Jogue como uma menina, por Katia Rubio

Que seja de todas as mulheres o direito de poder demonstrar suas habilidades

(Folha de S.Paulo, 08/06/2019 – acesse no site de origem)

Hoje é dia de reverenciar as mulheres de uma seleção brasileira. Aquelas que ainda me fazem ter algum prazer em falar, ver ou discutir sobre o futebol. Que fazem esse esporte ter a beleza da competição que um dia pareceu ser um espetáculo em pés masculinos.

Proibidas de jogar por lei, desafiaram tudo e todos pelo direito de fazer acontecer nos mesmos campos nos quais os homens reinaram soberanos. Mais que jogadoras, foram guerreiras. Enfrentaram todo tipo de preconceito, ndiscriminação e agressão pelo prazer de jogar um jogo que demorou quase cem anos para ser considerado também de mulheres.

Consideradas usurpadoras, enfrentaram diferentes argumentos sociais e familiares para hoje se firmarem como atletas. O esporte de menino foi invadido por meninas corajosas que impuseram seu desejo e foram em busca de um sonho. Enfrentaram com os pés e o coração determinações de quem pouco conhecia o esporte, mas detinha a mão que sustentava uma caneta que escreveu, assinou e determinou os rumos de uma prática esportiva apenas para varões. Sem evidências concretas que sustentasse essa proibição, coube às “infratoras” praticar clandestinamente o futebol, o que, naquele momento, era apenas uma paixão. Nossa reverência a essas contestadoras!

Mulheres dibradoras. Quem diria que elas conquistariam a oportunidade de ter uma Copa do Mundo só delas, que ganhariam transmissão ao vivo e cobertura in loco por mulheres jornalistas, outra conquista inquestionável. Enfim, era inimaginável que teriam visibilidade e fossem tratadas com o respeito que toda atleta merece ter, independentemente da modalidade que pratica. Assim é o tempo. Assim é a memória da qual retiramos feitos e fatos para não serem esquecidos. Cansadas de ouvir gracinhas e impropérios, viraram o jogo e hoje se mostram poderosas. Adeus ao apupo: jogue como um homem. Meninas e mulheres podem agora, mais do que nunca, falar e ouvir em caixa alta e letras de forma: JOGUE COMO UMA MENINA!

Passado o tempo em que o modelo de jogo e habilidade era o outro, elas passaram a ser a referência para as gerações futuras. O desejo de vir a ser se firma no presente em pessoas como , Cristiane, , que também já tiveram as pioneiras Acre, Didi, Elane, , Katia Cilene, Marcia Tafarel, Maravilha, Marisa, Meg, Michael Jackson, Monica, Nenê, , Raquel, , , Suzana, , Tânia Maranhão, que foram a mundiais que ainda não eram Copa do Mundo. Que não tinham referência de jogo de mulheres e tiveram que inventar a si mesmas para o futebol feminino seguir em frente, alterando o artigo definido masculino o para o feminino A para uma jogadora e contemplar Andressinha e Ludmilla, ídolos dessa nossa geração.

Se hoje há no elenco a melhor jogadora do mundo, a única a ser escolhida para essa posição nada mais, nada menos do que seis vezes, é porque antes dela vieram outras que abriram um caminho onde ele não existia.

Se o futebol se confunde nessa terra com a própria identidade nacional, então que comece o espetáculo! Chega de jogo escondido. Adeus à necessidade de treinar com meninos por falta de times de meninas. Que seja de todas as mulheres, que assim o desejam, o direito de poder demonstrar suas habilidades. Que times e campeonatos sejam organizados para que toda a cadeia produtiva, das categorias de base ao profissional, tenha seleções estruturadas e calendários produtivos.

Salve, salve todas as que hoje estão na seleção e que mantêm viva a missão de ter a estranha mania de ter fé na vida.

Katia Rubio é professora da USP, jornalista e psicóloga, é autora de “Atletas Olímpicos Brasileiros” Por assédio, Rússia abre inquérito contra brasileiros que constrangeram mulher

Ministério do Interior russo aceita denúncia da ativista russa Alyona Popova e inicia investigações nesta segunda-feira

(O Estado de S. Paulo, 02/07/2018 – acesse no site de origem)

O Ministério do Interior da Rússia abriu um inquérito formal contra os brasileiros que, nos primeiros dias da Copa do Mundo, constrangeram uma mulher em Moscou, num vídeo que difundiram pela internet.

A decisão do governo foi uma reação à denúncia apresentada pela advogada e ativista russa, Alyona Popova. Numa carta endereçada a ela, a polícia de Moscou confirmou que iniciou investigações.

O documento, obtido pelo Estado, é desta segunda-feira (2 de julho de 2018) e indica que um registro especial foi dado ao caso, dentro do Ministério do Interior. As autoridades tinham um mês para dar uma resposta à ativista, o que significava que tinham um prazo até 20 de julho para tomar uma decisão. Mas anteciparam o processo e, em apenas dez dias, optaram por iniciar o caso.

Na carta enviada ao governo, a ativista considerava que “cidadãos estrangeiros deveriam pedir desculpas publicamente, e para a menina, e todos cidadãos russos diante do sexismo, da falta de respeito às leis da Federação Russa, o desrespeito por um cidadão russo, insultos, humilhação da honra e dignidade de um grupo de pessoas com base em seu gênero.”

Caso sejam considerados como culpados, os brasileiros podem sofrer sanções que vão desde multas até a proibição de voltarem a entrar em território russo.

Na comunicação ao governo datada de 20 de junho, Popova cita artigos das leis russas que apontam para punições quanto à humilhação ou insulto. Nesse caso, multa pode chegar a 3 mil rublos (R$ 175). Mas também existiria a possibilidade de que os brasileiros sejam denunciados por violência da ordem pública e abusos sexuais. Uma responsabilidade criminal apenas poderia ser atribuída se ficar constatado que o ato tem uma relação com discriminação de sexo, de raça ou nacionalidade.

Num texto publicado pela ativista, ela alerta que um dos envolvidos tinha um cargo público e que “não podem humilhar” a mulher russa. Ela se referia ao tenente da Polícia Militar de Santa Catarina Eduardo Nunes, um dos identificados no vídeo. Segundo a advogada, a ofensa tem uma relação direta com “nacionalidade e gênero”. “Gostaria que esses cidadãos fossem punidos”, escreveu.

Na semana passada, o CEO da Copa, Alexey Sorokin, surpreendeu ao dizer que desconhecia os casos de assédio sexual por parte dos torcedores.

“Eu desconheço o tema. Não acho que isso seja um problema enorme, não ocorreu tanto”, tentou minimizar Sorokin. Na sequência, o CEO da Copa tentou mudar o um pouco o tom da sua resposta e disse esperar que “todos tenham respeito, sem distinção entre homens, mulheres, crianças. “Cortesia é uma conduta básica. Em caso de condutas criminais, tomaremos medidas de acordo com as autoridades. Se quebrar as regras da lei, vão responder por isso”, disse o russo.

Jamil Chade Ministério Público vai investigar brasileiros que assediaram mulher na Rússia

Para o MPF, vídeo tem ‘cunho nitidamente machista e discriminatório’. Ato será investigado como crime de injúria.

(HuffPost Brasil, 21/06/2018 – acesse no site de origem)

O Ministério Público Federal no Distrito Federal abriu investigação criminal para identificar os brasileiros que assediaram uma mulher na Rússia e divulgaram a gravação na internet.

O vídeo viralizou e gerou revolta e comentários de repúdio nas redes sociais.

O ato será investigado como crime de injúria (ofensa à honra e à dignidade). Na gravação, os brasileiros fazem a estrangeira repetir palavras que, em português, remetem ao órgão sexual feminino, sem que ela saiba o significado do que diz.

Para o MPF-DF, as imagens têm “cunho nitidamente machista e discriminatório”, e a conduta dos brasileiros feriu a dignidade da mulher e a expôs a “humilhação pública”.

A decisão de abrir inquérito contra os brasileiros, diz o MPF, é baseada nos artigos 1 e 3 da Convenção Internacional sobre Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher:

Artigo 1: “Para os fins da presente Convenção, discriminação contra a mulher significará toda a distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher, independentemente de seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo”. Artigo 3: “Os Estados Partes [signatários da convenção] tomarão, em todas as esferas e, em particular, nas esferas política, social, econômica e cultural, todas as medidas apropriadas, inclusive de caráter legislativo, para assegurar o pleno desenvolvimento e progresso da mulher, com o objetivo de garantir-lhe o exercício e o gozo dos direitos humanos e liberdades fundamentais em igualdade de condições com o homem”.

Homens identificados

Ao menos 4 brasileiros que aparecem no vídeo já foram identificados.

Um deles é Luciano Gil Mendes Coelho, engenheiro civil natural de Picos (PI). Em entrevista ao portal G1, Coelho disse que já pediu desculpas “a todas as mulheres” e responsabilizou o álcool.

“Todos nós somos seres humanos e erramos. Além disso, não conhecíamos ninguém, bebemos um pouco mais da conta e foi isso”, justificou.

Outro homem que aparece nas imagens é Diego Jatobá, advogado e ex- secretário de Turismo de Ipojuca (PE). A Ordem dos Advogados do Brasil em Pernambuco (OAB-PE) informou que vai investigar a conduta do advogado.

O terceiro identificado é o policial Eduardo Nunes, que atua em Lages (SC). A Polícia Militar de Santa Catarina informou que abrirá um processo administrativo para apurar a “conduta irregular do militar”.

“A corporação não corrobora com este tipo de atitude que é incompatível com a profissão e o decoro da classe”, disse a PM, em nota enviada à imprensa.

O quarto é o jornalista Leonardo da Silva Júnior. Conhecido como Leo Catuaba Selvagem, ele foi criticado por colegas de universidade em uma carta de repúdio divulgada nas redes sociais.

“Nós, jornalistas, ex-alunas/os da Universidade Metodista de São Paulo, do curso de Jornalismo, graduadas/os no ano de 2006, no período noturno, vimos por meio desta carta declarar o nosso absoluto repúdio ao ato do colega de turma Leonardo da Silva Júnior, conhecido nas redes sociais como Leo Catuaba Selvagem, que, junto de um grupo de homens, praticou assédio contra uma mulher russa, fato registrado em vídeo pelos próprios assediadores e que vem sendo amplamente divulgado e criticado.”

Débora Melo

A Copa do Mundo de Futebol e As Masculinidades, por Sergio Barbosa

A cada 4 anos um evento atrai todos os holofotes para si. Capaz de gerar milhões em faturamento com propaganda e mídia, o futebol é um esporte altamente lucrativo. Além de todas essas possíveis análises, é necessário pensar como futebol produz, reproduz representações sociais heteronormativas, misóginas e homofóbicas.

(Bem Querer Mulher, 20/06/2018 – acesse no site de origem)

O futebol moderno é uma fábrica de construção de papéis sociais de gênero. É o cenário perfeito onde as relações sociais de dominação se cristalizam. O futebol de verdade é masculino, o que vale pintar ruas, corpos, vestir a camisa amarela. O futebol feminino é de brincadeirinha, uma recreação, um espaço cedido mas com ressalvas para as mulheres. O futebol que mexe com as emoções, faz vibrar e aflorar o patriotismo é o futebol viril que reforça o poder e domínio do masculino.

Por que o futebol se tornou este ápice da representação masculina? As representações sobre as masculinidades são criadas dentro de uma sociedade e dentro de uma cultura. E como construção determinam os papeis de homens e mulheres na sociedade. Então, o esporte como fragmento desta cultura forma os indivíduos como sujeitos de gênero e é a partir do conceito de relações de gênero que nos permitimos pensar e agir nas formas das masculinidades baseadas na virilidade, no poder, controle. E desde o técnico da seleção brasileira até o gândula, é atravessada a figura que ser homem no Brasil é se aproximar deste modelo. O futebol define a existência de uma masculinidade porque “não se pode dizer que os corpos tenham uma existência significável anterior à marca do seu gênero” (BUTLER, 2003, p. 27). O conceito de “gênero funciona como um organizador social e da cultura (…) e, assim, engloba todos os processos pelos quais a cultura forma desde a infância valores que os homens deverão assumir.

Assim como no futebol o jogador é medido pela sua peformarce, na sociedade homens são medidos pela sua performace. Estão incluídas nesta performatividade a força, nunca desistir, alcançar a glória, intimidar, dominar. São atributos sociais cristalizados desde a educação em escolas que homens não podem demonstrar sentimentos de afeto, carinho ou cuidado. “Doar o sangue pela camisa”, significa muitas vezes abrir mão de valores, de morrer se preciso for, para ser considerado como herói. A perversidade do futebol torna meninos em homens agressivos, focados em uma vitória isolada, em um prêmio pela glória que o importante é ser o primeiro. As masculinidades que se baseiam nestes atributos exercem de fato o controle, estão no limite da prática da violência contra si e contra mulher. Quem sabe, um dia poderemos ter um outro modelo de futebol, dentro e fora dos campos e estádios de futebol.

A árdua missão de ser mulher e repórter em uma Copa

Jornalistas sofrem com o assédio dos torcedores durante a cobertura do evento de futebol na Rússia

(El País, 19/06/2018 – acesse no site de origem) Festa popular, promovendo o encontro e a congregação de etnias diversas, regada a cerveja, vodka, empolgação e gritos de gol. Ao mesmo tempo em que comprova sua dimensão festiva e multicultural a cada quatro anos, a Copa do Mundo masculina de futebol também expõe o caráter universal do machismo. Mal começou e o evento já registra casos dehomens, de diferentes nacionalidades, assediando mulheres que circulam pelas cidades- sede na Rússia, sobretudo profissionais de imprensa.

Antes mesmo do início da Copa, Julieth González Therán, enviada especial da Deutsche Welle a Moscou, foi agarrada à força e beijada no rosto por um homem de boné, na praça Manege, enquanto fazia uma transmissão sobre a contagem regressiva para a cerimônia de abertura. No estúdio, diante do constrangimento da repórter colombiana, a apresentadora Ana Plasencia desabafou, questionando as medidas de segurança tomadas pela Rússia para receber o Mundial: “Percebo que os torcedores tomam a liberdade de distribuir beijos sem pedir permissão”. Para poder terminar a transmissão, Therán teve de ser cercada por pessoas que presenciaram o assédio e a protegiam de novas investidas. Em seu perfil no Instagram, ela se pronunciou exigindo respeito. “Não merecemos esse tratamento. Somos igualmente competentes e profissionais. Compartilho a alegria do futebol, mas devemos identificar os limites entre afeto e assédio.”

No jogo entre Argentina e Islândia, fora do estádio de Nizhny Novgorod, um torcedor islandês fantasiado ameaçou interromper com gracejos a entrada ao vivo da repórter Agos Larocca, da ESPN, mas foi impedido por um produtor. Em frente a um dos portões de saída, a reportagem do jornal Superesportes registrou o momento em que dois torcedores argentinos assediaram e tentaram roubar um beijo de uma compatriota jornalista, que precisou se defender com o braço e o microfone para brecar a aproximação dos agressores.

Brasileiros também protagonizaram outro episódio de assédio em solo russo. Em vídeos que viralizaram no último sábado, um grupo de torcedores com camisas do Brasil debocha de uma mulher– que, de acordo com informações compartilhadas nas redes sociais, seria uma repórter local e não entendia o português – cantando palavras obscenas e depreciativas. Entre os integrantes da trupe está o advogado Diego Valença Jatobá, ex-secretário de Turismo de Ipojuca, cidade da região metropolitana de Recife.

À esquerda, torcedor islandês constrange repórter. Ao lado, brasileiros ridicularizam mulher na Rússia. (Foto: Reprodução)

No começo de junho, o Itamaraty e o Ministério do Esporte lançaram um guia recomendando a torcedores gays que evitassem demonstrações públicas de afeto na Rússia, por causa da intolerância a LGBT’s no país-sede da Copa. Porém, não havia instruções para os homens brasileiros sobre como se comportar diante de uma mulher ao longo do evento. Em maio, a Associação do Futebol Argentino (AFA) resolveu agir nesse sentido. Mas, em vez de prevenir, reforçava o machismo com uma cartilha distribuída a jornalistas em que indicava as melhores práticas para conquistar mulheres russas. “Trate a mulher como alguém de valor, com ideias e desejos próprios”, pregava uma das orientações.

O campo fértil do assédio no futebol

Quando a Copa foi disputada no Brasil, em 2014, mulheres da imprensa também sofreram com abordagens machistas. A repórter Sabina Simonato, da Rede Globo, por exemplo, acabou assediada em duas oportunidades. Na primeira delas, ela foi beijada no rosto por um torcedor croata enquanto transmitia informações da Avenida Paulista, em São Paulo. Depois, às vésperas do jogo entre Alemanha e Portugal, o beijo veio de um funcionário da Casa de Portugal, no bairro da Liberdade, onde torcedores portugueses se reuniriam para assistir à partida. Colega de Simonato na Globo de Porto Alegre, a repórter Luciane Kohlmann, rodeada por torcedores holandeses, viu dois deles tomarem a liberdade de beijar sua bochecha.

Embora encarados por muitos como brincadeira, os ataques de fãs de futebol a jornalistas já não são mais tolerados por mulheres que, a duras penas, tentam conquistar seu espaço em um meio tradicionalmente machista. Em março, na cobertura ao vivo do jogo entre Vasco e Universidad de Chile, pela Copa Libertadores, no Rio de Janeiro, a repórter Bruna Dealtry, do canal Esporte Interativo, foi beijada à força por um torcedor vascaíno. Constrangida, ela se limitou a dizer no ar que a atitude “não foi legal”, mas continuou a transmissão. O episódio, somado a outras agressões sofridas por mulheres da crônica esportiva nos estádios, ajudou a desencadear a campanha #DeixaElaTrabalhar, encabeçada por um grupo de 50 jornalistas brasileiras.

Antes da Copa do Mundo, no fim de abril, um caso de assédio chamou a atenção no México. Maria Fernanda Mora, repórter da Fox Sports local, informava sobre a festa do título do Chivas Guadalajara na Concachampions 2018 até ser apalpada nas nádegas por um torcedor. Ela reagiu ao abuso golpeando com o microfone o agressor, que passou a insultá-la. Assustada com a repercussão na mídia, que descrevia sua reação como exagerada, Mora divulgou uma carta cobrando que o caso não fosse tratado como um simples arrimón – expressão utilizada no México quando um homem encosta o pênis em uma mulher na rua ou no transporte público, de tão comum que se tornou esse tipo de assédio no país.

Nas redes sociais, outros torcedores passaram a atacá-la afirmando que ela havia “forçado a barra” ou que merecia ser estuprada. “Não me arrependo da forma como me defendi porque nós, mulheres, não vamos deixar e não vamos nos calar. É preciso deixar muito claro: o problema sempre é o agressor, e não nosotras”, escreveu. Assim como no Brasil, a violência sofrida por Mora motivou uma campanha de jornalistas contra o assédio sexual. Elas usaram as hashtags #NoMeToques e #UnaSomosTodas para denunciar ofensas machistas nos estádios mexicanos.

Breiller Pires

Vídeo mostra que o Brasil ainda perde de goleada para o machismo, por Beatriz Mota

Não importa em qual bolha você se insira, certamente suas redes falaram a mesma língua neste domingo, fenômeno raríssimo nesta nação das mais graves disparidades sociais e polaridades políticas. Mas num país em que o instinto canarinho (ainda que pistola) agoniza, fica difícil não jogar a toalha diante da estreia que traz como destaque noticioso da Rússia, além do empate morno e sonolento da seleção contra a Suíça, o vídeo machista, misógino e racista que foi protagonizado por torcedores brasileiros.

(O Globo, 18/06/2018 – acesse no site de origem)

Nas imagens, cerca de cinco homens brancos se reúnem em torno de uma mulher loira, supostamente russa. Abusando da simpatia e da falta de conhecimento do português da jovem, eles a induzem a participar de um coro grosseiro em referência ao órgão sexual feminino. Entre as frases entoadas estão: “Essa é bem rosinha”, “Ai, que delícia” e “Buceta rosa”.

Estamos certos que é constrangedor ler e ouvir este palavrão. Mas há o que incomoda bem mais, como os dados que seguem: no Brasil, uma mulher é morta a cada duas horas; uma mulher é estuprada a cada onze minutos; mais de cinco mulheres são violentadas por hora; e cerca de 70% das vítimas de abuso são crianças e adolescentes. Sim, aqui é todo dia um 7 x 1 para a cultura do estupro. Os homens do vídeo são, portanto, bem mais do que inconvenientes e bobos. Eles são grosseiros, abusivos e alavancam uma sociedade machista que sustenta os números alarmantes acima. Pois não é apenas com leis que minimizam-se estatísticas criminais. A operação transformadora é basilar, age na reestruturação de pensamentos, levantando discussões políticas e socioeducacionais.

As crianças e jovens que acompanham o mundial de futebol precisam ver em destaque mulheres que não são apenas as musas da Copa, mas trabalham como especialistas, comentando e narrando as partidas. Precisam debater por que não há negros na torcida brasileira que tem dinheiro para viajar para a Rússia e comprar ingressos. Precisam refletir que o manual de bom comportamento para homossexuais que existe no país europeu, na realidade, não deveria parecer tão absurdo no Brasil, país que mais mata transexuais em todo o mundo. Precisam observar que a Copa vai muito além das quatro linhas, e que tudo pode passar por uma “brincadeira” machista e terminar até em feminicídio.

A gente até tenta usar a Copa para arejar a cabeça: se distrair com o futebol bonito, eleger os melhores craques em campo e fora (uma objetificaçãozinha masculina não faz mal, para variar…), rir do cabelo do Neymar. Mas a realidade é dura, mesmo durante os jogos. Pra frente, Brasil: sigamos atentxs e juntxs.

Beatriz Mota é editora-assistente de mídias sociais do Jornal O Globo

Livro traz histórias das vítimas dos grandes eventos no Rio

(IstoÉ, 14/08/2016) “Foram retirando as minhas coisas, arrastando pelo meio da rua, passando [com máquina de demolição] em cima da horta, quebrando tudo, arrastando geladeira, fogão e foram avançando, jogaram a máquina no galinheiro, onde 60 galinhas foram embora, salvamos umas, outras não, e eu fiquei no meio daquilo tudo. Ninguém me dava ouvidos. Só falavam: – a senhora tem que sair, acabou o prazo. Foi um choque muito grande. Eu nunca bebi, mas o que eu senti, foi como se eu tivesse misturado todas as bebidas fortes do mundo. Não conseguia ficar em pé”.

Feito ainda sob lágrimas, o relato é de Rita Barbosa, 59, uma pequena agricultora, que morava na mesma casa onde produzia hortifrutigranjeiros e de onde foi despejada pela prefeitura, na zona oeste do Rio de Janeiro, em 2012. Faz parte do livro Atingidas, lançado na última semana, pelo Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (Pacs). A obra traz a história de lideranças comunitárias impactadas por obras associadas a grandes eventos, que começaram nos Jogos Pan-Americanos, em 2007, passaram pela Copa do Mundo, em 2014, e se estenderam até a Olimpíada.

O despejo de Rita fez parte de uma leva de remoções, de cerca de 4 mil famílias, em um período de dez anos, segundo o Comitê Popular da Copa e da Olimpíada da cidade.

Parque Olímpico

A menos de dez quilômetros do Parque Olímpico, onde acontecem provas da Rio 2016, a casa da pequena agricultora foi a primeira de muitas a sair para dar lugar a uma via expressa de ônibus. No terreno dela, especificamente, foi instalada uma sede para companhia de limpeza urbana. Há três anos Rita contesta na Justiça a remoção, por meio da Defensoria Pública.

O despejo ocorreu um dia depois de a prefeitura ter prometido uma outra casa à moradora, com quintal e espaço para plantar, o que não aconteceu. Toda a produção de Rita que tinha galinhas e 30 tipos de árvores, somava cerca de R$ 80 mil, mas ela não ficou com nada. “Sobrevivi meses recebendo comida dos outros. Depois de trabalhar dez anos na minha casa, perdi tudo em menos de meia hora”, disse.

Rita foi colocada em uma casa com problemas estruturais e não se conforma. “Hoje, onde eu vivo, não tem terra para plantar. Planto no quintal dela [vizinha], vou para o outro, planto. Chove, eu corro para casa, para proteger da água o que sobrou. Tenho problema de coração, de pressão, eu esqueço as coisas. Foi isso o que a prefeitura me deixou”.

Símbolo

No livro Atingidas, a história de Rita divide as páginas com a de outras mulheres impactadas pela transformação da cidade, como a diarista Maria da Penha. Aos 50 anos, ela se tornou símbolo da luta de moradores pela permanência na Vila Autódromo. Ano passado, a corrente humana que ela liderou para impedir que a destruição de mais uma moradia na vila, pela guarda municipal, lhe custou uma fratura no osso do rosto e que liberou muito sangue – uma imagem que circulou, até por jornais estrangeiros. A comunidade, de 40 anos e cerca de 500 famílias, no entanto, foi praticamente toda demolida para dar lugar ao Parque Olímpico só restando 20 casas.

Um dos autores de Atingidas, o jornalista Thiago Mendes, explica que os perfis escolhidos para o livro refletem a resistência de lideranças contra as transformações da cidade e que acabaram passando por cima de direitos humanos. “Os textos procuram ser diálogos. Partimos da perspectiva delas para falar das violações das quais foram vítimas”, explicou.

A repressão ao trabalho de ambulantes, com conflitos urbanos que deixaram dezenas de pessoas feridas, é contada por Maria de Lourdes, do Movimento Unidos dos Camelôs. A treinadora Edneida Freire fala dos estudantes e atletas órfãos do Estádio de Atletismo Célio de Barros, demolido ainda na Copa do Mundo para ampliação do Estádio do Maracanã. Já as marcas da repressão a mulheres trans, prostitutas e moradores de rua é contada pela travesti Indianara Siqueira.

Acesso no site de origem: Livro traz histórias das vítimas dos grandes eventos no Rio (IstoÉ, 14/08/2016) Fifa multa federações de futebol por cantos homofóbicos de torcida

(Agência Brasil, 13/01/2016) A Fifa anunciou nesta quarta-feira (13) que multou as seleções Chile, Argentina, Peru, México e Uruguai por causa de canções homofóbicas entoadas por suas torcidas em jogos pelas Eliminatórias da Copa do Mundo da Rússia. A punição para Argentina e Chile são relativas a jogos contra a seleção brasileira.

A maior punição foi para a seleção chilena: R$ 276 mil. Além de ser punida no jogo contra o Brasil, os chilenos foram condenados por ações nas partidas contra Peru, Colômbia e Uruguai. As outras seleções vão pagar multa de R$ 78 mil. Uruguai e Peru foram punidos por ações no jogo contra o Chile e o México por gritos no jogo contra El Salvador.

De acordo com Claudio Sulser, presidente do Comitê Disciplinar da Fifa, a entidade tem lutado contra a discriminação no futebol por muitos anos e uma forma é por meio de sanções. “Com o novo sistema de monitoramento, a Comissão Disciplinar tem apoio graças adicionais para os relatórios detalhados fornecidos por observadores antidiscriminação”.

Sulser complementa que o processo disciplinar não pode mudar o comportamento das pessoas, mas acredita que é papel da entidade “ser pró- ativa em educar e inspirar uma mensagem de igualdade e respeito em todos os níveis do jogo”.

*com informações da Fifa

Edgard Matsuki do Portal EBC

Acesse no site de origem:Fifa multa federações de futebol por cantos homofóbicos de torcida (Agência Brasil, 13/01/2016) Copa do Mundo no Brasil aumentou denúncias contra prostituição na internet

(EFE, 10/02/2015) A associação brasileira SaferNet, que luta contra crimes e violações de direitos humanos na internet, recebeu ano passado 3.084 denúncias anônimas contra páginas que promoviam o tráfico humano, explicou o presidente da entidade, Thiago Tavares, em uma videoconferência. De acordo com Tavares, a realização da Copa do Mundo no país, entre junho e julho do ano passado, estimulou a criação de páginas de recrutamento para prostituição, que incluíam adolescentes, para as 12 cidades sedes, especialmente São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Fortaleza.

Acesse a íntegra no Portal Compromisso e Atitude: Copa do Mundo no Brasil aumentou denúncias contra prostituição na internet (EFE, 10/02/2015)

Denúncias de abusos sexuais contra crianças aumentaram 41,2% na Copa

(Correio Braziliense, 22/07/2014) Notificações de casos de exploração sexual que envolvem crianças e adolescentes cresceram 41,2% nas semanas do Mundial, segundo a Secretaria de Direitos Humanos.

Acesse a matéria no Portal Compromisso e Atitude:Denúncias de abusos sexuais contra crianças aumentaram 41,2% na Copa