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Os capitéis de Ivorá/RS-BR e sua importância para o turismo local.

Thaís Viero Bezerra1 Centro Universitário Franciscano (UNIFRA) Eva Regina Coelho2 Centro Universitário Franciscano (UNIFRA)

Resumo

Este estudo é o resultado parcial da pesquisa de campo desenvolvida no primeiro semestre de 2012, a partir de um projeto de pesquisa vinculado ao Curso de Turismo da UNIFRA/Santa Maria, com o objetivo levantar dados sobre a história, as condições atuais dos capitéis de Ivorá/RS, sua viabilidade turística, relacionando-os com a devoção herdada pelos descendentes dos imigrantes italianos instalados nesta região. Até o momento foram pesquisados 19 capitéis, de um total de 24 existentes no município e constatou-se a importância da religiosidade católica trazida pelos imigrantes na formação da identidade local. Embora o estudo ainda esteja em andamento, já é possível entrever alguma forma de aproveitamento turístico dos capitéis de Ivorá/RS.

PALAVRAS-CHAVE: Ivorá/RS; Capitéis; Turismo.

Introdução

O presente artigo é o resultado parcial da pesquisa bibliográfica e de campo realizadas no primeiro semestre de 2012, referentes ao Projeto de Pesquisa “Capitéis de Ivorá/RS: religiosidade, patrimônio histórico e turismo”, vinculado ao Curso de Turismo do Centro Universitário Franciscano de Santa Maria/RS. Tal projeto tem como objetivo geral recuperar a história dos capitéis existentes nas zonas urbana e rural do município de Ivorá/RS e dos construtores, relacionando-os ao patrimônio histórico cultural, legado pelos descendentes italianos nesta região e a possibilidade do seu uso para o turismo. O município de Ivorá situa-se na região central do , a 360 quilômetros de e a cerca de 50 quilômetros de Santa Maria, tendo como

1 Acadêmica do 4º semestre do Curso de Turismo da UNIFRA/SM, Bolsista de iniciação científica do Projeto de Pesquisa “Capitéis de Ivorá/RS: Religiosidade, patrimônio histórico e turismo”, primeiro autor; [email protected];

2 Licenciada em História pela UFSM, Bacharel em Turismo pela UNIFRA, Mestre em Patrimônio Cultural pela UFSM, atualmente responsável pela disciplina de Patrimônio Turístico no Curso de Turismo da UNIFRA, SM. Coordenadora do Projeto de Pesquisa “Capitéis de Ivorá/RS: Religiosidade, patrimônio histórico e turismo”, [email protected];

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municípios limítrofes Júlio de Castilhos, , e . A base da sua economia é voltada para a agricultura e pecuária3. Atualmente conta com uma população de 2.156 habitantes (IBGE-Censo 2010), destes 705 na zona urbana, e 1.451 na zona rural. Inúmeros fatores provocaram a vinda de grupos de imigrantes europeus especialmente os alemães e os italianos para o sul do Brasil durante o Império. Os interesses do governo brasileiro eram principalmente que estes colonos, alemães ou italianos, inicialmente, se dedicassem à agricultura e à criação em pequenas propriedades rurais de maneira a formar um mercado interno, além de atender à necessidade de substituição gradativa da mão-de-obra escrava. As terras devolutas do governo imperial no Rio Grande do Sul, preferencialmente longe das grandes propriedades e que não fossem próprias para a criação de rebanhos bovinos, foram repartidas em lotes, demarcadas e vendidas aos imigrantes italianos que chegaram a partir de 1870 no RS. (GIRON, 1980). A Quarta Colônia Imperial de Imigração Italiana4 foi criada pelo governo imperial brasileiro em terras devolutas no centro do Rio Grande do Sul, na região da Serra de São Martinho, tendo como núcleo inicial, Silveira Martins, surgido em 1877. Neste contexto surge o Núcleo Norte, cujos lotes foram entregues em 1883 aos primeiros colonos italianos oriundos do Vêneto e do Friuli-Venezia-Giulia, a família de Valentin Zancan, sua esposa e quatro filhos. Pouco tempo mais tarde chegam as famílias Dall’Aglio, Stroili, Morondini, Coderini e Dall-Ross, e outras. (BELINAZZO; MARCON, 1993). Passado alguns anos, o Núcleo Norte adotou o nome de Nova Údine, em homenagem à Údine, cidade italiana de origem de muitos dos colonos ali estabelecidos. Em 1901, Nova Údine foi elevada à categoria de vila e em 1918, à categoria de Paróquia. Em meio à Segunda Guerra por determinação superior, todos os núcleos coloniais no Brasil que tivessem nomes que lembrassem a terra natal de seus moradores, principalmente dos descendentes de italianos e alemães, foram obrigadas a trocarem seu nome. Nova Údine passou a chamar-se Ivorá, palavra indígena que significa Rio da Praia Formosa. (RIGHI; BISOGNIN; TORRI, 2001). Em 1988 emancipou-se com o nome de Ivorá. Longe da terra natal e esquecidos pelo governo imperial que demorou a cumprir as promessas que os atraíram para estas paragens, os colonos italianos só tinham a sua força de

3 Disponível em: http://www.ivora.rs.gov.br/index.php?site=ivora.php, acesso em 10 de ago.2012. 4 São os seguintes os municípios formadores da Quarta Colônia, hoje: Silveira Martins, Faxinal do Soturno, Ivorá, , São João do Polêsine, Nova Palma, , , Agudo e parte do Município de Santa Maria. 3

trabalho, a sua fé e a companhia da família para fortalecê-los e animá-los a seguir. A força da religiosidade foi o que os manteve unidos para recomeçar numa terra estranha uma nova vida. De Boni (1980) chama a atenção para a importância que teve a religião católica sob a forma de religiosidade popular para o italiano no Rio Grande do Sul, o qual, afastado de toda a sociedade, sem recursos, [...], nas longínquas linhas, precisou se manter unido ao seu grupo para sobreviver e ajudar-se mutuamente. Foi Deus, a Virgem e os santos que sustentaram a religiosidade dos imigrantes italianos durante a viagem e nos primeiros tempos. Frente ao trabalho na floresta e nos campos, a religião foi o fator de integração social, que permitiu aos colonos manter a coesão e a identidade cultural na nova realidade. (MANFROI, 2001). Os primeiros tempos para as famílias italianas no sul do Brasil não foram fáceis, já que precisaram resolver seus problemas de ordem prática sem o apoio econômico prometido, daí a necessidade destes núcleos “se organizarem de formas alternativas para manter sua prática religiosa e dela extrair as forças necessárias para suportar a situação de estranhamento a que estavam submetidos em terra estrangeira” (ZANINI, 2006 p. 137). Suas primeiras iniciativas foram, de modo geral, erguer uma capela, por rústica que fosse e nela improvisar o acompanhamento espiritual das famílias com ajuda de um membro mais instruído da comunidade, o padre leigo que “puxava o terço”. A reza do terço em comunidade na capela improvisada substituía a missa dominical. (MANFROI, 2001). Além das capelas, as famílias das colônias de imigração italiana, costumavam erguer os capitéis. Nesta região no sul do Brasil, conforme observa Gutierrez e Gutierrez (2000) capitel não quer designar a parte superior de uma coluna, e sim, era o nome dado pelos imigrantes às pequenas capelas erguidas geralmente em homenagem a um santo de devoção, ou por uma promessa ou graça alcançada. Na Quarta Colônia, como lembra Bisognin (2008), principalmente “no meio rural, os imigrantes deixaram uma marca profunda, sobretudo pela presença do grande número de capitéis”. Conforme destacam Belinazzo e Marcon (1993) os capitéis em Ivorá são geralmente construídos no jardim da casa ou à beira da estrada e não implicavam em grandes gastos, pois eram simples e de pequeno tamanho. São demonstrações de fé popular, conforme pesquisa realizada por Belinazzo e Marcon (1993), envolvendo os capitéis construídos entre o final do século XIX e a década de 1980 e somam hoje 24 capitéis. De acordo com Rovílio Costa, na região de colonização italiana no Rio Grande do Sul, os capitéis são na sua maioria Nascidos de promessas diversas e, em alguns casos, como lugar de encontro das 4

comunidades. Em alguns casos, porque os capitéis não aparecem com o sinal das capelas - doação de terreno, lugar de lazer, lugar de escola... originaram-se mais de iniciativas particulares. (ROVILIO COSTA, 1990, p.534).

Caracterizando estas pequenas construções, Posenato (1983, p.331) as denomina de ermida, pois, “outro costume italiano trazido para o Brasil e que perdura até hoje nas áreas de colonização italiana é a construção de ermidas junto aos caminhos”. Na região, prossegue Posenato, "esta ermida denomina-se capitel, sem outra relação com a parte superior das colunas clássicas, a não ser a identidade do nome”. Para o Posenato (1983), as ermidas originaram-se daqueles agrupamentos espontâneos para rezar, nas linhas, ou travessões e que se organizaram paulatinamente em capelas. Também podiam surgir de devoções promessas e agradecimento, destaca o autor. Este projeto se propõe a resgatar a história da comunidade no que se relaciona à memória da construção e conservação dos seus capitéis, bem como recuperar com as famílias a importância destas pequenas construções para a manutenção dos laços de identidade e pertencimento que as ligam às origens italianas e ao local onde estão inseridas. A meta do projeto é oferecer um produto final sobre este aspecto da cultura da região, um catálogo, por exemplo, que venha ser útil não apenas para fonte de futuras pesquisas, como para divulgação turística e cultural da região. Na definição dada por De La Torre Padilha (1997, p.16), o turismo é um fenômeno social que consiste no deslocamento voluntário e temporal de indivíduos ou grupos de pessoas que, fundamentalmente, por motivos de recreação, descanso, cultura ou saúde, se deslocam de seu lugar de residência habitual a outro, no qual não exercem nenhuma atividade lucrativa nem remunerada, gerando múltiplas inter-relações de importância social, econômica e cultural.

Percebem-se nesta definição as implicações decorrentes da visitação turística e sugere a ideia de que o município precisa estar preparado para receber e usufruir os seus benefícios sócio-econômicos. Por outro lado, muitas pessoas, atualmente viajam em busca de locais com cultura material e imaterial preservadas, onde os moradores cultuam suas crenças e costumes mais autênticos, conhecem sua história e valorizam seu passado, preservando sua autenticidade cultural. Esse aspecto do fenômeno turístico é conhecida como turismo cultural, que Barretto (2000) simplifica como sendo todo o turismo em que o principal atrativo não seja a natureza, mas algum aspecto da cultura humana, como história, o cotidiano, o artesanato ou qualquer outro dos inúmeros aspectos que o conceito de cultura abrange. 5

O turismo cultural configura-se como um segmento importante desenvolvido pela região de colonização italiana no Rio Grande do Sul tendo em vista, que aspectos do patrimônio material e da tradição oral destes locais precisam ser preservados e conhecidos em época de avanços da mundialização das comunicações. Stebbins (apud COSTA, 2009, p. 44) entende que o turismo cultural caracteriza-se como Um gênero de turismo [...] baseado na busca e na participação em experiências culturais novas e profundas, quer estéticas, intelectuais, emocionais ou psicológicas. Muitas formas culturais como museus, galerias, festivais, arquitetura, ruínas históricas, performances artísticas e sítios patrimoniais rotineiros atraem visitantes [...].

Em nosso país, o Ministério do Turismo, preocupado em definir as abrangências do segmento cultural do turismo, em virtude da necessidade de interação entre turismo e cultura, bem o direcionamento das políticas públicas nestes setores, definiu turismo cultural, Como o segmento que compreende as atividades turísticas relacionadas à vivência do conjunto de elementos significativos do patrimônio histórico e cultural e dos eventos culturais, valorizando e promovendo os bens materiais e imateriais da cultura (BRASIL 2006, p.11).

Importante destacar o aspecto da vivência dos elementos significativos do patrimônio cultural pelo turista, pois aqui se entende que não basta ver ou ouvir, mas vivenciar, isto é, conhecer, contemplar, discutir, entender o objeto de visitação, o que implicariam em experiência participativa e de entendimento além de apenas contemplativa do local visitado. Portanto, a valorização pelo turismo de aspectos da cultural local pode servir também como fator de autoconhecimento para as comunidades envolvidas e a consciência de que a divulgação de seus costumes e patrimônio ao visitante - turista - lhe trará benefícios, principalmente, na forma de auto-estima e valorização da identidade local.

Metodologia

Metodologicamente este trabalho de pesquisa desenvolve-se com base na bibliografia sobre a história do povoamento e desenvolvimento da região da Ivorá, e em entrevistas com pessoas locais indagando sobre a origem da devoção venerada no capitel, aspectos da construção e sobre sua utilização atual. As entrevistas são direcionadas para o tema principal, com perguntas que provoquem e oportunizem ao entrevistado falar o quanto achar necessário. A cada visita quinzenal a Ivorá são buscados dados sobre os capitéis de uma determinada região do interior do município, contatando moradores que vivem nas 6

imediações da pequena capela, preferencialmente os proprietários das terras onde ela está inserida. Os moradores, conhecedores da história do capitel, ou parte dela, ajudam com suas informações ao preenchimento da ficha catalográfica de cada capitel, onde são indagados sobre data da construção, localização, santo reverenciado, motivo da construção, características da construção (materiais, estilo, adornos externos) estado de conservação, ocupação atual (festas, novenas, terços) visitação, entre outros dados. Nem sempre a família proprietária da terra onde a construção está inserida é descendente daquela que ergueu o capitel, mas geralmente esta é a família responsável pela sua manutenção e cuidados. Conversando com estas pessoas é que se obtêm os dados principais de cada capitel. Neste caso, usa-se a entrevista oral e transcrita posteriormente, de maneira literal. Cabe também observar o capitel e fotografá-lo para mais facilmente descrevê- lo. Com a transcrição das narrativas e a recuperação de dados é possível reescrever a história de cada capitel, das famílias responsáveis por eles, dos momentos em que eles foram reverenciados ou ainda o são através de cerimônias periódicas. Isto deverá recompor um momento da história do município de Ivorá, resultante de um núcleo de pioneiros da colonização italiana, refazendo a memória coletiva e a identidade representada pela italianidade de sua cultura.

Os capitéis em Ivorá/RS

Como elemento de cunho religioso, o capitel constitui-se em apenas um dos legados culturais da comunidade de Ivorá, mas que sendo parte de sua história e de seu patrimônio cultural, é tarefa do historiador a obtenção de fatos relevantes que relacionados de forma coerente e significativa poderão ser utilizados para valorização da memória local. Este conjunto de fatos poderá ser aproveitado pelo profissional do turismo com responsabilidade e respeito ao local, para agregar valor ao produto turístico, pois se trata de aproveitar e expor o patrimônio cultural de uma comunidade. Pois, como adverte Moser (2004, p.81), é muito fácil que a reinterpretação [das entrevistas] descaracterize a comunidade na sua oferta turística e gere um produto que não corresponda ao modelo, ou como a comunidade se vê e se acredita, “pasteurizando” e colocando à disposição do turista um produto inverossímil e inverídico e, portanto [...] artificial ou irreal.

A fidedignidade aos relatos de histórias pessoais coletados neste trabalho de campo 7

junto à população de Ivorá/RS, leva em consideração a importância da memória individual e coletiva ao preservar certos símbolos locais e a capacidade da comunidade em preservá-los, o que garante a manutenção da sua identidade. Para definir identidade e sua importância na manutenção da memória cultural da comunidade de Ivorá, leva-se em consideração o que afirma Calhoun (apud CASTELLS, 1999, p. 22), com respeito ao autoconhecimento: “não há povo que não tenha nomes, idioma ou cultura em que alguma forma de distinção entre o eu e o outro, nós e eles, não seja reconhecida. O autoconhecimento [...] nunca está totalmente dissociado da necessidade de ser reconhecido [...] pelos outros”. Complementando o pensamento, Castells (1999, p. 22) afirma que “identidade é o processo de construção de significado com base em atributo cultural ou ainda um conjunto de atributos culturais inter-relacionados, o (s) qual (is) prevalece (m) sobre outras fontes de significado”. Ainda para Castells (1999) as condições históricas, geográficas, biológicas, as instituições produtivas e reprodutivas da memória coletiva, as influências das instituições de poder e revelações de cunho religioso são responsáveis pela formação da identidade. Ao considerar-se que identidade, como explica Stauvutzky (1999, p. 143), “deriva do pronome latin idem (eadem) que é um pronome de identidade, que significa o mesmo, a representação que cada um faz de si, em oposição entre o eu e o outro, o eu e o mundo”, verifica-se o que aconteceu em comunidades como Ivorá que permaneceram praticamente isoladas de outros grandes centros mantendo seus costumes. Esta circunstância as fazem diferentes, pois o passado lhes concedeu um sentido de pertencimento que torna seus moradores conscientes da necessidade de manter esta continuidade através do tempo. Como afirma Barretto (2000, p.46), manter algum tipo de identidade - étnica, local ou regional- parece ser essencial para que as pessoas se sintam seguras, unidas por laços extemporâneos a seus antepassados, a um local, a uma terra, a costumes e hábitos que lhes dão segurança, que lhes informam quem são e de onde vêm.

O sentido de pertencimento e de convicção de manter suas origens demonstrados pelos ivorenses interrogados sobre seus capitéis. O orgulho e a consciência da necessidade de preservar este costume com algo que os diferencia das demais comunidades, transparecem em suas repostas. Pode-se notar tal entendimento do morador de Ivorá quando procurado para informar sobre o capitel de sua propriedade, por exemplo, ele abre sua residência sem cerimônia, são 8

simpáticos, gentis, largam o que estão desenvolvendo para dar atenção ao grupo de estudantes entrevistadores. Estas atitudes e demonstrações de confiança levam a crer que a própria comunidade tem interesse em registrar essas informações para que a história dos capitéis no município não se perca. Em sua maioria são trabalhadores rurais, gente simples e que vive em contato com a natureza, valorizando e cultivando sua religião. Na região de Ivorá, o capitel tem o aspecto de uma pequena capela, de construção muito simples, quase sem adornos, muitas vezes solitário na curva de uma estrada ou quase inacessível no alto de uma encosta da estrada, algumas vezes, no interior da propriedade rural. O acesso é livre. Não se necessita solicitar permissão para visitá-lo, nem para reverenciar o santo homenageado ali. A grande maioria está em estado muito precário de conservação, o mato cresce ao seu redor, os raros ornamentos danificados, o acesso quase impossível. Ao passo que outros recebem cuidados periódicos, alguns até tem proteção ao seu redor para evitar o vandalismo, apresentam pintura recente e imagens dos santos em muito bom estado. Quanto ao material empregado na sua construção identificam-se desde o basalto, pedra abundante na região e usada pelos imigrantes em suas moradias, por exemplo; o tijolo artesanal e o tijolo de fabricação mais recente; as telhas artesanais de barro ou de madeira, as telhas de barro industrializadas e até de amianto, para a cobertura; as grades de madeira ou de ferro para as aberturas e proteção. Raramente existem informações da localização ou mesmo de identificação do capitel. No entanto, segundo narram os entrevistados, apesar do descuido, a devoção aos santos homenageados continua, pois vez ou outra uma capelinha, mesmo que parecendo abandonada, recebe flores ou velas são ascendidas ali, demonstrando que a fé não esmorece, apesar de tudo. A pesquisa ainda em andamento demonstrou que entre os 19 capitéis levantados até o momento as devoções mais recorrentes têm sido Santo Antônio de Pádua, São Francisco de Assis, São Paulo, Santana, Nossa Senhora nas suas diversas manifestações, como Nossa Senhora della Guardia, Nossa Senhora da Saúde, Nossa Senhora Aparecida, Nossa Senhora Medianeira, Nossa Senhora de Lourdes, Nossa Senhora da Salete, Nossa Senhora do Rosário de Pompéia. Prova desta afirmação são as festas que continuam a ser realizadas nos capitéis de Ivorá, pelas respectivas comunidades. Dentre estas se destacam a festa no capitel de Nossa Senhora do Rosário de Pompéia na Linha Sete, no capitel de Nossa Senhora Medianeira em 9

Barreiro, festa de Nossa Senhora da Salete, na Comunidade de Chapadão. Todas com apoio do pároco que reza as missas e da comunidade que organiza os almoços e festividades com bailes e jogos típicos da cultura imigrante italiana. Destaque ainda para aqueles capitéis onde ocorrem celebrações em dia santo e em festas de fim de ano, como no capitel do Sagrado Coração de Jesus, na Linha Zancan, de São Roque e de São Francisco na Linha Venturini e o de Nossa Senhora della Guardia, onde rezam novenas em épocas de seca.

Considerações finais

Os capitéis e as manifestações resgatadas até o momento pela pesquisa de campo realizadas em Ivorá/RS confirmam a predominância da identidade religiosa católica entre os descendentes dos imigrantes italianos na região central e vislumbram alguma perspectiva turística tendo o capitel como atrativo. Religiosidade que se manifesta diariamente na sua devoção a Nossa Senhora e aos santos e santas aos quais os moradores dedicam seus capitéis e que lhes ajudaram enfrentar as dificuldades do dia-a-dia. Os capitéis, como marca singela da religiosidade desta comunidade e com a força de manifestação material de uma condição imaterial da cultural local, a religiosidade, devem ser preservados, pois simbolizam o grau de pertencimento dos indivíduos desta comunidade cultural. A presença dos turistas, que na certa provocará interações, poderá até oportunizar modificações perspectiveis na cultura e nos costumes religiosos locais, mas isso faz parte do processo cultural que é dinâmico e vivo, e já deve ter ocorrido certamente e em outras circunstâncias. No entanto, não impedirá o fortalecimento e preservação por parte da comunidade, dos aspectos mais importantes da cultura religiosa local.

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