Daniel Andrés Raizman

A Justiça pósconflitual ante o regime civilmilitar brasileiro no período de 19641984

Rio de Janeiro 2009

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Daniel Andrés Raizman

A Justiça pósconflitual ante o regime civilmilitar brasileiro no período de 19641984

Tese apresentada, como requisito para obtenção do título de Doutor, ao Programa de PósGraduação da Faculdade de Direito, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Área de Concentração: Direito Internacional Público.

Orientador: Professor Doutor Carlos Eduardo Adriano Japiassu

Rio de Janeiro 2009

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CATALOGAÇÃO NA FONTE UERJ / REDE SIRIUS / BIBLIOTECA CCS/C

Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta tese.

______Assinatura Data

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Daniel Andrés Raizman

A Justiça pósconflitual ante o regime civilmilitar brasileiro no período de 19641984

Tese apresentada, como requisito para obtenção do título de Doutor, ao Programa de PósGraduação da Faculdade de Direito, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Área de Concentração: Direito Internacional Público.

Aprovado em: ______

Banca Examinadora: ______

______Prof. Dr. Carlos Eduardo Adriano Japiassú (Orientador) Faculdade de Direito da UERJ

______Prof. Dr. Nilo Batista Faculdade de Direito da UERJ

______Prof. Dr. Jorge Luís Fortes Pinheiro da Câmara Faculdade de Direito da UERJ

______Prof. Dr. Eduardo Val Faculdade de Direito da UFF

______Prof. Dra. Vera Malaguti Batista Faculdade de

Rio de Janeiro 2009

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A mi querida esposa Fernanda Freixinho, minha paixão, por acompañarme en mis proyectos, sacrificando por veces los suyos, y, en especial, por apoyarme y ayudarme desde la trinchera en la realización de este trabajo, hasta inclusive, en el momento especial en que culmina.

A Maria Clara, por el tiempo que le robé para poder terminar este trabajo, aprovechando de su inocencia, y por mis lapsos de impaciencia cuando demandaba mi presencia; pero al mismo tiempo para registrar lo duro que fue poder abstraerme de su dulce sonrisa; ese ha sido, sin dudas, el sacrificio más fuerte que tuve en todo mi tiempo de estudios.

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Agradecimentos

O presente trabalho sintetiza o final de uma etapa difícil não só no plano acadêmico, senão também no profissional e pessoal. Tenho a sorte de que na Banca estejam presentes pessoas muito importantes para mim e também muito queridas e que então, neste trabalho possa retribuir suas generosidades. O professor Nilo deume a oportunidade de vir ao Rio, no ano de 2001, além de ter o privilégio de suas aulas individuais, nas reuniões periódicas por ocasião das atividades referentes ao seu livro de direito penal. Foi o meu orientador no mestrado em Ciências Penais realizado na UCAM. O mestrado foi essencial, não só pelo conteúdo curricular senão por ter apresentado um sonho, que se foi concretizando ao longo do tempo. Sem o professor Eduardo Val não teria conseguido me inserir no Rio de Janeiro, e sem esse apoio inicial, muito possivelmente minha vida não teria continuado nesta maravilhosa cidade, e para quem não o sabe, talvez não teria podido formar a maravilhosa família que tenho. O professor Carlos Eduardo Japiassú, desinteressadamente sempre, me ajudou nos momentos difíceis, e com ele consegui concretizar, dentre outros, o projeto de doutorado, cujo apoio e orientação foi essencial desde o momento mesmo da elaboração do projeto, isto é antes da iniciação do curso. O tema, e o seu desenvolvimento, não poderia ter sido realizado sem o seu apoio substancial, no qual, não poupou idéias, bibliografia e tudo quanto esteve ao seu alcance. O professor Antonio Celso, apoiou o projeto sabidamente crítico, e sem esse apoio não poderia ter realizado o curso. Assim mesmo não poderia deixar de agradecer suas aulas que mostraram um universo até esse momento por mim desconhecido e que influenciou de forma relevante o desenvolvimento do curso, até no próprio objeto do trabalho. A professora Vera, temme acolhido no ano de 2001 e acompanhado desde então os meus passos. Dela agradeço muitíssimo suas orientações em favor de uma visão interdisciplinar do direito.

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Não poderia deixar de considerar os meus dois grandes mestres os professores Raúl Zaffaroni e Alejandro Slokar, pois, eles me formaram, desde o início na minha saudosa Casa de Estudos, me iniciaram na atividade acadêmica e me deram o conhecimento e oportunidades necessárias para reconhecer minha própria liberdade. Também gostaria de agradecer à professora Bethania Assi, pela generosa troca de idéias nas suas aulas sensacionais, que influenciaram sobremaneira na minha forma de pensar o direito. Finalmente, gostaria de agradecer à professora Fernanda Freixinho, primeiro pela força, principalmente, nos momentos em que achei que sua finalização era impossível, depois para ampliar minha tolerância à frustração, em especial no momento das críticas e, por ter realizado a correção, formatação pesquisa bibliográfica, etc., aportes essenciais, sem os quais o trabalho não teria chegado ao término. Para todos vocês, minha gratidão é infinita.

Daniel Andrés Raizman

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Resumo

O presente trabalho aborda as respostas pósconflituais ao último regime cívicomilitar no Brasil (19641984). Para tal fim é apresentado, de forma sumária, o contexto em que é realizada a quebra da ordem constitucional como passo prévio para compreender a resposta escolhida ante a situação conflituante, motivada pelas graves violações de direitos humanos ocorridas no regime cívicomilitar. São esclarecidas as respostas pósconfltuais escolhidas pela classe política como forma de responder a esse passado de violações de direitos humanos, tomando em consideração a necessidade de conciliar a sociedade brasileira. Nessa ordem, são analisados os tipos de respostas segundo os modelos decisórios possíveis, destacando as respostas reparadoras, conciliadoras e punitivas, em função da capacidade destas pra solucionar, suspender ou suprimir conflitos. Em tal sentido é observado que o Brasil tem optado em favor de respostas conciliadoras e reparadoras, menosprezando as respostas punitivas, o que permitiu gradativamente a redução do emprego da violência, porém garantindo a impunidade por graves violações de direitos humanos. Assim mesmo, é realizado um estudo comparativo das respostas oferecidas nos países da região (, Chile Paraguai e Uruguai) a fim de avaliar se a resposta oferecida pelo Brasil encontrase contextualizada com as respostas adotadas nos países da região, que enfrentaram situações da mesma natureza.

Palavras chave: Direitos humanos – pósconflitos de justiça – violência.

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Resumen

El presente trabajo aborda las respuestas pósconflictuales del último régimen cívicomilitar en el Brasil (19641984). Para tal fin es presentada de forma resumida el contexto em que fue realizado el quiebre del orden constitucional como paso previo para comprender la respuestas elegida ante la situación de conflicto motivada por las graves violaciones de derechos humanos ocurrida en el régimen cívicomilitar. Son esclarecidas as respuestas postconflictuales escogidas por la clase política como forma de responder al pasado de violaciones de derechos humanos, tomando en consideración la necesidad de conciliar la sociedad brasilera. En tal sentido, son analizados los tipos de respuestas según los modelos decisorios posibles, destacando las respuestas reparadoras, conciliadoras y punitivas, en función de la capacidad de estas para solucionar, suspender o suprimir conflictos. En tal sentido es observado que Brasil ha optado a favor de respuestas conciliadoras y reparadoras, menospreciando las respuestas punitivas, circunstancia que permitió gradualmente la reducción del empleo de violencia, aunque garantizando por causa de eso, la impunidad de graves violaciones de derechos humanos. Asimismo, es realizado un estudio comparativo de las respuestas ofrecidas en los países de la región (Argentina, Chile, Paraguay y Uruguay), a fin de analizar se la respuesta ofrecida por Brasil se encuentra contextualizada con las adoptadas en la región para situaciones de la misma naturaleza.

Palabras claves: Derechos humanos – postconflictos de justicia – violencia

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 12 Apresentação do tema 12 Problemática e hipótese de trabalho 13 Plano de trabalho 14 Metodologia 16

CAPÍTULO I DIREITOS HUMANOS. SUA INCLUSÃO NO DIREITO BRASILEIRO 17

1. Introdução 17 2. Ponto de partida 27 2.1. Cosmopolitanismo vs. realismo 27 2.2. Sociedades de estados vs. estados 28 2.3. Universalismo vs. relativismo cultural 29 2.4. Sobre o conceito de direitos humanos 31 2.5. Poder vs. violência 34 2.6. Opção discursiva da punição 39 3. Direitos humanos como objeto de reconhecimento e/ou proteção. 45 4. Vias de reconhecimento e proteção dos direitos humanos. 48 5. Sistema de Direitos Humanos no Brasil 52 5.1. Introdução 52 5.2. Dualismo vs. monismo 54 5.3. Tratados de direitos humanos vs. direito interno. 56 5.4. A emenda Constitucional n. 45. 64 5.5. Princípio da primazia da norma mais favorável à vítima. 65 5.6. Disposições de Tratados Internacionais de Direitos Humanos consideradas no trabalho 67

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CAPÍTULO II JUSTIÇA PÓSCONFLITUAL 71

1. Introdução 71 2. Desenvolvimento da Justiça pósconflitual 75 3. Os Princípios de Chicago sobre Pósconflitos de justiça 77 4. Enunciados dos princípios de Chicago sobre justiça pósconflitual 79 Primeiro Princípio 79 Segundo Princípio 86 Terceiro Princípio 88 Quarto Princípio 90 Quinto Princípio 91 Sexto Princípio 94 Sétimo Princípio 95 5. Observações Gerais 96

CAPITULO III O PROCESSO DITATORIAL BRASILEIRO DO PERÍODO 19641984 E AS RESPOSTAS PÓSCONFLITUAIS 101

1. Introdução 101 2. Breve referência histórica 103 3. A modo de síntese 122 4. As respostas às violações de direitos humanos 124 4.1. Princípios Segundo e Quinto 125 4.1.1 Comissões de verdade 125 4.1.2. Arquivos 134 4.2. Princípio Terceiro: reconhecimento do status de vítima e estabelecimento de sistema de reparações 135 4.3. Princípios Primeiro e Quarto 142 4.3.1. Anistia e julgamentos 142

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CAPÍTULO IV REFERÊNCIAS AOS CONFLITOS E RESPOSTAS REGIONAIS 153

1. Argentina 153 1.1. Introdução 153 1.2. Segundo Principio: Comissões de verdade 157 1.3. Terceiro Principio: reconhecimento do status de vítima e estabelecimento de sistema de reparações 161 1.4. Quinto princípio: preservação da memória histórica 167 1.5. Princípios Primeiro e Quarto: perseguição de violações de direitos humanos e implementação de procedimentos administrativos. 167 1.5.1. Anistia e julgamentos 167 2. Chile 178 2.1.Introdução 178 2.2. Princípio Segundo: Comissões de verdade 181 2.3. Princípio Terceiro: reconhecimento do status de vítima e estabelecimento de sistema de reparações 186 2.4. Princípios Primeiro e Quarto: perseguição de violações de direitos humanos e implementação de procedimentos administrativos 189 2.4.1. Anistia e julgamentos 189 2.5. Quinto princípio: preservação da memória histórica 196 3. Paraguai 197 3.1. Introdução 197 3.2. Princípio Segundo: Comissões de verdade 200 3.3. Princípios Primeiro e Quarto: perseguição de violações de direitos humanos e implementação de procedimentos administrativos. 204 3.3.1. Julgamentos 204 3.4. Principio Quinto: programas de preservação da memória histórica 205 3.4.1. Arquivos 205 3.5. Princípio Terceiro: reconhecimento do status de vítima e estabelecimento de sistema de reparações 206 4. Uruguai 208 4.1. Introdução 208 4.2. Princípio Segundo: Comissões de verdade 213

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4.3. Princípios Primeiro e Quarto: perseguição de violações de direitos humanos e implementação de procedimentos administrativos. 217 4.3.1. Anistia e julgamentos 217 4.4. Princípio Terceiro: reconhecimento do status de vítima e estabelecimento de sistema de reparações 222

OBSERVAÇÕES GERAIS 224 CONCLUSÕES 241

FONTES BIBLIOGRÁFICAS 243

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INTRODUÇÃO

Apresentação do tema

O presente trabalho tem por finalidade apresentar e analisar as respostas pósconflituais no Brasil, elaboradas após o período ditatorial que vai dos anos de 1964 a 1984. O estudo das respostas pósconflituais é recente e se insere dentro da linha de trabalhos realizados pelo International Human Rights Law Institute (IHRLI) , o International Institute of Higher Studies in Criminal Sciences (ISISC) e o Chicago Council on Foreign Relations, cujo resultado tem sido os denominados Chicago Principles on PostConflit Justice . Os princípios de Chicago sobre pós conflitos de justiça buscam estabelecer responsabilidades e sistemas de reparações pelas violações de direitos humanos nos momentos posteriores ao desenvolvimento dos conflitos, a partir de uma abordagem interdisciplinar. Os princípios de Chicago estabelecem propostas conciliadoras, reparadoras e punitivas. Foi escolhida essa temática, por sugestão do meu orientador, pois, como se verá, nela concorrem dois modelos diversos de propostas de conciliação e busca da paz. Uma oriunda do direito nacional, que tem proposto uma resposta reparadora, porém não punitiva, mediante a sanção de uma lei de anistia; e outra, emergente do direito internacional que propõe, além da reparação, a punição dos responsáveis pelas graves violações de direitos humanos. Também, interessou o embate entre a tradição do direito penal, que, desde uma perspectiva crítica tem questionado o uso da pena, no entendimento de que a mesma, como manifestação de violência não tem nenhuma função positiva, e a proposta do direito internacional que lhe atribui precisamente uma função preventiva . Por trás de tudo o trabalho esteve sempre, de forma subjacente, a idéia de que se o sistema internacional de direitos humanos foi construído para limitar a violência estatal, e por esse motivo não poderia, de forma alguma, ser utilizado para habilitar essa violência, ainda que seja contra os autores de graves violações de direitos humanos. A partir de uma interpretação redutora da punição, temse a intuição de que o poder punitivo estarseia apropriando de uma das

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principais armas de resistência, pois mediante a consideração dos direitos humanos como objeto de proteção ou tutela, poderia estender sua intervenção punitiva sem limites nem fronteiras. O período em questão é de interesse, pois as condutas ocorridas tinham relevância penal, conforme o direito interno da época, mas também, tinham importância segundo o direito internacional, conforme o sistema internacional de direitos humanos. A elaboração dos princípios dos pósconflitos de justiça constitui um estágio importante no desenvolvimento das políticas de proteção e defesa dos direitos humanos. Contudo, temse presente que a análise das respostas pós conflituais, bem como as demandas internacionais têm sido realizadas de forma seletiva, em razão de que o sistema de direitos humanos não foi aplicado a todos os países e para todos os conflitos por igual. Essa situação factual é considerada relevante ao momento de avaliar as demandas internacionais com relação às respostas pósconflituais devidas no Brasil pelas graves violações de direitos humanos ocorridas no período ditatorial de 19641984. Assim, indagase se a falta de investigação e punição dos responsáveis, baseada em disposições legais nacionais ou domésticas, poderia importar a violação dos deveres emergentes do direito internacional dos direitos humanos e se, ainda, passados trinta anos, seria possível desenvolver uma resposta punitiva. O tema é atual, pois hoje em dia se debate se as respostas pós conflituais elaboradas pelo Brasil foram suficientes em função do sistema regional de direitos humanos. Por último, resta considerar que os princípios de Chicago sobre pósconflitos de justiça constituem o marco mais específico de análise para estas problemáticas.

Problemática e hipótese de trabalho

Interessa saber se o Brasil respondeu a problemática oriunda do regime cívicomilitar do período 19641984, de forma compatível com o sistema de Justiça Pósconflitual estabelecido nos Princípios de Chicago.

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O trabalho procura demonstrar a seguinte afirmação: 1. As graves violações de direitos humanos ocorridas no Brasil, no período ditatorial de 19641984, tiveram respostas pósconflituais, conforme os princípios de Chicago segundo e terceiro, todavia, não foram respeitados os princípios primeiro e quarto, pois não foram investigados, nem punidos, os responsáveis por esses atos, uma vez que foi estabelecida uma lei desincriminadora, pela classe política que participou no regime.

Plano do trabalho

A pesquisa se ordena da seguinte maneira: No capítulo 01 é analisado o desenvolvimento do direito internacional dos direitos humanos. Assim mesmo são estabelecidos os pontos de partida, em termos principiológicos, do presente trabalho. O capítulo 2 apresenta os princípios de Chicago, esclarecendo suas diretrizes básicas para uma maior compreensão do tema. Assim mesmo é feito uma análise do tipo de resposta conflitual proposta nos princípios, segundo sua aptidão para solucionar, suspender ou suprimir conflitos. Desses princípios destacamos o primeiro e o quarto, que procuram garantir o julgamento, seja mediante processos judiciais ou administrativos, dos responsáveis por graves violações de direitos humanos. Assim mesmo, o princípio segundo, que focaliza a busca de verdade, mediante o estabelecimento de Comissões da Verdade, a fim de esclarecer o passado de violações de direitos humanos, no entendimento de que a preservação da memória coletiva é uma das melhores formas para prevenir a repetição de fatos dessa natureza. Também o princípio terceiro, que considera a necessidade de reconhecer as vítimas dos conflitos e os mecanismos de reparação das graves violações de direitos humanos. Finalmente é considerado o princípio quinto, que propõe que os estados apóiem programas e iniciativas populares em favor da memória das vítimas.

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O capítulo terceiro é dividido em dois: uma primeira parte faz uma resenha histórica do período da ditadura brasileira (19641984). Na análise é observado que a fratura da ordem constitucional foi realizada por militares com apoio de uma parte importante da população civil, em especial dos dirigentes. Assim mesmo, que a prática de torturas, bem como a desaparição forçada de pessoas, tiveram gradativamente o rechaço popular quando essas práticas se estenderam por além dos evidentes adversários políticos. A resenha histórica permite entender o tipo de respostas pós conflituais desenvolvidas e as dificuldades apresentadas para ampliar o tipo de respostas, em especial, as punitivas. Assim mesmo, a reticência da classe militar, bem como de grupos civis no esclarecimento do passado de violações de direitos humanos. Mas ao mesmo tempo o amplo sistema de reparações, em especial para a classe política que sofreu os efeitos do regime ditatorial. O Capítulo 4 faz uma análise dos regimes ditatoriais e das respostas pósconflituais nos países da região. Foram focalizados Argentina, Uruguai, Paraguai e Chile, por serem países do ConeSul que durante o mesmo período sofreram idêntico processo, por causa do plano Condor. Assim mesmo, porque as respostas pós conflituais nesses países têm sido muito relevantes. Em tal sentido, cabe destacar as leis de anistia, bem como outros dispositivos limitadores do julgamento dos responsáveis pelas violações de direitos humanos (v. g. lei de ponto final, obediência devida, e caducidade da perseguição criminal), o reconhecimento das vítimas do regime repressivo, os sistemas de reparações para as vítimas, o reconhecimento formal de responsabilidade institucional pelas graves violações de direitos humanos e a criação de monumentos, museus, têm sido as principais respostas pósconflituais. Nesses países as respostas têm procurado o reconhecimento dos fatos historicamente acontecidos, a responsabilidade institucional, o resgate da memória coletiva mediante a busca da verdade, e a minimização dos efeitos lesivos, como estratégias para a prevenção de que fatos dessa natureza não voltem a acontecer. Em tal sentido, foi possível observar respostas conciliadoras e reparadoras. A resposta da discórdia tem sido o estabelecimento de limitações ao julgamento dos responsáveis pelas graves violações de direitos

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humanos, que na atualidade são matéria de revisão, porém em um contexto diverso e com mudanças de força que tem permitido em alguns países ultrapassar esses obstáculos e submeter a julgamento os autores dessas condutas lesivas. Finalmente, são apresentadas as conclusões do trabalho, analisando as respostas pósconflituais adotadas pelo Brasil e fazendo considerações sobre a possibilidade de impor, ainda, outro tipo de medidas. O presente trabalho focaliza as respostas pósconflituais. Assim, não tem por objeto estudar ou analisar as graves violações de direitos humanos, isto é, as torturas ou outros tratos cruéis desumanos ou degradantes. Estes fatos encontramse amplamente reconhecidos; então se parte do pressuposto que os mesmos existiram. Da mesma forma, não se focaliza o estudo dos tratados de direitos humanos, pois sua aplicação a esses fatos é aceita de forma pacífica. Tampouco as decisões da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, nem da Corte Interamericana de Direitos Humanos, a fim de estabelecer se foram violados direitos humanos em decorrência daqueles fatos, pois essa questão, também se encontra amplamente demonstrada. A referência a essas questões será realizada, somente, quando for indispensável para estabelecer o marco factual ou normativo da problemática apresentada.

Metodologia

No plano metodológico o trabalho procura considerar os eventos históricos e sociais que permitem caracterizar os períodos ditatoriais, bem como as respostas pósconflictuais. Assim mesmo, são consideradas as principais normas jurídicas a fim de estabelecer o marco normativo em que esses processos sociais se desenvolveram, seja no período ditatorial, bem como no momento pósconflitual. Isso implicou considerar normas do direito interno ou doméstico e normas internacionais de direitos humanos. Assim, o objeto da pesquisa, as problemáticas e a hipótese investigativa coloca em evidência o enfoque interdisciplinar do trabalho.

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CAPÍTULO I – DIREITOS HUMANOS. SUA INCLUSÃO NO DIREITO BRASILEIRO

1. Introdução

Cabe observar que a partir da metade do Século XX, teve particular consideração o reconhecimento dos direitos humanos. O conceito de direitos humanos encontra no direito natural seu principal fundamento, mas sua definição conceitual resulta difícil, tendo em vista sua permanente mutação 1. Pelo menos, de forma inicial, é possível antecipar o entendimento dos direitos humanos como os considerados inerentes a todo ser humano pela simples condição de tal 2. Em termos normativos, dentro do direito internacional, o conceito de direitos humanos, encontra antecedentes no direito de gentes, ao qual os estados recorriam para solução de litígios, por via da guerra e que, com o decurso do tempo, transformouse em um direito de paz, de entendimento, de cooperação entre as nações, de solidariedade, onde a guerra passou a ser considerada como um ato ilícito internacional 3.

1 Assim MELLO, Celso de Albuquerque. Direitos Humanos e Conflitos Armados . Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 4. 2 Cf. UNESCO. Les dimensions internationales dês droit de l’homme, 1978, p. 11. Na expressão de Carlos E. A. Japiassú: “podese dizer que direitos humanos, relacionados à idéia de dignidade humana, são os direitos gerais de todos os membros da raça humana, sem distinção de tempo, lugar, cor, sexo, nascimento ou grupo social” (JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. O Tribunal Penal Internacional. A Internacionalização do Direito Penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p.45.) Os direitos humanos são distinguidos dos chamados direitos fundamentais, em razão de que estes últimos são inerentes a todos os indivíduos que estejam vinculados de alguma forma a determinado estado (Cf. PINHEIRO, Carla. Direito Internacional e Direitos Fundamentais . São Paulo: Atlas, 2001, p. 2223). Alexandre de Moraes conceitua os direitos humanos fundamentais como “o conjunto institucionalizado de direitos e garantias do ser humano que tem por finalidade básica o respeito a sua dignidade, por meio de sua proteção contra o arbítrio do poder estatal, e o estabelecimento de condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana” (MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais. Teoria Geral, comentários aos arts. 1 o a 5 o da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência . São Paulo: Atlas, 2005, p. 21; Também BASTOS, Celso Ribeiro. Direitos e garantias individuais. In: A constituição brasileira de 1988. Comentários . Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1988, p. 2137; SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo . São Paulo: Malheiros, 1997, p. 177. 3 HUSEK, Carlos Roberto. Elementos de Direito Internacional Público. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 203.

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Assim, sua abordagem foi desenvolvendose, em especial, por meio do: a) direito internacional humanitário, b) direito internacional dos refugiados; e c) direito internacional dos direitos humanos 4.

a) O direito internacional humanitário 5, mais antigo, relacionado com a guerra 6, procurou reduzir os efeitos danosos dos conflitos armados, abrangendo o conjunto de disposições que regulamentam quando os estados podem exercer atos bélicos ( jus ad bellum )7 e como devem atuar durante os mesmos ( jus in bello )8. Com relação ao jus ad bellum a Carta das Nações Unidas, declarou a ilegalidade da guerra, salvo em caso de ações militares de segurança coletiva 9, as guerras de legítima defesa 10 , e as guerras de libertação nacional 11 . O chamado Jus in bello, nas suas duas vertentes principais, está formado pelo direito de Haia, relativo à limitação dos meios e métodos de combate, vale dizer a como é conduzido o ato bélico, e o direito de Genebra, referido a

4 CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos . Vol. I. Porto Alegre: Fabris, 1997, p. 270 e ss.; CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto – PEYTRIGNET, Gérard – RUIZ DE SANTIAGO, Jaime. As três vertentes da proteção internacional dos direitos da pessoa humana. Direitos Humanos, Direito Humanitário, Direito dos Refugiados . In : http://www.icrc.org/web/por/sitepor0.nsf/html/9A61705B9AD3183303256E7E00617187?OpenDocume nt &Style =CustoFinal.3&View =defaultBody. Consultado em 8/09/05. 5 Cf. MELLO, Celso de Albuquerque. Direitos Humanos e Conflitos Armados . Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 06; GONZÁLEZ GÓMEZ, Avelino José. Derecho Internacional Humanitario . La Havana: Editorial Ciencias Sociales, 1990, p. 3 e ss.; SWINARSKI, Christophe. Principales nociones e institutos del derecho internacional humanitario como sistema internacional para la protección de la persona humana. San José: Serie Educación y Derechos Humanos, CICR e IIDH, 1990, p. 21. 6 Vide, JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. O Tribunal Penal Internacional. A Internacionalização do Direito Penal , p. 7. 7 O jus ad bellum, que se ocupava do direito da guerra, ficou limitado às guerras consideradas lícitas com a Carta das Nações Unidas (Cf. CHORNET RAMÓN, Consuelo. ¿Violencia Necesaria? La intervención humanitaria en Derecho Internacional. Madrid: Trotta, 1995). 8 Ocupouse de estudar as normas internacionais, de origem convencional ou consuetudinária, especificamente destinadas a regulamentar os problemas humanitários derivados dos conflitos armados, internacionais ou não, e que restringem por razões humanitárias o direito das partes em conflito a utilizar os métodos e meios de sua eleição ou que protegem as pessoas e bens afetados pelo conflito. Comitê Internacional da Cruz Vermelha, Comentários aos Protocolos adicionais de 8/6/1977, p. XXVII. 9 Previstas no capítulo VII da Carta, nas quais se prevêem medidas de força contra Estados que representem uma ameaça para a paz ou a segurança internacional (situação que cobrou muita atualidade nos últimos anos, com o entendimento unânime dos membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU). 10 Nelas os Estados têm o direito de defenderse contra a agressão armada. 11 De conformidade com o direito de autodeterminação dos povos, sendo excluídas desta categoria as guerras internas de tipo revolucionário.

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respeito das vítimas da guerra. Seus antecedentes podem ser encontrados em 1864 na Convenção de Genebra para a proteção às vítimas da guerra 12 . A batalha naval, acontecida em Lyssa (1866), deu lugar a uma Convenção sobre a proteção ao militar náufrago, que se concretizou em Haia (Holanda) em 1907. Em 1919, as Sociedades Nacionais decidiram criar uma Federação Internacional a Liga das Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho. Foi revisada a primeira Convenção de 1864, depois de observar as conseqüências da 1ª Guerra Mundial, o que aconteceu em 1929. Assim, foi celebrada a Convenção sobre proteção dos prisioneiros de guerra 13 . A segunda Guerra Mundial evidenciou a necessidade de proteger a população civil, o que gerou a celebração de novos Tratados (Convenções de Genebra de 1949). Os novos conflitos armados, guerras de libertação nacional, guerras de descolonização, e guerras revolucionárias, onde o caráter interestatal dos enfrentamentos nem sempre aparecia, e a noção de forças armadas uniformizadas e identificadas era substituída pela de combatentes ou de guerrilheiros levou a realizar novos instrumentos internacionais (Protocolos Adicionais às Convenções de Genebra de 1949, tentando proteger às vítimas destes conflitos I Protocolo relativo aos conflitos internacionais e guerras de descolonização, e II Protocolo aplicável aos conflitos internos, cuja intensidade ultrapassasse as características das situações de simples distúrbios internos) 14 .

b) O direito internacional dos refugiados 15 procurou dar resposta às pessoas que se encontravam deportadas, perseguidas, desabrigadas e vítimas

12 Os antecedentes podem encontrarse, também pelo ano 1859, no campo de batalha de Solferino, ao norte da Itália, onde ao verse os resultados da guerra se organizaram socorros para os soldados feridos ou abandonados, formandose posteriormente a Cruz Vermelha e com isso o direito humanitário moderno. PEYTRIGNET, Gerard. I. Direito Internacional Humanitário (DIH) Moderno: Fundamentos e Histórico, Princípios Essenciais e Mecanismos de Aplicação. In : As três vertentes da proteção internacional dos direitos da pessoa humana. Direitos Humanos, Direito Humanitário, Direito dos Refugiados . CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto – PEYTRIGNET, Gérard – RUIZ DE SANTIAGO, Jaime. In: http://www.icrc.org/web/por/sitepor0.nsf/html/9A61705B9AD3183303256E7E0 0617187?OpenDocu ment &Style=Custo_Final.3&View=defaultBody4 (Consultado em 8/09/05). 13 Vide. JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano . O Tribunal Penal Internacional. A Internacionalização do Direito Penal , p. 11. 14 PEYTRIGNET, Gerard. Ob. cit. 15 ANDRADE, José H. Fischel. Direito Internacional dos Refugiados . Rio de Janeiro: Renovar, 1996; AAVV. O Direito Internacional dos Refugiados (Nádia Araújo / Guilherme Almeida Coord.). Rio de Janeiro: Renovar, 2000.

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da fome e das enfermidades 16 . Por causa da Segunda Guerra mundial a comunidade internacional decidiu criar a Agência das Nações Unidas 17 para o Auxílio e a Reabilitação (UNRRA). Com a criação da Organização das Nações Unidas, foi criada a Organização Internacional para Refugiados (OIR), que substituiu a UNRRA.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos 18 reconheceu o direito que toda pessoa tem de buscar e gozar asilo em outros países se sofre perseguição (art. 14). Assim mesmo, no ano de 1949 a Assembléia Geral designou um AltoComissário das Nações Unidas para os Refugiados e, um ano depois, aprovou o Estatuto sob o qual trabalharia. Finalmente foi aprovada a Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados, no ano de 1951, entrando em vigor no ano de 1954, sendo reforçada com o Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados, aprovado em Nova York, em janeiro de 1967.

A Convenção de Genebra de 1951 estabelece com nitidez a proteção da devolução dos refugiados e dos solicitantes de refúgio – ao país em que sua vida ou liberdade se encontre ameaçada (Princípio de NonRefoulement) . O Princípio de NonRefoulement (NãoDevolução) é, atualmente, considerado como a coluna vertebral do sistema jurídico protetor dos refugiados e como disposição que forma parte do Jus Cogens . Constitui, também, o ponto de partida para os sistemas de proteção dos refugiados no plano regional.

c) O direito internacional dos direitos humanos se desenvolveu em especial a partir da Segunda Guerra Mundial como resposta às graves violações aos direitos dos seres humanos cometidas pelo nazismo e na crença de que parte dessas violações poderia ser prevenida por meio de um sistema de proteção

16 Encontra como antecedentes: o deslocamento de pessoas, por causa da Primeira Guerra mundial e da Guerra Civil que estava em curso na Rússia; depois pela guerra entre a Grécia e a Turquia, que tinha gerado numerosos gregos e turcos fora de seu país (também podem considerarse as reclamações do povo armênio que se encontrava disperso pelo Oriente Médio, Síria, Iraque, Chipre, Palestina, Grécia e Bulgária, embora não teve a mesma resposta da Sociedade das Nações). 17 Sobre Nações Unidas ver HUMPHREY, John. Human Rights and united nations : a great adventure. Dobbs Ferry NY: Transnational, 1984. 18 ANTUNES, Eduardo Muylaert. A natureza jurídica da declaração universal de direitos . São Paulo: Revista dos Tribunais. n. 446, dez de 1972, p. 2536.

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internacional 19 . Posteriormente a preocupação se centrou no reconhecimento da capacidade processual dos indivíduos e grupos sociais no plano internacional 20 . Este ramo do direito internacional público ocupase do sistema de normas internacionais, procedimentos e instituições desenvolvidas para promover e salvaguardar os direitos humanos, ou melhor, os direitos da pessoa humana 21 , ao reconhecer que toda pessoa humana tem direitos que devem ser respeitados e protegidos pelos estados, podendo gerar responsabilidade internacional para o estado que não os respeita ou protege 22 . Nesse contexto surgiu, em 1945 a Organização das Nações Unidas e, em 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos 23 , que reconheceu a universalidade 24 e indivisibilidade 25 dos direitos humanos. A partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos foi estabelecendose um sistema de proteção mundial 26 que funciona como parâmetro para a proteção internacional de tais direitos em torno de valores básicos universais, a serem observados e seguidos por todos os estados e povos 27 , deslegitimando a comunidade internacional aos que sistematicamente violentam os direitos humanos, e até habilitando medidas para resguardar tais direitos.

19 PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos . São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 22. 20 CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos . Vol. I. Porto Alegre: Fabris, 1997, p. 1718. 21 Assim, PIOVESAN, Flavia. Direitos Humanos e o direito constitucional internacional . São Paulo: Max Limonad, 1996, p. 43. 22 PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos , p. 22. 23 Aprovada pela Resolução 217 A (III), da Assembléia Geral, em 10 de dezembro de 1948. 24 É aplicável a todos os seres humanos de todos os países, raças, religiões e sexos, seja qual for o regime político dos territórios onde more, como membro que é da sociedade humana é sujeito direto do direito de gentes (Cf. CASSIN, René. El problema de la realización de los derechos humanos en la sociedad universal. In: Vente años de evolución de los derechos humanos. México: Instituto de Investigaciones Jurídicas, 1974, p. 397). 25 A indivisibilidade foi reforçada pela Resolução 32/130 da Assembléia Geral das Nações Unidas ao estabelecer que “todos os direitos humanos, qualquer que seja o tipo a que pertencem, se inter relacionam necessariamente entre si, e são indivisíveis, interdependentes e interrelacionados” (Cf. CANÇADO TRINDADE. Antônio Augusto. A proteção internacional dos direitos humanos no limiar do novo século e as perspectivas brasileiras. In: Temas de Política Externa Brasileira, II, v. 1, 1994, p. 169). 26 O sistema reconhece dois âmbitos: um global integrado por instrumentos internacionais de alcance geral (por ex. Convenção Americana de Direitos Humanos) e outro especial, que especifica o sujeito de direito (por ex. convenção contra a tortura, discriminação racial, dentre outras) (Cf. PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos , p. 3031). 27 CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. O legado da Declaração Universal de 1948 e o Futuro da Proteção Internacional dos Direitos Humanos. In: O Direito Internacional em um Mundo em Transformação . (Ensaios 19762001). Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 641.

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Tanto a Carta das Nações Unidas, quanto a Declaração Universal dos Direitos Humanos, refletem o interesse das nações civilizadas de assegurar o respeito à pessoa humana a partir do reconhecimento dos direitos que lhe são intrínsecos pela sua simples condição de tal, de modo que são consideradas as normas internacionais de direitos humanos como parte do jus cogens .28 Inicialmente, foram considerados os direitos civis e políticos, como direitos de primeira geração, que reconhecem o valor liberdade; dos direitos econômicos, sociais e culturais, como direitos de segunda geração, que referenciam o valor igualdade; e dos direitos relativos ao desenvolvimento, à paz, à livre determinação, como direitos de terceira geração que relevam o valor solidariedade 29 . Sem embargo, cabe observar que, atualmente, com o reconhecimento da indivisibilidade do sistema de proteção de direitos humanos 30 ,

28 HITTERS, Juan Carlos. Derecho Internacional de los Derechos Humanos . T. I. : Ediar, 1991, p. 135. 29 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito constitucional . São Paulo: Malheiros, 1993, p. 474482; GROSS ESPIELL, Héctor. Estudios sobre derechos humanos. Madrid: Civitas, 1988, p. 328332; PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos , p. 27. Admitese também o surgimento de direitos humanos de quarta geração que seriam os resultantes da evolução das pesquisas relacionadas com clonagem e herança genética de indivíduos; assim, vide BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1992, p. 32 e 36. 30 Sobre direitos humanos e proteção dos direitos humanos em geral ver CASSIN, Rene. El problema de la realizacion de los derechos humanos en la sociedade universal. In: Viente anos de evolución de los derechos humanos . MÉXICO: Instituto de Investigaciones jurídicas, 1974, p. 397. VERDROSS, Alfred. Derecho Internacional Público . Madrid: Aguilar, 1961. PEREIRA, André Gonçalves, QUADROS, Fausto de. Manual de direito internacional público. Coimbra: Almedina, 2007.LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt. São Paulo: Cia das Letras, 1988. ALVES, José Augusto Lindgren. O sistema de proteção dos direitos humanos e o Brasil. Arquivos do Ministério da Justiça . Brasília. Vol. 46, n. 182, p. 88, juldez 1993; PIOVESAN, Flavia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional, p. 144. BUERGENTHAL, Thomas e SOHN, Louis. International protection of human rights . Indianápolis: Bobbs Merril Company, 1973. ESPIELL, Hector Gross. Estudios sobre derechos humanos . ESPIELL, Hector Gross. Los derechos economicos, sociales y culturales en el sistema interamericano . San José: Libro Libre, 1986. SIEGHART, Paul. International human Rights law: some currents problems. In: BLACKBURN, Robert e TAYLOR, John. Human Rights for the 1990s: legal, political and ethical issues . London: Mansell Publishing, 1991, p. 30. LILLICH, Richard B. Civil Rights. In: MERON, Theodor. Human Rights in international law: legal and policy issues. Oxford: Clarendon Press, 1984, p. 116117. MARITAIN, Jacques. Los derechos del hombre y la lei natural . Buenos Aires: Ed. Leviatan, 1982. NIKKEN, P. La protección Internacional de los derechos humanos – su desarrolo progresivo . Madrid: Civitas, 1987. EZEJIOFOR, G. Protection of human rights under the law . London: Butterworths, 1964. CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Direitos humanos e meio ambiente – Paralelo dos Sistemas de Proteção Internacional . Porto Alegre: S. A Fabris, 1993, do mesmo, A proteção internacional dos direitos humanos – Fundamentos Jurídicos e Instrumentos Básicos . São Paulo: Saraiva, 1991; The domestic jurisdiction of States in the practice of the united nations and regional organizations, 25. International and Comparative Law Quaterly , 1976, p. 715765; A evolução doutrinária e jurisprudencial da proteção internacional dos direitos humanos nos planos global e regional: as primeiras quarto décadas. Revista de Informação Legislativa do Senado Federal. Brasília n. 90, 1986, p. 233288. Também, ACCIOLY, Hildebrando e NASCIMENTO SILVA, Geraldo Eulálio. Manual de direito internacional público . São Paulo: Saraiva, 2002. CASSESSE, Antonio. Human Rights in a changing world . Philadelphia: Temple University Press, 1990. HENKIN, Louis. The age of

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teria ficado superada a distinção entre direitos civis e políticos de um lado e econômicos, sociais e culturais, de outro, porque não haveria hierarquia de direitos, senão uma consideração em pé de igualdade, da qual surge sua consideração em termos de cúmulo e não alternatividade. 31 Dessa forma, a distinção em função do tipo de prestação devida pelo estado perde sentido.32 Assim, começou a intensificarse a aprovação de inúmeras declarações e tratados internacionais que formaram um sistema de proteção global33 e regional 34 de proteção de direitos humanos guiados na etapa legislativa e de implementação pela I Conferência Mundial de Direitos Humanos (Teerã, 1968) e sua reavaliação impondo a aplicação de tais instrumentos com a II Conferência Mundial de Direitos Humanos (Viena, 1993), abrindo campo ao exame do processo de consolidação e aperfeiçoamento dos mecanismos de proteção internacional 35 .

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Com efeito, nela foi observado que: Todos os direitos humanos são universais, indivisíveis interdependentes e interrelacionados. A comunidade internacional deve tratar os direitos humanos globalmente, de modo justo e equitativo, com o mesmo fundamento e a mesma ênfase. Levando em conta a importância das particularidades nacionais e regionais, bem como os diferentes elementos de base históricos, culturais, e religiosos, é dever dos Estados, independentemente de seus sistemas políticos, econômicos e culturais, promover e proteger todos os direitos humanos e as liberdades fundamentais 36

Por outra parte, foi observada a necessidade de que as vítimas de violações de direitos humanos tivessem capacidade para atuar no plano internacional ( locus standi ), pois não seria razoável conceber direitos sem a capacidade processual de reivindicálos 37 . Assim mesmo, foi observada a necessidade de estabelecer um sistema de monitoramento contínuo dos direitos humanos, tanto para a prevenção como para o seguimento de violações de direitos humanos 38 . Foi considerada, também, a necessidade de estabelecer uma jurisdição penal internacional de caráter permanente, que até esse momento não tinha o consenso internacional necessário a sua concretização 39 . Nesse sentido, o Estatuto de Roma 40 e a Corte Penal Internacional se apresentam como um dos últimos estágios da progressão do direito

Sobre direitos humanos ver também PAINE, Thomas. Rights of Man . Harmondsworth: Pelican, 1979. DE BRITO, Alexandra Barahona. Human Rights and Democratization in Latin America. Uruguay and Chile . Oxford: Oxford University Press, 1997. 36 Vide COMPARATO, Fabio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos . São Paulo: Saraiva, 2003, p. 65. Os direitos humanos são considerados indivisíveis porque apresentam um único conjunto de valores de liberdade e igualdade (PIOVESAN, Flavia. Temas de direitos humanos , p. 34) e universais, porque têm por único requisito de titularidade a condição de pessoa humana (MELLO, Celso de Albuquerque. Direitos humanos e conflitos armados. Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 5). 37 Assim, CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. O legado da Declaração Universal de 1948 e o futuro da proteção internacional dos direitos Humanos , p. 654. 38 CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. O legado da Declaração Universal de 1948 e o futuro da proteção internacional dos direitos Humanos, p. 655. 39 ZUPPI, Alberto Luis. Jurisdicción Universal para crímenes contra el derecho internacional. El camino hacia La corte Penal Internacional . Buenos Aires: AdHoc, 2002. BAZELAIRE, JeanPaul. A justiça penal internacional: sua evolução, seu futuro: de Nuremberg a Haia . Barueri, SP: Manole, 2004. JAPIASSÚ, C. E. A. . Le Comité Juridique Interaméricain et la promotion de la Cour Pénale Internationale. In: Révue Internationale de Droit Penal , v. 78 1/2, 2008, p. 225231 ; do mesmo, Dificuldades jurídicas e políticas para ratificação ou implementação do Estatuto de Roma. In: Dificuldades jurídicas e políticas para ratificação ou implementação do Estatuto de Roma da Corte Penal Internacional (AMBOS, Kai; MALARINO, Ezequiel; WOISCHNIK, Jan. Orgs.). São Paulo: IBCCRIM, 2006, p. 81111. 40 O Estatuto de Roma foi aprovado por 120 estados, em 17 de julho de 1998 e ratificado por 60 estados em 11 de abril de 2002, entrando em vigor em 1 de julho de 2002. O Brasil assinou o tratado internacional em 7 de fevereiro de 2000, depositou o instrumento de ratificação em 20 de junho de 2002 e o promulgou em 25 de setembro de 2002 (Decreto n. 4388). Finalmente, a Emenda constitucional n. 45 reconheceu expressamente a jurisdição do Tribunal Penal Internacional. Resta agora estabelecer as disposições regulamentares no direito brasileiro.

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punitivo internacional 41 , como forma legitimadora do poder punitivo internacional, frente a eventuais respostas ilimitadas oriundas de conflitos que envolvem graves violações aos direitos humanos 42 .

Finalmente, resta considerar o estabelecimento do Conselho de Direitos Humanos, em substituição da Comissão de Direitos Humanos, como órgão subsidiário da Assembléia Geral das Nações Unidas, em 15 de março de 2006 43 .

Sem embargo, apesar dos tratados e convenções internacionais assinados, os conflitos internacionais registraram genocídios, massacres, desaparições forçadas de pessoas, e demais tratamentos cruéis inumanos ou degradantes em que as respostas posteriores ao conflito, asseguravam a impunidade para os autores desses atos aberrantes, bem como eram ignoradas as vítimas e suas reclamações, transformandose estas, em alguns casos, em moeda de troca para a finalização dos conflitos.

41 Uma análise aprofundada em JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. O Tribunal Penal Internacional. A Internacionalização do Direito Penal ; do mesmo, Direito Penal Internacional . Belo Horizonte: Del Rey, 2009; Direito penal internacional, estrangeiro e comparado . (JAPIASSÚ, C. E. A. org.). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007; T ribunal Penal Internacional. Possibilidades e Desafios . (JAPIASSÚ, C. E. A. AMBOS, Kai orgs.). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. O direito internacional e o direito penal. In: Novas perspectivas do direito internacional contemporâneo Estudos em homenagem ao Prof. Celso D. de Albuquerque Mello (Carlos Alberto Menezes Direito; Antônio Augusto Cançado Trindade; Antônio Celso Alves Pereira. Org.) Rio de Janeiro: Renovar, 2008, v., p. 5781. Também, EIROA, Pablo D. La Corte Penal Internacional. Fundamentos y Jurisdicción . Buenos Aires: AdHoc, 2004; GUZMÁN. Augusto J. Ibañez. El Sistema Penal en el Estatuto de Roma . Bogotá:Universidad Externado de Colombia, 2003. 42 No Brasil, encontra dificuldades de implementação em razão da incompatibilidade de algumas disposições do Estatuto com a Constituição Federal. Cf. JAPIASSÚ, C. E. A; ADRIANO, A. R. O Tribunal Penal Internacional: dificuldades para sua implementação no Brasil. In: Revista da Faculdade de Direito Candido Mendes , Rio de Janeiro, v. 10, 2005, p. 107128; do mesmo, A Corte Criminal Internacional e a implementação do direito Penal Internacional. In: Revista de Ciências Jurídicas. Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, 2002; Possibilidades e desafios de adequação do Estatuto de Roma à ordem constitucional brasileira. In:. Tribunal Penal Internacional: possibilidades e desafios . (Carlos Eduardo Adriano Japiassú; Kai Ambos Orgs.) Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, v. p. 199222; A Corte Criminal Internacional. Possibilidades de adequação do estatuto de Roma à ordem constitucional brasileira. In: Estudos jurídicos em homenagem ao professor João Marcelo de Araújo Junior . (Ester Kosowski; Eugênio Raúl Zaffaroni Org.). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001. 43 Vide Resolución 60/251 de la Asamblea General estableciendo el Consejo de Derechos Humanos. Disponível em http://www2.ohchr.org/spanish/bodies/hrcouncil/docs/A.RES.60.251._Sp.pdf Consultada em 29/07/09.

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As situações descritas levaram a estudar as respostas oferecidas em diversas comunidades na busca da justiça e reconciliação, no estágio posterior aos conflitos lesivos aos direitos humanos. Essas respostas tem contribuído para garantir a paz, a segurança e a reconstrução nacional em função das experiências passadas. Em parte envolvem problemáticas analisadas sob os conceitos de justiça de transição, estratégias de combate à impunidade, construção da paz, etc. que refletem instituições particulares e também ideologias específicas. O estudo dos pósconflitos de justiça permitiu a elaboração de princípios ou diretrizes que resultam de utilidade para orientar as políticas públicas e estratégias dos atores internacionais e locais, claro que segundo as necessidades dos povos em função das suas especificidades contextuais e culturais. Nesse sentido, a elaboração dos princípios de pósconflitos de justiça constituiu um estágio importante na evolução das políticas de proteção e defesa dos direitos humanos. Os primeiros trabalhos para a elaboração dos princípios foram organizados pelo International Human Rights Law Institute (IHRLI) in 1997, no Holocaust Memorial Museum, em Washington . O esboço das diretrizes foi realizado no âmbito do International Institute of Higher Studies in Criminal Sciences (ISISC) , em Siracusa, Itália 44 . Posteriormente, em 2003, foram revistos pelo IHRL e o Chicago Council on Foreign Relations, em três encontros, sendo denominados como Chicago Principles on PostConflit Justice. Desde então esses princípios foram submetidos à consulta de mais de 180 expertos de 30 países, sendo reformulados e adequados pelos membros do IHRLI 45 . Os princípios de Chicago sobre pósconflitos de justiça buscam estabelecer responsabilidades pelas violações de direitos humanos nos momentos posteriores ao desenvolvimento dos conflitos, cuja compreensão exige uma abordagem interdisciplinar, além da mera aproximação formal legalista, que raramente satisfaz as necessidades das vítimas. O estudo dessas respostas constitui o objeto do presente trabalho.

44 BASSIOUNI, M. Cherif. Post Conflict Justice (International and Comparative Criminal Law Series). NY: Transnational, 2004. 45 BASSIOUNI, M. Cherif. Prefácio. In: BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice . In: Chicago Principles on Post Conflict Justice , IHRLI, 2007, p. VVI.

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2. Ponto de partida

A proliferação de normas que reconhecem direitos humanos e estabelecem limitações ao poder estatal envolvem, no fundo um conteúdo político em relação ao conceito de estado e o reconhecimento da pessoa com direitos anteriores ou posteriores a ele.

2.1. Cosmopolitanismo vs. realismo

Desde uma perspectiva, os direitos humanos como categoria universal podem ter sua origem no cosmopolitanismo , que reconhece um cidadão universal 46 e também, uma justiça universal, como fim último de todos os homens. A fundamentação dos direitos do homem a partir de uma visão cosmopolita pode encontrarse em Kant para quem, a idéia racional de uma comunidade pacífica perpétua de todos os povos da terra, não era um princípio filosófico senão um princípio de direito; e para tal fim podia apelarse a uma aliança de estados em um congresso permanente 47 . A partir de uma perspectiva mais atual é possível sintetizar os fundamentos em favor de uma justiça global: em primeiro lugar, considerando a necessidade de reconhecer o direito a subsistência como um direito básico, na medida em que permite desfrutar todos os outros direitos 48 .

46 KANT, Emm. Príncipes métaphysiques du Droit suivis du projet de paix perpétuelle . Paris: Librairie Philosophique de Ladrange, 1855, p. 258 259. 47 KANT, Emm. Príncipes métaphysiques du Droit suivis du projet de paix perpétuelle, p. 259 e 258. Essa idéia pode verse, também, em Diógenes, Cícero, Sêneca, Plutarco, Epictetus e Marco Aurélio. Em etapa posterior, em Jeremy Bentham. Mais atual, BEITZ, Charles. Political Theory and International Relations . Princeton: Princeton Univ. Press, 1979 e POGGE, Thomas . World Poverty and Human Rights . Cambrigde: Polity Press, 2002. 48 SHUE, Henry. Basic Rights: Subsistence, Affluence, and U.S. Foreign Policy . Princeton: Princeton Univ. Press, 1996, p. 2627.

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De outra, realista , afirmase que cada estado deve procurar garantir os seus interesses, que muitas vezes podem ser antagônicos 49 , motivo pelo qual não seria possível pensar em uma idéia de cidadão ou justiça universal 50 . A partir de uma perspectiva cosmopolita pode reafirmarse a existência de direitos anteriores ao estado, ante o reconhecimento da pessoa humana como titular de direitos no âmbito internacional 51 . Nesse sentido, “direito do homem são os que cabem ao homem enquanto homem... dos quais nenhum homem pode ser despejado ... [e} cujo reconhecimento é condição necessária para o aperfeiçoamento da pessoa humana, ou para o desenvolvimento da civilização” 52 .

2.2. Sociedades de estados vs. estados

Outra distinção pode ser realizada entre aqueles que defendem as sociedades de estados e uma visão nacionalista. Na primeira idéia defendese a idéia de uma ordem mundial integrada por estados iguais e independentes, o que garante um espaço de autonomia entre estes e a não intervenção nos assuntos internos de outros estados. Sem embargo, reconhecem a possibilidade de realizar políticas comunitárias entre os diversos estados, mas sempre reconhecendo o princípio da não intervenção 53 . Na segunda posição, consideram que as pessoas, como membros de uma nação, ficam vinculadas a um direito que lhe é próprio e que lhe garante o seu direito de autodeterminação e também a uma justiça

49 Os antecedentes podem encontrarse em Maquiavel (O Príncipe; Os Discursos), Hobbes, dentre outros. Mais atual, WALTZ, Kenneth. Theory of International Politics. NY: McGraw Hill, 1979. 50 Os direitos humanos dependerão, então, do reconhecimento positivo de sua existência na forma e extensão em que são reconhecidos no direito positivo de cada estado, que da mesma forma que os reconhece pode, então, reduzilos ou limitálos (Vide. COMPARATO, Fabio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos , p. 12). 51 Juan Antonio Carrillo Salcedo reconhece a aparição de um novo consenso internacional em relação aos direitos humanos e democracia que afirma ao ser humano como titular de direitos próprios oponíveis juridicamente a todos os estados (CARRILLO SALCEDO, Juan Antonio. Derechos Humanos y Derecho Internacional. In: Globalización y derechos humanos ISEGORÍA. Revista de Filosofía Moral y Política. Nº 22 (septiembre 2000). Madrid: Instituto de Filosofía del CSIC, 2000, p. 6981. Em relação à Corte Penal internacional, o trabalho de BLENGINO, Chiara. La position juridique de l’individu dans le Statut de la Cour pénale internationale. In: La justice pénale entre passé et avenir (Mario Chiavario, dir). Milano: Dalloz / Giuffrè Editore, 2003, p. 153 e ss. 52 BOBBIO, Norberto . A era dos direitos . Rio de Janeiro: Editora Campus, 1992, p. 17. 53 Assim, RAWS, John. The Law of Peoples . Cambrigde, MA: Harvard Univ. Press, 1999.

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independente, com relação a outras comunidades ou nações 54 . Enquanto as sociedades de estados encontrase comprometida com a soberania dos estados, o nacionalismo voga pela autonomia das nações.

2.3. Universalismo vs. relativismo cultural

Por outra parte, cabe distinguir entre o enfoque universalista e o relativismo cultural. Para o primeiro seria possível reconhecer uma moral universal que poderia ser aplicada a todas as pessoas; para o segundo, a moral universal só seria aquela que é avaliada em função de uma visão média de membro de uma comunidade que neutraliza as singularidades das diversas nações do mundo 55 . As teorias cosmopolitas, em regra, têm uma visão universalista, na medida em que reconhecem que em função de uma idéia de cidadão universal é possível estabelecer princípios civis, políticos, econômicos e de justiça universal. Em tal sentido, afirmase que se determinados princípios morais aplicamse a algumas pessoas porque estes possuem alguma propriedade moral relevante, então, estes devem ser aplicados a todas as pessoas que compartilham esses princípios. O ponto de partida, assim, seria o reconhecimento de que as pessoas em geral – isto é com independência da comunidade a que pertencem têm necessidades e expectativas de bemestar comuns, razão pela qual o reconhecimento destas e das formas de satisfação em favor de umas deveria estenderse a todas. A dificuldade estaria em estabelecer quais são as necessidades e expectativas que, em termos de princípios podem ter dimensão universal. Para os pensadores cosmopolitas os direitos humanos apresentamse como um bloco de princípios com pretensão de vigência universal. Em tal sentido, pode observarse a passagem dos direitos naturais, como teoria filosófica com valor universal, às constituições modernas, nos limites em que eram reconhecidos pelo Estado. Após a Declaração Universal de

54 Assim, MILLER, David . On Nationality . Oxford: Clarendon Press, 1995. 55 WALZER, Michel. Spheres of Justice: A defence of pluralism and Equality. Oxford: Martin Robertson, 1983.

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1948, esses direitos passaram a ter um sistema de proteção planetário, reconhecendo o indivíduo como um sujeito de uma comunidade internacional potencialmente universal 56 . Com efeito, a Declaração Universal de 1948, bem como as Conferências Mundiais de Direitos Humanos, de Teerã, em 1968, e em Viena, em 1993, colocam os direitos humanos como tema global, reafirmando sua universalidade, indivisibilidade e interdependência, deixando em evidência que não há direitos civis e políticos sem direitos sociais, econômicos e culturais; e que não há liberdade sem igualdade, nem igualdade sem plena e eficaz proteção da liberdade 57 . Sem embargo, não pode passar por alto que a recepção destes, ainda, flutua em função dos valores culturais de cada comunidade, o que coloca em discussão, em especial para os realistas, quem e como podem ser estabelecidos os princípios com pretensão de vigência universal. Nesse sentido foi observado, de uma parte o relativismo cultural, segundo o qual cada povo tem sua cultura e os seus valores, de tal forma que nem sempre são coincidentes com os dos outros povos. De outra parte, pode observarse que a idéia de direitos humanos reflete essencialmente o interesse dos estados de cultura ocidental, sendo um dos principais fios condutores de suas políticas expansionistas e intervencionistas. Em tal sentido, foi observado que a diversidade cultural (relativismo) não pode ser invocada para justificar violações aos direitos humanos. Desta forma, dentro de uma idéia universalista, afirmouse o dever dos estados de promover e proteger os direitos humanos, independentemente do sistema político adotado e sem prejuízo do reconhecimento da soberania estatal 58 .

56 BOBBIO, Norberto. Teoria Geral da Política . Rio de Janeiro: Editora Campus, 2000, p. 485 e ss. 57 Cf. PIOVESAN, Flávia. Temas de direitos humanos, p. 2729. 58 Cf. BARROSPLATIAU, Ana Flávia GÓIS, Ancelmo César Lins de. Direito internacional e globalização. In: Revista Cidadania e Justiça da Associação dos Magistrados Brasileiros , ano 4, n.º 8, p. 2742, 1.º semestre de 2000 , p. 37.

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2.4. Sobre o conceito de direitos humanos

Inicialmente foi observada a dificuldade teórica de definir os direitos humanos 59 . Sem embargo, parece mister esclarecer o seu entendimento. Quando aqui se fala de direitos, fazse referência à situação factual de alguém ser reconhecido com o poder de requerer a/de outros fazer ou não fazer alguma conduta 60 . Esse poder de requerer tem como contrapartida o dever dos outros de agir conforme o reconhecimento de determinado poder de requerer, fazendo ou não fazendo alguma coisa. Assim, para cada situação de reconhecimento –direitos haverá um tipo especial de dever. O reconhecimento desses direitos e deveres tem levado a distinguir entre direitos positivos e direitos negativos. Dentre esses últimos, temse

59 Sobre direitos humanos de uma forma geral ver CANÇADO TRINDADE. Antônio Augusto. O legado da declaração universal e o futuro da proteção universal dos direitos humanos. In : AMARAL JR, Alberto do e PERRONEMOISÈS, Claudia (Orgs.). O cinquentenário da declaração universal dos direitos do homem. São Paulo: EDUSP, 1999. FARIA, José Eduardo. O futuro dos direitos humanos após a globalização econômica. In : AMARAL JR, Alberto do e PERRONEMOISÈS, Claudia (Orgs.). O cinquentenário da declaração universal dos direitos do homem. São Paulo: EDUSP, 1999. PERRONEMOISÈS, Claudia. Direitos humanos e desenvolvimento: a contribuição das nações unidas. In : AMARAL JR, Alberto do e PERRONEMOISÈS, Claudia (Orgs.). O cinquentenário da declaração universal dos direitos do homem. São Paulo: EDUSP, 1999. FISCHEL DE ANDRADE, José Henrique. O direito internacional dos refugiados em perspectiva histórica. In : AMARAL JR, Alberto do e PERRONEMOISÈS, Claudia (Orgs.). O cinquentenário da declaração universal dos direitos do homem. São Paulo: EDUSP, 1999. SABOIA, Gilberto Vergne. O Brasil e o sistema internacional de proteção dos direitos humanos. In : AMARAL JR, Alberto do e PERRONEMOISÈS, Claudia (Orgs.). O cinquentenário da declaração universal dos direitos do homem. São Paulo: EDUSP, 1999. PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos globais, justiça internacional e o Brasil. In: AMARAL JR, Alberto do e PERRONEMOISÈS, Claudia (Orgs.). O cinquentenário da declaração universal dos direitos do homem. São Paulo: EDUSP, 1999. LAFER, Celso. Resistência e realizabilidade da tutela dos direitos humanos no plano internacional no limiar do século XXI. In : AMARAL JR, Alberto do e PERRONEMOISÈS, Claudia (Orgs.). O cinquentenário da declaração universal dos direitos do homem. São Paulo: EDUSP, 1999. 60 Entendemos que o direito, como tal, tem como fundamento místico a autoridade (vide DERRIDA, Jacques. Força de Lei. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 20 e ss.) que se manifestaria como o poder de requerer a/de outros fazer ou não fazer alguma conduta. Essa autoridade pode encontrar sua fonte na força fundadora ou conservadora do direito (vide BENJAMIN, Walter. Para una crítica de la violencia . Buenos Aires: Leviatán, 1995) o bem na aceitação voluntária do direito (vide AGAMBEN, Giogio. Homo Sacer . O poder soberano e a vida nua I. Belo Horizonte: UFMG, 2002, p. 4041, interpretando o Livro X Das Leis de Platão). Cabe observar que, não obstante o exposto é possível reconhecer na humanidade da pessoa humana, a fonte última de reconhecimento de seus direitos, ainda que não se manifeste com violência ou consenso. Ou seja, a fato de viver faz a pessoa portadora de uma entidade que lhe permite exigir que outras façam ou deixem de fazer alguma coisa com relação a sua existência (vide AGAMBEN, Giorgio. O que resta de Auschwitz . São Paulo: Boitempo, 2008). .

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distinguido entre: a) a exigência de não realizar determinadas condutas em função dos direitos reconhecidos; e b) a exigência não só de não realizar determinadas condutas, senão também de exigir a realização de determinas atividades em função dos direitos reconhecidos 61 . Assim, quando aqui se fala de direitos humanos fazse referência aos direitos que possui uma pessoa pela simples condição de tal62 : o reconhecimento de sua humanidade implica o reconhecimento desses direitos 63 . O reconhecimento dos direitos humanos foi aprofundandose, em especial como conseqüência dos maiores conflitos armados do século passado, em particular depois da Segunda Guerra Mundial, pois este último acontecimento não só gerou um holocausto de magnitude planetária senão, também, colocou em evidência a possibilidade fática da extinção da humanidade 64 . Assim, ante as manifestações exacerbadas que priorizavam os estados, operou uma verdadeira mudança de paradigma em favor da pessoa humana 65 . Com efeito, no artigo 1 o da Declaração Universal foi estabelecida uma opção antropológica jurídica mínima a partir da igualdade e dignidade de direitos que exclui qualquer posição transpersonalista 66 . O

61 Cf. SHUE, Henry. Basic Rights: Subsistence, Affluence, and U.S. Foreign Policy , p. 34. 62 Sobre os direitos do homem a bibliografia é interminável. Reconhecem como fundamentos o direito natural. Sobre sua evolução contemporânea pode consultarse o trabalho de BARRETTO, Vicente. Les fondements éthiques des droits de l’homme. In: Paideia Project OnLine . http://www.bu.edu/wcp/Papers/Huma /HumaBarr.htm (consultado em 5/9/2005). Um enfoque mais antigo, JOUFFROY, TH. Cours de Droit Naturel . Paris: Librarie de L. Hachette et, 1858. 63 Vide CANEY, Simon. Justice Beyond Borders: a global political theory . NY: Oxford University Press, 2005; GRIFFIN, James. On Human Rights . New York: Oxford University Press, 2008; NICKEL, James. Making Sense of Human Rights. Malden, MA: Blackwell, 2006; (vide AGAMBEN, Giorgio. O que resta de Auschwitz . São Paulo: Boitempo, 2008) Uma outra perspectiva para a definição dos direitos humanos pode encontrarse no trabalho de Charles Beitz, para quem o conteúdo do conceito de direitos humanos surgiria a partir do reconhecimento dado pelos estados nas suas atividades no plano internacional (BEITZ, Charles. Human Rights as a Common Concern . American Political Science Review 95. Cambrigde Press, 2001). Esta posição é objetável, pois no presente trabalho, partese do princípio de que os direitos humanos constituem um instrumento limitador do poder do estado, portanto, sua definição deve ser preexistente a esse poder, e não depender deste. 64 COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos , p. 210. 65 ZAFFARONI, Eugenio Raúl ALAGIA, Alejandro – SLOKAR, Alejandro. Derecho Penal. Parte General. Buenos Aires: Ediar, 2000, p. 194. 66 FERRAJOLI, Luigi. Sobre el papel cívico y político de la ciencia penal en el Estado constitucional de Derecho. In: Nueva Doctrina Penal . 1998/A. Buenos Aires: Del Puerto, p. 63 e ss.

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reconhecimento da existência da pessoa humana e da sua dignidade deve garantir sua proteção integral 67 . Desta forma, o Direito Internacional que tinha sido elaborado para regulamentar as relações entre estados, colocou no centro do debate a pessoa humana e com ela a proteção desta contra, precisamente as ações ou omissões dos estados. Assim, o antigo direito de gentes, na qual sua análise limitavase a analisar a relação entre estados e do nacional com o estrangeiro, passou a considerar o cidadão, antes que vinculado a uma nação, como verdadeiro, cidadão do mundo 68 . Por último, resta considerar e rejeitar as propostas funcionalistas que gravitam em relação ao conceito de sistema 69 e não reconhecem como marco e centro de referência a pessoa humana na sua individualidade, pois ele não é protegido por causa de um próprio direito emergente de sua simples condição humana, senão devido ao fato de pertencer a um grupo ou sociedade 70 . Resta observar que essa visão funcional instrumentaliza a pessoa humana e a desintegra como indivíduo, pois tanto sua existência, quanto seus direitos só dependerá de seu reconhecimento como parte do grupo 71 .

67 Desde essa opção antropológica positivada Zaffaroni reconhece a exigência de um marco teórico que seja personalista, que reconheça no ser humano a capacidade de determinarse conforme o sentido e que se lhe reconheça sua condição de pessoa, isto é dotada de consciência moral (ZAFFARONIALAGIASLOKAR. Ob. cit., p. 352). Expressa Flávia Piovesan que ante a ruptura “do paradigma dos direitos humanos, por meio da negação do valor da pessoa humana como valor fonte do Direito”, surgiu “a necessidade de reconstrução dos direitos humanos, como referencial e paradigma ético que aproxime o direito da moral”. PIOVESAN, FLÁVIA. Direitos humanos e o direito constitucional internacional , p. 129. 68 BARROSPLATIAU, ANA FLÁVIA e LINS DE GÓIS, ANCELMO CÉSAR. Direito internacional e globalização. In: Revista Cidadania e Justiça da Associação dos Magistrados Brasileiros , ano 4, n.º 8, p. 35. 69 A pessoa é entendida como subsistema que deve cumprir uma função social, de tal sorte que seu reconhecimento e proteção dependerá das necessidades do sistema social ao qual pertence. 70 A partir destas coordenadas se apresenta a construção de Jakobs, que distingue entre cidadãos e inimigos da sociedade. Os inimigos, que podem ser internos ou externos, são indivíduos hostis não pessoas, que podem ser neutralizados se não oferecem a garantia mínima cognitiva de que vão comportarse com pessoas. Caso não ofereça essa garantia é possível adiantar a punibilidade, leia se neutralização, a estágios anteriores à lesão de um bem jurídico e limitando, em seu caso, as garantias processuais. Poderseia inferir que os cidadãos são aqueles que oferecem uma garantia mínima de segurança cognitiva que vão comportarse conforme o direito, vale dizer como pessoas. (JAKOBS, Günther. La ciencia del derecho penal ante las exigencias del presente. In: Revista Peruana de Ciencias Penales .n. 1112. Lima: Idemsa, 1998, p. 315316). 71 AMBOS, Ka., La parte General Del derecho penal internacional. Bases para una elaboración dogmática . Montevideo: Fundación KonradAdenauer, oficina Uruguay, 2005, p. 55 56. Zaffaroni, em um recente trabalho (ZAFFARONI, Eugenio Raúl. O inimigo do Direito Penal . Coleção Pensamento Criminológico nº 14. Rio de Janeiro: ICC, Revan, 2007). O trabalho é continuação de outros dois “De Satán al autoritarismo penal cool ” e “¿Es posible un derecho penal del enemigo no autoritario?) analisa se é admissível em um estado de direito a categoria do inimigo ou hostis . Responde considerando que o tratamento penal diferenciado dos hostis implica uma lesão aos limites

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2.5. Poder vs. violência

Assim mesmo, cabe precisar o entendimento dado à violência ao poder e a relação entre estes conceitos. Em tal sentido convém antecipar que foram seguidas as definições realizadas por Hannah Arendt, próprias do campo da política 72 . O poder é entendido como a capacidade humana de agir em comum acordo . Assim, o poder não é propriedade de um individuo senão que existe enquanto o grupo se conserva unido 73 . Conforme o exposto deve entenderse que quando alguém está ‘no poder’ está autorizado por certo número de pessoas a atuar em nome delas. O poder não deve ser confundido com a fortaleza, que designa um atributo individual, ou seja, uma propriedade inerente a um objeto ou uma pessoa , e indica que a mesma tem força, vigor, sendo, portanto, essencialmente independente de outras pessoas 74 . Tampouco deve ser confundido com a autoridade é uma qualidade que importa o reconhecimento incondicional daqueles que devem obedecer , não sendo necessária coação ou qualquer meio de persuasão 75 . do estado a respeito do cidadão o que se coaduna muito mais com o estado absoluto que com o estado de direito. Além disso, observa que como os hostis não são individualizáveis por traços físicos, que cairia em um direito penal de autor cf. Manuel Cancio Meliá (JAKOBS, Günther – CANCIO MELIÁ, Manuel. Derecho Penal del enemigo . Madrid: Civitas, 2003, p. 65 e ss.), a questão não se limita a se é possível reduzir as garantias e liberdades dos terroristas e outros patibulares, senão que a questão a esclarecer é se podem limitarse as liberdades e garantias dos cidadãos para individualizar mais eficazmente aos inimigos, ainda assumindo o risco de considerar inimigo a algum cidadão. Em tal sentido observa os antecedentes do tratamento diferenciado do inimigo em Hobbes, para quem o inimigo era quem resistia o poder do soberano, introduzindo a guerra; em Kant, quem considerava que os povos ou seres humanos em estado de natureza, com suas presenças anárquicas representam um perigo e, em tais condições existe o direito a obrigarlhes a entrar no contrato como única forma de garantir a paz; e finalmente em Carl Schmitt, para quem a distinção entre amigo/inimigo indica o extremo grau de intensidade de uma união ou de uma separação, de uma associação ou de uma dissociação, sem apelar a nenhuma outra distinção nem basearse nelas... o que interessa é que o inimigo é simplesmente o outro, e basta a sua essência que seja existencialmente, em um sentido particularmente intensivo . 72 ARENDT, Hannah. Da Violência. In. Crises da República (Col. Debates n. 85 – dir. Ginsburg, J.). São Paulo: Perspectiva, 2006, p. 123. 73 ARENDT, H. Da violência, p. 123. 74 Explica Hannah Arendt que a fortaleza do indivíduo mais forte pode ser subjugada por um grupo, que muitas vezes se forma com a única finalidade de arruinar a fortaleza, em razão de sua peculiar independência. ARENDT, H. Da violência, p. 123. 75 ARENDT. H. Da violência, p. 123.

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A violência é um meio de exercer coação, tendo um caráter meramente instrumental. A essência da ação violenta é marcada pela relação meio fim, que sendo aplicada às questões humanas tem a característica de o fim ser sobrepujado pelos meios que ele justifica e que são necessários para atingilo 76 . Por tal motivo, os meios técnicos utilizados para uma guerra, seja convencional ou suja, nunca podem ser previstos com segurança e em vista da periculosidade que comportam terminam sendo mais relevantes que o próprio fim que se persegue. Nesse sentido, o dano produzido nas ditaduras latinoamericanas pelos meios empregados tem colocado em segundo plano os fins, reais ou inventados, que deram origem à intervenção militar. Por outra parte, cabe observar que a violência não deve ser confundida com o poder 77 , pois são conceitos diversos que funcionam de forma antagônica. Explica Hannah Arendt que o poder, como expressão de consenso, encontra sua legitimidade no ato em que as pessoas de comum acordo se unem. O poder assim entendido constitui o pressuposto para que a comunidade organizada possa pensar e agir segundo meios e fins. A violência, por sua natureza instrumental, carece de legitimação, porém, precisa de orientação ou justificação que lhe atribua sentido. Vale lembrar que o questionamento sobre a legitimidade encontra resposta no apelo ao passado ; enquanto que, a indagação sobre a justificação exige a consideração do fim que existe no presente ou se projeta ao

76 ARENDT, H. Da Violência, p. 94. 77 Dentro da ciência política é possível observar que a violência foi considerada como uma manifestação de poder. A confusão em parte responde à velha idéia de estado absoluto onde o poder era vinculado ao soberano. Nesse sentido vale lembrar Jean Bodin no século XVI e Thomas Hobbes, no século XVII. Por outra parte, Voltaire afirmava que o poder “consiste em fazer os outros agirem como eu quiser”. De outra parte, a tradição grega que ao definir as formas de governo, considerava as formas em que se apresentava o domínio do homem sobre o homem. Assim, o domínio de um ou poucos na monarquia e oligarquia, e do melhor ou de muitos na aristocracia e na democracia. Finalmente, caberia acrescentar a burocracia, como domínio de ninguém 77 . Na tradição hebraico cristã a concepção imperativa da lei importava a consideração da relação entre ordem e obediência na essência da lei, o que também confirmava a tendência a vincular o poder com a dominação e a obediência. Assim, John Stuart Mill entendia que “a primeira lição de civilização é a da obediência” Desde uma construção teórica que parte de uma sociedade integrada por grupos com interesses diversos, foi entendido, também, que “toda política é uma luta pelo poder; a forma básica de poder é a violência”; na forma de poder estatal “domínio do homem pelo homem por meio da violência legítima”; assim o poder era “um ato de violência para compelir o oponente a proceder como desejamos”. Outra tradição pode observarse em Atenas, onde sua constituição foi chamada de isonomia e, também, nos casos dos romanos que chamava sua forma de governo de civitas . Em ambos os casos o domínio da lei repousava no poder do povo, enquanto tinha dado o seu consentimento. Assim, é o apoio do povo que outorga o poder às instituições de um país, que decaem quando o poder do povo cessa de lhes sustentar (ARENDT, H. Da violência, p. 122).

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futuro , de tal forma que quanto maior é a projeção ao futuro menor é sua justificação. Assim, no caso do poder, a indagação sobre a legitimidade exige a avaliação de como foi estabelecida a união e o consenso entre as pessoas que integram a comunidade, carecendo de sentido o interrogante sobre sua justificação; a violência, como forma de coação carece de legitimação, porém, sua justificação exigirá a consideração de uma circunstância imediata que exija sua implementação, ou seja, que a torne necessária para o fim proposto. Do exposto se segue que quanto maior é o consenso em uma estrutura política, maior será também o poder desta, e, conseqüentemente menor será a necessidade do uso da violência; o consenso torna desnecessária qualquer forma de coação. O uso da violência, para alcançar o consenso, evidencia ao mesmo tempo falta de consenso e, logicamente, perda de poder. Quando a violência é extrema, já não é contida pelo poder e, passa a constituir um fim que só acaba com a destruição do poder. Nessa hipótese o poder é destruído e, a partir desse momento a dominação é estabelecida pelo terror, que passa a ter o controle total da situação, não distinguindo entre os amigos ou inimigos, sejam internos ou externos, do regime 78 . Assim, em síntese, “poder e violência se opõem; onde um deles domina totalmente o outro está ausente; A violência aparece onde o poder está em perigo, mas se a permitem seguir seus próprios caminhos, resulta no desaparecimento do poder... a violência pode destruir o poder, mas é totalmente incapaz de criálo” 79 . Cabe observar que a violência é uma característica de todas as instituições sociais criadas para a defesa e proteção de determinados interesses 80 , porém na medida em que a mesma seja aplicada, ficará em evidência que aqueles não possuem o consenso que os legitime. Resta dizer que os termos assim definidos nem sempre se apresentam nas formas puras no plano da realidade. Com efeito, na maioria das

78 O terror como é conhecido hoje, ataca sem provocação preliminar, e suas vítimas são inocentes até mesmo do ponto de vista do perseguidor, não só como prática de extermínio e amedrontamento dos oponentes, senão também como instrumento corriqueiro para governar as massas obedientes (ARENDT. Hannah. Origens do totalitarismo , São Paulo: Companhia das letras, 1989, p. 26). 79 ARENDT. H. Da violência, p. 132. 80 MUÑOZ CONDE, Francisco. Derecho Penal y Control Social. Jerez: Fundación Universitaria de Jerez, 1985, p. 16.

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sociedades as comunidades institucionalizam o poder, estabelecendo autoridades, que exigem seu reconhecimento incondicional, utilizando para tal fim a violência, segundo o tempo e as circunstâncias. Por outra parte, cabe observar que o homem é um ser situado em um determinado espaço físico, sobre o qual se estabelecem os assentamentos e se estabelecem as formas de convivência e, conseqüentemente, as relações de poder 81 .

Quando o homem se estabelece em um lugar determinado estabelece uma forma de pensar e sentir determinada. Ao mesmo tempo estabelece uma ordem concreta que vigora nesse espaço ou território determinado. Essa definição de uma ordem do espaço concreto constitui uma disposição e uma ordem especifica: um nomos da terra. 82

Nessa ordem concreta se estabelece uma especial relação entre o espaço e o poder, pois este último opera dentro dos limites daquele e porque a partir da definição desse marco se definem as relações com outros poderes soberanos 83 .

Cabe observar que a existência de uma coletividade determina uma ordem específica que é formalizada pelo direito. Por tal razão o direito se encontra determinado, na sua matéria ou substância – isto é em sentido valorativo – pelo nomos e o estado aparece como entidade portadora de uma ordenação espacial 84 com projeção no plano interno e externo, de tal forma que o direito dos estados são compreensíveis a partir de sua configuração espacial 85 .

Schmitt, por meio da combinação e integração do nomos e do GroBraum (grande espaço) tratou de fundamentar um princípio de ordem interno e internacional que desse conta da crises do estado nação 86 . A soberania, assim, opera sobre uma ordem concreta, limitada desde o ponto de vista físico, social político e jurídico.

81 SCHMITT, C. El nomos de la Tierra en el derecho de gentes del Jus Publicum Europaeum. Granada: Comares, 2002, p.15. 82 SCHMITT, C. El nomos de la Tierra..., p.17. 83 SCHMITT, C. El nomos de la Tierra, p. 20. 84 SCHMITT, C. El nomos de la Tierra, p. 157 e ss. 85 SCHMITT, C. El nomos de la Tierra, p. 258. 86 PEREZ, José Luis Monereo. Estudio Preliminar Soberania y orden internacional en Carl Schmitt. In: SCHMITT, C. El nomos de la Tierra en el derecho de gentes del Jus Publicum Europaeum. Granada: Comares, 2002, p. XLVII.

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Assim mesmo, observa o autor, o sistema internacional integrado por vários estados soberanos constitui um fenômeno histórico, mas não é o único. Em tal sentido, observa que o império, isto é a formação de uma grande extensão de território controlada por uma potência mundial, cristalizaria a superação da forma estatal tradicional, como conseqüência do desenvolvimento industrial e das relações de mercado que se orientam à abertura de um espaço mundial único 87 .

A formação de grandes espaços sob o domínio unilateral tem gerado uma forte tensão nas relações multilaterais das grandes potências, prejudicando o equilíbrio necessário para garantir a paz estável no âmbito internacional. Da mesma forma, tem prejudicado a relação com e entre as outras potências, que ficam mais vulneráveis às ingerências das grandes potências. Isto seja por oposições diretas ou indiretas, em qualquer caso para estabelecer um pensamento único ou homologador de uma visão globalizadora do mundo com um estado universal transcultural e homogêneo, ou mediante uma pluralidade de grandes espaços com um centro diretivo e tutelar em uma potência hegemônica continental ou regional 88 .

As ditaduras da região (Argentina, Chile, Brasil, Paraguai e Uruguai, dentre outros), representaram uma demonstração evidente da tensão entre as grandes potências e a ingerência destas, na medida em que estabeleceram um espaço de indefinição ou exceção, dependente de suas pressões diretas e indiretas.

Da mesma forma, só que mais atual, o sistema internacional de direitos humanos se apresenta como um instrumental de tensão e submissão dos países ao desígnio das grandes potências, operando em forma similar a então, pois, novamente, por essa via procurase suspender a normalidade intraestatal do direito. Porém, com uma neutralidade instrumental, sobre a base de uma legalidade que, em rigor, não é mais uma nova forma de imposição, que em alguns países, aos poucos começou a evidenciar certa hostilidade, como por exemplo, nas recentes intervenções humanitárias ou nas chamadas ações preventivas. A procura de uma resposta punitiva importa recorrer à violência como forma de responder aos conflitos sociais.

87 Idem, p. XLVIII. 88 FERNÁNDEZ PARDO, Carlos A. Carl Schmitt em la teoria política internacional. Buenos Aires: Biblos, 2007, p. 93

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2.6. Opção discursiva redutora da punição

O presente trabalho parte de uma opção discursiva redutora da punição, isto é da violência 89 . Em tal sentido considerase que o direito é um saber jurídico e não uma ciência, que elabora um discurso que tem por objetivo interpretar leis, que, em algumas hipóteses, habilitam a imposição de um tipo especial de sanção que chamamos pena. A elaboração desse discurso é neutra ou avalorada, pois toda construção jurídica parte de uma idéia de estado, sociedade e indivíduo. Por causa disso, toda teoria jurídica tem um conteúdo político, explícito ou implícito que lhe dá sustentação. Nosso discurso jurídico, como toda teoria jurídica, parte de uma idéia de indivíduo entendido como pessoa humana com capacidade para autodeterminarse, ou seja, para escolher entre fazer ou não fazer, conforme sua orientação de sentido. Assim desconsideramos as opções deterministas que consideram a pessoa como um ente determinado, seja, por exemplo, por questões hereditárias, patológicas ou culturais. A sociedade é entendida como uma comunidade integrada por diversos grupos de pessoas, às vezes em permanente tensão ou conflito, outras vezes, estabelecendo relações de cooperação, e o estado, como instituição, participando da decisão de conflitos 90 . A lei, nesse contexto, nem sempre reflete o interesse de todos, senão o do grupo dominante. Desta vez se desconsideram as teorias do consenso, que consideram que a sociedade tem os mesmos valores, sintetizandose na lei.

Finalmente, a nosso ver, a sociedade deve procurar organizar se para reforçar o estado constitucional de direito, entendido como uma organização

89 Em tal sentido, é seguida a diretriz estabelecida na obra BATISTA, Nilo – ZAFFARONI, Eugenio Raul – ALAGIA, Alejandro – SLOKAR, Alejandro. Direito Penal Brasileiro , Volume I. Rio de Janeiro: Revan, 2003, continuada no trabalho RAIZMAN, Daniel Andrés. Direito Penal I . São Paulo: Saraiva, 2008. 90 Dessa forma é introduzida a crítica sociológica ao direito penal (ZAFFARONI, Eugenio Raúl, La crítica sociológica al derecho penal y el porvenir de la dogmática jurídica. In: Hacia un realismo penal marginal . Caracas: Monte Ávila, 1993, p. 15 e ss., entre outros); e aquí ao direito penal internacional.

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política que procura garantir os direitos de todos seus membros por meio da construção do consenso, sem necessidade do uso da violência. A lei, como regra de comportamento, deve surgir da participação efetiva e igualitária de todos os indivíduos, refletindo, assim, os interesses de todos. Assim, consideramos negativamente o estado de polícia, que organiza politicamente a comunidade por meio do uso da violência. A lei, estabelecida pelo grupo dominante que teria consciência do que é bom e melhor para todos, habilita a violência como forma de garantir sua própria estrutura de poder mediante o exercício de uma violência institucionalizada e conservadora do direito 91 .

Com efeito, observar Walter Benjamin, que o direito, em geral, proíbe em regra a violência individual e a condena na medida em que se apresenta como uma ameaça à própria ordem jurídica. Por tal motivo, o direito procurase instaurar e, uma vez estabelecido, conservarse, rejeitando a violência não exercida por ele 92 .

Assim, o estado por meio do uso do poder assegura sua existência seja mediante o exercício de uma violência fundadora , que institui e instaura o direito, e uma violência conservadora , que mantém ou assegura a permanência e aplicabilidade do direito.

Cabe observar que os estados surgem de uma situação revolucionária, que em regra apresentase mediante o uso da força ou violência, que inaugura um novo direito, que terá vinculação com os fatores fundadores do direito.

Por isso sempre existirá uma estreita relação entre a violência fundadora e conservadora do direito 93 . Da mesma forma que a compreensão da violência conservadora do direito dependerá do fato fundador, este será compreendido, posteriormente, em função do momento conservador.

A violência fundadora suspende inicialmente o direito para fundar o novo, gera assim, junto com essa ruptura, uma instância de nãodireito. Nesse momento de fundação, o direito fica suspenso no vazio ou em cima do

91 BENJAMIN, Walter. Para una crítica de la violencia . Buenos Aires: Leviatán, 1995. 92 BENJAMIN, Walter. Para una crítica de la violencia . 93 DERRIDA, Jacques. Força de Lei: o fundamento mítico da autoridade. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 83.

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abismo, sem que deva prestar contas a ninguém 94 . Dessa forma, haveria uma mistura dessas violências na instituição da moderna polícia do estado, cujos limites são indetermináveis. A combinação dessas violências gera uma nova ordem com força de lei, mas sem lei, que suspende ou releva qualquer função fundadora ou conservadora do direito.

A violência policial por ter sua origem em “uma decisão instituinte que, não tendo por definição de justificar sua soberania diante de nenhuma lei preexistente, apela somente para uma “mística” que só pode enunciar se na forma de ordens” 95 ; apresentase assim, descontrolável e degenerativa da democracia e, vale frisar, também, fora do direito.

Cabe observar que quando a autoridade impõe o direito, pelo menos, no ato fundador, o faz mediante a violência. Essa violência é oculta a partir da apresentação de valores imanentes da comunidade, que devem ser seguidos pelos seus membros; sem embargo quando “devem ser seguidos” se institucionaliza novamente a violência, que, desta vez, tentará conservar o direito já instituído.

A violência se apresenta assim, como instrumento para a conservação do direito imposto no ato fundador quando o fundamento místico da lei baseado na autoridade que impõe o direito e que procura ocultar o momento da violência fundadora não obtém um adequado reconhecimento.

Nesses termos uma teoria da justiça que procure legitimar o direito, mantendo o seu elemento coercitivo, teria como efeito instituir um fundamento místico da lei que ocultaria a violência exercida, tanto no ato fundador, quanto no ato conservador do direito. Mas, ao mesmo tempo estaria legitimando a violência, como um valor imanente da própria ordem que se procura impor e eternizar no tempo.

O direito procura atualizar o passado, o seu momento constitutivo, agindo em uma realidade que lhe é distante e que lhe é adversa. Sua força constitutiva, então se atualiza e se impõe de forma violenta a essa realidade que, como simples dever ser não conseguiu atingir. O direito, então, reconhece sua incapacidade enquanto imperativo e passa a ser um instrumento de força.

94 DERRIDA, Jacques. Força de lei. p. 84. 95 DERRIDA, Jacques. Força de lei. p. 106.

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O direito, ante a situação adversa habilita uma violência que reflete não sua constituição senão sua dissolução, sua incapacidade de reconstituir se como a realidade que não foi, mas que deveria ter sido de outra maneira. A violência não pode atualizar o direito senão perceber como ele se perde no tempo, incapaz de reafirmar sua própria existência. Se, como foi dito, o direito não pode operar somente com o consenso, então ele teria que coexistir com o uso da violência. Nesse caso, cada vez que o direito deva recorrer à violência, então demonstraria sua falta de consenso, ou seja, sua falta de poder ou autoridade para se impor nas relações interpessoais.

Neste esquema conceitual o direito penal, seja na ordem interna ou internacional, constituiria, nos respectivos âmbitos, a expressão máxima da violência institucionalizada que, responderia, em princípio, à violência das relações interpessoais, quando lesivas aos direitos destas.

O direito penal então se apresentaria como o barômetro do poder do estado (ou dos estados) baseado no consenso, onde sua aplicação, por irrigar violência, apresentarseia como a negação do próprio direito.

Em tal sentido, cabe atualizar o caráter sancionador da lei penal, isto é simplesmente punitivo ante as lesões dos direitos definidos em outros ramos dos direito. O direito penal seria uma simples potentia punindi , que reagiria a um ser que não foi como deveria ter sido, e que precisaria de limitação e contenção uma vez que não se apresenta um direito senão como uma violência que precisa de justificação para sua habilitação.

O direito penal deve constituir a ultima ratio , pois sua aplicação só pode operar como exceção de uma generalidade estabelecida pela norma. A aplicação da lei penal importa uma decisão em termos políticos que confirmaria a existência de uma regra do direito sem violência e cuja manifestação extensiva, anularia o direito, vertendose em uma máquina letal.

Assim, como os estados, atualmente, não concebem o uso do poder sem o recurso à violência, cabe considerar que em cada estado, encontrase

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embutido uma potencia que se for liberada o poderia destruir 96 . Dessa forma, se impõe a contenção ou limitação dessa violência.

O direito como consenso, na medida em que se apresente junto à pena, com violência se encontrará em permanente tensão, da qual sua finalidade não poderá ser o reconhecimento dos direitos, senão propriamente sua negação.

Do exposto se segue que o direito penal não poderia exercer uma função de prevenção geral positiva, pois, quando maior seja sua aplicação menor será o espaço dos direitos. Em tal sentido, cabe lembrar que para Welzel, mediante a pena se reforçaria simbolicamente internalizações valorativas do sujeito não delinqüente para conservar e fortalecer os valores éticosociais elementares frente a ações que lesam bens e se dirigem contra esses valores 97 . Jakobs, por sua parte, entende que: "A pena é sempre reação, ante a infração de uma norma. Mediante a reação sempre fica de manifesto que tem que observála. 98 ". Para este autor, ante o absurdo que seria querer um mal porque já se deu outro mal, a pena terá que defini la positivamente: "É uma amostra da vigência da norma a costa de um responsável. Desde aí surge um mal, mas a pena não cumpriu já seu encargo com tal efeito, a não ser, só com a estabilização da norma lesada” 99 . A partir da perspectiva seguida, o direito penal não pode ter a função de reforçar os valores éticosociais ou a estabilidade das normas, uma vez que sua aplicação importa a negação do próprio direito.

Por outra parte, por via da intimidação poderia procurar dissuadir os potenciais delinqüentes a fim de que se abstenham de cometer delitos. Um de seus mais conhecidos expoentes foi Feuerbach, quem considerava, como causa do crime que 'o apetite do homem se vê impulsionado à comissão pelo prazer na ação'. Por isso, dizia, se querem evitar as infrações 'não fica ao Estado outro

96 Em tal sentido observa Zaffaroni que dentro de cada estado de direito existe um estado de polícia, e entre estes existe uma relação dialética onde ante cada impulso do estado de polícia o estado de direito intervém para contêlo (Entende o autor que o estado de direito,submete a todos os habitantes à lei, em oposição ao estado de polícia, no qual, todos os habitantes estão subordinados ao poder de que manda (ZAFFARONI, R.E. – ALAGIA, A. – SLOKAR, A. Derecho Penal, p. 5). 97 WELZEL, Hans, Derecho Penal Alemán. Parte General (trad. de J. Bustos Ramírez y S. Yáñez Pérez). Santiago de Chile: Editorial Jurídica de Chile, 1970, p. 3. 98 JAKOBS, Günther, Derecho Penal. Parte General . Fundamentos y teoría de la imputación. Madrid: Marcial Pons, 1997, p. 8. 99 Idem , p. 9.

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meio, senão, intervir por meio da sensualidade mesma na sensualidade, e neutralizar o estímulo sensorial mediante outro estímulo sensorial' 100 .

Neutralizamse os impulsos para a ação 'quando todo cidadão sabe com certeza que à infração seguirá um mal maior que aquele que surge da não satisfação da necessidade depois de uma ação'. Esta consciência transmite ao cidadão ao ameaçar uma lei com o mal maior, a pena, antes do fato e com uma descrição exata do fato e da pena, e ao pôr de manifesto a seriedade da ameaça mediante a execução em todo caso de infração 101 .

O problema dessa teoria é que, ainda que seja difícil de provar o efeito dissuasório, levaria inevitavelmente à violência extrema, seja mediante a negação da vida, bem como qualquer outra expressão do direito. Assim mesmo, levaria a instalação de um estado do terror, pois a sociedade estaria pautada pela violência e não pelo consenso. A exposição extrema da violência, leva a anular qualquer resquício do direito como expressão de consenso.

Por sua parte, as teorias preventivoespeciais, na versão positiva 102 , desconhecem o efeito aflitivo 103 , isto é o conteúdo de violência intrínseco da pena, e na versão negativa 104 , permite o estabelecimento do estado do terror, uma vez que o direito então se estabeleceria como um programa de extermínio. Resta observar, por último, que definimos a pena a partir de sua manifestação real e concreta, reconhecida e estudada, em particular, pelas ciências sociais. Não limitamos sua definição aos enunciados legais, pois nem sempre a lei reconhece o caráter punitivo de uma sanção, mas nem por isso perde seu conteúdo punitivo. Assim, conforme o exposto a pena, no plano político pode ser

100 FEUERBACH, Paul Johann Anselm Ritter v., Tratado de derecho penal . Colección de Criminalistas perennes, n° 1 (dir. M. de Rivacoba y Rivacoba y E. R. Zaffaroni). Buenos Aires: Hammurabi, 1999. 101 JAKOBS, Günther, ob. cit., p. 26. 102 Mediante estas teorias se procurou atribuir à pena a função de melhoramento sobre o criminalizado. Através das ideologias "ré" (resorcialização reeducação, reinserção, repersonalização, etc.) tentouse sustentar o aprisionamento como meio para alcançar o melhoramento do institucionalizado. (Vide FERRI, Enrico, Sociología Criminal (trad. de A. Soto e Hernández) Madrid, s.f). 103 ZAFFARONI, R.E. – ALAGIA, A. – SLOKAR, A. Derecho Penal. Parte General. Buenos Aires: Ediar, 2000, p. 60. 104 Garófalo sustentava que os delinqüentes eram seres inferiores e degenerados, que impunham a necessidade da pena capital para combater com estes, aos que considerava inimigos interiores da sociedade (GARÓFALO, Rafael, La Criminología . Estudio sobre el delito y sobre la teoría de la represión, (trad. de Pedro Dorado Montero), Madrid, s.f., pp. 77 e 133).

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entendida como uma manifestação extrema de violência, cuja utilização implica a perda do poder social de agir de comum acordo 105 . Assim, quanto mais se aplica a pena, mais se reduz o limitado espaço de comum consenso , ainda que seja do grupo dominante. No plano jurídico, pode ser definida como a restrição de um direito que não repara nem interrompe um ato lesivo em curso 106 .

3. Direitos humanos como objeto de reconhecimento e/ou proteção.

O desenvolvimento dos direitos humanos impõe como ponto de partida os direitos do homem no direito internacional. Nesse sentido, afirmase que não pode estar mais em dúvida que o estado e a comunidade internacional estão chamados – forçosamente – a proteger a dignidade humana 107 . A partir de uma perspectiva, é considerada a necessidade de reconhecer o direito a subsistência como um direito básico, pois sem ele é impossível desfrutar todos os outros direitos 108 . Outros consideram que devem ser protegidos os interesses fundamentais da pessoa humana, acrescentando o direito à subsistência, o direito à saúde, à alimentação, evitando assim, a má nutrição ou as doenças 109 . Finalmente, encontramse aqueles que acrescentam a democracia como um valor ideal, pois, por meio desta as pessoas podem satisfazer suas necessidades essenciais, garantindo, também, os seus direitos socioeconômicos 110 . Esses direitos podem ser conjugados com o reconhecimento de ações positivas que garantissem esses direitos e até de deveres negativos de não impor regras injustas ou instituições, como tampouco de gerar danos aos direitos

105 ARENDT, Hannah. Da Violência. p. 123. 106 BATISTA–ZAFFARONI– ALAGIA– SLOKAR. Direito Penal Brasileiro , Cap. 2. 107 Assim, AMBOS, Kai. La parte General del derecho penal internacional, p. 62. Também em Derechos humanos y derecho penal internacional. In: Diálogo Político. Publicación trimestral de la KonradAdenauerStiftung A. C. Año XXI Nº 3 Septiembre, 2004 , p. 85 115. 108 SHUE, Henry. Ob. cit., p. 2627. 109 JONES, Charles. Global Justice: Defending Cosmopolitanism . Oxford: Oxford University Press, 1999, p. 6162. 110 HELD, David. Democracy and the Global Order: from the modern state to cosmopolitan governance. Palo Alto, CA: Stanford University Press, 1995, p. 192198.

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dos outros 111 . Cabe observar, sem embargo, que a violação de direitos humanos nem sempre pode ser evitada sem uma intervenção profunda na realidade das comunidades, o que coloca como dilema ou confronto o reconhecimento dos direitos humanos de uma parte, e o direito à autodeterminação dos povos, de outra parte. A situação é mais crítica quando as comunidades se estruturam social e economicamente de forma diversa a partir de valores culturais diferenciados. O dilema tem um sentido crítico para os nacionalistas na medida em que entendem que é inviável o estabelecimento de uma justiça global, pois resulta, quanto menos, duvidosa a possibilidade de que todos os participantes da comunidade internacional se identifiquem com os mesmos princípios, ou com o seu mesmo grau de reconhecimento. Em tal sentido, é observado que o princípio, por exemplo, de solidariedade, pode ser reconhecido de forma diversa pelas comunidades, sem alcançar de forma igualitária, em todos os casos, o nível global de solidariedade 112 . Por outra parte, argumentase que os princípios são reconhecidos pelos estados de forma recíproca, seja em favor de nacionais ou de cidadãos, dependendo do grau de aceitação, mais do grau de relacionamento 113 que de um comprometimento com os princípios envolvidos. No plano institucional, o ideal de democracia cobra particular relevância, na medida em que se propõe como paradigma organizacional das instituições internacionais 114 . Assim é defendida a idéia de uma ‘democracia cosmopolita’ que reconhece o direito das pessoas de participar nos processos sociais econômicos e políticos, seja na determinação das suas possibilidades, bem como no processo de controle das instituições 115 .

111 POGGE, Thomas. Ob. cit, p. 32. 112 Cf. MILLER, David. Ob. cit. , p. 35. 113 Cf. DAGGER, Richard. Civic Virtues: Rights, Citizenship, and Republican Liberalism. NY: Oxford University Press, 1997, p. 4660. 114 Vide POGGE, Thomas. Ob. cit, p. 41; CANEY, Simon. Cosmopolitan Justice and Institutional Design: an Egalitarian Liberal Conception of Global governance. Social Theory & Practice , n. 32. Thomson Gale, 2006, p. 725726. 115 Vide HELD, David. Ob. cit, p. 23.

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Nesse sentido, procurase que sua estrutura responda a um sistema de pesos e contrapesos que seja útil para proteger os direitos, mais que a um sistema de poder total que possa desenvolver políticas de terror. Assim mesmo, esperase que essas instituições desenvolvam os princípios de justiça global, conforme as necessidades evidenciadas pelas autoridades supraestatais 116 . Nestes termos as instituições podem ter valor meramente instrumental ou um valor substancial intrínseco 117 . O ideal de democracia proposto encontra objeções para os nacionalistas, que defendem como ideal o princípio da autodeterminação dos povos, em razão de que: garante a autonomia e os valores culturais da comunidade; também, que as obrigações que assumem os seus membros não afetem os seus valores, caso essas obrigações se estendam em favor de outros que não pertencem à mesma comunidade 118 . Se uma opção puramente cosmopolita poderia teria por efeito neutralizar as diferenças culturais dos povos, uma opção que garanta a autodeterminação poderia tornar a comunidade internacional espectadora de graves violações de direitos humanos ou até da extinção da vida planetária. O justo meio, talvez, seria pensar no reconhecimento de direitos humanos, como construção cosmopolita, porém com um sistema de proteção que não exerça violência 119 . A legitimidade do sistema de direitos humanos encontra sustento, precisamente, no princípio que reconhece a pessoa humana como centro de referência, com virtualidade para desempenhar uma função de proteção dos seus direitos inerentes pela simples condição de tal, reconhecendo, conseqüentemente, o respeito a sua identidade e cultura 120 .

116 POGGE, Thomas. Ob. cit, p. 187190. 117 Cf. BEITZ, Charles. Cosmopolitan Liberalism and the States System. In: Political Restructuring in Europe: Ethical Perspectives . London: Routledge, 1994, p. 131134. 118 Assim, MILLER, David. Ob. cit., p. 8390; assim mesmo, argumenta que a autodeterminação é essencial para garantir boas políticas públicas, planos de justiça social e o estabelecimento de um governo democrático (p. 9098). 119 Essa questão será analisada no capítulo conclusivo. 120 Cf. HERRERA FLORES, Joaquín. Direitos Humanos, Interculturalidade e Racionalidade de Resistência. In: Direitos Humanos e filosofia jurídica na América Latina . (Antonio Carlos Wolkmer org.) Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 359 e ss.

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4. Vias de reconhecimento e proteção dos direitos humanos.

Como foi observado, por via dos direitos humanos, procurouse achar o caminho para garantir a convivência pacífica das nações, o que, desde então, fez com que fossem elaboradas e aperfeiçoadas normas jurídicas garantidoras dos direitos humanos com vigência planetária; além das fronteiras dos estados nacionais quando aqueles direitos são comprometidos ou violentados. Assim, é possível reconhecer um sistema mundial de direitos humanos, baseados em tratados internacionais, com órgãos próprios de prevenção e proteção 121 . A violação de direitos humanos teve como resposta da comunidade internacional sanções reparadoras dos direitos envolvidos, seja por meio de indenizações ou exigência de políticas públicas que evitassem novas violações 122 . A proteção dos direitos humanos, nos graves conflitos avançou, também, além das sanções reparadoras ou preventivas, para garantir uma resposta punitiva para os responsáveis por tais violações. Uma fundamentação punitiva em favor da proteção dos direitos humanos pode encontrarse em Otfried Höffe, para quem os direitos humanos dos cidadãos mundiais, reconhecidos universal e interculturalmente, e os princípios de justiça, especialmente, da liberdade frente à arbitrariedade e a violência, como forma de proteger o corpo, a vida e a liberdade, devem ser protegidos pela república mundial , caso seja necessário, complementada com um direito penal mundial 123 .

121 GREGORI, Giorgio. La tutela europea di Diritti dell’Uomo . Milano: Sugarco Edizioni. 1979, p. 20 e ss. 122 Nessas instâncias, em regra, eram reconhecidos os estados como sujeitos de direito internacional. Cf. ZAFFARONIALAGIASLOKAR. Ob. cit., p. 195; JESCHECK, HansHeinrich. Tratado de Derecho Penal . Parte General. Granada: Comares, 1993, p. 105. 123 Assim, a proteção mínima dos direitos humanos (moral mínima) seria, ao mesmo tempo, legitimação e limitação do direito penal mundial: “a justificação de um direito penal de um Estado mundial se vincula com sua limitação para a proteção dos direitos humanos”. Enquanto os direitos penais se “possam fundamentar em argumentos humanosgenerais, mais precisamente, argumentos de direitos humanos... existe, sem dúvida alguma, um poder penal transcultural, um direito penal intercultural”. Deste modo, o direito penal mundial formaria parte “do escudo de proteção dos direitos humanos e da visível solidariedade da cidadania mundial com as vítimas das violações aos direitos humanos” que teria que se dirigir aos homens de todas as culturas, não podendo existir, neste sentido, o estrangeiro (vide AMBOS, Kai. La parte General del derecho penal internacional . Bases

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Jürgen Habermas persegue, também, a proteção dos direitos humanos. Expressa que o desejado estabelecimento de um estado cidadão mundial significa que as infrações contra os direitos humanos... sejam perseguidas como ações criminais dentro de um ordenamento jurídico estatal. Neste sentido, os direitos humanos deveriam entenderse não só como orientação moral do atuar político senão, também, como direitos subjetivos que devem ser implementados em sentido jurídico. Esclarece o autor que somente quando os direitos humanos tenham encontrado seu lugar em um ordenamento jurídico global, como os direitos fundamentais em nossas Constituições, poderemos partir, também no plano global, de que os destinatários destes direitos podem considerarse, ao mesmo tempo, como seus autores 124 . A busca de legitimidade estaria, na opinião desses autores 125 , no dever de garantir uma persecução penal efetiva de qualquer pessoa responsável por crimes que ameaçam a paz, a segurança e o bemestar do mundo, em qualquer lugar onde se tenham cometido como necessidade para evitar uma situação de insegurança e precariedade geral equivalente a ordem da força e o arbítrio, é dizer a negação do direito 126 . Dado que dentro de certos limites, entendese que a pessoa individual é sujeito de direitos e deveres dentro do direito internacional, é possível que as infrações graves de determinadas normas nucleares daquele sejam consideradas crimes internacionais que devem ser castigados por este direito 127 . Assim, além de reconhecer a pessoa humana como titular dos direitos humanos, foi reconhecido, também, o autor das violações de direitos humanos. Neste sentido, cabe referenciar, que após a Segunda Guerra Mundial, os vencedores do conflito julgaram a classe dirigente da Alemanha e seus aliados por sua responsabilidade pelos crimes contra a paz, crimes de guerra e

para una elaboración dogmática. Montevidéo: Fundación KonradAdenauer, oficina Uruguay, 2005, p. 62. 124 Vide, AMBOS, Kai. La parte general del derecho penal internacional, p. 63. 125 Em rigor não são os únicos. Observava Vassalli que após a Segunda Guerra Mundial era compartilhado o entendimento em favor do efeito preventivo da pena entre os fins da pena, junto à idéia de uma retribuição justa, era dominante a prevenção geral, é dizer que os processos e as penas deviam existir para que atrocidades desse tipo não se repetissem no futuro (VASSALLI, G. La giustizia internazionale penale. In I diritti dell´uomo: cronache e battaglie , n. 1, 1998, p. 30. 126 EIROLA, Pablo D. La Corte Penal Internacional. Fundamentos y Jurisdicción . Buenos Aires: Ad Hoc, 2004, p. 71. 127 JESCHECK, HansHeinrich. Ob. cit., p. 106.

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crimes contra a humanidade. Também, podem ser considerados os Tribunais para a ExIugoslávia e Ruanda; e finalmente, como último estágio, a Corte Penal Internacional 128 . Nesse processo é possível observar a elaboração de uma resposta punitiva seletiva, tendo em vista que numerosos conflitos lesivos aos direitos humanos não tiveram a mesma resposta da comunidade internacional 129 . A abrumadora quantidade de conflitos coloca em evidência a seletividade da comunidade internacional para interagir com esses, bem como a falta de efeito preventivo das respostas punitivas. Esta seletividade direcionada as condutas consideradas como crimes internacionais, primeiro, e aos autores daqueles depois, evidencia uma nova instância punitiva internacional 130 como, também, a crise dos estados, entendidos como unidades autônomas e independentes, mostrando uma desigualdade concreta entre estes, fruto inevitável da aplicação da lei do mais forte no âmbito internacional 131 . Em tal sentido, cabe considerar as chamadas ‘intervenções humanitárias’, cuja justificação é questionável 132 , em especial desde uma perspectiva empírica.

128 Sobre a criação de tribunais ver: JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. O Tribunal Penal Internacional. A Internacionalização do Direito Penal . 129 Vide tabelas de conflitos internacionais, em que são apresentadas as vítimas dos diversos conflitos armados e dos estados ditatoriais de 1945 a 2008 no final do capítulo. Essas tabelas formam parte da investigação Fighting impunity and promoting international Justice European Initiative for Democracy and Human Rights: Promoting Justice and the Rule of Law – General Report 26 October 2008, por M. Cherif Bassiuni O. (gentilmente fornecido pelo prof. Carlos E. Japiassú). 130 JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. O Tribunal Penal Internacional ; do mesmo, Direito Penal Internacional . Belo Horizonte: Del Rey, 2009; Direito penal internacional, estrangeiro e comparado . (JAPIASSÚ, C. E. A. org.). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007; T ribunal Penal Internacional. Possibilidades e Desafios . (JAPIASSÚ, C. E. A. AMBOS, Kai orgs.). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005; MACHADO, Maíra Rocha. Internalização do direito penal. A gestão de problemas internacionais por meio do crime e da pena . São Paulo: Edesp, 2004. 131 FERRAJOLI, Luigi. La soberanía en el mundo moderno. In Derechos y Garantías. La ley del más débil . Madrid: Trotta, 1999, p. 146. Observa o autor que a crise dos estados se apresenta em dois planos. De um lado, a causa da abundante transferência para instâncias supraestatais ou extra estatais; de outro, pelas tensões centrífugas e os processos de desagregação que fazem cada vez mais difíceis as funções estatais históricas de unificação nacional e pacificação interna (p. 150). Com sentido crítico, também, MELLO, Celso de Albuquerque. A Soberania através da história , p. 22; Também, SCHMITT, Carl. El nomos de la Tierra en el Derecho de Gentes del Ius Publicum europaeum. Granada: Comares, 2002; PARDO, Carlos A Fernández. Carl Schmitt en la Teoria política internacional . Buenos Aires, Biblos: 2007. 132 Entende que poderia justificarse para garantir uma integração comunitária, quando a comunidade encontrase dividida por questões religiosas, étnicas ou de outra índole e um grupo vitimiza a outro. WALZER, Michael. The Moral Standing of States: A Response to Four Critics. Philosophy. & Public Affairs, vol. 9, n. 3, 1980, p. 211.

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Por além das reivindicações de vingança por parte das vítimas em relação àqueles que as subjugaram e da meditada elaboração de um programa protetor dos direitos humanos, certo é que fica sem ser aprofundada a necessidade de responder, com o uso do sistema punitivo – isto é com violência – para a proteção dos direitos humanos no mundo globalizado 133 , uma vez que esse tipo de respostas não implicam a solução ou resolução do conflito 134 . Desde outra perspectiva, poderseia afirmar que, no âmbito internacional e nacional, os direitos humanos, que tradicionalmente se elaboraram como forma de resistir às manifestações do poder punitivo, hoje se apresentam habilitando, também, uma resposta punitiva. Pode objetarse que por esta via se chega à situação paradoxal de que um instrumento de limitação do poder punitivo se apresente como instância habilitadora deste nos casos de graves conflitos. Sendo assim, frente a esta habilitação se impõe uma nova atividade discursiva redutora. Dentro do âmbito penal internacional, a questão se apresenta entre estas posições: de uma parte, reforçando os direitos humanos, que podem ser ameaçados por necessidades conjunturais do poder punitivo; de outra, recortando discursivamente o âmbito de aplicação dos direitos humanos para habilitação do poder punitivo na perseguição de autores de graves violações de direitos humanos e na medida necessária para assegurar sua efetividade.

Ante as respostas originadas em vinganças ilimitadas parece certo pautar a resposta de forma racional, ou melhor, o menos irracional possível. A partir desta perspectiva, seria mister contar com um discurso jurídico que permita interpretar as disposições reguladoras das respostas punitivas no caso de crimes com relevância internacional pela grosseira violação de direitos humanos.

Não se desconhece que as violações de direitos humanos, por regra são previstas como crime em disposições do direito interno. Mas nesse âmbito, se estabeleceram regras garantidoras de tais direitos. O problema acontece quando

133 Chama a atenção neste sentido AMBOS, Kai. La parte General del derecho penal internacional , p. 32. (vide, tradução em português A parte Geral do Direito Penal Internacional. Bases para uma elaboração dogmática. (trad. JAPIASSÚ, C.E.A. – RAIZMAN, D. A.). São Paulo: RT, 2008). 134 MACHADO, Maíra Rocha. Internalização do direito penal. A gestão de problemas internacionais por meio do crime e da pena . São Paulo: Edesp, 2004, p. 19.

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se pretende sair do regime interno para, no plano internacional, habilitar respostas punitivas só limitadas pela vontade de quem exerce o poder 135 .

5. Sistema de Direitos Humanos no Brasil

5.1. Introdução

No continente americano, o sistema de proteção de direitos humanos é regulamentado pela recepção de diversos tratados internacionais 136 e, especialmente, pela Convenção Americana de Direitos Humanos – Pacto de San José de Costa Rica , adotada no âmbito da Organização dos Estados Americanos, em São José da Costa Rica, em 22 de novembro de 1969, entrou em vigor internacional em 18 de julho de 1978, e no Brasil, em 25 de setembro de 1992 137 , e pelo Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, adotado pela XXI Sessão da AssembléiaGeral das Nações Unidas, em 16 de dezembro de 1966, entrou em vigor internacional em 23 de março de 1976, e em vigor no Brasil em 24 de abril de 1992 138 . A Convenção Americana de Direitos humanos se desenvolveu como um instrumento de proteção das pessoas humanas ante as ações ou omissões dos estados, quando estas se apresentam como lesivas aos direitos que lhe são inerentes por sua simples condição de pessoa.

135 Neste sentido, com razão, Ferrajoli coloca como desafio refundar o direito internacional não já sobre a idéia de soberania dos estados, que é contrária a idéia do estado de direito, senão sobre a autonomia dos povos, entendido como direito de autodeterminação (FERRAJOLI, Luigi. La soberania en el mundo moderno , p. 151). 136 Cabe lembrar que foram ratificadas: a Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes; a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, em 20 de julho de 1989; a Convenção sobre os Direitos da Criança, em 24 de setembro de 1990; o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, em 24 de janeiro de 1992; o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, em 24 de janeiro de 1992; a Convenção Americana de Direitos Humanos, em 25 de setembro de 1992; a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, em 27 de novembro de 1995. 137 Vide Decreto n. 678, 6 de novembro de 1992. Publicado no D.O.U de 9.11.1992. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/dem 25 de setembro de 1992decreto/D0678.htm – Consultado em 29/07/2009. 138 Vide Decreto n. 592, de 6 de julho de 1992. Publicado no D.O.U. de 7.7.1992 . Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/19901994/D0592.htm Consultado em 29/07/09.

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Cabe observar que o sistema da Convenção estabelece obrigações objetivas para os estados em favor dos indivíduos que se apresentam como titulares de tais direitos; e que se aplicam de forma subsidiária, isto é quando não se alcança a proteção dos direitos humanos apesar de ter esgotado os recursos internos de cada pais 139 . Resta observar que: Com a adesão aos dois Pactos Internacionais da ONU, assim como ao Pacto de São José no âmbito da OEA, em 1992, e havendo anteriormente ratificado todos os instrumentos jurídicos internacionais significativos sobre a matéria, o Brasil já cumpriu praticamente todas as formalidades externas necessárias a sua integração ao sistema internacional de proteção aos direitos humanos. Internamente, por outro lado, as garantias aos amplos direitos entronizados na Constituição de 1988, não passíveis de emendas e, ainda, extensivas a outros decorrentes de tratados de que o país seja parte, asseguram a disposição de Estado democrático brasileiro de conformarse plenamente às obrigações internacionais por ele contraídas 140 .

Cabe observar que esses tratados constituem acordos internacionais, nos termos do artigo 38, inc. 1º (a) do Estatuto da Corte Internacional de Justiça. Por tal motivo, são normas do direito internacional e fundamentam, conforme a Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, responsabilidade internacional, uma vez que passam a ter vigência, após ter sido reconhecidos e aprovados pelos estados contratantes 141 .

139 TAMAYO, Carolina L. Aplicación de la normatividad protectora de los derechos humanos en el ordenamiento interno. In: Revista Brasileira de Ciências Criminais . São Paulo: v. 8, n. 31, 2000, p. 29. CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. O esgotamento dos recursos internos e a evolução da noção de vítima no Direito Internacional. Revista de Informação legislativa do Senado Federal 89. Brasília, 1986, p. 377448; do mesmo, O esgotamento dos recursos internos no Direito Internacional . Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1984. 140 ALVES , José Augusto Lindgren. A. Os direitos humanos como tema global . São Paulo: Editora Perspectiva e Fundação Alexandre de Gusmão, 1994, p. 108. 141 AMBOS, Kai. Impunidad y Derecho Penal Internacional . Buenos Aires: AdHoc, 1999, p. 67.

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5.2. Dualismo vs. monismo

No Brasil, a aplicação da Convenção Americana teve sérios obstáculos, pois ficou subordinada sua consideração ao debate existente a respeito da relação entre as normas internacionais e o direito interno 142 . Em tal sentido, cabe lembrar que existem duas grandes tradições doutrinárias, a dualista e a monista. A primeira considera que o direito interno e o direito internacional são dois sistemas independentes que por operar em planos e sobre matérias diversas não podem gerar conflitos 143 . Os tratados internacionais representam compromissos exteriores do Estado com outros Estados, e, portanto, não podem influir no ordenamento interno. As normas de direito interno, em lugar, regulamentam as relações entre indivíduos. Pelo exposto, os tratados internacionais só têm efeitos no direito interno se não tem uma norma interna que os considere expressamente como válidos nesse âmbito específico. Nesse caso, o estado apenas obrigase a incorporar a norma internacional no direito interno, porém essa obrigação seria meramente moral, com efeitos em termos de responsabilidade, apenas, no âmbito internacional 144 .

A outra tradição, a monista, considera que o direito internacional e o direito interno formam uma unidade de ordenamento, razão pela qual quando o estado assina e ratifica um tratado internacional afirma um compromisso que tem efeitos imediatos no direito interno sem necessidade de um novo diploma que assim o reconheça 145 . Os monistas dividemse em duas correntes: a) uma, que afirma a unicidade da ordem jurídica sob o primado do direito internacional, devendose a esta ajustar a ordem interna (Monismo internacionalista); b) outra, que afirma o primado do direito nacional de cada estado soberano, onde a adoção dos preceitos

142 Vide, JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. O Tribunal Penal Internacional. A Internacionalização do Direito Penal , p. 13. 143 TRIEPEL, Karl Heinrich. As relações entre o Direito Interno e o Direito Internacional . Revista da Faculdade de Direito. Belo Horizonte, Ano XVII, n. 06, p. 0764, out 1966. 144 Cf. ACCIOLY, Hildebrando – NASCIMENTO E SILVA, Geraldo Eulálio do. Manual de direito internacional público , São Paulo: Saraiva, 1996, p. 59. Também, AMORIM ARAUJO, Luis Ivani de. Curso de direito internacional público Rio: Forense, 1997, p. 44; DALLARI, Pedro Bohomoletz de Abreu. Normas internacionais de direitos humanos e a jurisdição nacional. In: Revista especial do Tribunal Regional Federal, 3.ª Região (seminário) . São Paulo: Imprensa Oficial, 1997, p. 29. 145 KELSEN, Hans. Teoria Geral do Direito e do Estado . São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 515 e ss.

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do direito internacional refletem uma faculdade discricionária ( monismo nacionalista )146 . A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que inicialmente seguia a tradição dualista 147 , optou no último tempo em favor da doutrina monista nacionalista, onde tratados internacionais são equiparados as leis ordinárias editadas pelo estado, de tal forma que têm o mesmo grau de eficácia.

Com efeito, no julgamento realizado a propósito do conflito normativo entre a Convenção de Genebra e a Lei Uniforme sobre Letras de Câmbio e Notas Promissórias, entenderam que a norma internacional poderia ser modificada por lei nacional posterior, ficando consignado que os conflitos entre duas disposições normativas, uma de direito interno e outra de direito internacional, devem ser resolvidos pela mesma regra geral destinada a solucionar antinomias normativas num mesmo grau hierárquico: lex posterior derrogat legi priori 148 .

Com a vigência da Constituição de 1988, o Plenário do Supremo Tribunal Federal voltou a discutir a matéria, porém tendo como foco o problema específico da prisão civil do devedor como depositário infiel na alienação fiduciária em garantia 149 . Na ocasião, reafirmouse o entendimento de que as normas internacionais ingressam no direito interno no patamar da legislação ordinária e eventuais conflitos normativos resolvemse pela regra Lex posterior derrogat legi priori . Assim mesmo, foi observado que como o art. 7º do Pacto de San José da Costa Rica é uma norma geral, não revoga a legislação ordinária de caráter especial, como o DecretoLei n° 911/69, que equipara o devedorfiduciante ao depositário infiel para fins de prisão civil.

Posteriormente no julgamento da medida cautelar de ADI o Tribunal voltou a afirmar que entre os tratados internacionais e as leis internas

146 Cf. DALLARI, Pedro Bohomoletz de Abreu. Normas internacionais de direitos humanos e a jurisdição nacional, p. 29; AMORIM ARAÚJO, Luis Ivani de. Curso de direito internacional público , p. 4445. 147 Sobre a jurisprudência antiga de influência dualista , vide a respeito DOLINGER, Jacob. Direito internacional privado . Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 90107. 148 Cf. STF – RE n. 80.004/SE, Rel. p/ Acórdão Min Cunha Peixoto. Também, RE n° 95.002/PR, Rel. Min. Soares Muñoz, DJ 13.11.1981. 149 HC n° 72.131/RJ, Red. p/ o acórdão Ministro Moreira Alves, julg. 22/11/95.

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brasileiras existe relação de paridade normativa, entendendose as leis internas no sentido de simples leis ordinárias e não de leis complementares 150 . Segundo observa Resek, desta forma foi assegurado “o primado da Constituição em confronto com a norma pacta sunt servanda” e conseqüentemente, “ é corrente que se preserve a autoridade da lei fundamental do Estado, ainda que isto signifique a prática de um ilícito pelo qual, no plano externo, deve aquele responder” 151 . De outra banda, foi argumentado que em vista da necessidade de promulgação do tratado por decreto do Presidente da República para que possa haver a vigência interna, teria sido adotado o dualismo moderado, já que seria possível que um tratado tivesse vigência internacional antes da interna 152 . Resta observar que, como se verá, a posição da Corte mudou com uma nova análise do conflito entre um tratado internacional de direitos humanos e uma norma do direito interno, envolvendo a Convenção Americana de Direitos Humanos e uma norma de direito interno 153 .

5.3. Tratados de direitos humanos vs. direito interno.

150 STF – Tribunal Pleno – ADI n° 1.4803/DF, Rel. Min. Celso de Mello, julg. 4/9/1997. Posteriormente, também, RE n° 206.4823/SP, Rel. Min. Maurício Corrêa, julg. Em 27.5.1998, DJ 5.9.2003; HC n° 81.3194/GO, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 24.4.2002, DJ 19.8.2005); HC n 77.0531/SP, Rel. Min. Maurício Corrêa, julgado em 23.6.1998, DJ 4.9.1998; HC n° 79.8705/SP, Rel. Min. Moreira Alves, julgado em 16.5.2000, DJ 20.10.2000; RE n° 282.6448/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, Red. p/ o acórdão Min. Nelson Jobim, julgado em 13.2.2001, DJ 20.9.2002. 151 Cf. REZEK, José Francisco. Direito internacional público: curso elementar. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 103104. 152 Porém são reconhecidas duas exceções: os casos da extradição e de conflito de legislação tributária. Vide REIS, Marcio Monteiro. Os tratados no ordenamento jurídico brasileiro. Revista Forense. Rio de Janeiro, v. 96, n. 349, p. 449463, jan/mar 2000. Observa o autor que “tem sido comum a referência aos tratados de extradição como exemplo de exceção à regra segundo a qual o acordo internacional perde sua vigência naquilo em que for conflitante com lei posterior. Notese, todavia, que neste caso não existe verdadeiramente um conflito. Os tratados de extradição – em geral celebrados de forma bilateral – aplicamse apenas aos Estados signatários (...). Assim, em relação aos Estados com os quais o Brasil tenha assinado tratado de extradição, aplicarseá a regra específica aí prevista. Em relação aos demais Estados continua válida a regra geral, prevista pela Lei número 6815/80”. Em matéria tributária “a redação deixa claro o primado do direito internacional em matéria tributária. Em um conflito envolvendo norma tributária interna e norma tributária internacional, prevalecerá sempre esta sobre aquela”. 153 STF Tribunal Pleno – RE n. 466.3431/SP – Min. Rel. Cezar Peluso, em especial voto do min. Gilmar Mendes.

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Com relação aos tratados de direitos humanos o debate tem sido intenso no último tempo, em razão de reconhecer o caráter especial destes instrumentos internacionais. Em tal sentido cabe lembrar que: Los tratados modernos sobre derechos humanos en general, y, en particular la Convención Americana no son tratados multilaterales del tipo tradicional concluidos en función de un intercambio reciproco de derechos para el beneficio mutuo de los Estados contratantes. Su objeto y fin son la protección de los derechos fundamentales de los seres humanos independientemente de su nacionalidad, tanto frente a su propio Estado como frente a los otros Estados contratantes. Al aprobar estos tratados sobre derechos humanos, los Estados se someten a un orden legal dentro del cual ellos, por el bien común, asumen varias obligaciones, no en relación con otros Estados, sino hacia los individuos bajo su jurisdicción. Por tanto, la Convención no sólo vincula a los Estados partes, sino que otorga garantías a las personas. Por ese motivo, justificadamente, no puede interpretarse como cualquier otro tratado 154 .

Em tal sentido podem ser sistematizadas quatro correntes a respeito dos tratados e convenções em matéria de direitos humanos reconhecem:

a) status de lei ordinária 155 Esta posição foi seguida pelo Supremo Tribunal Federal, conforme análise jurisprudencial já realizada 156 . Nesta corrente afirmase que o tratado, uma vez vigente internamente, equiparase à lei federal infraconstitucional (isso em função dos artigos 102, inciso III, alínea b e 105, inciso III alínea a, ambos da CF). Com efeito, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o tratado internacional, qualquer que seja ele, uma vez celebrado em nome do Presidente da República (art. 84, VIII, CR), referendado pelo Congresso Nacional por meio de decreto legislativo (art. 49, I, CR), promulgado e publicado por decreto presidencial, entra no sistema jurídico pátrio com o grau de lei ordinária, não

154 TRAVIESO, Juan. Derechos humanos y derecho internacional . Buenos Aires: Editorial Heliasta, 1990, p. 90. 155 Cf. RE n 80.004/SE, Rel Min. Xavier de Albuquerque, DJ 29/12/1977. 156 Vide, por exemplo, STF – Pleno – ADIn n.1.480/DF – Rel. Min. Celso de Mello – Informativo STF n. 135. 156 STF RHC 79785 / RJ, julgado em 29.03.2000, publicado em 22.11.2002, Rel. Min. Moreira Alves, Pleno.

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podendo versar sobre matéria em que exige a Constituição Federal lei complementar 157 . Em tal sentido afirmavase que, em função do artigo 102, III, b, da CF, se é cabível recurso extraordinário em caso de decisão que “declarar a inconstitucionalidade de tratado”, não se especificando que tipo de tratado seria esse, é porque o constituinte teve a intenção de afirmar a superioridade da Constituição em face de todas fontes internacionais de direito. Com efeito: Assim como não o afirma em relação às leis, a Constituição não precisou dizerse sobreposta aos tratados: a hierarquia está ínsita em preceitos inequívocos seus, como os que submetem a aprovação e a promulgação das convenções ao processo legislativo ditado pela Constituição e menos exigente que o das emendas a ela e aquele que, em conseqüência, explicitamente admite o controle da constitucionalidade dos tratados (CF, art. 102, III, b) 158 .

Também, argumentavase que o procedimento de entrada do tratado internacional no direito pátrio tem quorum de votação assemelhado ao da lei ordinária, razão pela qual a convenção internacional deve ser assemelhada a esse ente normativo 159 . Sobre essa linha de pensamento expressa Luiz A. D. Araujo que: Se o constituinte teve tanto cuidado no descrever do processo de emenda constitucional, exigindo quorum qualificado e dois turnos de votação (§ 2º, do art. 60), iniciativa especial (incisos I, II e III do art. 60), não se pode permitir que a Constituição seja alterada por um decreto legislativo, espécie normativa prevista no art. 59, VI, que exige um quorum singelo de aprovação (art. 47).

157 Cf. FERREIRA FILHO, M. G. Direitos Humanos Fundamentais. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 98 99. 158 STF –Tribunal Pleno RHC 79785 / RJ, Rel. Min. Moreira Alves, julg em 29/03/2000 (publicado em 22/11/2002). 159 Cf. o voto do Min. Celso de Mello no HC 76.5613/SP. Considerando o tipo de constituição adotado, expressa Gilmar Mendes que “Uma solução que viesse a responder afirmativamente à questão colocada teria, certamente, de admitir que a Constituição concebida como um texto rígido tornarseia flexível, pelo menos para o efeito da adição de novos direitos, até por que, como se sabe, o processo constitucional de aprovação dos tratados, entre nós, reforça a idéia de que é de direito ordinário de que se cuida (aprovação de decreto legislativo, mediante decisão da maioria dos membros presentes de cada uma das Casas, presente a maioria absoluta de seus membros maioria simples; ratificação mediante decreto do Chefe do Poder Executivo)”. (FERREIRA MENDES, Gilmar. Jurisdição constitucional: o controle abstrato de normas no Brasil e na Alemanha . São Paulo: Saraiva, 1996, p. 178).

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E continua: Portanto, entender que o decreto legislativo pode servir de veículo para o ingresso de 'Tratado Internacional' e que tal Tratado ingressa na posição de norma constitucional, seria admitir que há possibilidade de alteração da Constituição Federal pelo processo legislativo do decreto legislativo, ou seja, com a aprovação da maioria simples (art. 47). Tal concepção fere o sistema constitucional que exige, para sua alteração, o processo especial e difícil previsto no art. 60. Não há espaço na interpretação para que se chegue à conclusão de que a Constituição Federal possa ser alterada por maioria simples (quorum previsto no art. 47 para a aprovação do decreto legislativo art. 49, I) 160

Finalmente, foi aduzido que dar relevo constitucional a convenção internacional é fazer poço da soberania do Estado brasileiro 161 .

b) natureza supraconstitucional Segundo esse critério as normas constitucionais não teriam poderes revogatórios em relação às normas internacionais 162 .

c) caráter supralegal Esse entendimento foi inicialmente referenciado no voto do Rel. Min. Sepúlveda Pertence no julgamento do RHC n° 79.785RJ, julgado em 29 de março de 2002, nos seguintes termos: Certo, com o alinharme ao consenso em torno da estatura infraconstitucional, na ordem positiva brasileira, dos tratados a ela incorporados, não assumo compromisso de logo – como

160 ARAÚJO, Luiz Alberto David. A impossibilidade de prisão do depositário infiel, o Pacto de São José e a decisão do Supremo Tribunal Federal. In : Revista da Escola Paulista da Magistratura Associação Paulista dos Magistrados (Apamagis), Ano 2, n.º 4, nov./jun. 1998, p. 85 e ss. 161 Cf. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2003, p. 613. 162 Expressa Celso Mello: “confesso que o d. internacional, para mim é supranacional. É preciso que o d. interno na sua totalidade o respeite e só assim haverá uma ampla proteção do homem contra o seu próprio estado” (MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Direitos humanos e conflitos armados. Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 38); também do mesmo. O § 2 do art. 5º da Constituição Federal. In: Teoria dos direitos fundamentais (org. Torres, Ricardo L.) Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 2526. Também, GONÇALVES PEREIRA, André – QUADROS, Fasto de. Manual de direito internacional público. Coimbra: Livraria Almedina, 1993, p. 117 e 121, que consideram que à expressão "não excluem", constante no § 2. “não pode ser concedido um alcance meramente quantitativo: ela tem de ser interpretada como querendo significar também que, em caso de conflito entre as normas constitucionais e o Direito Internacional em matéria de direitos fundamentais, será este que prevalecerá. () Quanto aos demais tratados de Direito Internacional Convencional particular, aí sim, pensamos que eles cedem perante a Constituição, mas tem valor supralegal, isto é, prevalecem sobre a lei interna, anterior e posterior. Ou seja, adaptamos a posição que se encontra expressamente consagrada nas Constituições francesa, holandesa e grega”.

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creio ter deixado expresso no voto proferido na ADInMc 1.480 – com o entendimento, então majoritário – que, também em relação às convenções internacionais de proteção de direitos fundamentais – preserva a jurisprudência que a todos equipara hierarquicamente às leis. Na ordem interna, direitos e garantias fundamentais o são, com grande freqüência, precisamente porque – alçados ao texto constitucional – se erigem em limitações positivas ou negativas ao conteúdo das leis futuras, assim como à recepção das anteriores à Constituição (...). Se assim é, à primeira vista, parificar às leis ordinárias os tratados a que alude o art. 5o, § 2o, da Constituição, seria esvaziar de muito do seu sentido útil a inovação, que, malgrado os termos equívocos do seu enunciado, traduziu uma abertura significativa ao movimento de internacionalização dos direitos humanos. 163

Posteriormente, esse entendimento foi referenciado no voto do Min. Gilmar Mendes no julgamento do recurso extraordinário n. 66.3431, no qual considerou que tomando em consideração a Emenda Constitucional n 45, a jurisprudência da Corte devia ser revisada 164 . No entendimento do Min. Gilmar Mendes “diante do inequívoco caráter especial dos tratados internacionais que cuidam da proteção dos direitos humanos, não é difícil entender que a sua internalização no ordenamento jurídico, por meio do procedimento de ratificação previsto na Constituição, tem o condão de paralisar a eficácia jurídica de toda e qualquer disciplina normativa infraconstitucional com ela conflituante” 165 . Assim, embora não tenha o tratado internacional de direitos humanos o poder de revogar uma norma constitucional, esta deixa de ser aplicada em razão do efeito paralisante desses tratados em relação à legislação infraconstitucional. 166 A nova posição foi sintetizada e reiteradamente aplicada em outros julgamentos, nos seguintes termos: Desde a adesão do Brasil, sem qualquer reserva, ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 11) e à Convenção Americana sobre Direitos Humanos Pacto de San José da Costa Rica (art. 7º, 7), ambos no ano de 1992, não há mais base legal para prisão civil do depositário infiel, pois o

163 STF – Tribunal Pleno R HC no 79.785RJ, por maioria, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 22.11.2002. 164 STF Tribunal Pleno – RE n. 466.3431/SP – Min. Rel. Cezar Peluso, em especial voto do min. Gilmar Mendes. 165 Idem. 166 Ibidem.

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caráter especial desses diplomas internacionais sobre direitos humanos lhes reserva lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da Constituição, porém acima da legislação interna. O status normativo supralegal dos tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil torna inaplicável a legislação infraconstitucional com ele conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato de adesão (STF – Pleno RE 349703 / RS RIO GRANDE DO SUL Relator: Min. CARLOS BRITTO Julgamento: 03/12/2008; anteriormente STF – 2ª Turma HC 95967 / MS MATO GROSSO DO SUL Relator(a): Min. ELLEN GRACIE Julgamento: 11/11/2008; HC 88240 / SP SÃO PAULO Relator(a): Min. ELLEN GRACIE Julgamento: 07/10/2008; HC 94702 / GO GOIÁS Relator(a): Min. ELLEN GRACIE Julgamento: 07/10/2008.

d) caráter constitucional 167 Em tal sentido, afirmase que a Constituição Federal no seu artigo 5º, § 2.º, dispõe que “os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros direitos decorrentes dos tratados internacionais”, e, portanto, a contrariu sensu , permite “incluir, no catálogo dos direitos constitucionalmente protegidos, os direitos enunciados nos tratados internacionais em que o Brasil seja parte. Este processo de inclusão implica na incorporação pelo texto constitucional destes direitos” 168 . Cabe observar que a redação desse artigo corresponde ao Prof. Antônio Augusto Cançado Trindade quem expressou que: O disposto no art. 5.º, § 2.º, da Constituição Brasileira de 1988 se insere na nova tendência de Constituições latinoamericanas recentes de conceder um tratamento especial ou diferenciado também no plano do direito interno aos direitos e garantias individuais internacionalmente consagrados. A especificidade e o caráter especial dos tratados de proteção internacional dos direitos humanos encontramse, com efeito, reconhecidos e sancionados pela Constituição Brasileira de 1988: se, para os tratados internacionais em geral, se tem exigido a intermediação pelo Poder Legislativo de ato com força de lei, de modo a outorgar as suas disposições vigência ou obrigatoriedade no plano do ordenamento jurídico interno, distintamente no caso dos tratados de proteção internacional dos direitos humanos em que o Brasil é parte os direitos fundamentais neles garantidos passam, consoante o art. 5.º, § 1.º e 2.º, da Constituição

167 CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Memorial em prol de uma nova mentalidade quanto à proteção dos direitos humanos nos planos internacional e nacional. Boletim da Sociedade Brasileira de Direito Internacional. Brasília, n. 113118, 1998, p. 8889; e PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional , p. 13. 168 PIOVESAN, Flavia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional , p. 82.

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Brasileira de 1988, a integrar o elenco dos direitos constitucionalmente consagrados e direta e imediatamente exigíveis no plano do ordenamento jurídico interno 169

Por outra parte, cabe considerar que o próprio texto constitucional dispõe que os direitos e garantias expressos na Constituição, não excluem outros “ decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados” , dentre os quais, cabe destacar o princípio da prevalência dos direitos humanos , nos termos do artigo 4º, II, do próprio texto constitucional. Assim, cabe concluir que os tratados internacionais de direitos humanos terão prevalência , no que forem mais benéficos, às normas constitucionais em vigor. Da mesma forma, cabe atualizar o seu artigo art. 1º, III, que institui o Brasil como um Estado Democrático de Direito, com reconhecimento da dignidade da pessoa humana 170 , dentre outros fundamentos, que, novamente, impõem a “ prevalência dos direitos humanos , enquanto princípio norteador das relações exteriores do Brasil” 171 Dessa forma, ao incorporar em seu texto esses direitos internacionais, a Constituição está atribuindolhes uma natureza especial e diferenciada, a saber, natureza de norma constitucional, passando, então a integrar o elenco dos direitos constitucionalmente protegidos 172 . Conseqüentemente, afirmase que o Brasil adotou o sistema misto combinando regimes jurídicos diferenciados: um aplicável aos tratados internacionais de proteção aos direitos humanos e outro aplicável aos tratados tradicionais, que não disponham sobre direitos humanos 173 .

169 CANÇADO TRINDADE, A. A. Direito internacional e direito interno: sua interpretação na proteção dos direitos humanos. In: Instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos, obra cujo autor prefacia. São Paulo: Centro de Estudos da Procuradoria Geral do Estado, 1996, p. 2021. Ver também, do mesmo, Direitos e garantias individuais no plano internacional. In: Assembléia Nacional Constituinte – atas das comissões , v. 1, Brasília, n. 66, supl., 27.05.87, p 111, e 109116; Entrevista, 1 Justiça e Democracia – Revista da Associação Juízes para a Democracia, São Paulo, 1996, p. 07 17, esp. p. 1011; A proteção internacional dos direitos humanos: fundamentos jurídicos e instrumentos básicos. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 630635; Tratado de direito internacional dos direitos humanos , 1.ª ed., vol. I. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1997, p. 407408. 170 Observa o Prof. José Afonso da Silva “é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida” (SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros Editores, 1997, p. 106). Da mesma forma Canotilho quando expressa que a dignidade da pessoa humana é “a raiz fundamentante dos direitos humanos”. CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional . Coimbra: Livraria Almedina, 1993, p. 498. 171 DALLARI, Pedro Bohomoletz de Abreu. Constituição e relações exteriores. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 162. 172 PIOVESAN, Flavia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional , p. 82. 173 PIOVESAN, Flavia. Temas de direitos humanos . São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 48.

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Observa E. Graus que, em rigor, não são os tratados internacionais de direitos humanos que adentram nossa ordem jurídica com energia constitucional, mas sim as normas internacionais que protegem tais direitos, pois é possível que uma convenção internacional contenha em seu bojo regras e princípios de direito humanitário 174 e também preceitos de outra natureza; sendo que só as primeiras se integrarão às normas constitucionais 175 . Cabe esclarecer, conforme expresa Bidart Campos: Que una normativa tenga tal jerarquía no es igual a sostener que, por tenerla, está 'dentro de la constitución'. Para nosotros, los instrumentos sobre derechos humanos que se incorporan ‘al derecho interno’ con el mismo rango de la constitución, no están incorporados ‘a la constitución’: están fuera de ella, integrando el denominado bloque de constitucionalidad federal 176

O tratamento jurídico diferenciado é justificado em razão de que nos tratados internacionais comuns buscase estabelecer relações de equilíbrio e reciprocidade nas relações estabelecidas entre estados; enquanto que nos tratados internacionais de direitos humanos procurase salvaguardar os direitos da pessoa humana 177 . Assim, na medida em que os estados assumem compromissos em convenções internacionais diminuem sua competência discricionária, apontando a prevalência da perspectiva monista internacionalista para a regência da relação entre direito interno e Direito Internacional 178 , o que implica a possibilidade de aplicar o tratado de forma imediata em função do § 1 do artigo 5º da Constituição Federal. Em tal sentido, observa Cançado Trindade que

174 Sobre direito humanitário em geral ver BUERGENTHAL, Thomas. Internacional Human Rights . Minesota : West Publishing, 1988. LAFER, Celso. Prefácio. In: ALVEZ, José Augusto Lindgren. Os direitos humanos como tema global . São Paulo: Perspectiva, 2003, p. XXIV e XXV. MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional . Tomo IV. Coimbra: Coimbra Editora, 2008. STEINER, Henry, ALSTON, Philip. Internacional Human Rights in Context – Law, Politics and Morals . Oxford: Clarendon Press, 2000. 175 Cf. GRAU, E. Ensaio e Discurso Sobre a Interpretação/Aplicação do Direito. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 17. 176 BIDART CAMPOS, Germán J. Tratado elemental de derecho constitucional argentino. Tomo III. Buenos Aires: Ediar, 1995, p. 285. 177 PIOVESAN, F. Ob. cit, p. 94. 178 Cf. BASTOS, Celso Ribeiro – MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988 , 2.º vol. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 396. A respeito afirma: “Não será mais possível a sustentação da tese dualista, é dizer, a de que os tratados obrigam diretamente aos Estados, mas não geram direitos subjetivos para os particulares, que ficariam na dependência da referida intermediação legislativa. Doravante será, pois, possível a inovação de tratados e convenções, dos quais o Brasil seja signatário, sem a necessidade de edição pelo Legislativo de ato com força de lei, voltado à outorga de vigência interna aos acordos internacionais”.

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Podese mesmo admitir uma presunção em favor da auto aplicabilidade dos tratados de direitos humanos, exceto se contiverem uma estipulação expressa de execução por meio de leis subseqüentes que condicionem inteiramente o cumprimento das obrigações em apreço; assim como a questão da hierarquia das normas (e da determinação de qual delas deve prevalecer) tem sido tradicionalmente reservada ao direito constitucional (daí advindo as consideráveis variações neste particular de país a país), a determinação do caráter autoaplicável (self executing) de uma norma internacional constitui, como se tem bem assinalado, por sua vez, 'uma questão regida pelo Direito Internacional, já que se trata nada menos que do cumprimento ou da violação de uma norma de direito internacional .179

5.4. A emenda Constitucional n. 45.

A emenda constitucional número 45, de 8 de dezembro de 2004, tentou resolver a questão, porém, na realidade a tornou mais complexa. Em conformidade com a emenda constitucional o artigo 5º § 3º da Constituição estabelece que: Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. Com efeito, segundo uma interpretação literal poderseia afirmar que os tratados que não passarem por tal procedimento não teriam vigor constitucional. Como todas as convenções, inclusive as de direitos humanos, não passaram até hoje por esse procedimento, então, não seriam equivalentes às emendas constitucionais. De outra parte, argumentase que a emenda constitucional só pode ter efeitos para as convenções internacionais assinadas com posterioridade à emenda, pois as anteriores já formariam parte do texto Constitucional. Em tal sentido, acrescentase que uma emenda que tenha efeito negativo contra direitos e

179 Cf. CANÇADO TRINDADE, ANTÔNIO AUGUSTO. Direito internacional e direito interno: sua interpretação na proteção dos direitos humanos. In: Instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos . São Paulo: Centro de Estudos da Procuradoria Geral do Estado, 1996, p. 34. Também, cf. CLÈMERSON MERLIN CLÈVE, em parecer publicado na Revista dos Tribunais, n. 736, p. 527.

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garantias fundamentais estaria proscrita em função da regra pétrea do art. 60, parágrafo 4º, IV, Constituição Federal 180 . Em tal sentido, cabe lembrar que o Estadotratadista, ao declarar sua vontade de se submeter a um acordo internacional, fica obrigado perante o Direito Internacional a tomar todas as providências para que sejam válidas e eficazes, em sua ordem jurídica interna, as normas dispostas na convenção, pois se não procede dessa forma, comete ato ilícito e deve se responsabilizar por ele 181 .

5.5. Principio da primazia da norma mais favorável à vítima.

Por último, resta observar que, por além da discussão sobre a preponderância do direito interno ou internacional, parece certo reconhecer como critério norteador da aplicação do direito que seja mais protetor da pessoa humana.

Em tal sentido foi observado que: No presente domínio de proteção a primazia é da norma mais favorável às vítimas, seja ela norma de direito internacional ou de direito interno. Este e aquele aqui interagem em benefício dos seres protegidos. É a solução expressamente consagrada em diversos tratados de direitos humanos, da maior relevância por suas implicações práticas 182 .

O critério da norma mais favorável às pessoas protegidas permite reduzir e minimizar as pretensas possibilidades de conflitos entre

180 Cabe observar que no julgamento da ADIn nº 939/93, foi observado que não são irreformáveis os direitos e garantias individuais previstos no art. 5º do Diploma Fundamental, senão também quaisquer outros reconhecidos na Constituição da República, sejam estes individuais, sociais, econômicos ou de solidariedade (vide. voto do Min. Carlos Velloso). Nesse sentido, observa Carlos Weis, que “o artigo que confere ao Supremo Tribunal Federal poder de decidir sobre a constitucionalidade de tratado internacional (art. 102, III, "b") não pode ser aplicado aos que tenham por objeto direitos humanos, os quais () possuem 'privilégio hierárquico' em relação aos demais, conferido pela Constituição Federal de 1988, em atenção à sua natureza e finalidade” (WEIS, Carlos. Direitos humanos contemporâneos . São Paulo: Malheiros Editores, 1998, p. 3334), pois os direitos e garantias fundamentais constituem cláusulas pétreas , não podendo ser abolidos nem mesmo pela via de Emenda à Constituição. 181 Cf. REZEK, José Francisco; Direito Internacional Público: curso elementar. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 96. 182 CANÇADO TRINDADE, A. A. Direito internacional e direito interno: sua interpretação na proteção dos direitos humanos. In : Instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos , p. 43. Vide, por exemplo, o artigo 5, 2 do Pacto de Direitos Civis e Políticos.

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instrumentos legais em seus aspectos normativos . Assim mesmo, contribui, para obter maior coordenação entre tais instrumentos, tanto em dimensão vertical (tratados e instrumentos de direito interno), quanto horizontal (dois ou mais tratados) . Finalmente, contribui para demonstrar a tendência e o propósito da coexistência de distintos instrumentos jurídicos que garantem os mesmos direitos, permitindo ampliar e fortalecer sua proteção 183 . Cabe observar que o critério da primazia da disposição mais favorável às vítimas foi aplicado pela Comissão Européia de Direitos Humanos, no final da década de 1950 (petição n. 235/56, de 19581959), e também pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no Parecer de 1958 sobre a Associação Obrigatória de Jornalistas 184 . Segundo Max Soresen, a primazia da norma mais favorável, é possível extrair da “regla bien establecida de que un Estado no puede invocar las disposiciones de su derecho interno para disculpar la falta de cumplimiento de sus obligaciones internacionales, o para escapar a las consecuencias de ella “ 185 . Finalmente, resta observar que o princípio da primazia da norma mais favorável às vítimas possibilita a integração do sistema normativo internacional e o ordenamento interno do país, fortalecendo sobremaneira a eficaz proteção dos direitos e garantias individuais, amplamente consagrados por vários tratados internacionais. Na medida em que esse plexo normativo reconhece direitos individuais sua interação permitirá o reforço, mas não a exclusão de um direito fundamental reconhecido no direito interno. A partir desta perspectiva, ficaria cancelada a existência de conflitos. O critério da primazia da norma mais favorável às vítimas foi seguido recentemente pelo Supremo Tribunal Federal, que assim se manifestou: Os magistrados e Tribunais, no exercício de sua atividade interpretativa, especialmente no âmbito dos tratados internacionais de direitos humanos, devem observar um princípio hermenêutico básico (tal como aquele proclamado no Artigo 29 da Convenção Americana de Direitos Humanos), consistente em atribuir primazia à norma que se revele mais favorável à pessoa humana, em ordem a dispensarlhe a mais

183 Idem. 184 Ibidem. 185 SORESEN, Max . Manual de derecho internacional. México: Fondo de Cultura Económico, 1992, p. 42.

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ampla proteção jurídica. O Poder Judiciário, nesse processo hermenêutico que prestigia o critério da norma mais favorável (que tanto pode ser aquela prevista no tratado internacional como a que se acha positivada no próprio direito interno do Estado), deverá extrair a máxima eficácia das declarações internacionais e das proclamações constitucionais de direitos, como forma de viabilizar o acesso dos indivíduos e dos grupos sociais, notadamente os mais vulneráveis, a sistemas institucionalizados de proteção aos direitos fundamentais da pessoa humana, sob pena de a liberdade, a tolerância e o respeito à alteridade humana tornaremse palavras vãs (STF – 2ª turma HC 90450 / MG MINAS GERAIS Relator Min. CELSO DE MELLO Julgamento: 23/09/2008; também, HC 91361SP – Relator MIN. CELSO DE MELLO JULG23092008. HC 94695 / RS RIO GRANDE DO SUL Relator Min. CELSO DE MELLO Julgamento: 23/09/2008.

5.6. Disposições de Tratados Internacionais de Direitos Humanos consideradas no trabalho

Cabe observar que tanto a Convenção Americana de Direitos Humanos, quanto o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos não têm disposições específicas sobre a persecução de violações de direitos humanos, sem embargo, é possível estabelecer um ponto de partida da norma geral que estabelece o dever de respeitar e assegurar, bem como a que exige o oferecimento de remédios efetivos 186 . Com relação à CADH, a Corte Interamericana de Direitos Humanos expressou que El Estado está en el deber jurídico de prevenir, razonablemente, las violaciones a los derechos humanos, de investigar seriamente con los medios a su alcance las violaciones que se hayan cometido dentro del ámbito de su jurisdicción a fin de identificar a los responsables, de imponerles las sanciones pertinentes y de asegurar a la víctima una adecuada reparación 187

A Corte observou nesse mesmo caso que o estado deve investigar toda situação na qual se tenha violado direitos humanos protegidos pela

186 AMBOS, Kai. Impunidad y Derecho Penal Internacional . Buenos Aires: AdHoc, 1999, p. 68. 187 Corte IDH. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Fondo. Sentencia de 29 de julio de 1988. Serie C No. 4, p. 174.

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Convenção, de forma que seja evitada a impunidade. Esclareceu nesse sentido que: En ciertas circunstancias puede resultar difícil la investigación de hechos que atenten contra derechos de la persona. La de investigar es, como la de prevenir, una obligación de medio o comportamiento que no es incumplida por el solo hecho de que la investigación no produzca un resultado satisfactorio. Sin embargo, debe emprenderse con seriedad y no como una simple formalidad condenada de antemano a ser infructuosa. (parágrafo 177) 188 .

Com relação ao PIDCP, o Comitê de Direitos Humanos ao interpretar o artigo 2, 1 189 tem seguido a doutrina da margem de apreciação, no sentido de que os Estados partes tem também que assegurar o gozo desses direitos a todos os indivíduos sob sua jurisdição; porém, é observado que dessa norma surgem deveres positivos de proteção nos casos de violação ao direito à vida, que vão por além de simples mandatos negativos de omissão 190 . Por sua parte a Comissão Interamericana de Direitos Humanos também tem afirmado o dever de punir os casos de torturas e de desaparições forçadas de pessoas. 191 Em tal sentido, o Comitê observou com relação à proibição de tortura (art. 7 do PIDCP), que ...se deriva do art. 7, lido juntamente com o art. 2º do Pacto, que os Estados devem assegurar a proteção efetiva por meio de algum

188 Essa jurisprudência tem sido repetida reiteradamente: Caso Aloeboetoe y otros Vs. Surinam. Fondo. Sentencia de 4 de diciembre de 1991. Serie C No. 11; Corte IDH. Caso El Amparo Vs. Venezuela. Fondo. Sentencia de 18 de enero de 1995. Serie C No. 19; Corte IDH. Caso Neira Alegría y otros Vs. Perú. Fondo. Sentencia de 19 de enero de 1995. Serie C No. 20; Corte IDH. Caso Caballero Delgado y Santana Vs. Colombia. Fondo. Sentencia de 8 de diciembre de 1995. Serie C No. 22; Corte IDH. Caso Loayza Tamayo Vs. Perú. Fondo. Sentencia de 17 de septiembre de 1997. Serie C No. 33; Corte IDH. Caso Castillo Páez Vs. Perú. Fondo. Sentencia de 3 de noviembre de 1997. Serie C No. 34; Corte IDH. Caso Suárez Rosero Vs. Ecuador. Fondo. Sentencia de 12 de noviembre de 1997. Serie C No. 35; Corte IDH. Caso Blake Vs. Guatemala. Fondo. Sentencia de 24 de enero de 1998. Serie C No. 36; Corte IDH. Caso de la “Panel Blanca” (Paniagua Morales y otros) Vs. Guatemala. Fondo. Sentencia de 8 de marzo de 1998. Serie C No. 37. Disponíveis em: http://www.corteidh.or.cr/casos.cfm. Consultado em 29/07/09. 189 “Artigo 2.1. Os Estados Partes do presente pacto comprometemse a respeitar e garantir a todos os indivíduos que se achem em seu território e que estejam sujeitos a sua jurisdição os direitos reconhecidos no presente Pacto, sem discriminação alguma por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, situação econômica, nascimento ou qualquer condição”. 190 Assim, AMBOS, Kai. Impunidad y Derecho Penal Internacional . Buenos Aires: AdHoc, 1999, p. 72. 191 Vide o caso Velásquez Rodriguez já citado.

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mecanismo de controle. As queixas por mal trato devem ser investigadas efetivamente pelas autoridades competentes. Os que são considerados culpáveis devem ser declarados responsáveis e as vítimas devem ter a sua disposição os recurso efetivos, incluindo o direito de obter uma compensação 192 Mais atual, observou com relação ao Brasil que: Es imperativo adoptar medidas estrictas para hacer frente a la cuestión de la impunidad garantizando que las denuncias de las violaciones de los derechos humanos se investiguen de forma inmediata y completa, que se enjuicie a los autores, que se impongan penas apropiadas a los que sean declarados culpables y que se indemnice en forma adecuada a las víctimas. El Estado Parte deberá velar por que los miembros de las fuerzas de seguridad a quienes se haya declarado culpables de graves delitos sean destituidos permanentemente de las fuerzas y por que los miembros de éstas contra los cuales se estén investigando denuncias de tales delitos sean suspendidos de sus funciones hasta que termine la investigación 193

Por outra parte, cabe considerar a Convenção contra a Tortura e outros Tratos ou Penas Cruéis, desumanos ou Degradantes da ONU 194 e a Convenção Americana para Prevenir e Sancionar a Tortura 195 , pois estabelecem disposições específicas sobre a matéria. Com efeito, a Convenção contra a Tortura da ONU obriga aos Estados partes a adotar as medidas legislativas, administrativas, judiciais ou de outra índole eficazes para impedir os atos de tortura (art. 2). Assim mesmo, essas práticas devem ser codificadas e cominadas com penas adequadas (art. 4), sendo o dever de persecução universal e descentralizado, a fim de que nenhum culpável de tortura possa sentirse a salvo de persecução (art. 5).

192 HRC, General Comment n 7, Doc. ONU CCPR/C/21/Ver.1 (19/05/1989. Apud AMBOS, Kai. Impunidad y Derecho Penal Internacional . Buenos Aires: AdHoc, 1999, p. 73. 193 Vide Compilación de observaciones finales del Comité de Derechos Humanos sobre países de América Latina y el Caribe (1977 2004), p. 94. Disponível em: http://www2.ohchr.org /english/bodies/hrc/docs/publications/HRCCompilacion(19772004).pdf – Consultado em 29/07/09. 194 Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes Decreto nº 40, de 15 de fevereiro de 1991. Entrou em vigor em 28.10.1989. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/19901994/D0040.htm. Consultado em 29/07/09. 195 Adotada e aberta à assinatura no XV Período Ordinário de Sessões da Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos, em Cartagena das Índias (Colômbia), em 9 de dezembro de 1985 ratificada pelo Brasil em 20.07.1989

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Em sentido similar a Convenção Interamericana para prevenir a Tortura estabelece que: Em conformidade com o disposto no artigo 1, os Estados Partes tomarão medidas efetivas a fim de prevenir e punir a tortura no âmbito de sua jurisdição. Os Estados Partes assegurarseão de que todos os atos de tortura e as tentativas de praticar atos dessa natureza sejam considerados delitos em seu Direito Penal, estabelecendo penas severas para sua punição, que levem em conta sua gravidade. Os Estados Partes obrigamse também a tomar medidas efetivas para prevenir e punir outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes, no âmbito de sua jurisdição (art. 6)

Finalmente, resta considerar que as execuções extrajudiciais e as desaparições forçadas de pessoas não tem recepção em tratados especiais, porém a desaparição forçada encontrase considerada no Estatuto de Roma (art. 7, par. 1 (i).e a execução extrajudicial pode ser considerada em função das normas relativas ao direito à vida (art. 4.1 da CADH e art. 6 do PIDCP)196 .

196 Cf. AMBOS, Kai. Impunidad y Derecho Penal Internacional . Buenos Aires: AdHoc, 1999, p. 77.

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CAPÍTULO II – JUSTIÇA PÓSCONFLITUAL

1. Introdução

Como foi observado, o direito internacional dos direitos humanos se desenvolveu em especial a partir da Segunda Guerra Mundial como resposta às graves violações aos direitos dos seres humanos cometidas pelo nazismo e na crença de que parte dessas violações poderiam ser prevenidas por meio de um sistema de proteção internacional 197 . Neste contexto surgiu, em 1945, a Organização das Nações Unidas e, em 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que reconheceu a universalidade e indivisibilidade dos direitos humanos. A partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos foi estabelecendose um sistema de proteção mundial que funciona como parâmetro para a proteção internacional de tais direitos em torno de valores básicos universais, a serem observados e seguidos por todos os estados e povos 198 , deslegitimando a comunidade internacional aos que sistematicamente violentam os direitos humanos, e até habilitando medidas para resguardar tais direitos. Tanto a Carta das Nações Unidas, quanto a Declaração Universal dos Direitos Humanos, refletem o interesse das nações civilizadas de assegurar o respeito à pessoa humana a partir do reconhecimento dos direitos que lhe são intrínsecos pela sua simples condição de tal, de modo que são consideradas as normas internacionais de direitos humanos como parte do jus cogens .199 A partir desse momento foi intensificada a aprovação de inúmeras declarações e tratados internacionais que formaram um sistema de proteção global e regional de proteção de direitos humanos guiados na etapa legislativa e de implementação pela I Conferência Mundial de Direitos Humanos e

197 PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos, p. 22. 198 CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. O legado da Declaração Universal de 1948 e o Futuro da Proteção Internacional dos Direitos Humanos. In: O Direito Internacional em um Mundo em Transformação . (Ensaios 19762001). Rio de Janeiro: Renovar, p. 641. 199 HITTERS, Juan Carlos. Derecho Internacional de los Derechos Humanos . T. I. Buenos Aires, 1991, p. 135.

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sua reavaliação impondo a aplicação de tais instrumentos com a II Conferência Mundial de Direitos Humanos, abrindo campo ao exame do processo de consolidação e aperfeiçoamento dos mecanismos de proteção internacional 200 . Assim mesmo foram aprovadas diversas Convenções, como por exemplo, contra o crime de Genocídio, dentre outros crimes contra a humanidade e resoluções em favor da cooperação na detenção, arresto, extradição e punição de autores de crimes de guerra e crimes contra a humanidade, bem como da não aplicação de estatutos limitadores da punição para esses crimes 201 . Sem embargo e apesar dos esforços realizados, a última metade do século passado registrou conflitos de diversa índole, nos quais o denominador comum foi a violação de direitos humanos. Com efeito, foram registradas guerras, insurgências e demais ações violentas por parte dos estados por meio de regimes autoritários, provocando o sofrimento e morte de milhões de pessoas, na maioria dos casos, civis. Nesses conflitos foram registrados genocídios, massacres, desaparecimento forçado de pessoas, torturas, estupros, e demais tratamentos cruéis inumanos ou degradantes. Em regra esses conflitos contaram com a participação de instituições políticas que tentaram – e em muitos casos conseguiram – assegurar a impunidade para os autores desses atos aberrantes, ignorando as vítimas e suas reclamações, em alguns casos, como moeda de troca para a finalização dos conflitos. Nesse contexto, parte da comunidade internacional, junto com organizações sociais, tentou elaborar uma resposta que atendesse as demandas das vítimas, em especial, em relação à busca da verdade, a justiça e a reconciliação. Para tal fim foram estudadas as respostas oferecidas em diversas comunidades na busca da justiça e reconciliação, no estágio posterior aos conflitos lesivos aos direitos humanos. Essas respostas, que envolvem complexas problemáticas, constituem os chamados pósconflitos de justiça (PostConflict Justice).

200 CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. O legado da Declaração Universal de 1948 e o futuro da proteção internacional dos direitos Humanos , p. 654. 201 BASSIONI, M. Cherif. Searching for peace and achieving Justice: The need for accountability. In: Law and Contemporary Problems. Vol. 59, n. 4. Accountability for International Crimes and Serius Violations of Fundamental Human Right (Autumn), 1996, p. 16.

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O estudo e desenvolvimento da justiça pósconflitual procurou estabelecer princípios políticos internacionais que contribuam para garantir a paz, a segurança e a reconstrução nacional em função das experiências passadas. Em parte envolvem problemáticas analisadas sob os conceitos de justiça de transição, estratégias de combate à impunidade, construção da paz, etc. que refletem instituições particulares e também ideologias específicas. Em tal sentido, os pósconflitos de justiça envolvem a difícil tarefa de conciliar ou reconciliar a comunidade, após vivenciar uma situação de grosseira violação de direitos humanos, garantindo a estabilidade, a governabilidade, mas sem o esquecimento do acontecido, isto é mediante o esclarecimento do vivido e o julgamento dos responsáveis. O estudo dos pósconflitos de justiça permitiu a elaboração de princípios ou diretrizes que resultam de utilidade para orientar as políticas públicas e estratégias dos atores internacionais e locais, claro que segundo as necessidades dos povos em função das suas especificidades contextuais e culturais. Nesse sentido, a elaboração desses princípios constituiu um estágio importante no desenvolvimento das políticas de proteção e defesa dos direitos humanos. Os primeiros trabalhos para a elaboração dos princípios foram organizados pelo International Human Rights Law Institute (IHRLI) em 1997, no Holocaust Memorial Museum, em Washington . O esboço das diretrizes foi realizado no âmbito do International Institute of Higher Studies in Criminal Sciences (ISISC) , em Siracusa, Itália 202 . Posteriormente, em 2003, foram revistos pelo IHRL e o Chicago Council on Foreign Relations, em três encontros, sendo denominados como Chicago Principles on PostConflit Justice. Desde então esses princípios foram submetidos à consulta de mais de 180 expertos de 30 países, sendo reformulados e adequados pelos membros do IHRLI 203 . Os princípios de Chicago sobre pósconflitos de justiça buscam estabelecer responsabilidades pelas violações de direitos humanos nos momentos

202 BASSIOUNI, M. Cherif. Prefácio. In: BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice . In: Chicago Principles on Post Conflict Justice , IHRLI, 2007, p. VVI. 203 BASSIOUNI, M. Cherif. Prefácio. In: BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. VVI.

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posteriores ao desenvolvimento dos conflitos, cuja compreensão exige uma abordagem interdisciplinar, além da mera aproximação formal legalista, que raramente satisfaz as necessidades das vítimas. Em tal sentido, foi observado que os mecanismos internacionais e nacionais raramente oferecem uma resposta eficaz, em termos de justiça, a respeito das atrocidades do passado, o que termina mitigando a sensação geral de justiça, em especial, durante os governos de transição. Por outra parte, sem uma adequada investigação, os autores dessas atrocidades podem virar mártires ou simplesmente ficar impunes em razão de uma percepção simplesmente política dos atos. Cabe esclarecer que os princípios de Chicago sobre pós conflitos de justiça focalizam os problemas internos ou nacionais, a partir da perspectiva da vítima, enquanto que as leis internacionais humanitárias, as leis internacionais sobre direitos humanos e as leis internacionais criminais, focalizam os conflitos internacionais que tem como principais atores os estados. As estratégias pósconflituais envolvem a delicada relação entre paz, justiça e reconciliação, cujo equilíbrio depende, essencialmente, de fatores complexos de caráter local, como a força dos regimes autoritários, as forças de resistência, as divisões políticas, étnicas, religiosas, a participação civil nos conflitos, dentre outros. Nessas situações se apresentam como dilemas valores/metas, tais como, segurança ou investigação das atrocidades do passado; responsabilização ou reconciliação. Essas tensões freqüentemente dependem da situação conjuntural em que se desenvolve a transição de regimes, de autoritários a democráticos, na qual, os autores das violações de direitos humanos procuram assegurar a impunidade, colocando como moeda de negociação a responsabilidade pelos seus atos, o que em muitos casos, não permite o fechamento desses conflitos: a falta de justiça impossibilita sua solução. O equilíbrio dos valores envolvidos depende, na sua essência, das demandas morais de ação, o que exige, como pressuposto, a consideração dos acontecimentos passados, e como instrumento de ação, o consenso político das políticas públicas estabelecidas pelo governo de transição. Sua força dependerá da

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violência com que se manifestou o sistema autoritário anterior, e do comprometimento cívico da comunidade e das necessidades gerais da população. Os princípios de Chicago procuram apresentar, em função das pesquisas realizadas, uma diretriz de ação que permita garantir o equilíbrio entre paz, justiça e reconciliação, assumindo o conflito, na sua máxima extensão possível: isto é, reconhecendo os fatos do passado, os seus responsáveis, suas vítimas, e suas conseqüências lesivas, junto com a necessidade de reparação, como forma plausível de solução.

2. Desenvolvimento da Justiça pósconflitual

Os princípios de pósconflitos de justiça foram formulados a partir da observação de que na recente história a responsabilização e redução de impunidade por violações de direitos humanos tem sido importante para a construção de estados democráticos pósconflitos. Essas práticas foram essenciais para estabelecer as regras legislativas nesses estados a respeito dos direitos humanos, reconhecendo o sofrimento das vítimas e prevenindo futuras violações. A justiça pósconflitual é relativamente nova, tem surgido aproximadamente há duas décadas a partir do desenvolvimento prático e teórico das respostas dadas por diversos estados a conflitos caracterizados por graves violações de direitos humanos. Cabe observar que os compromissos essenciais estão baseados nas promessas globais que estabeleceram o moderno sistema de direitos humanos nos últimos 50 anos. Todavia o processo específico representa um significante e recente desenvolvimento 204 . A genealogia da justiça pósconflitual poderia situarse no período posterior à Primeira Guerra Mundial, quando a emergente comunidade internacional começou a considerar seriamente o valor da busca da justiça após o conflito, apesar de não se concretizar em ações substantivas 205 .

204 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice . In: Chicago Principles on PostConflict Justice , IHRLI, 2007, p. 2/3. BASSIONI, M. Cherif. Searching for peace and achieving Justice: The need for accountability, p. 9. 205 Cf. TEITEL, Ruti G. Transitional Justice Genealogy. In: Harvard Human Rights Journal . Vol. 16, 2003, p. 70.

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Após a Segunda Guerra Mundial, como já observado, teve o nascimento do moderno sistema de direitos humanos, por meio da criação das Nações Unidas e da aceitação da Declaração Universal sobre direitos humanos. Com ela também foram estabelecidas importantes instituições de justiça pós conflitual, incluindo o Tribunal Militar Internacional de Nuremberg e Tókio, que deu suporte a persecuções de crimes de guerra domésticos na Europa e Ásia 206 . Entre os anos 1950 a 1980 o sistema normativo de Direitos Humanos continuouse desenvolvendo, porém, com reduzida implementação de políticas substanciais referente a obrigações sobre direitos humanos, em especial, por conta da guerra fria, que implicou uma divisão ideológica e política de caráter global. A partir da década de 80 em diante, a justiça pósconflitual foi fortemente enriquecida por conta das medidas adotadas pelos governos de transição com relação às violações de direitos humanos realizadas por regimes autoritários. Em geral essas estratégias de pósconflitos emergiram de movimentos populares e do desenvolvimento de respostas ou experiências locais 207 208 . Em especial, na América do Sul, os estados que se voltaram a organizar de forma democrática, implementaram persecuções no âmbito nacional, comissões sobre a verdade, políticas de declaração, mecanismos de memorização, motivados pela pressão popular, a sociedade civil, e grupos de direitos humanos 209 . Assim, foram iniciados processos de aceitação do passado, abrindo arquivos sobre os planos sistemáticos de repressão, instituídas comissões em busca da verdade, propondo reparações a suas vítimas. Em alguns casos, teve também, o julgamento dos principais responsáveis. Cabe observar que as estratégias pósconflituais se estabelecem em função do momento político, ajustando os ensejos de castigo aos responsáveis pelas violações de direitos humanos ao contexto político do país, de tal sorte que, com o passar do tempo e as mudanças políticas, a pretensão de castigo se atualiza na expectativa de concretizar os julgamentos 210 .

206 Cf. TEITEL, Ruti G. Transitional Justice Genealogy, p. 70. 207 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 5. 208 Cf. TEITEL, Ruti G. Transitional Justice Genealogy, p. 78. 209 Cf. TEITEL, Ruti G. Transitional Justice Genealogy p. 789. BASSIONI, M. Cherif. Searching for peace and achieving Justice: The need for accountability p. 11. 210 Cf. TEITEL, Ruti G. Transitional Justice Genealogy, p. 86.

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Na Europa Central e Oriental, governos criaram iniciativas envolvendo o debate público, memorização, abertura de arquivos de segurança, instituíram sanções administrativas conhecidas como lustration ou veting. Assim, e já no meio dos anos 90 o consenso internacional foi desenvolvendo a idéia de que para dar fim aos conflitos era necessária a concreção de um sentimento de justiça e reconciliação. Esse entendimento foi acompanhado de uma crescente legitimação dos direitos humanos, seja por meio de organizações não governamentais internacionais ou nacionais, ou pela crescente expansão do comprometimento dos estados em favor dos direitos fundamentais 211 . Nessa ordem, a aceitação internacional das idéias pós conflituais também estiveram influenciadas pelas atividades das Nações Unidas, incluindo manutenção de paz e missões sobre direitos humanos, assim como, um crescente reconhecimento institucional da ligação entre direitos humanos e desenvolvimento internacional. Esse processo avançou por meio do estabelecimento por parte do Conselho de Segurança de comissões para investigar os crimes cometidos na exIugoslávia, Ruanda, SerraLeoa, Kosovo, Timor do Leste e Camboja, ao estabelecimento de tribunais para o julgamento desses crimes. Assim, com o estabelecimento do Tribunal Penal Internacional, pode ser reconhecida a última fase do desenvolvimento da justiça pósconflitual, na qual é confirmado o modelo proposto com os julgamentos dos responsáveis por crimes contra a humanidade em Nuremberg 212 .

3. Os Princípios de Chicago sobre Pósconflitos de justiça

Os Princípios de Chicago são apresentados em duas partes. Na primeira, são esclarecidos os elementos fundacionais a partir dos quais são elaborados. Também, o desenho das estratégias pósconflituais de justiça.

211 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 6. TEITEL, Ruti G. Transitional Justice Genealogy, p. 83. 212 Cf. TEITEL, Ruti G. Transitional Justice Genealogy, p. 90.

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Assim, em primeiro lugar é observado que a violação de direitos humanos e leis humanitárias produzem complexos danos, sofrimentos, e perdas, em conseqüência, os estados devem promover as demandas por justiça quando atos dessa natureza são conhecidos. Considerase, também, que os direitos humanos e as leis humanitárias estabelecem a média de direitos e obrigações, ao tempo que promovem esforços para combater a impunidade, dando suporte à responsabilização por passadas violações de direitos humanos. Assim mesmo, é observado que a paz, democracia e as políticas direcionadas a assegurar estabilidade, seguintes aos conflitos ou regimes autoritários, são de utilidade quando os estados e a sociedade tomam em consideração as violações do passado 213 . Em tal sentido, cabe observar que o desenvolvimento das estratégias pósconflituais envolve a complexa relação entre o universal, o global e o local, isto é a universalização dos direitos humanos, de uma parte, o contexto regional de outra, e finalmente as necessidade das nações, que podem comprometer, de uma ou outra forma, os processos de pacificação e reconciliação 214 . Considerase que as políticas públicas que procuram a justiça por violações do passado devem centralizar o enfoque nas vítimas e nas formas de remediar e reparar os danos, sofrimentos e perdas sofridas por estas 215 . A justiça pósconflitual, também, deve estabelecer estratégias que considerem de forma sensível os aspectos sociais e culturais, bem como o contexto político em que o conflito se desenvolveu. Essa tarefa exige uma abordagem interdisciplinar e visão de longo prazo 216 . No plano das estratégias de justiça postconflictual é observado que os estados que foram impactados diretamente pelo passado violento, têm a responsabilidade primária de implementar experiências pósconflituais, para o qual podem aproveitar de experiências vivenciadas por outros estados, contando ainda,

213 Os fundamentos surgem da atividade de pesquisa dos professores BASSIOUNI, M. Cherif, como diretor do projeto, ROTHENBERG, Daniel. Diretor executivo, e HIGONNET, Etelle e HANNA, Michael, como colaboradoras, in Chicago Principles on PostConflit Justice , IHRLI, 2007, p. 12 e p. 21. 214 Cf. TEITEL, Ruti G. Transitional Justice Genealogy, p. 789. 215 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 22. 216 As estratégias, também são enunciadas na pesquisa referenciada, p. 23.

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com a contribuição da comunidade internacional e de organizações não governamentais. Em tal sentido, podem adotar diversos tipos de atividades, incluindo, persecuções, comissões de verdade, reparações, sanções e medidas administrativas, memorização, educação, arquivos, aproximação às tradições, culturas indígenas e religiões, reformas institucionais, etc. 217 Essas estratégias devem ser representativas e sensíveis dos sentimentos e necessidades dos grupos envolvidos, incluindo assim os segmentos minoritários ou socialmente menos representativos. Também, devem permitir a participação das vítimas e os seus familiares. Em termos gerais, devem procurar o envolvimento de toda a sociedade, o que pode ser gerado, por exemplo, mediante consultas públicas. Assim mesmo, as atividades pósconflituais devem garantir a segurança e estabilidade governamental, individualizando os responsáveis, seja no plano individual ou no plano institucional, ajustando ao longo do tempo as estratégias para garantir a justiça, a paz e a reconciliação social e que no futuro fatos dessa natureza não se repitam 218 .

4. Enunciados dos princípios de Chicago sobre justiça pósconflitual 219 :

Primeiro Princípio

“Os Estados devem processar pretensos autores de graves violações dos direitos humanos e do direito humanitário”.

Conforme o princípio enunciado, os estados têm a jurisdição primária para investigar e julgar as graves violações de direitos humanos e leis

217 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 24. 218 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 25. Os enunciados surgem da atividade de pesquisa referenciada, p. 26 e ss.

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humanitárias. Para tal fim, devem criar os mecanismos necessários para garantir que os julgamentos sejam realizados de forma independente e imparcial. Nas hipóteses em que a justiça nacional não consiga garantir o julgamento nesses termos, pode recorrer à ajuda de instituições internacionais, por exemplo, mediante o estabelecimento de tribunais mistos. Caso o julgamento, ainda, assim não possa ser efetivado, então, deverá ser realizado por tribunais internacionais 220 . Finalmente, considerase que os estados devem criar normas que garantam o estabelecimento de cortes com jurisdição universal por graves violações de direitos humanos e leis humanitárias 221 . Por outra parte, considerase que os estados devem cooperar entre eles e as organizações internacionais para a preservação, compilação, desclassificação e troca de informações referentes a graves violações de direitos humanos. Assim mesmo, devem cooperar com as investigações referentes a fatos dessa natureza e, quando for requerido, extraditar ou entregar indivíduos para o julgamento por graves violações de direitos humanos 222 e leis humanitárias, segundo as leis internacionais, ou realizar as atividades necessárias para garantir o julgamento em outros territórios por fatos dessa natureza 223 . Os estados devem investigar as alegações de graves violações de direitos humanos e leis humanitárias cometidas no seu território ou por indivíduos submetidos a sua jurisdição. Essas investigações e julgamentos devem ser públicos, porém de forma discreta, respeitando as regras do devido processo e impedindo a persecução múltipla, exceto quando o primeiro julgamento tenha sido realizado de forma imprópria, garantindo sua impunidade 224 . Em tal sentido deve ser garantida a ampla defesa (presunção de inocência, conhecimento da acusação, possibilidade de se defender, assistente

220 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 29. 221 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 29. 222 Sobre a origem dos direitos ver DERSHOWITZ, Alan. Rights from wrongs: A secular theory of the origins of rights . New York: Basic Books, 2004. 223 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 30. 224 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 31.

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técnico, controle das provas de acusação, possibilidade de produzir prova de defesa, alegações sobre a prova) e o direito à jurisdição, com acesso a um tribunal independente e imparcial, que não seja militar (propriamente militar, policial, grupo de inteligência, ou similar) 225 . Assim mesmo, devem ser protegidas as testemunhas, os membros de suas famílias, como também outras pessoas que possam ser ameaçadas pelo resultado ou pela sua cooperação na investigação. Da mesma forma devem ser protegidas as autoridades que participam da investigação ou julgamento. Atos ou omissões que não são considerados crimes pela lei nacional e internacional ao tempo de sua realização, não podem ser matéria de investigação ou julgamento. Sendo privado da sua liberdade, deverá ser respeitada sua dignidade, devendo ter tratamento humanitário 226 . A persecução deve considerar os principais responsáveis pelo planejamento e a implementação de graves violações de direitos humanos e leis humanitárias. Com relação à simples soldados, a perseguição deverá considerar as possibilidades de reabilitação e reintegração. Com relação à menores, deverão ser submetidos à justiça juvenil. A autoridade é legalmente responsável pelas graves violações de direitos humanos ou leis humanitárias ocorridas em operações sob seu efetivo controle. A persecução criminal pode demorar por período de tempo razoável a fim de garantir a segurança, e o desenvolvimento apropriado da capacidade das instituições investigativas e judiciais. Sem embargo, deverão levar em consideração os direitos das vítimas em razão do negativo impacto que a demora pode gerar em matéria de provas 227 .

Disposições legais que limitem a responsabilidade não podem ser aplicáveis nas persecuções por genocídio, crimes de guerra, ou crimes contra humanidade. Da mesma forma não podem ser invocadas como defesa a ordem do

225 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 32. 226 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 32. 227 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 34.

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superior para crimes dessa natureza. Tampouco podem ter nenhum sistema de redução de punição, imunidade, anistia 228 , ou asilo. Caso o estado conceda anistia, ainda que seja para finalizar o conflito, ficará sujeito à responsabilidade internacional por ter concedido impunidade 229 . Em tal sentido, cabe observar que os tratados em matéria de direitos humanos de caráter universal, bem como os de caráter especial, proíbem de forma explicita as anistias. Em rigor, somente se conta com o artigo 18 da Resolução da Assembléia Geral da ONU, que estabelece com relação à desaparição forçada que: Las personas que hayan cometido o sean acusadas de habe cometido qualqueira de los delitos referidos em el art. 4º, parágrafo 1, no podra beneficiarse por ninguna lei de amnistia o medidas de carácter similar que tengan por objeto eximirlas de cualquier proceso penal o sanción 230 .

O Comitê de Direitos Humanos, por sua parte, tem observado que: Las amnistías son generalmente incompatibles con el deber de los Estados de investigar esta clase de actos; de garantizar la no comisión de tales acto dentro de su jurisdicción; y de asegurar que ellos no ocurran nuevamente en el futuro Los Estados no pueden privar a los individuos del derecho a un recurso efectivo incluyendo el pago de una compensación y a una rehabilitación plena en el caso de que sea posible 231 .

Desta forma, afirmase que o direito internacional estabelece limites absolutos no que tange às graves violações aos direitos humanos (torturas, execuções extrajudiciais) que não admitem sob nenhuma circunstância uma isenção total de pena 232 . O problema em questão reside em que o direito internacional humanitário autoriza, em princípio, com a anistia após a finalização de um conflito

228 Sobre perdão ver JANKVITCH, Vladimir. L'imprescriptible. Pardonner? Dans l'honneur et la dignity . Paris: Seuil, 1986 ; do mesmo, Le pardon . Paris: AubierMontaigne, 1967; MICHNIK, Adam, VAICLAV, Havel. Justice or Revenge? Journal of Democracy 4 (January), 1993, p. 2027. MURPHY, Jeffrie G, HAMPTON, Jean. Forgiveness and Mercy . Cambridge: Cambridge University Press, 1988. 229 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 33 e 35. 230 Cf. AMBOS, Kai. Impunidad y Derecho Penal Internacional . Buenos Aires: AdHoc, 1999, p. 126. 231 Cf. AMBOS, Kai. Impunidad y Derecho Penal Internacional , p. 129. 232 AMBOS, Kai. Impunidad y Derecho Penal Internacional , p. 129

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internacional. Com efeito, de acordo com o II Protocolo Adicional, uma vez finalizadas as hostilidades, as partes em conflitos devem “esforçarse por garantir uma anistia o mais ampla possível” “para os fatos que são conseqüência necessária do conflito” (art. 6.5), a fim de alcançar na medida do possível e sem contratempos, a paz interna e a reconciliação das partes em conflito. Essa disposição que se encontraria em contradição com as normas do sistema de direitos humanos é interpretada no sentido de que só deve ser aplicada para os conflitos internacionais que são regulamentados pelas Convenções de Genebra e, em rigor, como forma de evitar a pena de morte (em função do art. 4.2. da CADH e 6.2 do PIDCP) 233 A respeito do exposto, é observado que essas disposições poderiam ser aplicadas para conflitos internos, segundo a mais atual jurisprudência da Corte Internacional de Justiça 234 A avaliação da concessão de anistia é tão delicada que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos observou o seguinte: Um problema difícil que tiveram que encarar as democracias recentes tem sido o da investigação das violações aos direitos humanos ocorridas nos anteriores governos, assim como a possibilidade de sancionar aos responsáveis de tais violações. A comissão reconhece que é um assunto sensível e extremadamente delicado, onde a contribuição que pode dar... e mínima. A resposta, então, deve surgir dos setores nacionais, que são em se mesmos os afetados, e a urgente necessidade de uma reconciliação e pacificação nacional deve ser conciliada com as exigências iniludíveis de um entendimento da verdade e da justiça 235 .

Sem prejuízo do exposto, cabe observar que no âmbito do direito internacional cabe distinguir a anistia em função dos grupos de autores e dos favorecidos. Vale dizer se a anistia favorece de forma direta ou indireta a quem cria a norma ou a outras pessoas que não dependem ou não tem relação com quem dita a norma (oposição). Essa distinção é relevante, pois, considerase inaceitável a anistia que favorece a quem dita a norma: seria uma autoanistia ou auto favorecimento, porque o legislador, nesse caso atuaria como “juiz de seus próprios

233 AMBOS, Kai. Impunidad y Derecho Penal Internacional, p. 128 234 Cf. CIJ, no caso Nicarágua – ICJ Reports 1986, par. 255 e 219 e ss. 235 Comissão Interamericana de Direitos Humanos – Informe anual 1985/1986 Disponível em: http://www.cidh.org/annualrep/85.86span/Indice.htm consultado em 29/07/09.

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atos”. Em tal sentido, cabe observar que já em 1925 a Corte Permanente de Justiça tinha considerado que as disposições de isenção de punibilidade, ditadas pelos nacionalsocialistas, não podiam aplicarse aos crimes de guerra causados 236 . Assim mesmo, foi observado que esse tipo de disposições violenta o princípio da razoabilidade, uma vez que a lei deve ser orientada para o bem comum, mas nesses casos, a mesma é orientada somente nos próprios interesses do parlamento 237 Finalmente, resta observar que, de modo geral, é atribuída maior legitimidade quando a anistia é aprovada pelo legislativo democrático ou mediante referendum, que quando é aprovada pelo executivo 238 . Cabe observar que no julgamento da Corte Interamericana sobre Direitos Humanos no caso Almonacid Arellano y otros contra Chile 239 , a Corte concluiu que: 2. El Estado incumplió sus obligaciones derivadas de los artículos 1.1 y 2 de la Convención Americana sobre Derechos Humanos, y violó los derechos consagrados en los artículos 8.1 y 25 de dicho tratado, en perjuicio de la señora Elvira del Rosario Gómez Olivares y de los señores Alfredo, Alexis y José Luis Almonacid Gómez, en los términos de los párrafos 86 a 133 de la presente Sentencia. 3. Al pretender amnistiar a los responsables de delitos de lesa humanidad, el Decreto Ley No. 2.191 es incompatible con la Convención Americana y, por tanto, carece de efectos jurídicos, a la luz de dicho tratado. 240

Cabe observar que nesse caso é seguida a doutrina estabelecida no caso Barrios Alto, quando manifestou o seguinte:

Como consecuencia de la manifiesta incompatibilidad entre las leyes de autoamnistía y la Convención Americana sobre Derechos Humanos, las mencionadas leyes carecen de efectos jurídicos y no pueden seguir representando un obstáculo para la investigación de los hechos (...) ni para la identificación y el castigo de los responsables(...) (párr. 44).

236 AMBOS, Kai. Impunidad y Derecho Penal Internacional , p. 130. 237 AMBOS, Kai. Impunidad y Derecho Penal Internacional , p. 130. 238 Comissão Interamericana de Direitos Humanos – Informe anual 1985/1986 Disponível em http://www.cidh.org/annualrep/85.86span/Indice.htm consultado em 29/07/09. 239 Corte Interamericana de Derechos Humanos. Caso Almonacid Arellano y otros Vs. Chile. Sentencia de 26 de septiembre de 2006. Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec _154_esp.pdf Consultado em 24/07/09. 240 Idem, p 65.

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Assim, na decisão foi observada a nãoaplicabilidade de leis limitadoras no que se refere a crimes contra a humanidade. Segundo a Corte, limitações nesses casos violam o Tratado sobre a nãoaplicabilidade em crimes contra a humanidade, bem como o princípio jus cogens de que também é obrigatória aos países que não ratificaram o tratado, como o caso do Chile. Em tal sentido esclareceu que as leis de autoanistia: conducen a la indefensión de las víctimas y a la perpetuación de la impunidad de los crímenes de lesa humanidad, por lo que son manifiestamente incompatibles con la letra y el espíritu de la Convención Americana e indudablemente afectan derechos consagrados en ella. Ello constituye per se una violación de la Convención y genera responsabilidad internacional del Estado. En consecuencia, dada su naturaleza, el Decreto Ley n. 2191 carece de efectos jurídicos y no puede seguir representando un obstáculo para la investigación de los hechos que constituyen este caso, ni para la identificación y el castigo de los responsables, ni puede tener igual o similar impacto respecto de otros casos de violación de los derechos consagrados en la Convención Americana acontecidos en Chile (párr. 118).

Com relação às disposições sobre prescrição, o direito internacional segue o critério referente a anistias, de tal forma que, os crimes que são anistiáveis podem ser prescritíveis, mas os que são inanistiáveis devem ser imprescritíveis.

Em tal sentido, foi observado desde longa data (Estatuto do Tribunal Militar de Nuremberg) que os crimes de guerra e os crimes contra a humanidade são imprescritíveis, razão pela qual esse critério aplicase, também aos crimes que constituem graves violações de direitos humanos.

Cabe observar que a Convenção Interamericana sobre desaparições forçadas de pessoas estabelece que “A persecução penal pela desaparição forçada de pessoas e a pena imposta judicialmente aos seus perpetradores não deve estar sujeita a estatutos de limitações”.

Resta observar que pela “natureza própria das desaparições forçadas ou involuntárias é oferecido um argumento legal contra as limitações estatutárias: os efeitos dessa ofensa continuam até o momento em que as

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circunstâncias da vítima mudam ou se esclarecem. Como é um delito permanente, o término da limitação à ação criminal começa quando o crime deixa de se cometer” 241 .

Segundo Princípio

“Os Estados devem respeitar o direito à verdade e encorajar investigações formais de violações passadas por comissões da verdade ou outros órgãos”

O direito à verdade toma em consideração o interesse das vítimas, suas famílias, e em geral a sociedade, enquanto, têm o direito de conhecer a verdade sobre as violações de direitos humanos e leis humanitárias ocorridas no passado. Em especial as vítimas e suas famílias têm o direito de receber informações específicas sobre as violações ocorridas no passado, como por exemplo, o destino dos desaparecidos (as circunstâncias do tempo em cativeiro, sua morte e destino dos seus restos mortais) 242 . As investigações sobre a verdade podem ser realizadas por comissões formadas para tal efeito, podendo ter caráter oficial, judicial, ou social. Essas comissões devem ser independentes e imparciais e, uma vez criadas, forças externas não podem interferir em sua composição, estrutura ou funcionamento. Em geral as comissões são compostas por personalidades renomadas por seu alto valor moral. Podem ter diversas finalidades, como por exemplo, estabelecer o historicamente acontecido, determinando a responsabilidade individual ou institucional pelos atos lesivos; oferecer um fórum para as vítimas contarem suas histórias e trocar informações para evitar a impunidade; recomendar mudanças legislativas e institucionais; recomendar reparações; e constituir um canal de reconciliação. Também oferecer material para a instauração de processos civis

241 Vide UN ECOSOCCHR, 1993, parr. 52. Também, RÚA, Alejandro Luis. Vigencia de la acción penal en el caso Jorge Rafael Videla. In: Cuadernos de Doctrina y Jurisprudencia Penal n. 8A. Buenos Aires: Ad Hoc, 1998, p. 395 e ss. 242 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 37.

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ou criminais 243 . As comissões de verdade inicialmente estabelecem o tempo de funcionamento, o período de tempo a ser investigado, os tipos de fatos a serem investigados e o foco da pesquisa. No funcionamento recebem as informações das vítimas, seja mediante testemunhos ou documentos, trocam informação com outras agências, inclusive com o novo estado ou autoridades. Realizam exumações e perícias necessárias para o esclarecimento dos fatos. Caso seja necessário para garantir a segurança das participantes asseguram a confiabilidade das testemunhas. Por outra parte, é concedido o direito de resposta a eventuais indiciados como responsáveis pelos atos investigados 244 . A comissão tem a responsabilidade de apresentar ao público, em geral, os trabalhos realizados, bem com suas conclusões, para tal fim podem ser transmitidos pelos diversos meios massivos de comunicação social. A publicidade deve ser garantida pelo estado, que poderá fazer a difusão de diversas formas, até em outras línguas. Assim mesmo, o material produzido pela comissão deve formar parte da grade curricular dos cursos de educação 245 . O estabelecimento de comissões de verdade, não exime ao estado de realizar os seus próprios procedimentos para o conhecimento do passado de violações de direitos humanos, para o qual podem aproveitar do resultado das investigações de organizações não governamentais. Em tal sentido, devem realizar as atividades que sejam necessárias para o esclarecimento dos fatos, tais como exumações, abertura de arquivos, assegurando o seu acesso às pessoas interessadas, bem como a privacidade, intimidade e a seguridade das mesmas 246 247 .

243 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 3839. 244 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 40. 245 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 4142. 246 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 43. 247 No presente trabalho, foram consideradas as Comissões da Verdade estabelecidas no Brasil, Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai.

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Terceiro Princípio

“Os Estados devem reconhecer a condição especial das vítimas, assegurar acesso à justiça e desenvolver remédios e reparações ”

São consideradas vítimas todas aquelas pessoas que tem sofrido um dano, individual ou coletivo, incluindo agressões psicológicas, mentais, emocionais, perdas econômicas, ou ataques significativos aos seus direitos básicos. A qualidade de vítima é atribuída tanto a quem sofre de forma direta as agressões ou perdas, quanto também, aos membros imediatos de suas famílias. Os estados devem assegurar que as vítimas sejam tratadas com compaixão, respeito, segurança e privacidade, devendo estabelecer programas que tenham especial sensibilidade a suas necessidades 248 . As vítimas devem ter o direito ao acesso de forma igualitária e efetiva à justiça, tendo informação dos fatos de violações de direitos humanos, e uma adequada, e efetiva promoção de reparações 249 . Os estados devem garantir um poder judicial justo, independente e imparcial, que garanta o acesso das vítimas, promovendo sua participação em processos civis e criminais sobre o passado de violação de direitos humanos 250 . As vítimas têm o direito a obter reparações pelas violações de direitos humanos e leis humanitárias. Os estados devem garantir adequadas reparações pelos atos ou omissões que resultaram na violação de direitos humanos. Quando os responsáveis pelas violações são grupos que não pertencem ao estado,

248 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 44. 249 Sobre verdade, reparações e reconciliação ver: ALONSO, Ana Maria. The effects of truth: Re presentations of the past and the imagining of community. In: Jornal of Historical Sociology , p. 3357. BARKAN, Elazar. The guilt of nations: restitution and negociating historical justices . NY: Norton, 2000. BARKAN, Elazar KARN, Alexander. Taking wrongs seriously: apologies and reconciliation . Stanford, CA: Stanford University Press, 2006. MINOW, Martha. Between vengange and forgiveness: facing history after genocide and mass violence . Boston: Beacon, 1998. ALWEISS, Lilian. Collective guilt and responsibility: some reflections. European Journal of Political Theory 2, p. 307318. LOVEMAN, Brian, LIRA, Elizabeth. Truth, Justice, Reconciliation, and impunity as historical themes: Chile, 1814 2006. In: Radical History Review . NY: Marho, 2007. Sobre a culpa coletiva ver: WOHL, Michael J. A. BRANSCOMBE, Nyla R. Forgiveness and collective guilt assignment to historical perpetrator groups depend on level of social category inclusiveness. In: Journal of Personality and Social Psychology n. 88, 2005, p. 288303. 250 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 45.

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estes deverão prover as reparações, sem embargo, o estado deverá assumir a responsabilidade, pela sua cumplicidade ou inadequada ação preventiva 251 .

As reparações devem ser estabelecidas de acordo com as leis domésticas e internacionais, podendo consistir em restituições, compensações, reabilitações, ou outros tipos de satisfações, incluindo a garantia de não repetição de tais atos 252 . A restituição deve procurar colocar à vitima na situação anterior a que se encontrava antes de sofrer as violações aos seus direitos, seja restabelecendo sua liberdade, unidade familiar, emprego, bem como o local onde residia, retornando as propriedades confiscadas, além dos outros direitos emergentes da sua condição de cidadão. O estado deve fazer os esforços para garantir a eliminação dos registros policiais ilegítimos realizados por forças policiais, motivadas pelas políticas repressivas governamentais 253 .

A compensação deve prover às vitimas com indenizações monetárias pelos danos, sofrimentos e perdas resultantes do passado de violações. Assim, são incluídos os danos psicológicos, mentais, perdas econômicas, educacionais, bem como oportunidades sociais, danos na reputação e dignidade; também os custos ocasionados com assistência médica, psicológica, e legal, dentre outros serviços sociais 254 .

A reabilitação deve promover serviços às vitimas que sofreram os impactos das violações, incluindo assistência médica e psicológica, serviços sociais, educação, trabalho, e assistência legal, em especial de crianças que foram vítimas das violações, de filhos das vítimas ou que participaram como soldados 255 .

251 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel . Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 45. 252 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel . Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 46. 253 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel . Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 46. 254 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 46. 255 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 47

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A satisfação e garantia de não repetição de violações dessa natureza exige do estado uma atividade e seguimento das conseqüências do passado de violação, bem como atividades futuras de prevenção 256 . As reparações devem ser proporcionais à natureza da violação e ao dano sofrido; devem, também, ser oferecidas de forma igualitária às vítimas. As reparações morais, bem como as comemorações e tributos devem considerar o processo de reconciliação e cicatrização das feridas individuais e coletivas 257 .

Quarto Princípio

“Os Estados devem implementar políticas de veto, sanções e medidas administrativas ”

Os estados devem realizar procedimentos administrativos para estabelecer a participação governamental no passado de violações de direitos humanos, em especial nas autoridades de alta patente das forças policiais, militares, inteligência e outros serviços especiais, que têm planejado, instigado, ordenado ou comandado tais violações. Da mesma forma, deve proceder a respeito de grupos não estatais que tem participado em atos dessa natureza, e também de grupos ou países que tem dado apoio, suporte financeiro, logístico ou de outra natureza 258 . Em tal sentido devem ser realizados procedimentos administrativos investigatórios e estabelecidas medidas administrativas sancionadoras para punir aos perpetradores das violações e, também prevenir futuras perpetrações 259 .

256 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 47. 257 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 47. 258 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 48. 259 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 48.

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O novo governo deve distinguirse do anterior regime repressivo, expressando claramente as responsabilidades pelas violações de direitos humanos e estabelecendo sistemas institucionais de investigação intragovernamental. Também deve desenvolver políticas de remoção dos juízes associados com o regime repressivo, em especial, quando tem contribuído suportando ou negando graves violações de direitos humanos 260 . Os procedimentos devem respeitar as garantias do devido processo e o direito à ampla defesa. As sanções devem ser proporcionais ao grau de participação nos fatos lesivos aos direitos humanos e leis humanitárias, devendo cancelar os benefícios inerentes à função pública 261 .

Quinto Princípio

“Os Estados devem apoiar programas oficiais e iniciativas populares para memorializar vítimas, educar a sociedade quanto à violência política passada, e preservar a memória histórica”

Conforme o princípio, as atividades em favor da memória das vítimas reforçam sua dignidade, ao mesmo tempo em que, constituem ferramentas importantes para a cicatrização das feridas e a reconciliação. Para tal fim essas atividades, patrocinadas pelo estado, devem ter visibilidade 262 .

260 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 49. 261 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 50. Sobre memória ver LEBOW, Richard Ned. The future of memory. In: The Annals of the American Academy of political and social science . SAGE, 2008, p. 25 41. Os historiadores e pesquisadores em geral dedicamse à reconstrução do passado. Todavia, o autor em questão trabalha com as diversas faces da memória e a possibilidade de a mesma ser construída de acordo com os interesses do estado e outros. Segundo ele nós não temos memórias do futuro, mas temos memórias imaginárias do futuro. Rotineiramente construímos cenários com bons ou maus desfechos baseados nas lições que nós achamos que aprendemos do passado e as usamos para construir nosso caminho no decorrer da vida e escolhas políticas ou até mesmo para tentar passar nossas preferências a outros. 262 A preservação da memória é algo importantíssimo, embora possa ser manipulada e falsas memórias podem ser incutidas no imaginário coletivo. Até mesmo pela sua dureza a coletividade por vezes não reconhece a verdadeira memória ou os interesses em jogo são muito poderosos para que a verdade efetivamente venha à tona. Nietzsche e Freud já trabalharam a questão da memória e como a verdadeira memória pode acabar cedendo em face de outros fatores, sendo que o segundo desenvolvendo uma idéia do primeiro. No aforismo 68 a questão vem à tona: “Eu fiz isso ”, minha

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memória me diz, “Eu não posso ter feito isso ”, diz meu orgulho e permanece inexorável. No final – a memória cede. (NIETZCHE, Friedrich. Para a lém do bem e do mau: ou prelúdio de uma filosofia do futuro. São Paulo: Martin Claret, 2002). Tal questão surge no caso conhecido como O homem das ratas onde um paciente evocando uma ação criminosa que lembra ter cometido, mas na qual não se reconhece, cita o aforismo em questão (GONZÁLES, Gabriela Ruiz. Escritura del psicoanálisis. In: ASCENCIO, Heli et al . Escritura y psicoanálisis . Colóquios de la fundación. Siglo veintiuno editores, p. 5868). Ainda sobre a memória histórica ver: HEISLER, Martin. The political currency of the past: History, Memory and Identity. In: The Annals of the American Academy of political and social science . SAGE, May 2008, p. 1424. HEISLER, Martin. Challenged histories and collective self concepts: politics in history, memory and time. 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Podem consistir na construção de monumentos, memoriais, museus, sítios de memorização, como antigas prisões, campos de concentração ou de combate, ou na inclusão de dias específicos no calendário oficial, a renominação de ruas, praças ou outros espaços públicos, ou no patrocínio de atividades culturais ou sociais que envolvam o passado de violação de direitos humanos 263 . Nessas atividades, resulta de especial importância a participação das vítimas, individuais ou coletivas, mediante a abertura de espaço às organizações estabelecidas em função do passado de violações. Por outra parte, os estados têm a responsabilidade de garantir a informação referente ao passado de violações de direitos humanos, de forma adequada para todos os segmentos sociais, incluindo essas informações nos processos educativos. 264 Em tal sentido, os estados tem o especial dever de preservar as informações ou arquivos sobre o passado de violações. Assim, o estado, junto com

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as vítimas e a comunidade devem trabalhar para fazer público o passado de violações de direitos humanos e prevenir que no futuro fatos dessa natureza não voltem a ocorrer, gerando assim uma cultura de respeito aos direitos humanos e ao estado de direito 265 .

Sexto Princípio

“Os Estados devem apoiar e respeitar enfoques tradicionais, indígenas e religiosos relativos às violações passadas ”

As tradições indígenas e religiosas têm alto nível de legitimidade local e geralmente são integradas na vida diária das vítimas, seus familiares, comunidades e na sociedade como um todo 266 . A respeito, os estados devem estabelecer instituições e práticas governamentais que reconheçam tais tradições ou costumes, em especial suas estruturas, incluindo sua organização em famílias, clãs, ou outras formas de agrupação, e forma de proceder, seja mediante rituais, invocação de histórias, passados e costumes em geral, de tal forma que sejam, especialmente, respeitados a honra, a dignidade e o prestígio desses grupos. A partir de uma perspectiva dos direitos humanos, os estados devem promover processos de julgamento e punição, ainda dentro desses grupos, de forma igualitária e segundo os princípios gerais reconhecidos nas cartas de direitos humanos. Assim mesmo os estados devem reconhecer o passado de violência que envolvem esses grupos e a reconciliação entre grupos e destes com a sociedade 267 .

265 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 53. 266 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 54. 267 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 55.

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Sétimo Princípio

“Os Estados devem empreender uma reforma institucional para estabelecer o estado de direito, restaurar a confiança pública, promover os direitos fundamentais e apoiar a boa gestão estatal ”

Os estados devem realizar atividades que promovam a governabilidade e a assistência às instituições, bem como submeter à lei o passado de violações de direitos humanos. Em tal sentido, os estados devem incluir a reestruturação das instituições de segurança, bem como reformas legais e judiciais que garantam a democratização e a defesa dos direitos humanos 268 . As reformas devem contar com a participação dos grupos afetados pelo passado e violação de direitos humanos, sejam vítimas, familiares ou comunidades ou organizações representativas dos diversos segmentos sociais envolvidos, bem como grupos minoritários, como, por exemplo, assegurando a representação adequada da mulher 269 . Os estados devem promover o desarmamento, a desmobilização de grupos armados ou de milícias, e a realização de programas de reintegração social. Também, o controle civil das forças militares, de inteligência e de polícia, e o respeito por parte destas, dos direitos humanos, para o qual devem ser elaborados regulamentos compatíveis com estes. Assim mesmo, devem ser promovidos cursos de capacitação sobre direitos humanos para os integrantes das forças de segurança 270 . As reformas legais devem garantir o estabelecimento e vigência do estado de direito, para o qual devem ser reconhecidos e ratificados os tratados internacionais de direitos humanos e adequado o direito interno a essas normas internacionais. Assim mesmo, deve ser garantido o funcionamento independente e

268 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 56. 269 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 57. 270 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice , p. 57.

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imparcial do poder judiciário 271 . Por outra parte, devem ser estabelecidas políticas de combate à corrupção que assegurem uma governabilidade transparente e responsável 272 . Os estados, também, devem realizar esforços para integrar nas suas políticas e gestões os direitos humanos, de tal forma que se estabeleçam sistemas de proteção em termos civis e políticos. Assim mesmo, deve estabelecer sistemas de monitoramento por ombudsmen ou organizações independentes para o adequado reconhecimento e proteção dos direitos humanos. Por outra parte, os estados devem promover políticas econômicas e sociais que garantam os direitos humanos e minimizem os conflitos entre os diversos grupos sociais 273 .

5. Observações Gerais

Em todo grupo social existem conflitos 274 , dos quais cada grupo social estabelece a forma de responder ante essas situações. As respostas que são oferecidas para cada conflito, podem ser reconduzidas a modelos, que dependendo da matéria conflituante podem ser formalizados ou não 275 .

271 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 58. 272 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 59. 273 BASSIOUNI, M. Cherif – ROTHENBERG, Daniel. Facing Atrocity: The importance of guiding principles on postconflict justice, p. 60. 274 Segundo Julien Freund, “o conflito consiste no enfrentamento, choque ou desacordo intencional entre dois grupos ou entes da mesma espécie que manifestam, uns com relação aos outros uma intenção hostil, em geral a propósito de um direito, e estes por manter, afirmar ou restabelecer o direito intentam quebrar a resistência do outro, eventualmente recorrendo à violência” FREUND, Julien. Sociologie du conflit. Paris: Presses Universitaires de France (PUF), 1983, p. 65. 275 A formalização opera em regra mediante os chamados mecanismos de controle social. PAVARINI, Massimo. Control y dominación . Teorías criminológicas burguesas y proyecto hegemónico. México: Siglo XXI, 1983; BARATTA, Alessandro. Criminología crítica y crítica del Derecho penal . Introducción a la sociología jurídicopenal. México: Siglo XXI, 1986; BERGALLI, R. Control social punitivo . Barcelona: Bosch, 1996; GARLAND. David. The Culture of Control : Crime and Social Order in Contemporary Society. University of Chicago Press, 2001; AAVV. Punishment and social control (BLOMBERG, Thomas G. e COHEN, Stanley – orgs.) New York: Aldine de Gruyter, 2003. AA.VV. Criminologia Críticay Control Social. Rosario (Arg.), 1993. MELOSSI, Dario. El estado del control social . Buenos Aires: Siglo XXI, 1993.

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Cabe observar que socialmente existem conflitos cuja resposta se encontra formalizada por regras sociais de comportamento não jurídicas. Em outras situações, quando os conflitos são previstos em normas jurídicas, a resposta encontrase estabelecida em módulos de comportamento que de forma geral e abstrata prevêem a situação de fato e sua particular resposta ou conseqüência. A resposta jurídica não pode ser muito diversa da prevista e aceita socialmente, pois nesse caso, a regra não é seguida e, consequentemente o conflito ficará sem a resposta formalizada, ou bem, a resposta socialmente estabelecida se imprime com tal força que faz sucumbir à norma jurídica. Isso significa que cada conflito social, tem uma solução natural que deve ser seguida pela norma jurídica e, quando isso não acontece, ou a norma jurídica não é aplicada ou se aplica pela força. Dessa forma é estabelecido um controle social que procura assegurar o cumprimento das expectativas de conduta e dos interesses previstos nas normas, seja mediante o consenso ou mediante a imposição de sanções. Dessa forma, se estabelecem limites na liberdade humana 276 . Em qualquer caso, a resposta, seja formalizada ou não, deve ajustarse a um dos modelos decisórios possíveis, a saber: conciliador, reparador, terapêutico ou punitivo 277 . A escolha em favor de um ou outro modelo, bem como sua formalização ou não dependerá de uma decisão, que opera, em primeiro lugar, no plano hipotético, pois, na situação factual, a resposta dependerá de uma outra solução, que opera no caso concreto, quando é reconhecido o conflito como tal e se escolhe dentre as respostas possíveis a prevista ou adequada para o mesmo. O sucesso na escolha do modelo proposto, bem como a sua formalização dependerá da receptividade resultante da adequação do fato concreto ao modelo previsto. Quando a receptividade é negativa o seu reconhecimento e aplicação, como foi dito dependerá do uso da força. Cabe observar que em muitos casos são os próprios atores os que definem o modelo a seguir e a forma em que socialmente está previsto; sem embargo existem casos em que o modelo é escolhido pelos agentes encarregados

276 MUÑOZ CONDE, Francisco. Derecho Penal y Control Social. Jerez: Fundación Universitaria de Jerez, 1985, p. 42. 277 HORWITZ, Allan. The logic of social control . New York: Plenum Press, 1990. p. 9 e ss. Acrescenta o modelo corretivo, ZAFFARONI, R. – ALAGIA, A. SLOKAR, A. Derecho Penal, p. 35.

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de formalizar os conflitos, com independência da vontade dos autores (v.g. polícia) 278 . Ante um conflito, os modelos de respostas possíveis podem gerar sua solução, o que ocorre quando entre as partes os interesses deixam de estar em tensão ou contradição. Nesses casos o conflito é dissolvido e deixa de existir como tal. Os modelos conciliador e reparador são idôneos para a solução de conflitos, pois o primeiro exige o consenso das partes envolvidas para a satisfação dos interesses em jogo e o segundo a volta à situação prévia ao conflito, isto é, quando não existia como tal. Em outros onde a solução não é possível a resposta pode implicar a suspensão 279 do conflito ou sua supressão. A suspensão acontece quando os conflitos são inconciliáveis, seja pela falta de capacidade de diálogo ou pela impossibilidade de reparação. Em geral ocorre quando a situação factual impossibilita sua solução, seja porque é materialmente inviável ou porque os sujeitos não têm a capacidade para se conciliar. Nesses casos o conflito se projeta no tempo, na expectativa de que a situação factual mude ou que os agentes mudem a partir do desenvolvimento das capacidades necessárias para a solução do conflito. No modelo terapêutico, e poderíamos somar o corretivo, aguardase que os agentes, ou uma parte deles, consigam desenvolver as capacidades necessárias para conciliar os interesses em conflito. No modelo punitivo, a resposta pode buscar, também, o desenvolvimento dessas capacidades ou simplesmente a supressão de um dos interesses em conflito, mediante o emprego de violência.

A resposta punitiva se apresenta como possível, pois as partes se encontram distantes para chegar a uma solução do conflito 280 . A aversão ante o passado, que foi de determinada forma e não de outra, marca o espaço de separação entre as partes, que é preenchido com o emprego da violência, que se

278 MACHADO, Maíra, Rocha. Internalização do direito penal. A gestão de problemas internacionais por meio do crime e da pena . São Paulo: Edesp, 2004, p. 20. 279 ZAFFARONI, R. – ALAGIA, A. SLOKAR, A. Derecho Penal , p. 35. 280 HORWITZ, Allan. The logic of social control . New York: Plenum Press, 1990, p. 30.

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dispara para o futuro na expectativa de mudar a representação que se tem do conflito 281 . Os modelos decisórios, quando suspendem o conflito, aguardam que as partes mudem sua percepção, operando no próprio ser da pessoa, para que no futuro não o percebam como tal. A mudança na percepção dependerá da gravidade do conflito, do qual também, dependerá o tempo que deverá ficar suspenso. Na medida em que na solução de um conflito os interesses envolvidos são satisfeitos, parece plausível sua busca, assim, é questionável a suspensão do conflito mediante respostas punitivas, quando a solução é possível, pois dessa forma se nega a satisfação dos interesses das partes envolvidas, mas também é questionável quando não sendo possível a solução, sua escolha por não ter efeitos positivos só encontra justificativa na simples satisfação de interesses vindicativos. Nos casos de graves violações de direitos humanos as respostas formalizadas têm procurado aproveitar os modelos ao alcance, a saber a conciliação dos grupos sociais, a reparação das vítimas, a correção das partes envolvidas, na expectativa de que não aconteçam esses fatos novamente, e o modelo punitivo contra os responsáveis dessas ações. A resposta punitiva, embora não implique a solução ou resolução do conflito 282 , tem sido aceita pelos internacionalistas como meio de prevenção de futuras violações de direitos humanos, porém, a multiplicidade de conflitos internacionais põe em evidência o seu permanente fracasso 283 . Com relação ao particular conflito, pode ser observado que, cada uma dessas respostas pode procurar sua solução ou suspensão. Os princípios de Chicago oferecem respostas de diversa natureza, a saber: O princípio primeiro, que propõe a perseguição e julgamento dos responsáveis pelas violações de direitos humanos e leis humanitárias, oferece o

281 MESSUTI, Ana. Reflexiones sobre el pensamiento penal. In: Perspectivas criminológicas en el umbral del tercer milenio (Messuti Ana, org.). Buenos Aires: Fundación de Cultura Universitaria, 1998, p. 117. 282 MACHADO, Maíra Rocha. Internalização do direito penal. A gestão de problemas internacionais por meio do crime e da pena . São Paulo: Edesp, 2004, p. 19. 283 Vide, capítulo I e tabelas apresentadas em anexo.

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modelo punitivo como forma de decisão do conflito. O princípio segundo, que exige o respeito do direito à verdade e o fomento de investigações sobre o passado de violações de direitos humanos, se apresenta como uma resposta conciliadora. O princípio terceiro, que exige o reconhecimento do status de vítimas, o acesso à justiça e o desenvolvimento de medidas paliativas e de reparações, oferece uma resposta reparadora. O princípio quarto, que exige a implementação por parte dos estados de procedimentos policiais, bem como sanções e medidas administrativas, apresentase como uma resposta inserida no modelo punitivo. O princípio quinto, que exige por parte dos estados o apoio de programas e iniciativas populares em favor da memória das vítimas, além de políticas públicas de educação, considerando o passado de violência política, constitui uma resposta inserida no modelo conciliador. O princípio sexto, que exige por parte dos estados o respeito às tradições indígenas, se apresenta como uma resposta inserida no modelo conciliador. O princípio sétimo, que exige por parte dos estados a promoção de reformas institucionais para reforçar o estado de direito, promovendo os direitos fundamentais, constitui uma resposta que se insere no modelo corretivo e conciliador.

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CAPITULO III – O PROCESSO DITATORIAL BRASILEIRO DO PERÍODO 19641984 E AS RESPOSTAS PÓSCONFLITUAIS

1. Introdução

1. O presente capítulo analisará o conflito brasileiro emergente do processo ditatorial do período 19641984, e também a experiência comparada nos países da região que, também, sofreram processos semelhantes, em particular Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai, em função dos princípios vistos no capítulo anterior. Na análise da situação brasileira, foi realizada uma síntese dos fatos históricos que apresentam a dinâmica do regime ditatorial, para depois trabalhar as respostas oferecidas pelo estado, uma vez restabelecida a ordem constitucional, em função dos princípios, considerados aplicáveis ao país. Essa mesma metodologia foi seguida com relação aos países da região que foram considerados, a fim de facilitar o estudo comparativo das respostas oferecidas para os conflitos, que têm sido semelhantes.

2. Em tal sentido foram considerados os seguintes princípios: Primeiro: os estados perseguirão as alegações de perpetrações de graves violações de direitos humanos e leis humanitárias. Segundo: os estados respeitarão o direito à verdade, e fomentarão a formal investigação de violações passadas por comissões da verdade ou outros órgãos. Terceiro: os estados reconhecerão o especial status de vítimas, garantindo o acesso à justiça e o desenvolvimento de medidas paliativas e reparações. Quarto: os estados implementarão procedimentos policiais, sanções e medidas administrativas.

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Quinto: os estados apoiarão programas e iniciativas populares em favor da memória das vítimas, e educarão a sociedade, considerando o passado de violência política e preservando a memória histórica.

3. Esses princípios foram considerados da seguinte forma: Os princípios primeiro e quarto foram atualizados no momento de analisar as atividades realizadas pelos estados para submeter a julgamento os responsáveis pelas violações de direitos humanos. Os princípios segundo e quinto foram considerados na análise do estabelecimento de comissões da verdade e da formação de arquivos e monumentos, para salvar a memória das vítimas das graves violações de direitos humanos. O princípio terceiro foi considerado ao momento de avaliar a implementação de sistemas de reparações, uma vez que estes dependem para o seu desenvolvimento do reconhecimento da qualidade de vítimas por parte dos reclamantes.

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2. Breve referência histórica

A intervenção militar na política brasileira e, em especial, nas épocas de crises tem sido uma constante no Brasil. Sua participação tem procurado explicação a partir de um papel moderador, ao dizer de Alfred Stepan, segundo o qual, no momento em que existe o risco de grave ruptura das relações democráticas, os militares são chamados, pela própria sociedade, a intervir e restabelecer a ordem 284 . O padrão moderador, seguido até o golpe cívicomilitar do ano 1964, representava uma intervenção militar limitada à supressão da crise. Os militares não assumiam plenamente o papel de governantes, pois entendiam que a função constitucional das forças armadas era o da preservação da ordem constitucional. Porém, o golpe cívicomilitar do ano 1964 importa uma ruptura desse padrão moderador, originada na mudança no pensamento dos militares, que observava as sucessivas crises políticas desde a deposição de Vargas como demonstração de que a sociedade civil não podia exercer por si mesma o controle democrático diante das ameaças subversivas e da corrupção que grassava nos círculos de poder. Por outra parte, passaram a se considerar preparados para governar o país. Nessa mudança de perspectiva, contribuíram os teóricos da Escola Superior de Guerra (ESG), sendo os principais artífices do golpe de 1964 285 . O golpe cívicomilitar de 1964 constitui o momento culminante de um processo de instabilidade e descontentamento governamental que dominava o ambiente político desde a renúncia de Jânio Quadros em 1961, e que se intensificou com a política de governo do seu vicepresidente, João Goulart, quando assumiu a presidência num clima político adverso 286 . João Goulart procurou uma maior participação das organizações

284 STEPAN, Alfred. Os militares na política . Rio de Janeiro: Artenova, 1975, p. 46 e ss. 285 Brasil. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos . Direito à verdade e à memória: Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos / Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2007, p. 21. 286 GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada . São Paulo: Companhia das Letras, 2002, p. 46.

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sociais nas políticas públicas, o que implicou a abertura do governo em favor de setores sociais, ordinariamente afastados desses espaços de poder. Essa orientação política gerou preocupação a outros segmentos sociais, que temiam que o governo se inclinasse, gradativamente, em favor de políticas socialistas 287 . No dia 13 de março de 1964, João Goulart realizou um grande comício na Central do Brasil (Rio de Janeiro), defendendo as chamadas Reformas de Base 288 . Em resposta, os grupos conservadores, em 19 de março, organizaram a Marcha da Família com Deus pela Liberdade (São Paulo), que era contrária às reformas propostas por Goulart 289 . Nesse clima de instabilidade política 290 , que aumentava a cada dia, e com a imprensa que pregava abertamente a deposição do presidente 291 , no

287 Com efeito, os partidos de oposição, como a União Democrática Nacional (UDN) e o Partido Social Democrático (PSD), acusavam a João Goulart de planejar um “golpe de esquerda” e de ser o responsável pelo desabastecimento que naquele tempo sofria o Brasil. 288 As reformas de base implicavam mudanças radicais na estrutura agrária, econômica e educacional do país. 289 GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada , p. 62. 290 Segundo a Fundação Getúlio Vargas, " (...)o golpe militar foi saudado por importantes setores da sociedade brasileira. Grande parte do empresariado, da imprensa, dos proprietários rurais, vários governadores de estados importantes (como Carlos Lacerda, da Guanabara, Magalhães Pinto, de Minas Gerais, e Ademar de Barros, de São Paulo), além de setores da classe média, pediram e estimularam a intervenção militar, como forma de pôr fim à ameaça de esquerdização do governo e de controlar a crise econômica." A Igreja católica, que tinha organizado movimentos como o Marcha da Família com Deus pela Liberdade, a Juventude Universitária Católica (JUC) e o Movimento de Educação de Base (MEB), inicialmente apoiou a ditadura, porém, quando ativistas católicos foram presos e torturados, a igreja passou a denunciar os desmandos do governo. Disponível em: http://www.cpdoc.fgv.br/dhbb/verbetes_htm/6367_7.asp consultado em 07/06/09. 291 Antes da ditadura, jornais como O Globo, Jornal do Brasil, Correio da Manhã, Diário de Notícias, folhas da tarde, pregaram abertamente a deposição do presidente. Somente o jornal Última Hora se opôs ao golpe. (vide, ABREU, Alzira Alves de. A participação da imprensa na queda do governo Goulart. In: 1964 2004. 40 anos do Golpe. Rio de Janeiro: 7letras, 2004; KUSHNIR Beatriz. Cães de guarda – Jornalistas e censores, do AI5 à Constituição de 1988 . São Paulo: Boitempo, 2004). O resumo dos editoriais pode ser consultado no site da historiadora Cristiane Costa, disponível em: http://blogdabrhistoria.blog.uol.com.br/ consultado em 07/06/09; e no site do PT disponível em: http://www.pt.org.br/portalpt/index.php ?option=com_content&task=view&id=75415&Itemid=455 consultado em 07/06/09. “Desde ontem se instalou no País a verdadeira legalidade... Legalidade que o caudilho não quis preservar, violandoa no que de mais fundamental ela tem: a disciplina e a hierarquia militares. A legalidade está conosco e não com o caudilho aliado dos comunistas” (Editorial do Jornal do Brasil Rio de Janeiro 1º de Abril de 1964). “Multidões em júbilo na Praça da Liberdade. Ovacionados o governador do estado e chefes militares. O ponto culminante das comemorações que ontem fizeram em Belo Horizonte, pela vitória do movimento pela paz e pela democracia foi, sem dúvida, a concentração popular defronte ao Palácio da Liberdade. Toda área localizada em frente à sede do governo mineiro foi totalmente tomada por enorme multidão, que ali acorreu para festejar o êxito da campanha deflagrada em Minas (...), formando uma das maiores massas humanas já vistas na cidade” (O Estado de Minas Belo Horizonte 2 de abril de 1964). “Salvos da comunização que celeremente se preparava, os brasileiros devem agradecer aos bravos

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militares que os protegeram de seus inimigos”... “Este não foi um movimento partidário. Dele participaram todos os setores conscientes da vida política brasileira, pois a ninguém escapava o significado das manobras presidenciais” (O Globo Rio de Janeiro 2 de Abril de 1964). “A população de Copacabana saiu às ruas, em verdadeiro carnaval, saudando as tropas do Exército. Chuvas de papéis picados caíam das janelas dos edifícios enquanto o povo dava vazão, nas ruas, ao seu contentamento” (O Dia Rio de Janeiro 2 de Abril de 1964). “Escorraçado, amordaçado e acovardado, deixou o poder como imperativo de legítima vontade popular o Sr. João Belchior Marques Goulart, infame líder dos comunocarreiristasnegocistas sindicalistas. Um dos maiores gatunos que a história brasileira já registrou., o Sr João Goulart passa outra vez à história, agora também como um dos grandes covardes que ela já conheceu” (Tribuna da Imprensa Rio de Janeiro 2 de Abril de 1964). “A paz alcançada. A vitória da causa democrática abre o País a perspectiva de trabalhar em paz e de vencer as graves dificuldades atuais. Não se pode, evidentemente, aceitar que essa perspectiva seja toldada, que os ânimos sejam postos a fogo. Assim o querem as Forças Armadas, assim o quer o povo brasileiro e assim deverá ser, pelo bem do Brasil” (Editorial de O Povo Fortaleza 3 de Abril de 1964). “Ressurge a Democracia! Vive a Nação dias gloriosos. Porque souberam unirse todos os patriotas, independentemente das vinculações políticas simpáticas ou opinião sobre problemas isolados, para salvar o que é de essencial: a democracia, a lei e a ordem. Graças à decisão e ao heroísmo das Forças Armadas que, obedientes a seus chefes, demonstraram a falta de visão dos que tentavam destruir a hierarquia e a disciplina, o Brasil livrouse do governo irresponsável, que insistia em arrastálo para rumos contrários à sua vocação e tradições” “Como dizíamos, no editorial de anteontem, a legalidade não poderia ter a garantia da subversão, a ancora dos agitadores, o anteparo da desordem. Em nome da legalidade não seria legítimo admitir o assassínio das instituições, como se vinha fazendo, diante da Nação horrorizada ...” (O Globo Rio de Janeiro 4 de Abril de 1964). “Milhares de pessoas compareceram, ontem, às solenidades que marcaram a posse do marechal Humberto Castelo Branco na Presidência da República... O ato de posse do presidente Castelo Branco revestiuse do mais alto sentido democrático, tal o apoio que obteve” (Correio Braziliense Brasília 16 de Abril de 1964). “Vibrante manifestação sem precedentes na história de Santa Maria para homenagear as Forças Armadas” “Cinqüenta mil pessoas na Marcha Cívica do Agradecimento” (A Razão Santa Maria RS 17 de Abril de 1964). “Vive o País, há nove anos, um desses períodos férteis em programas e inspirações, graças à transposição do desejo para a vontade de crescer e afirmarse. Neguese tudo a essa revolução brasileira, menos que ela não moveu o País, com o apoio de todas as classes representativas, numa direção que já a destaca entre as nações com parcela maior de responsabilidades”. (Editorial do Jornal do Brasil Rio de Janeiro 31 de Março de 1973). “Sabíamos, todos que estávamos na lista negra dos apátridas que se eles consumassem os seus planos, seríamos mortos. Sobre os democratas brasileiros não pairava a mais leve esperança, se vencidos. Uma razzia de sangue vermelha como eles, atravessaria o Brasil de ponta a ponta, liquidando os últimos soldados da democracia, os últimos paisanos da liberdade” (O Cruzeiro Extra 10 de Abril de 1964 Edição Histórica da Revolução “Saber ganhar” David Nasser). “Golpe? É crime só punível pela deposição pura e simples do Presidente. Atentar contra a Federação é crime de lesapátria. Aqui acusamos o Sr. João Goulart de crime de lesapátria. Jogounos na luta fratricida, desordem social e corrupção generalizada” (Jornal do Brasil, edição de 01 de abril de 1964.) "Participamos da Revolução de 1964 identificados com os anseios nacionais de preservação das instituições democráticas, ameaçadas pela radicalização ideológica, greves, desordem social e corrupção generalizada". (Editorial do jornalista Roberto Marinho, publicado no jornal "O Globo", edição de 07 de outubro de 1984, sob o título: "Julgamento da Revolução"). 31/03/64 – FOLHA DA TARDE – (Do editorial, A GRANDE AMEAÇA)"... cuja subversão além de bloquear os dispositivos de segurança de todo o hemisfério , lançaria nas garras do totalitarismo vermelho, a maior população latina do mundo ..." 31/03/64 – CORREIO DA MANHÃ – (Do editorial, BASTA!): "O Brasil já sofreu demasiado com o governo atual. Agora, basta!". A redação desse editorial foi obra conjunta de Edmundo Moniz,

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Osvaldo Peralva, Newton Rodrigues e Otto Maria Carpeaux. O chamativo é que alguns dos redatores tinham formação de esquerda, e eram professores de história ou de filosofia ( GASPARI, Elio. A ditadura envergonhada. São Paulo: Companhia das letras, 2002, p. 65) . 31/02/64 – JORNAL DO BRASIL – "Quem quisesse preparar um Brasil nitidamente comunista não agiria de maneira tão fulminante quanto a do Sr. João Goulart a partir do comício de 13 de março..." 1º/04/64 – CORREIO DA MANHÃ – (Do editorial, FORA!): "Só há uma coisa a dizer ao Sr. João Goulart: Saia!" 1º/04/64 – ESTADO DE SÃO PAULO – (SÃO PAULO REPETE 32) "Minas desta vez está conosco"... "dentro de poucas horas, essas forças não serão mais do que uma parcela mínima da incontável legião de brasileiros que anseiam por demonstrar definitivamente ao caudilho que a nação jamais se vergará às suas imposições." 02/09/64 Editorial de O GLOBO após o golpe militar “RESSURGE A DEMOCRACIA. Vive a Nação dias gloriosos. Porque souberam unirse todos os patriotas, independentemente de vinculações políticas, simpatias ou opinião sobre problemas isolados, para salvar o que é essencial: a democracia, a lei e a ordem. Graças à decisão e ao heroísmo das Forças Armadas, que obedientes a seus chefes demonstraram a falta de visão dos que tentavam destruir a hierarquia e a disciplina, o Brasil livrouse do Governo irresponsável, que insistia em arrastálo para rumos contrários à sua vocação e tradições. Como dizíamos, no editorial de anteontem, a legalidade não poderia ser a garantia da subversão, a escora dos agitadores, o anteparo da desordem. Em nome da legalidade, não seria legítimo admitir o assassínio das instituições, como se vinha fazendo, diante da Nação horrorizada. Agora, o Congresso dará o remédio constitucional à situação existente, para que o País continue sua marcha em direção a seu grande destino, sem que os direitos individuais sejam afetados, sem que as liberdades públicas desapareçam, sem que o poder do Estado volte a ser usado em favor da desordem, da indisciplina e de tudo aquilo que nos estava a levar à anarquia e ao comunismo. Poderemos, desde hoje, encarar o futuro confiantemente, certos, enfim, de que todos os nossos problemas terão soluções, pois os negócios públicos não mais serão geridos com máfé, demagogia e insensatez. Salvos da comunização que celeremente se preparava, os brasileiros devem agradecer aos bravos militares, que os protegeram de seus inimigos. Devemos felicitarnos porque as Forças Armadas, fiéis ao dispositivo constitucional que as obriga a defender a Pátria e a garantir os poderes constitucionais, a lei e a ordem, não confundiram a sua relevante missão com a servil obediência ao Chefe de apenas um daqueles poderes, o Executivo. As Forças Armadas, diz o Art. 176 da Carta Magna, "são instituições permanentes, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade do Presidente da República E DENTRO DOS LIMITES DA LEI. No momento em que o Sr. João Goulart ignorou a hierarquia e desprezou a disciplina de um dos ramos das Forças Armadas, a Marinha de Guerra, saiu dos limites da lei, perdendo, conseqüentemente, o direito a ser considerado como um símbolo da legalidade, assim como as condições indispensáveis à Chefia da Nação e ao Comando das corporações militares. Sua presença e suas palavras na reunião realizada no Automóvel Clube, vincularamno, definitivamente, aos adversários da democracia e da lei. Atendendo aos anseios nacionais, de paz, tranqüilidade e progresso, impossibilitados, nos últimos tempos, pela ação subversiva orientada pelo Palácio do Planalto, as Forças Armadas chamaram a si a tarefa de restaurar a Nação na integridade de seus direitos, livrandoos do amargo fim que lhe estava reservado pelos vermelhos que haviam envolvido o Executivo Federal. Este não foi um movimento partidário. Dele participaram todos os setores conscientes da vida política brasileira, pois a ninguém escapava o significado das manobras presidenciais. Aliaramse os mais ilustres líderes políticos, os mais respeitados Governadores, com o mesmo intuito redentor que animou as Forças Armadas. Era a sorte da democracia no Brasil que estava em jogo. A esses líderes civis devemos, igualmente, externar a gratidão de nosso povo. Mas, por isto que nacional, na mais ampla acepção da palavra, o movimento vitorioso não pertence a ninguém. É da Pátria, do Povo e do Regime. Não foi contra qualquer reivindicação popular, contra qualquer idéia que, enquadrada dentro dos princípios constitucionais, objetive o bem do povo e o progresso do País. Se os banidos, para intrigarem os brasileiros com seus líderes e com os chefes militares, afirmarem o contrário, estarão mentindo, estarão, como sempre, procurando engodar as massas trabalhadoras, que não lhes devem dar ouvidos. Confiamos em que o Congresso votará, rapidamente, as medidas reclamadas para que se inicie no Brasil uma época de justiça e harmonia social. Mais uma vez, o

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dia 31 de março de 1964, tropas de Minas Gerais e São Paulo saíram às ruas e tomam o poder 292 , com a conivência de grande parte da sociedade civil 293 , e dos integrantes do poder legislativo, que consideraram vaga a presidência da república 294295 . Em 9 de abril, é decretado o Ato Institucional Número 1 (AI1), povo brasileiro foi socorrido pela Providência Divina, que lhe permitiu superar a grave crise, sem maiores sofrimentos e luto. Sejamos dignos de tão grande favor. http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2003/08/261573.shtml Consultado em 07.06.2009. 02/04/64 – CORREIO DA MANHÃ – "Lacerda anuncia volta do país à democracia." 05/04/64 – O GLOBO – "A Revolução democrática antecedeu em um mês a revolução comunista". 05/04/64 – O ESTADO DE MINAS – "Feliz a nação que pode contar com corporações militares de tão altos índices cívicos". "Os militares não deverão ensarilhar suas armas antes que emudeçam as vozes da corrupção e da traição à pátria." 06/04/64 – JORNAL DO BRASIL – "PONTES DE MIRANDA diz que Forças Armadas violaram a Constituição para poder salvála!" 09/04/64 – JORNAL DO BRASIL – "Congresso concorda em aprovar Ato Institucional". 10/04/64 – JORNAL DO BRASIL – "Partidos asseguram a eleição do General Castelo Branco". 16/04/64 – JORNAL DO BRASIL – "Rio festeja a posse de Castelo". 18/04/64 – JORNAL DO BRASIL – "Castelo garante o funcionamento da Justiça". 21/04/64 – JORNAL DO BRASIL – "Castelo diminui nível de aumento aos militares". Corte propõe aumento aos militares com 50% menos do que tabela anterior". 07/10/1984 – O GLOBO – (Do editorial, JULGAMENTO DA REVOLUÇÃO)"...Sem o povo não haveria revolução, mas apenas um "pronunciamento" ou "golpe" com o qual não estaríamos solidários". "... nos meses dramáticos de 1968 em que a intensificação dos atos de terrorismo provocou a implantação do AI5." "...na expansão econômica de 1969 a 1972, quando o produto nacional bruto cresceu à taxa média anual de 10%..." "...naquele primeiro decênio revolucionário, a inflação decrescera de 96% para 12% ao ano, elevandose as exportações anuais de 1 bilhão e 300 mil dólares para mais de 12 bilhões de dólares". "... elevando a produção de petróleo de 175 mil para 500 mil barris diários e a de álcool de 680 milhões para 8 bilhões de litros, e simultaneamente aumentar a fabricação industrial em 85%, expandir a área plantada para produção de alimentos com 90 milhões de hectares a mais, criar 13 milhões de novos empregos, assegurar a presença de mais de 10 milhões de estudantes nos bancos escolares, ampliar a população economicamente ativa de 25 milhões para 45 milhões elevando as exportações anuais de 12 bilhões para 22 bilhões de dólares". "... há que se reconhecer um avanço impressionante: em 1964 éramos a quadragésima nona economia mundial, com uma população de 80 milhões de pessoas e renda per capita de 900 dólares; somos hoje a oitava, com uma população de 130 milhões de pessoas, e uma renda média per capita de 2500 dólares". "...Não há memória de que haja ocorrido aqui, ou em qualquer outro país, que um regime de força consolidado há mais de dez anos, se tenha utilizado do seu próprio arbítrio para se auto limitar, extingüindose os poderes de exceção, anistiando adversários, ensejando novos quadros partidários, em plena liberdade de imprensa. É esse, indubitavelmente, o maior feito da Revolução de 1964". 292 GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada , p. 67 e ss. 293 Em tal sentido cabe lembrar a Marcha da Vitória, ocorrida no dia 2 de abril de 1964, logo após o golpe, no Rio de Janeiro com cerca de um milhão de pessoas. A manifestação foi patrocinada e financiada, dentre outros, pelo IPES, pelo governador mineiro Magalhães Pinto e pelo governador Carlos Lacerda, saudando o novo regime que estava assumindo o poder. 294 O Presidente João Goulart, permaneceu em território brasileiro até o dia 2 de abril, em que o Congresso Nacional declarou que a Presidência da República estava vaga e deu posse ao Presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzili, que permaneceu no cargo até 15 de abril de 1964, quando foi substituido por um militar. Goulart partiu para o exílio no Uruguai, morrendo na Argentina, em 1976. 295 GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada , p. 111.

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em razão do qual foram cassados os mandatos políticos de opositores ao regime militar e foi retirada a estabilidade dos funcionários públicos 296 .

O primeiro presidente militar chega ao cargo após as alterações advindas do Ato Institucional nº 2 297 , ou AI2, em que foi permitida a eleição de militares e a eleição indireta para presidente (art. 9) 298 . Assim mesmo permitia a declaração de estado de sítio, bem como da intervenção federal (arts.13 e 17) 299 a suspensão dos direitos políticos e a aplicação de medidas de segurança (art. 15 e 16) 300 , e declara extintos os partidos políticos (art. 18) 301 . Assim mesmo autoriza ao presidente a emitir decretosleis para regulamentar questões de segurança (art. 30). 302 Permite, também, colocar em recesso o Congresso Nacional, as Assembléias Legislativas e as Câmaras de Vereadores (art. 31) 303 ; O general militar Castello

296 Brasil. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos . Direito à verdade e à memória: Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos / Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2007, p. 24. 297 D.O. de 27/10/65, p. 11017. 298 Art. 9º A eleição do Presidente e do VicePresidente, da República será realizada pela maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão pública e votação nominal. 299 Art. 13 O Presidente da República poderá decretar o estado de sítio ou prorrogálo pelo prazo máximo de cento e oitenta dias, para prevenir ou reprimir a subversão da ordem interna. Parágrafo único O ato que decretar o estado de sítio estabelecerá as normas a que deverá obedecer a sua execução e indicará as garantias constitucionais que continuarão em vigor. Art. 17 Além dos casos previstos na Constituição federal, o Presidente da República poderá decretar e fazer cumprir a intervenção federal nos Estados, por prazo determinado: I para assegurar a execução da lei federal; II para prevenir ou reprimir a subversão da ordem. 300 Art. 15 No interesse de preservar e consolidar a Revolução, o Presidente da República, ouvido o Conselho de Segurança Nacional, e sem as limitações previstas na Constituição, poderá suspender os direitos políticos de quaisquer cidadãos pelo prazo de 10 (dez) anos e cassar mandatos legislativos federais, estaduais e municipais. Parágrafo único Aos membros dos Legislativos federal, estaduais e municipais, que tiverem seus mandatos cassados não serão dados substitutos, determinandose o quorum parlamentar em função dos lugares efetivamente preenchidos. Art. 16 A suspensão de direitos políticos, com base neste Ato e no, art. 10 e seu parágrafo único do Ato institucional, de 9 de abril de 1964, além do disposto no art. 337 do Código Eleitoral e no art. 6º da Lei Orgânica dos Partidos Políticos, acarreta simultaneamente: I a cessação de privilégio de foro por prerrogativa de função; II a suspensão do direito de votar e de ser votado nas eleições sindicais; III a proibição de atividade ou manifestação sobre assunto de natureza política; IV a aplicação, quando necessária à preservação da ordem política e social, das seguintes medidas de segurança: a) liberdade vigiada; b) proibição de freqüentar determinados lugares; c) domicílio determinado. 301 Art. 18 Ficam extintos os atuais Partidos Políticos e cancelados os respectivos registros. Parágrafo único Para a organização dos novos Partidos são mantidas as exigências da Lei nº 4.740, de 15 de julho de 1965, e suas modificações. 302 Art. 30 O Presidente da República poderá baixar atos complementares do presente, bem como decretosleis sobre matéria de segurança nacional. 303 Art. 31 A decretação do recesso do Congresso Nacional, das Assembléias Legislativas e das Câmaras de Vereadores pode ser objeto de ato complementar do Presidente da República, em

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Branco foi eleito pelo Congresso Nacional presidente da República em 15 de abril de 1964. Pelo AI n. 3, de 5 de fevereiro de 1966 304 , se estabelecem as eleições indiretas para os governadores dos estados 305 No seu governo, foi instituído o bipartidarismo, ficando autorizados a funcionar: a Aliança Renovadora Nacional (ARENA), que representava os militares, e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), que se manifestava como oposição 306 . Parlamentares e cidadãos, de outras orientações políticas, tiveram os seus mandatos cassados, bem como seus direitos políticos e constitucionais cancelados 307 . Os sindicatos, por sua parte, receberam intervenção do governo militar. Os militares que conspiraram contra Goulart esperavam enfrentar resistência armada; imaginavam que oficiais legalistas defenderiam o presidente e seu governo, talvez mergulhando o Brasil em uma guerra civil. Por isso, queriam atacar antes que os legalistas pudessem se mobilizar, sem embargo, a resistência jamais se materializou 308 .

estado de sítio ou fora dele. Parágrafo único Decretado o recesso parlamentar, o Poder Executivo correspondente, fica autorizado a legislar mediante decretosleis em todas as matérias previstas na Constituição e na Lei Orgânica 304 D.O. de 07/02/66, p. 1435. 305 Art 1º A eleição de Governador e ViceGovernador dos Estados farseá pela maioria absoluta dos membros da Assembléia Legislativa, em sessão pública e votação nominal. 306 O Ato Complementar Número 4, em novembro de 1965, institucionalizou o sistema bipartidário no Brasil. Foram criados dois partidos, um situacionista e um oposicionista, sendo que o segundo jamais poderia ter quórum superior ao primeiro. O partido situacionista, formado por integrantes dos extintos PSD e UDN e chamado de Aliança Renovadora Nacional, ARENA, dava sustentação ao governo, portanto era obrigatório que tivesse maioria. O partido oposicionista foi nominado Movimento Democrático Brasileiro, MDB. (Vide D.O. de 22/11/65). 307 A junta militar, no dia 10 de abril de 1964, divulgou o Ato do Comando Revolucionário Nº 1, com a lista de cem nomes, cujos direitos políticos foram suspensos, entre eles o expresidente João Goulart, o expresidente Jânio Quadros, o secretáriogeral do proscrito Partido Comunista Brasileiro (PCB) Luís Carlos Prestes, os governadores depostos Miguel Arraes, de Pernambuco, o deputado federal e exgovernador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola, o deputado federal por Roraima e ex governador do Amazonas Gilberto Mestrinho, o desembargador Osni Duarte Pereira, o economista Celso Furtado, o embaixador Josué de Castro, o ministro deposto da Justiça, Abelardo Jurema de Araújo, os exministros Almino Afonso, do Trabalho, e Paulo de Tarso, da Educação, o presidente deposto da Superintendência da Política Agrária (Supra) João Pinheiro Neto, o reitor deposto da Universidade de Brasília, Darcy Ribeiro, o assessor de imprensa de Goulart Raul, Riff, o jornalista Samuel Wainer e o presidente deposto da Petrobrás, marechal Osvino Ferreira Alves. No mesmo dia, foi publicado Ato do Comando Revolucionário Nº 2, cassando o mandato de 40 membros do Congresso Nacional, que já haviam sido incluídos no ato de suspensão dos direitos políticos. As listas posteriores incluíram 29 líderes sindicais, como o presidente do então extinto Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), Clodsmith Riani, além de Hércules Correia, Dante Pellacani, Osvaldo Pacheco e Roberto Morena. Cento e vinte e dois oficiais de alta patente das forças armadas foram também expulsos, além de sargentos, cabos, etc. 308 GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada , p. 112.

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Por outra parte, queriam pôr as mãos nos líderes subversivos que supostamente estavam levando o Brasil para o comunismo, por meio da Operação Limpeza 309 310 311 312 .

309 A repressão foi especialmente severa no Nordeste, onde atuavam líderes considerados perigosos, como o governador de Pernambuco Miguel Arraes, o superintendente da SUDENE Celso Furtado, o especialista em alfabetização Paulo Freire, o advogado Francisco Julião, das ligas camponesas, e o velho ativista do Partido Comunista, Gregório Bezerra. Aliás, o estado de Pernambuco serviu de abrigo para um dos maiores centros de atividade do Partido Comunista no Brasil, embora modesto em números absolutos. O grupo de inteligência do Quarto Exército (G2), que observava o trabalho dos organizadores das ligas camponesas e dos ativistas políticos, com a quebra da ordem constitucional, prenderam centenas deles, trazendoos para o Recife, onde ficava o quartelgeneral, submetendo muitos deles a torturas e outros atos lesivos de direitos humanos. O Rio de Janeiro tinha dois centros de torturas: o CENIMAR (Centro de Informação da Marinha) e o DOPS (a polícia política do estado da Guanabara). O primeiro reduziu substancialmente o uso da violência logo após o golpe, mas o segundo continuou, como um instrumento a serviço do governador do estado, Carlos Lacerda, aparelhado para caçar o pessoal político da esquerda, líderes de organizações sindicais, religiosas e estudantis. Outras partes do país conheceram também a prática de torturas, embora o que se divulgou a respeito tenha sido muito pouco. O estado de Goiás, por exemplo, testemunhou atos de extrema violência contra presos políticos quando os militares e os políticos da UDN ali intervieram para depor o governador do PSD, Mauro Borges. 310 Até 1967 a responsabilidade pela repressão física cabia ao CENIMAR e às polícias estaduais (por meio da Secretaria Estadual de Segurança Pública SESP). A SESP coordenava as atividades do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), que por sua vez operava as Divisões Municipais de Polícia (DMs). À medida que cresciam os grupos de luta armada, o Estado de Segurança Nacional criou outros organismos especialmente treinados para a obtenção de informação. A primeira organização de repressão violenta direta foi a Operação Bandeirantes (OBAN), que pouco depois se tornou os DOICODI em diversos estados. 311 O aparato repressivo do Estado de Segurança Nacional contava com uma vasta rede de informação política; órgãos e organizações diretamente responsáveis pelas ações repressivas em nível local; e os aparatos das Forças Armadas usados no controle político interno. O Serviço Nacional de Informações (SNI) canalizava toda a informação encaminhada ao Executivo. Foi criado pelo general Golbery do Couto e Silva e regulamentado por decretolei a 13 de junho de 1964, mas já estava sendo planejado durante a conspiração para derrubar o governo Goulart. Diretamente vinculadas ao SNI estavam as Divisões de Segurança e Informações (DSIs), que funcionavam em todos os ministérios. Encarregavamse de controlar o aparato burocrático interno dos ministérios e as áreas psicossociais específicas de que se ocupavam. Desse modo, cada DSI não só tinha poder de veto sobre nomeações de qualquer escalão nos ministérios, como estendiam suas atribuições a toda a área de responsabilidade ministerial. Também se vinculavam diretamente ao SNI as Assessorias de Segurança e Informação (ASIs), que operavam em todos os ministérios civis, empresas, órgãos e autarquias de Estado, assim como em empresas que tivessem contato com o governo federal. Cada ramo das Forças Armadas tinha sua própria rede de informação. Este aparato consiste de Centros de Informação, que operavam interna e externamente, e dos Serviços Secretos, com sua Segunda Seção, cuja função exclusiva era controlar o ramo das Forças Armadas a que estava organicamente vinculada. Acerca da SNI, Ver: LAGOA, Ana. SNI: como nasceu, com funciona . São Paulo: Brasiliense, 1983; GASPARI, Elio. A ditadura escancarada. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. Brasil. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos . Direito à verdade e à memória: Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, p. 22. Os militares negam enfaticamente a tortura como instrumento institucionalizado de obtenção de informações, mas diferem em seus conceitos sobre o que seria tortura, bem como reconhecem a existência de “excessos” por parte de determinados executores de interrogatórios, justificando o ato pela educação moral recebida pelos soldados, e alegando que todas as denúncias recebidas foram devidamente apuradas. Neste sentido, fundamental é a leitura do livro AA.VV. Os anos de chumbo: a

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Em janeiro de 1967 foi aprovada uma nova Constituição, que confirma e institucionaliza o regime militar e suas formas de atuação. Assim mesmo, assumiu a presidência o general Arthur da Costa e Silva, após ser eleito indiretamente pelo Congresso Nacional 313314 . No seu governo se aprofundaram as manifestações sociais contrárias ao regime. No poder legislativo teve que enfrentar a crise oriunda do famoso discurso do deputado Márcio Moreira Alves 315 . O movimento estudantil foi um dos grupos mais atingidos desde o início do regime, pois o governo encerrou suas atividades, em especial a União Nacional dos Estudantes (UNE), bem como alterou a legislação acerca desses

memória militar sobre a repressão (D´ARAUJO, Maria Celina SOARES, Glaucio Ary Dillon CASTRO , Celso Antônio Pinheiro de – orgs.). Rio de Janeiro: RelumeDumará, 1994. 312 GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada , p. 129 e ss. 313 Brasil. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos . Direito à verdade e à memória: Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, p. 26. 314 GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada , p. 250; do mesmo, A ditadura encurralada. São Paulo: Companhia das Letras, 2004; também, A ditadura derrotada. São Paulo: Companhia das Letras, 2003. Sobre a ditadura de forma geral ver: ALMEIDA, Agassis. A Ditadura dos Generais: Estado Militar Na America Latina, O Calvário na Prisão. Brasil: Bertrand, 2007. SALES, Jean Rodrigues. A Luta Armada Contra a Ditadura Militar: a Esquerda Brasileira e a Influencia da Revolução Cubana. São Paulo: Ed. Fundação Perseu Abramo, 2007. GUENA, Márcia. Arquivo do horror: Documentos secretos da ditadura do Paraguai, 19601980. São Paulo: Memorial da América Latina, 1996. MIRANDA, Nilmário. Dos filhos deste solo: Mortos e desaparecidos políticos durante a ditadura militar: a responsabilidade do Estado. São Paulo, SP: Editora Fundação Perseu Abramo: Boitempo Editorial, 1999. MARIANO, Nilson. As garras do condor. Petrópolis: Vozes, 2003. FICO, Carlos. Reinventando o otimismo: ditadura, propaganda e imaginário social no Brasil. RJ: FGV, 1997. FICO, Carlos. Como eles agiam. Os subterrâneos da ditadura militar: espionagem e polícia política. Rio de Janeiro: Record, 2001. COUTO, Ronaldo Costa. Historia indiscreta da ditadura e da abertura: Brasil: 19641985. Rio de Janeiro: Record, 1999. SORJ, Bernardo. A construção intelectual do Brasil contemporâneo: da resistência a ditadura ao governo FHC. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001; SADER, Emir. A transição no Brasil: Da ditadura a democracia? São Paulo: Editora Atual, 1991. SODRÉ, Nelson Werneck. Vida e morte da ditadura: 20 anos de autoritarismo no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1984; do mesmo, História militar do Brasil . Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968. MATHIAS, Suzeley Kalil. Distensão no Brasil: o projeto militar . Campinas: Papirus, 1995. 315 O deputado Márcio Moreira Alves, que já tinha ouvido diversos discursos contra a invasão da Universidade de Brasília ocorrida dias antes, fez um discurso irônico, propondo a chamada Operação Lisystrata, segundo a qual, a exemplo das mulheres atenienses da comédia de Aristófanes, as mulheres se recusariam a dormir com seus maridos até que o governo concordasse com o fim da repressão. O boicote deveria ser feito também pelas moças, de modo que estas não dançassem como os cadetes formados. Cópias do discurso foram distribuídas aos diversos quartéis, provocando indignação e o pedido ao Congresso de autorização para processar Moreira Alves nos dispositivos da Lei de Segurança Nacional. O governo acreditava que com sua base de apoio conseguiria a autorização, porém, os deputados, temerosos de que a cassação de Moreira Alves fosse o início da intervenção no Congresso, aproveitaram o voto secreto para formar posição contrária à cassação (Vide GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada , p. 316; com mais detalhe, consultar, TAVARES, Aurélio. O Brasil de minha Geração. Mais dois decênios de lutas – 1956/1976. V. 2. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1976/1977, p. 182183).

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órgãos de maneira a poder exercer o controle desse segmento 316 . Sem embargo, contra as disposições do governo, a UNE continuou a exercer as atividades de maneira ilegal, mas ostensiva, elegendo representantes de ideologia semelhante aos expulsos pelo regime Sem embargo, a UNE fez diversas manifestações que geraram confrontos frontais com o regime 317 e, junto com o movimento sindical e a

316 Sobre a repressão ao movimento estudantil, vide: SANFELICE, José Luis. Movimento Estudantil: a UNE na resistência ao golpe de 1964. 2. ed. Campinas: Alínea, 2008; MAETINS FILHO, João Roberto. Movimento estudantil e ditadura militar, 19641968 . Campinas: Papirus, 1987; GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada , p. 282). 317 GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada, p. 226. A UNE, mesmo proibida, realizou o seu Congresso Nacional em Belo Horizonte em 1966. A repressão foi implacável, prendendo dezenas de estudantes. As prisões não foram maiores por causa da ação de grupos religiosos da região, que esconderam estudantes em igrejas e conventos (Alguns relatos podem ser encontrados em VENTURA, Zuenir. 1968 o ano que não terminou . Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006; e no depoimento de João Paulo Moreira Burnier em AA.VV. Os anos de chumbo: a memória militar sobre a repressão, p. 209210; Também, Brasil. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos . Direito à verdade e à memória: Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, p. 23; GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada , p. 325. No ano 1968, a repressão do movimento estudantil no Calabouço constitui um exemplo emblemático. O Calabouço era um restaurante no Rio de Janeiro que oferecia refeições baratas aos estudantes que vinham do interior, e que dependiam do seu funcionamento para continuar estudando. No entanto, o governo demolira o prédio para construir outro, ao mesmo tempo em que privatizava a administração do restaurante, que passou a oferecer refeições mais caras. Diante do quadro, os estudantes se manifestaram. A repressão policial foi violenta e no confronto foi morto o estudante Édson Luís Lima Souto. A reação dos estudantes gerou uma grande comoção na cidade. Os estudantes, usando o corpo do colega como aríete, caminharam até a Assembléia Legislativa do Estado. Lá, os deputados paralisaram a sessão e apoiaram o grupo. Pelo receio de que o corpo desaparecesse, os estudantes se recusaram a liberálo para autópsia. O corpo foi autopsiado e velado na própria Assembléia, que recebeu a visita de centenas de pessoas. De lá, o cortejo seguiu até o Cemitério São João Batista, onde Édson foi enterrado. Édson Luís foi sepultado à luz de velas e de archotes improvisados e ao som do hino nacional cantado pela multidão. Depois, já se retirando, todos entoavam a Valsa do Adeus. Na semana seguinte houve confrontos com policiais. Coincidiu com a comemoração da data do aniversário do golpe militar. Nesse dia, durante três horas, com paus e pedras, eles paralisaram o centro do Rio. Depredaram lojas e bancos, viraram carros oficiais, queimaram um Volkswagen na Avenida Rio Branco e danificaram uma ambulância e dois carros do Ministério da Saúde. Os manifestantes, organizados em piquetes que avançavam ou recuavam quando hostilizados pelos pequenos contingentes da PM dispersos nas ruas, chegaram a travar lutas renhidas com as forças policiais, sobretudo nas imediações do prédio do antigo MEC, onde houve tiroteio e luta corpo a corpo. Os estudantes usaram o que as autoridades chamariam no dia seguinte de “as mais modernas técnicas de guerrilha urbana”. O balanço do dia não ficava devendo muito ao de uma jornada de guerra: vinte e seis civis atendidos nos hospitais Souza Aguiar e Miguel Couto; trinta soldados feridos com cacos de garrafas e pedradas; um estudante morto com um tiro no coração, Davi de Souza Neiva, e quatro outros jovens baleados. Além desse confronto, houve grandes confrontos no mês de junho, em um episódio conhecido como “sextafeira sangrenta”. A missa de 7º dia foi marcada para ser realizada na Candelária, onde no final houve confrontos (Vide VENTURA, Zuenir. Ob. cit.; ALVES, Maria Helena Moreira. Estado e oposição no Brasil (19641984). Petrópolis: Vozes, 1985, p. 145; Jornal do Brasil, p. 2 e 3, 5 abr 1968. A violenta repressão nas missas levou a Igreja Católica a unirse à oposição para protestar publicamente contra a invasão do templo e o ataque a padres e fiéis desarmados durante serviços religiosos. A posição adotada pela hierarquia religiosa propiciou uma aliança informal com os estudantes, a imprensa e, de modo geral, as classes médias do Rio de Janeiro que poucos anos antes haviam apoiado o golpe militar por medo de uma ditadura comunista (Sobre a posição da igreja na ditadura, Vide SERBIN, Kenneth P. Diálogos na sombra. Bispos e Militares, tortura e justiça social

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Frente Ampla 318 , organizou, no Rio de Janeiro, a Passeata dos Cem Mil 319 . Assim mesmo, no contexto do programa de renovação sindical 320 , foram realizadas greves de operários que paralisara as fábricas 321 , destacandose as manifestações em Contagem (MG) 322 e Osasco (SP) 323 . Também, na ditadura . São Paulo: Companhia das Letras, 2001. 318 A Frente Ampla era uma aliança entre políticos de vários espectros ideológicos contra a ditadura militar. A sua liderança cabia a Carlos Lacerda, antigo governador da Guanabara que apoiara o regime no início, e que se aliara a outros três do grupo de persona non grata do regime: João Goulart, Leonel Brizola e Juscelino Kubitschek. O grupo, por sua amplitude, preocupou o regime militar, que proibiu sua menção em periódicos. 319 No dia 25 de junho uma grande passeata realizouse no centro do Rio de Janeiro. Os militares evitaram a repressão direta, e mais de 100 mil pessoas juntaramse para a manifestação antigovernamental em frente à catedral. Foi relatado, na época, que o então Chefe do CISA (Centro de Informações da Aeronáutica), João Paulo Moreira Burnier, teria acionado o PARASAR (uma esquadrilha de busca e salvamento), para que, à paisana, controlasse a passeata, com ordens de atirar, bem com uma tentativa de explosão de pontos importantes da cidade do Rio de Janeiro, atribuindo os atentados ao regime comunista. Duas versões do caso podem ser lidas no livro de Zuenir Ventura, já citado, e no depoimento do próprio brigadeiro, em: AA.VV. Os anos de chumbo: a memória militar sobre a repressão , p. 213228; GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada , p. 286. Na ocasião formouse uma comissão especial de representantes dos grupos de oposição para negociar medidas de liberalização com o governo federal. A própria composição da “Comissão dos Cem Mil” evidencia a natureza da aliança oposicionista: um representante dos setores profissionais, dois representantes dos estudantes, um do Movimento das Mães pela Anistia e um padre representando a Igreja Católica. Tratavase de uma comissão de negociação representando as classes médias, àquela altura em aberta oposição aos militares no poder e enfrentando a polícia nas ruas. Esta Comissão posteriormente conseguiu se reunir com o governo federal. Um relato aproximado do que ocorreu na reunião pode ser lido em VENTURA, Zuenir. Ob. cit. , p. 155167. 320 O programa de “renovação sindical, destinado a ampliar as funções previdenciárias dos sindicatos, impos a suas burocracias a tarefa de mediar o Estado e a classe trabalhadora. Ao mesmo tempo, o regime criou sindicatos, de filiação compulsória, a fim de poder controlar as federações e confederações de trabalhadores. Sem embargo, a política de liberalização e a “renovação sindical”, ao contrário do que se esperava, estimularam o debate e a participação dos trabalhadores no quadro da estrutura sindical oficial. 321 Sobre a questão das greves, vide: MARTINS, Heloísa Helena Teixeira Souza. O estado e a burocratização do sindicato no Brasil . São Paulo: Hucitec, 1979; WEFFERT, Francisco. Participação e conflitos industriais: Contagem e Osasco, 1968 . Cadernos CEBRAP: São Paulo, n. 5, 1972; AA.VV. A esquerda e o movimento operário – 19641984. Vol 1: A resistência à ditadura (FREDERICO, Celso – org.) São Paulo: Novos Rumos, 1987. 322 Em Contagem foram iniciadas as primeiras greves, apesar de que a oposição não tinha obtido vitória nas eleições, pois o cabeça da chapa, Ênio Seabra, tinha sido vetado pelo Ministério do Trabalho. No dia 16 de abril de 1968, mil e setecentos operários da Fábrica BelgoMineira, a maior de Contagem, tomaram seus diretores como reféns e se declararam em greve. Em uma semana, quinze mil trabalhadores haviam aderido e muitas das principais indústrias da região estavam paralisadas. Os trabalhadores exigiam aumento salarial de 25%, contra o índice oficial de 17%. Como o movimento grevista foi majoritariamente espontâneo, as exigências eram limitadas e o ministério pretendia equiparar os salários aos aumentos do custo de vida, o governo pôde adotar uma posição conciliatória e negociar. O Ministério do Trabalho, recorrendo ao sindicato como mediador, ofereceu reajuste de 10% a todos os trabalhadores de Contagem. A oferta foi aceita e os trabalhadores votaram pelo fim da greve no dia 25 de abril. (vide GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada , p. 287). 323 Em Osasco, a união entre diversos setores da oposição estimulou a criação de comissões de fábrica, e a experiência dessas comissões facilitou a vitória da oposição nas eleições municipais de 1967.

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foram formadas organizações, formada por jovens idealistas de esquerda que se propunham a enfrentar o regime mediante diversos atentados 324 325 , além de também atentados paramilitares 326 . Nesse quadro de situação, em 13 de dezembro de 1968, o governo decretou o Ato Institucional Número 5 (AI5), estabelecendo o marco legal de referência para o aprofundamento da repressão militar, aposentando juízes, habilitando a cassação de mandatos e acabou com as garantias do habeas corpus, dentre outras coisas 327 . O AI5, que tinha como principais conseqüências, para fins de nosso estudo: 1) direito de cassar os mandatos eleitorais de membros dos poderes Legislativo e Executivo nos níveis federal, estadual e municipal; 2) direito de suspender por dez anos os direitos políticos dos cidadãos e reinstituição do Estatuto dos cassados; 3) direito de demitir ou remover juízes e suspensão das garantias do Judiciário da vitaliciedade, inamovibilidade e estabilidade; 4) poder de decretar estado de sítio sem qualquer dos impedimentos fixados pela Constituição; 5) suspensão da garantia de habeas corpus em todos os casos de crimes contra a Segurança Nacional; 6) julgamento de crimes políticos para fins militares; 7) proibição de apreciação pelo Judiciário de recursos interpostos por pessoas acusadas em nome do Ato Institucional nº 5 328 .

Em Osasco, entretanto, após a eleição de José Ibrahim para a presidência do sindicato, foram realizadas assembléias de trabalhadores nas fábricas e na sede do sindicato para discutir seus problemas, prioridades e estratégias de organização. O sindicato passou a centralizar uma série de atividades destinadas a elevar o grau de consciência política dos operários. Havia comissões nas maiores fábricas da região e no resto comissões em estágio embrionário. A greve foi planejada para novembro de 1968, porém, a data foi adiantada pela ação espontânea de greve surgida em uma das fábricas, iniciandose em maio e irrompendo plenamente em julho. A ameaça de um movimento organizado a partir das bases não foi tolerada pelo governo. No segundo dia da greve o Ministério do Trabalho interveio no sindicato e afastou os dirigentes eleitos. José Ibrahim foi perseguido, forçado à clandestinidade e, mais tarde, ao exílio. Os operários que ocuparam a fábrica da Cobrasma foram reprimidos: após a invasão, 120 pessoas foram detidas, espancadas e muitas torturadas. A greve durou três dias, e algumas fábricas ainda resistiram por mais dois, mas terminou em total derrota, pois nenhuma das reivindicações foi atendida, sendo eliminados muitos direitos anteriormente conquistados. A sede do sindicato foi cercada e ocupada por tropas. Sem ter onde reunirse, os trabalhadores recorreram a uma igreja local, que foi invadida e seriamente danificada, sendo detidos todos os que nela se encontravam. O sindicato foi dissolvido e os dirigentes foram perseguidos, tendo muitos dos seus membros desaparecido. 324 Aliança Libertadora Nacional (ALN) e MR8. 325 GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada , p. 313 326 GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada , p. 328. 327 GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada , p. 333 e ss. 328 O Ato Institucional n. 5, estabelece, dentre seus principais artigos: Art. 2º O Presidente da República poderá decretar o recesso do Congresso Nacional, das

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O ato Institucional nº 5 serviu como instrumento legal de punição de burocratas, políticos, professores e profissionais de diversas áreas a fim de eliminar a dissidência, inclusive dentro das próprias forças armadas (pelo menos

Assembléias Legislativas e das Câmaras de Vereadores, por Ato Complementar, em estado de sitio ou fora dele, só voltando os mesmos a funcionar quando convocados pelo Presidente da República. § 1º Decretado o recesso parlamentar, o Poder Executivo correspondente fica autorizado a legislar em todas as matérias e exercer as atribuições previstas nas Constituições ou na Lei Orgânica dos Municípios. Art. 3º O Presidente da República, no interesse nacional, poderá decretar a intervenção nos Estados e Municípios, sem as limitações previstas na Constituição. Parágrafo único Os interventores nos Estados e Municípios serão nomeados pelo Presidente da República e exercerão todas as funções e atribuições que caibam, respectivamente, aos Governadores ou Prefeitos, e gozarão das prerrogativas, vencimentos e vantagens fixados em lei. Art. 4º No interesse de preservar a Revolução, o Presidente da República, ouvido o Conselho de Segurança Nacional, e sem as limitações previstas na Constituição, poderá suspender os direitos políticos de quaisquer cidadãos pelo prazo de 10 anos e cassar mandatos eletivos federais, estaduais e municipais. Parágrafo único Aos membros dos Legislativos federal, estaduais e municipais, que tiverem seus mandatos cassados, não serão dados substitutos, determinandose o quorum parlamentar em função dos lugares efetivamente preenchidos. Art. 5º A suspensão dos direitos políticos, com base neste Ato, importa, simultaneamente, em: I cessação de privilégio de foro por prerrogativa de função; II suspensão do direito de votar e de ser votado nas eleições sindicais; III proibição de atividades ou manifestação sobre assunto de natureza política; IV aplicação, quando necessária, das seguintes medidas de segurança: a) liberdade vigiada; b) proibição de freqüentar determinados lugares; c) domicílio determinado, § 1º O ato que decretar a suspensão dos direitos políticos poderá fixar restrições ou proibições relativamente ao exercício de quaisquer outros direitos públicos ou privados. § 2º As medidas de segurança de que trata o item IV deste artigo serão aplicadas pelo Ministro de Estado da Justiça, defesa a apreciação de seu ato pelo Poder Judiciário. Art. 6º Ficam suspensas as garantias constitucionais ou legais de: vitaliciedade, inamobilidade e estabilidade, bem como a de exercício em funções por prazo certo. § 1º O Presidente da República poderá mediante decreto, demitir, remover, aposentar ou pôr em disponibilidade quaisquer titulares das garantias referidas neste artigo, assim como empregado de autarquias, empresas públicas ou sociedades de economia mista, e demitir, transferir para a reserva ou reformar militares ou membros das polícias militares, assegurados, quando for o caso, os vencimentos e vantagens proporcionais ao tempo de serviço. § 2º O disposto neste artigo e seu § 1º aplicase, também, nos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios. Art. 7º O Presidente da República, em qualquer dos casos previstos na Constituição, poderá decretar o estado de sítio e prorrogálo, fixando o respectivo prazo. Art. 8º O Presidente da República poderá, após investigação, decretar o confisco de bens de todos quantos tenham enriquecido, ilicitamente, no exercício de cargo ou função pública, inclusive de autarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista, sem prejuízo das sanções penais cabíveis. Art. 10 Fica suspensa a garantia de habeas corpus, nos casos de crimes políticos, contra a segurança nacional, a ordem econômica e social e a economia popular. Art. 11 Excluemse de qualquer apreciação judicial todos os atos praticados de acordo com este Ato institucional e seus Atos Complementares, bem como os respectivos efeitos. (publicado no D.O.U. 20/10/67. Vide Ato na integra em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ Constituiçao67.htm#art152§2d – consultado em 23/07/09).

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6.592 membros das Forças Armadas sofreram alguma força de coerção direta em razão dos atos institucionais n. 1º, 2º e 5º). 329 Por outra parte o Ato Institucional n. 5º permitiu a ampla utilização do aparelho repressivo do estado em razão das restrições impostas ao Poder Judiciário, em especial com a restrição do habeas corpus para crimes políticos. Assim, o governo efetuou prisões sem acusação formal e sem mandado, ao tempo que habilitou o espaço para o uso massivo da violência estatal 330 . Costa e Silva, doente, foi substituído em 31 de agosto de 1969, por uma junta militar formada pelos ministros Aurélio de Lira Tavares (Exército), Augusto Rademaker (Marinha) e Márcio de Sousa e Melo (Aeronáutica), para evitar que o vicepresidente, Pedro Aleixo, assumisse 331 . Dois grupos de esquerda, o MR8 e a ALN, seqüestraram o embaixador dos EUA, Charles Elbrick e exigiram, em troca da sua liberação, a divulgação de um manifesto pela imprensa e a libertação de 15 presos políticos 332 . Essas exigências foram aceitas pelo governo. O governo em resposta ao seqüestro, decretou o AI13 333 , que dava ao Poder Executivo o poder de “banir do território nacional o brasileiro que,

329 Foram mais de 1.600 pessoas até 1974, (ALVES, Maria Helena Moreira. Ob. cit., p. 161). Foram mandatos eleitorais de 13 deputados federais e senadores, 190 deputados estaduais, 38 vereadores e 30 prefeitos. 330 GASPARI, Elio. A Ditadura Envergonhada , p. 358. 331 Assim, conforme o Ato Institucional Número Doze (AI12), em 1 de setembro de 1969, onde foi estabelecido o afastamento do presidente e o controle do governo do Brasil pelos ministros militares. Art 1º Enquanto durar o impedimento temporário do Presidente da República, Marechal Arthur da Costa e Silva, por motivo de saúde, as suas funções serão exercidas pelos Ministros da Marinha de Guerra, do Exército e da Aeronáutica Militar nos termos dos Atos Institucionais e Complementares, bem como da Constituição de 24 de janeiro de 1967. (vide D.O. de 10/09/69, p. 7369. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ait/ait1269.htm consultado em 05/06/09). 332 Uma versão confessional do seqüestro pode ser lido em GABEIRA, Fernando . O que é isso, companheiro? São Paulo: Companhia das Letras, 1997. Os revolucionários condicionaram a entrega do embaixador a que um manifesto redigido por eles fosse divulgado em toda a imprensa, e a que fossem liberados os presos políticos indicados por eles. As exigências foram aceitas pelo governo: o manifesto foi divulgado e os 15 presos constantes da lista foram reunidos e enviados ao México (entre eles estavam Vladimir Palmeira, líder estudantil preso em Ibiúna, e José Ibrahim, líder sindicalista). 333 Os principais artigos são os seguintes: Art. 1º O Poder Executivo poderá, mediante proposta dos Ministros de Estado da Justiça, da Marinha de Guerra, do Exército ou da Aeronáutica Militar, banir do território nacional o brasileiro que, comprovadamente, se tornar inconveniente, nocivo ou perigoso à segurança nacional. Parágrafo único Enquanto perdurar o banimento, ficam suspensos o processo ou a execução da pena a que, porventura, esteja respondendo ou condenado o banido, assim como a prescrição da ação ou da condenação. Art. 2º Excluemse de qualquer apreciação judicial todos os atos praticados de acordo com este Ato Institucional e Atos Complementares dele decorrentes, bem como os respectivos efeitos. D.O.U. de 10.9.1969. – texto integral em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/AIT/ait1369.htm consultado em 23/07/09.

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comprovadamente, se tornar inconveniente, nocivo ou perigoso à segurança nacional” (na prática, permitia que os presos políticos trocados por diplomatas seqüestrados seriam banidos do território); o AI14334 , uma emenda à Constituição de 1967, tornando a pena de morte, prisão perpétua e banimento aplicáveis em casos de guerra psicológica, guerra adversa revolucionária ou subversiva, assim como em caso de guerra externa 335 ; sanção da lei de segurança nacional, de 29 de setembro de 1969 336 ; e a segunda a Constituição de 1969, outorgada durante o recesso do Congresso sob a forma da Emenda nº 01, de 17 de outubro de 1969 337 338 .

334 As principais disposições são as seguintes: Art. 1º O § 11 do art. 150 da Constituição do Brasil passa a vigorar com a seguinte redação: "Art. 150 ...... § 11 Não haverá pena de morte, de prisão perpétua, de banimento, ou confisco, salvo nos casos de guerra externa psicológica adversa, ou revolucionária ou subversiva nos termos que a lei determinar. Esta disporá também, sobre o perdimento de bens por danos causados ao Erário, ou no caso de enriquecimento ilícito no exercício de cargo, função ou emprego na Administração Pública, Direta ou Indireta." Art. 3º Excluemse de qualquer apreciação judicial todos os atos praticados de acordo com este Ato Institucional e Atos Complementares dele decorrentes, bem como seus respectivos efeitos. D.O.U. de 10.9.1969. – A integra disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/AIT/ait1469.htm consultado em 23/07/09. 335 A definição desses tipos de guerra era vaga, permitindo que qualquer cidadão fosse considerado potencialmente um “inimigo interno”. 336 A Lei de Segurança Nacional foi a aplicação prática da doutrina da Segurança Nacional, sendo os seus termos redigidos de forma imprecisa para permitir que o estado exercesse total arbítrio no estabelecimento do que constituiria crime contra a Segurança Nacional. A lei autorizava a repressão de qualquer pessoa ou grupo opositor à política estatal, mediante: a sanção de greves, em especial de serviços essenciais ou públicos, o controle de meios de comunicação e informação, e a proibição de partidos políticos, dentre outras limitações à liberdade de associação. Assim mesmo considerava crime: ofender moralmente quem exercia autoridade, por motivos de faccionismo ou inconformismo políticosocial, ofender a honra e a dignidade do Presidente da República, do vicepresidente e outros dignatários; incitar à guerra, à subversão, à desobediência às leis coletivas, à animosidade entre as Forças Armadas ou entre estas e as classes sociais ou instituições civis; à luta de classes, à paralisação de serviços ou atividades essenciais, ao ódio ou à discriminação racial. Também, perturbar sessões legislativas, julgamentos e conferências internacionais; organizar ou reorganizar partidos políticos dissolvidos e distribuir propaganda subversiva das maneiras as mais diversas. Finalmente, estimular alguém a cometer qualquer dos atos acima. As disposições sobre a imprensa eram particularmente severas, responsabilizando criminalmente o editor, o proprietário e o jornalista pela veiculação de fatos ou opiniões de terceiros que possam ter infringido algum artigo da lei. O estado podia, ainda, apreender edições inteiras de jornais ou revistas, ou fechálos por violação da lei de segurança nacional. 337 A Emenda nº 01 à Constituição de 1967, conhecida como Constituição de 1969, eliminava os elementos liberais da estrutura eminentemente da Constituição de 1967, atribuindo poderes extraordinários ao executivo e incluindo partes do AI5 no seu texto. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc_anterior1988/emc0169.htm consultado em 23/07/09. 338 A doutrina da segurança nacional vinculase as teorias geopolíticas, ao antimarxismo e às tendências conservadoras do pensamento social católico, por organizações como a Opus Dei , na Espanha, e a Action Française . A forma específica por ela assumida na região enfatizava a

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A junta militar, em 1969, declarou vago os cargos de presidente e vicepresidente convocando eleições indiretas, segundo o AI n. 16 339 , sendo escolhido como presidente o general Emílio Garrastazu Medici. O seu governo foi caracterizado pela dureza e a repressão extrema: conhecido como “anos de chumbo”. Foi estabelecida uma severa política de censura. Além do controle de jornais, revistas, livros, filmes, bem como o resto das manifestações artísticas em geral, muitos professores, políticos, músicos, artistas e escritores foram investigados, presos, torturados ou exilados do país. Nesse contexto cabe referenciar a autorização ao executivo de promulgar decretosleis secretos , cujos textos não seriam divulgados em qualquer publicação oficial (11 de novembro de 1977), o que permitia a prisão de uma pessoa por infração a lei cuja existência era totalmente desconhecida. Nessa época, também, foi estabelecida uma espécie de aliança entre o Exército e as polícias estaduais; primeiro com a chamada Operação Bandeirantes (OBAN), depois, com a criação do DOICODI que unia o DOI (Destacamento de Operações Internas) e o CODI (Comando Operacional de Defesa Interna). O Destacamento de Operações e Informações e ao Centro de Operações de Defesa Interna (DOICODI) atuou como centro de investigação e repressão do governo militar, ganhando força no campo a guerrilha rural, principalmente no Araguaia, onde a guerrilha foi fortemente reprimida pelas forças

“segurança interna”, face à ameaça de “ação indireta” do comunismo. Desse modo, enquanto os teóricos americanos da segurança nacional privilegiavam o conceito de guerra total e estratégia nuclear; e os franceses, envolvidos na guerra da Argélia, concentravam suas atenções na guerra limitada como resposta à ameaça comunista, os latinoamericanos, preocupados com o crescimento de movimentos sociais da classe trabalhadora, enfatizaram a ameaça da subversão interna e da guerra revolucionária. Ver REZENDE, Maria José de. A ditadura militar no Brasil: repressão e pretensão de legitimidade, 19641984. Londrina: EDUEL, 2001; COMBLIN, Joseph. A ideologia da segurança nacional: o poder militar na América Latina . Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980. 339 Art 1º É declarada a vacância do cargo de Presidente da República, visto que o seu titular, Marechal Arthur da Costa e Silva, está inabilitado para exercêlo, em razão da enfermidade que o acometeu. Art 2º É declarado vago, também, o cargo de VicePresidente da República, ficando suspensa, até a eleição e posse do novo Presidente e VicePresidente, a vigência do art. 80 da Constituição federal de 24 de janeiro de 1967. Art 3º Enquanto não se realizarem a eleição e posse do Presidente da República, a Chefia do Poder Executivo continuará a ser exercida pelos Ministros militares. Art 4º A eleição do Presidente e do VicePresidente da República, de que trata este Ato, será realizada no dia 25 do corrente mês de outubro, pelos membros do Congresso Nacional, em sessão pública e votação nominal (Vide D.O. de 15/10/69, p. 8705 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ait/ait1669.htm – consulado em 05/06/09.

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militares 340 . O outro seqüestro a considerar é o do embaixador da Suíça Giovanni Enrico Bucher, cujo guardacostas foi morto na operação. Em troca de sua liberdade foi exigido o resgate de 70 prisioneiros com os nomes devidamente especificados, a divulgação de quatro em quatro horas de um manifesto em que os guerrilheiros declaravam guerra total contra o governo Médici e a viagem de trem gratuita para os moradores dos subúrbios do Rio.

340 Talvez a mais séria incidência da repressão em larga escala contra a população rural desarmada foi a que ocorreu na região do Araguaia entre 1972 e 1975. A região da Amazônia, tradicionalmente, habitada por índios e famílias de camponeses dedicadas ao cultivo de subsistência, depois de um levantamento topofotográfico realizado por meio de um acordo entre Brasil e Estados Unidos, tornou se objeto de intensa especulação imobiliária, o que gerou violentos conflitos. Em 1968, uma CPI apurou que mais de 50 milhões de hectares de terras nos estados da Bahia, Goiás, Minas Gerais, Maranhão, Pará, Amazonas, e no território do Amapá estavam sob controle direto de empresas multinacionais que trabalhavam a extração de minério e que se beneficiavam do sistema de incentivos fiscais previstos num programa especial para o desenvolvimento da bacia amazônica. Em 1970, o PC do B começava a montar um foco rural na região. A organização clandestina instalou ali famílias e casais que começaram a cultivar a terra e fornecer assistência técnica aos camponeses locais. Este grupo guerrilheiro nunca chegou a reunir mais de 69 militantes do PC do B. Eles trabalharam com os camponeses, ajudaramnos a construir uma escola e deramlhes assistência médica e aulas de agronomia. À noite, treinavam na selva. Eram conhecidos na região como “paulistas”, pois acreditavase que vinham de São Paulo. Os camponeses e outros residentes desconheciam totalmente suas atividades clandestinas na selva. O Serviço Nacional de Informação (SNI) descobriu o foco em 1972. Imediatamente o Exército iniciou uma ampla manobra de ocupação militar da área, promovendo entre 1972 e 1975 três campanhas que envolveram um total de vinte mil homens. Segundo o general Viana Moog, um dos comandantes, “foi a maior mobilização de tropas realizada pelo Exército. Na realidade, foi semelhante à mobilização da FEB na luta contra o fascismo na Europa durante a Segunda Guerra Mundial”. Inicialmente toda a região foi declarada zona prioritária para a Segurança Nacional. Foram instalados quartéisgenerais nas cidades de Marabá, Itaituba, Altamira, Humaitá e Imperatriz. Foram entregues cartões de identificação entre a população local, e qualquer pessoa que não tivesse um desses era detida e enviada a áreas contíguas aos quartéis, que serviam de campos de prisioneiros, onde, segundo depoimentos de residentes locais, de líderes da Igreja e até dos próprios militares participantes indicam que a tortura era amplamente utilizada contra camponeses e outros habitantes da região. Equipes especiais de interrogatório foram levadas ao local ante a suspeita de que camponeses apoiavam os guerrilheiros. Dom Pedro Casaldáliga, Bispo de São Félix do Araguaia, afirmou que a repressão visava especialmente os agentes pastorais leigos e até a hierarquia religiosa na região. Em 1975, todos os guerrilheiros estavam mortos ou na prisão. Acerca da guerrilha do Araguaia, veja: DORIA, P et al. Diário da guerrilha do Araguaia . São Paulo: Alfa e Ômega, 1979; SOUZA, Aluisio Madruga de Moura e. Movimento comunista brasileiro: guerilha do Araguaia, revanchismo, a grande verdade. Brasília: A. M. de Moura e Souza, 2002; AA.VV. Guerrilha do Araguaia: uma epopéia pela liberdade 30 Anos (19722002) (MONTEIRO, Adalberto org.). São Paulo: A. Garibaldi, 2002; CARVALHO, Luiz Maklouf. O coronel rompe o silêncio: Lício Augusto Ribeiro, que matou e levou tiros na caçada aos guerrilheiros do Araguaia, conta sua história. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004; MORAIS, Taís. Operação Araguaia: os arquivos secretos da guerrilha. São Paulo: Geração, 2005. AMAZONAS, João; ANTERO, Luiz Carlos;. CAMPOS FILHO, Romualdo Pessoa. Guerrilha do Araguaia: a esquerda em armas . Goiânia: Ed.UFG,1997. DÓRIA, Palmeiro; BUARQUE, Sérgio; CARELLI, Vincent; SAUTCHUK, Jaime. A guerrilha do Araguaia . São Paulo: Alfa Omega,1982. POMAR, Wladimir. Araguaia: o partido e a guerrilha. São Paulo: Brasil Debates, 1980. PORTELA, Fernando. Guerra de guerrilhas do Brasil: a saga do Araguaia . São Paulo: Editora Terceiro Nome, 2002. CABRAL, Pedro Corrêa. Xambioá: guerrilha no Araguaia. Rio de Janeiro: Record, 1993. SÁ, Glênio. Araguaia: relato de um guerrilheiro . São Paulo: Anita Garibaldi, 1990.

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O governo, enquanto isso executou Eduardo Leite, após ter sido terrivelmente torturado por mais de dois meses, a fim de evitar sua entrega e ignorou as exigências de irradiar o manifesto e de fornecer passagens de trem grátis. Quanto a entregar os 70 prisioneiros, o governo negociou os nomes, ganhando tempo a fim de descobrir o local onde se encontravam os seqüestradores. Nesse ínterim perseguiram e executaram a vários indivíduos que participaram do seqüestro. Finalmente concordaram com os nomes e realizaram sua liberação no Chile. Após a liberação, a perseguição continuou, na qual executaram o líder da organização, Carlos Lamarca. Em 1974 assume a presidência o general Ernesto Geisel, com quem começa um lento processo de transição rumo à democracia. No seu governo começa uma abertura política lenta, gradual e segura, na qual a oposição política começa a ganhar espaço. Assim, nas eleições de 1974, o MDB conquista 59% dos votos para o Senado, 48% da Câmara dos Deputados e a maioria das prefeituras das grandes cidades. Nesse quadro de situação o assassinato do jornalista Vladimir Herzog 341 , em 1975, nas dependências do DOICodi em São Paulo e do operário

341 A ascensão de Geisel, em 1974, marca o retorno ao poder do grupo da Escola Superior de Guerra, que começou a traçar o retorno à democracia. No entanto, havia um grupo sob o qual ele não tinha controle: a repressão; e isso se mostrou com a prisão e morte do jornalista Vladimir Herzog. As circunstâncias da prisão são passíveis de dúvida. Porém, a versão mais conhecida é a de que, sabedor de que as forças de segurança do II Exército estavam à sua procura, Herzog compareceu pessoalmente. Mas outras versões demonstram que Herzog foi preso dentro da emissora de TV em que trabalhava, a TV Cultura. Pouco tempo depois, foi divulgada a notícia de que Herzog se suicidara enforcado em sua cela depois de ter assinado uma confissão declarandose membro do Partido Comunista, porém, ninguém acreditava na versão de suicídio, e o fato de Herzog ser judeu aumentava a reação ante o fato, em vista de que havia suspeitas de antisemitismo na conduta passada da linhadura militar. Estudantes e professores entraram em greve por três dias na Universidade de São Paulo e o sindicato dos jornalistas declarouse em sessão permanente para exigir a abertura de inquérito, exigência feita também pela Ordem dos Advogados. Além disso, quarenta e dois bispos de São Paulo assinaram uma declaração denunciando a violência do governo. O cardeal Arns, figura importante da oposição em São Paulo e no Brasil, organizou e presidiu impressionante serviço fúnebre ecumênico para Herzog na catedral de São Paulo, do qual participaram dois rabinos, entre eles Henry Sobel, e um pastor protestante. Outras cerimônias foram realizadas em diversas cidades do Brasil. Foi ordenado um procedimento investigatório que, finalmente, confirmou a morte como suicídio. Um tribunal militar reiterou o laudo da comissão no início de março do ano seguinte. Em abril de 1976, a viúva e os filhos de Herzog ajuizaram ação de responsabilidade do Estado pela morte de Herzog. No processo, tramitado perante a Justiça Federal, vários vícios do inquérito foram revelados. Uma das testemunhas, que à época dos fatos fora preso no mesmo lugar que Herzog, garantiu que Herzog fora torturado e demonstrou ter sido coagida a nada confirmar sobre a tortura no IPM. Além disso, outro preso político, Paulo Sérgio Markum, declarou que não haveria maneira de Herzog se suicidar com um cinto, pois os macacões entregues no presídio era inteiriços, sem cordões, cintos ou botões. Outros depoimentos também atestaram as ameaças contra familiares dos presos. Mas a falha mais evidente do inquérito foi confirmada pelo testemunho do Dr. Shibata, perito que assinara o laudo de

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Manuel Fiel Filho em 1976, em situação semelhante 342 , abriram o espaço para que, em 1978, Geisel acabasse com o AI5, restaurasse o habeas corpus e abrisse o caminho para a volta da democracia 343 . Com a vitória do MDB nas eleições, em 1979, o general João Baptista Figueiredo é designado presidente. No seu governo é decretada a Lei da Anistia, concedendo o direito de retornar ao Brasil aos políticos, artistas e demais brasileiros exilados e/ou condenados por crimes políticos. Também restabelece o pluripartidarismo no país. A ARENA muda o nome e passa a ser PDS; o MDB passa a ser PMDB e outros partidos são criados, como o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Democrático Trabalhista (PDT). Os militares de linha dura continuam com a repressão clandestina, porém sem conter as manifestações sociais, cada vez, mais opositoras ao regime 344 . Em 1984, políticos de oposição, artistas, jogadores de futebol e milhões de brasileiros participam do movimento das Diretas Já, favorável à aprovação da Emenda Dante de Oliveira que garantiria eleições diretas para presidente naquele ano, porém, a emenda não foi aprovada pela Câmara dos Deputados.

Herzog. Segundo ele, a autópsia foi realizada apenas por um perito, e não por dois, como ordenava a lei. E confirmou que o segundo perito não via o corpo, mas apenas concordava ou não, tecnicamente, com as conclusões exaradas no laudo pelo primeiro perito. Com base neste depoimento, o juiz declarou nulo o inquérito confirmando o suicídio. Embora não tivesse reconhecido que a morte fora conseqüência de tortura, o juiz declarou a responsabilidade do Estado pelo episódio, uma vez que ele tinha responsabilidade pela integridade física das pessoas sob sua custódia (Cf. JORDÃO, Fernando. Dossiê Hersog: prisão, tortura e morte no Brasil . São Paulo: Global, 2005). 342 No início de janeiro de 1976 foi submetido a interrogatório Manoel Fiel Filho, do sindicato dos metalúrgicos, tendo sido morto. A versão oficial foi de que se tratou de outro suicídio, porém não se podia duvidar que ele foi morto sob tortura. O presidente demitiu sumariamente o militar responsável sem consultar o Alto Comando do Exército, medida normalmente essencial na mudança de um comandante de tão alto nível. 343 De acordo com o general Hugo Abreu, Chefe da Casa Militar de Geisel, foi feita uma reunião do Alto Comando na qual o presidente comunicara o fato três dias depois da demissão. Na ocasião, não foi realizada votação, mas três dos onze generais foram contrários ao ato do presidente. No entanto, para evitar divisões no governo, todos apoiaram publicamente a decisão do presidente, principalmente pelo apoio dado pelo Ministro do Exército, general Frota. Algum tempo depois, o ministro também fora demitido pelo presidente. A justificativa oficial era a de que havia incompatibilidades pessoais entre o ministro e o presidente. Mas Hugo de Abreu considera que a verdadeira intenção era diminuir a influência de Frota, de maneira a facilitar o caminho para a eleição de Figueiredo. Ver FAORO, Raimundo. Os donos do poder. São Paulo: Globo, 2001 . 344 Foram colocadas cartasbomba em órgãos da imprensa e na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Assim mesmo, no dia 30 de Abril de 1981, uma bomba explode durante um show no centro de convenções do Riocentro.

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No dia 15 de janeiro de 1985, o Colégio Eleitoral escolheu o deputado Tancredo Neves como novo presidente da República 345 , porém o mesmo faleceu antes de assumir o cargo, motivo pelo qual assumiu o seu vicepresidente José Sarney. Em 1988 é aprovada uma nova constituição para o Brasil que procurou restabelecer o estado constitucional de direito.

3. A modo de síntese

O golpe militar de 1964 teve como fundamento a ameaça velada de que João Goulart buscasse pressionar o poder legislativo, utilizando o forte apoio popular que possuía, para que apoiasse as denominadas reformas de base e fosse alterada a legislação eleitoral, a fim de que pudesse concorrer novamente à Presidência em 1965. As atividades militares contaram, inicialmente, com apoio de alguns setores da sociedade civil, com relação à deposição de Goulart. Sem embargo, tiveram a crítica de outros setores sociais que consideraram que a partir desse momento foi suprimido o estado de direito; também por outros que perceberam que os militares não pretendiam devolver o governo aos civis antes de efetuarem as reformas que pretendiam realizar 346 . Por outra parte, foi percebido que a situação no Brasil respondia a um projeto continental estabelecido pelos Estados Unidos para conter o desenvolvimento das idéias comunistas no continente 347 . Finalmente, a repressão militar começou a minar o apoio inicial de diversos setores 348 .

345 Ele fazia parte da Aliança Democrática – o grupo de oposição formado pelo PMDB e pela Frente Liberal. 346 Ato Institucional n. 2 deixou em evidência que o “papel moderador” não seria algo passageiro, senão um estado de situação com tempo de duração incerto. Posteriormente, a Constituição de 1967, tentou legalizar, sem êxito, o regime militar, que como instrumento de força não podia ser compatível com um estado de direito. Finalmente, ante a falta de apoio social, o regime estremou a violência, com o Ato Institucional n. 5, em que eliminou qualquer pretensão de compatibilizar o exercício de poder com a vigência do direito. O regime, assim, assumiu sua face mais violenta, eliminando o pouco que restava da juridicidade das instituições políticas e sociais do país. 347 Vide MOREL , Edmar. O Golpe começou em Washington . Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965. 348 “Alguns jornalistas que apoiaram o golpe de 64, antes de ele fazer aniversário já eram adversários do regime que de certa forma ajudaram a instalar. Ao perseguir figuras que nada tinham de

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A participação social segmentada poderia explicar os ciclos de liberalização e repressão no decorrer do regime, com diversas alterações legislativas e explicações doutrinárias para permitir a continuidade do poder até a redemocratização controlada. Ao mesmo tempo a perda dessa participação popular poderia esclarecer o porquê da necessidade de intensificar as graves violações de direitos humanos, que se foram ampliando conforme as críticas ao governo iam se intensificando, em um verdadeiro ciclo vicioso. A cada aprofundamento do arbítrio, o regime de 1964 perdia apoio, o que motivou que gradativamente se fossem somando como oposição diversos grupos sociais, que até inicialmente, apoiaram a ação militar.

Não existe dúvida quanto ao envolvimento ativo de setores do Exército no processo de tortura, especialmente após a criação do DOICODI em 1969 349 .

As organizações internacionais religiosas e de direitos humanos obtiveram provas da existência no Brasil desses centros clandestinos, onde muitas comunistas ou subversivas, eram apenas liberais e até apoiaram o golpe, a ditadura, por assim dizer, perdia a razão. Ao que parece, figuras como o colunista social Ibrahim Sued aceitavam a repressão e a perseguição a um subversivo, mas não a um homem, como Antônio Callado, que apoiou a “revolução”. Devia haver alguns limites. Segundo Alvim, em fevereiro de 1965, emergiu uma crise na direção do Correio da Manhã em virtude de uma das crônicas de Carlos Heitor Cony, que pediu demissão. O redatorchefe, Antônio Callado, imediatamente também “se demitiu do cargo que ocupava há apenas dois meses, no jornal que havia publicado, em abril de 1964, o artigo Volta o barril, recusado pelo Jornal do Brasil, do qual era um dos principais redatores”. Tanto Cony como Callado, que no momento do Golpe apoiaram a derrubada de João Goulart, foram processados pela Lei de Segurança. Callado esteve preso, foi cassado pelo AI5 e “ainda recebeu uma punição invulgar: a proibição de trabalhar em qualquer empresa de comunicação, isto é, de exercer sua profissão”. Mas “o castigo durou poucos dias: até o cronista social Ibrahim Sued, arauto da revolução e amigo pessoal de Costa e Silva, protestou contra a medida absurda e desumana” (ALVIM, Thereza Cesário. O golpe de 64: a imprensa disse não . Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979, p. 13.). Assim, no decorrer da ditadura, “mesmo figuras tradicionalmente ligadas ao governo eram censuradas, se assumissem posições mais críticas ou dissidentes”. (PEREIRA, Álvaro. In: Jornalismo Político . (SEABRA, Roberto – Souza, Vivaldo de orgs.). Rio de Janeiro: Editora Record, 2006, p. 95). Por isso que muitos jornalistas conseguem posar de vítimas da ditadura, mas o fato é que muitos deles apoiaram o Golpe de 1964, tendo, portanto, participação, de uma forma ou de outra, no movimento que derrubou o Presidente João Goulart e deu sustentação ao regime que rompeu com a normalidade constitucional. 349 Existem centenas de relatos de tortura, mas um dos mais emblemáticos foi o ocorrido com um grupo de frades dominicanos, em especial com o Frei Tito. Os religiosos foram presos, torturados e posteriormente banidos do Brasil em troca de um embaixador seqüestrado. Frei Tito, no entanto, nunca conseguiu se livrar dos horrores a que foi submetido, e acabou por se suicidar na França (BETTO, Frei. Batismo de sangue: os dominicanos e a morte de Carlos Marighella . Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1982).

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vezes desapareciam os presos. Depoimentos pessoais das vítimas podem ser encontrados em relatórios preparados pela Organização dos Estados Americanos (OEA), o Conselho Mundial das Igrejas, o Conselho Nacional das Igrejas dos Estados Unidos e até o Vaticano. No Brasil os testemunhos de centenas de vítimas estão arquivados na Ordem dos Advogados do Brasil e na Conferência Nacional de Bispos do Brasil. O saldo do golpe cívicomilitar do ano 1964, de acordo com a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, calculase que foi de 50.000 pessoas detidas nos primeiros meses da ditadura; 7.367 foram acusadas judicialmente; 10.034 foram investigadas, sem acusação posterior; 10.000 foram exiladas; 4 condenadas à morte; 130 banidas; 4.862 titulares de cargos eletivos foram cassados; 65.912 militares punidos; e 245 estudantes universitários expulsos 350 .

4. As respostas às violações de direitos humanos

4.1.Introdução

Diferentemente dos demais países que atravessaram período semelhante, o Brasil não trilhou imediatamente os caminhos propostos pelos Princípios de Chicago para responder às violações de direitos humanos ocorridos na ditadura. O que já foi feito e documentado é em grande parte creditado à iniciativa de organizações nãogovernamentais e de familiares de desaparecidos. No entanto, como se verá adiante, existem iniciativas para que tal não deixe de ocorrer. Examinarseá, pois, como o Brasil vem dando suas respostas ao período ditatorial.

350 Outros dados acerca do saldo de atingidos pela ditadura militar brasileira pode ser obtido em AMNESTY INTERNATIONAL. Report on allegation of torture in Brazil. London, 1976; SABADELL, A. L.; SPINOZA, Olga; KOERNER, Andrei; DIMOULIS, Dimitrios; AQUINO, Maria Aparecida; SILVA, Tadeu Antonio Dix. Elaboração jurídicopenal do passado após mudança do sistema político em diversos países. Relatório Brasil, 2004. (Relatório de pesquisa).

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4.1. Princípios Segundo e Quinto

4.1.1 Comissões de verdade

O trabalho de apuração da verdade no Brasil se iniciou a partir de organizações não governamentais. Instituições religiosas e ONGs de familiares de desaparecidos empenharamse em obter informações acerca da repressão ocorrida. Embora não tivesse havido um esforço em documentar o que ocorria nos porões da ditadura 351 , a tendência brasileira de justificar legalmente as medidas tomadas produziu um acervo probatório reunido no dossiê Brasil: nunca mais 352 . Porém, grande parte dos documentos militares foram incinerados no final do regime.

351 Geralmente, não se documentavam os presos pela justificativa de se estar em uma guerra. A maior parte dos arquivos encontrados era pessoal. No entanto, alguns militares ousaram romper o “pacto de silêncio”: uma série de entrevistas foi publicada no livro AA.VV. Os anos de chumbo: a memória militar sobre a repressão . (D´ARAUJO, Maria Celina SOARES , Glaucio Ary Dillon CASTRO , Celso Antônio Pinheiro de – orgs.). Rio de Janeiro: RelumeDumará, 1994. 352 As primeiras investigações para conhecer as violações de direitos humanos foram dirigidas por membros da Arquidiocese de São Paulo, 30 aproximadamente, que trabalharam secretamente por quase cinco anos. Foi analisado o período 19641979, a partir do estudo de 707 expedientes que tramitavam no Tribunal Militar Supremo, contra opositores políticos. Uma síntese do informe foi publicada na forma de livro em 1985, porém a pesquisa tinha mais de 5.000 páginas. Um dos colabores (Paulo Stuart Wright, irmão menor do pastor presbiteriano Jaime Wright) foi seqüestrado e morto. O informe inclui detalhes sobre as práticas de tortura empregadas por militares e policiais. Também o testemunho de práticas de torturas contra crianças, mulheres e gestantes, além de abusos sexuais (Vide Tomo 2). Brasil Nunca Mais tem registrado no período 144 casos de cidadãos desaparecidos (vide Tom. 5, Vol. IV, p. 14). Cabe observar que a versão não impressa inclui o relatório de 444 agentes militares e policiais responsáveis pelas práticas de torturas (Vide Tomo II, Vol. 3, p. 1 e ss.) Na íntegra: http://docvirt.noip.com/docreader.net/DocReader.aspx?bib=\\Acervo01\drive_q\Trbs\GTNM_Livros\GT NM_Livros_MP.DOCPRO&Pasta=Volume%20II%20 %20%20Invent%e1rio%20dos%20Anexos&PagLog=&Pesq=&PagFis= consultado em 16/07/09. Em resposta as forças armadas publicaram um informe chamado Brasil Sempre , justificando o seu acionar. Além do dossiê Brasil: nunca mais , outros dados podem ser encontrados em CABRAL, Reinaldo LAPA, Ronaldo (orgs.). Desaparecidos políticos Prisões, seqüestros, assassinatos . Rio de Janeiro: Edições Opção/Comitê Brasileiro pela Anistia, 1979.

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Nas eleições de 1994, os candidatos à presidência fizeram uma cartacompromisso com 10 pontos: 1) reconhecimento pelo Estado da responsabilidade pelos desaparecimentos; 2) formação de comissões específicas para investigar casos de desaparecidos; 3) não indicar para cargos de confiança pessoas envolvidas com violações de direitos humanos; 4) abertura dos arquivos de repressão sob sua jurisdição; 5) anistia plena a vítimas da ditadura e repressão; 6) cumprimento do art. 5º, § 2º, da Constituição; 7) desmilitarização das PMs; 8) retirada da Justiça Militar a competência para julgar crimes praticados contra civis; 9) desmantelamento de organizações de repressão política; 10) revogação da Doutrina de Segurança Nacional 353 .

Como resposta a esses compromissos, a lei 9.140, de 4 de dezembro de 1995 354 criou uma Comissão Especial que devia esclarecer os fatos ocorridos no período de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979, no qual foram mortas pessoas por terem participado, ou terem sido acusadas de participação, em atividades políticas, e que, por este motivo, tenham sido detidas por agentes públicos, achandose, desde então, desaparecidas, sem que delas haja notícias (art.1). As atividades da Comissão deviam guiarse pelo princípio de reconciliação e de pacificação nacional, expresso na Lei nº 6.683, de 28 de agosto de 1979 Lei de Anistia . (art. 2) A comissão inicialmente, contava, no que interessa, com as seguintes atribuições: I proceder ao reconhecimento de pessoas: a) desaparecidas, não relacionadas no Anexo da lei 355 ; b) que, por terem participado, ou por terem sido

353 Brasil. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos . Direito à verdade e à memória: Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, p. 33. 354 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9140.htm consultado em 16/07/09. 355 O anexo tinha uma relação de 136 pessoas. Disponível em: https://www.planalto.gov.br /ccivil_03/leis/1995_1997/anlei914095.pdf consultado em 16/07/09.

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acusadas de participação, em atividades políticas, no período de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979, tenham falecido, por causas não naturais, em dependências policiais ou assemelhadas; II envidar esforços para a localização dos corpos de pessoas desaparecidas no caso de existência de indícios quanto ao local em que possam estar depositados; A comissão devia ser composta por sete membros, de livre escolha e designação do Presidente da República, que devia indicar, dentre eles, quem irá presidila, com voto de qualidade. Dos sete membros da Comissão, quatro deviam ser escolhidos dentre: os membros da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados; as pessoas com vínculo com os familiares das pessoas referidas na lista constante do Anexo; os membros do Ministério Público Federal; e os integrantes das Forças Armadas 356 . Assim mesmo, inicialmente a Comissão Especial podia ser assessorada por funcionários públicos federais, designados pelo Presidente da República, podendo, ainda, solicitar o auxílio das Secretarias de Justiça dos Estados, mediante convênio com o Ministério da Justiça 357 . Para o reconhecimento de pessoas desaparecidas a Comissão Especial podia solicitar: I documentos de qualquer órgão público; II a realização de perícias; II a colaboração de testemunhas; IV a intermediação do Ministério

356 Posteriormente, o representante das forças armadas foi substituído por integrantes do Ministério da Defesa (segundo a Lei nº 10.875, 1 de julho de 2004). Provavelmente, a causa de tal modificação foi a profunda controvérsia que determinados casos geraram na Comissão. Casos de pessoas reconhecidas como terroristas pelo regime, como Lamarca e Marighella, tiveram voto contrário apaixonado do representante das Forças Armadas. O processo relativo a Zuzu Angel também teve controvérsias (Zuzu Angel era o nome pelo qual foi conhecida uma grande estilista brasileira que iniciou um movimento contra a ditadura diante da morte de seu filho, Stuart Jones, líder do MR8. Posteriormente, Zuzu sofreu um acidente de carro que por muitos foi considerado homicídio) (Brasil. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos . Direito à verdade e à memória: Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, p. 38). Cabe observar que O Ministério da Defesa foi criado no contexto da Política de Defesa Nacional no governo Fernando Henrique na tentativa de redefinir o papel das Forças Armadas em um regime democrático. Neste sentido, vide: OLIVEIRA, Eliézer Rizzo SOARES, Samuel Alves. Forças Armadas, direção política e formato institucional. In: Democracia e Forças Armadas no Cone Sul. (D'ARAUJO, Maria Celina CASTRO, Celso org.) Rio de Janeiro: FGV, 2000; AA.VV. Visões do Golpe: a memória militar sobre o golpe de 1964. (D´ARAÚJO, Maria Celina CASTRO, Celso SOARES, Gláucio Ary Dillon orgs.). Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1994; OLIVEIRA, Eliézer Rizzo de. Política de defesa nacional e as relações civismilitares. Separata de: Premissas (1718), maio 1998. 357 Depois, com a criação da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, ela começou a interagir, conforme Lei n. 10.875.

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das Relações Exteriores para a obtenção de informações junto a governos e a entidades estrangeiras (art. 9) Finda a apreciação dos requerimentos, a Comissão Especial deve elaborar um relatório circunstanciado, que encaminhará, para publicação, ao Presidente da República, e encerrará seus trabalhos. Porém, enquanto durarem seus trabalhos, a Comissão Especial devia apresentar trimestralmente relatórios de avaliação (art. 13). A Lei, inicialmente, relacionava pessoas que tivessem desaparecido entre 03 setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979 (mesmo período da Lei de Anistia), constantes de um anexo 358 . A idéia era de que a Lei 9140/95 fechasse o ciclo de reconciliação que teria sido aberto pela anistia. Posteriormente, a lei n. 10.536, de 14 de agosto de 2002 359 ampliou o rol de pessoas que seriam reconhecidas como mortas pela Lei 9140/1995 ampliando o período temporal considerado na lei, sendo fixado o período de 2 de setembro de 1961 até 5 de outubro de 1988. Assim mesmo, a lei 10.875, de 1º de junho de 2004 360 , ampliou o âmbito de aplicação com relação às funções da Comissão Especial, pois permitia reconhecer as pessoas, que, por terem participado, ou terem sido acusadas de participação, em atividades políticas, tenham falecido por causas nãonaturais, em dependências policiais ou assemelhadas, que tenham falecido em virtude de repressão policial sofrida em manifestações públicas ou em conflitos armados com agentes do poder público; e que tenham falecido em decorrência de suicídio praticado na iminência de serem presas ou em decorrência de seqüelas psicológicas resultantes de atos de tortura praticados por agentes do poder público 361 (art. 4). Desde que foi formada 362 , a comissão, a despeito da divisão, trabalhou com afinco, embora tenha encontrado grandes resistências e dificuldades.

358 O anexo tinha uma relação de 136 pessoas. Disponível em: https://www.planalto.gov.br /ccivil_03/leis/1995_1997/anlei914095.pdf consultado em 16/07/09. 359 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10536.htm#art1 – consultado em 16/07/09. 360 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20042006/2004/Lei/L10.875.htm consultado em 16/07/09. 361 Era o caso, por exemplo, de Frei Tito que se suicidou. 362 1995/2000 Miguel Reale Júnior — Presidente; Nilmário Miranda — Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados; Eunice Paiva — Representante da sociedade civil até 03/04/1996, quando foi substituída por Luís Francisco Carvalho Filho; Suzana Keniger Lisbôa — Representante dos familiares; general Oswaldo Pereira Gomes — Representante das Forças Armadas; Paulo Gustavo Gonet Branco — Representante do Ministério Público Federal; João Grandino Rodas — Ministério das Relações Exteriores. 2001 Miguel Reale Júnior — Presidente até 27/12/2001; Luís Francisco Carvalho Filho — Presidente a partir de 27/12/2001; Nilmário Miranda — Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados; Belisário dos Santos Junior — Representante da sociedade civil a partir de 27/12/2001. Suzana Keniger Lisbôa — Representante dos familiares; general Oswaldo Pereira Gomes —

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Em determinados casos havia dificuldade de acesso a arquivos e insuficiência de documentos por parte das famílias. Cabe observar que a Comissão teve os trabalhos desenvolvidos sob regime sigiloso. Ao mesmo tempo, os documentos por ela obtidos ou analisados seguiram as regras de sigilo de documentos estabelecidas pelo Decreto nº 4553/2002, o que tem dificultado o acesso ao seu conteúdo. Inclusive, os arquivos referentes à Guerrilha estão sob a guarda do Arquivo Nacional, sem acesso ao público 363

Representante das Forças Armadas; Paulo Gustavo Gonet Branco — Representante do Ministério Público Federal; João Grandino Rodas — Ministério das Relações Exteriores. 2002 Luís Francisco Carvalho Filho — Presidente; Nilmário Miranda — Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados; Belisário dos Santos Junior — Representante da sociedade civil. Suzana Keniger Lisbôa — Representante dos familiares; general Oswaldo Pereira Gomes — Representante das Forças Armadas; Paulo Gustavo Gonet Branco — Representante do Ministério Público Federal; João Grandino Rodas — Ministério das Relações Exteriores. 2003 Luís Francisco Carvalho Filho — Presidente; Maria do Rosário Nunes — Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, a partir de 14/08/2003; Belisário dos Santos Junior — Representante da sociedade civil; Suzana Keniger Lisbôa — Representante dos familiares; Coronel João Batista Fagundes — Representante das Forças Amadas, a partir de 14/08/2003; Maria Eliane Menezes de Farias — Representante do Ministério Público Federal, a partir de 14/08/2003; André Sabóia Martins — Ministério das Relações Exteriores, a partir de 14/08/2003. 2004 Luís Francisco Carvalho Filho — Presidente; João Luiz Duboc Pinaud — Presidente a partir de 29/06/2004; Augustino Veit — Presidente a partir de 17/11/2004; Maria do Rosário Nunes — Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados; Belisário dos Santos Junior — Representante da sociedade civil; Suzana Keniger Lisbôa — Representante dos familiares; Coronel João Batista Fagundes — Representante das Forças Armadas; Maria Eliane Menezes de Farias — Representante do Ministério Público Federal; André Sabóia Martins — Ministério das Relações Exteriores. 2005 Augustino Veit — Presidente; Maria do Rosário Nunes — Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados; Belisário dos Santos Junior — Representante da sociedade civil; Suzana Keniger Lisbôa — Representante dos familiares até 02/08/2005; Diva Soares Santana —; Representante dos familiares a partir de 06/12/2005; Coronel João Batista Fagundes — Representante das Forças Armadas; Maria Eliane Menezes de Farias — Representante do Ministério Público Federal; André Sabóia Martins — Ministério das Relações Exteriores, até 18/10/2005, quando é substituído por Márcia Adorno – Ministério das Relações Exteriores 2006 Augustino Veit — Presidente até 25/04/2006; Marco Antônio Rodrigues Barbosa — Presidente a partir de 25/04/2006; Maria do Rosário Nunes — Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados até 03/08/2006; Luís Eduardo Greenhalgh — Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, a partir de 03/08/2006; Belisário dos Santos Junior — Representante da sociedade civil; Diva Soares Santana — Representante dos familiares; Coronel João Batista Fagundes — Representante das Forças Armadas; Maria Eliane Menezes de Farias — Representante do Ministério Público Federal; Márcia Adorno — Ministério das Relações Exteriores, substituída por Augustino Veit em 25/04/2006 2007 Marco Antônio Rodrigues Barbosa — Presidente; Pedro Wilson — Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, a partir de 06/03/2007; Belisário dos Santos Junior — Representante da sociedade civil; Diva Soares Santana — Representante dos familiares; Maria Eliane Menezes de Farias — Representante do Ministério Público Federal; Coronel João Batista Fagundes — Representante das Forças Armadas; Augustino Veit (Brasil. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos . Direito à verdade e à memória: Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos / Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos Brasília : Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2007). 363 Cumpre ressaltar que o trabalho de comissões de verdade no Brasil sempre foi um tema

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Um dos trabalhos mais emblemáticos foi o realizado para a localização de cemitérios clandestinos, como a Vala de Perus, em São Paulo, o de Ricardo de Albuquerque, no Rio; e o de Xampiaó, no Tocantins 364 .

No cemitério de Xampiaó, a comissão obteve o auxílio de uma equipe de arqueólogos argentina, pertencente a uma ONG, nas buscas realizadas no mês de julho de 1996. Outro projeto importante é a criação de um banco de DNA, para a futura comparação de ossadas com o material de familiares para a identificação de corpos.

Um dos maiores obstáculos para o trabalho da comissão é a nãoabertura de arquivos. Até hoje, toda a documentação relacionada à Guerrilha do Araguaia não está aberta ao acesso público 365 .

A Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP/SEDH), apresentou um livrorelatório elaborado a partir dos depoimentos das vítimas das ditaduras, além de outros documentos oficiais colhidos ao longo dos 11 anos em que esteve em funcionamento 366 .

O livro faz uma resenha da história das vítimas da ditadura no Brasil. Assim, a trajetória de operários, estudantes, profissionais liberais e espinhoso entre os militares. Para muitos, o país possui problemas muito mais graves e prementes para serem resolvidos e o retorno ao passado somente traz problemas. O general do Exército Leônidas Soares chega a se referir sobre essa tentativa de retorno ao passado nos seguintes termos: “I sso é coisa do passado. (...) Não gosto de discutir o passado, acho que temos que olhar para o futuro deste país. E acho que o futuro do Brasil é problemático (...) Quando eu era ministro, dizia: 'Olhem a mulher do Lot! Virou estátua de sal.” 364 Brasil. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos . Direito à verdade e à memória: Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, p. 31, 42 e ss. 365 O Exército, recentemente, montou base para a localização de ossadas de mortos na Guerrilha do Araguaia no sul do Pará. Vide: Exército abre base no Araguaia para busca por ossadas. O Estado de São Paulo, 09 jul 2009. Disponível em: http://www.estadao.com.br/noticias /nacional,exercitoabre basenoaraguaiaparabuscaporossadas,400215,0.htm – consultado em 16/07/09. No entanto, alguns militares, ocupantes de cargos de chefia na época da ditadura, entendem que a responsabilidade pela localização das ossadas é dos líderes guerrilheiros e partidários, uma vez que era deles a responsabilidade de velar pelos seus “soldados”, tal qual as Forças Armadas sempre velou pelos seus. 366 Brasil. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos . Direito à verdade e à memória: Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos / Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2007.

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camponeses que se engajaram em organizações de esquerda para combater o regime militar aparece agora como documento oficial do Estado brasileiro . O livro foi lançado, em 29 de agosto de 2008, data que marcou os 28 anos da publicação da Lei de Anistia, em 1979, sinalizando a busca de concórdia, do sentimento de reconciliação e dos objetivos humanitários que moveram os 11 anos de trabalho da Comissão Especial367 . Ao final dos trabalhos a CEMDP, além dos 136 nomes, do Anexo da Lei n. 9.140, aprovou 221 casos e indeferiu 118 368 . Cabe observar que recentemente foi observado que foram seqüestradas três crianças, filhas de guerrilheiros mortos na guerrilha do Araguaia, que teriam sido entregues aos moradores da região 369 . Assim mesmo, com relação à guerrilha do Araguaia, uma ação movida na Justiça Federal 370 levou o governo a criar uma comissão especial sobre a guerrilha (Decreto nº 4850, de 2 de outubro de 2003371 ), com a finalidade de “obter informações que levem à localização dos restos mortais de participantes da Guerrilha do Araguaia, para que se proceda à sua identificação, traslado e sepultamento, bem como à lavratura das respectivas certidões de óbito” (art. 1º, do decreto). Referida comissão estava coordenada pelo Ministro da Justiça (art. 2º, I, a), porém depois passou ao âmbito da Secretaria de Direitos Humanos.

367 A tiragem inicial de 3.560 exemplares foi distribuída para os familiares de mortos e desaparecidos citados no livro, bibliotecas públicas e entidades ligadas ao tema. Na íntegra: http://www.presidencia.gov.br/estrutura_presidencia/sedh/.arquivos/livrodireitomemoriae verdadeid.pdf consultado em 16/07/06. 368 Brasil. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos . Direito à verdade e à memória: Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos / Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2007, p. 48. 369 Cf. O Globo, FRANCO. Bernardo Mello. Araguaia: militares acusados de seqüestro de crianças. Parente de vítima diz que sumiram três filhos de guerrilheiros com moradoras da região, publicada em 14/07/09, p. 8. 370 Ação No. 82.00.246825 (Caso Gomes Lund e outros vs. Brasil), interposta pelos familiares de algumas das vítimas em face da União Federal, em trâmite perante a 1ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal. A sentença de 30 de junho de 2003 julgou procedente o pedido para determinar: [] ao réu que, no prazo de 120 (cento e vinte) dias, informe a este Juízo onde estão sepultados os restos mortais dos familiares dos Autores, mortos na Guerrilha do Araguaia, bem como que proceda ao traslado das ossadas, o sepultamento destas em local a ser indicado pelos [familiares que interpuseram a ação], fornecendolhes, ainda, as informações necessárias à lavratura dos certidões de óbito. 371 Decreto Nº 4.850, de 2 de outubro de 2003. Publicado no D.O.U. de 3/10/03. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2003/D4850.htm consultado em 24/07/09.

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Em 29 de abril de 2009, o Ministério da Defesa editou a Portaria 567/MD, que prevê a criação de um Grupo de Trabalho cuja atribuição principal é “coordenar e executar, conforme os padrões de metodologia científica adequada, as atividades necessárias para a localização, recolhimento e identificação dos corpos dos guerrilheiros e militares mortos no episódio conhecido como “Guerrilha do Araguaia””. Os familiares dos desaparecidos foram convidados a participar como observadores 372 , porém, após uma reunião com o Ministro da Defesa foi comprovado o caráter eminentemente militar do Grupo de Trabalho. Por tal motivo os familiares rejeitaram qualquer participação no projeto e expressaram seu repúdio à iniciativa ministerial que deixa sob controle militar todas as atividades de investigação e identificação dos corpos. 373 Assim mesmo foi observado que as iniciativas de localização, recolhimento e identificação dos restos mortais deviam ser conduzidas pela Comissão Especial criada pela Lei n.º 9.140/95, cuja competência legal e ética é inquestionável. Também, observaram que as Forças Armadas deviam restringirse a fornecer informações a essa Comissão Especial; e por outra parte, a presença dos militares na região onde ocorreram os fatos reabrirá feridas na população local, além de atemorizar e afastar eventuais colaboradores voluntários civis”. Por último foi questionado que o comando das operações ficasse a cargo de um general de brigada que afirmou a imprensa, a respeito do que sucedeu em 31 de março de 1964, que o Exército brasileiro atend[eu] a um clamor popular [] contribuindo substancialmente e de maneira positiva, impedindo que o Brasil se tornasse um país comunista” 374 375 .

372 Vide Jornal O Globo, Araguaia: comitê acompanhará busca a ossadas de guerrilheiros. Representantes de grupos de Direitos humanos também são incluídos. “O órgão terá entre seus integrantes Diva Santana, vicepresidente da ONG Tortura Nunca Mais na Bahia e parente de dois guerrilheiros mortos pelo Exercito”. (21/07/09, p. 4). 373 Cabe observar que, o exército, logo após o inicio dos trabalhos dispensou a ajuda de moradores. (O Globo. Araguaia: FRANCO, Bernardo Mello. Exército dispensa ajuda de moradores. ‘Alguns mateiros sabem onde os guerrilheiros foram enterrados’, diz uma das testemunhas da guerrilha na região. 12/07/09, p. 13). 374 Vide Resolução da Corte Interamericana de Direitos Humanos de 15/0709. Solicitação de medidas provisórias a respeito da República Federativa do Brasil, caso Gomes Lund e outros (guerrilha do Araguaia). Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/medidas /lund_se_01_portugues.pdf consultado em 24/07/09. 375 Cabe observar que em 1996 foram achadas 12 ossadas. Foram identificadas duas, a de Maria Lúcia Petit da Silva e de Bérgson Gurjão Farias, mortos em 1972, porém desde então considerados desaparecidos. A identificação foi possível depois que, no início de 2008, o deputado Pompeo de

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A questão foi levada a conhecimento do Corte Interamericana de Direitos Humanos, mediante pedido de liminar, que se manifestou em 15 de julho de 2009, em sentido negativo 376 , por tomar em consideração que: a busca de restos mortais foi ordenada no marco de um processo judicial e, portanto, encontrase sob a supervisão do juiz que determinou tal medida, a quem deve enviar a informação obtida (10). foram feitas mudanças em relação ao Grupo de Trabalho originalmente estabelecido, pois em razão da Portaria 993/MD, publicada no Diário Oficial da União em 13 de julho de 2009, se modificou a Portaria 567/MD, precisando que a responsabilidade do Comando do Exército será “coordena[r] os trabalhos de apoio logístico”. Nesse mesmo sentido, de acordo com a Portaria 995/MD dessa mesma data, a coordenação geral do referido Grupo de Trabalho foi atribuída ao Consultor Jurídico do Ministério da Defesa, que é um membro da Advocacia Geral da União cuja função é colaborar com o titular daquele Ministério e resguardar a constitucionalidade e a legalidade dos atos ministeriais 377 . (11). na integração do Grupo de Trabalho existem observadores independentes, entre os quais se encontra um juiz federal, e que as tarefas de escavação, exumação e identificação dos restos estarão a cargo de profissionais técnicos civis. (11). o Estado informou que está criando um Comitê Interinstitucional de Supervisão, integrado por representantes de organizações da sociedade civil e organismos do Estado, como a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, que, entre outras tarefas, acompanhará fisicamente e supervisionará in situ as atividades do Grupo de Trabalho em suas atividades de escavação, busca e reconhecimento dos restos mortais. as tarefas de escavação começariam no mês de agosto.(12).

Mattos (PDTRS), logo ao assumir a presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, se deparou com várias ossadas num armário. (O Globo. CARVALHO, Jailton de – MARTIN, Isabela. Ossada de guerrilheiro do Araguaia é identificada. Restos mortais de Bérgson Gujão Farias, morto em 1972, estavam guardados em secretaria desde 1996. 8/07/09, p. 9). 376 Resolução da Corte Interamericana de Direitos Humanos de 15 de julho de 2009. Solicitação de medidas provisórias a respeito da República Federativa do Brasil, caso Gomes Lund e outros (guerrilha do Araguaia). Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/medidas/lund_se_01_ portugues.pdf consultado em 24/07/09. 377 Cf. O Globo, FRANCO. Bernardo Mello. Araguaia: militares acusados de seqüestro de crianças. Parente de vítima diz que sumiram três filhos de guerrilheiros com moradoras da região, publicada em 14/07/09, p. 8. Na nota é informado que o ministro da Defesa entregou a assessores vivis o comando das buscas, ficando o exército encarregado da equipe de apoio logístico.

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4.1.2. Arquivos

Em 21 de dezembro de 2005, a ministrachefe da Casa Civil Dilma Rousseff anunciou a transferência da documentação relativa ao período da ditadura militar que estava em poder da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para o Arquivo Nacional, subordinado a sua pasta. O material pertencia ao Serviço Nacional de Informações, ao Conselho de Segurança Nacional e à Comissão Geral de Investigações, compreendendo o período de 1964 a 1990. Foram transportados 13 arquivos de aço com fotos, cartazes, filmes, livros, panfletos e revistas, além de 220 mil microfichas e 1.259 caixasarquivo 378 . Os arquivos foram abertos, permanecendo invioláveis tão somente informações sobre a honra, a imagem, a intimidade e a vida privada dos cidadãos, por força de determinação constitucional e legal. Os arquivos datados até 1975 tiveram seu sigilo expirado e tornaramse disponíveis para pessoas diretamente interessadas – que tenham os nomes neles citados – ou seus cônjuges, ascendentes ou descendentes. Cabe observar que esse assunto é regulamentado pela Lei nº 11.111, de 11 de maio de 2005, originária da Medida Provisória 228/2004. A lei atribui a uma Comissão de Averiguação e Análise de Informações Sigilosas o poder de administrar os documentos ultrasecretos e trata do denominado sigilo imprescindível à segurança da sociedade e do Estado. Durante o ano de 2006, foram coordenadas iniciativas para desclassificar o material. Apesar disso, universidades, bem como grupos de familiares e defensores dos Direitos Humanos, tem questionado o sigilo desses documentos 379 .

378 Brasil. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos . Direito à verdade e à memória: Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, p. 45. 379 Brasil. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos . Direito à verdade e à memória: Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, p. 45.

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4.2. Princípio Terceiro: reconhecimento do status de vítima e estabelecimento de sistema de reparações

A lei 6.683, de 28 de agosto de 1979 380 , além de conceder anistia, estabelecia um sistema mínimo de reparações para as pessoas compreendidas na lei, no período entre 02 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979. Cabe lembrar que eram compreendidas as pessoas que teriam cometido crimes políticos ou conexos com estes, crimes eleitorais, aos que tiveram seus direitos políticos suspensos e aos servidores da Administração Direta e Indireta, de fundações vinculadas ao poder público, aos Servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário, aos Militares e aos dirigentes e representantes sindicais, punidos com fundamento em Atos Institucionais e Complementares (art. 1). Também os dirigentes e representantes sindicais punidos pelos Atos a que se refere o art. 1º, ou que tenham sofrido punições disciplinares incorrido em faltas ao serviço naquele período, desde que não excedentes a 30 (trinta) dias, bem como os estudantes (art. 9). Para aqueles incluídos na lei de anistia era reconhecido o direito à reversão ao Serviço Público a esposa do militar demitido por Ato Institucional, que foi obrigada a pedir exoneração do respectivo cargo, para poder habilitarse ao montepio militar (art. 1, § 3º). Assim mesmo permitia os servidores civis e militares demitidos, postos em disponibilidade, aposentados, transferidos para a reserva ou reformados, o seu retorno ou reversão ao serviço: se servidor civil ou militar, ao respectivo Ministro do Estado; se servidor civil da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de Assembléia Legislativa e da Câmara Municipal, aos respectivos Presidentes; se servidor do Poder Judiciário, ao Presidente do respectivo Tribunal; se servidor de Estado, do Distrito Federal, de Território ou de Município, ao Governo ou Prefeito.No entanto, dependia do pedido do interessado no prazo de 120 dias, e, no caso de existência de vaga e/ou interesse da administração, além de parecer favorável de comissões presididas pelos respectivos comandantes para exintegrantes das

380 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6683.htm consultado em 16/07/09.

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Polícias Militares ou dos Corpos de Bombeiro, e finamente, desde que o afastamento não tivesse sido motivado por improbidade do servidor (art. 2 e 3). Assim mesmo, foi estabelecido que se o destinatário da anistia houver falecido, ficava garantido aos seus dependentes o direito às vantagens que lhe seriam devidas se estivesse vivo na data da entrada em vigor da lei. (art. 3). Assim mesmo era reconhecido como tempo de serviço aquele em que ficou afastado do serviço, podendo considerálos aposentados, e com isso atualizando o direito de pensão, para ele, bem como para a família (art. 4 e 5).

1. Posteriormente, com a Constituição Federal de 1988, no ato das disposições constitucionais transitórias foi estabelecido que “aos que, por força de atos institucionais, tenham exercido gratuitamente mandato eletivo de vereador serão computados, para efeito de aposentadoria no serviço público e previdência social, os respectivos períodos”. Assim mesmo assegura a readmissão dos servidores públicos civis e aos empregados em todos os níveis de governo ou em suas fundações, empresas públicas ou empresas mistas sob controle estatal, exceto nos Ministérios militares, que tenham sido punidos ou demitidos por atividades profissionais interrompidas em virtude de decisão de seus trabalhadores, bem como em decorrência do DecretoLei nº 1.632, de 4 de agosto de 1978 , ou por motivos exclusivamente políticos, a partir de 1979 (art. 8). Também, estabelece que os que, por motivos exclusivamente políticos, foram cassados ou tiveram seus direitos políticos suspensos no período de 15 de julho a 31 de dezembro de 1969, por ato do então Presidente da República, poderão requerer ao Supremo Tribunal Federal o reconhecimento dos direitos e vantagens interrompidos pelos atos punitivos, desde que comprovem terem sido estes eivados de vício grave. Para tal fim o interessado devia apresentar petição ao Supremo Tribunal Federal, que devia resolver a questão no prazo de 120 dias (art. 9).

3. A lei 9.140, de 4 de dezembro de 1995 381 , estabeleceu um sistema de reparações em favor de familiares de pessoas mortas por terem

381 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9140.htm consultado em 16/07/09.

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participado, ou terem sido acusadas de participação, em atividades políticas, no período de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979, e que, por este motivo, tenham sido detidas por agentes públicos, achandose, desde então, desaparecidas, sem que delas haja notícias (art. 1). Para tal fim foi criada uma Comissão Especial que tinha como funções, no que interessa: proceder ao reconhecimento de pessoas desaparecidas, que não foram relaciondas no anexo da lei 382 , e que, por terem participado, ou por terem sido acusadas de participação, em atividades políticas, no período de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979, tenham falecido, por causas não naturais, em dependências policiais ou assemelhadas; e emitir parecer sobre os requerimentos relativos a indenização (art. 4). Assim mesmo estabeleceu que a indenização prevista na lei devia ser deferida, ao cônjuge; aos descendentes; ascendentes; colaterais, até o quarto grau (art. 10). Fixou em 120 dias o prazo para a formulação do pedido, a contar da data da publicação da lei ou da data em que foi realizado o reconhecimento pela Comissão Especial a morte nos termos previstos na lei (art. 10, § 1º) 383 A lei estabeleceu que a indenização, a título reparatório, consistirá no pagamento de valor único igual a R$ 3.000,00 (três mil reais) multiplicado pelo número de anos correspondentes à expectativa de sobrevivência do desaparecido, levandose em consideração a idade à época do desaparecimento e os critérios e valores estabelecidos em uma tabela anexa 384 . Esclareceu, também, que em nenhuma hipótese o valor da indenização será inferior a R$ 100.000,00 (cem mil reais) (art. 11). Finalmente, estabelecia que no caso de localização, com vida, de pessoa desaparecida, ou de existência de provas contrárias às apresentadas, serão revogados os respectivos atos decorrentes da aplicação desta Lei, não cabendo ação regressiva para o ressarcimento do pagamento já efetuado, salvo na hipótese de comprovada máfé (art. 12).

382 O anexo tinha uma relação de 136 pessoas. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/leis /1995_1997/anlei914095.pdf consultado em 16/07/09. 383 O prazo, posteriormente foi ampliado (Vide Lei nº 10.536, de 2002 e Lei nº 10.875, de 2004. 384 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1995_1997/anlei914095.pdf consultado em 16/07/09.

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Posteriormente, pela lei n. 10.536, de 14 de agosto de 2002 385 , foi ampliado o período temporal considerado na lei, sendo fixado o período de 2 de setembro de 1961 até 5 de outubro de 1988. Assim mesmo, a lei 10.875 de 1 de junho de 2004 386 , ampliou o âmbito de aplicação com relação às funções da Comissão Especial, pois permitia reconhecer as pessoas, que, por terem participado, ou por terem sido acusadas de participação, em atividades políticas, tenham falecido por causas nãonaturais, em dependências policiais ou assemelhadas; que tenham falecido em virtude de repressão policial sofrida em manifestações públicas ou em conflitos armados com agentes do poder público; e que tenham falecido em decorrência de suicídio praticado na iminência de serem presas ou em decorrência de seqüelas psicológicas resultantes de atos de tortura praticados por agentes do poder público (art. 4). Assim mesmo estabeleceu que a Comissão Especial funcionasse junto à Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República (art. 6). Foi apresentado um regime de anistiado político com disposições que estabelecem um regime de reparações pela media provisória n. 2.151, de 31 de maio de 2001, reeditada pela medida provisória n. 2.1511, de 28 de junho de 2001, também n. 2.1512, de 27 de julho de 2001; reeditada com alteração pela 2.1513, de 24 de agosto de 2001, que depois foi revogada pela medida provisória n. 65 , de 28 de agosto de 2002, que finalmente foi convertida em lei 10.559, de 2002. A lei n. 10.559, de 13 de novembro de 2002 387 estabeleceu um Regime do Anistiado Político, segundo o qual reconhecia, dentre outros direitos, a reparação econômica, de caráter indenizatório, em prestação única ou em prestação mensal, permanente e continuada, asseguradas a readmissão ou a promoção na inatividade, nas condições estabelecidas no caput e nos §§ 1o e 5o do art. 8o do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; (art. 1, II)

385 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10536.htm#art1 – consultado em 16/07/09. 386 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20042006/2004/Lei/L10.875.htm consultado em 16/07/09. 387 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10559.htm consultado em 16/07/09.

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Para tal fim, permitia a contagem, do tempo em que o anistiado político esteve compelido ao afastamento de suas atividades profissionais, em virtude de punição ou de fundada ameaça de punição, por motivo exclusivamente político, vedada a exigência de recolhimento de quaisquer contribuições previdenciárias (art. 1, III). Reconhecia também o direito a conclusão do curso, em escola pública, ou, na falta, com prioridade para bolsa de estudo, a partir do período letivo interrompido, para o punido na condição de estudante, em escola pública, ou registro do respectivo diploma para os que concluíram curso em instituições de ensino no exterior, mesmo que este não tenha correspondente no Brasil, exigindose para isso o diploma ou certificado de conclusão do curso em instituição de reconhecido prestígio internacional (art. 1, IV); Da mesma forma, reconhecia o direito de reintegração dos servidores públicos civis e dos empregados públicos punidos, por interrupção de atividade profissional em decorrência de decisão dos trabalhadores, por adesão à greve em serviço público e em atividades essenciais de interesse da segurança nacional por motivo político, bem como àqueles que foram afastados em processos administrativos, instalados com base na legislação de exceção, sem direito ao contraditório e à própria defesa, e impedidos de conhecer os motivos e fundamentos da decisão, serão reintegrados em seus cargos (art. 1, V) 388 . O sistema de reparações pode ser considerado amplo, uma vez que a relação das condições para ser considerado anistiado político é extensa, conforme foi observado ao comentar a lei em questão ao momento de analisar a anistia 389 . Ao momento de regulamentar a reparação econômica estabeleceu o pagamento de prestação única ou mensal, permanente e continuada, não sendo possível sua cumulação (art. 3 § 1). A lei estabelece que a reparação econômica em prestação única consistirá no pagamento de trinta salários mínimos por ano de punição, não podendo ser superior a R$ 100.000,00, sendo devida aos anistiados políticos que não puderem comprovar vínculos com a atividade laboral (art. 4).

388 Em função destas disposições revogou as normas da lei n. 6.683 que regulamentavam a mesma matéria. 389 Vide art. 2 da lei 10.559.

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A reparação econômica em prestação mensal, permanente e continuada, foi assegurada aos anistiados políticos que comprovarem vínculos com a atividade laboral, à exceção dos que optarem por receber em prestação única (art. 5). Nesse caso o valor da prestação deve ser igual ao da remuneração que o anistiado político receberia se na ativa estivesse (art. 6) 390 . O valor da prestação mensal, permanente e continuada, não será inferior ao do salário mínimo nem superior ao do teto estabelecido no art. 37, inciso XI, e § 9o da Constituição. (art. 7) Para a aplicação desta lei foi prevista a criação, no âmbito do Ministério da Justiça, da Comissão de Anistia, com a finalidade de examinar os requerimentos referidos no art. 10 desta Lei e assessorar o respectivo Ministro de Estado em suas decisões (art. 10 e 12). A lei estabelece que os membros da Comissão de Anistia devem ser designados mediante portaria do Ministro de Estado da Justiça, devendo participar dela, dentre outros, um representante do Ministério da Defesa, indicado pelo respectivo Ministro de Estado, e um representante dos anistiados, segundo indicação das respectivas associações (art. 12). Resta observar que, no caso de falecimento do anistiado político, o direito à reparação econômica transferese aos seus dependentes, observados os critérios fixados nos regimes jurídicos dos servidores civis e militares da União (art. 13).

390 Art. 6 O valor da prestação mensal, permanente e continuada, será igual ao da remuneração que o anistiado político receberia se na ativa estivesse, considerada a graduação a que teria direito, obedecidos os prazos para promoção previstos nas leis e regulamentos vigentes, e asseguradas as promoções ao oficialato, independentemente de requisitos e condições, respeitadas as características e peculiaridades dos regimes jurídicos dos servidores públicos civis e dos militares, e, se necessário, considerandose os seus paradigmas. § 1º O valor da prestação mensal, permanente e continuada, será estabelecido conforme os elementos de prova oferecidos pelo requerente, informações de órgãos oficiais, bem como de fundações, empresas públicas ou privadas, ou empresas mistas sob controle estatal, ordens, sindicatos ou conselhos profissionais a que o anistiado político estava vinculado ao sofrer a punição, podendo ser arbitrado até mesmo com base em pesquisa de mercado. § 2º Para o cálculo do valor da prestação de que trata este artigo serão considerados os direitos e vantagens incorporados à situação jurídica da categoria profissional a que pertencia o anistiado político, observado o disposto no § 4o deste artigo. § 3º As promoções asseguradas ao anistiado político independerão de seu tempo de admissão ou incorporação de seu posto ou graduação, sendo obedecidos os prazos de permanência em atividades previstos nas leis e regulamentos vigentes, vedada a exigência de satisfação das condições incompatíveis com a situação pessoal do beneficiário. § 4º Para os efeitos desta Lei, considerase paradigma a situação funcional de maior freqüência constatada entre os pares ou colegas contemporâneos do anistiado que apresentavam o mesmo posicionamento no cargo, emprego ou posto quando da punição.

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Conforme o exposto é possível perceber que as reparações aos anistiados políticos excedem em muito os valores das reparações aos desaparecidos, o que, a nosso ver, fere o princípio da isonomia.

Reconhecimento de vítima

A lei 6.683, de 28 de agosto de 1979 391 , além de conceder anistia, estabelecia um sistema mínimo de reparações, admitia o reconhecimento como vítima, permitindo que o cônjuge, qualquer parente, ou afim, na linha reta, ou na colateral, ou o Ministério Público, poderá requerer a declaração de ausência de pessoa que, envolvida em atividades políticas, esteja, até a data de vigência desta Lei, desaparecida do seu domicílio, sem que dela haja notícias por mais de 1 (um) ano (art. 6) A lei estabelecia o seguinte procedimento, conforme artigo 6º: § 1º Na petição, o requerente, exibindo a prova de sua legitimidade, oferecerá rol de, no mínimo, 3 (três) testemunhas e os documentos relativos ao desaparecimento, se existentes. § 2º O juiz designará audiência, que, na presença do órgão do Ministério Público, será realizada nos 10 (dez) dias seguintes ao da apresentação do requerente e proferirá, tanto que concluída a instrução, no prazo máximo de 5 (cinco) dias, sentença, da qual, se concessiva do pedido, não caberá recurso. § 3º Se os documentos apresentados pelo requerente constituírem prova suficiente do desaparecimento, o juiz, ouvido o Ministério Público em 24 (vinte e quatro) horas, proferirá, no prazo de 5 (cinco) dias e independentemente de audiência, sentença, da qual, se concessiva, não caberá recurso. § 4º Depois de averbada no registro civil, a sentença que declarar a ausência gera a presunção de morte do desaparecido, para os fins de dissolução do casamento e de abertura de sucessão definitiva.

Assim mesmo, a lei 9.140, de 4 de dezembro de 1995 392 que criou uma Comissão Especial que devia esclarecer os fatos ocorridos no período de

391 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6683.htm consultado em 16/07/09. 392 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9140.htm consultado em 16/07/09.

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2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979, no qual foram mortas pessoas por terem participado, ou sido acusadas de participação, em atividades políticas, e que, por este motivo, tenham sido detidas por agentes públicos, achandose, desde então, desaparecidas, sem que delas haja notícias (art.1), autorizava o cônjuge, o companheiro ou a companheira, descendente, ascendente, ou colateral até quarto grau, das pessoas nominadas em uma lista anexa (que contava com o nome de 136 pessoas desaparecidas) comprovando essa condição, podiam requerer a oficial de registro civil das pessoas naturais de seu domicílio a lavratura do assento de óbito, instruindo o pedido com original ou cópia da publicação desta Lei e de seus anexos (art. 3).

4.3.Princípios Primeiro e Quarto

4.3.1. Anistia e julgamentos

Assim como em outros países, a anistia foi largamente utilizada no Brasil, na etapa de transição entre o governo militar e a instauração de um governo eleito livremente pelo povo. Com efeito, no período militar, a anistia foi o primeiro passo em direção ao alívio da pressão social, no entanto, ela foi parcial em 1979 393 . A medida possibilitaria um desafogo de opinião política, ao mesmo tempo desarticulando um amplo movimento social que se mobilizara em torno da questão da anistia aos presos por motivos de opinião 394 . Cabe observar que a anistia política era reivindicada pela oposição desde a promulgação do Ato Institucional nº 01. O movimento cresceu de

393 Acerca do tema: FERREIRA, Lucia Elena Arantes. Anistia: as leis internacionais e o caso brasileiro . Curitiba: Juruá, 2009; SWENSSON JUNIOR, Lauro Joppert. Anistia penal: problemas de validade da lei de anistia brasileira (Lei 6683/79). Curitiba, Juruá, 2007; VILELA, Teotonio (apres.) Em defesa dos presos políticos: por uma anistia ampla, geral e irrestrita pronunciamentos e emendas do Projeto de Anistia . São Paulo: USP, Núcleo de Estudos da Violência, 1991. MARTINS, Roberto Ribeiro. Liberdade para os brasileiros: anistia ontem e hoje. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978, p. 249; BARBOSA, Rui. Amnistia inversa, um caso de teratologia. Disponível em: http://docvirt.noip.com/docreader.net/DocReader.aspx?bib=\\Acervo01\drive_r\Trbs\ObrasRui\Obras Rui.docpro&Pasta=&PagLog=&Pesq=amnistia%20inversa&PagFis= consultado em 16/07/09. 394 Acerca da elaboração da lei de anistia, vide MEZAROBA, Glenda. Um acerto de contas com o futuro: a anistia e sua conseqüências um estudo do caso brasileiro, 2003 (mestrado em ciências políticas Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, USP, São Paulo).

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tal modo que já em 1978 o Estado de Segurança Nacional não podia mais ignorálo. Além da realização de debates, passeatas, manifestações e comícios, pressionouse no Congresso por uma lei que concedesse anistia a todos os presos políticos e a todos os cidadãos banidos, em nome de qualquer dos três principais atos institucionais, e seus sucessores. O fato de que os próprios atos institucionais estivessem prestes a ser revogados tornava difícil, para o Estado, evitar a concessão da anistia 395 . A Lei de Anistia resultou de intensas negociações com a oposição e do resultado do acordo entre as pressões oposicionistas e as preferências dos setores militares de linhadura 396 . Assim foi sancionada a lei 6.683, de 28 de agosto de 1979 397 , que concede anistia e dá outras providencias. No artigo 1 se estabelece que “É concedida anistia a todos quantos, no período compreendido entre 02 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, cometeram crimes políticos ou conexo com estes, crimes eleitorais, aos que tiveram seus direitos políticos suspensos e aos servidores da Administração Direta e Indireta, de fundações vinculadas ao poder público, aos Servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário, aos Militares e aos dirigentes e representantes sindicais, punidos com fundamento em Atos Institucionais e Complementares”. Por um lado, a lei não concedia anistia aos que se haviam envolvido na luta armada e eram acusados do que o governo definia como “crimes de sangue” 398 . Tampouco se dava liberdade imediata aos presos políticos condenados segundo a Lei de Segurança Nacional por tentar reorganizar um partido ilegal.

Os integrantes das Forças Armadas expurgados por motivos políticos não poderiam reassumir suas funções, mas passariam a receber

395 Vide MEZAROBA, Glenda. Um acerto de contas com o futuro: a anistia e sua conseqüências um estudo do caso brasileiro, 2003 (mestrado em ciências políticas Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, USP, São Paulo). 396 Vide MEZAROBA, Glenda. Ob. cit. 397 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/leis/L6683.htm consultado em 16/07/09. 398 Conforme art. 1, § 2º “excetuamse dos benefícios da anistia os que foram condenados pela prática de crimes de terrorismo, assalto, seqüestro e atentado pessoal”. Cabe observar que esse dispositivo, teria sido declarado inconstitucional pelo STF.

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pagamento integral por aposentadoria, no lugar das pensões parciais 399 . Servidores públicos, diplomatas, professores universitários e membros do Judiciário poderiam retomar suas funções, dependendo de decisão de uma comissão especial de inquérito 400 . A nova lei trouxe de volta grande número de exilados, inclusive Leonel Brizola e Luís Carlos Prestes, anteriormente excluídos por determinação do presidente Geisel. Também, Miguel Arraes, Márcio Moreira Alves e Francisco Julião, juntamente com outros políticos relevantes. A anistia melhorou a atmosfera política, favorecendo o processo de transição, pois permitia a participação política de muitos exilados 401 . Porém, a lei não revogava os dispositivos da Lei de Segurança Nacional, nem tinha caráter retroativo, não permitindo, portanto, que pessoas respondendo a processos por violações da lei de segurança fossem soltas imediatamente, e nem impedindo que novos processos não fossem abertos. O movimento próanistia, contudo, não estava satisfeito com a nova lei, pois queria que os autores das desaparições forçadas respondessem a processos, em especial, em função dos dossiês detalhados, inclusive com relatos de outros presos que foram testemunhas oculares. Do lado dos militares a negativa a essas expectativas era evidente, ao ponto que tomaram medidas para fechar a

399 Estabelecia no art. 4º que “Os servidores que, no prazo fixado no art. 2º, não requerem o retorno ou a reversão à atividades ou tiverem seu pedido indeferido, serão considerados aposentados, transferidos para a reserva ou reformados, contandose o tempo de afastamento do serviço ativo para efeito de cálculo de proventos da inatividade ou da pensão. (Revogado pela Lei nº 10.559, de 2002). 400 Conforme o art. 2º Os servidores civis e militares demitidos, postos em disponibilidade, aposentados, transferidos para a reserva ou reformadas, poderão, nos cento e vinte dias seguintes à publicação desta lei, requerer o seu retorno ou reversão ao serviço ativo: I se servidor civil ou militar, ao respectivo Ministro do Estado; II se servidor civis da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de Assembléia Legislativa e da Câmara Municipal, aos respectivos Presidentes; III se servidor do Poder Judiciário, ao Presidente do respectivo Tribunal; IV se servidor de Estado, do Distrito Federal, de Território ou de Município, ao Governo ou Prefeito.Parágrafo único. A decisão, nos requerimentos de exintegrantes das Políticas Militares ou dos Corpos de Bombeiro, será precedida de parecer de comissões presididas pelos respectivos comandantes.” No artigo 3º ficava estabelecido que “O retorno ou a reversão ao serviço ativo somente deferido para o mesmo cargo ou emprego, posto ou graduação que o servidor, civil ou militar, ocupava na data de seu afastamento, condicionado, necessariamente, à existência de vaga e ao interesse da Administração”. Também que “os requerimentos serão processados e instituídos por comissões especialmente designadas pela autoridade a qual caiba a apreciálos” (art. 3 § 1) sendo que “o despacho decisório será proferido nos centos e oitenta dias seguintes ao recebimento do pedido (art. 3 § 2). 401 Isso, conforme o art. 12 que “Os anistiados que se inscreveram em partido político legalmente constituído poderão voltar e ser votados nas convenções partidárias a se realizarem no prazo de 1 (um) ano a partir da vigência desta Lei”.

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revista Veja por ter publicado uma reportagem sobre supostos campos de tortura com ilustrações fotográficas. 402 A questão de uma possível ação contra os torturadores foi de fato resolvida pela inclusão na lei de anistia de uma definição que incluía tanto os praticantes de crimes políticos, quanto de crimes conexos 403 , este último eufemismo geral elegido como um artifício para dar cobertura aos torturadores. Dessa forma, foi incluído um dispositivo legal que eliminava a possibilidade de denúncia criminal contra os acusados da prática de tortura, bem como eventuais investigações sobre as atividades do Aparato Repressivo. Posteriormente, com a Constituição Federal de 1988, no ato das disposições constitucionais transitórias foi estabelecido que “É concedida anistia aos que, no período de 18 de setembro de 1946 até a data da promulgação da Constituição, foram atingidos, em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção, institucionais ou complementares, aos que foram abrangidos pelo Decreto Legislativo nº 18, de 15 de dezembro de 1961, e aos atingidos pelo DecretoLei nº 864, de 12 de setembro de 1969 , asseguradas as promoções, na inatividade, ao cargo, emprego, posto ou graduação a que teriam direito se estivessem em serviço ativo, obedecidos os prazos de permanência em atividade previstos nas leis e regulamentos vigentes, respeitadas as características e peculiaridades das carreiras dos servidores públicos civis e militares e observados os respectivos regimes jurídicos. (art. 8) Esclarece a norma constitucional que a anistia concedida aplicase aos servidores públicos civis e aos empregados em todos os níveis de governo ou em suas fundações, empresas públicas ou empresas mistas sob controle estatal, exceto nos Ministérios militares, que tenham sido punidos ou demitidos por atividades profissionais interrompidas em virtude de decisão de seus trabalhadores, bem como em decorrência do DecretoLei nº 1.632, de 4 de agosto de 1978 , ou por motivos exclusivamente políticos, assegurada a readmissão dos que foram atingidos a partir de 1979, observado o disposto no § 1º.

402 Descendo aos porões . Antônio Carlos Fon. Veja, 21 fev 1979. O artigo mostrou, entre outros, o conhecido Presídio Tiradentes. A respeito ver AA.VV. Tiradentes: um presídio da ditadura: memórias de presos políticos . (FREIRE, Alípio ALMADA, Izaías PONCE, J. A. Granville Orgs.). São Paulo: Scipione, 1997. 403 Conforme art. 1,§ 1º “Consideramse conexos, para efeito deste artigo, os crimes de qualquer natureza relacionados com crimes políticos ou praticados por motivação política”.

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Como foi observado, foi apresentado um regime de anistiado político pela medida provisória n. 2.151, de 31 de maio de 2001, reeditada pela medida provisória n. 2.1511, de 28 de junho de 2001, também n. 2.1512, de 27 de julho de 2001; reeditada com alteração pela n. 2.1513, de 24 de agosto de 2001, que depois foi revogada pela medida provisória n. 65 , de 28 de agosto de 2002, que finalmente foi convertida em lei 10.559, de 2002. A lei n. 10.559, de 13 de novembro de 2002 404 estabeleceu um Regime do Anistiado Político. Segundo o artigo 2º: São declarados anistiados políticos aqueles que, no período de 18 de setembro de 1946 até 5 de outubro de 1988, por motivação exclusivamente política, foram: I atingidos por atos institucionais ou complementares, ou de exceção na plena abrangência do termo; II punidos com transferência para localidade diversa daquela onde exerciam suas atividades profissionais, impondo se mudanças de local de residência; III punidos com perda de comissões já incorporadas ao contrato de trabalho ou inerentes às suas carreiras administrativas; IV compelidos ao afastamento da atividade profissional remunerada, para acompanhar o cônjuge; V impedidos de exercer, na vida civil, atividade profissional específica em decorrência das Portarias Reservadas do Ministério da Aeronáutica n o S50GM5, de 19 de junho de 1964, e n o S285GM5; VI punidos, demitidos ou compelidos ao afastamento das atividades remuneradas que exerciam, bem como impedidos de exercer atividades profissionais em virtude de pressões ostensivas ou expedientes oficiais sigilosos, sendo trabalhadores do setor privado ou dirigentes e representantes sindicais, nos termos do § 2o do art. 8o do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; VII punidos com fundamento em atos de exceção, institucionais ou complementares, ou sofreram punição disciplinar, sendo estudantes; VIII abrangidos pelo Decreto Legislativo n o 18, de 15 de dezembro de 1961, e pelo DecretoLei no 864, de 12 de setembro de 1969; IX demitidos, sendo servidores públicos civis e empregados em todos os níveis de governo ou em suas fundações públicas, empresas públicas ou empresas mistas ou sob controle estatal, exceto nos Comandos militares no que se refere ao disposto no § 5 o do art. 8 o do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; X punidos com a cassação da aposentadoria ou disponibilidade;

404 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10559.htm consultado em 16/07/09.

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XI desligados, licenciados, expulsos ou de qualquer forma compelidos ao afastamento de suas atividades remuneradas, ainda que com fundamento na legislação comum, ou decorrentes de expedientes oficiais sigilosos. XII punidos com a transferência para a reserva remunerada, reformados, ou, já na condição de inativos, com perda de proventos, por atos de exceção, institucionais ou complementares, na plena abrangência do termo; XIII compelidos a exercer gratuitamente mandato eletivo de vereador, por força de atos institucionais; XIV punidos com a cassação de seus mandatos eletivos nos Poderes Legislativo ou Executivo, em todos os níveis de governo; XV na condição de servidores públicos civis ou empregados em todos os níveis de governo ou de suas fundações, empresas públicas ou de economia mista ou sob controle estatal, punidos ou demitidos por interrupção de atividades profissionais, em decorrência de decisão de trabalhadores; XVI sendo servidores públicos, punidos com demissão ou afastamento, e que não requereram retorno ou reversão à atividade, no prazo que transcorreu de 28 de agosto de 1979 a 26 de dezembro do mesmo ano, ou tiveram seu pedido indeferido, arquivado ou não conhecido e tampouco foram considerados aposentados, transferidos para a reserva ou reformados; XVII impedidos de tomar posse ou de entrar em exercício de cargo público, nos Poderes Judiciário, Legislativo ou Executivo, em todos os níveis, tendo sido válido o concurso. § 1o No caso previsto no inciso XIII, o período de mandato exercido gratuitamente contase apenas para efeito de aposentadoria no serviço público e de previdência social. § 2o Fica assegurado o direito de requerer a correspondente declaração aos sucessores ou dependentes daquele que seria beneficiário da condição de anistiado político.

Esse regime estabelecia um sistema de reparações, mas não alterou o § 2 da lei 6.683, que garantia a impunidade dos autores das violações de direitos humanos cometidas no tempo da ditadura. Resta observar que a questão foi estabelecida novamente em debate no país, por conta do Ministro da Justiça, Tarso Genro e do Secretário de Direitos Humanos, Paulo Vanucchi, que defenderam publicamente a inconstitucionalidade da lei de anistia 405 .

405 WEBER, Demétrio; OLIVEIRA, Germano. Tarso Gento defende punição para torturadores do regime militar . IN: O Globo online, 31 jul 2008. Disponível em: http://oglobo.globo.com/pais/mat/2008 /07/31/tarso_genro_defende_punicao_para_torturadores_do_regime_militar547498555.asp consul tado em 04.06.09

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Paradoxalmente, a Advocacia Geral da União decidiu intervir na defesa de militares integrantes do Esquadrão da Morte paulista que estavam respondendo a processos. Na peça defensiva, a instituição alegou principalmente que os fatos alegados na denúncia estariam abrangidos pela Lei de Anistia, devendo a denúncia ser rejeitada. Em outubro de 2008, a Ordem dos Advogados do Brasil ajuizou Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental com pedido de interpretação conforme a Constituição de modo a declarar, à luz dos preceitos fundamentais, que a anistia concedida pela Lei nº 6683, de 28 de agosto de 1979 aos crimes políticos ou conexos não se estende aos crimes comuns praticados pelos agentes da repressão contra opositores políticos, durante o regime militar 406 . Em tese, a OAB critica o art. 1º, §1º, da referida Lei, que dispõe que: § 1º Consideramse conexos, para efeito deste artigo, os crimes de qualquer natureza relacionados com crimes políticos ou praticados por motivações políticas. Na fundamentação, a Ordem argumentou que: a) o art. 1º, §1º da Lei de anistia é uma norma inepta, redigida intencionalmente de forma obscura para incluir subrepticiamente os agentes militares envolvidos na repressão, uma vez que, analisandose o instituto da conexão tal qual previsto em nosso ordenamento jurídico, não existe possibilidade de conexão entre os crimes políticos, cometidos pelos opositores do regime militar, e os crimes comuns contra eles praticados pelos agentes da repressão e seus mandantes no governo; ao mesmo tempo, os militares não cometeram crimes políticos que possam guardar relação com os crimes comuns por eles praticados nenhum militar incorreu nos dispositivos legais dos diplomas definidores dos crimes contra a segurança nacional: o Decretolei nº 314, de 13 de março de 1967; o Decretolei 898, de 29 de setembro de 1969; e a Lei 6620, de 17 de dezembro de 1978; b) a interpretação questionada viola o princípio fundamental da isonomia em matéria de segurança, uma vez que, em primeiro lugar, viola o

406 O inteiro teor da petição inicial da ADPF nº 153 pode ser encontrada no sítio do STF em: http://www.stf.jus.br/portal/peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp?base=ADPF&s1=anistia&processo=153 – consultado em 16/07/09.

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postulado de que não há crime sem lei anterior que o defina, ao estender a anistia não somente a crimes, mas também a classes indefinidas e a motivações do agente, objeto de perquirição do juízo e não do legislador; e em segundo lugar, a interpretação permite que graves violações cometidas pelos agentes estatais (um terrorismo de Estado , na expressão da OAB) sejam anistiadas, quando a própria lei de anistia impossibilita sua concessão aos “condenados pela prática de crimes de terrorismo, assalto, seqüestro e atentado pessoal” (art. 1º. § 2º, da referida lei) 407 . c) a interpretação questionada viola o princípio fundamental do dever do poder público de não ocultar a verdade, inserto no art. 5º, XXXIII, da Carta Magna, pois impediu ao povo, titular do Poder, e principalmente às vítimas e seus familiares o direito de conhecer os agentes responsáveis pela repressão que praticaram violações; não se pode, também, considerar como correto o entendimento de que o sigilo se impõe pela segurança nacional, pois seria o mesmo que dizer que os crimes praticados pelos agentes o foram feitos em nome da segurança nacional; assim, por uma decisão arbitrária dos representantes do regime militar, impediu que o povo, restabelecido em sua soberania, com a Constituição de 1988, tomasse conhecimento da identidade dos responsáveis pelos horrores perpetrados. d) a interpretação questionada viola os princípios democráticos e republicanos, por ter sido aprovada por um Congresso sem legitimidade (1/3 dos senadores eram escolhidos via eleição indireta 408 ) e sancionada por um presidente não alçado ao poder pelo povo, mas por um colegiado de fardas, devendo, portanto, ser ratificada por um Congresso democraticamente eleito ou mediante referendo, o que não foi feito; ao mesmo tempo, em um regime democrático o governante não poderia anistiar criminalmente a si mesmo ou aos agentes que executavam suas ordens; inclusive a Corte Interamericana de Direitos Humanos já declarou a nulidade da autoanistia em pelo menos cinco casos, sendo certo que o Brasil é signatário do Pacto de São José 409 .

407 São crimes relacionados aos art. 27 e 28 da Lei de Segurança Nacional, que sempre tiveram sua exclusão defendida pelos autores da anistia. Vide reportagem em Veja, 27 jun 79: a anistia de 1979. 408 Tal disposição foi inserida por força da Emenda Constitucional nº 08, de 14 de abril de 1977, e foi uma das medidas do chamado “Pacote de Abril”, série de alterações legislativas e constitucionais com o objetivo de se controlar as eleições no país, diante de seguidas vitórias do MDB, partido de oposição. 409 Um dos mais emblemáticos foi o caso Barrios Altos , já citado no presente trabalho.

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e) a interpretação questionada viola o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana e toda a teoria de direitos fundamentais, principalmente no que tange à característica da inalienabilidade, uma vez que a anistia seria resultante de um acordo para a redemocratização do país. Assim, em troca do retorno de determinados agentes, a dignidade de pessoas mortas e torturadas pelo regime (como Frei Tito, que sofreu abalos psicológicos de tal monta que chegou a tentar suicídio ainda na prisão e depois conseguiu seu intento na França, e Herzog e Fiel Filho, aviltados em sua dignidade ao serem declarados suicidas), bem como de suas famílias foi aviltada; ademais, cumpre ressaltar que a prática de tortura é considerada aviltante tanto na Constituição, quanto em diversos tratados de direitos humanos, sendo, portanto, a interpretação questionada incompatível, tanto moral, quanto juridicamente, com toda a sistemática de direitos humanos presentes em nosso ordenamento jurídico. A Advocacia Geral da União, em sua manifestação, argumentou que a ação não deveria ser conhecida, uma vez que não foi demonstrada a exigência da controvérsia judicial a que se refere a Lei nº 9882/98 (que trata do rito da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental). No mérito, sustentou que a regra é a de que a anistia se dirija aos crimes políticos, mas que nada impede sua concessão a crimes comuns, e que a Constituição de 1988 reforça o caráter amplo e irrestrito da anistia da Lei 6.683/79, abrangendo os mais diversos crimes, desde que tenham sido praticados por razões políticas e que uma interpretação que restrinja este alcance não acolhe a vontade do legislador. Por fim, ressaltou que já ocorreu a extinção da punibilidade destes crimes, uma vez que já se passaram mais de 29 anos desde o seu cometimento, e argumentou que a própria OAB concordou com a edição da lei na ocasião de sua entrada em vigor. Pelo exposto, opinou pelo nãoconhecimento da ADPF ou, se conhecida, pela sua improcedência 410 . Ainda não há previsão para o julgamento da ação, mas isso já demonstra a vontade de se reanalisar o período.

410 A afirmação da AGU não é desprovida de razão. De fato, Raymundo Faoro confirmou, em entrevista a Thomas Skidmore que ajudou a convencer um grupo de mães e viúvas dos que foram mortos pela repressão de que não havia perspectiva real de punir os torturadores. Seu sucessor na presidência da OAB, Seabra Fagundes, lutou contra a anistia para os torturadores e, perdendo, lutou para tornálos passíveis de ação civil, esforço que também não logrou êxito (SKIDMORE, Thomas. Brasil: de Castelo a Tancredo . São Paulo: Editora Paz e Terra, 1988).

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Há previsão de julgamento no STF para o segundo semestre de 2009 411 . Com relação aos julgamentos, ainda à época do regime militar, várias ações de responsabilidade foram ajuizadas por parentes de prisioneiros políticos que desapareceram ou foram mortos. Um deles foi o de Vladimir Herzog, já citado anteriormente. No entanto, poucas foram as ações criminais ajuizadas em face de antigos violadores de direitos humanos. Em outros casos foram tentadas ações declaratórias de reconhecimento de que houve danos morais e à integridade física, por causas de torturas sofridas durante o regime 412 . Assim, os julgamentos criminais tiveram como obstáculos a falta de parcialidade dos tribunais, bem como a lei de anistia em favor dos responsáveis pelas graves violações de direitos humanos. Nesse contexto, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) apresentou uma demanda, em 26 de março de 2009, perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos contra o Brasil, no Caso n. 11.552, Julia Gomes Lund e outros ( Guerrilha do Araguaia )413 . O caso apresenta as graves violações de direitos humanos ocorridas a partir da detenção arbitrária, tortura e desaparecimento forçado de 70 pessoas, entre membros do Partido Comunista do Brasil e camponeses da região,

411 Outros doutrinadores já se posicionaram sobre a validade e aplicabilidade da Lei de Anistia. Neste sentido, vide: SWENSSON JUNIOR, Lauro Joppert. A nistia penal: problemas de validade da lei de anistia brasileira (Lei 6683/79 ). Curitiba, Juruá, 2007; WEICHERT, Marlon Alberto. Crimes contra a humanidade perpetrados no Brasil. Lei de anistia e prescrição penal. Separata de: Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais. V. 74, p. 170229. 412 Repórter Brasil. Começa o julgamento de Ustra, primeiro acusado de tortura da ditadura militar . Por Bia Barbosa, da Agência Carta Maior, 10/11/2006 – disponível em: http://www.reporterbrasil. org.br/exibe.php?id=793 – consultado em 23/07/2009. O coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra comandou o DOICodi em São Paulo entre 1970 a 1974. Em 9 de outubro de 2008 foi condenado, porém a decisão tem efeito moral e simbólico pela tortura contra César Augusto Teles, Maria Amélia de Almeida Teles e Criméia Alice Schmidt de Almeida. Cabe observar que nessa ação a família não pede indenização financeira, mas o reconhecimento de que o Estado mantinha como torturadores membros do Exército (Vide Agência Brasil. Coronel Ustra é declarado torturador pela Justiça de São Paulo Por Ivy Farias Repórter da Agência Brasil, 9/10/09. Disponível em: http://www.agenciabrasil.gov.br/noticias/2008/10/09/materia.20081009.5724790702/ view consultado em 23/07/2009; Agência Brasil. Família comemora condenação moral e política de coronel torturador, por Flávia Albuquerque Repórter da Agência Brasil .10/10/2008. Disponível em: http://www.agenciabrasil.gov.br/noticias/2008/10/10/materia.20081010.7483232573/view Consultado em 23/07/09. 413 Relatório Anual 2000 Relatório n °33/01 Caso n °11.552 Guerrilha do Araguaia Julia Gomes Lund e outros Brasil 6 de março de 2001. Disponível em: http://www.cidh.org/annualrep /2000port/11552.htm#_ftnref9 – Consultado em 29/07/2009. Também, relatório de demandas, disponível em: http://www.cidh.org/demandas/demandasPORT2009.htm consultado em 29/07/2009.

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como resultado de operações empreendidas entre 1972 e 1975 pelo Exército brasileiro a fim de erradicar a Guerrilha do Araguaia , no contexto da ditadura militar no Brasil (19641985). Assim mesmo, nessa demanda é avaliada a lei de Anistia (Lei n. 6.683/79), que foi promulgada pelo governo militar do Brasil, e em virtude da qual o Estado não realizou uma investigação penal com o propósito de julgar e sancionar os responsáveis por esses atos, em particular pelo desaparecimento forçado de 70 pessoas e a execução extrajudicial de Maria Lucia Petit da Silva, cujos restos mortais foram encontrados e identificados em 14 de maio de 1996. Também é considerada a figura do sigilo permanente de arquivos oficiais relativos a determinadas matérias, que foi introduzida por meio da Lei n. 11.111, de 5 de maio de 2005. Recentemente, em 02 de agosto de 2009, foi anunciado o lançamento de uma nova versão do Programa Nacional de Direitos Humanos, elaborado pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos com a colaboração da sociedade civil, que prevê uma série de ações para identificar e responsabilizar agentes do Estado que, durante a ditadura militar, torturaram, mataram e desapareceram com os opositores do regime. O documento recomenda a revogação das leis que impedem a apuração desses crimes. Assim mesmo, estabelece uma lista de diretrizes para ações do governo, como, por exemplo, que seja proibido o uso de nomes de violadores de direitos humanos para batizar ruas, praças e outros locais públicos. Até ser publicado no Diário Oficial, como decreto do presidente Lula, o texto deverá enfrentar a oposição dos militares, contrários à revisão dessas leis por considerar os crimes prescritos e perdoados pela Lei de Anistia 414 .

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414 O ministro dos Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, apresentou o programa quintafeira a entidades da área. São 395 ações em seis eixos segurança pública, educação, cultura, Justiça e direito à memória e à verdade. (cf. O Globo. DIREITOS HUMANOS Documento oficial pede punição a torturadores Publicada em 02/08/2009 às 23h46m. Disponível em: http://oglobo.globo.com/pais/mat /2009/08/02/documentooficialpedepunicaotorturadores757080825 .asp consultado em 3/8/09.

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CAPÍTULO IV REFERÊNCIAS AOS CONFLITOS E RESPOSTAS REGIONAIS

1. Argentina

1.1. Introdução

No dia 24 de março de 1976 foi realizado um golpe cívicomilitar, seis meses antes das eleições presidenciais, contra a presidente Maria Estela Martinez de Perón, que tinha assumido a presidência após a morte do presidente Juan Domingo Perón 415 . No breve período em que governou teve um forte incremento da violência, com enfrentamentos entre facções armadas, tais como os Montoneros, ERP, e AAA. Assim mesmo enfrentava dificuldades econômicas que foram utilizadas como justificativa do golpe militar 416 .

415 Sobre a ditadura argentina: EL poder militar en la Argentina,19761981. AA.VV. (WALDMAN, Peter GARZON VALDES, J. comps.) Buenos Aires: Galerna, 1983; YANNUZZI, Maria de los Angeles. Política y dictadura; los partidos políticos y el 'Processo de Reorganización Nacional, 19761983. Rosario: Fundação Ross, 1996; CASTIGLIONE, Marta. La militarización del Estado en la Argentina (19761981). Buenos Aires: Ceal, 1992.; CAVAROZZI, Marcelo. Autoritarismo y democracia (1955 1983). Buenos Aires: Ceal, 1987; DUHALDE, Eduardo Luis. El Estado terrorista . Buenos Aires: Javier Vergara, 1984; FRAGA, Rosendo. LA cuestión militar 19871989. Buenos Aires: Centro de Estudios Unión para la nueva mayoría, 1989; FRAGA, Rosendo. El balance militar en el Cono Sur de América . Separata de Archivos del Presente . Buenos Aires, 3/11, dic/feb. 1997/1998; O'DONNELL, Guillermo. Modernización y autoritarismo . Buenos Aires: Paidós, 1972; QUIROGA, Hugo. El tiempo del 'Proceso'; conflitos y coincidencias entre politicos y militares, 19761983 . Rosario: Fundación Ross, 1994; NOVARO, Marcos PALERMO, Vicente. La dictadura argentina (19761983): del golpe de estado a la restauración democrática . Buenos Aires: Paidós, 2003. 416 Vide Também, AA.VV. La ultima dictadura militar en argentina . (RAGGIO, Sergio – SALVATORI, Samantha coord.). Rosario: Homo Sapiens, 2009. GILES, Jorge. Allí va la vida, la masacre de Margarita Belén . Buenos Aires: Colihue, 2003. ROBLES, Adriana. Perejiles, los otros Montoneros . Buenos Aires: Colihue, 2004. MONTES, Graciela. El golpe y los chicos . Buenos Aires: Colihue, 1995. D´ ANDREA MOHR, José Luis. Memoria debida . Buenos Aires: Colihue, 1999; COX, David. En honor a la verdad, memorias desde el exilio de Robert Cox . Buenos Aires: Colihue, 2002; VERBITSKY, Horacio. El vuelo . Buenos Aires: Sudamericana, 1995; DEARRIBA, Alberto. El golpe . Buenos Aires: Sudamericana, 2001; SEOANE, María. La noche de los lápices . Planeta, 1986; SURIANO, Juan. Dictadura y democracia 1976 – 2001 . Buenos Aires: Sudamericana, 2007; ZUCKER, Cristina. El tren de la victoria . Buenos Aires: Sudamericana, 2004; ROMERO, Luis Alberto. Breve historia contemporánea de la Argentina . Buenos Aires: Fondo de Cultura Económica, 1998; ANDERSEN, Martín Edwin. Dossier secreto . Buenos Aires: Sudamericana, 1985; ROBIN, Marie– Monique. Escuadrones de la muerte, la escuela francesa . Buenos Aires: Sudamericana, 2005. ANGUITA, Eduardo CAPARROS, Martin. La voluntad: una historia de la militancia revolucionaria en la Argentina 19661978. Tomo 3. Buenos Aires: Norma, 1998; RODRÍGUEZ, Andrea. Nacidos en la sombra, la historia secreta de los mellizos Reggiardo Tolosa y el subcomisario Miara . Buenos Aires: Sudamericana, 1996. SEISDEDOS, Gabriel. El honor de Dios . Buenos Aires: San Pablo, 1996.

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O governo ficou a cargo de um presidente militar, que por sua vez participava da junta militar, com representantes das três forças armadas 417 . A junta militar levou a cabo uma ação repressiva contra as organizações guerrilheiras e os opositores, dentro do plano regional Condor, que tentou instituir a Guerra Suja. Durante toda a ditadura, e mesmo após sua derrocada, os militares justificaram a freqüente violação aos direitos humanos, incluindo a censura 418 torturas, desaparecimentos e execuções extrajudiciais com o argumento de que as guerrilhas de esquerda haviam se tornado uma grave ameaça à segurança do Estado, e que eles estavam em meio a uma guerra 419 . Em concordância com esta narrativa, os militares e seus aliados de direita argumentaram que, à exceção de atos marcados pelo excesso, mas isolados, eles haviam cumprido com seu dever e deveriam, portanto, ser antes anistiados que processados. No entanto, a ameaça criada pelas guerrilhas foi agravada e ao contrário do clamor militar de que os insurgentes chegavam a 15 mil combatentes com um número equivalente de apoiadores, os insurgentes nunca passaram de dois mil, em flagrante contraste com os números apresentados pela ditadura.

MIGNONE, Emilio. Iglesia y dictadura . Buenos Aires: Ediciones de Pensamiento Nacional, 1986. VALES, José CAVALLO, Ricardo. Genocidio y corrupción en América Latina . Buenos Aires: Norma, 2003; ROUQUIÉ, Alain. Poder militar y sociedad política en la argentina tomo 1 y 2. Buenos Aires: Emecé, 1981; BLAUSTEIN, Eduardo ZUBIETA, Martín. Decíamos ayer. La prensa argentina bajo el proceso. Buenos Aires: Colihue, 1998; CARDOSO, Oscar KIRSCHBAUM, Ricardo VAN DER KOOY, Eduardo. Malvinas, la trama secreta . Buenos Aires: Planeta, 1985; CALVEIRO, Pilar. Política y/o violencia. Una aproximación a la guerrilla de los años ´70 . Buenos Aires: Norma, 2005. GOÑI, Uki. Judas, la verdadera historia de Alfredo Astiz, el infiltrado . Buenos Aires: Sudamericana, 1996. URIARTE, Claudio. Almirante Cero . Buenos Aires: Planeta, 1992; SEOANE, María. Todo o nada, La historia secreta y la historia pública del jefe guerrillero Mario Roberto Santucho . Buenos Aires: Planeta, 1991. 417 A junta esteve integrada, segundo o período da seguinte forma: 19761980: Jorge Rafael Videla, Emilio Eduardo Massera e Orlando Ramón Agosti 19801981: Roberto Eduardo Viola, Armando Lambruschini e Omar Domingo Rubens Graffigna 19811982: Leopoldo Fortunato Galtieri, Basilio Lami Dozo e Jorge Isaac Anaya 19821983: Cristino Nicolaides, Rubén Franco e Augusto Jorge Hughes Em cada um dos períodos a junta nominou um presidente de fato, Jorge Rafael Videla, Roberto Eduardo Viola, Leopoldo Fortunato Galtieri e Reynaldo Benito Bignone, respectivamente. 418 Comunicado N° 19, 24/03/76 “ Se comunica a la población que la Junta de Comandantes Generales ha resuelto que sea reprimido con la pena de reclusión por tiempo indeterminado el que por cualquier medio difundiere, divulgare o propagare comunicados o imágenes provenientes o atribuidas a asociaciones ilícitas o personas o grupos notoriamente dedicados a actividades subversivas o al terrorismo. Será reprimido con reclusión de hasta diez años, el que por cualquier medio difundiere, divulgare o propagare noticias, comunicados o imágenes, con el propósito de perturbar, perjudicar o desprestigiar las actividades de las Fuerzas Armadas, de Seguridad o Policiales. (Diario "La Prensa", 24 de marzo de 1976)”. 419 Vide. Informe da CONADEP.

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No ano 1978, as forças militares iniciaram o plano Soberania como resposta ao laudo arbitral que favorecia o Chile no conflito do Canal de Beagle 420 421 . A intervenção papal evitou a guerra, sendo firmado um tratado de paz em 1984 422423 . Em 2 de abril de 1982 o regime militar iniciou um conflito armado com o Reino Unido mediante a ocupação pela força das ilhas do Atlântico Sul, em especial as Ilhas Malvinas 424 . A guerra terminou no dia 14 de junho desse mesmo ano, colapsando o regime militar e abrindo o espaço para a volta da democracia, mediante o chamado a eleições no ano seguinte, no dia 30 de outubro de 1983, na qual foi eleito Raul Alfonsín. Neste período, entre 9 e 15 mil cidadãos foram assassinados ou se encontravam desaparecidos; 30 mil foram aprisionados, e por volta de 500 mil pessoas foram exiladas. Para aqueles que se encontravam presos em um dos 340 centros de detenção clandestinos, a tortura era rotina 425 . Raúl Alfonsín assumiu a presidência em 10 de dezembro de 1983 e, uma vez no poder, no dia 13 de dezembro convocou o Congresso a sessões

420 No ano 1971 os presidente Lanusse, da Argentina, e Allende, do Chile, acordaram submeter o conflito limítrofe a um tribunal arbitral, sendo designado para tal fim o Reino Unido, integrado por juízes cuja designação foi conforme as normas do direito internacional. 421 O tribunal em 22 de maio de 1977 deu a conhecer a decisão, outorgando ao Chile as Ilhas Picton, Nueva e Lennox, junto às ilhas adjacentes. A Argentina, por sua vez obteve a metade do canal e as ilhas correspondentes. Relatório do caso e decisão Disponível em: http://untreaty.un.org/cod/riaa/ cases/vol_XXI/53264.pdf consultado em 10/07/09. 422 A junta argentina declarou a decisão arbitral “insanablemente nula” e iniciou o planejamento de uma guerra de agressão contra o Chile, mediante a Operação Soberania, em 21 de dezembro de 1978. 423 Notas jornalísticas no Clarin, de 20 de dezembro de 1998: Disponível em: http://www.clarin.com/ suplementos/zona/1998/12/20/i00801e.htm consultada em 10/07/09; e http://www.clarin.com/ suplementos/zona/1998/12/20/i00401e.htm consultada em 10/07/09; em nota do Jornal La Nación de 12/08/1996. Disponível em: http://www.ser2000.org.ar/protect/Archivo/ d000ce03.htm consulta em 10/07/09. Também, TABARÉ, Arias – PALAZZO, Santiago. “Como se paró la guerra con Chile”. Revista Somos, de 8 de julho de 1983. PASSARELLI, Bruno. El Delirio Armado. ArgentinaChile . Buenos Aires: Editorial Sudamericana, 1998; TÚROLO, Carlos M. De Isabel a Videla, los pliegues del poder. Buenos Aires: Editorial Sudamericana, 1996. 424 As baixas foram de 635 homens e 1.068 feridos e do Reino Unido 255 homens e 3 mulheres e 777 feridos. Vide site da Fuerza Aérea Argentina, disponível em: http://www.fuerzaaerea.mil.ar/conflicto/las_cifras.html consultado em 10/07/09; também, http://www.raf.mod.uk/falklands/rollofhonour.html consultado em 10/07/09. 425 Vide Pablo Calvo (06/10/2003). Una duda histórica: no se sabe cuántos son los desaparecidos . Diario Clarín. 11/07/09. O número de desaparecidos durante a última ditadura militar argentina ainda gera controvérsias. Para o Estado, segundo dados oficiais da Comisión Nacional sobre Desaparición de Personas (CONADEP), as vítimas seriam 8.960. Para organismos internacionais como a Anistia Internacional e o American Watch , há de 10 a 15 mil desaparecidos, e para organismos argentinos de defesa dos direitos humanos Las Madres de Plaza de Mayo, Abuelas, Familiares etc. o número ascende a 30 mil. Sobre a cifra: Asamblea Permanente por los Derechos Humanos. Las cifras de la guerra sucia . Buenos Aires: APDH, 1988.

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extraordinárias a fim de considerar um conjunto de leis vinculadas aos direitos humanos 426 , a saber: • Revogação da lei de autoanistia (lei n. 22.924) editada pelos militares. • Proposta de equiparação da tortura ao homicídio. • Modificação do Código de Justiça Militar, limitando a competência dos tribunais militares, estabelecendo no lugar a competência da Câmara Federal de Apelações. • Lei de defensa del orden constitucional y de la vida democrática. • Ratificação da Convención Americana sobre Derechos Humanos (Pacto de San José de Costa Rica) . • Redução de pena aos presos durante o governo militar. • Modificação do Código de Procedimentos em matéria penal , estabelecendo que as decisões dos tribunais militares possam ser apeladas ante a justiça civil. • Modificação do Código Penal , em matéria de condenação condicional e reincidência, revogando as normas incompatíveis com uma ordem constitucional. • Modificação do Código de Procedimientos en materia Penal sobre liberdade provisória. Assim mesmo, pelo decreto 153/83 submeteu a juízo sumário ante o Conselho das Forças Armadas aos integrantes das três primeiras juntas Militares e pelo Decreto 157/83 instruiu ao Procurador Geral da Nação para que investigasse e exercesse ação pública pelos delitos penais cometidos pelos dirigentes de grupos de guerrilha. Finalmente, pelo decreto 187/83 constituiu a Comisión Nacional sobre la Desaparición de Personas (Conadep) para que investigasse e esclarecesse os fatos relacionados com a desaparição forçada de pessoas, bem como a localização das crianças subtraídas.

426 Cabe observar que no Informe Anual de la CIDH 19831984, de 28 de setembro de 1984, foi observado que “el Gobierno del Presidente Raúl Alfonsín ha demostrado en el curso del presente año una vocación decidida en la tarea de afianzar y fortalecer el Estado de Derecho y consolidar un sistema democrático en beneficio de la vigencia plena de los derechos humanos”. (Disponível em:http://www.nuncamas.org/document/infcidh_19831984.htm – consultado em 10/07/09).

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1.2. Segundo Principio: Comissões de verdade

O presidente Raúl Alfonsín, mediante o Decreto n. 187, de 15 de dezembro de 1983, criou a comissão Nacional sobre Desaparecimento de Pessoas (CONADEP), considerando que “la cuestión de los Derechos Humanos trasciende a los poderes públicos y concierne a la sociedad civil y a la comunidad internacional”. A comissão recebeu o dever de descobrir informações sobre violações de direitos humanos que ocorreram entre o golpe militar de 1976 e o fim do regime em 1983, particularmente o destino das aproximadamente trinta mil pessoas que desapareceram pela ação dos militares. A CONADEP foi composta de dez membros, todos considerados pessoas respeitadas na sociedade. Dela faziam parte membros da imprensa, intelectuais, religiosos e professores universitários 427 . A comissão da verdade fez um relatório denominado Nunca Mais. Relatório da Comissão Nacional sobre desaparecimento de pessoas, de mais de 50.000 páginas de testemunhos 428 . A Comissão expressou ao momento das conclusões: Hasta la fecha de presentación de este informe, la CONADEP estima en 8.960 el número de personas que continuan en situación de desaparición forzosa, sobre la base de las denuncias recibidas por esta Comisión, compatibilizadas con nóminas elaboradas por organismos nacionales e internacionales de Derechos Humanos. Esta cifra no puede considerarse definitiva, toda vez que la CONADEP ha comprobado que son muchos los casos de desapariciones que no fueron denunciados. Asimismo, no se descarta que pudiera estar incluida en la nómina elaborada

427 Membros da CONADEP: Ernesto Sábato. (Escritor) Jaime F. de Nevares. (Bispo de Neuquén); Marshall T. Meyer. (Rabino Judío); Ricardo Colombres; René Favarolo; Hilario Fernández Long; Carlos T. Gattinoni. (Bispo Metodista); Gregorio Klimovsky; Eduardo Rabossi; Magdalena Ruiz de Guiñazu; Santiago Marcelino López. (Deputado); Hugo Diógenes Piucill. (Deputado); Horacio Hugo Huarte. (Diputado). Ficaram a cargo da Secretaría de Recepción de Denuncias . Graciela Fernández Meijide; da Secretaría de Documentación y Procesamiento de Datos , Daniel Salvador; da Secretaría de Procedimientos , Raúl Aragón e da Secretaría de Asuntos Legales Alberto Mansur e Secretaría Administrativa , Leopoldo Silgueira. Cabe observar que o medo dos militares era tão grande que a Câmara do Senado não enviou os seus três representantes para integrar a Comissão. 428 Embora o relatório final estivesse à disposição do público, uma versão menor, em formato de livro, com o título Nunca mais , foi publicada por uma editora em 1985, obtendo sucesso de vendas instantâneo. Foram vendidas quarenta mil cópias em seu lançamento e 150 mil em oito semanas, chegando a 300.000 mil cópias.

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alguna persona que no comunicó oportunamente el cese de su desaparición a los organismos pertinentes. La desaparición de personas como metodología represiva reconoce algunos antecedentes previos al golpe de estado del 24 de marzo de 1976. Pero es a partir de esa fecha, en que las fuerzas que usurparon el poder obtuvieron el control absoluto de los resortes del Estado, cuando se produce la implantación generalizada de tal metodología. Comenzaba por el secuestro de las víctimas, a cargo de efectivos de las fuerzas de seguridad que ocultaban su identidad. El secuestrado era conducido a alguno de los aproximadamente 340 centros clandestinos de detención por entonces existentes. La CONADEP, en el curso de sus investigaciones, inspeccionó un devado número de establecimientos que durante el último gobierno de facto funcionaron con tales características. Estos centros clandestinos estaban dirigidos por altos oficiales de la FF.AA. y de seguridad. Los detenidos eran alojados en condiciones infrahumanas, sometidos a toda clase de tormentos y humillaciones. De las investigaciones realizadas hasta el momento, surge la nómina provisoria de 1.300 personas que fueron vistas en alguno de los centros clandestinos, antes de su definitiva desaparición. La comprobación de la extensión que adquirió la práctica de la tortura en tales centros y el sadismo demostrado por sus ejecutores resultan estremecedores. De algunos de los métodos empleados no se conocían antecedentes en otras partes del mundo. Hay varias denuncias acerca de niños y ancianos torturados junto a un familiar, para que éste proporcionara la información requerida por sus captores. La CONADEP ha comprobado que en el marco de la metodología investigada fueron exterminadas personas previamente detenidas, con ocultamiento de su identidad, habiéndose en muchos casos destruido sus cuerpos para evitar su posterior identificación. Asimismo, se pudo establecer, respecto de otras personas que en la versión de las fuerzas represivas habrían sido abatidas en combate, que fueron sacadas con vida de algún centro clandestino de detención y muertas por sus captores, simulándose enfrentamientos o intentos de fuga inexistentes. Entre las víctimas que aún permanecen en condición de desaparecidas, y las que fueron posteriormente liberadas habiendo pasado por centros clandestinos de detención, se encuentran personas de los más diversos campos de la actividad social 429 : Es posible afirmar que contrariamente a lo sostenido por los ejecutores de tan siniestro plan no solamente se persiguió a los miembros de organizaciones políticas que practicaban actos de terrorismo. Se cuentan por millares las víctimas que jamas tuvieron vinculación alguna con tales actividades y fueron sin embargo objeto de horrendos

429 Operários, 30,2 %, estudantes 21,0 %, funcionários 17,9 %, profissionais 10,7 %, docentes 5,7%, autônomos 5,0 %, donas de casa 3,8% recrutas e pessoal subalterno as formas armadas 2,5 %, jornalistas 1,6 %, atores e artistas 1,3 %, religiosos 0.3 %.

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suplicios por su oposición a la dictadura militar, por su participación en luchas gremiales o estudiantiles, por tratarse de reconocidos intelectuales que cuestionaron el terrorismo de Estado o, simplemente, por ser familiares, amigos o estar incluidos en la agenda de alguien considerado subversivo. Esta Comisión sostiene que no se cometieron «excesos», si se entiende por ello actos particularmente aberrantes. Tales atrocidades fueron práctica común y extendida y eran los actos normales y corrientes efectuados a diario por la represión. A pesar de afirmase en el «DOCUMENTO FINAL DE LA JUNTA MILITAR SOBRE LA GUERRA CONTRA LA SUBVERSIÓN Y EL TERRORISMO» que la subversión reclutó veinticinco mil efectivos de los cuales quince mil estaban «técnicamente capacitados e ideológicamente fanatizados para matar», los Consejos de Guerra con competencia para juzgar tales delitos sólo sostuvieron cargos que concluyeran en condenas contra aproximadamente trescientas cincuenta personas. Ello demuestra claramente cual fue entonces la otra modalidad adoptada para suprimir a millares de opositores, fueran o no terroristas. En consecuencia, carece de validez la afirmación de que la subversión y el terrorismo fueron efectivamente vencidos. Se derrotó a algunas organizaciones terroristas, pero a cambio de implantar un sistema de terror institucionalizado, vulnerador de los más elementales principios éticos y morales inherentes a la persona la humana, con respaldo doctrinario en concepciones también extrañas a nuestra identidad nacional. La CONADEP formó 7.380 legajos, comprensivos de denuncias de familiares de desaparecidos, testimonios de liberados de los centros clandestinos de detención y declaraciones de miembros de las fuerzas de seguridad que intervinieron en el accionar represivo antes descripto. Realizó inspecciones en distintos puntos del territorio nacional; recabó información a las FF.AA. y de Seguridad y a diversos organismos públicos y privados. De la investigación efectuada resultó la formulación de denuncias ante la justicia, comprensivas de 1.086 legajos que permiten tener por acreditada la existencia y funcionamiento de los principales centros clandestinos de detención; nómina parcial de «desaparecidos» que fueron vistos con vida en tales centros y de miembros de las FF. AA. y de Seguridad mencionados por las víctimas como responsables de los graves hechos denunciados. La destrucción o remoción de la documentación que registró minuciosamente la suerte corrida por las personas desaparecidas, dispuesta antes de la entrega del gobierno a las autoridades constitucionales, dificultó la investigación encomendada a esta Comisión por el decreto constitutivo. No obstante, existen fundamentos que permiten afirmar que las personas aún desaparecidas pasaron por los centros clandestinos de detención y que la respuesta acerca de su posterior destino está subordinada a los avances que se

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produzcan en la individualización de los responsables de la acción represiva a que nos venimos refiriendo 430 .

No capítulo de reparações foram feitas várias propostas e recomendações, dentre elas, a continuação das investigações por meio de revisões judiciais, bolsas de estudo e oportunidades de trabalho para os parentes dos desaparecidos, assistência econômica, criação de legislação para declarar o desaparecimento forçado de pessoas, ensino obrigatório de direitos humanos nas escolas, apoio a organizações de direitos humanos, e repulsa às leis repressivas no país. Com efeito foi proposto: a) Que el organismo que sustituya a esta Comisión acelere los trámites tendientes a remitir a la justicia la documentación recogida durante la investigación encomendada por el Poder Ejecutivo. b) Que el Poder Judicial se aboque adecuadamente a la agilización de los trámites investigativos y de comprobación de las denuncias recibidas por esta Comisión. c) Que se dicten las normas necesarias para que los hijos y/o familiares de personas desaparecidas durante la represión reciban asistencia económica; becas para estudio; asistencia social; puestos de trabajo. Asimismo, que se sancionen las medidas que se estimen convenientes y que concurran a palear los diversos problemas familiares y sociales emergent es de la desaparición forzada de personas. d) Sancionar normas que tiendan a: 1. Declarar crimen de lesa humanidad la desaparición forzada de personas. 2. Apoyar el reconocimiento y la adhesión a las organizaciones nacionales e internacionales de Derechos Humanos. 3. Establecer la enseñanza obligatoria de la defensa y difusión de los Derechos Humanos en los organismos docentes del Estado, sean ellos civiles, militares o de seguridad. 4. Fortalecimiento y adecuación plena de los medios con que deberá contar la Justicia Civil para la investigación de oficio en relación a la violación de Derechos Humanos. 5. Derogar toda la legislación represiva que se encuentre vigente 431 .

Muitas dessas recomendações foram atendidas. Nos últimos anos foi dado um passo importante para repelir as leis de anistia que impediam a

430 Informe Nunca Más disponível em:http://www.desaparecidos.org/arg/conadep/nuncamas/479.html, consultado em 10/07/09. 431 Informe Nunca Más disponível em:http://www.desaparecidos.org/arg/conadep/nuncamas/477.html, consultado em 10/07/09.

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persecução desses crimes. A composição da atual Corte Federal declarou inconstitucional a lei de anistia e meses depois o Parlamento a anulou.

1.3. Terceiro Principio: reconhecimento do status de vítima e estabelecimento de sistema de reparações

O primeiro decreto, n. 70/91 (ampliado ligeiramente pela lei n. 24.043), estabeleceu compensações aos que foram presos e aos que foram oficialmente reconhecidos como prisioneiros cujos pedidos de compensação foram encerrados pelas cortes por causa da Lei do Ponto Final. Poucas reparações ocorreram uma vez que a maior parte dos prisioneiros não foi reconhecida. Posteriormente, pela lei n. 24.043, de 23 de dezembro de 1991 432 , foi prevista uma reparação patrimonial para as pessoas que estiveram presas a disposição do poder executivo nacional ou por ordem emanada de tribunais militares dentro do período de 6 de novembro de 1974, data em que foi declarado o estado de sítio, a 10 de dezembro de 1983. Assim mesmo contempla um acréscimo para aqueles que foram mortos durante o cativeiro, ou sofreram lesões gravíssimas 433 .

432 B.O. de 02/01/92, número 27296, p. 1. 433 Dentre suas disposições cabe destacar: ARTICULO 1° — Las personas que durante la vigencia del estado de sitio hubieran sido puestas a disposición del Poder Ejecutivo Nacional, por decisión de éste, o que siendo civiles hubiesen sufrido detención en virtud de actos emanados de tribunales militares, hayan o no iniciado juicio por daños y perjuicios, podrán acogerse a los beneficios de esta ley, siempre que no hubiesen percibido indemnización alguna en virtud de sentencia judicial, con motivo de los hechos contemplados en la presente. ARTICULO 2 ° — Para acogerse a los beneficios de esta ley, las personas mencionadas en el artículo anterior deberán reunir alguno de los siguientes requisitos: a) Haber sido puestas a disposición del Poder Ejecutivo Nacional antes del 10 de diciembre de 1983. b) En condición de civiles, haber sido privadas de su libertad por actos emanados de tribunales militares, haya habido o no sentencia condenatoria en este fuero. ARTICULO 4° — El beneficio que establece la presente ley será igual a la treintava parte de la remuneración mensual asignada a la categoría superior del escalafón para el personal civil de la administración pública nacional (aprobado por el Decreto N° 1428 del 22 de febrero de 1973, o el que lo reemplace), por cada día que duró la medida mencionada en el artículo 2 , incisos a) y b), respecto a cada beneficiario. A este efecto se considerará remuneración mensual a la totalidad de los rubros que integran el salario del agente sujetos a aportes jubilatorios, con exclusión de los adicionales particulares (antiguedad, título, etc.), y se tomará la correspondiente al mes en que se otorgue el beneficio.

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A lei n. 24.321, de 1 de maio de 1994 434 , criou a figura do “ausente por desaparição forçada”. Nesses casos a Secretaria de Direitos Humanos, que depende do Ministério de Justiça, emite um certificado para que possa ser apresentado nos processos ou trâmites de interesse.435

Para el cómputo del lapso aludido en el párrafo anterior, se tomará en cuenta el acto del Poder Ejecutivo que decretó la medida o el arresto efectivo no dispuesto por orden de autoridad judicial competente, y el acto que la dejó sin efecto con carácter particular o como consecuencia del cese del estado de sitio. Los arrestos domiciliarios o libertad vigilada no serán considerados como cese de la medida. Cuando las referidas personas hubiesen fallecido durante el lapso que duró la medida mencionada en el artículo 2° , incisos a) y b), el beneficio se fijará en la forma indicada precedentemente, computándose el lapso hasta el momento de la muerte. Sin perjuicio de ello, en estos casos el beneficio se incrementará, por el solo hecho de la muerte en una suma equivalente a la prevista en esta ley para cinco (5) años de vigencia de la medida mencionada en el artículo 2° , incisos a) y b). El beneficio correspondiente a las personas que en iguales circunstancias hubiesen sufrido lesiones gravísimas, según la clasificación que hace el Código Penal, será incrementado , por ese solo hecho, en una suma equivalente a la prevista en el párrafo anterior, reducida en un treinta por ciento (30 %). ARTICULO 7° — En todos los supuestos, el pago deberá hacerse efectivo en seis (6) cuotas semestrales con vencimiento, la primera de ellas, dentro de los sesenta (60) días corridos del otorgamiento del beneficio. El monto de las cuotas se actualizará desde el día de su otorgamiento hasta el del pago de acuerdo con la variación sufrida durante ese período por el índice de precios al consumidor que publica el INDEC, con más un interés del seis por ciento (6%) anual sobre saldos. A los efectos del cálculo se tomará el índice correspondiente al mes anterior al otorgamiento del beneficio y a la materialización del pago respectivamente. O prazo para requerer a indenização foi prorrogado por diversas disposições, a saber: art. 1° da lei 26.178 B.O. 19/12/06 que dispõe sobre novo prazo de dois anos, a partir do vencimento estabelecido na lei n. 25.985; tendo como prorrogas anteriores: lei n° 25.985 B.O. 7/1/05, Lei n° 25.814 B.O. 1/12/2003; Lei n° 24.906 B.O. 19/12/97 (segundo texto substituído por lei n° 25.497 B.O. 21/11/01); lei n° 24.436 B.O.19/1/1995). Disponível em: http://www.infoleg.gov.ar/infolegInternet /anexos/0 4999/442/texact.htm consultado em 10/7/09. 434 B.O. de 10/06/94, n. 27910. 435 Suas principais disposições são as seguintes: ARTICULO 1ºPodrá declararse la ausencia por desaparición forzada de toda aquella persona que hasta el 10 de diciembre de 1983, hubiera desaparecido involuntariamente del lugar de su domicilio o residencia, sin que se tenga noticia de su paradero. ARTICULO 2ºA los efectos de esta ley se entiende por desaparición forzada de personas, cuando se hubiere privado a alguien de su libertad personal y el hecho fuese seguido por la desaparición de la víctima, o si ésta hubiera sido alojada en lugares clandestinos de detención o privada, bajo cualquier otra forma, del derecho a la jurisdicción. La misma deberá ser justificada mediante denuncia ya presentada ante autoridad judicial competente, la ex Comisión Nacional sobre la Desaparición de Personas (decreto 158/83), o la Subsecretaría de Derechos Humanos y Sociales del Ministerio del Interior o la ex Dirección Nacional de Derechos Humanos. ARTICULO 3ºPodrán solicitar la declaración de ausencia por desaparición forzada, todos aquellos que tuvieren algún interés legítimo subordinado a la persona del ausente. En el caso del cónyuge, ascendientes, descendientes y parientes hasta el 4º grado, dicho interés se presume. El trámite judicial, en jurisdicción nacional, será eximido de tasa de justicia. ARTICULO 7ºLos efectos civiles de la declaración de ausencia por desaparición forzada serán análogos a los prescriptos por la Ley 14.394 para la ausencia con presunción de fallecimiento. ARTICULO 8ºEn caso de reaparición con vida del ausente, éste podrá reclamar la entrega de bienes que existiesen y en el estado que se hallasen, los adquiridos con el valor de los que faltaren, el precio que se adeudase de los que se hubieren enajenado y los frutos que no se hubieren consumido. La reaparición no causará por sí la nulidad del nuevo matrimonio ni de ningún otro acto jurídico que se hubiese celebrado conforme a derecho.

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A lei 24.411, de 28 de dezembro de 1994 436 , estabelece benefícios para os familiares de pessoas desaparecidas ou mortas, como conseqüência do regime militar, com anterioridade ao dia 10 de dezembro de 1983 437 . A lei define por desaparição forçada de pessoas, quando se tivesse privada

ARTICULO 10º En los casos ya declarados de ausencia con presunción de fallecimiento con sentencia ya inscripta en el Registro Nacional de las Personas o firme y pendiente de inscripción podrán ser a pedido de parte reconvertidos en "ausencia por desaparición forzada" probándose solamente los extremos del artículo 2 de esta ley ante el mismo juez que declaró la ausencia con presunción de fallecimiento. Verificada la desaparición forzada, el juez ordenará sin más trámite el oficio modificatorio de la sentencia, declarando sustituida la declaración de ausencia con presunción de fallecimiento por la ausencia por desaparición forzada. Disponível em: http://www.infoleg.gov.ar/ infolegInternet/anexos/04999/719/norma.htm consultado em 10/07/09). 436 B.O. de 03/01/95, n. 28052. 437 ARTICULO 1º — Las personas que al momento de la promulgación de la presente ley se encuentren en situación de desaparición forzada, tendrán derecho a percibir, por medio de sus causahabientes, un beneficio extraordinario equivalente a la remuneración mensual de los agentes Nivel A del escalafón para el personal civil de la administración pública nacional aprobado por el decreto 993/91, por el coeficiente 100. A los efectos de esta ley, se entiende por desaparición forzada de personas, cuando se hubiera privado a alguien de su libertad personal y el hecho fuese seguido por la desaparición de la víctima, o si ésta hubiera sido alojada en lugares clandestinos de detención o privada bajo cualquier otra forma del derecho a la jurisdicción. ARTICULO 2º — Tendrán derecho a percibir igual beneficio que el establecido en el artículo 1º los causahabientes de toda persona que hubiese fallecido como consecuencia del accionar de las fuerzas armadas, de seguridad, o de cualquier grupo paramilitar con anterioridad al 101283. ARTICULO 2 BIS. — La indemnización establecida por la presente ley tiene el carácter de bien propio del desaparecido o fallecido. En el caso de desaparición y en tanto la ausencia permanezca, será distribuida haciendo aplicación analógica del orden de prelación establecido en los artículos 3545 y siguientes del Código Civil, sin perjuicio de los derechos que reconoce el artículo 4º de esta ley. (Artículo incorporado por art. 1º de la Ley Nº 24.823 B.O. 28/05/1997) ARTICULO 3º — Para la acreditación de las situaciones enunciadas precedentemente, y a los efectos exclusivos de esta ley, se procederá de la siguiente manera: 1. — En el artículo 1º, la desaparición forzada se probará por cualquiera de los siguientes medios: a) La pertinente denuncia penal por privación ilegítima de la libertad y por la resolución del juez de que prima facie, la desaparición es debida a esa causa. Al respecto el juez deberá comprobar la veracidad formal de la denuncia, y resolver al solo efecto de esta ley y en forma sumarísima; b) Indistintamente, por la denuncia realizada ante la Comisión Nacional sobre la Desaparición de Personas creada por decreto 187/83, o ante la Subsecretaría de Derechos Humanos del Ministerio del Interior. 2. — En el artículo 2º, por cualquiera de los medios enunciados en el inciso anterior, además del fallecimiento que se acreditará con la partida de defunción pertinente. ARTICULO 4º — Los efectos y beneficios de esta ley se aplicarán también a las uniones matrimoniales de hecho que tuviesen una antigüedad de por lo menos dos años anteriores a la desaparición o fallecimiento, según el caso, y cuando esto se probara fehacientemente. Se presumirá, salvo prueba en contrario, que existió unión de hecho cuando hubiera descendencia reconocida por el desaparecido o el fallecido, o la filiación del descendiente hubiera sido establecida judicialmente. La persona que hubiese estado unida de hecho concurrirá en la proporción que hubiere correspondido al cónyuge, Si hubiera concurrencia de cónyuge y de quien hubiera probado unión de hecho durante al menos los dos años inmediatamente anteriores a la desaparición o el fallecimiento, la parte que correspondiese al cónyuge será distribuida entre ambos en partes iguales. (Párrafo incorporado por art. 2º de la Ley Nº 24.823 B.O. 28/05/1997)

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a alguém a liberdade pessoal e o fato fosse seguido pela desaparição da vítima, ou se esta tivesse sido alocada em lugares clandestinos de prisão ou privada sob qualquer forma do direito à jurisdição (art. 1, par. segundo). Por outra parte foi revogado e declarado “insanablemente nulo el acto institucional de la Junta Militar del 28 de Abril de 1983, y el chamado Informe Final sobre la lucha antisubversiva de igual fecha”438 .

A lei n. 25.914, de 25 de agosto de 2004 439 , estabeleceu benefícios para as pessoas que tivessem nascido durante a privação da liberdade de suas mães, ou que, sendo menores, tivessem permanecido em cativeiro com os seus pais, sempre que por razões políticas, a disposição do poder executivo

Como excepción al Título IV de la Sección Segunda, Libro Primero del Código Civil sobre Adopción Plena, se establece que los hijos que como consecuencia de la desaparición forzada o muerte de uno o ambos padres hubieran sido dados en adopción plena, tendrán derecho a la percepción de la indemnización establecida por la presente ley. (Párrafo incorporado por art. 3º de la Ley Nº 24.823 B.O. 28/05/1997) ARTICULO 4 BIS. — La persona, cuya ausencia por desaparición forzada se hubiera declarado judicialmente en los términos de la ley 24.321, percibirá dicha reparación pecuniaria a través de sus causahabientes, los cuales deberán acreditar tal carácter en sede judicial. El juez actuante en la causa de ausencia por desaparición forzada, será competente para dictar la declaración de causahabientes. ARTICULO 4 TER. — El pago de la indemnización a los herederos del fallecido o a los causahabientes del desaparecido que hubiesen acreditado tal carácter tal carácter mediante declaración judicial, incluyendo la resolución que correspondiere a las uniones de hecho, liberará al Estado de la responsabilidad que le compete por esta ley. Quienes hubieran percibido la reparación pecuniaria en legal forma, quedarán subrogando al Estado si con posterioridad solicitasen igual beneficio otros causahabientes o herederos con igual o mejor derecho. (Artículo incorporado por art. 5º de la Ley Nº 24.823 B.O. 28/05/1997) ARTICULO 5º — En caso de aparición de las personas mencionadas en el artículo 1º, se deberá comunicar esta circunstancia al juez competente, pero no habrá obligación de reintegrar el beneficio si ya hubiera sido obtenido. ARTICULO 9º — En los casos en que se haya reconocido indemnización por daños y perjuicios por resolución judicial o se haya otorgado el beneficio previsto en el Decreto 70/91, Decreto 1313/91 o por la causal que establece el artículo 4º, párrafo 4º de la ley 24.043, y el mismo haya sido percibido, los beneficiarios sólo podrán percibir la diferencia entre lo establecido por esta ley y los importes efectivamente cobrados por la otra normativa indicada. Si la percepción hubiera sido igual o mayor no tendrán derecho a la nueva reparación pecuniaria. (Artículo sustituido por art. 7º de la Ley Nº 24.823 B.O. 28/05/1997)). Disponível em: http://www.infoleg.gov.ar/infolegInternet/anexos/04999/793 /texact.htm ) consultado em 10/7/09. 438 Foi incorporado como artigo 9 bis na lei em referencia. Nos seguintes termos: “ ARTICULO 9 BIS. — Deróganse en cuanto hubieren tenido vigencia, y decláranse insanablemente nulos, el acto institucional de la Junta Militar del 28 de Abril de 1983, y el llamado Informe Final sobre la lucha antisubversiva de igual fecha. Deróganse todas las disposiciones que se opongan a la ley 24.411 y a la presente.” (Artículo incorporado por art. 8º de la Ley Nº 24.823 B.O. 28/05/1997). 439 B.O. de 30/08/04, n. 30473.

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nacional, e/ou tribunais militares, ou que foram vítimas de substituição de identidade 440 . Cabe observar, também, avanços em reconhecimentos ou reparações simbólicas, a saber:

440 As disposições mais relevantes são as seguintes: ARTICULO 1° — Las personas que hubieren nacido durante la privación de la libertad de su madre, o que, siendo menores, hubiesen permanecido en cualquier circunstancia detenidos en relación a sus padres, siempre que cualquiera de éstos hubiese estado detenido y/o detenidodesaparecido por razones políticas, ya sea a disposición del Poder Ejecutivo nacional y/o tribunales militares y/o áreas militares, con independencia de su situación judicial, podrán acogerse a los beneficios instituidos en la presente ley. Las personas que por alguna de las circunstancias establecidas en la presente, hayan sido víctimas de sustitución de identidad recibirán la reparación que esta ley determina. El presente beneficio es incompatible con cualquier indemnización percibida en virtud de sentencia judicial, con motivo de los hechos contemplados en la presente. ARTICULO 2° — Para acogerse a los beneficios de esta ley, las personas mencionadas en el artículo anterior deberán acreditar ante la autoridad de aplicación, el cumplimiento de los siguientes requisitos: a) Para quienes hayan nacido durante la detención y/o cautiverio de su madre, constancia de la fecha de nacimiento, anterior al 10 de diciembre de 1983, y acreditación, por cualquier medio de prueba, de que su madre se encontraba detenida y/o desaparecida por razones políticas a disposición del Poder Ejecutivo nacional, y/o tribunales militares y/o áreas militares, con independencia de su situación judicial; b) En el supuesto de menores nacidos fuera de los establecimientos carcelarios y/o de cautiverio, acreditar por cualquier medio de prueba su permanencia en los mismos y las condiciones requeridas en el artículo 1° de la presente ley en alguno de sus padres; c) Sentencia judicial rectificatoria de la identidad en los casos del segundo párrafo del artículo 1°. Quedan exceptuados de acompañar tal sentencia aquellos que encontrándose en esta situación hayan sido adoptados plenamente y de buena fe, debiendo probar por cualquier medio la desaparición forzada de sus padres. ARTICULO 3° — La solicitud del beneficio se hará ante el Ministerio de Justicia, Seguridad y Derechos Humanos, en su condición de autoridad de aplicación de la presente ley, el que comprobará en forma sumarísima el cumplimiento de los recaudos exigidos en los artículos anteriores. En caso de duda sobre el otorgamiento del beneficio previsto en esta ley, deberá estarse a lo que sea más favorable a las víctimas o sus derechohabientes, conforme al principio de buena fe. ARTICULO 4° — El beneficio que establece la presente ley consistirá en el pago por única vez de una suma equivalente a VEINTE (20) veces la remuneración mensual de los agentes Nivel A, Grado 8, del Sistema Nacional de la Profesión Administrativa Decreto N° 993/91 t.o. 1995. Se considera remuneración mensual a la totalidad de los rubros que integran el salario del agente sujeto a aportes jubilatorios. Cuando, en las circunstancias y épocas señaladas en los artículos 1° y 2°, al beneficiario se le hubiere sustituido la identidad, recibirá por todo concepto una indemnización equivalente a la fijada por la Ley N° 24.411, sus complementarias y modificatorias. Si, en virtud de las circunstancias establecidas en el artículo 1°, el beneficiario hubiese sufrido lesiones graves o gravísimas, según la clasificación del Código Penal, o hubiese fallecido, el beneficio será incrementado en un CINCUENTA POR CIENTO (50%), SETENTA POR CIENTO (70%) y CIEN POR CIENTO (100%) respectivamente. Disponível em: http://www.infoleg.gov.ar/infolegInternet/ anexos/9500099999/97981/norma.htm consultado em 10/7/09.

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Em abril de 1995, o general Martin Balza, chefe do Exército argentino, se desculpou à nação pelos crimes cometidos pelos militares durante a guerra suja 441 . Em março de 2004, na ocasião da abertura de um antigo centro de tortura que foi transformado em museu, Néstor Kirchner disse: Las cosas hay que llamarlas por su nombre (...) Vengo a pedir perdón de parte del Estado nacional por la vergüenza de haber callado durante 20 años de democracia tantas atrocidades Hablemos claro: no es rencor ni odio lo que nos guía. Me guía la justicia y la lucha contra la impunidad. Los que hicieron este hecho tenebroso y macabro como fue la ESMA tienen un solo nombre: son asesinos 442 .

Por outra parte, em julho de 2004, também tiveram reparações os responsáveis por filmes que foram censurados pela ditadura 443 . Finalmente tem procurado acordos de reparação ante as denúncias por violação de direitos humanos realizadas por cidadãos ante organismos internacionais. 444 O progresso na Argentina nos recentes anos foi descrito como generacional e como a juventude de hoje não cresceu com a ameaça de uma ditadura militar e portanto se sente mais à vontade em buscar respostas e responsabilidades. Em outras palavras, a juventude argentina tem mais possibilidade de buscar um ajuste de contas do que a geração passada. Tal progresso se somou ao desenvolvimento da jurisprudência do sistema interamericano de proteção e com a abertura dos arquivos relativos à Operação Condor em outros Estados, em especial os Estados Unidos.

441 Foi em 29 de maio de 1995 em um programa jornalístico de TV. (Vide nota jornalística de Diego Rivera, disponível em http://www.elperiodista.cl/newtenberg/1428/article35153.html consultado em 10/07/09; também, entrevista a Martin Balza em jornal Pagina 12 http://www.pagina12.com.ar/diario/ elpais/12931020031215.html consultado em 11/07/09). 442 Em 25 de março de 2004. Vide Jornal Clarin, disponível em: http://www.clarin.com/diario/ 2004/03/25/p00301.htm Consultado em 11/07/09. 443 Disponível em: http://www.clarin.com/diario/2004/07/03/sociedad/s04701.htm Consultado em 10/7/09 444 B.O. de 08/04/08 Decreto 568/2008 que aceita Acuerdo de Solución Amistosa celebrado el 16 de agosto de 2007 entre el Gobierno de la República Argentina y los Peticionarios en la Petición Nº 2829/02 del registro de la Comisión Interamericana de Derechos Humanos; B.O. de 05/05/09 Decreto 399/09 que Aceita Acuerdo de Solución Amistosa celebrado entre Argentina y el señor Valerio O. Castillo Baez en la petición Nº P 455402 del registro de la Comisión Interamericana de Derechos Humanos; dentre outros.

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1.4. Quinto princípio: preservação da memória histórica

O Congresso, sancionou a lei n. 25.633 445 , de 1 de agosto de 2002, que estabelece o dia 24 de março como o Día Nacional de la Memoria por la Verdad y la Justicia com o fim de recordar às vítimas da ditadura 446 . Por meio da lei n. 26.085 447 , de 15 de março de 2006, foi estabelecido como feriado nacional.

Assim mesmo foram transformados em museus antigos centros de detenção e tortura, sendo o mais famoso a Escola de Mecânica da Armada (ESMA), inaugurado em março de 2004. 448 .

1.5. Princípios Primeiro e Quarto: perseguição de violações de direitos humanos e implementação de procedimentos administrativos.

1.5.1. Anistia e julgamentos

Durante os últimos meses em que esteve no poder, a junta militar que governava o país preparou uma lei de anistia que os livrava da persecução criminal tão logo entregassem o poder a quem de direito.

445 B. O. de 23/08/02 n. 29968. 446 ARTICULO 1º — Institúyese el 24 de marzo como Día Nacional de la Memoria por la Verdad y la Justicia en conmemoración de quienes resultaron víctimas del proceso iniciado en esa fecha del año 1976. ARTICULO 2º — En el seno del Consejo Federal de Cultura y Educación, el Ministerio de Educación de la Nación y las autoridades educativas de las distintas jurisdicciones acordarán la inclusión en los respectivos calendarios escolares de jornadas alusivas al Día Nacional instituido por el artículo anterior, que consoliden la memoria colectiva de la sociedad, generen sentimientos opuestos a todo tipo de autoritarismo y auspicien la defensa permanente del Estado de Derecho y la plena vigencia de los Derechos Humanos. ARTICULO 3º — Facúltase al Poder Ejecutivo nacional para disponer en los distintos ámbitos de su competencia la implementación de actividades específicas, en el mismo sentido que el dispuesto para la comunidad educativa en el artículo anterior de la presente ley. 447 B.O. de 21/03/06 n. 30870. 448 Em 25 de março de 2004. Vide Jornal Clarín, disponível em: http://www.clarin.com/diario/2004 /03/25/p00301.htm consultado em 11/07/09.

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Os planos da “anistia livre, geral e irrestrita”, na verdade uma máscara a acobertar todo o histórico de violações de direitos humanos ocorridos em tão curto período de tempo, foi rechaçada por inúmeras organizações de defesa dos direitos humanos, que organizaram grandes protestos contra a anistia proposta. No entanto, mesmo diante de todas as objeções, a anistia foi decretada pelos militares em setembro de 1983, semanas antes das eleições. A então chamada Lei da Pacificação Nacional n. 22.924 449 , de 23 de setembro de 1983 450 , garantia anistia por “crimes cometidos com motivações ou objetivos terroristas ou subversivos ocorridos entre 25 de maio de 1973 e 17 de junho de 1982” , e “por todos os crimes resultantes ou motivados pelo

449 B.O. de 27/09/83, n. 25266. 450 As disposições mais relevantes são as seguintes: ARTICULO 1º — Decláranse extinguidas las acciones penales emergentes de los delitos cometidos con motivación o finalidad terrorista o subversiva, desde el 25 de mayo de 1973 hasta el 17 de junio de 1982. Los beneficios otorgados por esta ley se extienden, asimismo, a todos los hechos de naturaleza penal realizados en ocasión o con motivo del desarrollo de acciones dirigidas a prevenir, conjurar o poner fin a las referidas actividades terroristas o subversivas, cualquiera hubiere sido su naturaleza o el bien jurídico lesionado. Los efectos de esta ley alcanzan a los autores, partícipes, instigadores, cómplices o encubridores y comprende a los delitos comunes conexos y a los delitos militares conexos. ARTICULO 2º — Quedan excluidos de los beneficios estatuidos en el artículo precedente, los miembros de las asociaciones ilícitas terroristas o subversivas que, a la fecha hasta la cual se extienden los beneficios de esta ley, no se encontraren residiendo legal y manifiestamente en el territorio de la Nación Argentina o en los lugares sometidos a su jurisdicción o que por sus conductas hayan demostrado el propósito de continuar vinculadas con dichas asociaciones. ARTICULO 3º — Quedan también excluidas las condenas firmes dictadas por los delitos y hechos de naturaleza penal referidos en el artículo 1º, sin perjuicio de las facultades que, de conformidad con el inciso 6º del artículo 86 de la Constitución Nacional, el Poder Ejecutivo Nacional pueda ejercer en materia de indulto o conmutación de las penas impuestas por dichas condenas, para coplementar el propósito pacificador de esta ley. ARTICULO 4º — No están comprendidos en los beneficios de esta ley, los delitos de subversión económica tipificados en los artículos 6º, 7º, 8º y 9º de la Ley Nº 20.840. ARTICULO 5º — Nadie podrá ser interrogado, investigado, citado a comparecer o requerido de manera alguna por imputaciones o sospechas de haber cometido delitos o participado en las acciones a los que se refiere el artículo 1º de esta ley o por suponer de su parte un conocimiento de ellos, de sus circunstancias, de sus autores, partícipes, instigadores, cómplices o encubridores. ARTICULO 6º — Bajo el régimen de la presente ley quedan también extinguidas las acciones civiles emergentes de los delitos y acciones comprendidos en el artículo 1º. Una ley especial determinará un régimen indemnizatorio por parte del Estado. ARTICULO 7º — La presente ley operará de pleno derecho desde el momento de su promulgación y se aplicará de oficio o a pedido de parte. ARTICULO 11. — Cuando corresponda otorgar los beneficios de esta ley en causas pendientes se dictará el sobreseimiento definitivo por extinción de la acción. ARTICULO 12. — Los Jueces Ordinarios, Federales, Militares u organismos castrenses ante los que se promuevan denuncias o querellas fundadas en la imputación de los delitos y hechos comprendidos en el artículo 1º, las rechazarán sin sustanciación alguna. Disponível em: http://www.infoleg.gov.ar/infolegInternet/anexos/7000074999/73271/norma.htm Consultado em 10/07/09.

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desenvolvimento de ações dirigidas ao combate das atividades acima mencionadas, qualquer que tenha sido a natureza da violação ou o dispositivo penal violado” . Além disso, a anistia foi estendida a “todos os autores, participantes, instigadores, cúmplices e partícipes e inclui qualquer crime comum ou militar relacionado com os fatos objeto da presente lei”. Estas previsões indicavam que, a despeito da propaganda militar contra a subversão de esquerda, a anistia foi criada para incluir as guerrilhas de esquerda. No entanto, parecia que apenas um pequeno número de membros destas guerrilhas poderiam ser realmente beneficiados pelas medidas, uma vez que a maioria dos membros foram mortos ou exilados. A extensão da anistia é muito ampla, incluindo todos os níveis de envolvimento com os crimes cometidos com objetivos terroristas ou contra terroristas. Há, no entanto, algumas restrições nos artigos subseqüentes, como por exemplo a exclusão de subversivos que houvessem fugido ou estivessem no exílio, como previsto no artigo 2º da Lei, e também àqueles que houvessem sido condenados por sentenças irrecorríveis pelos crimes elencados no artigo 1º (art. 3º). Estas previsões serviam para limitar a possibilidade de membros da guerrilha receber anistia. E por fim, o artigo 4º proibia a concessão de anistia para “crimes de subversão econômica”. O Presidente Raul Alfonsín, eleito em 1983, logo após assumir o governo, apresentou projeto de lei para deixar sem efeito a lei de anistia. Dessa forma foi sancionada a lei n. 23.040 451 , de 27 de dezembro de 1983, que revogou a lei de facto n. 22.924 por ser inconstitucional e, assim mesmo, a declarou insanavelmente nula 452453 .

451 B.O. de 29/12/83, n. 25331. 452 As principais disposições são as seguintes: ARTICULO 1º — Derógase por inconstitucional y declárase insanablemente nula la ley de facto n. 22.924. ARTICULO 2º — La ley de facto Nº 22.924 carece de todo efecto jurídico para el juzgamiento de las responsabilidades penal, civil, administrativa y militar emergentes de los hechos que ella pretende cubrir, siendo en particular inaplicable a ella el principio de la ley penal más benigna establecido en el artículo 2º del Código Penal. Lo dispuesto en el párrafo anterior no se altera por la existencia de decisiones judiciales firmes que hayan aplicado la ley de facto Nº 22.924. ARTICULO 3º — La persona que hubiera recuperado su libertad por aplicación de la ley de facto Nº 22.924 deberá presentarse ante el tribunal de radicación de la causa dentro del quinto (5) día de la vigencia de la presente ley. En caso contrario, será declarada rebelde y se dispondrá su captura, sin necesidad de citación previa.

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Também, além de estabelecer a Comissão Nacional sobre Pessoas Desaparecidas para investigar o desaparecimento e descobrir o paradeiro de vítimas do regime, anunciou a intenção de submeter a julgamento os antigos dirigentes militares da argentina. Os julgamentos começaram dezoito meses depois que a junta deixou o poder e foram os primeiros processos de dirigentes militares na América Latina. Cinco dos nove acusados foram condenados em 1985, incluindo dois a quem foram dadas penas de prisão perpétua. Alguns membros de guerrilha exilados também foram indiciados e foram iniciadas investigações contra centenas de outros membros das Forças Armadas. Embora os militares, em um primeiro momento, parecessem aceitar a idéia do julgamento de seus líderes, a partir de 1986 aumentou a preocupação dos militares, uma vez que o número de processos começava a superar as expectivas do presidente da Argentina e dos militares. Essa preocupação se manifestava pelo não comparecimento às cortes, rumores de tentativas de novos golpes e uma onda de atentados à bomba por todo o país. O governo respondeu com a proposta da Lei de Punto Final, n. 23.492 454 , de 24 de dezembro de 1986, apesar dos protestos dos ativistas de direitos humanos 455 .

Si se tratare de un civil sometido a la jurisdicción militar, la presentación a que se refiere el párrafo anterior podrá hacerse efectiva simultáneamente con la impugnación dirigida contra ese enjuiciamiento, y en el tribunal donde esta impugnación se radique. Disponível em: http://www.infoleg.gov.ar/infolegInternet/anexos/2500029999/28166/norma.htm Consultada em 10/7/09 453 Sobre a lei, vide. AMADEO, José Luis. Ley 22.924 de pacificación nacional. In: Revista Jurisprudencia Argentina La ley . Buenos Aires: La Ley 1984A, pp. 534544. 454 As principais disposições são as seguintes: Artículo. 1º Se extinguirá la acción penal respecto de toda persona por su presunta participación en cualquier grado, en los delitos del artículo 10 de la Ley Nº 23.049, que no estuviere prófugo, o declarado en rebeldía, o que no haya sido ordenada su citación a prestar declaración indagatoria, por tribunal competente, antes de los sesenta dias corridos a partir de la fecha de promulgación de la presente ley. En las mismas condiciones se extinguirá la acción penal contra toda persona que hubiere cometido delitos vinculados a la instauración de formas violentas de acción política hasta el 10 de diciembre de 1983. Artículo. 2° Dentro del término establecido por el artículo precedente las Cámaras Federales competentes podrán examinar el estado de las causas que tramitan ante el Consejo Supremo de las Fuerzas Armadas a los electos del artículo l0, última parte de la ley 23.049. Las denuncias que se formulen en este término ante el Consejo Supremo de las Fuerzas Armadas deberán ser informadas dentro de las cuarenta y ocho (48) horas por el Consejo Supremo de las

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A Lei do Ponto Final não era uma lei de anistia clássica, pois não impedia o julgamento e a condenação dos ofensores. No lugar disso, estabelecia um prazo de 60 dias para os julgamentos, em uma tentativa de limitar os esforços de levar à justiça membros das Forças Armadas. Essa lei era aplicável a qualquer nível hierárquico das Forças Armadas, e se estendia aos membros das guerrilhas, embora excluísse os que se encontrassem fugitivos. A extensão material da lei era larga, embora excluísse os crimes de mudança de estado civil e seqüestro de menores. Foi uma importante exceção que permitiu, posteriormente, iniciar processos criminais por esses crimes 456 . A Lei do Ponto Final fracassou na tentativa de parar os julgamentos militares. Apesar de o governo ter sancionado a lei à época dos festejos natalinos, período em que as cortes argentinas costumam parar por um mês, estas cancelaram seus feriados e trabalharam além do horário de funcionamento para julgar por volta de 1000 processos de assassinato, tortura e outras violações

Fuerzas Armadas a la Cámara Federal que corresponda, quienes deberán examinarlas y en su caso abocares. Artículo. 3° Cuando en las causas en trámite se ordenare respecto del personal en actividad de las Fuerzas Armadas, de seguridad, policiales o penitenciarias, cualquiera sea su rango, la detención o prisión preventiva previstas en los artículos. 363 a 375 del Código de Procedimientos en Materia Penal o en los artículos 309 a 318 del Código de Justicia Militar, tales medidas se harán efectivas bajo el régimen del inc. 2° del artículo 315 de este último Código; a petición del jefe de la unidad en que prestare servicio aquel personal, o de cualquier otro oficial superior de que dependiese. En este caso el superior será responsable de la comparecencia inmediata del imputado todas las veces que el tribunal lo requiera. Artículo. 4° Las cuestiones de competencia que se susciten entre el Consejo Supremo de las Fuerzas Armadas y las Cámaras Federales o entre estas últimas, así como la pendencia de recursos que impidan resolver sobre el mérito para disponer la indagatoria al tribunal competente, suspenderán el plazo establecido en el artículo. 1°. Tampoco se computará el lapso comprendido entre la fecha de notificación al Consejo Supremo de las Fuerzas Armadas del requerimiento de la Cámara Federal competente en el caso del artículo 2° y la fecha de recepción de la causa por ésta. A los fines del artículo 1° no será de aplicación el artículo 252 bis última parte del Código de Justicia Militar. Artículo 5° La presente ley no extingue las acciones penales en los casos de delitos de sustitución de estado civil y de sustracción y ocultación de menores. Artículo 6° La extinción dispuesta en el artículo. 1° no comprende a las acciones civiles. Disponível em: http://www.infoleg.gov.ar/infolegInternet/anexos/2000024999/21864/norma.htm consultada em 10/07/09. 455 Vide Jornal El pais Disponível em: http://www.elpais.com /articulo/internacional/ARGENTINA/ MADRES_DE_LA_PLAZADE_MAYO/DESAPARECIDOS_Y_DICTADURA_MILITAR_/19761982/ Senado/argentino/aprueba/ley/punto/final/amplia/mayoria/elpepiint/19861224elpepiint_17/Tes/ consultado em 16/07/09. 456 A questão do seqüestro de crianças de dissidentes do regime ainda é uma ferida aberta, e um dos pontos sobre os quais os defensores de direitos humanos tentam obter a condenação de violadores dos direitos humanos. Acerca do assunto, NOSIGLIA, J. Botín de guerra. Buenos Aires: Abuelas de Plaza de Mayo, 1985.

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menores trazidas pelas organizações de direitos humanos. Ao tempo em que o prazo de 60 dias se esgotara, as cortes haviam julgado 280 oficiais, incluindo 30 membros de alto escalão e dois expresidentes. Diante da tentativa fracassada de limitar as condenações por meio da Lei do Ponto Final, os militares ficaram extremamente ansiosos com a perspectiva de mais julgamentos. Embora o governo tivesse aceitado a alegação de obediência (mesmo com a exclusão dos crimes atrozes), a Suprema Corte argentina ainda não havia definido o limite acerca dos julgamentos, o que deixava o futuro desses oficiais incerto. Isto contribuiu para o surgimento de conflitos internos dentro das Forças Armadas, com muitos oficiais de baixo escalão perdendo a confiança em seus superiores e se tornando mais contrários aos esforços do governo de profissionalizar as Forças Armadas. As tensões eclodiram em um levante dos carapintadas na Páscoa de 1987. Embora os soldados participantes do levante proclamassem que não estavam tentando derrubar o governo, a rebelião provocou o medo de um novo golpe de Estado na Argentina, particularmente porque o levante coincidiu com uma nova onda de atentados à bomba, em que membros do Judiciário eram os alvos. Mas a força de oposição à rebelião se mostrou forte quando pelo menos 150 mil pessoas responderam aos pedidos do governo de se reunirem em Buenos Aires. Seguindose à rendição dos rebeldes, o governo começou a revisitar as demandas militares por anistia e renovou o discurso de reconciliação tão logo resolvida a crise. A rebelião marcou o fim da inércia militar que se seguira à transição e demonstrou que Alfonsin teria dificuldades em controlar as Forças Armadas. A situação só foi resolvida por meio de uma legislação, uma vez que as Cortes se negaram a implementar a política governamental de obediência hierárquica. Conseqüentemente, em 13 de maio de 1987, Alfonsin pediu ao Congresso que aprovasse uma lei para permitir esta política. Nesse discurso, Alfonsin declarou que ele mesmo não estava satisfeito com o preço a pagar, mas que considerava necessário para a sobrevivência da frágil democracia argentina, uma vez que o país estava à beira de uma guerra civil. A existência da ameaça, no entanto, foi questionada, uma vez que a insurreição se limitou a determinados segmentos das Forças Armadas, e mesmo

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eles tinham deixado claro que não pretendiam derrubar o governo. A legislação proposta ainda sofreu com a oposição de grupos ativistas dos direitos humanos e até de certos setores das Forças Armadas. Ela ainda contava com pouco apoio da população. A lei de obediência devida n. 23.521 457 , de 8 de junho de 1987, foi aprovada pelo congresso 458 . Estabeleceu como presunção irrefutável que um subordinado que cometeu violações aos direitos humanos agiu sob ordens superiores, sem nenhuma possibilidade de resistência ou de reconhecimento da ilegalidade da ordem (art. 1). Além disso, a lei se utilizou de uma ampla acepção do termo subordinado, incluindo oficiais de comando, subordinados, não

457 B.O. de 09/06/87, n. 26155. 458 As principais normas são as seguintes: Artículo. 1º Se presume sin admitir prueba en contrario que quienes a la fecha de comisión del hecho revistaban como oficiales jefes, oficiales subalternos, suboficiales y personal de tropa de las Fuerzas Armadas, de seguridad, policiales y penitenciarias, no son punibles por los delitos a que se refiere el artículo 10 punto 1 de la ley Nº 23.049 por haber obrado en virtud de obediencia debida La misma presunción será aplicada a los oficiales superiores que no hubieran revistado como comandante en jefe, jefe de zona, jefe de subzona o jefe de fuerza de seguridad, policial o penitenciaria si no se resuelve judicialmente, antes de los treinta dias de promulgación de esta ley, que tuvieron capacidad decisoria o participaron en la elaboración de las órdenes. En tales casos se considerará de pleno derecho que las personas mencionadas obraron en estado de coerción bajo subordinación a la autoridad superior y en cumplimiento de ordenes, sin facultad o posibilidad de inspección, oposición o resistencia a ellas en cuanto a su oportunidad y legitimidad. Artículo. 2°La presunción establecida en el artículo anterior no será aplicable respecto de los delitos de violación, sustracción y ocultación de menores o sustitución de su estado civil y apropiación extensiva de inmuebles. Artículo 3ºLa presente ley se aplicará de oficio. Dentro de los cinco (5) dias de su entrada en vigencia, en todas las causas pendientes, cualquiera sea su estado procesal, el tribunal ante el que se encontraren radicadas sin más trámite dictará, respecto del personal comprendido en el artículo 1º, primer párrafo, la providencia a que se refiere el artículo. 252 bis del Código de Justicia Militar o dejará sin efecto la citación a prestar declaración indagatoria, según correspondiere. El silencio del tribunal durante el plazo indicado, o en el previsto en el segundo párrafo del artículo 1º, producirá los efectos contemplados en el párrafo precedente, con el alcance de cosa juzgada. Si en la causa no se hubiere acreditado el grado o función que poseía a la fecha de los hechos la persona llamada a prestar declaración indagatoria, el plazo transcurrirá desde la presentación de certificado o informe expedido por autoridad competente que lo acredite. Artículo. 4°Sin perjuicio de lo dispuesto por la ley Nº 23.492, en las causas respecto de las cuales no hubiera transcurrido el plazo previsto en el artículo 1º de la misma, no podrá disponerse la citación a prestar declaración indagatoria de las personas mencionadas en el artículo 1º, primer párrafo de la presente ley. Artículo. 5º Respecto de las decisiones sobre la aplicación de esta ley. procederá recurso ordinario de apelación ante la Corte Suprema de Justicia de la Nación, el que podrá interponerse dentro de los cinco (5) dias de su notificación. Si la decisión fuere tácita el plazo transcurrirá desde que ésta se tuviere por pronunciada conforme con lo dispuesto en esta ley. Artículo. 6°No será aplicable el artículo 11 de la ley Nº 23.049 al personal comprendido en el artículo 1º de la presente ley. Disponível em: http://www.infoleg.gov.ar/infolegInternet/anexos/2000024999/21746/norma.htm Consultada em 10/07/09.

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comissionados, e membros do alto escalão das Forças Armadas, forças de segurança, forças policiais, e agentes penitenciários. Significa que apenas quem detinha a posição de comandante em poder, chefe de área, subchefe de área e diretor de segurança, polícia ou prisão, ou aqueles que forem considerados pela lei como tendo poderes de decisão ou envolvidos no processo decisório poderiam ser processados. A lei considerou que em todos os casos os agentes atuaram sob pressão, em subordinação a uma autoridade superior e seguindo ordens, sem ter a possibilidade de resistir ou se recusar a cumprir as ordens e de examinar sua ilegalidade. Na ocasião foi questionada sua constitucionalidade, porém a Corte convalidou a vigência dessas disposições 459 . O efeito desta lei foi o de reduzir o número de pessoas que poderiam ser processadas àqueles que ocupavam os mais altos escalões da hierarquia militar, refletindo o conceito de obediência hierárquica que Alfonsin manifestava antes de sua eleição. No entanto, a lei não impediu que a ansiedade tomasse conta dos quartéis e nos próximos dois anos, dois novos levantes ocorreram, até que Carlos Menem tomou posse como presidente da Argentina. Tão logo entrou no poder, Menem anunciou perdão para os militares, incluindo os líderes da junta militar que haviam sido condenados em 1985 460 . Utilizandose de perdões no lugar de legislações de anistia, ele não

459 Com efeito a lei foi impugnada no ano 1987, na causa "Camps" (Fallos: 310:1162), A Corte declarou a validade constitucional da lei 23.521, constitucionalidade, posteriomente em outros precedentes, bem como a lei de ponto final (Fallos: 311:401, 816, 890, 1085 y 1095; 312:111; 316:532 y 2171 y 321:2031, entre otros). 460 O presidente Menem concedeu os seguintes indultos (perdões) beneficiando as seguintes pessoas: 1) Totalidade dos altos chejes militares que não foram beneficiados pelas leis de punto final e obediencia devida, Carlos Guillermo Suarez Mason, extraditado dos Estados Unidos; Juan Sasiain, José Montes, Andrés Ferraro Ramón Genaro Díaz Bessone, do Segundo Corpo do exercito e outros (Decreto 1002/89, de 7 de outubro de 1989). 2) Indultou a represores uruguayos como José Nino Gavazzo e Jorge Silveira, além dos montoneros Mario Firmenich e Rodolfo Galimberti. Também, pessoas que estiveram desaparecidas, como como Graciela Daleo, que se negou a receber o perdão, e outros que resultaram mortos ou que não voltaram (Decreto 1003/89, de 7 de outubro de 1989). 3) Todo o pessoal militar da Prefectura naval e da inteligência que atuou nas rebeliões contra o governo constitucional na Semana Santa (1987), Monte Caseros (1987) e Villa Martelli (1988). Dentre eles Aldo Rico. Alguns deles participaram na rebelião contra ele em dezembro de 1990, sendo novamente sancionados (Decreto 1004/89, de 7 de outubro de 1989). 4) Exmembros da junta militar tenente general Leopoldo Fortunato Galtieri, almirante Jorge Isaac Anaya e brigadeiro general Basilio Arturo Ignacio Lami Dozo, condenados pelas suas responsabilidades política e estratégicomilitares na guerra das Ilhas Malvinas (Decreto 1005/89, de 7 de outubro de 1989).

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precisou da aprovação do Congresso, mas continuou enfrentando oposição de ativistas de direitos humanos. Os perdões foram introduzidos sistematicamente entre setembro de 1989 e dezembro de 1990 461 . Durante o início da década de 1990, a questão da anistia se tornou menos conflituosa e as tensões militares diminuíram, embora organizações nãogovernamentais continuaram a empenhar as cortes argentinas no seu esforço de encontrar verdade e justiça 462 . Isto contribuiu para os tribunais da verdade, onde as cortes investigavam e documentavam violações de direitos humanos, mas não processavam os envolvidos por causa das leis de anistia. Além disso, outros casos não acobertados pelas leis de anistia forma julgados, especialmente o seqüestro e ocultação de menores. Então, as cortes argentinas começaram a entender que crimes que envolvessem desaparecimentos não estavam sob a proteção das leis de anistia, uma vez que se tratava de crimes de natureza permanente, não estando, portanto, dentro do limite da Lei do Ponto Final. Finalmente, as cortes nacionais começaram a entender que as leis de anistia eram inconstitucionais. Estas decisões contribuíram para repelir as leis

5) Jorge Rafael Videla, Emilio Eduardo Massera, Orlando Ramón Agosti, Roberto Eduardo Viola e Armando Lambruschini, exmembros das juntas militares; e Juan Ramón Alberto Camps e Ovidio Pablo Riccheri, antigos chefes da polícia da Provincia de Buenos Aires. Todos eles foram condenados pela Cámara Nacional de Apelaciones en lo Criminal y Correccional Federal de la Capital Federal en 1985, nas causas iniciadas pelos decretos 158/83 e 280/84 do presidente Alfonsín. (Decreto 2741 /90, de 30 de dezembro de 1990). 6) Mario Eduardo Firmenich, chefe dos Montoneros (Decreto 2742/90, de 30 de dezembro de 1990). Estava condenado pela justiça civil durante período constitucional, após ter sido extraditado do Brasil.Como posteriormente foi requerido por outros processos teve um outro indulto, em fevereiro de 1991. 7) Norma Bremilda Kennedy, Duilio Antonio Rafael Brunello, José Alfredo Martínez de Hoz e Carlos Guillermo Suarez Mason, dentre outros (Decretos 2743 a 2746, de 30 de dezembro de 1990). Os mesmos estavam processados em diversas causas. Kennedy e Brunello foram funcionários do governo constitucional peronista em 1973/76; Martínez de Hoz foi Ministro de Economia da ditadura militar de l976/83; e Suarez Mason exchefe do primeiro Corpo do Exército, acusado de graves crimes lesivos de direitos humanos. (disponível em: http://www.nuncamas.org/document/ nacional/indulto_intro.htm consultado em 10/07/09; nota de jornal de 25/03/06 disponível em: http://www.clarin.com/diario/2006/03/25/elpais /p00402.htm consultado em 10/07/09). 461 Menem indultou a todos os agentes envolvidos, inclusive guerrilheiros do Montoneros e o Exército Revolucionário do Povo. Sobre o governo Menem: PALERMO, Vicente; NOVARO, Marcos. Política y poder en el gobierno de Menem. Buenos Aires: Flacso/Norma, 1996. 462 Vide. ABREGÚ. Martín. La Tutela Judicial del Derecho a la Verdad en la Argentina. In: Revista del Instituto Interamericano de Derechos Humanos n. 24 (JulioDiciembre 1996). San José, pp. 1147.

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de anistia, mediante sua revogação com a sanção da lei n. 24.952 463 em 25 de março de 1998, e sua anulação, com a lei n. 25.779 464 , em 21 de agosto de 2003. A decisão de anular as leis de anistia foi mantida pela Corte Suprema em 14 de junho de 2005 465 e desde então centenas de casos foram reabertos 466 . Em tal sentido cabe observar que desde a reabertura das causas até fins de 2007 foram realizados cinco julgamentos, dos quais quatro derivaram em condenações aos policiais Julio Simon, Miguel Etchecolatz, o sacerdote Christian Christian Von Wernich e a cúpula do Batallón de Inteligencia 601 do exército. O quinto não foi finalizado pela morte do imputado, o prefecto (policial naval) Héctor Febres. 467 Em 2008 começaram nove juízos no Tribunal Oral Federal de San Luis, sendo que ainda não finalizaram. Também foram realizados oito juízos orais e públicos no interior do país (Misiones, Córdoba, Corrientes, Tucumán, Neuquén, e Capital Federal) que terminaram em condenações a pessoas emblemáticas do terrorismo de estado, como os generais Antonio Domingo Bussi e Luciano Benjamín Menéndez; também a policiais e civis desconhecidos responsáveis por seqüestros e torturas 468 . Assim mesmo, cabe destacar que tem havido um aumento de pessoas processadas, 194 no ano de 2008, fazendo o total de 513. Contudo foi

463 B.O: 17abr1998 número 28879. Disponível em: http://infoleg.mecon.gov.ar/infolegInternet /anexos/5000054999/50364/norma.htm consultado em 10/07/09. 464 B.O. 03/09/03 n. 30226. Disponível em: http://infoleg.mecon.gov.ar/infolegInternet/anexos/85000 89999/88140/norma.htm consultado em 10/07/09. 465 S. 1767. XXXVIII. "Simón, Julio Héctor y otros s/ privación ilegítima de la libertad, etc. causa N° 17.768" CSJN 14/06/05 (decisão completa disponível em: http://www.derechos.org/nizkor /arg/doc/nulidad.html#S. 1767. XXXVIII. – consultado em 10/07/09. 466 No ano 2000, o CELS apresentou uma queixa penal contra os responsáveis pelo seqüestro e desaparição forçada e torturas que sofreram José Poblete e Gertrudis Hlaczik. No pedido foi afirmado que as leis de obediência devida e ponto final não deviam ser aplicadas no caso e que deviam ser declaradas nulas por contradizer disposições constitucionais e normas internacionais de direitos humanos. No dia 6 de março de 2001 o juiz Cavallo declarou a nulidade de ambas as leis, por serem contrárias à Constituição Nacional e os tratados de Direitos humanos vigentes ao momento de sua sanção. No dia 9 de novembro de 2001, essa decisão foi confirmada pela Cámara Federal, mantendo os fundamentos do juiz de primeira instância. A decisão foi recorrida, tendo atuado a Corte Suprema, que confirmou a decisão, em 14 de junho de 2005, com prévio parecer favorável dos procuradores Gerais, Becera e Righi. Vide Relatório do CELS. Disponível em: http://www.cels.org.ar/common/documentos /sintesis_fallo_csjn_caso_poblete.pdf consultado em 10/07/09. 467 Centro de Estudios Legales y Sociales (CELS): Derechos humanos en Argentina: informe 2009. Buenos Aires, 2009. Disponível em: http://cels.org.ar/common/documentos/ia09.pdf consultado em 11/07/09. 468 Centro de Estudios Legales y Sociales (CELS): Derechos humanos en Argentina: informe 2009. Buenos Aires, 2009. Disponível em http://cels.org.ar/common/documentos/ia09.pdf consultado em 11/07/09.

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observado morosidade na atuação do poder judiciário, bem como o registro de acontecimentos que evidenciam problemas de realização dos juízos, por exemplo a fuga do Tenente Coronel Julián Oscar Corres, o seqüestro de uma testemunha, Evaristo Puthod (que não foi a primeira, pois existe o registro da desaparição forçada de uma testemunha Jorge Julio Lopes, e de outro que sofreu tormentos, Luis Gerez) , o suicídio do comissário Mario Ferreyra, quando estava prestes a ser preso pela Gendarmeria, e a morte por envenenamento do prefeito Hector Febre, nas instalações da Prefeitura 469 . Também, foram registradas 30 condenações e duas absolvições, porém o número é muito baixo em função da quantidade de pessoas processadas e a idade de muitos dos acusados e dos familiares das vítimas 470 . Sem embargo, observa o CELS que: La alarmante lentitud con la que se instruyen las causas por los delitos de lesa humanidad cometidos durante la última dictadura, la ausencia de una estrategia eficiente de persecución penal y la indiferencia de la mayor parte de la corporación judicial constituyen hoy el problema central que enfrenta el proceso de verdad y justicia 471 .

Resta observar que, na oportunidade, seja no governo de transição ou etapa posterior, não foram observados processos administrativos dentro da própria força pelas violações de direitos humanos.

469 Centro de Estudios Legales y Sociales (CELS): Derechos humanos en Argentina: informe 2009. Buenos Aires, 2009. Disponível em: http://cels.org.ar/common/documentos/ia09.pdf consultado em 11/07/09. 470 Centro de Estudios Legales y Sociales (CELS): Derechos humanos en Argentina: informe 2009. Buenos Aires, 2009. Disponível em: http://cels.org.ar/common/documentos/ia09.pdf consultado em 11/07/09. 471 Centro de Estudios Legales y Sociales (CELS): Derechos humanos en Argentina : informe 2009 . Buenos Aires, 2009. Disponível em: http://cels.org.ar/common/documentos/ia09.pdf consultado em 11/07/09.

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2. Chile

2.1.Introdução

Em setembro de 1973, seguindo um rastro de violência política e crise econômica, as Forças Armadas, lideradas pelo general Augusto Pinochet Ugarte, deram início a um violento golpe de estado para derrubar do poder o governo de Salvador Allende, democraticamente eleito. As forças armadas e de segurança, mediante a Junta de Gobierno (Decreto Lei n. 1) assumiram inicialmente o poder executivo, depois o poder legislativo e finalmente o poder de estabelecer a constituição (Decreto lei n. 128) 472 . Assim foi estabelecida a suma do poder público mediante a cumulação da presidência e do comando das formas armadas, de forma tal que a administração, a criação de normas, bem como o estabelecimento do estado de exceção dependia de uma pessoa 473 . Em tal sentido, mediante o Decreto Lei n. 5, de 22 de setembro de 1973, “se declaró que el estado de sitio por conmoción interna que regía al país debía entenderse como `estado o tiempo de guerra’” 474 . No começo de 1974 foi criada a DINA, com o decretolei n. 521, a cargo do tenente coronel Manuel Contreras 475 que tinha a faculdade de deter e confinar pessoas nos seus centros de operações. No início direcionaram suas atividades contra o grupo de amigos pessoais de Allende (GAP), provocando 60 mortos, depois, contra o Movimento de Izquerda Revolucionário (MIR) com 400 mortos, contra o Partido Socialista de Chile, também com 400 mortos e contra o Partido Comunista, provocando 350 476 . Também foi responsável pelo assassinato de

472 Cfr. Informe de la Comisión Nacional de Verdad y Reconciliación, Tomo I, p. 42. 473 Cfr. Informe de la Comisión Nacional de Verdad y Reconciliación, Tomo I, p. 47. 474 Cfr. Informe de la Comisión Nacional de Verdad y Reconciliación, Tomo I, p. 60. 475 CAVALLO, Ascanio SALAZAR, Manuel SEPÚLVEDA, Óscar. La historia oculta del régimen militar. Santiago de Chile: Editorial Sudamericana, 1998, p. 5769. 476 VIAL, Gonzalo. Pinochet, La Biografía. Santiago de Chile: El Mercurio, Aguilar, 2002, p. 240249.

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Carlos Prats em Buenos Aires e de Orlando Letelier em Washington 477 . A repressão generalizada, dirigida às pessoas que o regime considerava opositoras operou até o final do governo militar, porém com graus de intensidade variáveis, bem como com distintos níveis de seletividade ao tempo de escolher suas vítimas 478 . Caracterizouse pela prática massiva e sistemática de fuzilamentos e execuções, torturas, estupros, privações de liberdade, desaparição forçadas de pessoas, dentre outras violações de direitos humanos 479 . A época mais violenta do regime foi o início: mais da metade

477 FERMANDOIS, Joaquín, Mundo y Fin de Mundo, Chile en la política mundial 19002004 . Santiago: Ediciones Universidad Católica de Chile, 2005, p.434439. Cabe observar que nesses assassinatos Contreras acusa a Pinochet de ter sido o autor intelectual. Disponível em: http://www.elmundo.es /papel/2005/05/15/mundo/1800672.html consultado em 10/07/09. 478 Cfr. Informe de la Comisión Nacional de Verdad y Reconciliación, Tomo I, p. 115. 479 Cfr. Informe de la Comisión Nacional de Verdad y Reconciliación, Primera Parte, capitulo II e Segunda Parte, pp. 15104; e Informe sobre calificación de víctimas de violaciones de derechos humanos y de la violencia política de la Corporación Nacional de Reparación y Reconciliación, p. 37 e Informe de la Comisión Nacional sobre prisión política y tortura. Vide, também, MARIANO, Nilson Cezar. Operación Cóndor Terrorismo de Estado en el Cono Sur. Buenos Aires: Ed. LohléLumen, 1998, p. 87; PAZ, A. B., LÓPEZ, M. H. PECCI, A.V. GUANES, G. G. En los Sótanos de los Generales Los Documentos Ocultos del Operativo Cóndor. Asunción: Expolibro/Servilibro, 2002, p. 187;DINGES, J. Operación Cóndor Una Década de Terrorismo Internacional en el Cono Sur . Santiago: Ediciones B Chile, 2004, p. 2223. Sobre a ditadura no Chile ver, também, ARRIAGADA, Genaro. Por la razón o la fuerza. Chile bajo Pinochet . Santiago de Chile: Sudamericana, 1998; CORREA, Raquel SUBERCASEAUX, Elizabeth. Ego Sum Pinochet . Santiago de Chile: Zig Zag, 1989. HUNEEUS, Carlos. El Régimen de Pinochet . Santiago de Chile: Sudamericana, 2000; O'SHAUGHNESSY, Hugh. Pinochet. The Politics of Torture. NY: New York University Press, 2000; SAMARONE, Lima. Los archivos de la represión: documentos, memoria y verdad (en castellano). Madrid: Siglo XXI de España Editores, 2002. WRIGHT, Thomas. State terrorism in Latin America: Chile, Argentina and international human rights. Lanhan: Rowman e Littlefield, 2007. KORNBLUH, Peter. The Pinochet File: A Declassified Dossier on Atrocity and Accountablity . NY: New Press, 2003. BOROSAGE, Robert L. MARKS, John: Los Archivos de la CIA. México: Editorial Diana, 1980. CAYUELA, José. Chile. La masacre de un pueblo. Caracas, Venezuela: Síntesis Dosmil C.A, s. d.; DAVIS, Nathaniel. Los dos últimos años de Salvador Allende . Barcelona: Plaza y Janes Editores, 1986; DINGES, John LANDAU, Saul. Asesinato en Washington. Santiago: Grupo Editorial Planeta, 1990; DOMÍNGUEZ, Andrés. El poder y los derechos humanos; Santiago: Terranova Editores S.A., 1988; GARCÍA LUPO, Rogelio. Paraguay de Stroessner ; Serie Reporter, Ediciones B, Grupo Editorial Zeta S.A., Buenos Aires, 1989; GÓMEZ ARANEDA, León. Que el pueblo juzgue . Santiago: Terranova Editores, 1988; GONZÁLEZ JANZEN, Ignacio. La Triple A . Buenos Aires: Editorial Contrapunto, 1986; HARRINGTON, Edwin; González Mónica. Bomba en una calle de Palermo . Santiago: Emisión Ltda., 1987; JORQUERA, Carlos. El Chicho Allende. Santiago: Ediciones BAT, 1990; MATUS, Alejandra ARTAZA, Francisco. Crimen en Washington D.C .; Especial diario La Nación, Santiago, maio de 1995. PINOCHET UGARTE, Augusto. Camino Recorrido. Memorias de un Soldado. Tomos I y II. Santiago: Instituto Geográfico Militar de Chile, 1991; ROJAS, María Eugenia. La represión política en Chile. Madri: Iepala Editorial, 1988; SALAZAR, Manuel. Quien, Como, Por que . Santiago: BAT Ediciones, 1994; VALDÉS, Hernán: Tejas Verdes . Espanha: Editorial Laia, 1976. VERDUGO, Patricia. Tiempo de días claros. Los desaparecidos . Santiago: Ediciones Chileamérica Cesoc, 1990. BARROS, Robert. La Junta Militar Pinochet y la Constitución 1980 . Santiago de Chile: Editorial Sudamericana, 2005; CORREA, Sofía et al. La Historia del siglo XX chileno . Santiago de Chile: Editorial Sudamericana, 2001; FERNÁNDEZ, David. La "Iglesia" que resistió a Pinochet: historia, desde la fuente oral, del Chile que no puede olvidarse . Madrid: IEPALA, 1996. HUNEEUS, Carlos. El Régimen de Pinochet . Santiago de Chile: Editorial Sudamericana, 2000. KATZ, Claude. Chile Bajo Pinochet. Barcelona: Anagrama, 1998. KORNBLUH, Peter. Pinochet: los archivos secretos. Barcelona: Crítica, 2004.

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das vítimas identificadas de execuções e desaparições forçadas ocorreram no ano de 1973 480 e mais de 60 % das detenções, qualificadas pela Comisión Nacional sobre Prisión Política y Tortura , corresponde a detenções efetuadas nesse mesmo ano 481 . Finalmente mais de 94 % das pessoas que sofreram prisão política afirmaram que tinham sido torturadas por agentes estatais 482 . A partir de dezembro de 1978 teve que enfrentar uma crise de origem externa: a operação soberania, iniciada pela ditadura argentina, que tinha por escopo ocupar militarmente as ilhas do canal de Beagle 483 e o Chile continental, o que não aconteceu em razão de que as autoridades argentinas abortaram a operação e aceitaram a mediação papal, oferecida por João Paulo II. Por sua parte, o Chile apoiou a Inglaterra no conflito das Malvinas no ano de 1982. Finalmente, a situação sobre as ilhas ficou resolvida no tratado de paz e amizade entre Chile e Argentina em 1984. Desde o início do regime os ditadores achavam que a constituição devia ser mudada, pois, segundo eles, tinha levado o país a uma situação de crise. Foi formada uma comissão, presidida pelo jurista Enrique Ortúzar, que ficou encarregada de elaborar o projeto. A constituição proposta diminuiu as faculdades do poder legislativo; reconheceu o Consejo de Seguridad Nacional, presidido pelo presidente da república; fixou em oito anos o período presidencial e estabeleceu um prazo de transição para a democracia, no qual a junta indicaria um candidato para presidir por oito anos. Para legitimar essa constituição foi convocado um plebiscito, que foi realizado em 11 de setembro de 1980, sem praticamente espaço para a oposição e sem a intervenção de tribunais eleitoral. O resultado foi de 67 % de aprovação 484 .

480 Cfr. cuadro 17 “Denuncias investigadas y víctimas declaradas por el Estado, según el año en que ocurrieron los hechos denunciados”, Anexo 1 del Informe sobre calificación de víctimas de violaciones de derechos humanos y de la violencia política de la Corporación Nacional de Reparación y Reconciliación. 481 Cfr. Informe de la Comisión Nacional sobre Prisión Política y Tortura, p. 178. 482 Cfr. Informe de la Comisión Nacional sobre Prisión Política y Tortura, p. 177. 483 Sobre o conflito, pode consultarse ARTEMIO, Luis Melo. La cuestión internacional del Canal de Beagle. Buenos Aires: Ediciones Depalma, 1979; ESCUDÉ, Carlos. La Argentina ¿paria internacional?, Buenos Aires: Editorial de Belgrano, 1984; RUSSELL, Roberto. El proceso de toma de decisiones en la política exterior argentina (19761989). In: Política exterior y toma de decisiones en América Latina. (RUSSELL, Roberto ed.). Buenos Aires: Grupo Editor Latinoamericano, 1990; SCENNA, Miguel Ángel. ArgentinaChile. Una frontera caliente. Buenos Aires: Editorial de Belgrano, 1981. 484 CAVALLO, Ascanio SALAZAR, Manuel SEPÚLVEDA, Óscar. La historia oculta del régimen militar , p. 456458.

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O governo de Pinochet permaneceu no poder até o momento da transição para a democracia, em que foi realizado um plebiscito para determinar se o candidato proposto pela junta, que era Pinochet, continuaria governando no tempo de transição, isto é até 1997. A eleição foi livremente conduzida e resultou em uma manifesta derrota de Pinochet 485 , a modificação da constituição e a determinação do chamado a eleições para o ano seguinte, em que Patricio Aylwin Azócar foi eleito como presidente, inaugurando a democracia em março de 1990.

2.2. Princípio Segundo: Comissões de verdade

Quando o Chile retornou à democracia em 1990, a nova aliança governamental de Patrício Aylwin encarou uma escolha difícil. Embora quisesse analisar os abusos cometidos, o governo temia que o julgamento de Pinochet e outros líderes da junta poderiam trazer instabilidade como ocorreu na Argentina. O presidente Aylwin, mediante o Decreto Supremo n. 355, de 25 de abril de 1990 criou a Comisión Nacional de Verdad y Reconciliación (CNVR) 486 cujo principal objetivo era contribuir ao esclarecimento global da verdade sobre as mais graves violações aos direitos humanos cometidos entre os dias 11 de setembro de 1973 e 11 de março de 1990, seja no país ou no estrangeiro, caso essas violações tivessem relação com o Estado do Chile ou com a vida política chilena 487 . Na busca da verdade a CNVR recorreu a diversos organismos vinculados aos direitos humanos, tais como Vicaría de la Solidaridad, dependente da Igreja Católica e que em 1992, passou à Fundación de Documentación y Archivo de la Vicaría de la Solidaridad . A Comissão teve como tarefas efetivas: • Establecer un cuadro, lo más completo posible, sobre los graves hechos de violación a los derechos humanos, sus antecedentes y circunstancias.

485 "Por que gano el No" en CEP N°33, verano 1989. 486 A CNVR era composta pelo advogado Raúl Rettig Guissen, como presidente; Jorge Correa Sutil, como Secretario Executivo; Jaime Castillo Velasco; José Luis Cea Egaña; Mónica Jiménez de la Jara; Ricardo Martín Díaz; Laura Novoa Vásquez; Gonzalo Vial Correa e José Zalaquett Daher, grupo este de pessoas de reconhecido prestígio e autoridade moral no país. 487 Vide, informe do Ministério do Interior. Disponível em: http://www.ddhh.gov.cl/ddhh_rettig.html consultado em 7/7/09.

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• Reunir información que permitiera individualizar a sus víctimas y establecer su suerte o paradero. • Recomendar las medidas de reparación y reivindicación que estimara de justicia, y • Recomendar las medidas legales y administrativas que a su juicio debieran adoptarse para impedir o prevenir la comisión de nuevos atropellos graves a los derechos humanos.

A Comissão limitouse a investigar, somente os casos em que houve o resultado morte ou desaparição, dentro do período em análise (11/9/73 – 11/3/90), de tal forma que não foram analisados casos em que a violação de direitos humanos não teve como efeito a morte ou desaparecimento. Assim mesmo, a Comissão foi proibida de se pronunciar sobre a responsabilidade individual de pessoas pelos fatos investigados. A Comissão, em 9 de fevereiro de 1991 apresentou os resultados de sua investigação ao Presidente da República, em três volumes, e 2.000 páginas. O informe conclui que os direitos humanos de 2.279 pessoas foram gravemente violados durante o período de 19731990, das quais 2.115 foram qualificadas como “víctimas de violación a los Derechos Humanos” e 164 como “víctimas de la violencia política”. A comissão realizou audiências em todo o país para ouvir os denunciantes. Assim mesmo recebeu as denúncias formuladas por organizações de direitos humanos, organizações sindicais, de grêmios e de diversas áreas das forças armadas e de carabineros . Assim mesmo, foram pedidos informes ao Registro Civil, Registro Electoral, Policía Internacional, Servicio Médico Legal, Archivo Nacional, etc. Cabe observar, que nos casos em que os antecedentes indicavam a possível participação de agentes das forças armadas e de segurança, foi consultado o comandantechefe ou diretor da área correspondente, que responderam: “conforme a la legislación vigente y a la reglamentación institucional respectiva, los antecedentes que pudieran haber existido sobre estos hechos, en cumplimiento de disposiciones jurídicas, habían sido incinerados o destruidos luego de transcurrido el plazo legal para hacerlo”.

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Em outras situações foi respondido que não podiam informar em razão de tratarse de serviços de inteligência ou encontrarse o agente em serviço ativo. Durante os trabalhos, a Comissão Rettig investigou três mil e quatrocentos casos de morte e conseguiu provas da maioria (menos 641 casos). Em seu relatório, a CNVR atribuiu noventa e cinco por cento dos crimes aos militares. Embora a comissão não tivesse mencionado nomes no relatório, providências foram tomadas para tornálos públicos em 2016. Logo após a submissão do relatório da CNVR ao governo, o presidente Aylwin fez um discurso apaixonado, transmitido pela TV em 04 de março de 1991, apresentando o relatório e se desculpando em nome da sociedade às vítimas dos abusos. Ao mesmo tempo solicita às forças armadas e de ordem que tiveram participação nos excessos cometidos, que façam gestos de reconhecimento da dor causada. O Presidente Patricio Aylwin expressou: Cuando fueron agentes del Estado los que ocasionaron tanto sufrimiento, y los órganos competentes del Estado no pudieron o no supieron evitarlo o sancionarlo, y tampoco hubo la necesaria reacción social para impedirlo, son el Estado y la sociedad entera los responsables, bien sea por acción o por omisión. Es la sociedad chilena la que está en deuda con las víctimas de las violaciones a los derechos humanos. (...) Por eso es que yo me atrevo, en mi calidad de Presidente de la República, a asumir la representación de la Nación entera para, en su nombre, pedir perdón a los familiares de las víctimas (...) reivindicando “pública y solemnemente la dignidad personal de las víctimas, en cuanto hayan sido denigradas por acusaciones de delitos que nunca les fueron probados y de los cuales nunca tuvieron oportunidad ni medios adecuados para defenderse” 488 . Policiais e militares rejeitaram o relatório. Assim mesmo, a Suprema Corte rejeitou o relatório, considerandoo “apaixonado, descuidado e preconceituoso”. Com uma resposta mais receptiva dos políticos, as duas Casas do Congresso unanimemente passaram uma resolução elogiando o relatório e teceram planos para a implementação das recomendações, o que implicava uma serie de reformais legais e constitucionais para habilitar a anistia e indulto por crimes

488 Disponível em: http://www.ddhh.gov.cl/historia_programa.html consultado em 7/7/90; AZOCAR, P. Aylwin. La Comisión de la Verdad y Reconciliación de Chile. In: Estudios Básicos de Derechos Humanos , tomo II (eds. A.A. Cançado Trindade y L. González Volio). San José de Costa Rica, IIDH, 1995, p. 105 119.

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cometidos por terroristas durante da ditadura. No entanto, uma série de ataques dos políticos de direita ofuscaram o relatório e encerraram a discussão sobre ele. O mais dramático foi a morte de Jaime Guzmán, senador e principal teórico do regime de Pinochet, que se opunha às reformas, menos de um mês após a divulgação do relatório 489 490 . Temendo a instabilidade, meses após a divulgação do relatório Rettig, Aylwin declarou que o período de reconciliação estava acabado. Em resposta ao relatório, o governo Aylwin iniciou uma profunda revisão das previsões legais e constitucionais chilenas sobre direitos humanos. Assim mesmo criou um serviço de ouvidoria. Em 8 de fevereiro de 1992, pela lei n. 19.123 foi criada a Corporación Nacional de Reparación y Reconciliación,(CNRR)491, com o objetivo de determinar os casos em que a CNVR conheceu em profundidade, bem como novos casos. Assim mesmo, tinha por intuito dar assistência social e legal aos familiares das vítimas. Em 28 de fevereiro a CNRR finaliza a qualificação de casos, reconhecendo que as vítimas, tanto pela CNVR, quanto pela própria CNRR ascendem a 3.195 pessoas. Em 25 de abril de 1997 o Presidente dita o Decreto Supremo n. 1005, que estabelece o Programa Continuación Ley 19.123, dependente do Ministério do Interior, sendo designado como secretário do mesmo, o advogado Alejandro González Poblete. O Programa foi direcionado para atender as necessidades dos processos judiciais em trâmite, oferecendo informações aos juízes sobre os fatos investigados. Posteriormente, a partir de 21 de agosto de 1999, no âmbito do Ministério da Defesa, foi inaugurada a Mesa de Diálogo, destinada a encontrar as

489 Sobre a morte de Guzmán, vide, Jornal El periodista. Lo que la DINA escribió sobre Jaime Guzmán. Disponivel em: http://atinachile.bligoo.com/content/view/29595/Elasesinatodelsenador JaimeGuzmanErrazuriz.html consultado em 16/07/09. Também, Historia de Chile: Biografías. Jaime Guzmán Errázuriz: 19461991 . Disponível em: http://www.biografiadechile.cl/detalle. php?IdContenido=340&IdCategoria=8&IdArea=34&status=S&TituloPagina=Historia%20de%20Chile& pos=10 consultado em 16/07/09. 490 Sobre as implicações da morte de Guzmán. Vide Escuela de Periodismo. Museo de Prensa. Asesinato de Jaime Guzmán . Disponível em: http://www.museodeprensa.cl/1991/asesinatodejaime guzmn0 consultado em 16/07/09. 491 Foi integrada pelo jurista Alejandro González Poblete, como presidente e por José Luis Cea Egaña, Jorge Correa Sutil, Carlos Andrade Geywitz, Carlos Reymond Aldunate, Rodolfo Armas Merino e Jorge Molina Valdivieso, como conselheiros, e Andrés Domínguez Vial, como secretário executivo. Informe de la Comisión Nacional de Verdad y Reconciliación, Tomo II, p. 887 a 894

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vitimas do regime militar. Nessa mesa participaram representantes das forças armadas e policiais, agrupações religiosas, culturais e sociais, além de intelectuais, científicos, advogados, bem como outros grupos defensores de direitos humanos. Como resultado dos acordos alcançados em Janeiro de 2001 as forças armadas entregaram uma listagem indicando o destino final de 200 vítimas, entre elas 180 identificados e 20 não identificados. Segundo foi consignado, essas vítimas teriam sido atiradas ao mar, em rios, lagoas, enquanto que outras se encontravam em fossas comuns em diversos pontos do país. Na ocasião o Presidente Ricardo Lagos Escobar fez entrega da informação à Corte Suprema, solicitando reforçar as instâncias judiciais para avançar na busca da verdade e esclarecer o destino dos presos desaparecidos 492 . Em 13 de novembro de 2003, foi estabelecida pelo Decreto Supremo 1.040, a Comisión Nacional sobre Prisión Política y Tortura – conhecida também como Comisión Valech – a fim de recolher antecedentes sobre pessoas que sofreram esse tipo de tratos cruéis e desumanos no período do regime. Durante seis meses elaborou um cadastro que foi entregue ao presidente a fim de que sejam formuladas políticas de reparação. Em 28 de novembro de 2004, o presidente deu a conhecer o informe elaborado pela Comissão, segundo o qual, 35.000 cidadãos chilenos declararam que foram presos e submetidos a tratamentos ilegítimos, dos quais, 28.000 foram qualificadas como vítimas pela comissão, não obstante, 7.000 casos, que não cumpriram os requisitos para ser aceitos, foram submetidos a um processo de revisão. Assim, mesmo, a Comissão observou, fez esclarecimentos sobre os lugares onde ocorreram essas práticas, bem como dos agentes, civis e militares que realizaram as práticas, além dos meios e o marco legam em que se ampararam, além de finalmente a posição dos tribunais sobre tais atos. Em junho de 2005, foi apresentado o informe complementar da Comisión Nacional de Prisión Política y Tortura , com o registro de 1.118 novas vítimas, dentre elas, 108 correspondem a menores de 18 anos e 86 delas menores de 12 anos, detidas junto aos seus pais, seqüestradas, que nasceram na prisão ou se encontravam em gestação ao momento da privação da liberdade ou das torturas das mães.

492 Disponível em: http://www.ddhh.gov.cl/mesa_dialogo.html

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2.3. Princípio Terceiro: reconhecimento do status de vítima e estabelecimento de sistema de reparações

A Comissão de Verdade e Reconciliação recomendou, dentre outras coisas, a criação de uma entidade governamental para planejar reparações às famílias dos mortos e desaparecidos 493 . A Corporación Nacional de Reparación y Reconciliación, (CNRR)494 , foi criada por lei n. 19.123 495 , em 8 de fevereiro de 1992, com o objetivo de determinar os casos em que a CNVR conheceu em profundidade, bem como novos casos. Assim mesmo, tinha por intuito “la coordinación, ejecución y promoción de las acciones necesarias para el cumplimiento de las recomendaciones contenidas en el Informe de la Comisión Nacional de Verdad y Reconciliación” 496 . A CNRR, seguindo as diretrizes da lei, estabeleceu as seguintes linhas de atuação: • Programa de Calificación de Víctimas; • Programa de Investigación del Destino Final de las Víctimas; • Programa de Atención Social y Legal a los Familiares de las Víctimas y apoyo a las Acciones de Reparación de ellos; • Programa de Educación y Promoción Cultural;

493 Sobre reconciliação ver SCHREITER, Robert J. Reconciliation: mission and ministry in a changing social order . NY: Orbis, 1992; ALDUNATE, José. Derechos humanos camino de reconciliación . Santiago: Ediciones Paulinas, 1988; MISFUD, Tony. El rostro ético de la reconciliación . Persona y Sociedad 1, 1987, p. 3546; LOVEMAN, Brian LIRA, Elizabeth. Las ardientes cenizas del olvido: via chilena de reconciliación política 19321994. Santiago: DIBAM –LOM, 2000. LOVEMAN, Brian LIRA, Elizabeth. Leyes de reconciliación en Chile: amnistías, indultos e reparaciones 1819 – 1999. Santiago: DIBAM, 2001. LOVEMAN, Brian LIRA, Elizabeth. El espejismo de la reconciliación política : Chile 19902002. Santiago: DIBAMLOM, 2002. Sobre reparação ver LOVEMAN, Brian LIRA, Elizabeth. Políticas de reparación : Chile 19902004. Santiago: Lom, 2004. Sobre verdade ver LOVEMAN, Brian LIRA, Elizabeth. Historia, política y ética de la verdad en Chile, 18912001: Reflexiones sobre la paz social y la impunidad . Santiago: LOM, 2001. 494 Foi integrada pelo jurista Alejandro González Poblete, como presidente e por José Luis Cea Egaña, Jorge Correa Sutil, Carlos Andrade Geywitz, Carlos Reymond Aldunate, Rodolfo Armas Merino e Jorge Molina Valdivieso, como conselheiros, e Andrés Domínguez Vial, como secretário executivo. 495 Cfr. Ley No. 19.123, publicada no Diario Oficial de 8 de fevereiro de 1993. 496 Cfr. artículo 1 de la Ley No. 19.123, publicada no Diario Oficial de 8 de fevereiro de 1993.

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• Programa de Estudios e Investigaciones Jurídicas y Programa del Centro de Documentación y Archivos de la Corporación.

Mediante a lei 19.123, foram estabelecidas políticas de reparações para os casos de violações de direitos humanos com resultado morte, considerando, executados políticos, detentos desaparecidos e vítimas da violência política. Assim, reconhecendo os fatos causados e a dor produzida, a lei estabeleceu pensões e diversos benefícios em educação e saúde para os cônjuges, mães e filhos das vítimas. No total foram considerados 3.195 casos, dos quais 2.772 foram vítimas de violações aos direitos humanos e 423 vítimas da violência política, entre os quais 160 são membros das forças armadas 497 . Posteriormente, em agosto de 2000, o governo reestruturou a área social do Programa Continuación Ley 19.123, com o fim de melhorar as condições de atenção a familiares das vítimas, estabelecendo convênios com organismos da rede social pública e privada para sua melhor atenção. No mês de junho de 2003, foram beneficiários da pensão de reparação 1.287 cônjuges, 1187 mães e pais, 252 mães de filhos não matrimoniais, 244 filhos e 133 filhos com algum tipo de deficiência. Assim, durante os 11 anos foram beneficiadas 5.099 pessoas 498 . Assim mesmo, a lei concedeu benefícios educacionais aos filhos, consistente no pagamento de taxas, matrículas, além de um subsídio mensal a estudantes de educação média, técnica ou universitária, até os 35 anos. Por outra parte, no ano de 1990 foi criada a Oficina Nacional del Retorno , mediante a lei n. 18.994, que tinha por objetivo facilitar a reinserção dos exilados, atendendo somente nos seus primeiros 4 anos mais de 50.000 pessoas. Assim mesmo, com o propósito de facilitar a volta, foram concedidas isenções aduaneiras para a internação de seus bens, por meio da lei n. 19.128. Também, foi estabelecido um regime especial para a habilitação de atividades profissionais e o reconhecimento dos estudos realizados no exterior, mediante a lei, 19.074. Em tal sentido foram desenvolvidos programas de financiamento e cooperação internacional para a reinserção laboral 499 .

497 Disponível em: http://www.ddhh.gov.cl/filesapp/propuesta_DDHH.pdf consultado em 7/7/09. 498 Disponível em: http://www.ddhh.gov.cl/filesapp/propuesta_DDHH.pdf consultado em 7/7/09. 499 Disponível em: http://www.ddhh.gov.cl/filesapp/propuesta_DDHH.pdf consultado em 7/7/09.

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Com relação às pessoas que foram exoneradas ou perderam os seus empregos por razões políticas durante o período do regime, foram estabelecidos benefícios de pensões não contributivas de sobrevivência e o abono de tempo por graça, mediante as leis n. 19.234 de 1993, n. 19.582, de 1998 e n. 19.881, de 2003. Dentro desse marco foram reconhecidos até 2003, 86.208 pessoas na qualidade de exoneradas, das quais 41.905 tem pensões não contributivas, 48.966 tiveram abono de tempo por graça e 1.564 são viúvas que tem pensões de sobrevivência por graça. A fim de cumprir com uma das recomendações da Comisión Nacional de Verdad y Reconciliación, foram oferecidas reparações a todas as vítimas facilitando o acesso à saúde e desenvolvidos programas de saúde mental. Assim foi criado o Programa de Reparação y Atenção Integral de Salud (PRAIS), no âmbito do Ministério de Saúde. Assim no final de 2002 foram registradas mais de 110.000 pessoas. Dessa forma, foram mitigados, em parte, os sofrimentos das vítimas e de seus familiares. 500 Por outra parte, foi reconhecido o direito à indenização a partidos políticos em razão de ter sido confiscado parte de seus bens, conforme a lei 19.568. Assim mesmo, a lei n. 19.980, em novembro de 2004 501 , modificou a lei n. 19.123, ampliando os benefícios reconhecidos nessa lei, em favor de familiares de vítimas executadas ou presos desaparecidos. Dentre os benefícios concedidos, cabe destacar o Bono único de reparação aos filhos que não perceberam pensão de reparação e a concessão de 200 pensões de graça a famílias em situações especiais estabelecidas na lei. Em função do informe apresentado pela Comisión Nacional sobre Prisión Política y Tortura, em 24 de dezembro de 2004 foi publicada a lei. n. 19.992 que estabelece pensão de reparação e concede benefícios de educação, saúde e moradia em favor daquelas pessoas que foram qualificadas como vítimas da prisão e da tortura por motivos políticos, cometidas por agentes do estado 502 .

500 Disponível em: http://www.ddhh.gov.cl/filesapp/propuesta_DDHH.pdf consultado em 7/7/09. 501 Cfr. Lei n. 19.980 publicada no Diario Oficial em 29 de octubro de 2004. 502 Cfr. Informe da Comisión Nacional sobre prisión política y tortura.

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Em 2005 foram definidos os procedimentos a serem seguidos para a concessão dos benefícios estabelecidos pelas leis n. 19.980 e n. 19.992, restando o seu cumprimento.

2.4. Princípios Primeiro e Quarto: perseguição de violações de direitos humanos e implementação de procedimentos administrativos

2.4.1. Anistia e julgamentos

Durante o período de larga violação aos direitos humanos pelas Forças Armadas, Pinochet introduziu em 18 de abril de 1978 uma lei de anistia, mediante o decreto lei n. 2.191 503 .

503 “Considerando: 1° La tranquilidad general, la paz y el orden de que disfruta actualmente todo el país, en términos tales, que la conmoción interna ha sido superada, haciendo posible poner fin al Estado de Sitio y al toque de queda en todo el territorio nacional; 2° El imperativo ético que ordena llevar a cabo todos los esfuerzos conducentes a fortalecer los vínculos que unen a la nación chilena, dejando atrás odiosidades hoy carentes de sentido, y fomentando todas las iniciativas que consoliden la reunificación de los chilenos; 3° La necesidad de una férrea unidad nacional que respalde el avance hacia la nueva institucionalidad que debe regir los destinos de Chile. La Junta de Gobierno ha acordado dictar el siguiente Decreto ley: Artículo 1° Concédese amnistía a todas las personas que, en calidad de autores, cómplices o encubridores hayan incurrido en hechos delictuosos, durante la vigencia de la situación de Estado de Sitio, comprendida entre el 11 de Septiembre de 1973 y el 10 de Marzo de 1978, siempre que no se encuentren actualmente sometidas a proceso o condenadas. Artículo 2° Amnistíase, asimismo, a las personas que a la fecha de vigencia del presente decreto ley se encuentren condenadas por tribunales militares, con posterioridad al 11 de septiembre de 1973. Artículo 3° No quedarán comprendidas en la amnistía a que se refiere el artículo 1°, las personas respecto de las cuales hubiere acción penal vigente en su contra por los delitos de parricidio, infanticidio, robo con fuerza en las cosas, o con violencia o intimidación en las personas, elaboración o tráfico de estupefacientes, sustracción de menores de edad, corrupción de menores, incendios y otros estragos; violación, estupro, incesto, manejo en estado de ebriedad, malversación de caudales o efectos públicos, fraudes y exacciones ilegales, estafas y otros engaños, abusos deshonestos, delitos contemplados en el decreto ley número 280, de 1974, y sus posteriores modificaciones; cohecho, fraude y contrabando aduanero y delitos previstos en el Código Tributario. Artículo 4° Tampoco serán favorecidas con la aplicación del artículo 1°, las personas que aparecieren responsables, sea en calidad de autores, cómplices o encubridores, de los hechos que se investigan en proceso rol N° 19278 del Juzgado Militar de Santiago, Fiscalía Ad Hoc. Artículo 5° Las personas favorecidas por el presente decreto ley, que se encuentren fuera del territorio de la República, deberán someterse a lo dispuesto en el artículo 3° del decreto ley N° 81, de 1973, para reingresar al país”.

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Com relação à lei de anistia, cabe observar que foram apresentados diversos projetos. De uma parte procuravase que a lei fosse interpretada de tal forma que não fosse aplicável aos crimes de lesa humanidade, em razão do seu caráter inanistiável e imprescritível 504 , ou que se reconhecesse o direito a saber a verdade, mesmo que não estabelecessem responsabilidades ou punições 505 . Outro pretendia ampliar o período de vigência do decretolei 506 . Por outra parte, pretendiase impedir que se iniciassem processos em razão de reconhecer a extinção da ação penal ou civil 507 . Finalmente, foi apresentado um projeto destinado a reconhecer a nulidade do decretolei 508 . Entretanto o decreto lei foi aplicado sistematicamente pelo poder judicial 509 .

504 Cfr. boletín No. 65407, presentado el 7 de abril 1992 por los senadores Rolando Calderón Aránguiz, Jaime Gazmuri Mujica, Ricardo Núñez Muñoz y Hernán Vodanovic Schnake; Boletín No. 171807, presentado el 11 de octubre de 1995 por los senadores Ruiz de Giorgio y Mariano Ruiz Esquide. 505 Cfr. boletín n. 165707, apresentado no dia 19 de julho de 1995 pelos senadores Diez, Larraín, Otero e Piñera. 506 Cfr. boletín n. 1.62207, apresentado no dia 6 de junho 1995 pelo senador Sebastián Piñera Echenique. 507 Cfr. boletín n. 163207, apresentado no día 14 de junho 1995 pelo senador Francisco Javier Errazuriz. 508 Cfr. boletín n. 416207, apresentado no dia 21 de abril de 2006 pelos senadores Girardi, Letelier, Navarro e RuizEsquide. 509 Cfr. Corte de Apelaciones de Santiago, Recurso de Apelación Rol No. 3868394 de 30 de septiembre de 1994 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 483 a 495); Corte Suprema, Recurso de Casación Rol No. 383197 de 8 de junio de 1998 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 186 a 196); Corte Suprema, Recurso de Casación Rol No. 46998 de 9 de septiembre de 1998 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 364 a 380); Corte Suprema, Recurso de Casación Rol No. 20971998 de 29 de diciembre de 1998 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 299 a 305); Corte Suprema, Recurso de Casación Rol No. 24798 de 7 de enero de 1999 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 197 a 206); Corte Suprema, Recurso de Casación Rol No. 1359–2001 de 26 de agosto de 2002 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 220 a 234); Corte Suprema, Recurso de Casación Rol No. 41352001 de 29 de noviembre de 2002 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 207 a 219); Corte Suprema, Recurso de Casación Rol No. 40542001 de 31 de enero de 2003 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 272 a 283); Corte Suprema, Recurso de Casación Rol No. 40532001 de 31 de enero de 2003 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 253 a 271); Corte Suprema, Recurso de Casación Rol No. 420901 de 3 de marzo de 2003 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 284 a 298); Corte Suprema, Recurso de Casación Rol No. 223101 de 28 de agosto de 2003 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 235 a 252); Corte Suprema, Recurso de Casación Rol No. 11342002 de 4 de noviembre de 2003 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 306 a 316); Corte Suprema, Recurso de Casación Rol No. 25052002 de 11 de noviembre de 2003 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 317 a 324); Corte de Apelaciones de Santiago, Recurso de Apelación Rol No. 118212003, de 5 de enero de 2004 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 443 a 475); Corte Suprema, Recurso de Casación, Rol No. 4572005, de 9 de febrero de 2005 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 424 a 437); Corte Suprema, Recurso de Casación Rol No. 46222002, de 29 de marzo de 2005 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 325 a 339); Corte de Apelaciones de Santiago, Recurso de Revisión Rol No.

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A anistia foi garantida a todas as pessoas que, como autores ou partícipes, cometeram crimes durante o período de estado de sítio, entre 11 de setembro de 1973 e 10 de março de 1978. O presidente Alwyn se empenhou em repelir a lei de 1978 após sua posse. Mas nada pôde fazer sobre isso diante da forte oposição das forças armadas da qual Pinochet ainda era o comandante, e tendo apenas uma minoria no Senado. A CNVR investigou os casos resultantes em morte e, deles descobriu que apenas quatro por cento das violações aos direitos humanos por ela averiguados e documentados foram cometidos por subversivo, demonstrando a falácia do governo militar ao declarar que a lei de 1978 era um instrumento de mútuo perdão. Em 1998, as audiências no Reino Unido sobre a possibilidade ou não de se extraditar Pinochet para ser julgado por crimes contra os direitos humanos na Espanha renovou os esforços para que houvesse julgamentos no Chile. O processo foi fortalecido pela decisão da Suprema Corte chilena, em 1999, que declarou que desaparecimentos são crimes permanentes e, portanto, não alcançados pela lei de anistia. Mais recentemente, em agosto de 2003, o então presidente Lagos anunciou novas proposições sobre crimes passados, inclusive a possível anistia de quem ainda não estivesse sendo investigado ou julgado e que voluntariamente se apresentasse perante os tribunais chilenos para fornecer informações sobre o paradeiro de vítimas ou esclarecesse circunstâncias de seu

157652004, de 6 de julio de 2005 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 438 a 442); Corte Suprema, Rol No. 3925 2005, de 5 de septiembre de 2005 (expediente de documentos presentados en la Audiencia Pública, folios 390 a 423); Corte de Apelaciones de Santiago, Recurso de Apelación Rol No. 37483–2004, resolución 8472, dictada por la Secretaria Criminal, de 18 de enero de 2006 (expediente de anexos a los alegatos finales escritos del Estado, Anexo 4, Tomo II, folios 4170 a 4179); Corte de Apelaciones de Santiago, Recurso de Apelación Rol No. 24471–2005, resolución 43710, dictada por la Secretaría Criminal, 20 de abril de 2006 (expediente de fondo, Tomo IV, folios 1089 a 1093); Corte Suprema, Recurso de Queja Rol No. 396– 2006, Resolución 9334, dictada por la Secretaría Única, de 8 de mayo de 2006 (expediente de fondo, Tomo IV, folios 1094 y 1095); Corte Suprema, Recurso de Casación Rol No. 32152005, Resolución 11745, dictada por la Secretaría Única, de 30 de mayo de 2006 (expediente de fondo, Tomo IV, folios 1157 a 1159); Corte de Apelaciones de Santiago, Rol No. 145672004, Resolución 64656, dictada por la Secretaría Criminal, de 2 de junio de 2006 (expediente de fondo, Tomo IV, folios 1160 y 1161); Corte de Apelaciones de Santiago, Rol No. 140582004, Resolución 74986, dictada por la Secretaria Criminal, de 27 de junio de 2006 (expediente de fondo, Tomo IV, folios 1263 a 1270); Corte de Apelaciones de Santiago, Rol No. 323652005, Resolución 76786, dictada por la Secretaria Criminal, de 29 de junio de 2006.

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desaparecimento ou morte e a possível imunidade para militares que alegassem estar cumprindo ordens. A imunidade oferecida neste plano diferese da antiga concessão de anistia, pois no lugar de ser incondicional, requeria do ofensor a verdade, e excluía agentes que dirigiram, planejaram, ordenaram ou executaram sistemáticas violações aos direitos humanos. Além disso, embora estas propostas significassem que os ofensores poderiam escapar da punição por seus crimes, elas diferiam da lei de anistia porque seu objetivo era de descobrir a verdade, e não de escondêla. O objetivo foi depois desenvolvido com o estabelecimento da Comissão Nacional de Prisão Política e Tortura em agosto de 2003, não obstante, uma lei subseqüente proibiu às cortes de ter acesso aos depoimentos de testemunhas por cinqüenta anos, embora cada testemunha estivesse livre para tornar suas declarações públicas ou submetêlos à Corte se assim o quisesse. Os planos de Lagos não incluíam a anulação da Lei de 1978; no entanto, eles permitiam às cortes continuar a decidir sobre a aplicabilidade ou não da lei de anistia. Em janeiro de 2005, a Suprema Corte chilena apresentou uma resolução que dava aos juízes apenas seis meses para que concluíssem as investigações acerca de abusos cometidos pela ditadura militar chilena. Justificando a instrução para que encerrassem os casos, a Corte citou normas internacionais que davam ao acusado o direito de ser julgado em um período razoável de tempo. As ações para anular a anistia chilena ganharam força nos recentes anos, particularmente após o julgamento do caso AlmonacidArellano pela Corte Interamericana de Direitos Humanos 510 . Nesta decisão, a Corte declarou que a autoanistia da junta chilena violava a Convenção Americana de Direitos Humanos por garantir impunidade por crimes contra a humanidade, e conseqüentemente as autoridades chilenas tinham que anular a legislação que contrariasse a Convenção. Resta observar que em recentes casos, as cortes chilenas vêm se utilizando do status dado aos tratados internacionais pela Constituição para

510 Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_154_esp.doc consultado em 05/07/09.

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argumentar que as obrigações internacionais sobre direitos humanos possuem um status maior do que leis domésticas para justificar uma recusa em aplicar a anistia. Cabe observar que durante o regime militar a Corte Suprema do Chile entendia como regra geral a aplicação do decretolei de anistia, a partir do momento em que se advertia que o fato investigado tinha caráter de delito compreendido no período abrangido pelo decreto 511 . A partir de setembro de 1998, no caso Poblete e Córdoba , foi estabelecido que para aplicar a lei de anistia devia investigarse e determinar o responsável, e só depois seria possível extinguir a pena. Em 7 de janeiro de 1999, na causa contra Gómez Segovia, no caso de presos desaparecidos não seria possível aplicar o decretolei na medida em que o crime de seqüestro qualificado ou a detenção ilegal tratase de um delito permanente e como tal transcende o período determinado pelo mesmo. Em suma, a anistia não pode ser aplicada ao delito que permanece no tempo. Assim mesmo, na sentença da Sala Penal da Corte Suprema de 17 de novembro de 2004, agregase como elemento a aplicação e reconhecimento de que os fatos desse período aconteceram em um estado de guerra que tornava aplicável os Convênios de Genebra, de 1948: assim reconhece explicitamente que havia um estado de guerra no ano 1973. Finalmente, na sentença da Sala Penal de 4 de agosto de 2005, no caso do Coronel Rivera [] acolhe o entendimento do direito internacional utilizando o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem, e ao mesmo tempo o direito consuetudinário e os princípios de jus cogens. Admite que não havia guerra, razão pela qual não seria aplicável a Convenção de Genebra. Por outra parte, reconhece a aplicação das normas internacionais nos casos de delitos permanentes, porém, também, ao mesmo tempo o instituto da prescrição. No julgamento da Corte Interamericana sobre Direitos Humanos

511 Informe pericial ante Corte Interamericana de Derechos Humanos, sobre aplicación jurisprudencial de decreto ley 2191 de amnistía, de fecha 19 de abril de 1978 Ius et praxis Núm. 121, Enero 2006 Prof. Dr. Jean Pierre Matus A. (Disponível em:http://cl.vlex.com/vid/pericialjurisprudencialdecreto amnistiafecha43411024 consultado em 06/07/09).

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no caso Almonacid Arellano y otros contra Chile 512 , a Corte concluiu que: “2. El Estado incumplió sus obligaciones derivadas de los artículos 1.1 y 2 de la Convención Americana sobre Derechos Humanos, y violó los derechos consagrados en los artículos 8.1 y 25 de dicho tratado, en perjuicio de la señora Elvira del Rosario Gómez Olivares y de los señores Alfredo, Alexis y José Luis Almonacid Gómez, en los términos de los párrafos 86 a 133 de la presente Sentencia. 3. Al pretender amnistiar a los responsables de delitos de lesa humanidad, el Decreto Ley No. 2.191 es incompatible con la Convención Americana y, por tanto, carece de efectos jurídicos, a la luz de dicho tratado.” 513

Assim, na decisão foi observado a nãoaplicabilidade de leis limitadoras no que se refere a crimes contra a humanidade. Segundo a Corte, limitações nesses casos violam a Convenção, uma vez que a mesma não pode deixar de ser aplicada nos crimes contra a humanidade, sendo, assim mesmo essas normas parte do jus cogens que a torna obrigatória, ainda para os países que não ratificaram o tratado. Em tal sentido esclareceu que as leis de autoanistia: conducen a la indefensión de las víctimas y a la perpetuación de la impunidad de los crímenes de lesa humanidad, por lo que son manifiestamente incompatibles con la letra y el espíritu de la Convención Americana e indudablemente afectan derechos consagrados en ella. Ello constituye per se una violación de la Convención y genera responsabilidad internacional del Estado. En consecuencia, dada su naturaleza, el Decreto Ley n. 2191 carece de efectos jurídicos y no puede seguir representando un obstáculo para la investigación de los hechos que constituyen este caso, ni para la identificación y el castigo de los responsables, ni puede tener igual o similar impacto respecto de otros casos de violación de los derechos consagrados en la Convención Americana acontecidos en Chile (párr. 118).

Cabe observar que nesse caso foi seguida a doutrina estabelecida no caso Barrios Alto, quando manifestou o seguinte: "Como consecuencia de la manifiesta incompatibilidad entre las leyes de autoamnistía y la Convención Americana sobre Derechos Humanos, las mencionadas leyes carecen de efectos jurídicos y no pueden seguir representando un obstáculo para la investigación de los hechos (...) ni para la identificación y el castigo de los responsables(...)" (párr 44).

512 Corte Interamericana de Derechos Humanos. Caso Almonacid Arellano y otros Vs. Chile. Sentencia de 26 de septiembre de 2006. Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/ seriec_154_esp.pdf consultado em 24/07/09. 513 Idem, p 65.

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A partir desse momento, a jurisprudência gradativamente foi afastando a aplicação desse decreto. Assim, o poder judiciário no Chile abriu várias investigações e chegou a condenar criminalmente o diretor da DINA. Todavia, a aplicação da lei de anistia ficava a cargo da discrecionalidade do juiz. Cabe observar que a prisão de Pinochet em Londres em 1998, no entanto, foi instrumental na instigação de uma onda de novos casos acerca dos abusos cometidos na era Pinochet. Quando Pinochet retornou ao Chile no inverno de 2000, ele estava destinado a passar o resto da vida em batalhas legais. Em dezembro de 2006, a Corte Suprema considerou que os crimes de lesa humanidade não prescrevem, razão pela qual deveriam ser julgados. Assim condenou a dois expoliciais pela morte de dois estudantes em 1973. Observou que: ''Como lo ha señalado la Comisión Interamericana de Derechos Humanos, la violación de estas normas afecta gravemente la conciencia moral de la humanidad y obliga, a diferencia del Derecho Consuetudinario tradicional, a la comunidad internacional como un todo, independientemente de su rechazo, reconocimiento o aquiescencia” Assim mesmo entendeu que deviam prevalecer os Convênios do direito humanitário internacional, uma vez que se tratou de uma guerra interna, que exigia a partir do decreto de 12 de setembro de 1973, a aplicação preponderante da Convenção de Genebra (que regulamenta o trato humanitário aos prisioneiros) sobre a lei de anistia 514 . Ao final de 2007, centenas de oficiais aposentados estavam ou na cadeia ou sendo acusados e centenas de outros casos estavam sendo processados na Justiça. No plano operacional, resta referenciar que a partir de 2001, a Corte Suprema designou diversos juízes, com dedicação exclusiva para investigar casos de presos desaparecidos com base nas informações colhidas pelas comissões.

514 Disponível em: http://www.lanacion.cl/prontus_ oticias/site/artic/20070314/pags/200703142 3015 html consultado em 07.07.2009.

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Destaquese que, na oportunidade, seja no governo de transição ou etapa posterior, não foram observados processos administrativos dentro da própria força pelas violações de direitos humanos.

2.5. Quinto princípio: preservação da memória histórica

Em tal sentido cabe observar que o estado tem construído diversos memoriais em homenagem as vítimas de violações aos direitos humanos 515 .

Em tal sentido cabe destacar que recentemente, no dia 9 de novembro de 2008, foi inaugurado o memorial construído em favor de Jaime Guzmán Errazúriz, senador de direito que teve participação ativa da ditadura, assessorando a Pinochet 516 .

515 Vide. Programa de direitos humanos do Ministerio do Interior. Disponível em http://www.ddhh.gov.cl/memoriales_region.html consultado em 07/09/09. As obras de reparação simbólica se encontram por tudo o território nacional. O Relatório pode ser consultado no site referenciado. Também, Memoriales de Derechos Humanos en Chile. Homenaje a las víctimas de violaciones de derechos humanos entre 1973 y 1990. Programa de Gobernabilidad. Santiago de Chile: Facultad Latinoamericana de Ciencias Sociales, FLACSOChile. ACUÑA, María Elena – BUSTAMANTE, Javiera – HORNAZÁBAL, Daniela. Informe Estudio de Cassos sobre Memoriales Instalados en Chile en Homenaje a las Víctimas de las Violaciones a los Derechos Humanos entre 19731990. 516 Biblioteca Nacional de Chile – BCN. Jaime Guzmán a 17 años de su muerte. 10 de noviembre 2008. Disponível em: http://www.bcn.cl/carpeta_temas_profundidad/jaimeguzman17anosdesu muerte consultado em 7/7/09.

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3. Paraguai

3.1. Introdução

O general Alfredo Stroessner, em maio de 1954, encabeçou o golpe militar contra o então presidente Federico Chaves 517 . Logo a Junta do partido Colorado o elegeu candidato a presidente e assim, em 11 de julho de 1954, foi eleito, assumindo a presidência em 15 de agosto do mesmo ano. Já no poder, foi eleito em eleições como único candidato em 1958, 1963, 1968, 1973, 1978, 1983 e 1988. Stroessner decretou sistematicamente o estado de sitio, durante o tempo em que exerceu o poder 518 , ao tempo que perseguiu e reprimiu aos opositores do regime. Cabe observar que a Corte Suprema de Justicia , interpretou que os detidos pelo Poder Executivo, em razão do estado de sítio não tinham direito ao habeas corpus . Por outra parte, estendeu sua aplicação territorial estabelecendo que quando estava vigente somente em Asunción , os detentos de outras partes do país, podiam sofrer também o estado de sítio se eram trasladados à capital. Assim o estado de sítio, junto com a falta de controle judicial e os amplos poderes da polícia, constituía o marco para as violações de direitos humanos.

517 Sobre a ditadura e a figura de Alfredo Stroessner, vide: LEZCANO, Carlos María. El régimen militar de Alfredo Stroessner; Fuerzas Armadas y politica en Paraguay, 19541989. Asunción, Grupo de Ciencias Sociales (GCS), 1989.(documento de trabajo, 1); CHIAVENATTO, Julio Jose. Stroessner: o retrato de uma ditadura . São Paulo: Brasiliense, 1980. 518 A Constituição de 1940 permitia sua declaração por parte do presidente da república, devendo comunicar à Câmara de Representantes em caso de sobrevir: "alguna amenaza grave de perturbación interior o conflicto exterior que pueda poner en peligro el ejercicio de esta Constitución y las autoridades creadas por ella" (art. 52). O estado de sitio permitia ordenar o detenção de pessoas suspeitas, transladálas de um lugar a outro do país, dando opção de exílio. Na Constituição de 1967, o presidente era autorizado a decretar o estado de sitio em caso de "conflicto o guerra internacional, de invasión exterior, de conmoción” e também durante sua vigência se podia “detener a las personas indicadas de participar en alguno de esos hechos, o trasladarlas de un punto a otro de la República, y prohibir reuniones” (arts. 79 e 181).

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Assim mesmo, estabeleceu a lei n. 294 de la Defensa de la Democracia , de17 de outubro de 1955 519 , e a lei n. 209 de la Defensa de la Paz Pública e Libertad de las Personas , de 15 de setembro de 1970 520 521 . Inicialmente, realizou uma dura repressão dentro do próprio partido colorado e no exército, a fim de contar com um exército sólido e um governo estável. Posteriormente, começa a desenvolver o seu regime, exigindo a filiação obrigatória no seu partido para trabalhar no governo, a divisão das associações e organizações estudantis. Em 1962, elimina as guerras de guerrilhas, encabeçadas pelo PCP (Partido Comunista Paraguayo), o PL (Partido Liberal) e o PRF (Partido Revolucionario Febrerista). Assim mesmo começou com obras que garantiam popularidade 522 . Esse modelo de ditadura caracterizouse pelo permanente estado de sítio porque a constituição dava poderes para o executivo renoválo a cada 90 dias. O estado de insegurança e medo era muito grande e havia uma prática sistemática de detenções arbitrárias e aprisionamentos prolongados sem julgamento, tortura, tratamentos cruéis e degradantes, mortes durante torturas e

519 Na primeira parte “castiga a los que se alzaren con mano armada contra los poderes constituidos para suplantar total o parcialmente la organización democrática republicana de la nación, por el sistema comunista o cualquier otro régimen totalitario” (art. 1) Na segunda parte, estabelecida que “Serán reprimidos con la pena de seis meses a cinco años de penitenciaría: 1) los que difundieren la doctrina comunista o cualesquiera otras doctrinas o sistemas que se propongan destruir o cambiar por la violencia la organización democrática republicana de la Nación. 2) Los que organizaren, constituyeren o dirigieren asociaciones o entidades que tengan por objeto visible u oculto cometer el delito previsto en el inciso precedente. (art. 2º) Tampouco para esta lei havia habeas corpus, nem recurso legal que mitigasse os seus efeitos. 520 A lei 209/70 considerava como crime o “odio entre los paraguayos”, “la lucha de clases”, “apología del crimen o de la violencia” (art. 4) que já estavam presentes na Constituição de 1967. Esta lei começou a ser sistematicamente aplicada a partir de 1975. 521 Vide ACUÑA, Edith, In : El Precio de la Paz . (Blanch, José María coord.) Asunción: CEPAG, 1991, p. 333. 522 Em 1963 já estavam praticamente esgotadas as forças de resistência da sociedade civil, tendo em vista que o movimento guerrilheiro foi vencido seus participantes mortos, presos ou exilados. Igualmente foram eliminados os dirigentes dos partidos Liberal e Febrerista. Posteriormente o Partido Liberal sob o nome de Renovação Liberal voltou a participar, bem como o Febrista, com a restrição de dirigentes e nomes históricos do partido. Essa participação da oposição deu uma certa legitimidade ao processo político dando uma aparência de democrático, apesar de manterse como uma das mais cruéis ditaduras latinoamericanas. MORAES, Ceres. Paraguai: a consolidação da ditadura Stroessner 19541963 . Coleção História 34. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000. Sobre a dominação stronista ver também YORE, Fátima. La dominación stronista: Orígenes e consolidación. Seguridad nacional y represión . Asunción: Base ECTA, 1992. É importante destacar o apoio que o regime teve do governo brasileiro, tanto indireto, uma vez que vez investimentos em vários campos, como direto ao solicitar que os países vizinhos não permitissem que os exilados fizessem grupos guerrilheiros em seus territórios e principalmente quando forneceu aviões e munição para que o governo combatesse os guerrilheiros (MORAES, Ceres. Paraguai: a consolidação da ditadura Stroessner 19541963, p. 105106).

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assassinato político de subversivos. Durante esse regime as cortes recusavamse a receber habeas corpus relacionados a medidas decretadas pelo poder executivo durante o estado de sítio. As garantias judiciais de fato eram ineficazes e promoviam uma generalizada impunidade com relação a violações de direitos humanos i . Em 1963 Stroessner é reeleito e ante a impossibilidade de concorrer por um novo mandato acorda em troca de uma nova constituição que permitisse sua reeleição, a participação de pequenos partidos nas eleições, excluindo o PCP e o PDC. Em 1967, foi apresentada a nova constituição que contou com a aprovação dos demais partidos políticos, autorizando a reeleição por mais 10 anos (art. 173), legitimando as aspirações do presidente, ao tempo que concentrava o poder no executivo 523 . Em 1977, novamente Stroessner conseguiu alterar a constituição para autorizar sua reeleição 524 . O estado de sitio deixou de ser decretado em agosto de 1987, por conta da pressão internacional, em especial pela resolução especial para O Paraguai n. 28/83, emitida pela Comissão de Direitos Humanos, bem como o trâmite do procedimento n. 503 no âmbito da Subcomissão e da Comissão de Nações Unidas 525 . No dia 3 de fevereiro de 1989, Stroessner foi deposto em um golpe militar encabeçado pelo general Andrés Rodríguez, quem convocou as eleições para o dia 1 de maio, e anunciou a legalização de todos os partidos, com exceção do comunista. Apresentouse às eleições e ganhando com grande apoio (74 %), confirmou o exercício do poder na presidência. Em Julho de 1992, foi estabelecida uma nova constituição, que estabeleceu um sistema democrático de governo, ao tempo que aperfeiçoava a proteção dos direitos humanos.

523 Na constituição existia uma separação de poderes meramente formal, segundo a qual havia um predomínio forte do Poder Executivo, pois ficava autorizado a dissolver o Congresso "por hechos graves que le sean imputables y que pongan en peligro el equilibrio de los Poderes del Estado" (art. 182), não tendo nenhum artigo que autorizasse o Congresso a destituir ao presidente. 524 Vide reportagem disponível em: http://victorian.fortunecity.com/russell/634/reportajes/r7/index.htm consultado em 6/7/09. 525 Vide Informe da Liga Internacional de Derechos del Hombre, após a visita ao Paraguai em 1977, apresentada à Comissão de Direitos Humanos de Nações Unidas.

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Em maio de 1993, Juan Carlos Wasmosy foi escolhido presidente, em eleições consideradas justas e livres por observadores internacionais, sendo o primeiro presidente civil do Paraguai em quase 40 anos. O resultado dos 35 anos de ditadura foram mais de 4.000. opositores assassinados, 360.000 presos políticos e um milhão e meio de exilados526 .

3.2. Princípio Segundo: Comissões de verdade

Desde que a ditadura de Stroessner foi derrubada em 1989 e a democratização se seguiu no início dos anos 1990, o esforço de se conseguir a análise dos abusos cometidos foi um longo e lento processo. Em tal sentido, cabe observar que o Comité de Iglesias para Ayudas de Emergencia (CIPAE) em 1984 realizou a sistematização das informações que se obtinham sobre a violência no Paraguai. O resultado das investigações foi publicado a partir de maio de 1990, em quatro volumes sob o título de “Paraguay: Nunca Más”. No informe são registrados numerosos fatos de violação aos direitos humanos, indicando que aproximadamente 360 mil pessoas passaram pelos cárceres de Stroessner e que um milhão e meio de pessoas foram obrigadas ao exílio 527 . A lei 2.225, estabeleceu, em outubro de 2003, a Comisión de Verdad y Justicia (CVJ). Os nove membros da Comissão, sob a presidência de Mons. Mário Melanio Medida, receberam um mandato para examinar violações aos direitos humanos cometidos de 1954 a 2003 particularmente os praticados pela ditadura Stroessner de 1954 a 1989 528 .

526 Vide jornal disponível em: http://www.surysur.net/?q=node/10467 consultado em 6/7/09. 527 CIPAE, "Paraguay Nunca Más" , p. 212. 528 Ley Nº 2225 POR LA CUAL SE CREA LA COMISION DE VERDAD Y JUSTICIA Artículo 1º. Créase la Comisión de Verdad y de Justicia en adelante "La Comisión", la que tendrá a su cargo investigar hechos que constituyen o pudieran constituir violaciones a los derechos humanos cometidos por agentes estatales o paraestatales entre mayo de 1954 hasta la promulgación de la Ley, y recomendar la adopción de medidas para evitar que aquéllos se repitan, para consolidar un estado democrático y social de derecho con plena vigencia de los derechos humanos y para fomentar una cultura de paz, de solidaridad y de concordancia entre paraguayos.

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A Comissão tinha por objetivos: Artículo 2º. a) analizar e investigar las condiciones políticas, sociales y culturales, así como los comportamientos que, desde las distintas instituciones del Estado y otras organizaciones contribuyen a las graves violaciones de los derechos humanos. b) colaborar con los órganos pertinentes en el esclarecimiento de las violaciones de los derechos humanos ejecutados por agentes estatales y paraestatales. c) preservar la memoria y testimonio de las víctimas, procurando determinar el paradero y situación de los afectados por estas violaciones e identificar en la medida de lo posible a los victimarios. d) preservar las pruebas de las violaciones a los derechos humanos. e) aportar todos los elementos probatorios al Poder Judicial para que el sistema de justicia actúe de inmediato en procura de precautelar los derechos de las víctimas y evitar la impunidad de los responsables de tales violaciones. f) contribuir a esclarecer la verdad de manera oficial, lo que implica establecer moral y políticamente la responsabilidad del Estado. g) contribuir a esclarecer la vinculación de violaciones de los derechos humanos con políticas autoritarias estatales, nacionales e internacionales. h) recomendar cursos de acción y reformas institucionales, legales, educativas y de otro tipo, como garantías de prevención, a fin de que sean procesadas y atendidas por medio de iniciativas legislativas, políticas o administrativas. i) elaborar propuestas de reparación y reivindicación de las víctimas de las violaciones de los derechos humanos, las que servirán de base para las medidas que se adopten para su instrumentación. j) elaborar un informe final oficial de todas las investigaciones y propuestas realizadas durante el período investigado 529 .

Quando a CVJ foi formalmente estabelecida, em junho de 2004, era esperado que a investigação contribuísse para futuros processos. Embora estivesse designada para trabalhar por 18 meses, o Parlamento subseqüentemente foi lento em providenciar o necessário à CVJ e ao final do prazo só havia feito metade do que se esperava. Como resultado, a Comissão continuou a trabalhar até

Artículo 3º. La Comisión aplicará las reglas de debido proceso en sus investigaciones. La Comisión enfocará su trabajo sobre los casos de violaciones de derechos humanos ocurridos en el período mayo de 1954 hasta la promulgación de la Ley en especial sobre: a) desapariciones forzadas. b) ejecuciones extrajudiciales. c) torturas y otras lesiones graves. d) exilios. e) otras graves violaciones de derechos humanos.” (Disponível em: http://www.usip.org/files/file/resources/collections/commi ssions/ParaguayCharter.pdf consultado em 6/7/209). 529 Disponível em: http://www.usip.org/files/file/resources/collections/commissions/ParaguayCharter .pdf consultado em 6/7/209.

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o fim de 2007, apresentando um relatório parcial em 2006 530 e o relatório final em agosto de 2008. Como em meados de 2007, 1350 testemunhos foram coletados pela CVJ, que estava no processo de investigar mais quatrocentos casos de três a quatro mil casos de pessoas mortas pelo regime de Stroessner, de acordo com cálculos de grupos de direitos humanos. A comissão teve por objetivo investigar, resgatar os restos humanos para propor o estudo antropológico e genético das pessoas, a fim de determinar a identidade dos restos e entregar aos familiares 531 . A CVJ no seu informe final estabeleceu em 20.090 as vítimas totais diretas de violações de direitos humanos entre 1954 e 1989. Delas, 19.862 pessoas foram detidas de forma arbitrária ou ilegal; 18.772 foram torturadas; 59 executadas extrajudicialmente; 336 desaparecidas e 3.470 exiladas. Assim mesmo, observa que se estima que os familiares afetados que são vítimas indiretas foram de 107.987 pessoas, entre familiares e agregados. Resta observar que a Comissão formulou dez denúncias entre maio de 2006 e março de 2008, sendo que na sua grande maioria se encontram em etapa investigativa 532 . Assim mesmo, estabeleceu recomendações, nas seguintes questiones:

530 Desde março de 2005 até o término do primeiro mandato a Comissão avançou nos seguintes pontos: “a) Desaparición forzada y ejecuciones extrajudiciales: La Comisión cuenta en sus registros con 373 detenidos y desaparecidos, 10 ejecutados extrajudiciales y 39 muertos en tortura. Total 422 personas. b) Tortura: Hasta la fecha la Comisión ha recibido 1000 testimonios y cuenta en base de datos de fuentes segundarias con 598 testimonios. De los testimonios recibidos 70% corresponden a casos de tortura, 10% de exilio, 11% de despojo o destrucción de bienes, 9% otras violaciones. 80% de victimas corresponde al sexo masculino y 20 % al sexo femenino; 22 mujeres que han sufrido violencia sexual y 4 niños han nacido en prisión; 81% de la victimas son mayores de edad y 19% menores de edad. 46% de las victimas son campesinos de las ligas agrarias y 36% pertenecen a partidos políticos de todas las tendencias ideológicas. c) Exilio: Se encuentran en etapa de sistematización 100 testimonios recogidos a nivel nacional y 25 testimonios en la audiencia pública realizada en Buenos Aires y documentos obtenidos del archivo del Ministerio de Relaciones Exteriores del Paraguay d) Victimarios: Existen 290 señalamientos de supuestos victimarios mencionados en los testimonios obrantes en la Comisión de Verdad y Justicia. En cumplimiento del principio del debido proceso hasta la fecha se han realizado 28 entrevistas a dichos supuestos victimarios. e) Judicialización: Se han presentado 5 denuncias sobre supuestos hechos punibles de tortura, desaparición forzada y violencia contra mujeres habiéndose dictado por primera vez acta de imputación firmada por la unidad fiscal de derechos humanos.” (Disponível em: http://ejp.icj.org/IMG/BenitezFlorentin.pdf consultado em 6/7/09). 531 Disponível em: http://www.desaparecidos.org/bbs/archives/003780.html consultado em 07/07/09. 532 CVJ Informe final. Disponível em: (http://www.cej.org.py/ archivos/Comisi%C3% B3n%20Verdad %20y%20 JusticiaConclusiones%20y %20Recomen daciones.doc – consultado em 05/07/09.

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Recomendaciones en materia de satisfacción Medidas dirigidas a la revelación pública y completa de la verdad en la medida en que esa revelación no provoque más daños o amenace la seguridad y los intereses de la víctima, de sus familiares, de los testigos o de personas que han intervenido para ayudar a la víctima o impedir que se produzcan nuevas violaciones; Medidas dirigidas a búsqueda de las personas desaparecidas, de las identidades de los niños secuestrados y de los cadáveres de las personas asesinadas, y la ayuda para recuperarlos, identificarlos y volver a inhumarlos según el deseo explícito o presunto de la víctima o las prácticas culturales de su familia y comunidad; Medidas dirigidas a obtener declaraciones oficiales que restablezcan la dignidad, la reputación y los derechos de la víctima y de las personas estrechamente vinculadas a ella.; Medidas dirigidas a obtener disculpas públicas que incluyan el reconocimiento de los hechos y la aceptación de responsabilidades; Medidas dirigidas a aplicar sanciones judiciales o administrativas a los responsables de las violaciones; Medidas dirigidas a la realización de conmemoraciones y homenajes a las víctimas; Medidas dirigidas a promover una educación de derechos humanos que cuente lo ocurrido. Recomendaciones en materia de restitución Medidas dirigidas al restablecimiento de derechos; Medidas dirigidas al regreso a su lugar de residencia; Medidas dirigidas a la reintegración a su empleo; Medidas dirigidas a la devolución de los bienes. Recomendaciones en materia de indemnización; Perjuicios por el daño físico o mental. Perjuicios por la pérdida de oportunidades, como la educación y otras prestaciones sociales; Otros perjuicios. Recomendaciones en materia de rehabilitación Atención médica y psicológica; Servicios jurídicos y sociales. Recomendaciones en materia de no repetición. Medidas que garanticen un control efectivo de las autoridades civiles sobre las fuerzas armadas y de seguridad. Medidas dirigidas al fortalecimiento de la independencia del Poder Judicial. Medidas dirigidas a la protección de los profesionales que están en una particular situación de vulneración y riesgo. Medidas en materia de educación para todos los sectores de la sociedad en materia de derechos humanos. Medidas de capacitación de derechos humanos de los funcionarios encargados de hacer cumplir la ley, así como de las fuerzas armadas y de seguridad. Medidas dirigidas a promover la observancia de los códigos de conducta y de las normas éticas por los funcionarios públicos, periodistas y personal de empresas comerciales. Medidas dirigidas a la promoción de mecanismos destinados a precautelar los derechos laborales y promover la paz social. Medidas dirigidas a impulsar reformas constitucionales y legales que adecuen el marco normativo de los derechos humanos conforme al derecho

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internacional 533 3.3. Princípios Primeiro e Quarto: perseguição de violações de direitos humanos e implementação de procedimentos administrativos.

3.1. Julgamentos

Cabe observar que no Paraguai não houve anistia, nem norma anômala desincriminadora como a lei de ponto final ou de caducidade da pretensão punitiva do estado, razão pela qual os crimes de lesa humanidade que foram cometidos na ditadura puderam ser investigados, possibilitando as primeiras condenações da justiça local aos torturadores e criminosos da ditadura, embora com demora que motivara a intervenção da Corte Interamericana de Direitos Humanos, declarando a violação dos direitos de proteção judicial por parte de Paraguai em diversos casos (Goiburú, Mancuello, Soler, Ramírez Villalba) 534 . Assim, gradativamente são realizados julgamentos dos responsáveis pelos crimes no regime ditatorial. Em tal sentido, cabe destacar que Sabino Sabino Montanaro, exministro do interior, foi acusado como responsável intelectual pela morte sob tortura, em 1976, do jovem universitário Mario Schaerer Pronto, além de outros processos por torturas e desaparições forçadas de pessoas 535 . Em outro processo Francisco Ortiz Telles, exconsul na cidade argentina de Posadas, foi condenado em 2007 a dez anos de prisão pela desaparição do médico dissidente Agustín Goiburú, ocorrida em 1969. Segundo a sentença delatou a organismos de segurança as atividades do médico na Argentina 536 . Resta observar que, na oportunidade, seja no governo de transição ou etapa posterior, não foram observados processos administrativos dentro da própria força pelas violações de direitos humanos.

533 CVJ – informe Final. Disponível em: http://www.cej.org.py/archivos/ Comisi%C3%B3n%20 Verdad%20y%20JusticiaConclusiones%20y%20Recomendaciones.doc consultado em 5/7/09. 534 Disponível em: http://www.cajpe.org.pe/RIJ/BASES/jurisp/Corte/Paraguay/goiburu/goiburu _fondo.pdf consultado em 05/07/09. 535 Jornal de 25/06/09. Disponível em: http://www.nuestratele.tv/content/encarcelanparaguayaex ministroladictadurastroessner – consultado em 6/7/09. 536 Disponível em: http://noticias.terra.es/GenteyCultura/2009/0627/Actualidad/Exrepresoresdela dictadurapara guaya sonbeneficiadosporlaleydeancianidad.aspx – consultado em 6/7/09.

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3.4. Principio Quinto: programas de preservação da memória histórica

3.4.1. Arquivos

Em 22 de dezembro de 1992, foram achados arquivos que demonstram a participação da ditadura na operação Condor, bem como o controle de atividades de cidadãos vistos como oposição, detenção, troca e traslado, tortura e desaparição forçada de presos políticos por parte de autoridades policiais e militares paraguaias, junto as de Argentina, Brasil, Chile e Uruguai, entre os anos 1970 e 1980 537 . Foram achados no Departamento de Produções da Polícia, na cidade de Lambaré, no procedimento dirigido pelos juízes José Agustín Fernández e Luis María Benítez Riera, do Segundo e Terceiro Turno no Criminal. Posteriormente, em 24 de dezembro do mesmo ano, foi realizado um procedimento na Dirección Nacional de Asuntos Técnicos , conhecida como “La Técnica” , dirigido pelo juiz Luis María Benítez do Segundo Turno en lo Criminal , onde foram achados documentos dos anos 19581965 (primeiros anos de funcionamento da Direção, Fichas de presos políticos, e demais documentos). Posteriormente, foram realizados outros procedimentos em Janeiro de 1993, no Departamento Judicial da Polícia e em Delegacias, onde foram obtidos outros documentos referentes a presos políticos. Esses documentos, desde então, estão sendo pesquisados e classificados por funcionários da Corte Suprema de Justiça, Promotores e assistentes do Ministério Público, integrantes de ONGs, bem como de outras organizações CIPAE (Comité de Iglesias para Ayudas de Emergencia) CDE (Centro de Documentación y Estudios), vítimas e familiares. A preservação desses arquivos constitui uma forma de manter a memória das vítimas e do período de violações de direitos humanos. Assim mesmo, como forma de preservar a memória tem denominado a praça que se encontro ao lado do Palácio de Governo como “PLAZA

537 Foram chamados “archivos del terror” (vide site disponível em: http://www.aprodeh.org.pe/ridhualc/ri_pcondor02.htm consultado em 6/7/09) Encontramse no Centro de Documentación y Archivo para la defensa de los Derechos Humanos, no âmbito da Corte Suprema de Justicia de Paraguay. PAZ, A. B. LÓPEZ, M. H. PECCI, A. V. GUANES, G. G. En los Sótanos de los Generales Los Documentos Ocultos del Operativo Cóndor , p. 295296. Para ver o site do centro de arquivos vide: http://www.unesco.org/webworld/paraguay/historia.html consultado em 6/7/09.

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DE LOS DESAPARECIDOS”, em memória das vítimas de desaparições forçadas durante a ditadura e outras vítimas de graves violações de Direitos Humanos 538 . Resta observar que a Corte Interamericana de Direitos Humanos, estabeleceu que o Estado “debe construir, en el plazo de un año, un monumento en memoria de los señores Agustín Goiburú Giménez, Carlos José Mancuello, Rodolfo Ramírez Villalba y Benjamín Ramírez Villalba, en los términos del párrafo 177 de la presente Sentencia”. 539

3.5. Princípio Terceiro: reconhecimento do status de vítima e estabelecimento de sistema de reparações

As reparações foram estabelecidas na lei n. No. 838/96 “sobre Indemnización de las víctimas de la dictadura de 19541989”. Sem embargo, não foi imediatamente aplicada em razão de que inicialmente foi vetada pelo Poder Executivo, embora depois o Congresso a ratificou. E depois foi atacada por inconstitucional por parte do Poder Executivo, porém, a Corte Suprema rechaçou esse pedido. Uma vez validada, teve que esperar a designação do Defensor del Pueblo , em 2002, encarregado de registrar as vítimas e realizar verificações, estabelecer o valor das indenizações, segundo a gravidade dos delitos cometidos pelo governo. Contudo, em agosto de 2006, aproximadamente 1500 vítimas identificadas pela CVJ estavam recebendo compensações do governo por abusos sofridos durante a ditadura. Em março de 2009, o estado paraguaio indenizou 273 pessoas, porém reconheceu que “a lista de víctimas es larga y cumpliremos con ellas paulatinamente, de acuerdo con la disponibilidad del presupuesto”. Em maio de 2009, o presidente Lugo, entregou um ressarcimento econômico a 102 pessoas,

538 CIDH. Caso Goiburú y otros Vs. Paraguay; Sentencia de 22 de septiembre de 2006. Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_153_esp.pdf consultada em 24/07/09. 539 CIDH. Caso Goiburú y otros Vs. Paraguay; Sentencia de 22 de septiembre de 2006. Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_153_esp.pdf consultada em 24/07/09.

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“cuyos derechos humanos fueron violentados” . Aguardase a reparação a umas 10.000 pessoas 540 . No dia 02 de maio de 2009 o presidente Lugo anunciou a criação de uma comissão com o intuito de recuperar os bens mal havidos por ocasião da ditadura militar 541 .

540 Vide nota em jornal, disponível em: http://www.mercopress.info/index.php/paraguay/65 politica/1165paraguayindemnizaavictimasdeladictaduradestroessner consultado em 6/7/09. Também, site disponível em: http://blogs. clarin.com/ alparaguay/2009/5/13/paraguayindemniza victimasladictadurastroessner – consultado em 6/7/09. 541 Paraguai volta de ministro da ditadura reabre feridas. Correio da cidadania. 04.05.2009. Disponível em: http://www.vermelho.org.br/base.asp?texto=55440 consultado em 20/0709.

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4. Uruguai

4.1. Introdução

O Uruguai passou por um período ditatorial de sistemáticas violações de direitos humanos no mesmo contexto dos países da região. A ditadura no Uruguai, como as outras acontecidas na região, contaram com o apoio da população civil. Foi iniciada em 27 de junho de 1973 e se estendeu até o dia 28 de fevereiro de 1985. Os antecedentes do golpe cívicomilitar de 1973 podem encontrarse na conflitividade emergente nos anos anteriores, nos quais, os grupos Movimiento de Liberación Nacional-Tupamaros , Escuadrón de la muerte e a Juventud Uruguaya de Pie (JUP) se manifestava mediante guerra de guerrilhas ante as autoridades estatais; por outra parte a Convención Nacional de Trabajadores tinha um papel participativo que foi considerado como desestabilizador da ordem institucional. Em 1972 as Forças Conjuntas detiveram os dirigentes tupamaros (foram liberados somente com a volta da democracia). Ante esse quadro de situação, as forças armadas foram assumindo maior participação política. O presidente designou o general Antonio Francese para comandar as forças e tentar restabelecer o controle, porém, a designação foi resistida ao tempo que foi evidenciada a intenção de participar na organização política do país 542 . Nesse

Comunicado n. 4. 9 de fevereiro de 1973. “Los mandos militares conjuntos del Ejército y la Fuerza Aérea, ante la crisis que afecta al país y a los efectos de despejar hasta la última duda que pueda existir en el espíritu de todos los uruguayos sobre las causas que la han ocasionado, sienten el deber moral de informar lo siguiente: 1°. Si bien se ha manifestado la solicitud al señor presidente de la República de que disponga el relevo y se ha declarado la decisión de desconocer la autoridad del señor ministro de Defensa Nacional, se expresa con la más absoluta lealtad hacia el pueblo y sus autoridades nacionales que dicha posición no obedece a que se cuestione la persona misma del mencionado jerarca, sino lo que él representa y las graves consecuencias que derivarían del ejercicio de su cargo. 5°. Se han planteado entonces, procurar alcanzar o impulsar la obtención de los siguientes objetivos: i) Extirpar todas las formas de subversión, que actualmente padece el país, mediante el establecimiento de adecuada legislación para su control y sanción. k) Asegurar la intervención o la representación de las Fuerzas Armadas en todo organismo o actividad que tenga relación con aspectos. concernientes a la seguridad y soberanía nacional.

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contexto, então, o presidente Bordaberry, no acordo de Boiso Lanza 543 , aceitou as condições das formas Armadas, criando o Consejo de Seguridad Nacional

6°. Colaborar en alcanzar lo señalado precedentemente mediante. el desarrollo de una política de acción conjunta de las Fuerzas Armadas, que se ajuste a los siguientes preceptos: a) Manteniendo permanentemente total cohesión en las Fuerzas Armadas, vigilar la conducción nacional en procura de los objetivos fijados, gravitando en las decisiones que afectan el desarrollo y la seguridad, mediante el mantenimiento de un estrecho contacto con el Poder Ejecutivo, y la presentación oportuna a través de planteamiento de la posición que las Fuerzas Armadas adopten en cada caso. b) Manteniendo a las Fuerzas Armadas al margen de los problemas sindicales y estudiantiles salvo que lleguen por su intensidad a poner en peligro la seguridad. Previa anuencia del Poder Ejecutivo, iniciar una política de realizaciones eficaces y concretas, apoyando o tomando a su cargo planes de desarrollo o interés nacional, aprovechando sus capacidades técnico profesionales. c) Proceder en todo momento de manera tal de consolidar los ideales democráticorepublicanos en el seno de toda la población, como forma de evitar la infiltración y captación de adeptos a las doctrinas y filosofías marxistasleninistas, incompatibles con nuestro tradicional estilo de vida. ” (Fonte: 7 días que conmovieron al Uruguay , Cuadernos de Marcha, Nº 68, Montevideo, marzo de 1973 Disponível em: http://www.uc.org.uy/d0203b.htm consultado em 06/07/09). Comunicado n. 7. 10 de fevereiro de 1973. “Los mandos militares conjuntos del Ejército y la Fuerza Aérea Entienden conveniente. ahora efectuar las siguientes precisiones: 3°. Existen objetivos básicos permanentes, de gran alcance, que son igualmente deseados por todos los uruguayos y que sólo admiten pequeñas variantes en la estrategia a seguir para alcanzar su plena satisfacción, por lo que aún, a pesar de ser de importancia fundamental, se creyó innecesario provisoriamente incluirlos en el documento. 4°. Tal el caso, por ejemplo, de la preservación de la soberanía y la seguridad del Estado, que a su indiscutible y singular vigencia permanente, une la condición de ser unánimemente procurada y deseada por todos los orientales. Quede, sin embargo, perfectamente establecido que ese punto, para las Fuerzas Armadas, invariablemente ha sido y será, con el mayor fervor, determinación y empeño, motivo esencial de su existencia. Y causa de sus mayores desvelos. Para ello, hasta sus últimas consecuencias, habrán de exigir de todos los orientales, en la medida de la responsabilidad individual de cada uno, no sólo la defensa territorial de la patria, sino también, y muy especialmente, la de su más absoluta libertad de decisión. Ésta deberá ejercerse tanto en los asuntos internos del Estado como en los variados problemas de las relaciones internacionales, sin otra limitación que las libremente aceptadas en convenios suscritos por propia voluntad. 6°. Por último, se considera imprescindible establecer que las Fuerzas Armadas no se adhieren ni ajustan sus esquemas mentales a ninguna filosofía política partidaria determinada, sino que pretenden adecuar su pensamiento y orientar sus acciones según la concepción propia y original de un Uruguay ideal, meta inalcanzable pero intensamente deseada, ya que ofrecería el mayor bienestar y felicidad para todos sus hijos. Este concepto se complementa con la aspiración de crear y consolidar en la totalidad de los uruguayos la "mística de la orientalidad", que consiste en la recuperación de los grandes valores morales de aquellos que forjaron nuestra nacionalidad y cuyas facetas básicas son: el patriotismo, la austeridad, el desinterés, la generosidad, la honradez, la abnegación y la firmeza de carácter. Ello facilitaría que fuera realidad el reencuentro de los orientales, permitiendo que la República se proyecte hacia la consecución de sus más elevados destinos.” (fonte : Brecha, 31 de enero de 2003 Disponível em: http://www.uc.org.uy/d0203c.htm consultado em 06/07/09). 543 Versão do jornal "El Día" do acordo "Boizo Lanza". "El Día", martes 13 de febrero de 1973 Destituyen a Segovia y otros diplomáticos. Ayer, a la hora 16, la Junta de Comandantes en Jefe de las Fuerzas Armadas, emitió el comunicado Nº 11/73, que dice así: "'Las Fuerzas Armadas hacen saber a la población que en la reunión realizada en la fecha con la participación del señor presidente de la república y los altos mandos, se ha coincidido en las bases fundamentales que aseguran la concreción de un previsor acuerdo total". Este resultó el primer indicio, posteriormente confirmado, de que la gravísima crisis institucional desencadenada en la madrugada del miércoles último, se había encaminado hacia una positiva solución. Las bases del acuerdo al que llegaron el presidente de la

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república y los mandos militares, no fueron reveladas en forma oficial, por cuanto aún quedan algunos puntos —"sin mayor trascendencia", de acuerdo con lo que se nos informó— por dilucidar. El acuerdo. No obstante el rígido hermetismo que caracterizó tanto a los círculos gubernamentales como a los castrenses, un equipo de reporteros de EL DIA consiguió reunir los aspectos básicos del acuerdo, luego de consultar a muy altas fuentes, todas ellas de indudable solvencia y jerarquía, que están directamente vinculadas a estos acontecimientos. Según tales informes, las bases del entendimiento giraron, entre otros, en tomo a los siguientes puntos: Creación del Consejo Nacional de Seguridad. Integración del gabinete ministerial. Nombramiento de los entes autónomos y servicios descentralizados. Normas para el ascenso de los militares al generalato. Destitución de algunos funcionarios del servicio exterior. a) El Consejo de Seguridad. El Consejo Nacional de Seguridad (CONASE) estaría integrado por los ministros de Defensa Nacional (que lo presidirá), del Interior, de Relaciones Exteriores y de Economía y Finanzas y por las más altas jerarquías castrenses. Según lo explicó anoche el presidente a sus asesores, el CONASE sería "el instrumento de acción para ejecutar el programa propuesto por los militares" (el programa es un plan de acción político gubernamental expuesto en el comunicado Nº 4). El CONASE no será un organismo supragubernamental, como algunos lo han insinuado —aclaró uno de nuestros informantes— sino que funcionará en la órbita del Ministerio de Defensa y bajo la supervisión directa del presidente de la república. b) Integración del gabinete. Acerca de este punto nos extendemos en la información inserta en la página 4 de esta misma edición. c) Entes autónomos. Sobre el particular, los militares expusieron su aspiración en el sentido de que los nombramientos no se hicieran teniendo en cuenta las cuotas políticas y sí la especialización y atributos morales de los candidatos. En este aspecto, hubo total coincidencia con el primer mandatario, habiendo afirmado el señor Bordaberry que integrará entes y servicios a la brevedad siguiendo esas directivas, por compartidas íntegramente. Hay que establecer que los militares no rec1amaron posiciones para sí en los entes. —¿Qué pasará con las expectativas de los grupos que integran el acuerdo nacional? —Pues nada, replicó otro informante, tendrán que tragarse la oblea... d) Ascenso de militares. Según las disposiciones vigentes, se registran dos ascensos anuales al grado de general, uno por concurso y otro por selección. Los mandos solicitaron —y el presidente habría accedido— a que el número no se limite a dos y que los cambios de grado se hagan solo por selección. e) Destitución de funcionarios. Los militares le solicitaron al presidente el inmediato llamado al país con la consiguiente destitución, de los siguientes funcionarios: —El embajador permanente ante los Organismos Internacionales con sede en Ginebra, Dr. Augusto Legnani. —Embajador ante el gobierno de Francia, Dr. Glauco Segovia. —Embajador ante el gobierno de Perú, general César Barba. —Ministro Consejero de la embajada en España, Sr. Alejandro Gari, que es hijo del amigo del presidente, señor Juan José Gari. Ante estos planteamientos, la respuesta del señor Bordaberry puede sintetizarse así: a) Accedió a la inmediata sustitución de los embajadores Segovia y Borba y los decretos disponiendo su cesantía serán aprobados en el curso de las próximas horas. b) Accedió también a destituir al señor Alejandro Gari, pero en un plazo prudencial, no bien determinado. c) Defendió, en cambio, la permanencia del doctor Legnani, quien goza de toda la confianza del presidente y, en consecuencia, seguirá en su cargo. En otro orden de cosas, cabe consignar que ayer mismo, el presidente Bordaberry encomendó al ministro de Economía y Finanzas, entre otras cosas, las siguientes: —Estudiar una fórmula que permita al estado ejercer un mayor control acerca de las actividades de la banca privada. —Igual criterio en lo que respecta al comercio exterior.

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(COSENA) 544 . Posteriormente, no dia 27 de junho de 1973, resolveu dissolver o parlamento e estabelecer um Conselho de Estado, com funções executivas e legislativas, a fim de realizar uma reforma constitucional 545 . Assim mesmo foi restringido o direito de reunião primeiro, para

—Reducción de los gastos del parlamento, así como la normalización. de las decenas de Funcionarios que hay "en comisión". Otro calificado informante expresó que al domingo, sendas delegaciones de la UNR y de Unidad y Reforma Lista 15, le habían exigido la renuncia al presidente Bordaberry. Sin embargo ayer, ambas agrupaciones se rectificaron y volvieron a ofrecerle su respaldo. Se nos dijo además, que durante la presente crisis, el señor Bordaberry habló en varias oportunidades con el señor Pacheco Areco, quien en todas las ocasiones le reiteró su confianza y le instó a mantenerse en el cargo, fueran cuales fueran las circunstancias.” (fonte: 7 días que conmovieron al Uruguay, Cuadernos de Marcha, Nº 68, Montevideo, marzo de 1973. – Disponível em http://www.uc.org.uy/d0203e.htm consultado em 05/07/09). 544 Os principais artigos da Resolução do Conselho de Ministro de 23 de fevereiro de 1973 que cria e regulamenta o COSENA são os seguintes: "Artículo 1º Créase el Consejo de Seguridad Nacional, con el carácter de órgano asesor del Poder Ejecutivo, bajo la dependencia directa de la Presidencia de la República. "Artículo 2º Será presidido por el presidente de la república y estará integrado por los ministros del Interior, Relaciones Exteriores, Defensa Nacional y Economía y Finanzas, el director de la Oficina de Planeamiento y Presupuesto y los comandantes en jefe de las Fuerzas Armadas; quienes serán miembros permanentes del consejo. Según la materia de que se trate, podrán ser convocados a participar en las reuniones y trabajos del consejo, como miembros eventuales, otros ministros de estado, directores de entes autónomos y servicios descentralizados, intendentes municipales y personas de reconocida competencia en el asunto que se considera. "Artículo 3º Será cometido del consejo asesorar al Poder Ejecutivo en asuntos de seguridad nacional, por disposición del presidente o por iniciativa de sus miembros permanentes. "Artículo 6º Las reuniones, así como las actuaciones que cumpla y los documentos que produzca, son secretos. No obstante, con la anuencia del presidente, podrá emitir comunicados de prensa sintéticos. (Fonte: 7 días que conmovieron al Uruguay , Cuadernos de Marcha, Nº 68, Montevideo, marzo de 1973 Disponível em: http://www.uc.org.uy/d0203h.htm consultado em 05/07/09). 545 O presidente Bordaberry, junto com os ministros Néstor Bolentini e Walter Ravenna, nesse dia emitiu o decreto n° 464/973, que expressava o seguinte: 1° Declárase disueltas la Cámara de Senadores y la Cámara de Representantes. 2° Créase un Consejo de Estado, integrado por los miembros que oportunamente se designarán, con las siguientes atribuciones: A) Desempeñar independientemente las funciones específicas de la Asamblea General; B) Controlar la gestión del Poder Ejecutivo relacionada con el respeto de los derechos individuales de la persona humana y con la sumisión de dicho Poder a las normas constitucionales y legales; C) Elaborar un anteproyecto de Reforma Constitucional que reafirme los fundamentales principios democráticos y representativos a ser oportunamente plebiscitado por el Cuerpo Electoral. 3° Prohíbese la divulgación por la prensa oral, escrita o televisada de todo tipo de información, comentario o grabación, que, directa o indirectamente, mencione o se refiera a lo dispuesto por el presente Decreto, atribuyendo propósitos dictatoriales al Poder Ejecutivo. 4° Facúltase a las Fuerzas Armadas y Policiales a adoptar las medidas necesarias para asegurar la prestación ininterrumpida de los servicios públicos esenciales . O decreto nº 465/973 da mesma data considerou compreendida no texto do artigo 1º do decreto 464/973 a “todas las Juntas Departamentales del País” (art. 1º). Assim mesmo criou “ en cada Departamento una Junta de Vecinos, que en lo pertinente y en el ámbito Departamental, tendrá atribuciones similares a las conferidas al Consejo de Estado creado por el art. 2º del decreto de hoy” (art. 2º).

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fins políticos (decreto n. 466/973), depois com a participação de estudantes (decreto n. 1207), e finalmente a imprensa (Resolução n. 1804 de 15 de outubro de 1973). O golpe cívicomilitar foi resistido por parte da população, em especial pelos trabalhadores da Convención Nacional de Trabajadores (CNT), bem como pelo Movimiento Estudiantil , principalmente representado pela Federación de Estudiantes Universitarios (FEUU) da Universidad de la República, realizando uma greve geral de 15 dias de duração. O regime, então, começou com a repressão, mediante a detenção dos principais dirigentes e dos dissidentes, acusandoos de sedição e a prática de tortura e outros tratos cruéis e desumanos 546 . A comissão Internacional de Juristas assim observou: La situación de los Derechos Humanos en Uruguay es muy grave... una represión política muy dura, con varios miles de detenidos, algunos de los cuales murieron durante la detención. En un primer momento se dirigió contra los grupos de guerrilla urbana (...) y continuó contra otros sectores de izquierda y, posteriormente, se extendió hasta reprimir todo tipo de manifestación política de oposición al gobierno. Actualmente, es el país que ostenta el triste honor de tener en sus cárceles y campos de internación el mayor número relativo de prisioneros políticos de toda América Latina” 547 .

No ano de 1976, o presidente Bordaberry, próximo a finalizar o seu mandato, propôs mudar o sistema político, eliminando os partidos políticos por “corrientes de opinión”, mas as forças militares não aceitaram. O conflito então terminou gerando uma crise que culminou com a remoção do presidente e a designação interina, em 12 de Julho, de Alberto Demicheli, até então presidente do Consejo de Estado. Imediatamente, suspendeu a convocatória a eleições e criou o Consejo de la Nación. Em setembro desse mesmo ano, delegou a presidência a Aparício Méndez (exministro de saúde pública), quem assume pelo período de 5 anos. No seu governo é apresentado um projeto de reforma constitucional, incompatível com diversas cláusulas da Convenção Americana, que foi rechaçado pela população 548 .

546 Sobre a repressão no Uruguai: BAUM GARTNER, José et alli . Os desaparecidos, a historia da repressão no Uruguai. Porto Alegre: Tchê, 1987; MICHELINI, R. Desaparecidos.Uruguay ya no quiere silencio . Sobre a ditadura em geral ver VILLALOBOS, Marco Antonio. Tiranos Tremei! Ditadura e Resistência Popular no Uruguai (19681985) . Porto Alegre: Edipucrs, 2006. 547 Revista de la Comisión Internacional de Juristas, Ginebra, Nº 16 junio – diciembre de 1976. 548 Vide Informe da Comisão Interamericana de Dreitos Humanos. Disponível em: http://www.cidh.org/annualrep/79.80sp/ cap.5c.htm#_ftn2 – consultado em 5/06/09.

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Em 1º de setembro de 1981 assume a presidência o general Gregório Alvarez, quem, após realizar um pacto com a classe política 549 , em 1984, chama a eleições, porém, com cidadãos e partidos proscritos. Na eleição vence o Partido Colorado. No começo de 1985, deixa o mandato ao Presidente da Corte Suprema de Justiça, Rafael Addiego Bruno, que em 1 de março de 1985 entrega o mandato a Julio Maria Sanguinetti, que tinha vencido nas eleições 550 . O resultado do regime ditatorial cívicomilitar foi a morte de centenas de prisioneiros políticos e a desaparição de, ainda, 140 pessoas 551 .

4.2. Princípio Segundo: Comissões de verdade

O Presidente Julio Maria Sanguinetti tinha certa relutância em investigar o passado, pois considerava que se tratou de uma guerra contra uma grave ameaça esquerdista à nação e, conseqüentemente, suas ações eram justificadas, com a exceção de alguns excessos. Dessa forma, o discurso adequava se ao período de transição em que as forças armadas negociaram sua retirada com as elites políticas, permitindo a manutenção de sua grande influência na transição 552 . Em abril de 1995, o parlamento uruguaio criou a Comisión Investigadora sobre la Situación de Personas Desaparecidas y Hechos que la Motivaron . Após um período de sete meses, a Comissão coletou evidências e testemunhos de 164 desaparecimentos ocorridos nos onze anos de ditadura militar. A Comissão devia investigar somente desaparições de pessoas, motivo pelo qual, outros abusos como prisões, torturas e tratos cruéis ou desumanos não foram investigados.

549 Pacto do Clube Naval, em 3 de agosto de 1984. O pacto foi uma negociação secreta entre as forças militares e representantes dos partidos Frente Amplio, Colorado e União Cívica, possibilitando a volta da democracia. Existe divergência sobre o acordado, em particular com relação ao pacto de impunidade dos militares pelas violações de direitos humanos. Cabe destacar que os representantes do Partido Nacional se retiraram das negociações em razão de discordar da idéia de realizar eleições com partidos e pessoas proscritas. Parte do acordado foi plasmado no Ato Institucional n. 19 – (disponível em: http://www.derechos.org/nizkor/uruguay/doc/clubnaval.html consultado em 5/06/09). 550 Cf. MARTINEZ, Virginia . Tiempos de dictadura . Montevideo: Banda Oriental, 2005. Ver também MARTINEZ, Maria Ximena Alvarez. Brasil y Uruguai: la historia regional en el discurso militar uruguaio (1973/1985). Revista de História Regional , vol. 11, n. 1, 2006, p. 2952. 551 Vide CERPAJ – lista disponível em: http://www.serpaj.org.uy/inf97/listade.htm consultado em 07/07/09. 552 Vide resposta do presidente a pedido de investigações realizado por desaparecidos. Disponível em: http://www.trilce.com.uy/pdf/anexos/11bfamiliaresdoc.pdf – consultado em 5/7/09.

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Assim a Comissão manifestou ter provado: “a) vinculación de las desapariciones ocurridas en la República Argentina y en el Uruguay; b) práctica de la tortura denominador común para los secuestrados desaparecidos; c) existencia en el Uruguay de tumbas NN. d) En esas desapariciones están involucrados efectivos militares y policiales uruguayos reiteradamente denunciados” 553 A Comissão não teve um impacto substancial no Uruguai, pois não contou com apoio político significativo. De uma parte, o presidente se opunha a ela e os representantes do Partido Colorado no Congresso trabalharam para diminuir o seu poder. Ao mesmo tempo, partidos de esquerda estavam fragmentados e os militares continuavam tendo poder. Nesse contexto, a definição dos fatos investigados, às vezes dependia das pressões políticas. O relatório foi tornado público, mas não foi distribuído em larga escala, nem apresentado oficialmente. Por sua parte, o informe Uruguay Nunca Mas , observou que a partir de 1972, com a passagem dos presos à orbita militar, foi generalizada a prática de tortura. Em 1984, um alto mando das forças armadas revelou que foram processadas pela justiça militar 4.933 pessoas, estimandose a cifra de 3.700 detentos 554 . Em agosto de 2000, o presidente Jorge Battle criou a Comisión para la Paz para descobrir o destino de detidos desaparecidos durante a ditadura militar 555 . A comissão esteve integrada originariamente pelo Mosenhor Nicolás Cotungo (presidente) o Presbítero Luis Perez Aguirre S.J. o Sr. José D´Elia e os Doctores José Claudio Williman, Gonzalo Fernandez e Carlos Ramela Regules,

553 Informe da “Comisión Investigadora sobre situaciones de Personas Desaparecidas y los Hechos que la Motivaron” da Câmara de Representantes. Diario de Sesiones, Nº 1.856, tomo 620, de 7 de novembro de 1985, pp. 511 e ss. 554 Uruguay Nunca Más. Informe sobre la violación a los Derechos Humanos (19721985). Servicio Paz y Justicia. Montevideo: 1989. 5. Vide. Uruguay Nunca Más, p. 116 117. 555 A Comissão foi criada por Resolução da Presidência da República nº 858/2000, de 9 de agosto de 2000 (Diario Oficial Nº 25.583 de 17 de agosto de 2000), atendendo a necessidade de “dar los pasos posibles para determinar la situación de los detenidosdesaparecidos durante el régimen de facto, así como de los menores desaparecidos en iguales condiciones” e em cumprimento de “una obligación ética del Estado” , encarando “una tarea imprescindible para preservar la memoria histórica” de la Nación, así como para “ consolidar la pacificación nacional y sellar para siempre la paz entre los uruguayos. ”

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tendo posteriormente integrado o presbítero Jorge Osório em razão da morte do presbítero Aguirre 556 . A Comissão teve poder de recolher informações e ouvir testemunhas, porém não poderia compelir ninguém a colaborar com a investigação. Muitas das informações coletadas eram originadas de organizações de direitos humanos e familiares das vítimas. O governo também liberou documentos para ajudar o trabalho da Comissão. Assim, a comissão teve por função “recibir, analizar, clasificar y recopilar información sobre las desapariciones forzadas ocurridas durante el régimen de facto” , e para tal fim contou com “las más amplias facultades para recibir documentos y testimonios” , tendo o dever de “mantener estricta reserva sobre sus actuaciones” , bem como guardar “la absoluta confidencialidad” a respeito das fontes de informação obtidas. Como funcionava no âmbito da Presidência da República, periodicamente levava informação ao Presidente; também adiantava informação aos familiares das vítimas, dentro dos limites impostos ao seu poder de atuação 557 . A Comissão submeteu seu relatório ao Presidente em outubro de 2002, que foi publicado oficialmente em abril de 2003, num decreto executivo apresentando o relatório final 558 . O Presidente Battle aceitou todas as conclusões do relatório como uma declaração governamental da situação de pessoas presas e desaparecidas. A Comissão recebeu 39 requisições oficiais sobre pessoas que presumidamente desapareceram no Uruguai durante o regime militar, mas só foi capaz de determinar o paradeiro de vinte e seis. Muitos morreram como resultado da tortura infligida em centros de detenção clandestinos. A Comissão também encontrou informações sobre cidadãos desaparecidos mortos na República Argentina, Paraguai e Bolívia. Além disso, foram apresentadas 40 denúncias sobre crianças desaparecidas ou cuja identidade não é conhecida, das quais uma considera confirmada e 6 em tramitação. Foram, ainda, registradas 26 denúncias sobre corpos aparecidos

556 Res. n. 486/2001. 557 Vide informe da Comissão. Disponível em: http://www.presidencia.gub.uy/noticias/archivo/2003 /abril/Informe_ final.doc – consultado em 5/7/09. 558 Vide informe da Comissão. Disponível em: http://www.presidencia.gub.uy/noticias/archivo/2003 /abril/Informe _ final.doc consultado em 5/7/09.

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no Rio da Prata, das quais foram esclarecidos 13 casos. Finalmente, a Comissão instigou o governo a estabelecer uma Secretaria de seguimento e afirmou a necessidade de estabelecer um sistema de reparações. Como sugestões gerais consignou o seguinte: “a. Se promueva y fomente, a todo nivel, con especial énfasis en los planes de estudio en general y en los procesos de formación de docentes y educadores en particular, un análisis objetivo y global de la triste realidad que vivió el país desde la década de los años sesenta y hasta mediados de los años ochenta, que rescate y valore una realidad completa y veraz y permita entender, asumir y reconocer, en toda su dimensión, las causas y los factores complejos y múltiples que incidieron para generar uno de los períodos más duros y trágicos de nuestra historia nacional. b. Se enseñe y estimule también a todo nivel, a partir del análisis crítico que se sugiere en el literal anterior, la plena vigencia de conceptos, valores y principios que hacen a nuestra propia esencia como Nación y son la mejor garantía contra toda forma de violencia y arbitrariedad, tales como, entre otros, los siguientes: la democracia como instrumento formal, sustancial y único de convivencia; el diálogo y la solución no violenta de los conflictos y las divergencias; la tolerancia y el respeto por los derechos de los demás como vehículo para definir objetivos nacionales comunes, sin perjuicio de la diversidad que nos distingue como sociedad libre y pluralista; la consolidación plena del Estado de Derecho; la absoluta sujeción del Estado y sus agentes al marco de más estricta legalidad y, en definitiva, la promoción y protección genuina de los derechos fundamentales del hombre. c. Se revean y actualicen nuestras normas legales vigentes, de forma de contemplar delitos (como por ejemplo, tortura, delitos contra la humanidad, genocidio, desaparición forzada, etc.) que han sido reconocidos y sancionados en el derecho comparado – e incluso en convenios multilaterales, con la finalidad de evitar y reprimir los excesos y los desvíos en que pueda incurrir el propio Estado y sus agentes. d. Se ratifiquen y aprueban los tratados, pactos y convenciones internacionales que se impulsan a nivel internacional, por sociedades que comparten nuestra visión humanista y liberal, como forma de mantener a nuestra país en la vanguardia de aquéllos que hacen del individuo y del respeto de sus derechos una prioridad básica y esencial. e. Se genere un ámbito adecuado para analizar y resolver la creación de una estructura institucional propia y autónoma que pueda actuar, en forma permanente, en el seguimiento y control de las regulaciones y normas tendientes a la más efectiva protección de los derechos humanos del individuo” 559 .

559 Vide informe da Comissão. Disponível em: http://www.presidencia.gub.uy/noticias/archivo/2003 /abril/Informe_ final.doc Consultado em 5/7/09.

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O Poder Executivo, mediante decreto de 16 de abril de 2003, estabeleceu que as conclusões finais da Comissão constituem a versão oficial sobre a situação dos detentosdesaparecidos durante o governo cívicomilitar 560 .

4.3. Princípios Primeiro e Quarto: perseguição de violações de direitos humanos e implementação de procedimentos administrativos.

4.3.1. Anistia e julgamentos

A primeira anistia, Lei de Pacificação Nacional, foi introduzida em março de 1985 logo após o governo de transição assumir o poder. Assim mesmo os prisioneiros políticos recuperaram a liberdade 561 .

560 Vide site disponível em: http://www.presidencia.gub.uy/decretos/2003041605.htm. Consultado em 5/7/09. 561 Ley Nº 15.737 Montevideo, 8 de marzo de 1985. Os principais artigos são os seguintes: Artículo 1º. Decrétase la amnistía de todos los delitos políticos, comunes y militares conexos con éstos, cometidos a partir del 1º de enero de 1962. Respecto a los autores y coautores de delitos de homicidio intencional consumados, la amnistía sólo operará a los fines de habilitar la revisión de las sentencias en los términos previstos en el artículo 9º de esta ley. Artículo 2º. A los efectos de esta ley se consideran delitos políticos, los cometidos por móviles directa o indirectamente políticos, y delitos comunes y militares conexos con delitos políticos los que participan de la misma finalidad de éstos o se cometieron para facilitarlos, prepararlos, consumarlos, agravar sus efectos o impedir su punición. También se consideran delitos conexos todos aquellos que concurran de cualquier manera (reiteración real, reiteración formal o concurrencia fuera de la reiteración) con los delitos políticos. Artículo 3º. Esta amnistía comprende expresamente: A) Los delitos del artículo 60, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII y XII del Capítulo 6 bis del Código Penal Militar, incorporados a éste por el artículo 1º de la ley 14.068, de 10 de julio de 1972. B) Los delitos establecidos en los Títulos I y II del Libro II del Código Penal Ordinario; y las asociaciones para delinquir (artículos 150 y 152 del Código Penal y artículo 5º de la ley 9.936, de 18 de junio de 1940) si hubieran sido creadas con las finalidades políticas. C) Los tipificados en el Código Penal Militar cuando se hubieren cometido por móviles directa o indirectamente políticos, o en su mérito se hubiere requerido, procesado o condenado a civiles. D) Los delitos contenidos en bandos militares dictados durante la declaración del estado de guerra. E) En general, y sin perjuicio de los enunciados precedentemente, todos los delitos, cualesquiera sea el bien jurídico lesionado, que hayan sido cometidos por móviles políticos directos o indirectos. Artículo 4º. Quedan comprendidas en los efectos de esta amnistía todas las personas a quienes se hubiera atribuido la comisión de estos delitos, sea como autores, coautores o cómplices y a los encubridores de los mismos, hayan sido o no condenados o procesados, y aun cuando fueren reincidentes o habituales. Artículo 5º. Quedan excluidos de la amnistía los delitos cometidos por funcionarios policiales o

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Posteriormente, as cortes foram inundadas de reclamações contra os militares por torturas e desaparecimentos. As Forças Armadas responderam se recusando a cumprir intimações e ameaçando promover grandes insurreições, particularmente porque parece que em 1984, durante as negociações do Pacto do Clube Naval para a entrega do poder, o futuro presidente civil garantiu aos líderes militares que as Forças Armadas não seriam chamadas à responsabilidade. A tensão culminou em dezembro de 1986 quando foi estabelecida por lei a impossibilidade de submeter a julgamento aos militares mediante a Lei de Caducidade da Pretensão Punitiva do Estado .562 Essa lei era militares, equiparados o asimilados, que fueran autores, coautores o cómplices de tratamientos inhumanos, crueles o degradantes o de la detención de personas luego desaparecidas, y por quienes hubieren encubierto cualquiera de dichas conductas. Esta exclusión se extiende asimismo a todos los delitos cometidos aun por móviles políticos, por personas que hubieren actuado amparadas por el poder del Estado en cualquier forma o desde cargos de gobierno. Artículo 6º. Decláranse extinguidas de pleno derecho las penas principales y accesorias, las acciones penales, las sanciones administrativas y jubilatorias, las deudas generadas por expensas carcelarias y toda otra sanción dispuesta por una autoridad estatal en virtud de los delitos amnistiados. Artículo 7º. A partir de la promulgación de esta ley cesarán de inmediato y en forma definitiva: a) Todos los regímenes de vigilancia para las personas comprendidas en el beneficio de la amnistía, cualquiera fuere su naturaleza y la autoridad que lo hubiere dispuesto. Dichas personas quedarán automáticamente eximidas de toda obligación directa o indirectamente relacionada con el régimen a que se hallaren sometidas. b) Todas las órdenes de captura y requerimiento pendientes, cualquiera fuere su naturaleza y la autoridad que lo hubiere dispuesto, dictadas contra personas beneficiadas por esta amnistía. c) Todas las limitaciones vigentes para entrar al país o salir de él, que alcanzaren a dichas personas. d) Todas las investigaciones de hechos que pudieren configurar cualquiera de los delitos comprendidos en la amnistía. Disponível em: http://200.40.229.134/leyes/AccesoTextoLey.asp? Ley=15737&Anchor= consultado em 5/7/09. 562 Ley Nº 15.848 Publicada D.O. 28 dic/986 Nº 22295. “Artículo 1º. Reconócese que, como consecuencia de la lógica de los hechos originados por el acuerdo celebrado entre partidos políticos y las Fuerzas Armadas en agosto de 1984 y a efecto de concluir la transición hacia la plena vigencia del orden constitucional, ha caducado el ejercicio de la pretensión punitiva del Estado respecto de los delitos cometidos hasta el 1º de marzo de 1985 por funcionarios militares y policiales, equiparados y asimilados por móviles políticos o en ocasión del cumplimiento de sus funciones y en ocasión de acciones ordenadas por los mandos que actuaron durante el período de facto. Artículo 2º. Lo dispuesto en el artículo anterior no comprende: a) Las causas en las que, a la fecha de promulgación de esta ley, exista auto de procesamiento; b) Los delitos que se hubieren cometido con el propósito de lograr, para su autor o para un tercero, un provecho económico. Artículo 3º. A los efectos previstos en los artículos anteriores, el Juez interviniente en las denuncias correspondientes, requerirá al Poder Ejecutivo que informe, dentro del plazo perentorio de treinta días de recibida la comunicación, si el hecho investigado lo considera comprendido o no en el artículo 1º de la presente ley. Si el Poder Ejecutivo así lo comunicare, el Juez dispondrá la clausura y el archivo de los

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“conseqüência da lógica dos eventos decorrentes do Pacto do Clube Naval” e necessária “de modo a completar a transição para uma total ordem constitucional ”. A anistia foi planejada de modo a prevenir o Estado de exercitar seu poder de persecução penal “a respeito de crimes cometidos até 01 de março de 1985, por militares ou oficiais de polícia tanto por razões políticas quanto pelo cumprimento de suas funções ou obediência a ordens de seus superiores durante o perído de exceção”. Isto incluía sérias violações aos direitos humanos como tortura, assassinatos e desaparecimentos Esta lei apenas se aplicava aos casos futuros, pois o artigo 2º explicitamente excluía casos em que já tivesse havido indiciamentos. A segunda anistia sofreu uma considerável oposição de ativistas de direitos humanos que conseguiram forçar um referendo sobre a lei de anistia. Mas eles foram malsucedidos em sua campanha, pois em 1989 a lei de anistia foi aprovada por 57 por cento dos votantes. Este referendo é freqüentemente lembrado como um exemplo de aprovação democrática. Por sua parte, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos considerou essa lei incompatível com a Convenção, nos seguintes termos: 1. Concluye que la Ley 15.848, del 22 de diciembre de 1986, es incompatible con el artículo XVIII (Derecho de justicia) de la Declaración Americana de los Derechos y Deberes del Hombre, y los artículos 1, 8 y 25 de la Convención Americana sobre Derechos Humanos. 2. Recomienda al Gobierno del Uruguay que otorgue a las víctimas peticionarias, o a sus derechohabientes, una justa compensación por las violaciones a las que se hace referencia en el párrafo precedente. antecedentes. Si en cambio, no contestare o informa que no se halla comprendido dispondrá continuar la indagatoria. Desde la fecha de promulgación de esta ley hasta que el Juez reciba la comunicación del Poder Ejecutivo quedan suspendidas todas las diligencias presumariales en los procedimientos mencionados en el inciso primero de este artículo. Artículo 4º. Sin perjuicio de lo dispuesto en los artículos precedentes el Juez de la causa remitirá al Poder Ejecutivo testimonios de las denuncias presentadas hasta la fecha de promulgación de la presente ley referentes a actuaciones relativas a personas presuntamente detenidas en operaciones militares o policiales y desaparecidas así como de menores presuntamente secuestrados en similares condiciones. El Poder Ejecutivo dispondrá de inmediato las investigaciones destinadas al esclarecimiento de estos hechos. El Poder Ejecutivo dentro del plazo de ciento veinte días a contar de la comunicación judicial de la denuncia dará cuenta a los denunciantes del resultado de estas investigaciones y pondrá en su conocimiento la información recabada.” Disponível em: http://200.40.229.134/leyes/AccesoTextoLey.asp?Ley=15848&Anchor= Consultado em 5/7/09.

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3. Recomienda al Gobierno del Uruguay la adopción de las medidas necesarias para esclarecer los hechos e individualizar a los responsables de las violaciones de derechos humanos ocurridas durante el período de facto.” 563

No ano 2005 novamente foi questionada a lei de anistia, propondose sua anulação. Assim, o governo propôs a possibilidade de estabelecer uma lei interpretativa que permitisse julgar alguns casos em que participaram civis ou que estavam fora do período da ditadura, mas sem êxito. Posteriormente, já em 2006, familiares de desaparecidos juntos com organizações de direitos humanos lançaram uma campanha propondo a caducidade dessa lei 564 . Em 4 de setembro de 2007 foi iniciada a campanha de recolhimento de assinaturas com a finalidade de levar a plebiscito a anulação da lei de anistia, à qual se soma o apoio de partidos políticos (Frente Amplio) 565 . Como resultado da campanha foram entregues nos dia 14 e 25 de abril de 2009, 338.449 assinaturas 566 . Assim, no dia 14 de junho último a Corte Eleitoral do Uruguai confirmou que seria realizado o plebiscito nas próximas eleições nacionais 567 . Paralelamente, no processo judicial iniciado por conta da morte de Nibia Sabalsagaray em 1974 568 , a fiscal Mirtha Guianze interpos recurso de insconstitucionalidade da lei de caducidade, sendo o mesmo remetido à Suprema Corte de Justiça, que, por sua vez, requereu manifestação dos que “podiam ter interesse em defender a lei”, a saber o Poder Executivo e o Poder Legislativo, que se manifestaram em favor da declaração de inconstitucionalidade da lei 569 .

563 Disponível em: http://www.ccee.edu.uy/ensenian/catderpu/material/inanual.PDF. Consultado em 5/7/09. 564 Disponível em: http://www.espectador.com/1v4_contenido.php?id=71440&sts=1 – Consultado em 5/7/09. Disponível em: http://www.presidencia.gub.uy/_web/noticias/2006/08/2006080802.htm Consultado em 5/7/09. Vide também, GOLDARACENA, Oscar. Derecho Internacional y Crímenes contra la Humanidad . Montevideo: FCU, 2008. 565 Disponível em: http://www.larepublica.com.uy/politica/289419faadhirioalaanulaciondelaley decaducidad Consultado em 05/07/09. 566 Disponível em: http://www.larepublica.com.uy/politica/361559entregaron13676firmasmas anoche Consultado em 05/07/09. 567 Disponível em: http://www.larepublica.com.uy/politica/368811habraplebiscitoayeralas1635 horaslacorte elec toralfinalizoconelconteo http://www.larepublica.com.uy/politica/368811habra plebiscitoayeralas1635horaslacorteelectoralfinalizoconelconteo Consultado em 05/07/09. 568 Processo “Curutchet, Blanca StelaDenuncia Excepción de Inconstitucionalidad, Art. 1, 3 y 4 de la Ley Nº 15.848 Ficha 97397/2004". 569 O Poder Executivo se manifestou em 17 de fevereiro de 2009, aceitando a inconstitucionalidade: “Que evacuando el traslado conferido por auto Nº 78 de 6 de febrero de 2009, conforme a lo dispuesto en el Artículo 516.1 del Código General del Proceso viene en la representación invocada a allanarse a la pretensión de declaración de inconstitucionalidad por vía de excepción planteada por el

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Apesar das leis de anistia, existiram alguns procedimentos investigatórios. Em tal sentido, os juízes começaram a considerar que os crimes cometidos fora do Uruguai não se adequavam à lei de 1986, nem os casos em que foram acusados civis. Esta interpretação da Lei de Caducidade da Pretensão Punitiva do Estado também foi articulada pelo governo por meio de sua submissão à Comissão Interamericana de Direitos Humanos com relação a uma petição de 2007 do pai de uma mulher que desapareceu por ação do Estado em 1976. No entanto, tentativas de se estabelecer esta interpretação como uma interpretação autêntica da legislação por meio de lei parecem encontrar forte oposição dos militares e dos partidos de direita. No ano de 2002 a administração do Presidente Tabaré Vázquez buscou iniciar processos sobre os abusos cometidos, inclusive contra o ex presidente Juan Maria Bordaberry e Juan Carlos Blanco, e o seu chanceller, sob acusações de homicídio 570 , sendo condenados em 2006 571 . Cabe observar que, em função do artigo 3 da lei de caducidade, o juiz que recebe a denúncia a respeito de investigações no período abrangido pela mesma deve realizar consulta ao Poder Executivo a fim de que se manifeste sobre o arquivo do caso ou a continuação da investigação, caso considere que o fato investigado não está incluído na lei.

Ministerio Público y Fiscal, con respecto a los Artículos 1, 3 y 4 de la ley 15.848 de 22 de diciembre de 1986” Disponível em: http://www.larepublica.com.uy/politica/353280poderejecutivolaleyde impunidadesinconstitucio nal consultado em 5/7/09. Poder legislativo, reunido em Assembléia Geral, em 25 de fevereiro de 2009, também aceitou a inconstitucionalidade da lei, nos seguentes termos: "Evacuando el traslado por auto conferido Nº 78 del 6 de febrero de 2009 vienen a allanarse a la Pretensión de declaración de inconstitucionalidad por vía de excepción planteada por el Ministerio Público y Fiscal a los artículos 1º, 3º y 4º de la Ley 15.848 del 22 de diciembre de 1986. Por lo expuesto, a la Suprema Corte de Justicia solicita 1) Se les tenga por presentado, constituido el domicilio y evacuado el traslado. 2) Se tenga presente el allanamiento del Poder Legislativo a la excepción interpuesta" . Disponível em: http://www.larepublica.com.uy/politica/354321historicoparlamentosepronunciopor lainconstitucionalidaddelaleydecaducidad consultado em 5/07/09. 570 A imputação é pelos homicídios de Zelmar Michelini, Héctor Gutiérrez Ruiz, Rosario Barredo y William Whitelaw, ocorridos em maio de 1976, na República Argentina, precedidos dos quatro homicídios, do seqüestro das vítimas e furto de seus pertences, em um mesmo procedimento criminal. 571 Vide sentença de 16/11/06, Disponível em: http://memoriaviva5.blogspot.com/2008/12/sentencia deljuezrobertotimbal.html consultado em 5/7/09. Cabe observar que Blanco também foi condenado anteriormente e responde outros processos (Disponível em: http://memoriaviva5. blogspot.com/2008/07/sentenciadeljuezeduardocavallijuan.html consultado em 05/09/09).

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O governo do Frente Amplio tem optado em favor de excluir os casos que foram remetidos pelo Poder Judicial, permitindo, assim, a investigação das violações de direitos humanos 572 . Por outra parte, a familia de Eugenio Berríos, químico e ex agente da Dirección de Inteligencia Nacional (DINA) da ditadura de Augusto Pinochet pretende reclamar ante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, a responsabilidade uruguaia pela morte deste em 1993, em mãos de militares uruguaios, por considerar que foi um caso de "lesa humanidad" 573 . Resta observar que, na oportunidade, seja no governo de transição ou etapa posterior, não foram observados processos administrativos dentro da própria força pelas violações de direitos humanos.

4.4. Princípio Terceiro: reconhecimento do status de vítima e estabelecimento de sistema de reparações

O Uruguai ainda, não estabeleceu um sistema geral de reparações, apesar do fato de que a Corte Interamericana de justiça já se manifestou expressando que as medidas de reparação devem ser estabelecidas desde uma perspectiva integral sóciocoletiva, que transcenda o patrimonial 574 . Assim as pessoas para obter reparações devem iniciar ações isoladas em tal

572 Assim, nos seguintes casos: em 31/10/2005 decreto n. 356 em favor de Washington Barrios; 31/10/2005 decreto n. 358 em favor de Horacio Ramos; 12/12/2005 decreto n.430 em favor de Claudia Garcia de Gelman; 24/05/2006 decreto n. 627 em favor de Adalberto Soba; 27/06/2006 em favor de Leonardo De Los Santos; 02/08/2006 decreto n. 748 em favor de María Emilia Islas, Juan Pablo Recagno, Ary Cabrera, Juan Errandonea, Armando Bernardo Arnone; 16/04/2007 decreto n. 1230 em favor de Alberto Mechoso, León Duarte; 14/05/2007 decreto n. 1261 em favor de Juan Morales, Josefina Klein, Roger Julián, Juan Pablo Errandonea, Victoria Grisonas, Jorge Zaffaroni, Cecilia Trías, Raúl Tejera, Washington Cram, Rafael Lezama, Ruben Prieto, Jorge Chejenian, Graciela Martínez de Chejenian, Miguel Moreno, Casimira Carretero, Carlos Rodríguez Mercader, Juan Pablo Recagno, Washington Queiro; 11/06/2007 decreto n. 1290 em favor de José Michelena Bastarrica, Graciela Susana de Gouveia, Eduardo Desetti, Ileana García, Julio D'Elía, Yolanda Casco, Guillermo Sobrino, Gustavo Goicochea, Graciela Basualdo, Juvelino Carneiro Da Fontana, Miguel Ríos, Aida Sanz, Elsa Fernandez, Eduardo Gallo, Carlos Cabezudo Pérez, Cecilia Gómez, Carolina Barrientos. 573 Disponível em: http://www.nuestratele.tv/content/uruguayseradenunciadooeaasesinato1993 eugenioberrios consultado em 6/7/09. 574 Corte Interamericana de Derechos Humanos, Caso LOAYZA TAMAYO. Sentencia de 27 de noviembre de 1998, Serie C, Nº 42. Fundamento de voto conjunto de los jueces A.A. Cançado Trindade y A. Abreu Burelli, párrafo 9.

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sentido 575 .

575 Corte IDH. Caso Goiburú y otros Vs. Paraguay . Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 22 de septiembre de 2006. Serie C No. 153. Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/ pais.cfm?id_Pais=5 consultado em 29/07/09.

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OBSERVAÇÕES GERAIS

1. A partir da metade do Século XX, os direitos humanos foram considerados com especial relevância na medida em que o direito internacional foi se aperfeiçoando como instrumento idôneo para garantir a paz mundial. O direito de gentes , ao qual os estados recorriam para a solução dos conflitos armados, foise transformando em um direito de paz, de entendimento entre as nações, de tal forma que o seu desenvolvimento implicou um discurso de limitação da guerra, bem como dos seus terríveis efeitos. Um dos grandes triunfos do direito internacional, senão o maior foi, sem dúvida, a consideração da guerra como um ato ilícito internacional. As normas que regulamentam quando um estado pode exercer atos bélicos (jus ad bellum) , foram acompanhadas de outras que tentaram estabelecer como os estados devem atuar quando se encontram em conflito (jus in bello) . Assim, então, desenvolveuse o direito internacional humanitário, depois, o direito internacional dos refugiados (considerando as vitimas deportadas, perseguidas, desabrigadas e vítimas da fome e das enfermidades), e finalmente, o direito internacional dos direitos humanos.

2. A segunda guerra mundial teve incidência capital no direito internacional, estabelecendo um antes e um depois, em todos os sentidos. De uma parte, foi estabelecido um sistema normativo e institucional como resposta às graves violações aos direitos dos seres humanos cometidas pelo nazismo, na crença de que parte dessas violações poderiam ser prevenidas no futuro. De outra, em um discurso em que só eram protagonistas os estados, foi reconhecida a pessoa humana. Isso implicou, de uma parte a responsabilidade pessoal pelos atos lesivos às violações de direitos humanos, quebrando assim, a tradição, resistida até nos pactos posteriores à primeira guerra mundial, de que o soberano não poderia ter responsabilidade individual por seus atos. De outra, o reconhecimento da pessoa humana como titular de direitos que poderiam ser atingidos pelos estados. A partir desse momento, no cenário internacional, além dos estados, aparecem as pessoas de carne e osso.

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No trabalho foi observado que o sistema de direitos humanos tem desenvolvido normas, procedimentos e instituições que têm por objetivo promover e salvaguardar os direitos da pessoa humana das ações ou atividades lesivas dos estados. A Organização das Nações Unidas, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, os sistemas de proteção mundial e regional propostos foram elaborados com o intuito de garantir a paz e proteger a pessoa humana das atividades lesivas dos estados. Isso significa que o desenvolvimento dos direitos humanos, e me atreveria a dizer sua genealogia, se estabelece como uma via de mão única, no sentido de que sua funcionalidade é limitar as atividades dos estados em favor da pessoa humana, seja mediante a limitação da guerra, ou dos seus terríveis efeitos .

3. Cabe observar que esse sistema, que em tese seria mundial e/ou universal, na prática, temse manifestado de forma seletiva. Cabe dizer que a manifestação é seletiva porque é possível observar que o sistema de direitos humanos não foi aplicado a todos os países e para todos os conflitos. Longe disso, o sistema tem sido aplicado para alguns países e, logicamente, para alguns conflitos. Essa observação que é de natureza empírica se impõe, pois do contrário a análise seria de um autista, e qualquer proposta que se procure fazer não teria viabilidade fora do papel. A seletividade foi possível porque no próprio desenho da ONU se admitiu um espaço de anomia mediante o reconhecimento do poder de veto em favor das grandes potências, que assim se reconheceram após a guerra. Não é o espaço para o desenvolvimento dessa questão, porém, se impõe sua consideração para entender porque a seletividade foi e é possível. Embora o discurso jurídico tenha caminhado em favor das construções teóricasnormativas, de orientação kelseniana, que eliminavam a decisão, como problema político do campo do direito, o certo é que o direito existe e opera a partir de uma decisão. A realidade tem se mostrado como um abismo para o direito que achava que tudo podia ser previsto e que, sem decisão, poderia sobreviver. Se a decisão deve ficar fora do direito ou dentro dele, é uma longa discussão, cuja solução não será proposta neste espaço, porém, pelo menos aqui, cabe reconhecer que a norma e a decisão são elementos que, pelo menos,

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coexistem e de alguma forma vinculamse entre si. Ou seja, direito e política não estão tão distantes quanto se achava. A decisão no campo do direito se manifesta, tanto no momento de criação da norma, quanto no momento do seu reconhecimento e, finalmente, de sua aplicação. A decisão implica uma escolha, e essa escolha importa uma seleção a partir de pelos menos uma alternativa. De tal forma que a origem da norma, e sua aplicação dependerá da decisão política que se adote em função das alternativas apresentadas. Mais concreto, o sistema de direitos humanos importa uma decisão política no plano internacional que, sobre determinadas matérias, procura ter vigência universal. Porém, como qualquer outra expectativa dentro da comunidade internacional encontra realização segundo o sistema institucional que, como foi dito, admite exceções.

4. O período posterior à segunda guerra foi marcado pela tensão de duas grandes potências que, com ambição planetária, tem incidido no resto da comunidade internacional (em rigor não eram as únicas, e isso foi demonstrado com o decorrer do tempo, que outras potências reclamaram e ainda reclamam espaço internacional). Dessa tensão surgiram ao longo do tempo diversos conflitos, que geraram inúmeros genocídios, ou pelo menos, inúmeras mortes e calamidades de toda sorte. A resposta internacional a esses conflitos tem sido seletiva em função das potências ou países envolvidos. A decisão política tem brilhado tanto em relação à consideração ou não dos conflitos como lesivos de direitos humanos, bem como à resposta oferecida em função de suas conseqüências. O sistema internacional de direitos humanos, então, teve que ser reajustado. No plano internacional foi estabelecido o Conselho de Direitos Humanos com o intuito de mitigar o funcionamento do Conselho de Segurança; e o Tribunal Penal Internacional, como forma de prevenir e responder a futuras violações de direitos humanos, quando não é aplicado o direito interno. Novamente, não é o espaço para discutir essas matérias, mas, não poderia deixar de tomar posição, manifestando a inviabilidade das duas propostas. A primeira, porque na medida em que exista o poder de veto, sempre

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existirá a possibilidade de excepcionar, sem que contra isso o CDH possa ter alguma incidência concreta. O estatuto de Roma e criação do TPI, também, não passam de uma ficção, na qual os grandes ditadores, genocidas, ou em suma os responsáveis pelas violações de direitos humanos vão ficar intimidados ou limitados sabendo que os crimes por eles cometidos encontramse tipificados em uma norma internacional e que poderiam ser julgados por um tribunal internacional. Da mesma forma, que sua aplicação protegerá de forma imparcial os direitos destes, se é que chegam a sua jurisdição. Uma análise realista evidencia que a aplicação da norma, e em especial a punitiva é essencialmente seletiva, razão pela qual, enquanto exista a possibilidade de excepcionar o sistema geral de direitos humanos, o sistema só será aplicado a aqueles países e pessoas que não tem esse estado de exceção ao seu favor ou que, por razões políticas perderam a cobertura que os detentores desses estados lhes conferiam. Por outra parte, no plano interno, foram aprofundados os estudos sobre as respostas elaboradas pelas comunidades e os estados às graves violações de direitos humanos. O estudo dessas respostas permitiu a elaboração dos chamados princípios de pósconflitos de justiça como estágio importante na evolução das políticas de proteção e defesa dos direitos humanos.

5. Os princípios de Chicago sobre pósconflitos de justiça buscam estabelecer responsabilidades pelas violações de direitos humanos nos momentos posteriores ao desenvolvimento dos conflitos, cuja compreensão exige uma abordagem interdisciplinar, além da mera aproximação formal legalista, que raramente satisfaz as necessidades das vítimas. Cabe observar que esses estudos foram orientados no sentido de contribuir para garantir a paz, a segurança e a reconstrução nacional em função das experiências passadas. O estudo dos pósconflitos de justiça permitiu a elaboração de princípios ou diretrizes que resultam de utilidade para orientar as políticas públicas e estratégias dos atores internacionais e locais, claro que segundo as necessidades dos povos em função das suas especificidades contextuais e culturais.

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Nesse sentido, a recepção dos princípios de pósconflitos de justiça pode constituir um estágio importante na evolução das políticas de proteção e defesa dos direitos humanos.

6. Os princípios elaborados são sete, e propõem diversos tipos de respostas. Com efeito, o princípio primeiro, que propõe a perseguição e julgamento dos responsáveis pelas violações de direitos humanos e leis humanitárias, oferece o modelo punitivo como forma de decisão do conflito. O princípio segundo, que exige o respeito do direito à verdade e o fomento de investigações sobre o passado de violações de direitos humanos, se apresenta como uma resposta conciliadora. O principio terceiro, que exige o reconhecimento do status de vítimas, o acesso à justiça e o desenvolvimento de medidas paliativas e de reparações, oferece uma resposta reparadora e terapêutica. O princípio quarto, que exige a implementação por parte dos estados de procedimentos policiais, bem como sanções e medidas administrativas, apresentase como uma resposta inserida no modelo punitivo. O princípio quinto, que exige por parte dos estados o apoio de programas e iniciativas populares em favor da memória das vítimas, além de políticas públicas de educação, considerando o passado de violência política, constitui uma resposta inserida no modelo conciliador. O princípio sexto, que exige por parte dos estados o respeito às tradições indígenas, se apresenta como uma resposta inserida no modelo conciliador. O princípio sétimo, que exige por parte dos estados a promoção de reformas institucionais para reforçar o estado de direito, promovendo os direitos fundamentais, constitui uma resposta que se insere no modelo corretivo e conciliador.

7. Ante um conflito, os modelos de respostas possíveis podem gerar sua solução, o que ocorre quando entre as partes os interesses deixam de estar em tensão ou contradição, fazendo com que o conflito deixe de existir como tal, ou sua suspensão ou supressão, quando esta não é possível.

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A solução é possível no modelo de resposta conciliadora porque as partes devem agir com consenso, o que leva à satisfação dos interesses em jogo. No modelo reparador a solução, também é possível, porque a resposta tenta deixar as partes na situação prévia ao conflito, isto é, quando não existia como tal. A suspensão acontece quando os conflitos são inconciliáveis, seja pela falta de capacidade de diálogo ou pela impossibilidade de reparação. Nesses casos o conflito se projeta no tempo, na expectativa de que os agentes mudem ou a situação factual mude partir do desenvolvimento das capacidades necessárias para a solução do conflito. No modelo terapêutico, e poderia ser somado o corretivo, aguardase que os agentes, ou uma parte deles, consigam desenvolver as capacidades necessárias para conciliar os interesses em conflito. No modelo punitivo, o conflito se suspende no tempo, aguardando o seu esquecimento ou simplesmente a supressão de um dos interesses em conflito. Na solução de um conflito os interesses envolvidos são satisfeitos, motivo pelo qual parece plausível a utilização de respostas orientadas a esse sentido (conciliadoras e reparadoras) Por outra parte as respostas que suspendem o conflito resultam questionáveis, uma vez que não procuram a solução do conflito. Dentre elas, cabe distinguir a terapêutica da punitiva, uma vez que a primeira, por interferir na pessoa permite sua solução, enquanto que, a segunda, na medida em que simplesmente dispara o conflito no tempo ou suprime uma das partes, não tem como obter a solução do conflito. Nos casos de graves violações de direitos humanos as respostas formalizadas têm procurado aproveitar os modelos ao alcance, a saber: a conciliação dos grupos sociais, a reparação das vítimas, a correção das partes envolvidas, na expectativa de que não aconteçam esses fatos novamente, e o modelo punitivo contra os responsáveis por essas ações.

8. No presente trabalho foi possível observar como a tensão entre os Estados Unidos e a União Soviética, com desenhos políticos colidentes, tem incidido na nossa margem. Com efeito, as grandes mudanças na política latino

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americana dos anos 50/60 teve como resposta o modelo norteamericano imposto, em parte, pela força mediante a instauração de ditaduras. Cabe dizer em parte porque conforme referenciado na descrição da instauração do regime ditatorial brasileiro, grande parte da população apoiou a quebra da ordem constitucional em favor da instauração de um novo governo. Infelizmente a referência a fatores externos tem sido a estratégia corriqueira para eliminar ou, pelo menos diminuir a própria responsabilidade. No presente trabalho, para evitar isso, procurouse fazer pouca referência ao plano Condor, focalizando, no entanto, a situação interna.

9. O governo, legitimamente estabelecido, foi despojado do poder por um ato de violência, na qual participaram parte das classes políticas e militares mais relevantes do país. Esses atos de violência constituem um ato fundador de uma nova ordem jurídica, cuja viabilidade dependia da sua identificação com as expectativas da população. Nesse contexto, foram apresentadas as editoras dos jornais da época que colocaram em evidência o forte apoio de parte da classe dirigente e da população em geral. Cabe observar que o fundamento último dessa ordem tem sido a violência, mas sua manutenção foi acompanhada, pelo menos em parte, de consenso. A declaração de vacância da presidência da república é um exemplo evidente do exposto. A violência expulsou o governo legítimo, e o consenso sobre a nova ordem instituiu a nova autoridade. Desde esse momento, os acontecimentos posteriores, de disputa política habilitaram uma violência conservadora da ordem jurídica imposta. Nessa altura, a violência era exercida contra os opositores do regime ou desse novo regime de governo, e por isso contava com grande apoio da população, e de outra, sua indiferença. Quando a disputa política se foi apresentando entre os mesmos cúmplices que pretendiam usufruir as vantagens resultantes da quebra da ordem constitucional, o poder foi se debilitando e, conseqüentemente, o regime expandiu sua onda de violência.

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Essa violência conservadora, generalizada, começou a ter maior exposição e com isso maior crítica, ao tempo que a mesma perdia o controle de si própria, gerando um estado policial de anomia. O transcurso do tempo e o permanente recurso à violência foram corroendo a estrutura de poder imposta de tal forma que finalmente o regime se viu sustentado pela violência, gerando um estado do terror (governo Médici). A proposta de um governo de transição foi a saída encontrada para colocar um freio na violência e provocar o consenso em favor da estrutura de governo. Assim o caminho começa a ser inverso, isto é, a redução gradativa do uso da violência em favor de um sistema político de maior consenso. Isso implicou, também, a adoção de medidas de pacificação que minimizassem o uso da violência entre os grupos em conflito. A transição se deu para ambos os sentidos, permitindo o uso dos direitos políticos e assim, a eleição de um presidente em condições de maior liberdade (1985), como último passo, para o retorno da vida democrática (1988/1989). A lei de anistia em favor de condenados por crimes políticos, mas que também incluiu os crimes conexos é o reflexo desse momento de transição, onde não havia um pleno uso da força, nem tampouco pleno consenso. Com relação ao passado de violações de direitos humanos foi oferecida, também, uma resposta reparadora, que tem como pressuposto o reconhecimento da lesão dos direitos a serem reparados, mediante um sistema amplo de pensões e compensações econômicas e, em alguns casos, mediante o retorno à função que possuía antes da quebra da ordem constitucional. Com o tempo o sistema de reparações foi se aperfeiçoando ampliando o âmbito temporal de aplicação e, também, a abrangência de pessoas beneficiadas. O processo de transição contou com a participação dos mesmos atores, ou pelo menos os que restaram; de uma parte os que se opuseram ao regime, de outra aqueles que o apoiaram desde o começo até o fim, ou até o momento em que sentiram que não tiveram o espaço que pretendiam. Por tal motivo, é compreensível que não houvesse espaço para as investigações pelas graves violações de direitos humanos. Isso implicaria a habilitação de punições, isto é, mais violência contra aqueles que ainda participavam da vida política do país, e isso não se limitava aos militares.

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Cabe lembrar que uma parte importante da classe política tinha apoiado o regime militar, e consequentemente deveria ter responsabilidade pelo acontecido no regime ditatorial que ajudaram a estabelecer. Em tal sentido cabe lembrar que desde o ato institucional n. 1 os direitos políticos foram cassados abstraindo tais atos de apreciação judicial, ou seja, desde o início começou a caça às bruxas, então não se pode simplesmente afirmar o desconhecimento do que iria suceder. Mais comprometida é a responsabilidade cível uma vez que, segundo princípio geral do direito, cada um deve reparar o dano que causa. A tentativa de saber a verdade a respeito do passado de violações de direitos humanos só aconteceu em 1995, porém, limitada ao estudo de casos de mortes ou de desaparição forçada de pessoas. O resultado da comissão só viu a luz em 2007, sendo lançado o resultado do informe na forma de livro no ano de 2008! Ou seja, passaram mais de 11 anos de trabalho para finalmente reconhecer os 136 casos já conhecidos em 1995, esclarecer mais 221 casos de violações de direitos humanos, indeferindo outros 118. O magro resultado da comissão depois de tanto tempo põe em evidencia a falta de interesse das políticas governamentais e da classe política em geral, por esclarecer o passado de violações de direitos humanos, pois além dos casos em estudo, existem muitos outros em que as pessoas foram submetidas a torturas e outros tratos cruéis desumanos e degradantes que não foram investigados. A abertura de arquivos do período ditatorial para a população só teve lugar no ano de 2005, e de forma parcial, não só porque grande parte foi destruída, senão também porque parte do conteúdo ainda tem restrições para sua consulta.

11. Do exposto é possível concluir que até a presente data o Brasil optou por oferecer respostas conciliadoras e reparadoras às graves violações de direitos humanos, sendo atualizados os princípios segundo, de forma parcial, e terceiro do sistema de pósconflitos de justiça. O princípio terceiro tem sido atualizado uma vez que foi oferecido um sistema amplo de reparações às vítimas das violações de direitos humanos.

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O princípio segundo foi reconhecido de forma parcial, pois, a comissão da verdade foi instaurada de forma tardia e os resultados demorados ficaram limitados ao universo de casos em que as violações de direitos humanos terminaram com mortes ou desaparições forçadas de pessoas.

12. Com relação à perseguição criminal ou administrativa, de violações de direitos humanos, princípios primeiro e quarto, o Brasil tem demonstrado manifesto desinteresse até a presente data. Em tal sentido o Brasil, como outros países da região que enfrentaram um processo ditatorial similar, articulou como mecanismo de conciliação a anistia pelas violações de direitos humanos. As torturas, bem como a imposição de outros tratos cruéis desumanos ou degradantes, os homicídios e as desaparições de pessoas constituem crimes segundo o direito interno ou doméstico. A perseguição e punição dessas condutas, então, têm dependido, mais de uma decisão política que de um problema de previsão normativa. Portanto, o fato de constituir um crime segundo o direito internacional, é uma questão de segunda ordem, que será tratada mais na frente. Como foi observado, precedentemente, a decisão política adotada no momento da anistia tem sido a não punição dos chamados crimes conexos, habilitando assim um manto de impunidade para os autores dessas graves violações de direitos humanos, mediante a alegação de que assim se contribuía à conciliação nacional. Poderseia abrir o debate acerca de se a anistia, na forma em que foi estabelecida, foi um mecanismo necessário para a conciliação nacional, o que em parte seria fácil após 30 anos. Mas a meu ver, a medida deveria ser avaliada desde a ótica de quem tinha que tomar a decisão nesse tempo e contexto, com as incertezas das conseqüências emergentes da decisão a ser tomada. Aí a análise muda totalmente, porém, sua resposta ficará fora de nosso trabalho. O que sim é possível esclarecer é que essa decisão, de natureza política, foi seletiva. Como toda decisão política que envolve uma resposta conforme o modelo punitivo, sua elaboração, bem como sua aplicação responde a uma seletividade.

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A seletividade tem dominado a elaboração da lei de anistia, pois não abrangeu a todos senão alguns, a saber: os condenados por crimes políticos (art. 1, caput), que foram atribuídos à dissidência do regime e os autores dos crimes conexos (art. 1 § 1), que seriam atribuídos aos participantes do regime. Mas, excluiu os crimes de sangue (terrorismo, assalto, seqüestro e atentado pessoal) (art. 1, § 2) que foram cometidos também pela dissidência. Essa exclusão é significativa, pois, estabelece o marco até onde a conciliação foi possível em função dos interesses e forças em jogo. Como já foi dito, a lei de anistia é o reflexo de um momento de transição, onde não havia um pleno uso da força, mas tampouco pleno consenso nas medidas a serem tomadas pelos dirigentes políticos. Foi elaborada a Constituição do ano 1988, outra lei de anistia, mas a norma que estabeleceu a impunidade para crimes conexos não foi alterada, o que reflete no transcurso de quase 30 anos o desinteresse pela classe política de punir essas graves violações de direitos humanos. O porquê dessa posição, entendo, pode ter pelo menos duas respostas.

13. Como pressuposto contextual, cabe ter presente que a perseguição por essas práticas implicaria a habilitação de punições, isto é mais violência, contra aqueles que, ainda, participavam da vida política do país, e isso não se limitava à militares. A primeira resposta, então, tornase evidente: a opção em favor da não punição do passado de violações de direitos humanos importou uma forma de assegurar a não autoincriminação. Por além dos anelos de parte da população, a autoincriminação é inexigível e, por isso aquela classe política que tinha colaborado com o regime optou em favor de uma resposta que garantisse a exclusão de sua própria responsabilidade. Novamente, vale lembrar que uma parte importante da classe política tinha apoiado o regime militar, e conseqüentemente deveria ter responsabilidade pelo acontecido no regime ditatorial que ajudaram a estabelecer. Cabe observar que essa participação inicial, em termos penais, estabelece uma posição de garantidor que ante o desenvolvimento causal produzido

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impõe um especial dever de agir que não sendo cumprido responsabiliza ao autor de forma equivalente a quem produz o resultado de forma ativa (art. 13 do CP). A fragilidade da memória, bem como a participação ativa dos formadores de opinião fizeram com que se instalasse a idéia de que no ano de 1964 aconteceu um golpe militar, quando na realidade aconteceu um golpe cívicomilitar , do qual muitos deles, junto com parte da classe política, têm sido partícipes.

14. A segunda resposta surge do estudo comparado das respostas pósconflituais oferecidas por países da região que sofreram um regime ditatorial semelhantes, às vezes com repressões mais profundas ou intensas. Foram analisados o Chile, o Uruguai, o Paraguai e a Argentina. O Chile estabeleceu a lei de anistia no ano 1978, ainda encontrandose no poder o regime ditatorial. Só a instância do julgamento do caso AlmonacidArellano na CIDH, a Corte Suprema aceitou, no ano 2005, o entendimento de que esses crimes deviam ser investigados. O Uruguai estabeleceu a lei de anistia em 1985, não sendo aplicada a militares. Ante as reclamações contra os militares pelo passado de violações de direitos humanos, estes ameaçaram promover grandes insurreições. A tensão culminou com uma lei de caducidade da pretensão punitiva do estado, que teve como efeito impossibilitar a perseguição criminal. A peculiaridade do caso uruguaio foi que essa lei foi submetida a referendo, em 1989, sendo aprovada pela população com um 57 % de votantes. Aguardase que no ano em curso, 2009, novamente seja submetida a referendo. Entretanto, cabe observar que existe declaração dos poderes executivo e legislativo em favor da declaração de inconstitucionalidade dessa lei. Também, que a partir do ano 2002, foram julgados e condenados militares por terem cometido crimes contra uruguaios fora do território nacional, que, segundo o entendimento, não seriam abrangidos pela mencionada lei. No caso da Argentina, o regime militar, no seu final estabeleceu uma lei de anistia que incluía tanto os crimes praticados por terroristas e subversivos, quanto os praticados por militares. Contudo, cabe observar, foram excluídos os crimes de sangue, o que fazia que na prática a anistia não fosse aplicada aos terroristas e subversivos.

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Após a volta da democracia o presidente deixou sem efeito a lei de anistia, por ser inconstitucional e insanavelmente nula. Assim mesmo submeteu a julgamento os militares que integraram as juntas de governo do regime, bem como pessoas que participaram da guerrilha. Assim mesmo foram iniciados processos contra o resto dos participantes das forças armadas, o que motivou movimentos de insurreição militar. Ante esse quadro de situação o governo aprovou a lei de ponto final, estabelecendo o prazo a partir do qual já não seria possível a instauração de processos sobre fatos ocorridos na ditadura. Como mesmo assim foram instaurados muitos processos, os militares responderam com novos movimentos, o que levou a estabelecer a lei de obediência devida. Como essa lei não assegura a impunidade dos altos escalões da hierarquia militar, houve ainda dois novos alçamentos, o que motivou que, já com Menem no poder, fossem concedidos indultos para esses militares e civis que participaram no regime, bem como participantes da guerrilha armada. O questionamento dessas normas desincriminadoras terminou com a revogação da lei de anistia em 1998 e sua anulação em 2003. A confirmação da inconstitucionalidade dessas normas por parte da Corte, teve como efeito a instauração de procedimentos contra os responsáveis pelas violações de direitos humanos. No Paraguai, não houve lei de anistia, nem norma anômala desincriminadora, razão pela qual foram possíveis os julgamentos, embora com demora considerável que motivou a intervenção da Corte Interamericana de Direitos humanos.

15. Desta breve síntese é possível observar que o Paraguai e a Argentina procuraram realizar julgamentos por crimes cometidos no regime ditatorial, sendo que o primeiro teve que suportar diversos levantamentos armados, o que motivou o estabelecimento de regras limitadoras da punição. No caso do Paraguai os julgamentos foram possíveis, porém cabe observar, mediante a quebra da ordem imposta na ditadura, pois nesse país houve um golpe ao golpe militar do antigo ditador, com forte apoio popular, pois nas eleições posteriores esse candidato ganhou com 74 % dos votos. Nesse contexto, então, é possível que a seletividade estabelecida pela linha opositora de Stroessner

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tenha podido habilitar o modelo punitivo contra os partícipes do regime ditatorial deposto. No Chile e Uruguai, o caminho de transição impôs a adoção de mecanismos limitadores da punição contra os responsáveis pelas graves violações de direitos humanos, sendo que no segundo, houve um referendo, legitimando a adoção dessas medidas.

16. Dentro desse marco referencial é possível observar como as estratégias punitivas tiveram que se ajustar ao marco social e político de cada país. Nos casos em que as pretensões políticas ultrapassaram as possibilidades fáticas de realização enfrentaram sérios problemas, que colocaram em crise a ordem institucional do país. A resposta nesses casos teve que se ajustar em função daquilo que era possível (Argentina) ou ao que, nesse momento histórico, a maioria desejava (Uruguai). O governo que optou em favor de políticas de transição que garantiram a impunidade pelas graves violações de direitos humanos conseguiu voltar à ordem constitucional sem sobressaltos, porém, com o custo internacional de não ter punido esse tipo de condutas (Chile). Finalmente, o governo que teve a possibilidade de habilitar a punição conseguiu estabelecer a resposta punitiva, porém, devendo fazer frente aos problemas operacionais decorrentes da adoção dessa política (Paraguai)

17. No caso do Brasil, e com isso procurase a segunda resposta, é possível observar que se optou por uma política de transição que garantisse a impunidade pelas graves violações de direitos humanos. Essa opção deve ser avaliada no contexto social e político em que foi tomada, isto é no ano de 1979, e nesse sentido, parece que a habilitação de uma resposta punitiva naquele momento era inviável. O custo político foi a admissão dessa impunidade. A incógnita é saber o que teria acontecido se a escolha política tivesse sido diferente. 18. A questão atual é se essa decisão em favor da impunidade pela violação de direitos humanos ocorridas no regime ditatorial pode ser modificada, passados 30 anos. Em rigor essa resposta foge ou deveria fugir do presente trabalho, uma vez que não forma parte do raciocínio lógico para avaliar a tese

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apresentada, porém, apresentase necessária pelo menos para fechar a visão que se tem da problemática geral abordada.

19. O Brasil tem assinado a Convenção Americana de Direitos Humanos, incorporando ao direito interno, de maneira expressa, as regras internacionais e regionais sobre direitos humanos. A discussão sobre a hierarquia dos tratados internacionais de direitos humanos perde sentido, segundo a interpretação doutrinária em favor da aplicação da norma mais favorável para os direitos envolvidos. As normas constitucionais e de direitos humanos se complementam para oferecer à pessoa humana a maior proteção possível de sua vida e dos seus direitos.

20. O sistema regional de proteção dos direitos humanos tem reconhecido os direitos da pessoa humana e exigido dos estados o reconhecimento de tais direitos, bem como mecanismos de proteção. Em rigor, o sistema normativo regional de direitos humanos não estabelece como exigência para o respeito dos direitos humanos a adoção de medidas punitivas, e nem sequer a adoção destas como resposta para os casos de violações de direitos humanos. A jurisprudência da Corte, bem como as opiniões consultivas, nas suas primeiras elaborações reclamavam o respeito e proteção das pessoas por parte dos estados e exigiam reparações em favor das vítimas, nos casos de violações de direitos humanos. A exigência em favor da busca da verdade e, depois a punição das graves violações de direitos humanos surge da jurisprudência mais atual.

21. A exigência de respostas punitivas com base nos direitos humanos não se corresponde com a matriz história ou genealógica dos direitos humanos, uma vez que importa a habilitação de violência estatal, que desde diversas formas tem tentado ao longo do tempo limitar ou conter. A resposta punitiva com fundamento nos direitos humanos constitui uma inversão de sua tradicional orientação em favor da paz e da conciliação dos povos.

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O reconhecimento do cidadão universal não demanda a adoção de medidas punitivas, senão a prática de medidas de reconhecimento e proteção da pessoa humana, sem distinção alguma. A violação de direitos humanos deve ter respostas conciliadoras, reparadoras e terapêuticas, caso seja necessário, segundo o tipo de conflito. O modelo punitivo, assim, apresentase incompatível uma vez que habilita violência estatal sem possibilidade de solucionar os conflitos; e por outra parte, por sua incidência tão intensa nos direitos dos envolvidos, pode apresentarse como um fator de instabilidade social e política que pode desencadear um processo de violência tão ou mais grave que o passado de violência que se pretende punir. Por outra parte, o modelo punitivo, ainda que seja em razão da violação de direitos humanos, não guarda uma finalidade que justifique sua imposição. Em tal sentido, não se reconhece nenhuma função de prevenção que justifique a medida. Nesse sentido é atualizada a doutrina que releva a falta de fundamentação e racionalidade do sistema punitivo, cuja crítica não se altera pelo fato de que os direitos humanos tenham recepção em uma norma internacional. O problema de não punir é que embora a punição desses crimes não tenha nenhuma finalidade positiva, a não ser satisfazer desejos de vingança, a falta de punição para tão graves condutas, produz como efeito negativo a deslegitimidade de qualquer castigo que fosse imposto a crimes comuns. Ou seja, se o estado não criminaliza o homicida ou torturador serial, partícipe de um plano sistemático de repressão ou extermínio, como então poderia aplicar uma pena a um simples caso de furto? Para quem não atribui nenhum efeito positivo à pena, a melhor saída, talvez, racionalmente não seja a punição, porém, antes disso – isto é não punir essas graves condutas , muitas outras não deveriam ser punidas. Na saída das instâncias punitivas, parece correto afirmar, junto com Zaffaroni, que os primeiros em abandonar o barco sejam aqueles que não provocaram o afundamento. Entretanto, e enquanto se aguarda o turno, os perpetradores de tais atos deverão esperar no final, sem chance, de furar a fila .

24. Sem prejuízo do exposto, cabe observar que a Corte Interamericana de Direitos Humanos, no caso Almonacid Arellano y otros contra Chile , analisou uma lei de anistia elaborada no processo político de transição.

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A Corte observou que essas leis deixam indefesas as vítimas e estabelecem a impunidade para os autores dessas graves violações de direitos humanos, razão pela qual são manifestamente contrárias às disposições da Convenção Americana. Assim considerou que as leis de autoanistia, carecem de efeitos jurídicos e não podem constituir obstáculo para a investigação dos fatos que constituem graves violações de direitos humanos, nem para a investigação e castigo dos responsáveis. Assim, a punição, ainda que seja, há mais de 30 anos, não poderá ter obstáculos no direito interno, não podendo sequer se argumentar a prescrição, uma vez que os crimes que não são passiveis de anistia são imprescritíveis. Nesse contexto, cabe ainda, considerar que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos apresentou uma demanda, em 26 de março de 2009, perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos contra o Brasil, no Caso n. 11.552, Julia Gomes Lund e outros ( Guerrilha do Araguaia ), e conforme o precedente citado, tudo faz pensar que se não mudar o estado de situação o Brasil terá responsabilidade internacional pelas graves violações de direitos humanos que motivaram a demanda. Cabe lembrar que o Brasil aceitou a jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos, razão pela qual se encontra obrigado a respeitar suas decisões.

25. Assim, o Brasil, deverá mudar sua legislação, revogando as disposições da lei de anistia que estabelecem uma autoanistia ou aceitar a responsabilidade internacional pelas graves violações de direitos humanos. Uma alternativa que poderia dar maior legitimidade à saída escolhida poderá depender da participação comunitária na decisão, mediante a realização de um referendo para estabelecer a necessidade ou não de uma resposta punitiva. Essa tem sido a saída do Uruguai no passado e, ainda, no presente ano, 2009. A procura de uma resposta pela própria comunidade, constitui, ao mesmo tempo, uma forma de saída da armadilha que oferece o sistema internacional de direitos humanos para os países da região, que encontram uma

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intromissão intensa da comunidade internacional pelo passado de violações de direitos humanos, que não se manifesta de forma igualitária para outros países da comunidade internacional que participaram, também, nas violações que se pretende punir, ou que provocaram e ainda provocam outras intensas violações de direitos humanos.

CONCLUSÕES

Do exposto é possível concluir, com relação às respostas pós conflituais oferecidas no Brasil, com relação ao regime ditatorial do período 1964 1984 que até a presente data: 1. Optouse por oferecer respostas conciliadoras e reparadoras às graves violações de direitos humanos, sendo atualizados os princípios segundo, de forma parcial, e terceiro do sistema de pósconflitos de justiça. O princípio segundo foi reconhecido de forma parcial, pois, a comissão da verdade foi instaurada de forma tardia e os resultados demorados ficaram limitados ao universo de casos em que as violações de direitos humanos terminaram com mortes ou desaparições forçadas de pessoas. O princípio terceiro tem sido atualizado uma vez que foi oferecido um sistema amplo de reparações às vítimas das violações de direitos humanos.

2. Foi demonstrado manifesto desinteresse com relação à perseguição criminal ou administrativa dos autores de violações de direitos humanos. Conseqüentemente não foram atualizados os princípios primeiro e quarto do sistema de pósconflitos de justiça. A opção em favor da não punição do passado de violações de direitos humanos foi estabelecida no contexto de uma política de transição que importou uma forma de assegurar a não autoincriminação.

3. Segundo a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos ( Almonacid Arellano y otros contra Chile ) as leis de autoanistia deixam indefesas as vítimas e estabelecem a impunidade para os autores dessas graves violações de direitos humanos, razão pela qual são manifestamente contrárias às

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disposições da Convenção Americana, carecendo de efeitos jurídicos e não podem constituir obstáculo para a investigação dos fatos que constituem graves violações de direitos humanos, nem para a investigação e castigo dos responsáveis.

4. A modo de recomendação. O Brasil deverá mudar sua legislação, revogando as disposições da lei de anistia que estabelecem uma autoanistia ou aceitar a responsabilidade internacional pelas graves violações de direitos humanos. A realização de um referendo poderia dar maior legitimidade à saída escolhida.

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