Justiça Federal da 1ª Região PJe - Processo Judicial Eletrônico

31/03/2020 Número: 1009850-85.2017.4.01.3400

Classe: AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Órgão julgador: 5ª Vara Federal Cível da SJDF Última distribuição : 15/08/2017 Valor da causa: R$ 2.600.000,00 Assuntos: Improbidade Administrativa Segredo de justiça? NÃO Justiça gratuita? NÃO Pedido de liminar ou antecipação de tutela? NÃO

Partes Procurador/Terceiro vinculado Ministério Público Federal (Procuradoria) (AUTOR) Diretor do Complexo Penitenciário da Papuda (TERCEIRO INTERESSADO) Juiz de Direito da Vara de Execução Penais do TJDFT (TERCEIRO INTERESSADO) SUPERINTENDENTE REGIONAL DA POLÍCIA FEDERAL NO DF (TERCEIRO INTERESSADO) GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA (RÉU) GAMIL FOPPEL EL HIRECHE (ADVOGADO) GISELA BORGES DE ARAUJO (ADVOGADO) Ministério Público Federal (Procuradoria) (FISCAL DA LEI) Documentos Id. Data da Documento Tipo Assinatura 19824 31/03/2020 14:19 Sentença Tipo A Sentença Tipo A 3879

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Distrito Federal 5ª Vara Federal Cível da SJDF

SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1009850-85.2017.4.01.3400 CLASSE: AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (64) AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA)

RÉU: GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA TERCEIRO INTERESSADO: DIRETOR DO COMPLEXO PENITENCIÁRIO DA PAPUDA, JUIZ DE DIREITO DA VARA DE EXECUÇÃO PENAIS DO TJDFT, SUPERINTENDENTE REGIONAL DA POLÍCIA FEDERAL NO DF Advogados do(a) RÉU: GAMIL FOPPEL EL HIRECHE - BA17828, GISELA BORGES DE ARAUJO - BA27221

SENTENÇA

1. RELATÓRIO

Trata-se de ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em face de GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA, requerendo sua condenação nas sanções previstas no art. 12, da Lei nº 8.429/92, pela prática dos atos de improbidade administrativa descritos no art. 11, caput, do mesmo diploma legal, por entender que o requerido, enquanto Ministro-Chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República, exigiu do então Ministro do Estado da Cultura, FARIA GARCIA, a produção de parecer técnico favorável aos seus interesses particulares.

Alega que, em junho de 2016, GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA, então Ministro-Chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República, na condição de agente público pressionou o então Ministro de Estado da Cultura, MARCELO CALERO FARIA GARCIA, para intervir em decisão a ser proferida pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN.

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 1 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 Aduz que GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA intencionava a liberação da construção de empreendimento imobiliário de alto padrão na cidade de Salvador/BA, pois havia comprado uma unidade habitacional no 23º andar do Edifício “La Vue”, cujo projeto inicial não foi aprovado pelo IPHAN/BA, de acordo com o Parecer Técnico nº 0087/14, de 25/02/2014.

Atribuiu à causa o valor de R$ 2.600.000,00 (dois milhões e seiscentos mil reais).

Notificado, o requerido sustentou, em suma, a rejeição liminar da petição inicial e argumentou, em resumo, que: a) a construção do empreendimento imobiliário não está revestida de qualquer ilicitude; b) a liberação da obra não depende de ato isolado da Superintendência Regional do IPHAN nacional, e que o Presidente do IPHAN nacional não detém atribuição para revogar o ato do IPHAN/BA; c) não influenciou politicamente a manifestação dos órgãos competentes; d) não existe indicação precisa das datas em que se sucederam as etapas do procedimento de investidas indevidas que guardem alguma relação com sua atuação no cargo de Ministro-Chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República; e) sua posse é posterior aos fatos narrados na inicial referentes a não liberação do empreendimento imobiliário pelo IPHAN.

Decisão recebeu a inicial e determinou a citação do réu GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA (id 6598479).

Embargos de declaração da defesa (id 6910497) não conhecidos (id 8537446).

Citado, o réu apresentou contestação, suscitando, preliminarmente, a inépcia da inicial. No mérito, reiterou as alegações da defesa prévia (id 10834587).

Réplica do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL na qual se valeu dos fundamentos da inicial para rebater a defesa (id 12395955). Arrolou testemunhas.

A defesa requereu prova testemunhal (id 20611972).

Foi deferida prova documental requerida pela defesa (id 24375485).

Decisão proferida, em 30/01/2019, deferiu a produção de prova testemunhal. Determinou, ainda, que independente de intimação pelo juízo, os advogados da parte deveriam providenciar a intimação das testemunhas arroladas, nos termos do art. 455 do CPC (id 31463993).

Em 05/02/2019, a defesa indicou o endereço das testemunhas MICHEL MIGUEL ELIAS TEMER LULIA e GUSTAVO DO VALE ROCHA (id 32894027).

Foi realizada audiência de instrução na qual foi ouvida a testemunha de defesa GUSTAVO DO VALE ROCHA. Na oportunidade, a defesa arguiu a preclusão da oitiva das testemunhas de acusação, não acatada pelo juízo (id 43574451).

Foi designada nova audiência para oitiva das testemunhas faltantes e do réu (id 88578731).

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 2 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 A testemunha , já não mais na condição de Presidente da República, informou impossibilidade de comparecer à audiência e apresentou relato escrito de seu testemunho (id. 114095349).

Decisão indeferiu o pedido de dispensa e determinou o comparecimento da testemunha (id 114095394).

A defesa requereu a desistência da oitiva da testemunha. MICHEL TEMER, pedido indeferido pelo juízo, que determinou o comparecimento da testemunha como informante do juízo (id 114564445).

Realizada audiência de instrução, foram ouvidas as testemunhas ELISEU DOS SANTOS PADILHA, MICHEL MIGUEL ELIAS TEMER LULIA, KATIA DOS SANTOS BORGÉA, MARCELO CALERO e o réu GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA (id 116688389).

Alegações finais do MPF pugnando pela improcedência da demanda (id 136450386), sob a alegação de que a lei de improbidade é muito gravosa.

Alegações finais da defesa pela improcedência dos pedidos da ação (id 194829847). Alegou, em síntese: a) que o pedido de improcedência feito pelo MPF tem efeitos vinculantes; b) nulidade da oitiva das testemunhas de acusação em razão da preclusão da informação dos novos endereços pelo MPF; c) ausência de isenção da testemunha MARCELO CALERO; d) ilicitude das gravações apresentadas por MARCELO CALERO, e; e) provas produzidas em juízo comprovam que o réu não praticou ato de improbidade.

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1. QUESTÕES PRELIMINARES

Inépcia da inicial

A preliminar suscitada pela defesa não merece guarida. A simples leitura da inicial permite concluir que não é inepta a petição, vez que o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL narrou de modo claro as condutas imputadas ao réu de forma a permitir o exercício pleno do contraditório e o da ampla defesa. Rejeito a preliminar.

Nulidade da oitiva das testemunhas de acusação

Quanto a preliminar de nulidade da oitiva das testemunhas de acusação, tampouco merece prosperar a defesa. A decisão que designou audiência e determinou prazo de 3 (três) dias para que as partes fornecessem endereço atualizado das testemunhas, sob pena de preclusão, foi proferida em 30 de janeiro de 2019 (id 31463993), quarta-feira, da qual as partes foram intimadas no mesmo dia (id 31506450 e 31506451).

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 3 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 Portanto, seguindo as regras de contagem de prazos do CPC, o prazo se findaria na segunda-feira, dia 04/02/2019. Por sua vez, a defesa apenas se manifestou em 06/02/2019 (id 32894027), ou seja, após o término do prazo; e o MPF não informou novo endereço, apenas se deu por ciente da audiência, em 08/02/2019 (id 33338977). Ou seja, se houvesse a preclusão alegada pela defesa, esta se daria para ambas as partes, e não só para a acusação, o que não é o caso.

Ratifico que a decisão consignada pelo juízo não foi expressa em determinar a preclusão do direito de oitiva das testemunhas, mencionando apenas a eventual preclusão de modo genérico e aberto quanto ao endereço das testemunhas a ser informado. Pondero que o próprio juízo em audiência reiterou a necessidade da busca à verdade real prevalecer sobre as formalidades. Estando, pois, no espectro de atuação judicial, a possibilidade de o julgador revogar e/ou reapreciar a qualquer momento os seus despachos ou decisões anteriores, diante do princípio da livre persuasão racional motivada. Ademais, a própria decisão mencionou que às partes caberia a intimação de suas testemunhas, independente de intimação pelo juízo:

“Independente da intimação das testemunhas pelo juízo, caberá aos advogados da parte providenciar a intimação das respectivas testemunhas arroladas, para que compareçam ao ato, na data e lugar designados, nos termos do art. 455 do novo CPC e seguintes. Apenas as intimações amparadas por hipótese de exceção legal serão arroladas pelo juízo, com fundamento nos artigos 454 CPC e 455, § 4º do CPC.”

Outrossim, ressalto ainda que, conforme decisão proferida em audiência, na primeira oportunidade em que a acusação alegou preclusão da oitiva das testemunhas de acusação, este juízo se manifestou pela ausência de prejuízo em concreto para ambas as partes, e pela predominância do princípio da verdade real no cotejo probante dos fatos. Pontuo que uma das testemunhas da própria defesa, o Ex-Presidente Sr MICHEL TEMER, havia informado na véspera da audiência sobre a impossibilidade de comparecimento, razão pela qual outra audiência seria designada para sua oitiva por videoconferência. Analogicamente, incide o princípio da pas de nullité sans grief, diante da ausência de qualquer prejuízo às partes. Cito:

“Na oportunidade, o juízo determinou que nova audiencia fosse designada, com a oitiva de todas as testemunhas que ainda não depuseram, por videoconferencia e presencial, e, em seguida, o réu, se entender por bem, tudo em ato contínuo e audiencia una. Sendo a testemunha da parte autora, Sra. Kátia dos Santos Bogeá, intimada no endereço inicialmente já apresentado pelo MPF, ou que o MPF traga a testemunha por sua conta, caso não encontrada no referido endereço pelo oficial de justiça.

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 4 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 No mais, as testemunhas de defesa MARCELO CALERO e KATIA BORGEÁ foram intimadas nos endereços inicialmente declinados pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, em sua petição inicial (id 2689899), observando-se os mesmos endereços contidos nas cartas precatórias id’s 109334873, 98566387 e 109279416, respectivamente. Sendo de tela improcedente os argumentos da defesa.

Rejeito a preliminar de nulidade.

2.2. MÉRITO

Trata-se de ação de improbidade ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em face do réu GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA pela prática de atos atentatórios aos princípios da legalidade, da moralidade e da imparcialidade, cujos escopos eram fim proibido em lei, conduta prevista no art. 11 da Lei n. 8.429/92, requerendo, ao final, sua condenação nas sanções previstas no art. 12 da referida lei.

Para tanto, alega que o réu, valendo-se da sua qualidade de Ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República, teria constrangido o então Ministro de Estado da Cultura, à época dos fatos, MARCELO CALERO FARIA GARCIA, para que interviesse junto ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN a fim de obter decisão favorável à construção de empreendimento imobiliário na cidade de Salvador/BA, Residencial La Vue, no qual era proprietário de 2 (duas) unidades residenciais no 23º andar.

A análise das provas carreadas aos autos permitem concluir que o réu efetivamente praticou Ato de Improbidade atentatório contra os Princípios da Administração Pública, a saber: a) termo de depoimento de MARCELO CALERO à Polícia Federal (id 2472481); b) Laudo n. 2615/2016 – INC/DITEC/PF, da Polícia Federal (id 2472493); c) Parecer n. 30/2016/CAR, da Câmara de Análise de Recursos do IPHAN (id 2472530); d) Relatório da Comissão de Ética Pública da Presidência da República nos autos do Processo n. 00191.010161/2016-87 (id 2472539); e) Termo de Declarações de GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA e de GUSTAVO DO VALE ROCHA ao MPF (id 2472544); f) oitiva das testemunhas de acusação MARCELO CALERO FARIA GARCIA (id 116688384) e KATIA SANTOS BORGEÁ (id 116694417); g) oitiva das testemunhas de defesa MICHEL MIGUEL ELIAS TEMER LULIA (id 116727861), ELISEU LEMOS PADILHA (id 116733883), GUSTAVO DO VALE ROCHA (id ); h) oitiva do acusado GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA (id 116776346).

As provas dos autos dão conta de que, em novembro de 2016, o acusado GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA praticou ato de improbidade administrativa atentatório contra os princípios da administração pública, valendo-se da influência que possuía em razão do cargo que ocupava à época, Ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República.

Ficou comprovado no decorrer da instrução processual que o acusado tentou constranger o então Ministro de Estado da Cultura, MARCELO CALERO FARIA GARCIA, a obter solução administrativa que atendesse aos seus interesses privados quanto à construção do Edifício La Vue, em Salvador/BA.

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 5 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 O contexto fático do ato de improbidade praticado pelo acusado emerge do processo para concessão de autorização para construção do Edifício La Vue, na cidade de Salvador/BA, junto ao IPHAN/BA. De inicio, a construção do empreendimento de acordo com o projeto original foi rejeitada por meio do Parecer Técnico n. 87/2014, em 25/02/2014. Posteriormente, em 04/11/2014, refluindo em seu entendimento, a construção foi liberada pelo IPHAN/BA, com base no Parecer Técnico nº 0627/14/BA.

Posteriormente, o referido processo foi remetido à Presidência do IPHAN nacional, onde foi exarado o Parecer 003-2016/GAB.DEPAM pela revogação da autorização, acatado pela então Presidente do órgão, em 03/05/2016 (fl. 10 do id 2472530).

Em 23/06/2016, em razão da existência de vícios formais (ausência de contraditório e da ampla defesa da construtora), a decisão de revogação foi anulada pela então Presidente do IPHAN, KÁTIA BORGEÁ, à qual cabia a prolação de nova decisão.

Por esse motivo, foi elaborado novo parecer pelo DEPAM/IPHAN, Parecer n. 30/2016/CAR, direcionado ao Presidente da Câmara de Análise de Recursos – CAR, que concluiu mais uma vez pela anulação da autorização de construção do Edifício La Vue conforme o projeto original, limitando o empreendimento a apenas 13 pavimentos (fl. 11 id 2472530).

A partir de então, tiveram início as investidas do réu GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA, pessoalmente, por telefone e através de terceiros, por meio dos quais se deram as tentativas de constrangimento ao então Ministro de Estado da Cultura, MARCELO CALERO, a fim de obter decisão favorável do IPHAN nacional à construção do Edifício La Vue, sem o decote da altura.

É que, como Ministro da Cultura, pasta à qual se sujeita o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, caberia a MARCELO CALERO o julgamento de eventual recurso hierárquico impróprio da decisão de última instância proferida pelo IPHAN quanto ao empreendimento La Vue.

A primeira versão dos fatos veio à tona por meio de depoimento prestado por MARCELO CALERO, à época dos fatos, à Polícia Federal, no qual a testemunha afirmou o que segue:

“(…) QUE por volta do mês de junho deste ano, o depoente recebeu uma ligação telefônica do Ministro-Chefe da Secretaria de Governo, , solicitando que o depoente fizesse contato com a atual presidente do IPHAN, Sra. KÁTIA BOGÉA, a fim de que ela recebesse os advogados da parte interessada na construção do empreendimento; QUE nesta ocasião, GEDDEL afirmou que a decisão do IPHAN que resultou na paralização da obra era absurda e que trazia prejuízos à atividade econômica da região, a exemplo de outras decisões do IPHAN; (…)

QUE no dia 28 de outubro, por volta das 20hs, o depoente recebeu uma ligação de GEDDEL VIEIRA LIMA, que pediu ao depoente, em tom assertivo, que o IPHAN homologasse a decisão autorizativa da obra tomada pela Superintendência do IPHAN da Bahia; QUE nesta ligação, GEDDEL disse ao

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QUE na reunião com GEDDEL, no dia 31, o mesmo, sempre de maneira assertiva, expôs ao depoente o seu entendimento da situação; QUE, inclusive, GEDDEL disse ao depoente que tinha ouvido rumores, oriundos do lPHAN da Bahia, dando conta de que o prédio deveria ser reduzido quanto ao número de andares; QUE a este respeito GEDDEL chegou a dizer "e eu que -- comprei em andar alto como fico?"; QUE GEDDEL, de maneira enfática, disse que o IPHAN deveria convalidar a autorização concedida pelo IPHAN da Bahia; QUE mesmo não havendo relação formal de subordinação à pasta administrada por GEDDEL, o depoente sentia-se subordinado a GEDDEL, uma vez que este integra o núcleo "palaciano" da Administração Federal; QUE no dia 06 de novembro, o depoente recebeu a mais contundente das ligações realizadas por GEDDEL; QUE nesta ligação, GEDDEL disse ao depoente que não gostaria de ser surpreendido cm qualquer decisão que pudesse contrariar seus interesses; QUE GEDDEL indagou a respeito do andamento do processo e chegou a dizer que o depoente deveria "enquadrar" a presidente do IPHAN; QUE, por fim, GEDDEL disse ao depoente, sempre de maneira muito arrogante, que se fosse preciso "pediria a cabeça" da presidente do IPHAN e que falaria até com o Presidente da República; QUE após esta ligação, o depoente recebeu em outro dia uma outra chamada de GEDDEL, no período da manhã, a qual não atendeu; QUE logo em seguida, ligou o Ministro Chefe da Casa Civil, ; QUE ELlSEU PADILHA argumentou com o depoente no sentido de que se a questão estava judicializada, não deveria haver decisão administrativa defmitiva a respeito; QUE ELlSEU PADILHA disse são depoente para que tentasse construir essa saída com a AGU; QUE o depoente não procurou a AGU e nem tomou qualquer iniciativa de buscar saída que contemplasse a tese apresentada por ELISEU PADILHA; QUE no dia 07 de novembro o depoente encontrou-se com GEDDEL na antessala do gabinete da Presidência da República; QUE GEDDEL estava acompanhado do Secretário de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, GUSTAVO ROCHA; QUE, na ocasião, /"-. GEDDEL falou de maneira genérica sobre o assunto e GUSTAVO ROCHA perguntou ao depoente se a AGU já havia lhe procurado; QUE em face da negativa do depoente, GUSTAVO ROCHA tentou imediatamente fazer contato com alguém da AGU, cujo nome o depoente não se recorda; QUE GUSTAVO ROCHA não teve êxito em sua tentativa; QUE após isto, despediram-se; (…)

QUE no dia 16 de novembro, o IPHAN, após manifestação favorável da Procuradoria do órgão, deu parecer definitivo determinando que o empreendimento deveria se enquadrar aos preceitos normativos aplicáveis ao caso e, por consequência, reduzir a quantidade de andares; QUE após esta decisão de mérito, o depoente passou a receber ainda mais pressões, vindas de diversos integrantes do Governo; QUE ainda no dia 16 do corrente mês, o depoente despachou com o Ministro-Chefe da Casa Civil ELISEU PADILHA ocasião em que o depoente expôs ao Ministro a decisão contrária aos interesses de GEDDEL; QUE, por

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Na mesma ocasião, MARCELO CALERO entregou à Polícia Federal aparelho de gravação com o qual havia gravado como interlocutor algumas das conversas citadas em seu depoimento, cuja perícia deu origem ao Laudo n. 2615/2016 – INC/DITEC/PF, da Polícia Federal.

A esse respeito, pontuo que, ao contrário do que sustenta a defesa, tal gravação é lícita, posto que não se trata de interceptação telefônica, mas sim de gravação ambiental por um dos interlocutores da conversa, nos termos em que já decidido pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, reiteradas vezes. Nesse sentido:

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 8 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 “A violação do sigilo das comunicações, sem autorização dos interlocutores, é proibida, pois a Constituição Federal assegura o respeito à intimidade e vida privada das pessoas, bem como o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas e telefônicas (art. 5º, inciso XII, da CF 88). Entretanto, não se trata nos autos de gravação da conversa alheia (interceptação), mas de registro de comunicação própria, ou seja, em que há apenas os interlocutores e a captação é feita por um deles sem o conhecimento da outra parte. No caso, a gravação ambiental efetuada pela corré foi obtida não com o intuito de violar a intimidade de qualquer pessoa, mas com o fito de demonstrar a coação que vinha sofrendo por parte da ora recorrente, que a teria obrigado a prestar declarações falsas em juízo, sob pena de demissão. Por não se enquadrar nas hipóteses de proteção constitucional do sigilo das comunicações, tampouco estar disciplinada no campo infraconstitucional, pela Lei nº 9.296/96, a gravação unilateral feita por um dos interlocutores com o desconhecimento do outro deve ser admitida como prova, em face do princípio da proporcionalidade” (STJ – REsp n° 1113734-SP – Rel. Og Fernandes, j. 28.09.2010, DJe 06.12.2010)

A narrativa inicial dos fatos pela testemunha MARCELO CALERO é corroborada nos autos pelas provas pré-processuais e processuais produzidas, as quais permitem concluir que houve a prática de conduta ímproba pelo acusado.

Ouvida em juízo, a testemunha de acusação KÁTIA BORGEÁ confirmou que o então Ministro MARCELO CALERO havia comentado com a testemunha a respeito do pedido do então Ministro GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA:

“(…)

Testemunha: Mas não me pressionou nem me pediu que fizesse qualquer coisa que fosse que não fosse o correto

Juíza: Mas ele chegou a dizer que tinha que dar uma resposta?

Testemunha: Que tinha que responder o mais rápido possível.

Juíza: A quem ele se referiu porque estava sendo pressionado para responder logo?

Testemunha: Ele tinha que responder logo que tinha que entregar o parecer, a resposta do IPHAN pra ele, que tinha que entregar logo, mas ele nenhum momento me impressionou ou disse para eu fazer diferente.

Juíza: Ele chegou a comentar quem estaria pedindo?

Testemunha: Sim, o Ministro Geddel.

Juíza: Ele chegou a comentar que o ministro Geddel…

Testemunha: Sim, sim é claro. Sim, sim sabia que o caso se referia, mas ele em

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 9 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 nenhum momento fez nenhum tipo de coação .

Juíza: Sim, mas ele chegou a comentar que o ministro Geddel tinha pedido para ele analisar?

Testemunha: Mas não falou que estava sendo pressionado, apenas que tinha pedido.

Juíza: que tinha pedido e que a senhora apreciasse...

Testemunha: No tempo mais rápido e de acordo com entendimento legal do IPHAN. E foi o que nós fizemos.”

Ouvido em sede administrativa pelo MPF, GUSTAVO DO VALE ROCHA, então Subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, afirmou ter se encontrado com MARCELO CALERO e questionado a respeito do assunto do empreendimento La Vue, já sabendo que GEDDEL possuía apartamento no edifício (id 2472544):

“(…) Que em outra data o declarante encontrou casualmente o Ministro da Cultura Marcelo Calero na antessala da Presidência da República; Que nessa oportunidade, vindo a tona o assunto, referiu a Calero que cabia a ele decidir o assunto, seja para um lado ou para o outro; Que nesse momento o declarante já possuía conhecimento de que Geddel possuía apartamento no edifício objeto da discussão; “

Em juízo, a testemunha GUSTAVO DO VALE ROCHA confirmou ter presenciado conversa entre o então Ministro GEDDEL QUADROS e o então Ministro ELISEU PADILHA, como também ter contatado o então Ministro MARCELO CALERO para “orientá-lo” a respeito de eventual recurso hierárquico. Afirmou, ainda, que a demissão de GEDDEL se deu por conta de existência de um conflito entre ministros, no caso, entre este e MARCELO CALERO:

“(…) Juíza: O senhor participou de uma conversa com o então Ministro Padilha na qual Geddel informou que ele tinha um apartamento nessa obra que estava sendo embargada pelo IPHAN nacional. O senhor se lembra?

Testemunha: Nesse primeiro momento, que eu fui despachar com o Ministro Padilha, eu presenciei a conversa, mas eu não tinha a informação de que o Ministro Geddel teria imóvel nesse empreendimento.

Juíza: Nesse primeiro momento, o que foi então que o Ministro Geddel lhe informou?

Testemunha: Ele me perguntou o rito, como era o rito desses procedimentos no âmbito do processo administrativo.

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 10 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 Juíza: Aí o senhor informou e ele não alegou nada porque ele teria esse interesse?

Testemunha: Não, no primeiro momento ele só perguntou a quem seria dirigido o recurso do indeferimento da decisão e expliquei para ele como é que funcionava.

Juíza: Ele falou especificamente qual era a obra?

Testemunha: Não, ele não falou.

Juíza: Ele falou quando?

Testemunha: Quando eu cheguei já estava tendo a conversa, cheguei no meio da conversa, então não sei se ele já teria falado com ele. Eu cheguei, eles só me questionaram sobre a questão do recurso, somente na questão jurídica, sobre o rito do processo administrativo.

Juíza: O senhor explicou o rito e diante de uma divergência no caso o senhor orientou então que seria o Ministro da Cultura ou seria Advocacia Geral da União?

Testemunha: Na verdade eu orientei que o recurso hierárquico seria dirigido ao Ministro da Cultura, em se tratando de mesmo órgão do mesmo ministério, o competente para o recurso hierárquico seria o ministro da pasta. O AGU seria em caso de conflito entre ministérios.

Juíza: O senhor orientou o então ministro Marcelo Calero que ele deveria se dirigir à AGU?

Testemunha: Ele me informou, palavras dele, que ele não decidiria, que ele não colocaria as mãos naquilo. O que eu disse pra ele, tendo em vista que tem que ter uma decisão e que ele não vai decidir, que ele encaminhasse para AGU, que a AGU pode dirimir eventual conflito. Foi a única coisa que eu falei pra ele sobre o encaminhamento pra AGU, tendo em vista que ele não decidiria.

Juíza: Também no seu depoimento junto ao Ministério Público Federal, o senhor informou que no decorrer das tratativas acabou sabendo que o réu Geddel tinha um apartamento, uma promessa de compra e venda, no 23º andar do empreendimento. Como foi que você ficou sabendo?

Testemunha: Não me recordo, nesse momento já havia se tornado um fato bem conhecido, então eu não me recordo de que forma chegou ao meu conhecimento.

(…)

Juíza: Qual seria esse impasse? Quando o então Presidente da República Michel Temer assinou a demissão do Ministro Geddel foi informado no texto publicado que haveria um conflito entre ministérios. Qual seria o conflito?

Testemunha: Na decisão de exoneração não tinha...

Juíza: Teve um comunicado posteriormente pela Presidência da República quanto a

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Testemunha: O que existia, o que eu sei é que existia um conflito entre ministros.

Juíza: Então existe um conflito. Quem eram esses ministros?

Testemunha: Seria entre o Geddel e o Calero.

Juíza: Então existia um conflito entre ministros?

Testemunha: Sim, que precisava ser resolvido e o presidente na época falou ‘tem que chegar o resultado final desse processo’.

Juíza: O senhor como assessor jurídico, uma pessoa de grande preparo, grande conhecimento, qual seria a atribuição do Ministro Geddel para pleitear esse conflito, na pasta dele?

Testemunha: Na verdade, houve um conflito entre pessoas, o então Ministro Geddel tinha uma questão envolvendo um órgão que era subordinado ao Ministério da Cultura, do Ministro Calero, e esse conflito é justamente, a solução desse conflito é que se buscava, seja por um lado, seja por outro.

Juíza: Então não era um conflito entre ministérios. Era um conflito entre ministros, e no caso do senhor Calero, então tinha um conflito de um Ministro e de um Ministério. É isso?

Testemunha: Pode se dizer que sim.

(...)

Juíza: Ele chegou a dizer porque não decidiria?

Testemunha: Pra mim, não.

Juíza: Ele chegou a dizer que estava recebendo telefonemas?

Testemunha: Pra mim, não. No dia seguinte eu liguei pra ele porque chegou a informação no meu gabinete que haveria interposição de recurso, porque lá na presidência tendo em vista que a minha área era a área jurídica e o protocolo central do Palácio ficava no meu setor, muitas vezes recursos ou petições eram protocolados de forma equivocada lá na subchefia. O meu gabinete informou que haveria um recurso dessa questão, momento que eu liguei para o então ministro Calero falando que foi noticiada a existência do recurso, que esse recurso seria dirigido a ele.

Juíza: Mas não é da sua pasta. Como é que o senhor tomou conhecimento se não era algo relativo a sua pasta?

Testemunha: Como eu disse lá é o protocolo central para todos os atos envolvendo o Palácio e la é a principal área jurídica do governo, então não é raro protocolo de

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 12 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 petições equivocadas lá. Nesse caso, não houve o protocolo, houve o comunicado para o meu então chefe de gabinete que haveria interposição de recurso. Esse recurso eu nunca encontrei no protocolo.

Juíza: Mas mesmo assim o senhor ligou.

Testemunha: Liguei.

Juíza: e o senhor tinha o costume de fazer isso quando chegavam outros assuntos que não são da sua pasta?

Testemunha: O normal era encaminhar para o ministro responsável, geralmente avisando que está acontecendo. Se chegasse algo equivocado que não era da minha pasta, que era de atribuição exclusiva do ministro, eu ligava avisando que chegou aqui e que estava encaminhando para o processamento devido. (...)”

Da leitura das transcrições acima, é possível concluir que o então Subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, GUSTAVO DO VALE ROCHA, tomou conhecimento da questão relativa ao empreendimento de GEDDEL e, mesmo antes de eventual interposição de recurso hierárquico contra a decisão do IPHAN, fez contato com o então Ministro da Cultura MARCELO CALERO, extrapolando em absoluto sua alçada de atribuição.

Há nos autos ainda trecho da conversa gravada por MARCELO CALERO, entre ele e GUSTAVO DO VALE ROCHA: Os áudios apresentados por MARCELO CALERO à Polícia Federal foram periciados por meio do Laudo n. 2615/2016 - INC/DITEC/PF, no qual há transcrição de ligações efetuadas. Nesse trecho, GUSTAVO conversa com CALERO a respeito do recurso que ele (GUSTAVO) iria protocolar contra a decisão do IPHAN nacional que havia indeferido a construção do prédio:

“M3: É, eu ... eu tô te ligando que ... é ... eu tô dando entrada {lá} com pedido protocolar. {Então .. vou} protocolar o recurso lá no Iphan. '/ M2:Tá.

M3: Vou protocolar uma cópia aí.

M2: Tá. Mas eu ... eu ... eu até falei com o presidente, Gustavo, eu não quero me meter nessa história não.

M3: É, o que ele me falou pra ... pra falar era, "veja se ele encaminha, e num precisa fazer nada aí, encaminha pra AGU". Falou isso comigo ontem, né? {Aí eu falei "não, eu falo isso com ele"} .',

M2: Bom ... tá, eu vou ... eu vou fazer uma reflexão aqui, Gustavo. Agora, mudando de assunto': Ancine, é ... eu pedi uma correção pro texto que me chegou hoje de manhã e ... eu lô dependendo da velocidade aqui do nosso jurídico ... “

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 13 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 O teor da conversa explica o porquê de GUSTAVO DO VALE ROCHA saber que haveria interposição de recurso da decisão do IPHAN, vez que ele mesmo afirmou que iria protocolar o recurso junto ao IPHAN e, como também uma cópia no Ministério da Cultura, e não apenas por ter ouvido falar, conforme seu depoimento em juízo.

Ademais, na conversa gravada, fica claro que GUSTAVO DO VALE ROCHA entra em contato com MARCELO CALERO a pedido de GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA, para tratar de assunto de interesse privado de GEDDEL junto ao Ministro da Cultura.

Por sua vez, ao ser ouvido em juízo, a testemunha ELISEU PADILHA, então Ministro-chefe da Casa Civil confirmou ter ligado para o então Ministro CALERO para “conversar” a respeito da decisão do IPHAN:

Advogado: O senhor tomou conhecimento da situação desse processo?

Testemunha: Eu tomei conhecimento sim. Talvez eu tenha que explicar para haver uma compreensão melhor. O Ministro Geddel era ministro da Secretaria de Governo da SEGOV, que fazia articulação política com o Congresso Nacional, e diariamente ou periodicamente, mas com muita frequência, despachava comigo pleitos que estavam com ele vindo dos vários Estados da Federação, dos parlamentares, das bancadas. E numa dessas conversas ele falou sobre esse assunto da construção de um edifício em Salvador, que havia sido liberado pelo IPHAN regional, o Superintendente Regional da Bahia havia liberado e havia um entendimento na Presidência em Brasília de que não deveria liberar. Então ele pediu qual seria orientação. Primeiro era uma questão de ser resolvida pelo ministro Calero, que era o Ministro da pasta. Se havia um órgão que tinha discordância entre si, o Ministro da pasta que teria que resolver e foi sugerido que fosse falado com o Ministro Calero para que ele pudesse, se fosse o caso, decidir. Não estou falando que a decisão tem que ser A ou B ou C ou D, mas que ele tomasse uma decisão para que o assunto fosse dirimido de uma vez, então isso foi o que aconteceu.

Advogado: O senhor em algum momento, senhor Eliseu, em algum momento pressionou Calero, ligou para o Calero para fazer algum tipo de pressão?

Testemunha: Eu liguei sim para o ministro Calero, mas absolutamente nenhuma pressão. O que eu pedi a ele é que ele, se fosse o caso, resolvesse. Como ele disse que não queria se envolver nisso aí eu dei a sugestão: se é uma discordância na interpretação de texto normativo quanto à liberação ou não liberação, quando isso acontece entre dois órgãos em nome dos ministérios, a solução é encaminhar para a Advocacia-Geral da União que poderá ditar qual dos órgãos que tem razão, Isso era usual, mas ele, pelo que eu sei não quis tomar nenhum tipo de providência.”

A simples leitura dessa declaração, aliada ao contexto fático que ficou claramente evidenciado, permite a conclusão de que não se tratou aqui de uma simples ligação telefônica para sugerir uma solução administrativa, mas sim para

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 14 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 exercer uma pressão, ainda que velada, contra o então Ministro da Cultura, para que decidisse a questão a favor do acusado ou para que levasse o caso à AGU, onde, provavelmente, tentariam nova decisão favorável.

Em verdade, em se tratando de pessoas que ocupavam à época cargos do mais alto escalão no Governo Federal, não se pode considerar que tais contatos foram simples ligações no intuito de orientar o então Ministro da Cultura MARCELO CALERO. Observa-se que, durante toda esta movimentação (contatos, telefonemas, etc), o recurso hierárquico impróprio contra a decisão do IPHAN nacional sequer havia sido protocolado, o que faz cair por terra toda a retórica no sentido de que MARCELO CALERO estivesse se negando a decidir o caso.

Por conseguinte, não é plausível que dois Ministros, GUSTAVO DO VALE ROCHA e ELISEU PADILHA, que possuíam agendas lotadas e várias atribuições inerentes ao cargo que ocupavam, tivessem dispendido tanto tempo em questões estranhas às suas pastas. Exsurge inconteste dos autos que, em verdade, tal interesse se justificava exclusivamente por conta dos interesses pessoais do então Ministro GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA em obter solução que lhe favorecesse pessoalmente, ou seja, a liberação da construção nos moldes do projeto original do Edifício La Vue.

A esse respeito, há os áudios apresentados por MARCELO CALERO à Polícia Federal, que foram periciados por meio do Laudo n. 2615/2016 - INC/DITEC/PF, no qual há transcrição de ligação efetuada pelo então Ministro ELISEU PADILHA a MARCELO CALERO em que PADILHA pede com urgência cópia da decisão do IPHAN para passar pra ele (GEDDEL) para que ele possa ver os recursos que irá entrar:

“MI: Oi, ministro.

M2: (Ininteligível- ruído de manipulação do gravador sobrepondo as falas) {chegou passar} (ininteligível) {pediu} cópia{, né? Da decisão enviada pro ministro Geddel.}

MI: Perfeito.

M2: {Pra ele poder} (ininteligível) {passou.}

MI: Uhum Uhum.

M2: {E que que o} (ininteligível).

MI: Perfeito, perfeito.

M2: Que aí ele veja ... lá {os} recursos que ele vai entrar. (...)

M2: {Bem} (ininteligível) {conversar de novo} (ininteligível) essa... essa (ininteligível) técnica, (ininteligível).

MI: Tá bem.

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 15 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 M2: (Ininteligível) {tá?}

Ml: Perdão, não entendi.

M2: Vou passar pra ele (ininteligível) {urgente, vou dizer que eu te pedi} (ininteligível)

Ml: Perfeito, perfeito, tá bem.

M2: {Depoi~ a gente vê} (ininteligível) {ele faz um recurso e aí} (ininteligível) {haverá um} (ininteligível).”

Há também áudio em que CARLOS HENRIQUE SOBRAL (M2), chefe de Gabinete do então Ministro ELISEU PADILHA liga para CALERO, atendendo a pedido de GEDDEL, questionando sobre possível recurso da decisão do IPHAN:

Ml: Diga, Sobral...

M2: Tudo bom? Ml: Tudo.

M2: O ministro Geddel me ligou aqui (ininteligível) {dissesse} (ininteligível) {qual o prazo recursal do documento} (ininteligível).

Ml: Pois é, é ... eu tenho que o consultar o pessoal da AGU. Eu ... eu te confesso que eu não sei nem ao certo o recurso que ele apresenta nesse caso, porque ...

M2: ... (Ininteligível) ...

Ml: ... se trata de um processo administrativo regular, né? E aí tá sujeito às ... às normas lá do processo administrativo ... da própria lei do processo administrativo, né? .. ,

M2: ... (Ininteligível) ...

M I: ... É, não sei essa resposta de bate pronto.

M2: {Essa ... essa ... essa resposta cê que tinha que ter}.

MI: Não entendi.

M2: Essa resposta você consegue em quanto tempo?

MI: Em quanto tempo eu consigo? É, eu acho que na próxima meia hora a gente consegue descobrir isso. Tá bom?

M2: Me liga.

MI: Eu ligo pra você, Sobral.

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 16 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 M2: Obrigado.

MI: Um abraço (Ruído de manipulação do gravador)”

O teor das conversas não deixa dúvida a respeito da intenção dos interlocutores, que, a pedido de GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA, se dirigem a MARCELO CALERO com o claro intuito de pressioná-lo a decidir de maneira favorável ao acusado.

Tratando-se de um processo administrativo federal, que segue as normas da Lei do Processo Administrativo Federal, Lei n. 9.784/99, não haveria porquê o Subchefe para Assuntos Jurídicos da Casa Civil, o Ministro-chefe da Casa Civil e seu Chefe de Gabinete ligarem pessoalmente para outro Ministro de Estado, apenas para questioná-lo sobre recurso cabível contra uma decisão administrativa qualquer, se não fosse, por óbvio, o evidente interesse pessoal do então Ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República, GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA.

Resta inconteste que o caso teve uma movimentação atípica, desarrazoável e pessoalizada, dentro da alta cúpula do Poder Executivo, com o fito de atender às pressões pessoais do réu GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA, maculando os princípios que norteiam a proba conduta dos agentes públicos, conforme preconiza o art. 37 da Constituição Federal.

Há, ainda, o depoimento da testemunha de defesa, posterior informante do juízo, o Sr MICHEL MIGUEL ELIAS TEMER LULIA, Ex-Presidente da República, o qual antes de ser ouvido como testemunha, juntou aos autos declaração acerca do que sabia sobre os fatos, e em audiência ratificou tal teor ao juízo, passando as informações a valerem a partir de então como prova idônea, onde afirma que o réu GEDDEL LIMA relatou que fizera um pedido a MARCELO CALERO,. Cito:

“(…) a) Numa noite em que dei jantar no Palácio da Alvorada para a bancada de deputados federais, o então Ministro Marcelo Calero procurou-me, relatando que recebera pedido do então Ministro Geddel, mas que não poderia atendê-lo. Tratava- se, salvo engano, de divergência entre duas instâncias de órgão encarregado da proteção ao patrimônio histórico e artístico nacional;

b) Disse-lhe, então, que se houvesse nova solicitação, apenas reiterasse que não seria possível o atendimento;

c) Dia seguinte, o então Ministro Calero procurou-me para dizer que pretendia deixar o Ministério;

d) Disse-lhe que não aceitava seu pedido de exoneração, uma vez que desejava continuar contando com os seus serviços e que, se persistisse o impasse que ele me relatara, poder-se-ia ouvir a Advocacia Geral da União, que tinha competência para dirimir controvérsias entre órgãos da União;

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 17 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 e) Nesse mesmo dia, o então Ministro Geddel relatou-me, superficialmente, que fizera o pedido, mas não solicitou a demissão de seu colega de Ministério, nem me pediu para interferir junto a ele para a aprovação de qualquer matéria ou solução da controvérsia existente;

f) Dia seguinte, estando eu em São Paulo, telefonou-me o então Ministro Calero, solicitando que eu acatasse o seu pedido de exoneração, agora feito em caráter irrevogável;

g) Disse que, em face da sua insistência, aceitava o pedido”.

Em juízo, fora a testemunha ter ratificado os termos da declaração juntada aos autos, confirmou saber que GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA havia procurado MARCELO CALERO para lhe fazer um pedido a respeito do processo administrativo envolvendo o Edifício La Vue.

Importante ressaltar que, quando da demissão do então Ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República, GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA, a Presidência da República emitiu nota, no dia 24 de novembro de 2016, confirmando a existência de divergência entre Ministros, e a qual o próprio Presidente da República havia tentado solucionar, mas sem sucesso. Tudo revela que a alegada “divergência” era nada mais do que a indevida ingerência do réu GEDDEL QUADROS em pasta alheia, afeta ao então Ministro da Cultura, MARCELO CALERO, que poderia vir a apreciar possível recurso hierárquico, ou mesmo para que viesse a pressionar servidores públicos ligados diretamente ou indiretamente ao seu Ministério ou ao IPHAN. Cito trecho:

“Sobre informações hoje publicadas pela imprensa em relação ao ex-ministro Marcelo Calera, a Presidência da República esclarece que:

1 - O presidente Michel Temer conversou duas vezes com o então titular da Cultura para solucionar impasse na sua equipe e evitar conflitos entre seus ministros de Estado;

2 - Sempre endossou caminhos técnicos para solução de licenças em obras ou açães de governo. Reiterou isso ao ex-ministro em seus encontros e refirmou essa postura ao atual ministro Roberto Freire, que recebeu instruções explícitas para manter os pareceres técnicos, que, reiterese, foram mantidos;

3 - O presidente buscou arbitrar conflitos entre os ministros e órgãos da Cultura sugerindo a avaliação jurídica da Advocacia Geral da União, que tem competência legal para solucionar eventuais dúvidas entre órgãos da administração pública, como estabelece o decreto 7392/2010, já que havia divergências entre o Iphan estadual e o Iphan federal. Em seu artigo 14, inciso 11/, o decreto diz que cabe à AGU 'Identificar e propor soluções para as questões jurídicas relevantes existentes nos diversos órgãos da administração pública federal".

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 18 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 4 - O presidente trata todos seus ministros como iguais. E jamais induziu algum deles a tomar decisão que ferisse normas internas ou suas convicções. Assim procedeu em relação ao ex-ministro da Cultura, que corretamente relatou estes fatos em entrevistas concedidas. É a mais pura verdade que o presidente Michel Temer tentou demover o ex-ministro de seu pedido de demissão e elogiou seu trabalho à frente da Pasta:

5 - O ex-ministro sempre teve comportamento irreparável enquanto esteve no cargo. Portanto, estranha sua afirmação, agora, de que o presidente o teria enquadrado ou pedido solução que não fosse técnica. Especialmente, surpreendem o presidente da República, boatos de que o ex-ministro teria solicitado uma segunda audiência, na quinta-feira (17), somente com o intuito de gravar clandestinamente conversa com o presidente da República para posterior divulgação.

Ouvido em sede administrativa pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, o acusado GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA confirmou ser proprietário do apartamento do 23º andar do empreendimento, corroborando seu interesse na resolução do caso a seu favor. Afirmou, ainda, ter efetuado contato com MARCELO CALERO a respeito da obra:

“Que o interesse do declarante se referia ao potencial econômico da obra para o município de Salvador, de modo a atender ao interesse público; Que em 2011 criou a empresa de investimentos M&A Empreendimentos e Participaçôes; Que em 2013 fez um contrato de sociedade por quota de participação com a empresa COSBAT Engenharia, de modo que sua empresa M&A arcaria com 20% do investimento inicial para compra da fração ideal do terreno; Que os 20% eram apenas referentes à fração ideal do terreno, não englobando a obra; Que pelo contrato a empresa do declarante não teria nenhuma obrigação com terceiros referente a qualquer problema na obra; Que isso foi declarado no seu imposto de renda; Que sobre isso, declara que sua condenação pela Comissão de Ética da Presidência da República se deu sem contraditório, sem defesa e sem o devido processo legal; Que a Comissão de Ética nunca lhe perguntou sobre a declaração desses bens; Que bastava verificar sua declaração de renda pessoal somada com a declaração da pessoa jurídica M&A; Que todos os pagamentos foram feitos por meio de cheques da empresa M&A para a COSBAT e que os recursos foram originados de sua pessoa física; Que chegou a investir um pouco menos de 2 milhões de reais no empreendimento; Que em fevereiro de 2016 fez um pedido de opção de compra de um apartamento na referida obra à COSBAT; Que para tanto seria utilizado o valor já investido ou, em caso do surgimento de interesse real de terceiro, o estabelecimento de fluxo financeiro complementar; Que o apto seria o 2301 (no vigésimo terceiro andar da obra); (…) Que pela crença de estar defendendo o interesse público e do seu Estado, o declarante não se sentiu constrangido em falar com Calero sobre a obra, ainda que tivesse expectativa de direito em receber um apartamento nesta em razão dos pagamentos efetuados; (...)”.

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 19 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 Em juízo, o acusado GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA confirmou ter tratado do caso mais de uma vez com o então Ministro da Cultura MARCELO CALERO, assunto que não era atribuição da sua pasta, e que atuou junto à cúpula do Poder Executivo tentando viabilizar a solução que lhe beneficiaria, a liberação do empreendimento imobiliário pelo projeto originário, onde possuía interesse pessoal e direto na solução que defendia de forma contumaz, a ponto de até envolver o então Presidente da República MICHEL THEMER, à época dos fatos, para tentar solucionar “impasse entre Ministros”. Segue trecho do depoimento do réu:

Juíza: Nesse caso, especificamente, o apartamento no edifício desse empreendimento imobiliário em Salvador, o senhor teria um contrato de compra e venda de um dos apartamentos. O senhor não se sentiu de certa forma suspeito, você não teria achado melhor levar o caso por interesse próprio?

Testemunha: No momento, não, no momento não, Doutora. Tanto que eu fiz de forma transparente com clareza. Se eu achasse que estava fazendo alguma coisa errada, se eu tivesse agido com dolo, por que eu faria então (inaudível)? Quem descobriria? Quem saberia se eu fizesse alguma coisa a sorrelfa, em algum pe de escada? Eu tratei o tema com transparência como é exigido, com clareza. Apenas para mostrar conhecimento doutora porque conheço sei do que se trata e o contrato que foi entregue por mim, por contra própria, ao Doutor Ivan, é que o contrato me dava todas as garantias que eu não teria nenhum problema se algo acontecesse com a obra, não teria nenhum tipo de problema, eu teria os meus direitos absolutamente assegurados.”

Destarte, as provas dos autos são fartas e suficientes para comprovar que o então Ministro GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA pressionou de forma desproporcional e ilícita, pessoalmente e por meio de terceiros, o então Ministro MARCELO CALERO FARIA GARCIA a fim de que este solucionasse favoravelmente ao acusado o caso do Edifício La Vue, no qual possuía apartamento no 23º andar.

Importante ressaltar que pelos mesmos fatos que deram origem a esta ação de improbidade, em razão da publicação de entrevista com a testemunha MARCELO CALERO no Jornal Folha de São Paulo, foi aberto processo junto à Comissão de Ética da Presidência da República, no bojo do qual foi aplicado ao réu GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA censura prevista no art. 17, II, do Código de Conduta da Alta Administração Pública Federal, que assim prevê:

Art. 17. A violação das normas estipuladas neste Código acarretará, conforme sua gravidade, as seguintes providências:

I - advertência, aplicável às autoridades no exercício do cargo;

II - censura ética, aplicável às autoridades que já tiverem deixado o cargo.

Trago à colação trechos do voto do Relator do Processo Administrativo junto

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 20 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 a Comissão de Ética Pública – CEP, que assim consignou:

“72. Pois bem, entendo que tudo o que até aqui veio aos autos é mais do que suficiente para a formulação de um juízo a propósito da matéria analisada. Assim, passo à análise derradeira desses fatos em face das normas aplicáveis já colacionadas nos autos.

73. Emerge cristalino, a meu juízo, o entrechoque do interesse privado do cidadão e indivíduo Geddel Quadros Vieira Lima envolvendo a aquisição daquela unidade condominial com a forma de condução do assunto no âmbito institucional e oficial por aquela importante autoridade ministerial da República brasileira.

74. Deveras, a confusão entre o público e o privado tem se manifestado há tempos no Brasil especialmente na concepção segundo a qual o Estado é propriedade de quem está no poder e, portanto, deva servir aos (seus) interesses privados, aos interesses das autoridades da República.

(...)

80. Os ocupantes de quaisquer cargos ou empregos públicos no Poder Executivo Federal, inclusive e sobretudo os Ministros de Estado, devem agir de modo a prevenir ou a impedir possíveis conflitos de interesses na Administração Pública, evitando exatamente situações como as relatadas na consulta.

81. No caso de dúvida sobre como prevenir ou impedir situações que configurem conflito de interesses, o agente público deverá consultar a Comissão de Ética Pública ou até a Controladoria-Geral da União (atual Ministério da Transparência), conforme o caso.

82. A ocorrência de potencial conflito de interesses in depende, como se sabe, da existência de lesão ao patrimônio público, bem como do recebimento de qualquer vantagem ou ganho patrimonial ou financeiro pelo agente público ou por terceiro.

83. A situação examinada, a meu juízo, expõe claro conflito de interesses que o legislador procurou prevenir, estabelecendo regras de comportamento da autoridade enquanto no cargo, protegendo-a de acusações tantas vezes infundadas, preservando os compromissos morais e os padrões qualitativos que devem gizar a conduta na Administração Pública e de seus agentes, "com vistas a motivar o respeito e a confiança do público em geral" (artigo 3° do CCAAF).

84. O representado não nega - ao contrário. afirma - que em mais de uma ocasião cuidou do tema (empreendimento La Vue) junto ao governo. seja com o Ministro Calero, seja com outras autoridades. Alega que. como conhecedor dos problemas envolvendo o empreendimento. não vislumbrava problema ou conflito algum em sua conduta.

85. Não é assim. Todavia.

86. Qualquer agente público deve evitar a todo custo qualquer situação que o leve

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 21 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 ou conduza ao conflito de interesses concreto ou potencial. Do mesmo modo. é proibido no Brasil patrocinar interesse privado perante a Administração Pública sendo agente desse patrocínio um servidor público. Patrocinar no sentido de defender requerer postular ou pressionar sendo autoridade ou servidor público pode vir a constituir ademais tipos penais como tráfico de influência e advocacia administrativa.

(...)

88. Não é por outra razão que essa Comissão de Ética Pública, por inúmeras vezes, deixou assentado que a autoridade pública deve declarar-se impedida de participar, direta ou indiretamente, do exame de qualquer matéria de interesse de entidade fiscalizada ou que tenha sob sua esfera de influência interesse particular.

89. Mesmo quando afastada do cargo público, a autoridade deve como regra abster- se de aceitar convite, influenciar ou atuar em segmentos que envolvam interesses diretos dos órgãos da União com os quais atuou no cargo público (art. 6° da Lei n. 12.813/2013). O que dizer do patrocínio, pressão ou mesmo envolvimento em assunto de seu interesse particular direto?

(...)

91. Não tenho como aceitável o argumento esgrimido por S. Exa. no sentido de que como era proprietário do imóvel detinha mais e melhor conhecimento da causa e por isso defendeu-a perante a Administração Pública Federal e perante seus colegas de Ministério.

92. As normas e princípios regentes da Administração Pública apontam para a direção oposta ao que sustenta o denunciado.

93. Não poderia o Sr. Ministro Geddel Vieira Lima atuar, gerir, comentar ou pressionar de qualquer forma qualquer autoridade governamental que estivesse gerindo direta ou indiretamente a regulação pública do citado empreendimento.

(...)

94. O "simples fato" de ser proprietário de uma unidade naquele empreendimento já deveria ser suficiente para causar lhe total paralisação ou contenção para agir ou comentar a respeito do tema na Administração Pública Federal, quanto mais para produzir artificial contencioso administrativo.

(...)

114. De acordo com os fatos admitidos pelo próprio denunciado que traduzem atuação em benefício de interesse particular próprio com indiscutível uso do cargo público resulta que no exercício de suas funções como Ministro de Estado da Secretaria de Governo da Presidência da República. o ex-Ministro Geddel Vieira Lima violou os padrões da ética pública, sobretudo no que diz respeito ã integridade. à moralidade. ã clareza de posições e ao decoro tendo em vista a nítida omissão de

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 22 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 informações obrigatórias relevantes e a conduta em flagrante conflito de interesses público e privado.

115. Face a todo o exposto. conclui-se que o Ex-Ministro de Estado Geddel Quadros Vieira Lima incorreu em desvio ético. devendo ser-lhe aplicada a sanção de censura ética, nos termos do artigo 17. 11. do Código de Conduta da Alta Administração Federal.”

Ademais, no mesmo documento acima, há a informação de que o então Ministro GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA omitiu em sua Declaração Confidencial de Informações apresentadas à CEP informações sobre o empreendimento La Vue, na relação patrimonial por ele apresentada:

“12. Entretanto, diante das declarações feitas pelo próprio Ministro Geddel Vieira Lima, no sentido de que teria assinado promessa de compra e venda de unidade no referido condomínio, procedi à análise da Declaração Confidencial de Informações - DCI apresentada à CEP em atendimento ao art. 9° da Lei nO 12.813/2013e ao art. 4° do Código de Conduta da Alta Administração Federal [CCAAF) logo após a sua posse no cargo público, verificando que não constam informações sobre o empreendimento citado na relação patrimonial apresentada.

13. Referido documento tem por finalidade, dentre outras, apresentar à CEP informações sobre situação patrimonial da autoridade pública que, real ou potencialmente, possam suscitar conflitos de interesses, além de indicar os meios pelos quais pretende evitá-los.

14. Assim, a análise realizada não infirma a confidencialidade do documento, que permanece sob sigilo em relação a todos os dados pessoais, bens adquiridos e rendimentos auferidos pelo investigado.

15. Por outro lado, há omissão de informação relevante, sob o ponto de vista de seu potencial gerador de conflito de interesses.”

Assim, cai por terra a alegação da defesa de que o acusado teria agido de forma transparente, uma vez que omitiu em sua declaração de patrimônio que era proprietário de unidade no empreendimento embargado pelo IPHAN, pois tal declaração independe da que veio a apresentar à Receita Federal - imposto de renda da pessoa jurídica ou da pessoa física. É uma obrigação autônoma e impositiva.

Quanto à alegação de que a sanção na Comissão de Ética Pública não foi precedida de contraditório e da ampla defesa, oportuno destacar trecho do voto do relator em que consta que foi ofertada defesa ao acusado, no processo de ética:

“17. Em 10 de dezembro de 2016, já ex-Ministro, Geddel Vieira Lima apresentou

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 23 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 esclarecimentos à CEP. Inicialmente afirmou causar espanto tal pedido, alegando ter dedicado mais de três décadas de sua vida ao serviço público. (...)”

No tocante à penalidade de censura ética aplicada ao réu pela Comissão de Ética Pública – CEP, importa constar que, como a própria denominação revela, trata- se de sanção de caráter ético-moral, e não de sanção jurídica. Em suma, a sanção ética não se confunde ou se sobrepõem às sanções previstas no âmbito da ciência do Direito, em especial, nas sanções administrativas, cíveis e penais, de modo que a ocorrência da censura ética não impede e nem obsta que o autor responda administrativa, civil e penalmente, diante da proteção do bem jurídico pela ciência do Direito, que é autônoma aquela.

Tanto é que a Resolução n. 10/2008, da CEP, que estabelece as normas de funcionamento e de rito processual, delimitando competências, atribuições, procedimentos e outras providências no âmbito das Comissões de Ética, prevê em seu art. 16 que “as Comissões de Ética, sempre que constatarem a possível ocorrência de ilícitos penais, civis, de improbidade administrativa ou de infração disciplinar, encaminhará cópia dos autos às autoridades competentes para apuração de tais fatos, sem prejuízo da adoção das demais medidas de sua competência.”, de modo que fica claro a total independência entre a instância ética e as demais.

As normas éticas de conduta, diferentemente das normas jurídicas, embora possuam carga valorativa de comportamentos a serem desejados pelos destinatários, possuem uma grande distinção: a coercibilidade que existe no Direito, norma jurídica mais coação, a “organização da força”, como bem definiu Tobias Barreto. Daí, em que pese o Direito possuir também um núcleo ético na sua norma jurídica do dever ser, goza de autonomia científica, e não se confunde com as normas morais e éticas, possuindo a sua própria dogmática jurídica.

Observo que o membro do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, Dr. Frederick Lustosa de Melo, - aqui pontuo que não se trata do mesmo Procurador da República que promoveu a ação e ofertou a réplica -, aduziu que as sanções da Lei de Improbidade são por demais severas e não devem ser aplicadas ao caso:

“Enfim, a conduta do réu evidenciada nos autos afigura-se reprovável e inadequada a qualquer servidor ou agente público, e deve ser rechaçada pela administração pública. Contudo, tenho que as duras sanções impostas pela Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92), as quais equivalem a uma autêntica capitis diminutio, devem ser reservadas para fatos que atentem gravemente contra a probidade administrativa, sob pena de utilização exagerada da legislação, mormente no que concerne ao art. 11, caput, o qual descreve tipos completamente abertos.”

Contudo é sobremodo infundada e salta aos olhos a alegação do segundo Procurador da República que atuou no processo, Dr Frederick Lustosa de Melo, quando, mesmo reconhecendo a existência do fato ilícito, pediu à absolvição do réu GEDEL QUADROS por entender que a sanção ética já o teria repreendido.

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 24 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 Assim, descabida a alegação de que o réu já havia se submetido à censura ética para fins de afastar a autonomia científica do Direito, e a subsunção das suas normas jurídicas ao caso concreto. As contradições do Ministério Público Federal, nas alegações finais, soam gritantes pois, em que pese ter requerido a improcedência da demanda, também afirmou que a conduta do acusado buscou influenciar decisões administrativas, e que o lobby promovido pelo acusado albergou defesa de interesse pessoal, qualificando-a como reprovável e inadequada a qualquer servidor ou agente público, nos seguintes termos:

“Na verdade, pode-se concluir que a conduta do réu configurou o famigerado lobby, o qual consiste na atividade estruturada de promoção de interesses junto a autoridades públicas, buscando influenciar decisões, geralmente, de caráter político; não olvidando que, neste caso específico, o lobby promovido pelo réu em nome dos empresários baianos também albergou, implicitamente, uma defesa de seu interesse pessoal.”

Outrossim, também não merece guarida a alegação da defesa de que o pedido de absolvição nas alegações finais vincula o juiz. De acordo com as regras de competências e de atribuições estabelecidas na Constituição Federal, compete ao Poder Judiciário julgar as demandas que a si são submetidas. A atividade de julgar é típica e cabe ao Poder Judiciário, principalmente diante de alegações finais com grave equívoco quanto à aplicação do Direito. Na contramão do que alega a defesa, e no sentido de que o pedido de absolvição formulado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL não vincula o magistrado a proferir a sentença de mérito, cito analogicamente o entendimento do STJ, no julgamento de agravo regimental em recurso especial, quanto a não vinculação do juízo ao pedido de absolvição do parquet, no julgamento de ação penal. Leia-se:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. JÚRI. TENTATIVA DE HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO. MANIFESTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PELA ABSOLVIÇÃO. ARTIGO 385 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, RECEPCIONADO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO DO JUIZ. PRECEDENTES. RECURSO DESPROVIDO. 1. Nos termos do art. 385 do Código de Processo Penal, nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição. 2. O artigo 385 do Código de Processo Penal foi recepcionado pela Constituição Federal. Precedentes desta Corte. 3. Agravo regimental não provido. (STJ - AgRg no REsp: 1612551 RJ 2016/0179974-0, Relator: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Julgamento: 02/02/2017, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/02/2017)

Se em processos criminais de ação pública, nos quais vigem os princípios da intervenção mínima ou ultima ratio, in dubio pro reo, presunção de inocência, e outros em que se busca resguardar o acusado em ações penais, o magistrado não está adstrito ao pedido de absolvição do parquet, quanto menos estará em processos de improbidade administrativa, de natureza híbrida civil-sancionador (administrativo), valendo, pois, o brocardo de “quem pode o mais, pode o menos”.

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 25 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 Importância reforçar que os membros do Ministério Público Federal, no agir da sua atividade, também devem observar os princípios da obrigatoriedade e da indisponibilidade.

Reitero que também não cabe ao membro do MPF a valoração das sanções previstas em lei, questão afeta à típica competência legiferante do Poder Legislativo, quando da elaboração das normas jurídicas do país. Aos operadores do direito, sejam eles membros do ministério público, advocacia pública e privada, ou magistrados, cabem perquirir a aplicação da lei no caso concreto, e verificar a subsunção do fato à norma jurídica; tanto à norma primária (conduta), quanto à secundária (sanção pelo descumprimento da primária).

No caso, ficou evidenciado, de forma cristalina, que o acusado GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA utilizou-se da influência política de seu cargo para tentar influenciar o então Ministro da Cultura MARCELO CALERO a proferir decisão favorável à construção do Edifício La Vue, nos moldes do projeto original que estava sendo questionado, agindo, pois, no mínimo, com dolo genérico, que consiste na vontade de praticar ato que atente contra os princípios da Administração Pública, o qual é necessário e suficiente para sua condenação por ato de improbidade, conforme entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. ELEMENTO SUBJETIVO. CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE SEM LICITAÇÃO. ATO ÍMPROBO POR ATENTADO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. CONDENAÇÃO CRIMINAL TRANSITADA EM JULGADO. APLICAÇÃO DAS SANÇÕES. (…). 2. Conforme já decidido pela Segunda Turma do STJ (REsp 765.212/AC),o elemento subjetivo, necessário à configuração de improbidade administrativa censurada nos termos do art. 11 da Lei 8.429/1992, é o dolo genérico de realizar conduta que atente contra os princípios da Administração Pública, não se exigindo a presença de dolo específico. 3. Para que se concretize a ofensa ao art. 11 da Lei de Improbidade, revela-se dispensável a comprovação de enriquecimento ilícito do administrador público ou a caracterização de prejuízo ao Erário. (…) (STJ - REsp: 951389 SC 2007/0068020-6, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 09/06/2010, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 04/05/2011)

Por conseguinte, resta demasiadamente provado que o acusado GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA praticou ato de Improbidade Administrativa atentatório contra os Princípios da Administração Pública, previsto no art. 11, da Lei n. 8.42992.

3. DISPOSITIVO

Ante o exposto, julgo PROCEDENTES os pedidos, resolvendo o processo com julgamento do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC, conforme a fundamentação,

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 26 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937 para CONDENAR o acusado GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA pela prática de ato de Improbidade Administrativa atentatório aos Princípios da Administração Pública, nos termos do art. 11, caput, da Lei n. 8.429/92.

Em razão da condenação pelo ato previsto no art. 11, da Lei n. 8.429/92, CONDENO o acusado GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA às seguintes sanções, previstas no art. 12, III, da Lei n. 8.429/92:

a) perda da função pública e suspensão dos direitos políticos por 05 (cinco) anos;

b) pagamento de multa civil de 10 (dez) vezes o valor da remuneração percebida pelo agente enquanto Ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República;

c) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 03 (três) anos.

Custas pelos réus. Sem condenação em honorários advocatícios de sucumbência, por força do disposto no art. 18, da Lei nº 7.347/85, aplicado ao caso por simetria (STJ, AgInt no AREsp nº 996192/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves).

Após o trânsito em julgado:

i) oficie-se à Justiça Eleitoral, à Secretaria do Tesouro Nacional, bem como aos demais órgãos e instituições devidos, remetendo-lhes cópia dessa sentença, para os fins de direito e, especialmente, para as anotações, nos registros respectivos, da condenação transitada em julgado, bem da sanção consistente na proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios, ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócio majoritário, nos termos da fundamentação supra;

ii) inscreva-se o nome dos réus no Cadastro Nacional de Condenados por ato de Improbidade Administrativa, na forma da Resolução do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, sobre o tema.

BRASÍLIA, #data_extenso#.

DIANA WANDERLEI

Juíza Federal Substituta da 5ª SJ/DF

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 27 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937

Assinado eletronicamente por: DIANA MARIA WANDERLEI DA SILVA - 31/03/2020 14:19:54 Num. 198243879 - Pág. 28 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=20033114195454100000194782937 Número do documento: 20033114195454100000194782937