PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

Heron Ledon Pereira

Jornalismo Rá-Tim-Bum: uma proposta de vínculos entre imprensa, escola e criança

Mestrado em Comunicação e Semiótica

SÃO PAULO 2018

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

Heron Ledon Pereira

Jornalismo Rá-Tim-Bum: uma proposta de vínculos entre imprensa, escola e criança

Mestrado em Comunicação e Semiótica

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Comunicação e Semiótica, sob orientação da Profa. Dra. Lucia Isaltina Clemente Leão.

SÃO PAULO 2018

Banca Examinadora

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Esta pesquisa de mestrado foi realizada com bolsa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

Dedico esta pesquisa a todas as crianças. Portanto, também àquelas que um dia deixamos de ser.

Agradecimentos

Os agradecimentos são infinitos e complexos ao ponto de não saber onde começam e terminam. Se é que essas delimitações existem.

Agradeço, então, a Deus e aos amigos espirituais que tanto sopraram caminhos e palavras e martelaram coisas na consciência. É curioso ver e sentir como aconteceram os processos da pesquisa e da vida nesse tempo.

Agradeço também a meus pais Berenice Ledon e José Carlos Pereira, pois todo o apoio e trajetória com eles está de alguma forma presente no trabalho e nas ideias. Gratidão a minha tia Lilia Ledon, pelas revisões, histórias, conversas e críticas sobre a humanidade. Menciono ainda as presenças inspiradoras de meus falecidos avós Gilbert Ledon e Symilde Schenk Ledon.

Os professores do curso de Comunicação e Semiótica da PUC-SP foram fundamentais. Agradeço à Profa. Dra. Lucia Isaltina Clemente Leão pela orientação, pontuações cirúrgicas, aulas e ensinamentos; ao Prof. Dr. Norval Baitello Junior pelo conhecimento transmitido, reflexões provocadas, acolhimento e carinho indescritíveis; à Profa. Dra. Cecilia Almeida Salles não só pelas disciplinas, ideias e contribuições na Qualificação, mas também pelos elos afetivos e histórias sobre uma parte da família Ledon. Agradecimento também ao Prof. Dr. Silvio Henrique Vieira Barbosa pela aproximação e informações no II Simpósio Internacional Jornalismo em Ambientes Multiplataforma, em 2016, na ESPM-SP, como também pelas sugestões e avaliações durante o processo de pesquisa.

A relação com os colegas de curso foi surpreendente e enriquecedora. A troca de ajuda, os debates, as sugestões e os conselhos foram totalmente contra as batalhas de egos de que tanto se fala no ambiente acadêmico. Agradeço a todos com os quais convivi nesse sentido. E, para não correr o risco de me esquecer de citar alguém, faço um agradecimento especial a Ana Catarina Santilli, minha grande amiga das salas, corredores e rampas da PUC. A aproximação dos temas das pesquisas, as discussões, as reflexões, as aspirações e o carinho foram valiosos e estão nestas páginas.

Minha lembrança e agradecimento vão também àquelas que produziram comigo o Trabalho de Conclusão de Curso de jornalismo, em 2014, pela Universidade Presbiteriana Mackenzie: a jornalista Natália Melo, a publicitária Ana Paula Molina e a Profa. Dra. Denise Paiero, nossa orientadora, também Mestra e Doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. A reportagem “Revivendo o Castelo Rá- Tim-Bum” é uma das origens desta pesquisa de Mestrado.

Agradeço a todas as outras pessoas, colegas e amigos que contribuíram para minha construção pessoal e profissional. Sobretudo as experiências como jornalista na Sociedade Esportiva Palmeiras, onde tive meu grande mestre Marcelo Cazavia, e na Burson-Marsteller serviram de motivação e estão impressas aqui.

Agradeço também à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela bolsa e investimento para este trabalho acontecer.

“Deixai que venham a mim as criancinhas”. Jesus

Resumo

Esta pesquisa investiga o jornalismo infantil brasileiro nos últimos anos e propõe uma maior aproximação entre imprensa, escola e criança. Para isso, observa-se como o programa Castelo Rá-Tim-Bum pode servir de inspiração para esse tipo de jornalismo no país. Exibido ineditamente de 1994 a 1997, o Castelo é uma das principais séries infantis da história da TV brasileira, com altos índices de audiência e reconhecimento internacional de especialistas. Produzido pela TV Cultura, voltou a ganhar destaque no cenário cultural do país em 2014, quando completou 20 anos de existência, com exposições, novas peças teatrais e matérias nos veículos de comunicação. Este trabalho traz panoramas sobre o histórico e exemplos recentes de jornalismo para crianças – inclusive nas universidades – e a produção de conteúdo infantil na TV, Internet, cinema, rádio, música, literatura, HQs e teatro. Também apresenta resumos dos principais programas infantis da TV Cultura antes e depois do Castelo. Sobre a série, abordam-se detalhes dos personagens, quadros e cômodos do recinto, bem como produtos antigos e recentes frutos da atração. A análise aponta elementos que possam auxiliar o jornalismo para a garotada e com ela. Destacam-se seis tópicos: assunto de criança; o papel do jornalista; apuração e descoberta; brincar; sons; criança quer falar. Utiliza-se o entendimento de comunicação como construção de vínculos, segundo Baitello Junior. O conceito de ecologia da comunicação, conforme Romano, baseia a reflexão sobre práticas comunicacionais que envolvem a meninada. Compreende-se o campo da educomunicação a partir de Soares. E as ideias de Leão sobre hipermídia ajudam a esboçar um exemplo de aplicação dos resultados.

Palavras-chave: jornalismo infantil; Castelo Rá-Tim-Bum; ecologia da comunicação; educomunicação.

Abstract

This research investigates Brazilian children's journalism in recent years and proposes a closer relationship between the press, school and children. Therefore, this study reveals how the TV program Castelo Rá-Tim-Bum can serve as an inspiration for this type of journalism in the country. Unveiled from 1994 to 1997, Castelo is one of the leading children's series in the history of Brazilian TV, with high ratings and international recognition of specialists. Produced by TV Cultura, it returned to gain prominence in the cultural scene of the country in 2014, when it completed 20 years of existence, with exhibitions, new plays and materials in the media. This work brings together historical and recent examples of journalism for children – including universities – and the production of children's content on TV, Internet, cinema, radio, music, literature, comics and theater. It also presents summaries of the main children's programs of TV Cultura before and after Castelo. About the series, this dissertation covers details of the characters, paintings and rooms of the enclosure, as well as old products and recent fruits of attraction. The analysis points out elements that can contribute to journalism for children and with them. There are six topics: children's issues; the role of the journalist; investigation and discovery; playfulness; sounds; children want to talk. The understanding of communication is used as link building, according to Baitello Junior. The concept of ecology of communication, according to Romano, bases the reflection on communication practices that involve children. It is understood the field of educommunication from Soares, and the ideas of Leão about hypermedia help sketch an example of how the results are applied.

Keywords: children‟s journalism; CasteloRá-Tim-Bum; communication ecology; educommunication.

Lista de tabelas

Tabela 1 – Recorte do trabalho infantil brasileiro ...... 24 Tabela 2 – Acesso a serviços básicos...... 25 Tabela 3 – Aparelhos de comunicação nos domicílios ...... 25 Tabela 4 – Artigos sobre jornalismo infantil na base de dados da Intercom...... 37 Tabela 5 – Disciplinas de jornalismo especializado nas graduações do Brasil ...... 38 Tabela 6 – Breve comparativo de gêneros televisivos na TV aberta em 2015 ...... 41 Tabela 7 – Panorama do contexto social e da produção de conteúdo infantil no Brasil ... 50 Tabela 8 – Lista de episódios e temas do Castelo ...... 93 Tabela 9 – Principais papéis e atividades de Penélope por episódio ...... 95 Tabela 10 – Histórias de Morgana no quadro Feitiçaria ...... 97 Tabela 11 – Experimentos de Tíbio e Perônio ...... 99 Tabela 12 – Temas do quadro do Telekid ...... 100 Tabela 13 – Disfarces do Dr. Abobrinha...... 101 Tabela 14 – Senhas para entrar no Castelo ...... 103 Tabela 15 – Charadas e trava-línguas de Mau e Godofredo...... 104 Tabela 16 – Desafios de Lana e Lara ...... 105

Lista de figuras

Figura 1 – Primeiras páginas do The Lilliputian Magazine ...... 26 Figura 2 – Duas páginas da revista, indicando o projeto gráfico ...... 27 Figura 3 – Capas de O Tico-Tico ...... 29 Figura 4 – Páginas de O Tico-Tico ...... 29 Figura 5 – Parte final da vinheta de abertura e encerramento do Castelo ...... 68 Figura 6 – Maquete do Castelo ...... 71 Figura 7 – Parte dos personagens ...... 75

Lista de gráficos

Gráfico 1 – Quantidade de canais infantis no YouTube Brasil por categoria ...... 45

Sumário

Introdução ...... 15 1. Jornalismo infantil brasileiro ...... 21 1.1. Jornalismo infantil ...... 26 1.1.1. Repórter Rá Teen Bum ...... 31 1.2. Jornalismo infantil no meio acadêmico ...... 34 1.3. Outros conteúdos infantis na TV ...... 39 1.4. Um pouco mais sobre Internet ...... 43 1.5. Cinema para crianças ...... 45 1.6. Rádio e música infantil ...... 47 1.7. Literatura infantil e HQs...... 48 1.8. Teatro infantil ...... 49 1.9. Percepções e caminhos ...... 49 2. Bum! Bum! Bum! ...... 56 2.1. TV Cultura ...... 56 2.1.1. Programas antes e depois do Castelo ...... 57 2.2. Família Rá-Tim-Bum ...... 65 2.3. O Castelo ...... 67 2.3.1. História ...... 68 2.3.2. Cômodos ...... 69 2.3.3. Personagens ...... 71 2.3.4. Quadros ...... 76 2.3.5. Outros produtos e narrativas transmidiáticas ...... 79 2.3.6. 20 anos e atualmente ...... 81 2.4. Pesquisas sobre o Castelo...... 83 3 Jornalismo Rá-Tim-Bum ...... 87 3.1. Analisando o programa ...... 89 3.1.1. Temas como pautas ...... 92 3.1.2. Penélope, mais do que repórter ...... 94 3.1.3. Contação de histórias ...... 97 3.1.4. Mais informações e curiosidades ...... 99 3.1.5. Apuração ...... 101

3.1.6. Jogos ...... 102 3.1.7. Músicas ...... 107 3.2. Bases do Jornalismo Rá-Tim-Bum ...... 107 3.3. Esboço de uma aplicação ...... 110 Considerações finais ...... 113 Referências bibliográficas ...... 118

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Introdução

A escolha de pesquisar sobre jornalismo infantil parte principalmente de reflexões pessoais sobre os papéis e responsabilidades de um jornalista, além do apreço por conteúdos destinados a menores de idade. A percepção prévia, como consumidor e integrante do mercado de trabalho, é de praticamente não haver atividade jornalística para esse público. O primeiro questionamento é: o que o jornalismo brasileiro tem feito para crianças?

Outra motivação crucial foi o Trabalho de Conclusão de Curso, de 2014, em jornalismo, pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, intitulado “Revivendo o Castelo Rá-Tim-Bum”. Foi uma reportagem em formato de site sobre os 20 anos de lançamento de um dos programas televisivos infantis mais importantes do país. Pelas entrevistas com os artistas e profissionais, foi possível perceber a forte crítica sobre a produção de conteúdo nacional para a garotada após a série. O projeto foi feito com a jornalista Natália Melo, teve ilustrações e design da publicitária Ana Paula Molina e orientação da Profa. Dra. Denise Paiero.

As primeiras pesquisas já revelaram a dificuldade de encontrar exemplos atuais de jornalismo infantil. Logo, a indagação principal se transformou em: o que o jornalismo pode fazer para as crianças? Tentamos buscar referências em produções digitais para adultos, em veículos jornalísticos infantis, na educação e na literatura infantil, mas nada nos satisfez de forma plena. Naturalmente, o Castelo Rá-Tim-Bum despontou como um caminho seguro, apesar de parecer desconexo com o tema.

De fato, o Castelo não é um programa jornalístico, mas o desafio foi realmente este: descobrir como ele pode ajudar a pensar e produzir jornalismo infantil atualmente no Brasil. Sua magnitude e relevância para a história midiática e cultural do país é inegável e já se sustenta. Não é à toa que a atração se mantém viva no cotidiano das pessoas, com reprises, exposições e entrevistas. Além disso, buscar uma referência ao jornalismo fora do próprio jornalismo não deixa de ser uma crítica às atividades e cenário da profissão, que não andam bem há alguns anos, como é de conhecimento público.

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Algumas buscas mais aprofundadas e as primeiras análises da série lapidam a questão central: o que o jornalismo pode fazer para as crianças e com elas? Percebe-se a necessidade de colocar a meninada como protagonista no processo de produção de conteúdo e conhecimento. Esta pesquisa fala justamente sobre essa vinculação entre imprensa e criança e vê a escola como um dos ambientes mais propícios para isso acontecer.

Então, esse trabalho se destina a jornalistas, comunicadores e comunicólogos, bem como a pesquisadores, pedagogos e professores do ensino básico. Acreditamos que essa troca entre profissionais da comunicação e educação pode render bons frutos a eles mesmos e, principalmente, às crianças. Os estudantes de ambas as áreas, com suas ideias e vontades emergentes, também são bem-vindos.

No entanto, antes de chegar à análise e a seus resultados, precisamos entender e mapear – conforme Lucia Leão (2011) – o contexto social e midiático da garotada, a que se destina o primeiro capítulo. Apresentamos algumas definições e conceitos de criança apresentados pelos teóricos Philippe Ariès (2011), Jean-Jacques Rousseau (2004) e Neil Postman (1999), pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (2012) e pelo Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001) e Dicionário do Castelo Rá-Tim-Bum (1997).

Pontuamos o que é jornalismo, também segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001), e jornalismo infantil, de acordo com a pesquisadora Juliana Doretto (2013). Ainda trazemos o entendimento de comunicação, pois, afinal, é disso que o trabalho trata. Vicente Romano (2004) e Norval Baitello Junior (2008) nos esclarecem que comunicação é um ato de vínculo, o que serve de base fundamental para toda a pesquisa.

Em seguida, levantamos alguns dados sociais de crianças e da população brasileira, conforme a “Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios” (PNAD) de 2015, elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e divulgada em 2016. Vemos alguns números sobre acesso à educação e a serviços básicos, como água potável, energia elétrica, coleta de lixo etc. Há estatísticas sobre trabalho

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infantil e presença de aparelhos de comunicação nos lares do país. E ainda tomamos ciência de que naquele ano havia 43 milhões de pessoas entre 0 e 14 anos de idade (21% da população). Nosso foco é a faixa etária de 6 a 12 anos, que abrange aproximadamente os sete primeiros anos do Ensino Fundamental.

Feita essa contextualização inicial, partimos especificamente para o jornalismo infantil. Descobrimos que provavelmente a revista inglesa The Lilliputian Magazine foi a primeira produção do gênero no mundo – circulando entre 1751 e 1752 –, segundo Carmen Bravo-Villasante (1963, p. 77 apud ARROYO, 2011, p. 180). Já Leonardo Arroyo (2011) mostra a importância dos veículos infantis e até amadores do Brasil durante os anos de 1800 até surgir, em 1905, a revista O Tico-Tico, que até hoje é considerada o maior exemplo do país para crianças.

Na sequência, apresentamos o que há de jornalismo infantil na atualidade. Nossas buscas livres na Internet e em listas oficiais dos principais veículos brasileiros comprovaram a escassez do setor. Encontramos apenas 13 jornais impressos e/ou online, duas revistas e um programa de TV. Os destaques são o Jornal Joca, as revistas Recreio e Ciência Hoje das Crianças e o programa Repórter Rá Teen Bum.

Partimos, então, para o universo acadêmico. No estado da arte, identificamos somente cinco teses e dissertações, 16 artigos e outros poucos exemplos de trabalhos sobre jornalismo infantil. Não satisfeitos, acessamos 225 grades curriculares de cursos brasileiros de jornalismo e não achamos uma disciplina sequer que leve tal nome. Em contrapartida, são diversas as matérias de jornalismo esportivo, econômico, político, cultural, científico etc.

Continuamos a contextualização abrindo para a produção e oferta de conteúdo infantil recente no Brasil. Focamos principalmente a televisão e Internet – em razão do Castelo e da expansão digital –, mas também trouxemos dados sobre cinema, rádio, música, literatura, histórias em quadrinhos e teatro.

Por fim, elaboramos uma tabela sinóptica de todo esse levantamento e completamos com mais algumas conceituações que nos ajudam a entender o panorama

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apresentado. O entendimento de complexidade, de Edgar Morin (2005), nos ajuda a compreender as diversas relações discutidas na pesquisa. Já a ideia de ecologia da comunicação, trabalhada por Vicente Romano (2004), também serve de base para refletir sobre o enlace entre meios de comunicação e criança e para dar continuidade à proposta de sugerir inspirações ao jornalismo infantil.

O Castelo Rá-Tim-Bum é o protagonista do segundo capítulo. Começamos com um breve histórico da TV Cultura e depois apresentamos pequenos resumos dos principais programas infantis feitos pela emissora antes e depois do Castelo – praticamente todos premiados e com grande importância para a trajetória da TV brasileira. O objetivo é compreender o contexto de produção para crianças, que é um dos destaques da TV Cultura. Em seguida, exploramos mais um pouco as atrações que levam o nome “Rá-Tim-Bum”.

Chegamos ao Castelo e apresentamos seu surgimento e enredo. Então, detalhamos a série com descrições de todos os personagens, quadros e cômodos do recinto – afinal, consideramos que o próprio Castelo é o protagonista. Também discorremos sobre outros produtos lançados a partir do programa e o forte retorno da atração nos dias de hoje, após a comemoração dos 20 anos de seu lançamento, em 2014. Com mais um estado da arte, descobrimos não haver pesquisas científicas que relacionam o Castelo ao jornalismo infantil.

O último capítulo é reservado à análise do Castelo Rá-Tim-Bum, de modo a extrair elementos que sejam inspiradores para fazer esse tipo de jornalismo. Buscamos e revelamos características do programa que de alguma forma possuem relação com o jornalismo. Então, trazemos tabelas detalhadas com temas dos capítulos, de determinados quadros e de funções de certos personagens. E elas podem servir de referência também a outras pesquisas acadêmicas e a práticas pedagógicas.

Assim, elencamos seis tópicos que, a partir da análise e discussão, consideramos relevantes para um contexto de produção de jornalismo infantil. Eles foram livremente intitulados: assunto de criança; o papel do jornalista; apuração e descoberta; brincar; sons; criança quer falar. Finalizamos esboçando uma possível

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aplicação desses resultados em uma parceria entre veículo de comunicação e escola, utilizando também recursos digitais, conforme conceitua Lucia Leão (2005).

Já nas considerações finais pontuamos novamente as principais descobertas e conclusões frutos da pesquisa. Contamos um pequeno relato prático de situações vividas em duas escolas, que ajuda a materializar um pouco do que foi discutido. E reforçamos a necessidade de dar voz às crianças, bem como de resgatar em nós, adultos, características perdidas da infância.

O foco deste trabalho é o jornalismo infantil, envolvendo, certamente, a comunicação e a garotada. Apesar de acreditarmos que a escola pode ser um ambiente favorável para acontecer a vinculação entre imprensa e criança, não exploramos conceitualmente fatores que envolvem a educação, pois isso poderia expandir demais a pesquisa e fugir do recorte escolhido. Ainda assim, no terceiro capítulo explicamos pontualmente que a educomunicação, segundo Ismar de Oliveira Soares (2004, 2009 e 2011), é uma área que justamente trabalha esse ponto de encontro entre educação e comunicação. Portanto, vemos como essa é uma das possibilidades para o jornalismo infantil.

Também optamos por não entrar em questões técnicas, econômicas ou políticas quanto a todas as aplicações de nossos resultados na prática jornalística. Ou seja, não exploramos os universos da publicidade infantil e da legislação, por exemplo. A proposta desta pesquisa não daria conta de absorver temas tão complexos, delicados e discutidos por pesquisadores, profissionais e ativistas sociais. Aqui, apenas apontamos a necessidade de vinculação entre imprensa e crianças, mas obviamente isso não pode ser feito de um modo prejudicial à garotada ou que a explore no pior sentido da palavra. Aliás, a ecologia da comunicação, de acordo com Romano (2004), nos conscientiza sobre isso.

Ainda que façamos tal sugestão de vinculação, não trazemos detalhes teóricos sobre vínculos. Por uma questão de recorte e delimitação, nos atemos ao entendimento de comunicação como um ato vinculativo, como trata Baitello Junior (2008). Acreditamos que a interessante análise dos elos criados a partir de uma

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aproximação maior entre imprensa e criança renderia outra pesquisa, talvez até uma continuação desta.

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1. Jornalismo infantil brasileiro

O primeiro passo para falar de jornalismo infantil é compreender o que é jornalismo1 em si, para evitar possíveis dúvidas e sensos comuns. O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001) o define como

“atividade profissional que visa coletar, investigar, analisar e transmitir periodicamente ao grande público, ou a segmentos dele, informações da atualidade, utilizando veículos de comunicação (jornal, revista, rádio, televisão etc.) para difundi-las” (HOUAISS, 2001, p. 1687).

Doretto (2013, p. 14) diz que “o jornalismo direcionado a crianças também pode falar sobre qualquer assunto, desde que se respeite o estágio de desenvolvimento cognitivo dos leitores” (DORETTO, 2013, p. 14). Assim, podemos entender que jornalismo infantil fala para crianças e não somente de crianças – ao contrário, por exemplo, do jornalismo esportivo, cujo enfoque é tratar de esportes não apenas se dirigir a esportistas. A mesma lógica ocorre nos jornalismos econômico, político, de meio ambiente, automotivo, científico, entre outros. Neste trabalho, porém, vamos além para sugerir uma prática jornalística com a garotada.

Portanto, pesquisar sobre jornalismo infantil no Brasil requer cuidados e atenção redobrados devido a especificidades do universo das crianças e escassez de trabalhos acadêmicos e atividades profissionais na área, sobretudo em comparação a outros temas. Dessa forma, devemos observar o atual momento de produção de conteúdo para crianças no país. Não é nosso objetivo traçar uma história totalmente detalhada ou tentar descrever absolutamente tudo o que há para a meninada nos dias de hoje – e nem teríamos tempo para isso neste projeto –, mas mostrar um panorama que ajude a situar o leitor e nosso objeto no contexto brasileiro.

1 É comum ver o jornalismo ranqueado em diversas pesquisas como uma das piores e mais perigosas profissões do mundo. Dados da ONG internacional Repórteres Sem Fronteiras (2017) apontam que o Brasil está na 103ª colocação no Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2017, entre 180 países, e é a segunda nação da América Latina com mais jornalistas assassinados nos últimos cinco anos – 21 casos, atrás somente do México. Já o relatório “Violações à Liberdade de Expressão” de 2017, feito pela ABERT (2017) – Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão, revela que, em 2016, houve 172 registros de agressões físicas, atentados, ataques, ameaças e intimidações a jornalistas do país, além de no mínimo 261 profissionais e veículos de comunicação que passaram por algum tipo de violência não letal.

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Antes disso, porém, é preciso saber de que criança e de que infância estamos falando. Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001), criança é um “ser humano que se encontra na fase da infância, indivíduo que se encontra na fase que vai do nascimento à puberdade” (HOUAISS, 2001, p. 868). Já infância é, “na vida do ser humano, período que vai do seu nascimento ao início da adolescência” (HOUAISS, 2001, p. 1611). Para dar um caráter um pouco mais lúdico a essas definições, utilizamos o Dicionário do Castelo Rá-Tim-Bum (1997), que faz parte de alguns dos livros e produtos frutos do programa televisivo homônimo. Criança é “um ser humano com pouca idade. Pode ser menino ou menina” (CHAIB e ROSENBERG, 1997, p 72). O personagem Nino completa na ilustração do verbete: “Tenho 300 anos, mas ainda sou criança” (CHAIB e ROSENBERG, 1997, p. 72, grifo do autor).2

O art. 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente diz que “considera-se criança, para os efeitos desta lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente, aquela entre doze e dezoito anos de idade” (BRASIL, 2012, p. 11). Nesta pesquisa, mantemos como foco principal a faixa etária dos 6 aos 12 anos, idade principal dos telespectadores do Castelo Rá-Tim-Bum, base desse trabalho. É natural, porém, que em alguns casos as análises e conclusões possam também incluir a garotada um pouco mais nova ou mais velha, de forma contextual.

E tais compreensões são recentes na história ocidental. Segundo Philippe Ariès (2011), em seu livro “L‟enfant et la vie familiale sous l‟Ancien Régime” (1960) – “História social da criança e da família”, na edição brasileira –, a ideia de infância não existia na Idade Média. Para o historiador francês, foi a partir dos anos 1200, com mais intensidade entre 1500 e 1700, que a separação até mesmo sentimental entre criança e adulto ocorreu, com a ida às escolas, o uso de termos específicos no vocabulário e em documentos e representações artísticas.

“A descoberta da infância começou sem dúvida no século XIII, e sua evolução pode ser acompanhada na história da arte e na iconografia dos séculos XV e XVI. Mas os sinais de seu desenvolvimento tornaram-se

2 Uma breve explicação: na série, Nino tem 300 anos e é considerado criança porque pertence a uma família de feiticeiros. Como comparação, seu tio Victor e sua tia-avó Morgana são adultos e têm 3 mil e 6 mil anos, respectivamente. No próximo capítulo, daremos mais detalhes da trama e de outros produtos oriundos do Castelo Rá-Tim-Bum.

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particularmente numerosos e significativos a partir do fim do século XVI e durante o século XVII” (ARIÈS, 2011, p. 28).

Também na discussão a respeito do conceito de criança, é importante resgatar as ideias de Jean-Jacques Rousseau (1712-1778). O filósofo suíço afirma que as crianças possuem características naturais de aprendizado e desenvolvimento que geralmente não são respeitadas pelos adultos ao longo dos anos. “A infância tem maneiras de ver, de pensar e de sentir que lhe são próprias; nada é menos sensato do que querer substituir essas maneiras pelas nossas (...)” (ROUSSEAU, 2004, p. 91). E o autor completa, referindo-se ao que chama de primeira educação, ou seja, à relação dos mais velhos com os pequenos de até 12 anos: “Portanto, a primeira educação deve ser puramente negativa. Consiste não em ensinar a virtude ou a verdade, mas em proteger o coração contra o vício e o espírito contra o erro” (ROUSSEAU, 2004, p.97).

Com relação aos estudos envolvendo a imprensa, Neil Postman (1931-2003) aponta que a invenção da prensa tipográfica, em torno de 1450 – e a maior disseminação de livros e escritos a partir disso – contribuiu para a ideia de infância. “A imprensa criou uma nova definição de idade adulta baseada na competência de leitura, e, consequentemente, uma nova concepção de infância baseada na incompetência de leitura” (POSTMAN, 1999, p. 32, grifo do autor). Por outro lado, o pesquisador americano também faz uma crítica aos limites da existência da infância e afirma que os meios eletrônicos de comunicação, principalmente a televisão, com início na primeira metade dos anos 1900, induzem a seu desaparecimento. O autor diz que a TV “destrói a linha divisória entre infância e idade adulta” (POSTMAN, 1999, p. 94) ao proporcionar um acesso irrestrito das crianças a quaisquer conteúdos, incluindo os do mundo adulto, sem exigir a necessidade de conhecimentos básicos ou técnicos – como seria preciso dominar a leitura para ler um livro, por exemplo.

É necessário esclarecer ainda a ideia de comunicação utilizada nesta pesquisa, visto que o assunto já foi iniciado mais especificamente e será aprofundado em breve. Segundo Romano, “a comunicação é o processo e o resultado da relação, mediada pelo intercâmbio de informações e sentimentos, entre indivíduos (humanos), seus grupos e organizações sociais etc.” (ROMANO, 2004, p. 59, tradução nossa). E o

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autor completa: “Os processos de comunicação humana não só possibilitam a conexão, mas também a vinculação” (ROMANO, 2004, p. 63, tradução nossa). Aliás, Baitello Junior (2008, p. 100) segue a mesma linha de raciocínio e diz que:

“(...) não mais se pode compreendê-la como simples conexão ou troca de informações, mas necessariamente é preciso ver nela uma atividade vinculadora entre duas instâncias vivas. Não será, portanto, a entidade quantificável chamada „informação‟ o parâmetro para considerar as metas de um processo de comunicação. Muito antes e mais abrangentemente, todo processo de comunicação pretende estabelecer e manter vínculos” (BAITELLO JUNIOR, 2008, p. 100).

É importante também conhecer alguns dados sobre as crianças brasileiras, e para tanto nos baseamos na “Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios” (PNAD) de 2015, elaborada pelo IBGE (2016) – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Naquele ano, 21% da população brasileira, ou aproximadamente 43 milhões de indivíduos, tinham entre 0 e 14 anos – sendo 30,1 milhões de 5 a 14 anos, de acordo com o IBGE (2016, p. 37).

Sobre a taxa de escolarização, o IBGE (2016, p. 47) estima que 98,6% das crianças entre 6 e 14 anos estudavam, e os números caíam para 85% entre 15 e 17 anos. Entre os estudantes, 85,3% do Ensino Fundamental, 88,1% do Ensino Médio e apenas 25,3% do Superior pertenciam à rede pública, de acordo com o IBGE (2016, p. 48).

Fator que preocupa ainda mais é o trabalho infantil. O IBGE (2016, p. 62) estima que havia 2,7 milhões de seres humanos de 5 a 17 anos trabalhando, sendo 79 mil de 5 a 9 anos e 333 mil de 10 a 13 anos. Para entender – ou imaginar – um pouco mais essa situação:

Tabela 1 – Recorte do trabalho infantil brasileiro 412 mil crianças de 5 a 13 anos trabalhando Média de 12,9 horas semanais trabalhadas Salário mensal de R$ 193,00 42,8% não eram remuneradas 2,6% não estudavam 64,7% estavam em atividades agrícolas 31,7% produziam para o próprio uso ou consumo Fonte: IBGE (2016, p. 64)

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Em relação aos domicílios do país – cerca de 63,6 milhões –, onde obviamente habitam crianças e adolescentes, o IBGE (2016, p. 79) revela que as condições de saneamento básico ainda são muito precárias para inúmeras famílias:

Tabela 2 – Acesso a serviços básicos Dos 63,6 milhões de domicílios brasileiros 14,6% não possuíam rede geral de abastecimento de água 34,7% não tinham rede coletora de esgoto 10,2% não contavam com coleta de lixo 0,3% não dispunha de iluminação elétrica Fonte: IBGE (2016, p. 79)

Outro dado interessante para essa pesquisa é a presença dos aparelhos de comunicação nas residências do país.

Tabela 3 – Aparelhos de comunicação nos domicílios Entre os 63,6 milhões de domicílios 97,1% tinham televisão 69,2% tinham rádio 62,2% tinham DVD 46,2% tinham microcomputador 40,5% tinham microcomputador com acesso à Internet 93,3% tinham telefone fixo ou celular 58% tinham apenas celular Fonte: IBGE (2016, p. 80)

Inclusive, vale apontar que 102,1 milhões de pessoas com 10 anos ou mais (57,5% da população) tinham acesso à Internet; apenas entre 10 e 14 anos, 69,1% acessavam a rede online e 54,1% possuíam celular para uso pessoal, de acordo com o IBGE (2016, p. 81, 82 e 83).

Assim, não é difícil constatar que a realidade brasileira em diversos setores sociais é complicada para milhões de crianças, jovens e adultos. Enquanto privilegiados,

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nossa missão com esta pesquisa é tentar contribuir um pouco para as práticas de comunicação dessa garotada e para os estudos a respeito. Ou seja, ver de que forma o programa Castelo Rá-Tim-Bum, sucesso absoluto, pode inspirar atividades jornalísticas para a meninada e com elas. Assim, vamos levantar problemas contextuais e sugerir ideias para a vinculação entre imprensa, escola e criança.

1.1. Jornalismo infantil

A relação entre jornalismo e público infantil é de longa data. De acordo com Bravo- Villasante (1963, p. 77 apud ARROYO, 2011, p. 180), a revista infantil inglesa The Lilliputian Magazine, que circulou entre 1751 e 1752, teria sido o primeiro periódico do gênero da Europa e do mundo. A British Library (2017) afirma que ela só teve três edições, posteriormente reeditadas em um volume único diversas outras vezes. Elas traziam “lições morais, narrativas curtas, fábulas, danças, canções, hinos, epigramas, brincadeiras e enigmas, todos feitos de uma maneira atraente para crianças, com uma mistura de gravuras e xilogravuras” (BRITISH LIBRARY, 2017, tradução nossa).

Figura 1 – Primeiras páginas do The Lilliputian Magazine. Volume único de 1765, com as três edições. Fonte: Internet Archive

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Figura 2 – Duas páginas da revista, indicando o projeto gráfico, que separa de um lado a parte escrita e do outro uma ilustração. Fonte: Internet Archive

Inúmeros outros jornais e revistas infantis surgiram ao longo das décadas na Europa. Como curiosidade, vamos citar apenas alguns deles, de acordo com Arroyo (2011, p. 182, 212 e 213). Na própria Inglaterra: The Museum for Young Gentlemen and Ladies (1758) e, durante a segunda metade do século XIX, Infant’s Magazine, The Children’s Friend e Little Folk. Na França: Magazin des Enfants (1757), Le Journal des Jeunes (1832), Le Journal des Enfants (1857), La Semaine des Enfants (1857) e Le Magazin d’Éducation et Récréation (1864). Na Alemanha: Leipziger Wochenblatt für Kinder (1772-1774) e Kinderfreund (1775-1784). Já na Itália: Il Nipote (1832-1848), Il Giornale dei Fanciulli (1832) e Giornale per i Bambini (1881). Por sua vez, o madrilenho Gazeta de los Niños (1798) inaugurou o gênero na Espanha.

As publicações para crianças surgiram no Brasil ao longo dos anos 1800 e tinham como base justamente o que era feito no continente europeu. Além do mais, Arroyo (2011, p. 179) afirma que a imprensa exerceu papel importante para a literatura infantil brasileira daquele período.

“Em uma época em que praticamente a literatura oral ainda exercia notável influência e era mesmo o instrumento lúcido e instrutivo por excelência da

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meninada do Brasil, os primeiros jornais dedicados às crianças não só despertavam o interesse do pequeno leitor, por meio do instrumento de cultura que representavam, como também se constituíam em veículos galvanizadores de vocação e de discussão de problemas e questões relativas ao aprendizado escolar. Os jornais infantis marcaram bem determinado período da literatura infantil brasileira” (ARROYO, 2011, p. 179).

O primeiro jornal infantil brasileiro, segundo Arroyo (2011, p. 179 e 180) provavelmente foi o baiano O Adolescente, de 1831. A partir de então, dezenas de outros pequenos veículos apareceram de norte a sul do país naquele mesmo século, mas a maioria estava relacionada a produções feitas também por crianças em escolas, de acordo com Arroyo (2011), que fala até mesmo de uma imprensa escolar.

No entanto, o grande marco inicial do jornalismo infantil brasileiro foi a revista O Tico-Tico, que circulou pela primeira vez em 11 de outubro de 1905, no , e foi produzida semanalmente até 1957; nos vinte anos seguintes, apenas em edições especiais. O periódico teve cerca de 2.100 edições e tiragem entre 20 mil e 100 mil exemplares. Por meio de seus personagens, quadrinhos, histórias, notícias e curiosidades, a publicação teve como objetivo “oferecer a seus pequenos leitores uma alegria simples e sadia” (ARROYO, 2011, p. 216).

“O Tico-Tico, como que galvanizando toda a necessidade de leitura das crianças brasileiras, impunha-se pioneiramente como publicação tecnicamente concebida. Fora a revista organizada em bases racionais, com motivos e temas de interesse nacional. O grande número de pequenos jornais e revistas que antecederam com dificuldades a importante publicação de Luís Bartolomeu de Sousa e Silva havia criado condições excepcionais para o triunfo de O Tico-Tico, que haveria, por mais de meio século, de se tornar leitura obrigatória das crianças brasileira” (ARROYO, 2011, p. 212).

Em seu início, a revista trazia e adaptava histórias em quadrinhos publicadas no jornal norte-americano The New York Herald, que tinham como personagens o garoto Buster Brown e seu cachorro Tiger, do caricaturista Richard Felton Outcault. Arroyo (2011, p. 215) diz que, em O Tico-Tico, eles se transformaram respectivamente nos brasileiros Chiquinho e Jagunço – feitos pelo desenhista Renato de Castro. Ao longo dos anos, o periódico ganhou personagens próprios, que embalavam as inúmeras histórias educativas e tiveram grande sucesso entre o público, conforme Arroyo (2011, p. 217 e 218). Entre eles, estão: Benjamim (de Luís Gomes Loureiro); Zé Macaco, Faustina, Baratinha, cão Serrote e Chocolate (de

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Alfredo Storni); Kaximbown, Pipoca, Pandareco, Para-choque, Vira-lata e Barão de Rapapé (de Max Yantock). A revista também publicou outros personagens famosos norte-americanos a partir de 1930, como Popeye, Gato Félix e Mickey Mouse.

Figura 3 – Capas de O Tico-Tico. Edições 1.083, de 07 de julho de 1926, e 1.348, de 05 de agosto de 1931. Fonte: Biblioteca Digital da Fundação Biblioteca Nacional

Figura 4 – Páginas de O Tico-Tico. Edições 1.960, de março de 1949, e 2.022, de 05 de maio de 1954. Fonte: Biblioteca Digital da Fundação Biblioteca Nacional

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Os estudos realmente apontam O Tico-Tico como o principal veículo jornalístico infantil brasileiro. A imprensa escolar continuou existindo, e outros periódicos e suplementos naturalmente surgiram no decorrer do século passado, mas nenhum com tamanho reconhecimento.

“Depois da revista de Luis Bartolomeu de Sousa e Silva tivemos algumas de glória efêmera, como Bem-Te-Vi (1923), Vida Infantil, Sesinho, além de uma série de outras publicações que se enquadram na técnica de uma produção industrial que proporciona leitura em vários países do mundo” (ARROYO, 2011, p. 226).

Podemos citar outros exemplos infantis de tempos mais recentes. Um dos maiores nomes é a revista semanal Recreio, antes editada pela Editora Abril e nos dias de hoje pela Editora Caras. Seu projeto atual existe desde 2000 – além de contar com um site e perfis no Facebook, Instagram e YouTube –, mas ela teve também um primeiro período de circulação entre 1969 e 1981. Já entre os suplementos de maior destaque, estão os dos jornais O Estado de S. Paulo, O Globo e Folha de S. Paulo. Iniciado em 1987, o Estadinho deixou de ser impresso em 2013, mesmo ano da última postagem em seu blog, logo após comemorar seus 25 anos de existência. O Globinho surgiu em 1983 e também foi extinto em 2013; seu blog parou de ser atualizado em 2015. Já a Folhinha circulou entre 1963 e 2016, mas sua seção online ainda sobrevive – porém apenas com notícias “de agenda”, ou seja, basicamente indicando livros, filmes e peças teatrais infantis em vias de lançamento, sem matérias diversas.

Em busca de mais publicações jornalísticas infantis, consultamos em maio de 2017 a lista de editoras associadas da ANER – Associação Nacional de Editores de Revistas, atualizada em março de 2017. Das 42 editoras presentes, conseguimos ter acesso aos sites e informações de 33. Além da Recreio, a única revista que parece desenvolver jornalismo voltado para a meninada é a Ciência Hoje das Crianças (ela ainda possui um site com notícias, curiosidades, jogos, quadrinhos, vídeos e rádio), do Instituto Ciência Hoje, que edita uma versão para o público geral. Essa revista infantil existe desde 1986, teria sido a primeira do Brasil sobre ciência para a garotada e está presente em bibliotecas de mais de 60 mil escolas públicas do país.

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Vale esclarecer que, no levantamento feito, desconsideramos guias para estudantes, publicações teen e de colorir e histórias em quadrinhos.

Ainda fizemos procura semelhante entre jornais, também por meio de seus sites. Como forma de estabelecer um limite, tomamos por base os associados à ANJ – Associação Nacional de Jornais. Consultada em maio de 2017, a lista apontava 104 veículos de todo o Brasil, e conseguimos acesso a 98. Só consideramos os portais que possuíam uma seção infantil atualizada ao menos uma vez naquele mesmo mês. Além da Folhinha, encontramos 11 exemplos. Seis deles realizam um trabalho pedagógico junto a escolas para levar seus jornais aos alunos, como instrumentos de educação. São eles: Diário do Nordeste (CE), Diário do Norte do Paraná (PR), A Notícia (SC), A Tribuna (SP), Correio Popular (SP) e Jornal da Cidade de Bauru (SP). Já na seção DC na Sala de Aula, do Diário Catarinense (SC), não há a informação se existe um projeto especificamente para escolas, apesar do nome. O Diarinho, do Diário do Pará (PA), está na editoria de Entretenimento. O Jornal de Brasília (DF) possui a coluna/blog Playground. Por fim, há seções infantis no Jornal do Povo (RS) e no Jornal Cidade de Rio Claro (SP), mas o acesso é restrito e não foi possível visualizar o conteúdo.

Em meio a demais pesquisas, encontramos outro exemplo interessante: o Jornal Joca, da Editora Magia de Ler, criado em 2011 e inspirado em publicações da Europa, sobretudo da França. O veículo infantil possui site de notícias atualizado diariamente, perfis no Facebook, Instagram e YouTube, blog para os pais e serviço de assinatura de sua versão impressa. Aliás, a edição em papel, quinzenal, é o ponto forte da empresa, que com ela tem um projeto pedagógico em cerca de 50 escolas brasileiras, inclusive com instruções e apontamentos especiais para os professores.

Todavia, não achamos a presença de jornalismo infantil em levantamento em portais noticiosos também conhecidos no país – como G1, R7, UOL, Terra, iG, Yahoo Brasil, MSN Brasil, El País Brasil, BBC Brasil, DW Brasil e Nexo Jornal.

1.1.1. Repórter Rá Teen Bum

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Não é muito difícil imaginar a escassez de jornalismo infantil na TV brasileira, e nossas buscas – realizadas na última semana de maio de 2017 – nos sites das emissoras confirmam isso. Tomamos como base as grades de programação disponíveis e as poucas (quando existentes) informações específicas sobre os programas, fato esse que dificultou obter resultados mais detalhados. Assim, não encontramos conteúdo jornalístico infantil nas principais redes abertas do país, que são a Band, CNT, Globo, Record, RedeTV!, SBT, TV Brasil, TV Cultura e TV Gazeta, segundo a Agência Nacional do Cinema – Ancine (2016a). E o resultado foi quase o mesmo nos portais dos cerca de 250 canais por assinatura da lista da própria Ancine (2017a).

A exceção é o programa Repórter Rá Teen Bum, o único que não deixa dúvidas de se encaixar no jornalismo infantil. Ele é veiculado na TV Rá Tim Bum! (disponível também no canal no YouTube), nas noites de sábado, e produzido pelas equipes da própria emissora e da TV Cultura – ambas pertencem à Fundação Padre Anchieta. Estreou em 16 de abril de 2016, tem o público de até 10 anos e se intitula “o primeiro programa de notícias totalmente dedicado a crianças e adolescentes”. Com duração de 11 a 15 minutos, a atração é apresentada pela jovem atriz Nathália Falcão, e as reportagens – que são menos factuais, ou mais “frias”, no jargão jornalístico – tratam de assuntos que interessam ao universo infantil. Inclusive, os pequenos são os principais entrevistados nas matérias.

Apesar de ser uma produção brasileira, a iniciativa do Repórter Rá Teen Bum é internacional. O programa faz parte do projeto WADADA News for Kids, da ONG holandesa Free Press Unlimited, presente em 46 países e que trabalha principalmente com questões de liberdade de imprensa e acesso a informação em zonas de guerra. O WADADA teve início em 2014, no Suriname, atua em mais de 20 países3 e atinge aproximadamente 100 milhões de pessoas, com conteúdo em 12 línguas diferentes. Há também o intercâmbio das matérias elaboradas. Ou seja, as reportagens brasileiras, por exemplo, são exibidas em outras nações e vice-versa.

3 De acordo com a ONG, os países são: África do Sul, Bangladesh, Brasil, Bolívia, Egito, Equador, Gana, Holanda, Indonésia, México, Myanmar/Birmânia, Nepal, Nicarágua, Peru, Serra Leoa, Suriname, Ucrânia e Zâmbia, além de possuir correspondentes na Argentina, Colômbia e Kosovo. Mais informações em: wadadanewsforkids.org.

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É claro que este exemplo de jornalismo infantil não está sozinho na história da TV brasileira. Uma das atrações mais lembradas é a Globinho, da TV Globo, que estreou em 1972 e teve pouco mais de dez anos de exibição. Era um telejornal para crianças e adolescentes e teve diferentes periodicidades, durações e horários de transmissão – como de segunda a sexta, em edições de 5 a 15 minutos, e aos sábados, com 30 minutos. O programa ainda promoveu campanhas, eventos e concursos com seu público e teve como uma de suas grandes apresentadoras a jornalista Paula Saldanha, que a partir de 1981 teve a companhia de um boneco manipulado, o macaquinho Loiola.

Existem ainda produções mais recentes que, embora talvez não possam ser estritamente classificadas como jornalismo infantil, têm características da prática jornalística, como as entrevistas, principalmente. Uma delas foi o dominical Gente Inocente, também da TV Globo, veiculado de 2000 a 2002, aos domingos. Ao lado do apresentador Márcio Garcia, um elenco de crianças entrevistava celebridades, além de dançar, cantar e interpretar. Outra atração foi Cartãozinho Verde, da TV Cultura, inspirada no Cartão Verde, um programa de debate sobre futebol e no ar desde 1993. A versão mirim existiu de 2012 a 2014 e tinha uma apresentadora adulta e quatro garotos que discutiam o esporte e faziam matérias sobre os clubes pelos quais torciam: João Braga (Corinthians), Eric Lanfredi (Palmeiras), Pedro Crema (São Paulo) e Matheus Ribeiro (Santos).

Já a TV Cocoricó foi um programa exibido em 2012 e 2013, que se diferenciava do original Cocoricó por ser ao vivo, com uma hora de duração. Produzido pela TV Cultura, tinha os mesmos personagens feitos de bonecos, como o garoto Júlio e diversos animais da fazenda. A atração mostrava diversas histórias, receitas culinárias e curiosidades, além de longas entrevistas com artistas como Maurício de Sousa, , Rosi Campos, Sandra Peres e Paulo Tatit (Palavra Cantada), entre tantos outros. Falaremos mais sobre Cocoricó no capítulo seguinte.

Há quem conheça Marcelo Tas por interpretar o Professor Tibúrcio, do Rá-Tim-Bum, ou o Telekid, do Castelo Rá-Tim-Bum, mas o jornalista, roteirista e apresentador já fez e faz outros trabalhos com crianças que também possuem certa ligação com o

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jornalismo. Lançado em 2009, no canal infantil fechado Cartoon Network, Plantão do Tas é um telejornal de notícias fictícias em que o âncora tem a companhia de dois repórteres mirins. Na mesma emissora, teve início em 2014 o Papo Animado com Marcelo Tas, um talk show de aproximadamente três minutos de duração em que Tas entrevista personagens de desenhos animados. Já na TV aberta, na Band, Marcelo apresentou em 2012 o Conversa de Gente Grande. Nele, algumas crianças entrevistavam celebridades e conversavam sobre variados assuntos.

Também merece ser citado o Canal Futura, distribuído na TV por assinatura, em TVs universitárias e na Internet. É uma emissora educativa fundada em 1997, pertencente à Globosat e que possui parcerias com universidades para produção de materiais. Pela falta de informações concretas disponíveis, não podemos afirmar com absoluta certeza se há conteúdos de jornalismo infantil atualmente. Porém, alguns programas educativos chamam a atenção por tratar de questões corriqueiras, com entrevistas de especialistas. Um deles é a série Que abuso é esse?, que fala sobre violência sexual infantil por meio de histórias com personagens de bonecos e participações de autoridades no assunto.

Ainda vale destacar uma seção do site da TV Climatempo, emissora criada em 1999 e pertencente à empresa de meteorologia Climatempo. Seu portal possui uma área para crianças muito interessante, chamada Climakids. Ela conta com a presença dos personagens da Turma da Mônica – do cartunista – e quadrinhos da série sobre fenômenos climáticos e experiências que podem ser feitas pelo leitor, além da opção de consultar a previsão do tempo. Na grade de programação da TV, há conteúdos socioeducativos, mas não identificamos algo especificamente infantil.

Como a partir deste ponto os resultados das pesquisas por materiais com potencial jornalístico são cada vez mais raros, faremos uma breve pausa na questão. Em seguida, retomaremos o contexto da produção de conteúdo infantil no país como um todo e nos diferentes meios e práticas de comunicação.

1.2. Jornalismo infantil no meio acadêmico

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A pouca quantidade de jornalismo infantil na imprensa brasileira também parece ocorrer nas universidades do país. Doretto (2013, p. 15) afirma haver diversos trabalhos de conclusão de curso em jornalismo infantil, mas a proporção não se mantém nas pós-graduações.

Nossas buscas por trabalhos acadêmicos sobre o tema confirmaram esse cenário de escassez. No Banco de Teses e Dissertações da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) – fundação do Ministério da Educação –, só encontramos cinco pesquisas sobre jornalismo infantil:

- Título: “Ler sem engasgar: dois tipos de recepção do jornalismo infantil da Folhinha – suplemento infantil da Folha de S. Paulo”. Pesquisadora: Mônica Pinto Rodrigues da Costa. Ano de defesa: 1992. Formação/Programa: Mestrado em Comunicação e Semiótica. Instituição de Ensino: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP. Resumo: O trabalho investiga a decodificação de leitura das crianças e se elas assimilam as informações da maneira imaginada pelos jornalistas que produzem tais conteúdos.

- Título: “Jornalismo infantil: „Pinguinho de Notícia‟”. Pesquisadora: Iracema Batista Torquato. Ano de defesa: 2002. Formação/Programa: Mestrado em Comunicação. Instituição de Ensino: Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP. Resumo: A pesquisa conta sobre o processo de produção e leitura de um jornal infantil feito de forma experimental por uma escola estadual de Jaú (SP), envolvendo também a relação entre comunicação e educação.

- Título: “O jornal infantil interativo”. Pesquisador: Emerson Cesar Biral Mendes. Ano de defesa: 2002. Formação/Programa: Mestrado em Comunicação. Instituição de Ensino: Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP. Resumo: O trabalho analisa a forma de adaptação dos jornais Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo e Jornal da Cidade de Bauru ao público infantil, por meio de seus suplementos Folhinha, Estadinho e JC Criança. Também pesquisa sobre uma proposta de um jornal escolar interativo.

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- Título: “Pequeno leitor de papel: jornalismo infantil na Folhinha e no Estadinho”. Pesquisadora: Juliana Doretto. Ano de defesa: 2010. Formação/Programa: Mestrado em Ciências da Comunicação. Instituição de Ensino: Universidade de São Paulo – USP. Resumo: O trabalho mapeia o perfil das crianças entrevistadas pela Folhinha e Estadinho em 25 edições de cada um dos suplementos, em 2009. Consequentemente, também analisa as notícias de ambos os veículos.

- Título: “O jornalismo infantil e o desejo de consumo: o discurso da revista Recreio”. Pesquisadora: Thaís Helena Furtado. Ano de defesa: 2013. Formação/Programa: Doutorado em Comunicação e Informação. Instituição de Ensino: Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRS. Resumo: O estudo faz uma análise do discurso da revista Recreio, principalmente verificando como a publicação trabalha e incentiva o desejo de consumo das crianças.

Também fizemos uma pesquisa na plataforma de periódicos da Capes e encontramos apenas três artigos que tratam de jornalismo infantil:

- Título: “Natureza do hipertexto no jornalismo digital em dois suplementos para o público infantil”. Autoras: Izabel Cristina Diniz/CEFET-MG e Leila Aparecida Anastácio/CEFET-MG. Revista: Texto Livre: Linguagem e Tecnologia, v. 5, n. 2, 2012. Resumo: O artigo faz uma análise do hipertexto, segundo Marcushi (2001), na Folhinha, da Folha de S. Paulo, e do Blog do Guri, do Estado de Minas. Verifica ainda suas práticas jornalísticas.

- Título: “A relação entre o discurso didático científico e o discurso jornalístico na revista Recreio”. Autoras: Thaís Helena Furtado/ e Sabrina Franzoni/Unisinos. Revista: Galáxia, n. 29, jun. 2015. Resumo: O artigo faz uma análise dos discursos didático científico e jornalístico da Recreio – é um desdobramento da tese defendida por Furtado em 2013, mencionada acima.

- Título: “O jornalismo infantil revistativo da Recreio”. Autora: Thaís Helena Furtado/Unisinos. Revista: Vozes e Diálogo, v. 14, n. 2, jul./dez. 2015. Resumo: O

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artigo, também fruto da tese citada, discute se a revista Recreio pode ser considerada jornalística, concluindo que sim e que possui características próprias.

Ainda tentamos encontrar artigos sobre jornalismo infantil na plataforma SciELO – Scientific Eletronic Library Online (que reúne periódicos científicos na Internet). O único achado foi o mesmo feito por Thaís Helena Furtado e Sabrina Franzoni e publicado na Galáxia, em 2015: “A relação entre o discurso didático científico e o discurso jornalístico na revista Recreio”.

Onde conseguimos maior número de resultados foi no banco de produção científica da Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, que promove encontros científicos, com participação e produção, inclusive, de alunos de graduação. A seguir, a lista dos 13 artigos descobertos no Portal de Livre Acesso à Produção em Ciências da Comunicação, dos mais recentes aos mais antigos.

Tabela 4 – Artigos sobre jornalismo infantil na base de dados da Intercom Autores Título Ano Thaís Helena Furtado O Discurso Jornalístico presente na revista Recreio 2014 João Victor Melo Sales O jornalismo infantil na revista Recreio 2013 Mayra Fernanda Ferreira Potencialidades Educomunicativas do 2011 Jornalismo para Crianças Thaís Helena Furtado A criança leitora imaginada por Zero Hora 2011 Greyce Nunes e Jiani Perspectivas Teóricas para Compreender o 2010 Bonin Jornalismo Infantil Juliana Doretto Jornalismo e os pequenos leitores: a temática 2010 de suplementos infantis Rodrigo Pscheidt; Samara Revista Mania – Educação, informação, cultura, 2009 Najar; Stela Tondo cidadania e lazer Thaís Helena Furtado A editorialização do Jornalismo Infantil 2009 Juliana Doretto Foquinha: jornalismo infantil na ditadura militar 2009 Ednubia Ghisi; Michel Análise das revistas Recreio, Disney Princesas 2009 Prado; Hendryo André e Atrevidinha Mayra Fernanda Ferreira Jornalismo Infantil: por uma prática educativa 2007 Mayra Ferreira e Loriza Infância em papel: o jornalismo infantil no 2007

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de Almeida interior Luana Aparecida Vianna Jornalismo Infantil em Ribeirão Preto: Estudo do 2006 “A Cidade Criança” Fonte: Portcom (2018)

Com essas pesquisas nas principais plataformas de produção científica, vemos como realmente há poucos trabalhos acadêmicos do gênero. Em buscas livres no Google Acadêmico, também são pouquíssimos os resultados. A maioria dos artigos trata de panoramas históricos, publicações antigas – como O Tico-Tico –, veículos mais recentes (sobretudo Recreio, Folhinha e Estadinho) e outros exemplos pontuais e experimentais de jornalismo infantil impresso e online. Por outro lado e por curiosidade, são inúmeros os estudos sobre comunicação e crianças, como suas relações com a TV, jogos, videogames e publicidade.

Não satisfeitos, fizemos ainda um levantamento sobre as disciplinas dos cursos brasileiros de Jornalismo e Comunicação Social – com habilitação em Jornalismo. Em abril de 2017, consultamos a lista do Cadastro e-MEC de Instituições e Cursos de Educação Superior, do Ministério da Educação, e, no mês seguinte, visitamos os portais de todas as universidades e conseguimos acesso a 225 grades curriculares. Infelizmente, nossa intuição estava correta: não encontramos disciplina alguma intitulada “Jornalismo Infantil”.

Não entraremos na discussão sobre vantagens e desvantagens pedagógicas de disciplinas específicas de editorias. No entanto, entre as 427 aulas optativas e obrigatórias identificadas do gênero, nenhuma sequer parece abordar o jornalismo infantil.

Tabela 5 – Disciplinas de jornalismo especializado nas graduações do Brasil Disciplinas Quantidade (%) Jornalismo Esportivo 39 (9,1%) Jornalismo Cultural 31 (7,2%) Jornalismo Econômico 30 (7%) Jornalismo Científico ou de Ciência e Tecnologia 27 (6,3%) Jornalismo Político ou Político e Internacional 22 (5,1%)

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Jornalismo Ambiental ou de Sustentabilidade ou de Meio Ambiente 20 (4,6%) Jornalismo Internacional 14 (3,2%) Jornalismo Político e Econômico 10 (2,3%) Jornalismo Especializado 114 (26,7%) Optativa 65 (15,2%) Outras 55 (12,9%) Jornalismo Infantil 0 (0%) Total 427 (100%)

É verdade que o jornalismo para crianças pode, sim, ser estudado, discutido e trabalhado em diversas outras matérias – como nas 114 de Jornalismo Especializado e nas outras 65 Optativas, das quais não encontramos as opções ofertadas –, porém o fato é que, segundo o levantamento, existem aulas de mais de 30 editorias diferentes, mas não de jornalismo infantil.

1.3. Outros conteúdos infantis na TV

As emissoras brasileiras de TV produzem conteúdo infantil desde praticamente a chegada do aparelho no país, em 1950. O primeiro programa do gênero foi o Sítio do Picapau Amarelo, que foi ao ar em 1951, como teleteatro. Logo no ano seguinte a obra do escritor Monteiro Lobato ganhou sua primeira adaptação para formato série, feita pelo casal Tatiana Belinky e Júlio Gouveia e produzida pela antiga TV Tupi. Desde então, o Sítio teve novas versões ao longo das décadas e ainda é veiculado.

Outra produção que merece destaque é Vila Sésamo. O original, Sesame Street, produzido pela CTW – Children‟s Television Workshop, foi ao ar em 1969, nas TVs públicas dos Estados Unidos. Sua primeira versão brasileira, com conteúdos nacionais e dublados, foi feita e veiculada pela TV Cultura e pela TV Globo a partir de 1972. Destinado a crianças de idade pré-escolar, o programa é um dos mais reconhecidos e estudados do mundo e ganhou reedições no Brasil em 2007 e 2017, sendo que esta última ainda faz parte da grade televisiva.

Historicamente, a TV Cultura é renomada por sua programação cultural, educativa e infantil. São muitas as séries marcantes feitas para a criançada que atingiram

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índices interessantes de audiência e tiveram prestígio. Algumas delas, além de Vila Sésamo: Bambalalão (1977), Curumim (1981), Catavento (1985), Revistinha (1988), Rá-Tim-Bum (1990), Mundo da Lua (1991), Glub-Glub (1991 e 2006), X-Tudo (1992), Castelo Rá-Tim-Bum (1994), Cocoricó (1996), Ilha Rá-Tim-Bum (2002); atualmente, Quintal da Cultura (2011) e Que Monstro Te Mordeu? (2014) são alguns dos destaques. Aliás, o próprio Castelo Rá-Tim-Bum, parte fundamental desta pesquisa, é considerado o principal programa televisivo infantil brasileiro, vencedor de prêmios internacionais e dono de audiências jamais imagináveis para uma televisão pública no país. Ele será abordado com mais detalhes no próximo capítulo.

Também é impossível não citar os fenômenos das apresentadoras que surgiram nos anos 80 e perduraram entre as crianças até poucos anos atrás com seus inúmeros shows e programas de auditório. Entre elas, estão Xuxa, Angélica, Eliana, Simony, Mara Maravilha, Mariane, Pat, Jacky e Kira. Esse universo ainda é tema de debates e críticas sobre suas qualidades e seus impactos na garotada. Da mesma forma fazem parte desse contexto atrações de Sérgio Mallandro e do personagem e palhaço Bozo.

Os desenhos animados são outro tipo de conteúdo massivamente presente na programação da TV nacional, principalmente com a exibição de inúmeras séries infantis de sucesso no mundo todo. Provavelmente a TV Globinho (2000 a 2015), da TV Globo, é um dos programas de exibição de desenhos mais lembrados pelas atuais gerações. No mesmo veículo, quem marcou época de 1993 a 1997 foi a TV Colosso. Já no SBT, ainda permanecem o Bom Dia & Companhia (desde 1993) e o Sábado Animado (desde 1955). Por ambas as emissoras nos anos 90 e início dos 2000, passou o Disney Club, produzido pela Disney. Em seguida, no SBT, ele deu lugar ao Disney CRUJ (2001 a 2003). Esses são apenas alguns exemplos.

Vale reforçar que a televisão fazia parte de 97,1% dos domicílios brasileiros em 2015, segundo o IBGE (2016, p. 80), e, para falar um pouco da programação infantil gratuita mais atual, vamos nos apoiar no “Informe de Acompanhamento do Mercado de TV Aberta”, feito pela Ancine (2016a), em relação a 2015. O órgão analisou as veiculações das principais redes brasileiras, que, lembramos, são: Band, CNT,

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Globo, Record, RedeTV!, SBT, TV Brasil, TV Cultura e TV Gazeta. Segundo a Ancine (2016a, p. 16), o gênero Infantil4 foi o oitavo mais presente na TV aberta em 2015, entre as 32 divisões, representando 4,7% ou 3.680 horas e 45 minutos da programação das emissoras. Veja o comparativo a seguir.

Tabela 6 – Breve comparativo de gêneros televisivos na TV aberta em 2015 Gênero Tempo de exibição % Posição Religioso5 16.654 horas e 7 minutos 21,1% 1º Telejornal6 11.527 horas e 14 minutos 14,6% 2º Séries7 9.135 horas e 51 minutos 11,6% 3º Infantil 3.680 horas e 45 minutos 4,7% 8º Instrutivo8 1.139 horas e 12 minutos 1,4% 15º Educativo9 1.078 horas e 23 minutos 1,4% 16º Desenho Animado10 335 horas e 42 minutos 0,4% 22º Fonte: Ancine (2016a, p. 16).

4 Gênero Infantil: “Voltados ao público infantil (...), podem existir no formato de capítulos e seriados, game shows, musicais e programas de auditório, com entrevistas, desenhos, brincadeiras e atrações controlados por apresentador (a) ou personagem fantasiado; podem ainda ser entremeados por desenhos animados e séries de animação ou ficção brasileiros e/ou estrangeiros” (SOUZA, 2004, p. 116 e 117 apud ANCINE, 2016a, p. 46). 5 Gênero Religioso: “Formato tradicional é o de transmissão ao vivo ou de gravação dos encontros religiosos (missa, cultos ou rituais), com público ou auditório (normalmente, o próprio templo). A platéia, formada de fiéis, demonstra sua fé com hinos, orações e manifestações espontâneas ou solicitadas pelo líder (...)” (SOUZA, 2004, p. 167 apud ANCINE, 2016a, p. 50). 6 Gênero Telejornal: “‟Fórmula básica: um ou mais apresentadores leem textos e apresentam as reportagens externas realizadas pelos jornalistas, ao vivo ou gravadas‟; atende ao formato de noticiário, às vezes com a presença de „comentaristas especializados‟” (SOUZA, 2004, p. 152 apud ANCINE, 2016a, p. 48). 7 Gênero Séries: “Classificadas pelo seu formato e não por seu gênero, assim como os filmes, ocupam determinada fatia da programação geralmente em um mesmo horário; são compostas por vários episódios ligados a uma mesma trama ou núcleo de personagens; “servem a todos os públicos e o conteúdo varia do educativo ao policial” (SOUZA, 2004, p. 131 apud ANCINE, 2016a, p. 47). 8 Gênero Instrutivo: “Linguagem e objetivo claramente educacional, que instrui para uma atividade ou profissão”; “podem levar o telespectador a aumentar seus conhecimentos sobre determinado assunto, sem a pretensão ou o compromisso de obter qualificação em exames ou provas” (SOUZA, 2004, p. 154 apud ANCINE, 2016a, p. 49). 9 Gênero Educativo: “Aulas com linguagem televisiva”; teleaulas, exibidas “em horário classificado pelas próprias redes como pouco lucrativo”, “os quais auxiliam o sistema de ensino regular” (SOUZA, 2004, p. 153 e154 apud ANCINE, 2016a, p. 49). 10 Gênero Desenho Animado: “Predominantemente voltado ao público infantil, „o gênero é produzido em escala industrial e comercializado em pacotes, formando uma série de desenhos de curta, média ou longa duração (de três minutos a meia hora)‟” (SOUZA, 2004, p. 103 apud ANCINE, 2016a, p. 44).

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Como curiosidade, vamos abordar um pouco mais as categorias Infantil e Desenho Animado. De acordo com a Ancine (2016a, p.16), o Infantil só não foi veiculado nas redes CNT e TV Gazeta. Sua maior presença foi no SBT (18,6% da programação da emissora, o principal gênero), na TV Cultura (17,3%, o segundo) e na TV Brasil (3,7%). Já o Desenho Animado apenas se fez presente no SBT (2,7%) e na TV Brasil (1,1%).

De um modo geral, dados do Kantar IBOPE Media (2017) apontam que, em 2016, os brasileiros assistiram a 6 horas, 17 minutos e 5 segundos de televisão por dia. Em 2008, eram quase 5 horas e 9 minutos, e isso foi crescendo ano a ano. A pesquisa ainda diz que “(...) o tempo médio dedicado à TV pelos jovens de 4 a 11 anos subiu 2,9% de 2015 para 2016. Já entre 12 e 17 anos, o percentual foi ligeiramente maior, chegando a 3,1%” (KANTAR IBOPE MEDIA, 2017). Outra pesquisa do Kantar IBOPE Media (2014) afirma que os programas infantis estiveram em terceiro lugar na preferência das crianças de 4 a 11 anos (atrás de minisséries e novelas) – essa garotada passou 49 minutos e 51 segundos por dia assistindo ao gênero Infantil no primeiro semestre de 2014. Tal conteúdo foi apenas a sétima preferência entre 12 e 17 anos.

Uma emissora que merece destaque no contexto da meninada é a TV Escola, uma televisão pública do Ministério da Educação voltada a professores e alunos. Criada em 1996, ela se institui como política pública e instrumento pedagógico, veiculando desenhos, documentários, entrevistas, reportagens e outros programas. É distribuída via satélite aberto, TVs por assinatura e na Internet, como também por meio de aplicativos de celulares. Possui um público potencial de 18 milhões de pessoas e está presente em cerca de 50 mil escolas do Brasil. Em seu site, há programas veiculados na TV, jogos, notícias etc.

No entanto, a quantidade principal de conteúdo televisivo para crianças brasileiras está mesmo na TV fechada. Aliás, em julho de 2015, quase 30% dos domicílios brasileiros (19,64 milhões de assinantes) possuíam o serviço, segundo a Anatel – Agência Nacional de Telecomunicações (2015). Entre os cerca de 250 canais pagos que constam registrados na Ancine (2017a), 18 são exclusivamente infantis

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(incluindo suas versões em HD, independentemente de transmitirem ou não a mesma programação): Baby TV, Boomerang, Cartoon Network, Cartoon Network HD, Discovery Kids, Discovery Kids HD, Disney Channel, Disney Channel HD, Disney Junior, Disney XD, Gloob, Gloob HD, Nick HD, Nick Jr, Nickelodeon, Tooncast, TV Rá Tim Bum! e Zoomoo.

Entre as seis categorias de canais11 apresentadas também pela Ancine (2016b, p. 44), a Infantil era a quarta com maior presença em 2015, cerca de 10%. Porém, sua importância é enorme para esse tipo de serviço, pois facilmente encontramos tais emissoras na liderança de audiência das TVs por assinatura, conforme a Ancine (2016b, p. 47 e 48).

Os canais infantis disponíveis atualmente que estão há mais tempo no Brasil, segundo a Ancine (2015), são o Cartoon Network (1993), o Nickelodeon (1996) e o Discovery Kids (1998), todos dos Estados Unidos. Os únicos de origem brasileira são a TV Rá Tim Bum! (2004), da Fundação Padre Anchieta, e o Gloob e Gloob HD (ambos de 2012), da Globosat. Os mais recentes são o Zoomoo (2013) e as versões em HD do Discovery Kids (2013) e Cartoon Network (2014). Os conteúdos veiculados pelas emissoras infantis são principalmente desenhos animados, filmes e séries. Em seus sites e perfis nas redes sociais, é possível assistir a ao menos parte dessa programação e acessar diversos jogos. Naturalmente, também entendemos que há veiculações para crianças em outros canais.

1.4. Um pouco mais sobre Internet

Esta segmentação de subcapítulos de acordo com cada meio de comunicação é útil para deixar um pouco mais claros os diferentes contextos e características de conteúdos infantis, mas é natural que todos conversem entre si. E é praticamente impossível isolar totalmente a Internet, pois, como vimos, a maioria absoluta das emissoras de TV, jornais, revistas etc. estão presentes na rede online. Inclusive, para se ter ideia, a população da Grande São Paulo consumiu uma média diária de

11 A Ancine (2016b, p. 44) agrupou os canais em seis categorias, aqui em ordem de maior presença em 2015: Filmes & séries (37%), Esportes (21%), Variedades (20%), Infantil (10%), Documentário (8%) e Notícias (5%).

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1h e 38 minutos de conteúdo televisivo em dispositivos móveis, como celulares e tablets, entre janeiro e outubro de 2016, segundo o Kantar IBOPE Media (2016a). Então, vamos trazer agora um pouco mais de informações e panoramas desse ambiente virtual.

De um modo geral, o Kantar IBOPE Media (2016b) revela que usar as redes sociais e ver e/ou baixar vídeos foram as principais atividades que brasileiros entre 12 e 75 anos fizeram na Internet, no período analisado de 2016. O estudo “Retratos da Leitura no Brasil”, feito pelo Instituto Pró-Livro (2016), em relação a 2015, mostra algumas especificidades. As principais atividades das crianças de 5 a 10 anos que usaram a Internet nos últimos três meses em relação à pesquisa foram jogar (69%), assistir a vídeos, filmes ou TV online (58%) e escutar música (48%),12 segundo o Instituto Pró-Livro (2016, p. 103). Já entre os pequenos de 11 a 13 anos, suas ocupações foram jogar (59%), trocar mensagens no WhatsApp ou no Snapchat (57%) e assistir a vídeos, filmes ou TV online (55%),13 também conforme o Instituto Pró-Livro (2016, p. 103).

Vamos nos ater agora à produção e consumo de vídeos, mais especificamente no YouTube, principal plataforma de vídeos do mundo virtual. Segundo a pesquisa “Geração YouTube”, de Corrêa (2016, p. 8), em 2016 havia 230 canais infantis no YouTube Brasil – divididos em sete categorias –, 120 a mais que em 2015.

12 As demais atividades da meninada entre 5 e 10 anos na Internet, segundo o Instituto Pró-Livro (2016, p. 103): trocar mensagens no WhatsApp ou no Snapchat (43%), enviar ou receber e-mails (24%), acessar ou participar de redes sociais, blogs ou fóruns (23%), trabalhar ou buscar informações sobre trabalho ou profissão (17%) e fazer compras (8%). 13 Suas outras atividades foram: escutar música (51%), acessar ou participar de redes sociais, blogs ou fóruns (39%), enviar ou receber e-mails (33%), trabalhar ou buscar informações sobre trabalho ou profissão (17%) e fazer compras (12%), também de acordo com o Instituto Pró-Livro (2016, p. 103).

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Gráfico 1 – Quantidade de canais infantis no YouTube Brasil por categoria Canais infantis no YouTube Brasil YouTuber Teen (14) Educativos (1) Games – 7% 1% Minecraft, vlogs de games e YouTuber Mirim entretenimento e (61) gameplays (58) 26% 25% Programação de Propagandas de TV, desenhos e brinquedos, unboxi novela infantil (35) ng, vídeo de 15% massinhas e de Desenhos e brincadeiras, histor musicais infantis – inhas a partir de não disponíveis na brincadeiras (26) TV (35) 11% 15% Fonte: Corrêa (2016)

Para se ter uma noção de tamanho, esses 230 canais somavam 211,6 milhões de inscritos e, naquele último ano, seus vídeos tiveram 52,1 bilhões de visualizações, de acordo com Corrêa (2016, p. 15 e 30). Entre os 100 maiores canais do YouTube Brasil, 48 eram infantis, também conforme Corrêa (2016, p. 13), mostrando a relevância do nicho das crianças.

O Google (2017), proprietário do YouTube, afirma que em 2016 as pessoas do mundo todo assistiram a 1 bilhão de horas de vídeos por dia na plataforma. E uma prova da importância do fenômeno no Brasil foi a chegada do YouTube Kids no país em 30 de junho de 2016. O aplicativo feito para a garotada foi lançado no exterior em 2015 e teve 10 milhões de downloads em seu primeiro ano. Segundo o Google (2016), ele reúne os conteúdos infantis disponíveis no YouTube e ainda oferece diversas opções de controle e segurança para os pais ou responsáveis, como configurações de busca, senha e acesso de acordo com a faixa etária e delimitação de tempo de uso do app.

1.5. Cinema para crianças

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A oferta para crianças no cinema também não é menor, principalmente se considerarmos as produções estrangeiras que chegam ao Brasil e têm grande público. Dessa forma, não vamos focar apenas os filmes infantis nacionais, pois são poucos os que ficam entre as principais bilheterias. Para se ter ideia, dos 20 longas brasileiros com maior audiência em 2015, segundo lista da Ancine (2016c, p. 14 e 15), identificamos apenas Carrossel, O Filme como o único voltado às pessoas de menores idades, na quarta colocação, com cerca de 2,5 milhões de espectadores. Por outro lado, entre as 20 maiores bilheterias de 2015 no geral, também de acordo com dados da Ancine (2016c, p. 12), podemos encontrar ao menos seis: Minions, Cinderela, Divertida Mente, Bob Esponja: Um Herói Fora d’água, Hotel Transilvânia 2 e Os Pinguins de Madagascar. Juntos, eles tiveram público de pouco mais de 27 milhões de pessoas. Naturalmente, entendemos que crianças assistem a outros tipos de filmes, assim como adultos também veem produções mais pensadas para a garotada.

De qualquer modo, o fenômeno se repetiu nos três primeiros trimestres de 2016, a partir de informações da Ancine (2016d, p. 12 e 13). Carrossel 2 – O Sumiço de Maria Joaquina foi o único entre os 20 brasileiros mais vistos, no segundo lugar, também com 2,5 milhões de espectadores. Incluindo os filmes estrangeiros, estiveram entre as 20 maiores bilheterias Procurando Dory, A Era do Gelo – O Big Bang, Pet – A Vida Secreta dos Bichos, O Bom Dinossauro, Zootopia – Essa Cidade é o Bicho, Mogli – O Menino Lobo, A Lenda de Tarzan, Snoopy & Charlie Brown – Peanuts, o filme, Alice Através do Espelho, além de Carrossel 2. Vale destacar que Carrossel é uma novela infantojuvenil produzida pelo SBT e exibida originalmente entre 2012 e 2013, sempre uma das principais audiências da emissora, inclusive quando reprisada.

Trazemos ainda alguns números da presença dos filmes infantis comercializados em DVD e Blu-ray, em 2015. Segundo a Ancine (2017b, p. 12 e 13), entre os dez DVDs mais vendidos, estiveram Minions (5º lugar, 63 mil cópias) e Bob Esponja Calça Quadrada (6º lugar, 60 mil cópias); podemos apontar Avatar entre os Blu-rays, no 8º lugar, com quase 13 mil cópias.

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Se considerarmos apenas as produções nacionais em DVD, o destaque infantil foi maior, como revela a Ancine (2017b, p. 14). Nove títulos estão no top 10, com venda entre 13 mil e 20 mil unidades cada: O Show da Luna!, Patati Patatá – A Vida é Bela, Carrossel – O Filme, Os Pequerruchos – Dia de Festa, Bob Zoom – Volume 3 e quatro volumes de Galinha Pintadinha. Completa a lista O Auto da Compadecida.

1.6. Rádio e música infantil

Lembramos que, segundo o IBGE (2016, p. 80), 69,2% dos domicílios brasileiros possuíam um aparelho de rádio em 2015, ficando atrás apenas da televisão e à frente do celular. A pesquisa “Mídia Dados 2016”, feita pelo Grupo de Mídia São Paulo (2017), diz que em 2016 7% dos ouvintes de rádio do país tinham entre 10 e 14 anos, sendo percentualmente a menor faixa etária. O estudo ainda afirma que a taxa de penetração do rádio entre os jovens de 10 a 14 foi de 49%.

Outro dado curioso é que, das 9.626 emissoras de rádio no Brasil em 2014, apenas 497 eram educativas (5,1%), segundo o Ministério das Comunicações (2014 apud ABERT, 2015, p. 26). Em estudo sobre conteúdos infantis nas rádios brasileiras, Fernandes (2014, p. 64) afirma:

“Embora seja possível encontrar programas radiofônicos infantis de bom nível de produção e importante função pedagógica, poucos ou nenhum entre eles trabalha as potencialidades sonoras do rádio como estímulo à criatividade infantil” (FERNANDES, 2014, p. 64).

Tratando apenas de músicas em execução pública, a maior presença infantil ocorre em “Casas de Festas”, um dos segmentos de classificação do Ecad – Escritório Central de Arrecadação e Distribuição, empresa responsável pela captação e repasse financeiros de direitos autorais de canções. Os dados consultados no site do instituto mostram que essa é a única categoria em que aparecem compositores de músicas para a garotada – como sucessos de Patati Patatá, Xuxa, Galinha Pintadinha e Palavra Cantada – entre os líderes de arrecadação dos últimos anos. Entre eles, estão Yorrana Plinta, Marcos Luporini, João Walter Plinta, Paulo Tatit, Sandra Peres e Vanessa Alves.

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Há diversos destaques brasileiros na produção musical infantil, como, por exemplo, a própria dupla Palavra Cantada (Paulo Tatit e Sandra Peres) e a banda de rock Pequeno Cidadão – que, inclusive, teve um jornal homônimo com 17 edições, lançou livros inspirados em suas músicas e possui um programa na Rádio Vozes, nas manhãs de sábado e domingo. Por sua vez, Hélio Ziskind é um cantor e compositor de grandes sucessos de programas televisivos infantis, como o próprio Castelo Rá- Tim-Bum. Outros artistas também já se dedicaram às crianças. Alguns deles são Adriana Calcanhotto, com seu pseudônimo Adriana Partimpim, Zeca Baleiro, com os discos Zoró (bichos esquisitos) Vol. 1 e Zeca Baleiro e Convidados – A Viagem da Família Zoró, e a banda Detonautas Roque Clube, com o álbum Viva o Rock! – Detonautas para Bebês.

1.7. Literatura infantil e HQs

O Instituto Pró-Livro (2016, p. 55) estima que 104,7 milhões de brasileiros, 56% da população, eram leitores14 em 2015. Para as crianças de 5 a 13 anos, as principais motivações para ler um livro eram gosto, exigência escolar, distração e atualização cultural ou conhecimento geral, de acordo com o Instituto Pró-Livro (2016, p. 24). A pesquisa do Instituto Pró-Livro (2016, p. 31) ainda aponta que as publicações mais lidas por essa faixa etária são as infantis, de contos e a Bíblia.15

Diversos estudos indicam que o setor de livros passa por um encolhimento nos últimos anos. Segundo dados da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas – Fipe (2017, p.8), foram produzidos 427.188.093 exemplares de livros no país em 2016. Desse montante, 16.621.398 foram da categoria Literatura Infantil, (3,89% do total), a quinta com maior número.16 Os da Literatura Juvenil aparecem na sequência, com pouco mais de 10,2 milhões (2,39%).

14 Para a pesquisa, “leitor é aquele que leu, inteiro ou em partes, pelo menos 1 livro nos últimos 3 meses” (INSTITUTO PRÓ-LIVRO, 2016, p. 54). 15 O Instituto Pró-Livro (2016, p. 31) mostra que os gêneros prediletos das crianças de 5 a 10 anos são: infantis (41%), contos (37%), Bíblia (32%), HQs, gibis ou RPG (29%), didáticos (23%), ciências (22%), artes (16%), poesias (14%), religiosos (14%) etc. Já de 11 a 13 anos: contos (40%), Bíblia (31%), didáticos (27%), poesia (27%), infantis (22%), ciências (21%), HQs, gibis ou RPG (21%), romance (20%), juvenis (20%), artes (11%) etc. 16 Entre as 24 categorias, as quatro primeiras foram: Didáticos (48,48%), Religião (20,79%), Literatura Adulta (7,71%) e Auto-ajuda (4,78%), segundo a Fipe (2017, p. 8).

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Já o mercado de histórias em quadrinhos – que não atrai somente crianças – parece viver um momento melhor. Inclusive, a Câmara Brasileira do Livro anunciou em 2017 a inclusão de uma categoria para HQs a partir da edição seguinte do Prêmio Jabuti, um dos principais da literatura. O número de lançamentos independentes cresceu nos últimos anos, e suas vendas ocorrem principalmente para nichos específicos e pela Internet. Entre as produções de maior escala, o destaque são os gibis e almanaques da Turma da Mônica e companhia, criação de Maurício de Sousa, com tiragem de centenas de milhares de unidades anuais. Histórias dos personagens da Disney e dos heróis e heroínas da Marvel Comics e DC Comics também estão entre as mais vendidas.

1.8. Teatro infantil

Completamos esse contexto de opções e produção para crianças com algumas informações sobre o teatro infantil brasileiro. Aliás, ele próprio sempre influenciou os programas televisivos para a garotada, e com o Castelo Rá-Tim-Bum não foi diferente – como veremos melhor no próximo capítulo –, inclusive, com peças inspiradas na série.

O primeiro espetáculo infantil do Brasil foi, segundo Assis (2008), O Casaco Encantado, de 1948, escrito por Lúcia Benedetti. Na época, a peça fez grande sucesso pelo país e rendeu até prêmios para a autora. Atualmente, há cerca de 150 grupos e companhias afiliados ao CBTIJ – Centro Brasileiro de Teatro para a Infância e Juventude, segundo lista do site da entidade consultada em junho de 2017.

1.9. Percepções e caminhos

A partir da coleta de tantos dados de áreas diferentes, mas que se relacionam, temos a tabela a seguir, que resume o que foi apresentado.

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Tabela 7 – Panorama do contexto social e da produção de conteúdo infantil no Brasil População infantil brasileira em 2015 e condições sociais 43 milhões entre 0 e 14 anos (21%) – 30,1 milhões entre 5 e 14 anos 1,4% das crianças entre 6 e 14 anos não estudavam 85,3% das crianças cursavam o Ensino Fundamental em escolas públicas 412 mil crianças de 5 a 13 anos em trabalho infantil Domicílios (63,6 milhões): 14,6% sem abastecimento de água, 34,7% sem coleta de esgoto, 10,2% sem coleta de lixo, 0,3% sem iluminação elétrica Jornalismo infantil Identificados 13 jornais (impressos e/ou online), 2 revistas e 1 programa de TV Jornalismo infantil no meio acadêmico Identificadas 5 teses e dissertações, 16 artigos e outros poucos exemplos Nenhuma disciplina de Jornalismo Infantil TV aberta (2015) 97,1% dos domicílios com aparelho de TV Gêneros Infantil, Instrutivo, Educativo e Desenho Animado: 7,9% da programação TV por assinatura 30% dos domicílios com o serviço em 2015 18 canais infantis (7,2%) em 2017 e donos das maiores audiências Internet Em 2015, 40,5% dos domicílios tinham microcomputador com acesso à Internet, 93,3% tinham telefone fixo ou celular e 58% tinham apenas celular Crianças entre 10 e 14 anos: 69,1% acessavam a Internet e 54,1% possuíam celular para uso pessoal em 2015 230 canais infantis no YouTube Brasil em 2016 (211,6 milhões de inscritos e 52,1 bilhões de visualizações) Cinema (2015) 20 maiores bilheterias: 6 filmes mais voltados a crianças (27 milhões de espectadores) Rádio 69,2% dos domicílios tinham rádio em 2015 7% dos ouvintes em 2016 tinham entre 10 e 14 anos Das 9.626 emissoras em 2014, 497 (5,1%) eram educativas Literatura (2016) 26,8 milhões (6,3%) de livros produzidos de Literatura Infantil e Literatura Juvenil Teatro infantil (2017) 150 grupos e companhias Fontes: Anatel (2015), Ancine (2016a, p. 16), Ancine (2016c, p. 12), Ancine (2017a), Corrêa (2016, p. 8), Fipe (2017, p.8), Grupo de Mídia São Paulo (2017), IBGE (2016, p. 37, 47, 48,62,79, 80, 82, 83) e Ministério das Comunicações (2014 apud ABERT, 2015, p. 26).

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Não é difícil perceber por meio desse panorama que há diversas produções infantis no Brasil, mesmo que em menor quantidade em relação a conteúdos para outros públicos – e sem discutirmos sobre juízo qualitativo. Entendemos que as crianças inevitavelmente consomem o que não é feito para elas de um modo específico, mas esse não é exatamente nosso foco. Por outro lado, esse contexto também nos mostra que parece haver poucas opções de jornalismo infantil, sobretudo em comparação com a oferta dos demais setores relatados. E isso ainda se comprova pela escassez de aulas universitárias e trabalhos acadêmicos sobre o tema.

Em um momento inicial, a primeira pergunta que nos vem à mente é: por que há diversos conteúdos infantis na televisão, literatura, cinema etc. e quase não há jornalismo para crianças no Brasil? No entanto, não é o objetivo desta pesquisa encontrar alguma resposta para isso. Queremos também estimular a reflexão a respeito desse cenário, sobretudo porque, do contrário, provavelmente precisaríamos entrar no mínimo em discussões econômicas, políticas e sobre as diversas dificuldades pelas quais o jornalismo tem passado, ainda mais com o boom da Internet, de forma acentuada a partir do fim da primeira década dos anos 2000. Assim, é “(...) indispensável repensar, de maneira bastante radical, muitas das certezas ou dos dogmas que teóricos e/ou jornalistas mantiveram por décadas” (SALLES, 2016, p. 72).

Porém, não bastaria propormos uma produção qualquer de jornalismo infantil como mera “solução” para todos os problemas. Partimos do princípio que esses materiais jornalísticos não estão isolados de um ambiente maior e complexo, e é para ele que devemos olhar com um pouco mais de atenção primeiramente. Aliás, essas relações complexas entre os diversos setores de comunicação e suas produções nos servem de estímulo, pois seria um erro “(...) conceber a complexidade como receita, como resposta, em vez de considerá-la como desafio e como uma motivação para pensar” (MORIN, 2005, p. 176).

O paradigma de complexidade não "produz" nem "determina" a inteligibilidade. Pode somente incitar a estratégia/inteligência do sujeito pesquisador a considerar a complexidade da questão estudada. Incita a distinguir e fazer comunicar em vez de isolar e de separar, a reconhecer os

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traços singulares, originais, históricos do fenômeno em vez de ligá-los pura e simplesmente a determinações ou leis gerais, a conceber a unidade/multiplicidade de toda entidade em vez de a heterogeneizar em categorias separadas ou de a homogeneizar em indistinta totalidade. Incita a dar conta dos caracteres multidimensionais de toda realidade estudada. (MORIN, 2005, p. 334).

Com o panorama apresentado e a prática do dia a dia, também não é difícil constatar que vivemos em uma época de abundância de conteúdos, nos mais diversos meios de comunicação, mas principalmente na Internet e redes sociais – inclusive, com nossas próprias postagens e compartilhamentos. Todo esse cenário nos remete à ideia apresentada pelo pensador Vilém Flusser, já em 1972, de que, ao contrário do que se diz, não somos uma sociedade do consumo, mas, sim, uma sociedade incapaz de consumir tudo o que produz e, portanto, geradora de lixo, como esclarece Baitello Junior (2010, p. 25 e 26). Diante dessa relação entre o consumo e os reinos da natureza e cultura, “(...) consumir não significa devolver algo à natureza, mas estabelecer um terceiro reino da realidade: o reino do lixo” (FLUSSER, 1972, p. 38).

Flusser (1997 apud BAITELLO JUNIOR, 2010, p.52) ainda releva outro diagnóstico – a terceira catástrofe do ser humano – que nos ajuda a entender esse contexto de excessos, incluindo os produzidos nos meios de comunicação. Baitello Junior (2010, p. 52) explica o pensamento do autor, dizendo que a humanidade

“(...) vivenciou três grandes catástrofes ao longo de sua história: a hominização, trazida pelo uso de ferramentas de pedra; a civilização, criada pela vida em aldeias, com sua consequente sedentarização; e a terceira catástrofe, em curso e ainda sem nome, é marcada pela volta ao nomadismo, pois as casas se tornaram inabitáveis (...) porque por todos os seus buracos entra o vento da informação (com suas imagens técnicas, transmitidas pelas tomadas de eletricidade)” (BAITELLO JUNIOR, 2010, p. 52, grifo do autor).

E as crianças naturalmente fazem parte desses fenômenos, uma vez que elas são alguns dos grandes usuários das chamadas TIC (Tecnologias da Informação e Comunicação) e há diversos programas de inclusão digital nas escolas e em comunidades com maiores dificuldades sociais. Aliás, o documento “Um mundo para as crianças”, das Nações Unidas, de 2002, já aponta a necessidade de atenção ao uso das TIC pela meninada: “Os investimentos na educação e na formação, entre

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outras coisas, ajudarão as crianças a se beneficiar dos avanços da tecnologia da informação e da comunicação” (NAÇÕES UNIDAS, 2002, p. 22).

Acreditamos que projetos e práticas comunicacionais comprometidos com questões e reflexões éticas são extremamente valiosos ao desenvolvimento humano como um todo – afinal, uma das metas desta pesquisa é sugerir uma produção jornalística interessante para a garotada. Por isso, justamente, é preciso pensar também sobre os malefícios possíveis e existentes.

“A criança e o adolescente são irrestrita e irrefletidamente vistos como „consumidores‟ e submetidos a um arsenal de imagens educacionais, informacionais, comportamentais, publicitárias e comerciais sem precedentes na história. Os mais recentes meios eletrônicos franquearam a adolescentes e crianças as portas de acesso a mundos de inimaginável complexidade e incalculável risco, a conteúdos de sedução inconsequente, a relatos e documentos imagéticos sobre fatos ou práticas assustadoramente cruéis” (BAITELLO JUNIOR, 2014, p. 38).

A violência está intimamente ligada às consequências “menos saudáveis” que os conteúdos de comunicação podem causar na garotada. O pesquisador alemão Jo Groebel (1998) aponta que, apesar de ser algo presente na sociedade, a violência nos meios de comunicação deve ser evitada ao público infantil porque gera um impacto negativo e que estudos “indicam que as crianças não têm geralmente capacidade para distinguir entre realidade e ficção” (GROEBEL, p. 16, 1998).

Em seu trabalho de 1998 para a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), “Percepção dos jovens sobre a violência nos meios de comunicação”, Groebel (1998, p. 10 e 11) diz que a violência na mídia atua como compensação de frustrações para crianças que vivem em lugares com problemas sociais e como forma de emoção para os pequenos que habitam em lugares menos problemáticos. Exemplificando, a pesquisa revela que “um total de 47% das crianças que preferem os conteúdos agressivos da mídia também gostariam de se ver envolvidas em situações de risco” (GROEBEL, 1998, p. 11).

Diante de tudo isso, vamos nos apoiar no conceito de ecologia da comunicação, de Vicente Romano (2004), para refletir sobre o cenário atual das relações entre os meios de comunicação e as crianças e basear nossas análises e propostas. O autor

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diz que “a ecologia da comunicação estabelece assim uma ponte entre teoria da comunicação e ecologia humana. No fundo se trata de estudar a relação entre o meio humano interno e o meio comunicativo externo” (ROMANO, 2004, p. 12, tradução nossa).17 O comunicólogo espanhol ainda afirma que, com essa visão, devemos nos fazer cinco questionamentos:

“1) Como os seres humanos querem se comunicar uns com os outros, que atitude tomar ante o meio interno, social e natural. 2) Que exigências se derivam disso para a organização das condições tecnológicas da comunicação. 3) Até que ponto é factível criar ou conservar relações satisfatórias com o meio interno, social e natural. 4) Quais são as necessidades humanas de informação e comunicação. 5) Como sensibilizar a percepção para as necessidades comunicativas, como orientar a ação comunicativa de modo que não só tenha em conta o aspecto tecnológico, mas também o espiritual, social e ecológico” (ROMANO, 2004, p. 12, tradução nossa).

Essas indagações nos dão uma base reflexiva para pensar a comunicação e mais especificamente o jornalismo infantil. Ou seja, percebemos a importância de entender qual é a necessidade de uma nova proposta de jornalismo e projetar quais impactos ela causaria nas crianças. A partir da explicação e perspectiva apresentadas, Romano (2004, p. 13) aponta três tarefas de uma ecologia da comunicação:

“1) Desenvolver teses teóricas sólidas que possam servir de princípios reguladores de toda atuação comunicativa, assim como de parâmetro para investigar as formas e sistemas da comunicação humana. 2) Obter conceitos práticos para a comunicação ecológica: como, quando, onde e por que podem ou não podem se utilizar as TIC a curto e a longo prazo para melhorar a qualidade de vida, o bem-estar do ser humano, a riqueza social. 3) Descobrir as contradições dos sistemas atuais de comunicações e apontar vias para superá-las” (ROMANO, 2004, p. 13, tradução nossa).

Então, é evidente a responsabilidade que comunicadores, comunicólogos e meios de comunicação têm com a sociedade, a partir dos trabalhos desenvolvidos. Aliás, não restam dúvidas de que os conteúdos gerados e pesquisas feitas podem causar impactos positivos e negativos também nas emoções, sentimentos, sonhos das

17 O autor explica que a ecologia “trata de relações recíprocas dos seres vivos entre si e entre eles e seu entorno. Investiga as leis destas interações que, por natureza, produzem um equilíbrio autorregulador, o que se chama equilíbrio ecológico” (ROMANO, 2004, p. 46 e 47, tradução nossa). Em seguida, o comunicólogo espanhol define a ecologia humana: “Em relação com os seres humanos não só importam as condições do entorno, as do meio externo, mas também as do mundo interno, as da consciência e da mente. (...) Estas duas dimensões, a do exterior e a do interior, condicionam a vida humana e, portanto, são objetos da ecologia humana” (ROMANO, 2004, p. 56 e 57, tradução nossa).

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pessoas, ou seja, no mundo interior de cada um. Inclusive, o já citado texto “Um mundo para as crianças” considerou essa atenção no item 8 das ações colaborativas para a construção de uma humanidade melhor para os pequenos:

“Os meios de comunicação e suas organizações têm um papel essencial a desempenhar na sensibilização a respeito da situação das crianças e dos problemas que elas enfrentam; além disso devem representar um papel mais ativo quanto a informar às crianças, aos pais, às famílias e ao público em geral sobre as iniciativas para proteger e promover os direitos das crianças; devem também contribuir com os programas educativos dirigidos às crianças. A esse respeito, os meios de comunicação devem estar atentos à influência que exercem sobre as crianças” (NAÇÕES UNIDAS, 2002, p. 30).

Portanto, é com o olhar atento e o pensamento crítico abordados – principalmente diante do atual uso, expansão e possibilidades da Internet – que queremos apresentar caminhos que contribuam para o estudo e prática de jornalistas, comunicadores, pesquisadores de comunicação e educação e professores e estudantes universitários e do ensino básico. A partir de características do Castelo Rá-Tim-Bum, principal programa televisivo brasileiro para a meninada, pretendemos propor inspirações para uma produção de jornalismo infantil que ajude a criar vínculos com as crianças.

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2. Bum! Bum! Bum!

Ainda antes de realmente falarmos sobre o Castelo Rá-Tim-Bum, é necessário relatar um pouco mais de seu contexto de criação. Afinal, seu surgimento e os resultados obtidos não se deram ao acaso ou de forma pontual. Trata-se de todo um movimento de produção de conteúdo para crianças, desenvolvido pela TV Cultura desde os anos 70.

2.1. TV Cultura

Inicialmente fundada pelos Diários Associados, em 20 de setembro de 1960, a TV Cultura foi adquirida anos mais tarde pela Fundação Padre Anchieta – Centro Paulista de Rádio e TV Educativas, que ainda é sua mantenedora, sendo reinaugurada em 16 de junho de 1969. Com sede em São Paulo (SP) e disponível para cerca de 120 milhões de pessoas de grande parte do país, por meio de suas 95 afiliadas, o canal aberto é reconhecido internacionalmente por sua programação cultural e educativa. Inclusive, ganhou em 2014 o posto de segunda emissora de melhor qualidade do planeta, perdendo somente para a britânica BBC One, de acordo com pesquisa18 do instituto Populus (BBC, 2014), encomendada pela própria BBC. Já em 1998 ela havia faturado o Prix Télévision Jeunesse, na Alemanha, como a melhor TV pública do mundo, devido a sua programação.

Aliás, a Fundação Padre Anchieta (FPA) foi instituída pelo Governo do Estado de São Paulo em 1967 e se mantém por meio de recursos públicos e parcerias com a iniciativa privada. Além da TV Cultura e da TV Rá-Tim-Bum!, a FPA administra as Rádios Cultura FM e Cultura Brasil (AM), a Univesp TV e a MultiCultura. Os veículos não possuem foco comercial e têm caráter público. A propósito, esse é um assunto polêmico e razão de críticas de especialistas quanto a um possível uso político de tais meios de comunicação pelo governo paulista nos últimos anos. Recentemente, também vieram à tona problemas sobre corte no repasse de verba e consequentes demissões de funcionários, questões trabalhistas e mudanças prejudiciais aos espectadores nas grades de programação.

18 As demais emissoras brasileiras que apareceram no ranking de 66 canais foram, segundo a BBC (2014): Globo (28º lugar), TV Brasil (32º lugar), Band (35º lugar), Record (39º lugar) e SBT (40º lugar).

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Se atualmente há situações adversas, o passado da Fundação revela inúmeras atrações que marcaram a história da comunicação brasileira, sobretudo com a TV Cultura. Programas como Sr. Brasil (apresentado por Rolando Boldrin), Viola, Minha Viola (comandado por Inezita Barroso, que faleceu em 2015), Ensaio, Jornal da Cultura e Roda Viva são apenas alguns dos mais célebres. A emissora também tem por tradição exibir produções regionais, independentes, universitárias, musicais, educativas e artísticas, que geralmente não são veiculadas pelos demais canais abertos de maior audiência.

E boa parte da fama qualitativa da TV Cultura se deve ao seu vasto leque de programas infantis e infantojuvenis, muitos deles premiados internacionalmente e até hoje lembrados pelos fãs e imprensa. Não à toa, ainda foram e são reprisados por outros veículos, como a própria TV Rá-Tim-Bum!, TV Globo, TV Brasil, Discovery Kids, Zoomoo etc. Voltamos a citá-los: Vila Sésamo (1972, 2007 e 2017), Bambalalão (1977), Curumim (1981), Catavento (1985), Revistinha (1988), Rá-Tim- Bum (1990), Mundo da Lua (1991), Glub-Glub (1991 e 2006), X-Tudo (1992), Castelo Rá-Tim-Bum (1994), Cocoricó (1996), Ilha Rá-Tim-Bum (2002), Quintal da Cultura (2011), Que Monstro Te Mordeu? (2014), entre outros.

Infelizmente, a produção de grandes atrações para crianças, pela TV Cultura – e pelas demais redes abertas –, diminuiu muito a partir dos anos 2000, como indicam as pesquisas e as opiniões de especialistas em entrevistas na imprensa. Quando se fala em programas brasileiros de enorme reconhecimento, ainda é preciso voltar ao passado, pois talvez a única exceção recente seja Cocoricó, que perdurou até 2013. De fato, a oferta de conteúdo infantil televisivo foi transferida aos canais por assinatura. Tanto é que a Fundação Padre Anchieta lançou em 2004 a TV Rá-Tim- Bum!, como já mencionamos.

2.1.1. Programas antes e depois do Castelo

Os programas infantis e infantojuvenis feitos pela TV Cultura possuem algumas ligações que vão além de seus públicos. Uma breve pesquisa revela que muitos

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profissionais – como diretores, roteiristas, atores, equipe técnica etc. – trabalharam juntos em diversas atrações ao longo dos anos. Ou seja, criou-se uma espécie de “escola de produções para crianças” na emissora, algo que, aliás, é muito relatado em depoimentos sobre o assunto. O mesmo se deu com os apoios às realizações dos projetos, seja com TVs parceiras ou com instituições que ajudaram no financiamento, como o Sesi, Fiesp, Ciesp, Senai.

O objetivo aqui não é traçar um mapeamento detalhado de toda essa rede de relações, pois demandaria um trabalho totalmente à parte, em razão da quantidade de informações e dificuldade em obtê-las. O intuito é resumir alguns dos principais programas antes e depois do Castelo Rá-Tim-Bum, de forma a enriquecer esse contexto. Mesmo assim, é possível perceber elos entre certos profissionais e suas presenças em diferentes atrações.

Lançado em 1969, nos Estados Unidos, Sesame Street é o maior sucesso televisivo mundial para crianças, presente em cerca de 150 países, seja em reedição, dublado ou das duas maneiras em uma mesma temporada. Foi criado pela Children‟s Television Workshop (CTW) e tem como público principal a garotada em idade pré- escolar, sobretudo a de baixa renda. Assim, desde o início surgiu com fundo social e educativo. A série inovou a produção infantil para TV por possuir quadros de curta duração com histórias que estimulam o aprendizado do telespectador. Os personagens são adultos, crianças e bonecos manipulados.

A versão brasileira ganhou o nome de Vila Sésamo e estreou em 12 de outubro de 1972, numa coprodução entre a TV Cultura e a TV Globo, sendo transmitida por ambas até o ano seguinte. De 1973 a 1977, a produção e exibição ficaram por conta apenas da Globo. Somente em 2007 a série teve uma nova temporada no país, novamente a cargo da TV Cultura, em parceria com a Sesame Workshop – como a CTW atualmente se intitula para o público –, detentora dos direitos.

Por fim, mais uma edição do programa foi lançada, em 2017, pela Cultura e TV Brasil, também juntamente com a Sesame Workshop. Passou por alguns problemas de financiamento e atrasos em sua estreia, sobretudo devido ao contexto de queda

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de investimentos, citado anteriormente. Nessa versão, a principal curiosidade é a ausência do célebre boneco Garibaldo (uma ave amarela de proporção humana). Alguns dos outros personagens são: Bel, Elmo, Grover, Beto, Ênio, Come Come, Zoe e Sivan. A reedição teve 52 episódios e contou com participações de diversos artistas brasileiros, principalmente na música.

A Vila Sésamo atual conta com um site, ligado ao portal Cmais, da TV Cultura, em que há atividades e jogos para crianças e conteúdos para pais e educadores. Em janeiro de 2018, seu canal no YouTube tinha 18 mil inscritos, e os vídeos somavam 16,5 milhões de visualizações. No Brasil também há projetos sociais criados pela Sesame Workshop, como o “Sonhar, Planejar, Alcançar”. Patrocinado pela MetLife Foundation, ele tem como objetivo fortalecer financeiramente as famílias, por meio de materiais sobre o tema destinados aos pequenos de 3 a 6 anos e adultos.

Por sua vez, o programa Bambalalão esteve no ar de 1977 até 1990, sendo transmitido ao vivo a partir de 1982. Ele era apresentado por Gigi Anhelli e Silvana Teixeira e tinha a presença de personagens como os Palhaços Tic-Tac (Marilan Sales), Pam Pam (Mateus Esperança) e Perereca (João Tadeu), o Professor Parapopó (Chiquinho Brandão) e muitos outros. Possuía gincanas com crianças de escolas, contação de histórias, rodas de música, teatro de fantoches e participação de diversos bonecos, como BambaLeão, Briela, Macaco Chiquinho, Maria Balinha, João Balão etc. Recebeu cinco prêmios de Melhor Programa Infantil de TV, entre 1982 e 1987, pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA), e deu origem ao BambaLeão & Silvana, na mesma época, por causa do sucesso da dupla.

A atração também serve de inspiração para o grupo Brincando de Bambalalão, que apresenta espetáculos para crianças e antigos fãs desde 2003. Tem a presença de Gigi Anhelli e de personagens como Doctor Xyss (Cláudio Pereira) e Palhaço Perereca (João Tadeu). Um programa homônimo esteve no ar entre 2010 e 2011, na webtv CLICTV UOL, com os mesmos integrantes e o mágico Dudu Coelho.

Já o Curumim foi produzido de 1981 a 1985 e tinha o apoio pedagógico da Secretaria Municipal de Educação da cidade de São Paulo. O programa era também

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utilizado por professores nas escolas públicas de educação infantil. Com 15 minutos de duração e participação de estudantes, tinha diversos personagens e oferecia às crianças atividades educativas, como brincadeiras, músicas e visitas externas. Curumim também se tornou uma atração infantil da Rádio Cultura AM em 1982.

O Catavento, de 1985, foi outro programa destinado aos pequenos, mas tendo por objetivo prepará-los para o período de alfabetização. Além da presença de crianças, possuía personagens e bonecos que desenvolviam atividades para estimular os telespectadores a, por exemplo, contar números, adivinhar palavras iniciadas com determinadas letras, desenvolver o senso motor etc. Nem mesmo a limitação financeira da atração impediu sua qualidade e reconhecimento, sendo eleita duas vezes o melhor programa infantil, no Prêmio Japão, em 1985, promovido pela TV NHK, e no 9º Festival Internacional de Cinema, Vídeo e TV, de Cuba, em 1987.

Entre 1988 e 1990, esteve no ar o Revistinha, uma revista eletrônica para jovens. Continha notícias, entrevistas, documentários, piadas e jogos, sempre de forma a levar informação e curiosidades – portanto, exemplo de jornalismo infantil. Era transmitida ao vivo, e havia participação de telespectadores por telefone para responder a alguma charada, desafio. Os atores e personagens também interpretavam histórias conhecidas. Em 1988 e 1989, recebeu o prêmio de Melhor Programa Infantojuvenil, pela APCA.

Um dos programas infantis mais emblemáticos da TV brasileira estreou em 5 de fevereiro de 1990 e teve exibição inédita até 26 de março de 1994: o Rá-Tim-Bum. A criação principal foi do roteirista Flavio de Souza, com Cláudia Dalla Verde e Tacus (Dionísio Jacob). foi o diretor geral. Os cerca de 190 episódios produzidos giravam em torno das crianças da família Teodoro, os irmãos Ivo (João Victor D‟avilla) e Lia (Pamella Domingues), que ligavam a televisão para assistir ao Rá-Tim-Bum. Composta por diversos quadros de curta duração, a atração era destinada à meninada de até cinco anos de idade e tinha um foco educativo muito forte.

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Para citar alguns personagens: Doutor Barbatana (Marcelo Mansfield), Esfinge (Norival Rizzo), Euclides (Carlos Moreno), Máscara (Paulo Contier), Nina (Iara Jamra), Pinguim Pianista (Theo Werneck), Professor Tibúrcio (Marcelo Tas). Entre os bonecos, Molibdênio, Professor Miguilim e Rói (Luciano Ottani), Blundo (Goiabinha), a cobra Sssílvia (Helen Helene) etc.

E novamente voltamos a nos deparar com um exemplo de jornalismo infantil. Um dos quadros do Rá-Tim-Bum era o Jornal da Criança, que trazia matérias frias, com imagens e entrevistas de cidadãos, além de reportagens ficcionais, sobre a Chapeuzinho Vermelho e a Bela Adormecida, por exemplo. Havia dois bonecos – o apresentador Arinélson (Márcio Ribeiro) e a repórter Darlene Rocha (Helen Helene) – e dois personagens humanos, o cameraman Zé (Wandi Doratiotto) e a editora Cacilda (Eliana Fonseca).

O primeiro licenciamento da Fundação Padre Anchieta foi feito com o Rá-Tim-Bum. Em 1991, foi lançado um álbum de sua trilha sonora, com 12 composições de Edu Lobo (diretor musical do programa), Paulo César Pinheiro, Abel Silva, Joyce Moreno, Cláudia Dalla Verde e Flavio de Souza. De 1990 a 1992, a atração ganhou aproximadamente dez prêmios, incluindo a medalha de ouro do Festival de Cinema e TV de Nova York, de 1990, em que Vila Sésamo ficou em segundo lugar.

Foi ao ar na mesma época o Glub-Glub, que estreou em 9 de setembro de 1991 e ficou em produção ao longo dos anos 90, com 670 episódios exibidos – a ideia original era fazer 60. O Glub e a Glub (interpretados por Carlos Mariano e Gisela Arantes) são dois peixinhos que moram no fundo do mar e sempre passam algum ensinamento. O programa ainda transmitia animações e filmes nacionais e estrangeiros, feitos com diversas técnicas. Os peixes assistem a esses conteúdos pela sua televisão. Outra personagem integrante foi o caranguejo fêmea Carol (Andrea Pozzi).

A ideia da atração surgiu de um pequeno quadro do Rá-Tim-Bum composto da mesma forma por peixes marinhos, com atuação de Cecília Homem de Mello e

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também de Carlos Moreno. Outra curiosidade é que o Glub e a Glub fizeram uma participação especial no episódio 69 do Castelo Rá-Tim-Bum, chamado “Praia”.

Glub-Glub foi novamente produzido e veiculado em 2005 e 2006, pela TV Rá-Tim- Bum!. O programa continuou com os atores Carlos e Gisela, mas desta vez teve como tema principal a biologia marinha, com a exibição de materiais feitos pelo documentarista Lawrence Wahba.

Outra série marcante foi Mundo da Lua, com exibição inédita de outubro de 1991 a setembro de 1992, totalizando 52 episódios. A narrativa se passa na família de classe média Silva e Silva, que tem como integrante central o garoto Lucas (Luciano Amaral), além de seu pai Rogério (Antônio Fagundes), sua mãe Carolina (Mira Haar), sua irmã mais velha Juliana (Mariana Blum), seu avô paterno Orlando () e a empregada doméstica Rosa (Anna D‟Lira). O elenco de peso ainda teve as presenças de Denise Fraga, Edson Celulari, Ken Kaneko, Laura Cardoso, Lucinha Lins, Marisa Orth, entre outros, muitos deles cedidos pela TV Globo, que veiculou a atração posteriormente.

O roteirista Flavio de Souza (que também atuou como tio Dudu) foi o criador da série, dirigida por Roberto Vignati. A história se baseia em problemas familiares, na perspectiva de Lucas. Em seu aniversário de 10 anos, ele ganha um gravador de seu avô e desde então passa a fazer diários de bordo para lidar melhor com os problemas que vivencia, imaginando situações até mesmo impossíveis. O bordão inicial de suas gravações é: “Alô, alô! Planeta Terra chamando! Esta é mais uma edição do diário de bordo de Lucas Silva e Silva. Falando diretamente do Mundo da Lua, onde tudo pode acontecer...”. E essa também é uma contação de histórias que pode ser relacionada a práticas de jornalismo infantil e de educomunicação, como veremos posteriormente.

Mundo da Lua foi eleito o Melhor Programa Infantil de 1991, pela Associação Paulista de Críticos de Arte. Na mesma época, ainda deu origem à série Lucas e Juquinha em: Perigo, Perigo, Perigo, que consiste em cinco episódios de 1 minuto

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cada sobre prevenção de acidentes domésticos para crianças – com roteiros de Flavio de Souza e direção de Cao Hamburger.

X-Tudo foi mais uma atração importante, de longo período de produção – de 1992 a 2002 – e com total ligação com jornalismo infantil. Era um programa que levava diversos tipos de informação para o público, por exemplo, sobre ecologia e literatura, além de receitas culinárias, fabricação de brinquedos e jogos, experimentos, mágicas, charadas e curiosidades. X-Tudo ainda fazia reportagens de fato, sobre temas variados e com entrevistas de adultos e crianças.

O personagem principal era o boneco X, manipulado por Fernando Gomes, de 1992 a 1998, e por Enrique Serrano em seguida. Também vencedor de prêmios, teve dois apresentadores: Gérson de Abreu até 1994 (faleceu em 2002, aos 37 anos), e Márcio Ribeiro na sequência (morreu em 2013, aos 49 anos). Outros atores que participaram foram Fernanda Souza, Henrique Stroeter, Joyce Roma, Marcelo Mansfield, Norival Rizzo, Oscar Simch, Rafael Barioni, Raquel Barcha.

Nesta ordem cronológica, pulamos agora o Castelo Rá-Tim-Bum, lançado em 1994, para falarmos sobre o Cocoricó, que surgiu em 1996. Ele foi provavelmente o último programa infantil da TV Cultura – e da TV brasileira – com o sucesso e reconhecimento da crítica no mesmo nível dos antecessores citados. A primeira ideia era fazer uma “Fazenda Rá-Tim-Bum”, mas o projeto final focou totalmente personagens de bonecos. Foi dirigido por Arcângelo Mello e Eliana Logo até 2001 e por Fernando Gomes a partir de 2003, ficando em produção até 2013.

A atração traz o dia a dia do garoto Júlio (manipulado por Fernando Gomes) na Fazenda Cocoricó, de seu avô e avó, situada na cidade de Cocoricolândia. Lá, ele interage e vive aventuras com diversos animais e outros integrantes, como as galinhas Lilica, Lola e Zazá, o cavalo Alípio, a vaca Mimosa, o papagaio Caco, o porquinho Astolfo e a índia Oriba. Para citar outros atores que deram vida aos bonecos: Álvaro Petersen Jr, Clayton Bonardi, Eduardo Alves, Enrique Serrano, Hugo Picchi, Kelly Guidotti, Léo Abel, Magda Crudelli, Neusa de Souza, etc.

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Cocoricó tem uma forte presença musical, com inúmeros lançamentos de trilhas sonoras e DVDs. O músico Hélio Ziskind – que produziu para diversas séries infantis televisivas, incluindo muitas das mencionadas – fez mais 100 de canções para o programa. Exibida por diferentes canais e com vários prêmios, a atração teve ainda outros produtos licenciados, virou espetáculos teatrais, ganhou a versão Cocoricó na Cidade em 2010 e estreou no cinema dois anos depois com Cocoricó Conta Clássicos, em que os personagens interpretam histórias famosas da literatura. Em seu canal no YouTube, em janeiro de 2018, Cocoricó tinha cerca de 80 mil inscritos e mais de 47 milhões de visualizações.

Seguindo a tradição que pode ser observada nas trajetórias resumidas, a turma de Júlio também produziu jornalismo para crianças. Estreou em 2012 a TV Cocoricó, um programa ao vivo de uma hora de duração, que, entre outras coisas, levava informações por meio de histórias, fazia receitas culinárias e entrevistava diversos artistas e personalidades.

A primeira série que ganhou certo reconhecimento após Cocoricó foi Ilha Rá-Tim- Bum, com exibição original em 2002 e reprises em outras oportunidades ao longo dos anos. Criada por Flavio de Souza e dirigida por Maísa Zakzuk e Fernando Gomes, teve mais de 50 episódios e conta as aventuras de cinco jovens que foram parar numa ilha misteriosa e cheia de seres fantásticos. Traz temas como ecologia, amizade e solidariedade. Ainda em 2002, foi lançada sua trilha sonora e, no ano seguinte, o filme Ilha Rá-Tim-Bum – O Martelo de Vulcano, baseado na série.

No entanto, Quintal da Cultura é provavelmente o principal e mais reconhecido programa da TV Cultura criado neste século, com exceção das novas produções de Cocoricó. A atração já chegou à quinta temporada e leva conhecimentos educativos por meio de seus quadros, com contação de histórias, humor, músicas, brincadeiras etc. Os personagens centrais são Doroteia (Helena Ritto), Ludovico (José Eduardo Rennó) e Osório (Jonathan Faria), além dos bonecos Quelônio e Minhoquias, manipulados também por Jonathan. A direção é de Bete Rodrigues.

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O premiado Quintal da Cultura tem um canal no YouTube, com postagens semanais de novos vídeos. Em janeiro de 2018, somava 204 mil inscritos e mais de 132 milhões de visualizações. Também possui produtos licenciados, como DVDs.

Outro destaque foi o Que Monstro Te Mordeu? (2014). Criada por Cao Hamburger e Teodoro Poppovic, a série tem 50 episódios e trata de histórias que se passam no Monstruoso Mundo dos Monstros, onde simples desenhos de monstros feitos por crianças ganham vida. Os personagens principais são a garota-monstro Lali (Daphne Bozaski), seus amigos monstros Luísa (Melina Meghini), Dedé (Hugo Picchi) e Gorgo (Sidnei Caria), seu pai adotivo e cientista Dr. Z (Paulo Henrique Santos) e o monstro Morgume (Aguinaldo Rodrigues Feitosa), assistente de Dr. Z.

O programa foi vencedor do 7º Festival comKids Prix Jeunesse Iberoamericano, na categoria Audiovisual Ficção (7 a 11 anos), em 2015. Possui um canal no YouTube, com vídeos de músicas, bastidores e ciências, que somavam quase 7 milhões de visualizações, em janeiro de 2018. Os capítulos estão disponíveis na Netflix.

Como curiosidade e complemento, citamos ainda outros programas infantis e infantojuvenis produzidos pela TV Cultura: É Proibido Colar (1981), Qual é o Grilo (1981), Quem Sabe, Sabe! (1982, 2003 e 2013), Vestibulando (1985), Enigma (1987), Matéria Prima (1990), Fanzine (1992), Confissões de Adolescente (1994), Turma da Cultura (1997), Almanaque Educação (2008), Tudo Que É Sólido Pode Derreter (2009), Programa Novo (2009), AnimaTV (2010), Caçadores de Mitos (2012), Pedro e Bianca (2012), Os Cupins (2012), Caderninho Verde e Suas Estórias (2014).

2.2. Família Rá-Tim-Bum

“Rá-Tim-Bum” é provavelmente o maior destaque da produção infantil na história da TV brasileira. O início aconteceu em 1990 e desde então foram diversos outros programas e produtos lançados que levam a marca. Segundo relata Célia Regina Ferreira Santos (2008) – então chefe do Departamento de Programas Infantojuvenis da emissora – no livro “Uma História da TV Cultura”, de Jorge da Cunha Lima, quem

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deu a ideia do nome ao Rá-Tim-Bum foi o músico Edu Lobo, diretor musical da série. A sugestão surgiu durante um almoço, enquanto alguns responsáveis pela atração falavam sobre a importância da festa de aniversário19 para uma criança. Inclusive, sua vinheta de abertura e encerramento termina com o apagar de velas de um bolo de aniversário.

“(...) E a gente estava sem o nome do programa, aí o Edu Lobo falou: „Ah, o momento do parabéns, então por que não „Rá-Tim-Bum‟?‟; então ele deu o nome por causa do „É pique, é pique... Rá-Tim-Bum!‟. (...) Aí ficou, foi daí que o programa estreou, porque até as vésperas da estreia ele se chamava apenas Projeto Pré-escola...” (SANTOS, 2008).

O êxito do Rá-Tim-Bum desencadeou sucessores interessantes. Logo em seguida foi lançado o Teatro Rá-Tim-Bum, que exibia histórias e peças infantis adaptadas para televisão, em parceria com diversas companhias teatrais. Ficou no ar de 1991 a 2004, com mais de 70 espetáculos, e depois entre 2006 e 2010, com 32 novas produções. O próprio Castelo Rá-Tim-Bum, o mais célebre de todos, seria uma continuação do primeiro, algo como “Rá-Tim-Bum 2”, mas o projeto cresceu a ponto de ter independência. Aliás, o episódio 54 da série, em que é comemorado o aniversário de 6 mil anos da bruxa Morgana, tem o nome de “Rá-Tim-Bum!”. Já no capítulo 72 – “Uma onda no mar”, as crianças criam a Rádio Rá-Tim-Bum.

Em seguida, como citamos, o Cocoricó teria o nome de “Fazenda Rá-Tim-Bum”, porém o foco nos bonecos fez nascer uma atração à parte. Quem de fato continuou a família foi a Ilha Rá-Tim-Bum, de 2002. Uma curiosidade é que a série possui três personagens chamados Rá (um tatu), Tim (um passarinho fêmea) e Bum (um bicho- preguiça), respectivamente interpretados pelos cantores Pedro Mariano, Fernanda Takai e Bukassa. Os bonecos são os narradores da história.

A fundação da TV Rá-Tim-Bum!, em 2004, mostrou mais uma vez a força do nome e trouxe outras novidades com a marca. Estreou em 2007 o Esporte Clube Rá-Tim- Bum, um programa sobre dicas e curiosidades esportivas, com entrevistas de

19 Há uma possível e curiosa origem do trecho final do “Parabéns a Você” brasileiro. De acordo com Marques (2004, p. 57 e 58), “é pique, é hora, rá-tim-bum” surgiu a partir de bordões criados por estudantes de Direito da USP dos anos de 1930. “’Rá-tim-bum’, por incrível que pareça, refere-se a um rajá indiano chamado Timbum, ou coisa parecida, que visitou a faculdade – e cativou os estudantes com a sonoridade de seu nome” (MARQUES, 2004, p. 58).

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especialistas, atletas e crianças – novo exemplo de jornalismo infantil. Ao longo dos anos, a emissora também criou três faixas de programação: Cine Rá-Tim-Bum (com filmes), Laboratório Rá-Tim-Bum (com produções sobre ciências) e É hora, é hora, é hora, Rá-Tim-Bum (com atrações antigas da TV Cultura).

Ainda estão inclusos nesses exemplos todos os produtos derivados das séries, principalmente do Rá-Tim-Bum, do Castelo e da Ilha. Foram filmes, CDs, jogos, brinquedos, peças de teatro, livros etc. Citaremos alguns deles referentes ao Castelo no subcapítulo a seguir.

2.3. O Castelo

O Castelo Rá-Tim-Bum é considerado pela crítica e especialistas um dos melhores programas televisivos infantis que o Brasil já teve. Como foi visto, ele naturalmente não surgiu de forma isolada, mas, sim, ligado a um rico histórico da TV Cultura e dos profissionais que já trabalhavam em produções do gênero. Mais especificamente, a pesquisadora Vânia Lúcia Quintão Carneiro (1999, p. 98) afirma que a atração possui características de quatro antecessores: Vila Sésamo, Sítio do Picapau Amarelo, Rá-Tim-Bum e Mundo da Lua. Inclusive, é possível perceber relações específicas com outras séries da emissora, como pontuaremos em breve.

Seus criadores foram Flavio de Souza e Cao Hamburger, que também foi o diretor principal, e sua estreia ocorreu às 19h de 9 de maio de 1994, com exibição inédita até 1997. Logo na primeira semana conseguiu bons resultados de audiência, mas foi em 1996 que atingiu 12 pontos na Grande São Paulo, o que na época equivalia a mais de 400 mil domicílios. Já no primeiro ano foi eleito o Melhor Programa Infantil, pela Associação Paulista de Críticos de Arte, e ganhou a medalha de prata no Festival de Nova York, entre outros prêmios com o passar do tempo. E o mais curioso é que praticamente toda a série foi gravada antes de sua exibição. Ou seja, não houve grandes modificações de acordo com a resposta do público.

Destinado a crianças de idade pré-escolar até os dez anos, o Castelo tem 90 episódios independentes um do outro e de aproximadamente 25 minutos de

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duração, além de um especial com o dobro do tempo. Cerca de 250 profissionais fizeram parte de sua produção, que teve investimento de US$ 3 milhões, com apoio do Sesi e Fiesp.

O programa não só foi reprisado em inúmeras oportunidades e por outras emissoras, como também teve transmissão em diversos países. Ele voltou com força ao cenário cultural em 2014, no marco de seus 20 anos de existência, quando ganhou uma exposição no MIS (Museu da Imagem e do Som), em São Paulo (SP), e grande notoriedade nas redes sociais e imprensa brasileiras. Sua repercussão se manteve com entrevistas, peças teatrais, uma nova exposição – no Memorial da América Latina, também na capital paulista –, entre outras ações.

Figura 5 – Parte final da vinheta de abertura e encerramento do Castelo. Crédito: Reprodução do episódio 54 – Rá-Tim-Bum!

2.3.1. História

A série conta histórias que se passam dentro de um castelo situado numa cidade grande, como São Paulo (SP). O Castelo Rá-Tim-Bum é habitado por uma família de bruxos composta por Nino (um garoto de 300 anos e aprendiz de feiticeiro), sua tia-

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avó Morgana e seu tio Victor, que possuem 6 mil e 3 mil anos, respectivamente. Vivem ainda no local alguns animais falantes e seres fantásticos.

Nino é mimado e tem dificuldades para lidar com o fato de ser um bruxo e não um jovem como qualquer outro. Assim, recebe diariamente as visitas de seus amigos Pedro, Biba e Zequinha, crianças importantes para ele se desenvolver enquanto pessoa. Há outros cinco frequentadores do Castelo: a repórter Penélope, o ET Etevaldo, a personagem folclórica Caipora, o entregador de pizzas Bongô e o especulador imobiliário Dr. Abobrinha, vilão que tenta roubar o imóvel para construir um prédio de 100 andares.

Cada episódio tem sua narrativa própria, que é interrompida algumas vezes para dar espaço a diversos quadros de curta duração. Geralmente, eles se relacionam com a trama de cada capítulo, mas isso não é uma regra. Os quadros apresentam canções, histórias, curiosidades, charadas, animações, entre outros, e alguns deles fizeram tanto sucesso quanto os feiticeiros, visitantes ou bonecos.

2.3.2. Cômodos

O Castelo em si é o “personagem principal” do programa. Ele é o lugar mágico onde tudo acontece e que toda criança ou fã sempre sonhou conhecer (o que foi possível com as exposições). Inspirado na obra do arquiteto espanhol Antonio Gaudí (1852- 1926), não tem uma aparência sombria que amedronta quem o observa, seja os visitantes ou os espectadores. Ao contrário, possui espaços alegres e convidativos, com objetos e invenções curiosas. Seus principais ambientes são:

Entrada. Local importante na série, pois é onde o Porteiro, um boneco de lata, propõe charadas e desafios para quem deseja entrar no Castelo.

Hall principal. É o salão em que a maior parte das aventuras acontece e que dá acesso a outros ambientes. A curiosidade é a presença de uma grande árvore, habitada pela cobra Celeste.

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Cozinha. Naturalmente, as situações relacionadas a comidas e refeições ocorrem ali. Há ainda um pequeno jardim atrás da cozinha, local de pouquíssimas cenas.

Quarto do Nino. Provavelmente o grande sonho de consumo dos espectadores. É bem apertado e foi um espaço improvisado pela equipe de cenografia. Suas marcas principais são a porta giratória e as paredes decoradas com páginas de gibis.

Sala da lareira. Possui objetos criados por Dr. Victor e que dão origem a determinados quadros, como Caixa Preta e Músicas do Mundo Todo. Há também uma televisão utilizada pelos personagens em alguns episódios.

Sala de música. Onde há objetos musicais, que também resultam em quadros do programa, como a Caixinha de Música, a Pianola, o Circo.

Biblioteca. Na história, possui 1005 livros, os mais importantes do mundo. O Gato Pintado é o responsável por toda sua organização. A produção do programa recebeu doações de livros e precisou serrar diversos deles para compor o cenário.

Oficina. Onde Dr. Victor faz algumas de suas invenções, assim como Nino. Fica no subsolo e é acessada por um elevador na biblioteca.

Quarto da Morgana. Dos ambientes mencionados até aqui, é o menos frequentado por personagens além da própria Morgana e sua gralha Adelaide. Fica na torre do Castelo e é porta de entrada e saída quando a feiticeira passeia com sua vassoura, a Valdirene.

Encanamentos. São habitados por Mau e Godofredo, dois seres do Castelo. Neles, a dupla forma um quadro com charadas e trava-línguas. Algumas vezes, outros personagens aparecem no cenário.

Em raríssimos episódios, é citado o banheiro do Castelo ou aparece rapidamente algum habitante nele. Há também o lustre e a casinha de joão-de-barro, mas neles só atuam, respectivamente, as fadinhas Lana e Lara e os passarinhos cantores,

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como falaremos no subitem Quadros. Cenas em outros locais e estúdios fazem parte de poucos capítulos, e algumas das externas foram gravadas no Zoológico de São Paulo, no Theatro Municipal de São Paulo, em ruas da cidade paulistana e em uma fazenda.

Figura 6 – Maquete do Castelo. Compõe cenas como as de abertura dos episódios. Crédito: Reprodução do capítulo 1 – Tchau, não! Até amanhã!

2.3.3. Personagens

São muitos os personagens marcantes do programa, incluindo os bonecos. Alguns deles aparecem especialmente nos quadros e possuem menor relação com a história contada em cada capítulo. Uma curiosidade é que foram utilizados mais de 800 figurinos na série.

Nino (Cássio Scapin). É um menino e aprendiz de feiticeiro de 300 anos de idade, o equivalente a uma criança comum de aproximadamente dez anos. Precisa lidar com

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problemas internos por ser de uma família de bruxos e está sempre criando uma invenção que na verdade já existe. Foi inspirado na garota Nina, do Rá-Tim-Bum.

Morgana (Rosi Campos). A mais experiente do Castelo e tia-avó de Nino. Possui 6 mil anos de idade e presenciou os principais acontecimentos do planeta nesse período. Portanto, é uma grande contadora de histórias, sobretudo no quadro Feitiçaria. A gralha Adelaide é seu animal de estimação.

Dr. Victor (Sérgio Mambertti). Também chamado de Tio Victor, possui 3 mil anos de idade, é tio de Nino e sobrinho de Morgana. É na verdade o dono do Castelo, além de um grande inventor e feiticeiro. Conhecido por esbravejar o bordão “raios e trovões”, também é carinhoso e amigo das crianças.

Pedro (Luciano Amaral). É o mais inteligente dentre as crianças e tem dez anos de idade. Ele sempre traz alguma ideia nova ou tenta propor soluções para os mistérios e encrencas que surgem.

Biba (Cinthya Rachel). Tem a mesma idade de Pedro e é a mais responsável. Certas vezes precisa se impor diante dos garotos por ser a única menina da turma e se une a outras personagens femininas.

Zequinha (Freddy Allan). É o mais novo da meninada, com seis anos, e também é chamado de Zeca. Sua grande marca é perguntar “por quê?” repetidamente quando não entende alguma explicação, situação ou tem uma dúvida qualquer. Então, todos perdem a paciência e respondem: “Porque sim, Zequinha!”, dando início ao quadro do Telekid, com a devida resposta.

Penélope (Ângela Dip). É a principal repórter de TV e jornal da cidade. Possui os cabelos e a roupa em tons de rosa, lembrando a famosa personagem Penélope Charmosa. Às vezes, ela tem a função mais de mediar conflitos do que de produzir de fato uma matéria ou levar informações.

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Etevaldo (Wagner Bello). É um extraterrestre que aprende as coisas da Terra com a turma do Castelo e também conta sobre a vida em seu planeta, o Zeta-7. Em algumas ocasiões, utiliza seus poderes especiais.

Caipora (Patrícia Gaspar). Personagem do folclore brasileiro, Caipora chega ao Castelo sempre que alguém assovia. Aprende sobre a vida na cidade e traz ensinamentos sobre a floresta, contando histórias da mata no quadro Curumins.

Bongô (Eduardo Silva). É o personagem mais alegre de todo o programa e tem como grandes paixões a música e a dança. É entregador de pizzas e tem medo de Morgana, por ela ser bruxa.

Dr. Abobrinha (Pascoal da Conceição). Seu nome é Pompeu Pompílio Pomposo, como gosta de enfatizar quando o chamam de Abobrinha. É um especulador imobiliário que tenta roubar o Castelo de todas as formas para demoli-lo e construir um prédio de 100 andares. Sempre usa disfarces para fazer com que alguém assine o contrato de venda.

Tíbio e Perônio (Flavio de Souza e Henrique Stroeter). São dois cientistas gêmeos e atrapalhados que fazem diversas experiências em seu quadro. Apenas em poucos episódios eles vão até o Castelo e interagem com a turma. São inspirados nos detetives Dupond e Dupont, de As aventuras de Tintim.

Lana e Lara (Fabiana Prado e Teresa Athayde). São duas fadinhas irmãs que moram no lustre do Castelo e têm quadro próprio. Em poucas oportunidades elas se relacionam com os demais personagens.

João-de-barro e as Patativas. São os três passarinhos que moram na casinha de joão-de-barro, localizada na árvore da Celeste. Fazem o quadro Que Som É Esse?, tocando e cantando diferentes instrumentos musicais, e não interagem com a turma. O João-de-barro foi interpretado por 23 atores e atrizes; já as Patativas, por Ciça Meirelles e Dilmah Souza.

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Telekid (Marcelo Tas). Telekid é um garoto tecnológico – uma espécie de personagem virtual de um computador – que tem quadro próprio para responder às perguntas de Zequinha, principalmente. Sempre começa com o bordão “Porque sim não é resposta” e nunca se relaciona com os habitantes ou visitantes.

Os personagens a seguir são bonecos ou objetos manipulados:

Celeste (Álvaro Petersen Jr.). É uma cobra rosa que mora na árvore do Castelo. Observadora e fofoqueira, sonha em ter pés e mãos. Celeste é prima da cobra Sssílvia, do Rá-Tim-Bum.

Mau e Godofredo (Cláudio Chakmati e Álvaro Petersen Jr.). São dois seres que habitam os encanamentos do Castelo e têm um quadro próprio com charadas e trava-línguas. Quando quer assustar alguém, Mau solta sua “gargalhada fatal”, mas na verdade ele é do bem. Godofredo é seu assistente, mais amedrontado e que desbanca as “maldades” do Mau com sua ingenuidade.

Porteiro (Cláudio Chakmati). É um boneco de lata que sempre propõe senhas para entrar no Castelo, como adivinhar uma charada ou imitar algum animal, por exemplo. Seu bordão é “clift, cloft, stil, a porta se abriu”.

Gato Pintado (Fernando Gomes). É o responsável pela biblioteca e um dos mais cultos de todos. Sempre é fonte de informação e conselho para a turma.

Relógio (Fernando Gomes). Literalmente é o regulador do tempo e das atividades do Castelo. Sempre avisa os personagens sobre os afazeres e os horários de sair e chegar.

Fura-Bolos (Fernando Gomes). É um fantoche de dedo que geralmente conversa com a turma para chamar os quadros Lavas as Mãos e Dedolândia.

Tap e Flap (Theo Werneck e Gérson de Abreu). São duas botas roqueiras e que conversam rimando.

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Adelaide (Luciano Ottani). A gralha é a grande companheira de Morgana, sempre curiosa para ouvir suas histórias.

Ratinho. O que aparece para os demais personagens é o Ratomóvel, que Ratinho dirige até entrar em sua toca e começar seu quadro. Então, se inicia uma animação (feita por Marcos Magalhães) de Ratinho cantando canções sobre tomar banho, escovar os dentes, jogar o lixo no lixo e reciclagem.

Radialista (Cláudio Chakmati). Apresenta grupos de crianças de diversos estilos musicais. O quadro aparece raríssimas vezes, após Lana e Lara ligarem seu rádio.

Há também quatro objetos que têm vida e pouco interagem com os outros integrantes. São eles: Livro Mágico, Felisberto (projetor antigo de cinema), a Valdirene (vassoura) – que pertencem a Morgana – e Planta Carnívora.

Figura 7 – Parte dos personagens. Atrás, da esquerda à direita: Mau, Adelaide, Nino, Morgana, Penélope, Celeste e Perônio. À frente, no mesmo sentido: Bongô, Dr. Abobrinha, Biba, Zequinha, Pedro, Caipora e Etevaldo. Fonte: Portal Cmais – http://cmais.com.br/castelo

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Demais personagens. O Castelo ainda tem diversos outros personagens em seus quadros ou que aparecem pontualmente nos 90 capítulos. Talvez a participação mais especial seja a dos peixinhos Glub e Glub (Carlos Mariano e Gisela Arantes), os mesmos do programa Glub-Glub.

Vale reforçar que a grande maioria dos atores do Castelo fizeram parte de atrações infantis anteriores e posteriores à série, atuando também em diferentes funções. O mesmo aconteceu com tantos outros profissionais, como roteiristas, diretores, produtores, cenógrafos, figurinistas, músicos etc. Essa é uma extensa rede de ligações que se forma, sendo possível percebê-la superficialmente ao comparar alguns nomes presentes nas atrações citadas aqui.

2.3.4. Quadros

É possível observar a importância dos quadros do programa mesmo antes de entrar especificamente no assunto. Eles são 26 ao todo, têm pouca duração e interrompem a narrativa principal em todos os episódios – contabilizamos uma média de quase sete inserções por capítulo. Possuem forte presença musical e de animações, charadas, curiosidades e histórias.

A seguir estão pequenos resumos de todos os quadros, intitulados de forma hipotética e como são conhecidos popularmente, pois não encontramos publicamente seus nomes oficiais.

Caixa Preta. Mostra animações com formas geométricas tridimensionais. Algumas vezes saem objetos de dentro da caixa.

Caixinha de Música. Exibe diversas apresentações com bailarinos, em tom mais engraçado. Muitas delas estão ligadas ao tema do capítulo.

Cavalete Mágico. Traz principalmente vídeos acelerados das criações de grafites do Pintor Maluco, um personagem do quadro interpretado pelos grafiteiros Jejo Cornelsen e Rui Amaral.

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Circo. Há um circo de brinquedo criado pelo Professor Aldebarã (Claudio Mamberti), um mago de 10 mil anos de idade, avô de Nino, pai de Victor e irmão de Morgana. São exibidas apresentações de crianças do Circo Tremelique.

Clipe musical. É um quadro muito raro que mostra clipes musicais sobre temas como bolas, jeitos, fazer coisas com os pés e as mãos etc.

Como se Faz. Traz clipes musicais sobre como são feitos diversos objetos, como guarda-chuva, pipa, tijolo etc. Wandi Doratiotto é o cantor e compositor.

Crianças reais. São crianças reais que aparecem falando sobre determinado assunto ou tentando resolver charadas e trava-línguas. Essas participações são exibidas no quadro de Mau e Godofredo e algumas vezes durante a história em si.

Curumins. São histórias e lendas contadas por Caipora sobre dois indiozinhos, Poranga e Porunga (Jonatas Martin e Luan da Silva Ferreira).

Dedolândia. Com manipulação de Marcos Bertoni, é uma banda de rock formada por fantoches de dedos que canta músicas sobre operações matemáticas. Fura- Bolos chama o quadro.

Desenho Mágico. Um personagem chega a uma invenção que possui um visor e uma manivela. Ao girá-la, é exibida uma animação em que as imagens dão origem a outras imagens.

Feitiçaria. Morgana conta histórias sobre acontecimentos e pessoas que marcaram o mundo. Muitas vezes Relógio chama o quadro com o bordão: “morcego, ratazana, baratinha e companhia, está na hora da feitiçaria!”.

Lana e Lara. O quadro das fadinhas sempre começa com o bordão “enquanto isso, no lustre do Castelo...”. Apresenta charadas que uma irmã faz à outra e aos espectadores.

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Lareira. É um teatro de marionetes que acontece dentro da lareira e mostra características de diferentes países.

Lavar as Mãos. Esse é outro quadro que frequentemente se inicia a partir de Fura- Bolos. É um clipe musical sobre lavar as mãos, cantado por .

Lousa Mágica. Animações de animais como se fossem feitas com giz.

Mãos Pintadas. Algumas mãos pintadas simulam animais em diferentes situações.

Mau e Godofredo. Os dois seres contam pequenos “causos” que aconteceram entre eles e sempre propõem charadas e trava-línguas aos espectadores. Crianças reais também aparecem em gravações respondendo os desafios. Algumas vezes, Mau lança esses desafios fora do quadro, aos demais habitantes do Castelo.

Músicas do Mundo Todo. Um personagem vai até o globo terrestre, na sala da lareira, e escolhe um país para ouvir um estilo musical típico daquele lugar. Uma animação acompanha a canção.

Pianola. A engenhoca é uma mistura de piano e bicicleta. É preciso pedalar para a engrenagem funcionar e aparecer uma partitura em que bailarinos interpretam a canção, simulando notas musicais.

Poesias Animadas. Há um livro de poemas de autores brasileiros importantes. São eles: Arnaldo Antunes, Cecília Meirelles, , Manuel Bandeira, Mario Quintana, Paulo Leminski e . É exibida uma animação enquanto um personagem lê o poema.

Quadros. Sempre há diferentes pinturas de artistas famosos no hall do Castelo. Alguns personagens vão observá-las e comentar suas características.

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Que Som é Esse?. É o quadro do João-de-barro e as Patativas. A base das canções é a mesma, variando os 28 instrumentos principais que dão tema às edições. A criação das músicas é de Hélio Ziskind.

Radialista. É um quadro que aparece raramente e exibe apresentações musicais de crianças, após terminar a história de Lana e Lara.

Ratinho. O personagem animado Ratinho canta quatro músicas, cujos temas são tomar banho, escovar os dentes, jogar o lixo no lixo e reciclar. Hélio Ziskind compôs e gravou as canções.

Telekid. É um garoto virtual que esclarece as dúvidas surgidas durante a história, principalmente vindas de Zequinha, por exemplo, sobre poluição, corpo humano etc. Telekid possui um aparelho de onde tira as informações e exibe fotos e vídeos, o que podemos comparar aos smartphones e sites de busca.

Tíbio e Perônio. Os cientistas gêmeos fazem diversos experimentos sobre animais, seres humanos, equilíbrio, sombras, entre outros. Possuem um animal de estimação que nunca é mostrado, o Tatatossauro. No episódio 82, “T de Tíbio, P de Perônio”, é revelado que o laboratório da dupla fica a 5238 passos do Castelo.

2.3.5. Outros produtos e narrativas transmidiáticas

Não demorou muito para o Castelo Rá-Tim-Bum expandir as fronteiras da televisão e também fazer sucesso de outras maneiras. O programa teve mais de 150 produtos licenciados e milhares e milhares de vendas, como escovas de dente, chinelos, jogos, brinquedos e álbum de figurinhas.

O Castelo ainda foi comercializado em fitas de vídeo. Já o CD da atração possui 18 músicas, referentes a alguns personagens e quadros. Por sua vez, os atores da série viajaram o país com peças teatrais – o musical “Teatro Castelo Rá-Tim-Bum: Onde Está o Nino?”, de 1997, teve mais de 190 mil espectadores e ganhou nova versão em 2008.

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Foi lançado em 1997 o “Dicionário do Castelo Rá-Tim-Bum”, de Beatriz Rosenberg e Lidia Chaib. Já entre 1995 e 1999 surgiu a “Coleção Castelo Rá-Tim-Bum”, com 12 livros, ilustrados por Ricardo Fernando Girotto e Luis Carlos Fernandes. As histórias incrementam a narrativa do programa ao revelar diversas informações e curiosidades, como nomes completos e origens de alguns personagens até encontrarem o Castelo, por exemplo. Também estimulam a participação dos leitores com algumas brincadeiras, perguntas e dados para preencher.

Eis os títulos e seus respectivos autores:

1. O álbum do Nino (1995) – Flavio de Souza 2. O diário de bordo do Etevaldo (1995) – 3. As experiências de Tíbio e Perônio (1995) – Flavio de Souza 4. As memórias de Morgana (1996) – Anna Muylaert 5. Os enigmas do Mau (1996) – Flavio de Souza 6. As fofocas da Celeste (1996) – Flavio de Souza 7. As aventuras do Bongô (1996) – Cao Hamburger e Naninha Gitahy 8. As reportagens da Penélope (1997) – Anna Muylaert 9. As estripulias de Biba, Pedro e Zeca (1997) – Flavio de Souza 10. As verdades e mentiras do doutor Abobrinha (1998) – Ana Maria Caira e Cao Hamburger 11. Lendas e causos da Caipora (1998) – Flavio de Souza 12. As invenções do dr. Victor (1999) – Ana Maria Caira e Cao Hamburger

Já em 1999 estreou Castelo Rá-Tim-Bum, o Filme, dirigido por Cao Hamburger. O longa é uma adaptação da série e não sua continuação ou algo do gênero. Portanto, alguns personagens se repetem e outros são diferentes, assim como os figurinos e cenários. Ele teve público de 725 mil espectadores nos cinemas.

O filme teve também um CD com a trilha sonora, produzido por André Abujamra, e um livro, adaptado por Ana Maria Caira e Beatriz Lefèvre. Em 2000, foi feita uma

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exposição do longa no Sesc Belenzinho, em São Paulo (SP), chamada “Universo Mágico do Castelo Rá-Tim-Bum – o Filme”, com mais de 75 mil visitantes.

2.3.6. 20 anos e atualmente

Apesar de todos os frutos e reprises do Castelo, o programa voltou à tona com muita repercussão em 2014, quando completou 20 anos de lançamento. Praticamente durante todo o período ele foi destaque na imprensa brasileira, nas redes sociais e na agenda cultural paulistana, sobretudo.

“Castelo Rá-Tim-Bum – A exposição” foi o grande marco daquele ano. Sediada no Museu da Imagem e do Som (MIS), em São Paulo (SP), que a concebeu com o apoio da TV Cultura, a mostra apresentou os cenários reconstruídos, além de objetos de cena restaurados e depoimentos de atores e profissionais. Foi uma febre, com filas enormes de espera, ingressos esgotados e site de venda de bilhetes congestionado. Inclusive, ela foi prorrogada duas vezes e ficou em cartaz de 16 de julho de 2014 até 25 de janeiro de 2015. Foram cerca de 410 mil visitantes, recorde de público no MIS.

Também foram inúmeras as matérias especiais produzidas pelos veículos de comunicação e as entrevistas concedidas pelos artistas e equipe de produção do programa. Diversos youtubers criaram conteúdos sobre a atração, além de homenagens feitas por fãs na Internet.

E a repercussão não ficou apenas em torno dos 20 anos. Em 2016, por exemplo, Flavio de Souza e Henrique Stroeter foram convidados pela multinacional GE para reviver os cientistas Tíbio e Perônio no contexto dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. Uma das investidoras de tecnologia daquela Olimpíada, a empresa lançou uma websérie de cinco episódios com os personagens, em seu canal no YouTube. Os vídeos possuem de três a seis minutos de duração e mostram a dupla em seu laboratório, contando sobre as inovações tecnológicas desenvolvidas pela GE ao megaevento esportivo. O lançamento da campanha teve até uma edição especial do programa Roda Viva, da TV Cultura, com Tíbio e Perônio como entrevistados.

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Mais uma exposição foi lançada no ano seguinte: “Rá-Tim-Bum, o Castelo” também teve duas prorrogações e ficou em cartaz de 31 de março de 2017 a 4 fevereiro de 2018, no Memorial da América Latina, na capital paulista. Ela foi realizada pelo Memorial e o Governo do Estado de São Paulo, em parceria com a TV Cultura e a Caselúdico, e teve mais de 800 mil visitantes. A mostra trouxe cenários, depoimentos, objetos e dados históricos, além de atrações em projeção mapeada, peças de teatro – como “Esse Castelo Será Meu”, protagonizada por Pascoal da Conceição (Dr. Abobrinha) – e painéis itinerantes em estações de metrô.

Aliás, a série deu origem a espetáculos fora da exposição, em 2017 e se estendendo para 2018. Foi lançado no Teatro Opus, em São Paulo (SP), o “Castelo Rá-Tim-Bum – O Musical”. Já o ator Cássio Scapin voltou a viver o aprendiz de feiticeiro em “Admirável Nino Novo”, em cidades como Goiânia (GO), Porto Alegre (RS) e São Paulo (SP). Na história, Nino precisa novamente aprender a lidar com seus sentimentos porque percebe que o tempo passou e seus amigos cresceram.

Outro exemplo é o Canal da Penélope, no YouTube, inaugurado em 2017 pela atriz Ângela Dip, que novamente interpreta a repórter. Em fevereiro de 2018, o canal contava com 41 mil inscritos, e seus vídeos somavam quase 1 milhão de visualizações. Os conteúdos são de entrevistas, desafios e curiosidades. Em 2014, Ângela também lançou a peça “Penélope, a Repórter Cor-de-Rosa”, no Teatro Amil, em Campinas (SP).

Aliás, o próprio Castelo possui um canal no YouTube, administrado pela TV Cultura. Estão disponíveis todos os capítulos e dezenas de outros conteúdos sobre personagens, entrevistas e bastidores. Em fevereiro de 2018, os 306 vídeos tinham quase 27,5 milhões de visualizações, enquanto o canal, mais de 137 mil inscritos.

Se por um lado o Castelo repercute até os dias de hoje com novos lançamentos, em contrapartida sabe-se que a TV Cultura/Fundação Padre Anchieta sofre processos judiciais de alguns artistas devido a questões de direitos de imagem e autorais,

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sobretudo em relação a reprises e produtos licenciados. No entanto, não entraremos em detalhes para não fugirmos do foco da presente pesquisa de mestrado.

2.4. Pesquisas sobre o Castelo

Os trabalhos acadêmicos sobre o Castelo Rá-Tim-Bum também ajudam a contextualizar sua importância e repercussão. Fizemos as buscas nas mesmas bases de dados citadas no estado da arte sobre jornalismo infantil. Encontramos pesquisas interessantes, mas nenhuma delas relaciona a série a jornalismo para crianças. Seus assuntos são educação, psicologia, arquitetura, cenografia, roteiro, processo de criação, entre outros.

Achamos nove exemplos no Banco de Teses e Dissertações da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), sendo oito pesquisas de mestrado e uma de doutorado:

- Título: “Estratégias de interação do programa Castelo Rá-Tim-Bum: das formas de vida aos regimes de interação”. Pesquisadora: Carolina Mazzaron de Castro. Ano de defesa: 2016. Formação/Programa: Mestrado em Linguística. Instituição de Ensino: Universidade de Franca.

- Título: “A percepção visual do espaço arquitetônico e sua representação no espaço televisivo: o caso do Castelo Rá-Tim-Bum”. Pesquisadora: Sandra Regina Moreira da Silva Vita. Ano de defesa: 2009. Formação/Programa: Mestrado em Arquitetura e Urbanismo. Instituição de Ensino: Universidade São Judas Tadeu.

- Título: “Relacionamento interpessoal e mídia: as relações de amizade entre as personagens do programa Castelo Rá-Tim-Bum”. Pesquisadora: Luciana Teles Moura. Ano de defesa: 2007. Formação/Programa: Mestrado em Psicologia. Instituição de Ensino: Universidade Federal do Espírito Santo.

- Título: “Televisão e infância, a autofagia na criação: um estudo sobre os programas infantis produzidos pela primeira geração de telespectadores”.

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Pesquisadora: Regina da Graça Soler Simões. Ano de defesa: 2004. Formação/Programa: Mestrado em Comunicação e Semiótica. Instituição de Ensino: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

- Título: “A inserção do programa Castelo Rá-Tim-Bum, nos propósitos da TV Cultura, a partir de sua produção, estrutura e conteúdo”. Pesquisador: Raimundo Nonato Silva Câmara. Ano de defesa: 2001. Formação/Programa: Mestrado em Ciências da Comunicação. Instituição de Ensino: Universidade de São Paulo.

- Título: “Os poemas animados pelo Castelo Rá-Tim-Bum: aproveitamento da poesia infantil na televisão”. Pesquisadora: Satira Pereira Machado. Ano de defesa: 2000. Formação/Programa: Mestrado em Linguística e Letras. Instituição de Ensino: Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

- Título: “O visível e o invisível de um Castelo Imaginário e um Anjo Real – Angélica, Castelo Rá-Tim-Bum e programas infantojuvenis em análise pelos caminhos da comunicação e educação”. Pesquisador: Cláudio Márcio Magalhães. Ano de defesa: 1999. Formação/Programa: Mestrado em Comunicação Social. Instituição de Ensino: Universidade Federal de Minas Gerais.

- Título: “O educativo como entretenimento na TV Cultura: Castelo Rá-Tim-Bum, um estudo de caso”. Pesquisadora: Vânia Lúcia Quintão Carneiro. Ano de defesa: 1997. Formação/Programa: Doutorado em Educação. Instituição de Ensino: Universidade de São Paulo.

- Título: “Roteiros da Televisão Educativa: análises do caso da televisão brasileira”. Pesquisador: Néstor Ricardo Ruiz Matiauda. Ano de defesa: 1996. Formação/Programa: Mestrado em Comunicação e Semiótica. Instituição de Ensino: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

Já no portal de periódicos da Capes, encontramos apenas dois artigos específicos sobre o programa:

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- Título: “Desconstruir para edificar: uma visão acerca da infância e uma proposta para sua compreensão através da chave da mudança”. Autora: Laryssa Frezze e Silva/USP. Revista: Literatura e Autoritarismo, n. 15, 2015.

- Título: “Relacionamento interpessoal e mídia: as amizades no Castelo Rá-Tim- Bum”. Autores: Agnaldo Garcia/UFES e Luciana Teles Moura/UFES. Revista: Psicologia em Revista, v. 14, n. 2, 2008.

O resultado foi nulo na plataforma SciELO – Scientific Eletronic Library Online. Por outro lado, identificamos três estudos sobre o Castelo no Portal de Livre Acesso à Produção em Ciências da Comunicação, da Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação:

- Título: “O Ratinho do Castelo Rá-Tim-Bum e a Inserção de Séries Animadas em Stop-Motion na TV Cultura”. Pesquisadora: Ellen Charlise Rocha Souza. Ano: 2009. Instituição de Ensino: Universidade Federal de Sergipe.

- Título: “Uma breve análise do programa infantil Castelo Rá-Tim-Bum”. Pesquisadora: Gabriela Lima Ribeiro. Ano: 2009. Instituição de Ensino: Universidade Federal do Ceará.

- Título: “Cenário: mensagem e concretização de um universo fantástico. Estudo de caso do papel da cenografia na produção do programa infantil Castelo Rá-Tim-Bum”. Pesquisadora: Larissa Minutti Ferretti. Ano: 2008. Instituição de Ensino: Faculdade Cásper Líbero.

As buscas livres no Google Acadêmico revelam ainda dezenas de trabalhos universitários20 que possuem o Castelo como tema central ou estudo de caso, dos

20 O Trabalho de Conclusão de Curso do autor desta pesquisa e de sua colega Natália Melo, em jornalismo, pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, foi sobre os 20 anos do programa. Foi feita uma reportagem hipermídia intitulada “Revivendo o Castelo Rá-Tim-Bum” (http://revivendoocastelo.wixsite.com/ratimbum), que traz 14 entrevistas exclusivas com atores e profissionais dos bastidores da atração, além de curiosidades, fotos e ilustrações. O projeto foi orientado pela Profa. Dra. Denise Paiero, e toda a montagem e criação artística do site foram feitas pela publicitária Ana Paula Molina. A ideia da pauta surgiu em agosto de 2013, antes da explosão da efeméride, e sua finalização ocorreu no ano seguinte. O trabalho foi um dos cinco finalistas do XXII Prêmio Expocom 2015 (região Sudeste), na categoria Produção em Jornalismo Digital, e foi apresentado no XX

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antigos aos mais recentes, tratando até mesmo das últimas exposições em São Paulo (SP). Também é possível perceber que a série foi citada em inúmeras outras pesquisas, incluindo estrangeiras, como bom exemplo de conteúdo televisivo infantil ou com forte ligação com a educação.

Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sudeste, o Intercom Sudeste 2015, realizado na Universidade de Federal de Uberlândia, em Minas Gerais.

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3 Jornalismo Rá-Tim-Bum

A contextualização do capítulo anterior ajuda a encontrar outros exemplos de jornalismo infantil ou que possuem relação com ele. Também é curioso e importante notar que muitos deles não têm o objetivo central de transmitir novidades atuais do dia a dia, que é uma das principais atividades jornalísticas. Não é difícil perceber que o foco é levar informações relevantes, e não necessariamente factuais, aos telespectadores, porém de maneira divertida, por meio de jogos, brincadeiras, contação de histórias etc. Inclusive, há até a presença de matérias ficcionais.

Para relembrar tais programas ligados de certa forma ao jornalismo para crianças: Revistinha (1988), quadro Jornal da Criança, do Rá-Tim-Bum (1990), X-Tudo (1992), Esporte Clube Rá-Tim-Bum (2007) e TV Cocoricó (2012).

Este cenário nos remete à ideia de infotenimento, discutida por especialistas nos últimos anos. O termo vem das palavras informação e entretenimento e “surgiu nos anos 1980, nos EUA, para designar a mistura de notícia com diversão num mesmo pacote” (AGUIAR e BARSOTTI, 2013, p. 308). Há autores que criticam negativamente essa prática, apontando que os veículos de comunicação seduzem o público a qualquer custo e sem responsabilidade, sob a justificativa de prestar o serviço de transmissão de notícias. Já outros especialistas relativizam um pouco mais algumas questões estéticas e de sedução utilizadas pela imprensa e pela publicidade para ter audiência, como algo natural da prática do mercado.

O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001) revela os significados de entretenimento; eis os primeiros: “1) prender, desviar a atenção de; distrair. 2) enganar; iludir, lograr. 3) ocupar(-se) de maneira prazerosa (com); distrair(-se), recrear(-se). 4) ter por ocupação ou distração; entender-se. (...)” (HOUAISS, 2001, p. 1168). Portanto, fica claro que veicular uma informação para entreter o espectador, e vice-versa, pode ser algo ético e saudável ou não, de acordo com a intenção.

Nossa meta, porém, não é propor classificações absolutas, cravando que determinados programas são de jornalismo infantil ou se baseiam em técnicas de

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infotenimento. Voltamos a mencionar: as atrações feitas pela TV Cultura e citadas aqui ganharam reconhecimento até internacional ao longo das décadas, por sua qualidade e relevância para a garotada. Então, partimos do princípio que elas também podem servir de inspiração e referência para novas produções. Afinal, suas próprias criações aconteceram dessa forma.

Mesmo o Mundo da Lua (1991) se encaixa entre os exemplos desse universo, pois os diários de bordo do personagem Lucas Silva e Silva (Luciano Amaral) têm certa relação com a educomunicação e com o que buscamos nesta pesquisa. Segundo o pesquisador Ismar de Oliveira Soares,

“a Educomunicação é um campo de intervenção social que objetiva criar e manter ecossistemas comunicativos abertos e democráticos em espaços educativos. Como área de atividade profissional, reúne especialistas voltados para o estudo das mediações entre comunicação, educação e cultura. Tem como meta ampliar o coeficiente comunicativo das ações humanas e está presente nos mais diversos setores da sociedade, incluindo a mídia, a escola, os centros culturais e as organizações não governamentais” (SOARES, 2004, p. 31).

Portanto, de acordo com Soares (2011, p. 11), a educomunicação é uma área de interface entre a comunicação e a educação, com exemplos práticos de produções de conteúdo feitas principalmente por crianças e adolescentes. O termo foi ressemantizado21 a partir de uma pesquisa latino-americana promovida pelo Núcleo de Comunicação e Educação da Universidade de São Paulo (NCE/USP), no fim dos anos 1990, e liderada pelo Prof. Dr. Ismar Soares.

Desde então, houve uma expansão de projetos educomunicativos. Um dos pioneiros e mais marcantes no Brasil foi o Educom.Rádio, lançado em 2001, numa parceria do NCE/USP e a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, com o objetivo de diminuir a violência nas escolas públicas da cidade. Professores e educomunicadores auxiliavam os alunos a produzir matérias de rádio sobre a comunidade escolar e seu entorno. A iniciativa tanto deu certo que em 2004 se tornou uma lei municipal, regulamentada em 2005, passando a se chamar Programa

21 Soares (2009, p. 161) explica que “inicialmente, o conceito de Educomunicação era usualmente empregado, de forma restrita, pela Unesco e por pesquisadores como Mario Kaplún, para designar a prática da educação ante os efeitos da mídia” (SOARES, 2009, p. 161).

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Nas Ondas do Rádio. Ainda em atividade, se expandiu e deu origem a projetos de jornal mural, agência de notícias e produtos audiovisuais.

Soares (2009, p. 181 e 182) cita a própria TV Cultura como exemplo de gestão educomunicativa na criação de programas para a meninada nos anos 1990, com “(...) uma programação elaborada pela intervenção conjunta de psicopedagogos, arte-educadores, profissionais da Comunicação, arquitetos e agentes culturais e educadores” (SOARES, 2009, p. 182). Ele menciona o Castelo Rá-Tim-Bum e destaca “(...) a originalidade do processo de produção adotado pela emissora e o respeito ao público infantil. No caso da Cultura, temos um exemplo singular de procedimento educomunicativo” (SOARES, 2009, p. 182).

Assim, não poderíamos dissociar a educomunicação do jornalismo infantil, sobretudo se entendermos que ele pode ser feito também com crianças e não apenas para elas. A partir desse histórico e olhar, vamos analisar o Castelo de uma perspectiva jornalística, para identificar elementos que possam basear tais práticas e produções de conteúdo atualmente.

3.1. Analisando o programa

Primeiramente, vale destacar que ao menos quatro episódios do Castelo Rá-Tim- Bum ilustram todo o contexto apresentado nesta pesquisa. Ou seja, abordam de forma direta a relação entre crianças e comunicação – o que não significa que o assunto não seja tratado pontualmente em outros capítulos. São eles:

Episódio 51 – TV Mania. A turma está completamente viciada em televisão. Nino e os seres habitantes do Castelo assistem a um filme de monstros e não dão atenção para mais nada. Pedro, Biba e Zeca chegam e também ficam vidrados. De repente, a TV se apaga, e as crianças percebem algo estranho no Castelo, até que um monstro aparece e começa a persegui-las. Elas se escondem no quarto do Nino, enquanto Penélope chega sem entender o que está acontecendo e corre perigo.

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Então, Nino se lembra do anel mágico que sua tia Morgana lhe deu, coloca-o no dedo e se transforma no Super Nino. Com superpoderes, ele ataca o monstro, que fica indefeso no chão. As crianças tiram o disfarce e descobrem que o inimigo na verdade era Dr. Victor, que tramou toda a brincadeira com Penélope, para tirar os garotos da frente da telinha. Fica a lição de moral sobre o consumo excessivo de televisão (e demais tecnologias, como hoje podemos entender). Por fim, o episódio termina com o próprio Victor grudado na TV.

Episódio 72 – Uma onda no mar. Dr. Victor vai viajar por alguns dias no navio do Almirante Costa, seu amigo. Para que o tio não se sinta sozinho no meio do mar – já que o Almirante não pode acompanhá-lo –, Nino pega um rádio amador do Castelo para se comunicar com o feiticeiro, que possui outro aparelho na embarcação. As crianças gostam da ideia e decidem criar a Rádio Rá-Tim-Bum para entreter Victor.

Elas se dividem em funções e produzem os próprios conteúdos com novidades do Castelo. Nino é o apresentador; Pedro faz locução das notícias; Biba faz entrevistas; Zeca conta piadas, e até Gato Pintado dá a previsão do tempo. Todos ajudam a montar trilhas sonoras com alguns objetos e também transmitem músicas do João- de-barro e as Patativas e de algumas engenhocas. Bongô aparece com discos de vinil e participa da brincadeira. Então, o Castelo é invadido por dezenas de crianças que ouviram o programa pelos rádios amadores de seus pais. Todas entoam: “Bum! Bum! Bum! A Rádio Rá-Tim-Bum!”.

Ainda neste episódio, Morgana fala no quadro “Feitiçaria” sobre a época em que o rádio era o principal meio de comunicação. Ela conta a história de uma transmissão radiofônica que causou pânico nos Estados Unidos. Em 30 de outubro de 1938, véspera do Halloween, a rede CBS (Columbia Broadcasting System) fez uma edição especial do programa Mercury Theater on the Air com uma adaptação do livro “Guerra dos Mundos”, de Herbert George Wells. O roteiro em formato jornalístico foi escrito e narrado por Orson Welles (que anos depois lançou o célebre filme Cidadão Kane, de 1941), relatando uma invasão alienígena na cidade de Grover‟s Mill, em Nova Jersey.

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A narração teve até entrevistas de testemunhas, reportagens, opiniões de comentaristas, sonoplastia etc. para parecer real. E parecia tão real que milhares de cidadãos entraram em desespero. Ao terminar de relatar a história, Morgana diz sobre Orson Welles: “Ele provou que os meios de comunicação são poderosíssimos porque as pessoas acreditam em tudo”.

Episódio 87 – Extra, extra! Nino se esquece de dar diversos recados para o tio Victor. Fura-Bolos aconselha-o amarrar uma fita colorida em cada dedo conforme as tarefas que precisa fazer. Mesmo com a ajuda das crianças, a ideia não funciona. Penélope sugere a criação de um jornal com as notícias diárias do Castelo. Ela ensina sobre pauta, coordena atividades, indica funções e incentiva a garotada, que vai atrás de notícias e entrevistas, grava áudios, tira fotos e filma.

Zequinha acha um presente escondido na biblioteca, e todos começam uma apuração até descobrir que é de Dr. Victor para Nino. O garoto deseja abrir o pacote, mas é alertado por Penélope: “O trabalho de um repórter é descobrir a verdade, não estragar a surpresa”. Assim, eles fecham a primeira edição do Jornal do Castelo. Victor chega do trabalho, recebe de Nino o único exemplar e lê a manchete sobre o embrulho misterioso, que no fim das contas era justamente uma impressora para cada morador ter uma cópia da publicação.

Neste episódio também há um trecho que merece destaque. Estão todos produzindo os materiais na cozinha, e Penélope diz: “Não, Nino. Nós não vamos fazer o jornal só com recados. Nós podemos fazer muitas outras coisas super-hiperlegais”. E Zequinha pergunta: “Por quê?”. Ela responde: “Porque o jornal precisa ser atraente, interessante, bonito...”. Após mais um “por quê?” do garoto, a repórter fala: “Porque ler jornal é uma coisa muito importante!”. Como sempre insatisfeito, o pequeno insiste: “Por que o jornal é importante?”. E tradicionalmente todos perdem a paciência e disparam o bordão “porque sim, Zequinha!”.

Então, tem início o quadro do Telekid para esclarecer a questão. Depois de algumas explicações, o personagem resume que o jornal “(...) serve para nos manter atentos

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e informados sobre as coisas que afetam a nossa vida”. E também mostra que o produto pode ser reciclado ou se transformar num aviãozinho de papel.

Episódio especial – Hora de Dormir. Assim como o capítulo 51 – “TV Mania”, tem a mensagem sobre o consumo excessivo de tecnologias. E consideramos válida essa menção, mesmo que o episódio não faça parte da série regular de 90 programas. O garoto Daniel (Fernando Pimentel) assiste ao Castelo Rá-Tim-Bum até tarde da noite e não consegue dormir. Seu pai, Arnaldo (Theo Werneck), começa a narrar a história de A Bela Adormecida para fazê-lo pegar no sono, mas se esquece dos detalhes do conto e diz para o filho tentar dormir assim mesmo.

Daniel aparentemente sonha que a TV é ligada, com Nino o convidando para conhecer o Castelo. Enquanto ele faz um tour pelos cômodos ao lado do aprendiz de feiticeiro, os personagens de A Bela Adormecida chegam ao recinto e percebem que algo está errado porque a Princesa Aurora (Iara Jamra) também não consegue dormir. Após algumas encrencas, todos conversam com Arnaldo pela televisão e o ajudam a se lembrar do conto e terminar de narrá-lo. Ele não recordava que a princesa espetava seu dedo em um fuso (objeto têxtil de fiar) e só então adormecia.

Situação resolvida, Daniel volta para casa e se deita. Quando é acordado pelo pai, percebe que tudo aquilo fora um sonho e fica triste. Porém, Nino aparece novamente na TV e afirma ao garoto que a aventura foi real. Ao se despedirem, o bruxo diz: “Tchau, não! Até amanhã!” – mesmo encerramento do primeiro capítulo da série, que é intitulado dessa maneira.

Outros exemplos. Apenas para citarmos mais alguns capítulos que tratam de comunicação e do potencial expressivo das crianças: 14 – “Luz, câmera, ação!”, 17 – “O Rei Abacaxi”, 22 – “Ciúmes, eu?”, 28 – “Vou aparecer na TV” e 50 – “Boatos”.

3.1.1. Temas como pautas

Uma das primeiras observações extraídas é que os temas centrais dos episódios podem servir de base para pautas jornalísticas. Essa é uma questão mais ampla e

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até mesmo corriqueira para quem já lida com jornalismo e comunicação, mas ajuda a projetar possibilidades. Também é importante notar que eles rendem assuntos “quentes” e “frios”, no jargão da profissão, ou seja, factuais ou não. Apontamos a seguir a principal temática de cada capítulo, o que não indica necessariamente haver apenas uma por programa.

Tabela 8 – Lista de episódios e temas do Castelo Episódio Tema Episódio Tema 1 – Tchau, não! Até Amizade 47 – O feitiço vira contra o Ciência e amanhã! feiticeiro magia 2 – Qual é o seu planeta Comunicação 48 – O dia em que a Terra Tempo de origem? parou 3 – Meu nome é Caipora Natureza 49 – A escola vai até o Nino Escola 4 – Quem é quem aqui? Mentira 50 – Boatos Boatos 5 – A cidade dos meus sonhos Cidade 51 – TV Mania Ver TV 6 – Ligeiramente enjoado Alimentação 52 – Zula, a menina azul Preconceito 7 – Olha o passarinho Fotos 53 – Me dá um dinheiro aí Dinheiro 8 – Multiplicação Matemática 54 – Rá-Tim-Bum! Aniversário 9 – Ninguém gosta de mim Aniversário 55 – O tambor Bonga- Cultura bonga africana 10 – Tudo se transforma Reciclagem 56 – Lar, doce lar Família 11 – Eu prometo Política 57 – Pegadas pré-históricas Dinossauros 12 – Folias Espaciais Imaginação 58 – É proibido entrar com Animais animais 13 – Alguém viu meus sapatos? Tamanhos 59 – Raios e Trovões Desperdícios 14 – Luz, câmera, ação! Cinema 60 – O Tesouro dos Mapa de Desejos tesouro 15 – O som do silêncio Som 61 – A Caipora dá o fora Arrependi mento 16 – É taça, é raça, é Esporte 62 – Em busca do tempo Viagem no graça! perdido tempo 17 – O Rei Abacaxi Teatro 63 – Eugênio, o gênio Decisões 18 – Xi! Escapou o Saci! Folclore 64 – Todo dia pode ser Natal Brinquedos 19 – O Nino está ficando verde Saúde 65 – Alimentação Alimentação 20 – Tudo o que entra, sai Alimentação 66 – Quem canta, seus Música males espanta!

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21 – O Nino mudou Adultos 67 – Entrei de gaiato num veleiro Velejar 22 – Ciúmes, eu? Ciúmes 68 – Um sorriso eterno Mona Lisa 23 – Não engorda e faz crescer Alimentação 69 – Praia Praia 24 – Mágicas orelhudas Animais 70 – Cometa Dormir 25 – Bobeou, dançou! Dança 71 – Beleza Estética 26 – Pintou sujeira Pintura 72 – Uma onda no mar Rádio 27 – Leia, a Geleia do espaço Galáxias 73 – Lágrima de crocodilo Chorar 28 – Vou aparecer na TV Televisão 74 – Sonho Sonho 29 – Asas da imaginação Literatura 75 – Gincana de Páscoa Páscoa 30 – Feijão maravilha Plantas 76 – Gravidez Gravidez 31 – Quem é Capitão Baleia? Mensagens 77 – Asas Morte 32 – Tem alguém estranho Rios 78 – A Terra é uma esfera Formas aqui geométricas 33 – Com que roupa eu vou? Carnaval 79 – Nino x Nino Falsificação 34 – Levanta a poeira Faxina 80 – Dicionário Livros 35 – Quer parar de me olhar? Mau humor 81 – Leite Leite 36 – Felizes para sempre Contos de 82 – T de Tíbio, P de Ler e fadas Perônio escrever 37 – Pintou sujeira? Tá Corpo 83 – A Bolinha do Vestido Moda limpo! humano 38 – Quem procura, acha! Brincadeiras 84 – Ver para crer Coisas invisíveis 39 – Sempre cabe mais um Espaço 85 – Relações Familiares Família 40 – Pintou o maior clima! Climas 86 – O Palhaço que é? Circo 41 – Snif, snif, buá, buá, Água 87 – Extra, extra! Jornal plic, plic, chuá, chuá 42 – Uma babá nada boba Convívio 88 – Et cetera Timidez 43 – Travessura de cupido Paixão 89 – Lua/Sol Eclipse 44 – Bala de coco e doce Saúde 90 – O Dono do Castelo Arrependi- de leite bucal mento 45 – Sua majestade, o bebê Bebês Especial – Hora de Dormir Imaginação 46 – Meninos e meninas Guerra de ------sexos

3.1.2. Penélope, mais do que repórter

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Penélope é repórter de jornal e TV e, portanto, a personagem mais ligada ao jornalismo, a princípio. No entanto, nem sempre ela realiza atividades jornalísticas propriamente ditas, como fazer uma matéria ou levar informações à turma do Castelo. Em certos casos, atua como mediadora de situações e conflitos ou de outras formas, como mãe, atriz e convidada de festas, por exemplo. Claro, entendemos que ela nunca deixa exatamente de ser uma jornalista, pois essa é sua profissão, mas é interessante ver como Penélope tem outras funções na série.

Identificamos seus principais papéis em cada um dos 23 episódios em que aparece. Os resultados são: Jornalista (9 vezes – 39,1%); Mediadora de situações (7 vezes – 30,4%); Jornalista e mediadora de situações (2 vezes – 8,7%); Outros papéis (4 vezes – 17,4%); Jornalista e outros papéis (1 vez – 4,3%). Vejamos detalhadamente:

Tabela 9 – Principais papéis e atividades de Penélope por episódio Ep. Papel Atividades 4 Jornalista Conhece o Castelo 7 Jornalista Faz uma reportagem fotográfica 11 Mediadora Propõe uma eleição 17 Mediadora Ajuda a criar uma peça de teatro 22 Jornalista Convida todos a seu programa e o apresenta 28 Jornalista Fala sobre aparecer na TV e depois apresenta seu programa 29 Mediadora Tenta ajudar a encontrar alguns livros que sumiram 32 Jornalista Em seu programa, faz uma reportagem sobre poluição dos rios 35 Jornalista e Propõe brincadeiras e depois apresenta seu programa mediadora 39 Jornalista e Fazia reportagem sobre regiões superpovoadas e sugere que o mediadora pessoal saia do quarto de Nino para haver espaço para todos 46 Mediadora Propõe e participa de uma gincana de meninos contra meninas 51 Mediadora Ajuda Victor a enganar as crianças com a encenação de que há um monstro no Castelo, para tirá-las de frente da TV 52 Mediadora Ensina sobre preconceito 54 Outros Participa do aniversário de Morgana 57 Jornalista Passa para pegar um livro sobre dinossauros para uma reportagem 63 Mediadora Sugere fazer uma Festa Junina com os milhos gigantes 68 Jornalista Sente que algo de importante aconteceu no Castelo e ouve

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Victor contar sobre a visita de Leonardo da Vinci 73 Outros Diz que foi contratada como atriz e ensaia seu papel com a turma 75 Jornalista Em seu programa, revela uma das dicas da gincana de Páscoa, a pedido de Victor 76 Jornalista Faz uma matéria sobre as atividades do Castelo. Depois, grávida, e outros explica sobre ultrassonografia. Por fim, dá à luz, e Nino a visita 83 Outros Participa do desfile de moda do Castelo 87 Jornalista Sugere a criação do Jornal do Castelo e coordena as crianças 90 Outros Participa da festa de despedida do Castelo

Ao expandirmos um pouco a análise, como complemento, percebemos que outros personagens possuem relações indiretas e sutis com práticas jornalísticas. Talvez um dos mais marcantes seja o Zequinha, justamente em razão de seus repetidos “por quês?”. É bem verdade que esta é uma característica comum de crianças, mas vale frisar que a curiosidade, o espírito investigativo e a insatisfação com respostas prontas são qualidades fundamentais de um bom exercício do jornalismo.

Também é relevante observar Gato Pintado. Responsável pela biblioteca, ele já leu e conhece de cor todos os livros do Castelo – alguns dos principais do mundo. Portanto, é um intelectual e sempre fonte confiável de informação para as crianças. Isso nos remete tanto à credibilidade que os jornalistas têm popularmente (mesmo que recentemente isso tenha diminuído com a crise da profissão) quanto ao ato jornalístico de consultar e entrevistar especialistas em determinados assuntos.

Já o Relógio cumpre principalmente a função de avisar os moradores e visitantes sobre seus compromissos e horários de ir ao trabalho e terminar a brincadeira para voltar para casa ou dormir. Lembremos, então, que o jornalismo e os meios de comunicação no geral também são reguladores sociais do tempo. Exemplos: os jornais (ainda) são entregues e lidos nas manhãs; domingo é dia de ver futebol; “está na hora da novela das oito” (que geralmente não começa às 20h). E podemos ir além ao imaginar que, na perspectiva ecológica abordada no primeiro capítulo deste trabalho, os próprios veículos de comunicação deveriam no mínimo sugerir limites de consumo de conteúdo para seu público, ou seja, educá-lo criticamente.

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3.1.3. Contação de histórias

O ato de contar histórias é recorrente no Castelo e um dos objetivos básicos do jornalismo, mesmo que na profissão esteja geralmente ligado a casos verídicos. No programa, a personagem que mais relata acontecimentos não é a repórter Penélope, mas, sim, a bruxa Morgana. Isso se deve a seus 6 mil anos de idade e por ter participado dos principais eventos do planeta. Relacionada aos temas dos capítulos, a maioria das narrativas é feita no quadro Feitiçaria, para a gralha Adelaide e com o auxílio de objetos, adereços, magias e fotos e vídeos antigos.

Como curiosidade, no episódio 29 – “Asas da imaginação”, Penélope ajuda Morgana a discorrer sobre uma história de que estavam sumindo livros de um reinado. Então, as crianças daquele lugar descobriram que os guardas escondiam as publicações a mando do rei, que foi deposto, e tudo voltou ao normal.

Morgana conta histórias em 71 capítulos da série (78% do total), sem repetições. Na somatória, consideramos apenas as relatadas no quadro Feitiçaria e não incluímos conversas que fazem parte da narrativa central. Também tomamos como integrantes do referido quadro todas as vezes que bruxa aparece em seu quarto, com sua gralha, e relembra algum caso – quebrando a linearidade do episódio. Certas vezes, há a chamada inicial do Relógio: “morcego, ratazana, baratinha e companhia, está na hora da feitiçaria!”.

Tabela 10 – Histórias de Morgana no quadro Feitiçaria Ep. Tema da história Ep. Tema da história 1 Sentir medo 41 Casamento de Anfitrite e Netuno 2 Imagens rupestres 42 Teatro antigo 3 Chegada dos portugueses ao Brasil 43 Cupido 4 Guerra de Troia 44 Maria Borralheira 7 Fotografias 45 Moisés 8 Surgimento dos cálculos 46 Joana d‟Arc 10 Roupas antigas 47 Galileu Galilei 11 Surgimento da eleição 48 Chegada de Colombo à América

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12 Cadelas Laika, Belka e Strelka 50 Santos Dumont 13 Diferenças físicas humanas 52 Chica da Silva 14 Cinema e irmãos Lumière 53 Vida antes do dinheiro 15 Invenção dos carros 55 Zumbi dos Palmares 16 Pelé 57 Época dos dinossauros 17 Teatro grego 59 Domínio sobre o fogo 18 Marechal Rondon e os índios 60 Muralha da China 19 História das vacinas 62 Estações do ano 20 História do macarrão 63 Invasão de Napoleão a Moscou 21 Imperador Pu Yi 64 Bicicleta 22 Espada do Rei Arthur 65 Isaac Newton 23 História da batata 66 Mozart 24 Serenata 67 Érico, o Vermelho 25 Luís XIV, o Rei Sol 68 Fábula da lagarta, de Leonardo da Vinci 26 Pintura 69 Atlântida 27 Apollo 11 70 Charles Augustus Lindberg 28 Novelas de rádio 71 O Patinho Feio 29 História sobre livros que sumiram 72 Época do rádio (caso de Orson Welles) 30 Vida na pré-história 74 Sigmund Freud 31 Fidípides 78 Recipientes de vidro 32 Cleópatra 80 Marechal Rondon (flechada) 33 81 Rômulo e Remo 34 Jogar lixo no chão 82 Alfabetos 35 Como Morgana conheceu Adelaide 83 Hippies 37 Jogos Olímpicos 87 Escrita 38 Atenas e Esparta 88 Albert Einstein 39 Ida de Robert Peary ao Polo Norte 89 Rá, Deus do Sol 40 Amyr Klink e a viagem ao Polo Sul ------

Caipora também é reconhecida pela turma por sempre ter uma boa história para contar. A personagem conversa com as crianças sobre curiosidades da vida na mata e narra lendas indígenas no quadro Curumins, pouco recorrente na série.

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3.1.4. Mais informações e curiosidades

Podemos destacar mais três personagens cujos papéis se assemelham à prática jornalística: os cientistas Tíbio e Perônio e o garoto virtual Telekid. Em seus respectivos quadros, eles transmitem uma série de informações e curiosidades que complementam a narrativa principal de cada episódio e que facilmente poderiam ser trabalhadas em diversas pautas.

Os irmãos gêmeos naturalmente discorrem sobre temas com um ponto de vista mais “científico”, porém sempre em tom engraçado e divertido. São experimentos simples e interessantes. O quadro da dupla aparece 34 vezes no Castelo (37,7% dos capítulos), sendo 28 exibições inéditas e seis reprisadas. Isso aconteceu porque, devido ao sucesso, o programa ganhou 20 novos episódios, no entanto o cenário do laboratório já havia sido desmontado e dado lugar a outra gravação da emissora.

Tabela 11 – Experimentos de Tíbio e Perônio Ep. Tema do experimento Ep. Tema do experimento 1 Batidas do coração 45 Tato 4 Função da língua (órgão) 46 Olfato 6 Digestão 51 Pegadas/impressão digital 7 Sombras 52 Como os peixes dormem 12 Ninhos de pássaros 56 Comparação entre animais 13 Ovos de aves 58 Borboletas 19 Micróbios 61 Sementes de frutas 22 Perspectiva 62 Ampulheta 23 Bicos dos pássaros 65 Articulações 26 Cores 69 Pérolas 27 Dia e noite 70 Perspectiva (reprise) 31 Sons 71 Borboletas (reprise) 37 Esqueleto 79 Levantar coisas pesadas 40 Vento 80 Sombras (reprise) 41 Estados da água 85 Ampulheta (reprise) 42 Equilíbrio 86 Equilíbrio (reprise) 44 Dentes de leite 89 Dia e noite (reprise)

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O quadro do Telekid justamente surge a partir dos “por quês?” de Zequinha. O personagem não apenas responde a uma questão central, como dá exemplos relacionados e traz curiosidades acerca do tema. Telekid é uma fonte confiável de informação – apesar de não interagir com a turma, mas somente com o espectador –, pois consulta seu aparelho eletrônico para descobrir e transmitir as respostas. Todas as 36 perguntas, uma em cada episódio (40% do total), fazem parte da rotina das pessoas e também são exemplos de inspiração para matérias jornalísticas.

Tabela 12 – Temas do quadro do Telekid Ep. Por que será que... Ep. Por que será que... 3 ... o ar das matas é mais puro que 44 ... temos cárie no dente? o das cidades? 5 ... existem prédios? 48 ... o mar sobe na areia? 8 ... tem areia na praia? 55 ... quando a gente anda de trem as árvores parecem correr? 12 ... o céu muda de cor? 57 ... não tem dinossauro no zoológico? 14 ... tem gente que usa óculos? 58 ... a vaca está sempre mastigando? 16 ... é importante fazer ginástica? 64 ... a gente precisa dormir? 17 ... as flores são perfumadas? 68 ... a gente não consegue enxergar tudo a nossa volta? 18 ... os animais andam pelados e 73 ... quando choramos cai lágrima? não sentem frio? 24 ... a galinha bota ovo? 75 ... não devemos comer muito chocolate? 25 ... a chuva é importante? 76 ... nós crescemos? 28 ... a gente não consegue entrar 79 ... quando é noite no Japão aqui dentro da TV? no Brasil é dia? 29 ... o olho pisca? 81 ... os bebês tomam leite? 30 ... as folhas das árvores caem? 83 ... a moda muda? 33 ... as pessoas não gostam de 84 ... a nossa cabeça não para de barulho? pensar? 36 ... a cabeça pensa coisas que não 87 ... o jornal é importante? existem?

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38 ... a pipa não cai do céu? 88 ... ficamos vermelhos? 39 ... a cidade é cheia de gente? 89 ... a Lua muda de forma? 42 ... as pessoas falam em línguas 90 ... o cachorro põe a língua para diferentes? fora?

3.1.5. Apuração

Dois personagens do Castelo nos remetem ao tema da checagem de informação e fake news, de que tanto se fala nos últimos anos com a disseminação virtual de matérias intencionalmente mentirosas. Dr. Abobrinha e a cobra Celeste nos fazem refletir sobre esse cenário e a necessidade do questionamento por parte das crianças, como já falamos nos tópicos acima.

Abobrinha quer ser o dono do Castelo por meio de trapaça e usa os mais diversos disfarces para tentar enganar a turma. Para o espectador, sempre fica claro que o especulador imobiliário está fazendo mais uma investida. Suas fantasias são criativas e engraçadas, mas sempre há alguma vestimenta original à mostra, como os sapatos ou a barra da calça quadriculada. Ou seja, a mentira deixa vestígios.

Então, podemos extrair como é importante estimular na garotada a busca pelo verdadeiro/falso, sobretudo para ajudar a preparar cidadãos críticos. E isso também pode ser feito pelo próprio jornalismo infantil, como por meio de pequenas adivinhações, por exemplo (falaremos um pouco mais sobre jogos no tópico seguinte). Para ilustrar, vejamos os disfarces do personagem:

Tabela 13 – Disfarces do Dr. Abobrinha Ep. Disfarce Ep. Disfarce 14 Diretor de cinema 54 Dr. Victor 19 Médico 59 Inspetor de água e energia 25 Bongô 64 Criança e Papai Noel 28 Penélope 79 Nino 31 Capitão Baleia 80 Vendedor de livros 44 Dentista 82 Perônio 49 Professor 86 Dono de circo

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53 Realejo da Sorte e apresentador 90 Sorveteiro de concurso

Celeste também merece destaque. Por ser uma cobra, é fofoqueira e gera intrigas com informações duvidosas sobre outros colegas ou determinadas situações. No entanto, se por um lado conta fofocas, por outro ela sabe de coisas que ninguém viu, já que sua localização na árvore do hall principal do Castelo permite estar atenta a quase tudo o que acontece. Porém, nem sempre a turma lhe dá atenção, justamente pela fama de causar discórdias. E mais uma vez essa questão da credibilidade nos remete ao exercício do jornalismo.

Um capítulo que exemplifica muito bem esse assunto é o 50 – “Boatos”. Em um diálogo despretensioso, Bongô diz para Nino que adora viajar de trem. Todavia, Gato Pintado – que mesmo assim enfatizamos acima como fonte confiável de conhecimento – entende que o entregador de pizzas havia convidado o aprendiz de feiticeiro para uma viagem. Esse boato se espalha de boca em boca até que se torna: “todo o pessoal do Castelo foi convidado por Bongô para viajar de avião pelo Brasil”. A turma inteira faz as malas e espera pelo amigo, que chega sem entender a situação e, então, explica a confusão. Por fim, Gato confessa seu equívoco.

3.1.6. Jogos

Já pontuamos brevemente como uma adivinhação poderia ser usada em uma reportagem para estimular o senso crítico na descoberta do que é verdadeiro ou falso. E aqui veremos como o jogo é uma das características marcantes do Castelo Rá-Tim-Bum, também transmitindo conhecimento. Vamos nos ater apenas às brincadeiras que estimulam a fundo uma resposta dos espectadores, mesmo que apenas mental. Mas vale citar que os personagens brincam entre si em todos os episódios, o que também impulsiona reações no público.

Um dos jogos mais marcantes e recorrentes são as senhas do Porteiro. Em 84 capítulos (92,3% do total), o robô autoriza a entrada de visitantes, sobretudo das crianças, mediante a imitação de animais, pessoas, movimentos ou o acerto de charadas – sempre relacionados ao tema da narrativa. Em pouquíssimas ocasiões,

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o boneco de lata dá lugar a outro ser ou bicho do Castelo, que igualmente propõe desafios.

Tabela 14 – Senhas para entrar no Castelo Ep. Senha Ep. Senha 2 Jogar bola com uma bola invisível 45 Engatinhar como um bebê 3 Dançar como os índios 46 Dar as mãos e os mesmos passos 4 Dançar uma valsa romântica 47 Quem é o filho do seu pai e da sua mãe, mas não é seu irmão? 5 Imitar um carro 48 Girar como um planeta 6 Mexer o corpo de jeitos diferentes 49 Dançar 7 Imitar as três idades do homem 50 Imitar meios de transporte 8 Pular amarelinha 51 Imitar um comercial de TV 9 Imitar um canguru 52 Gritar “Ninooo!” 10 Dançar sem música 53 Cantar uma música sobre dinheiro 11 (Preencher um formulário, a 54 Cantar “Parabéns a você” mando de Celeste) 12 Andar como na Lua 55 O que algumas tribos africanas usavam como telefone? 13 Dar passos de gigante 56 O que o irmão da nossa mãe e o filho do irmão da nossa mãe é da gente? O que a mãe da nossa mãe é do nosso pai? 14 Imitar personagens de cinema 57 Imitar macacos 15 Imitar bichos 58 Imitar bichos do zoológico 16 Fazer ginástica 59 Imitar um robô 17 Imitar as máscaras de teatro 60 (Pede para fecharem os olhos e dá as coordenadas até a Celeste) 18 Fazer o som de “hm” 61 Quantos habitantes o Castelo tem? 19 Sussurrar 63 (A senha é não ter senha alguma) 21 Imitar aves 64 Imitar o presente de Natal desejado 22 Pular sela 65 De qual fruta os macacos gostam mais? 23 Fingir que come algo 66 Cantar as sete notas musicais 24 Imitar um coelho 67 Com quantos paus se faz uma canoa? 25 Imitar o Bongô 68 Dizer o nome de um pintor famoso 26 Imitar uma cor 69 Imitar uma gaivota

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27 Imitar um cometa 70 Imitar alguém roncando 28 Imitar uma TV desligada 72 O que foi inventado primeiro: a TV, o rádio ou o telefone? 29 Piscar os olhos 73 Quantos dedos tem o ser humano? 30 Imitar um jardim 74 Contar um sonho 31 (Bilhete misterioso: Capitão Baleia) 75 Nomes de três coelhos famosos 32 Remar 76 Cantar uma canção de ninar 33 Cantar uma música de Carnaval 77 Dizer nomes de passarinhos 34 Fingir varrer o chão 79 Quais as capitais do Brasil e Japão? 35 Andar em câmera lenta 80 Nome do livro que tem os significados das palavras 36 Adivinhar a história (João e Maria) 81 Dizer derivados do leite 37 Dizer uma parte do corpo humano 82 5 palavras que começam com A 38 Imitar um bicho com uma mão 83 Fazer sinais com as mãos 39 Pular para se aquecer 84 (Deixa entrar sem senha) 40 Imitar uma estátua 85 Quem é o pai do pai do primo? 41 Imitar alguém nadando 86 Imitar artistas de circo 42 Imitar bebês 88 Andar sem fazer barulho 43 Dar um abraço e um beijo 89 Dizer as fases da Lua 44 Entrar mole como o dente do Zequinha Esp. Cantar uma canção de ninar

Mau e Godofredo também são importantes com relação aos jogos no programa. A dupla propõe em seu quadro diversos trava-línguas e charadas com palavras. Aparecem crianças reais respondendo, e os bonecos também direcionam os desafios para o espectador. Mau sempre diz que, se alguém errar, ele soltará sua temida “gargalhada fatal”.

Identificamos e apresentamos a seguir 35 inserções do quadro (38,5% dos episódios). Em outros capítulos da série, Mau lança também alguns enigmas à turma do Castelo, durante a narrativa principal.

Tabela 15 – Charadas e trava-línguas de Mau e Godofredo Ep. Desafio Ep. Desafio 1 Tem 5 dedos e não é de carne e unha 31 Palavras que rimam com “Mau”

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2 “Um tigre, dois tigres, três tigres” 34 Palavras que rimam com “bonitão” 4 Palavras que rimam com “rir” 45 Palavras que rimam com “chulé” 5 “A aranha arranha a jarra” 49 “O pinto pia, a pia pinga” 6 Qual é o contrário de doce? 50 “Três tigres nos trilhos do trem” 8 Palavras que começam com “pro” 52 “Quando digo digo, não digo Diogo. Quando digo Diogo, não digo digo” 9 Palavras que terminam com “reiro” 54 “O padre Pedro tem um prato de prata” 13 Qual é o contrário de grande? 55 Palavras que começam com “tra” 15 Palavras que começam com “im/n” 57 Palavras que rimam com “ia” 16 “Quatro quadros quadrados, 63 “Quem a paca cara compra, paca quatro quadros quebrados” cara pagará” 18 Qual é o contrário de mal criado? 69 Qual é o contrário de frio? 20 Qual é o contrário de forte? 72 Palavras que rimam com “mentira” 21 Qual é o contrário de impossível? 73 Antônimos de alegre, leve e riso 23 Palavras que rimam com “dor” 75 Repetir a palavra “orelha” 25 Palavras que rimam com “trovoada” 76 “Luzia lustrava o lustre listrado” 26 Palavras que rimam com “imaginar” 77 Palavras que rimam com “gente” 29 “Troca o trigo e traz o troco” 88 Qual é o contrário de claro? 30 “Pinga a pipa dentro do prato, pia ------o pinto e mia o gato”

Por fim, ainda destacamos o quadro das fadinhas Lana e Lara. Elas sempre têm algum conflito, situação ou dúvida que precisa ser resolvida. Assim, como normalmente uma delas sabe a melhor solução, propõem desafios entre si e pedem a ajuda do espectador. De modo geral, essas charadas envolvem a identificação de objetos e imagens que estão fora de seus grupos característicos.

O quadro das irmãs é exibido 28 vezes na série (30,8% dos capítulos), com poucas reprises. Também são raras as vezes que a dupla se relaciona com os demais personagens para auxiliá-los, mas, quando acontece, não há charadas.

Tabela 16 – Desafios de Lana e Lara Ep. Tema do desafio Ep. Tema do desafio 2 Objetos escondidos 34 Objetos de faxina 10 Separar o lixo 35 Desenhos de castelo de cartas

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11 Roupa de rainha e de presidenta 36 Insetos que picam 15 Brinquedos e seus barulhos 39 Locais onde cabem pessoas 17 Erros em uma figura 41 Ciclo: água, nuvem e chuva 18 Bonecos folclóricos e partes ausentes 51 Objetos que fazem barulho 20 Partes subterrâneas e comestíveis 53 Coisas com forma de círculo de plantas 21 Ordem: bebê, criança e adulto 54 Ingredientes para fazer bolo 22 Mímica de brinquedos 60 Organização de objetos 24 Animais que botam ovo 67 Barcos a vento e a motor 27 Objetos úteis na chuva 74 Coisas de comer 29 5 coisas que têm perna 77 Ordem do crescimento da planta 30 Coisas de comer 79 Objeto que falta num grupo 32 Objetos ausentes 87 Roupa de rainha e de presidenta

Esses exemplos lúdicos, tão marcantes no Castelo Rá-Tim-Bum, nos levam a concluir que a utilização de jogos em produções jornalísticas para crianças também pode ser importante. Aliás, matérias do gênero, as chamadas newsgames, já existem na imprensa e são objetos de estudo de pesquisadores. Mais um motivo, portanto, para explorar este universo no contexto infantil.

O gosto pelos jogos e brincadeiras em si acompanha a história da humanidade. É curioso notarmos que, segundo o pensador tcheco Ivan Bystrina (1995), o jogo é uma das quatro raízes da cultura (assim como o sonho, os estados alterados de consciência e as variantes psicopatológicas). Ou seja, é algo inato do ser humano em suas relações culturais. O autor diz: “Os jogos têm a finalidade de nos ajudar na adaptação à realidade, além de facilitar sobremaneira o aprendizado, o comportamento cognitivo” (BYSTRINA, 1995, p. 15).

Segundo os estudos do intelectual francês Roger Caillois (1990, p. 32), os jogos podem ser separados em quatro grandes categorias, conforme suas características. Basicamente, são jogos de Agôn (competição), Alea (sorte), Mimicry (simulacro) e Ilinx (vertigem). Eles também se misturam, dependendo da proposta lúdica.

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Assim, não é difícil perceber que, no Castelo, a maioria das brincadeiras gira em torno da competição (acertar um desafio primeiro que um amigo para conseguir algo) e da mimese (imitar alguma coisa, repetir um trava-língua). Aqui não sugerimos que uma prática jornalística utilize exatamente esses dois grupos ou os demais indicados por Caillois, mas eles podem servir de referência.

3.1.7. Músicas

A última característica marcante do Castelo que destacamos é a forte presença musical. Dos 26 quadros identificados e citados no capítulo anterior, pelo menos 11 têm relação íntima com a sonoridade. Os mais famosos são: Como se Faz, Lavar as Mãos, Que Som É Esse? e Ratinho. Completam a lista: Caixinha de Música, Clipe Musical, Dedolândia, Lareira, Músicas do Mundo Todo, Pianola e Radialista.

Não é por acaso que as músicas do programa ficaram gravadas na memória dos fãs pela associação com tomar banho ou lavar as mãos, por exemplo. O músico Hélio Ziskind explicou um pouco esse processo vinculativo e criativo em uma entrevista para o canal Sounds Two Inspire, do YouTube, em 2016:

“Foi um processo, assim, de eu descobrir em mim o que que a canção, qual era o caminho que ela tinha que tomar. Não de ela ser educativa, mas de ela ser uma coisa que cristaliza uma emoção. Toda vez que você passar pela canção, você vai entrar em contato com aquele negócio” (ZISKIND, 2016, grifo nosso).

Entendemos que em todos esses quadros as músicas não são exclusividade, pois estão acompanhadas de imagens visuais, mas nem por isso elas deixam de ter um papel fundamental de vínculo. Aliás, a própria vinheta da série é marcante pelo bordão “Bum! Bum! Bum! Castelo Rá-Tim-Bum!”. Sem contar a presença sonora na narrativa principal dos capítulos, com brincadeiras e aventuras entre os personagens, sobretudo o entregador de pizzas Bongô, o mais musical de todos.

3.2. Bases do Jornalismo Rá-Tim-Bum

O objetivo aqui não é criar um novo estilo de jornalismo, mas apenas estimular reflexões sobre a atividade e sugerir inspirações para a produção voltada às

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crianças e com elas. Da mesma forma, “Jornalismo Rá-Tim-Bum” não vem substituir ou ressignificar “jornalismo infantil”. O termo somente indica a fonte da discussão e proposta, que é o Castelo Rá-Tim-Bum e sua base e contexto históricos.

A questão principal é como o jornalismo (englobando prática e profissionais) pode fortalecer e construir mais vínculos com a garotada. Por meio da análise do Castelo, resumimos a seguir algumas das formas possíveis para isso acontecer – e não quer dizer que uma matéria tenha que necessariamente abarcar todos os pontos.

- Assunto de criança. A enorme variedade de temas do programa mostra que é possível falar de tudo ou praticamente tudo com as crianças. Até mesmo a morte e a gravidez – que geralmente são tabus com os pequenos – foram tratadas no programa. Ou seja, de maneira lúdica e curiosa, o jornalismo pode levar ao público infantil até mesmo materiais sobre guerra, por exemplo.

- O papel do jornalista. Por meio dos diversos personagens, percebemos que a tarefa do jornalista pode ir além do ato de apenas transmitir informação. O profissional também pode ser um provocador das crianças, estimulando o senso crítico e a busca pelo saber e pela compreensão do mundo. Enfim, cabe-lhe assumir a responsabilidade social com o público infantil.

- Apuração e descoberta. Este tópico está associado ao anterior. Nem precisaríamos mencionar ou fazer o lembrete que todo jornalista deve realizar uma boa apuração de informações para divulgar uma matéria, mas a opinião atual de especialistas indica que essa prática está em falta recentemente no Brasil, ao menos. Mais do que isso, reforçamos que o jornalismo infantil deve ajudar a formar cidadãos críticos e curiosos, incitando na meninada uma atitude interrogativa, o prazer pela descoberta e pela apuração de dados.

- Brincar. O consumo de materiais jornalísticos pode se dar por meio de experiências lúdicas e divertidas. Não consideramos que seja necessariamente um problema para a criança ler algum texto (se for alfabetizada) e assistir a uma entrevista, mas, junto a isso, também seria interessante oferecer algum jogo,

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charada, adivinhação ou outro instrumento que a faça ter satisfação. Enfim, absorver uma reportagem, por exemplo, não precisa ser algo massivo, cansativo e burocrático.

- Sons. O Castelo também mostra que a estimulação sonora é possível e importante para o universo infantil. Ou seja, o jornalismo para crianças pode ir muito além de oferecer um texto insípido sobre a agenda cultural do fim de semana ou se basear apenas em ilustrações visualmente perfeitas. Pelo programa, percebemos como o som é um grande meio de vinculação e pode ser utilizado em produções jornalísticas infantis.

- Criança quer falar. Este é talvez o tópico mais importante desta reflexão. O Castelo escancara o desejo expressivo das crianças. Além de querer simplesmente aparecer na TV, vimos que na série as crianças têm uma participação mais profunda nas atividades produzidas e se divertem ao fazer um jornal, um programa de rádio, uma peça de teatro, cenas de um filme etc. É a diversão por se comunicar, por se vincular ao outro. E a pesquisa nos mostra que o escasso jornalismo infantil brasileiro atual não explora esse potencial.

De forma alguma queremos que as crianças sejam pequenas repórteres ou que haja algo parecido com trabalho infantil. Mas, em primeiro lugar, deve haver um exercício de humildade do jornalismo em ouvir os desejos e opiniões da meninada. E percebemos que as crianças têm muito a contribuir com um processo jornalístico, gerando conteúdos que despertem interesse até dos adultos. Os exemplos educomunicativos, como vimos, provam que isso é possível.

Não queremos excluir ou invalidar um jornalismo infantil sem a participação de seu público, com materiais já prontos. No entanto, acreditamos que essa troca entre profissionais e meninos e meninas pode ser rica e beneficiar a todos. Por isso, pensamos que os ambientes educativos, como colégios e ONGs, podem ser os mais propícios para essa relação acontecer. É a vinculação tríade entre jornalismo, escola e criança. É o estímulo da criação de vínculos entre a garotada e dela com comunicadores, professores, familiares, ou seja, com o mundo.

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3.3. Esboço de uma aplicação

É possível deduzir de antemão que há infinitas possibilidades a partir das características que apontamos, sem contar tantas outras práticas válidas para a produção de jornalismo infantil. Portanto, vamos apenas esboçar uma ideia para de algum modo ilustrar a discussão apresentada.

Utilizaremos um exemplo de produção para um site, no intuito de aproveitarmos as opções oferecidas pela hipermídia, mas essa não é uma regra ou recomendação. A pesquisadora Lucia Leão diz que a hipermídia “(...) é uma tecnologia que engloba recursos do hipertexto e multimídia, permitindo ao usuário a navegação por diversas partes de um aplicativo [site etc.], na ordem que desejar” (LEÃO, 2005, p. 16).22

Então, imaginemos o cenário em que um jornal de bairro, impresso e digital, possui uma seção infantil, porém, após realizar uma pesquisa, descobre que a satisfação do público não é exatamente a esperada. Assim, a empresa decide fazer uma parceria com uma escola da região. Um dos principais objetivos é que os alunos interessados em participar do projeto produzam um material jornalístico com os profissionais. Muito além disso, o senso crítico da garotada deve ser estimulado a todo momento.

Em primeiro lugar, a equipe de jornalistas, comunicadores e professores realiza encontros com os estudantes para apresentar a proposta e contar um pouco sobre o que é fazer jornalismo. A turma da escola deverá produzir uma edição especial do jornal. Após alguns debates, o tema escolhido pela meninada foi a Copa do Mundo de Futebol Masculino de 2018, que se realizará dentro de alguns meses, com sede na Rússia.

22 “O hipertexto é um documento digital composto por diferentes blocos de informações interconectadas. Essas informações são amarradas por meio de elos associativos, os links” (LEÃO, 2005, p. 15). A autora também afirma que o termo multimídia, entre suas definições, engloba “a incorporação de informações diversas como som, textos, imagens, vídeos etc., em uma mesma tecnologia (...)” (LEÃO, 2005, p. 16).

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O trabalho dos profissionais ainda é principalmente um exercício de mediação, provocação, orientação e participação na produção. São mostrados exemplos de coberturas prévias de grandes eventos esportivos. Também é interessante que os alunos aproveitem os conteúdos de diferentes disciplinas para pensar a publicação. O Português é necessário para redigir; as aulas de Artes podem ajudar na criação de infográficos e ilustrações; com a Matemática é possível extrair os dados estatísticos; Ciências incitam a curiosidade sobre o corpo de um atleta; da disciplina de História podem vir contribuições sobre o passado da Rússia e Copas anteriores; na Geografia podem ser estudados os mapas e características físicas do país-sede; Educação Física aborda o esporte em si. São diversas possibilidades, e cada pequeno grupo de alunos trabalha sua pauta, sob responsabilidade de um repórter, editor, fotojornalista etc.

O projeto cresce, e a edição não será apenas veiculada na versão impressa para o bairro, mas haverá ainda um material especial para o portal do veículo. A equipe da empresa de comunicação mostra as formas possíveis de trabalhar o jornalismo no ambiente virtual – e programadores de site ajudarão na parte técnica. Quatro estudantes questionam o fato de a Copa do Mundo de Futebol Feminino não ter o mesmo destaque na imprensa e não ser tão conhecida pelas pessoas. Assim, decidem elaborar um quiz para os leitores refletirem sobre o tema.

O quarteto faz um levantamento de informações, curiosidades e dados históricos para elaborar perguntas comparativas entre os torneios dos dois sexos e formular as alternativas do jogo. Há questões como: local e data das últimas edições das Copas; Seleções campeãs; artilheiros e artilheiras; escalações do Brasil; clubes de atletas brasileiros; diferenças de salários e premiações; entre outras. Após cada resposta, certa ou errada, haverá uma explicação sobre o item correto.

Todos esperam menos acertos sobre o futebol feminino. Dessa forma, outro grupo de alunos, também com a ajuda de professores e comunicadores, decide ouvir as opiniões de crianças e especialistas sobre esses preconceitos e diferenças de valores entre ambos os gêneros no esporte e no futebol especificamente. As entrevistas serão disponibilizadas em áudio e em vídeo.

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Entre tantos textos, gravações, busca de informações e debates, um grupo decide aproveitar a aula de Música para criar uma canção sobre a Copa, baseada nos dados colhidos pelos colegas, que estará na reportagem do site. A harmonia da composição é feita com sons do próprio corpo – batidas de mãos e pés, estalar de dedos, assovios e outros barulhos com a boca – e sua interação com uma bola, ao chutá-la, quicá-la, espalmá-la e batê-la na trave. E, claro, somente um instrumento musical pode ser usado: a vuvuzela...

Uma proposta como essa mostra como pode ser enriquecedora a parceria entre colégio e veículo de comunicação, deixando o aluno como protagonista do processo. Todas as partes ganham: ambas as instituições, com um fortalecimento de marca e bons frutos a seus públicos; os estudantes, com a oportunidade de experiência, reflexão e expressão. A comunidade escolar e do bairro se beneficia com um material diferenciado e pouco visto nos meios de comunicação. Enfim, essa maior vinculação entre imprensa, escola e criança contribui para as práticas jornalísticas e formação de cidadãos críticos.

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Considerações finais

A pesquisa sobre a existência atual de jornalismo infantil no Brasil comprova a percepção prévia de escassez do setor. Antes disso, os dados do IBGE já expõem as diversas dificuldades sociais às quais as crianças brasileiras estão submetidas – como falta de saneamento básico, acesso à educação etc. No entanto e muito pelo contrário, esse lado negativo não diminui a responsabilidade que o jornalismo tem com uma parcela da população.

Vale relembrar que, em 2015, o país tinha 43 milhões de pessoas entre 0 e 14 anos, segundo o IBGE (2016, p. 37), que equivalia a 21% dos habitantes. Se essa garotada lê, assiste ou ouve algum tipo de conteúdo jornalístico, muito provavelmente consome o que não foi produzido para ela, mas, sim, para adultos. Ou seja, a linguagem, a oferta e os interesses podem não ser os adequados.

As buscas entre os principais veículos de comunicação do Brasil revelaram somente 13 jornais (impressos/online), duas revistas e um programa de TV nitidamente voltados a levar informação cotidiana às crianças. Esse número nos parece insuficiente para um universo de 43 milhões de cidadãos em formação. Isso sem considerarmos a questão qualitativa de cada um deles.

Também não é novidade que o jornalismo há anos passa por um momento delicado de corte de verbas, demissões e precarização. Porém, isso não pode servir de desculpa para uma omissão profissional. Dos cerca de 250 canais de TV disponíveis no país, desconsiderando as emissoras afiliadas, são cerca de 20 (e por assinatura) destinados exclusivamente aos pequenos, mas o único exemplo jornalístico é o programa Repórter Rá Teen Bum. E pior: ele nasce da iniciativa de uma ONG holandesa.

Mesmo assim, vimos que esses canais transmitem desenhos e outros programas de entretenimento; há músicas e filmes para crianças; jogos de celular, computador e brinquedos são febres; é inegável a alta audiência dos canais no YouTube para a

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meninada. Mas... e o jornalismo? Publicar textos sobre a agenda cultural infantil do fim de semana não nos parece suficiente.

Outro fator que nos gera incômodo é a revista O Tico-Tico ainda ser considerada o maior exemplo de jornalismo infantil que o Brasil já teve. Não queremos tirar seu mérito justo, porém ela deixou de circular semanalmente em 1957 e definitivamente em 1977. É preocupante não haver nenhum outro exemplo de grande destaque entre a população e especialistas após mais de 40 anos.

E é curioso relatar duas experiências pessoais que aconteceram no fim da produção deste trabalho, durante o mês de março de 2018, que ajudam a materializar esta pesquisa, mesmo que elas não tenham sido projetadas intencionalmente para isso.

A primeira delas é que fui convidado para auxiliar cerca de 80 alunos do 9º do Ensino Fundamental (média de 14 anos de idade) da Escola Estadual Deputado Raul Pilla na implantação de um jornal mural. A escola está localizada em São Miguel Paulista, extremo leste de São Paulo (SP), uma região periférica e com diversos problemas sociais.

Os alunos estudam em período integral, desenvolvendo projetos nas tardes. A ideia de um jornal mural partiu deles. Para conciliar agendas e demais compromissos, fiz dois encontros com a turma, de aproximadamente 3 horas cada, para conversarmos sobre comunicação e jornalismo, mostrar alguns exemplos e possibilidades, mas sempre lhes deixando autonomia de escolha na execução do projeto.

Já adolescente, a garotada nunca havia ouvido falar de jornalismo infantil e não sabia citar exemplo algum. Segundo os estudantes, eles consumiam jornalismo por meio de alguns telejornais gerais e programas esportivos e policiais/de tragédia. No entanto, ao mostrar em um slide da apresentação uma capa da Revista Recreio, a entoação de surpresa e reconhecimento foi unânime na sala. Ou seja, a maioria em determinado momento da vida teve contato com a revista ou soube de sua existência, mas sequer recordava – e isso é um problema.

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No mesmo período, eu ingressei como auxiliar de classe no Colégio Certus, localizado em Interlagos, zona sul da capital paulista. É uma escola particular, em uma região de grande mistura de condições sociais. No geral, os alunos são de classe média. Em parceria com as professoras de redação, tive a oportunidade de dar algumas aulas sobre notícia e crônica para três turmas do 7º ano do Ensino Fundamental (entre 11 e 13 anos de idade).

Ao falar de jornalismo e jornalismo infantil, as respostas dos alunos foram muito parecidas com as da garotada da E.E. Raul Pilla. Alguns citaram gostar de documentários sobre animais, canais no YouTube sobre jogos e a revista Capricho – mais voltada para fofocas infantojuvenis. No entanto, o esquecimento e seguida recordação sobre a Recreio foram os mesmos. Um garoto até disse ter guardadas algumas edições antigas. Esse cenário comprova a pouca vinculação entre jornalismo e criança e ao mesmo tempo a empolgação da meninada com a possibilidade de produzir um jornal ou algo do tipo.

Os alunos prontamente associaram o Repórter Rá Teen Bum, quando exposto também como exemplo, ao Castelo Rá-Tim-Bum, pela pronúncia do nome. E realmente é algo especial um programa com mais de 20 anos de estreia e encerramento permanecer vivo no contexto cultural das pessoas, incluindo as que só o conhecem por reprises ou produtos derivados.

Aliás, a pesquisa evidencia outra crítica: a falta de atrações infantis publicamente reconhecidas por sua qualidade após o Castelo – tal como aconteceu com seus antecessores. Mais uma vez pontuamos que provavelmente só o Cocoricó atingiu esse patamar. Aliás, esse foi um dos pontos unânimes abordados pelas fontes entrevistadas quando fiz o TCC de jornalismo sobre os 20 anos do Castelo: “o que foi feito depois dele? Nada”, muitos resumiram. Ainda assim, a situação do jornalismo infantil e de O Tico-Tico parece mais delicada.

A análise do Castelo mostrou como a série pode contribuir para se pensar um projeto de jornalismo voltado para crianças e feito por e com elas. São inúmeros os exemplos criados pelos próprios personagens, que revelam a profunda vontade da

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meninada de produzir algo comunicativo ou participar de um trabalho do gênero com profissionais. Acreditamos que justamente falta aos veículos de comunicação aproveitar esse encantamento dos pequenos. E as tantas outras características do programa, destacadas também nas tabelas, podem ainda servir de base para ilustrar possíveis atividades ou pautas jornalísticas, além de pesquisas e instrumentos pedagógicos.

A busca por essa produção de jornalismo e participação da garotada faz nos lembrarmos do nome do quadro “Senta que lá vem história”, do Rá-Tim-Bum. Em nosso contexto, adaptaríamos a frase para “levanta pra fazer história” (com o perdão da norma culta da Língua Portuguesa). É mais um alerta para que os jornalistas retomem seu papel de responsabilidade com o público infantil, que acaba consumindo matérias para adultos.

Mas também é um incentivo para que as crianças criem suas histórias com os profissionais e que estes saibam acima de tudo ouvir suas vontades e interesses. Esse tom de protagonismo da meninada ainda nos remete à ideia trabalhada pelo comunicólogo Norval Baitello Junior no livro “O pensamento sentado: sobre glúteos, cadeiras e imagens”. De forma muito resumida, Baitello Junior (2012) justamente fala sobre o ato de sentar como uma sedação do pensamento e das experiências e atitudes humanas.

“Nossas escolas se tornaram ao longo dos séculos instituições mestras em domesticar a inquietude natural de nossas crianças. Anos e anos são gastos para uma lição magna: ensinar a sentar e permanecer sentado, preferencialmente com as mãos também em repouso. Esse passa a ser o pressuposto maior de qualquer outro conteúdo de aprendizagem. O processo educacional, tal qual se configura hoje, funda-se sobre uma escolarização para a redução e para a simplificação do indivíduo” (BAITELLO JUNIOR, 2012, p. 138).

É ainda contra esse panorama que o jornalismo pode contribuir, não apenas cumprindo seu papel de levar informações relevantes para a população, mas com a oferta de experiências lúdicas sobre o cotidiano e o incentivo da busca pelo saber na criançada. E a escola é uma entidade fundamental nesse processo e possibilidade. Parece-nos o melhor ambiente para ocorrer toda essa vinculação proposta. As experiências educomunicativas já mostram como isso é possível e gera bons frutos.

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Resta a imprensa querer assumir de fato seu compromisso com um público que foi esquecido por ela.

Isso faz parte do processo da ecologia da comunicação, tratada por Vicente Romano (2004) e apresentada no primeiro capítulo. É pensar nas responsabilidades e impactos profissionais que interferem no cotidiano e consciência das pessoas. Esse papel crítico e honesto dos veículos de comunicação com os adultos e principalmente com as crianças já é previsto há décadas por documentos internacionais assinados por diversas nações. As atitudes de omissão e covardia quanto à produção e oferta de conteúdo são inaceitáveis.

Para finalizarmos, vamos refletir um pouco sobre a epígrafe deste trabalho: “Deixai que venham a mim as criancinhas”, uma das frases cristãs mais conhecidas. O trecho é peculiar por seus sentidos e pela reflexão que pode provocar, independentemente de questões religiosas. Por um lado, Jesus demonstrou ternura e carinho ao se referir à criançada. Por outro, também se dirigiu, em tom de acolhimento, a todas as demais pessoas que se assemelhassem aos pequenos enquanto pureza, simplicidade e humildade.

Com esta mensagem milenar, nos parece ainda mais urgente a necessidade de voltarmos nossas atenções à garotada e a suas necessidades, escolhas e opiniões e aprendermos com elas. Além disso, da mesma forma surge a crítica de que em algum momento os adultos deixaram algo importante da infância para trás. Este trabalho é sobre todo esse resgate.

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Referências bibliográficas

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