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TÍTULO: A NOVA MÚSICA: AS TRANSFORMAÇÕES QUE A INTERNET PROPORCIONOU AO ROCK BRASILEIRO

CATEGORIA: CONCLUÍDO

ÁREA: CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS

SUBÁREA: MÚSICA

INSTITUIÇÃO: UNIÃO DAS FACULDADES DOS GRANDES LAGOS

AUTOR(ES): VINÍCIUS FERREIRA FRANCO

ORIENTADOR(ES): SÍLVIA DE CÁSSIA RODRIGUES DAMACENA

COLABORADOR(ES): JEFF NUNO, JOSÉ NORBERTO FLESCH, MARKY RAMONE, RODRIGO LIMA, TICO SANTA CRUZ

A NOVA MÚSICA: As transformações que a internet proporcionou ao rock brasileiro

1. RESUMO Esse estudo analisa as transformações que a internet proporcionou para o rock e suas vertentes no Brasil. Desde a década de 40, quando foi concebido, o rock passou por múltiplas mudanças. O mesmo acontece com a internet, que desde seus primórdios nos anos 60, vem transformando a sociedade em diversas esferas. Quando ambos se colidem, na década de 90, inúmeras transformações ocorrem na indústria fonográfica, afetando tal arte em âmbito cultural, comportamental e socioeconômico.

2. INTRODUÇÃO A tecnologia proporcionou grandes transformações às práticas humanas. Consequentemente, foi possível recriar o modo de conceber as artes, inclusive a música. A internet – fruto substancial da tecnologia – contribuiu para o desencadeamento amplo de eventos, serviços e consequências dentro da indústria fonográfica. Listamos alguns exemplos, como: a falência de gravadoras consagradas devido à distribuição de mídia digital por streaming; o download como fator de replanejamento industrial; o surgimento de gravadoras independentes; a criação de veículos de comunicação digitais especializados no assunto (emissoras de rádio e televisão cederam seus postos a blogs, fansites, podcasts e canais no YouTube); a incorporação de programas de computador como ferramenta de gravação musical; a utilização de redes sociais como disseminação de conteúdo e formação de identidade, entre outros.

Nesse sentido, buscamos reunir dados para compreender toda essa transformação e seus efeitos diretos aos profissionais que contemplam a área. Principalmente porque, em se tratando de uma revolução recente, as respostas existentes para as questões que surgem durante tal período de transição se encontram fragmentadas.

3. OBJETIVOS O objetivo geral da pesquisa é investigar o contexto histórico de dois objetos de estudo, sendo eles a internet e o rock, e posteriormente gerar uma análise sobre o impacto de um sobre o outro. Dessa forma, o objetivo específico é mapear quais foram as transformações que a internet proporcionou para o rock brasileiro.

4. METODOLOGIA Para entender o contexto histórico dos objetos de estudo, recorremos a livros, documentários, matérias jornalísticas e artigos científicos da área. Posteriormente, realizamos entrevistas (via presencial e online) com músicos, produtores, representantes de empresas de distribuição e jornalistas culturais, para coletarmos depoimentos e dados que nos serviram de embasamento para análise.

5. DESENVOLVIMENTO O livro A Internet (2008) oferece um panorama geral e detalhado sobre a linha do tempo da internet, fazendo-se entender seu papel para o desenvolvimento da arte em geral – desde seus primórdios durante a Guerra Fria, passando pelo momento em que Gilberto Gil se torna o primeiro músico brasileiro a disponibilizar uma faixa para download em seu site em 1997, até a criação de web rádios e sites/programas de compartilhamento em rede. E já que estamos falando de música com ênfase em rock, torna-se indispensável o conhecimento de sua história, o que se deu com livros como Breve História do Rock (2007) e com a série de documentários 50 Anos do Rock Brasileiro (2014).

Do ponto de vista sociológico, Manuel Castells insere uma antítese diante a frenesi benéfica da web. Em passagem do primeiro volume da trilogia A Sociedade em Rede, Castells diz:

Redes globais de trocas instrumentais ligam e desligam seletivamente indivíduos, grupos, regiões e até países, de acordo com sua relevância em preencher os objetivos processados na rede, num fluxo incessante de decisões estratégicas. Segue-se uma ruptura fundamental entre o instrumentalismo abstrato, universal, e as identidades enraizadas historicamente e particularizadas. Nossas sociedades são, cada vez mais, estruturados ao redor de uma oposição bipolar entre a ‘Rede’ e o ‘Eu’”.

A investigação é endossada, ainda, por matérias jornalísticas, artigos e demais documentários e livros, além de entrevistas com profissionais - brasileiros e estrangeiros - que contemplam a área, como músicos, distribuidores e jornalistas culturais.

Em entrevista cedida para o estudo por meio de minidocumentário, Rodrigo Lima, vocalista da banda Dead Fish afirma que as redes sociais podem ser fúteis por um lado, mas oferecem benefícios em linhas de divulgação e de formação de opinião por outro. Além disso, Lima diz que a com a amplitude de conteúdo que a web oferece, a aparição de fenômenos do rock está basicamente execrada. O Dead Fish, aliás, é a banda que detém o recorde de crowdfunding nacional, pela plataforma de financiamento coletivo Catarse, quando em 2014, arrecadou cerca de R$250.000,00 para a gravação de um álbum.

O músico Marky Ramone, ex-baterista da banda Ramones, se prontificou em responder uma pergunta para o estudo em uma entrevista coletiva realizada em decorrência de sua turnê 2016 pelo Brasil. Marky afirma que a internet possibilitou comodidade ao fã de música. Ele diz que em meio a uma infinidade de conteúdo, pode ouvir o que quiser, quando e aonde quiser.

O músico Tico Santa Cruz, vocalista da banda , afirmou ao estudo que se não fosse a internet, sua banda já teria caído no esquecimento. Tico explica que o grupo é independente, e mesmo sendo boicotado por veículos de massa, foi convidado para tocar no palco principal do 2011, um dos principais festivais do gênero; e que segue lotando casas de shows pelo país. Sinal de que uma estratégia de comunicação via redes sociais pode gerar proximidade em um público cativo e fiel.

Embora a produção musical também tenha ficado mais acessível devido a programas de gravação, masterização e mixagem caseiras, o produtor Rafael Ramos afirma em seu e-book, O Papel do Produtor (2016), que o produtor ainda tem (e provavelmente sempre terá) uma função essencial dentro da indústria fonográfica.

“Lutar para realizar um trabalho original, novo, diferente, que faça diferença dentro do mercado, que tenha suas chances comerciais, esse é o verdadeiro papel do produtor (...) O Brasil tem mão de obra maravilhosa nesta área, mas às vezes se você quer um diferencial e descobre que o cara do Tame Impala lá na Austrália está disponível para masterizar seu disco a um preço competitivo. Já pensou?! É possível, acredite. E a internet te propicia isso”.

O jornalista José Norberto Flesch, editor de Diversão & Arte do Jornal Destak de São Paulo também contribuiu com entrevista à pesquisa. Flesch pontua que a web pode ser benéfica para artistas em início de carreira em questão de autopromoção, fator que hoje em dia é levado em conta para um contratante. Para quem consome música, a criação de playlists virtuais pode ser deleitável, embora pode fadar o usuário a nunca ouvir um disco de vinil, por exemplo. A lista de benefícios inclui ainda o conhecimento de programas de gravação, novidades sobre instrumentos, atualização em tecnologia musical – o que antes só era possível com ajuda de materiais impressos e que não eram acessíveis. Já para os músicos consagrados, a web pode representar uma ameaça em questão de vazamento de canções. Músicas roubadas tem se tornado uma ocorrência comum dentro do universo mainstream do rock. Em março de 2016, três faixas não finalizadas do álbum Mellon Collie and the Infinite Sadness (1995), da banda norte americana The Smashing Pumpkins, foram roubadas e divulgadas na internet. O caso é só um entre dezenas noticiados anualmente. Outro fator negativo que o jornalista atribui à web é a manifestação de “haters”, também conhecidos como “trolls”. Estes são movidos a ódio gratuito em forma de comentários maldosos, ofensivos e preconceituosos, o que muitas vezes resulta em crimes virtuais de injúria racial, homofobia, xenofobia, dentre outras mazelas. Isso seria consequência da relação músico-fã ter se estreitado com as redes sociais.

A ONErpm é uma das principais empresas de distribuição musical do mundo. Seu Gerente de Relacionamento no Brasil, Jeff Nuno, também cedeu entrevista para o estudo. Nuno detalha alguns custos que o artista ou gravadora precisa pagar para ter acesso a alguns serviços. Para um artista ter um canal na plataforma VEVO (dentro do YouTube) e lá postar um videoclipe, por exemplo, é necessário pagar uma taxa de R$75,00. O artista/gravadora também tem a

opção de negociar um contrato, e assim obter a isenção da taxa. Um contrato com a ONErpm, além de isenções, pode render suporte, marketing, serviços de inteligência e desenvolvimento digital. Em ambos os casos, o artista/gravadora fica com os royalties adquiridos por meio de publicidade inserida em seu videoclipe. Contudo, existe um trâmite: os royalties são pagos do YouTube para a VEVO, do VEVO à ONErpm, e da ONErpm para o artista/gravadora. No final, a ONErpm fica com 30% do líquido total e final. O mesmo acontece com relação às plataformas de streaming, no entanto, a ONErpm não cobra para que o artista disponibilize sua discografia em tais plataformas. A quantidade de receita gerada com isso, segundo Nuno, depende exclusivamente do número de views e de plays. Além disso, o artista também recebe pelo que é chamado de “brending” e “posicionamento”.

“Eu tenho clientes que vendem muitos shows por terem milhares de acessos no YouTube, ou clientes de funk que vendem dezenas de shows por mês por terem um clipe bombando no canal do ‘Kondzilla’, ou clientes que vendem muitas ações com ‘marcas’ por exemplo, por terem milhares de inscritos no YouTube... Ter milhares de acessos verdadeiros e valiosos acabou ganhando algo parecido com o que o ‘Ibope’ tem na televisão. Já não se fala mais em quanto Ibope o artista tem em aparecer na TV, mas em quantos views tem no YouTube, quantos plays tem no Spotify. Hoje em dia, isso é muito mais valioso do que propriamente a rentabilidade que ele vai receber de lá”.

6. RESULTADOS Culturalmente, vimos que o modelo de gravação musical se tornou mais independente, fazendo com que o mercado fonográfico sofresse uma espécie de inflação, tornando a aparição de artistas mais ampla, ao passo que o surgimento de fenômenos se torne mais esporádica. Programas de computador foram incorporados à ação de gravar e mixar música, embora uma parcela significativa de produtores contra argumentam sobre a funcionalidade e eficiência de tais programas. A interação entre público e bandas foi facilitada via redes sociais como Facebook, Twitter e Snapchat, permitindo uma relação mais estreita entre ambos. Também vimos que as redes sociais se transformaram em um meio de o artista não depender exclusivamente de veículos de televisão e rádio para manter uma carreira sólida.

Socioeconomicamente, o download alterou o foco de artistas independentes e gravadoras, diminuindo o investimento em prensagem de discos, fomentando a divulgação via redes sociais e distribuição de trabalhos em formato digital via streaming, em plataformas como Spotify, Deezer, Apple Music, Tidal e Xbox Music. A web possibilitou que o fã (e consumidor de música) também patrocine a produção de materiais de seus artistas favoritos por meio de financiamento coletivo, o crowdfunding. As redes sociais, por sua vez, também se tornaram responsáveis por formar a identidade de artistas. Sendo assim, o número de acessos e seguidores de determinado site ou página passou a refletir diretamente na quantidade de público em shows, podendo gerar, até, uma noção de receita. Atualmente, aliás, um artista consegue prever a quantidade de público em seus shows por meio de eventos virtuais.

Em via comportamental, o meio de se informar sobre música mudou. Nos dias atuais, a informação chega por meio de sites, fansites, podcasts, vídeos no YouTube e web rádios – o que transformou a rádio e a TV em meios secundários de informação. No entanto, as redações de portais online tem se mostrado enxutas, e em sua maioria apenas reproduzem informações de portais estrangeiros ou mesmo de nacionais. Dessa forma, estes veículos de comunicação se viram obrigados a alterar o formato de programação, estabelecendo mais interação entre ouvinte/telespectador.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS A pesquisa tem base em dois objetos de estudo que estão em um ciclo de constante e interminável transformação. Lembremos: há pouco tempo era inconcebível fazer ligações de celular via wi-fi ou gravar uma música de dentro do quarto. No entanto essas novidades são voláteis, e num curto período de tempo podem se tornar mais comunais e passadas do que a indústria em geral pode imaginar. Portanto preferimos não fazer nenhuma espécie de conclusão em tom definitivo na pesquisa – mas preferimos indicar possibilidades, isto é, mostrar o “antes”, oferecer um panorama sobre o “agora” e sugerir hipóteses para o “depois”.

Consideramos, também, as respostas obtidas determinantes para a

conscientização e formação de profissionais da área, como músicos, produtores, diretores artísticos e jornalistas que pretendem se especializar em música, arte e/ou internet. Até então, tais respostas existiam, mas estavam todas fragmentadas pela nuvem da web ou em matérias e depoimentos que, se isoladas, não compunham um estudo.

No mais, ressaltamos que a pesquisa deve ter prosseguimento e os resultados devem ser aprofundados, e que existe a chance de serem consolidados em forma de e-book ou livro impresso.

Contar com as palavras de diversos nomes importantes do cenário artístico nacional e internacional foi de suma importância. Para tanto, foi necessário contar com o apoio de empresas e pessoas dispostas a superar desafios e engajadas em colaborar com o estudo. Estes acreditam na proposta da pesquisa e nos possíveis resultados gerados a partir dela.

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50 ANOS do rock brasileiro – Parte 1: Anos 50 e 60. Direção: Marcelo Rossi. (44min.), colorido. Disponível em: . Acesso em: 12 jul. 2015.

50 ANOS do rock brasileiro – Parte 2 (Anos 70 – Os Anos de Chumbo). Direção: Marcelo Rossi. (76min.), colorido. Disponível em: . Acesso em: 01 mai. 2016.

50 ANOS do rock brasileiro – Anos 80 (Parte 3). Direção: Marcelo Rossi. (68min.), colorido. Disponível em: . Acesso em: 01. mai. 2016.

50 ANOS do rock brasileiro – Anos 90 e 2000 Parte 4. Direção: Marcelo Rossi (96min.), colorido. Disponível em: . Acesso em: 01. Mai. 2016.