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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE CENTRO DE COMUNICAÇÃO E LETRAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS

REGINA PAULA AMBROGI AVELAR

PESQUISA GLOBAL SOBRE LÍNGUA, CULTURA, IDENTIDADE E ‘ENSINO BILÍNGUE’: CIÊNCIAS EM UM ENTRELAÇAR

São Paulo 2018

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REGINA PAULA AMBROGI AVELAR

PESQUISA GLOBAL SOBRE LÍNGUA, CULTURA, IDENTIDADE E ‘ENSINO BILÍNGUE’: CIÊNCIAS EM UM ENTRELAÇAR

Defesa de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras (Mestrado e Doutorado), da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito para obtenção do grau de Doutor em Letras.

Orientadora: Profa. Dra. Vera Lúcia Harabagi Hanna

São Paulo 2018

REGINA PAULA AMBROGI AVELAR

PESQUISA GLOBAL SOBRE LÍNGUA, CULTURA, IDENTIDADE E 'ENSINO BILiNGUE': CIIÊNCIAS EM UM ENTRELAÇAR

Defesa de Doutorado apresentada ao Programa de Pós•-Gradua,ção •em Letras (Mestrado e Doutorado), da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial à obtenção de título de Doutor em Letras. .

Aprovado em 24 de agosto de 20·1s

BANC.A EXAMINADORA

Profª. 1 ra. Ana Elvira Luciano Gebara Universidade Unicsul/FGV

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Ao meu filho Bento, razão do meu viver e amor, uma reflexão sobre a língua e a linguagem. Que possamos entender melhor a sua, meu pequeno!

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AGRADECIMENTOS

Meus sinceros agradecimentos primeiros não poderiam ir para outra pessoa que não à minha eterna orientadora, professora e amiga Profa. Dra. Vera Lúcia Harabagi Hanna por sua compreensão em um dos momentos mais difíceis de minha vida, que acabou sendo, também, o momento desta tese. Embora eu duvidasse de que iria conseguir fazer este trabalho, a Vera nunca duvidou, me apoiou, me ajudou, me ouviu, me orientou, respeitou minhas falhas e, por isso tudo, consegui me reestruturar e cumprir todas as etapas necessárias até à conclusão. Obrigada, Vera! Nunca me esquecerei de sua presença e seu apoio, fora suas, visões, críticas, questionamentos sempre enriquecedores, perspicazes e sinceros orientações que me ajudaram a construir essa singela contribuição para o conhecimento.

Agradeço muitíssimo à banca, Profa. Dra. Silvia Etel Gutierrez Bottaro, querida professora da graduação e amiga, que contribuiu com suas visões na Qualificação e, dentre muitas outras coisas, com a correção do questionário em espanhol que disponibilizamos; à Profa. Dra. Thais Helena Affonso Verdolini, de quem não tive o prazer de ser aluna, mas cujas opiniões me reiteraram a continuar na direção de entrecruzar as Ciências Biológicas com as Humanas na banca de Qualificação deste doutorado; além da Profa. Dra. Neusa Maria Oliveira Barbosa Bastos, queridíssima amiga e professora da Graduação e da Pós-graduação, e a Profa. Dra. Ana Elvira Luciano Gebara, que tive o prazer de conhecer em um Congresso, SIL 2017, sobre interculturalidade. Agradeço muito à todas por terem aceitado participar dessa avaliação e pela emissão de suas opiniões, recomendações, críticas e sugestões que muito me ajudam no desenvolvimento e na conclusão desta dissertação.

Quero deixar registrados meus agradecimentos especiais ao meu esposo, Fabio da Silva Avelar, por toda sua contribuição material e emocional ao longo desses anos, por sua ajuda na parte da montagem e na disponibilização dos questionários online e por todo o amor e apoio para que eu pudesse terminar essa pesquisa. Meu obrigadíssima a você, meu amor, te amo!

Meus agradecimentos verdadeiros à Isabel Cristina Contro Castaldo que me recebeu em sua casa, me serviu um delicioso café, me interou de sua pesquisa, me deu orientações e dicas valiosíssimas de como fazer a pesquisa por meio de um recurso online, o que propiciou que esta pesquise fosse mundial.

Obrigada à Eliane Machado por me receber e conversar comigo sobre como era trabalhar em uma escola internacional, que era diferente da bilíngue, e por todas as orientações dadas neste encontro muito esclarecedor e enriquecedor.

Agradeço a todos os meus familiares, amigos, alunos, professores, conhecidos e desconhecidos, que totalizaram os 207 respondentes desta pesquisa, por terem me ajudado a divulgar, por a responderem, e por terem contribuído com suas opiniões nesse projeto de me tornar doutora.

Obrigada ao Instituto Presbiteriano Mackenzie e às pessoas que nele trabalham, sua parte humana, professores, colegas e amigos, e à CAPES e a concessão da bolsa que fez com que pudesse escrever e pesquisar este projeto.

At last, but not least, muitíssmo obrigada à minha querida mãezinha, professora, amiga, vovó - por sair bastante com seu netinho para que eu pudesse escrever - por me ajudar em todo o resto, parte burocrática, revisão de texto, pelo amor, e pelo apoio incondicional de sempre. Muito obrigada, mãe, você sabe que não teria conseguido sem você!

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C'è in ogni bambino un'insegnante certosina, così abile da ottenere risultati identici in tutti i bambini in tutte le parti del mondo. L'unico linguaggio che gli uomini parlano sempre perfettamente è quello che imparano durante l'infanzia, quando nessuno può insegnargli nulla!

There is in every child a painstaking teacher, so skillful that he obtains identical results in all children in all parts of the world. The only language men ever speak perfectly is the one they learn in babyhood, when no one can teach them anything!

Há em cada criança um professor meticuloso, tão habilidoso que obtém resultados idênticos em todas as crianças em todas as partes do mundo. A única língua que os homens podem falar perfeitamente é a única que eles aprendem desde o nascimento, quando ninguém lhes pode ensinar nada! (MARIA MONTESSORI) Tradução nossa.

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AVELAR, R.P.A.: PESQUISA GLOBAL SOBRE LÍNGUA, CULTURA, IDENTIDADE E ‘ENSINO BILÍNGUE’: CIÊNCIAS EM UM ENTRELAÇAR (394 páginas). Tese (Doutorado em Letras. Ensino) Universidade Presbiteriana Mackenzie. Orientadora Profa. Dra. Vera Lúcia Harabagi Hanna. São Paulo, 2018.

RESUMO

Ao longo desta tese trouxemos numerosos exemplos de objetos da mídia - brasileira e internacional - e das ciências que apontavam tanto para as supostas desvantagens quanto para as vantagens do bilinguismo e do ensino feito em pelo menos dois idiomas por cerca de um século. Entrelaçamos os conhecimentos das três áreas científicas, as Humanas, as Biológicas e as Exatas, objetivando uma visão ampla do bilinguismo de maneira a ver sua importância no cenário mundial atual em que povos estão em imigração e há contextos de conflito linguístico- cultural em voga. Alguns autores que nos deram embasamento teórico foram a fisiologista Bervely A. Clark (2000), a educadora Antonieta Megale (2005), o antropólogo Néstor García Canclini (2006), a neurocientista Angela de Bruin (2015) e a psicóloga Ellen Bialystok (2017). Além desses, trouxemos da física Thomas Kuhn (1962) e a conceituação de paradigma; de Michael Agar (1994), antropologista e também etnólogo, trouxemos o axioma línguacultura; dos Estudos Culturais, o conceito de identidade cultural de um de seus fundadores, Stuart Hall (2003), e a recente conceituação de competência global da pesquisadora Vera L. H. Hanna (2018); o conceito de cultura do filósofo Terry Eagleton (2005) e da psicolinguística a conceituação de bilíngue de François Grosjean (2008). Todos esses conceitos embasaram-nos na formulação de um questionário para a condução de uma pesquisa estatística mundial sobre língua, cultura, identidade e ‘Ensino Bilíngue’ - elementos que têm como fundamento primeiro a(s) língua(s) que forja(m) o indivíduo bilíngue. Nossa hipótese inicial era a de que os paradigmas da ciência teriam extrapolado suas fronteiras e seriam reproduzidos no senso- comum dos cidadãos sem ter sua essência alterada, o que de fato se confirmou. Adicionalmente, propusemos nove parâmetros para o denominado ‘Ensino Bilíngue’ brasileiro – o feito pelas escolas internacionais, bilíngues propriamente ditas, e pelos ‘programas bilíngues’ para escolas regulares – uma vez que identificamos a falta de regulamentação para esse setor, em franca expansão no país, que urge por referências para que o Brasil consiga mudar a estatística de ter apenas cerca de 3-5% de sua população dentro da condição bilíngue.

Palavras-chave: Pesquisa Mundial sobre Bilinguismo; competência global; ‘Ensino Bilíngue’; linguacultura; identidade (cultural).

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ABSTRACT

Throughout this thesis we have brought numerous examples of objects from the media - Brazilian and international press – in addition to objects from the sciences which pointed to both the alleged disadvantages, along with the advantages, of bilingualism and the teaching done in at least two languages for about one century long. We interwove knowledge of the three major fields of science, the Humanities, the Biological and the Exact, aiming at a broad view of bilingualism in order to see its importance in the current world scenario in which peoples are in immigration and there are contexts of linguistic-cultural conflict in vogue. Some authors who gave us theoretical background were the physiologist Bervely A. Clark (2000), the educator Antonieta Megale (2005), the anthropologist Néstor García Canclini (2006), the neuroscientist Angela de Bruin (2015) and the psychologist Ellen Bialystok (2017). In addition to these, we have brought from physics Thomas Kuhn (1962) and the conceptualization of paradigm; by Michael Agar (1994), anthropologist and also an ethnologist, we have brought the languaculture axiom; from Cultural Studies, the concept of cultural identity of one of its founders, Stuart Hall (2003), and the recent conceptualization of global competence of the researcher Vera L. H. Hanna (2018); the concept of culture of the philosopher Terry Eagleton (2005), and the conceptualization of bilingualism by François Grosjean (2008). All these concepts have based the formulation of a questionnaire for conducting a world statistical research on language, culture, identity and 'Bilingual Teaching' - elements which are substantiated first on the language(s) that forge(s) the bilingual individual. Our initial hypothesis was that the paradigms of science would have extrapolated their boundaries and would be reproduced in the common sense of citizens without having their essence altered, which in fact was confirmed. We have proposed, as well, nine parameters for the regulation of the so- called 'Brazilian Bilingual Education' – the education made by international schools, bilingual schools themselves, and the 'bilingual programs' for regular schools - since we have identified the lack of regulation for this sector, which is booming in the country, and urges references, so that can change the statistics of having only about 3-5% of its population within the bilingual condition.

Key words: global research on bilingualism; global competence; 'Bilingual Teaching'; languaculture; (cultural) identity.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...... 11

1 CAPÍTULO I – “VANTAGEM” OU “DESVANTAGEM” DO BILÍNGUE NO COMPLEXO JOGO ENTRE A CIÊNCIA E O SENSO-COMUM...... 36 1.1 Quando ser bilíngue era considerado uma “desvantagem”...... 37 1.2 Início da mudança do paradigma: quando o bilinguismo passou a ser visto como uma “vantagem” cognitiva ...... 42 1.3 A consolidação do paradigma da “vantagem bilíngue”...... 45 1.4 Podemos mesmo falar “vantagem bilíngue” de ordem cognitiva, ou devemos procurar essa suposta vantagem em outra esfera? ...... 55 1.5 Money makes the world go around……………………………………………………..…….71

2 CAPÍTULO II – COMO A LÍNGUA FUNDA O CONTEXTO SOCIAL: QUESTÕES DE IDENTIDADE (CULTURAL) E QUESTÕES ECONÔMICAS ...... 78 2.1 Língua e linguagem: as Ciências Biológicas e Humanas em um breve entrelaçar ...... 79 2.2 Um pouco mais dos estudos da cultura, do discurso e dos teóricos que definem a identidade cultural ...... 88 2.3 O poder econômico da língua e um pouco sobre as identidades nacionais ...... 93 2.4 A língua, cultura e a identidade por uma nomenclatura também biológica: a hibridação. 98 2.5 Povos em imigração e os conflitos linguísticos ...... 105

3 CAPÍTULO III – O ‘ENSINO BILÍNGUE’ BRASILEIRO: FEITO PELAS ESCOLAS BILÍNGUES, INTERNACIONAIS E PELOS “PROGRAMAS BILÍNGUES”...... 115 3.1 Breve contexto do ensino bilíngue no mundo e no Brasil ...... 116 3.2 Definição de escola bilíngue (brasileira): mais uma vez a visão da Ciência e da mídia ...... 121 3.3 O que os pais esperam ao matricularem seus filhos em uma escola bilíngue...... 133 3.4 O que diz a legislação brasileira sobre ensino bilíngue e o que ela omite...... 134 3.5 Conciso retrospecto histórico da escola internacional no Brasil e os motivos dos pais ao matricularem seus filhos lá...... 138 3.6 Definição de escola internacional e o número de escolas (bilíngues e internacionais) no Brasil ...... 140 3.7 Os chamados “programas bilíngues” para escolas regulares ...... 147 3.8 Para quem é destinado o ensino bilíngue brasileiro? Novamente a questão econômica ...... 154 3.9 Critérios que pretendem ajudar a regulamentar o denominado ‘Ensino Bilíngue’ no Brasil...... 160

4 CAPÍTULO IV - AS PERGUNTAS DA NOSSA PESQUISA MUNDIAL, SEUS RESULTADOS, A ANÁLISE E A DISCUSSÃO ...... 168 4.1 As perguntas de nossa pesquisa e suas justificativas individuais ...... 169 4.2 Os resultados, a análise e a discussão de cada pergunta feita ...... 178 5 CAPÍTULO V - CONCLUSÃO ...... 324

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...... 347

REFERÊNCIAS WEBGRÁFICAS ...... 351

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ANEXO 1 - QUESTIONÁRIO DA PESQUISA NOS TRÊS IDIOMAS: PORTUGUÊS, INGLÊS E ESPANHOL...... 359

ANEXO 2 – INVENTÁRIO DAS ESCOLAS INTERNACIONAIS, BILÍNGUES E BILÍNGUES PÚBLICAS NO BRASIL...... 373

ANEXO 3 – O TESTE DO QUI-QUADRADO...... 389

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INTRODUÇÃO

To have another language is to possess a second soul1. (CHARLEMAGNE)

É sabido que, em Ciências2, sejam elas Humanas, Biológicas ou Exatas, busca-se investigar um objeto com a finalidade primeira de que os resultados obtidos refutem ou reiterem o paradigma vigente, não havendo a preocupação de obter-se verdades absolutas, já que estas não existem. Os paradigmas são vigentes até que um novo trabalho científico tenha argumentações e resultados consistentes para propor um novo paradigma que seja aceito pela maioria da comunidade científica, vigente, por sua vez, até que um novo paradigma passe pelo mesmo processo. Este é o chamado princípio da falseabilidade, um dos pilares do pensamento científico.

Os paradigmas, ou em uma forma mais simplificada e bem reduzida, os modelos defendidos pelos cientistas, por vezes extrapolam as fronteiras da Ciência e atingem o senso-comum, nem sempre com seus teores inalterados. Tais modelos ou exemplos podem passar a povoar o imaginário coletivo com modificações de acordo com as motivações que as fizeram serem interpretadas por leigos, ou os não-cientistas, sendo estas razões econômicas, sociais, culturais e de mercado, entre outras. Isso faz-se sentir, por exemplo, quando o ovo, mais precisamente a gema, torna-se, de tempos em tempos, recomendado ou proibido nas dietas indicadas por revistas de divulgação, pela mídia ou por prescrições de nutricionistas.

O curioso é que a recíproca também é verdadeira, ou seja, as ideias do senso-comum igualmente podem fomentar investigações científicas num jogo complexo de alimentação e retroalimentação que pode fazer com que não saibamos mais de onde surgiu a ideia, como na pergunta insolúvel: quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha? As ideias de cunho científico e

1“Possuir uma outra língua é ter uma segunda alma. (CHARLEMAGNE)”. Tradução nossa. Nesta tese, usaremos como norma deixar as traduções feitas por nós no corpo do texto para facilitar a leitura em língua portuguesa e colocaremos o trecho em língua estrangeira original nas notas de rodapé. Optamos por deixar a citação em língua original, sempre que possível, disponível para consulta, uma vez que a tese é sobre bilinguismo e, por essa razão, acreditamos que poderá contar com futuros leitores bilíngues para consultas. Como a tradução nesta tese é livre e nossa, julgamos que talvez esses leitores queiram fazer suas próprias traduções e interpretações a partir dos originais. Somente as epígrafes de cada capítulo estarão na língua original e traduzidas em nota de rodapé. 2 Toda vez que nos referirmos à Ciência como a qualquer conhecimento ou prática sistemáticos, ou no sentido estrito que se refere ao sistema de adquirir conhecimento baseado em método científico, bem como ao corpo organizado de conhecimento conseguido através de tais pesquisas, a palavra estará grafada, nesta tese, com letra maiúscula, grifo nosso.

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as da memória coletiva estão, assim, imersas em âmbitos mais amplos do que os formados pelos indivíduos que as defendem, isso ocorre mesmo com aquelas pessoas que reproduzem um padrão sem saber o porquê de o fazerem: todas as ideias estão obrigatoriamente imersas nos âmbitos da linguagem e da cultura.

O físico Thomas Kuhn, norte-americano, professor da Universidade de Harvard, que em um certo momento de sua carreira lecionou a matéria Ciências para alunos de Humanas, em 1962 publicou Fundamentos da Unidade da Ciência3. Esse livro deu origem a um longo artigo, chamado de Estrutura das Revoluções Científicas [ERC] -, cujo alcance foi muito grande, poucos anos após sua publicação teve seus principais termos, ciência normal e paradigma, adotados por pesquisadores de diferentes áreas, Humanas e Biológicas inclusive, segundo o físico brasileiro e pesquisador da sociologia da ciência Jesus de Paula Assis (ASSIS, 1993: 133-134). Kuhn divide o desenvolvimento científico de uma disciplina particular em dois grandes componentes os momentos de ciência normal, em que há concordância entre os cientistas, e os de revolução científica, em que opiniões contrárias se rivalizam: Durante os períodos de ciência normal, os cientistas concordam acerca dos fundamentos de sua disciplina e o grosso de seu trabalho se dá no sentido de articular esses fundamentos e de ampliar sua aplicabilidade. Já nos períodos de revolução científica, acontece o debate entre alternativas rivais, no qual os participantes de cada escola baseiam seu discurso em conjuntos diferentes de fundamentos. Logo, não existe campo neutro no qual avaliar as diferentes teorias.” (ASSIS, 1993: 135-136).

A fase paradigmática de uma atividade com aspirações a conhecimento ocorre quando o debate em torno de seus princípios cessa e as escolas que estudam determinados fenômenos concordam em um enfoque mais promissor. O paradigma da escola vencedora ganha a aceitação geral e passa a ser a base de da tradição de estudos naquele campo. Nesse momento, os cientistas começam a citar os autores que reforçam esse paradigma e mencionam os mesmos princípios básicos e começam a surgir os livros e artigos publicados em revistas especializadas, ou seja, assim é feita a chamada ciência normal que passa posteriormente pelos períodos de revolução científica, em que os paradigmas passam a ser questionados e as publicações começam a dar-se no novo sentido, até ocorre a aceitação geral novamente e essa passar a ser sucessivamente questionada (ASSIS, 1993: 136-137).

3 “Foundations of the Unity of Science” Tradução nossa.

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Quanto às acepções de paradigma, Assis afirma que Kuhn adotou a noção do Dicionário Oxford: “Um padrão, um exemplar, um exemplo4 [...] Embora seja essa a noção adotada por Kuhn, ele mesmo não lhe foi muito fiel no decorrer da ERC [Estrutura das Revoluções Científicas]”. Um estudioso dos trabalhos de Kuhn, Masterman, em 1970, após fazer o inventário de 21 usos diferentes do termo paradigma no ERC, dividiu os paradigmas de Kuhn em três: metaparadigmas, que seriam os paradigmas metafísicos; os paradigmas sociais, que dizem respeito à natureza de aceitação do paradigma, ao invés das características estruturais de um corpo de doutrina; e o chamado artefato ou constructo “Essa é a aceitação preferida de Kuhn, e que ele chama de exemplar, querendo dizer sucesso científico reconhecido pela comunidade, que passa a ser usado analogicamente [...] é um provedor de analogias para a comunidade de praticantes. (ASSIS, 1993: 138-139).

O metaparadigma significa “crença profunda [...] em que toda hipótese deve se permitir julgar pela experiência ou em que explicações devem exibir estrutura lógica (ainda que não rigorosa e explicitada)” (ASSIS, 1993: 140), sendo a maneira mais abrangente de se entender o termo; o paradigma sociológico estaria ligado aos fatores que mantêm coesa determinada comunidade de praticantes de uma disciplina: “Kuhn chama a esses fatores coletivamente de matriz disciplinar”; e, mais próximo da atividade cotidiana do cientista, estaria o exemplar, ou as realizações científicas concretas da comunidade que servirão de modelo para os praticantes tentarem estender o paradigma a casos novos (ASSIS, 1993: 140).

Se pararmos para refletir e fizermos um breve retrospecto acerca da História das Ciências, rapidamente constataremos que a própria subdivisão de Ciências Humanas, Biológicas e Exatas é bem recente (LAKATOS, 1985: 17-39). Quando pensamos que até o que ficou conhecida na história como Revolução Científica (XVI-XVIII) existiam somente as Filosofias Naturais e que estas englobavam todas as investigações antigas acerca da natureza e do homem, descobrimos que, estes estudos são considerados como pré-científicos, ou seja, como estudos que antecediam a Era Moderna. A Ciência Moderna tem como fundador Galileu Galilei (1564-1642), conhecido como “o teórico do método científico” e da “autonomia da pesquisa científica”. Somente no século XIX o termo Ciência Natural foi cunhado para diferenciar os campos que se utilizam do método científico para estudar a natureza daqueles que estudam o homem (Ciências Sociais e Humanas - que usam o método cientifico para estudar a sociedade e o comportamento humanos), diferenciando-as também das ciências formais ou Ciências

4 “A pattern, exemplar, example” (OXFORD DICITIONARY apud ASSIS, 1993: 139)

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Exatas que utilizam métodos quantitativos, predições precisas e métodos rigorosos de testar hipóteses – sendo que as Ciências Exatas datam do início do século XVII, na Europa Ocidental.

Antes de haver as subdivisões das Ciências, era comum na Idade Média, por exemplo, um artista, como Leonardo da Vinci (1452-1519), ser pintor, escultor, cientista, arquiteto, matemático, literato, astrônomo, botânico, anatomista, etc., ou seja, tudo é uma questão de cultura e identidade, classificação e discurso, pensamento e linguagem que se amoldam em um determinado tempo e espaço, de acordo com os paradigmas daquele momento determinado historicamente em um entrelaçar da tradição e do novo, do presente com o passado. Citamos brevemente que Thomas Kuhn se viu obrigado a ensinar para não-cientistas as origens das Ciências, o que o fez estudar sua história, ligando o autor à Área da Filosofia. Tais estudos foram essenciais para que suas publicações se tornassem tão relevantes, segundo o próprio cientista. As subdivisões ao conhecimento, embora necessárias, são sempre posteriores a ele, conforme veremos ao longo desta tese, e autores que transitem por diferentes áreas do conhecimento tornam-se relevantes na medida em que o conhecimento já produzido tenha se tornado impossível de abarcar. O que propomos ao longo desta tese como um todo é o entrelaçar entre os conhecimentos das diferentes áreas, em especial entre as Ciências Humanas e as Biológicas, embora os das Exatas também se encontrem presentes, como trazido pelos estudos de Thomas Kuhn e nas análises estatísticas dos dados coletados em nosso questionário (Anexo 3).

Ao longo do Capítulo 1 desta tese trouxemos um retrospecto histórico da discussão paradigmática ligada ao bilinguismo por cerca de um século, contrastando a visão da Ciência e dos meios de comunicação midiáticos, a qual reflete majoritariamente a visão do senso-comum. Desde a década de 1920 até as recentes publicações deste século XXI, os períodos de ciência normal e de revolução científica ficarão evidentes. No início do século XX o paradigma vigente era o de que haveria desvantagens (de ordem cognitiva e/ou social) ligadas à condição bilíngue. Na década de 1960, alguns trabalhos começaram a aparecer para que a revolução científica se iniciasse e o paradigma de que haveria uma vantagem de ordem cognitiva despontou. A fase paradigmática da vantagem cognitiva estabeleceu-se, um exemplar foi amplamente seguido pela comunidade científica, muitas publicações foram feitas e, em meados de 2015, uma nova revolução científica parece iniciar-se. O paradigma de uma vantagem cognitiva parece perder força no meio científico devido às novas evidências que se acumulam e um paradigma de que esta vantagem pode ser de outra ordem, como de ordem social (melhor comunicação, empatia

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com pessoas ou povos de outras culturas, etc.), parece ser o norte da nova revolução científica que se instaura. Para terminar o Capítulo 1, trouxemos uma outra faceta das possíveis vantagens sociais, as vantagens econômicas, tanto em nível individual, quanto em nível de uma economia, que a vantagem bilíngue de ordem social pode acarretar.

A história do paradigma da (des)vantagem bilíngue teve pesquisas publicadas por teóricos de diversas áreas do conhecimento, os quais deram sustentação à nossa reflexão ao longo do capítulo e destacamos Elizabeth Peal e Wallace Lambert (1962), Beverly A. Clark (2000), François Grosjean (2008), Kanavillil Rajagopalan (2009), Ellen Bialystok (2012) e Angela de Bruin (2015). Como ao longo do capítulo contrastamos o discurso científico sobre o bilinguismo e suas supostas vantagens/desvantagens com o discurso do senso-comum, do qual os meios de comunicação são representativos, trouxemos alguns jornalistas e suas reportagens para comparação, os principais jornalistas ou autores de outras áreas que nos deram sustentação são Ranka Bijeljac-Babi’ C (2010), Yudhijit Bhattacharjee (2012), Maria Konnikova (2015) e Kaisa S. Danielsson (2017).

Se ampliarmos nossa visão e refletirmos acerca do que antecede a condição bilíngue, podemos inferir que para falarmos uma língua temos que pensar e podemos concluir que não há como se formular um pensamento sem a língua/linguagem5. De maneira introdutória nos limitaremos a dizer que o pensamento, tal qual o conhecemos, dá-se por meio da língua/linguagem. A mente tem um comportamento chamado de global, porém capaz de acionar certas partes específicas cerebrais que, a grosso modo, linearizam o pensamento e o traduzem em palavras, sendo estas uma projeção linear do conteúdo cognitivo mental. As palavras – e o pensamento – vêm em uma linha temporal, umas atrás das outras, o que faz com que a comunicação seja possível.

Os cientistas estudam a aquisição de linguagem dos surdos e como é o pensamento dos autistas porque estes não ocorrem do mesmo modo que o de pessoas que não tenham essas condições. A língua/linguagem é, assim, uma função cognitiva e essencialmente social, pois fala-se, sempre, para/com alguém, mesmo que o interlocutor seja, em última instância, nós mesmos. Por cognição adotaremos nesta tese o entendimento amplo do conjunto de habilidades cerebrais/mentais necessárias para a obtenção de conhecimento sobre o mundo, as quais envolvem o pensamento, o raciocínio, a abstração, a linguagem, a memória, a

5 Abordaremos a discussão científica a respeito da relação entre pensamento e linguagem, além da questão de qual seria antecedente, ou a questão da primazia – qual seria antecedente a qual, o pensamento ou a linguagem? - no Capítulo 2, subitem 2.1, no qual também abordaremos a questão do funcionamento global do cérebro humano.

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atenção e a capacidade de resolução de problemas, entre outras funções (SIMONETTI, 2012: s/p).

Na Pós-Modernidade, o conceito de cultura, por ser extremamente complexo e amplamente multifacetado e discutido, tem por singularidade o fato de que jamais ser totalmente definido, por estar em contínua (re)construção. Ele ganha novas fronteiras com a globalização e a transnacionalização dos sujeitos e dos objetos, sendo diluído, atrelando-se a outro conceito de difícil unificação de sentido: o da identidade6. As identidades Pós-Modernas estão cada vez mais fraturadas ou fragmentadas, nunca sendo únicas ou singulares. Estão em constante multiplicidade, mudança e progressão sendo construídas nos discursos, nas posições, emoções, e nas práticas dos indivíduos, podendo ser convergentes ou divergentes entre si.

Se apoderarmo-nos dos conceitos de identidade defendidos pela visão do autor jamaicano Stuart Hall (2003: 46), veremos que as identidades são subdivididas em três, de acordo com sua época: a identidades do sujeito iluminista (individualista), a do sujeito sociológico (interacionista) e a identidade do sujeito pós-moderno - que efetiva a celebração móvel, nas palavras do autor. Do nascimento e da morte do sujeito moderno emerge o conceito de descentramento do sujeito, ou seja, a morte do sujeito cartesiano7. Tal visão consolidou-se por meio de ideias de autores como Saussure e Foucault que ao descreverem os deslocamentos sofridos pelos sujeitos ressaltaram as rupturas nos discursos advindas do conhecimento moderno. O sujeito do iluminismo era visto como tendo uma identidade fixa e estável, ao ser descentrado o resultado é o de identidades abertas, contraditórias, inacabadas, fragmentadas, ou em outras palavras a identidade do sujeito pós-moderno, que vive em um mundo globalizado, em movimentação e sem fronteiras fixas – na maior parte dos casos.

A complexidade do trinômio língua/cultura/identidade é tal que não há como falar em identidade sem tomar por base a linguagem/língua ou a cultura em que ela emergiu e de línguas que foram adicionadas a esse sujeito em diferentes momentos de sua formação. Em realidade, atualmente a pluralização faz-se necessária, devemos falar em linguagens, línguas, culturas, identidades em um entrelaçar que forma, com estes elementos, uma engrenagem de interpenetração e complementação.

6 As questões de identidade, língua e cultura serão abordadas no Capítulo 2. 7 “Penso, logo existo”.

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O texto e o discurso são partes fundamentais de tais engrenagens, em constante intersecção em seus contextos de cultura e de situação. Contemplam as dimensões universais, histórica e individual da linguagem, sendo o texto interpretado por nós como a parte formal onde estão os processos organizacionais dentro dos princípios estruturais (sintáticos, semânticos, pragmáticos, etc.) e o discurso como aquele que abarca os elementos funcionais ou interacionais da formação ideológica e de formação discursiva, as quais formam o laço histórico do que é proferido. Tanto a memória coletiva quanto a discursiva - discurso científico, por exemplo - estão neste laço histórico-cultural-identitário em que estamos todos imersos inevitavelmente. Como a linguagem é a matéria comum a tudo que podemos estudar exatamente por ser o seu veículo, as questões de texto e discurso perpassam todas as demais temáticas e têm a linguagem como fundamento sendo, por essa razão, questões da base reflexiva humana, independendo do assunto debatido.

Há países em que o ensino de línguas estrangeiras se dá de forma concomitante com a língua materna, formando cidadãos bilíngues ou trilíngues desde a mais tenra idade. Tais culturas podem ter impulsionado investigações científicas do sistema cognitivo destes falantes, gerando questões generalizadas, como a que indaga se o ensino de uma língua estrangeira juntamente com a materna causa atrasos na alfabetização; ou ainda se os falantes bilíngues têm vantagens - cognitivas, sociais, econômicas ou todas - em relação aos falantes monolíngues.

O fato de neste início do século XXI as sociedades viverem um momento de crise migratória causada por guerras, problemas econômicos, ambientais ou humanitários faz com que legiões de vítimas de diásporas forçadas vejam-se obrigadas a comunicarem-se em línguas distintas de seus idiomas maternos. Tal realidade, porém, não é substancial na sociedade paulistana, que embora acolha imigrantes, o faz em proporções bem menores do que em países europeus ou em outras localidades brasileiras. Em regiões brasileiras de fronteiras, como em Roraima8 pequenos municípios recebem contingentes de venezuelanos que depois espalham-se pelo Brasil. Fortes contingentes imigratórios acarretam em implicações sociais e culturais que essa obrigação de convívio traz, tanto na vida dos imigrantes quanto na vida dos cidadãos dos países que os recebem. As regiões do sul do Brasil de fronteira com o Paraguai, Argentina e o Uruguai, por exemplo, têm outras especificidades, o que significa que cada região de contato linguístico tem suas características próprias, com suas vantagens e desvantagens.

8 CREVILARI, V. Crise na Venezuela faz crescer o número de refugiados no Brasil. Jornal da USP, São Paulo, 31 jun. 2017. Disponível em: . Acesso em 02 set. 2017.

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A crise humanitária dos últimos anos é tamanha que em 2016 estimou-se que 128 milhões de pessoas precisavam de ajuda nos diversos continentes por causa de conflitos, deslocamentos, desastres naturais e profunda vulnerabilidade - a que a ONU considerou “a maior crise humanitária desde a Segunda Guerra Mundial”9, sendo precisos U$22,2 bilhões de dólares para socorrer essas pessoas. Em 2017, a ONU chamou de “maior crise humanitária10 desde a criação das Nações Unidas em 1945”, a situação do Sudão do Sul, Iêmen, Somália e Nigéria em que cerca de 20 milhões de pessoas se encontravam em situação crítica de mortalidade, fome e desnutrição, calculando serem necessários U$ 4,4 bilhões de dólares para contornar a situação.

O aumento de imigrantes em São Paulo, cidade sede desta pesquisa mundial, é, em sua maioria, de pessoas de origem dos países latinos como Bolívia, Venezuela e Haiti, e em menor número de países do Oriente Médio como Síria e Líbano, o que torna o tema do ensino bilíngue do interesse do público geral. As ONGs do terceiro setor (Organizações Não-Governamentais), as comunidades religiosas e as organizações sem fins lucrativos majoritariamente criam cursos gratuitos e com vagas limitadas de ensino do português para estrangeiros, para tentar incluir os imigrantes em nossa sociedade, além das escolas públicas que recebem seus filhos sem haver uma política de inclusão ou acolhimento propriamente dita. Essas situações de convivência multilinguística forçada fazem com que novas expressões sejam necessárias para definir o conflito linguístico que essa dinâmica acarreta, como o termo “língua de acolhimento”.

Segundo a pesquisadora Giselda Pereira (2017: 119): “A expressão “língua de acolhimento” surge no contexto português após o aumento dos movimentos migratórios para Portugal, sobretudo no ano 2000, [com imigrantes] procedentes de países do leste europeu e dos continentes africano e asiático.” e afirma que segundo a pesquisadora portuguesa Maria Helena Ançã, “Ançã (2002, 2003) defende o uso da designação “língua de acolhimento”, numa tradução emprestada de Lüdi e Py (1986), para situações de aprendizagem da língua portuguesa pelos imigrantes.”. Em países em que é falado majoritariamente apenas um idioma,

9 MUNDO VIVE a maior crise humanitária desde a segunda guerra mundial. Isto é, Estadão, São Paulo, 05 dez. 2016. Disponível em: . Acesso em 02 set. 2017. 10 MUNDO VIVE a maior crise humanitária desde 1945, alerta ONU. G1 Globo, , 11 mar. 2017. Disponível em: . Aceso em 02 set. 2017.

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a língua portuguesa, no caso de Portugal e Brasil, uma “língua de acolhimento” é necessária para que a inclusão e a independência dos refugiados sejam reais e possíveis11.

O Brasil já foi um país bilíngue, ou melhor, multilíngue ou plurilíngue, na época de seu descobrimento. No Período Jesuítico (1549-1759), quando os portugueses aqui chegaram, no século XVI, os portugueses trouxeram consigo seu idioma e sua cultura, encontraram em nosso território habitantes nativos provenientes de muitas etnias e distintas culturas falando centenas de línguas, e com comportamentos muito diferentes entre si. Há cerca de 500 anos, segundo estimativas de Ayron Dall’Igna Rodrigues (1993: 23), na publicação Línguas indígenas: 500 anos de descobertas e perdas, por volta de 1.078 línguas indígenas eram faladas em nosso país, ou seja, o Brasil era um território essencialmente plurilíngue. A língua geral, como ficou conhecida a língua falada pelos colonos portugueses, era um misto do tupi e de outros idiomas, como o guarani, esta última muito comum em nosso território. A língua geral, ou tupinambá, era a usada pelos missionários aqui estabelecidos até 1694, utilizando-a inclusive em documentos escritos e obras literárias da época, o que fez com que a Coroa decretasse a chamada Lei do Diretório que veremos a seguir. Conforme os colonizadores foram estabelecendo-se e dominando as terras, tal qual ocorreu com todos os outros dominadores ao longo da História no mundo todo, uma das primeiras medidas tomadas pelos portugueses foi a de ensinar a língua portuguesa, em uma tentativa de impedir que a língua-geral se estabelecesse, como forma de dominação e aculturação dos povos indígenas.

Nas chamadas Escolas de Ler e Escrever, houve o começo da alfabetização dos índios, que estudavam ao longo de suas vidas inteiras, para aprenderem os costumes europeus. Estudioso desse período da história, Demerval Saviani (2010: 26-27), afirma que é possível perceber que o início da educação brasileira é marcado pela colonização, enquanto exploração da terra, pela aculturação, enquanto submissão forçada dos índios à cultura europeia, e pela catequização dos indígenas na fé cristã. Já outro pesquisador, Fernando de Azevedo (1976: 10) diz que o processo de criação das escolas, elementares, secundárias, de seminários e de missões brasileiras foi marcado pelo domínio religioso e difusão da cultura europeia nas terras ocupadas pelos indígenas.

As preocupações principais dos jesuítas eram de ensinar a língua portuguesa, a religião católica e os modos de vida e valores portugueses, tentando substituir a cultura dos nativos. Embora os

11 Abordaremos as questões de imigração e conflito linguístico no Capítulo 2 e, principalmente, no subitem 2.5.

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portugueses quisessem apagar a cultura indígena, a convivência entre culturas e línguas deu- se de maneira efetiva e longeva em nosso país. O intento dos portugueses de aniquilar as culturas nativas obteve relativo sucesso, uma vez que os habitantes nativos foram utilizando-se cada vez menos de suas línguas e costumes originais e fazendo cada vez mais uso da língua portuguesa e de seus costumes, o que tornou, séculos depois da chegada dos portugueses ao Brasil, mais precisamente no século XVIII, a língua portuguesa, como a única língua oficial do Brasil, com a já mencionada Lei do Diretório.

No site em que há o texto do Diretório dos Índios digitalizado e disponível para o acesso de todos, há a informação de que o diretório foi elaborado em 1755 e tornou-se público somente em 1757. O documento expressa importantes aspectos da política indígena do período da história de Portugal e do Brasil denominado Período Pombalino. Marquês de Pombal, ministro do rei de Portugal, D. José I, implementou os 95 artigos deste regimento. A intenção do governo do Reino de Portugal era o de evitar a escravização dos índios, sua segregação, seu isolamento e sua repressão, tentando-se evitar seu tratamento como pessoas de segunda categoria pelos colonizadores e missionários brancos. O documento estabelece, entre outras medidas, a proibição do uso do termo 'negro', já que a escravidão africana já havia iniciado no Brasil, o incentivo ao casamento de colonos brancos com indígenas, a substituição da língua geral pela língua portuguesa, e a punição contra discriminações (DIRETÓRIO DOS ÍNDIOS, 1755: s/p).

O Brasil foi um país colônia por cerca de quatro séculos - do século XVI ao século XIX, até 1822, ano de nossa Independência. Como sabido, muitos estrangeiros fizeram parte da História do país, trazendo consigo, consequentemente, sua cultura, modos de viver e línguas. Podemos citar, no início da colonização brasileira (DONATO, 1987: 71-42), no século XVI, os espanhóis e os franceses que disputaram territórios com os portugueses, além dos holandeses. Já os ingleses vinham ao país como imigrantes, aventureiros e até como piratas e travavam comércio com o Brasil, em seus navios, desde a descoberta do país. Mais tardiamente temos como exemplo as levas de imigrantes do século XIX dos italianos (início do ano de 1870), e dos japoneses no século XX (com começo em 1908), além de outros povos que não vieram em contingentes como os alemães (início em 1824 e maior imigração final em 1960). Todos esses povos, ao trazerem sua língua e cultura, conviveram de maneira bilíngue com a nossa população, tais convivências; porém, não foram capazes de nos tornar um povo bilíngue,

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embora tenham nos proporcionado empréstimos linguísticos, tenham trazido palavras estrangeiras e hábitos culturais para nossa vida cotidiana.

Recentemente observou-se no Brasil, já no século XXI, a tendência de tentar co-oficializar algumas dessas línguas, estrangeiras e indígenas nativas, nos municípios povoados por imigrantes, ou seja, cidades em que há muitos falantes das línguas italiana e alemã, por exemplo, ou nos das regiões de comunidades indígenas. Nos levantamentos do Inventário Nacional da Diversidade Linguística (INDL), do IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) estimou-se que, em 2014, há 250 línguas faladas no Brasil – indígenas, de sinais, de imigração, crioulas e afro-brasileiras, além de outras variedades da língua portuguesa. O Decreto no 7.387, de 9 de dezembro de 2010, instituiu o INDL como “instrumento oficial de identificação, documentação, reconhecimento e valorização das línguas faladas pelos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira (IPHAN, 2014: s/p).

O último Censo realizado, de 2010, contabilizou 305 etnias indígenas no Brasil que falam 274 línguas diferentes, sendo considerados idiomas minoritários e não oficiais em nosso país atualmente (IBGE, 2010: s/p). Podemos dizer que o Brasil atual (2017) é tido como um país bilíngue com a publicação Diário Oficial da Lei 10.43612 que versa sobre as línguas realmente oficiais no país: o português (vigente oficialmente a partir do século XVIII) e as libras (língua brasileira de sinais) a partir de 24 de abril de 2002, século XXI.

O bilinguismo é algo relativamente comum no globo e a estimativa do número de falantes dos idiomas globais, porém, não é uma tarefa simples; por essa razão tomamos por base o site Ethnologue13 (2018: s/p) que tem um banco de dados sobre línguas desde 1951. Eles estão na 21ª edição de um ranking das línguas mais faladas no mundo, sendo que alegam que vinte mil atualizações foram feitas desde o ano passado quando lançaram a 20ª edição. Além do ranking de idiomas há muitas outras informações sobre línguas, sendo que seu banco de dados é alinhado ao ISO 639-3, um inventário internacional de línguas. No século XXI, segundo suas informações, alguns países oficialmente bilíngues e suas línguas oficias são: Canadá (inglês e francês); Israel (hebraico e árabe); Holanda (holandês e frísio); Cazaquistão (casque e russo);

12 LEI DA LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS; LEI DE LIBRAS (LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS). 22 abr 2002. Disponínel em: . Acesso em 19 maio 2018. 13 Dados extraídos do site: ETHNOLOGUE. 2018. Languages of the World. Summary by language size. Disponível em: . Acesso 14 maio 2018.

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Camarões (francês e inglês); Reino Unido (galês e inglês). Como oficialmente trilíngues destacamos: Bélgica (holandês, francês e alemão) e Nova Zelândia (inglês, maori e língua de sinais). Já os polilíngues: África do Sul (inglês, africânder, zulu, xhosa, ndebele, tsuana, suázi, tsonga e venda) e os Estado Unidos (caroliniano, chamorro, inglês, francês, havaiano, samoano e espanhol).

Os EUA são um exemplo de país que não possui uma língua oficial e embora cerca de 80% de seus habitantes falem a língua inglesa, cada Estado da União tem autonomia para colocar a língua desejada como oficial. A Constituição dos EUA14 não permite que uma língua seja a oficial para a nação, o máximo permitido são leis para requisitos de naturalização, como as que exigem a fluência em inglês para que a naturalização se efetive. Embora tenham uma grande tolerância linguística a ponto de não se assumir uma única língua como oficial, é ao menos controversial que nos EUA haja tanta intolerância com os imigrantes, provenientes de outras culturas e falantes nativos de outras línguas.

Em alguns países há dezenas, ou até centenas, de línguas ou dialetos em uso (ETHNOLOGUE, 2018: s/p)15, como no próprio Brasil (228 línguas), nos EUA (334), na Nigéria (526) e na Papua Nova Guiné (841). No entanto, nesses locais é comum que a língua oficial seja a única privilegiada nas escolas, nos meios de comunicação e nos órgãos oficiais, o que os torna minoritários. Moçambique (GONÇALVES, 2012: 4) é mais um exemplo de país em que isso ocorre. O português e a língua de sinais são as línguas oficiais, mas além delas há cerca de 41 línguas nacionais na Constituição do país, a maioria de origem bantu. Apenas um pouco mais de 50% (cerca de 50,4% dos maçambicanos), de acordo com o Censo de 2007, falam português como L1 ou L2 - primeira ou segunda línguas -, mas nos meios oficiais somente a língua portuguesa é utilizada, sendo esse idioma o de maior prestígio no país. A questão do prestígio e do status linguístico, presentes nas comunidades em que o bilinguismo e o multilinguismo faz-se presente, e sua influência, tanto no bilinguismo social como no individual, são aspectos abordados no Capítulo 2.

As comunidades podem ser bi, tri, multi ou polilíngues, este é o chamado bilinguismo social e ocorre quando um povo, e suas comunidades, comunicam-se em mais de uma língua, oficial ou

14CONSTITUTIONAL TOPIC: OFFICIAL LANGUAGE. No official language is mentioned or contemplated in the Constitution. Disponível em: . Acesso em 19 maio de 2018. 15Dados extraídos do site ETHNOLOGUE 2018. Disponível em: . Acesso 14 maio 2018.

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não. O bilinguismo individual dá-se quando um indivíduo fala (pelo menos) duas línguas diferentes, também muito comum, pode ocorrer tanto em lugares em que o bilinguismo social é menos presente quanto nos locais em que ele se dá de maneira efetiva. Os motivos para o bilinguismo individual - e também para o multilinguismo, biculturalismo e multiculturalismo - segundo Jane Jackson, professora canadense de língua inglesa na Universidade de Hong Kong e autora de livros sobre diálogo intercultural, são os mais variados, as pessoas, em muitas partes do mundo, têm mais interação com outras de origens linguísticas e culturais diferentes seja por meio da: imigração (refugiados, imigrantes legais ou ilegais); educação superior (ex. há mais campus universitários com maior diversidade devido às políticas de internacionalização) viagens ou permanências (estudos ou residências em países estrangeiros); emprego (ex. expatriados); trabalho voluntário de grande duração (missionários); adoção ou nascimento (pais com origens multiculturais diversas); casamentos (uniões interétnicas e interreligiosas) (JACKSON, 2014: 143).

Em relação ao bilinguismo coletivo, as nações podem ser bilíngues, ou multilíngues, por razões econômicas - o país necessita de outra língua para o comércio, ou por outros motivos econômicos - e acaba adotando uma segunda língua como oficial; comunicacionais - em que a nação precisa comunicar-se em outra língua por situar-se em uma região fronteiriça, ou simplesmente para a manutenção de laços com outras nações ou povos; ou por questões de sua gênese, como no caso dos EUA, país formado por diferentes imigrantes; dentre outras razões possíveis.

Resumidamente, propomos no Capítulo 2 uma reflexão ampla que entrelaçasse as visões sobre língua e linguagem das Ciências Biológicas e Humanas, considerando os âmbitos culturais em que estão imersas. Os estudos da cultura e do discurso nos ajudaram a definir a identidade cultural e as identidades nacionais. O poder econômico da língua e os conflitos linguísticos são outras temáticas abordadas para que fizéssemos uma reflexão sobre a dinâmica dos povos em imigração, momento em que refletimos sobre os problemas enfrentados por eles – preconceito, falta de aceitação de sua cultura, inadequação ao sistema educacional do país de acolhimento, entre outros. O momento histórico em que vivemos (2018), marcado por contingentes imigratórios que ao deslocarem-se forçam a convivência bilíngue de milhões de pessoas fez com que nossa reflexão sobre bilinguismo, por trata-se de uma pesquisa de âmbito mundial, abarcasse temáticas de outras áreas do conhecimento, como as da Sociologia e da Economia.

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Os teóricos que nos deram suporte no Capítulo 2 para nossos apontamentos sobre língua, linguagem, cultura e identidade foram Ferdinand de Saussure (1910), Roland Barthes (1962), Jesús Martín-Barbero (2000), Vera Lucia Harabagi Hanna (2005), Néstor García Canclini (2006), Terry Eagleton (2005), Stuart Hall (1996 & 2003) e Mia Couto (2008), entre outros.

O termo bilinguismo, quando aplicado ao indivíduo, segundo o autor de contos, novelas, ensaios e também jornalista norte-americano George Saunders, pode significar simplesmente a capacidade de expressar-se em duas línguas (SAUNDERS, 1988: 8) e embora adotemos essa visão ampla e generalizante de bilinguismo nesta tese destacamos que não há um consenso entre os autores, até porque esses são provenientes de diferentes áreas do conhecimento, como ficará evidente ao longo desta pesquisa. Para François Grosjean, professor emérito francês especialista em bilinguismo e psicolinguística, o bilinguismo trata-se do uso regular de duas ou mais línguas ou dialetos, os bilíngues seriam as pessoas que usam as línguas ou dialetos em suas vidas diárias (GROSJEAN, 2008: 10), definições também consideradas por nós nesta tese.

Já as pesquisadoras brasileiras da área da psicologia sobre o tema Elizabete Villibor Flory & Maria Thereza Costa Coelho de Souza (2009: 30), da USP-SP, na tese Bilinguismo: Diferentes definições, diversas implicações afirmam que há vários critérios para apontar os tipos de bilinguismo existentes. Esses critérios dependem de características individuais e contextuais tais como: proficiência nas línguas em questão, idade de aquisição da segunda língua, organização dos códigos linguísticos, status das línguas, valorização afetiva das línguas, tempo de exposição a elas, manutenção da língua materna, identidade cultural do indivíduo bilíngue, entre outros. Tais critérios também foram aqui considerados e foram abordados no Capítulo 2. Para Flory & Souza (2009:30) ao invés de considerarmos as várias definições para os termos (bilinguismo e bilíngue) é mais produtivo para as pesquisas focar nos critérios utilizados em cada investigação selecionando o que é relevante de acordo com o que objetivamos estudar sobre o tema. Como a pesquisa mundial (uma pesquisa estatística) sobre língua, cultura, identidade e bilinguismo aqui apresentada destina-se ao público-geral, justificamos a definição geral de bilinguismo por nós adotada “a capacidade de expressar-se em duas línguas” (SAUNDERS, 1988: 8). No início do século XXI, estima-se que cerca de cinquenta por cento da população mundial seja bilíngue segundo Annick De Houwer (1997), da Universidade Antwerp, da Bélgica, “metade da população mundial é funcionalmente bilíngue, e a grande maioria desses bilíngues tem as duas línguas como língua materna” (DE HOUWER, 1997: 185).

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Outro conceito-chave desta tese é o de fluência. A pesquisadora brasileira Ester M. Scarpa da Unicamp, em Sobre o sujeito fluente, afirma que ao procurarmos a definição de fluência na literatura “nota-se que os linguistas desaparecem” e assim justifica este desaparecimento: “Na verdade, grande parte dos estudos sobre definição, limites e critérios de avaliação de fluência tem sido realizada por foniatras, fonoaudiólogos [...] que se viram instados a aprofundar o conceito de fluência por causa do extremo de sua negação, isto é, a gagueira.” (SCARPA, 1995: 163-164), quer dizer que o conceito de fluência cientificamente é feito em oposição à falta dela. A fluência, assim, é majoritariamente definida por linguistas, psicolinguistas ou fonoaudiólogos por um caminho de sua negativa “fluência é melhor definida como uma unidade de resposta destituída de disfluências, prolongamentos e pausas” (id. 164). Também nos valeremos nesta tese de outra definição corrente de que a fluência é um "barômetro para o sistema de fala como um todo, cujos limites são estabelecidos pela adequação do desempenho das dimensões semântica, sintática, morfêmica e prosódica da fala" (PERKINS, 1971, apud FINN & INGHAM, 1991: 92). Essas "dimensões semântica, sintática e morfêmica da fala", embora estejam no espaço privilegiado da fala, também estão no espaço da lingua(gem), havendo uma quase impossibilidade de mapearem-se, adequadamente, os aspectos mensuráveis e definidores da fluência para que a distinção da disfluência seja inequívoca, conforme concluem os teóricos Finn & Ingham (id. 92).

Como fica evidente, o conceito científico de fluência envolve diferentes áreas do conhecimento e é de difícil definição por ser baseado em uma negativa – ser “destituída de disfluências, prolongamentos e pausas”. Seus parâmetros norteadores têm por base tanto a oralidade quanto componentes estruturais da língua(gem): da linguística, o estudo dos elementos da significação, ou os componentes do sentido das palavras e da interpretação das sentenças e dos enunciados (semântica); da relação das palavras, ou parte da semiótica, que trata da combinação dos signos entre si (sintaxe); da forma das palavras, parte da linguística que trata da descrição, das noções e da classificação dos morfema e da morfologia; e da parte da linguística que estuda a entonação, o ritmo, o acento - intensidade, altura, duração, etc. - da linguagem falada e demais atributos correlatos na fala (prosódica). A ideia de a fluência ser “um barômetro para o sistema da fala como um todo” que leva em consideração esses elementos aqui destrinchados nos parece uma visão holística relevante e ampla que nos norteará nesta tese. O substantivo barômetro – um instrumento que indica a pressão atmosférica, a altitude e prováveis mudanças do tempo – usado nesta analogia igualmente revela-se significativo, uma

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vez que pode ser interpretado como um instrumento interno do falante que indica a pressão e prováveis mudanças tanto nos componentes da oralidade quanto da língua(gem) e, portanto, da sua própria fluência.

Com relação ao biculturalismo, nos valeremos novamente de uma definição de Jane Jackson (2014), “o biculturalismo é caracterizado pela proficiência e conforto de um indivíduo com ambas, a cultura original e a cultura de um novo país ou região” (JACKSON, 2014: 207), aqui é interessante o emprego do termo “proficiência” associado à cultura – o que reforça o axioma de que língua é cultura que veremos a seguir. Jackson adiciona que os “indivíduos bilíngues podem ‘incorporar essas línguas e culturas em seu senso de quem são’” (JACKSON, 2014: 207)16, como fica evidente, esta segunda definição conecta línguas e culturas ao senso de identidade. Já Rod Ellis, renomado teórico britânico de bilinguismo, afirma que o termo competência é o conhecimento linguístico de uma língua que os falantes já interiorizaram e o termo proficiência refere-se à habilidade dos falantes para usarem esse conhecimento em diversas tarefas (ELLIS, 2008: 26), sendo que estas definições também serão as adotadas nesta tese. Isso implica em dizer que as questões de nomenclatura e contextos de seus empregos são muito variadas e que suas discussões se fazem de maneira profícua e científica (ciência normal e revolução científica de Kuhn, 1962), o que torna imperativo que nos atenhamos a uma definição específica como norte.

As teorias antropológicas da cultura auxiliam-nos no entendimento das mais diferentes formas de manifestação cultural do ser humano, no meio em que vivem. Com base na teorização antropológica sobre língua, línguas estrangeiras e outras culturas, tomaremos como referência as considerações de Vera L. Harabagi Hanna, pesquisadora da área dos Estudos Culturais, da Literatura e professora da Área de Estudos de Línguas Estrangeiras da Universidade Presbiteriana Mackenzie, sobre o axioma línguacultura: Afirmar que o entendimento cultural é parte irrestrito da educação linguística é um truísmo, contando, porém, que sempre existe espaço para intensificá-lo, utilizaremos o termo languaculture, cunhado por Agar que, em seu livro Language Shock, Understanding the Culture of Conversation (1994), elucida sua intenção ao criar o conceito: a de que seus leitores ao ouvirem a palavra language, ou a palavra culture, sempre se lembrassem da outra metade (Agar, 1994, p.60). (HANNA, 2018: 26)

16 “Biculturalism is characterized by proficiency and comfort with both one’s original culture and the culture of the new country or region […] a bilingual individual may ‘incorporate these languages and cultures into their sense of who they are’”. Tradução nossa.

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Em outras palavras, o entendimento cultural é constituinte absoluto da educação/aprendizagem de línguas (maternas, estrangeiras, L1 ou L2 etc.), por isso o termo cunhado por Agar é uma verdade evidente por si mesma ou um axioma, no sentido de ser uma premissa considerada necessariamente verdadeira. Como o conhecimento está em constante construção, há sempre como intensificar os estudos e, assim, o termo línguacultura é bem-vindo e necessário. Esta noção será válida para nós, uma vez que, ainda para Hanna (2018: 26), Agar utiliza-se do termo em seus estudos com o objetivo “de teorizar o universo que cobre língua mais cultura, de maneira especial quando refere-se à variabilidade da língua-cultura nas interações verbais, não somente entre nativos usuários da mesma língua, mas entre indivíduos que utilizam a língua como primeira ou língua estrangeira”. Este é o contexto linguístico-cultural com que nos defrontamos em nossa pesquisa mundial17, usuários nativos e não nativos dos três idiomas (português, inglês e espanhol) que disponibilizamos nossos questionários de pesquisa.

De acordo com a pesquisadora (HANNA, 2018: 26), Agar considera o termo languaculture, “uma invenção inevitável”, “um lembrete da absoluta necessidade da vinculação das duas partes”, sendo indispensável para esta pesquisa porque o termo engloba os aspectos de dois ramos distintos da Linguística, a semântica – ou simplificadamente o estudo dos significados – e da pragmática – ramo que estuda a linguagem em uso, ou em seu contexto de comunicação. A línguacultura, por essa perspectiva, seria um elo entre o sistema linguístico de uma pessoa somente, chamado de idioleto, ou o sistema linguístico de um único indivíduo, que reflete suas características singulares, biografia etc. – e o sistema linguístico da coletividade, representada pela estrutura da língua. A línguacultura abarcaria a busca pela comunicação intercultural, uma vez que seria capaz de aliar as variáveis individuais e coletivas da prática linguística e, por isso, é uma concepção de interesse para nós, como vemos pelo excerto: É importante observar que com base na variabilidade semântica e pragmática da prática linguística, a busca da comunicação intercultural está presente, no sentido de que intenções línguaculturais estão ligadas a condições variáveis, social e pessoalmente, funcionam como uma ponte entre a estrutura da língua e o idioleto pessoal socialmente constituído. (HANNA, 2018: 26).

Quando abordamos a educação formal em mais de um idioma, temática do Capítulo 3, nos defrontamos com um conjunto de outras questões. Os pais quando vão matricular seus filhos em uma instituição, do Ensino Fundamental e Médio, no Brasil, por exemplo, deparam-se com nomenclaturas desconhecidas e dúvidas sobre elas. Há o chamado ensino bilíngue propriamente dito, feito nas escolas que se autointitulam bilíngues; o ensino que segue um

17 Ver ANEXO 1 para questionário completo.

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currículo internacional (currículo de outro país), que também é feito em pelo menos dois idiomas, ou o ensino das autointituladas escolas internacionais; e há ainda as escolas regulares que apresentam os chamados “programas bilíngues”.

No Brasil, deparamo-nos nas últimas duas décadas, com um aumento da procura de brasileiros por um ensino em pelo menos dois idiomas, segundo a reportagem da Revista Istoé, Antunes e Todeschini (2007: 100) houve um aumento de 25% no número de escolas de alfabetização simultânea de dois idiomas no Brasil até 2007, sendo que destas, 90% ensinam além do português o inglês. De acordo com os últimos números da Organização das Escolas Bilíngues (OEBi), há hoje 13 instituições de ensino vinculadas a ela (OEBI, 2016: s/p), conforme vermos no Capítulo 3, a organização tenta estabelecer parâmetros para que as escolas possam ser chamadas de bilíngues. Nossas pesquisas, no entanto, revelaram um número de escolas bem maior que estes, conforme ficará evidente por meio das reportagens e dos dados, por nós levantados, das próprias escolas - ver também Anexo 2 para inventário de escolas bilíngues privadas e públicas no Brasil e das chamadas escolas internacionais.

Ao longo do Capítulo 3 trouxemos um sucinto retrospecto do chamado ensino bilíngue, ou aquele feito pelas escolas autointituladas bilíngues no Brasil, contrastando-o com o que é definido no mundo. Constatamos que esta definição é majoritariamente feita pelas próprias escolas por meio dos meios midiáticos. Ao trazermos as definições de escola bilíngue encontradas em trabalhos científicos brasileiros, traçamos um contraponto e elencamos os principais elementos que ajudariam na definição deste tipo de ensino, além de trazermos alguns motivos que os pais apontam como fundamentais para matricularem seus filhos nestas escolas. O que a legislação brasileira fala sobre esse tipo de ensino e principalmente o que ela omite, mesmo com a Nova Base Comum curricular (NBCC) do Ensino Fundamental (2017) e o Novo Ensino Médio, foram motivo de um novo tópico adicional neste capítulo.

O mesmo foi feito em relação à chamada ‘escola internacional’; fizemos um retrospecto histórico dessas instituições no Brasil, trouxemos as razões apontadas por pais para a matrícula lá, além de tentarmos traçar sua definição de acordo com os mesmos padrões - as definições das próprias escolas, de pesquisas científicas e da mídia. Adicionalmente fizemos um inventário destas instituições (Anexo 2) antes de, tal como fizemos nos dois outros capítulos anteriores, trazermos dados econômicos de qual classe social este ensino estaria majoritariamente voltado no país. Deparamo-nos também com os chamados “programas bilíngues”, que são vendidos

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principalmente por franquias especializadas e escolas bilíngues para escolas regulares, também tendo suas próprias regras e metodologias. Com o levantamento feito, verificamos as carências deste tipo de ensino no Brasil, o que nos levou a propor uma nomenclatura e os critérios mínimos que podem ajudar na regulamentação do setor.

Propusemos, assim, o termo ‘Ensino Bilíngue’ em letras maiúsculas e entre aspas simples para descrever o atual cenário brasileiro das escolas bilíngues, escolas internacionais e das escolas regulares que tenham os chamados “programas bilíngues”, sempre que nos referirmos ao objeto primordial dessa pesquisa que é o ensino feito em escolas regulares, em pelo menos dois idiomas estrangeiros, por instituições que atendam aos dez requisitos mínimos (de horas de exposição mínima à língua-alvo, de certificações internacionais para alunado e professorado, de elementos culturais dos países de referência etc.) por nós propostos e justificados no subitem 3.9 desta tese. O termo ensino bilíngue, como grafado aqui, em minúsculas e sem aspas, será utilizado nos outros momentos desta tese e refere-se ao ensino oferecido pelas escolas bilíngues ou pelo ensino que não englobe essas definições mínimas propostas.

Com relação à teoria utilizada no Capítulo 3, sobre como é feito o ‘Ensino Bilíngue’ no Brasil em contraponto com o do mundo, nos valemos de William F. Mackey (1972) e François Grosjean (1982) e da pesquisadora brasileira Antonieta Megale (2005), com suas descrições deste tipo de ensino no Brasil e em alguns países do globo. Na descrição brasileira, além de Megale (2205) tivemos que nos nortear em trabalhos recentes, de jovens pesquisadores brasileiros (PIBICS, artigos de revistas, mestrados, doutorados), como os de Adriana L. Cantuaria (2005), Marcello Marcelino (2009), Samanta Malta P. da Silva (2009), Flávia Queiroz Hoexter (2016) e Aline Möller (2017), além das próprias definições das escolas bilíngues e internacionais disponíveis nas mídias e reportagens, uma vez que são raros os livros que descrevam a situação do ‘Ensino Bilíngue” brasileiro.

Quando iniciamos nossa pesquisa acerca do ensino em duas línguas, cultura, identidade, ou o que chamamos de ‘Ensino Bilíngue’, inevitavelmente nos defrontamos com questionamentos que englobam ideias que podem permear o senso-comum da população sobre a temática, que forma algumas de nossas perguntas de pesquisa: o bilinguismo acarretaria em algum tipo de benefício (vantagem cognitiva ou social), ou o contrário disso (preconceito) para seus falantes? Os modelos, ou paradigmas, sobre os falantes bilíngues defendidos pelos cientistas em suas teses e hipóteses sempre falseáveis influenciam as ideias do senso-comum? Qual é o papel da

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mídia na influência ao optar-se por um ‘Ensino Bilíngue’? Haveria algum tipo de benefício (social, econômico etc.) em se optar por um ‘Ensino Bilíngue’? A língua é o mesmo que cultura? A língua é identidade, a língua é (o mesmo que) poder? Essas foram algumas das perguntas selecionadas para fazer parte do questionário de nossa pesquisa. No Capítulo 4, estão detalhadas todas as vinte e quatro (24) perguntas e as justificativas individuais de cada uma para sua inclusão na pesquisa de acordo com a teoria pesquisada ao longo da tese, sua dinâmica ao respondê-las está no ANEXO 1 (ex. caso o respondente marcasse “sim” o que aconteceria, caso marcasse “não”, etc.).

Disponibilizamos o mesmo questionário em três versões, nos idiomas português, inglês e espanhol devido à importância em número de milhões de falantes destas línguas no mundo, e pelo fato de as respostas desta pesquisa poderem ser analisadas pela pesquisadora, que as conhece. A pesquisa18 foi disponibilizada por meio de um site de pesquisas online durante os dias 23 de abril a 26 de maio. O fato de ser uma pesquisa online fez com que houvesse a possibilidade de espalhar o questionário pelo mundo, tornando essa pesquisa uma pesquisa mundial. A escolha desses idiomas também serviu para a seleção do critério de metodologia de análise das respostas obtidas, quer dizer, na análise, o principal critério será a língua. As respostas serão analisadas em relação ao idioma em que os entrevistados optaram por responder ao questionário e conterá afirmações como “X% dos que responderam que língua (era o mesmo que cultura) responderam em português, enquanto Y% respoderam em inglês e Z% em espanhol” (ver Capítulo 4).

Utilizamo-nos nesta tese de três metodologias distintas. Primeiramente, fizemos uma pesquisa teórica, tomando por base os estudiosos já mencionados além de outros, sobre as seguintes temáticas principais: os paradigmas científicos ligados a vantagens e desvantagens do bilinguismo por cerca de um século no Capítulo 1; a língua e a linguagem, a cultura e a identidade, as Ciências Biológicas e sua intersecção com as Ciências Humanas e os conflitos linguísticos causados por povos em imigração no Capítulo 2; o ‘Ensino Bilíngue’ no Brasil, sua história, a tentativa de sua definição, suas variáveis, problemas e a proposta de uma diretriz para ele, no Capítulo 3. À segunda fase, coube formular as perguntas que seriam disponibilizadas em nosso questionário, cujos critérios de elaboração foram a teoria por nós pesquisada e as reflexões feitas nos três primeiros capítulos.

18 PESQUISA MUNDIAL SOBRE BILINGUISMO. Disponível em: . Acesso de 23 abril a 26 maio 2018.

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Na terceira etapa, da análise estatística dos dados coletados, fizemos, inicialmente, duas análises diferentes de acordo com a pergunta formulada. Primeiramente houve a análise quantitativa individual dos resultados por idioma em que a questão foi respondida: português, inglês ou espanhol. Cada pergunta foi acompanhada de uma figura e um gráfico ilustrativo (tipo pizza) que representava o universo e a porcentagem dos respondentes que marcaram sim, não, ou não sei; ou por um gráfico na forma de barras quando eram disponibilizadas alternativas (a – e) a serem assinaladas (ver Capítulo IV). Geralmente quando os respondentes marcavam sim era disponibilizada uma escala ali explicitada (no geral 1 – discordo plenamente - a 5 – concordo plenamente) para a coleta de dados qualitativos. Uma figura da distribuição destas repostas seguindo a escala também foi disponibilizada por idioma, além da informação da média aritmética destas respostas, quer dizer, perto de qual valoração as respostas, em média, encontravam-se entre 1 a 5, e a informação do desvio padrão. O desvio padrão indicava se, no universo de repostas fornecidas pelos participantes, a maioria dos participantes concordou com a valoração fornecida, desvio pequeno, ou discordou dela, desvio grande.

Após estas análises iniciais, comparamos os dados nos três idiomas e obtivemos os resultados gerais das respostas para a confrontação com a teoria que nos fez formular cada questão. Verificamos, assim, se os dados obtidos em nossa pesquisa confirmavam ou não nossa hipótese inicial individual, ali explicitada, em cada pergunta formulada, seguida de uma breve discussão. Em suma, nossa análise estatística foi feita da seguinte maneira: analisamos os dados quantitativos – porcentagem de concordância, discordância ou de não saber - e os entrecruzamos aos qualitativos – valoração de 1 a 5 (concordância/discordância plena) quando presentes - sendo que usamos esses últimos como critério de desempate para corroborar ou refutar nossa hipótese inicial baseada na teoria pesquisada. Entrecruzamos também esses dados com o desvio padrão nas respostas qualitativas para analisar se os respondentes da subamostra de cada pergunta mais concordavam ou discordavam entre si em suas respostas. Para terminar, quando julgamos que o resultado obtido ainda era conflitante, fizemos um teste estatístico, o teste do Qui-Quadrado (χ2), que é uma das distribuições mais utilizadas em estatística inferencial – em que um conjunto de métodos estatísticos visam a caracterizar ou inferir sobre uma população a partir de uma parte dela, de uma amostra19. Este teste serve para avaliar quantitativamente a relação entre o resultado de um experimento e a distribuição

19 VIRTUOUS. Teste do qui quadrado para independência. 1998. Disponível em: . Acesso em 10 jun 2018.

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esperada para o fenômeno, dizendo-nos o grau certeza de os valores observados serem aceitos como regidos pela teoria em questão. Em outras palavras, são propostas duas hipóteses, a H0 e a H1, uma é a nossa hipótese inicial que acaba por ser aceita ou rejeitada de acordo com os resultados obtidos pela amostra coletada (se ela for rejeitada aceita-se a outra).

Todos os detalhes destas análises, seus cálculos e as hipóteses, H0 e H1, estão no ANEXO 3.

As possibilidades de respostas que disponibilizamos para os entrevistados foram, predominantemente, na forma de múltipla escolha, do tipo estruturadas (fechadas), restringindo as do tipo não-estruturadas (abertas) para uma ou outra resposta, como quando perguntamos sobre a língua materna e demais línguas faladas pelo entrevistado, ou no caso de supormos haver outras possibilidades que não estavam contempladas nas alternativas propostas – por exemplo, quando a resposta podia ser. “não me considero bilíngue porque...” em que, além das alternativas, deixamos a possibilidade de uma resposta aberta para o respondente poder manifestar-se livremente.

Como justificativas gerais20 à presente investigação destacamos os fatos de que: uma língua comporta um universo de crenças; uma língua emana da identidade cultural de uma nação ou de muitas nações e de suas regiões; a língua, como unidade imaginária, caracteriza os diferentes grupos sociais de um país; falar um idioma estrangeiro significa ter direito à integração e ter acesso às oportunidades de manifestação do seu próprio mundo de crenças e à manifestação dos mundos de crenças dos outros. As ideias acerca do ensino e aprendizado de línguas que permeiam as Ciências e o senso-comum em constante entrelaçar; as questões linguísticas da vida cotidiana e as que alcançam algum destaque midiático; além dos questionamentos dos teóricos, dos pais, dos mestres e estudantes em relação ao ‘Ensino Bilíngue’ praticado atualmente no Brasil, igualmente, servem de justificativa para a presente pesquisa que tem por intenção maior fomentar o debate e incentivar a discussão e a reflexão sobre como esse ensino é praticado, com que qualidade, além de propor o início da regulamentação do setor (ver subitem 3.9).

Como última justificativa geral para esta investigação sobre o que as pessoas do mundo, bilíngues ou não, pensam sobre língua, cultura, identidade e o ‘Ensino Bilíngue’ no Brasil e no mundo, tomaremos como referência a definição de competência global (global competence)

20 Como já mencionado, ver Capítulo 4 para justificativas individuais de cada pergunta, ou ANEXO 1 para todas as perguntas e respostas disponibilizadas nos três idiomas.

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definida pela National Education Association (NEA), em uma publicação, Global Competence is a 21st Century Imperative (s.d.), interpretada da seguinte maneira, por Hanna (2018: 23), como “a habilidade de adquirir conhecimento e compreensão profundos sobre assuntos internacionais”. Na chamada competência global estaria “explícita a aptidão de possuir proficiência em línguas estrangeiras – nas habilidades de ler, falar e escrever mais de um idioma” (id. 23), esta aptidão de possuir a proficiência em línguas estrangeiras conecta a competência global a um dos objetos de investigação de nossa tese, o ‘Ensino Bilíngue’.

A proficiência em mais de uma língua, ainda segundo a pesquisadora, abriria as portas para o entendimento de outros povos e culturas, assim como manteria um conhecimento internacional histórico, socioeconômico e político, sendo peça fundamental para cultivar uma apreciação da diversidade cultural, além de implicar em tolerância e senso de cooperação entre as pessoas e povos (id. 23). Esses aspectos apontados por Hanna vão ao encontro do que pesquisamos ao longo desta tese como um todo. O requisito obrigatório para que o que foi pontuado ocorra – melhor conhecimento de povos e culturas, de história, política, sociedade e economia internacional, que resultariam em maior tolerância e senso de cooperação entre as pessoas - é a proficiência em uma língua franca, além da compreensão de conceitos como os de interculturalidade e globalização cultural, temáticas abordadas indiretamente nesta investigação, como evidenciado no excerto: Para que isso aconteça, a compreensão do sentido de globalização cultural, a prática da interculturalidade, o contato entre pessoas e suas culturas, seus valores, seus modos de vida, a importância do conhecimento de uma língua chamada de comunicação, ou de franca, ou de global, quase sempre o inglês, mas não exclusivamente, se faz mandatório (HANNA, 2018: 23).

Por fim, delinearemos o objetivo desta tese, o de verificar se uma ideia, axioma, modelo sobre língua, cultura, identidade, ‘Ensino Bilíngue’ entre outros, tramita entre o senso-comum dos cidadãos, em seu dia-a-dia, e em outros meios, como o científico, o jornalístico, o educacional, o econômico, etc., com seus valores alterados ou não. Ao pesquisarmos a teoria sobre o bilinguismo nos deparamos com conceitos complexos – definição de fluência, línguacultura, biculturalismo, competência global, identidade, identidade cultural, dentre outros, que eram os subsídios, ou os elementos fundadores essenciais da condição bilíngue e chegamos à conclusão de que sem eles não poderíamos fazer uma pesquisa que fosse relevante para o meio científico. Ao mesmo tempo, não queríamos que esta pesquisa fosse restrita ao meio acadêmico por considerarmos que este nicho é demasiado restrito e seletivo, não contendo a opinião da maioria da população e sim, as ideias dos cientistas. Desta maneira surgiu a ideia de

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nos utilizarmos dos conceitos, paradigmas, axiomas, definições etc. da ciência sobre o bilinguismo e seus elementos essenciais – língua(gem), cultura, identidade e ‘Ensino Bilíngue’ – para perguntar à população geral o que, em sua opinião pessoal, era verdade ou não, ou não sabiam informar.

O objetivo específico de nossa pesquisa é o de confrontar as ideias científicas das diversas áreas do conhecimento que estudam o bilinguismo, a fisiologia, economia, psicologia, educação, direitos humanos, literatura, estudos culturais, antropologia, filosofia, história, etc., com as ideias do senso-comum, representadas pelas opiniões dos 207 participantes que se propuseram a responder essa pesquisa. Objetivamos com isso alimentar as discussões sobre a relevância do bilinguismo e dos bilíngues no mundo, assim como o da educação bilíngue que a eles subjaz, de maneira a contribuir para um mundo melhor e mais tolerante linguisticamente e culturalmente por meio de uma análise crítica dos resultados por nós encontrados. Na parte teórica, objetivamos, também a proposição de parâmetros que venham a nortear o ‘Ensino Bilíngue’ brasileiro para que este consiga obter, dentro de sua identidade própria, elementos comuns nivelados a parâmetros internacionais para que mais e mais brasileiros consigam ser bilíngues de fato e nosso país saia da estatística de ser uma nação predominantemente monolíngue e torne-se cada vez mais constituída por bilingues, trilíngues ou multilíngues munidos de uma competência global.

As hipóteses individuais, para cada questão, encontram-se disponíveis no Capítulo IV, nossa hipótese geral é a de que, no senso-comum, a maior parte das ideias, paradigmas científicos, conceitos, etc. estariam reproduzidos de forma inalterada. Isto porque entendemos que há um complexo jogo de entrelaçamento entre as ideias do senso-comum e da Ciência, no qual os meios de comunicação fazem o papel intermediário. Justificamos a escolha de um público geral com base em nossas pesquisas de que estamos imersos em âmbitos culturais amplos, não restritos ao conhecimento científico, jornalístico, educacionais, econômico, filosófico, etc. ou ao conhecimento de uma crítica especializada. Acreditamos ser imperioso fazer com que os debates sejam amplos, feitos com conhecimentos oriundos de diversas áreas do conhecimento, para que as discussões sobre os variados temas, tais quais os que trazemos aqui, sejam profícuas e relevantes na contemporaneidade, em si, multifacetada e complexa.

Identificamos em nossas pesquisas teóricas uma tendência de segmentação do conhecimento na atualidade, provavelmente devido à necessidade de alta especialização dos profissionais

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que se veem conhecedores somente de um pequeno nicho do conhecimento, talvez porque esse seja muito vasto. Há uma tendência de que os profissionais atuais, das diversas áreas, científicas ou não, fiquem somente em sua área de conhecimento, sem conseguir colocar os resultados de suas pesquisas/trabalhos em uma perspectiva mais ampla. Isso pode levar a resultados distorcidos, principalmente nas Ciências. Acreditamos que esta pesquisa, que envolve conhecimentos de áreas bem distintas do conhecimento, possa contribuir para os debates aprofundados no bilinguismo uma vez que considera não somente as publicações que exaltem de maneira inconteste a existência de uma suposta vantagem bilíngue, mas também pondera sobre o que os cidadãos comuns avaliam desta suposta vantagem – dela ser de ordem cognitiva, social, econômica, etc. - o que pode ser um fator favorável para a formação de um pensamento crítico em relação aos dados obtidos sobre o bilinguismo.

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CAPÍTULO I – “VANTAGEM” OU “DESVANTAGEM” DO BILÍNGUE NO COMPLEXO JOGO ENTRE A CIÊNCIA E O SENSO-COMUM.

One language sets you in a corridor for life. Two languages open every door along the way. (FRANK SMITH)21

Haveria uma forma de separar os cientistas (e suas ideias científicas sobre os assuntos como o domínio de dois idiomas) de suas próprias ideias no mundo comum? Ou por serem pessoas acima de serem cientistas não há como essas ideias não se interpenetrarem e formarem um complexo jogo em que não sabemos onde cada coisa começa ou termina? Por acreditarmos que a Ciência e a vida cotidiana misturam-se porque os envolvidos nelas são essencialmente seres humanos fazendo Ciência ou vivendo a vida ordinária – da qual a mídia é uma parte essencial – fechamos o questionário de perguntas para nossa pesquisa mundial sobre língua, cultura, identidade e ‘Ensino Bilíngue’ com estes e outros questionamentos. Neste primeiro capítulo abordaremos os paradigmas das Ciências sobre o bilinguismo desde o início do século XX até o presente momento, início do século XXI. Dentro deste século de discussões, os paradigmas de o bilinguismo acarretar em uma suposta desvantagem a ele implicar em uma suposta vantagem de ordens diversas – cognitivas, sociais, psicológicas, etc. – encontram-se no centro das discussões.

Antes de aprofundarmo-nos na complexa dinâmica que se estabelece entre as partes científicas e ordinárias, nos valeremos da conceituação, não menos complexa, do psicolinguista François Grosjean, Professor Emérito da Universidade de Neuchâtel, Suíça, que se destacou em seus estudos sobre o bilinguismo e assim define o termo bilíngue:

O bilíngue ou a visão holística do bilinguismo propõe que o bilíngue é um todo integrado que não pode ser facilmente decomposto em duas partes diferentes. O bilíngue não é a soma de dois monolíngues completos ou incompletos; mais propriamente, ele ou ela tem uma configuração linguística específica e única. A coexistência e constante interação das duas línguas no bilíngue produziu um sistema linguístico diferente, mas completo (GROSJEAN, 2008: 13-14).

Gostaríamos de ressaltar que os elementos que definem um indivíduo bilíngue, assim como as próprias acepções de bilinguismo, não serão do escopo dessa tese. Somente Li Wei (2000: 6-7) apresenta 37 tipos diferentes de bilíngue em seu livro The bilingualism Reader. Pelo fato de já existirem teses e livros que debatem as definições de bilíngue e bilinguismo optamos por trazer

21 “Uma língua coloca você em um corredor para a vida. Duas línguas abrem cada porta ao longo dele”. (FRANK SMITH). Tradução nossa.

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uma definição mais holística e abrangente para dela partirmos para as discussões que nos interessam nessa tese.

Essa definição de Grosjean de que o bilíngue é um todo não divisível, e não dois monolíngues em sobreposição em um ser; somada a ideia de que ele é único em sua configuração linguística exatamente devido às línguas que aprendeu, e que resulta em sistema linguístico completo apenas diferente dos demais, nos valerá como definição de bilíngue. Esse conceito norteará a pesquisa para as discussões que seguem sobre o tema. A seguir entraremos no nosso recorte e em um pequeno retrospecto de como a conceituação de “vantagem” ou “desvantagem” em ser bilíngue estabeleceu-se podendo ter influenciado o pensador Grosjean no caminho de seus estudos para que chegasse a essa definição.

1.1 Quando ser bilíngue era considerado uma “desvantagem”

Quando se começou a estudar, investigar e observar os falantes bilíngues, os cientistas iniciaram suas teorias pelas crianças. Na primeira metade do século XX, os pesquisadores sobre o assunto tendiam a acreditar que o bilinguismo, tanto em concomitância quanto em sequência, poderia trazer alguma espécie de “desvantagem” para as crianças em relação àquelas que aprendiam apenas uma língua, devido basicamente ao momento biológico inicial, de formação cerebral em que ela se encontrava no momento da aprendizagem. Esse paradigma ficou conhecido como a “desvantagem do bilíngue” e perdurou até o século XXI, ou seja, ainda hoje encontramos pessoas que acreditam que um falante pode ter malefícios por ser exposto a duas línguas.

Encontramos em estudos recentes de pesquisadores brasileiros como Limberger e Buchweitz, ambos da PUCRS, que o paradigma recorrente era aquele em que o bilinguismo era tido como causador de uma “desvantagem”: “As pesquisas mais antigas sugeriam uma “confusão mental” nos bilíngues, tratando-os com inferioridade”; eles dizem que a pesquisa de Saer de 1923 falava em “confusão mental” e a de Goodenough de 1926 mencionava o “retardo” como possíveis desvantagens do bilinguismo (LIMBERGER & BUCHWEITZ, 2012: 68). A ideia recorrente ligada à “desvantagem bilíngue” é a de que, principalmente os imigrantes - ao manterem a língua mãe em casa - teriam algum tipo de impedimento para a integração escolar, o que, provavelmente, levaria à confusão, retardo ou até regressão acadêmica.

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A conhecida pesquisadora canadense Ellen Byalistok (2013) publicou centenas de artigos científicos e dezenas de livros para o público em geral, como veremos ao longo dessa tese. Em um de seus artigos Bilinguismo: consequências para a mente e para o cérebro22 encontramos, na conclusão do artigo, um trecho de Goodenough para justificar como o paradigma ainda persiste no pensamento de algumas pessoas. Nele há a recomendação de se evitar a língua materna nos seguintes termos: Deve ser considerada como evidência que o uso de uma língua estrangeira em casa é um dos fatores principais da produção de retardo mental como medido por testes de inteligência. Uma explicação mais provável é a de que aqueles grupos de nacionalidade cuja habilidade intelectual média é inferior não aprendam uma nova língua tão rapidamente 23. (GOODENOUGH, 1926: 393 apud BYALISTOK 2013: s/p).

Outros dois autores que ajudaram na consolidação do paradigma, Jespersen (1926) e Firth (1930), demonstram como era o pensamento sobre o bilinguismo há pouco menos de um século atrás. Suas reflexões, juntamente com as de Goodenough (1926), estão disponíveis em uma página da University of Columbia24. Suas visões apontam para uma avaliação de “desvantagem do bilinguismo”, mesmo que, a princípio, elogiem o bilinguismo. Jerspersen afirma: É, obviamente, uma vantagem para uma criança ser familiar a duas línguas: mas sem dúvida a vantagem pode ser, e geralmente é prezada em demasia. Primeiramente a criança em questão mal aprende qualquer uma das duas línguas tão perfeitamente como teria feito se tivesse limitando-se a uma... Segundo, o esforço cerebral necessário para dominar as duas línguas ao invés de uma certamente diminui o poder da criança de aprender outras coisas25 (JESPERSEN, 1922: s/p). Firth também emite uma opinião que corrobora a opinião vigente de o bilinguismo acarretar em uma desvantagem, como vemos pelo excerto: O falante bilíngue médio, é verdade, tem duas cordas em seu arco – uma um pouco mais frouxa do que a outra... Todo homem culto necessita de uma segunda língua e talvez uma terceira língua estrangeira – mas ele não necessita ser bilíngue. O monolíngue tem a vantagem, e quão maior for a

22 “Bilinguism: consequences for mind and brain” Tradução nossa. 23 "This might be considered evidence that the use of a foreign language in the home is one of the chief factors in producing mental retardation as measured by intelligence tests. A more probable explanation is that those nationality groups whose average intellectual ability is inferior do not readily learn a new language." Tradução nossa. 24 CLASS 20. Firth, Jerspersen & Goodenough. University of Columbia. Disponível em: . Acesso em 08 maio 2018. 25"It is, of course, an advantage for the child to be familiar with two languages: but without doubt the advantage may be, and generally is, purchased too dear. First of all the child in question hardly learns either of the two languages as perfectly as he would have done if he had limited himself to one… Secondly, the brain effort required to master the two languages instead of one certainly diminishes the child’s power of learning other things."(Jespersen, 1922). Tradução nossa.

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comunidade cultural naquela língua, maior será a vantagem. Como primeiro princípio coloque sua fé na língua mãe26. (FIRTH, 1930: s/p).

As citações desses quatro autores refletem a maneira de ver o bilinguismo no início do século XX. Saer (1923) fala em “confusão mental”; Jespersen (1922) afirma que a “vantagem em ser familiar a duas línguas é prezada em demasia”, e ainda que o “esforço cerebral para dominar duas línguas diminui o poder de aprender outras coisas”; Goodenough (1926) acredita que o “uso de uma língua estrangeira em casa é um dos fatores principais da produção de retardo mental como medido por testes de inteligência”; e, finalmente, Firth (1930) crê que “o monolíngue tem a vantagem” acrescentando que “quão maior for a comunidade cultural naquela língua, maior será a vantagem”. Nos ditos de Saer, Jerspersen e Goodenough as desvantagens bilíngues apontam para problemas de funcionamento cerebral e de ordem cognitiva que seriam, na visão deles e no senso-comum da época, causados pelo bilinguismo. Já a visão de Firth aborda uma questão cultural e, portanto, uma desvantagem de ordem social.

O paradigma de haver uma “desvantagem bilíngue” não ficou isolado àquela época. Essa ideia chegou até nós como vemos, muito mais recentemente, em um relatório da UNESCO – “Relatório do Desenvolvimento Humano 2004” – assinado pela psicolinguista da Universidade de Paris, Ranka Bijeljac-Babi ‘C. A publicação da matéria na Revista Planeta, “Crianças Bilíngues, o trunfo que alguns países ricos rejeitam” (2010) criticou esse paradigma vigente no século XX. Por não ser de grande circulação como muitos dos demais meios midiáticos por nós aqui trazidos, acreditamos ser relevante, primeiramente contextualizar a Revista Planeta. É uma publicação brasileira que tem a palavra transformação como uma de suas palavras-chave. A sustentabilidade, a tecnologia, questões ambientais e de responsabilidade social também são temáticas recorrentes nas plataformas impressas e da web. Mensalmente há a publicação de pesquisas da UNESCO sobre Patrimônios da Humanidade, Educação e Ciência que servem como base tanto para pesquisadores das diversas áreas como para os leitores comuns que se interessem pelas temáticas, sendo o bilinguismo uma delas.

26 "The average bilingual speaker, it is true, has two strings on his bow — one rather slacker than the other… Every cultured man needs a second and perhaps a third foreign language — but he need not be bilingual. The unilingual has the advantage, and the bigger the cultural community in that language the bigger the advantage. As first principle, pin your faith to the mother tongue." (Firth, 1930). Tradução nossa.

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Essa antiga ideia de evitar-se o bilinguismo por acarretar “desvantagens” levou a orientações de ordem educacional por parte de governos no século XXI que incentivavam que a língua estrangeira fosse evitada no convívio doméstico. A autora Bijeljac-Babi ‘C discute esse aspecto em sua reportagem à Revista Planeta afirmando que ao privar os filhos de imigrantes de falarem suas línguas maternas em casa, cria-se um modelo de conflito entre o que é vivido na família e na sociedade, havendo um problema de identidade nesses imigrantes. Bijeljac-Babi ‘C chama o desprezo pelas línguas maternas de “rejeição ao bilinguismo”. Outro aspecto ali discutido em relação a suposta “desvantagem” que o bilinguismo traria é a ressalva de que há nas sociedades valorização ou desvalorização social de status linguístico das línguas, quer dizer, há línguas que são valorizadas e têm seus status aumentados e outras que são diminuídas, o que faz com que nem todo bilinguismo seja bem visto em todas as sociedades, como fica claro no excerto: Isso também implica que o bilinguismo não é visto como um bem, mas uma desvantagem, um obstáculo ao êxito da educação e da integração, sobretudo quando as línguas consideradas, como o árabe, o chinês ou o russo, são ridiculamente chamadas de “raras”. Se as línguas consideradas são “socialmente valorizadas”, como o inglês ou o alemão, o bilinguismo torna-se um símbolo da elite! (BIJELJAC-BABI ’C, 2010: s/p).

Como veremos no subitem 1.4 deste capítulo, a mudança mais atual do paradigma parece pender para algum tipo de vantagem de ordem social para os bilíngues, tal qual aponta o trecho aqui mencionado. Antes de nos aprofundarmos nessa mudança de perspectiva do paradigma em questão voltemos à suposta desvantagem que o bilinguismo acarretaria a seus falantes.

Vimos até aqui que essa tendência de apreciação negativa do bilinguismo presente entre os pesquisadores e estudiosos do século passado pode ter ultrapassado as fronteiras da Ciência e influenciado a sabedoria transmitida pelas pessoas comuns fazendo com que a ideia de que o bilinguismo colocava uma criança/pessoa em “desvantagem” se propagasse. Os cientistas e a mídia da época, tal qual ainda ocorre hoje, publicavam estudos que apontavam para atrasos de ordem cognitiva e mental, para danos ao desenvolvimento geral dos falantes, para problemas de ordem de integração e adaptação cultural, entre outros problemas ligados ao bilinguismo. Aqueles que tinham uma língua materna diferente da falada no país em que viviam, por muitas décadas, comumente deparavam-se, tanto na mídia quanto na Ciência, com a propagação da ideia de que línguas estrangeiras deveriam ser evitadas tanto em casa quanto na sociedade para evitar os citados transtornos e problemas.

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Se observarmos mais atentamente, até mesmo hoje, e nas décadas mais recentes, o bilinguismo ainda é capaz de causar desaprovação e preconceitos diversos, pois as ideias mais acreditadas por quase um século são as de que só haveria espaço para uma língua no cérebro e que o bilinguismo traria problemas para a expansão do Q.I. e para o desenvolvimento verbal e a convivência social, principalmente em crianças. Isso significa dizer que o bilinguismo até o século XX era visto tanto pelos educadores como pelos implementadores de políticas educacionais como um fator que dificultava ou prejudicava o desenvolvimento acadêmico e intelectual de uma criança e um fator de limitação - social, cognitiva, ou outra - entre os adultos.

O jornalista Tobias Jones (2018: s/p), do tradicional jornal diário britânico The Guardian, também faz uso da mesma publicação do influente pesquisador da área educacional, Goodenough, de 1926, sendo o trecho já mencionado um dos mais citados tanto pela mídia quanto pelas pesquisas de cunho científico. O jornalista em seu artigo jornalístico afirma o seguinte sobre a sabedoria estabelecida e a crença nas desvantagens do bilinguismo no século XX: Até décadas recentes, o bilinguismo era fortemente reprovado e considerado deletério para o desenvolvimento. A sabedoria estabelecida transmitida por muito tempo durante o século XX era a de que havia espaço somente para uma língua no cérebro de uma criança. Acreditava-se que se, por exemplo, os imigrantes mantivessem sua língua materna em casa, isso impediria a integração na escola e que provavelmente os levaria à regressão acadêmica e confusão27 (JONES, 2018: s/p). E para ilustrar como a língua materna era vista como algo negativo, há um outro trecho em que Jones fala que ela era desaconselhada não somente na esfera educativa, por professores e políticas públicas, mas na esfera social como um todo, sendo evitada no meio público por ser considerada uma fonte de vergonha, ou um sinal de pobreza ou ainda motivo de bullying: A saída de evitar-se a língua materna não era simplesmente educacional, mas também social: a língua de casa era invariavelmente considerada uma fonte de vergonha, um sinal de pobreza ou diferença que na maioria das vezes levaria a ser apontado ou a sofrer bullying. Para os imigrantes, a integração costumava implicar em esquivar-se deliberadamente da língua de seus pais, pelo menos em qualquer ambiente público28 (JONES, 2018: s/p).

27 “Until recent decades, bilingualism was deeply frowned upon and considered deleterious to development. The received wisdom for much of the 20th century was that there was really only space for one language in a child’s brain. It was thought that if, for example, immigrants maintained a mother tongue at home, it would impede integration at school and probably lead to academic regression and confusion.”. Tradução nossa. 28 “The choice to avoid the mother tongue wasn’t simply an educational, but also a social, one; the home language was invariably considered a source of shame, a sign of poverty or difference that would almost certainly lead to being singled out and bullied. For immigrants, integration used to imply the deliberate avoidance of your parents’ language, at least in any public setting.”. Tradução nossa.

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Acreditamos ser relevante destacar que até mesmo quando era apontada como uma desvantagem, as considerações de ordem social acarretadas pelas línguas são consideradas proeminentes como vimos pelo trecho de Jones.

Podemos perceber que demorou muito tempo para que a ideia de o bilinguismo ser uma “desvantagem” aos falantes começasse a ser discutida e até refutada. Tanto cientificamente por meio de argumentação de possíveis danos cerebrais, quanto educacionalmente e socialmente a língua materna, ou segunda língua, quer dizer, praticar um idioma diferente do idioma em uso em um país era, e em muitas culturas ainda é considerado, aceito e difundido como uma fonte de vergonha, um sinal de pobreza – social, linguística, intelectual, econômica, etc. – ou uma fonte de algo que causa a diferença entre os falantes.

Isso provavelmente leva a alguma forma de discriminação, e talvez por isso ainda haja políticas públicas, incentivos, ou discursos de ódio que propagam que se deve eliminar o uso de outra língua. As ideias de supremacia e superioridade racial/cultural e quiçá até linguística ou social também eram comuns e perduraram por séculos ou milênios. Tais aspectos serão abordados no Capítulo II, que abarca questões sociais e de identidade. Vale ressaltar que essas ideias de haver uma suposta desvantagem não eram assustadoras a quase ninguém no passado recente, afinal elas eram consequência de uma maneira de viver em que as comunidades linguísticas e culturais eram bem mais isoladas do que atualmente, antes do advento da Internet e da facilidade em viajar-se pelo mundo. O início da mudança nessa forma de agir e pensar é muito recente na História da Humanidade e ainda gera debates e conflitos conforme veremos nos próximos subitens desse capítulo.

1.2 Início da mudança do paradigma: quando o bilinguismo passou a ser visto como uma “vantagem” cognitiva

O repórter do The Guardian, em As alegrias e benefícios do bilinguismo29, Jones (2018: s/p) cita um estudo acadêmico de 1962 que considerou relevante para a mudança no pêndulo do julgamento das pessoas sobre a questão do bilinguismo. O estudo foi conduzido no Canadá e comparava os monoglotas que falavam somente francês e os bilíngues que falavam também a língua inglesa. Os autores Elizabeth Peal e Wallace Lambert selecionaram uma ampla variedade de testes com a expectativa de provar que os monoglotas eram mais capazes do que

29 “The joys and benefits of bilingualism”. Tradução nossa.

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os bilíngues, ou seja, sua hipótese era a de que iriam encontrar resultados que corroborassem o paradigma vigente de que havia alguma desvantagem em ser bilíngue. Para a surpresa dos cientistas os resultados apontaram exatamente para o oposto: “Intelectualmente a experiência [da criança bilíngue] com os dois sistemas linguísticos parece ter deixado nele [ou nela] uma flexibilidade mental, uma superioridade na formação conceitual, um conjunto mais diversificado de habilidades mentais30.” (PEAL & LAMBERT 1962, apud JONES 2018: s/p).

A monografia foi intitulada A Relação entre o Bilinguismo e a Inteligência31 e, segundo Jones (2018: s/p), foi o primeiro trabalho acadêmico a sugerir que longe de ser um impedimento como era pensado até aquele momento, a exposição a mais de uma língua poderia oferecer uma “vantagem” a seus falantes. Essa pesquisa ocorreu em Montreal, Canadá, e foi conduzida com monoglotas que falavam somente francês e com bilíngues que falavam também o inglês.

A pesquisa de Peal e Lambert, publicada em 1962, é apontada como um marco na mudança do paradigma quando enfoca-se também o meio acadêmico. Em 2012, os pesquisadores brasileiros sobre bilinguismo e cognição Limberger e Buchweitz dizem, em um de seus artigos, que “Esse estudo instituiu um novo paradigma, que considera os efeitos benéficos do bilinguismo” (LIMBERGER & BUCHWEITZ, 2012: 68).

Segundo Jones (2018: s/p) a pesquisa que colaborou para o abandono do preconceito de se haver algum tipo de desvantagem bilíngue foi uma publicação de 1979 de Jim Cummins e Virgínia Collier da Universidade de Toronto. Nela os pesquisadores encontraram evidências de que estudantes que tinham escolaridade em sua língua nativa manifestariam a chamada CALP (proficiência cognitiva acadêmica em língua) em uma segunda língua muito antes do que aqueles que não a possuíam em sua língua nativa. Em outras palavras isso gerou a conhecida afirmação, já recorrente no senso-comum, de que é melhor ser exposto a uma língua materna falada em sua completude – nuances, gramática, eloquência, enfim, uma língua viva – do que ser exposto a uma língua simplificada (como um pidgin) nas casas dos imigrantes que eram instruídos a evitar a língua materna. Isso fica evidente no excerto: A implicação era a de que é muito mais vantajoso para as crianças imigrantes ouvirem uma língua eloquente, gramaticalmente correta e rica em nuances em casa do que ser exposta a uma simplificação do inglês de baixa qualidade

30 “Intellectually,” they said, “[the bilingual child’s] experience with two language systems seems to have left him [or her] with a mental flexibility, a superiority in concept formation, a more diversified set of mental abilities.”. Tradução nossa. 31 “The Relation of Bilingualism to Intelligence”. Tradução nossa.

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[piding English]. Elas podem transferir aquelas habilidades linguísticas – o conceito, a dicção e as estruturas sofisticadas – para sua nova língua32 (JONES, 2018: s/p).

Outra pesquisadora apontada como fundamental para a desconstrução das ideias de uma suposta “desvantagem bilíngue” é a já brevemente citada Ellen Bialystok, uma respeitada psicóloga canadense da Universidade York de Toronto e pesquisadora associada do Rotman Research Institute of the Baycrest Centre for Geriatric Care. Em um breve retrospecto sobre essa esquisadora, Bialystok iniciou suas pesquisas focando no efeito do bilinguismo na linguagem das crianças e em seu desenvolvimento cognitivo, nas décadas de 80 e 90, quer dizer cerca de 20 anos depois da publicação de Peal & Lambert. Os estudos progrediram para a investigação de adultos e atualmente Bialystok dedica-se a pesquisar os idosos bilíngues e os efeitos do bilinguismo em sua cognição. Com base nesse e em seus muitos outros estudos, Bialystok (2017: s/p) defende que os cérebros e a cognição desenvolvida pelos bilíngues passam por melhorias no chamado “sistema executivo” do cérebro. Esse sistema é responsável por um conjunto de habilidades mentais que permitem ao falante a capacidade de bloquear informações irrelevantes e a habilidade de concentração naquelas tarefas realmente importantes para aquela ação ou entendimento.

Jones afirma que não deveria ser uma surpresa o fato de que muitas das pesquisas de ponta sobre bilinguismo venham de Toronto, já que tanto Cummins quanto Collier e Bialystok são provenientes dessa cidade canadense, pois é uma cidade na qual é estimada que metade dos habitantes seja bilíngue e acrescenta que ser pelo menos bilíngue é o mais comum nesse início do século XX, ao contrário do que ocorria na maior parte do século passado, os poliglotas são a norma na atualidade. O autor cita como dados que suportam tal visão que 56% dos cidadãos europeus e 60% dos residentes de Los Angeles são funcionalmente bilíngues nos dias de hoje e em questões mundiais ele afirma que os dados para o bi, multilinguismo são considerados acima de 50%, estando em tendência de alta “significando que ser monolíngue não é mais (se é que algum dia já foi) o padrão para o qual os poliglotas são uma exceção eventual”33 (JONES, 2018: s/p).

32 “The implication was that it’s far more advantageous for immigrant children to hear an eloquent, grammaticaly correct, richly nuanced language at home than to be exposed to low-level pidgin English. They can then transfer those languages skills – the concept, diction and sophisticated structures – to their new language.”. Tradução nossa. 33 “[…] meaning that being monolingual is no longer (if it ever was) the default to which polyglots are an odd exception.”. Tradução nossa.

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Acumulando indícios em suas pesquisas de que haveria algum tipo de “vantagem bilíngue”, os pesquisadores começaram a inclinar-se para o entendimento de que haveria uma “vantagem” de ordem cognitiva, do funcionamento do cérebro, do sistema executivo, em ser bilíngue. Essa vantagem seria a responsável por alguns indivíduos conseguirem concentrar-se, por exemplo, na gramática e ignorar o sentido das palavras ao responderem uma pesquisa, acertando se havia ou não um erro gramatical naquele excerto independentemente de o sentido daquele conjunto de palavras não estar correto. A característica também os ajudaria a passar de uma tarefa para outra sem encontrar-se em um estado de breve confusão. O sistema executivo é fundamental para praticamente tudo que fazemos, de uma simples leitura às habilidades matemáticas, passando por tarefas mais complexas como conduzir carros. Melhorias no sistema executivo resultariam em maior flexibilidade mental passando por nossas habilidades sociais, o que resultaria em algum tipo de “vantagem”.

1.3 A consolidação do paradigma da “vantagem bilíngue”

Desde os estudos de Peal e Lambert (1962) as publicações científicas que corroboram o paradigma de obter-se uma “vantagem” ao se falar mais de um idioma não param de aparecer. Somente na pesquisa feita em 2014 e publicada em 2015 sob o título de Vantagem Cognitiva no Bilinguismo: um exemplo de Tendência de Publicação?34 escrito pelos autores Angela de Bruin, Barbara Treccani, e Sergio Della Sala, respectivamente dos departamentos de Neurosciência Cognitiva Humana e Psicologia da Universidade de Edimburgo; Departamento de História, Ciências Humanas e Educação, Universidade de Sassari; e do Centro de Envelhecimento Cognitivo e Epidemiologia Cognitiva, e Psicologia da Universidade de Edimburgo, há o levantamento de mais de uma dúzia dos por eles considerados os principais cientistas que publicaram sobre o tema ao longo desses anos e colaboraram para a consolidação do paradigma da “vantagem bilíngue”.

De Bruin et al os dividiram naqueles que estudaram as crianças (Bialystok & Martin 2004); nos que observaram jovens adultos (Costa, Hernández, & Sebastián-Gallés, 2008); naqueles que investigaram os adultos mais maduros (Gold, Kim, Johmson, Kryscio, & Smith, 2013); naqueles que estudaram tarefas que demonstraram menos resultados de interferência nos bilíngues do que nos monolíngues35 (Simon, Bialystok, Craik, Klein & Viswanathan, 2004); nos

34 “Cognitive Advantage in Bilingualism: An Example of Publication Bias?”. Tradução nossa. 35 “[…] using tasks showing smaller interference effects in bilinguals than in monolinguals”. Tradução nossa.

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pesquisadores que investigaram a alternância de tarefas – task-switching - (Prior & MacWhinney, 2010); nos que defenderam o argumento de que o bilinguismo melhoraria o controle cognitivo em livros (Bialystok & Barac, 2013), em edições especiais de Revistas Científicas (Bobb, Wodniecka, & Kroll, 2013; Kroll, Christoffels, & Bajo, 2013) e em conferências como no Workshop Internacional Anual em Bilinguismo e Controle cognitivo (DE BRUIN & TRECCANI & DELLA SALA, 2015: 99). Como podemos notar pelo número de vezes que o nome foi citado, na opinião desses pesquisadores, a estudiosa canadense Ellen Bialystok também exerce uma forte influência na formação de opinião na comunidade científica por meio de seus artigos, e na população em geral, por seus livros, sobre a temática.

Talvez seja pela força do maniqueísmo que encontramos na mídia atualmente diversas reportagens e matérias jornalísticas que defendem a ideia de que os “bilíngues têm vantagens” de ordem cognitiva ou outras de forma categórica. O jornal The New York Times (NYT) publicou em 17 de março de 2012 uma reportagem intitulada Porque bilíngues são mais espertos36. O próprio título da publicação é categórico em afirmar que os bilíngues são melhores e que a reportagem irá esclarecer o porquê disso. O autor é Yudhijit Bhattacharjee, um jornalista indiano especializado em matérias científicas, que escreve sobre Ciências desde 2003. Ele inicia seu artigo pela tese de que falar duas línguas, ao invés de apenas uma, traz “benefícios óbvios” acarretados aos falantes devido ao mundo cada vez mais globalizado, ou seja, vantagens basicamente sociais. Ele chama atenção ao fato de que nos últimos anos os cientistas apontam para o que chamou de “habilidades cognitivas”37 não relacionadas à linguagem, que podem ter profundos efeitos no cérebro tendo a possibilidade de proteger os bilíngues da demência ou da senilidade em idades avançadas.

Em sua reportagem ele também pontua a tendência no século XXI em estudos científicos mais recentes enxergarem evidências de que os bilíngues teriam “um controle cerebral executivo aperfeiçoado” ao alternarem línguas com muita frequência (BHATTACHARJEE, 2012: s/p). Ele continua sua explicação afirmando que a mente de um bilíngue seria “treinada” a ignorar distrações em outros contextos, pelo uso dos distintos códigos, sendo ilustrado na reportagem, para que a população geral possa entender melhor o funcionamento cerebral, pela imagem de um motorista e sua constante necessidade de monitoria dos arredores ao dirigir seu carro, alternando sua atenção dentro e fora do carro, sem distrair-se do ato da direção. Os bilíngues

36 “Why bilinguals are smarter.”. Tradução nossa. 37 “cognitive skills”. Tradução nossa.

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teriam assim, “maior agilidade mental” ao resolverem questões mentais desde a mais tenra idade.

Bhattacharjee cita um exercício feito pela cientista Kovacs, de 2009, com bebês de 7 meses e com pessoas até as idades mais avançadas, além dos estudos do neuropsicólogo Tamar Gollan, da Universidade da Califórnia, São Diego, que ao medir o grau de proficiência em línguas de seu grupo de amostragem, correlacionou que quanto maior a habilidade nas línguas, mais tardio o surgimento do Alzheimer (em um grupo de 44 pacientes bilíngues em inglês e espanhol). Bhattacharjee conclui, com esses elementos, que “ninguém jamais duvidou do poder da língua” – talvez desconhecendo, ou mesmo ignorando, as supracitadas publicações do século passado que apontavam para uma “desvantagem bilíngue” – e questiona seus leitores: mas quem poderia imaginar que as palavras que ouvimos e as sentenças que falamos poderiam deixar uma marca (cerebral) tão profunda? (BHATTACHARJEE, 2012: s/p). Todos esses elementos aqui pontuados indicam que na visão do jornalista o paradigma da “vantagem bilíngue” está consolidado, sendo o vigente a nortear a discussão sobre a temática.

Não temos como objetivo trazer análises dos discursos proferidos pela mídia, embora nos seja impossível fugir totalmente disso, como mencionamos na Introdução e conforme veremos em maior detalhe nas subseções dessa pesquisa adiante. Se retomarmos a reportagem da Revista Planeta, em uma análise bem breve e simples, podemos interpretar que em um discurso mais moderado, a reportagem afirma que “o desenvolvimento bilíngue no mínimo não impede o pleno desenvolvimento cognitivo”; a moderação no discurso aqui dá-se principalmente pelo emprego de “no mínimo”. A reportagem afirma que as crianças bilíngues de qualquer origem sociocultural seriam capazes de imprimir, em algumas situações de aprendizado, maior velocidade e flexibilidade, que resultariam em melhores habilidades comunicacionais aos bilíngues. A escolha vocabular de “em determinadas situações”, igualmente, modera o discurso. O texto progride afirmando que caso sejam notadas deficiências nos bilíngues, em uma segunda língua, essas debilidades seriam temporárias e compensadas por um sistema mental chamado de “mais rico”, com “habilidades cognitivas mais eficientes” e que resultaria em “uma visão de mundo mais ampla”: o emprego de um intensificador seguido por adjetivo nas três construções tem um efeito generalizador, porque fica difícil para o leitor quantificar quanto esse sistema é “mais rico”, “mais eficientes” e “mais amplo” sem serem mencionados os parâmetros. Assim o leitor é levado a conclusões mais categóricas, as quais reforçam a tendência por nós observada

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de consolidação do paradigma de realmente haver o uma “vantagem bilíngue” de ordem cognitiva. O trecho completo está abaixo transcrito: Os últimos 20 anos de pesquisa em psicolinguística e sociolinguística demonstram inequivocamente que a aquisição e a aprendizagem de várias línguas por crianças, não importa qual seja sua origem sociocultural, tampouco de quais línguas se esteja falando, no mínimo não impedem o desenvolvimento cognitivo e educacional desses meninos e meninas. Pelo contrário, as crianças bilíngues apresentam maior velocidade e flexibilidade em determinadas situações de aprendizagem e desenvolvem melhores habilidades de comunicação. Se elas são um pouco deficientes na segunda língua, é algo frequentemente temporário, e elas compensam isso com um sistema mental mais rico, habilidades cognitivas que são em geral mais eficientes e uma visão mais ampla do mundo (BIJELJAC-BABI ‘C, 2016: s/p).

Maria Konnikova, jornalista russo-americana, que escreve para o do The New Yorker periodicamente em colunas e artigos sobre Psicologia e Ciências, fez uma pesquisa para uma reportagem sobre bilinguismo. Considerou que, no início do século XXI, os estudos da renomada psicóloga canadense Ellen Bialystok (2012) foram relevantes à propagação da ideia científica da “vantagem do bilíngue”. Ela elenca, em sua reportagem, que Bialystok publicou diversos papers com títulos que sugerem essa suposta vantagem, principalmente de ordem cognitiva. Dentre as publicações estão: os artigos Criatividade e Bilinguismo, Vantagens Cognitivas de Bilíngues de Cinco Anos-de-Idade, Uma Vantagem Bilíngue em Alternância de Tarefas, Bons Alternadores de Idiomas são Bons Alternadores de Tarefas38; além de livros com resultados expressivos de vendas com títulos provocativos como A vantagem Bilíngue e Bilíngue é melhor39. Analisando os títulos das publicações e pesquisando sobre a autora, Konnikova atribui à Bialystok e à expressividade nas vendas de seus best-sellers um fomento da ideia, que parece predominar no senso-comum desse início do século XXI, de que “criar uma criança bilíngue é, em grande parte, uma receita de sucesso de educação” (KONNIKOVA, 2015: s/p).

A influência das pesquisas de Bialystok também é sentida nos meios acadêmicos, além de Bruin et al., os já mencionados pesquisadores brasileiros Limberger e Buchweitz afirmam que “No Brasil, as pesquisas que relacionam bilinguismo e cognição são incipientes. Elas foram inspiradas principalmente nos trabalhos de Bialystok.” (LIMBERGER & BUCHWEITZ, 2012: 68). Os estudiosos ressaltam que isso se deu devido aos múltiplos aspectos verbais e não verbais e

38 Os títulos originais em inglês são: “Creativity and Bilingualism, Cognitive Advantages of Bilingual Five-Year- Olds, A Bilingual Advantage in Task-Switching, Good Language-Switchers Are Good Task-Switchers”. Tradução nossa. 39 “The Bilingual Edge e Bilingual is Better. Tradução nossa.

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ao controle inibitório – a tal capacidade de inibir fatores não relevantes ao contexto que os bilíngues teriam como vantagem - que os estudos de Bialystok contemplam ao longo dessas décadas.

A chamada “vantagem do bilíngue” - bilingual advantage – teria suas justificativas embasadas nas pesquisas que obtiveram resultados que apontam para o controle cerebral executivo aperfeiçoado. As justificativas mais recorrentes estariam fundadas em experimentos com falantes bilíngues que ao mudarem de um código linguístico para outro teriam uma maior habilidade de gerenciar de maneira efetiva o que é chamado de processo cognitivo superior, processo cerebral responsável pela resolução de problemas, memória e pensamento, e inibição de tarefas secundárias menos importantes para aquele momento. Segundo a pesquisa jornalística de Konnikova parece haver nos cientistas e na sociedade atual - permeada pela mídia de comunicação - uma tendência crescente em acreditar-se que os bilíngues teriam “vantagens”, tais quais melhor desempenho acadêmico do que os monolíngues, ou seja, o paradigma vigente apontaria para vantagens de ordem cognitiva para os falantes de mais de uma língua (KONNIKOVA, 2015: s/p).

O relatório da UNESCO 2004, que mistura abordagens científicas e jornalísticas em suas publicações, é utilizado como um parâmetro para boas práticas políticas e humanitárias no mundo todo. Ele revela essa tendência de enxergar-se uma “vantagem do bilíngue” ao citar o exemplo de crianças francesas submetidas a aulas de bretão numa escola de Brest, no noroeste da França: “Pesquisas das últimas duas décadas mostram que crianças que aprendem várias línguas são mais rápidas e flexíveis em determinadas situações de aprendizagem e desenvolvem melhores habilidades de comunicação” (BIJELJAC- BABI‘C, 2010: s/p).

No meio midiático, parece estar estabelecido de maneira menos questionada o paradigma de haver uma vantagem de ordem cognitiva em ser biletrado. Não são incomuns afirmações generalizadas que acabam por ser aceitas como verdades incontestáveis, tal qual a afirmação de que: “Ser bilíngue tem vantagens óbvias. Aprender mais de uma língua possibilita novas conversas e novas experiências40”; ou aquelas com um embasamento mais científico que

40 “BEING bilingual has some obvious advantages. Learning more than one language enables new conversations and new experiences. But in recent years, psychology researchers have demonstrated some less obvious advantages of bilingualism, too. For instance, bilingual children may enjoy certain cognitive benefits, such as improved

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versam sobre paradigmas da fisiologia ou psicologia sobre o bilinguismo como: “Mas em anos recentes, pesquisadores de psicologia demonstraram [...] que crianças bilíngues podem desfrutar de certos benefícios cognitivos, como a função executiva aperfeiçoada [...]”. (KINZLER, 2016: s/p), ambos do jornal The New York Times.

Para ilustrar o que entendemos como “discurso menos moderado”, traremos outro exemplo jornalístico, Kaisa S. Danielsson que se define como “uma finlandesa global com um chamado digital41” com 10 anos de experiência em mídia digital e marketing direto entre outras áreas. Em sua publicação Os benefícios de se falar mais de uma língua42, feita para o Fórum Econômico Mundial ela emprega os termos “afirmam” e “implicam nitidamente no cérebro melhor” para referir-se ao papel da mídia na construção de imagens positivas do bilinguismo (de ordem cognitiva) dizendo: Dezenas de estudos, com frequência citados na imprensa, afirmam que, dentre outras coisas, aprender duas línguas na tenra infância melhora toda uma série de habilidades cognitivas, fazendo o cérebro mais hábil nas alternâncias entre as tarefas; mantendo o foco em um ambiente com grande movimentação ou ruído e conseguindo [que o cérebro] recorde-se de coisas. Aprender e fazer o uso de duas línguas, estes estudos implicam, nitidamente tornam o cérebro de uma criança melhor43 (DANIELSSON, 2017:s/p).

Em declarações ainda mais categóricas, como indica o próprio subtítulo da reportagem – A verdade sobre o cérebro bilíngue44, o mesmo artigo jornalístico faz generalizações sobre as evidências científicas obtidas em pesquisas sobre o funcionamento cerebral e acerca da possibilidade de que o bilinguismo seja capaz de postergar o início de doenças degenerativas, como, por exemplo, a demência. A autora os coloca como fatos consumados, como fica evidente no trecho: “O cérebro, como qualquer músculo, gosta de exercitar-se, e como descobriu-se, ser fluente em duas ou mais línguas é uma das melhores formas de mantê-lo em forma e de manter distúrbios como a demência à distância45.”; além das evidências de que o Alzheimer pode ser postergado em seu início: “Na verdade, pessoas bilíngues demonstram

executive function — which is critical for problem solving and other mentally demanding activities.”. Tradução nossa. 41 A definição encontra-se no site: . Tradução nossa. 42 “The benefits of speaking more than one language”. Tradução nossa. 43 “Dozens of studies, often quoted in the press, have claimed that, among other things, learning two languages in early childhood improves a whole host of cognitive abilities, making the brain more adept at switching between tasks, focusing in a busy environment, and remembering things. Learning and using two languages, these studies imply, clearly make children’s brains better.”. Tradução nossa. 44 “The truth about the bilingual brain”. Tradução nossa. 45 “The brain, like any muscle, likes to exercise, and as it turns out, being fluent in two or more languages is one of the best ways to keep it fit and keep degenerative disorders like dementia at bay.”. Tradução nossa.

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sintomas perceptíveis do Alzheimer quase cinco anos mais tarde do que as pessoas que são monolíngues e falam apenas uma língua46.”47 (DANIELSSON, 2017: s/p).

Quanto ao primeiro trecho, gostaríamos de pontuar que o cérebro não é um músculo. Acreditamos que aqui a autora tenha tentado fazer uma conhecida analogia, comumente realizada por pesquisadores para que as pessoas leigas consigam entender como o cérebro funciona: eles equiparam o funcionamento do cérebro ao de um músculo. Para o cérebro manter-se ativo e poder impedir que doenças de origem genética degenerativas, como a demência ou o Alzheimer, instaurem-se com precocidade, é necessário manter o cérebro em funcionamento, ou seja, manter as conexões entre os neurônios ativas. Realmente, há muitas pesquisas e indícios que apontam para o fato de que falar mais de uma língua seja de fato eficiente nesse sentido de manutenção de conexões neurais. Assim, tal qual um músculo faz para manter-se ativo se exercitando, o cérebro deve ser “exercitado para manter as conexões neuronais ativas. Acreditamos que o problema da generalização de Danielsson esteja no arranjo gramatical e na escolha vocabular - o emprego da conjunção comparativa “como/like” seguida do quantificador “qualquer/any” e do substantivo “músculo/muscle”. Esse arranjo pode resultar em uma interpretação de sentido em que tanto em uma tradução livre para o português, quanto no próprio inglês, sejamos induzidos à compreensão de que o cérebro seria um músculo: “o cérebro, como qualquer músculo” / “the brain, like any muscle” (vide original nota de rodapé 41).

O que é relevante para nós, no entanto, não é o arranjo ou a escolha lexical e o possível sentido que ele suscite – que como vimos pode levar a interpretações dúbias da parte dos leitores mais atentos – mas o que realmente importa é o fato de que mais uma publicação parece levar à avaliação positiva do bilinguismo e à consolidação do paradigma de que há algum tipo de vantagem de ordem cognitiva relacionada à condição bilíngue. Devido ao grande número por nós elencado de publicações nesse sentido, até mesmo os responsáveis pela mídia parecem começar a perceber que o senso-comum das reportagens se inclinam para que haja uma vantagem de ordem cognitiva estabelecida. Como posto, a própria Danielsson critica os

46 “In fact, bilingual people show noticeable symptoms of Alzheimer’s nearly five year later than people who are monolingual and only speak one language.” Tradução nossa. 47 Conforme ficará evidente ao longo deste texto, e mais precisamente na página 63 com a posição do teórico Rajagopalan, somos contrários às afirmações como essas de que os bilíngues são necessariamente superiores, pois acreditamos que são contraproduscentes e provocativas de preconceitos.

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dois extremos da mudança do paradigma de desvantagem para vantagem e enxerga, nos artigos e publicações atuais, uma tendência de tratar os bilíngues como gênios: Não obstante a antiga crença de que bebês que eram expostos a mais de uma língua terminam confusas, menos inteligentes e até mesmo esquizofrênicas tenha sido desmitificada (sim, as pessoas acreditavam nisso), nos últimos anos o pêndulo voltou-se para a direção oposta: livros e artigos promovem o bilinguismo como uma varinha mágica que irá transformar cada criança em um gênio apequenado, um gênio multitarefas48 (DANIELSSON, 2017: s/p).

Mesmo nas famigeradas Redes Socais são comuns posts valorizando e propagando as supostas “vantagens do bilinguismo”. Separamos um post do Facebook que vai nessa direção, relacionando o “Ensino Bilingue” a vocábulos positivos como “interessante”, “curtir”, “novidades” e “boas notícias”, no print da página de Antonieta Megale, 201849, proeminente pesquisadora da área de bilinguismo no Brasil: "Tem acontecido muita coisa interessante no mundo da Educação Bilíngue tanto para grupos majoritários quanto para minoritários [...] Se você curtir essas novidades, se manifeste, compartilhe, indique amigos, faça as boas notícias chegarem para mais educadores e interessados em educação bilíngue.”:

48 “Although the old belief that babies who are exposed to more than one language will end up confused, less intelligent or even schizophrenic has been debunked (yes, people really used to believe this), in recent years the pendulum has swung in the opposite direction: books and articles tout bilingualism as a magic wand that will transform every child into a pint-sized, multitasking genius.”. Tradução nossa. 49 Figura 1 - página de Antonieta Heyden Megale do FaceBook. Elaborada pela autora. Disponível em: . Acesso 16 mar 2018.

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Como veremos a seguir, no meio científico as verdades absolutas, universais, inquestionáveis não são tão comuns quanto na vida ordinária. Dificilmente os pesquisadores, que fazem Ciências (sejam Humanas, Biológicas ou Exatas), são tão categóricos em suas afirmações como as pessoas comuns ou pessoas que simplesmente não fazem Ciência, devido, principalmente, a uma questão de discurso. O discurso científico não permite o emprego de verbos categóricos como “provar”, termos como “sem dúvida”, “está comprovado”, ou a famigerada expressão “cientificamente provado” como a mídia, e muitos médicos e outros profissionais que não estão acostumados às publicações científicas, às vezes, insistem em propagar, simplesmente pelo fato de que não existem certezas e provas, não existem verdades absolutas. As questões de discurso e de adaptação ao discurso vigente subjazem todas as proposições científicas.

Quando lemos as publicações (Byalistok, Bruin, Grosjean, etc.) e até mesmo quando Megale publica um artigo e não em sua página pessoal, artigos aos quais os jornalistas referem-se, notamos esse cuidado e o efeito modalizante de suas escolhas lexicais, gramaticais, etc. e percebemos que os cientistas não são categóricos em suas afirmações como seus colegas jornalistas. É uma questão de registro – formal ou informal - e de focalização ao público – meio acadêmico e público geral - ao qual aquela publicação dedica-se. Tal fato dá-se porque, caso eles não tivessem esse cuidado de modalização do discurso, muito provavelmente suas publicações nem seriam aceitas, uma vez que o meio científico tem suas próprias regras e normas, dentre as quais a modalização do discurso é uma regra vigente.

Diferentemente das pessoas leigas de variadas profissões, quem faz Ciência sabe, que, na melhor das hipóteses, aquela teoria é a mais bem aceita até aquele momento e que, a qualquer hora, o pêndulo pode mudar novamente de direção e estabelecer um novo paradigma – que, provavelmente, cairá no senso-comum das pessoas em um período. É exatamente assim que a Ciência é, foi e continuará a ser feita: fases de ciências normal seguidas por revoluções científicas ou o questionamento daquilo que é tido como a explicação mais aceita, termos propostos por Thomas Kuhn (1962), sendo exatamente a eterna tendência de questionar o paradigma vigente que possibilita uma eventual mudança de paradigma. Tais questões serão melhor exploradas no item a seguir.

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1.4 Podemos mesmo falar em “vantagem bilíngue” de ordem cognitiva no bilinguismo, ou devemos procurar essa suposta vantagem em outra esfera?

Konnikova, em 2015, publicou o texto “O bilinguismo é mesmo uma vantagem50?”. Nele, ela desenvolve a ideia de que talvez os rumos do paradigma “bilinguismo-desvantagem/vantagem” estão prestes a mudar novamente devido a novos estudos e cita a publicação de de Bruin para embasar sua afirmação. A jornalista russa percorreu o mesmo caminho dos demais jornalistas aqui citados (Jones 2018, Danielsson 2017, Kinzler 2016, Bhattacharjee, 2012): identificou que na literatura primeiro houve a tendência de acreditar-se em uma “desvantagem” do bilinguismo e posteriormente deparou-se com a ideia de haver uma “vantagem cognitiva”, a qual instaurou- se posteriormente.

Segundo Konnikova, de Bruin também acreditava que encontraria em suas pesquisas evidências de que os bilíngues - tais quais ela própria, holandesa fluente em mais de um idioma desde criança – estariam em vantagem e que os bilíngues teriam o “controle cerebral executivo aperfeiçoado”, uma vantagem cognitiva em relação aos monolíngues. Para sua surpresa, porém, os resultados científicos de sua investigação não apontaram para essas evidências. Como base nesses fatos, de Bruin teria chegado à conclusão de que os cientistas encontravam maior suporte por parte das revistas científicas quando seus trabalhos apontavam para esta suposta “vantagem do bilíngue” do que quando tendiam para uma suposta “desvantagem” em ter-se aprendido duas línguas (KONNIKOVA, 2015: s/p).

Teria a ideia da “vantagem do bilíngue” caído no senso-comum dos próprios cientistas? Em seus trabalhos, de Bruin afirmou que há uma imagem distorcida sobre o bilinguismo que poderia ter ultrapassado as fronteiras do científico e adentrado a esfera social influenciando as mídias, como vemos no excerto das conclusões desses estudos de Bruin citados na reportagem de Konnikova: Nossa análise geral mostra que há uma imagem distorcida dos resultados reais dos estudos em bilinguismo, com pesquisadores (e a mídia) acreditando que o efeito positivo do bilinguismo nos processos cognitivos não linguísticos é forte e incontestável. 51 (DE BRUIN apud KONNIKOVA, 2015: s/p).

50 “Is Bilingualism Really an Advantage?”. Tradução nossa. 51 “Our overview shows that there is a distorted image of the actual study outcomes on bilingualism, with researchers (and the media) believing that the positive effect of bilingualism on nonlinguistic cognitive processes is strong and unchallenged.”. Tradução nossa.

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Danielsson (2017), na já mencionada publicação Os benefícios de se falar mais de uma língua52, concorda com Konnikova (2015) que a publicação de Bruin et al. (2015) foi significativa para a mudança dos rumos do paradigma da “vantagem bilíngue”, como fica claro no excerto: Mas quando a jovem pesquisadora chamada Angela de Bruin, ela mesma bilíngue, observou centenas desses estudos em mais detalhe, ela descobriu que aqueles estudos frequentemente exageravam consideravelmente nas vantagens e apresentavam evidências inconclusivas como conclusivas. A narrativa de que “bilíngue é melhor” estava tornando-se bem estabelecida na cultura popular, mas a crítica de Bruin baseada na pesquisa por trás dela mostrou que os benefícios não eram tão nítidos ou universais como haviam sido reportados53 (DANIELSSON, 2017: s/p) O estudo a que Konnikova (2015) e Danielsson (2017) referem-se é o já citado no item 1.3 dessa tese, Vantagem Cognitiva no Bilinguismo: um exemplo de Tendência de Publicação?54, escrito não somente por de Bruin, como as reportagens jornalísticas afirmam, mas escrito por dois outros autores também Treccani e Della Sala (2015).

O questionamento levantado no artigo científico escrito para a Associação de Ciência Psicológica55 parece-nos importante: “Há uma convicção generalizada de que os bilíngues têm uma vantagem sobre os monolíngues no controle executivo de tarefas, mas é isso o que todos os estudos realmente demonstram?56” (DE BRUIN & TRECCANI & DELLA SALA, 2015: 99). Em outras palavras, podemos inferir pelo trecho que segundo os três cientistas autores do artigo, há um entendimento generalizado de que há uma “vantagem bilíngue de ordem cognitiva” e por isso eles questionam se os estudos realmente demonstram isso.

Em sua argumentação, de Bruin, Treccani e Della Sala alegam que tomando por base as pesquisas científicas o papel da mídia foi fundamental para a propagação dessas ideias positivas da “vantagem bilíngue”: Com base nesses estudos, a mídia tem com frequência apresentado uma imagem de uma forte vantagem bilíngue, como expresso por títulos como “Cérebros bilíngues são mais saudáveis” (Fox, 2011) ou “Por que os bilíngues são mais espertos” (Bhattacharjee, 2012), o que sugere que a ideia consolidou-

52 “The benefits of speaking more than one language”. Tradução nossa. 53 “But when a young researcher named Angela de Bruin, herself a bilingual, looked at hundreds of these studies in more detail, she discovered that these studies often significantly overstated the advantages, and presented inconclusive evidence as conclusive. The narrative that “bilingual is better” was becoming well established in popular culture, but de Bruin’s critical take on the research behind it showed that the benefits weren’t as clear-cut or universal as had been reported.” Tradução nossa. 54 “Cognitive Advantage in Bilingualism: An Example of Publication Bias?. Tradução nossa. 55 “Association for Psicological Science. Tradução nossa. 56 “It is a widely held belief that bilinguals have an advantage over monolinguals in executive-control tasks but is this what all studies actually demonstrate?”. Tradução nossa.

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se e foi aceita no senso-comum57 (DE BRUIN & TRECCANI & DELLA SALA, 2015: 99).

A última reportagem citada, a de Bhattacharjee 2012, é uma das que trouxemos anteriormente no subitem 1.3 para ilustrar a influência das reportagens e da mídia na formação das opiniões das pessoas e sua extensão no senso-comum. Como a própria acepção da palavra informa mídia pode ser interpretada como um suporte de difusão da informação, o qual constitui em um meio intermediário de expressão, capaz de transmitir mensagens. Uma imagem que ilustra o papel das mídias é a imagem de uma membrana que faz interface com dois diferentes meios e proporciona a troca de apenas algumas substâncias entre eles, por ela selecionadas. Talvez por essa razão encontramos a já aqui citada discrepância nos discursos proferidos nos diferentes meios: o jornalístico mais próximo da linguagem cotidiana e por isso mais categórico e generalizador; e o científico, mais cuidadoso e por isso mais moderado. O que nos interessa do conjunto dos meios de comunicação social em massa, não são os meios em si, ou tão pouco queremos explorar em demasia o fato do discurso disseminado pela mídia ser mais categórico, mas temos a intenção de observar a capacidade da mídia de promover a difusão de informações de um nicho mais especializado de conhecimento – da comunidade científica – para esse amplo espectro populacional – população em geral, e sua atuação na formação das ideias do senso-comum dos cidadãos.

Tanto as muitas reportagens por nós aqui citadas, quanto os trechos, “Com base nesses estudos, a mídia tem com frequência apresentado uma imagem de uma forte vantagem bilíngue, como expresso por títulos como “Cérebros bilíngues são mais saudáveis” (Fox, 2011) e “Por que os bilíngues são mais espertos” (Bhattacharjee, 2012), o que sugere que a ideia se consolidou e foi aceita no senso-comum” (DE BRUIN & TRECCANI & DELLA SALA, 2015: 99) nos mostram que há interpenetração entre as partes – científica e midiática – e que essa troca é do conhecimento dos envolvidos. Isso não impede, porém, que o jogo se estabeleça e que haja influência de umas nas outras. Em outras palavras, poderíamos dizer que a mídia tem o papel de filtrar, selecionar, recortar, certos conhecimentos científicos que são considerados relevantes para a maior parte da população e os deglutir, simplificar, construir imagens para que a população consiga entendê-los de maneira mais palatável, podendo retroinfluenciar a outra parte desse sistema - a própria Ciência.

57 “On the basis of these studies, the media have often presented a picture of a strong bilingual advantage, as expressed in titles such as “Bilingual Brains Are More Healthy” (Fox, 2011) or “Why Bilinguals Are Smarter” (Bhattacharjee, 2012), which suggests that the idea has been consolidated and accepted as common wisdom.”. Tradução nossa.

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Ao fazê-lo, há, necessariamente, uma emissão de um juízo, um valor ou uma apreciação exatamente por não haver um discurso que seja neutro, como já foi exaustivamente constatado em trabalhos científicos da área de Análise de Discurso. Bakhtin/Volochinov elucidam-nos sobre a questão do que está fundamentalmente implícito em qualquer enunciação proferida, seja ela da mídia, da Ciência ou da vida ordinária: “Toda enunciação compreende antes de mais nada uma orientação apreciativa. É por isso que, na enunciação viva, cada elemento contém ao mesmo tempo um sentido e uma apreciação.” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 1997: 35) já que “O centro organizador de toda enunciação, de toda expressão, não é interior, mas exterior: está situado no meio social que envolve o indivíduo” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 1997: 121).

Mesmo sem serem pesquisadores da Área Científica da Linguística, de Bruin, Treccani e Della Sala têm em seu cabedal de conhecimento a noção da ideia de que não há como se proferir um discurso neutro. Aqui cabe a ressalva de que nas universidades e no meio científico como um todo é exaustivamente ensinado e lembrado que o discurso científico deve ser neutro, assim como o da mídia, e que a emissão de juízos, valores ou apreciações deve ser minimizado ou até mesmo extinto. Como Bakhtin/Volochinov e tantos outros estudiosos do Discurso nos recordam, isso não é possível pela própria natureza da língua e sua porção social, quer dizer não há um discurso que seja de fato neutro. Assim, o que pensamos a respeito de um assunto sempre perpassa o dito seja na escolha lexical, no arranjo dos vocábulos, na entonação utilizada, na gramática, enfim, não há como sermos realmente neutros como os manuais de instrução científica e midiática nos instruem a ser.

Posto isso, voltemos a de Bruin, Treccani e Della Sala, no momento em que os próprios pesquisadores admitem ter contribuído para a construção da ideia da “vantagem bilíngue cognitiva” com publicações, fazendo no artigo um mea culpa: “Nós mesmos somos culpados. Nós contribuímos para a criação do conhecimento aceito de uma vantagem cognitiva em bilíngues ao publicarmos um estudo que reportava um resultado do bilinguismo em tarefas espaciais priming-negativas (Treccani, Argyri, Sorace, & Della Sala, 2009)58” (DE BRUIN & TRECCANI & DELLA SALA, 2015: 99).

58 “We contributed to the creation of the accepted wisdom of a cognitive advantage in bilinguals by publishing a study reporting an effect of bilingualism in a spatial negative-priming task (Treccani, Argyri, Sorace, & Della Sala, 2009).”

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Consideramos importantes uns parênteses para explicar de maneira breve e resumida do que se tratam as tarefas priming (priming tasks) porque elas são de relevância tanto nos estudos supracitados quanto em pesquisas em geral, como na presente pesquisa. As pesquisas de opinião atuais, no geral, levam em consideração os mecanismos de pré-ativação (priming) de maneira direta ou indireta, seja pelo número reduzido de palavras envolvidas na formulação das questões, seja na agilidade que se espera que o entrevistado passe de uma pergunta para a outra, ou até mesmo pelo suporte empregado – papel, computador, etc. Mesmo que não possamos aqui nos estender e detalhá-los é implícito pelo emprego desses procedimentos que o que esperamos de nossos entrevistados é uma resposta sem que haja muita mobilização consciente. Isso implica em dizer que também queremos que nossos entrevistados respondam a nossas questões sem haver muito planejamento da resposta – ou seja, queremos que haja uma pré-ativação ou priming - para que possamos identificar a representação interna do entrevistado sobre aquele tema ou questionamento específico, e que isso ocorra sucessivamente nas demais perguntas. Por essa razão, buscamos nos utilizar de perguntas curtas (de em média 12 palavras), em sua maioria de múltipla escolha, com estruturas parecidas e uma plataforma digital que disponibiliza respostas em um click para alcançarmos nosso objetivo de obter um retorno sem grande planejamento consciente por parte do entrevistado, uma vez que elaborações complexas nos revides poderiam levar a distorções nos resultados por nós obtidos.

O efeito “priming” ou “a pré-ativação”, em tradução livre, vem sendo estudado pela Neuropsicologia e Psicologia Social por aproximadamente 50 anos segundo os pesquisadores brasileiros do tema Pacheco Júnior, Damacena e Bronzatti (2015: s/p) todos da PUC-RS. Em um artigo para a Publicação Estudos e Pesquisas em Psicologia, eles relacionam o modo como um estímulo inicial pode afetar as respostas de um indivíduo a estímulos subsequentes, sem que haja consciência de tal influência. A partir dos anos 1990, além da área cognitiva de onde o efeito inicialmente originou-se, o assunto passou a ser alvo de pesquisas no âmbito do comportamento do consumidor por ser um importante variável nos trabalhos voltados para a compreensão das influências que as pessoas sofrem durante o processo de tomada de decisão. Para os pesquisadores: “[o] efeito da pré-ativação (priming) ocorre quando a representação interna é ativada por um estímulo e, sem a consciência do indivíduo, influencia em seus processamentos mentais subsequentes.” (PACHECO JR & DAMACENA & BRONZATTI, 2015: s/p). Ainda de acordo com os autores dentro do paradigma “priming” há muitos subtipos de pré-ativação: direta, indireta, conceitual, contextual, perceptual, por

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repetição, afetiva, motivacional, textual, social, de outros sentidos, espacial, dentre outros. A “tarefa priming espacial” a qual referem-se de Bruin et. al (2015)59 seria aquela relacionada às habilidades de navegação e as estratégias de memorização de rotas dentre outras desenvolturas espaciais.

Ao retornarmos o raciocínio de Bruin, Treccani e Della Sala (2015) percebemos a importância dessa publicação para que o pêndulo do paradigma “vantagem/desvantagem” mude novamente. Os autores após declararem-se contribuintes para a alimentação das avaliações positivas do bilinguismo, principalmente para a “vantagem cognitiva do bilíngue”, com a publicação do estudo de “tarefas espaciais priming-negativas” admitem que apenas o experimento cujos resultados apontavam para a corroboração das teorias de que os bilíngues teriam um controle inibitório de tarefas secundárias mais desenvolvido foi publicado.

Três outras tarefas da psicologia comumente utilizadas em testes – a “tarefa Simon”, a da “pré- ativação negative priming” e uma “tarefa espacial”, “spatial cueing”60 – embora tenham sido aplicadas em experimentos simultâneos ao publicado pelos autores, não tiveram seus resultados divulgados em uma publicação por não apresentarem resultados com diferenças entre as performances de bilíngues e monolíngues (DE BRUIN & TRECCANI & DELLA SALA, 2015: 99-100). A “tarefa Simon”, ou o “efeito Simon”, é relevante para nossa pesquisa, termo proveniente da área de psicologia, “se refere às descobertas de que os tempos de reação são geralmente mais rápidos, e as reações geralmente mais precisas, quando o estímulo ocorre no mesmo local relativo da resposta, mesmo que a localização do estímulo seja irrelevante para a tarefa.” (SIMON, 1969: 174-176), quer dizer, o estímulo deve estar na mesma localização física da resposta para proporcionar essa rapidez e precisão responsiva. A explicação original para o efeito é de J.R. Simon, nos anos 1960, e versava que havia uma tendência inata em direção a fonte de estímulo.

Os autores ainda citam um outro experimento do grupo de pesquisa deles cujos resultados não replicaram o sucesso do grupo de Treccani, mesmo envolvendo o mesmo procedimento de tarefas espaciais priming-negativas. Eles utilizam-se do termo cunhado por Robert Rosenthal em 1979, “file-drawer”61 - que é definido como a tendência em publicação de publicar-se

59 Vide referência 56. 60 “Simon, color negative priming, and spatial cueing”. Tradução nossa. 61 O "file drawer problem" (termo cunhado em 1979 por Robert Rosenthal) refere-se ao viés introduzido na literatura científica por publicação seletiva - principalmente pela tendência de publicar resultados positivos, mas não publicar

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somente os resultados de pesquisas que corroborem o paradigma vigente, não havendo aceites daquelas publicações com resultados negativos ou contraditórios - para questionar o paradigma vigente da “vantagem bilíngue cognitiva”. Essa tendência de publicação de resultados positivos é a chamada publication bias: Por causa da mesma tendência file-drawer (cf. Spellman, 2012) este estudo também não foi submetido. Nós, assim, nos perguntamos se a afirmação de que os bilíngues têm uma vantagem cognitiva é um reflexo correto de todas as pesquisas nesse campo. Recentemente, Paap (2014) exprimiu a preocupação que a literatura em bilinguismo e o controle executivo pode ter sido afetada pela confirmação da tendência de reportar somente resultados positivos62 (DE BRUIN & TRECCANI & DELLA SALA, 2015: 100). Os três pesquisadores basearam-se na publicação de 2014 de outro pesquisador (Paap) para embasar seu questionamento. Isso quer dizer que há um número de pesquisadores de bilinguismo, tal como nós, que começam a reunir evidências de que talvez a suposta vantagem bilíngue cognitiva relacionada ao controle executivo cerebral - que é tida como a teoria mais aceita para explicar resultados superiores dos biletrados em testes - começa a ser questionada indicando uma provável mudança nesse paradigma vigente.

Devido a essa desconfiança de que pode haver uma tendência em publicar-se somente os resultados positivos (publication bias), os autores de Bruin et al conduziram um estudo estatístico entre 1999 e 2012 e concluíram que de um total de 104 resumos (abstracts) 68% das publicações tinham algum tipo de correlação com resultados positivos do bilinguismo – seja relacionada à cognição ou controle executivo aperfeiçoado –; e que apenas 29% das publicações que não demonstravam nenhum efeito positivo desses nos bilíngues, ou os que tivessem resultados de algum tipo de efeito negativo foram publicados; eles ainda afirmaram que apenas 4 dos 104 resumos apontavam para algum tipo de “desvantagem bilíngue” (DE BRUIN & TRECCANI & DELLA SALA, 2015: 104-105). Os autores concluem a publicação dizendo: Embora concordemos que o bilinguismo deva ser concebido, a priori, como uma conquista positiva e desejável, nós também estamos convencidos de que debates políticos e educacionais que abordem a relevância do bilinguismo não devam ser promovidos ignorando-se os resultados nulos e negativos. Ao invés de selecionarem-se somente aquelas tarefas e resultados que corroborem as teorias vigentes, os investigadores deveriam ser mais abertos aos estudos que desafiem as teorias existentes, especialmente quando estas ainda não estão resultados negativos, ou resultados não-confirmatórios. Definição disponível no site: . Acesso 28 mar 2018. 62 “Because of the same file-drawer bias (cf. Spellman, 2012), this study was not submitted either. We then wondered if the claim that bilinguals have a cognitive advantage is a correct reflection of all research in this field. Recently, Paap (2014) raised the concern that the literature on bilingualism and executive control might be affected by a confirmation bias to report positive results only.”. Tradução nossa.

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totalmente estabelecidas. Todos os dados, não apenas aqueles selecionados que sustentem uma teoria em particular, devem ser compartilhados, e isso é sobretudo verdade quando consideram-se dados que dizem respeito a assuntos que têm uma enorme relevância social e implicações, tal qual o bilinguismo63 (DE BRUIN & TRECCANI & DELLA SALA, 2015: 105).

Consideramos relevante destacar alguns trechos da conclusão desse artigo. Como fica evidente no excerto de Bruin et al (2015) não consideram que não haja nenhuma vantagem ligada ao bilinguismo, uma vez que segundo eles “o bilinguismo deve ser concebido a priori como uma conquista positiva e desejável”. A questão na visão deles é apenas mais complexa e não deve ser simplificada, já que “esses dados [...] têm uma enorme relevância social e implicações”; quer dizer, eles também apontam para questões da esfera social para justificar seu ponto de vista, como nós também supomos. Por último, achamos muito profícua a afirmação64 de que são necessários debates verdadeiros sobre a questão do bilinguismo, sem a supervalorização ou depreciação dele, e que estes debates devem ser feitos com os dados reais das pesquisas, com seus resultados positivos e negativos, para que se desmistifiquem os estereótipos. Tanto os positivos “de super-crianças bilíngues”, quanto os negativos “de imigrantes com problemas cerebrais”, conforme trouxemos nos subitens anteriores, devem ser combatidos e evitados em tempos de polarização tão severas como os que vivemos atualmente.

O estudioso Kanavillil Rajagopalan, linguista indiano, que já morou em muitos países e está radicado no Brasil, é titular na área de Semântica e Pragmática das Línguas Naturais da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Rajagopalan também expressa sua opinião contrária ao paradigma da “vantagem bilíngue” e é crítico ao fato de pressupor-se, indiscriminadamente, que todas as crianças do mundo devem ser submetidas a uma educação formal em duas ou mais línguas por supor-se que isso lhes traria alguma vantagem. Ele critica as evidências científicas de que elas possam aprender tudo devido à idade, ou a evidência de que elas estariam prontas para aprenderem os idiomas devido basicamente ao momento biológico em que encontram-se. Ele não rechaça as evidências cientificas de que haja

63 “While we agree that bilingualism should be conceived, a priori, as a positive and desirable achievement, we are also convinced that educational and political debates addressing the relevance of bilingualism should not be promoted by ignoring null or negative results. Instead of selecting exclusively those tasks and results that support current theories, investigators should attempt to include all conducted tasks and reported findings. On the other hand, reviewers and editors should be more open to studies that challenge the existing theories, especially when these are not yet fully established. All data, not just selected data that supports a particular theory, should be shared, and this is especially true when it comes to data regarding issues that have enormous societal relevance and implications, such as bilingualism.” Tradução nossa. 64 “[...] nós também estamos convencidos de que debates políticos e educacionais que abordem a relevância do bilinguismo não devam ser promovidos ignorando-se os resultados nulos e negativos”.

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aprendizado desde o útero materno, mas foca sua crítica principalmente ao ensino formal de idiomas desde a mais tenra idade. O estudioso é cético quanto ao fato de que os cientistas tenham evidências de que o ensino formal seja assim tão benéfico, considerando essas evidências não indubitáveis, uma vez que, para ele, muitos cientistas fazem uso de evidências episódicas para defenderem suas posições e achados científicos, ou seja, ele também critica a postura dos autores em adaptarem suas pesquisas para conseguirem resultados que corroborem o paradigma vigente e a tendência de publicação positiva dos resultados sobre essas pesquisas – publication bias: Aqueles que acreditam apaixonadamente que as crianças estão prontas e totalmente equipadas com todos os meios necessários (isso é, nunca imaturas o suficiente) para aprender qualquer coisa que queiramos que elas aprendam, frequentemente citam como evidência irrefutável para sua declaração a descoberta de que, na realidade, o aprendizado inicia-se, ainda que informalmente, desde o momento em que se é um pequenino feto no ventre de sua mãe, sendo sensível a tudo o que ocorre ao seu redor e, de certa forma, já aprendendo disso tudo. Sim, isso é de fato verdade, na medida em que novas evidências continuem acumulando-se. Mas e quanto ao ensino formal? Sobre essa questão, os resultados das pesquisas estão longe de serem indubitáveis, os acadêmicos têm muitos estudos empíricos e evidências episódicas para endossar seus disparates e alegações conflituosas para empunharem seus punhais uns contra os outros (RAJAGOPALAN, 2009:186).65

Tal qual nós também supomos, de Bruin & et al (2015), Paap (2014), Konnikova (2015), e quiçá Rajagopalan (2009) acreditam haver na memória coletiva, seja na científica e nas tendências de aceite de publicação, seja na mídia, ou até mesmo no entendimento dos pais de estudantes matriculados em ‘Escolas Bilíngues’, uma predisposição para avaliações positivas do bilinguismo no complexo jogo de influência e interpenetração em que os elementos da cultura e da identidade se encontram. Se isso for um fato, entretanto, não haveria nenhuma vantagem real em formar-se cidadãos bilíngues? De Bruin et al (2015:105), como vimos, definitivamente não afirmam que não exista nenhuma vantagem, eles somente enfatizam a necessidade de discussão aprofundada sobre as publicações em bilinguismo e suas tendências; ou como Rajagopalan afirma “[...] isso de fato é verdade, na medida em que novas evidências continuem acumulando-se” (RAJAGOPALAN, 2009:186)

65 “Those who passionately believe that children are ready and fully equipped with the basic wherewithal (i.e., never too immature) to learn anything we want them to learn often cite as irrefutable evidence for that their claim the discovery that, as a matter of fact, learning starts, albeit on an informal basis, right from the days when, as still a tiny fetus in its mother’s womb, an infant is attentive to everything happening around it and, in a way is already learning from it. Yes, that’s indeed true as far as it goes and fresh evidence from scientific research findings are far from as clear-cut and scholars have plenty of empirical studies and anecdotal evidence to back their disparate and conflicting claims and be at daggers drawn with one another.” Tradução nossa.

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Por que não supormos, então, que uma das possíveis “vantagens” em se formar crianças e adultos bilíngues, ou apenas em na existência de mais pessoas bilíngues no mundo sem ensino formal esteja na outra face da moeda, na porção inseparável da linguagem, em sua faceta intrinsecamente social? Se ela não está na cognição como aventavam os cientistas, por que não pode estar, então, na porção social, no poder de adaptação cultural, ou na capacidade de adquirir consciência intercultural e aceitação de outras culturas, de comunicação, enfim, no respeito pela diversidade linguística e étnica advinda da convivência e da tolerância linguística? Podemos crer que o bilinguismo seja uma “vantagem” na formação de cidadãos com um entendimento do que é ser um ser plural, globalizado, inter e até transcultural. Em outras palavras, as vantagens do bilinguismo poderiam extrapolar as fronteiras do cognitivo – como os processos de aprendizagem e comportamentos cerebrais - e adentrar as do cognoscível – como aquilo que podemos vir a conhecer.

Nesse sentido que aborda uma visão que acredita em algum tipo de vantagem menos biológica, mas numa vantagem de ordem mais social para o bilinguismo, podemos citar Cléa Desjardins, relação sênior de mídia da Concordia University do Canadá. Em um artigo ela cita um estudo realizado entre bilíngues cujo resultado aponta para a quebra do pensamento essencialista em crianças bilíngues em idade pré-escolar. Na visão essencialista, forte tendência entre crianças, existe a crença de que as características humanas e animais são inatas, fazendo com que particularidades como a aquisição de língua materna sejam consideradas intrínsecas. Isso significa que as crianças antes de serem submetidas ao experimento tinham, em sua grande maioria, tanto as monolíngues quanto as bilíngues, a tendência de acreditar que as línguas não poderiam ser aprendidas e, sim, que seriam manifestadas naturalmente devido a características intrínsecas.

Após terem sido conduzidos os experimentos, o estudo segundo Desjardins (2015: s/p) concluiu que as crianças bilíngues – fossem estas bilíngues sequenciais, aprendendo uma língua e depois a outra, ou em simultaneidade – passaram a acreditar que características individuais como as de aquisição de linguagem, afloram da experiência, ao contrário do que pensavam seus colegas monolíngues, que continuaram com a visão inicial de que esta seria inata. Uma das cientistas que conduziu a pesquisa, Byers-Heinlein, aponta para uma outra hipótese distinta da estabelecida vantagem cognitiva do controle executivo aperfeiçoado, e formula uma hipótese de cunho social e não biológica, pelo viés da educação, que resultaria em maior aceitação da diversidade social:

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Nosso resultado de que o bilinguismo reduz as crenças essencialistas levanta a possibilidade de que a educação precoce de uma segunda língua poderia ser usada para promover a aceitação da diversidade humana social e física (DESJARDINS, 2015: s/p)66.

Outra abordagem mais social de uma suposta “vantagem bilíngue” está no já mencionado Relatório do Desenvolvimento Humano 2004, Liberdade Cultural num Mundo Diversificado publicado para o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Esse relatório periódico aborda temáticas relevantes ao desenvolvimento humano. As discussões que nele se estabeleciam em 2004 levavam em consideração, abertamente, que as culturas e suas línguas podiam gerar conflitos e confusões entre as partes envolvidas, o que nem sempre foi deliberado em outros momentos da História ou em outras publicações. No prefácio assinado por Mark Malloch Brown, administrador da PNUD, há menção ao momento atual de conflitos de língua, religião, cultura e etnicidade. O prefácio sugere que os problemas causados pela convivência de diferentes línguas e culturas podem ser geridos e mitigados quando as pessoas se permitem “uma expressão cultural completa”, ou em outras palavras, autorizam-se experienciar o mundo das demais pessoas por meio das línguas delas: Numa altura em que o “choque de culturas” global ressoa fortemente – e preocupantemente – por todo o mundo, encontrar respostas para velhas questões sobre a melhor maneira de gerir e mitigar os conflitos acerca da língua, religião, cultura e etnicidade assumiu uma importância renovada. [...] porque permitir às pessoas uma expressão cultural completa é um fim importante do desenvolvimento em si mesmo. (BROWN/RELATÓRIO, 2004: v- vi)

Como veremos no Capítulo 2, a língua é a característica social que nos diferencia das demais como espécie. Não devemos deixar de estudar e considerar as características biológicas, genéticas, cerebrais, comportamentais etc., porém essas não são as únicas causas de algum tipo de vantagem ou desvantagem. Assuntos complexos como o bilinguismo e as supostas vantagens ou desvantagens que ele acarreta não devem ser simplificados em demasia porque podem levar a distorções muitas vezes capazes de fomentar ideias distorcidas no senso- comum, de todos e dos cientistas (publication bias). Como vimos, as ideias contrárias entre si de acarretamento de uma vantagem ou uma desvantagem de qualquer ordem - biológica, cognitiva, ou no estabelecimento de doenças degenerativas, sociais, como as educacionais e econômicas (subitem 1.5) - para os falantes bilíngues são algo comum e recorrente tanto na

66 “Our finding that bilingualism reduces essentialist beliefs raises the possibility that early second language education could be used to promote the acceptance of human social and physical diversity”. Tradução nossa.

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literatura específica da área, quanto na mídia e na vida cotidiana, desde de que o assunto começou a ser debatido.

Para nós, parece haver a tendência de segmentação do conhecimento na atualidade, devido, principalmente, à alta especialização dos profissionais, e isso é algo importante para os debates aprofundados no bilinguismo em nossa maneira de ver. Os profissionais da Ciências são atualmente especialistas somente em um pequeno nicho do conhecimento, talvez porque esse seja muito vasto. Há, assim, uma tendência de que eles fiquem somente em sua área de conhecimento, sem conseguir colocar seus resultados em uma perspectiva mais ampla, o que pode fazer com que muitas vezes o resultado seja distorcido. Ressaltamos que não defendemos aqui que os cientistas virem generalistas, mas que acreditamos que talvez seja um fator favorável na contribuição das pesquisas para a formação de um pensamento crítico em relação aos dados obtidos sobre o bilinguismo levar em consideração somente as publicações que exaltem de maneira inconteste a suposta vantagem bilíngue.

Dessa maneira, acreditamos que um pesquisador da Área de Fisiologia, por exemplo, pode propor na discussão de seus resultados sobre bilinguismo uma teoria que aborde além dos fatores fisiológicos por ele encontrados, fatores de ordem social, ou genética, ou de comportamento linguístico, desde que ele acumule evidências para tal. E segundo o que apresentamos até aqui, essa visão mais ampla e crítica publicada por pesquisadores, jornalistas ou outros autores que conseguem analisar seus resultados ou os de outros fugindo da tendência de publicar somente o que está de acordo com o paradigma vigente (publication bias) parece ser a tendência de publicações deste início de século XXI que é a mais relevante para o tipo de discussão que pretendemos fomentar sobre o bilinguismo - vide de Bruin et al (2015), Paap (2014), Konnikova (2015), Rajagopalan (2009), Desjardins (2015), Brown (2004).

Em uma discussão aprofundada e com um viés acadêmico, citaremos novamente o estudioso Rajagopalan e sua própria vivência multilíngue, em uma conexão entre diferentes áreas, feita de maneira eficiente e crítica. Ele aborda a temática do viés social de uma língua e do status que as línguas ocupam em uma publicação de 2009 chamada A exposição de crianças ao inglês como língua estrangeira: o papel emergente do World English. O status popular do bi- (multi-)linguismo de uma sociedade67 e do multilinguismo de um indivíduo68 é, há muito,

67 “societal bi-(multi-)multilingualism”. Tradução nossa. 68 “individual bi-(multi-)multilingualism”. Tradução nossa.

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suscitador de reações variadas e frequentemente despertador de avaliações conflitantes. Na visão dele, no entanto, o bi, multilinguismo no nível individual é tido como um trunfo individual, valorizado, portanto, já o da sociedade é frequentemente encarado como um problema social, como se vê no excerto: O multilinguismo tem sido há muito tempo um tópico de reações opostas e frequentemente alvo de avaliações variadas e conflituosas. No nível individual é tipicamente visto como um trunfo, uma marca de inteligência superior e requinte cultural. O multilinguismo da sociedade, isso é, uma sociedade como um todo conduzindo sua rotina diária com a ajuda de duas ou três línguas, é, não obstante, frequentemente visto como um problema social e um obstáculo no caminho do progresso econômico e da estabilidade. (RAJAGOPALAN, 2009: 188).69

O status que a língua ocupa em uma sociedade e até mesmo internamente, no julgamento do próprio usuário, acarreta em julgamentos de ordem de “vantagem” ou “desvantagem” social da utilização daquela língua. A escolha da utilização, seu emprego e até mesmo da demonstração do conhecimento de uma ou mais línguas depende do usuário, que pode fazê-lo ou não de acordo com suas necessidades e de acordo com sua própria avaliação da relevância, da importância ou da valoração que ele faz de seu emprego naquele dado momento ou situação. Estas ideias são de ordem social e implicam em avaliações de status e prestígio que a língua ocupa na opinião do falante. Tal qual vimos anteriormente no subitem 1.1 sobre a reportagem de Jones70 (2018), os imigrantes ao terem uma orientação externa educacional e social que deveriam evitar sua língua materna, muitas vezes, acabavam mudando seu próprio julgamento interno em relação à sua língua mãe associando-a à vergonha, pobreza ou a causa de diferença naquela sociedade, ou seja, gerando preconceito em si.

Outra reportagem que discute a questão do bilinguismo não se restringindo às supostas vantagens de ordem cognitiva, é a já citada Os benefícios de se falar mais de uma língua (DANIELSSON, 2017: s/p). A autora afirma que os “ganhos sociais” podem ser igualmente importantes às supostas “habilidades cognitivas melhoradas” no biletrismo, o que vem ao encontro de nossa própria opinião em relação à questão:

69 “Multilingualism has long been a topic of mixed reactions and varied and often conflicting appraisals. At the individual level it is typically seen as an asset, a mark of superior intelligence and of cultural finesse. Societal multilingualism, i.e. a society as a whole, conducting its day-to-day routine with the help of two or three languages, is nevertheless often viewed as a social problem and a stumbling block in the way of economic progress and stability.” Tradução nossa. 70 “A saída de evitar-se a língua materna não era simplesmente educacional, mas também social: a língua de casa era invariavelmente considerada uma fonte de vergonha, um sinal de pobreza ou diferença que na maioria das vezes levaria a ser apontado ou a sofrer bullying. Para os imigrantes, a integração costumava a implicar esquivar-se deliberadamente da língua de seus pais, pelo menos em qualquer ambiente público” (JONES, 2018: s/p).

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Isto não é dizer que não há benefícios, e eles podem até podem mostrar-se significativos uma vez que a Ciência os consiga alcançar. E além de habilidades puramente cognitivas, os ganhos sociais podem ser igualmente importantes. Um estudo recente, por exemplo, concluiu que crianças bilíngues, e até mesmo crianças meramente expostas a uma segunda língua, tinham mais facilidade de interpretar as intenções de uma outra pessoa sendo capazes de ver as coisas por meio da perspectiva delas. Isto, os pesquisadores inferiram, as fez mais empáticas e melhores no entendimento do que o falante queria dizer71 (DANIELSSON, 2017: s/p)

Outros trechos desse parágrafo que gostaríamos de ressaltar são os que afirmam que as crianças bilíngues estudadas “tinham mais facilidade em interpretar as intenções” e que os pesquisadores “inferiram que isso as fez mais empáticas”. Essas habilidades sociais, a empatia e a compreensão da visão de mundo do outro, são muito importantes e necessárias, na nossa maneira de ver, no mundo de hoje. Talvez a forma como vivemos, os valores capitalistas e individualistas a que estamos submetidos, nos inclinem a nos privar da capacidade de ver o outro, de enxergá-lo e de tentar sentir como ele. Na nossa opinião, as línguas são capazes de promover essa visão de mundo do outro e quem sabe, exatamente por isso, a necessidade de se aprender uma nova língua esteja tão em voga na atualidade, pela urgência de empatizarmos uns com os outros. Jones também fala em empatia relacionada à condição bilíngue em sua reportagem: “Mais do que a metade da população é agora bilíngue. Agora acreditado como capaz de encorajar a flexibilidade mental e a empatia, o bilinguismo está também transformando sociedades72” (JONES, 2018: s/p).

O artigo a que Danielsson refere-se é de Fan, Liberman & Keysar de 2015 intitulado A vantagem da exposição: exposição precoce a um ambiente multilíngue promove comunicação efetiva73, estudo publicado no periódico Psychological Science que vai ao encontro da tendência que nos parece prevalecer como o novo paradigma na área de que a suposta “vantagem bilíngue” pode estar mais acertadamente na esfera social do que na cognitiva. Logo no resumo da publicação os autores afirmam: Uma exposição precoce à língua é essencial para o desenvolvimento de um sistema linguístico formal, mas pode não ser o suficiente para a comunicação efetiva. Para se entender a intenção de um falante, uma pessoa tem que aceitar

71 “This is not to say that there are no benefits, and they may even turn out to be significant once the science catches up. And beyond purely cognitive skills, the social gains may be equally important. A recent study, for example, concluded that bilingual children, even kids merely exposed to a second language, were better at interpreting another person’s intentions by being able to see things from their perspective. This, the researchers inferred, made them more empathetic and better at understanding what the speaker meant.”. Tradução nossa. 72 “More than half the world’s population is now bilingual. Now thought to encourage flexibility of mind and empathy, bilingualism is also transforming societies”. Tradução nossa. 73 “The Exposure Advantage: Early Exposure to a Multilingual Environment Promotes Effective Communication”. Tradução nossa.

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a perspectiva desse falante. A exposição multilíngue pode promover a comunicação efetiva por meio da melhora na aceitação da perspectiva do outro. Nós testamos crianças em uma tarefa que se requeria a aceitação de perspectiva para interpretar o significado intencionado pelo falante. Crianças monolíngues falharam na interpretação da perspectiva do falante mais dramaticamente do que ambas crianças bilíngues e crianças que foram expostas a um ambiente multilíngue, mas não eram elas mesmas bilíngues. As crianças que eram meramente expostas a uma segunda língua tiveram performance tão boa quanto as crianças bilíngues, embora tivessem resultados mais baixos em testes de função executiva. Assim, as vantagens comunicativas demonstradas pelos bilíngues podem ser sociais de origem, e não de acordo com uma função executiva aperfeiçoada que são críticas para a comunicação efetiva74 (FAN, LIBERMAN & KEYSAR, 2015:1).

É sabido e estudado que uma exposição em uma idade muito jovem – de bebês - a uma língua é fundamental para que haja o desenvolvimento cognitivo necessário para ter-se um falante no futuro. O trecho elucida-nos, porém, que para uma comunicação efetiva outros fatores se fazem necessários e que um desses, segundo as pesquisas, está relacionado à intenção desse falante. Ao chegar a resultados em que a resposta de bilíngues efetivos e bilíngues não- efetivos, mas que tinham convivência em um ambiente multilíngue têm seus resultados equiparados, o que faz com que paradigma de uma vantagem de ordem cognitiva possa ser questionado. Tais dados levam aos pesquisadores proporem uma hipótese de que “vantagens comunicativas demonstradas pelos bilíngues podem ser sociais de origem” (FAN, LIBERMAN & KEYSAR, 2015: 1).

Nos anos 2000, Beverly A. Clark, reconhecida fisiologista pesquisadora da UCL, University College London, estudava, entre outras coisas, a integração neuronal, e frequentemente investigava e publicava sobre o bilinguismo. Clark também faz sua contribuição na desmistificação da antiga ideia da “desvantagem bilíngue” - de que mais de uma língua poderia causar problemas de aprendizado -, além de tentar romper com outro estereótipo, o de que somente as crianças em idade de aquisição poderiam tornar-se proficientes em uma segunda

74 “Abstract: Early language exposure is essential to developing a formal language system, but may not be sufficient for communicating effectively. To understand a speaker’s intention, one must take the speaker’s perspective. Multilingual exposure may promote effective communication by enhancing perspective taking. We tested children on a task that required perspective taking to interpret a speaker’s intended meaning. Monolingual children failed to interpret the speaker’s meaning dramatically more often than both bilingual children and children who were exposed to a multilingual environment but were not bilingual themselves. Children who were merely exposed to a second language performed as well as bilingual children, despite having lower executive-function scores. Thus, the communicative advantages demonstrated by the bilinguals may be social in origin, and not due to enhanced executive control. For millennia, multilingual exposure has been the norm. Our study shows that such an environment may facilitate the development of perspective-taking tools that are critical for effective communication.” Tradução nossa.

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língua, ou ainda com o de que as crianças têm vantagens em relação aos adultos, como vemos no excerto: Não há evidência de que haja quaisquer limites biológicos para o aprendizado de segunda língua ou que as crianças tenham necessariamente uma vantagem sobre os adultos. Até mesmo aqueles que começam a aprender uma segunda língua na infância podem sempre ter dificuldade com pronúncia, regras de gramática e vocabulário e podem nunca dominar completamente as formas e usos da língua. Não há uma forma simples de se explicar porque algumas pessoas têm sucesso no aprendizado da segunda língua e outras não75 (CLARK, 2000:183).

Ao tentar desconsolidar a “desvantagem bilíngue”, Clark ajudaria na consolidação do paradigma da “vantagem bilíngue”, mas não necessariamente, embora nos anos 2000 o paradigma de uma vantagem cognitiva estar bem estabelecido em sua área de pesquisa. Essa visão maniqueísta de que há apenas dois pontos de vista, o positivo e o negativo, e que um necessariamente um exclui o outro, ainda pode predominar na razão de muitas pessoas, sejam elas cientistas ou pessoas leigas, no entanto, ela não é a mais comum entre as pessoas que fazem Ciências.

No artigo chamado Aquisição de Primeira e Segunda línguas na Primeira Infância76 Clark afirma que nem mesmo os mais ferrenhos defensores da educação bilíngue como Cummins alegam que a educação bilíngue seja o elemento mais importante na educação de uma criança. O que seria mais relevante seriam os bons programas e o status do grupo linguístico na comunidade a que pertence – aspectos sociais, portanto – os “bons programas” de ordem educacional e o “status linguístico”, uma questão social já brevemente discutida nesse subitem. Tais aspectos seriam determinantes para o sucesso nessa empreitada comunicativa em duas línguas, uma vez que para Clark: “Não há efeitos negativos para as crianças que são bilíngues. O desenvolvimento linguístico delas segue o mesmo padrão das crianças monolíngues77” (CLARK, 2000: 183). Notamos no trecho uma moderação do discurso em relação ao do século passado e até mesmo em relação ao dos inícios da pesquisa em bilinguismo. Nesse sentido, Clark pondera que talvez os padrões de aprendizado linguísticos de mono e bilíngues sejam, no

75 “There is no evidence that there are any biological limits to second-language learning or that children necessarily have an advantage over adults. Even those who begin to learn a second language in childhood may always have difficulty with pronunciation, rules of grammar, and vocabulary, and they may never completely master the forms or uses of the language. There is no simple way to explain why some people are successful at second-language learning and some are not.”. Tradução nossa. 76 “First-and Second-Language Acquisition in Early Childhood”. Tradução nossa. 77 “There are no negative effects for children who are bilingual. Their language development follows the same pattern as that of monolingual children.”. Tradução nossa.

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final os mesmos, o que implica em dizer que a suposta diferença entre eles estaria, então, em outra esfera, se é que podemos mesmo indicar uma diferença.

Parece que a mudança na interpretação do paradigma de uma “vantagem bilíngue social” começa a consolidar-se principalmente no meio científico e que o pêndulo parece inclinar-se mais na direção de entender as vantagens do bi, multilinguismo como sociais e comunicacionais, e não tanto para as antigas ideias de (des)vantagens cognitivas, sendo que há um crescente de autores (CLARK, 2000; RAJAGOPALAN, 2009; de BRUIN et al. 2015; FAN et al. 2015) apontando para as vantagens sociais, culturais, comunicacionais, educacionais e até econômicas como veremos a seguir. Essa tendência de enxergar uma vantagem bilingue de ordem social – educacional, comunicacional, de empatia, de aceitação da cultura/ponto de vista do outro, econômicas, etc. - será uma das investigadas nessa pesquisa (ver todas as questões da pesquisa ANEXO 1), mas temos a consciência de que tal pesquisa não extinguirá o debate. Rajagopalan nos ajudará a resumir a eterna questão do senso-comum e dos paradigmas da Ciência porque sintetizou o que pensamos sobre isso da seguinte maneira: “Com relação à língua, as opiniões de especialistas e pessoas-comuns são pólos opostos, mas o que não é sempre percebido ou plenamente reconhecido é que a assim chamada opinião leiga é muitas vezes nada mais do que a opinião dos especialistas de ontem78” (RAJAGOPALAN, 2009:187).

1.5 Money makes the world go around79

A teoria de que o bilinguismo pode acarretar “vantagens sociais” ao bilíngue, não pode excluir uma questão fundamental das variáveis desse complexo sistema social: as possíveis vantagens econômicas do mercado, seja ele da economia de um país bilíngue como um todo, seja do mercado educacional, ou do de trabalho. Essas “vantagens” do biletramento teriam caído no senso-comum dos empresários donos de escolas, que decidiriam por investir seu dinheiro em uma instituição de ensino com estrutura diferenciada e profissionais especializados, bilíngues ou multilíngues? Dos alunos ali matriculados, os quais acreditariam haver uma vantagem em estudar ali? Dos pais de alunos mais novos que não podem ainda optar por seus estudos sozinhos? Dos próprios professores que investem em sua formação em mais de um idioma? E, finalmente, dos profissionais do mercado de trabalho que posteriormente contratarão os

78 “With regard to language, expert and lay opinions are frequently poles apart, but what is often not perceived or fully appreciated is that the so-called lay opinion of today is nothing but the expert opinion of yesteryears.”. Tradução nossa. 79 “O dinheiro faz o mundo girar”. Tradução nossa.

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bilíngues caso acreditem que isso acarreta em algum tipo de vantagem? Essas ideias de o ensino feito em pelo menos dois idiomas acarretar em vantagens de ordem socioeconômicas aos bilíngues estão em nosso questionário de pesquisa (vide Capítulo 4 onde estão as justificativas das perguntas, ou ANEXO 1 para as questões em todos os idiomas). Perguntamos aos entrevistados se eles acreditam que o ‘Ensino Bilíngue’ seja mais caro do que o regular, se isso é justificado para eles e se os entrevistados acreditam que os bilíngues recebem necessariamente melhores salários dos que os monolíngues.

Mais uma vez deparamo-nos com a ideia de haver uma “vantagem bilíngue” e desta ter caído no senso-comum dos cidadãos, dessa vez, porém, o que nos interessa é o viés econômico o que nos fez procurar publicações dessa ordem na mídia. Quando retomamos a publicação de Danielsson (2017) Os benefícios de se falar mais de uma língua, devemos nos recordar que ela foi feita para o Fórum Econômico Mundial. A autora, como vimos, percorre todo o caminho esmiuçado nessa tese: pesquisa sobre as supostas “desvantagens/vantagens” bilíngues até chegar aos trabalhos mais recentes que apontam para vantagens de ordem social como vimos nas seções anteriores desse capítulo.

O que nos chamou a atenção, porém, foi a subdivisão em seu texto intitulada O caso de negócios para o bilinguismo80. Cabe aqui explicar que “um caso de negócio” (business case) é proveniente da Área de Administração e pode ser definido como uma “Justificativa para um gasto significativo. O caso de negócio inclui informação sobre custos, benefícios, opções, imprevistos, riscos e possíveis problemas81”. Somente pelo subtítulo do artigo – O caso de negócios para o bilinguismo – e pela definição de “caso de negócios”, podemos inferir que somente pela existência de um caso de negócio ligado ao bilinguismo já é relativamente aceito na área econômica que ele seja considerado um negócio, com seus riscos, custos, benefícios, revezes, planos de investimento, tempo de retorno do investimento, porcentagens de lucro etc.

Isso torna-se ainda mais evidente em uma breve pesquisa feita via Google. Se colocamos para procura “bilingualism cases” aparecem “aproximadamente 894.000 resultados (0,40 segundos)82. Em português, quando colocamos “caso de negócio bilinguismo” são encontrados

80 “The business case for bilingualism”. Tradução nossa. 81 CASO DE NEGÓCIO. Disponível em: < http://www.pmgacademy.com/pt/glossario-itil/68-caso-de-negocio>. Acesso em 25 de mar 2018. 82 BILINGUALISM CASES. Buscador Google. Disponível em: < https://www.google.com.br/?gws_rd=ssl>. Acesso em 25 de mar 2018.

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195.000 resultados (0,42 segundo). Obviamente que no caso do Google sabemos que a pesquisa procura por artigos, reportagens, propagandas entre outros, que contenham as palavras “bilingualism” ou “cases” em inglês; e “caso”, “negócios” e “bilinguismo” em português respectivamente, sendo de nosso conhecimento que esses resultados não estão necessariamente somente ligados à área econômica.

Embora esta tese não esteja inserida na Área de Economia, acreditamos ser contribuinte para uma visão holística da condição bilíngue uma opinião que venha dessa área do conhecimento. Dessa maneira, usaremos principalmente a já referida publicação de Danielsson, que cita pesquisas relevantes na área, para ilustrar essa questão de vantagem/desvantagem econômica ligada ao bilinguismo, uma vez que esse texto foi utilizado no Fórum Econômico Mundial de 2017. Vemos no texto um levantamento de estudos realizados em países pelo menos bilíngues oficialmente como a Suíça (que tem as línguas oficiais alemão, francês e italiano), o Canadá (inglês e francês), a Índia (hindi, inglês e mais 20 línguas reconhecidas) e a Grã-Bretanha (o inglês, o escocês, o galês, o irlandês e o cornês).

Quando se levam em consideração estudos como o Índice de Proficiência em Inglês EF (EF EPI) “se realçam as recompensas financeiras associadas ao bilinguismo ou multilinguismo em todos os níveis83”, segundo a autora e os estudos apresentados, altos índices de proficiência em inglês são apontados como financeiramente recompensadores em bilíngues ou multilíngues e as recompensas financeiras dão-se em todos os níveis. Já um estudo suíço “constatou que o multilinguismo é estimado em contribuir em 10 por cento do PIB, provando que as habilidades linguísticas dos trabalhadores abrem mais mercados para os negócios suíços, favorecendo consideravelmente a economia como um todo84” (DANIELSSON, 2017: s/p).

As desvantagens econômicas naqueles países menos abertos às pessoas bilíngues ou multilíngues são igualmente sentidas na economia. Na Grã-Bretanha o custo da chamada stubborn attachment85, em uma tradução livre, uma “fixação teimosa” à língua inglesa, que pode

83 “The benefits of bilingualism don’t end there, however. Studies in Switzerland, Britain, Canada and India, as well as our very own EF English Proficiency Index (EF EPI), highlight the financial rewards associated with bilingualism or multilingualism at all levels.” Tradução nossa. 84 “A Swiss study, for example, noted that multilingualism is estimated to contribute 10 percent of Switzerland’s Gross Domestic Product (GDP), proving that the language skills of workers open up more markets to Swiss businesses, greatly benefiting the economy as a whole.”. Tradução nossa. 85 Stubborn attachment - “A noção que melhor ilustra a necessidade de uma ‘falsa’ (‘unilateral’, ‘abstrata’) escolha em curso de um processo dialético é o de “fixação teimosa”; esta noção ambígua mais aprodundada é operante ao

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ser expressa como uma falta de vontade de se investir de maneira significativa no aprendizado de outras línguas, foi estimada em perdas de impressionantes 48 bilhões de libras ao ano, ou 3.5 por cento do PIB86. (DANIELSSON, 2017: s/p).

Outros números interessantes estão ligados ao bilinguismo e às habilidades linguísticas de trabalhadores para os negócios, sendo que foram consideradas as habilidades tanto em uma língua falada em um novo mercado em expansão, quanto no próprio inglês – uma das línguas francas globais da atualidade, uma considerada tão importante quanto a outra. Em uma unidade de estudo de Inteligência Econômica de 2014 (Economist Intelligence Unit study), quase 90% dos gerentes disseram que na opinião deles o fato de se ter melhor comunicação internacional geraria um melhor resultado (bottom line) no negócio. Outro estudo da unidade reportou que 79% das empresas que haviam investido em habilidades de seus trabalhadores em inglês tiveram aumento em suas vendas. Um último dado destas pesquisas levantadas por Danielsson é sobre os gerentes bilíngues, os recrutadores e os líderes da indústria, como vemos no excerto: "Gerentes bilíngues ou multilíngues também são valorizados e procurados em um crescente. Os recrutadores e líderes da indústria consideram que eles estão melhor equipados para gerenciar negócios globais, relacionamentos e times”87 (DANIELSSON, 2017: s/p). Vale a ressalva que Danielsson levantou mais algumas vantagens de ordem social nesse dado por ela trazido: gerenciamento dos negócios, gerenciamento de habilidades de relacionamento e dos times de trabalho; todos ligados às supostas vantagens sociais que o bi-multilinguismo teriam.

Finalmente, o levantamento de Danielsson (2017: s/p) menciona os benefícios econômicos do bilinguismo no nível individual. Segundo a autora, esses são mais difíceis de quantificar principalmente porque dependem da indústria, do local e da taxa de emprego. Ela cita um estudo canadense de 2010 que mostrou que os trabalhadores bilíngues recebiam de 3 a 7% a

largo de toda a Fenomenologia de Hegel. Por outro lado, ela representa uma ligação patológica a algum conteúdo em particular (interesse, objeto, prazer...) menosprezada pelo julgamento moral da consciência.”. (ZIZEK, 2000: 103). Tradução nossa. 86 “In Britain, on the other hand, the cost of the country’s stubborn attachment to the English language and unwillingness to significantly invest in learning other languages, has been estimated to be as high as £48bn a year, or a staggering 3.5 percent of GDP.” Tradução nossa. 87 “For businesses, the language skills of their workers – be it a language spoken in a new market they’re expanding to, or English, the global lingua franca – are just as important. In an Economist Intelligence Unit study, quoted in the 2014 EF EPI, nearly 90 percent of managers said that better cross-border communication would improve the bottom line, while another study noted that 79 percent of companies that had invested in the English skills of their workers, had seen an increase in sales. Bilingual or multilingual managers are also increasingly valued and sought after. Recruiters and industry leaders consider them to be better equipped to manage both global business relationships and teams.”. Tradução nossa.

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mais do que seus colegas monolíngues, mesmo que eles não precisassem utilizar a outra língua nacional em seus trabalhos. Já nos EUA, os estudos apontam para um aumento de ordem de 1,5 - 3,8%, sendo que aqueles que falam alemão são mais valorizados, tanto pela escassez desses profissionais, quanto devido à importância global alemã nos negócios mundiais. Por fim, na Índia, essa diferença salarial é mais notada e bonificada, com aqueles que falam inglês recebendo em média até 34% mais por hora trabalhada88.

Na reportagem há o seguinte gráfico89 da revista The Economist que projeta as gratificações ligadas às línguas acumuladas entre os anos de 2014 e 2054 em euros. Essas gratificações chegarão a mais de 125.000 euros quando relacionadas ao alemão; 75.000 ao francês; e aproximadamente 50.000 ao espanhol.

88 “At the individual level, the benefits of bilingualism are a little harder to quantify, mainly because they depend on industry, location and level of employment. A 2010 study in Canada, for example, showed that bilingual workers earned between 3-7 percent more than their monolingual peers. Speaking both of the country’s official languages – English and French – helped people earn more, even if they weren’t required to speak that second language on the job. In the US, studies have shown that speaking a foreign language can increase your salary by (at least) 1,5-3.8 percent, with German skills having the highest value due to their relative scarcity and Germany’s importance to global trade. In India, this premium was even more notable, with those who spoke English earning, on average, 34 percent more per hour.”. Tradução nossa. 89 Figura 2 – ACCUMALATED LANGUAGE BONUSES. The Economist. Disponível em: . World Economic Forum. 10 abr 2017. Acesso 15 mar 2018.

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Figura 2 – Previsão de bônus acumulado por língua em euros.

Sendo as línguas parte da faculdade humana da linguagem e intrinsecamente sociais, partes integrantes e representativas das culturas das quais emergiram, a ideia de um ganho social econômico do bilíngue vai ao encontro das nossas expectativas de que o bilinguismo pode ser considerado senão uma vantagem cognitiva, por ser essa vantagem ainda algo controverso, uma vantagem de conhecimento que reflete-se em ganho financeiro. Em outras palavras, a vantagem seria algo que pode ser aprendido pela vasta maioria dos humanos e, em última instância, uma vantagem do mundo da cultura, não algo inato, biológico, ou em concordância com uma visão essencialista. Encontramos em nossa pesquisa essa tendência, por parte de alguns cientistas, que aponta para a possibilidade de que se instaure um novo paradigma, ou seja, um paradigma em que a possível vantagem bilíngue pode (também) estar atrelada a ganhos sociais. Como exemplificado aqui, já são encontradas nos meios de comunicação tais visões, por meio de reportagens e matérias jornalísticas. Tais evidências e reflexões fazem com que possamos, assim, começar a pensar em “vantagens sociais do bilinguismo”, sendo essa uma de nossas perguntas de pesquisa (vide ANEXO 1 ou Capítulo 4): indagamos se nossos entrevistados acreditam que haja vantagens de ordem sociais (além das já mencionadas vantagens econômicas) ao se falar mais de um idioma.

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No próximo capítulo faremos uma reflexão sobre a língua como fundadora do contexto social humano, sendo parte essencial da identidade (cultural) dos indivíduos e dos povos, e como subjacente às questões econômicas em que nos inserimos, por um viés amplo em que as Ciências se entrecruzam.

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CAPÍTULO II – COMO A LÍNGUA FUNDA O CONTEXTO SOCIAL: QUESTÕES DE IDENTIDADE (CULTURAL) E QUESTÕES ECONÔMICAS

About multilingualism: Many Americans have long been of the opinion that bilingualism is ‘a good thing’ if it was acquired via travel (preferably to Paris) or via formal education (preferably at Harvard) but that it is a ‘bad thing’ if it was acquired from one’s immigrant parents or grandparents. 90 (FISHMAN)

As Ciências Humanas, as Biológicas e as Exatas foram separadas recentemente conforme já discutido na Introdução desta tese, entre outras razões, para que os estudos dessas áreas fossem facilitados e aprofundados. Essas Ciências, porém, inevitavelmente mantêm interseções e cruzamentos, seja por meio de seus autores, ou por meio de algum tema específico inter ou transdisciplinar. Mas é a língua, fator comunicacional social comum entre todas elas, que proporciona tais confluências. Por meio da língua é que conseguimos entender o que um estudioso de uma área distinta da nossa área de atuação, ou de interesse, diz. O que propomos nesse Capítulo 2 é manifestar, nem que seja de maneira breve, que as Ciências, principalmente as biológicas, e o discurso que a ela subjaz, não estão reduzidas às questões e às ideias defendidas nos paradigmas científicos. Por isso traremos aqui reflexões acerca de língua e linguagem, cultura e identidade que entrelaçam as áreas biológicas e humanas por meio de alguns autores que transitam entre essas Ciências.

Como já vimos brevemente nas partes anteriores dessa tese, um mesmo fenômeno quando estudado pelo prisma de uma área, científico ou ordinário, pode ter explicações diferentes de quando o mesmo fenômeno é abordado por outra área do conhecimento. Isso ocorre, fundamentalmente, porque dá-se o alinhamento ao pensamento dessa área específica, fazendo com que ele fique submetido aos paradigmas e ao discurso vigente daquele segmento do conhecimento. O único elemento capaz de nos fazer compreender o que não é de nosso domínio, por conter especificidades desconhecidas, é o artefato comum da língua. Por essa razão, faremos uma reflexão sobre a língua e a linguagem que unifique algumas meditações sobre o tema interligando principalmente as áreas biológicas e as humanas porque acreditamos que as subdivisões do conhecimento, embora necessárias, sejam posteriores ao conhecimento

90 Sobre o multilinguismo: Muitos norte-americanos há muito tempo têm a opinião de que o bilinguismo é uma ‘coisa boa’ se foi adquirido em uma viagem (preferencialmente à Paris) ou por meio da educação formal (preferencialmente em Harvard), mas que é uma ‘coisa ruim’ se foi adquirido dos pais ou avós de um imigrante. (FISHMAN). Tradução nossa.

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em si. Destacaremos o contexto social que subjaz à língua tanto nas vertentes econômicas, quanto nas identitárias e culturais que a língua, invariavelmente, é capaz de despertar.

Neste capítulo trouxemos uma reflexão sobre a língua como singularidade da espécie humana, valendo-nos de uma fala de Mia Couto (2008) – ao longo do capítulo como um todo - para conceituar língua e linguagem por meio dos teóricos da Linguística; abordamos os estudos da cultura e alguns teóricos que definem a identidade cultural; e ainda entrelaçamos a visão biológica e a humana, os conceitos de línguacultura e identidade para abordarmos novamente a questão econômica que subjaz à organização de nossa sociedade; definimos a hibridação cultural e propomos uma reflexão acerca do papel do homem no planeta em que a língua deve ser usada como uma arma de união e de convergência, em que as misturas e hibridações devem ser valorizadas para a produção de tolerância, empatia e diversidade humana, em contextos dos povos em imigração e dos conflitos linguísticos gerados por esses deslocamentos.

2.1 Língua e linguagem: as Ciências Biológicas e Humanas em um breve entrelaçar

No Capítulo 1, trouxemos a discussão do paradigma bilíngue (vantagem/desvantagem) ao longo de aproximadamente um século em que essas ideias são debatidas. Refletiremos agora acerca de alguns elementos básicos que antecedem a condição bilíngue: a língua e a linguagem são definidas da mesma maneira? são algo exclusivamente humano? se não, seriam elas que diferenciariam os seres humanos dos outros animais? O que subjaz a esses questionamentos são elementos de ordem científica, cultural e de nomenclatura que variam de uma área de conhecimento para outra, como desenvolveremos a seguir.

Comecemos pela terceira pergunta. Pergunte a um filósofo e ele lhe responderá que o que difere os humanos dos outros animais é o conhecimento. Você pode concluir da resposta que os outros animais não têm nenhum tipo de conhecimento. Ao refletir mais sobre o assunto você pode perguntar a um poeta, que lhe dirá que a diferença entre os animais e nós está na capacidade de sonhar. Você perguntará a si mesmo se somente os humanos sonham. Fisiologicamente não, metaforicamente, como acreditam os poetas, talvez. Você pode perguntar a um linguista, ele lhe dirá que o que nos diferencia dos outros animais é a linguagem. Assim, a linguagem é algo exclusivo dos seres humanos. E a linguagem das abelhas? Dos golfinhos? Perguntemos, a um biólogo, então, ele deve ter resposta, pois estuda

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comparativamente os animais. Ele nos falará que o que nos diferencia é o nosso cérebro altamente desenvolvido. Não, porque os golfinhos também o têm. Ele mencionará que o que nos diferencia dos demais é a habilidade de falar línguas e de passar nosso conhecimento adiante indiretamente, ou seja, uma característica intrinsecamente social, a comunicação social. Justificará dizendo que há muitos outros animais que se comunicam por meio de linguagens, mas que a linguagem verbal é exclusiva dos humanos.

Tomemos como base para nossa reflexão um texto de um autor que reúne, em suas produções, todas as áreas de conhecimento dos questionamentos enumerados acima, por ser um poeta, linguista, filósofo e biólogo: o Moçambicano Mia Couto. Ele reflete sobre língua, linguagem, cultura e identidade, temáticas que abordaremos neste segundo capítulo. A fala que nos norteará foi apresentada na Conferência Internacional de Literatura WALTIC e foi chamada por ele próprio de uma “interinvenção” ou intervenção. Ficou posteriormente conhecida (tal qual falamos, as classificações são sempre posteriores) como Línguas que não sabemos que sabíamos (2008), e, em seguida, foi publicada no livro E se Obama fosse africano, de 2009. Essa reflexão tornou-se um artigo publicado nos Cadernos de Pós-Graduação em Letras da Universidade Presbiteriana Mackenzie publicado em abril de 2018 do qual citaremos em alguns trechos (AVELAR, 2018: 155-168).

Gostaríamos de fazer uma observação antes de iniciarmos e reiterar que não iremos nos ater detidamente aos resultados de estudos científicos que consideramos relevantes nas Áreas Biológicas, e nem a suas possíveis citações na mídia. Apenas o faremos de maneira pontual por meio de notas de rodapé. Podemos valer-nos ora do conhecimento do senso-comum em relação a essas temáticas e ora do conhecimento enciclopédico, ou de mundo, desta pesquisadora91, embora sempre justifiquemos tais menções por meio das respectivas referências usadas, no corpo do texto ou nas notas de rodapé. As citações mais longas no corpo do texto serão restritas aos tópicos e teorias que estejam relacionados os conhecimentos específicos da Área de Letras, para não nos determos na seara de debater o que é defendido nas Ciências e seus paradigmas em relação a todos os tópicos aqui trazidos, com o risco de perder o foco da discussão e da reflexão que desejamos propor.

Para as muitas respostas à pergunta do que nos diferencia dos outros animais, Mia Couto começa sua “interinvenção” mencionando um conto, que nunca publicou, em que uma mulher

91 A pesquisadora também é formada em Ciências Biológicas, pela USP (2003).

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com uma doença em fase terminal pede a seu marido que lhe conte uma história em uma língua desconhecida. Ela justifica que o emprego dessa língua desconhecida é para apaziguar suas dores: “Que eu preciso tanto de não compreender nada!” (COUTO, 2009: 9). O narrador relata que o esposo se sente ridículo falando em um idioma inventado “[...] como se a si mesmo desse provas da incapacidade de ser humano” (COUTO, 2009: 9).

A partir deste pequeno trecho iniciaremos nossa reflexão sobre a língua. Podemos, em um primeiro momento, inferir que é do senso-comum que o pensamento humano é estruturado pela língua e pela linguagem92: “Não há sequer como compreendermos o mundo se não for por meio do complexo cognitivo língua/linguagem, talvez daí venha a ideia de que o marido se sentiu “ridículo” “como se desse provas da incapacidade de ser humano”. Falar uma língua é algo genuinamente humano.” (AVELAR, 2018: 158). E como sempre falamos com alguém, nem que esse alguém em última instância sejamos nós mesmos, falar uma língua é algo essencialmente social.

Embora a mente funcione de maneira global93, o pensamento é linearizado em uma cadeia temporal para que haja a fala. Nossa cognição faz com que as palavras sejam emitidas umas após as outras, em uma corrente. Sendo assim, aquele pensamento difuso torna-se uma sequência temporal que nos propicia falar e nos comunicar socialmente uns com os outros. Adquirimos linguagem desde os primeiros dias de vida, um bebê por exemplo, ri, chora, bate palminhas, faz caretas, mostra a língua, dança, etc. - mas a aquisição de uma ou mais línguas

92 Há um debate “[...] acerca das relações entre pensamento e linguagem. Esta discussão possui como pano de fundo a noção de primazia: o pensamento é anterior à linguagem ou a linguagem é anterior ao pensamento? Duas abordagens alternativas são propostas para responder a esta pergunta. A primeira delas, denominada "visão comunicativa acerca da linguagem" (VCAL) propõem a primazia do pensamento em relação à linguagem. A segunda chamada "visão supra comunicativa acerca da linguagem" (VSAL), postula que o desenvolvimento do pensamento é posterior à linguagem. As evidências empíricas disponíveis até o momento não permitem que qualquer uma das hipóteses seja refutada em definitivo [...]” (DA SILVEIRA; PERGHER; OLIVEIRA, 2005: s/p) 93 “O funcionamento global do cérebro, e não um funcionamento “por partes” ou regiões anatómicas isoladas, está na base do funcionamento cerebral “normal” [...] O cérebro funciona de forma global e unitária. Há alguns anos considerava-se que uma área cerebral era responsável por determinada função. A avaliação neuropsicológica baseava-se quase exclusivamente na identificação e localização de lesões cerebrais focais. Hoje sabe-se que os processos cognitivos e os comportamentos resultam da interdependência entre várias regiões cerebrais, ainda que uma determinada zona no córtex cerebral seja muito importante em determinada função mental (ou função cognitiva). O reconhecimento do funcionamento cerebral holístico está na base da Neuropsicologia contemporânea, para a qual muito contribui Alexander Luria (1966). Luria acreditava que o desenvolvimento das funções mentais (funções cognitivas ou corticais superiores) requeria a interação do desenvolvimento neurológico normal e de estímulos ambientais específicos de natureza cultural, histórica e social. O resultado dessa interação seria o funcionamento cortical superior, como por exemplo a linguagem, a memória, o pensamento abstrato.” (FUNCIONAMENTO GLOBAL DO CÉREBRO, 2016: s/p).

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leva anos para ocorrer de fato. Uma criança com desenvolvimento típico94, ou seja, sem nenhuma intercorrência de aprendizado que a faça não obter o que é esperado para aquela fase de seu desenvolvimento, só será proficiente em seu idioma materno entre os 3 e os 4 anos de idade, isso somente no aspecto oral, sem considerarem-se outros elementos formais como a gramática, aprendida posteriormente na escola.

Também já parece ser do senso-comum, a ideia propagada por muitos estudos que caso um humano não seja exposto a nenhuma língua na primeira infância, há o risco de ele nunca adquirir a habilidade de falar de maneira efetiva e comunicativa95 comprometendo sua capacidade de compreender o mundo ao seu redor devidamente, ou seja, sua habilidade comunicativa social poderá ficar comprometida. A fala depende tanto do suporte físico em perfeito funcionamento – aparato fonador e auditivo – quanto da imersão no mundo de significados e signos que compõem uma língua, relacionado ao pensamento simbólico, portanto; mas acima de tudo a fala necessita do gatilho social para ocorrer: ouvir a língua sendo falada pelos outros. Talvez por isso as crianças isoladas tenham mais dificuldade em falar, existindo ou não um período crítico na aquisição da linguagem, como a que é enfrentada pelos surdos que não dispõem desse gatilho por motivos físicos.

Quanto ao mundo dos signos, Roland Barthes, semiólogo, crítico literário e filósofo que, entre outras coisas, fez parte da escola estruturalista francesa (2004:15), afirma em uma de suas reflexões: “[...] os signos de que a língua é feita só existem na medida em que são reconhecidos, isto é, na medida em que se repetem; o signo é seguidor, gregário; em cada

94 Em Ciências e em relação ao aprendizado no geral, fala-se em desenvolvimento típico (e não mais “normal”) e atípico – este último ocorre em crianças com condições de nascença, como indivíduos do espectro autista, com paralisia cerebral, e em outras situações em que o esperado não é atingido. Isso quer dizer que caso não seja obtido o nível de aprendizado e os resultados esperados para aquela faixa etária ou do desenvolvimento, chama-se de desenvolvimento atípico. (LOPES, A. P. F. A., 2016: 22) 95 “Eric Lenneberg sugeriu que há um período crítico para a aquisição da linguagem, que começa no início do primeiro ano de vida e termina próximo à puberdade. Lenneberg argumentou que seria difícil, ou até impossível, uma criança que ainda não tivesse adquirido a linguagem fazê-lo após aquela idade [...] Estudos de caso como os de Genie [menina de 13 anos achada isolada no subúrbio de Los Angeles 1970] e Victor, o menino selvagem de Aveyron, ilustram a dificuldade de aquisição da linguagem depois dos primeiros anos de vida; entretanto, por haver tantos fatores complicadores, eles não permitem chegar a conclusões definitivas sobre a possibilidade dessa aquisição. Por causa da plasticidade do cérebro, alguns pesquisadores consideram os anos que antecedem a puberdade um período mais sensível que crítico para o aprendizado da linguagem. As pesquisas de imagens do cérebro revelam que, apesar de as partes do cérebro mais adequadas ao processamento da linguagem serem danificadas no desenvolvimento da linguagem próximo ao normal pode continuar à medida que outras partes do cérebro assumem o comando.” (HÁ UM PERÍODO CRÍTICO PARA A AQUISIÇÃO DE LINGUAGEM?, 2013: s/p).

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signo dorme este monstro”. Este monstro a que Barthes se refere nos meados da década de 1960, quando ajudou a redefinir a Semiologia, pode ser interpretado como a gama de significados que os significantes podem adquirir nos mais variados contextos. Para podermos compreender os signos de uma ou mais línguas, a definição dos conceitos é um fator determinante, os conceitos de língua e linguagem são relevantes já que têm significados distintos no conhecimento específico da área.

Em seus estudos, Ferdinand de Saussure, linguista suíço, cujos conceitos foram base para a citada escola estruturalista da linguagem, preocupou-se em esclarecer a diferenciação entre os dois termos – língua e linguagem - nos cursos de Linguística que ministrou entre 1907 e 1910, na Universidade de Genebra. Seus ensinamentos foram compilados juntamente com outros conceitos da área em 1916, por dois de seus alunos Charles Bally e Albert Sechehaye, no livro que chegou a nós como Curso de linguística Geral, livro seminal da Linguística. A linguagem é considerada por Saussure como mais ampla, uma faculdade humana; já a língua é um produto social que a linguagem comporta, sendo constituída por convenções que devem ser aprendidas pelos falantes, chamamos atenção aqui para o fato de as convenções serem aprendidas socialmente: Mas o que é a língua? Para nós, ela não se confunde com a linguagem, é somente uma parte determinada, essencial dela, indubitavelmente. É, ao mesmo tempo, um produto social da faculdade de linguagem e um conjunto de convenções necessárias, adotadas pelo corpo social para permitir o exercício dessa faculdade nos indivíduos. (SAUSSURE, 2004: 17)

A língua é, sobretudo, uma característica intrinsecamente humana e não a linguagem, pois “[...] o exercício da linguagem repousa numa faculdade que nos é dada pela Natureza, ao passo que a língua constitui algo adquirido e convencional” (SAUSSURE, 2004:17), e se essa “repousa na Natureza” como afirma Saussure, também pode estar presente em outros animais; já língua ao constituir-se em algo “adquirido e convencional”, reside no mundo social da cultura. A linguagem é uma faculdade, inata, portanto; a língua, um produto social adquirido pelo aprendizado, que permite o exercício dessa faculdade.

Embora tanto a esfera biológica – do funcionamento cognitivo cerebral - quanto a social (para que a comunicação realmente ocorra entre as partes) sejam imprescindíveis no caso de se falar uma ou mais línguas, queremos frisar que essa porção social, de convivência com as línguas faladas e escritas, de transmissão de convenções, etc. – faz-se igualmente essencial para o bom funcionamento da língua/linguagem. Vide os muitos casos reportados tanto na literatura

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específica quanto na mídia, de problemas em qualquer no desenvolvimento da língua/linguagem, ocasionados pela falta de interação social com os membros de nossa espécie e o que eles resultam para o aprendizado das línguas (notas de rodapé 85 e 88).

Na reflexão mais ampla que queremos propor aqui – a que faz uma interface das Ciências Biológicas com as Humanas –, gostaríamos de pontuar que as linguagens animais são variadas e distintas das nossas próprias linguagens (no plural), pois não podemos, obviamente, dizer que haja apenas uma linguagem humana já que são muitas as linguagens humanas: a corporal, a facial, a de sinais, a artística em suas muitas vertentes, e assim por diante. O que diferencia, então, a “nossa linguagem” da dos demais animais?

Muitas espécies utilizam-se de linguagens para comunicação e passam seu conhecimento diretamente para seus descendentes. O que nos diferencia deles, dentre outras coisas, é a capacidade de deixar o conhecimento perpetuado, transmitindo nossos ditos por algum tipo de mídia, deixando-os disponíveis para qualquer um acessar em algum outro momento que não aquele momento presente, nem que seja por meio de uma tradição oral. É a língua, seja ela oral ou escrita, e não a linguagem que nos diferencia, pois é ela que permite que passemos nosso conhecimento à diante sem a necessidade de interação direta, por meio de inscrições rupestres, papiros, livros, filmes, gravações, internet, por meio das estórias, mitos que contamos etc. É, sobremaneira, a língua que nos identifica como espécie, e lembremos, leva-se em média de 3-4 anos para que um filhote humano típico se torne realmente humano no sentido de adquirir a língua, que o identifica como tal (AVELAR, 2018: 159).

Alguns podem contra-argumentar que nas muitas linguagens artísticas - em pintura, por exemplo, que engloba desde a Arte Rupestre, até a mais refinada exposição de Arte Clássica, passando pelas controversas instalações de Arte Moderna e Contemporânea - não são língua, mas linguagem. Elas, igualmente, seriam acessadas de maneira não direta, pois sobrevivem a seus autores. Podemos rebater que dificilmente elas chegam a nós sem o suporte da língua, com a óbvia exceção as artes anteriores a escrita, sejam nas instalações, nos livros, na internet, enfim, a língua permeia praticamente tudo o que fazemos. Se pensarmos em uma apresentação de ballet, na linguagem da dança o suporte verbal dificilmente é protagonista, porém até mesmo nessa expressão o benefício da língua faz-se sentir, ora no encarte distribuído ao público, ora na fala do apresentador do espetáculo, na narração do vídeo feito pela companhia de dança, ou, em última instância, na orientação dada pelo diretor durante os

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ensaios que passaram-se antes mesmo da apresentar existir. A língua se faz presente em muitas esferas da linguagem.

Não é somente a língua - embora esta seja mais singular - que nos diferencia dos demais seres vivos, a linguagem humana caracteriza-se e diferencia-se da linguagem animal por ter simbolismo, ou seja, por possuir a capacidade de formular e interpretar um signo de forma convencional. A linguagem das abelhas, por exemplo, traduz-se pela dança, pelo movimento, sem haver um aparelho fonador envolvido, não há nela uma capacidade de articulação. A mensagem passada pelas abelhas não provoca o que podemos chamar de resposta propriamente dita, e sim uma conduta. A linguagem das abelhas não se decompõe em elementos menores que possam ser analisados, como os códigos e sinais, os conteúdos, fixos e variáveis, tal qual ocorre com a linguagem humana.

Ainda em uma abordagem de cunho linguístico e agora com um viés mais cultural, quando comparamos os termos língua e linguagem em diferentes idiomas nos deparamos com universos culturais distintos. Em inglês, por exemplo, não há duas palavras para os termos: language é usado para os dois, língua e linguagem. Isso implica em dizer que na(s) cultura(s) de língua inglesa um único termo mobiliza pelo menos dois na(s) cultura(s) de língua portuguesa, sendo que nos restringimos somente a essas duas culturas. Podemos, para evitar uma possível ambiguidade, utilizar-nos do termo idioma, ao invés de língua, para compreendermos que os termos língua e linguagem (language) existem como parte de universos culturais mais amplos.

Se tomarmos como referência o axioma de que língua é cultura, pela lógica, língua/linguagem, ou language, seriam, então, cultura (culture). Ao recorrermos novamente a Mia Couto para tentar desatar esse nó cultural sobre os termos língua/linguagem/cultura, Couto aciona sua porção poeta e liga a linguagem à condição humana, e nós imbricaremos mais a reflexão ao adicionar que a condição humana está condenada à língua/linguagem/cultura: “Nascemos e morremos naquilo que falamos, estamos condenados à linguagem mesmo depois de perdermos o corpo. Mesmo os que nunca nasceram, mesmo esses existem em nós como desejo de palavra [...]” (COUTO, 2009:11). Talvez seja melhor ilustrar a questão da relação entre a língua - em seu significado amplo língua/linguagem/cultura - e os seres humanos por meio do empréstimo da visão de uma pessoa que estuda as sociedades. O sociólogo indiano André Béteille escreveu: “Conhecer uma língua nos torna humanos; sentirmo-nos à vontade em mais que uma língua nos torna civilizados’” (BÉTEILLE apud COUTO, 2009: 20).

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Se a capacidade de passarmos nosso conhecimento sem a necessidade da interação direta com os outros membros de nossa espécie pode ser considerada uma marca da espécie humana, o que dizer das sociedades ágrafas? Seriam elas “menos humanas”? Elas têm seu conhecimento perpetuado na oralidade, possuem tanto a capacidade da linguagem quanto da língua, e o mundo oral, da fala, permite que o conhecimento seja passado para as futuras gerações por meio de seus, ritos, lendas, estórias, sem que quem as cunhou tenha que interagir diretamente com seus descendentes. O conhecimento perpetua-se por meio dessas interações não diretas e, assim, diferencia a espécie humana das demais. Mia Couto resolve a questão novamente como poeta: “A oralidade é um território universal, um tesouro rico de lógicas e sensibilidades que são resgatadas pela poesia” (COUTO, 2009:19). Nesse universo ágrafo somos todos analfabetos. Sabemos ler os livros, mas não sabemos mais ler o mundo, as chuvas, os bichos, sendo biólogos ou não. Mia Couto, também biólogo, resume: “Nesse universo de outros saberes sou eu o analfabeto [...] Nessas visitas que faço à savana, vou aprendendo sensibilidades que me ajudam a sair de mim e afastar-me das minhas certezas” (COUTO, 2009:12).

Essas linguagens concretas, que não sabemos utilizar, deveriam ser nossas principais ferramentas de inserção e atuação no mundo. Na atualidade, devido a tantos problemas ambientais e econômico-sociais gerados pelas atividades humanas predatórias, parece ser importante lembrarmo-nos de que há uma circularidade que torna imperioso que dominemos língua/linguagem para navegarmos apropriadamente nesse mundo cultural que criamos e nesse mundo de natureza que estamos paulatinamente apagando. Como se precisássemos voltar ao nosso lado mais primitivo e próximo da natureza, nossa porção que nos iguala aos demais animais, nossa cultura primitiva, ágrafa, para que possamos nos esquecer de nossos universos de crenças, nossas línguas, identidades e culturas a fim de termos contato com a Natureza e de termos a capacidade, novamente, de ler e entender seus sinais e suas variadas linguagens.

Mia Couto afirma sobre a visão antropocêntrica que perdura há séculos: “Na realidade, as coisas não nos rodeiam, nós formamos com elas um mesmo mundo, somos coisas e gente habitando um indivisível corpo” (COUTO, 2009:18). Precisamos aprender novamente a nos comunicar com o mundo ao nosso redor, com o nosso corpo indivisível, seja por meio das línguas, seja por meio de linguagens. É necessário reaprendermos a nos comunicar com este

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mundo que não é virtual, mas real, e que está sempre nos enviando mensagens que não temos mais habilidades de ler, ou talvez, estejamos muito distraídos com outras coisas para fazê-lo (AVELAR, 2018: 160). Não há como separar a espécie humana das demais e do planeta, assim como não há como separar a língua da cultura da qual emergiu, formamos, assim, sociedades culturais entre os humanos e uma comunidade planetária com os demais seres vivos do Terra.

Terry Eagleton (2005:55), filosofo e crítico literário britânico acredita que a cultura96 seja “[...] o complexo de valores, costumes, crenças e práticas que constituem o modo de vida de um grupo específico”, sendo que a língua e a linguagem desenvolvem-se dentro desse complexo de onde surge a identificação, ou identidade, do indivíduo. A cultura como um todo, enquanto instância mais ampla da linguagem/língua, é que pode ter ajudado na separação da espécie humana das demais, colocando o homem no centro por meio de seus discursos, estudos e filosofias, identificando-nos. A recente reflexão acerca do papel do homem na devastação da natureza e na observância dos males socioeconômicos do capitalismo predatório pode levar-nos a um repensar, de fato, da visão antropocêntrica, e não somente no discurso, o que faz com que mais e mais pessoas passem a pensar como Mia Couto, e tal como nós mesmos, que o homem é apenas mais uma peça da grande engrenagem chamada Planeta Terra.

As palavras constituem a realidade de um povo, por isso cada cultura é uma realidade única, que apenas é diferente das demais realidades também únicas. Falar um idioma diferente é “poder visitar a intimidade do outro” para Mia Couto (2009:19), pois cada um tem a(s) língua(s) que o identifica(m). Cada forma de passarmos uma mensagem exige uma postura diferente, uma outra identidade, que assumimos naquele contexto. As muitas identidades que temos, as línguas que falamos, as muitas posições que assumimos, acabam por nos singularizar dentro do nosso meio social.

O mesmo ocorre com as palavras, elas são singulares em suas acepções e, em nossa análise, os que a trabalham, os escritores, têm como ofício arranjá-las de maneira a alcançar novos sentidos e efeitos, ou seja, novas identidades para elas naquele arranjo especial. Mia Couto afirma sobre os que têm a palavra como ofício: “Não existe escritor no mundo que não tenha de procurar uma identidade própria, entre identidades múltiplas e fugidias” (COUTO, 2009:19), assim, tanto a palavra, constituinte da língua, quanto a língua, podem ser vistas como fontes de

96 Pelo mesmo motivo que não iremos abordar as múltiplas definições de bilíngue e bilinguismo, também não iremos nos debruçar na tarefa das múltiplas definições de cultura. Trouxemos a definição de Eagleton porque ela é ampla e complexa e alinha-se às demais definições teóricas dos temas aqui debatidos.

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uma identidade. Na Literatura, especialmente, um signo pode ser trabalhado e alcançar novos significados em uma língua. Mia Couto em suas obras ficcionais, e nas não-ficcionais, utiliza o signo de formas novas e leva-nos a enxergar a relação de língua e linguagem de fora do campo teórico e mais próximo da vida comum, em que os signos são reinventados a todo o momento. As muitas identidades que temos, as línguas que falamos, as muitas posturas que assumimos, acabam além de nos singularizar por nos identificar. A língua é o produto que nos identifica, que identifica a espécie humana.

2.2 Um pouco mais dos estudos da cultura, do discurso e dos teóricos que definem a identidade cultural

Inferimos que a língua é a matéria comum exatamente por ser o veículo que nos permite transitar na cultura produzida nas diferentes áreas de conhecimento, o que faz com que as questões de texto e discurso também perpassem todas as demais temáticas, independendo do assunto a ser debatido. A língua/linguagem pela perspectiva do discurso é instável e indeterminada97, a identidade, construída no discurso, também será, embora não seja consequência dela.

A mistura cultural, ou como veremos no subitem 2.4, a hibridização ou mestiçagem, é um dos pontos trazidos por Stuart Hall, sociólogo jamaicano, às discussões contemporâneas de cultura e identidade. Autor da sociologia que também refletia sobre as línguas em contato em contextos culturais múltiplos, o teórico cultural, é tido como um dos fundadores dos Estudo Culturais. Por seus estudos podemos entender que a cultura abarca diversos níveis em sua formação, como o nível social, o econômico e o político. A identidade é vista como um lugar que se assume, uma costura de posição e de contexto, um sentimento de pertencimento, e não uma essência ou substância a ser examinada, ou em suma, a identidade cultural é uma discussão profunda em um diálogo crítico com correntes do pensamento contemporâneo.

Durante a vida nós passamos por um longo processo de (des)identificação baseado na relação intrínseca que existe entre língua/linguagem, cultura/identidade98. Tomaremos a definição de Stuart Hall de identidade cultural: “As identidades culturais são pontos de identificação, os

97 Abordamos isso na Introdução. 98 A discussão de identidade e identidade cultural é demasiado ampla para detalharmos o tema e por isso nos valeremos da definição proposta por Hall, embora aprofundemos um pouco essa teoria e traremos mais definições de outros autores no subitem 2.3.

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pontos instáveis de identificação ou sutura, feitos no interior dos discursos da cultura e da história” (HALL, 1996: 70); quer dizer, a identidade cultural está relacionada às especificidades que um indivíduo ou grupo atribui a si pelo fato de sentir-se pertencente a uma cultura específica.

Para Hall, possuir uma identidade cultural é estar em contato com o núcleo imutável e atemporal que liga o passado ao futuro e conecta-se, também, ao presente, numa linha ininterrupta, um “cordão umbilical” que chamamos de “tradição”. Tal identidade cultural é subordinada aos mitos fundadores de cada nação ou grupo que “[...] como todo potencial real dos nossos mitos dominantes [têm a força] de moldar nosso imaginário, influenciar nossas ações, conferir significados às nossas vidas e dar sentido à nossa história” (HALL, 2003: 29). A cultura molda nosso imaginário e vidas, insere-nos em um povo e em uma história, em seus mitos, em suma, em uma filiação ou tradição. A identidade cultural seria, assim, subordinada aos mitos fundadores e as tradições de cada nação ou grupo: As identidades culturais são pontos de identificação, os pontos instáveis de identificação ou sutura, feitos no interior dos discursos da cultura e história. Não uma essência, mas um posicionamento. Donde haver sempre uma política da identidade, uma política de posição, que não conta com nenhuma garantia absoluta numa lei de origem sem problemas, transcendental (HALL, 1996: 70).

Hall compartilhava da ideia de que a identidade é desenvolvida sob dois enfoques maiores: o primeiro que concebia uma cultura partilhada, quer dizer, os sistemas culturais unificariam os indivíduos em quadros de referência ou práticas de representação e ação99 – cujos exemplos seriam os movimentos sociais, feminista, anticolonialista, antirracista, anti-homofóbico, etc. (HALL, 1996: 69); o segundo enfoque diz respeito ao “que nós realmente somos” – e à intervenção da modernidade – “o que nós nos tornamos”, ou seja, Hall defende que as identidades culturais provêm de alguma parte, possuem histórias e sofrem modificações constantes (HALL, 1996: 69). Esses dois prismas colocam a discussão das identidades culturais, respectivamente, na perspectiva das demais culturas e suas representações e da história.

Esses enfoques ajudam-nos a perspectivar a ideia de identidade cultural ao longo do tempo conforme mencionamos na Introdução dessa tese: a identidade cultural do sujeito do Iluminismo, a do sociológico e a identidade do sujeito pós-moderno. A identidade do sujeito iluminista compreende o ser humano como um indivíduo unificado, centrado, dotado de razão,

99 Ver Canclini subitem 2.3.

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de consciência e ação; esse sujeito era detentor de uma identidade que surgia em seu nascimento e permanecia a mesma ao longo da vida. A identidade do sujeito sociológico seria formada na interação entre o sujeito e a sociedade, é vista como a identidade de um indivíduo não autossuficiente ou centrado, mas formada na relação com outras pessoas, mediada por outros valores, sentidos e símbolos. Já a concepção do sujeito pós-moderno compreende o sujeito como um ser sem uma identidade fixa, essencial ou estável, formada e transformada histórica e continuamente de acordo com a cultura que permeia o indivíduo (HALL, 2003: 46).

A identidade cultural como diáspora seria, assim, construída por meio da diferença entre o EU/TU em relação ao outro TU estabelecida no sistema comunicacional/discursivo que ainda tem como elementos o AQUI/AGORA – os quatro elementos da dêixis enunciativa. O outro/ele(s) seria o nosso exterior, detentor de algo que não possuímos, algo que falta em nós e que nos diferencia deles. Nossa unidade identitária seria constituída no interior dessa relação de exclusão, sendo que o que não nos constitui, o outro/ele(s), pode desestabilizar o jogo de poder instaurado na relação. Para Hall (2003: 29), a identidade baseia-se nesse ato de exclusão e seria resultado da poderosa hierarquização entre os polos resultantes, quer dizer, a identidade nasceria da relação estabelecida entre EU/TU e o outro TU e da diferença entre ambos.

Se nos assumimos alguém, ou que algo faz parte de nossa identidade, assumimos também que não somos uma série de outras coisas. Essa é uma questão essencialmente discursiva, residindo aí a ideia da diferença a que se refere Hall. Ou seja, a identidade só existe na língua/linguagem, é um produto sociocultural e não um ser da natureza, e só existe e tem sentido dentro de seu sistema de significação formado pela diferença: eu sou o que o outro não é. A identidade e a diferença são interdependentes e partilham a importante característica de serem resultados de atos de criação linguística que têm de ser ativamente produzidos - sendo criações sociais e culturais, portanto. A questão da identidade para Hall, enfim, deve ser entendida “sob rasura” (HALL, 2003: 238), ou em palavras bem simplificadas diante de toda a argumentação que ele apresenta, pela diferença daquilo que ela não é.

Uma analogia muito comum para entendermos o que é a identidade pela diferença é feita entre os linguistas que se valem da Teoria de Valor do Signo de Saussure (2004: 79) e de sua explicação sobre o signo linguístico. O signo linguístico só adquire valor na cadeia infinita de diferenças daquilo que ele não é. Essa teoria postula que os signos estão numa relação

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diferencial e negativa entre si dentro do sistema de língua. Cada signo só adquire valor na medida em que não é um outro signo qualquer: um signo é aquilo que os outros signos não são. Para deixar a ideia clara também para aqueles que não sejam da Área da Linguística, tomemos um exemplo de como diferenciar um cão de um homem. A característica positiva seria ambos serem mamíferos e por isso não os distinguiria. Já a característica de ser quadrúpede é positiva no cão e negativa no homem, o que leva à distinção entre ambos. Existindo outros animais com as mesmas características (quadrúpede, por exemplo, em gato e cachorro) outros elementos devem ser considerados para que se achem as diferenças entre ambos. Um fato é claro, certamente, o resultado não seria o homem, pois este possui característica ser bípede.

A identidade cultural, embora heterogênea, carrega em si “traços de unidade essencial, unicidade primordial, indivisibilidade e mesmidade” (HALL, 2003: 29), essa unidade essencial é formada pela língua. O último termo mesmidade, um neologismo, é de difícil entendimento a priori. A palavra mesmidade é originada do termo mesmo - o filósofo Gilberto de Mello Kujawski traça um paralelo em que elucida bem o sentido da palavra mesmidade empregado por Hall, em um texto sobre a identidade nacional: O paralelo com a evolução da pessoa física é sugestivo e elucidativo. Eu atravesso várias idades, a infância, a adolescência, a maturidade, a velhice, talvez sofra transformações acentuadas de caráter e de temperamento, para melhor ou para pior, mas sou sempre eu mesmo, não me altero em minha mesmidade. Também os povos passam da infância e da juventude para a maturidade e a velhice, recebem influências externas que transformam seus usos, seus valores, suas instituições, mas, no fundo, prosseguem fieis a si mesmos. Também não dissolvem sua mesmidade. (KUJAWSKI, 2005: 14).

A nossa mesmidade individual (e até a coletiva de um povo) tem como fundação o complexo cultura/língua/linguagem. Mesmo que venhamos a adquirir ou a aprender uma ou mais línguas em nossa história seremos nós mesmos. Nossa mesmidade é o que nos torna únicos e ao mesmo tempo é o que nos permite transitar entre as culturas do mundo, identificando-nos, dando a nós mesmos uma identidade cultural única.

Uma questão central nesta pesquisa, o papel que a língua ocupa por ser parte essencial da construção da identidade (de um indivíduo, de uma nação, etc.) fez-nos considerar a publicação na Revista científica Animus, O conceito de identidade nos Estudos Culturais britânicos e latino- americanos: um resgate teórico, escrito por Marcielly Cristina Moresco e Regiane Ribeiro 2015, e seu resumo sobre o que há de comum em todas as definições de identidade na pós- modernidade: a identidade não é mais vista como algo fixo, sendo o que muda nessas

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definições a perspectiva dada pelo teórico, embora a identidade seja sempre gerada pela heterogeneidade da cultura e do meio social: Entende-se a identidade como algo não fixo, sempre em (re)construção, e sob diversas perspectivas: a partir de Hall é possível perceber a identidade como diáspora, por Bauman como uma ambivalência líquida, a identidade como um problema de caráter binário por Bhabha, como multiplicidade de tempo e espaço com Martín-Barbero e a identidade como hibridismo por Canclini. Por fim, a identidade é movida pela incerteza, pela crise (MERCER, 1990; BHABHA, 1998; BAUMAN, 2001; HALL, 2001, WOODWARD, 2014). É construída pela heterogeneidade cultural e social (CANCLINI, 1995; MARTÍN-BARBERO, 1997, apud MORESCO; RIBEIRO, 2015: 180).

Como vemos pelo excerto acima, os autores propõem as definições de acordo com suas próprias vivências, leituras e reflexões, tal qual ocorre com todos os demais autores de todas as áreas. A discussão, a conceituação, a proposição de uma nomenclatura ou paradigma está inerentemente ligada ao sujeito que a propõe, à sua própria identidade, mas acima de tudo, ligado à sua língua e cultura, o que nos faz voltar para o mesmo ponto: a língua é o veículo que nos permite definir a identidade (cultural).

Tendo ciência das muitas definições de identidade cultural, valer-nos-emos principalmente das ideias de Hall e de nossas leituras para compreenderemos que a identidade cultural, tal qual a vida social como um todo, ao mesmo tempo escapa e é captada pela língua/linguagem e que os estudos da cultura fazem-se na própria tensão entre a discursividade e as demais questões que importam, o que nos faz perceber que é impossível abarcar todos os questionamentos pela textualidade crítica.

Os termos pelos quais entendemos a identidade cultural, baseados em nossas leituras dos teóricos já trazidos nesta tese, são resumidamente os seguintes: a identidade cultural compõe- se de uma montagem de imaginários e de significados. É formada no discurso, na língua/linguagem, nos símbolos, nos sinais e nos textos – conceitos todos aplicados à sistemas de significação, que nunca são estáveis e que mudam de acordo com o tempo, o espaço e a ação humana. Ela pode ser coerente, disjuntiva, sobreposta, controversa, contínua, descontínua, ou, em outras palavras, a identidade cultural é sempre transitória, transformadora, aberta e instável. Sem uma origem, um centro, ou uma causa última. O complexo língua/linguagem é formado na cultura o que faz com que a identidade cultural seja igualmente transitória, instável e dinâmica. A cultura/língua/linguagem tornam-se, assim, uma fonte para a libertação da identidade cultural, da diversidade, do livre imaginar e da livre expressividade,

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porém dentro de sua multiplicidade a identidade, cultural ou não, é sempre permeada pela língua.

Uma das perguntas de nosso questionário de pesquisa (ver Anexo 1 ou Capítulo 4) é: você considera a língua (materna/aprendida) parte da identidade de um falante? Não detalhamos se seria da identidade relacionada à personalidade do indivíduo, da identidade de um povo, a cultural, de todas elas em associação, devido ao público geral a que a pesquisa se endereçava. Passemos a questão das identidades nacionais na próxima subdivisão.

2.3 O poder econômico da língua e um pouco sobre as identidades nacionais

As transformações na língua/cultura, ou na línguacultura (languaculture), termo cunhado pelo antropólogo e linguista norte-americano Michael Agar (1994), visto na Introdução, não são feitas somente ao nível individual, como apontamos sobre a identidade cultural, ou no nível artístico, tal qual na Literatura. Quando as línguas entram em contato percebemos forças que não podem ser facilmente estruturadas agindo ali, como a força econômica. A língua desse poder econômico é imposta como oficial, sendo, portanto, obrigatória. As demais línguas/linguagens, porém, as quais sempre estiveram ali para comunicar - da chuva que viria, até um dialeto utilizado por uma pequena tribo – retro influenciam a língua oficial de tal modo que esta adquire uma nova camada de identidade. A identidade cultural individual passa assim a ter também uma dimensão na sociedade.

As identidades culturais – étnicas, nacionais, de gênero, raciais, e até as identidades próprias - são socialmente produzidas, já que para afirmar que somos isso ou aquilo, necessitamos da observação, comparação, valoração, julgamento em relação ao outro, ou seja, nos fiamos na nossa diferença em relação ao outro para construir nossa identidade100. Como vemos, tudo está imbricado em sua essência. As subdivisões, insistimos, tendem a ser sempre póstumas. As questões da esfera social, das quais ressaltamos o poder econômico da língua, subsidiem às questões de construção de cultura e identidade.

Quando ampliamos a visão da construção de identidades por meio da língua e da cultura, para as identidades culturais das sociedades, lembramos Mia Couto quando questiona: “[...] quanto

100 Como visto no subitem anterior 2.3.

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às culturas nacionais como comunidades imaginadas o que está acontecendo à identidade cultural na modernidade tardia?” (COUTO, 2009: 62). Em outras palavras, como as identidades culturais nacionais estão sendo afetadas ou deslocadas pelo processo de globalização? O autor destaca que as nações são como comunidades imaginadas, que são perpetuadas pela memória do passado, pelo desejo de viver em conjunto do presente e pela necessidade da perpetuação de sua herança no futuro.

Quanto à existência de uma cultura nacional como uma identidade unificadora101, Mia Couto afirma que as culturas nacionais, na verdade, "[...] são atravessadas por profundas divisões e diferenças internas, sendo unificadas apenas através do exercício de diferentes formas de poder cultural" (COUTO, 2009: 62). O poder cultural está atrelado ao poder econômico e os dois estão conectados ao poder da língua, que os subjaz. Tais poderes são exercidos para que os interesses, dentre eles os socioeconômicos, sejam garantidos, pois como já pontuamos não existem discursos neutros102. As “divisões e diferenças internas” referidas por Couto são de ordens diversas (linguísticas, culturais, econômicas, sociais etc.) e encontram-se tanto no nível individual quanto no nível de uma sociedade – causadas por diferenças de língua/cultura e identidade – podendo levar a desestruturações nas culturas nacionais que podem ficar desunidas em sua identidade nacional.

As culturas nacionais não passam ao largo das disputas, sendo que estas contendas acabam por imprimir camadas identitárias tanto nas culturas (nacionais e outras), quanto na própria sociedade e língua. É claro para nós que essas questões de identidade/identidade nacional são muito mais complexas e não acreditamos, tão pouco, termos esgotado a questão. Ao contrário, nossa intenção aqui é apenas pontuar, gotejar nesse amplo tema que as questões linguísticas, por serem de ordem social, permeiam todas as demais discussões, como as de ordem identitária e econômica.

Néstor García Canclini é um antropólogo argentino que entende as identidades como narrativas que se constroem e reconstroem-se entre os diversos atores sociais; tais narrativas incluem a presença de conflitos de nacionalidades, etnias, gêneros, e constituem-se em representação e ação103. O autor também desconsidera a existência de uma identidade nacional una na pós-

101 Afinal como pontuamos brevemente em 2.3, as identidades atuais, incluindo as nacionais, estão fragmentadas devido a muitos fatores, dentre os quais destacamos o maior contato que temos com muitas línguas e culturas. 102 Presente no subitem 1.4. 103 Essa mesma visão de identidade que se constitui em representação e ação foi trazida por Hall (ver subitem 2.3)

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modernidade: “[...] não podemos considerar os membros de cada nacionalidade como elementos de uma única cultura homogênea, tendo, portanto, uma única identidade distinta e coerente” (CANCLINI, 2006: 196).

Moresco e Ribeiro em sua pesquisa de identidade cultural de autores britânicos e latino- americanos, afirmam que Canclini e outros autores latinos ecoam em concordância que a mídia contribui na organização das identidades nacionais na América-Latina nessa concepção narrativa que mencionamos no parágrafo anterior. As identidades nacionais na era da globalização formam-se também nos meios eletrônicos e de comunicação, diminuindo a importância dos elementos fundadores e dos territórios, como vemos no trecho como um todo abaixo destacado: Os autores latino-americanos abordados aqui concordam com o fato de que os meios de comunicação, como o rádio na Argentina e o cinema no México e, essencialmente, a televisão no Brasil, contribuíram para a organização da identidade e do sentido de cidadania nas sociedades do continente. A identidade surge, na atual concepção das ciências sociais, não como uma essência intemporal que se manifesta, mas como uma construção imaginária que se narra. A globalização diminui a importância dos acontecimentos fundadores e dos territórios que sustentavam a ilusão de identidades a- históricas e ensimesmadas. Os referentes de identidade se formam, agora, mais do que nas artes, na literatura e no folclore - que durante séculos produziram signos de distinção das nações -, em relação com os repertórios textuais e iconográficos gerados pelos meios eletrônicos de comunicação e com a globalização da vida urbana (CANCLINI, 1995: 124, apud MORESCO; RIBEIRO, 2015: 179).

Segundo o antropólogo argentino e outros autores trazidos por Moresco e Ribeiro (2015) a mídia é capaz de influenciar a identidade nacional de um país. Trouxemos evidências da influência da mídia na formação de opinião dos próprios cientistas104 - dentre as quais destacamos a pesquisa de de Bruin et al. (2015) – podemos supor, assim, que os meios de comunicação são considerados como influenciadores dos três pilares que exploramos nessa tese como um todo: a língua, a cultura e a identidade, nesse caso específico a identidade nacional. Como a identidade nacional faz parte da identidade de um indivíduo a extensão para sua identidade própria pode ser aventada.

Consonante com a visão de perda de importância dos acontecimentos fundadores de Canclini (1995), Mia Couto afirma que o uso poético da escrita também tem sofrido os males do interesse econômico: a disseminação de determinada língua, principalmente em sua forma escrita, está diretamente ligada ao poder econômico que cada nação possui. Mais uma vez ele

104 Abordamos a temática no Capítulo 1.

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faz a relação dos interesses econômicos ao poder de uma língua. Na opinião dele, os critérios de hoje desvalorizam tanto o pensamento, quanto a palavra, em nome do lucro rápido. Isso quer dizer que por uma visão mais biológica aqui trazida por nós, desvalorizam-se exatamente os dois elementos que apontamos como caracterizadores, singularizantes e identificadores da espécie humana: o pensamento e a língua, sendo que é claro que um não existe sem o outro105: Num congresso [WALTIC] que celebra o valor da palavra, o tema da intervenção é o modo como critérios hoje dominantes desvalorizam palavra e pensamento em nome de lucro fácil e imediato. Falo de razões comerciais que se fecham a outras culturas, outras línguas, outras lógicas. A palavra de hoje é cada vez mais aquela que se despiu da dimensão poética e que não carrega nenhuma utopia sobre um mundo diferente (COUTO, 2009:10-11).

É um paradoxo e um contrassenso, pois o homem que julga estar no centro dos acontecimentos do mundo está prejudicando a si mesmo, ao valorizar uma língua devido aos interesses econômicos, a diversidade linguística fica prejudicada. Assim, há perdas de línguas (culturas e identidades). Há aqueles que lutam para salvar espécies, em um paralelo, Mia Couto nos lembra de que há aqueles que lutam para salvar línguas. Ele acredita que as línguas só se salvam se suas culturas se mantiverem dinâmicas, se puderem dialogar e misturar com outras, hibridarem-se: “As línguas e as culturas fazem como as criaturas: trocam genes e inventam simbioses como resposta aos desafios do tempo e do ambiente” (COUTO, 2009:13). As culturas e as línguas, quando em contato, relacionam-se de forma a trocar informações, palavras, costumes, modos de viver.

As relações de troca não são fáceis de serem estabelecidas e tanto língua e cultura, como identidade sobrevivem através de seu uso e de sua utilidade, de maneira análoga ao que ocorre com a manutenção de uma língua em um bilíngue, se a língua não for utilizada, o falante pode perdê-la. Conforme discutido criticamente na história, o continente africano -– Mia Couto é moçambicano - tem sido prejudicado em todas as esferas de diversidade, social, cultural e econômica, devido ao interesse econômico de países desenvolvidos que, historicamente, veem o continente como um local de exploração e não de investimento.

Acreditamos ser relevante acabar essa seção com uma reflexão baseada nas palavras críticas de Mia Couto, que nos chama a atenção para o processo que empobrece a diversidade, depaupera a nossa capacidade de usar a língua e de contar nossas histórias, em suma,

105 Na nota de rodapé 96 há uma discussão científica sobre pensamento e língua.

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compromete nossa capacidade de sermos humanos. Ao invés de lamúrias ou culpas, o autor acredita que todos são vítimas e culpados da castração do poder de criar histórias, dada pelo declínio da diversidade linguística humana: Talvez se esperasse que, vindo de África, eu usasse desta tribuna para lamentar, acusar os outros e isentar de culpas aqueles que me são próximos. Mas eu prefiro falar de algo em que todos somos ao mesmo tempo vítimas e culpados. Prefiro falar do modo como o mesmo processo que empobreceu o meu continente está, afinal, castrando a nossa condição comum de criadores de histórias (COUTO, 2009:10).

Berço da humanidade106, o continente africano, fonte primordial de nossa diversidade, embora não seja o único a sofrer disso, está cada vez mais oprimido social e economicamente ou, em outras palavras, perdendo sua identidade maior: a diversidade. Essas perdas dão-se em todos os níveis, tanto para os humanos quanto para as outras espécies, sendo, portanto, a perda do poder de hibridação uma perda biológica geral - iremos explorar melhor a hibridação no próximo item.

2.4 A língua, cultura e a identidade por uma nomenclatura também biológica: a hibridação

Stuart Hall (1990) utiliza-se de alguns termos biológicos em suas reflexões acerca de língua, cultura e identidade. Ele usa o termo biológico “hibridismo”, “hibridação” ou “hibridização”, encontrados no campo dos Estudos Culturais, em uma de suas reflexões para falar acerca das novas línguas que surgem no mundo. Se procurarmos o vocábulo em um dicionário, encontraremos que a hibridação, termo de nossa preferência nessa tese, é o “cruzamento entre espécies diferentes”. Transpondo para os estudos de Hall, podemos interpretar o termo como a mistura entre coisas diferentes, sejam elas culturas, línguas, identidades ou, simplesmente, palavras.

No livro Identidades Culturais e Diáspora107, Hall (1990) discorre sobre a crioulização ou hibridação da língua inglesa, ou seja, a aparição de línguas chamadas crioulas ou híbridas, os pidgins108. Por essa visão, há uma dinâmica sincrética cultural – quer dizer, em cultura há uma atividade de fusão entre as partes envolvidas – em que os falantes se apropriam criticamente

106 O Homo sapiens, nossa espécie, teve sua origem na África cerca de 300 mil anos atrás. Da mesma forma, todas as espécies mais próximas geneticamente do ser humano são africanas, tais como os bonobos, gorilas e chimpanzés. 107 Cultural Identities and Diaspora. 108 Consultar nota de rodapé 27.

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dos elementos dos códigos das culturas dominantes tornando-os crioulos, desarticulando seus signos e rearticulando seus significados simbólicos. Ele afirma: A força subversiva dessa tendência de hibridação é mais evidente no nível da própria língua onde os crioulos, gírias e o inglês dos negros deslocam, descentralizam e carnavalizam a dominação linguística do ‘inglês’ – a língua- nação do discurso dominante – por meio de inflexões estratégicas, novos acentos e outros movimentos performativos na semântica, sintaxe e códigos lexicais. (HALL, 1990:236). 109

As modificações feitas pelos falantes dão-se em três níveis quando há o surgimento de uma língua pidgin: no nível semântico (ou de significados), no sintático – ou seja, no núcleo duro da gramática – e no lexical, na criação de novas palavras. É a necessidade que promove o aparecimento de usos linguísticos novos. Línguas/cultura em contato geram diversidade, misturas, mestiçagem, hibridações. No nível da língua, essa percepção é sentida mais facilmente, quando, por exemplo, surgem novas palavras; mas língua é cultura, e uma não sobrevive sem a outra. Mia Couto inclusive acredita que a sobrevivência de uma cultura está intimamente relacionada a sua capacidade de hibridizar-se com as demais: “As culturas sobrevivem enquanto forem sujeitas a mudança e elas próprias dialogarem e se mestiçarem com outras culturas” (COUTO, 2009:13).

Quando tomamos o contexto Latino-americano, Jesús Martín-Barbero, semiólogo, antropólogo e filósofo nascido na Espanha, mas que se considerava colombiano, discorre, no prólogo do livro de Guilhermo Orozco (2000), sobre a questão das identidades, dos sujeitos e de seus agentes. Para o autor, a comunicação social é mais ampla e diferencia-se da mera informação por ser impossível reduzi-la ao simples intercâmbio de mensagens. A comunicação social tem em sua constituição a sua especificidade sociocognitiva, quer dizer, tem a capacidade de produzir um sentido comum aos falantes. O que resulta disso é a necessidade de deslocar-se epistemologicamente – no sentido amplo da teoria do conhecimento e no estrito da teoria do conhecimento científico – e metodologicamente o foco da análise comunicativa na direção de identidades sociais dos sujeitos enquanto “agentes das interações comunicativas” (MARTÍN- BARBERO, 2000: 12).

109“Across a whole range of cultural forms there is a 'syncretic' dynamic which critically appropriates elements from the master-codes of the dominant culture and 'creolises' them, disarticulating given signs and re-articulating their symbolic meaning. The subversive force of this hybridising tendency is most apparent at the level of language itself where Creoles, patois and black English decentre, destabilise and carnivalise the linguistic domination of 'English' - the nation-language of master-discourse - through strategic inflections, re-accentuations and other performative moves in semantic, syntactic and lexical codes.”

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Isso significa dizer que a comunicação social se faz entre os sujeitos e, por essa razão, suas identidades devem ser levadas em consideração na análise das comunicações. As identidades não são construídas pelos sujeitos, mas têm sua concepção nessas interações comunicativas que se estabelecem. Para nós, a análise de Martín-Barbero (2000) é especificamente relevante porque leva em consideração os principais aspectos que desejamos explorar teoricamente nessa pesquisa: a comunicação social em sua complexidade que vai além da simples troca de mensagens – como discutido no item 2.1 – ; sua faceta sociocognitiva110 – que abarca a esfera social comum a todos e a produção de sentido aos envolvidos –; e as identidades culturais que emergem nesses agentes promotores da interação comunicativa. Todos esses elementos só se tornam possíveis devido ao veículo comum primeiro: a língua.

Sobre esse mesmo trecho do prólogo de Martín-Barbero as pesquisadoras Moresco e Ribeiro, além do que já mencionamos em relação à comunicação social e as identidades sociais, falam um pouco sobre a institucionalização discursiva dessa interação social – político-econômica e legal –, além da construção da identidade cultural na América Latina que sustenta múltiplas temporalidades e hibridações culturais: [...] a comunicação social diferencia-se da informação em sua impossível redução ao intercâmbio de mensagens, pois o que constituí sua especificidade sociocognitiva é a produção em comum de sentido, então, necessitamos deslocar epistemológica e metodologicamente o foco da análise comunicativa: a) para a institucionalização discursiva, político-econômica e legal da interação social (...); b) na direção da construção de identidades sociais dos sujeitos enquanto “agentes das interações comunicativas” (MARTÍN-BARBERO, 2000, p. 12). Nesse caso, o autor implica que os sujeitos não constroem suas próprias identidades, mas são concebidas a partir de interações comunicativas. Esse olhar permite compreender o modo como a identidade cultural na América Latina é construída. Ela, necessariamente, precisa sustentar essas múltiplas temporalidades e hibridações culturais referidas por Martín-Barbero. (MORESCO; RIBEIRO, 2015: 178).

O termo hibridismo nas concepções de identidade é empregado por outros autores, segundo as mesmas autoras. Como esta parte da pesquisa propõe um entrelaçar entre as Ciências Humanas e Biológicas, focamo-nos no conceito de hibridação de Hall e Martín-Barbero indicados acima em comunicação com as ideias de Mia Couto principalmente. A fortuna crítica sobre o termo hibridismo, porém, é vasta e há muitas pesquisas sobre a identidade cultural híbrida. Não podemos abster-nos, portanto, de mencionar ainda outros autores que se valem do mesmo termo. A pesquisa de Moresco e Ribeiro (2015) traz um panorama desses autores e de suas definições para identidade cultural híbrida. Segundo as autoras (MORESCO; RIBEIRO,

110 A discussão que promovemos no Capítulo 1 mostra que muitos cientistas investigam a sociocognição e os possíveis benefícios do bilinguismo nela.

100

2015: 178) a ideia do hibridismo está presente nas concepções de identidade de Orozco (2006), Hall (2001; 2003) e Bhabha (1998), Canclini (1988; 2006) e Escosteguy (2001), sendo que “Hall lembra que “as nações modernas são todas híbrido culturais” (HALL, 2003: 62, apud MORESCO; RIBEIRO, 2015: 178).

Posto isso, a grande questão sobre a qual passamos a nos debruçar, então, passa a ser a respeito do fato de que muitas pessoas e povos no mundo globalizado, por razões diversas, são provenientes de mais de uma cultura que se hibridizam e misturam-se de muitas maneiras, mas em especial nos próprios indivíduos. Vera L. H. Hanna afirma sobre a hibridação cultural: “Admitir estar em meio a hibridismos culturais implica em portar uma dimensão basculante entre realidades, em apresentar uma ambivalência de sentidos: ser um, ser dois, ser três, ser muitos ao mesmo tempo” (2013: 5). A “dimensão bascular” a que Hanna refere-se é a possibilidade de transportarmo-nos entre estas realidades ou identidades que não são nossas necessariamente por fundação, mas podem ser nossas por convivência com os elementos culturais, dentre eles a língua. Uma das formas mais comuns de sermos híbridos culturais é por meio da língua/linguagem. Ao mudarmos de código linguístico (code-switching), por exemplo, nos permitimos assumir, nem que momentaneamente, diferentes identidades culturais: de nossa língua materna, de nossa segunda-língua, da natureza híbrida de um pidgin que utilizarmos, da mistura de dois códigos linguísticos em concomitância e assim por diante.

Culturas que se fecham e não se misturam com as demais são cada vez mais raras em nosso planeta – vide os últimos bastiões desse isolamento: o Irã, por exemplo, que já goza de uma certa abertura; e a Coréia do Norte. No ano de 2018 houve uma quebra histórica do isolamento cultural norte-coreano. No dia 25 de janeiro de 2018, uma delegação de atletas norte-coreanas de hóquei cruzou a fronteira juntamente com autoridades para o início de treinamentos conjuntos com a Coreia do Sul para a Olímpiada de Inverno (FOLHA DE SÃO PAULO, 2018: s/p). Em fevereiro de 2018, a Coreia do Norte enviou uma delegação de 22 atletas a convite do presidente sul-coreano Moon Jae-in e do COI (Comitê Olímpico Internacional): “Os participantes da Coreia do Norte, incluídos de última hora no evento esportivo, graças a um convite do COI, já que só dois tinham se classificado, se transformaram em atração do encontro, já chamado de “Jogos da Paz”.” (REVISTA VEJA, 2018: s/p).

Após esses sinais de abertura foi previsto um encontro entre o presidente norte-americano Donald Trump e o ditador da norte-coreano Kim Jong-um, porém em março de 2018 esse

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encontro esteve ameaçado. A visita foi cancelada por Trump no dia 24/05/2018 devido a declarações do Presidente norte-coreano, Kim Jong-un, consideradas de "tremenda raiva e hostilidade aberta" (O GLOBO, 2018: s/p). No dia 26/05/2018, no entanto, os presidentes da Coreia do Norte e do Sul, tiveram um segundo encontro histórico dentro de um mês, fato que não ocorria desde a separação das Coreias em 1950, no episódio conhecido como Guerra das Coreias. Nesta reunião surpresa de 26/05/2018, os dois presidentes, da Coreia do Norte e do Sul, discutiram a provável reunião de Kim Jong-un com Trump e uma possível desnuclearização da Coreia do Norte (FOLHA UOL, 2018: s/p).

Na terça-feira, dia 12 de junho de 2018, finalmente, o encontro entre os presidentes Trump e Jong-un ocorreu em Singapura, nele foi assinado um compromisso norte-coreano de completa desnuclearização, foram previstas novas relações entre os países e asseguradas garantias de segurança por parte dos EUA (REVISTA VEJA, 2018: s/p). O encontro foi considerado histórico porque além de ser uma importante sinalização de paz com a possível desnuclearização do país norte-coreano, pode levar a uma quebra do isolamento físico, cultural e econômico da Coreia do Norte, sendo que as Coreias terão a oportunidade de reunir as famílias que ficaram isoladas desde a Guerra das Coreia de 1950 e tentar reestruturar os laços culturais, também por meio da língua coreana comum, que um dia as tornava uma única nação.

A valorização das diversas formas de produzir diversidade, entre elas da língua(gem) e da cultura, fortalece o desenvolvimento dos povos. Tirar a influência linguística de um povo, por meio de seu isolamento, como ocorreu nas Coreias, também significa prejudicar seu desenvolvimento como um todo (AVELAR, 2018: 165) e, para isso, lembremo-nos da cultura de dominação pela imposição da língua praticada na época das Grandes Navegações111 e das perdas de todos tipos dos povos indígenas. A diversidade, a mistura, a hibridação – seja cultural, linguística, identitária ou outra - seria uma vantagem evolutiva da espécie humana para Couto: “O que fez a espécie humana sobreviver não foi apenas a inteligência, mas a capacidade de produzir diversidade” (COUTO, 2009:11).

Os povos africanos, caribenhos e, atualmente, sobretudo os do Oriente Médio – sírios e seus vizinhos – estão em constante imigração e diáspora devido a muitas razões, sendo as principais, porém, geralmente em sua origem, de ordem econômico-social: a pobreza, as guerras, problemas religiosos, ou os problemas diversos causados por desastres e catástrofes

111 Trouxemos isso na Introdução.

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naturais. Há, logicamente, razões de outra ordem, como causas pessoais ou emocionais individuais, como no caso de alguém não se sentir pertencente à esta ou àquela cultura, por relacionamentos, ou motivos de trabalho, de estudo que fazem uma pessoa procurar a imigração. Não somente os africanos, mas as pessoas cidadãs do mundo, hoje, muitas vezes sentem-se pertencentes a muitas culturas ao mesmo tempo, talvez pelo já apontado fato de que os bilíngues sejam a maioria no mundo de contemporâneo112.

Se a identidade é uma postura que se assume, ou um sentimento de pertencimento, povos que falam muitas línguas podem sentir-se pertencentes à muitas culturas. Muitos podem sentir-se híbridos, misturados, mas, ao mesmo tempo, únicos. Em um paralelo com as Ciências Biológicas, cada espécime de uma espécie é único em sua constituição biológica singular. Até mesmo os gêmeos idênticos são únicos em seu material genético, em suas mutações. Somos todos singulares, ao mesmo tempo em que somos parte integrante do todo, ou como diz Mia Couto: “Todos nós temos que encontrar uma língua própria que nos revele como seres únicos e irrepetíveis” (COUTO, 2009:20). Embora sejamos únicos, participamos e trocamos partes com o todo: genes, línguas, pensamentos, ideias, sentimentos, culturas, identidades. Ninguém consegue viver verdadeiramente isolado neste mundo, somos seres intrinsecamente sociais, e o que nos une, a nossa amálgama, é a língua, que nos permite a comunicação social e as trocas necessárias com nossos pares.

Talvez os seres humanos tenham se diferenciado tanto dos outros seres, por meio de sua inteligência como mencionou Mia Couto (2009:11)113, que tenha forjado para si uma identidade de espécie superior, o que nos impede de tentar reverter o quadro que instauramos de depreciação do meio-ambiente e de depreciação humana – que as guerras inevitavelmente geram. Quanto mais pessoas puderem/quiserem ver as semelhanças que temos com os demais seres que habitam nosso planeta, da mesma espécie e das demais, mais provável será que consigamos iniciar uma reversão desse trágico quadro.

A língua e seu mundo de significados têm suas armadilhas, e talvez a grande ilusão dos seres humanos tenha sido a de que, com seus jogos de palavras e sentidos, com suas culturas e identidades, poderiam colocar-se em um pedestal, acima dos demais animais e com o rótulo de “seres racionais” afixado em nossos pescoços. Com relação às demais espécies do planeta,

112 Dado trazido por Jones (2018:s/p). Vide nota de rodapé 74. 113 “O que fez a espécie humana sobreviver não foi apenas a inteligência, mas a capacidade de produzir diversidade”.

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pensamos que seria possível vivermos segregados delas e esquecemo-nos de que todos os seres habitam apenas um planeta. Para aqueles que ainda encontram dificuldade em entender essa ideia holística, propomos o exercício de pensar em um recente terremoto ocorrido na Bolívia, no dia 02 de abril de 2018, e que foi sentido, em seus reflexos, por muitos brasileiros em território nacional. Pessoas de Santa Catarina, São Paulo, Brasília e outras localidades sentiram a terra tremer114. Houve um terremoto na Bolívia, sentido por brasileiros em seu país, e ainda há aqueles que acreditam que prejudicar o “seu território” – por poluição, armas químicas, etc. – não terá reflexos em outras partes do globo.

Por outro lado, considerando a convivência social, dentro de nossa própria espécie, ao buscarmos diferenças ou supostas qualidades que nos diferenciam uns dos outros, de maneira depreciativa e negativa acabamos por promover um discurso de empobrecimento da diversidade humana. Assim, segregamo-nos de nossos próprios membros que julgamos inferiores, por meio da intolerância e do preconceito. Tentamos com nossos discursos de tradição histórica tornar alguns seres humanos “mais humanos” que outros, inventamos compartimentalizações e subdivisões dentro da espécie humana, criamos as “raças humanas” – a negra, a branca, a amarela, a vermelha – esquecendo-nos, novamente, do todo, de que somos apenas Homo sapiens, uma única espécie, no esplendor de sua diversidade fenotípica e genotípica.

O momento urge por um repensar, uma nova postura, uma nova identidade humana, mais holística, diante dos velhos fatos e problemas que foram, muitas vezes, criados por nós mesmos. Mia Couto, assim como nós, advoga por um homem mais plural, cuja arma seja um idioma plural: O que advogo é um homem plural, munido de um idioma plural. Ao lado de uma língua que nos faça ser mundo, deve coexistir uma outra que nos faça sair do mundo. De um lado, um idioma que nos crie raiz e lugar. Do outro, aquele que nos faça ser asa e viagem (COUTO, 2009: 21).

Aqueles que falam dois ou mais idiomas tendem a ser irrepetíveis, há aqui uma conquista portanto, independentemente de que ordem ela seja, da ordem que nos liga ao cordão umbilical da tradição cultural, “que nos crie raiz e lugar”; ou da que nos permita extrapolar as fronteiras da língua e “nos faça ser asa e viagem” nas artes, ou no imaginar. A língua é a nossa identidade

114 TERREMOTO DE MAGNITUDE 6.8 ATINGE O SUL DA BOLÍVIA. Terremoto ocorreu dia 02/04/2018 e foi sentido em Brasília, São Paulo, Santa Catarina entre outros estados do Brasil: Disponível em: . Acesso 20 abr 2018.

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como espécie, devemos valer-nos dela para que ela “nos faça ser mundo” e, ao fim e ao cabo, híbridos culturais, em nossa identidade multifacetada e heteróclita, feita de muitas línguas e posturas, costuras e pertencimentos. Se uma língua já representa toda essa variedade de oportunidades, imaginem-se duas, três, muitas (AVELAR, 2018: 166).

Por fim, acima de tudo, temos que nos recordar de que somos parte do todo (“somos mundo”). Somos a natureza, partilhamos da simbiose holística do planeta e suas espécies, da sociedade e da comunhão com os outros humanos. A língua/linguagem é a bússola, ou mais modernamente o GPS, necessária para permitir a navegação nesse habitat social – navegar no mundo da cultura – e no habitat natural, na natureza. A linguagem é parte essencial, faculdade que tem a língua como produto. O complexo língua/linguagem influência nosso meio social, mas, é por meio da língua e mais precisamente da palavra, oral ou escrita, que nos identificamos e nos singularizamos como espécie. Falar mais de um idioma, assim como falar mais de uma linguagem, é ser esse ser plural, é ser o ser que é necessário para a continuidade da espécie no planeta, ou, como Mia Couto sintetiza a questão, “As línguas servem para comunicar. Mas elas não apenas ‘servem’. Elas transcendem essa dimensão funcional. Às vezes, as línguas fazem-nos ser.” (COUTO, 2009: 11). Entretanto, façamos uma ressalva: quando “cabe-nos ser”, deparamo-nos tanto com o que há de positivo em nossos pensamentos quanto com o seu contrário. Que sejamos Humanos com letra maiúscula então, munidos de nossas línguasculturas na construção de uma nova identidade mais tolerante e empática conosco mesmos e com os demais habitantes do planeta.

Para concluirmos este capítulo, traremos em seu último subitem uma reflexão baseada em uma reportagem da mídia na qual deparamo-nos com os conflitos de língua gerados no seio da sociedade, em sua dinâmica, quando as pessoas se encontram em imigração. Baseamo-nos na reportagem da Revista Planeta, Crianças Bilíngues, o trunfo que alguns países ricos rejeitam (2010), para uma ponderação que versa sobre o ensino de línguas, as orientações governamentais e os conflitos gerados pelo contato entre duas ou mais línguas/culturas nesses contextos. Isso significa dizer que para essa meditação do papel da língua na dinâmica social da atualidade – valemo-nos, em primeiro lugar, de uma visão trazida pela mídia, embora essa seja uma mídia especializada.

105

2.5 Povos em imigração e os conflitos linguísticos

A Revista Planeta baseia-se em um relatório da UNESCO, como já mencionamos. Esse acrônimo (Organização Educacional, Científica e Cultural das Nações Unidas115), por si só, diz muito a respeito das temáticas que abordamos nesse setor da tese: é uma organização internacional – quer dizer, que se utiliza de pelo menos uma língua distinta da nossa, o inglês, língua franca internacional -; formada por várias nações – ou seja, há várias culturas envolvidas -; em que temáticas educacionais, científicas e culturais são abordadas. Este tripé (educação- ciência-cultura) tem por base fundadora a língua/cultura/linguagem, uma vez que não há comunicação, educação, ciência ou cultura a não ser por meio do trinômio.

A reportagem aborda questões de ordem social que se vinculam a algum tipo de discurso: como colocações que contêm posições de discursos de (anti-)xenofobia; des/valorizações dos status das línguas116; o incentivo, ou não, da manutenção da língua materna nas casas dos imigrantes117; a valorização ou o desprezo da identidade cultural do país de origem118. Isso quer dizer que as línguas em contato, invariavelmente, geram conflitos (sociais, discursivos, culturais, identitários, etc.) entre elas mesmas e entre as línguas/culturas envolvidas.

Segundo a revista, essas temáticas que subjazem a línguacultura, utilizando-nos aqui do termo criado por Agar (1994), em contato embasam modelos educacionais defendidos pelos governos e acarretam em situações de litígio entre o que é vivido pela família e o que é vivido socialmente fora da convivência familiar. Há, assim, devido à convivência forçada de línguas pela imigração em massa, discrepâncias entre o modelo vivenciado nas casas e o modelo social das escolas que causam prejuízos para a identidade desses imigrantes: “Privar os filhos de imigrantes da sua língua materna significa criar situações de conflito entre dois modelos - o de família e o social - e desprezar suas identidades.” (BIJELJAC-BABI’ C, 2010: s/p); problemas de empobrecimento cultural119 e de socialização como um todo: “Privar a criança da língua materna em casa é criar uma situação de conflito entre o modelo de família e o modelo social e entre a família e a escola, com o risco de empobrecer ainda mais referências culturais e

115 Organização internacional conhecida por UNESCO (United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization). 116Discutimos o status linguístico nos subítens 1.1 e 1.4. 117 Abordamos a questão da manutenção da língua materna em imigrantes principalmente no subíten 1.1. 118 Nosubíten 2.3 trouxemos uma discussão sobre a (des)valorização da identidade cultural. 119 Questões de empobrecimento cultural, linguístico e de diversidade também foram discutidos no subitem 2.3.

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enfraquecer a socialização.”; destacando que uma visão positiva da convivência de língua/culturas podem levar ao enriquecimento linguístico e não o contrário: “Imigrantes ajudam a tornar línguas como o inglês mais ricas” (BIJELJAC-BABI’ C, 2010: s/p).

Segundo a autora, podemos inferir que há alguns pontos sociais importantes relacionados à valorização da língua materna: mitigar os conflitos de língua gerados pelo contato, valorizar as identidades culturais dos imigrantes, enriquecer suas referências culturais, fortificar a socialização e enriquecer as línguas dos países acolhedores dos imigrantes e assim por diante. Tais visões vão ao encontro de nossa própria visão dos efeitos positivos que o bilinguismo é capaz de suscitar no convívio social, quando há acolhimento e tolerância em relação às línguas/culturas.

O oposto dessa tolerância e enriquecimento, pode ser sentido em um exemplo das supostas desordens causadas pelas línguas em contato. Lembremos do relatório de segurança interna da França de 2004 – e aqui cabe a ressalva de que era um relatório de segurança interna – o que nos permite inferir que as línguas estrangeiras eram vistas como uma ameaça para a ordem interna do país. O polêmico relatório continha, segundo a autora, uma tentativa, recorrente entre os governos ocidentais, de desincentivar os imigrantes a comunicarem-se em casa em sua língua materna. O resultado disso, segundo a Revista Planeta, foi a tentativa de se “apagar” a primeira língua e a cultura desses imigrantes por serem estas consideradas “menores e inferiores”. O texto da revista ainda critica a postura do governo francês em desincentivar o uso da(s) língua(s) materna(s) nas casas dos imigrantes e ressalta os termos que colocam as línguas estrangeiras em diminuição (“dialeto”) em relação a língua francesa (“maior” e “melhor”) como podemos ver no excerto abaixo:

Mas, quando esses imigrantes chegam, muitas vezes há uma tentativa de “apagar” suas línguas maternas de suas cabeças, em especial se elas são consideradas idiomas “menores”. Precisamos apenas nos lembrar do relatório de outubro de 2004 sobre a segurança interna na França. “[quanto a crianças de 1 a 3 anos], só os pais, e especialmente as mães, têm contato com seus filhos. Se as crianças têm origem estrangeira, os pais devem se obrigar a falar francês em casa, a fim de fazer as crianças se acostumarem a ter apenas essa língua para se expressar”, diz o relatório, frisando: “Mas se, em certos casos, elas sentem a relutância de seus pais, que frequentemente insistem no uso do dialeto de seus países de origem em casa, elas vão ser dissuadidas de fazê-lo. Será então necessário tomar medidas para incentivar os pais a ir na direção certa.”. No texto original em francês, a palavra français (francês), designando um idioma, foi escrita em maiúsculas, o que contraria as regras da ortografia francesa. Pode-se supor que “falar um dialeto” é entendido como falar em árabe, chinês, sérvio, etc. (BIJELJAC-BABI’C, 2010: s/p).

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Conforme trazido por Bijeljac-Babi ‘C, as orientações fornecidas pelo governo francês no início desse século XXI apontam principalmente para um mito - que pode povoar a mente das pessoas – o mito de que “o bilinguismo irá atrasar a aquisição de linguagem em crianças120”, por isso há a ressalva de que o relatório dava orientações para crianças de 1 a 3 anos, fase de aquisição de linguagem em crianças típicas. Quando perguntados qual seria a razão das dificuldades de aprendizado dos imigrantes aos professores franceses, em sua maioria, eles culparam principalmente “o conflito de línguas e culturas” (BIJELJAC-BABI ‘C, 2010: s/p). Isso sugere que para os professores perguntados, o ensinamento de uma línguacultura diferente da língua/cultura francesa era a causadora da dificuldade de aprendizado das crianças.

Há no excerto também mais um exemplo da questão do status linguístico – em que uma língua é considerada “melhor”, ou “maior” e outra “menor” ou “pior” – valorações estas que estão no centro dos debates/discursos xenofóbicos e levam ao preconceito121. Se pensarmos que as línguas são reflexas de culturas e povos, tanto a língua, quanto a cultura e seu povo são considerados “menores” ou “piores” ao aceitar-se esse tipo de escala de valor. O relatório valoriza a língua francesa ao empregá-la em letra maiúscula mesmo contrariando as regras ortográficas do francês que versam por escrevê-la em minúscula, como as demais línguas do excerto estariam grafadas. As outras línguas ficam qualificadas na portaria francesa como

120 Um trabalho em especial do já mencionado professor emérito da University of Neuchâtel, Suíça, François Grosjean irá servir de norte para nossa pesquisa sobre bilinguismo, seu livro Bilíngue: Vida e realidade (2010) o levou a publicar em um website - http://www.francoisgrosjean.ch/myths_en.html, vide bibliografia -, de sua autoria, que contém os mitos e verdades baseados na vasta pesquisa ao longo de sua vida acadêmica sobre a temática. MITO 1O – O bilinguismo irá atrasar a aquisição de linguagem em crianças. ERRADO. Este é um mito que era popular no meio do século XX. Desde então muitas pesquisas mostraram que crianças bilíngues não têm atrasos na aquisição de linguagem. Isto posto, as pessoas devem ter em mente que as crianças bilíngues, porque têm que lidar com duas ou mais línguas, são diferentes em alguns aspectos das crianças monolíngues, mas definitivamente não em relação à taxa de aquisição de linguagem. Por exemplo, em relação às crianças bilíngues com distúrbios linguísticos (ex: dislexia), as crianças bilíngues disléxicas não são proporcionalmente mais numerosas do que as crianças monolíngues disléxicas (GROSJEAN, 2010: s/p). Tradução nossa. “Bilingualism will delay language acquisition in children. WRONG. This is a myth that was popular back in the middle of the 20th Century. Since then much research has shown that bilingual children are not delayed in their language acquisition. This said, one should keep in mind that bilingual children, because they have to deal with two or more languages, are different in some ways from monolingual children, but definitely not on rate of language acquisition. As for bilingual children with language challenges (e.g. dyslexia), they are not proportionally more numerous than monolingual children with the same challenges.” 121 Conforme já colocamos anteriormente continuaremos em nossa postura de não adentrar demasiado na teoria do discurso, uma vez que seria impossível abarcar os matizes e discussões dessa vasta área nesta tese. As questões de discurso de ódio e xenofobia, no entanto, perpassam a nossa discussão e são relevantes para a nossa discussão e por isso não podem ser de todo ignoradas. Isso dá-se devido principalmente ao fato de que queremos uma visão holística das questões linguísticas, para poder refletir de maneira mais aprofundada e fundamentada.

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“menores” e são tratadas como “dialetos”. No trecho acima, verificamos a valorização da língua francesa e percebermos no discurso elementos usados com a finalidade de desincentivar as outras línguas, vistas como desvalorizadas em relação a ela. Para essa construção de desvalorização das demais línguas nesse discurso destacamos o emprego do substantivo “dialetos”; dos verbos “obrigar”, “acostumarem”, “insistem”, “dissuadidas” e “incentivar”, nessa desqualificação das outras línguas; e das sentenças “as crianças a acostumarem-se a ter apenas essa língua”, “pais insistem no uso de dialetos”, “será necessário tomar medidas na direção certa” para destacar o conflito gerado pelas línguas em contato.

A reportagem fala também em problemas no “desenvolvimento cognitivo, social e educacional” das crianças obrigadas a falar francês em casa, língua que não é de domínio de fato de nenhuma das partes dos envolvidos, nem das crianças e nem dos pais imigrantes. A reportagem chama tal recomendação por parte do governo de “absurda”: “Essa posição absurda reflete uma ignorância flagrante do desenvolvimento da linguagem e do papel da língua materna na construção cognitiva, psíquica e cultural de um indivíduo.” (BIJELJAC-BABI ‘C, 2010: s/p). A autora assume nesse trecho que a língua materna faz parte de uma base capaz de fomentar o desenvolvimento cognitivo do ser em processo de aquisição e de desenvolvimento da linguagem, tal qual nós também assumimos. Não devemos, no entanto, confundir isso com o questionamento do paradigma científico vigente que propusemos - que aponta para a crença de ganhos cognitivos superiores em bilíngues. Queremos dizer com isso, que independentemente de o bilíngue ser supostamente superior em sua cognição ao monolíngue ou não, o papel das línguas maternas, em mono, bi, multilíngues é indispensável para o desenvolvimento de uma cognição plena122.

A língua materna desempenha um papel fundamental no desenvolvimento da cognição é a base para o pleno desenrolar linguístico, educacional e social de um indivíduo. Outras questões como as afetivas, psicológicas e até psíquicas permeiam esse pleno desenvolvimento cognitivo, mas também perfazem esse desenvolvimento social, educacional, cultural e até identitário. Consideramos, assim, que o questionamento da autora que se segue à afirmação anterior sobre a flagrante ignorância dos que fazem as políticas educacionais em relação ao processo de desenvolvimento na aquisição de linguagem, é uma visão holística e relevante para nossa

122 O paradigma vigente, conforme discutimos no subíten 1.3 da consolidação desse paradigma, aponta para uma visão em que os bilíngues teriam funções cognitivas melhoradas em relação aos monolíngues.

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discussão e por isso destacamos a seguinte indagação para nossa ponderação: “Como alguém poderia ignorar o fato de que a língua materna transmite afetos, permite a organização de faculdades cognitivas, simboliza – para crianças oriundas de famílias de imigrantes – a continuidade entre o país de origem e a família? ” (BIJELJAC-BABI ‘C, 2010, s/p).

O relatório francês e suas orientações aos imigrantes credita conflitos de identidade, os quais refletir-se-iam em problemas comportamentais no futuro, às línguas maternas dos imigrantes, acreditando que problemas relacionados à linguagem seriam a causa de atos não desejados, ou até de atos delinquentes futuros, segundo a autora: Segundo esse relatório, o desenvolvimento cognitivo, social e educacional de crianças que não são obrigadas a falar francês em casa ficaria comprometido, uma vez que elas teriam inevitavelmente problemas de linguagem, levando a distúrbios comportamentais que resultariam mais tarde em delinquência! (BIJELJAC-BABI ‘C, 2010, s/p).

Após o domínio público desse relatório de 2004 muitas críticas foram feitas por parte da sociedade por ONGs, sindicatos e associações, pela imprensa e pela própria UNESCO, por políticos, acadêmicos e intelectuais, todos manifestaram-se criticando os argumentos do relatório que propunha o não uso da língua materna nas famílias como forma de prevenir a delinquência juvenil. Em 2005 os termos do relatório foram modificados no sentido de:

Reconhecimento do bilinguismo precoce como fator de integração. Depois de muitos debates, a Comissão mudou consideravelmente sua posição sobre o assunto. Parece também que a manutenção tanto da língua materna como da língua dominante permite que as crianças tenham melhores resultados na escola […]. (BIJELJAC-BABI ‘C, 2010: s/p).

Destacaremos um trecho dos estudos da fisiologista Clark (2000), novamente, por acreditar que nele há uma visão holística do processo de aquisição linguística capaz de fazer uma interface entre as pesquisas fisiológicas da área biológica e essa área social, de contato linguístico, que corrobora a visão de Bijeljac-Babi ‘C (2010). Em seu artigo de 2000, momento próximo ao relatório francês (2004), Aquisição de primeira e segunda língua na primeira infância123, Clark cita alguns autores que pesquisou os quais apontam que um ambiente linguístico rico e estimulante irá dar suporte ao desenvolvimento da língua, sendo que tanto a frequência com que os pais comuniquem-se com as crianças, quanto o quão bem o fizerem, são fortes indicadores de quão rapidamente as crianças expandirão o aprendizado de línguas. Além disso,

123 “First- and Second-Language Acquisition in Early Childhood”. Tradução nossa.

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ela indica como fator determinante o engajamento das crianças e as situações reais, como vemos no trecho abaixo:

Em ambas aquisições de primeira e segunda línguas, um ambiente linguístico estimulante e rico irá dar suporte ao desenvolvimento da língua. A frequência com a qual e quão bem os pais comunicarem-se com as crianças é um forte previsor de quão rapidamente as crianças irão expandir o aprendizado linguístico. Encorajar as crianças a expressarem suas necessidades, ideias e sentimentos, quer seja em uma língua ou em duas, enriquece a criança linguisticamente e cognitivamente. Engajar as crianças e encorajá-las a expressarem-se interativamente enquanto constroem seu conhecimento prévio em situações de vida real é uma maneira eficiente de construir-se a experiência linguística (CUEVAS, 1996; MCLAUGHLIN, 1984) (CLARK, 2000: 184)124. Destacamos o trecho “Encorajar as crianças a expressarem suas necessidades, ideias e sentimentos, quer seja em uma língua ou em duas, enriquece a criança linguisticamente e cognitivamente” (CLARK, 2000: 184) e as relações estabelecidas pela autora de ganho cognitivo e linguístico pelo encorajamento da expressão das crianças em uma ou na outra língua. Ao valer-se dos termos “necessidades”, “ideias” e “sentimentos”, a autora amplia a visão biológica para outras áreas, como a área social, sociocognitiva, portanto, levando em consideração fatores psicológicos e sentimentais, o que para nós evidencia uma visão mais ampla do aprendizado bilíngue.

Parece-nos que a continuidade proporcionada pelo contato entre as línguasculturas seja mais proveitosa, significativa e construtora do que a fragmentação, ruptura ou quebra entre as elas. A construção simbólica deve ser feita no sentido de agregarem-se e somarem-se elementos das culturas em contato dentro de cada indivíduo com a finalidade de se acrescentar simbolismo afim de não romper com as estruturas pré-existentes. Assim, gera-se continuidade e tolerância, indo em direção a quebrar-se o discurso de valorações de “maior” e “menor”, “melhor” e “pior”, “superior” e “inferior”, inclinando-se na direção da tolerância e da aceitação, ensinando-se a empatia, como também já mencionamos125. A tolerância e a empatia são vias capazes de romper com os padrões xenofóbicos e puristas do passado, tão em voga novamente, infelizmente, em tempos em que as polarizações discursivas e as posições extremadas são tão

124“In both first- and second-language acquisition, a stimulating and rich linguistic environment will support language development. How often and how well parents communicate with their children is a strong predictor of how rapidly children expand their language learning. Encouraging children to express their needs, ideas, and feelings whether in one language or two enriches children linguisticly and cognitively. Engaging the children and encouraging them to express themselves interactively while building on their prior knowledge in real-life situations is an effective way to build language experience (Cuevas, 1996; McLaughlin, 1984).” Tradução nossa. 125 No subitem 1.4 trouxemos essa tônica.

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presentes, devido as muitas causas, mas devido também aos impactos gerados pelos grandes fluxos imigratórios.

Um exemplo de não apagamento ou de convivência, tolerância e diálogo linguístico é o do “espanglês” (ou Spanglish) uma linguagem híbrida, ou pidgin, muito falada por jovens e imigrantes de origem hispânica que vivem nos EUA que segundo o periódico: “[...] é um dos exemplos mais marcantes de mudanças em uma língua posta frente a frente com a imigração e a globalização” (BIJELJAC-BABI ‘C, 2010, s/p). Os falantes de espanhol que vivem nos EUA, de suas mais diferentes origens, passam diariamente por situações em que há a convivência das duas línguas. Há o dado126 de que o espanhol é a língua mais falada após o inglês nos EUA atualmente. Há muitos estudos, publicações, livros, pensamentos, redes sociais que retratam o ‘code-switching’, ou ‘mudança de código linguístico’, ou reconhecidamente o uso de duas línguas concomitantemente, aqui o inglês e o espanhol.

O diálogo entre as línguas parece ser algo comum e corriqueiro entre os falantes desses dois idiomas. O Spanglish parece ser uma realidade para esses falantes, em seus pensamentos, falas diárias, interações, e isso fica mais evidente nas músicas, poemas, na literatura, bulas de remédio, nos alertas e avisos em locais públicos, placas em mercados, por todo os EUA e não somente nos Estados em que há maior incidência de hispânicos. O bilinguismo, mais uma vez, parece ser apontado como um fator de integração social. A porção social da língua – comunicar, promover o diálogo, promover trocas, empatia, etc.-, mais do que as possíveis vantagens de ordem cognitiva127 - sistema executivo aperfeiçoado, enfoque em uma única tarefa, ou maior concentração etc. As possíveis contribuições que essa conexão linguística interna pode acarretar (de suas próprias línguas em convivência) para o pleno desenvolvimento do indivíduo parece ser o rumo acertado a ser explorado pela Ciência no novo paradigma que pode vir a despontar para o entendimento funcional e pragmático que a habilidade de ser bilíngue (ou multilíngue) acarreta em seus falantes.

Estudos interculturais preveem a inclusão da língua e da cultura dos envolvidos no aprendizado, o que resulta em uma maior naturalidade na convivência entre as línguas e culturas, em um próprio individuo, e em uma menor estereotipização em relação às línguas e a seus falantes, no

126 AS VÁRIAS LÍNGUAS FALADAS NOS EUA. 2017. Disponível em: . Acesso em 08 abr 2017. 127 O subitem 1.4 trouxe a discussão sobre vantagens sociais e cognitivas.

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nível da sociedade. Nesse sentido, a matéria da Revista Planeta destaca que o respeito às línguas e culturas dos imigrantes, feito por meio do ensino dessas línguas nas escolas, levaria à melhoria da autoestima dessas populações e poderia levar ao desenvolvimento da alteridade e do respeito mútuos – as questões sociais por nós apontadas anteriormente -, como vemos a seguir:

No entanto, se as línguas e as culturas dos imigrantes fossem mais enfatizadas, ensinadas a todos os alunos nas escolas e respeitadas pelo sistema escolar e pela sociedade dominante, os indivíduos desenvolveriam uma melhor estima e respeito por si mesmos e, consequentemente, pelos outros (BIJELJAC-BABI ‘C, 2010: s/p).

Por este viés, podemos supor que ao privar o falante do contato com sua língua materna, o desenvolvimento do indivíduo como um todo fique lesado, já que a competência nas línguas pode ficar prejudicada e as questões fundadoras do ser ligadas à linguagem, como a identidade e a comunicação social e até a empatia podem fragmentar-se. Em suma, é exatamente o contrário do que sugeria o Relatório de Segurança francês de 2004, o que nos pode levar a sugerir que a delinquência ali mencionada, possa estar relacionada exatamente ao oposto do que ele propunha, ou seja, parece-nos pela pesquisa feita até aqui que a privação da convivência com a língua materna dos imigrantes seja uma das possíveis causas da delinquência.

Quanto à outra temática, de haver-se uma possível imposição do bilinguismo na atualidade devido à imigração, a revista cita o exemplo do imigrante de origem chinesa François Cheng, que migrou para Paris aos 20 anos sem saber sequer uma única palavra de francês e tornou-se membro um escritor membro da Academia Francesa128 em 2003. Em seu livro O Diálogo129 (2002), Cheng questiona se houve livre arbítrio para que ele se tornasse bilíngue e diz como resolveu internamente o conflito entre os dois idiomas que conviviam em si, em suas palavras, “chegando a um acordo com as duas línguas” a sua própria maneira, em sua “aventura linguística direcionada pelo amor” por meio do “diálogo”:

O destino fez com que, a partir de um certo momento da minha vida, eu me tornasse o portador de duas línguas, chinês e francês. Foi apenas por conta do destino? A menos que, apesar de tudo, houvesse uma parte de livre arbítrio deliberado nele? O fato é que tentei assumir o desafio, chegando a um acordo com as duas línguas da minha própria maneira, com as consequências mais extremas […]. Não é de estranhar que, desde então, no

128 “Académie Française”. Tradução nossa. 129 “Le Dialogue”. Tradução nossa.

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coração da minha aventura linguística, que é direcionada para o amor de uma linguagem adotada, um tema tenha tido lugar de destaque: o diálogo… (BIJELJAC-BABI ‘C, 2010: s/p).

Cheng vale-se de sua própria experiência bilíngue para apontar que a solução de seu conflito linguístico interno esteve pautada no “amor” e no “diálogo”. Em outras palavras, suas línguas em contato (chinês e francês) conseguiram conviver devido ao diálogo, ou à dialética que nele estabeleceu-se internamente. Destacamos que essa convivência pacífica só se fez possível devido à função fundamentalmente social iminente a toda língua: a sua utilidade primeira de comunicar algo a alguém, nem que esse alguém sejamos nós mesmos e dessa comunicação fazer sentido, ou a comunicação sociocognitiva de Martín-Barbero (2000). Não devemos tentar apagar as culturas, línguas, hábitos, identidades, etc. de origem dos imigrantes, e sim valorizar as culturas de origem deles para que haja enriquecimento de todas as partes. A aposta deve ser feita no sentido de haver diálogo entre as partes, tal qual proposto pelo autor franco-chinês Cheng (2002). O diálogo inevitavelmente leva a trocas, não somente linguísticas, mas culturais de maneira geral, que levam a contribuições das mais diversas formas.

Essa polêmica em relação à obrigatoriedade de aquisição ou aprendizado de uma segunda língua para os cidadãos do mundo de hoje faz-nos questionar: aprender/adquirir um idioma é opcional ou é algo imposto a todos nós? Quando pensamos em contextos de altos fluxos de contingentes imigratórios causados por condições extremas de catástrofes ambientais e humanitárias, como as guerras e suas consequências sociais e econômicas devastadoras, a resposta a essa pergunta certamente aponta para a obrigação da condição bilíngue para que ocorra a sobrevivência. Mas não seria, de certa forma, também, uma imposição da condição do bilinguismo a feita por pais amorosos e preocupados que matriculam seus filhos na mais tenra idade em escolas bilíngues do mundo, tendo como justificativas internas suas próprias dificuldades em tornarem-se proficientes em outra língua, pensando nas perdas de salário e oportunidades de emprego ou de vivência em viagens que o não domínio de pelo menos um outro idioma lhes acarretou?

Independente da controvérsia do bilinguismo ser ou eletivo ou opcional, tal qual aventado por François Cheng (2002) ou por nós mesmos, o que nos parece relevante nessa discussão é que por questões de sobrevivência variadas as línguasculturas entram em contato e obrigam as pessoas a desenvolverem-se em alguma outra língua. Parece que ser conhecedor de pelo menos dois idiomas torna-se imperioso no mundo globalizado. Por razões múltiplas e diversas,

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o domínio de apenas uma língua talvez não satisfaça mais os requisitos básicos comunicacionais, sociais e culturais e até identitários de sobrevivência em humanos. De certa maneira isto abre um fosso em um país monolíngue e em desenvolvimento como o nosso, porém as diásporas forçadas ou voluntárias, e até mesmo as atividades de turismo no mundo globalizado fazem com que reflitamos sobre o monolinguismo como ao menos limitador de um povo.

A fala, que singularizou nossa espécie, aparenta não poder mais estar restrita a um único grupo social, havendo indícios de que ela deva ser mais plural, realmente voltada para as diferentes partes da sociedade, igualmente plurais, oriundas de várias culturas, de modos de agir e pensar, e falantes de distintos idiomas. A fala deve ser social no sentido amplo de comunicação social com a maior parte de seres humanos possíveis, talvez justificando o surgimento de idiomas como o World English - a que Rajagopalan (2009:1) refere-se - e o próprio Spanglish. A educação é a ponte para termos êxito nessa comunicação ampla entre os diferentes povos, ela é um reflexo tanto da cultura quanto das Ciências, sejam elas Humanas, Exatas ou Biológicas. A língua é o meio fecundo em que tudo isso se dá. As diferentes línguas são os meios de cultura nos quais ocorrem as trocas e os contatos que possibilitam a proliferação das cepas culturais.

Quando os imigrantes se encontram assentados em seus novos países de moradia deveriam sentir-se seguros, firmes em suas novas nações, porém questões sociais são produzidas, muitas vezes fruto dos conflitos entre as línguas e culturas em contato, agravando as situações. Uma vez inseridos no sistema educacional daquele país, os imigrantes irão deparar-se além das problemáticas aqui levantadas com outras, as quais também têm a língua/cultura como fundamento. Iremos abordar, a seguir, questões relacionadas à nomenclatura dessa educação formal uma vez que o ensino feito em pelo menos dois idiomas adquire diferentes feições no mundo e, consequentemente, seus próprios aspectos no território nacional.

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CAPÍTULO III – O ‘ENSINO BILÍNGUE’ BRASILEIRO: FEITO PELAS ESCOLAS BILÍNGUES, ESCOLAS INTERNACIONAIS E PELOS “PROGRAMAS BILÍNGUES”.

Language is inextricably entwined with our mental life, our perceiving, our remembering, our attending, our comprehending, our thinking - in short, all of our attempts to make sense of our experience in the world.130 (LINDFORS)

O Capítulo 3 foi dedicado ao denominado ‘Ensino Bilíngue’ – ensino (programa) bilíngue, ensino internacional - que atendem a requisitos mínimos em comum, levantados em nossa pesquisa, para serem considerados como integrantes do setor. Antes de chegarmos a essa proposição no último subitem, porém, trouxemos aspectos históricos, sociais, culturais e econômicos dos componentes deste ensino em seus multifacetados aspectos, por meio de pesquisa em trabalhos científicos publicados e em reportagens nos meios de comunicação.

Dedicamo-nos, no início deste capítulo, à definição do que se entende por escolas bilíngues (de imersão ou não), comparamos de maneira breve o contexto deste ensino no mundo e no Brasil; houve a tentativa de definir-se a escola bilíngue brasileira e de elencar seus critérios de definição, geralmente trazidos pelas próprias escolas. Trouxemos o que é esperado pelos pais ao matricularem seus filhos em uma escola bilíngue propriamente dita segundo algumas pesquisas e compilamos o que versa, e o que não versa, a legislação brasileira sobre esse ensino. As recentes modificações ocorridas na Política Educacional Brasileira e o que a BNCC (Base Nacional Comum Curricular) de 2017 e o Novo Ensino Médio (2018) tratam para o ensino de línguas (no que diz respeito às estrangeiras) também constam nessa pesquisa. Essas políticas são dinâmicas e dependem de múltiplos fatores, o que faz com que se modifiquem mesmo antes de ser implementadas.

Posteriormente, fizemos um retrospecto histórico da chamada escola internacional no Brasil, além de elencarmos alguns motivos dos pais de matricularem seus filhos nestas instituições. A definição de escola internacional, assim como um panorama do número de escolas (bilíngues e internacionais) no Brasil são igualmente elencados no capítulo e no Anexo 2.

130 “A língua está inextricavelmente entrelaçada à nossa vida mental, nossa percepção, nossa memória, nossa atenção, nossa compreensão, nosso pensamento - resumindo, todas as nossas tentativas de fazer sentido a nossa experiência no mundo.” (LINDFORS). Tradução nossa.

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Em nossa pesquisa deparamo-nos com uma outra modalidade oferecida pelas escolas regulares, os chamados “programas bilíngues”, que também foi exemplificada.

O público para quem é majoritariamente destinado o chamado ‘Ensino Bilíngue’ brasileiro - feito por estas três modalidades, além das escolas bilíngues públicas existentes no país - estão igualmente presentes. Toda essa pesquisa sobre o setor permitiu-nos, enfim, apresentarmos a nossa proposta teórica, elencando alguns critérios mínimos básicos que ajudarão a regulamentar o ‘Ensino Bilíngue’ no Brasil.

3.1 Breve contexto do ensino bilíngue no mundo e no Brasil

No início desta pesquisa de doutorado, a autora desta tese foi posta em contato com uma professora de uma escola supostamente bilíngue. Logo no começo da conversa, a educadora, com todo o cuidado, pontuou que a escola em que ela trabalhava, embora ensinasse em mais de um idioma as matérias de seu currículo, não se considerava uma escola bilíngue, e sim uma escola internacional, isso porque seguia um currículo ligado a uma instituição situada em outro país. Diante dessa problemática de nomenclaturas, debruçamo-nos sobre a pesquisa do tema.

O primeiro aspecto que nos chamou atenção nessa diferenciação entre ensino bilíngue e internacional é que as pesquisas acadêmicas que contêm essas nomenclaturas no Brasil são muito recentes, geralmente após os anos 2000. São em sua maioria projetos de pesquisa, de conclusão de curso ou projetos de iniciação científica (PIBIC ou PIVIC) na graduação de universidades, dissertações de mestrado e teses de doutorado na pós-graduação, sendo mais comumente encontrados artigos, revistas e cadernos científicos, e mais difíceis de encontrarem- se teóricos e bibliografias em livros publicados sobre o assunto. As pesquisas em bilinguismo, como temos discutido desde o início desta tese, podem ser em áreas diversas, feitas em cursos de pedagogia, letras, psicologia, biologia etc., sendo que podemos considerar o bilinguismo um assunto multi, inter ou até transdisciplinar131; o mesmo pode ocorrer com seus teóricos, que são provenientes de diferentes áreas.

131 Embora saibamos da problemática, decidimos não nos debruçar sobre as pesquisas a respeito das nomenclaturas multi, inter e transdisciplinaridade pois trata-se de uma questão teórica sensível e complexa que nos desviaria do foco principal desta pesquisa, cujo escopo principal é a visão do senso-comum das pessoas em contraponto a visão cientifica sobre a o ‘Ensino Bilíngue’ no mundo, dentre outros aspectos.

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Esta dificuldade de encontrarem-se livros sobre o assunto foi sentida na pesquisa Reflexão crítica sobre as escolas bilíngues (português/inglês) de imersão e internacionais na cidade de São Paulo - de Aline Möller, graduada em psicologia, como vemos pelo excerto: “Porém, pouco se sabe sobre as diferenças entre as escolas bilíngues de imersão e as escolas bilíngues internacionais, principalmente por causa do sigilo exigido pelas escolas em relação às suas metodologias.” (MÖLLER, 2017: 111). A questão do sigilo e da falta de uma legislação para o setor provavelmente estão na raiz da problemática, porém, antes de debruçarmo-nos especificamente sobre essa diferenciação entre ensino bilíngue (ensino bilíngue de imersão e ensino internacional) focar-nos-emos em um breve retrospecto do ensino bilíngue no Brasil e no mundo.

O que mais encontramos em uma busca por meio da ferramenta Google quando colocamos “escola bilíngue x escola internacional” (253.000 resultados) são reportagens da mídia, blogs e sites especializados em bilinguismo, ou propagandas das próprias escolas fazendo a diferenciação entre uma e outra. Quando recorremos ao recurso do Google Acadêmico, ao digitarmos “escolas internacionais” encontramos 271.000 resultados em abril de 2018. Quando procuramos somente artigos científicos sobre “escolas bilíngues” nessa mesma data há 19.500 artigos relacionados. Quando procuramos por “bilingual schooling” encontramos 152.000 resultados e por “international schooling” 3.280.000. Por fim, quando digitamos “bilingual schooling x international schooling” outros 41. 2000 resultados aparecem132. Tal pesquisa por meio da ferramenta de pesquisa acadêmica do Google nos informa que a bibliografia sobre a temática é mais vasta no exterior do que no Brasil e que os pesquisadores daqui muitas vezes, têm que recorrer aos teóricos de outras culturas para poderem traçar um paralelo da realidade deles com a nossa em relação as escolas bilíngues e internacionais133.

Um artigo científico brasileiro da pesquisadora Antonieta Megale (MEGALE, 2005: 7), Bilinguismo e Ensino Bilíngue – discutindo conceitos - contém definições de ensino bilíngue em alguns países. A pesquisadora valeu-se da publicação do autor Jean Grosjean que citava um outro cientista da área, William F. Mackey, linguista canadense que estudava o bilinguismo, para definir no Reino Unido, Canadá, União Soviética e EUA o que são as escolas bilíngues:

132 O site do Google Acadêmico é: https://scholar.google.com.br/. A pesquisa foi feita dia 24 abril de 2018. 133 Ao analisarem-se os achados com mais cuidado, no entanto, por exemplo no caso de “escola bilíngue x escola internacional” encontramos poucos artigos que contenham “escola internacional” e muitos somente com “escola” ou “bilíngue”. Isso dá-se, como já falamos, devido ao fato de a ferramenta buscar por todas as palavras em combinação ou separadamente.

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Escolas no Reino Unido nas quais metade das matérias escolares é ensinada em inglês são denominadas escolas bilíngues. Escolas no Canadá em que todas as matérias são ensinadas em inglês para crianças franco-canadenses são denominadas bilíngues. Escolas na União Soviética em que todas as matérias exceto o Russo são ensinadas em inglês são escolas bilíngues, assim como escolas nas quais algumas matérias são ensinadas em georgiano e o restante em russo. Escolas nos Estados Unidos nas quais o inglês é ensinado como segunda língua são chamadas escolas bilíngues, assim como escolas paroquiais e até mesmo escolas étnicas de final de semana... [Consequentemente] o conceito de escola bilíngue tem sido utilizado sem qualificação para cobrir tamanha variedade de usos de duas línguas na educação. (MACKEY, 1972, apud GROSJEAN, F.,1982:213).

Como fica sugerido pela autora parece haver uma nomenclatura (ensino bilíngue) que se vale de um conceito polivalente para abrigar uma série de definições distintas sob sua égide de denominações. Essa parece ser uma problemática mundial que circunda a definição de ensino bilíngue, e não somente local. Como fica claro no excerto, o ensino bilíngue vale para aquele em que: metade das matérias são ensinadas em inglês (no Reino Unido); todas as matérias são ensinadas em inglês para um público franco-canadense; todas as matérias exceto o russo, para os russos; ou quando o inglês é ensinado como segunda língua nos EUA; ou seja, em cada país há critérios distintos adotados para sua definição e que podem variar dentro de um mesmo país como exploraremos melhor no caso brasileiro.

Retomando a pesquisa de Möller (2017: 111), em uma parte em que faz um retrospecto histórico, ela cita que escolas bilíngues surgiram na Europa, sendo as primeiras na Irlanda e no País de Gales, em 1921. A autora também cita o teórico William F. Mackey para falar que a educação bilíngue existe há muito tempo porque ao longo da história, se pensarmos nas sociedades, e no encontro de povos de línguas diferentes, detectamos que a necessidade de comunicação, inevitavelmente, gerava uma educação bilíngue ou multilíngue, mesmo que informal: “Porém, a educação bilíngue existe há mais de 5000 anos, segundo Mackey (1978).” (MÖLLER, 2017: 111)134.

De fato, além do caso brasileiro de convivência com os povos indígenas na época do descobrimento, destacamos uma época anterior a isso, a de expansão do romana (KELLY, 2006: 4), que se iniciou no século VI a.C - ou seja, 2600 anos atrás aproximadamente – com o início da anexação de territórios por volta do século III a. C. Os romanos, tal qual os portugueses, também faziam imposição de sua língua, o latim, quando dominavam outras terras

134 Essa mesma reflexão foi trazida por nós no contexto de educação que se iniciou no Brasil na época do descobrimento na Introdução dessa tese.

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pelo globo, o que impunha o bilinguismo, ou até o multilinguismo, aos povos conquistados e aos conquistadores. O mesmo pode ser remontado para outros povos como estudado por Mackey, e isso significa dizer que o uso de pelo menos dois idiomas por uma sociedade, ou por seus indivíduos, é um fenômeno cuja história pode ser resgatada em pelo menos 5000 anos, sendo uma característica remota das sociedades humanas.

Möller (2017: 111) traça um paralelo do bilinguismo em países como EUA, Inglaterra, Canadá e Brasil que têm contextos sociais muito distintos. Nos Estados Unidos e Inglaterra, os estudos sobre bilinguismo estão voltados para as minorias étnicas desses países, como os mexicanos e os imigrantes de variadas origens do Leste Europeu, pessoas em busca de melhores condições de vida e oportunidades: Nesse contexto, a língua materna passa a ser a língua menos utilizada, normalmente praticada em casa e em contextos mais familiares, e os mexicanos passam a falar mais inglês do que espanhol. Isso normalmente acontece em casos de imigração ou de ex-colônias, porque o bilinguismo passa a ser um contexto comum, possibilitando que essas comunidades se integrem à maioria social, incluindo-as na sociedade e na cultura daquele lugar. (MÖLLER, 2017: 111).

A autora afirma que no Canadá, em que dois idiomas são oficiais (o inglês e o francês): “[...] o bilinguismo não está restrito à sala de aula135, sendo a escola apenas mais um contexto de aquisição das duas línguas simultaneamente, porque é possível presenciar a mesma característica nas suas ruas, cidades, restaurantes etc.” (MÖLLER, 2017: 111). No primeiro contexto mencionado, de imigração ou de ser proveniente de uma ex-colônia, a segunda língua (no caso a materna dos imigrantes) fica mais restrita aos ambientes familiares, conforme discutimos anteriormente; no segundo contexto, de países com mais de um idioma oficial, a convivência entre as línguas dá-se em outras esferas da convivência social.

No Brasil, a condição bilíngue parece estar associada às condições econômicas da classe social mais abastada, já que o mercado de trabalho brasileiro privilegia a contratação dos fluentes em outra língua, principalmente o inglês, além de estar ligada ao status de prestígio proporcionado por falar um idioma estrangeiro: Já no Brasil, a condição de ser bilíngue é geralmente procurada por uma minoria privilegiada, que busca uma eficiente comunicação com o mundo externo devido ao contexto social do país, que, “mesmo sendo uma nação de dimensões continentais e riquíssima em recursos naturais, [...] desponta uma

135 Esse mesmo contexto linguístico e cultural mais amplo é encontrado em países como a Suíça e outros que possuam mais de uma língua oficial, como Moçambique, conforme discutido no Capítulo 2.

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triste contradição, de estar sempre entre os dez países do mundo com o PIB mais alto e, por outro lado, estar sempre entre os dez países com maiores índices de disparidade social”. Nesse sentido, o bilinguismo está associado a uma ideia de prestígio, de status, que ajuda a manter e fortalecer a posição de determinados grupos da sociedade. Afinal, a fluência na segunda língua representa um diferencial, e o mercado de trabalho brasileiro considera, cada vez mais, uma boa fluência no inglês um requisito básico para a maioria das oportunidades de emprego (MÖLLER, 2017: 112).

A manutenção e fortalecimento da posição privilegiada da classe dominante por meio da comunicação internacional propiciada por se falar mais um idioma, as melhores oportunidades de emprego, além do status social privilegiado ocupado por bilíngues parecem ser a tônica levantada pela pesquisa de Möller como as principais razões do surgimento do ensino bilíngue no Brasil.

O outro contexto de bilinguismo em nosso país é o dos povos indígenas, ou seja, do outro extremo, dessa vez do minoritário, menos abastado, do nosso país136. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Censo 2010, indica que 274 línguas indígenas são faladas no país. A população total de índios no Brasil é de 896.917 indígenas: “A população indígena brasileira não é composta por um só povo, mas por muitos, cada qual com seus costumes, habilidades, tecnologias, atitudes estéticas, organização social, crenças religiosas e filosóficas peculiares [...] a partir desses dados podemos reconhecer a multilinguagem brasileira.” (MÖLLER, 2017: 112).

Segundo a publicação O que é uma escola Bilíngue, a primeira escola bilíngue no Brasil foi fundada há 36 anos, embora não seja citado o nome dessa instituição, o post diz que “[...] as bases de sua fundação vinham de experiências bem-sucedidas de escolarização de crianças em duas línguas em países do hemisfério norte.” (O QUE É UMA ESCOLA BILÍNGUE, 2014: s/p). A escola bilíngue em questão queria reconhecer-se “[...] como um ambiente onde os alunos estariam cercados e imersos em duas línguas, que seriam usadas para todos os tipos de atividades escolares e não apenas em aulas de língua [...]” (O QUE É UMA ESCOLA BILÍNGUE, 2014: s/p), esse seria o princípio fundamental do sucesso dessas escolas, de acordo com a publicação que afirma ainda que as escolas teriam se multiplicado primeiro em São Paulo, depois pelo Rio de Janeiro e gradualmente para outros estados.

136 Abordamos isso também na Introdução.

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Já para a pesquisa acadêmica Percepção Social do Ensino Bilíngue inglês/português no Brasil, de Samanta Malta P. da Silva, quanto à data da primeira escola bilíngue no país: “A primeira escola de ensino bilíngue, português – inglês surgiu na década de 80, porém, conforme David (2007) foi somente a partir da década de 90, principalmente na cidade de São Paulo, que o número de escolas bilíngues teve um aumento significativo.” (DA SILVA, 2009: 1).

Marcello Marcelino, no artigo Bilinguismo no Brasil: significado e expectativas, acredita que o surgimento da escola bilíngue no Brasil parece ter sido por uma necessidade do próprio mercado brasileiro: “Em relação à necessidade de uma escola bilíngue, esta parece ser mercadológica em essência. A crença forte, no passado, era de que o inglês ensinado na escola não era o suficiente, mas existia para composição de grade curricular.” (MARCELINO, 2009: 10). O autor argumenta que os institutos de idioma eram “o único lugar com profissionais e condições ideais para se ensinar e aprender uma outra língua” e diz que as escolas bilíngues surgiram no ínterim de opor-se tanto à abordagem dada ao ensino da língua das escolas de idioma, quanto das escolas regulares que terceirizavam somente o ensino de língua (principalmente a inglesa): Neste contexto, surgem as escolas bilíngues, que se propõem, inicialmente, a unir as duas competências: a da escola regular, voltada para educação e formação do indivíduo; e do instituto de idiomas, voltado para o ensino do idioma, com enfoque no desenvolvimento linguístico. (MARCELINO, 2009: 10).

Como podemos inferir pelo breve retrospecto brasileiro de ensino bilíngue, a questão econômica parece ser apontada como fundamental para o surgimento desse tipo de ensino no Brasil. Parece que o surgimento do ensino bilíngue está associado a situações de necessidade de comunicação com outras línguasculturas com outros povos, valorização na contratação de bilíngues no mercado de emprego brasileiro, além do status social privilegiado que o bilíngue ocupa em um país em que a comunicação dá-se majoritariamente em uma só língua, o português. Já em outras nações, tal ensino pode ter emergido, principalmente, pelo o que discutimos no subitem anterior, devido aos choques de línguas gerados em contextos internacionais em que a imigração se faz presente, por mais tempo, e mais expressivamente, do que no Brasil, pelo menos até o presente momento.

3.2 Definição de escola bilíngue (brasileira): mais uma vez a visão da Ciência e da mídia

Quando procuramos a definição de escola bilíngue deparamo-nos, muitas vezes, com as definições das próprias escolas. Observamos que elas fazem uso de páginas na web para

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esclarecerem aos pais de seus possíveis alunos futuros do que se trata aquela escola bilíngue. Mesmo quando abordamos pesquisas científicas na área de bilinguismo, a definição das próprias escolas parece dar o norte para a discussão em terras nacionais.

Novamente em Percepção Social do Ensino Bilíngue inglês/português no Brasil, da Silva, 2009, utilizou como recurso as definições das próprias escolas, autoproclamadas bilíngues, para elucidar o que é considerado esse tipo de ensino no Brasil, como vemos no excerto: “Um dos objetivos desta pesquisa foi identificar e compreender o conceito de ensino bilíngue para as escolas brasileiras denominadas bilíngues. Para tal, utilizamos informações disponíveis nos sites de algumas escolas bilíngues [...] (DA SILVA, 2009: 18); e a questão é levantada novamente por Möller, que também acredita que a nomenclatura abarca muitas definições distintas: O que define uma escola como bilíngue? Um grande número de escolas da cidade de São Paulo vem se autodenominando bilíngue. Porém, é preciso entender que educação bilíngue é um termo bastante amplo, que pode se referir ao trabalho realizado em escolas com os mais variados objetivos linguísticos e culturais, como as escolas para surdos (Libra, português) e as escolas indígenas (língua indígena-português) (MÖLLER, 2017: 113).

Ainda para da Silva um grande diferencial destas duas modalidades de ensino é quanto ao seu objetivo: “As escolas denominadas bilíngues ampliam seus objetivos para muito além da aquisição linguística, aspectos como formação social e cultural fazem parte dos objetivos dessas escolas, enquanto as escolas de idiomas têm como único objetivo a formação linguística de seus alunos.” (DA SILVA, 2009: 26).

Em relação aos números de escolas que se autoproclamam bilíngues em 2009: “De acordo com o professor Lyle Gordon French, diretor pedagógico de uma instituição bilíngue em São Paulo em português/inglês, hoje temos 130137 escolas bilíngues no país, o que representa um aumento de 23% em relação ao ano anterior.” (DA SILVA, 2009: 5). Ainda de acordo com ele “[...] o Ministério da Educação não tem controle do número dessas escolas, pois, segundo a assessoria de imprensa do órgão, o Censo Escolar não faz este tipo de questionamento para as escolas (DA SILVA, 2009: 5).

Como não há um Censo que contabilize o número de escolas que se consideram bilíngues, dependemos das próprias instituições e de pesquisas (científicas ou outras) para entender o que significa o aumento desse tipo de escola, sendo a mídia parte importante nesse

137 No Anexo 2 há uma lista de escolas bilíngues.

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entendimento. Segundo a reportagem de 2017 da Revista Exame, as franquias e desenvolvedores de programas bilíngues são os consultados para fornecer os dados de sua expansão no Brasil. Por exemplo, Rone Costa, gerente de desenvolvimento programa de educação bilíngue do Brasil Systemic Bilingual, no mercado há 15 anos, informou que somente no Systemic, o crescimento do número de escolas que utilizam o programa foi de quase 63% em 2016. As regiões Sudeste e Nordeste são as maiores em oferta de educação bilíngue, já as regiões Norte e Centro-Oeste também representam 6,9% e 10,3%, respectivamente, da presença do Systemic no país. Hoje, o programa está presente em 60 escolas em 18 estados brasileiros, levando educação bilíngue a mais de 12 mil alunos. (DINO, 2017:s/p).

A reportagem também cita a franquia Learning Fun, especializada no ensino de idiomas para crianças de oito meses a sete anos de idade, informando que ela cresceu 20% no ano passado. A empresa conta com cerca de 31 franqueados e 150 escolas no Brasil, o que representa cerca de 6.500 mil alunos no país (DINO, 2017:s/p). Aqui vale a ressalva de que a reportagem considera o ensino de escolas de idioma terceirizado, como ensino bilíngue. Conforme abordaremos em mais detalhe no subitem 3.7 de “programas bilíngues” e em nossa proposta teórica 3.9, veremos que a falta de regulamentação do setor faz com que as instituições definam o ensino bilíngue tal qual o ensino de idiomas, sem proporcionar os requisitos mínimos necessários para serem considerados promotores de um ‘Ensino Bilíngue”, nem proporcionar o alinhamento com outros critérios que distinguiria um ensino bilíngue de fato de um ensino de língua estrangeira, proporcionado pelos institutos de idioma.

De acordo com a publicação de 2017, Möller acredita que os autores Ferguson, Houghton & Wells (1977) delineiam em sua pesquisa alguns objetivos que encaixar-se-iam à realidade do ensino bilíngue paulistano. Esses objetivos podem servir como norteadores do que a escola bilíngue paulistana teria por definição: “Propiciar a comunicação com o mundo externo; proporcionar aptidões linguísticas vendáveis, dando apoio a posição no mercado de trabalho e status; fortalecer grupos de elite e preservar sua posição na sociedade; e aprofundar a compreensão de língua e cultura.” (MÖLLER, 2017: 114).

Quando consultamos a referida pesquisa dos autores de 1977, tratava-se de uma lista de objetivos implícitos dos programas bilíngues de educação contemporânea à época138. Os objetivos pinçados por Möller foram propostos de acordo com os objetivos das escolas bilíngues

138 “a list of implicit goals of contemporary bilingual education programs”. Tradução nossa.

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em diferentes países e, por isso, a autora diz que podem ser ligados à realidade das escolas paulistanas. No livro de resenhas de Arnulfo G. Ramirez (1984: 12) sobre bilinguismo por meio da educação, encontramos essa lista dos objetivos implícitos de Ferguson, Houghton & Wells (1977), Möller ligou à realidade brasileira os objetivos de número 3, 4, 8 e 11 escritos em inglês original no rodapé139.

No artigo científico de Marcelino, as distinções entre escola bilíngue e escola de idiomas são feitas por meio da abordagem em relação à língua estrangeira: “Na escola bilíngue, a língua inglesa é um veículo, o meio através do qual a criança também desenvolve-se, adquire e constrói conhecimento e interage e age sobre o meio.”; e por meio dos próprios objetivos escolares: “A escola bilíngue deveria ser sempre vista essencialmente como uma escola, com objetivos de uma escola, focada na educação, não como um instituto de idiomas aumentado.” (MARCELINO, 2009: 10).

No aprofundamento da questão de nomenclatura, o autor explica que o conceito que circunda a escola bilíngue brasileira passa pela comparação do que ela significa nos outros países, mas que fundamentalmente têm que abarcar os valores culturais brasileiros, de escola e línguas; o que faz com que a língua-alvo, no caso, ele focou-se na língua inglesa, passe a ser um veículo que promove a comunicação no mundo globalizado: É importante ressaltar que o conceito de escola bilíngue muda de país para país, com diferentes possibilidades e interpretações (ver Megale, 2005), daí a importância de se compreender o que é uma escola bilíngue no Brasil. A escola bilíngue é uma escola brasileira, com o diferencial de que os conteúdos escolares e interações também ocorrem em inglês. A “brasilidade” e aspectos culturais brasileiros estão presentes, e a língua inglesa não é a mera representação da cultura, valores e crenças de países como Estados Unidos e Inglaterra, mas sim uma tendência presente no mundo da globalização. A língua inglesa passa a ser, assim, uma língua internacional, a língua de acesso à informação, a língua da internet, das transações internacionais, da comunidade acadêmica. (MARCELINO, 2009: 10-11).

As questões culturais foram apontadas por da Silva como definidoras, em sua análise, de uma escola bilíngue propriamente dita. O reconhecimento, a participação e o respeito a ambientes

139 3 “To enable people to communicate with the outside world (e.g. Dutch people children learn English and German); 4 “To gain as economic advantage for individuals or groups (e.g. Japan trains large numbers of personnel in English, for jobs in business, government, and technology)”; 8 “To embellish or strengthen the education for elites (e.g. United Nations International School in New York City for children of UN officials)”;11“To deepen understanding of language and culture (e.g. the study of Greek and Latin among Europeans).” Tradução nossa.

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culturais diversos a formação de cidadãos para o mundo globalizado estão entre as características consideradas de uma escola bilíngue: Outra característica em comum que encontramos é a preocupação das escolas em formar alunos capazes de reconhecer, respeitar e participar de diferentes ambientes culturais. As frases “formar cidadãos para um mundo globalizado”, “cidadãos internacionais”, “cidadãos do mundo” aparecem em dois dos textos analisados. Uma vez que essas escolas incluem em seu currículo a formação multicultural de seus alunos, e a língua internacional é tratada como objeto a fim de aprimorar a competência linguística e também como instrumento de comunicação para fins diversos, essas escolas estão de acordo com as definições que caracterizam uma escola bilíngue. (DA SILVA, 2009: 24).

Da Silva conclui sobre os objetivos principais das escolas bilíngues em sua pesquisa são os de formar cidadãos que lidem com diferentes aspectos sociais e culturais: “Vimos que muitas dessas escolas preocupam-se em formar alunos preparados para lidar com diferentes culturas e ambientes sociais, contribuindo para a disseminação da tolerância entre os povos e a formação de cidadãos multiculturais.” (DA SILVA, 2009: 27); e formar cidadãos multiculturais bilíngues: “A partir dos resultados obtidos, percebemos que um novo perfil de cidadão está sendo criado a partir da expansão dessas escolas; cidadãos bilíngues e multiculturais.”140 (DA SILVA, 2009: 27); a formação de uma elite sociocultural também é apontada como um dos objetivos de algumas instituições: “Outras escolas, porém, deixam claro o seu caráter elitista no qual todo esse preparo social e cultural tem um único objetivo: a formação de pessoas aptas a ocuparem altos cargos sociais e profissionais, sendo esse objetivo também almejado por vários pais.”141 (DA SILVA, 2009: 27).

Como vemos do exposto pela pesquisa de da Silva (2009), os aspectos discutidos por nós, principalmente no Capítulo 2, que concernem ao maior traquejo social dos cidadãos ao serem expostos a aspectos sociais e culturais distintos dos seus próprios, podem ser vistos como contribuidores para a tolerância entre as pessoas e povos. O segundo aspecto evidente naquele trecho é o da manutenção do status e privilégio de uma elite que almeja melhores remunerações por meio de uma educação formal em mais de um idioma, tal manutenção foi também sentida por Marcelino (2009) e Möller (2017). Nos dois casos, porém, fica evidente o desejo da formação de um ser com uma competência global, (multi) bilíngue ou cultural.

140 Tais conclusões – lidar com aspectos sociais e culturais diversos, além de formar cidadão bilíngues multiculturais - vão ao encontro do que também achamos que o ensino bilíngue possa promover, conforme discutimos no Capítulo 2 como um todo. 141 Ver Ferguson, Houghton & Wells (1977) e Möller acima.

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Quando pesquisamos o que as próprias escolas e a mídia dizem a respeito no Brasil, a escola Influx, uma escola de idiomas da cidade de , no artigo Escola Internacional, bilíngue ou escola de idiomas: qual escolher para seu filho aprender inglês? propõe uma definição de escola bilíngue que leva em consideração o currículo, a carga horária da segunda língua e sua ministração como veículo em disciplinas que não são de língua estrangeira: “Na escola chamada bilíngue, a grade curricular brasileira é seguida, mas há uma carga horária mínima de duas horas diárias de ensino de inglês com disciplinas curriculares ministradas no idioma, como matemática, ciências e etc.” (INFLUX, 201: s/p).

Já em uma matéria do Portal Terra, a autora Cidinha Ramalho a define com relação à abordagem adotada e consideram bilíngues aquelas que propiciam uma imersão completa na segunda língua, embora isso não seja a realidade, já que pela lei brasileira as escolas têm que oferecer um currículo mínimo em língua portuguesa: A escola bilíngue possui uma abordagem distinta. Diferentemente das escolas tradicionais, que ensinam idiomas em matérias específicas, as escolas bilíngues utilizam o segundo idioma na totalidade de suas aulas, ou seja, em vez de os alunos terem aulas de inglês, eles têm aulas em inglês. Ciências, Biologia, Matemática, enfim, todas as matérias ensinadas nesse segundo idioma. Mais do que um curso de idiomas, é um processo de completa imersão cultural. (RAMALHO, 2017: s/p).

A Escola Novos Alunos escreveu o post Escola bilíngue ou currículo internacional: qual a diferença? (2016). Nele a instituição aborda a legislação brasileira explicando que o Ministério da Educação brasileiro não estabeleceu ainda uma regulamentação sobre a educação bilíngue e que não há uniformidade nas abordagens, metodologias e nem próprios sistemas das instituições no país: “Nessas escolas, as disciplinas do currículo são as exigidas pelo MEC, mas as aulas são ministradas tanto na língua-alvo quanto em português. Ou seja, a segunda língua não é uma disciplina apenas, mas sim um veículo de imersão”, como vemos a definição também considera a imersão na língua fundamental, embora mencione que a carga horária geralmente a metade das aulas oferecidas pela instituição: “Aulas de matemática, história, literatura, geografia e educação física, por exemplo, são também ministradas em outro idioma. A proporção costuma ser de quase 50% em cada idioma.” (NOVOS ALUNOS, 2016: s/p). Por essa visão a língua deixa de ser o objeto a ser estudado e passa a ser o veículo de comunicação nas diferentes disciplinas.

Em sua pesquisa científica, da Silva afirma não ter encontrado uma diferenciação dos conceitos de ensino bilíngue por imersão praticados no Brasil dos propostos pelo respeitado teórico

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internacional Colin Baker, professor aposentado da Bangor University, autor de livros sobre bilinguismo. Segundo a autora em sua pesquisa em instituições bilíngues brasileiras são respeitados o percentual de exposição na segunda língua (L2) que caracterizaria o critério de bilinguismo por imersão total em língua estrangeira proposto por Baker (1998), tal qual ao privilégio dado à comunicação significativa, autêntica e relevante, em detrimento da correção sistemática da gramática e outras correções, o que tornaria o aprendizado por imersão semelhante ao aprendizado da primeira língua (L1): Não encontramos um conceito particular de ensino bilíngue que diferenciasse dos conceitos encontrados nas teorias quanto à educação bilíngue por imersão no qual Baker nos afirma que a imersão total costuma iniciar-se com 100% de imersão em uma segunda língua, reduzindo-se para 80% depois de dois ou três anos e terminando o ensino fundamental com aproximadamente 50% de imersão na segunda língua. A comunicação em sala de aula tem como objetivo ser significativa, autêntica e relevante às necessidades da criança. O conteúdo curricular torna-se o foco para o desenvolvimento da língua. Insistência na comunicação “correta” é evitada. Aprender uma segunda língua desde o ensino infantil em um sistema de imersão torna-se acidental e subconsciente, similar ao aprendizado da primeira língua (DA SILVA, 2009: 23-24).

Quando procuramos a definição em organizações ou sites mais especializados em bilinguismo no Brasil, segundo a definição da Organização das Escolas Bilíngues (OEBI,2016: s/p) existente desde 2000, para ser considerada integrante desse setor bilíngue a instituição de ensino precisa oferecer uma carga horária mínima diária na segunda língua, ou seja, considera como critério essencial a escola ministrar uma carga horária mínima. Esse percentual de imersão, segundo o site, deve ser maior nos primeiros anos da Educação Fundamental (75% no Infantil, 35% no Fundamental), diminuindo gradualmente até o Ensino Médio que deve apresentar 25% de sua carga horária em uma língua diferente do português. Tal percentual é distinto do proposto por Baker (100%, 80% e 50%, respectivamente). O mesmo site da associação define o papel da escola bilíngue por critérios da competência linguística, ensino da língua-alvo como L2, imersão total no segundo idioma, a proposta pedagógica da escola, e a formação de cidadãos para o mundo globalizado:

Escolas bilíngues formam alunos competentes academicamente em Português e noutro idioma, por meio de um programa pedagógico integral, com imersão total da segunda língua durante a Educação Infantil e parcial nos Ensinos Fundamental e Médio. Nas escolas bilíngües de São Paulo predomina a adoção do Inglês como segundo idioma, em virtude do contexto sócio-econômico e político mundial. A proposta pedagógica das escolas bilíngües contempla uma maneira de educar que leva o aluno a interagir na prática com um contexto planetário, seguindo a tendência de globalização que espera da escola e a formação de homens preparados para atuarem como cidadãos do mundo. O particular e o universal são trabalhados com bastante eficácia, inclusive, porque

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a barreira da língua já é ultrapassada no cotidiano da sala de aula (OEBI, 2016: s/p).

Segundo o mesmo portal, para conseguirem cumprir essas exigências de acrescentar conteúdos curriculares em uma segunda língua, as escolas precisariam ampliar a carga horária: “O recomendável é que pelos menos três horas por dia sejam dedicadas ao ensino na segunda língua. Por isso, as escolas bilíngues precisam funcionar em período integral ou semi-integral, garantindo ao aluno tempo para estudo nas duas línguas” (OEBI, 2016: s/p).

Ainda de acordo com a Organização: “Todas as escolas brasileiras devem obedecer às determinações da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, além de determinações do MEC e dos conselhos estaduais de educação, que definem, por exemplo, a carga horária mínima e a quantidade de dias letivos” (OEBI, 2016: s/p). Da Silva, inclusive, menciona a preocupação das escolas bilíngues de estarem em consonância com as exigências dos órgãos regulatórios brasileiros educacionais: “À uma grande preocupação por parte destas escolas em informar aos pais-leitores de que apesar de fornecer uma educação bilíngue elas seguem os padrões de ensino brasileiro (MEC).” e “Portanto, cada escola define sua proposta de ensino, garantindo aos pais, de que seus filhos terão o ensino de uma escolar regular com o acréscimo de um ensino bilíngue.” (DA SILVA, 2009: 24).

Com relação às exigências do MEC (2017: s/p), a partir da Educação Infantil, o Português deve ocupar pelo menos 60% da carga horária; já a segunda língua, deve ocupar no mínimo 25%. O MEC também exige que as escolas bilíngues trabalhem no máximo 50% de cada idioma (L1 e L2), sobre esses dados o que vai ao encontro da caracterização de escola bilíngue da OEBI, e ainda ressalta que não existe no Brasil uma regulamentação específica para o ensino bilíngue, apenas para o ensino de línguas estrangeiras, conforme veremos melhor no próximo subitem. A reforma, que inclui tanto a BNCC (Base Nacional Comum Curricular), quanto o chamado Novo Ensino Médio, 2017 e 2018, respectivamente, torna o inglês obrigatório somente a partir do 6º ano do ensino fundamental e no ensino médio, conforme veremos em mais detalhes no subitem 3.4.

O site Educação Bilíngue no Brasil: Plurilinguismo, Interculturalidade e Educação no Brasil reúne publicações periódicas sobre a temática embora não tenha suas postagens assinadas por seus autores. Elas versam sobre o bilinguismo, ensino bilíngue (sendo no Brasil a educação bilíngue dos indígenas) e internacional etc. Na publicação O que é uma escola bilíngue?, a

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definição de escola bilíngue engloba a organização total da instituição para o desenvolvimento das competências linguísticas em contextos sociais e linguísticos variados, destaca que os idiomas são veículos para a comunicação, contrapondo a definição de escola bilíngue à proposta das escolas de idioma: Uma escola bilíngue se organiza, em todos os níveis, para proporcionar aos seus alunos as competências necessárias para usar duas ou mais línguas em situações acadêmicas e sociais. Por isso, uma escola bilíngue ensina por meio das línguas e não apenas as línguas, sendo essa a principal diferença em relação a escolas de idiomas. Isso significa que os alunos não têm apenas aulas de inglês, francês, espanhol, libras ou línguas indígenas, mas tem, principalmente, aulas de diversas matérias em inglês, francês, espanhol, coreano, libras, línguas indígenas ou qualquer outra. (O QUE É UMA ESCOLA BILÍNGUE, 2014: s/p).

Outros tipos de definição de escola bilíngue invariavelmente interseccionam-se com a definição do tipo de bilinguismo adquirido pelo aluno. O bilíngue por imersão seria aquele introduzido na educação infantil, sendo que há muitos tipos dessa imersão, que variam de acordo com a idade em que o estudante iniciou seus estudos, e o número de horas de exposição na língua-alvo, novamente, tomando-se por base os estudos propostos por Baker (1998): Para o bilinguismo de imersão, a L2 precisa ser introduzida a partir da Educação Infantil e deve ser a língua mais falada e aprendida até a fase de alfabetização, ou seja, a escola bilíngue de imersão é uma escola em que a criança falante de uma língua materna, no caso o português, entra na escola e recebe sua educação ou boa parte dela em uma segunda língua, no caso o inglês. Nessa variedade de bilinguismo, são levados em consideração a idade de ingresso da criança na escola e o período de tempo que ela estará exposta ao aprendizado da L2. Segundo Baker (1998, p. 496), é a idade em que a criança começou a ter contato com essa experiência que nomeia o tipo de imersão da qual ela faz parte [...] (MÖLLER, 2017: 115-116)

Nesse momento Möller (2017: 116) enumera os tipos de imersão, segundo Baker (1998), o que determina essa nomenclatura “é a idade em que a criança começou a ter contato com essa experiência que nomeia o tipo de imersão”– que vai da chamada imersão inicial (quando a criança ingressa na escola bilíngue até os 8 anos), a mediana (dos 9-10 anos) e a tardia (quando ela ingressa no Fundamental II); ou de acordo com a quantidade de tempo de exposição da criança à língua-alvo (L2), imersão total (início de 100% de tempo exposta à L2, três anos após a exposição é reduzida para 80% e nos próximos anos até Fundamental I, a 50% do tempo na língua materna e 50% na L2), a parcial (50% do tempo na língua materna e 50% na L2) e a tardia (a alfabetização dá-se em língua materna, as crianças ficam expostas à língua materna 100% do tempo quando ingressam no Ensino Médio passam a ter contato com a L2).

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Möller (2017: 118) ressalta ser fundamental diferenciar o ensino de línguas estrangeiras do ensino bilíngue: “A educação regular que ensina línguas estrangeiras tem como objetivo noções básicas de comunicação escrita e oral, diferentemente da educação bilíngue, que tem como objetivo a aquisição de um nível avançado de comunicação na L2.” Ainda de acordo com a pesquisa de Möller (2017: 116-117) os principais diferenciais das escolas bilíngues por imersão das internacionais são que a equipe de professores nem sempre é de estrangeiros, com um time composto em sua maioria por brasileiros fluentes no inglês; o currículo é predominantemente brasileiro com uma grande carga horária na L2, na maior parte dos caso o inglês, seguindo-se o calendário escolar das escolas brasileiras, feriados e as férias: “[...] as escolas de educação bilíngue por imersão pretendem proporcionar às crianças uma aprendizagem significativa e contextualizada na L2, sem deixar de lado a cultura associada à L1, tendo como principal objetivo formar indivíduos com boa fluência em dois idiomas, pois, na maioria das vezes, existe um foco na L1 também.” e que “Exemplos de escolas bilíngues por imersão presentes na cidade de São Paulo: See-Saw-Panamby Bilingual School; PlayPen; My School; Maple Bear; Tiny People Bilingual School, entre outras.” (MÖLLER, 2017: 117).

A pesquisa de Marcelino (2009) cita o teórico em bilinguismo Wei para afirmar que a escola bilíngue além da possibilidade de oferecer “[...] a facilidade de desenvolvimento de uma língua desde cedo com todas as possibilidades educacionais trazidas por uma língua a mais. Em escala maior, ser bilíngue traz vantagens nos campos comunicativo, cognitivo e cultural (WEI, 2000: 22 - 24).” (MARCELINO, 2009: 11). Como discutimos ao longo do Capítulo 1, as vantagens no campo cognitivo advindas do bilinguismo estão no centro das discussões científicas do paradigma vigente para a temática. Tais vantagens são mencionadas como uma vantagem bilíngue nessa pesquisa brasileira, sendo que são citadas também uma vantagem comunicativa, portanto, social, além de uma vantagem cultural, como ligadas e presentes à condição bilíngue no trecho destacado - temática abordada no Capítulo 2. O autor Li Wei é um linguista chinês e britânico da UCL (University College London) com pesquisas expressivas em bilinguismo e multilinguismo, tal qual Baker. Seu mundialmente famoso best-seller The bilingualism reader norteia as discussões sobre o conceito de bilinguismo, code-switching, entre outros assuntos.

O que gostaríamos de destacar, porém, é que os outros dois aspectos sociais da língua, a comunicação e a cultura, são colocados em igualdade às possíveis vantagens cognitivas que o

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bilinguismo pode acarretar. Outras habilidades sociais comunicativas também são exaltadas pelo pesquisador brasileiro Marcelino no campo comunicativo, que destaca que o bilíngue pode estabelecer vínculos com parentes e outras comunidades linguísticas, além de poder ter acesso à materiais originais, sem necessitar fazer o uso de traduções, como fica evidente no excerto: “[...] o bilíngue pode estabelecer vínculos diferenciados e íntimos com pais que falam línguas diferentes, e por extensão, com os pais dos pais e também com diferentes comunidades linguísticas dentro ou fora do mesmo país; além de acesso a desenhos, filmes, gibis e livros em suas versões originais.” (MARCELINO, 2009: 11). O autor ainda fala de uma “maior sensibilidade linguística” e de “vantagens culturais”, tais vantagens foram mencionadas por nós como vantagens sociais142 e podem ser consideradas como relevante na construção de tolerância (DA SILVA, 2009) ou para “sensibilizar o indivíduo mais ainda para outras culturas” (MARCELINO, 2009), como fica evidente: A sensibilidade linguística de indivíduos bilíngues parece ser um diferencial. Devido ao constante monitoramento de duas línguas (com quem se fala qual língua), o bilíngue se torna mais atento, paciente e sensível a diferentes situações linguísticas do que monolíngues. As vantagens culturais trazidas pelo bilinguismo não são dissociáveis das comunicativas, uma vez que mais sensível às questões linguísticas, o bilíngue também se torna mais sensível às questões culturais atreladas às diferentes línguas que fala, já que o uso de uma outra língua possibilita uma visão diferenciada e penetração mais eficiente na cultura do outro. O que, por extensão, pode sensibilizar o indivíduo mais ainda para outras culturas (MARCELINO, 2009: 11).

Comparativamente, como veremos no subitem 3.6, a definição de escola bilíngue pode ser feita em relação à definição de escola internacional, ou como já trazido pelas ideias de alguns pesquisadores ela faz-se existir quando traça-se um comparativo com o ensino em língua estrangeira feito em institutos de idiomas, principalmente no que diz respeito ao número de horas de exposição a L2. Também vimos que a língua pode ser vista como um instrumento de aprendizado, ou um veículo, e agora destacamos que ela pode ser enxergada como promotora de contato com aspectos sociais e culturais do país de referência daquela língua:

Ao comparar o ensino bilíngue com o ensino de línguas em institutos de idiomas, verificamos que existe uma semelhança nos dois sistemas de ensino, quanto à forma de ensino-aprendizagem ocorrer de forma significativa e contextualizada. Contudo, o que parece diferenciar o ensino de línguas no contexto bilíngue do instituto de idiomas é: maior número de horas que o aluno fica exposto a esta nova língua, uso da língua internacional como instrumento para o aprendizado de outras matérias, como ciências e artes, maior contato com os aspectos sociais e culturais desta nova língua. (DA SILVA, 2009: 25).

142 Abordamos isso no Capítulo 2.

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De acordo com a pesquisa acima exposta, elencamos como os dez principais critérios que parecem nortear a definição de escola bilíngue no Brasil: • primeiro critério, o do objetivo da instituição que se autodenomina bilíngue – de promover a comunicação na L2, de manter os status e posição de dominância de uma classe dominante, de propiciar melhor empregabilidade do aluno, etc.; • segundo critério da abordagem dada em relação à língua/cultura pela escola que se autoproclama bilíngue, de acordo com esse critério a língua pode ou não ser vista como um veículo para a comunicação; podendo haver ou não a consideração dos aspectos culturais e sociais de outros países além da línguacultura do Brasil; • terceiro critério contém as definições de escola bilíngue que levam em consideração a comparação com as escolas internacionais, quanto ao currículo e o calendário seguidos, brasileiro ou de outra nação; • quarto critério menciona a carga horária das aulas ministradas; • o quinto critério abarca a questão de desenvolvimento da competência linguística e/ou da fluência nos idiomas; • o sexto analisa a proposta pedagógica da escola que visa a formação de ‘cidadãos do mundo’, ou seja, inclui aspectos socioculturais e/ou históricos; • o sétimo considera a organização da escola em todos os níveis para desenvolver em seus alunos a competência linguística, tanto nas situações sociais quanto nas acadêmicas; • o oitavo critério é quanto à nacionalidade dos professores contratados, sendo que no ensino bilíngue nem sempre estes são preferencialmente estrangeiros (diferentemente do da escola internacional, como veremos a seguir); • o nono aponta para critérios que consideram que a escola bilíngue possa acarretar em vantagens nos campos comunicativo, de comunicação social, ou vantagens cognitivas e/ou culturais para seus alunos; • o décimo critério considera os aspectos em relação à definição do tipo de bilinguismo adquirido pelo aluno. O bilíngue por imersão teria que iniciar seus estudos na Educação Infantil, mas há as subdivisões dessa nomenclatura: imersão inicial, mediana e tardia, total ou parcial, conforme vimos, o que faz com que os critérios se multipliquem exponencialmente, principalmente se levarmos em consideração as múltiplas definições de tipos de bilinguismo existentes na fortuna crítica da área.

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Como podemos resumir, os critérios para definir a escola bilíngue brasileira trazidas por artigos científicos e pela mídia em geral, apontam para questões muito diversas, como ocorre em outras nações. Essas múltiplas definições valem-se de uma gama de critérios para abrigar uma série de discernimentos distintos que definiriam a escola bilíngue e o ensino bilíngue no Brasil. Estes vão desde haver uma carga horária mínima de duas horas diárias de ensino em uma língua-alvo à uma imersão total em uma segunda língua, com maior ou menor cuidado pedagógico de organização para efetuar essa vivência e o desenvolvimento da competência linguística na língua alvo, passando ou não por aspectos culturais, aspectos de fluência e competência linguística, além dos aspectos sociais, dentre outros não mencionados aqui.

3.3 O que os pais esperam ao matricularem seus filhos em uma escola bilíngue

Em sua pesquisa, da Silva (2009) analisou a percepção social do ensino bilíngue, em específico dos idiomas português e inglês em território nacional, para tal valeu-se de entrevistas e da análise dos textos disponibilizados na Internet pelas escolas bilíngues, para sua discussão a respeito das possíveis causas de os pais matricularem seus filhos nessas instituições bilíngues.

As principais razões elencadas foram as seguintes: (1) a rapidez no aprendizado da segunda língua e maneira que ela é ensinada: “Parece-nos que o que move os pais a matricularem seus filhos em escolas bilíngues está atrelada à rapidez de aprendizagem e a forma de ensino desta nova língua.” (DA SILVA, 2009: 25); (2) a ampliação do horizonte cultural do aprendiz devido à globalização e oportunidade de melhor inserção no mercado de trabalho globalizado: “Esses pais buscam mais do que aulas de idiomas, eles querem que seus filhos tenham um conhecimento cultural mais amplo, acreditando que assim eles estarão mais preparados para este novo mundo globalizado e o futuro mercado de trabalho.” (DA SILVA, 2009: 25); (3) a fluência total na L2: “[...] os pais que procuram uma escola bilíngue querem que seus filhos adquiram fluência total em uma língua internacional, sendo na maioria dos casos a língua inglesa, acreditando que trará melhores resultados do que se tivessem matriculado seus filhos em um instituto de idiomas.” (DA SILVA, 2009: 26); e, finalmente, (4) as preocupações em relação ao futuro profissional dos jovens que estaria inserido em um contexto sociocultural mais amplo do que o mero aprendizado de uma segunda língua: “[...] esses pais já não mais acreditam que apenas o ensino de uma nova língua traga bons benefícios para o futuro profissional de seus filhos, sendo a preocupação

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com o futuro profissional um dos principais motivos para matricularem seus filhos nestas escolas.” (DA SILVA, 2009: 26).

Como podemos inferir, os quatro elementos principais apontados por da Silva como motivadores para a matrícula em um colégio bilíngue em detrimento da matrícula em institutos de idioma estão relacionados a(o): fato dessas instituições exporem os alunos mais horas a L2, que resultaria em maior rapidez de aprendizado; expectativa de ampliação de conhecimento cultural da L2, que contribuiria na formação de cidadãos para o mundo globalizado; esperança de atingirem-se melhores resultados de fluência (total) na L2; e, finalmente, ao fato desses pais almejarem melhores resultados profissionais futuros para seus filhos que, segundo sua crença, seria alcançado devido ao ensino bilíngue ser capaz de inserir os aprendizes em contextos socioculturais mais amplos143.

3.4 O que diz a legislação brasileira sobre ensino bilíngue e o que ela omite

No Brasil ainda não há uma regulamentação específica por parte do governo que defina exatamente o que é uma escola bilíngue. A regulamentação dá-se para outras linguagens e línguas brasileiras como as LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais), para as escolas de fronteiras144, sendo que a única regulamentação realmente existente é para as escolas indígenas - que são as únicas dessa modalidade de ensino nomeadas como bilíngues nos documentos oficiais brasileiros de acordo com o MEC (Ministério da Educação).

A LDB, Lei de Diretizes e Bases da Educação (2017), reconhece a existência de um modelo de educação bilíngue, chamada de “educação escolar bilíngue e intercultural aos povos indígenas”. Conforme colocamos na Introdução dessa tese, os povos indígenas sofrem tentativas de apagamento de sua línguacultura desde o início da colonização portuguesa145. Essa é uma conquista importante dos povos originais de nosso país, essa lei pode ser uma tentativa de reparação pela violência linguística que os indígenas vêm sofrendo ao longo desses cinco séculos. Destacamos os Artigos 78 e 79, do Título VIII, das Disposições Gerais que versam sobre a educação escolar bilíngue e intercultural indígena e o suporte financeiro do Estado, respectivamente:

143 No subitem 3.9 trazemos nossa proposta teórica. 144 Há um documento inteiro que aborda essas instituições: Escolas de Fronteiras. Feito em conjunto entre os Ministérios da Educação Brasileiro e Argentino. O PEBF – Programa Escolas Bilíngues de Fronteira, que não será abordado por fugir do escopo desta pesquisa. 145 Abordamos isso na Introdução.

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Art 78 - O Sistema de Ensino da União, com a colaboração das agências federais de fomento à cultura e de assistência aos índios, desenvolverá programas integrados de ensino e pesquisa, para oferta de educação escolar bilingüe e intercultural aos povos indígenas, com os seguintes objetivos: I – proporcionar aos índios, suas comunidades e povos, a recuperação de suas memórias históricas; a reafirmação de suas identidades étnicas; a valorização de suas línguas e ciências; II – garantir aos índios, suas comunidades e povos, o acesso às informações, conhecimentos técnicos e científicos da sociedade nacional e demais sociedades indígenas e não-índias. Art. 79. A União apoiará técnica e financeiramente os sistemas de ensino no provimento da educação intercultural às comunidades indígenas, desenvolvendo programas integrados de ensino e pesquisa [...] (LDB, 2017: 49)

Em geral, a língua materna dos povos indígenas no Brasil é a língua indígena de seu povo, a língua portuguesa é a segunda língua e este bilinguismo não é eletivo para esses povos. Isso faz o processo de escolarização, a educação bilíngue indígena, uma forma fundamental de garantir a essas comunidades o acesso à cidadania, a elevação da autoestima, dando a eles o direito de preservação de identidade146, tanto por meio da preservação de sua língua materna, quanto pelo acesso à língua oficial do país, o português. Nas escolas bilíngues particulares, ou até mesmo nas públicas, o bilinguismo é opcional, quer dizer, que para elas é válida a legislação brasileira como é esperado de qualquer outra escola do território nacional, ou seja, as mesmas regras e obrigações são observadas.

Anteriormente, a LDB não trazia a língua inglesa como disciplina obrigatória. A reforma, que inclui tanto a BNCC (Base Nacional Comum Curricular), quanto o chamado Novo Ensino Médio, torna o inglês obrigatório a partir do 6º ano do ensino fundamental e no ensino médio. O Portal do MEC em sua sessão de dúvidas afirma que somente o inglês é obrigatório e justifica-se da seguinte maneira: “Os sistemas de ensino poderão ofertar outras línguas estrangeiras se assim desejarem, preferencialmente o inglês. A língua inglesa é a mais disseminada e a mais ensinada no mundo inteiro” (MEC, 2017: s/p). Já a LDB permite que haja uma parte diversificada do currículo desde o fundamental ao médio, o que permite que as escolas bilíngues e internacionais operem em território nacional e regula que a língua inglesa é obrigatória a partir do sexto ano:

Art. 26º. Os currículos da educação infantil, do ensino fundamental e do ensino médio devem ter uma base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e em cada estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e dos educandos [...]

146 Observar também o que trouxemos no Capítulo 2.

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§ 5o No currículo do ensino fundamental, a partir do sexto ano, será ofertada a língua inglesa. (LDB, 2017: 19-20)

A LDB, mesmo após a reforma, preconiza a obrigatoriedade do ensino em língua portuguesa no território nacional e do idioma inglês a partir do 6º ano, como língua estrangeira. A exceção a isso é o que versa sobre a educação bilíngue dos povos indígenas. As escolas bilíngues atualmente existentes no país posicionam-se como as demais e devem seguir as regulamentações de oferecer 200 dias letivos, aulas dos componentes curriculares obrigatórios em língua portuguesa, em uma carga horária mínima de 4 horas diárias.

Como não há legislação específica para as escolas bilíngues e como ainda não foi feito um Censo dessas instituições, elas têm liberdade para organizar a parte diversificada de seus currículos, desde que cumpridas as exigências mínimas da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Em geral, as autointituladas escolas bilíngues cumprem apenas o currículo brasileiro, já as denominadas escolas internacionais147 além do currículo brasileiro cumprem o currículo do país de origem. Essa ausência de legislação específica foi sentida por da Silva, que ressalta que instituições autoproclamam-se bilíngues somente devido ao aumento de número de horas de exposição a L2: “Todavia, devido à falta de regulamentação pelos órgãos públicos, também encontramos escolas que apenas intensificam o ensino de língua inglesa e autodenominam-se bilíngues, cabendo aos pais conhecer de perto as escolas antes de matricularem seus filhos.” (DA SILVA, 2009: 27).

O site Educação Bilíngue no Brasil afirma que as escolas bilíngues acrescentam um horário complementar e/ou um currículo adicional: “A maior parte das escolas oferece cerca de 3 horas diárias a mais em seu período letivo, e procuram equilibrar o tempo de exposição à segunda língua com o tempo regulamentar no currículo brasileiro.” e que “Algumas escolas organizam curricularmente o período complementar, em que é oferecida a educação bilíngue, no item “parte diversificada” do currículo, conforme também é previsto na LDB.” (EDUCAÇÃO BILÍNGUE NO BRASIL, 2014: s/p). O site também menciona que outras instituições especificam esse período complementar como um “curso extra” e que tais denominações dão à escola bastante liberdade na condução deste curso, o que implica em menor cobrança externa a esse respeito. Sobre isso Möller também afirma: “Algumas escolas no município de São Paulo passaram a promover o bilinguismo como uma proposta extracurricular, ou seja, como um contexto optativo no contraturno escolar.” (MÖLLER, 2017: 118).

147 No subitem 3.3, discutimos sobre escolas bilíngues.

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Em uma pesquisa recente de 2016, chamada de O que pensam os gestores sobre a regulamentarização e funcionamento de uma escola de Educação Infantil bilíngue, Flávia Queiroz Hoexter (2016: 11) traz o dado de que de acordo com o Parecer do Conselho Municipal de Educação (CME) da cidade de São Paulo (número 135/2008) os supervisores escolares deparam-se com propostas de ensino bilíngue, projetos políticos pedagógicos (PPP) e regimentos escolares com organização variada ao analisarem pedidos de autorização de funcionamento dessas escolas na iniciativa privada para o segmento Educação Infantil. Não existe um projeto pedagógico com parâmetros específicos para essas escolas, o que possibilita uma ampla gama de métodos pedagógicos para a educação bilíngue, permitindo que algumas escolas promovam apenas a intensificação de um segundo idioma ao invés de uma verdadeira educação bilíngue.

Segundo Möller (2017: 118): “Uma pesquisa realizada pelo Datafolha com 117 colégios teve como resultado 28% deles autointitulando-se bilíngues, sendo que muitos desses colégios apenas possuem uma carga horária maior na L2.”, isso implica em dizer que a falta de regulamentação para o setor, além da falta de parâmetros, informação e até fiscalização podem levar a distorções nesse tipo de ensino.

Dois aspectos relevantes para que não existam distorções que devem ser considerados quando houver uma mobilização política e social para que sejam feitos os parâmetros referentes à escola bilíngue no Brasil são em relação à formação dos professores e a fiscalização que far- se-á necessária. Segundo Hoexter (2016: 11) a formação adequada dos profissionais que vão trabalhar em sala de aula é essencial para a efetivação do ensino bilíngue no Brasil para não comprometer a qualidade do ensino, sendo necessárias tanto a especialização quanto a fluência na segunda língua, além de conhecimento acadêmico sobre bilinguismo por parte dos professores e demais profissionais das escola bilíngues, uma vez que: “[...] no cotidiano educacional verifica-se certo desconhecimento dos fundamentos do bilinguismo, suas possibilidades, limitações e alcances.” (HOEXTER, 2016: 11).

Finalmente, como não existe sobre as escolas autoproclamadas bilíngues uma supervisão sistemática e periódica por parte das Secretarias de Educação, há uma dificuldade do estabelecimento de um padrão de qualidade, já que não é possível identificar quais critérios devem ser seguidos, quais realmente definem a escola bilíngue, nem quais serviriam para

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avaliar tais escolas, o que faz com que os pais tenham que acreditar nas próprias definições e parâmetros das instituições. Sobre a falta de sistematização no setor, Möller resume a questão: A regulamentação de escolas bilíngues exige adequação, revisão das práticas e reflexão sobre as estratégias de formação profissional, para que realmente responda às características de um contexto bilíngue e atenda às demandas educacionais. Portanto, o estabelecimento de padrões claros de qualidade que permitam avaliar a escola bilíngue é necessário, especialmente em um contexto no qual muitas escolas que se dizem bilíngues agem completamente diferente, descaracterizando o conceito de bilíngue. Só assim será possível garantir a educação bilíngue no contexto brasileiro. (MÖLLER, 2017: 119).

3.5 Conciso retrospecto histórico da escola internacional no Brasil e os motivos dos pais ao matricularem seus filhos lá

Encontramos na tese de Adriana L. Cantuaria, da Área de Educação, Escola internacional, educação nacional: a gênese do espaço de escolas internacionais de São Paulo, uma profunda pesquisa sobre esse tipo de instituição e um retrospecto significativo da escola internacional brasileira em sua origem ou gênese. Tal qual Möller (2017) identificou em relação às escolas bilíngues148, Cantuaria identifica, na origem dessas instituições, a tendência de manutenção do status e do privilégio das elites nesses espaços escolares.

Em seu retrospecto histórico desde a época do Império, ela aponta a escola internacional como capaz de desempenhar um papel unificador da classe dominante no país: “No Brasil, a utilização estratégica da escola como instância privilegiada de formação dos grupos dominantes é anterior ao princípio do Império, num quadro em que coube à educação o papel particular de ser instrumento de unificação das elites.” (CANTUARIA, 2005: 2). A elite brasileira, diferentemente das de outros países, em especial dos europeus, não era homogênea, nem constituída de uma origem social comum, ou intelectualmente e ideologicamente coesa, esse papel coube à escola secundária e principalmente ao ensino superior no país: A unificação das elites através da passagem pela escola secundária e sobretudo pela escola superior significou, então, sua própria sobrevivência como tal garantindo o acesso às credenciais acadêmicas e, principalmente, sociais necessárias para a inserção nas instâncias de poder, particularmente de poder político. Ao mesmo tempo, ao permitir a identificação e articulação entre esses grupos, ampliava a distância entre estes e os demais grupos sociais (CANTUARIA, 2005: 3).149

148 Ver subitem 3.2. 149 Como vemos pelo trecho, três itens também investigados ao longo dessa pesquisa como um todo são considerados de suma importância desde o início da escola no Brasil: a parte social (aqui dada pela sobrevivência de grupos sociais); o poder da língua (que permite o acesso à academia pela educação) e a identidade (aqui dado pela

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Com relação à internacionalização dos estudos, Cantuaria explica que essa prática era restrita aos grupos dominantes até muito recentemente, no início do século XX, sendo considerada um trunfo diferenciador da elite: Prática virtualmente restrita às elites econômicas até as primeiras décadas do século XX, a internacionalização das experiências escolares, por outro lado, manteve-se tradicionalmente como trunfo das camadas privilegiadas nas lutas por diferenciação, principalmente nos momentos em que sua posição foi ameaçada por grupos médios ou ascendentes, nacionais ou imigrantes. (CANTUARIA, 2005: 3).

Segundo Cantuaria (2005: 13) a escola internacional no Brasil surgiu principalmente como voltada para os filhos de imigrantes que se estabeleceram aqui em contextos de colonização e expansão cafeeira; para os filhos de imigrantes temporários – filhos de diplomatas, industriais e aqueles que promoviam a infraestrutura no Brasil - que queriam que seus filhos pudessem ser inseridos em contextos educacionais de outros países sem prejuízos; e para filhos da elite brasileira em resposta ao surgimento dessas duas últimas, sendo essa escola especificamente o liceu francês150.

A pesquisa de Möller (2017: 113) afirma sobre as escolas internacionais que “O ingresso de crianças brasileiras em escolas bilíngues não era comum até 30 anos atrás, pois estas eram frequentadas, em sua maioria, por crianças estrangeiras.” e “Eram as escolas internacionais, que atendiam a alunos nascidos no exterior que passavam a residir no Brasil e que tinham alguma língua estrangeira como sua primeira língua”. Ela reforça que a classe média ou classe alta eram as que frequentavam essas escolas internacionais, ou as bilíngues de imersão, como vemos no excerto: “[...] com a crescente valorização da habilidade e fluência numa segunda língua – especialmente por uma classe média em ascensão –, um número maior de crianças brasileiras passou a ingressar em escolas internacionais e em escolas de imersão, que começaram a ser inauguradas especialmente nas grandes cidades.” (MÖLLER, 2017: 113).

Como possíveis motivos da mudança de público da escola internacional no final do século XX e início do século XXI, Möller aponta a possibilidade de fluência na L2, a vivência em contextos bi- ou multiculturais, a oportunidade de estudar em universidades e de empregos fora do país que a escola proporciona, além do recente aumento do poder aquisitivo da população brasileira: identificação e articulação dos grupos sociais de elite). Como podemos inferir esse tripé - língua-identidade-poder – é essencial para as discussões sobre educação e o fundamento da língua é o fator unificador e articulador do trinômio. 150 No próximo subitem comentamos a proposta de Cantuaria sobre a definição de escola internacional.

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Alguns dos motivos para o aumento dos alunos brasileiros em escolas internacionais são: uma possível atração pela fluência em uma segunda língua, a vivência em um contexto bicultural ou multicultural oferecido pela instituição e a viabilização de oportunidades no exterior, como universidades e ofertas de emprego, além do aumento do poder aquisitivo de parte da população brasileira, que já era considerada alta baixa e passou a ser considerada alta média, pois essas escolas cobram mensalidades ainda mais altas do que as das escolas bilíngues de imersão, que, por sua vez, oferecem um preço mais elevado que o das escolas não bilíngues (MÖLLER, 2017: 117).

Já Cantuaria acredita que seu surgimento das escolas internacionais nesses últimos dois séculos se deu em um quadro mais amplo em que a qualidade da inserção social que a escola inevitavelmente acaba por promover, além da própria estruturação da vivência do estudante por meio de sua experiência devem alinhar-se aos valores, visão de mundo e estilo de cada instituição - que são bem variados de uma para a outra. Tal alinhamento deve dialogar com o imaginário das famílias dos estudantes em termos da língua estrangeira a ser ensinada, do país com o qual dialogará culturalmente e do grupo social que predominará na convivência escolar: Considerando que que a passagem por um determinado sistema escolar tem efeitos importantes na estruturação da experiência e na qualidade da inserção social, a opção por uma escolarização internacional, desde que a família tenha condições de optar [...] depende, fundamentalmente da existência da correspondência entre o estilo das instituições e valores e visão do mundo das famílias que se dispõem a servir. É nesse quadro que compreende o surgimento das escolas internacionais, diferenciado e hierarquizado, onde cada uma delas dialoga com a imaginação das famílias dos jovens que se encarrega de formar, mobilizando seus elementos constitutivos (nação de referência, língua de ensino, grupo social que atende etc.) (CANTUARIA, 2005: 5-6).

3.6 Definição de escola internacional e o número de escolas (bilíngues e internacionais) no Brasil

Já mencionamos que, em nossa pesquisa teórica, encontramos, predominantemente, trabalhos científicos recentes e não publicações em livros, no Brasil, que detalham uma definição propriamente dita de escola internacional ou de um chamado ensino internacional, as que encontramos, em geral, fazem a definição por meio de uma oposição comparativa com as chamadas escolas bilíngues.

Cantuaria (2005: 6) afirma sobre as escolas internacionais que o fato de terem sido criadas por estrangeiros e para eles, de autointitularem-se “internacionais”, de serem reconhecidas em seus países de referência, além de possibilitarem o acesso a certificações internacionais que validam os estudos no Brasil, e em outros países, são os principais fatores comuns entre as escolas internacionais que: “No caso da cidade de São Paulo [...] é formado por grandes instituições escolares, instaladas em prédios suntuosos em pontos nobres da cidade e que oferecem um

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ensino que vai da Educação Infantil ao último ano do Ensino Médio, ministrado em língua estrangeira.” (CANTUARIA, 2005: 6).

Para a definição de escola internacional a pesquisadora (CANTUARIA, 2005: 11) valeu-se de três expedientes: examinou o material de divulgação e a Internet procurando por informações das escolas que autoproclamavam-se internacionais; procurou a Secretaria de Estado da Educação e do Conselho Estadual de Educação que regulamentam o setor escolar; e consultou a Literatura sobre imigração e sobre a construção dos sistemas de ensino. Como resultado da pesquisa, houve, por parte da autora, a construção de um grupo de escolas que tinham em comum pelo menos uma de duas características: a primeira era o fato dessas instituições serem reconhecidas pelos sistemas de ensino de seus respectivos países de referência, sendo suas representantes em territórios estrangeiros; já a segunda era o fato dessas escolas funcionarem regularmente no Brasil como instituições internacionais. Segundo a pesquisadora, em 2001, obedeciam a esses critérios somente dez instituições a Graded, a Chapel e a Pan-american – americanas, a Saint Paul – inglesa -, o Miguel de Cervantes – espanhol -, o Colégio Suiço- Brasileiro, o Dante Allighieri – italiano -, o Porto Seguro e o Humboldt – alemães - e o Liceu Pasteur – francês.”.

Numa segunda etapa Cantuaria entrevistou pais e profissionais de algumas escolas e chegou a um subgrupo de escolas, minoritário, que possuía características suficientes para serem consideradas internacionais, mas eram ignoradas pelas demais, ou seja, que não eram reconhecidas como internacionais por aquele seleto grupo de dez escolas. A pesquisadora concluiu que: “Pelo que pude averiguar, esse processo parece estar ligado ao prestígio de cada instituição, tradição, legitimidade junto aos governos dos países de referência, ou simplesmente à concorrência.” (CANTUARIA, 2005: 11).

Cantuaria (2005: 13), após sua análise, propôs três modelos de escolas internacionais baseados no lugar social que as escolas ocupavam de acordo com suas origens (de proporcionarem estudo às levas de filhos de imigrantes vindos nos séculos XIX e XX): o primeiro chamado de “escolas de imigrantes” – grupo relacionado aos contingentes italianos e alemães da época da colonização dos territórios brasileiros e da expansão da economia cafeeira; o segundo modelo chamado de “escolas de expatriados” – relacionado aos grupos minoritários de norte-americanos e ingleses que vinham temporariamente ao Brasil para empreendimentos financeiros, de infraestrutura ou industriais; e o terceiro que ela chamou de

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“escola internacional” que refere-se a um caso único o do liceu francês que “surge como resposta brasileira à ameaça de concorrência pelos grupos imigrantes e suas escolas de alto nível”.

O objetivo do liceu segundo a autora era o de “formar as novas elites da república” seus estudantes eram, assim, jovens de famílias abastadas brasileiras, alguns franceses e estrangeiros de nacionalidades variadas - grupo que foi aumentando com o passar do tempo. Segundo Cantuaria, que estudou particularmente essa instituição na sua tese, a fundação do liceu contribuiu para a construção da nacionalidade brasileira: “Aclamada por políticos e intelectuais brasileiros como a primeira iniciativa rumo à constituição de um verdadeiro sistema de ensino no Brasil, a fundação do liceu francês aparece em seus discursos como um passo importante no processo de construção da nacionalidade.” (CANTUARIA, 2005: 13)151.

Há pesquisas científicas que definem a escola internacional em comparação às escolas bilíngues, na já mencionada Percepção Social do Ensino Bilíngue inglês/português no Brasil (2009), a diferença é feita por meio dos currículos ensinados, o autor afirma que além do currículo brasileiro, há o enfoque no currículo do país de origem da instituição: “[...] encontramos no país escolas de educação internacional até o nível do ensino médio; porém, estas escolas priorizam o currículo do país de referência, ao contrário das escolas denominadas bilíngues que seguem o calendário escolar brasileiro e também privilegiam a cultura do país.” (DA SILVA, 2009: 4). Como podemos inferir, os principais critérios apontados como diferenciadores das escolas bilíngues das internacionais pela autora são que o currículo e o calendário a serem seguidos, além da própria cultura privilegiada, não são a do país em que a escola está fisicamente localizada.

Mollër em sua pesquisa também define a escola internacional em contraponto às escolas bilíngues e em relação a critérios associados à cultura do país de referência, embora ressalte que, tal qual as escolas bilíngues, as escolas internacionais proporcionem aprendizagem contextualizada e significativa: É importante ressaltar que as escolas internacionais também pretendem proporcionar às crianças uma aprendizagem significativa e contextualizada na L2. Porém, em geral, a cultura da L1 é restringida nesse contexto, já que praticamente todos os repertórios (músicas, histórias, matérias etc.) são

151 Isso é relevante para nossa análise uma vez que conflui para o que defendemos nesta tese: que a identidade nacional é inevitavelmente perpassada pela língua como vimos no Capítulo 2.

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oferecidos em outro idioma e, portanto, estão relacionados à outra cultura, que não a da L1. (MÖLLER, 2017: 117).

Essa pesquisa define “a escola bilíngue internacional” como: “Outro modelo de educação bilíngue presente em São Paulo é a escola bilíngue internacional, que surge em diversos países com o intuito de proporcionar um currículo estável e adequado às necessidades das crianças que mudam de país, muitas vezes por motivos profissionais dos pais.” (MÖLLER, 2017: 117). Além de terem acesso a “um currículo estável”, a escola é definida por meio de seus objetivos, de possuir uma metodologia própria, pelo foco empregado nas línguas ensinadas, pelo nível de proficiência alcançado na L2, além do privilégio diferenciado dado às culturas envolvidas, como vermos no trecho selecionado:

Portanto, essas escolas têm como principal objetivo proporcionar uma educação seguindo uma metodologia própria do país de origem da escola, ou por meio de programas internacionais, tentando estabelecer um padrão, tanto curricular quanto cultural, fazendo com que as crianças aprendam ambas as línguas, tendo, porém, a língua comum da escola (L2) um foco maior que a língua portuguesa (L1). Mesmo assim, o objetivo é que, ao final da vida escolar, as crianças estejam aptas a se comunicar com proficiência em ambos os idiomas. É comum que alunos de escolas internacionais cheguem à escola falando o idioma estrangeiro, sem saber falar o português, no caso do Brasil. Por consequência, o idioma estrangeiro facilita o deslocamento dessas crianças entre os países, por ser a língua comum nas escolas internacionais. Ao mesmo tempo, o idioma nativo do país em que a escola está situada vai sendo aprendido aos poucos pelas crianças vindas do exterior (MÖLLER, 2017: 117).

Möller (2017: 117-118) resume as características mais importantes das escolas internacionais como as seguintes: seguir uma metodologia ou programa de seu país de origem ou internacional; ter professores predominantemente estrangeiros recrutados pela escola por um processo seletivo diferenciado; seguir a cultura do país de origem da escola e não da nação que está localizada fisicamente; ter como referência o calendário do país de origem - podendo iniciar as aulas e férias de acordo com outros países de outro hemisfério ou continente -, porém, os feriados nacionais e municipais do local onde a escola está instalada também são seguidos normalmente; seguir a grade curricular do currículo nacional brasileiro somente para as disciplinas de Língua Portuguesa, História e Geografia por exigência do MEC para poderem ser reconhecidas - tais disciplinas são ministradas em português, por um professor brasileiro na maioria dessas escolas, porém em menor carga horária em relação ao currículo em L2.

Como exemplos de escolas internacionais na cidade de São Paulo, a autora (MÖLLER, 2017: 118) cita a Escola Graduada (Graded School), que é apontada como a primeira, fundada em

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1920; a Escola Britânica (St. Paul’s School), de 1926; a Escola Maria Imaculada (Chapel School), em 1947; e a Saint Nicholas, em 1980.

Cantuaria fala ainda nessas escolas como um seleto grupo que ocupa uma posição social privilegiada na sociedade brasileira na atualidade e que “baseia-se na acumulação de uma cultura internacional” baseado no conhecimento de línguaculturas que permitiram acesso a outros países até mesmo quanto a oportunidade de empregos: A inserção ou reprodução no interior desse grupo baseia-se na acumulação de uma cultura internacional, caracterizada por recursos sociais de vários tipos. O conhecimento de línguas, de culturas, de modos de vida diferentes, assim como a possibilidade de construir a carreira em vários países, produz “uma alquimia entre os capitais linguísticos, culturais, sociais, profissionais e simbólicos. (WAGNER, 1988: 17 apud CANTUARIA, 2005: 5).

A aquisição seria a de um tipo de capital cultural específico, o capital cultural internacional, o qual ligava os imigrantes a sua cultura de origem na gênese das escolas internacionais, e que hoje faz com que os estudantes da escola internacional consigam estudar e trabalhar em outras nações. Tal acumulação de uma cultura internacional seria um capital desejado pelos pais e alunos dessas instituições, sendo uma espécie de competência social exigida na nova ordem mundial, como fica claro pelo trecho: O montante e a natureza dos capitais desejáveis para a ocupação de cargos e a recomposição de quadros, nesse contexto, transformam a escola em instância dominante de produção de competências não apenas técnicas, mas principalmente sociais, exigidas para a participação nesta nova ordem mundial. (BOURDIEU & BOLTANSKI, 1975 apud CANTUARIA, 2005: 5).

Quando percorremos o mesmo caminho feito pelos pesquisadores aqui trazidos e recorremos à mídia para encontrar mais detalhes sobre a escola internacional localizada no Brasil, nos deparamos, principalmente, com as seguintes características segundo a reportagem de Karoline Figueiredo (2017: s/p), no passado as escolas internacionais: • surgiram devido aos grandes contingentes imigratórios e usavam a escola como espaços de preservação de sua língua e cultura - “Os imigrantes (italianos, alemães, japoneses, etc.) que começaram a chegar no país em busca de trabalho, foram formando comunidades e fundando algumas cidades.”, “Esses grupos que não falavam a língua portuguesa [...] foram criando espaços onde poderiam se comunicar, educar seus filhos e preservar a língua de origem.” -; • passaram a receber os brasileiros ao diminuírem-se os contingentes de imigrantes: “Com o passar dos anos, o fluxo de imigrantes foi diminuindo e essas Escolas passaram

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a receber também crianças e jovens brasileiros. Com a crescente procura, novas Escolas Internacionais foram abrindo.”.

No presente, as chamadas escolas internacionais, ainda de acordo com Karoline Figueiredo (2017: s/p):

• cumprem além do currículo brasileiro – “O currículo brasileiro também é incluso nas disciplinas, porém, a língua utilizada na rotina diária é o idioma estrangeiro.” -, cumprem o currículo do país de origem – “Os estabelecimentos possuem forma de ensino diferenciado e atuam com grade curricular baseada principalmente no país de origem. Uma Escola Norte Americana no Brasil por exemplo, os estudantes seguirão o calendário, o idioma e carga horária do país.” -; • facilitam o ingresso do aluno em uma universidade estrangeira e no mercado de trabalho internacional - “O objetivo é oferecer qualidade de ensino aos estudantes, promovendo o conhecimento amplo e diversificado; prepará-los para dar continuidade aos estudos e carreira no exterior; desenvolver o potencial de cada aluno com atividades complementares, oficinas, entre outros.” -; • contratam profissionais brasileiros fluentes em pelo menos dois idiomas - “Os profissionais contratados são brasileiros com fluência em outros idiomas.” -, ou contratam expatriados - “Cerca de 50% dos professores contratados são profissionais expatriados que lecionaram em diversos países do mundo.”.

Encontramos dados de que muitos colégios internacionais são credenciados pela IBO152 (International Baccalaureatte Organizattion/Organização Internacional de Bacharelado), essa certificação é aceita em universidades de mais de 140 países e facilitaria o acesso dos alunos brasileiros em universidades de qualquer lugar do mundo (FIGUEIREDO, 2017: s/p). O IBO

152 As escolas bilíngues e internacionais e os programas bilíngues podem oferecer certificações internacionais que validariam o estudo (de língua ou da grade curricular como um todo) feito no Brasil em outros países. As principais levantadas por nós são: 1 Certificação que comprova o ensino formal intitulada IB (International Baccalaureate); 1.1 IB do tipo PYP (Primary Years Programme) ou Programa do Anos Primários; 1.2 IB do tipo MYP (Middle Years Programme) – Programa do Ensino Médio; 1.3 IB e seus Programas de Diplomação (Diploma Programme) e o Programa Relacionado às Carreiras (Career Programme); 2 Certificação que comprova o ensino formal intitulada IGCSE – (International General Certificate of Secondary Education) Certificado Geral Interacional de Educação Secundária do Cambridge; 3 Certificação que comprova o ensino formal intitulada Teste de Admissão para Universidade SAT; 4 Testes que correspondem ao ensino de língua correlacionados às instituições de ensino como da Universidade Cambridge (CAE – Certificate of Advanced English, CPE – Certificate of Proficiency English); 4.1 TOEFL- (Test of English as a Foreign Language); 4.2 IELTS- (International, English Language Testing System); 5 Certificação para o mundo corporativo TOEIC (Test of English for International Communication). Tradução nossa.

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segundo uma publicação do site Educação Bilíngue no Brasil: Plurilinguismo, Interculturalidade e Educação no Brasil é conseguido por alunos que tenham estudado em um currículo “de vanguarda”, como vemos no trecho: “Algumas escolas internacionais são credenciadas pela IBO (International Baccalaureatte Organization), oferecendo um currículo de vanguarda, baseado na formação de pensadores críticos comprometidos com valores.” (O QUE É UMA ESCOLA INTERNACIONAL, 2016: s/p).

No site especializado em bilinguismo (O QUE É UMA ESCOLA INTERNACIONAL, 2016: s/p) além das características apontadas por Figueiredo, há destaque para as seguintes particularidades das escolas internacionais:

• ajudam, desde sua gênese, a manter e criar a identidade de seus estudantes – “Nessas escolas as crianças mantinham um senso de identidade, aprendiam a língua do país e preservavam sua língua de origem, além de aprender os conteúdos escolares.” -; • formam estudantes plurilíngues e interessados em uma experiência internacional – “Com a mudança do perfil de imigrantes e a diminuição do fluxo destes países para o Brasil, estas escolas começaram a receber também filhos de famílias brasileiras interessadas em uma experiência internacional e uma formação plurilíngue para seus filhos.” -; • têm como chamariz a qualidade de ensino oferecido – “O progressivo reconhecimento da qualidade do ensino oferecido nestas escolas aumentou a procura de pais brasileiros, o que tornou as escolas internacionais mais diversas culturalmente e favoreceu o surgimento de novas escolas no final do século XX.” -; • são objeto de desejo dos pais dos estudantes devido à globalização, trocas linguísticas e culturais derivadas de seu advento e por causa de seu prestígio social - “Com a globalização e a intensificação de trocas linguísticas e culturais no século XXI a procura por estas escolas aumentou ainda mais e elas tornaram-se objeto de desejo de pais, tanto pela formação oferecida quanto pelo prestígio que alcançaram.” -; • proporcionam diversidade de contato cultural para seus alunos, embora o contato social seja mais homogêneo da elite devido a seus altos custos - “[...] o contato com colegas de diversas origens, línguas e culturas, proporcionando um contato com a diversidade cultural e linguística, mas uma certa homogeneidade social, pois os altos custos das mensalidades acabam tornando-as possíveis apenas para as classes médias e altas.”.

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Com relação a um comparativo entre as escolas bilíngues e as internacionais, Figueiredo afirma que essa diferença se dá principalmente em relação à grade curricular e as aulas ministradas em língua estrangeira: “As Escolas Internacionais são diferentes das Escolas Bilíngues. As Instituições Bilíngues são baseadas na grade curricular brasileira, onde algumas aulas são ministradas na língua estrangeira e outras, na língua portuguesa.” (FIGUEIREDO, 2017: s/p). Já o site especializado aponta como diferenças a grade curricular e a comunidade social que frequenta a instituição: Há duas diferenças principais entre escolas internacionais e escolas bilíngues. A primeira diz respeito à composição curricular: nas escolas bilíngues de qualidade há, necessariamente, dois currículos (integrados ou não): o brasileiro e o desenvolvido em segunda língua, enquanto na escola internacional se desenvolve um currículo predominantemente internacional. A segunda diz respeito à comunidade escolar, muito mais diversa linguisticamente na escola internacional. O St Nicholas, uma escola internacional em São Paulo tem, por exemplo, alunos brasileiros, americanos, argentinos, mexicanos, belgas, japoneses, coreanos, chineses, sul africanos, indianos, entre outras nacionalidades, de modo que as crianças, tendo contato com colegas de diversas partes do mundo, falantes de muitas línguas e vivendo em culturas e religiões diferentes, aprendem pela experiência a desenvolver uma cidadania global e um apreço pela diversidade (O QUE É UMA ESCOLA INTERNACIONAL, 2016: s/p).

Finalmente, em relação ao número de escolas internacionais presentes no Brasil, encontramos o dado de que elas seriam 28 - aqui cabe a ressalva de que muitas se autoproclamam internacionais e não são aceitas pelas demais, como levantou Cantuaria (2005) e colocamos no subitem 3.6. As escolas internacionais estão distribuídas em todas as cinco regiões brasileiras, de acordo com a seguinte proporção pelos Estados brasileiros: Atualmente, existem 28 Escolas Internacionais distribuídas nos Estados de Amazonas (1), Bahia (1), (1), Pará (1), Paraná (1), (1), Rio de Janeiro (5), (2), São Paulo (11), e no Distrito Federal – Brasília (4). Essas Instituições atendem estudantes na Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio (FIGUEIREDO, 2017: s/p).

O site Educação Bilíngue no Brasil: Plurilinguismo, Interculturalidade e Educação no Brasil, pode ser apontado como relevante no sentido de fazer-se um Censo sobre essas escolas no Brasil. Ele possui uma lista de 31 escolas internacionais e 86 escolas bilíngues particulares (consideramos como uma as escolas de mesma franquia como Mapple Bear) em suas páginas153. Essas instituições estão divididas por regiões do país, contém seus endereços e telefones e são constantemente atualizadas (2017 foi a última atualização). O site cita escolas

153A lista dessas escolas que se encontra no ANEXO 2 foi extraída do endereço: https://educacaobilingue.com/escolas/escolas-internacionais/.

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bilíngues públicas da Amazônia (português e japonês), do Rio de Janeiro (português e inglês) e as escolas de fronteiras. Em nossa pesquisa, encontramos reportagens de mais 8 escolas bilíngues públicas, que ensinam além do português as libras, o espanhol, o francês etc. espalhadas pelo país (ver todas no ANEXO 2).

3.7 Os chamados “programas bilíngues” para escolas regulares

Além das escolas bilíngues e das internacionais detectamos o surgimento de um novo segmento na educação feita em pelo menos dois idiomas, os chamados “programas bilíngues”. Eles são vendidos por escolas de idiomas, escolas bilíngues ou internacionais regulares ou outras empresas de educação para as escolas regulares que querem oferecer esse tipo opção de extensão de seus currículos. Dessa forma, cada instituição oferece um tipo de programa bilíngue com suas próprias particularidades de metodologia, material e suporte oferecidos, número de horas de exposição ou imersão na língua alvo, o que faz com que tenhamos que recorrer, novamente, a elas para entender e definir o que se trata.

A franquia The English Club oferece às escolas a disciplina de língua inglesa tanto na grade curricular fixa da escola quanto como atividade extracurricular154, de uma a três horas diárias (de 5 a 15 horas aula por semana), ou não diárias155; provém um programa bilíngue que chama de “estruturado”156, aulas 100% em inglês, com professores fluentes e treinados157, aprendizado do idioma de forma natural, material didático exclusivo, definindo o seu programa bilíngue em comparação ao que define como sendo uma escola bilíngue: Diferentemente de uma escola bilíngue, onde os alunos estudam em período integral e aprendem as disciplinas em inglês, o Programa Bilíngue The English Club propõe apenas aulas em inglês, com carga horária estendida. [...] A proposta do The English Club é levar às instiuições de ensino uma Programa Bilíngue estruturado, de qualidade, onde os alunos aprendem o idioma de forma profissional, eficiente rápida, mas acima de tudo, muito divertida. A carga horária estendida e as aulas 100% em inglês permitem que o aprendizado aconteça de forma natural, onde o aluno vivencia e experimenta com a língua, através de atividades lúdicas, jogos, culinária, teatro, músicas, histórias infantis, atividades manuais, e muito mais! Desta forma, nossos alunos são estimulados

154 Isso é previsto como aceitável pela LDB conforme já anotado. 155 Somente a partir de 3 horas diárias de imersão total na língua é considerado como uma “imersão”, não sendo total como exposto anteriormente, nem para a OEBi e nem para os teóricos estrangeiros como Baker. Em nossa proposta, usaremos como base a exposição de três horas diárias na língua-alvo como referência mínima para ser considerado um ‘Ensino Bilíngue’, como exposto em 3.9. 156 A franquia não especifica em seu site quais seriam os referenciais dessa “estrutura”, apenas menciona algumas aulas que provém. 157 A franquia não menciona como a fluência e o treinamento desses professionais são referenciados, por meio de quais parâmetros, certificações, diplomas etc.

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a se comunicar, cantar e brincar em inglês desde a primeira aula. E o resultado disso é que aprendem sem perceber. (THE ENGLISH CLUB, 2015: s/p).

Com relação à metodologia, a empresa afirma priorizar “a integração dos alunos em faixas etárias próximas, com base no desenvolvimento das competências de ordem física, cognitiva, afetiva e social, dentro de um contexto lúdico”158. A metodologia é de Linda Ellis, pedagoga, que tem cerca de 600 franquias pelo mundo, com cerca de 100 mil alunos, desde 1986 e que foi implementada no Brasil em 1994. Ainda segundo o site, a franquia The Kids Club by Fun Language é de origem inglesa, cuja fundadora valeu-se de sua própria experiência ao ensinar francês para sua filha e amigas de cerca de 2 anos de idade. Além das aulas de língua inglesa, a franquia disponibiliza aulas especiais que disponibilizam jogos, teatro, música, culinária, brincadeiras ao ar livre e projetos de leitura, fora atividades temáticas no Natal, Páscoa, Halloween e outras datas festivas159 (THE ENGLISH CLUB, 2015: s/p).

A franquia International School afirma ter uma proposta “inovadora” que alia “criatividade e aulas práticas dentro de um ambiente de total imersão linguística” para “adquirirem proficiência na língua inglesa de maneira contextualizada e dinâmica” contribuindo para o desenvolvimento integral dos alunos para toda a vida. Quanto à metodologia o referencial é o CLIL160, europeia, que visa a aprendizagem da língua integrando os conteúdos, a comunicação por meio da segunda língua e de sua cultura, além de afirmar basear-se nos quatro pilares da educação propostos pela UNESCO – aprender a conhecer, a conviver, a ser e a fazer:

Nosso compromisso é oferecer um programa diferenciado para o ensino da língua inglesa, que propicia um rico e variado ambiente de aprendizagem, permitindo, assim, que o aluno desenvolva competências e habilidades em todo o seu potencial. Tendo como referência a mesma metodologia utilizada na União Europeia para o ensino do segundo idioma, todo o material da International School é baseado nas diretrizes do Ensino Integrado de Conteúdos e Língua, o CLIL (Content and Language Integrated Learning), bem como nos quatro pilares da UNESCO, oferecendo projetos que vão além da sala de aula, como imersão linguística e cultural por meio de oficinas temáticas e visitas pedagógicas para conhecimento e investigação do mundo, exploração de temas e eventos multiculturais, entre outros. (INTERNATIONAL SCHOOL, 2009: s/p).

A International School (IS) está presente em quase todo o país, sendo adotado até 2018 por aproximadamente 90 escolas, totalizando cerca de 20.000 alunos “prestando um serviço

158 A integração de alunos de faixa etária próxima pode evidenciar uma tentativa da franquia de conseguir o número mínimo de alunos por turma e não necessariamente os outros aspectos mencionados. 159 Essas atividades temáticas que referenciam datas festivas podem englobar aspectos culturais de outros países. 160 CLIL é uma sigla para Content and Language Integrated Learning, ou segundo a própria franquia, Ensino Integrado de Conteúdos e Língua. Tradução nossa.

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diferenciado e oferecendo materiais didáticos desenvolvidos após anos de pesquisa, que buscam apresentar o segundo idioma de forma inovadora”161. (INTERNATIONAL SCHOOL, 2009: s/p).

Segundo um blog de 2016 a inovação da IS dá-se, dentre outros aspectos, por meio da utilização de kits da marca LEGO® Education, sendo que a franquia teve um crescimento de 1700% no número de alunos, 485% em número de escolas162, estando presente, atualmante, em todas as regiões do Brasil:

A International School (IS), criadora do primeiro programa de ensino bilíngue do mundo a utilizar kits LEGO® Education, comemora um crescimento de 1.700% no número de alunos que passaram a utilizar, em 2016, seu programa educacional, um incremento de 485% no número de escolas que apostaram na inovadora proposta educativa. O programa bilíngue já atende mais de nove mil alunos e a expectativa é triplicar esse volume em 2017, atendendo mais de 30 mil estudantes em todo o país. De acordo com Rone Costa, gerente geral da International School, a região Nordeste foi a de maior crescimento e interesse pelo programa. “Hoje, quase 46% das nossas escolas estão no Nordeste e 37% no Sudeste. Já o Norte representa 8,6%, o Centro Oeste, 5,7% e a região Sul detêm 2,9% de nossa presença no país”, explica. (PROGRAMA BILÍNGUE DA INTERNATIONAL SCHOOL, 2016: s/p).

O IS oferece duas opções163 às instituições que adotarem sua metodologia, tanto podem aplicar o Bilingual Program utilizando sua própria estrutura e recursos, ou adotar o modelo On Site “onde a IS assume a operação pedagógica – provendo em 100% a equipe de coordenadores e professores e usando apenas a estrutura física e administrativa da escola.” Além do método, a franquia provê Kits – para os alunos, para a escola e os usados em sala de aula -, a IS ainda “oferece às escolas uma estrutura integral de serviços que inclui o auxílio no processo seletivo de docentes; formação de professores; implementação do método; suporte à estrutura e metodologia; monitoramento da qualidade; e formação continuada.” (PROGRAMA BILÍNGUE DA INTERNATIONAL SCHOOL, 2016: s/p).

Segundo Rafael Pinheiro, os Programas Bilíngues (como o do Colégio Dom Bosco de São Paulo, capital) seriam um novo modelo, diferente do modelo de uma escola bilíngue – que teria

161 Há uma sessão no site que elenca esses materiais. 162 A IS, tanto por meio de seu site em um infográfico do Brasil que contém a distribuição nacional de suas franquias, quanto por meio de depoimentos de seus franquiados quanto por meio do referido blog, mostra-se preocupada e orgulhosa do número de franquiados que já possui e dos que pretende alcançar. Tais números, de fato, demonstram que a franquia é bem-sucedida em termos de mercado e em termos econômicos, o que parece ser sentido por depoimentos de franquiados igualmente satisfeitos. 163 Essas duas opções oferecidas pela franquia parecem demonstrar um cuidado por parte da franquia em implementar um programa que pode ser considerado bilíngue de fato, principalmente a segunda opção proposta.

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suas disciplinas em uma L2 como parte integrante do currículo da escola -; e distinto das escolas regulares que ensinariam o idioma como língua estrangeira, ou como atividades extras:

Normalmente, o ensino de uma língua estrangeira – tanto nas escolas da rede pública, como no ensino particular, aparece em três formas: como parte integrante do currículo pedagógico, trabalhando com o conceito de escola bilíngue; como atividade extra nas escolas; ou como programas bilíngues específicos para escolas, modelo que começa a ganhar adeptos progressivamente. (PINHEIRO, 2016: s/p). O programa bilíngue do Dom Bosco contempla do Mini Maternal ao 9º Ano, em uma carga horária de 10* horas semanais de aulas bilíngues, sendo 2 horas diárias de imersão total164 no idioma inglês, ministradas por professores fluentes, altamente capacitados na didática do idioma165. - * exceto Mini Maternal e Maternal que têm carga horária de 5 horas semanais e 8º ano e 9º ano, com carga horária de 6 horas semanais (PROGRAMA BILÍNGUE DOM BOSCO, 2018: s/p).

As salas são exclusivas para o curso e ambientadas para o programa bilíngue e conta com as seguintes atividades: CENTERS – “Utilizada em diversos países, os alunos são divididos em grupos e realizam atividades diversas dentro de um tempo determinado pelo Teacher” [sic]; SMARTBOARDS – “Lousa interativa utilizada para atividades diversas como Quiz, Song Lyrics, Escrita, Games etc.”; CIRCLE TIME – “Momento no qual os alunos formam uma roda sentados no chão e conversam. Essencial nas aulas, pois é quando acontece a maior interação entre eles e os teachers, que denominamos de “Real Life Conversation” [sic].; SCIENCE CLASS – “Aulas que fazem os alunos vivenciarem novas experiências fora do contexto literário, ampliam o vocabulário de forma mais divertida e proporcionam situações de conversação.”; COOKING CLASS – “Nesta aula os alunos cuidam de outro aspecto da língua, o paladar. Eles aprendem novas palavras e desenvolvem atividades com receitas deliciosas, de forma divertida e que estimulam a ampliação do vocabulário;” GEOGRAPHY CLASS – “Aprender inglês é a primeira barreira a ser passada para se conhecer outros países e culturas. Na aula de geografia, os alunos são convidados a localizar os países, conversar sobre e eles e ainda reforçam o conteúdo ministrado no curso regular.”; MATH CLASS – “O material didático também apresenta exercícios matemáticos, ensinados de forma lúdica, visando o raciocínio

164 Somente a partir de 3 horas diárias de imersão total na língua é considerado como uma “imersão”, não sendo total, como exposto anteriormente, nem para a OEBi e nem para os teóricos estrangeiros como Baker. Em nossa proposta, usaremos como base a exposição de três horas diárias na língua-alvo como referência mínima para ser considerado um ‘Ensino Bilíngue’, como exposto em 3.9. 165 Novamente nesse caso, a franquia não menciona quais são as referências de fluência e capacitação dos professionais por eles utilizados.

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lógico e a expansão do vocabulário”. Utilizando-se de materiais didáticos da editora Pearson - referência Internacional – que fornece material adequado para cada faixa etária, estimulando o aprendizado e o interesse pela literatura (PROGRAMA BILÍNGUE DOM BOSCO, 2018: s/p).

Notamos que as três franquias aqui mencionadas apresentam generalizações a respeito dos benefícios cerebrais de se falar uma segunda língua ao exporem seus produtos. Já as franquias English Club e Programa Bilíngue Dom Bosco falam também das vantagens econômicas que a instituição escolar, ao contratar seu Programa Bilíngue, poderá ou irá alcançar. Isso quer dizer que tais empresas se pautam nas possíveis vantagens cognitivas por nós debatidas no Capítulo 1 e nas vantagens econômicas debatidas no Capítulo 2 para venderem seu produto: um programa bilíngue a ser instaurado em na instituição de ensino regular já existente.

The English Club (2015: s/p) afirma sobre o funcionamento cerebral: “Já sabemos que as crianças têm facilidade para aprender idiomas, pois o cérebro já nasce pronto para receber os estímulos da linguagem.”166, “Ao expor uma criança a uma nova língua, as conexões cerebrais trabalham rápida e eficientemente, de forma que essa nova língua é facilmente absorvida.”167 e “O aprendizado de idiomas na infância desenvolve também outras competências neurológicas na criança, como melhorara nas habilidades intelectuais, no raciocínio e na capacidade de memorização, além de promover melhoras no uso do seu primeiro idioma, e até em matemática!”168. Quanto às vantagens econômicas: “Sabemos o quanto sua instituição de ensino é respeitada e reconhecida hoje no mercado. Nossa proposta é estabelecer uma parceria de resultados financeiros e de fortalecimento de imagem no mercado, visando melhores resultados nesse mercado tão competitivo.”169 Um “Programa Bilíngue” ministrado por especialistas no ensino de inglês na infância traz diversos benefícios à sua instituição de ensino. Além da certeza de estar oferecendo a seus alunos um serviço de qualidade diferenciada, as suas mensalidades escolares podem ser reajustadas em função do novo serviço oferecido, e o The Kids Club ainda oferece a todas as instituições parceiras participação em nossas mensalidades. Invista no futuro de seus alunos! [...] este será o seu grande diferencial! (THE ENGLISH CLUB, 2015: s/p).

166 Esta afirmação só é verdadeira para crianças típicas, ou com padrão cerebral normal, quer dizer, autistas, crianças com perdas cognitivas por paralisia cerebral, Zika e outras, infelizmente não “nascem prontos”, como sugere a franquia. 167 Em Ciências não encontramos referência a uma suposta “absorção cerebral de uma língua”. 168 Essas afirmações sobre o aprendizado são generalizações que se alinham as supostas vantagens cognitivas defendidas pelo paradigma vigente. 169 A empresa generaliza que todas as instituições são boas e reconhecidas no mercado e que estão inseridas em um mercado (empresarial) competitivo.

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A certificação internacional oferecida pela franquia The English Club é de língua, e não de currículo válido em outro país, ligada à editora dos livros utilizados PTE Young Learners somente para alunos de 08 a 13 anos170.

Pinheiro (2016: s/p) afirma sobre o funcionamento cerebral: “Ulisses Cardinot, CEO de uma empresa especializada em educação bilíngue, afirma que a exposição a duas línguas estimula o aumento do número de conexões cerebrais melhorando o raciocínio lógico e a criatividade das crianças” e quanto as vantagens econômicas: “[...] a adoção de um programa bilíngue proporciona benefício inclusive para as escolas já consolidadas no mercado, “pois permite aliar à tradição um método singular no mercado, respondendo de forma rápida, confiável e efetiva à forte pressão existente hoje pelo ensino bilíngue”’.

Já no próprio site do Colégio Dom Bosco: “Nosso cérebro tem uma capacidade imensa de adaptação e pode aprender qualquer idioma. Quanto mais cedo formos expostos a uma segunda língua, melhor será nossa pronúncia e distinção dos fonemas.”171, “A exposição da criança a mais de um idioma ao mesmo tempo aumenta o número de conexões cerebrais, ajuda na criatividade e raciocínio rápido. Antes da fase de alfabetização, o contato da língua deve ser feito somente em língua oral.” e “Crianças pequenas alcançam uma pronúncia sem sotaque com mais facilidade, por isso é importante expor a criança à oralidade da língua. Dessa forma, ela aprenderá o novo idioma por meio de vivências e experiências.” A franquia oferece dupla certificação - diploma brasileiro e americano172 (PROGRAMA BILÍNGUE DOM BOSCO, 2018: s/p).

Finalmente, a International School fala que o bilíngue terá vantagens cognitivas e culturais, e não fala em vantagens econômicas em seu site: “Vantagem Cognitiva: Devido ao constante uso de duas línguas, o bilíngue torna-se mais atento, paciente e sensível a diferentes situações

170 Isso significa dizer que a franquia não oferece certificação em todos os níveis a que se presta a ensinar e nem que será possível que seus alunos tenham comprovação avançada de fluência e competência conforme propomos em 3.9. 171 Há aqui menção à plasticidade cerebral, que realmente é tida como muito alta pela visão científica, e a questão da idade de exposição às línguas, que de fato revela-se interessante na primeira infância quanto à pronúncia e percepção dos fonemas, segundo os paradigmas vigentes na área. O que não é mencionado é que da mesma forma que esses aspectos – pronúncia e distinção de fonemas – são melhor desenvolvidos na primeira infância e quanto mais cedo a exposição à língua-alvo for feita, tais ganhos podem ser perdidos caso não haja a manutenção dessa língua ao longo da vida, sendo a necessidade da língua, por seu falante, um dos fatores prioritários nessa manutenção. 172 O número de horas reduzido de exposição a língua-alvo nos leva a perguntar qual seria essa dupla certificação, que está submetida à Pearson Publishers – sendo que não encontramos a lista desses -, e somente no Ensino Médio está ligada a Full Education-K12, sendo obtida por exposição de 6 a 9 horas semanais de aulas na língua-alvo em período extra.

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linguísticas. Além de pensar de forma mais flexível e criativa.” e “Vantagem Cultural: A Língua Inglesa é o idioma oficial de mais de 350 milhões de pessoas e a segunda língua de mais de 750 milhões. É a porta de entrada para o mundo!” e oferece certificações de língua do Cambrige University173 como comprovação de seu método. Vale ressaltar que essas certificações não valem para o ingresso em universidades estrangeiras, somente servem como comprovação das habilidades linguísticas no segundo idioma (PROGRAMA BILÍNGUE DA INTERNATIONAL SCHOOL, 2016: s/p).

Como ficou evidente nesta breve exposição, podemos concluir que os programas bilíngues são muito variados em sua oferta – disciplinas, abordagens e metodologias, número de horas/aula de exposição na língua-alvo, alunado em mesma sala de aula, materiais utilizados, certificações oferecidas, internacionais de língua ou de comprovação de currículo válido em outro país, etc. – uma vez que, tal qual ocorre com as escolas bilíngues e internacionais, não há regras nacionais, nem um Censo, ou padrões estipulados para que proponha-se uma regulamentação acerca de sua definição.

3.8 Para quem é destinado o ensino bilíngue brasileiro? Novamente a questão econômica

Quando investigamos sobre para qual público as escolas bilíngues, as internacionais e os programas bilíngues são direcionados, tanto nos meios de comunicação, quanto nas pesquisas de cunho científico, deparamo-nos com a ideia de que esse ensino é majoritariamente voltado para a elite brasileira em suas classes socioeconômicas mais altas.

Se pegarmos como exemplo somente uma dessas reportagens, dentre as muitas sobre esse tipo de ensino, Elas querem seu filho de 2017, Paulo Vieira, o autor, inicia sua reportagem com tonalidades críticas para a Revista Poder, afirmando que as mensalidades das escolas bilíngues são a partir de R$ 6000,00: “Escolas bilíngues com mensalidades que começam em R$ 6 mil estreiam em São Paulo e movimentam-se para atrair alunos das famílias abastadas da cidade.”.

Vieira afirma que como justificativas pelo preço cobrado, as escolas fazem promessas de desenvolvimento socioemocional dos alunos, de promover a interdisciplinaridade e dão demonstrações de poder e prestígio da elite que pode arcar com esse estudo, como exemplo,

173 A página de quais certificações do Cambridge são oferecidas estava em construção no dia 08.05.2018: .

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uma palestra do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC): “As armas? Promessas de valorizar as habilidades socioemocionais dos estudantes, projetos interdisciplinares174 e até palestra de um ex-presidente do país para divulgar a instituição.” (VIEIRA, 2017: s/p).

A reportagem destaca a inauguração próxima da instituição Avenues, em um bairro nobre da capital paulista, sendo a primeira unidade longe de Nova York. A escola diz querer formar “cidadãos globais” e que terá mais unidades também no Catar, na China e na Inglaterra, porém São Paulo será a primeira unidade fora dos EUA: “Para justificar a deferência, Alan Greenberg, um dos fundadores, [...] menciona a demanda aquecida: “Todas as boas escolas internacionais de São Paulo têm listas de espera de alunos”’ (VIEIRA, 2017: s/p). Como fica evidente, a reportagem direciona-se as escolas bilíngues e internacionais de maneira indistinta.

Ao falar sobre outra instituição de ensino voltada para a classe alta (VIEIRA, 2017: s/p), em Higienópolis, “no imóvel tombado pelo patrimônio histórico do município que pertenceu à decana Casa Pia São Vicente de Paulo”, a reportagem dirige-se a “outra escola bilíngue, a Internacional de São Paulo”, também tratando tanto as escolas bilíngues quanto as internacionais como bilíngues, o que parece demonstrar que no senso-comum a diferenças entre as escolas não está clara. Por essa razão, esta é uma de nossas perguntas do questionário: “Para você existem diferenças entre uma escola bilíngue e uma escola internacional? Se houver, qual seria?”

A reportagem diz que escola também iniciará seus cursos em 2018, e que teve como uma de suas estratégias de divulgação, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso para falar sobre “educação no Brasil”. A matéria (VIEIRA, 2017: s/p) diz que os proprietários da Internacional, o casal Raquel e Moisés Lam, que fundaram, expandiram e venderam a rede de escolas de inglês Red Balloon, ouviram na palestra do ex-presidente brasileiro que “Ter um ensino multicultural é fundamental hoje em dia. Aprender diferentes visões de mundo sob outros aspectos culturais é enriquecedor. A escola tem de transmitir humanidade aos alunos”. Na introdução desta tese abordamos, brevemente, a questão do biculturalismo e do multiculturalismo, em que expusemos que os motivos de tornar-se bicultural ou multicultural dependem de fatores individuais, como a imigração, estudos, casamentos etc.; sendo que definimos nesta tese o biculturalismo como “[...] caracterizado pela proficiência e conforto de um

174 Tais conceitos não foram abordados nessa tese devido à complexidade e necessidade de aprofundamento teórico. Olhar nota de rodapé 182 para mais detalhes.

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indivíduo com ambas, a cultura original e a cultura de um novo país ou região” (JACKSON, 2014: 207).

O autor da reportagem, Vieira, frisa que o valor estimado dessa palestra foi da ordem de R$ 300 mil, segundo sua reportagem. A crítica da reportagem fica evidente pelo destaque dado ao ex-presidente que fala em transmitir “humanidade aos jovens”, pela ênfase dada ao valor atribuído a fala, além do realce dado à temática da palestra, a “educação no Brasil” - a educação brasileira sobre a qual Fernado Henrique Cardoso falou é das elites para as elites, tendo a promoção de um ensino multicultural e humano como fundamental.

A reportagem cita uma outra gigante do setor bilíngue “que promete competir pelos milhares de reais dos pais que querem os filhos em escolas bilíngues – se não para tornarem-se cidadãos globais, ao menos para ter acesso às melhores faculdades – é a Concept” (VIEIRA, 2017: s/p), escola de Chaim Zaher, fundador do sistema COC by Pearson de ensino, presente em mais de 70 países, acionista do Grupo Estácio, e atual presidente do grupo SEB, que congrega as redes de ensino Pueri Domus e Dom Bosco “Em associação com a filha Thamila, Zaher deu o input à Concept com investimento anunciado de R$ 150 milhões. A escola debutou este ano em Salvador e em Ribeirão Preto, no interior paulista, onde fica a sede do grupo.” (VIEIRA, 2017: s/p).

A Concept, vai ocupar o histórico imóvel dos Jardins onde funcionou o tradicionalíssimo Colégio Sacré-Coeur, na capital paulistana, que ficou ali até 1985, afirmando, igualmente, que ‘“A multiculturalidade é chave no nosso projeto”, disse Thamila. Há vídeos promocionais em que entrevistam educadores de vários lugares do mundo como Cingapura, Genebra e Finlândia. Para Thamila, o “professor é a peça-chave, o agente da mudança”, sendo que os projetos interdisciplinares estão no cerne da metodologia de ensino. Em 2017, na unidade de Ribeirão Preto, os alunos dos oitavo e nono anos foram entender como é viver numa nação em guerra, a Síria: “Os estudantes estão plugados em tudo o que acontece ao redor deles, e decidiram saber qual é o impacto que uma guerra tem na vida das pessoas”, cujo “resultado de dois trimestres dedicados ao tema foi a criação de um canal no YouTube com (duas) entrevistas, um livro de receitas culinárias e um site com algumas crônicas.” (VIEIRA, 2017: s/p).

A reportagem apresenta uma visão crítica dessa modalidade de ensino (bilíngue e internacional) pelo fato dela ser voltada para as elites e devido as opiniões de seus fundadores sobre questões fundamentais desse elitismo. Vieira cita que, para Michel Lam, presidente da

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Escola Internacional e filho do casal Moisés e Raquel Lam, a preocupação em buscar exemplos internacionais de educação reflete as deficiências da própria educação brasileira: “Na média, os cursos de pedagogia são ruins por aqui. Se já é difícil para quem se forma em medicina, imagine o estímulo que o sujeito tem para ser professor? É preciso ser muito idealista, querer muito exercer essa profissão.” (VIEIRA, 2017: s/p) – ressaltamos que a instituição considera o “professor é a peça-chave, o agente da mudança”, como vimos no parágrafo anterior.

Vieira (2017: s/p) afirma que quando indagado sobre os investimentos milionários neste setor em tempos difíceis da economia no país, segundo a reportagem “[...] Michel é lapidar: “Nosso negócio é resistente, pois a última coisa em que os pais mexem é na escola. Com a Red Balloon enfrentamos uma época crítica na crise da gripe aviária. Mas só porque os pais não queriam mandar seus filhos para ambientes fechados”.’. Tal fala dos fundadores, revela que há um profundo conhecimento de mercado, de hábitos dos consumidores, em outras palavras, o setor educacional e seus proprietários já mais assumidamente falam que o setor é mesmo um negócio e o tratam como tal, sem muitos pudores, como era mais comum há pouco tempo atrás, o que simplesmente revela a realidade do setor educacional privado como um todo no Brasil, seguindo uma tendência mundial no setor educacional.

As instituições vendem produtos educacionais de acordo com as demandas do público – alunado e pais - como fica evidente nos trechos de outras publicações sobre o segmento: “Mas surge também a especulação, pois com a mudança de mentalidade sobre a educação bilíngue, valorizando-a, e o reconhecimento dos benefícios do bilinguismo, muitos pais começam a buscar esse tipo de educação.” e “O acirramento da concorrência entre as escolas particulares as leva a buscar ‘diferenciais’ para se destacar no ‘mercado’, e franquias rapidamente formam- se para atender essa demanda.” (EDUCAÇÃO BILÍNGUE NO BRASIL, 2014: s/p).

Ressaltamos que as opiniões críticas de Vieira - sobre os valores cobrados e sobre para qual público o ensino internacional é voltado - tanto em relação as escolas internacionais quanto as bilíngues, não inserem esse tipo de escola na visão ampla de sua gênese e origem, que as ligam à tradição em traço de vinculação, ou em um cordão umbilical histórico do presente com o passado que vimos ao longo desta tese. Essas escolas, historicamente, mantêm a tradição de preservação de uma elite e de seu prestígio – podendo inclusive ter ajudado na formação da

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identidade dessa elite e na identidade nacional em sua gênese, como vimos175. Tal fato apenas coloca essas instituições, e o público a que se direcionam, nesse cordão da tradição.

Acreditamos que não devemos fazer juízo de valores quanto à tradição sem haver um debate crítico e profundo, embasado em uma pesquisa profunda sobre os aspectos sociais e econômicos, tal qual foi proposto por Cantuaria (2005) em sua reflexão, e embora respeitemos as demais opiniões como as de Vieira, não pode-se ignorar o fato de que essas instituições estão ligadas a esse traço histórico-cultural de suas identidades desde sua origem no país e por essa razão perguntamos a nossos entrevistados: “Você acredita que uma intitulada ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional – tenha mensalidades mais altas do que uma escola regular?”; “Você considera procedente (justificado) uma ‘Escola Bilíngue’ ser mais cara do que uma regular?”, além de perguntarmos sobre a sensação de influência midiática nessa escolha: “Você considera que a mídia (jornais, revistas Rede Sociais, etc.) exercem influência sobre as pessoas ambicionarem um estudo bilíngue atualmente?”

Destacamos, também, que a classe dos professores é historicamente oprimida em nossa nação, infelizmente, em todas as instâncias. Tais opressões são sentidas também nos salários oferecidos na rede pública e privada como um todo, das instâncias básicas à pós-graduação de ensino. Tais escolas, as bilíngues e internacionais, são almejadas pelos profissionais de língua e de pedagogia que tenham comprovação de fluência e competência em uma L2, porque além de oferecerem melhores salários, oferecem melhores condições de trabalho – cursos, materiais, formação continuada, planejamento de aula, etc.

Outro dado curioso é que tanto as escolas internacionais quanto as bilíngues são almejadas por docentes de línguas (estrangeiras) pelo simples fato de as aulas serem 100% ministradas na língua-alvo, o que, infelizmente, não é comum nas disciplinas de língua estrangeira em escolas regulares, uma vez que embora ensinem esses idiomas como exigido pelo MEC, as aulas são feitas em português com traduções para L2 e vice-versa, o que faz com que os profissionais bem formados sintam-se frustrados e desmotivados, assim como os próprios estudantes que tenham competência e fluência nesses idiomas por meio de cursos de idiomas no Brasil ou no exterior.

175 Tal pesquisa foi feita por Cantuaria (2005).

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O elitismo das escolas internacionais e bilíngues é sentido nas publicações científicas, sendo que a pesquisa de Cantuaria, conforme supracitado, menciona a localização física privilegiada, em bairros nobres, das escolas, as altas mensalidades, a lista de espera das instituições que selecionam seus futuros alunos por critérios de seleção sociais econômicos e de prestígio - parentesco e amizade com os já matriculados e com os que já estudaram lá no passado -, o que a faz pensar na criação de um espaço dessas escolas, o das “boas escolas”:

Em maior ou menor grau, são também bastante seletivas, não apenas em termos do alto valor das anuidades exigidas para a admissão, mas também porque valorizam de maneira significativa o fato do candidato a uma vaga pertencer a rede de parentesco e amizade que incluem alunos e ex-alunos. Além disso, a própria localização da escola tem um impacto significativo na seleção da clientela. É possível falar aqui em espaço porque essas instituições relacionam-se entre si e reúnem uma série de características que, ao mesmo tempo, as unem e separam de outras escolas presentes no sistema educacional brasileiro. Elas pertencem ao grupo de “boas escolas” e ao mesmo tempo diferenciam-se desse grupo em função das relações que estabelecem com o exterior. (CANTUARIA, 2005: 6-7).

Esse espaço criado por essas instituições, das “boas escolas” privadas, tem como fundamento o fato de possuírem algumas características em comum: a seletividade da clientela, o prestígio, a visibilidade, que as colocam em posição de concorrer com as instituições que possuem também essas características, inserindo-as nesse espaço escolar mais amplo, extremamente hierarquizado e competitivo, o que faz com que tenham um “capital de competência linguística e social” que permite que os alunos insiram-se em sistemas de ensino de outros países, além de seu mercado de emprego: “Por outro lado, possuem um tipo de capital que as outras não têm já que produzem um tipo particular de competência linguística e social que permitem a inserção em dois ou mais sistemas de ensino e no mercado profissional de outros países, entre outras características.” (CANTUARIA, 2005: 7).

O que acreditamos ser realmente preocupante em relação ao setor de educação bilíngue e internacional não é o fato de ele ser feito pela elite e para a elite, mas sim o fato de não existirem regras que o regulamentem e que possam nortear os pais em suas escolhas, uma vez que ficam evidentes seus altos custos, tanto para as instituições que tem que investir em infraestrutura, formação e inovação, quanto dos próprios pais que arcam com os custos de seu desejo de alinhamento social e de prestígio ao almejarem tais aspectos para seus filhos. O setor urge por bases conceituais e elementos que ajudem a todos a delinear um verdadeiro ‘Ensino Bilíngue’176 para que sejam evitados depoimentos como o do site de bilinguismo a

176 Conforme Introdução e próximo subitem para a nomenclatura.

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seguir, em que o ensino bilíngue é um mero produto de mercado para gerar lucro fácil, e não um produto com agregação de valor e responsabilidade social, com em outros casos: Hoje há uma grande quantidade de pseudo-escolas bilíngues que apenas introduziram ou aumentaram a carga horária de inglês. Uma escolinha de bairro na zona sul de São Paulo anuncia em sua fachada um ‘horário bilíngue’, e em visita à escola descobre-se que foi feita uma parceria com uma escola de idiomas que envia uma professora para dar duas aulas semanais na educação infantil. Outra escola simplesmente copiou deste blog um artigo e apresenta-o em seu site como sua proposta pedagógica, obviamente sem dar créditos, em uma demonstração de desonestidade que faz questionar a capacidade da equipe pedagógica e sua ética. Há anos este blog vem buscando informar pais e professores sobre educação bilíngue com seriedade, engajado em contribuir com a qualidade da educação. Por isso é frustrante perceber que o bilinguismo tem se tornado um mero ‘produto’ a melhorar os rendimentos de algumas escolas. (EDUCAÇÃO BILÍNGUE NO BRASIL, 2014: s/p).

Finalmente, destacamos que em nossa pesquisa encontramos oito (autoproclamadas) escolas bilíngues públicas espalhadas pelo Brasil (ANEXO 2). Isto demonstra que embora as escolas bilíngues e internacionais ainda sejam majoritariamente voltadas para as classes dominantes, tal qual identificamos ao longo da história e atualmente, há uma crescente preocupação e vontade, incluindo a política, em disponibilizar-se o ensino bilíngue para as outras classes sociais, menos abastadas, seja por meio do ensino público, seja por meio de programas bilíngues de custo intermediário, o que faz com que a necessidade de uma regulamentação para o setor seja ainda mais eminente no sentindo de minimizar as diferenças entre os polos sociais para os quais esse tipo de ensino direciona-se.

O Brasil é um país de proporções continentais em que predominantemente a língua portuguesa é falada por séculos; o aumento de escolas que propõem um ensino bilíngue reflete uma tendência de mudança de postura em relação ao monolinguismo estabelecido, sendo que regras claras para o setor são o melhor caminho para o estabelecimento de uma excelência em relação à nova condição, a bilíngue, que a população parece almejar ao procurar esse tipo de estudo.

3.9 Critérios que pretendem ajudar a regulamentar o denominado ‘Ensino Bilíngue’ no Brasil

Propomos o termo ‘Ensino Bilíngue’, grafado em maiúscula, para descrever o atual cenário brasileiro das escolas bilíngues, escolas internacionais e das escolas regulares que tenham os chamados “programas bilíngues”. Propomos uma conceituação guarda-chuva, ou seja, um conceito em sentido amplo, que abarcará essas diferentes modalidades do ‘Ensino Bilíngue’

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brasileiro que englobará todo o ensino que for praticado em pelo menos duas línguas por uma instituição de ensino regular177, em território nacional, feito em português e em mais pelo menos um idioma estrangeiro, sem o uso de traduções, em carga mínima de três horas diárias e que contemplem as demais exigências mínimas listadas abaixo. Isso quer dizer que excluiremos dessa conceituação os ensinos bilíngues que concirnam às línguas nacionais, como as indígenas e LIBRAS, por tratarem-se do ensino de línguas brasileiras e não estrangeiras.

As escolas de idioma, por definição, mesmo que proporcionem certificações que venham a comprovar a competência e a fluência na língua-alvo, teoricamente ensinam, ou deveriam ensinar, somente em um idioma (a língua estrangeira-alvo, inglês, espanhol etc.), ou seja, a turma matriculada aprende uma língua por curso e, por essa razão, não podem ser consideradas como participantes do ‘Ensino Bilíngue’, por ser um ensino monolíngue em sua essência. Por extensão, o mesmo aplica-se aos “programas bilíngues” que sejam ministrados em escolas regulares, em aulas extracurriculares ou não, que não cumpram os requisitos mínimos que os enquadrem em um ‘Ensino Bilíngue’ conforme o veremos a seguir. Para tais arranjos, propomos a nomenclatura ‘programas de ensino de língua (estrangeira)’ ou ‘programas de ensino de idioma (estrangeiro)’ por alinharem-se mais ao ensino praticado em escolas de idiomas do que ao ‘Ensino Bilíngue’ propriamente dito.

Ficarão de fora da proposta que sugerimos, as escolas regulares e as autoproclamadas bilíngues, e internacionais, ou ainda as que apresentem os chamados “programas bilíngues”, que não ofereçam certificações internacionais (de fluência e competência linguística) em nível avançado da língua-alvo178 de maneira comprovada - nem para seus alunos, nem para os professores que ensinem nelas - em todos os níveis em que proponham-se a ensinar, pois estas instituições não contemplariam, portanto, segundo nossa pesquisa teórica, os requisitos mínimos necessários para ser considerado ‘Bilíngue’ de fato. Isso significa que como primeiro critério para estar apto a autoproclamar-se como integrante do ‘Ensino Bilíngue’ brasileiro propomos a inclusão da necessidade de haver uma certificação que tenha padrões internacionais de avaliação de fluência e competência linguística nas quatro habilidades (ler,

177 Por ensino regular entender o ensino praticado em escolas que ensinem do Ensino Fundamental (mini maternal ao 9º ano) ao Ensino Médio (1º, 2º, 3º anos) e que sigam as especificações vigentes do MEC e de outros órgãos regulatórios do ensino praticado no Brasil. 178 Colocamos nessa proposição sempre língua-alvo porque sabemos que no chamado ‘Ensino Bilíngue’ pode-se ensinar um idioma como língua estrangeira, L1 ou L2; há casos de escolas internacionais, por exemplo, que ensinam a língua portuguesa como L2, ou como língua estrangeira; já a língua do país de referência - inglês, espanhol, italiano, etc. – é ensinada como L1.

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escrever, falar e ouvir), em nível avançado, tanto para os professores que ministram as aulas no idioma estrangeiro, quanto para os estudantes que estudem com tais professores, por nível de idade e certificação correspondente a ele.

Essa proposição é justificada pelo fato de já existirem seleções mais criteriosas na contratação dos professores – com relação à fluência, formação e certificação dos mestres -, e na admissão dos alunos que estudam em escolas bilíngues – como idade de ingresso para que a aquisição179 da língua-alvo concretize-se, ou de fluência de alunos maiores, para que consigam acompanhar os colegas -, nas instituições de escola bilíngues, internacionais, das classes econômicas mais abastadas do país. Como trata-se de um ensino predominantemente voltado para as classes econômicas mais altas do país, conforme ficou evidente em nossa pesquisa histórica ao longo do capítulo 3 desta tese, consideramos que devemos nivelar os parâmetros pelo nível superior e não pelo oposto, traçando referenciais que deverão ser seguidos pelas escolas bilíngues públicas e “programas bilíngues” mais populares ou menos elitistas, além das demais escolas autointituladas bilíngues e internacionais.

A falta desse cuidado de comprovação de fluência e competência linguísticas no idioma-alvo pode permitir que os estudantes que valeram-se de um estudo autointitulado “bilíngue ou internacional”, cujos preços são sempre maiores, conforme vimos, não consigam, no final de seus estudos, ingressar em instituições de estudo internacionais como universidades, ou não atinjam as notas necessárias nas habilidades para obter as certificações que assegurem sua competência na língua-alvo ao serem submetidos à elas (de certificação internacional ou em testes admissionais de emprego). Tais alunos submetidos a um ‘Ensino Bilíngue’ deficiente, invariavelmente, aperceberão-se não-fluentes ou não terão competência linguística no idioma- alvo e talvez não conseguirão atingir o nível de comunicação avançado que desejavam a submeter-se a esse tipo de ensino – sendo que definimos, nesta tese, com base em Rod Ellis (2008: 26), competência como o conhecimento linguístico de uma língua que os falantes já

179 Outro aspecto que abordamos nesta pesquisa foi a questão da aquisição da língua-alvo em suas variáveis, como o momento de exposição a essa língua, os tipos de abordagem e metodologias, suas controvérsias, sem nos alongarmos demasiadamente, essencialmente por uma questão de extensão dessa tese. O momento mais indicado para a exposição a uma segunda língua é uma das questões que faz parte da polêmica que circunda os programas que ensinam em mais de uma língua no mundo todo. Uma imersão na segunda língua desde o princípio do aprendizado seria a mais indicada para a maioria dos estudantes, ou seria melhor haver uma transição da língua nativa para a segunda língua? Esses questionamentos fazem parte da controvérsia que envolve o ‘Ensino Bilíngue’ ao redor do mundo, não serão aprofundados nessa tese e podem ser relevantes para o estabelecimento dos parâmetros para o setor.

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interiorizaram e o termo proficiência na referência à habilidade dos falantes para usarem esse conhecimento em diversas tarefas. Muitas vezes, esses estudantes não alcançarão esse domínio linguístico devido aos próprios professores, que, como não têm sua competência e fluência linguística avaliadas em padrões internacionais, por sua vez, talvez eles próprios não tivessem esses saberes bem estruturados e não poderiam, assim, prover os meios necessários para esse desenvolvimento em seu alunado.

Propomos a nomenclatura, ‘Ensino Bilíngue’, tal qual alguns parâmetros para regulamentá-lo porque, conforme dito até agora, os pesquisadores do setor apontaram para essa deficiência, o que deixa os pais que matriculam seus filhos nessas instituições sem um padrão de referência apropriado, tendo que fiar-se nas próprias definições, padrões e argumentos das escolas. Como também já pontuamos, as próprias instituições tratam mais abertamente, na atualidade, o ensino que promovem como um produto de mercado e, como tal, anseiam o retorno financeiro advindo de seu investimento. Isso faz com as regulamentações para o setor sejam ainda mais necessárias para que não haja mais distorções provenientes das variáveis econômicas advindas da questão.

Para que haja uma regulamentação que ajude a nortear o ‘Ensino Bilíngue’ no Brasil propomos os seguintes critérios mínimos para que os órgãos de educação, as escolas bilíngues e internacionais, as regulares que ofereçam um “programa bilíngue” e os pais de alunos baseiem- se, em relação ao(s): 1. Docentes: comprovar a competência linguística, discursiva e comunicativa – por meio de certificações de língua em nível avançado180 - e, se possível, de ensinamento – certificações voltadas para os professores especificamente181 - dessa língua-alvo, em nível avançado, em padrão internacional de todos os docentes que irão ministrar as aulas na língua-alvo. Os padrões internacionais são relevantes porque estabelecem um nível de conhecimento linguístico aceito internacionalmente, incluindo os países de origem daquela língua, o que promove legitimidade para o profissional contratado e para a instituição provedora daquele ensino. Dessa forma, os pais e estudantes terão um referencial confiável para fiarem-se e não mais terão que acreditar apenas nos discursos

180 Citamos exemplos destas certificações na nota de rodapé 154. 181 A Cambridge University, por exemplo, oferece o CELTA e o DELTA, para o ensino do inglês como língua estrangeira ou como segunda língua. Disponível em: http://www.cambridgeenglish.org/br/teaching-english/teaching- qualifications/delta/

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das instituições como “temos profissionais altamente qualificados”, cujos parâmetros de referência são, na verdade, “altamente” subjetivos. 2. Tempo de exposição mínimo à língua-alvo: prover 3 horas mínimas diárias de exposição à língua-alvo – as aulas ministradas na língua-alvo para programas de imersão parcial bilíngue devem seguir, nos anos da Educação Infantil, até 75% do tempo de toda a grade curricular, até 35% no Fundamental I e II, podendo diminuir gradualmente até o Ensino Médio para pelo menos 25% de sua carga horária em uma língua diferente do português. Para imersão total, recomendamos tal qual proposto por Baker (1998: 496), a imersão total de 100% de imersão na Educação Infantil, reduzindo- se para 80% no Fundamental I e II, terminando o ensino Fundamental II com aproximadamente 50%. Lembremos que com relação às exigências do MEC (2017: s/p), a partir da Educação Infantil, a disciplina que ensina a língua portuguesa deve ocupar pelo menos 60% da carga horária oferecida e a segunda língua deve ocupar no mínimo 25%. Como última recomendação, para “programas bilíngues”, ou outros ‘Ensinos Bilíngues’ que não sejam por imersão, a carga horária de pelos menos três horas por dia dedicadas ao ensino na segunda língua, sem o expediente de traduções, deve ser respeitada. 3. Currículo: fornecer uma grade curricular que contemple as exigências nacionais do MEC e, caso trate-se de uma instituição internacional, outra grade do país de referência, ou uma grade em língua estrangeira caso seja uma escola (programa) bilíngue por imersão total ou parcial. Não serão recomendadas aulas exatamente iguais feitas, nos dois idiomas em horários distintos, porque tais aulas não respeitariam os aspectos socioculturais, contemplados nos próximos subitens, também considerados como requisitos mínimos necessários para inclusão no ‘Ensino Bilíngue’. 4. Aspectos culturais: incluir e ampliar os aspectos culturais (de artes, música, literatura, locais turísticos, gastronomia, esportes, museus e artistas, etc.) da língua-alvo nas disciplinas da grade – aspectos como a formação social e cultural devem fazer parte do projeto pedagógico e dos objetivos dessas escolas, além da formação linguística de seus alunos. A escola internacional, como vimos, apresenta aspectos associados à cultura do país de referência em sua grade curricular e acreditamos que essa referência – podendo ser, talvez, feita a várias culturas diferentes - também deva ser incluída pelas escolas e (programas) bilíngues. Essas referências à outras culturas promovem um ensino contextualizado, propiciam à comunicação com o mundo externo e aprofundam a compreensão de línguas e culturas, para assim, formar cidadãos para o mundo

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globalizado, ao inserir os aprendizes em contextos socioculturais mais amplos, segundo o que pesquisamos. O reconhecimento, a participação e o respeito a ambientes culturais diversos promove visões bi-multiculturais relevantes e críticas. O ‘Ensino Bilíngue’ deve ter por objetivo formar cidadãos que lidem com diferentes aspectos culturais de ambientes sociais distintos, contribuindo para a disseminação da tolerância entre os povos e a formação de cidadãos multiculturais. 5. Aprendizado significativo e contextualizado: contextualizar a aprendizagem da língua-alvo de maneira significativa e relevante ao alunado, isso quer dizer, que as vivências, experiências, dúvidas e anseios dos estudantes devem ser considerados nas aulas, semelhante à abordagem student centered learning, em que o aluno é a peça central e os professores são os mediadores do processo de aprendizado. A língua-alvo deve ser um veículo, um meio, pelo qual o aprendiz se desenvolverá, adquirirá e construirá conhecimento, interagindo e agindo sobre o meio, não sendo somente fonte de correções gramaticais, de pronúncia e de uso da língua. Assim, haverá um verdadeiro aprimoramento da competência linguística, da fluência e das quatro habilidades – ler, ouvir, falar e escrever - em situações reais de aprendizado, relevantes e significativas. 6. Aspectos sociais: produzir competências não apenas técnicas, mas principalmente sociais, cada vez mais exigidas das pessoas para a participação nesta nova ordem mundial por meio da língua-alvo – promover, independentemente de qual instituição se trate (bilíngue, internacional, ou regular com programa bilíngue) a inserção dos estudantes em um grupo que promova a acumulação de uma cultura internacional (Cantuaria 2009: 5), caracterizada por recursos sociais de vários tipos, como o conhecimento de línguas, de culturas e de modos de vida diferentes, que possibilitem a construção de uma carreira em vários países, por meio dos capitais linguísticos, culturais, sociais, profissionais e simbólicos adquiridos pela vivência bicultural ou multicultural. 7. Discentes: comprovar a competência linguística avançada, de padrão internacional, dos alunos que concluírem os estudos, por etapas – além de darem legitimidade para os próprios estudantes quanto a seu próprio conhecimento na língua-alvo, a certificação ao final de cada etapa proporcionará respeito, prestígio e legitimidade à própria instituição de ‘Ensino Bilíngue’, tal qual ocorre com as escolas internacionais que têm seus currículos reconhecidos internacionalmente, por meio de certificações ou validade de seus currículos nos países de referência.

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8. Escolas internacionais propriamente ditas: possuir pelo menos uma de duas características em comum caso queiram além de ser enquadradas como parte do ‘Ensino Bilíngue’, ser também chamadas de instituição ou escola internacional: a primeira ser uma instituição reconhecida pelos sistemas de ensino de seus respectivos países de referência, sendo sua representante em territórios estrangeiros; ou a segunda, o fato dessas escolas funcionarem regularmente no Brasil como instituições internacionais, tal qual proposto por Cantuaria (2005: 6). 9. Objetivo maior: ter como um objetivo maior o desenvolvimento de uma competência global definida como “a habilidade de adquirir conhecimento e compreensão profundos sobre assuntos internacionais”, em que estaria “explícita a aptidão de possuir proficiência em línguas estrangeiras – nas habilidades de ler, falar e escrever mais de um idioma” (HANNA, 2018: 23). O desenvolvimento de uma competência global tem por finalidade um melhor conhecimento de povos e culturas, de história, política, sociedade e economia internacional, que podem vir a promover uma maior tolerância e um senso de cooperação entre as pessoas do mundo. 10. Requisito primordial básico: proporcionar conhecimento acadêmico sobre bilinguismo para os envolvidos no ‘Ensino Bilíngue’, tal qual proposto por Hoexter: “no cotidiano educacional verifica-se certo desconhecimento dos fundamentos do bilinguismo, suas possibilidades, limitações e alcances.” (HOEXTER, 2016: 11). A este requisito nossa pesquisa visa a colaborar com uma visão ampla e holística do bilinguismo que engloba os paradigmas científicos, as questões de cultura, identidade e ensino além dos dados por nós coletados na pesquisa mundial sobre estas temáticas que retratam o senso- comum sobre esses mesmos assuntos.

Como última ressalva, acreditamos não ter esgotado os critérios que deveriam ser elencados para a inclusão das instituições no chamado ‘Ensino Bilíngue’, tão pouco exaurimos os pormenores de cada item por nós propostos. Lembremo-nos do aspecto apontado como central do ‘Ensino Bilíngue’, principalmente do internacional, visto no subitem anterior, a interdisciplinaridade. A transdisciplinaridade, a multidisciplinaridade e a interdisciplinaridade são termos polissêmicos e polêmicos que dependem de uma série de fatores, como os contextos histórico-culturais em que foram cunhados, além do entendimento da finalidade pela qual o teórico os propôs/cunhou naquele dado contexto. Os termos relacionados à multi/trans/interdisciplinaridade estão em construção por se tratarem de uma prática, um

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movimento em processo de desenvolvimento dentro das Ciências e de seu ensino. Tais aspectos serão explorados em pesquisas posteriores. Por fim, cremos que um debate amplo, com todos os setores da sociedade, antes de que as regulamentações sejam, de fato, feitas seja imperioso, o que não invalida que desejemos iniciar essa regulamentação, norteando as bases delineadoras do setor com base nas pesquisas feitas por nós até o momento.

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CAPÍTULO IV – AS PERGUNTAS DA NOSSA PESQUISA MUNDIAL, SEUS RESULTADOS, A ANÁLISE E A DISCUSSÃO

Language fills the spaces between us with sound; culture forges the human connection through them. Culture is in language, and language is loaded with culture.182 (AGAR).

Dedicamos este último capítulo às perguntas que foram selecionadas para o questionário de nossa pesquisa mundial, assim chamada uma vez que foi respondida por pessoas localizadas nos cinco continentes do mundo, além das justificativas individuais de sua seleção. Primeiramente, gostaríamos de informar que optamos por fazer o mesmo questionário em três idiomas (para a versão completa dos questionários, nos três idiomas, consultar ANEXO 1): o português, por ser a língua materna desta pesquisadora, uma brasileira, e por esse ser o sétimo idioma mais falado no mundo; o inglês, a segunda língua da mesma que trabalha como professora deste idioma, mas acima de tudo por ser a língua franca de comunicação mundial da atualidade, sendo o terceiro idioma mais falado no mundo; e o espanhol, terceiro idioma da pesquisadora e segunda língua mais falada no mundo.

A escolha desses idiomas se deu devido à sua importância em número de milhões de falantes no mundo, como veremos a seguir, e pelo fato de as respostas desta pesquisa poderem ser analisadas pela pesquisadora que as conhece. Novamente usamos como referência à estimativa do número de falantes dos idiomas no mundo o site Ethnologue183 (2018: s/p), do qual extraímos alguns dados na Introdução desta tese. Segundo seu ranking das dez línguas mais faladas no mundo, o chinês é falado por 1,299 bilhões de pessoas sendo o primeiro idioma no mundo; o espanhol é o segundo com estimados 442 milhões de falantes; o inglês o terceiro, 378 milhões; o árabe, 315 milhões é o quarto; o hindi, 260 milhões é o quinto; o bengali, de Bangladesh, é o sexto com 243 milhões; o sétimo é o português com estimados 223 milhões; o russo ocupa a oitava posição com cerca de 154 milhões de falante; o japonês a nona com 128 milhões e a língua lahnda, do Paquistão, ocupa a décima posição com 119 milhões de usuários.

182 A língua preenche os espaços entre nós com o som; a cultura forja a conexão humana entre elas. A cultura está na língua e a língua é carregada de cultura (AGAR). Tradução nossa. 183 Dados extraídos do site: ETHNOLOGUE. 2018. Languages of the World. Summary by language size. Disponível em: . Acesso 14 maio 2018.

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Gostaríamos de fazer a ressalva de que como o link184 da pesquisa foi disponibilizado em universidades e escolas de idiomas, alguns entrevistados podem ter optado em respondê-la em um idioma que não fosse sua língua materna, por algum motivo seu, por exemplo, para testar seus conhecimentos em sua segunda língua. Já como última observação antes de passarmos para as perguntas propriamente ditas, destacamos que o questionário foi subdivido por assuntos. A primeira parte perguntava majoritariamente os dados socioeconômicos do participante, além da língua em que desejava responder ao questionário e sua localização no mundo. A segunda parte continha perguntas quanto ao bilinguismo dos participantes e os conceitos subjacentes a ele como língua e cultura, língua e identidade, língua e poder. A terceira parte indagava sobre a opinião dos entrevistados quanto aos supostos benefícios – cognitivos, sociais e econômicos – ou do oposto disso – preconceito - que a condição bilíngue pode acarretar. A quarta e última parte perguntava sobre o ‘Ensino Bilíngue’ também explorando os aspectos sociais, econômicos e de ensino, propriamente dito.

4.1 As perguntas de nossa pesquisa e suas justificativas individuais

A primeira pergunta presente foi disponibilizada nos três idiomas, de forma que ao clicar nela o pesquisado passava a responder as demais na língua selecionada, como vê-se: “1. Em que língua você gostaria de responder a essa pesquisa?”; “1. In which language would you like to respond to this survey?”; 1. “¿En qué idioma le gustaría responder a esta encuesta?”. Nesta sessão, para a justificativa de cada pergunta, iremos disponibilizar apenas a versão em português, com exceção desta primeira pergunta e da de número três. Ressaltamos que os questionários eram iguais, ou seja, fizemos três versões idênticas de perguntas e respostas apenas modificando a língua em que os entrevistados as liam.

O questionamento de número dois versava sobre a localização da pessoa no mundo ao responder a pesquisa, se localizada no Brasil ou em outro país (“2. De onde você responde a essa pesquisa? a. Brasil b. Outro país”); caso a pessoa respondesse “a. do Brasil” ela era direcionada para a pergunta 2.B para que especificasse de que região do país se encontrava: “Em que região do Brasil você vive? a. Norte b. Sul c. Centro-oeste d. Nordeste. e. Sudeste”; caso marcasse b, outro país, ela era levada para a pergunta 2.C: “De que continente você

184 PESQUISA MUNDIAL SOBRE BILINGUISMO. Disponível em: . Acesso de 23 abril a 23 maio 2018.

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responde a essa pesquisa? a. América do Norte (Canadá ou EUA) b. América Central ou do Sul c. Europa d. África e. Ásia f. Oceania”.

Com essas duas perguntas de localização almejamos descobrir onde os falantes dos três idiomas estavam localizados no momento em que respondiam à pesquisa, no Brasil ou em que continente do mundo. O foco de nossa análise terá por base os idiomas em que formulamos o questionário - português, inglês ou espanhol -, ou seja, na análise poderão ser encontradas afirmações como “os entrevistados que responderam em português estavam majoritariamente (75%) localizados no Brasil”, por exemplo. Dessa maneira, a identificação do consultado estar no Brasil ou em outro país é relevante para que sejam feitos cruzamentos na análise. Também optamos pela localização geográfica da pessoa no globo, ao invés da nacionalidade dela, porque conseguiremos cruzar as informações obtidas de maneira mais relevante, como por exemplo: “7% dos que responderam à pesquisa em português estavam em outro país, destes 45% estavam na América Norte”.

Perguntamos ainda se a língua em que a pessoa preferiu responder ao questionário era a língua materna do entrevistado, “3. Esta língua (português) é a sua língua materna? a. Sim b. Não”; “3. Is this language (English) your mother tongue?”; “3. ¿Esta lengua (español) es su lengua materna?”. Caso marcassem “b. não, no ou no”, deveriam reponder, em uma resposta aberta, qual era a sua língua materna - “3.B Qual é sua língua materna?”; “3. B What is your mother tongue?”; “3.B ¿Cuál es su lengua materna?”. Por essa pergunta, poderemos inferir se o entrevistado é um falante de L1 ou L2 do idioma que optou por responder a entrevista, sem ter que nos utilizar desta terminologia que nem sempre é o do conhecimento da população em geral, público-alvo de nossa pesquisa.

Como perguntas para obtenção de informações socioeconômicas dos entrevistados, os questionamentos foram em relação: ao sexo do entrevistado - “4. Qual é o seu sexo? Feminino b. Masculino”; à idade - “5. Qual é sua faixa etária? a. 0-10 b. de 11 a 19 c. de 20-29 d. 30-39 e. 40-49 f. 50-59 g. 60-69 h. 70-79 i. + 80 anos”; à classe econômico-social, “6. Qual é sua renda familiar? a. Até R$ 1.254 b. de R$ 1.255 a R$ 2.004 c. de R$ 2.005 a R$ 8.640 d. de R$ 8.641 a R$ 11.261 e. acima de R$ 11.262” (“7. What is your family income? (for a family of three per year)” “7. ¿Cuál es su renta familiar? a. U$18,871 a year b. between U$30,000 and U$100,000 c. between U$100,000 and U$150,000 d. between U$100,000 and U$350,000 e. at least U$389,436 a year”); e aos estudos - “7. Qual é a sua escolaridade? a. Ensino Fundamental 1 b.

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Ensino Fundamental 2 c. Ensino Médio d. Ensino Superior e. Pós-Graduação.” Na questão de número 6 foram disponibilizados apenas as opções em reais, para os que responderam em português, e em dólares americanos, para os que optaram em responder em inglês ou espanhol, pelo fato de o dólar ser uma moeda referencial monetária internacional de fácil conversão a todos. Utilizamo-nos dos quesitos socioeconômicos mínimos - sexo, idade, renda e escolaridade - que fossem capazes de nos dar uma base referencial, em todos os países e culturas envolvidas, em uma pesquisa mundial.

A questão 8, “8. Você se considera bilíngue? a. Sim b. Não”, levava a três caminhos: caso a resposta fosse “a. Sim (sou bilíngue)”, a pergunta sobre a(s) segunda(s) língua(s) falada(s) pelo entrevistado era feita, sendo que ele poderia marcar quantas alternativas quisesse: “8 B. Que línguas você fala (além do português)? a. inglês b. espanhol c. alemão d. japonês e. outra, qual? (RESPOSTA ABERTA)” -; caso a resposta fosse b, “b. Não (não sou bilíngue)”, era posto a ele a múltipla escolha: “8.C. Não me considero bilíngue porque... a. sou monolíngue b. sou multilíngue c. não sei escrever ou ler na outra língua d. não me considero fluente na segunda língua e. outra razão. Qual? (RESPOSTA ABERTA)”. Caso a pessoa dissesse que não se considerava bilíngue porque “b. sou multilíngue”, deveria responder adicionalmente: “8. E. Quais outros idiomas você fala? (RESPOSTA ABERTA).”

Conforme observamos em nossa pesquisa teórica ao longo desta tese, o conceito de bilinguismo não é único e nem tão pouco de simples conceituação, ao contrário, é múltiplo, variado, polêmico, multifacetado e dependente de muitos fatores, como de critérios de fluência e domínio dos idiomas, do desenvolvimento das habilidades nas línguas (ler, escrever, falar e ouvir), ou do tipo de bilinguismo adquirido (por imersão, por semi-imersão etc.), ou ainda de fatores de ordem sociocultural185. Vimos também que o conceito de bilingue depende dos referenciais teóricos de cada autor, do uso e do status ocupado por cada língua, tanto individualmente, quanto em uma sociedade, dentre outros referenciais sociais, culturais e até econômicos (temas predominantemente discutidos principalmente no Capítulo 2), o que fez com que nos utilizássemos de uma referência teórica única para a conceituação de bilíngue nesta tese, sem porém, ignorar a existência das demais. Nesta tese, valemo-nos da definição de bilíngue de Grosjean (2008: 13-14)186, “o bilíngue ou a visão holística do bilinguismo propõe que

185 Na Introdução e no início do Capítulo 1 há uma breve discussão sobre o tema e a menção aos 37 tipos de bilinguismo de Wei (2000). 186 “O bilíngue ou a visão holística do bilinguismo propõe que o bilíngue é um todo integrado que não pode ser facilmente decomposto em duas partes diferentes. O bilíngue não é a soma de dois monolíngues completos ou

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o bilíngue é um todo integrado que não pode ser facilmente decomposto em duas partes diferentes [...]”, a qual é abrangente e contém uma visão ampla da condição bilíngue, que vai ao encontro de nossas expectativas de que cada bilíngue, tal qual cada indivíduo em sua genética, é único, completo e tem sua especificidade linguística irrepetível, conforme já justificamos anteriormente.

Ao questionarmos se o entrevistado se considerava bilíngue gostaríamos de verificar se o conceito de bilinguismo também é múltiplo para os falantes comuns e não somente para a crítica especializada. Adicionalmente, tínhamos a intenção de verificar quais eram os critérios individuais dos respondentes que não consideravam-se bilíngues, elencando quatro razões comuns para a negativa (nas alternativas de a-d) e deixando que eles manifestassem-se livremente na alternativa na última (e), caso achassem que os motivos trazidos nas outras alternativas não eram as suas razões para não considerarem-se bilíngues.

Decidimos perguntar para nossos participantes se eles consideravam a língua (o mesmo que) cultura, “9. Para você língua é cultura (ou é o mesmo que cultura)? * a. Sim b. Não c. Não sabe opinar”, na pergunta de número nove. O axioma de que língua é cultura (AGAR, 1994) mencionado na Introdução, o qual permeia toda essa tese, foi trazido na forma de pergunta para que pudéssemos verificar a percentagem de entrevistados que consideravam a língua (o mesmo que) cultura, a porcentagem dos que não consideravam a língua (o mesmo que) cultura, e daqueles que não sabiam opinar a respeito do axioma.

A partir deste questionamento, todas as vezes em que houve um asterisco na pergunta, principalmente quando o entrevistado marcava “a. Sim”, uma tela de escala 1-5 abria-se. Em cada uma dessas perguntas encontrava-se explícito, de maneira a orientar o respondente, o que cada número da escala significava: “9. B “Língua é cultura ou é o mesmo que cultura. Marque 1 (discordo completamente) a 5 (concordo completamente)”. As respostas com escala são de ordem qualitativa por permitirem-nos analisar o resultado de maneira a quantificar o grau da concordância, ou da discordância, com aquela afirmação, sendo que os extremos (1 e 5); também podem demonstrar que o entrevistado reviu sua afirmação (ou negação), isso quer

incompletos; mais propriamente, ele ou ela tem uma configuração linguística específica e única. A coexistência e constante interação das duas línguas no bilíngue produziu um sistema linguístico diferente, mas completo. (GROSJEAN, 2008: 13-14)”.

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dizer, se ele marcou “Língua é cultura ou é o mesmo que cultura” e depois marcou 1 (discordo plenamente) pode significar que tenha mudado de ideia quanto sua afirmação primeira.

A pergunta 9 tinha um terceiro caminho para os que respondessem “a. Sim (“a língua é cultura”)”, eles deveriam responder adicionalmente: “9. C Para você um bilíngue é necessariamente bicultural? *” a. Sim b. Não c. Não sabe opinar”, e se marcassem sim novamente eram direcionados à 9. D “Os bilíngues são sempre biculturais 1 (discordo completamente) a 5 (concordo completamente)” Devido a um problema do software da empresa contratada por nós para fazer a pesquisa, as respostas 9.D de escala ““Os bilíngues são sempre biculturais 1 (discordo completamente) a 5 (concordo completamente)” não tiveram seus dados coletados somente na língua portuguesa (ver Capítulo IV).

O já mencionado professor emérito da University of Neuchâtel, Suíça, François Grosjean baseou-nos no questionamento 9. C. Após a publicação do livro Bilíngue: Vida e realidade187 (2010), não disponível no Brasil, Grosjean publicou em um website188, de sua autoria, mitos e verdades baseados na vasta pesquisa sobre bilinguismo ao longo de sua vida acadêmica. Nesse site, o autor indica como um mito sobre o bilinguismo, o de número 7, “Bilíngues são também biculturais.” Ele afirma que isso não é verdade, e sim um mito, porque embora muitos bilíngues sejam também biculturais uma vez que interagem com duas culturas e combinam aspectos de cada uma delas, outros muitos são monoculturais. Como exemplos, ele cita os habitantes da parte Suíça que fala alemão e que frequentemente adquirem três ou quatro línguas na juventude, mas continuam monoculturais, em contraponto a um britânico que viva nos EUA e seja monolíngue, porém bicultural: “Assim, uma pessoa pode ser bilíngue sem ser bicultural, tal qual uma pode ser monolíngue e bicultural (ex: o britânico que vive nos EUA)”189 (GROSJEAN, 2010: s/p). Essa noção de mono/bilinguismo e mono/biculturalismo é que gostaríamos de investigar com essa pergunta, queríamos ver se os respondentes que assinalaram que “a. sim, língua é (o mesmo que) cultura” também acreditavam, ou não, que “um bilíngue são sempre biculturais”.

187 GROSJEAN, F. Bilingual: Life and Reality. Harvard University Press, 2010. 188 GROSJEAN, F. Myths about bilingualism. Disponível em:. Acesso em 13 maio 2018. 189 “Bilinguals are also bicultural. WRONG. Even though many bilinguals are also bicultural (they interact with two cultures and they combine aspects of each), many others are monocultural (e.g. the inhabitants in the German speaking part of Switzerland who often acquire three or four languages during their youth). Thus one can be bilingual without being bicultural just as one can be monolingual and bicultural (e.g. the British who live in the USA).” Tradução nossa.

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As próximas perguntas 10-11, “10. Você considera a língua (materna/aprendida) parte da identidade de um falante? * a. Sim b. Não c. Não sabe opinar” e “11. Para você língua é poder (ou é o mesmo que poder)? * a. Sim b. Não c. Não sabe opinar”, igualmente levavam a uma escala 1 (concordo completamente) a 5 (discordo completamente), caso marcassem “a. sim”: “10. B A língua (materna/aprendida) é parte da identidade de um falante” e “11.B Língua é poder ou é o mesmo que poder.” Nas outras línguas e nas demais perguntas em português a escala era 1 (discordo completamente) a 5 (concordo completamente), essa inversão deu-se somente nessas duas perguntas e apenas no questionário de língua portuguesa e ocorreu, novamente, por problemas técnicos. Esse expediente – a inversão das escalas, alternativas, etc. - é comumente utilizada em pesquisas de opinião de maneira proposital, para detectar-se se os respondentes respondiam atentamente às perguntas de escala ou de forma automática, sendo esse o viés que usaremos para nossa análise, uma vez que a falha foi detectada.

O questionamento 12, “12. Você considera que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traga benefícios a uma pessoa? * a. Sim b. Não c. Não sabe opinar”, também levava a dois caminhos, “12. B Falar mais de um idioma traz benefícios.”, sendo que a escala era 1 (discordo completamente) a 5 (concordo completamente) e caso marcassem “b. não”, falar mais de um idioma não traz benefícios na minha opinião, levaria a “12. C Falar mais de um idioma não traz benefícios.”, com a mesma escala. Formulamos essa pergunta de maneira generalizante (“traga benefícios”) porque especificamos alguns tipos de benefícios que o bilinguismo traria nas perguntas de número 14-16, vantagens cognitivas, “14. Você acredita que um bilíngue tenha alguma vantagem cognitiva (concentração, agilidade mental, fazer tarefas melhor etc.) em relação aos monolíngues? * a. Sim b. Não c. Não sabe opinar”; vantagens sociais, “15. Você acredita que um bilíngue tenha alguma vantagem social (melhor comunicação, maior empatia ou tolerância na convivência com os outros etc.) em relação aos monolíngues? * a. Sim b. Não c. Não sabe opinar”; e vantagens econômicas “16. Você acha que uma pessoa bilíngue terá inevitavelmente um melhor salário em sua profissão do que uma monolíngue? * a. Sim b. Não c. Não sabe opinar”. Nas três perguntas, caso marcassem “a. sim” a escala 1 (discordo completamente) a 5 (concordo completamente) era disponibilizada: “14. B Um bilíngue tem alguma vantagem cognitiva.”; “15. B Um bilíngue tem alguma vantagem social.” e “16. B Um bilíngue inevitavelmente terá melhor salário.”.

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Justificamos essas três perguntas, questionando se o respondente acreditava que haveria “benefícios” ou “vantagens bilíngues” no decorrer desta tese como um todo, sendo que as vantagens cognitivas estão predominantemente enfocadas no Capítulo 1, as sociais no Capítulo 2, e as econômicas nos Capítulos 2 e 3.

Optamos por contrastar, de maneira indireta, as possíveis vantagens/benefícios do bilinguismo com uma possível desvantagem que os falantes de mais de uma língua poderiam ter, intercalando os questionamentos de possíveis vantagens com a pergunta de número “13. Você acha que um imigrante sofre preconceito por vir de uma cultura diferente e por falar outra língua?* a. Sim b. Não c. Não sabe opinar” e, caso marcassem “a. sim”, deveria responder “13.B Um imigrante bilíngue sofre preconceito por vir de outra cultura e falar outro idioma.”, cuja escala era 1 (discordo completamente) a 5 (concordo completamente). As justificativas para esse questionamento de ordem social e discursiva – o preconceito – estão fundamentadas no subitem 2.5 e ao longo do Capítulo 2.

As perguntas seguintes diziam respeito ao ‘Ensino Bilíngue’, segundo a nossa proposta teórica, e questionaram: “17. Se você tivesse oportunidade de se matricular, ou matricular algum parente, em uma “escola bilíngue” ou em uma “escola internacional”, você o faria? a. Sim b. Não c. Não sabe opinar”. Caso marcassem “a. sim”, foi perguntado se o respondente acreditava ter sofrido algum tipo de influência da mídia nessa decisão: “17. B Você considera que a mídia (jornais, revistas Rede Sociais, etc.) exercem influência sobre as pessoas ambicionarem um estudo bilíngue atualmente? a. Sim b. Não c. Não sabe opinar”. Justificamos o questionamento 17. B principalmente nos Capítulos 1 e 3 desta tese.

Perguntamos se para os entrevistados haveria alguma diferença entre uma escola bilíngue e uma internacional já que as distinções técnicas nem sempre são do conhecimento da população em geral, como vimos na teoria do Capítulo 3: “18. Para você existem diferenças entre uma escola bilíngue e uma escola internacional? Se houver, qual seria? (MARQUE QUANTAS ALTERNATIVAS QUISER) a. Não há diferença entre escola bilíngue e internacional já que ambas ensinam em pelo menos dois idiomas b. Sim, a escola bilíngue segue o currículo do país em que está, mas também oferece algumas matérias em idiomas estrangeiros c. Sim, a escola internacional segue um currículo de outro país d. Sim, a escola internacional prepara os alunos para universidades em outros países e. Sim, a escola internacional oferece certificações internacionais.”. Optamos por deixar que os respondentes marcassem quantas alternativas

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quisessem nesta questão de múltipla escolha e elencamos as principais diferenças apontadas no Capítulo 3 desta tese nas alternativas de a-e.

No que diz respeito à parte econômica (Capítulos 2 e 3), dos custos do ‘Ensino Bilíngue’, nos questionamentos “19. Você acredita que uma intitulada ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional – tenha mensalidades mais altas do que uma escola regular? a. Sim b. Não c. Não sabe opinar” e “20. Você considera procedente (justificado) uma “Escola Bilíngue” ser mais cara do que uma regular? a. Sim b. Não c. Não sabe opinar”. A ordem destes questionamentos foi importante, uma vez que caso a pessoa respondesse “b. não” ou “c. não sei”, somente na pergunta seguinte (20) ela seria informada de que essa escola era realmente mais cara.

Intencionamos ainda descobrir quantas pessoas dentro do universo de nossos pesquisados haviam estudado ou ainda estudavam em uma ‘Escola Bilíngue’: “21. Você estudou ou ainda estuda em uma “Escola Bilíngue” (escola bilíngue ou internacional)? a. Sim, bilíngue b. Sim, internacional c. Não.” e se para eles haveria algum tipo de vantagem em estudar-se nessas instituições, embora não tenhamos especificado quais tipos de benefícios elas trariam: “22. Para você existem vantagens em se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’? a. Sim b. Não c. Não sabe opinar.”. Somente os entrevistados que marcaram “a. sim, há vantagens de se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’, seriam levados a pergunta “22. B Quais seriam as vantagens de se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’? (MARQUE QUANTAS ALTERNATIVAS QUISER OU NENHUMA) a. falar/dominar um outro idioma b. aprender a respeitar outras culturas e pessoas c. obter alguma certificação internacional no idioma d. conhecer novas culturas por meio de seus idiomas e. ter um melhor salário no futuro”.

Elencamos as principais vantagens apontadas pelas instituições bilíngues e internacionais (‘Escolas Bilíngues’) em nossa pesquisa ao longo do Capítulo 3, como opções para os entrevistados que poderiam marcar quantas alternativas achassem que continham vantagens desse tipo de ensino. As principais categorias de vantagens dessas alternativas estavam relacionadas ao ensino/aprendizado dos idiomas (a), aspectos que apontam para vantagens culturais (b e d), aspectos sociais de convivência entre os povos (c) e econômicos (e).

Como última pergunta, indagamos se nossos entrevistados trabalhavam ou já haviam trabalhado nessas instituições de ensino: “23. Você trabalha ou já trabalhou em uma “Escola Bilíngue” ou “Internacional”? a. Sim b. Não”. Caso marcassem não, a participação era

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encerrada. Os que assinalassem “a. sim” eram interpelados com o questionamento final, mais específico, sobre aquisição de uma segunda língua: “24. Você acha que quando a língua falada em casa é diferente da escola, haverá um efeito negativo na aquisição da língua da escola? (em contextos de imigração ou de alfabetização em uma segunda língua diferente da língua do país)* a. Sim, somente em contextos de imigração b. Sim, somente em contextos de alfabetização em segunda língua diferente da língua do país em que a escola está c. Sim, nos dois contextos d. Não e. Não sabe opinar” e somente os que marcassem as alternativas com “sim” (a, b ou c) deveriam marcar na escala de 1 (discordo completamente) a 5 (concordo completamente) “24. B Sim, haverá um efeito negativo na aquisição da língua da escola”.

Justificamos a inclusão deste questionamento para os que já trabalharam nessas escolas tomando por base um outro mito sobre o bilinguismo exposto por Grosjean no mesmo site190 citado anteriormente em relação às crianças bilíngues, o mito de número 10 - “O bilinguismo irá atrasar a aquisição de linguagem em crianças”. Grosjean afirma que este mito era popular no meio do século XX e que desde então muitas pesquisas apontam para o resultado de que as crianças bilíngues não têm atrasos na aquisição de linguagem. Ele afirma que as pessoas deveriam ter em mente que as crianças bilíngues, uma vez que têm que lidar com duas ou mais línguas, são diferentes em alguns aspectos das crianças monolíngues, mas não em relação à taxa de aquisição de linguagem, fornecendo o dado de que: “Por exemplo, em relação às crianças bilíngues com distúrbios linguísticos (ex: dislexia), as crianças bilíngues disléxicas não são proporcionalmente mais numerosas do que as crianças monolíngues disléxicas” (GROSJEAN, 2010: s/p)191. Abordamos essa questão do possível atraso na aquisição de uma segunda língua no Capítulo 2, subitem 2.5, quando mencionamos contextos de alfabetização e de imigração, e nossa finalidade com essa pergunta era a de descobrir se o mito ainda vigora entre os professores do ‘Ensino Bilíngue’, ou se ele está restrito ao século passado como apontado por Grosjean (ver questões 24 e 24 B).

190 GROSJEAN, F. Myths about bilingualism. Disponível em:. Acesso em 13 maio 2018. 191 “Bilingualism will delay language acquisition in children. WRONG. This is a myth that was popular back in the middle of the 20th Century. Since then much research has shown that bilingual children are not delayed in their language acquisition. This said, one should keep in mind that bilingual children, because they have to deal with two or more languages, are different in some ways from monolingual children, but definitely not on rate of language acquisition. As for bilingual children with language challenges (e.g. dyslexia), they are not proportionally more numerous than monolingual children with the same challenges.” Tradução nossa.

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4.2 Os resultados, a análise e a discussão de cada pergunta feita

Passaremos, agora, para os resultados de nossa pesquisa mundial. O questionário192 ficou disponível do dia 23/04/2018 até 26/05/2018. Durante este período de um pouco mais de um mês, 207 participantes responderam a pesquisa de maneira completa, quer dizer, finalizaram todas as perguntas obrigatórias disponíveis, gerando um universo de amostra total de 207 respondentes. O número absoluto de questionamentos, nos três idiomas, contando-se que os entrevistados tomassem o caminho mais longo dentre as respostas possíveis foi de 131 perguntas. As perguntas de 2 a 44 estavam em português, as de 45 a 87 em inglês e as de 88 a 131 em espanhol, lembrando-se de que se tratavam das mesmas perguntas apenas em versões, em idiomas diferentes.

Quanto à pergunta de número 1, em que língua o participante gostaria de responder ao questionário, dos 207 (100%) respondentes, 155 (74.9%) responderam em língua portuguesa, 43 (20.77%) em língua inglesa e 9 (4.35%) em língua espanhola (FIGURA 3). A análise deste primeiro dado leva-nos a concluir que a maioria absoluta, ou 75% dos respondentes desta pesquisa, optou pela língua portuguesa como suporte para responderem ao que era perguntado.

192 PESQUISA MUNDIAL SOBRE BILINGUISMO. Disponível em: . Acesso de 23 abril a 26 maio 2018.

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Figura 3 – Porcentagem de respondentes em cada idioma: português (74.9%), inglês (20.77%) ou espanhol (4.35%).

O segundo questionamento, de onde o entrevistado respondia a pesquisa, teve por resultado a maioria absoluta dos respondentes em língua portuguesa dizendo que o fazia de dentro do Brasil - 144 (92.9%) -, 11 (7.1%) afirmaram estar em outro país - de um total de 155 (100%) (FIGURA 4).

Figura 4 – Porcentagem dos participantes que responderam em português que estavam no Brasil (92.9%) e que não estavam (7.1%).

Quando perguntamos de onde os respondentes em língua inglesa o faziam (pergunta 45), encontramos o mesmo resultado da maioria estar no Brasil, dos 45 participantes (100%), 32

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(71,11%) estavam no Brasil quando a responderam e 13 (28.89%) estavam localizados em outros países (FIGURA 5).

Figura 5 – Porcentagem dos participantes que responderam em inglês que estavam no Brasil (71.1%) e que não estavam (28.9%).

Seguindo a tendência, em língua espanhola (pergunta 88), dos 10 participantes (100%), 6 (60%) estavam no Brasil e 4 (40%) encontravam-se em outros países (FIGURA 6).

Figura 6 – Porcentagem dos participantes que responderam em espanhol que estavam no Brasil (60%) e que não estavam (40%).

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Tais dados apontam para o fato de que a maioria absoluta estava no Brasil quando respondeu à pesquisa totalizando 182 (88%) respondentes de dentro do Brasil e 28 (12%) dos entrevistados em outros países, nos três idiomas perguntados. O resultado de a maior parte estar situada no Brasil pode ser decorrente do fato de que a pesquisadora desta tese é brasileira, vive no país, nele trabalha, nele fez suas graduações e pós-graduações, assim como seus familiares e amigos fazendo com que, portanto, a maior parte de seus contatos pessoais e de trabalho, via redes sociais, e-mail, WhatsApp etc. – principais meios de propagação da pesquisa - também o é. O mesmo pode ter ocorrido com os conhecidos dos contatos dessa pesquisadora, que foram solicitados compartilhar a pesquisa.

O fato de 28 pessoas (12%) dos respondentes totais estarem localizados em outro país, no entanto, é de relevância. Se for tomado em consideração o dado de que apenas 25% dos convidados a responderem uma pesquisa de fato o fazem193, foram necessários pelo menos 828 convites totais para que 207 respondessem ao questionário, sendo que destes, 112 convites foram mandados para pessoas que estavam fora do Brasil, para que os 28 efetivamente respondessem. A distância geográfica, mesmo com o advento da Internet, é um dificultador. Isso sem mencionar os respondentes que não completaram as respostas consideradas obrigatórias do questionário, dentro e fora do Brasil, cujos resultados foram excluídos desta análise, o que faz com que o número total de convites que foram espalhados para a obtenção de 28 respondentes de fora do Brasil tenha sido ainda maior do os 112 mencionados.

Adicionalmente, tomemos por base elementos estatísticos e o teste do Qui-Quadrado (χ2) também utilizado por nós na análise de algumas respostas. O referido teste é uma das distribuições mais utilizadas em estatística inferencial, na qual um conjunto de métodos estatísticos visam a caracterizar ou inferir sobre uma população a partir de uma parte dela, a amostra (VIRTUOUS, 1998: s/p)194. O teste serve para avaliar quantitativamente a relação entre o resultado de um experimento e a distribuição esperada para o fenômeno, nos dizendo com quanta certeza os valores observados podem ser aceitos como regidos pela teoria em questão. Se considerarmos as amostras consideradas para este teste, é recomendado que

193 CENTRAL DE AJUDA. Quantas pessoas devo convidar para responder ao meu questionário. 1999-2018. Disponível em: . Acesso em 26 maio de 2018. 194 VIRTUOUS. Teste do qui quadrado para independência. 1998. Disponível em: . Acesso em 10 jun 2018.

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sejam tomadas amostras grandes em pesquisas, uma amostra é considerada grande quando possui 30 ou mais elementos em sua amostra (ANEXO 3). Se analisarmos que 28 respondentes estavam situados em outros países, temos a diferença de apenas 2 para que a amostra complete 30, o que torna somente esta subamostra, a de respondentes fora do Brasil, uma amostra média, porém muito próxima de uma amostra grande. Não são recomendadas amostras abaixo de cinco respondentes. Pelo mesmo referencial, a amostra total de respondentes desta pesquisa é uma amostra grande - 207 entrevistados.

A pergunta de número 3, em que região do Brasil os entrevistados viviam, dos 144 participantes em português, 1 (0.69%) disse morar da Região Norte do Brasil, 13 (9.03%) afirmaram residir na Região Sul, 1 (0.69%) no Centro-Oeste, 1 (0.69%) no Nordeste e 128 (88.89%) no Sudeste (FIGURA 7). Esta distribuição em que a maioria dos respondentes morava no Sudeste do Brasil, pode ser explicada, novamente, pelo fato de a pesquisadora morar, trabalhar, estudar etc. nessa região e dela ter um maior número de contatos pessoais e profissionais, sendo esta região a mais populosa do país. Uma análise importante, no entanto, é que apesar da dominância de respondentes na Região Sudeste, obtivemos pelo menos um respondente em cada região do Brasil em língua portuguesa.

Figura 7 – Distribuição pelas regiões do Brasil dos respondentes em língua portuguesa.

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Dos que responderam em inglês (pergunta 46), dos 32 ou 71,1% do total que estavam no Brasil, 4 (12.5%) moravam na Região Sul do Brasil, 2 (6.3%) no Nordeste e 26 (81.3%) no Sudeste, o que confirma a tendência anterior de maioria absoluta morando no Sudeste. Não houve respondentes em inglês que habitavam a Região Norte e Centro-Oeste (FIGURA 8).

Figura 8 – Distribuição pelas regiões do Brasil dos respondentes em língua inglesa.

Já dos respondentes em espanhol (pergunta 89), do total de 10 entrevistados nesta língua, 6 estavam no Brasil (60%) e, destes, 1 (16.7%) vivia na Região Sul do Brasil, 1 (16.7%) morava na Região Nordeste e 4 (66.7%) no Sudeste (pergunta 89), o que também aponta para a maioria vivendo na Região Sudeste (FIGURA 9). Não houve entrevistados em espanhol que moravam na Região Norte e Centro-Oeste.

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Figura 9 – Distribuição pelas regiões do Brasil dos respondentes em língua espanhola.

Comparativamente, analisamos que dos 182 respondentes totais, nos três idiomas, que alegaram estar no Brasil, 158 ou 87% moravam na Região Sudeste, a maioria absoluta deles, portanto, respondeu ao questionário da região mais populosa do Brasil.

Na pergunta de número 4, questionamos em que continente aqueles que não respondiam do Brasil estavam. Dos 11 participantes que respondiam na língua portuguesa, 5 ou 45.45% estavam na América, sendo especificamente da América do Norte; 3 ou 27.27% estavam na Europa; 2 ou 18.18% na Oceania e 1 ou 9.09% na África. Não houve respondentes situados na América Central ou do Sul, na Ásia ou na Antártida (FIGURA 10). Isso significa que a maior parte dos que responderam em português e não estavam no Brasil estavam na América do Norte (45.5%).

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Figura 10 – Distribuição pelos continentes dos respondentes em língua portuguesa que não estavam no Brasil.

Com relação aos respondentes em inglês que não situavam-se no Brasil (questão 47), dos 13 entrevistados, 4 ou 30.77% estavam igualmente localizados na Ásia e na Europa; 3 ou 23.08% estavam na América, especificamente do Norte (EUA ou Canadá) e 1 ou 7.69% na América Central ou do Sul e 1 ou 7.69% na Oceania, sendo que ninguém respondeu da África ou Antártida em língua inglesa (FIGURA 11). Dos respondentes em inglês, a maior parte estava situada na Europa ou Ásia, 31% em cada ou 62% do total da subamostra.

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Figura 11 – Distribuição pelos continentes dos respondentes em língua inglesa que não estavam no Brasil.

Já dos 4 entrevistados que responderam em espanhol (questão 90) e não estavam no Brasil, 2 ou 50% estavam localizados na América, especificamente Central ou do Sul e 2 ou 50% na Europa, não havendo respondentes dos outros continentes (FIGURA 12).

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Figura 12 – Distribuição pelos continentes dos respondentes em língua espanhola que não estavam no Brasil.

Comparativamente e resumidamente, nos três idiomas, concluímos que não houve uma homogeneidade na localização dos respondentes que alegaram estar fora do Brasil. A maior parte ou 45% dos que responderam em português estavam na América (do Norte), seguido de 27% na Europa, 18% na Oceania e 9% na África, ou seja, os respondentes em português estavam distribuídos por 4 continentes. Em língua inglesa, 31% estavam igualmente localizados na Ásia e na Europa; seguido de 23% na América (do Norte), 8% na América (Central ou do Sul), totalizando 31% nas Américas; e 8% na Oceania, quer dizer, os respondentes em inglês estavam distribuídos por 5 continentes. Em espanhol 50% estavam igualmente localizados na América (Central ou do Sul) e 50% na Europa, ou seja, os respondentes em espanhol estavam distribuídos por 2 continentes.

Pela análise dos dados coletados, dos que estavam fora do Brasil, os 46% que responderam em língua inglesa tiveram a maior distribuição pelo globo, distribuindo-se pelos cinco continentes; seguidos de 39% que responderam em português e encontravam-se em 4

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continentes, e 14% em espanhol que estavam em 2 continentes. Esses dados indicam que os respondentes em língua inglesa tiveram a maior distribuição de participantes pelos continentes do globo, respondendo de 5 deles. Quantitativamente e geograficamente os respondentes que estavam fora do Brasil também foram maiores em número em língua inglesa totalizando 13 participantes em inglês distribuídos por 5 continentes; seguidos de 11 em português em 4 continentes; e 4 em espanhol em 2 continentes.

Segundo a referência teórica por nós utilizada no ranking das dez línguas mais faladas no mundo, o espanhol é o segundo idioma com estimados 442 milhões de falantes; o inglês o terceiro, com 378 milhões; e o português é o sétimo com estimados 223 milhões de falantes pelo mundo (ETHNOLOGUE, 2018: s/p), ressaltando que independentemente do número de falantes estimado, a língua inglesa uma das línguas francas de comunicação internacional da atualidade, ou uma língua global (globish), ou a língua de contato de grande difusão, o que justifica a maior distribuição pelo globo por nós encontrada.

Os questionamentos de número 5, 48 e 91, respectivamente em português, inglês e espanhol, perguntavam se a língua escolhida para se responder ao questionário era a língua materna do respondente. Caso negassem que a língua escolhida para responder o questionário era a sua língua materna, eles eram encaminhados aos questionamentos 6, 49 e 92, respectivamente, e deveriam informar, em uma resposta aberta, qual era o seu idioma materno.

Dos 155 participantes que responderam em português (pergunta 5), 150 ou 96.77% disseram que sim, o português era sua língua materna, e 5 ou 3.23% responderam que não era (FIGURA 13).

189

Figura 13 – Distribuição dos respondentes em língua portuguesa que tinham o português (96.77%) como língua materna.

Dos 5 que responderam que o português não era sua língua materna (pergunta 6), foram apontadas como maternas os idiomas, desta forma grafados e em letras maiúsculas: 1 “Holandês”, 1 “Turco”, 1 “Italiano”, 1 “Japonesa” e 1 “Castelhano” (sic) - FIGURA 14. Curiosamente todos os respondentes usaram do masculino em suas repostas, provavelmente referindo-se ao idioma - o “Holandês”, o “Turco”, o “Italiano” e o “Castelhano” - e somente um utilizou-se do feminino, possivelmente referindo-se à língua (Japonesa).

Figura 14 – Línguas apontadas como maternas dos que responderam em português.

190

É curioso ressaltar que nenhum dos estrangeiros acertou a regra ortográfica da língua portuguesa de que as línguas e nacionalidades são grafadas em letra minúscula em nosso idioma: todos usaram letras maiúsculas. Tal fenômeno pode ser explicado pelo fato de que, em muitas línguas, a regra ortográfica para línguas e nacionalidades é o emprego da letra maiúscula, como no caso da língua inglesa, por exemplo. Na falta de uma referência em uma segunda língua, é comum que os usuários se utilizem das regras de suas próprias línguas maternas, ou de outras segundas línguas, como referencial. Um dado importante é que o software automaticamente colocava o que foi digitado em letra maiúscula, o que pode ter feito com que os respondentes não se atentassem para a regra, ou não se apercebessem de que haviam respondido à questão em letra maiúscula, ou até que não tenham querido corrigir suas respostas. Veremos na resposta da pergunta 49, abaixo, que algumas pessoas responderam sua língua materna na língua inglesa utilizando-se de letras minúsculas, o que pode significar que alguns respondentes se aperceberam desta configuração do software.

Dos que optaram por responder em língua inglesa (pergunta 48), dos 45 respondentes, a maioria absoluta, 41 ou 91.11% respondeu que o inglês não era sua língua materna e apenas 4 ou 8.89% responderam que era (FIGURA 15).

Figura 15 – Distribuição dos respondentes em língua inglesa que tinham o inglês (8.89%) como língua materna.

191

Gostaríamos de aqui fazer uma ressalva, embora na pergunta anterior (48) o software coletor dos dados tenha apontado para 41 respondentes afirmando que a língua inglesa não era sua língua materna, foram coletados dados de apenas 40 respondentes (na pergunta 49). A eliminação do dado de um respondente deve ter ocorrido por algum erro do software, uma vez que na dinâmica das respostas obrigatórias, ou no chamado fluxograma do questionário, esta resposta era uma resposta obrigatória, ou seja, sem seu preenchimento não se passaria para a próxima questão. Isso significa dizer que essa obrigatoriedade pode não ter sido acionada, nesta e/ou nas perguntas subsequentes que apontarmos que isso ocorreu, devido a problemas essencialmente técnicos ou de programação ou de coleta dos dados, uma vez que só analisamos aqui os questionários que foram respondidos em sua totalidade, como já mencionamos.

Os 40 participantes que tiveram seus dados computados responderam, desta forma grafadas, que suas línguas maternas eram: 22 “Portuguese”, 1 “Brazilian portuguese”, 1 “Cantonese”, 1 “Portoghese”, 2 “Brazilian Portuguese”, 1 “Portguese“, 1 “portuguese”, 1 “Português”, 1 “brasilian portuguese”, 1 “Chinese”, 1 “Tamil”, 1 “DutchI”195, 2 “German”, 2 “Spanish”, 1 “Swedish”, 1 “French” (sic). Um dado importante é que dos 40 dados disponíveis para análise, 39 ou 97.5% se utilizaram da língua do questionário (língua inglesa) para responder à pergunta e somente 1, ou 2.5% do total, não a utilizou, respondendo “Português”, grafando-o de acordo com as normas para nacionalidades e línguas na língua inglesa, com letras maiúsculas, ou por razões de configuração do software conforme aventado (FIGURA 16).

195 Dutch ou holandês.

192

Figura 16 – Línguas apontadas como maternas dos que responderam em inglês.

A maioria absoluta, 29 ou 72.5%, dos que responderam em língua inglesa afirmou que sua língua materna era o português, nas variadas grafias, sendo que a correta na ortografia de língua inglesa, em letra maiúscula, “Portuguese” foi usada pela maior parte ou por 72.41% dos respondentes. As demais grafias, portuguese, com minúscula, “Portoghese” (sic) e “Portoghese” (sic) e aqueles que mencionaram a variante da língua “Brazilian portuguese”, “brasilian portuguese” e “Brazilian Portuguese” (sic) somaram os outros 27,59%, o que significa que uma parcela alta, mais de um quarto dos usuários da língua inglesa que têm a língua portuguesa como materna não sabiam, não se utilizaram, ou não lembraram-se da regra do uso de maiúscula para nacionalidades do idioma inglês – “portuguese”, “brasilian portuguese” e “Brazilian portuguese” (sic) - ou não sabiam/lembravam de como soletrar a sua própria língua materna neste idioma - “Portoghese” e “Portoghese” (sic) - ou tão pouco tinham o conhecimento de que uma variedade linguística não é uma língua – “Brazilian portuguese”, “brasilian portuguese” e “Brazilian Portuguese” (sic).

Os 10 restantes, ou 25% que alegaram ter línguas diferentes do português como maternas (1 cantonês, 1 chinês, 1 tâmil196, 1 holândês, 2 alemão, 2 espanhol, 1 suéco, 1 francês), destes 2

196 A língua tâmil é originária do sul da Índia e de Sri Lanka, Mianmar (ex- Birmânia), Malásia, Indonésia, Vietnã, Singapura e ainda em zonas do sul e leste da África, pelo povo tâmil (ETHNOLOGUE, 2018: s/p).

193

ou 20% cada, 40% do total, ou tinham o alemão ou o espanhol como língua materna, as demais línguas maternas totalizaram 1 usuário ou 10% cada.

As respostas como tâmil e cantonês e chinês são relevantes para nós porque indicam algumas percepções dos entrevistados em relação às línguas. No caso do tâmil, a língua pode ser de diversos países em que outras línguas são oficiais, porém caso o falante que alegou que o tâmil seja proveniente da Índia, que tem o inglês como língua oficial, ou do Vietnã, em que o vietnamita o é, isso pode indicar que este falante tenha a percepção de que a língua oficial nem sempre é o mesma que língua materna. O cantonês197 é definido como um dos principais dialetos da língua chinesa, o que pode indicar que o respondente considere essa variante como sua língua materna e que desconheça a diferença entre dialeto e língua, talvez até por questões culturais em que os conceitos variam conforme vimos em nossa pesquisa teórica.

Com relação aos que responderam em língua espanhola (questão 91), dos 9 participantes que tiveram suas respostas computadas (eram 10 originalmente), 4 (44.5%) responderam que a língua espanhola era sua língua materna e 5 (55.5%) que não era (FIGURA 17).

197 ETNÓNIMOS, UMA CATEGORIA GRAMATICAL À PARTE? Boletim de língua portuguesa nas instituições europeias (n. 40). Comissão Europeia (outono de 2012). Disponível em: . Acesso em 10 jun 2018.

194

Figura 17 – Distribuição dos respondentes em língua espanhola que tinham o espanhol (44.4%) como língua materna.

Com relação às línguas apontadas como maternas dos respondentes em espanhol (FIGURA 18), dos 5 entrevistados, 4 (80%) responderam que o “Português” (sic) era sua língua materna e 1 (20%) respondeu “Brasileiro” (sic), podemos aventar a possibilidade deste respondente considerar o português falado no Brasil, a variante do português brasileiro, como distinto do português de outros países e por isso quis assinalar como “Brasileiro” (sic).

Figura 18 – Línguas apontadas como maternas dos que responderam em espanhol.

195

Em sua totalidade, dos respondentes em língua espanhola que afirmaram que o espanhol não era sua língua materna, todos tinham, portanto, a língua portuguesa como língua materna, o que não ocorreu com as duas demais línguas que tinham línguas maternas diversas, como vimos anteriormente. Novamente na tabulação das respostas fornecidas - “Brasileiro” (sic) e 4 vezes “Português” (sic) -, as questões por nós levantadas de ciência da regra de ortografia em língua portuguesa ou da possível configuração do software persistem, além do conhecimento ou não, do respondente saber que o idioma português tem como uma de suas variantes o português brasileiro.

Nas respostas abertas, 5 respondentes em português podem ser considerados não brasileiros com certeza, pois afirmaram que suas línguas maternas eram holandês, turco, italiano, japonês e castelhano. Em inglês esses totalizaram 10 e tinham por língua materna o cantonês, o chinês, o tâmil, o holandês, o alemão - por dois entrevistados-, o espanhol - também por dois -, o sueco e o francês. Já em língua espanhola não podemos ter certeza de que os respondentes não eram brasileiros, uma vez que a totalidade alegou ser o português sua língua materna, o que pode indicar que eram brasileiros ou provenientes de outros países que têm a língua portuguesa como materna – Portugal, Moçambique etc.

Comparativamente, de todos os idiomas apontados como línguas maternas pelos respondentes nos três idiomas, o português, em suas várias grafias, foi apontado como a primeira língua de 189 participantes ou para 91% dos respondentes totais do universo de 207 da pesquisa, respectivamente, 155 em português, 29 em inglês e 5 em espanhol. Seguido por 7, ou 3% do total de respondentes, nos três idiomas, que tinham o espanhol e 4 ou 2% que tinham o inglês como língua materna. 2 ou 1% cada apontaram igualmente o holandês e o alemão como suas línguas maternas e 0.50% cada outras línguas - turco, italiano, japonês, cantonês, chinês, tâmil, sueco e francês.

Cruzando os dados já obtidos até aqui, como a maioria absoluta dos participantes da pesquisa estava no Brasil (88%), podemos afirmar que 3% dos respondentes que tinham a língua portuguesa como materna estavam localizados em outras partes do globo quando responderam ao questionário (do total de 91%), podendo ser brasileiros ou de outras nacionalidades que tenham a língua portuguesa como materna.

196

Os próximos questionamentos versavam sobre as características socioeconômicas dos respondentes. A questão de número 7, em língua portuguesa, queria saber sobre o sexo dos entrevistados. Do universo de 155 participantes 105 (67.74%) alegaram ser do sexo feminino e 50 (32.26%) do sexo masculino, o que significa dizer que a maior parte deles era do sexo feminino (FIGURA 17).

Figura 17 – Sexo dos respondentes de língua portuguesa.

Na pergunta de número 50, dos respondentes em língua inglesa, por sua vez, da amostra de 44 participantes registrados pelo software (atente que na questão 48 eram 45 os respondentes), apenas 18 (40.91%) eram do sexo feminino e 26 (59.09%) do masculino, o que configura uma amostra predominantemente masculina ao responder em língua inglesa (FIGURA 18).

197

Figura 18 – Sexo dos respondentes de língua inglesa.

Do universo computado de 9 respondentes em língua espanhola, 4 (44.44%) eram do sexo feminino e 5 (55.56%) do masculino, o que significa que a maioria destes participantes era do sexo masculino (FIGURA 19).

198

Figura 19 – Sexo dos respondentes de língua espanhola.

De todos os respondentes, aqueles que optaram em responder em língua portuguesa eram majoritariamente do sexo feminino (68%) e os respondentes nos outros dois idiomas do sexo masculino, 59% em língua inglesa e 56% em língua espanhola, respectivamente. Se analisarmos o sexo dos respondentes na amostra total de 207 participantes, teremos 127 ou 61% de mulheres nos três idiomas, a maioria absoluta, e 81 ou 39% de homens.

Os questionamentos sobre a idade dos respondentes, nos três idiomas, foram subdivididos por faixas de 10 em 10 anos (dos 0 a mais de 80 anos). Em português (questão 8), dos 155 respondentes, 52 eram da faixa entre 30-39 anos (33.55%), seguido por 36 de 40 a 49 anos (23.23%), 28 de 50 a 59 (18.06%), 18 de 20 a 29 (11.61%), 12 de 60 a 69 (7.74%), 6 de 11 a 19 (3.87%) e 3 de 70 a 79 anos (1.94%). As únicas faixas etárias em que não foram registrados respondentes na língua portuguesa foram as extremas (0-10 e + de 80 anos) - FIGURA 20.

199

Figura 20 – Distribuição das faixas etárias dos respondentes de língua portuguesa.

Dos 44 respondentes cujos dados foram coletados em língua inglesa (questão 51), 10 participantes, ou a maior parte, totalizando 22.73%, tinha entre 50-59 anos de idade; seguido por 9 (20.25%) que igualmente declaram ter entre 20-29 e 40-49; 11.36%, ou 5 respondentes, estavam entre 60-69 anos e 4.55% ou 2 participantes estavam nas faixas entre 11-19 e 70-79 anos cada, como vê-se na figura 21 abaixo (FIGURA 21).

Figura 21 – Distribuição das faixas etárias dos respondentes de língua inglesa.

200

Dos respondentes em língua espanhola (questão 94), do universo computado de 9 participantes, a maioria tinha entre 40-49 anos (33.33%) ou 3 respondentes, depois 50-59 (22.22%) ou 2 participantes, seguido por 11-19, 20-19, 30-39 e 60-69 com 11.11% ou 1 respondente cada (FIGURA 22).

Comparativamente, a faixa etária predominante não foi equivalente nos três idiomas: em língua portuguesa a maior parte era da faixa entre 30-39 anos (34%); em língua inglesa 50-59 anos (23%) e em espanhola 40-49 anos (33%). Somando-se os participantes nos três idiomas que tinham idades entre 30 e 59 anos, totalizamos 141 participantes dos 207 respondentes totais, significa que a maioria absoluta dos participantes, nos três idiomas, 68% tinha idades no intervalo entre 30 a 59 anos e 32% em outras faixas.

Figura 22 – Distribuição das faixas etárias dos respondentes de língua espanhola.

Com relação à renda familiar, em língua portuguesa (pergunta 9), dos 155 respondentes, 70 (45.16%) alegaram ter renda mensal máxima, para todos os familiares de uma casa, ou receber acima de R$ 11.262,00, sendo da classe A; seguido de 49 participantes (31.61%) que alegaram receber entre R$ 2.005,00 a R$ 8.640,00 sendo da classe C; 28 (18.06%) declararam receber entre R$ 8.641,00 e R$ 11.261,00 sendo da classe B; 6 (3.87%) disseram receber entre R$

201

1.255 e R$ 2.004,00 sendo da classe D e 2 (1.29%) até R$1.254 sendo da classe E198 - FIGURA 23.

Figura 23 – Distribuição de renda dos respondentes de língua portuguesa.

Quanto aos respondentes em língua inglesa e espanhola, as perguntas de número 52 e 95 perguntaram a renda por ano, por família, com referenciais em dólar. Conforme justificamos a escolha do dólar para os respondentes nos dois idiomas deu-se devido à fácil conversão dos

198 As classes econômicas para os respondentes em língua portuguesa utilizadas nesta pesquisa foram baseadas nas informações da Faculdade Getúlio Vargas de Economia. CLASSES ECONÔMICAS* LIMITE INFERIOR LIMITE SUPERIOR Classe E 0 R$ 1.254 Classe D R$ 1.255 R$ 2.004 Classe C R$ 2.005 R$ 8.640 Classe B R$ 8.641 R$ 11.261 Classe A R$11.262 - CLASSES ECONÔMICAS. FGV SOCIAL. 2018. Disponível em: . Acesso em 03 jun 2018.

202

salários dos respondentes, em variadas moedas, para esta moeda de referência de comércio internacional. Para esses respondentes, a classe A era receber pelo menos U$ 389,436 por ano; a classe B entre U$ 100,000 e U$ 350,000; a classe C entre U$ 100,000 e U$ 150,000; a classe D entre U$ 30,000 e U$ 100,000; e a classe E receber U$ 18,871 por ano199.

Com relação aos entrevistados que responderam em língua inglesa (pergunta 52), da amostra de 44 participantes, a maioria, ou 22 (50%), disse receber entre U$ 30,000 e U$ 100,000 dólares norte-americanos por ano ou classe D, por família; 8 ou 18.2% entre U$ 100,000 e U$ 150,000 ou classe C; 4 participantes ou 9.1% entre U$ 100,000 e U$ 350,000 ou classe B, ou receber pelo menos U$ 389,436 por ano cada ou classe A; e 6 ou 13.6% disseram receber U$ 18,871 por ano classe E (FIGURA 24).

Figura 24 – Distribuição de renda dos respondentes de língua inglesa.

199 ALHANATI, J. Which Income Class Are You? 17 set 2017. Disponível em: . Acesso em 03 jun 2018.

203

Já os entrevistados que responderam em língua espanhola (pergunta 95), da amostra de 9 participantes, a maioria, ou 4 (44,4%), disse receber entre U$ 30,000 e U$ 100,000 dólares norte-americanos por ano ou classe D, por família; 2 ou 22.2% disse receber U$ 18,871 por ano ou classe E; e 1 entre U$ 100,000 e U$ 150,000 ou classe C, 1 entre U$ 100,000 e U$ 350,000 ou classe B e 1 pelo menos U$ 389,436 por ano ou classe A (FIGURA 25).

Figura 25 – Distribuição de renda dos respondentes de língua espanhola.

Comparativamente, 45% dos respondentes em língua portuguesa declararam ser da classe A (receber acima de R$ 11.262,00 mensais); 50% em língua inglesa e 44% em língua espanhola da classe D (receber entre U$ 30,000 e U$ 100,000 dólares norte-americanos por ano). Ao fazermos os cálculos, um pertencente à classe A brasileira recebe ao menos R$135.144,00 por ano. Se tomarmos por base que na cotação do dia 03/06/2018, US$1,00 valia R$3,4040200, o

200 COTAÇÃO DO DÓLAR. 03/06/2018. Disponível em:. Acesso em 03 jun 2018.

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que significa que um pertencente da classe D, em dólares, recebia, em reais, entre R$ 102.000 a R$ 340.000,00 anuais, o que engloba as faixas das classes A e B referência brasileira (entre R$103.632,00 a R$135.144,00 valores anuais).

Tais cálculos fazem-nos concluir que a maior parte dos respondentes, nos três idiomas, pertencia à classe A pelas referências brasileiras, ou R$135.144,00 por ano ou mais. Os que declararam em línguas inglesa e espanhola receber acima da classe D (classes A, B, C e D) portanto, também devem ser considerados como pertencentes à classe A, referência brasileira. Isso faz com que dos 207 respondentes totais tenhamos 143 participantes ou 69%, nos três idiomas, como pertencentes às classes A e B, referência brasileira e 31% às demais classes.

A segunda faixa econômica foi a da Classe C brasileira ou daqueles que disseram receber entre R$ 2005,00 a R$ 8640,00 mensais, ou de R$ 24.064,00 a R$ 103.680,00 anuais. A Classe E em dólares ao ser convertida em reais seria R$ 64.161,40, ou seja, estaria nesse intervalo, portanto. 32% em língua portuguesa alegaram ser da Classe C, e em língua espanhola 22% disseram receber essa quantia anual, sendo a segunda faixa econômica dos respondentes, 51 ou 25% do total de 207 da pesquisa.

Para completar o perfil socioeconômico dos participantes perguntamos sobre a escolaridade deles. Dos 155 participantes que responderam em língua portuguesa (pergunta 10) a maior parte, 82 ou 52.90% tinham a Pós-Graduação como formação; 55 ou 35.48% alegaram ter Ensino Superior; 17 ou 10.97% o Ensino Médio e ou 0.65% o Fundamental II (FIGURA 26).

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Figura 26 – Escolaridade dos respondentes de língua portuguesa.

Dos que responderam em inglês (questão 53), em um universo de 44 participantes, a maioria também era pós-graduada, com 26 ou 59.09%; 12 ou 27.27% afirmaram ter Ensino Superior; 5 ou 11.36% Ensino Médio e 1 ou 2.27% Ensino Fundamental II (FIGURA 27).

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Figura 27 – Escolaridade dos respondentes de língua inglesa.

Quanto aos respondentes em espanhol, questão 96, em uma amostra de 9 participantes, a maioria ou era pós-graduada ou com Ensino Superior, com 4 alegando ter cada uma dessas formações ou 44.44%; 1 proclamou ter Ensino Médio, totalizando 11.11% desta amostra (FIGURA 28).

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Figura 28 – Escolaridade dos respondentes de língua espanhola.

Comparativamente, nos três idiomas, a maioria era pós-graduada totalizando 112 participantes ou 54%; em seguida, 71 ou 34% deles tinham a formação no Ensino Superior, o que implica em 88% dos respondentes do total de 207 participantes pós-graduados ou graduados e apenas 12% com outras formações.

Tais dados socioeconômicos nos permitem traçar o perfil dos respondentes em cada língua. Em português, a maioria ou 68% alegou ser do sexo feminino e da faixa etária entre 30-39 anos (34%), 45% ainda afirmaram ter a renda mensal máxima, ou receber acima de R$ 11.262,00 82, e 53% tinham a Pós-Graduação como formação escolar. Os respondentes em língua portuguesa tinham o seguinte perfil: mulheres entre 30 e 39 anos, pós-graduadas e pertencentes à classe social A.

Em língua inglesa, 59% afirmaram ser do sexo masculino sendo que a maior parte destes, 23%, tinha entre 50-59 anos de idade, 50% disseram receber entre U$ 30,000 e U$ 100,000 dólares

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norte-americanos por ano e 59.09% alegaram ser pós-graduados. Os respondentes do idioma inglês tinham o seguinte perfil socioeconômico em sua maioria: homens entre 50 e 59 anos, pós-graduados e pertencentes à classe social B para parâmetros internacionais e A para parâmetros brasileiros.

Na língua espanhola, 56% afirmaram ser do sexo masculino, sendo que a maioria estava na faixa etária entre 40-49 anos (33%), a maior parte ou 44% disse receber entre U$ 30,000 e U$ 100,000 dólares norte-americanos por ano, por família, sendo sua escolaridade ou o Ensino Superior, ou a Pós-Graduação, com 44% cada. O perfil dos participantes em língua espanhola é o seguinte: homens entre 40 e 49 anos, pós-graduados ou com formação em Ensino Superior e pertencentes à classe social B para parâmetros internacionais e A para parâmetros brasileiros.

Como perfil geral dos respondentes, nos três idiomas, 61% da amostra era composta por mulheres e 39% de homens; 68% dos participantes tinham idades no intervalo entre 30 a 59 anos de idade; 69% pertenciam às classes A e B, referência brasileira; e 88% dos respondentes eram pós-graduados ou graduados do total de 207 dos participantes.

Passemos agora para os questionamentos que continham as perguntas de pesquisa propriamente ditas desta tese. O primeiro deles era se o participante se considerava bilíngue, sendo que as respostas possíveis eram apenas “sim” ou “não”. Dois caminhos distintos se abriam: caso marcassem “sim” deveriam responder à pergunta de quais idiomas além do escolhido para responder o questionário eles falavam; caso respondessem “não” deveriam dizer porque não se consideram bilíngues marcando entre as alternativas: a. sou monolíngue b. sou multilíngue c. não sei escrever ou ler em outra língua d. não me considero fluente em outra língua e. outros. Caso ainda assinalassem a alternativa “b. sou multilíngue” deveriam responder a próxima pergunta sobre quais outros idiomas ele falava.

Em português, a pergunta 11 foi respondida por 155 participantes dos quais 96 ou 61.94% alegaram ser bilíngues e 59 ou 38.06% não serem (FIGURA 29).

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Figura 29 – Resposta à indagação se os respondentes em língua portuguesa se consideravam bilíngues, sim ou não.

Em inglês, o questionamento 54 foi respondido por 44 participantes dos quais 38 ou 86.36% alegaram ser bilíngues e 6 ou 13.64% não serem bilíngues (FIGURA 30).

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Figura 30 – Resposta à indagação se os respondentes em língua inglesa se consideravam bilíngues, sim ou não.

Em língua espanhola, a questão 97 foi respondida por 9 participantes dos quais 8 ou 88.89% alegaram ser bilíngues e 1 ou 11.11% não ser bilíngue (FIGURA 31).

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Figura 31 – Resposta à indagação se os respondentes em língua espanhola se consideravam bilíngues, sim ou não.

Resumidamente esse foi o perfil dos respondentes: em português 62%, em inglês 86% e em espanhol 89% alegaram-se bilíngues, totalizando 142 participantes, a maioria absoluta ou 69% do total de 207 participantes. Isso significa que 31% do total ou 65 participantes não se consideraram bilíngues. Se compararmos esses resultados com a teoria, a reportagem de Anna Carolina Rodrigues de 2016, para a Revista Exame estima que no Brasil apenas 5% da população fala uma segunda língua e menos de 3% têm fluência em inglês sendo que “O domínio do inglês entre os brasileiros é tão baixo que o país ocupa a 41ª colocação de um ranking de 70 países desenvolvido pela EF Education First.” (RODRIGUES, 2016: s/p). Convertendo essa porcentagem em números, em uma pesquisa do Mundo Poliglota (QUANTOS POLIGLOTAS EXISTEM NO BRASIL, 2014: s/p) estimou-se que 5.132 milhões de pessoas alegaram na pesquisa IBOPE (2012: s/p) que possuíam um nível alto ou muito alto em uma segunda língua - correspondente aos 2.54% da população do país, de 220 milhões, em 2014. Quanto à comparação dos dados brasileiros e do mundo, a porcentagem de bilíngues no Brasil é estimada, então, nesses 2.54% ou 5.132 milhões, e a porcentagem de bilíngues no mundo em 43% (id.).

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Embora os dados nacionais apontem para um monolinguismo dominante no Brasil, os dados por nós coletados não corroboraram uma porcentagem tão baixa de bilinguismo. Vimos que o perfil dos respondentes nos três idiomas é de 69% do total de participantes, o que difere drasticamente dos 2,54% do Mundo Poliglota e dos 5% da Revista Exame. Assim, teremos que recorrer a outros dados para poder tirar conclusões. Os resultados desta pesquisa, conforme já mencionamos, apontaram para 143 participantes ou 69% como pertencentes as classes A e B, referência brasileira, faixa dos que recebiam entre R$103.632,00 a R$135.144,00 por ano. Segundo a pesquisa do Mundo Poliglota, dos respondentes da pesquisa IBOPE de 2012, das Classes A/B, 9% disseram ter capacidade alta ou muito alta em um segundo idioma, o que foi calculado como 2.7 milhões de pessoas no Brasil; na Classe C, 2% disseram ter capacidade alta ou muito alta, totalizando 2.432 milhões de pessoas; nas Classes D/E, 0% dizem ter capacidade alta ou muito alta ou 0 pessoas; chegando aos 5.132 milhões de pessoas que alegaram, na pesquisa IBOPE 2012, possuir nível alto ou muito alto em uma segunda língua, ou 2,54% da população do país (QUANTOS POLIGLOTAS EXISTEM NO BRASIL, 2014: s/p).

O cruzamento com os dados socioeconômicos da nossa amostra pode levar-nos a inferir que como quase 69% de nossos respondentes eram da classe A ou B, eles pertenciam a esses 9% da pesquisa IBOPE 2012. Há ainda os da Classe C (25% do total de 207 da pesquisa) ou 2% da classe C que alegaram ter capacidade alta ou muito alta em um segundo idioma na pesquisa nacional (IBOPE 2012), o que justifica os 69% por nós encontrados – das classes A,B e C - se considerando bilíngues e os 31% restantes não considerando-se bilíngues.

Quanto aos que alegaram ser bilíngues foi-lhes perguntado quais outros idiomas eles falavam nas perguntas subsequentes (12, 55 e 98, respectivamente em português, inglês e espanhol). Os respondentes poderiam assinalar quantas alternativas quisessem dentre as cinco disponíveis: a. inglês, b. espanhol, c. japonês, d. alemão, e. outros. Sendo que, quando marcavam outros, um campo adicional abria-se para que eles respondessem livremente os idiomas que também falavam.

Dos 96 respondentes em português que se consideravam bilíngues (pergunta 12) foram computadas 166 indicações diferentes de respostas nas alternativas disponíveis, das quais 89 marcações ou 92.7%, ou a maioria absoluta assinalou a alternativa a (falavam o inglês além do português); 44 ou 45.8% marcaram a alternativa b (o espanhol); 23 marcações ou 24% na

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alternativa e outros desta forma grafados: 8 “Francês”; 1 “Frances”, 1 “francês”; 4 “Italiano”; 1 “italiano”; 1 “Holandês”; 1 “Turco”; 1 “Hebraico”; 1 “Grego”; 1 “Francês e italiano”; 1 “francês”, “italiano”; 1 “Italiano e francês”; 1 “Francês”, “Chinês”, “Russo”, “Arábe” (sic) -; 9 ou 9.4% do total de bilíngues responderam alternativa c (falar alemão além do português); e 1 ou 1% marcou alternativa d (falar o japonês além do português) - FIGURA 32.

Figura 32 – Figura das demais línguas faladas pelos respondentes em português.

Quando calculamos a porcentagem dos que responderam falar outros idiomas, em comparação com o total de 96 respondentes bilíngues em língua portuguesa, 14 ou 14.58% afirmaram falar o francês, e 8 respondentes ou 8.33%, falavam o italiano além do português, indicados nas formas das diferentes grafias que vimos. Adicionalmente, analisamos que 3 participantes ou 3.12% eram pelo menos trilíngues e indicaram falar o francês, italiano e português e 1 ou 1.04% era asseguradamente multilíngue ou poliglota e indicou falar além do português o francês, o chinês, o russo e o árabe.

Como os participantes poderiam marcar mais de uma alternativa, as 166 línguas totais indicadas demonstram que boa parte desses 96 respondentes indicaram mais de um idioma adicional, além do português em que já respondiam à pesquisa, o que nos leva a concluir que

214

eles eram pelo menos bilíngues, podendo ser trilíngues, multilíngues ou poliglotas. Do universo dos pelo menos bilíngues que respondiam em língua portuguesa, analisamos que o inglês foi apontado pela maioria absoluta como idioma falado além do português (89 ou 93%), seguido pelo espanhol (44 ou 46%), o francês (14 ou 15%) e o italiano (8 ou 8%).

Dos 38 respondentes em inglês que se consideravam bilíngues (pergunta 55), foram coletadas um total de 78 indicações nas alternativas disponíveis, das quais 32 marcações ou 84.2%, ou a maioria absoluta assinalou a alternativa a (falavam o inglês além do português); 19 ou 50% a marcaram a alternativa b (o espanhol); 17 ou 44.7% a alternativa e outros idiomas desta forma grafados: 4 “French”, 2 “Chinese”, 2 “Italian”, 1 “french”, 1 “Mandarin”, 1 “Dutch”, 1 “Swedish”, 1 “RUSSIAN”, 1 “english”, 1 “Hindi, Dutch ”, 1 “Thai, Chinese ”, 1 “Tamil, Singhala” (sic) -; 7 ou 18.4% do total de bilíngues responderam alternativa c (falar alemão além do português); e 3 ou 7.9% marcaram alternativa d (falar o japonês além do português) - FIGURA 33.

Figura 33 – Figura das demais línguas faladas pelos respondentes em inglês.

Quando calculamos a porcentagem dos que responderam falar outros idiomas, em comparação com o total de 38 respondentes bilíngues em língua inglesa, 5 ou 13.15% afirmaram falar o francês, 3 ou 7.89% o chinês - sendo que não consideramos o mandarin aqui, caso ele seja considerado serão 4 ou 10.52% - e 2 ou 5.26% o italiano. Adicionalmente, analisamos que 3

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participantes ou 7.89% eram pelo menos trilíngues e indicaram falar além do inglês o hindi e o holandês; o tailandês e o chinês; e o tâmil e o cingalês.

Por fim, em relação aos bilíngues que responderam em língua inglesa um afirmou que a outra língua que falava era o “english” (sic). Tal resposta faz-nos formular algumas hipóteses: (1) pode ser que este respondente fosse um dos que alegaram que o inglês não era sua língua materna - 41 ou 91% dos respondentes em inglês afirmaram que este idioma não era sua primeira língua - e tenha formulado seus pensamentos em sua língua materna, o que o levou a colocar inglês ou “english” (sic) no campo adicional; (2) podemos aventar que a língua materna deste respondente pode ter a ortografia que verse por escrever línguas e nacionalidades em letras minúsculas, como o português, uma vez que ele grafou “english” desta maneira; (3) podemos também supor que este respondente, por qualquer motivo, não tenha compreendido o que exatamente a pergunta indagava: “What languages do you speak (other than English)?” ou “Que línguas você fala (além do inglês)?” – se este falante não entendeu o emprego do adjetivo other no sentido de diferente, adicional, além de, etc. isso pode lhe ter levado a responder inglês ou “english” (sic).

Como os participantes poderiam marcar mais de uma alternativa, as 78 línguas totais indicadas demonstram que boa parte desses 38 respondentes indicaram mais de um idioma adicional, além do inglês em que já respondiam à pesquisa, o que nos leva a concluir que eles eram pelo menos bilíngues, podendo ser trilíngues, multilíngues ou poliglotas. Do universo dos pelo menos bilíngues que respondiam em língua inglesa, analisamos que o português foi apontado pela maioria absoluta como outro idioma falado (32 ou 84%), seguido pelo espanhol (19 ou 50%), o alemão (7 ou 18%), o francês (5 ou 13.15%) e o chinês (3 ou 7.89%) ou 4 ou 10.52% se considerarmos o mandarin como chinês.

Dos 8 respondentes em espanhol que se consideravam bilíngues (pergunta 98), foram coletadas um total de 15 indicações nas alternativas disponíveis, das quais 6 ou 75% das marcações, ou a maioria absoluta assinalou a alternativa a (falavam o português além do espanhol); 4 ou 50% marcaram alternativa e outros idiomas desta forma grafados: 2 “Italiano”, 1 “Italaiano” e 1 “Francés” (sic); 5 ou 62.5%, também a maioria absoluta marcou a alternativa b (o inglês) - FIGURA 34.

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Figura 34 – Figura das demais línguas faladas pelos respondentes em espanhol.

Quando calculamos a porcentagem dos que responderam falar outros idiomas, em comparação com o total de 8 respondentes bilíngues em língua espanhola, 3 ou 37.5% afirmaram falar o italiano, 1 ou 12.5% o francês. Mencionamos novamente, que como os participantes poderiam marcar mais de uma alternativa, as 15 línguas totais indicadas demonstram que boa parte desses 8 respondentes indicaram mais de um idioma adicional, além do espanhol em que já respondiam à pesquisa, o que nos leva a concluir que eles eram pelo menos bilíngues, podendo ser trilíngues, multilíngues ou poliglotas. Do universo dos pelo menos bilíngues que respondiam em língua espanhola, analisamos que o português foi apontado pela maioria absoluta como outro idioma falado (6 ou 75%), seguido pelo inglês (5 ou 62.5%), o italiano (3 ou 37.5%) e o francês (1 ou 12.5%).

Cruzando os dados, calculamos que, nos três idiomas, do universo total de 207 respondentes, 121 ou 58.45% afirmaram falar o português e o inglês, ou a maioria absoluta; seguido de 50 ou 24.15% português e espanhol; e 24 ou 11.59% inglês e espanhol; 20 ou 9.66% falavam também o francês (além ou do português, ou do inglês, ou do espanhol); 16 ou 7.72% também falavam o alemão; e 11 ou 5.31% também falavam o italiano. Os dados apontam para a maioria dos respondentes desta pesquisa (59%) falando o português e o inglês em primeiro lugar e o português e o espanhol (24%) em segundo lugar.

Com relação aos participantes que marcaram “não, não sou bilíngue” nas questões 11, 54 e 97, respectivamente em português, inglês e espanhol, eles deveriam responder o porquê de não se considerarem bilíngues (perguntas de número 13, 56 e 99, respectivamente). Foram disponibilizadas as seguintes alternativas “Não me considero bilíngue porque...”: a. sou monolíngue b. sou multilíngue c. não sei escrever ou ler em outra língua d. não me considero

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fluente em outra língua e. outros. Essa resposta era do tipo aberta, o que significa que serão feitas as análises das informações recebidas por nós. Caso ainda assinalasse a alternativa “b. sou multilíngue” deveriam responder a próxima pergunta (15, 55 e 98, respectivamente em português, inglês e espanhol) sobre quais outros idiomas falava, também em uma resposta aberta. Somente em língua portuguesa houve um participante que se considerava multilíngue, o que significa que não precisamos disponibilizar as figuras referentes aos demais idiomas.

Dos 59 participantes em língua portuguesa que não se consideravam bilíngues (pergunta 13), a maioria, 37 respondentes ou 62.7%, assinalou não considerar-se fluente na segunda língua (alternativa d); 8 ou 13.6% afirmaram não saber escrever ou ler na outra língua (alternativa c); 7 ou 11.9% alegaram ser monolíngues (alternativa a); 6 ou 10.2% alegaram outros motivos (alternativa e), assim grafados: 1 “Leio algumas línguas fora a materna”, 1 “Entendo pouco”, 1 “Consigo ler porém tenho insegurança para falar”, 1 “Porque nunca vivi a cultura referente a outra língua”, 1 “sou fluente nas duas línguas, mas penso que a fluência não é o único critério para considerar uma pessoa bilíngue”, 1 “Embora seja fluente na segunda língua, falta-me o uso idiomático” (sic.); 1 respondente ou 1.7% não achava-se bilíngue porque considerava-se multilíngue (alternativa b) - FIGURA 35. Foi perguntado a este participante quais outros idiomas ele falava a que respondeu, desta forma grafados, “Inglês, francês e espanhol” (sic.) - FIGURA 36.

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Figura 35 – Figura das razões de não serem bilíngues fornecidas pelos respondentes em língua portuguesa.

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Figura 36 – Demais idiomas falados pelo respondente em língua portuguesa que se considerava multilíngue.

Nas alternativas por nós propostas, elencamos alguns critérios básicos, investigados na teoria desta tese, de inclusão ou exclusão no autojulgamento do falante no bilinguismo. As alternativas a (sou monolíngue) e b (sou multilíngue) foram formuladas levando-se em consideração o critério do número de línguas faladas pelo bilíngue. Um bilíngue falaria ao menos duas línguas, um monolíngue apenas uma e um multilíngue mais de duas. Isso implica em dizer que alguns bilíngues podem considerar-se bilíngues ao falar três ou mais idiomas, já que ser bilíngue implica em falar ao menos dois idiomas. Aqui não entramos em detalhes do que esse “falar” significava em termos de proficiência, competência e fluência, uma vez que por tratar-se de uma pesquisa direcionada ao público-geral consideramos que colocar tais definições e nomenclaturas poderia ser contraproducente. A alternativa, por nós proposta, c (não sei escrever ou ler na segunda língua) baseava-se nos critérios das habilidades, aqui expostas como duas, de ler ou escrever em um segundo idioma, como fica evidente, as habilidades de ouvir e falar não estavam contempladas nesta alternativa. Já a alternativa d (não me considero fluente na segunda língua) contemplava, indiretamente, a habilidade de falar um idioma, por meio de ter-se fluência nele. Por fim, a alternativa e (outros motivos) levava a um campo adicional em que os respondentes se manifestavam livremente sobre seus critérios internos de bilinguismo.

Analisaremos agora as respostas abertas dos 6, ou 10.2% do total, que alegaram outros motivos para não se considerarem bilíngues em língua portuguesa. Como vimos na figura 35, um participante justificou não ser bilíngue pelo critério das habilidades, no caso ler, “Leio algumas línguas fora a materna” (sic.). Atente que a nossa alternativa c (não sei escrever ou ler na segunda língua), usava a negativa “não sei ler”, o que pode nos levar a supor que como o respondente sabia ler em outros idiomas, ele provavelmente marcou e (não sou bilíngue por outros motivos). Sua justificativa de saber ler em outras línguas, no entanto, não foi considerada suficiente para ele considerar-se bilíngue, uma vez que afirmou na pergunta anterior que não era bilíngue e por essa razão foi direcionado a essa pergunta. Podemos hipotetizar que, em seu próprio critério de julgamento, o respondente considere que somente a habilidade de ler em

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outros idiomas não é configuradora de um requisito mínimo necessário para conformar o bilinguismo em uma pessoa.

Como assumimos no início desta tese, Rod Ellis, teórico de bilinguismo, afirma que o termo competência é o conhecimento linguístico de uma língua que os falantes já interiorizaram e o termo proficiência refere-se à habilidade dos falantes para usarem esse conhecimento em diversas tarefas (ELLIS, 2008: 26). Podemos, assim, supor que o participante em questão admita ter uma competência linguística na habilidade de ler em outro idioma, mas que não se julgue proficiente, por não acreditar ter internalizado esse conhecimento linguístico. Outra possibilidade desta negativa de ser bilíngue embora leia outras línguas pode estar relacionada a usar o conhecimento internalizado em diversas tarefas, assumindo que o respondente somente lê em outros idiomas que não o materno, podemos aventar a possibilidade de que ele tenha ciência de que não consegue realizar tarefas como falar, ouvir e escrever e, por esse viés, não se consideraria bilíngue de fato.

O segundo respondente da amostra de língua portuguesa justificou que não se considerava bilíngue porque “Entendo pouco” (sic.). Se tomarmos a definição de um dicionário do verbo entender, só no dicionário Caudas Aulete201 digital há 15 acepções do verbo, das quais destacaremos algumas que acreditamos se encaixarem na justificativa exposta pelo respondente: (en.ten.der) v. 1. Perceber, usando inteligência, memória, intuição etc., captar o significado de (texto, o que foi dito, situação, problema, processo etc.) [td. : Nada foi dito, mas só de olhar as fisionomias ela entendeu que tudo fora resolvido.: Não sabia inglês, e não entendeu o que o turista lhe perguntara.] 2. Ter conhecimento, experiência, sapiência em relação a; CONHECER; SABER [td.: Você entende código Morse?] [tr. + de: Pode confiar nele, ele entende de eletrônica.] 3. Perceber (intenção, situação, motivo), intuir, inferir, deduzir [td.: Pelo rumo da conversa entenderam que era hora de se despedir e ir embora.: Examinando a lista dos aprovados, pôde entender o critério da classificação.] [...] 6. Perceber, captar pela audição; OUVIR [td.: O ar condicionado fazia tanto barulho que não entendemos o que ele falou.] 7. Interpretar (significado, mensagem etc.) [F.: Do lat. intendere. Hom./Par.: intender (em todos os tempos).] (CAUDAS AULETE: 2018, s/p).

201 DICIONÁRIO CAUDAS AULETE DIGITAL. Disponível em: . Acesso em 29 maio 2018.

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Ao justificar que não se considera bilíngue porque entende pouco, podemos inferir que o respondente se refere ao verbo entender na acepção 1 do dicionário e que não capta o significado do texto, do que é dito, da situação etc. na segunda língua. Podemos supor que o participante se refere à acepção 2, e empregou o verbo entender como ter conhecimento, experiência, sapiência no segundo idioma, “não sabendo ou conhecendo pouco” o outro idioma. Se o respondente estiver referindo-se a entender na acepção 3, de perceber uma intenção, situação ou motivo, o participante referiu-se às intenções comunicativas, às situações de uso da língua-alvo ou talvez às motivações comunicacionais em uma segunda língua, nas quais ele também se julga deficiente. Caso ele tenha empregado entender na sexta acepção do verbo – perceber ou captar pela audição ou ouvir – o entrevistado referiu-se a uma das quatro habilidades (ler, escrever, falar e ouvir), neste caso o ouvir, alegando não “ouvir bem” por “entender pouco”. Por fim, caso ele tenha empregado o verbo entender na sétima acepção mencionada acima, ele afirmou com sua justificativa que “não era capaz de interpretar o significado, ou as mensagens” na segunda língua de maneira efetiva e por essa razão não se considerava bilíngue.

O participante de número 3 da amostra em língua portuguesa afirmou que não se considerava bilíngue porque “Consigo ler porém tenho insegurança para falar” (sic.). A justificativa esteve baseada nas habilidades de leitura e fala. Podemos supor por este dito, que embora o respondente considerasse sua habilidade na leitura compatível com as características de um bilíngue, ele não julgava sua habilidade de fala no mesmo nível e por isso negou ser bilíngue. O emprego do substantivo feminino insegurança em “tenho insegurança para falar” denota seu emprego no sentido “de falta de segurança em si mesmo”, de ordem emocional, portanto, sendo definida pela Sociedade Brasileira da Inteligência Emocional como: “A insegurança é um estado emocional no qual a pessoa apresenta um sentimento de inferioridade, sentindo que não é boa o suficiente para ser amada, aceita ou reconhecida” (SBIE, 2018: s/p). A mesma entidade ainda afirma: “Sob os olhos da Inteligência Emocional, a insegurança é resultado do medo: de fracassar, de se frustrar, de desistir, de ser rejeitado, de ouvir críticas, de perder alguém.” (SBIE, 2018: s/p) e “O medo é uma emoção importante, que nos protege de situações que trazem riscos, que nos faz parar para pensar antes de agir e que, justamente por isso, pode nos impulsionar para a ação ou nos paralisar” (SBIE, 2018: s/p). Assim, podemos supor que, sob a ótica do respondente, caso não seja superada a insegurança da fala a condição bilíngue não será alcançada por ele, que, pode pensar em demasia antes de falar (agir) e paralisar-se no ato da fala, ocasionando para si um estado de inferioridade por medo de fracassar nesta habilidade,

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ou por medo de ouvir críticas quanto à sua performance, ou por medo de ser rejeitado ao tentar falar, ou por medo de não ser aceito ou reconhecido como bilíngue pelos demais falantes, devido à essa deficiência que julga ter.

O quarto respondente de língua portuguesa que não se considerava bilíngue afirmou que não era bilíngue “Porque nunca vivi a cultura referente a outra língua” (sic.). Podemos supor que ao fornecer esta justificativa, este participante tenha feito o que citamos na Introdução desta tese, os “leitores ao ouvirem a palavra língua, ou a palavra cultura, sempre se lembrassem da outra metade” (AGAR, 1994: 60 apud HANNA, 2018: 26), o que levou Agar a cunhar o termo línguacultura. Se supusermos que este entrevistado ao ler a palavra língua (não sou bilíngue porque...) lembrou-se da cultura, podemos justificar sua resposta. Podemos inferir que para tal respondente língua é cultura, um axioma ou verdade incontestável, e sem a vivência em uma cultura de referência da língua-alvo o bilinguismo não seria possível para este participante. Outra teoria que nos valemos nesta tese em que podemos nos apoiar para justificar essa resposta é a do conceito de cultura de Terry Eagleton (2005:55) “o complexo de valores, costumes, crenças e práticas que constituem o modo de vida de um grupo específico”. Ao dizer que não sou bilíngue porque nunca vivi a cultura referente a outra língua este respondente pode ter em mente esta definição em que as “práticas” são levadas em consideração e podemos aventar a possibilidade de que ele acredite não ter tido a oportunidade de ter a vivência prática de outra línguacultura, para adquirir o complexo de valores, costumes e crenças que constituem o modo de vida de um grupo específico que ele iria conviver na cultura referente a outra língua que ele mencionou.

O quinto participante em língua portuguesa justificou-se assim: “sou fluente nas duas línguas, mas penso que a fluência não é o único critério para considerar uma pessoa biíngue” (sic.). Ele afirmou considerar o critério da fluência insuficiente para a inclusão de um falante na condição bilíngue como podemos concluir por sua afirmação, já que se considera fluente em dois idiomas, mas não bilíngue. Ele, porém, não citou quais seriam os demais critérios que julgava relevantes para considerar-se um falante bilíngue. Outra análise que podemos fazer de seu dito é que ao responder “mas penso que a fluência não é o único critério para considerar uma pessoa bilíngue”, os outros critérios por nós elencados nas demais alternativas - em a e b o critério do número de línguas faladas e c critério das habilidades de ler ou escrever em um segundo idioma – podem ser considerados pelo respondente como critérios subjacentes à fluência no seu entendimento e, por essa razão, afirmou que a fluência não é o único critério

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para considerar uma pessoa bilíngue, critério, por sua vez, elencado por nós somente na alternativa d.

Como vimos na Introdução, a definição de fluência é feita por cientistas de diversas áreas, da saúde, como psicolinguistas e fonoaudiólogos, além de linguistas e outros profissionais de outras áreas, sendo “melhor definida como uma unidade de resposta destituída de disfluências, prolongamentos e pausas” (SCARPA, 1995: 163-164). Por acreditarmos que esta primeira definição que se apoia em uma negativa é demasiadamente específica, também valemo-nos, nesta tese, de outra definição corrente de fluência, definindo-a como um "barômetro para o sistema de fala como um todo, cujos limites são estabelecidos pela adequação do desempenho das dimensões semântica, sintática, morfêmica e prosódica da fala" (PERKINS, 1971, apud FINN & INGHAM, 1991: 92). Esta segunda definição tem por elementos constituintes tanto a oralidade quanto os elementos estruturais da língua(gem), resumidamente, a significação, ou sentido das palavras e da interpretação das sentenças e dos enunciados (semântica); a relação das palavras (a sintática); a forma das palavras, a classificação dos morfema e da morfologia (a morfêmica); e os estudos da entonação, o ritmo, o acento - intensidade, altura, duração, etc. - da linguagem falada (a prosódica). Embora o conceito de fluência seja complexo e aborde todas essas vertentes aqui pontuadas, dentre outras não trazidas aqui, a fluência, realmente, não é o único critério para considerar uma pessoa bilíngue, conforme o respondente afirmou e conforme nós mesmo afirmamos ao trazer as demais justificativas contidas nas outras alternativas e na própria alternativa e que pedia que se explicitassem quais seriam os outros critérios faltantes, o que não foi feito pelo respondente.

O sexto e último respondente em língua portuguesa que afirmou não ser bilíngue justificou-se afirmando que “Embora seja fluente na segunda língua, falta-me o uso idiomático” (sic.). Tal qual o entrevistado anterior, ele afirmou considerar o critério da fluência insuficiente para a inclusão de um falante na condição bilíngue, uma vez que se considera fluente e não bilíngue. O participante, desta vez, citou que para si um dos critérios de definição de bilinguismo estaria relacionado ao “uso idiomático”, já que para ele isso é o que falta para ser considerado bilíngue de fato, como podemos supor por sua afirmação. Em Linguística, as expressões idiomáticas202 ou idioms, segundo o teórico John Saeed, é “uma colocação, na qual as palavras que a integram deixaram de ter significação independente por um processo de fossilização na língua”

202 Um exemplo de expressão idiomática em inglês é “it is raining dogs and cats”, cujo significado é “está chovendo demais” que em português seria equivalente a expressão “está chovendo canivete”, e não está chovendo cachorros e gatos como uma tradução literal poderia levar a supor.

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(SAEED, 1997: 60), ou seja, é um conjunto de palavras que tornou-se fixo, ou petrificado, através do tempo por meio de seu uso. A expressão idiomática tem, assim, uma justaposição de palavras com um sentido único e contextualizado, em uma ou várias culturas, e não um sentido literal dado por cada palavra isoladamente. Essas expressões, muitas vezes, estão associadas a jargões, por vezes gírias, em contextos culturais específicos, as vezes de certos grupos sociais (de diferentes classes, idades, regiões e profissões) podendo, por vezes, extrapolar seus contextos originais, e resistir ao tempo, tendo sua origem histórica mantida ou até perdida. Se o respondente em questão tiver conhecimento desta teoria relacionada ao que ele chamou de “uso idiomático” podemos supor que ele levou em consideração dois aspectos principais para formular sua justificativa, os de correlação entre significante (a expressão idiomática) e seu significado (um sentido único contextualizado culturalmente) do signo linguístico, e a sua contextualização cultural, em que emergem o sentido, sua validade e legitimidade. O conhecimento das expressões idiomáticas em seu uso seria, então, o requisito primordial para esse respondente considerar-se bilíngue de fato, o que, em sua visão lhe falta. Tal hipótese pode ser aventada devido ao perfil socioeconômico dos respondentes em língua portuguesa cuja escolaridade predominante é a de pós-graduação (53%), além do fato desta pesquisa ter sido espalhada entre estudantes de pós-graduação da Universidade Presbiteriana Mackenzie em que foi realizada.

A questão 56 pedia aos respondentes em língua inglesa que justificassem o porquê de não terem se considerado bilíngues no questionamento anterior. Dos 6 participantes, a totalidade (100%) marcou a alternativa d (não me considero fluente no segundo idioma) como justificativa, quer dizer, que para estes entrevistados o critério de fluência foi suficiente para a consideração de não ser bilíngue (FIGURA 37). O mesmo ocorreu com o único participante de língua espanhola (questão 99) que não se considerava bilíngue, ele apontou como justificativa o critério da fluência, como vemos na figura 38 abaixo.

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Figura 37 – Figura das razões de não serem bilíngues fornecidas pelos respondentes em língua inglesa.

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Figura 38 – Figura das razões de não serem bilíngues fornecidas pelos respondentes em língua espanhola.

Com relação às três amostras de participantes que não se consideravam bilíngues, a maioria absoluta, 37 respondentes ou 63% em língua portuguesa, 6 ou 100% em língua inglesa e 1 ou 100% em língua espanhola apontou como a principal justificativa a razão de não serem fluentes na segunda língua, o que indica que o critério de fluência é o considerado mais relevante para a condição de bilinguismo na visão dos participantes em seu autojulgamento. Do universo total de 66 participantes, nos três idiomas, que não se consideravam bilíngues, 44 ou 67% apontaram a falta de fluência como o principal critério, o que vai ao encontro de nossa hipótese inicial, uma vez que a fluência é complexa e mobiliza conhecimentos tanto da oralidade quanto de elementos estruturais da lingua(gem) e pode ser definida como o "barômetro para o sistema de fala como um todo, cujos limites são estabelecidos pela adequação do desempenho das dimensões semântica, sintática, morfêmica e prosódica da fala" (PERKINS, 1971, apud FINN &

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INGHAM, 1991: 92).

Já mencionamos que o termo bilinguismo é de conceituação múltipla, e que nos valeríamos de algumas definições amplas com a do escritor norte-americano George Saunders, em que o bilinguismo individual pode significar simplesmente a capacidade de expressar-se em duas línguas (SAUNDERS, 1988: 8), e na de François Grosjean, em que o bilinguismo trata-se do uso regular de duas ou mais línguas ou dialetos em suas vidas diárias (GROSJEAN, 2008: 10). Já abordamos também que há critérios diversos até para apontar os tipos de bilinguismo existentes, sendo dependentes de características individuais e contextuais tais como a proficiência nas línguas em questão, a idade de aquisição da segunda língua, a organização dos códigos linguísticos, o status das línguas, a valorização afetiva das línguas, o tempo de exposição a elas, a manutenção da língua materna, a identidade cultural do indivíduo bilíngue, entre outros (FLORY & SOUZA, 2009:30). Como não poderíamos contemplar todos esses critérios e as muitas definições de bilinguismo, optamos, em uma pesquisa direcionada ao público geral, por perguntar qual seria o critério individual do entrevistado de não se considerar bilíngue, como justificado anteriormente.

A diversidade de respostas dos participantes que não se consideravam bilíngues em língua portuguesa, os 6 respondentes que nos forneceram respostas abertas, mostraram que os critérios de conceituação do bilinguismo não são diversos somente para os teóricos, mas também o são para os a população geral, uma vez que é difícil de assumir-se que os 6 respondentes sejam teóricos do bilinguismo, ainda mais se eles mesmos não são bilíngues. Quando pedimos a justificativa de não considerarem-se bilíngues ao invés de questionarmos porque os falantes consideravam-se bilíngues, aventamos a possibilidade de não conseguirmos analisar os critérios de conceituação individuais dos bilíngues de uma amostra maior, uma vez que a pesquisa, sendo sobre bilinguismo deveria, naturalmente, ser respondida, em sua maior parte, por bilíngues, já que as próprias pessoas que ajudaram a divulgá-la, espontaneamente, procuravam mais pessoas bilíngues para enviá-la.

Reiteramos, desta forma, a escolha teórica de definição de bilíngue de François Grosjean (2008: 13-14) ou a visão holística do bilinguismo que propõe que o bilíngue é um todo integrado que não pode ser facilmente decomposto em duas partes diferentes. Respostas como “Leio algumas línguas fora a materna”, “Entendo pouco”, “Consigo ler porém tenho insegurança para falar”, “sou fluente nas duas línguas, mas penso que a fluência não é o único

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critério para considerar uma pessoa bilíngue”, “Embora seja fluente na segunda língua, falta-me o uso idiomático” (sic.) podem ser interpretadas como evidências de que os falantes sentem-se um todo e não partes em que têm bom desempenho (leem, entendem, são fluentes) e partes em que não têm (não conseguem falar, entendem pouco, não sabem empregar as expressões idiomáticas). Como são um todo, os falantes podem não se considerar bilíngues, uma vez que não se sentem desenvoltos em todas as habilidades que julgam necessárias para serem, em seu autojulgamento, de fato bilíngues. Assim, reforçamos que o bilíngue não é a soma de dois monolíngues completos ou incompletos, tal qual Grosjean (2008) definiu; mais propriamente, ele ou ela tem uma configuração linguística específica e única, cuja coexistência e constante interação das (duas) línguas produziu um sistema linguístico diferente, mas completo e sujeito às regras próprias do sujeito (bilíngue ou não), seus conceitos e autojulgamentos.

O próximo questionamento foi sobre o axioma de que língua é cultura. Os participantes deveriam responder se, para eles, a língua é cultura ou o mesmo que cultura, em repostas de sim, não ou não sei (questões 14, 57 e 100, em português, inglês e espanhol) e somente se concordassem com a afirmação eram direcionados às perguntas 16, 59 e 102, respectivamente, em que deveriam valorar a afirmação em uma escala - 1 (discordar plenamente), 2 (discordar), 3 (concordar medianamente), 4 (concordar) e 5 (concordar plenamente).

Como resultados, dos 155 respondentes em língua portuguesa (questão 14), 131 ou 84.52% concordaram com a afirmação de que língua é cultura (ou o mesmo que), a maioria absoluta, portanto; 17 participantes ou 10.97% responderam que não e outros 7 ou 4.52% marcaram não saber – FIGURA 39.

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Figura 39 – Resposta à indagação se para os respondentes em português a língua é (ou é o mesmo que) cultura: sim, não ou não sabiam.

Com relação aos respondentes que marcaram que língua era o mesmo que cultura em português, ao valorarem a afirmação (pergunta 16) da amostra total de 134 respondentes, a maioria, 73 ou 54,48%, marcou 5 (concordar plenamente); 40 ou 29.85% assinalaram 4 (concordar); 19 ou 14.18% marcaram 3 (concordar medianamente); e 1 ou 0.75% igualmente valorou como 2 (discordar) e igualmente como 1 (discordar plenamente) da afirmação de que língua é cultura (ou o mesmo que) – FIGURA 40.

Figura 40 – Figura de distribuição de respostas em língua portuguesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que língua é cultura e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

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Traremos dois dados qualitativos em nossas análises, o primeiro é a média aritmética, , definida como o valor que mostra para onde concentram-se os dados de uma distribuição, ou o ponto de equilíbrio das frequências em um histograma ou distribuição de frequências (PINHEIRO et al., 2012: 56). Em outras palavras, a média aritmética representa em qual valoração disponível os respondentes, em média, assinalaram sua resposta. Neste gráfico acima, a média foi de 4.37, ou seja, mais próxima de 4 (concordo), o que significa que a média das respostas dos respondentes estava propensa a concordância com a afirmação de que língua é cultura. O segundo é o desvio padrão (standard deviation), , que, segundo a ferramenta de análise estatística fornecida pelo próprio site203 (ENUVO, 2018: s/p), reflete a dispersão nas respostas. Segundo eles, no desvio padrão, os valores pequenos significam que os respondentes concordam em suas respostas e os valores grandes que os participantes divergem em suas respostas. No caso dos respondentes de língua portuguesa, o valor do desvio padrão foi de 0.81 ou um valor mediano, o que significa que as respostas da amostra oscilaram entre o intervalo de valoração 3.5 (concordar medianamente para concordar - 4) a 5 (concordar plenamente), como vemos pela barra cinza à direita no gráfico pequeno acima.

Das 43 respostas computadas em língua inglesa (questão 57), 38 ou 88.37% marcaram sim para a afirmação de que língua é cultura (ou o mesmo que), também sendo a maioria absoluta; 5 respondentes ou 11.63% assinalaram não e não houve aqueles que alegaram não saber se língua é cultura (ou o mesmo que) – FIGURA 41.

203 ENUVO. Características. SUÍÇA. 2007-2018. Disponível em: . Acesso em: 30 maio 2018.

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Figura 41 - Resposta à indagação se para os respondentes em inglês a língua é (ou é o mesmo que) cultura: sim, não ou não sabiam.

Com relação aos participantes que marcaram que língua era o mesmo que cultura no idioma inglês (questão 59), da amostra total de 38 participantes, 19 ou 50% valoraram como 5 (concordar plenamente); 10 ou 26.32% marcaram 4 (concordar); 7 ou 18.42% assinalaram 3 (concordar medianamente); e 1 ou 2.63% marcou igualmente 2 (discordar) e 1 (discordar plenamente) da afirmação de que língua é cultura (ou o mesmo que) – FIGURA 42. Quanto às informações adicionais fornecidas pelo gráfico, em relação à média aritmética, 4.18, é mais próxima de 4 (concordo), o que significa que na média das respostas houve a concordância com a afirmação de que língua é cultura; já em relação ao desvio padrão, os participantes em língua inglesa alcançaram o valor de 1.01, o que ainda significa um valor mediano, com um desvio que vai de quase 3 a 5 (olhar barra cinza à direita no gráfico pequeno abaixo), em que suas respostas estão predominantemente enquadradas no intervalo de 3.15 (concordo medianamente) a 5 (concordo plenamente).

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Figura 42 – Figura de distribuição de respostas em língua inglesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que língua é cultura e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Dos 9 participantes em língua espanhola (pergunta 100) que disseram sim, 7 ou 77.78% concordaram com a afirmação de que língua é cultura (ou o mesmo que), a maioria absoluta, novamente; 1 respondente ou 11.11% discordou e 1 ou 11.11% não soube responder – FIGURA 43.

Figura 43 – Resposta à indagação se para os respondentes em espanhol a língua é (ou é o mesmo que) cultura: sim, não ou não sabiam.

Com relação aos participantes que marcaram que língua era o mesmo que cultura em espanhol (questão 102), da amostra total de 7 participantes, 4 ou 57,14% marcaram 5 (concordo

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plenamente) e 3 ou 42.86% valoram como 4 ou (concordo) – FIGURA 44. Quanto às informações adicionais fornecidas pelo gráfico, em relação à média aritmética, 4.57, é igualmente mais próxima de 5, ou da plena concordância, o que significa que a média das respostas estava mais próxima da escala dos que concordam plenamente com a afirmação de que língua é cultura; já em relação ao desvio padrão, os participantes em língua espanhola alcançaram o valor de 0.53, um valor pequeno, que vai de 4 a 5 (olhar barra cinza à direita no gráfico pequeno abaixo), o que quer dizer que as respostas dos participantes concentraram-se somente no intervalo de 4 (concordo) a 5 (concordo plenamente).

Figura 44 – Figura de distribuição de respostas em língua espanhola na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que língua é cultura e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Comparativamente, os respondentes das três línguas, em uma análise quantitativa, em sua maioria absoluta - 85% em português, 88% em inglês 78% em espanhol - concordou com a afirmação de que língua é cultura (ou o mesmo que), sendo a porcentagem de concordância sempre acima de 78% aproximadamente. Qualitativamente estes respondentes, nos três idiomas, em sua maioria valorou a afirmação de que língua é cultura mais próximo de 5 (concordo plenamente) - 54% em português, 50% em inglês e 57% em espanhol – ou seja, sempre 50% ou mais da amostra analisada, inclinando-se para a concordância total com a afirmação de que língua é cultura (ou o mesmo que). Por fim, em relação ao desvio padrão destas amostras, ou o quanto os respondentes concordaram ou discordaram nesta valoração de 1 a 5, a amostra em língua portuguesa foi mediana (0.81), a de língua inglesa também mediana (1.01) porém um pouco superior a última, o que significa que mais participantes de língua inglesa valoraram a afirmação de maneira mais distinta do que os de língua portuguesa; quanto ao desvio padrão em língua espanhola, este foi o mais baixo dos três, 0.53, o que quer dizer que suas respostas foram mais semelhantes entre si.

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Com a maioria absoluta de participantes, nos três idiomas, concordando com a afirmação de que língua é cultura ou é o mesmo que cultura (totalizando 176 ou 85% do total de 207 respondentes) houve a confirmação de nossa hipótese inicial de que o axioma língua é cultura é amplamente aceito, nos três idiomas. Tal resultado vai ao encontro de nossa expectativa de que a vasta maioria dos respondentes, bilíngues ou não, julgariam como verdadeira a afirmação de que língua é cultura, de que ao serem postos em contato com a palavra língua, ou a palavra cultura, sempre lembrar-se-iam da outra metade, o que nos faz concluir que o termo cunhado por Agar (1994), línguacultura, é válido no senso-comum, para a maioria absoluta de nossa amostra.

O próximo questionamento foi sobre biculturalidade. Os participantes deveriam responder se, para eles, um bilíngue era necessariamente bicultural em respostas de sim, não ou não sei (questões 17, 60 e 103, em português, inglês e espanhol) e somente se concordassem com a afirmação eram direcionados às perguntas (18, 61 e 104, respectivamente) em que deveriam marcar valorar a afirmação em uma escala.

Dos 155 respondentes em língua portuguesa (pergunta 17), 98 ou 63.23% discordaram da afirmação de que um bilíngue era necessariamente bicultural, ou a maioria absoluta; 52 participantes ou 33.55% responderam que sim, e outros 5 ou 3.23% marcaram não saber se um bilíngue era necessariamente bicultural (FIGURA 45).

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Figura 45 – Resposta à indagação se para os respondentes em português um bilíngue é necessariamente bicultural: sim, não ou não sabiam.

Conforme já mencionamos no Capítulo IV, houve uma falha técnica, provavelmente do software de coleta de dados, e as respostas relacionadas à pergunta obrigatória - como podemos ver pelo asterisco indicativo na pergunta 18 (FIGURA 46) - não teve seus dados coletados. Desta forma, não pudemos coletar opiniões qualitativas desta indagação, ou seja, as valorações (1 concordo plenamente a 5 discordo plenamente), e nem pudemos analisar os dados adicionais de média aritmética e desvio padrão.

Figura 46 – Figura de distribuição de respostas em língua portuguesa na escala de 1, concordo plenamente com, e 5, discordo plenamente da afirmação de que um bilíngue é necessariamente bicultural e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

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Dos 43 respondentes em língua inglesa (questão 60) cujas opiniões foram contabilizadas, 26 ou 60.47% marcaram sim e concordaram com a afirmação de que um bilíngue era necessariamente bicultural, ou seja, a maioria absoluta. Os que marcaram não foram 16 participantes ou 37.21% e 1 ou 2.33% ainda marcou não saber (FIGURA 47).

Figura 47 – Resposta à indagação se para os respondentes em inglês um bilíngue é necessariamente bicultural: sim, não ou não sabiam.

Da amostra de 26 participantes em língua inglesa (questão 61), 12 ou 46.15%, a maior parte, portanto, valorou como 3 (concordo medianamente); 7 ou 26.92% como 5 (concordo plenamente); 5 ou 19.23% valoraram como 2 (discordo) e 2 ou 7.69% marcaram 4 (concordo). A média aritmética foi de 3.42, o que indica que a média das respostas da amostra ficou perto de concordo medianamente com a afirmação. Já o desvio padrão foi de 1.10 ou alto, sendo que as respostas se concentram entre aproximadamente 2.20 a 4.5 – em que 2 (discordar), 3 (concordar medianamente), 4 (concordar) e 5 (concordar plenamente) - FIGURA 48.

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Figura 48 – Figura de distribuição de respostas em língua inglesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que um bilíngue é necessariamente bicultural e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Já na amostra de respondentes em língua espanhola, dos 9 participantes (questão 103), 5 ou 55.56% concordaram com a afirmação de que um bilíngue era necessariamente bicultural, ou seja, a maioria absoluta, os outros 4 participantes ou 44.44% marcaram não concordar. Esta amostra teve a distribuição quantitativa de respostas sim e não mais bem distribuída até o momento, embora não devamos deixar de considerar o fato de que é uma amostra pequena em que, portanto, distribuições mais igualitárias são mais fáceis de ocorrer - FIGURA 49.

Figura 49 – Resposta à indagação se para os respondentes em espanhol um bilíngue é necessariamente bicultural: sim, não ou não sabiam.

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Da amostra de 5 participantes em língua espanhola (questão 104) que marcaram sim, 2 ou 40%, a maior parte, portanto, valorou como 4 (concordo); 1 ou 20% (concordo plenamente); 1 ou 20% valorou como 3 (concordo medianamente) e 1 ou 20% marcou 2 (discordo). A média aritmética foi de 3.60, o que indica que a média das respostas da amostra ficou mais próxima de concordar medianamente com a afirmação. Já o desvio padrão foi de 1.14 ou alto, sendo que as respostas se concentram entre aproximadamente 2.50 a 4.80 – em que 2 (discordar), 3 (concordar medianamente), 4 (concordar) e 5 (concordar plenamente) - FIGURA 50.

Figura 50 – Figura de distribuição de respostas em língua espanhola na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que um bilíngue é necessariamente bicultural e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

O dado do alto desvio padrão das análises qualitativas – 1.10 e 1.114 – permite-nos supor que, embora a maior parte dos respondentes em língua inglesa e espanhola tenham primeiramente assinalado que acreditavam que um falante bilíngue era necessariamente bicultural, quando pensaram mais detidamente sobre o assunto, ao terem que atribuir um valor para essa concordância inicial, a maior parte deles pode ter revisto sua própria afirmação e concordou apenas medianamente com ela. O alto desvio padrão também pode ser interpretado como uma grande dúvida gerada nestes respondentes quando foi disponibilizada a eles uma escala de valores. Nossa hipótese é a de que o emprego do advérbio necessariamente, que quer dizer de modo indispensável, na formulação da pergunta, emprego proposital, tenha levado à alta variação de respostas e, portanto, ao alto desvio padrão nelas.

Comparativamente, quanto aos respondentes das três línguas, em uma análise quantitativa, somente os respondentes em língua portuguesa discordaram majoritariamente da afirmação de que um bilíngue era necessariamente bicultural (98 participantes ou 63%). Em sua maioria absoluta os demais participantes, 26 participantes de língua inglesa ou 60% e 5 ou 56% em

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língua espanhola, concordou com a afirmação de que um bilíngue é necessariamente bicultural. Embora os que responderam em português majoritariamente discordassem e os nos outros idiomas concordassem com a afirmação, a porcentagem de aproximadamente 60% de concordância ou discordância manteve-se.

Qualitativamente, quando analisamos os dados disponíveis dos respondentes de língua inglesa e espanhola, 12 ou 46% em inglês valoraram 3 (concordar medianamente) com a afirmação de que um bilíngue é necessariamente bicultural, e 2 ou 40% valoraram 4 (concordar) em espanhol. Esses últimos dados indicam que para os respondentes em espanhol a afirmação primeira de que os bilíngues são necessariamente biculturais é mais verdadeira do que para os em língua inglesa. As respostas de todos os participantes analisados foram bem díspares na análise qualitativa do desvio padrão, sendo alto em ambas amostras, 1.10 em língua inglesa e 1.14 em língua espanhola, os mais altos até agora, o que significa dizer que em ambas as línguas os participantes divergiram bastante entre si em suas respostas.

Quando comparamos os dados obtidos com as hipóteses aventadas na formulação da questão, os dados quantitativos obtidos na amostra em língua portuguesa, em que 63% discordam da afirmação de que um bilíngue é necessariamente bicultural, apontam para a confirmação de nossa hipótese primeira de que a maioria dos entrevistados não concordaria com o afirmado, como o teórico Grosjean (2010: s/p) afirmou: “uma pessoa pode ser bilíngue sem ser bicultural, tal qual uma pode ser monolíngue e bicultural (ex: o britânico que vive nos EUA)”. A falta dos dados qualitativos e, portanto, de sua análise, a qual poderia confirmar ou não essa tendência faz com que não possamos fazer maiores inferências ou generalizações a respeito destes dados, no entanto.

Os dados quantitativos das outras duas amostras, de língua inglesa espanhola, apontaram para o contrário, 60% em inglês e 56% em espanhol dos respondentes dizendo majoritariamente acreditar que um bilíngue fosse necessariamente bicultural. A análise qualitativa dos dados adicionais de valoração e desvio padrão, entretanto, levaram-nos à outra interpretação. Como as respostas de todos os participantes analisados foram bem díspares na análise qualitativa dos desvios padrões, sendo altos, concluímos que, em ambas as línguas, os participantes divergiram bastante entre si em suas respostas, o que nos faz aventar que outras variáveis, além do já mencionado emprego do advérbio necessariamente, possam ter levado os participantes a divergir.

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Se retomarmos a teoria por nós estudada e a definição de biculturalismo que nos norteou, “o biculturalismo é caracterizado pela proficiência e conforto de um indivíduo com ambas, a cultura original e a cultura de um novo país ou região” (JACKSON, 2014: 207), entrecruzando-a com a definição de proficiência que se refere à habilidade dos falantes para usarem esse conhecimento [competência linguística] em diversas tarefas, sendo competência o conhecimento linguístico de uma língua que os falantes já interiorizaram (ELLIS, 2008: 26), podemos aventar a possibilidade dos respondentes terem em mente alguns desses três conceitos, proficiência ou competência, para aqueles que tiverem algum estudo ou conhecimento em biculturalismo, e o simples conforto nas línguas ou culturas, para os que não tiverem; o que pode os ter levado a divergir em suas respostas, ocasionando na interpretação de que eles têm menos certeza de que um bilíngue é necessariamente bicultural quando aspectos qualitativos, ou valorativos, são pedidos a eles do que quando somente aspectos quantitativos, como em uma reposta trinária (sim, não e não sei).

Pelas análises dos dados quantitativos e qualitativos somados nos três idiomas, analisamos, assim, que nossa hipótese inicial, de que a maioria dos entrevistados não concordaria com a afirmação de um bilíngue seria necessariamente bicultural, confirmou-se. Como encontramos os dados qualitativos e quantitativos conflitantes, optamos por fazer um cálculo adicional, o teste estatístico do qui-quadrado (no ANEXO 3 estão os cálculos). Com ele, analisamos que o qui-quadrado calculado (11.19) era maior do que o tabelado (9.5), o que nos levou, de fato, a rejeitar H0 em prol de H1, o que significou que estava certa nossa afirmação com base nos dados quantitativos e qualitativos de que a maioria dos entrevistados não concordaria com a afirmação de um bilíngue é necessariamente bicultural.

A próxima indagação era sobre a consideração do participante em relação à língua (materna ou aprendida) fazer parte da identidade de um falante (questões 19, 62 e 105). Caso respondessem afirmativamente deveriam valorar a afirmativa anterior de acordo com a escala disponível (perguntas 20, 63 e 103 respectivamente em português, inglês e espanhol).

Dos 155 participantes em português (questão 19), quase a totalidade, 149 ou 96.13%, marcou que sim, a língua faz parte da identidade do falante. 4 ou 2.58% marcaram que não e 2 ou 1.29% responderam não saber – FIGURA 51.

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Figura 51 – Resposta à indagação se para os respondentes em português a língua é parte de sua identidade: sim, não ou não sabiam.

Com relação à escala de valores, como já mencionamos, ela estava invertida somente em língua portuguesa e era 1 (concordo plenamente), 2 (concordo), 3 manteve-se em (concordo medianamente), 4 (discordo) e 5 (discordo plenamente) - questão 20.

Dos 149 participantes que responderam em português (pergunta 20), 62 ou 41.61% marcaram 1 (concordo plenamente) e 61 ou 40.94% assinalaram 5 (discordo plenamente); 20 ou 13.42% marcaram 4 (discordo) e 3 ou 2.01% marcaram 2 (concordo). A média aritmética foi de 3.10 ou quase 50% em cada resposta extrema, o que desloca a média para o centro do gráfico - FIGURA 52. O desvio padrão foi extremamente alto ou 1.86, o que significa dizer que houve respostas em todo o espectro de possibilidades (de 1.15 a 4.94 aproximadamente).

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Figura 52 – Figura de distribuição de respostas em língua portuguesa na escala de 1, concordo plenamente com, discordo plenamente da afirmação de que um bilíngue a língua é parte de sua identidade e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Dos 43 participantes em inglês (pergunta 62), quase a totalidade, 39 ou 90.7%, marcou que sim, a língua faz parte da identidade do falante e 4 ou 9.3% marcaram que não - FIGURA 53.

Figura 53 – Resposta à indagação se para os respondentes em inglês a língua é parte de sua identidade: sim, não ou não sabiam.

Com relação à análise qualitativa, a escala era 1 (discordo plenamente), 2 (discordo), 3 (concordo medianamente), 4 (concordo) e 5 (concordo plenamente). Dos 39 respondentes em língua inglesa, 19 ou 48.72% marcaram 5 (concordar plenamente); 12 ou 30.77% assinalaram 4 (concordar); 6 ou 15.38% valoraram como 3 (concordar medianamente); e 2 ou 5.13% marcaram 2 (discordar) - FIGURA 54. A média aritmética ficou em 4.23 significando que

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a média das respostas ficou mais próxima de 4 (concordo). Já o desvio padrão, 0.90, foi mediano, o que significa que o universo das respostas oscilou de aproximadamente 3.20 a 5, havendo divergência mediana entre as respostas fornecidas.

Figura 54 – Figura de distribuição de respostas em língua inglesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que a língua é parte de sua identidade e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Dos 9 respondentes em espanhol, pergunta 105, a totalidade, 9 ou 100%, marcou que sim, a língua faz parte da identidade do falante - FIGURA 55.

Figura 55 – Resposta à indagação se para os respondentes em espanhol a língua é parte de sua identidade: sim, não ou não

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sabiam.

Com relação a análise qualitativa em língua espanhola (questão 106), a escala era 1 (discordo plenamente), 2 (discordo), 3 (concordo medianamente), 4 (concordo) e 5 (concordo plenamente). Dos 9 respondentes, 5 ou 55.56% marcaram 5, concordar plenamente e 4 ou 44.44% assinalaram 4, concordar - FIGURA 56. A média aritmética ficou em 4.56 significando que a média das respostas ficou mais próxima de 5 (concordo plenamente). Já o desvio padrão, 0.53, foi baixo, o que significa que o universo das respostas oscilou pouco, havendo mais concordância do que divergência nas respostas fornecidas (intervalo entre 4 e 5).

Figura 56 – Figura de distribuição de respostas em língua espanhola na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que a língua é parte de sua identidade e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Se comprarmos os dados quantitativos em que dos 155 participantes em português, quase a totalidade, 149 ou 96%, marcou que sim, a língua faz parte da identidade do falante, e que os demais não e não sei somaram somente 4%, podemos supor que haver quase metade das respostas em cada extremo (42% marcaram concordo plenamente e 41% discordo plenamente) no dado qualitativo, pode ser interpretado como derivado da não observância atenta da escala disponível, o que quer dizer que podemos supor que muitos seguiram a escala de 1 (discordo plenamente) a 5 (concordo plenamente), da pergunta anterior em que tiveram que fazer uma valoração (questão 16).

Se tomarmos, porém, por base a análise desta última pergunta em que os respondentes em língua portuguesa tiveram que fazer a valoração sobre língua e cultura (questão 14), em sua análise quantitativa a maioria absoluta 85% concordou que língua era cultura, na pergunta subsequente, 16, na análise qualitativa, apenas 54% valoraram mais próximo de 5 (concordo plenamente), podemos concluir pelos números que a faixa de concordância foi de 42% na pergunta 20 – sobre identidade - e de 54% na pergunta 16 – sobre cultura – o que indica que houve cerca de 10% de variação na concordância, o que não é muita variação, em uma escala

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de 100%.

O dado qualitativo do desvio padrão, então, pode ser utilizado como fator de desempate, no caso da questão 20 (sobre a identidade) foi extremamente alto ou 1.86, e no caso da questão 16 (sobre língua e cultura) o desvio padrão de 0.81 foi mediano tendendo para baixo, o que pode indicar que a inversão de escala possa ter causado mesmo uma maior gama de respostas, ou um desvio padrão mais alto. A interpretação de que a inversão da escala possa ter levado a uma maior discordância entre as respostas intensifica-se ainda mais ao entrecruzarmos esses dados com o dado quantitativo de que quase a totalidade dos respondentes em língua portuguesa,149 ou 96%, marcaram que sim, a língua faz parte da identidade do falante - sendo esta a maior porcentagem de respondentes concordando com uma única afirmação por nós proposta até agora.

Se levarmos em consideração a teoria que pesquisamos dos mecanismos de pré-ativação (priming) e a agilidade que se espera de um entrevistado passar de uma pergunta para a outra, mencionamos que esperávamos de nossos participantes uma resposta sem que houvesse muita mobilização consciente, ou sem haver muito planejamento da resposta, e que isso ocorresse sucessivamente nas demais perguntas, uma vez que o respondente seguiria os modelos anteriores de maneira automática (PACHECO JÚNIOR, DAMACENA & BRONZATTI, 2015: s/p). Assim, inclinamo-nos para a interpretação de que a mudança na escala possa mesmo ter influenciado no aumento do desvio padrão, aumentando o número de respostas diferentes apontadas pelos participantes, havendo influenciado no resultado.

Resumida e comparativamente quanto aos respondentes das três línguas, em uma análise quantitativa, a quase totalidade dos participantes em português, 96%, e em inglês 91%, e a totalidade dos respondentes em espanhol, 100%, marcou que sim a língua fazia parte da identidade dos falantes. Qualitativamente, em português 42% marcaram 5 (concordar plenamente) e 41% assinalaram 1 (discordar plenamente), os dois extremos, conforme já analisado e discutido anteriormente, havendo alta discrepância nas respostas, embora isso não nos tenha levado a considerar que ouve influência na obtenção dos dados qualitativos, como expusemos. Em língua inglesa, a maioria, 49%, marcou 5 (concordar plenamente), semelhantemente ao que ocorreu na língua espanhola em que 56% marcaram 5 (concordar plenamente).

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Esses dados podem ser interpretados como a maioria dos respondentes, nos três idiomas, avaliando concordar plenamente (marcaram 5) com a afirmação de que a língua faz parte da identidade de um falante, 86 ou 41.54% dos 207 da amostra total. Ao adicionarmos a esses os que concordaram (marcando 4), 19 participantes nos três idiomas, teremos 105 ou 50.72% da amostra total, ou seja analisamos que 51% da amostra total, na análise qualitativa, concordaram ou concordaram plenamente com a afirmação de que língua é identidade.

Embora tenhamos aventado a possibilidade dos dados em língua portuguesa poderem ser muito mais expressivos caso a inversão da escala não tivesse ocorrido, concluímos que não houve influência final na reposta da maioria nesta língua, que apontou para a mesma direção nas demais línguas, confirmando a tendência de que a língua é considerada parte da identidade do falante, admitindo-se, porém, que há a possibilidade de ter havido distorções no desvio padrão e na porcentagem final desta concordância, no entanto. Outra inferência que podemos fazer é que os respondentes não estavam atentos a essa mudança de escala e que, assim, houve o aumento do desvio padrão, indicativo de respostas divergentes entre si.

Por essa razão optamos por fazer o teste do qui-quadrado nestes resultados conflitantes (ANEXO 3). Concluiu-se que o qui-quadrado calculado (4.97) era menor do que o tabelado

(9.5), então, não rejeitamos H0 em prol de H1, o que significa que nossa afirmação primeira de que a maioria dos entrevistados concordaria com a afirmação de que língua é identidade confirmou-se também por este teste.

Como obtivemos o resultado de que a maioria absoluta dos participantes, nos três idiomas, concordava com a afirmação de que língua é cultura, quantitativamente totalizando 85%, e que 95% acreditavam que língua é identidade, sendo esses 10% a mais, podemos cruzar esses dados e inferir que a língua é cultura e identidade, o que nos remete novamente à teoria que pesquisamos de que “as identidades culturais são pontos de identificação, os pontos instáveis de identificação ou sutura, feitos no interior dos discursos da cultura e história” (HALL, 1996: 70), ou simplificadamente, a identidade é feita no discurso, por meio da língua, e está imersa nos âmbitos de cultura e história.

Ao valermo-nos da definição de cultura de Terry Eagleton (2005:55) o complexo de valores, costumes, crenças e práticas que constituem o modo de vida de um grupo específico, sendo que a língua e a linguagem desenvolvem-se dentro desse complexo de onde surge a

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identificação, ou identidade do indivíduo; e ainda da definição de Hall (2003: 29) para identidade cultural como todo potencial real dos nossos mitos dominantes de moldar nosso imaginário, influenciar nossas ações, conferir significados às nossas vidas e dar sentido à nossa história, podemos concluir que a cultura molda nosso imaginário e vidas, insere-nos em um povo e em uma história, em seus mitos, em suma, em uma filiação ou tradição e que a identidade cultural seria, assim, subordinada a esses mitos fundadores e às tradições de cada nação ou grupo, como um posicionamento que se assume. A teoria levou-nos a concluir que os conceitos de identidade, cultura e língua, ou o trinômio cultura/língua/identidade, ao qual nos referimos nesta tese, estão de fato imbricados, sendo que os resultados obtidos nesta pesquisam confirmaram essa expectativas, indicadas pela maioria absoluta dos participantes, ou 85% ou mais de todos os participantes de nossa amostra total de 207 respondentes, afirmando que a língua é considerada parte da identidade e/ou da cultura do falante.

A próxima pergunta era se para o participante a língua era poder (ou o mesmo que poder) - questões 21, 64 e 107. Caso respondessem afirmativamente deveriam valorar, de acordo com a escala disponível - perguntas 22, 65 e 108, respectivamente em português, inglês e espanhol – a afirmação de que língua é poder (ou o mesmo que).

Dos 155 participantes em português (questão 21), 110 ou 70.97%, ou seja, a maioria marcou sim, 38 ou 24.52% marcaram que não e 7 ou 4.52% responderam não saber se a língua era poder (ou o mesmo que poder) – FIGURA 57.

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Figura 57 – Resposta à indagação se para os respondentes em português se a língua é poder (ou é o mesmo que poder): sim, não ou não sabiam.

Com relação à escala de valores, esta é a última pergunta em que ela estava invertida em língua portuguesa e era 1 (concordo plenamente), 2 (concordo), 3 manteve-se em (concordo medianamente), 4 (discordo) e 5 (discordo plenamente). Notamos que houve 112 participantes que valoraram o quanto língua é poder, ou seja, os dados contabilizados para sim foram maiores (foram 2 a mais).

Destes 112 que responderam que sim, língua é poder, em português (questão 22), 29 ou 25.89% valoraram como 1 (discordo plenamente); 25 ou 22.32% marcaram 1 (concordo plenamente); 20 ou 17.86% marcaram 4 (discordo) e 20 ou 17.86% marcaram 3 (concordo medianamente); e 18 ou 16.07% assinalaram 2 (concordo). A média aritmética foi de 3.09 significando que houve uma distribuição bem igualitária em todas as respostas disponíveis - FIGURA 58. O desvio padrão foi bem alto ou 1.51, só perdendo para a pergunta anterior (questão 20), o que significa dizer que houve respostas em todo o espectro de possibilidades (de 1.50 a 4.50 aproximadamente).

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Figura 58 – Figura de distribuição de respostas em língua portuguesa na escala de 1, concordo plenamente com, discordo plenamente da afirmação de que a língua é poder (ou é o mesmo que poder) e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Devido à alta discrepância apresentada nos resultados – na pergunta 21, a maioria absoluta dos respondentes ou 71% marcou sim – e na 22, a maioria dos participantes, ou 26%, discordou plenamente da afirmação de que língua é poder, podemos interpretar, conforme já discutido na questão de número 20 (sobre língua e identidade), que a inversão da escala pode ter influenciado nos resultados qualitativos obtidos devido à pré-ativação, ou efeito em que um participante de uma pesquisa responde automaticamente às perguntas que se sucedem de maneira automática ao primeiro modelo disponibilizado - em que a escala era 1 discordo plenamente a 5 concordo plenamente. Tal hipótese é corroborada pelo alto desvio padrão que evidencia que houve alta divergência nas respostas apresentadas pela amostra de respondentes.

O fato da segunda maior porcentagem de resposta assinalada ter sido concordo plenamente com 22%, pode ser interpretada como um reforçador desta hipótese de que a inversão nesta escala pode ter influenciado nos resultados qualitativos desta subamostra, o que pode indicar que a maioria dos respondentes não estava atenta à mudança da escala e, que, portanto, estava utilizando sua ativação automática de resposta cerebral.

Dos 43 participantes em inglês (pergunta 64), quase a totalidade, 36 ou 83.72%, marcou que sim, a língua é poder (ou o mesmo que), 5 ou 11.63% marcaram que não e 2 ou 4.65% marcaram não saber - FIGURA 59.

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Figura 59 – Resposta à indagação se para os respondentes em inglês se a língua é poder (ou é o mesmo que poder): sim, não ou não sabiam.

Com relação à análise qualitativa em língua inglesa – pergunta 65 -, a escala era 1 (discordo plenamente), 2 (discordo), 3 (concordo medianamente), 4 (concordo) e 5 (concordo plenamente). Dos 36 respondentes em língua inglesa que marcaram sim, 19 ou 52.78% marcaram 5 (concordo plenamente); 8 ou 22.22% valoraram como 3 (concordo medianamente); 6 ou 16.67% assinalaram 4 (concordo); 2 ou 5.56% marcaram 2 ou afirmaram (discordo) e 1 ou 2.78% marcou 1 (discordo plenamente) - FIGURA 60. A média aritmética ficou em 4.11 significando que a média das respostas ficou mais próxima de 4 (concordo). Já o desvio padrão, 1.12, foi mediano tendendo para alto, o que significa que o universo das respostas oscilou de aproximadamente 3 a 5, havendo certa divergência entre as respostas fornecidas.

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Figura 60 – Figura de distribuição de respostas em língua inglesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que a língua é poder (ou é o mesmo que poder) e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Dos 9 respondentes em espanhol, pergunta 107, a maioria absoluta, 8 respondentes ou 88.89%, concordou com a afirmação de que a língua é poder (ou o mesmo que) e 1 ou 11.11% marcou que discordava dela (FIGURA 61).

Figura 61 – Resposta à indagação se para os respondentes em espanhol se a língua é poder (ou é o mesmo que poder): sim, não ou não sabiam.

Com relação à análise qualitativa da amostra em língua espanhola – questão 108 -, a escala era 1 (discordo plenamente), 2 (discordo), 3 (concordo medianamente), 4 (concordo) e 5 (concordo plenamente). Dos 8 respondentes que marcaram sim, 5 ou 62.50% marcaram 4 (concordo), e 3 ou 37.50% assinalaram 5 (concordo plenamente) - FIGURA 62. A média

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aritmética ficou em 4.38 significando que a média das respostas ficou mais próxima de 4 (concordo). Já o desvio padrão, 0.52, foi baixo, o que significa que o universo das respostas oscilou pouco, havendo mais concordância do que divergência nas respostas fornecidas (intervalo entre 4 e 4.90).

Figura 62 – Figura de distribuição de respostas em língua espanhola na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que a língua é poder (ou é o mesmo que poder) e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Resumindo e comparando os dados obtidos nas três línguas, em uma análise quantitativa, a maioria dos participantes nos três idiomas, 154 ou 74% dos 207 totais da pesquisa, marcou que sim a língua era poder (ou o mesmo que poder). Qualitativamente, em português foram analisadas 112 respostas quase igualmente distribuídas em todas as possibilidades de respostas (1 a 5) o que levou à um alto desvio padrão e a hipótese de que houve distorção nos dados qualitativos desta subamostra. A maior porcentagem dos respondentes em português que concordou previamente com a afirmação de que língua era poder, marcou discordar plenamente dela na valoração, totalizando 26%, o que é um contrassenso quando comparado com o fato da maioria ter concordado com a afirmação anteriormente. Se observarmos que a segunda maior valoração teve 22% concordando plenamente com a mesma afirmação, podemos concluir que a análise qualitativa dos dados ficou comprometida devido a inversão da escala. Na análise quantitativa, em língua inglesa a maioria (53%) marcou concordar plenamente e, em espanhola (62%) concordou com a afirmação de que língua era poder, seguindo a tendência das perguntas anteriores.

Optamos por fazer o teste do qui-quadrado devido aos dados quantitativos e qualitativos conflitantes encontrados. Concluiu-se que o qui-quadrado calculado (4.45) era menor do que o tabelado (9.5), e não rejeitamos H0 em prol de H1, o que significou que estava correta nossa afirmação de que a maioria dos entrevistados concordaria com a afirmação de que a língua era poder (ou o mesmo que poder).

253

Ao longo dos capítulos teóricos desta tese discutimos e trouxemos dados do poder da língua, iniciamos pela Introdução mencionando o poder de dominação das línguas nas conquistas de povos e territórios ao longo da história – romanos, portugueses, ingleses, etc. – e o poder da língua de aculturar e subjugar os povos – como os indígenas, nativos brasileiros. Concluímos que a língua tem o poder de transmitir, ou de impedir a transmissão, dos valores culturais de um povo a sua descendência, ou os modos de viver, valores, costumes, tradições etc. tanto no campo individual quanto na coletividade. Outro poder linguístico que discutimos é o poder econômico, seja na economia propriamente dita de um país, por exemplo no caso de países que têm mais de uma língua como oficiais (caso de Moçambique, Suíça e tantos outros), seja no valor dos salários dos cidadãos, conforme os dados trazidos por Danielsson (2017: s/p) que constatou que o multilinguismo é estimado em contribuir em 10 por cento do PIB suíço, e que as habilidades linguísticas dos trabalhadores abrem mais mercados para os negócios naquele país, favorecendo consideravelmente a economia como um todo. Citamos estudos, como o canadense de 2010 que mostrou que os trabalhadores bilíngues recebiam de 3 a 7% a mais do que seus colegas monolíngues naquele país. Adicionalmente, fizemos menções a dados de políticas internacionais relatando os conflitos linguísticos, como no caso da França que recomendava que os pais de imigrantes falassem somente o francês com seus filhos em casa (BIJELJAC-BABI ‘C, 2010: s/p), o que indica que há disputas de língua e cultura, e que as línguas podem ser consideradas dominantes no exercício de seu poder ou nas configurações de poder que podem exercer.

Um último dado relacionado ao poder linguístico que gostaríamos de mencionar foi levantado na pesquisa em relação ao ‘Ensino Bilíngue’ brasileiro, escolas internacionais e (programas) bilíngues, majoritariamente feito por e voltado para as elites brasileiras. Ao depararmo-nos com a história da gênese da escola brasileira como um todo, percebemos que a escola teve um papel na unificação das classes abastadas brasileiras, unificação das elites através da passagem pela escola secundária e sobretudo pela escola superior, isso significou sua própria sobrevivência, garantindo o acesso às credenciais acadêmicas e sociais necessárias para a inserção desta elite nas instâncias de poder, em particular a do poder político (CANTUARIA, 2005: 3). O ensino como um todo tem por essência a língua, ensina-se, em um idioma ou mais, assuntos, matérias, temas, conceitos; sendo que a origem da educação, e isso não somente no Brasil, mas na história - lembremo-nos que a Igreja Católica manteve seu poder por séculos através do letramento de seus clérigos - deu-se para a manutenção e expansão das formas de poder. A educação é, assim, uma forma de poder e é feita por meio de pelo menos uma língua.

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Diante destes fatos, optamos por formular a pergunta para nossos respondentes da pesquisa que indagava se, para eles, língua era (o mesmo que) poder, tendo como hipótese de que a maioria deles responderia afirmativamente, o que confirmou-se com a análise dos dados obtidos na análise quantitativa em que 154 participantes de 207 totais, ou seja, 74%, afirmou concordar com a afirmação de que língua era (o mesmo que) poder e também no teste do qui- quadrado. Ao entrecruzarmos esse resultado com o dado anterior de que 85% ou mais de todos os participantes de nossa amostra afirmaram que a língua é considerada parte da identidade e/ou da cultura do falante, teremos 74% ou mais do nosso universo de respondentes afirmando que a língua é cultura ou identidade ou poder.

A próxima questão era se, para o participante, falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traria algum benefício a uma pessoa - questões 23, 66 e 109. Nesta pergunta, caso respondessem tanto afirmativamente quanto negativamente deveriam valorar, de acordo com a escala disponível, igual para todos, 1 (discordo plenamente), 2 (discordo), 3 (concordo medianamente), 4 (concordo) e 5 (concordo plenamente), - nas perguntas 24 e 25; 67 e 68 e 110 e 111, respectivamente em português, inglês e espanhol – a afirmação de que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) (não) traria algum benefício a uma pessoa.

Dos 155 participantes em português (pergunta 23), 155 ou 100%, ou a totalidade marcou sim, ou que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traria algum benefício a uma pessoa – FIGURA 63.

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Figura 63 – Resposta à indagação se os respondentes em português consideravam que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traria benefícios a uma pessoa: sim, não ou não sabiam.

Com relação à análise qualitativa em língua portuguesa – questão 24 - dos 155 respondentes que marcaram sim, 138 ou 89.03% marcaram 5 (concordo plenamente); 12 ou 7.74% valoraram como 4 (concordo); 3 ou 1.94% assinalaram 1 (discordo plenamente); e 2 ou 1.29% marcaram 3 (concordo medianamente). A média aritmética ficou em 4.82 significando que a média das respostas ficou mais próxima de 5 (concordo plenamente). Já o desvio padrão, 0.64, foi baixo, o que significa que o universo das respostas não oscilou muito e ficou entre aproximadamente 4.15 a 5, havendo pouca divergência entre as respostas fornecidas - FIGURA 64.

Figura 64 – Figura de distribuição de respostas em língua portuguesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traria benefícios a uma pessoa e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

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Nenhum respondente em língua portuguesa discordou da afirmação de que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traria algum benefício a uma pessoa (FIGURA 65).

Figura 65 – Figura de distribuição de respostas em língua portuguesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que de que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) não traria benefícios a uma pessoa e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Dos 43 participantes em inglês (pergunta 66), quase a totalidade, 42 ou 97.67%, marcou que sim, ou que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traria algum benefício a uma pessoa e 1 ou 2.33% marcou não saber (FIGURA 66).

Figura 66 – Resposta à indagação se os respondentes em inglês consideravam que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traria benefícios a uma pessoa: sim, não ou não sabiam.

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Na análise qualitativa em língua inglesa, dos 42 respondentes que marcaram sim, 35 ou 83.33% marcaram 5 (concordo plenamente); 5 ou 11.90% assinalaram 4 (concordo); e 2 ou 4.76% valoraram como 2 (discordo) - FIGURA 61. A média aritmética ficou em 4.74 significando que a média das respostas ficou mais próxima de 5 (concordo plenamente). Já o desvio padrão, 0.70, foi baixo, o que significa que o universo das respostas oscilou de aproximadamente 4.10 a 5, havendo pouca divergência entre as respostas fornecidas – FIGURA 67.

Figura 67 – Figura de distribuição de respostas em língua inglesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traria benefícios a uma pessoa e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Nenhum participante em língua inglesa discordou da afirmação de que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traria algum benefício a uma pessoa (FIGURA 68).

Figura 68 – Figura de distribuição de respostas em língua inglesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) não traria benefícios a uma pessoa e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Dos 9 respondentes em espanhol, pergunta 109, a totalidade, ou 9 participantes, concordou com a afirmação de que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traria algum benefício a uma pessoa (FIGURA 69).

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Figura 69 – Resposta à indagação se os respondentes em espanhol consideravam que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traria benefícios a uma pessoa: sim, não ou não sabiam.

Com relação à análise qualitativa da amostra em língua espanhola – questão 110 - dos 9 respondentes que concordaram, 8 ou 88.89% marcaram 5 (concordo plenamente); e 1 ou 11.11% assinalou 4 (concordo) com a afirmação de que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traria algum benefício a uma pessoa (FIGURA 70). A média aritmética ficou em 4.38 significando que a média das respostas ficou mais próxima de 4 (concordo). Já o desvio padrão, 0.52, foi baixo, o que significa que o universo das respostas oscilou pouco, havendo mais concordância do que divergência nas respostas fornecidas (intervalo entre 4 e 4.90).

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Figura 70 – Figura de distribuição de respostas em língua espanhola na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traria benefícios a uma pessoa e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Tal qual observado nos dois outros idiomas, nenhum participante em língua espanhola discordou da afirmação de que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traria algum benefício a uma pessoa (FIGURA 71).

Figura 71 – Figura de distribuição de respostas em língua espanhola na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) não traria benefícios a uma pessoa e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Resumindo e comparando os dados obtidos nas três línguas, em uma análise quantitativa, a totalidade dos participantes nas duas línguas, 100% em português e em espanhol, além de 98% em inglês marcou que sim falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traria algum benefício a uma pessoa, o que totalizou 206 participantes ou 99.51%, um número muito expressivo, sendo que se arredondarmos é 99% dos 207 respondentes totais.

Qualitativamente, nos três idiomas a maioria valorou como 5 (concordar plenamente) com a afirmação, respectivamente, 89% em português, 83% em inglês e 89% espanhol, ou 87% do total de 207, o que também é bem significativo. Como últimas análises deste questionamento, avaliamos que, quando perguntados de maneira geral sobre os possíveis benefícios que o bilinguismo traria, os entrevistados, em sua quase totalidade, 99.5%, acredita que o bilinguismo traz benefícios a um falante, sendo que destes 87% concordaram plenamente com a

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afirmação; 0% do universo total de 207 participantes afirmou que falar mais de um idioma não traria benefícios ao falante bilíngue; e apenas 1 ou 0.5% dos respondentes (1 em língua inglesa) afirmou não saber sobre os supostos benefícios de ser bilíngue.

Conforme já mencionamos no início deste capítulo em que estão as justificativas individuais a cada questão, optamos por fazer primeiramente uma pergunta com um termo generalizante, benefícios em: Você considera que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traga benefícios a uma pessoa? - para somente nas próximas perguntas especificar quais seriam esses tipos de benefícios (cognitivos, sociais e econômicos). Também observamos que perguntamos indiretamente sobre o bilinguismo acarretar o oposto de um benefício por meio da menção ao preconceito que um imigrante, por exemplo, poderia sofrer. Isso foi feito para termos dados comparativos em nossas análises e discussões.

Assim, passamos para a próxima pergunta se o participante acreditava que um imigrante sofria preconceito por vir de uma cultura diferente e por falar outra língua (questões 26, 69 e 112, em português, inglês e espanhol). A afirmativa (perguntas 27, 70 e 113, respectivamente) deveria ser valorada de acordo com a escala 1 (discordo plenamente), 2 (discordo), 3 (concordo medianamente), 4 (concordo) e 5 (concordo plenamente) em todos os idiomas.

Dos 155 participantes em português (pergunta 26), 126 ou 81.29% achavam que um imigrante sofria preconceito por vir de uma cultura diferente e por falar outra língua; outros 23 ou 14.84% não achavam que os imigrantes sofreriam preconceito, e 6 ou 3.87% não sabiam (FIGURA 72).

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Figura 72 – Resposta à indagação se os respondentes em português achavam que um imigrante sofria preconceito por vir de outra cultura e por falar outra língua: sim, não ou não sabiam.

Com relação à análise qualitativa em língua portuguesa - questão 27 - dos 126 respondentes que disseram sim, 48 ou 38.10% marcaram 5 (concordar plenamente); 37 ou 29.37% valoraram como 4 (concordar); 32 ou 25.40% assinalaram 3 (concordar medianamente); 6 ou 4.76% marcaram 2 (discordar); e 3 ou 2.38% (discordar plenamente) - FIGURA 73. A média aritmética ficou em 3.96 significando que a média das respostas ficou mais próxima de 4 (concordo). Já o desvio padrão, 1.02, foi médio, o que significa que o universo das respostas oscilou um pouco e ficou entre aproximadamente 3 a 5, havendo certa divergência entre as respostas fornecidas.

Figura 73 – Figura de distribuição de respostas em língua portuguesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que achavam que um imigrante sofria preconceito por vir de outra cultura e por falar outra língua e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

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Na análise quantitativa em língua inglesa (pergunta 69), dos 43 participantes em inglês, 21 ou 48.84%, marcaram que não, 19 ou 44.19% assinalaram sim e outros 3 ou 7% marcaram não saber se um imigrante sofria preconceito por vir de uma cultura diferente e por falar outra língua (FIGURA 74).

Figura 74 – Resposta à indagação se os respondentes em inglês achavam que um imigrante sofria preconceito por vir de outra cultura e por falar outra língua: sim, não ou não sabiam.

Em língua inglesa, na análise qualitativa – questão 70 -, dos 19 respondentes que marcaram que sim, 10 ou 52.63% assinalaram 4 (concordar); 5 ou 26.32% assinalaram 3 (concordar medianamente); 3 ou 15.79% marcaram 5 (concordar plenamente) e 1 ou 5.26% valoraram como 2 ou (discordar) - FIGURA 75. A média aritmética ficou em 3.79 significando que a média das respostas ficou mais próxima de 4 (concordo). Já o desvio padrão, 0.79, foi baixo, o que significa que o universo das respostas oscilou de aproximadamente 3 a 4.5, havendo pouca divergência entre as respostas fornecidas.

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Figura 75 – Figura de distribuição de respostas em língua inglesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que achavam que um imigrante sofria preconceito por vir de outra cultura e por falar outra língua e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Quantitativamente, dos 9 respondentes em espanhol (pergunta 112), 7 ou 77.78% dos participantes, responderam sim que um imigrante sofria preconceito por vir de uma cultura diferente e por falar outra língua e 2 ou 22.22% afirmaram que não (FIGURA 76).

Figura 76 – Resposta à indagação se os respondentes em português achavam que um imigrante sofria preconceito por vir de outra cultura e por falar outra língua: sim, não ou não sabiam.

Na análise qualitativa da amostra em língua espanhola (pergunta 113), dos 7 respondentes que concordaram, 3 ou 42.86% assinalaram 4 (concordar); e 2 ou 28.57% marcaram 5 (concordar plenamente) e outros 2 ou 28.57% marcaram 3 (concordar medianamente) com a afirmação de que um imigrante sofria preconceito por vir de uma cultura diferente e por falar outra língua - FIGURA 77. A média aritmética ficou em 4.00 significando que a média das respostas ficou em 4 (concordo). Já o desvio padrão, 0.82, foi mediano, o que significa que o universo das

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respostas oscilou um pouco, havendo certa divergência nas respostas fornecidas (intervalo entre 3.10 e 4.90).

Figura 77 – Figura de distribuição de respostas em língua espanhola na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que achavam que um imigrante sofria preconceito por vir de outra cultura e por falar outra língua e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Comparando os dados obtidos nas três línguas, em uma análise quantitativa, 81% em português marcaram sim, 44% em inglês e 78% espanhol, o que significa que a maioria absoluta dos respondentes da pesquisa, nos três idiomas, marcou sim, um imigrante sofre preconceito por causa de sua língua ou cultura - 152 participantes, ou 76% dos 207 totais, um número muito expressivo. Qualitativamente, nos três idiomas, 103 ou 50% assinalaram ou 5 (concordo plenamente) ou 4 (concordo) da amostra total.

Na língua inglesa, acreditamos que devemos fazer uma análise a mais devido às discrepâncias entre os dados quantitativos e qualitativos. Na pergunta 112 a maior parte, 49%, marcou não concordar com o preconceito; a segunda maior porcentagem, de 44%, havia respondido sim, acreditar em preconceito aos imigrantes, o que indica que os respondentes estavam bem divididos, na análise quantitativa, quanto a haver ou não preconceito aos imigrantes, com uma diferença de 5% entre os que não acreditavam e os que acreditavam nele. Na análise qualitativa – pergunta 113 - a maioria ou 53% assinalou 4 (concordo), 26% assinalaram 3 (concordar medianamente) e 16% marcaram 5 (concordar plenamente), sendo que apenas 5% valoraram como 2 (discordar). Se somarmos todos os que disseram concordar com a afirmação (concordo medianamente, concordo e concordo plenamente) teremos 16 ou 84% do total de 19 que haviam concordado com a existência do preconceito anteriormente concordando que há preconceito aos imigrantes e somente 1 ou 5% discordando dela. Dessa forma, devido aos dados qualitativos coletados, em nossa análise, concluímos que a maior parte dos que concordou na primeira pergunta com o preconceito reafirmou esta concordância na análise qualitativa e somente 1 mudou de opinião, o que nos isentou da necessidade da análise do teste do qui-quadrado.

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Se compararmos esses dados com os coletados - 76% acreditam haver preconceito e, destes, 50% assinalaram concordar ou concordar plenamente com a afirmação de que um imigrante sofre preconceito por causa de sua língua ou cultura – com os da pergunta anterior sobre os benefícios em ser pelo menos bilíngue, em que 99.5% da amostra total afirmaram haver benefícios no bilinguismo, sendo que 199 respondentes ou 96% marcaram ou concordar ou concordar plenamente com esses benefícios – observamos que o universo pesquisado acredita haver, em sua maioria absoluta, tanto benefícios (96%) quanto a falta de benefícios (76%) advindos da condição bilíngue, de acordo com o contexto apresentado (imigração).

Ao longo de nossa pesquisa teórica, defrontamo-nos com as supostas desvantagens que o bilinguismo poderia acarretar pois as ideias mais acreditadas há quase um século eram as de que só haveria espaço para uma língua no cérebro e que o bilinguismo traria problemas para a expansão do Q.I. e para o desenvolvimento verbal e a convivência social, principalmente em crianças imigrantes – ideias que vimos nos Capítulos 1 e 2.

Vimos que o bilinguismo até o século XX era tido tanto pelos educadores como pelos implementadores de políticas educacionais como um fator que dificultava ou prejudicava o desenvolvimento acadêmico e intelectual de uma criança e um fator de limitação, social, cognitiva, entre os adultos em contextos de imigração. Vimos também que o poder econômico da língua e os conflitos linguísticos são outras temáticas abordadas quando fazemos uma reflexão sobre a dinâmica dos povos em imigração, momento em que devemos refletir sobre os problemas enfrentados por eles, como o preconceito, a falta de aceitação de sua cultura, a inadequação ao sistema educacional do país de acolhimento, etc. Apercebemo-nos do momento histórico em que vivemos (2018), marcado por contingentes imigratórios que ao deslocarem-se forçam a convivência bilíngue de milhões de pessoas o que fez com que nossa reflexão sobre bilinguismo abarcasse temáticas de outras áreas do conhecimento, como as da Sociologia e da Economia, entre outras.

Embora não tenhamos nos aprofundado nas problemáticas, lembramo-nos e fizemos referências à situação dos nossos bilíngues nativos, os povos indígenas brasileiros, cuja língua materna é a língua indígena de seu povo, sendo a língua portuguesa a sua segunda língua. Mencionamos que o bilinguismo para os indígenas, assim como para os imigrantes, não é eletivo o que faz com que o processo de escolarização seja uma forma fundamental de garantir

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a essas comunidades o acesso à cidadania e a elevação de sua autoestima, dando a eles o direito de preservação de suas identidades, tanto por meio da preservação de sua língua materna, quanto pelo acesso à língua oficial do país em que se encontram.

Devido a todos esses dados teóricos, nossa hipótese primeira era a de que a maioria de nossos respondentes iria afirmar que acreditava que um imigrante sofre preconceito por causa de sua língua ou cultura o que se confirmou pelos dados quantitativos, 76%, e qualitativos, 50% assinalando concordar ou concordar plenamente com a referida afirmação.

Na próxima pergunta, indagamos se o participante acreditava que um bilíngue tivesse alguma vantagem cognitiva (concentração, agilidade mental, fazer tarefas melhor etc.) em relação aos monolíngues (questões 28, 71 e 114, em português, inglês e espanhol). A afirmativa levava às perguntas 29, 72 e 115, respectivamente, de valoração da afirmativa de acordo com a escala 1 (discordo plenamente), 2 (discordo), 3 (concordo medianamente), 4 (concordo) e 5 (concordo plenamente) nos três idiomas.

Dos 155 participantes em português (pergunta 28), 93 ou 60%, ou a maioria disse acreditar em uma vantagem cognitiva dos bilíngues; 53 ou 34.2%, porcentagem expressiva, disseram não acreditar em uma vantagem cognitiva, e ainda 9 ou 5.81% falaram que não sabiam (FIGURA 78).

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Figura 78 – Resposta à indagação se os respondentes em português acreditavam haver uma vantagem cognitiva dos bilíngues em relação aos monolíngues: sim, não ou não sabiam.

Com relação à análise qualitativa em língua portuguesa (pergunta 29), dos 93 respondentes que disseram sim a afirmação anterior sobre haver uma vantagem cognitiva, 59 ou 63.44% valoraram 5 (concordo plenamente); 23 ou 24.73% valoraram como 4 (concordo); 8 ou 8.60% assinalaram 3 (concordo medianamente); 2 ou 2.15% (discordo plenamente); e 1 ou 1.08% marcou 2 (discordo) - FIGURA 79. A média aritmética ficou em 4.46 significando que a média das respostas ficou mais próxima de 4.5, ou seja, entre 4 (concordo) e 5 (concordo plenamente). Já o desvio padrão, 0.87, foi baixo, o que significa que o universo das respostas oscilou pouco e ficou entre aproximadamente 3.5 a 5, havendo pouca divergência entre as respostas fornecidas.

Figura 79 – Figura de distribuição de respostas em língua portuguesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que havia uma vantagem cognitiva dos bilíngues em relação aos monolíngues e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

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Quantitativamente, em língua inglesa, dos 43 participantes (pergunta 71), 31 ou 72.09%, a maioria absoluta marcou que sim; 8 ou 18.60% assinalaram que não e outros 4 ou 9.3% marcaram não saber se haveria uma vantagem cognitiva dos bilíngues em relação aos monolíngues (FIGURA 80).

Figura 80 – Resposta à indagação se os respondentes em inglês acreditavam haver uma vantagem cognitiva dos bilíngues em relação aos monolíngues: sim, não ou não sabiam.

Na análise qualitativa, em língua inglesa (pergunta 72), dos 31 respondentes que marcaram que sim na resposta anterior, 16 ou 51.61% assinalaram 5 (concordar plenamente); 11 ou 35.48% marcaram 4 (concordar); e 2 ou 6.45% marcaram igualmente 3 (concordar medianamente) e 2 (discordar) - FIGURA 81. A média aritmética ficou em 4.32 significando que a média das respostas ficou mais próxima de 4 (concordo). Já o desvio padrão, 0.87, foi baixo, o que significa que o universo das respostas oscilou de aproximadamente 3.30 a 5, havendo pouca divergência entre as respostas fornecidas pelos respondentes.

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Figura 81 – Figura de distribuição de respostas em língua inglesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que havia uma vantagem cognitiva dos bilíngues em relação aos monolíngues e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Na análise quantitativa, dos 9 respondentes em espanhol (pergunta 114), 6 ou 66.67% dos participantes responderam que haveria uma vantagem cognitiva dos bilíngues em relação aos monolíngues e 3 ou 33.33% afirmaram que acreditavam não haver uma vantagem cognitiva (FIGURA 82).

Figura 82 – Resposta à indagação se os respondentes em espanhol acreditavam haver uma vantagem cognitiva dos bilíngues em relação aos monolíngues: sim, não ou não sabiam.

Qualitativamente, da amostra em língua espanhola (pergunta 115) dos 6 respondentes que concordaram com a pergunta anterior, 3 ou 50% valoraram 5 (concordo plenamente) e 3 ou 50% marcaram 4 (concordo) com a vantagem cognitiva bilíngue (FIGURA 83). A média aritmética ficou em 4.50 significando que a média das respostas ficou em 4 (concordo) e 5 (concordar plenamente). Já o desvio padrão, 0.55, foi baixo, o que significa que o universo das

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respostas oscilou pouco, havendo pouca divergência nas respostas fornecidas (intervalo entre 4 e 5).

Figura 83 – Figura de distribuição de respostas em língua espanhola na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que havia uma vantagem cognitiva dos bilíngues em relação aos monolíngues e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Quantitativamente, comparando os dados obtidos nas três línguas, 60% em português marcaram sim, 72% em inglês e 67% espanhol, o que significa que nas três línguas a maioria absoluta acreditou haver algum tipo de vantagem cognitiva acarretada pelo bilinguismo, totalizando 130 participantes, ou 63%, dos 207 respondentes totais da pesquisa, um número muito expressivo.

Qualitativamente, nos três idiomas, a maioria absoluta ou 63% em língua portuguesa, 52% em língua inglesa e 50% em espanhola valoraram 5 (concordar plenamente), totalizando 78 respondentes ou 38% da amostra total de 207 participantes da pesquisa concordando plenamente com a existência de uma vantagem cognitiva bilíngue em relação ao monolíngue. Se adicionarmos a essa análise o fato de que 37 participantes nos três idiomas, ou 18% respondentes da amostra total, ainda marcaram 4 (concordar), teremos uma subamostra de 56% de todos os participantes, ou a maioria absoluta afirmando concordar ou concordar plenamente com a existência de uma vantagem cognitiva bilíngue.

Como vimos na pesquisa teórica do Capítulo 1 desta tese, na história do paradigma que aponta para uma (des)vantagem bilíngue por cerca de um século, após a ideia inicial de haver-se uma desvantagem acarretada pela condição bilíngue até o início do século XX, houve o estabelecimento, a partir da década de 1960, de uma vantagem de ordem cognitiva bilíngue. Vimos também que a pesquisa de Peal e Lambert, publicada em 1962, é apontada como um marco na mudança do paradigma quando se enfoca o meio acadêmico, sendo que “Esse estudo instituiu um novo paradigma, que considera os efeitos benéficos do bilinguismo”

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(LIMBERGER & BUCHWEITZ, 2012: 68). Observamos que a fase paradigmática da vantagem cognitiva se estabeleceu, um exemplar foi amplamente seguido pela comunidade científica, muitas publicações foram feitas e que, em meados de 2015, uma nova revolução científica parece iniciar-se, com trabalhos questionando a vantagem cognitiva já estabelecida.

Após mostrarmos casos da predisposição de avaliações positivas ao bilinguismo tanto na mídia quanto na Ciência e elencarmos publicações que seguiam essa tendência de haver uma vantagem cognitiva ligada ao bilinguismo, trouxemos à discussão uma tendência em publicação científica de publicar-se somente os resultados de pesquisas que corroborem o paradigma vigente, não havendo aceites daquelas publicações com resultados negativos ou contraditórios. Essa tendência de publicação de resultados positivos é a chamada publication bias. Destacamos, então, a pesquisa feita em 2014 e publicada em 2015 sob o título de Vantagem Cognitiva no Bilinguismo: um exemplo de Tendência de Publicação? de Angela de Bruin (DE BRUIN & TRECCANI & DELLA SALA, 2015) que trazia a ideia da vantagem cognitiva do bilíngue poderia ter caído no senso-comum dos cientistas, alimentando a tendência de publicação de resultados que apontassem para a vantagem cognitiva bilíngue. Analisamos também a reportagem de uma jornalista russo-americana, Konnikova (2015), que igualmente questionava se não teria caído no senso-comum dos próprios cientistas uma suposta imagem distorcida do bilinguismo que acarretasse em uma vantagem cognitiva, e constatamos que esse paradigma estabelecido na Ciência poderia ter ultrapassado as fronteiras do científico e adentrado a esfera social influenciando as mídias e, portanto, o senso- comum dos cidadãos, nos fazendo formular a pergunta se o respondente desta pesquisa acreditava que um bilíngue tivesse alguma vantagem cognitiva (concentração, agilidade mental, fazer tarefas melhor etc.) em relação aos monolíngues, com o intuito de verificar se este paradigma vigente na Ciência vigorava no senso-comum.

Conforme analisamos tanto quantitativamente quanto qualitativamente, nos três idiomas, a maioria absoluta, ou 63%, concordou em haver uma vantagem de ordem cognitiva em falantes bilíngues e que destes 56% afirmaram ainda concordar ou concordar plenamente com a existência desta uma vantagem cognitiva bilíngue, o que faz com que seja confirmada nossa hipótese inicial de que encontraríamos a maior parte de nossos participantes em concordância com o paradigma científico vigente - de que há uma vantagem de ordem cognitiva no falante bilíngue -, resultado que nos permite supor que esse paradigma científico tenha ultrapassado

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as fronteiras da Ciência, suas publicações e discussões restritas ao nicho científico, e tenha se consolidado, também, no senso-comum dos cidadãos.

No próximo questionamento, indagamos se o participante acreditava que um bilíngue tivesse alguma vantagem social (melhor comunicação, maior empatia ou tolerância na convivência com os outros etc.) em relação aos monolíngues (questões 30, 73 e 116, em português, inglês e espanhol). A afirmativa levava as perguntas 31, 74 e 117, respectivamente, de valoração da afirmativa de acordo com a escala 1 (discordo plenamente), 2 (discordo), 3 (concordo medianamente), 4 (concordo) e 5 (concordo plenamente) nos três idiomas.

Dos 155 participantes em português (pergunta 30), 124 ou 80%, ou a maioria absoluta disse acreditar em uma vantagem social dos bilíngues; seguido por 27 ou 17.42% que disseram não acreditar e ainda 4 ou 2.58% que falaram que não sabiam se haveria uma vantagem de ordem social (FIGURA 84).

Figura 84 – Resposta à indagação se os respondentes em português acreditavam haver uma vantagem social dos bilíngues em relação aos monolíngues: sim, não ou não sabiam.

Quanto à análise qualitativa em língua portuguesa (pergunta 31), dos 123 respondentes que disseram sim à afirmação anterior sobre haver uma vantagem social ligada ao bilinguismo, 68 ou 54.84% valoraram 5 (concordar plenamente); 40 ou 32.26% valoraram como 4

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(concordar); 15 ou 12.10% assinalaram 3 (concordar medianamente) e 1 ou 0.81% assinalou 1 (discordar plenamente) - FIGURA 85. A média aritmética ficou em 4.40 significando que a média das respostas ficou mais próxima de 4.5, ou seja, entre 4 (concordo) e 5 (concordo plenamente). Já o desvio padrão, 0.76, foi baixo, o que significa que o universo das respostas oscilou pouco e ficou entre aproximadamente 3.75 a 5, havendo pouca divergência entre as respostas fornecidas.

Figura 85 – Figura de distribuição de respostas em língua portuguesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que havia uma vantagem social dos bilíngues em relação aos monolíngues e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Na análise quantitativa em língua inglesa, dos 43 participantes (pergunta 86), 39 ou 90.70%, a maioria absoluta marcou que sim; 3 ou 6.98% marcaram não saber e 1 ou 2.33% assinalaram que não haveria uma vantagem social dos bilíngues em relação aos monolíngues (FIGURA 86).

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Figura 86 – Resposta à indagação se os respondentes em inglês acreditavam haver uma vantagem social dos bilíngues em relação aos monolíngues: sim, não ou não sabiam.

Qualitativamente, em língua inglesa (pergunta 74), dos 39 participantes que marcaram que sim na resposta anterior, 21 ou 53.85% assinalaram 5 (concordar plenamente); 10 ou 25.64% marcaram 4 (concordar); 6 ou 15.38% marcaram 3 (concordar medianamente); e 1 ou 2.56 marcou igualmente 2 (discordar) e 1 (discordar plenamente) da existência de uma vantagem social bilíngue (FIGURA 87). A média aritmética ficou em 4.26 significando que a média das respostas ficou mais próxima de 4 (concordo). Já o desvio padrão, 0.99, foi médio, o que significa que o universo das respostas oscilou um pouco, de aproximadamente 3.10 a 5, havendo certa divergência entre as respostas fornecidas.

Figura 87 – Figura de distribuição de respostas em língua inglesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que havia uma vantagem social dos bilíngues em relação aos monolíngues e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

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Em espanhol (pergunta 116), quantitativamente, dos 9 respondentes totais 7 ou 77.78%, ou a maioria absoluta dos participantes respondeu que haveria uma vantagem social dos bilíngues em relação aos monolíngues e 2 ou 22.22% afirmaram que acreditavam não haver uma vantagem social (FIGURA 88).

Figura 88 – Resposta à indagação se os respondentes em espanhol acreditavam haver uma vantagem social dos bilíngues em relação aos monolíngues: sim, não ou não sabiam.

Na análise qualitativa da amostra em língua espanhola (questão 117), dos 7 respondentes que concordaram com a pergunta anterior, 4 ou 57.14% valoraram como 5 (concordar plenamente) e 3 ou 42.86% como 4 (concordar) com a vantagem social bilíngue (FIGURA 89). A média aritmética ficou em 4.57 significando que a média das respostas ficou entre 4 (concordo) e 5 (concordar plenamente). Já o desvio padrão, 0.53, foi baixo, o que significa que o universo das respostas oscilou pouco, havendo pouca divergência nas respostas fornecidas (intervalo entre 4 e 5).

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Figura 89 – Figura de distribuição de respostas em língua espanhola na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que havia uma vantagem social dos bilíngues em relação aos monolíngues e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Quantitativamente, comparando os dados obtidos nas três línguas, 80% em português marcaram sim, 91% em inglês e 78% espanhol, o que significa que nas três línguas a maioria absoluta acreditou haver algum tipo de vantagem social acarretada pelo bilinguismo, totalizando 170 participantes, ou 82%, dos 207 respondentes, um número muito expressivo. Se compararmos com a análise quantitativa e comparativa feita na pergunta anterior em que 130 participantes, ou 63% confirmaram haver uma vantagem cognitiva bilíngue, sentimos um aumento expressivo de mais de 20% no grau de concordância, o que significa que os participantes em cerca de 20% a mais dos que acreditavam haver uma vantagem de ordem cognitiva creem que há uma vantagem social ligada ao bilinguismo.

Qualitativamente, nos três idiomas, a maioria absoluta ou 55% em língua portuguesa, 54% em língua inglesa e 57% em espanhola valoraram 5 (concordar plenamente), totalizando 93 respondentes ou 45% da amostra total de 207 participantes da pesquisa concordando plenamente com a existência de uma vantagem social bilíngue em relação ao monolíngue. Se adicionarmos à essa análise o dado de que 53 participantes nos três idiomas, ou 26% dos respondentes da amostra total, ainda marcaram 4 (concordar), teremos uma subamostra de 71% de todos os participantes, ou a maioria absoluta, afirmando concordar ou concordar plenamente com a existência de uma vantagem social bilíngue. Comparativamente aos resultados da questão anterior, em que 115 ou 56% de todos os participantes afirmam concordar ou concordar plenamente com a existência de uma vantagem cognitiva bilíngue, obtemos 146 ou 71% do universo total de respondentes, o que faz com que possamos analisar que há um aumento de 15% a mais apontando para a existência de uma vantagem social bilíngue do que para os que apontaram uma vantagem cognitiva qualitativamente.

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Em nosso levantamento teórico destacamos alguns autores pesquisadores de áreas diferentes do conhecimento sobre bilinguismo, como Brown (2004) que falou no choque de culturas e em gerir e mitigar conflitos de língua e cultura; Rajagopalan (2009), Paap (2014) e de Bruin et al (2015) que trouxeram indícios de um publication bias, ou a tendência de publicação de experimentos que confirmem o paradigma vigente em detrimento dos que o contestam; e Desjardins (2015) que abordou estudos que apontavam para a redução das crenças essencialistas quando há educação precoce em uma segunda língua. Todos apresentaram uma visão mais ampla e crítica ao analisar os resultados de suas próprias investigações, ou da investigação de outros, e fugiram da tendência de publicar somente o que está de acordo com o paradigma vigente (publication bias) – de que o bilíngue tem uma vantagem cognitiva em relação ao monolíngue.

Quando juntamos a essas publicações científicas fatos históricos como os que estudamos sobre a língua materna dos povos indígenas no Brasil – em que a língua indígena é a materna e a língua portuguesa é a segunda língua - e a observância de que o processo de escolarização, a denominada educação bilíngue indígena, como uma forma fundamental de garantir a essas comunidades o acesso à cidadania, dando a eles o direito de preservação de identidade, tanto por meio da preservação de sua língua materna, quanto por meio do acesso à língua oficial do país, o português, supomos que as vantagens em formar-se crianças e adultos bilíngues poderiam deslocar-se para a esfera social, podendo estar no poder de adaptação cultural, ou na capacidade de adquirir consciência intercultural e aceitação de outras culturas, de comunicação, enfim, podendo estar no respeito pela diversidade linguística e étnica advinda da convivência e da tolerância linguística. Em outras palavras, supomos, com respaldo na discussão do paradigma e da revolução científica que parece estabelecer-se, que as vantagens do bilinguismo poderiam extrapolar as fronteiras do cognitivo – como os processos de aprendizagem e comportamentos cerebrais - e adentrar nas do cognoscível – como aquilo que podemos vir a conhecer, ou aprender socialmente.

Discutimos ao longo deste trabalho que a mudança na interpretação do paradigma de uma vantagem cognitiva para a ideia de uma vantagem bilíngue social parece começar a consolidar- se principalmente no meio científico e que o pêndulo parece inclinar-se mais na direção de entender as vantagens do bi(-multi-)linguismo como sociais e comunicacionais, e não tanto para as antigas ideias de (des)vantagens cognitivas, com autores (CLARK, 2000;

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RAJAGOPALAN, 2009; de BRUIN et al., 2015; FAN et al., 2015) apontando para as vantagens sociais, culturais, comunicacionais, educacionais e até econômicas.

Observamos que essa tendência científica de enxergar-se uma vantagem bilíngue de ordem social – educacional, comunicacional, de empatia, de aceitação da cultura/ponto de vista do outro, econômicas, etc. - já são encontradas nos meios de comunicação, por meio de reportagens e matérias jornalísticas e como vimos a língua é fundadora do contexto social humano, sendo parte essencial da identidade (cultural) dos indivíduos e dos povos e é subjacente às questões econômicas em que nos inserimos, por um viés amplo em que as Ciências se entrecruzam.

Ao aprofundarmos a questão e valermo-nos de conceitos teóricos, trouxemos a definição de Jesús Martín-Barbero (2000: 12) de comunicação social sendo caracterizada como mais ampla e diferenciada da mera informação por ser impossível reduzi-la ao simples intercâmbio de mensagens. Segundo o autor, a comunicação social tem em sua constituição a especificidade sociocognitiva, quer dizer, tem a capacidade de produzir um sentido comum aos falantes, o que torna os sujeitos agentes das interações comunicativas por meio de suas identidades sociais. Desta forma, fica impossível a dissociação da língua(gem) – veículo da comunicação - da identidade do sujeito – ou sua identidade social – da comunicação social que só é possível em sua especificidade sociocognitiva, ou seja, a cognição como o entendimento amplo do conjunto de habilidades cerebrais/mentais necessárias para a obtenção de conhecimento sobre o mundo - as quais envolvem o pensamento, o raciocínio, a abstração, a linguagem, a memória, a atenção e a capacidade de resolução de problemas, entre outras funções (SIMONETTI, 2012: s/p) - e a produção de um sentido social.

Isso significa dizer que a comunicação social se faz entre os sujeitos e, por essa razão, suas identidades devem ser levadas em consideração na análise de suas comunicações. As identidades não são construídas pelos sujeitos, mas têm sua concepção nessas interações comunicativas que se estabelecem. Destacamos que para nós, a análise de Martín-Barbero (2000) é especificamente relevante porque leva em consideração os principais aspectos que desejávamos explorar teoricamente nessa pesquisa: a comunicação social em sua complexidade que vai além da simples troca de mensagens; a sua faceta sociocognitiva – que abarca a esfera social comum a todos e a produção de sentido aos envolvidos –; e as identidades culturais que emergem nesses agentes promotores da interação comunicativa.

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Estudamos todos esses elementos e teorias porque a temática do bilinguismo, aparentemente e simplificadamente falar/domininar pelo menos dois idiomas, tem como veículo primeiro a língua, mas como vimos língua é cultura, língua é poder e língua é identidade e para haver a comunicação (social) em uma ou mais línguas faz-se primordial o entendimento da sociocognição.

A sociocognição pode ser entendida, assim, como uma janela que se abre entre o mundo interno e biológico de um sujeito, por meio do conjunto de suas habilidades cerebrais/mentais individuais, e o mundo da coletividade de todos os sujeitos, a esfera social comum a todos, com a produção de sentido aos envolvidos. A indentidade (social) deste sujeito é a promotora da comunicação social, ou seja, a postura assumida por aquele sujeito, naquele meio social, ou a sua identidade social, faz a interface entre o que é específico de um indivíduo – sua cognição – e o que é comum a todos os indivíduos de sua espécie – a sociedade ou coletividade – sendo que por meio do sentido comum alcançado ocorre a comunicação, ou troca, ou interação (social).

Como analisamos, tanto quantitativamente quanto qualitativamente, a maioria absoluta, ou 82%, nos três idiomas, concordou em haver uma vantagem de ordem social em falantes bilíngues e que destes 71% afirmaram ainda concordar ou concordar plenamente com a existência desta vantagem social bilíngue. Conforme já mencionamos, sentimos ainda um aumento expressivo de mais de 20% no grau de concordância quando comparamos os resultados de uma confirmação de haver uma vantagem cognitiva para a confirmação de haver uma vantagem social ligada ao bilinguismo. Tais dados confirmam nossa hipótese inicial, ao formular o questionamento, de que uma vantagem social poderia, no senso-comum, ser mais facilmente associada ao bilinguismo do que uma de ordem cognitiva, uma vez que podemos ligar o bilinguismo ao desenvolvimento e ao exercício da cidadania, à tolerância linguístico- cultural, à melhor aceitação de modos de viver e cultura, enfim, habilidades intrinsecamente sociais e não cognitivas.

Na próxima questão, perguntamos se o participante acreditava que um bilíngue teria inevitavelmente um melhor salário na profissão do que um monolíngue (questões 32, 75 e 118, em português, inglês e espanhol). A afirmativa levava as perguntas 33, 76 e 119, respectivamente, de valoração da asseveração de acordo com a escala 1 (discordo

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plenamente), 2 (discordo), 3 (concordo medianamente), 4 (concordo) e 5 (concordo plenamente), nos três idiomas.

Dos 155 respondentes em português (pergunta 32), 77 ou 49.68% disseram acreditar em um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue, seguido por 72 ou 46.45% que disseram não acreditar e ainda 6 ou 3.87% que falaram que não sabiam (FIGURA 90).

Figura 90 – Resposta à indagação se os respondentes em português acreditavam que um bilíngue teria inevitavelmente um melhor salário em sua profissão do que um monolíngue: sim, não ou não sabiam.

Quanto à análise qualitativa em língua portuguesa (questão 33), dos 77 respondentes que disseram sim a afirmação anterior sobre haver um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue, 32 ou 41.56% valoraram 5 (concordar plenamente); 28 ou 36.36% valoraram como 4 (concordar); 15 ou 19.48% assinalaram 3 (concordar medianamente) e 1 ou 1.30% igualmente valoraram 2 (discordar) e 1 (discordar plenamente) - FIGURA 91. A média aritmética ficou em 4.16 significando que a média das respostas ficou mais próxima de 4.0, ou seja, 4 (concordo). Já o desvio padrão, 0.87, foi baixo, o que significa que o universo das respostas oscilou pouco e ficou entre aproximadamente 3.25 a 5, havendo pouca divergência entre as respostas fornecidas, portanto.

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Figura 91 – Figura de distribuição de respostas em língua portuguesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que que um bilíngue teria inevitavelmente um melhor salário em sua profissão do que um monolíngue e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Na análise quantitativa em língua inglesa (questão 75), dos 43 participantes, 28 ou 65.12%, a maioria absoluta marcou que sim; 15 ou 34.88% marcaram não concordar com a afirmação de que haveria um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue (FIGURA 92).

Figura 92 – Resposta à indagação se os respondentes em inglês acreditavam que um bilíngue teria inevitavelmente um melhor salário em sua profissão do que um monolíngue: sim, não ou não sabiam.

Em uma análise qualitativa, em língua inglesa (questão 76), dos 28 participantes que marcaram que sim na resposta anterior, 12 ou 42.86% marcaram 4 (concordar); 9 ou 32.14% assinalaram 5 (concordar plenamente); 5 ou 17.86% marcaram 3 (concordar medianamente); e 2 ou 7.14% marcaram 2 (discordar) de que haveria um melhor salário na

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profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue (FIGURA 93). A média aritmética ficou em 4.00 significando que a média das respostas ficou em 4 (concordo). Já o desvio padrão, 0.90, foi médio, o que significa que o universo das respostas oscilou um pouco, de aproximadamente 3.10 a 5, havendo certa divergência entre as respostas fornecidas.

Figura 93 – Figura de distribuição de respostas em língua inglesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que que um bilíngue teria inevitavelmente um melhor salário em sua profissão do que um monolíngue e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Na língua espanhola (pergunta 118), quantitativamente, dos 9 respondentes totais 6 ou 66.67%, ou a maioria absoluta dos respondentes respondeu que haveria um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue e 3 ou 33.33% afirmaram que não acreditavam nisso (FIGURA 94).

Figura 94 – Resposta à indagação se os respondentes em espanhol acreditavam que um bilíngue teria inevitavelmente um melhor salário em sua profissão do que um monolíngue: sim, não ou não sabiam.

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Já qualitativamente em língua espanhola (questão 119) dos 6 respondentes que concordaram com a pergunta anterior, 2 ou 33.33% valoraram igualmente como 5 (concordar plenamente), como 4 (concordar) e como 3 (concordar medianamente) que haveria um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue (FIGURA 95). A média aritmética ficou em 4.00 significando que a média das respostas ficou em 4 (concordo). Já o desvio padrão, 0.89, foi médio, o que significa que o universo das respostas oscilou um pouco, de aproximadamente 3.10 a 4.90, havendo certa divergência entre as respostas fornecidas.

Figura 95 – Figura de distribuição de respostas em língua espanhola na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que que um bilíngue teria inevitavelmente um melhor salário em sua profissão do que um monolíngue e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Comparando quantitativamente os dados obtidos nas três línguas, 50% em português marcou sim, 65% em inglês e 67% espanhol, o que significa que nas três línguas a maioria concordou com a afirmação de que haveria um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue, totalizando 111 participantes, ou 53%, dos 207 respondentes totais da pesquisa. Outro dado que consideramos relevante é a alta porcentagem de respondentes que acreditaram no contrário que não haveria um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue, 46% em português, 35% em inglês e 33% em espanhol, totalizando 90 participantes, ou 43%, dos 207 respondentes totais da pesquisa, diferença de cerca de 10% dos que concordaram. Tais dados indicam que para os entrevistados essa diferença salarial maior para um bilíngue não é tão óbvia ou inevitável assim.

Comparando qualitativamente as respostas nos três idiomas, a maioria ou 42% em língua portuguesa, a segunda maior porcentagem ou 32% em língua inglesa e 33% em língua espanhola valorou como 5 (concordar plenamente), totalizando 43 respondentes ou 21% da amostra total de 207 participantes da pesquisa apontando por haver um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue. Se adicionarmos a essa análise o dado

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de que 42 participantes nos três idiomas, ou 20% dos respondentes da amostra total, ainda marcaram 4 (concordar), 36% em português, 43% em inglês sendo a maioria da subamostra, e 33% em espanhol, teremos um total de 41% de todos os participantes, ou a maioria, afirmando concordar ou concordar plenamente com a existência de um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue.

A análise quantitativa comparativa nos três idiomas analisados apontou para uma alta porcentagem de respondentes totais, 43%, dizendo acreditar não haver um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue. As análises qualitativas eram feitas somente com os respondentes que concordaram com a afirmação de que haveria um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue e confirmaram essa porcentagem elevada de concordância inicial (54%), em língua portuguesa apenas 3% totais assinalaram 2 (discordar) ou 1 (discordar plenamente), 7% em língua inglesa marcaram 2 (discordar), maior porcentagem de todas as amostras e em língua espanhola não houve aqueles que discordassem (plenamente) da afirmação.

Segundo nosso levantamento teórico, Danielsson (2017) em sua exposição de dados para o Fórum Econômico Mundial afirmou que quando levam-se em consideração estudos como o Índice de Proficiência em Inglês, as recompensas financeiras associadas ao bilinguismo ou multilinguismo em todos os níveis realçavam-se, sendo que os estudos apresentados indicavam que altos índices de proficiência em inglês são apontados como financeiramente recompensadores em bilíngues ou multilíngues. Observamos também os dados trazidos por um estudo suíço que “constatou que o multilinguismo é estimado em contribuir em 10 por cento do PIB, provando que as habilidades linguísticas dos trabalhadores abrem mais mercados para os negócios suíços, favorecendo consideravelmente a economia como um todo” (DANIELSSON, 2017: s/p).

Ela também apontou que as desvantagens econômicas naqueles países menos abertos às pessoas bilíngues ou multilíngues são igualmente sentidas na economia. Na Grã-Bretanha o custo da chamada stubborn attachment em uma tradução livre, uma “fixação teimosa” à língua inglesa, que pode ser expressa como uma falta de vontade de investir-se de maneira significativa no aprendizado de outras línguas, foi estimada em perdas de impressionantes 48 bilhões de libras ao ano, ou 3.5 por cento do PIB (DANIELSSON, 2017: s/p); caso fosse feito um estudo como esse no Brasil, talvez também fosse concluído um número semelhante.

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Já no nível individual, gerentes bilíngues ou multilíngues também são valorizados e procurados em um crescente, sendo que os recrutadores e líderes da indústria consideram que eles estão melhor equipados para gerenciar negócios globais, relacionamentos e equipes (DANIELSSON, 2017: s/p). Outro dado aponta para quase 90% dos gerentes dizendo que, na opinião deles, o fato de se ter melhor comunicação internacional gera um melhor resultado no negócio. Vimos ainda que 79% das empresas que haviam investido em habilidades de seus trabalhadores em inglês tiveram aumento em suas vendas e que um estudo canadense de 2010 mostrou que os trabalhadores bilíngues recebiam de 3 a 7% a mais do que seus colegas monolíngues, dentre outros dados econômicos (id.).

Com base nesta teoria, formulamos a hipótese de que os respondentes afirmariam, em sua maioria, que haveria um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue, o que de fato confirmou-se, totalizando 111 participantes, ou 54%, a maioria absoluta dos 207 respondentes, portanto. A alta porcentagem de respondentes que discordaram desta afirmação, no entanto, não pode ser ignorada, totalizando 90 participantes, ou 43%, diferença de apenas cerca de 10% dos que concordaram com ela. Então, decidimos fazer o teste do qui-quadrado com esses dados e concluímos que o qui-quadrado calculado

(5.36) era menor do que o tabelado (9.5), então, não rejeitou-se H0 em prol de H1, o que significa que estava correta nossa afirmação de que a maioria dos entrevistados concordaria com a afirmação de que um bilíngue teria inevitavelmente um melhor salário na profissão do que um monolíngue.

Podemos tentar explicar esta alta discordância com base em outros dados como o de que 189 participantes ou 91% dos respondentes totais do universo de 207 da pesquisa apontaram que a língua portuguesa era sua língua materna. Independentemente destes respondentes serem brasileiros ou de outra nacionalidade, inferimos que a maioria absoluta deles seja brasileiro, já que 182 ou 88% afirmaram estar no Brasil no momento em que responderam à pergunta. Sabe-se que embora o Brasil receba imigrantes que têm a língua portuguesa como materna, de Portugal, Moçambique, Luanda, etc. esta porcentagem não é tão alta para inferirmos que a maioria dos respondentes dos que alegaram ter a língua portuguesa como materna ser de outra nacionalidade que não a brasileira.

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Posto isso, retomemos os dados de Danielsson (2017) e a “fixação teimosa” britânica ao não incentivo do aprendizado de um idioma estrangeiro. Se transpusermos que, semelhantemente, ocorre no Brasil, um país em que apenas o idioma oficial português é valorizado na nação, cruzaremos este dado com o já exposto da reportagem da Istoé, em que são estimados que apenas cerca de 5% fale um segundo idioma sendo que “O domínio do inglês entre os brasileiros é tão baixo que o país ocupa a 41ª colocação de um ranking de 70 países desenvolvido pela EF Education First.” (RODRIGUES, 2016: s/p). Vimos que na pesquisa do Mundo Poliglota, estimou-se que no Brasil em 2012, 5.132 milhões de pessoas alegaram possuir nível alto ou muito alto em um segundo idioma, como o inglês, o que corresponde a 2,54% da população do país de 220 milhões, segundo a pesquisa do IBOPE 2012 e que comparando esses dados aos brasileiros, no Brasil há cerca de 2.54% de bilíngues e no mundo 43% (QUANTOS POLIGLOTAS EXISTEM NO BRASIL, 2014: s/p). Esses dados podem levar à corroboração de nossa hipótese de que possa haver uma “fixação teimosa” do brasileiro à língua portuguesa que justificaria a alta porcentagem de 43% dos entrevistados totais discordando da afirmação de que haveria um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue, uma vez que a vasta maioria dos brasileiros é monolíngue.

A partir do próximo questionamento, perguntamos sobre o ‘Ensino Bilíngue’ brasileiro e internacional, ou aquele praticado pelas escolas bilíngues e internacionais. Na primeira pergunta quisemos saber se o participante tivesse a oportunidade de matricular-se, ou de matricular algum parente em uma “escola bilíngue” ou uma “escola internacional”, ele o faria (questões 34, 77 e 121, em português, inglês e espanhol). As escalas de valor não eram mais disponibilizadas a partir desta pergunta, com exceção da última pergunta, a qual era direcionada somente aos que alegavam trabalhar em uma escola bilíngue ou internacional, (questões 44, 87 e 131, respectivamente).

Dos 155 respondentes em português (pergunta 34), 133 ou 85.81%, ou a maioria disse que sim que matricular-se-ia, ou a um parente, em uma escola bilíngue ou internacional, seguido por 12 ou 7.74% que disseram não e ainda 10 ou 6.45% que falaram que não sabiam (FIGURA 96).

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Figura 96 – Resposta à indagação se os respondentes em português matriculariam a si ou a um parente em uma escola bilíngue ou internacional: sim, não ou não sabiam.

Em língua inglesa, dos 43 participantes (pergunta 77), 40 ou 93.02%, a maioria absoluta marcou que sim; 3 ou 6.98% marcaram que não se matriculariam, ou a um parente, em uma escola bilíngue ou internacional (FIGURA 97).

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Figura 97 – Resposta à indagação se os respondentes em inglês matriculariam a si ou a um parente em uma escola bilíngue ou internacional: sim, não ou não sabiam.

Na língua espanhola (pergunta 121) dos 9 respondentes totais 7 ou 77.78%, ou a maioria absoluta dos respondentes disse que se matricularia, ou a um parente, em uma escola bilíngue ou internacional e 2 ou 22.22% disseram que não (FIGURA 98).

Figura 98 – Resposta à indagação se os respondentes em espanhol matriculariam a si ou a um parente em uma escola bilíngue ou internacional: sim, não ou não sabiam.

Comparando os dados obtidos nas três línguas, 86% em português marcaram sim, 93%, em inglês e 78% espanhol, o que significa que, nas três línguas, a maioria absoluta disse que se matricularia, ou a um parente, em uma escola bilíngue ou internacional, totalizando 180 participantes, ou 86%, dos 207 respondentes totais da pesquisa. Cruzaremos esses dados com os da pergunta de se considerarem ou não bilíngues, em português 62%, em inglês 86% e em espanhol 89% alegaram-se bilíngues, num total de 69%. Nas parciais, em português há um aumento de cerca de 24%, o que significa que embora somente 62% consideravam-se bilíngues e, portanto, naturalmente talvez desejassem um ‘Ensino Bilíngue’ para si ou para seus filhos, 24% a mais deles desejaram matricular seus filhos nessas escolas. Em inglês, houve um aumento de cerca de 7%, cerca de 86% declaram-se bilíngues e 93% matricular-se- iam ou a um parente nessas escolas. Em espanhol, houve uma ligeira queda deste porcentual,

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cerca de 89% declaram-se bilíngues e 78% disseram que se matriculariam ou a um parente em um ‘Ensino Bilíngue’, queda de 11%, o que pode indicar que uma porcentagem dos bilíngues não gostariam que seus parentes, ou eles mesmos, estudassem nesse tipo de ensino. Na porcentagem total, no entanto, houve um aumento, cerca de 76% afirmaram que se matriculariam ou a um parente em um ‘Ensino Bilíngue’ e cerca de 67% consideraram-se bilíngues, um aumento de 9% o que pode indicar que dos cerca de 31% dos 65 participantes do total da amostra de 207 participantes, uma porcentagem dos que não se consideraram bilíngues podem também desejar um ‘Ensino Bilíngue’ para si ou para algum parente, além dos próprios bilíngues que não o desejassem, obviamente.

A alta porcentagem total de respondentes, nos três idiomas, que afirmaram querer para si ou para algum parente um ‘Ensino Bilíngue’, ou 86%, está alinhada ao que pesquisamos, as escolas internacionais têm fila de espera para a matrícula e selecionam seus ingressantes por critérios de parentesco e amizade, critérios socioeconômicos e de prestígio segundo Cantuaria (2005: 6-7), embora as altas mensalidades. Segundo uma das reportagens que trouxemos: “Todas as boas escolas internacionais de São Paulo têm listas de espera de alunos”’ (VIEIRA, 2017: s/p). O mesmo pode ser observado quanto às escolas bilíngues mais privilegiadas o que criou um espaço das “boas escolas”, que gozam de uma visibilidade, capaz de as colocar em posição de concorrer com as instituições que possuam essas mesmas características, inserindo-as nesse espaço escolar mais amplo, extremamente hierarquizado e competitivo (CANTUARIA, 2005: 7).

Nossa hipótese inicial era a de que os respondentes iriam afirmar, em sua maioria, que gostaria de matricular-se, ou a um parente, nesse tipo de instituição educacional, uma vez que nossas pesquisas apontaram para um crescente número, muito expressivo, destas escolas no Brasil, o que indica que há um interesse do público nelas. Houve a confirmação de nossa hipótese inicial e a porcentagem de 76% de interesse no ‘Ensino Bilíngue’, ou mais de três quartos de todos os entrevistados por nós, é muito expressiva e confirma alguns dados levantados por nós como os de 11 anos atrás para a revista Istoé de Antunes e Todeschini (2007: 100) que afirmaram haver um aumento de 25% no número de escolas de alfabetização simultânea de dois idiomas no Brasil até 2007, sendo que destas, 90% ensinavam além do português o inglês, até os impressionantes dados de 2 anos atrás do Programa Bilíngue da franquia International School (IS), que alegou que somente em 2016 teve um crescimento de 1700% no

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número de alunos, e de 485% em número de escolas que implementaram seu programa. Conforme frisamos ao longo desta tese, ainda não foi feito um Censo do número de escolas que se autointitulam bilíngues ou internacionais no país, o que nos obriga a recorrer aos dados das próprias escolas, da mídia e de pesquisas científicas para traçarmos referenciais.

A próxima pergunta (questões 35, 78 e 122, em português, inglês e espanhol) só era respondida por aqueles que assinalaram sim na pergunta anterior (se o participante tivesse a oportunidade de matricular-se, ou de matricular algum parente em uma “escola bilíngue” ou uma “escola internacional”, ele o faria), uma vez que queríamos saber se o participante considerava que a mídia exercia influência sobre as pessoas ambicionarem um estudo bilíngue atualmente. Os que assinalaram não querer um estudo bilíngue não teriam como responder sobre a possível influência da mídia nesta ambição.

Dos 133 respondentes cujas respostas foram coletadas em português (pergunta 35), 99 ou 74.44%, ou a maioria absoluta disse que sim que considerava que a mídia exercia influência sobre as pessoas ambicionarem um estudo bilíngue atualmente, seguido por 29 ou 21.80% que disseram não e ainda 5 ou 3.76% que falaram que não sabiam (FIGURA 99).

Figura 99 – Resposta à indagação se os respondentes em português consideravam que a mídia exercia influência sobre as pessoas ambicionarem um estudo bilíngue atualmente: sim, não ou não sabiam.

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Em língua inglesa, dos 36 participantes (pergunta 78), 36 ou 90%, a maioria absoluta marcou que sim; 3 ou 6.98% marcaram que não consideravam que a mídia exercia influência sobre as pessoas ambicionarem um estudo bilíngue atualmente (FIGURA 100).

Figura 100 – Resposta à indagação se os respondentes em inglês consideravam que a mídia exercia influência sobre as pessoas ambicionarem um estudo bilíngue atualmente: sim, não ou não sabiam.

Na língua espanhola (pergunta 122) dos 7 respondentes totais 6 ou 85.71%, ou a maioria absoluta disse que considerava que a mídia exercia influência sobre as pessoas ambicionarem um estudo bilíngue atualmente e 1 ou 14.29% disse que não (FIGURA 101).

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Figura 101 – Resposta à indagação se os respondentes em espanhol consideravam que a mídia exercia influência sobre as pessoas ambicionarem um estudo bilíngue atualmente: sim, não ou não sabiam.

Comparando os dados obtidos nas três línguas, 74% em português marcaram sim, 90% em inglês e 86% espanhol, o que significa que, nas três línguas, a maioria absoluta disse que considerava que a mídia exercia influência sobre as pessoas ambicionarem um estudo bilíngue atualmente, totalizando 141 participantes, ou 68%, dos 207 respondentes totais da pesquisa.

Ao longo desta tese trouxemos muitas reportagens, de autores, de diferentes países e nacionalidades, e de áreas do conhecimento distintas sobre a temática do bilinguismo para ilustrar a influência da mídia na formação das opiniões do senso-comum. Somente como algumas dessas reportagens citamos os autores Bijeljac-Babi ‘C (2010), Bhattacharjee (2012), Desjardins (2015), Dino (2018) e Danielsson (2018), dentre tantos outros. Como já afirmamos, a própria acepção da palavra mídia pode ser interpretada como um suporte de difusão da informação, o qual constitui em um meio intermediário de expressão, capaz de transmitir mensagens, sendo a nossa intenção a de observar a capacidade da mídia de promover a difusão de informações de um nicho mais especializado de conhecimento – da comunidade científica – para esse amplo espectro populacional – população em geral, e sua atuação na formação das ideias do senso-comum dos cidadãos ao trazermos todas essas reportagens. Como não poderíamos indagar sobre uma possível percepção da influência da mídia em todos os questionamentos, restringimo-nos à essa pergunta. Nossa hipótese inicial era a de que os

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respondentes afirmariam que consideravam que a mídia exercia influência sobre as pessoas ambicionarem um estudo bilíngue atualmente devido ao grande destaque e a positividade com que o bilinguismo é tratado nos meios de comunicação social, o que foi confirmado pela alta porcentagem geral desta confirmação - a maioria absoluta, 68%, respondeu sim, nos três idiomas, confirmando que acreditavam que a mídia exercia influência em seu desejo de ter um ‘Ensino Bilíngue’, como vimos.

A próxima indagação (questões 36, 79 e 123, em português, inglês e espanhol) perguntava se para os participantes existiam diferenças entre uma escola bilíngue e uma escola internacional e, se houvesse, quais seriam. Os respondentes poderiam assinalar quantas alternativas quisessem dentre as cinco que disponibilizamos: a. Não há diferença entre escola bilíngue e internacional já que ambas ensinam em pelo menos dois idiomas; b. Sim, a escola bilíngue segue o currículo do país em que está, mas também oferece algumas matérias em idiomas estrangeiros; c. Sim, a escola internacional segue um currículo de outro país; d. Sim, a escola internacional prepara os alunos para universidades em outros países; e. Sim, a escola internacional oferece certificações internacionais.

Dos 155 respondentes em português (pergunta 36) foram computadas 319 indicações diferentes em todas as alternativas disponíveis, das quais 108 marcações ou 69.7%, ou a maioria absoluta assinalou a alternativa b (sim, a escola bilíngue segue o currículo do país em que está, mas também oferece algumas matérias em idiomas estrangeiros); 72 marcações ou 46.5% na alternativa c (sim, a escola internacional segue um currículo de outro país); 67 ou 43.2% responderam alternativa e (sim, a escola internacional oferece certificações internacionais; outros 62 ou 40% responderam alternativa d (sim, a escola internacional prepara os alunos para universidades em outros países); e 10 ou 6.5% alternativa a (não há diferença entre escola bilíngue e internacional já que ambas ensinam em pelo menos dois idiomas) - FIGURA 102. O total de respostas afirmativas – alternativas de b, c, d e e – foi de 309 ou 98.86% do total de 319 respostas, o que significa que apenas 10 ou 3.13% das respostas totais afirmaram não haver diferenças entre a escola bilíngue e a internacional em sua opinião.

Em nossa análise de critérios distintivos das escolas bilíngues e internacionais, em língua portuguesa, a maioria apontou o critério do currículo do país em que a escola está ou de outro país-referência como principal diferenciador das duas escolas - alternativas b e c. O segundo

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critério por eles apontado foi o de preparação para uma universidade fora do Brasil – alternativa d – e o terceiro a oferta de certificações internacionais – alternativa e.

Figura 102 – Resposta à indagação se para os respondentes em português existiam diferenças entre uma escola bilíngue e uma escola internacional e quais seriam: a. Não há diferença entre escola bilíngue e internacional já que ambas ensinam em pelo menos dois idiomas; b. Sim, a escola bilíngue segue o currículo do país em que está, mas também oferece algumas matérias em idiomas estrangeiros; c. Sim, a escola internacional segue um currículo de outro país; d. Sim, a escola internacional prepara os alunos para universidades em outros países; e. Sim, a escola internacional oferece certificações internacionais.

Os 43 participantes em inglês (pergunta 79) geraram 94 indicações diferentes em todas as alternativas disponíveis, das quais 29 marcações ou 67.4%, ou a maioria absoluta assinalou a alternativa b (sim, a escola bilíngue segue o currículo do país em que está, mas também oferece algumas matérias em idiomas estrangeiros); 20 marcações ou 46.5% na alternativa c (sim, a escola internacional segue um currículo de outro país) e mais 20 ou 46.5 na alternativa d (sim, a escola internacional prepara os alunos para universidades em outros países); 18 ou 41.9% responderam alternativa e (sim, a escola internacional oferece certificações internacionais; e 7 ou 16.3% alternativa a (não há diferença entre escola bilíngue e internacional já que ambas ensinam em pelo menos dois idiomas) - FIGURA 103. O total de respostas afirmativas – alternativas de b, c, d e e – foi de 87 ou 92.55% do total de 94 respostas, o que significa que apenas 7 ou 7.44% das respostas totais afirmaram não haver diferenças entre a escola bilíngue e a internacional em sua opinião.

Na análise de critérios distintivos das escolas bilíngues e internacionais, em língua inglesa, a maioria também apontou o critério do currículo seguido ser o do país em que a escola está ou de outro país-referência como principal diferenciador das duas escolas - alternativas b e c –

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igualmente seguido pelo critério de preparação para uma universidade fora do Brasil – alternativa d – e o da oferta de certificações internacionais – alternativa e.

Figura 103 – Resposta à indagação se para os respondentes em inglês existiam diferenças entre uma escola bilíngue e uma escola internacional e quais seriam: a. Não há diferença entre escola bilíngue e internacional já que ambas ensinam em pelo menos dois idiomas; b. Sim, a escola bilíngue segue o currículo do país em que está, mas também oferece algumas matérias em idiomas estrangeiros; c. Sim, a escola internacional segue um currículo de outro país; d. Sim, a escola internacional prepara os alunos para universidades em outros países; e. Sim, a escola internacional oferece certificações internacionais.

Os 9 respondentes em espanhol (pergunta 123) geraram um total de 22 indicações diferentes nas cinco alternativas disponíveis, das quais 7 marcações ou 77.8%, ou a maioria absoluta assinalou a alternativa d (sim, a escola internacional prepara os alunos para universidades em outros países); 5 ou 55.6% na alternativa e (sim, a escola internacional oferece certificações internacionais); 4 marcações ou 44.4% na alternativa b (sim, a escola bilíngue segue o currículo do país em que está, mas também oferece algumas matérias em idiomas estrangeiros) e 4 ou 44.4% na alternativa c (sim, a escola internacional segue um currículo de outro país); e 2 ou 22.2% alternativa a (não há diferença entre escola bilíngue e internacional já que ambas ensinam em pelo menos dois idiomas) - FIGURA 104. O total de respostas afirmativas – alternativas de b, c, d e e – foi de 20 ou 90.90% do total de 22 respostas, o que significa que apenas 2 ou 9.09% das respostas totais afirmaram não haver diferenças entre a escola bilíngue e a internacional em sua opinião.

Na análise de critérios distintivos das escolas bilíngues e internacionais, em língua espanhola, a maioria apontou o critério d ou o de preparação para uma universidade fora do Brasil. O segundo critério foi o da oferta de certificações internacionais – alternativa e – e somente o terceiro critério foi em relação ao currículo ser o do país em que a escola está ou de outro país- referência, como diferenciador das duas escolas - alternativas b e c.

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Figura 104 – Resposta à indagação se para os respondentes em espanhol existiam diferenças entre uma escola bilíngue e uma escola internacional e quais seriam: a. Não há diferença entre escola bilíngue e internacional já que ambas ensinam em pelo menos dois idiomas; b. Sim, a escola bilíngue segue o currículo do país em que está, mas também oferece algumas matérias em idiomas estrangeiros; c. Sim, a escola internacional segue um currículo de outro país; d. Sim, a escola internacional prepara os alunos para universidades em outros países; e. Sim, a escola internacional oferece certificações internacionais.

Comparando os dados obtidos nas três línguas, quantitativamente, a maioria absoluta disse que considerava que sim, afirmou haver diferenças entre a escola bilíngue e a internacional em sua opinião, 99% do total de respostas em língua portuguesa, 93% em língua inglesa e 91% em língua espanhola, em todos os casos uma porcentagem muito perto da totalidade de respondentes. Com relação às alternativas mais assinaladas, 70% em português e 67%, em inglês, a maioria absoluta assinalou a alternativa b (sim, a escola bilíngue segue o currículo do país em que está, mas também oferece algumas matérias em idiomas estrangeiros) e em espanhol a 78%, ou a maioria absoluta assinalou a alternativa d (sim, a escola internacional prepara os alunos para universidades em outros países). Isso significa que para os respondentes em português e inglês o principal critério distintivo entre escolas bilíngues e internacionais é o critério do currículo seguido (ser o do país em que a escola está, ou seguir o currículo de outro país); e, em língua espanhola, é o de preparação para uma universidade fora do Brasil, oferecido pela escola internacional principalmente.

Nossa hipótese era a de que os respondentes não saberiam diferenciar as escolas bilíngues das internacionais em uma porcentagem alta, o que fez com que nossa hipótese inicial fosse frustrada. Como vimos em reportagens, ou em nossas conversas com professores, alunos, pessoas do nosso círculo, etc. os termos de definição das escolas internacional e bilíngue nem sempre são do conhecimento geral, como vimos na reportagem, no trecho “outra escola

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bilíngue, a Internacional de São Paulo” (VIEIRA, 2017: s/p). Acreditamos que a principal razão para que a porcentagem de concordância de existirem diferenças entre a escola bilíngue e a internacional ter ficado acima de 91%, nos três idiomas, foi a própria formulação da pergunta que tinha as alternativas com as diferenças ali elencadas disponíveis desde um primeiro momento. Isso pode ter levado à quase totalidade dos respondentes a pensar nas supostas diferenças, diferentemente da situação em que se providencia apenas sim, não e não sei e somente os que marcam sim teriam acesso as alternativas com as supostas diferenças elencadas, tal qual fizemos nas outras perguntas desta pesquisa.

A próxima pergunta (questões 37, 80 e 124, em português, inglês e espanhol) foi se os participantes acreditavam que uma escola intitulada ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional – tinha mensalidades mais altas do que uma escola regular. Dos 155 respondentes em português (pergunta 37), 142 ou 91.61%, ou a maioria absoluta disse que sim, acreditava que uma escola intitulada ‘Escola Bilíngue’ tinha mensalidades mais altas do que uma escola regular, seguido por 8 ou 5.16% que disseram não e ainda 5 ou 3.23% que falaram que não sabiam (FIGURA 105).

Figura 105 – Resposta à indagação se os respondentes em português acreditavam que uma escola intitulada ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional – tinha mensalidades mais altas do que uma escola regular: sim, não ou não sabiam.

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Dos 43 participantes em inglês (pergunta 80), 34 ou 79.07%, ou a maioria absoluta disse que sim, acreditava que uma escola intitulada ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional – tinha mensalidades mais altas do que uma escola regular, seguido por 6 ou 13.95% que disseram não e ainda 3 ou 6.98% que falaram que não sabiam (FIGURA 106).

Figura 106 – Resposta à indagação se os respondentes em inglês acreditavam que uma escola intitulada ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional – tinha mensalidades mais altas do que uma escola regular: sim, não ou não sabiam.

Dos 9 respondentes em espanhol (pergunta 124), 8 ou 88.89%, ou a maioria absoluta disse que sim, acreditava que uma escola intitulada ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional – tinha mensalidades mais altas do que uma escola regular, seguido por 1 ou 11.11% que disse não (FIGURA 107).

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Figura 107 – Resposta à indagação se os respondentes em espanhol acreditavam que uma escola intitulada ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional – tinha mensalidades mais altas do que uma escola regular: sim, não ou não sabiam.

Comparando os dados obtidos nas três línguas, a maioria absoluta, nos três idiomas, afirmou que acreditava que uma escola intitulada ‘Escola Bilíngue’ tinha mensalidades mais altas do que uma escola regular, 92% do total de respostas em língua portuguesa, 79% em língua inglesa e 89%, em língua espanhola, totalizando 185 respondentes ou 89% dos 207 participantes totais da pesquisa. Isso significa dizer que aproximadamente 89% do universo pesquisado acreditam que o ‘Ensino Bilíngue’ seja mais oneroso do que um ensino regular ou não bilíngue ou internacional.

Conforme levantamos em nossa pesquisa teórica, o ‘Ensino Bilíngue’ é mais caro do que o regular, sendo voltado para as classes A e B majoritariamente: “Escolas bilíngues com mensalidades que começam em R$ 6 mil estreiam em São Paulo e movimentam-se para atrair alunos das famílias abastadas da cidade.” (VIEIRA, 2017: s/p) e, como já mencionamos, o autor da reportagem Paulo Vieira intercambia os termos escola bilíngue e internacional entre si, o que implica em dizer que ambas têm valores como esse como ponto de partida. Desta forma, nossa hipótese inicial era a de que os participantes considerariam o ‘Ensino Bilíngue’ mais custoso do que um ensino regular (com mensalidades a partir de R$ 1.500,00), o que foi confirmado.

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O próximo questionamento (questões 38, 81 e 125, em português, inglês e espanhol) indagou se os participantes achavam justificado que uma escola ‘Escola Bilíngue’ fosse mais cara do que uma escola regular. Dos 155 respondentes em português (pergunta 38), 91 ou 58.71%, ou a maioria absoluta disse que sim acreditavam que era justo uma escola ‘Escola Bilíngue’ ter mensalidades mais altas do que uma escola regular, seguido por 56 ou 36.13% que disseram não e ainda 8 ou 5.16% que falaram que não sabiam (FIGURA 108).

Figura 108 – Resposta à indagação se os respondentes em português achavam justificado que uma escola ‘Escola Bilíngue’ tivesse mensalidades mais altas do que uma escola regular: sim, não ou não sabiam.

Dos 43 participantes em inglês (pergunta 81), 27 ou 62.79%, ou a maioria absoluta disse que sim que era justo uma escola ‘Escola Bilíngue’ ter mensalidades mais altas do que uma escola regular, seguido por 15 ou 34.88% que disseram não e ainda 1 ou 2.33% que falaram que não sabiam (FIGURA 109).

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Figura 109 – Resposta à indagação se os respondentes em inglês achavam justificado que uma escola ‘Escola Bilíngue’ tivesse mensalidades mais altas do que uma escola regular: sim, não ou não sabiam.

Dos 9 respondentes em espanhol (pergunta 125), 6 ou 66.67%, ou a maioria absoluta disse que sim, acreditava ser justo uma escola ‘Escola Bilíngue’ ter mensalidades mais altas do que uma escola regular, seguido por 3 ou 33.33% que disseram não achar justificado (FIGURA 110).

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Figura 110 – Resposta à indagação se os respondentes em espanhol achavam justificado que uma escola ‘Escola Bilíngue’ tivesse mensalidades mais altas do que uma escola regular: sim, não ou não sabiam.

Comparando os dados obtidos nas três línguas, a maioria absoluta, nos três idiomas, afirmou que acreditava ser justo uma escola ‘Escola Bilíngue’ ter mensalidades mais altas do que uma escola regular, 59%do total de respostas em língua portuguesa, 63%, em língua inglesa e 67% em língua espanhola, totalizando 124 respondentes ou 60% dos 207 participantes totais da pesquisa. Isso significa dizer que aproximadamente 60% do universo pesquisado acreditam ser justificado que o ‘Ensino Bilíngue’ seja mais oneroso do que um ensino regular ou não bilíngue ou internacional.

Segundo a teoria que pesquisamos, exposta no Capítulo III como um todo - resumimos aqui alguns pontos - a escola chamada de bilíngue geralmente ensina dois currículos, um em língua portuguesa e outro na língua-alvo, necessitando da presença tanto de professores quanto de alunos em mais de um período na escola. A escola internacional, por sua vez, ao seguir o currículo de outro país, no geral, também tem uma carga horária maior do que a brasileira. Fora isso, os professores do ‘Ensino Bilíngue’ têm que ser treinados para ensinar o currículo na língua-alvo e ter proficiência em outros idiomas para conseguirem desenvolver suas aulas. Se juntarmos a essas razões o dado de que o domínio do inglês entre os ocupa a 41ª colocação de um ranking de 70 países desenvolvido pela EF Education First (RODRIGUES, 2016: s/p) e

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que a formação dos professores em pedagogia é considerada ruim por donos das escolas (VIEIRA, 2017: s/p), podemos inferir que há gastos na formação dos profissionais que atuam nas escolas do ‘Ensino Bilíngue’ brasileiro, voltada para as classes A e B de nosso país. Essas e outras razões elencadas por nós, ao longo desta pesquisa, justificam os preços mais elevados deste tipo de estudo confirmando nossa hipótese inicial de que os participantes iriam concordar que era justificado o ‘Ensino Bilíngue’ ser mais custoso que um ensino regular.

A próxima pergunta (questões 39, 82 e 126, em português, inglês e espanhol) queria saber se os respondentes haviam estudado ou ainda estudavam em uma ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional. Dos 155 respondentes em português (pergunta 39), 144 ou 92.90%, ou a maioria absoluta disse que não haviam estudado ou ainda estudavam em uma ‘Escola Bilíngue’, seguido por 7 ou 4.52% que disseram sim, em escola bilíngue e ainda 4 ou 2.58% que falaram que sim, em escola internacional (FIGURA 111).

Figura 111 – Resposta à indagação se os respondentes em português haviam estudado ou estudavam em uma ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional: sim, bilíngue; sim, internacional ou não.

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Dos 43 participantes em inglês (pergunta 82), 32 ou 74.42%, ou a maioria absoluta disse que não haviam estudado ou ainda estudavam em uma ‘Escola Bilíngue’, seguido por 7 ou 16.28% que disseram sim, em escola bilíngue e ainda 4 ou 9.30% que falaram que sim, em escola internacional (FIGURA 112).

Figura 112 – Resposta à indagação se os respondentes em inglês haviam estudado ou estudavam em uma ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional: sim, bilíngue; sim, internacional ou não.

Dos 9 respondentes em espanhol (pergunta 126), 6 ou 66.67%, ou a maioria absoluta disse que não haviam estudado ou ainda estudavam em uma ‘Escola Bilíngue’, seguido por 3 ou 33.33% que disseram sim, em escola bilíngue e sendo que ninguém apontou estudar ou ter estudado em uma escola internacional (FIGURA 113).

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Figura 113 – Resposta à indagação se os respondentes em espanhol haviam estudado ou estudavam em uma ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional: sim, bilíngue; sim, internacional ou não.

Comparando os dados obtidos nas três línguas, a maioria absoluta, nos três idiomas, afirmou que não havia estudado ou ainda estudava em uma ‘Escola Bilíngue’ - 93% do total de respondentes em língua portuguesa, 74%, em língua inglesa e 67% em língua espanhola - totalizando 182 participantes ou 88% dos 207 totais da pesquisa. Isso quer dizer que apenas 12% do total estudavam/estudaram, ou seja, 25 respondentes, dos quais 17 (8%) participantes, ou 68% da subamostra total dos que alegaram sim estudavam em uma escola bilíngue, e 8 (4%) ou 32% em uma escola internacional. Assim, do total que alegou estudar em uma instituição que promovia o ‘Ensino Bilíngue’ a maioria absoluta, nos três idiomas, indicou estudar ou ter estudado em uma escola bilíngue (68%).

Segundo a teoria pesquisada, essas instituições, bilíngues e internacionais, são voltadas para a elite e são elitistas, como vimos na pesquisa de Cantuaria: “Em maior ou menor grau, são também bastante seletivas, não apenas em termos do alto valor das anuidades exigidas para a admissão [...] Além disso, a própria localização da escola tem um impacto significativo na seleção da clientela (CANTUARIA, 2005: 6-7). Vimos que isso criou um espaço das “boas escolas particulares” e que as demais escolas particulares investem em diferenciais para não ficarem em desvantagem, o que acarretou o surgimento de franquias que vendem os

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programas bilíngues para as escolas regulares: “O acirramento da concorrência entre as escolas particulares as leva a buscar ‘diferenciais’ para se destacar no ‘mercado’, e franquias rapidamente se formam para atender essa demanda.” (EDUCAÇÃO BILÍNGUE NO BRASIL, 2014: s/p). As escolas regulares, assim, viram uma mudança no comportamento do mercado, em que foram identificados os anseios dos pais dos alunos que passaram a buscar o ‘Ensino Bilíngue’ em uma proporção muito maior.

A nossa hipótese inicial era a de que uma pequena parcela dos participantes desta pesquisa estudasse ou tivesse estudado no ‘Ensino Bilíngue’, uma vez que esse ensino é extremamente elitista, ou seja, apenas as classes mais privilegiadas da classe A e parte da B têm acesso a ele. Os resultados desta pesquisa, conforme já mencionamos, apontaram para 143 participantes ou 69%, nos três idiomas, como pertencentes às classes A e B, referência brasileira, faixa dos que recebiam entre R$103.632,00 a R$135.144,00 por ano. Mesmo que a maioria dos respondentes desta pesquisa tenham alegado pertencer a classe A ou B, acreditávamos que este elitismo extremo do ‘Ensino Bilíngue’, principalmente do brasileiro (a maioria absoluta, ou 88% disseram estar no Brasil) refletir-se-ia em nossos dados, o que de fato confirmou-se nos 12% do total de respondentes da pesquisa dizendo ter tido ou ter esse tipo de ensino. O que analisamos na teoria é que esse nicho, do ‘Ensino Bilíngue’, é extremamente restrito, elitizado, hierarquizado e desejado, e que essas características ao mesmo tempo o distinguem e servem de modelo para os demais segmentos de ensino que tentam copiá-lo.

O próximo questionamento (questões 40, 83 e 127, em português, inglês e espanhol) queria saber se para os respondentes existiam vantagens em se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional. Dos 155 respondentes em português (pergunta 40), 146 ou 94.19%, ou a maioria absoluta disse que sim existiam vantagens em se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’, seguido por 6 ou 3.87% que disseram não saber e ainda 3 ou 1.94% que falaram que não (FIGURA 114).

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Figura 114 – Resposta à indagação se para os respondentes em português existiam vantagens em se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional: sim, não ou não sei.

Dos 43 participantes em inglês (pergunta 83), 38 ou 88.37%, ou a maioria absoluta disse que sim existiam vantagens em se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’, seguido por 3 ou 6.98% que disseram não saber e ainda 2 ou 4.65% que falaram que não (FIGURA 115).

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Figura 115 – Resposta à indagação se para os respondentes em inglês existiam vantagens em se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional: sim, não ou não sei.

Dos 9 respondentes em espanhol (pergunta 127), 8 ou 88.89%, ou a maioria absoluta disse que sim existiam vantagens em se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’, seguido por 1 ou 11.11% que falou que não existiam vantagens em se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’ (FIGURA 116).

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Figura 116 – Resposta à indagação se para os respondentes em espanhol existiam vantagens em se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional: sim, não ou não sei.

Comparando os dados obtidos nas três línguas, a maioria absoluta, nos três idiomas, afirmou que que sim existiam vantagens em se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’ – 94% do total de respondentes em língua portuguesa, 88%, em língua inglesa e 89% em língua espanhola - totalizando 192 participantes ou 93% dos 207 totais da pesquisa. Ao longo desta tese trouxemos numerosos exemplos de reportagens da mídia, brasileira e internacional, além de estudos científicos de áreas diferentes do conhecimento – fisiologia, economia, psicologia, educação, direitos humanos, literatura, estudos culturais, história, antropologia, etc. – que apontavam para as vantagens do bilinguismo e para as vantagens do ensino feito em dois idiomas ou ‘Ensino Bilíngue’. Esse embasamento teórico fez-nos lançar a hipótese de que encontraríamos a maioria absoluta dos participantes respondendo que haveria vantagens em se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional – o que se confirmou nos cerca de 93% respondendo sim, nos três idiomas, a essa pergunta.

A próxima pergunta (questões 41, 84 e 128, em português, inglês e espanhol) só era respondida por aqueles que assinalaram sim na pergunta anterior, ou seja, seria respondida somente por aqueles que disseram que existiam vantagens em se estudar em uma ‘Escola

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Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional. Os respondentes poderiam assinalar quantas alternativas quisessem dentre as cinco que disponibilizamos: a. falar/dominar um outro idioma; b. aprender a respeitar outras culturas e pessoas; c. obter alguma certificação internacional no idioma; d. conhecer novas culturas por meio de seus idiomas; e. ter um melhor salário no futuro.

Dos 146 respondentes em português (pergunta 41) foram computadas 493 indicações diferentes em todas as alternativas disponíveis, das quais 136 ou 93.2%, ou a maioria absoluta assinalou a alternativa a (falar/dominar um outro idioma); 115 marcações ou 78.8%, também a maioria absoluta, na alternativa d (conhecer novas culturas por meio de seus idiomas); 93 ou 63.7%, também a maioria absoluta respondeu alternativa b (aprender a respeitar outras culturas e pessoas); outros 80 ou 54.8%, também a maioria absoluta respondeu alternativa c (obter alguma certificação internacional no idioma); e 69 ou 47.3% alternativa e (ter um melhor salário no futuro) - FIGURA 117. As respostas em língua portuguesa que tiveram porcentagens acima de 51%, ou maioria absoluta, foram as das alternativas a, b, c e d, totalizando 424 ou 86% das 493 indicações totais, o que significa que os critérios ligados à língua e cultura – a-d - foram considerados mais relevantes dos que o critério econômico – alternativa e.

Figura 117 – Resposta à indagação de quais seriam as vantagens para os respondentes em português de se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’: a. falar/dominar um outro idioma; b. aprender a respeitar outras culturas e pessoas; c. obter alguma certificação internacional no idioma; d. conhecer novas culturas por meio de seus idiomas; e. ter um melhor salário no futuro.

Os 38 participantes em inglês (pergunta 84) geraram 133 indicações diferentes em todas as alternativas disponíveis, das quais 35 ou 92.1%, ou a maioria absoluta assinalou a alternativa a (falar/dominar um outro idioma); 29 marcações ou 76.3%, também a maioria absoluta assinou igualmente a b (aprender a respeitar outras culturas e pessoas) e a alternativa d (conhecer novas culturas por meio de seus idiomas); 22 ou 57.9%, também a maioria absoluta respondeu alternativa c (obter alguma certificação internacional no idioma); e 18 ou 47.4% alternativa e

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(ter um melhor salário no futuro) - FIGURA 118. As respostas em língua inglesa que tiveram porcentagens acima de 51%, ou maioria absoluta, foram as das alternativas a, b, c e d, totalizando 115 ou 86% das 133 indicações totais, o que significa que os critérios ligados à língua e cultura – a-d - foram considerados mais relevantes dos que o critério econômico – alternativa e.

Figura 118 – Resposta à indagação de quais seriam as vantagens para os respondentes em inglês de se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’: a. falar/dominar um outro idioma; b. aprender a respeitar outras culturas e pessoas; c. obter alguma certificação internacional no idioma; d. conhecer novas culturas por meio de seus idiomas; e. ter um melhor salário no futuro.

Os 8 respondentes em espanhol (pergunta 128) geraram um total de 21 indicações diferentes nas cinco alternativas disponíveis, das quais 6 ou 75%, ou a maioria absoluta marcou a alternativa d (conhecer novas culturas por meio de seus idiomas); 5 ou 62.5%, ou a maioria absoluta assinalou a alternativa a (falar/dominar um outro idioma); 4 marcações ou 50% assinalou a b (aprender a respeitar outras culturas e pessoas); e 3 ou 37.5% responderam igualmente as alternativas c (obter alguma certificação internacional no idioma) e alternativa e (ter um melhor salário no futuro) - FIGURA 119. As respostas em língua espanhola que tiveram porcentagens acima de 51%, ou maioria absoluta foram as das alternativas a e d, totalizando 11 ou 52% das 21 indicações totais, o que significa que os critérios ligados à língua e cultura – a-d - foram considerados mais relevantes dos que o critério econômico – alternativa e.

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Figura 119 – Resposta à indagação de quais seriam as vantagens para os respondentes em espanhol de se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’: a. falar/dominar um outro idioma; b. aprender a respeitar outras culturas e pessoas; c. obter alguma certificação internacional no idioma; d. conhecer novas culturas por meio de seus idiomas; e. ter um melhor salário no futuro.

Com a maioria absoluta dos respondentes apontando como uma das principais vantagens do ‘Ensino Bilíngue’ a de falar/dominar um idioma, 93% em português e 92% em inglês, sendo a número um para estes respondentes, e 62% em espanhol, como a vantagem de número dois para eles, cruzaremos estes dados com outros de nossa pesquisa. Como 91% do universo total de todos os participantes afirmaram ter o português como língua materna e ainda 88% estarem localizados no Brasil, sendo que destes 69% consideraram-se bilíngues e 76% gostariam de matricular-se ou matricular um parente em uma ‘Escola Bilíngue’, a alta indicação de falar/dominar um idioma como vantagem principal de um ‘Ensino Bilíngue’ pode ser interpretada como indicativo de que em um país essencialmente formado por monolíngues esteja despontando no senso-comum de sua sociedade a importância (vista como uma vantagem) de falar ou dominar um outro idioma que não o português, ou de ser pelo menos bilíngue. Nossa hipótese inicial era a de que a maioria dos respondentes iria considerar uma vantagem do ‘Ensino Bilíngue’ o desenvolvimento (falar, dominar, ser proficiente, competente) em um idioma estrangeiro, o que se confirmou.

A segunda maior vantagem para os respondentes foi conhecer novas culturas por meio dos idiomas, respectivamente, 79%, 76% e 75%; e a terceira foi a de aprender a respeitar culturas e pessoas, 64% em português, 76% em inglês, e 50% em espanhol. Como vimos na teoria língua é cultura, sendo que o termo línguacultura cunhado por Agar (1994) norteou nossa pesquisa como um todo. Os resultados desta pesquisa apontaram para 85% de todos os respondentes concordando com a afirmação de que língua é cultura ou é o mesmo que cultura, o que corrobora este segundo dado de que, nesse mesmo universo de pesquisados, conhecer novas culturas por meio dos idiomas seja apontada uma vantagem principal do ‘Ensino Bilíngue’. Essas duas vantagens apontadas pelos respondentes confirmaram nossa hipótese

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primeira de que os participantes, em sua maioria, considerariam uma vantagem do ‘Ensino Bilíngue’ o fato de ele propiciar o conhecimento de culturas e de ele ensinar a respeitá-las, além de ensinar o respeito a pessoas de outras culturas por meio do aprendizado de idiomas.

Conforme a pesquisa teórica, as questões culturais foram apontadas por da Silva (2009: 24) como definidoras, em sua análise, de uma escola bilíngue propriamente dita: o reconhecimento, a participação e o respeito a ambientes culturais diversos a formação de cidadãos para o mundo globalizado estão entre essas características. Destacamos a preocupação das escolas em formar alunos capazes de reconhecer, respeitar e participar de diferentes ambientes culturais; estudantes que estejam preparados para lidar com diferentes culturas e ambientes sociais, o que pode ser interpretado como uma contribuição para a disseminação da tolerância entre os povos e a formação de cidadãos multiculturais ao formar os bilíngues (DA SILVA, 2009: 27). Observamos que são comuns as frases “formar cidadãos para um mundo globalizado”, “cidadãos internacionais”, “cidadãos do mundo” nos textos fornecidos pelas escolas analisados pela pesquisadora (DA SILVA, 2009).

As pesquisas de Cantuaria (2005: 5) falam nessas escolas de ‘Ensino Bilíngue’ como um seleto grupo que ocupa uma posição social privilegiada na sociedade brasileira na atualidade e que “se baseia na acumulação de uma cultura internacional”, no conhecimento de língua e culturas que permitiram acesso a outros países até mesmo quanto à oportunidade de empregos. Vimos que essa aquisição de “cultura internacional” seria a de um tipo de capital cultural específico, o capital cultural internacional, o qual no passado ligava os imigrantes a sua cultura de origem, na gênese das escolas internacionais, e que hoje faz com que os estudantes da escola internacional consigam estudar e trabalhar em outras nações, que segundo autores de outros países: “[...] transformam a escola em instância dominante de produção de competências não apenas técnicas, mas principalmente sociais, exigidas para a participação nesta nova ordem mundial” (BOURDIEU & BOLTANSKI, 1975 apud CANTUARIA, 2005: 5).

Essas competências sociais foram por nós definidas, logo na Introdução desta tese, como a competência global (global competence) definida pela National Education Association (NEA), como a habilidade de adquirir conhecimento e compreensão profundos sobre assuntos internacionais em que estaria explícita a aptidão de possuir proficiência em línguas estrangeiras – nas habilidades de ler, falar e escrever mais de um idioma (HANNA, 2018: 23). Esta aptidão de possuir a proficiência em línguas estrangeiras fez-nos conectar a competência

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global a um dos objetos de investigação de nossa tese, o ‘Ensino Bilíngue’. A competência global, por meio da proficiência em mais de uma língua, ainda segundo a pesquisadora, abriria as portas para o entendimento de outros povos e culturas, assim como manteria um conhecimento internacional histórico, socioeconômico e político, sendo peça fundamental para cultivar uma apreciação da diversidade cultural, além de implicar em tolerância e senso de cooperação entre as pessoas e povos (id. 23).

Valemo-nos também de outras habilidades sociais comunicativas exaltadas pelo pesquisador brasileiro Marcelino (2009: 11), que, no campo comunicativo, destaca que o bilíngue pode estabelecer vínculos com parentes e outras comunidades linguísticas, além de poder ter acesso à materiais originais, sem necessitar fazer o uso de traduções e uma “maior sensibilidade linguística” e de “vantagens culturais”, que podem ser consideradas como relevantes na construção de tolerância, tal qual Da Silva (2009) apontou, ou para “sensibilizar o indivíduo para outras culturas” (MARCELINO, 2009), como fica evidente:

A sensibilidade linguística de indivíduos bilíngues parece ser um diferencial. Devido ao constante monitoramento de duas línguas (com quem se fala qual língua), o bilíngue se torna mais atento, paciente e sensível a diferentes situações linguísticas do que monolíngues. As vantagens culturais trazidas pelo bilinguismo não são dissociáveis das comunicativas, uma vez que mais sensível às questões linguísticas, o bilíngue também se torna mais sensível às questões culturais atreladas às diferentes línguas que fala, já que o uso de uma outra língua possibilita uma visão diferenciada e penetração mais eficiente na cultura do outro. O que, por extensão, pode sensibilizar o indivíduo mais ainda para outras culturas (MARCELINO, 2009: 11).

Destacamos o autor Cheng (2002) que se valeu de sua própria experiência bilíngue para apontar que a solução de seu conflito linguístico interno esteve pautada no “amor” e no “diálogo”. Observamos que suas línguas em contato (chinês e francês) conseguiram conviver devido ao diálogo, ou à dialética que nele estabeleceu-se internamente e que essa convivência pacífica só fez-se possível devido à função fundamentalmente social iminente a toda língua: a sua utilidade primeira de comunicar algo a alguém, nem que esse alguém sejamos nós mesmos e dessa comunicação fazer sentido, ou a comunicação sociocognitiva de Martín- Barbero (2000). Concluímos, assim, que não devemos tentar apagar as culturas, línguas, hábitos, identidades, etc. de origem (nem dos imigrantes, nem dos nativos de um país, nem dos estudantes bilíngues) e que devemos valorizar suas culturas e identidades para que haja enriquecimento de todas as partes, por meio da tolerância e da mitigação de possíveis conflitos linguístico-culturais.

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Fizemos uma crítica à tendência de segmentação do conhecimento na atualidade, devido, principalmente, à alta especialização dos profissionais, afirmando que acreditamos ser importante para os debates aprofundados no bilinguismo não levar em consideração somente as publicações que exaltem de maneira inconteste a suposta vantagem bilíngue e por isso propusemos um entrelaçar de visões, conceitos, teorias, paradigmas, opiniões, etc. das diversas áreas do conhecimento científico e da vida comum – reforçando o papel da mídia comunicativa como importante intermediária entre as partes.

Enfim, como as segundas e as terceiras maiores vantagens do ‘Ensino Bilíngue’ para os respondentes desta pesquisas foram conhecer novas culturas por meio dos idiomas e aprender a respeitar culturas e pessoas, em porcentagens expressivas, como a teoria nos embasa, propomos, com esses resultados, a reflexão de que o bilinguismo é capaz de promover a cidadania e desenvolver uma competência global, intrinsecamente social, que podem dar sustentação a um novo paradigma em Ciências em que dois dos aspectos sociais da língua, a sua capacidade de comunicação social e o substrato cultural do qual a fez emergir, sejam colocados em igualdade às possíveis vantagens cognitivas que o bilinguismo pode acarretar, tomando por base os conceitos de línguacultura (AGAR, 1994) identidade cultural (HALL, 1996), comunicação social MARTÍN-BARBERO, 2000) e competência global expostos nesta tese (HANNA, 2018).

A quarta e a quinta vantagens do ‘Ensino Bilíngue’ para os entrevistados, obter uma certificação no idioma (55%, 58% e 37%, em português, inglês e espanhol) e ter um melhor salário (47%, 47%, 37%, respectivamente) podem ser relacionadas a vantagens de ordem educativa, uma certificação que comprova o nível no idioma, ou a proficiência, ou que permita o ingresso em uma universidade estrangeira; e/ou de ordem econômica, uma vez que estas certificações podem ser utilizadas para se trabalhar em um outro país. Estas questões foram abordadas na teoria levantada no Capítulo 3 e fez com que nossa hipótese inicial de que os respondentes, em sua maioria consideraria que o ‘Ensino Bilíngue’ acarretaria na vantagem de fornecer uma certificação internacional e um melhor salário no futuro confirmassem-se.

O último questionamento geral (questões 42, 85 e 129, em português, inglês e espanhol) queria saber se os respondentes já haviam trabalhado ou ainda trabalhavam em uma ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional. Somente os que dissessem sim deveriam responder a mais uma pergunta (questões 43, 86 e 130, respectivamente) e os que dissessem não teriam sua participação terminada na pesquisa.

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Dos 155 respondentes em português (pergunta 42), 140 ou 90.32%, ou a maioria absoluta disse que não e 15 ou 9.68% que disseram sim que já haviam trabalhado ou ainda trabalhavam em uma ‘Escola Bilíngue’ (FIGURA 120).

Figura 120 – Resposta à indagação se os respondentes em português já haviam trabalhado ou ainda trabalhavam em uma ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional: sim, não.

Dos 43 participantes em inglês (pergunta 85), 38 ou 88.37%, ou a maioria absoluta disse que não e 5 ou 11.63% que disseram sim que já haviam trabalhado ou ainda trabalhavam em uma ‘Escola Bilíngue’ (FIGURA 121).

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Figura 121 – Resposta à indagação se os respondentes em inglês já haviam trabalhado ou ainda trabalhavam em uma ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional: sim, não.

Dos 9 respondentes em espanhol (pergunta 129), 9 ou 100% disse que não haviam trabalhado ou ainda trabalhavam em uma ‘Escola Bilíngue’ (FIGURA 122).

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Figura 122 – Resposta à indagação se os respondentes em espanhol já haviam trabalhado ou ainda trabalhavam em uma ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional: sim, não.

Comparando os dados obtidos nas três línguas, a maioria absoluta, nos três idiomas, afirmou que não havia trabalhado ou ainda trabalhava em uma ‘Escola Bilíngue’ – 90% do total de respondentes em língua portuguesa, 88%, em língua inglesa e 100% em língua espanhola - totalizando 187 participantes ou 90% dos 207 totais da pesquisa, ou 20 participantes. Conforme discutimos em análises anteriores, estas instituições são bem elitizadas o que torna natural poucos profissionais terem acesso a elas o que é refletido nessa baixa porcentagem. Outro aspecto é a necessidade de formação específica ou ter duas diplomações, pedagogia e proficiência em língua estrangeira, licenciatura em biologia e proficiência em língua estrangeira, ou formação em Letras, geralmente sendo necessárias provas internas nas quatro habilidades, ler, escrever, ouvir e falar no idioma-alvo, além de entrevistas e treinamentos e o desenvolvimento de aulas teóricas e práticas, já com os alunos, antes da contratação.

Após a contratação, os professores geralmente passam por um período de experiência, como assistentes dos professores mais antigos, antes de serem realmente efetivados. Como fica evidente, os critérios de seleção para professores são rígidos o que nos levou a propor critérios rigorosos para a regulamentação do setor de ‘Ensino Bilíngue’ (Capítulo 3), como vimos, em uma tentativa de nivelar o setor pelo nível superior. Outro fator é que muitos estrangeiros têm

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privilégio na contratação, principalmente nas escolas internacionais, embora também ocorra nas bilíngues, uma vez que são falantes nativos e a porcentagem de brasileiros com proficiência em um idioma estrangeiro é baixa, como também já discutimos. Todos esses aspectos, nos levaram à hipótese de que uma porcentagem muito baixa de participantes afirmaria trabalhar ou ter trabalhado no ‘Ensino Bilíngue’, o que de fato foi confirmado nos 9.7%, ou apenas 20 indivíduos de 207 de respondentes totais.

A última pergunta (questões 43, 86 e 130, em português, inglês e espanhol), direcionada aos que já trabalharam em uma ‘Escola Bilíngue’ queria saber se os respondentes achavam que quando a língua falada em casa era diferente da escola, haveria um efeito negativo na aquisição da língua da escola em contextos de imigração ou alfabetização em segunda língua diferente da língua do país. Se respondessem sim uma escala de valores 1 (discordo plenamente) a 5 (concordo plenamente) nas perguntas (questões 44, 87 e 131, respectivamente).

Dos 15 respondentes em português (pergunta 43), 9 ou 60%, ou a maioria absoluta disse que não; 3 ou 20% que disseram sim, somente em contextos de alfabetização em segunda língua diferente da língua país em que a escola está localizada; 2 ou 13.33% que sim, somente em contextos de imigração; e 1 ou 6.67% disse que sim, nos dois contextos (FIGURA 123).

Figura 123 – Resposta à indagação se os respondentes em português achavam que quando a língua falada em casa era diferente da escola, haveria um efeito negativo na aquisição da língua da escola em contextos de imigração ou alfabetização em segunda língua diferente da língua do país: sim, em contextos de imigração; sim, em contextos de aquisição, sim, nos dois contextos; não e não sabiam.

Qualitativamente em língua portuguesa (questão 44) dos 6 respondentes que afirmaram que sim, que haveria um efeito negativo na aquisição da língua da escola em contextos de imigração e/ou alfabetização em segunda língua diferente da língua do país na pergunta

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anterior, a maior parte ou 3 respondentes, 50%, valorou como 4 (concordo); 1 ou 16.67% valorou igualmente como 5 (concordo plenamente), como 3 (concordo medianamente) e como 1 (discordo plenamente) - FIGURA 124. A média aritmética ficou em 3,50 significando que a média das respostas ficou entre 3 (concordo medianamente) e 4 (concordo). Já o desvio padrão, 1.38, foi alto, o que significa que o universo das respostas oscilou bastante, de aproximadamente 2.10 a 4.90, havendo divergência entre as respostas fornecidas.

Figura 124 – Figura de distribuição de respostas em língua portuguesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que haveria um efeito negativo na aquisição da língua da escola (em contextos de imigração ou alfabetização em segunda língua diferente da língua do país) e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Dos 5 respondentes em inglês (pergunta 86), 3 ou 60%, ou a maioria absoluta disse que não; 3 ou 20% que disseram sim, somente em contextos de alfabetização em segunda língua diferente da língua país em que a escola está localizada; 1 ou 20% que sim, nos dois contextos, e 1 ou 20% respondeu não saber (FIGURA 125).

Figura 125 – Resposta à indagação se os respondentes em inglês achavam que quando a língua falada em casa era diferente da escola, haveria um efeito negativo na aquisição da língua da escola em contextos de imigração ou alfabetização em segunda língua diferente da língua do país: sim, em contextos de imigração; sim, em contextos de aquisição, sim, nos dois contextos; não e não sabiam.

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Qualitativamente em língua inglesa (questão 87) houve apenas 1 participante que sim, que haveria um efeito negativo na aquisição da língua da escola nos dois contextos de imigração e alfabetização em segunda língua diferente da língua do país na pergunta anterior. Este respondente valorou como 3 (concordo medianamente) a afirmação de que haveria um efeito negativo na aquisição da língua da escola em contextos de imigração ou alfabetização em segunda língua diferente da língua do país (FIGURA 126). A média aritmética ficou em 3 significando que a média das respostas ficou em 3 (concordo medianamente). Já o desvio padrão, 0, ou inexistente, o que significa que o universo das respostas foi único.

Figura 126 – Figura de distribuição de respostas em língua inglesa na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que haveria um efeito negativo na aquisição da língua da escola (em contextos de imigração ou alfabetização em segunda língua diferente da língua do país) e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Não houve respondentes em língua espanhola para estes questionamentos uma vez que ninguém declarou ter trabalhado ou estar trabalhando em uma ‘Escola Bilíngue’ na questão que trazia a essas – FIGURAS 127 e 128.

Figura 127 – Resposta à indagação se os respondentes em espanhol achavam que quando a língua falada em casa era diferente da escola, haveria um efeito negativo na aquisição da língua da escola em contextos de imigração ou alfabetização em segunda língua diferente da língua do país: sim, em contextos de imigração; sim, em contextos de aquisição, sim, nos dois contextos; não e não sabiam.

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Figura 128 – Figura de distribuição de respostas em língua espanhola na escala de 1, discordo plenamente da, e 5, concordo plenamente com a afirmação de que haveria um efeito negativo na aquisição da língua da escola (em contextos de imigração ou alfabetização em segunda língua diferente da língua do país) e figuras da média aritmética e do desvio padrão desta resposta.

Comparando quantitativamente os dados obtidos nas duas línguas em que houve respondentes, 60%, ou a maioria absoluta, em português e inglês disse que não acreditava haver um efeito negativo na aquisição do idioma da escola quando esse era diferente da língua do país em que a escola estava, um total de 12 participantes. A porcentagem de respondentes que acreditava no contrário, que sim, haveria um efeito negativo na aquisição do idioma, 20% em cada idioma disseram que sim, somente em contextos de alfabetização, ou seja, um total de 6 participantes ou 30% da subamostra de 20. A análise qualitativa das respostas ficou entre 3 (concordo medianamente) e 4 (concordo) em português, e 3 (concordo medianamente) em inglês, o que pode significar que os respondentes têm dúvidas quanto a haver um efeito negativo na aquisição da língua da escola nos dois contextos de imigração e alfabetização em segunda língua diferente da língua do país.

Conforme Grosjean (2010) afirmou este mito era popular no meio do século XX e desde então muitas pesquisas apontaram para o resultado de que as crianças bilíngues não têm atrasos na aquisição de linguagem em nenhum dos contextos citados. Ele afirma que as pessoas deveriam ter em mente que as crianças bilíngues, uma vez que têm que lidar com duas ou mais línguas, são diferentes em alguns aspectos das crianças monolíngues, mas não em relação à taxa de aquisição de linguagem. Nossa finalidade com essa pergunta era a de descobrir se o mito ainda vigorava entre os professores do ‘Ensino Bilíngue’, ou se ele estava restrito ao século passado como apontado por Grosjean. Os resultados apontaram para a confirmação de nossa hipótese inicial de que a maioria absoluta (60%) não acreditaria em haver um efeito negativo na aquisição do idioma da escola quando esse era diferente da língua do país em que a escola estava, o que confirma que este mito pode, realmente, ter sido mais forte no século passado, século XX, e que está perdendo sua força, tal qual Grosjean afirmou.

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Dessa forma, acabaram-se as perguntas, suas análises e a discussão de seus resultados em conexão com a teoria previamente pesquisada e passaremos, por fim, à conclusão desta tese.

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V - CONCLUSÃO Language is a city to the building of which every human being brought a stone.204 (RALPH WALDO EMERSON)

A amostra total de respondentes desta pesquisa mundial foi a de 207 entrevistados, uma amostra grande quando se toma por referência o teste do Qui-Quadrado (χ2), uma das distribuições mais utilizadas em estatística inferencial. A maioria absoluta, ou 75% dos respondentes, optou pela língua portuguesa, seguido por 21% a língua inglesa e 4% a língua espanhola como suporte linguístico ou idioma para responder ao que era perguntado. Também a maioria absoluta estava no Brasil quando respondeu a pesquisa, totalizando 88%, e os 12% restantes estavam localizados em outros países. Dos que estavam no Brasil, 87% moravam na Região Sudeste, região mais populosa do país, sendo também a maioria absoluta da amostra. Foram conseguidos, no entanto, respondentes das 5 regiões do Brasil, o que para um país de proporções continentais é bem relevante.

Concluímos que o fato de 12 % ou 28 pessoas dos respondentes totais estarem localizados em outro país de relevância, uma vez que apenas 25% dos convidados a responderem uma pesquisa de fato o fazem, o que significa que foram necessários pelo menos 112 convites para pessoas que estavam fora do Brasil, para que os 28 efetivamente respondessem. Ajuizamos que havia diferença de apenas 2 respondentes para que a amostra completasse 30 participantes, o que tornou a subamostra de respondentes fora do Brasil, uma amostra média, porém muito próxima de uma amostra grande com referência ao recomendado pelo teste do Qui-Quadrado (χ2), novamente. Destes participantes que estavam fora do Brasil, foram conseguidos respondentes distribuídos pelos 5 continentes do globo: Américas (do Norte, central e do Sul), Europa, África, Ásia e Oceania. Apenas do continente da Antártida, o sexto, portanto, não conseguimos respondentes.

Pela análise dos dados coletados, dos que estavam fora do Brasil, os 46% que responderam em língua inglesa tiveram a maior distribuição pelo globo, distribuindo-se pelos cinco continentes; seguidos de 39% que responderam em português e encontravam-se em 4 continentes, e 14% em espanhol que estavam em 2 continentes. Concluímos que esta maior distribuição pelo globo de falantes de língua inglesa deu-se, majoritariamente, devido ao fato de

204 A língua(gem) é uma cidade em cuja construção cada ser humano trouxe uma pedra. (RALPH WALDO EMERSON). Tradução nossa.

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que a língua inglesa é a principal língua franca de comunicação internacional da atualidade, ou língua global (globish), ou a língua de contato ,o que justifica a maior distribuição pelo globo por nós encontrada, independentemente da referência teórica do inglês ser o terceiro em número de falantes no mundo (atrás do chinês e do espanhol, primeiro e segundo respectivamente).

Comparativamente, de todos as línguas apontadas como maternas pelos respondentes nos três idiomas, o português, em suas várias grafias, foi nomeado como a primeira língua de 189 participantes ou para 91% dos respondentes totais do universo de 207 da pesquisa, respectivamente, 155 em português, 29 em inglês e 5 em espanhol. Seguido por 7, ou 3% do total de respondentes, nos três idiomas, que tinham o espanhol e 4 ou 2% que tinham o inglês como língua materna. 2 ou 1% cada apontaram igualmente o holandês e o alemão como suas línguas maternas e 0.5% cada outras línguas - turco, italiano, japonês, cantonês, chinês, tâmil, sueco e francês.

Cruzando os dados já obtidos até ali, como a maioria absoluta dos participantes da pesquisa estava no Brasil 88%, afirmamos que 3% dos respondentes que tinham a língua portuguesa como materna estavam localizados em outras partes do globo quando responderam ao questionário (do total de 91%), podendo ser brasileiros ou de outras nacionalidades.

Passamos para as conclusões socioeconômicas de nossa pesquisa: de todos os respondentes, aqueles que optaram em responder em língua portuguesa eram majoritariamente do sexo feminino (68%) e os respondentes nos outros dois idiomas do sexo masculino, 59% em língua inglesa e 57% em língua espanhola, respectivamente.

Comparativamente, a faixa etária predominante não foi equivalente nos três idiomas: em língua portuguesa a maioria era da faixa entre 30-39 anos (34%); em língua inglesa 50-59 anos (23%) e em espanhola 40-49 anos (33%). Somando-se os participantes nos três idiomas que tinham idades entre 30 e 59 anos, totalizamos 141 participantes ou 68% dos 207 respondentes totais, o que significa que a maioria absoluta dos participantes, nos três idiomas, tinha idades no intervalo de 30 a 59 anos de idade.

Tais cálculos fizeram-nos concluir que a maior parte dos respondentes pertencia à classe A pelas referências brasileiras, ou recebia R$135.144,00 por ano ou mais. Os que declararam em línguas inglesa e espanhola receber acima da classe D (classes A, B, C e D) portanto, também

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devem ser considerados como pertencentes à classe A, referência brasileira. Isso fez com que dos 207 respondentes totais tivéssemos 143 participantes ou 69% das classes A e B, referência brasileira. A segunda faixa econômica encontrada foi a da Classe C brasileira ou daqueles que recebiam entre R$ 2005,00 a R$ 8640,00 mensais ou de R$ 24.064,00 a R$ 103.680,00 anuais. A Classe E em dólares ao ser convertida em reais equivale a receber R$ 64.161,40, ou seja, estaria nesse intervalo, portanto. 32% em língua portuguesa alegaram ser da Classe C, e em língua espanhola 22% disseram receber essa quantia anual, sendo a segunda faixa econômica dos respondentes, 51 ou 25% do total de 207 da pesquisa.

Comparativamente nos três idiomas, obtivemos o seguinte perfil de escolaridade: a maioria era pós-graduada totalizando 112 participantes ou 54%; 71 ou 34% deles tinham a formação no Ensino Superior, o que implica em 88% dos respondentes do total de 207 participantes serem pós-graduados ou graduados.

Pudemos assim traçar o perfil socioeconômico por idioma em que responderam ao questionário. Os respondentes em língua portuguesa tinham o seguinte perfil em sua maioria: mulheres entre 30 e 39 anos, pós-graduadas e pertencentes à classe social A; os do idioma inglês eram homens entre 50 e 59 anos, pós-graduados e pertencentes à classe social B para parâmetros internacionais e A para parâmetros brasileiros; os participantes em língua espanhola, em sua maioria, eram homens entre 40 e 49 anos, pós-graduados ou com formação em Ensino Superior e pertencentes à classe social B para parâmetros internacionais e A para parâmetros brasileiros.

Como perfil geral dos respondentes, nos três idiomas, 61% da amostra total era composta por mulheres e 39% de homens; 68% dos participantes tinham idades no intervalo entre 30 a 59 anos de idade; 69% pertenciam às classes A e B, referência brasileira; e 88% dos respondentes eram pós-graduados ou graduados do total de 207 participantes da pesquisa.

Quanto ao fato de considerarem-se bilíngues, resumidamente este foi o perfil dos respondentes nos três idiomas: em português 62%, em inglês 86% e em espanhol 89% alegaram-se bilíngues, totalizando 142 participantes ou a maioria absoluta, 69% do total. Isso significa que 31% ou 65 participantes não se consideraram bilíngues.

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Concluímos em nossas análises que embora os dados nacionais apontassem para uma monolinguismo dominante no Brasil, os dados por nós coletados não corroboravam essa porcentagem baixa de bilinguismo. Vimos que o perfil dos respondentes nos três idiomas era de 69% considerando-se bilíngues, o que diferia drasticamente dos dados números encontrados na teoria (2,54% do Mundo Poliglota e dos 3% da Revista Exame). Recorremos a outros dados para poder tirar conclusões como o cruzamento desses dados com a uma pesquisa nacional IBOPE 2012 em que os participantes responderam ser ou não bilíngues de acordo com sua classe social. O cruzamento com os dados socioeconômicos da amostra levou-nos a inferir que como quase 69% de nossos respondentes eram da classe A ou B, eles pertenciam aos 9% da população brasileira que alegaram ter capacidade alta ou muito alta em um segundo idioma na pesquisa nacional (IBOPE 2012), o que justificou a alta porcentagem, os 69% de nossos participantes considerando-se bilíngues e apenas 31% não considerando-se bilíngues.

Quando perguntados quais outros idiomas falavam, como os participantes poderiam marcar mais de uma alternativa, as 166 línguas totais indicadas demonstram que boa parte desses 96 respondentes indicaram mais de um idioma adicional, além do português em que já respondiam à pesquisa, o que nos levou a concluir que eles eram pelo menos bilíngues, podendo ser trilíngues, multilíngues ou poliglotas.

Calculamos que, nos três idiomas, do universo total de 207 respondentes, 121 ou 58% afirmaram falar o português e o inglês, ou a maioria absoluta; seguido de 50 ou 24% português e espanhol; e 24 ou 12% inglês e espanhol; 20 ou 10% falavam também o francês (além ou do português, ou do inglês, ou do espanhol); 16 ou 8% também falavam o alemão; e 11 ou 5% também o italiano. Os dados apontaram para a maioria dos respondentes desta pesquisa (59%) falando o português e o inglês em primeiro lugar e o português e o espanhol (24%) em segundo lugar.

Com relação às justificativas do porquê de não se considerarem bilíngues, do universo total de 66 participantes, nos três idiomas, 44 ou 67% apontaram a falta de fluência como o principal critério para não se considerarem bilíngues o que foi ao encontro de nossa hipótese inicial. Justificamos que a fluência é complexa e mobiliza conhecimentos tanto da oralidade quanto de elementos estruturais da língua(gem).

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A diversidade de respostas dos participantes que não se consideravam bilíngues em língua portuguesa, no entanto, e que nos forneceram respostas abertas, mostraram que os critérios de conceituação do bilinguismo não são diversos somente para os teóricos, mas também o são para os a população geral. Respostas como “Leio algumas línguas fora a materna”, “Entendo pouco”, “Consigo ler porém tenho insegurança para falar”, “sou fluente nas duas línguas, mas penso que a fluência não é o único critério para considerar uma pessoa bilíngue”, “Embora seja fluente na segunda língua, falta-me o uso idiomático” (sic.) foram interpretadas como evidências de que os falantes sentem-se um todo e não partes em que têm bom desempenho (leem, entendem, são fluentes) e partes em que não têm (não conseguem falar, entendem pouco, não sabem empregar as expressões idiomáticas). Como são um todo, os falantes podem não se considerar bilíngues, uma vez que não se sentem desenvoltos em todas as habilidades que julgam necessárias para serem de fato bilíngues. Assim, reforçamos que o bilíngue não é a soma de dois monolíngues completos ou incompletos, tal qual Grosjean (2008) definiu; mais propriamente, ele ou ela tem uma configuração linguística específica e única, cuja coexistência e constante interação das (duas) línguas produziu um sistema linguístico diferente, mas completo e sujeito às regras próprias do sujeito (bilíngue ou não), seus conceitos e autojulgamentos.

Com a maioria absoluta de participantes concordando com a afirmação de que língua é cultura ou é o mesmo que cultura (totalizando 176 ou 85% do total de 207 respondentes) houve a confirmação de nossa hipótese inicial de que o axioma língua é cultura é amplamente aceito, pela maioria absoluta de participantes, nos três idiomas. Tal resultado foi ao encontro de nossa expectativa de que a vasta maioria dos respondentes, bilíngues ou não, julgaria como verdadeira a afirmação de que língua é cultura, indo na mesma direção da teoria proposta e sustentada por Agar (1994) e por Hanna (2018) de que ao serem postos em contato com a palavra língua, ou a palavra cultura, sempre lembrar-se-iam da outra metade, o que nos faz concluir que o termo cunhado por Agar, línguacultura, é válido para a maioria absoluta de nossa amostra.

Comparativamente, em uma análise quantitativa, somente os respondentes em língua portuguesa discordaram majoritariamente da afirmação de que um bilíngue era necessariamente bicultural (98 participantes ou 63%). Em sua maioria absoluta, os demais participantes, 26 participantes de língua inglesa ou 60% e 5 ou 56% em língua espanhola, concordaram com a afirmação de que um bilíngue é necessariamente bicultural. Embora os que

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responderam em português majoritariamente discordassem e os nos outros idiomas concordassem com a afirmação, a porcentagem de aproximadamente 60% de concordância ou discordância manteve-se.

Tivemos que recorrer às análises qualitativas para tirar nossas conclusões. Qualitativamente, quando analisamos os dados disponíveis dos respondentes de língua inglesa e espanhola, 12 ou 46% em inglês valoraram 3 (concordar medianamente) com a afirmação de que um bilíngue era necessariamente bicultural, e 2 ou 40% valoraram 4 (concordar) em espanhol. Esses últimos dados indicaram que para os respondentes em espanhol a afirmação primeira de que os bilíngues são necessariamente biculturais é mais verdadeira do que para os participantes em língua inglesa. As respostas de todos os participantes analisados foram bem díspares na análise qualitativa do desvio padrão, sendo alto em ambas amostras, 1.10 em língua inglesa e 1.14 em língua espanhola, o que significou dizer que em ambas as línguas os participantes divergiram bastante entre si em suas respostas.

Quando comparamos os dados obtidos com as hipóteses aventadas na formulação da questão, os dados quantitativos obtidos na amostra em língua portuguesa, em que 63% discordam da afirmação de que um bilíngue é necessariamente bicultural, apontaram para a confirmação de nossa hipótese primeira de que a maioria dos entrevistados não concordaria com o afirmado, tal qual o teórico Grosjean (2010: s/p) propôs. A falta dos dados qualitativos devido a um problema do software coletor dos dados e, portanto, de sua análise, a qual poderia confirmar ou não essa tendência fez com que não pudéssemos fazer maiores inferências ou generalizações a respeito destes dados.

Os dados quantitativos das outras duas amostras, de língua inglesa e de língua espanhola apontaram para o contrário, 60% em inglês e 56% em espanhol dos respondentes dizendo majoritariamente acreditar que um bilíngue fosse necessariamente bicultural. A análise qualitativa dos dados adicionais de valoração e desvio padrão, entretanto, levaram-nos à outra interpretação. Como as respostas de todos os participantes analisados foram bem díspares na análise qualitativa dos desvios padrões, sendo altos de 1.10 em língua inglesa e 1.14 em espanhola, concluímos que, em ambas as línguas, os participantes divergiram bastante entre si em suas respostas, o que nos faz aventar que outras variáveis, além do emprego do advérbio necessariamente, significando obrigatoriamente, pudessem ter levado os participantes a divergirem.

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Retornamos, assim, à teoria por nós estudada e a definição de biculturalismo que nos norteou, “o biculturalismo é caracterizado pela proficiência e conforto de um indivíduo com ambas, a cultura original e a cultura de um novo país ou região” (JACKSON, 2014: 207), e quando entrecruzamos esta definição com a de proficiência que se referia à habilidade dos falantes para usarem esse conhecimento [competência linguística] em diversas tarefas, sendo competência o conhecimento linguístico de uma língua que os falantes já interiorizaram (ELLIS, 2008: 26) aventamos, então, a possibilidade de os respondentes terem em mente alguns desses três conceitos, proficiência, competência ou o simples conforto nas línguas ou culturas para que tivessem divergido em suas respostas. Isso fez-nos concluir que os participantes tinham menos certeza de que um bilíngue era necessariamente bicultural quando aspectos qualitativos, ou valorativos, eram pedidos a eles do que quando somente aspectos quantitativos, como em uma resposta trinária (sim, não e não sei).

Pelas análises dos dados quantitativos e qualitativos somados nos três idiomas, analisamos, assim, que nossa hipótese inicial, de que a maioria dos entrevistados não concordaria com a afirmação de um bilíngue seria necessariamente bicultural, confirmou-se. Como encontramos os dados qualitativos e quantitativos conflitantes, optamos por fazer um cálculo adicional, o teste estatístico do qui-quadrado (no ANEXO 3 estão os cálculos). Com ele, concluiu-se que o qui-quadrado calculado (11.19) era maior do que o tabelado (9.5), o que nos levou, de fato, a rejeitar H0 em prol de H1, o que significou que estava certa nossa afirmação com base nos dados quantitativos e qualitativos de que a maioria dos entrevistados não concordaria com a afirmação de um bilíngue é necessariamente bicultural.

Quanto à questão de a língua ser parte da identidade de um falante apontamos que houve a inversão da escala de valoração em língua portuguesa por falhas técnicas, ou seja 1 era concordo plenamente e 5 discordo plenamente. Ao comparamos os dados quantitativos em que dos 155 participantes em português, quase a totalidade 149 ou 96% marcaram que sim, a língua fazia parte da identidade do falante, e que os demais não e não sei somaram somente 4%, isso levou-nos a supor que haver quase metade das respostas em cada extremo na avaliação qualitativa - 42% marcaram concordar plenamente e 41% discordar plenamente da língua ser parte da identidade do falante – fez-nos hipotetizar que a alta variação nas respostas poderia ser derivada da não observância atenta da escala disponível que encontrava-se invertida.

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Quando tomamos, porém, por base a análise da última pergunta em que os respondentes em língua portuguesa tiveram que fazer a valoração, sobre língua e cultura (questão 14), em sua análise quantitativa a maioria absoluta 85% concordou que língua era cultura, na pergunta subsequente 16, na análise qualitativa, apenas 54% valoraram mais próximo de 5 (concordo plenamente), o que nos fez concluir, pelos números, que a faixa de concordância foi de 42% na pergunta 20 – sobre identidade - e de 54% na pergunta 16 – sobre cultura – o que indicava que houve cerca de 10% de variação na concordância, o que não é muita variação, em uma escala de 100%.

O dado qualitativo do desvio padrão, então, foi utilizado como fator de desempate, no caso da questão 20 (sobre a identidade) foi extremamente alto ou 1.86, e no caso da questão 16 (sobre língua e cultura) o desvio padrão de 0.81 foi mediano tendendo para baixo, o que nos fez concluir que a inversão de escala pode ter causado mesmo uma maior gama de respostas assinaladas, ou um desvio padrão mais alto. A interpretação de que a inversão da escala possa ter levado a uma maior discordância entre as respostas intensificou-se quando entrecruzamos esses dados com o dado quantitativo de que quase a totalidade dos respondentes em língua portuguesa,149 ou 96%, marcou que sim, a língua fazia parte da identidade do falante - sendo esta a maior porcentagem de respondentes concordando com uma única afirmação por nós proposta até aquele momento.

Levamos em consideração, assim, a teoria que havíamos pesquisado dos mecanismos de pré- ativação (priming) e da agilidade que se espera do entrevistado para passar de uma pergunta para a outra e mencionamos que esperávamos de nossos entrevistados uma resposta sem que houvesse muita mobilização consciente, ou sem haver muito planejamento da resposta, e que isso ocorresse sucessivamente nas demais perguntas, uma vez que o respondente seguia os modelos anteriores de maneira automática (PACHECO JÚNIOR, DAMACENA & BRONZATTI, 2015: s/p). Assim, inclinamo-nos para a interpretação de que a mudança na escala havia influenciado no aumento do desvio padrão, aumentando o número de respostas diferentes apontadas pelos participantes, alterando o no resultado.

Resumida e comparativamente quanto aos respondentes das três línguas, em uma análise quantitativa, a quase totalidade dos participantes em português, 96%, e em inglês 91%, e a totalidade dos respondentes em espanhol, 100%, marcou que sim a língua fazia parte da

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identidade dos falantes. Qualitativamente, em português 42% marcaram 5 (concordar plenamente) e 41% assinalaram 1 (discordar plenamente), os dois extremos, conforme já analisado e discutido anteriormente, havendo alta discrepância nas respostas, embora isso não nos tenha levado a considerar que ouve influência na obtenção dos dados qualitativos, como expusemos. Em língua inglesa, a maioria 49% marcou 5 (concordar plenamente), semelhantemente ao que ocorreu na língua espanhola em que 56% marcaram 5 (concordar plenamente).

Esses dados foram interpretados como a maioria dos respondentes, nos três idiomas, avaliando concordar plenamente (marcaram 5) com a afirmação de que a língua faz parte da identidade de um falante, 86 ou 42% dos 207 da amostra total. Quando adicionamos a eles os que concordaram (marcando 4), 19 participantes nos três idiomas, obtivemos 105 ou 51% da amostra total, analisamos que 51%, na análise qualitativa, concordaram ou concordaram plenamente com a afirmação de que língua era identidade.

Embora tenhamos aventado a possibilidade dos dados em língua portuguesa poderem ser muito mais expressivos caso a inversão da escala não tivesse ocorrido, concluímos que não houve influência final na reposta da maioria nesta língua, que apontou para a mesma direção nas demais línguas, confirmando a tendência de que a língua é considerada parte da identidade do falante, admitindo-se, porém, que possam ter havido distorções no desvio padrão e na porcentagem final desta concordância. Outra inferência que fizemos é que os respondentes não estavam atentos a essa mudança de escala e que, assim, houve o aumento do desvio padrão, indicativo de respostas divergentes entre si. Fizemos o teste do qui-quadrado nestes resultados conflitantes (ANEXO 3) e concluímos que o qui-quadrado calculado (4.97) era menor do que o tabelado (9.5), então, não rejeitou-se H0 em prol de H1, o que significa que nossa afirmação primeira de que a maioria dos entrevistados concordaria com a afirmação de que língua é identidade confirmou-se também por este teste.

Como obtivemos o resultado de que a maioria absoluta dos participantes, nos três idiomas, concordou com a afirmação de que língua é cultura, quantitativamente totalizando 85%, e que 95% acreditam que língua é identidade, sendo esses 10% a mais, pudemos cruzar esses dados e inferir que para a maioria absoluta dos entrevistados a língua era cultura e identidade.

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A teoria nos levou à concluir que os conceitos de identidade, cultura e língua, ou o trinômio cultura/língua/identidade, ao qual referimo-nos nesta tese, estavam de fato imbricados, sendo que os resultados obtidos nesta pesquisa confirmaram essa expectativa, indicada pela maioria absoluta dos participantes, ou 85% ou mais de todos os participantes de nossa amostra total de 207 respondentes, afirmando que a língua é considerada parte da identidade e/ou da cultura do falante.

Quando perguntamos se para os participantes língua era (o mesmo que) poder, tendo como hipótese de que a maioria deles responderia afirmativamente, houve a confirmação de nossa hipótese primeira com a análise dos dados obtidos na análise quantitativa - em que 154 de 207 totais, ou 74%. Optamos por fazer o teste do qui-quadrado devido aos dados quantitativos e qualitativos conflitantes encontrados e concluímos que o qui-quadrado calculado (4.45) era menor do que o tabelado (9.5), e não rejeitamos H0 em prol de H1, o que significou que estava correta nossa afirmação de que a maioria dos entrevistados concordaria com a afirmação de que a língua era poder (ou o mesmo que poder). Ao entrecruzarmos esse resultado com o dado anterior de que 85% ou mais de todos os participantes de nossa amostra afirmaram que a língua era considerada parte da identidade e/ou da cultura do falante, obtivemos 74% ou mais do nosso universo de respondentes afirmando que a língua é cultura ou identidade ou poder.

Resumindo e comparando os dados obtidos nas três línguas, em uma análise quantitativa, a totalidade dos participantes nas duas línguas, 100% em português e em espanhol, além de 98% em inglês marcaram que sim falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traria algum benefício a uma pessoa, o que totalizou 206 participantes ou 99.51%, dos 207 respondentes totais da pesquisa, um número muito expressivo, sendo que ao arredondarmos obtivemos 99% dos 207 respondentes totais afirmando que o bilinguismo acarretaria em benefícios, de forma genérica.

Qualitativamente, nos três idiomas a maioria valorou como 5 (concordar plenamente) com a afirmação, respectivamente, 89% em português, 83% em inglês e 89% espanhol, ou 87% do total, o que também foi bem significativo. Como últimas análises deste questionamento, avaliamos que, quando perguntados de maneira geral sobre os possíveis benefícios que o bilinguismo traria, os entrevistados, em sua quase totalidade, 99.5%, acreditaram que o bilinguismo traria benefícios a um falante, sendo que destes 87% concordaram plenamente com a afirmação; 0% do universo total de 207 participantes afirmou que falar mais de um

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idioma não traria benefícios ao falante bilíngue; e apenas 1 ou 0.5% dos respondentes (1 em língua inglesa) afirmou não saber sobre os supostos benefícios de ser bilíngue.

Quando perguntados se um imigrante sofre preconceito por causa de sua língua ou cultura, comparando os dados obtidos nas três línguas, em uma análise quantitativa, 81% em português marcaram sim, 44% em inglês e 78% espanhol, o que significa que a maioria absoluta dos respondentes da pesquisa, nos três idiomas, marcou sim, 152 participantes, ou 76% dos 207 totais, um número muito expressivo. Qualitativamente, nos três idiomas, 103 ou 50% assinalaram ou 5 (concordo plenamente) ou 4 (concordo) da amostra total de 207 respondentes.

Quando compararmos esses dados com os coletados - 76% acreditavam haver preconceito e, destes, 50% assinalaram concordar ou concordar plenamente com a afirmação de que um imigrante sofre preconceito por causa de sua língua ou cultura – com os da pergunta anterior sobre os benefícios em ser pelo menos bilíngue, em que 99.5% da amostra total afirmaram haver benefícios no bilinguismo, sendo que 199 respondentes ou 96% marcaram ou concordar ou concordar plenamente com esses benefícios – observamos que o universo pesquisado acreditava haver, em sua maioria absoluta – tanto benefícios (96%) quanto a falta de benefícios (76%) advindos da condição bilíngue, de acordo com o contexto apresentado (imigração).

Comparando aos dados teóricos, nossa hipótese primeira era a de que nossos respondentes, em sua maioria, iriam afirmar que acreditavam que um imigrante sofria preconceito por causa de sua língua ou cultura o que se confirmou pelos dados quantitativos, 76%, e qualitativos, 50% - assinalando concordar ou concordar plenamente com a referida afirmação.

Quando questionados sobre a crença de haver algum tipo de vantagem cognitiva acarretada pelo bilinguismo, quantitativamente, comparando os dados obtidos nas três línguas, 60% em português marcaram sim, 72% em inglês e 67% espanhol, totalizando 130 participantes, ou 63%, um número muito expressivo.

Conforme analisamos tanto quantitativamente quanto qualitativamente, nos três idiomas, a maioria absoluta, ou 63%, concordou em haver uma vantagem de ordem cognitiva em falantes bilíngues e que destes 56% afirmaram ainda concordar ou concordar plenamente com a existência desta uma vantagem cognitiva bilíngue, o que fez com que fosse confirmada nossa

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hipótese inicial de que encontraríamos a maior parte de nossos participantes em concordância com o paradigma científico vigente - de que há uma vantagem de ordem cognitiva no falante bilíngue -, resultado que nos permitiu inferir que esse paradigma científico tenha ultrapassado as fronteiras da Ciência, suas publicações e discussões restritas ao nicho científico, e tenha se consolidado, também, no senso-comum dos cidadãos.

Nas três línguas a maioria absoluta acreditou haver algum tipo de vantagem social acarretada pelo bilinguismo, totalizando 170 participantes, ou 82%. Ao compararmos com a análise quantitativa e comparativa feita na pergunta anterior em que 130 participantes, ou 63%, dos 207 respondentes totais da pesquisa confirmaram haver uma vantagem cognitiva bilíngue, sentimos um aumento expressivo de mais de 20% no grau de concordância, o que significa que os participantes em cerca de 20% a mais do que os que acreditavam haver uma vantagem de ordem cognitiva criam que havia uma vantagem social ligada ao bilinguismo.

Qualitativamente, obtivemos uma subamostra de 71% de todos os participantes, ou a maioria absoluta, afirmando concordar ou concordar plenamente com a existência de uma vantagem social bilíngue. Comparativamente aos resultados da questão anterior, em que 115 ou 56% de todos os participantes afirmam concordar ou concordar plenamente com a existência de uma vantagem cognitiva bilíngue, obtivemos146 ou 71% do universo total de respondentes, o que nos fez concluir em um aumento de 15% dos respondentes apontando para a existência de uma vantagem social bilíngue do que para os que apontaram uma vantagem cognitiva qualitativamente.

Observamos que já podemos avaliar como uma tendência científica a de enxergar-se uma vantagem bilíngue de ordem social - vantagem educacional, comunicacional, maior empatia com os falantes de outro idioma, de aceitação da cultura/ponto de vista do outro, vantagens econômicas, etc. conforme vimos na pesquisa teórica. Vimos que estas visões já eram encontradas nos meios de comunicação, por meio de reportagens e matérias jornalísticas; vimos a língua como fundadora do contexto social humano, sendo parte essencial da identidade (cultural) dos indivíduos e dos povos e subjacente às questões econômicas em que nos inserimos, por um viés amplo em que as Ciências se entrecruzavam. Trouxemos a definição de Jesús Martín-Barbero (2000: 12) de comunicação social sendo caracterizada como mais ampla e diferenciada da mera informação por ser impossível reduzi-la ao simples intercâmbio de mensagens. Concluímos que fica impossível a dissociação da língua(gem) –

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veículo da comunicação - da identidade do sujeito – ou sua identidade social – da comunicação social que só é possível em sua especificidade sociocognitiva, ou seja, a cognição como o entendimento amplo do conjunto de habilidades cerebrais/mentais necessárias para a obtenção de conhecimento sobre o mundo - as quais envolvem o pensamento, o raciocínio, a abstração, a linguagem, a memória, a atenção e a capacidade de resolução de problemas, entre outras funções (SIMONETTI, 2012: s/p) - e a produção de um sentido social.

Isso significa dizer que a comunicação social se faz entre os sujeitos e, por essa razão, suas identidades devem ser levadas em consideração na análise das comunicações. As identidades não são construídas pelos sujeitos, mas têm sua concepção nessas interações comunicativas que se estabelecem. Destacamos que para nós, a análise de Martín-Barbero (2000) foi especificamente relevante porque levava em consideração os principais aspectos que desejávamos explorar teoricamente nessa pesquisa: a comunicação social em sua complexidade que vai além da simples troca de mensagens; a sua faceta sociocognitiva – que abarca a esfera social comum a todos e a produção de sentido aos envolvidos –; e as identidades culturais que emergem nesses agentes promotores da interação comunicativa. Estudamos todos esses elementos e teorias porque a temática do bilinguismo, aparentemente e simplificadamente falar/dominar pelo menos dois idiomas, tem como veículo primeiro a língua, mas como vimos língua é cultura, língua é poder e língua é identidade e, para haver a comunicação (social) em uma ou mais línguas, faz-se primordial o entendimento da sociocognição.

Ajuizamos que a sociocognição pode ser entendida, assim, como uma janela que se abre entre o mundo interno e biológico de um sujeito, por meio do conjunto de suas habilidades cerebrais/mentais individuais, e o mundo da coletividade de todos os sujeitos, a esfera social comum a todos, com a produção de sentido aos envolvidos. A identidade (social) deste sujeito é a promotora da comunicação social, ou seja, a postura assumida por aquele sujeito, naquele meio social, ou a sua identidade social, faz a interface entre o que é específico de um indivíduo – sua cognição – e o que é comum a todos os indivíduos de sua espécie – a sociedade ou coletividade – sendo que por meio do sentido comum alcançado ocorre a comunicação, ou troca, ou interação (social).

Como analisamos, tanto quantitativamente quanto qualitativamente, a maioria absoluta, ou 82%, nos três idiomas, concordou em haver uma vantagem de ordem social em falantes

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bilíngues e que destes 71% afirmaram ainda concordar ou concordar plenamente com a existência desta vantagem social bilíngue. Conforme já mencionamos, sentimos ainda um aumento expressivo de mais de 20% no grau de concordância quando comparamos os resultados de uma confirmação de haver uma vantagem cognitiva para a confirmação de haver uma vantagem social ligada ao bilinguismo. Tais dados confirmaram nossa hipótese inicial, ao formular o questionamento, de que uma vantagem social poderia, no senso-comum, ser mais facilmente associada ao bilinguismo do que uma de ordem cognitiva, uma vez que podemos ligar o bilinguismo ao desenvolvimento e ao exercício da cidadania, à tolerância linguístico- cultural, à melhor aceitação de modos de viver e cultura, enfim, habilidades intrinsecamente sociais e não cognitivas.

Comparando qualitativamente as respostas nos três idiomas, a maioria, ou 42% em língua portuguesa, a segunda maior porcentagem ou 32% em língua inglesa e 33% em língua espanhola valorou como 5 (concordar plenamente), totalizando 43 respondentes ou 21% da amostra total de 207 participantes da pesquisa apontando por haver um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue. Ao adicionarmos à essa análise o dado de que 42 participantes nos três idiomas, ou 20% dos respondentes da amostra total, ainda marcaram 4 (concordar), 36% em português, 43% em inglês sendo a maioria da subamostra, e 33% em espanhol, obtivemos um total de 41% de todos os participantes, ou a maioria, afirmando concordar ou concordar plenamente com a existência de um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue.

A análise quantitativa comparativa nos três idiomas analisados apontou para uma alta porcentagem de respondentes totais, 43%, dizendo acreditar não haver um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue. As análises qualitativas eram feitas somente com os respondentes que concordaram com a afirmação de que haveria um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue e confirmaram essa porcentagem elevada de concordância inicial (54%), em língua portuguesa apenas 3% totais assinalaram 2 (discordar) ou 1 (discordar plenamente), 7% em língua inglesa marcaram 2 (discordar), maior porcentagem de todas as amostras e em língua espanhola não houve aqueles que discordassem (plenamente) da afirmação.

Posto isso, retomamos os dados de Danielsson (2017) e a “fixação teimosa” britânica ao não incentivo do aprendizado de um idioma estrangeiro. Ao transpormos que, semelhantemente,

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ocorria no Brasil, um país em que apenas o idioma oficial português é valorizado na nação, e ao cruzamos este dado com o já exposto da reportagem da Istoé (2007), em que eram estimados que apenas cerca de 5% falava um segundo idioma, formulamos a hipótese de que pode haver uma “fixação teimosa” do brasileiro à língua portuguesa que justificaria a alta porcentagem de 43% dos entrevistados totais discordando da afirmação de que haveria um melhor salário na profissão de um bilíngue em relação a um monolíngue, uma vez que a vasta maioria dos brasileiros é monolíngue. Decidimos fazer o teste do qui-quadrado com esses dados e concluímos que o qui-quadrado calculado (5.36) era menor do que o tabelado (9.5), então, não rejeitou-se H0 em prol de H1, o que significa que estava correta nossa afirmação de que a maioria dos entrevistados concordaria com a afirmação de que um bilíngue teria inevitavelmente um melhor salário na profissão do que um monolíngue.

Cerca de 76% dos entrevistados afirmaram que se matriculariam ou a um parente em um ‘Ensino Bilíngue’ e 67% consideraram-se bilíngues, o que nos fez constatar que da diferença de 9%, uma porcentagem dos que não se consideravam bilíngues desejava um ‘Ensino Bilíngue’ para si ou para algum parente, além dos próprios bilíngues que não o desejassem, obviamente.

Nossa hipótese inicial era a de que os respondentes iriam afirmar, em sua maioria, que gostariam de matricular-se, ou a um parente, nesse tipo de instituição educacional, uma vez que nossas pesquisas apontaram para um crescente número, muito expressivo, destas escolas no Brasil, o que indicava que há um interesse do público nelas. Houve a confirmação de nossa hipótese inicial e a porcentagem de 76% de interesse no ‘Ensino Bilíngue’, ou mais de três quartos de todos os entrevistados é muito expressiva e confirma os dados teóricos levantados por nós.

A maioria absoluta disse que considerava que a mídia exercia influência sobre as pessoas ambicionarem um estudo bilíngue atualmente, quando comparamos os dados obtidos, 74% em português, 90% em inglês e 86% espanhol, o que significa um total de 141 participantes, ou 68%, dos 207 respondentes totais da pesquisa. Nossa hipótese inicial era a de que os respondentes afirmariam que consideravam que a mídia exercia influência sobre as pessoas ambicionarem um estudo bilíngue atualmente, o que foi confirmado devido as pesquisas que fizemos, o grande número de reportagens, e propagandas que encontramos do ‘Ensino Bilíngue’.

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Nossa hipótese era a de que os respondentes não saberiam diferenciar as escolas bilíngues das internacionais em uma porcentagem alta, o que fez com que nossa hipótese inicial fosse frustrada. Acreditamos que a principal razão para que a porcentagem de concordância de existirem diferenças entre a escola bilíngue e a internacional ter ficado acima de 91%, nos três idiomas, foi a própria formulação da pergunta que tinha as alternativas com as diferenças ali elencadas disponíveis desde um primeiro momento. Isso pode ter levado a quase totalidade dos respondentes a pensar nas supostas diferenças, diferentemente da situação em que se providencia apenas sim, não e não sei e somente os que marcam sim teriam acesso as alternativas com as supostas diferenças elencadas, tal qual fizemos nas outras perguntas desta pesquisa.

A maioria absoluta, nos três idiomas, afirmou que acreditava que uma escola intitulada ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional – teria mensalidades mais altas do que uma escola regular, 92% do total de respostas em língua portuguesa, 79% em língua inglesa e 89%, em língua espanhola, totalizando 185 respondentes ou 89% dos 207 participantes. Isso significa dizer que aproximadamente 89% do universo pesquisado acreditavam que o ‘Ensino Bilíngue’ fosse mais oneroso do que um ensino regular ou não bilíngue ou internacional, o que confirmou nossa hipótese inicial, uma vez que encontramos esse dado em nossa pesquisa teórica.

Comparando os dados obtidos nas três línguas, a maioria absoluta, nos três idiomas, afirmou que acreditava ser justo uma escola ‘Escola Bilíngue’ ter mensalidades mais altas do que uma escola regular, 59% do total de respostas em língua portuguesa, 63%, em língua inglesa e 67% em língua espanhola, totalizando 124 respondentes ou 60%, confirmando nossa hipótese inicial, uma vez que a teoria apontou para maior necessidade de treinamento, infraestrutura e formação no ‘Ensino Bilíngue’.

Também a maioria absoluta, nos três idiomas, afirmou que não havia estudado ou ainda estudava em uma ‘Escola Bilíngue’ - 93% do total de respondentes em língua portuguesa, 74%, em língua inglesa e 67% em língua espanhola - totalizando 182 participantes ou 88% dos 207 totais da pesquisa. Isso quer dizer que apenas 12% do total estudavam/estudaram, ou seja, 25 respondentes, dos quais 17 participantes, ou 68% da subamostra total dos que alegaram sim, estudavam em uma escola bilíngue, e 8 ou 32% em uma escola internacional. Assim, do total que alegou estudar em uma instituição que promovia o ‘Ensino Bilíngue’, a maioria absoluta, nos três idiomas, indicou estudar ou ter estudado em uma escola bilíngue (68%). A nossa

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hipótese inicial era a de que uma pequena parcela dos participantes desta pesquisa estudasse ou tivesse estudado no ‘Ensino Bilíngue’ – escolas internacionais ou bilíngues ou ainda escolas regulares com um “programa bilíngue”, uma vez que esse ensino é extremamente elitista, ou seja, apenas as classes mais privilegiadas, A e parte da B, têm acesso a ele.

Os resultados desta pesquisa, conforme já mencionamos, apontaram para 143 participantes ou 69%, nos três idiomas, como pertencentes às classes A e B, referência brasileira, faixa dos que recebiam entre R$103.632,00 a R$135.144,00 por ano. Mesmo que a maioria dos respondentes desta pesquisa tenham alegado pertencer a classe A ou B, acreditávamos que este elitismo extremo do ‘Ensino Bilíngue’, principalmente do brasileiro (a maioria absoluta, ou 88% disseram estar no Brasil) refletir-se-ia em nossos dados, o que de fato confirmou-se nos 12% do total de respondentes da pesquisa dizendo ter tido ou ter esse tipo de ensino. O que analisamos na teoria é que esse nicho, do ‘Ensino Bilíngue’, é extremamente restrito, elitizado, hierarquizado e desejado, e que essas características ao mesmo tempo o distinguem e servem de modelo para os demais segmentos de ensino que tentam copiá-lo.

Nos três idiomas, a maioria absoluta afirmou que que sim existiam vantagens em se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’ – 94% do total de respondentes em língua portuguesa, 88%, em língua inglesa e 89% em língua espanhola - totalizando 192 participantes ou 93% dos 207 totais da pesquisa. Ao longo desta tese trouxemos numerosos exemplos de reportagens da mídia, brasileira e internacional, além de estudos científicos de áreas diferentes do conhecimento – fisiologia, economia, psicologia, educação, direitos humanos, literatura, estudos culturais, antropologia, etc. – que apontavam para as vantagens do bilinguismo e para as vantagens do ensino feito em dois idiomas ou ‘Ensino Bilíngue’. Esse embasamento teórico fez-nos considerar a hipótese de que encontraríamos a maioria absoluta dos participantes respondendo que haveria vantagens em se estudar em uma ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional – o que se confirmou nos cerca de 93% respondendo sim, nos três idiomas, à essa pergunta.

Nas análises, os respondentes apontaram como uma das principais vantagens do ‘Ensino Bilíngue’ a de falar/dominar um idioma, 93% em português e 92% em inglês, sendo a número um para estes respondentes, e 62% em espanhol, como a vantagem de número dois para eles, cruzaremos estes dados com outros de nossa pesquisa. Como 91% do universo total de todos os participantes afirmaram ter o português como língua materna e ainda 88% estarem

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localizados no Brasil, sendo que destes 69% consideraram-se bilíngues e 76% gostariam de matricular-se ou matricular a um parente em uma ‘Escola Bilíngue’, a alta indicação de falar/dominar um idioma como vantagem principal de um ‘Ensino Bilíngue’ foi interpretada como indicativo de que em um país essencialmente formado por monolíngues estivesse despontando no senso-comum de sua sociedade a importância (vista como uma vantagem) de falar ou dominar um outro idioma que não o português, ou de ser pelo menos bilíngue. Nossa hipótese inicial era a de que a maioria dos respondentes iria considerar uma vantagem do ‘Ensino Bilíngue’ o desenvolvimento (falar, dominar, ser proficiente, competente) em um idioma estrangeiro, o que se confirmou.

A segunda maior vantagem para os respondentes foi a de conhecer novas culturas por meio dos idiomas, respectivamente, 79%, 76% e 75%; e a terceira foi a de aprender a respeitar culturas e pessoas, 64% em português, 76% em inglês, e 50% em espanhol. Como vimos na teoria língua é cultura, sendo que o conceito línguacultura cunhado por Agar (1994) norteou nossa pesquisa como um todo. Os resultados desta pesquisa apontaram para 85% de todos os respondentes concordando com a afirmação de que língua é cultura ou é o mesmo que cultura, o que corrobora este segundo dado de que, nesse mesmo universo de pesquisados, conhecer novas culturas por meio dos idiomas seja apontada uma vantagem principal do ‘Ensino Bilíngue’. Essas duas vantagens apontadas pelos respondentes confirmaram nossa hipótese primeira de que os participantes, em sua maioria, considerariam uma vantagem do ‘Ensino Bilíngue’ o fato de ele propiciar o conhecimento de culturas e de ele ensinar a respeitá-las, além de ensinar o respeito às pessoas de outras culturas por meio do aprendizado de idiomas.

Conforme a pesquisa teórica, as questões culturais foram apontadas por Da Silva (2009: 24) como definidoras, em sua análise, de uma escola bilíngue propriamente dita: o reconhecimento, a participação e o respeito a ambientes culturais diversos a formação de cidadãos para o mundo globalizado estão entre essas características. Destacamos a preocupação das escolas em formar alunos capazes de reconhecer, respeitar e participar de diferentes ambientes culturais; estudantes que estejam preparados para lidar com diferentes culturas e ambientes sociais, o que foi interpretado como uma contribuição para a disseminação da tolerância entre os povos e a formação de cidadãos multiculturais ao formar os bilíngues (id: 27). Observamos que são comuns as frases “formar cidadãos para um mundo globalizado”, “cidadãos internacionais”, “cidadãos do mundo” nos textos fornecidos pelas escolas analisados pela pesquisadora.

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As pesquisas de Cantuaria (2005: 5) falavam nessas escolas de ‘Ensino Bilíngue’ como um seleto grupo que ocupa uma posição social privilegiada na sociedade brasileira na atualidade e que se baseava na acumulação de uma cultura internacional, no conhecimento de língua e culturas que permitiram acesso a outros países até mesmo quanto a oportunidade de empregos. Vimos que essa aquisição de “cultura internacional” seria a de um tipo de capital cultural específico, o capital cultural internacional, o qual no passado ligava os imigrantes a sua cultura de origem, na gênese das escolas internacionais, e que hoje faz com que os estudantes da escola internacional consigam estudar e trabalhar em outras nações, que segundo autores de outros países: “[...] transformam a escola em instância dominante de produção de competências não apenas técnicas, mas principalmente sociais, exigidas para a participação nesta nova ordem mundial” (BOURDIEU & BOLTANSKI, 1975 apud CANTUARIA, 2005: 5).

Essas competências sociais foram por nós definidas, logo na Introdução desta tese, como a competência global (global competence) definida pela National Education Association (NEA), como a habilidade de adquirir conhecimento e compreensão profundos sobre assuntos internacionais em que estaria explícita a aptidão de possuir proficiência em línguas estrangeiras – nas habilidades de ler, falar e escrever mais de um idioma (HANNA, 2018: 23). Esta aptidão de possuir a proficiência em línguas estrangeiras fez-nos conectar a competência global a um dos objetos de investigação de nossa tese, o ‘Ensino Bilíngue’. A competência global, por meio da proficiência em mais de uma língua, ainda segundo a pesquisadora, abriria as portas para o entendimento de outros povos e culturas, assim como manteria um conhecimento internacional histórico, socioeconômico e político, sendo peça fundamental para cultivar uma apreciação da diversidade cultural, além de implicar em tolerância e senso de cooperação entre as pessoas e povos (id. 23).

Valemo-nos também de outras habilidades sociais comunicativas exaltadas pelo pesquisador brasileiro Marcelino (2009: 11), que, no campo comunicativo, destacou que o bilíngue pode estabelecer vínculos com parentes e outras comunidades linguísticas, além de poder ter acesso à materiais originais, sem necessitar fazer o uso de traduções e uma “maior sensibilidade linguística” e de “vantagens culturais”, que podem ser consideradas como relevantes na construção de tolerância, tal qual Da Silva (2009) apontou, ou para “sensibilizar o indivíduo para outras culturas” (MARCELINO, 2009).

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Destacamos o autor Cheng (2002) que se valeu de sua própria experiência bilíngue para apontar que a solução de seu conflito linguístico interno esteve pautada no “amor” e no “diálogo”. Observamos que suas línguas em contato (chinês e francês) conseguiram conviver devido ao diálogo, ou à dialética que nele estabeleceu-se internamente e que essa convivência pacífica só fez-se possível devido a função fundamentalmente social iminente a toda língua: a sua utilidade primeira de comunicar algo a alguém, nem que esse alguém sejamos nós mesmos e dessa comunicação fazer sentido, ou a comunicação sociocognitiva de Martín-Barbero (2000). Concluímos, assim, que não devemos tentar apagar as culturas, línguas, hábitos, identidades, etc. de origem (nem dos imigrantes, nem dos nativos de um país, nem dos estudantes bilíngues) e que devemos valorizar suas culturas e identidades para que haja enriquecimento de todas as partes, por meio da tolerância e da mitigação de possíveis conflitos linguístico- culturais.

Em nossa análise crítica, à tendência de segmentação do conhecimento na atualidade, devido, principalmente, à alta especialização dos profissionais, afirmamos que acreditamos ser importante para os debates aprofundados no bilinguismo não levar em consideração somente as publicações que exaltem de maneira inconteste a suposta vantagem bilíngue, ou a tendência de publicação atual (publication bias) e, por isso, propusemos um entrelaçar de visões, conceitos, teorias, paradigmas, opiniões, etc. das diversas áreas do conhecimento científico e da vida comum – reforçando o papel da mídia comunicativa como importante intermediária entre as partes.

Enfim, como as segundas e as terceiras maiores vantagens do ‘Ensino Bilíngue’ para os respondentes desta pesquisas foram conhecer novas culturas por meio dos idiomas e aprender a respeitar culturas e pessoas, em porcentagens expressivas, como a teoria nos embasa, propusemos com esses resultados a reflexão de que o bilinguismo é capaz de promover a cidadania e desenvolver uma competência global, intrinsecamente social, que podem dar sustentação a um novo paradigma em Ciências em que dois dos aspectos sociais da língua, a sua capacidade de comunicação social e o substrato cultural do qual a fez emergir, sejam colocados em igualdade às possíveis vantagens cognitivas que o bilinguismo pode acarretar, tomando por base os conceitos de línguacultura (AGAR, 1994) identidade cultural (HALL, 1996), comunicação social MARTÍN-BARBERO, 2000) e competência global expostos nesta tese (HANNA, 2018).

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A quarta e a quinta vantagens do ‘Ensino Bilíngue’ para os entrevistados, obter uma certificação no idioma (55%, 58% e 37%, em português, inglês e espanhol) e ter um melhor salário (47%, 47%, 37%, respectivamente) foram relacionadas a vantagens de ordem educativa, uma certificação que comprova o nível no idioma, ou a proficiência, ou que permita o ingresso em uma universidade estrangeira; e/ou de ordem econômica, uma vez que estas certificações podem ser utilizadas para se trabalhar em um outro país. Estas questões foram abordadas na teoria levantada no Capítulo III e fez com que nossa hipótese inicial de que os respondentes, em sua maioria, considerariam que o ‘Ensino Bilíngue’ acarretaria na vantagem de fornecer uma certificação internacional e um melhor salário no futuro.

Comparando os dados obtidos nas três línguas, a maioria absoluta, nos três idiomas, afirmou que não havia trabalhado ou ainda trabalhava em uma ‘Escola Bilíngue’ – 90% do total de respondentes em língua portuguesa, 88%, em língua inglesa e 100% em língua espanhola - totalizando 187 participantes ou 90% dos 207 totais da pesquisa, ou 20 participantes. Conforme discutimos, estas instituições são bem elitizadas o que torna natural poucos profissionais terem acesso a elas o que é refletido nessa baixa porcentagem. Outro aspecto é a necessidade de formação específica ou ter duas diplomações, pedagogia e proficiência em língua estrangeira, licenciatura em biologia e proficiência em língua estrangeira, ou formação em Letras, geralmente sendo necessárias provas internas nas quatro habilidades, ler, escrever, ouvir e falar no idioma-alvo, além de entrevistas e treinamentos e o desenvolvimento de aulas teóricas e práticas, já com os alunos, antes da contratação.

Após a contratação, os professores geralmente passam por um período de experiência, como assistentes dos professores mais antigos, antes de serem realmente efetivados. Observamos em nossas pesquisas, que os critérios de seleção para professores do ‘Ensino Bilíngue’ brasileiro são rígidos também devido ao seu elitismo e alta especialização necessária para seus contratados, o que nos levou a propor critérios rigorosos para a regulamentação do setor (Capítulo 3, subitem 3.9), em uma tentativa de nivelar o setor pelo nível superior.

Em nossa proposta elencamos 10 critérios mínimos para que a instituição – escola bilíngue, escola internacional, ou programa bilíngue para escolas regulares – seja realmente considerada como parte do ‘Ensino Bilíngue’ brasileiro. Esses critérios mínimos, por nós propostos, versavam sobre a qualificação da docência contratada; o número mínimo de horas de exposição na língua-alvo; os currículos a serem seguidos; os aspectos culturais que devem

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ser incluídos; a necessidade de promover-se um aprendizado significativo e contextualizado; a necessidade de inclusão dos aspectos sociais nesse ensino; a necessidade de comprovação do aprendizado linguístico dos discentes por níveis com comprovação de nível internacional; caso queiram ser também escolas internacionais, devem ou ser uma instituição reconhecida pelos sistemas de ensino de seus respectivos países de referência, sendo sua representante em territórios estrangeiros, ou funcionarem regularmente no Brasil como instituições internacionais; ter como objetivo maior o desenvolvimento de uma competência global definida como “a habilidade de adquirir conhecimento e compreensão profundos sobre assuntos internacionais” (HANNA, 2018: 23); e ter como requisito primordial básico proporcionar o conhecimento acadêmico sobre bilinguismo para os envolvidos no ‘Ensino Bilíngue’, tal qual proposto por Hoexter (2016).

Outro fator que encontramos é que muitos professores estrangeiros têm privilégio na contratação, principalmente nas escolas internacionais, embora também ocorra nas bilíngues, uma vez que são falantes nativos e a porcentagem de brasileiros com proficiência em um idioma estrangeiro é baixa, como também já discutimos. Todos esses aspectos, levaram-nos à hipótese de que uma porcentagem muito baixa de participantes afirmaria trabalhar ou ter trabalhado no ‘Ensino Bilíngue’, o que de fato foi confirmado nos 9.7%, ou apenas 20 indivíduos de 207 de respondentes totais.

Comparando quantitativamente os dados obtidos nas duas línguas em que houve respondentes, 60%, ou a maioria absoluta, em português e inglês disse que não acreditava haver um efeito negativo na aquisição do idioma da escola quando esse era diferente da língua do país em que a escola estava. O total foi de 12 participantes, ou 60% dos 20 respondentes da subamostra dos professores do ‘Ensino Bilíngue’, ou a maioria absoluta. A porcentagem de respondentes que acreditaram no contrário, que sim haveria um efeito negativo na aquisição do idioma, 20% em cada idioma disseram sim, somente em contextos de alfabetização, ou seja, um total de 6 participantes ou 30% da subamostra de 20. A análise qualitativa das respostas ficou entre 3 (concordo medianamente) e 4 (concordo) em português, e 3 (concordo medianamente) em inglês, o que pode significar que os respondentes têm dúvidas quanto a haver um efeito negativo na aquisição da língua da escola nos dois contextos de imigração e alfabetização em segunda língua diferente da língua do país.

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Vimos na pesquisa teórica que esse mito proposto por Grosjean (2010) era popular na primeira metade do século XX, o autor afirmou que desde então muitas pesquisas apontaram para o resultado de que as crianças bilíngues não têm atrasos na aquisição de linguagem em nenhum dos contextos citados. Ele afirmou que as pessoas deveriam ter em mente que as crianças bilíngues, uma vez que têm que lidar com duas ou mais línguas, são diferentes em alguns aspectos das crianças monolíngues, mas não em relação à taxa de aquisição de linguagem. Nossa finalidade com essa pergunta era a de descobrir se o mito ainda vigora entre os professores do ‘Ensino Bilíngue’, ou se ele estava restrito ao século passado como apontado por Grosjean. Para terminarmos a análise dos dados coletados em nossa pesquisa, concluímos que esses resultados apontaram para a confirmação de nossa hipótese inicial de que a maioria absoluta (60%) não acreditaria em haver um efeito negativo na aquisição do idioma da escola quando esse era diferente da língua do país em que a escola estava, o que confirma que este mito pode, realmente, ter sido mais forte no século passado, século XX, e que está perdendo sua força, tal qual Grosjean afirmou.

Por fim, concluímos, pela parte teórica, que há a necessidade de formularem-se parâmetros para o ‘Ensino Bilíngue’ brasileiro, a que nos prestamos contribuir por meio desta pesquisa (subitem 3.9), para que haja uma real promoção de uma competência global em seus estudantes e para que estes consigam mudar a estatística de apenas 5% da população brasileira ter conhecimentos avançados em outros idiomas. Advogamos para que este ‘Ensino Bilíngue’ tenha parâmetros nivelados pelo nível superior para que possa contribuir na acumulação de uma cultura internacional, no conhecimento de língua e culturas, no aumento da tolerância/empatia entre pessoas, povos e culturas, no acesso a outros países, até mesmo quanto à oportunidade de empregos, em todas as classes sociais brasileiras, e não somente na elite. O bilinguismo, dessa forma, será finalmente visto por uma perspectiva ampla, que contemple as várias facetas que o formam – faceta biológica, social, identitária, cultural, linguística, econômica, etc. – não sendo interpretado como uma mera vantagem, mas sim como a vantagem essencial para melhorarmos o mundo.

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359

ANEXO 1

QUESTIONÁRIO (PESQUISA MUNDIAL SOBRE BILINGUISMO)

1. Em que língua você gostaria de responder a essa pesquisa? 1. In which language would you like to respond to this survey? 1. ¿En qué idioma le gustaría responder a esta encuesta?

2. De onde você responde a essa pesquisa? Whereabouts do you respond to this research? ¿De dónde usted responde a esta encuesta? a. Brasil b. Outro país a. Brazil b. Another country a. Brasil b. Otro país

(DO BRASIL) 2.B Em que região do Brasil você vive? In which region of Brazil do you live? ¿En qué región de Brasil usted vive?

a. Norte b. Sul c. Centro-oeste d. Nordeste. e. Sudeste a. North b. South c. Middle west d. Northeast e. Southeast a. Norte b. Sur c. Centro-oeste d. Noreste. e. Sudeste

(OUTRO PAÍS) 2.C De que continente você responde a essa pesquisa? From which continent do you respond to this research? ¿De qué continente usted responde a esa encuesta?

a. América do Norte (Canadá ou EUA) b. América Central ou do Sul c. Europa d. África e. Ásia

360

f. Oceania

a. North America (Canada or USA) b. Central or South America c. Europe d. Africa e. Asia f. Oceania

a. América del Norte (Canadá o EE.UU.) b. América Central o del Sur c. Europa d. África e. Asia f. Oceanía

3. Esta língua (português) é a sua língua materna? Is this language (English) your mother tongue? ¿Esta lengua (español) es su lengua materna?

a. Sim b. Não a. Yes b. No a. Sí b. No

(NÃO É MINHA LÍNGUA MATERNA) 3.B Qual é sua língua materna? What is your mother tongue? ¿Cuál es su lengua materna? (RESPOSTA ABERTA)

4. Qual é o seu sexo? What is your gender? ¿Cuál es su sexo? a. Feminino b. Masculino c. Prefiro não responder

361

a. Female b. Male c. Rather not answer a. Femenino b. Masculino c. Prefiero no responder

5. Qual é sua faixa etária? What is your age group? ¿Cuál es su grupo de edad? a. 0-10 b. de 11 a 19 c. de 20-29 d. 30-39 e. 40-49 f. 50-59 g. 60-69 h. 70-79 i. + 80 anos

a. 0-10 b. de 11 a 19 c. de 20-29 d. 30-39 e. 40-49 f. 50-59 g. 60-69 h. 70-79 i. + 80 years a. 0-10 b. de 11 a 19 c. de 20-29 d. 30-39 e. 40-49 f. 50-59 g. 60-69 h. 70-79 i. + 80 años

6. Qual é sua renda familiar? What is your family income? (for a family of three per year) ¿Cuál es su renta familiar? a. Até R$ 1.254 b. b. de R$ 1.255 a R$ 2.004 c. c. de R$ 2.005 a R$ 8.640 d. de R$ 8.641 a R$ 11.261 e. acima de R$ 11.262

a. U$18,871 a year b. between U$30,000 and U$100,000 c. between U$100,000 and U$150,000 d. between U$100,000 and U$350,000 e. at least U$389,436 a year

7. Qual é a sua escolaridade? What is your schooling? ¿Cuál es su escolaridad? a. Ensino Fundamental 1 b. Ensino Fundamental 2 c. Ensino Médio

362

d. Ensino Superior e. Pós-Graduação

a. Elementary School 1 b. Elementary School 2 c. High School d. Higher Education e. Postgraduate

a. Enseñanza Fundamental 1 b. Enseñanza Fundamental 2 c. Enseñanza media d. Enseñanza Superior e. Posgraduación

8. Você se considera bilíngue? Do you consider yourself bilingual? ¿Usted se considera bilingüe?

a. Sim b. Não a. Yes b. No a. Sí b. No

(SE A PESSOA RESPONDER “NÃO SOU BILÍNGUE”) 8.B. Não me considero bilíngue porque... I do not consider myself bilingual because... No me considero bilingüe porque... a. sou monolíngue b. sou multilíngue c. não sei escrever ou ler na outra língua. d. não me considero fluente na segunda língua e. outra razão. Qual? ______

a. I'm monolingual b. I'm multilingual

363

c. I do not know how to write or read in the other language d. I do not consider myself fluent in the second language e. another reason. Which one? ______

a. yo soy monolíngue b. soy multilingüe c. no sé escribir o leer en la otra lengua d. no me considero fluyente en la segunda lengua e. otra razón. ¿Quál? ______

(SE A PESSOA RESPONDER “SIM, SOU MULTILÍNGUE”) 8.C. Quais outros idiomas você fala? What other languages do you speak? ¿Qué otros idiomas usted habla?

(RESPOSTA ABERTA)

(SE A PESSOA RESPONDER “SIM, SOU BILÍNGUE”) 9. B. Que línguas você fala (além do português)? What languages do you speak (other than English)? ¿Qué idiomas usted habla (además del español)? a. Inglês b. espanhol c. alemão d. japonês e. outra, qual? (RESPOSTA ABERTA)

a. Portuguese b. Spanish c. German d. Japanese e. another, which one? (RESPOSTA ABERTA)

a. Portugués

364

b. Inglés c. Alemán d. Japonés e. otro, ¿cuál? (RESPOSTA ABERTA)

10. Para você língua é cultura (ou é o mesmo que cultura)? * For you, is language culture (or is the same as culture)? ¿Para usted la lengua es cultura (o es lo mismo que cultura)?

a. Sim b. Não c. Não sabe opinar a. Yes b. No c. Do not know a. Sí b. No c. No tengo opinión

* (A PARTIR DESSE PONTO NAS PERGUNTAS COM * UMA TELA DE ESCALA SE ABRIRÁ QUANDO O ENTREVISTADO MARCAR “SIM”) 10 B – “Língua é cultura ou é o mesmo que cultura.” Marque 1 (discordo completamente) a 5 (concordo completamente) 1 2 3 4 5

10 B - “Language is culture or is the same as culture.” Mark 1 (strongly disagree) to 5 (completely agree) 1 2 3 4 5

10 B - “La lengua es cultura o es lo mismo que cultura.” Marque 1 (desacuerdo completamente) a 5 (totalmente de acuerdo)

1 2 3 4 5

(SE RESPONDEREM SIM) 10. C Para você um bilíngue é necessariamente bicultural? * For you, a bilingual is necessarily bicultural?

¿Para usted un bilingüe es necesariamente bicultural? a. Sim b. Não c. Não sabe opinar a. Yes b. No c. Do not know a. Sí b. No c. No tengo opinión

365

10.D * “Os bilíngues são sempre biculturais.” “Bilinguals are always bicultural.” “Bilingües son siempre biculturales.”

11. Você considera a língua (materna/aprendida) parte da identidade de um falante?* Do you consider the language (mother tongue/learned) part of a speaker's identity? ¿Usted considera la lengua (materna/aprendida) parte de la identidad de un hablante? a. Sim b. Não c. Não sabe opinar a. Yes b. No c. Do not know a. Sí b. No c. No tengo opinión

11. B* “A língua (materna/aprendida) é parte da identidade de um falante.” “The language (mother tongue/learned) is part of a speaker's identity.” “La lengua (materna/aprendida) es parte de la identidad de un hablante.”

12. Para você língua é poder (ou é o mesmo que poder)? * For you, is language power (or is the same as power)? ¿Para usted la lengua es poder (o es lo mismo que poder)? a. Sim b. Não c. Não sabe opinar a. Yes b. No c. Do not know a. Sí b. No c. No tengo opinión

12.B * “Língua é poder ou é o mesmo que poder.” “Language power is or is the same as power.” “La lengua es poder o es lo mismo que poder.”

13. Você considera que falar mais de um idioma (ser pelo menos bilíngue) traga benefícios a uma pessoa? * Do you consider that speaking more than one language (being at least bilingual) brings benefits to a person? ¿Usted cree que hablar más de un idioma (ser al menos bilingüe) traiga beneficios a una persona? a. Sim b. Não c. Não sabe opinar

366

a. Yes b. No c. Do not know a. Sí b. No c. No tengo opinión

(SE MARCAR SIM) *

13. B “Falar mais de um idioma traz benefícios.” “Speaking more than a language brings benefits.” “Hablar más de un idioma trae beneficios.”

(SE MARCAR NÃO) * 13. C “Falar mais de um idioma não traz benefícios.” “Speaking more than a language does not bring benefits.” “Hablar más de un idioma no trae beneficios.”

14. Você acha que um imigrante sofre preconceito por vir de uma cultura diferente e por falar outra língua? Do you think a bilingual immigrant is prejudiced by coming from another culture and speaking another language? ¿Usted cree que un inmigrante bilingüe sufre prejuicio por venir de otra cultura y por hablar otra lengua? a. Sim b. Não c. Não sabe opinar

a. Yes b. No c. Do not know a. Sí b. No c. No tengo opinión

(SE MARCAR SIM) 14. B *“Um imigrante bilíngue sofre preconceito por vir de outra cultura e falar outro idioma.” “A bilingual immigrant is prejudiced by coming from a different culture speaking another language.” “Un inmigrante bilingüe sufre prejuicio por de venir de una cultura diferente y hablar otro idioma.”

15. Você acredita que um bilíngue tenha alguma vantagem cognitiva (concentração, agilidade mental, fazer tarefas melhor etc.) em relação aos monolíngues? *

367

Do you believe that a bilingual has any cognitive advantage (concentration, mental agility, performing tasks better etc.) compared to monolinguals? ¿Usted considera que un bilingüe tiene alguna ventaja cognitiva (concentración, agilidad mental, hacen mejor las tareas, etc.) en relación con los monolingües? a. Sim b. Não c. Não sabe opinar a. Yes b. No c. Do not know a. Sí b. No c. No tengo opinión

15. B * “Um bilíngue tem alguma vantagem cognitiva.” “A bilingual has a cognitive advantage.” “Un bilingüe tiene alguna ventaja cognitiva.”

16. Você acredita que um bilíngue tenha alguma vantagem social (melhor comunicação, maior empatia ou tolerância na convivência com os outros etc.) em relação aos monolíngues? * Do you believe that a bilingual has a social advantage (better communication, greater empathy or tolerance in the coexistence with others, etc.) compared to monolinguals? ¿A usted le parece que un bilingüe tiene alguna ventaja social (mejor comunicación, mayor empatía o tolerancia en la convivencia con los demás, etc.) en relación con los monolingües? a. Sim b. Não c. Não sabe opinar a. Yes b. No c. Do not know a. Sí b. No c. No tengo opinión

16. B * “Um bilíngue tem alguma vantagem social.” “A bilingual has a social advantage.” “Un bilingüe tiene alguna ventaja social.”

17. Você acha que uma pessoa bilíngue terá inevitavelmente um melhor salário em sua profissão do que uma monolíngue? * Do you think a bilingual person will inevitably have a better salary in his profession than a monolingual one? ¿A usted le parece que un bilingüe tendrá inevitablemente mejor sueldo en su profesión que un monolingüe?

368

a. Sim b. Não c. Não sabe opinar a. Yes b. No c. Do not know a. Sí b. No c. No tengo opinión

17. B * “Um bilíngue inevitavelmente terá melhor salário.” “A bilingual person will inevitably have a better salary.” “El bilingüe tendrá inevitablemente mejor sueldo.”

(AQUI NÃO MAIS APARECERÃO AS ESCALAS PARA AS RESPOSTAS SIM) 18. Se você tivesse oportunidade de se matricular, ou matricular algum parente, em uma “escola bilíngue” ou em uma “escola internacional”, você o faria? If you had a chance to enroll or enroll any relatives, in a "bilingual school" or an "international school," would you do it? ¿Si tuviera la oportunidad de matricularse, o matricular a algún pariente, en una "escuela bilingüe" o en una "escuela internacional", usted lo haría? a. Sim b. Não c. Não sabe opinar a. Yes b. No c. Do not know a. Sí b. No c. No tengo opinión

(SE A PESSOA MARCAR “SIM, QUERO ESTUDAR EM UMA ESCOLA BILÍNGUE) 18. B Você considera que a mídia (jornais, revistas Rede Sociais, etc.) exercem influência sobre as pessoas ambicionarem um estudo bilíngue atualmente? Do you consider that the media (newspapers, Social Network, magazines, etc.) exert influence on people's ambition for a bilingual study these days? ¿Usted cree que los medios (periódicos, revistas Red Sociales, etc.) ejercen influencia sobre las personas para ambicionar un estudio bilingüe actualmente? a. Sim b. Não c. Não sabe opinar a. Yes b. No c. Do not know a. Sí b. No c. No tengo opinión

19. Para você existem diferenças entre uma escola bilíngue e uma escola internacional? Se houver, qual seria? (MARQUE QUANTAS ALTERNATIVAS QUISER) Are there differences between a bilingual and an international school for you? If so, what would that be? (CHECK AS MANY ALTERNATIVES YOU WANT)

369

¿Para usted hay diferencias entre una escuela bilingüe y una internacional? ¿Si hay, cuál sería? (MARQUE TODAS LAS ALTERNATIVAS QUE QUIERA)

a. Não há diferença entre escola bilíngue e internacional já que ambas ensinam em pelo menos dois idiomas. b. Sim, a escola bilíngue segue o currículo do país em que está, mas também oferece algumas matérias em idiomas estrangeiros. c. Sim, a escola internacional segue um currículo de outro país. d. Sim, a escola internacional prepara os alunos para universidades em outros países. e. Sim, a escola internacional oferece certificações internacionais.

a. There is no difference between bilingual and international schools since both teach in at least two languages. b. Yes, bilingual schools follow the curriculum of the country they are in, but also offers some subjects in foreign languages. c. Yes, international schools follow a curriculum from another country. d. Yes, international schools prepare students for universities in other countries. e. Yes, international schools offer international certifications.

a. No hay diferencia entre la escuela bilingüe e internacional ya que ambas enseñan en al menos dos idiomas. b. Sí, la escuela bilingüe sigue el currículo del país en que está, pero también oferta algunas materias en idiomas extranjeros. c. Sí, la escuela internacional sigue un currículo de otro país. d. Sí, la escuela internacional prepara los alumnos para universidades en otros países. e. Sí, la escuela internacional ofrece certificaciones internacionales.

20. Você acredita que uma intitulada ‘Escola Bilíngue’ – escola bilíngue ou internacional – tenha mensalidades mais altas do que uma escola regular? Do you believe that a titled 'Bilingual School' - bilingual or international school - has higher tuition than a regular school? ¿Usted cree que una titulada 'Escuela bilingüe' - escuela bilingüe o internacional - tenga mensualidades más altas que una escuela regular? a. Sim b. Não c. Não sabe opinar

370

a. Yes b. No c. Do not know a. Sí b. No c. No tengo opinión

21. Você considera procedente (justificado) uma “Escola Bilíngue” ser mais cara do que uma regular? Do you consider it appropriate (justified) that a "Bilingual School" be more expensive than a regular one? ¿Usted considera procedente (justificado) una "Escuela Bilingüe" ser más cara que una regular? a. Sim b. Não c. Não sabe opinar a. Yes b. No c. Do not know a. Sí b. No c. No tengo opinión

22. Você estudou ou ainda estuda em uma “Escola Bilíngue” (escola bilíngue ou internacional)? Did you study or still study at a "Bilingual School"(bilingual or international school)? ¿Usted estudió o aún estudia en una "Escuela Bilingüe"(escuela bilingüe o internacional)? a. Sim, bilíngue b. Sim, internacional c. Não. a. Yes, bilingual b. Yes, international c. No. a. Sí, bilingüe b. Sí, internacional c. No

23. Para você existem vantagens em se estudar em uma “Escola Bilíngue”? For you are there any advantages of studying in a "Bilingual School"? ¿Para usted hay ventajas en estudiar en una "Escuela Bilingüe"? a. Sim b. Não c. Não sabe opinar a. Yes b. No c. Do not know a. Sí b. No c. No tengo opinión

(SE MARCAR “SIM, HÁ VANATGENS”) 23. B Quais seriam as vantagens de se estudar em uma “Escola Bilíngue”? (MARQUE QUANTAS ALTERNATIVAS QUISER OU NENHUMA) What would be the advantages of studying at a "Bilingual School"? (CHECK AS MANY ALTERNATIVES YOU WANT OR NONE)

371

¿Cuáles serían las ventajas de estudiar en una "Escuela Bilingüe"? (MARQUE TODAS LAS ALTERNATIVAS QUE QUIERA O NINGUNA)

a. falar/dominar um outro idioma b. aprender a respeitar outras culturas e pessoas c. obter alguma certificação internacional no idioma d. conhecer novas culturas por meio de seus idiomas e. ter um melhor salário no futuro

a. to speak/master another language b. to learn to respect other cultures and people c. to obtain some international certification in the language d. to know new cultures through their languages e. to have a better salary in the future

a. hablar/dominar otro idioma b. aprender a respetar otras culturas y personas c. obtener una certificación internacional en el idioma d. conocer nuevas culturas a través de sus idiomas e. tener un mejor sueldo en el futuro

24. Você trabalha ou já trabalhou em uma “Escola Bilíngue” ou “Internacional”? Do you work, or did you work at a "Bilingual" or "International School"? ¿Usted trabaja o ha trabajado en una "Escuela Bilingüe" o "Internacional"? a. Sim b. Não a. Yes b. No a. Sí b. No

(AQUI SE ABRE UMA PERGUNTA SOMENTE PARA OS QUE TRABALHAM/TRABALHARAM NA ESCOLA BILÍNGUE OU INTERNACIONAL)

25. Você acha que quando a língua falada em casa é diferente da escola, haverá um efeito negativo na aquisição da língua da escola? (em contextos de imigração ou de alfabetização em uma segunda língua diferente da língua do país) *

372

Do you think that when the language spoken in the home is different from the school, there will be a negative effect on the acquisition of the school language? (in contexts of immigration or literacy in a second language other than the language of the country) ¿A usted le parece que cuando el idioma que se habla en casa es diferente al de la escuela, habrá un efecto negativo en la adquisición del idioma de la escuela? (en contextos de inmigración o de alfabetización en una segunda lengua distinta de la lengua del país) a. Sim, somente em contextos de imigração b. Sim, somente em contextos de alfabetização em segunda língua diferente da língua do país em que a escola está c. Sim, nos dois contextos d. Não e. Não sabe opinar

a. Yes, only in immigration contexts b. Yes, only in literacy contexts in a second language other than the language of the country where the school is located c. Yes, in both contexts d. No e. Do not know

a. Sí, sólo en contextos de inmigración b. Sí, sólo en contextos de alfabetización en segunda lengua diferente de la lengua del país en que la escuela está c. Sí, en los dos contextos d. no e. No sé opinar

25. B * “Sim, haverá um efeito negativo na aquisição da língua da escola” “Yes, there will be a negative effect on the acquisition of the school language.” “Sí habrá un efecto negativo en la adquisición del idioma de la escuela.”

373

ANEXO 2

I. ESCOLAS INTERNACIONAIS NO BRASIL

Essas informações foram extraídas do site Educação Bilíngue no Brasil: Plurilinguismo, Interculturalidade e Educação no Brasil205.

Região Norte:

1. Amazon Valley Academy Caixa Postal 5170 Ag. Cabanagem – Belém, Pará 66613-970 Fone: (91) 245-2566

2. Amazonas English Academy – International School of Amazonas Rua dos Igarapes 20 – Cond. Porto Marina Tauá – Ponta Negra – , Amazonas Fone: (92) 658 2832

Região Nordeste:

3. American School of Rua Sá e Souza, 408 – Boa Viagem – Recife – Pernambuco Fone: (81)341-4716

4. The Global School – Escola de Educação Internacional da Bahia Avenida Octávio Mangabeira 7869 Praia de Pituaçu – Salvador, Bahia Fone: (71) 3461-1004

5. Pan American School of Bahia Caixa Postal 231 Salvador – Bahia 41.680-060 Tel: ++55 (71) 367-9099

Região Centro-Oeste:

205 MOURA, S. Escolas Internacionais. 2017. Disponível em: . Acesso 12 abr 2018.

374

6. American School of Brasília Av. L-2 Sul, SGAS Q-605-E – Brasilia – DF 70200 Fone: 61) 243-3237

7. Brasilia International School 309/310 Asa Norte – Brasilia, DF Fone:(61) 347-8846

8. Escola Internacional de Goiânia Rua 13, no 902 – Quadra H – Lote 8 Fone: (62) 3241-8600

9. The British School of Brasília SEPS Quadra 708/908 – Asa Sul, Brasilia – DF

Região Sudeste:

10. St. Nicholas School Av. Eusébio Matoso, 333 – Pinheiros – São Paulo – SP Fone:(11) 3814-1355

11. Colégio Humboldt Av. Eng.º Alberto Kuhlmann, 525 Interlagos – São Paulo SP Fone:( 11) 5686 4055

12. Scuola Italiana Eugenio Montale Rua Dr. José Gustavo Busch, 75 – Parque Morumbi – São Paulo-SP Fone 011-846.9141

13. American School of Rio de Janeiro Estrada da Gávea, 132 Rio de Janeiro – RJ 22451-260 Fone:(21) 2512 9830

375

14. Associação Escola Graduada de São Paulo – Graded School Av. Giovanni Gronchi, 4710 – São Paulo – SP Fone:(11)3747-4800

15. Chapel International School – Escola Maria Imaculada Caixa Postal 21293 – Brooklin – São Paulo – SP Fone: 11) 5687-7455

16. Escola Americana de Campinas (American School of Campinas) Rua Cajamar, 35 – Chácara da Barra – Campinas – SP Fone:(19) 2102-1011 / 2102-1016

17. Escola Suíço-Brasileira de São Paulo R. Visconde de Porto Seguro, 391 – Alto da Boa Vista -São Paulo – SP Tel: (11) 5548 6672

18. Escola Suíço-Brasileira do Rio de Janeiro Rua Corrêa de Araújo, 81 – Barra da Tijuca – RJ Fone: (21) 2493-0300 Rua Almirante Alexandrino, 2495 – Santa Teresa – Rio de Janeiro – RJ

19. Escola Árabe Islâmica Ibn Khaldon R. Anália Franco, 121 São Paulo – SP

20. Escola Islâmica Brasileira Vila Carrão – São Paulo Fone: (11) 6781-0659

21. Escola Holandesa de São Paulo Rua Job Lane 1030 – Jardim Petrópolis – Alto de Boa Vista – São Paulo – SP T/F: (11) 5522- 9811 e: [email protected]

22. Escola Americana de Av. Deputado Cristovan Chiaradia, 120 – Buritis – Belo Horizonte, MG Fone: 31)378-6700

376

Fundação Torino – Escola Internacional Rua Jornalista Djalma Andrade, 1300 – Belvedere – Belo Horizonte, MG

23. Pan American Christian Academy – PACA Rua Cassio de Campos Nogueira, 393 São Paulo, SP Fone: (11) 5928-9655 / 5928-9167

24. Sant’ Anna International School Av. Independência, 5588 – Vinhedo – SP Fone: (19) 3876-3691

25. St. Paul’s School Rua Juquia 166, Jardim Paulistano – São Paulo – SP Fone:(11) 3085-3399

26. St. Francis College Rua Bélgica, 399 – Jd. Europa – São Paulo – SP Tel/Fax: 11) 3082-7640

27. The British School of Rio de Janeiro Rua Real Grandeza, 87 Botafogo Fone: (21) 2539 2845

28. The British College of Brazil Av. Eng. Oscar Americano, 630 Cidade Jardim

Região Sul:

29. Escola Árabe Brasileira Foz do Iguaçu – Paraná Fone: 45) 573-1906

377

30. International School of Curitiba Avenida Des. Hugo Simas, 1800 – Curitiba – PR Fone:(41) 338 6611

31. Pan American School of Porto Alegre Rua João Paetzel, 440 – Porto Alegre – RS Fone: (51) 3334-5866

378

II. ESCOLAS BILÍNGUES PARTICULARES

Essas informações foram extraídas do site Educação Bilíngue no Brasil: Plurilinguismo, Interculturalidade e Educação no Brasil206.

NA CIDADE DE SÃO PAULO

1. Stance Dual School (Português/Inglês – Educação Infantil e Ensino Fundamental): Rua Avanhandava, 682 – Consolação

2. Wish Bilingual School (Português/Inglês – Educação Infantil): R. Prof. João de Oliveira Torres, 531 – Jd Anália Francoo

3. Polilogos Escola Coreana (Português/Coreano/Inglês): Rua Sólon, 1018 – Bom Retiro

4. Lycée Pasteur (Português/Francês): Rua Vergueiro, 3799 – Vila Mariana

5. Alphaville International School (Português/Inglês – Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio): Av. Copacabana, 624 – Condomínio 18 do Forte Empresarial Alphaville – Barueri – SP

6. Playpen – Escola Cidade Jardim (Português/Inglês – Educação Infantil e Ensino Fundamental): Praça Prof. Américo de Moura, 101 – Cidade Jardim

7. See Saw – Panamby (Português/Inglês – Educação Infantil e Ensino Fundamental): Rua Visconde de Nácar, – Morumbi

8. All Together (Português/Inglês): Rua Suzano, 125 – Jardim Paulista

9. Aubrick Escola Bilíngue Multicultural (Português/Inglês – Educação Infantil e Ensino Fundamental): Rua Vieira de Morais, 177 – Campo Belo/Moema

10. Beit Yaacov (Português/Inglês/Hebraico – Educação Infantil e Ensino Fundamental): Av. Marquês de São Vicente, 1748 – Barra Funda

11. Beit Kids – American Bilingual Preschool (Português/Inglês): R. Prof João de Oliveira Torres, 445 – Jardim Anália Franco

12. Be Living (Português/Inglês): Rua Salto, 98 – Jardim Paulista

206 MOURA, S. Escolas Bilíngues. 2017. Disponível em: . Acesso 12 abr 2018.

379

13. BIS – Brazilian International School (Português/Inglês): Rua Barão de Cotegipe, 111 – Granja Julieta

14. All Together (Português/Inglês): Rua Suzano, 125 – Jardim Paulista

15. Bluebonnet Escola Internacional (Português/Inglês): Rua Pedralva, 290 – Alto de Pinheiros

16. Bright Kids (Português/Inglês): Al. Campinas, 1200-E – Jardim Paulista

17. Blue Sky (Português/Inglês): Rua Mal. Hastimphilo de Moura, 27 – Morumbi

18. Beacon School (Português/Inglês): Rua Berlioz, 245 – Alto de Pinheiros

19. Colégio Brasil Canadá (Português/Inglês): Rua Airosa Galvão, 127 – Perdizes

20. Colégio Jardim França (Português/Inglês): Av. Nova Cantareira 2534 – Jardim França

21. Colégio Monteiro Lobato (Português/Inglês): Av. Zumkeller, 400 – Mandaqui

22. Colégio Oshiman (Português/Japonês): Rua Ferdinando Galiani, s/nº – Vila Mariana

23. Colégio Santa Amália – Unidade Tatuapé (Português/Inglês): Rua Professor Pedreira de Freitas, 981 – Tatuapé/Jd. Anália Franco

24. Colégio Visconde de Porto Seguro (Português/Alemão): Rua Itapaiúna, 1355 – Panamby – São Paulo

25. Colégio Monteiro Lobato (Português/Inglês): Av. Zumkeller, 400 – Mandaqui – São Paulo

26. Escola Americana Backyard Preschool (Português/Inglês): Rua Alphonsus de Guimarães, 112 – Altos de Santana

27. Escola do Futuro (Inglês/Português): Rua Dr. Francisco Pati, 40 – Vila São Francisco

28. Escola do Max (Português/Inglês): Rua Garapeba, 55 – Chácara Klabin

29. Future Kids American School (Português/Inglês): Rua Nello Bini, 50 – Jardim Anália Franco

30. Green Book School (Português/Inglês): Rua José dos Santos Jr, 141 – Brooklin

31. Integration (Português/Inglês): Unidade Vila Olímpia:Rua Fiandeiras, 135/ Unidade Morumbi: Rua São Pedro Fourier, 189 – São Paulo

32. Global Me (Português/Inglês): Rua Colômbia, 66 – Jardim América

380

33. Grow Berçário e Educação Infantil Bilíngue (Inglês/Português): Rua José Oscar Abreu Sampaio, 259, Jardim Anália Franco

34. Kinder Kampus (Português/Inglês): Rua Dep. João Sussumo Hirata, 480 – Morumbi

35. Kinder Village Educação Infantil Bilíngüe (Português/Inglês): Rua Constantino de Sousa, 308- Campo Belo

36. Kindy Kids Preschool (Inglês/Português): Rua Canuto Abreu, 75 – Jd Anália Franco

37. Kindergarten Hansel und Gretel (Alemão/Português): Rua Deputado Martinho Rodrigues, 139 04646-020 Alto da Boa Vista

38. Kindergarten Igel Mecki (Alemão/Português) Rua São José , 400

39. Kinderwelt (Alemão/Português): Rua Dr. Jesuíno de Abreu, 416 – Morumbi

40. Little’sCool (Inglês/Português): Rua Domingos Lopes da Silva, 4 – Morumbi

41. Maple Bear Alto de Pinheiros: Av. Padre Pereira de Andrade, 575 – Alto de Pinheiros; Maple Bear Vila Nova Conceição: Rua Inajaroba, 88 – Vila Nova Conceição

42. Monica´s School (Inglês/Português): Rua Santo Aristides, 101 – Santo Amaro

43. Oen Yotien (Japonês e Português): Rua Conde do Irajá, 225 – Vila Mariana

44. PACA – Pan American Christian Academy (Inglês e Português): Rua Cássio de Campos Nogueira, 393 – Jardim das Imbuias

45. Phantasialand (Berçário e Educação Infantil – Alemão/Português): Rua Diogo de Quadros, 129 – Alto da Boa Vista

46. Pueri Domus – Global Program (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio): Unidade Verbo Divino: Rua Verbo Divino, 993 – Campo Belo; Unidade Itaim: Rua Itacema 214; Unidade Aldeia da Serra: Estrada Dr. Yojiro Takaoka, 3900

47. Puzzle Educação Infantil Bilíngüe (Português/Inglês): Rua Dr. Jesuíno Maciel, 919 – Campo Belo

48. Red Brick School (Português/Inglês): Rua dos Chanés,152 – Moema

49. Sun Port (Português/Inglês): Rua Xavier de Cravalho, 7 – Vila Sônia/ Rua N. Sra dos Navegantes, 57 – Vila Sônia

50. Talk Kids: Rua Bento de Andrade, 84 – Ibirapuera – São Paulo

381

51. Teddyhaus Recreação Infantil (Alemão/Português) – Rua São Benedito, 1.062 Alto da Boa Vista

52. Tree Top (Português/Inglês): Rua Araguari, 96 – Moema – V.N. Conceição

53. TTWICE Escola Bilíngüe (Português/Inglês): Rua Canário, 762 – CEP 04521-003 – Moema

NA REGIÃO DO ABC PAULISTA 54. Escola Happy House (Educação Infantil – Português/Inglês): Rua Caraíbas, 201 – Jd do Mar

ESCOLAS BILÍNGUES EM OUTRAS CIDADES NO ESTADO DE SÃO PAULO

Sorocaba:

55. Colégio Objetivo Sorocaba: Rua Romeu do Nascimento, 777 – Jardim Portal da Colina – Sorocaba

Maple Bear Canadian School Sorocaba: Rua Elias Rodrigues Claro, 695 – Jd. Pagliato – Sorocaba – SP

Itu:

56. Instituto Branta: Rua Prof. José Benedicto Gonçalves, 309 – Terras de São José, Itu – SP

São José dos Campos

57. Esfera – Escola Internacional (Português/Inglês): Av. Anchieta, 908 – Jardim Esplanada

58. Escola Blossom: Rua Pandiá Calógeras, 205 – Jd Esplanada

Bauru:

59. Escola Four C (Português/Inglês): Av. Afonso José Aiello, 12-50 – Vila Aviação

Campinas:

382

Maple Bear Campinas (Inglês/Português): Rua Guapuruvú, 461 – Alphaville Empresarial

60. Tigrinhos Pré Escola Bilíngüe (Português/Inglês): Rua Iguatemi, 584 – Vila Brandina

61. Colégio Múltiplo: Rua das Margaridas, 900 – Chácaras Primavera

Santana de Parnaíba:

62. Tip Toe Alphaville´s Montessori School e Tip Toe Alphaville’s Elementary School: Estrada de Ipanema, 300 – Vila Velha – Santana de Parnaíba – SP

Jundiaí:

Maple Bear Jundiaí: Av. Comendador Gumercindo Barranqueiros, 600 – Jd. Santa Teresa

Mogi das Cruzes:

Maple Bear Mogi das Cruzes: Av. Francisco Assis Monteiro de Castro, 1100, Vila Oliveira –

Valinhos:

Maple Bear : Rua Vitória Colombo Rossi, 100 – Centro – Valinhos – SP

ESCOLAS BILÍNGUES NO RIO DE JANEIRO

63. Escola Bloom: Rua Dom Rosalvo Costa Rego, 400 – Itanhangá

64. Crianças e Cia – Educação Infantil e Ensino Fundamental: Av. Dom Helder Câmara 7817 – Abolição

65. Miraflores: Av. Cmte. Júlio de Moura, 150 – Barra da Tijuca/ Rua das Laranjeiras, 537 a 543 – Laranjeiras

66. Ninho da Criança – Educação Infantil: Av. Min. Afrânio Costa, 201 – Barra da Tijuca

67. Petra: Rua Barão de Jaguaripe, 35 – Ipanema

68. Colégio Everest Internacional – (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio): Rua Dom Rosalvo Costa de Janeiro

69. Bambini: Rua Redentor, 16 – Ipanema

383

Maple Bear Macaé: Rua A2, 175 – Loteamento Novo Cavaleiros – Vale Encantado

ESCOLAS BILÍNGUES NO AMAZONAS

Maple Bear Manaus: Av. Nilton Lins, 3259 – Parque das Laranjeiras

ESCOLAS BILÍNGUES NA BAHIA

70. Escola Panamericana da Bahia: Av. Ibirapitanga, s/n – Patamares

ESCOLAS BILÍNGUES EM BRASÍLIA

71. Escola das Nações – School of the Nations

ESCOLAS BILÍNGUES NO CEARÁ

72. Sandbox: Rua Marcos Macedo, 1485 – Aldeota – Fortaleza – CE

ESCOLAS BILÍNGUES EM GOIÁS

73. Colégio Integrado Jaó: Alameda Quitandinha – 620 – Setor Jaó – Goiânia – Goiás

ESCOLAS BILÍNGUES EM MATO GROSSO DO SUL

74. Escola Harmonia: Rua José Caetano, 225 – Jardim Bela Vista -Mato Grosso do Sul

ESCOLAS BILÍNGUES EM MINAS GERAIS

75. Tic Tac Toe: Rua Gentios, nº 700, bairro Luxemburgo, Belo Horizonte – MG

ESCOLAS BILÍNGUES NO PARANÁ

76. St James International School: (Inglês e Português): Av: Gil de Abreu Sousa, 1850 – Londrina – PR 77. Colégio Dom Bosco (Português e Inglês): Av. Visconde de Guarapuava, 5.581 – Batel – Curitiba – PR

78. Kinderland (Português e alemão): Av. Desembargador Hugo Simas, 2001/ R. Deputado Olívio Belich, 46

ESCOLAS BILÍNGUES EM PERNAMBUCO

79. CIEC Centro Internacional de Educação e Cultura: R. Profa Silvia Ferreira, 110 – Recife – PE

ESCOLAS BILÍNGUES NO RIO GRANDE DO SUL

80. Global Village: Rua 20 de setembro, 2721 – Caxias do Sul – RS

384

81. Santa Mônica Escola Bilíngue: Rua do Guia Lopes, 926 – Centro – Caxias do Sul – RS

ESCOLAS BILÍNGUES EM SANTA CATARINA

Joinville:

82. Colégio AZ Bilíngue: Rodovia Alkindar Monteiro Junqueira, km 52

83. Escola Americana de Joinville: Rua Rio Grande do Norte, 269 – Joinville – SC

84. Sociesc Escola Internacional: Rua Gothard Kaesemodel, 833

85. Joinville Bilingual School: Rua Profa Ada Xavier da Silveira, 168 -Joinville – SC

Florianópolis:

86. Santa Catarina Yellow Tree – Bilingual School: Rua Eng. Paulo Werner, 599 – Itoupava Seca – Blumenau – SC

385

ESCOLA BILÍNGUES PÚBLICAS

Essas informações foram extraídas do site Educação Bilíngue no Brasil: Plurilinguismo, Interculturalidade e Educação no Brasil207.

1. Escola Bilíngue Pública no Amazonas:

ESCOLA PÚBLICA BILÍNGUE NO AMAZONAS. Escola pública bilíngue no amazonas. 2016. Disponível em: . Acesso 12 abr 2018.

“Escola Djalma Batista – A Escola Estadual de Tempo Integral Bilíngue Português/Japonês Professor Djalma da Cunha Batista passa a contar com 19 salas de aula, salas de leitura, quadra poliesportiva, piscina semiolímpica, auditório, biblioteca, sala de artes, laboratório de ciências, brinquedoteca, videoteca, laboratório de informática, refeitório, sala de jogos, gabinete odontológico, enfermaria, sala de descanso e academia. Todo o espaço escolar é adaptado para o atendimento a pessoas com necessidades especiais.”

“A escola receberá 760 estudantes, oferecendo atendimento educacional na modalidade de tempo integral em ensino fundamental do 6º ao 9º ano. A instituição de ensino contará ainda com 50 profissionais, sendo 40 professores e dez servidores administrativos.”

2. Escola Bilíngue Pública em João Pessoa na Paraíba:

Essas informações foram extraídas do site:

JOAO PESSOA. 2018. Disponível em: . Acesso em 12 abr 2018.

“Com 2.301 m2 a escola bilíngue conta com 14 laboratórios, auditório, biblioteca, quadra poliesportiva, além de toda uma infraestrutura de área administrativa. A unidade vai assumir uma dinâmica diferente, onde os alunos terão uma sala específica para cada disciplina, sempre

207 MOURA, S. Escolas Bilíngues Públicas. 2017. Disponível em: < https://educacaobilingue.com/category/escolas- publicas/>. Acesso 12 abr 2018.

386

com conteúdo voltado para o ensino da língua inglesa. Inicialmente, foram abertas as matrículas para estudantes do 6º ano do ensino fundamental, que irão abrir caminhos para que a escola chegue, até o 9º ano, com estudantes com proficiência plena em inglês.”

“Com funcionamento em tempo integral, a escola bilíngue vai oferecer disciplinas como matemática, geografia e história em dois idiomas. Durante três dias por semana, serão estimuladas várias habilidades dos estudantes, como escuta, leitura e escrita em inglês.”

“A escola bilíngue vai oferecer disciplinas como matemática, geografia e história em dois idiomas. A unidade também vai adotar novos materiais pedagógicos, fazendo uso de vídeos, jogos, atividades de campo e pesquisas em língua inglesa. Os professores da escola passaram por uma seleção interna na própria rede municipal. Aqueles que obtiveram melhor desempenho receberam uma nova etapa de capacitação, além de todo suporte pedagógico do Centro de Línguas Estrangeiras para o início das aulas.”

3, 4, 5 e 6 Escolas Bilíngues Públicas no Rio de Janeiro:

Essas informações foram extraídas do site:

JUNQUEIRA, F. A experiência das escolas bilíngues na rede pública do Rio. 2014. Disponível em: . Acesso 12 abr 2018.

“Yes, nós temos escola pública bilíngue. E o exemplo das quatro existentes hoje na rede municipal do Rio de Janeiro foi apresentado, na tarde desta sexta-feira, no encontro internacional Educação 360º, que acontece na Escola Sesc do Ensino Médio, em Jacarepaguá, de 9h a 19h. O projeto piloto, que faz parte do Programa Rio Criança Global, lançado em 2013, atende atualmente 506 mil crianças da educação infantil ao ensino fundamental. O objetivo principal dos 1.823 professores que atuam nessas unidades é proporcionar aos alunos a capacidade de comunicação oral.”

“As escolas que dividem seu currículo em aulas ministradas em inglês e português são Ciep Glauber Rocha, na Pavuna; EM Professora Dyla Sylvya de Sá, em Jacarepaguá; Ciep Francisco Pontes, em Campo Grande; e EM Affonso Várzea, no Complexo do Alemão. Para o ano que vem, há previsão que mais duas escolas entrem nesse formato. E, em 2016, o total de unidades inseridas no projeto deve chegar a dez.”

387

Essas informações foram extraídas do site:

ESCOLAS PÚBLICAS BILÍNGUES COMEÇAM A SURGIR NO BRASIL. 2014. Disponível em: . Acesso 12 abr 2018.

“O Colégio Estadual Hispano-Brasileiro João Cabral de Melo Neto, no Méier, Rio de Janeiro, é uma dessas iniciativas. Com período integral (das 7:00 às 17:00) e parceria com o governo espanhol. “Durante o turno da manhã, o aluno estuda com 90% do currículo em português e o restante em espanhol e, no turno da tarde, a situação se inverte. O secretário explicou que o modelo foi criado para atender à matriz curricular definida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e para que os alunos também possam participar do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem)”, afirma Cristina Indio do Brasil – Repórter da Agência Brasil.”

“Além desta escola bilíngue espanhol-português, o Rio conta também com o Ciep Governador Leonel de Moura Brizola, que tem aulas em português e francês, e o Ciep Carlos Drumond de Andrade, em inglês e português.”

7. Escola Bilíngue Pública no Amapá:

Essas informações foram extraídas do site:

ALVES, J. Quase 200 alunos terão aulas lecionadas em francês em escola bilíngue no Amapá. Disponível em: . Acesso em 12 abril 2018.

“A primeira escola pública do Amapá com ensino bilíngue foi inaugurada nesta terça-feira (6), na Zona Norte de Macapá. Cerca de 200 estudantes da Escola Marly Maria e Souza da Silva terão aulas de francesa duas vezes por semana. As aulas de matemática e ciências também serão lecionadas em francês.”

8. Escola Bilíngue Pública no Maranhão:

Essas informações foram extraídas do site:

IMPERATRIZ. Escola Bilíngue. 1986. Disponível em: . Acesso em 12 abril 2018.

388

“A primeira Escola Bilíngue do Maranhão e a segunda do país encontra-se em Imperatriz.”

“Inaugurada através da Lei nº 1453/2012, a Escola Municipal de Educação Bilíngue para Surdos Professor Telasco Pereira Fialho, localizada no bairro São José do Egito, atende aproximadamente 63 alunos de 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental.”

"Sou gestora da primeira escola bilíngue no Maranhão e sou orgulhosa disso, porque sou a fundadora da Educação de Surdos em nossa cidade em 1986. Desenvolvemos esse trabalho com todo carinho, trabalhando com o surdo para que ele possa ser incluso no ensino regular com equidade, na mesma condição do ouvinte. O aluno aqui na escola passa por um processo da aprendizagem da sua língua materna que é a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) e da Língua Portuguesa como segunda língua, mas utilizando as duas línguas de maneira paralela".

389

ANEXO 3

Extraimos as informações para esse teste estatístico do seguinte endereço:

VIRTUOUS. Teste do qui quadrado para independência. 1998. Disponível em: . Acesso em 10 jun 2018.

11.1.2 Teste do qui quadrado para independência (duas amostras) A utilização do presente teste em pesquisa visa verificar se as distribuições de duas ou mais amostras não relacionadas diferem significativamente em relação à determinada variável.

11.1.2.1 Condições para a execução do teste Exclusivamente para variáveis nominais e ordinais;

Preferencialmente para amostras grandes, <30; Observações independentes; Não se aplica se 20% das observações forem inferiores a 5 Não pode haver frequências inferiores a 1; Nos dois últimos casos, se houver incidências desta ordem, aconselha-se agrupar os dados segundo um critério em específico.

11.1.2.2 Procedimento para a execução do teste

Determinar H0. As variáveis são independentes, ou as variáveis não estão associadas; estabelecer o nível de significância (µ);

Determinar a região de rejeição de H0. Determinar o valor dos graus de liberdade (φ), sendo φ = (L – 1) (C – 1), onde L = números de linhas da tabela e C = ao número de colunas. Encontrar, portanto, o valor do Qui-quadrado tabelado; calcular o qui-quadrado, através da fórmula:

Para encontrar o valor esperado (E), utilizar a fórmula a seguir:

390

Sendo o qui-quadrado calculado, maior do que o tabelado, rejeita-se H0 em prol de H1. Há dependência ou as variáveis não estão associadas.

As questões 17, 60 e 103, em português, inglês e espanhol, perguntavam se um falante era necessariamente bicultural para os entrevistados. Pelas análises dos dados quantitativos e qualitativos somados nos três idiomas, analisamos, assim, que nossa hipótese inicial de que a maioria dos entrevistados não concordaria com a afirmação de um bilíngue ser necessariamente bicultural se confirmou, embora este assunto fosse de difícil avaliação como pudemos observar pelos dados qualitativos e quantitativos conflitantes, por isso aplicamos o teste do qui-quadrado e formulamos as seguintes hipóteses:

H0: a maioria dos entrevistados concordaria com a afirmação de que um bilíngue é necessariamente bicultural

H1: a maioria dos entrevistados não concordaria com a afirmação de que um bilíngue é necessariamente bicultural

Perguntas Respostas Pergunta Pergunta Pergunta ∑ 17 60 103 Sim 52 26 5 83 Não 98 16 4 118 Não sabe 5 1 0 6 ∑ 155 43 9 207

µ = 0,05 φ = (3 – 1) (3 – 1) = 4, onde o qui-quadrado tabelado é igual a 9,5.

Cálculo dos valores Perguntas esperados (E). Respostas Pergunta Pergunta Pergunta 17 60 103 Sim 62.1 17.2 3.6 Não 88.3 24.5 5.1 Não sabe 4.5 1.2 0.2

391

Χ2 = (52 – 62,1)2/62,1 + [(26 – 17.2)2/17.2] ... [(0 – 5.1)2/5.1] = 1.64+4.50+0.54+1.06+2.94+0.23+0,05+0,03+0,2 = 11.19

Conclui-se que o qui-quadrado calculado (11.19) é maior do que o tabelado (9.5), então, de fato rejeita-se H0 em prol de H1, o que significa que está certa nossa afirmação de que a maioria dos entrevistados não concordaria com a afirmação de um bilíngue é necessariamente bicultural. Adicionalmente, há diferença significativa, ao nível de 0.05, para as respostas.

A segunda indagação com dados quantitativos e qualitativos conflitantes foi a indagação sobre a consideração do participante em relação a língua (materna ou aprendida) fazer parte da identidade de um falante (questões 19, 62 e 104), aplicamos o teste e formulamos as seguintes hipóteses:

H0: a maioria dos entrevistados concordaria com a afirmação de que língua é identidade

H1: a maioria dos entrevistados não concordaria com a afirmação de que língua é identidade

Perguntas Respostas Pergunta Pergunta Pergunta ∑ 19 62 104 Sim 149 39 9 197

Não 4 4 0 8 Não sabe 2 0 0 2

∑ 155 43 9 207

µ = 0,05 φ = (3 – 1) (3 – 1) = 4, onde qui-quadrado tabelado é igual a 9,5.

Cálculo dos valores Perguntas esperados (E). Respostas Pergunta Pergunta Pergunta 19 60 104 Sim 147.5 40.9 8.6 Não 5.9 1.7 0.3 Não sabe 1.5 0.4 0.1

392

Χ2 = (149 – 147.5)2/147.5 + [(4 – 5.9)2/5.9] ... [(9 – 0.1)2/0.1] = 0.01+0.61+0.17+0.25+3.11+0.4+0.02+0.3+0.1 = 4.97

Conclui-se que o qui-quadrado calculado (4.97) é menor do que o tabelado (9.5), então, não se rejeita H0 em prol de H1, o que significa que nossa afirmação primeira de que a maioria dos entrevistados concordaria com a afirmação de que língua é identidade se confirmou também pelo teste do qui-quadrado. Adicionalmente, há diferença significativa, ao nível de 0.05, para as respostas.

A próxima pergunta em que obtivemos dados quantitativos e qualitativos em desarmonia foi a que perguntava se para o participante a língua era poder (ou o mesmo que poder) - questões 21, 64 e 107 em português, inglês e espanhol, aplicamos o teste e formulamos as seguintes hipóteses:

H0: a maioria dos entrevistados concordaria com a afirmação de que a língua era poder (ou o mesmo que poder)

H1: a maioria dos entrevistados não concordaria com a afirmação de que a língua era poder (ou o mesmo que poder)

Perguntas Respostas Pergunta Pergunta Pergunta ∑ 21 64 107 Sim 110 36 8 154

Não 38 5 1 44 Não sabe 7 2 0 9

∑ 155 43 9 207

µ = 0,05 φ = (3 – 1) (3 – 1) = 4, onde qui-quadrado tabelado é igual a 9,5.

393

Cálculo dos valores Perguntas esperados (E). Respostas Pergunta Pergunta Pergunta 21 64 107 Sim 115.3 32 6.7 Não 32.9 9.1 1.9 Não sabe 6.7 1.9 0.4

Χ2 = (110 – 115.3)2/115.3+ [(38 – 32.9)2/32.9] ... [(0 – 0.4)2/0.4] = 0.24+0.79+0.01+0.5+1.84+0.0+0.25+0.42+0.4 = 4.45

Conclui-se que o qui-quadrado calculado (4.45) é menor do que o tabelado (9.5), então, não se rejeita H0 em prol de H1, o que significa que está correta nossa afirmação de que a maioria dos entrevistados concordaria com a afirmação de que a língua era poder (ou o mesmo que poder) se confirmou. Adicionalmente, há diferença significativa, ao nível de 0.05, para as respostas.

Com relação à última indagação em que aplicamos o teste, sobre se o participante acreditava que um bilíngue teria inevitavelmente um melhor salário na profissão do que um monolíngue (questões 32, 75 e 118, em português, inglês e espanhol), formulamos as seguintes hipóteses:

H0: a maioria dos entrevistados concordaria com a afirmação de que um bilíngue teria inevitavelmente um melhor salário na profissão do que um monolíngue

H1: a maioria dos entrevistados não concordaria com a afirmação de que um bilíngue teria inevitavelmente um melhor salário na profissão do que um monolíngue

Perguntas Respostas Pergunta Pergunta Pergunta ∑ 32 75 118 Sim 77 28 6 111

Não 72 15 3 90 Não sabe 6 0 0 6

∑ 155 43 9 207

µ = 0,05

394

φ = (3 – 1) (3 – 1) = 4, onde qui-quadrado tabelado é igual a 9,5.

Cálculo dos valores Perguntas esperados (E). Respostas Pergunta Pergunta Pergunta 19 60 104 Sim 83.1 23 4.8 Não 67.4 18.7 3.9 Não sabe 4.5 1.2 0.3

Χ2 = (77 – 83.1)2/83.1+ [(72 – 67.4)2/67.4] ... [(9 – 0.3)2/0.3] = 0.44+0.61+0.5+1.08+0.73+1.2+0.3+0.20+0.3 = 5.36

Conclui-se que o qui-quadrado calculado (5.36) é menor do que o tabelado (9.5), então, não se rejeita H0 em prol de H1, o que significa que está correta nossa afirmação de que a maioria dos entrevistados concordaria com a afirmação de que um bilíngue teria inevitavelmente um melhor salário na profissão do que um monolíngue. Adicionalmente, há diferença significativa, ao nível de 0.05, para as respostas.