e eventos como reino e hereges conde­ ­nados ao inferno, eram muito símbolos de um significado espiritual­ mais pro­ perseguidos.­ Sua separação os le­vou finalmente­ ao fundo e sentiam que, ao promover seu pró­prio Novo Mundo. lu­cro e o bem-estar de sua comu­ ­nidade, esta­vam também levando avante os planos de Deus. Não William Bradford (1590 - 1657) distinguiam as esferas secular e reli­­giosa: toda a Logo após a chegada dos Separatistas, William vida era expres­são da vontade divi­na — cren­­ça que Bradford foi eleito governador de Plymouth, na renasce no Trans­cen­den­ta­lismo. Colônia de Massachusetts Bay. Era extremamente Ao registrar os eventos comuns para revelar seu piedoso, autodidata,­ tendo aprendido­ muitas línguas, significado espiritual, os Purita­nos muitas vezes até o hebraico, para poder “ver com os próprios­ olhos citavam a Bíblia, capí­tulo e versículo. A história os antigos oráculos­ de Deus em sua bele­ za­ original.” era um panorama religioso simbólico que levava Seu papel na migra­ ção­­ para a Holanda e na viagem ao triunfo Puritano no Novo Mun­do e ao Reino dos do May­flower para Plymouth e seu trabalho como Céus na Terra. gover­nador o torna­ ­vam perfeito para ser o primeiro Os primeiros Puritanos da Nova Inglaterra exem­ historiador­ de sua colônia. Sua histó­ ria,­ Of Plymouth plificavam a seriedade­ do Cristianismo Refor­ mado.­ Plantation [Sobre a Colônia de Plymouth] (1651) Conhecidos­ como ‘Peregrinos’, eram um peque­ ­no descreve com clareza e fascínio­ os primórdios da grupo de fiéis que mi­grou da Ingla­terra para a colônia. Sua descri­ ção­­ da primeira visão da América Holanda — famosa desde aquela­ épo­­ ca­­ pela tole­ faz juz à fama: rância­ religiosa — em 1608, época de perseguições. Tendo atravessado o vasto oceano e um mar de difi­ Como a maioria dos Pu­rita­ nos,­ inter­pre­tavam a culdades... agora não tinham amigos para aco­lhê-los Bíblia literalmen­ te.­ Liam e agiam com base na Se­ nem hospedarias para dis­trair ou descan­sar seus gun­da Epís­ ­tola aos Coríntios — “Saia do meio deles e corpos castigados pelo tempo; nem casas e muito fique sepa­­­ rado,­­­­ disse o Senhor.” Desiludidos­ quanto menos cidades para onde ir, para buscar­ auxílio... a purificar a Igreja da Inglaterra de dentro­ para fora, bárbaros selva­gens... esta­vam mais dis­postos­ a os ‘Separatistas’ formaram igrejas­ clandes­ tinas­­­ — 8 cobri-los de fechadas. Como­ era inverno­ e aqueles Up in America [A Décima Musa Recém-Surgida na que conhecem­ o inverno desse país sabem­­ que são América] (1650) revela a influência de Edmund rigo­ro­sos e violentos, sujei­tos a tem­­pes­­ta­des cruéis Spenser, Philip Sidney e outros poetas ingle­ses. e ferozes... todos­ os enfrenta­vam com a face crestada Recorria com fre­qüên­­cia a conceitos elaborados pelas intem­­péries e o país inteiro, cheio de florestas e ou a me­tá­foras dilatadas. “To My Dear and Loving mata­gais, se mostrava­ com um ar selvagem e bravio. Husband” [Para Meu Querido e Amoroso Mari­ ­­do] (1678) usa imagens orientais, o tema do amor e a radford também registrou o primeiro técnica da comparação, muito popular na Europa documento de autogoverno colonial no da época. No final, a autora reveste seu poema de BNovo Mundo inglês, o Mayflower Compact um sentido piedoso: [Acordo de Mayflower], elaborado enquan­to os peregrinos ainda estavam à bordo do navio. O Se algum dia dois foram um, então certa­mente nós. acordo era precursor da Declaração de Indepen­ ­ Se algum dia um homem foi amado pela esposa, dência que viria um século e meio depois. en­tão você; Os Puritanos reprovavam as diversões seculares­ Se alguma mulher já foi feliz com um homem, como dança e jogo de cartas, que associa­vam Comparem-se comigo, ó mulheres, se puderem. ao estilo de vida ímpio e imoral­ dos aristo­cratas. Prezo seu amor mais do que minas inteiras de ouro Escrever ou ler livros “le­ves” caia na mesma cate­ Ou todas as riquezas que o Oriente possui. goria. As mentes puritanas­ dedi­ca­vam suas ener­ Meu amor é tanto, que rios não podem saciá-lo, gias a gêneros piedosos­ e a­lheios à ficção: poesia, Nada além do seu amor pode dar recom­pensa. sermões, textos teo­ló­gicos e relatos históricos. Seu amor é tal, que nada posso para retribuí-lo, Seus diários e meditações­ íntimas registram­ a rique­ Rogo aos céus que lhe paguem em dobro. za da vida interior dessas pessoas introspectivas e Então, enquanto vivermos, perseveremos no amor intensas. Para, quando já não vivermos, vivermos sempre.

Anne Bradstreet (c. 1612 - 1672) Edward Taylor (c. 1644 - 1729) O primeiro livro de poesias publicado por um Como Anne Bradstreet, e, de fato, como quase­ americano foi também o primeiro livro ameri­ ­cano todos os primeiros escritores da Nova Inglater­ ra,­ o publicado por uma mulher­ — Anne Bradstreet.­­­ Não intenso e brilhante poeta e ministro Edward Taylor é surpresa que tenha sido im­presso na Inglaterra,­ nasceu na Inglaterra.­ Filho de um pequeno proprie­ dada a falta de prensas tipográ­ ­­ficas nos primórdios tário rural — agricultor­ independente, dono de suas das colônias­ america­ ­nas. Nasci­da e educada na terras — Taylor foi um professor que preferiu­ vir para Ingla­terra, Anne Bradstreet era filha do adminis­ a Nova Ingla­ terra­­ em 1688 a fazer o juramento de leal­ trador da propri­edade de um conde. Emi­grou dade à Igreja da Inglaterra.­ Ele estudou no Har­vard com sua família aos 18 anos. Seu marido tornou-se College e, como a maioria dos clérigos treina­­ dos­ em gover­­na­­dor da Colônia de Massachusetts Bay, que Harvard, conhecia grego, latim e hebrai­ co.­ Altruísta for­ma­ria mais tarde a grande­ cidade de Bos­ton. e piedoso, Taylor agiu como missionário juntos aos Ela pre­feria seus longos poemas religio­sos, sobre colonos quando aceitou­ a posição vitalícia de pastor temas con­ven­cio­nais, como as esta­ções, em­bora em Westfield,­ Massachusetts,­ cidade de fronteira 160 os leitores­ de hoje apreciem mais seus poemas quilômetros­ adentro de florestas fechadas. Taylor era curtos e espiri­ ­tuosos sobre a vida cotidi­ ­ana e suas o mais culto da região e usou sua educação­ para poe­sias calorosas­ e amorosas dedicadas ao marido servir como pastor, médico e líder cívico da cidade. e aos filhos.­ Ela se inspirava na poesia metafísica­ Modesto, piedoso e trabalhador, Taylor nunca ingle­­­­sa e seu livro The Tenth Muse Lately Sprung publicou­­ suas poesias, que foram descobertas por

9 volta de 1930. Ele certamente creditaria­ a descoberta­ meta­física da América pro­tes­­tan­te ain­da não foi à pro­­vidên­­ cia­ divina; os leitores de hoje­ devem ser exaurida.) gratos pela existên­ ­cia de seus poemas­­ — os melhores omo quase toda a literatura colonial, os pri- exempla­res da poesia do século 17 na América do ­meiros poemas da Nova Inglaterra imitam Norte. Ca forma e técnica do país mãe, embora­­ a Taylor escreveu várias obras poéticas: elegias­ paixão religiosa e citações freqüentes de passa­ fune­rárias, poemas líricos, um “debate”­ medieval gens bíblicas, além do novo cenário, dêem a eles e o Metrical History of Christianity [Histó­ ­ria Métrica­ identidade especial. Os autores isolados do Novo da Cristandade]­ de 500 páginas (uma história de Mundo viveram antes do adven­ ­to dos transportes mártires). Sua melhor obra, na opinião dos crí­ rápidos e da comunicação eletrônica.­ Como resul­ ticos modernos, é a série de curtas meditações tado, os escritores colo­ ­ni­ais imitavam estilos já fora prepara­tórias. de moda­ na Inglaterra. Portanto, Edward Taylor, o me­lhor poeta de sua é­po­ca, escreveu poesia me­ Michael Wogglesworth (1631 - 1705) ta­física quando já havia caído em desuso­ na Ingla­ Como Taylor, Michael Wogglesworth nasceu terra. Às vezes, como no ca­so de Taylor, riqueza e na Inglaterra, era ministro puritano­ educado­ em ori­gi­na­li­dade nasciam do iso­la­mento da colônia. Harvard que praticava a medicina.­ Foi o terceiro Os escritores coloniais muitas vezes pareciam­ poeta de renome na Nova Inglater­ ra­ colonial. Dá ignorar grandes­ autores­ ingleses como Ben Jonson. continuidade aos te­mas puri­ tanos­ em sua obra mais Alguns­­ rejeitavam poetas ingleses que pertenciam a conhecida, The Day of Doom [O Dia do Juízo Final] outras seitas, afas­ tando­­ -se assim dos melhores mo­­ (1662). Uma longa narrativa­ que muitas vezes decai delos­ líricos e dramáticos­ produzidos­ pela língua para o burlesco, esta popularização aterradora­ da inglesa. Além­ disso, muitos colonos permane­ ciam­ doutrina­ calvinista era o poema mais popular do ignorantes devido à falta­ de livros. período colonial. O primeiro bestseller americano­ O grande modelo de escrita, fé e conduta era a é um retrato apa­vorante da condenação­ ao inferno, Bíblia, numa tradução­ inglesa autorizada já há mui­ em métrica de balada. to desatualizada quando­ foi finalmente­ divulgada. É péssima poesia — mas todos adoravam. Mes­­­ A idade da Bíblia,­ mai­or que a da Igreja Roma­na, clava o fascínio de uma história de terror com a dava a ela autoridade aos olhos Puri­tanos. au­to­ridade de Calvino. Por mais de dois sé­­culos, Os Puritanos da Nova Inglaterra apega­­­ ­vam-se às as pessoas decoraram esse longo e pa­voroso­­ histórias dos judeus­ no Velho Testamento,­ crendo monumento ao terror religioso; as crian­ ­ças o re­ que eles, como os judeus, eram perse­­ guidos­ por citavam com orgu­lho e os mais ve­lhos o cita­vam sua fé, eram os únicos a conhecerem o Deus em conversas­ diárias. Não é grande­­ a distância­ dos verda­deiro e eram os eleitos para fundar a Nova sofri­men­tos atrozes desse­­ poe­ ma­ à chocante ferida Jerusalém — o paraíso na Terra. Os Puritanos esta­ auto-infligida­ por Arthur Dimmes­dale, o pastor vam cientes­ dos paralelos entre os antigos judeus puritano­ cul­pado, de Nathaniel Hawthorne, em do Velho Testamento e eles próprios.­ Moisés lide­ rou­ The Scarlet Letter [A Carta Escarlate] (1850), ou os israelitas em fuga da escra­­ ­vidão do Egito, abriu o aleijado Captain Ahab, de Herman Melville, um o Mar Vermelho­ com a ajuda miraculosa de Deus Fausto da Nova Inglaterra­ cuja busca pelo conhe­ para que pudessem fugir­ e recebeu­ a lei divina na ci­mento proi­bido afun­da o barco da humanidade­ for­ma dos Dez Mandamentos.­ Como Moisés,­ os ame­ricana­ em Moby-Dick (1851). (Moby-Dick era lí­de­res Puritanos criam estar­ sal­van­do seu povo o romance pre­dileto do romancista americano do da corrupção espiritual na Inglaterra, atra­vessando­ século 20 William Faulkner, cuja obra pro­funda miraculosa­ mente­ um oceano­ bravio com a ajuda e perturbadora sugere que a vi­são obs­­cura e de Deus e criando­ no­vas leis e formas de go­verno­

10 com base nos desejos de Deus. aristocratas­ e dispendiosas, como usar Os mundos coloniais tendem peruca e carruagem. a ser arcaicos e a Nova Inglaterra cer­tamente não foi exce­ção. Seus Mary Rowlandson Puri­tanos eram arcaicos­ por opção, (c. 1635 - 1678) con­vicção e circunstância. A primeira escritora de prosa digna de nota foi Mary Rowland­son, Samuel Sewall (1652 - 1730) esposa de um pastor que relata­ clara De leitura mais fácil que a poesia­ e comoventemente as onze semanas­ profundamente­ religiosa, rica em que passou em poder dos índios, referências bíbli­cas, são os rela­tos num massacre, em 1676. O livro, históricos e seculares que des­­cre­ sem dú­vi­da, ali­men­tou a chama do vem fatos verdadeiros com detalhes­ sentimento anti-indígena, como o vibrantes. O Journal (1790) do Go­ver­ fez The Redeemed Captive [O Cativo nador Winthrop é a melhor­ fonte­ de Resga­ta­­do] (1707), de John Williams, informação­ sobre o início da colônia que des­creve seus dois anos como de Massa­chusetts Bay e a teoria­­­ polí­ pri­sio­neiro dos fran­ceses e índios tica dos Puritanos. após um massacre. Os textos pro­ O Diary [Diário] de Samuel Se­wall, du­­­zidos por mu­lhe­res são em geral que registra os anos 1674 a 1729, é vivaz relatos domésticos, que não exigem e cati­ ­vante. Sewall segue­­ o padrão­ dos educação­ especial. Pode se dizer que primeiros es­cri­­­­tores da No­va In­gla­ a literatura feminina­ se beneficie­ do terra, como Bradford e Taylor. Nasceu realismo familiar e da perspicácia­ do na Inglater­ ra­ e veio para a colônia­ ain­ bom senso; é cer­to que obras co­mo da jo­­vem. Viveu em Boston, for­mou-se Journal [Diá­rio], de Sarah Kem­ble em Harvard e seguiu a carreira­ legal,­­ Knight (publi­ ­cado postuma­ ­mente em adminis­ trativa­ e religiosa. 1825) de gran­de vivaci­ ­dade, descre­ Sewall nasceu tarde o bastante vendo uma audacio­ sa­ viagem solo de para ver a mudança do estilo de ida e volta de Boston a No­va York em vida­ reli­gioso­ rígido seguido pe­los 1704, são ex­ceção à comple­xi­dade Puritanos para o período yan­kee Cotton Mather barroca que marcou muitos escritos­ mais mundano de riqueza mer­ Puri­tanos. can­tilista na Nova Inglaterra; seu Diary, muitas vezes com­parado ao Cotton Mather (1663 - 1728) do contem­porâneo in­glês Samuel Nenhum exame da literatura colo­ Pepys, inadvertidamente­ registra­ essa nial da Nova Inglaterra estaria com­ transição. pleto sem menção a Cotton Mather, Como o diário de Pepys, o de Sewall mestre dos intelectuais. Ter­cei­ro na faz registro minucioso de sua vida coti­ dinastia Mather de quatro gerações diana e reflete sua preocu­ ­pação em em Massachusetts Bay, escreveu mui­ viver bem e piedosa­ mente.­ Ele men­ to sobre a Nova Ingla­ ­­terra, em mais ciona com­pras de doces para a moça de 500 livros e panfletos. Magnalia que ele corte­ ­ja­va e suas discussões Gravura © The Bettmann Christi Americana (História Eclesiás­­ Archive sobre se de­veria­­ ou não adotar maneiras Gravura © The Bettmann Archive tica da Nova Inglaterra), de 1702, sua

11 obra mais ambi­ ­ciosa, descreve exaustivamente­­ a sua experiência­ vivida entre as tribos. Cada capítulo colonização da Nova Inglaterra por meio de uma é dedicado a um tema — por exemplo, comida e série de biografias. O enorme li­vro apre­senta a refeições. As palavras e frases­ indí­ genas­­­ sobre esse missão divina dos Puritanos,­ na terra desco­ nhe­ cida­ tema­ são mescla­ das­ a comen­ tários,­ anedotas­ e um de estabelecer o Reino dos Céus; sua estrutura é poema final. O primeiro capítu­ lo­ termina­ assim: uma série de narrativas­ sobre a vida­­ de “Santos” americanos re­pre­­senta­tivos. Seu zelo o redi­ ­me em Se os filhos da natureza, selva­gens ou não, parte por sua preten­ ­são: “Des­­crevo as maravilhas São benevolentes e amáveis, da religião­ cristã, fugin­ ­do das privações­ da Europa Como fica mal para os filhos de Deus para as praias da América.” Carecerem de humanidade.

Roger Williams (c. 1603 - 1683) o capítulo das palavras sobre divertimen­ ­ Na passagem do século 17 para o século 18, tos, ele comenta que: “é u ­­ma verdade o dog­matismo religioso enfraqueceu-se gradual­ Nestranha que um homem­ possa geralmente­ mente, apesar de esforços purita­ ­nos espo­rádicos encontrar mais distração­ gratuita e agradável entre e agressivos­ para­ conter a onda de tolerância.­ O esses bárbaros­ do que entre os milhares que se pastor­ Roger Williams sofreu por suas opiniões so­ consi­de­ram cristãos.” bre religião. Inglês, filho­ de um alfaiate,­ foi banido A vida de Williams é particu­ lar­ men­­ te­­ inspiradora. de Massachusetts, durante o ter­rível­ inverno de Em visita à Inglaterra,­ durante a Guerra­ Civil sangrenta­­ 1635 na Nova Ingla­ terra.­­ Avisado­ secreta­ mente­ pelo lá ocorrida,­ usou sua expe­­ riên­ cia­ de sobrevivência na Governador de Massachusetts, John Winthrop, só ge­lada Nova Inglaterra para organizar a distribuição­ so­bre­vi­veu vivendo com os índios;­ em 1636, criou de lenha para os pobres­ de Londres durante o inver­ em Rhode Island uma nova colônia que acolhia no, depois que os supri­ mentos­­ de carvão­ foram cor­ pessoas de outras reli­giões. tados. Ele escre­ ­­­­veu ardoro­ ­sas defesas da tolerância Formado pela Cambridge University (In­glater­ religiosa, não apenas entre seitas cristãs,­ mas até em ra), manteve a simpatia pelos trabalhadores­ e por re­la­ção a não-cristãos. “É a vontade e o manda­ men­ to­ pontos de vista diver­ ­gentes. Suas idéias­ eram muito de Deus que... seja­ permitido­ a todos os homens, avançadas pa­ra a época. Foi um dos pri­­meiros em todas as nações, possuir uma consciência pagã, críticos ao imperialismo,­ insis­ ­tindo que as terras judaica, turca ou anti-cristã...”,­ escreveu ele em The america­ nas­ pertenciam aos índios e que, portanto,­ Bloody Tenent of Persecu­tion for Cause of Conscience os reis europeus não tinham direito de conceder [A Doutrina­­ Sanguinária­ da Perseguição­­ por Causa terras. Williams também­ acreditava na separa­ção de Consciência]­ (1644). A experiência­ intercultural entre esta­ do­ e igreja — princí­ pio­ fundamen­ tal­­­ que de viver entre índios­ humanos e corte­­ ­ses certa­ ­­men­te vigora até hoje na América. Afirma­ ­va que tribu­ nais­ explica­ boa parte­­ de sua sabedoria.­ não deveriam­ ter o poder­ de punir pessoas­ por Na colônia, a influência foi nos dois sentidos. Por motivos­ religiosos — posição­ que enfra­ quecia­­ as exemplo, John Eliot traduziu a Bíblia­ para Narra­ rigorosas teocra­ cias­ da Nova Ingla­ terra.­­ Acreditava gansett. Alguns índios se converteram­ ao cristianis­ em igualda­ de­ e democracia­ e foi amigo dos índios mo. Até hoje,­ a igre­ ­­ja nativa americana é uma mistura­ por toda a sua vida.­ Seus inúmeros livros incluem:­­ A de cristianismo e crenças indí­ genas­ tradicionais.­ Key Into the Languages of Amer­ica [Uma Cha­ve para­ O espírito de tolerância e liberdade­­ religiosa,­ as Línguas da América] (1643), um dos primeiros­ que foi aos poucos se fortalecendo nas colônias livros com frases em línguas indígenas.­ O livro repre­ america­nas, surgiu primeira­ mente­ em Rhode Island senta um estudo etnográ­ fico­­ embrio­ nário,­­ fazendo e Pensilvânia, terra dos Quakers. Estes, benevolen­ ousadas descrições­­ da vida indígena,­ a partir­ de tes e tolerantes,­­ ou “Amigos”, como eram­ conhe­

12 cidos, acreditavam que a consciência­ [Desobediência­ Civil] de 1849. individual era sagra­da e a origem da ordem social e da mo­ralidade.­ Jonathan Edwards A crença fundamental dos Quakers ( 1703 - 1758) no amor universal e na fraternidade,­ A antítese de John Woolman, Jona­ os fez firme­mente demo­cráticos e than Ed­wards, nasceu 17 anos antes vigorosamente opostos à autoridade do Quaker no­tá­­vel. Woolman­ recebeu religio­ sa­ dogmática. Expulsos da pouca instru­ ­ção formal; Edwards era rígi­da Massachusetts, que temia­ sua muito ins­truí­do. Wool­man seguiu sua influência, eles criaram em 1681, sob luz interior; Edwards dedicou-se à lei a liderança de William Penn, a muito e à autori­­­­da­de. Ambos escre­viam bem sucedida colônia da Pensilvânia. mui­to bem, mas reve­laram polos opostos­ da experiên­cia reli­giosa John Woolman (1720 - 1772) colonial. O trabalho Quaker mais conheci­ do­ Edwards foi moldado por seu é o extenso Journal [Diário] (1774), exa­cerbado senso do dever e um de John Woolman, que do­cumenta­ ambiente puritano­ severo, que cons­ sua vida interior com tamanha­ pureza piraram para fazê-lo defender o cal­vi­ e doçura de cora­ção, que recebe nis­mo rigoroso e sombrio das forças até hoje elogios de muitos escritores liberais que brota­vam à sua volta. É americanos e ingle­ ­­­ses. Este homem conhe­ cido­ por seu sermão poderoso­ notável deixou­ para trás seu conforto na e assusta­ ­dor “Sinners in the Hands of cidade e passou uma temporada com an Angry God” [Peca­­dores nas Mãos os índios­ porque pensava que poderia de Um Deus Irado] (1741): aprender com eles e com­partilhar­ suas idéias. Ele apenas descreve seu dese­ jo­ [I] Se Deus o soltasse, você imediata­ de “sentir­­ e com­­preen­der suas vidas e mente afunda­­ ria,­ desceria em pecado o Espírito­ em que vivem.” Seu espírito e mergulharia no abismo­ sem fim... O a­man­te da justiça natu­­ ­­­ralmente se volta­ Deus que o mantém acima do abismo para a crítica social: “Per­cebi­­ que mui­ do inferno, como alguém se­gu­raria tos brancos vendem rum aos índios,­ o uma aranha­ ou outro inseto repugnante­ Jonathan Edwards que, creio, é um grande Mal.” acima do fogo, o abomina e sente-se oolman foi um dos primei­ terri­velmente pro­vo­cado... ele o vê ros es­cri­­tores an­ti­es­cra­ como algo que merece ser lançado­ no Wvagistas e pu­blicou­­ dois pre­cipício­­ sem fundo. ensai­ os,­ “Some Considerations on the Keeping of Negroes” [Considerações Os sermões de Edwards tinham Sobre o Trata­ mento­ de Negros], em enorme im­pacto,­ levando con­ 1754 e 1762. Hu­­ma­nitário ar­do­ro­so, gregações inteiras ao pranto his ­ seguiu­ o caminho da “o­bediência­­­­­ térico. A longo prazo, porém, seu passi­­ va”­ às autorida­ des­ e às leis que rigor gro­tes­co afas­tou o povo do considerava injus­ tas,­ se anteci­ pando­­ calvinismo por ele de­fendido­ com assim ao fa­moso­ ensaio de Henry valentia. Seus sermões­ dogmáticos David Thoreau, “Ci­vil Dis­obedience” Gravura © The Bettmann Archive e medie­vais não se a­de­quavam à ex­

13 pe­ri­ên­­cia prós­­pera e re­la­­ti­vamente pa­cí­fica dos escravos e todo tipo de comércio entre meus servos, colonos do século 18. Após Edwards, as novas de modo que vivo uma espécie de inde­ pendência­­ em cor­ren­tes libe­rais de tolerância­ se fortale­ceram. relação a todos, a não ser a Pro­vidência...­

A LITERATURA NAS COLÔNIAS William Byrd representa o espírito da elite DO SUL E DO CENTRO colonial sulista. Herdeiro de 1.040 hectares, que literatura pré-revolucionária do Sul era aris­ ex­pan­diu para 7.160, era mercador, comer­cian­te tocrática e secular, refletindo os sistemas e fazendeiro. Sua biblioteca de 3.600 li­­­vros era A sociais e econômicos predomi­nan­­tes nas a maior do Sul. A in­te­li­gência­­­ argu­ta foi aprimo­ planta­ ções­ do Sul. Os primeiros imigrantes­ ingleses­ rada por seu pai, que o mandou pa­ra excelentes­ foram atraídos para as colônias do Sul pela­­ oportu­ escolas na Inglaterra e na Holan­ ­­da. Visitou a corte nidade econômica e não pela liber­dade de culto. francesa, foi membro­­ da Socie­ ­dade Real e amigo Embora muitos sulistas fossem agricul­tores de al­guns dos prin­ci­pais es­cri­tores ingleses da pobres ou artesãos, vivendo pouco melhor que épo­ca, como William Wycherley e William Con­ es­cra­vos, a elite instruída inspi­rava-se no ideal gre­ve. Seus diários­ de Londres­ são o oposto dos clássico do Velho Mundo, de aristo­cra­cia agrá­ relatos puri­ ­tanos da Nova Inglaterra: com janta­res ria cuja existência se devia à escra­vidão. Es­ta sofisticados,­ fes­tas reluzentes e promis­cuidade, instituição liberava os brancos ricos do trabalho sem muita introspecção. manual, dava-lhes lazer e permitia o sonho­­ de uma Byrd é mais conhecido por sua obra vivaz His­tory vida aristo­ ­crática em pleno interior americano.­ A of the Dividing Line [História da Linha de Fronteira], ên­fa­se puritana­ no tra­ba­­­lho duro, edu­ca­ção e dili­ diário de uma viagem de algumas semanas em 1729, gên­cia era ra­­­ra — ao invés disso, ou­vi­­mos falar de de 960 quilômetros no interior do país para fazer pra­ze­­res como cavalgar e caçar. A igreja era fo­­­co um levantamento topográ­ fico­ da linha que dividia da vida social elegante e não foro para exame da as colônias da Virgínia­ e Caro­ lina­ do Norte. As consciência. rápidas impressões daquela­ vastidão, dos índios, William Byrd (1674 - 1744) dos brancos semi-sel­vagens, das feras e de toda A cultura do Sul naturalmente girava em tor­ espécie de dificuldades­ enfrentadas por este cava­ no do ideal do cavalheiro. Como um homem da lheiro civilizado fazem deste um livro singularmente Renascença, igual­mente capaz de admi­nistrar uma americano e muito sulista. Ele ridiculariza os primei­ fazenda e ler grego clássico, ele detinha­ o po­der ros colo­ nos­ da Virgínia, “cerca de cem homens, a de um senhor feudal. maioria deles réprobos de boas famílias,” e zomba William Byrd, numa famosa carta de 1726 a um que, em Jamestown, “como verdadeiros ingleses,­ amigo inglês, Charles Boyle, Conde de Orrery, construíram uma igreja que só custou cinqüenta descreve a graciosa vida em sua fazenda chamada­­ libras e uma taverna que custou quinhentas.” Os Westover: escritos de Byrd constituem exce­lentes exemplos do grande interesse que os sulistas tinham pelo mundo Além da vantagem do ar puro, temos abun­dância material: a terra, os índios, as plantas, os animais e de todo tipo de provisão, sem qualquer despesa os colonos. (quero dizer, nós que temos plantações). Tenho uma grande família, minhas­ portas estão abertas­ a todos Robert Beverly (1673 - 1722) e, no en­tan­to, não tenho con­tas a pa­gar e uma meia obert Beverly, outro rico dono de terras e coroa poderá permanecer into­cada no meu bolso autor de The History and Present State of por muitas luas. RVir­gi­nia [A História e o Estado Atual da Como um patriarca, tenho meus reba­nhos, meus Virgínia] (1705, 1722), registra a histó­ ­ria da colônia

14 da Virgínia num estilo vigoroso e humano. Como the African [A Interessante Narrativa da Vida de Byrd, admirava os índios e comentou as estra­ Olaudah Equiano, ou Gusta­ ­vus Vassa o Africano] nhas superstições que os eu­ro­peus tinham sobre­ (1789). Nesse livro — um dos primeiros exemplos a Virgínia — por exemplo, a crença de que “a do gênero de narrativa­ escravista — Equiano faz um terra transforma em negros todos os que lá vão”. relato de sua terra natal e dos horrores e crueldade Assinalou a grande hospi­ta­lidade dos sulistas, de sua captura e escravização nas Antilhas. Equi­ característica mantida até hoje. ano, que se converteu ao cristianismo, lamenta de A sátira humorística — obra literária em que modo comovente o tratamento “não-cristão”­ que vícios ou loucuras humanas são atacados com recebeu nas mãos dos cristãos — sentimen­ to­ que ironia, escárnio ou chiste — aparece­ com fre­qüên­ muitos afro-americanos expressa­ riam­ nos séculos cia no sul colonial. Um grupo­ de colonos irri­tados seguintes. com o General James Oglethorpe, fun­dador filantrópico da Colônia da Georgia, satiri­zou-o Jupiter Hammon (c. 1720 - 1800) num panfleto intitulado A True and Historical O poeta negro americano Jupiter Hammon, es­ Narrative of the Colony of Georgia [A Ver­dadeira e cravo em , Nova York, é lembrado pelos Histórica Narrativa da Colônia da Georgia] (1741). seus poemas religiosos e também por seu Address Eles fingiam louvá-lo por man­tê-los tão pobres e to the Negroes of the State of New York [Discurso sobrecar­regados de traba­ ­lho, que eles tiveram de aos Negros do Estado de Nova York] (1787), em desenvolver a “valiosa virtude da humildade” e re­ que defendia a libertação de filhos­ de escravos, jeitar “as ansiedades de qualquer outra ambição.” ao invés de condená-los à escravi­dão hereditária. O poema satírico e desordeiro intitulado The Seu poema “An Even­ing Thought” [Um Pensamento Sotweed Factor satiriza a colônia de Maryland, onde na Noite] foi o primeiro­ poema publicado por um o autor, o inglês Ebenezer Cook, tentou, sem êxito, homem ne­gro na América.  ser um negociante de tabaco. Cook expôs com humor as maneiras rudes dos colonos­ e os acusou de trapaceá-lo. O poema termi­na com uma maldição exagerada: “Que a ira divi­ ­na possa transformar essa região em terras improdutivas/ Em que não haja homem fiel nem mulher virtuosa.” Em geral, o sul colonial pode ser associado à tradição literária realista, informativa, munda­ ­na e leve. Imitadores das modas literá­rias in­glesas, os sulistas alcan­çaram grandes altu­ras, em termos de ima­gi­nação em observações precisas e espirituo­ sas das condições do Novo Mundo.

Olaudah Equiano (Gustavus Vassa) (c. 1745 - c.1797) Durante o período colonial, importantes­ escri­ tores negros emergiram, como Olaudah Equi­ano e Jupiter Hammon. Equiano, um Ibo da Nigéria (África Ocidental), foi o primeiro negro­ a escrever uma autobiografia, The Interest­ing Nar­ra­tive of the Life of Olaudah Equiano, or Gustavus Vassa

15 James Fenimore Cooper, Ralph Waldo Emerson, Henry David Thoreau, Herman Melville, Nathaniel­ CAPÍTULO Hawthorne, Edgar Allan Poe, Walt Whitman e Emily Dickinson. A independência literária dos Estados­ Unidos foi um pouco retar­dada em função da pro­ longada identificação com a Inglaterra, da imitação excessiva dos modelos­ literários ingleses ou clássicos e de difi­ ­culdades­ econômicas­ e políticas que prejudi­ ORÍGENS2 DEMOCRÁTICAS caram a publicação das obras. E ESCRITORES Os escritores revolucionários, apesar de seu REVOLUCIONÁRIOS, 1776-1820 patriotismo genuíno, eram, por necessidade, cons­ cientes e nunca pude­ ram­­ encontrar raízes em suas renhida Revolução Americana contra a Grã- sensi­bilidades­ americanas. Os escritores­ coloniais Bretanha (1775 - 1783) foi a primeira guerra da gera­ ção­ revolucionária haviam nascido ingleses, A moderna de libertação contra uma potência chegado à maturidade como cidadãos ingleses e colonial. O triunfo da inde­pen­dên­cia americana cultivado hábi­ tos­ de pensamento­ e conduta ingle­ parecia, para muitos da épo­ca, um sinal divino ses. Seus pais e avós eram­ ingleses (ou europeus), de que a Amé­rica e seu povo se destinavam à assim­ como seus amigos. Além disso, a consciência gran­de­za. A vitória militar alimentou esperanças americana das modas literárias­ era sempre defasada nacionalistas de uma no­va grande literatura. Com em relação à inglesa, o que intensificava a imitação exceção dos notáveis textos políticos, porém, pelos americanos. Cinqüenta anos depois de terem­ poucas obras de valor apareceram durante ou alcançado a fama na Inglaterra, escritores­ neoclássi­ logo após a Revolução. cos como­ Joseph Addison, Richard Steele, Jonathan Os livros americanos eram alvo de crítica­ rigorosa Swift, Alexander Pope, Oliver Goldsmith e Samuel na Inglaterra. Os americanos­ esta­vam dolorosamente Johnson ainda eram entusiasticamente­ imitados na cientes de sua ex­ces­si­va dependência­ em relação aos América. modelos literários­ ingleses.­ A busca de uma literatura Por outro lado, os empolgantes desafios re­ pró­pria tornou-se obsessão nacional. Segundo o sul­­­tantes da necessidade de construir uma no­ editor de uma revista americana, por volta de 1816, “A va nação levaram muitas pessoas talentosas e depen­ dência­ é um estado de degra­ dação­ repleto de ins­truí­das a se encaminharem para a política, o ignomínia e ser dependente­ de mentes estran­ geiras­ di­reito e a diplomacia. Esse caminho trazia­ hon­ra, para aquilo que podemos­ produzir nós mesmos é glória e segurança financeira. Já a literatu­ ­ra não o mesmo que acrescentar­ o crime da indolência à pagava bem. Os primeiros escri­tores ameri­ ­canos, fraque­ ­za da estupidez.” agora separados da Ingla­terra, não dispunham, As revoluções culturais, diferentemente das efetivamente, de edito­res moder­ ­­nos, público ou revoluções militares, não podem ser impostas, mas proteção legal adequada. A assis­ ­tência editorial, têm de brotar do solo da experiência com­parti­ lhada.­ a distribuição e a divulgação­ eram rudimentares. Revo­luções­ traduzem expressões do coração das Até 1825, a maioria dos autores americanos pessoas;­ desenvolvem-se gradualmen­ te­ a partir de tinha de pagar aos edi­tores­ para ter suas obras novas sensibilidades e da rique­­ za­ de experiências.­ pu­bli­ca­das. É claro que apenas os que dispu­ ­­nham Seria preciso esperar cinqüenta anos de história de tempo e posses, como Wa­shing­ton Irving e o acumulada para a América­ ganhar sua indepen­ gru­­po Knickerbocker­ de Nova York, ou os poetas dência cultural e produzir a primeira­ geração de de Connec­ticut, co­nhe­cidos como Hartford Wits, grandes escri­tores ameri­ca­nos: Washington Irving, podiam se dar ao luxo de es­crever. A exceção

16 foi Ben­jamin Fran­­­klin que, embora casos de pirataria. Matthew Carey, de família po­bre, era ti­pó­grafo de importante editor ame­ricano, contratou profissão, podendo por is­so publicar um agente em Londres­ — espécie de suas pró­prias obras. espião lite­ rá­­ rio­ — para que lhe man­ Charles Brockden Brown foi mais dasse páginas ainda por encadernar, típico. Autor de vários roman­ces ou até mesmo provas gráficas, em ‘góticos’ interessantes, Brown foi o na­vios­ velozes que pudessem chegar primeiro autor ameri­cano a tentar à América dentro de um mês. Já na ganhar a vida com a lite­ ­­ra­tura. Mas América, os empregados de Ca­rey morreu moço e pobre. saíam ao encontro desses navios no A falta de público era outro pro­ porto, e imprimiam rapida­ ­men­te os blema. O reduzido público culto da livros pirateados, recor­ ­rendo a tipó­ América queria autores euro­peus grafos que dividiam o livro em seções bem conhecidos, em parte devido e trabalhavam em turnos 24 horas por ao exagerado respeito que as antigas­ dia. Um livro inglês assim pirateado colô­ nias­ tinham por seus ex-gover­ podia ganhar­ nova tiragem­ em um dia, nantes. Essa preferência por obras e ser colocado à venda­ em livrarias inglesas tinha sua razão de ser, dada a americanas quase­ ao mesmo tem­po inferioridade da produção­ americana. que na Inglaterra.­ Mas só fez piorar a situação, ao privar­ Como edições importadas au­to­ os autores ame­­ri­canos de pú­blico. rizadas eram mais caras e não podiam­ Apenas o jornalismo oferecia remu­ competir com as pirateadas,­ a falta de neração finan­ceira,­ mas o público proteção ao direito autoral­ prejudica­ de massa queria­ obras leves, ensaios va não só autores­ americanos,­ mas curtos sobre­ temas atuais ou versos também autores estran­ ­geiros, como fáceis — nada de trabalhos longos ou Sir Walter­ Scott e Charles Dickens. Só expe­ rimentais.­ que os autores­ estrangeiros já tinham­ A ausência de legislação adequada­ pelo menos­ sido pagos por seus edito­ sobre direitos autorais talvez tenha res originais e eram bem conheci­ dos.­ sido o principal motivo da estagna­ Americanos, como James Feni­ more­­ ção literária. Os editores­­ ame­ ricanos­ Noah Webster Cooper, não só deixavam de receber que pirateavam obras de sucesso na pagamento condizente,­ como­ ainda Inglaterra naturalmen­ ­te não estavam passavam pelo desprazer­ de ver suas dis­postos a pagar a um autor ameri­ obras pirateadas­ nas suas barbas.­ O cano por material desconhecido. A primeiro­ sucesso­ de Cooper, The Spy cópia não autori­zada­ de livros es­ [O Espião] (1821), foi pirateado por trangeiros foi ini­cial­mente enca­rada quatro diferentes editoras no decor­ rer­ como um be­ne­fício para as colônias e do primeiro­ mês de seu lançamento. uma fonte de lucro para tipógrafos­ co­ Ironicamente, a lei de direitos auto­ mo Fran­­­klin, que reim­primia grandes rais de 1790, que permitia a pirataria, clás­sicos e obras européias, no intui­ tinha intenções nacionalistas. Escrita to de educar o público ame­ricano. por Noah Webster, o grande­­­­­ lexicó­ Seu exemplo foi seguido por tipó­ ­ grafo que mais tarde compilou um grafos em toda a América. São notó­ ­rios Gravura © The Bettmann Archive di­cio­nário americano, a lei protegia

17 apenas o traba­ lho­ de autores americanos; sentia­ o impacto que o Iluminismo pode exercer sobre um -se que os autores ingleses deveriam cuidar de si indivíduo­ talentoso. Autodidata, mas muito versado próprios.­ nas obras de John Locke, Lord Shaftesbury,­ Joseph Apesar de ruim, nenhum­ dos editores da épo­ ca­ Addison e outros autores do Iluminismo, Franklin estava dispos­ to­ a alte­ rar­ a lei, já que lhes propiciava aprendeu com eles a aplicar a razão à sua própria lu­cros. A pirataria fez morrer de fome­ a primei­ ­­ra vida e romper com a tradição­ — sobre­­ ­tudo a antiqua­ gera­ção de escritores revolucio­ ­nários americanos;­ da tradição puritana — quan­­do ameaçou sufocar seus não é de surpreender que a geração seguinte tenha ideais. produzido ainda menos­ obras de valor. O ápice da Enquanto jovem, Franklin aprendeu sozinho vá­ pirataria, 1815, corresponde­ ao ponto mais baixo na rias línguas, leu muito e praticou a arte de escre­­ ­­ver lite­ ra­ tura­ americana.­ Mas a oferta abun­ dante­­ e barata para o público. Quando se transferiu de Boston para de livros estrangeiros e clássicos­ pirateados­ durante Filadélfia, na Pensilvânia,­ já tinha­ o tipo de educação os primeiros cinqüenta­ anos da nação, te­ve o mérito geralmente associado às elites. Tinha também a de educar os america­ ­nos, inclusive­ os primeiros capacidade dos puritanos­ para o trabalho, cuida­ grandes escri­ ­tores, que começaram­ a surgir por volta doso­ e com constan­ te­ autocrítica, além do desejo de 1825. de aperfeiçoar­ -se cada vez mais. Essas qualidades o impulsionaram­ progressivamente na direção da O ILUMINISMO AMERICANO riqueza, da respeitabilidade e do prestígio. Não era Iluminismo americano do século 18 foi um egoísta e procurou ajudar outras pessoas­ comuns a movimento marcado pela ênfase dada à progredirem na vida, compartilhando­ sua sabedoria Orazão, em lugar da tradição; à pesquisa­­ cien­ e dando início a um gênero caracteristicamente tífica, em lugar do dogma religioso inquestionável; e americano — o livro de auto-ajuda. ao governo representativo, em lugar da monarquia. Poor Richard’s Almanack [O Almanaque do Os pensadores e escritores ilumi­ ­nistas dedicavam-se Pobre Ricardo], iniciado em 1732 e publi­cado aos ideais de justiça,­ liberdade e igualdade, prerro­ ­ durante muitos anos, tornou Franklin próspero gativas inerentes­ ao homem. e conhecido em todas as colônias.­ Nesse­ anuá­ rio de estímulos úteis, conselhos­ e informações Benjamin Franklin (1706 - 1790) factuais, personagens divertidos, como o Velho Benjamin Franklin, a quem o filósofo escocês Abraão e o Pobre Ricardo, exortam o leitor com David Hume chamou de “o primeiro grande homem­­­ adágios enérgicos e memoráveis. Em The Way to das letras” na América, encarnava o ide­ al­­ iluminista Wealth [O Caminho para a Riqueza], que apareceu­ da racionalidade humanista. Prático, mas idealista, pela primeira vez no almanaque, o Velho Abraão, trabalhador e muito bem sucedido, Franklin regis­ “velho íntegro, sim­ples, com cachos bran­cos,” trou seus primeiros anos na famosa Autobiography cita inúmeras vezes Pobre Ricardo. “Para o sábio, [Autobio­grafia]. Escritor, tipógrafo, editor, cientista, meia palavra basta”,­ diz ele. “Deus ajuda os que se filan­ ­tropo e diplomata, foi a figura privada mais famosa­ ajudam.” “Quem cedo dorme e cedo se levanta, e respeitada de sua época. Foi o primeiro­ grande ho­ torna-se saudável, rico e sábio.” O Pobre Ricar­do é mem a vencer sozinho na América:­ um demo­ crata­ psicólogo­ (“O trabalho paga as dívidas, enquan­ ­to o pobre nascido numa era aristo­ cra­ ta,­ que seu próprio desespero só as faz aumentar”) e sem­pre aconselha exemplo ajudou a liberalizar. o trabalho­ esforçado (“A diligên­ cia­ é a mãe da boa Franklin pertencia a uma segunda geração de sorte”). Não seja preguiçoso,­ ele aconselha, pois imigrantes. Seu pai, puritano, fabricante de velas, “Um hoje vale dois ama­nhã.” Às vezes, ele cria imigrou da Inglaterra para Boston, em Massachusetts, anedotas­ para ilustrar suas verdades: “Um pouco em 1683. A vida de Franklin ilustra­­ de muitos modos de negligên­ cia­ pode criar um grande problema...­

18 Benjamin Franklin

Gravura, cortesia da Biblioteca do Congresso 19 Por falta de um cravo perdeu-se a ferradura; por ra de proa na convenção de 1787, que redigiu a falta de uma ferra­du­ra perdeu-se o cavalo; por Constituição dos Estados Unidos.­ Em seus últimos falta do cavalo perdeu-se o cavaleiro,­ alcançado anos, presidiu uma as­so­­ciação aboli­cionista. Um e abatido pelo inimigo, tudo por falta de cuidado de seus últimos em­preendimentos foi promover a com um cravo de ferradura.”­ Franklin­ era um gênio educação pú­blica universal. ao condensar um pensamento moral: “O gastos com um vício sus­tentariam duas cri­anças.” “Um Hector St. John de Crèvecoeur (1735 - 1813) pequeno vaza­ mento­ afunda­ um navio.” “Os tolos Outro Iluminista é Hector St. John de Crève­ dão banquetes,­ os sábios­ os comem.” coeur, cujas Letters from an American Farmer Autobiography de Franklin é, em parte, outro [Cartas de Um Agricultor America­no] (1782) livro de auto-ajuda. Escrita para orientar seu filho, deram­ aos europeus uma idéia brilhante­ das opor­ cobre apenas seus primeiros anos. A parte­ mais tu­nidades de paz, riqueza e orgulho na América.­ famosa descreve seu sistema cien­tífico de auto­ Nem ame­ricano­ nem agricultor, mas aris­tocrata -aperfeiçoamento. Franklin relaciona­ 13 virtudes: francês que antes da Revo­lução foi dono de terras sobriedade, silêncio, ordem, determi­ ­nação, frugali­ fora da cida­de de Nova York, Crè­ve­­coeur exaltou dade, trabalho, sinceridade,­ justiça, moderação, as­ entu­sias­­tica­ mente­­ o espírito em­pre­endedor, a tole­ seio, tranqüilidade, castidade­ e humildade. Ele fala rân­­cia e a crescente prospe­ ­ridade das colônias em de cada­ uma, através de aforismos. Por exemplo, a 12 cartas que pintam a América como um paraí­so máxima rela­­ ­­tiva à sobriedade é: “Coma, sem ficar agrário. Sua visão inspiraria Thomas Jefferson, em­bo­tado. Beba, sem ficar alto.” Cientista pragmá­ Ralph Waldo E­mer­son e vários outros autores, até tico, Franklin testou a idéia da perfeição,­ usan­do a hoje. si mesmo como objeto de expe­ri­mentação. Crèvecoeur foi o primeiro euro­peu a desen­ Para cultivar bons hábitos, Franklin criou uma volver uma visão pon­derada da América e do agenda de registro em que trabalhava uma virtude no­­vo cará­ter americano. O pri­mei­ro a explorar a cada semana, marcando cada lapso com um a ima­gem do “caldeirão­ de raças” [melting pot] ponto preto. Sua teo­ ­ria prefi­ ­­gura o beha­viorismo para a América, o autor, num famoso trecho, faz a psicológico e seu método siste­­ ­mático de anotação seguinte per­gunta: antecipa a alteração comportamental moderna. O projeto de auto-aper­ ­feiçoa­mento mistura a crença Quem é afinal o americano, esse novo ho­mem? É iluminista na perfeição ao hábito purita­no do europeu ou descendente de europeu. Daí, aque­la auto-exame. estranha mistura de sangue que não é encon­ ­trada ercebeu desde cedo que a melhor maneira em nenhum outro país. Eu poderia lhes apontar­­ uma de promover suas idéias seria pô-las no família cujo avô era inglês, a esposa, holandesa, o papel. Então, deliberadamente, aprimorou­ filho, casado com uma fran­cesa e cujos quatro filhos P hoje são casados com mulhe­ ­res de quatro di­fe­rentes seu estilo de prosa,­ não como um fim em si, mas co­­mo uma ferramenta. “Escreva­ com os letrados.­ nacionalidades... Aqui, indivíduos­ de todas as nações Pro­­­­nuncie com o povo”, sugeria ele. Cientis­ ­ta, se­ se fundem em u­ma nova raça de ho­mens, cujo tra­ guiu o conselho da Socie­ ­dade Real (de Ciên­cias) balho e descen­den­tes irão um dia mudar o mundo. de 1667 para adotar um estilo natural, pre­ciso, trans­pa­rente; expressões positivas,­ senti­­ ­dos claros, PANFLETO POLÍTICO: trazendo todas as coisas o mais perto pos­sível da Thomas Paine (1737 - 1809) simplicidade mate­mática.” A paixão da literatura revolucionária­ é encontra­ Mesmo próspero e famoso, Franklin nunca perdeu sua sensibilidade democrática e foi figu­

20 da em panfletos, a forma mais popular lógica, mas as modificações feitas por de literatura polí­ tica­ na época. Mais sua comissão a torna­ ­ram mais simples de 2.000 panfletos­­ foram publicados ain­da. The Federa­list Papers [Textos­ durante­ a Revolu­ ção.­ Os panfletos fa­ Federalistas], escritos­ para apoiar­ a ziam vibrar os patriotas e ameaçavam­ Constituição,­ também­ são ar­gumentos­ os legalistas (loyalists); preenchiam o lú­cidos e lógicos, adequados ao debate pa­pel do drama, pois eram quase sem­ numa nação­ democrática. pre lidos em voz alta para emocionar­ as platéias. Soldados­­ ameri­­ ­canos os NEOCLASSICISMO: ÉPICO, liam em voz alta em seus acampamen­ PARÓDIA DE ÉPICO E SÁTIRA tos, legalistas ingleses os lançavam em Infelizmente, a escrita “literá­ria” grandes fogueiras. não era tão simples e direta quanto­­­­ a panfletoCommon Sense [Bom política. Ao tentar escre­ver poesia, a Senso], de Thomas Paine, ven­ maioria dos auto­ res­ cultos tropeçava Odeu mais de 100.000 exempla­ no abismo do neoclassicismo elegan­ res nos primeiros três meses. Ainda­ te. O épico,­ em parti­ ­cular, exercia uma hoje, inflama os espíritos.­ “A causa da atra­ção fatal. Os patriotas literários Amé­ rica­­ é, em grande­ parte, a causa­­ america­­ nos­ tinham certeza de que da hu­­ma­nidade”, es­cre­veu ele, ex­ a gran­de Revolução Americana na­ pres­­sando a idéia da excepcionalidade tural­­ mente­ encontraria expres­são americana, ain­da for­­te nos Estados no gênero­ épico — um longo poema­ Unidos — o sentido fundamental de narrativo­­ e dramático, es­crito em que, como a Amé­rica é um experi­ linguagem­ elevada, que celebra­ ­va os mento demo­crático teo­ri­camente feitos de um herói lendário.­ aberto a to­­dos os imi­­­­gran­tes, seu Muitos tentaram, mas nenhum con­ destino prefigura o destino de toda a seguiu. Timothy Dwight (1752 - 1817), humanidade. integrante do grupo deno­minado Os textos políticos numa demo­ Hartford Wits, é um bom exemplo. cracia precisavam ser claros, para Dwight, que aca­bou se tor­­­nando empolgarem os leito­res. E, para ter Presidente da Univer­­ si­ dade­ de Yale, eleitores informados, muitos dos baseou seu épico, The Conquest of fun­dadores da nação promoveram a Thomas Paine Canaan [A Conquista­ de Canaã]­ (1785), educação universal. Um indício da vi­ na história­ bíblica­ da luta de Josué gorosa, ainda que simples, vida­ literária para chegar à terra­ prometida. Dwight foi a proliferação de jornais.­ Durante colocou o Ge­ne­ral Washington, co­man­ a Revolução, liam-se mais jornais na dante­ do exército americano e primeiro América do que em qualquer outra Pre­siden­ te­ dos Estados Unidos, como parte do mundo.­ A imigração também­ Josué em sua alegoria­ e tomou­ em­ determi­nava um estilo literário simples. prestada a forma do dístico usado por A clareza­ era vital para o recém­ -che­ Alexander Pope para traduzir Homero.­ ga­do que poderia ter no inglês sua O épico de Dwight era tão massante se­gun­da língua. A versão original da quanto ambi­ cioso.­ Os críticos ingleses Decla­ração de Independência, escri­­ arrasaram o poema.­ Até os amigos de Retrato, cortesia da Biblioteca do ta por Thomas Jefferson, era clara e Congresso Dwight, como John Trumbull­ (1750-

21 1831), não se entusiasmaram. Tantos­ raios e trovões resco em Dom Quixote; descreve as desventuras troavam nas cenas de batalha melodramáticas, que do Capitão Farrago e seu servo Teague O’Re­gan, Trumbull propôs que o épi­ co­ viesse acompanhado estúpido, brutal, ainda assim agradavel­mente de pára-raios. humano. ão é de surpreender que a poesia satírica tenha se saído melhor que a poesia séria. POETA DA REVOLUÇÃO AMERICANA: NA pa­ró­dia de épico estimulou os poe­tas Philip Freneau (1752 - 1832) americanos a usarem suas vozes naturais e não Poeta, Philip Freneau, absorveu os novos es­ os atraiu para o atoleiro de sentimentos patrióticos tímulos­ do Romantismo europeu e escapou da pretensiosos e previ­síveis e de outros epítetos imi­­tação e universalidade vaga dos Hartford Wits. poéticos convencionais copiados do poeta­ grego A chave para seu sucesso, como também­ de seu Homero e do poeta romano Virgílio por intermédio fracasso, estava no seu espírito apaixo­ ­na­damente dos poetas ingleses. democrático combinado a seu tem­peramen­ to­ Em paródias de épicos, como a bem-humorada inflexível. M’Fingal (1776 - 1782) de John Trum­bull, emoções Os Hartford Wits, indubitavel­mente patrio­tas, estilizadas e clichês convencio­ nais­ são munição refletiam o conservadorismo cultural das classes para a boa sátira e a própria oratória bombástica da instruídas. Freneau colocou-se em opo­sição a Revolução era ridicularizada.­ Basenado-se no texto essa herança das velhas atitudes conservadoras,­ Hu­dibras, do poe­ ta­ inglês Samuel Butler, a paródia criticando os “escritos de uma facção aristocrática, zomba de M’Fingal, um Tory [político conservador].­ especulativa de Hartford a favor da monarquia e da É muitas vezes consiso, como­ quando descreve os concessão de títulos nobiliárquicos.” Embora tenha condenados que enfrentam a forca: recebido educação­ primorosa e conhecesse os clás­ sicos tão bem quanto qualquer dos Hartford Wits, Nenhum homem jamais sentiu o aperto do laço Freneau­ abraçou as causas liberais e democráticas.­ Com boa opinião sobre a lei. De família huguenote (protestantes fran­ce­ses radicais), Freneau foi da milícia durante a Guerra M’Fingal teve mais de 30 edições, foi reimpresso Revolucio­nária. Em 1780, foi captu­ ra­ do­ e preso em por mais de 50 anos e apreciado tanto­ na Inglaterra dois navios ingleses; quase­ morreu­ antes de sua quanto na América.­ A sátira agradava­ ao público família conseguir libertá-lo. Seu poema “The British revolucioná­rio em parte porque continha comentá­ Prison Ship” [O Na­vio-Pri­são Britânico] é uma amarga rios e críticas sociais; temas políticos­ e problemas condenação da crueldade dos ingleses, que queriam sociais eram o grande assunto da época. A primeira “man­char o mundo com sangue.”­ Essa e outras comédia americana­ a ser encenada, The Contrast obras re­­vo­­lu­cionárias, incluindo “Eutaw Springs” [O Contraste] (produzida em 1787), de Royall Tyler [A Fonte de Eutaw], “Ame­rican Liberty” [Liberdade (1757-1826), contrasta de forma humorística o Coro­ Ameri­ cana],­ “A Political Litany” [Lita­ nia­ Política], nel Manly, oficial americano, e Dimple, imitador das “A Midnight Consultation” [Consulta à Meia-Noite],­ modas inglesas.­ É claro que Dimple é ridicu­ larizado.­ e “George the Third’s Soliloquy” [O Solilóquio de A peça introduz a primei­ ra­ personagem­ yankee, George III], o tornaram­ famoso como o “Poeta da Jonathan. Re­­volução­ Americana”. Outra obra satírica, o romance Modern Chi­valry Freneau editou uma série de peri­ ódicos­ durante [Cavalheirismo Moderno], publicado em capítulos sua vida, sem­pre cônscio da grande causa da por Hugh Henry Brackenridge, de 1792 e 1815, zom­ demo­cracia. Quando, em 1791, Thomas Jefferson o ba de forma memorável dos excessos da época. ajudou a fundar o National Gazette, jornal militante Brackenridge (1748-1816), imigrante escocês criado e anti-federalista, Freneau tornou-se o primeiro na fronteira americana,­ baseou seu romance pica­ 22 editor poderoso de jor­na­l defensor de 100 mi­­­lhões de cópias. Versões de grandes causas na América e atua­li­zadas do dicionário Webster o predecessor literá­rio de William ainda estão em uso até hoje. Ame­­rican Cullen Bryant, William Lloyd Garrison Geography [Geografia Ameri­cana], e H.L. Mencken. de Jedidiah Morse, ou­tra impor­tan­ Como poeta e editor, Freneau aderiu­ Iluminismo tíssima obra de referência,­ promovia­ a seus ideais demo­ cráticos.­ Seus poe­ Oamericano do o conhecimento­ do grande território mas populares,­ publicados­ em jornais, ameri­cano, ainda em franca expansão. celebravam temas­ bem americanos.­ sécu­ lo­ XVIII foi Algumas­ das obras­ mais interessantes­ “The Virtue of Tobacco” [As Virtudes­ um movimento do período,­ embora sem cunho lite­­ do Tabaco] fala dessa plan­ta nativa, marcado pela rário, são os diários de desbra­vadores e esteio da economia­ sulis­ ­ta, ao passo ênfase na razão exploradores, como­ Meriwether­ Lewis que “The Jug of Rum” [A Garrafa­ de (1774-1809) e Zebulon Pike (1779-1813), Rum] elogia a bebida das Antilhas, em lugar da que relatam­ suas expedições no Terri­ item básico no comér­cio da América­ e tradição, na tório­ da Louisiana, vasta por­ção do um dos principais­ produtos de expor­­ pesquisa científica, continente­ americano comprada por tação do Novo Mundo. Perso­ na­ gens­ em lugar do Thomas Jefferson de Napoleão em americanos­ comuns viviam em obras dogma religioso 1803. como “The Pilot of Hatte­ras” [O Piloto­ de Hatteras] e poemas sobre­ médicos incontestável, FICCIONISTAS charlatões e evangelistas bombásticos.­ e no governo s primeiros escritores impor­ Freneau escrevia num estilo natural e representativo, tantes de ficção­ amplamente coloquial, adequado a uma­ democracia em lugar da Oreco­nhe­cidos hoje, Charles autên­ tica,­ mas podia atingir o ápice do Brockden Brown, Washington Irving lirismo­ neoclás­ sico­ em obras freqüen­ monarquia. Os e James Fe­nimore­ Cooper, usa­vam temente incluídas em antologias como pensadores e persona­gens ame­ricanas, pers­­pectivas “The Wild Honey Suckle” [A Madressilva escritores do históricas,­ temas envolvendo mudança­ Sil­vestre] (1786), que evoca um arbusto­ Ilumi­ nismo­ e nostalgia. Escreveram em muitos gê­ nativo de perfume­ adocicado.­ Só com eram dedicados ne­ros de prosa, iniciaram­ no­­vas formas­­ a “Renas­ ­­­­cença Americana” (1820), a e encontraram meios de ganhar­ a vida poe­ sia­ americana­ conseguiu superar o aos ideais de com a literatura. Com eles, a literatura­ que Freneau­ havia alcançado 40 anos justiça, liberdade americana­ come­ çou­ a ser lida e apre­ antes. e igualdade, ciada nos Estados Unidos­ e o exterior. Os primeiros anos lança­ ram­ bases considerando-os para outros feitos literários subse­­­ prerrogativas­ Charles Brockden Brown (1771 qüentes.­ O naciona­ ­lismo inspirou­ a - 1810) publicação de trabalhos em muitos­ inerentes Já citado como o primeiro escri­ campos, levando à valorização das ao homem. tor americano profissional, Charles coisas americanas. Noah Webster­ Brockden Brown inspirou-se nos (1758-1843) criou o Ame­rican Dictionary escritores ingleses Radcliffe e English [Di­cio­nário Ame­ri­cano] e também William Godwin. (Radcliffe é conhe­ uma­ importante­ cartilha de leitura e cida por seus romances ‘góticos’ ortografia para as escolas.­ Seu Spelling aterrorizantes; Godwin, ro­mancista Book [Livro­ de Ortografia]­ vendeu mais e reformador social, foi pai de Mary

23 Shelley, autora de Frankenstein, casada com o e receber­ o pagamen­ to­ devido. poeta inglês Percy Bysshe Shelley.) Sketch Book of Geoffrye Crayon [Caderno Movido pela miséria, Brown rapidamente­ escre­­ ­­veu de Esboços de Geoffrye Crayon] (pseudônimo quatro romances assustadores em dois anos: Wieland de Irving) contém suas duas histórias mais co­ (1798), Arthur Mervyn (1799), Ormond (1799) e Edgar nhecidas, “Rip Van Winkle” e “The Legend of Sleepy Huntley (1799). Nessas obras, desenvolveu o gênero Hollow”[A Lenda do Va­le Sonolento]. O termo ‘gótico ameri­ cano’.­ O romance gótico, muito­ popular “esboço” (sketch) apli­ ­­ca-se perfeita­ ­mente ao estilo na época, caracterizava-se por cenários­ exóticos­ e delicado, ele­gan­te, ainda que aparentemente es­ fan­tás­ti­cos, profundidade­ psicológica­ perturba­ ­ pontâneo de Irving, enquanto “crayon” sugere seu e muito suspense. Os acessórios incluíam­ castelos talen­to para colorir ou criar matizes ricos e efeitos ou mosteiros­ abandonados, fantasmas,­ segredos emo­cionais. No Sketch Book, Irving transforma misteriosos, personagens ameaça­ ­dores e donzelas as Montanhas Catskills, que acompanham o Rio solitárias que sobreviviam graças à inteligência­ e à for­ Hudson ao norte da cidade de Nova York, numa­­ ça espiritual. Os melhores­­­­ do gêne­ ro­ oferecem muito região fabulosa e mágica. suspense e toques de mági­ ca,­­ além da exploração Os leitores americanos aceitaram a “história” dos pro­­funda da alma humana submetida a con­di­ções Catskills inventada por Irving, apesar das histórias­ extremas. Os críticos­­ sugerem que a sensibi­ ­lidade terem sido adaptações de lendas de origem alemã gótica de Brown expressa profunda ansiedade­ em (fato por eles ignorado). Irving deu à América algo relação às instituições­ sociais inadequadas­ da nova de que ela precisava muito­ naqueles primeiros anos nação. impetuosos e materialistas:­ deu-lhe uma forma ima­ Brown recorria a cenários bem americanos. ginativa de se relacionar com a nova terra. Homem de idéias, dramatizou teorias­ cientí­ fi­ cas,­ de­ Nenhum autor conseguiu humanizar a terra senvolveu uma teoria pessoal de ficção e conquistou como ele, dando-lhe nome, rosto e um conjunto alto padrão­ literário, apesar das sérias­­ dificuldades de lendas. Virou folclore a história de “Rip Van financeiras. Embora imperfei­ ­ta, sua obra é som­ Winkle”, que dormiu por 20 anos e despertou briamente poderosa.­ Cada vez mais, é visto como quando as co­lônias já estavam indepen­­dentes. Foi predecessor de escritores românticos como Edgar adaptada ao teatro, incor­ ­porada à tra­dição oral e Allan Poe, Herman­ Melville e Nathaniel Hawthorne. passou a ser aceita, por várias gera­ ções,­ co­­mo uma Ex­pressa temores­ inconscientes­ que o período ilu­ lenda genui­na­mente ame­ri­cana. minista, aparen­ ­temente otimista, procurou reprimir. Irving identificou e ajudou a preencher­ o sentido­ de história da nova nação. Suas inúmeras­ obras po­ Washington Irving (1789 - 1859) dem ser vistas como bem intencionados­ esforços pa­ Caçula de 11 filhos de uma próspera família co­ ra construir­ uma­ alma para a nova nação,­ recrian­ ­do a merciante de Nova York, Washington Irving tornou­ história com vitalidade­ e imaginação.­­ Escolheu co­mo -se um tipo de embaixador cultu­ ral­ e diplo­ mático­ temas os aspectos mais dramáticos­ da história­ ameri­ na Europa, como Benjamin Fran­klin e Nathaniel cana: a descoberta­ do Novo Mundo, o primeiro presi­ Hawthorne. Apesar de talento­so, talvez não se dente­ e herói nacional e a explo­ ração­­ da fronteira tivesse tornado­ escri­ tor­ em tempo integral, dada­ oeste. Sua primeira­ obra foi a cintilante sátira History a falta de retor­ ­no financeiro­ propor­cio­nado pela of New York (1809), contan­ do­ a história­­ da cidade literatu­ ra,­ não fosse uma série de incidentes­ fortui­ tos­ ain­da sob domínio­ dos holandeses e osten­ ­­si­vamente que o forçaram­ a escolher o caminho­ da lite­ ra­­­ tu­­ ra.­ escrita por Diedrich Knickerbocker­ (daí o nome dado Graças à ajuda de amigos,­ ele pôde publicar seu ao círculo de amigos de Irving e escri­­ tores­­ de Nova Sketch Book [Caderno­ de Ilustrações]­ (1819-1820), York na época, a “Escola Knickerbocker”). simultaneamente­ na Ingla­terra e na América, ter reconhe­cidos seus direitos­ autorais nos dois países James Fenimore Cooper 24 (1789 - 1851) terras invadidas por colonos brancos­­ James Fenimore Cooper, como audaciosos. Irving, evocava o passado dando-lhe Natty Bumppo, a conhecida per­ uma presença geográfica e um nome. sonagem de Cooper, encarna sua visão­­ Em Cooper, contudo, encontramos­ o do explorador das fronteiras: um cava­ poderoso mito de uma era dourada e lheiro, um “aristocrata natu­ ral”­­ à moda a pungência de sua per­da. Enquan­ ­to de Jefferson. No início­ de 1823, em Irving e outros escritores­ americanos, The Pioneers [Os Pioneiros],­­ Cooper antes e depois de­­­le, vascu­ ­lharam a começava a descobrir­ Bumppo. Natty Europa em busca­ de lendas, castelos é o primeiro desbravador famoso­ na e grandes te­mas, Cooper captou a literatura americana, bem como o essência do mito americano: uma predecessor de inúmeros­ ‘caubóis’ e terra atem­ ­­poral, como o ermo. A his­ heróis do interior. É aquele individualis­ tó­ria americana era como que uma ta idealizado, de grande retidão, melhor­ invasão do eterno; a história européia­ do que a sociedade­­ que ele protege.­ na América era uma reencenação da Pobre e isolado, mas ainda assim puro, queda no Jardim do Éden. O ciclo é a pedra de toque dos valores éticos,­ da natu­reza só era vis­lumbrado­ no prefigurando Billy Budd de Herman­ momento­ de sua destruição:­ o ermo Melville, e Huck Finn de Mark Twain. desaparecia dian­ te­ dos olhos dos ame­ Parcialmente baseado na vida ricanos, desva­ ne­ cendo­ como se fosse real de Daniel Boone – quaker, co­ miragem.­ Esta é a trágica visão bási­ ca­ mo Cooper – Natty Bumppo, exí­ da irôni­ ­ca destruição das terras into­­ mio le­nhador como Boone, foi um cadas, o novo Éden que havia atraído homem­ pacífico adotado por u­ma os primeiros colonos. tribo­­ indígena. Tanto Boone quanto­ o As experiências pessoais per­ fictício Bumppo amavam a natu­ reza­ mitiram­ a Cooper poder descre­ver e a liberdade. Estavam sem­pre avan­ inten­ samente­ as mudanças nas terras­ çando em direção ao oeste para­ fugir intocadas e tratar de ou­tros te­mas, dos colonos que eles mesmos­­ haviam como o mar e o conflito­ entre pessoas guiado no ermo e torna­ ram­ -se lendas de diferentes culturas.­ Filho­ de família James Fenimore vivas. Natty é também­ virtuoso, probo quaker, foi cria­ do­ na propriedade de Cooper e profunda­ ­mente espiritual, tal qual um seu pai em Otsego Lake­ (hoje Cooper­ ca­valeiro­­ cristão dos romances medie­­ s­town), no centro­ do então remoto vais transposto às flores­ ­tas vir­gens e o Estado de Nova York. Embora­ a área solo rochoso da América. desfrutas­ se­ de relativa­ tranqüilidade O elo de ligação entre os cinco ro­ du­ran­­te sua infân­cia, já tinha sido mances conhecidos coletivamen­ te­ co­ palco­­ de um massacre de índios. O mo Leather-Stocking Tales [Contos das jovem Fenimore­­ Cooper cresceu num ‘Perneiras de Couro’]­ é a vida de Natty am­bi­­ente quase­­ feudal. Seu pai, Juiz Bumppo. São a obra-prima de Cooper: Cooper, era dono de terras e líder co­ um grande épico em prosa que tem o mu­­nitário. Quando me­ni­no, em Otsego conti­nente norte-ameri­cano por pal­co, La­­ke, conhe­ ­ceu desbra­­­­ ­­va­do­res das Foto, cortesia da Biblioteca do as tribos indígenas­ por personagens­ e frontei­ras e índios. Mais tarde, viu suas Congresso grandes­ guerras e a migra­ ção­ para o

25 Oeste como pano de fundo­ social. Os cultura tem o monopólio­ da virtude ou romances dão vida à fronteira oeste do refinamento. entre 1740 e 1804. Cooper aceitava a condição ame­ Os romances de Cooper retratam­ ricana, enquanto Irving não. Este trata­ as sucessivas ondas de colonização­ va o cenário americano como faria um de fronteira: as terras intocadas­ inicial­ europeu — importando­ e adaptando­ da mente habitadas por índios;­ a chegada Europa as lendas,­ cultura e história. dos primeiros­ brancos­ como guias, Cooper levou o processo­ um passo soldados, comer­ ­ciantes e desbrava­ adiante. Criou cenários americanos­ e dores; a che­gada das famílias de novos e distintos­ personagens e temas colonos rudes e pobres; e por fim a americanos.­ Foi o primei­ ro­­ a soar a chegada da classe média, trazen­do nota trágica que permeia toda a ficção­ os pri­mei­ros profissio­nais – o juiz, americana. o médico­ e o banqueiro.­ Cada onda deslo­ ca­ ­va o grupo­ anterior: os brancos­ MULHERES E MINORIAS deslo­­ caram­ os índios, que recua­ ram­ mbora o período colonial tenha para o oeste; a classe média­ “civili­­ testemunhado o despontar de zada”, que construía esco­ las,­ igrejas­ Evárias escritoras­ dignas de nota, e prisões, deslocou os desbra­ ­vadores a era revolucionária­ não favoreceu o individualistas de classe­ mais baixa trabalho das mulhe­ res­ e das minorias,­­ mais para oeste e que, por sua vez, apesar do sur­gimento de muitas es­ deslo­ ca­ ram­ os índios­ que os haviam colas, re­vistas,­ jornais e clubes literá­ prece­dido. Cooper evoca a onda rios. Mulhe­­­ res­ da era colonial como interminável­ e ine­vitável de colonos e Anne Bradstreet,­ Anne Hutchinson, vê não só os benefícios­ mas também Ann Cotton e Sarah Kemble Knight, as perdas. exerceram consi­derável influência Os romances de Cooper revelam social e literária, apesar das condições profunda tensão entre o indi­víduo primitivas e dos perigos. Das dezoito solitário e a sociedade, a natu­ reza­ e a mulheres que vieram para a América cultura, a espiri­ ­tualidade e a reli­­ ­gião em 1620, no navio Mayflower, apenas formal. Em suas obras, o mundo natural quatro sobre­viveram ao primeiro e os índios são fundamentalmente­ bons Phillis Wheatley ano. Quando­ cada pessoa ativa era — como­ também­­ o é a esfera mais civi­ importante e as con­dições sociais lizada­ associada a seus perso­ na­ gens­ eram ainda fluidas, o talento inato mais cultos. Os personagens­ intermedi­ podia encontrar expressão. Porém, à ários são muitas vezes suspeitos, espe­ me­di­­da que as instituições culturais cialmente colonos­ brancos pobres­ e na nova república­ foram sendo for­ ganan­ cio­ sos­ incultos ou inca­ pazes­ de malizadas, as mulheres­ e as minorias apre­­­ciar a natureza ou a cultura. Assim foram progressivamente­ excluídas. como Rudyard Kipling,­ E.M. Forster,­ Herman Mel­ville e outros obser­ ­­vadores Phillis Wheatley (C. 1753 - 1784) sensí­ veis­ aos matizes na interação­ entre Dada a dureza dos primeiros anos culturas­ variadas, Cooper era um rela­ Gravura © The Bettmann na América,­ é irônico que algumas tivista cultural. Entendia­ que nenhu­ ma­ Archive das melhores poe­sias do período

26 tenham sido escritas por uma mulher fantástica romances incluem a popularís­sima história de e escrava. A primeira autora afro-ame­ricana de sedução, Charlotte Temple (1791). Ela abor­da te­ importância nos Estados Unidos, Phillis Wheatley mas feministas e aboli­cionistas e retrata os índios nasceu na África e foi trazida pa­ra Boston, americanos com respeito. Massachusetts, aos sete anos, onde­ foi comprada utra romancista há muito esquecida é por um alfaiate devoto e rico, John Wheatley, Hanna Foster (1758-1840), cujo ‘best-seller’ para servir de companhia para sua esposa. Os OThe Coquette [A Coquete] (1797) contava Wheatleys reconheceram a notá­ vel­ inteligência de sobre uma jovem dilacerada entre a virtu­ ­de e a Phillis e, com a ajuda de sua filha Mary, ensinaram­ tentação. Rejeitada pelo namorado, ho­mem frio -na a ler e escrever. de igreja, ela é seduzida, aban­donada,­ tem um Os temas poéticos de Phillis são religiosos e seu filho e morre sozinha. estilo é neoclássico, como o de Philip Freneau.­ Entre Judith Sargent Murray (1751-1820) publi­cou seus poemas mais famosos estão “To S.M., a Young suas obras com um pseudônimo masculino, para African Painter, on Seeing His Works” [Para S.M., assegurar uma atenção mais séria a seus traba­ Jovem Pintor Africano, ao Ver Suas Obras], poema lhos. Mercy Otis Warren (1728-1814) era poeta, de louvor e encorajamen­ to­ a outro negro de talento, historiadora, dramaturga, satirista e patriota.­ Fazia e um curto­ poe­ ma­ mostrando sua forte sensibilidade­ reuniões pré-revolucionárias em sua casa, atacava reli­giosa filtrada por sua experiência de conver­ são­ os ingleses em suas vigorosas peças teatrais e cristã. Esse poema perturba alguns críticos con­ escreveu a única história radical contemporânea tem­porâneos — os brancos, porque o consideram­ da Revolução Americana. convencional, e os negros, porque não expressa As cartas trocadas entre mulheres, como Mercy um protesto contra a imoralidade da escravidão. No Otis Warren e Abigail Adams, e cartas de uma ma­ entanto, a obra é uma expressão sincera; confronta neira geral, constituem importantes documentos o racismo branco e afirma a igualdade espiritual. De do período. Por exemplo, Abigail Adams escreveu fato, Wheatley foi a primei­ ­ra a abordar tais questões para seu marido, John Adams (mais tarde, segundo de forma confiante­ em seus versos, como em “On Presidente dos Estados Unidos), em 1776, instando­ Being Brought from Africa to America” [Como Fui -o a garantir a inde­pendência das mulheres na Comprada e Trazida da África para a América]: futura cons­tituição americana. 

‘A misericórdia me trouxe de minha terra pagã Ensinou minha alma inculta a compreender Que há um Deus, que há um Salvador também; Antes eu não buscava nem conhecia a redenção. Alguns olham nossa raça escura com desdém, “Sua cor é uma tintura diabólica”. Lembrem-se, cristãos, negros escuros como Caim, Podem purificar-se e ingressar no coro angelical.

Outras Mulheres Escritoras Várias escritoras da era revolucionária vêm sendo redescobertas por doutos feministas. Susa­nna Rowson (c. 1762-1824) foi das primei­ras romancistas profissionais da Amé­rica. Seus sete

27 O desenvolvimento do próprio ser torna-se um dos principais temas. A autoconscientização, CAPÍTULO um método primário. Se, de acordo com a teoria romântica,­ ser e natureza são um, então o auto­ conhecimento não é um beco sem saída ego­ ís­ ta,­ mas uma forma de conhecimento que abre as portas do universo. Se seu ser está em sintonia­ PERÍODO3 ROMÂNTICO com a humanidade, o indivíduo tem o dever moral 1820-1860 de reformar as desigualdades so­ciais e aliviar o ENSAÍSTAS E POETAS sofrimento humano. O conceito “ser” (self) — que evocava egoísmo para gera­ ­ções anteriores­ — foi movimento Romântico — que surgiu na redefinido. Surgiram novas palavras compostas, Alemanha, mas rapidamente se espalhou com significados positivos: “auto-realização” (self- Opara a Inglaterra, França e além — chegou à -realization), “au­to-expressão” (self-expression), América em torno de 1820, cer­ca de 20 anos depois “auto­-confiança”­ (self-reliance). de William Wordsworth e Samuel Taylor Coleridge Como o ser subjetivo­ e único se tornou im­por­ terem revolucionado a poesia inglesa com a obra tante, assim o fez a esfera da psicologia. Técnicas­ e Lyrical Ballads [Baladas­ Líricas]. Na América, como efeitos artísticos excepcionais foram desen­ volvidos­­ na Europa, a nova visão eletrizou os círculos artísticos para evocar estados psicológicos­ ele­vados. O “subli­ e inte­­ lectuais.­ Mas havia uma diferença importan­ te:­ o me” — efeito da bele­ za­ em escala­ grandiosa (a vista Romantismo na América coincidiu com a expansão do alto de uma montanha,­ por exemplo) — gerava nacional e a descoberta de uma voz distintamente sentimentos­ de admiração,­ reverência, vastidão e americana. A consolidação da identidade­­ nacional, um poder além da compreensão humana. o idealismo emer­gente e a paixão vigorosa do Ro­ O Romantismo era afirmativo e apropriado para a mantismo­ nutriram as obras-primas da “Renascença maioria dos poetas e ensaístas criativos da América. Americana”. As vastas montanhas da América, desertos e trópicos As idéias românticas giravam em torno da arte­ encarnavam o sublime. O espírito Romântico pare­ como inspiração, da dimensão estética e espi­­ cia adequar-se particularmente­ bem à democracia ritual da natureza, das metáforas de crescimen­ ­to americana: enfatizava­ o individualismo, valorizava a orgânico. A arte, mais que ciência, argu­men­tavam pessoa­­ comum­ e buscava, na imaginação inspi­ rada,­ os Românticos, poderia melhor expres­sar a seus valores estéticos e éticos. Certamente,­ o movi­ verdade universal. Os Românticos­ salientavam­ a mento­ Romântico inspirou os transcen­ denta­­ listas­ da importância da arte expressiva para o indivíduo e Nova Inglaterra — Ralph Wal­­do Emer­son, Henry David a sociedade. Em seu ensaio, “The Poet” [O Poeta] Thoreau e seus colegas — para­ uma nova afirmação (1844), Ralph Waldo Emer­son, talvez o escritor otimis­ta. Na No­va Inglaterra, o Romantismo encontrou­ mais influente da era Român­tica, afirma: solo fértil.

Pois todos os homens vivem pela verdade e precisam­ TRANSCENDENTALISMO expressar-se. No amor, na arte, na avareza, na política, O Movimento Transcendentalista foi uma reação­ no trabalho, nos jogos, estuda­mos co­mo exprimir ao racionalismo do século 18 e uma mani­ fes­ tação­ da nosso doloroso segredo. O homem é apenas sua tendência humanista geral do século 19. O movimen­ metade, a outra é sua ex­pres­são. to era baseado na crença fundamental­ na unidade entre Deus e o mundo. A alma de cada indi­ víduo­ era considerada­ idêntica ao mundo — um microcosmo­ do próprio mundo. A doutrina da auto­ ­confiança e do 28 individualismo­ desen­ volveu­ -se atra­vés Bronson Alcott e o poeta­ William Ellery da crença na identificação­ da alma Channing. O Clube­ Transcendental foi individual com Deus. informalmen­ te­ organizado em 1836 O Transcendentalismo estava incluindo,­ em diferentes­ momentos, intimamente­ ligado à cidadezinha Emer­ son,­­ Thoreau, Fuller, Channing,­ de Concord, Nova Inglaterra,­ 32 qui­ Bronson, Alcott, Orestes Brown­son lômetros­ a oeste de Boston. Concord­ (pregador de gran­de in­flu­ência), foi o primeiro povoado de da Colônia Theodore Parker­ (abolicio­ nista­ e pas­ de Massachusetts Bay. Cerca­da de tor) e outros.­ florestas, era e ainda é bem calma­ e Os transcendentalistas publicaram­ suficientemente próxima­ às palestras,­ por quatro anos a revista tri­mes­ livrarias e universidades­ de Boston, tral The Dial editada inicial­men­ para ser inten­samente culta, mas te por Margaret Fuller e depois longe o bastan­te para manter sua por Emerson. Esforços refor­mistas­ tranqüilidade. A primeira­ batalha da os inspiravam, além da literatu­ra. Re­volução­ Americana­ aconteceu em Vários transcenden­talistas­ fo­ram Concord e o poe­ma em que Ralph abo­li­cionistas e alguns­ parti­ ­ci­param Waldo Emerson­ comemora­ a batalha, de comunida­des utó­picas ex­pe­ “Concord Hymn” [Hino de Concord], rimentais, como Fruitlands­ e Brook tem uma­ das mais famosas estrofes da Farm (descrita em The Blithe­dale literatura americana:­ Romance [O Ro­mance de Blithedale] de Haw­thorne). Junto à rude ponte que se arqueia sobre Contrariamente a muitos gru­pos a corrente, europeus, os transcendentalis­ ­tas nunca Sua bandeira desfraldada na brisa lançaram um manifesto. Insistiam nas de abril, diferenças individuais­ — nos pontos Aqui, num dia, prontos para a luta, de vista únicos de cada indivíduo. estiveram agricultores Os românticos trans­­­cendentalistas Cujo tiro foi ouvido em todo o mundo. americanos le­varam o individualismo radical ao extremo. Os autores ameri­ Concord foi a primeira colônia Ralph canos freqüen­ temente­ se viam como Waldo Emerson rural de artistas, e o primeiro lugar a explo­ ­radores solitários à mar­­gem da oferecer uma alternativa espiritual­ e sociedade e das conven­ ções.­­ O herói­ cultural ao materialismo­ americano.­ americano — como­ o Capitão Ahab Era um lugar para conversas­ elevadas de Herman Melville, ou Huck Finn de e vida simples (tanto­ Emer­ son­ como Mark Twain, ou Arthur Gordon Pym de Henry David Thoreau tinham hortas). Edgar Allan Poe — tipicamente enfren­ Emer­son, que se mudou para Concord tava riscos, ou até mesmo­ a destruição em 1834, e Thoreau são os escritores certa, na busca do autodesco­ bri­ mento­ mais associados à cidade; mas o metafísico. Para o escritor romântico­ lo­cal também atraiu o romancista america­ no,­ nada era axiomático. Na­thaniel Hawthorne, a escritora fe­ As conven­ções literá­rias e sociais, minista­ Margaret Fuller, o educa­ dor­ (e Foto, cortesia longe de ajudarem, eram­ perigosas.­ National Portrait Gallery, pai da romancista Louisa May Alcott) Smthsonian Institution Havia enorme pressão para atin­gir

29 autenti­ cidade­ na forma literária, no conteúdo­ e na de outros. Abrigados por uma estação na natureza, voz — tudo ao mesmo tempo. Fica claro,­ através das cujas correntes de vida correm­ à nossa volta e den­ muitas obras-primas produzidas­ nas três décadas­ que tro de nós e nos convi­dam, pelos poderes que nos antecederam a Guerra­ Civil Americana (1861-65), que conferem, a agir em harmonia com a natureza, por os escritores americanos venceram o desafio. que deve­ríamos­ tropeçar entre os ossos secos do pas­sado..? O sol também brilha hoje. Há mais lã e Ralph Waldo Emerson (1803 - 1882) li­nho nos campos. Há novas terras, novos homens,­ Ralph Waldo Emerson, figura mais importante­ novos pensamentos. Deixe-nos exijir nossas próprias­ de sua época, tinha um sentido religioso­ de mis­ obras, nossas próprias leis e nossa pró­pria forma são. Embora muitos o acusassem de subverter o de adoração. cristianismo, explicava que, para ele, “para­ ser um bom pastor, era preciso deixar a igreja”. O discurso Emerson adorava o ensaísta francês Montaigne,­ proferido em 1838, em sua alma mater, a Harvard gênio aforístico do século 16, e certa vez disse a Divinity School [Faculdade­ de Teologia], fez dele Bronson Alcott que adoraria escrever um livro como per­sona non grata naquela universidade por 30 anos. o de Montaigne, “cheio de graça, poesia, negócios, Nes­se pronunciamento, Emerson acusou a igre­ ­ja de divindade, filosofia, anedotas, histórias picantes”. agir “como se Deus estivesse morto” e de enfa­­ tizar­ Queixou-se que o estilo abstrato­ de Alcott omitia “a o dogma em detrimento do espírito.­ luz que brilha no chapéu­ de um homem, na colher filosofia de Emerson tem sido tachada de uma criança”. de contraditória e é certo que ele cons ­ A visão espiritual e a expressão aforística prática­ A cientemente evitou erigir uma estrutura tornam Emerson fascinante; um dos trans­cen­ in­te­lectual lógica, porque tal sistema racional dentalistas de Concord disse com muita proprie­­­ contrariaria sua crença romântica na intuição e dade que escutá-lo era como “subir aos céus num na flexibilidade. Em seu ensaio intitulado “Self- balanço”. Uma boa parcela de seu discernimento­ Reliance”[Autoconfiança], Emerson co­menta:­ espiritual advém de suas leituras sobre religiões “Uma consistência tola representa o bicho­ -papão orientais, especialmente do hin­duísmo, confucio­ de mentes pequenas”. E, no entanto, ele é im­ nismo e sufismo islâmico. Seu poema“ Brahma”, pressionantemente consistente em seu apelo ao por exemplo, apoia-se em fontes hindus para surgimento do individualismo ameri­ cano­ inspirado afirmar uma ordem cósmica além da limitada per­ na natureza. A maioria de suas idéias principais — a cepção dos mortais: necessidade de uma nova visão nacional, o uso da experiência pessoal, a noção de uma Sobre-Alma Se o homicida vermelho pensa que matou cósmica e a doutrina da compensação — estão Ou se o assassinado pensa que está morto, sugeridas em sua primeira obra, Nature [Natureza] Eles não conhecem bem os caminhos sutis (1836). O ensaio assim começa: Que sigo, percorro e retorno novamente.

Nossa era é retrospectiva. Constrói os sepulcros Longe ou esquecido para mim está próximo dos pais. Escreve biografias, histórias, críticas. As Sombra e luz do sol são o mesmo; gerações que nos antecederam contemplaram Deus Os deuses desaparecidos aparecem para mim; e a natureza face a face; nós, por seus olhos. Por E um só para mim são a fama e a vergonha. que não podemos também­ usufruir de uma­ relação Caem em erro os que me deixam fora; original com o universo?­ Por que não podemos nós Quando me alçam ao vôo, sou as asas; ter uma poesia­ de discernimento e não de tradição, Sou o que duvida e a dúvida, uma religião de re­ve­lação direta e não a história das E eu, o hino que o Brâmane canta

30 conformis­ ­­ta, procurou viver sempre de Os fortes deuses anseiam por minha acor­do com seus princípios rígidos. permanência, Es­­sa tentativa foi tema de muitos de E anseiam em vão os Sete Sagrados, seus escritos. Mas Tu, modesto amante do bem! A obra-prima de Thoreau, Walden, Encontre-me e vire as costas para o or, Life in the Woods [Walden,­ ou, Vida céu. no Bosque] (1854), foi o resultado de dois anos, dois meses e dois dias (de Esse poema, publicado no pri­ 1845 a 1847) passados numa cabana meiro número da revista Atlantic por ele mesmo construída, em Walden Monthly (1857), confundiu os leito­ ­res Pond, propriedade de Emerson. Em não familiarizados com Bra­ma, deus Walden, Thoreau deliberada­mente supremo dos hindus, al­ma eter­na e condensa esse tempo em um ano e o infinita do universo. Emer­­son deu livro é cuidadosamente montado de aos seus leitores o seguin­­ ­te conselho: forma que as estações são sutilmente “Diga-lhes para dizer Jeová em vez de evocadas em or­dem. O livro também é Brama.” organiza­do de modo que em primeiro O crítico inglês Matthew Arnald disse lugar vêm as preocupações terrenas que as obras mais impor­tan­tes do (na seção chamada “Economia”, ele século 19, escritas em inglês,­ eram as descreve­ as despesas envolvidas na poesias de Wordsworth­ e os ensaios construção de uma cabana). No final, de Emerson. Grande­­ escritor, tanto o livro progrediu até meditações­ sobre em prosa como­ em poesia, Emerson as estrelas. influenciou­ uma longa série de poetas Em Walden, Thoreau, amante de ame­ricanos, inclusive Walt Whit­man, livros de viagens e autor de vá­rios Emily Dickinson, Edwin Arlington deles, dá-nos um livro anti-via­gem, Robinson, Wallace Stevens, Hart Crane que paradoxalmente abre as fronteiras e Robert Frost. Credita­ -se também a interiores do autodes­co­brimento, ele influência­ sobre os filósofos John como nenhum livro ame­ricano fez De­wey, Geor­ge Santayana,­ Friedrich­ até o momento. Ilusoriamente­ mo­ Nietzsche e William James. Henry David Thoreau desto, como a própria­­ vida ascética de Thoreau, não é nada menos que um Henry David Thoreau guia para se viver o ideal clássico de (1817 - 1862) uma­ vida completa. Reunindo poesia­ Henry David Thoreau, descendente­ e filoso­ fia,­ esse longo ensaio poético­ de franceses e escoceses, nasceu em desafia­ o leitor a examinar sua vida e Concord e lá sempre residiu. Nascido a vivê-la com autenticida­ de.­ A cons­ numa família pobre, como Emerson, trução da cabana, descrita­ em riqueza teve que trabalhar para­­ se sustentar, de detalhes, é uma metáfora­ concreta esquanto estudava em Harvard.­ Por da cuidadosa edifi­­­ cação­ da alma. Em toda a vida, reduziu­ suas necessidades seu diário, no dia 30 de janeiro de ao nível mais simples e conseguiu viver 1852, explica­ sua preferência­ por viver com muito pouco dinheiro, mantendo enrai­zado num só lugar: “Receio viajar portanto sua in­de­pendência. Em Foto © The Bettmann Archive muito­­ ou a lugares famosos senão iria essência, fez da vida sua carreira. Não- 31 dissipar completamente a mente.” Yeats, apaixonado nacionalista irlandês,­­­ O método de recolhimento e a escrever The Lake Isle of Innisfree [A con­centração de Thoreau lembra as Ilha Lacustre de Innisfree]­ enquanto o técnicas orientais de meditação. A ensaio de Thoreau Civil Disobedience semelhança não é acidental: co­mo [De­­so­be­­diência Civil], com sua teo­ ­ria Emerson e Whitman, tam­bém foi de resistência pacífica, ba­seada na influenciado pela filosofia hindu e necessidade moral do homem­ justo budista. Seu maior tesouro era sua de desobedecer­ leis injustas, serviu coleção de clássicos asiáticos, que de inspiração­ para o movimento­ de ele compartilhava com Emer­son. indepen­ dência­ indiana­ liderado por Seu estilo eclético tem influ­ên­cia Mahatma Gandhi e a luta de Martin dos clássicos gregos e roma­nos, é Luther King pelos direitos civis dos cristalino, cheio de jogo de palavras negros no século­ 20. e tão ricamente metafórico­ quanto o Thoreau é hoje o mais atraente dos autores metafí­sicos ingleses do dos transcendentalistas, por sua cons­ final da Renascença. ciência ecológica, independên­ cia­ e Em Walden, Thoreau não apenas­ auto-suficiência, seu com­promisso­ testa as teorias do Transcen­ ­den­ta­lismo, ético com o aboli­cionis­mo e a teoria ele reencena­ a experiên­ ­cia coletiva política da de­sobe­ di­ ência­ civil e ameri­ cana­ no século 19: viver nas da resistência pa­cífica. Suas idéias fronteiras. Tho­reau acha­va que sua parecem atu­ais e novas. Seu estilo contribuição consis­ tiria­ em recuperar, poético incisivo­ e o hábito de fazer na lingua­ gem,­ o sentido da terra indo­ observa­ções cuidadosas­ ainda hoje mada.­ Seu diário contém a seguinte­ são mui­to mo­dernos. entrada, sem data, em 1851: Walt Whitman (1819 - 1892) A literatura inglesa dos dias dos me­ Nascido em Long Island, Nova nestréis até os Lake Poets, in­clu­­in­do York, Walt Whitman era carpinteiro em Chaucer, Spenser, Shakes­peare e regime de tempo parcial e homem do Milton, não tem caráter refrescante e, povo cuja obra brilhante­ e inovadora neste sentido, sel­va­gem. É essencial­ expressou o espírito democrático­ do men­te domesticada­ e civilizada, refle­ país. Whitman era praticamente um Walt Whitman tindo a Grécia e Roma. Suas vasti­ ­­­dões autodidata: aos 11 anos deixou a escola são uma flo­res­ta, sua selva é frondosa, para trabalhar,­ perdendo o tipo tradicio­ seus selva­gens, Robin Hood. Há em nal de educação que fazia da maioria­ seus poetas muito amor prazeroso dos escritores americanos imitadores pela na­tu­reza, mas não há muita natu­ respei­tosos dos ingleses. Seu Leaves reza. Suas crônicas nos informam of Grass [Folhas de Rel­va] (1855), que quan­do seus animais selvagens, mas ele reescreveu e revisou por toda a sua não seus homens selvagens, foram vida, contém “Song of Myself” [Can­ extintos. Havia necessi­dade­ de uma ção de Mim Mesmo], o poema mais América. incrivelmen­ te­­ original escrito por um americano. Os elogios entusiasmados Foto, cortesia da Walden inspirou William Butler Biblioteca do Congresso que Emerson e alguns outros fizeram

32 a esse volume audacioso confirmaram­ a vocação na terra, tem provavelmente a natureza poética mais poética de Whitman, embora o livro não tenha sido aguçada. Os Estados Unidos são essencialmente o um sucesso de público. maior poema”. Quando Whitman­ escreveu essas Livro visionário que celebra toda a criação,Leaves palavras, audaciosamen­ te­ re­­verteu­ a opinião genera­ of Grass foi fortemente inspirado pelos escritos de lizada de que a América­ era muito tosca e nova para Emerson, especialmente seu ensaio “The Poet” [O ser poética. Ele inventou uma América atemporal de Poeta] que antevia um poeta do tipo robusto, sincero imaginação­ livre, habitada por espíritos pioneiros de e universal, misteriosamen­ te­ parecido com o próprio todas as nações. O romancista e poeta inglês D.H. Whitman. A forma­ inovadora, sem rima e com verso Lawrence, chamou-o, muito apropriadamen­ te,­ de livre, sua celebração aberta da sexualidade, sua vibran­­ poeta da “estrada aberta”. te sensibilidade democrática e a afirmação­ romântica­ grandeza de Whitman pode ser vista em mui­ extrema de que o ser do poeta era um só com a poesia, tos de seus poemas, inclusive em “Crossing o universo e o leitor alteraram para sempre o curso da ABrooklyn Ferry” [Atravessando­ na Barca do poesia americana.­ Brooklyn], “Out of the Cradle Endlessly Rocking” Leaves of Grass é tão vasto, pleno de energia [Fora do Berço que Balan­ça Continuamente] e natural quanto o próprio continente americano;­ e “When Lilacs Last in the Dooryard Bloom’d” era o épico que gerações de críticos americanos­ [Quando os Lilases Perduram­ do Jardim Florido], aguardavam, embora não o tivessem reconhecido. uma tocante elegia sobre a morte de Abraão O movimento perpassa “Song of Myself” como Lincoln. Outra importan­ te­ obra é seu longo ensaio música inquieta: “Democratic Vistas” [Vistas Democráticas]­ (1871), escrito durante os anos de materialismo­ desenfre­ Meus vínculos e lastros se vão... ado da “Era de Ouro” da industrialização. Nesse Contorno serras, as palmas de minhas mãos ensaio,­ Whitman critica merecidamente a América,­ cobrem continentes por sua indústria e riqueza multivariadas e gigantes­ Caminho com minha visão. cas, que encobrem uma alma “seca e plana como o Saara”. Ele pede o surgimento de um novo tipo O poema se arqueia com uma miríade de visões e de literatura que sirva para reanimar a população sons concretos. Os pássaros de Whitman­ não são os americana (“Não é tanto o livro que precisa ser “espíritos alados” da poesia convencional. Sua “garça uma coisa acabada, e sim o leitor do livro”). Mas, de crista amarela vem para a beira do pântano à noite em última instância, a imortalidade de Whitman se e se alimenta de pequenos caranguejos”. Whitman deve sobretudo a Song of Myself. Aqui ele coloca o parece projetar-se em tudo que vê ou imagina. É um ser Romântico­ no centro da consciência do poema: homem das massas: “Viajando a cada porto atrás de pechinchas e aventuras, / Apressando-se com Celebro a mim mesmo e canto o meu ser, a multidão moderna, ansioso e inconstante­ como E o que eu assumir você vai assumir, qualquer outro”. Mas ele é também o indivíduo Pois cada átomo que a mim pertence sofredor, “A mãe de antigamente, condenada como também pertence a você. bruxa, queimada com lenha seca, suas crianças A voz de Whitman eletriza até leitores­ modernos assitindo a tudo... Sou o escravo caçado, estremeço com sua proclamação­ da unidade e força vital de toda a cada mordida dos cachorros... Sou o bombeiro a criação. Foi extremamente ino­vador. Dele brotou ferido, com o esterno­ fraturado...” o poema como­ autobiografia, o americano comum Mais que qualquer outro escritor, Whit­man como bardo, o leitor­ como criador e a descoberta inventou o mito da América democrática. “Os ainda contem­ ­porânea da forma ‘experimental’ ou americanos, de todas as nações, em qualquer época orgânica.

33 cresci­­ mento­ de uma consciência ame­­ OS POETAS BRÂMANES ricana distin­ta. Bem­-inten­cio­na­dos, sua m sua época, os brâmanes for­ma­­ção conservadora os cegou para de Boston (como veio a ser as inovações auda­ ­ciosas de homens Econhecida a classe alta for­ como Thoreau, Whitman­ (a quem re­ ma­da em Harvard) eram a fonte dos cusaram receber­ social­ men­­ te)­ e Edgar árbitros literários mais respeitados­ e Allan Poe (considerado pelo próprio­ verdadeiramente cultos nos Estados Emerson um “rimador”).­ Eram os pi­ Unidos. Suas vidas se en­caixavam­ lares da chamada “tradição elegante”, num agradável padrão de riqueza e contra a qual três gerações de realistas lazer ditado pela forte éti­ca de traba­ america­nos tiveram que lutar. Em parte lho e respeito pelo co­nhe­­cimento da de­vido à sua influência benigna,­ mas Nova Inglaterra. insípida, passaram-se quase­ 100 anos Na era puritana anterior, os brâ­ até que o gênio­ america­ no­ distinto­ de manes de Boston teriam sido pre­ Whitman, Melville, Poe e Thoreau fosse gadores. No século 19, torna­ram-se reconhecido nos Esta­ dos­ Unidos. professores, geralmente em Harvard.­ Mais velhos, por vezes serviam­ como Henry Wadsworth Longfellow embai­xadores ou recebiam títulos (1807 - 1882) hono­ ríficos­ de insti­ tuições­ européias.­ Os principais poetas brâ­ma­nes A maioria deles viajou ou estudou na de Boston foram Henry Wads­­­worth Europa:­ esta­vam familiarizados com Longfellow, Oliver Wen­dell Holmes as idéias e livros da Grã-Breta­nha, e James Russell Lo­well. Longfellow,­ Alemanha­ e França, além da Itália e professor de lín­guas mo­dernas em Espanha. Elitistas­ por formação, mas Har­vard, foi o mais famoso poeta demo­cratas por simpatia, os poetas­ a­me­ricano de sua época.­ Foi respon­ ­ brâ­ma­nes leva­vam seu enfoque ele­ sá­vel pela visão­ nebulosa, lendária­ e gante,­­ europei­ ­zado a todos os Esta­ dos­ não-histó­rica do passado, que fundia­ Unidos, em palestras nos 3.000 liceus as tra­di­ções americana e euro­péia. (centros reservados para palestras pú­ Es­cre­­­­veu três longos po­emas­ nar­ Henry Wadsworth blicas) e nas páginas­ de duas revistas Longfellow rativos­ que populari­zavam lendas influ­ entes­ de Boston, North Ame­ri­can nativas e usavam a métrica européia­ Review e Atlantic Monthly. — “Evan­geline” (1847), “The Song Os textos dos poetas brâmanes of Hia­watha” [Canto de Hiawatha] fundiram­ as tradições americanas às (1855) e “The Court­ship of Miles Stan­ eu­­ro­péias e procuraram criar uma­ con­ dish” [O Noivado de Mi­les Stan­dish] tinuidade de experiências do A­tlântico (1858). com­par­tilhadas. Esses poe­ ­­tas acadê­ Longfellow também escreveu micos procuraram­ edu­ car­­ e elevar o livros de línguas­ modernas e um livro nível da popula­ ­ção pela introdução da de viagens, Outre-Mer [Além-Mar], re­ dimen­ são­­ européia­ na literatura ame­­­­­­ contando lendas estran­gei­ras, no for­ ricana. É irôni­ co­ que seu efeito global mato do Sketch Book, de Washington­ fosse conser­ vador.­ Insistindo em coi­ Irving. Embora conven­ciona­ lis­ mo,­ sas e formas­­ européias,­ retardaram o Foto, cortesia de Brown Brothers senti­­ menta­­ lismo­ e superficialidade

34 estra­guem os poemas longos, os versos líricos, ser ligeiros­ (“The Deacon’s Masterpiece” [A Obra-Pri­ curtos e marcantes como­ “The Jewish Cemetery at ma do Diáco­ ­no] ou “The Wonderful One-Hoss Shay” New­port” [O Cemi­ té­ rio­ Judeu em Newport] (1854), [A Maravilhosa Caleche de um Cavalo]), filosóficos­ My Lost Youth [Minha Juventude Perdi­da] (1855) (“The Chambered Nautilus” [O Náutilo­ Com­parti­­ ­ e The Tide Rises, The Tide Falls [A Ma­ré Sobe, A mentalizado])­ ou fervorosamen­ te­­ patrióticos­ (“Old Maré Baixa] (1880) continuam agradando. Ironsides” [O Velho Encouraçado]). Holmes, nascido em Cambridge, subúrbio de James Russell Lowell (1819 - 1891) Boston onde fica a Universidade de Harvard, era James Russell Lowell, que lecionou línguas filho de um preeminente ministro local. Sua mãe modernas em Harvard após a aposentadoria de era descendente da poeta Anne Bradstreet. Em sua Longfellow, é o Matthew Arnold­ da literatura ame­ época e mais ainda poste­riormente, simbolizou ricana. Começou como poeta, mas aos pou­cos perspicácia, inte­ ­ligência e charme, não como um foi per­dendo sua habilidade­ poética e terminou­ descobridor ou desbra­vador, mas por ter sido intér­ como respeitado crí­tico e educador. Como editor­ prete exemplar de tudo, da sociedade à linguagem, do Atlan­tic e co-editor do North American Review, da medicina à natureza humana. Lowell foi muito influente. A Fable for Critics [Uma Fábula para Críticos] (1848) de Lowell é DOIS REFORMADORES uma avaliação engraçada e oportuna dos autores os anos anteriores à Guerra Civil, a Nova americanos, como neste co­mentá­ rio:­ “Aí vem o Inglaterra reluzia com energia intelectual. Poe com seu corvo, como um Barna­­ ­by Rudge/Três NAlgumas estrelas que hoje brilham­ mais que quintos gênio e dois quin­tos de pura bobagem”. a famosa constelação de Brâmanes foram­ obscure­ Influenciado pela esposa, tornou­ -se reforma­ dor­­ cidas em vida pela pobreza ou por contingências liberal, abolicionista e defensor do voto feminino e de de sexo ou raça. Leitores mo­dernos valorizam leis proi­bindo­ o traba­­ lho­ infantil.­ Biglow Papers, First cada vez mais o trabalho do abolicionista John Se­ries [Ensaios de Biglow, Primeira Série] (1847-48) Greenleaf Whittier e da feminista e reformadora cria Hosea Biglow, poeta­ de aldeia­­ sagaz mas inculto social Margaret Fuller. que defende­­ a introdução­ de reformas­ em sua poe­ ­sia em dia­ leto.­ Benjamin­ Fran­klin e Fre­neau já haviam John Greenleaf Whittier (1807 - 1892) usado­ aldeões inteligen­ ­tes como­ porta-vozes de co­ John Greenleaf Whittier, o poeta mais ativo da mentários sociais.­ Lo­well escreveu­ no mesmo estilo, época, teve criação muito semelhante à de Walt ligando­ a tradição­ colonial­ da ‘perso­ na­ gem’­ ao no­vo Whitman. Nasceu e foi criado numa modesta fazen­ rea­ ­lismo e regionalis­­ mo­ base­­ ado­ no dialeto,­ no­va tra­ da quacker em Massachusetts, teve pouca educação dição­ que floresceu­ na década­ de 1850 e amadureceu­ formal e trabalhou como jornalista. Muitas décadas com Mark Twain. antes da causa ter-se tornado popular, já era ardoro­ so abolicio­ nista.­ Whittier é respeitado por poe­ mas­ Oliver Wendell Holmes (1809 - 1894) anti-escravagistas como “Icha­­­bod” e sua poesia é Oliver Wendell Holmes, famoso médico e às vezes vista­ como um dos primeiros exem­plos professor de anatomia e fisiologia em Harvard, do realismo regionalista. é o mais difícil dos três brâmanes mais famosos As imagens penetrantes de Whittier, sua constru­ de categorizar, pois seu trabalho é mar­cado por ção simples e seus dísticos tetramétricos, parecidos­ uma versatilidade refrescante. Inclui coletâneas­ de com baladas, têm a textura simples e natural de ensaios humorísticos (The Autocrat of the Break­ Robert Burns. Sua melhor obra, o longo poema fast-Table [O Autocrata da Mesa de Café­ da Manhã] “Snow Bound” [Presos pela­ Neve], recria­­ vividamente 1858), romances (Elsie Venner, 1861), biografias seus famili­ ­a­res e amigos­ já falecidos como os recor­da (Ralph Waldo Emerson, 1885) e versos que podiam da infância, aconche­ ­gados­ em volta da lareira acesa 35 duran­ te­ uma violenta tempestades­ de analisa atentamente­ as inúme­ ­ras cau­ neve na Nova Inglaterra. Esse poema­ sas sutis e as conse­ ­qüências nefastas sim­ples, religioso e in­tensamen­ te­ da discrimi­nação se­xual e sugere pessoal,­ escrito depois do longo pesa­ medidas positivas a serem tomadas. delo­ da Guerra Civil, é uma elegia aos Muitas de suas idé­ ­ias são impressio­ mortos e um hino­ de consolo. Afirma nantemente­ mo­dernas. Enfatiza a a eterni­ dade­ do espírito,­ o poder atem­ importância­ da “auto-sufi­ciência”, poral do amor na lembrança e a beleza que as mu­lheres care­cem porque irredu­tível da natureza, a despeito “são ensi­na­­das a a­pren­der regras que das vio­lentas tempestades polí­ticas vêm de fora e não deixá-las brotarem externas.­ de dentro.” Fuller não é simplesmente uma Margaret Fuller (1810 - 1850) feminista, mas uma ativista e reforma­­ Margaret Fuller, ensaísta extraor­ dora dedicada à causa da liber­dade dinária, nasceu e cresceu em Cam­ criativa e da dignidade de to­dos os bridge,­ Massachusetts. De origem seres humanos: modesta, foi educada em casa pelo pai (mulheres não podiam estudar ...Sejamos sábios e não impeçamos em Harvard). Foi criança pro­dígio a alma... Tenhamos uma energia nos clássicos­ e na literatura­ moderna.­ criativa... Deixemos que ela tome a Sua paixão mai­or era a lite­ratura forma que quiser e não a prenda­mos ro­mântica ale­mã, es­pe­­cial­mente pelo passado, a homens ou mulheres, Goethe, que ela traduziu. negros ou brancos. Primeira jornalista profissional de renome na América, escre­ ­veu críticas li­ Emily Dickinson terárias influentes, além de reportagens (1830 - 1886) sobre temas sociais como o tratamento­ Emily Dickinson é, num certo sen­ de mulheres prisioneiras­ e de loucos. tido, um elo de ligação entre sua era e Alguns desses­­­ ensaios foram publi­ a sensibilidade literária da vi­ra­da do cados no livro : Papers on Literature século. Individualista radical,­ nasceu and Art [Textos sobre Literatura e e passou toda a sua vida em Amherst,­ Emily Dickinson Arte] (1846). Um ano antes, publicou­ pequena cidadezinha calvinis­ta de seu livro mais significativo,Woman in Massachusetts. Nunca se casou e the Nineteenth Century [A Mulher­ no le­­vou uma vi­da na­­da convencional, Século 19]. O texto ha­via aparecido externamente tran­qüila, mas dotada originalmente­ na re­vista transcenden­­ de grande inten­ sidade­ interior. Amava­ talista­ The Dial, que editou de 1840 a a natureza e inspi­rou-se pro­funda­­ 1842. mente em pássaros, animais, plantas Woman in the Nineteenth Century, e a mudança das estações, no campo, escrito por Fuller, é a primeira e a na Nova Inglaterra. mais americana análise do papel ickinson passou o final da das mulheres na sociedade. Apli­ vida como re­clusa, por sua cando­ com freqüên­cia princípios psique extremamente sensível Daguerreótipo, cortesia D democráticos e transcendentalistas,­ Harper & Bros. e possivelmente para arranjar tempo

36 para escrever (durante alguns períodos, escrevia­ um É a Maioria poema por dia). Sua rotina também incluía cuidar Nisso, como em Tudo, prevalece — da casa de seu pai advoga­ do,­ figura de destaque em Concorde — e você é são — Amherst que se tornou­ parlamentar. Vacile — logo será tachado de perigoso Dickinson não tinha lido muito, mas conhe­cia E levado em cadeias — profundamente a Bíblia, as obras de William Shakespeare e as obras da mitologia clás­si­ca. Sua perspicácia brilha no poema 288, que Esses foram seus verdadeiros professores: pois foi ridiculariza a ambição e a vida pública: certamente a figura literária mais solitária­ de sua época. Essa mulher tímida, retraída,­ de uma cida­ Não sou Ninguém! Quem é você? dezinha, cujas obras quase­ não foram publicadas Será você — Ninguém — Também? e lidas, criou parte do que há de melhor na poesia Então há dois de nós? americana do século 19, além de ter fascinado o Não diga! Eles vão anunciar — você público desde­ a déca­ da­ de 1950, quando sua poesia sabe! foi redescoberta. Como é enfadonho — ser — Alguém! O estilo lapidar e freqüentemente imagístico de Quão Público — como um Sapo — Dickinson é ainda mais moderno e inovador que o Dizer o nome de alguém — durante todo de Whitman. Ela nunca usa duas pala­vras, se uma é Junho — suficiente e combina coisas concretas­ com idéias Para um brejo admirador! abstratas num estilo condensado,­ quase proverbial. Suas melhores poe­sias não contêm excessos; muitas Os 1.775 poemas de Dickinson continuam intri­ ridicula­ ri­ zam­ o sentimentalismo corrente e algumas gando os críticos, que muitas vezes discor­dam che­gam a ser heréticas. Por vezes, revela uma ater­ entre si a respeito. Alguns salientam­ seu lado­ mís­ radora consciência existencial. Assim como Poe, ela tico, outros sua sensibilidade para com a natureza; explora as partes escuras e escondidas da mente, alguns ressaltam seu apelo estranho,­ exótico. Um dramatizando a morte e o túmulo. E, no entanto, crítico moderno, R.P. Blackmur, comenta que às também celebrava objetos sim­ples — uma flor, uma vezes a poesia de Dickin­son nos passa a sensação abelha. Sua poesia revela grande inteligência e mui­ de que “um gato se apro­xi­mou de nós falando tas vezes evoca o angustiante paradoxo dos limites inglês”. Seus versos, lim­pos, claros, burilados, da consciência­ humana presa no tempo. Tinha um estão entre os mais fasci­nantes e desafiadores da excelente senso de humor e tratava de uma enorme literatura americana.  variedade de temas com uma impressionante diver­ sidade de abordagens. Seus poemas geralmente são conhecidos pelos números que lhes foram atribuídos na edição padrão de Thomas H. Johnson, em 1955. Apresentam um emprego extravagante de maiúsculas e travessões. Não-conformista, como Thoreau, ela por vezes­ invertia o sentido de palavras e frases e usa­ ­va os paradoxos com grande impacto. Da poesia 435:

Muita Loucura é o sentido mais divino — Para um Olho capaz de discernir — Muito Senso — a mais pura Loucura —

37 bem arti­cu­lada e tradicional e compartilhavam com os leitores­ atitudes que informavam sua ficção CAPÍTULO rea­lista. Os romancistas americanos­ se defronta­vam com uma história­ de luta e revolução,­ geografia­ de vastos­ ermos e sociedade demo­ crática­­ fluida e pouco estrati­ ficada.­ Os roman­ ces­­­ americanos­ mui­ tas vezes revelam revolucionária­ falta de tradição. PERÍODO4 ROMÂNTICO Muitos roman­ ­ces ingleses mostram um protagonista 1820-1860: FICÇÃO pobre ascendendo econômica e socialmente devido a um bom casamento ou desco­ berta­ de um passa­­ do­ aristocrático­ escon­ dido.­ Mas essa trama­ oculta não alt Whitman, Nathaniel Hawthorne, desafia a estrutura­ social aristo­ crá­ tica­ da Inglaterra. Herman Melville, Edgar Allan Poe, Ao contrário,­ vem confir­ ­má-la. A ascensão­ da perso­ WEmily Dickinson e os transcenden­ ­ta­listas nagem­­ satisfaz o desejo dos leitores, em sua maioria,­­ representam a primeira grande geração literária de classe média. surgida nos Estados Unidos. No Ro­mantismo, a Já o romancista americano tinha que depender­ visão Romântica tendia a expres­sar-se na forma de seus próprios recursos. A América era em parte que Hawthorne denominou­ “Romance”, um tipo uma fronteira indefinida e em constante­ movimento elevado, emo­cional e simbólico­ de romance. Os povoada por imigrantes falan­do lín­guas estrangeiras “Roman­ces” não eram­ histórias de amor, mas obras e seguindo costumes rudes­­­ e estranhos. Por isso, sérias que usavam técnicas especiais para comu­ ­ a perso­ ­nagem prin­cipal poderia en­con­trar-se só nicar sig­ni­ficados complexos e sutis. entre uma tribo de canibais, como em Typee de Em vez de definir cuidadosamente e em detalhe Melville, explorando­ vastidões intocadas, como em persona­ gens­ realistas, como fazia a maio­ ­­ria dos Leather-Stocking Tales de James­ Fenimore­ Cooper, romancistas ingleses ou conti­­ nen­ tais,­ Hawthorne, pre­senciando visões­ solitárias­ do túmulo, como Melville e Poe moldaram­ figuras­ heróicas grandio­ os solitários de Poe, ou encontrando o demônio sas, impregnadas­ de significado­ mítico. Os prota­ caminhando na floresta, como Young Goodman gonistas típicos do “Romance”­ Americano eram Brown de Haw­thorne. Quase todos os grandes pro­ta­ atormen­tados e alie­nados.­ Arthur Dimmesdale, gonistas­ americanos­ foram “solitários”. O indivíduo­ de Hawthorne­ ou Hester Prynne em The Scarlet democrático­ americano tinha, de certo modo,­ que Letter [A Carta Escarlate]­ ou Ahab de Melville,­ em inventar a si próprio. Moby-Dick e as inúmeras perso­ na­ gens­ isola­ das­ e O romancista americano sério tinha que inven­­ obce­cadas­ dos contos de Poe são prota­go­nistas tar novos modelos também — daí a forma espar­­ solitá­ ­rias que têm que enfren­ tar­ desti­ ­nos desco­ ramada e idiossincrática de Moby-Dick de Melville nhecidos­ e obscuros­ e que, de modo misterioso,­ e a Narrative of Arthur Gordon Pym [Narrativa de bro­tam de seus inconscien­ tes­­­­ mais profun­ dos.­ As Arthur Gordon Pym] de sonho e de­va­neio de tramas simbólicas re­velam­ as ações escondidas­ de Poe. Ainda hoje, pou­cos romances americanos um espírito angustiado.­ alcançam a perfeição formal. Ao invés de tomar Uma razão para a exploração fictí­ cia­­ dos recôn­­ empres­tado modelos literários já experimentados, ditos da alma é a ausência de uma vida comu­ nitária­ os americanos tendem a inventar novas técnicas consolidada e tradicional na Améri­ ­ca. Os romancis­ criativas. Na América, não basta ser uma unidade tas ingleses — Jane Austen, Charles­ Dickens (o gran­ social tradicional e definível, pois o velho e o de favorito), Anthony Trollope, George Eliot, William tradicio­nal são deixa­dos para trás; a força nova e Tha­ckeray — viviam numa sociedade complexa, inova­dora é o centro das atenções.

38 por volta de 1650, no início da colo­ O ROMANCE nização Puritana, o romance­ destaca forma do “Romance”­ é sombria a obsessão calvinista­ por morali­ dade,­ e ameaçadora, indicando como­ repressão sexual,­ culpa­ e confissão­ e A é difícil criar iden­ti­dade sem salvação espiritual. uma sociedade estável. A maio­ ­­ria dos Para a época, The Scarlet Letter era heróis românticos morre­­ no fim: to­ um livro audacioso e até subversivo. O dos os mari­ ­nhei­ros, com exceção de estilo suave de Hawthorne,­ o contexto Ishmael, mor­rem afoga­dos em Moby- histórico remoto e a am­bigüidade­ Dick e o ministro­­­ Arthur­ Dimmesdale,­­ ameni­zaram seus temas sombrios e sen­sível, mas peca­­­ ­­dor, morre no fim satisfizeram o público,­ mas escrito­­ de The Scar­let Letter. A nota trági­­­ ­ca res sofisti­cados como Ralph Waldo da própria di­visão na lite­ratura a­me­ Emerson e Herman Melville reconhe­ ricana torna­ -se dominan­ ­te nos roman­ ceram o poder ‘infernal’ do livro. Abor­ ces, mesmo­­ antes da Guerra Civil de dava questões geralmente­ reprimidas 1860 ter manifestado a tragédia­ social na América do século 19 como, por maior de uma sociedade­ em guerra exemplo, o impacto da nova ex­pe­ contra si mesma. riência democrática e liberta­dora no comportamento individual, particu­ lar­­ Nathaniel Hawthorne mente na liber­dade sexual­ e religiosa. (1804 - 1864) O livro é maravilhosamente Nathaniel Hawthorne, quinta gera­­­­ or­ganizado e muito bem escrito. ção americana descendente de ingle­ Apropriadamente, usa a ale­goria,­ ses, nasceu em Salem, Massa­­­ chu­­­ ­setts, técnica praticada pelos primeiros próspero porto ao norte de Bos­ton Puritanos.­ especializado no comér­cio com as A reputação de Hawthorne deve-se Índias Orientais. Um antepassado seu também­­ a outros romances e contos.­­ havia sido­ juiz no século anterior nos Em The House of the Seven Ga­bles julgamen­­ tos­ de mulhe­ res­­ acusadas­­­­­­ de (1851), ele volta­ novamente à história bruxaria­ em Salem. Hawthorne­ usou­ a da Nova Inglaterra. O desmoronamento­ idéia de uma maldição sobre­ a família Nathaniel Hawthorne da “casa” refere­ -se à uma família de de um juiz iníquo no ro­man­ce The Salem, além da casa propria­mente House of the Seven Ga­bles [A Casa das dita. O tema trata de uma maldição Sete­ Cume­ eiras].­ her­dada e seu fim pelo amor. Como Muitas histórias de Hawthorne­ se observou um crítico, Holgrave, o prota­­ passam na Nova Inglaterra Puritana­ gonis­ ta­ idealista, expressa a descrença e seu mais importante romance,­ The democrática do próprio Hawthorne­ Scarlet Letter [A Letra Escar­ ­late] (1850), em relação às velhas famílias­ aristo­­ transformou-se no retrato clássico da crá­ticas: “A verdade é que, uma vez em América Puritana.­ Fala da paixão proibi­ cinqüen­ ta­ anos pelo menos, a família da entre um jovem sensível e religioso, deveria ser incorporada à grande mas­ o Reverendo Arthur Dimmesdale, sa obscura da humanidade­ e esquecer e Hester Prynne, moça da cidade seus ancestrais.”­ sensual­ e bonita. Passada­ em Boston Foto, cortesia OWI

39 s dois últimos romances de Hawthorne não adas ou artificiais e os sofrimentos do indivíduo foram bem sucedidos. Ambos usam cen­ isolado. Oários modernos, comprometendo a magia A ideologia da revolução também deve ter tido do romance. The Bli­thedale Romance [O Romance seu papel na glorificação da liber­dade orgu­lhosa, de Blithedale] (1852) é interes­san­te por retratar a ainda que alienada. A Revo­lução Americana, do comuni­da­de socialista­ e utópica­ de Brook Farm ponto de vista psico-histó­rico, asseme­lha-se à [Fazen­da Brook]. No li­­vro, Hawthorne­ critica os rebelião do adolescente contra a figura paterna reforma­do­res sociais arrogantes­ e ávidos de poder­ da Inglaterra e a comu­nidade mais am­pla do com instin­ tos­ profundos­­ não genuinamente demo­­ império britânico. Os americanos­ ganha­ram sua crá­ticos. The Marble Faun [O Fauno­ de Mármore]­ independência e então se depararam com o dilema (1860), em­bora em Roma, lida com temas pu­ri­ des­concertante de desco­ ­brir sua identidade sem tanos de pecado, isolamento,­ expiação­ e salvação.­ o referencial das ve­lhas autori­dades. Esse cená­ ­rio Esses temas e cenários da Nova Ingla ­terra repetiu-se tantas vezes nas regiões de fronteira, colonial Puritana são marca registrada dos contos­ que, na ficção, o isolamento parece ser condição mais conhecidos de Hawthorne: “The Mi­nis­­ter’s básica de vida dos ameri­ ­canos. O puritanismo e Black Veil” [O Véu Negro do Pregador], “Young suas ramificações pro­tes­tantes pode ter enfraque­ Goodman Brown” [O Jovem Good­man Brown] e cido ainda mais a família, ao pregar que a primeira “My Kinsman, Major Molineux” [Meu Colega, Major res­ponsabilidade­ do indivíduo é salvar sua própria Molineux]. Neste, um jo­­vem ingê­nuo do interior alma. vem à cidade — trajeto comum na América do século 19 em crescente urbani­za­ção — para pedir Herman Melville (1819 - 1891) ajuda a um parente po­de­ro­so a quem não conhe­ Herman Melville, como Haw­thorne, descendia­ cia. Robin tem mui­ta di­fi­culdade em encontrar o de família antiga e rica que, com a mor­te do pai, major e acaba se unindo a uma estranha revolta caiu repentinamente na pobreza. Apesar da criação noturna­­ na qual um homem, que parece um crimi­­­ sofisticada, das orgulhosas tradições­ familiares e noso em des­graça, é cô­mica e cruelmente­ expulso do trabalho ár­duo, Melville se viu pobre e sem da ci­­­dade.­ Robin ri mais alto que os outros até educa­ ção­ universitária. Aos 19 a­nos, foi para o des­­co­brir que esse “crimino­ so”­ nada mais é que mar. Seu interesse pela vida dos marinheiros bro­ o homem­­­ por ele procurado­ — um represen­ ­tante tou naturalmente de suas próprias expe­ ­ri­ências e inglês recém-depos­ to­ pela turba de revolucio­ ­nários­­ muitos de seus primeiros­ roman­ces inspiraram-se americanos. A história confirma­ o elo de pecado e nestas viagens. Neles,­ vemos a experiência am­pla sofrimento comparti­ lha­ do­ por toda a humanidade. e demo­crática de Melville e seu horror à tirania e Também­ res­salta­­ o tema do ho­mem que se faz à in­jus­tiça. Seu pri­meiro livro, Typee, baseou-se sozinho: Robin tem que apren­der, como qualquer­ no conví­ ­vio com os Taipis, das Ilhas Marquesas, ame­ricano democrático, a prosperar por seu traba­ no Pacífico­ Sul, supostamente canibais,­ mas muito lho árduo e não por favo­res especiais de parentes­ hospitaleiros. O livro elogia a tribo, sua vida natu­­ ­ral ricos. e harmoniosa e critica os mis­sionários­ cris­­tãos, My Kinsman, Major Molineux ilustra um dos que Melville considerou­ menos civilizados­ que os elementos mais notáveis na ficção de Hawthorne:­ povos que tinham vin­do converter. a ausência de famílias operacionais em suas obras. Moby-Dick; or The Whale [Moby-Dick ou A Embora Leather-Stocking Tales de Cooper tenha Baleia], obra-prima de Melville, é o relato épico conseguido introduzir famílias nos ermos mais do baleeiro Pequod e seu Capitão Ahab, um improváveis, as histórias­ e roman­ ces­ de Hawthorne­ “semideus perverso”,­­ cuja caça obses­ ­siva à baleia volta e meia mostram fa­­mí­lias divididas, amaldiço­ branca Moby-Dick levou o navio e sua tripulação à

40 des­truição. A obra, romance realista tendência reflexiva ou de auto-refe­ de aventura, con­tém uma série de rência. Em outras pala­ ­vras, o roman­­ reflexões so­bre a condição huma­ ce é muitas vezes sobre ele mesmo. na. A caça à baleia,­ em todo o livro, Melville freqüentemente­ comenta os é a grande metáfora para a busca processos mentais como­ a escrita, a do conhe­cimento. Classificações e leitura e a com­pre­ensão. Um capítulo, descrições realistas de baleias­ e da por exem­plo, é um estudo exaustivo indústria baleeira povoam o livro, que o narra­ dor­ tenta classificar mas mas têm cono­ ­tações simbólicas. No acaba por desis­tir, alegando que capítulo 15, “The Right Whale’s Head” nada grande pode vir a ser concluído­ [A Cabeça da Baleia Direita], o nar­ (“Não permita Deus que eu um dia rador diz que a Baleia Direita é estóica­ conclua alguma coisa. Todo este livro­ e que a Baleia Cachalote é platônica,­ não passa de um rascunho — nem refe­rin­do-se a duas esco­las clássicas isso: o rascunho­ de um rascunho.­ Ó de filosofia. Tem­po, Força, Dinheiro­ e Paciência”). Embora o romance­ de Melville seja A noção de Mel­ville sobre o texto filosófico, também é trágico.pe A­ sar­ literário­ como uma versão imperfeita­ de seu heroísmo, Ahab é condenado ou um rascunho­ abandonado é bem e talvez amaldiçoado no final. A contem­ ­porânea.­ natureza, ainda­­­­­ que bela, perma­ nece­ Ahab insiste em imaginar um estranha e potencialmen­ te­ fatal. Em mun­do heróico, atemporal, de ab­ Moby-Dick, Mel­ville desafia a idéia oti­ so­lutos, em que pode ser superior­ a mista de Emer­ son­ de que os homens seus homens. Tolamente, exige­ um podem com­pre­ender a natureza. texto acabado, uma res­pos­ta. Mas Moby-Dick, a grande baleia­ branca, o romance mostra­ que, assim como é um ser cósmico, ines­ crutável,­ que não existem textos acabados, não há do­mina todo o ro­mance à medida também respostas finais, a não ser, que obceca­ Ahab. Fatos­ sobre­ baleias­ talvez, a morte. e sobre­­ a caça às baleias não podem Certas referências literárias resso­­ explicar Moby-Dick; ao contrá­ rio,­ os am em todo o romance. Ahab, que é o próprios fatos tendem a se tornar­ sím­ herman Melville nome de um rei do Velho Testamento, bolos e todo fato­ está obscu­ ramente­ deseja um conheci­ ­men­to total, faustia­ relacionado a todos os demais, numa no, quase divino.­ Como o Édipo na rede cósmica. Essa­ idéia de corres­­ tragédia de Sófocles, que paga caro pondência (como Melville a denomina pelo conhecimento­ indevido, Ahab no capítulo Sphinx) não sig­nifica, fica cego antes de ser ferido na perna porém, que os seres huma­ ­nos possam e finalmente­­ morto.­ Moby-Dick termi­ ‘ler’ a ver­dade­ na natu­ reza,­ como­ se na com a palavra “órfão”. Ishmael, o ima­gina em Emerson. Por trás do narrador, é um viajante meio órfão. acúmulo­ de fatos de Mel­ville, há uma O nome Ishmael emana do livro do visão mística­ — mas não fica claro se Gênesis, no Velho Testamento — era essa visão é má ou boa, humana ou filho de Abraão e Hagar (serva de desumana.­ Sara, esposa de Abraão).­ Ishmael­ e Retrato, cortesia Biblioteca O romance é moderno em sua do Harvard College Hagar foram lançados ao deserto por

41 Abraão. surge a vida, no final. Existem outros exemplos. Raquel (uma das espo­ Moby-Dick tem sido chamado de ‘épico natural’ sas do patriarca Jacó) é o nome do barco que resgata — magnífica dramatização do espírito huma­ no­ ence­ Ishmael, no fim do livro. Por fim, a baleia metafísica nada na natureza primitiva — por causa do mito do lembra a judeus e cristãos a his­­­tória bíblica de Jonas, caçador, do tema da iniciação, do simbolismo da ilha lan­çado ao mar por seus colegas marinheiros, por ser paradisíaca, da abor­dagem positiva dos povos pré-tec­ considerado objeto de má-sorte. O texto bíblico diz nológicos e da busca do renascimento. Ao colocar a que foi engolido por um ‘grande peixe’ e viveu algum humanidade­ sozinha na natureza,­ é essencialmen­ te­ tempo dentro do seu ventre, antes de ser devol­vido à americana. O escritor e político francês Alexis de terra firme pela intervenção­ de Deus. Ao tentar fugir Tocqueville havia predito, em sua obra Democracy do sofrimento, só fez provocar sofrimento ainda­ maior in America [Democracia na América]­ de 1835, que para si mesmo. esse tema iria surgir na Améri­ ca,­ como resultado de O romance é também enriquecido por refe­ sua democracia: rências históricas. O barco Pequod tem o nome de uma tribo indígena extinta da Nova Ingla­ terra;­ Os destinos da humanidade, o próprio homem alheio o nome sugere, portanto, que o barco está­ fadado ao seu país e à sua era, na presença da Natureza e de à destruição. A caça de baleias era de fato uma Deus, com suas paixões, dúvidas,­ raras inclinações importante indústria, sobretudo na Nova Inglaterra: e miséria inconcebível, se­rão o principal, senão o fornecia óleo, uma importante­ fonte de energia, único, tema da poesia (americana). especialmente para lâm­padas. Assim, a baleia literalmente ‘ilumina’ o universo. A caça às baleias Tocqueville pondera que, numa democracia, a era também ineren­ ­­temente expansionista­ e ligada literatura versaria sobre “as profundezas ocultas à idéia de um destino manifesto, por exigir que da natureza imaterial do homem”, em vez de os americanos­ navegassem por todo o mundo à meras aparências e distinções superficiais,­­ como pro­cura das baleias (na realidade, o estado do Ha­ classe e status. É certo que tanto Moby-Dick quanto vaí tornou-se possessão americana porque era a Typee, assim como Adventures of Huckleberry principal base de reabastecimento para os navios Finn e Walden, encai­xam-se nessa descrição. baleeiros americanos). A tripulação do Pequod Representam celebrações­ da natureza e subver­ representa todas as raças e diversas religiões, o sões pastoris da civilização urbana estratificada que sugere a idéia da América como um estado socialmente. de espírito universal, além de um cal­­deirão de culturas. Por fim, Ahab encarna a versão trágica do Edgar Allan Poe (1809 - 1849) individualismo democrático americano. Ele afirma O sulista Edgar Allan Poe com­partilha da vi­ sua dignidade­ como indivíduo­ e ousa opor-se às são metafísica e sombria de Melville, que reú­ ­ne forças externas inexoráveis­ do universo. elementos de realismo, paró­dia e burlesco. Ele O epílogo do romance abranda a trágica destrui­ aperfeiçoou o gê­nero do con­to e inventou a fic­ ção do barco. Por toda a obra, Melville enfatiza a ção policial. Muitas de suas histórias­ prefi­guram importância da amizade e da comu­nidade multicul­ os gêneros de ficção­ científica, horror e fantasia, tural. Depois do naufrágio, Ishmael­ é salvo pelo hoje tão populares. caixão entalhado por seu grande­ amigo, Queequeg, A curta e trágica vida de Poe foi atormentada príncipe da Polinésia e herói­ co­ arpoador tatuado. pela insegurança. Co­mo tantos outros grandes As figuras primitivas e mitológicas entalhadas no escri­tores­ americanos do século 19, Poe ficou órfão caixão incorporam a história dos cosmos. Ishmael muito cedo. Seu estra­ nho­ casamento, em 1835, com é salvo da morte por um objeto de morte. Da morte, sua prima Virginia Clemm, de 14 anos incompletos, foi interpretado­ como uma tentativa de encontrar a 42 vida familiar estável que tanto lhe fazia Nes­se poema lúgubre, o narrador falta. assombrado e insone lê e lamenta oe acreditava que a estranheza a morte de sua ‘falecida Lenore’ era um ingrediente essencial quan­do, à meia noite, recebe a visi­ Pda beleza e seus textos são ta de um corvo (pássaro que come muitas vezes exóti­ cos.­ Suas histórias carne morta, portanto, um símbolo e poemas estão­ plenos de aristocratas­ da morte) que pousa em cima de intros­pectivos­­­­ e predestinados (Poe, sua porta e repete agourentamen­te co­mo vários sulistas, nutria ideal o famoso refrão do poema, ‘nun­ca a­ris­to­crata). As personagens­ melan­­ ­ mais’ (nevermore). O poema termina­ cólicas parecem­ nunca traba­ lhar­ ou numa cena de morte-em-vida: ter vida social; ao contrário,­ enter­ ram­ - se em castelos­ escuros­ e deca­­ dentes,­ E o Corvo, sem adejar, ainda simboli­ca­mente de­co­ra­dos com está pousado, ainda pousado tapetes e tapeçarias bizar­ ras­­ que es­ No pálido busto de Palas, condem o mundo real­ de sol, janelas, em cima da porta de meu quarto; paredes e pisos. Cômodos secretos E seus olhos têm toda a aparência re­velam­ antigas bibliotecas,­ estranhas­ dos de um demônio que sonha, obras de arte e objetos orientais­ ecléti­ E a luz da lâmpada sobre ele cos. Aris­ tocratas­­ tocam instrumentos no chão espraia sua sombra; mu­sicais ou lêem livros­ antigos,­ en­ E minha alma, daquela sombra quan­to remoem suas tragédias, como­ que paira sobre o chão a morte de entes queridos.­ Temas­ de Será levantada — nunca mais! morte­ -em-vida, espe­ cial­ men­ te­ ser en­ ter­ra­do vivo ou voltar do túmulo como As histórias de Poe — como as vampiro, aparecem­ em várias obras,­ citadas cima — foram descritas como como “The Pre­mature Burial” [O Enter­ histórias de horror. Contos como “The ro Prema­­ turo],­­­ “Ligeia”, “The Cask of Gold Bug” [O Escaravelho­ Dourado] A­mon­tilla­do” [Barril de Amontilla­ do]­ e “The Purloined Letter” [A Carta e “The Fall of the House of Usher” [A Furtada] são mais narrativas­ de racio­ Que­da da Casa de Usher]. O reino­ cre­ cínio ou argumen­ ­­tação. As histórias­ Emily Dickinson puscular de Poe entre a vi­­da e a morte de horror prefi­ guram­ obras­ de autores e os cenários­ góticos ber­rantes não ameri­ canos­ de fantasia de horror, co­ são meramente deco­ ­rativos. Refletem mo H.P. Lovecraft e Stephen­ King, já os o interior ex­ces­sivamente civilizado­ contos de raciocínio­ são precursores mas inerte da psique perturbada de da ficção policial de DashiellHammett, suas per­sonagens. São expres­sões Ray­mond Chandler, Ross Macdonald simbóli­cas do subconsciente e, por­ e John D. MacDonald. Havia indícios tanto, cerne de sua arte. também daquilo que viria a ser a ficção A poesia de Poe, como a de científica. Todas essas histó­rias revelam mui­tos sulistas, era muito musical e o fascínio de Poe pela mente humana e de métrica rígi­da. Seu poema mais o pertur­ ­bador conhecimento científico conhecido, tanto em vida como ho­ que estava secularizando­ radicalmen­ ­te je, é “The Raven” [O Corvo] (1845). Foto © The Bettmann Arquive a cosmovisão do século 19.

43 Em todos os gêneros, Poe explora a psique. e os modos tradicionais. Na arte, essa confusão Profundas introvisões psicológicas faíscam em de símbolos alimentou o gro­tesco, idéia que Poe suas histórias. “Quem já não cometeu mais de explicitamente transformou em tema de sua clás­ cem vezes um ato vil ou estúpido, pela simples sica coleção de contos Tales of the Grotes­que and razão de saber que não deveria fazê-lo”, lemos Arabesque [Contos do Grotesco e do Arabesco] em “The Black Cat” [O Gato Preto]. Para explorar (1840). os aspectos exóticos e estranhos­ dos processos psicológicos, Poe mer­gulhou­ em relatos de loucura­ ESCRITORAS E REFORMADORAS e extrema emoção.­ O estilo penosamente­ inten­ s mulheres americanas suportaram mui- cional e as ex­pli­cações elaboradas nas histórias tas desigualdades no século 19: não po- inten­sificam a sensação de hor­ror, por tornarem­ Adiam votar, eram barradas nas escolas­ pro­ os eventos vívidos e plausíveis. fissionalizantes e universidades, não podiam falar Sua combinação de decadência e primitivismo­ em público nem participar de convenções­ públicas romântico atraía fortemente os europeus, particu­ e não podiam ter propriedades. Apesar de todos larmente os poetas franceses Stéphane Mallarmé, esses obstáculos, uma forte rede­ de mulheres sur­ Charles Baudelaire, Paul Valéry e Arthur­ Rimbaud. giu. Através de cartas, amizades­­ pessoais, reuniões Mas Poe não é não-america­ no,­ apesar de seu des­ formais, jornais femi­ ninos­ e livros, as mulheres pro­ prezo aristocrático­ pela democracia, preferência pelo moveram mudanças­ sociais. Mulheres intelectuais exótico e temas de desumanização. Ao contrá­ rio,­ é traçaram paralelos­ entre elas e os escravos. Cora­ quase um exem­plo literal da previsão de Tocqueville josamente, exigiram­­ reformas fundamentais,­ como a que a democracia americana produziria obras que abolição­ da escravidão e o voto feminino,­ a despeito desvendariam as partes mais profundas­ e ocultas­ da do ostracismo social e às vezes a ruína financei­ ra.­ psique. Ansiedade profunda e insegurança­ psíquica Suas obras eram a vanguar­da da expressão­ inte­ parecem ter ocorrido primeiro na América que lectual de uma tradição literária feminina­ maior e na Europa, já que os europeus tinham ao menos que incluía o romance sentimental. Romances uma estrutura social rígida e complexa que lhes sentimen­tais femininos, como­ Uncle Tom’s Cabin [A dava segurança psicológica. Na América, não havia Cabana do Pai Tomás],­ de Harriet Beecher Stowe, segurança compensatória;­ era cada homem por si. eram muito populares.­ Despertavam as emoções e, Poe descreveu­ com precisão o outro lado do sonho não raro, drama­ ­tizavam questões sociais­­ polêmicas, americano do homem­ que se faz por si próprio e sobre­ ­tudo aquelas atinentes à família e ao papel e mostrou o preço cobrado pelo materialismo e pelo responsabilidades das mulheres. excesso de competição —solidão, alienação e ima­ A abolicionista Lydia Child (1802 - 1880), que gens de morte-em-vida. muito influenciou Margaret Fuller, era uma das A ‘decadência’ de Poe também reflete a desva­­ líderes dessa rede. Seu popular romance de 1824, lorização dos símbolos ocorrida no século 19 — a Hobomok, mostra a necessidade de to­lerância tendência de misturar promiscuamente objetos de racial e religiosa. Seu cenário — a cidade­­ Puritana arte de várias eras e lugares, privando­ -os de sua de Salem, Massachusetts — antecipou Nathaniel identidade e reduzindo-os a itens decorativos numa Hawthorne. Ativista, Child fundou uma escola coleção. O caos de estilos resultante era particu­ particular para moças, fundou­ e editou o primei­ ro­ larmente aparente nos Estados Unidos, que muitas jornal para crianças nos Estados Unidos e publi­ vezes carecia de estilos próprios tradicionais. cou em 1833 o primeiro­ tratado antiescravagista,­ Essa mescla re­flete a perda de sistemas coerentes An Appeal in Favor of that Class of Americans de pensa­mento, já que a imigração, urbanização­ Called Africans [Apelo em Prol Daquela Classe de e indus­trialização cortaram as raízes familiares Ame­ri­canos Chamados Africanos]. Esse trabalho

44 auda­ cioso­ tornou-a muito conhecida e arruinou-a de escrever uma car­ta ao Presidente Theodore fi­­nanceiramente.­ Sua History of the Condition of Roosevelt, em favor do voto feminino. Suas nume­ Women in Various Ages and Nations [Histó­ ria­ da rosas obras — inicialmente­ sob pseudônimo e mais Condição das Mulheres em Várias Épocas e Nações] tarde com seu próprio nome — incluem três volumes (1855) defende a igualdade das mulheres relatando da History of Woman Suffrage [História do Sufrágio­ seus feitos históricos. da Mulher] (1881-1886), escritos em parceria, e uma Angelina Grimké (1805-1879) e Sarah Grimké­ autobiografia franca e jocosa. (1792-1873) eram de grande fa­mília de ricos senho­ ojourner Truth (c.1797-1883) é a epítome res de escravos na elegante­­ Charleston,­ na Carolina­ da perseverança e do carisma desse grupo do Sul. Ambas se transferiram para­ o Norte, para Sextraordinário de mulheres. Nascida escrava defender os direitos de negros­ e mulheres. Co­mo em Nova York, cresceu falando holandês.­ Fugiu de porta-vozes da Socieda­ de­ Antiescra­ ­vagista­ de Nova seu cativeiro em 1827, instalando-se, com um casal York, foram as primeiras­ a falar em público, inclu­ de filhos, junto à acolhedora família Van Wagener, sive para homens. Em cartas, ensaios­ e estudos, de origem ho­lan­desa, para quem traba­lhava como traça­ram parale­ ­los entre racismo­ e discrimina­ ­ção empregada.­ Eles a ajudaram a ganhar a batalha se­xual. legal pela liberdade de seu filho e ela adotou o Elizabeth Cady Stanton (1815-1902), abo­ nome da família. Resolveu tomar rumo próprio, licionista e ativista de direitos femininos, viveu trabalhando­ com um pastor para converter certo tempo em Boston, onde foi amiga de Lydia prosti­tutas ao cristianismo e viveu num lar comu­ Child. Com Lucretia Mott, organi­ zou­ a Convenção­ nitário progressista. Foi batizada ‘Sojourner Truth’ de Seneca Falls pelos Direitos da Mulher; redigiu [Viajante Verdade] pelas vozes e visões místicas também Declaration of Sentiments [Declaração de que passou a ter. Para difundir a ver­dade desses Sentimentos] da Convenção. Sua ‘Declaração de ensinamentos visionários, viajou só, por mais Independência da Mulher’ começa com “homens de três décadas, proferindo pales­tras, cantando e mulheres são criados iguais” e inclui uma reso­ músicas evangélicas e pregando­ o abolicionismo lução para dar às mulheres­ direito ao voto. Com em muitos Estados. Encorajada por Elizabeth Cady Susan B. Anthony, Elizabeth fez campanha em favor Stanton, de­fen­deu o su­frá­gio da mulher. Sua vida do sufrágio para mulheres nas décadas de 1860 e é conta­ ­da por Narra­tive of Sojourner Truth [Nar­ 1870, formou a anti-escravagista Women’s Loyal rativa de ‘Viajante Verdade’] (1850), relato auto­ Na­tio­nal Lea­gue (Liga Nacional das Mulheres Leais) biográfico transcri­to e editado por Olive Gilbert. e a National Woman Suffrage Association (Associa­­ Analfabeta toda sua vida, falava inglês com sotaque ção Nacional Para o Sufrágio das Mulheres) e foi holandês. Conta-se que certa vez, acusada de ser co-editora do semanário Revolution. Presidente da um homem, desnudou o peito numa convenção Woman Suffrage Association por 21 anos, liderou sobre os direitos da mulher.­ Tornou-se lendária a a luta pelos direitos da mulher. Discursou publica­ resposta por ela dada a um homem que afirmou mente em vários estados, em parte para sustentar ser a mulher o sexo fraco: a educação de seus sete filhos. Depois da morte de seu marido, Stanton apro­ Já arei e plantei e ajuntei em feixes, e nenhum homem fundou sua análise das desigualdades entre os me vencia! E não sou mulher? Podia trabalhar como sexos. Seu livro The Woman’s Bible [Bí­blia da homem e comer como homem — quando podia — e Mulher] (1895) discerne uma profunda tendência agüentar as chicotadas também! E não sou mulher? antifeminina na tradição judaico-cristã. Discursou Tive treze filhos e vi quase todos serem vendidos sobre temas como divórcio, direitos da mulher e como escra­vos e quando clamei com minha dor religião até sua morte, aos 86 anos, pouco depois de mãe, ninguém a não ser Jesus me ouviu! E não

45 sou mulher? sendo açoitado — quando participava de um culto religioso. Mais tarde, disse Essa oradora humorística e irre­ que o romance­ foi inspirado e “escrito verente já foi comparada aos grandes­ por Deus”. Sua motivação foi paixão­ re­ cantores de blues. Harriet Bee­cher ligiosa de reformar a vida, tornando­ -a Stowe e muitos outros encontra­ ­ram sa­ mais piedosa. O período­ romântico in­ bedoria nessa mulher negra visionária troduzido uma era de sentimentos: As capaz de exclamar, “Senhor, Senhor, virtudes da família­ e do amor de­veriam­ posso amar até os brancos!” reinar supremos.­ O romance de Stowe a­ta­cava a escravidão precisamente por Harriet Beecher Stowe violar valores domésticos. (1811 - 1896) Uncle Tom, escravo e personagem­ O romance de Harriet Beecher central, é um verdadeiro mártir­­ cristão Stowe, Uncle Tom’s Cabin or Life que se esforça por converter seu Among the Lowly [Cabana do Pai To­ bondoso dono, St. Clare, reza por más ou Vida Entre os Humildes] foi sua alma quando este está morrendo o livro americano mais popular do e é morto ao de­­fender mulheres século 19. Publicado inicialmente­ em escravas. A es­cravidão é retratada capítulos, pela revista National Era como maléfica, não por razões po­ (1851-1852), tornou­ -se sucesso imedia­ líticas ou filo­só­ficas, mas sobretudo to. Só na Inglaterra,­ foi publicado por porque divide famílias, destrói o amor 40 editores­ e logo traduzido para­ 20 lín­ familiar e é ineren­temente an­ticristã. guas, recebendo elogios de autores­ co­ As cenas­ mais como­ven­tes mostram mo Georges Sand na França, Heinrich uma escrava angus­ ­tiada, incapaz de Heine na Alema­ nha,­ e Ivan­ Turgenev ajudar seu filho que chora, e um pai na Rússia.­ Seu apelo apaixonado pelo vendido e separado de sua fa­mília. fim da escravidão nos Estados Unidos Esses eram crimes contra­ a santidade inflamou o debate que em uma década do amor domés­tico. conduziria­ à Guerra Civil Americana Originalmente, o romance não (1861-1865). tinha a intenção de atacar o Sul. De São óbvias as razões do sucesso fato, Stowe havia visitado o Sul, gos­ de Uncle Tom’s Cabin. Ele re­fle­tia a Harriet tava dos sulistas e os retratou com Beecher Stowe idéia de que a escravidão nos Estados­ benevolência. Sulistas se­nho­res de Unidos, nação que apa­ren­temente escravos são bons e tratam­ Tom bem. encarnava a demo­cra­cia e a igual­ St. Clare, pesso­al­mente, abomina a dade de todos, era uma in­justiça de escravidão e tem a inten­ ­ção de libertar proporções colossais. todos os seus escravos.­ Já o senhor towe era uma representante cruel, Simon Legree,­ é do norte e o perfeita dos velhos Puritanos vilão. Ironicamente,­ o romance tinha Sda Nova Inglaterra. Seu pai, a intenção­ de reconciliar norte e sul, irmão e marido eram todos instruídos­ que estavam à beira da Guerra Civil e conhecidos clérigos e reforma­ dores­ uma década depois. No fim, porém, protestantes. Stowe conce­ beu­ a idéia foi usado por abolicionistas e outros­ Foto, cortesia para o romance — numa visão de Culver Pictures, Inc. como polêmica contra o Sul. um velho escravo, todo esfarrapado, 46 colonial. Harriet Jacobs (1818 - 1896) Nascida escrava na Carolina do Harriet Wilson (c. 1807 - 1870) Norte, Harriet Jacobs aprendeu a ler Harriet Wilson foi a primeira afro­ e escrever com sua senhora. Com -americana a publicar um romance a morte desta, foi vendida pa­ra um nos Estados Unidos — Our Nig: or, senhor branco, que tentou forçá-la a Sketches from the Life of a Free Black, ter relações sexuais. Ela lhe resistiu, in a two-storey white house, North. encontrando outro aman­te branco showing that Sla­very’s Shadows com quem teve dois filhos, que foram Fall Even There [Nosso Nego: ou viver com sua avó. “Parece menos de­ Ilustrações da Vi­da de Uma Negra gradante entregar­ -se a alguém do que Livre, Numa Ca­sa Branca de Dois sujeitar-se à coação”, escreveu ela Andares, no Nor­te. mostrando que com im­pres­sionante franqueza. Ela as Sombras da Escravidão Chegam esca­pou de seu senhor e espalhou Até Mesmo Lá] (1859). O romance o boato de que havia fugido para o dramatiza rea­lis­ticamente o casa­ Norte. mento de uma mu­lher branca com Apavorada em ser pega e voltar um homem­ negro­ e também descreve para­­ a escravidão e o castigo, passou­ a vida difícil de uma serva negra nu­ quase sete anos escondida na cidade ma casa­­ cristã próspera. Inicialmente de seu senhor, no pequeno sótão considerada autobio­gráfica,­ hoje escu­ ro­ da casa de sua avó. Era sus­ acredita-se que seja obra de ficção. tentada pelas olhadelas que dava em Como Jacobs, Wilson não publicou­ seus amados filhos por orifícios que seu livro com seu próprio nome abriu no teto. Final­mente, escapou (Our Nig era uma ironia), e sua obra para o Norte e se fixou em Rochester, es­teve esquecida até recentemente. Nova York, onde Frederick Douglass O mesmo­ pode ser dito da obra da publicava o jornal antiescravagista maioria das escritoras da época. O North Star e perto de onde­ (Seneca famoso estudioso afro-ame­ricano, Falls) acabava de ser realizada­ uma Henry Louis Gates, Jr. — no seu papel conven­ ção­ dos direitos da mulher. Frederick Douglass de levar adiante o projeto de ficção Ja­cobs fez amizade com Amy Post, negra — reeditou Our Nig em 1983. aboli­ cionista­ e feminista quacker, que a encorajou a escrever­ sua au­ Frederick Douglass (1817 - 1895) tobio­­ grafia.­ In­cidents in the Life of a O mais famoso líder afro-ame ­ Slave Girl [Incidentes na Vida de uma ricano anti­escravagista e orador Jovem Escrava], publicado­ em 1861 negro da época, Frederick Douglass com o pseudônimo de “Linda­­ Brent”, nasceu escravo numa propriedade foi editado por Lydia Child. Condena em Maryland. Sua sorte foi ser man­ abertamente­ a exploração sexual de dado, quando jo­vem, para Baltimore, escravas­ negras.­ Tanto o livro de Ja­ cidade relativamente liberal, onde cobs, como o de Douglass, são parte aprendeu a ler e escre­ver. Fugindo do gênero de narrativa de escravo, Foto-ambrotipo, cortesia para Massachussetts em 1838, aos National Portrait Gallery, iniciado por Olaudah Equiano na era Smithsonian Institution 21 anos, Douglass foi ajudado pelo

47 editor abolicionista William Lloyd Garrison e sensação de viver uma vida clandestina, invisível, passou a palestrar em reuniões de sociedades ameaçada, não reconhecida­ pela maioria branca, antiescravagistas. ainda aparece em obras de escritores americanos Em 1845, publicou Narrative of the Life of negros do séc­ulo 20, tais como Richard Wright, Frederick Douglass, An American Slave [Nar­rativa James Baldwin, Ralph Ellison e Toni Morrison. da Vida de Frederick Douglass, Um Es­cra­vo  Americano] (segunda versão em 1855 e re­vista em 1892), a melhor e mais po­pular das “narrativas de escravos”. Essas narrativas,­ geralmente­ ditadas por negros anal­fa­betos a abo­licionistas brancos e usa­ das como propaganda, eram bem conhecidas nos dias que antece­ ­deram a Guerra Civil. A narrativa de Dou­glass é intensa e bem escrita e nos nos dá in­trovisões únicas da mentalidade da escra­vi­dão e agonia que essa instituição cau­sava aos negros. A “narrativa de escravo” foi o primeiro gênero literário de prosa negra nos Estados Unidos. Ajudou os negros na difícil tarefa de estabelecer uma identidade afro-americana em meio a uma América branca e continuou a exercer importante­ influência nas técnicas de ficção e nos temas adota­ dos pelos negros em todo o século 20. A busca de uma identidade, o ódio contra a discriminação e a

48 por grandes agricultores­ no Havaí, ferro­vias e outras empresas americanas na costa oeste. CAPÍTULO Em 1860, a maioria dos americanos vivia em fazendas ou em pequenas vilas, mas em 1919 metade da população se concentrava­ em cerca de 12 gran­ des cidades. Surgiram­ proble­ mas­ de urbanização e industrializa­ ção:­ habitações­ pobres e superlotadas, ASCENÇÃO5 DO REALISMO: condi­ ções­ insalubres,­ salários baixos (chamados de 1860-1914 “salário escra­vo”), condições difíceis de trabalho­ e limi­tes inadequados aos empresários.­ Os sindicatos­ Guerra Civil Americana (1861-1865) entre cres­ceram­ e as greves trouxeram­ as dificul­ da­ des­ dos o Norte industrializado e o Sul agrícola e trabalhadores­ à consciência­ nacio­ nal.­ Os agricul­ A escravagista foi um divisor de águas na tores também se viram lutando­ contra “interesses­ história americana. O inocente otimismo da jovem financeiros” do Leste, os chamados­ ‘barões ladrões’, nação democrática cedeu lugar, depois da guerra, como J.P. Morgan e John D. Rockefeller. Seus bancos a um período de exaustão.­ O idealismo­ americano no leste controla­ ­vam com mão de ferro hipotecas­ sobreviveu, mas foi redirecionado.­ Antes da guer­ e crédito,­ tão vitais para a agricultura e o desenvol­ ra, os idealistas defendiam os direitos humanos, vimento do Oeste,­ enquanto empresas­ ferro­viárias­ especialmente a abolição da escravatura; depois cobra­ ­vam carís­simo para trans­portar­ produtos da guerra, os americanos idealizavam mais e agrícolas até as cidades.­ O agricultor­ aos poucos se mais o progres­so e o homem que se faz por si tornou objeto de ridículo, satiri­ zado­ como caipira próprio. Essa foi a era do indus­ ­trial milionário e (hick) ou jeca (rube). O ameri­ cano­­ ideal do período do especulador,­ quando a evolução darwiniana e pós-Guerra Civil passou a ser o milio­ ­nário. Em 1860, a ‘sobre­vi­vência do mais adaptado’ pareciam san­ havia menos­ de 100 milionários;­ em 1875, já eram cionar métodos pouco éticos do magnata industrial­ mais de 1000. bem-sucedido. De 1860 a 1914, os Estados Unidos se trans­ Os negócios prosperaram depois da guerra. A formaram de uma pequena e jovem ex-colônia produção bélica havia estimulado a indústria no agrícola­ para uma grande nação industrializa­ da­ e Norte, dando-lhe prestígio e influência polí­tica. moderna. Nação endividada em 1860, em 1914, era a Também deu aos líderes industriais expe­ri­ência mais rica do mundo,­ cuja população havia mais que valiosa na administração de homens e máquinas.­ dobrado, passando­ de 31 milhões­­ em 1860, para 76 Os abundantes recursos naturais do solo america­ milhões­ em 1900. Na I Guerra Mundial,­ os Estados no — ferro, carvão, petróleo, ouro e prata — bene­ Unidos eram uma potên­ cia­ mundial.­ ficiaram os negócios. O novo sistema­ ferroviário Crescia a industrialização, assim como a alie­ intercontinental, inaugura­ do­ em 1869, e o telégrafo nação. Os romances ame­ricanos mais caracte­ transcontinental, que começou a operar em 1861, rísticos do período — Mag­gie: A Girl of the Streets deram à indús­ tria­ acesso a materiais, mercados e [Maggie: Uma Moça­ das Ruas] de Stephen­ Crane, comunicações.­ O constante influxo de imigrantes Martin Eden de Jack London e depois An American fornecia uma fonte interminável de mão-de-obra ba­ Tragedy [Uma Tragédia Ame­ri­cana] de Theodore rata. Mais de 23 milhões de estrangeiros — alemães, Dreiser — re­tra­tam danos das forças econô­­ ­mi­cas escan­dinavos e irlandeses inicial­mente e, mais tarde, e da alienação ao indivíduo­ fraco ou vulne­rá­vel. da Europa­ central e do sul — acorreram aos Estados Sobre­vi­ven­tes, como Huck Finn de Twain, Hum­ Unidos entre­ 1860 e 1910. Trabalhadores­ contra­ ­tados phrey Vanderveyden de Sea-Wolf [Lo­bo do Mar] chineses, japoneses e filipinos­ foram importados de London e a oportu­ ­­nista Sister Carrie de Drei­ser,

49 re­­sistem graças à força interior que Mississipi de St. Petersburg. Filho de envolve bondade, flexi­bili­dade e, um vagabundo­ bêbado,­ Huck acaba acima de tudo, indivi­duali­dade. de ser adota­ ­do por uma família res­ peitável, quando­­ seu pai, num estupor­ SAMUEL CLEMENS alcoó­­lico, ameaça matá-lo. Temendo (MARK TWAIN) (1835 - 1910) pela vi­da, Huck fo­ge, simulando amuel Clemens, mais conhe­ sua mor­te. Em sua fuga, junta-se a cido pelo pseudônimo Mark ou­tro fugitivo, o escravo Jim, cuja STwain, cresceu na cidade­ dona, Miss Watson, está pen­san­do zinha­ ribeirinha do Rio Mississipi em vendê-lo rio abaixo, no coração de Hannibal, no Missouri. A famo­ do Sul, onde a escravidão era mais sa declaração de Ernest Heming­ im­placável. Huck e Jim des­cem de way que toda a literatura americana­ balsa­ o majestoso Mis­sissipi,­ mas vem de um grande­ livro, Adventures são afundados por um barco a vapor, of Huckleberry Finn [Aven­turas­­ de separados e reunidos nova­mente.­ Huckleberry Finn] de Twain indica a Passam por mui­tas aventu­ras perigo­ preemi­nência desse autor na tradição. sas e engra­ ­­çadas, em terra,­ que mos­ Escritores america­ ­nos do início do sé­ tram a diver­sidade, a generosidade culo 19 tendiam­ a ser muito floreados, e, por vezes, a cruel irracionalidade sen­ti­men­­tais ou pomposos — em parte, da socie­dade. No fim, descobre-se porque ainda ten­tavam pro­var que que Miss Watson já havia libertado podiam escrever de forma­ tão elegan­ te­ Jim e que uma família respeitável quanto os ingleses. O estilo­ de Twain, estava cuidando do travesso Huck. baseado­ na fala america­ na­ vigorosa,­ Mas este impacienta­ -se com a soci­ realista e coloquial,­ deu aos autores e­dade civilizada e planeja fugir para amerianos novo apreço­­ por sua voz “os territórios” — as terras dos índios.­ nacional.­ Twain foi o primeiro grande O fim apre­senta ao leitor a versão autor do interior do país e captou sua oposta do mito clás­si­co americano iconoclastia­ e gíria­ jocosa e peculiar. do sucesso:­ o cami­nho aberto, que Para Twain e outros escritores ame­ leva às terras into­cadas, longe da ricanos do final do século 19, realismo influ­ência moral­mente corruptora não era apenas uma técnica­ literária: da “civilização”. Os romances de Ja­ era um modo de di­zer a verdade e Samuel Clemens mes Fenimore Cooper, os hinos de derrubar conven­ ­ções surradas.­ Era, (Mark Twain) Walt Whitman em louvor do caminho­ portanto, profunda­ mente­ libertador e aberto, The Bear [O Urso] de William potencial­ mente­ em desavença com a Faulkner e On the Road [Na Estrada] sociedade. O exem­plo mais conhecido de Jack Kerouac são outros exemplos é Huck Finn, menino pobre que decide literários. se­guir sua consciência e ajudar um Huckleberry Finn inspirou nu­ escravo­ negro a fugir, mesmo crendo­ merosas inter­pretações literárias. É que essa infração da lei o condenará­ claro que o romance é uma história ao inferno. de morte, renasci­ ­mento e iniciação.­ A obra prima de Twain, surgida em O escravo fugitivo Jim torna-se figura Ilustração por 1884, se passa na vila ribeiri­ ­nha do Thaddeus A. Mikinski, Jr. pater­­na para Huck que, ao decidir

50 salvá-lo, cres­ce moralmente e ultrapassa as fron­ his­tórias exorbitantes, gabo­ ­lices incríveis e heróis teiras de sua so­ciedade escravagista. As aventuras cômicos trabalhadores davam vida à literatura de Jim iniciam Huck na complexidade­ da natureza de fronteira. Essas for­mas humorísticas eram humana e o imbuem de coragem moral. encontradas em muitas regiões de fronteira — no O romance também dramatiza o ideal de Twain “velho Sudoeste” (hoje, o interior do Sul e baixo de uma comunidade equilibrada: “O que você mais Meio-Oeste), na fronteira das minas e na costa quer, numa balsa, é que todos estejam satisfeitos e do Pacífico. Cada região tinha suas personagens se sin­tam bem e gene­rosos para com os outros”. pitorescas, sobre as quais se contavam as histórias: Co­mo o navio Pequod, de Mel­ville, a balsa afunda Mike Fink, ar­ruaceiro das barcas do Mis­sissipi; e, com ela, aquela comuni­ ­dade especial. O mun­ Casey Jo­nes, corajoso engenheiro das ferrovias; do puro e simples da balsa acaba dominado­ pelo John Henry, afro-americano durão; Paul Bunyan, progres­so — o bar­co a vapor — mas a imagem mítica le­nhador gigante cuja fama foi promovida pela do rio perma­ ­nece, vasta e mutante como a própria pu­blicidade; Kit Carson, que combatia os índios,­ vida. e Davy Crockett, batedor, ambos do oeste. Seus A relação instável entre realidade e ilusão é o feitos foram exagerados e acentuados em baladas, tema característico de Twain, a base para muito­ do jornais e revistas. Às vezes, como acon­te­ceu com seu humor. O rio, magnífico mas enganoso,­ sempre Kit Carson e Davy Crockett, as histórias­ eram reu­ em mutação, é também o principal elemento­ de nidas em forma de livro. sua criativa paisagem. Em Life on the Mississippi Twain, Faulkner e muitos outros escritores, particu­ [Vida no Missis­sipi], Twain relembra seu treina­ larmente do Sul, devem muito aos humo­ ­ristas de mento como jovem piloto de barco a vapor e diz: fron- teira pré-Guerra Civil, como Johnson Hooper, “Passei a trabalhar­ agora­ em conhecer a forma do George Washington Harris, Augustus­ Longstreet, rio; de todas as coisas­­ evasivas e inalcançáveis que Thomas Bangs Thorpe e Joseph Baldwin. Deles e um dia tentei compreender ou agarrar, essa foi a do pessoal da fron­tei­ra ameri­cana veio a prolife­ mais difícil.” ração de no­vas palavras­ cômicas:­ “absquatulate” O senso moral de Twain, como escritor, ecoa (sair), “flabbergasted” (impressionado), “rampa- sua responsabilidade, como piloto, de conduzir­­ o gious” (in­dis­ciplinado, turbulento). Os fanfarrões barco para a segu­rança. O pseudônimo de Samuel locais, ou “ring-tailed roarers” que alegavam ser Clemens, “Mark Twain”, é a expressão que os bar­ me­tade cavalo, metade jacaré, também ressal­ ­tavam queiros do Mississipi usavam para indicar 2 braças a energia incontida da fronteira. Eles tiravam for­ça (3,6 metros) de água, o nível mí­­nimo exigido para de perigos naturais que aterrori­zariam ho­mens a passagem segura de um barco. O propósito sério menos valentes. “Sou um ver­dadeiro­ fura­cão,” de Twain, aliado a um raro gênio para o humor e gabava-se um, “duro como­ a nogueira e com fôlego estilo, mantêm seu texto atraente e sempre atual. do vento noroeste. Eu soco como a ár­vore que cai e cada golpe abre um rombo­ na turba que deixa HUMOR E REALISMO DA FRONTEIRA entrar um acre de sol.” Duas importantes correntes literárias na América do século 19 se fundem em Mark Twain: o humor COLORISTAS LOCAIS popular da fronteira­ e a cor local ou ‘regionalismo’. Como o humor de fronteira, a literatura colorista Tais abor­ ­dagens literárias­ correlatas surgiram por local tem raízes antigas, mas pro­­du­ziu suas me­ volta de 1830 — e tinham raízes anterio­ ­res na tra­ lhores obras bem depois da Guerra Civil. É claro dição oral local. Nas cidades rudes de fronteira,­ que muitos escritores pós-Guerra, de Henry David nas barcas, garimpos, rodas de caubóis­ em torno Thoreau e Nathaniel­ Hawthorne a John Greenleaf da fogueira, longe dos diver­timentos das cidades, Whittier e James Russell Lowell, pintam retratos floresceu a arte de contar histórias. Exageros, 51 notáveis de certas regiões america­ Orr’s Island [A Pérola da Ilha de nas. O que dis­tin­gue os coloristas é Orr] (1862) que retrata humil­des seu interes­ ­se consciente e exclusivo­ comunidades pesquei­ras do Maine, em re­pro­duzir um lugar e a téc­nica exerceram grande influên­cia sobre es­cru­pulosamente factual e realista. Jewett. As escrito­ras do século 19 Bret Harte (1836-1902) é lem­bra­ formavam suas próprias redes de do como o autor de aventuras­ como apoio moral e influência, como re­ve­ The Luck of Roaring Camp [A Sorte­ lam suas cartas. As mulheres­ eram os do Campo do Agito] e The Outcasts principais leitores­ de ficção e muitas of Poker Flat [Os Margi­nais de Poker escreveram romances, poemas e Flat], ambientados nas minas do peças humo­rís­ticas po­pu­lares. Oes­te. Como primei­ro grande su­ Todas as regiões do país celebraram­­ cesso da escola de co­lo­­ristas locais, a si mesmas em obras literárias­ influen­ Harte foi talvez, por algum tempo, o ciadas pela cor local. Algumas­ delas es­cri­­­tor mais conhe­ ­­cido na América­ incluíam protestos­ sociais,­ sobretudo — tamanha a popula­ridade de sua ao fim do século, quando­ desigual­ ­dade versão romantizada­ do Oeste, onde social e difi­cul­da­des eco­nô­micas se todos anda­vam armados. Aparen­te­ tornaram questões­ premen­ ­tes. Injustiça­ mente rea­lis­ta, foi um dos pri­mei­ros racial e desigual­ dade­ entre sexos apa­ a introduzir­ persona­ ­gens menos no­ recem nos trabalhos­ de escritores su­ bres — jogadores astu­tos, prostitutas listas como George Washington Cable espalhafatosas e ladrões rudes — em (1844-1925) e Kate Chopin (1851-1904), obras lite­rárias sérias. Conse­guiu cujos poderosos roman­ ces,­­ passados­ sair-se bem (como o ti­nha fei­to, na na Luisiana francesa,­­­ transcen­ ­dem o Inglaterra, Charles Dickens, que ad­ rótulo de cor local. The Grandissimes mirava muito o trabalho de Har­te) ao (1880) de Cable­ desen­ volve­ o tema mos­trar, no final, que esses­ supostos­ da injus­ tiça­ racial com grande virtuo­ párias tinham na rea­li­­da­de corações si­dade; como The Awakening [O de ouro. Desper­ tar]­ (1899) de Kate Chopin, que Várias escritoras são lembradas Sarah Orne Jewett trata da tenta­­­ tiva­ malsucedida de uma por suas boas descrições da Nova mu­lher de buscar sua identi­­dade numa­ Ingla­ter­ra: Mary Wilkins Freeman paixão, estava à frente de sua época. (1852-1930), Harriet Beecher Stowe Em The Awakening, uma jovem casa­ (1811-1896) e especial­mente­ Sarah da, com lindas crian­ ças­ e um marido Orne Jewett (1849-1909). A originali­ bem-sucedido e indulgente, abandona dade de Jewett, suas obser­ ­vações pre­ família, di­nheiro,­ respeitabilidade e cisas das persona­ ­gens e cenário do eventual­ mente­­ a vida na busca da Maine e seu estilo sensível­ sobressa­ auto-realização. Evocações­ poéticas­ em de forma­ especial no conto “The do oceano,­ pássaros­ (presos­ e livres) White Heron” [A Gar­ça Branca], de e música dotam esse curto roman­ce de Country of the Poin­ted Firs [Terra dos inten­sidade e com­plexidade inusitadas. Pinhei­ros Pon­tia­gudos] (1896). As The Awakening é freqüente­men­te obras coloristas de Harriet­ Beecher comparado a “The Yellow Wallpaper” Stowe, especialmente The Pearl of Foto © The Bettmann Archive [Papel de Parede Ama­­­relo] (1892),

52 ótimo conto de Charlotte Perkins invés­ do sucesso sem ética. Si­las Gilman (1860-1935). Ambas estavam Lapham é, como Huckleberry Finn, es­­que­cidas, mas fo­ram redescobertas uma história de insucesso: o fracasso por críticos literá­rios feministas, já empresa­rial de Lapham corresponde­ no final do século 20. Na história de à sua ascensão moral. No fim da vida, Gilman, um médico condescendente Howells, do mesmo modo que Mark leva sua mulher à loucura, confinan­ Twain, tornou-se cada vez mais ativo do-a num quarto para “curá-la” de em causas políticas,­ defendendo os um esgotamento nervoso. A mulher direitos­ dos organizadores de sindi­ a­pri­­sionada projeta sua clausura no catos e de­plorando­ o colonia­lismo papel de parede, em cujo dese­ ­nho americano­ nas Filipinas. vê mulheres aprisiona­ ­das rastejando­ atrás das grades. ROMANCISTAS COSMOPOLITAS Henry James (1843 - 1916) REALISMO DO MEIO-OESTE Henry James uma vez escre­veu Por vários anos, o editor da importante que arte, especialmente a arte li­­­te­­­­ revista Atlantic Monthly, William Dean rária, “é o que dá vida, gera interesse­ Howells (1837-1920), publicou obras­ e tem importância.” A ficção­ e crítica realistas de cor local de Bret Harte, de James são as mais cons­cientes, Mark Twain, George W. Cable e outros. sofisticadas e também as mais difíceis Defensor do realismo,­ seus romances, de sua época. Junto com Twain, como­ A Modern Instance [Instân­ cia­ Mo­ James é consi­derado o maior ro­ der­na] (1882), The Rise of Silas Lapham mancista ameri­cano da segunda [Ascen­ são­­ de Silas Lapham]­ (1885) e metade do século 19. A Hazard of New Fortunes [O Risco­ James é conhecido por seu “te­ma de Novas Fortunas]­ (1890) entre­ ­laçam­ internacional” — ou seja, as com­­plexas com cuidado­ cir­cunstân­ cias­ sociais relações entre america­ nos­ ingênuos e emoções­ do americano­­ comum­ de e europeus cosmopo­­­ litas.­ A fase que classe­ média.­ seu bió­grafo, Leon Edel, classifica Amor, ambição, idealismo e ten­ como primeira ou fase “internacional”­ tação movem suas persona­gens. engloba obras co­mo Transatlantic Howells era profundamente conscien­­ Harriet Sketches [Im­pressões Trans­­a­tlân­ticas] Beecher Stowe te da corrupção moral dos magnatas­ (1875), The American [O Americano] dos Anos Dourados da dé­cada de (1877), Daisy Miller (1879) e uma 1870. Em The Rise of Silas Lapham, obra-prima, The Portrait of a Lady [O Howell usa um título irônico para Re­trato de Uma Dama] (1881). Em The ressaltar seu propósito.­ Silas Lapham American, por exemplo, Christopher tornara­ -se rico fraudando um velho New­man, ingênuo­ mas inteligente­ e só­cio nos negócios. Seu ato imoral idealista industrial milionário que se pertur­ bou­ muito sua família,­ embora­ fez sozinho, vai à Europa à procura de por anos o próprio Lapham tenha uma noiva.­ Quando a família desta o sido incapaz­ de perceber que agira re­jeita, por sua falta de antecedentes mal. No fim, Lapham é moralmente­ aris­to­crá­ticos, ele tem a oportuni­ ­dade redi­mi­do ao escolher a falência, ao Foto © The Bettmann Archive de se vingar; ao decidir não fazê-lo,

53 revela sua superioridade­ moral. pecaram. segunda fase de James foi expe­ rimental. Explorou novos temas Edith Wharton (1862 - 1937) A— feminismo e re­­forma social Como James, Edith cresceu em em The Bostonians [Os Bostonianos] parte na Euro­ ­pa e acabou­ por lá resi­ dir­ (1886) e intrigas políticas em The permanente­ mente.­ Descendia­ de famí­ Princess Sasa­massima [A Princesa lia rica, estabelecida na sociedade de Sasamassima]­ (1885). Tentou também Nova York, e assistiu,­ em primeira­ mão, escre­ ­­ver para o teatro, mas fracassou ao declínio­ desse­ grupo­ culto e, no seu terrivelmente quando sua peça Guy ponto­­ de vista, à ascen­ são­ de famílias­ Domville (1895) foi vaiada na noite de em­pre­sários­ nou­veaux-riches incul­ de estréia. tos. Essa­ mudança social é cenário de Em sua terceira ou ‘principal’ fase,­ muitos­ de seus romances. James voltou aos temas interna­ cionais,­ Como James, Wharton contrasta mas tratou-os com crescen­ te­­ sofistica­ americanos e europeus. O cer­ne de ção e penetração psicológica.­ Datam sua preocupação é o abismo entre dessa fase: The Wings of the Dove [As realidade social e o ser interior.­ Não Asas do Pombo]­ (1902), obra complexa raro, uma persona­gem sen­sível sen­ e quase­ mítica; The Ambassadors [Os te-se aprisionada por persona­gens Embaixadores] (1903), considerado­ ou forças sociais in­sen­síveis. Edith por James seu melhor­ romance, e The Wharton havia pas­­sado por tal ex­ Golden Bowl [O Vaso Dourado] (1904). periência de apri­sionamento como Se o tema central da obra de Twain é jovem escritora, tendo um prolonga­ aparên­ cia­ e realidade, a preocupação­ do esgota­mento­ nervoso, em parte constan­ te­ de James é com a per­cep­ devido ao con­fli­to entre seus papéis ção. Nele, só a autoconsciên­ cia­ e uma de escritora e esposa. clara­ per­cepção­ dos outros pode gerar Entre os melhores romances sabedoria­ e amor de abnegação.­ Com de Whar­­ton estão: The House of seu amadurecimento, os romances­ de Mirth [Casa da Alegria] (1905), The James se tornaram mais psicológicos Custom of the Country [O Costume e menos­ preocupa­ ­dos com eventos da Terra] (1913), Summer [Ve­rão] exter­nos.Em suas últimas obras, os Henry James (1917), The Age of Innocence [A Era even­tos mais importantes são todos da Inocência] (1920) e a linda novela psicológicos — geralmen­ te­ momentos Ethan Frome (1911). de intensa­ per­cepção,­ que revelam às perso­ na­ gens­ sua cegueira anterior. NATURALISMO E Por exem­plo, em The Ambassadors, DENÚNCIA (MUCKRAKING) Lam­bert Strether, idealista de certa s dissecações das motivações idade, desvenda um caso amoroso sexuais e financeiras ocultas na secreto e, ao fazê-lo, descobre nova Asociedade de Whar­ton e James comple­xidade em sua vida interior. os ligam a escrito­ res­ que na superfície Sua moralidade rígida, hon­rada, se parecem muito diferen­tes: Stephen humaniza e amplia à medida que des­ Fotogravura, cortesia Crane, Jack London,­ Frank Norris, National Portrait Gallery. cobre a capacidade de aceitar­ os que Smithsonian Institution Theo­dore Dreiser e Upton Sinclair.

54 Como os romancistas­ cosmopolitas,­ ralismo apareceu inicialmente na mas mais explici­ ­tamente, os naturalis­­ Europa. Geralmente é remontado às tas usaram­ o realismo para­ relacionar­ obras de Honoré de Balzac, na déca­ o indi­víduo à so­cieda­ de.­ Fre­qüen­ da de 1840, e visto como movimento­ temen­ te,­ denuncia­vam pro­blemas­­ literário francês associado a Gustave sociais e eram in­flu­encia­dos pelo Flaubert, Edmond e Ju­les Goncourt, pensa­mento­ dar­wi­niano e a dou­trina Émile Zola e Guy de Maupassant. filo­sófica afim do terde­ ­­mi­nismo, que Audaciosamente re­ve­­lou o lado vê o indivíduo­ como joguete impo­ sórdido da sociedade e temas como tente de for­ças econômicas­ e so­ciais divórcio, sexo, adul­tério, pobreza e além de seu con­trole. crime. Naturalismo é, em essência, ex­ O Naturalismo floresceu quando pressão literária do deter­minis­mo. os americanos se tornavam urbanos­ e Associado a descrições áridas e rea­ conscientes da im­portância das gran­ listas da vida da classe baixa, o deter­­ des forças econômicas­ e sociais.­ Em minismo nega a religião­ como for­ça 1890, as fronteiras foram­ oficialmente motivadora no mundo­ e, em vez disso, declaradas fechadas.­ A maioria dos percebe o universo como máquina. Os ame­rica­nos morava­ em cidades e os iluministas do século XVIII também­ negó­cios do­mi­navam até mesmo as imaginaram o mundo­ como máquina, fazendas remotas. só que perfeita, inventada por Deus e caminhando para o pro­gresso e o Stephen Crane (1871 - 1900) aprimoramen­ to­ humano. Já os natura­ Stephen Crane, nascido em New listas imaginavam­ a sociedade como Jersey, tinha em sua linhagem soldados­ uma máquina­ cega, sem Deus e fora revolucionários, clérigos, xerifes, juizes de controle. e fazendeiros que viveram um século O historiador americano do século­ antes. Basicamente­ um jornalista que 19, Henry Adams, cons­truiu uma também escrevia fic­ção, ensaios, sofisticada teoria da história, que en­ poesias e peças dramáticas, Crane volve a idéia de dína­mo, ou força de encarava a vida nua e crua, em favelas máquina, e entropia,­ ou desgaste de e campos de batalha. Seus contos — força. Ao invés de progresso,­ Adams Stephen Crane em particular, “The Open Boat” [O vê o declínio­ inevitável­ da sociedade Barco Aberto], “The Blue Hotel” [O hu­ma­na. Hotel Azul] e “The Bride Comes to Stephen Crane, filho de clé­rigo, Yellow Sky” [A Noiva Vem Para o Céu expôs de forma sucinta a per­da de Amarelo] — exemplificam sua forma Deus: literária. Seu pun­gente romance da Guerra Civil, The Red Badge of Courage Um homem disse para o universo: [A Insígnia Vermelha da Coragem], “Senhor, eu existo!” foi publicado e muito aclamado em “Entretanto”, respondeu o universo, 1895, mas ele pouco gozou da fama “Esse fato não criou em mim antes de morrer aos 29 anos, por ter Um sentido de obrigação”. negligenciado a saúde. Praticamente­ Foto, cortesia da Biblioteca do Congresso esquecido durante as primeiras duas Como o Romantismo, o Natu­ décadas do século 20, foi redescoberto 55 através de uma biografia laudatória por Thomas Beer, mar. Como muitos dos melhores romances de sua em 1923. Desde então, vem sendo muito lido — como época, Martin Eden é uma história de insucesso. defensor do homem comum, realista e simbolista. PrefiguraThe Great Gatsby [O Grande­ Gatsby], de aggie: A Girl of the Streets [Maggie: Uma F. Scott Fitzgerald, ao revelar o desespero em meio Moça das Ruas] (1893) de Crane é um à grande riqueza. Mdos melho­ ­res senão o primeiro romance americano naturalista. É a história angustiante­ de Theodore Dreiser (1871 - 1945) uma jovem pobre e sensível cu­jos pais, ignorantes A obra de 1925, An American Tragedy [Uma e alcoólatras, a deixam no desamparo. Apaixona­ Tragédia Ame­ricana] de Theodore Dreiser, co­mo da e ansiosa por escapar da vida familiar violenta, Martin Eden de London, explora os perigos­ do sonho deixa-se seduzir e vai viver com um jovem, que americano. O romance relata, com detalhes, a vida logo a abandona. Quan­do sua mãe farisaica a de Clyde Griffiths, rapaz­ de vontade­ fraca e limitada rejeita, Maggie se torna prostituta para sobreviver, consciência de si próprio.­ É criado na pobreza,­ numa­ mas logo se suicida em desespero.­ Seu tema mun­ família de evange­ lizadores­ itinerantes,­ mas sonha dano e estilo­ científico­ e objetivo, sem moralismo, com a riqueza e o amor de lindas­ mulheres.­ Um tio definemMaggie como uma obra naturalista. rico­ o emprega em sua fábrica. Quando sua namora­­ da Roberta fica grávida, exige que ele se case­ com Jack London (1876 - 1916) ela. Nesse interim, Clyde se apaixona­ por rica moça­ Trabalhador pobre e autodidata da Califórnia,­ o de sociedade, que representa­ sucesso,­ dinheiro­ e naturalista Jack London se viu içado da pobreza­ à aceitação social. Ele planeja cuidadosamente­ afo­ fama por sua primeira coletânea de histórias,­ The gar Roberta num passeio de bar­co, mas, no último Son of the Wolf [O Filho do Lobo] (1900), passadas minuto, muda de idéia; ela, porém, cai do barco sobretudo na região Klondike, do Alasca, e no aciden­ talmen­ te.­ Clyde, bom nadador, não a sal­va e Yukon canadense. Outros suces­sos, como The ela se afo­ ga.­­ Quando ele vai a julgamento,­ Dreiser Call of the Wild [Apelo do Instinto]­­ (1903) e The reconta­ sua história no sentido inver­ so,­ usando magis­ Sea-Wolf [O Lobo do Mar] (1904) fizeram dele o tralmente as posições dos advogados de acusação e mais bem pago escritor de sua época, nos Estados defesa para analisar cada passo e motivo que levaram Unidos. o pacato Clyde, com forte bagagem religiosa e boas O romance autobiográfico Martin Eden (1909) conec­ ções­ familiares, a cometer homi­ cídio.­ revela as tensões interiores do sonho america­ ão obstante seu estilo canhestro, Dreiser, no, como experimentado por London, quando em An American Tragedy, revela autoridade ascendeu vertiginosamente da pobreza e do Nesmagadora. Seus deta­lhes precisos criam desconhecimento para a riqueza e a fama. Eden, uma sensação avassaladora­ de trágica inevitabi­­ marinheiro e operário inteligente e tra­balhador,­ lidade. O romance é o retrato contundente­­­ do mito embora pobre, resolve tornar-se escri­ ­tor. Com o de sucesso ame­ricano que azedou, mas também­ tempo, sua literatura o torna rico e famoso, mas é uma história universal das tensões decorrentes Eden vê que a mulher por ele amada só se interessa da urbaniza­ ­ção, mo­der­­ni­zação e alienação. Nele­ pelo dinheiro e a fama. Seu desespero ante sua estão presentes as fantasias ro­mân­ticas e perigosas incapacidade de amá-lo termina por desiludí-lo da dos espoliados.­ na­tu­reza humana. Também sofre de alienação de An American Tragedy reflete a insatisfação, a inveja classe, já que não pertence mais à classe trabalha­ e o desespero que afligiam muitos pobres e traba­ dora enquanto­ rejeita os valores materialistas­ da lhadores­ na sociedade americana marcada pela com­ classe rica, que tanto se esforçara por integrar. Ele petição e voltada unicamente para o sucesso. Com parte para o Pacífico Sul e se suicida, jogando-se ao a expansão do poderio industrial americano, a vida

56 cintilante dos ricos,­ retratada em jornais do de William Dean Howells, é uma e fotogra­ fias,­ contrastava nitidamente galeria de re­tra­tos de gente comum. com a vida insípida dos agricultores e Descreve de modo chocante a po­ trabalhadores urbanos comuns. A mí­ breza dos fazen­ ­deiros do Meio-Oeste, dia alimentava expectativas gran­diosas que exi­­giam reformas agrícolas. O e desejos exorbitantes. Tais problemas, títu­lo sugere as muitas trilhas percor­ comuns às nações em modernização, ridas pelos valentes pioneiros para fez surgir o jornalismo­ de denúncia Oeste e as estradas em­poeiradas das de corrupção (“muckraking”) — re­ aldeias que funda­ram. portagens jornalísticas investigativas Perto de Main-Travelled Roads pene­tran­tes que documentavam os de Garland, está Wines­burg, Ohio, pro­blemas sociais e deram importante­ de Sherwood Anderson (1876-1941), impulso à reforma social. iniciado em 1916. É uma cole­ tânea­ de A grande tradição do jornalismo inves­ histórias­ sobre os habi­ tantes­ da cida­ tigativo americano teve início nesse de fictícia de Wines­ burg,­­ vistas pelos período, em que revistas nacionais,­ olhos de um jo­vem repórter ingênuo, como McClures e Collier’s, publicaram George Willard, que um dia vai em­ a History of the Standard Oil Company bora em busca de fortuna na cidade­ [His­­tória da Empresa Standard Oil] grande. Como Main-Travelled Roads e (1904) de Ida M. Tarbell, The Shame outras­ obras naturalistas,­ Winesburg, of the Cities [A Vergonha das Cidades] Ohio enfati­za a pobreza re­sig­na­da, (1904) de Lincoln Steffens e outras solidão e desespero nas cida­ ­dezi­nhas denúncias sérias. Romances de de­ da América. núncia usavam técnicas­ jornalísticas­ chamativas para retratar duras­ con­ A “ESCOLA DE CHICAGO” DE dições de trabalho e opressão.­ Frank POESIA Norris, autor populista de The Octopus rês poetas do Meio-Oeste, cria­ [O Polvo] (1901), expôs grandes dos em Illinois e que comparti­ empresas ferroviárias­ enquanto The Tlhavam a preocupação do meio­ Jun­gle [A Selva] (1906) do socialista -oeste com as pessoas comuns­ são Upton Sinclair, pintava a sordidez das Carl Sandburg, Vachel Lindsay e Edgar Theodore Dreiser casas de em­pacotamento de carne de Lee Masters. Sua poesia cos­tuma­ Chicago. A distopia de Jack London, tratar de indivíduos desconhecidos;­ The Iron Heel [O Calca­ nhar­ de Ferro] desenvolveram técnicas­ — realismo, (1908), prefigura 1984 de George interpretações dramá­ ticas­ — que alcan­ Orwell que prevê uma guerra de classe çaram um número maior de leitores.­ e a derruba­ da­ do governo. Integram a Escola do Meio-Oeste, ou Outra resposta mais artística foi o Chica­ go,­ que surgiu antes da I Guerra retrato realista, ou grupo de retra­ ­tos, Mundial,­ para desafiar o domínio de per­sonagens comuns e suas vidas literário da costa leste. A “Renascença­ inte­ riores­ frustradas. A coletânea de Chicago” foi um divisor de águas de histórias Main-Travelled Roads na cultura americana: demonstrou que [Estradas Mais Viaja­das] (1891) de o interior do país havia amadurecido. Hamlin Garland (1860-1940), protegi­ Foto © The Bettmann Archive

57 Edgar Lee Masters (1868 - 1950) ...(e) can­tar todo dia.” Na virada do século, Chicago já se transformara­ Um bom exemplo de seus temas e estilo à moda numa grande cidade, com inovado­ ra­ arqui­ ­tetura e de Whitman e o poema “Chicago” (1914): coleções de arte cosmopolitas.­ Chicago­ era tam­ bém a cidade de Poetry, de Harriet Monroe, a mais Açougueiro de Porcos para o Mundo, importante revista literária da época. Artífice de Ferramentas, Empilhador de Trigo, Entre os poetas contemporâneos­ intrigantes que Jogador com as Estradas de Ferro e os a revista publicava estava Edgar Lee Masters, autor Transportadores de Carga da Nação; do audacioso Spoon River Antho­logy [Antologia de Tempestuosa, robusta, barulhenta, Spoon River] (1915), com seu novo estilo coloquial Cidade dos Ombros Largos... “não-poético”, franca apresentação do sexo, visão crítica da vida pro­vinciana e a vida interior intensa­ Vachel Lindsay (1879 - 1931) mente imaginada­ das pessoas comuns. Vachel Lindsay era um celebrante do populis­ mo­ Spoon River Anthology é uma coleção de retratos da cidadezinha do Meio-Oeste e criador de poesia apresentados como epitáfios coloquiais,­ resumindo rítmica e forte, criada para ser declamada­ em voz a vida dos habitantes como que em suas próprias alta. Seu trabalho cria um elo curio­ so­ entre as for­ palavras. Apresenta o panorama­ de uma vila do mas populares, ou folclóricas,­ de poesia, como as interior a partir de seu cemitério: 250 pessoas lá músicas gospel cristãs e os espatáculos de variedades enterradas falam, revelando seus segredos mais vaudeville (teatro­ popular) e, de outro lado, a poética profundos. Muitas­ delas são aparentadas; membros moder­ nista­ avançada. Tendo sido um declamador de cerca de 20 famílias falam de seus fracassos extrema­mente­ popular em sua época, as leituras­ de e sonhos em monólogos de verso livre, que são Lindsay prefiguram leituras de poe­sia “Beat”, surgidas surpreendentemente­ modernos. após a II Guerra Mundial, que eram acompanhadas Carl Sandburg (1878 - 1967) por jazz. Um amigo disse certa vez: “Tentar escrever Para popularizar a poesia, Lindsay desenvolveu sucintamente sobre Carl Sandburg é como tentar­ o que ele chamou de espetáculo de variedades em captar o Grand Canyon em uma única foto em preto al­to nível­ (“higher vaudeville”), usan­ ­­­do música e e branco”. Poeta, historiador, biógrafo, romancista, ritmos fortes. Racista,­ pelos padrões atuais, seu músico, ensaísta — Sandburg, filho­ de um ferreiro famoso­ poema “The Congo” [O Con­go] (1914) de estrada de ferro, era tudo isso e mais. Jornalista celebra a história dos africanos­ misturando jazz, por profissão, escreveu uma biografia monumental poesia, mú­sica e cantilenas. Ao mesmo tem­po, de Abraão Lincoln, que é uma das obras clássicas imortalizou figuras do cenário­ americano como do século 20. Abraham Lincoln (“Abra­ham Lincoln Walks at Para muitos, Sandburg foi um Walt Whitman mo­ Midnight” [Abraão Lincoln Caminha à Meia-Noite]) derno, escrevendo poemas urbanos e patrióticos­ e John Chapman (“Johnny Appleseed”) [Johnny evocativos, expansivos, e rimas e baladas simples, Se­mente de Maçã], fre­qüen­­temente incorporando infantis. Viajou muito, recitando e gra­van­do suas mitos aos fatos. poesias numa voz cadenciada e tom melífluo, que parecia um tipo de canto. No fundo,­ era totalmente Edwin Arlington Robinson (1869 despretensioso, apesar­ da fama­ nacional. O que - 1935) queria da vida, disse­ certa vez, era “ficar fora da Edwin Arlington Robinson é o melhor poeta cadeia... comer regularmente...­ conseguir publicar americano do final do século 19. Como Edgar Lee o que escre­vi... um pouco de amor em casa e uma Masters, é conhecido por seus curtos e irônicos es­ gostosa afeição aqui e ali na paisagem americana, tudos de personalidade­ de pessoas comuns. Mas

58 Robinson, diferentemente de Masters, Tragedy e The Great Gatsby, como usa a métrica tradicional. A cidade poderoso aviso contra os perigos do imaginária de Tilbury Town [Cidade mito em torno do sucesso­ exagerado do Tílburi], criada por Robinson, é que atormentou os americanos que semelhante à cidade de Spoon River viveram na era dos milionários. de Masters, em que as pessoas vivem um desespero contido. DUAS ROMANCISTAS Alguns dos monólogos dramáticos REGIONALISTAS mais conhecidos de Edwin Robinson s romancistas Ellen Glasgow são “Luke Havergal” (1896), sobre (1873-1945) e Willa Cather (1873- um aman­te abandonado; “Miniver A1947) exploraram a vida das Cheevy” (1910), retrato de um so­ mulheres, colocando-as em cenários nhador romântico; e “Richard Cory” regionais brilhante­mente evocados. (1896), retrato sombrio de um ho­ Nenhuma das duas buscou abordar mem rico que se suicida: temas femi­nistas especificamente; Sempre que Richard Cory ia à cidade, seus primei­ ­ros trabalhos geralmente Nós, pessoas na calçada, olhávamos gira­vam em torno de protagonistas para ele: mas­culinos. Só quando adquiriram Era um cavalheiro, dos pés à cabeça, confiança e maturidade artística é que Bem apessoado e imperialmente passaram a retratar a vida de mulhe­ delgado, res. Glasgow e Cather só podem­ ser tidas como ‘escritoras femininas’­ num E sempre vestido discretamente, sentido descritivo, pois suas obras são E sempre humano em suas conversas; difíceis de categorizar.­ Mas ainda fazia palpitar os corações Glasgow era de Richmond, quando dizia, Virgínia, a velha capital dos Estados “Bom dia”, e resplandecia quando Confederados do Sul. Seus romances passava. realistas examinam a transformação do Sul de uma economia rural para uma E era rico — sim, mais rico que um rei — industrializada. As obras da maturi­ E admiravelmente instruído nas boas Willa Cather dade, como Virginia (1912), enfocam maneiras: a experiência su­lis­ta, enquanto os Enfim, achávamos que ele era tudo romances posteriores, como Barren Para nos fazer desejar estar em seu lugar. Ground [Terra­ Estéril] (1925), — reco­ nhecidamente seu melhor tra­ba­lho Então, continuávamos trabalhando e — dramatizam a tentativa, por parte de aguardando a luz, mulheres talentosas, de romper o claus­ E passávamos sem carne e amaldiçoá­ trofóbico código sulista tradicional, que vamos o pão; impõe à mulher­ a vida doméstica, a E Richard Cory, numa bela noite de verão, devoção religiosa e a dependência. Foi para casa e deu um tiro na cabeça. Cather, também da Virgínia, foi criada nas planícies de Nebrasca, “Richard Cory” ocupa seu lugar ao lado de Martin Eden, An American Foto, cortesia OWI

59 entre imigrantes pioneiros — mais no Estado de Vir­gínia. Sua bela e sim­ tarde imortalizados em O Pioneers! ples auto­biografia, Up From Slavery [Pioneiros!] (1913), My Antonia [Mi­ [Saindo da Es­cra­vidão] (1901), narra nha Antonia] (1918) e seu conhecido­ sua bem-sucedida luta para vencer na conto “Neighbour Rosicky” [O Vizinho vida. Tornou-se conhecido por seus Rosicky] (1928). Ao longo de sua esforços em prol de uma vida melhor vida, sentiu­ -se cada vez mais alienada para os afro-americanos. Sua política do materialismo da vida moderna e de conciliação com os brancos — escreveu sobre visões alternativas no tentativa de integrar os ame­ricanos Sudoeste americano e no passado.­ Seu negros recém-libertos à sociedade livro, Death Comes for the Archbishop ame­ricana — foi esboçada em seu [A Morte Chega para o Arcebispo] famoso Atlanta Exposition Address (1927), evoca o ide­a­lismo de dois [Discurso na Exposição de Atlanta] padres do século 16 que levam a igreja (1895). católica ao deserto do Novo México. As obras de Cather comemoram aspectos W.E.B. du Bois (1868 - 1963) importantes da experiência americana Nascido na Nova Inglaterra e for­ fora da corrente literária principal — o mado pelas universidades de Harvard pioneirismo, o estabelecimento da reli­ e de Berlim (Alemanha),­ W.E.B. Du gião e a vida independente de mulheres. Bois foi o autor de “Of Mr. Boo­ker T. Washington and Others”[Sobre o ASCENSÃO DA LITERATURA Sr. Booker T. Washington e Outros], AMERICANA NEGRA ensaio depois incluído naquele livro concretização do potencial que viria a ser um marco em sua vida, literário afro-americano foi The Souls of Black Folk [As Almas A um dos fenômenos mais mar­ de Pessoas Negras](1903). DuBois cantes do período que se se­guiu à demonstra com todo o cuidado que, Guerra Civil. Nas obras de Booker T. apesar de suas inúmeras­ realizações, Washington, W.E.B. Du Bois, James Washington havia, efetivamente,­ aceito Weldon Johnson, Charles Waddell a segregação — isto é, o tratamento Chesnutt, Paul Laurence Dunbar e separado e desigual de americanos outros, vemos a consolidação das Booker negros — e que tal segregação resulta­ T. Washington raízes da lite­ratura americana negra, ria inevitavelmente­ na inferiorização sobretudo na forma de autobiogra­ dos negros, sobretudo em termos fias, textos de protesto, sermões, educacionais. Du Bois, um dos funda­­ poesia e cânticos. dores­ da Associação Nacional para a Promo­ção de Povos Negros (National Booker T. Washington Association for the Advancement of (1856 - 1915) Colored People - NAACP), tam­bém Booker T. Washington, educador escreveu textos que revelam sua sensi­ e líder negro mais importante de sua bilidade­ em relação às tradições e às época, filho de um pai branco senhor culturas afro-americanas. Seu trabalho de escravos e de uma escra­ ­va, foi cria­ ajudou os intelec­ tuais­ negros a redes­ do como escravo em Franklin County, Foto, cortesia Brown Brothers cobrirem a riqueza de sua literatura e

60 música popular. inclusive raça. Chesnutt freqüentemente revela a ­ força da comunidade negra e afirma valores éticos James Weldon Johnson (1871 - 1938) e a solidariedade racial. Assim como Du Bois, o poeta James Weldon  Johnson inspirou-se na música dos spirituals afro­ -americanos. Seu poema “O Black and Unknown Bards” [O! Bardos Negros e Desconhecidos]­ (1917) faz a seguinte pergunta:

O coração de qual escravo derramou melodia Como a de “Steal Away to Jesus”? Em seus acordes Seu espírito deve ter flutuado livre à noite, Ainda que sentisse as correntes em seu pulso.

Com antepassados brancos e negros, Johnson explorou a questão complexa da raça em seu Autobiography of an Ex-Colored Man [Autobiografia de um Ex-Negro] (1912), obra de ficção sobre um mestiço que “passa” por (é aceito como) branco.­ O livro transmite de forma muito vívida a preo­ cupação do negro americano com a questão da identidade na América.

Charles Waddell Chesnutt (1858 - 1932) Charles Waddell Chesnutt, autor de duas coletâneas de contos, The Conjure Woman [A Mulher Feiticeira] (1899) e The Wife of His Youth [A Mulher de Sua Juventude] (1899), e de vários romances, inclusive The Marrow of Tradition [A Essência da Tradição] (1901) e uma biografia de Frederick Douglass, estava à frente de seu tempo. Suas histórias lidam com temas raciais, mas evitam finais previsíveis e o sentimento generalizado; suas personagens são indivíduos distintos, com atitudes com­plexas em relação a uma série de coisas,

61 americanos estudavam em cursos superiores­ — nos anos 20, duplica­ ­ram as matrí­ ­­culas em universidades. CAPÍTULO A classe média prospe­ rou;­­ os americanos­ come­ ça­­ ram a ter a renda média nacio­ nal­ mais alta do mundo nessa era e muitos adquiriram o maior símbolo de status — o automóvel. O típico lar urbano americano­ bri­lha­va com lâmpadas elétricas e se gabava­ do MODERNISMO6 E rádio, que ligava a casa ao mundo exterior, e até de um telefone,­ máquina fotográfica,­ de datilografia­ EXPERIMENTAÇÃO: ou de costura. Como o empresário­ protagonista de 1914-1945 Babbitt (1922), romance­ de Sinclair Lewis, o ameri­ cano médio apro­vava essas máquinas porque eram uitos historiadores caracterizam os anos modernas,­ mas principalmente­ porque a maioria foi entre as duas grandes guerras como o inventada e produzida nos Estados Unidos. Mperíodo “traumático” em que os Estados Os americanos dos incríveis anos 20 se apai­ Unidos atingiram a maioridade,­ apesar­­ do envol­ xonaram por outras diversões modernas. A maio­ria vimento relativamente breve (1917-1918) e baixas ia ao cinema uma vez por semana. Embora­ a Lei muito menores que a dos aliados e inimigos Seca — o banimento­ nacional da produção, trans­ europeus. John Dos Passos­ ex­pres­sou a desilusão­ porte­ e venda­ de álcool instituída­ pela 18ª Emenda­ pós-guerra da América­ no roman­ ce­ Three Soldiers à Constituição­ americana­ — tenha iniciado em 1919, [Três Solda­ ­­dos] (1921), em que dizia que a civiliza­ prolife­ravam os bares clandes­tinos e as boates ção era “vasto edifício­ de hipocrisia e a guerra,­ em apre­sentando­ jazz, coquetéis e ousados modismos­ vez de sua ruína,­­­ era sua expressão­­ mais plena e de roupa e dança. Dançar,­ ir ao cinema, passear de­fi­niti­va”. Cho­cados e muda­dos para sem­pre, de auto­móvel e ouvir rádio torna­ram-se manias os ame­ri­canos voltaram para casa, sem ja­mais nacionais.­ As mulheres­ americanas,­ em particular,­ recupe­rar a inocência. sentiam-se liberadas.­ Muitas­ haviam deixado fa­ Nem soldados da América rural podiam­ voltar zendas e vilas para colaborar­ no esforço de guerra­ às suas raízes com facilidade. Depois­ de conhe­ cer­­ nas cidades ameri­ canas,­ na I Guerra, e estavam o mundo, muitos ansiavam pela vida moderna, ur­ decididas a serem moder­ nas.­ Cortavam os cabe­­ bana. Novas máquinas agrí­ co­ las­ como semeadoras, los curtos, vestiam-se de melindrosas­ e exultavam colheitadeiras e enfardadei­ ­ras haviam reduzido a com o direito ao voto garantido pela 19ª Emenda à procura por mão-de-obra no campo. Mas, apesar de Constituição, apro­ ­vada em 1920. Expressavam com produzirem­ mais, os fazendeiros estavam pobres. coragem suas opiniões e as­sumiam­ papéis públicos Os preços das safras, como os salários­ de operários­ na sociedade. ur­banos, dependiam das for­ças desenfreadas­ do mer­ Os jovens ocidentais se rebelavam, furiosos e cado, sujeitas aos interes­ ­­ses em­presa­riais: subsídios­­ desiludidos­ com a guerra cruel, responsabi­ lizando­ do go­verno­ para agriculto­ res­ e sindicatos eficien­ tes­ a geração mais velha pelo conflito e a difícil­ situação ainda não tinham­ sido criados.­ “O principal negócio econômica pós-guerra, que, iro­ni­camente, permitia do po­vo americano­ são os negócios”, proclamou, a americanos com dólares —como os escritores F. em 1925, o Presidente­ Calvin Coolidge e a maioria­ Scott Fitzgerald, Ernest Hemingway, Gertrude Stein concor­dou. e Ezra Pound—viver­ no exterior elegantemente com No “Big Boom” do pós-guerra, os negócios flores­ pouco dinheiro.­ Correntes intelectuais, sobretudo a ceram e os bem-sucedidos enriqueceram mais do psicologia­ e, até certo ponto, o marxis­ mo­ que poderiam imaginar. Pela primeira­ vez, muitos (como a anterior teoria darwiniana da evolução),­

62 envolviam uma visão do mundo­ sem Deus e, desse america­nos estava­ sem emprego. A distribui­ ­ção de modo, contri­ buíram­ para o desmo­ ronamento­ dos sopa, fa­­ve­las e exércitos de vagabun­ ­dos (hobos) – valores tradicionais. Os ame­ricanos no exterior de­sem­­­pre­gados viajando clandes­tinos em trens de absorveram essas idéias e as trouxeram para a carga – tornaram­ -se parte da vida nacional. Muitos América, onde cria­ ram­­ raízes,­ inflamando a ima­ viram a Depres­são como castigo­ pelos pe­ca­dos ginação de jo­vens escrito­res e artistas. William do ma­te­­rialismo excessivo e vida desregrada.­ As Faulkner, por exemplo, ro­mancista­ ameri­cano,­ tem­pestades de areia que escu­reciam o céu do empregou elementos­ freudia­ ­nos em todas as obras, Meio-Oeste, acre­ditavam, era julgamento­ do Velho­ como­ o fizeram­ praticamente­ todos os escritores Testamento: “redemoinhos­ de dia e escuri­dão ao ameri­canos ficcio­nis­tas sérios após a I Guer­ra meio-dia.” Mundial. A Depressão virou o mundo de cabeça para Apesar da alegria exterior, modernidade e pros­ baixo. Os Estados Unidos haviam pregado um pe­ridade material sem par, os jovens americanos­ evan­­­­gelho dos negócios nos anos 20. Ago­ra, vá­rios dos anos 20 foram “a geração perdida”–­ assim cha­ americanos apoiavam um papel mais atuan­ te­ do mados pela retratista literária Ger­trude Stein. Sem governo nos programas do New Deal do Presidente estrutura tradicional­ estável­ de valores, o indivíduo Franklin D. Roosevelt. Re­cursos federais criaram em­ per­deu o sentido de sua identidade. A vida familiar­ pregos em obras públi­ ­cas, serviços de conservação protetora e segu­ ra;­­ a comunidade estável; os ritmos e eletrificação­ rural.­ Artistas­­ e intelectuais foram naturais eternos da natureza que guiam plantio pagos para criar­ murais­ e compêndios estaduais. e colheita­ na fazenda; o sentido confortador de Tais ações ajuda­ ­ram, mas só o de­senvolvimento­­­ patrio­tis­mo; valores morais­ incutidos por cren­ças industrial da II Guerra Mun­dial renovou a pros­ religiosas e observações­ – tudo foi mi­na­do pela I peridade. Depois que o Japão atacou os EUA em Guerra Mundial e seus desdobramentos.­ Pearl Harbor, em 7 de dezembro­ de 1941, estaleiros Vários romances, como The Sun Also Rises [O e fábricas oci­osos­ ganharam vida, produ­zindo Sol Também Se Levanta] (1926) de Hemingway­ e em massa­ bar­cos, aviões,­ jipes e supri­ ­mentos. A This Side of Paradise [Este Lado do Paraíso]­­ (1920) produção e expe­rimen­ tação­ béli­cas levaram às de Fitzgerald, evocam a extra­va­gân­cia e desilusão novas tecnolo­ gias,­ inclusive a da bomba nuclear.­ da geração per­dida. No longo e influente poema Teste­munha da primeira­ explosão­ nuclear,­ Robert de T.S.Eliot, The Waste Land [A Terra Devastada] Oppenhei­ mer,­ chefe da equipe­ inter­ na­ cional­­ de (1922), a civilização ocidental­ é simbolizada por cientistas­ nuclea­res, citou pro­feticamente­ um um deserto árido em deses­ ­pe­ro por chuva (reno­ poema­ hindu:­ “Tornei-me Morte, o destruidor de vação espi­ritual). mundos.”­ A Depressão mundial dos anos 30 afetou a mai­oria da população americana. Trabalhadores­ MODERNISMO perderam empregos e fá­bricas­ fecha­ram; em­ grande onda cultural do modernismo que presas e bancos faliram; agricultores, sem poder­ emergiu gradualmente na Europa e nos colher, trans­portar ou ven­der seus pro­dutos, não A Estados Unidos no início do sécu­lo 20 puderam pagar suas dívidas e perde­ram as terras. expressou o sentido da vida moderna atra­vés da As secas do Meio-Oeste transfor­­maram o “celeiro” arte como rompimento brusco com o passado­ e da Amé­rica num mon­te de areia. Fazendeiros as tradições clás­sicas da civilização ocidental. A deixaram o Meio-Oeste para a Califórnia em busca vida moderna parecia radicalmente diversa da de empregos, como vividamente­ descrito em The tradi­cional — mais científica, rápida, tecnológica Grapes of Wrath [As Vinhas da Ira] (1939) de John e mecanizada. O modernismo abra­çou essas Steinbeck. No auge­ da Depressão,­ um ter­ço dos mu­­danças.

63 Na literatura, Gertrude Stein (1874-1946) de­ belas artes, aliada aos desenvolvimentos científicos senvolveu um análogo à arte moderna. Resi­ ­dente da época. O fotógrafo Alfred Stieglitz abriu um salão em Paris e colecionadora de arte (ela e o irmão­ em Nova York e, em 1908, estava expondo os traba­ Leo compraram obras de Cézanne, Gau­­­guin, lhos mais recentes da Europa, incluindo peças de Renoir, Picasso e muitos outros), Stein expli­cou Picasso e outros amigos­ europeus­ de Gertrude Stein. que ela e Picasso faziam a mesma­ coi­sa, ele na O salão de Stieglitz influenciou vários escritores e arte e ela na lite­ ­ratura. Usan­do pala­vras simples artistas, inclusive­­­ William Carlos Williams, um dos e concretas como contra-fortes, de­sen­volveu poetas americanos mais influentes do século 20. uma poesia em prosa experimental e abstrata. A Williams cultivou uma clareza fotográfica da ima­ qualidade infantil do vocabu­lário simples de Stein gem. Seu slogan estético era: “nenhuma idéia a não lembra as brilhantes­ cores primárias da arte mo­ ser nas coisas”. derna, enquan­ ­to suas repetições ecoam as formas visão e o ponto de vista tornaram-se aspectos repe­tidas das composições visuais abstratas. Ao essenciais também no romance modernista. deslocar a pontuação­ e a gramática, conquistou ANão bastava mais escrever uma narrativa novos signi­ ­ficados “abstratos”, como na in­flu­ente objetiva na terceira pessoa ou (pior ainda) usar um co­le­tânea Tender Buttons [Botões Tenros](1914), inútil narrador intruso. A maneira como a história que vê objetos por ângulos diferentes, como num era contada tornou-se tão importante quanto a quadro cubista: pró­pria história. Henry James, William Faulkner e muitos outros Uma mesa Uma Mesa significa não é minha escritores americanos fizeram experiências­ com querida significa toda uma firmeza. pontos de vista fictícios (alguns ainda o fazem Será que é provável que uma mudança. Uma mesa hoje). James freqüentemente limitava a informação significa mais que um copo de vidro no romance àquela que uma única personagem até um espelho é alto. teria sabido. The Sound and the Fury [O Som e a Fúria] (1929), ro­mance de Faulkner, divide a Significado, na obra de Stein, estava muitas vezes narrativa em quatro­ seções, cada qual expressando subordinado à técnica, assim como o tema era menos o ponto de vista de uma personagem diferente importante que a forma­ na arte visual abstrata. Tema (in­cluindo um menino mentalmente retardado). e técnica tornaram-se inseparáveis­ tanto na arte Para analisar romances e poesias modernistas­ visual como na literatura, nessa época. O conceito da desse tipo, surgiu nos Estados Unidos a escola forma como equivalente­ do conteúdo, pedra angular conhecida como “New Criticism” [Crítica Nova], da arte e da literatura depois da II Guerra Mundial, com um novo vocabulário crítico. Os New Critics cristalizou­ -se nesse período. buscavam a “epifânia” (momento em que a per­ Inovações tecnológicas no mundo das fábri­ ­cas sonagem repentinamente­ compreende­ a verdade e máquinas inspiraram um novo interesse pela transcen­ dente­ da situação, termo deri­vado da técnica nas artes. Por exemplo: A luz, sobre­ ­tudo aparição de santos aos mortais); “examinavam” e a elétrica, fascinava os artistas e escri­tores moder­ “esclare­ciam” uma obra, na esperança de “trazer nos. Cartazes e anúncios da época estão repletos luz” ao trabalho através de suas “percepções”. de imagens de ar­ranha-céus iluminados e raios de luz que emanam de faróis de carros, cinemas, POESIA 1919- 1945: e torres de vigia e iluminam a escuridão externa EXPERIÊNCIAS NA FORMA ameaçadora,­ sugerindo ignorância e tradições Ezra Pound (1885 - 1972) ultrapassadas. Ezra Pound foi um dos poetas americanos mais in­ A fotografia passou a assumir status de uma das

64 fluentes deste século. De 1908 a 1920, a­lu­sões a obras­ literárias­ e artísticas­ viveu em Londres, onde conviveu com de eras e cultu­ras diferentes­ a torna­ muitos­ escritores, inclusive William difí­cil. A poesia­­ de Pound é fa­mosa Butler Yeats, para quem trabalhou pelas­ ima­gens visuais cla­ras, ritmo como secretário, e T.S. Eliot, cujo no­vo, li­nhas muscu­­­lares, in­te­­li­gen­tes Waste Land revisou e melhorou dras­ e in­co­muns, como no Canto­­ LXXXI: ticamente. Foi um elo entre os Estados “A formiga é um cen­tau­ro em seu Unidos e a Grã-Bretanha,­ trabalhando mun­do de dra­gão”, ou em poemas como editor colaborador­ da importan­ inspirados no haicai japonês,­ como te revista Poetry, editada em Chicago “In a Station of the Me­tro” [Numa por Harriet Monroe, e encabeçando Estação do Metrô] (1916): a nova es­cola poética conhecida como Imagismo,­ que advogava uma A aparição desses rostos na multidão; apresen­tação clara e altamente visual. Pétalas num galho molhado, negro. Após o Imagismo, defendeu várias outras­ abordagens poéticas. Acabou T.S. Eliot (1888 - 1965) mu­dando-se para a Itália, onde foi Thomas Stearns Eliot nasceu em apanhado pelo fascismo italiano. St. Louis, Mis­sou­ri, numa fa­mília ound promoveu o Imagismo próspera com raízes no nor­deste­ por meio de cartas, ensaios e dos Estados Unidos. Dos principais­ Puma antologia. Numa­ carta a escritores­ americanos de sua ge­ Monroe, em 1915, defen­ ­de uma po­ ração, foi quem recebeu a melhor esia visual, que soe mo­der­na e evite edu­cação: estudou em Harvard “chavões e frases feitas”. Em “A Few College, Sorbonne e Mer­ton College Don’t’s of an Ima­­giste” [Alguns Nãos da Universidade de Oxford. Estudou­ de um Ima­gista] (1913), ele definiu sânscrito e filosofia ori­ental, que “ima­gem” como algo que “apresenta influenciaram sua poe­­sia. Como seu um com­plexo intelectual e emocional amigo Pound, foi cedo para a Ingla­ num único instante”. Sua antologia terra­ e tor­­­nou-se figura de proa no de 1914 de 10 poetas, Des Imagis­tes T.S. Eliot mun­do literário inglês. Um dos mais [Dos Imagistas], oferecia exem­­plos respeitados poetas de sua é­poca,­ da poesia imagista de poetas extra­ sua poesia modernista,­ ico­noclasta, ordinários, inclusive William Carlos aparen­te­mente ilógica ou abstrata Williams, H.D. (Hilda Doo­little) e teve im­pacto revolucionário.­ Também Amy Lowell. es­cre­­veu ensaios e dramas influentes Os interesses e leituras de Pound e defendeu a importância das tra­ eram universais. Suas adap­tações e dições literárias e sociais para o poeta brilhantes, ain­da que às ve­zes im­ moderno. perfeitas, traduções introdu­ ­ziram no­ Como crítico, Eliot é melhor lem­ vas possibilidades lite­ rárias­ de muitas­­­ brado pela sua formulação do “ob- culturas aos escri­tores mo­dernos. Sua jective correlative”, descrito em The obra maior, The Can­tos [Os Cantos], Sacred Wood [O Bosque Sa­grado] ele escre­veu e publicou­­ até a morte. como sendo um meio de expressar Ela possui tre­chos brilhantes, mas Foto, cortesia Acme Photos emoções por inter­médio de “um conjunto de objetos, uma situação, 65 uma série de even­tos” que seriam invernal, a “fórmula” daquela e­mo­ção em Uma multidão fluiu por cima da Ponte particular. Poemas como “The Love de Londres, tantos Song of J. Alfred Pru­frock” [A Canção Não pensei que a morte tivesse levado de Amor de J. Alfred Prufrock] (1915) tantos... (I, 60-63) incorpo­ram essa­ abordagem, como quando o velho­ e infrutífero Prufrock The Waste Land é, em última ins­ pensa consigo mesmo que tinha “me­ tância, apocalíptico e universal: dido sua vida­ com colheres de café”, usan­ do­ colheres de café para refletir Rachaduras e reformas e explosões no uma existência banal e perdida. ar violeta O famoso início de “Prufrock”, de Torres que caem Eliot, convida o leitor a entrar por Jerusalém, Atenas, Alexandria ruelas vistosas, que, como a vi­da Viena Londres moderna, não têm respostas para­ as Irreal (V, 373-377) perguntas que a vida faz: utros poemas principais de Eliot Vamos então, eu e você, incluem “Gerontion” (1920), Quando o entardecer se espalha contra Oque usa um homem idoso para o céu simbolizar a decrepitude da sociedade Como um paciente anestesiado sobre ocidental; “The Hollow Men” [Os uma mesa; Homens Ocos] (1925), tocante réquiem Vamos, passando por certas ruas pela morte do espírito da humanida­ semidesertas, de contem­porânea; Ash-Wednesday Recônditos murmurantes [Quar­ta-Feira de Cinzas] (1930), em De noites agitadas em hotéis baratos de que se volta explicitamente para a alta rotatividade Igreja Anglicana­ em busca de sentido E restaurantes de serragem com con­ para a vida humana; e Four Quartets chas de ostras: [Quatro Quartetos] (1943), meditação­ Ruas que se prolongam como uma experimental complexa e alta­mente discussão tediosa subjetiva sobre temas trans­cendentes De intenção insidiosa como o tempo, a natu­­ ­reza do ser e Para levá-lo a uma pergunta avassaladora a consciência espiritual.­ Sua poesia, Robert Frost Oh!, não pergunte “O que é?” especialmente seu trabalho mais auda­ Vamos e façamos nossa visita. cioso dos primeiros anos, influenciou várias gerações. The Waste Land (1922) está impregna­ Robert Frost (1874 - 1963) da de imagens semelhantes.­ O autor, Robert Lee Frost nasceu na Cali­­fórnia, ao evocar as ruas congestionadas­ de mas foi criado numa fazenda­ no nordeste Londres na época da I Guerra Mundial, dos Estados Unidos­ até os dez anos de ecoa o Inferno de Dante : idade. Como Eliot e Pound, foi para a Inglaterra, atraído pelos novos movi­ Cidade Irreal, mentos póeticos que estavam surgindo Foto © Kosti Ruohamaa, Sob a neblina marrom de um amanhecer Black Star naquele­ país. Declamador carismático,­

66 era famoso por suas turnês. Na posse A floresta está linda, escura e profunda, do Presidente John F. Kennedy, em 1961, Mas tenho promessas a cumprir, recitou um trabalho original, que ajudou E muitas milhas a percorrer antes de a despertar­ um interesse nacional pela poder dormir, poesia. Sua popularidade é facilmente­ E muitas milhas a percorrer antes de explicável: ele escreveu sobre a vida poder dormir. tradicional no campo, apelando para a nostalgia dos velhos­ tempos. Seus temas Wallace Stevens (1879 - 1955) são universais­ — colheitas de maçãs, mu­ Nascido no Estado da Pensilvânia,­ ros de pedra, cercas, estradas no campo. Wallace Stevens estudou em Har­­vard Sua abordagem era lúcida e acessível: College e na Faculdade de Direito­ da raramente em­pre­gava alusões pedan­tes Universidade de Nova York, cidade em ou elipses. Seu uso freqüente da rima que exerceu a advocacia­ de 1904 a 1916, também­ agradava ao grande público. quando fervilhava­ de atividade artística Muitas vezes, a obra de Frost é e poética. Ao mudar-se, em 1916, para enganosamente simples. Numerosos­ Hartford, em Connecticut, para tornar­ poemas sugerem um significado­ mais -se executivo numa com­panhia de profundo. Por exemplo, graças a uma seguros, continuou escrevendo poesia. estrutura de rimas quase hipnótica, Sua vida é notável­ por sua comparti­­ uma noite tranqüila,­ com a neve caindo mentaliza­ção: seus asso­ciados na com­ lá fora, pode sugerir a aproximação não panhia de seguros nem sabiam que totalmente indesejável da morte. Como ele era um poeta importante. Em sua em “Stopping By Woods on a Snowy privacidade,­ continuou a desenvolver Evening” [Parando no Bosque­ Numa idéias extre­ ­mamente complexas sobre Noite de Neve] (1923): or­dem estética em livros com títulos muito signifi­ ­cativos, como Harmo­nium Creio saber de quem são estes bosques. (edição­ ampliada, 1931), Ideas of Order Contudo, ele mora na aldeia; [Idéias de Ordem] (1935) e Parts of a Não me verá parando por aqui World [Partes de um Mundo] (1942). Para ver sua floresta cobrir-se de neve. Alguns dos poemas mais conhecidos são “Sunday Morning” [Manhã de Meu pequeno cavalo deve achar Domingo], “Peter Quince at the Clavier” estranho [Peter Quince ao Te­cla­do], “The Fazer uma parada longe de qualquer Wallace Stevens Emperor of Ice-Cream” [O Imperador fazenda do Sorvete], “Thirteen Ways of Looking Entre a floresta e o lago gelado at a Blackbird” [Treze Modos de se Na noite mais escura do ano. Olhar um Melro]­ e “The Idea of Order at Key West” [A Idéia de Ordem em Key Ele sacode seu arreio, fazendo soar West]. os guizos A poesia de Stevens trata de temas Perguntando se não há qualquer engano. da imaginação,­ necessidade de forma O único outro som é o varrer estética e crença­ de que a ordem da Do vento suave e do floco de neve arte corresponde à or­dem na natureza. Foto © The Bettmann Archive Seu vocabulário é rico e variado:­ pinta

67 cenas tropicais luxuriantes, mas também cria dísticos Mais tarde, passou a defender o uso da linguagem enxutos, humorísticos e irônicos. coloquial; seu ouvido­ para os ritmos naturais do Alguns de seus poemas se inspiram na cultura­ inglês americano­ ajudou a libertar nossa poesia da po­pular, enquanto outros zombam da socie­ ­dade métrica iâmbica, que dominara os versos ingleses sofisticada ou nos elevam a um paraíso intelectual. desde a Renascença. Sua simpatia pelos trabalhado­ Ele é conhecido por seu exuberante jogo de pa­ res comuns, pelas crianças e eventos corriqueiros­ da lavras: “Logo, como ao som de tamborins­ / Veio vida urbana moderna tornam sua poesia atraente e sua criada Byzantines”. acessível. “The Red Wheelbarrow” [O Carrinho de A obra de Stevens é plena de percepções sur­ Mão Vermelho] (1923), como uma natureza morta preendentes. Às vezes, ele prega peças no leitor, co­ holandesa, encontra interesse e beleza nos objetos mo em “Disillusionment of Ten O’Clock” [Desilusão do dia a dia: das Dez Horas] (1931): Tanto depende As casas são assombradas de Por camisolas brancas. Nenhuma delas é verde, um carrinho de mão Ou roxa com círculos verdes vermelho Ou verde com círculos amarelos, Ou amarela com círculos azuis. brilhando com água Nenhuma delas é estranha, da chuva Com meias de renda E cinturas bordadas com contas. ao lado das galinhas As pessoas não vão brancas. Sonhar com babuínos e pervincas. Apenas, aqui e ali, um velho marujo, Williams cultivou uma poesia natural e descontra­ Bêbado e dormindo em suas botas, ída. Em suas mãos, o poema não era suposto tornar­ Pega tigres -se um objeto de arte perfeito, como em Stevens, Em tempo vermelho. nem tampouco a cuidadosa recriação do incidente de Wordsworth, como em Frost. Em vez disso, o sse poema parece queixar-se de vidas en­ poema devia captar um momento no tempo, como fadonhas (camisolas brancas e lisas), mas uma foto instantânea­ — conceito que absorveu dos Eestá, de fato, evocando na men­te do leitor fotó­­gra­fos e artistas que conhecera em galerias como­ imagens bem vívidas. No fim, um marujo­ bêbado, a de Stieglitz, em Nova York. Como­­ fotografias, seus ignorando todas as convenções, “pega tigres” — poemas muitas vezes insinuam possibilidades­ ou pelo menos em sonho. O poe­ma mostra que a atrações secretas, como em “The Young Housewife” imaginação humana — do leitor ou do marujo — [A Jovem Dona de Casa]­ (1917): sempre encontrará uma saída criativa. Às dez da manhã a jovem dona de William Carlos Williams (1883 - 1963) casa circula de negligé por trás das William Carlos Williams foi pediatra por toda a paredes de madeira da casa d e vida; fez o parto de mais de 2.000 bebês e escrevia­­­ seu marido. poemas nos blocos de receita. Williams foi colega Passo solitário em meu carro. dos poetas Ezra Pound e Hilda Doolittle e seus pri­ meiros poemas revelam a influência­ do Imagismo. Então novamente ela vem até o meio-fio

68 para chamar o sorveteiro, o peixeiro, e fica - final da primavera, tímida, sem espartilho, ajeitando uma tarde de domingo! fios soltos de seus cabelos, e eu a comparo - e vai pela trilha até os rochedos A uma folha caída. (contando: a prova)

As rodas silenciosas de meu carro ele mesmo entre outros correm com um som crepitante sobre - pisa ali as mesmas pedras folhas secas enquanto a cumprimento e em que seus pés escorregam passo sorrindo. quando sobem, acompanhados por seus cães! Ele chamou sua obra de “obje­ tivista”, para sugerir a importância rindo, gritando uns pelos outros - de objetos visuais concretos. Seus tra­balhos freqüentemente capta­ ­vam Esperem por mim! o padrão emotivo e espontâneo­ da (II, i, 14 -23) experiência e influenciaram os textos “Beat” do início dos anos 50. ENTRE AS GUERRAS Como Eliot e Pound, Williams Robinson Jeffers (1887 - 1962) também tentou o gênero épico, mas, o período entre as duas guerras enquanto seus épicos empregam­ alu­ surgiram diversos poetas ameri­ sões literárias dirigidas apenas­ a um Ncanos de estatu­ ra­ e verdadeira grupo reduzido de leitores­ muito cultos, visão; entre eles, poe­tas da Costa Williams escre­ve para um público mais Oeste, mulheres e afro-americanos. amplo. Em­bora tenha estudado no Como o romancis­ ­ta John Steinbeck, exterior, escolheu viver nos Estados Robinson Jeffers viveu na Califórnia Unidos. Seu épico, Paterson (cinco e escreveu­ sobre os rancheiros espa­ vols., 1946-58), celebra sua cidade nhóis, os índios e suas tradições natal de Paterson, New Jersey, como­ mistas­ e a obsessiva beleza da terra.­ vista pelo autobiográfico “Dr. Paterson”. Rovinson Jeffers Treinado nos clássicos e bom conhe­ Nele, Williams jus­­tapõe passagens cedor de Freud, ele recriou temas da líricas, prosa, cartas, autobiografia, tragédia grega, tendo como cenário relatos jornalís­ ticos­ e fatos históricos. aquele litoral acidentado.­ Ele é me­ A disposi­ção grá­fica do livro, com lhor conhecido por suas narrativas amplos espaços em branco, sugere o trágicas, como Tamar (1924), Roan tema do caminho­ aberto da literatura Stallion [O Garanhão Ruão](1925), americana­ e dá um sentido de novos The Tower Beyond Tragedy [A Torre horizontes até mesmo para as pessoas­ Além da Tragédia](1924) — recriação mais pobres, que fazem piquenique­ de Agamemnon, de Ésquilo — e Me­ no parque aos domingos. Como a per­ dea (1946), recriação da tragédia de sona de Whitman, em Leaves of Grass Eurípedes. [Folhas de Relva], Dr. Paterson tem Foto © UPI/The Bettmann trânsito livre entre os trabalhadores: Archive Edward Estlin Cummings

69 (1894 - 1962) estilo exuberante, superaquecido, con­ Edward Estlin Cummings, mais segue melhores resultados em poemas conhecido como e. e. cummings, curtos, como “Voyages” [Viagens] criou versos inovadores e atraentes,­ (1923, 1926) e “At Melville’s Tomb” notabilizados pelo humor, gra­ça, [No Túmulo de Melville] (1926), cujo celebração do amor e do erotis­mo fi­m serviria como epitáfio digno do e experimentação com a pontua­ ­ção próprio Crane: e o formato visual da página. Pintor, foi o primeiro poeta ameri­cano a monodia não irá despertar o marujo. reconhecer que a poesia se havia Esta fabulosa sombra apenas o mar tornado uma arte mais visual que oral. guarda. Seus poemas usaram espa­ ­çamentos e tabulações insólitos, bem como Marianne Moore (1887 - 1972) eliminaram maiúsculas. Marianne Moore certa vez escre­ ummings, como Williams, veu que poemas eram “jardins imagi­ também usou linguagem co­ nários com sapos de verdade”.­ Seus Cloquial, imagens nítidas e poemas têm tom de con­versa, mas palavras da cultura popular. Ainda usam uma versificação­ silábica apura­ como Williams, tomou muitas liber­­ da e sutil, baseando-se em descrições dades com a apresentação gráfi­ca. extremamente minuciosas e em fatos Seu poema “in Just -” [Justo em -] históricos e científicos. Uma “poeta (1920) convida o leitor a preencher de poe­tas”, ela influenciou poetas as idéias que faltam: posteriores­ como sua jovem amiga Eliza­beth Bishop. Justo em – Primavera quando o mundo é lama- Langston Hughes delicioso o pequeno (1902 - 1967) homem do balão manco Um dos vários poetas de talento assobia longe e baixinho surgidos na Renascença do Har­lem, e eddieebill vêm na década de 20 — na com­panhia correndo das bolinhas de gude e de James Weldon Johnson, Claude piratarias e é McKay, Countee Cullen e outros — foi primavera.... Langston Hughes. Ele abraçou ritmos Langston Hughes do jazz afro-americano e foi um dos Hart Crane (1899 - 1932) pri­meiros escritores negros a tentar­ Hart Crane foi um jovem poeta transfor­ mar­­ sua arte em uma carreira­ atormentado, que cometeu suicídio ren­­tável. Hughes incor­ porou­ em suas aos 33 anos, lançando-se ao mar. poesias os blues, os spirituals, a lin­ Deixou poemas admiráveis, incluin­ ­do guagem coloquial­ e o folclore.­ um épico, The Bridge [A Ponte]­ (1930), Influente organizador cultural, inspirado na Ponte de Brooklyn, em Hughes publicou numerosas anto­ que ele ambicionou abarcar toda logias de negros e criou grupos teatrais­ a experiência cultural americana e negros em Los Angeles, Chicago­ e Nova recolocá-la em termos afirmativos. Seu Foto, cortesia Knopf, Inc. York. Também­ escre­veu um jornalismo

70 eficiente, criando­ a personagem Jesse mbora a prosa americana entre B.Semple (‘sim­ples’), para expressar as guerras tenha experimentado comen­tários sociais. Um de seus Ecom pontos de vista e formas, poemas mais queridos, “The Negro os americanos es­creveram com Speaks of Ri­vers” [O Negro Fala de maior realismo, de uma maneira Rios] (1921,1925), abraça sua herança­ geral, que os europeus.­ O romancista africana­ — e universal — num grande Ernest He­ming­­way escreveu sobre catálogo épico. O poema sugere que, a guerra, caça e outras atividades como os grandes rios do mundo, masculinas num estilo despojado a cultura­ africana irá permanecer e e simples; William Faulkner situou aprofundar-se: seus po­derosos romances sulistas, abran­gendo gerações e culturas, no Conheci rios: calor e poeira do Mississipi e Sinclair Conheci rios antigos como o Lewis delineou a vida burguesa com mundo e mais velhos que o clareza irônica. fluir do sangue humano A importância de se enfrentar em veias humanas. a realidade tornou-se tema domi­ nante nas décadas de 1920 e 1930: Minh’alma se tornou profunda Escritores como F. Scott Fitzgerald como os rios. e o dramaturgo Eugene O’Neill des­ Banhei-me no Eufrates quando creveram repetidamente a tragédia as auroras eram jovens. que aguardava aqueles que viviam Construí minha cabana perto do Congo em sonhos frágeis. e ele me ninou até eu dormir. Olhei para o Nilo e F. Scott Fitzgerald ergui as pirâmides acima dele. (1896 - 1940) Ouvi o canto do A vida de Francis Scott Key Mississipi quando Abe Lincoln Fitzgerald parece um conto de fadas.­ desceu até New Orleans, Durante a I Guerra Mundial, Fitzgerald e vi seu enlameado alistou-se no exército, e apaixonou-se seio ficar dourado ao por Zelda Sayre, moça­ rica e bonita, cair do sol que morava per­­to de Montgomery, no Alabama, onde ele servia. Zelda F. Scott Fitzgerald Conheci rios rompeu o noivado porque ele era Antigos, crepusculares rios. relativamente­ pobre. Depois de ser desmobilizado,­ no fim da guerra, ele Minh’alma se tornou profunda foi para Nova York, tentar fazer fortuna como os rios. literária e poder casar com a moça. Seu primeiro romance, This Side of Paradise [Este Lado do Pa­raíso] ESCRITA EM PROSA, 1914 - (1920), tornou-se um best-seller e, aos 1945: REALISMO AMERICANO 24 anos, se casaram. Nenhum dos dois foi capaz de suportar­ as pressões Foto, cortesia Culver Pictures, Inc. do sucesso e da fama e dilapidaram seus recursos. Em 1924, mudaram-se 71 para a Fran­­ça, para tentar economizar. magistralmente uma longa passagem Voltaram sete anos depois. Zelda de tempo: “Havia música da casa do tornou-se mentalmente instável e teve meu vizinho ao longo das noites de de ser internada. O próprio Fitzgerald verão. Em seus jar­dins azuis, homens tornou-se alcoólatra e morreu jo­ e garotas iam e vinham,­ como maripo­ vem trabalhando como roteirista de sas, entre os cochichos,­ a champanhe cinema. e as estrelas.”­ itzgerald detém lugar garantido na literatura americana graças Ernest Hemingway Fsobretudo a seu romance The (1899 - 1961) Great Gatsby [O Gran­de Gatsby] Poucos escritores tiveram vida tão (1925), uma história brilhantemente colorida como Ernest Hemingway,­ escrita e economi­camente estru­ cuja carreira bem poderia ter saído turada, sobre o so­nho americano de um de seus romances de aventura. do homem que enriquece por seus Como Fitzgerald, Dreiser e muitos próprios meios. O protagonista, o outros ótimos romancistas do século misterioso Jay Gatsby, descobre que 20, Hemingway veio do Meio-Oeste sucesso traz um custo devastador dos Estados Unidos. Nascido em em termos de realização pessoal e Illinois, Hemingway passou suas férias amor. Outras ótimas obras incluem de verão em Michigan, em excursões Tender is the Night [Suave é a Noite] de caça e pesca. Foi voluntário, numa (1934), sobre um jovem psiquiatra cuja unidade­ de ambulâncias militares na vida é arruinada por seu casamento­ França, na I Guerra Mundial, mas foi com uma mulher instável, e algumas­ ferido e hospitalizado por seis meses. histórias das coletâneas Flappers Depois da guerra, como correspon­ and Philosophers [Melindro­sas e dente sediado em Paris, conheceu Filósofos] (1920), Tales of the escritores americanos expatriados [Contos da Era do Jazz] (1922), e All como Sherwood Anderson,­ Ezra the Sad Young Men [Todos os Jovens Pound, F. Scott Fitzgerald­ e Gertrude Tristes] (1926). Mais que qualquer au­ Stein. Esta, em especial, influenciou tor, Fitzge­ ­rald captou a vida reluzente seu estilo despojado. e deses­ perada­ dos anos 20. This Side Depois de seu romance The Sun of Paradise [Este Lado do Paraíso] Ernest Hemingway Also Rises [O Sol Também se Le­vanta] foi anunciado como a voz do jovem (1926) trazer-lhe a fama, cobriu a Guerra americano moderno. Seu segundo ro­ Civil Espanhola, a II Guerra Mundial e a mance, The Beautiful and the Damned luta na China nos anos 40. Num safári na [Os Belos e os Condenados]­ (1922), África, ficou gravemente ferido quando continuou explorando­ a extravagância seu pequeno avião caiu; ainda assim auto-destru­ tiva­ de sua época. continuou a apreciar a caça e pesca As qualidades especiais de Fitz­ esportiva, atividades­ que inspiraram gerald incluem um estilo deslum­ alguns de seus me­lhores trabalhos. brante, perfeitamente adequado ao The Old Man and the Sea [O Velho e tema do encanto sedutor. Um trecho­ o Mar] (1952), um curto romance poé­ Foto, cortesia famoso de The Great Gatsby resume Pix Publishing, Inc. tico sobre um pobre e velho pescador

72 que he­roi­camente pesca um peixe deles­ debaixo­ d’água para cada parte enorme que é devorado por tubarões, visí­vel.” deu-lhe o Prêmio Pulitzer em 1953; no O ótimo ouvido para diálo­gos e ano seguinte, recebeu o Prêmio Nobel. descrições precisas de He­ming­way Desencorajado por sua vida familiar aparece em excelentes contos, como­ problemática, doença, e a crença de “The Snows of Kilimanjaro” [As Ne­ves que estivesse perdendo o dom de do Kilimanjaro] e “The Short Happy escrever, Hemingway suicidou-se com Life of Francis Ma­com­­ber” [A Vida um tiro em 1961. Curta e Feliz de Francis­ Macomber].­ A emingway talvez seja o roman­ crítica, de fato,­­ geralmente­ considera­ cista americano mais popular seus con­tos tão bons, ou até melho­ Hdeste século.­ Suas simpatias res que os roman­ ces.­­ Seus princi­ pais­ são basicamente apolíticas e huma­ romances incluem­ The Sun Al­so Rises nistas e, nesse sentido, ele é universal. [O Sol Também se Le­vanta],­­­ sobre a Seu estilo simples torna seus romances vida desalentadora dos expatriados fáceis de entender e geralmente se após­ a I Guerra Mundial;­­ A Farewell passam­ em cenários exóticos. Adepto to Arms [A­deus às Armas], sobre­ o do “culto à experiência”, Hemingway­ trágico ro­mance entre um sol­dado freqüentemente envolvia suas perso­ ameri­cano e uma enfermei­ ­ra inglesa­ nagens em situações perigosas­ para durante a guerra; For Whom the Bell poder revelar sua natu­reza interior; Tolls [Por Quem os Sinos Dobram]­ em suas obras mais tardias, o perigo (1940), passado durante a Guerra Civil às vezes se torna oportunidade para a Espanhola e The Old Man and the Sea afirmação da masculinidade. [O Velho e o Mar]. Como Fitzgerald, Hemingway tornou­ -se porta-voz de sua geração.­ Mas, em William Faulkner (1897-1962) vez de pintar seu fascínio­ fatal, como Nascido numa velha família sulista,­ fez Fitzgerald,­ que nunca lutou na I William Harrison Faulkner foi criado Guerra Mundial,­ Hemingway escreveu em Oxford, Mississipi, onde passou sobre a guerra,­ a morte e a “geração a maior parte de sua vida. Criou todo perdi­da” de sobreviventes cínicos. Suas um cenário imaginativo,­ o Condado de personagens­ não são sonhadoras,­ mas Yoknapa­tawpha,­ mencionado em vários toureiros, soldados­ e atletas durões.­ Se Robert Forst roman­ces, além de várias famílias com intelectuais,­ são profun­ damente­ marca­ ligações­ entre si há várias gerações. O das e desilu­ didas.­ Condado de Yoknapatawpha, com sua Sua marca é um estilo limpo, livre­­ capital,“Jefferson”, se pare­ ce­ muito com de palavras inúteis. Usa fre­­qüente­­ Oxford, Mississipi­ e seus arredores.­ mente declarações atenuadas. Em A Faulkner recria­ a história da terra e das Farewell to Arms [Adeus às Armas] várias raças­ — indígena,­ afro-americana, (1929), a heroí­na morre no parto euro-ame­ricana e várias misturas — que dizendo “Não estou­ nem um pouco já viveram nela. Escritor ino­vador, com medo. Tu­do não passa de um Faulkner experimentou brilhantemente truque sujo”. Uma vez, com­­­pa­rou su­ com a cronologia narrativa, diferentes Foto © UPI/The Bettmann as o­bras a icebergs: “Há sete oitavos Archive pontos de vista­ e vozes (incluindo as

73 de marginais,­ crianças e analfabetos) e esde a década de1890, uma um estilo barroco rico e exigente,­ cons­ tendência latente de protesto truído com sentenças ex­tre­ma­men­te Dsocial fluiu na literatu­ ra­ ame­ longas e repletas de subor­dinadas ricana, vertendo no natu­ralismo­ de complicadas. Stephen Crane e Theodore­ Dreiser e Os melhores romances de Faulkner­ nas mensagens claras­ dos romancistas incluem The Sound and the Fury [O muck­racking. Os autores socialmente Som e a Fúria] (1929) e As I Lay Dying enga­ ­jados que vieram depois incluem [Deitado Morren­ ­do] (1930), duas obras Sinclair Lewis, John Steinbeck,­ John moder­nis­tas experimentando com Dos Passos, Richard Wright e o drama­ pontos de vista e vozes para perscrutar turgo Clifford Odets. Estavam ligados­ famílias­ sulistas sob a tensão de perder aos anos 30 em sua preocupação­ com um membro da família; Light in August o bem-estar do cidadão comum e enfo­ [Luz em Agosto] (1932), sobre rela­ que em grupos de pessoas­ — as profis­ ções complexas e violentas­ entre uma sões, como nos arquétipos Arrowsmith mulher branca e um homem­ negro e (um médico)­ e Babbitt (um empresário Absalom, Absa­lom! (1936), talvez seu local) de Sinclair Lewis; famílias, como melhor trabalho, sobre a ascenção em The Gra­pes of Wrath [As Vinhas da de um fazendeiro pelos­ seus próprios Ira] de Steinbeck; ou massas urbanas, méritos e sua trágica decadência pelo como consegue John Dos Passos, por precon­ceito racial e inca­ pa­ cidade­ de seus onze principais personagens­ em amar. sua trilogia U.S.A. A maioria desses romances usa per­ sonagens diferentes para contar­ partes Sinclair Lewis (1885 - 1951) da história e demons­ trar­ que o signifi­ Harry Sinclair Lewis nasceu em Sauk cado reside tanto na forma de contar,­ Centre, Minnesota, e formou-se pela como no pró­prio ob­jeto. O uso de Universidade de Yale. Interrompeu­ seus diversos pontos­ de vista torna Faulkner estudos­ para trabalhar­ numa comu­ mais auto-referencial ou “reflexivo” que nidade socialista, Helicon Home Colony, He­mingway­ ou Fitzgerald; cada roman­­ financiada pelo romancista­ muckraking ce reflete sobre si mesmo, enquanto­ Upton­ Sinclair. Main Street [Rua Prin­ desdobra uma história de interesse­ Sinclair Lewis cipal] (1920) de Lewis satirizou­ a vida­ universal. Os temas de Faulkner­ são as monótona e hipócrita da cidadezinha tradições do Sul, família, comunidade, de Gopher Prairie, Minnesota. Sua apre­ a terra, história­ e o passado, raça e as sentação incisi­ va­ da vida americana­ e paixões­ da ambição e do amor. Tam­ a crítica ao materialismo,­ mentalidade­ bém criou­ três romances centrados­ na tacanha e hipo­crisia do americano as­censão de uma família degenerada, o rendeu-lhe reconheci­ ­mento nacional­ e clã dos Snopes: The Hamlet [A Aldeia] interna­ ­cio­nal. Em 1926, ofereceram­ -lhe, (1940), The Town [A Cida­ de]­ (1957) e mas ele declinou, o Prêmio­ Pulitzer The Mansion [A Mansão]­ (1959). por Arrowsmith (1925), romance des­ crevendo os esfor­ços de um médico­ ROMANCES DE para manter­ sua ética médica em meio Foto, cortesia CONSCIÊNCIA SOCIAL Pix Publishing, Inc. à ganân­ cia­­ e corrupção.­ Em 1930, tor­

74 nou-se o primeiro­ americano a ganhar­ [noticiário cinematográfico] tirados­ o Prêmio­ Nobel de Literatura.­ de manchetes contemporâ­neas, can­ s principais romances de Lewis ções populares e anúncios,­ além de incluem Babbitt (1922). George “biografias” resumindo­ a vida de ame­ OBabbitt é um empresário co­ ricanos importantes­ na época, como o mum que vive e trabalha em Zenith, inventor Thomas Edison, o organizador­ uma cidade americana comum. Babbitt sindical­ Eugene Debs, o astro de cine­ é em­preendedor, de princípios­ morais, ma Rodolfo Valen­tino, o financista que crê nos negócios como a nova J.P. Morgan e o sociólogo Thorstein abordagem científica­ para a vida­ mo­ Veblen. Os newsreels e as biografias­ derna. Tornando-se inquie­to, busca dão aos seus romances um valor de rea­lização mas é desilu­ dido­ por um documentário; uma ter­ceira­ técnica, o caso com uma mulher­ boêmia,­ volta “olho da câmera”, consis­ te­ de poemas para a esposa e aceita seu destino.­ O em prosa de fluxo­ de consciência que romance adicionou­ uma nova palavra oferecem uma resposta subjetiva aos ao vocabu­ ­­lário americano – “Babbittry”, eventos descritos nos livros. sig­ni­fi­cando mentalidade tacanha, com­ placência­­ e modos burgueses. El­mer John Steibeck (1902 - 1968) Gantry (1927) expõe a religião avivada Como Sinclair Lewis, John Steinbeck nos Estados­ Unidos, enquanto­ Cass é hoje mais admirado pela crítica Timber­la­ne (1945) estuda as tensões que fora dos Estados Unidos, em grande crescem no casamento entre um juiz já medida, porque re­cebeu­ o Prêmio maduro e sua jovem esposa.­ Nobel de Literatura em 1963 e a fama interna­cional que o mesmo confere. John Dos Passos (1896 - 1970) Em ambos os casos, o Comitê Nobel Como Lewis, John Dos Passos es­colheu americanos liberais conhe­ começou como radical de esquer­da, cidos por sua crítica social. mas, com a idade, mo­veu-se para a Steinbeck, califórniano, situou muitas direita. Dos Passos escreveu realistica­ de suas histórias no Vale de Salinas, mente, alinhado à doutrina­ do realis­ perto de São Francisco. Seu romance mo socia­ lista.­ Seus melhores­ trabalhos mais conhecido é The Grapes of Wrath John Steinbeck atingem­­ um objeti­ vismo­ científico e o [As Vinhas da Ira] (1939), ganhador do efeito de um quase documen­tário. Dos Prêmio Pulitzer,­ que acompanha a labu­ Passos desen­­ volveu­ uma técnica expe­ ta de uma família pobre de Oklahoma rimental de colagem para sua obra-pri­ que perde suas terras na Depressão­ e vai ma, U.S.A., formada por 42nd Parallel para a Califórnia em busca de trabalho. [Paralelo­ 42] (1930), 1919 (1932), e A família­ é submetida a condições de The Big Money [O Dinheiro­ Grande]­ opressão feudais pelos ricos donos (1936). A lon­ga coletâ­nea cobre a de terras. Outras histórias passadas­ na história social dos Estados Unidos de Califórnia incluem Tortilla Flat (1935), Of 1900 a 1930 e expõe a corrupção­ moral Mice and Men [Sobre­ Ratos e Homens] da sociedade americana­­ materialista­ (1937), Cannery Row (1945) e East of pelas vidas de suas personagens.­ Eden [A Leste do Éden] (1952). Foto, cortesia As novas técnicas de Dos Passos Pinney & Beecher Steinbeck une realismo a um ro­ incluíam segmentos de “newsreel” mantismo primitivo que acha virtude 75 em pobres agricultores próximos à terra. afro-americanos, que rejeitavam os Sua ficção demonstra a vulnerabilidade Estados Unidos, em favor do movi­ dessas pessoas, que podem ser expul­ ­­­ mento de Marcus Garvey, chamado sas pela seca e as primeiras a sofrer “Back to Africa” [De Volta para a Áfri­­ em épocas de instabilidade política e ca]. Jean Toomer fica entre essas duas depressão econômica. posições divergentes.

A RENASCENÇA DE Jean Toomer (1894 - 1967) urante a exuberante década Como Cullen, o poeta e escritor de de 1920, o Harlem, a co­mu­ ficção afro-americano Jean Toomer Dnidade negra ao nor­te da vislumbrava uma identidade­ americana cidade de Nova York, brilhava com que transcenderia­ a raça. Talvez por is­ entusiasmo e criatividade. Os sons so, tenha empregado com brilhantismo de seu jazz negro americano varre­ tradições­ poéticas de rima e métrica ram os Estados Unidos e mú­sicos­­ e não tenha buscado novas formas e compositores de jazz, como Duke “negras” de poesia. Sua principal Ellington, tornaram-se as­tros dentro obra, Cane [Cana] (1923), é, contudo,­ e fora dos Estados Uni­dos. Bessie ambiciosa e inovadora. Como Paterson, Smith e outras cantoras do blues apre­ de Williams, Cane incorpora­ versos, sentavam letras francas, sensuais e vinhetas em prosa, histórias e notas au­ tortuosas, transbor­dando de emoção. tobiográficas. Nela, um afro-americano Os spirituals dos negros passaram a luta para descobrir sua identidade ser apreciados­ como música religiosa dentro e além das comunidades negras de excepcional beleza. Ethel Waters, da Georgia rural, de Washington D.C., a atriz negra, venceu no palco, e de Chicago, Illinois e também como a dança e a arte negra america­na professor negro no sul. Em Cane, os floresceram com música e drama. negros da Georgia rural são vistos por Em meio à rica variedade de ta­ Toomer como naturalmente­ artísticos: lentos do Harlem coexistiam diver­ sas­ visões. O romance de Carl Van Vechten Suas vozes se elevam.... os pinheiros de 1926, simpático ao Harlem, dá uma são violões, idéia da vida com­plexa e sofrida da Dedilhando, folhas de pinheiro caem América Negra face à desigualdade como lençóis de chuva... Jean Toomer econômica­ e social. Suas vozes se elevam.... o coro O poeta Countee Cullen (1903 - da cana 1946), nascido no Harlem e casado Canta as vésperas para as estrelas.... por pouco tempo com a filha de W.E.B (I, 21-24) Du Bois, criou poesias rimadas­ de alta qualidade, dentro das formas então Cane contrasta o ritmo acelerado­ aceitas, que foram muito elogiadas por da vida dos afro-americanos na cida­ brancos. Ele acreditava que um poeta de de Wa­shington, D.C.: não deveria permitir que a raça ditasse o tema ou o estilo de seus versos. O dinheiro queima o bolso, bolso dói, Foto © UPI/The Bettmann No outro lado do espectro estavam Archive Contrabandistas em camisas de seda,

76 Imensos Cadilacs vibrando, sina, o romance de Wright foi uma Passando zunindo pelos trilhos expressão,­ de há muito devida, da do bonde. (II, 1-4) desi­gualdade racial que tem sido objeto de tanta polêmica nos Estados Richard Wright (1908 - 1960) Unidos. Richard Wright nasceu numa fa­ mília pobre de meeiros do Mississipi Zora Neale Hurston que o pai abandonou quando ele (1903 - 1960) tinha 5 anos. Wright foi o primeiro Nascida em Eatonville, pequena romancista afro-americano a alcançar ci­da­de da Flórida, Zora Neale Hurs­­ton o grande público, embora só tenha é conhecida como uma das luzes da freqüentado­ a escola até a nona Renascença do Harlem.­ Aos 16 anos, série. Sua infância difícil é descrita veio pela primei­ra vez à cidade de em um de seus melhores livros, o Nova York, como mem­bro de uma autobio­gráfico Black Boy [Menino troupe teatral itineran­ ­te. Contadora de Negro] (1945). Ele disse mais tarde histórias excepcionalmente talentosa, que sua sentido de privação, devido que cativava seus ouvintes, freqüentou ao racismo, era tão grande, que ape­ o Barnard College, onde estudou com nas a leitura o manteve vivo. o antropólogo Franz Boaz e passou­­ Wright foi fortemente inspirado a compreender a etnicidade a partir pela crítica social e pelo realismo de uma perspectiva científica.­ Boaz de Sherwood Anderson, Theodore incentivou-a a recolher­ o folclore de Dreiser e sobretudo de Sinclair Lewis. sua Flórida nativa. O eminente folclo­ Durante a década de 30, afiliou-se ao rista Alan Lomax descreveu Mules and partido comunista. Nos anos 40, foi Men [Mulas­­ e Homens] (1935) como viver na França, onde já conhecia “o livro mais cativante, genuíno e bem Gertrude Stein e Jean-Paul Sartre, e lá escri­ to­ no campo do folclore”. tor­nou-se anti-comunista. Seus textos Hurston também passou algum muito francos abriram caminho para tempo no Haiti estudando vodu e re­ os romancistas afro-ameri­canos que Richard Wright colhendo o folclore do Caribe, que re­ vieram depois. sultou em Tell My Horse [Di­­­ga ao Meu Sua obra inclui Uncle Tom’s Cavalo] (1938). Seu domínio natural Children [Os Filhos do Pai Tomás] do inglês coloquial a insere­ na grande (1938), um livro de contos, e o pode­ tradição de Mark Twain. Seus textos ro­so e inexorável romance Native Son brilham com uma linguagem colorida [Filho Nativo] (1940), em que Bigger e histó­ ­rias cômicas – ou trágicas – da Thomas, jovem negro sem instrução, tradição oral afro-americana. mata sem querer a filha de seu patrão Hurston era uma romancista im­ bran­co, queima de forma horrível o pressionante. Sua obra mais im­portante, corpo, e finalmente mata sua namo­­ Their Eyes Were Watching God [Seus rada negra — receioso de que ela o Olhos Observavam a Deus] (1937), traia. Embora alguns afro-americanos é um relato tocante e inovador do tenham criticado Wright por retratar amadu­recimento e da redescoberta Foto, cortesia uma personagem­ negra que é assas­ Howard University

77 da felicidade de uma linda mulata ao associados. longo de três casamentos. O romance Esses três principais escritores da evoca vivi­damente­ a vida dos afro- escola dos Fugitivos eram tam­bém americanos­ que trabalham a terra no associados ao New Criticism [Nova sul rural. Precursora do movimento Crítica], que buscava a compreensão­ feminista, Hurston inspirou e influenciou­ da literatura com base em lei­turas escritoras contemporâneas,­ como Toni meticulosas e atenção aos padrões­ for­ Morrison e Alice Walker, graças a livros mais (de imagens, metáforas,­ métrica, como sua autobiografia,Dust Tracks on sons e símbolos) e seus significados a Road [Trilhas de Poeira numa Estra­ ­da] sugeridos. Ransom, principal teórico (1942) da renascença­ sulista entre as duas guer­ras, publicou um livro, The New CORRENTES LITERÁRIAS: Criticism [A Nova Crítica] (1941), OS FUGITIVOS sobre esse método, que oferecia uma E A NOVA CRÍTICA alternativa aos métodos ante­riores esde a Guerra Civil, o sul extra-literários, baseados na história e dos Estados Unidos havia na biografia. A Nova Crítica tornou-se Dpermanecido atrasado po­lí­ a abordagem crí­tica dominante na tica e economicamente, dominado América entre os anos 40 e 50 porque pelo racismo e pela superstição, mas, pro­vou ser adequada à análise de escri­­ ao mesmo tempo, abençoado por tores modernistas, como Eliot, e capaz um folclore rico e um forte sentido de absorver a teoria freudiana­ (espe­ de orgulho e tradição. Tinha­ a fama cialmente suas cate­ go­ rias­ estruturais imerecida de ser um deserto cultural como id, ego e superego) e abordagens de provincianismo e ignorância. inspiradas em padrões míticos. É irônico que o movimento lite­rário regional mais significativo no século DRAMA AMERICANO 20 tenha sido o dos Fugitivos­ — lidera­ NO SÉCULO 20 dos pelo poeta, crítico­ e teórico John dramaturgia americana conti­ Crowe Ransom, o poeta Allen Tate e nuou imitando o teatro inglês o romancista, poeta e ensaísta Robert Aeuropeu, durante boa parte do Penn Warren. Essa escola literária século­ 20. Freqüentemente, as peças do Sul rejei­ tava­ os valores urbanos e Zora Neale Hurston da Inglaterra ou traduzidas de línguas­ comer­ciais “do Norte”, que sentiam européias dominavam as tem­poradas que havia dominado toda a América. teatrais. Uma legislação inadequada­ Os Fugitivos clamavam pela volta à de direitos autorais, que não protegia ter­ra e às tradições americanas que nem promovia os autores americanos, podiam ser encontradas no Sul. O prejudicou a dramaturgia autêntica. movimento tomou seu nome de Assim o fez o “star system” [sistema de uma revista literária, The Fugitive [O estrelato],­ em que os atores e atrizes, e Fugitivo], que circulou entre 1922 e não as peças propriamente ditas, eram 1925 na Universidade de Vanderbilt aclamados. Os americanos acorriam­ em Nashville, Tennessee, e com a para ver artistas europeus­ em turnês Foto © Carl Van Vechten, qual Ransom, Tate e Warren­ estavam cortesia Yale University pelos Estados Unidos.­ Além disso, as

78 peças importadas,­ como o vinho im­ de um rico empresário e Stran­ge portado, desfru­ tavam­ de mais prestígio Interlude [Estranho Interlúdio] (1928), que as produções domésticas. ganhador do Prêmio Pulitzer, narra Durante o século 19, foram po­ os amores­ emaranhados de uma mu­ pulares os melodramas com figuras­ lher. Essas peças­ poderosas­ revelam democráticas exemplares e claros­ con­ diferentes personalidades re­vertendo trastes entre o bem e o mal. Peças sobre para emoções primitivas ou confusão­ problemas sociais, como­ a escravidão, sob intensa pressão. também atraíam­ grandes platéias. Às O’Neill continuou a explorar as ten­ vezes, essas­ peças eram adaptações sões freudianas­ do amor e do domínio de roman­ces, como Uncle Tom’s dentro de famílias numa trilogia de pe­ Cabin. Não foi senão no século 20 que ças coletivamente intituladas­ Mourning a peças sérias buscaram a inovação Becomes Electra [Electra Fica Bem esté­tica. A cultura popular, contudo, de Luto] (1931), baseada na trilogia apresentava desenvolvimentos vitais,­ clássica­ de Édipo, de Sófocles. Suas especialmen­te no vaudeville (espe­ peças posteriores­ incluem reconheci­ táculo de variedades, com esquetes­ das obras-primas: The Iceman Cometh satíricos, palhaçadas, música,­ etc.). [A Vinda do Homem do Gelo] (1946), Apresentações de menestréis­ baseadas obra severa sobre o tema da morte, e em música e folclore afro-americano Long Day’s Journey Into Night [A Longa — interpretadas por personagens bran­ Viagem para Dentro da Noite] (1956), cas usando maquiagem “blackface” poderosa e extensa autobiografia em (rosto pintado­ de preto) — também forma dramática, que enfoca sua pró­ desen­volveram formas e expressões pria família e sua deterioração­ física e originais.­ psicológica, testemunhada no decorrer de uma noite. Esta última faz parte de Eugene O’Neill (1888 - 1935) um conjunto de peças em que O’Neill Eugene O’Neill é a grande figura estava trabalhando quando morreu. do teatro americano. Suas numerosas­ O’Neill redefiniu o teatro ao aban­ peças reúnem enorme originalidade­ donar as divisões tradicionais de atos técnica, visão inovadora e profun­ e cenas (Strange Inter­lude tem nove didade emocional. Suas pri­meiras atos, e Mourning Becomes Elec­tra peças tratam da classe trabalhadora leva nove horas para ser encenada); Eugene O’Neil e dos pobres; traba­lhos posteriores ao usar máscaras, como as que são exploram áreas subjetivas, como as encontradas no teatro da Ásia e da obsessões­ e o sexo, e destacam suas Grécia antiga; ao introduzir monólo­ leitu­ ras­ de Freud, bem como sua ten­ gos shakespearianos e coros gregos; tativa desesperada se reconciliar com e ao produzir efeitos especiais por sua mãe morta, seu pai e seu irmão. meio de luz e som. Ele é geralmente Sua peça Desire Under the Elms reconhecido co­mo o dramaturgo [Desejo sob os Olmos] (1924) recria mais importante da América.­ Em 1936, as paixões latentes numa família; The recebeu o Prêmio Nobel de Litera­ tura­ Great God Brown [O Grande Deus — o primeiro dramaturgo americano a Brown] (1926) revela a inconsciência Foto © The Bettmann Archive receber tal distinção.

79 Thornton Wilder (1897 - 1975)  Thornton Wilder é conhecido por suas peças Our Town [Nossa Cidade] (1938) e The Skin of Our Teeth [Por Um Triz] (1942) e por seu ro­mance The Bridge of San Luis Rey [A Ponte de San Luis Rey] (1927). Our Town evoca valores americanos positivos.­ Tem todos os elementos do sentimenta­lismo e da nostalgia — o arquétipo da cidadezinha­ rural tradicional, os pais bondosos e crianças­ travessas, os jovens amantes. Ainda assim, elementos inova­ dores, como fantasmas, vozes na platéia e ousados deslocamentos no tempo a mantêm atraente. É, na realidade, uma peça sobre vida e morte, em que os mortos renascem, pelo menos naquele momento.

Clifford Odets (1906 - 1963) Clifford Odets, mestre do drama social, veio de uma família judia emigrada da Europa oriental. Criado em Nova York, foi um dos atores fundadores do Group Theater, diri­gido por Harold Clurman, Lee Stras­berg e Cheryl Crawford, cujo compro­ misso era produ­zir apenas peças de autores ameri­canos. Sua peça mais conhecida é Waiting for Lefty [Esperando por Lefty] (1935), obra experimental de um ato que advoga fervorosamente­ o sindica­ lismo. Seu Awake and Sing! [Acor­de e Cante!], drama familiar nostálgico, tornou-se outro sucesso, seguido de Golden Boy [Menino Dourado], história de um jovem imigrante ita­liano que arruina seu talento musical (ele é violinista) quando, seduzi­ do pelo dinheiro, acei­ta ser boxeador e fere suas mãos. Como The Great Gatsby de Fitzgerald e An American Tra­gedy de Dreiser, a peça alerta para os perigos do excesso de ambição e materialismo.

80 rádio, o cinema e depois a presença­ de uma televi­ são ubíqua e toda­ poderosa mudaram­ radicalmente CAPÍTULO a vida americana. De uma cultura elitizada, privada e instruída, baseada­ no livro e na leitura, os Estados Unidos se tornaram uma cultura de mídia, ligada­ à voz no radio, à música dos CDs e dos cassetes, aos filmes e às imagens da tela da televisão. A poesia americana foi diretamente influen­ POESIA7 AMERICANA ciada pela mídia de massa e tecnologia eletrô­ 1945 - 1999: nica. Filmes, videoteipes e gravações em fita de A ANTI-TRADIÇÃO declamações de poesia e entrevistas com poetasse­ tornaram disponíveis e novos métodos foto­ ­­gráficos ormas e idéias tradicionais não pareciam pro­ de impressão mais accessíveis estimularam jovens ver mais sentido a muitos poetas americanos poetas a publicarem suas próprias­ obras e jovens Fna segunda metade do século 20. Os eventos editores a fundarem revistas­ literárias — das quais após a II Guerra Mundial geraram um sentido de existiam mais de 2.000 em torno de 1990. história descontínua:­ cada ato, emoção e momento Ao mesmo tempo, os americanos se tornaram era visto como único. Estilo e forma agora­ pareciam desconfortavelmente conscientes de que a tecno­ provisórios,­ improvisados, reflexos­ do processo logia, tão útil como ferramenta, poderia ser usada de composição e autoconsciên­ cia­ do escritor. Ca­ para manipular a cultura. Para os ame­ricanos tegorias familiares de expressão­ eram suspeitas;­ a em busca de alternativas,­ a poesia parecia­ mais originalidade tornava-se uma nova tradição. relevante do que nun­­ca: oferecia às pessoas um A quebra com a tradição ganhou impulso modo de expres­ ­sar a vida subjetiva­ e articular o durante o julgamento por obscenidade do poema impacto da tecnologia e da so­cie­dade de massa Howl [Uivo] de Allen Ginsberg, em 1957. Quando sobre o indivíduo. a alfândega de São Francisco apreendeu o livro, Vários estilos, alguns regionais, ou­tros asso­ sua editora, a City Lights, de Laurence Ferlinghetti, cia­dos a escolas ou poetas famosos,­ disputavam­­ moveu uma ação. Durante aquele notório jul­ atenção; a poesia ameri­cana após a II Guerra gamento, críticos famosos defenderam a crítica Mundial era descen­tralizada, ricamen­ ­te variada e social apaixonada de Howl com base em seu impossível de se resumir. Para fins de discussão, mérito literário redentor. O triunfo de Howl sobre porém, pode ser disposta ao longo de um espectro os censores ajudou a empulsionar os poetas Beat pro­duzindo três campos sobrepostos­ — num extre­­ rebeldes – especialmente Ginsberg e seus amigos mo, o tradi­cional; no meio, o idiossincrático­ e; no Jack Kerouac e William Burroughs — para a fama. outro extre­ ­mo, o expe­ ­rimental. Poetas tradicionais­ Não é difícil achar causas históricas para essa têm mantido­­ ou revita­lizado tra­dições poé­ticas. Os sensibilidade desassociada nos Estados Unidos.­ A poe­tas idiossincráticos­ recorrem­ tanto a téc­nicas própria II Guerra Mundial, a elevação do anonimato tradicio­ nais­ quanto inovadoras para produzir vozes e consumismo numa sociedade­ urbana de massa, singulares. Os experi­men­tais buscam no­vos estilos os movimentos de protesto nos anos 60, o conflito culturais. de uma década no Vietnã,­ a Guerra Fria, ameaças ambientais — a coleção de choques sofridos pela TRADICIONALISMO cultura americana­ é extensa e variada. O que mais s escritores tradicionais incluem os reco­ transformou­ a sociedade­ americana, porém,­ foi o nhecidos mestres das formas e da dicção adven­to da mídia e da cultura de massa. Primei­ ro­ o Otradicionais, que escrevem com des­treza 81 facilmente identificável,­ usando, em geral­ ,­ rimas ou no inglês falado é alterada de forma pouco natural. padrão métrico preesta­ be­ lecido.­ Costumam ser da Às vezes­ o efeito é nobre,­ como na linha de Warren; costa­ leste ou do sul do país e lecionam em facul­ em outras, a poesia parece afetada, sem qualquer dades e universidades.­ Richard Eberhart e Richard relação com emoções reais, como na linha de Tate: Wilbur; os poetas Fugitivos­ mais velhos John Crowe “Presunçosamente tocou as orlas dos hierofantes.” Ransom, Allen Tate e Robert Penn Warren; jovens Ocasionalmente, como em Hollander, Howard­ e poetas talentosos como John Hollander e Richard James Merrill (1926-1995), a dicção auto-consciente­ Howard e o iniciante Robert Lowell, são exem­plos. se combina com chiste, trocadi­ lhos­ e alusões literá­ Estão estabelecidos e suas obras são com fre­ rias. Merrill, que é muito inovador­ por seus temas qüência incluídas em antologias. urbanos, versos brancos,­ temas pessoais e tom de O capítulo anterior discutiu o refinamento, o conversa leve, compartilha­ com os tradicionais o respeito pela natu­­ reza­ e os valores profunda­ mente­ hábito do chiste em “The Broken Heart” [Coração conservadores­ dos Fugitivos. Essas qualidades­ en­ Partido] (1966), escrevendo sobre o casamento feitam muitas obras poéticas guiadas pelos moldes como se fosse um coquetel: tradicionais. Os poetas tradicio­ ­na­is são em geral precisos, rea­lis­tas e espirituo­­sos; como Richard Sempre aquela velha história - Wilbur (1921­- ), são mui­tas vezes influenciados Pai Tempo e Mãe Terra, nessas direções por poetas metafísicos ingleses Um casamento com gelo. dos séculos 15 e 16, revalorizados­ por T.S.Eliot. No poema mais famoso de Wilbur, “A World Without fluência óbvia e a pirotecnia verbal de alguns­ Objects Is a Sensible Emptiness” [Um Mundo­ Sem poetas, como Merrill e John Ashbery, os tornam Objetos é Um Vazio Sensorial] (1950) o título­ foi Abem sucedidos, em termos tradicionais, embora em­pres­tado de Thomas Traherne,­ poeta metafísico.­ sua poesia redefina a arte poética de forma radicalmen­ A abertura vívida ilustra a clareza encontrada­ por te inovadora. A elegância estilística­ faz alguns poetas alguns poetas na rima e regularidade­ formal: parecerem mais tradicio­ ­nais do que são, como no caso de Randall Jarrell (1914-1965) e A.R. Ammons Os altos camelos do espírito (1926-2001). Ammons cria diálogos intensos entre a Dirigem-se para seus desertos, passando ruidosa­ humanidade­ e a natureza; Jarrell entra na consciência­ mente os últimos arvoredos encurralada dos expropriados — mulheres, crianças, Com o estridular de serraria do gafanhoto, para o mel soldados condenados, como em “The Death of the pleno do árido Ball Turret Gunner” [A Morte do Artilheiro da Torre Sol. São lentos, orgulhosos... de Tiro] (1945):

Os poetas tradicionais, ao contrário de muitos Do sono de minha mãe caí no Estado, experimentais que desconfiam da dicção “muito E curvei-me em seu ventre até meu pelo molhado poética”,­ apreciam­ linhas poéticas ressonan­ tes.­ Robert congelar. Penn Warren (1905-1989) concluiu um poema com: Seis milhas da terra, livre de seu sonho de vida, “Para amar tão bem o mundo que possamos crer, Acordei para um fogo antiaéreo negro e lutadores de enfim, em Deus.” AllenTate (1899 -1979) terminou um pesadelo. poema assim: “Sentinela­ do túmu­ lo,­ que a nós todos Quando morri lavaram-me para fora da torre com conta!”­ Poetas tradicionais­ também gostam de usar às uma mangueira. vezes uma dicção­ retórica, de palavras obsoletas ou estranhas,­ e muitos adjetivos (ex.:“coruja sepulcral”)­ Embora muitos poetas tradicionais usem rima,­ e inversões, em que a ordem natural das pala­vras nem toda poesia rimada é tradicional em tema ou

82 tom. A poeta Gwendolyn Brooks (1917- estudou­ em Harvard, mas em Kenyon 2000) fala da dificuldade de viver — sem College, Ohio, onde rejeitou sua origem­ falar­ de escrever — em favelas urbanas. puritana e converteu-se ao catolicismo. Seu “Kitchenette Building” [Prédio Preso por um ano como­ opositor cons­ Kitchenette] (1945) pergunta como: ciente à II Guerra Mundial, mais tarde protestou em público­ contra a Guerra Poderia um sonho subir através do do Vietnã.­­ cheiro de cebola Seus primeiros livros, Land of Seu branco e violeta, lutar com batatas Un­likeness [Terra da Desseme­lhan­ fritas ça] (1944) e Lord Weary’s Cas­tle [O E o lixo de ontem amadurecendo no Castelo de Lorde Weary] (1946), ga­ corredor... nhador do Prêmio Pulitzer,­ revelaram grande controle de formas­ e estilos Muitos poetas, inclusive Brooks, tradicionais, forte sentimento e visão Adri­enne Rich, Richard Wilbur, Robert­ inten­samen­­te pessoal­­ ainda que histó­ Lowell e Robert Penn Warren, escreve­ rica. A violên­ cia­ e especificidade de ram no início tradicionalmente,­­­ com suas primeiras­ obras são esmagadoras­ rima e métrica, mas as abandonaram em poemas como “Children of Light” nos anos 60, sob pressão dos eventos [Crianças da Luz] (1946), condena­ ­ção públicos­ e da tendência gradual para severa dos Puritanos­ que mata­ ram­ ín­ formas abertas. dios e cujos descendentes­ queimavam cereais ex­ceden­ tes­ em vez de enviá­ Robert Lowell (1917 - 1977) -los aos famintos.­ Lowell escreve: “Nos­ mais influente dos poetas sos pais extraí­­ram seu pão do tronco­ e recentes, Robert Lowell come­ das pedras­ / E cercaram­ seus jar­dins Oçou tradicionalmente,­ mas foi com ossos de peles-vermelhas.”­ influenciado por correntes­ experimen­ Seu livro seguinte, The Mills of tais. Como sua vida e obra abrangem the Kavanaughs [Os Moinhos de o período entre mestres­ modernistas­­ Kavanaughs] (1951), tem monólo­ ­gos mais velhos, como­ Ezra Pound, e es­ tocantes e dramáticos em que mem­ critores con­tem­­­porâneos, sua carreira bros da família revelam­ suas ternuras põe os experimentais posteriores num e falhas. Como sem­pre, seu estilo Robert Lowell contexto maior. combina o hu­mano­­ e o ma­jestoso. Lowell se encaixa no molde do Usa muito a rima tradi­cional, mas escritor acadêmico: branco, homem,­ seu coloquia­ ­lismo a disfarça­ até que nacido protestante, instruí­ do­ e bem pareça melodia de fundo. Foi a poesia relacionado no meio políti­ co­ e social. experimental, porém, que deu a Lowell Descendia de uma respei­ tável­ família a ruptura para um idioma cria­tivo ‘Brâmane’ de Boston que incluía o individual. famoso poeta James­ Russell Lowell, Numa turnê de declamação nos do século 19, e um presidente recente anos 50, Lowell ouviu­ pela primeira­ da Universidade­ de Harvard. Robert vez as novas poesias experimentais.­ Lowell, porém, encontrou uma iden­ Howl [Uivo] de Allen Ginsberg e tidade fora de seu meio elitista. Não Foto © Nancy Crampton Myths and Texts [Mitos e Textos] de

83 Gary Snyder, ainda­ por publicar, esta­ processo. vam sendo lidos e cantados,­ às vezes A transformação de Lowell, um acompanhados de jazz, em cafés de divisor de águas para a poesia do North Beach, São Francisco. Lowell pós-guerra, abriu o caminho para sentiu que, comparados a estes, seus outros jovens escritores. Em For the poemas de reconhecido valor eram Union Dead [Para os Mortos da União] muito formais, re­tóricos e presos a (1964), Notebook 1967-69 [Livro conven­ ções;­ ao lê-los em voz alta, foi Notas 1967-69] (1970) e livros subse­ intro­du­zindo revisões espontâ­neas, qüentes, continuou suas explorações em direção a uma dicção­ colo­ quial.­ autobiográficas e inovações técnicas, “Meus pró­prios poemas pa­reciam inspirando-se na experiência com a mons­tros pré-históricos, ar­ras­tados psicanálise. A poesia confessional brejo abaixo e mortos pela pesada­ ar­ de Lowell tem sido particularmente madura”.­ Escre­veu depois.­ “Recitava­ influente. As obras de JohnBerryman, o que não mais sentia.” Anne Sexton, Sylvia Plath (as duas Nessa altura, Lowell, como muitos­ últimas,­ suas alunas) e muitos outros,­ poetas depois dele, aceitou o desafio­ seriam inimagináveis sem Lowell. de aprender com a tradição rival na América — a escola de William Carlos POETAS IDIOSSINCRÁTICOS Williams. Em 1962, escreveu:­ “É como s poetas que desenvolveram se apenas Williams tivesse realmente estilos ímpares a partir da tra­ enxergado a América ou ouvido sua Odição, estendendo-a po­rém linguagem”.­ Desde então, Lowell mu­ para novos campos, com um sabor dou radicalmente seu estilo, incorpo­ distintamente contem­porâ­ neo,­ além de rando “as mudanças­ rápidas de tom, Plath e Sexton, incluem­ John Berryman, atmosfera e ritmo” que tanto apreciava Theodore Roethke, Richard Hugo, em Williams. Philip Levine, James Dickey, Elizabeth Lowell largou muitas de suas alu­ Bishop e Adrienne Rich. sões obscuras; suas rimas torna­ ram­ -se integrantes da experi­ência poética, Sylvia Plath (1932 - 1963) em vez de sobrepos­ tas.­ A estrutura de Sylvia Plath teve uma vida aparen­­ estrofes também­ en­trou em colapso; temente exemplar: tendo cursado­ o Sylvia Plath surgiram novas formas de improvisa­ Smith College como bolsista, se forma­ ção. Em Life Studies [Estudos da Vida] do em primeiro lugar em sua turma, (1959), introduziu a poesia confessio­ e ganho uma bolsa Fulbright para nal, novo modo em que desnudava­ cursar a Universidade de Cambridge, na os problemas pessoais mais que mais Inglaterra. Lá conheceu­ seu carismático o afligiam com grande honestidade e futuro marido, o poeta Ted Hughes, intensidade. Em essência,­ não apenas com quem teve dois filhos e se fixou descobriu sua individualidade como numa­ casa no campo da Inglaterra. Por celebrou nela suas manifestações mais trás do aparente conto de fadas, fervilha­ pessoais e difíceis. Transfor­mou-se vam problemas psicológicos­ evocados num contem­ ­porâneo, à vontade com o em The Bell Jar [O Pote em Forma de Foto © UPI/The Bettmann ser, o fragmentado e a forma enquan­ ­to Archive Sino] (1963), romance­ agradabilíssimo.

84 Alguns desses problemas eram pessoais enquanto outros, decorrentes­ de atitudes repressoras para com Anne Sexton (1928 - 1974) as mulheres­ nos anos 50. Entre estas, estava a crença­ Como Plath, Anne Sexton era uma mulher pas­ — compartilhada pela maioria das mulheres­ — de que sional, que tentou ser esposa, mãe e poeta, às vés­ elas não deveriam­ demonstrar­ raiva ou perseguir uma peras do movimento feminista nos Estados­ Unidos. carreira­ ambiciosamente,­ ao invés disso, deveriam Como Plath, sofria de doença mental e acabou se contentar-se em cuidar do marido e filhos. Mulheres­ suicidando. bem sucedidas, como Plath, viviam uma contradição. A poesia confessional­ de Sexton é mais autobio­ O conto de fadas de Plath desmoronou quando­ gráfica que a de Plath e não apresenta a apurada ela e Hughes se separaram e ela cuidou das crianças qualidade dos primeiros poemas de Plath. Seus pequenas num apartamento em Londres­ durante versos, contudo,­ suscitam fortes emoções. Lançam um inverno de frio extremo. Doente,­ isolada e em temas tabus como sexo, culpa e suicídio. Introduzem, desespero, Plath trabalhou­ sem parar para criar uma audaciosamente, temas femininos como parto,­ o série de poemas marcantes,­ antes de suicidar-se corpo feminino ou casamento, visto do ponto de com gás, na cozinha. Esses­ poemas foram reunidos vista da mulher. Em poemas como “Her Kind” [Seu no volume Ariel (1965) dois anos após sua morte. Tipo] (1960), Sexton se identifica com uma bruxa Robert Lowell, que escreveu a introdução,­ destacou queimada viva na fogueira: o rápido desenvolvimento de sua poesia, desde o tempo em que ela e Anne Sexton eram suas alunas Já andei em sua carroça, condutor, de poesia em 1958. acenei meus braços nus às aldeias que passavam, A poesia inicial de Plath é bem trabalhada e aprendendo as últimas rotas brilhantes, sobrevivente tradicional,­ mas seus últimos poemas exibem uma onde suas chamas ainda mordem minha coxa bravura desesperada, um grito de angústia proto­ - e minhas costelas estalam onde suas rodas passam. feminista. Em “The Applicant” [A Candidata]­ (1966), Uma mulher assim não tem vergonha de morrer. Plath expõe o vazio de seu atual papel de esposa Eu já fui de seu tipo. (reduzida a um “aquilo” inanimado):­ Os títulos de suas obras indicam sua preocupação­ Uma boneca viva, onde quer que você olhe. com a loucura e a morte. IncluemTo Bedlam and Part Pode costurar, pode cozinhar. Way Back [A Ida e a Volta Par­­cial Ao Hospício] (1960), Pode falar, falar, falar. Live or Die [Viva ou Morra] (1966) e o livro póstumo The Awful Rowing Toward God [O Terrível Remar em Trabalha, não há nada de errado com aquilo. Dire­ção a Deus] (1975). Você tem um buraco, é um cataplasma. Você tem um olho, é uma imagem. John Berryman (1914 - 1972) Meu filho, é seu último recurso. A vida de John Berryman assemelha-se à de Será que você casa com ela, casa com ela, casa com ela. Robert Lowell em alguns aspectos. Nascido em Plath ousa usar linguagem de cantiga de roda e Oklahoma, estudou no Nordeste — na escola prepa­ franqueza brutal. Ela tem um jeito­ especial de usar ratória e na Universidade de Columbia, depois foi bol­ imagens audaciosas da cultura popular. Sobre um sista na Universidade de Princeton.­ Especializado em bebê, ela escreveu certa vez: “O amor te fez começar métrica e formas tradicio­ nais,­ foi inspirado pelo início a funcionar, como um baita relógio de ouro.” Em da história americana­ e escreveu em seu Dream Songs “Daddy” [Papai], ela imagina seu pai como o Drácula [Canções­ de Sonhos] (1969) poemas confessionais,­ do cinema: “Há uma estaca em seu gordo coração autocríticos, que apresentam uma personagem­ au­ negro / E os aldeões jamais gostaram de você.” tobiográfica grotesca, Henry, e reflexões sobre sua

85 pró­pria rotina de ensino, alcoolis­ ­mo dos U­nidos. crônico e ambição. Hugo escreveu poemas confessio­­ Como Theodore Roethke, seu con­ nais nostálgicos em ousados versos temporâneo, Berryman desenvol­ ­­veu iâmbicos sobre pequenos vi­larejos um estilo maleável, diver­tido, mas esquecidos em sua parte dos Estados­ profundo, enriquecido por fra­ses do Unidos; falou da vergonha,­ fracasso e folclore, cantigas de roda, chavões e os raros momentos de aceitação nos gíria. Sobre sua per­­so­nagem Henry, relacionamentos humanos.­ Chama­ ­va Berryman es­cre­veu: “Ele encarou a a atenção do leitor­ a detalhes minucio­ ruína. A ruí­na devolveu seu olhar.” sos, aparen­ ­te­men­te inconseqüentes, Em outro trecho,­ escreveu espirituosa­ para ressaltar idéias mais significativas. mente, “Oh, ai de mim, ai de mim / O poema“What Thou Lovest Well, Quando é que a indiferença vai chegar, Remains American” [O Que Você Mui­ eu gemo e rujo.” to Ama Continua Americano] (1975) termina com uma pessoa carregando­­ Theodore Roethke lembranças de sua velha­ cidade natal, (1908 - 1963) como comida: Filho do proprietário de viveiro de plantas, Theodore Roethke de­ caso você fique encalhado em alguma senvol­­ ­veu uma linguagem especial estranha cidade vazia evo­cando o “mundo da estufa” de e precise de amantes famintos como in­setos minúsculos­ e raízes ocultas:­ amigos, e precise sentir-se Minhoca,­ fique comigo. / Este é meu bem-vindo no clube de rua tem­po de prova.” Seus poe­mas de que eles formaram. amor­ em Words for the Wind [Pala­vras ao Vento] (1958), celebram a beleza Philip Levine (1928 - ) e o desejo com paixão inocente.­ Um Philip Levine, nascido em Detroit, poema começa:­ “Conheci­ uma mulher, Michigan, lida diretamente com os linda em seus ossos / Quando os pas­ sofrimentos econômicos dos trabalha­ sarinhos suspira­vam, ela suspirava de dores, através da observação­ incisiva, volta para eles.” Às vezes, seus poemas James Dickey raiva e ironia dolorosa.­ Como Hugo, pa­recem­ taquigrafia da natureza ou sua origem é urbana­ e pobre. Tem sido enigmas­ antigos: “Quem aturdiu o pó a voz do indiví­ ­duo solitário a mercê em barulho? / Pergunte à toupei­ ra,­ ela da América industrial. Muitos de seus sabe.” versos são sombrios e refletem uma ten­ dência­ anárquica em meio à realização­ Richard Hugo (1923 - 1982) de que sempre existirão os sistemas de Richard Hugo, natural de Seattle, governo. Washington, estudou com Theodo­ ­re Em um poema, Levine se com­para Roethke. Cresceu pobre, em ambientes­ a uma raposa que sobrevive num urbanos sombrios, e se destacou­ ao mundo perigoso de caçadores graças à comunicar as espe­ ­­ran­ças, temores e coragem e esperteza. Em termos de seu frustrações dos trabalhadores­ contra o padrão rítmico,­ percorreu o caminho pano de fundo do Noroeste dos Esta­ Foto © Nancy Crampton da métrica tradicional em suas obras

86 iniciais, para versos mais livres, abertos descritivo, que contém profun­dida­ em seus trabalhos recentes ao expressar­ des filosóficas ocultas. A descrição seu protesto solitário contra os males do do Atlântico Norte gelado em “At the mundo contemporâneo. Fishhouses” [Nas peixarias] pode­ ­ria aplicar-se também à sua própria poe­ James Dickey (1923 - 1997) sia: “É como imaginamos­ que seja o James Dickey, romancista e en­ conhecimento: / escu­ ro,­ salgado, claro, saísta, além de poeta, é natural da tocante, total­ ­mente livre.” Georgia. Em suas próprias reflexões,­ Com Moore, Bishop pode ser co­ cria que o principal tema de seus lo­cada na tradição de poetas “frias”, trabalhos era a continuidade que remontando a Emily Dickinson,­­ em existe — ou precisa existir — en­tre comparação com a poesia “quente” de o ser e o mundo. Boa parte de sua Plath, Sexton e Adrienne Rich. Embora obra tem raízes na natureza — rios e Rich tenha­ iniciado com versos em for­ montanhas, padrões climáticos­ e os ma e métrica tradicionais, suas obras, perigos à espreita na natureza. sobretudo as escritas após ter se tornado No fim da década de 60, come­ çou­ feminista ardorosa na década de 1980, a trabalhar num romance, Deliverance incorporam fortes emoções. [Libertação], sobre o lado sombrio do Seu talento especial é para metáfo­ relacionamento entre homens, que, ras, como em “Diving Into the Wreck” quando publicado­ e posteriormente [Mergulhando no Naufrágio] (1973), filmado,­ aumentou se reconhecimento. trabalho extraor­ ­dinário que evoca a Suas recentes coletâneas de versos busca de uma mulher por sua iden­ lidam com temas variados, como a tidade em termos de um mergulho paisagem do Sul (Jericho: The South num navio naufragado. Os destroços Beheld [Jericó: A Visão do Sul], 1974) são como a ruína da personalidade­ da e a influência da Bíblia sobre sua vida mu­lher, sugere o narrador; as mulheres­ (God’s Images [Ima­gens de Deus], precisam encontrar seu caminho 1977). Dickey com freqüência preo­ por entre domínios masculinos.­ “The cupava-se com o esfor­ ­ço: “Supe­ rando,­ Roofwalker” [Quem Anda no Telhado] desespera­da­mente/Supe­rando o que (1961), dedi­cado à poeta Denise é preciso.”­ Levertov, imagina­ a criação poética, Elizabeth Bishop Elizabeth Bishop (1911-1979) e para mulheres, como­ ofício perigoso. Adrienne Rich (1929- ) Como homens­ ergendo um telha­ ­do, ela Entre as poetas do grupo idios­­ se sente “exposta, maior que a vida, / sincrático, Elizabeth Bishop e Adrienne fadada a quebrar o pescoço.” Rich foram as que granjearam­ mais respeito nos últimos anos. A inteligên­ POESIA EXPERIMENTAL cia cristalina e interesse­ por paisagens força por traz da realização longín­quas e metáforas de viagem de madura de Lowell de boa par­ Bishop agradam os leitores por sua Ate da poesia contemporânea exati­dão e sutileza. Como sua mento­ reside na experimentação ini­cia­da ra, Marianne Moo­re, Bishop escreveu nos anos 50 por uma série de poetas. Foto © UPI/The Bettmann poemas de grande destreza num estilo Archive Estes podem ser divididos em cinco escolas livres identificadas por Donald 87 Allen em The New American Poetry [A No­va Poesia abrir sua cabeça e colocar Americana] (1960), a primeira antologia­ a apresen­ uma vela por tar o trabalho de poetas até então relegados pelos trás dos olhos. críticos e acadêmicos.­ Inspirada pelo jazz e a pintura expressionista O amor está morto em nós abstrata, a maioria dos escritores experimentais se esquecemos são uma geração mais moça que Lowell. Tendiam­ as virtudes de um amuleto a ser boêmios, intelectuais da contracultura­ que e da rápida surpresa se desassociaram das universi­ dades­ e criticavam­ abertamente a sociedade america­ na­ “burguesa”. A Escola de São Francisco Sua poesia é ousada, original­ e, às vezes, chocante. A obra da Escola de São Francisco — que inclui a Em sua busca de novos valores, alega afinidade com maioria dos poetas da Costa Oeste em geral — deve o mundo arcaico de mitos, lendas e sociedades muito às filosofias e religiões orien­ ­tais, bem como à tradicionais co­mo a dos indios americanos. As poesia japonesa e chinesa. Isto não é surpreenden­ formas são mais livres, espontâneas, orgânicas; te, já que a influência do Oriente sempre foi forte brotam do próprio­ tema, do sentimento do poeta no Oeste dos Estados­ Unidos. A região em torno de no momento de criação e das pausas naturais da São Francisco­ — as Montanhas de Sierra Nevada e a linguagem falada. Como Allen Ginsberg comentou costa­ acidentada — é linda e majestosa e os poetas­ em “Improvised Poetics”, “o primeiro pensamento da região costumam ter um profundo sentimento­ é o melhor pensamento”. pela natureza. Muitos dos poemas situam-se nas montanhas ou transcorrem durante caminhadas A Escola de Black Mountain pela região. A poesia olha para a natureza, e não A Escola de Black Mountain centrava-se em torno para a tradição literária, como fonte de inspiração. do Black Mountain College, faculdade experimental Os poetas de São Francisco incluem Jack Spicer, liberal de ciências humanas em Asheville, Carolina Lawrence Ferlinghetti, Robert Duncan, Phil Whalen, do Norte, onde os poetas Charles Olson, Robert Lew Welch, Gary Snyder, Kenneth Rexroth, Joanne Duncan e Robert Creeley lecionavam, no início dos Kyger e Diane diPrima. Muitos destes se identificam anos 50. Ed Dorn, Joel Oppenheimer e Jonathan com a classe trabalhadora.­ Suas poesias são, em Williams estu­daram lá e Paul Blackburn, Larry geral, simples, acessíveis e otimistas. Eigner e Denise­ Levertov publicaram trabalhos nas Em seus melhores momentos, como na obra de Gary revis­tas da escola, Origin e Black Mountain Review. Snyder (1930 - ), a poesia de São Francisco­ evoca o A Escola de Black Mountain está associada­ à teoria delicado equilíbrio entre o indivíduo e o cosmos. Em de Charles Olson de “versos projetivos”,­ que insistia “Above Pate Valley” [Acima do Vale de Pate] (1955), no uso de formas abertas, baseadas na espontanei­ o poeta descreve o trabalho dos que abrem trilhas na dade da pausa de respiração­ na fala e na extensão montanha e encontram pontas de flechas de obsidiana, da linha produzida pela máquina de escrever no de tribos indígenas desaparecidas: papel. Robert Creeley (1926-2005), que escreve com Numa colina nevada exceto no verão, um estilo lapidar, minimalista, foi um dos prin­ Uma terra de veados gordos do verão, cipais poetas da Escola de Black Mountain. Em Eles vieram acampar. Em suas “The Warning” [O Alerta] (1955), Creeley imagina Próprias trilhas. Segui minha própria a violenta e amorosa imaginação: Trilha aqui. Peguei a furadeira, Picareta, marreta e saco Por amor .... eu iria De dinamite. Dez mil anos. 88 Lawrence Ferlinghetti (1919 - ), cuja Poetas Beat livraria, City Lights, estabelecida em A Escola de São Francisco se mescla­ North Beach, São Francisco, em 1951, ao grupo seguinte — os poetas­ “Beat”, tornou-se ponto de encontro. Um dos que surgiram nos anos 50. O termo poetas mais instruídos de meados do “Beat” sugere variadamente batidas século 20 (ele obteve um doutorado musicais, como no jazz; beatitude na Sorbonne), a poesia cuidadosa, angelical ou bênçãos e “beat-up” — can­ humorística e política de Ferlinghetti çado ou ferido. Os Beats (beatniks) se incluiu A Coney Island of the Mind [Uma inspiravam no jazz, na religião ocidental Coney Island da Mente] (1958). Endless e na vida itinerante. Esses foram todos Life [Vida sem Fim] (1981) é o título de descritos em On the Road [Na Estrada], seus poemas selecionados. famoso romance de Jack Kerouac, uma Gregory Corso (1930-2001), um sensação quando foi publicado em criminoso insignificante cujo talento foi 1957. Um relato de uma viagem de carro nutrido pelos “Beats”, é lembrado por através do país em 1947, o romance foi volumes de poemas bem-humorados, escrito em três semanas agitadas, num como “Marriage” [Casamento], freqüen­ único rolo de papel, no que Kerouac temente incluído em antologias. Um po­ chamava de “prosa bop espontânea”. eta talentoso, tradutor e crítico original, O estilo irrefreado, improvisado, os como visto em seu criterioso American personagens alienados-místicos e a Poetry in the Twentieth Century [A rejeição da autoridade e convenção Poesia Americana no Século Vinte] incendiou a imaginação dos jovens (1971), Kenneth Rexroth (1005-1982) leitores e ajudou a prenunciar a contra­ desempenhou o papel de estadista -cultura independente dos anos 1960. para a anti-tradição. Um organizador A maioria dos Beats importantes trabalhista de Indiana, ele viu os Beats migrou para São Francisco vindo da como uma alternativa na Costa Oeste Costa Leste e obteve seu reconheci­ ao padrão literário da costa Leste. Ele mento­ nacio­ nal­ inicial na Califórnia. encorajou os Beats com seu exemplo O carismático Allen ginsberg (1926- e influência. 1997) tornou-se o principal porta­ A poesia­ Beat é oral, repetitiva e mui­ -voz do grupo. Filho de pai poeta e Allen Ginsberg to eficaz quando declamada, especial­ uma mãe excêntrica, comprometida mente porque deriva das declamações­ com o comunismo, Ginsberg cur­ em clubes underground. Alguns­ podem­ sou a Universidade de Columbia, considerá-la correta­ ­mente a bisavó­ do onde se tornou grande amigo dos rap, ritmo predominante­ na década de colegas Kerouac (1922-1969) e Willam 1990. A poesia beat foi a forma literária Burroughs (1914-1997), cujos roman­ mais anti-estabelecimento nos Estados ces violentos e apavorantes sobre Uni­dos. Mas, por trás das pala­vras cho­ o submundo do vício da heroína cantes, existe o amor à pátria. A poesia incluem The Naked Lunch [O Almoço é um grito de dor e raiva pelo que os Nu] (1959). Esses três eram o núcleo poetas consideram a perda da inocên­ do movimento Beat. cia da América e o trágico desperdício Outros destaques incluiam o editor Foto © The Bettmann Archive de seus recursos­ humanos e materiais.

89 Poemas como Howl [Uivo] (1956) rela­ção à arte abstrata, que desconfia de Allen Ginsberg, revolucio­ ­na­ram a das formas figurativas e dos sentidos­ poesia tradicional: óbvios, suas obras são freqüentemente­ de difícil compreensão, como nos tra­ Vi as melhores mentes de minha geração balhos mais recentes de John Ashbery destruídas pela (1927 - ), talvez o poeta mais estimado loucura, esfomeadas histéricas pela crítica do fim do século 20. nuas, Os poemas fluidos de Ashbery se arrastando pelas ruas registram pensamentos e emoções co­ negras na aurora mo se passassem pela mente depressa procurando uma dose excitante, demais para a articulação direta. Seu alienados de cabeças angelicais, profundo e longo poema­ Self-Portrait ardendo pela antiga ligação in a Convex Mirror [Auto-Retrato num celestial com os dínamos estrelados na Espelho­ Convexo] (1975), ganhador maquinária da noite... de três importantes prêmios, desliza de pensamento em pensamento, fre­ A Escola de Nova York qüentemente refletindo de volta sobre Diferentemente dos poetas Beat si mesmo: e dos de São Francisco, os poetas da Escola de Nova York não se inte­ Um navio ressavam por questões claramente Desfraldando cores desconhecidas morais­ e, em geral, ficavam longe de entrou no porto. temas políticos. De todos, eram os que Você está deixando questões tinham a melhor educação formal. extemporâneas Os principais expoentes da Esco­ la­ Interromperem seu dia.... de Nova York — John Ashbery, Frank O’Hara e Kenneth Koch — se conhece­ Surrealismo e Existencialismo ram quando cursavam a Universidade Em sua antologia definindo as de Harvard. São fundamentalmente novas escolas, Donald Allen inclui um urbanos, frios, não-religiosos, espi­ quin­to grupo, que ele não conse­ gue­ rituosos com uma sofisticação ao John Ashbery definir por falta de uma base geo­ mesmo tempo tocante e delicada. Os gráfica clara. Esse grupo vago inclui versos primam pela ação, pelos deta­ diversos movimentos e experiências­ lhes urbanos, pelas incongruências e recentes. Liderando tais correntes, por uma sensação quase palpável de estão o surrealismo, que expressa o incredulidade. inconsciente através de imagens vívi­ A cidade de Nova York é o centro das, como que de sonhos,­ e diversos de belas artes na América e o berço trabalhos de mu­lheres e minorias do Expressionismo Abstrato, uma im­ étnicas que flores­ ­ceram nos últimos portante­ fonte de inspiração para esse anos. Embora­ superficialmente distin­ tipo de poesia. A maioria dos poetas tos, surrealistas, feministas e minorias trabalhou como crítico de arte, curador parecem compartilhar um sentido de de museu ou colaborou com pintores. alienação com respeito à litera­tura Talvez devido a seu sentimento com Foto © Nancy Crampton dominante.

90 mbora T.S. Eliot, Wallace Stevens Isto não vai amenizar nossa tristeza. e Ezra Pound já tivessem introdu­ Isto não vai consolar nossos filhos. Ezido técnicas do simbolismo­ na Isto não vai poder nos ajudar. poesia americana, ainda na década de 1920, o surrealismo, a principal força O surrealismo de Mark Strand, como na poesia e no pensamento europeu o de Merwin, costuma ser desolador; durante e depois da II Guerra Mundial, fala de uma carência extrema. Agora, não criou raízes nos Estados Unidos. que tradições, valores e crenças o de­ Somente nos anos 1960, o surrealismo­ cepcionaram, o poeta nada tem senão (juntamente com o existencialismo)­ sua alma cavernosa: foi domesticado na América,­ sob o impacto da guerra do Vietnã. Eu tenho uma chave Nos anos 1960, muitos escritores­ Então eu abro a porta e entro. americanos — W.S. Merwin, Robert Bly, Está escuro e eu entro. Charles Simic, Charles Wright e Mark Está mais escuro e eu entro. Strand, entre outros — se voltaram para o surrealismo­ francês e o espanhol,­ AS PoetaS E O FEMINISMO em especial, por suas emoções­ puras, A literatura nos Estados Unidos, imagens­ de arquétipos e modelos­ de como na maioria dos países, fora sem­ inquie­tação existencial anti-racional.­ pre avaliada com base em padrões Surrealistas como Merwin tendem­ que freqüentemente desconsidera­ a ser epigramatistas, como em: “Os vam a contribuição feminina. Ainda deuses são aquilo em que falhamos as­sim, há muitas poetas de valor em nos tornar / Se você achar­ que não na literatura americana. Nem todas crê mais, aumente o templo.” são feministas, nem só de questões O surrealismo político de Bly femininas falam seus temas. As dife­ criticava severamente os valores renças regionais, políticas e raciais americanos e a política externa na também deram forma à sua obra. época do Vietnã, em poemas como: As poetas mais conhecidas incluem “The Teeth Mother Naked at Last” [A Amy Clampitt, Rita Dove, Louise Mãe dos Dentes Nua Enfim]: Glück, Jorie Graham, Carolyn Kizer, Amy Clampitt Maxine Kumin, Denise Levertov, Audre É porque temos novas Lorde, Gjertrud Schnackenberg, May embalagens para ostras Swenson e Mona Van Duyn. defumadas Antes dos anos 1960, a maioria que buracos de bomba surgem nos das poetas havia aderido a um ideal arrozais andrógino, acreditando que o gênero não interferia na excelência artística. A influência surrealista mais difusa Essa posição alheia ao gênero foi, tem sido mais calma e contemplativa,­ com efeito, uma forma inicial de como o poema descrito por Charles feminismo que permitiu às mulheres Wright em “The New Poem” [O Novo argumentarem por direitos iguais. Ao Poema] (1973): fim da década de 1960, as mulheres Foto © Nancy Crampton americanas — muitas ativas na luta

91 por direitos civis e protestos contra o by Women [A Antologia Norton de conflito no Vietnã, ou influenciadas Literatura Feminina] (1985) de Gilbert pela contra-cultura — começaram e Gubar facilitou o estudo da literatura a reconhecer sua própria margina­ feminina entrou em foco. lização. The Feminine Mystique [A Outras poetas influentes antes de Mística Feminina] (1963), obra franca Sylvia Plath e Anne Sexton incluem de Betty Friedan, publicada no ano do Amy Lowell (1874-1925), cuja obra suicídio de Sylvia Plath, censurou pu­ tem grande beleza sensual. Ela editou blicamente o baixo status da mulher. antologias Imagísticas influentes e Outro marco, o livro Sexual Politics introduziu a poesia moderna francesa [Política Sexual] (1969) de Kate Millett, e a poesia chinesa em tradução para o defendeu a posição de que os textos mundo literário de língua inglesa. Sua masculinos revelavam uma misoginia obra celebrava o amor, o desejo e o penetrante, ou um desprezo pelas as­pec­to espiritual da beleza humana e mulheres. da natureza. H.D. (1886-1961), amiga de Nos anos 1970, uma segunda onda Ezra Pound e William Carlos Williams de crítica feminista emergiu após a que havia sido analisada por Freud, es­ fundação da Organização Nacional das creveu poemas cristalinos inspirados Mulheres (NOW) em 1966. A Literature pela natureza e pelos clássicos gregos of Their Own [Uma Literatura Própria] e o drama experimental. Sua poesia (1977) de Elaine Showalter identificou mística celebra deusas. As contribui­ uma importante tradição de autoras bri­ ções de Lowell e H.D., além de outras tânicas e americanas. The Madwoman poetas do início do século 20, como in the Attic [A Louca no Sótão] (1979) de Edna St. Vincent Millay, só agora estão Sandra Gilbert e Susan Gubar traçou a sendo totalmente reconhecidas. misoginia nos clássicos ingleses, como Poetas Multiétnicos em Jane Eyre de Charlotte Brontë. Nesse A segunda metade do século 20 romance, uma esposa é levada à loucura testemunhou um renascimento da pelo mal tratamento que seu marido lhe literatura multiétnica que se esten­ dispensa e é trancada no sótão; Gilbert Nikki Giovanni deu até o século 21. Nos anos 1960, e Gubar comparam as vozes abafadas os escritores étni­cos nos Estados das mulheres na literatura à essa figura Unidos, seguindo a liderança dos afro­ feminina oprimida. -americanos, começaram a comandar­ As críticas feministas da segunda a atenção do público. Os anos 1970 onda desafiavam os cânones aceitos viram o surgimento dos programas de das grandes obras argumentando estudos­ étnicos. nas universidades. que os padrões estéticos não eram Na década de 1980, surgiram diver­ atemporais e universais, mas um sos periódicos acadê­ micos,­ organiza­ tanto arbitrários, presos à cultura e ções profissionais­ e revistas literárias patriarcais. O feminismo tornou-se nos dedicadas à causa multiétnica. As anos 1970 a força motriz pela igualdade conferências volta­das ao estudo de de direitos, não apenas na literatura, literaturas étnicas específicas apare­ mas na cultura mais ampla também. ceram e o cânone dos “clássicos”­ foi The Norton Anthology of Literature Foto © Nancy Crampton expandido para incluir escritores étni­

92 cos nas antologias e listas de cursos. obras originais salientam os tradicio­ Os temas importantes incluíam raça nais aspectos fortes da comunidade e etnicidade, vida espiritual, papéis urgiram mexicana e a discriminação­ que às familiares e de gênero e linguagem. sdiversos vezes sofre entre brancos. Às vezes, os poesia dos grupos minoritários poetas mesclam­ palavras em espanhol compartilha a diversidade e, periódicos e inglês,­ como na fusão poética de Aàs vezes, a ira da literatura acadê­ micos,­ Alurista e Gloria Anzal­ dúa.­ Sua poesia feminina.­ Floresceu em obras de organizações é muito influenciada­ pela tradição oral latinos e chicanos como Gary­ Soto, profissionais­ e e é muito poderosa quando declamada­ Alberto Rios e Lorna Dee Cervantes; em voz alta. de americanos nativos como Leslie revistas literárias Alguns poetas escrevem sobre­ Marmon Silko, Simon Ortiz e Louise dedicadas tudo em espanhol, numa tradição que Erdrich; de afro-americanos como à causa remonta ao primeiro épico escrito Amiri Baraka (LeRoi Jones), Michael multiétnica. As em solo americano — Historia de la S. Harper, Rita Dove, Maya Angelou e conferências Nueva México, de Gas­par Pérez de Nikki Giovanni e de ásio-americanos Villagrá, que cele­bra a batalha de como Cathy Song, Lawson Inada e voltadas ao 1598 entre os in­va­­sores espanhóis Janice Mirikitani. estudo de e os índios Pueblo­ de Acoma, Novo literaturas México. Poesia Chicana/Latina étnicas I Am Joaquin [Sou Joaquin] (1972), A poesia de influência hispânica de Rodolfo Gonzales (1928 - ), texto­ abrange obras de diversos grupos. específicas central da nova poesia chicana, evoca Entre eles está o dos americanos de apareceram e a aculturação: o narrador está “Perdido origem mexicana, conhecidos desde a o cânone dos num mundo de confusão/Preso na década de 50 como chicanos,­ que têm “clássicos”­ foi roda-viva da sociedade gringa/Confuso vivido há muitas gera­ ções­ no Sudoeste expandido para pelas regras...” dos Estados Unidos­ tomado do México Muitos escritores chicanos encon­ na Guer­ra Mexicano-Americana que incluir escritores tram sustento em suas antigas raízes acabou­ em 1848. étnicos nas mexicanas. Pensando­ na grandeza do Entre as popula­ções do Caribe antologias e antigo México, Lorna Dee Cervantes hispânico, os cubano-americanos e os listas de cursos. (1954 - ) escreve que “um corrido épi­ porto-riquenhos são os que mantêm co” canta em suas veias, já Luis Omar tradições lite­rá­rias vitais e distintas. Salinas (1937 - ) se sente “um anjo Por exem­plo, o talento do cubano- asteca”. americano­ para a comédia o distingue­ Boa parte da poesia­ chicana é alta­ do lirismo elegíaco dos escritores mente pessoal e aborda sentimentos chicanos, como Rudolfo Anaya. Os ou pessoas da família ou da comuni­ novos imigrantes vindos do México, dade. Gary Soto (1952 - ) se inspira na América Central, do Sul e Espanha antiga tradição de honrar os antepas­ estão constantemente enriquecendo sados,­ mas os versos a seguir, escritos e ampliando esta seara literária. em 1981, descrevem a atual condição­ A poesia chicana, ou mexicano­ multicultural de todos os americanos: -americana, tem rica tradição oral, na forma de balada, ou o corrido. As Uma vela é acesa para os mortos

93 Dois mundos diante de todos nós Foto © Nancy Crampton como a do haicai:

Nos anos 1980, a poesia chicana do céu de gelo espesso alcançou nova proeminência e as correndo velozmente obras de Cervantes, Soto e Alberto batendo Rios foram cada vez mais incluídas revolvendo sobre a copa das árvores em antologias. Vêm os alces da neve, Gary Soto Correndo, correndo Poesia Americana Nativa canto branco Os americanos nativos têm produ­ ­ vento de tempestade nos galhos. zido versos excelentes, provavelmente­ porque a tradição do canto xamanístico Louise Erdrich (1954 - ), romancista­­ desempenha um papel vital em sua como Silko, cria pode­rosos monó­ herança cultural. Seus trabalhos­ pri­ logos dra­máticos­ que têm o efeito mam pela evocação vívida e dinâ­­ mica­­ de peças dramáticas condensadas. do mundo natural, que se torna quase Mostram cruelmente famílias lidando místico, às vezes. Os poetas indígenas com o alcoolismo,­ o desemprego, e a também expressam­ o sentido trágico pobreza­ na reverva Chippewa. da per­da irreversível de seu rico patri­ Em “Family Reunion” [Reu­nião mônio cultural. de Família] (1984), um tio bêbado e Simon Ortiz (1941 - ), um pueblo­ de grosseiro volta, depois de vários anos Acoma, baseia muitos de seus poemas na cidade. Como ele sofre do coração, a na história,­ explorando as contradições­ sobrinha maltra­ ­­tada, que é a narradora, ineren­tes à vida de um índio americano se lembra de como esse tio, anos antes, nos Estados Unidos de hoje. Sua poesia havia matado uma grande tartaruga desafia os leitores anglo-americanos, ao colocar fogos de artifício­ em seu porque freqüentemente­ os faz lembrar interior. O fim do poema liga o Tio Ray as injustiças­ e violências cometidas à tartaruga­ que ele vitimou. contra os ame­ricanos nativos. Seus poemas pressentem uma harmonia De algum modo achamos o caminho de racial baseada numa com­preensão­ mais volta, Tio Ray, profunda. canta uma velha canção para o corpo Em Star Quilt [Colcha de Estre­ ­las], que o puxa Roberta Hill Whiteman (1947 - ), da para casa. As barbatanas cinzas em que tribo Oneida, imagina um futuro mul­ suas mãos se tornaram ticultural­ semelhante­ a uma “colcha Leslie Marmon Silko Apertam seus ossos contra o de estrelas,­ costurada com a luz da painel. Seu rosto aurora”, já Leslie Marmon Silko (1948 tem a estranha, calma paciência de uma - ), que é parte pueblo de Laguna, criança que sempre usa a lingua­ gem­­ coloquial e histórias deixou as grandes feridas de lado, ou uma tradicionais­ para criar poemas líricos criatura que viveu muito tocantes. Em “In Cold Storm muito tempo debaixo d’água. Light” [À Luz da Tempes­tade Fria] E os anjos vêm (1981), Silko cria uma ressonância Foto © Nancy Crampton baixando suas tipóias e macas.

94 Foto © David Ash / O poema termina­ juntando­ imagens de Poesia Afro-Americana CORBIS OUTLINE hospital, racismo num antigo filme ame­ Os negros americanos têm produ­ rica­no, Birth of a Nation [Nascimento de zido muitos poemas de grande beleza uma Nação], a Ku Klux Klan, a edição­ e diver­sidade de temas e tons. É a de filmes e a tecnologia de raio-x: mais desenvolvida das literaturas­ étni­ cas na América e bem diversificada. Recarregamos nossos cérebros como Amiri Baraka (1934 - ), o mais famoso Louise Errich câmeras, poeta afro-americano­ dos anos 1960 e o filme superexposto 1970, também escreve peças teatrais e à luz do raio-X, participa da política.­ Os textos de Maya trancado com nossos fotômetros de Angelou (1928 - ) englobam formas porta dupla: raça e sexo literárias diver­sas, inclusive poesia, rebobinados e apertados como hobby; peças dramáticas,e seu famoso livro pegamos nossa trouxa e vamos de memórias, I Know Why the Caged para casa. Bird Sings [Eu Sei Porque o Pássaro Engaiolado Canta]­ (1969). A história, o jazz e a cultura popular­ Rita Do­ve (1952 - ), foi aclamada inspiraram muitos afro-ameri­canos, poeta laureada­ dos Estados Unidos em de Harper (professor universitário)­ ao 1993. Dove, também autora de ficção­ poeta e editor da Costa Oeste, Ishmael e drama, ganhou o Prêmio Pulitzer­ de Reed (1938 - ), conhecido por liderar 1987 por Thomas and Beulah (1986), a literatura multicul­tu­ral através da em que home­­­nageia­ seus avós por Before Columbus Foundation e de meio de uma série de poemas­ líricos. várias revistas como Yardbird, Quilt e Ela disse que escreveu esses­ versos Konch. para re­velar­ a rica vida interior das Mui­tos poetas afro-ame­ricanos, pessoas­ pobres. como Audre Lorde (1934-1992), têm Michael Harper (1938 - ) também­ se nutrido do Afrocentrismo, que vê a escreve poemas que revelam a vida África como centro de civilização desde complexa de afro-ameri­ca­nos frente à a antiguidade. Em poemas sensuais discriminação e violência.­ Seus poemas como “The Wo­men of Dan Dance with densos e cheios de alusões, tratam Swords in Their Hands to Mark the Time freqüen­temente de cenas amontoadas, When They Were Warriors” [Mulheres­­ dramá­ticas de guerra ou vida urbana.­ de Dan Dançam com Es­padas­ Nas Usam imagens cirúr­gicas, numa tentati­ Maya Angelou Mãos para Marcar o Tem­­po em que va de curar. Seu poema­ “Clan Meeting: Eram Guerreiras] (1978), ela fala como Births and Nations: A Blood Song” guerreira do antigo Daomé,­ “armando [Encontro de um Clã: Nascimentos tudo que toco” e “consumindo”­ só “O e Nações: U­ma Canção de Sangue] que já está morto”. (1971], que compara o cozinhar à cirurgia (“unindo as car­nes com flui­ Poesia Ásio-Americana dos”), começa: “recons­ tru­ imos­ vidas Como a poesia dos chicanos e lati­ na unidade / de terapia intensiva,­ de nos, a poesia ásio-americana­ também pedaços colocados juntos­ num bufê...” Foto © Nancy Crampton é extremamente variada.­ Americanos

95 de origem japonesa,­ chinesa e filipina Anthology [Ayumi: Uma Antologia Nipo- po­dem estar vivendo nos Estados Americana] (1980). Unidos há oito gerações, enquanto os A lírica Picture Bride [Retrato de de origem­ coreana,­ tailan­ desa­ e viet­ Noiva], da poeta sino-americana Cathy namita provavelmente são imigran­ tes­ Song (1955- ), tam­bém dramatiza a recentes. Cada grupo cresce a partir história através da vida de sua familia. de uma tradição lingüística,­ histórica e Muitos poetas ásio-americanos­ explo­ cultural distinta. ram a diversidade cultural. Em “The A literatura ásio-americana tem Vegetable Air”[O Ar Vegetal] (1988), de evo­luído no sentido de dar ênfase Song, uma cidadezinha­ dilapidada, com aos estu­ dos­ voltados para a Orla do vacas na praça, um restau­ ­rante chinês Pacífico e às obras femininas.­ Os ásio- e uma placa da Coca-Cola pendurada­ americanos­ normalmente resistem­ ao torta se tornam emblemáticos da vida estereótipo racial­ de uma minoria “exó­ contemporânea multicultural e sem ra­ tica” ou “boa”. Esteticistas­ começam a ízes, supor­ ­tável apenas pela arte, neste com­parar­ tradições literárias­ ocidentais caso uma ópera gravada em cassete: e orientais como, por exemplo, os conceitos de tao e logos. então, a ária familiar, Os poetas ásio-americanos se inspi­­ subindo como a lua, ram em muitas fontes, da ópera chinesa O eleva acima de si mesmo, ao zen, e as tradições­­­ literárias asiáticas, transportando-o para outro país particularmente o zen, têm inspirado onde, por um momento, você viaja leve. muitos poetas não-asiá­ticos, como pode ser visto na antologia Beneath a A ESCOLA DA LINGUAGEM, Single Moon: Buddhism in Contemporary EXPERIMENTAÇÃO E NOVO American Poetry [Debaixo de uma Única FORMALISMO Lua: o Budismo na Poesia Americana No fim do século 20,os rumos tomados Contempo­rânea], de 1991. Os poetas pela poesia americana incluiu o dos ásio-americanos cobrem o espectro da “language poets” [poetas da lin­gua­ postura iconoclasta adotada­ por Frank gem], vagamente associados com a Chin (1940- ), co-editor da Aiiieeeee! revis­ta Temblor e Douglas Messerli, (uma das primeiras antologias da litera­ Rita Dove editor de “Language” Poetries: An tura ásio-americana), ao uso generoso Anthology [Poesias da Linguagem:­ Uma da tradição por autores como a roman­ Antologia]­ (1987). Entre eles Bruce cista Maxine Hong Kingston (1940- ). Andrews, Lyn Hejinian, Bob Perelman Janice Mirikitani (1942- ), sansei (terceira e Barret Watten, autor de Total Syntax geração de nipo-americanos),­ evoca­ [Sintaxe Total] (1985), uma coletânea a história nipo-americana e publicou­ de ensaios. Esses poetas estendem a diversas antologias, como Third World linguagem para revelar seu potencial­ de Women [Mulheres­ do Terceiro Mundo] ambigüi­dade, fragmen­tação e auto-afir­ (1973), Time to Greez! Incantations ma­­ção em meio ao caos. Irônicos­ e pós- From the Third World [Hora de Greez! modernos,­ rejeitam as “metanarrativas”­

Encantamentos do Terceiro Mundo] Foto © Christopher Felver / — ideologias, dogmas,­ convenções­ — e (1975) e Ayumi: A Japanese American CORBIS questionam a existência­ de realidade

96 transcendente. Michael Palmer escreve: (editor­ da Station Hill Press), o falecido Armand Schwerner e Jackson Mac Este é o Paraíso, um livro embolorado Low. Este também escreveu poesia deixado na casa por tempo demais visual ou concre­ ­ta, que faz uma decla­ ração visual com base em posicio­ O “Chronic Meanings” [Sentidos namento e tipografia. Crônicos], de Bob Perelman, assim A poesia-performance étnica al­ começa: cançou popularidade­ com a música rap, enquanto, em todos os Estados O fato único é matéria. Unidos, as ‘maratonas­ poéticas’ [“po- Cinco palavras podem dizer apenas. etry slams”] — competições de poesia Céu negro à noite, razoavelmente. abertas, em galerias de arte alternativa Eu sou, o resíduo irracional... e em livrarias literárias — tornaram-se um passatempo barato, participativo­ e Vendo a crítica artística e literária bem-humorado. como ineren­ ­temente ideológica, eles No outro extremo do espectro se opõem às formas fechadas do teórico estão os “Novos Forma­ modernismo, hierarquias, noções de listas”, que defendem a volta à epifania e transcendência, categorias forma, rima e métrica. Todos os de gêneros e textos canônicos ou gru­pos estão reagindo ao mesmo obras literárias aceitas.­ Em vez disso, proble­ ma­ — a complacência do propõem formas­ abertas e textos mul­ mundo convencional para com o ticulturais. Apro­priam-se de ima­gens status quo, um som cuidadoso e da cultura popular e da mídia e as re­ excessivamente­ polido, (muitas vezes modelam. Como a poesia­ -performance, produto de oficinas poéticas), e uma os poemas de linguagem em geral ênfase excessiva no lirismo pessoal, resistem à interpretação e convidam­ à em detrimento do gesto público. participação. A escola formal está asso­ciada a Poesia orientada à performance Story Line Press; Dana Gioia (poeta­ — conjuntos de operações ca­suais -empresário); Philip Dacey e David como as do compositor John Cage, Maxine Hong Kingston Jauss, poetas e editores de Strong improvisações de jazz, traba­ lhos­ com Measures: Contemporary American meios mistos e o surrea­ ­lismo europeu Poetry in Traditional Forms [Medidas — têm influenciado muitos poetas For­tes: Poesia Americana Contem­ americanos. Entre as figuras famosas, porânea em Formas Tradicio­nais] temos Laurie Anderson (1947- ), autora (1986); Brad Leithauser; e Gjertrud do sucesso­ internacional United States Schnackenberg. The Direction of [Es­ta­dos Unidos] (1984), que usa filme, Poetry: Rhymed and Metered Verse vídeo, acústica e música, coreo­ ­grafia e Written in English Since 1977 [Os tecnologia espacial.­ A poesia­ do som, Rumos da Poesia: Versos com Rima e enfatizando a voz e os instrumentos, é Métrica, Escritos­ em Inglês a Partir de praticada por poetas como David Antin 1977], de Robert Richman, constitui (que faz apresentações improvisadas)­ uma das antologias mais recentes. e os no­va-iorquinos George Quasha Foto © Nancy Crampton Em­bora esses poetas tenham sido

97 acu­sados de estar recuando no tempo e tratando de temas do século 19, freqüentemente adotam posições e imagens con­tem­po­râneas, além da linguagem musical e das formas fechadas, tradi­ cionais. 

98 O LEGADO REALISTA E O FIM DA DÉCADA DE 1940 CAPÍTULO omo na primeira metade do século 20, a ficção da segunda metade refletia o espírito Cde cada déca­da. O fim dos anos 1940 viu as conseqüências­ da II Guerra Mundial­ e o início da Guerra Fria. PROSA8 AMERICANA A II Guerra ofereceu material de primeira: 1945-1990: Norman Mailer (The Naked and the Dead [Os Nus REALISMO E e Os Mortos] 1948) e James Jones (From Here to EXPERIMENTAÇÃO Eternity [Daqui para a Eternidade]­ 1951) foram os que melhor fizeram uso dele. Ambos utilizaram rea­ lismo beirando o naturalismo­ cruel e se esfor­çaram narrativa, nas décadas que se seguiram à II para não enaltecer o combate.­ O mesmo se deu Guerra Mundial, resistiu à generalização: era com The Young Lions [Os Jovens Leões] (1948) de A extremamente variada e multifacetada. Foi Irwin Shaw. Herman­ Wouk, em The Caine Mutiny revi­talizada por correntes internacionais como o [O Motim de Caim] (1951), também­ mostrou as exis­tencialismo europeu e o realismo mágico la­ fraquezas­ humanas, tão evidentes nos tempos de tino-americano enquanto a era eletrônica trouxe a guerra quanto nos de paz. aldeia global. A palavra falada na televisão trouxe Mais tarde, Joseph Heller retratou a II Guerra vida nova à tradição oral. Os gêneros orais, a mídia em termos satíricos e absurdos­ (Catch-22 [Beco e a cultura popular influenciaram cada vez mais Sem Saída] 1961), ar­gumen­­ tando­ que a guerra está a narrativa. impregnada de loucura. Thomas Pynchon apresentou No passado, a cultura de elite influenciava a cul­ um caso intricado e brilhante que parodia e desloca tura popular por seu status e exemplo; o processo diferentes versões­ da realidade­ (Gravity’s Rain­bow inverso parece ter ocorrido nos Estados­ Unidos dos [Arco-Íris da Gravidade]­ 1973). Kurt Vonnegut Jr. tor­ anos pós-guerra. Romancistas sérios como Thomas nou-se um dos expoentes da contracul­ tura­ do início Pynchon, Joyce Carol Oates, Kurt Vonnegut Jr., Alice dos anos 1970 com a publi­­­ cação­ de Slaughterhouse- Walker e E.L. Doctorow se inspiraram e comentaram Five; or The Chil­­dren’s Crusade [Mata­dou­ro-Cinco ou historias em quadrinhos, filmes, moda, música e A Cruza­­ da­ das Crian­ ças]­­­ (1969), romance antibélico­ história oral. sobre bombas incendiá­ rias­ lançadas pelos Aliados­ Dizer isso não é trivializar esta literatura: os escri­ em Dresden, Alema­ ­nha, na II Guerra (que presenciou tores nos Estados Unidos estão fazendo perguntas em terra, como prisio­ neiro­ de guerra). importantes, muitas de natureza metafísica. Eles se A década de 1940 viu florescer um novo con­ tornaram muito inovadores e autoconscientes, ou “re­ tingente­ de escritores, com o poeta-roman­cista- flexivos”. Geralmente achavam as formas tradicionais ensaísta Robert Penn Warren, os drama­tur­gos ineficazes e buscavam­ vitalidade no material mais Arthur Miller e Tennessee Williams e as contistas popular. Ou seja: os escritores americanos desenvol­ Kathe­rine Anne Porter e Eudora Welty. Todos, veram, nas décadas pós-guerra, uma sensibilidade menos Miller, eram do Sul. Todos exploraram o pós-moderna. A reestruturação modernista de pontos destino do indivíduo na família ou comunidade e de vista já não os satisfazia: era o contexto da visão enfocaram o equilíbrio entre crescimento pessoal que precisava ser reformulado. e responsabilidade para com o grupo.

Robert Penn Warren

99 (1905 - 1989) ao longo de várias décadas, incluíndo­ Robert Penn Warren, um Fu­­gitivo do All My Sons [Todos os Meus Filhos]­ Sul, desfrutou de carreira­ profícua por (1947) e The Crucible [O Ca­dinho] todo o sécu­ lo­ 20. Re­velou,­ ao longo (1953). Ambos são políti­cos — um de sua vida, preocu­pação com os contemporâneo, o outro­ ambientado valores democráticos­ dentro de seus na era colonial. O primeiro trata de um contextos históricos.­ Seu roman­ ce­­ mais industrial que, durante a II Guerra, per­ permanente, All the King’s Men [Todos­ mite a entrega de peças sabidamente­ os Homens­ do Rei] (1946), enfoca as defeituosas para­ fábri­ ­cas de aviões, implica­ções mais sombrias do sonho­­ causando a morte de vários pilotos americano­ — como visto no relato leve­ americanos. The Cru­ci­ble retrata o mente­­ camuflado da carrei­ ­ra de Huey julgamento de bruxas­ em Salem (em Long, exuberante e sinistro­ político do Massachusetts), no século 17, quando Sul. colonos­ puri­­ ta­ nos­ foram injusta­ mente­ condenados­ por bruxaria. Sua mensa­­­­ Arthur Miller (1915 -2005) gem, porém — de que “caças às bruxas” dramaturgo Arthur Miller, dirigidas a inocentes são aná­­­temas­­ natural de Nova York, teve numa democracia — era rele­vante na O seu auge em 1949 com Death era em que foi ence­ nada,­ no início dos of a Salesman [Morte de um Chaixeiro- anos 1950, quando­ a cruzada anti­ co­ ­ Viajante], estudo sobre a busca de um munista­ liderada pelo Senador­ Joseph homem por mérito e valor em sua vida­­ McCarthy e outros arrui­ nou­ a vida de e a realização de que o fracas­ so­ está muitos inocentes.­ Em parte em resposta sempre à espreita. Passado­ na família­ a The Crucible, Miller foi chamado da personagem principal, Willy Loman,­ perante a Comissão de Atividades a peça gira em torno de relaciona­ Antiamericanas do Congresso em 1956 mentos­­­ tumul­ tu­­­­ a­ dos­ entre pai e filhos,­ e foi solicitado a fornecer os nomes de mari­do e mulher.­ É um espelho­ das pessoas que pudessem se simpatizan­ atitudes­ literárias­ dos anos 1940, com tes do comunismo. Devido à sua recusa sua rica combinação­ de realismo­ tinto em fazê-lo, foi acusado de desrespeitar de natu­ ralis­ mo;­ personagens­ cuidado­ ­ o Congresso, acusação que foi retirada samente­ traçadas e bem acabadas­ e a Robert Penn Warren em apelação. insistência­ no valor do indivíduo,­ ape­ Uma peça sua posterior, Incident sar do fracasso­ e do erro. O romance é at Vichy [Incidente em Vichy] (1964), uma­ peã ao homem­ comum — a quem, tratava do holocausto — a destruição de como­ elogia a viúva de Willy Loman, muitos dos judeus europeus nas mãos “se deve dar atenção”. Tocante e som­ dos nazistas e seus colaboradores. Em bria, é também­­­­­ uma história de sonhos. The Price [O Preço] (1968), dois irmãos Como uma personagem­ comenta­ com lutam para se libertar dos fardos do ironia: “um vende­ dor­ tem que sonhar,­ passado. Um dos dramas de Miller menino.­ Faz parte do negócio.”­ incluía duas peças de um ato, Fame Death of a Salesman, um divisor [Fama] (1970) e The Reason Why [O de águas, ainda assim, é apenas um Porquê] (1970). Seus ensaios estão dos vários­ dramas escritos­ por Miller, Foto © Nancy Crampton colecionados em Echoes Down the

100 Corridor [Ecos ao Longo do Corredor] de Hellman, Scoundrel Time [Tempo (2000) e sua autobiografia,Timebends: de um Salafrário] (1976). A Life [Dobras do Tempo: Uma Vida], foi lançada em 1987. Tennessee Williams (1911 - 1983) Lillian Hellman (1906 - 1984) Tennessee Williams, natural do Como Robert Penn Warren, a visão Mississipi, foi dos indivíduos mais com­ moral de Lillian Hellman foi moldada plexos da cena literária america­ na­ em pelo Sul. Sua infância foi passada, na meados do século 20. Sua obra enfo­ maior parte, em Nova Orleans. Suas cava emoções­­ perturba­ das­ dentro­­­ das peças contrangedoras exploram as famílias­ — a maioria sulista. Era famoso muitas formas e abusos do poder. pelas repe­ti­­ções de en­can­tamento, Em The Children’s Hour [A Hora das dicção­ poéti­ ­ca sulista,­ cenários góti­ ­cos Crianças] (1934) uma garota mani­ estra­nhos e exploração freu­dia­na da puladora destrói as vidas de duas emoção humana. Um dos primeiros­ professoras ao dizer a todos que elas auto­ res­ americanos a assumir sua eral lésbicas. Em The Little Foxes [As homossexua­ lidade,­ Williams explicou­ Raposinhas] (1939), uma antiga e rica que os desejos de suas perso­ nagens­ família sulista luta por uma herança. atormentadas expres­ ­sa­vam sua soli­ Sua obra anti-facista Watch on the Rhine dão. Suas personagens­ vivem e sofrem­ [Sentinela no Reno] (1941) cresceu de intensa­ mente.­ suas viagens à Europa nos anos 1930. Escreveu mais de 20 dramas,­­­ muitos Suas memórias incluem An Unfinished dos quais auto­bio­gráficos. Che­gou Woman [Uma Mulher Inacabada] ao auge cedo na carreira – nos anos (1969) e Pentimento (1973). 1940 – com The Glass Me­­­na­gerie [Co­ Por muitos anos, Hellman se leção de Bichos­­ de Cristal]­ (1944) e A relacio­nou intimamente com o escri­ Street­car Named Desi­re [Um Bonde­ tor de scripts Dashiell Mannett, cuja Chama­ do­ Desejo]­ (1949). Nenhuma­­ persona­gem, o detetive experiente obra­ posterior, ao longo de mais de Sam Spade, fascinou os americanos duas décadas, chegou ao su­cesso e durante a Depressão. Hammett in­ rique­za destas duas. ventou o roman­ ce­ de detetive durão Tennessee Williams fundamentalmente­ americano: The Katherine Anne Porter Maltese Falcon [O Falcão Maltês] (1890 - 1980) (1930) e The Thin Man [O Homem A carreira de Katherine Anne Por­ Magro] (1934). ter abrangeu várias­ eras. Seu primeiro­ Hellman, Como Arthur Miller, recu­ su­ces­so, o conto “Flowering Judas” sou-se a fornecer nomes à Comissão [O Des­­pontar de Judas] (1929), se de Atividades Antiamericanas do passava no México, na re­volu­ ção.­ Os Congresso e ela e Hammett foram contos maes­tral­mente escritos que colocados na lista negra (impedidos de lhe de­ram no­torie­ dade­ desven­dam trabalhar na indústria de entretenimen­ com sutil­eza vidas pes­­soais. “The to americana) por certo tempo. Estes Jilting of Granny Wea­therall” [O Fim eventos são recontados nas memórias Foto © Nancy Crampton do Noiva­­­ ­do de Granny­ Weatherall],­ por

101 exemplo, transmite grandes­ emoções­ e afirma­tivo, como no con­to muito com precisão.­ Ela re­vela,­ muitas vezes,­ comen­ tado­ “Why I Work at the P. O.” expe­­ ri­ ências­ interiores­ das mulhe­ res­ e [Por­que Trabalho­ nos Correios],­ sobre sua depen­ dência­­ dos homens.­ a filha­ teimosa­ e indepen­ dente­ que sai Os matizes de Porter se devem mui­­­to de casa para viver numa minúscula às histórias da neo-zelande­ sa­ Katherine agência dos correios.­ As coletâneas­ de Mansfield. As coletâneas­ de contos de contos­ inclu­ em­ The Wide Net [A Rede Porter incluem­ Flowering Judas (1930), Am­pla] (1943), The Golden Apples [As Noon Wine [Vinho do Meio-Dia] (1937), Maças Douradas]­ (1949), The Bride of Pale Horse, Pale Rider [Cavalo Pálido,­ the Innisfa­llen [A Noiva­­ de Innisfallen]­ Cavaleiro Pálido](1939),­ The Leaning (1955) e Moon Lake [La­go da Lua] Tower [A Tor­­re Inclinada] (1944) e (1980). Também­ escre­veu roman­­ ­ces Collected Stories [Coletânea­ de His­ como Del­ta Wedding [Casa­mento­­­ tórias] (1965). No início dos anos 1960, no Delta]­­ (1946), sobre uma famí­ ­lia escre­veu um longo romance alegórico de fazen­ deiros­ na atua­ ­lidade,­ e The com um tema atem­po­ral — a responsa­­ Optimist’s Daughter [A Filha do Oti­ bi­lidade dos homens­ uns pelos outros.­ mista] (1972). Inti­tu­lado Ship of Fools [Navio de Tolos]­ (1962), se passava no fim da década OS ANOS 1950 de 1930 a bordo de um transatlân­ ­ti­co A década de 1950 viveu o impacto­ le­vando membros­ da elite e refugia­ ­dos retardado da moder­nização e tec­ ale­mães da nação nazista.­ nologia na vida diária. Não só a II ão muito prolífica, Porter ainda­ Guer­ra Mundial derrotou o fascismo, assim influen­ ciou­ gerações de mas tirou a América da Depres­­ Nescritores, dentre eles suas co­ são, e os anos 1950 per­mitiram­­ aos legas sulistas, Eudora Welty e Flannery americanos­ tempo para usu­fruir da O’Connor. prospe­ ri­­ dade­ há mui­to ansiada. Os negó­ cios,­ sobretudo­ no mundo das Eudora Welty (1909 - 2001) corpo­ rações,­ pare­ciam oferecer a ascida no Mississipi, de fa- boa vida (em geral, nos subúr­bios), mília abastada do Norte, com suas mar­cas reais e simbólicas Eudora Welty foi guiada­ por de su­cesso — casa, car­ro, tele­visão e N Eudora Welty Robert Penn Warren e Katherine Ann ele­tro­domésticos. Porter. Porter,­ de fato,­ escre­ ­veu o prefá­ Porém, a solidão nas altas esferas era cio à primeira­ coletânea­ de contos de tema dominante para muitos escritores; Welty, A Cur­tain of Green [Uma Cortina o empresário sem rosto tornou­ -se este­ de Verde] (1941). Welty inspirou a reó­tipo cultural­ em The Man in the Gray obra mati­ zada­ em Porter, mas a jovem Flannel Suit [O Homem de Terno de se interessou­­ pelo cômico e o grotes­­­­­­ Flane­ la­ Cinza] (1955), best-seller de Sloan co. Como o colega sullista Flannery­ Wilson. A alienação generalizada­ na O’Connor, Welty muitas vezes usa­va América­ foi examinada pelo sociólogo persona­ gens­ anormais,­ ex­cêntri­­ cas­ ou Da­vid Riesman em The Lonely Crowd excep­cionais­ como tema. [A Multidão­ Solitá­ ria]­­ (1950). Apesar da violência em sua obra Foto © Nancy Crampton Ou­tros estudos­ popula­ ­res, mais ou seu espírito é essencialmente humano­­ 102 menos científicos, se seguiram,­ de The “comitê de boas-vindas” quande tenta Hidden Per­sua­­­­ders [Os Per­­suasores­­ se mudar para uma vizinhança branca. Ocultos]­ (1957) e The Status Seekers Alguns escritores­ foram­ além ao [Os Perseguidores­ de Status] (1959) de enfocar em personagens que ficaram Vance Packard ao The Organization Man década pelo caminho, como fez J.D. Salinger [O Homem da Organi­ za­ ção]­ (1956) de Ade 1950 foi, em em The Catcher in the Rye [O Apanha­ William Whyte e às formulações mais dor no Campo Centeio] (1951), Ralph intelec­ tuais­ de C. Wright Mills — Whi­te termos literários, Ellison em Invisible Man [Homem Collar [Cola­ rinho­ Branco] (1951) e The na realidade,­ de Invisível] (1952) e Jack Kerouac­ em On Power Elite [A Elite do Poder] (1956). tensão sutil e the Road [Na Estra­­ ­da] (1957). Em 1959, O economista e acadêmico John K. difusa. Roman­ Philip­ Roth chegou­­ com uma série de Galbraith contri­ buiu­ com The Affluent ces de John contos refle­­ tindo­ sua própria­ aliena­ ção­ Society [A Sociedade da Opu­­ ­­lência] de sua heran­ça judaica (Good­­bye, (1958). O’Hara, John Columbus [A­deus, Columbus]). Suas maioria des­sas obras apoiava Cheever­­­ e John ru­mi­nações psicológi­cas ainda ins­ a pre­sunção dos anos 1950 Updike exploram piram a ficção e até autobiografia­ em Ade que todo america­no des­ a tensão à espreita plena novo milênio. frutava um esti­ lo­ de vida comum.­ Os A ficção dos escritores judeus estudos fala­vam em termos­ genéricos, nas sombras americanos­ Bellow, Bernard Malamud critican­do cidadãos­ por terem perdido da satisfação e Isaac Bashevis Singer — entre outros o individua­lismo de fronteira e se aparente. proeminentes na década de 1950 torna­do muito conformistas­ (Riesman e anos posteriores — também são e Mills, por exem­plo); ou aconselhan­ adições valiosas e fascinantes ao do as pessoas­ a se tornarem­ parte da compêndio da literatura­ americana. A “Nova Classe” criada­ pela tecnologia­ e produção desses­ autores é notável por o lazer­ (como­ nas obras de Galbraith). seu humor, preocupação­ ética­ e retrato A década de 1950 foi, em termos das comunidades­ judaicas­ no Velho e literários, na realidade,­ de tensão sutil no Novo Mundo. e difusa. Romances­ de John O’Hara, John Chee­­­ver e John Updike explo­ John O’Hara (1905 - 1970) ram a tensão à espreita nas sombras Formado em jornalismo, John da satisfação aparente. Algumas das O’Hara foi um autor prolífico de peças melhores obras retratam ho­mens teatrais, contos e romances. Era mestre que fracassam­ na luta pelo sucesso, do deta­ lhe­ cuidadoso e revelador e é como em Death of a Salesman [Mor­ mais lembrado por vários romances­ te de um Caixeiro Viajante] de Arthur rea­listas escritos, em sua maio­ria, Miller e Seize the Day [Apro­veite o nos anos 1950, sobre pessoas­ aparen­ Dia] (1956), no­vela de Saul Bellow. temente bem-sucedidas­ cujas­ falhas­ A afro-americana Lorraine Hansberry internas e frustrações deixam-nas (1930-1965) re­velou­­ o racismo como vulnerá­veis. Estes romances incluem uma tendên­ cia­ contínua em sua peça Appointment in Samarra [Encontro em tocante A Raisin in the Sun [Uma Passa Samarra] (1934), Ten North Frederick ao Sol], de 1959, na qual uma família [Fre­derick­ Norte, Dez] (1955) e From negra se encontra com um ameaçador the Terrace [Do Terraço] (1958).

103 que vive­ uma existência subterrânea, James Baldwin (1924 - 1987) numa adega feericamente ilumi­ nada­ James Baldwin e Ralph Ellison refle­ com eletricidade roubada da conces­ tem a experiência afro-americana­ nos sionária elétrica. O livro relata suas anos 1950. Suas persona­ ­gens sofrem de experiências grotescas de desencanto. falta de identidade­ em vez de excesso Quando ele ganha uma bolsa para estu­ de ambição.­ dar numa facul­ ­dade negra, é humilhado Bal­dwin, o mais velho de nove ir­ pelos brancos; quando chega à faculda­ mãos, nascido no Harlem, Nova York, foi de, vê o reitor negro desprezando­ os criado por um pregador. Ainda jo­vem, anseios dos americanos negros.­ A vida Baldwin pregou algu­ ­mas vezes­ na igreja. fora da faculdade também é corrupta. Isso o ajudou a moldar­ a fascinan­ ­te Nem sequer a religião serve de con­ qua­lidade oral de sua prosa, claramen­ solo: o prega­dor acaba se revelando te notada em ensaios excelentes como um crimi­noso. O romance culpa a “Letter from a Re­gion of My Mind” [Carta sociedade por não dar aos cidadãos — de uma Região­ de Minha­ Mente”] da negros e brancos — ideais viáveis e as coletâ­ nea­ The Fi­re Next Time [O Fogo instituições necessárias­ para realizá-los. da Próxi­ ma­ Vez] (1963). Nesta, defendeu­ Encarna um tema racial poderoso, pois ar­dorosamente o fim da segregação­ o “homem­ invisível” não é invisível por racial. si, mas porque os outros, cegados­ pelo primeiro romance de Baldwin, preconceito, não conseguem­ enxergá­ o autobiográfico Go Tell It -lo como ele é. OOn the Mountain [Vá Dizer à Montanha] (1953), é talvez o mais Flannery O’Connor famoso.­ É a história de um jovem de (1925 - 1964) 14 anos que busca autoconhecimento­ Flannery O’Connor nasceu na e fé religiosa enquanto se debate­ com Georgia e teve sua vida abreviada ques­­tões de conversão­ cris­tã numa pelo lúpus, doen­ça fatal do san ­ igreja atrás de um arma­ zém.­ Outras­ gue. Ainda assim, re­jei­tou o senti­ obras importan­tes incluem Another mentalismo, como provam suas Country [Um Outro País] (1962) e James Baldwin histórias bem joco­sas, ainda que Nobody Knows My Name [Ninguém­ soturnas e des­com­promissa­das. Sabe Meu Nome] (1961), coletânea­ de Ao contrá­rio de Anne Porter, ensaios pessoais apaixonados­ sobre­ Eudora Welty e Zora Neale Hurston, racis­ mo,­ o papel do artista e literatu­ ra.­ O’Connor guardava, na marioria das vezes, distância das perso­na­gens, Ralph Ellison (1914 - 1994) reve­lan­do suas ina­­de­qua­ções e to­ Ralph Ellison nasceu em Oklahoma, lices.­ Per­sonagens­ sulis­tas in­cultas­­ no Meio-Oeste, e estudou no Instituto geram violên­ ­cia por supers­ ­­tição ou Tuskegee, no Sul dos Estados Unidos. re­ligião, como­ vemos em Wi­se Blood Teve uma das carreiras­ mais estranhas [San­gue Sábio] (1952), romance so­ na literatura americana — um livro bre um fanático religioso que funda muito aclamado­ e nada mais. sua própria igreja. O romance é In­­visible Man [Homem­ Foto © Nancy Crampton Às vezes a violência vem do pre­­­ Invisível] (1952), história de um negro 104 conceito, como em “The Dis­pla­­ced mais cômica: usou vários narra­­ ­dores Person” [A Pessoa Deslocada],­ sobre­ vigorosos­ e aventu­­ rei­ ros­ na primeira um imigrante assassi­ nado­ pela popula­ pessoa em The Adventures of Augie ção rural igno­ rante,­­ ameaça­ da­ por seu March [As Aventuras de Augie March] tra­balho duro e diferen­ ­tes costumes. (1953) — estudo de um empresário urba­ Muitas vezes, eventos­ cruéis simples­ no, do gênero ‘Huck Finn’, envolvido­ no men­te acon­tecem­ com as persona­ gens,­ mer­­cado negro europeu — e emHender ­ como em “Good Coun­try People” [Bom son the Rain King [Hender­ son,­ o Rei da Povo Rural], história­ de uma menina­ Chuva] (1959), roman­ ce­ sério-cômico seduzida pelo homem­ que rouba sua brilhante­ e exuberante­ sobre­ um mi­ perna artificial. lionário­ de meia-idade cujas ambições­ O humor negro de O’Connor a frustradas­ o levam à África. liga a Nathanael West e Joseph Heller.­ Seus trabalhos posteriores­ incluem Produziu as coletâneas­ de contos A Herzog (1964), um professor de inglês­ Good Man is Hard to Find [É Difícil­ neu­ró­­tico espe­ ­cializa­do na idéia do ser Achar um Homem Bom] (1955) e Român­ ­tico;­ Mr. Samm­ler’s Planet [O Everything that Rises Must Converge Planeta­ do Sr. Sammler]­ (1970); Hum­­ [Tudo que Sobe Tem de Conver­ ­gir] boldt’s Gift [O Presente de Humboldt]­ (1965); o romance The Violent Bear It (1975) e o autobiográfico­ The Dean’s Away [Os Violentos Agüentam]­ (1960) December [O Dezembro­ do Reitor]­ e um volume de car­­tas, The Habit (1982). of Being [O Hábi­to de Ser] (1979). Ao fim dos anos 1980, Bellow escre­ The Complete Stories [Os Contos veu dois novelas em que protagonistas­ Completos] saiu em 1971. idosos buscam as verdades supre­ ­mas, Something to Remember [Algo para se Saul Bellow (1915 -2005) Lembrar] (1991) e The Actual [O Real] Nascido no Canadá e criado em Chi­ (1997). Seu romance Ravelstein (2000) cago, Saul Bellow é de origem russa­ é um relato velado da vida de Alan -judaica. Estu­ ­dou antropologia­ e so­ Bloom, amigo de Bellow, autor do best- ciologia, mar­cantes em seus trabalhos. -seller The Closing of the American Mind Declarou-se uma vez profundamen­ te­ Ralph Ellison [O Fechamento da Mente Americana] grato­­ a Theodore Dreiser­ pela abertu­ ra­ (1987), um ataque conservador à acade­ para uma ampla gama de experiências­ mia pela erosão percebida dos padrões e seu comprometimento­ emocional­ na vida cultural americana. com isto. Muito­ respeitado, recebeu o Seize the Day [Aproveite o Dia] de Prêmio Nobel­ de Literatu­ ra­ em 1976. Bellow é uma novela brilhante centrada Seus primeiros romances, existen­ num em­pre­sá­rio fracassado, Tommy cialistas e meio sotur­nos, inclu­em Wilhelm,­ tão consumido por sen­­ti­ Dangling Man [O Homem­ Dependu­­ mentos de inadequação, que se torna rado] (1944), estudo­ Kafka­ ­­niano de totalmente inadequado — um fracasso um homem aguar­dando a convocação­ com as mulheres, empregos, máquinas pelo Exér­ ­cito, e The Victim [A Vítima] e o mercado de commodities, onde (1947), sobre­ as rela­ ções­ entre judeus e perde todo a sua fortuna. Wilhelm­ é gen­tios. Nos anos 1950, sua visão ficou­­ Foto © Nancy Crampton exem­plo do schlemiel do folclore judai­

105 co — vítima ine­vitável­ de toda espécie de má sorte. Isaac Bashevis Singer (1904- 1991) Bernard Malamud O romancista ganhador do Prê­ (1914 - 1986) mio Nobel e mestre dos contos Isaac Bernard Malamud nasceu em Nova Bashevis Singer — polonês emigra­ do­ York, filho de imigrantes russos-judeus.­ para os Estados Unidos­ em 1935 — era Em seu se­gun­­do romance, The Assistant filho de um proemi­ nente­­ líder de um [O Assistente]­ (1957), Malamud achou tribunal­ rabínico­ em Varsóvia.­ Escreveu seus temas característicos­ — a luta do em iídiche­ durante toda a vida e tratou, homem para sobreviver,­ apesar­ das em termos míticos e realis­ tas,­ de dois dificuldades,­ e os fundamentos éticos­ grupos específicos de judeus — os dos imigran­ tes­ judeus recentes.­ moradores­ das shtetls, pequenas aldeias ua primeira obra publicada foiThe do Velho Mundo, e os emigrantes que Natural [O Natural] (1952), com­­ atra­ves­saram o oceano no século 20, Sbinação de realismo e fanta­ sia­ no antes e depois da II Guerra. mundo mítico do beisebol­ profis­­ sional.­­ As obras de Singer foram supor­ tes­ de Outros romances incluem­ A New Life livros sobre o Holocausto. De um lado,­­ [Uma Nova Vida]­ (1961), The Fixer [O descre­veu — em romances como­­­ The Negocis­ta] (1966), Pictures of Fidelman Ma­nor [A Mansão] (1967) eThe Estate [A [Retra­tos de Fidelman] (1969) e The Propriedade] (1969), passados­ na Rússia Te­nants [Os Inquilinos] (1971). do século 19, e The Family Moskat [O Tam­bém era um mestre prolífico­ Moskat­ da Família] (1950), falando sobre dos contos.­ Através de suas histórias,­ uma família­ polonesa-judaica vivendo em coletâneas como The Ma­gic Bar­rel entre as duas guerras — o mundo já [O Barril Mágico] (1958), Idiots First desapa­ recido­ dos judeus­ europeus. [Idiotas Primeiro] (1963) e Rembrandt’s Com­plementando­ essa visão, havia os Hat [O Chapéu­ de Rembrandt] (1973), textos passados­ após a guerra,­ como­ transmitiu­ — mais do que qualquer outro­ Enemies, A Love Story [Inimigos,­ Uma escritor nascido nos Estados Unidos — Histó­ ria­ de Amor] (1972), cujos prota­ um sentido do presente e do passado gonistas, sobre­viventes do Holocaus­ to,­ Bernard Malamud judeus, do real e do surrealista,­ fato e procura­vam reconstruir suas vidas. lenda. A obra monumental de Malamud­ Vladimir Nabokov — ganhadora do Prêmio Pulitzer e do (1889 - 1977) National Book Award — é The Fixer. omo Singer, Vladimir Nabokov Passada na Rússia da virada­ do século era imigrante da Europa Ori­ 20, é uma pálida amostra de um caso Cental. De família rica na Rússia real de calúnia racial — o julgamento czarista, veio para a América em infame­ de Mendel Bliss, em 1913, 1940 e obteve­ a cidadania americana­ triste­ mancha anti-semítica na história­ cinco anos depois. De 1948 a 1959, le­­ moderna. Como em muitas de suas cionou literatura na Universidade­ de obras,­ Malamud destaca os sofrimentos­ Cornell, no norte de Nova York; em do herói, Yakov Bok, e sua luta para Foto © Nancy Crampton 1960, transferiu-se permanentemente­ sobreviver contra todas­ as dificuldades. 106 para a Suíça. sas, filhos e amigos. É famoso­ por seus romances,­ que Uma estranha melancolia e um de­ incluem­ o auto­ bio­ grá­ fico­ Pnin (1957), sejo jamais plenamente­ saciado ainda sobre um professor russo emigrado que aparentemente­ inútil de paixões ineficaz, e Lolita (edição americana,­ e certezas metafísicas se esgueira nas 1958), sobre um europeu instruído sombras­ dos magistralmente escritos de meia-idade que se apaixona por contos Chekovianos, reunidos em uma america­na de apenas­ 12 anos. The Way Some People Live [O Mo­ Seu romance pastiche,­ Pale Fire [F­ogo do Como Algumas Pessoas Vivem] Pálido] (1962), outro empreendi­ men­­ (1943), The Housebreaker of Shady Hill to bem-sucedido, enfoca um lon­go [O Arrombador de Shady Hill] (1958), poema escrito por um faleci­ do­ poeta Some People, Places and Things That imaginário e os comentá­ rios­ sobre o Will Not Appear in My Next Novel mesmo de um crítico cujos escritos [Algumas Pessoas, Coisas e Lugares dominam o poema e inesperadamente que Não Aparecerão em Meu Próximo assumem­ vida própria. Romance] (1961), The Brigadier and the Nabokov é um escritor importan­ te­ Golf Widow [O Brigadeiro e a Viúva do por sua sutileza estilística,­ habilidade Golfe] (1964), e The World of Apples [O satírica e engenhosas inovações na Mundo das Maçãs] (1973). Seus títulos forma, que inspira­ram romancistas revelam sua característica despreocu­ como John Barth. Nabokov estava pação, espírito jocoso e irreverência e ciente de seu papel de mediador en­ insinuam­ seu tema. tre os mundos literá­ rios­ americano e Cheever publicou­ também vários russo; escreveu um livro sobre Gogol e romances — The Wap­shot Scandal [O traduziu o Eugene Onegin, de Pushkin. Escândalo Wapshot]­ (1964), Bullet Park Seus temas­ ousados, um tanto expres­ (1969) e Falconer (1977) — o último, sio­nistas, como o estranho amor em bem autobiográfico. Lolita, ajudaram a introduzir as corren­ tes expressionistas euro­péias do século John Updike (1932 - ) 20 na tradição essen­ cialmente­ realista omo Cheever, John Updike­ da ficção ameri­­ ­cana. Seu tom, em parte John Cheever é também considerado um satíri­ co­ e em parte nostálgico, também Cescritor de maneiras, pelos ce­ sugeria novo registro sério-cô­mico nários suburbanos,­ temas domés­ ticos,­ emocional usado por autores­ como reflexões sobre tédio e melancolia­ e, Pynchon, que combina notas opostas­ em especial, seus cenários­ fictícios de humor e medo. no litoral leste, em Massachusetts e Pensil­vânia. John Cheever (1912 - 1982) É mais famoso pelos cinco livros John Cheever tem sido muitas vezes Rabbit, descrições da vida de um chamado de “romancista de maneiras”. homem­­­ — Harry “Rabbit” Angstrom­ É conhecido por seus contos elegantes — nos altos e baixos de sua e­xis­ e sugestivos, que perscrutam o mundo tência por quatro­ décadas­ da história dos negócios­ de Nova York, por seus sócio-política americana. Rabbit, Run efeitos sobre os empresários, suas espo­ Foto © Nancy Crampton [Rabbit,­ Corra] (1960) é um espelho­

107 dos anos 50, com Angstrom como­ um J.D. Salinger tem retratado­ tentativas­ de jo­vem marido sem rumo e alienado.­ se desistir da sociedade.­­ Nascido em Rabbit Re­dux (1971) — sali­ ­entando a Nova York, obte­ve sucesso literário­ com contra­ cultura­ dos anos 1960 — encontra­ a publi­ cação­ do romance­ The Catcher Angstrom ainda sem propósito, obje­­ in the Rye [O Apanha­ dor­­ no Campo tivo claro ou rota de fuga da rotina.­ Em de Centeio] (1951), que fala de Holden­ Ra­bbit Is Rich [Rabbit É Rico]­­ (1981), Caul­field, jovem de 16 anos sen­­sí­­vel que Harry torna-se próspe­­ ro­ empresárionos foge do colégio interno de elite para anos 1970, no fim da guerra do Viet­ buscar a vida adulta no mun­do exterior nã. Rabbit at Rest [Rabbit­ Descan­­ sa]­ e se desilude com seu materialismo e (1990), vislumbra­­­ a recon­ ci­­ liação­ de sua falsidade.­ Angstrom com a vida, antes da morte Quando inquirido sobre o que gos­­ por ataque cardíaco, contra o pano taria de ser, Caulfield diz: “um apanha­ de fundo dos anos 1980. Na novela dor no campo de centeio”,­ mal citando de 1995 Rabbit Remembered [Rabbit um poema de Robert Burns. A seu ver, Lembrado], os filhos adultos de lem­ ele é a versão­ moder­ na­ do cavaleiro bram de Rabbit. branco, único­ defensor da inocên­ cia.­ Outros romances de Updike­ incluem­ Imagina um cam­po de cen­teio tão The Centaur [O Centauro] (1963), alto­ que crianças não podem ver para­ Couples [Casais]­ (1968), A Month of onde correm­ quando ali brincam.­ Ele Sundays [Um Mês de Domingos] (1975), é o único adulto. “Estou­ à beira de um Roger’s Version [A Versão de Roger] preci­pício louco. O que tenho a fazer­ (1986) e S. (1988). Updike cria um alter é pegar­­ todos que corram­­ para­ ele.” A ego — um escri­ ­tor cuja fama ironica­ que­da no precipício equivale­ à per­da mente ameaça­ cala-lo — noutra série da inocência­ infantil — tema freqüente­­ de romances: Bech: A Book [Bech: Um na época. Livro] (1970), Bech is Back [Bech Está Outras­ obras­ do escritor­ recluso­ e de Volta] (1982) e Bech at Bay [Beck ao frugal incluem­ Ni­ne Stories [No­ve His­ Largo] (1988). tórias] (1953), Franny and Zooey (1961) pdike possui estilo mais brilhan­­ e Raise High the Roof-Beam, Carpenters te que qualquer dos autores­ de John Updike [Er­gam Bem Alto a Cumeeira,­ Carpin­­ Uhoje e seus contos oferecem­ teiros]­ (1963), coletânea de histórias­ exem­plos cintilantes de sua variedade­ da revista­ The New Yorker. Desde sua e criatividade.­ Suas coletâneas­ incluem­ última­ história em 1965, Salinger­ — que The Same Door [A Mesma Porta] vive em New Hampshi­ re­ — mantem-se (1959), The Music School [A Escola de ausente da cena literária americana. Música] (1966), Museums and Wo­men [Museus e Mulheres]­ (1972), Too Far To Jack Kerouac (1922 - 1969) Go [Longe­ Demais]­ (1979) e Problems De origem franco-canadense pobre, [Problemas] (1979). Também escre­veu Jack Ke­rouac também questionou os vários volu­ mes­ de poesias e ensaios. valores da classe media. Encontrou-se com membros do submun­ ­do literá­ ­rio J.D. Salinger (1919 - ) “beat” quando estudante na Univer­ Precursor do que viria nos anos 60, Foto © Nancy Crampton sidade­ de Colum­ bia,­ em Nova York.

108 Sua ficção foi influen­ ciada­­ pela obra Capote — romancista que havia levemen­te autobiográfica do sulista deslum­ bra­ do­ leitores como enfant Thomas Wolfe. terrible, no fim dos anos 1940 e 1950, eu romance mais famoso, On em obras como Breakfast at Ti­ffa­ the Road [Na Estrada] (1957), alienação ny’s [Bonequinha de Luxo] (1958) descreve os “beatniks” peram­­ — ator­do­ou-os com In Cold Blood [A S e tensãoA latentes bu­­lando pela América em busca do Sangue Frio] (1965), aná­­li­se eletri­ sonho idealis­ ­ta de vida comunitária na década de zante de um assassinato em massa e beleza. The Dharma Bums [Os 1950 encontraram brutal no coração da América com Vagabundos de Dharma] (1958) expressão, nos ares de romance po­licial. enfo­ ca­­ intelectuais peripa­téticos­ da anos 1960, nos Ao mesmo tempo, surgiu o No­vo contracultura­ e seu fascínio pelo Estados Unidos, Jornalis­ mo­ — volumes de não-ficção­ Zen Budismo. Kerouac também es­ que uniam jornalismo­ e téc­nicas­ de cre­veu um livro de poesias, Mexico no movimento ficção ou que freqüentemente­ brinca­­ City Blues [Tris­teza na Ci­dade do de direitos civis, vam com os fatos, moldando-os para Méxi­co] (1959), e obras sobre a vida­ feminismo, aumentar a dramati­ ­ci­dade e imediatis­ com beatniks como o romancista protestos contra a mo da história. Em The Electric Kool-Aid experimental William Burroughs e o Acid Test [O Teste do Ácido do Refresco poeta Allen Ginsberg. guerra, ativismo Elétri­co] (1968), Tol Wolfe (1931- ) de minorias e na festejava os esgares­ do roman­ ­­cista Ken OS TURBULENTOS PORÉM chegada de uma Kesey (1935-2001) e sua sede de viagens­ CRIATIVOS ANOS 60 contracultura na contracul­ ­tura; Radical Chic and Mau- A alienação e tensão latentes cujos efeitos Mauing the Flak Catchers [Radi­ ­cal-Chic na dé­cada de 1950 foram ex­ e o Terror dos RPS] (1970) ridiculari­ pres­sas nos anos 1960, nos ainta estão sendo zava mui­tos aspectos do ativis­mo de Estados­ Unidos, no movimento pelos­ absorvidos esquerda. Wolfe, mais tarde, escreveu di­reitos civis, feminismo, protestos pela sociedade uma história­ exuberante­ e perspi­ caz­ do contra a guerra,­ ativismo de minorias e americana. início do programa­ espacial americano, na chegada da contracultura­ cujos efei­ The Right Stuff [Os Eleitos] (1979), e um tos ainda estão sendo absor­ vidos­ pela ro­mance, The Bon­fi­re of the Vanities [A sociedade americana. Obras­ polí­ ticas­ Fogueira das Vaidades] (1987), retrato e sociais notáveis da época incluem­ panorâmico­ da sociedade­ americana­ os discursos­­ do líder dos direitos civis, na década de 1980. Dr. Martin­ Luther­ King, Jr., os textos No correr dos anos 1960, a literatura iniciais da líder femi­ nista­ Betty Friedan fluiu com a turbu­lência­ da época. (The Femini­ne Mystique [A Mística Surgiu uma visão irô­nica, cô­mica, Feminina], 1963) e The Armies of the refletida na fabulação de vários escri­ Night [Os Exércitos da Noite] (1968), tores. Exemplos incluem o sortuno e de Norman Mailer,­­ sobre uma marcha cômico One Flew Over the Cuckoo’s contra a guerra, em 1967. Nest [O Estranho no Ninho] (1962) Os anos 1960 foram marcados de Ken Kensey, romance sobre a vida por menor nitidez­ na distinção entre num hospício,­ onde enfermei­ ros­ são ficção e fato, romance e re­­portagem, mais pertur­ ­bados que internos,­ e o tendência mantida até hoje. Truman­ extra­ ­vagante­ e fantasista­ Trout Fishing

109 in Ameri­ca [A Pesca de Trutas­ na América] (1967), Thomas Pynchon, autor misterioso e avesso à de Richard Brautigan.­ pu­bli­cidade, nasceu em Nova York e formou-se, O cômico e o fantás­ tico­ geraram um novo gênero, em 1958, pela Univer­sidade de Cornell, onde meio cômico e metafísico,­ nos paranóicos e brilhan­­ pode ter sido influenciado por Vladimir Nabokov.­ tes V (1963) e The Crying of Lot 49 [O Choro­ do Lote Certamente, suas fantasias inovadoras usam 49] (1966), de Thomas Pyn­chon, Giles Goat-Boy temas de dicas de tradução, jogos e códigos que [Giles, O Pastor de Cabras] (1966) de John Barth e os pode­riam derivar­ de Nabokov. O tom flexível de contos grotescos­ de Donald Barthelme (1931-1989), Pynchon pode modular paranóia em poesia. cuja primei­ ra­ coletânea,­ Come Back, Dr. Cali­gari oda a ficção de Pynchon tem estrutura [Vol­te, Dr. Caligari] foi publica­ da­ em 1964. semelhante. Uma ampla trama é desconhe­ Esse novo gênero passou a ser chamado de meta­ Tcida de pelo me­nos uma das personagens ficção — ficção consciente ou reflexiva que chama a prin­ci­pais, cuja tarefa passa a ser criar ordem em tenção para a sua própria técnica. Tal “ficção sobre meio ao caos e deci­frar o mundo. Este projeto, ficção” enfatiza a linguagem e o estilo e deixa as con­ função do artista­ tradicional, também­­­ é passado­ venções do realismos, como personagens redondas, ao leitor, que de­ve seguir o de­senrolar dos fatos e uma trama crível que permita o desenvolvimento buscar pis­tas e significados. Esta visão paranóica­ de uma personagem e ambientes apropriados. Na se estende por con­tinen­tes e eras diversas, já que metaficção, o estilo do escritor atrai a atenção do Pyn­chon usa a metáfora da entropia, a desarticu­­ leitor. O verdadeiro sujeito não é a personagem, mas lação gra­dual do univer­so. O gran­de domí­nio da a própria consciência do autor. cultura popular—sobretudo a ficção cien­tífica e Críticos dessa época geralmente agrupavam policial — é visível em suas obras. Pynchon, Barth e Barthelme como metaficcionais, Seu V é levemente estruturado­ em torno­ de Benny juntamente com William Gaddis (1922-1998), cujo Profane — um fracassado­­ que insiste em perambu­ ­ longo romance JR (1975), sobre um rapaz que constrói lações sem sentido e várias­ em­prei­­ta­das estranhas­ — e um falso império de negócios com base em títulos de seu opos­to, o letrado Herbert Stencil, que pro­­cura sucata, prevê de forma sinistra os excessos futuros uma espiã miste­­­ riosa,­ V (alter­ nativamente­­ Vênus,­­ de Wall Street. Seu romance mais curto e accessível, Virgem, Vazio).­ The Crying of Lot 49, obra curta, trata­ Carpenter’s Gothic [O Gótico de Carpenter] (1985), de um sistema secreto associado ao serviço de correio­ combina romance com ameaça. Gaddis é muitas americano. Gra­vi­ty’s Rainbow [Arco-Iris da Gravidade]­ vezes associada ao filósofo e romancista do Meio- (1973) se passa em Londres,­ na II Guerra­ Mundial, Oeste, William Gass (1924 - ), mais conhecido por sua quan­do bombas caíam na cidade, e conta­ a busca cuidadosa obra inicial, Omensetter’s Luck [A Sorte de farsante, ainda que sim­bólica, de nazistas e outras Omensetter] (1966), e por seus contos na coletânea figuras disfar­ ­çadas. In the Heart of the Heart of the Country [No Coração Em Vineland [Vinhedo] (1990), obra cômica de do Coração do País] (1968). Pynchon ambientada no norte da Califórnia, forças Robert Coover (1932 - ) é outro escritor de meta­ fic­­ sombrias dentro de agências federais põem indivíduos ção. Sua coletânea de contos Pricksongs & Descants em perigo. Em Mason & Dixon (1997), parcialmente [ Pontos & Contrapontos] (1969) brinca com enredo ambientado em terras ermas em 1765, dois explorado­ familiares de lendas e cultura popular, enquanto seu ro­ res ingleses pesquisam a linha que iria dividir o Norte mance The Public Burning [A Queima Pública] (1977) do Sul dos Estados Unidos. Novamente, Pynchon vê desconstrói a execução de Julius e Ethel Rosenberg, o poder­ exercido de forma injusta. Dixon diz: “Não condenados por espionagem. importa aonde... formos, será que encontaremos todos os Tiranos e Escravos do Mundo?” Apesar de Thomas Pynchon (1937 - ) sua abrangência, violência, comédia e talento para a inovação, fazem dos trabalhos de Pynchon um produto­ 110 bem característico dos anos 1960. The Ar­mies of the Night [O Exército “ da Noite].­ Em Sabbatical: A Roman­ce John Barth (1930 - ) [Sabático: Um Romance] (1982), Barth John Barth, natural de Maryland, é usa o tema­ popular do espião;­ é a histó­­ mais interes­ ­sado em como a história é ão ria de uma profes­ ­sora universitária e seu contada­ do que na histó­ ria­ em si, mas importaN aonde... marido, agente­ secreto aposentado­ que onde Pynchon­ ilude­ o leitor com pistas vira romancista. Obras posteriores —The falsas e dicas de romances policiais,­ formos, será que Tidewater Tales [As Lendas das Marés] Barth atrai seus leitores a um parque encontaremos (1979), The Last Voyage of Somebody the de diversões­ cheio de espelhos­ dis­ todos os Tiranos Sailor [A Última de Viagem de Alguém torcidos que exageram­ alguns­ traços e Escravos do o Marinheiro] (1991) e Once Upon a e minimizam­ outros. Mundo?” Apesar Time: A Floating Opera [Era Uma Vez: Realismo­ é o inimi­ go­ para Barth, A Ópera Flutuante] (1994) revelam o autor­ de Lost in the Funhouse [Per­­di­ de sua abrangência, “virtuosismo passional” de Barth (sua do no Parque de Diversões] (1968), violência, comédia própria frase) ao negociar o mundo 14 histórias que constantemente se e talento para a caótico, oceânico com o cordame referem­ aos processos de escrita e inovação fazem brilhante da linguagem. leitura.­ A intenção de Barth é aler­ tar­ o leitor para a natureza artificial­ da leitura dos trabalhos Norman Mailer (1923 - ) e da escrita e impedí-lo de ser tragado de Pynchon um Norman Mailer tornou-se o mais pela história como se fosse verdadeira. pro­duto bem visível romancista das décadas de 1960 Barth usa uma panóplia de elementos­ característico dos e 1970. Co-fundador de The Village reflexivos para lembrar seus leito­ res­ anos 1960. Voyce, semanário novaiorquino anti­ que estão­ lendo. -estabelecimento, Mailer divulgava a si As obras iniciais de Barth, como mesmo e seus pontos de vista políticos. as de Saul Bellow, são inquisidoras­ e Em seu apetite por experiências,­ estilo existenciais, com temas­ dos anos 1950 vigo­roso e pessoa­ pública­ dramática, de fuga e peram­ bulação.­ Em The Floa­ segue a tradição de Ernest Heming­ way.­ ting O­pe­ra [A Ópera Flutuante]­ (1956), Para ocupar uma posição vantajosa um homem­ pensa­ em suicídio. The End sobre o assassinato do presidente John of the Road [O Fim da Estrada] (1958) F. Kennedy, os protestos contra a guerra é sobre um caso amoroso complexo.­ do Vietnã, a liberação dos negros, e Nos anos 1960, suas obras tornaram­ -se o movimento feminista, ele construiu mais cômicas e menos realistas. The uma personalidade pública de machão Sot-Weed Factor [O Fator­ da Erva-do- sofisticado, existencialista (em seu Ébrio] (1960) parodia­ o estilo­ picaresco livro Sexual Politics [Políticas Sexuais] do século 18 enquan­ ­to Giles Goat-Boy Kate Millett identificava Mailer como [Giles,­ Guar­dador de Cabras] (1966) é o arquétipo do macho chauvinista). O a paródia do mundo visto como uma irreprimível Mailer casou-se seis vezes e universi­ dade.­ foi candidato a prefeito de Nova York. Chimera [Quime­ ­ra] (1972) reconta Mailer é o inver­so do autor como lendas mi­to­lógicas gre­gas e Letters Barth, para quem o tema não é tão [Cartas] (1979) usa Barth como perso­­ crucial quanto a forma como é aborda­ nagem,­ como fez Norman Mailer em do. Ao contrário do invisível Pynchon,

111 sem­pre corteja e requer atenção. [Minha Vida Como um Homem] (1974), Ro­man­­cista, ensaísta, às vezes polí­ sob o stress do divórcio, um homem ti­co, ativista literário e ator eventual, vale-se da criação de um alter-ego, Nathan está sem­pre em cena. De exer­cícios Zuckerman, cujas histórias constituem de Novo Jornalismo co­mo Mia­mi um polo da narrativa, o outro sendo os and the Siege of Chicago [Mia­mi e o diversos tipos de respostas dos leitores. Cerco de Chicago](1968), análise­ das Zuckerman aparentemente toma posse convenções­ presidenciais­ americanas de uma série de romances subseqüentes. de 1968, e seu fasci­nan­­­te estudo da O mais bem-sucedido é provavelmente execução de um assas­­ ­­sino condena­ o primeiro, The Ghost Writer (1979). É do, The Execu­tio­ner’s Song [Canção contado por Zuckerman, como jovem es­ do Carras­co] (1979), Mailer passou critor criticado pelos anciãos judeus por a escrever romances ambiciosos, atiçar o anti-semitismo. Em Zuckerman ainda que imperfeitos, como Ancient Bound [Zuckerman Constrangido] Evenings [Noites Antigas] (1983), (1985), um romance tornou Zuckerman passado no Egito da antigüidade, e rico, porém notório. Em The Counterlife Harlot’s Ghost [Fantasma de Harlot] [A Contravida] (1986), o quinto romance (1992), em torno da Agência­ Central de Zuckerman, histórias competem com de Inteligência­ (CIA). histórias, enquanto a suposta vida de Nathan é comparada com outras vidas Philip Roth (1933 - ) imaginárias. As memórias de Roth, The Como Norman Mailer, Philip Roth Facts (1988) apertam o parafuso ainda tem provocado controvérsias ao minar mais; nelas Zuckerman critica o próprio sua vida com a ficção. No caso de estilo narrativo de Roth. Roth, seu tratamento de temas sexuais oth continua oscilando na e análises irônicas da vida judaica têm fronteira entre fato e ficção atraído a atenção popular e da crítica, Rem Patrimony: A True Story além de desaprovação. [Patrimônio: Uma história Real] O primeiro livro de Roth, Goodbye, (1991), um memorial sobre a morte Columbus [Adeus, Columbus] (1959), de seu pai. Seus romances recentes satirizava os subúrbios judaicos­ pro­ Norman Mailer incluem American Pastoral [Pastoral vincianos. Em seu romance mais Americana] (1997), em que o radicalis­ famoso, o ultrajante best-seller Portnoy’s mo dos anos 1960 da filha fere seu pai, Complaint [A Reclamação de Portnoy] e The Human Stain [A Nódoa Humana, (1969), um administrador da cidade sobre um professor cuja carreira é de Nova York deleita seu analista taci­ arruinada por um mal-entendido racial turno com histórias impróprias de sua com base no idioma. juventude. Roth é um profundo analista das for­ Embora The Great American Novel ças e fraquezas dos judeus. Suas carac­ [O Grande Romance Americano] (1973) terizações são ricas­ em matizes; seus sonde o mundo do beisebol, muitos­ dos protagonistas complexos, individua­ romances de Roth permanecem resoluta­ lizados e profundamente humanos. mente, ou mesmo de forma desafiadora, A série de romances autobiográficos auto-biográficos. Em My Life As a Man Foto © Nancy Crampton de Roth sobre um escritor relembra a

112 série Beck recente de John Updike e de seus primeiros trabalhos no estilo é com o mestre estilista Updike que sulista elegante, decadente e gótico. Roth — amplamente admirado por seu O professor afro-americano de com­ estilo flexível e engenhoso — é mais posição literária Ernest Gaines (1933 freqüentemente comparado. - ), também natural de Nova Orleans, Apesar de seu brilhantismo e inteli­ ambientou muitas de suas obras como­­ gência, alguns leitores acham a obra de ventes e cuidadosas na zona ruralbayou Roth muito absorvida. Ainda assim, suas predominantemente negra da Lousiana. conquistas vigorosas ao longo de quase Talvez sua obra mais conhecida,­ The 50 anos deu a ele um lugar entre os mais Autobiography of Miss Jane Pittman estimados romancistas americanos. [A Autobiografia da Sta. Jane Pittman] ESCRITORES SULISTAS (1971), faz reflecções sobre o espaço A literatura sulista da década de de tempo entre o fim da Guerra Civil 1960 tendia, como a então ainda em 1865 até 1960. Preocupado com bem agrária Região Sul, a aderir às questões humanas mais profundas que tradições consagradas pelo tempo. a cor da pele, Gaines trata das relações Ela continuou enraizada no realismo raciais com sutileza. e numa visão ética, senão religiosa, Reynolds Price (1933 - ), professor durante essa década de mudanças por longo tempo na Duke University, radicais. Os temas sulistas recorren­ nasceu na Carolina do Norte, que tes incluem a família, o lar familiar, mobília as cenas de muitos de seus a história, a terra, a religão a culpa, trabalhos, como A Long and Happy a identidade a morte e a busca pelo Life [Uma Vida Longa e Feliz] (1961). significado redentor da vida. Como Como William Faulkner e Robert Penn William Faulkner e Thomas Wolfe Warren, povoa seu solo sulista com (Look Homeward, Angel [Olhe para famílias in­­ter­ligadas próximas a suas Casa, Anjo], 1929), que inspiraram raízes e preocupa-se com a passagem a “renascença sulista” na literatura, do tempo e o imperativo de expiar faltas muitos outros escritores sulistas passadas. Seu estilo meditativo e poético nos anos 1960 eram acadêmicos e re­lembra a tradição literária clássica do estilistas elaborados, reverenciando Philip Roth antigo Sul. Par­cialmente paralisado pelo a palavra escrita como um elo com câncer, Price explora o sofrimento físico tradições enraizadas no mundo em The Promise of Rest [A Promessa de clássico. Descanço] (1995), sobre um pai que Muitos foram professores influentes. cuida do filho que está morrendo de Caroline Gordon (1895-1981), natural AIDS. Seu romance bem-conceituado do Kentucky, casada com o poeta Kate Vaiden (1986) revela sua habilidade sulista Allen Tate, foi uma respeitável em evocar a vida de uma mulher. professora de composição literária. Walker Percy (1916-1990), residente Ela ambientava seus romances em seu na Louisiana, era membro da aristo­ Kentucky natal. Truman Capote nasceu cracia sulista. Seus romances de lei­ em Nova Orleans e passou parte de sua tura fácil — por vezes cômicos, líricos, infância em cidadezinhas da Louisiana moraliza­ ­dores e satíricos — revelam e do Alabama, cenários de muitos Foto © Nancy Crampton sua consciência social e conversão ao Catolicismo. Seu melhor roman­ ce­ é 113 seu primeiro, The Moviegoer [O Cinéfilo] (1961). A No­va York], 1986). história de um operador da bolsa de Nova Orleans charmoso, porém sem objetivo, mostra a influência E.L. Doctorow (1931 - ) do existencialismo francês­ transplantado para o Novo Os romances de E. L. Doctorow demonstram Sul impetuoso e em plena expansão, que floresceu a transição da metaficção para uma sensibilidade depois da II Guerra Mundial. nova e mais humana. Seu romance sobre o alto custo humano da guerra fria, The Book of Daniel [O Livro OS ANOS 1970 E 1980: CONSOLIDAÇÃO de Daniel] (1971), aclamado pela crítica, é baseado Em meados dos anos 1970, teve início­ uma era na execução de Julius e Ethel Rosenberg por espio­ de consolidação. O conflito do Vietnã termi­ nara,­ nagem, contado pela voz de seu desolado filho.The seguido­­­ do reconhe­ cimen­ to­ da Repú­ blica­ Popular Public Burning [A Queima Pública], de Robert Coover, da China pelos Esta­ dos­ Unidos e da celebração­ do trata do mesmo tema, mas o livro de Doctorow traz Bicentenário da Amé­ rica.­ Seguiram­ -se os anos 1980 mais calor e emoção. — a “Década­ do Eu” — em que indivíduos­ passaram­ Ragtime [Nos Tempos do Rag] (1975) é uma a enfocar mais questões pessoais­ que sociais­ mais colagem rica e caleidoscópica dos Estados Unidos amplas. começando em 1906. Como fez John Dos Passos várias Na literatura, velhas correntes­ permaneceram, décadas antes em sua trilogiaU.S.A., Doctorow mistura mas a força da expe­ ri­ men­ ta­ ção­ foi diminuindo. No­ personagens fictícios e reais para capturar o sabor e a vos autores­ como John Gard­ner, John Irving (The complexidade da era. A história fictícia de Doctorow World According to Garp [O Mundo­ Segundo Garp], sobre os Estados Unidos continua emLoon Lake [Lago 1978), Paul The­roux (The Mos­qui­to Coast [A Costa do Loon] (1979), sobre um capitalista cruel­ que domina Mosqui­to], 1982), William Ken­ne­dy (Ironweed, 1983) e destrói pessoas idealistas nos anos 1930. e Alice Wal­ker (The Co­lor Pur­­ple [A Cor Púrpura],­ Os romances posteriores são os autobiográficos 1982) emer­giram­ com romances estilisticamente World’s Fair [Feira Mundial] (1985), sobre um menino brilhan­­­ tes­ a retratar dramas­ huma­­­­ nos­ comoventes. de oito anos durante a Depressão dos anos 1930;Billy Voltou o inte­ ­­resse­­ por cenário, persona­ gem­ e te­ Bathgate (1989), sobre Dutch Schultz, um verdadeiro mas associados­ ao realismo,­ além de um renovado gansgter de Nova York; e The Waterworks [O Chafariz] interesse pela História, como nos romances de E.L. (1994), ambientado em Nova York, na década de Doctorow. 1870. City of God [Cidade de Deus] (2000) — o título rea­ ­­lismo, abandonado por autores expe­ se refere a Saint Augustine — volta-se à Nova York no rimenta­listas dos anos 1960, retornou aos presente. A consciência de um clérigo cristão entre­ Opoucos, mescla­­­ do­ muitas­ vezes a elemen­ tos­ meia a pobreza generalizada, o crime e a solidão da originais ousados­ — a estru­ tu­ ra­ ousada do roman­­ ce­­ cidade com histórias de pessoas cujas vidas tocam a dentro­ do romance, como em October Light [Luz de sua. O livro alude à crença permanente de Doctorow Outubro]­ (1976) de John Gardner, ou o dialeto­ negro de que escrever — um modo de testemunhar — é uma ame­ricano em The Color Pur­­ple [A Cor Púrpura], forma de sobrevivência humana. de Alice­­ Walker. A literatura­­ de mino­ rias­ começou a Suas técnicas são ecléticas. Sua exuberância esti­ florescer. O teatro passou­ do realis­ mo­ para técnicas lística e inventividade formal o associam ao autores mais cinematográficas,­ cinéticas. Simulta­ nea­ mente­ metaficcionais, como Thomas Pynchon e John Barth, porém, a“Década do Eu” se refletiu em novos talen­ mas seus romances permanecem enraizados no tos ousados­­ como Jay McInerny (Bright Lights, Big realismo e na história. Seu uso de pessoas e eventos City [Luzes Brilhantes,­ Cidade Grande],­ 1984), Bret reais o associa com o Novo Jornalismo dos anos 1960 Easton Ellis (Less Than Zero [Menos­ que Zero],­­ 1985), e com Norman Mailer, Thruman Capote e Tom Wolfe, e Tama Jano­witz (Sla­ves of New York [Escra­vos de enquanto seu uso de memórias fictícias, como em

114 World’s Fair, o aproxima de autores como Maxine de Loucura] (1990), recorda a terrível contracor­ Hong Kingston e o florescimento das memórias nos rente que suas próprias personagens condenadas anos 1990. devem ter sentido. Nas ficções autobiográficas de A Tidewater Morning [Uma Manhã em Tidewater] William Styron (1925 - ) (1993), a tremeluzente e calorenta costa da Virgínia a região de Tidewater, na Virgínia, o sulista em que cresceu espelha e estende a consciência William Styron escreve romances ambiciosos inconstante do narrador. Dque colocam indivíduos em lugares e épocas que desafiam os limites de sua humanidade. Suas John Gardner (1933-1982) primeiras obras incluem o aclamado Lie Down John Gardner, da área rural do Estado de Nova in Darkness [Deitar-se na Escuridão] (1951), que York, foi o principal porta-voz de sua era para valores começa com o suicídio de uma linda sulista — que éticos­ na literatura até sua morte, num acidente­ de salta de arranha-céu de Nova York — e volta atrás no motocicleta.­ Foi profes­ sor­ de inglês,­ especializado tempo para explorar as forças negras dentro de sua em literatura­ medieval; seu romance mais famoso, família que a levaram à morte. Grendel (1971), reconta o velho épico inglês,­ Beo­ O tratamento falkneriano, incluindo os temas góticos wulf, do ponto­ de vista existencialista do monstro. O sombrios sulistas, flashbacks e o fluxo de monólogos ro­mance curto, vivaz e muitas vezes cômico é uma da consciência, trouxeram fama a Styron que se tornou crítica sutil­ ­ao existencialismo que enche o protago­ controversa com a publicação de The confessions nista de desespero e cinis­ mo­­ auto-destrutivos.­ of Nat Turner [As Confissões de Nat Turner] (1967), Romancista prolífico e popular, Gardner usou uma vencedor do Prêmio Pulitzer. O romance­ recria a mais abordagem realista,­ mas empregou técnicas ino­va­do­ violenta revolta escrava da história dos EUA, vista pe­ ras — flashbacks, histórias­ dentro­ de histórias, mitos los olhos de seu líder. O livro foi lançado no auge do recontados e histórias contrastantes — para revelar movimento “black power” e a descrição de Nat Tuner a verdade­ de situações humanas. Seus pontos­ fortes atraiu fortes críticas — o que não surpreende — de são a caracterização (parti­ cu­­ lar­ mente­ seus retratos muitos observadores afro-americanos, embora alguns simpá­ticos­­ de pessoas­ comuns) e o estilo colorido. tenham defendido Styron. Suas principais obras incluem­ The Resurrection [A O fascínio de Styron por ações humanas indi­ Ressur­ reição]­ (1966), The Sunlight Dialogues [Os viduais ambientadas contra panos de fundo de Diálogos ao Sol] (1972), Nickel Moun­tain [Monta­ nha­ injustiça racial mais ampla continua em Sophie’s de Níquel]­ (1973), October Light [Luz de Outubro]­ Choice [A Escolha de Sofia] (1979), outro esforço (1976) e Mickelson’s Ghosts [Os Fan­tasmas de sobre o destino de uma linda mulher — temas que Mickelson] (1982). Edgar Allan Poe, espírito dominante dos autores Seus padrões de ficção sugerem os poderes sulistas, achava o mais comovente de todos. Neste curativos do companhei­ rismo,­ dever e obrigações fa­ romance, uma linda polonesa que sobreviveu a miliares­ e, nesse sentido, Gardner foi profundamente Auschwitz é derrotada pelas agonias recordadas, tradicional­ e conservador. Tentou mostrar­ que certos cujo ápice é o momento em que foi forçada a es­ valores e ações le­vam a uma vida plena. Seu livro On colher qual de seus filhos viveria e qual morreria. Mo­ral Fiction [Sobre­ a Ficção Moral] (1978), clama O livro traça paralelos complexos entre o racismo por romances­ que incorporem valores éticos em vez do Sul e o Holocausto. de deslumbrarem com ino­vações técnicas vazias. O Recentemente, Styron, como muitos autores, livro­ criou um furor ,em grande parte porque Gardner partiu para a forma de memórias. O breve relato de criticou abertamente im­portantes escritores vivos — sua depressão quase-suicida, Darkness Visible: A especialmente autores­ de metaficção — por não trans­ Memoir of Madness [Escuridão Visível: Memórias mitirem preocupações éticas. Gardner defendia uma

115 ficção mais calorosa, humana e, acima pai molestador.­ Pecola acredita que de tudo, mais realista e socialmente seus olhos escu­ ros­ se tornaram­ azuis engajada, como a de Joyce Carol Oates magicamente e farão com que fique e Toni Morrison. amável. Mor­rison disse que estava Joyce Carol Oates (1938 - ) criando sua própria identidade como Joyce Carol Oates e a romancista escritora­ através deste romance: “Eu mais prolífica e séria das últimas déca­ era Pecola,­ Claudia, todo­ mundo.” das, tendo publicado romances, contos, Sula (1973) descreve a grande ami­ poesia, não-ficção, peças, estudos zade entre duas mulheres. Morrison­­ críticos e ensaios. Ela usa o que chama pinta as mulheres afro-americanas como de “realismo psicológico” numa séria personagens­ plenas,­ únicas e não este­­ panorâmica de temas e formas. reótipos. Seu Song of Solomon [Cânticos Oates escreveu uma trilogia góti­ de Salo­ mão]­ (1977), ganhou­ vários prê­ ca composta de Bellefleur (1980), A mios. Segue a vida do negro Milkman­­ Bloodsmoor Romance [Um Romance Dead e suas relações complexas­ com a de Bloodsmoor] (1982) e Mysteries of família e a comunidade.­ Tar Baby [Bebê Winterthurn [Mistérios de Winterthurn] de Piche] (1981) lida com as relações­ (1984); um livro de não-ficção, On entre brancos e negros. Beloved [A Bem- Boxing [Sobre Boxing] (1987) e um Amada] (1987) é a história angustiante estudo sobre Marilyn Monroe (Blonde de uma mulher que mata seus filhos [Loura], 2000). Seus enredos são som­ para impedir que vivam como escra­ ­­vos. brios e em geral giram sobre a violência, Emprega técnicas de sonho­ do realis­ ­mo que considera estar profundamente mágico ao retratar uma figura misteriosa, enraizada na psique americana. Beloved, que volta­ a viver com a mãe que cortou­ sua garganta. Toni Morrison (1931 - ) Jazz (1992), ambientado no Harlem A romancista afro-americana To­ dos anos 1920, é uma história de amor ni Morrison nasceu em Ohio, numa­­­­­ a assassinato; em Paradise [Paraíso] família muito espiritualizada. Cursou (1998), homens de Ruby, cidade negra a Howard University, em Washington, de Oklahoma, matam vizinhas de e tem traba­ lhado­­ como edito­ ra­ sênior­ Toni Morrison um assentamento só de mulheres. de uma­ grande editora de Washington Morrison revela que a exclusão, quer e professora eminente em vá­rias seja por sexo ou raça, enquanto que universidades. aparentemente atraente, leva, enfim, A ficção rica­men­te tramada de não ao paraíso, mas a um inferno Morrison propiciou-lhe aclamação inventado pelo homem. internacional. Em roman­ces fas­ci­ Em Playing in the Dark: Whiteness nan­tes e de grande abertura, trata­ a and the Literary Imagination [Brincan­ do­ identidade complexa dos negros­ de no Escuro: a Brancura e a Ima­ gi­ nação­ forma universal. Em The Bluest Eye Literária] (1992), livro de não-ficção [O Olho Mais Azul](1970), uma de accessível, Morrison discerne uma suas primeiras­ obras, uma jovem negra corrente definível de consciência racial obs­ti­nada conta a história­ de Pecola­ na literatura americana. Morrison sugere Breedlove, é levada à loucura por um Foto © Nancy Crampton que, embora seus romances sejam obras

116 de arte consumadas, contêm sentido­­ a autobiografia de Maya Angelou, I polí­ti­co: “Não estou interes­ sada­­ em Know Why the Caged Bird Sings [Sei entre­ ­gar-me a um exercício privado de Porque o Pássaro Engaio­ lado­ Canta] minha imaginação...­ sim, a obra tem que (1970), que exalta a ligação mãe-filha, ser política.” Em 1993, Morrison ganhou ficção rica­ e a obra de feministas brancas, como o Prêmio Nobel de Literatura. Amente­ tramada Adrienne­ Rich. The Color Purple mostra os homens como basicamente Alice Walker (1944 - ) de Morrison alheios às necessidades e realidades­ Alice Walker, afro-americana, filha­ propiciou-lhe da mulher. de meeiros da Georgia rural, formou­­­ - aclamação Embora muitos críticos consi­derem se pelo Sarah Lawrence Col­­lege, internacional. a obra de Walker muito didá­ tica­ ou ide­ onde uma de suas profes­so­ras foi a Em romances­ ológica, uma grande parcela de leitores poeta politicamente enga­ ­­jada­ Muriel aprecia suas audaciosas explorações Rukeyser. Outras influências­ em sua fasci­ nan­ tes­ e de da femi­ ­nilidade afro-americana. Seus obra são Flannery­ O’Connor e Zora grande abertura, romances lançaram luz sobre temas Neale Hurston.­­ trata­ a identidade inflamados como o duro legado do Escritora “mulherista”, como Walker complexa dos trabalho de meeiro (The third Life of chama a si própria, está há muitos anos Grange Copeland [A Terceira Vida de associada ao femi­ nis­­ mo,­ apresentando negros­ de forma Grange Copeland], 1970) e a circumci­ a existência­ negra­ da perspectiva fe­ universal. são feminina (Possessing the Secret Joy minina.­ Como Toni Morrison, Jamaica [Possuindo a Alegria Secreta], 1992). Kin­caid, a falecida Toni Cade Bambara e outros ro­man­cistas negros contemporâ­ A ASCENÇÃO DA FICÇÃO neos de sucesso, Walker usa o realismo­ MULTIÉTNICA lírico intensificado para se centrar nos scritores judeus-americanos sonhos e fracassos das pessoas­­ comuns como Saul Bellow, Bernard com credibilidade. Seu trabalho­ ressalta EMalamud, Isaac Bashevis Singer, a busca de dignidade­ na vida humana. Arthur Miller, Philip Roth e Norman Refinada estilista, particularmente­ em Mailer foram os primeiros, desde seu romance­ dialético epistolar The os abolicionistas do século 19 e dos Color Purple [A Cor Púrpura], sua obra afro-americanos de narrativas es­cravas pro­cura­ educar. Nisto, se parece com o a tratar do preconceito étnico­ e da ro­man­cista americano Ish­mael Reed, condição­ de estrangeiro. Eles explo­ cujas sátiras expõem problemas sociais­ raram novos meios de projetar uma e questões raciais. consciência que era tanto americana The Color Purple de Walker é a e específica a uma subcultura. Nisto, história do amor entre duas irmãs ne­ abriram as portas para o florescimento gras pobres que subsis­ te­ à separação da literatura multiétnica nas décadas de muitos anos, entrelaçada à história futuras. de como, durante esse período,­ a irmã O fim dos anos 1980 e o início da tímida, feia e sem instrução­ descobre década 1990 viu a literatura de minorias sua força interior, graças ao apoio tornar-se parte integrante­ do cenário de uma amiga. O tema do apoio das literário americano. Isso se deu com mulheres umas às outras relembra a dramaturgia assim como a prosa.­ O

117 falecido Au­gust Wilson (1945-2005) escreveu um acla­ de Aurora] (1968), de N. Scott Momaday (1934 - ) e mado ciclo de peças sobre a experiência­ negra no seu poético The Way to Rainy Mountain [O Caminho século 20 que fica lado a lado com a obra de roman­ para a Montanha Chuvosa] (1969) evocam a be­leza e cistas como­ Alice­ Walker, John Edgar Wideman e desespero da vida dos índios Kiowa. De ascendência Toni Morrison. Acadêmicos como Lawrence Levine parcialmente pueblo, Leslie Marmon Silko escreveu (The Opening of the American Mind: Canons, Culture o romance Ceremony [Cerimônia] (1977), estimado and History [A Abertura da Mente Americana: pela crítica, que conquistou um grande público. Cânones, Cultura e História], 1996) e Ronald Takaki Como os trabalhos de Momaday, sua obra é um (A Different Mirror: A History of Multicultural America “romance cantado” estruturado sobre os rituais de [Um Espelho Diferente: Uma História da América cura indígenas. Multicultural], 1993) fornecem um contexto sem par O poeta e romancista blackfoot James Welch (1940- para o entendimento da literatura multiétnica e seus 2003) detalhou as lutas dos indígenas em seus roman­ significados. ces leves, quase perfeitos Winter in the Blood [Inverno Os ásio-americanos também assumiram seu no Sangue] (1974), The Death of Jim Loney [A Morte lugar em cena. Maxine Hong Kingston (The Woman de Jim Loney] (1979), Fools Crow [Canto dos Tolos] Warrior [A Mulher Guerreira] 1976) abriu o caminho (1986) e The Indian Lawyer [O Advogado Indígena] para seus companheiros ásio-americanos. Entre eles (1990). Louise Erdrich, parte chippewa, escreveu uma está Amy Tan (1952 - ), cujos romances­ luminosos poderosa série de romances, inaugurada por Love sobre a vida chinesa transposta para a América do Medicine [Remédio de Amor] (1984), que captura pós-guerra (The Joy Luck Club [O Clube da Sorte da as vidas emaranhadas das famílias disfuncionais da Alegria], 1989, e The Kitchen God’s Wife [A Esposa reserva com uma mistura tocante de estoicismo e do Deus da Cozinha], 1991) têm cativado os leitores. humor. David Henry Hwang (1957 - ), um californiano filho de imigrantes chineses, já deixou sua marca no O TEATRO AMERICANO teatro, com peças como F.O.B. (1981) e M. Butterfly pós a I Guerra Mundial, os musicais­ populares e (1986). lucrativos dominavam­ cada vez mais o cenário Um grupo relativamente novo no horizonte literá­ Ateatral da Broadway. O teatro sério retraiu-se rio era o dos escritores latino-americanos, incluindo para salas menores, menos dispendiosas “fora da o ganhador do Prêmio Pulitzer roman­ cista­ Oscar Broadway” ou fora da cidade de Nova York. Hijuelos, nascido em Cuba, autor­ de The Mambo Essa situação se repetiu após a II Guerra Mundial. Kings Play Songs of Love [Os Reis do Mambo Tocam O teatro americano definhou nos anos 1950, repri­ Canções de Amor] (1989).Os principais escritores mido pela Guerra Fria e o Macarthismo. A energia de ascendência mexicano-americana incluem dos anos 1960 o revitalizou. O movimento off-off- Sandra Cisneros (Women Hollering Creek and Other -Broadway apresentou uma alternativa inovadora Stories [O Córrego das Mulheres que Gritam e Outras para o teatro popular comercializado. Histórias],1991) e Rudolfo Anaya, autor do romance Muitos dos principais dramaturgos, após os poético Bless Me, Ultima [Abençoe-Me, Ultima] anos 1960, produziram suas peças em pequenas (1972). salas. Livres da necessidade de ganhar dinheiro A ficção indígena floresceu. Muitas vezes, os ­au suficiente para manter casas de espetáculos caras, tores evocavam a perda da vida tradicional baseada foram novamente inspirados pelo existencialismo na natureza, a tentativa estressante de se adaptar europeu e o chamado­ Teatro do Absurdo, associado à vida moderna e suas lutas contra a pobreza, o a dramaturgos europeus como Samuel Beckett, Jean desemprego e o alcoolismo. A obra vencedora do Genet e Eugene Ionesco, além de Harold Pinter. Os Prêmio Pulitzer, House Made of Dawn [Casa Feita melhores dramaturgos tornaram-se inovadores e

118 mesmo surrealistas, rejeitando o teatro O poeta Amiri Baraka, conhecido realista para atacar as convenções por sua poesia vivaz orientada para a sociais superficiais. fala e afinidade com o jazz de improvi­ sação, voltou-se para o teatro nos anos Edward Albee (1928- ) 1960. Sempre buscando encontrar a si O dramaturgo mais influente do mesmo, Baraka mudou seu nome várias início dos anos 1960 foi Edward Albee, vezes, ao procurar definir sua identidade filho adotivo de uma família abastada como negro americano. Quando jovem, que tinha sido proprietária de teatros Baraka explorou vários rumos na vida, de variedades e contava com inúmeros abandonou a Universidade de Howard e atores entre seus amigos. Ajudando a foi afastado com desonra da Força Aérea produzir o teatro do absurdo europeu, dos EUA sob suposta ligação com o co­ Albee levou ativamente novas correntes munismo. Nesses anos, sua verdadeira européias para o teatro americano. vocação para escritor aflorou. Em The American Dream [O Sonho Nos anos 1960, viveu em Greenwich­ Americano], 1960, figuras caricatas da Village na cidade de Nova York, onde mãe, do pai e da avó recitam chavões conheceu muitos artistas e escrito­ que representam de forma grotesca uma res, incluindo Frank O’Hara e Allen família convencional sem amor. Ginsberg. A perda de identidade e a conse­ Em 1965, Baraka iniciou o Black Arts qüente luta pelo poder de preencher o Repertory Theater, no Harlem, bairro vazio impulsionam as peças de Albee, negro da cidade de Nova York. Retratou como em Who’s Afraid of Virginia visões nacionalistas dos negros sobre Woolf [Quem Tem Medo de Virgínia racismo em peças inquietantes como Wolf] (1962). Nessa peça controversa, Dutchman [Holandês] (1964), na qual transformada em filme estrelado por uma mulher branca flerta e, por fim, Elizabeth Taylor e Richard Burton, a mata um jovem negro no metrô da ci­ fantasia compartilhada por um casal dade de Nova York. A primeira metade infeliz — de que tinham um filho, que da peça é realista e espirituosa, com suas vidas tinham significado — é diálogos engenhosos e caracterizações intensamente exposta como mentira. Edward Albee sutis. O final chocante beira o melodra­ Albee continuou a produzir obras ma para dramatizar a incompreensão notáveis por várias décadas, incluindo racial e a vitimização do protagonista Tiny Alice [Pequena Alice] (1964); negro. A Delicate Balance [Um Equilíbrio Delicado] (1966); Seascape [Paisagem Sam Shepard (1943- ) Marinha] (1975); Marriage Play [Jogo Ator e dramaturgo, Sam Shepard do Casamento] (1987); e Three Tall passou a infância mudando com a Women [Três Mulheres Altas] (1991), família de base em base do Exército, que acompanha a personagem prin­ seguindo seu pai, que tinha sido piloto cipal, que lembra a dominadora mãe na II Guerra Mundial. Passou sua ado­ adotiva de Albee por três fases da vida. lescência num rancho no árido deser­ to a leste de Los Angeles, Califórnia. Amiri Baraka (1934- ) Foto Scott Gries / Getty Images No ensino médio, Shepard encontrou

119 conforto nos poetas Beat; aprendeu a cional, a cena funciona como comédia, tocar jazz na bateria e mais tarde tocou teatro do absurdo e ironia. em uma banda de rock. Produziu suas Shepard deixa suas personagens di­ primeiras peças, Cowboys e The Rock rigirem sua escrita, em vez de começar Garden [O Jardim de Pedra], em 1964. com um enredo pré-planejado, e suas Elas são indicativas de seu trabalho peças são modernas e naturais. Seu maduro com seus motivos do Oeste talento surrealista e experimentalismo e tema de competição masculina. ligam-no a Edward Albee, mas suas Das quase 50 obras de Shepard para obras são mais mundanas e engraçadas teatro e cinema, as mais queridas são e suas personagens, mais realistas. Elas três peças inter-relacionadas, abordando carregam uma consciência ousada amor e violência em família: Curse of the da Costa Oeste e fazem comentários Starving Class [A Maldição da Classe sobre os Estados Unidos em seu uso Faminta] (1976), Buried Child [Criança de motivos paisagísticos e cenários e Enterrada] (1978) e True West [Oeste contextos específicos. Verdadeiro] (1980), sua obra mais conhecida. Em True West, dois irmãos David Mamet (1947- ) de meia-idade, um roteirista culto e um Igualmente importante é David ladrão errante,­ competem para escrever Mamet, criado em Chicago, cuja es­ uma peça sobre a verdadeira­ história crita foi influenciada pelo método do Oeste para um rico­ produtor cine­­ Stanislavsky de atuar que lhe revelou ma­tográfico urbano. Cada um deles a maneira como “a linguagem que acredita precisar do que o outro tem — usamos... determina a maneira como sucesso e liberdade — os dois trocam de nos comportamos, e não o contrário.” lugar num clima de violência crescente Sua ênfase na linguagem, não como co­ alimentada pelo álcool. A peça registra municação, mas como arma, evasão­ e a preocupação de Shepard com a perda manipulação da realidade, deu a Mamet da liber­ ­dade, autenticidade e autonomia uma sensibilidade contemporânea na vida americana. Ela dramatiza a pós-moderna. fronteira que desaparece (o errante) e As obras de maior importância a imaginação americana (o escritor), Amiri Baraka de Mamet incluem American Buffalo seduzidas pelo dinheiro, a mídia e as [Búfalo Americano] (1975), peça em forças comerciais personificadas no dois atos com linguagem de violência produtor. crescente envolvendo um drogado, uma Ao escrever, Shepard tenta recriar loja de quinquilharias e uma tentativa uma zona de liberdade ao permitir de furto; e Speed-the-Plow [Apresse o que suas personagens ajam de forma Arado] (1987). O aclamado e muitas imprevisível, espontânea e muitas vezes vezes incluído em antologias Glengarry ilógica. O exemplo mais conhecido Glen Ross [Sucesso a Qualquer Preço] está em True West. Num gesto cujo (1982), sobre corretores de imóveis, significado sugere liberdade sem lei, deu origem a um excelente filme em o confuso escritor rouba várias torra­ 1992 com um elenco de estrelas. Esta deiras. Totalmente irreal, ainda que peça, como muitas das obras de Mamet, estranhamente crível em um nível emo­ Foto © Nancy Crampton revela seu intenso comprometimento

120 com algumas das questões não resol­ Foto Sara Krulwich / Guard [Acerto Final] (1994) e Corners vidas dos EUA — aqui, como numa The New York Times [Esquinas] (1998) sobre o conceito de atualização de Death of a Salesman honra na Máfia. [Morte de um Caixeiro Viajante] de Arthur Miller, vê-se a necessidade de August Wilson (1945-2005) recobrar a dignidade e a segurança no O renomado dramaturgo afro­ emprego, especialmente para os traba­ -americano August Wilson, nascido lhadores mais velhos; competição entre Frederick August Kittel, era filho de as gerações mais velha e mais jovem um imigrante alemão que nunca se nos locais de trabalho; foco intenso nos Sam Sheppard preocupou com a família. Wilson lucros em detrimento do bem-estar dos enfrentou a pobreza e o racismo e ado­ trabalhadores e — englobando tudo — o tou o sobrenome da mãe afro-america­ ambiente corrosivo de competição na, na adolescência. Influenciado pelo levado a níveis abusivos. movimento artístico negro do fim dos Oleanna (1991), de Mamet, faz uma anos 1960, Wilson foi co-fundador do análise minuciosa do assédio sexual Black Horizons Theater de Pittsburgh. em um contexto universitário. The As obras de Wilson exploram a Cryptogram [O Criptograma] (1994) experiência afro-americana, orga­ imagina uma visão horrorosa de uma nizada por décadas. Ma Rainey’s criança sobre a vida familiar. Obras re­ Black Bottom [O Fundo Negro de Ma centes incluem The Old Neighborhood Rainey] (1984) se passa na Chicago [Velha Vizinhança] (1991) e Boston de 1927 e retrata a famosa cantora Marriage [Casamento de Boston] de blues. Sua aclamada peça Fences (1999). [Cercas] (1985), ambientada nos anos 1950, dramatiza o conflito entre David Rabe (1940- ) pai e filho, tocando em temas total­ Outro dramaturgo de destaque é mente americanos, como o beisebol David Rabe, veterano da Guerra do e o sonho americano de sucesso. Vietnã e um dos primeiros a explorar Joe Turner’s Come and Gone [Idas a revolta e a violência daquela guer­ e Vindas de Joe Turner] (1986) trata ra em The Basic Training of Pavlo dos moradores de uma pensão em Hummel [Treinamento Básico de 1911. The Piano Lesson [A Aula de Pavlo Hummel] (1971) e Sticks and Piano] (1987) desenrola-se nos anos Bones [Gravetos e Ossos], 1969. Peças 1930 e cristaliza a dinâmica de uma fa­ subseqüentes incluem The Orphan [O mília, ao concentrar-se no piano que Órfão] (1973), baseada em Oresteia, é sua relíquia. Two Trains Running David Mamet de Ésquilo; In the Boom Boom Room [Dois Trens em Movimento] (1990) [No Quarto de Boom Boom] (1973), tem lugar em um café nos anos 1960, sobre o estupro de uma dançarina; ao passo que Seven Guitars [Sete e Hurlyburly (1984) e Those the River Guitarras], 1995, explora os anos Keeps [Aqueles que o Rio Guarda] 1940.  (1990) ambas sobre a desilusão de Hollywood. As obras mais recen­ Foto © Robin Holland / tes de Rabe incluem The Crossing CORBIS OUTLINE

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August Wilson

Foto © Cori Wells Braun / CORBIS OUTLINE

122 revistas e autores empreendedores criam websites. A poesia americana atual é um vasto território de livre CAPÍTULO imaginação, um caldeirão em ebulição, um trabalho dinâmico em andamento. A efervescência da poesia americana desde 1990 torna o campo descentralizado e de difícil definição. A maioria das antologias apresenta uma só dimensão 9POESIA da poesia, como textos femininos — ou grupos de CONTEMPORÂNEA escritores étnicos ou poesias de inspiração comum AMERICANA — poesia do jazz, poesia cowboy, poemas com influ­ ência budista e hip-hop. Os poucos antologistas que aspiram representar o conjunto da poesia americana contemporânea come­ poesia americana, desde 1990, está em meio çam com negações copiosas e discorrem longamente a um renascimento caleidoscópico. Na sobre seus diferentes impulsos: o pós-modernismo, a Aúltima metade do século 20, havia, se não expansão do cânone, etnias, imigração (com menção consenso, pelo menos um formato discernível especial às novas vozes do sul e sudeste asiático e do no campo poético, completo, com posições bem Oriente Médio), o surgimento da literatura global, a defendidas. Escolas bem-definidas dominavam a elaboração das contínuas contribuições das mulheres, cena e as discussões críticas tendiam ao binário: a ascensão da tecnologia da internet, a influência de formalismo versus verso livre, acadêmico versus professores específicos, de programas de redação experimental. ou de impulsos regionais, a mídia onipresente e o Em retrospectiva, algumas pessoas viram os anos papel do poeta como voz individual e solitária que que se seguiram à II Guerra Mundial como uma era se ergue contra o comercialismo e o conformismo heróica, em que a poesia americana libertou-se de exacerbados. limitações como rima e métrica e mergulhou de Os próprios poetas lutam para dar sentido à cabeça em novas dimensões, junto com os expres­ inundação de poesias. É possível vislumbrar um sionistas abstratos na pintura americana. Outros con­tinuum, tendo de um lado a poesia da fala, o — experimentalistas, autores multiétnicos e globais eu subjetivo, de outro a poesia do mundo e, no e escritoras feministas entre eles — relembram a meio, uma ampla faixa em que o eu e o mundo se cegueira da época para com questões como raça fundem. e gênero. Esses autores vivenciam a diversidade A poesia do eu que fala tende a enfocar ex­pres­ como bênção do presente e anseiam por liberdades sões vívidas e a exploração de emoções profundas ainda inimagináveis. Sua contribuição fez da poesia geralmente enterradas. É psicológica e intensa e atual uma rica cornucópia de base genuinamente os cenários são secundários. Na última metade do popular. século 20, o poeta mais influente dessa linha foi Entre o público em geral, o interesse por poesia Robert Lowell, cujo mergulho na própria psique atingiu o nível mais elevado de todos os tempos. e no histórico conturbado de sua família inspirou Os concursos de poesia geram uma camaradagem textos confessionais. competitiva entre escritores iniciantes, grupos in­ A poesia do mundo, por sua vez, tende a construir formais de redação fornecem apoio e críticas e os significado a partir do impulso narrativo, do detalhe clubes de leitura proliferam. Programas de redação e do contexto. Cria cenas de forma cuidadosa. Uma florescem em todos os níveis, intercâmbios poéticos das poetas mais influentes do mundo foi Elizabeth ligeiros circulam pela internet e as universidades, Bishop, considerada a melhor poeta americana do

123 fim do século 20. O que se move e o que não quer ser movido, o solto Robert Lowell e Elizabeth Bishop foram amigos Significado, desordenado e simples como uma eira da vida toda; ambos lecionaram na Universidade de debulho. de Harvard. Assim como Walt Whitman e Emily Dickinson no século 19, Lowell e Bishop reinam O enigmático W.S. Merwin (1927- ), de formação como espíritos geradores de futuros poetas. E, em­ clássica, continua a produzir farta poesia subjetiva bora tivessem uma visão comum, suas abordagens e obsessiva. Seu poema “The River of Bees” [O Rio eram diametralmente opostas. A poesia complexa, de Abelhas] (1967) termina: subjetiva e retórica de Lowell extrai significado da auto-apresentação e linguagem elevada, ao passo Na porta está escrito o que fazer para sobreviver que Bishop, ao contrário, oferece paisagens deta­ Mas não nascemos para sobreviver lhadas em estilo aparentemente simples e prosaico. Só para viver Somente com a releitura percebe-se sua precisão e profundidade. O termo “só” destaca ironicamente o quanto é Muitos dos poetas pairam em algum ponto entre os difícil viver plenamente como ser humano, uma dois pólos. Em última instância, a grande poesia — seja busca mais nobre do que a mera sobrevivência. do eu ou do mundo — supera essas divisões; o eu e Tanto Ashbery quanto Merwin, precursores da o mundo tornam-se espelho um do outro. Contudo, atual geração de poetas do eu, caracteristicamente para fins de discussão, pode-se fazer provisoriamente escrevem monólogos descolados de contextos ou uma distinção entre elas. narrativas explícitas. As líricas existenciais atormen­ tadas de Merwin sondam profundezas psicológicas, A POESIA DO EU enquanto em Ashbery, o uso inesperado de palavras poesia do eu tende ao discurso direto ou de vários registros da diligência humana — psicolo­ ao monólogo. Em sua intensidade máxima, gia, agricultura, filosofia — anseia pela Escola da Aexpressa um estado de alma. Os cenários, Linguagem. ainda que presentes, não desempenham papéis Os poetas recentes do eu foram mais a fundo na definitivos. Essa poesia pode ser psicológica ou ciência fenomenológica da consciência exercida à espiritual, aspirando a um estado atemporal. Mas exaustão momento a momento. Para Ann Lauterbach pode também solapar a certeza espiritual ao referir (1942- ), o poema é uma extensão da mente em ação; todo significado de volta à linguagem. Dentro desse para ela, sua poesia é “um ato de auto-construção e grande grupo, portanto, pode-se encontrar poesia um a voz, seu limiar”. A poeta da linguagem Lyn Hejinian tanto romântica e expressiva, mas também poemas (1941- ) expressa o movimento da consciência em baseados na linguagem que questionam os próprios seu poema-prosa autobiográficoMy Life [Minha Vida] conceitos de identidade e significado, ao vê-los como (1987) que usa disjunção, saltos inesperados e interse­ imagens sintetizadas. ções fortuitas:­ “Visualizo uma idéia no momento em Ao equilibrar essas questões, John Ashbery disse que a tenho, nossa colisão.” Rae Armantrout (1947- ) estar interessado “na experiência da experiência” ou recorre a silêncios e grupos de associações sutis e no que é filtrado por sua consciência, em vez do que indiretos, o poema título de seu livro Necromance realmente aconteceu. Seu poema “Soonest Mended” (1991) alerta que “enfática / precisão / é revelada [Logo Passará] (1970) mostra uma realidade “lá fora”, como / hostilidade”. Outra poeta experimental, Leslie solta e aparentemente simples, mas letal como a eira Scalapino (1947- ), escreve poemas como um “exame sobre a qual o trigo e joio (como vidas humanas ou da mente durante o processo do que quer que esteja as folhas da relva de Walt Whitman) são separados: criando”. ...sob o discurso está Grande parte da poesia experimental do eu é elíp­

124 tica, não-linear, não-narrativa e não­ em transformação. O poe­ma reúne -objetiva; em sua melhor expressão, elementos díspares em livres asso­ contudo, é não-solipsística, mas gira ciações de gestos largos — o caminho em vez disso em torno de um “centro percorrido pela poeta entre pequenos ausente”. A poesia­ do eu geralmente flocos brancos de uma tempestade envolve uma apresentação em públi­ de neve para devolver a malha de co. No caso de mulheres poetas, as balé preta de uma amiga, um bando exclusões, as noções de silêncio e as de estorninhos pretos (aves que disjunções são geralmente associadas expulsam as espécies nativas) e um à Julia Kristeva e a outras teóricas único corvo negro (protagonista da feministas francesas. A poeta Susan tradição oral nativo-americana) evo­ Howe (1937- ), que desenvolveu uma cado como “uma mancha de tinta na poética visual complexa para interligar cena emoldurada pela neve que caía o histórico e o pessoal, ressaltou a ao anoitecer”. dificuldade de recuperar as linhas Essas impressões sensoriais recu­ femininas em arquivos e genealogias, peram lembranças da infância da bem como a exclusão das mulheres poeta na Europa e de sua professora na história cultural. Para ela, como de dança em malha de balé preta, mulher, “nas lacunas e no silêncio são e se estendem na história do Novo onde você pode se encontrar”. Mundo. O contato de Cristóvão Colombo com os índios americanos Jorie Graham (1950- ) em uma praia de areias brancas é Uma das mais talentosas poetas como a tempestade de neve branca do eu subjetivo é Jorie Graham. da poeta: “Ele pensou ter visto índios Nascida em Nova York, cresceu na fugindo pelo branco na frente do na­ Itália e estudou na Sorbonne na vio” e, “No torvelinho branco, fincou França, na Universidade de Nova uma grande cruz”. York (especializando-se em cinema, Todos esses elementos estão su­ que continua a influenciar sua obra) bordinados à mente em movimento e no Workshop de Escritores de Iowa, que as contém e que constantemente onde mais tarde lecionou. Desde Jorie Graham se questiona. Essa mente, ou “campo então, é professora na Universidade unificado” (conjunto de teorias da de Harvard. física que tenta relacionar todas as A obra de Graham é carregada de forças do universo), é como a tem­ referências cosmopolitas e ela vê a pestade de neve do início: história dos EUA como parte de um compromisso internacional maior Nada verdadeiro ou falso em si mesmo. ao longo do tempo. O poema que Apenas movimento. Muitas faixas de dá título à sua coletânea vencedora movimento. Filamentos de queda do Prêmio Pulitzer The Dream of the marcados Unified Field: Selected Poems 1974- por minúsculas certezas de flocos. 1994 [O Sonho do Campo Unificado: Poemas Selecionados 1974-1994] Graham enfoca a mente como Foto: Estate of (1995) fala dessa história complexa Thomas Victor um portal de significado e distorção,

125 tanto uma parte do mundo quanto um Dove confere dignidade à vida humilde ponto privilegiado separado. Como de seus avós. O primeiro emprego de na montagem de um filme, sua voz Thomas, como trabalhador de terceiro costura visões e experiências dis­ turno, exigiu que ele morasse em um crepantes. Swarm [Enxame] (2000) alojamento e dividisse o colchão com intensifica a tendência metafísica de dois homens com os quais nunca se Graham, sua profundidade emocional encontra. Seu trabalho é “uma dor e seu sentimento de urgência. intensa”, mas a música anima sua alma como uma bela mulher (antecipando A POESIA DA VOZ Beulah, que ele ainda não conhecia). m seu extremo, a poesia do eu Quando Thomas canta, elimina o eu se faltar uma sensi­ Ebilidade que sirva de contrapeso. ele fecha os olhos. A próxima fase pode ser a poesia Nunca sabe quando ela virá de várias vozes ou de eus ficcionais, mas quando ela parte, sempre quebrando a idéia monolítica do eu em tira o chapéu. fragmentos e personagens. Os monó­ logos dramáticos de Robert Browning Louise Glück (1943- ) são seus precursores do século 19. O Entre os poetas da voz, uma das “eu” fictício é sólido, mas não envolve mais impressionantes é Louise Glück. o verdadeiro autor, cujo eu se mantém Nascida na cidade de Nova York, fora de cena. Glück, poeta americana premiada em Esse tipo de poesia costuma buscar 2003 e 2004, cresceu com permanente seus temas nos mitos e na cultura sentimento de culpa devido à morte popular, vendo os relacionamentos de uma irmã nascida antes dela. modernos tipicamente como redefi­ Na Faculdade Sarah Lawrence e na nições ou versões de padrões mais Universidade de Colúmbia, estudou antigos. Entre os poetas contempo­ com os poetas Leonie Adams e Stanley râneos da voz ou do monólogo estão Kunitz, e atribuiu sua sobrevivência Brigit Pegeen Kelly, Alberto Rios e a psíquica à psicanálise e a seus estu­ .. poeta canadense Margaret Atwood. Louise Gluck dos de poesia. Grande parte de suas Geralmente, a poesia da voz é escri­ poesias fala de perdas trágicas. ta na primeira pessoa, mas a terceira Cada livro de Glück é um experi­ pessoa pode causar impacto semelhan­ mento em novas técnicas, tornando te se o ponto de vista for claramente o difícil uma síntese de sua obra. Em dos personagens, como em Thomas seus primeiros livros, como The House and Beulah [Thomas e Beulah] de on Marshland [A Casa em Marshland] Rita Dove. Nesse livro, Dove entrelaça (l975) e The Triumph of Achilles [O biografia e história para dramatizar a Triunfo de Aquiles] (1985) trata o mate­ vida de seus avós. Assim como vários rial autobiográfico a uma distância psí­ afro-americanos no início do século 20, quica, ao passo que nos últimos é mais eles fugiram da pobreza e do racismo direta. Em Meadowlands [Pradarias] da zona rural do sul dos Estados Unidos (1996) usa de ironia e referências Foto: Associated / para trabalhar no Norte urbanizado. Library of Congress cômicas à Odisséia para descrever um

126 casamento fracassado. norte da Califórnia de Robert Hass, os Em seu memorável The Wild Iris litorais e as memórias do surf no sul [A Íris Selvagem] (1992) diferentes da Califórnia de Mark Jarman, os po­ tipos de flores declamam monólogos emas de Tess Gallagher ambientados metafísicos. O poema que dá título ao no noroeste do Pacífico e os poemas livro, uma exploração da ressurreição, de Simon Ortiz e Jimmy Santiago poderia ser uma epígrafe para o con­ Baca que emanam das paisagens­ do junto de sua obra. A íris selvagem, uma sudoeste. Cada sub-re­gião inspirou flor linda de cor azul profundo que ao poesia: o extremo sul marginal de brotar de um botão que ficou adorme­ C.D. (Carolyn) Wright está distante cido durante todo o inverno, diz: “É do úmido Golfo da Louisiana de Yusef terrível sobreviver / como consciência / Komunyakaa. enterrada na terra escura.” Assim como A poesia do lugar não se baseia a visão de Jorie Graham do eu fundido na descrição da paisagem; mais com a tempestade de neve, o poema de exatamente, a terra, e sua história, é Glück termina com uma visão de fusão a força geradora com implicações na entre o mundo e o eu — dessa vez na maneira como seu povo, inclusive o água da vida, azul sobre azul: poeta, vive e pensa. A terra é perce­ bida­ como o que D.H. Lawrence Você que não se lembra chamou de o “espírito do lugar”. da passagem do outro mundo Digo-lhe que poderia falar de novo: Seja Charles Wright (1935- ) o que for que Um dos poetas do lugar mais co­ volte do esquecimento volta moventes é Charles Wright. Criado para encontrar uma voz; no Tennessee, Wright é um sulista cosmopolita. O poeta tem sua base do centro da minha vida surgiu na poética italiana e da China antiga uma grande fonte, sombras de azul e infunde em sua obra temas sulistas profundo sobre água do mar azul. como o ônus de um passado trágico, retratado em sua série de poemas À maneira de Graham, Glück funde Charles Wright “Appalachian Book of the Dead” [Livro o eu e o mundo por meio de imagens dos Mortos dos Apalaches], baseado no fluidas de água. Se de um lado a água antigo Livro dos Mortos dos Egípcios. congelada — neve — de Graham parece­ Suas obras incluem Country Music: areia ou a terra encontrada à beira mar, Selected Early Poems [Música Country: em Glück a água fresca e azul — signi­ Primeiros Poemas Selecionados] (l982); ficando seu coração — funde-se com a Chickamauga (1995) e Negative Blue: água salgada do mundo. Selected Later Poems [Azul Negativo: Últimos Poemas Selecionados] (2000). A POESIA DO LUGAR A intensa poesia de Wright oferece ários poetas — não grupos, momentos de revelações espirituais res­ mas tendências nacionais — gatadas, ou melhor, construídas a partir Vencontram forte inspiração dos estragos do tempo e circunstância. em paisagens específicas. Alguns Foto © Nancy Crampton Uma inabilidade proposital — vista em exemplos são as evocações líricas do 127 suas voltas inesperadas de frase coloquial e prefe­ ______rência por linhas longas, quebradas com números O poema é um código sem mensagem: ímpares de sílabas — conferem a seus poemas uma O que importa na máscara não é a máscara mas o rosto graça lustrosa, como a de antigos implementos por baixo dela, agrícolas polidos pelo uso das mãos. Essa qualidade Absoluta, incomunicável, singular, trabalhada e às vezes irônica faz os poemas desabrigada e peregrina. de Wright soarem contemporâneos e impede que _____ pareçam pretensiosos. A rede de peixes da história nos arrancará em breve A disparidade entre visão transcendente e fragilida­ Das águas frias da auto-satisfação em que nos deixamos de humana está no âmago da visão de Wright. Ele é levar atraído por temas grandiosos — estrelas, constelações, Um a um história — de um lado, e pequenos elementos táteis — em sua luz e seu ar sufocantes. dedos, cabelos — de outro. Seu poema “Chickamauga” _____ conta com o conhecimento do leitor: Chickamauga, A estrutura se torna elemento da crença, a sintaxe na Geórgia, em 19 e 20 de setembro de 1862 foi cenário E a gramática um catequista, de uma batalha decisiva da Guerra Civil Americana Suas palavras o que dizem o rosário, entre o Norte e o Sul. O Sul não conseguiu destruir palavras desfiadas do nosso descontentamento.­ o exército da União (Norte) e abriu caminho para a devastadora invasão do Sul a partir de Atlanta, na O poema vê a história como conceito, um “código Geórgia. sem mensagem”. Cada indivíduo existe em si mesmo, “Chickamauga” pode ser lido como uma medita­ impossível de se conhecer fora de seus próprios ção sobre a paisagem, mas é também um lamento termos e tempo, “não é a máscara mas o rosto por elegíaco e a ars poetica do poeta. Começa com uma baixo dela”. A morte é inevitável para nós como para simples observação: “Revoada de pombos na relva os soldados caídos, o Velho Sul e os peixes pescados. alta.” Esse idílio aparente é o momento que antecede Não obstante, a poesia oferece um consolo parcial: os tiros do caçador; os soldados assas­ ­sinados, jamais Nosso descontentamento manifesto pode produzir mencionados no poema, foram esquecidos, triturados uma dimensão de imortalidade. como pombas ou relva. A “árvore de magnólia golpe­ ada” destrói o estereótipo “meia-noite e magnólia” das A POESIA DA FAMÍLIA plantações pré-guerra no Sul. O poema funde presente m tipo de poesia ainda mais arraigada e passado em um poderoso epitáfio a mundos e ideais coloca o objeto poético em uma matriz de perdidos. Upertencimento — à família, à comunidade e a tradições em mudança. Geralmente as tradições Revoada de pombos na relva alta. evocadas são étnicas ou internacionais. Brilho de fim de verão aqui ao lado Poucos poetas, como Sharon Olds (1942- ), ex­ Sobre as luvas e as pontas fendidas da árvore magnólia põem suas feridas abertas recorrendo ao modo con­ golpeada. fessional, mas a maioria dos poetas contemporâneos Sons de lida: buzina traseira de caminhão, martelo de escreve com um sentimento, que embora de lamento estanho e madeira, cigarra, sirene de incêndio. é, não obstante, genuíno. Stephen Dunn (1939- ) é um _____ exemplo: Em seus poemas, os relacionamentos são A história trata nosso passado como fruta podre. um meio de conhecimento. Em alguns poetas, o res­ Meio da manhã, luz de fim de século peito pela família e pela comunidade carrega consigo vestidos de algodão sob os pessegueiros. um sentido de afirmação, se não uma sensibilidade Toque-nos aqui. Toque-nos aqui e aqui. explicitamente devota. Esse tipo de poesia não é

128 conservadora; geralmente confronta a mensões espirituais da poesia. Seu po­ mudança e a perda, assim como luta ema de maior influência,“Persimmons” com os poderes da tradição literária [Caquis] (1986) do livro Rose, evoca étnica ou não-ocidental. sua origem asiática por meio do caqui, Lucille Clifton (1936- ) encontra fruta pouco conhecida nos EUA. Frutos conforto na comunidade negra. Sua e flores são objetos tradicionais da linguagem coloquial e sua grande fé arte e da poesia chinesa, mas raros formam uma combinação poderosa. As no Ocidente. O poema contém uma emocionantes elegias feitas por Agha crítica afiada, mas bem-humorada de Shahid Ali (1949-2001) à sua mãe são uma professora provinciana que Lee baseadas em uma fascinante gama de encontrou nos Estados Unidos e que formas poéticas clássicas do Oriente tinha a pretensão de conhecer caquis Médio, entrelaçando a vida de sua mãe e linguagem. ao sofrimento da Caxemira, país nativo Seu poema “Irises” [Íris] (1986) de sua família. do mesmo livro, sugere que nos A americana malásio-chinesa Shirley deixamos levar em um “sonho de Geok-lin Lim (1944- ) faz uma compa­ vida” mas, como a íris, “desperta ração pungente entre sua complicada morrendo — violeta ficando azul, família na Malásia e sua nova família crescendo / negra, negra”. O poema na Califórnia. A poeta mexicano-ame­ e seu tratamento das cores ecoam a ricana Lorna Dee Cervantes imortaliza íris selvagem de Glück. a vida dura e precária de sua família na O poema-título de The City in Which I Califórnia; Louise Erdrich traz de volta à Love You anuncia o ingres­ ­so afirmativo vida a energia vigorosa de sua imprevi­ de Lee numa comunidade maior de sível e tragicômica família indígena. poetas. Assim termina o poema:

Li-Young Lee (1957- ) minha terra nativa desapareceu, minha Uma história trágica paira sobre cidadania conquistei, Li-Young Lee, cujo pai chinês, que foi em liga com pedras da terra, eu médico de Mao Tse-tung, é mais tarde entro, sem abrigo ou ajuda da história, encarcerado na Indonésia. Nascido Li-Young Lee em Jacarta, Indonésia, Lee viveu uma os dias de dia nenhum, minha terra vida de refugiado, mudando-se com de terra nenhuma, eu re-entro a família para Hong Kong, Macau e na cidade onde eu te amo. Japão antes de conseguir abrigo nos E nunca acreditei que a multidão EUA, onde seu pai tornou-se pastor de sonhos e muitas palavras fossem protestante na Pensilvânia. Lee foi em vão. aclamado por seus livros Rose [Rosa] (1986) e The City in Which I Love You A POESIA DO BELO [A Cidade Onde Eu Te Amo] (1990). utra vertente da poesia inten­ Lee mostra-se sensível e filial — ele samente lírica, impulsionada descreve sua família e a decadência de Opor imagens, celebra a beleza seu pai de forma emocionante — e é sin­ apesar da vida moderna, ou em meio cero em seu compromisso com as di­ Foto © Dorothy Alexander a ela, com tudo que isso implica de

129 sofrimento e confusão. Muitos poetas tamanho dessa linha”. Como pessoas ou poderiam ser incluídos aqui — Joy Harjo idéias, os peixes querem liberdade: Eles (1951- ), Sandra McPherson (1943- ) “querem nadar para frente”, mas por e Henri Cole (1965- ) — já que essas ora “pulsam em seu globo dourado”. O tendências são em parte sobrepostas, e sentido de conexão orgânica comparti­ não mutuamente excludentes. lhado com outros está presente em todo Alguns dos mais destacados poetas o livro. O terceiro poema, “At the Gym” contemporâneos usam a imaginação [No Ginásio] imagina a impressão de não como elemento decorativo, mas cabeças suadas em equipamentos para para explorar novos temas e domínios. exercícios como “uma auréola / que os Harjo vê nos cavalos uma forma de re­ vivos fizeram juntos”. cuperar sua herança nativo-americana, Doty encontra em Walt Whitman ao passo que McPherson e Cole criam um guia pessoal e poético. O poeta imagens que parecem ganhar vida. americano também tem escrito de forma memorável sobre a tragédia da Mark Doty (l953- ) epidemia de Aids. Suas obras incluem Desde o fim dos anos 1980, Mark My Alexandria [Minha Alexandria] Doty tem publicado meditações poé­ (1993), Atlantis [Atlântida] (l995) ticas belas, maleáveis, sobre a arte e e suas vívidas memórias, Firebird as relações — com amantes, amigos [Pássaro de Fogo] (1999). Still Life e vários tipos de comunidades. Sua With Oysters and Lemon [Natureza imaginação vívida, exata e sensorial é Morta com Ostras e Limão] (2001) é muitas vezes uma forma de conhecer, uma coletânea recente. sentir e se aproximar. Por meio de Os poemas de Doty são ao mesmo imagens, Doty nos leva a descobrir tempo reflexivos (referindo-se a si mes­ afinidades com animais, com estranhos mos como arte) e receptivos ao mundo e com a obra de criação artística, o exterior. Ele vê o corpo imperfeito, que implica, segundo ele, uma nova todavia vital, como a margem — um tipo maneira de ver as coisas. de texto — onde o interior e o exterior É possível apreciar Doty seguindo se encontram, como em seu pequeno sua evolução da idéia de comunidade. Mark Doty poema, também tirado de Source, sobre Em “A Little Rabbit Dead in the Grass” o ato de fazer uma tatuagem, “To the [“Coelhinho Morto na Grama”] tirado de Engraver of My Skin” [Ao Tatuador da Source [Fonte] (2001) um coelho morto Minha Pele]. inspira uma meditação filosófica. Este coelho em particular, como um poema, Sei que o pacto é mortal, é importante em si mesmo e como aceito arcar com essa permanência. texto, “algo elaborado com arte” em cuja fronte “um traço / de pensamento Eu contrato com restrição; digo não e não, parece escrito”. O poema seguinte em então sim a você, e assino Source, “Fish R Us” [“ Aquário”], com­ para a comunidade humana a um saco — aqui, na linha pontilhada — de peixes nun tanque de loja de animais, para o que vier, assino: nosso tempo, “cada peixinho / mais ou menos do Foto © Dorothy Alexander

130 nosso perfil, o preenchimento de nossos detalhes Jane Hirshfield (l953-) (é a densidade que machuca, sempre, Jane Hirshfield não faz quase nenhu­ ma referência explícita ao budismo em não o plano original). Estou aqui seus poemas; no entanto, eles respiram para revisão, descoloração; aqui para o espírito de seus muitos anos de medi­ desvanecer tação zen e de suas traduções­ da antiga poesia cortesã de duas autoras japone­ e durar, indelével, azul. Escreva em mim! sas, Ono no Komachi e Izumi Shikibu. Esta tinta dura mais que eu. Hirshfield editou a antologia, Women in Praise of the Sacred: 43 Centuries of A POESIA DO ESPÍRITO Spiritual Poetry by Women [Mulheres em utra vertente da poesia ame­ Louvor ao Sagrado: 43 Séculos de Poesia ricana contemporânea busca Espiritual Feita por Mulheres] (1994). Otrazer um enfoque espiritual. A poesia de Hirshfield manifesta Nessas obras, a relação mais profunda o que ela chama de “pensamento é aquela entre o indivíduo e a essên­ indireto” em seu livro sobre a arte de cia eterna que existe além da beleza escrever poesia, Nine Gates: Entering artística, embora ligada a ela. Entre os the Mind of Poetry [Nove Portões: poetas mais antigos que anunciaram Entrando no Pensamento Poético] uma consciência espiritual destacam­ (1997). Essa orientação traz consigo -se Gary Snyder, que ajudou a intro­ a veneração à natureza, economia de duzir o zen na poesia americana, e o linguagem e o sentido de imperma­ poeta-tradutor Robert Bly, que trouxe nência budista. Sua própria “poesia à poesia dos EUA o conhecimento indireta” segue nuances, associações do surrealismo latino-americano. Nos (muitas vezes com as estações e as últimos tempos, Coleman Barks tem condições do tempo, evocando visões traduzido muitos livros de Rumi, poeta do mundo e estados de espírito) e místico do século 13. imagens da natureza . Entre os poetas americanos con­ O poema de Hirshfield, “Mule temporâneos espiritualmente afina­ Jane Hirshfield Heart” [“Coração de Mula”] da sua dos, destaca-se Arthur Sze (1950- ), coletâ­nea de poesia The Lives of the considerado possuidor de uma sensi­ Heart [As Vidas do Coração] (1997) bilidade zen. Seus poemas oferecem evoca vivamente uma mula sem jamais observações literais aparentemente mencioná-la. Para escrever o poema, simples que também são meditações, que ela mesma considerou uma receita tais como estas linhas tiradas de para superar tempos difíceis, Hirshfield “Throwing Salt on a Path” [“Jogando baseou-se em suas lembranças de uma Sal no Caminho”] (1987): “Defumando mula usada para transportar cargas por camarões sobre o fogo. Ah, /a luz de encostas íngremes na ilha grega de uma estrela nunca pára, só viaja”. Santorini. O poema instiga o leitor a Removendo a neve, ele observa: “O ganhar coragem. A humilde mula tem sal abre caminho na neve, expande sua própria beleza (guizos da cabeçada) as margens do universo”. Foto © Jerry Bauer e força.

131 natureza. Exemplos de poetas contem­ Nos dias quando o descanso porâneos com raízes em uma visão lhe é negado, natural são Pattiann Rogers (1940- ) e deixe que isso seja o seu — Maxine Kumin (1925- ). Rogers coloca a moscas, pó, um odor indescritível, história natural no centro das atenções, as duas cestas que esperam: ao passo que Kumin escreve com senti­ uma para os limões e a paixão, mento sobre sua vida na fazenda e seu a outra para tudo o que lhe tiraram. trabalho como criadora de cavalos. Ambas vazias, ela virá ao seu ombro, Mary Oliver (1935- ) respirará lentamente em seu braço nu. Uma das mais celebradas poetas Se lhe ofereceres feno, ela comerá. da natureza é Mary Oliver. Essa poeta Se nada lhe ofereceres, formidável e acessível evoca plantas e lá quedará pelo tempo que pedir. animais com intensidade visionária. Os pequenos guizos da cabeçada penderão Oliver nasceu em Ohio, mas viveu na ao seu lado em silêncio, Nova Inglaterra durante anos, e seus no calor e na precária sombra da árvore. poemas, como os de Robert Frost, ins­ Não deixe sua crina esparsa piram-se em suas diferentes paisagens lhe enganar, e mudanças de estação. Oliver encontra ou o modo como move a orelha esquerda significado em seus contatos com a no sonho. natureza, mantendo a tradição trans­ Isso também é presente dos deuses, cendental de Henry David Thoreau e calmo e completo. Ralph Waldo Emerson, e sua obra tem forte dimensão ética. É autora, entre A POESIA DA NATUREZA outros, de American Primitive [Primitivo Novo Mundo atraiu a atenção Americano] (1983), New and Selected dos americanos durante o Poems [Novos Poemas Selecionados] Operíodo revolucionário no final (l992), White Pine [Pinheiro Branco] dos anos 1700, quando Philip Freneau (1994), Blue Pastures [Pastagens Azuis] considerou importante celebrar a (1995) e os ensaios em The Leaf and the flora e a fauna nativas das Américas Mary Oliver Cloud [A Folha e a Nuvem] (2000). como forma de forjar uma identidade Para Oliver, não há fato natural, por americana. O transcendentalismo e o mais simples que seja, que não possa agrarianismo enfocaram a relação dos trazer novos conhecimentos ou o que Estados Unidos com a natureza no Emerson chamou de “fatos espirituais”, século 19 e início do século 20. como em seu poema “The Black Snake” As preocupações ambientais de [A Serpente Negra] (1979). Embora hoje refletem-se em uma poderosa ver­ a narradora, uma motorista de carro, tente da poesia dos EUA voltada para esteja implicada na morte da serpente, questões ecológicas. O falecido A.R. ela pára e remove o corpo do animal Ammons foi um precursor moderno e em sinal de respeito. Ela reconhece na poetas nativo-americanos, tais como o serpente, vítima freqüente de difamação falecido James Welch e Leslie Marmon pelas associações negativas com o Silko, nunca deixaram de reverenciar a Foto © Nancy Crampton livro Gênesis da Bíblia e com a morte,

132 um “irmão morto”, e aprecia sua beleza cintilante. existência consiste em “esperar ou recordar”, já que A serpente lhe ensina sobre a morte, mas também na maior parte do tempo do mundo nós “não estamos sobre uma nova gênese e a alegria de viver, e segue aqui, / não nascemos ainda, ou já morremos”. Uma adiante, pensando na “luz no centro de cada célula” intensidade que relembra o falecido poeta James que incita toda criatura viva “a seguir em frente / ale­ Wright arde em muitos poemas de Oliver, como gremente por toda a primavera” — sem saber nunca “Poppies” [Papoulas] (1991-1992). Esse poema co­ onde encontraremos nosso fim. Essecarpe diem é o meça com uma descrição das “chamas alaranjadas; convite a uma percepção mais profunda e festiva. balançando / ao vento, sua congregação é uma levitação”. Ele termina com uma provocação à morte: Quando a negra serpente “que pode fazer / a respeito — profunda noite azul”? irrompeu na estrada da manhã, e o caminhão não pôde desviar — A POESIA DA ARGÚCIA morte, como sempre acontece. o espectro da poesia do eu à poesia do mundo, a poesia da argúcia — incluindo o Agora ela jaz enrolada e sem valia Nhumor, o senso do absurdo e os vôos da como velho pneu de bicicleta. imaginação — está mais perto da poesia do mundo. Eu paro o carro A argúcia depende da interseção de duas ou mais e a carrego para o matagal. estruturas de referência e de agudo discernimento; é uma poesia mundana. Ela está tão fria e cintilante A poesia da argúcia encontra o momento poético como um chicote trançado, e está tão bela e tranqüila na rotina da vida diária, conferindo a ela um elevado como um irmão morto. tom humorístico, surrealista e alegórico. Em geral a Eu a deixo sob as folhas linguagem é coloquial, de forma que as situações fantásticas têm a força da realidade. Os mais antigos e sigo adiante, pensando mestres desse estilo são Charles Simic e Mark Strand; na morte: Sua subitaneidade, entre os poetas mais jovens destacam-se Stephen seu peso terrível, Dobyns e Mark Halliday. sua vinda certa. Não obstante, sob A linguagem do dia-a-dia, o humor, a ação surpre­ endente e o exagero dessa poesia acaba por torná-la a razão queima um fogo mais brilhante, que os ossos extremamente acessível, embora o melhor dessa sempre preferiram. obra só revele seus segredos se lida repetidas vezes. É a história da boa fortuna eterna. E diz ao olvido: não eu! Billy Collins (1941- ) Billy Collins é hoje o mais influente poeta da É a luz no centro de cada célula. razão O autor, que foi o poeta laureado dos EUA em É o que induz a serpente a espiralar e seguir em frente 2001-2003, é refrescante e estimulante, como Frank feliz por toda a primavera entre as folhas verdes, antes O’Hara na geração anterior. Como O’Hara, Collins de chegar à estrada. usa a linguagem cor­rente para registrar milhares de detalhes da vida diária, combinando livremente Os poemas de Oliver encontram inúmeras formas eventos do cotidiano­ (comer, realizar tarefas, escre­ ­ver) de celebrar o simples, mas transcendental fato de com referências culturais. Seu humor e originalidade estar vivo. No poema “Hummingbird Pauses at the fizeram com que atraísse o grande público. Embora Trumpet Vine” [Beija-Flor pausa no Jasmim-da- alguns tenham acusado Collins de acessível demais, Virgínia] (1992) ela nos lembra que quase toda a seus imprevisíveis vôos de imaginação mergulham no

133 mistério. Foto © Nancy Crampton espírito, os poetas se aventuram no A obra de Collins é uma forma do­ mundo com um “eu” em letras minús­ mesticada de surrealismo. Seus melhores culas, aberto a tudo que os moldou. poemas, muito longos para reproduzir Esses poetas acreditam no valor da aqui, catapultam de imediato a imagina­ experiência. ção a uma série de situações cada vez Michael Harper, poeta mais velho mais surrealistas, oferecendo no fim uma dessa vertente de poesia, reflete esse aterrissagem emocional, uma disposição espírito ao entrelaçar a história afro­ de ânimo em que podemos nos apoiar, -americana com as experiências de mesmo que brevemente, como uma sua família em forma de montagem. Billy Collins modulação final na música. O pequeno De maneira semelhante, Frank Bidart poema “The Dead” [“Os Mortos”], de tem fundido eventos políticos como o Sailing Alone Around the Room: New assassinato do presidente americano, and Selected Poems [Velejando Sozinho John F. Kennedy, com a vida pessoal. em Volta do Quarto: Novos Poemas Ed Hirsch, Gjertrud Schnackenberg e Selecionados] (2001), dá uma idéia do Rita Dove impregnam alguns de seus vôo imaginativo e suave aterrizar de mais belos poemas com lembranças Collins, como o de uma ave em busca igualmente irredutíveis de seu passado de repouso. pessoal e centram sua atenção em momentos decisivos. Os mortos estão sempre a nos desdenhar, dizem, Robert Pinsky (1940- ) enquanto calçamos nossos sapatos ou Robert Pinsky está entre os mais com­ preparamos um sanduíche, pletos poetas da história. Poeta laureado eles nos olham com desdém de seus dos EUA de 1997 a 2000, Pinsky vincula barcos de fundo de vidro, lá no céu, fala coloquial à virtuosidade técnica. em seu lento remar pela eternidade. A cor local e pessoal é um dos seus traços característicos, mas seus poemas Eles observam o topo de nossas cabeças também atingem contextos históricos e se movendo aqui na terra, nacionais. Como as obras de Elizabeth e quando nos deitamos no campo ou Bishop, sua poesia coloquial combina no sofá, aparente simplicidade com arte sutil. drogados talvez pelo zunir da tarde quente, Robert Pinsky O influente livro de crítica de pensam que também estamos a olhá-los, Pinsky, The Situation of Poetry [A Situação da Poesia] (1976) recomen­ o que os fazem levantar os remos e ficar dava uma poesia com as virtudes da em silêncio prosa, e ele colocou isso em prática a esperar, como pais, que fechemos em seu poema do tamanho de um nossos olhos. livro An Explanation of America [Uma Explicação dos Estados Unidos] A POESIA DA HISTÓRIA (1979) e History of My Heart [História poesia inspirada pela história do Meu Coração] (l984), embora os é de certa forma a mais difícil livros publicados depois, inclusive The Foto © Christopher Felver / Ae ambiciosa de todas. Nesse CORBIS Want Bone [O Osso do Desejo] (l990) 134 desencadeiem um lirismo também visto em sua o extremo mais distante do espectro poético impressionante coletânea de poemas The Figured encontra-se a poesia do mundo, na qual rei­ Wheel [A Roda Figurada] (1996). Nna o espírito de Elizabeth Bishop. É uma po­ O poema do título de The Figured Wheel é um esia pessimista ou pária que parece antipoética na dos mais belos trabalhos de Pinsky, mas é difícil se­ primeira leitura. Ela pode parecer prosaica demais, lecionar algum trecho. O pequeno poema “The Want muito envolvida com meras eventualidades, para Bone”, sugerido pela mandíbula de um tubarão visto realizar algo transcendente. A exposição hesitante no console da lareira de um amigo, demonstra o bri­ é o oposto da oracular, e o tema a princípio parece lhantismo técnico de Pinsky (rimas internas como perdido ou meramente descritivo. Apesar disso, o “limber grin” [dócil sorriso largo], rimas inclinadas melhor dessa poesia abre múltiplas perspectivas, como em “together” [juntos] e “pleasure” [prazer] questiona a própria noção de identidade pessoal e polissílabos tamborilados levemente contra uma e entende o sofrimento do ponto de vista ético. linha iâmbica firme como um tambor). O poema Pertencem a essa vertente poetas mais velhos co­ inicia com a descrição do tubarão como a “língua mo Richard Hugo, Gwendolyn Brooks e Phil Levine. das ondas” e termina com seu canto — do reino dos Vozes contemporâneas, tais como Ellen Bryant Voight mortos — peã do desejo eterno. O ego ou o eu pode e Yusef Komunyakaa foram influenciados por sua ser criticado aqui: É uma ânsia sem sentido, um O visão quase naturalista, e eles são atraídos para a ou zero, e sua satisfação uma ilusão sem esperança. violência e sua sombra de longo alcance.

A língua das ondas tangeu o sino da terra. Yusef Komunyakaa (1947- ) O azul encrespou-se e impregnou-se no fogo do azul. Criado na Luisiana, Yusef Komunyakaa, nascido A mandíbula seca do tubarão no pântano quente James Willie Brown Jr., serviu no Vietnã, logo depois Escancarada sem nada mais que areia dos dois lados. de se formar na escola de nível médio, ganhando a Estrela de Bronze. Foi jornalista do jornal militar, O osso não saboreava nada e não sentia cheiro de nada, Southern Cross, e escreveu muitos poemas tendo a Uma harpa escaldada e desdentada, oprimida e fatigada. guerra como cenário. Muitas vezes, como na antologia Os arcos unidos assumiram a forma do nascimento e do de poesia, “Camouflaging the Chimera” [“Disfarçando desejo veemente a Quimera”] (1988) há um elemento de suspense, E a bocarra soldada, aberta, parecia a letra O. perigo e emboscada. Komunyakaa tem falado sobre

a necessidade de a poesia propiciar uma “série de Cordas ossificadas mantinham os cantos juntos surpresas”. Como o poeta Michael S. Harper, ele usa Em espirais com arestas pregueadas como um vestido freqüentemente técnicas de jazz e tem escrito sobre a de verão. importância da livre improvisação e da abertura para Mas onde estava o dócil sorriso largo, o corte do prazer? outras vozes, como fazem os músicos em uma “jam Bocas infinitesimais a carregaram, session”. Ele co-editou The Jazz Poetry Anthology [A A praia o esfregou e gravou e o conservou limpo. Antologia da Poesia do Jazz] (1991-1996) e publicou Mas ainda canta O te amo minha pequena minha terra um volume de ensaios intitulado Blue Notes [Notas de Meu alimento meu pai meu filho quero-o todo para mim Blues] (2000) embora seu reconhecimento inicial se Minha flor minha nadadeira minha vida minha leveza deva à coletânea Neon Vernacular [Vernáculo Néon] meu O. (1993). Um dos temas recorrentes de Komunyakaa A POESIA DO MUNDO diz respeito à identidade. Seu poema “ Facing It” [Há que Enfrentá-lo] (1988) ambientado no

135 Memorial dos Veteranos do Vietnã o outro extremo do espectro em Washington, D.C., começa com poético, a ciberpoesia é uma um riff (uma frase típica do jazz) que Nnova poesia do mundo. Para junta sua própria face às memórias e muitos jovens adultos americanos, o rostos refletidos: livro ocupa um segundo plano perante o monitor do computador e a leitura em Meu negro rosto se desvanece, língua humana falada vem depois da escondendo-se dentro do negro granito. exposição a códigos binários. Disse que não o faria, A literatura gerada por computador maldito seja: Sem lágrimas. começou a ganhar forma a partir do Sou pedra. Sou carne. início dos anos 1990; com o advento da Meu reflexo anuviado olha pra mim Rede Mundial de Computadores, parte como uma ave de rapina, o perfil da noite da poesia experimental transferiu o seu inclinado contra a manhã. Viro foco para uma esfera global, virtual e assim—a pedra me larga. sem papel. Viro de novo—Estou dentro Motivos recorrentes na ciberpoesia do Memorial dos Veteranos do incluem auto-reflexões críticas sobre Vietnã, dependendo da luz a obra impulsionada pela tecnologia; para ter importância. ícones de computadores, gráficos e Recorro aos 58.022 nomes, links de hipertextos festoam vastas quase esperando encontrar redes de relacionamento, enquanto o meu em letras como fumaça. camadas dimensionais — animação, Toco o nome de Andrew Johnson; tecnologia do som, textos hiperligados Vejo o lampejo branco da armadilha — multiplicam-se em várias direções, al­ explosiva. gumas vezes criadas por vários autores Os nomes tremeluzem sobre uma blusa desconhecidos. de mulher Os meios de expressão para essa mas quando ela vai embora obra vão e vêm; entre muitos outros, os nomes continuam na parede. podem ser mencionadas as revistas As pinceladas chamejam, as asas de um de poesia em CD-ROM, The Little pássaro vermelho atravessam minha visão. Yusef Komunyakaa Magazine, Cyberpoetry, Java Poetry, O céu. Um avião no céu. New River e Parallel. Writing From the A imagem branca de um veterano flutua New Coast: Technique [Escrevendo pra mais perto de mim, então seus olhos da Nova Costa: Técnica] (1993) in­ pálidos fluente compilação de manifestações olham através dos meus. Sou uma janela. poéticas acompanhadas de uma Ele perdeu seu braço direito coletânea de poemas editada por dentro da pedra. No negro espelho Juliana Spahr e Peter Gizzi, ajudou uma mulher tenta apagar os nomes: a estimular a poesia experimental Não, ela escova o cabelo de um menino. na era da comunicação eletrônica. O volume celebra a multiplicidade CIBERPOESIA irredutível e a primazia do contexto histórico, atacando as próprias no­ Foto © Nancy Crampton ções de identidade e universalidade

136 como conceitos burgueses repressivos. Jorie Graham e outros poetas experimentais do eu chegaram a pontos de vista semelhantes, partindo de direções opostas. Fundamentais ou contingentes, os poemas existem no cruzamento da palavra com o mundo. 

137 The New Yorker, Malcolm Gladwell e relatos sobre reabilitação de uso de drogas e crimes. Na última CAPÍTULO categoria estava uma reedição do inovador In Cold Blood [A Sangue Frio] de Truman Capote, “não-ficção” de 1965 que obscurece a distinção entre literatura de alta qualidade e jornalismo e que recentemente deu origem a um filme. Livros de autores não-americanos sobre temas LITERATURA10 internacionais também ocupavam lugar de destaque CONTEMPORÂNEA na lista. O fascinante romance do afegão-americano AMERICANA Khaled Hosseini, The Kite Runner [O Caçador de Pipas] fala da infância de dois amigos em Cabul s Estados Unidos são uma das mais diver­ separados pelo governo do Taleban, enquanto o sificadas nações do mundo. Sua dinâmica livro de memórias de Azar Nafisi, Reading Lolita in Opopulação de quase 300 milhões de habitantes Teheran [Lendo Lolita em Teerã], relembra de forma vangloria-se de mais de 30 milhões de indivíduos pungente o ensino de grandes obras da literatura nascidos em outros países que falam vários idiomas ocidental para jovens iranianas. Um terceiro romance, e dialetos. Cerca de um milhão de imigrantes chega a de Arthur Golden, Memoirs of a Geisha [Memórias cada ano, muitos da Ásia e América Latina. de uma Gueixa], que deu origem a um filme, conta A literatura atual nos EUA é também fascinan­ a vida de uma japonesa durante a Segunda Guerra temente diversificada, instigante e em evolução. Mundial. Novas vozes surgiram de vários cantos, desafiando Além disso, a lista de best-sellers revela a popu­ velhas idéias e adaptando tradições literárias para se laridade dos temas religiosos. Segundo a revista ajustar às condições de mudança da vida nacional. Publishers Weekly, 2001 foi o primeiro ano em que Avanços socioeconômicos possibilitaram a grupos livros sobre temas ligados ao cristianismo encabe­ antes sub-representados se expressarem mais plena­ çaram a lista dos mais vendidos, tanto no gênero mente enquanto inovações tecnológi­ ­cas criaram um ficção como não-ficção. Entre os livros de capa fórum público em rápida transformação. Clubes de dura mais vendidos desse exemplar de domingo leitura proliferam, feiras de livros, festivais literários em 2006, encontramos o romance de Dan Brown, e “concursos de poesia” (eventos em que novos po­ The DaVinci Code[O Código Da Vinci] e o conto etas concorrem com a apresentação de sua poesia) de Anne Rice, Christ the Lord: Out of Egypt [Cristo atraem públicos entusiasmados. A escolha de uma Senhor: a Saída do Egito]. nova obra para um clube do livro pode lançar um Além da lista best-sellers do Times, redes de escritor desconhecido dando-lhe destaque da noite livrarias oferecem seções distintas para as principais para o dia. religiões, entre elas: cristianismo, islamismo, judaís­ Em um domingo típico, a lista de livros mais ven­ mo, budismo e, às vezes, hinduísmo. didos no New York Times Book Review comprova a Na seção de literatura feminina de livrarias encon­ extraordinária diversidade da cena literária americana tramos obras de uma “Terceira Onda” de feministas, atual Em janeiro de 2006, por exemplo, a lista de livros movimento geralmente dirigido a mulheres de 20 brochura mais vendidos incluía o gênero ficção — ro­ a 30 anos de idade que cresceram em uma era de mances excitantes de Nora Roberts, um novo suspense igualdade social de grande aceitação nos EUA. As de John Grisham, assassinatos misteriosos — junto a feministas da Terceira Onda sentem-se suficiente­ livros científicos de não-ficção do antropólogo Jared mente capacitadas para enfatizar a individualidade Diamond, sociologia popular do redator da revista de escolhas feitas pelas mulheres. Freqüentemente

138 associado na mente popular a uma volta ricos veios e, à medida que cada literatura à tradição e aos estilos de educadora de étnica amadurece, ela cria suas próprias crianças, mulher de batom e “feminina”, tradições. A não-ficção criativa e a auto­ essas jovens recuperaram a expressão biografia proliferaram. O gênero “conto” “garota” — algumas recusam o rótulo de ganhou destaque e o conto “curto” se feministas. O que geralmente é chamado firmou. Uma nova geração de drama­ de “chick lit” (literatura de garotas) é s autores turgos continua a tradição americana de um ramo em prosperidade. Bridget Opós-modernos explorar questões sociais atuais no palco. Jones’s Diary [Diário de Bridget Jones] questionam Não há espaço nesta breve pesquisa para da inglesa Helen Fielding e Sex and the as estruturas fazer justiça à fascinante diversidade da City de Candace Bushnell, que retratam literatura americana contemporânea. Em a mulher urbana solteira e romântica, externas, sejam vez disso, é preciso considerar desenvol­ deram origem a um gênero popular elas políticas, vimentos gerais e figuras representativas. entre as jovens. filosóficas ou Escritores de não-ficção também artísticas. Tendem PÓS-MODERNISMO, CULTURA analisam o fenômeno do pós-feminismo. a desacreditar as E IDENTIDADE The Mommy Myth [O Mito da Mamãe] “Pós-modernismo” sugere fragmen­ (2004), de Susan Douglas e Meredith narativas-mestre tação: colagem, hibridismo e uso de Michaels, analisa o papel da mídia do pensamento várias vozes, cenas e identidades. Os nas “guerras das mães”, ao passo que modernista, as autores pós-modernos questionam o intenso ManifestA: Young Women, quais julgam as estruturas externas, sejam elas Feminism, and the Future [ManifestA: politicamente políticas, filosóficas ou artísticas. Jovens Mulheres, Feminismo e o Futuro] Tendem a desacreditar as narativas­ (2000) de Jennifer Baumgardner e Amy suspeitas. -mestre do pensamento modernista, as Richards, discute o ativis­ mo­ da mulher quais julgam politicamente suspeitas. na era da internet. Caitlin Flanagan, Em seu lugar, exploram gêneros da redatora de revista que se diz “antifemi­ cultura popular, em especial a ficção nista” explora os conflitos entre a vida científica, a espionagem e as histórias doméstica e a vida profissional das de detetives, tornando-se, efetivamente, mulheres. Seu ensaio de 2004 na revista arqueólogos da cultura popular. The Atlantic, “How Serfdom Saved the White Noise [Ruído Branco], de Women’s Movement” [Como a Servidão Don DeLillo, obra estruturada em 40 Salvou o Movimento de Mulheres], seções como videoclipes, ressalta os relato sobre como as mulheres que tra­ dilemas da representação: “As pessoas balham fora dependem das imigrantes eram tolas assim antes da televisão?”, de classe inferior para cuidar de seus pergunta-se um personagem. O sensa­ filhos, desencadeou grande debate. cional Infinite Jest [Gracejo Infinito], É claro que a literatura americana de David Foster Wallace, com mil no início do século 21 tornou-se demo­ páginas e novecentas notas de rodapé crática e heterogênea. O regionalismo mistura terroristas cadeirantes, droga­ floresceu e escritores internacionais ou dos e descrições futuristas de um país “globais” refletem a cultura dos Estados como os Estados Unidos. Em Galatea Unidos sob perspectivas estrangeiras. A 2.2, Richard Powers junta tecnologia literatura multi-étnica continua a minerar sofisticada com vidas privadas.

139 Influenciados por Thomas Pynchon, os autores pobreza, de alcoolismo familiar e a intolerância na pós-modernos produzem tramas complexas que Irlanda com surpreendente afeto e humor. Hand to exigem saltos de imaginação. Quase sempre nivelam Mouth [Existência Precária] de Paul Auster, publicado a profundidade histórica a uma única dimensão; os em 1997, fala da pobreza que tolheu sua escrita e romances de William Vollmann deslizam por tempos envenenou sua alma. e espaços extremamente diferentes com a mesma facilidade com que um mouse de computador se O Conto: Novos Rumos movimenta entre textos. O gênero “romance” perdeu um pouco do seu bri­ lho no final dos anos 1970. Donald Barthelme, Robert Não-ficção Criativa: Memórias e Coover, John Barth e William Gass escreveram obras Autobiografias de metaficção experimentais, mas elas já não eram ários escritores anseiam por gêneros livres e consideradas as mais modernas. Revistas semanais de menos canônicos como veículos para suas grande circulação que publicavam contos de ficção, Vvisões pós-modernas. A ascensão da literatura como a Saturday Evening Post, faliram. global, multiétnica e feminina — obras nas quais Coube a um forasteiro do Noroeste do Pacífico — escritores refletem sobre experiências moldadas corajoso realista na tradição de Ernest Hemingway por cultura, cor e gênero — deram às autobiogra­ — revitalizar o gênero. Raymond Carver (l938-l988) fias e memórias um fascínio especial. Embora as estudou com o falecido escritor John Gardner, absor­ fronteiras terminológicas sejam debatidas, um livro vendo sua paixão pela arte acessível mesclada com de memórias em geral é mais curto ou limitado visão moral. Carver cresceu em meio ao alcoolismo em seu escopo, ao passo que uma autobiografia e pobreza extrema para se tornar o escritor de contos tenta passar um panorama mais abrangente sobre de maior influência nos EUA. Em suas coletâneas a vida do autor. Will You Please Be Quiet, Please? [Fique Quieta, por A fragmentação pós-moderna tornou problemática Favor] (l976), What We Talk About When We Talk para muitos escritores a idéia de um eu acabado que About Love [Sobre o Quê Falamos Quando Falamos pode ser revelado com sucesso de uma única vez. de Amor] (1981), Cathedral [Catedral] (l983) e Where Vários escritores recorrem ao gênero memórias em I’m Calling From [De Onde Estou Ligando] (1988), suas batalhas para fundamentar um eu autêntico. O acompanha trabalhadores confusos em empregos que constitui autenticidade e até que ponto pode o sem perspectivas, farras alcoólicas e quartos alugados autor florear as experiências registradas na memória num estilo minimalista sutil de escrever de grande em obras de não-ficção são temas discutidos acalora­ impacto. damente em conferências de escritores. Junto com Carver está a romancista e contistaAnn Os próprios escritores têm contribuído com con­ Beattie (1947- ) cujos personagens de classe média siderações perspicazes acerca dessas questões em freqüentemente levam a vida de modo inconseqüente. livros sobre o ato de escrever, como The Writing Life Seus contos fazem referência a eventos políticos e [Vida de Escritor] de Annie Dillard, publicado em canções populares e oferecem vislumbres extraídos 1989. Obras notáveis no gênero memórias incluem da vida, década a década, durante a transformação The Stolen Light [Luz Roubada] de Ved Mehta, edi­ dos Estados Unidos . Suas obras mais recentes são tado em 1989. De origem indiana, Mehta ficou cego Park City [Cidade-Parque] (1998), e Perfect Recall aos três anos de idade. Seu relato sobre a viagem [Lembrança Perfeita] (2001). de avião que fez sozinho para estudar nos Estados Inspirados por Carver e Beattie, em meados dos Unidos é algo inesquecível. O fascinante Angela’s anos 1980 escritores produziram coletâneas de contos Ashes [As Cinzas de Ângela] (1996), do irlandês­ neo-realistas fascinantes, entre eles: Reasons to Live -americano Frank McCourt, recorda sua infância de [Razões para Viver] (1985) de Amy Hempel, Family

140 Dancing [Dança em Família] (1984) de Seus defensores dizem que as David Leavitt, Rock Springs de Richard “geografias reduzidas” do conto curto Ford (1987), Shiloh and Other Stories refletem condições pós-modernas nas [Shiloh e Outras Histórias] (1982) quais os limites parecem mais próximos. e Self-Help [Auto-Ajuda] (1985) de Eles encontram simplicidade elegan­ Lorrie Moore. Outras figuras notáveis te nessas ficções curtas. Detratores incluem o falecido Andre Dubus, autor consideram o conto curto um sinal de de Dancing After Hours [Dança pela decadência cultural, uma perda geral Madrugada] (1996) e o produtivo John da habilidade de leitura e um déficit Updike, cuja recente coletânea de con­ de atenção. De qualquer forma, contos tos inclui The Afterlife and Other Stories curtos encontraram certo nicho: são [Após a Morte e Outras Histórias] fáceis de enviar em um e-mail e se (1994). prestam à distribuição eletrônica. São Hoje, como discutido mais adiante de fácil manejo em aulas de leitura e neste capítulo, escritores com raízes étni­ bons modelos redações cas e globais estão informando o gênero do conto com abordagens não-ocidentais Teatro e tribais, e a narrativa tem comandado a O teatro contemporâneo combina atenção da crítica e do público. O conto realismo e fantasia em obras pós­ versátil primitivo é a base de várias formas -modernas que misturam os universos híbridas: romances construídos a partir pessoal e político. O exuberante Tony do encadeamento de contos ou vinhetas Kushner (l956- ) é aclamado por suas e não-ficções criativas que entrelaçam premiadas Angels in America [Anjos história e história pessoal com ficção. na América], que representam de modo vívido a epidemia da Aids e os Conto Curto: ­ custos psíquicos da homossexualidade Ficção Rápida ou Breve remprimida nos anos 1980 e 1990. Part O conto curto é uma história muito One: Millennium Approaches [Parte I: pequena, em geral, com apenas uma ou o Milênio se Aproxima] (1991) e seu duas páginas. Por vezes é chamado de com­plemento,­ Part Two: Perestroika “flash fiction” (ficção breve) ou “sudden [Parte II: Perestroika] (1992) têm juntas Raymond Carver fiction” (ficção rápida), de acordo com a duração de sete horas. Combinando a antologia Sudden Fiction de 1986, comédia, melodrama, análise polí­ editada por Robert Shapard e James tica e efeitos especiais, elas entrela­ Thomas. çam diversas tramas e personagens No conto curto há pouco espaço marginalizados. para desenvolver um personagem. Mulheres dramaturgas têm alcança­ Em vez disso, o elemento da trama é do especial sucesso nos últimos anos. central: ocorre uma crise e o esboço Entre elas, destacam-se Beth Henley de um personagem simplesmente (1952- ), do Mississippi, conhecida por tem de reagir. Os autores empregam seus retratos de mulheres do Sul. Henley uma narrativa inteligente ou padrões ganhou reconhecimento nacional por lingüísticos; em alguns casos o conto Crimes of the Heart [Crimes do Coração] Foto © Marion Ettlinger / curto lembra um poema em prosa. CORBIS OUTLINE (1978) que originou um filme em

141 1986. Trata-se de uma peça atraente sobre três irmãs movimentos artísticos como o fez a cidade de Nova excêntricas cujo afeto mútuo as ajuda a sobreviver à York em outros tempos. Comunidades de artes vitais desilusão e ao desespero. Peças posteriores, comoThe surgiram em muitas cidades e a tecnologia eletrônica Miss Firecracker Contest [O Concurso Miss Firecracker] descentralizou a vida literária. (1980), The Wake of Jamey Foster [O Despertar de À medida que as mudanças econômicas e sociais Jamey Foster] (l982), The Debutante Ball [Baile de redefinem os Estados Unidos, instaura-se um anseio Debutante] (l985) e The Lucky Spot [Lugar da Sorte] por tradição. Os mitos mais sustentáveis e nitida­ (l986) exploram formas de socialização do Sul — mente americanos fazem parte do país, e escritores concursos de beleza, funerais, bailes de debutantes e recorrem ao Sul da Guerra Civil, ao Oeste Selvagem salões de baile. do rancheiro, à vida arraigada do agricultor do Meio Wendy Wasserstein (1950-2006), de Nova York, Oeste, à terra natal tribal do Sudoeste e a outras es­ começou escrevendo comédias, como When Dinah feras localizadas onde o real e o mítico se misturam. Shore Ruled the Earth [Quando Dinah Shore Dominou Naturalmente, mais de uma região inspirou muitos a Terra] (l975), uma paródia dos concursos de beleza. autores; elas estão incluídas aqui em regiões que Ela é mais conhecida por The Heidi Chronicles [As formaram a visão desses autores ou as características Crônicas de Heidi] (l988) sobre uma professora bem­ de seus trabalhos maduros. -sucedida que confessa sua profunda infelicidade e adota uma criança. Wasserstein continuou explorando O Nordeste as aspirações femininas em The Sisters Rosensweig O Nordeste pitoresco, região de invernos longos, [As Irmãs Rosensweig] (l991), An American Daughter florestas decíduas densas e cadeias de montanhas [Uma Filha Americana] (1997) e Old Money [Dinheiro acidentadas baixas, foi a primeira área ocupada por Velho] (2000). colonizadores de língua inglesa e conserva um ar de Jovens dramaturgas como a afro-americana Suzan- Inglaterra. Boston, em Massachusetts, é o motor de Lori Parks (1964- ) dão continuidade ao sucesso de sua cultura e ostenta instituições de pesquisa e várias suas predecessoras. Parks, criada em várias bases mi­ universidades. Diversos escritores da Nova Inglaterra litares nos EUA e Alemanha, aborda questões políticas retratam personagens que dão continuidade ao legado em obras experimentais cuja atemporalidade e ritua­ puritano, incorporando a ética do trabalho da classe lismo lembram o escritor de origem irlandesa Samuel média protestante e o compromisso progressivo com a Beckett. Sua obra mais conhecida, The America Play reforma social. Nas áreas rurais, pequenos agricultores [A Peça da América] (1991) gira em torno do assassi­ independentes lutam para sobreviver no mundo do nato de Abraham Lincoln por John Wilkes Booth. Ela marketing global. retorna ao tema em Topdog/Underdog [Vencedor/ A romancista Joyce Carol Oates usa o norte do Perdedor], 2001, que conta a história de dois irmãos Estado de Nova York como cenário para muitos afro-amerianos, Lincoln e Booth, e a rivalidade entre de seus trabalhos góticos. Richard Russo (1949- ), eles. em seu sedutor Empire Falls (2001), evoca a vida em uma cidade fabril em decadência no Maine, REGIONALISMO estado em que Stephen King (1947- ) ambienta seus ma sensibilidade regionalista generalizada ga­ populares romances de terror. nhou força na literatura americana nas últimas Romances agridoces de Sue Miller (1943- ) situa­ Uduas décadas. A descentralização expressa a dos em Massachusetts, como The Good Mother [O condição pós-moderna americana, tendência mais Preço da Paixão] (1986), analisam estilos de vida de evidente na literatura de ficção; não existe mais contraculturas em Cambridge, cidade conhecida pela um ponto de vista ou código capaz de expressar diversidade cultural e social, vitalidade intelectual e com sucesso a nação. Nenhuma cidade define os inovações tecnológicas. Também de Massachusetts,

142 Anita Diamant (1951- ), recebeu aclamação popular Três escritores que estudaram na Universidade com The Red Tent [A Tenda Vermelha] (1997), roman­ de Brown ,em Rhode Island, quase na mesma época ce histórico feminista baseado na história bíblica de e foram alunos da escritora britânica Angela Carter Dinah. são, com freqüência, mencionados como núcleo Russell Banks (1940- ), de New Hampshire, estado de uma “próxima geração”. Donald Antrim (1959- ) pobre e rural, afastou-se da literatura experimental e satiriza a vida acadêmica em The Hundred Brothers adotou em suas obras um estilo mais realista, como [Os Cem Irmãos] (1997), que se passa em uma Affliction [Aflição] (1989), romance sobre persona­ enorme biblioteca de onde se podem ver pessoas gens da classe trabalhadora de New Hampshire. Para desabrigadas. Rick Moody (1961- ) é mais conhecido Banks, reconhecer suas raízes é parte fundamental por seu romance The Ice Storm [Tempestade de Gelo] da identidade. Em Aflição, o narrador despreza (1994). Entre os romances de Jeffrey Eugenides (1960 - pessoas que “foram para a Flórida, o Arizona e a ), estão Middlesex ( 2002), que narra as experiências Califórnia, compraram um trailer ou condo, ficaram de um hermafrodita. Escritores admiráveis com visões com a pele áspera de jogar shuffleboard o dia inteiro incomuns, chegando ao absurdo, Antrim, Moody e e esperaram a morte”. As recentes obras de Banks Eugenides, levam adiante as tradições opostas de incluem Cloudsplitter [O Divisor de Nuvens] (1998), John Updike e Thomas Pynchon. Muitas vezes ligado romance histórico do século 19 sobre o abolicionista a esses três jovens romancistas, está o exuberante pós­ John Brown. -moderno David Foster Wallace (1962- ). Wallace, de A surpreendente escritora Annie Proulx (1935- ) Ithaca, Nova York, foi aclamado por seu complicado cria histórias sobre os batalhadores habitantes do romance sério-cômico The Broom of the System [A norte da Nova Inglaterra em Heart Songs [Canções Vassoura do Sistema] (1987) e histórias saturadas de do Coração] (1988). Seu melhor romance, The cultura pop em Girl With Curious Hair [A Garota com Shipping News [Notícias sobre Navegação] (1993) Cabelos Estranhos] (1989). é ambientado mais para o norte, em Newfoundland, Canadá. Proulx também passou anos no Oeste e O Meio Atlântico um de seus contos originou o filme Brokeback“ Os estados férteis do Meio Atlântico, dominados Mountain,” em 2006. pela cidade de Nova York com seu grande porto, William Kennedy (1928- ) escreveu um ciclo de roman­ permanecem uma porta de entrada para ondas de ces densos e entrelaçados situados em Albany, no imigrantes. Hoje a economia diversificada da região norte do estado de Nova York, incluindo o aclamado engloba finanças, comércio e transporte, bem como Ironweed [Vermônia]. O título de sua história como publicidade e moda. A cidade de Nova York é o conhecedor profundo de Albany dá uma idéia de reduto da indústria de editoração, bem como de seu estilo firme, coloquial e do número exagerado de galerias de arte e museus prestigiados. personagens muitas vezes inescrupulosos: O Albany! Don DeLillo (1936- ), de Nova York, começou Improbable City of Political Wizards, Fearless Ethnics, como redator publicitário e seus romances exploram Spectacular Aristocrats, Splendid Nobodies, and o consumismo, entre muitos outros temas.Americana Underrated Scoundrels [Oh, Albany! Cidade Improvável (1971) conclui: “Consumir nos EUA não é comprar, é de Magos Políticos, Etnias Intrépidas, Aristocratas sonhar.” Os protagonistas de DeLillo procuram iden­ Espetaculares, “Zé-ninguéns” Esplêndidos e Canalhas tidades baseadas em imagens. White Noise [Ruído Subestimados], 1983. Kennedy também foi aclamado Branco] (1985) é sobre Jack Gladney e sua família, como estadista mais velho de um pequeno movimento cujas experiências são mediadas por vários textos, literário irlandês-americano que inclui Mary McCarthy, especialmente anúncios de publicidade. O trecho a já falecida, Mary Gordon, Alice McDermott e Frank seguir indica o estilo de DeLillo: “...o vazio, o sentido McCourt. de escuridão cósmica. Mastercard, Visa, American

143 Express”. Fragmentos de anúncios sol­ Papéis de Puttermesser] (1997). Seu tos pelo livro surgem do subconsciente impressionante The Shawl [O Xale] de Gladney proveniente do papagaiar da (1989), apresenta o ponto de vista de mídia, gerando o ruído branco sublimi­ uma jovem mãe sobre o Holocausto. nar do título. Os últimos romances de A divertida e informal Collected Stories DeLillo incluem figuras políticas e histó­ [Coletânea de Contos], publicada em ricas: Libra (1988), imagina o assassinato 1994, de Grace Paley (1922- ), capta os do presidente John F. Kennedy como ritmos sincopados da cidade. uma explosão de consumismo frustado; Entre os jovens escritores associados Underworld [Submundo] (1997) tece a uma vida em ritmo acelerado estão uma teia de interconexões entre um Jay McInerney (1955- ), cuja Story of jogo de beisebol e uma bomba nuclear My Life [História da Minha Vida] (1988) no Cazaquistão. retrata a cultura jovem movida a drogas Numa Nova York multidimensional do boom dos anos de 1980, e a satirista e poliglota, obras de ficção mostrando Tama Janowitz (1957- ). O retrato desses uma cidade obscura pós-moderna escritores sobre a solidão e a depen­ são abundantes. Um exemplo é a dência química na cidade anônima e labiríntica trilogia de Nova York City of efervescente lembra as obras de John Glass [Cidade de Vidro] (1985), Ghosts Cheever. [Fantasmas] (1986) e The Locked Room Os subúrbios próximos são res­ [O Quarto Trancado] (1986) de Paul ponsáveis pela criatividade de outros Auster (1947- ). Nessa obra, inspirada em escritores. Mary Gordon (1949- ) am­ Samuel Beckett e no romance policial, bienta muitas de suas obras centradas um escritor isolado trabalhando numa no universo feminino no local onde história policial aborda Paul Auster, que nasceu, Long Island, como o faz Alice está escrevendo sobre Cervantes. A McDermott (1953- ), cujo romance trilogia sugere que a “realidade” é apenas Charming Billy [O Charmoso Billy] um texto construído via ficção, desse (1998) disseca a promessa não cum­ modo, apagando a fronteira tradicional prida de um alcoólatra. entre realidade e ilusão. A trilogia de Realistas do Meio Atlântico incluem Auster, na verdade, autodesconstrói-se. Richard Bausch (1945- ), de Baltimore, Do mesmo modo, Kathy Acker (1948- Don DeLillo autor de In the Night Season [Na Estação 1997) justapôs trechos das obras de da Noite], 1998, e de contos emSomeone Cervantes e Charles Dickens com ficção to Watch Over Me [Alguém Para Me científica em pastiches pós-modernos, Proteger], publicado em 1999. Bausch como Empire of the Senseless [Império escreve sobre famílias fragmentadas, da Insensatez] (1988), uma busca, no como Anne Tyler (1941- ), também tempo e no espaço, por voz individual. de Baltimore, cujos personagens ex­ A cidade de Nova York abriga muitos cêntricos tentam resolver seu tipo de grupos de escritores com interesses em vida isolada e desorganizada. Mestra do comum. Entre as mulheres judias há a detalhe e senso de humor sóbrio, Tyler célebre ensaísta Cynthia Ozick (1928- ), escreve em linguagem simples e calma. originária do Bronx, cenário de seu Entre seus romances mais conhecidos romance The Puttermesser Papers [Os Foto © Nancy Crampton estão Dinner at the Homesick Restaurant

144 [Jantar no Restaurante da Saudade] Filadélfia. (1982) e The Accidental Tourist [O David Bradley (1950- ), também da Turista Acidental] (1985), transformado Pensilvânia, ambienta seu romance em filme em 1988.The Amateur Marriage histórico The Chaneysville Incident [Michael e Pauline: Um Casamento [O Incidente de Chaneysville] (1981) Amador] (2004) situa o divórcio em um no movimento abolicionista, rede de panorama da vida americana durante 60 cidadãos que oferecia oportunidades anos. e ajuda a escravos sulistas negros para Os afro-americanos deram contribui­ que encontrassem a liberdade no Norte ções especiais. A autobiografiaZami: A na Guerra Civil dos EUA. New Spelling of My Name [Zami: uma Trey Ellis (1962- ) escreveu os ro­ Nova Grafia do Meu Nome] (1982) da mances Platitudes [Trivialidades], 1988, ensaísta, feminista e poeta Audre Lorde Home Repairs [Consertos Caseiros] é um relato honesto das experiências de (1993) e Right Here, Right Now [Aqui, uma mulher negra nos Estados Unidos. Agora] (1999) e roteiros, entre os quais Bebe Moore Campbell (1950- ), da “The Tuskegee Airmen” [Prova de Fogo] Filadélfia, escreve romances regionais (1995) e, em 1989, um ensaio “The New cheios de energia, entre eles Your Blues Black Aesthetic” [A Nova Estética Negra] Ain’t Like Mine [Seu Blues Não É Como o revelando nova sensibilidade multiétni­ Meu], publicado em 1992. Gloria Naylor ca na geração mais jovem. (1950- ), da cidade de Nova York, explora Escritores de Washington, D.C., a vidas de diferentes mulheres em The quatro horas de carro ao sul da cidade Women of Brewster Place [As Mulheres de Nova York, incluem Ann Beattie de Brewster] (1982), romance que a (1947- ), cujos contos foram mencio­ tornou­ famosa. nados anteriormente. Seus romances Aclamado pela crítica, John Ed­ sobre a vida cotidiana incluem Picturing gar Wideman (1941- ) cresceu em Will [Descrevendo Will] (1989), Another Homewood, bairro negro de Pitts­ You [Seu Outro Lado] (1995) e My burgh, Pensilvânia. Em sua trilogia Life, Starring Dara Falcon [Minha Vida, faulkneriana­ de Homewood — Hiding Estrelando Dara Falcon] (1997). Place [Esconderijo], 1981, Damballah A capital dos EUA é reduto de muitos (1981) e Sent for You Yesterday [Fui Anne Tyler romancistas políticos. Ward Just (1935- ) Buscar Você Ontem] (1983) — usa pon­ ambienta seus romances nos vertigi­ tos de vista mutáveis e jogos lingüísticos nosos círculos militares, políticos e para expressar a experiência negra. Seu intelectuais de Washington. Christopher conto mais conhecido, “Brothers and Buckley (1952- ) incrementa sua sátira Keepers” [Acaso Sou o Guarda do Meu humorística política com detalhes Irmão?] (1984) é sobre seu relaciona­ locais; seu Little Green Men [Pequenos mento com seu irmão presidiário. Em Homens Verdes] (1999) é uma paródia The Cattle Killing [A Matança do Gado] sobre respostas oficiais sobre alieníge­ (1996), Wideman retorna a sua famosa nas do espaço sideral. Michael Chabon história inicial “Fever” [Febre] (1989). (1963- ), que cresceu nos subúrbios de Seu romance Two Cities [Duas Cidades] Washington, mas mais tarde se mudou Foto © Diana Walker / (1998) desenrola-se em Pittsburgh e na Getty Images para a Califórnia, retrata jovens no

145 limiar fascinante da idade adulta em conflito. The Mysteries of Pittsburgh [Usina de Lee Smith (1944- ) coloca o povo dos Sonhos – Os Mistérios de Pittsburgh] Montes Apalaches em foco pungente, (1988); seu romance inspirado em gibi, recorrendo à fonte de música folclórica The Amazing Adventures of Kavalier and americana em seu romance The Devil’s Clay [Incríveis Aventuras de Kavalier e Dream [O Sonho do Diabo] (1992). Clay] (2000), mistura glamour e arte à Jayne Anne Phillips (1952- ) escreve maneira de F. Scott Fitzgerald. contos sobre a falta de adaptação –Black Tickets [Ingressos Negros] (1979) – e um O Sul romance Machine Dreams [Sonhos de O Sul é composto de regiões dís­ Máquina] (1984) ambientado nas mon­ pares no sudeste dos Estados Unidos, tanhas inóspitas da Virgínia Ocidental. desde a fria cordilheira dos Montes Os romances de Jill McCorkle (1958- ) Apalaches e o extenso vale do Rio abordam seu passado na Carolina do Mississippi até os úmidos pântanos Norte. Sua história de amor envolta de ciprestes da Costa do Golfo. A em mistério Carolina Moon [A Lua de cultura do algodão e as plantações Carolina] (1996) explora um suicídio cultivadas por escravos transformou ocorrido há anos em um vilarejo litorâ­ o Sul na região mais rica do país antes neo onde implacáveis ondas destroem da Guerra Civil dos EUA (1860 – 1865). as fundações das casas de praia aban­ Mas após a guerra, a região mergulhou donadas. A Carolina do Sul exuberante, em pobreza e em isolamento por um terra natal de Dorothy Allison (1949- ), século. Hoje, o Sul é parte do que é aparece em seu romance autobiográfico chamado o Cinturão do Sol, região Bastard Out of Carolina [A Bastarda dos Estados Unidos que cresce mais da Carolina] (1992) visto pelos olhos rapidamente. de uma menina levada de 12 anos, de origem bastarda, suja e muito pobre, Sul, com sua rica tradição apelidada de Osso. Ellen Gilchrist (1935- oral, tem nutrido muitas con­ ), do Mississippi, ambienta a maior parte Otadoras de história. Na parte de sua Collected Stories [Coletânea de superior do Sul, Bobbie Ann Mason Bobbie Ann Mason Contos] (2000) em pequenos­ vilarejos (1940- ), de Kentucky, escreve sobre ao longo do Rio Mississippi e em Nova as mudanças infligidas pela cultura de Orleans, Louisiana. massa. Em sua história mais famosa, Entre os romancistas com experiên­ “Shiloh” [Shiloh e Outras Histórias] cia na realidade das minas sulistas, pode­ (1982), um casal deve modificar seu -se citar o renomado Cormac McCarthy relacionamento ou se separar quan­ (1993- ), cujos primeiros romances, co­ do as subdivisões de habitações se mo Suttree (1979) são relatos na maneira espalham pelo “oeste do Kentucky arquetípica do Sul de evocar emoções como uma mancha de petróleo”. O obscuras e profundas, ignorância e conto aclamado de Mason, In Country pobreza ambientados nos vales e monta­ [No País] (1985), mostra os efeitos da nhas verdes do Leste do Tennessee. Em Guerra do Vietnã focalizando uma Foto © Jymi Bolden / 1974, McCarthy mudou-se para El Paso, jovem inocente cujo pai morreu no CitiBeat Texas, e começou a tentar entender as

146 paisagens e tradições do Oeste. Blood e novos empreendimentos imobiliários Meridian: Or the Evening of Redness in áridos, os quais percorre continuamente the West [Meridiano de Sangue ou o em silêncio para comprovar a visão de Crepúsculo Vermelho no Oeste] (1985) Ford de uma doença nacional. é uma visão dura de The Kid, garoto Muitos escritores afro-americanos de 14 anos, originário do Tennessee são do Sul, como Ernest Gaines da que se torna um matador a sangue frio Louisiana, Alice Walker da Geórgia e no México nos anos 1840. A Trilogia Zora Neale Hurston da Flórida, cuja da Fronteira, épico mais vendido de obra de 1937, Their Eyes Were Watching McCarthy — All the Pretty Horses [Todos God, [Seus Olhos Observavam Deus], é os Belos Cavalos] (1992), The Crossing considerada o primeiro romance femi­ [A Travessia] (1994) e Cities of the Plain nista escrito por uma afro-americana. [Cidades da Planície] (1998) — confere Hurston, que morreu nos anos de 1960, grandeza mítica ao deserto entre o Texas passou por um ressurgimento crucial e o México. nos anos de 1990. Ishmael Reed, do Outros autores célebres são Charles Tennessee, ambientou Mumbo Jumbo Frazier (1950- ), da Carolina do Norte, (1972), em Nova Orleans. Margaret com o romance sobre a Guerra Civil, Walker (1915-1998), do Alabama, escre­ Cold Mountain [Montanha Fria] (1997); veu o romance Jubilee [Jubileu] (1966) Pat Conroy (1945- ), da Geórgia, com e os ensaios On Being Female, Black, The Great Santini [O Grande Santini] and Free [Ser Mulher, Negra e Livre] (1976) e Beach Music [Canção da (1997). Praia](1995); além do romancista O escritor James Alan McPherson Barry Hannah (1942- ), do Mississippi, (1943- ), da Geórgia, retrata trabalha­ conhecido por seus enredos violentos dores em Elbow Room [Espaço para e estilo ousado. Manobra] (1977); O livro A Region Not Um escritor muito diferente oriundo Home: Reflections From Exile [Uma do Mississippi é Richard Ford (1944- ), Região Longe de Casa: Reflexões do que começou a escrever no estilo faulk­ Exílio], (2000), cujo título reflete sua neriano, porém, é mais conhecido por mudança para Iowa, é uma autobio­ seu romance sutil ambientado em Nova grafia. ZZ Packer (1973- ), nascida Jersey, The Sportswriter [O Cronista Richard Ford em Chicago, aluna de McPherson no Esportivo] (1986) e sua continuação, Workshop de Escritores de Iowa, criada Independence Day [Independência] no Sul, estudou no Meio Atlântico e (1995). Esse romance é sobre Frank hoje vive na Califórnia. Sua primeira Bascombe, um vagabundo sonhador, obra, o volume de contos Drinking ambíguo, que perde todas as coisas que Coffee Elsewhere [Tomar Café em dão sentido a sua vida – um filho, seu so­ Outro Lugar] (2003), transformou-a em nho de escrever ficção, seu casamento, estrela em ascensão. Escritora feminina amantes, amigos e emprego. Bascombe prolífica, bell hooks (nascida Gloria é sensível e inteligente – suas escolhas, Watkins, no Kentucky, 1952) ficou diz ele, são feitas “para desviar a dor de famosa pelas análises críticas cultu­ arrependimento terrível” – e seu vazio, rais incluindo Black Looks: Race and Foto © Don MacLellan / junto com os anônimos shopping centers CORBIS SYGMA Representation [Aparências Negras:

147 Raça e Representação] (1992) e autobiografias A ficção do Meio Oeste está calcada no realismo. iniciando com Bone Black: Memories of a Girlhood O romance regional floresceu nos últimos anos, re­ [Osso Negro: Memórias de Tempos de Garota], 1996. tratando redes de relacionamentos entre parentes, a Poeta experimental e estudiosa de narrativas sobre comunidade local e o meio ambiente. O agronegócio escravos (Freeing the Soul, 1999), [Libertando a Alma], e o desenvolvimento ameaçam fazendas familiares Harryette Mullen (1953- ) escreve coletâneas de poesia em algumas partes da região e alguns romances multivocais, como Muse & Drudge [Musa & Mula] prenunciam a morte da agricultura como um modo (1995). Romancista e contista Percival Everett (1956 - ) de vida. da Geórgia, escreve ficção sutil, passível de amplas Entre os romancistas regionais, encontra-se Jane interpretações; suas obras mais recentes são Frenzy Smiley (1949- ), cujo romance A Thousand Acres [Mil (Frenesi), 1997, e Glyph [Glifo], 1999. Acres] (1991) é uma versão contemporânea feminista Muitos escritores afro-americanos cujas famílias da história do Rei Lear. O reino perdido é uma grande seguiram padrões de migração interna nasceram propriedade rural familiar mantida há quatro gerações longe do Sul, porém, para lá retornaram em busca de e as forças que a minam são a concatenação do nível inspiração. Famosa romancista de ficção científica, pessoal e político. Kent Haruf (1943- ) cria personagens Octavia Butler (1947 - ), da Califórnia, recorre ao mais fortes em seu romance radical sobre a pradaria, tema da escravidão e à tradição de narrativas dos Plainsong [Canção Simples] (1999). escravos em Wild Seed [Semente Selvagem] (1980); Michael Cunningham (1952- ), de Ohio, começou sua Parable of the Sower [Parábola do Semeador] como romancista regional em A Home at the End of (1993) aborda a dependência química. Sherley Anne the World [Uma Casa no Fim do Mundo] (1990). The Williams (1944- ), também da Califórnia, escreve sobre Hours [As Horas] (1998), transformado em filme, amizades inter-raciais entre mulheres do Sul durante entrelaça brilhantemente a vida da Sra. Dalloway de a escravidão em seu romance histórico de 1986, Virginia Woolf com a de duas mulheres de diferentes baseado em fatos, Dessa Rose. Randall Kenan (1963- épocas. Stuart Dybek (1942- ) escreveu coletâneas de ), nasceu em Nova York e cresceu na Carolina do contos fulgurantes, inclusive I Sailed With Magellan Norte, cenário de seu romance A Visitation of Spirits [Eu Naveguei Com Magalhães] (2003) sobre sua [Visitação dos Espíritos], 1989, e de seus contos Let infância no sul de Chicago. the Dead Bury Their Dead [Deixai os Mortos Enterrar Entre romancistas urbanos mais jovens, encontram­ os seus Mortos] (1992). Seu romance Walking on -se Jonathan Franzen (1959- ), nascido em Missouri Water: Black American Lives at the Turn of the Twenty- e criado em Illinois. O romance panorâmico mais First Century [Caminhando Sobre as Águas: Vida dos vendido de Franzen, The Corrections [As Correções] Negros Americanos Na Virada do Século 21] (1999) (2001) — assim intitulado por causa de uma queda é não-ficção. na bolsa de valores — evoca a vida familiar no Meio Oeste durante várias gerações. O romance registra a O Meio Oeste deterioração física e mental de um patriarca que sofre As vastas planícies do Meio Oeste dos EUA – do mal de Parkinson; como em A Thousand Acres de grande parte dele entre as Montanhas Rochosas e o Smiley, a família toda é afetada. Franzen usa pessoas Rio Mississippi – queimam no verão e congelam nas físicas contra grandes conspirações em The Twenty- tempestades cortantes de inverno. A área foi aberta Seventh City [A Vigésima Sétima Cidade] (1988) e com o término do Canal Erie em 1825, atraindo coloni­ Strong Motion [Movimento Forte] (1992). Alguns zadores da Europa Setentrional ávidos por terra. Entre críticos ligam Franzen a Don DeLillo, Thomas Pynchon escritores do início do século 20 com raízes no Meio e David Foster Wallace como escritor de romances de Oeste estão Ernest Hemingway, F. Scott Fitzgerald, conspiração. Sinclair Lewis e Theodore Dreiser. O Meio Oeste produziu ampla variedade de

148 obras escritas, a maioria com influências interna­ Simpson (1957- ), de Wisconsin, é autora deAnywhere cionais. Richard Powers (1957- ), de Illinois, viveu But Here [Em Qualquer Lugar Menos Aqui] (1986), na Tailândia e na Holanda. Seus desafiadores uma análise sobre relações mãe-filha. romances pós-modernos entrelaçam vidas pessoais com tecnologia. Galatea 2.2 (1995) atualiza o tema O Oeste montanhoso do cientista louco; nesse caso, os cientistas são os O interior do oeste dos Estados Unidos é uma área programadores de computador. em grande parte selvagem que se estende ao longo romancista afro-americano Charles Johnson das majestosas Montanhas Rochosas desde Montana, (1948- ), ex-cartunista nascido em Illinois na fronteira com o Canadá, indo em direção oblíqua Oe se mudou para Seattle, Washington, até as colinas do Texas, na fronteira dos EUA com o recorre a tradições díspares, como o zen-budismo México. Agropecuária e mineração durante muito e as narrativas sobre escravos em romances como tempo constituíram a espinha dorsal da economia Oxherding Tale [O Conto do Rebanho de Gados] da região, e a tradição inglesa nessa área reforça o (1982). O romance picaresco e talentoso de Johnson espírito independente da fronteira. Middle Passage [Passagem do Meio] (1990) mistura A literatura do faroeste geralmente envolve con­ a história internacional sobre a escravidão com um flitos. No Oeste do século 19 contrapõem-se como conto sobre o mar que lembra Moby-Dick. Dreamer inimigos o cowboy e o índio, o agricultor/colonizador [Sonhador](1998) recria o assassinato do Dr. Martin e o forasteiro, o pecuarista e o ladrão de gado. Entre os Luther King, Jr. adversários atuais estão os homens do petróleo contra Robert Olen Butler (1945- ), nascido em Illinois e os ecologistas, os incorporadores contra os arqueólo­ veterano da Guerra do Vietnã, escreve sob o ponto gos e os cidadãos ativistas contra os representantes de vista de refugiados vietnamitas na Louisiana de instalações nucleares e militares, muitos dos quais em A Good Scent From a Strange Mountain [Um moradores do Oeste pouco povoado. Bom Aroma de Uma Montanha Desconhecida] Um escritor dominou grande parte da produção (1992). Seus contos em Tabloid Dreams [Sonhos de literária sobre o faroeste, da mesma forma como Tablóide], 1996 — inspirados em manchetes jocosas William Faulkner fez com relação ao Sul. Wallace — foram transformados no romance humorístico Mr. Stegner (1909-1993) registra o fim da vida selvagem Spaceman [Sr. Homem do Espaço] (2000), em que no Oeste. Em sua obra-prima Angle of Repose [Ângulo um alienígena aprende inglês assistindo televisão e de Repouso] (1971), um historiador imagina a mu­ abduz um ônibus cheio de turistas para entrevistá-los dança de seus avós de educação refinada para o em sua espaçonave. Oeste “selvagem”. Seu último livro aborda sua vida Entre os autores indígenas americanos da região no Oeste como escritor: Where the Bluebird Sings to estão Louise Erdrich, descendente em parte dos the Lemonade Springs [Onde o Pássaro Azul Canta chippewas, que lançou uma série de romances em para Fontes de Limonada] (1992). Durante um quarto sua terra natal, Dakota do Norte. Gerald Vizenor de século, Stegner dirigiu o programa de redação (1935- ) oferece um retrato cômico, pós-moderno da Universidade de Stanford; sua lista de alunos da vida americana indígena contemporânea em parece a relação dos autores mais importantes da Darkness at Saint Louis Bearheart [Escuridão em produção literária sobre o Oeste: Raymond Carver, Saint Louis Coração de Urso] (1978) e Griever: An Ken Kesey, Thomas McGuane, Larry McMurtry, N. American Monkey King in China [Griever: Um Rei Scott Momaday, Tillie Olsen e Robert Stone. Stegner Macaco Americano na China] (1987). Chancers também influenciou a escola contemporânea de es­ [Ressuscitados] de Vizenor (2000), aborda esque­ critores de Montana ligada a McGuane, Jim Harrison e letos enterrados longe da terra natal. algumas obras de Richard Ford, bem como escritores A romancista popular sírio-americana Mona texanos como McMurtry.

149 escritor Thomas McGuane Horseman, Pass By [Cavaleiro, Siga em (1939- ) em geral retrata o Frente] (1961), obra que deu origem O homem só em uma área ao filme Hud [O Indomado] em 1963, selvagem, onde se envolve em cres­ retrato pouco romântico do mundo cente conflito. Entre suas obras, rural. Leaving Cheyenne [Deixando estão: The Sporting Club [O Clube Cheyenne] (1963) e seu romance se­ Esportivo], (1968) e The Bushwacked guinte, The Last Picture Show [A Última Piano [O Piano Atacado por uma Sessão de Cinema] (1966), transformado Emboscada] (1971), em que o herói também em filme, evoca o desapare­ viaja de Michigan a Montana numa cimento de certo modo de vida em louca missão de conquista amorosa. cidades pequenas do Texas. A obra mais O entusiasmo de McGuane por caça conhecida de McMurtry é Lonesome e pesca levou os críticos a compará-lo Dove [Pomba Solitária] (1985), romance com Ernest Hemingway. Jim Harrison épico arquetípico de faroeste sobre a jor­ (1937- ), nascido em Michigan como nada de uma boiada nos anos de 1870, McGuane, morou muitos anos numa que se tornou minissérie de sucesso fazenda. Em seu primeiro romance, na TV. Entre suas obras mais recentes Wolf: A False Memoir [Lobo: uma está Comanche Moon [Lua Comanche] Memória Falsa] (1971), um homem (1997). tenta ver um lobo no deserto na O Oeste de escritores de várias etnias esperança de mudar sua vida. Entre é menos heróico e com freqüência suas obras de ficção posteriores e mais voltado para o futuro. Uma das mais pessimistas, estão: Legends of escritoras chicanas mais conhecidas é the Fall [Lendas do Outono] (1979) Sandra Cisneros (1954- ). Nascida em e The Road Home [O Caminho para Chicago, Cisneros morou no México e Casa] (1998). no Texas; ela aborda a grande fronteira No romance Wildlife [Vida Selva­ cultural entre o México e os EUA como gem] (1990) de Richard Ford sobre zona criativa e contraditória em que Montana, a paisagem desolada serve mulheres mexicano-americanas preci­ de contraponto à desintegração de sam se reinventar. Seu best-seller The uma família. O escritor de contos, House on Mango Street [A Casa da Rua Larry McMurtry crítico da ecologia e ensaísta sobre a Mango] (1984), uma série de descrições natureza Rick Bass (1958- ), nascido interligadas sob o ponto de vista de uma no Texas e educado como geólogo garota, serviu de guia para outros escrito­ especializado em petróleo, escreve so­ res latinos e apresentou o barrio vital de bre confrontações elementares entre Chicago aos leitores. Cisneros continuou a natureza e os homens que vivem ao a retratar a vida das mulheres chicanas ar livre em sua coletânea de contos In em Woman Hollering Creek [Riacho da the Loyal Mountains [Nas Montanhas Mulher que Chora] (1991). Pat Mora Fiéis] (1995) e no romance Where the (1942- ) oferece uma visão chicana em Sea Used To Be [Onde Ficava o Mar] Nepantla: Essays from the Land in the (1998). Middle [Nepantla: Ensaios da Terra do O texano Larry McMurtry (1936- ) Meio] (1993), que trata de questões de descreve sua infância numa fazenda em Foto © Richard Robinson conservação cultural.

150 Entre os índios americanos da feminino sobre o Sudoeste em sua região está o falecido James Welch, popular trilogia passada no Arizona: cujo livro The Heartsong of Charging The Bean Trees [As Árvores de Feijão] Elk [A Canção de Amor de Charging (1988), sobre Taylor Greer, jovem aven­ Elk] (2000), retrata um jovem sioux tureira que adota uma criança cheroqui; que sobrevive à batalha de Little Animal Dreams [Sonhos de Animais] Bighorn e constrói uma nova vida na (1990); e Pigs in Heaven [Porcos no França. Linda Hogan (1947- ), nascida Céu] (1993). The Poisonwood Bible no Colorado e descendente de índios [A Bíblia Envenenada] (1998) é uma chickasaws, reflete sobre as índias ame­ narrativa sobre uma família missionária ricanas e a natureza em romances co­ na África. Kingsolver aborda temas mo Mean Spirit [Espírito Mau] (1990), políticos em tom não apologético e que aborda a corrida ao petróleo em admite: “Eu quero mudar o mundo”. terras indígenas na década de 1920, O Sudoeste abriga o maior número e Power [Poder] (1998), em que uma de escritores ameríndios, cujas obras índia descobre seus recursos internos revelam ricas narrativas míticas, aborda­ naturais. gem espiritual da natureza e profundo respeito pela palavra na forma oral. O Sudoeste O tema de ficção mais importante é a Por séculos, o Sudoeste deserto cura, entendida como restauração da desenvolveu-se sob o domínio espa­ harmonia. Entre outros temas estão nhol, onde grande parte da população pobreza, desemprego, alcoolismo e continua a falar esse idioma e algumas crimes de brancos contra índios. tribos de índios vivem em terras de seus A produção literária indígena é ancestrais. As chuvas são inconstantes mais filosófica que colérica, contudo, e a agricultura sempre foi precária na re­ e projeta forte visão ecológica. Autores gião. Hoje grandes projetos de irrigação importantes incluem o notável N. Scott impulsionam a produção agrícola e o Momaday, que marcou o início do ar condicionado atrai um número cada romance contemporâneo ameríndio vez maior de pessoas para cidades em com House Made of Dawn [Casa Feita expansão como Salt Lake City, em Utah, Sandra Cisneros de Aurora]; seus trabalhos recentes e Phoenix, no Arizona. incluem The Man Made of Words [O Numa região onde a ecologia do Homem Feito de Palavras] (1997). A deserto é tão frágil, não é de surpreen­ romancista Leslie Marmon Silko, em der que haja tantos escritores voltados parte descendente de índios lagunas para o meio ambiente. O ativista e autora de Ceremony [Cerimônia], Edward Abbey (1927-1989) celebrou também publicou Gardens in the Dunes a vida selvagem do deserto de Utah [Jardins nas Dunas] (1999), retratando em Desert Solitaire: A Season in the Indigo, órfão criado por uma mulher Wilderness [Deserto Solitário: uma branca na virada do século 20. Temporada em Território Selvagem] Muitos escritores mexicano-ame­ (1968). ricanos vivem no Sudoeste há sécu­ Barbara Kingsolver (1955- ), bióloga los. Entre os assuntos característicos Foto Associated Press / de formação, oferece o ponto de vista Wide World Photos encontram-se: o idioma espanhol, a

151 tradição católica, as formas folclóricas e Ishmael Reed, além de escritores e, recentemente, desigualdade entre com mentalidade internacional como raças e gêneros, conflitos de gerações Norman Rush (1933- ), cujo romance e ativismo político. A cultura é acentua­ Mating [Acasalamento] (1991) aborda damente patriarcal, mas surgiram novas os anos que passou na África. vozes femininas chicanas. O Norte da Califórnia abriga rica O livro poético de não-ficção tradição literária ásio-americana, Borderlands/La Frontera: The New cujos temas característicos incluem Mestiza [Fronteiras: a Nova Mestiça] família e papéis dos gêneros, conflito (1987), de Gloria Anzaldúa (1942- ), de gerações e busca de identidade. imagina de forma apaixonada uma Maxine Hong Kingston ajudou a consciência feminina híbrida da fron­ inspirar o renascimento da literatura teira formada por vertentes das culturas ásio-americana, além de popularizar mexicana, ameríndia e inglesa. o gênero de autobiografia fictícia. Também digna de destaque é a es­ O grupo de escritores ásio-america­ critora do Novo México, Denise Chavez nos da Califórnia inclui a romancista (1948- ), autora da coleção de contos Amy Tan, cujo best-seller The Joy Luck The Last of the Menu Girls [A Última Club [Clube da Felicidade e da Sorte] das Garotas do Menu] (1986). Sua Face tornou-se filme de sucesso em 1993. of an Angel [Face de um Anjo] (1994), Seus capítulos interligados como con­ sobre uma garçonete que prepara um tos delineiam as diferentes sortes de manual para suas colegas de profissão quatro pares de mães e filhas. Entre os há 30 anos, foi considerado um roman­ romances de Tan que abarcam a China ce autenticamente latino escrito em histórica e os Estados Unidos de hoje, inglês. encontram-se The Hundred Secret Senses [Os Cem Sentidos Secretos] (1995), Literatura da Califórnia sobre meias irmãs e The Bonesetter’s A Califórnia poderia ser um país Daughter [A Filha do Restaurador de à parte com sua enorme população Ossos] (2001) sobre os cuidados de multiétnica e economia poderosa. O uma filha com sua mãe. A espirituosa estado é conhecido por gerar experi­ Amy Tan Gish Jen (1955- ), cujos pais emigraram ências sociais, movimentos de jovens de Xangai, surpreendeu com os ro­ (beats, hippies, tecnólogos) e novas mances estimulantes Typical American tecnologias (os “pontocom” do Vale do [Americano Típico] (1991) e Mona Silício) que podem ter conseqüências in the Promised Land [Mona na Terra inesperadas. Prometida] (1996). O norte da Califórnia, cujo centro No grupo de escritores nipo-ameri­ é São Francisco, desfruta de tradição canos está Karen Tei Yamashita (1951- ), literária liberal, até mesmo utópica, co­ nascida e criada na Califórnia, cujos mo em Jack London e John Steinbeck. nove anos no Brasil inspiraram Through Têm raízes nessa região centenas de the Arc of the Rain Forest [Através do escritores, inclusive o ameríndio Gerald Arco da Floresta Tropical] (1990) e Vizenor, a chicana Lorna Dee Cervantes Brazil-Maru (1992). Seu Tropic of Orange Foto Associated Press / e os afro-americanos Alice Walker Graylock [Trópico da Laranja] (1997) evoca a

152 Los Angeles poliglota. Escritores nipo-americanos de Califórnia é o brilhante T. Coraghessan Boyle (1948- ), ficção criam a partir da obra anterior de Toshio Mori, conhecido por seus inúmeros romances exuberantes, Hisaye Yamamoto e Janice Mikitani. entre eles, World’s End [Fim do Mundo], 1987, e The A literatura do sul da Califórnia tem tradição muito Road to Wellville [Dr. Kellogg e a Guerra dos Sucrilhos] diferente associada com a cidade mais nova de Los (1993) sobre John Harvey Kellogg, inventor americano Angeles, feita por ivestidores e agentes imobiliários, do cereal para café da manhã. apesar do problema óbvio de recursos hídricos. Los Escritores mexicano-americanos em Los Angeles Angeles foi, desde o início, um empreendimento às vezes focalizam a tensão racial moderada. comercial; não surpreende que Hollywood e a Richard Rodriguez (1944- ), autor de Hunger of Disneylândia sejam alguns dos seus mais conhecidos Memory:The Education of Richard Rodriguez [Ânsia legados. Como que para contrabalançar sua fachada por Recordações: a Educação de Richard Rodriguez] brilhante, um estilo distópico de produção literária flo­ (1982) opina contra a educação bilíngüe e a ação afir­ resceu no sul da Califórnia, inaugurado pelo romance mativa em Days of Obligation:An Argument With My de Nathanael West, The Day of the Locust [O Dia do Mexican Father [Dias de Obrigação: uma Discussão Gafanhoto] (1939). com meu Pai Mexicano] (1992). Always Running Solidão e alienação permeiam as criações de Gina [Sempre Correndo] (1993), memórias sobre a vida Berriault (1926-1999), cujos personagens sobrevivem de uma gangue de chicanos em Los Angeles, de Luis precariamente em quartos alugados em Women in Rodriguez (1954- ), fala sobre o submundo obscuro Their Beds [Mulheres em Suas Camas] (1996). Joan da cidade. Didion (1934- ) evoca o anseio de descompromisso A diáspora latino-americana influenciou Helena da Califórnia em seus brilhantes ensaios Slouching Maria Viramontes (1954- ), nascida e criada no barrio Towards Bethlehem [Arrastando-se até Belém] (1968). do leste de Los Angeles. Suas obras retratam essa Em 2003, Didion escreveu Where I Was From [De Onde cidade como um ímã para uma quantidade cada vez Eu Vim], narrativa de como sua família se mudou para maior de imigrantes hispânicos, especialmente mexi­ o Oeste juntamente com a fronteira e se estabeleceu canos e centro-americanos que fogem da pobreza e na Califórnia. Outro escritor natural de Los Angeles, da guerra. Em contos vibrantes como “The Cariboo Dennis Cooper (1953- ), escreve bons romances sobre Café” [O Café Cariboo], 1984, combina nativos de um submundo de homens entorpecidos e alienados. língua inglesa, refugiados de esquadrões da morte Thomas Pynchon foi quem conseguiu captar com imigrantes clandestinos que vêm para os EUA melhor a estranha combinação de tranqüilidade e em busca de trabalho. inquietação que reina em Los Angeles em seu romance sobre uma vasta conspiração de marginais,The Crying O Noroeste of Lot 49 [O Leilão do Lote 49]. Pynchon inspirou o pro­ Nas últimas décadas, o Noroeste montanhoso com lífico pós-modernista William Vollmann (1959- ), que se densas florestas em torno de Seattle, Washington, tornou popular entre leitores jovens da contracultura surgiu como centro cultural conhecido por pontos de devido a suas meta-narrativas extensas e surrealistas vista liberais e um apaixonado apreço pela natureza. como as da coletânea “Seven Dreams: A Book of Seu mais influente e recente escritor foi Raymond North American Landscapes” [Sete Sonhos: um Livro Carver. de Paisagens Norte-Americanas], iniciado com The David Guterson (1956- ), de Seattle, conquistou Ice-Shirt [A Camisa de Gelo] (1990) sobre vikings, e muitos leitores quando seu romance Snow Falling on fantasias como You Bright and Risen Angels: A Cartoon Cedars [Neve Sobre os Cedros] (1994) foi filmado. [Vós, Anjos Brilhantes e Elevados: uma Charge] (1987) Passado nas remotas e nevoentas Ilhas de San Juan, sobre uma guerra entre humanos virtuais e insetos. em Washington, após a II Guerra Mundial, conta a Outro romancista ambicioso que vive no sul da história de um nipo-americano acusado de assas­

153 sinato. No emocionante romance de Sherman Alexie (1966- ), índio da Guterson East of the Mountains [A Leste reserva de Spokane, da tribo Coeur das Montanhas] (1999), um cirurgião d’Alene, é o mais jovem romancista cardiologista que está morrendo de indígena a alcançar fama nacional. câncer volta à terra de sua juventude Alexie faz relatos humorísticos e pouco para se suicidar, mas descobre razões românticos da vida indígena, abordan­ para viver. O comovente romance do misturas incoerentes de tradição e Housekeeping [Trabalhos Domésticos] cultura popular. Fazem parte de seus (1980) de Marilynne Robinson (1944- ) ciclos de contos Reservation Blues [O observa esse território selvagem e escar­ Blues da Reserva] (1995) e The Lone pado através de olhos femininos. Em seu Ranger and Tonto Fistfight in Heaven [A brilhante e bastante aguardado segundo Luta de Zorro e Tonto no Céu] (1993), romance, Gilead [Ao Meu Filho] (2004), que inspirou o ótimo filme sobre a vida um pregador idoso e íntegro, prestes a em reservas Smoke Signals [Sinais de morrer, escreve para seu filho caçula a Fumaça] (1998), com roteiro do próprio história da família que remonta à Guerra Alexie. Smoke Signals é um dos poucos Civil. filmes feitos por índios americanos e Embora tenha vivido em muitas não sobre eles. A coletânea recente de regiões, Annie Dillard (1945- ) fez do contos de Alexie é The Toughest Indian Noroeste o tema de suas obras cristali­ in the World [O Índio Mais Forte do nas, como o fascinante ensaio poético Mundo] (2000) enquanto seu pungente intitulado “Holy the Firm” [Benditos os romance Indian Killer [Índio Matador] Perseverantes] (1994) inspirado pelas (1996) lembra Native Son [Filho Nativo], queimaduras sofridas por uma criança de Richard Wright. vizinha. Sua descrição do Noroeste do Pacífico evoca um cenário ao mesmo AUTORES INTERNACIONAIS: tempo real e espiritual. “Vim para cá VOZES DA AMÉRICA LATINA E estudar coisas palpáveis — montanhas DO CARIBE rochosas e mar salgado — e abrandar scritores de língua inglesa do meu espírito em suas margens”. Da Caribe receberam sua formação mesma forma que Henry David Thoreau do currículo literário britânico e Sherman Alexie E e Ralph Waldo Emerson, Dillard busca a segundo normas coloniais, mas ultima­ sabedoria na natureza. Pilgrim at Tinker mente seu foco mudou de Londres pa­ Creek [Peregrino em Tinker Creek] ra Nova York e Toronto. Entre os temas (1974) é uma admirável coleção de abordados, estão a beleza das ilhas, a ensaios de Dillard. Seu único romance, sabedoria inata de seu povo e aspectos The Living [Os Vivos] (1992), exalta as da imigração e do exílio — dissolução primeiras famílias pioneiras atacadas familiar, choque de culturas, mudança por doenças, afogamentos, gases vene­ nos papéis dos gêneros e assimilação. nosos, queda de árvores gigantes e in­ Duas precursoras merecem men­ cêndios em casas de madeira à medida ção. Paule Marshall (1929– ), do que se integram com tribos indígenas, Brooklyn, não é escritora internacional imigrantes chineses e recém-chegados sob o ponto de vista técnico, mas Foto Associated Press / do Leste. Wide World Photos relembra com nitidez suas experi­

154 ências como filha de imigrantes de Amadurecimento na América] (1995), Barbados no Brooklyn em Brown exalta o beisebol tanto quanto Havana. Girl, Brownstones [Garota Parda, O título é irônico: “O Ano Que Vem Arenito Pardo] (1959). A romancista em Cuba” é uma frase dos exilados da República Dominicana Jean Rhys cubanos aferrando-se à visão de um (1894-1979) escreveu Wide Sargasso retorno triunfante. The Pérez Family Sea [Grande Mar de Sargaço] (1966), [A Família Perez], 1990, de Christine uma recriação assombrosa e poética Bell (1951- ), traça o retrato caloroso do romance Jane Eyre de Charlotte do tumulto existente entre famílias Brontë. Rhys viveu a maior parte da cubanas — metade delas, pelo menos, vida na Europa, mas seu livro foi de nome Perez — exiladas em Miami. defendido por feministas americanas, Entre as obras recentes do romancista para quem “a louca no sótão” havia se Oscar Hijuelos (1951– ) encontramos tornado um ícone da individualidade The Fourteen Sisters of Emilio Montez feminina reprimida. O’Brien [As Catorze Irmãs de Emilio O trabalho de Rhys abriu caminho Montez O’Brien] (1993), sobre ame­ para a voz colérica de Jamaica Kincaid ricanos descendentes de cubanos e (1949- ), de Antigua, cujas inúmeras irlandeses, e Mr. Ives’ Christmas [O obras autobiográficas incluem os Natal do Sr. Ives] (1995), história de romances Annie John (1985), Lucy um homem cujo filho morreu. (1990) e The Autobiography of My Os escritores com raízes em Porto Mother [A Autobiografia de Minha Rico incluem Nicholasa Mohr (1938- ), Mãe] (1996). Nascida no Haiti, mas cujo Rituals of Survival: A Woman’s criada nos EUA, Edwidge Danticat Portfolio [Rituais de Sobrevivência: (1969 - ) chamou a atenção com seu o Portfólio de uma Mulher] (1985), livro Krik? Krak! (1995), cujo título apresenta a vida de seis porto-rique­ foi tirado de uma frase usada por nhas, e Rosario Ferré (1938- ), autora contadores de histórias da tradição de The Youngest Doll [A Boneca oral haitiana. Danticat lembra o pas­ Mais Nova] (1991). Entre os mais sado trágico de seu país no romance jovens, destaca-se Judith Ortiz Cofer histórico The Farming of the Bones [A Jamaica Kincaid (1952- ), autora de Silent Dancing: Colheita de Ossos] (1998). Muitos es­ A Partial Remembrance of a Puerto critores latino-americanos discordam Rican Childhood [Dança em Silêncio: das opiniões comuns entre escritores Lembrança Parcial de uma Infância chicanos com raízes no México que em Porto Rico] (1990) e The Latin Deli tendem a ser românticos, nativistas e [A Delicatessen Latina] (1993), que esquerdistas na política. A produção combina poesia e contos. A poeta e literária dos cubano-americanos, ao ensaísta Aurora Levins Morales (1954- contrário, tende a ser cosmopolita, cô­ ) escreve sobre Porto Rico sob o ponto mica e politicamente conservadora. A de vista judeu cosmopolita. autobiografia de Gustavo Pérez Firmat, A escritora mais conhecida com ra­ Next Year in Cuba: A Chronicle of ízes na República Dominicana é Julia Coming of Age in America [O Ano que Alvarez (1950- ). Em How the García Vem em Cuba: uma Crônica Sobre o Foto Nacy Crampton Girls Lost Their Accents [Como as

155 Meninas Garcia Perderam o Sotaque] uitos escritores do subcon­ (1991), dominicanas da classe alta tinente indiano passaram a lutam para se adaptar a Nova York. Mresidir nos EUA nos últimos ¡Yo! (1997) retoma o tema das irmãs anos. Bharati Mukherjee (1940- ) es­ Garcia, explorando a identidade por creveu aclamada coletânea de contos, meio de histórias de 16 personagens. The Middleman and Other Stories [O Junot Diaz (1948- ) oferece uma visão Intermediário e Outros Contos] (1988); bem mais impiedosa na coletânea de seu romance Jasmine [Jasmim] (1989) contos Drown [Afogado] (1996) sobre conta a história de uma imigrante ilegal. jovens das favelas de Nova Jersey e da Mukherjee foi criado em Calcutá; seu República Dominicana. romance The Holder of the World [O Importantes escritores latino-america­ Detentor do Mundo] (1993) imagina nos que primeiro se tornaram conheci­ aventuras emocionantes na Índia do dos nos EUA nos anos 1960 – Jorge Luis século 17 para personagens do livro Borges, da Argentina, Gabriel García The Scarlet Letter [A Letra Escarlate] Márquez, da Colômbia, Pablo Neruda, de Nathaniel Hawthorne. Leave It to do Chile, e Jorge Amado, do Brasil – Me [Deixa Comigo] (1997) acompa­ apresentaram aos autores americanos nha a luta errante de uma menina o realismo mágico, o surrealismo, uma abandonada na Índia em busca de sensibilidade hemisférica e o amor às suas raízes. O inquietante conto “The culturas nativas. Desde essa primeira Management of Grief” [O Tratamento onda de popularidade, mulheres e da Dor] (1988), sobre as conseqüências escritores negros acharam seu público, de um atentado à bomba a um avião, entre eles, a romancista chilena Isabel ganhou nova ressonância desde o dia Allende (1942- ). Isabel Allende, sobri­ 11 de setembro de 2001. nha do presidente chileno, Salvador Meena Alexander (1951- ), natural Allende, assassinado em 1973, registrou da Índia e de ascendência síria, foi a história sangrenta de seu país em La criada no norte da África; ela reflete Casa De Los Espiritus, (1982), traduzido sobre suas experiências na autobio­ para o inglês como The House of the grafiaFault Lines [Linhas Imperfeitas] Spirits (1985). Romances posteriores Bharati Mukherjee (1993). A poeta e contista Chitra (escritos e publicados primeiro em Banerjee Divakaruni (1956- ), nasci­ espanhol) incluem Eva Luna (1987) e da na Índia, escreveu os romances Daughter of Fortune [Filha da Fortuna] sensuais centrados nas mulheres: (1999), passado na corrida do ouro de The Mistress of Spices [A Senhora 1849 na Califórnia. O estilo evocativo de dos Temperos] (1997), e Sister of My Allende e visão centralizada na mulher Heart [Irmã do Meu Coração] (1999), atraíram muitos leitores nos EUA. além de coletâneas de contos, como The Unknown Errors of Our Lives [Os AUTORES INTERNACIONAIS: Erros Desconhecidos de Nossa Vida] VOZES DA ÁSIA E DO ORIENTE (2001). MÉDIO Jhumpa Lahiri (1967- ) focaliza conflitos e assimilação das gerações Foto © Miriam Berkley mais jovens em Interpreter of Maladies:

156 Stories of Bengal, Boston, and Beyond Santos (1911-1996), autor do romance [Intérprete de Males: Histórias de poético Scent of Apples [Aroma de Begala, Boston e Outros Lugares] Maçãs] (1979), e Jessica Hagedorn (1999) e o romance The Namesake [O (1949- ), cujos romances surrealistas Homônimo] (2003). Lahiri se baseia de cultura popular são Dogeaters em sua experiência: seus pais, de [Comedores de Cães] (1990) e The Bengala, foram criados na Índia e ela Gangster of Love [O Bandido do nasceu em Londres mas foi educada Amor] (1996). De modos diferentes, nos EUA. respondem ao mordaz romance au­ Autores americanos com raízes tobiográfico do trabalhador imigrante no sudeste da Ásia, especialmente da filipino-americano Carlos Bulosan Coréia e das Filipinas, ganharam vozes (1913-1956) America Is in the Heart [A poderosas na última década. Entre os América Está no Coração], 1946. escritores coreano-americanos recen­ A extraordinária cineasta vietna­ tes, destaca-se Chang-rae Lee (1965-). mita-americana e teórica social Trinh Nascido em Seul, na Coréia, o notável Minh-Ha (1952-) combina narrativas e romance de Lee, Native Speaker teoria em sua obra feminista Woman, [Falante de Língua Nativa](1995), Native, Other [Mulher, Nativa, Outra] entrelaça ideais públicos, traição e (1989). Da China, Ha Jin (1956- ) es­ desespero pessoal. Seu emocionante creveu o romance Waiting [À Espera] segundo romance, A Gesture Life (1999), triste narrativa sobre a sepa­ [Uma Vida Gestual] (1999), explora a ração de 18 anos, cujo estilo realista, longa sombra de uma atrocidade do típico da ficção chinesa, chega aos tempo da guerra – o uso de coreanas ouvidos americanos como algo novo como “objeto de conforto” pelos e original. japoneses. As vozes mais recentes vêm da co­ Theresa Hak Kyung Cha (1951- munidade árabe-americana. Joseph 1982), nascida na Coréia, combina Geha (1944- ), nascido no Líbano, fotos, vídeos e documentos históricos situa suas narrativas de Through and em sua obra experimental Dictee Through [Completamente] (1990) em [Ditado] (1982) para registrar o sofri­ Chang-rae Lee Toledo, Ohio; a jordaniano-americana mento de coreanos sob as forças de Diana Abu-Jaber (1959- ), nascida ocupação japonesas. A poeta malásio­ em Nova York, escreveu o romance -americana Shirley Geok-lin Lim, de Arabian Jazz [Jazz Árabe] (1993). origem étnica chinesa, é autora de um A poetisa e dramaturga Elmaz livro de memórias provocador, Among Abinader (1954-) é autora de uma the White Moon Faces [Entre as Faces autobiografia,Children of the Roojme: Brancas da Lua] (1996). Seu romance A Family’s Journey From Lebanon autobiográfico é Joss and Gold [Joss [Crianças de Roojme: a Viagem de e Ouro] (2001) e seus contos foram uma Família do Líbano] (1991). Em recompilados em Two Dreams [Dois “Just Off Main Street” [Apenas Fora Sonhos] (1997). da Rua Principal] (2002), Abinader Entre os escritores nascidos nas escreveu sobre sua infância bicultural Foto © Marion Ettlinger / Filipinas, podemos citar Bienvenido CORBIS OUTLINE numa cidadezinha da Pensilvânia na

157 década de 1960: “...as cenas familiares enchiam-me de alegria e sensação de estar no lugar apropriado, mas eu sabia que nada daquilo poderia ser com­ partilhado do lado de fora da porta”. A literatura americana percorreu um caminho longo e tortuoso desde os dias pré-coloniais até os tempos contemporâneos. Sociedade, história, tecnologia, tudo isso teve impacto eloqüente sobre ela. Em última análise, no entanto, existe uma constante — humanidade, com todo o seu brilho e sua malevolência, sua tradição e sua promessa.

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Abolicionismo: Movimento destinado a acabar com a de 1940 e princípios da década de 1950) durante o qual escravidão no norte dos Estados Unidos, muito atuante o Senador americano Joseph McCarthy processou cida­ antes da Guerra Civil da década de 1860. dãos americanos que ele e seus seguidores suspeitavam de serem membros, ou ex-membros, ou simpatizantes do Alusão: Referência implícita ou indireta a um outro texto, Partido Comunista. Seus esforços incluíram a criação de contida num texto literário. “listas negras”, em várias profissões — listas de pessoas que eram proibidas de trabalhar naqueles empregos. Beatnik: Rebelião artística e literária contra a sociedade McCarthy acabou sendo denunciado pelos seus colegas estabelecida, nas décadas de 1950 e 1960, e muito ligada do Senado. a Jack Kerouac, Allen Ginsberg e outros. “Beat” sugere santidade (“beatificação”) e sofrimento (“abatido”). Existencialismo: Movimento filosófico segundo o qual o indivíduo sofredor tem de criar sentido num universo incognoscível, caótico e aparentemente vazio. Brâmanes de Boston [Brahmins]: Escritores influen­ tes e respeitados do século 19, provenientes da Nova Inglaterra, e que mantinham a “tradição cavalheiresca” Expressionismo: Movimento artístico surgido após a I dos valores da elite. Guerra Mundial, de origem alemã, que distorcia as apa­ rências para comunicar estados emocionais interiores. Calvinismo: Doutrina teológica rigorosa do reformador protestante francês João Calvino (1509-1564), e base da Fabulista: Criador ou escritor de fábulas (narrativas sociedade puritana. Calvino mantinha que todos os seres curtas com uma moral, tipicamente apresentando humanos nasciam pecadores e que só a graça de Deus animais como personagens) ou contos sobrenaturais (e não a igreja) poderia salvar uma pessoa do inferno. incorporando elementos de mitos e lendas.

Cânone: Um corpo de obras literárias aceito ou sancio­ Faulkneriano: Num estilo reminiscente de William nado considerado como permanentemente estabelecido Faulkner (1897-1962), um dos maiores romancistas do e de alta qualidade. século 20 nos EUA, que escreveu sobre o declínio e decadência do Sul aristocrático. Diferentemente de regionalistas anteriores que escrevia sobre a cor local, Canto visionário: Canto poético criado por membros Faulkner criou obras literárias complexas na forma e de algumas tribos de americanos nativos para as ce­ muitas vezes violentas e trágicas no conteúdo. rimônias em que se purificavam por meio de jejum e meditação solitários. Fausto: Personagem literário que vende sua alma ao Chekhoviano: Estilo similar às obras do autor russo diabo para tornar-se onisciente, ou semelhante a um Anton Pavlovitch Chekhov. Chekhov (1860-1904), um deus; protagonista de peças do dramaturgo Christopher dos maiores contistas e dramaturgos da era moderna, é Marlowe (1564-1593), da renascença inglesa, e de Johan conhecido tanto por suas peças humorísticas de um ato Wolfgang von Goethe (1749-1832), escritor romântico como por suas longas tragédias. alemão.

Conceit: Metáfora ampliada. Expressão usada para des­ Feminismo: O ponto de vista, articulado no século 19, crever a poesia metafísica da renascença, na Inglaterra, e de que as mulheres são inerentemente iguais aos homens da época colonial americana, como a de Anne Bradstreet. e merecem os mesmos direitos e oportunidades. Mais recentemente, movimento social e político que se espa­ lhou pelos Estados Unidos no final da década de 1960 e Épico-cômico (Mock-epic): Paródia que adota a forma depois se espalhou pelo mundo afora. do épico (também conhecido como heróico-cômico).

Era McCarthy: Período da Guerra Fria (final da década

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algo que é visto. Fugitivos: Poetas que colaboraram em The Fugitive, revista publicada entre 1922 e 1928 em Nashville, Imagistas: Grupo de poetas, sobretudo americanos, em Tennessee. Os colaboradores, inclusive alguns eruditos que se incluíam Ezra Pound e Amy Lowell, que usavam como John Crowe Ransom, Robert Penn Warren e Allen imagens visuais e linguagem coloquial penetrantes. Tate, rejeitaram os valores urbano, comerciais do “norte”, Atuantes de 1912 a 1914. que achavam que havia dominado os Estados Unidos, e clamavam por um retorno à terra e às tradições ameri­ Ironia: Sentido (freqüentemente contraditório) enco­ canas que podiam ser encontradas no Sul. berto por trás do significado aparente de uma palavra ou frase. Gênero: Uma das categorias de forma literária (romance, poema lírico, épico, por exemplo) Julgamento de bruxas em Salem: Julgamento de pessoas acusadas de bruxaria, ocorrido em 1692, na Guerra Civil: A guerra (1861-1865) entre os estados cidade de Salem, em Massachusetts. Dezenove pessoas do Norte dos Estados Unidos , que permaneceram na foram enforcadas e muitas outras foram constrangidas a União, e os estados do Sul, que se separaram e forma­ confessar atos de bruxaria ou a acusar outras de praticar ram a Confederação. A vitória do norte levou ao fim da a bruxaria. escravidão e preservou a União. Kafkaniano: Reminiscente do estilo do romancista e Guerra Revolucionária: A Guerra da Independência, contista tcheco Franz Kafka (1883-1924). As obras de de 1775 a 1783, entre as colônias americanas e a Kafka retratam a opressão da vida moderna e seus per­ Grã-Bretanha. sonagens frequentemente se encontram em situações de perigo para as quais não há explicação e das quais Hartford Wits: Circulo literário patriótico, mas conser­ não há escapatória. vador, do final do século 18, centrado na Universidade de Yale, no Estado de Connecticut (também conhecido Knickerbocker School: Escritores do início do século como Connecticut Wits). 19, centrados na cidade de Nova York, que imitavam as modas literárias inglesas e européias. História exagerada (tall tale): História popular, contada na região de fronteira dos Estados Unidos, geralmente Literatura de Criação de Personagem: Gênero literá­ exagerada e humorística, e envolvendo casos de força rio popular, nos séculos 17 e 18, em que se esboçava o sobre-humana. perfil de uma personagem que representava um grupo ou um tipo. Hudibras: Sátira heróico-cômica do escritor inglês Samuel Butler (1612-1680). Hudibras foi imitado pelos Literatura Global: Textos contemporâneos de muitas satiristas do início da era revolucionária. culturas do mundo. Seleções incluem literatura atribuída a vários grupos religiosos, ideológicos e étnicos dentro Iâmbico: Pé de verso consistindo de uma sílaba curta e além de fronteiras geográficas. seguida de uma longa, ou de uma sílaba átona seguida de uma tônica. Literatura regional: A literatura que explora os costu­ mes e a paisagem de uma região dos Estados Unidos. Iluminismo: Movimento do século 18 centrado nos ideais do bom senso e da benevolência, bem como na Livro de auto-ajuda: Livro que diz aos leitores como crença de que liberdade, justiça e igualdade constituem melhorar sua vida, com base em seus próprios esforços. direitos inalienáveis do homem. Gênero popular na América, desde meados do século 19 até os dias de hoje. Imagem: Representação concreta de um objeto ou de

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Maratona poética (Poetry Slam): Competição Mary Rowlandson e John Williams, na época colonial. de poesia oral. Narrativa escrava - Primeiro gênero literário de prosa Metaficção: Ficção que enfatiza a natureza da ficção, escrita por negros nos Estados Unidos. Relata a vida dos as técnicas e convenções usadas para escrevê-la e o afro-americanos no tempo da escravidão. papel do autor. Naturalismo - Enfoque literário surgido na França, no “Middle Colonies” (Colônias do Meio): Estados do final do século 19 e princípio do século 20; que retratava litoral leste ou atlântico dos Estados Unidos de hoje. Na com grande intensidade os problemas sociais, e encarava era colonial, correspondia a Nova York, Nova Jersey, os seres humanos como vítimas impotentes diante de Pensilvânia e, às vezes, Delaware — conhecidos por suas forças sociais econômicas mais poderosas. atividades comerciais centradas na cidades de Nova York e Filadélfia. Neoclassicismo - Movimento artístico do século 18, associado ao Iluminismo, que se baseava em modelos Meio Oeste: A área central dos Estados Unidos, desde clássicos e enfatizava a razão, a harmonia e a moderação. o Rio Ohio até as Montanhas Rochosas, incluindo as Pradarias e a região das Grandes Planícies (também Neojornalismo: Um estilo literário popularizado nos conhecida como o Meio-Oeste). Estados Unidos nos anos 1960 por Tom Wolfe, Truman Capote e Norman Mailer, que usavam as técnicas de Minimalismo: Estilo literário exemplificado nas obras contar histórias e a caracterização de escritores de ficção de Raymond Carver, caracterizada por frugalidade e ao criar obras não-ficcionais. simplicidade. Nova Inglaterra: Região dos Estados Unidos compre­ Modernismo: Movimento cultural internacional que endendo os atuais Estados de Maine, Vermont, New se seguiu à Primeira Guerra Mundial e que expressava Hampshire, Massachusetts, Rhode Island e Connecticut a desilusão com a tradição e o interesse pelas novas conhecida por sua precoce industrialização e vida inte­ visões e tecnologias. lectual. Tradicionalmente, terra do astuto, independente e parcimonioso comerciante “Yankee”. Motivo (Motif): Elemento recorrente, como uma imagem, um tema ou um tipo de incidente. Objetivista: Movimento poético de meados do século 20, associado com William Carlos Williams, que enfatiza Muckrakers: Jornalistas e romancistas americanos as imagens e a fala coloquial. (1900-1912) cujos textos sobre corrupção nas empresas e no governo desencadearam um processo de reforma Oficina de Escritores de Iowa (Iowa Writers’ social. Workshop): Um programa de graduação em redação criativa na Universidade de Iowa em que escritores talen­ Multicultural - Intercâmbio criativo de várias subcultu­ tosos, e geralmente jovens, trabalham com manuscritos ras étnicas e raciais. e trocam idéias sobre redação entre si e com poetas e escritores estabelecidos. Mito - Narrativa lendária, geralmente sobre deuses e he­ róis, ou um tema que expressa a ideologia de uma cultura. Old Norse: A velha língua norueguesa das sagas, prati­ camente idêntica ao moderno islandês. Narrativa de cativeiro - Relato do cativeiro nas mãos de tribos americanas nativas, como o dos escritores Poesia cowboy: Verso baseado na tradição oral e geral­ mente rimado ou métrico que celebra as tradições da cultura de gado do Oeste dos EUA. Seus temas incluem a natureza, história, folclore, família, amizade e trabalho. A poesia cowboy tem sua origem no estilo das baladas 161 GLOSSÁRIO da Inglaterra e do Sul apalache. Reflexivo: auto-referencial. Uma obra literária é reflexiva quando refere-se a si mesma. Poesia hip-hop: Poesia que é escrita numa página, mas apresentada a uma platéia. A poesia hip-hop, com suas Região das Planícies: A região central dos Estados raízes na tradição retórica afro-americana, enfatiza o Unidos, que desce das Montanhas Rochosas em direção ritmo, a improvisação, a livre-associação, rimas e o uso ao leste, até chegar às Pradarias. de linguagem híbrida. Romance: Romances americanos simbólicos, dotados Poesia da linguagem: Poesia que estica a linguagem de alta intensidade emocional, associados ao período para revelar seu potencial para a ambigüidade, frag­ romântico. mentação e auto-afirmação dentro do caos. Os poetas da linguagem favorecem as formas abertas e textos mul­ Romance doméstico: Um romance sobre a vida domés­ ticulturais; se apropriam de imagens da cultura popular tica e familiar que em geral dá ênfase às personalidades e da mídia e as remodelam. e atributos de seus personagens sobre o enredo. Muitos romances domésticos do século 19 e do início do século Poesia metafísica - Tipo intricado de poesia inglesa do 20 empregaram certo grau de sentimentalismo — geral­ século 17 que empregava agudeza e imagens inesperadas. mente uma mistura de compaixão e humor.

Poeta laureado: Indivíduo indicado como consultor em Romantismo - Reação contra o neoclassicismo. Este poesia na Biblioteca do Congresso dos EUA geralmente movimento, do início do século 19, exaltava o indivíduo, por um mandato de um ano. Durante seu mandato, busca as paixões e a vida interior. Enfatizava as emoções fortes, aumentar a conscientização nacional para uma maior a imaginação e a liberdade em relação à correção clás­ apreciação da poesia. sica, nas formas artísticas, bem como a rebelião contra as convenções sociais. Pós-Modernismo - sensibilidade estética influenciada pelos meios de comunicação, no final do século 20, e ca­ Saga - Uma antiga narrativa escandinava que fala de racterizada pela abertura e pela ‘colagem’. O movimento eventos históricos ou míticos. questiona os fundamentos das formas culturais e artís­ ticas, servindo-se, para tanto, da ironia auto-referencial Separatistas - Seita puritana muito rígida que, nos sé­ e da justaposição de elementos da cultura popular e da culos 16 e 17, preferiu separar-se da Igreja da Inglaterra tecnologia eletrônica. a tentar reformá-la. Muitos dos primeiros colonos da América eram separatistas. Pradarias - A região agrícola plana, sem florestas, do Meio-Oeste americano. Síntese - Mistura de dois sentidos, técnica usada por Edgar Allan Poe e outros para sugerir correspondências Primitivismo - Crença de que a natureza oferece mode­ ocultas e criar efeitos exóticos. los mais verdadeiros e mais saudáveis que a cultura. Tem como exemplo o mito do “bom selvagem”. Sul - Região dos Estados Unidos que inclui os estados de Maryland, Virginia, Carolina do Norte, Carolina do Puritanos - Reformadores religiosos e políticos ingleses Sul, Georgia, Kentucky, Tennessee, Louisiana, Mississipi, que fugiram de seu país em busca de liberdade religiosa Alabama, Missouri, Arkansas, Florida, West Virginia e o e que assentaram e colonizaram a Nova Inglaterra do leste do Texas. século 17. Surrealismo - Movimento artístico e literário europeu Reforma - Movimento político e religioso da Europa do que usa imagens e eventos ilógicos, semelhantes a so­ Norte, entre os séculos 15 e 17, que tentou reformar o nhos, para tentar transmitir o inconsciente. catolicismo e acabou dando origem ao protestantismo.

162 GLOSSÁRIO

Tema - Idéia abstrata incorporada numa obra literária. Versificação silábica - Métrica poética baseada no número de sílabas de uma linha (um verso). Tory - Facção de homens ricos e favoráveis aos ingleses, na América do tempo da Guerra Revolucionária, no final do século 18.

Tradição oral - Transmissão de boca em boca, tradição que é passada de uma geração para outra; tradição verbal folclórica.

Transcendentalismo - Movimento filosófico de largo alcance, na Nova Inglaterra do período romântico (com seu ápice entre 1835 e 1845). Enfatizava o papel da divindade na natureza, bem como a intuição individual, e sobrepunha os sentimentos à razão.

Trapaceiro (trixter) - Personagem esperto das narrati­ vas tribais folclóricas (sobretudo dos afro-americanos e dos americanos nativos), que rompe os códigos culturais de comportamento; em geral, é um herói da cultura.

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ÍNDICE

Abbey, Edward 152 Ammons, A.R. 82, 132 Abinader, Elmaz, 158 Among the White Moon Faces (Shirley Geok-lin Lim) 158 “Above Pate Valley” (Gary Snider) 88 Anaya, Rudolfo 93, 119 “Abraham Lincoln Walks at Midnight” (Vachel Lindsay) 59 Ancient Evenings (Norman Mailer) 112 Absalom, Absalom! (William Faulkner) 74 Anderson, Laurie 97 Abu-Jaber, Diana 158 Anderson, Sherwood 58, 73, 77 Accidental Tourist, The (Anne Tyler) 145 Andrews, Bruce 97 Acker, Kathy 144 Angela’s Ashes (Frank McCourt) 140 Actual, The (Saul Bellow) 106 Angelou, Maya 93, 95, 118 Adams, Abgail 27 Angels in America: Part One: Millennium Approaches Adams, Henry 55 (Tony Kushner) 141 Address to the Negroes of the State of New York, An Angels in America: Part Two: Perestroika ( Tony Kushner) 141 (Jupiter Hammon) 15 Angle of Repose (Wallace Stegner) 150 Adventures of Augie March, The (Saul Bellow) 105 Animal Dreams (Barbara Kingsolver) 152 Adventures of Huckleberry Finn (Mark Twain) 42, 50 Annie John (Jamaica Kincaid) 156 Affliction (Russell Banks) 143 Another Country (James Baldwin) 104 Affluent Society, The (John Kenneth Galbraith) 103 Another You (Ann Beattie) 146 Afterlife and Other Stories, The (John Updike) 141 Antin, David 97 Age of Innocence, The (Edith Wharton) 55 Antrim, Donald 143 Aiiieeeee! (Frank Chin, ed.) 96 Anywhere But Here (Mona Simpson) 149 Albee, Edward 119, 121 Anzaldúa, Gloria 152 Alcott, Bronson 29, 30 “Appalachian Book of the Dead” (Charles Wright) 127 Alcott, Louisa May 29 Appeal in Favor of that Class of Americans Called Africans, An Alexander, Meena 157 (Lydia Child) 45 Alexie, Sherman 154, 155 “Applicant, The” (Sylvia Plath) 85 Ali, Agha Shahid 129 Appointment in Samarra (John O’Hara) 104 Allen , Donald 88, 90 Arabian Jazz (Daina Abu-Jaber) 158 Allende, Isabel 157 Ariel (Sylvia Plath) 85 Allison, Dorothy 147 Armantrout, Rae 124 All My Sons (Arthur Miller) 100 Armies of the Night, The (Norman Mailer) 109, 111 All the King’s Men (Robert Penn Warren) 100 Arrowsmith (Sinclair Lewis) 74, 75 All the Pretty Horses (Cormac McCarthy) 147 Arthur Mervyn (Charles Brockden Brown) 24 All the Sad Young Men (F. Scott Fitzgerald) 72 Ashbery, John 82, 90, 124 Alurista 93 Ash-Wednesday (T.S. Eliot) 66 Alvarez, Julia 156 As I Lay Dying (William Faulkner) 74 Always Running (Luis Rodriguez) 154 Assistant, The (Bernard Malamud) 106 Amateur Marriage, The (Anne Tyler) 145 Atlantis (Mark Doty) 130 Amazing Advantures of Kavalier and Clay, The (Michael Chabon) 146 “At Melville’s Tomb” (Hart Crane) 70 Ambassadors, The (Henry James) 54 “At the Fishhouses” (Elizabeth Bishop) 87 America is in the Heart (Carlos Bulosan) 158 “At the Gym” (Mark Doty 130 American, The (Henry James) 54 Atwood, Margaret 126 Americana (Don DeLillo) 144 Auster, Paul 140, 144 American Buffalo (David Mamet) 121 Autobiography (Benjamin Franklin) 18, 20 American Daughter, An (Wendy Wasserstein) 142 Autobiography of an Ex-Colored Man (James Weldon Johnson) 61 American Dream, The (Edward Albee) 120 Autobiography of Miss Jane Pittman, The (Ernest Gaines) 114 American Geography (Jedidiah Morse) 23 Autobiography of My Mother, The (Jamaica Kincaid) 156 “American Liberty” (Philip Freneau) 23 Autocrat of the Breakfast-Table, The (Oliver Wendell Holmes) 35 American Pastoral (Philip Roth) 113 Awake and Sing! (Cllifford Odets) 80 American Poetry in the Twentieth Century (Kenneth Rexroth) 89 Awakening, The (Kate Chopin) 52, 53 American Primitive (Mary Oliver) 133 Awful Rowing Toward God, The (Anne Sexton) 85 American Tragedy, An (Theodore Dreiser) 49, 56-57, 59, 80 Ayumi: A Japanese American Anthology (Janice Mirikitani, ed.) 96 The America Play (Suzan-Lori Parks) 142

165 ÍNDICE

Babbitt (Sinclair Lewis) 62, 74, 75 Blue Notes (Yusef Komunyakaa) 136 Baca, Jimmy Santiago 127 Blue Pastures (Mary Oliver) 133 Baldwin, James 48, 104 Bluest Eye, The (Toni Morrison) 117 Baldwin, Joseph 51 Bly, Robert 91, 131 Bambara, Toni Cade 118 Bone Black (bell hooks) 148 Banks, Russell 143 Bonesetter’s Daughter, The (Amy Tan) 153 Baraka, Amiri (LeRoi Jones) 93, 95, 120 Bonfire of the Vanities, The (Tom Wolfe) 110 Barren Ground (Ellen Glasgow) 60 Book of Daniel, The (E.L. Doctorow) 115 Barth, John 107, 110-111, 115, 140 Borderlands/La Frontera: The New Mestiza Barthelme, Donald 110, 140 (Gloria Anzaldúa) 152 Basic Training of Pavlo Hummel, The (David Rabe) 122 Bostonians, The (Henry James) 54 Bass, Rick 150 Boston Marriage (David Mamet) 122 Bastard Out of Carolina (Dorothy Allison) 147 Boyle, T.Coraghessan 154 Baumgardner, Jennifer 139 Brackenridge, Hugh Henry 22 Bausch, Richard 145 Bradford, William 8-9, 11 Beach Music (Pat Conroy) 147 Bradley, David 145 Bean Trees, The (Barbara Kingsolver) 152 Bradstreet, Anne 9, 27, 35, 159 Bear, The (William Faulkner) 50 “Brahma” (Ralph Waldo Emerson) 30 Beattie, Ann 140, 146 Brautigan, Richard 110 Beautiful and the Damned, The (F. Scott Fitzgerald ) 72 Brazil-Maru (Karen Tei Yamashita) 153 Bech: A Book (John Updike) 108 Breakfast at Tiffany’s (Truman Capote) 109 Bech at Bay (John Updike) 108 Brent, Linda (see Jacobs, Harriet) Bech Is Back (John Updike) 108 “Bride Comes to Yellow Sky, The” (Stephen Crane) 56 Bell, Christine 156 Bride of the Innisfallen, The (Eudora Welty) 102 Bellefleur (Joyce Carol Oates) 116 Bridge, The (Hart Crane) 70 Bell Jar, The (Sylvia Plath) 85 Bridge of San Luis Rey, The (Thornton Wilder) 80 Bellow, Saul 103, 105, 111, 118 Bridget Jones’s Diary (Helen Fielding) 139 Beloved (Toni Morrison) 117 Brief and True Report of the New-Found Land of Virginia, A Beneath a Single Moon 97 (Thomas Hariot) 7 Berriault, Gina 153 Brigadier and the Golf Widow, The (John Cheever) 108 Berryman, John 84, 85 Bright Lights, Big City (Jay McInerny) 114 Beverley, Robert 15 “British Prison Ship, The” (Philip Freneau) 22 Bidart, Frank 134 “Broken Heart, The” (James Merril) 82 Biglow Papers, First Series (James Russel Lowell) 35 Brooks, Gwendolyn 83 Big Money, The (John Dos Passos) 75 Broom of the System, The (David Foster Wallace) 143 (E.L. Doctorow) 115 “Brothers and Keepers” (John Edgar Wideman) 145 Bishop, Elizabeth 70, 84, 87, 124, 135 Brown, Charles Brockden 17 23, 24 Black Boy (Richard Wright) 77 Brown, Dan 138 Blackburn, Paul 88 Brown, James Willie, Jr. (see Komunyakaa, Yusef) “Black Cat, The ” (Edgar Allan Poe) 44 Brown Girl, Brownstones (Paule Marshall) 155 Black Looks (bell hooks) 148 Brownson, Orestes 29 “Black Snake, The” (Mary Oliver) 133 Bryant, William Cullen 23 Black Tickets (Jaye Anne Phillips) 146 Buckley, Christopher 146 Bless Me, Ultima (Rudolfo Anaya) 119 Bullet Park (John Cheever) 108 Blithedale Romance, The (Nathaniel Hawthorne) 29, 40 Bulosan, Carlos 158 Blonde (Joyce Carol Oates) 117 Buried Child (Sam Sheppard) 121 Blood Meridian (Cormac McCarthy) 147 Burroughs, William 81, 109 Bloodsmoor Romance, A (Joyce Carol Oates) 116 Bushnell, Candace 139 Bloom, Alan 106 Bushwacked Piano, The (Thomas McGuane) 150 Bloody Tenent of Persecution for Cause of Conscience, The Butler, Octavia 148 (Roger Williams) 13 Butler, Robert Olen 149 “Blue Hotel, The” (Stephen Crane) 56 Byrd, William 14

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Cable, George Washington 52 “Clan Meeting: Births and Nations: A Blood Song” Caine Mutiny (Herman Wouk) 99 (Michael Harper) 95 Call of the Wild, The (Jack London) 56 Clemens, Samuel (see Twain, Mark) “Camouflaging the Chimera” (Yusef Komunyakaa) 136 Clifton, Lucille 129 Campbell, Bebe Moore 145 Closing of the American Mind, The (Alan Bloom) 106 Cane (Jean Toomer) 77 Cloudsplitter (Russell Banks) 143 Cannery Row (John Steinbeck) 76 Cofer, Judith Ortiz 156 Cantos, The (Ezra Pound) 65 Cold Mountain (Charles Frazier) 147 Capote, Truman 109, 114, 138 Cole, Henry 130 “Cariboo Café, The” (Helena Maria Viramontes) 154 Collected Stories (Ellen Gilchrist) 147 Carolina Moon (Jill McCorkle) 147 Collected Stories (Grace Paley) 144 Carpenter’s Gothic (William Gaddis) 110 Collected Stories (Katherine Anne Porter) 102 Carver, Raymond 140, 141, 150, 154 Collins, Billy 134 Casas, Bartolomé de las 6 Color Purple, The (Alice Walker) 114, 118 “Cask of Amontillado, The” (Edgar Allan Poe) 43 Comanche Moon (Larry McMurtry) 151 Cass Timberlane (Sinclair Lewis) 75 Come Back, Dr. Caligari (Donald Barthelme) 110 Catcher in the Rye, The (J.D. Salinger) 103 108 Common Sense (Thomas Paine) 21 Catch-22 (Joseph Heller) 99 Complete Stories, The (Flannery O’Connor) 105 Cathedral (Raymond Carver) 140 “Concord Hymn” (Ralph Waldo Emerson) 29 Cather, Willa 59 Coney Island of the Mind, A (Lawrence Ferlinghetti) 89 Cattle Killing, The (John Edgar Wideman) 145 Confessions of Nat Turner, The (William Styron) 115 Centaur, The (John Updike) 108 “Congo, The” (Vachel Lindsay) 59 Ceremony (Leslie Marmon Silko) 119, 152 Conjure Woman, The (Charles Waddell) 61 Cervantes, Lorna Dee 93, 94, 129, 153 Conquest of Canaan, The (Timothy Dwight) 22 Cha, Theresa Hak Kyung 158 Conroy, Pat 147 Chabon, Michael 146 Contrast, The (Royal Tyler) 22 “Chambered Nautilus, The” (Oliver Wendell Holmes) 35 Cooper, Dennis 153 Chancers (Gerald Vizenor) 149 Cooper, James Fenimore 16, 17, 23, 25, 38, 50 Chandler, Raymond 44 Coover, Robert 110, 115, 140 Chaneysville Incident, The (David Bradley) 145 Coquette, The (Hanna Foster) 27 Channing, William Ellery 29 Corners (David Rabe) 122 Charlotte Temple (Susanna Rowson) 27 Corrections, The (Jonathan Franzen) 149 Charming Billy (Alice McDermott) 145 Corso, Gregory 89 Chavez, Denise 152 Cotton, Ann 27 Cheever, John 103, 107, 144 Counterlife, The (Philip Roth) 113 Chesnutt, Charles Waddell 61 Country Music (Charles Wright) 127 “Chicago” (Carl Sandburg) 58 Country of the Pointed Firs (Sarah Orne Jewett) 52 Chickamauga (Charles Wright) 128 Couples (John Updike) 108 Child, Lydia 45, 47 “Courtship of Miles Standish, The” “Children of Light” (Robert Lowell) 83 (Henry Wadsworth Longfellow) 35 Children of the Roojme (Elmaz Abinader) 158 Cowboys (Sam Shepard) 120 Children’s Hour, The (Lillian Hellman) 101 Crane, Hart 31, 70 Chimera (John Barth) 111 Crane, Stephen 49, 55, 56, 74 Chin, Frank 96 Creeley, Robert 88 Chopin, Kate 52 Crèvecoeur, Hector St. John de 20 Christ the Lord: Out of Egypt (Anne Rice) 138 Crimes of the Heart (Beth Henley) 142 “Chronic Meanings” (Bob Perelman) 97 Crossing, The (Cormac McCarthy) 147 Cisneros, Sandra 119, 151 “Crossing Brooklyn Ferry” (Walt Whitman) 33 Cities of the Plain (Cormac McCarthy) 149 Crossing Guard, The (David Rabe) 122 City in Which I Love You, The (Li-Young Lee) 129 Crucible, The (Arthur Miller) 100 City of Glass (Paul Auster) 144 Crying of Lot 49, The (Thomas Pynchon) 110, 111, 153 City of God (E.L. Doctorow) 115 Cryptogram, The (David Mamet) 122 Civil Disobedience (Henry David Thoreau) 13, 32 Cullen, Countee 71, 76 Clampitt, Amy 91 Cummings, Edward Estlin (e.e. cummings) 70

167 ÍNDICE

Cunningham, Michael 149 “Disillusionment of Ten O’Clock” (Wallace Stevens) 68 Curse of the Starving Class (Sam Shepard) 121 “Displaced Person, The” (Flannery O’Connor) 105 Curtain of Green, A (Eudora Welty) 102 Divakaruni, Chitra Banerjee 157 Custom of the Country, The (Edith Wharton) 55 “Diving Into the Wreck” (Adrienne Rich) 87 Doctorow, E.L. 99, 114-115 Dacey, Philip 98 Dogeaters (Jessica Hagedorn) 158 “Daddy” (Sylvia Plath) 85 Doolittle, Hilda (H.D.) 65, 68 Daisy Miller (Henry James) 54 Dorn, Ed 88 Damballah (John Edgar Wideman) 145 Dos Passos, John 62, 74, 75, 115 Dancing After Hours (Andre Dubus) 141 Doty, Mark 130-131 Dangling Man (Saul Bellow) 105 Douglas, Susan 139 Danticat, Edwidge 156 Douglass, Frederick 47, 48, 61 Darkness Visible (William Styron) 116 Dove, Rita 91, 93, 95, 126, 134 Daughter of Fortune (Isabel Allende) 157 Dreamer (Charles Johnson) 149 DaVinci Code, The (Dan Brown) 138 Dream of the Unified Field, The (Jorie Graham) 125 Day of Doom, The (Michael Wogglesworth) 10 Dream Songs (John Berryman) 86 Day of the Locust, The (Nathanael West) 153 Dreiser, Theodore 49, 55, 56-57, 74, 77, 105, 148 Days of Obligation (Richard Rodriguez) 154 Drinking Coffee Elsewhere (ZZ Packer) 148 “Deacon’s Masterpiece, or, The Wonderful One-Hoss Shay” Drown (Junot Diaz) 157 (Oliver Wendell Holmes) 35 Du Bois, W.E.B. 60, 61, 76 “Dead, The” (Billy Collins) 134 Dubus, Andre 141 Dean’s December, The (Saul Bellow) 106 Dunbar, Paul Lawrence 60 Death Comes for the Archbishop (Willa Cather) 60 Duncan, Robert 88 Death of a Salesman (Arthur Miller) 100, 103, 122 Dunn, Stephen 129 Death of Jim Loney, The (James Welch) 119 Dust Tracks on a Road (Zora Neale Hurston) 78 “Death of the Ball Turret Gunner, The” (Randall Jarrell) 82 Dutchman (Amiri Baraka) 120 Debutante Ball, The (Beth Henley) 142 Dwight, Timothy 21 Declaration of Sentiments (Elizabeth Cady Stanton) 45 Dybek, Stuart 149 Delicate Balance, A (Edward Albee) 120 DeLillo, Don 139, 144, 149 East of Eden The (John Steinbeck) 76 Deliverance (James Dickey) 87 East of the Mountain (David Guterson) 154 Delta Wedding (Eudora Welty) 102 Eberhart, Richard 82 “Democratic Vistas” (Walt Whitman) 33 Echoes Down the Corridor (Arthur Miller) 101 Desert Solitaire (Edward Abbey) 152 Edgar Huntley (Charles Brockden Brown) 24 Des Imagistes (Ezra Pound) 65 Edwards, Jonathan 13-14 Desire Under the Elms (Eugene O’Neill) 79 Eigner, Larry 88 Dessa Rose (Sherley Anne Williams) 148 Elbow Room (James Alan McPherson) 148 Devil’s Dream, The (Lee Smith) 146 Electric Kool-Aid Acid Test, The (Ken Kesey) 110 Dharma Bums, The (Jack Kerouac) 109 Eliot, T.S. 63, 65-66, 67, 69, 79, 82, 91 Diamant, Anita 143 Ellis, Bret Easton 115 Diamond, Jared 138 Ellis, Trey 145 Diary (Samuel Sewall) 11 Ellison, Ralph 48, 103, 104, 105 Diaz, Junot 156 Elmer Gantry (Sinclair Lewis) 75 Dickey, James 84, 86, 87 Elsie Venner (Oliver Wendell Holmes) 33 Dickinson, Emily 16, 31, 36, 38, 87, 124 Emerson, Ralph Waldo 5, 16, 20, 28, 29, 30, 31,32, 33, 34, 39, Dictee (Theresa Hak Kyung Cha) 158 41, 133, 155 Dictionary (Noah Webster) 23 “Emperor of Ice-Cream, The” (Wallace Stevens) 68 Didion, Joan 153 Empire Falls (Richard Russo) 143 Different Mirror, A (Ronald Takaki) 118 Empire of the Senseless (Kathy Acker) 144 Dillard, Annie 140, 154 Endless Life (Lawrence Ferlinghetti) 89 Dinner at the Homesick Restaurant (Anne Tyler) 145 End of the Road, The (John Barth) 111 diPrima, Diane 88 Enemies, A Love Story (Isaac Bashevis Singer) 1075 Direction of Poetry (Robert Richman, ed.) 98 Equiano, Olaudah 15, 47

168 ÍNDICE

Erdrich, Louise 93, 94-95, 119, 129, 149 For Whom the Bell Tolls (Ernest Hemingway) 73 Estate, The (Isaac Bashevis Singer) 107 Foster, Hanna 27 Ethan Frome (Edith Wharton) 55 Four Quartets (T.S. Eliot) 66 Eugenides, Jeffrey 143 Fourteen Sisters of Emilio Montez O’Brien, The “Eutaw Springs” (Phillip Freneau) 22 (Oscar Hijuelos) 156 Eva Luna (Isabel Allende) 155 Franklin, Benjamin 17, 18-20, 24, 35 “Evangeline” (Henry Wadsworth Longfellow) 35 Franny and Zooey (J.D. Sallinger) 109 “Evening Thought, An” (Jupiter Hammon) 15 Franzen, Jonathan 149 Everett, Percival 148 Frazier, Charles 147 Everything that Rises Must Converge Freeing the Soul (Haryette Mullen) 148 (Flannery O’Connor) 105 Freeman, Mary Wilkins 52 Executioner’s Song, The (Norman Mailer) 112 Freneau, Philip 22-23,27, 35, 132 Explanation of America, An (Robert Pinsky) 135 Frenzy (Percival Everett) 148 Friedan, Betty 92, 109 Fable for Critics, A (James Russell Lowell) 35 From Here to Eternity (James Jones) 99 Face of an Angel (Denise Chavez) 152 From the Terrace (John O’Hara) 104 “Facing It” (Yusef Komunyakaa) 136 Frost, Robert 31, 66, 67, 132 Facts, The (Phlip Roth) 113 Fuller, Margaret 29, 35, 36, 45 Falconer (John Cheever) 108 “Fall of the House of Usher, The” (Edgar Allan Poe) 43 Gaddis, William 110 Fame (Arthur Miller) 101 Gaines, Ernest 114, 147 Family Dancing (David Leavitt) 141 Galatea 2.2 (Richard Powers) 140, 149 Family Moskat, The (Isaac Bashevis Singer) 107 Galbraith, John Kenneth 103 “Family Reunion” (Louise Erdrich) 95 Gallagher, Tess 127 Farewell to Arms, A (Ernest Hemingway) 73 Gangster of Love, The (JessicaHagedorn) 158 Farming of the Bones, The (Edwidge Danticat) 156 Gardens in the Dunes (Leslie Marmon Silko) 152 Faulkner, William 10, 50, 51, 63, 64, 71, 74, 113, 114, 150, 159 Gardner, John 114, 116, 140 Fault Lines (Meena Alexander) 157 Garland, Hamlin 57 Federalist Papers, The 21 Garrison, William Lloyd 23, 48 Feminine Mystique, The (Betty Friedan) 92, 109 Gass, william 110, 140 Fences (August Wilson) 122 Geha, Joseph 158 Ferlinghetti, Lawrence 81, 88, 89 “George the Third’s Soliloquy” (Philip Freneau) 23 Ferré, Rosario 156 “Gerontion” (T.S. Eliot) 66 “Fever” (John Rdgar Wideman) 145 Gesture Life, A (Chang-rae Lee) 158 “Few Don’t’s of an Imagiste, A” (Ezra Pound) 65 Ghosts (Paul Auster) 144 Fielding, Helen 139 Ghost Writer, The (Phlip Roth) 113 Figured Wheel, The (Robert Pinsky) 135 Gilead (Marilynne Robinson) 154 Firebird (Mark Doty) 130 Gilbert, Sandra 92 Fire Next Time, The (James Baldwin) 104 Gilchrist, Ellen 147 Firmat, Gustavo Pérez 156 Giles Goat-Boy (John Barth) 110, 111 “Fish R Us” (Mark Doty) 130 Gilman, Charlotte Perkins 53 Fitzgerald, F. Scott 56, 62, 63, 71-72, 73, 74, 80, 146, 148 Ginsberg, Allen 81, 84, 88, 89, 90, 109, 120, 159 Fixer, The (Bernard Malamud) 106 Gioia, Dana 98 Flanagan, Caitlin 139 Giovanni, Nikki 92, 93 Flappers and Philosophers (F. Scott Fitzgerald) 72 Girl with Curious Hair (David Foster Walllace) 143 Floating Opera, The (John Barth) 111 Gizzi, Peter 137 “Flowering Judas” (Katherine Anne Porter) 101 Gladwell, Malcolm 138 Flowering Judas (Katherine Anne Porter) 102 Glasgow, Ellen 60 F.O.B. (David Henry Hwang) 118 Glass Menagerie, The (Tennessee Williams) 101 Fools Crow (James Welch) 119 Glengarry Glen Ross (David Mamet) 121 Ford, Richard 141, 147, 150 Glück, Louise 91, 126-127, 129 For the Union Dead (Robert Lowell) 84 Glyph (Percival Everett) 148 42nd Parallel, The (John dos Passos) 75 “Gold Bug, The” (Edgar Alan Poe) 44

169 ÍNDICE

Golden, Arthur 138 Heartsong of Charging Elk, The (James Welch) 151 Golden Apples, The (Eudora Welty) 102 Heart Songs (Annie Proulx) 143 Golden Bowl, The (Henry James) 54 Heidi Chronicles, The (Wendy Wasserstein) 142 Golden Boy (Cllifford Odets) 80 Hejinian, Lyn 97, 124 Gonzales, Rodolfo 94 Heller, Joseph 99, 105 Goodbye, Columbus (Philip Roth) 103, 112 Hellman, Lillian 101 “Good Country People” (Flannery O’Connor) 105 Hemingway, Ernest 50, 62, 63, 71, 72-73, 74, 112, 140, 148, 150 Good Man is Hard to Find, A (Flannery O’Connor) 105 Hempel, Amy 141 Good Mother, The (Sue Miller) 143 Henderson the Rain King (Saul Bellow) 105 Good Scent From a Strange Mountain, A Henley, Beth 142 (Robert Olen Butler) 149 “Her Kind” (Anne Sexton) 85 Gordon, Caroline 114 Herzog (Saul Bellow) 105 Gordon, Mary 143, 145 Hidden Persuaders, The (Vance Packard) 103 Go Tell It on the Mountain (James Baldwin) 104 Hiding Place (John Edgar Wideman) 145 Graham, Jorie 91, 125, 127, 137 Hijuelos, Oscar 118, 156 Grandissimes, The (George Washington Cable) 52 Hirsch, Ed 134 Grapes of Wrath, The (John Steinbeck) 63, 74, 76 Hirshfield, Jane 131-132 Gravity’s Rainbow (Thomas Pynchon) 99, 111 Historia de la Nueva México (Gaspar Pérez de Villagrá) 93 Great American Novel, The (Philip Roth) 112 History and Present State of Virginia, The (Robert Beverley) 15 Great Gatsby, The (F. Scott Fitzgerald) 56, 59, 72, 80 History of My Heart (Robert Pinsky) 135 Great God Brown, The (Eugene O’Neill) 80 History of New York (Washington Irving) 25 Great Santini, The (Pat Conroy) 147 History of the Condition of Women in Various Ages and Nations Grendel (John Gardner) 116 (Lydia Child) 45 Griever (Gerald Vizenor) 149 History of the Dividing Line (William Byrd) 14 Grimké, Angelina 45 History of the Indians (Bartolomé de las Casas) 6 Grimké, Sarah 45 History of the Standard Oil Company (Ida M. Tarbell) 57 Grisham, John 138 History of Woman Suffrage (Elizabeth Cady Stanton) 45 Gubar, Susan 92 Hobomok (Lydia Child) 45 Guterson, David 154 Hogan, Linda 151 Guy Domville (Henry James) 54 Holder of the World, The (Bharati Mukherjee) 157 Hollander, John 82 Habit of Being, The (Flannery O’Connor) 105 “Hollow Men, The” (T.S. Eliot) 66 Hagedorn, Jessica 158 Holmes, Oliver Wendell 34, 35 Halliday, Mark 133 “Holy the Firm” (Anni Dillard) 155 Hamlet, The (William Faulkner) 74 Home of the End of the World, A (Michael Cunningham) 149 Hammett, Dashiell 44, 101 Home Repairs (Trey Ellis) 145 Hammon, Jupiter 15 Hooks, Bell (bell hooks) 148 Hand to Mouth (Paul Auster) 140 Hooper, Johnson 51 Hannah, Barry 147 Horseman Pass By (Larry McMurtry) 151 Hansberry, Lorraine 103 Hosseini, Khaled 138 Hariot, Thomas 7 Hours, The (Michael Cunningham) 149 Harjo, Joy 130 Housebreaker of Shady Hill, The (John Cheever) 107 Harlot’s Ghost (Norman Mailer) 112 Housekeeping (Marilynne Robinson) 154 Harmonium (Wallace Stevens) 67 House Made of Dawn (N. Scott Momaday) 119, 152 Harper, Michael 93, 95, 96, 134, 136 House of Mirth, The (Edith Wharton) 55 Harris, George Washington 51 House of the Seven Gables, The (Nathaniel Hawthorne) 39 Harrison, Jim 149 House of the Spirits, The (Isabel Allende) 157 Harte, Bret 52, 53 House on Mango Street, The (Sandra Cisneros) 151 Haruf, Kent 149 House on Marshland, The (Louise Glück) 126 Hass, Robert 127 Howard, Richard 82 Hawthorne, Nathaniel 10, 16, 24, 29, 38, 39-40, 52, 157 Howe, Susan 125 Hazard of New Fortunes (William Dean Howells) 53 Howells, William Dean 53, 57 H.D. (Hilda Doolittle) 65, 92 Howl (Allen Ginsberg) 81, 84, 90

170 ÍNDICE

“How Serfdom Saved the Women’s Movement” Jacobs, Harriet 47, 48 (Caitlin Flanagan) 139 James, Henry 53-54, 55, 64 How the Garcia Girls Lost Their Accents (Julia Alvarez) 156 Janowitz, Tama 115, 144 Hughes, Langston 70-71 Jarman, Mark 127 Hugo, Richard 84, 86, 135 Jarrell, Randall 82 Human Stain, The (Philip Roth) 113 Jasmine (Bharati Mukherjee) 157 Humboldt’s Gift (Saul Bellow) 105 Jauss, David 98 “Hummingbird Pauses at the Trumphet Vine” (Mary Oliver) 133 Jazz (Toni Morrison) 117 Hundred Brothers, The (Donald Antrim) 143 Jazz Poetry Anthology, The (Yusef Komunyakaa, ed.) 136 Hundred Secret Senses, The (Amy Tan) 153 Jeffers, Robinson 69-70 Hunger of Memory (Richard Rodriguez) 154 Jefferson, Thomas 20, 21, 23, 25 Hurlyburly (David Rabe) 122 Jen, Gish 153 Hurston, Zora Neale 78, 105, 117, 148 Jewett, Sarah Orne 52 Hutchinson, Anne 27 “Jewish Cemetery at Newport, The” Hwang, David Henry 118 (Henry Wadsworth Longfellow) 35 “Jilting of Granny Weatherall, The” I Am Joaquin (Rodolfo Gonzalez) 94 (Katherine Anne Porter) 102 Iceman Cometh, The (Eugene O’Neill) 80 Jin, Ha 158 Ice-Shirt, The (William Vollmann) 153 Joe Turner’s Come and Gone (August Wilson) 122 “Ichabod” (John Greenleaf Whittier) 36 “Johnny Appleseed” (Vachel Lindsay) 59 “Idea of Order at Key West, The” (Wallace Stevens) 68 Johnson, Charles 149 Ideas of Order (Wallace Stevens) 67 Johnson, James Weldon 61, 71 Idiots First (Bernard Malamud) 106 Jones, James 99 I Know Why the Caged Bird Sings (Maya Angelou) 95, 118 Jones, LeRoi (see Baraka, Amiri) “Improvised Poetics” (Allen Ginsberg) 88 Journal (John Winthorp) 11 Inada, Lawson 93 Journal (John Woolman) 13 “In a Station of the Metro” (Ezra Pound) 65 Journal (Sarah Kemble Knight) 11 Incident at Vichy (Arthur MIller) 100 Joy Luck Club, The (Amy Tan) 118, 153 Incidents in the Life of a Slave Girl (Harriet Jacobs) 47 JR (William Gaddis) 110 In Cold Blood (Truman Capote) 109, 138 Jubilee (Margaret Walker) 148 “In Cold Storm Light” (Leslie Mamon Silko) 94 “Jug of Rum, The” (Philip Freneau) 23 In Country (Bobbie Ann Mason) 146 Jungle, The (Upton Sinclair) 57 Independence Day (Richard Ford) 147 Just, Ward 146 Indian Killer (Sherman Alexie) 155 “Just Off Main Street” (Elmaz Abinader) 158 Indian Lawyer, The (James Welch) 119 Infinite Jest (David Foster Wallace) 139 Kate Vaiden (Reynolds Price) 114 “in Just -” (Edward Estlin Cummings) 70 Kelly, Brigit Pegeen 126 Interesting Narrative of the Life of Olaudah Equano, or ­ Kenan, Randall 148 Gustavas Vassa, the African, The (Olaudah Equiano) 15 Kennedy, William 114, 143 Interpreter of Maladies (Jhumpa Lahiri) 157 Kerouac, Jack 50, 81, 89, 103, 109, 159 In the Boom Boom Room (David Rabe) 122 Kesey, Ken 110, 150 In the Heart of the Heart of the Country (William Gass) 110 Key Into the Languages of America, A (Roger Williams) 12 In the Loyal Mountains (Rick Bass) 151 Kincaid, Jamaica 118, 155, 156 In the Night Season (Richard Bausch) 145 King, Martin Luther, Jr. 32, 109, 149 Invisible Man (Ralph Ellison) 103, 104 King, Stephen 44, 143 “Irises” (Li-Young Lee) 129 Kingsolver, Barbara 152 Iron Heel, The (Jack London) 57 Kingston, Maxine Hong 96, 97, 115, 118, 153 Ironweed (William Kennedy) 114 143 “Kitchenette Building” (Gwendolyn Brooks) 83 Irving, John 114 Kitchen God’s Wife, The (Amy Tan) 118 Irving, Washington 16, 17, 23, 24-25, 26, 35 Kite Runner, The (Khaled Hosseini) 138 I Sailed With Magellan (Stuart Dybek) 149 Kizer, Carolyn 92 Knight, Sarah Kemble 11, 27 Koch, Kenneth 90

171 ÍNDICE

Komunyakaa, Yusef 127, 135-136 Locked Room, The (Paul Auster) 144 Krik? Krak! (Edwidge Danticat) 156 Lolita (Vladimir Nabokov) 107 Kumin, Maxine 92, 132 London, Jack 49, 55, 56, 57, 153 Kushner, Tony 141 Lonely Crowd, The (David Riesman) 103 Kyger, Joanne 88 Lone Ranger and Tonto Firstfight in Heaven, The (Sherman Alexie) 155 La Casa de los Espíritus (Isabel Allende) 157 Lonesome Dove (Larry McMurtry) 151 Lahiri, Jhumpa 157 Long and Happy Life, A (Reynolds Price) 114 Land of Unlikeness (Robert Lowell) 83 Long Day’s Journey Into Night (Eugene O’Neill) 80 “Language” Poetries: An Anthology (Douglas Messerli, ed.) 97 Longfellow, Henry Wadworth 34-35 Last of the Menu Girls, The (Denise Chavez) 152 Longstreet, Augustus 51 Last Picture Show, The (Larry McMurtry) 151 Look Homeward, Angel (Thomas Wolfe) 113 Last Voyage of Somebody the Sailor, The (John Barth) 112 Loon Lake (E.L. Doctorow) 115 Latin Deli, The (Judith Ortiz Cofer) 156 Lorde, Audre 92, 96, 145 Lauterbach, Ann 124 Lord Weary’s Castle (Robert Lowell) 83 Leaf and the Cloud, The (Mary Oliver) 133 Lost in the Funhouse (John Barth) 111 Leaning Tower, The (Katherine Anne Porter) 102 Lovecraft, H.P. 44 Leather-Stocking Tales (James Fenimore Cooper) 26, 38 Love Medicine (Thomas McGuane) 119 Leave It to Me (Bharati Mukherjee) 157 “Love Song of J. Alfred Prufrock, The” (T.S. Eliot) 66 Leaves of Grass (Walt Whitman) 32, 33, 69 Lowell, Amy 65 Leaving Cheyenne (Larry MCMurtry) 151 Lowell, James Russell 34, 35, 52 Leavitt, David 141 Lowell, Robert 82, 83-84, 85, 88, 92, 123, 124, 160 Lee, Chang-rae 157, 158 “Luck of Roaring Camp, The” (Bret Harte) 52 Lee, Li-Young 129-130 Lucky Spot, The (Beth Henley) 142 “Legend of Sleepy Hollow, The” (Washington Irving) 24 Lucy (Jamaica Kincaid) 156 Legends of the Fall (Jim Harrison) 150 “Luke Havergal” (Edwin Arlington Robinson) 59 Leithauser; Brad 98 Less Than Zero (Bret Easton Ellis) 115 MacDonald, John D. 44 “Letter from a Region of My Mind” (James Baldwin) 104 Macdonald, Ross 44 Letters (John Barth) 111 Machine Dreams (Jayne Anne Phillips) 146 Letters from an American Farmer Madwoman in the Attic, The (Hector St. John de Crèvecoeur) 20 (Sandra Gilbert andsusan Gubbar) 92 Let the Dead Bury Their Dead (Randall Kenan) 148 Maggie: A Girl of the Streets (Stephen Crane) 49, 56 Levertov, Denise 88, 92 Magic Barrel, The (Bernard Malamud) 106 Levine, Lawrence 118 Magnalia Christi Americana (Cotton Mather) 12 Levine, Philip 84, 86-87, 135 Mailer, Norman 99, 109, 111, 112, 115, 118, 161 Lewis, Meriwether 23 Main Street (Sinclair Lewis) 75 Lewis, Sinclair 62, 71, 74, 75, 76, 77, 148 Main-Travelled Roads (Hamlin Garland) 57, 58 Libra (Don DeLillo) 144 Malamud, Bernard 103, 106, 118 Lie Down in Darkness (William Styron) 115 Maltese Falcon, The (Hammett, Dashiell) 101 Life on the Mississippi (Mark Twain) 51 Mambo Kings Play Songs of Love, The (Oscar Hijuelos) 118 Life Studies (Robert Lowell) 84 Mamet, David 121-122 “Ligeia” (Edgar Allan Poe) 43 “Management of Grief, The” (Bharati Mukherjee) 157 Light in August (William Faulkner) 74 ManifestA (Jennifer Baumgardner and Amy Richards) 139 Lim, Shirley Geok-lin 129, 158 Man in the Gray Flannel Suit, The (Sloan Wilson) 103 Lindsay, Vachel 58-59 Man Made of Words, The (N. Scott Momaday) 152 Literature of Their Own, A (Elaine Showalter) 92 Manor, The (Isaac Bashevis Singer) 107 Little Foxes, The (Lillian Hellman) 101 Mansion, The (William Faulkner) 74 Little Green Men (Christopher Buckley) 146 Ma Rainey’s Black Bottom (August Wilson) 122 “Little Rabbit Dead in the Grass, A” (Mark Doty) 130 Marble Faun, The (Nathaniel Hawthorne) 40 Live or Die (Anne Sexton) 85 “Marriage” (Gregory Corso) 89 Lives of the Heart, The (Jane Hirshfield) 132 Marrow of Tradition, The (Charles Waddell Chesnutt) 61 Living, The (Annie Dillard) 155 Marshall, Paule 155

172 ÍNDICE

Martin Eden (Jack London) 49, 56, 59 Momaday, N. Scott 116, 147, 149 Mason, Bobbie Ann 138, 146 Mommy Myth, The (Susan Douglas and Meredith Michaels) 139 Mason & Dixon (Thomas Pynchon) 111 Mona in the Promised Land (Gish Jen) 153 Masters, Edgar Lee 58, 59 Month of Sundays, A (John Updike) 108 Mather, Cotton 11, 12 Moody, Rick 143 Mating (Norman Rush) 153 Moon Lake (Eudora Welty) 102 M. Butterfly (David Henry Hwang) 118 Moore, Lorrie 141 McCarthy, Cormac 147 Moore, Marianne 70, 87 McCarthy, Mary 143 Mora, Pat 151 McCorkle, Jill 147 Morales, Aurora Levins 156 McCourt, Frank 140, 143 Mori, Toshio 153 McDermott, Alice 143,145 Morrison, Toni 48, 78 116-117, 118 McGuane, Thomas 150 Morse, Jedediah 23 McInerney, Jay 112, 144 Mosquito Coast, The (Paulo Theroux) 114 McKay, Claude 71 Mourning Becomes Electra (Eugene O’Neill) 80 McMurtry, Larry 150, 151 Moviegoer, The (Walker Percy) 114 McPherson, James Alan 148 Mr. Ives’ Christmas (Oscar Hijuelos) 156 McPherson, Sandra 130 Mr. Sammler’s Planet (Saul Bellow) 105 Meadowlands (Louise Glück) 127 Mr. Spaceman (Robert Olen Butler) 149 Medea (Robinson Jeffers) 70 Mukherjee, Bharati 156-157 Mehta, Ved 140 “Mule Heart” (Jane Hirshfield) 131 Melville, Herman 10, 16, 24, 25, 26, 29, 34, 38, 39, 40-42, 43, 51 Mules and Men (Zora Neale Hurston) 78 Memoirs of a Geisha (Arthur Golden) 138 Mullen, Harryette 148 Mencken, H.L. 23 Mumbo Jumbo (Ishmael Reed) 147 Merrill, James 82 Murray, Judith Sargent 27 Merwin, W.S. 91, 124 Muse & Drudge (Harryette Mullen) 148 Messerli, Douglas 97 Museums and Women (John Updike) 108 Metrical History of Christianity (Edward Taylor) 10 Music School, The (John Updike) 108 Mexico City Blues (Jack Kerouac) 109 My Alexandria (Mark Doty) 130 M’Fingal (John Ttumbull) 22 My Antonia (Willa Cather) 60 Miami and the Siege of Chicago (Norman Mailer) 112 My Kinsman, Major Molineux (Nathaniel Hawthorne) 40 Michaels, Meredith 139 My Life (Lyn Hejinian) 124 Mickelson’s Ghosts (John Gardner) 116 My Life As a Man (Philip Roth) 112 Middleman and Other Stories, The (Bharati Mukherjee) 157 “My Lost Youth” (Henry Wadsworth Longfellow) 35 Middle Passage (Charles Johnson) 149 Mysteries of Pittsburgh, The (Michael Chabon) 146 Middlesex (Jeffrey Eugenides) 143 Misteries of Winterhurn (Joyce Carol Oates) 116 “Midnight Consultation, A” (Philip Freneau) 23 Myths and Texts (Gary Snyder) 84 Millay, Edna St. Vincent 92 Miller, Arthur 99, 100-101, 103, 118, 122 Nabokov, Vladimir 107, 110 Miller, sue 143 Nafisi, Azar 138 Millett, Kate 92, 112 Naked and the Dead, The (Norman Mailer) 99 Mills, C. Wright 103 Naked Lunch, The (William Burroughs) 89 Mills of the Kavanaughs, The (Robert Lowell) 83 Namesake, The (Jhumpa Lahiri) 157 Minh-Ha, Trinh 158 Narrative of Arthur Gordon Pym (Edgar Allan Poe) 38 Minister’s Black Veil, The (Nathaniel Hawthorne) 40 Narrative of Sojourner Truth (Olive Gilbert, ed.) 45 “Miniver Cheevy” (Edwin Arlington Robinson) 59 Narrative of the Life of Frederick Douglass, An American Slave Mirikitani, Janice 93, 96 (Frederick Douglass) 48 Miss Firecracker Contest, The (Beth Henley) 142 Native Son (Richard Wright) 77 155 Mistress of Spices, The (Chitra Banerjee Divakaruni) 157 Native Speaker (Chang-rae Lee) 157 Moby-Dick; or The Whale (Herman Melville) 8, 36, 37, 38-40, 146 Natural, The (Bernard Malamud) 106 Modern Chivalry (Hugh Henry Brackenridge) 20 Nature (Ralph Waldo Emerson) 30 Modern Instance, A (William Dean Howells) 51 Naylor, Gloria 145 Mohr, Nicholasa 153 Necromance (Rae Armantrout) 124

173 ÍNDICE

Negative Blue (Charles Wright) 127 O’Neill, Eugene 71, 79-80 “Negro Speaks of Rivers, The” (Langston Hughes) 71 On Moral Fiction (John Gardner) 116 “Neighbour Rosicky” (Willa Cather) 60 On the Road (Kack Kerouac) 50, 103, 109 Neon Vernacular (Yusef Komunyakaa) 136 “Open Boat, The” (Stephen Crane) 56 Nepantla: Essays From the Land in the Middle Opening of the American Mind, The (Lawrence Levine) 118 (Sandra Cisneros) 151 O Pioneers! (Willa Cather) 60 New American Poetry, The (Donald Allen) 88 Oppenheimer, Joel 88 New and Selected Poems (Mary Oliver) 132 Optimist’s Daughter, The (Eudora Welty) 102 “New Black Aesthetic, The” (Trey Ellis) 145 Organization Man, The (William Whyte) 103 New Criticism, The (John Crowe Ransom) 79 Ormond (Charles Brockden Brown) 24 New Life, A (Bernard Malamud) 106 Orphan, The (David Rabe) 121 “New Poem, The” (Charles Wright) 91 Ortiz, Simon 93, 94, 127 Next Year in Cuba (Gustavo Pérez Firmat) 155 Orwell, George 57 Nickel Mountain (John Gardner) 116 Our Nig (Harriet Wilson) 47-48 Nine Gates: Entering the Mind of Poetry (Jane Hirshfield) 131 Our Town (Thornton Wilder) 80 Nine Stories (J.D. Sallinger) 109 “Outcasts of Poker Flat, The” (Bret Harte) 52 1984 (George Orwell) 57 “Out of the Cradle Endlessly Rocking” (Walt Whitma 33 1919 (John Dos Passos) 75 Outre-Mer (Henry Wadsworth Longfellow) 35 Nobody Knows My Name (James Baldwin) 104 Oxherding Tale (Charles Johnson) 149 Noon Wine (Katherine Anne Porter) 102 Ozick, Cynthia 144 Norris, Frank 55, 57 Norton Anthology of Literature by Women, The ­ Packard, Vance 103 (Sandra Gilbert and Susan Gubar) 92 Packer, ZZ 147 Notebook, 1967-68 (Robert Lowell) 84 Paine, Thomas 21 Pale Fire (Vladimir Nabokov) 107 O Albany! (William Kennedy) 143 Pale Horse, Pale Rider (Katherine Anne Porter) 102 Oates, Joyce Carol 99,116, 142 Paley, Grace 144 “O Black and Unknown Bards” (James Weldon Johnson) 61 Palmer, Michael 97 O’Connor, Flannery 102, 104-105, 117 Papers on Art and Literature (Margaret Fulller) 36 October Light (John Gardner) 114, 116 Parable of the Sower (Octavia Butler) 148 Octopus, The (Frank Norris) 57 Paradise (Toni Morrison) 117 Odets, Clifford 74, 80 Park City (Ann Beattie) 140 Of Mice and Men (John Steinbeck) 76 Parks, Suzan-Lori 142 “Of Mr. Booker T. Washington and Others” (W.E.B. Du Bois) 61 Parts of a World (Wallace Stevens) 67 Of Plymouth Plantation (William Bradford) 8 Paterson (William Carlos Williams) 69, 77 O’Hara, Frank 90, 120,134 Patrimony: A True Story (Philip Roth) 113 O’Hara, John 103-104 Pearl of Orr’s Island, The (Harriet Beecher Stowe) 52 “Old Ironsides” (Oliver Wendell Holmes) 35 Pentimento (Lillian Hellman) 101 Old Man and the Sea, The (Ernest Hemingway) 73, 74 Percy, Walker 114 Old Money (Wendy Wasserstein) 142 Perelman, Bob 97 Old Neighborhood, The (David Mamet) 121 Pérez Family, The (Christine Bell) 155 Olds, Sharon 128 Perfect Recall (Ann Beattie) 140 Oleanna (David Mamet) 121 “Persimmons” (Li-Young Lee) 129 Oliver, Mary 132-133 “Peter Quince at the Clavier” (Wallace Stevens) 68 Olsen, Tillie 150 Phillips, Jayne Anne 146 Olson, Charles 88 Piano Lesson, The (August Wilson) 122 Omensetter’s Luck (William Gass) 110 Picture Bride (Cathy Song) 96 “On Being Brought from Africa to America” Pictures of Fidelman (Bernard Malamud) 106 (Phillis Wheatley) 27 Picturing Will (Ann Beattie) 145 On Being Female, Black and Free (Margaret Walker) 147 Pigs in Heaven (Barbara Kingsolver) 151 On Boxing (Joyce Carol Oates) 116 Pike, Zebulon 23 Once Upon a Time: A Floating Opera (John Barth) 111 Pilgrim at Tinker Creek (Annie Dillard) 154 One Flew Over the Cuckoo’s Nest (Ken Kesey) 110 “Pilot of Hatteras, The” (Philip Freneau) 23

174 ÍNDICE

Pinsky, Robert 134-135 Red Badge of Courage, The (Stephen Crane) 56 Pioneers, The (James Fenimore Cooper) 25 Redeemed Captive, The (John Williams) 11 Plainsong (Kent Haruf) 148 Red Tent, The (Anita Diamant) 143 Plath, Sylvia 84-85, 87, 92 “Red Wheelbarrow, The” (William Carlos Williams) 68 Platitudes (Trey Ellis) 145 Reed, Ishmael 96, 117, 147, 152 Playing in the Dark (Toni Morrison) 117 Region Not Home, A (James Alan McPherson) 147 Pnin (Vladimir Nabokov) 107 Rembrandt’s Hat (Bernard Malamud) 106 Poe, Edgar Allan 16, 24, 29, 34, 38, 42-44, 115 Reservation Blues (Sherman Alexie) 154 “Poet, The” (Ralph Waldo Emerson) 28, 33 Resurrection, The (John Gardner) 116 Poisonwood Bible, The (Barbara Kingsolver) 151 Rexroth, Kenneth 88, 89 “Political Litany, A” (Philip Freneau) 22 Rhys, Jean 155 Poor Richard’s Almanack (Benjamin Franklin) 18 Rice, Anne 138 “Poppies” (Mary Oliver) 133 Rich, Adrienne 83, 84, 87-88, 118 Porter, Katherine Anne 99, 101-102, 105 “Richard Cory” (Edwin Arlington Robinson) 59 Portnoy’s Complaint (Philip Roth) 112 Richards, Amy 139 Portrait of a Lady, The (Henry James) 54 Richman, Robert 98 Possessing the Secret Joy (Alice Walker) 118 Riesman, David 103 Pound, Ezra 62, 65, 68, 73, 83, 91, 92 Right Here, Right Now (Trey Ellis) 145 Power (Linda Hogan) 151 Right Stuff, The (Tom Wolfe) 110 Power Elite, The (C. Wright Mills) 103 Rios, Alberto 93, 94, 126 Powers, Richard 140, 149 “Rip Van Winkle” (Washington Irving) 24 “Premature Burial, The” (Edgar Allan Poe) 43 Rise of Silas Lapham, The (William Dean Howells) 53 Price, Reynolds 114 Rituals of Survival (Nicholasa Mohr) 156 Price, The (Arthur Miller) 100 “River of Bees, The” (W.S. Merwin) 124 Pricksongs & Descants (Robert Coover) 110 Road Home, The (Jim Harrison) 150 Princess Sasamassima, The (Henry James) 54 Road to Wellville, The (T. Coraghessan Boyle) 153 Problems (John Updike) 108 Roan Stallion (Robinson Jeffers) 70 Promise of Rest, The (Reynolds Price ) 114 Roberts, Nora 138 Proulx, Annie 143 Robinson, Edwin Arlington 31, 59 Public Burning, The (Robert Coover) 110, 114 Robinson, Marilynne 154 “Purloined Letter, The” (Edgar Allan Poe) 43 Rock Garden, The (Sam Shepard) 120 Puttermesser Papers, The (Cynthia Ozick) 144 Rock Springs (Richard Ford) 141 Pynchon, Thomas 99, 107, 110-111, 112, 115, 140, 143, 149, 153 Rodriguez, Luis 153 Rodriguez, Richard 153 Quasha, George 97 Roethke, Theodore 84, 86 Rogers, Pattiann 132 Rabbit, Run (John Updike) 108 Roger’s Version (John Updike) 108 Rabbit at Rest (John Updike) 108 “Roofwalker, The” (Adrienne Rich) 87 Rabbit Is Rich (John Updike) 108 Rose (Li-Young Lee) 129 Rabbit Redux (John Updike) 108 Roth, Philip 103, 112-113, 118 Rabbit Remembered (John Updike) 108 Rowlandson, Mary 11-12 Rabe, David 121-122 Rowson, Susanna 27 Radical Chic & Mau-Mauing the Flak Catchers (Tom Wolfe) 110 Rush, Norman 152 Ragtime (E.L. Doctorow) 114 Russo, Richard 142 Raise High the Roof-Beam, Carpenters (J.D. Sallinger) 109 Raisin in the Sun, A (Lorraine Hansberry) 103 S. (John Updike) 108 Ralph Waldo Emerson (Oliver Wendell Holmes) 35 Sabbatical: A Romance (John Barth) 111 Ransom, John Crowe 78, 79 82 Sacred Wood, The (T.S. Eliot) 66 Ravelstein (Saul Bellow) 105 Sailing Alone Around the Room (Billy Collins) 134 “Raven, The” (Edgar Allan Poe) 43 Salinas, Luis Omar 94 Reading Lolita in Teheran (Azar Nafisi) 138 Salinger, J.D. 103, 108-109 Reasons to Live (Amy Hempel) 141 Same Door, The (John Updike) 108 Reason Why, The (Arthur Miller) 101 Sandburg, Carl 58

175 ÍNDICE

Santos, Bienvenido 157 “Snows of Kilimanjaro, The” (Ernest Hemingway) 73 Scalapino, Leslie 124 Snyder, Gary 84, 88, 131 Scarlet Letter, The (Nathaniel Hawthorne) 10, 38, 39 “Some Considerations on the Keeping of Negroes” Scent of Apples (Bienvenido Santos) 157 (John Woolman) 13 Schnackenberg, Gjertrud 92, 98, 134 Some People, Places, and Things That Will Not Appear in ­ Schwerner, Armand 97 My Next Novel (John Cheever) 107 Scoundrel Time (Lillian Hellman) 101 Something To Remember Me By (Saul Bellow) 105 Seascape (Edward Albee) 119 Song, Cathy 93, 96 Sea-Wolf, The (Jack London) 50, 56 “Song of Hiawatha, The” (Henry Wadsworth Longfellow) 35 Seize the Day (Saul Bellow) 103, 106 “Song of Myself” (Walt Whitman) 33 Self-Help (Lorrie Moore) 141 Song of Solomon (Toni Morrison) 117 Self-Portrait in a Convex Mirror (John Ashbery) 90 Son of the Wolf, The (Jack London) 56 “Self-Reliance” (Ralph Waldo Emerson) 30 “Soonest Mended” (John Ashberry) 124 Sent for You Yesterday (John Edgar Wideman) 145 Sophie’s Choice (William Styron) 115 “Seven Dreams: A Book of North American Landscapes” (Wil­ Soto, Gary 93, 94 liam Vollmann) 153 Sot-Weed Factor, The (John Barth) 111 Seven Guitars (August Wilson) 122 Souls of Black Folk, The (W.E.B. Du Bois) 61 Sewall, Samuel 11 Sound and the Fury, The (William Faulkner) 64, 74 Sex and the City (Candace Bushnell) 139 Source (Mark Doty) 130 Sexton, Anne 84, 85, 92 Spahr, Juliana 137 Sexual Politics (Kate Millett) 92, 112 Speed-the-Plow (David Mamet) 121 Shame of the Cities, The (Lincoln Steffens) 57 Spelling Book (Noah Webster) 23 Shapard, Robert 141 Spicer, Jack 88 Shaw, Irwin 99 Spoon River Anthology (Edgar Lee Masters) 58 Shawl, The (Cynthia Ozick) 144 Sporting Club, The (Thomas McGuane) 150 Shepard, Sam 120-121 Sportswriter, The (Richard Ford) 147 “Shiloh”(Bobbie Ann Mason) 146 Spy, The (James Fenimore Cooper) 17 Shiloh and Other Stories (Bobbie Ann Mason) 141 Stanton, Elizabeth Cady 45 Ship of Fools (Katherine Anne Porter) 102 “Star Quilt” (Roberta Hill Whiteman) 94 Shipping News, The (Annie Proulx) 143 Status Seekers, The (Vance Packard) 103 “Short Happy Life of Francis Macomber, The” Steffens, Lincoln 57 (Ernest Hemingway) 73 Stegner, Wallace 149 Showalter, Elaine 92 Stein, Gertrude 62, 63, 64, 73, 77 Silent Dancing (Judith Ortiz Cofer) 156 Steinbeck, John 63, 69, 74, 75, 152 Silko, Leslie Marmon 93 94, 118, 132, 152 Stevens, Wallace 31, 67-68, 91 Simic, Charles 91, 133 Sticks and Bones (David Rabe) 121 Simpson, Mona 149 Still Life With Oysters and Lemon (Mark Doty) 130 Sinclair, Upton 55, 57, 75 Stolen Light, The (Ved Mehta) 140 Singer, Isaac Bashevis 103, 106-107, 118 Stone, Robert 150 “Sinners in the Hands of an Angry God” (Jonathan Edwards) 14 “Stopping By Woods on a Snowy Evening” (Robert Frost) 67 Sister of My Heart (Chitra Banerjee Divakaruni) 157 Story of My Life (Jay McInerney) 144 Sisters Rosensweig, The (Wendy Wasserstein) 142 Stowe, Harriet Beecher 44, 46-47, 52 Situation of Poetry, The (Robert Pinsky) 135 Strand, Mark 91, 133 Sketch Book of Geoffrye Crayon (Washington Irving) 24 Strange Interlude (Eugene O’Neill) 79, 80 Skin of Our Teeth, The (Thornton Wilder) 80 Streetcar Named Desire, A (Tennessee Williams) 101 Slaughterhouse-Five (Kurt Vonnegut, Jr.) 99 Strong Measures (Philip Dacey and David Jauss, eds.) 98 Slaves of New York (Tama Janowitz) 114 Strong Motion (Jonathan Franzen) 149 Slouching Towards Bethlehem (Joan Didion) 153 Styron, William 115 Smiley, Jane 148 Sudden Fiction (Robert Shapard and James Thomas, eds.) 141 Smith, Lee 146 Sula (Toni Morrison) 117 Smoke Signals (Sherman Alexie) 154 Summer (Edith Wharton) 55 “Snow Bound” (John Greenleaf Whittier) 36 Sun Also Rises, The (Ernest Hemingway) 63, 73 Snow Falling on Cedars (David Guterson) 154 “Sunday Morning” (Wallace Stevens) 68

176 ÍNDICE

Sunlight Dialogues, The (John Gardner) 116 Topdog/Underdog (Suzan-Lori Parks) 142 Suttree (Cormac McCarthy) 147 Tortilla Flat (John Steinbeck) 76 Swarm (Jorie Graham) 126 “To S.M., a Young African Painter, on Seeing His Works” Swenson, May 92 (Phillis Wheatley) 27 Sze, Arthur 131 Total Syntax (Barret Watten) 97 “To the Engraver of My Skin” (Mark Doty) 130 Tabloid Dreams (Robert Olen Butler) 149 Toughest Indian in the World, The (Sherman Alexie) 154 Takaki, Ronald 118 Tower Beyond Tragedy, The (Robinson Jeffers) 70 Tales of the Grotesque and Arabesque (Edgar Allan Poe) 44 Town, The (William Faulkner) 74 Tales of the Jazz Age (F. Scott Fitzgerald) 72 Transatlantic Sketches (Henry James) 53-54 Tamar (Robinson Jeffers) 70 Triumph of Achilles, The (Louise Glück) 126 Tan, Amy 118, 152 Tropic of Orange (Karen Tei Yamashita) 153 Tar Baby (Toni Morrison) 117 Trout Fishing in America (Richard Brautigan) 110 Tarbell, Ida M. 57 True and Historical Narrative of the Colony of Georgia, A 15 Tate, Allen 78, 82, 113 True West (Sam Shepard) 120, 121 Taylor, Edward 9-10 Trumbull, John 22 “Teeth Mother Naked at Last, The” (Robert Bly) 91 Truth, Sojourner 45-46 Tell My Horse (Zora Neale Hurston) 78 “Tuskegee Airmen, The” (Trey Ellis) 145 Tenants, The (Bernard Malamud) 106 Twain, Mark (Samuel Clemens) 25, 29, 35, 50-51, 53, 78 Tender Buttons (Gertrude Stein) 64 Twenty-Seventh City, The (Jonathan Franzen) 149 Tender is the Night (F. Scott Fitzgerald) 72 Two Cities (John Edgar Wideman) 145 Ten North Frederick (John O’Hara) 104 Two Dreams (Shirley Geok-lin Lim) 157 Tenth Muse Lately Sprung Up in America, The Two Trains Running (August Wilson) 122 (Anne Bradstreet) 9 Tyler, Anne 144-145 Their Eyes Were Watching God (Zora Neale Hurston) 79, 147 Tyler, Royall 22 Theroux, Paul 114 Typee (Herman Melville) 38, 40, 42 Thin Man, The (Dashiell Hammett) 101 Typical American (Gish Jen) 153 Third Life of Grange Copeland, The (Alice Walker) 118 Third World Women (Janice Mirikitani) 96 Uncle Tom’s Cabin (Harriet Beecher Stowe) 44, 46-47, 79 “Thirteen Ways of Looking at a Blackbird” (Wallace Stevens) 68 Uncle Tom’s Children (Richard Wright) 77 This Side of Paradise (F. Scott Fitzgerald) 63,72 Underworld (Don DeLillo) 144 Thomas, James 141 Unfinished Woman, An (Lillian Hellman) 101 Thomas and Beulah (Rita Dove) 95, 126 United States (Laurie Anderson) 97 Thoreau, Henry David 13, 16, 28, 29, 31-32, 34, 37, 52, 132, 154 Unknown Errors of Our Lives, The Thorpe, Thomas Bangs 51 (Chitra Banerjee Divakaruni) 157 Those the River Keeps (David Rabe) 122 Updike, John 103, 108, 113, 141, 143 Thousand Acres, A (Jane Smiley) 148, 149 Up From Slavery (Booker T. Washington) 60 Three Soldiers (John Dos Passos) 62 U.S.A. (John Dos Passos) 75, 114 Three Tall Women (Edward Albee) 119 Through and Through (Joseph Geha) 158 V (Thomas Pynchon) 110-111 Through the Arc of the Rain Forest (Karen Tei Yamashita) 153 Van Duyn, Mona 92 “Throwing Salt on a Path” (Arthur Sze) 131 Van Vechten, Carl 76 “Tide Rises, The Tide Falls, The”­ Van Wagener, Isabella (see Truth, Sojorner) (Henry Wadsworth Longfellow) 35 Vassa, Gustavus (see Equiano, Olaudah) Tidewater Morning, A (William Styron) 115 “Vegetable Air, The” (Cathy Song) 96 Tidewater Tales, The (John Barth) 111 Victim, The (Saul Bellow) 105 Timebends: A Life (Arthur Miller) 101 Villagrá, Gaspar Pérez de 93 Time to Greez (Janice Mirikitani, ed.) 96 Vineland (Thomas Pynchon) 111 Tiny Alice (Edward Albee) 119 Violent Bear It Away, The (Flannery O’Connor) 105 To Bedlam and Part Way Back (Anne Sexton) 85 Viramontes, Helena Maria 153 “To My Dear and Loving Husband” (Anne Bradstreet) 9 Virginia (Ellen Glasgow) 60 Too Far To Go (John Updike) 108 “Virtue of Tobacco, The” (Philip Freneau) 23 Toomer, Jean 76-77 Visitation of Spirits, A (Randall Kenan) 148

177 ÍNDICE

Vizenor, Gerald 149, 152 White Pine (Mary Oliver) 132 Voight, Ellen Bryant 135 Whitman, Walt 16, 32-33, 35, 50, 58, 124, 130 Vollmann, William 140, 153 Whittier, John Greenleaf 35-36, 52 Vonnegut Jr., Kurt 99 Who’s Afraid of Virginia Woolf? (Edward Albee) 119 “Voyages” (Hart Crane) 70 “Why I Work at the P. O.” (Eudora Welty) 102 Whyte, William 103 Waiting (Ha Jin) 155 Wideman, John Edgar 118, 145 Waiting for Lefty (Cllifford Odets) 78 Wide Net, The (Eudora Welty) 102 Wake of Janey Foster, The (Beth Henley) 142 Wide Sargasso Sea (Jean Rhys) 155 Walden, or, Life in the Woods (Henry David Thoreau) 31, 32, 40 Wieland (Charles Brockden Brown) 24 Walker, Alice 78, 99, 114, 117-118, 152 Wife of His Youth, The (Charles Waddell Chesnutt) 61 Walker, Margaret 147 Wogglesworth, Michael 10 Walking on Water (Randall Kenan) 148 Wilbur, Richard 82, 83 Wallace, David Foster 139, 143, 149 Wilder, Thornton 80 Want Bone, The (Robert Pinsky) 135 “Wild Honey Suckle, The” (Philip Freneau) 23 Wapshot Scandal, The (John Cheever) 108 Wild Iris, The ( Louise Glück) 127 “Warning, The” (Robert Creeley) 88 Wildlife (Richard Ford) 150 Warren, Mercy Otis 27 Wild Seed (Octavia Butler) 148 Warren, Robert Penn 78, 82, 83, 99, 100, 101, 102, 114 Williams, John 11 Washington, Booker T. 60-61 Williams, Jonathan 88 Wasserstein, Wendy 142 Williams, Roger 12 Waste Land, The (T.S. Eliot) 63, 66 Williams, Sherley Anne 148 Watch on the Rhine (Lillian Hellman) 101 Williams, Tennessee 99, 101 Waterworks, The (E. L. Doctorow) 115 Williams, William Carlos 64, 65, 68-69, 84, 92 Watkins, Gloria (see Hooks, Bell) Will You Please Be Quiet, Please? (Raymond Carver) 140 Watten, Barret 97 Wilson, August 118, 122 Way Some People Live, The (John Cheever) 107 Wilson, Harriet 47 Way to Rainy Mountain, The (N. Scott Momaday) 118 Wilson, Sloan 103 “Way to Wealth, The” (Benjamin Franklin) 18 Winesburg, Ohio (Sherwood Anderson) 57-78 Webster, Noah 17, 23 Wings of the Dove, The (Henry James) 54 Welch, James 119, 132, 151 Winter in the Blood (James Welch) 119 Welch, Lew 88 Winthrop, John 12 Welty, Eudora 99, 102, 105 Wise Blood (Flannery O’Connor) 105 West, Nathanael 105, 153 Wolf: A False Memoir (Jim Harrison) 150 Whalen, Phil 88 Wolfe, Thomas 109, 113 Wharton, Edith 54-55 Wolfe, Tom 115 “What Thou Lovest Well, Remains American” Woman, Native, Other (Trinh Minh-Ha) 158 (Richard Hugo) 86 Woman Hollering Creek and Other Stories What We Talk About When We Talk About Love (Sandra Cisneros) 151 (Raymond Carver) 140 Woman in the Nineteenth Century (Margaret Fuller) 36 Wheatley, Phillis 26, 27 Woman’s Bible, The (Elizabeth Cady Stanton) 45 When Dinah Shore Ruled the Earth (Wendy Wasserstein) 142 Woman Warrior, The (Maxine Hong Kingston) 118 “When Lilacs Last in the Dooryard Bloom’d” Women in Praise of the Sacred (Jane Hirshfield, ed.) 131 (Walt Whitman) 33 Women in Their Beds (Gina Berriault) 153 Where I’m Calling From (Raymond Carver) 140 Women of Brewster Place, The (Gloria Naylor) 145 Where I Was From (Joan Didion) 153 “Women of Dan Dance with Swords in Their Hands to Mark the Where the Bluebird Sings to the Lemonade Springs Time When They Were Warriors, The” (Audre Lorde) 96 (Wallace Stegner) 149-150 Woolman, John 13 Where the Sea Used To Be (Rick Bass) 150 Words for the Wind (Theodore Roethke) 86 White Collar, The (C. Wright Mills) 103 World According to Garp, The (John Irving) 114 ”White Heron, The” (Sarah Orne Jewett) 52 World of Apples, The (John Cheever) 107 Whiteman, Roberta Hill 94 “World Without Objects Is a Sensible Emptiness, A” White Noise (Don DeLillo) 139, 143 (Richard Wilbur) 82

178 ÍNDICE

Wouk, Herman 99 “Yellow Wallpaper, The” (Charlotte Perkins Gilman) 53 Wright, C.D. 127 ¡Yo! (Julia Alvarez) 156 Wright, Charles 91, 127-128 You Bright and Risen Angels: A Cartoon (Willaim Vollmann) 153 Wright, James 133 Youngest Doll (Rosario Ferré) 156 Wright, Richard 48, 74, 77, 155 “Young Goodman Brown” (Nathaniel Hawthorne) 38, 40 Writing From the New Coast: Technique “Young Housewife, The” (William Carlos Williams) 69 (Juliana Spahr and Peter Gizzi, eds.) 137 Young Lions, The (Irwin Shaw) 99 Writing Life, The (Annie Dillard) 140 Your Blues Ain’t Like Mine (Bebe Moore Campbell) 145

Yamamoto, Hisaye 153 Zami: A New Spelling of My Name (Andre Lorde) 145 Yamashita, Karen Tei 153 Zuckerman Bound (Philip Roth) 113

179 DEPARTAMENTO DE ESTADOS DOS EUA / ESCRITÓRIO DE PROGRAMAS DE INFORMAÇÕES INTERNACIONAIS http://www.america.gov

REVISED EDITION PERFIL DA LITERATURA AMERICANA

(book spine)