CONSELHO DE DISCIPLINA

SECÇÃO PROFISSIONAL

Processo Disciplinar nº 78-20/21 e apenso PD nº 112–20/21

DESCRITORES: Deveres dos Clubes – Relatório de Árbitro - Relatório de Delegado da LPFP - Valor probatório reforçado - Presunção de veracidade - Sanção disciplinar – Agente desportivo – Agente de arbitragem – Plano de Retoma do Futebol Profissional - Concurso real de infrações - Aplicação no tempo – Regime mais favorável

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ESPÉCIE: Processo Disciplinar ARGUIDA: União Desportiva Vilafranquense – Futebol, SAD OBJECTO: “Factos ocorridos no jogo n.º 22704, disputado entre a UD Vilafranquense, Futebol, SAD e a CD Mafra, Futebol, SDUQ, realizado no dia 4 de abril de 2021” e “Factos ocorridos no jogo n.º 23302 (204.01.290), entre a UD Vilafranquense SAD e a CD Cova da Piedade SAD, realizado no dia 15 de maio de 2021”, ambos a contar para Liga SABSEG DATA: 10 de agosto de 2021 TIPO DE VOTAÇÃO: Unanimidade RELATOR: Coutinho de Almeida NORMAS APLICADAS: Artigos 4º, 13º, 17º, 36º, 59º, 127º, todos do RDLPFP20; artigos 35º, nº 1, al. j) e h) e 51º, nº1 do RCLPFP20 e artigo 2.º n.º 2 do Regulamento da Federação Portuguesa de Futebol – Retoma da Prática Competitiva de Futebol, Futsal e Futebol de Praia, COVID-19, disposição transitória 1.ª do Regulamento das Competições organizadas pela Liga Portugal e pontos 2 [Regras sanitárias gerais para realização de treinos e competições], 7 [Presença do Público] e 2.6 do Anexo I [Tribunas e Camarotes], todos do Plano de Retoma do Futebol Profissional; SUMÁRIO: I - Comete o ilícito p. e p. pelo artigo 127.º, n.º 1, do RDLPFP20 [Inobservância de outros deveres], por referência à violação do disposto no artigo 35.º, n.º 1, al. j) e h), do RCLPFP20, o clube que permite, aquando da realização de jogos no seu estádio ou enquanto equipa visitada, que elementos a si afetos, incluindo do seu staff, se dirijam aos elementos da equipa de arbitragem, proferindo as seguintes expressões «Oh de cinza vieram para aqui mandados pelo Pinto da Costa mas não conseguiste o que querias. Vai para o caralho» e «és um filho da puta, vieste encomendado do Porto, és um ladrão.» II - Comete igualmente o ilícito p. e p. pelo artigo 127.º, n.º 1, do RDLPFP20 [Inobservância de outros deveres], por referência à violação das disposições conjugadas do artigo 2.º n.º 2 do Regulamento da Federação Portuguesa de Futebol – Retoma da Prática Competitiva de Futebol, Futsal e Futebol de Praia, COVID-19, disposição transitória 1.ª do Regulamento das Competições organizadas pela Liga Portugal e pontos 2 [Regras sanitárias gerais para realização de treinos e competições], 7 [Presença do Público] e 2.6 do Anexo I [Tribunas e Camarotes], todos do Plano de Retoma do Futebol Profissional, o clube que permite, aquando da realização de jogos no seu estádio ou enquanto equipa visitada, que elementos a si

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afetos, ocupem e permaneçam de pé ou sentados na Tribuna Presidencial, nos camarotes ou nos corredores de acesso aos mesmos, adultos e crianças, sem observar qualquer distanciamento físico e sem respeitarem o devido distanciamento social, sendo necessária a intervenção da força policial, de forma a minimizar o distanciamento social e a averiguar o correcto uso da máscara.

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ACÓRDÃO

Acordam em conformidade com o disposto nos artigos 249.º n.º 7 e 206.º n. º1 do Regulamento Disciplinar das Competições Organizadas pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional os membros do Conselho de Disciplina, Secção Profissional, da Federação Portuguesa de Futebol1

I – Relatório

1 - Registo inicial

1. Por deliberação da Secção Profissional do Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol, datada de 06.04.2021, foi instaurado e remetido à Comissão de Instrutores da Liga Portuguesa de Futebol Profissional (doravante, CI), o presente processo, autuado como processo disciplinar, com o seguinte objecto: «Factos ocorridos no jogo n.º 22704 (204.01.238), disputado entre a UD Vilafranquense, Futebol, SAD, e a CD Mafra, Futebol, SDUQ, realizado no dia 4 de abril de 2021, a contar para a Liga Portugal SABSEG.» (cfr. Capa do processo e fls. 1 a 20)

2. Por despacho do Exmo. Sr. Presidente da Comissão de Instrutores, datado de 08.04.2021 e proferido nos termos da alínea c) do artigo 210.º do RDLPFP20, foi nomeado instrutor o Sr. Dr. Bruno Rodrigues Sampaio, a quem o processo foi distribuído, na sequência do qual se iniciou a instrução do processo, nos termos regulamentares (cfr. fls. 22).

3. Posteriormente, por deliberação da Secção Profissional deste Conselho de Disciplina, datada de 18.05.2021, foi instaurado e remetido à Comissão de Instrutores, o processo disciplinar n.º 112–20/21, e em que é Arguida a União Desportiva Vilafranquense - Futebol, SAD, com o seguinte objecto: «Factos ocorridos no jogo n.º 23302 (204.01.290), entre a UD Vilafranquense SAD e a CD Cova da Piedade SAD, realizado no dia 15 de maio de 2021, a contar para Liga

1 Regulamento Disciplinar das Competições Organizadas pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional aprovado na Assembleia Geral Extraordinária da Liga Portuguesa de Futebol Profissional de 27 de Junho 2011, com as alterações aprovadas nas Assembleias Gerais Extraordinárias de 14 de Dezembro 2011, 21 de Maio de 2012, 6 e 28 de Junho de 2012, 27 de Junho de 2013, 19 e 29 de Junho 2015, 8 e 15 de Junho de 2016, 29 de maio e 13 de junho de 2017, 29 de dezembro de 2017, 13 de junho de 2018, 29 de junho de 2018 e 22 de Maio de 2019, e de 28 de julho de 2020, ratificado na reunião da Assembleia Geral da Federação Portuguesa de Futebol de 26 de agosto de 2020 (Comunicado Oficial n.º 83, de 15 de setembro de 2020, publicado a 16 de setembro de 2020), doravante abreviado, por mera economia de texto, por RDLPFP20. O texto regulamentar encontra-se disponível, na íntegra, na página da LPFP. Página 4 de 29

Portugal SABSEG.» (cfr. capa e fls. 1-23 do processo apenso).

4. Por tal motivo, em 25.05.2021 os autos do Processo Disciplinar n.º 112-20/21 foram conclusos ao Exmo. Senhor. Presidente da CI, o qual, considerando adequado proceder-se à apensação dos Processos Disciplinares nºs 78-20/21 e 112-20/21, propôs a mesma ao Conselho de Disciplina, ao abrigo do disposto da citada alínea d) do artigo 210.º do RDLPFP20, proposta essa que por deliberação de 31.05.2021, foi julgada adequada, pelo que se procedeu à referida apensação (fls. 62 a 66 do processo apenso).

5. Por despacho datado de 12.04.2021, a Arguida União Desportiva Vilafranquense– Futebol, SAD foi notificada da instauração do presente processo disciplinar, do seu objecto e da possibilidade de, querendo, se pronunciar, nomeadamente por escrito e no prazo de 5 (cinco) dias, sobre os factos em investigação, tendo ainda o direito de requerer diligências instrutórias pertinentes e necessárias para o objecto dos presentes autos. Foi-lhe, igualmente, dado conhecimento que a sobredita factualidade indiciava o preenchimento da infracção p.p. no artigo 127.º do RDLPFP [Inobservância de outros deveres], por referência ao disposto no artigo 35.º, n.º 1, al. j) e h), do Regulamento das Competições Organizadas pela Liga Portugal 2 (cfr. despacho e notificação de fls. 23-28).

6. Já no âmbito do Processo Disciplinar n.º 112- 20/21, agora apenso a estes autos, por despacho datado de 20.05.2021, a Arguida foi notificada da instauração desse processo disciplinar, do seu objecto e da possibilidade de, querendo, se pronunciar, nomeadamente por escrito e no prazo de 5 (cinco) dias, sobre os factos em investigação, tendo ainda o direito de requerer diligências instrutórias pertinentes e necessárias para o objecto dos presentes autos. Foi-lhe, igualmente, dado conhecimento que a sobredita factualidade indiciava o preenchimento da infracção p.p. no artigo 127.º do RDLPFP [Inobservância de outros deveres], por referência ao disposto no artigo 35.º, n.º 1, al. j) e h), do RCLPFP (cfr. despacho e notificação de fls. 37-40 e 70-73 do processo apenso).

2 Regulamento das Competições Organizadas pela Liga Portugal (com as alterações aprovadas nas Assembleias Gerais Extraordinárias de 27 de junho de 2011, 14 de dezembro de 2011, 21 de maio de 2012, 28 de junho de 2012, 27 de junho de 2013, 20 de junho de 2014, 19 e 29 de junho de 2015, 21 de outubro de 2015, 15 de março de 2016, 28 de junho de 2016, 07 de fevereiro de 2017, 12 de junho de 2017, 29 de dezembro de 2017, 27 de fevereiro de 2018, 27 abril de 2018, 25 de maio de 2018, 29 de junho de 2018, 22 de maio de 2019, 08 de junho de 2020, 28 de julho de 2020 e 30 de setembro de 2020), doravante abreviado, por mera economia de texto, por RCLPFP20 ou simplesmente RCLPFP, cujo texto regulamentar se encontra disponível, na íntegra, na página da LPFP. Página 5 de 29

7. Como diligências instrutórias foi ordenado; i) num e noutro processo que se procedesse à junção do extracto disciplinar da Arguida (fls. 29-30 e 28, respectivamente). ii) A notificação da Directora de Imprensa da União Desportiva Vilafranquense– Futebol, SAD, Ana Mário da Silva Praça, para, com a maior brevidade possível, no prazo máximo de 3 (três) dias, e tendo por referência o jogo disputado no dia 04.04.2021 entre a UD Vilafranquense, Futebol, SAD, e a CD Mafra, Futebol, SDUQ, a contar para a 27.ª jornada da Liga Portugal SABSEG, informar os autos quem foi a pessoa, que se encontrava no camarote afecto aos elementos da União Desportiva Vilafranquense – Futebol, SAD, que proferiu a seguinte expressão, dirigida ao Árbitro principal no final do jogo: «Oh de cinza vieram para aqui mandados pelo Pinto da Costa mas não conseguiste o que querias. Vai para o caralho»; iii) A junção aos autos do Relatório de Policiamento Desportivo e do Boletim de Segurança elaborados por ocasião do jogo n.º 23302, disputado no dia 15 de maio de 2021, entre a União Desportiva Vilafranquense – Futebol, SAD e a Clube Desportivo Cova da Piedade - Futebol, SAD, a contar para a 33.ª jornada da Liga Portugal SABSEG; iv) A notificação do Delegado da Liga, nomeado para o jogo referido, para, com a maior brevidade possível, prestar os seguintes esclarecimentos: a. Consta do Relatório de Delegado que «(…) No final do jogo à saída da equipa de arbitragem do terreno de jogo elementos do staff do Vilafranquense com camisolas do clube presentes nos camarotes proferiram as seguintes palavras "és um filho da puta, vieste encomendado do Porto, és um ladrão.» b. Consegue identificar o(s) autor(es) de tais expressões? v) A notificação dos elementos da equipa de arbitragem nomeados para o referido jogo para, com a maior brevidade possível, prestar os seguintes esclarecimentos: a. Consta do Relatório de Árbitro que «No final do jogo, à saída da equipa de arbitragem do terreno de jogo, staff pertencente ao Vilafranquense com camisolas identificativas do clube, que estavam presentes no camarote, preferiram as seguintes palavras:" és um filho da puta, vieste encomendado do Porto, és um ladrão”.» b. Consegue identificar o(s) autor(es) de tais expressões?

8. Notificada nos termos e para os efeitos do artigo 227.º do RDLPFP, nomeadamente para se pronunciar sobre os factos em investigação e pelos quais se encontrava indiciada, optou a Arguida por não se pronunciar, nem requerer a realização de qualquer diligência instrutória. Página 6 de 29

9. Foi escopo deste processo disciplinar averiguar da existência de infracções disciplinares alegadamente perpetradas pela Arguida, designadamente: i) No que concerne aos dois jogos objecto dos autos, aquilatar se a conduta que lhe é imputada consubstancia, ou não, a prática da infracção disciplinar p.p. pelo artigo 127.º do RDLPFP [Inobservância de outros deveres], por referência ao disposto no artigo 35.º, n.º 1, al. j) e h), do (RCLPFP), por eventual incumprimento do dever de zelar por que elementos a si afectos usassem de correção, moderação e respeito relativamente a outros agentes desportivos, nos jogos objecto destes autos e ii) Tendo por referência o jogo n.º 23302, disputado no dia 15 de maio de 2021, entre a União Desportiva Vilafranquense – Futebol, SAD e a Clube Desportivo Cova da Piedade - Futebol, SAD, a contar para a 33.ª jornada da Liga Portugal SABSEG, aferir se a conduta que lhe é imputada consubstancia, ou não, a prática da infracção disciplinar p.p. pelo artigo 127.º do RDLPFP [Inobservância de outros deveres], por referência ao disposto no Plano de Retoma do Futebol Profissional (Comunicado Oficial da LPFP n.º 12), por eventual incumprimento, por parte da Arguida, das regras impostas pelo Plano de Retoma do Futebol Profissional, no concernente à lotação máxima da Tribuna Presidencial e dos Camarotes do Estádio.

10 - Apesar das diligências instrutórias que foram ordenadas e realizadas, não foi possível – debalde todos os esforços na investigação – apurar a concreta identidade do(s) autor(es) das expressões dirigidas aos elementos da equipa de arbitragem durante os jogos objecto dos autos.

2 - Relatório Final e Acusação

11. Considerando encerrada a atividade instrutória, em 21.07.2021 o Ilustre Instrutor elaborou o Relatório Final, constante de fls. 42 a 57 dos autos, o qual, por brevidade e desnecessidade de repetição, aqui se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos, deduzindo depois acusação, conforme o disposto no artigo 233.º, n.º 1, do RDLPFP20, por entender existirem indícios suficientes da factualidade em causa e que faz a Arguida na violação de deveres fixados em normas e, assim, em infracções disciplinares desportivas, concretamente por se mostrar suficientemente indiciado que a Arguida União Desportiva Vilafranquense - Futebol, SAD, cometeu, em concurso, 3 (três) infracções disciplinares p. e p. nos termos do disposto no artigo 127.º, n.º 1, do RDLPFP [Inobservância de outros deveres], duas das quais por violação do dever resultante das disposições conjugadas dos artigos 35.º, n.º 1, j) e h), do RCLPFP e uma por

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violação das disposições conjugadas do artigo 2.º n.º 2 do Regulamento da Federação Portuguesa de Futebol – Retoma da Prática Competitiva de Futebol, Futsal e Futebol de Praia, COVID-19, disposição transitória 1.ª do Regulamento das Competições organizadas pela Liga Portugal e pontos 2 [Regras sanitárias gerais para realização de treinos e competições], 7 [Presença do Público] e 2.6 do Anexo I [Tribunas e Camarotes], todos do Plano de Retoma do Futebol Profissional, punidas, cada uma, com a sanção de multa de montante a fixar entre o mínimo de 10 UC e o máximo de 50 UC.

3 - Audiência Disciplinar

12. Após a dedução da Acusação, foram os presentes autos remetidos pela CI a esta Secção Profissional do Conselho de Disciplina da FPF, tendo em vista, nomeadamente, a realização da respetiva Audiência Disciplinar, a qual, por despacho de 27.07.2021, foi agendada para o dia 05.08.2021, pelas 10H00, conforme melhor resulta de fls. 59.

13. Regularmente notificada da acusação em 27/07/2021, a Arguida nada disse, não apresentou memorial de defesa, nem requereu a produção de prova.

14. No dia 05.08.2021, cerca das 10:00 horas, realizou-se a audiência disciplinar, perante o Relator, com observância do formalismo regulamentar, à qual apenas compareceu o Senhor Dr. Bruno Rodrigues Sampaio, em representação da Comissão de Instrutores, diligência essa que se encontra gravada em registo de áudio, não tendo comparecido a Arguida ou quem a representasse, sem qualquer justificação.

15. Iniciada a audiência disciplinar e após a concessão da palavra ao representante da CI, o mesmo pugnou pela procedência da acusação, nos termos e para os efeitos do disposto no nº 1 do artigo 242º do RDLPFP, nada mais sendo requerido, a audiência disciplinar foi dada por encerrada, tendo o processo sido concluso para a prolação de decisão.

II – Competência do Conselho de Disciplina

16. Nos termos do artigo 43.º, n.º 1 do RJFD20083, compete a este Conselho, de acordo com a

3 Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 248-B/2008, de 31 de dezembro (regime jurídico das federações desportivas e do estatuto de utilidade pública desportiva) e alterado pelo artigo 4.º, alínea c), da Lei n.º 74/2013, de 6 de setembro (Cria o Tribunal Arbitral do Desporto e aprova a respetiva lei) e ainda pelos artigos 2º e 4º Decreto-Lei n.º 93/2014, de 23 de junho, cujo texto consolidado constitui anexo a este último. O artigo 3º da Lei nº 101/2017, de 28 de agosto, veio também a introduzir alterações neste regime, embora sem relevância neste domínio. Página 8 de 29

Lei e com os Regulamentos e sem prejuízo de outras competências atribuídas pelos Estatutos e das competências da Liga Profissional, instaurar e arquivar procedimentos disciplinares e, colegialmente, apreciar e punir as infrações disciplinares em matéria desportiva. No mesmo sentido, dispõe o artigo 15.º do Regimento deste Conselho4.

III – Questões Prévias Da aplicação da Lei no Tempo

17. Constatando-se que a presente decisão é prolatada na vigência do RDLPFP215, que entrou em vigor na sequência do Comunicado Oficial n.º 18, datado de 14.07.2021,6 cumpre indagar se a sucessão de regimes regulamentares levanta, in casu, um problema de aplicação da lei no tempo.

18. Preceitua a disposição transitória 1.ª do novo Regulamento o seguinte: «O presente Regulamento entra em vigor imediatamente após a publicação em comunicado oficial da deliberação de ratificação pela Assembleia-Geral da FPF, nos termos do artigo 47.º dos Estatutos Federativos».

19. Na esteira dos regulamentos anteriores, o RDLPFP21 contém disposições específicas em matéria de aplicação no tempo, podendo ler-se no seu artigo 11.º o seguinte: «(...) 1. As sanções são determinadas pela norma punitiva vigente no momento da prática da infração disciplinar; 2. O facto punível como infração por norma legal ou regulamentar no momento da sua prática deixa de ser punível se, em virtude da entrada em vigor de nova disposição legal ou regulamentar, deixar de ser qualificado como infração disciplinar; no caso de já ter havido condenação, ainda que por decisão já definitiva na ordem jurídica desportiva, cessa de imediato a respetiva execução;

4 Disponível, na íntegra, na página da Federação Portuguesa de Futebol. 5 Regulamento Disciplinar das Competições Organizadas pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional aprovado na Assembleia Geral Extraordinária de 27 de junho de 2011, com as alterações aprovadas nas Assembleias Gerais Extraordinárias de 14 de dezembro de 2011, 21 de maio de 2012, 06 e 28 de junho de 2012, 27 de junho de 2013, 19 e 29 de junho de 2015, 08 de junho de 2016, 15 de junho de 2016 e 29 de maio, 13 de junho de 2017, 29 de dezembro de 2017, 13 de junho de 2018 e 29 de junho de 2018 e de 22 de maio de 2019 e de 28 de julho de 2020 e 02 de junho de 2021, ratificado na reunião da Assembleia Geral Extraordinária da FPF de 14 de julho de 2021, adiante também designado, por mera economia de texto, por RDLPFP21. O texto regulamentar encontra-se igualmente disponível, na íntegra, na página da LPFP. 6 Cf. Comunicado Oficial n.º 18, de 14.07.2021, disponível na íntegra em https://www.fpf.pt/pt/Institucional/Documenta%C3%A7%C3%A3o. Página 9 de 29

3. Quando a sanção aplicável no momento da prática do facto for diversa daquela que vigorar em momento posterior será sempre aplicado o regime que concretamente se mostrar mais favorável ao arguido, salvo se este já tiver sido condenado por decisão transitada em julgado (...); 6. As normas procedimentais previstas no presente Regulamento serão aplicáveis a todos os procedimentos instaurados após a sua entrada em vigor (...)».

20. Importa destacar que à data da prática dos factos que deram origem à instauração do presente processo disciplinar, ou seja, em 06.04.2021, estava vigente o RDLPFP20. Ora, como nota Germano Marques da Silva, «a escolha dos regimes penais em confronto em sede de aplicação das leis no tempo, tem de ser feita em bloco, não podendo criar-se uma norma abstracta com os elementos mais favoráveis das várias leis» 7.

21. A infração disciplinar em juízo nos presentes autos – a saber, a infração disciplinar p. p. nos termos do artigo 127º, n. º 1 [Inobservância de outros deveres], do RDLPFP, com referência à violação do dever resultante das disposições conjugadas dos artigos 35.º, n.º 1, j) e h), do RCLPFP e à violação das disposições conjugadas do artigo 2.º n.º 2 do Regulamento da Federação Portuguesa de Futebol – Retoma da Prática Competitiva de Futebol, Futsal e Futebol de Praia, COVID-19, disposição transitória 1.ª do Regulamento das Competições organizadas pela Liga Portugal e pontos 2 [Regras sanitárias gerais para realização de treinos e competições], 7 [Presença do Público] e 2.6 do Anexo I [Tribunas e Camarotes], todos do Plano de Retoma do Futebol Profissional - não sofreu, no essencial, alterações nem na sua hipótese, nem no respetivo arco sancionatório.

22. Uma vez que não se detectam, noutros segmentos do Regulamento, alterações com impacto na responsabilidade disciplinar da Arguida – mormente no que respeita às circunstâncias atenuantes (artigo 55.º), à reincidência como elemento de qualificação do tipo (artigo 54.º), ao concurso de infracções (artigo 59º), aos prazos de caducidade e prescrição (artigos 22.º e 23.º) e ao valor da unidade de conta (UC), sobre o qual recai o fator de ponderação previsto no n.º 3 do artigo 36.º (0,35) - e tendo em conta que, efetuado um exercício comparativo entre os blocos normativos do RDLPFP20 e do RDLPFP21, não se mostra o segundo concretamente mais favorável para a Arguida do que o primeiro, em termos que imponham a aplicação do

7 Germano Marques da Silva, Direito Penal Português – Parte Geral – I Introdução e teoria da lei penal, Editorial Verbo, Lisboa, 1997, p. 265 Página 10 de 29

preceituado no nº 3 do artigo 11º, conclui-se que o presente procedimento disciplinar deve ser regulado, tanto substantiva como procedimentalmente, pelo Regulamento disciplinar vigente à data da prática dos factos - a saber, o RDLPFP20.

23. Inexistindo outras questões prévias de que se deva tomar conhecimento ou apreciar, passamos para a análise e valoração da prova.

IV - Fundamentação de facto

§1. A prova no direito disciplinar desportivo

24. Nem no RDLPFP, nem em qualquer outro diploma de natureza jus-disciplinar desportiva que regule as competições futebolísticas, encontramos uma resposta expressa à questão da valoração da prova em ambiente disciplinar desportivo.

25. Contudo, a actual redacção do nº 1 do referido artigo 16º do RDLPFP20 permite-nos resolver, ainda que indiretamente, essa questão, porquanto ali se dispõe que “[N]a determinação da responsabilidade disciplinar é subsidiariamente aplicável o disposto no Código Penal e, na tramitação do respetivo procedimento, as regras constantes do Código de Procedimento Administrativo e, subsequentemente, do Código de Processo Penal, com as necessárias adaptações”.8

27. Neste enquadramento, quando se questiona e se procura indagar a base normativa para a valoração da prova pelo julgador, para efeitos do processo disciplinar desportivo e, especialmente, porque este assume natureza pública, o entendimento deste Conselho, que já antes ia nesse sentido, fica agora mais sedimentado e com respaldo regulamentar, isto é, a resposta está nos princípios do direito penal e, quanto à tramitação, nas regras do respetivo processo.

28. Portanto, é, sem dúvida, no direito penal que vamos encontrar um complexo normativo referencial também para a questão da valoração da prova no direito disciplinar desportivo, desde logo porque encontramos as normas processuais penais que são, pela sua própria natureza, aquelas que se colocam como mais garantísticas dos direitos de defesa dos arguidos,

8 Alterações ao Regulamento Disciplinar, aprovadas em reunião extraordinária da LPFP, como se refere na nota 1 de rodapé. Página 11 de 29

razão pela qual, nalguns casos e sempre com as necessárias adaptações, o processo penal pode e deve representar a matriz do direito sancionatório público (criminal, contraordenacional e disciplinar). 9

29. Por outro lado, é também entendimento pacífico na nossa jurisprudência que ao processo disciplinar se deve aplicar a regra da “livre apreciação da prova” consagrada no artigo 127.º do Código de Processo Penal10, o que bem se compreende, dadas as proximidades e as similitudes entre o processo disciplinar e o processo penal, designadamente no que respeita a alguns procedimentos e às garantias do arguido.

30. Na verdade, o artigo 127.º do Código de Processo Penal estatui que a prova é apreciada segundo as regras da experiência comum e a livre convicção da entidade competente, sem prejuízo, como é óbvio, do princípio da “presunção de inocência”, consagrado no artigo 32.º, n.º 2, da CRP, e do princípio “in dubio pro reo”, que igualmente fazem parte da dimensão jurídico- processual do princípio material da culpa.

31. Nesta conformidade, o julgador, no exercício do poder disciplinar - ou seja, a “entidade competente” de que nos fala o citado art.º 127º, para o processo penal - tem a liberdade de formar a sua convicção sobre os factos submetidos à sua apreciação e ao seu julgamento, sendo que a livre apreciação da prova não pode nunca “ser entendida como uma operação puramente subjectiva pela qual se chega a uma conclusão unicamente por meio de impressões ou conjecturas de difícil ou impossível objectivação, mas valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos, que permita objectivar a apreciação, requisito necessário para uma efectiva motivação da decisão”.11

9 A própria Constituição da República Portuguesa parece sufragar este entendimento quando, a propósito das garantias do processo criminal, estende a outros processos sancionatórios, de forma inequívoca, pelo menos algumas delas (cf. artigo 32.º, n.º 10). Vide, a este respeito, JJ Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, 4.ª edição revista, , Coimbra Editora, 2007, p. 526 e Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, 2.ª edição, Tomo I, Coimbra, Coimbra Editora, 2010, pp. 740-743. 10 Neste sentido ver, entre outros, o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, processo n.º 03132/11.6BEPRT, de 20-05-2016; o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, processo n.º 07455/11, de 12-03-2015; o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, processo n.º 06944/10, de 20-12-2012; o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, processo n.º 00093/06.7BEVIS, de 09-12-2011; o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, processo n.º 01717/06, de 05-11-2009; o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, processo n.º 12372/03, de 29-09-2005; o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, processo n.º 10842/01, de 11-03-2004 (todos disponíveis em www.dgsi.pt). 11 Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, Lisboa, Editorial Verbo, 1993, p. 111. Página 12 de 29

32. Não pode, pois, surpreender a quantidade de contributos que são recebidos da doutrina e da jurisprudência.12

33. A este propósito e nesta vertente, Maia Gonçalves salienta que “… livre apreciação da prova não se confunde de modo algum com apreciação arbitrária da prova, nem com a mera impressão gerada no espírito do julgador pelos diversos meios de prova; a prova livre tem como pressupostos valorativos a obediência a critérios da experiência comum e da lógica do homem médio suposto pela ordem jurídica”.13

34. Para Paulo Pinto de Albuquerque14, citando decisão do Tribunal Constitucional, a livre apreciação não é sinónimo de operação puramente subjetiva, emocional. Deverá, isso sim, traduzir-se em valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas de experiência e dos conhecimentos científicos que permita ao julgador objetivar a apreciação dos factos.

35. M. Simas Santos e M. Leal Henriques15, citando Cavaleiro Ferreira, dão conta da repartição da norma em dois segmentos: - nas regras da experiência e - na livre convicção da entidade competente; As regras da experiência são definições ou juízos hipotéticos de conteúdo genérico, independentes do caso concreto, assentes na experiência comum. Por seu turno, a livre convicção é um meio de descoberta da verdade, não uma afirmação infundamentada da verdade e, portanto, uma conclusão livre, porque subordinada à razão e à lógica, enão limitada por prescrições formais exteriores.

36. Por fim, evidencia-se no Código de Processo Penal Comentado16, que a livre apreciação da prova comporta duas vertentes: por um lado, a entidade que decide fá-lo de acordo com a sua íntima convicção em face do rol de provas aparentadas no processo, em especial na audiência de julgamento, quer sejam arroladas pela acusação, quer pela defesa, quer ainda, aquelas que

12 Neste último caso, bem patente nas indicações presentes no site da Procuradoria-Geral da República, em anotação ao artigo em causa (http://www.pgdlisboa.pt/leis). 13 “Código de Processo Penal Anotado”, 1998, 9ª edição, p.322/323 (e doutrina aí citada). 14 Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Lisboa, Universidade Católica, 4ª edição atualizada, 2011, p. 345. 15 Código de Processo Penal. Anotado, 2ª edição, I volume, Lisboa, Reis dos Livores, 1999, p.683. 16 AA.VV., Coimbra, Almedina, 2ª edição revista, 2016, p. 428. Página 13 de 29

o tribunal entende oficiosamente conhecer e, por outro lado, essa convicção, objetivamente formada com apoio em regras técnicas e de experiência, não deve estar sujeita a quaisquer cânones legalmente pré- estabelecidos.

37. Ou seja, ao contrário do que acontece no sistema de prova legal, no qual a conclusão probatória é pré-fixada legalmente mediante inferências probatórias sustentadas pela lei em abstrato, pelo princípio da livre convicção o juiz tem a liberdade de formar a sua convicção sobre a realidade e os factos do caso submetido a julgamento, com base apenas no juízo que se fundamenta no mérito objetivamente concreto desse caso, na sua individualidade história, tal como ele foi exposto e adquirido representativamente no processo (pelas alegações, repostas, inquirições e meios de prova utilizados, etc.).

38. Ainda a propósito, dada a sua relevância para a apreciação da materialidade em causa, sublinha-se que apesar de o princípio da livre apreciação da prova constituir a trave-mestra no que tange à valoração da prova, existem ainda assim, meios de prova com valor reforçado, e reafirma-se que quer o relatório de delegado, quer o relatório do árbitro (como é o caso dos autos) e ainda o relatório de policiamento desportivo gozam de um valor probatório especial e reforçado em relação aos factos dele constantes, consubstanciado uma presunção de veracidade dos factos neles relatados, enquanto tais factos não forem fundadamente colocados em dúvida – cf. alínea f) do artigo 13.º RDLPFP20 (quanto ao relato das autoridades policiais, veja-se o 169.º do Código de Processo Penal e artigos 363.º, n.º 2, 371.º, n.º 1 e 372.º, n.º 1, do Código Civil).

39. Em jeito de remate, o julgador em sede disciplinar deve apreciar a prova de acordo com as regras da experiência comum e a sua livre convicção, contanto, porém, objetivo, ponderado e justo na análise dessa mesma prova, dentro dos limites da legalidade a que deve obediência; sem prejuízo de os relatórios do jogo – e, por maioria de razões, o de policiamento – aparecerem dotados de especial credibilidade, sendo necessário mais do que a mera invocação da presunção de inocência para infirmar os factos neles descritos.

40. É, pois, em conformidade com estes princípios que cumpre decidir sobre as questões em análise, designadamente a matéria de facto relevante para a decisão quanto à acusação.

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§2. Factos provados

1º - A Arguida participou, na época desportiva 2020/2021, na II Liga – Liga Portugal SABSEG - correspondente ao segundo escalão das competições organizadas pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional. 2º - No dia 04.04.2021, realizou-se, a contar para a 27.ª jornada da Liga Portugal SABSEG, no Estádio Rio Maior, o jogo oficialmente identificado sob o n.º 22704, entre a UD Vilafranquense – Futebol, SAD e a CD Mafra - Futebol, SDUQ, Lda. 3º - Para o sobredito jogo foram nomeados, como árbitro principal, Rui Lima, como árbitro assistente n.º 1, Bruno Rocha, como árbitro assistente n.º 2, Leonel Ferreira, e como 4.º árbitro, Fábio Nunes. 4º - No final do jogo, quando a equipa de arbitragem se dirigia ao túnel de acesso aos balneários, elementos afetos à União Desportiva Vilafranquense– Futebol, SAD, dirigindo-se aos elementos da equipa de arbitragem, proferiram as seguintes expressões: «Oh de cinza vieram para aqui mandados pelo Pinto da Costa mas não conseguiste o que querias. Vai para o caralho.» 5º - No dia 15.05.2021, realizou-se, a contar para a 33.ª jornada da Liga Portugal SABSEG, no Estádio Rio Maior, o jogo oficialmente identificado sob o n.º 23302, entre a entre a UD Vilafranquense – Futebol, SAD e a CD C. Piedade - Futebol, SAD. 6º - Para o predito jogo foram nomeados, como árbitro principal, Artur Soares Dias, como árbitro assistente n.º 1, Rui Licínio, como árbitro assistente n.º 2, Paulo Soares, e como 4.º árbitro, Rui Lima. 7º - No final do jogo referido em 5.º, quando a equipa de arbitragem abandonava o terreno de jogo, elementos do staff da Arguida, que se encontravam nos camarotes, dirigindo- se aos elementos da equipa de arbitragem, proferiram as seguintes expressões: «és um filho da puta, vieste encomendado do Porto, és um ladrão.» 8º - Durante o jogo supra identificado em 5.º, estavam a assistir ao jogo: a. 10 pessoas na Tribuna Presidencial; b. Sem qualquer distanciamento físico, 10 adultos e 7 crianças no camarote n.º 1; c. Sem qualquer distanciamento físico, 6 pessoas no camarote n.º 3; d. Sem respeitarem o devido distanciamento social, 9 pessoas (7 sentadas e 2 de pé), no camarote n.º 4: e e. Nos corredores de acesso aos camarotes, encontravam-se ainda vários adultos de pé, 2 dos quais estavam a "tomar conta" de 4 crianças que se encontravam naquele espaço.

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9º - A capacidade da máxima da Tribuna Presidencial do Estádio são 12 pessoas. 10º - Foi solicitado, pelo Delegado da Liga, ao Diretor de Segurança da Arguida a regularização (de acordo com o Plano de Retoma) da situação descrita em 8.º. 11º - Pese embora o solicitado, não foi pelo Director de Segurança da Arguida, nem pela Arguida, adoptada qualquer medida ou acção no sentido de pôr cobro à situação, tendo o Diretor de Segurança afirmado que as pessoas que estavam presentes eram algumas esposas e filhos de alguns jogadores e convites feitos pelo presidente e que não se poderia opor às decisões do mesmo. 12º - No intervalo do jogo realizou-se uma reunião com o Delegado da Liga, Comandante da Força Policial e com o Director de Segurança, dando conta da situação ocorrida (descrita em 8.º), e, nessa sequência, o Comandante da Força Policial deslocou 1 (um) elemento da força policial para o respetivo local de forma a minimizar o distanciamento social e a averiguar o correcto uso da máscara. 13º - A Arguida agiu de forma livre, consciente e voluntária, bem sabendo que o seu comportamento consubstanciava conduta prevista e punida pelo ordenamento jus-disciplinar desportivo, não se abstendo, porém, de a realizar. 14º - A Arguida tem antecedentes disciplinares na época desportiva 2020/2021.

§3. Factos não provados

41. Com relevo para a apreciação e para a decisão deste processo, não há quaisquer factos que não tenham resultado provados.

V - Motivação da Fundamentação de Facto

42. No caso vertente, para a formação da nossa convicção foi tido em consideração todo o acervo probatório carreado para os autos, consubstanciado essencialmente na prova documental, elementos esses que foram objeto de análise crítica e criteriosa, à luz de regras de experiência comum e segundo juízos de normalidade e razoabilidade, como se passa a expor: (i) A prova dos factos descritos em 1º, 2º e 3º de §2. Factos provados, assenta nos documentos juntos aos autos a fls. 5 a 19. (ii) A prova do facto descrito em 4º de §2. Factos provados, assenta no Relatório de Árbitro e de Delegado a fls. 8 e 12.

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(iii) A prova dos factos descrito em 5º e 6º de §2. Factos provados, assenta nos documentos de fls. 5 a 20 do processo apenso. (iv) A prova dos factos descritos em 7º, 8º, 9º, 10º, 11º e 12º de §2. Factos provados, assenta no Relatório de Árbitro e de Delegado a fls. 8 e 13 do processo apenso.

(v) A prova do facto descrito em 13º, de §2. Factos provados, representando o estado psíquico da Arguida no quadro do preenchimento do elemento subjetivo do tipo das infrações disciplinares em causa, a sua demonstração decorre da valoração dos elementos probatórios juntos aos autos e já acima mencionados, à luz da lógica e das regras da experiência comum de um homem médio. (vi) A prova do facto descrito em 14º de §2. Factos provados ancora-se no registo disciplinar da Arguida de fls. 30 e fls. 41 (do processo apenso).

VI - Fundamentação de direito §1. Enquadramento jurídico-disciplinar A - Fundamentos e âmbito do poder disciplinar

43. O poder disciplinar exercido no âmbito das competições organizadas pela Federação Portuguesa de Futebol – ou, por delegação, pela Liga Portuguesa de Futebol profissional – assume natureza pública.17 Com clareza, concorrem para esta proposição as normas constantes dos artigos 19.º, n.º 1 e 2, da Lei n.º 5/2007 de 16 de janeiro (Lei de Bases da Atividade Física e do Desporto)18 e dos artigos 10.º e 13.º, alínea i), do RJFD2008.

44. A existência de um regulamento justifica-se pelo dever legal – artigo 52.º, n.º 1, do RJFD2008 – de sancionar a violação das regras de jogo ou da competição, bem como as demais regras desportivas, nomeadamente as relativas à ética desportiva, entendendo-se por estas últimas as que visam sancionar a violência, a dopagem, a corrupção, o racismo e a xenofobia, bem como quaisquer outras manifestações de perversão do fenómeno desportivo (artigo 52.º, n.º 2, do

17 “A Federação Portuguesa de Futebol é uma pessoa coletiva de direito privado sem fins lucrativos, dotada de utilidade pública desportiva, por via da qual o Estado lhe atribuiu competências várias para o uso, em exclusivo, de poderes de natureza pública, entre os quais o poder regulamentar e o poder disciplinar” (Ac. do STJ de 05.07.2018, procº nº 8671/14.4T8LSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt). 18 A Lei nº 5/2007 sofreu alterações, nomeadamente através da Lei nº 74/2013, de 6 de setembro, mas sem qualquer relevância neste âmbito. Página 17 de 29

RJFD2008).19

45. O poder disciplinar exerce-se sobre os clubes20, dirigentes, praticantes, treinadores, técnicos, árbitros, juízes e, em geral, sobre todos os agentes desportivos que desenvolvam a atividade desportiva compreendida no seu objeto estatutário (artigo 54.º, n.º 1, do RJFD2008).21

Em conformidade com o artigo 55.º do RJFD2008 o regime da responsabilidade disciplinar é independente da responsabilidade civil ou penal.

46. Todo este enquadramento, representa, entre tantas consequências, que estamos perante um poder disciplinar que se impõe, em nome dos valores mencionados, a todos os que se encontram a ele sujeito, conforme o âmbito já delineado e que, por essa razão, assenta na prossecução de finalidades que estão bem para além dos pontuais e concreto interesses desses agentes e organizações desportivas.

B - Das infrações disciplinares em geral

47. O RDLPFP encontra-se estruturado, no estabelecer das infrações disciplinares, pela qualidade do agente infrator - clubes, dirigentes, jogadores, delegados dos clubes e treinadores, demais agentes desportivos, espectadores, árbitros, árbitros assistentes, observadores de árbitros e delegados da Liga.

48. Para cada um destes tipos de agente o RDLPFP recorta tais infrações e respetivas sanções em obediência ao grau de gravidade dos ilícitos, qualificando assim as infrações como muito

19 Sob a epigrafe “Regulamentos disciplinares”, o artigo 52º estatui que: “1 – As federações desportivas devem dispor de regulamentos disciplinares com vista a sancionar a violação das regras de jogo ou da competição, bem como as demais regras desportivas, nomeadamente as relativas à ética desportiva. 2 – Para efeitos da presente lei, são consideradas normas de defesa da ética desportiva as que visam sancionar a violência, a dopagem, a corrupção, o racismo e a xenofobia, bem como quaisquer outras manifestações de perversão do fenómeno desportivo.” 20 À data dos factos, a arguida estava sujeita à observância das normas do RDLPFP e ao exercício da ação disciplinar por parte do Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol- cfr. artigos 3.º, n.º 1 e 4.º, n.º 1, alíneas b) e c) , ambos do RDLPFP (com igual redação nos Regulamentos Disciplinares que vigoraram desde a época desportiva 2017/2018). 21 “Artigo 54º (Âmbito do poder disciplinar): 1 – No âmbito desportivo, o poder disciplinar das federações desportivas exerce-se sobre os clubes, dirigentes, praticantes, treinadores, técnicos, árbitros, juízes e, em geral, sobre todos os agentes desportivos que desenvolvam a actividade desportiva compreendida no seu objecto estatutário, nos termos do respectivo regime disciplinar. 2 – Os agentes desportivos que forem punidos com a pena de incapacidade para o exercício de funções desportivas ou dirigentes por uma federação desportiva não podem exercer tais funções em qualquer outra federação desportiva durante o prazo de duração da pena.” Página 18 de 29

graves, graves e leves.

C - Da infração disciplinar concretamente imputada

49. No caso concreto situamo-nos no universo das infrações dos clubes, qualificadas como leves, previstas e punidas de acordo com o artigo 127º (Inobservância de outros deveres) do RDLPFP20.22

50. Em causa, encontra-se a previsão constante das normas que a seguir se transcrevem: a) Do RDLPFP20 “Artigo 3.º Âmbito subjetivo de aplicação 1. O presente Regulamento aplica-se a todos os clubes e agentes desportivos que, a qualquer título ou por qualquer motivo, exerçam funções ou desempenhem a sua atividade no âmbito das competições organizadas pela Liga Portugal. 2. (…)” “Artigo 4.º Definições 1. Para efeitos de aplicação do presente Regulamento, considera-se: a) «clube», os clubes e sociedades desportivas; b) «agente desportivo», os dirigentes dos clubes e demais funcionários, trabalhadores e colaboradores dos clubes, os jogadores, treinadores, auxiliares-técnicos, elementos da equipa de arbitragem, observadores dos árbitros, delegados da Liga, agentes das forças de segurança pública, coordenador de segurança, assistentes de recinto desportivo, médicos, massagistas, maqueiros dos serviços de emergência e assistência médicas, bombeiros, representante da proteção civil, apanha-bolas, repórteres e fotógrafos de campo e, em geral, todos os sujeitos que desempenhem funções ou exerçam cargos no âmbito das competições organizadas pela Liga Portugal e nessa qualidade estejam acreditados, bem como os membros dos órgãos sociais, dos órgãos técnicos permanentes e das comissões eventuais da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e da Liga Portugal; (…)” “Artigo 13.º Princípios fundamentais do procedimento disciplinar O procedimento disciplinar regulado no presente Regulamento obedece aos seguintes princípios fundamentais: a) (…); b) (…); c) (…); d) (…); e) (…); f) presunção de veracidade dos factos constantes das declarações e relatórios da equipa de

22 Capítulo IV (Infrações disciplinares), Secção I (Infrações específicas dos clubes), Subsecção III (Infrações disciplinares leves). Página 19 de 29

arbitragem e do delegado da Liga e dos autos de flagrante delito lavrados pelos membros da Comissão de Instrutores, e por eles percecionados no exercício das suas funções, enquanto a veracidade do seu conteúdo não for fundadamente posta em causa; (…)” “Artigo 127.º Inobservância de outros deveres 1. Em todos os outros casos não expressamente previstos em que os clubes deixem de cumprir os deveres que lhes são impostos pelos regulamentos e demais legislação desportiva aplicável são punidos com a sanção de multa de montante a fixar entre o mínimo de 10 UC e o máximo de 50 UC. 2. Na determinação da medida da pena prevista no n.º 1 do presente artigo, salvo se cometer a violação do mesmo dever violado na mesma época desportiva, não será considerada a circunstância agravante da reincidência prevista nos artigos 52.º e 53.º, n.º 1 alínea a) do presente regulamento.” b) Do RCLPFP20

“DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS Disposição transitória 1.ª Regime de organização dos jogos em consequência da pandemia de CoViD-19 Em consequência das limitações impostas pela resposta à pandemia de CoViD-19, provocada pelo vírus SARS-CoV-2, os jogos da época desportiva 2020-21 serão organizados de acordo com as regras descritas no Plano de Retoma Progressiva das Competições, aprovado pela Direção Geral de Saúde (DGS) em maio e nos termos dos comunicados oficiais da Liga Portugal que venham a ser emitidos em desenvolvimento daquelas regras, bem como das normas que venham a ser emitidas pela DGS.”

“Artigo 35.º Medidas preventivas para evitar manifestações de violência e incentivo ao fair-play 1. Em matéria de prevenção de violência e promoção do fair-play, são deveres dos clubes: a) (…); b) (…); c) (…); d) (…); e) (…); f) (…); g) (…); h) usar de correção, moderação e respeito relativamente a outros promotores de espetáculos desportivos e organizadores de competições desportivas, associações, clubes, sociedades desportivas, agentes desportivos, adeptos, autoridades públicas, elementos da comunicação social e outros intervenientes no espetáculo desportivo; i) (…); j) zelar por que dirigentes, equipa técnica, jogadores, pessoal de apoio, ou representantes dos clubes ajam de acordo com os preceitos das alíneas h) e i);”

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c) Do Regulamento da Federação Portuguesa de Futebol – Retoma da Prática Competitiva de Futebol, Futsal e Futebol de Praia, COVID-19 23, em vigor à data da prática dos factos:

Artigo 2.º Âmbito de aplicação 1. As normas do Regulamento aplicam-se a todos os Clubes, Sociedades Anónimas Desportivas, Sociedades Desportivas Unipessoais por Quotas, Associações Distritais e Regionais, agentes desportivos e funcionários de apoio envolvidos em treinos de futebol, futsal e futebol de praia e em todas as competições tuteladas pela Federação Portuguesa de Futebol. 2. As normas do presente regulamento aplicam-se às competições profissionais de futebol, organizadas pela Liga Portugal, com as devidas especificações, que serão publicadas em Plano Próprio elaborado entre a Federação Portuguesa de Futebol, a Liga Portugal e as Sociedades Desportivas.

d) Do Regulamento da Retoma para o Futebol Profissional 24, em vigor à data da prática dos factos: “2. Regras sanitárias gerais para realização de treinos e competições 1. A presença de público nas competições de futebol, depende de parecer técnico da DGS, sustentado na evolução da situação epidemiológica, e respetiva aprovação em Conselho de Ministros; (…)”

“7. Presença do Público 1. A presença de público nas competições de futebol, depende de parecer técnico da DGS, sustentado na evolução da situação epidemiológica, e respetiva aprovação em Conselho de Ministros; 2. Caso seja autorizada a presença de público nos termos referidos no número anterior, a Liga Portugal e a FPF podem alterar ou emitir normas complementares ao presente Regulamento; 3. O Plano de Contingência de cada Sociedade Desportiva, deverá contemplar a presença de público nas bancadas e na hospitalidade.”

“ANEXO I PLANO DE DIA DE JOGO 2.6 Tribunas e Camarotes • Tribuna presidencial com uma lotação máxima de 50%; • Tribunas Presidenciais devem garantir lugar para: - Os elementos regulamentarmente previstos para a equipa visitante; - 2 elementos máximo FPF (observador e observador de seleções); - Representantes da Liga Portugal em funções ao jogo.”

23 Aprovado pelo Comité de Emergência da FPF, na sua reunião de 28 de agosto de 2020, e consultável in https://www.fpf.pt/Institucional/Documenta%C3%A7%C3%A3o 24 Adoptado ao abrigo do n.º 2 do artigo 2.º do Regulamento da Federação Portuguesa de Futebol - Retoma da Prática Competitiva de Futebol, Futsal e Futebol Praia, COVID-19, e nos termos da disposição transitória 1.ª do Regulamento das Competições organizadas pela Liga Portugal (RC), e divulgado através do Comunicado n.º 12 da Liga Portugal, datado de 07.09.2020, consultável in https://www.ligaportugal.pt/media/27043/comunicado-oficial-n-12-plano-de- retoma-do-futebol-profissional.pdf Página 21 de 29

§2. O caso concreto: subsunção ao direito aplicável

51. Determina o artigo 17.º do RDLPFP20 (Conceito de infração disciplinar) que se considera infração disciplinar “o facto voluntário, por ação ou omissão, e ainda que meramente culposo, que viole os deveres gerais ou especiais previstos nos regulamentos desportivos e demais legislação aplicável.”25

52. Ora, resulta provado que na época desportiva 2020/2021, a Arguida União Desportiva Vilafranquense – Futebol SAD participou na Liga Portugal SABSEG, competição organizada pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional, correspondente ao segundo escalão das competições organizadas pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional, 26 encontrando-se, por isso, submetida ao RDLPFP e ao exercício da ação disciplinar por parte do Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol (em conformidade com os artigos 3.º n.º 1, 4.º n.º 1, alíneas a) e b), 5.º n.º 1 e 7.º, n.º 1 e n.º 2, todos do RDLPFP).

53. Igualmente vem provado que: a) no final do desafio realizado no dia 04.04.2021 (a contar para a 27.ª jornada da Liga Portugal SABSEG, no Estádio Rio Maior, entre a UD Vilafranquense - Futebol, SAD e a CD Mafra - Futebol, SDUQ, Lda), quando a equipa de arbitragem se dirigia ao túnel de acesso aos balneários, elementos afetos à União Desportiva Vilafranquense– Futebol, SAD, dirigindo-se aos elementos da equipa de arbitragem, proferiram as seguintes expressões: «Oh de cinza vieram para aqui mandados pelo Pinto da Costa mas não conseguiste o que querias. Vai para o caralho.» b) no final do desafio ocorrido no dia 15.05.2021 (a contar para a 33.ª jornada da Liga Portugal SABSEG, no Estádio Rio Maior, entre a entre a UD Vilafranquense – Futebol, SAD e a CD C. Piedade - Futebol, SAD), quando a equipa de arbitragem abandonava o terreno de jogo, elementos do staff da Arguida, que se encontravam nos camarotes, dirigindo-se aos elementos da equipa de arbitragem, proferiram as seguintes expressões: «és um filho da puta, vieste encomendado do Porto, és um ladrão.»

25 São, assim, elementos essenciais da infração disciplinar, de verificação cumulativa, os seguintes: (i) o facto do agente (que tanto pode traduzir-se numa ação como numa omissão); (ii) a ilicitude desse mesmo facto e (iii) a culpa. No plano da culpa basta que estejamos face a uma conduta meramente culposa ou negligente do agente, para que essa conduta, desde que ilícita, seja passível de punição disciplinar. 26 Cfr. artigo 7.º do RCLPFP, quanto à denominação da competição e artigos 20.º e ss. do mesmo diploma, relativamente ao aludido escalonamento. Página 22 de 29

c) a capacidade da máxima da Tribuna Presidencial do referido Estádio são 12 pessoas, mas ainda durante este último jogo disputado no dia 15.05.2021, estavam a assistir ao mesmo i) 10 pessoas na Tribuna Presidencial; ii) sem qualquer distanciamento físico, 10 adultos e 7 crianças no camarote n.º 1; iii) sem qualquer distanciamento físico, 6 pessoas no camarote n.º 3; iv) sem respeitarem o devido distanciamento social, 9 pessoas (7 sentadas e 2 de pé), no camarote n.º 4 e v) nos corredores de acesso aos camarotes, encontravam-se ainda vários adultos de pé, 2 dos quais estavam a "tomar conta" de 4 crianças que se encontravam naquele espaço. d) não obstante ter sido solicitada, pelo Delegado da Liga ao Diretor de Segurança da Arguida, a regularização da situação (de acordo com o Plano de Retoma acima referido), não foi adoptada qualquer medida ou acção no sentido de pôr cobro à situação, tendo sido necessária a intervenção do Comandante da Força Policial, que deslocou um elemento policial para o respetivo local, de forma a minimizar o distanciamento social e a averiguar o correcto uso da máscara.

54. No quadro fáctico descrito, por não ter velado para que os agentes desportivos a si afectos usassem de correção, moderação, educação, urbanidade e respeito relativamente a outros agentes desportivos durante os referidos jogos (in casu, elementos da equipa de arbitragem) e ao infringir, de uma forma grosseira, as regras sanitárias e as instruções emanadas do Regulamento da Retoma para o Futebol Profissional, a Arguida protagonizou e mostrou-se responsável por condutas que indubitavelmente são prevista e punidas pelo ordenamento jus- disciplinar desportivo, violando os deveres a que estava vinculada.

55. Factos estes, de resto, que a Arguida nunca negou, nem cuidou em contraditar.

56. Donde decorre que a relatada conduta da Arguida, consubstanciada nos factos supra descritos em 1º a 13º de § 2º de Factos provados, preenche os elementos objetivos e subjetivos do ilícito disciplinar p. e p. pelo artigo 127º, nº 1, do RDLPFP [Inobservância de outros deveres] – no caso, em concurso, 3 (três) infracções disciplinares, duas das quais por violação do dever resultante das disposições conjugadas dos artigos 35.º, n.º 1, j) e h), do RCLPFP e uma por violação das disposições conjugadas do artigo 2.º n.º 2 do Regulamento da Federação Portuguesa de Futebol – Retoma da Prática Competitiva de Futebol, Futsal e Futebol de Praia, COVID-19, disposição transitória 1.ª do Regulamento das Competições organizadas pela Liga Página 23 de 29

Portugal e pontos 2 [Regras sanitárias gerais para realização de treinos e competições], 7 [Presença do Público] e 2.6 do Anexo I [Tribunas e Camarotes], todos do Plano de Retoma do Futebol Profissional - comportamento esse punível, por cada infracção, com a sanção de multa de montante a fixar entre o mínimo de 10 UC e o máximo de 50 UC, razão pela qual deve ser responsabilizada e sancionada disciplinarmente, nos termos que dilucidaremos de seguida.

VII – Medida e graduação da sanção

57. É no Capítulo III (“Medida e graduação das sanções”), artigos 52.º a 61.º do RDLPFP, que nos deparamos com as normas que possibilitam alcançar a media concreta da sanção, tendo sempre presente o princípio da proporcionalidade patente no artigo 10.º: “As sanções disciplinares aplicadas como consequência da prática das infrações disciplinares previstas no presente Regulamento devem ser proporcionais e adequadas ao grau da ilicitude do facto e à intensidade da culpa do agente.”

58. Também como princípio mentor da tarefa de concretização da medida da sanção, deve ter- se como revelante o disposto no artigo 52.º (“Determinação da medida da sanção”): “A determinação da medida da sanção, dentro dos limites definidos no presente Regulamento, far-se-á em função da culpa do agente, tendo ainda em conta as exigências de prevenção de futuras infrações disciplinares.” Acrescenta o n.º 2 deste artigo que na determinação da sanção, atender-se-á a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo da infração, militem a favor do agente ou contra ele.

59. Por seu lado, o artigo 53.º, vem estabelecer as circunstâncias agravantes, no seu n.º 1: “1. Constituem especiais circunstâncias agravantes de qualquer infração disciplinar: a) a reincidência; (…)

O n.º 2 do mesmo artigo explicita o seguinte: “É sancionado como reincidente quem, na mesma época desportiva, depois de ter sido sancionado, por decisão transitada em julgado, pela prática de uma infração disciplinar vier a cometer, por si ou sob qualquer forma de coautoria, outra infração disciplinar do mesmo tipo, infração maior gravidade ou duas ou mais infrações de menor gravidade.”

60. Cabe ao artigo 55.º, n.ºs 1 a 3, elencar as circunstâncias atenuantes: “1. São especiais circunstâncias atenuantes das faltas disciplinares: Página 24 de 29

a) o bom comportamento anterior, aferido pela inexistência de condenações disciplinares há mais de um ano. (…) 2. Para além das atenuantes previstas no número anterior, é ainda considerada como circunstância especialmente atenuante o cumprimento de uma pena de suspensão que posteriormente venha a ser reduzida em mais de um terço ou revogada por decisão final na ordem jurídica desportiva caso a suspensão já tenha sido integral ou parcialmente cumprida. 3. Além destas, poderão excecionalmente ser consideradas outras atenuantes, quando a sua relevância o justifique.” (…)

61. O artigo 56.º explicita os termos da atenuação e do agravamento, nos seguintes termos: “1. O efeito da aplicação das circunstâncias atenuantes e agravantes opera sobre a sanção concretamente determinada nos termos do artigo 52.º. 2. Sempre que houver lugar à aplicação de circunstância atenuante, a sanção concretamente aplicada ao agente é reduzida em um quarto, salvo disposição especial em sentido diverso. 3. Sempre que houver lugar à aplicação de circunstância agravante, a sanção concretamente aplicada ao agente é agravada em um quarto. (…)”

62. Por último, há ainda a registar a possibilidade de atenuação especial da sanção, prevista no artigo 60.º: “A sanção concretamente aplicada, depois de determinada ao abrigo do disposto nos artigos anteriores, poderá ainda ser especialmente atenuada em de um quarto a dois terços quando existam circunstâncias anteriores, contemporâneas ou posteriores à infração que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto ou a culpa do agente.”

63. Voltando ao caso em apreço e levando em conta o recorte factual apurado, importa começar por assentar que não se antevêem quaisquer circunstâncias anteriores, contemporâneas ou posteriores à prática da infração disciplinar que nos conduzam à possibilidade de atenuação especial da sanção, prevista no artigo 60.º do RDLPFP.

64. Já no tocante ao registo disciplinar, se bem que o mesmo revele a existência de antecedentes disciplinares à data da prática dos factos, o certo é que a Arguida, na época desportiva 2020/2021, não regista a violação do mesmo dever ora violado, o que afasta a circunstância agravante da reincidência prevista nos artigos 52.º e 53.º, n.º 1 alínea a) do presente regulamento, como claramente resulta do nº 2 do citado artigo 127º, todos do RDLPFP20.

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65. Importa, no entanto, ter presente quer as exigências de prevenção geral (positiva e negativa) inerentes a situações como as sub judice, as quais são intensas - na medida em que os deveres de respeito, correção, moderação, educação e urbanidade para com outros agentes desportivos são uma matriz essencial à credibilidade e ao decurso normal da competição, por poderem potenciar comportamentos violentos ou perturbação da ordem pública, por um lado e, por outro, a necessidade do escrupuloso cumprimento das regras sanitárias e das instruções emanadas do Regulamento da Retoma para o Futebol Profissional são exigências que importa, tal como à data dos factos, ainda hoje preservar, tendo em vista o estado pandemia e, portanto, a intransigente defesa de uns e de outros valores visa também evitar graves prejuízos para a imagem e o bom nome das competições de futebol -, quer as exigências de prevenção especial, que mesmo no quadro de antecedentes disciplinares já referido, não deixam de ser relevantes.

66. Com efeito, a Arguida não pode esquecer que os deveres de correção e urbanidade dos intervenientes – e, em particular, dos seus agentes desportivos ou a si ligados - e bem assim as regras de índole sanitária e a segurança que estas arrastam, são valores que os regulamentos desportivos têm sempre presentes e, como tal, a Arguida tem não só a obrigação de os cumprir, como a obrigação de os fazer cumprir, sem tibiezas e de uma forma escrupulosa.27

67. isto e como acima se deixou referido, a Arguida cometeu três infracções p. e p. pelo artigo 127º, nº 1, do RDLPFP [Inobservância de outros deveres], por violação dos deveres acima enunciados, punível cada uma com a sanção de multa de montante a fixar entre o mínimo de 10 UC e o máximo de 50 UC.

68. Como resulta dos factos provados, podemos, assim, concluir que a Arguida agiu de forma livre, consciente e voluntária, bem sabendo que a sua conduta, conscientemente assumida e protagonizada ao arrepio dos regulamentos, violava os preceitos regulamentares acima transcritos e, como tal, disciplinarmente punível.

69. Apreciando e valorando o comportamento da Arguida, ou seja, seu comportamento inadimplente no caso em apreço, por um lado e, por outro, a necessidade de acentuar os efeitos

27 Cfr. a propósito, o disposto no artigo 51º, nº 1 do RCLPFP20 [Deveres de correção e urbanidade dos intervenientes]: “1. Todos os agentes desportivos devem manter comportamento de urbanidade e correção entre si, bem como para com os representantes da Liga Portugal e da FPF, os árbitros e árbitros assistentes.” No plano das instruções emanadas do Regulamento da Retoma para o Futebol, todos ainda temos presente as enormes dificuldades dos clubes no sentido de convencer as autoridades, incluindo as sanitárias, em permitir a presença de público nos estádios. Página 26 de 29

da prevenção especial, fixa-se a sanção de multa em 15 UC por cada uma das infracções, o que perfaz o total de 45 UC, ou seja, 4.590,00€ (quatro mil quinhentos e noventa euros).

70. Porém, uma vez que está em causa o concurso de infrações, ter-se-á de aplicar o disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 59º [Concurso de infrações] do RDLPFP20, o qual, no essencial, dispõe que “(…) as sanções da mesma espécie aplicadas a cada uma das infrações em concurso são cumuladas materialmente na decisão final do procedimento (…)”.

71. Nestes termos, mostra-se adequado e proporcional fixar a pena de multa em 45 (quarenta e cinco) UC, ou seja, em 4.590,00€ (quatro mil quinhentos e noventa euros), pelo que aplicando o factor de ponderação de 0,35 (previsto no nº 3 do artigo 36.º do RDLPFP20), a sanção de multa a aplicar à Arguida União Desportiva Vilafranquense – Futebol SAD fixa-se em 1.610,00 (mil seiscentos e dez euros).28

VIII - Decisão

Nestes termos e com os fundamentos expostos, decide-se julgar procedente por provada a acusação, condenando-se a Arguida União Desportiva Vilafranquense – Futebol SAD na multa de 1.610,00 (mil seiscentos e dez euros), pela prática de três ilícitos disciplinares p. e p. pelo artigo 127º, nº 1, do RDLPFP20 [Inobservância de outros deveres], em concurso, sendo duas por violação do dever resultante das disposições conjugadas dos artigos 35.º, n.º 1, j) e h), do RCLPFP20 e uma por violação das disposições conjugadas do artigo 2.º n.º 2 do Regulamento da Federação Portuguesa de Futebol – Retoma da Prática Competitiva de Futebol, Futsal e Futebol de Praia, COVID-19, disposição transitória 1.ª do Regulamento das Competições organizadas pela Liga Portugal e pontos 2 [Regras sanitárias gerais para realização de treinos e competições], 7 [Presença do Público] e 2.6 do Anexo I [Tribunas e Camarotes], todos do Plano de Retoma do Futebol Profissional. * Custas a cargo da Arguida, fixando-se o emolumento disciplinar em €408,00 (quatrocentos e oito euros), valor correspondente a 4 (quatro) UC (artigos 279.º, n.º 1 e 284.º, n.º 2, todos do RDLPFP20. *

28 45 x 102 = 4590 x 0,35 = 1.606,5 Página 27 de 29

Registe, notifique e publicite (artigo 216º do RDLPFP20). * Cidade do Futebol, 10 de agosto de 2021 O Conselho de Disciplina, Secção Profissional

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RECURSO DESTA DECISÃO

As decisões do Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol são passíveis de recurso, nos termos da lei e dos regulamentos, para o Conselho de Justiça ou para o Tribunal Arbitral do Desporto. De acordo com o artigo 44.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 248-B/2008, de 31 de dezembro, na redação conferida pelo artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 93/2014 de 23 de junho, cabe recurso para o Conselho de Justiça das decisões disciplinares relativas a questões emergentes da aplicação das normas técnicas e disciplinares diretamente respeitantes à prática da própria competição desportiva. O recurso deve ser interposto no prazo de 5 dias úteis (artigo 35.º do Regimento do Conselho de Justiça aprovado pela Direção da Federação Portuguesa de Futebol, em 18 de dezembro de 2014 e de 29 de abril de 2015 e publicitado pelo Comunicado Oficial n.º 383, de 27 de maio de 2015). Em conformidade com o artigo 4.º, n.ºs 1 e 3, da Lei do Tribunal Arbitral do Desporto (aprovada pelo artigo 2.º da Lei n.º 74/2013 de 6 de setembro, que cria o Tribunal Arbitral do Desporto e aprova a respetiva lei, na redação conferida pelo artigo 3.º da Lei n.º 33/2014 de 16 de junho - Primeira alteração à Lei n.º 74/2013, de 6 de setembro, que cria o Tribunal Arbitral do Desporto e aprova a respetiva lei), compete a esse tribunal conhecer, em via de recurso, das deliberações do Conselho de Disciplina. Exclui-se dessa competência, nos termos do n.º 6 do citado artigo, a resolução de questões emergentes da aplicação das normas técnicas e disciplinares diretamente respeitantes à prática da própria competição desportiva. O recurso para o Tribunal Arbitral do Desporto deve ser interposto no prazo de 10 dias, contados da notificação desta decisão (artigo 54.º, n. º2, da Lei do Tribunal Arbitral do Desporto).

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