Reflexões Sobre As Primeiras Organizações Patronais Rurais No Estado Do Pará
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Interfaces em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade Reflexões sobre as primeiras organizações patronais rurais no estado do Pará Aluisio Fernandes da Silva Júnior 1 Este texto apresenta, de forma exploratória e descritiva, as primeiras organiza- ções patronais rurais do estado do Pará a partir de levantamentos realizados na Federação de Agricultura e Pecuária do Estado do Pará - Faepa. Em função das dificuldades encontradas visando à elaboração de um pensamento cronológico, congruente e fidedigno, outras fontes de pesquisas foram consultadas. A evolu- ção e a expansão dessas organizações constituem elementos importantes para a compreensão da atual configuração espacial desta entidade, bem como propor- cionam o entendimento da complicada rede de relações que envolvem diferentes personagens presentes no espaço rural paraense através das mudanças que ge- raram contradições, conflitos e violências. Organizações Patronais Rurais; Evolução e Expansão das Organizações Patro- nais; Federação de Agricultura e Pecuária do Estado do Pará - Faepa. 1 Bacharel e Licenciado Pleno em Geografia pela Universidade Federal do Pará/UFPA (2000). Licenciado Pleno em Pedagogia pela Universidade do Estado do Pará/Uepa (1996). Especialista em Educação Ambiental/Profima VI/NUMA/UFPA (2001). Mestre em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável/MAFDS/NEAF/CA/UFPA (2008). Doutorando em Estudios Sociales Agrários/Universidad Nacional de Córdo- ba/Argentina/Centro de Estudios Avanzados/CEA/UNC. Professor do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico (Classe D, Ref/Pad/Nível 301) da Escola de Aplicação da UFPA. Endereço eletrônico: [email protected]. Revista IDeAS, v. 3, n. 1, p. 94-114, jan./jun. 2009. Reflexões sobre as primeiras organizações patronais rurais... 95 As primeiras organizações patronais rurais do estado do Pará Na região Norte do Brasil, desde tempos coloniais, a Ilha de Marajó des- tacou-se por apresentar grandes proprietários de terras, como Antônio de Sousa Macedo, Secretário de Estado do rei D. Afonso VI, que recebeu a capitania por doação de juros e herdade. O sucessor de Antônio de Sousa Macedo foi seu filho, Luís Gonçalo de Sousa Macedo, considerado o 1. º barão da Ilha Grande de Joanes, em 1754. Sucedeu a este, na do- nataria 2 e no título de barão, seu filho Antônio de Sousa Macedo, 2. º barão da Ilha Grande de Joanes, que foi substituído pelo filho Luís de Sousa Macedo, considerado o 3.º e último barão da Ilha Grande de Joa- nes, conservando a estrutura familiar e fundiária de possessão da ilha (TEIXEIRA, 1953 p. 34). O Decreto de 29 de abril de 1754, que extinguiu a donataria e reuniu a capitania aos bens da Coroa e Fazenda Real, criou o cargo de inspetor geral da Ilha, nomeando em 1757, Florentino da Silveira Frade. No sé- culo seguinte, de acordo com Teixeira (1953, p. 38), em meados de 1825, o número de fazendas na costa norte correspondia a 56 e nos campos 92, destacando-se como proprietários instituições religiosas, como as ordens dos mercedários e jesuítas, e cidadãos de famílias ilustres da Ilha, con- siderados fazendeiros. A indústria pastoril crescia e concomitante a este crescimento o furto de gado, situação que proporcionou, entre outras medidas, a criação de grandes sindicatos e poderosas milícias privadas, lideradas por fazendeiros, com destaque para a Associação de Fazendei- ros de Marajó, de Muaná e Cachoeira do Arari (TEIXEIRA, 1953, p. 34). O Quadro 1 e a Figura 1 destacam os municípios e os principais fazen- deiros da Ilha de Marajó, com registro de presença do Syndicato Indus- trial e Agrícola Paraense em 1908, responsáveis por 405.431 reses bovi- nas. Em virtude de não termos acesso às informações referentes à área apre- sentada, no Quadro 1 estabeleceu-se uma estimativa de 1U.A/5 ha/ano 2 No texto entendemos como um sistema administrativo aplicado às terras possuídas pela Coroa Portuguesa além-mar, utilizado pelo rei para delegar os seus poderes, com certas restrições, a pessoas de sua inteira confiança. Revista IDeAS, v. 3, n. 1, p. 94-114, jan./jun. 2009. Reflexões sobre as primeiras organizações patronais rurais... 96 com relação à capacidade de suporte das pastagens, através da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa Amazônia Oriental, sob orientação do Engenheiro Agrônomo Guilherme Calandrini de Azevedo. De acordo com o pesquisador, a estimativa levou em consideração o pe- ríodo apresentado no quadro (1908), a pastagem nativa do Arquipélago e o deslocamento do gado. O pesquisador frisou que com a utilização de tecnologia recomendada para um período mais recente do que o quadro faz referência, na década de 1970 houve um aumento da taxa de fertilidade, redução da mortali- dade do rebanho, obtenção de novilhos para abate com 350 kg aos três anos e meio de idade e aumento da capacidade de suporte das pastagens nativas para 1U.A/2,5 há/ano. Atualmente (2008) o aumento da produ- ção por área tem sido substancial, podendo ultrapassar 800 kg peso vi- vo/ha/ano, em função do clima, da forrageira utilizada e da fertilidade do solo. Esta última estimativa atende outras áreas do estado do Pará. O fato é que, em estimativa baseada na relação entre efetivo bovino e área, as fazendas ocupavam mais de dois milhões de hectares, o que é demonstração cabal do domínio territorial dos criadores de bovinos da Ilha de Marajó. Quadro 1 - Proprietários Rurais da Ilha de Marajó, 1908. Estimativa Reses N.º de Proprietário Rural Município de Área em Bovinas Fazendas Ha Manuel Emídio Marques Muaná 13140 58 65700 Simão Ferreira Monteiro Muaná Rodrigo Lopes de Azevedo Muaná João Câncio da Silva Brito Muaná Joaquim Pereira Boulhosa Ponta de Pedras 9173 33 45865 Leonardo Lobato Tavares Ponta de Pedras Henrique Lobato Ponta de Pedras Bento Lobato de Miranda Cachoeira do Arari 162572 116 812860 Vicente José de Miranda Cachoeira do Arari José Maria da Cunha Cachoeira do Arari Manuel Lobato Cachoeira do Arari Raimundo Bezerra da Rocha Morais Soure 101050 64 505250 Revista IDeAS, v. 3, n. 1, p. 94-114, jan./jun. 2009. Reflexões sobre as primeiras organizações patronais rurais... 97 Artur Bezerra da Rocha Morais Soure Antonino da Cunha Mendes Soure Francisco de Paula Mendes Chaves 112021 55 560105 Manuel Rui Sêco Chaves Carlos Hesketh Chaves Antônio de Sousa Baraúna Afuá 7475 22 37395 Francisco Antônio de Resende Anajás Vicente Ferreira Brito Anajás TOTAL 405431 348 2027175 Fonte: TEIXEIRA, 1953. Elaborado por AFSJ. Colaboração de Guilherme Calandrini de Azevedo para os dados de área. Figura 1 - Principais municípios da Ilha de Marajó com registro de presença do Syndicato Industrial e Agrícola Paraense - 1908. LEGENDA PRINCIPAIS MUNICÍPIOS DA ILHA DO MARAJÓ Municípios da Ilha do Marajó w60° 58° 56° 54° 52° 50° 48° w46° com presença de Sindicato SURINAME GUIANA Industrial Agrícola FRANCESA N GUIANA Paraense em 1908 ° n 2 INGLESA 0 0 2 n ° 01- Anajas Oceano Atlântico 02- Afuá 03 03- Chaves ° 02 0 04- Cachoeira do Arari 0 07 ° 05- Muaná 06- Ponta de pedras 04 07- Soure ° 01 s 2 0 0 06 2 s 05 ° Limite da Mesorregião do Marajó CONVENÇÕES 0 ° AMAZONAS 4 4 ° Limites municipais paraenses PARÁ Limites estaduais brasileiros MARANHÃO 0 ° 6 Situação na América do Sul 6 ° Oceano Atlântico 0 Pacífico PARÁ ° 8 8 ° BRASIL Oceano Atlântico Oceano Pacífico ° 1s 0 200km 0 200km 0 s1 ° w60° 58° 56° 54° 52° 50° 48° w46° Oceano Atlântico FONTE: Bases cartográficas IBGE/SECTAM/ITERPA/DATA:MAR-2008 LAYOUT: Danny Sousa (CREA-PA 12.219-D/[email protected]) Fonte: Base Cartográfica do IBGE (2007), dados da Faepa (2004). Elaborada por AFSJ e DSS. Revista IDeAS, v. 3, n. 1, p. 94-114, jan./jun. 2009. Reflexões sobre as primeiras organizações patronais rurais... 98 Durante o período mencionado as atividades pastoris eram desencadea- das com maior frequência no Arquipélago Marajoara e em algumas á- reas do Baixo Amazonas, devido às condições físicas e climáticas da re- gião propícias à criação de gado e à privilegiada posição geográfica ao tipo de transporte utilizado (embarcações de vapor e de velas), que pro- porcionavam a condução de gado, legal e ilegal, em pé e charqueado. A falta de linhas rodoviárias e ferroviárias dificultava o acesso a outras regiões do estado. Os povoados, vilas e núcleos populacionais estavam às margens dos rios, fator importante para destacar a supremacia dos mei- os de transportes aquáticos utilizados nestas regiões. Outro fator deter- minante voltou-se para a organização da estrutura fundiária, sendo o fazendeiro personagem central deste processo. A partir de 1905, no governo de Augusto Montenegro (1901-1909) a oli- garquia do Arquipélago de Marajó, através do Senador José Ferreira Teixeira, funda e preside o Syndicato Industrial e Agrícola Paraense . Merece atenção o fato de a fundação desta organização ocorrer no auge da exploração da borracha ( Hevea brasiliensis Willd. ex Adr. de Juss), quando a Amazônia representava importante contribuição à economia nacional por uma atividade que associava a exploração extrativa na flo- resta à transformação industrial mais avançada em termos de sofistica- ção tecnológica. O caráter extrativo da Hevea não aparece representado no nome do sindicato que se pretende primeiro industrial e depois agrí- cola. É o caráter de indústria, que ocorre no beneficiamento da Hevea , que toma relevo, demonstrando a preocupação com a representação de modernidade que a atividade agropecuária pode assumir. Ao assumir o cargo de Senador, José Ferreira Teixeira beneficiou a indústria agrope- cuária, com a realização de congressos de fazendeiros, cujos trabalhos resumidos em conclusões foram publicados pela revista A Lavoura Pa- raense (1907), boletim da Diretoria de Agricultura do Estado. Essas conclusões traziam resultados para estimular e orientar a indús- tria pecuária paraense. No que se refere à atividade agropecuária, o Se- nador José Ferreira Teixeira defendeu a criação de três campos experi- mentais agrícolas, no Baixo Amazonas, no Marajó e no Tocantins, em que promoveu o fomento, organização e regulação da produção do algo- dão no Pará; estimulou a criação de posto de seleção de gado nacional “crioulo”; envolveu-se na organização do serviço de defesa sanitária a- Revista IDeAS, v.