UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO FACULDADE DE HUMANIDADE E DIREITO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO

IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS NA ÁFRICA SUBSAARIANA: IMPLANTAÇÃO, EXPANSÃO E TRANSNACIONALIZAÇÃO.

ADRIEN GYATO BOWANE

SÃO BERNARDO DO CAMPO

2014

IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS NA ÁFRICA SUBSAARIANA: Implantação, expansão e transnacionalização

ADRIEN GYATO BOWANE

Dissertação apresentada em cumprimento às exigências do Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião, para obtenção do grau de mestre. Orientador: Prof. Dr. Leonildo Silveira Campos

SÃO BERNARDO DO CAMPO 2014

FICHA CATALOGRÁFICA

G996i Gyato Bowane, Adrien Igreja Universal do Reino de Deus na Àfrica subsaariana : implantação expansão e transnacionalização / Adrien Gyato Bowane -- São Bernardo do Campo, 2014. 228fl.

Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) – Faculdade de Humanidades e Direito, Programa de Pós-Graduação Ciências da Religião da Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo Bibliografia

Orientação de: Leonildo Silveira Campos

1. Igreja Universal do Reino (IURD) - África 2. Pentecostalismo - África 3. Neopentecostalismo – Àfrica 4. Igrejas Independentes Africanas (IIA) I. Título

CDD 289.9

A dissertação de mestrado sob o tílulo “ Igreja Universal do Reino de Deus na África subsaariana: implantação, expansão e transnacionalização”, elaborada por Adrien Gyato Bowane, foi apresentada em 02 de outubro de 2014, perante a banca examinadora composta por Prof. Dr. Leonildo Silveira Campos (Presidente UMESP), Profª Drª Sandra Duarte de Souza (Titular-UMESP) e Profª Drª Patrícia Teixeira Santos (Titular-UNIFESP).

Professor Dr. Leonildo Silveira Campos

Orientador e Presidente da Baca Examinadora

Professor Dr. Helmut Renders

Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião

Programa: Ciências da Religião

Área de Concentração: Religião, sociedade e cultura

Linha de pesquisa: Religião e dinâmicas sócio-culturais

GYATO, Bowane Adrien. Igreja Universal do Reino de Deus na África subsaariana: implantação, expansão e transnacionalização, São Bernardo do Campo, Universidade Metodista de São Paulo, 2014.

RESUMO

Esse trabalho trata das estratégias de implantação e expansão da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) na África Subsaariana, tendo conta de crescimento acelerado do pentecostalismo no mundo e no contexto da transnacionalização religiosa. A IURD é uma Igreja neopentecostal brasileira que surgiu em 1977 e se expandiu em vários países do mundo. Ela está presente em 39 países da África subsaariana e se concentra nas grandes cidades. Vários fatores explicam o seu crescimento e expansão no continente africano, entre os quais o sincretismo, isto é, a capacidade de se adaptar à cultura africana. Outros fatores são: a visibilidade social (especialmente no uso da mídia e a assistência social), a política do segredo, a prática de exorcismo, o discurso da prosperidade, a relação de amizade e de parceria com governos africanos, a sua atitude anti-ecumênica e a adoção de uma organização episcopal. Aborda-se também nesse trabalho, o pentecostalismo e o neopentecostalismo na África, as Igrejas Independentes Africanas (IIA) e a presença do Cristianismo no continente africano desde os primórdios.

Palavras-chave: pentecostalismo na África, neopentecostalismo, Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), transnacionalização religiosa.

GYATO, Bowane, Adrien. Universal Church of the Kingdom of God: implementation, expansion and transnationalization. São Bernardo do Campo, Methodist University of São Paulo, 2014.

ABSTRACT

The purpose of this paper is to show the implementation strategies and the expansion of the Universal Church of the Kingdom of God (UCKG) in sub- Saharan Africa, while taking into account the rapid growth of in the world and the context of religious trans-nationalization. The UCKG is a Brazilian Pentecostal Church that emerged in 1977 and expanded into many countries worldwide. It is present in 39 countries in sub-Saharan Africa concentrating mostly in large cities. Several factors prove its growth and expansion in Africa, among other factors syncretism, i.e., the ability to adapt to African culture. The other factors are: social visibility (especially through the use of media and social assistance), the political secrecy, the practice of exorcism, prosperity discourses, the friendship and partner-ship with African governments, their anti-ecumenical attitude and the adoption of an Episcopal organization. This paper brings some discussions regarding Pentecostalism and neo-Pentecostalism in Sub-Saharan Africa, African Independent Churches (AIC) and the presence of Christianity in Africa since the very beginning.

Keywords: Pentecostalism in Africa, neo-pentecostalism, Universal Church of the Kingdom of God (UCKG), religious transnacionalization.

AGRADECIMENTO

Agradeço a Deus pelo dom da vida,

À CNPq pela concessão da bolsa, pois sem esse apoio financeiro não seria possível a realização deste trabalho,

À minha mãe Apematowa Anzetaka Caroline e a toda minha família que está longe na República Democrática do Congo,

À minha esposa Aline Conceição Nascimento, colega e amiga, pelo apoio e ajuda na correção desse trabalho,

Ao Benedito António Prezia, pelo acolhimento, orientação e vivência junto e à Maria Regina Alves Mariano, um coração de mãe,

Aos amigos congoleses e africanos da diáspora, especialmente Prof. Dr. Bas’Ilele Malumalu, Dieudonné Kabaka Hompa, Padre Sylvestre Sangalo e sem esquecer o falecido Clavert Manisa,

Aos colegas brasileiros da pós-graduação em História da África e do Negro no Brasil da Unicastelo, onde sendo africano, comecei o estudo da História da África.

Ao professor orientador Leonildo Silveira Campos, pelos conselhos e pela paciência.

E a todas as pessoas que me ajudaram de longe e de perto.

ABREVIAÇÕES

ABC: Associação de Beneficente Cristã (entidade social da IURD).

AC: Antes de Cristo ou antes da Era Cristã

AD: Assembleias de Deus

ADSA: Assembleias de Deus Sul Africanas

AG: Assembleis of God

AFM: Apostolic Faith Mission

AMEIAngola: Associação de Mulheres Empresárias da Igreja Universal de Angola

AT: Antigo Testamento ou Velho Testamento

At: Atos dos Apóstolos

CCB: Congregação Cristã no Brasil

DC: Depois de Cristo ou depois da Era Cristã

ECC: Église du Christianisme Célèste (Igreja do Cristianismo Celeste, ICC)

EUA: Estados Unidos da América

EJCSK: Église de Jesus Christ sur la Terre par son envoyé spécial Simon Kimbangu

ERS: Exército de Resistência do Senhor (República Centro Africana)

FMI: Foursquare Missions Internacional (Departamento missionário da Igreja do Evangelho Quadrangular, com sede nos EUA)

FIHNEC: Fraternidade Internacional de Homens de Negócios do Evangelho Completo.

FU: Folha Universal

HGA: História Geral da África (coleção de 8 volumes da UNESCO)

IADBF: Igreja Assembleias de Deus de Burkina Faso

ICM: Igreja Cristã Maranata 7

ICT: Igrejas Cristãs Tradicionais (Igreja católica e as Igrejas da Reforma)

ID: Igrejas do Despertar (Igrejas neopentecostais e carismáticas)

IEQ: Igreja do Evangelho Quadrangular

IIA: Igrejas Independentes Africanas

IIGD: Igreja Internacional da Graça de Deus

IISA: Igrejas Independentes Sul-Africanas (Igrejas Sionistas e Etíopes).

IMPD: Igreja Mundial do Poder de Deus

INB: Igrejas Neopentecostais Brasileiras

IPB: Igrejas Pentecostais Brasileiras

IPBC: Igreja Pentecostal o Brasil para Cristo

IPDA: Igreja Pentecostal Deus é Amor

IPRC: Igreja Pentecostal Renascer em Cristo

IURD: Igreja Universal do Reino de Deus

MPLA: Movimento Popular da Libertação de Angola

NT: Novo Testamento

RAS: República da África do Sul

RCA: República Centro Africana

RCC: Renovação Carismática Católica

RDC: República Democrática do Congo

RTA: Religiões Tradicionais Africanas

ZCC: Zion Christian Church

ZAOGA: Zimbabwe Africa

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SUMÁRIO

ABREVIAÇÕES...... 7

SUMÁRIO...... 9

INTRODUÇÃO...... 12

CAPÍTULO I: CRISTIANISMO NA ÁFRICA ANTIGA...... 21

1. Cristianismo primitivo na África...... 22 1.1. Egito...... 23 1.2. Cartago...... 26 1.3. Núbia...... 30 1.4. Axum...... 33 2. Cristianismo colonial...... 37 2.1. Cristianismo no reino Kongo (séc.XV-XVII)...... 37 2.2. Do séc. XIX a 1960...... 43 2.2.1. Vantagens da colonização...... 47 2.2.2. Africanização do Cristianismo...... 48 3. Igrejas Independentes Africanas...... 50 3.1. Igreja Harrista...... 54 3.2. Exército da Cruz de Cristo...... 57 3.3. Igrejas Independentes sul-africanas...... 57 3.4. Igreja Kimbanguista...... 59 3.5. Igreja do Cristianismo Celeste...... 63

CAPÍTULO II: PENTECOSTALISMO NA ÁFRICA...... 73

1. A chegada do pentecostalismo na África...... 75 1.1. O pentecostalismo no sul da África...... 77 1.1.1. Igrejas sionistas de influência pentecostal...... 79 1.1.2. Igreja Assembleias de Deus de N. Bhengu...... 80 1.2. O pentecostalismo no centro-leste da África...... 82 1.2.1. Igreja Deus é Bom...... 83 1.2.2. Pentecostalismo em Camarões...... 86

9

1.3. O pentecostalismo no oeste da África...... 87 1.3.1. Igreja Assembleias de Deus de Burkina Faso...... 90 1.3.2. Igreja Pentecostal do Gana...... 92 1.3.3. Pentecostalismo em Benim...... 96 1.3.4. Pentecostalismo no Togo...... 100 2. Neopentecostalismo na África...... 102 2.1. Surgimento e expansão do neopentecostalismo...... 102 2.2. Contexto histórico-social da década de 1990...... 105 2.3. Neopentecostalismo na África ocidental...... 107 2.3.1. Neopentecostalismo na Nigéria...... 107 2.3.2. Neopentecostalismo na Costa do Marfim...... 114 2.4. Neopentecostalismo na África central...... 118 2.4.1. Neopentecostalismo na RD Congo...... 118 2.4.1.1. Mamãe Olangi e a emancipação da mulher...... 123 2.4.1.2. Arcebispo Kutino Fernando...... 124 2.4.2. Neopentecostalismo no Gabão...... 125 2.4.3. Neopentecostalismo em Camarões...... 128 2.4.4. Neopentecostalismo em Congo-Brazzaville...... 130 3. Pentecostalismo brasileiro na África...... 132

CAPÍTULO III: IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS NA ÁFRICA SUBSAARIANA ...... 136

1. Presença da IURD na África subsaariana...... 138 1.1. A IURD na África de língua portuguesa...... 139 1.1.1. A IURD em Angola...... 139 1.1.1.1. Revista Plenitude Angola...... 141 1.1.1.2. Jornal Folha Universal...... 142 1.1.1.3. Discurso...... 144 1.1.2. A IURD em Moçambique...... 150 1.1.3. A IURD em Cabo Verde...... 154 1.2. A IURD na África de língua francesa...... 161 1.3. A IURD na África de língua inglesa...... 162 1.3.1. A IURD na África do Sul...... 164 1.3.2. A IURD na África austral...... 170

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1.4. A IURD em outros países anglófonos...... 172 1.4.1. A IURD no Quênia...... 172 1.4.2. A IURD em Gana...... 172 1.4.3. A IURD em Gâmbia...... 173 2. Estratégias de implantação e expansão...... 174 2.1. A visibilidade social...... 174 2.2. A política da discrição...... 176 2.3. O imaginário, rituais e discursos...... 176 2.3.1. O imaginário...... 178 2.3.2. O exorcismo...... 180 2.3.3. O discurso da prosperidade...... 182 2.4. A IURD e a política...... 183 2.5. Uma Igreja episcopal...... 184 2.6. O sincretismo iurdiano...... 184 2.7. A IURD e outros atores religiosos...... 187 3. Futuro da IURD na África subsaariana...... 190

CONSIDERAÇÕES FINAIS...... 193

BIBLIOGRAFIA...... 199

Anexos:

Tabela 1: Igrejas Independentes Africanas...... 220

Tabela 2: Pentencostalismo brasileiro na África...... 222

Tabela 3: Igrejas pentecostais brasileiras e número de templos...... 224

Tabela 4: IURD, CCB e IPDA em porcentagem...... 225

Tabela 5: Religiões na África (ARDA)...... 226

Mapas da África

África subsaariana...... 229

Religiões na África...... 231

Islã na África...... 232

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INTRODUÇÃO

Esse trabalho trata das estratégias de implantação e expansão da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) na África subsaariana. A IURD está presente na África, em 39 países, todos ao sul do Saara. Nessa parte, as principais religiões são o Cristianismo e o Islã. Apesar de a África do Norte, conhecida como África magrebina, ser predominantemente de fé muçulmana, há uma minoria cristã no Egito e na Líbia. Ao sul do Saara, a composição religiosa nacional varia de um país para outro. Há países de maioria cristã e outros de maioria muçulmana. Há outros que possuem essas duas religiões, em que cada uma representa aproximadamente a metade da população. Há também países com forte presença das Religiões Tradicionais Africanas (RTA) 1.

Falar das estratégias de implantação e expansão da IURD na África, nos leva a entender a sua atuação no processo de transnacionalização religiosa e a sublinhar o seu papel nas disputas no campo religioso africano. A hipótese deste trabalho é que a IURD teve sucesso em sua implantação e expansão na África subsaariana, pois ela conseguiu se adaptar com maior facilidade na cultura africana.

O estudo da performance da IURD no continente africano é um assunto novo. Há poucos estudos feitos nesse campo aqui no Brasil. Encontramos uma dissertação sobre a IURD em Moçambique escrita por Dowyvan Gabriel Gaspar e um artigo publicado por Paul Freston sobre a IURD na África do Sul. Além deles, não encontramos nenhum outro trabalho desenvolvido nesse sentido. Mas, o estudo da IURD na África torna-se pertinente, especialmente quando procura-se entender sua presença no processo da transnacionalização religiosa e o seu papel na expansão e crescimento do pentecostalismo no mundo. Devemos ainda sublinhar que a IURD é a principal Igreja brasileira que exporta bens simbólicos no continente africano, inclusive hajam outras de menor importância.

A IURD está presente em 39 países da África. É impossível fazer uma abordagem de sua atuação em todos esses países, por vários motivos, inclusive por falta de documentos e informações. Por isso, essa presença será analisada com mais

1 Veja Tabela 5, p. 224-225. 12

profundidade nos seguintes países: Angola, Moçambique, Cabo Verde, Costa do Marfim e África do Sul.

A escolha desse tema não se refere à polêmica que a IURD causa no cenário religioso brasileiro (relação conflituosa com a TV Globo e com a Igreja Católica; a fortuna de Edir Macedo; e recentemente a construção e inauguração do Templo de Salomão). O que estimula a analisar esse tema é o seu crescimento na África e no mundo, assim como a complexa relação que ela tem com a política em alguns países onde opera. Tudo isso em um processo mais amplo de globalização econômica, política e cultural.

Para entender o fenômeno da implantação e expansão da IURD nos países da África subsaariana, foi realizada uma ampla pesquisa em diferentes fontes. Uma fonte que se mostrou importante foi o site oficial da própria Igreja em Angola (www.iurdangola.net). Esse site contém informações sobre a atuação da Igreja no país. No site é possível encontrar publicado online, o jornal Folha Universal da edição angolana, assim como a revista Plenitude Angola. A IURD no Brasil publica o jornal Folha Universal, (http://www.universal.org/folha-universal), que possui informações sobre a sua expansão na África. Foram explorados também os sites franceses (www.cairn.info, www.persee.fr) e a revista Archives de Sciences Sociales des Religions, os quais publicam artigos científicos sobre o estudo da religião na África e especialmente do pentecostalismo. Além disso, foi realizada uma pesquisa bibliográfica, reunindo livro, dissertação e alguns artigos sobre a IURD na África.

Dowyvan Gabriel Gaspar defendeu uma dissertação sobre a IURD em Moçambique, em que estudou o perfil social dos adeptos dessa Igreja que buscam prosperidade financeira, os seus métodos de proselitismo e de arrecadação de dinheiro. No livro coletivo Igreja Universal do Reino de Deus. Os novos conquistadores da fé, Jean-Pierre Dozon analisa a presença iurdiana na Costa do Marfim; Ivan Droz, no Quênia; Teresa Cruz e Silva, em Moçambique e André Corten na África do Sul. Apesar do sucesso na África do Sul, Moçambique e Costa do Marfim, a IURD não teve o mesmo desenvolvimento no Quênia. Paul Freston afirma que a IURD teve sucesso na sua implantação e expansão na África do Sul apesar das fortes desigualdades sociais2.

2 Paul FRESTON, The Universal Church of the Kingdom of God: A Brazilian Church Finds Sucess in Southern Africa, 2005. 13

André Mary, analisando a implantação iurdiana na Costa do Marfim e no Gabão aponta suas seguintes estratégias de implantação e expansão: visibilidade social, beneficência, práticas de libertação e exorcismo, anti-ecumenismo, diabolização das RTA, política da discrição e rotatividade dos pastores3. Claudio Furtado, Pierre-Joseph Laurent e Charlotte Plaideau analisam a IURD em Cabo-Verde e concluem que o seu discurso é bem acolhido pela classe média emergente; e que a IURD aconselha os pobres do País a lutar para sair da situação em que se encontram e vencer. O seu sucesso está também na prática de orar pelos milhares de cidadãos cabo-verdianos que estão em exílio.

Por outro lado, não se pode separar a religião da economia e da política. As igrejas ou religiões que surgiram e cresceram no século XX devem ser compreendidas à luz do processo da transnacionalização religiosa, isto é, de circulação, troca, encontros e desencontros, viagens e migrações, negociação e alianças de vários atores para o crescimento, visibilidade e sucesso delas. As religiões não se encontram, mas são as pessoas que se encontram. A transnacionalização religiosa é o impacto da globalização sobre as religiões. Esse movimento não acontece de maneira unidirecional, mas multidimensional, Norte-Sul (tradicional), Sul-Norte (depois das independências), Sul- Sul (especialmente no século XX). As Igrejas Independentes Africanas e as pentecostais se colocam no eixo Sul. André Mary afirma que “todas as grandes religiões são por vocação, transnacionais em contraste com as religiões de linhagem, do terreiro ou as religiões étnicas” 4. Na África, a transnacionalização começou com as Igrejas missionárias (católicas e protestantes) já no século XIX e XX, antes das delimitações das fronteiras e da formação dos Estados-Nações Modernos 5.

A transnacionalização religiosa tanto na África como na Europa, se inscreve, portanto, na dialética complexa, onde a disseminação dos estilos religiosos impostos por religiões do mundo, acelerado e encorajado pela colonização, engendrou as nações religiosas territorializadas (aldeias cristãs ou cidades santas), preparadas para reiniciar e encontrar novos recursos nas formas recentes da globalização cultural e midiática, e em suas redes 6.

3 André MARY, Le pentecôtisme brésilien en Terre africaine. L’universel abstrait du Royaume de Dieu, p. 463-478. 4 André MARY e Laurent FOURCHARD, Introduction. Réveils religieux et nations missionnaires, p.10. 5 Ibid., p. 10. 6 Ibid., p.11. 14

A transnacionalização religiosa segue junto com a vontade de expansão que transcende as fronteiras do Estado-Nação e participa do imaginário básico da mundialização. Essas religiões ou Igrejas transcendem as fronteiras das nações para reinventarem seu produto religioso (o discurso, os objetos sagrados e os símbolos) e atender as novas demandas. Essa transnacionalização ainda de acordo com André Mary, passa pela “circulação internacional dos agentes religiosos e a abertura midiática sobre o mercado dos recursos simbólicos”7. Ela depende das redes religiosas, dos fluxos migratórios e da política entre as nações.

Nessa transnacionalização, segundo Mary, três coisas devem ser observadas: “concorrência para captar a clientela religiosa, as estratégias de conquista mundial e as alianças políticas transnacionais” 8. Nesse sentido, a “realidade transnacional das redes religiosas é, portanto, de dimensão variável, mas se alimenta necessariamente das redes comerciais e migratórias preexistentes” 9. Daí ser importante sublinhar que a migração está intimamente ligada às condições político-econômicas, guerras, seca, fome, desemprego, epidemias, etc. As pessoas migram de uma região para outra em busca de melhores condições de vida.

Para o movimento neopentecostal, esse fato é perceptível no treinamento e nas viagens de seus bispos e pastores, assim como no uso da mídia, e em seu espírito de empreendedorismo. A palavra de ordem é “pensar globalmente e agir localmente” 10. A livre circulação dos agentes religiosos e a busca por recursos financeiros fazem com que eles e suas instituições escapem do controle do Estado e das igrejas e religiões estabelecidas. No processo da transnacionalização, alguns grupos religiosos (dentro do Cristianismo e do Islã) tiram proveito dos recursos e apoios das organizações multinacionais contornando as fronteiras, limites e exigências dos Estados - Nações11.

A transnacionalização religiosa deve ser entendida pelas “novas trocas triangulares” (África-Europa-Américas)12 especialmente o Cristianismo cresceu nos dois últimos séculos. “O suporte midiático é ao mesmo tempo a causa e consequência

7 Ibid., p.12. 8 Ibid., p.13. 9 Ibid., p.14. 10 Ibid., p. 17. 11 Ibid., p. 18. 12 Kali ARGYRIADIS e René DE LA TORRE, Présentation générale et méthodologie: les défis de la mobilité, p.14. 15

da intensa circulação de significados religiosos e de sua descontextualização no quadro de uma competição crescente, que as transformam em significados globalizáveis suscetíveis de ressemantização e de reapropriação local” 13. A transnacionalização nesse caso leva os agentes religiosos a reinventar o conteúdo de seu produto, a fazer novas adaptações e reapropriações, sempre atentos à demanda religiosa atual e ao contexto político-econômico internacional.

Para melhor adentrar neste trabalho, é preciso definir alguns conceitos que serão utilizados ao longo da análise: Cristianismo, pentecostalismo, neopentecostalismo, Igrejas Independentes Africanas e Religiões Tradicionais Africanas.

Cristianismo se refere ao movimento que se formou a partir da “pregação de Jesus Cristo, profeta judeu de Nazaré na Galileia”14. A religião cristã se divide em várias denominações: Igreja Católica, Igreja Ortodoxa, Igreja Copta, Igrejas Protestantes, Igrejas pentecostais e carismáticas, Igrejas neopentecostais e entre outras. O pentecostalismo é um movimento que surgiu dentro do Protestantismo e é caracterizado pelo batismo do Espirito Santo, os dons do Espírito Santo tais como falar em línguas, profecia e cura; crença na Bíblia como autoridade da fé, conversão, os milagres e luta contra os demônios. Outras características do pentecostalismo são a liturgia oral, a espontaneidade e a expressões corporais. Uma das características do pentecostalismo é “o acento nos dons do Espírito Santo e o desejo de receber mais poderes para viver como cristão” 15. O crente pentecostal observa os preceitos bíblicos e morais: não fumar, não beber, não frequentar bares, cinemas e praias. O neopentecostalismo também surge dentro do Protestantismo, além de ter algumas características comuns ao pentecostalismo (batismo do Espírito Santo e dons do Espírito Santo), ele tem por ênfase a “guerra espiritual contra o diabo, pregação enfática da teologia da prosperidade, a liberalização dos estereotipados usos e costumes de santidade, a estrutura empresarial” 16 o uso da mídia, o envolvimento na política partidária e a acomodação ao mundo do consumo.

As Religiões Tradicionais Africanas (RTA) são um conjunto de crenças, práticas, costumes e visão de mundo dos povos africanos. É a relação que o africano

13 Ibid, p. 16. 14 Mircea ELIADE e Loan P. COULIANO, Dicionário das Religiões, p.102. 15 Allan ANDERSON, El pentecostalismo. El Cristianismo carismático mundial, p.23. 16 Ricardo MARIANO, Neopentecostais. Sociologia do novo pentecostalismo no Brasil, p.36. 16

tem com a comunidade humana, com a natureza e com as forças invisíveis (especialmente os Antepassados e o Criador). Na visão de mundo africana, o ser humano faz parte da natureza. Na sociedade tradicional africana, não havia separação entre o sagrado e o profano. Não havia distinção entre cultura e religião, entre ser humano e natureza. As RTA são essencialmente étnicas, isto é, cada etnia tem a sua maneira de se organizar e de se relacionar com os Antepassados. Atualmente, existe cerca de duas mil etnias na África (juntando a região do Magreb e o a África subsaariana). Nas RTA, inclui-se a medicina tradicional e o rito de iniciação. Não se pode confundir as RTA, com a bruxaria ou o fetichismo. A bruxaria é uma prática que causa mal, sofrimento, doença e mesmo a morte do outro. A bruxaria não promove a vida e a saúde, mas as destrói. É contrária às RTA. Essas são por sua vez anteriores a todas as grandes religiões na África.

As Igrejas Independentes Africanas são Igrejas (IIA) são Igrejas fundadas por africanos, fruto da ruptura com as Igrejas missionárias (Católica e Protestantes) durante a colonização. Elas surgiram essencialmente dentro do Protestantismo e a maior parte de seus líderes era catequista. Elas se caracterizam pela luta contra a colonização, o desejo de colocar em diálogo a cultura africana e o Cristianismo e valorização dos negros na África. Não se pode confundi-las com o pentecostalismo clássico na África apesar delas surgirem e se implantarem na mesma época.

As Igrejas Pentecostais Africanas são fundadas por missionários pentecostais estrangeiros ou africanos na África. São pentecostais porque têm as características do pentecostalismo e se reconhecem como tal. As grandes religiões são as religiões universais, institucionalizadas e hegemônicas em alguns países: Islã, Judaísmo, Budismo, Hinduísmo e Cristianismo. Atualmente, as Igrejas (Religiões) estabelecidas na África subsaariana são a Igreja católica, as Igrejas protestantes, as Igrejas Independentes Africanas, as Igrejas pentecostais, o Islã e outras Igrejas (como Testemunhas de Jeová e Exército da Salvação).

Falar da IURD na África leva-nos a falar dos principais atores com que ela disputa o mercado religioso no continente. Esses atores são: as Igrejas pentecostais e as Igrejas Independentes Africanas (IIA). As IIA são a reação ao Cristianismo colonial. Achamos importante apresentar esse tipo de Cristianismo e ir mais longe a fim de apresentar brevemente a presença cristã no continente africano desde suas origens. Cada

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período está ligado a outro. O surgimento, o crescimento e o desaparecimento de uma forma do Cristianismo estão ligados ao modelo anterior ou com fatores histórico-sociais respectivos.

Dessa maneira, esse trabalho está dividido em três capítulos. No primeiro capítulo, aborda-se o Cristianismo na África antiga, analisando principalmente o Cristianismo primitivo nos sete primeiros séculos da Era Cristã. Foram escolhidas quatro cidades ou reinos, onde este Cristianismo se desenvolveu esse: Egito, Cartago, Núbia e Axum. Os primeiros sete séculos da existência do Cristianismo estão marcados pela formação das primeiras comunidades (paróquias e dioceses), a circulação de vários escritos sobre a vida de Jesus, a formação de canon, o surgimento das heresias, disputa e combate contra as heresias, os concílios ecumênicos, a formulação dos primeiros dogmas e o surgimento da vida monástica (com santo Antão do Egito). Estuda-se também o Cistianismo trazido por exploradores portugueses no século XV em suas viagens para Índia para o comércio das especiarias. Esse Cristianismo se implantou somente nas costas do continente, nas ilhas e não conseguiu penetrar no interior. Esse período está marcado também pelo tráfico negreiro. Ainda nesse capítulo aborda-se o Cristianismo implantado a partir do século XIX. Com a dominação completa da África por europeus, os missionários católicos e protestantes vieram junto com os colonizadores para catequizar os africanos. Esse Cristianismo penetrou em toda África subsaariana. Como esse modelo estava carregado de violência, imposição e racismo, alguns catequistas africanos que trabalhavam com os missionários europeus romperam com eles, para fundar as suas próprias Igrejas. É o surgimento das Igrejas Independentes Africanas (IIA) a partir do final do século XIX ao início do século XX. Na última parte desse capítulo, serão analisadas algumas delas.

No segundo capítulo, analisa-se o pentecostalismo e o neopentecostalismo na África. A história do pentecostalismo africano está caracterizada pela chegada de missionários estadunidenes e europeus no início do século XX e a implantação de suas Igrejas, a entrada de evangelistas estadunidenses de cura divina (como por exemplo T.L Osborn) que organizavam cruzadas de evangelização e cura milagrosa em estádios atraindo multidões, a entrada do movimento da renovação carismática, a formação de vários grupos de oração e ministérios, o surgimento de várias Igrejas pentecostais por africanos, a entrada de missionários neopentecostais (estadunidenses, latinos americanos, brasileiros, sul coreanos,etc.) e o surgimento de várias igrejas

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neopentecostais africanas. Com a liberalização religiosa na maior parte dos países africanos na década de 1990, houve explosão religiosa em todo continente (seja nos países de maioria islâmica ou cristã). Nesse capítulo, analisam-se especificamente as principais Igrejas pentecostais e neopentecostais africanas, e suas estratégias de implantação e expansão. Se o Cristianismo se implantou de fato no continente africano na colonização, que marca a transnacionalização com relação Norte-Sul, mas com o surgimento das IIA, a chegada das novas Igrejas pentecostais, há um movimento inverso, eixo Sul isto é, não somente a chegada de agentes religiosos do Norte, mas do Sul: latinos americanos (especialmente brasileiros) e asiáticos (sul coreanos). E no nível interno, a circulação de agentes religiosos africanos de um país para outro, e a exportação de seu produto para fora do continente, especialmente para a Europa e EUA seguindo a rota migratória.

Estando no eixo Sul, no último capítulo, examina-se a Igreja Universal do Reino de Deus na África subsaariana. Estuda-se a sua implantação e expansão em diferentes países, os métodos usados para esse fim, as ações religiosas, o discurso e o futuro da Igreja no continente africano. Sobre a implantação da IURD, pode-se compreender a sua presença no continente africano, dividindo os países em três grupos ou regiões, seguindo as línguas oficiais: África de língua portuguesa, francesa e inglesa. Sem esquecer que ela está também presente na Guiné Equatorial, único país que tem o espanhol como língua oficial. Essa Igreja brasileira se implanta primeiramente em Angola, em 1991, depois da África do Sul um ano depois e se expande no restante dos países. Atualmente na África de língua portuguesa, ela tem uma presença significativa em Angola, Moçambique, Cabo Verde e Guiné Bissau. Na África de língua francesa, ela tem uma presença significativa na Costa do Marfim, Senegal, Madagascar e Gabão; e na África de língua inglesa, na África do Sul (representa em si 47,14% da presença iurdiana no continente), Zimbabue, Namíbia e Lesoto. Como se explica a rápida expansão iurdiana em poucos 23 anos? Quais as estratégias e métodos que usa para a expansão? Como se explica o seu sucesso no continente africano? Nesse capítulo, analisa-se especialmente alguns métodos que a IURD utiliza para a sua expansão, destacando o sincretismo, isto é, a capacidade de se adaptar na cultura africana, de selecionar alguns de seus elementos e inseri-los na sua prática. Operando no continente africano, a IURD enfrenta já alguns desafios pela sua continuidade (como a questão do

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poder e do diálogo com a cultura africana). Á última parte desse capítulo será dedicada especialmente ao horizonte e o futuro da IURD no continente.

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CAPÍTULO I: CRISTIANISMO NA ÁFRICA ANTIGA

Introdução

O Cristianismo é uma das religiões monoteístas. Ele começou com a pregação de Jesus de Nazaré, dos seus discípulos e sobretudo de um convertido porteriormente, Paulo. Com ele, o movimento se abriu aos gentios, deixando de ser um movimento exclusivamente judaico. A sua expansão se deu depois da destruição do templo de Jerusalém em 70. Muitos cristãos foram perseguidos e assassinados nos seus três primeiros séculos, pelo Império Romano. Além do martírio de muitos cristãos, essa época está marcada pela definição do Canon, o surgimento das heresias, a realização dos concílios ecumênicos para a defesa da fé e a formulação de doutrina e pelo começo da vida monástica. O Cristianismo foi oficializado pelo imperador romano Teodócio somente no século IV quando foi declarado religião oficial. Este capítulo se divide em três partes: o Cristianismo dos primórdios; o Cristianismo no tempo colonial e o surgimento das Igrejas Independentes Africanas (IIA). Na primeira parte, serão analisados a implantação e desenvolvimento desse movimento no Norte da África (Egito, Cartago) e na parte oriental (Núbia e Axum). Devemos nos lembrar que o movimento de Jesus estava presente no Norte da África e na Etiópia já no primeiro século depois de Cristo. Segundo os Atos dos Apóstolos (2,1-13), os egípcios, líbios, habitantes da Cirene se encontravam na Palestina durante o Pentecostes. Na segunda parte, analisa-se o cristianismo trazido por exploradores e viajantes portugueses entre os séculos XV-XVIII, em busca de especiarias e outros produtos. Esse período está também marcado pelo tráfico negreiro. Esse Cristianismo se limita somente nas costas do continente africano, mas se implanta no reino Kongo, na África central durante dois séculos, isto do século XVI ao século XVII. Aborda-se também o Cristianismo imposto aos africanos durante a colonização no século XIX. Se a África foi esvaziada pelo tráfico negreiro, logo depois desse drama, ela foi invadida e ocupada por europeus. A invasão foi completa, do ponto de vista geográfico, político, econômico, social, cultural e religioso. Analisam-se as vantagens e desavantagens da colonização, e o movimento de africanização das Igrejas missionárias na descolonização. Na última parte desse capítulo, analisa-se o surgimento e expansão das Igrejas Independentes Africanas (IIA), fruto da reação contra a opressão física e

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simbólica da colonização. As IIA são as primeiras Igrejas a estabelecer o diálogo entre a cultura africana e o Cristianismo, isto é, aderir à fé cristã sem renunciar a cultura africana e iluminar a cultura africana a partir dos Evangelhos. As IIA surgem em toda África subsaariana, especialmente na África do Sul, República Democrática do Congo, Quênia, Nigéria, e Costa do Marfim. Depois da independência dos países africanos, as IIA foram as primeiras a exportar o seu produto religioso para as antigas colônias e em outros países da Europa e EUA, seguindo a rota migratória.

1. Cristianismo primitivo na África

Depois do evento de Jesus de Nazaré na Palestina (nascimento, pregação, morte, ressurreição e pentecostes segundo os Evangelhos), os seus seguidores já se encontravam no Norte da África durante o primeiro século da Era Cristã. Sublinhamos quatro elementos decisivos para a expansão do Cristianismo nesse momento: o mandato missionário (Mateus 28,16-20), a figura do apóstolo Paulo de Tarso, o Pentecostes e a destruição do Templo de Jerusalém em 70.

Depois da ressurreição, Jesus ordenou aos seus discípulos ir pelo mundo para pregar o Evangelho (Reino de Deus) a todas as nações, converter e batizá-las, ensiná-las a observar os mandamentos (Mateus 28,16-20). Durante o Pentecostes (Atos dos Apóstolos 2,1-13), havia os habitantes do Egito, Líbia e Cirene que se encontravam na Palestina. O elemento principal do Pentecostes é que Jesus mandou o seu Espírito para capacitar os discípulos a fim de pregar o Evangelho a todas as nações. Esses, sendo judeus, falavam em línguas e povos diferentes ali presentes os entendiam (Atos dos Apóstolos, 2,1-4). Felipe, um dos discípulos de Jesus se encontrou com um eunuco etíope no deserto. Pregou-lhe o Evangelho e o batizou (Atos dos Apóstolos 8,26-40). O eunuco era um alto funcionário da rainha da Etiópia. Provavelmente, os egípcios, líbios, habitantes da Cirene e eunuco etíope em sua volta, foram os primeiros a trazer Evangelho de Jesus nessa região.

O apóstolo Paulo de Tarso, do verdadeiro nome Saulo, judeu da diáspora, cidadão romano e fariseu, foi o primeiro a pregar a mensagem de Jesus aos gentios (isto é aos não judeus). Em 48 d.C, embarcou na Europa e fundou as Igrejas de Filipos, Tessalônica e Corinto. Foi ele que emancipou o movimento de Jesus do Judaismo,

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mudando o critério para ser cristão. Não se trata mais de fazer a circuncisão e o respeitar estritamente às prescripções de Torá como no Judaismo, mas ser livre e ter somente fé em Jesus Crucificado17.

Com a destruição de Jerusalém em 70 d.C pelo Imperador romano Tito, muitos judeus fugiram e se espalharam no Oriente Médio chegando até África do Norte e na Arábia Meridional. Provavelmente, foram eles que trouxeram o movimento de Jesus na região. De pequenas comunidades, os seguidores de Jesus foram crescendo até chegar a formar paróquias, dioceses e patriarcado. A formação de dioceses e patriarcado se deu entre os séculos II e III d.C, é o momento de sua consolidação.

A África do Norte foi sucessivamente dominada por império grego, romano, persa, germânico e islâmico. O cristianismo surgiu na Palestina e se desenvolveu na África do Norte durante o Império Romano. O Cristianismo se desenvolveu de maneira espetacular nos sete primeiros séculos da Era Cristã em toda essa região formando grandes centros no Egito, Cartago, Núbia e Axum. Os mares Mediterrâneo e Vermelho, o rio Nilo, as rotas no deserto permitiam o contato entre os egípcios, líbios, núbios, axumitas e cartagineses e, entre esses e outros povos.

1.1. Egito

No Egito, entre os século III a.C e II d.C, além dos egípcios, viviam pessoas de diversas origens, entre elas gregos, judeus e romanos. Jesus de Nazaré viveu durante o reino no imperador Tibério (14 a.C-37d.C). Antes da chegada dos seguidores de Jesus na região, “os egípcios veneravam Isis e Osiris, com a esperança à salvação” 18. Além da religião tradicional dos egípcios, haviam grupos que praticavam o maniqueísmo e o gnosticismo. Na mesma região, existia uma colônia judaica antiga. Na época de Ptolomeu Filadelfo (281-246 d.c), a Bíblia judaica foi traduzida para o grego, sendo chamada de “Septuaginta”. Os aristocratas falavam o grego e as populações simples o copta. O Egito tinha como capital Alexandria, reconhecida como grande centro cultural e intelectual do mundo greco-romano.

Antes do reconhecimento oficial do Cristianismo por Teodósio (381 d.C), houve várias perseguições e assassinato de cristãos. No reinado dos imperadores A. de Décio

17 Mircea ELIADE e Loan P. COULIANO, Op. Cit., p. 105. 18 S. DONADONI, O Egito sob domínio romano, p.205. 23

(249-251) e Deocleciano (244-313), muitos cristãos foram assassinados por que se recusavam a participar do culto ao Imperador. O culto consistia “em queimar alguns grãos de incenso como saudação ao Imperador” 19.

Depois do reconhecimento do Cristianismo como religião e a sua adoção pelo Imperador Teodósio, começaram as disputas internas entre os cristãos que se diziam seguir a verdadeira ou falsa doutrina. Entre as heresias que surgiram, o arianismo teve impacto maior não somente no Egito, mas em todas as dioceses da África do norte, no Oriente e até em Roma. O arianismo afirmava que “Jesus tinha duas naturezas, uma humana e outra divina. A humana era simples aparência” 20.

As heresias surgiram depois das perseguições. Em 313, o Edito de Milão deu liberdade de culto aos cristãos. Depois do Édito, as leituras e meditações, a necessidade de confrontar os Evangelhos com diversas culturas gerou várias intepretações, muitas vezes antagônicas. O que levou a discussões, disputas, condenações, perseguições, injúrias, divisões, violências simbólicas e físicas. As disputas focavam-se na natureza de Jesus de Nazaré (era humano ou divino?). Contra o Nestorianismo que negava a divindade de Jesus e a maternidade divina de Maria, surgiu o monofisismo, pregado pelo patriarca de Alexandria, Dióscoro, que acreditava que Jesus Cristo tinha uma única natureza, ao mesmo tempo divina e humana. O representante do monofisismo era o sábio Eutíquio21. O arianismo dividiu bastante as comunidades cristãs primitivas. Essa doutrina “negava a unidade e a consubstancialidade das três pessoas da Santíssima Trindade e também a igualdade perfeita de Jesus Cristo com o Pai” 22. O patriarca Atanásio era adversário dessa doutrina. O patriarcado de Bizâncio era contra o monofisismo, professava a doutrina afirmada em Niceia (325). Segundo essa doutrina, “Cristo é consubstancial (homousios-homo ousia, mesma essência) com o Pai e não criatura” 23. A guerra doutrinária estava aberta por muitos anos.

Nos primeiros séculos, o Cristianismo se desenvolveu consecutivamente em Jerusalém, Roma, Constantinopla, Antioquia e Alexandria. Esses centros eram chamados de patriarcados, sendo que um desses patriarcados, Alexandria se encontrava

19 Ibid, p. 208. 20 S. DONADONI, Op. Cit., p. 208. 21 Tekle T. MEKOURIA, Op. Cit, p. 435. 22 Ibid, p. 429. 23 Renato Viana BOY, Debates sobre a natureza do Cristo no Oriente no primeiro milênio e sua relação com a crise iconoclasta, p.2. 24

no Egito. Alexandria se tornou um grande centro filosófico e teológico, dialogando diretamente com Constantinopla. Ali se encontrava a famosa Escola Catequética, com objetivo de colocar em diálogo o Cristianismo e o neoplatonismo. A filosofia grega serviu como pano de fundo para a formulação dos primeiros dogmas sobre a natureza de Jesus. Para resolver essas disputas teológicas, vários concílios foram organizados (por exemplo, Calcedônia, Niceia).

A Escola de Alexandria serviu também para divulgar o processo de helenização, isto é, “justificar determinados conceitos novos e integrá-los no amplo quadro da filosofia e filologia da Antiguidade” 24. A maior parte de intelectuais de Alexandria tinha como sobrenome o mesmo nome da cidade (exemplo: Filo de Alexandria, Clemente de Alexandira, etc.). Filo de Alexandria (séc. I d.C) procurou dar às Escrituras um sentido grego e universal. Organizou-se também um Didaskaleion (livro da catequese), versado em filosofia grega25. Além do Filo de Alexandria, os grandes representantes da Igreja de Alexandria: Orígenes (185-252 d.C) famoso professor da Escola Catequética de Alexandria, Amônios Sacas; Antão (que iniciou a vida monástica). Os bispos de Alexandria: Clemente (145-210), Atanásio (295-367) e Cirilo (370-442). O bispo Atanásio combateu o Arianismo; e Cirilo, o Nestorianismo26. Nesse período, apesar de ter definido já o Canon da Igreja, circulavam muitos apócrifos, com diferentes versões sobre a vida de Jesus.

Neste mesmo lugar, começa o movimento dos Anacoretas, eremitas ou monges que fugiam no deserto para viver o evangelho em sua pureza. Alí, não só rezavam, mas também trabalhavam. Essa saída não tinha somente motivo religioso, mas também político. As pessoas buscavam a perfeição cristã na fuga contra as adversidades da vida cotidiana, também para evitar o pagamento dos impostos. “Os monges encontravam nos conventos a satisfação não somente de suas aspirações religiosas, mas também de um desejo profundo àquela época: a fuga às dificuldades da vida e a proteção contra uma autoridade discricionária” 27.

24 Ibid, p. 209. 25 Ibid, p.208. 26 Lista completa dos Santos Padres e Doutores da Igreja disponível em http://www.ecclesia.com.br/biblioteca/pais_da_igreja/os_santos_padres.html, acesso 10/06/2014. 27 S. DONADONI, Op. Cit, p. 210. 25

Nesses monastérios, podiam-se encontrar “grandes organizações, proprietários de terras, animais, oficinas, lojas e instalações agrícolas” 28. Havia uma população numerosa nos monastérios, chegando a dezenas de milhares. Os monges, com a sua teologia, alimentavam um espírito de resistência nos alexandrinos que sofriam as pressões políticas e religiosas de Constantinopla29. O cristianismo floresceu nessa região até a chegada dos árabes em 642. Com a chegada desses, houve uma drástica redução do Cristianismo e levando até a sua extinção em algumas regiões, como veremos mais adiante. Ainda hoje, esse modelo de Cristianismo continua através das Igrejas copta e ortodoxa do Egito, que representam 10% da população.

1.2. Cartago30

Cartago foi um dos maiores impérios da antiguidade, como os impérios egípcio, fenício, grego, assírio, persa, romano, otomano, bizantino e muçulmano. A cidade foi fundada por fenícios por volta do século VIII a.C e o nome da cidade em fenício “Kart Hadasht” significa “Cidade Nova”31. Cartago é um império que rivalizou com o império grego, guerreou contra os romanos atingindo o seu apogeu entre os séculos VI ao século III a.C. A então Roma nascente foi o seu vássalo e várias outras cidades do mediterrâneo e do sul da Espanha. “No século VI antes da Era Cristã, Cartago tornou- se autônomo e passou a exercer supremacia sobre outras povoações fenícias de Ocidente, assumindo a liderança de um império na África do Norte, cuja criação teria profundas repercuções na história de todos os povos do Mediterrâneo Ocidental” 32.

Os maiores imperadores cartagineses são Almílcar e Aníbal. As extraordinárias guerras púnicas, entre cartagineses e romanos duraram boa parte do século III e terminaram com a derrota de Cartago em 202 a.C, logo a seguir a sua destruição em 149 a.C. Na África do Norte além de Cartago, havia cidades importantes como Numídia Tripolitana e Mauritânia. A presença cristã nessa região é entre o século I ao VII d.C. A África do norte passou sucessivamente sob domínio romano, germânico e bizantino. Sob domínio romano, ela passou por um intenso processo de urbanização, atingindo 500 cidades.

28 Ibid, p.210. 29 Ibid, p. 212. 30 Cartago pode se situa entre a atual Algéria e Tunísia. 31 B.H. WARMINGTON, O período cartaginês, p.476. 32 Ibid, p. 476. 26

Segundo autores clássicos da Antiguidade, havia sacrifícios humanos em Cartago. Os cartagineses cultuavam Baal-Hamon (deus da religião fenícia). Hamon significa “ardente”, deus solar. Mais tarde, ele foi sobrepujado pelo culto popular à deusa Tanit, ligado à fertilidade. As representações grosseiras de Tanit, com braços erguidos aparecem em centenas de Estelas em Cartago e em outras cidades. Os cartagineses cultuavam também Astarte, Eshmoun e Melqart33. “Nos recintos sagrados, foram descobertos urnas com ossadas, calcinadas de crianças, que frequentemente eram enterradas aos pés das estelas (...). Isso leva a supor que havia sacrifícios humanos oferecidos a Baal-Hamon (ou Tanit). As vítimas eram provavelmente as crianças do sexo masculino” 34.

Essa prática caiu em desuso em 310 a.C. O que vale assinalar aqui é que a maior parte dos nomes cartagineses possuía uma terminologia sagrada. Amílcar, por exemplo, significa “protegido de Melqart”, Aníbal “protegido de Baal”. Além dos sacrifícios humanos, havia ritual complexo envolvendo sacrifício de outras vítimas, que era cumprido por um corpo de sacerdotes nomeados a título permanente35. Segundo Warmington, apesar de seu contato com o Egito, os cartagineses parecem ter dado pouca importância à ideia de vida após a morte, o que os aproxima dos primeiros hebreus. Os cartagineses cultuavam também Deméter e Perséfone.

O panteão dos deuses númidos era composto de Netuno, Esculápio ou Serápis. “A maioria da população das províncias africanas cultuava Saturno” 36. Esse culto era a continuação do culto a Baal-Hamon e da deusa Tanit, Juno Caelestes, Cereres (4 divindades agrárias). A religião oficial do Império romano se explica de fato que “a fidelidade a Roma devia exprimir-se principalmente pela observância das práticas religiosas, que faziam parte integrante da civilização romana” 37. Todos os habitantes do Império eram obrigados a prestar culto ao Imperador, especialmente os funcionários da administração a nível municipal, provincial e senatorial. “Os membros do “ordo decurionum” que atingiram o apogeu de sua carreira municipal desejavam ser investidos

33 B.H. WARMINGTON, Op. Cit., p. 476. 34 Ibid., p.488. 35 Ibid., p. 489. 36 A. MAHJOUBI, O período romano e pós-romano na África do Norte. Parte I, o período romano, p.538. 37 Ibid., p.538. 27

da dignidade de flâmines perpétuos, sacerdotes que desfrutavam o privilégio de oferecer ao casal (imperial) deificado, as preces e os votos dos habitantes da cidade” 38.

Além disso, segundo Mahjoubi, a assembleia provincial composta por deputados de todas as assembleias municipais, reunia-se anualmente em Cartago para escolher o flâmine provincial, o grande sacerdote cuja função era celebrar o culto oficial ao Imperador em nome de toda província39. Os romanos e os povos subordinados ao Império eram politeístas e o próprio Imperador romano era considerado deus.

Em cada cidade, o culto da tríade capitolina, Júpiter, Juno e Minerva. Havia também culto a Marte, pai protetor do povo romano, culto a Vênus, Ceres, Apolo, Mercúrio, Hércules e Baco constituíam também outras formas oficiais da religião do Império e da vida espiritual grego-romana. Por toda parte, os templos e as estátuas, altares e sacrifícios celebravam essas divindades e muitas outras ainda, com a Paz, a Concórdia, a Fortuna, o gênio do Império e do senado romano, etc40. Os cartagineses cultuavam também divindades orientais como Ísis, Mitra ou Cibele. O culto a Baco e a Demeter era muito popular. Ainda segundo A. Mahjoubi há dois fatores que expliacam a implantação do Cristianismo em Cartago: “as estreitas relações que Cartago tinha com Roma e a existência de pequenas comunidades judaicas nos portos, principalmente em Cartago” 41. Segundo Tertuliano, havia uma presença grande de cristãos em Cartago no século II d.C. Provavelmente, essa presença começou já no século anterior. “De acordo com Tertuliano que viveu entre o final do século II e início do século III, naquela época, havia na África um número grande de cristãos, em todas as classes e profissões. Por volta de 220 d.C, foi possível reunir só em Cartago um sínodo de 71 bispos; outro realizado em cerca de 240 reuniu 90 bispos” 42.

Os cristãos se tornaram cada vez mais numerosos em muitas cidades africanas a ponto de se constituir uma grave ameaça contra a religião do Império. Eles se recusavam de cultuar o imperador romano e de participar em outros cultos voltados ás divindades do Império. Razão pela qual essa atitude chamou atenção dos governadores de diversas províncias romanas no Mediterrâneo e do próprio Imperador. Esse abandonou seu liberalismo e tolerância, ordenando a perseguição e morte de cristãos.

38 Ibid., p.540. 39 Ibid., p. 540. 40 Ibid, p. 540. 41 Ibid., p.540. 42 Ibid., p.542. 28

Segundo Mahjoubi, em 180 se dá o martírio de doze cristãos na cidade de Scilli. Esses foram decapitados por ordem de procônsul e no ano 203, houve martírio de Santas Perpétua, Felicidade e seus companheiros. Esses foram atirados aos animais na arena do anfiteatro de Cartago43. Apesar do martírio, muitos cristãos mantiveram o fervor e o zelo de sua fé e procuravam ardentemente morrer pela mesma.

O cristianismo cartaginês está marcado pela vida de grandes teólogos como Tertuliano (160-220) e Agostinho de Hipona (354-430 d.C). Tertuliano era advogado eleigo. Foi um dos primeiros teólogos cristãos a escrever em latim. Agostinho era bispo de Hipona, deixou uma obra fenomenal no campo da filosofia e teologia, as mais importantes são as Confissões e Cidade de Deus. A tradição católica os considera como “Santos Padres” e “Doutores da Igreja”, isto é, pessoas que lutaram para defender a fé cristã que estava se formando e deram a sua contribuição na formulação da mesma. Muitos morreram mártires. Cipriano (210-258) foi bispo de Cartago.

A invasão dos vândalos (germanos), comandada pelo rei Genserico (406 d.C) veio por fim ao domínio romano na região. Esses sitiaram Hipona em 430, quando morria o bispo Agostinho. Em 470 d.C, os vândalos tinham o controle total do norte da África e do Mediterrâneo44.

No campo religioso, o clima de crise foi permanente. Os vândalos eram cristãos, mas professavam o arianismo, heresia intolerável para o clero católico tradicional. Seguiu-se uma repressão quase sistemática do clero por um poder central pouco inclinado a tolerar resistências dogmáticas. O furor anticatólico atingiu seu clímax após um pseudo concílio em Cartago no ano 48445.

Em 533, o Império Bizantino conquistou toda região do Norte da África expulsando os vândalos, dominou-a até a chegada dos árabes em 698. Durante 165 anos, os bizantinos restabelecem o culto tradicional, isto é um tipo de Cristianismo ortodoxo, e proibiram o arianismo. Uma reaparição do donatismo foi reprimida considerando-o como contestação social. Segundo Salama, Bizâncio (os turcos) chegou a se dar o luxo de uma crise dogmática, a do monotelitismo, uma discussão fútil sobre a natureza de Jesus. Às vésperas da conquista muçulmana, o clero africano estava dividido sobre essa questão.

43 Ibid., p. 594. 44 P. SALAMA, O período romano e pós-romano na África do Norte Parte II. De Roma ao Islã, p. 549. 45 Ibid., p. 549. 29

1.3. Núbia46

O Reino Núbio era composto pelos três reinos Nobadia localizado ao norte, Makuria que se encontrava no centro e por último Alodia ao sul. O reino da Nobadia tinha como capital Faras, o de Makuria, Antiga Dongola e de Alodia, a capital de Soba. A Núbia não pertencia ao Império Bizantino, mas tinha algumas relações. A missão do padre Juliano e Longino constituía em evangelizar a região47. Por causa das escarmuças entre os núbios e os árabes do Egito, os dois reinos se uniram (o do norte com o do centro). O rei Merkurios sucedeu ao grande rei Kyriakos, a quem estavam subordinados trintas governadores. Assim como os faraós do Egito, os reis núbios também eram altos sacerdotes, não sujam as suas mãos com o sangue humano48. Além de intervir em matérias de religião, desempenhavam certas funções religiosas.

Segundo vestígios encontrados por arqueólogos, essa região foi cristianizada desde os primeiros séculos. Mas a conversão, oficialmente só se deu em 543. Assim como nos mostra Michalowski: “A imperatriz Teodora de Bizâncio enviou o padre Juliano em 543 na Núbia e todos os reis foram batizados” 49.

A corrente teológica predominante naquela região foi o monofisismo. Com a invasão árabe em 641, a Núbia permaneceu isolada da cultura mediterrânea. Esse isolamento da Núbia não significa a extinção do Cristianismo. O rei núbio assinou um tratado político e econômico (baqt) com o sultão do Egito, o que lhe permitiu certa liberdade religiosa. O tratado “obrigava os núbios a dar um tributo anual de escravos e mercadorias em troca de uma quantidade razoável de roupas e alimentos que os árabes se comprometiam a oferecer-lhes” 50. O baqt permitia também a livre circulação os egípcios e os núbios nos dois reinos, garantia segurança aos viajantes por respectivas autoridades, a recíproca extradição de criminosos, fugitivos e o pagamento anual de um tributo correspondente a 360 escravos ao governador de Assuã no Egito51. Esse tratado durou sete séculos, isto é, do século VII a XIV. E permitiu o desenvolvimento do Cristianismo na região.

46 Núbia se situa no atual Sudão. 47 K. MICHALOWSKI, A cristianização da Núbia, p.339. 48 Ibid., p.341. 49 Ibid., p.334. 50 Ibid., p.340. 51 Stefan, JAKOBIELSKI, A Núbia cristã no apogeu de sua civilização, p.233. 30

Os principais missionários que evangelizaram a Núbia foram o padre Juliano e o bispo Longino. Com o desenvolvimento da religião cristã, várias catedrais foram construídas, como Qars, Ibrim, Faras e Dongola. “Em 707, o bispo Paulos construiu a catedral de Faras decorando-a com esplêndidos murais. Também a antiga Dongola, vários templos forma construídos, cobertos de magníficas pinturas” 52. A Núbia cristã foi marcada pela prospediade econômica,

Até o século IX, a Núbia gozou de um período inicial de prosperidade, sem ser muito perturbada pela vizinhança dos muçulmanos, em geral pacíficos (...). Em Faras, capital do reino, aristocratas e oficiais administrativos falavam grego como também os dignitários da Igreja. O clero compreendia inclusive o copta, que talvez fosse a língua de muitos refugiados53. No período cristão, na, Núbia foi marcada por grande progresso econômico. Só na região setentrional a população chegou a cerca de 50 mil. Com “saqia” (roda d’água), introduzida no período ptolomaico e romano, era possível aproveitamento das enchentes do Nilo, muito abundante naquela época. Cultivava-se o trigo, a aveia, o sorgo e vinha. Nas plantações das tamareiras, as fartas colheitas contribuíram para elevar o nível de vida da população (...). Makuria vendia marfim para Bizâncio, cobre e ouro para a Etiópia54. Com o advento dos Fatímidas, os coptas egípcios sofreram graves perseguições no final do século X sob o califato de Al-Hãkin (996-1021). Muitos se refugiaram na Núbia, inclusive o patriarca de Alexandria, Christodulos (1046-1071). Com a presença desse patriarca na Núbia, ele se tornou o sexagésimo sexto patriarca da Igreja núbia. A Igreja da Núbia era grande e “possuía 5 bispados (dioceses), sendo os bispados de Kurta, Kasr, Ibrim, Faras, Sai e Dongola”55. O reino da Alódia, por sua vez possuía seis bispados56. Além dos bispos, a Igreja da Núbia tinha presbíteros e diáconos. Segundo Jakobielski, “graças à lista dos bispos, incrita em um dos muros da catedral, igualmente em virtude de inscrições tumulares e grafites, pode-se estabelecer a completa cronologia dos bispos de Faras, desde a fundação da diocese, no século I, até 1175” 57.

Na região, a liturgia era feita em grego, copta e núbio. Um fato interessante, é que a volta de 1080, Salaman, rei da Núbia, abdicara em favor do seu sobrinho,

52 K. MICHALOWSKI, Op. Cit, p.341. 53 Ibid., p.349. 54 Ibid., p.342. 55 Stefan JAKOBIELSKI, Op. Cit, p.253. 56 Alberto da Costa e SILVA. A enxada e a lança. A África antes dos portugueses, p. 247. 57 K. MICHALOWSKI, Op. Cit, p. 253. 31

Georgias III para se tornar monge. Anualmente, os cristãos faziam peregrinação para Jerusalém a fim de visitar o túmulo de Cristo, considerado como um lugar sagrado. O comercio na região se fazia na base do escambo, sem o dinheiro como intermediário como na Alexandria. O rei Georgias da Núbia realizou duas viagens para Bagdá, acompanhado de bispos cristãos e membros da corte a fim de fazer negociações político-econômicas com o califato, porque, naquele momento, toda região era dominada por muçulmanos. A primeira viagem foi em 835. O fato do rei, viajar com bispos, pode levar a afirmar que já havia um processo de diálogo e negociação entre o Islamismo e o Cristianismo.

A Núbia cristã também desenvolveu a arte religiosa, os afrescos de Faras representavam pinturas de Cristo, da Virgem Maria, de santos e arcanjos, cenas do Antigo e Novo Testamento e de dignitários locais sob proteção de santos58. Tudo isso mostra que a Núbia, naquele momento era essencialmente cristã. Ainda segundo Jakobielski, a pintura Núbia, na sua idade clássica, teve influência bizantina. Através da iconografia religiosa, pode-se afirmar que os núbios possuíam um profundo conhecimento religioso (tradição e textos sagrados) e estavam em contato não somente com o Egito copta, mas também com a Etiópia, Armênia, Síria e Palestina59.

O fim da dinastia dos fatímidas em 1170 no Egito, consequentemente marcou o fim do baqt, começou a perseguição de núbios pelos muçulmanos, deterioração progressiva do Cristianismo na região. A decadência do Cristianismo começou em 1317, quando o sultão do Egito mandou depor o rei cristão de Macúria, Maí, e colocar no seu lugar um soberano islamita, Barxambu. A catedral de Dongola foi convertida em mesquita60. Outro fator que não favoreceu a subsistência da Igreja núbia foi que ela não era uma Igreja nacional como a Igreja da Etiópia e Arménia, cada bispo respondia de forma direta ao patriarca de Alexandria61. Segundo Silva, o reino de Dotauo, vassalo de Macúria manteve o Cristianismo até o fim do século XV, no reinado de Joel e do bispo metropolitano Mercos62. “Os beduínos ocupavam os desertos das duas margens do Nilo e assumindo o comando dos itinerários para o mar Vermelho e Darfur” 63. Um chefe beduíno, Abdala Jama, destruiu Soba entre o fim do século XV e o início do século XVI

58 Ibid., p.261. 59 Ibid., p. 265. 60 Alberto da Costa e SILVA, Op. Cit, p. 261. 61 Ibid, p. 262. 62 Ibid, p. 262. 63 Ibid, p. 263. 32

e reunificou uma parte do território de Alódia. A quebra do poder dos reis e acesso ao trono de soberanos não cristãos, os bispados viram-se desamparados e ainda longe de Alexandria. Cortado do abastecimento em clero com Alexandria, o Cristianismo núbio foi se extinguindo.

1.4. Axum64

Segundo a História dos Reis (Tarike Neguest), o Cristianismo foi introduzido em Axum por Frumêncio, um grego-fenício no século IV. Esse foi chamado de “Iluminado” (Kessate Brham, Abba Selama), pai da paz65. Frumêncio foi consagrado bispo pelo patriarca Atanásio de Alexandria como primeiro bispo de Axum (atual Etiópia), retornou para batizar o rei Ezana e toda sua família. Era contra o arianismo. O Cristianismo em Axum foi marcado pela história dos Noves Santos que vieram do Império Bizantino para evangelizar. Esses Noves Santos são Abba Aregawi, Abba Guerima, Abba Aftse, Alef, Tsihma, Tseden, Tsedeniya, Ym’ata e Gouba66.

“O Cristianismo introduzido por Flumêncio no século IV foi consolidado por esses santos, obviamente com o apoio dos sucessores do rei Ezano, como Caleb, Guebre Merkel, cristãos fervorosos” 67. Os nove santos professavam e defendiam a doutrina monofisita. O Cristianismo se implantou em outras províncias de Axum como Begemdir, Gogiam e Choa. Os templos dos deuses da época pré-axumita ou axumita, pré-cristã eram quase sempre construídos em lugares elevados. Após a conversão dos reis axumitas, todos esses templos foram transformados em templos cristãos.

Os grupos étnicos cuxitas (beja e aguew) adoravam seus deuses antes do contato com a cultura judaica. Os deuses eram Mahrem, Beher e Meder. Mahrem era o deus nacional, invencível68. Segundo a História dos Reis, o judaísmo teria entrado cedo em Axum. Havia um grupo de axumitas, de origem judaica e professando a mesma fé. Os indícios dessa presença são “a circuncisão e a excisão infantil, o respeito ao sabá. Os cantos sagrados e as danças litúrgicas acompanhadas de tambores, sistros e palmas evocam a dança dos judeus e do rei Davi diante da arca da aliança” 69. Nessa região, havia povos de origens diferentes. Falava-se grego, sírio, gêes e amárico. É preciso

64 Axum é a atual Etiópia. 65 Tekle T. MEKOURIA, Axum cristão, p.427. 66 Ibid., p.436. 67 Ibid., p. 436. 68 Ibid., p. 426. 69 Ibid., p. 427. 33

notar que o gêes e o amárico eram línguas locais. Edésio era imrão de Frumêncio, eram grego-fenícios. Foram apresentados ao rei Elle Ameda, para educar seus filhos a nova religião. Frumêncio tornou-se secretário e tesoureiro da corte. Os dois chegaram em Axum em 257 d.C. Em 315, Frumêncio voltou a Axum já consagrado bispo.

Algumas fontes históricas afirmam Frumêncio introduziu a fé cristã no país dos negros, porém a influência de Constantinopla na região não pode ser negligenciada. O rei de Axum mantinha relações amigáveis com o imperador de Constantinopla70. Os reis Zoscales (século I d.C) e Ezana (século IV) escreviam e falavam grego. Os axumitas também estavam espalhados na região. Alguns viviam em Constantinopla, outros iam para a peregrinação em Jerusalém, etc.

O império de Bizâncio começou a perseguição contra os adversários no próprio território e em outros. Esses se refugiam no Egito e no sul da Arábia, foi nessa circunstância que vieram de Bizâncio os noves santos. Os nove santos evangelizaram diferentes regiões de Axum, Debre-Dama, Mettera, Yeha, Bhzan e Tseden Tsedeniya e Guerealta. Foram principalmente eles que expandiram o Cristianismo em Axum. Após sua morte, vários templos foram dedicados em seus nomes. A história do Cristianismo em Axum está marcada por perseguições e massacres de cristãos por judeus e árabes, e pela vingança do Imperador Caleb, no início do século VI.

No século VI d.C, havia muitos judeus no sul da Arábia. Esses se refugiaram depois da primeira destruição do Templo de Jerusalém por Nabucodonosor, rei da Babilônia em 587 a.C. Outros também se abrigaram depois da destruição de 70 d.C. Milhares de cristãos monofisitas perseguidos em Bizâncio e em outras regiões encontravam também abrigo nessa região. Esses cristãos formaram uma poderosa comunidade religiosa em cidade de Najran e Zafar. Nessa região, os nativos árabes eram adeptos a religião tradicional, que consistia no culto à Lua. Todos (árabes, judeus e cristãos) viviam lado a lado em Najran e Zafar. Com o crescimento demográfico e sobretudo económico surgiram as rivalidades entre os cristãos, judeus e árabes. Depois de algum tempo, essa disputa tomou uma conotação religiosa de injúrias e discriminações. Os cristãos consideravam os judeus deicidas condenados às chamas do inferno, e os judeus insultavam os cristãos, chamando-os de Goyim, gentios e pagãos, adoradores do

70 Ibid., p.429. 34

homem71. Os árabes se aliaram aos judeus contra os cristãos e os massacraram. O massacre aconteceu em 523 quando o imperador Justino I governava Bizâncio e Caleb, Axum.

O imperador Caleb, filho de Tazena, decidiu vingar os cristãos massacrados, porque entre esses tinha axumitas. Recebeu o apoio da Igreja de Alexandria, de Constantinopla e do próprio imperador Justino I. Caleb reuniu 30 mil homens do seu exército. Do imperador romano Justino I, Caleb recebeu apoio de 120 mil homens e sessenta navios de guerra. Embarcou no fim do mês de maio de 525 e atacou os inimigos. No meio da carnificina, os cristãos inimigos que não sabiam falar a língua dos inimigos, desenhavam na mão o sinal da cruz como símbolo de sua identidade a fim de escapar da morte72.

Depois da guerra o imperador Caleb assistiu a cerimônia em memória aos cristãos martirizados e mandou construir um monumento por esse motivo. Ordenou também construir outro monumento em sua memória73. Depois de sua volta vitoriosa em Axum, em vez de desfrutar a vitória, retirou-se ao convento de Abba Penteleon a fim de levar uma vida monástica74. A partir de escavações realizadas por arqueólogos, foi descoberta a moeda axumita feita em bronze e com variados símbolos dos principais reis de Axum: Enbybis, Aphilas, Ousanas I, Wazeba, Ezana. Após a conversão de Ezana ao Cristianismo no século IV, todas as moedas retratam a cruz no centro de uma das faces ou entre as letras da legenda inscrita à sua volta. As legendas estão inscritas em grego ou etíope, nunca em árabe. As palavras dessas legendas variam: “Pela graça de Deus”, “Saúde e felicidade para o povo”, “Paz para o povo”, “Ele triunfará através de Cristo” 75.

Com o advento do Islã no, os axumitas permaneceram os senhores incontestáveis do Mar Vermelho no século VII, mas a partir do século VIII, o domínio do mar foi dos muçulmanos até o século XIV. Entre os séculos VII e XIV, a relação ente a Etiópia cristã e a Etiópia meridional (do leste), a Arábia do sul foi marcada por vários conflitos e guerras. A expansão Islã nascente para o interior da Etiópia encontrou uma grande resistência do Negus.

71 Ibid., p.441. 72 Ibid., p.442. 73 Ibid., p.442. 74 Ibid., p.442. 75 F. ANFRAY, A civilização de Axum do século I ao século VII, p. 392 e 394. 35

Os muçulmanos começaram primeiramente a conquistar as ilhas do mar Vermelho e estabelecer seus postos comerciais e construir mesquitas. Os habitantes da Etiópia meridional se converteram ao Islã e formaram sultanatos que rivalizavam com a Etiópia cristã. Esses sultanatos também guerreavam entre si em busca da hegemonia regional. Os principais são: Shoa, Ifãt, Damut, Adal76. Por causa das lutas fratricidas, o sultão Dil-mãrrah, derrotado em 1278 se asilou junto ao Negus da Etiópia cristã77. Se alguns sultões se refugiavam na Etiópia cristã depois de serem derrotados por seus inimigos, houve várias guerras nos séculos XIV-XV entre cristãos e muçulmanos, onde os Negus alcançaram muitas vitórias. Mas em 1475, um dos negus da Etiópia, Eskender, foi derrotado e morto pelo sultão de Adal, Shams d-dîn ibn Muhammad, que supostamente foi vencido78.

Concluindo, a África do Norte que era composta de Egito, Cartago, Tripolitana, Numídia, Mauritânia teve a presença cristã durante sete séculos (século I ao século VII). Nesse tempo, a região foi dominada sucessivamente por romanos, germânicos e bizantinos (turcos). Os romanos e bizantinos professavam a fé ortodoxa, oriunda do concílio de Niceia e Calcedônia. Os germânicoss eram arianos. Na parte mais oriental, se encontram a Núbia e o Axum, que não estiveram sob dominação romana e germânica como os reinos do Norte. A Etiópia foi por algum tempo influenciada pelo Imperio Bizâncio. Os historiadores não fazem menção da presença de germanos na Núbia e Etiópia. Com a conquista árabe, o Cristianismo desapareceu completamente em toda região menos no Egito e na Etiópia. O baqt permitiu o crescimento e subsitência do Cristianismo na Núbia até o século XIV. As Igrejas coptas e ortodoxas são numerosas na Etiópia. Esse é o único país africano com uma tradição e identidade critãs milenares.

76 Enrico CERULLI, As relações da Etiópia com o mundo muçulmano, p. 676. 77 Ibid., p.678. 78 Ibid., p.683. 36

2. Cristianismo Colonial

A África subsaariana teve dois contatos com a Europa. O primeiro se deu durante as viagens dos exploradores portugueses a partir do século XV e o segundo, durante a colonização propriamente dita no século XIX.

2.1. O Cristianismo no Reino Kongo (séc.XV-XVIII)

A história da África subsaariana anterior ao século XV é pouco conhecida por falta de fontes escritas. Mas no século XX, muitas pesquisas foram feitas por arqueólogos a tal ponto que hoje, podemos ter uma ideia do que foi a África antiga. Os romanos e os árabes dão algumas informações sobre seus contatos com o Magreb e África oriental (Etiópia e Sudão). Pouco se sabe sobre os países do sul do Saara. Foi depois da exploração portuguesa nas costas do continente, durante o século XV, é que começou a ser produzido.

Esse período está caracterizado pelo comércio das especiarias, que vinham do Extremo Oriente,

“O Extremo Oriente, representado pelo Japão e pela China, incluindo a própria Índia, era fonte de abastecimento do mundo em especiarias. O Oriente Médio que cobria uma vasta zona compreendendo a península árabe, o Império Safávida e o Império Otomano, o qual englobou a África do Norte.A Europa, com os eslavos, os escandinavos, os alemães, os anglo-saxões e os latinos que permaneciam confinados dentro de suas fronteiras. Em fim, havia a África, com sua encosta mediterrânea ao norte e suas costas do Mar Vermelho e do Oceano Índico que participavam, de forma crescente, do comércio internacional com o Extremo Oriente e com o Oriente” 79. De acordo com Malowist, “do ponto de vista dos historiadores, o período que vai de 1450 a 1630 foi marcado, na sua maioria dos países europeus, em particular, naqueles do Oeste e do Sudoeste, por uma formidável expansão econômica, política e cultural” 80. Inicialmente Portugal foi atraído pelo ouro da África subsaariana e exportava para os países islâmicos e europeus. Não obstante, eles não tardaram a perceber que a África possuía outra mercadoria, também fortemente procurada pelos

79 M. MALOWIST, A luta pelo comercio internacional e suas implicações para a África, p.1. 80Ibid., p.2. 37

europeus: os escravos. Em 1451, os portugueses chegam a Senegâmbia e começam a traficar os escravos. Entre o século XV e XVI, para comprar ouro e escravos, os portugueses formavam feitorias (postos) nas costas do continente: Costa do Ouro, Axin, Shema, Acra, Elmina, Arguin, etc. Só mais tarde é que os demais europeus (franceses, ingleses, holandeses, etc) aderiram a essa aventura e começaram a disputar a instalação de feitorias ao longo do litoral do continente. Em diversas viagens ao litoral africano, as embarcações portuguesas possuiam: exploradores, comerciantes, soldados e missionários.

Segundo Joseph Abraham L., os missionários portugueses, entre 1415-1885, se instalaram ao longo das costas africanas não somente para o comércio, mas para as missões (católicas) em várias regiões: Cabo Verde, Serra Leoa, Antigo reino Kongo, Cabo de Boa Esperança, Grande Zimbabué, Moçambique, Costa Suaíli, Eritreia e Etiópia. Missionários franciscanos, agostinhos, capuchinos, dominicanos, carmelitas e jesuítas trabalhavam sob a égide da Coroa Portuguesa e não do Vaticano81. Esses missionários foram os primeiros a escrever as línguas africanas. Produziram dicionários, livros de gramáticas e empreenderam o trabalho da tradução da Bíblia em línguas africanas. Esse trabalho missionário tinha como objetivo permitir uma melhor comunicação com os nativos para a sua evangelização.

É preciso notar também que no século XV, quando os viajantes portugueses, chegaram a Senegâmbia e nas costas da África Oriental (ilha de Moçambique, Zanzibar até Etiópia) encontraram populações já muçulmanas ou islamizadas. Na parte oriental, os suaílis eram essencialmente islamizados. A língua suaíli se forma apartir da mistura entre as línguas bantas e o árabe. Portanto, na África Negra, o Islã é anterior ao Cristianismo, exceto em países como Sudão do Norte e Etiópia que analisamos acima.

Os portugueses desembarcaram, por exemplo, no reino Kongo, onde não tinha ouro, mas em busca de escravos. Na falência do Império Português em 1560, outras nações entraram no jogo: França, Inglaterra, Espanha e Holanda. Se a presença de europeus nas costas da África Negra foi esporádica, os portugueses tiveram uma presença permanente no reino Kongo entre o final do século XV até o século XVII. Com o enfraquecimento do reino Kongo (1678), os portugueses colonizaram a Angola, que era uma província do reino Kongo, depois se separou dele para se constituir um

81 Joseph Abraham LEVI, A missionação em África nos séculos XVI-XVII. Análise de uma atitude, p. 441. 38

reino a parte. Nessa parte, será apresentada brevemente a presença cristã no reino Kongo.

O reino Kongo foi cristianizado entre 1482-1700. Depois dessa data, não se sabe bem da continuidade deste Cristianismo até a chegada dos europeus no século XIX para a colonização efetiva. O reino Kongo tinha seis províncias, Soyo, Mpamba, Nsundi, Mpango, Mbata e Mpemba. E fazia fronteira com outros reinos, Ndongo, Matamba, Loango, Ngoyo, Dembe e Kakongo82. O explorador português Diego Cão chega à foz do rio Kongo no dia 24 de abril de 1482 e manda um grupo de portugueses até Mbanza Kongo, capital do reino, para se encontrar com o rei Nzinga-a-Nkuwu. Segundo Joseph Abraham Levi, como esses demoraram em voltar, Diego Cão capturou alguns nativos e foi junto com eles para Portugal. Depois de três anos, voltou de novo para a África acompanhado de nativos que havia capturado e com um padre para dar início a evangelização do reino.

Esses nativos cativos permitiram a comunicação entre os portugueses e o rei, e facilitaram a adesão dos demais a fé cristã, já que eles falavam o português a língua. Em 1491, um grupo de missionários veio e se juntou ao único padre que trabalhava desde 1485. Tudo foi rápido, o rei Nzinga-a-Nkuwu aderiu à fé cristã, assim como toda sua família. Ele foi batizado e recebeu o nome de João em homenagem ao rei de Portugal, a rainha Ne Mbanda recebeu o nome de Leonor; e o príncipe, Nzinga-a- Mvemba83 foi nomeado Afonso, em homenagem ao príncipe de Portugal84.

Ainda segundo Joseph Abraham Levi, apesar do rei ser receptivo ao catolicismo mais do que qualquer outro rei africano, as missões católicas no Kongo tiveram curta duração. As rivalidades fraternas entre os herdeiros do trono, Nzinga-a- Mvemba e o seu rimão mais novo Nzinga-a-Mpanzu, acabaram com todas as atividades missionárias nessa área85. Nzinga-a-Mpanzu era inimigo da fé cristã. Antes da morte do rei Nzinga-a- Nkuwu, esse abjurou o Cristianismo, rejeitando o nome cristão de “João” e tomou partido do filho mais novo. O rei morreu em 1507 e os dois pretendentes ao trono

82 Lucas CAREGNATO, Entre terras do Ngola e do Manikongo: Descrição dos reinos do Kongo e Ndongo no século XV, p.6. 83 Alguns autores escrevem “Nzinga-a- Mvemba” ou “Mvemba-a-Nzinga”, trata-se de Afonso I, filho do rei Nzinga-a-Nkuwu. Esse foi o primeiro a se encontrar com portugueses. 84 Joseph Abraham LEVI, Op. Cit, p. 446. 85 Joseph Abraham LEVI, Op. Cit, p. 447. 39

lutaram para a sucessão, que culminou com a derrota de Nzinga-a-Mpanzu. Nzinga-a- Mvemba (Afonso I) tornou-se rei e governou durante 47 anos, ou seja de 1507 a 1554.

No reinado de Nzinga-a-Mvemba, o Cristianismo (catolicismo) tornou-se a religião oficial. Logo depois o seu filho Henrique foi enviado para estudar em Portugal. Depois dos estudos no seminário, foi ordenado padre e mais tarde consagrado bispo em Roma. Dom Henrique esteve à frente da Igreja do Kongo de 1518 a 1536, morreu e foi enterrado em Roma. Em seguida, os missionários portugueses voltaram a administrar o bispado86. Naquele tempo, toda a nobreza do reino se tornou letrada e cristã. Os filhos da nobreza kongo foram enviados para estudar em Portugal. A princípio, os missionários capuchinos e jesuítas foram encarregados de evangelizar e educar os habitantes do reino, depois a eles se juntaram os dominicanos e loios. O rei comercializava cobre e ferro com os portugueses. Uma parte desse “rendimento usava para pagar técnicos e missionários portugueses, assim como para que os nobres do país pudessem estudar em Portugal”87. Além do bispo Henrique, não se sabe o número e o papel do clero autóctone no reino.

O rei Nzinga-a-Mvemba sabia ler e escrever em português e mantinha várias correspondências com seu colega, o rei de Portugal, e também com o Vaticano. Em uma de suas correspondências, que data de 05 de agosto de 1526, mandou um embaixador kongo ao rei de Portugal para um regimento missionário e uma reforma do seu reino. O documento abordava assuntos referentes à saúde, educação, evangelização, escravidão, comércio, política interna do reino, etc88. A grande preocupação do rei era o tráfico crescente de escravos em seu território. Ele foi um dos atores principais da evangelização do reino, pretendia “transformar o Congo num reino cristão, ponta de lança da conquista espiritual da África, crendo que a ação missionária e a introdução de novos modelos culturais fariam dele uma réplica perfeita do reino de Portugal” 89. Era chamado de “Apóstolo do Congo”, porque via no Cristianismo, um meio de reforçar a sua autoridade90. Ele pretendia impor sua crença à força ao povo, ordenou destruir todos

86 Jan VANSINA, O reino do Congo e seus vizinhos, p.657. 87 Ibid., p. 659-660. 88 António Custódia GONÇALVES, Op. Cit, p. 532. 89 Ibid., p.533. 90 Ibid., p.533. 40

os feitiços, assim como faziam os missionários91. Mandou construir templos e escolas em todo território do reino Kongo.

Depois da morte de um dos sucessores do rei Nzinga-a-Mvemba, Nzinga Mbande, irmã do rei sucedeu em 1624, essa foi batizada com o nome de Anna. A rainha Nzinga Mpande começou a combater os portugueses. Em 1645, no reino de Garcia II, chegou mais um fluxo de missionários capuchinos italianos, mais tarde chegaram outros 400 missionários para a evangelização 92. Depois da batalha de Mbwila (1666-1678) entre o rei do Kongo e os angolanos (apoiados por portugueses e brasileiros), Mbanza Kongo foi completamente e o rei decapitado em 1678. Com a decadência do reino Kongo, surgiram vários profetas e profetisas, com o intuito de restaurá-lo. Em 1704, entre estes, está a Kimpa Vita, conhecida também como Dona Beatriz. Essa começou a

pregar um Cristianismo renovado, chamado de antonianismo. Rejeitava os ensinamentos dos missionários e dos brancos. Exortava os pretendentes ao trono a abandonar a luta, restaurar o rei e repovoar Mbanza-Kongo. Obteve grande sucesso popular e convenceu um candidato ao trono a se estabelecer em Mbanza Kongo onde lhe cobriu a cabeça com a coroa negra antoniana. Dois anos depois, foi capturado pelo pretendente Pedro II e queimada como herege. O seu movimento perdurou por ainda alguns anos93. Segundo Gonçalves, Kimpa Vita não era somente profetisa, mas chefe de uma pequena aldeia de Soio (Soyo). Afirmava ser a reencarnação de Santo António. É preciso notar que desde aquela época, Kimpa Vita queria uma reforma profunda e propunha uma africanização do catolicismo. Ela alegava uma relação direta com o céu, por isso que era considerada munaki (profetisa) 94. Em suas práticas religiosas, usava símbolos locais ligados à água, ao solo e à vegetação. Afirmava que a santa família era negra e vinha de Mbanza Kongo. Ela reconhecia a autoridade do Papa, mas queria expulsar os missionários porque segundo ela, falsificavam a revelação. Contrariamente ao rei Nzinga-a-Mvemba, Kimpa Vita, retomou os valores e as práticas tradicionais do Congo, revitalizando-os95.

91 Ibid., p. 534. 92 Ibid., p. 690. 93 Ibid., p.691-692. 94 Ibid., p.700. 95 Ibid., p.536. 41

Ainda segundo Gonçalves, “Kimpa Vita morria e ressuscitava toda semana” 96. “Morrer” era uma prática na sociedade kongo que acontecia no rito de iniciação. Os iniciados eram desvinculados de sua personalidade anterior. E “ressuscitar” consistia em um ritual realizado em noites de lua cheia, durante o qual, os iniciados se comprometiam à vida, ao trabalho, à formação da família e recebiam um novo nome. Segundo ele, Kimpa Vita realizava milagres, as mulheres que não podiam engravidar, tornavam férteis. Kimpa Vita se apresentava como uma revolucionária. Em sua aldeia, instaurou uma hierarquia entre os antonianos. Instituiu a coerção física contra os marginais e recalcitrantes97.

O que é importante ressaltar na vida de Kimpa Vita é o desejo de colocar em diálogo o sistema político português ocidental e o sistema político tradicional (linhagem e hereditária), de um lado e do outro lado, o sistema simbólico (religioso) Cristianismo e as RTA (religiosidade Kongo). Os movimentos messiânicos que surgiram mais tarde naquela região (RDC, Congo Brazzaville e Norte de Angola), desde o fim do século XIX, e especialmente no início do século XX (Kimbanguismo, Matsouanismo, Tokoismo, Budu Dia Kongo, etc.) se declaravam continuadores da obra de Kimpa Vita, e são interpretados como de inspiração antonianista. Consideram a profetisa Kimpa Vita como precursora.

Os missionários capuchinos prosseguiram a evangelização no Kongo até 1700, grande parte da população foi batizada e o Cristianismo chegou até às aldeias mais distantes. Os missionários combatiam os ritos do kitomi, da feitiçaria, o culto aos antepassados e as associações terapêuticas (kimpasi, marinda), mas toleravam a medicina praticada pelos nganga98. Segundo Jan Vansina, esses missionários usavam as procissões e as respectivas orações para substituir os ritos de fecundidade que os nativos praticavam. Além do Movimento dos Antonianos da Kimpa Vita, haviam várias confrarias na antiga Mbanza Kongo. Em todo reino havia devoção ao São Francisco e Santo Antônio.

Segundo Ogot, a história da religião na África entre o século 1500 e 1800 está marcada pelo declínio do Cristianismo na Etiópia e no Congo e o crescimento e

96 Ibid., p. 536. 97 Ibid., p. 537. 98 Ibid., p. 699. “Nganga” pode ter significação diferente, dependendo do contexto no qual é usado: Nganga nkisi (feiticeiro ou curandeiro) e Nganga Nzambe (em kikongo e lingala, línguas bantas). 42

expansão do Islamismo na África de Oeste e Sudão do Norte99. O cristianismo que se implantou no Congo no século XVI, cresceu e se expandiu, o seu declínio começou com o fim do reino Kongo e o seu desmembramento no século XVII. Na Costa da Guiné inferior, o Cristianismo foi introduzido pelos holandeses e ingleses. Começaram por criar escolas elementares em seus castelos na Costa do Cabo, Elmina e Accra. Nos meados do século XVIII, os missionários haviam sido enviados para a Costa do Cabo pela Sociedade para a Propagação do Evangelho. Alguns nativos foram enviados para Europa a fim de estudar, de volta, se tornaram professores e missionários100.

2.2. Do século XIX a 1960

A entrada dos europeus no continente africano se deu pela conquista militar e ocupação,

na história da África jamais se sucederam tantas e tão rápidas mudanças como durante o período ente 1880 a 1935. Na verdade as mudanças mais importantes, mais espetaculares - e também mais trágicas - ocorreram num lapso de tempo bem mais curto, de 1880 a 1910, marcada pela conquista e ocupação de quase todo continente africano pela potencias imperialistas e, depois, pela instauração do sistema colonial. A fase posterior de 1910 caracterizou-se essencialmente pela consolidação e exploração do sistema101. A conquista e ocupação da África foram precedidas por um processo longo de estudo, observação e negociação entre os líderes europeus e africanos. Os europeus ocuparam algo que já conheciam até os detalhes. Começaram enviando especialistas, os geógrafos para observar os africanos, estudar o clima, a vegetação a fim de facilitar a ocupação. Trata-se de um assalto, uma invasão não somente da soberania dos Estados e Reinos africanos, mas também os sistemas de valores. Diante dessas mudanças bruscas, os africanos não tinham outra opção a não ser se adaptar ou sucumbir.

Diante dessa ocupação, a grande maioria dos dirigentes africanos se opôs e defendeu a sua soberania, religião e vida tradicional, alguns se aliaram aos invasores para lutar contra os seus inimigos e outros resistiram até o último suspiro. Nenhum colaborou com os invasores. Como os europeus conseguiram ocupar a África?

99 B.A. OGOT, A história das sociedades africanas de 1500 a 1800: Conclusão, p.1067. 100 Ibid, p. 1067. 101 Albert Adu BOAHEN, A África diante o desafio da colonização, p.1. 43

No entanto um fato escapava aos africanos, em 1880, graças ao desenvolvimento da revolução industrial na Europa e ao progresso tecnológico que ela acarreta - a invenção do navio a vapor, das estradas de ferro, do telégrafo e sobretudo da primeira metralhadora, a Maxim-, os europeus que eles iam enfrentar tinham novas ambições políticas, novas necessidades econômicas e tecnologia relativamente avançada102. Dessa vez, os europeus não queriam apenas trocar bens, mas exercer controle político direto sobre a África. O objetivo essencial das autoridades coloniais continuava a ser a exploração dos recursos africanos, fossem animais, vegetais ou minerais, em benefício exclusivo das potências metropolitanas, principalmente de suas empresas comerciais, minerais e financeiras. Deve-se mencionar aqui que a colonização foi um sistema desumano e racista, que gerou opressão e morte na África inteira (do Magred e ao sul do Saara), excepto a Etiópia e Libéria.

Segundo Kofi Asare Opoku, no final do século XVIII, surge um poderoso movimento missionário na Europa. Mas antes disso, a partir da década de 1840, assistiu-se a penetração dos missionários no interior do continente, enquanto que no período anterior caracterizara-se por concentração ao longo da costa103. Uma figura emblemática dessa penetração foi o missionário David Livingstone.

A arrancada para o sertão tornou-se possível graças à exploração geográfica, que deu aos europeus, maior conhecimento sobre o interior da África. Além disso, inúmeros missionários deviam estabelecer centros de catequese e de civilização destinados não só a expandir a religião, mas também a promover o comércio e a agricultura104. Assim que as nações europeias interessavam-se mais pela aquisição de territórios africanos, os missionários franqueavam lhes o caminho em algumas zonas e serviam conscientemente enquanto agentes do colonialismo europeu105. Dessa maneira, o Cristianismo serviu de ideologia do ponto de vista simbólico para conquista e dominação da África por europeus. Além de empregar o proselitismo, o missionário tinha uma estreita relação com o colonizador.

O cristianismo se desenvolvera em estreita colaboração com o colonialismo, enquanto o islão e a religião tradicional estavam, sobretudo distantes e eram por vezes e inclusive hostis a ele106.

102 Ibid., p. 7. 103 Kofi Asare OPOKU, A religião na África durante a época colonial, p.596. 104 Ibid., p. 596. 105 Ibid., p. 597. 106 Tshishiku TSHIBANGU, Religião e evolução social, p.613. 44

Os missionários europeus e americanos guardadores de um forte domínio sobre as Igrejas por eles fundadas, eles eram mais próximos, no pensamento e nos atos, dos funcionários coloniais e dos colonos europeus, comparativamente aos seus colegas, assistentes e párocos africanos107. Os estabelecimentos religiosos (templo, hospitais, escolas, plantações) faziam parte da estrutura colonial, que os movimentos independentistas e africanos tentavam descolonizar. Ainda segundo Kofi Asare Opoku, “a instauração do domínio colonial ajudou consideravelmente a obra dos missionários” 108. Ele avança quatro motivos,

os administradores coloniais compartilhavam a mesma visão do mundo e provinham da mesma cultura. A administração colonial alimentava disposição favorável ao trabalho dos missionários e, muitas vezes, subvencionavam as escolas das missões. A imposição do controle colonial em cada território assegurava a paz e a ordem graças às quais os missionários podiam contar com a proteção da administração. A introdução de meios de comunicação eficazes e a instauração da economia monetária estimularam o comércio e contribuíram para o advento de um novo estilo de vida, que haveria de impor-se em toda África, caracterizado pela falência das comunidades em proveito do individualismo109. O Cristianismo (catolicismo e protestantismo) era considerado como religião dos vencedores, fonte do poder do homem branco. Ele dava acesso à educação, ao emprego, ao poder e à influência no mundo dos brancos110. Tshibangu Tshishiku afirma que o papel do Cristianismo na “promoção da educação ocidental em diferentes níveis (ensino primário, secundário, na formação de professores, no ensino técnico e universitário) esteve no cerne do desenvolvimento africano” 111. Esses missionários trabalhavam na educação graças ao financiamento da administração colonial, através de impostos aplicados112. Os missionários eram aliados e complemento do Imperialismo colonial europeu.

Os missionários manifestavam uma atitude negativa para com a cultura e religião africanas. Desde o início, estavam decididos a destruí-las113. Segundo os missionários, o verdadeiro Deus era o Deus cristão revelado pela Bíblia. Jesus Cristo era

107 Ibid., p. 613. 108 Kofi Asare OPOKU, Op. Cit, p. 610. 109 Ibid., p. 610-611. 110 Ibid., p. 611. 111 Tshishiku TSHIBANGU, Op. Cit, p. 612. 112 Ibid., p. 612. 113 Kofi Asare OPOKU, Op. Cit, p. 612. 45

o único salvador da humanidade e a Igreja cristã era o único meio para alcançar a graça divina e salvação. O proselitismo dos missionários cristãos está relacionado ao fato deles se declararem detentores da verdade.

O cristianismo colonial condenava e rejeitava todas as práticas tradicionais: derrame de libações, cerimônia de pompa, batuques e danças, ritos de passagem, ritos de iniciação (para moços e moças), rito fúnebre, etc. Os missionários negavam a existência dos deuses, da bruxaria e de outras entidades sobrenaturais em que os africanos acreditavam. Segundo Opoku, tornar-se cristão nessa época significava, em larga medida, deixar de ser africano e tomar como ponto de referência a cultura europeia. O Cristianismo exercia uma força desagregadora sobre a cultura africana114.

“A reação africana aos esforços dos missionários assumiam três modos diferentes: aceitação, rejeição e adaptação” 115. Os primeiros a aceitarem a fé da nova religião eram párias e indivíduos rejeitados: leprosos, pessoas que sofriam de invalidez social, os que tinham violado algum tabu tradicional e fugiam de perseguição: mulheres que davam à luz a gêmeos. Os ensinamentos de missionários sobre a igualdade e fraternidade davam esperança, confiança e inspiração aos párias116.

O crescimento e a expansão da nova religião não ocorreram somente por iniciativa dos missionários europeus, mas também dos convertidos, catequistas, ministros de cultos, chefes tradicionais (chefe Lewanika e Lobengula). Inúmeros evangelistas africanos (leigos) deixaram seus negócios, suas aldeias e foram trabalhar junto com os missionários. “Os evangelistas baganda levaram o Cristianismo a outros povos como os Banyakare, os Bakiya, os Batoro, os Bagisu e Langi, chegando até Congo-Belga e Ruanda, de 1896-1899, e depois de 1915 a1933”117. Canon Apoio Kivebulaya (1866-1933) trabalhou junto com pigmeus no Congo Belga. O bispo yoruba Samuel Ajayi Crowther trabalhou no Vale do Niger e o profeta liberiano William Wade Harris pregou o Evangelho em Costa de Ouro, Costa do Marfim e Libéria118.

Porém outro grupo de africanos rejeitou a pregação de missionários e continuou a praticar a religião tradicional africana. Outro ainda fazia parte da comunidade de

114 Ibid., p. 612 115 Ibid., p. 612. 116 Ibid., p. 612. 117 Ibid., p. 612. 118 Ibid., p. 613. 46

convertidos, depois criticou e rejeitou a pregação de missionários, alegando que esses estivessem falsificando a fé cristã, como o fez Kimpa Vita no século XVII no reino Kongo, que fundou a própria Igreja. Esse grupo queria adaptar o Cristianismo à cultura africana. É assim que surgiram as Igrejas Independentes Africanas em todo território da África subsaariana.

2.2.1. Vantagens da Colonização

A contribuição dos missionários (protestantes e católicos) na educação foi relevante. “Os missionários não se interessavam unicamente pela educação ocidental. Dedicaram-se ao estudo de línguas africanas, à elaboração de ortografias, aos estudos linguísticos iniciais e a tradução da Bíblia e de outras obras religiosas, no sentido de criar uma nova tradição literária em línguas africanas e promover a alfabetização” 119.

Notemos também que os relatórios de missionários constituíram documentos sobre os quais, os fundadores das ciências humanas no século XIX (antropologia e sociologia) se inspiraram. Deve-se a eles a fundação das primeiras clínicas e hospitais na África. Alguns autores interpretam o Cristianismo pregado por eles como uma religião progressista, “Um dos grandes atrativos do Cristianismo residia nos importantes esforços por ele empreendidos na implementação de medidas progressistas e no encorajamento dos seus fiéis a ultrapassarem os limites da sociedade tradicional e alcançarem um mundo em vias de modernização, transição (...)” 120.

Os missionários desempenharam papel importante na introdução da economia monetária na África. As missões faziam plantações em inúmeras partes do continente, acrescentando outras espécies à cultura dos produtos locais e ajudando na difusão do cacau, do café, do tabaco, do algodão e da cana-de-açúcar121. O exercício do poder nas instituições religiosas sempre criou tensões, conflitos até divisões. “Em 1935, numerosos missionários estimavam que os africanos não poderiam ocupar, no interior da Igreja postos de responsabilidade comparáveis àqueles por eles ocupados no século XIX, antes da instauração do regime colonial”122.

119 Ibid., p. 613. 120 Ibid., p. 613. 121 Ibid., p. 611. 122 Tshishiku TSHIBANGU, Op. Cit, p.613. 47

2.2.2. Africanização do Cristianismo

A africanização deveria ser um processo lento e integral, tocando todas as esferas da vida da sociedade africana (política, economia, ciência e tecnologia, religião e sistemas de valores).

A maior parte dos dirigentes africanos após independências recebera uma educação ocidental, mas, eles estavam contudo e extremamente, consciente do fato que esta última implicava certo grau de colonização mental, de submissão forçada às ideias ocidentais e alienação em relação às raízes da cultura. Faltava-lhes, primeiramente transcender estes obstáculos e, tirando partido do trabalho dos missionários em respeito às línguas africanas, reatar contato com o pensamento e os valores africanos, utilizando-os com vista a vislumbrar uma nova sociedade africana123. Se a africanização foi difícil no campo político, mas alguns líderes religiosos africanos (católicos e protestantes) iniciaram o processo. No campo religioso africano, nota-se a anterioridade da africanização nas IIA. Alias, o motivo pelo qual, alguns africanos se levantaram para fundar as próprias Igrejas, era a necessidade de adaptar o Cristianismo à cultura africana. Essa africanização não somente consistia em transformar as estruturas e substituir as autoridades eclesiais europeias por africanas, mas em africanizar as formas e o conteúdo do Cristianismo, sem perder a essência de seus valores. Em nossa opinião, o problema da África hoje não se limita somente ao campo religioso e teológico, mas está também no campo econômico, político e social. É preciso africanizar principalmente a democracia, o modelo político ocidental, as formas de produção e distribuição de bens materiais, a ciência e a tecnologia. Africanizar significa aqui adaptar e contextualizar a cultura e aos costumes locais. Um dos documentos importantes da africanização do Cristianismo foi “Padres negros interrogam-se”, publicado em 1956 por dignitários africanos da Igreja Católica124. Foi resultado de um colóquio que reunia padres africanos. Esse documento foi fruto da reflexão teológica desses padres sobre a relação entre o Cristianismo e a cultura africana e seu papel no crescimento e expansão do Cristianismo universal.

A revista Presence Africaine, em Paris, de Alioune Diop, tratava de assuntos relacionados ao pensamento religioso africano e à pesquisa teológica. abordou temas

123 Ibid., p. 613. 124 Ibid., p. 614. 48

como “as religiões africanas como fonte de valores civilizatores”, “a Igreja católica e a civilização negra” 125. No campo protestante, líderes religiosos de várias denominações empreenderam um esforço de trabalhar conjuntamente em níveis de pan-africanismo e ecumenismo126. O Conselho Ecumênico de Igrejas realizou vários encontros de teólogos africanos, um deles foi realizado em Abidjan (1969) 127 a fim de refletir sobre diversos assuntos ligados ao Cristianismo na África. Segundo os teólogos, a religião tradicional africana é uma preparação ao evangelho cristão128. O que marca uma grande mudança em relação à postura dos missionários, que a considerava pagã e alheia à fé cristã. Além de outras aborgadens, pode-se resumir três correntes de teologia na África:

 A teologia da inculturação que consiste em colocar em diálogo a cultura africana e o Cristianismo. Buscar dentro da tradição africana, os valores que sejam iluminados ou iluminam a fé cristã. Valores que complementam ou prolongam a mensagem cristã. Essa inculturação se mostra pelo emprego de elementos africanos na liturgia: língua, canto, dança, símbolos e instrumentos musicais (batuque).  A teologia africana propriamente dita, que faz a distinção entre a teologia da religião tradicional e a teologia africana. Ela rejeita o diálogo entre ambas. E é o pensamento de teólogos cristãos africanos, derivado do contato com a Bíblia, interpretada à luz da experiência histórica e da realidade africanas no contexto de diálogo com outras correntes teológicas129.  A teologia da libertação, desenvolvida especialmente na África do Sul, é uma reflexão que se inspira na fé bíblica expressa em línguas africanas e consoante com as categorias culturais africanas, respirando ares da experiência e reflexões dos povos oprimidos sob o apartheid em luta pela libertação (como os negros estadunidenses, os negros e indígenas da América Latina) 130.

125 Ibid., p. 614. 126 Ibid., p. 614. 127 Ibid., p. 614. 128 Ibid., p. 615. 129 Ibid., p.616. 130 Ibid., p. 616. 49

3. Igrejas Independentes Africanas131

“As Igrejas Independentes Africanas (IIA) são as religiões que nasceram na África subsaariana, diferentes das religiões importadas (Cristianismo e Islão), são sincréticas e proféticas” 132. Sincrética por misturar elementos do Cristianismo com os das RTA, e profética, porque anunciavam o fim da colonização e a libertação dos negros. As IIA são religiões fundadas na África, por africanos para africanos.

Segundo Tshibangu Tshishiku, o surgimento de Igrejas Independentes Africanas em toda África é resultante do conflito entre colonizadores europeus e povos oprimidos. Também é consequência da falta de oportunidade para cidadãos negros de expressar suas opiniões políticas, religiosas e sociais133. Segundo Hans Kung, a divisão da África encontrou uma feroz resistência de africanos, essa foi movida pela religião. Desde o século XIX, houve já uma oposição às igrejas oficiais, a estabelecer uma nova forma de cristianismo, dito “africano”. “É aqui- e não na América Latina, que são encontrados os primeiros inícios da teologia cristã da libertação” 134. “O protesto profético e a fé cristã messiânica foram abrindo o caminho. Fundiram-se com velhas tradições africanas e, através da dinâmica capacidade de vivência religiosa do africano, deram mostra de uma grande força espiritual” 135.

As ideologias colonialistas penetraram na estrutura política, social e cultural da sociedade africana. Mesmo depois da independência de países africanos, as marcas da colonização não foram completamente apagadas. Através dos líderes marcados pelo carisma, profecia e messianismo, esses movimentos religiosos se constituíram em resistência contra a colonização no plano cultural e simbólico.

Em face das igrejas missionárias europeias conluidas com o poder colonial, em face da incompreensão dessas igrejas para com a peculiaridade, psicologia, língua, cultura, costumes e responsabilidade africanos, muitos negros cristãos frequentemente

131 As Igrejas Independentes Africanas são chamadas também de Igrejas Separatistas, Igrejas do Espírito, Igrejas autóctones ou de Cristianismo Africano. 132 Michel LEVALLOIS. Relatório sobre o debate sobre as Religiões Africanas (CADE), 28 de março de 2001, Bruxelas, In Congo Forum, Disponível: http://www.congoforum.be/fr/congodetail.asp?subitem=37&id=8275&Congofiche=selected, acesso 17/03/2014. 133 Tshishiku TSHIBANGU, Op. Cit, p.626. 134 Hans KÜNG, Religiões do mundo. Em busca dos pontos comuns, p. 51. 135 Ibid, p. 51. 50

camponeses explorados, por motivos religiosos decidiram-se pelo protesto. Sob liderança de chefes, ministros religiosos, professores ou trabalhadores, eles começaram ganhar autonomia. Para esses africanos, os missionários estrangeiros pareciam anunciar um falso Deus, um Deus de opressão e de exploração. Por isso fundaram igrejas livres africanas independentes. Agora, finalmente, precisamente no culto divino, os africanos podem ser eles mesmos, podem cantar e mover-se como estavam acostumados a fazer, podem ter seus próprios apóstolos, profetas, médicos e pregadores 136. O mérito das IIA foi a contextualização da mensagem cristã. As IIA não só criticaram e protestaram contra a colonização religiosa e ideológica, mas também política e econômica. Foi um campo de resistência e preparou o campo para o surgimento do nacionalismo. Reconheciam a existência e os efeitos da bruxaria e combatiam-na por meio da fé em Jesus Cristo. Foi um campo de diálogo entre a religião tradicional e a religião imposta pelo colonizador. A partir desse protesto e reflexão que africanos descobriram a opressão na qual viviam, a incoerência na pregação e na vida missionário colonizador (padres e pastores). Esses pregavam uma coisa e viviam outra, esquecendo que Evangelho de Jesus é essencialmente libertador.

Nessas igrejas, os africanos poderiam se sentir eles mesmos. “Se sentir bem” e “sentir-se você mesmo” dentro de uma comunidade religiosa é o ponto de partida de uma religiosidade autêntica e libertadora. Não tem como a pessoa pertencer a uma instituição religiosa contra a sua vontade ou porque ela lhe oferece segurança material e espiritual (bens materiais e a vida eterna). Mas primeiramente, o fiel deve sentir-se bem, emocional e espiritualmente. Sentir-se bem é o fruto de uma reflexão teológica local: acolhida, falar na linguagem da comunidade, tocar os assuntos de atualidade dentro da comunidade, valorizar as pessoas, dar-lhes a oportunidade de se expressar, celebrar na própria língua, cantar e dançar usando os instrumentos musicais autóctones. O mais importante é fazer com que a mensagem bíblica tenha incidência na comunidade.

As IIA estão espalhadas em toda África subsaariana 137. Ainda segundo Tshibangu Tshishiku, o que possibilitou o crescimento e expansão dessas Igrejas foi a leitura e tradução da Bíblia em línguas africanas. A partir daí, os cristãos africanos começaram a comparar a mensagem pregada por missionários e o que eles mesmos liam diretamente

136 Ibid., p. 51-52. 137 A lista é longa. Para mais informação: Kofi, Asare OPOKU, A religião na África durante a época colonial, p. 613-623. Exemplo de algumas Igrejas Independentes Africanas: país, nome, fundador e ano da fundação, veja Tabela 1, p.216. 51

da Bíblia. Além de colocar ênfase nos aspectos de resistência, de contestação e protonacionalismo destes movimentos, não se pode esquecer que elas Igrejas têm aspectos mais positivos e inovadores: “a buscar por uma teologia africana, capaz de conciliar os valores espirituais africanos e a inspiração Bílbica Cristã” 138. Como disse Hans Kung, elas têm um aspecto essencialmente libertador. É o grito dos pobres e oprimidos do sistema colonial de exploração e desumanização. Elas poderiam ser consideradas centros de reavaliação das religiões e das teologias africanas, em razão de elas terem renovado a temática humanista e o tratamento das questões no tocante a santidade da vida e solidariedade139.

Com as IIA, os africanos urbanos e camponeses encontravam uma religião que respondiam às suas necessidades. As IIA tiveram o mérito de preservar os sistemas de cura tradicionais no interior do mundo cristão moderno.

Além do seu valor como centro de contestação, elas talvez tenham desempenhado um papel ainda mais importante, ao preservarem a cosmologia africana no quadro dos ensinamentos cristãos. Igualmente, foi possível, para os deserdados da cidade e para os interioranos dos campos, aderirem em grande número a estas Igrejas, abandonarem as antigas divindades da religião tradicional e compreenderem o colonialismo e a sua versão do modernismo, sem estarem submetidos ao traumatismo da renúncia à essência da sua visão do mundo. Justa e particularmente foram as visões tradicionais de cura e salvação pela fé, impossíveis de lhes serem oferecidas dada a incapacidade das missões, que atraiu a maioria dos indivíduos para estas Igrejas. Elas ofereciam aos seus membros uma secularidade contra as forças tradicionais do mal e da feitiçaria. Nas cidades, elas constituíram um ambiente seguro marcado pela solidariedade e hospitalidade, além de oferecerem certa proteção social não proporcionada pelo sistema colonial. Elas permitiram trazer como desejado pela tradição, um apoio ao talento artístico do drama do ritual, bem como a música vocal e instrumental, tal como fizera a religião tradicional. Mas antes e sobretudo, foram estas Igrejas que permitiram a sobrevivência dos sistemas de cura tradicionais no interior do mundo cristão, até o dia a partir do qual recomeçou-se admitir publicamente o seu valor social140. A emergência de múltiplos e complexos movimentos messiânicos nas sociedades africanas tanto antes quanto após a independência revela-se como resposta às exigências

138 Tshishiku TSHIBANGU, Op. Cit, p. 626. 139 Ibid., p.626. 140 Ibid., p. 626-627. 52

socioeconômicas e à busca de novos caminhos espirituais. À procura de um novo equilíbrio global na sociedade, os africanos demostraram a necessidade de reconstruir seus sistemas religiosos de outrora, os quais lhes proporcionam todos os elementos necessários, levando-se em conta a sua situação geral141.

Segundo os especialistas, em 1987, estimava-se cerca de 10.000 Igrejas Independentes no continente, reunindo aproxidamente 33 milhões de fiéis. Enquanto elas se espalham por toda África, elas se concentram sobre tudo na África do Sul (3000), na Nigéria (800), na RDC (mais de 600), em Gana (cerca de 400) e no Quênia (180). Seus líderes eram considerados “Cristos Negros”, messias negros, salvadores dos oprimidos, reencarnação de Jesus Cristo, Grandes Profetas.

O Movimento Roho começou entre o povo luo no oeste do Quênia como movimento popular carismático entre os jovens da Igreja Anglicana. Os seus fundadores são Alfayo Odongo Mango (1889-1934) e o seu sobrinho Lawi Obonyo (1911-1934). Esse movimento foi caracterizado por muitas visões, curas e milagres. “Mango profetizó el fin del colonialismo y hizo campaña a favor de que se restituyera a los luos la tierra que les había quitado, también predicó contra ciertas costumbres de este pueblo indígena”142. Mango instaurou o rito de batismo e de comunhão. Sua casa virou um lugar de oração onde sairam vários missionários e evangelistas. Em 1934, um missionário inglês anglicano, juntamente com os colonizadores assassinou Mango, Lawi e seus sete seguidores. Desde então, a Igreja JoRoho (povo do Espírito) teve uma vigorosa expansão no Quênia e nos países vizinhos como Uganda e Tanzânia. A Igreja tinha ênfase no Espírito Santo (batismo do Espírito Santo e exorcismo), os líderes religiosos e fiéis vestiam roupas brancas como símbolo de pureza. “Las iglesias Roho mantienen que la muerte sacrificial de Mango expió sus pecados y abrió el Cielo para los africanos. Oran a Mango llamándole “nuestro salvador” y su figura há inaugurado una nueva era en el reinado del Espírito Santo en la África”143.

No Benim144 por exemplo, podemos encontrar Igrejas como Primeira Missão Africana Bodo Owa (1901), Igreja Metodista Eledja (1930), Igreja Primitiva do Cristo e a Igreja do Cristianismo Celestial (ICC). A ICC foi influenciada pela Igreja Aladura da

141 Ibid, p. 627. 142 Allan ANDERSON, El pentecostalismo. El Cristianismo carismático mundial, p. 138. 143 Ibid, p. 138. 144 Albert de SURGY, Le phénomène pentecôtiste en Afrique noire. Le cas beninois, p.9. 53

Nigéria. Hoje é uma das Igrejas mais populares em Benim e Nigéria. Expandiu-se em vários países da África, Europa e América. Ela será analisada com mais detalhe adiante.

Dentre as Igrejas Independentes sul-africanas, existe a corrente messiânica, como o Movimento Isaiah Shembe do líder carismático Enoch Mgijima. Os discípulos desse último, chamados de “Israelitas”, foram assassinados por colonos brancos, pois o profeta lhes tinha prometido que durante o confronto com os colonos brancos, as suas balas se transformariam em água. Falar de israelitas nos remete aos movimentos de resistência Mau-Mau do Quênia na época colonial, e aos Mai-Mai145 na RDC (no tempo colonial, durante a rebelião de 1964 e na guerra civil da RDC (1996-2014)). Os mai- mai (como também os bakataka katanga146) são milícias congolesas de resistência contra a invasão estrangeira (ugando-ruandesa), ocupação de terras e o extermínios dos nativos. São chamados de forças de autodefesa e têm raízes na cultura local.

Para entender melhor a dinâmica das Igrejas Independentes Africanas, apresentaremos quatro delas, Igreja Harrista, Igreja Musama Disco Christo, Igreja Kimbanguista e Igreja do Cristianismo Celeste.

3.1. Igreja Harrista

O profeta liberiano itinerante William Wade Harris viajou através da Costa do Marfim e do distrito de Apolônia, na Costa do Ouro, entre 1910-1915, convertendo cerca de 100 mil pessoas. Expulso da Costa do Marfim, retirou-se para a Costa do Ouro; suas atividades nos dois países redundaram na criação da Igreja Harrista na Costa do Marfim e da Igreja de Doze Apóstolos na Costa do Ouro147. William Wade Harris nasceu aproximadamente em 1865 em Glogbalé, chamado por americanos de Half-Graway, pertencia a etnia de Grebo, localizada no sul-leste da Libéria. Seus pais não eram cristãos, mas o enviaram para a escola Metodista de Cape Palmas aos 15 anos. Onde teve o seu tio materno como mestre, o pastor metodista Jesse Lawry. Que ensinou-lhe não somente a ler e escrever, mas, sobretudo a interpretar os textos sagrados. Harris começou a frequentar a seita Timbu Church a fim de aperfeiçoar seu conhecimento sobre a Bíblia. Aderiu à Igreja Episcopal do bispo Samuel Ferguson e

145 ‘Mau’ em Kikuyu (Quênia), ‘mai’ em Lingala (RDC) significa água. ‘Mau-mau’ , traduzindo literalmente significa água-água. 146 Outra milícia congolesa que luta pela defesa das terras e cessessão da província de Katanga. 147 Kofi A. OPOKU, Op. Cit, p. 613. 54

em 1892 foi nomeado catequista. Foi suspenso da Igreja ao questionar a proibição da poligamia. Envolveu-se junto com seu povo, Grebo, na tentativa de se libertar da opressão dos colonos ingleses e dos americano-liberianos. Na tentativa do golpe de Estado, ficou preso entre 1909 a 1912. De acordo com o que dizia, foi dentro da cadeia que recebeu do anjo Gabriel a missão de pregar o Evangelho e expulsar demônios. Ao sair da prisão, começou sua missão. No sonho,

O Anjo Gabriel lhe disse que seria “o Profeta dos últimos tempos”, tinha que abandonar as roupas modernas (calças, sapatos, ternos) para vestir uma túnica branca e destruiria feitiços, começando pelos próprios, deveria pregar o batismo cristão, sua esposa morreria mas antes disso, lhe daria seis shilling que o permitiriam viajar em toda região e realizar a missão148. Pregava contra a magia e bruxaria, convidando o povo a abandonar a bruxaria e o feiticismo e a confiar somente em Deus. Em 1892, foi nomeado professor auxiliar e catequista em uma Igreja Metodista Episcopal pelo bispo Ferguson na vila Spring Hill. Viveu dessa profissão durante 16 anos. Em 1899 foi nomeado intérprete oficial pelo “County of Mariland”, governo liberiano. De 1913 a janeiro de 1914, evangelizou a parte oeste-leste da Costa do Marfim até à fronteira com Gana e batizou cerca de 120.000 pessoas. Foi preso três vezes e expulso várias vezes pelos colonizadores franceses. Foi três vezes evangelizar em Serra Leoa respectivamente em 1917, 1919 e 1921. Morreu pobre no dia 23 de abril de 1929.

Esse movimento é anterior ao avivamento da Rua Azusa Street de Los Angeles. Harris afirmava que ter recebido a missão de Deus. O Espírito Santo tinha descido sobre ele e o que estava fazendo - pregar o Evangelho, expulsar demônios, curar doentes, converter os bruxos, falar em língua, etc - era obra do Espírito Santo. Sua pregação levava os bruxos de várias aldeias a entregar seus feitiços e à conversão. Depois da conversão, recebiam o batismo. Vendo que os grandes bruxos se convertiam, os camponeses tinham medo e por sua vez se convertiam e recebiam batismo em massa. Ele “se via como o profeta Daniel na cadeia, como o profeta Moisés diante do Faraó e por último como o profeta Eliseu que recusou dinheiro em troca de bênção e cura” 149. Harris não tinha como objetivo fundar uma Igreja, mas evangelizar. É por isso que

148 David A. SHANK, Wadé Harris William d’environ 1860 jusqu’em 1929. Libéria/Ganha/Cõte d’Ivoire, In Dictionnaire Biographique des Chrétiens d’Afrique, disponível: http://www.dacb.org/stories/liberia/f- legacy_harris.html, acesso 18/03/2014. 149 David A. SHANK, Le pentecôtisme du prophète William Wade Harris, p. 65. 55

depois de batizar as pessoas de uma aldeia, mandava-as participar em culto das Igrejas cristãs (protestante ou católica) mais próximas de suas casas. No caso de não haver uma igreja ai por perto, designava doze pessoas para forma um grupo de oração a fim de continuar a obra. Os missionários protestantes e católicos da região ficaram satisfeitos pelo trabalho do Profeta, porque viram o número de fiéis aumentar assustadoramente. Depois da pregação, Harris trazia paz e sossego às pessoas. Nunca falava de si próprio. Era um homem humilde. Depois da pregação de Harris, se alguém continuasse ainda guardando os feitiços, morria.

O que restou de sua pregação sobre as RTA foi a poligamia. Se referindo ao Antigo Testamento, onde existem vários casos de polígamos (Rei Salomão, David, Jacob, Abraão, etc.), Harris a defendia argumentando a partir da própria Bíblia. Guardou também os cantos tradicionais, mudando somente suas letras. Em sua itinerancia missionária, cantava, dançava, rezava e entrava em transe, batizava e curava. Estava sempre acompanhado de duas mulheres, Mary Pioca e Valentine Hellen, para auxiliá-lo em sua missão.

No ponto de vista organização, cada paróquia da Igreja Harrista é dirigida por 12 apóstolos. A doutrina se baseia na pregação do evangelho, batismo, Santa Ceia, os três sábados de ação de graças e de festas. Esses três sábados são: o primeiro sábado do mês de janeiro, o segunda sábado do mês de junho e o terceiro sábado do mês de setembro. Nesses dias, os fiéis são convidados a fazer retiro, jejum e várias orações. O batismo é feito pela aspersão e somente os adultos que podem ser batizados. Harris pregava ao povo os Dez mandamentos de Deus, ensinava a oração do Pai-Nosso, o Credo.

A Igreja Harrista é uma das quatro confissões religiosas que o Estado marfinês reconhece legalmente. Faz parte do conselho ecumênico das Igrejas, desde 1998. E hoje está presente em vários países africanos e do mundo, especialmente nos países como Libéria, Serra Leoa, Gana e França. A sucessão era hereditária, mas a partir de 1994, mudou e passou a ser por eleição. O primeiro a ser eleito como líder da Igreja foi Jacob Cessi Koutoun. No dia 27 de julho de 2013, a Igreja Harrista completou o seu primeiro centenário.

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3.2. Exército da Cruz de Cristo

Geralmente conhecida na língua local como “Igreja Musama Disco Christo”, foi fundada pelo profeta Jemisimihan Jehu-Appiah em 1919, na Costa do Ouro (atual Gana). Appiah reorganizou o Cristianismo adaptando-o à cultura do povo Akan.

A igreja surgiu em 1919 como grupo de oração, a Faith Society (Sociedade da Fé), vinculado à Igreja Metodista de Gomoa Oguan, na região central da Costa de Ouro. Mas, depois que seu chefe, o catequista William Egyanka Appiah, foi expulso dessa Igreja juntamente com seus fiéis, o grupo transformou-se em igreja plena, em 1922 150. Appiah não fundou somente uma Igreja, mas também uma dinastia, onde ele mesmo era o rei (Akaboba I), seu filho, o príncipe (Akasibuna), e sua esposa profetisa e rainha-mãe (Akatitibi). A sucessão é hereditária e de direito divino. Mozano é a cidade- capital, a terra santa, onde os fiéis da Igreja oram e recebem bênção e cura. Os fiéis se distinguem dos outros cidadãos pelo emprego de anéis e cruzes de cobre. A Igreja tem uma linguagem própria “osor kasa”, língua sagrada e é usada no templo e em seus domicílios151. As decisões essemciais são tomadas em Mozano (Terra Santa), é onde se desenrola a festa anual Asomdwee (Festival da Paz) e onde se faz também anualmente as peregrinações.

3.3. Igrejas Independentes sul africanas

Há uma discussão entre os autores sobre a classificação das Igrejas Sionistas e Etíopes152 da África do Sul. Tem autores que as classificam como parte do pentecostalismo clássico ou de influência pentecostal e outros, como IIA, que surgiram como crítica e reação contra as Igrejas missionárias (católicas e protestantes) no tempo colonial, e no caso da África do Sul, no Apartheid. Seguiremos aqui a concepção de Gerges Balandier e Jacqueline Eberhardt que as classificam como IIA, fazendo parte do messianismo africano.

150 Kofi Asare OPOKU, Op. Cit, p.621. 151 Ibid, p. 622. 152 Igreja Sionista, ou Igreja Sião a exemplo do Monte Sião (Salmo 50,1; 87,1-7), monte sagrado no judaísmo antigo. No salmo 87, 4: a Etiopia está entre as nações eleitas por Javé, entre as cidades de Deus. Mas é no Monte Sião que todo homem nasceu (Salmo 87,5). Os autores escrevem de maneira diferente a ‘Igreja Etíope’, em outros livros, ‘Igreja etiopia’ ou ‘etiópica’. “Etíope” se refere à Etiópia cristã, Abissinia, símbolo de uma nação que não foi colonizada, uma nação independente. Em 1930, Etiopia era vista como símbolo do nacionalismo e resistência ao colonialismo europeu. 57

Segundo G. Balandier, só na África do Sul, havia cerca de 800 IIA em 1945153. Naquele tempo somente 8 que foram reconhecidas pela autoridade colonial. Em 1954, havia 1.286 Igrejas Independentes sul-africanas154. Igreja Etíope faz parte do messianismo sul-africano. Os seus líderes tiveram contato com a Igreja Metodista Episcopa Americana, fundada nos EUA por negros e para negros. A Igreja Etíope tem como lema: “África para Todos”. A sua doutrina se fundamenta a partir da interpretação do Salmo 68,31: “Etiópia cedo estenderá as suas mãos para Deus e Makone”. O que significa que a liderança da Igreja cristã será agora autóctone, isto é africana155.

Segundo Jacqueline Eberhardt, as “Igrejas etíopes se separaram das Missões Protestantes e Anglicanas, se formaram no modelo das Igrejas Coptas Abisinianas” 156. Eis algumas Igrejas Sionistas: “The Zion City Apostolic Church of South Africa, The Zion City Apostolic Paulus Church in South Africa, The Zion Station Apostolic Church of South Africa, The Zion Revelation Church of South Africa, Zion Christian Church e Nazaretha” 157. Nazaretha Church foi fundada por Isaiah Shembe, em 1911, na província do Natal, no meio dos Zoulous. A Zion Christian Church foi fundada por Ignatus Lekganyane, em 1912, no Norte de Transvaal. É fruto da ruptura com a Missão de Igreja Livre de Escosa158.

O messianismo sul-africano surgiu como “reação contra o racismo e a opressão contra negros. Anunciou a subversão total das regras e a expulsão de europeus” 159. Há dois tipos dessas Igrejas, a Etíope e a Sionista. O tipo etíope se revela como Igreja viva dos negros, fora do controle dos europeus e uma organização no modelo tradicional (com chefe tradicional e hierarquia). O tipo sionista é mais sincrético e dá liberdade aos membros. O sacerdote é também profeta, adivinho, curandeiro e expulsador de bruxos. Essas Igrejas são contra e rejeitam o Cristianismo colonial trazido por missionários europeus e proclamam um Cristianismo negro. A sua força está “na oposição à política da discriminação racial, a exaltação dos valores africanos e a recuperação e afirmação

153 Georges BALANDIER, Messianisme et nationalismes en Afrique Noires, p.9. 154 Jacqueline EBERHARDT, Messianisme en Afrique du Sul, p.34. 155 Ibid., p. 77. 156 Ibid., p. 77. 157 Ibid., p. 36. 158 Ibid., p. 37. 159 Georges BALANDIER, Op. Cit, p.9. 58

da antiga cultura diante dos europeus” 160. “O recurso à Bíblia favorece as construções utópicas, a crença na salvação da raça negra guiada por profetas negros, que são também fundadores de Igrejas" 161. O fundador é também considerado Messias, isto é, aquele que vem restituir terras aos nativos que foram deserdados. Cada uma dessas Igrejas tem uma cidade santa, comparada à Jerusalém, e interpretada como “cidade da pureza religiosa e da justiça social” 162. O tipo etíope era aristocrática, mais organizada, moderna e servia como campo das primeiras reivindicações dos nacionalistas. O tipo sionista era mais popular e organizava várias manifestações contra o regime.

As Igrejas Etíopes e Sionistas cresceram na África do Sul e se expandiram em toda região. Milhares de imigrantes de Moçambique, Zimbabué, Namíbia e de Botsuana se converteram a essas Igrejas e implantaram-nas em seus países de origem. Alguns imigrantes moçambicanos, depois do contato com a Igreja Etíope, fundaram a Igreja Etiópica Africana de Moçambique (IEAM). Simone Cumbe, depois de frequentar a Igreja Sionista, também fundou a Igreja de Sião União Apostólica Cristã de Moçambique (ISUACM). Depois de fundar a sua Igreja, voltou em Moçambique em 1938 e a registrou diante da autoridade colonial em 1957. A maior parte da membresia era composta de mulheres (60%). Segundo o profeta, as mulheres são as pessoas que mais sofrem e são discriminadas na sociedade, é por isso que a Igreja deve ter uma atenção particular a elas.

3.2.Igreja Kimbanguista163

O nome oficial dessa Igreja é “Igreja de Jesus Cristo sobre a Terra pelo Enviado Especial Simon Kimbangu”. O kimbanguismo é uma mistura do Cristianismo com a cultura kongo. Simon Kimbangu nasceu em 1889 na vila de N’kamba, de pais Kuyela e Luezi. Pertencia a etnia Cingombe na atual província do Baixo-Congo. Ficou órfão de pai e de mãe ainda pequeno e foi criado pela tia Kinzembo. Essa foi uma dos primeiros “cingombe” a se converter à religião cristã. Kimbangu foi criado segundo a cultura local e fez seus primeiros estudos em uma escola batista. Logo depois foi nomeado professor na mesma escola e catequista de um templo da Igreja batista da vila. Além dessas profissões, era também carpinteiro e agricultor. Em 1913, casou-se com Muilu

160 Ibid., p. 11. 161 Ibid., p. 11. 162 Jacqueline EBERHARDT, Op. Cit., p.55. 163 Esse texto é uma síntese da monografia que apresentamos na conclusão da disciplina de Estudos do Protestantismo, segundo semestre de 2013. 59

Marie, com quem teve três filhos: Kisolekele Lukelo Charles (1914), Dialungana Kiangani Salomon (1915) e Diangenda Kuntima Joseph (1918).

Em meio à epidemia de gripe espanhola, com falta de remédios e de médicos, é que Kimbangu ouviu a voz de Deus à noite, mandando-o para cuidar de suas ovelhas. No dia 06 de abril de 1921, curou de febre uma mulher chamada Nkiantondo. Antes de começar sua missão, escolheu seis colaboradores na mesma vila. Sua pregação durou somente cinco meses, isto é, do mês de maio a setembro de 1921. René Dévich afirma que na década de 20, cerca de 150 profetas e 30 profetisas kongo surgem no território de Manianga, região do Baixo-Kongo e fundam Igrejas Independentes do Espírito Santo (ou Mpeve ya nlongo). Entre elas, Mission des Noirs de Simon Mpandi, Bola Manianga, Matonsi, Lusambulu lwa bougie, Munkukusa, Maza ma lusambulu, etc164. A vocação e o profetismo de Simon Kimbangu se entendem no contexto histórico do surgimento do messianismo kongo. Essas Igrejas surgiram da reação do trabalho missionário da região (dos missionários protestantes suecos, ingleses e estadunidenses) e da opressão colonial. Suas características são: o exorcismo, falar em línguas e o transe. Nessa Igreja, as pessoas cantam, dançam, invocam os espíritos, rezam.

Esses profetas e profetisas contestavam a superioridade dos brancos e a hegemonia colonial. Essas igrejas foram compostas de pessoas pobres, sem estudo e desempregados. Os líderes pregavam enunciando os versículos bíblicos e abençoam com água benta. Os profetas conhecem por iluminação e não a partir de uma formação académica. A missão de Simon Kimbangu consistia em evangelizar, curar doentes e expulsar demônios. Condenava a bruxaria e convidava os nativos a abandonar os feitiços. Kimbangu ressuscitava os mortos e ordenava às pessoas a desobedecer à ordem colonial, a não pagar imposto, a não ir trabalhar nas fazendas e fábricas de colonizadores belgas. Kimbangu proibia a poligamia, danças tradicionais e o culto aos mortos. A frase que pronunciava frequentemente em sua pregação: “o homem branco se tornará negro, e o homem negro se tornará branco” 165, perturbou fortemente a autoridade colonial e anunciou o fim da colonização. O kimbanguismo defende a igualdade entre homem e mulher, condena o racismo, proíbe o consumo de bebidas

164 René DEVISCH, Les églises de guérison à Kinshasa. Leur domestication de la crise des institutions, p. 124 e 128. 165 Aurelien MUKOKO GAMPIOT, Kimbanguisme e identité noire, p.54. 60

alcóolicas, drogas e cigarros. O movimento de Kimbangu constituía uma ameaça à administração colonial.

Como Harris, Kimbangu também não tinha pretensão de fundar uma nova Igreja, depois da pregação e exorcismo, ordenava aos seus seguidores de frequentar as Igrejas cristãs em suas respectivas vilas. Cerca de 500 pessoas o seguiam todos os dias. Essas pessoas vinham da região do Baixo-Congo, Congo-Brazzaville e do norte de Angola. Quando Kimbangu rezava e curava doentes, a multidão cantava e dançava com grande fervor. Em pouco tempo, essa atuação teve impacto na região. Kimbangu foi acusado de perturbar a ordem pública e simular milagres. Foi preso, junto com alguns de seus seguidores mais próximo, após julgado, foi condenado à prisão perpétua. Foi logo deportado do Baixo-Congo para Elizabethville (atual Lubumbashi) onde cumpriu pena de trinta anos, morrendo na cadeia em 12 de outubro de 1951. Depois de sua prisão, muitos de seus seguidores foram perseguidos, deportados e assassinados pela administração colonial. Mas apesar disso, o movimento continuou clandestinamente e penetrou em todo território nacional e se expandiu para Angola, Congo-Brazzaville, Ruanda e Burundi. Em 1959, o Kimbanguismo foi reconhecido pelo governo colonial e integrou o Conselho Mundial das Igrejas em 1968. Depois do reconhecimento oficial, os três filhos de Kimbangu foram encarregados de dirigir a Igreja. Entre esses, Diangenda foi escolhido como chefe espiritual (de 1959 a 1992). Foi ele que organizou, estruturou, institucionalizou e modernizou a Igreja. Ele marcou profundamente a vida da Igreja a tal ponto que sua vida e palavras tornaram dogmas e exemplo de vida para os fiéis. A Igreja kimbanguista usa o lingala e kikongo166 como línguas oficiais e sagradas. O kimbanguismo tem três fontes teológicas: a Bíblia, os cantos e a vida e palavras de Papa Diangenda167.

Na ausência de Kimbangu e por causa de conflito dentro do movimento nascente, algumas pessoas saíram e fundaram outras Igrejas, que alguns cientistas sociais consideram neo-kimbanguismo. As principais são a Igreja dos Negros fundada por Simon Mpandi, Igreja do Espírito Santo fundada por Simão Toko em Angola, Igreja das Duas Testemunhas em Ntimansi fundada por Ne Muana Nsemi, Igreja Manuel Bamba, e Igreja da Luz em Mbuji-Mayi. O nacionalista congolês de Brazzaville, André Matsoua se inspirou também da luta de Kimbangu para fundar o seu grupo político-

166 Lingala e kikongo fazem parte das quatro línguas nacionais da RDC. Outras são Tshiluba e swahili. 167 Aurelien MUKOKO GAMPIOT, Op. Cit., p.99. 61

religioso, o Matsouanismo para a libertação nacional. Em 1968, Ne Muana Nsemi, atual deputado nacional da RDC, começou um outro grupo político-religioso, Bundu Dia Kongo168, querendo perpetuar a mensagem do Profeta. Ele se declara o verdadeiro herdeiro de Simon Kimbangu.

Segundo René Devisch, depois do assassinato de Simon Kimbangu, as Igrejas do Espírito Santo se uniram e têm como referência Simon Kimbangu, considerando-o do Cristo Negro169. Atualmente, segundo a própria Igreja Kimbanguista, tem cerca de 17 milhões de fiéis. Tem uma presença significativa em três países, RDC, Congo- Brazzaville e Angola. Ela se expandiu em outros países africanos, europeus (especialmente França e Bélgica) e nos EUA. Sua expansão se dá a partir da imigração congolesa e africana. Aqui no Brasil, pode ser encontrada perto do metrô Artur Alvim (São Paulo) e no . A Igreja Kimbanguista e a Igreja Harrista, são as IIA mais conhecidas no continente europeu, especialmente em Paris, Londres e Bruxelas.

Na RDC, o Kimbanguismo é uma das três confissões religiosas mais importantes do país ao lado da Igreja Católica e Protestante. É considerada como igreja histórica juntamente com as outras duas. Nessa Igreja, a sucessão é hereditária e é o negócio da “família Kimbangu”, atualmente dos 26 netos e netas do profeta. Por causa da disputa pelo poder e outros interesses pessoais, a Igreja se dividiu em dois, um ramo é dirigido por Simon Kimbangu Kiangani, e o outro por Armand Kisolekele Lukelo e José Diangenda; todos os netos do profeta. Para diminuir a tensão foi preciso a intervenção do presidente Joseph Kabila. Atualmente, Simon Kimbangu Kiangani, é considerado líder espiritual e sucessor do Profeta. A ala dissidente está em busca do reconhecimento oficial.

Segundo Aurelien Mukoko, dentro da Igreja Kimbanguista, através de cantos, existe um processo de divinização de Simon Kimbangu e de seus três filhos170. Simon Kimbangu é considerado a encarnação de Deus Espírito Santo, consolador e libertador. Ele integra a Santíssima Trindade, como Deus Espírito Santo. Às vezes é considerado como Deus criador e os seus três filhos como a Santíssima trindade. O kimbanguismo é uma Igreja que afirma a identidade negra e luta pela libertação definitiva de negros sob

168 Esse é o nome do Movimento, mas a Igreja tem como nome oficial, Igreja das Duas Testemunhas em Ntimansi. 169 René DEVISCH, Op. Cit., p.125. 170 Aurelien MUKOKO GAMPIOT, Op. Cit., p. 235, 237, 240-241. 62

a dominação ocidental. Isso constitui sua razão de ser e sua missão principal. Ser negro é ser kimbanguista. É preciso ter orgulho de sua condição racial. Na RDC, a Igreja Kimbanguista possui escolas, hospitais espalhados no território nacional. Possui uma emissora de rádio e de televisão, e uma universidade. A Universidade Simon Kimbangu (USK) de Kinshasa oferece os cursos de direito, economia, ciências da computação, medicina e agronomia. Tem uma faculdade de teologia que serve para a formação de futuros pastores.

3.5. Igreja do Cristianismo Celeste

A Igreja do Cristianismo Celeste (ICC) foi fundada por Samuel Bilewy Joseph Oschoffa em Porto Novo (Benim), em 1947. Os seus pais eram daomeanos de origem yoruba (Nigéria). O pai de Oschoffa era analfabeto, carpinteiro e polígamo. Como polígamo, teve 57 filhos, o mais velho é Emmanuel Mobiyima Oschoffa. Oschoffa recebeu a educação metodista pelo amigo do pai dele, que era pastor. Mais tarde começou a frequentar a Ordem Sagrada dos Querubins e Serafins, uma das Igrejas mais antigas do movimento Aladura171, foi expulso dessa Igreja, pois tinha visões172. E segundo André Mary, parece que foi expulso por causa de adultério173, com a mulher chamada de Felicia Yaman174, que depois se tornará a primeira visionária na nova Igreja fundada por ele. Viveu entre o Benim e a Nigéria, mas foi sempre atraído pela Nigéria, terra onde sua mãe foi enterrada.

Oschoffa afirma que recebeu a missão de fundar uma Igreja encarregada de purificar o mundo inteiro, que os membros só adorariam o único Deus175. Oschoffa se declarava profeta e pastor. Era Papa de todos os celestes, visionário e chefe espiritual da Igreja. Quando vivo, ele parecia um líder religioso que apresentava a síntese cultural africana (chefe tradicional, curandeiro e líder carismático).

A dubla autoridade carismática e burocrática foi humanamente assumida por um verdadeiro pai (Papa Oschoffa) de todos os celestes, usando do poder espiritual, da força vital (ase) e do

171 “Aladura” em árabe significa, os oradores, pessoas de oração ou oração. É um movimento que surgiu do avivamento espiritual da Nigéria na década de 20. Desse movimento, saíram várias Igrejas, entre as quais a Ordem de Querubins e Serafins, a ICC, etc. 172 Christine HENRY et Joël NORET, Le Christianisme Céleste em France et en Belgique, p. 92. 173 André MARY, Histoire d’Église: héros chrétiens et chefs rebelles des nations “celestes”, p. 156. 174 IDEM, Culture pentecôtiste et charisme visionnaire au sein d’une Église independente africaine, p.31. 175 Ibid., p.92. 63

sentido do comando (agbara) que eram exclusivamente para chefes tradicionais e para babalaôs a fim de dirigir a grande família eclesiástica 176. Da Ordem Sagrada dos Querubins e Serafins, a ICC herdou a liturgia e a organização. Emprestou quatro elementos fundamentais da doutrina dos Aladura: “a pureza, oração, revelações por sonhos e visões, cura espiritual” 177. Em seu ritual, a Igreja usa os seguintes objetos sagrados: água, óleo, pedra e perfume de São Miguel, cruz e pedaço de panos, incenso, etc.

A ICC é da segunda geração das IIA. Não é uma Igreja dissidente ou separatista das Igrejas históricas cristãs, mas nasceu da visão profética de Oschoffa. É uma Igreja revelada178, pois Jesus e Maria apareceram várias vezes a Oschoffa. A própria Igreja se declara “Igreja Cristã Primitiva”, porque “emana diretamente do Espírito Santo e da Palavra de Deus, como se dá na Bíblia e é a síntese das religiões históricas fundamentais: judaísmo, islã e protestantismo” 179. Oschoffa afirma que quando Jesus lhe aparecia, tinha na mão a Bíblia e o Alcorão. A Igreja é a mistura dessas duas tradições. Em sua essência a ICC é uma Igreja sincrética, pode ser encontrados elementos da tradição judaica, cristã, muçulmana e da cultura africana (Fá).

Segundo Mary, o grande orgulho dos celestes e da hierarquia da Igreja é ter registrado em sua história o encontro entre o Profeta Oschoffa e o Papa João Paulo II em Benim, em 1982180. A ICC parece muito com a Igreja católica no que diz respeito ao ritual, organização e administração. No seu calendário litúrgico, observam-se as festas do Natal, Páscoa, Pentecostes, marianas (Natividade, Concepção, Assunção) e dos quatro Arcanjos. A liturgia da ICC é intensa, inspirada, expressiva, com cantos e danças. Durante os cultos, os fiéis fazem testemunhas e revelações. Os líderes religiosos vestem batinas brancas e os fiéis também tem uma roupa especial para os cultos.

A ICC foi reconhecida oficialmente pelo governo colonial em 1956, teve sua expansão a partir dos migrantes pescadores toffins em Makoko, periferia de Lagos, em 1950, e no mesmo ano chegou à Costa do Marfim, pelo amigo de Oschoffa, Nathanaël

176 IDEM. Afro-christianisme et politique de l’identité: l’Église du Christianime Céleste Versus Celestial Church of Christ, p.50. 177 Christine HENRY et Joël NORET, Op. Cit., p. 92. 178 André MARY, Op. Cit., p. 30. 179 Ibid., p. 31. 180 Ibid., p.33. 64

Yansunnu181. Na Nigéria, foi reconhecida em 1958. Expandiu-se rapidamente em toda África começando pela parte ocidental. Entrou na Europa em 1967 através de estudantes nigerianos e atualmente está também na América do Norte (EUA e Canadá).

Administrativamente, a ICC se divide em A divisão administrativa da ICC paróquia, distrito, diocese, e em última instância, o comitê mundial. Na cabeça de cada diocese, há um pastor. É uma Igreja hierárquica composta de: alagba, leader, sênior evangelista, chefe de diocese, superior evangélico, os evangelistas e encarregados de pastoral, cada um com sua responsabilidade. O “alagba” é o líder supremo e sucessor do profeta Oschoffa. Para ser evangelista, o candidato deve receber uma formação religiosa em um dos seminários que a instituição possui. Os da Nigéria fazem no Instituto Bíblico de Lagos.

O ritual de unção realizado pelo “alagba” no fim da peregrinação acontece na festa do Natal e na sede mundial, e constitui uma característica singular da Igreja. A unção permite que os candidatos a liderança subam de grau. O visionário é um dos cargos mais importantes dentro da instituição. Esse faz consultas divinatórias, interpreta sonhos, prevê acontecimentos. Ser visionário é um dom do Espírito Santo e é um ministério gratuito. Ele está também encarregado a vender bens simbólicos: água benta, velas, cruzes, perfume de São Miguel. É também da função do visionário carregar o recém-nascido durante o ritual de apresentação ao templo. Mary nota que essa função pode se transformar simplesmente na de um comerciante de bens simbólicos, sem uma dimensão espiritual. Portanto, não é qualquer fiel que pode ser visionário, para sê-lo, a pessoa deve ter uma vida intensa de oração, frequentar regularmente os cultos, uma vida de santificação e de meditação constante da Bíblia182. O ministério do visionário é de mulheres e o dos evangelistas, é de homens; mas os grandes visionários que seguram a direção espiritual são sempre homens.

Segundo Mary, a visão tem uma racionalidade: “A sua racionalidade supõe a erradicação da magia e do fetichismo que assombra a vida cotidiana do visionário” 183. O ministério da visão é central na economia religiosa da ICC. O visionário fala em línguas (glossolalia) e traz a mensagem (profecia). É o intérprete dos sonhos. Na visão tem sempre uma mensagem e a pessoa que inspira. O Espírito Santo se comunica

181 Christine HENRY e Joël NORET, Op. Cit, p.92. 182 André MARY, Op. Cit., p.51. 183 Ibid, p.35. 65

através de um dos Arcanjos durante a visão. O Espírito Santo revela ou comunica boas notícias, palavras de libertação e de consolo ao visionário. Nem sempre vêm mensagens de libertação durante a visão, Deus pode enviar um espírito demoníaco para provar a pessoa. Diante da confusão que pode acontecer em identificar os espíritos do bem ou do mal, é preciso o discernimento. São os evangelistas que detêm esse poder ou supervisionam os visionários. Cabe ao visionário também descobrir os agentes do mal na comunidade (pode ser parentes, vizinhos ou colegas) 184. Existem três tipos de visão: divinatória, terapêutica e mística. Ainda Segundo Mary, a dimensão mística é pouco explorada. Trata-se de uma experiência religiosa, de intimidade que o visionário tem com o sagrado185. Segundo Mary, a visão é fonte de conhecimento religioso e secreto. “A visão no cotidiano tem como objetivo esclarecer a origem da doença, da esterilidade, o contexto de uma viagem, as causas do acidente, o não êxito em uma prova”. Na cultura budu186 especialmente, consulta-se o visionário para saber a origem e a causa da doença e da morte de um parente, antes de fazer qualquer coisa importante na vida (buscar emprego, casar, construir a casa, viajar, organizar uma festa, caçar, fazer machamba187, construir uma casa, etc.), é preciso ter a opinião do visionário.

A clientela da ICC é composta pelos próprios fiéis, por pessoas de outras denominações cristãs e religiões, e mesmo pelos sem-religião e ateus. Segundo Mary, a bruxaria famíliar permanece sendo o pano de fundo principal ou motivo para leituras, interpretações e acusações sobre os males individuais e da comunidade. Se a pessoa for endemoniada, se tiver doenças crônicas e incuráveis, ou outro problema que precisa de um acompanhamento especial, deve ser internada para o tratamento. A Igreja orienta as pessoas que têm doenças que a medicina moderna pode curar a ir e seguir tratamento no hospital. A ICC é então uma verdadeira clínica e pronto socorro para o atendimento de fiéis com doenças físicas, problemas psicológicos, afetivos, espirituais e vítima da bruxaria. Depois da consulta ao visionário, o visitante ou paciente paga pelo serviço prestado.

O visionário trabalha gratuitamente, somente o evangelista que vive das ofertas e dízimos recolhidos na Igreja. O visionário que é reconhecido pelo seu poder de profecia

184 Ibid., p.41. 185 Ibid., p.42. 186 Etnia no nordeste da RDC. 187 É a plantação, agricultura de produtos para o consumo (cereais, tubérculos, verduras, plantas, frutas, etc.). É o trabalho manual de lavoura. 66

e cura é convidado a receber a unção de alagba, e de receber uma formação religiosa específica188. Depois é consagrado em um rito especial no domingo.

Mary compara a ICC com o culto de Vodu (que faz parte das RTA) e afirma que

os nomes dos orixás são substituídos pela invocação repetitiva de nomes de santos: Jeová, Jesus Cristo, Anjo Miguel, Gabriel e Rafael ou Santo Uriel. Os sacrifícios aos deuses e os trabalhos nos conventos de Vodu são substituídos pelas oferendas de frutas, a chama de velas, a fumaça do incenso, unção de óleo sagrado e a purificação usando água benta, mas sobretudo pela eficácia da oração189. A ICC dá mais ênfase como todas as IIA aos ritos de libertação e exorcismo, da apresentação da criança ao templo (sete dias depois do nascimento) e do encerramento do velório (depois de quadragésimo dia do enterro), da fecundidade. Segundo Mary, é durante esses ritos que se negocia de maneira acirrada os arranjos entre as concepções tradicionais de corpo e da pessoa de um lado, e as prescrições bíblicas e o ritual cristão de outro lado190. Em sua visita oficial ao presidente de Benim Matthieu Kérékou em 1973, Oschoffa lhe entregou uma Bíblia e profetizou que ele dirigiria o país durante 15 anos e o seu regime sofreria um golpe de estado. Anos depois tudo o que Oschoffa profetizou, se cumpriu. Por causa do regime marxista-leninista de Benim, ele se mudou definitivamente para Nigéria em 1976.

Oschoffa morreu de acidente de carro em 1985, sem designar o seu sucessor, mas tinha elaborado uma lista dos possíveis candidatos. Nessa lista se encontrava o pastor nigeriano Bada e o beninês Agbaossi. Não tinha colocado como critério de sucessão a hereditariedade, como outras Igrejas Independentes. Segundo ele, a escolha viria do Espírito Santo. Depois de sua morte, a história da Igreja foi marcada por disputas e divisões pela sucessão entre o pastor Bada e o pastor Agbaossi, entre o grupo anglófono e francófono. A crise da desunião se prorrogou durante 15 anos, (isto é, entre 1985 a 2000) com muitos pastores autoproclamados, excomunhões, dissidências e formação de outras Igrejas. Só em Costa do Marfim, há cinco dioceses diferentes da ICC, segundo André Mary. No meio da crise para um candidato chegar a ser líder supremo, tinha que fazer muitas alianças, negociações. Ninguém se fechou à sua identidade étnica e nacional, às vezes tinha que ter o apoio de um líder da Costa do

188 André MARY, Op. Cit., p. 45. 189 Ibid., p.51. 190 Ibid., p. 52. 67

Marfim, Gabão, Londres ou França. Durante as grandes celebrações mundiais no Benim e na Nigéria, é preciso a presença da polícia ou do exército, para impedir os ataques de adversários. Isso ocorre também durante as peregrinações, que a Igreja recebe os celestes de vários países do mundo. Como o conflito chegou à esfera nacional, pediu-se a intervenção do presidente Matthieu Kérekou para reconciliar as duas alas.

Para compreendermos melhor, a ICC tem dois ramos principais, o ramo do Benim e da Nigéria. Foi fundada em Porto Novo (Benim) e Seme é considerado Terra Santa de peregrinação, representado pelo pastor Agbaossi, que não compareceu do velório do fundador, por brigas internas da Igreja. No ramo da Nigéria, Makoko e Ketu são as principais paróquias. O profeta e a sua mãe foram enterrados em Imeko, que é considerado Terra Santa. Sempre existiu uma disputa de legitimidade entre a terra onde o profeta nasceu, cresceu e teve a visão (Benim) e a terra onde vieram os seus pais (Nigéria).

O pastor-evangelista Bada sucedeu ao profeta desde 1985 e morreu em 2000. Ajose foi eleito para substituir Bada, mas morreu uma semana depois da entronização. Na morte de Ajose, a Igrejas nigeriana se dividiu em três partes, uma parte seguiu o filho de Oschoffa, Emmanuel Oschoffa, outra Maforikan e a última G.Jesse. Nesse conflito entre Lagos e Porto Novo, Abidjan sempre teve um papel importante, em um momento apoiava o líder nigeriano, mas em outro, apoiava o beninês. Como a Nigéria é o país mais populoso que o Benim, pelo número de seus fiéis e líderes, a Igreja nigeriana tem mais peso nos encontros mundiais e pretende ser a referência da Igreja. Em 2002, segundo Henry e Noret, a Igreja nigeriana tinha mais de 2000 dioceses e milhares de paróquias.

Segundo Mary, depois da reconciliação dos dois ramos e da morte do líder nigeriano, é que foi eleito o próprio filho do profeta, Emmanuel Mobiyima Oschoffa. Esse, diferentemente do seu pai, se formou em ciências biológicas na França. Tem dupla nacionalidade (beninesa e francesa). Com a sua chegada à cabeça da Igreja, E. Mobiyima anunciou várias medidas de reformas: a formação de fiéis e dos líderes, a reforma do seminário de formação de Makoko, a importância do Instituto Bíblico para a

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formação dos encarregados das paróquias, reafirmação da vocação mundial da Igreja: consolidação da Cristandade, a evangelização da África e a abertura ao ecumenismo191.

A ICC cresceu e se expandiu na África ocidental e no restante do continente, na Europa e na América do Norte. Chegou à Londres, em 1967, por intermédio de estudantes nigerianos e depois à Munique, em 1974192. Instalou-se na França em 1974193 e em 2002. Neste país, a ICC tinha vinte paróquias, com mais de 1500 membros de maioria africana e de outras nacionalidades. Existe um bom grupo de fiéis antilhanos e também podem-se notar durante o culto a presença de alguns europeus, amigos ou parceiros de celestes. A ICC chega à Bélgica em 1991 e onde tem três paróquias (templos), uma em Bruxelas, uma em Liège e outra em Anvers194. A expansão da Igreja na Europa é mais fruto do desentendimento entre os membros do que uma estratégia de planificação da instituição, apesar dela ter a missão de evangelizar o mundo. A desunião e os conflitos dentro da Igreja repercutiram também na Europa.

Como em cada organização religiosa, conservadora que seja, pode existir um grupo de reforma, a ICC, nos últimos anos, tem um grupo de jovens, chamado “Juventude cristã celeste”, composto de académicos e visionários que querem mudanças dentro da Igreja. Querem a sua remoralização e fazem as seguintes reivindicações: ter critérios para exercer o cargo de visionário, ênfase na formação bíblica dos líderes e o fim mercantilização da unção195. O conflito da sucessão, a competição na gestão e implantação de paróquias e dioceses, o enfrentamento entre diversas identidades nos últimos anos contribuíram de maneira decisiva para a expansão e transnacionalização da Igreja 196.

191 Christine HENRY e Joël NORET, Op. Cit., p. 177. 192 Ibid., p.94. 193 Ibid., p.95. 194 Ibid., p.100 e 103. 195 André MARY, Op. Cit., p.55. 196 Ibid, p.55. 69

Conclusão

A análise da presença do Cristianismo no continente africano levou-nos a perceber que o campo religioso é um campo de batalha, assim como disse Pierre Bourdieu. A disputa religiosa foi perceptível em diversos momentos da presença do Cristianismo no continente africano: no surgimento das heresias e ao seu combate entre o segundo e terceiro século, a disputa geográfica entre os missionários europeus católicos e protestantes na implantação do Cristianismo durante a colonização e no surgimento das Igrejas Independentes Africanas (IIA).

Nessa primeira parte, a história do Cristianismo na África pode ser dividida em quatro partes. A primeira parte começa com a chegada do movimento de Jesus de Nazaré na África do Norte e sua expansão na Núbia e Axum. A segunda parte refere-se ao Cristianismo trazido pelos exploradores portugueses entre os séculos XV e XVIII. Já a terceira parte diz respeito à religião trazida pelos colonizadores europeus do século XIX (franceses, ingleses, alemães, portugueses, holandeses, belgas, etc.) até à descolonização da África (1960). A quarta parte é o surgimento das Igrejas Independentes Africanas, fruto da reação contra as Igrejas missionárias (catolicismo e protestantismo).

Nos dois primeiros séculos da Era Cristã, o Cristianismo foi implantado provavelmente pelos seguidores dos discípulos de Jesus, os egípcios, líbios, etíopes e habitantes da Cirene que se encontravam na Palestina durante o Pentecostes. Um fato que favoreceu a expansão do movimento de Jesus foi destruição de Jerusalém em 70 d.C. O Cristianismo se desenvolveu de maneira espetacular nos sete primeiros séculos da d.C em toda essa região (África do Norte, Núbia e Axum) formando grandes centros no Egito, Cartago, Núbia e Axum. O patriarcado de Alexandria formava com outros quatro patriarcados (Jerusalém, Antioquia, Constantinopla e Roma), os centros cristãos mais importantes do Império Romano. Esse período está marcado principalmente pela perseguição religiosa, o surgimento das heresias, a formação de primeiros dogmas, o surgimento da vida monástica (Santo Antão no Egito). Muitos seguidores de Jesus foram perseguidos e assassinados no Império Romano. Essa perseguição só acabou com a concessão da liberdade religiosa pelo imperador Constantino I (313 d.C) e o reconhecimento do movimento de Jesus como religião e sua adoção como religião oficial pelo imperador Teodósio (381 d.C) substituindo a antiga religião romana. Não

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se pode falar do Cristianismo primitivo na África do Norte sem se referir à figura dos teólogos: o bispo Agostino de Hipona e Tertuliano, e também da Escola Catequética da Alexandria, como grande centro de produção do conhecimento, formulação dos primeiros dogmas dessa religião, de interpretação do Cristianismo na perspectiva da filosofia grega.

Com o advento do Islã (início do século VII) e sua entrada naquela região, houve diminuição e extinção total do Cristianismo nos séculos anteriores. Se na antiga Mauritânia, Numídia, Cartago e Líbia, o Cristianismo foi completamente extinto, ele subsistiu no Egito, Etiópia e na Núbia. Na Núbia, o Cristianismo subsistiu até o século XIV, graças a um acordo (baqt) entre o rei núbio e o sultão do Egito, que durou cinco séculos (do século VII a XII). O desrespeito no cumprimento do acordo começou no século XII, consequentemente causando a decadência do Cristianismo e a expansão do Islã. Ainda hoje existem Igrejas Coptas e Ortodoxas monofisitas antigas no Egito e na Etiópia. Sengundo The ARDA197, 10,09 % dos egípcios são cristãos e 59,88% dos etíopes são também cristãos, sendo que a maioria é copta e ortodoxa. A Etiópia é um dos raros países do mundo que conserva ainda o Cristianismo primitivo (copta).

Entre os séculos XV e XVIII, os portugueses, explorando as costas africanas, estabeleceram centros comerciais para a compra de ouro, marfins e escravos. Esse período está marcado pelo tráfico negreiro. Milhares de africanos foram arrancados por europeus de suas terras e vendidos como escravos na América. O objetivo dessa presença não era a evangelização, mas o comércio. Nesse momento, eles se instalaram em algumas regiões de maneira provisória, e em outras de maneira permanente. Uma dessas regiões foi o Reino Kongo, na África central. Com a chegada dos portugueses no reino Kongo, toda corte real se converteu e foi batizada. O filho do rei Nzinga-a- Mvemba foi batizado recebendo o nome de Henrique e foi enviado para estudar no seminário em Portugal, onde mais tarde foi ordenado sacerdote e consagrado bispo. O bispo Henrique administrou a Igreja cristã do reino do Kongo durante 18 anos (1518- 1536), quando morreu, foi enterrado em Roma. Depois de sua morte, a nova diocese voltou a ser administrada pelos portugueses até o declínio do reino em 1678. Nota-se que durante dois séculos, o Cristianismo era florescente no reino Kongo (1482-1678)

197 Veja a Tabela 5, p. 224-225. 71

Tirando a presença cristã nos primórdios na África do Norte, o Cristianismo se implantou de fato na África no século XIX, com a colonização de todo continente exceto a Etiópia e Libéria. No século XIX, chegaram os missionários católicos e protestantes para a evangelização. Os missionários pentecostais entram por sua vez no início do século XX. É assinalado o surgimento de algumas Igrejas Independentes Africanos já no fim do século XIX na África do Sul. A colonização consistia em ocupar, dominar, explorar e povoar a África por europeus. A colonização foi uma dominação completa do continente (no campo político, econômico, social, cultural e científico). Os missionários europeus participaram ativamente na dominação cultural (incluindo o religioso e o simbólico). Pela catequização, os missionários ensinavam os africanos a obedecer aos colonizadores, a abandonar a religiosidade tradicional para aderir à nova religião, abrindo assim o caminho para a dominação. Os missionários foram os verdadeiros colaboradores dos colonizadores, na cristianização e europeinização (ocidentalização) da África. Apesar desse papel negativo dos missionários, eles trabalharam na alfabetização dos africanos, implantaram as primeiras escolas, os hospitais e combateram pela primeira vez, as doenças tropicais como a malária, introduziram e divulgaram novos produtos para agricultura (cacau, café, tabaco, algodão e cana-de-açucar). Como a atuação desses missionários foi marcada pela opressão, racismo e preconceitos, surgiram alguns líderes especialmente no meio protestante reagindo e criticando esse modelo do Cristianismo. Esses abandonaram as Igrejas mães, pregaram de aldeias em aldeias até formarem as próprias Igrejas. São as chamadas Igrejas Independentes Africanos, conhecidas como movimento de africanização do Cristianismo. As mais importantes são Igreja Kimbanguista, Igreja Harrista, o Cristianismo Celeste, Igrejas Sionistas e Etíopes, o movimento Aladura da Nigéria.

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CAPÍTULO II: PENTECOSTALISMO NA ÁFRICA

Introdução

O pentecostalismo é uma categoria dentro do Cristianismo que surgiu no início do século XX dentro do protestantismo. A origem do pentecostalismo é discutível. Para alguns autores, ele surgiu nos EUA, para outros, ele surgiu em vários lugares no mesmo tempo: EUA, Europa, América Latina e África.

Para alguns, o pentecostalismo vem dos movimentos do Avivamento de Tennessee de 1889 dos quais saiu em 1907 Church of God (Cleveland), para outros o pentecostalismo nasceu na comunidade branca de Topeka (Kansas) animado pelo pastor metodista Charles F. Parham, próximo do Ku Klux Klan. Quando se quer enfatizar o componente “africano” do pentecostalismo, fala-se da data de 1906, marcada pela efervencência religiosa de uma comunidade negra de Los Angeles (Azuza Stret Mission do pastor batista William J. Seymour) que se expalhou no mundo inteiro e notadamente na América Latina e África198. A característica principal do pentecostalismo é experiência do Espírito Santo. O crente (seja leigo ou pastor) testemunha de uma experiência pessoal da força sobrenatural, o Espírito Santo, que mudou a sua vida através dos dons (profecia, falar em línguas, cura, etc) e se exterioriza nos rituais de um fervor expressivo e corporal. O Pentecostalismo opõe a força do Espírito Santo a forças demoníacas. Além disso, as principais características do pentecostalismo são: a crença na Bílbia como autoridade da fé, a crença na Trindade, a doutrina da justificação e da santificação, a conversão, o batismo pelo Espírito Santo (os dons do Espírito Santo) e a luta contra o Diabo199. “O crente crê na existência pessoal do Diabo” 200. Para o crente, o diabo não é somente um espírito, mas tudo o que atrapalha a vida do ser humano (doença, mentiras, desonestidade, etc.). Revestido pelo Espírito Santo, o crente está preparado para combater os demônios. Segundo Allan Anderson, o pentecostalismo se caracteriza também pela liturgia oral, a espontaneidade, cantos e danças.

198 André CORTEN e André MARY, Imaginaires politiques et pentecôtismes. Africa/Amérique latine, p.11. Trad. por Adrien Gyato Bowane. 199 Walter HOLLENWEGER, El pentecostalismo. Historia y doctrina, p. 371 200 Ibid, p. 371. 73

Ainda segundo Allan Anderson, não existe “um pentecostalismo”, mas “pentecostalismos”. O acontecimento “Pentecostes” (Atos dos Apóstolos 2,1-13) é lido e interpretado de diversas maneiras segundo as culturas e contextos históricos. Há vários tipos de pentecostalismos: clássico, da cura divina e exorcismo, da renovação carismática e o neopentecostalismo. O que aconteceu no início do século XX foi reinterpretado tendo conta o novo contexto social, caracterizado pela globalização e uso da mídia, é o surgimento do Neopentecostalismo. Longe de conceituação académica, percebe-se uma necessidade espiritual dentro dos cristãos de reformar, contextualizar e adaptar o Cristianismo ao longo desses vinte e um séculos de sua existência (catolicismo-Igrejas Ortodoxas-protestantismo-pentecostalismo-neopentecostalismo e várias outras Igrejas carismáticas e sincréticas).

O neopentecostalismo surge nos EUA na década de 1970, da dissidência das Igrejas protestantes. Entra na África a partir da década de 1980, mas a sua explosão se dá na década de 1990, com a liberalização politico-religiosa. Na África, os conceitos “pentecostalismo” e “neopentecostalismo” diferem de um país a outro. Na RDC, por exemplo, fala de Igrejas do Despertar (ou de Avivamento). As características do neopentecostalismo são a “exarcerbação da guerra espiritual contra o Diabo, a pregação enfática da teologia da prosperidade e a liberalização dos estereotipados usos e costumes de santidade” 201. As Igrejas neopentecostais agem verdadeiramente como empresas e fazem ruptura com o sectarismo e o ascetismo puritano. É a primeira vertente pentecostal de afirmação do mundo202.

Há autores que consideram algumas Igrejas Independentes Africanas como pentecostais ou com influência pentecostal203. Mas aqui, trataremos do pentecostalismo africano como Igrejas pentecostais estrangeiras que se implantaram e se desenvolveram na África e de Igrejas que foram fundadas por africanos ou estrangeiros na África, com características do pentecostalismo. Uma Igreja pentecostal africana deve ter as características do Pentecostalismo e a identidade africana (ter ênfase na realidade africana, dialogar com a cultura africana). Portanto, podem existir várias Igrejas pentecostais na África, sem ser africanas.

201 Ricardo MARIANO, Neopentecostais. Sociologia do novo pentecostalismo no Brasil, p. 36. 202 Ibid, p. 36. 203 Walter HOLLENWEGER, El pentecostalismo. Historia y doctrinas, p.167; André CORTEN e André MARY, Les imaginaires politiques et pentecôtismes. Afrique/Amérique Latine, p.14; Ludovic LADO, Les enjeux du pentecôtisme africain, p.63. 74

A presença do pentecostalismo no continente africano pode ser entendida em diferentes fases: a chegada do Pentecostalismo clássico no início do século XX, a ruptura e surgimento do pentecostalismo africano, a pregação de evangelistas estrangeiros de cura de divina na década de 1950 e 1960 (T.L Osborn), a implantação do Movimento da Renovação Carismática, e a explosão de novas Igrejas pentecostais na década de 1990.

Esse capítulo será dividido em três partes, a chegada do pentecostalismo clássico, o neopentecostalismo e o pentecostalismo brasileiro na África. Nesse capítulo, serão analisados especificamente o pentecostalismo e o neopentecostalismo no continente africano. Como o assunto é amplo, serão apontados alguns países segundo o material que foi selecionado. Será analisado o pentecostalismo na África do Sul, RDC, Camarões, Burkina Faso, Gana, Benim e Togo. Os países com maior presença e influência pentecostal na África subsaariana são Nigéria, Gana, RDC, África do Sul e Quênia. O pentecostalismo entra no contintente africano no contexto da colonização, das guerras mundiais (I e II) e no início dos movimentos de descolonização.

1. A chegada do pentecostalismo na África

“Los movimentos pentecostales y carismáticos se están transformando rapidamente en las formas dominantes de cristianismo en el continente”204. O crescimento e expansão do pentecostalismo no mundo é uma grande preocupação para as demais denominações cristãs e outras religiões. Foi uma grande preocupação da Igreja Católica, durante Segundo Sínodo para África, organizado em Roma pelo Papa Bento XVI em 2009. Nessa ocasião os bispos africanos, além de incentivar e promover a renovação carismática em suas dioceses refletiam e buscavam outras estratégias para conter o avanço pentecostal e a evasão de fiéis.

A primeira presença pentecostal na África subsaariana foi a Igreja Assembleias de Deus estadunidense em 1907 na Libéria e Angola. Atualmente essa Igreja está presente em todos os países da África subsaariana. Depois dessa presença, o pentecostalismo chega à África do sul pelo missionário estadunidense John G. Lake em pleno Apartheid.

204 Allan ANDERSON, Op. Cit., p. 127. 75

Esse pregou entre 1908 e 1912. De sua pregação, surgiram a Apostolic Faith Mission (dos brancos) e Zion Christian Church (dos negros). Se essas Igrejas surgiram a partir da pregação pentecostal e se identificam como pentecostais então são pentecostais e não Igrejas Independentes Africanas. A Zion Christian Church é uma mistura do pentecostalismo e elementos da cultura africana. Têm dezenas de milhares de adeptos na África austral, especialmente nas camadas da população desfavorecida205. Além da Igreja Assembleias de Deus, naquela época também se implantou a Igreja Apostólica da Inglaterra. Ela cresceu na Nigéria e Gana.

As maiores Igrejas Pentecostais Africanas são: Apostolic Faith Mission (África do Sul), African Israel Church Nineveh e African Church of the Holy Spirit (Quênia), Christian Apostolic Church (Nigéria), Nzambe Malamu e Bima (RDC); Church of Pentecostal, Apostolic Chuch of Ghana, Assemblies of God, Apostolic Church of Christ (Gana). Segundo Allan Anderson essas Igrejas junto com as IIA, são fruto da contextualização e adaptação do Cristianismo na África. É o que ele chama de “Reforma africana” 206.

Segundo os dados do Conselho Nacional dos Evangélicos de França, há cerca de 500 milhões de crentes pentecostais no mundo sendo que 140 milhões estão na África (32 milhões na Nigéria e 15 milhões na RDC). Somente as AD na África têm 65.000 templos e 16 milhões de fiéis. Na Nigéria existe cerca de 2 milhões de fiéis das AD e 300 missionários trabalhando fora do país207. Esses números nos mostra que o pentecostalismo está crescendo de maneira acelerada no continente africano e é um interlocutor válido para o ecumenismo, o diálogo inter-religioso, a paz, a democratização e o desenvolvimento do continente.

Na análise sobre o pentecostalismo na África, será seguida a divisão feita por Allan Anderson. Esse divide o pentecostalismo na África por três regiões: Igrejas no sul, centro-leste e oeste da África. Em cada região tem um país ou dois países que serviram como polo de implantação, de surgimento de novas Igrejas e de expansão do pentecostalismo para países vizinhos e outras regiões.

205Ibid., p. 63. 206 Ibid., p. 147. 207 Mélanie Soiron FALLUT. Les églises de réveil en Afrique centrale et leurs impacts sur l’equilibre du pouvoir et la stabilité des États: le cas du Cameroun, du Gabon et de la République du Congo, p. 2. Trad. por Adrien Gyato B. 76

1.1. O pentecostalismo no sul da África

A África do Sul é o país referencial da explosão pentecostal regional. A Apostolic Faith Mission (AFM) foi fundada por Pieter Le Roux (1865-1945), missionário dinamarquês, junto com outros missionários pentecostais independentes, e 400 africanos, maioria oriunda das Igrejas Sionistas.

“En los primeros cultos pentecostales de Joanesburgo hubo integración racial, pero, a medida que los líderes africanos continuaron trabajando junto con la AFM, los líderes brancos abrobaron normas racistas y se reservaron todos los cargos importantes. Esto provoco los muchos cismas que se produjeron a partir de entonces, em los que la mayoria de los líderes sionistas africanos abandonaram la AFM”208. Por questões de poder e de racismo dentro da Igreja, houve ruptura e surgimento as primeiras Igrejas Pentecostais Africanas, isto é, fundadas por africanos, como a Christian Catholic Apostolic Holy Spirit Church in Zion, fundada por Daniel Nkonyane em 1910; Zion Apostolic Church in South Africa, fundada por Elias Malangu, em 1917; Christian Apostolic Church in Zion, fundada por Paulo Mabilitsa; Holy Catholic Apostolic Church in Zion fundada pelo imigrante malaio J.K Phillips.

Houve união e separação em algumas dessas Igrejas. Zion Apostolic Church de Malhangu se uniu a Zion Apostolic Faith Mission (ZAFM) de Edward Lion em 1920. Outro líder religioso sul africano se separou desse grupo e fundou seu próprio grupo, Engenas Lekganyane, “Zion Christian Church, que é agora a maior Igreja pentecostal da África do sul, com quatro milhões de fiéis no ano 2000” 209. A Igreja de Engenas cresceu tanto que em 1943 já estava presente em Zimbabué, Botsuana e na província de Cabo. A prática de Engenas se baseava em cura e imposição de mãos. Mais tarde foi agregando outros elementos para uso litúrgico de seus ministros, usava o lençol, cordas, papeis, pedaço de pau, água, como sinal de cura e proteção. Ao morrer em 1948, houve disputa entre dois filhos pela sucessão e a Igreja foi dividida em duas partes, uma foi com Joseph Lekganyane e a outra, que tinha um número maior dos fiéis, ficou com Edward Lekganyane.

208 Allan ANDERSON, Op. Cit., p. 131. 209 Ibid, p. 132. 77

A Igreja AFM é uma das maiores denominações pentecostais clássicas na África do sul. Seus membros são brancos essencialmente por africâneres, mas com uma minoria de negros. É preciso destacar aqui, o papel de Frank Chicane que foi pastor e político. Tinha projetos contra o apartheid em prol da libertação de negros. Frank Chicane trabalhou como pastor da AFM na periferia de Soweto entre 1978 e 1982. Nesse tempo foi preso quatro vezes pela polícia racista porque trabalhava na conscientização de jovens negros a fim de lutar contra o regime. Por causa de seu engageamento social, foi suspenso do cargo de pastor pelas autoridades da Igreja 210. Mas logo depois, em 1999, o presidente Thabo Mbeki o nomeou chefe do seu gabinete. Em 1996, depois de uma dolorosa e prolongada negociação, os diferentes ramos da AFM se reconciliaram e voltaram à união.

Fora dessas Igrejas tem a Full Gospel Church fundada em 1910, por sul- africanos brancos. Na província do Natal, a maioria de seus membros é de origem indiana. Tem também a Igreja Assembleias de Deus Sul Africanas (ADSA), que foi fundada por dois missionários pentecostais Henry Turney e Charles Chawner, fruto do avivamento da Rua Azusa Street. Esses tinham chegado ao país em 1909. Aqui também houve várias divisões, mas não por questões raciais. Em 1932, as ADSA se separaram das AD estadunidenses, mas esses últimos continuam trabalhando no país. Em 2002, houve uma união histórica das três denominações mais importantes, tornando assim a maior denominação pentecostal do país. Os trabalhadores imigrantes (especialmente zimbabueanos, moçambicanos, namibianos) de minas sul-africanas de países vizinhos tiveram contato com essas Igrejas; de volta para seus países, as implantaram.

No Zimbábue, existe Zimbanbwe Assemblies of God Africa (ZAOGA), a maior denominação do país, e também African Apostolic Church de Johane Maranke. A Igreja Assembleia de Deus está presente em todos os países da região. Serão abordadas brevemente as Igrejas Sionistas de influência pentecostal, e o papel de Nicolas Bhengu no crescimento e expansão das Assembleias de Deus na África do Sul.

210 Anne-Marie GORGUEL, Églises, mouvements religieux et changements sociaux em Afrique du Sud, p. 577. Trad. Por Adrien Gyato B. 78

1.1.1. Igrejas Sionistas de influência pentecostal

Na África do sul, as Igrejas Sionistas nasceram “devido à contradição entre as declarações teóricas contra o racismo das Igrejas multirraciais e sua prática” 211. É um fenómeno chamado de “‘Etiopismo’ que rejeita a liderança de brancos frente à Igreja e conserva os dogmas, os ritos e modo de organização de suas próprias confissões” 212. John Alexandre Dowie fundou duas Igrejas pentecostais, a Church of Zion (Igreja de Sião) e Christian Apostolic Catholic Church in Zion na cidade de Zion, nos EUA, em 1896. Essas duas Igrejas

enfatizam a conversão pessoal, as transformações psicológicas e espirituais, tal o dom de “falar em línguas”, profetizar, curar doentes. Encontram-se alguns elementos sincréticos da tradição africana: invocação do espírito dos Antepassados assimilados aos santos do Cristianismo, o uso de tambores sagrados, o transe, a possessão213. As duas Igrejas de Sião (ou Sionista) se implantaram na África, através da África do Sul (nas províncias do Natal e Transval) 214. Essas Igrejas são integradas no conjunto dos movimentos protestantes evangélicos que se caracterizam pela conversão, salvação pela fé, o sacrifício de Cristo e a importância da verdade das Escrituras Sagradas. Elas se fundamentam no poder absoluto de Deus e na cura divina. A revelação ocorre através dos profetas, religiosos, que são capazes de identificar e curar doenças. Estando possuídos pelo Espirito Santo, os profetas curam e expulsam demônios215.

Incorporam alguns elementos da cultura tradicional. As pessoas são atraídas pela cura (de doenças físicas e espirituais) e os milagres. A essência da doutrina Sionista é

a crença no Espírito Santo, os serviços e rituais baseados em orações cristãs e leituras bíblicas. Fazem uso de simbolismo ritual cristão, como sinal da cruz, velas acesas nos locais de culto, durante os serviços religiosos (...). Usam orações, água salgada (tirada do mar) e exorcisam os espíritos que originam as doenças.

211 Ibid., p.565. 212 Ibid., p. 565. 213 Ibid, p. 565. 214 Dowyvan Gabriel GASPAR. É dando que se recebe. A Igreja Universal do reino de Deus e o negócio da fé em Moçambique, p. 73. 215 Ibid, p. 74. 79

Os fiéis são chamados de maziones. Se para a cultura africana, a doença é consequência do relacionamento social (do relacionamento entre os parentes), e para a medecina moderna, é um mau funcionamento de algum órgão do corpo humano ou alguma infeção; para a Igreja Sionista, ela tem uma origem diabólica. A doença e as dores são causadas por demónios.

1.1.2. Igreja Assembleias de Deus de N. Bhengu

Nicholas Bhengu, filho de um pastor luterano, nasceu no dia 5 de setembro de 1909 em Kwazulu Natal. Foi considerado líder carismático e profeta. Bhengu era inteligente, estudioso e poliglota. Falava perfeitamente inglês, zulu, xhosa, swazi, shangana, sutho e africaans216. Frequentou a escola dos missionários luteranos em Entumeni e de missionários católicos de Inkamana e Marianhill. Formou-se em direito e trabalhou como advogado. Foi membro de um movimento sindical de Mr. Champion e fez parte do Partido Comunista. Depois afiliou-se à União Internacional de Investigação da Bíblia. Ficou atraido com a evangelização dos jovens estadunidenses de Full Gospel, que irá influenciar a sua vida.

Frequentou o Exército da Salvação, mas como era uma Igreja somente de brancos, não foi possível para se integrar por motivos raciais. Depois começou a organizar reuniões independentes em Kimberley. Conseguiu muitas pessoas para o estudo coletivo da Bíblia e o serviço de testemunho nas ruas. Estudou também em African General Mission School em Dumia entre 1934 e 1937. Em 1938 foi ordenado evangelista da Igreja Assembleias de Deus. Foi convidado por várias denominações para conduzir estudos de Bíblia, pregações em cruzadas de evangelização, sessões de cura e exorcismo. Fez campanhas de avivamento e de luta contra a delinquência na África do Sul. Mas em 1945 fundou a própria Igreja Assembleia de Deus East London. Construiu um novo templo com a capacidade de 3000 pessoas.

Desde 1945 realizó muchos viajes: a la ex África portuguesa, varias veces a Europa y a Estados Unidos, a Kenya, a la Conferência Mundial Pentecostal de Londres en 1952, al Japón. Fue membro del comité constitutivo de la 5ª Conferência Pentecostal Mundial en Toronto, en 1958 217.

216 Walter HOLLENWEGER, Op. Cit., p. 187. 217 Ibid, p. 189. 80

Segundo Bhengu, Deus se revela através da oração com fé. Quem ora com fé, encontra a Deus e será curado se afastar-se das obras do Diabo. Bhengu não acreditava totalmente na cura de doenças de infecção orgânica, mandava as pessoas irem ao hospital, enquanto muitos pentecostais de seu tempo se opunham. Concedia reverência aos Antepassados, mas não permitia que fossem venerados como deuses. Segundo ele, Deus Todo Poderoso reina sobre os Antepassados. Em nossa opinião, o que ele disse não contraria em nada as RTA. Os africanos acreditam no Ser Criador. E Esse está acima de tudo, os Antepassados são inferiores a Ele e O servem. Os Antepassados podem ser comparados aos santos católicos que intercedem junto a Deus, eles ajudam as pessoas cotidianamente em seus problemas espirituais e materiais. Fazem parte do panteão de divindade das RTA.

Nas cruzadas realizadas por Bhengu, muitas pessoas ouviam a Palavra de Deus, se convertiam e eram batizados pelo Espírito Santo. Segundo o autor, um dia dessas cruzadas na cidade de East London, toda cidade parou, com muito trânsito, pois as pessoas queriam chegar ao estádio para vê-lo. Bhengu não se reconhecia pentecostal, mas irmão livre e batista. Lutava contra o apartheid e pregava a convivência entre negros e brancos. Fortalecia a autoconfiança dos nativos frente à dominação dos colonos brancos, nas aldeias, organizava seus templos em cooperativas. Sua Igreja tinha uma administração decentralizada dando mais autonomia às comunidades locais. Em seus templos, conviviam ricos e pobres, citadinos e camponeses, pessoas cultas e pessoas com pouco estudo ou analfabetas.

Sendo negro, Bhengu conhecia a situação dos negros sul-africanos, vítimas do racismo e preconceitos. A maioria dos negros vivia amontoada na periferia da cidade, o bairro de Soweto em Johanesburgo é o exemplo concreto. A periferia era marcada pela pobreza, miséria, violência e delinquência. Bhengu empenhou-se durante toda sua vida a lutar pela diminuição da violência e da delinquência. A delinquência nesses bairros era símbolo de resistência e sobrevivência. Uma forma de reivindicar os direitos negados. O que é surpreendente, é que Nicholas Bhengu era favorável ao Apartheid, porque afirmava que esse permitiria a melhora da situação econômica dos negros sul-africanos. Era contra as IIA sul-africanas porque dizia ele, que faziam muito barulho com suas músicas e danças, e que os seus líderes trabalhavam só por dinheiro. Do ponto de vista político o Congresso Nacional Africano (CNA) acusou Bhengu de ser traidor da causa dos negros sul-africanos e servir os interesses dos brancos.

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1.2.O pentecostalismo no centro-leste da África

Na África central, a RDC é referência do pentecostalismo. O protestantismo se implantou na RDC a partir do trabalho de missionários europeus William F.P Burton (1889-1971) e James Salter (1890-1972), que fundaram a Missão Evangélica do Congo (MEC) em 1919. Na rebelião do Congo entre 1960 e 1964, muitos missionários dessa associação foram assassinados e outros deixaram o país. Dessa associação, surgiu a Igreja “Communauté Pentecôtiste du Congo”218 (CPC), que está presente em toda parte sul do país. No ano 2000, contava com meio milhão de fiéis. Ela está dividida em 70 distritos e em cada distrito tem um pastor presidente. Atualmente todos os pastores são congoleses. Da CPC surgiram várias outras Igrejas. Nota-se também a presença das AD estadunidenses, e as AGBI. Essas Igrejas são fruto do trabalho dos missionários suecos e norueguês. A Igreja Nzambe Malamu (Deus é bom) de Alexander Ayidini Abala (1927-1997) e Igreja Bima têm muitos elementos do pentecostalismo clássico219. Ayidini Abala se converteu no Quênia durante uma campanha de oração de T.L Osborn. Além das Igrejas católica, protestantes e Kimbanguista, a Igreja Nzambé Malamu e Assembleias de Deus estão presentes em todo território nacional. São populares e tradicionais.

Na África oriental, o Quênia é a referência do pentecostalismo. O Movimento Roho (Espírito Santo) do Quênia estava ligado à Igreja Anglicana. Os missionários Emil Danielsson, Otto e Marion Keller, e outros missionários canadenses, estadunidenses, escandinavos introduziram o movimento pentecostal no Quênia e em outros países da região. As Igrejas pentecostais mais importantes são: Pentecostal Evangelical Fellowship of Africa (iniciados por missionários estadunidenses em 1949), AD do Quênia (1967), associada com o ramo estadunidense.

Em 1927, um avivamento aconteceu na ‘Missão dos Amigos’, um movimento Dini ya Roho (também do Espírito Santo) entre os povos abaluyias. Os líderes de Dini ya Royo foram expulsos da Igreja mãe e em 1929 formaram a African Church of the Holy Spirit. Por sua vez, a African Israel Church Nineveh (AICN) foi fundada em 1942

218 Allan ANDERSON, Op. Cit, p. 136. 219 Bima em lingala significa “sai”. “Sai desse corpo satanás!” Uma expressão que mostra que a atividade principal da Igreja consiste em exorcismo. Opera uma luta aberta contra a bruxaria. O nome oficial Igreja é EJCEV: Église de Jésus Christ em Esprit et Vérité. (Igreja de Jesus Cristo em Espírito e Verdade) ela foi fundada no dia 18 de fevereiro de 1975 pelo Apóstolo Bolia Inzola. 82

pelo evangelista pentecostal Daudi Zakayo Kivuli (1896-1974) da etnia luyia. Daudi Zakayo Kivuli tinha experiência pentecostal anterior. Frequentou com os missionários Keller no PAC em 1925, fez a experiência do batismo do Espírito em 1932 e fez parte das campanhas de evangelização e santidade entre luos e luyias. A AICN possui uma sucessão hereditária.

Tem outros movimentos pentecostais como Akurinu ou Watu wa Mungu (povo de Deus), movimento que começou com o avivamento de 1922. É um movimento de cura profética entre os kikuyu do centro do Quênia, que rejeita tudo o que tem a ver com a cultura ocidental (roupas, sapatos, medicina moderna, educação e outros bens materiais e simbólicos). Eles usam a Bíblia com alguns elementos da tradição kikuyu. Até o ano 2000, possuía 30 templos naquela região. Na Tanzânia, as Igrejas pentecostais formam uma associação. A Igreja Assembleia de Deus, é a maior denominação pentecostal do país. Os missionários quenianos levaram a experiência pentecostal aos países vizinhos (Uganda e Tanzânia). O movimento pentecostal e carismático atingiu também a Etiópia, conhecida por sua tradição cristã milenar. Será analisada uma Igreja que não faz parte do pentecostalismo clássico, mas fruto do movimento da cura divina da década de 1950.

1.2.1. Igreja Deus é Bom 220

Pode-se classificar a Igreja Deus é Bom como Igreja de cura divina ou, segundo a classificação de Paul Freston221, pertecendo à segunda onda do Pentecostalismo. Em nossa opinião, essa Igreja faz parte das primairas Igrejas pentecostais na RDC. Foi fundada por Ayidini Abala em 1968. Ayidini nasceu no dia 15 de julho de 1927 em Ngibi, na coletividade222 dos Kaliko-Omi, no município de Aru, Província Oriental223. Ayidini é filho de Abala (pai) e Odjia (mãe). Esses não eram cristãos. Segundo a biografia do fundador, o pai dele tinha três esposas. Um dia, quando outras duas esposas estavam com seus filhos no campo, de repente um incêndio veio e os matou. Odjia que era estéril e com uma idade avançada, logo ficou grávida e deu à luz a um menino. Os

220 É conhecida na RDC pelo nome “Église Nzambe Malamu”. Mas o nome oficial da Igreja é FEPACO: Fraternité Evangélique de Pentecôte en Afrique et au Congo ( Fraternidade Evangélica de Pentecostes na África e no Congo). 221 Paul FRESTON, Breve história do pentecostalismo brasileiro, p. 70. 222 Coletividade ou setor faz parte da divisão administrativa da RDC, é um conjunto de aldeias dirigidas por um chefe tradicional que representa uma etnia. 223 Biografia do Apóstolo Ayidini Abala, disponível no site de Cristãos da África: http://www.dacb.org/stories/demrepcongo/f-ayidini_abala.html, acesso 20 /03/2014. 83

moradores da vila, sabendo disso, todos ficaram surpresos com a notícia. Ao visitarem o recém-nascido o nomearam “Ayidini”, isto é, “obrigado a Deus”.

Ayidini frequentou a escola dos missionários protestantes da “Communauté Evangélique au Centre de l’Afrique (CECA 20) fundada por missionários da African Inland Mission (AIM). O AIM fazia parte da Associação das Igrejas Protestantes do Congo. Um dia, a escola distribuiu folhetos a todos os alunos. Ayidini recebeu um dos folhetos, que estava escrito em Lingala: “Nzela na kondima” (o caminho da fé). Lendo atentamente, foi atraído pela passagem do Evangelho segundo Marcos 16, 15-18:

Ide por todo mundo, proclamai o Evangelho por toda criatura. Aquele que crer e for batizado será salvo. O que não crer será condenado. Estes são os sinais que acompanharão os que tiverem crido: em meu nome expulsarão demônios, falarão em novas línguas, pegarão em serpentes, e se beberem algum veneno mortífero, nada sofrerão, imporão as mãos sobre os enfermos, e estes ficarão curados. No dia seguinte Ayidini perguntou ao professor, que era também pastor da Igreja local, “por que essas palavras não se realizavam agora?”. O pastor respondeu lhe que, essas “palavras se realizaram na Igreja primitiva e que não podem se realizar agora”. Ayidini retrucou, “então por que os pastores continuam ensinando-as se não podem se realizar agora?”. Insatisfeito, Ayidini continuou fazendo várias outras perguntas ao professor a tal ponto que acabou sendo expulso da escola. Decidiu voltar para a aldeia, que ficava a alguns quilômetros dali. Chegando a sua casa, rasgou a sua Bíblia e começou a alimentar uma raiva contra os cristãos, sobretudo contra pastores e padres que vizitavam de vez em quando a aldeia. Considerou a Bíblia como um livro de mentira e de promessas irrealizáveis. Conseguiu reunir um grupo de jovens da aldeia e começou a planejar ações de violência contra os missionários, como apedrejamento, sequestro e furtos.

Aos 18 anos, deixou a aldeia de novo para buscar emprego. Conseguiu emprego de cozinheiro em Watsa224 na casa do Sr. Van Dolmer, um belga que trabalhava na Kilo-Moto, fábrica de extração de ouro. Devido a Segunda Guerra Mundial, seu patrão deixou o país e voltou para a Bélgica. Consequentemente Ayidini perdeu o emprego. Depois da guerra, Ayidini decidiu voltar à Uganda em busca de um novo emprego. Uma

224 Cidade no nordeste da RDC, conhecida por causa sociedade Kilo-Moto, que explora ouro. 84

vez em Kampala (capital de Uganda), reencontrou seu ex-patrão. Esse trabalhava na embaixada da Bélgica em Kampala e o contratou como motorista.

Um dia, passeando pela cidade viu um cartaz indicando que T.L Osborn iria fazer uma cruzada de evangelização e cura em Mombassa (Quênia), decidiu ir perturbar o evento. Saiu de Kampala no dia 03 de fevereiro de 1957, com 12 companheiros pegaram uma senhora com o nome de Tsibuka, cega e a levaram junto com eles para verificar se Osborn iria curá-la. Ao chegarem perto do local do evento, Ayidini ouviu uma voz: “Ayidini, não combate o teu Deus”. Duvidou e não quis responder, mas a voz repetiu várias vezes. Cansado então respondeu: “se é você Senhor, ordena que essa senhora veja”, exatamente no dia 10 de fevereiro de 1957, a senhora Tshibuka ficou curada depois da oração e imposição das mãos do evangelista T.L Osborn. Esse foi o motivo de conversão de Ayidini e de seus companheiros. Logo depois ele se batizou pelas mãos do evangelista em uma das praias de Mombassa, no oceano Índico.

Esse relato parace ser construído baseado na conversão do Apóstolo Paulo (At.9,1-19). Ele que perseguia cristãos, de repente ouviu o chamado de Jesus, se converteu e tornou-se um fervoroso discípulo, defensor e propagador de sua mensagem. De volta para Kampala, escreveu uma carta de demissão, mas seu patrão não aceitou o seu pedido, acusando-o por isso na justiça. Por esse motivo, Ayidini foi condenado injustamente e ficou preso por 8 dias. Saindo da prisão, começou o seu trabalho missionário. Casou-se com Amwuko, no dia 04 de abril de 1966, com quem teve seis filhos.

Depois de ter encontrado o evangelista T.L Osborn em Mombasa, em 1957, o pastor Ayidini organizou a chegada dele em Kinshasa para a cruzada de evangelização em 1964 e 1968. Só depois da segunda visita de Osborn na RDC que sua Igreja foi fundada entre 1968 e 1969. Ayidini Abala pregou o evangelho, curando doentes e expulsando demônios em vários países da África, Europa e Ásia. A Igreja Deus é Bom está presente em todo território da RDC, somente em Kinshasa ela tem 350 templos. Segundo Anderson, no ano 2000, seus membros passavam de meio milhão. A Igreja Deus é Bom, junto com a Igreja Assembleias de Deus e Kimbanguista, estão presentes em todo o território congolês, até nas aldeias mais afastadas. Depois de uma longa doença, o Apóstolo Ayidini faleceu na África do Sul em 1997 e o seu filho Pefa Ayidini

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o sucedeu. Depois de 8 anos a frente da Igreja, também morreu. Com a sua morte, seu outro irmão o sucedeu. A sucessão dentro da Igreja Deus é Bom é hereditária.

1.2.2. O pentecostalismo em Camarões

Como Nigéria, Costa do Marfim e outros países da África subsaariana, Camarões, sendo um país da África central, têm duas religiões principais: o Islã e o Cristianismo, um predominante no norte e outro no sul. É um país de muita diversidade linguística. As línguas oficiais são: o árabe (no norte), francês (no leste) e inglês (no oeste). Entre 1840 e 1890, o Cristianismo se implantou no litoral sul com os missionários europeus batistas, presbiterianos e católicos225. A associação Sudan United Mission (SUM) que reunia a União das Igrejas Evangélicas de Camarões (UEEC) e a Igreja Fraternal Luterana (IFL). Em 1920, foi para o norte, com o objetivo de impedir o crescimento e expansão do Islã. Essas duas Igrejas são fundamentalistas e rigorosas. Proíbem os fiéis de fumar, beber e possuir riquezas excessivas. Têm uma visão tradicional da família e defendem direitos da mulher.

Durante o regime do presidente Amadou Ahidjo (1960-1982), houve islamização forçada, perseguição e assassinato de cristãos. Com a chegada do presidente Paul Biya, começa a transição democrática e a liberdade religiosa, o que favorece a implantação e crescimento do Cristianismo no norte. As Igrejas pentecostais estão mais presente no sul do país, especialmente nas cidades de Yaunde e Douala e entraram no Grande Norte somente em 1970, mas tiveram crescimento somente entre 1980 e 1990. No começo, algumas dessas Igrejas se colocaram sob a proteção das Igrejas reconhecidas pelo Estado, uma delas é a Verdadeira Igreja de Deus. Com a liberdade religiosa, surgiram várias Igrejas pentecostais, como Igreja Messiânica Evangélica de Camarões (EMEC), Igreja Apostólica e a Igreja Fronteiras Globais. Depois da implantação das Igrejas Cristãs Tradicionais (católica e protestante) no norte, os movimentos fundamentalistas (pentecostais) iniciaram grandes cruzadas com o intuito também de converte os muçulmanos e os praticantes das RTA, considerados pagãos.

Se o Cristianismo entrou no Norte que tem a maioria muçulmana, por sua vez, o Islão também se expandiu para o sul, de maioria cristã. A mobilidade religiosa é fruto

225 Maud LASSEUR, Cameroun: les nouveaux territoires de Dieu, p. 99. Trad. por Adrien Gyato B. 86

da intensa migração interna de haoussas e bamouns. Se no Sul, existe uma concorrência no interior do Cristianismo, entre diversas denominações cristãs, isto é, entre as ICT e as pentecostais, para o controle do campo religioso; no Norte, também há uma concorrência interna no Islã entre o ramo tidjannita e sunita, entre o Islã tradicional africano e as novidades trazidas da Arábia Saudita, Sudão e Irã. Outro fato que caracteriza as religiões e Igrejas em Camarões é a nacionalização. As Igrejas ou religiões que eram étnicas e regionais, com uma forte mobilidade interna e migração, deixaram de ser e tornaram-se nacionais e interétnicas.

As Igrejas pentecostais e evangélicas em Camarões foram implantadas e cresceram graças aos evangelistas pentecostais estadunidenses e europeus que trabalhavam na Nigéria, isto é, a partir das duas províncias anglófonas da região oeste: North-West e South West, entre 1950-1960. No leste, a hostilidade das ICT freou sua implantação até 1980. Atualmente, as Igrejas Apostólicas, Missão do Evangelho Pleno, Verdadeira Igreja de Deus dispõem de centenas de templos distribuídos não só nessa região, mas em todo território nacional226. A difusão do pentecostalismo em Camarões acompanham a difusão da língua inglesa e o uso de novas tecnologias da comunicação. Estudando as duas religiões monoteístas em Camarões, K.Lasseur encontrou similaridade no que diz respeito ao surgimento de novos grupos no interior de cada religião. Esses novos grupos e correntes religiosos querem a reforma, a reconversão e a remoralização da instituição religiosa.

1.3. O pentecostalismo no oeste da África

A África ocidental é o ponto mais quente da África no que se refere ao pentecostalismo, especialmente na Nigéria e no Gana. Nota-se a presença de Lucy Farrow, missionário pentecostal da primeira geração, vindo de Los Angeles, em 1907 na Libéria. As principais Igrejas pentecostais de Gana são: Church of Pentecost, a maior; Assembleias de Deus, Apostolic Church of Ghana e Apostolic Church of Christ. Três dessas Igrejas são obra do trabalho missionário do ganês Peter Anim (1890-1984) e de seu companheiro irlandês do norte James McKeown (1900-1989).

Peter Anim é considerado uma das figuras emblemáticas do pentecostalismo no Gana. Ele entrou em contato com as publicações da Faith Tabernacle Church de

226Ibid., p. 113. 87

Filadelfia (EUA) por volta de 1917, foi curado de uma doença do estômago em 1921. Desistiu da Igreja Presbiteriana e se converteu ao pentecostalismo tornando-se pregador independente com ministério de cura e atraindo as multidões. Em 1922, adotou o mesmo nome para sua Igreja, Faith Tabernacle. Oito anos depois trocou o nome para Apostolic Faith. Anim colaborava com outras Igrejas estadunidenses e inglesas nas cruzadas que realizava, depois de alguns anos rompeu com elas. E em 1939, sua Igreja passou a ser chamada de Christ Apostolic Church.

James McKeown fundou a Gold Coast Apostolic Church em 1953, mas mudou o nome da Igreja para Churh of Pentecostal em 1962. Será abordadada mais para frente com mais detalhe a vida dessa Igreja. Como afirma Anderson, o que é importante na história do pentecostalismo ganês é a formação da federação Ghana Pentecostal Council, em 1969 que reuniu as três Igrejas apostólicas surgidas a partir da pregação de Peter Anim. E em 1998, outras 150 denominações cristãs se juntaram a ela, formando assim um verdadeiro “ecumenismo carismático e pentecostal” 227.

Na Nigéria, em 1915, um pregador popular anglicano Garrick Braide recomendava a destruição de feitiços e curava por meio da oração. Depois de sua pregação, os seus seguidores se reuniram para formar Christ Army Church, considerada a primeira Igreja pentecostal do país. Garrick Braside foi preso pelos colonos ingleses por ser uma ameaça à ordem pública e acusado de ter um comportamento sedutor 228.

Na região de Yoruba, Joseph Shadare, líder de uma Igreja Anglicana formou um grupo de oração em 1918 com o nome de Precious Stone Society, com o objetivo de oferecer uma ajuda espiritual e saúde às vítimas da epidemia de gripe. Esse grupo abandonou a Igreja Anglicana em 1922 porque não concordava com o batismo de crianças e se afiliou à Igreja Faith Tabernacle, que tinha como ênfase a santidade divina e o batismo de adultos por imersão. O grupo rompeu com Faith Tabernacle em 1925, para formar Eternal Sacred Order of Cherubim and Seraphim Society, essa vez, pela ajuda de Moses Orimolade Tunolashe. Por causa da insistência em oração, as pessoas começaram a chama-los de “gente de oração”, Aladura229. O Movimento Aladura teve a sua expansão em 1930, e essa foi possível pelo trabalho em conjunto de Moses Babalola e Joseph Shadare.

227 Allan ANDERSON, Op. Cit., p. 144. 228 Ibid, p. 144. 229 Ibid, p. 144. 88

Do grupo Aladura, surgiu a Christ Apostolic Church (CAC) em 1941, que se constituiu em uma das maiores denominações cristãs, com milhões de adeptos. Essa Igreja se considera pentecostal e segue o exemplo da Igreja Apostólica administrativamente e teologicamente. A Church of Lord também surgiu do movimento Aladura. As Igrejas Aladura se declaram pentecostais, apesar de ter recebido a influência pentecostal ocidental, segundo Allan Anderson, são essencialmente fruto do avivamento pentecostal africano 230. Condenam e rejeitam as RTA, a poligamia, fetichismo, a bruxaria. Em 1950, as Igrejas Aladura ocupavam um lugar fundamental na sociedade Yoruba, sendo a força importante do Cristianismo nigeriano.

Allan Anderson constata que existe um movimento de pentecostalização das Igrejas cristãs no continente africano como em outras partes do mundo. Além da teologia de inculturação, a Igreja Católica teve que acionar e promover o movimento da Renovação Carismática para conter a evasão dos fiéis. O sucesso das Igrejas pentecostais na África se explica por contextualização e responder as necessidades e as aspirações das pessoas. Elas adaptam a sua mensagem a partir da realidade histórica dos africanos (pessoas marginalizadas, desfavorecidas e em luta pela dignidade) frente ao colonialismo e neocolonialismo opressor e brutal. Como se observa, o pentecostalismo africano é fruto da ruptura com as Igrejas pentecostais clássicas estadunidenses e europeias, e das Igrejas Protestantes (Anglicana, Metodista, Presbiteriana, etc.). Nessa ruptura, algumas Igrejas estabelecem uma relação colaboração, cooperação ou alianças com outras para o seu sucesso no campo religioso. Essa ruptura resulta da luta por poder, privilégios, dinheiro e divergências teológicas. Na maioria dos casos, o desejo dos líderes africanos é de criar uma religião que corresponda com a realidade e as necessidades de seus povos.

Nessa região, Nigéria e Gana constituem os polos de implantação, expansão do pentecostalismo. Será analisado detalhadamente o pentecostalismo em Burkina Faso, Gana, Benim e Togo.

230 Ibid., p. 146. 89

1.3.1. Igreja Assembleias de Deus de Burkina Faso

A Igreja Assembleias de Deus de Burkina Faso (IADBF) é a maior denominação pentecostal do país, por seu crescimento e sucesso.

Esse sucesso deve ser entendido no contexto do que ele (P.J Laurent) chama de “modernidade insegura”, onde os laços familiares de solidariedade e de aliança perdem seus elementos constitutivos. Onde o fracasso do Estado não permite garantir a segurança de uma parte importante da população. Oferecendo espaços privilegiados de sociabilidade e ligando conversão e ritos de cura divina, as Assembleias de Deus se afirmam como uma solução milagrosa frente à solidão, as doenças, à adversidade, ao sofrimento físico ou social das pessoas231. A IADBF em 1921 e é considerada uma das Igrejas pentecostais mais antigas do continente inclusive está caminhando para seu centenário. Na comemoração dos 85 anos de sua fundação, isto é, no nível mundial a cúpula da Igreja fez o balanço, afirmando que tinha “32 milhões fiéis, 1.208 escolas bíblicas, 174.657 templos em 158 países” 232. Segundo Pierre-Joseph Laurent, ela possui meio milhão de fiéis em Burkina Faso, o que representa 5% da população. Ela se implantou na cultura de povo Mossi e em 1996, na ocasião da comemoração de 75 anos de sua implnatação, a direção geral em Ouagadougu forneceu seguintes dados: 400.000 membros batizados numa população de 10,5 milhões, 1800 pastores, 1750 templos.

Os fiéis reunidos em torno do pastor no templo encontram um clima de segurança e confiança, sob observância dos princípios divinos. “A confiança está restabelecida entre os irmão e irmãs em oração, que respeitam o mesmo sistema de interditos” 233. Tem duas categorias de fieís assembleanos, os camponeses e os urbanos. Essas pessoas têm noção do que é sobrenatural. A primeira categoria é a dos camponeses mossi, que vivem do trabalho manual (lavoura, pesca, caça, criação de animais e artesanato). Onde a bruxaria é base do controle social. A segunda categoria está formada de mossi urbano moradores de Ouagadougu, estes estão influenciados pela cultura ocidental, têm uma melhor condição de vida. Para se protegerem contra ataques de colegas de trabalho, ter segurança no emprego e ser promovido dos ataques de

231 Pierre-Joseph LAURENT. Effervescence religieuse et gouvernance. L’exemple des Assemblées de Dieu du Burkina Faso, p. 117. Trad. Por Adrien Gyato B. 232 Ibid., p. 95. 233 Ibid., p. 103. 90

bruxaria dos parentes camponeses, eles consultam os feiticeiros. A IADBF se apresenta como uma das vias de manipulação mágica de relacionamento entre os indivíduos.

A comunidade assembleiana parece ser uma comunidade de sociabilidade. “A conversão à Igreja e a participação nos ritos de cura e exorcismo podem ser interpretadas como busca de um ambiente de apaziguamento e de confiança mútua” 234. A Igreja se apresenta como um amparo e um espaço de consolação para pessoas que vivem com medo constante da bruxaria. A bruxaria gera insegurança e violência. A gestão da bruxaria na vida da comunidade se baseia num sentimento de perseguição: os grupos vivem com medo do outro, da onipresença da violência e da vingança. “O papel das Assembleias de Deus na sociedade burkinabé se compreende essencialmente na experiência cotidiana da confiança estabelecida entre os fiéis de sua comunidade” 235.

A Igreja também trabalha com a cura divina, que consiste em restaurar o bem- estar econômico das pessoas e instituir as redes de ajuda mútua entre os membros da comunidade. Se a comunidade assembleana institui as redes de ajuda mútua entre os seus fiéis, portanto não rompeu totalmente com a solidariedade africana. Nessa, os membros da mesma linhagem se ajudavam mutuamente. A ajuda se fazia dentro da lógica de consanguinidade (família extensa, linhagem e etnia). Enquanto na comunidade cristã, a ajuda se faz dentro da lógica da pertença à Igreja, tendo como base os valores cristãos, superando as barreiras da etnia, ela se abre à sociedade em seu conjunto. A solidariedade pentecostal vem ampliar a solidariedade tradicional e lhe dar um novo sentido.

O encontro com a mensagem cristã numa sociedade em constante mudança nos moldes da cultura ocidental leva os burquinas a reinterpretar a própria cultura, selecionar alguns de seus elementos que podem melhorar a vida e se adaptar ao novo contexto social,

A crença no imaginário político marcado por forças sobrenaturais conduz os fiéis a empregar os elementos de uma reinterpretação cultural com o objetivo de adaptar-se aos riscos de uma sociedade que passa por profundas transformações. 236

234 Ibid., p. 108. 235 Ibid., p. 109. 236 Ibid., p. 113. 91

A insegurança na modernidade nasce da transição da sociedade tradicional para a moderna, entre a lógica de organização social tradicional (RTA) e o modelo ocidental. O papel da Igreja é fazer com que essa transição se faça pacificamente de forma a diminuir a crise. “A conversão vem provisoriamente suspender a indecisão, que na maior parte de fiéis, resulta das hesitações entre os princípios da vida comum na sociedade tradicional e os modos de existência ligados ao sujeito da modernidade” 237.

O fato do crente viver em Ouagadougou não significa que abandonou completamente a cultura (Ki-sida) ora diabolizada pela Igreja. Pois a cultura local tem um papel decisivo, como fonte de sobrevivência. Muitos burquinas urbanos e imigrantes em países vizinhos e na Europa mantém contato com a família no interior do país e ajudam-na, oferecendo presentes a parentes, pagando dívidas por medo de não causar os sentimentos de inveja e ciúme que podem desembocar em bruxaria. Ajudar a própria família não se justifica somente medo da bruxaria, mas, é uma atitude de alguns seres humanos de querer melhorar a condição econômica de suas famílias. E isso se acentua no caso dos negros africanos, que têm a consciência da solidariedade tradicional. O africano acredita que quanto mais ajuda os parentes, mais será abençoado e próspero.

1.3.2. Igreja Pentecostal do Gana

É uma Igreja pentecostal africana, fundada em 1953 por James McKeown (1900-1989) missionário pentecostal escocês. James McKeown nasceu na vila de Glenboig na Escócia. Desde jovem teve contato com o movimento de avivamento do país de Gales. Frequentou a Igreja Elim, fundada por George Jeffreys em 1915, e depois se afiliou à Igreja Apostólica da Inglaterra. Foi nessa Igreja que foi ordenado pastor e enviado em missão a Gana a pedido do pastor ganês Peter Anim, isto em 1939. Mesmo separando-se de Peter Anim, continuou trabalhando na Igreja Apostólica até 1953, ano em que fundou The Gold Coast Apostolic Church e que em 1962 passou a se chamar Church of Pentecost (Igreja Pentecostal) A chegada desse missionário escocês na Costa do Ouro foi interpretada como a realização da profecia de William Harris, segundo a qual um missionário branco viria para evangelizar o povo Ashanti. James McKeown teve contato com o discípulo de William Harris, John Nackabah, fundador da Igreja Twelve Apostles Church.

237 Ibid., p. 116. 92

Com a independência do país, houve um movimento de nacionalização da Igreja. Em 1957, durante uma viagem de James McKeown a Europa, o pastor Joseph Anaman foi eleito presidente da Igreja. Ao voltar, James McKeown não aceitou a eleição feita em sua ausência e rejeitou a decisão da cúpula. Esse episódio provocou uma crise de liderança entre os dois. Essa crise teve fim em 1961 com a realização de um concílio reunindo todos os pastores da Igreja. Porém, outra crise se instalou na Igreja entre pastores europeus e ganeses, na disputa pelo poder. Somente após a aposentadoria do fundador e seu retorno para Escócia, é que um ganês, o reverendo F.S Safo foi eleito presidente da Igreja em 1982.

A Igreja Pentecostal do Gana é uma igreja étnica, isto é, dos Ashanti. “A língua “twi” dos Ashanti é usada como língua sagrada. A maior parte de pastores é recrutada no meio do grupo Akan 238. O grupo étnico akan (dos ashanti) se encontra em Gana e Costa do Marfim. A expansão da Igreja seguiu a migração do povo akan em toda região. O povo akan é essencialmente pescador e comerciante. Fora de Gana, a Igreja Pentecostal do Gana tem uma presença significativa na Costa do Marfim, Togo, Burkina Faso e Benim239. A Igreja de Burkina Faso foi introduzida por pastores mossi burquinas vindos de Gana, que negociaram com o próprio fundador James McKeown em 1950240. É por isso que essa Igreja tem certa autonomia diante da hegemonia ganesa. Foi reconhecida oficialmente na Costa do Marfim em 1966. Na década de 1990, se expandiu no restante dos países africanos até à África do sul. A Igreja está presente em vinte cinco países da África, e em outros vinte e cinco divididos entre Europa e na América do Norte 241. “O crescimento dessa Igreja é fruto de uma aliança entre Deus e os pais fundadores, colocando Gana na escala de nação missionária, que tem o objetivo de ser a ponta de lança da evangelização do mundo” 242. A Igreja é ao mesmo tempo étnica, transnacional e missionária. Apesar de sua internacionalização, os Ashanti de Gana continuam fazendo parte da alta hierarquia a nível mundial.

Ela adotou três estratégias para a implantação e expansão. A primeira consiste em seguir a imigração de pescadores e comerciantes ganeses, já a segunda é a

238 Sandra FRANCELLO. Le plan de Dieu pour le Ghana: Une église en héritage, p. 16. Trad. por Adrien Gyato B. 239 IDEM. Réseaux migratoires et structures de pouvoir: la Church of Pentecost du Ghana face aux communautés francofones, p.113. Trad. por Adrien Gyato B. 240 Ibid, p.113. 241 Ibid, p. 111. 242Sandra FRANCELLO, Op. Cit., p.19. 93

evangelização das populações autóctones recrutando os agentes locais243. E por fim, A terceira estratégia é designada “Operation Next Door”, tem como objetivo de fazer com que cada Igreja se estenda ao país vizinho e comece uma célula, que mais tarde se tornará comunidade autônoma, capaz de acolher e sustentar um missionário 244.

A herança da Igreja aos Ashanti é um enorme privilégio. Eles centralizaram o poder impondo a todos os membros a língua inglesa e twi como línguas sagradas e controlando a administração e economia das presenças da Igreja no exterior. O que é difícil de compreender é fazer o culto em inglês ou em twi num espaço francófono. O que exige a presença de intérpretes. A imposição das duas línguas já causou muitos conflitos e dissidências dentro da Igreja. A maior dissidência ocorreu no Togo em 1991, onde os pastores togoleses endureceram sua oposição a hegemonia ganesa. A Igreja se dividiu em duas, a maioria ficou na Igreja local e uma minoria seguiu fiel o ramo ganês. Essa minoria perdeu os templos que possuía e teve que mudar o nome para Igreja Pentecostal Internacional.

Apesar do controle muito rígido da cúpula ganesa, um pastor ganês implantou a Igreja na Ucrânia, formando um grupo de ucranianos para constituir a liderança. Hoje essa Igreja é autônoma e está afiliada à Igreja mãe de Gana. No nível de Accra, a Igreja tem sua sede mundial e um Conselho Executivo Internacional, encarregado de “avaliar os relatórios das atividades das missões e movimentos das Igrejas nacionais. Fazer convocações, promoções, nomeações, revogações e licenciamentos, e aposentar os líderes e membros da Igreja” 245.

O Apóstolo Michael Ntumy é o atual líder mundial da Igreja. Ele tem o título de Pastor-Doutor, como muitos líderes carismáticos neopentecostais da região. Ntumy é doutor em Filosofia religiosa e Teologia, autor de vários livros publicados em inglês e francês. A Igreja se recusa de permitir que as línguas nacionais sejam usadas no culto por medo de perder o poder e ter dissidências. A imposição dessas línguas pela instituição é uma estratégia de controle que usa para conservar o poder e ter influência no nível local e mundial. Essa imposição cria uma categoria de “intérpretes”, que constitui uma classe privilegiada dentro da Igreja. “Seu percurso, situação familiar e

243 IDEM, Réseaux migratoires et structures de pouvoir: la Church of Pentecost du Ghana face aux communautés francofones, p.114. 244 Ibid., p.116. 245 Ibid., p. 117. 94

formação universitária os colocam numa perspectiva transnacional” 246. Os pastores tendem a serem conservadores em questões morais e doutrinais, mas os intérpretes têm a liberdade de interpretação e de contextualização, o que proporciona mudança no entendimento do público.

A Igreja possui duas atividades principais: o grupo de oração e o de libertação. Através da oração a Igreja cura a loucura, deficiência física, problemas sexuais (impontência, infertilidade e o caso de esposa ou marido de noite)247. Todos os problemas físicos e espirituais são atribuídos ao Diabo. Neste grupo de oração, para fazer o exorcismo, os membros participam das sessões de oração três vezes por dia: de manhã, no meio dia e a tarde. Somente depois da leitura da Palavra de Deus é que começa a sessão de exorcismo. Os grupos de oração têm uma estrutura que não serve somente como terapia para os que os procuram, mas espaço de trânsito de imigrantes ganeses na espera de “documentos” para viajar. Em Accra, esses centros facilitam a imigração para a África ocidental e Ocidente. As pessoas que trabalham nesses centros têm o dom de cura, visão, discernimento de espíritos e profecia, não fazem parte da hierarquia da Igreja (pastores e apóstolos). Esses grupos de oração e centros de libertação são mantidos de ofertas, dízimos de fiéis e doações das pessoas que foram libertadas e curadas.

O exagero em enfatizar a dimensão de cura e libertação pode fazer com que a Igreja mercantilize suas práticas. “O modo de funcionamento, a gestão dos grupos de oração, assim como a questão de status de seus dirigentes estão na origem de muitas dissidências em Gana como também na Costa do Marfim” 248. Alguns líderes nacionais recusam-se a mandar o dinheiro de ofertas e dízimos para Accra, o que constitui também motivo de dissidência. Os intérpretes e os curadores são incontornáveis no processo de implantação, crescimento e expansão da Igreja.

246 Ibid., p.128. 247 Esposa ou marido de noite é comum na África subsaariana. Acontece que uma pessoa sonha ter tido relação sexual com outra a noite. Para os pentecostais, é uma prova de demônios. A pessoa precisa ser libertada. 248 Sandra FRANCELLO, Op. Cit., p. 132. 95

1.3.3. O pentecostalismo no Benim

Segundo Albert de Surgy, o Benim recebeu a influência do movimento pentecostal da Nigéria e Gana. “O primeiro a chegar foi o pentecostalismo afro-cristão da Nigéria. Depois, o pentecostalismo introduzido pelos missionários ingleses da Igreja Apostólica a partir dos anos 50” 249. Benim como outros países da África subsaariana é marcado pela diversidade religiosa. De acordo com o censo de 1992250, o país tinha uma população estimada a 4.421.094 de pessoas. O cenário religioso nacional se apresentava de seguinte forma:

Religião Número Porcentagem Vodu 1.556.910 35,21% Catolicismo 1.156.398 26,15% Islão 904.897 20,46% Metodismo 156.897 3,54% Outras denominações 261.113 5,95% cristãs Outras religiões 81.600 1,84% Religião não declarada 25.600 0,57% Sem religião 277.910 6,28% Total da população 4.421.094 100%

Claro que o cenário religioso beninês mudou muito nos últimos 22 anos, mas essa tabela nos dá uma ideia sobre a diversidade e o pluralismo religioso nesse país. Naquele tempo, havia cerca de 138.000 evangélicos, que representavam 8,17% dos cristãos e 3,12% da população. É bom notar que existia um número crescente das pessoas que se declara sem religião (6,28%) ou que simplesmente não declaram a sua religião (0,57). Se comparar com a ARDA, Benim tem 43, 77% de cristãos; 25,46% de muçilmanos; 30,38% de adeptos das RTA; 0,13% de Bahai; 0,19% de agnósticos e 0,07% de outras religiões. O surpreendente é que não se encontram a categoria de “sem-

249 Albert de SURGY, Pentecôtisme en Afrique. Le cas de benin, p. 21. Trad. por Adrien Gyato B. 250 Ibid, p. 13. Segundo os dados de The Arda (2010), o Benim tem 43,77% de cristãos, 25,46% de muçulmanos, 30,38% dos praticantes das RTA, 0,13% de Bahai, 0,19% de agnósticos e 0,07% de outras religiões, veja Tabela 5, p.223-224. Não tem nenhum dado sobre a categoria de sem-religião que o Censo de 1992 traz. 96

religião” nos dados da ARDA. Como no caso de Moçambique, só em 1997, segundo Raúl Manuel Braga Pires, 23,01% da população se declaravam sem religião251. O número poderia ser maior se incluísse o que ele chama de desconhecidos 2,06% e os cristãos indeterminados 3,06%. O restante, 23,8% de moçambicanos são católicos, 17,8% são muçulmanos, 17,5% são das Igrejas Sionistas e Etíopes, 7,8% são protestantes e pentecostais, 2,1% das RTA e 1,6% de outras religiões. Deve-se sublinhar que é muito raro fazer censo da população nos países da África subsaariana, por falta de recursos financeiros e vontade política. As políticas públicas são feitas por suposições, o que gera corrupções e desvio de dinheiro. A título de exemplo, o último censo a ser realizado na RDC foi em 1984. Os efeitos do marxismo em Moçambique podem estar na origem da visão negativa, de indiferência diante as instituições religiosas. No Brasil, segundo o censo de 2010, 8% da população se declaram sem-religião ou desigrejados. Dentre as pessoas que se declaram sem religião, existem os crentes, mas que não pertencem a uma instituição religiosa, as pessoas que transitam de uma instituição religiosa para outra sem pertencimento, ou simplesmente agnósticos e ateus. É um fenômeno novo no estudo das religiões. É interessante que esse fenômeno já está presente na África.

As principais Igrejas pentecostais do Benim são: Igreja Evangélica Universal, Igreja de Deus JJC (Jeová por Jesus Cristo), Assembleias de Deus, Igreja de Fé Apostólica, União e Renascimento dos Homens em Cristo. Além da grande influência do pentecostalismo ganês e nigeriano, as Igrejas pentecostais e evangélicas do Benim vêm de diferentes países, fruto de personagens e doutrinas diferentes. Existem Igrejas de origens diferentes: das IIA, do pentecostalismo estadunidense e de outras denominações pentecostais. Outras Igrejas começaram simplesmente como ministérios, grupos de oração e associações. “As Igrejas estadunidenses que se implantaram no Benim são: Igreja de Deus, Igreja de Deus em Cristo, Igreja do Santo Tabernáculo, Assembleias de Deus, Fé Apostólica e Igreja Quadrangular” 252.

As Igrejas pentecostais fundadas por benineses são: a Missão Evangélica dos Ganhadores de Almas, Igreja Africanas do Despertar, Igreja de Evangelização da Palavra de Cristo ao mundo, União de Renascimento dos Homens em Cristo, Igreja Bíblica da Fé Profunda, Igreja Messiânica Universal, Missão pela Unidade dos Filhos

251 Raúl Manuel Braga PIRES, Indianos sunitas em Moçambique 1974/2004, p.11. 252 Albert de SURGY, Op. Cit., p. 22-23. 97

Regenerados em Cristo, Igreja Evangélica da Libertação e Salvação em Cristo e Associação de Discípulos de Cristo.

A Missão Evangélica dos Ganhadores de Almas foi fundada em 1970 por Adjassa Kpoviessi Basile, que trabalhou junto com o evangelista estadunidense T.L Osborn. O Ministério da Profunda Vida Cristã (Deeper Christian Life Ministry) foi, por sua vez, fundado por W.F Fumuyi, em 1982. Começou como um grupo de estudo bíblico, depois virou Igreja com nome de Igreja Bíblica da Vida Profunda.

Igreja Africana do Despertar foi fundada por Salomon em 1973 e é uma instituição que investe na evangelização, proporcionando a estrutura (meios audiovisuais: projetores, rádio e televisão), sala para conferências253. Ela oferece curas milagrosas e exorcismo. Têm obras sociais como escolas, hospitais e plantações. Seus pastores têm cada um sua profissão e não vivem de ofertas e dízimos dos fiéis, que por sua vez trabalham voluntariamente para a Igreja. Em 1985, doze membros saíram para fundar a Igreja Messiânica Universal254.

Igreja de Evangelização da Palavra de Cristo ao Mundo (IEPCM) foi fundada por Paul Sonounameto, em Porto-Novo, em 1969. Essa Igreja é fruto de uma ruptura com a Igreja do Cristianismo Celeste. Paul Sonounameto acusava os celestes de ser infiéis e de praticar a poligamia. Depois de um tempo, um grupo saiu para fundar a União e Renascimento dos Homens em Cristo (1973). Outro grupo se desolidarizou também com a Igreja da Evangelização para fundar em 1979 novas Igrejas e outro ainda voltou a praticar o Vodou. Mas em 1985, a Igreja de Evangelização cresceu e abriu muitos templos pelo país, atravessou as fronteiras e chegou à Costa do Marfim. Suas práticas são marcadas pelo transe e glossolalia. Sua ênfase está no estudo bíblico e nas obras sociais. Proíbe a poligamia e ensina às mulheres a obedecer a seus maridos, a exemplo de Sara e Abraão. Convida também os servidores públicos à conversão, a não achar que seu trabalho é incompatível com a fé cristã.

A União e Renascimento dos Homens em Cristo (URHC) foi fundada por Pierre Loukouya, em Cotonou, em 1973255. É ativa na evangelização, seus fiéis pertencem de todas as classes sociais (camponeses, urbanos, ricos e pobres). É uma Igreja que se

253 Ibid., p. 35. 254 Ibid., p.37. 255 Ibid., p.33. 98

expandiu rapidamente no país, atingindo todas as províncias. Está presente na Nigéria, Gabão, Costa do Marfim e Togo. Essa Igreja convida seus fieis a receber o batismo e os dons do Espírito Santo. Não permite o transe e as manifestações espirituais espetaculares. Teve sua primeira crise em 1985 e outra, entre 1991 e 1992, o que ocasionou várias dissidências256 como a Missão pela Unidade dos Filhos Regenerados em Cristo (1990), Igreja Evangélica da libertação e salvação em Cristo, Associação de discípulos de Cristo, etc. Em 1999, o restante da Igreja se dividiu em duas, uma permaneceu fiel ao fundador Pierre Loukouya e a outra com outro pastor.

Igreja da Ascenção de Cristo, fundada na Nigéria em 1984, cresceu rapidamente em Benim e está presente em todas as províncias. Encontra-se também no Gana, Costa do Marfim, Togo e Benim. Nessa Igreja, batiza-se por imersão uma só vez. As crianças que não atingiram a idade da razão não podem ser batizadas. A comunhão é distribuída uma vez por mês. O batismo do Espírito é celebrado toda sexta-feira. A partir desse batismo, as pessoas recebem o dom da profecia, visão e sonhos premonitórios. A confissão de pecados é feita em público ou em particular diante de Deus. “As orações devem sair do coração. Nenhuma fórmula pode ser utilizada. Se apoiam somente em nome de Jesus Cristo. Todo uso de incenso, velas, encantação, toda enunciação de nomes especiais de anjos é proibido” 257. Todas essas proibições se referem às RTA e especialmente ao Vodu e ICC. O jejum é recomendado. Proíbe-se danças, roupas curtas e indecentes para mulheres e o consumo de bebidas alcóolicas e cigarro.

Outro fato que acontece no pentecostalismo beninês é que muitos ministérios, associações e grupos de oração depois de algum tempo se transformam em Igrejas. o exemplo disso é o caso da Igreja Missão Cristã pela Evangelização e Despertar (do pastor Kwazi Ebah Paul Zinsou), a Igreja Evangélica dos Missionários do pastor A. Jérémie Sognigbé e o Mundo Para Cristo do pastor camaronês Ngoa Atangana (1991) 258. O pastor Jérémie Sognigbé foi criado em uma família metodista, trabalhou na Missão Evangélica da Fé e teve visões que o incentivaram a criar um movimento religioso que pudesse formar missionários de toda denominação e ter estrutura para hospedá-los. Reuniu algumas pessoas e conseguiu começar um grupo denominado Reunião Bíblica Universal, que mais tarde se tornou uam Igreja, porém não teve

256 Ibid., p.34. 257 Ibid., p. 30. 258 Ibid., p. 43. 99

sucesso. Depois esse grupo de estudo bíblico virou Igreja, mas não teve sucesso, fracassou. Somente em 1993 que conseguiu fundar algo que pudesse corresponder às visões tidas. O Centro dos Missionários Voluntários (CMV) 259 iniciado por ele teve como objetivos:

Criar pequenos grupos de oração nos bairros para reunir, fortalecer e finalizar o processo de libertação das pessoas (...). Acolher os missionários assegurando-lhes hospedagem e comida, bancando suas viagens e organizando suas atividades (...). Colocar à disposição dos cristãos uma biblioteca. Constituir uma equipe com a tarefa de evangelizar diversos bairros da cidade e visitar regularmente os presos, os doentes no hospital, os órfãos, pessoas com deficiência física (...). Instituir uma escola de formação de evangelistas260. Albert de Surgy constata que algumas Igrejas pentecostais africanas se associam às Igrejas missionárias para receber apoio financeiro, material pedagógico. Em relação às Igrejas cristãs do Benim, pode-se observar a presença de vários ministérios, missões, associações e federações para coordenar as atividades, defender seus direitos e interesses na sociedade e como uma forma de se relacionar com o Estado.

1.3.4. O pentecostalismo no Togo

A Igreja Assembleias de Deus se estabeleceu nesse pequeno país da África ocidental em 1936261, através dos missionários mossi de Burkina Faso. Somente entre 1939-1941, é que chegam missionários estadunidenses na cidade de Dapaong, no norte do Togo262. Outras Igrejas como, a Igreja Apostólica e Church of Pentecost do Gana entraram no país através dos imigrantes convertidos naquele país entre 1948 e 1950, que voltaram ao país como evangelistas itinerantes.

Como foi em vários países africanos operando vários milagres, o evangelista estadunidense T.L.Osborn chega a Lomé em 1959. Como o caso da RDC, Quênia, Gana e outros países. Com o decreto presidencial de 1978, várias Igrejas foram proibidas de funcionar. O presidente da república Nyasingbe Eyadema, através do partido, Conselho Nacional do Reagrupamento do Povo Togolês, proibiu o

259 Ibid., p. 45. 260 Ibid., p. 45-46. 261 Togo tem cerca de 6 milhões de habitantes, com uma superfície de 56.785 km2. 262Joël NORET, Le pentecôtisme au Togo. Éléments d’histoire et développement, p.76. Trad. por Adrien Gyato B. 100

funcionamento de mais de vinte organizações religiosas, entre as quais, o Cristianismo Celeste, Testemunhas de Jeová, Igreja Apostólica, Igreja do Pentecostes, etc. Alegando que essas Igrejas perturbam gravemente a ordem pública, poderiam funcionar somente as Igrejas estabelecidas, isto é, a Igreja Católica, Igreja Evangélica do Togo, Igreja Metodista, Igreja Batista e Assembleias de Deus 263.

Antes de 1990, muitos pastores cujas Igrejas foram proibidas de funcionar foram presos e torturados durante o regime ditatorial de Eyadema que durou 39 anos. Apesar da proibição, algumas Igrejas continuaram funcionando na clandestinidade, sob cobertura de outras Igrejas reconhecidas. No meio da perseguição contra um grupo de religiosos, alguns jovens estudantes formaram grupos de estudos da Bíblia na Universidade de Lomé. A liberdade religiosa concedida em 1991 conduziu à explosão pentecostal, com o surgimento de várias Igrejas, ministérios, grupos de oração. Entre os dias 19 e 24 de fevereiro 1991, o evangelista alemão R. Bonnke visitou Lomé para a Cruzada de Evangelização e cura divina. Nessa visita, ele teve uma audiência especial com o presidente Nyasingbe Eyadema, num só dia conseguiu reunir cerca de 200.000 pessoas.

As principais Igrejas pentecostais do Togo são: AD, Igreja do Pentecostes do Togo, Igreja Bíblica da Vida Profunda, Igreja Ministério da Fé, Centro de Orações e Evangelização Zion-To, Ministério Amigos de Cristo, Igreja Praise Chapel e Dagerous Prayer Center. Segundo Joël Noret, no ano 2004, AD tinha 750 templos, 480 pastores e mais de 150.000 batizados. A Igreja do Pentecostes do Togo tinha por sua vez 650 templos, centenas de pastores e 50.000 fiéis. Algumas dessas Igrejas têm uma presença significativa na mídia, como o Centro de Orações e Evangelização Zion-To do pastor R.L Adjaho que tem duas emissoras de rádio e uma de TV.

263 Ibid., p.79. 101

2. Neopentecostalismo na África

2.1. Surgimento e expansão do neopentecostalismo

Depois da formação e consolidação do pentecostalismo (1906-1943), houve a formação de vários movimentos religiosos que não se enquadravam à doutrina do pentecostalismo clássico. Surgiram os evangelistas independentes com o grupo de santidade William Branham, os televangelistas como Oral Roberts e T.L Osborn. Em 1951, um milionário pentecostal arminiano, Demos Shakaria, organizou a Fraternidade Internacional de Homens de Negócios do Evangelho Completo (FIHNEC). Oral Roberts foi várias vezes convidado a fazer conferências nessa Fraternidade.

Entre as décadas de 1950 e 1960, na tentativa de pentecostalizar as Igrejas históricas, de torna-las mais carismáticas, houve conflitos e divisões entre os líderes para se formar novas Igrejas carismáticas independentes. Na mesma época, surgiram vários televangelistas como Jimmy Swaggart, Jim Bakker. O movimento carismático católico começou em 1967 com os leigos da faculdade de Teologia de Duquesne University de Pittsburgh, depois na University of Notre Dame, South Bend in Indiana e Michigan State University. Em pouco tempo, o movimento se expandiu no país e no mundo. Apesar da resistência das Igrejas Protestantes (Presbiteriana, Luterana, Anglicana, Episcopais, etc), o movimento carismático atingiu todas elas. No livro Disciple (1975), Juan Carlos Ortiz usa pela primeira vez o termo “neopentecostal” para designar os movimentos pentecostais e carismáticos nascidos nas décadas anteriores. O movimento carismático não apareceu pela primeira vez somente nos EUA, mas também na Europa, especialmente na França na década de 1930; na Inglaterra com os movimentos de restauração e de renovação.

Além do movimento de santidade e carismático, o neopentecostalismo ganha uma nova vertente, que é da teologia da prosperidade. Vertente começou com o nome Palavra da Fé, Mensagem da Fé e Confissão positiva264. Esse movimento se propunha a promover saúde e riqueza para seus membros. Seu precursor foi o pastor batista Kenyaon, que pregava a confissão positiva da Palavra de Deus e a lei da fé, que

264 Allan ANDERSON, Op. Cit., p. 188. 102

funcionam graças aos novos princípios predeterminados pelo crente. Dessa corrente que surgiram os movimentos de santidade de William Branham, Oral Roberts e a FIHNEC.

Inicialmente, os principais teólogos da prosperidade eram Kenneth Hagin de Oklohama, Kenneth Copeland do Texas e o afroamericano Frederic Price de Los Angeles.

Kenneth Hagin era pastor de Assembleias de Deus entre 1939 e 1949, mudou-se para Tulsa em 1966 e fundou o Rhema Bible Training Center em 1974, onde se dedicou a ensinar o evangelho da fé que oferecia saúde, riqueza e êxito. Vendeu mais de três milhões de livros e cerca de 16.500 alunos concluíram o curso de graduação em teologia em sua universidade265. Para a evangelização, Hagin usava também o rádio e a televisão. Em outras partes do mundo, muitos pregadores pentecostais e carismáticos propagaram formas modificadas dessa teologia adaptando-a ao seu contexto social. Entre os representantes mundiais, os mais destacados são: “o coreano , os nigerianos Benson Idahosi e David Oyedepo, os ganeses Nicholas Duncan-Williams e Mensa Oabil, o sueco Ulf Ekman, o brasileiro Edir Macedo, o argentino Héctor Gimenez e o sul- africano Ray McCauley” 266.

“Em muitas partes da África, as Igrejas pentecostais e carismáticas pertencem ao setor do Cristianismo que está crescendo com grande velocidade, atraindo especialmente os jovens urbanos e formados” 267. Essas Igrejas são criticadas por outras Igrejas que as acusam de propagar um Evangelho de prosperidade que parece reproduzir as piores formas do capitalismo estadunidense disfarçado no Cristianismo. O neopentecostalismo africano não é simplesmente uma transposição do pentecostalismo estadunidense, mas uma reconstrução seletiva adaptada ao contexto radicalmente diferente dos EUA.

De acorso com Allam Anderson, Nigéria e Gana constituem os polos de explosão neopentecostal na África ocidental. Essa nova forma de pentecostalismo se expandiu muito rapidamente em todas as cidades da África subsaariana, começando principalmente nas capitais. Está se tornando a principal expressão do Cristianismo.

265 Ibid., p. 189. 266 Ibid., p. 189. 267 Ibid., p. 190. 103

“Seus cultos são emocionais, entusiastas, barulhentos, sobretudo a maioria usa instrumentos musicais eletrônicos” 268. “Os novos pentecostais estão crescendo em número entre pessoas instruídas e jovens trabalhadores, que continuam oferecendo apoio financeiro e sentem que é aí que podem satisfazer suas necessidades” 269.

Usam as seguintes estratégias para conseguir novos adeptos: evangelização porta a porta, reuniões em salões, pregação no transporte público, (trem, ônibus, até taxi), estão nas esquinas de ruas, nas praças públicas, e fazem cruzadas de evangelização em estádios reunindo multidões. O acesso aos meios de comunicação (rádio, TV, e internet) os populariza e populariza também seus pregadores, sobretudo estrangeiros, que visitam regularmente o continente africano. Elas também abraçam a vida política, apoiando políticos ou participando diretamente na política partidária.

“O crescimento dessas Igrejas foi drástico na Nigéria e Gana onde o Cristianismo impregnou todas as facetas da sociedade, fazendo-se evidente para qualquer pessoa que visita esses países” 270. Segundo o autor, pode-se observar escrito em cartazes na entrada de pequenas lojas, negócios e empresas em cidades da África ocidental, os seguintes dizeres: “Em nome de Jesus”, computadores “a Deus seja a Glória”, salão de beleza “Mãos de Deus”, comida rápida “El Shaddai” e armazém de congelados “Meu Deus pode”. Muitos carros, motos e ônibus têm slogans cristãos.

Na África central, Kinshasa (RDC) é exemplo da explosão neopentecostal. É fácil perceber a presença dessas Igrejas nas ruas, dividindo espaços com bares, lojas e residências e com outras Igrejas. Elas se caracterizam pelo barulho (da música, dança, pregação e outras manifestações do Espírito Santo). Algumas dessas Igrejas possuem templos menores, salões ou fazem culto ao ar livre, em antigas casas de cinemas, e outras têm templos maiores, catedrais. Veremos mais detalhadamente que ser crente em Kinshasa é motivo de orgulho, de caráter e constitui a identidade de muitos kinois (morador de Kinshasa). A Igreja que representa a corrente neopentecostal na África do Sul é “Rhema Bible Church implantada em 1979 dezanove anos depois de sua fundação

268 Ibid., p. 191. 269 Ibid., p. 191. 270 Ibid., p. 192. 104

elo célebre Kenneth Hagin. As outras como Grace Bible Church, a Zoe Bible Church e a Faithways Community Church surgem entre 1984 a 1985” 271.

2.2. Contexto histórico-social da década de 1990

Para vários autores, o neopentecostalismo chega à África entre 1980 e 1990. Mas somente em 1990, com a abertura política é que começou a ter visibilidade social e a se expandir. Várias Igrejas neopentecostais estrangeiras (brasileiras e sul coreanas) se implantam naquele momento. A IURD chega à Angola em 1991. A maior parte dos países no sul do Saara conquistou a sua independência na década de 1960. Logo depois, passou por regime ditatorial, golpe de estado, guerras civis e grandes turbulências. Esse cenário africano lembrava e refletia o cenário mundial marcado pela Guerra Fria, entre o bloco Soviético e os EUA. Se a África subsaariana venceu o colonialismo político, de 1960 para cá, lhe resta vencer o colonialismo econômico. Aproximadamente de 1960 a 1990 a África subsaariana estava dividida em três tendências políticas: o capitalismo, o comunismo e o regime do Apartheid na África do Sul. A primeira tendência era a dos países de inclinação capitalista, apoiados pelo Ocidente (EUA e Europa), eles usavam a ditadura militar como estratégia para conter o avanço soviético e o comunismo em países como RDC, Nigéria, Costa do Marfim, Gabão, Camarões, RCA, Chade, Senegal, Togo, Niger, Quênia, etc. “Outro meio para lutar contra a influência soviética era as intervenções diretas militares do Ocidente para derrubar governos africanos esquerdizantes e proteger seus aliados” 272. É por isso que presidentes como Joseph Mobutu (1965-1997), Gnassingbé Eyadema (1967-2005), Omar Bongo Ondimba (1967- 2009), Félix Houphouët Boegny (1960-1993), Léopold Sédar Senghor (1960-1980) e outros governaram durante décadas sob proteção do Ocidente. A segunda tendência era composta pelo grupo sob influência comunista e socialista (Rússia, Cuba e China). Fazem parte desse grupo Gana, Guiné, Congo Brazaville e a partir de 1970, Etiópia, Angola e Moçambique273. A última tendência era o Apartheid e o racismo institucionalizado na África do Sul e Namíbia. Uma minoria branca colonizou a África do sul, inclusa a Namíbia durante todo século XX.

271 André CORTEN, Igreja Universal na África do Sul, p.142. 272 CHINWEIZU. A África e os países capitalistas, (HGA Vol.8) p. 934-935. Do mesmo volume veja também Iba Der THIAM e James MULIRA, A África e os países socialistas, p. 965-1001. 273 Ibid, p. 934. 105

O ano de 1990 foi marcado pelo fim da ditadura, que permitiu a abertura política, abrindo o espaço para o multipartidarismo, as Conferências Nacionais, a liberdade de expressão e a liberdade religiosa. O que levou ao fim das ditaduras na África e na América latina foi na verdade o cenário da política internacional caracterizado pela Queda do Muro de Berlim em 1989 marcando o fim da Guerra Fria. Esses acontecimentos causaram mudanças profundas na política e economia internacional.

Em 1990, boa parte dos países da África subsaariana inicia o processo de democratização. A África do Sul se encontrava nas negociações para o fim do Apartheid. As negociações do regime sul-africano com o ANC culminaram na eleição do primeiro presidente negro do país, Nelson Mandela, em 1994. Esse período foi marcado por várias crises políticas, econômicas e sociais. Os países africanos se vêem obrigados a aceitar as políticas de ajuste estrutural (FMI e do Banco Mundial) e boa gestão do governo. Esses sistemas resultaram em inflação, degradação econômica, desemprego, escassez de produtos de consumo, medo, fome e miséria. Laurent Fourchard fala da “modernidade insegura” 274. Ruth Marshall-Fratani e Didier Peclard afirmam que,

O desenvolvimento do religioso não basta evocar a intensificação da crise sócio-econômica e os efeitos nefastos da globalização e o aborrecimento das políticas internas dos Estados africanos ou os efeitos das políticas estrangeiras das grandes potencias. A relação entre o material e o espiritual é mais complexa275.

Os mesmos autores afirmam de novo que essa situação de crise276, isto é, a pobreza, exclusão social, globalização, destruição das formas de sociabilidade, falência dos modelos do desenvolvimento e modernização explica crescimento dos movimentos religiosos. Para sair da ditadura e começar a democratização da África, muitos países africanos implantaram fóruns de discussão e reflexão, reconciliação e de busca para fundamentos de Estado de direito. Nesse momento começaram as famosas Conferências Nacionais. Depois das Conferências, iniciar a transição política a fim de chegar às eleições democráticas. O que não foi realizado em muitos países. O não cumprimento

274 Laurent FOURCHARD, Introduction de la Troisième partie: Le Nigeria: une nation missionnaire?, p.334. Trad. Por Adrien Gyato B. 275 Ruth MARSHALL-FRATANI et Didier PECLARD, La religion du sujet en Afrique, p. 5. 276 Ibid, p.6. 106

das promessas feitas nas Conferências Nacionais causou frustração e decepção em muitos africanos.

Esse momento está também marcado por desemprego, inflação, violência, mudança nos fundamentos morais. Várias guerras civis aconteceram em Angola, Sudão, Uganda, Ruanda, Burundi, etc. Só em Ruanda, depois da guerra civil, houve genocídio de quase um milhão de pessoas em 1994. A guerra na RDC começa em 1996, continuará durante vários anos. Na África do oeste, nota-se um movimento de avivamento no Islão e no Cristianismo desde a década de 70. No mundo islâmico, esse avivamento se percebe a partir de um “apoio as “petromonarquias” árabes aos países africanos, o impacto da revolução iraniana e a afirmação no cenário internacional do projeto islamista” 277. Depois de falar brevemente do surgimento do neopentecostalismo e do contexto histório-social de sua implantação na África subsaariana, agora será abordada a sua presença em alguns países como Nigéria, Gana, Benim, RDC, Gabão, Camarões, Gabão, Congo-Brazzaville e Costa do Marfim.

2.3. Neopentecostalismo na África ocidental

2.3.1. Neopentecostalismo na Nigéria

Nigéria é o país mais populoso do continente africano, com uma estimativa de 178.507.539 habitantes. Esse país é conhecido pela violência político-religiosa que opõe fundamentalistas muçulmanos e cristãos. Essa violência já causou a morte de milhares de pessoas e destruiu vilas e cidades em todo país, especialmente na parte norte. A violência é fruto da desigualdade social e da má distribuição de riqueza no país. Existe um desequilíbrio no desenvolvimento econômico, o norte de maioria muçulmana é pobre e sem estrutura, e o sul de maioria cristã é rico e com melhor estrutura (educação, saúde, economia, empregos, transporte, etc). A Nigéria tem mais de 250 etnias, mas as três maiores são haoussas-Fulanis (Norte), Yoruba (Sul-Oest) e Ibos (Sul-Est).

A década de1970 também foi marcada pelo fim das ilusões desenvolvimentistas, com a massificação da pobreza e da miséria. O milagre econômico e a ilusão do desenvolvimento autocentrado se afastaram definitivamente com a redução da renda petroleira a partir de 1983. Ente 1970 e 1980, a Nigéria conheceu o surgimento de

277 Laurent FOURCHARD, Op. cit., p.334. 107

novos movimentos pentecostais e carismáticos nas grandes cidades, em meio a crise econômica crônica e sua expansão entre 1980 e1990. Os novos movimentos surgiram em meio de jovens estudantes que tinham uma grande ansiedade por renovação e reforma interior e pública (o fim da corrupção e a redemocratização da sociedade).

A Nigéria é considerada uma das maiores economias africanas, grande centro de produção científica, com suas universidades que recebem um número maior de estudantes no nível regional, isto é, na África ocidental. Nota-se nesse país a existência de um Islã reformador e de um Cristianismo autóctone desde o século XIX e a vitalidade do despertar religioso no século XX278. É da natureza de instituições religiosas o desejo por uma reforma interior. Quando esse desejo, que se transforma em uma exigência não é cumprido acontecem dissidências e a criação de novos grupos. Esse fato é perceptível no Cristianismo tanto no Catolicismo, com a multiplicidade de congregações e institutos religiosos, quanto no Protestantismo, com o surgimento do pentecostalismo e neopentecostalismo, e uma variedade de formas de pentecostalismo e neopentecostalismo.

O movimento neopentecostal tem o seu início no meio estudantil, com a Renovação Carismática nas cidades do sul, notadamente com a criação da Igreja Deeper Live em 1973, pelo universitário William Kumuyi. Existem várias escolas bíblicas de diferentes denominações cristãs no país. A escola bíblica do reverendo pastor Benson Idahosa formou vários pastores ganeses, responsáveis pelo despertar neopentecostal naquele país em 1980.

Segundo Laurent Fourchard, três características que marcaram o cenário religioso nigeriano na década de 1980: a primeira é a transnacionalização acentuada dos movimentos religiosos, a segunda, uma polarização de grupos religiosos marcada por enfrentamentos confessionais, a terceira é uma interpenetração muito forte das agendas políticas e religiosas279. As Igrejas neopentecostais de Lagos organizavam congressos mundiais que reuniam líderes religiosos nigerianos e africanos de diferentes denominações, demostrando seu carisma transnacional e uma organização burocrática internacional. O movimento de politização dos movimentos religiosos provocou a volta da polarização política entre 1980-1990, e favoreceu o desencadeamento da violência

278 Ibid., p.333. 279 Ibid., p.337. 108

interconfessional, principalmente entre diferentes correntes no interior do Islã, e entre muçulmanos e cristãos. Há uma imbricação crescente entre as agendas políticas e religiosas280. Essa imbricação é visível na administração dos Estados de maioria cristã tanto nos de maioria muçulmana. O resultado dessa imbricação foi a introdução da Charia em doze Estados do Norte281. A adoção da Lei Islâmica como constituição civil é resultado da assimilação recíproca dos valores das elites políticas e religiosas do Norte e da reinvindicação popular cumprida. Essa reinvindicação começou desde a independência.

O que caracteriza os pastores neopentecostais nigerianos é a riqueza e o luxo. No neopentecostalismo, a riqueza, saúde e prosperidade são símbolos de bênção divina. Essa riqueza vem de ofertas e dízimos dos fiéis, da ligação que esses líderes têm com os políticos corruptos do país e com a rede transnacional do neopentecostalismo. Esse enriquecimento coloca em dúvida a idoneidade do trabalho evangelístico desses líderes. Segundo a tradição africana, uma pessoa que era pobre e de repente se torna rica, tem sua riqueza da bruxaria. Vendeu os parentes na magia para se enriquecer. A mesma interpretação é feita no caso de religiosos. Há ambivalência na riqueza dos pastores neopentecostais, sua riqueza vem da Igreja ou do envolvimento com a magia e a bruxaria? Há uma explosão pentecostal especialmente no sul da Nigéria. Na pesquisa de campo que Ruth Marshall-Fratani fez, só em Lagos, no bairro de Ibadan tinha 164 igrejas, dentre elas 126 eram pentecostais 282.

Nas Igrejas carismáticas na década de 1970, havia uma interdependência entre o material e o espiritual. O poder material (dinheiro e riqueza) é apresentado como algo que tem origem sobrenatural (isto é, divina ou diabólica). Os jovens convertidos se apropriaram dessa visão maniqueísta e dos discursos sobre o poder absoluto de Cristo e a intervenção do Diabo na vida cotidiana283. Como consequência dessa espiritualidade, esses jovens começaram a diabolizar a tradição local. Para o crente da Renovação Carismática, é preciso esquecer o passado, os costumes, para nascer de novo. “O rápido sucesso material e de maneira espetacular, o consumo de produtos de luxo e a busca do poder político estavam ligados a esse imaginário da união com as forças do mal, a

280Ibid., p. 339. 281 Ibid, p. 339. 282 Ruth MARSHALL-FRATANI. Prosperitá miraculeuse. Les pasteurs pentecôtistes et l’argent de Die uau Nigeria, p.25. Trad. por Adrien Gyato B. 283Ibid, p. 30. 109

pertença às organizações ocultas e a utilização do poder dos bruxos” 284. O envolvimento nas atividades religiosas fez com que esses jovens não se preocupassem com a realidade social e política do próprio país. Consideravam a política como uma simples demagogia e uma quadrilha de ladrões.

Surgiu uma nova onda do pentecostalismo na metade de 1980, caracterizada pela doutrina da teologia da prosperidade e o uso aparelhos eletrônicos (baterias, guitarras, pianos e outros instrumentos musicais, rádio e televisão). Os novos líderes que encabeçavam essa onda tinham como estratégia buscar laços com líderes pentecostais transnacionais. Muitos viajavam para os EUA e ficavam meses e até anos em busca de apoio financeiro e de formação. Quando retornavam, inovavam na aparência (higiene e jeito de se vestir), na pontualidade, na ordem, no manuseio e manutenção dos equipamentos eletrônicos. Segundo Ruth Marshall-Fratani a principal característica dessas Igrejas é o “acúmulo de riqueza da parte de seus líderes. Mas essa riqueza não vem somente da rede transnacional, mas 80% vêm de ofertas e dízimo de fiéis” 285.

Nessas Igrejas, os pastores ensinam que “além da obra de Deus, é preciso que o fiel saiba poupar, fazer um planejamento, ter um orçamento e investir com inteligência” 286. Também segundo os pastores,

o sucesso financeiro não é consequência dos valores de uma economia de retribuição baseada em parentesco. A bênção financeira é pessoal, mesmo se sua aquisição depende da rejeição dos comportamentos antissociais como mentira, roubo, mendicância, adultério, ciúme, inveja; ninguém está forçado a dividir sua riqueza com a família extensa, sobretudo quando esses não são convertidos. O dinheiro deve ser gasto na obra de Deus e para ganhar a batalha mundial contra Satanás287. Aqui está o espírito de um crente neopentecostal: aproveitar ao máximo as benesses desse mundo. Quanto mais próspera é a pessoa, mais abençoada está. O fiel não foge mais do mundo, mas o abraça. Tem a missão de converter os infiéis e lutar contra o Diabo e sua legião. O fato de se converter, não poupa o fiel da tentação e dos ataques do Diabo. Deve ser vigilante a qualquer sinal de sua presença. Como Deus, o

284 Ruth MARSHALL-FRATANI, Op. Cit., p. 31. 285 Ibid, p. 34. 286 Ibid, p.34. 287 Ibid, p. 34. 110

Diabo é onipresente na vida do crente. Deve ser prudente e vigilante (tayari) 288 a cada instante. Alguns pastores ensinam técnicas para descobrir um espírito demoníaco, publicam livros e jornais voltados ao assunto. Ensinam tipos de oração, posição corporal, gestos, gritos que a pessoa deve ter e fazer durante o exorcismo. Um dos líderes dessas Igrejas publicou um livro com cerca de 50.000 nomes de espíritos demoníacos capazes de atrapalhar a vida dos homens. Nota-se também que durante os cultos dessas Igrejas, o assunto “dinheiro” é onipresente.

“É o dinheiro que leva as pessoas a ter ciúmes, a se destruir, a se envolver com o fetichismo e bruxaria. O dinheiro é de certa maneira o primeiro feitiço, um feitiço que nem sempre conduz à felicidade” 289. O problema não é o dinheiro em si, mas a maneira como os seres humanos usam. A posse de bens materiais e o seu uso egocêntrico podem constituir um perigo par a pessoa dentro da sociedade africana. Nessa sociedade, quando um membro de família possui bens materiais, deve partilhar com os demais. A recusa de partilha de bens cria ciúme e inveja, o que leva a bruxaria. Essa começa pelo fato de desejar degraça à pessoa, não querer o seu bem, o seu êxito. O que pode levar a fazer feitiço para que o outro adoeça e morra. O individualismo e o egocentrismo são vícios na sociedade africana. A solidariedade, isto é, a partilha de bens matérias (comida, roupa, dinheiro), a participação em um funerário e em uma festa, é um valor fundamental.

Segundo Joseph Tonda, o sucesso das Igrejas neopentecostais resulta de sua capacidade em unir o “gênio bruxo” e o Deus cristão como componentes e símbolos de um sistema chamado modernidade. Não estão em uma relação de exterioridade, nem de oposição absoluta290. “O capital do bruxo e o gênio do branco, indiferentemente do gênio cristão, do dinheiro, da ciência, da tecnologia, do Estado colonial e neocolonial fazem parte de uma só e única força na África de hoje” 291. “A relação entre a obra de Deus, o sucesso, a riqueza e os poderes de bruxos têm uma forma única porque é fruto de uma história particular na Nigéria como em outros lugares” 292. Uma das características do neopentecostalismo nigeriano é a figura carismática do líder. Não

288 Em swahili, expressão muito usada na RDC. Ser vigilante, pronto e preparado. 289 Ruth MARSHALL-FRATANI, Op. Cit, p. 39. 290 Ibid, p.44. 291 Ibid, p. 44. 292 Ibid., p.44. 111

basta a pessoa ter uma idade avançada, mas tem que ter o carisma e um bom desempenho.

Que relação existe entre o Cristianismo, a modernidade e a cultura africana? O sucesso de uma religião na África está na relação que estabelece entre esses três elementos A bruxaria é um aspecto da cultura africana, condenar, querer extinguir, incorporá-la nas práticas religiosas, ou fingir que ela não existe, são diversas atitudes que líderes religiosos podem tomar no campo religioso africano. A maior parte dos pastores neopentecostais condena a bruxaria incorporando-a em suas práticas religiosas.

As principais Igrejas neopentecostais nigerianas são Deeper Life Bible Church, Church of God Mission Internacional Incorporated, Living Faith e International Central Gospel Church, The Redeemed Evangelical Mission, Redeemed Christian Church of God, Moutain of Fire and Miracles, Christ Embassy, etc. Entre os dez maiores templos pentecostais do mundo, dois estão na Nigéria293. O templo do Pastor William Kumuyi, da Deeper Christian Life Ministry, é o segundo maior templo pentecostal do mundo, com capacidade para 75.000 pessoas; o templo do pastor David Olaniyi Oyodepo, Living Faith, conhecido como Tabernáculo da Fé, é o sexto maior do mundo, com capacidade para 50.000 pessoas. Segundo a Revista Forbes, em 2011, o pastor David Olaniyi Oyodepo era considerado o líder religioso mais rico do mundo, como uma fortuna estimada a 150 milhões de $.

A Deeper Life Bible Church é uma das maiores Igrejas da Nigéria, fundada por William Folorunso Kumuyi e está presente em todos os países da África ocidental. William Folorunso Kumuyi foi professor na Universidade de Lagos. A Deeper começou em 1973 como um grupo de estudo bíblico semanal. Em 1982, realizou-se os primeiros cultos, reunindo multidão de pessoas. A International Central Gospel Church foi fundada por Mensa Otabil em 1984. “Durante a década de 1980, começou a surgir várias Igrejas independentes que cresciam rapidamente no Quênia e Uganda, onde as Igrejas mais antigas consideravam-nas como uma ameaça, já que perdiam vários membros” 294.

293 http://top10mais.org/top-10-maiores-igrejas-do-mundo/, acesso 02/01/2014. 294 Allan ANDERSON, Op. Cit., p. 192. 112

Um de exemplo pastor- patrão 295 é Benson Andrew Idahosa, líder da Church of God Mission Internacional Incorporated. Idahosa era muito respeitado e era o pastor mais rico do país. No episódio de sua morte em 1998, a notícia correu em todo país, chegando até o norte, de maioria muçulmana. Seu velório foi um grande show, um espetáculo que ostentava luxo, “o caixão veio dos Estados Unidos da América, o mármore para construir o túmulo veio da Itália e as cerâmicas da Arábia” 296. Mais de 30.000 pessoas lotaram o estádio e milhares ficaram para fora. Além da Igreja, Idahosa possuía outros empreendimentos como um estádio, hospitais, uma universidade privada, escolas, um banco, residências para convidados, um supermercado, mansões de luxo em Lagos e Abuja, Londres e EUA e carros de luxo. Após a sua morte, sua esposa Margaret o substituiu como líder da Igreja e responsável pelas empresas. Essa Igreja tem um centro de milagre em Benin City e em vários outros países. A Igreja começou em 1989, em pouco tempo se expandiu em toda África, sobretudo no Quênia.

A Igreja The Redeemed Evangelical Mission (TREM) também está entre as maiores Igrejas neopentecostais nigerianas. Segundo Joël Noret, a TREM foi fundada em Lagos entre 1981 e 1982 pelo Bispo Mike Onkokwo. Este frequentou a Igreja Anglicana, onde pregava no radio e na TV. A TREM teve o seu momento de expansão na década de 1990, implantou-se em Gana, Gabão, Inglaterra, Benim, Etiópia, Israel, EUA, Filipinas e outros. Em 2002 tinha 146 templos sendo 129 na Nigéria e o restante de distribuídos em outros países297.

Mountain of Fire and Miracles (MFM) foi fundada pelo Doutor Daniel Olokoya em 1994298. A Igreja começou quando Olokoya convidou alguns colegas de faculdade para ir à sua casa meditar e orar, isto em 1984. O grupo de oração foi se transformando em Igreja. O pai de Olokoya era pastor da Christ Apostolic Church (CAC) sem ter uma formação académica. Olokoya deixou CAC, onde o seu pai era também pastor e fundou MFM em 1994. Os líderes religiosos que tiveram influência sobre ele foram: “Babalola, fundador de CAC, William Kumuyi, fundador de Deeper Life Bible Church; de Enoch Adeboye, fundador da Redeemed Christian Church of God e de Smith Wigglesworth,

295 Conceito comum em Kinshasa para designar pastores riquíssimos. 296 Ruth MARSHALL-FRATANI, Op. Cit, p. 26. 297 NORET, Joël. Logiques transnationales et développements missionnaires dans les pentecôtismes nigerians béninois et togolais, p.423. Trad. por Adrien Gyato B. 298 MOYET, Xavier. Le néopentecostalisme nigérian au Ghana. Les Églises Moutain of Fire and Miracles et Christ Embassy à Accra, p. 468. Trad. por Adrien Gyato B. 113

pai espiritual de Kenneth Hagin” 299. Com o crescimento da Igreja na década de 1990, deixou a docência para se dedicar pleinamente à pastoral. O Doutor Daniel Olokoya influenciou os mais populosos líderes neopentecostais ganeses como o Reverendo Steve Mensah, fundador de Charismatic Evangelical Ministries (CEM) e Eastwood Anaba, fundador da Foutain Gate Chapel (FGC).

A Christ Embassy foi fundada por Christ Oyakilome. Este estudou arquitetura na Universidade do Estado de Edo. Seu avô era pastor e ajudou a implantar a Igreja Assembleia de Deus no leste da Nigéria. Oyakilome foi pastor da Church of God Mission de Benson Idahosa, foi influenciado por pregadores estadunidenses como Kenneth Hagin, Capeland, Hinn e Meyer300. Em 2003, possuía um milhão de fiéis, além de uma emissora de rádio e TV.

Segundo Xavier Moyet, quando se fala do neopentecostalismo ganês ou da África ocidental, paira a sombra do Pastor nigeriano Benson Idahosa. Muitos líderes neopentecostais da região frequentaram a sua Igreja e receberam a formação religiosa no seu Benin City. Teve uma influência real sobre os líderes ganeses como

Nicholas Duncan William da Christian Action Faith Ministries (CAFM), Dag Heward-Mills da Lighthouse Chapel International (LCI), Charles Agyn Asare da Word Miracle Bible Church (WMBC), Matthew Addae-Mensah líder da Gospel Light International Church (GLIC) e Christine Doh Tetteh da Solid Rock Ministries301.

2.3.2. Neopentecostalismo na Costa do Marfim

O ano de 1990 marca o surgimento de uma nova geração de líderes religiosos, em sua maioria, jovens. Essa nova geração se autodeclara pastor, bispo, doutor, apóstolo, profeta, evangelista, etc. Esses provêm de gênero e classe social diferentes: homens e mulheres, estudantes, artistas, cantores, desempregados, bandidos, criminosos, jogadores de futebol, etc, imitam os televangelistas estadunidenses. Essa nova fase do pentecostalismo se apresenta como uma “oportunidade de inserção social”

299Ibid., p.469. 300 Ibid., p.469. 301 Ibid., p.478. 114

302. Os pastores são carismáticos e têm um espírito de empreendedorismo, estão ligados às redes do pentecostalismo internacional e mundial. O movimento da globalização favorece sua expansão.

Em 2008, Bony Guiblehon, a partir dos dados do Ministério do Interior, apresentou o censo do país e mostrou o cenário religioso nacional, “Islã 39,6%, Cristianismo 32,9%, RTA 11,9%, outras religiões 16,7%, com uma população de mais de 21 milhões” 303. Naquele tempo, a Costa do Marfim tinha 450 denominações religiosas diferentes reunidas em 25 confederações e associações religiosas. As Igrejas pentecostais mais importantes são União das Igrejas Evangélicas Serviços e Obras de Costa do Marfim, Aliança Missionária Cristã de Costa do Marfim, Igrejas Evangélicas Assembleias de Deus de Costa do Marfim, Igreja do Despertar de Costa do Marfim e Igreja Protestante Batista Obras e Missão Internacional.

Um dos mais famosos líderes marfinenses dessa geração é o falecido pastor Kacou Séverin (1960-2001). Antes de sua conversão foi estudante de direito na Universidade de Abidjan, afirmou ter recebido uma cura milagrosa e ser liberto de demônios, aos 24 anos abandonou os estudos e se afiliou a Foursquare Missions Internacional (FMI) onde foi ordenado pastor. Kacou Séverin foi presidente da FMI da Costa do Marfim durante 6 anos (1995-2001). Depois se autoproclamou “Profeta de todas as nações” e fundou o “Ministério do poder do Evangelho”, que na verdade funcionava como uma Igreja a parte da Quadrangular. O Ministério do poder do Evangelho se expandiu por vários países da região chegando até Europa e EUA. Sua sede mundial se encontra em Paris. Por ocasião de sua morte, onde Kacou Séverin foi vítima de acidente de carro no dia 13 de abril de 2001, sua mulher o sucedeu no Ministério.

A Igreja Protestante Batista Obras e Missões (IPBOM) foi fundada pelo doutor Dion Robert. Esse possui várias empresas comerciais: editoras, gravadoras (de cassete, CDs, DVDs), lojas de roupas femininas, etc. A Igreja Internacional do Espírito Santo foi fundada pelo Profeta Jean-Marie Domoraud. O ídolo nacional Waby Spider, ex- boxeador, se tornou pastor com o nome de Adebayo Wayebi e fundou a Igreja Winners

302 Bony GUIBLEHON, Les jeunes et le marché de la spiritualité pentecôtiste en Côte d’Ivoire, p. 117. Trad. por Adrien Gyato B. 303 Ibid., p. 117. Veja Tabela 5, p.224-225. Segundo The ARDA, 34,31% de marfinenses são criatãos, 40,58% são muçulmanos, 24,51% são praticantes das Religiões Tradicionais, 0,15% são da religão Bahai, 0,36% são agnósticos e 0,09% outras religiões. 115

Chapel Internacional (Akouédo, Abidjan). Gnazalé Didier, ex-jogador de futebol do time African Sport fundou o Ministério pela Libertação e Redenção das Almas. Kodjo Rosemonde profetisa se autoproclamou “” em 2008 e dirige a Igreja Internacional Fonte. Outra mulher com o nome de P. Kouhi, divorciada, se tornou também profetisa e dirige o Ministério Internacional Consolação. Guy Vincent Kodjo, ex-cantor de Rap na década de 80, fundou a Missão Evangélica Graças de Vida. Ele construiu um grande templo no bairro de Abobo Plateau Dokoou e nomeou o templo de “Igreja dos líderes”.

Esses pastores pertencem ao movimento transnacional que transcende as barreiras étnicas, regionais e nacionais. Os intermediários da internacionalização dessas Igrejas são os migrantes e imigrantes africanos (estudantes, comerciantes, exilados políticos) que difundem a mensagem da Igreja em outros países africanos e no mundo. Se o modelo da economia capitalista neoliberal enfraquece as economias nacionais, esse novo modelo de religião rompe por sua vez com as fronteiras étnicas, culturais e religiosas, “essa transnacionalização participa também de uma reconfiguração contemporânea ou de uma globalização religiosa que se recusa a fechar em determinadas regiões geográficas ou étnicas, que, consequentemente responde a uma demanda social de espiritualidade que não tem fronteiras” 304.

Essas Igrejas funcionam como mercado. Tem a lógica da demanda e oferta. A demanda social dos fiéis são os problemas que trazem na Igreja e a oferta é o que a os pastores oferecem: a palavra de Deus, milagres, cura e discurso de prosperidade, orientações, conselhos. Segundo Bony Guiblehon, as demandas dos marfineses são, “doenças (95%), pobreza (93%), conflitos conjugais e desejo de casamento (98%), bruxaria (85%), trabalho e desemprego (86%), não êxito nas viagens e negócios (80%), esterilidade e impotência sexual, maldição, feitiço, decrescimento espiritual” 305.

Para o pastor neopentecostal marfinense, todos os problemas dos fiéis (doenças, desempregos, divórcio) são considerados “bloqueios”, impedimento para a bênção divina. As doenças como HIV/AIDS e câncer são obras do Diabo, têm origem espiritual e não física. Se a origem da doença é espiritual, a cura também deve ser. Todos os problemas dos fiéis estão no nível espiritual, da fé. A fé tem uma função psicológica.

304 Ibid., p. 123. 305 Ibid., p. 124. 116

“de pensar positivamente, e pensar positivamente é acreditar em si mesmo. A cura depende da atitude mental e da capacidade de pensar positivamente” 306. Segundo a teologia da prosperidade, as riquezas espirituais e materiais vêm de Deus. São direitos dos crentes, considerados filhos de Deus. Portanto os crentes devem exigir de Deus e não pedir.

Os objetos sagrados como água, sal, óleo e lençol com o suor do pastor (...), são fonte de milagres. Esses líderes têm uma maior visibilidade na mídia (rádio, televisão, internet). Saindo para a cidade de Abidjan ou outra, pode-se encontrar cartazes em todos os cantos da cidade anunciando cruzadas de evangelização e sessões de milagre. Apesar do princípio da laicidade do Estado, esses líderes passam frequentemente na mídia pública para fazer o proselitismo religioso.

A Igreja é um meio de passar da invisibilidade a visibilidade social. Segundo G. Le Blanc, a “invisibilidade social é um processo, cuja última consequência é a impossibilidade de participar na vida pública. Tem então três consequências: o fato de ser marginal, de ser “um nada” (pessoa sem dignidade) e de não ter nenhuma qualidade” 307. Quem sai da invisibilidade social? Primeiro, os pastores e depois os fiéis. São os pastores que incentivam os fiéis a sair dessa situação. Como isso acontece? Depois da conversão, a pessoa encontra emprego, torna fervoroso adepto dentro da instituição religiosa com tempo ela é promovida, mais tarde torna líder religioso e começa a incentivar os demais a imitá-lo. A partir do capital humano, “os pastores marfinenses se enriquecem. Criam construtoras, financiadoras, editoras, gravadoras, hotéis, feiras de compra e venda de carros seminovos” 308.

A visibilidade social significa também para esses líderes religiosos ter uma vida bem sucedida. Alguns têm grandes templos construídos na periferia urbana, carros luxuosos, mansões em bairros da elite, como Cocody, Angré e Riveira e vestem roupas de marca e relógios e joias de ouro ou diamante. Depois da pesquisa de campo que o autor realizou em Abidjan e outras cidades, constatou-se, os líderes religiosos são homens e mulheres bem-sucedidos e moram em bairros de ricos e os fiéis, em sua grande maioria são da periferia.

306 Ibid., p. 125. 307 Idid., p. 129. 308 Ibid., p. 130. 117

O advento dessa nova geração de líderes religiosos marfinenses é ao mesmo tempo ruptura e inovação. Ruptura na concepção antiga do Cristianismo sobre a pobreza, a vida cristã e a formação teológica de pastores, face à cultura tradicional africana. Para essas Igrejas, o cristão não deve ser pobre, humilde e coitado. Deve ser rico, com saúde e forte. Para ser pastor, o candidato não precisa de muito estudo, mas de uma formação pontual, um treinamento específico. E na maior parte dos casos, o candidato aprende com a realidade. Essas Igrejas rejeitam tudo que tem a ver com o passado, os valores africanos como a solidariedade, o respeito ao mais velho e o lugar da medicina tradicional. De outro lado inovam assumindo a proposta da sociedade neoliberal, caracterizada pelo consumo e liberdade. O crente deve lutar pessoalmente na vida pelo seu sucesso e felicidade. É chamado a ser próspero e feliz. Nossa preocupação é de saber qual é a autenticidade e a credibilidade dessa proposta, sua continuidade e sucesso em um continente onde a maior parte das pessoas é pobre e miserável?

2.4. Neopentecostalismo na África central

2.4.1. Neopentecostalismo na RD Congo 309

A história do neopentecostalismo congolês está ligada ás visitas de cruzadas de evangelização realizadas pelo evangelista missionário estadunidense Tommy Lee Osborn (1924-2013). Esse fez várias visitas em países africanos. Chegou à RDC (antigo Zaire) três vezes 1964, 1968 e 1980. Em 1980, Osborn chega a Kinshasa onde opera vários milagres na praça da ponte Kasa-Vubu e também na Feira Internacional de Kinshasa (FIKIN). Esse acontecimento foi o ponto de partida do surgimento posterior de vários grupos de oração e exorcismo; mais tarde cresceram em ministérios e se tornam Igrejas. Cruzadas realizadas por Osborn em Kinshasa contribuíram para o aparecimento do novo pentecostalismo. Muitos líderes neopentecostais congoleses receberam formação e treinamento religioso na Nigéria e nos EUA. A passagem desses líderes nesses países é motivo de orgulho. Por exemplo, nas entrevistas o arcebispo Kuthino Fernando e Maman Olangi se orgulham desse fato.

Como vários países da África subsaariana, a RDC passou por uma ditadura militar que durou 32 anos (1965-1997). Nesse período, não havia liberdade de expressão ou liberdade religiosa e o monopartidarismo e a repressão reinavam. Mas

309 É uma síntese da monografia apresentada para a conclusão da disciplina de Religião sociedade e cultura, junho de 2013. 118

com a abertura política e a liberalização religiosa de 1990, houve explosão pentecostal. Milhares de Igrejas pentecostais se implantaram e surgiram em Kinshasa. Além da crise política e econômica, a RDC é conhecida como um país africano vítima de repetitivas guerras ( guerra da libertação entre 1996 e 1997, guerra de agressão de 02 de agosto de 1998 e 2003, e várias outras guerras de 2004 até agora). Essas repetitivas guerras causaram a morte de mais 5 milhões de pessoas, com vários crimes de guerras e crimes contra humanidade. Esses guerras têm como motivo a exploração dos recursos naturais (ouro, diamante, etc.).

As Igrejas neopentecostais são chamadas de Igrejas do “despertar” 310 porque afirmam levar as pessoas a “acordar do sono”, da vida em pecado, do não conhecimento da Bíblia para uma vida verdadeiramente cristã. Elas criticam a Igreja católica e as Igrejas protestantes por ter escondido a verdade aos cristãos, portanto acreditam que só elas que falam a verdade, isto é, pregam a Palavra de Deus. Convidam às pessoas a deixar a bruxaria e o feiticismo, converter-se e a receber o batismo do Espírito Santo. Portanto essas Igrejas pretendem fazer a restauração, renovação do Cristianismo e a remoralização da sociedade.

Há aproximadamente dez mil Igrejas do Despertar (ID) em Kinshasa. Elas se distinguem em tamanhos e doutrinas. A cerca do tamanho, algumas têm templos maiores, líderes carismáticos e conseguem encher o estádio dos Mártires, e outras se reúnem em pequenos templos, salões; antigos armazéns, cinemas, restaurantes, antigas fábricas ou ao ar livre e fazem vizinhaça com bares, lojas, empresas e residências. Encher o estádio dos Mártires, o maior do país, é símbolo de sucesso, de credibilidade e visibilidade social. Esse estádio recebe eventos tanto profanos (show de famosos cantores kinois, jogos de futebol, manifestações políticas) quanto religiosos (cultos, cruzadas, show de cantores religiosos). Há rivalidade e concorrência para enchê-lo, entre os cantores profanos, entre os cantores religiosos e entre os líderes religiosos neopentecostais.

A pregação de Igrejas do despertar está articulada a negação da cultura local (tradicional), isto é, rejeição e condenação da solidariedade africana, da concepção de família extensa e do respeito aos mais velhos. Elas condenam as crianças e adolescentes em situação de rua, acusando-os de bruxaria. Se os jovens estão quase ausentes nas

310 Avivamento é sinônimo de “despertar”. Preferimos “despertar” para ser fiel à tradução francesa. 119

Igrejas cristãs tradicionais, eles se encontram nas Igrejas do despertar. São atraídas pela dinâmica da música, diversão, encontram mais liberdade e flexibilidade em questões morais. A busca pela cura de doenças físicas, a proteção contra a bruxaria, busca de um parceiro para casamento, a imigração para a Europa são os verdadeiros problemas que os levam a frequentar essas Igrejas.

O imaginário dos kinois está marcado pelas Igrejas do despertar. Pertencer a uma dessas Igrejas é símbolo de identidade, da verdadeira religiosidade e de orgulho. É comum ouvir uma pessoa perguntar: “osambelaka wapi?”, e outra responder, “nasambelaka na ngai”, “naza frère ou soeur en Christ” 311. Isso significa que a pessoa é diferente dos demais.

As principais Igrejas do Despertar de Kinshasa são: Igrejas Arche de Noé do pastor Denis Lessie, Manne Cachée da Apóstola Rose Lessie Mokwabily, Ministère de la Foi Audacieuse do Apóstolo Iniace Tambu Lukoki, Ministère de la Foi Abondante do Apóstolo Albert Kakienza Mwana Mbo, Ministère du Combat Spirituel de Maman Olangi, Armée de l’Éternel do Général Sony Kafuta Rockman, Armée de la Victoire do Arcebispo Kuthino Fernando, Ministère du Pouvoir Divin, Église du Dieu Vivant, Communauté de l’Église Spiritualiste du Congo (CESC), Église Mai Mobikisi, Église Évangelique Vase d’Honneur do pastor Mohamed Sanogo, Assemblée Chrétienne de Kinshasa (ACK) do Bispo Pascal Mukuna, Ministère Amém do Apóstolo Léopold Mutombo Kalombo e Ministère de la Restauration Universelle à partir de l’Afrique Noire do profeta Joseph Mukungubila312.

No ponto de vista doutrinal, elas se dividem em várias correntes teológicas: prosperidade, exorcismo e libertação. Todas as Igrejas neopentecostais congolesas têm em comum a teologia da prosperidade. Mas existem alguns líderes que dão mais ênfase à libertação e ao exorcismo. A corrente da prosperidade tem como propagadores, o arcebispo Kuthino Fernando, General Sony Kafuta Rockman, o apóstolo Mutombo Kalombo, apóstolo Mbiye, apóstolo Denis Lessie. As correntes do combate espiritual e

311 Osambelaka wapi (aonde que você reza?), nasambelaka na ngai (eu rezo, costumo rezar), naza frère ou soeur en Christ (sou irmão ou irmã de Cristo). 312 Igreja Arca de Noé, Mana Escondida, Ministério da Fé Audaciosa, Ministério da Fé Abundante, Ministério do Combate Espiritual, Exército do Eterno, Exército da Vitória, Ministério do Poder Divino, Igreja do Deus Vivo, Comunidade de Igreja Espiritualista do Congo, Igreja Água Salvadora, Missão Evangélica Vaso de Honra, Assembleia Crista de Kinshasa, Ministério Amem, Ministério da Restauração Universal a partir da África Negra (Trad. Por Adrien Gyato B.). 120

exorcismo têm como representantes: Maman Olangi, Ngalasi, Tambu Lukoki e Kalienza Mwana Mbo.

A história recente do neopentecostalismo congolês está marcada pela prisão de dois líderes Dénis Lessie e Fernando Kuthino. O apóstolo Dénis Lessie foi acusado de estelionato, peculato, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e falsidade ideológica. Foi julgado e condenado à prisão. Foi preso em abril de 2013 e solto somente no dia 16 de maio de 2014. Na ausência de Denis Lessie, a sua esposa o substituiu. Mais para frente analisaremos com mais detalhe o caso do Arcebispo Kuthino Fernando. Esse é um preso político, foi falsamente acusado de porte de armas de guerra e de tentar matar o seu rival o pastor Ngalasi. Além disso, a disputa pela liderança neopentecostal de Kinshasa com Sony Kafuta também foi um dos motivos que o levou à prisão. Kuthino é nacionalista, patriota, contrário à invasão estrangeira (ruandesa e ugandesa) e contrário a todos os crimes de guerras e crimes contra humanidade cometidos nessas guerras. Em suas pregações sempre criticou duramente o regime. Seu slogan era “sauvons le Congo” (salvemos o Congo).

O espaço midiático de Kinshasa está dominado pelas ID. Segundo o Instituto Panos, em 2004, das quinze emissoras de rádio que emitiam na capital, dez eram de confissões religiosas, dentre essas sete eram das ID. Dos vinte sete canais de TV que funcionavam, onze eram de confissões religiosas e nove desses onze pertenciam às ID. Um dos fenômenos ligado a essas Igrejas é a produção de música religiosa. Existem inúmeros músicos congoleses religiosos, produzindo CDs, DVDs todos os anos e fazendo show dentro e fora do país. Pode-se encontrar pastores ou pastoras televangelistas que são também músicos. Os mais importantes músicos religiosos são Frère Patrick, L’Or Mbongo, Marie Misamu, Franc Mulaja, Matou Samuel, Michelle Shabani e Frère Nzito.

Falando da situação das crianças na RDC, existem dois casos: o caso de crianças vítimas de sucessivas guerras e aquelas em situação de rua na capital. As dezenas de milícias no leste, nordeste e sudeste do país recrutam por força crianças e adolescente para servir como soldados. As meninas são abusadas sexualmente, outras crianças trabalham como escravos em minas de ouro e diamante. Segundo Joseph Tonda, só em Kinshasa há entre 30.000 a 50.000 crianças e adolescentes em situação de rua. Devido à degradação politica e econômica, que causou desemprego, pobreza, falta de educação na

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família, a violência familiar, a crise entre a modernidade e a tradição e as condições de vida na cidade e no campo, muitas crianças e adolescentes de 5 a 15 anos foram expulsos de suas casas e foram parar na rua ou optaram de viver na rua. Em função dessa crise, muitas famílias foram fragmentadas, a taxa do desemprego é alta e são as mulheres que sustentam as famílias através do pequeno comércio informal e outros trabalhos informais. Se os pais trabalham, recebem pouco para manter a família, não têm dinheiro para pagar escola, aluguel, etc. Essa situação de carência leva milhares de crianças e adolescente a optar viver na rua. Os pais e parentes, incapazes de mantê-los, os expulsam da casa. Muitas crianças ficaram órfãs dos pais por causa da guerra; há caso de refugiados internos e uma boa parte fugiu para a capital. Existe também a migração interna, as pessoas deixam suas aldeias para procurar melhores condições de vida na capital. Toda essa situação permitiu o aumento desproporcional da população em Kinshasa, o que parece um caos total.

São os pais ou parentes que levam essas crianças às Igrejas. E lá, os pastores afirmam que as crianças estão endemoniadas, possuídas por espíritos ancestrais, e são bruxas (bandoki em lingala). Se a criança é a causa da desgraça familiar ou constitui o “bloqueio”, então deve passar pelo exorcismo e libertação. Para realizar o exorcismo, muitas sessões de oração e jejum são feitas. As crianças são internadas nos templos ou centros terapêuticos para seguir o tratamento. Existem vários grupos de oração, ministérios e Igrejas que se dedicam exclusivamente ao exorcismo e a libertação das crianças em Kinshasa. No catolicismo, existem congregações religiosas com trabalho direcionado exclusivamente às crianças e adolescentes em situação de rua (por exemplo, a Sociedade de Verbo Divino).

Segundo Filip e Jean-Pierre, a diabolização da figura do bruxo no discurso das Igrejas o torna onipresente no campo social. A bruxaria virou um fundo de comercio para muitos. Joseph Tonda afirma ainda que, a bruxaria faz parte do imaginário dos congoleses e dos habitantes da África central. Ainda de acorso com Joseph Tonda, o catolicismo missionário ajudou a reforçar esse imaginário,

distribuindo medalhas, escapulários, terços, restringindo a difusão da Bíblia, enfeitando o breviário de uma aura mística, em meio a pessoas cujo as disposições mentais não foram afetadas em profundidade pelo longo processo de desencantamento do mundo, o catolicismo missionário trabalhou objetivamente, se se pode afirmar assim, à constituição da

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bruxaria, da magia e dos feitiços como capital do trabalho de Deus, como mostra a rentabilização no mesmo tempo simbólica e econômica do pentecostalismo hoje313.

2.4.1.1. Mamãe Olangi e a emancipação da mulher

Maman Olangi é líder do Ministério do Combate Espiritual, uma das raras mulheres líderes do neopentecostalismo congolês. Segundo Mama Olangi, ela foi educada em uma família católica, frequentou a Renovação Carismática Católica (RCC) e também a Igreja Nzambe Malamu. Esteve presente durante as duas últimas cruzadas de T.L Osborn em Kinshasa (1968 e 1980). Teve contato com o movimento Full Gospel e alguns pastores nigerianos famosos, como Benson Idahosa. O seu ministério está presente em Johanesburgo, Congo-Brazzaville, Benim, Togo, Nigéria e em vários países da Europa. Ela tem como missão restaurar as famílias. Prega a emancipação das mulheres e a sua libertação total em uma cultura patriarcal, machista e preconceituosa. Aconselha as mulheres a se divorciarem dos maridos que não foram escolhidos por Deus, isto é, de casamentos fruto de arranjos entre famílias e sem o consentimento da noiva. Aconselha ainda as mulheres a se divorciarem dos maridos polígamos, traidores, viciados em bebidas alcoólicas, machistas e violentos. Considera como demônio a poligamia e os filhos nascidos desses casamentos. Considera os costumes locais um impedimento ao crescimento espiritual e à prosperidade econômica. Um desses costumes é o fato de toda família depender somente de uma única pessoa. O que favorece a preguiça por parte dos parentes, isto é, dos irmãos, primos, sobrinhos, tios, tias e avós. O fiel de sua Igreja deve se afastar e não ter relação com parentes que não querem estudar, se formar e trabalhar.

Apesar disso, Maman Olangi nasceu de um casamento polígamo. Sua mãe era a segunda esposa de seu pai. Ela e os seus irmãos eram infelizes e malditos. É por isso que recebeu essa revelação para evangelizar a cultura e propor a monogamia com fundamento no Evangelho. O grande slogan dela é “dans mon Église, les deuxième femmes deviennent les premières” 314. Ela foi acusada várias vezes de separar famílias.

313 Joseph TONDA. Économie des miracles et dynamiques de subjetivação/civilização na África central, p.32. 314 “Em minha Igreja, as segundas esposas do casamento se tornam as primeiras” diz Maman Olangi. Isto significa que quem adere à essa Igreja, não será mais a segunda ou a terceira esposa, mas terá um só marido escolhido por Deus. 123

ela ordena a seus fiéis a não acolher os parentes que vêm do campo. Antes de acolher uma pessoa em sua casa, é preciso saber o seu “estado do espírito” (próprios pais, irmãos, parentes, amigos ou um desconhecido). Ainda segundo ela, a maior parte das pessoas que vêm do interior do país, é bruxa. É por isso é preciso evitar qualquer contato. Um cristão não pode conviver com o diabo.

Adepta a teologia da prosperidade, segundo ela, o cristão não reza só por rezar, mas reza para ganhar dinheiro e ser rico. Critica os cristãos de outras denominações que continuam pobres apesar de acreditar em Jesus. Jesus veio libertar as pessoas do pecado, mas também da miséria e dos demônios. Quem adere à sua Igreja, tem solução a todos os problemas. Resolve a questão da pobreza, da esterilidade e do divórcio. A exemplo de Maria Madalena, que foi a primeira mulher a testemunhar a ressureição de Jesus (Marcos 16,1-8), ela defende a liderança feminina na pregação do Evangelho.

2.4.1.2. Arcebispo Kuthino Fernando

O Exército da Vitória foi fundado pelo arcebispo Kutino Fernando315. A Igreja faz parte da Instituição Missão Mundial Mensagem e Vida (MMMV), com objetivo de organizar no nível internacional a evangelização. Kutino nasceu e cresceu em Kinshasa. É um verdadeiro kinois. Depois de concluir o ensino médio, estudou filosofia, teologia e psicologia em Paris. Em 1978, se converteu nas Assembleias de Deus de Assossa, na prefeitura de Kasa-Vubu316. Foi para EUA e conheceu pessoalmente o evangelista de massas e cura divina, Tom Lee Osborn. Foi aí que iniciou “Worls Mission Message of Live”, um projeto de evangelização que o levou a vários países europeus. Na Europa, conheceu outro evangelista holandês Johan Maasbach. Junto com ele, realizaram várias cruzadas na década de 80.

Kuthino Fernando é um dos maiores líderes neopentecostais do Congo, por várias vezes encheu o estádio dos Mártires. O foco do seu ministério é cura e libertação. “Os mortos ressuscitam, os cegos veem, os coxos andam, os surdos ouvem e os pobres prosperam” 317. Outra dimensão de sua doutrina é prosperidade, batismo do Espírito Santo. Afirma que Jesus veio salvar as pessoas. Essa salvação se mostra com uma vida

315 http://www.kutino.org/, acesso 06/04/2014. 316 A cidade de Kinshasa tem o mesmo estatuto administrativo de província como as dez províncias do país. Está dividida em 24 prefeituras (communes). 317 http://www.kutino.org/spip.php?page=biogr, acesso 06/04/2014. 124

próspera aqui e agora. Ele se considera como continuador do trabalho de Ayidini Abala Alexandre, fundador de Igreja Nzambe Malamu. Kuthino tem um Instituto bíblico para a formação de evangelistas. Possui também uma emissora de rádio e TV (RTMV)318, instrumento eficaz para a evangelização. Segundo a fonte da própria Igreja, a RTMV tem uma audiência de 15 milhões de pessoas em Kinshasa e arredores, Congo- Brazzaville e norte de Angola. É conhecido como defensor dos Direitos Humanos. Para isso, quatro personagens históricos o inspiraram, Jesus, Paulo, Martin Luther King e Gandhi. Entre esses, admira mais M.L King. Foi preso no dia 30 de maio de 2003 e ficou 11 anos na cadeia. Beneficiou da graça presidencial resultante das Concertações Nacionais organizadas em junho de 2013, foi solto em agosto deste ano.

Em plena guerra em 2003, nas vésperas da reconciliação e transição política, articulou um movimento chamado “Souvons le Congo”319 (salvemos o Congo). Esse movimento tinha como objetivo de denunciar a invasão estrangeira (de Ruanda e Uganda apoiados pelos EUA e a Inglaterra), a guerra imposta a fim de exterminar a sua população, ocupar as terras e explorar os recursos naturais. O programa desse movimento passava ao vivo no seu canal RTMV. Foi preso junto com alguns fiéis em pleno comício no dia 30 de maio de 2003. Os policiais aproveitaram para destruir o templo, a sede da rádio e TV, saquear a sua residência e roubar um milhão de dólares. Desde então, o arcebispo está preso sem julgamento e nem chance de defesa. Kuthino junto com o cardeal Laurent Mosengwo Pasinya da Igreja católica são líderes religiosos que têm a coragem de criticar abertamente o governo e propor caminhos para sair do impasse. Kuthino reacendeu o fogo do nacionalismo e do patriotismo apagado desde a ocupação do país pelos exércitos ruandês e ugandês em 1996. Rompeu com a crítica feita aos crentes, de que só se interessam pela santidade, esperam a vida eterna abandonando a realidade política e social.

2.4.2. Neopentecostalismo no Gabão

A implantação das Igrejas pentecostais e neopentecostais na África central (Gabão, Camarões e Congo-Brazzaville) são “fruto das missões internacionais (África do Oeste, EUA, Japão e Europa), das cisões internas e da iniciativa de jovens pastores

318 Rádio Televisão Mensagem de Vida. 319 http://www.sauvonslecongo.org/, acesso 06/04/2014. 125

que vêm de novas formações com vontade de fundar a própria Igreja” 320. As ID são um espaço de sociabilidade. Nelas, os fiéis encontram redes de solidariedade e de apoio às dificuldades da vida. Elas se apresentam como instituições que resolvem todos os problemas das pessoas, inclusive doenças, desempregos, vistos para viajar para Europa, casamentos, etc. Essas Igrejas são uma força de mobilização social eficaz. Muitos políticos usam-nas como plataforma para ganhar votos. Alguns presidentes africanos foram mais longe para se converteram a essas Igrejas, o presidente Laurent Gbagbo, da Costa do Marfim; Matthieu Kérékou, do Benim e Olusegum Obasanjo da Nigéria. Depois da eleição de 2007, o presidente reeleito Omar Bongo Ondimba se reuniu com as Igrejas do Despertar para agradecê-las pelo apoio recebido 321.

Um pequeno país como Gabão, com uma população de 1.534.300, tem cerca de 150.000 pessoas que se declaram crentes (9,77% da população) e 1070 denominações diferentes. O pentecostalismo entrou no país em 1930 com as AD e a Igreja da Aliança Cristã Missionária (ACM). Os imigrantes nigerianos, benineses, congoleses (de Brazzaville), togoleses, ganeses e marfinenses, atraídos pela produção do petróleo (entre 1960 e 1980), tiveram também um papel relevante na implantação do pentecostalismo. A Igreja do Cristianismo Celeste foi introduzida por Cécile Sossou em 1977 e a Igreja Bíblica da Vida Profunda também foi implantada no mesmo período por imigrantes nigerianos e ganeses. Essa nova onda de pentencostalismo tem como estratégia se instalar nos lugares de maior visibilidade e de acesso fácil: perto de mercados e supermercados, terminais de ónibus e estações de trem, postos de gasolina, praças e avenida principal, etc. Como em outros países, a maior parte dessas Igrejas surgiu ou se implantou depois de 1990. O fato de não participarem na Conferência Nacional faz com que as Igrejas estabelecidades as discriminem.

O regime ditatorial de Omar Bongo Ondimba (1967-2009) proibiu as Igrejas do despertar o acesso à mídia. Essas, desejando ardentemente a visibilidade social, se reuniram em torno da Federação Pentecotista Carismática e do Despertar (FPCD), composta de 150 associações religiosas, a fim de reivindicar os seus direitos. Depois do encontro, o presidente da república concedeu lhes reconhecimento e liberdade de culto. As diferentes denominações que se enfrentam diariamente no mercado religioso são obrigadas a se encontrarem e se juntarem para lutar por seus direitos (liberdade de

320 Mélanie Soiron FALLUT, Op. Cit., p.8. 321 Ibid., p. 10. 126

exercer suas atividades). Porém não se encontram para atenuar a tensão no mercado religioso ou para melhor colaborarem na moralização da sociedade. A tensão no campo religioso e as rivalidades favorecem o seu crescimento e sucesso.

O Neopentecostalismo gabonês está marcado pelo grande envolvimento político. Na eleição presidencial de 2009, quatro líderes religiosos (Ernest Tomo, Georges Ngoussi, Profeta Ayo e Jean Guy Kombeny) se apresentaram como candidatos, mas nenhum deles venceu322. O Centro Evangélico Betânia (CEB) é a primeira Igreja autóctone do país nascida de uma cisão da Igreja Evangélica do Gabão. O CEB foi fundado pelo reverendo Francis Michel Mbandinga em 1985323. Mbandinga foi preso no mesmo ano em que fundou a Igreja, isto por ter criticado o regime ditatorial de Omar Bongo. Escreveu três livros, nos quais tratou da volta de Jesus Cristo, da necessidade de a elite política se converter e convidando a elite religiosa a se engajar na política para salvar o país324. Os três livros são Igrejas do Despertar face à crise do Estado na África, Igrejas do Despertar face aos lobbys politico-midiáticos e O pastor e o presidente 325. O CEB está em todo território nacional e possui um centro interdenominacional de formação de pastores.

Em Libreville há outras ID, como a Igreja Betel, a Árvore Ardente, o Ministério dos Efésios, a Igreja de Jerusalém e a Igreja do Santo Salvador. Um dos fiéis do CEB, Didjob Divungi Di Ndinge, primo a Mbandinga, foi nomeado vive-presidente da República em 1997. Um fato que deu mais visibilidade e respeitabilidade a Igreja. Entre o CEB e a política gabonesa existe um perfeito casamento, “os membros com grande influência de Betânia aproveitam do seu pertencimento à Igreja para obter promoções e valorizar o seu status. Ao mesmo tempo, a Igreja beneficia da imagem dos políticos de peso para melhorar o seu reconhecimento e propagar a sua mensagem” 326.

Como é comum em quase todos os países da África subsaariana, os fiéis afirmam que, depois de ter frequentado essas Igrejas foram curados de problemas de esterilidade, desemprego, afetivos, etc. Segundo Mélanie Soiron Fallut, são os mesmos

322 Ibid., p. 13. 323 Maixant Mebiame Zomo menciona 1987 como data da fundação por um grupo de jovens dissidentes da Igreja Evangélica do Gabão (IEG). Veja ARGYRIADIS, Kali et Outros. Religions transnationales des suds, p. 97. 324 Mélanie Soiron FALLUT, Op. Cit., p. 15. 325 Ibid., p. 15. 326 Ibd., p. 17. 127

problemas que os feiticeiros ou curandeiros (nganga) resolvem. No caso gabonês, eles resolvem-nos em um rito chamado bwiti ou ndjobi327. Se para curar doentes e expulsar demônios, os pastores invocam o nome de Jesus, os nganga invocam os espíritos dos antepassados. O ponto comum é a invocação de espíritos sobrenaturais. O espírito sobrenatural tem a capacidade de alterar algo na vida do ser humano e do mundo.

Na mídia secular (jornais, rádio e TV) e de outras Igrejas estabelecidas, “os pastores das Igrejas do Despertar são acusados de espoliação de bens materiais dos fiéis, de abuso sexual e desintegração familiar” 328. A desintegração familiar se explica pelo fato de que durante os testemunhos de novos convertidos ou na sessão de exorcismo, esses sob o transe e a possessão, acusam os parentes (marido ou esposa, filho, tio ou tia) de bruxaria, de ser a causa da desgraça (da doença ou morte). Essa acusação, sem prova cria conflitos e separações.

A Igreja Cristo Revelado às Nações (ICRN) foi fundada em 1996, pelo Bispo Mike S. Jocktane. Esse foi formado nos EUA no Institut Christ for the Nations de Dallas, depois em Tulsa na Universidade Cristã Oral Roberts. No início de sua vida religiosa, frequentou o CEB. Como líder religioso, se envolveu com a política sendo nomeado conselheiro do presidente Omar Bongo em 2005. Em janeiro de 2009, foi promovido como Subchefe da casa civil. Na propaganda da eleição presidencial de 2009, Mike Jocktane passou para a oposição e deu o seu apoio a André Mba Obame, o que lhe causou muitas acusações e perseguições do partido que está no poder há mais de meio século.

2.4.3. Neopentecostalismo em Camarões

Muitas Igrejas do despertar (ID) funcionam na ilegalidade em Camarões. Até 2012, o Estado camaronês reconheceu oficialmente somente 46 organizações religiosas: uma antes da independência, a Sociedade Missionária Batista Europeia em 1952, entre 1960 e1989, 22 foram reconhecidas, e entre 1990 e 2012, 23329. Na situação de ilegalidade, muitas Igrejas funcionam sob cobertura das Igrejas estabelecidas. Segundo os crentes, a Igreja católica e as Igrejas protestantes são instituições de brancos porque foram fundadas por eles e impostas aos africanos durante a colonização. O mérito

327 Ibid., p.18. 328 Ibid., p. 20. 329 Ibid., p. 27. 128

dessas Igrejas é dar possibilidade ao povo de ele mesmo ler e meditar a Palavra de Deus.

A Igreja Pentecostista Cristã dos Camarões foi fundada por Achille Mendongo e reconhecida em 1998. Desde 2012 dispõe de 850 templos em todo país, sendo que 50 templos em Yaounde e apenas 1 no norte. Segundo o pastor Mendongo, “Paul Biya, presidente da república, foi escolhido por Deus, somente Deus que decidirá o momento de sua retirada” 330. Mendongo tem esse discurso porque é da mesma etnia que do presidente Paul Biya e recebe muitos favores do governo.

Como muitas Igrejas funcionam na ilegalidade, todas elas são obrigadas apoiar os políticos, não criticá-los para não correr o risco de ter seus templos fechados. Há certo culto de personalidade ao presidente Paul Biya. As Igrejas reconhecidas e especialmente as Igrejas Cristãs Tradicionais incentivam os políticos a não reconhecer as novas Igrejas pentecostais a fim de não perder seus privilégios e sucesso. Outra razão que o governo usa para não reconhecer essas Igrejas é para evitar a formação e crescimento do fundamentalismo religioso que pode desembocar na intolerância e violência como é o caso da Nigéria e atualmente na República Centro Africana (RCA). Nessa situação, o governo costuma mandar os agentes de segurança participar nos cultos para ver se existem críticas direcionadas a ele. A Igreja Holy Ghost Revival Ministry do pastor nigeriano Tchambo é exemplo típico. Em todos os cultos da Igreja de Tchambo, recebia agente de segurança do Estado. Contrariamente a Kinshasa, aqui os fiéis tem vergonha de se declararem crentes por dois motivos: as suas Igrejas funcionam na clandestinidade e a mídia local passa uma imagem negativa de seus líderes. A mídia os apresenta como bandidos, mentirosos e vigaristas. Como se não bastasse, essas Igrejas são consideradas seitas. As únicas Igrejas pentecostais reconhecidas pelo governo são a Igreja Bíblica da Vida Profunda, a Missão Evangélica Vida e Paz dos Camarões, a Igreja Pentecostal Cristã dos Camarões, e a Full Gospel Mission331. As únicas Igrejas pentecostais mais estruturadas e que têm relação com os políticos são a Full Gospel, a Igreja Assembleia de Deus, a Reading Church e a Missão do Evangelho Pleno.

330 Ibid., p. 31. 331 Ibid., p. 27. 129

2.4.4. Neopentecostalismo no Congo-Brazzaville

Os fiéis das Igrejas do despertar (ID) representam 13,35% de uma população de 4.492.689 habitantes, ou seja, são 600.000 fiéis. Brazzaville tem 224 denominações cristãs e 350 templos. As Igrejas do Despertar de Congo Brazzaville estão reunidas em três associações:

 A Comunidade das Assembleias do Evangelho Pleno no Congo (CAEPC) é afiliada à Igreja Assembleias de Deus francesa,  Federação das Assembleias do Despertar (FAD) reunindo 45 Igrejas pentecostais,  Comunidade das Igrejas do Despertar (CID).

Na primeira associação, as Igrejas pentecostais se reúnem em torno da Igreja Assembleias de Deus, de origem francesa. Essa AD faz parte do pentecostalismo clássico, ela tem somente 13 templos em Brazzaville. O líder desse grupo é o carismático pastor Demba Isaïe. Durante o regime socialista congolês em 1977, os líderes da Igreja Assembleias de Deus foram expulsos do país. Na sua ausência, a Igreja continuou clandestinamente. Alguns oficiais de exército e políticos que tinham recebido uma formação religiosa se tornaram pastores. Criaram grupos de oração clandestinamente, e com tempo, esses grupos viraram primeiras Igrejas do Despertar do país332.

A segunda associação representa a elite social e cultural a nível nacional. Os líderes religiosos são inseridos profissionalmente e têm formação teológica ou religiosa. São membros das redes mundiais como Full Gospel e FIHNEC. A última é um conjunto de Igrejas independentes oriundas de Kinshasa, frequentadas principalmente por jovens. Sua doutrina rejeita o poder dos mais velhos, isto é o respeito exagerado aos mais velhos e privilegia laços internacionais, propaga a teologia da prosperidade. A maioria dos conversos dessas Igrejas vem da Igreja Católica333. Longe do crescimento desordenado das Igrejas do Despertar, existem redes de interação no nível local e

332 Ibid., p. 39-40. 333 Ibid., p. 40. 130

internacional, isso se mostra através da organização de megaeventos, vigílias de oração comum, cruzadas de evangelização e de cura divina334. Segundo Melanie Soiron Fallut,

o sucesso dessas Igrejas vem do fato de que elas entregam a Bíblia ao povo. O povo não assiste passivelmente ao culto, mas ativamente. Elas se colocam na tradição protestante. A palavra de Deus pertence a todos. Cada um pode testemunhar obter o dom de cura, falar em línguas sem distinção de condição social, gênero e raça335. O que dá credibilidade a desses grupos é a capacidade do líder de atrair e convencer as pessoas a aderirem à sua proposta, a capacidade de organizar, o manejo dos meios eletrônicos. Ele tem carisma e eloquência, o que o distingue de outros atores sociais. Nessas Igrejas, a solidariedade tradicional é combatida e substituída pela solidariedade confessional ou denominacional.

As pessoas frequentam essas Igrejas a fim de encontrar solução aos problemas como doenças, desemprego e carência afetiva. A “busca pela cura” é o elemento que desencadeia tudo” 336. O ponto central das atividades dessas Igrejas é a “conversão”. Quem é convertido obtém a paz, prosperidade, saúde e vida eterna, o caso contrário, é diabolizado 337. Nessas Igrejas, o fiel busca a origem da desgraça de sua vida no seu comportamento e na sua relação de intimidade com Deus e não nos outros e nos políticos.

Resumindo, o que Melanie Soiron Fallut observou na República dos Camarões, Gabão e Congo-Brazzaville, pode ser aplicado em toda África subsaariana apesar de de haver algumas exceções. Essa pesquisadora afirma que as Igrejas neopentecostais se relacionam com a política e elas possuem um discurso próprio. Muitas dessas Igrejas, mantendo relação com os políticos, têm liberdade de atuar e visibilidade social. Mas em alguns países, elas encontram dificuldades (como em Camarões). As principais características do neopentecostalismo africano são a autonomia financeira, o espaço de liberdade de expressão para os seguidores, envolvimento político (política partidária, apoio aos políticos ou amizade), a participação ativa na transnacionalização religiosa; de um lado, em momento de crise politico-econômica, elas têm discursos motivadores, de outro lado, na maioria dos casos, a sua ação religiosa preserva em certa medida o “status

334 Ibid, p. 42. 335 Ibid, p.42. 336 Ibid, p.44. 337 Ibid, p. 44. 131

quo” de regimes corruptos e ditatóriais africanos; a maioria parte de seus líderes têm curso superior (alguns eram professores universitários) e se autodeclaram doutores, bispos, apóstolos, arcebispos, etc.; o discurso da prosperidade e o exorcismo e libertação.

3. Pentecostalismo brasileiro na África

A partir da transnacionalização religiosa, o Brasil também exporta o seu produto simbólico assim como a África. Se antigamente o Brasil recebia um Cristianismo colonial (essencialmente católico, depois, protestante e pentecostal), a partir do século XX, ele começa a exportar o Cristianismo, isto é, o pentecostalismo e neopentecostalismo para outros países. Fora do pentecostalismo e neopentecostalismo, há muitos de missionários brasileiros católicos e protestantes trabalhando no mundo afora (especialmente na África, em países de língua portuguesa). O Brasil é considerado como um dos maiores países pentecostais do mundo.

O Brasil está presente na África não somente no ponto de vista religioso, mas também político e econômico. Ele faz cooperação com vários países africanos no campo da economia, desenvolvimento e ciência. Por consequência, vários estudantes africanos estão estudando no Brasil beneficiando de bolsa do governo brasileiro. A UNILAB, (Universidade de Integração Internacional da Lusofonia Afro-brasileira) por exemplo, foi criada nessa perspectiva.

As Igrejas pentecostais brasileiras presentes na África subsaariana são a Congregação Cristã no Brasil (CCB), Assembelias de Deus (AD), a Igreja Pentecostal Deus é Amor (IPDA), a Igreja Pentecostal o Brasil para Cristo (IPBC) e a Igreja Evangélica Quadragunlar (IEQ). A Igreja Pentecostal o Brasil para Cristo e a Igreja Pentecostal Deus é Amor se implantaram em Moçambique na década de 1990338. Das neopentecostais, tem a Igreja Mundial do Poder de Deus (IMPD), a Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD), a Igreja Pentecostal Renascer em Cristo (IPRC), a Igreja Cristã Maranata (ICM) e a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) 339. Em Angola,

338 Teresa Cruz e SILVA. A Igreja Universal em Moçambique, p.125. 339 Informações tiradas nos sites oficiais das referidas Igrejas. Para mais informação veja a Tabela 2, p.220: Presença das do pentecostalismo brasileiro na África subsaariana. Tabela 3, p.222: o pentecostalismo brasileiro em número de templos. Tabela 4, p. 223: a IURD, CCB e a IPDA em porcentagem. 132

pode-se encontrar outras Igrejas neopentecostais como a “Mundial do Reino de Deus, Mundial Internacional, Mundial da promessa de Deus, Mundial Renovada e a Igreja Evangélica Pentecostal Nova Jerusalém” 340. Essas são fruto da dissidência com a IURD.

A IURD está presente em 39 países, a IPDA em 26 países, a CCB em 12 países, a IPBC em 5 países, a IMPD e a IEQ, cada uma em 4 países, as AD em três países, a IIGD, a IPRC e a ICM, estão presente em apenas um país cada. O que é curioso, é que a ICM está presente somente em Burundi e é a única Igreja pentecostal brasileira presente naquele país. A IURD é a Igreja que tem o maior número de templos, ao total são700, em seguida a CCB com 568 templos e a IPDA com 46 templos. Os países que têm um número significativo de templos na África são: o Moçambique (402 templos da CCB; 41 templos da IURD e 18 da IPDA), África do Sul (330 templos da IURD, 1 templo da CCB e 3 templos da IPDA), Angola (57 templos da IURD, 21 templos da CCB e 1 templo da IPDA) e a RDC (57 templos da CCB, 5 templos da IURD e 1 templo da IPDA). Portanto, o Moçambique é país que tem uma significativa presença do pentecostalismo brasileiro (70,77% de templos da CCB e 39, 13% de templos da IPDA), seguido pela África do Sul (47,17% de templos da IURD). A partir desses dados, podemos concluir que o pentecostalismo e o neopentecostalismo brasileiros têm uma significativa presença na África subsaariana em Moçambique, África do Sul e Angola. Tomando somente a IURD, o neopentecostalismo brasileiro está presente em quase todos os países da África subsaariana.

340 http://www.publico.pt/mundo/noticia/presidencia-de-angola-manda-suspender-actividades-da-iurd- por-60-dias-1583142 acesso 01/06/2014.

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Conclusão

A história do pentecostalismo na África pode ser dividida em três fases. A primeira fase trata da chegada de missionários pentecostais estadunidenses e europeus no início do século XX. Esses pregaram e implantaram suas Igrejas ainda no período colonial. A segunda fase se inicia com a chegada de missionários estadunidenses e europeus da cura divina na década de 1950 e da Renovação Carismática na década de 1970. E a última fase é marcada pela entrada de missionários de diferentes nacionalidades (estadunidenses, europeus, brasileiros, coreanos, nigerianos, ganeses) trazendo um novo produto religioso, o neopentecostalismo, e a fundação de várias Igrejas neopentecostais e carismáticas pelos nativos.

Depois do avivamento espiritual nos EUA e na Europa, vários missionários pentecostais chegaram à África para pregar a nova versão da religião cristã, caracterizada pelo batismo do Espírito Santo e os dons do Espírito Santo: glossolalia, exorcismo e profecia. Para realizar a sua missão, os primeiros missionários se juntavam, faziam alianças e outros ainda trabalhavam sozinhos. Os primeiros crentes convertidos eram católicos, protestantes ou praticantes das RTA. A Igreja Assembleias de Deus e a Igreja Apostólica da Inglaterra fazem parte da primeira presença pentecostal no continente africano. Atualmente, a primeira está espalhada em todos os países da África subsaariana. Nos países como África do Sul, Zimbabue, Burkina Faso e Nigéria, ela é a maior Igreja pentecostal. Depois da implantação do pentecostalismo clássico, alguns crentes africanos romperam com as Igrejas-mães e fundaram as suas próprias Igrejas. Essa ruptura se dá por vários motivos: poder religioso (nacionalização) isto é, a disputa para a liderança dentro da Igreja e a necessidade de ter uma Igreja nacional independente e autônoma da influência estrangeira; de necessidade de adaptar o pentecostalismo à cultura africana. O ganês Peter Anim, fundador da Christ Apostolic Church (1922) faz parte da primeira geração do pentecostalismo africano. Não são somente os africanos que rompem com as Igejas-mães, alguns missionários pentecostais estrangeiros também o fizeram, a exemplo do escocês James McKeown, fundador da Church of Pentecost de Gana (1953).

A segunda fase comporta a chegada de evangelistas itinerantes estadunidenses e europeus da corrente da cura divina e milagre. Esses organizavam as cruzadas de

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evangelização na década de 1950 e 1960. A Igreja Nzambe Malamu da RDC surge naquele período. Várias outras Igrejas se implantam ou surgem a partir da influência da renovação carismática na década de 1970. As Igrejas que tiveram influência da renovação carismática começaram como grupos de oração ou ministérios para depois se constituirem em Igrejas. Entre uma ruptura com outra, há sempre uma continuidade em alguns aspectos da Igreja anteior, introdução de novos elementos e adaptação ao novo contexto sócio-cultural. Os efeitos da Guerra Fria foram os golpes de Estado, a formação de regimes ditatoriais, rebeliões e guerras civis. Entre 1970 a 1990, se instalou regimes detatoriais em vários países africanos e esses tinham a influência capitalista.

Esses regimes não favoreceram o crescimento e surgimento de novas Igrejas pentecostais, mesmo as Igrejas estabelecidas foram perseguidas nos países como Zaire (atual RDC) e Moçambique. Mas com abertura política e a liberalização religiosa a partir de 1990, houve explosão religiosa em toda África subsaariana. A última fase está marcada pela implantação das novas Igrejas pentecostais fundadas por missionários estrangeiros ou autóctones com ênfase na cura divina, exorcismo, prosperidade, uso da mídia e entrada na política partidária. Consequentemente, surgiram também várias Igrejas pentecostais (evangélicas ou carismáticas) influenciadas pelo neopentecostalismo e por correntes anteriores. Essa explosão pentecostal é muito visível em todo continente, especialmente em Nigéria, Gana, África do Sul, RDC, Quênia, Costa do Marfim e Benim. Em cidades como Kinshasa, fundar uma Igreja é um negócio lucrativo, que atrai muitas pessoas, especialmente a massa de jovens desempregados. Muito cedo demanhã, é comum ver nas ruas, vários jovens crentes de novas Igrejas pentecostais ou de grupos de oração, voltando de vigílias com Bílbias debaixo de braços. A Igreja Universal do Reino de Deus aproveitou desse contexto para fazer a sua entrada no continente.

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CAPÍTULO III: IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS NA ÁFRICA SUBSAARIANA

Introdução

A Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) foi fundada em 09 de julho de 1977, no Rio de Janeiro por Edir Bezerra Macedo, Romildo Soares e Roberto Lopes341. Romildo Soares permaneceu na Igreja até 1980, ano em que saiu para fundar a Igreja Internacional da Graças de Deus. Durante o terceiro aniversário da IURD, em julho de 1980, o pastor Roberto Lopes dirigiu o culto da consagração de Edir Macedo ao bispado. O pastor Roberto Lopes, ainda como membro da IURD foi eleito deputado federal em 1986, em dezembro do ano seguinte, desligou-se da instituição e regressou à Igreja Nova Vida 342. A IURD cresceu e se expandiu rapidamente em todos os Estados brasileiros. Começou sua transnacionalização pelos EUA (1980), Paraguai (1985), depois Portugal e Argentina. Entre 1990 e 2000, ela se implantou em quase todos os países da América e Europa, e entrou na África subsaariana, Ásia até a Oceania.

As perguntas que podem ser feitas são, como um pequeno grupo religioso, que começou com meia dúzia de pessoas numa ex-funerária no bairro da Abolição no Rio de Janeiro, em pouco tempo se transformou em um império religioso e midiático? Quais são as razões de seu crescimento e sucesso? O que favoreceu essa expansão?

Por causa do seu poderio financeiro, midiático e político; a capacidade de adaptar a sua mensagem em diversas culturas; o princípio de sua mensagem, que é tornar universal o Reino de Deus pregado por Jesus Cristo, atingir os quatro pontos da terra, seguir a recomendação do próprio Jesus nos Evangelhos, “Ide por todo mundo e pregai o evangelho a toda criatura” (Marcos 16, 15) 343. A IURD considera urgente anunciar a Palavra de Deus e expulsar os demônios que tomam conta das pessoas e do mundo. É preciso invandir o mundo e travar uma guerra espiritual contra Satanás.

Como a IURD entra num país, começa uma missão, cresce e tem sucesso? Cabe à cúpula da Igreja decidir o lugar, escolher as pessoas que serão enviadas, montar uma

341 Ricardo MARIANO, Op. Cit., p. 55. 342 Ibid, p. 56. 343 Dowyvan Gabriel GASPAR, Op. Cit., p. 165. 136

comissão de investigação, mandar dinheiro e executar a missão. A comissão está encarregada a investigar as probabilidades de sucesso, estudar a Constituição do país, avaliar a linguagem mais apropriada ao contexto. Após o estudo pormenorizado da região, a cúpula envia um pastor ou um grupo de pastores para alugar o espaço, que deve se situar num local de grande visibilidade, de circulação de pessoas. Depois, envia o dinheiro através de seu empreendimento bancário, o Banco Metropolitano de Crédito, que tem sede na cidade de São Paulo344. A IURD escolhe os países ou uma região seguindo os imigrantes lusófonos e hispânicos. Já que não tem interesse em dar uma formação teológica a seus pastores, a fim de enfrentar melhor os desafios da missão (compreender as pessoas e seus costumes, aprender e dominar línguas estrangeiras) e ela segue a rota migratória.

“A IURD é uma só Igreja seja na África e em outras partes do mundo, usa os mesmos métodos para a sua expansão” 345. Em sua expansão mundial, ela mostrou flexibilidade no uso do nome (mudando de nome em países onde ela não teve uma boa fama). Existe uma padronização dos métodos de expansão, porém eles podem ser adaptados de acordo com o contexto. Já a doutrina e a organização são imutáveis. O fator chave dessa padronização é o seu clericalismo e a centralidade de poder. Para ser pastor da IURD, além da capacidade de arrecadar dízimos e ofertas é necessário saber exorcizar.

Segundo André Mary, o neopentecostalismo iurdiano se increve na onda do neopentecostalismo mundial do Eixo-Sul. Quebrando a relação tradicional Norte-Sul, do centro para a periferia, da metrópole para as ex-colônias, que privilegia a corrente estadunidense. “As cidade africanas (Abidjan, Accra, Lagos, Douala ou Libreville) se tornam terras de missão de pastores de Igrejas pentecostais brasileiras e coreanas” 346. André Mary chama ainda a nossa atenção sobre o cenário religioso mundial: Norte-Sul (tradicional), Sul-Norte (a presença das Igrejas Independentes Africanas e Igrejas Pentecostais Africans nas capitais europeias (Paris, Londres, Ámsterdam) e EUA) Eixo- Sul (as Igrejas Pentecostais Brasileiras e Coreanas na África, as Igrejas africanas em países africanos, América Latina e Ásia). No processo de transnacionalização, esses

344 Ibid., p. 168-174. 345 Paul FRESTON The Universal Church of the Kingdom of God: A Brazilian Church Finds Sucess in Southern Africa, p. 40. 346 André MARY, Le pentecôtisme brésilien em Terre africaine. L’universel abstrait du Royaume de Dieu, p.463. Trad. por Adrien Gyato B. 137

grupos religiosos seguem a rota migratória. A tese principal desse capítulo é que a IURD cresce e se expande na África, se adaptando à cultura africana. Isto é, de um lado demoniza e de outro lado dialoga, negocia e incorpora alguns de seus elementos.

Esse capítulo será dividido em três partes. Na primeira parte, será analisada a presença iurdiana no continente africano, dividindo o continente em três línguas oficiais: português, francês e inglês, sem esquecer que a IURD está também presente no único país da língua espanhola, Guiné Equatorial. Dos 54 países que tem o continente africano, a IURD está presente em 39. Com exeção da África do Norte, a IURD está presente em quase todos os países no sul do deserto do Saara. Com isso, ela se torna a principal presença pentecostal (ou religiosa) brasileira no contintente africano. Na segunda parte, serão examinadas as estratégias de implantação e expansão da IURD. E na última parte serão abordas as perspectivas de seu futuro no continente.

1. A presença da IURD na África Subsaariana

Os critérios que serão usados para falar da presença da IURD na África subsaariana são o número de templos em determinado país e o trabalho social. As informações sobre o número de templos foram levantadas a partir dos endereços de cultos divulgados no site oficial da Igreja. Há, porém algumas contradições, o número de endereços postados nesse site nem sempre corresponde com o número que os jornalistas publicam na Folha Universal e em outras revistas da própria Igreja na África ou em outras revistas (como Folha de São Paulo, Veja) aqui no Brasil. A Tabela 2, na página 219, dá uma ideia sobre a presença da IURD na África subsaariana. A IURD está presente em 39 países. Os países com o maior número de templos são: África do Sul (330 templos), Angola (57 templos), Costa do Marfim (51 templos), Moçambique (41 templos), Namíbia (23 templos) e Zimbabué (22 templos). Para melhor analisar essa presença, a África subsaariana será dividida em três partes, de acordo com as línguas nacionais: África de língua portuguesa, francesa e inglesa.

As estratégias de implantação da IURD na África foram pensadas por Edir Macedo quando se mudou do Brasil para os EUA em outubro de 1986347. Queria implantar a Igreja primeiramente em Portugal ou na África do Sul. Na primeira estratégia, o Portugal seria a porta de entrada da IURD na África, começando pela África lusófona.

347 Mariano RICARDO, Op. Cit, p. 56. 138

Na segunda, a África do Sul seria também a porta de entrada para o continente já na década de 1990, Edir Macedo possuía uma residência naquele país.

1.1. A IURD na África de língua portuguesa

A África de língua portuguesa corresponde às antigas colónias de Portugal. Nesses países, apesar da língua oficial ser o português, tem várias línguas africanas, que são nacionais. O primeiro país onde a IURD se instalou foi a Angola em 1991, depois o Moçambique em 1992348, o Cabo Verde também em 1992349 e por fim a Guiné Bissau e o São Tomé Príncipe. A IURD teve a facilidade de se implantar nesses países por dois motivos: a língua falada e a preexistência do Cristianismo (sobretudo o Catolicismo).

1.1.1. A IURD em Angola

A IURD se implantou em Luanda (Angola) em 1991, mas foi juridicamente reconhecida em 1992. Depois da guerra civil (1975-2002) se expandiu no interior do país e atualmente está presente em Cabinda, Malange, Kwanza Sul, Huambo, Benguela, Huila, Lunda Norte, Bié e Namibe. Oito anos depois de sua implantação, tinha 170.500 fiéis e 40 templos350. Segundo a própria Igreja, atualmente possui 57 templos351.

Segundo o jornal Folha de São Paulo, as religiões ou Igrejas em Angola estão representadas da seguinte maneira: 55% de angolanos são católicos, 25% são das IIA, 10% são protestantes, 5% são das Igrejas pentecostais brasileiras, entre 1% a 2% de Islã, 3% cultuam outras religiões352. Segundo a ARDA (The Association of Religion Datas Archives), com uma estimativa de 13.068.161 de população (2010), 93,28% dos angolanos eram cristãos, 4,62% das RTA, 1,09% muçulmanos, 0,79% agnósticos, 0,20 % ateus e 0,02% pertenciam em outras religiões353. Por falta de livros publicados aqui no Brasil sobre a IURD em Angola, foram analisados alguns números do jornal Folha

348 Ari Pedro ORO, André CORTEN e Jean-Pierre DOZON, Igreja Universal do Reino de Deus. Os novos conquistadores da fé, p. 101. 349 Claudio FURTADO e Pierre-Joseph LAURENT, Le pentecôtisme brésilien au Cap-Vert. L’Église Universelle du Royaume de Dieu, p.1992. Trad. por Adrien Gyato B. 350 Tereza Cruz e SILVA. A Igreja Universal do Reino de Deus em Moçambique, p. 126. 351 Veja a Tabela 5, p.224-225. Mas a Folha Universal, nº 990, do dia 27 de março a 2 de abril de 2011, p.7i, dá o número de mais de 166 templos. 352 http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2013/04/1269733-angola-proibe-operacao-de-igrejas- evangelicas-do-brasil.shtml, acesso 26/06/2014. 353 http://www.thearda.com/internationalData/countries/Country_7_1.asp, acesso 27/06/2014. 139

Universal e da revista Plenitude Angola, que a própria Igreja disponinbiliza em seu site oficial de Angola (www.iurdangola.net).

A história recente da IURD em Angola está marcada pelo acidente que aconteceu na virada do ano de 2012, onde morreram 13 pessoas por esfixia, esmagamento e pisoteamento e outras 120 pessoas ficaram feridas. Por causa desse acidente, o governo angolano proibiu o funcionamento da IURD por 60 dias. Segundo a Folha de São Paulo, houve acidente porque a Igreja reuniu 150 mil pessoas no principal estádio de Luanda, muito acima do limite permitido que era 70 mil. O tema da campanha era “’O Dia do Fim’, é preciso dar fim a todos os problemas que afligem você: doenças, miséria, desemprego, feitiçaria, inveja, problemas na família e dívidas” 354. A adesão maciça de pessoas suplantou a previsão dos organizadores, levou a superlotação do recinto muito antes da hora marcada pelo início das atividades e dificultou o trabalho da polícia, dos serviços médicos e da proteção civil. Segundo o inquérito da Presidência da República, “a publicidade feita pela IURD criou no seio dos fiéis não só uma enorme expectativa de verem resolvidos os seus problemas, atraiu um número elevado de pessoas, idosos, crianças e doentes” 355.

Esse acidente além de causar perda de vidas humanas, foi uma oportunidade para o governo controlar a presença das Igrejas e das Religiões em seu território. O governo angolano verificou a presença de uma boa parte de Igrejas na capital e nas províncias e descobriu que 1200 Igrejas e religiões operavam legal e ilegalmente em território nacional. Com isso, publicou a lista de 192 delas que não preencheram requisitos para aquisição de personalidade jurídica. Dessas, 150 Igrejas foram proibidas de funcionar356. Entre essas Igrejas, encontravam-se seis Igrejas pentecostais brasileiras357: Igreja Mundial do Poder de Deus, Igreja Mundial e Renovada, Igreja Mundial do Reino de Deus, Igreja Mundial Internacional, Igreja Mundial da Promessa de Deus e a Igreja Evangélica Pentecostal Nova Jerusalém. As autoridades angolanas

354 http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2013/04/1269733-angola-proibe-operacao-de-igrejas- evangelicas-do-brasil.shtm, acesso 26/06/2014. 355 http://www.publico.pt/mundo/noticia/presidencia-de-angola-manda-suspender-actividades-da-iurd- por-60-dias-1583142, acesso 26/06/2014. 356 http://angola24horas.com/portal/index.php/religiao/item/718-mais-de-150-igrejas-proibidas-em- angola, acesso 27/06/2014. 357 http://www.publico.pt/mundo/noticia/presidencia-de-angola-manda-suspender-actividades-da-iurd- por-60-dias-1583142, acesso 26/06/2014. 140

alegaram que essas “Igrejas” não eram Igrejas, mas empresas que enganavam o povo angolano e vendiam milagres como mercadoria.

Dois acontecimentos marcaram a atuação dessa Igreja brasileira em Angola: o batismo de 20.000 pessoas em uma cerimônia coletiva feita pela IURD nas praias do município de Belas em fevereiro de 2012 e o acidente do dia 31 de dezembro de 2012. Esse batismo coletivo chamou a atenção da mídia nacional, regional e internacional, foi manchentes de vários jornais e revistas do país. A IURD afirma ter meio milhão de adeptos em todo país. Além da revista e jornal, a IURD possui a rádio LAC (Luanda Antena Comercial), que emite em todo território nacional, com uma grande audiência. Muitas pessoas tomam conhecimento da IURD através de seus programas

1.1.1.1. Revista Plenitude Angola

A revista Plenitude Angola tem uma tiragem de 20.000 exemplares e apesar de ser publicada pela IURD se parece com qualquer outra revista mensal, pois aborda diversos assuntos. Dentre eles: política, economia, bem-estar, assuntos juríricos, sobre a cultura, esporte, traz crônicas e artigos. Além disso, ela divulga as ações sociais e celebrações religiosas realizadas pela IURD em Angola. As crônicas e algumas reflexões são feitas pelo bispo Edir Macedo, bispo Augusto Dias (responsável da IURD em Angola) e Cristiane Cardoso (escreve sobre assuntos relacionados à mulher). A revista traz também entrevistas de obreiros, pastores, testemunhos e depoimentos de novos convertidos e notícia da IURD no mundo. No campo político-social, a revista publica as atividades do governo angolano: lançamentos das primeiras pedras e a inauguração de obras públicas, reunião de ministros, etc.

A assistência social é feita através de diversas ações: doação de sangue, visita em hospitais, maternidades, cadeias e albergues da terceira idade. Nessas visitas, os membros da IURD evangelizam, ajudam com bens materiais, como comida, roupas, produtos de higiene pessoal, etc. Outros exemplos dessa assistência social: a visita feita por obreiros ao hospital psiquiátrico de Luanda, onde cortaram cabelos, levaram manicure e pedicure, e evangelizaram a todos pacientes358. A Associação de Mulheres Cristãs da IURD visitou a maternidade Lucrecia Paim, rezando e distribuindo folhetos, o jornal Folha Universal, a revista Plenitude Angola, o livro da escritora Cristiane

358 Plenitude Angola, nº 19, setembro 2012, p. 36. 141

Cardoso, cujo pano de fundo aborda a conduta da mulher virtuosa359. A Associação de Mulheres Empresárias da IURD de Angola (AMEIAngola) e 300 obreiros doaram sangue no Hemocentro da maternidade Lucrecia Paim e Hospital Josina Machel360. Cinquenta missionárias da Sisterhood organização feminina ligada a IURD visitam o centro social de acolhimento à terceira idade, Beiral, em Luanda. Essas mulheres evangelizaram e ofereceram lençoís e cestos de frutas aos idosos 361. Os pastores e obreiros da IURD visitaram as cadeias de Luanda, evangelizaram os presos e num dia só batizaram 239 pessoas das quais 17 mulheres. Alguns agentes das cadeias também se converteram362. A AMEIAngoala orienta os imigrantes congoleses de legalizar o seu pequeno comércio. Ela trabalha pela reinserção social, reabilitação, estabilização econômica dos imigrantes e dos demais angolanos. Ela participa também da campanha de vacinação da pólio.363.

IURD de Angola costuma convidar as autoridades civis durante os lançamentos de primeiras pedras e inaugurações de seus templos. Um dos exemplos foi a inauguração do “Cenáculo da Viana”, com a capacidade para 20.000 pessoas, em Luanda, domingo dia 10 de junho de 2012. Essa cerimônia contou com a presença do Edir Macedo e do governador da província de Luanda 364. A inaugugração de várias outras obras da IURD conta sempre com a presença das autoridades angolanas. O fato da IURD publicar matérias referentes à vida política, econômica e social de Angola, nos leva a afirmar que ela estaria em boas relações com os governantes do país e também seria uma estratégia de atrair as pessoas, conseguir mais leitores, que são potenciais adeptos.

1.1.1.2. Jornal Folha Universal

A Folha Universal de Angola (FU) é semanal, tem tiragem de 40.000 exemplares e é diferente da Folha Universal do Brasil. É distribuído gratuitamente nas ruas e avenidas, praças, nos ônibus. Assim como a revista, o jornal aborda vários

359 Ibid, p. 37. 360 Plenitude Angola, nº 19, setembro 2012, pp. 40-41. A AMEIAngola foi fundada em 23 de outubro de 2011 com finalidade de lutar contra a pobreza dentro e fora da Igreja. É um parceiro do Estado como objetivos específicos: educação, criação de empregos e oportunidades, inclusão da mulher no mercado de trabalho. Plenitude Angola, nº17, abril de 2012, p. 14. 361 Ibid, p. 60. 362 Plenitude Angola, nº17, de abril de 2012, pp. 36-37. 363 Ibid, p. 66. 364 Plenitude Angola, nº18, de julho de 2012, p.50. 142

assuntos em diferentes campos da sociedade. A Folha Universal publica mais as reuniões da IURD do que a revista Plenitude Angola enquanto a última publica mais as ações sociais da Igreja do que a primeira.

A FU publica algumas obras sociais da Igreja: o encontro da AMEIAngola e os empreendedores. As pessoas apredem como estabelecer a própria empresa365. A Escola Bíblica Infanto-Juvenil (EBI) com a Turma de Fé Adolescente realizam encontro de aconselhamento (sobre a questão moral e o comportamento) de estudantes na escola Njinga Mbandi de Luanda366. A AMEIAngola aconselha os empreendedores a legalizarem os seus negócios e a se qualificar profissionalmente. Um dos integrantes afirma: “cada mulher ou homem que sonha entrar para o mundo de negócio deve antes de qualquer passo, formalizar o processo de legalização do seu negócio à luz da Constituição angolana”367. A Igreja organiza um encontro para a divulgação e sensibilização sobre a Lei contra a Violência Doméstica. Nesse encontro, havia um representante da Igreja Tocoista368. E a Sisterhood, uma organização feminina da IURD visita o Centro de acolhimento das pessoas da terceira idade em Beiral, Lunda. O centro tem cem idosos e é mantido pelo governo369.

A AMEIAngola aconselha os empreendedores a legalizarem os seus negócios. Ela se coloca também como instituição informadora da população local das oportunidades de mudança e crescimento que o governo angolano proporciona. O “Crédito Meu Negócio Minha Vida”, por exemplo, está disponível no Banco BPC e BCI, uma iniciativa do governo angolano para pequenos comerciantes a fim de banir o nível elevado da pobreza no meio da população. Através das palestras, a AMEIAngola motiva as pessoas a montar o seu próprio negócio. Convida pequenos empreendedores ou candidatos a empreendedorismo a confiar plenamente o seu negócio a Deus, a ser fiéis ao dízimo e ofertas. Em uma de suas propagandas está escrito: “AMEIAngola, a solução na luta contra a pobreza. Venha aprender como criar e estabelecer o seu negócio. Ganhe mais a custo zero”.

A IURD possui uma propaganda sobre a condenação hereditária, atacando então as RTA. Essa propaganda serve para diversas reuniões da IURD a nível nacional,

365 Folha Universal, Ano VII, nº91, Junho de 2012, p.4. 366 Folha Universal, Ano X, nº90, maio de 2012, p. 4. 367 Ibid, p.8. 368 Folha Universal, Ano VIII, nº84, outubro de 2011, p.4-5. 369 Folha Universal, Ano IX, nº93, agosto de 2012, p. 9. 143

Quebra da condenação hereditária: você que está condenado a viver com problemas que os seus Antepassados viveram tais como: esterilidade, doenças incuráveis, problemas cardíacos, mortes constantes na família, visão de vultos, câncer, hipertensão, pesadelos, audição de vozes, doenças de gota, mau olhar, depressão, dívidas constantes, abortos, vícios (como drogas, tabagismo e alcoolismo) e desemprego. Pare de sofrer! 370 Existe um clero iurdiano angolano (pastores e possivelmente alguns bispos), e milhares de obreiros e obreiras trabalhando em Angola e em outros países africanos. O perfil do pastor iurdiano é idêntico em todos os países. Geralmente é a história de alguém que passou por uma vida sofrida, com pouco estudo, que já esteve desempregado, que sofreu muito a ponto chegar ao suicídio, de repente escuta a voz de Deus, se converte e adere à Igreja. Em outras ocasiões, a pessoa adere à Igreja a partir do convite de um amigo ou parente, depois de ter escutado o programa de rádio da Igreja. Sofrimento extremo, pobreza ou doença é o que a IURD chama de “fundo do poço”. A pessoa que adere à Igreja, torna-se fiel, depois de algum tempo se dedica às atividades da Igreja e se torna obreiro. E mais tarde pode chegar a ser pastor. O pastor iurdiano é aquela pessoa que se formou na escola da vida, na realidade, que aprendeu com a experiência (pode-se tomar como exemplo o pastor Oscar Chimbili) 371. Para subir na hierarquia, o candidato deve demostrar carisma e capacidade arrecadar o dinheiro durante as reuniões.

Como em outros países, a IURD abre os seus templos todos os dias da semana. A reunião da vida financeira (ou prosperidade) acontece na segunda-feira, da saúde na terça-feira, dos filhos de Deus na quarta-feira, a da família na quinta-feira, a da libertação na sexta-feira, a da terapia do amor no sábado e o encontro com Deus, no domingo372.

1.1.1.3. O discurso

Foram selecionadas algumas matérias publicadas na revista Plenitude Angola e no jornal Folha Universal sobre as reuniões da Igreja, uma maneira de saber de discurso

370 Folha Universal, Ano IX, nº93, agosto de 2012, p.4. 371 Plenitude Angola, nº17, Abril 2012, p. 56-57. 372 Ibid, p. 68. 144

iurdiano em Angola. O discurso urdiano na Angola são pregações ou palavras proferidas por pastores e bispos durantes as reuniões.

Na reunião dos 319 e dos Heróis, de acordo com do discurso proferido pelo pastor na reunião, ser crente da IURD é ser duplamente vencedor: em primeiro lugar, o crente deve vencer em relação a Deus, isto é, na conversão e entrega. Em segundo lugar, o crente deve vencer na vida cotidiana, no negócio e buscar o seu bem-estar. Deve ser uma pessoa bem-sucedida. A pessoa é chamada a diferenciar o trabalho espiritual do trabalho material. O pastor diz “ali fora, você tem que ser águia, você tem de matar um leão por dia”. Os inimigos de um crente iurdiano não são somente católicos, praticantes de religião tradicional e os demônios, mas também os comerciantes na vida secular. O fiel deve lutar para encontrar seu lugar, montar seu próprio negócio e prosperar. Ainda segundo o pastor, para vencer o crente tem que fazer sacrifício. Não pode fazê-lo como todo mundo faz, tem que marcar a diferença, isto é ser um bom dizimista e dar regularmente ofertas. Algumas vezes, tem que desafiar a Deus, dar tudo que possui a fim de ser abençoado e tornar-se próspero. O crente não pode se contentar com o mínimo, mas sim com o máximo. Tem que desejar e querer mais, imaginar grandes coisas. Na perspectiva iurdiana, receber o Espírito Santo é ter contato direto com Deus e Jesus. O Espírito Santo capacita a pessoa para fazer obra de Deus e revela o reino de Deus. É a capacidade de enfrentar os desafios da vida, estar encarregado a resgatar as almas do inferno. É viver segundo a vontade de Deus, ser sincero, responder sempre “sim” ao invés de “sim e não” 373.

Na reunião do Jejum das Causas Impossíveis, o pastor afirmou que o medo faz com que as pessoas não vençam na vida. A falta de coragem impede que as pessoas tomem posse do emprego, do casamento, realizem seu sonho. O fiel deve se encher de coragem a exemplo de David diante de Golias (1 Samuel 17, 24). O crente deve se revestir do espírito de David, isto é, de coragem, fé e determinação. “A terminologia 'impossível' não existe no dicionário divino. 'impossível' é o juramento dos fracos” 374.

Já na reunião dos 328 e Grupo dos Heróis, o tema da pregação foi a convicção. O crente deve ter convicção, isto é certeza no que ele acredita. A convicção deve impactar a vida do crente. Ela traz vida, garantia, segurança e vitória. A convicção faz

373 Plenitude Angola, nº 19, setembro 2012, p. 32-33. 374 Plenitude Angola. Op. Cit, p. 43. 145

com que os sonhos se tornem realidade. A convicção implica perseverança, força de vontade e a não desistência. Para vencer, o fiel deve saber se superar. Quem supera os obstáculos é conhecido por sua dedicação, espírito de compromisso e disciplina. Quem comanda a sua vida? Pergunta o pastor. É você mesmo. Conforme você governa a sua vida, os objetivos fixados e metas colocadas serão alcançados. “Quem depende de Deus e de um excelente comando pessoal, será sempre vitorioso” 375.

O crente iurdiano é quem sabe perdoar. A história de José do Egito vendido por seus próprios irmãos como escravo (Gênesis 45, 4-5) foi o texto de base para a pregação daquele dia376. O fiel está convidado a perdoar ao outro como fez José, filho de Jacó. O perdão é um grande remédio para a depressão, pressão alta e outras doenças cardíacas. Quem perdoa vive em hamonia consigo mesmo e com os demais. Não tem como amar sem perdoar. O amor e o perdão andam junto.

Todo ano, alguns jovens iurdianos juntos com pastores realizam a caminhada missionária. A caminhada que ocorreu em junho de 2012 teve como objetivo: orar pela consolidação da paz em Angola e pela prosperidade dos fiéis iurdianos. Eles caminharam por 10 dias, percorrendo 319 km, de Sumbe a Luanda. Todo o sofrimento, dor, inchaço dos pés, frio, calor, perigo de encontrar animais selvagens e os mosquitos perigosos, etc., tudo foi prova de sacrifício, fé e determinação. Com esse sacrifício, os peregrinos acreditavam que todos os problemas insolúveis encontrariam solução, todos os sonhos seriam realizados. Esses vestiam camisas escritas “fé e determinação”. Eles queriam imitar a fé de Abraão, considerado pai dos crentes. Abraão disse “sim” a Javé e saiu de sua terra para um lugar desconhecido, só depois disso que nasceu Isaque. A cada kilómetro percorrido significava o fim das discórdias e desunião nas famílias, da esterilidade, da miséria, da inveja, das doenças constantes e da solidão. A chegada dos peregrinos em Luanda refletiu a derrota do mal e do Diabo. O bom pastor dá a vida por suas ovelhas (João 10,11). Com sacrifício, os pastores queriam repetir a palavra e a vida de Jesus. “A dureza do percurso tornou o nosso sacrifício verdadeiro”, repetia um pastor; “a peregrinação não é uma maratona de esporte, mas um ato de fé, a fim de

375 Plenitude Angola, Op. Cit. p. 35. 376 Ibid, p. 38-39. 146

chamar atenção de Deus a favor dos rejeitados” afirmava o outro377. Mais do que um discurso, essa caminhada foi uma ação, uma experiência religiosa.

Durante uma visita em Luanda para a inauguração do Cenáculo da Viana, o bispo Edir Macedo elogiou a fé dos angolanos ali presentes afirmando que “não há um povo no mundo que tenha a fé igual ao povo africano” 378. Jesus disse que eu vim para que todos tenham vida e vida em abundancia. O fundador da IURD perguntou: por que muitos não têm? O que está errado? Abraão foi vitorioso porque obedeceu à Palavra de Deus. Se você fizer a sua parte, Deus fará a parte Dele. Tudo depende de você, você está livre para decidir, porque foi criado livre por Deus. Duas coisas tornam o milagre possível, a graça de Deus e a fé do crente. Sem fé não há cura. Dois cegos tinham fé e pediam insistetemente a Jesus para serem curados. O pedido deles foi ouvido e eles foram curados (Mateus 9, 27-29).

Em outra reunião, além do sacrifício (ser dizimista e dar regularmente as ofertas), um pastor insistia sobre a obediência a Deus como condição para a bênção. Ao exemplo de Pedro que obedeceu a Jesus, quando esse mandou jogar as redes no mar mais profundo para pescar, depois de ter pescado a noite inteira sem apanhar nada. Pedro executou a ordem de Jesus e o milagre aconteceu (Lucas 5,3-5). O crente que obedece à Palavra de Deus receberá de volta bênçãos materiais e espirituais379.

Em uma reunião, um bispo vindo do Brasil, exortava os ex-obreiros, ex-pastores e ex-bispos da IURD a voltarem à Igreja380. A reunião foi essencialmente preparada com essa intenção. Não se sabe, em meio a dois mil pessoas presentes, quantos eram ex- obreiros, pastores e bispos. Preparar uma reunião com esse objetivo e convidar um bispo do Brasil, leva-nos a deduzir que além do crescimento e sucesso da IURD na África, há tensão e crise dentro da instituição. Essa crise leva pastores e bispos a abandonar a Igreja e fundar suas. Ou se não houver crise, a IURD estaria seguindo o exemplo a tradição protestante, que está marcada por cisões (processo de cissiparidade) e surgimento de novos grupos religiosos. Da reforma protestante no século XVI até agora, surgiram várias denominações cristãs, das Igrejas da Reforma, o pentecostalismo e Igrejas carismáticas, ao neopentecostalismo. A história do Cristianismo é feita de

377 Plenitude Angola, nº18, Julho de 2012, p. 32-45. 378 Ibid., p.50. 379 Ibid., p. 49-51. 380 Ibid., p. 56-59. 147

conflitos e divisões. O crescimento e expansão se dão nessa na tensão dentro da Igreja e entre a Igreja e a sociedade.

Estando já 23 anos na África subsaariana, a trajetória da IURD é marcada por casos de desistência de pastores e bispos, que sairam para fundar novas Igrejas. Pode-se citar dois casos: Bispo Valdemiro Santiago e Marcelo Abrantes. Valdemiro Santiago aderiu à IURD em 1979, dois anos depois de sua fundação. Em 1996, enquanto atuava em Moçambique como bispo, passou por uma experiência de “grande livramento”, foi resgatado de um naufrágio. Saiu da Igreja em 1997, momento em que voltou ao Brasil. Em fevereiro de 1998, fundou a Igreja Mundial do Poder de Deus (IMPD) em Sorocaba (São Paulo) 381. Atualmente, a IMPD cresceu no Brasil e se expandiu pelo mundo. Na África, está presente em Angola, Moçambique, Cabo Verde e África do Sul. Já o pastor Marcelo Abrantes, depois de trabalhar 24 anos na Igreja, deixou o trabalho missionário em Portugal, voltou para Cabo Verde a fim de fundar a Igreja dos Milagres. Essa Igreja está presente em Cabo Verde, Portugal e Espanha. Possivelmente os fundadores das seguintes Igrejas pentecostais em Angola são ex-líderes da IURD: Igreja Mundial e Renovada, Igreja Mundial do Reino de Deus, Igreja Mundial Internacional e a Igreja Mundial da Promessa de Deus.

Na concepção iurdiana, o pecado ocorre quando o demônio entra na vida do crente, do obreiro. É preciso tomar consciência do pecado, do mal, do fracasso pessoal é superá-lo. Falando com os obreiros, o bispo Augusto Dias disse,

Nós tínhamos muitos obreiros sedentos e famintos de trabalhar nas reuniões de libertação, para esmagar o diabo. Era só eles caminharem durante o culto no meio do povo, os demônios tremiam, manifestavam, as pessoas eram curadas de imediato, mesmo sem orar. Mas infelizmente com o passar do tempo e em função de alguns erros, alguns foram comentendo erros e esfriaram. Satanás entrou na vida deles tal como aconteceu com Judas, e perderam a vontade de servir a Deus382. Os obreiros são convidados a servir a Deus nos templos com fidelidade e dedicação. Se algum obreiro pecar, disse o bispo Augusto Dias, deve pedir perdão a Deus, se confessar ao seu superior, isto é ao seu pastor ou bispo383. Se for um erro

381 Revista Isto é, Ano 37, nº2293, 30 de outubro de 2013, p. 62-63. 382 Plenitude Angola, nº17, Abril 2012, p. 32. 383 Ibid., p. 33. 148

grave e que lese o casamento, deve se confessar também frente a seus companheiros. O obreiro deve se manter vigilante para não cair à tentação do diabo.

Em uma reunião sobre o Tratamento Espiritual, o tema da pregação foi o papel de Satanás na vida do crente. Depois de ser expulso do paraíso, Satanás trabalha com todas as suas forças para roubar a paz de Deus, no íntimo do crente. Satanás procura colocar dentro do ser humano doenças, brigas, desentendimento, contenda, inimizade, inveja, perseguições, vícios, calúnia, difamação e medos. Todo ser humano, longe de Deus está vulnerável e sujeito a todas as artimanhas satânicas e práticas do mal. Daí, a presença de tantos dementes na sociedade atual, vagueiando de lugar em lugar à procura da paz384. Sengudo o mesmo pastor, Quimbanda, a religiosidade tradicional angolana, faz parte desse mundo satânico385. O pastor apresenta Jesus como o único e imutável capaz de anular a ação diabólica na vida do aflito. Jesus é a fonte da paz, saúde, tranquilidade, sossego e felicidade através do Espírito Santo.

Em uma reunião com estudantes universitários e do terceiro ano do ensino médio em Benguela, o pastor ungiu-os com óleo e sublinhou a importância da formação académica e profissional para prosperar na sociedade. Com a formação, a pessoa adquire conhecimento, cultura e pode crescer profissionalmente. O pastor orou sobre os estudantes a fim de receber o dom da sabedoria e ciência. Toda distração, ou dores de cabeça perto das provas são obras do Diabo. Segundo o pastor, quando um estudante reprova, isso é obra do demônio, que veio atrapalhar a mente do estudante para não pensar normalmente, perder o foco e equilíbrio386.

O diálogo é o meio eficaz para resolver os conflitos e melhorar o relacionamento na vida do casal. Sem o diálogo, a relação vai se desgastando. Mas para ter o diálogo, é preciso escolher o momento e lugar. É preciso que o casal tenha momento de lazer e de diversão para melhorar o relacionamento, por exemplo, fazer caminhada junto no parque387.

Nos últimos anos, a IURD está construindo templos luxuosos no Brasil e em outros países. No Brasil, especificamente em São Paulo, foi construído o Templo de Salomão. Nos números de revista e jornal pesquisados, há vários casos de lançamento

384 Plenitude Angola, nº17, Abril 2012, p. 42. 385 Ibid., p. 42. 386 Ibid., p. 50. 387 Ibid., p.53. 149

de primeira pedra, inauguração e restauração de vários templos em Angola. O que representa essas ações? Se ontem, essa Igreja alugava salas de cinemas e teatros abandonadas em Luanda, hoje tudo mudou. O que representa essa mudança? Qual é o significado do templo para a IURD? A imagem de Deus que a IURD ensina é a de um Deus rico, próspero e poderoso, Dono do ouro e da prata, seria contraditório o mesmo Deus habitar um barraco ou uma casa precária A casa do Deus rico deve refletir a sua imagem. “Compramos espaços ideais e que glorificam a Deus. Não aceitamos lugares para remediar. O Deus que servimos merece melhor. Aconselho que aquele que busca o Deus da IURD, o Deus Vivo, não aceite apenas remediar, contetar-se com coisas pequenas, não! O nosso Deus pode todas as coisas” 388. Construir um novo templo é símbolo da presença de Deus, da vinda do seu reino, de mudança e conversão na comunidade. “O templo é a maternidade onde nascem filhos de Deus e onde as vidas são restauradas (...). A construção de um templo é a reconstrução de vidas” 389. O edifício está construído de maneira a proporcionar conforto aos fiéis.

1.1.2. A IURD em Moçambique

A geografia religiosa de Moçambique está dividida entre o norte, de maioria muçulmana, e o centro e sul, de maioria cristã. A IURD se implantou em Moçambique em 1992 no contexto do pós-guerra civil, de abertura ao multipartidarismo e aproximação entre o Estado e a Igreja (as religiões, mas especialmente a Igreja católica) 390. Atualmente, a IURD tem 41 templos em Moçambique391. Além de milhares de mortos, a guerra civil de Moçambique destruiu completamente o país, a infraestrutura de base: estradas, escolas, hospitais, pontes, templos, etc. Milhares de crianças ficaram órfãs, as famílias separadas, com 1,5 milhão de refugiados dentro e fora do país.

A destabilização provocada pelo aceleramento da guerra na década de 1980, a crise econômica e a dependência da ajuda externa durante o mesmo período transformara Moçambique em um país vulnerável a diferentes influências externas. Nesse contexto, as estratégias adotadas pelo governo para fazer face à

388 Plenitude Angola, nº19, Setembro, 2012, p. 51. 389 Ibid, p.51. 390 http://www.publico.pt/mundo/noticia/presidencia-de-angola-manda-suspender-actividades-da-iurd- por-60-dias-1583142, acesso 04/06/2014. 391 Veja a Tabela 3, p. 222. Mas a Folha Universal, nº 990, de 27 de março a 2 de abril de 2011, p.5i, deu o número de 305 templos 150

crise que se vivia levaram ao estabelecimento de alianças internas e à definição de parceiros com quem cooperar (...) 392. A IURD realizou a sua primeira reunião no Cine África, isto é, no dia 20 de novembro de 1992, depois alugou o “Cinema dos Continuadores e o Pavilhão do Estrela Vermelha em Maputo” 393. Segundo Tereza Cruz e Silva, a IURD atingiu primeiramente, os indivíduos pertencentes a estratos sociais mais desfavorecidos. Durante o seu processo de expansão, foi cobrindo sensivelmente os mesmos grupos sociais, com maior adesão de população urbana. Só mais tarde que um pequeno número de moçambicanos de classe alta começou a aderir. Nas regiões urbanas, para atrair pessoas, a sua principal ferramenta é a mídia. Ainda segundo Tereza Cruz e Silva, a IURD sintoniza suas mensagens com as necessidades materiais e espirituais dos pobres. Ela oferece resposta no campo moral, restituindo o sentido da família e o tecido social que o colonialismo destruiu, e que agora, o neoliberalismo continua destruindo.

“Apesar de condenar e rejeitar as crenças tradicionais, rituais de caráter mágico, feitiçaria e práticas de cura realizados por outros líderes religiosos, a IURD acaba por viver numa situação de simbiose entre o tradicional e o moderno” 394. Na IURD, não há diferença entre a religião e a magia, as duas não se excluem, mas se complementam. Outra estratégia para atrair pessoas é ter visibilidade na sociedade moçambicana é a prática da solidariedade através da ABC, trabalhando com crianças de rua, pessoas sem teto, imigrantes ilegais, prostitutas, usuários de drogas e desempregados e presidiários395. A Associação Beneficiente Cristã (ABC) distribui alimentos, agasalhos e fornece abrigo para essas pessoas. A ABC possui também um programa de alfabetização e de integração social das viúvas, com vista à criação de auto-emprego 396.

Uma das intervenções da IURD em Moçambique, segundo Tereza Cruz e Silva, foi a solidariedade com os desabrigados das enchentes nas regiões sul e centro em 2000 e 2001. A ABC mobilizou os seus crentes da República da África do Sul, numa cruzada contra a fome. Conseguindo trazer toneladas de alimentos (farinha de milho, água, espinafre enlatado e feijão) e outros produtos: roupas, materiais de construção e

392 Teresa Cruz e SILVA. Op. Cit, p. 124. 393 Dowyvan Gabriel GABRIEL. Op. Cit., p. 174. 394 Teresa Cruz e SILVA, Op. Cit., p 129. 395 Ibid, pp. 129-130. 396 Ibid, p. 130. 151

cobertores397. Dowyvan Gabriel Gaspar avança o número de 750 toneladas de bens398. Respondendo ao pedido do banco de sangue do Hospital Central de Maputo, a ABC mobilizou em massa seus crentes, conseguindo um número recorde de doações.

A IURD é proprietária da Rádio TV Miramar, que tem ampla cobertura no país. Essa emissora retransmite os programas da TV Record do Brasil, seu maior impacto faz-se sentir sobre as camadas mais jovens da população, com programas de música gospel, pop e entretenimento. Com seus programas na TV, a IURD se aproxima das pessoas, toca a vida delas (falando de suas realidades) e dá-lhes a palavra através de testemunhos e depoimentos.

Os programas de caráter religioso têm reservados apenas algumas horas do dia e da noite, e contêm mensagens que pretendem ir ao encontro dos problemas de cidadãos. Os testemunhos e depoimentos de indivíduos com problemas, dificuldades ou doenças e que foram “libertados” na IURD tentam retratar, cheios de emoção, a vida das pessoas em Moçambique e no Brasil, quer se trate da vida amorosa, de problemas econômicos, ou da saúde do corpo e do espírito, criando uma maior aproximação entre a instituição religiosa e os indivíduos, e entre suas dificuldades e sonhos. A possibilidade de diálogo ou de encontro com uma situação análoga à sua, transforma programas como “Fala que te escuto” ou “Terapia do amor” em grandes audiências399.

Em relação à política, Tereza Cruz e Silva não confirma a opinião de que o apoio da IURD à Frelimo (Frente de Libertação do Moçambique) durante as primeiras eleições multipartidárias de 1994 lhe teria facilitado a concessão da Rádio TV Miramar 400. “Porém durante o processo eleitoral (1999), os discursos proferidos pelos pastores da IURD continham frequentemente mensagens de apoio e bênção aos membros do governo e ao seu líder, presidente Chissano” 401. Depois de ela ter entrevistado o presidente da Comissão Nacional de Eleições de 1999, Jamisse Taimo, esse confirmou a evidência de atitudes semelhantes de apoio da IURD com orações e pedido de bênção ao candidato nas reuniões e nos programas de TV402.

397 Ibid, p. 130. 398 Dowyvan G. GASPAR, Op. Cit., p. 194. 399Teresa Cruz e SILVA, Op. Cit., p. 132. 400 Ibid., p. 133. 401 Ibid., p. 133. 402 Ibid., p. 134. 152

Em sua pesquisa de campo realizada em Maputo, em 2008, Dowyvan Gabriel Gaspar entrevistou 100 adeptos da IURD. Concluiu que os moçambicanos frequentam a IURD para encontrar a solução de seus problemas financeiros e de saúde403. Segundo os fiéis entrevistados, a cidade de Maputo está confrontada com vários problemas, entre os quais o atendimento e tratamento precário em hospitais, a violência urbana. 45% dos entrevistados afirmam ter concluído o ensino de base (fundamental e médio), e 55% não têm nenhum estudo. 75% afirmam ter tido uma religião anterior (entre a Igreja católica, RTA ou Igrejas Zionistas). Além de problemas financeiros e de saúde, alguns eram vítimas da feitiçaria, e tinham problemas afetivos (solteiros). O autor observou a divergência de opiniões sobre a questão de dízimo e ofertas. Uma parte dos fiéis da IURD ainda não compreendeu ou não se conveceu suficientemente sobre a razão de tanta insistência sobre o dízimo e as ofertas. 21% dos entrevistados acham o dízimo facultativo, 6% o desaprovam e 73% o acham obrigatório. Por outro lado, 7% dos entrevistados acham que a oferta deve ser obrigatória, 44% acham que deve ser facultativa e 49% a desaprovam404. Visitanto os templos da capital, com exeção de um pastor moçambicano, o restante dos pastores e bispos era brasileiro.

A IURD desenvolve vários programas com Jovens em Moçambique. Um desses programas é “Frequência Jovem 100 Limites”. No dia 22 de junho, o Bispo Jean Dos Santos ensinou-os a “andar com as duas pernas”, isto é, ter equilíbrio na vida. O jovem deve investir principalmente na comunhão com Deus, na vida acadêmica e profissional405. Na mídia de outras instituições do país, a IURD é atacada e acusada, como em outros países, de acumular riqueza de maneira não transparente, de se envolver com o tráfico de drogas, negócios ilegais, exploração comercial de crentes, lavagem de dinheiro, sonegação de impostos e outras atividades ilícitas406.

Não se pode comparar o acúmulo e ostentatação da riqueza da IURD na África com aqueles dos pastores milionários ganeses e nigerianos. A riqueza da IURD se mostra através da figura do pastor e da construção de catedrais (Moçambique, Angola e África do Sul).

403 Dowyvan G. GASPAR, Op. Cit, p. 177. 404 Ibid., p. 188-189. 405 http://www.universal.co.mz/2014/06/bispo-jean-realiza-frequencia-jovem-100-limites/#, acesso 24/06/2014. 406 Teresa Cruz e SILVA, Op. Cit., p.134. 153

A IURD acumula no plano mundial os recursos que aproveitam sem ambiguidade a seus líderes e empreende os investimentos que testemunham de sua riqueza, mas a regra que quer que a promoção dos pastores na hierarquia seja consequência de sua atitude em angariar ao máximo os dons e ofertas é incompantível, ao menos até certo nível, com a política do ventre407. O sucesso da IURD em Moçambique, assim como de outras Igrejas, está na adaptação de sua mensagem à situação concreta dos fiéis. Em nossa opinião, com a iniciativa de incentivar as viúvas a ter autonomia financeira, ensinando-lhes estratégias para começar um novo negócio, sair da dependência total e da extrema pobreza, aconselhando-as a superar as discriminações e perseguições da cultura, a IURD se coloca como uma Igreja libertadora, salvadora e emancipadora de uma categoria social muito discriminada. Porque é uma contradição enorme, pregar a Palavra de Deus e ver as pessoas continuarem vivendo na miséria e serem reféns de costumes discriminatórios e desumanos.

1.1.3. A IURD em Cabo Verde

O arquipélago de Cabo Verde, um conjunto de nove ilhas408, foi descoberto por exploradores portugueses no século XV. E desde então foi colonizado, isto é povoado e criastianizado por Portugal. Cabo Verde junto com São Tomé Príncipe serviam de entreposto para o tráfico negreiro. Em 2004, 93% da população era católica numa população de 475.000 habitantes. O fundo cultural é formado pelo catolicismo popular, com festas em homenagem a santos protetores, associações nas vilas, bairros e cidades409.

A independência foi tardia, em 1975, e o arquipélago tem um clima árido e um ambiente degradado, herdeiro da economia predatória nacional. O país tem memória coletiva marcada pela calamidade da fome: dozes vezes no século XIX e oito no início do século XX até a independência. A última fome, entre 1940 e 1950, fez mais de trinta mil vítimas sob uma população de cerca de cento e cinquenta mil pessoas410. Depois da independência, o país entrou num gradual processo de desenvolvimento e de democratização. “Em 1975, o PIB passou de $190 por habitante a $ 1938 em 2006, com

407 André MARY, Op. Cit., p. 474. 408 Ilhas de Santiago, São Vicente, Sal, Santo Antão, São Nicolau, Brava, Boa Vista, Fogo e Maio. 409 Claudio FURTADO e Pierre-Joseph LAURENT, Op. Cit., p.114 410 Ibid., p.115. 154

a esperança de vida de 71, 2 anos (FMI, 2006). Juntando indicadores econômicos e o desenvolvimento do capital humano, em janeiro de 2008, o país começou a fazer parte dos Países de Desenvolvimento Médio (PDM)” 411.

Pelo PIB, o setor dos serviços conta aproxidamente com 72% da riqueza nacional, enquanto 17% são atribuídos ao setor da indústria e construção, somente 11% à agricultura e pesca. Uma boa parte da riqueza nacional provém da transferência financeira de imigrantes cabo-verdianos e a ajuda pública ao desenvolvimento representa 24 % do PIB 412. Esse bem-estar não atinge todos os cabo-verdianos. Em 2004, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) estimou a taxa de pobreza em 36,7% e a taxa da pobreza extrema em 19,7% ou seja 56,4% da população (PNUD 2005). Desde então a repartição dos frutos desse crescimento tornou um grande risco para a coesão social e um real desafio político413. Cabo Verde é também marcado pela desigualdade social no mesmo nível que o Brasil. De um lado tem o crescimento econômico, e de outro lado, o aumento das desigualdades sociais.

Com a imigração de homens durante muitos anos, 40% de famílias cabo- verdianas são dirigidas por mulheres. É comum ver mulheres e seus filhos explorando terras alugadas no interior do país. A diáspora cabo-verdiana é maior que a população vivendo no país. Existe a estimativa de que 700.000 cabo-verdianos estejam morando em Portugal, EUA e França414. Os imigrantes impressionam os demais quando vêm passar as férias. Eles têm dinheiro, constrõem com ostentação, organizam grandes festas de batismo, casamentos ou ritos fúnebres, gastando muito. Os jovens desempregados das cidades os tomam como modelo de prosperidade. Alguns jovens formados, não querem trabalho de pião, e esperam cada mês uma transferência de dinheiro do pai ou parente imigrante. Em resumo, Cabo Verde vive um conjunto de fatores interligados que conduzem a essa situação, “crescimento econômico, o aumento da taxa de pobreza, o desemprego, a preguiça, o desejo de consumir, a instabilidade familiar, a occorencia

411 Ibid., p.115. 412Ibid., p. 115. 413 Ibid, p. 115. 414 Pierre-Joseph LAURENT, Claudio FURTADO e Charlotte PLAIDEAU, L’Église Universelle du Royaume de Dieu du Cap-Vert. Croissance urbaine, pauvreté et mouvement néo-pentecôtiste, p. 13. Trad. por Adrien Gyato B. 155

da família matricial associada com uma figura ausente do pai, a prostituição doméstica, o alcoolismo e drogas, delinquência e criminalidade” 415.

Na ilha da Praia, além da IURD e Igreja Católica, existem outras denominações critãs e religiões: as Igrejas Independentes Africanas de Gana e de Nigéria, a Igreja Assembleias de Deus, que foi implantada em 1986 pelo pastor cabo-verdiano P. Jorges Fernandes. Já Islã foi introduzido por imigrantes africanos (sobretudo senegaleses); a Igreja Nazarena foi fundada em 1907 por um ex-imigrante cabo-verdiano quando voltou dos EUA. Existe também a Igreja batista Independente, dissidente da Igreja Nazarena; Igreja Adventista do Sétimo Dia (implantada em 1934 por outro imigrante de volta dos EUA), as Testemunhas de Jeová (1957), os Mórmons e o Racionalismo cristão416. É nesse contexto de profundas mudanças e transformações sociais, de pluralismo religioso que a IURD traz a sua oferta religiosa, capaz de satisfazer as necessidades e angústias de muitos cabo-verdianos.

A implantação da IURD em Cabo Verde se deu em 1992 quando o pastor Alexandre, saiu de Portugal para a cidade de Praia. Da cidade de Praia, a IURD se implantou também em Mindelo na Ilha de São Vivente e depois se expandiu para todas as ilhas e atualmente possui 22 templos417. Naquele tempo, o bispo Marcelo Abrantes era responsável da IURD em três países: Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Guiné Bissau. A IURD do Cabo Verde tinha cerca de 40 pastores. Na cidade de Praia, capital do País, a IURD construiu um lugar de culto chamado “Templo Maior”, com a capacidade para 1600 assentos e inaugurou-o em 2003. Esse templo é um edificio luxuoso, com sistema de som, assentos de boa qualidade e ar condicionado, o que dá a imagem de ‘vencedores’ ou de pessoas bem sucedidas que a Igreja quer passar.

A IURD de Cabo-Verde também possui uma emissora de rádio (chamada Rádio Crioula) e uma emissora de televisão. A TV Record transmite telenovelas, programas de entretenimento, testemunhos e depoimentos de fiéis da Igreja. Esses programas encontram uma grande audiência entre os cabo-verdianos. A Rádio Crioula atinge o conjunto das ilhas que formam o País. Essa emissora começou a funcionar em 2004. A rádio convida insistentemente as pessoas a frequentar um dos templos da IURD e

415 Claudio FURTADO e P.J LAURENT, Op. Cit, p. 116. 416 Ibid., p. 121. Segundo The ARDA (2010), 95,05% de cabo-verdianos são cristãos, 2,77% são muçulmanos, 1,13% das RTA, 0,15% de Bahai, 0,89% de agnósticos e 0,01% de outras religiões. Veja Talela 5, p.224-225. 417 Veja a Tabela 3, p.222. 156

exorta-as a parar definitivamente de sofrer (Pare de sofrer!) 418. Os testemunhos levam a uma relação de proximidade, de familiaridade e de vizinhança. Um cabo-verdiano disse “se o meu vizinho recebeu um milagre na vida dele, por que eu não?”. Claudio Furtado e Pierre-Joseph Laurent citam um dos testemunhos que retrata a realidade cabo- verdiana,

o pastor pergunta à pessoa: qual é o seu nome? Onde que mora? O que aconteceu na sua vida, meu amigo? E a pessoa respondeu: tinha três anos quando o meu pai imigrou para os EUA, desde então, nunca deu sinal de vida, nem manda dinheiro para nós. Agora tenho trinta anos. Há dois meses que comecei a frequentar a IURD e agora duas semanas que o meu pai voltou a conversar com a família. O pastor se dirigindo à assembleia: vocês escutaram? É fantástico! Vocês veem a presença de Deus, é um milagre. Aplaudem! E agradecemos a Deus pela graça419. Em cada reunião da Universal, o tema da imigração é abordado. Os fiéis sem notícia dos parentes imigrantes são convidados a trazer as fotos deles, levantar para cima, e o pastor pede a Deus de restabelecer o laço. Muitos testemunhos são feitos sobre a reconstrução milagrosa desses laços familiares. Nesse contexto, a figura do imigrante torna-se modelo 420. A propaganda religiosa está presente nos cultos e na mídia. É possível ouvir e ler os slogans como: “Sai da dependência!”. “Conquiste uma nova vida!”. “Tome atitude!” “Se decida!”.

A figura do pastor é muito comtemplada, existe um certo culto à sua personalidade. O pastor incarna a imagem da pessoa bem sucedida que a Igreja quer passar. Veste-se impecavelmente, de terno e com o sotaque brasileiro. O bispo Marcelo encarnava essa figura de empreendedor dinâmico, chefe de uma empresa religiosa florescente. Rico e sedutor, tudo dá certo para ele. “O marketing da IURD é particularmente especializado, agressivo, dinâmico e eficaz. Se baseia sobre o princípio de ir buscar os adeptos potenciais onde se encontram: nos bairros populares das cidades” 421. Para isso, a Igreja usa a mídia e o trabalho dos obreiros (visita das famílias, cadeias, hospitais, nos bairros convidando as pessoas a ir ao templo). A cúpula da Igreja tem como princípio deixar os novos convertidos em paz, no primeiro momento, não ser

418 P.J LAURENT, C. FURTADO e C. PLAIDEAU, Op. Cit., p.2. 419 C. FURTADO e P.J LAURENT, Op. Cit, p. 119. 420 Ibid., p. 116. 421 Ibid., p. 120. 157

rígida na observância das normas religiosas e morais. Ela se empenha em sempre surpreender os fiéis, mudar, empurrar, convencer e gerar esperança neles.

Outra estratégia adotada pela IURD é o seu discurso, que tem como conteúdo a teologia da prosperidade. Ser adepto da IURD significa sair da vida sofrida, da doença e da dor, da carência material, etc. “A pobreza tornou-se escândalo, escravidão, cujo fiel procura por todos os meios se libertar”422. As noções de desgraça, fracasso e sofrimento estão no coração das representações que os fiéis fazem de sua situação, a IURD consideram-nas como imposturas. “O que os fiéis buscam na IURD é a esperança de ser livre e de encontrar a força para extrair o peso da culpa que a Igreja Católica deixou na consciência” 423. A vitória contra os inimigos é individual. E o inimigo é anônimo e impessoal.

A vitória acontece em dois momentos: no primeiro, o combate é feito contra o inimigo interior identificado e personificado: um mau espírito. Esse combate está ritualizado pelo exorcismo. Simboliza, primeiro a identificação concreta do mal, em seguida, a remissão pela extração da entidade maligna (fatalidade, sofrimento, pobreza) que se hospeda no corpo. O exorcismo é o tratamento espiritual ad hoc “o demônio deve sair do corpo, pois bloqueia o caminho da vitória”. O demônio está identificado, é o outro que persegue a pessoa. Analogicamente, esse outro está assimilado à dúvida que corroe a pessoa, ou ainda, é o seu próprio atentismo diante da situação424. O segundo momento é a definição, isto é, a certeza que deve progressivamente se instalar para que a vitória nasça. Essa certeza se explica de seguinte maneira: “o mal não é o outro que persegue você, mas é você mesmo, é a parte do baixo auto-estima que inibe toda a ação” 425.

Nessa perspectiva, o crente não nasceu para sofrer, sua vida reflete suas próprias atitudes. A vontade de Deus é que o fiel não fique na desgraça e na miséria. Mas tomar posse de si mesmo, se tornar responsável e dono do seu destino, a fim de se emancipar da inveja, ciúme, ira, álcool, drogas, nervosismo, as hesitações, atentismo que invadiu a sua existência. Libertar-se do mal depende unicamente da pessoa, culpado de comprazer-se na resignação. O sentimento de culpa diante do pecado se desloca: você

422 P.J LAURENT, C. FURTADO e C. PLAIDEAU, Op. Cit., p. 5. 423 C. FURTADO e P.J LAURENT, Op. Cit., p. 123. 424 Ibid., p. 124. 425 Ibid., p. 124. 158

não é mais culpado frente a Deus, mas frente a você mesmo426. E para sair dessa situação, “tem um preço a pagar: estar disposto a aceitar a responsabilidade de ser um sócio da obra de Deus” 427. Isto é, tornar-se dizimista e ser fiel as ofertas.

Nas reuniões da IURD, é possível observar duas dinâmicas que perpassam toda cerimônia: dom e demanda, oferta e pedido. Antes do pedido, o pastor já sabe da necessidade do fiel. Ele oferece os bens imateriais (fala, oração, bênção), em troca, os fiéis dão dinheiro. Participando em algumas reuniões no Cabo Verde, Pierre-Joseph Laurent e outros obervaram essa dinâmica:

1. O dom da Igreja para fiéis: difusão de um vídeo que mostra a expansão da Igreja em outros países e os milagres que acontecem. Como demanda da Igreja aos fiéis: o convite para pagar regularmente o dízimo. 2. O dom da Igreja aos fiéis: uma oração especial para os que sofrem de insónia. Em seguida uma demanda da Igreja aos fiéis: o convite para entrar na aliança com Deus ao exemplo de Abraão que sacrificou a metade de seu rebanho. Façam a sua parte. E os obreiros distribuem os envelopes. 3. O dom da Igreja aos fiéis: distribuição de um pano sagrado para a proteção da casa. Em seguida uma demanda da Igreja aos fiéis: dar oferta para o aluguel do salão. 4. O dom da Igreja aos fiéis: oração para restabelecer os laços com parentes de imigrantes, dos quais os fiéis não têm notícia (o pastor convida os fiéis a exibir as fotos de parentes). Em seguida uma demanda aos fiéis: participem de uma corrente, assistindo às reuniões da cura divina às segundas-feiras428.

Aqui, o safrifício é feito para ser religado e reconhecido. Ser religado, é deixar a vida anterior, escolher uma nova vida de acordo com os preceitos da Bílbia. Para chamar a atenção de Deus, o fiel não é convidado a rezar e fazer jejum como acontece na Igreja Assembleias de Deus em Burkina Faso, mas em privação, isto é, dons em dinheiro429. Em Cabo Verde, o sucesso da IURD é tido como uma vitória coletiva e individual. Coletiva, porque os fiéis participam e se identificam com as reuniões e

426 P.J LAURENT, C. FURTADO e C. PLAIDEAU, Op. Cit., p.6. 427 C. FURTADO, C. e P.J LAURENT, Op. Cit., p. 125. 428 P.J LAURENT, C. FURTADO e C. PLAIDEAU, Op. Cit., p. 6. 429 Ibid, p. 7. 159

outras obras que a Igreja realiza diariamente e individual, porque o êxito do fiel ou a melhoria de sua vida faz parte do êxito da Igreja.

O diagnóstico e o remédio aos múltiplos sofrimentos ressentidos por crentes consistem na recuperação da autoestima, evitando culpar outras pessoas ou o governo. A IURD incita os seus membros a apropriar-se da mudança como um fato inelutável da sociedade. Ao invés de resignar-se ou de opor-se, cada um onde estiver, está convidado a redefinir-se, isto é, a adaptar-se às mudanças societais, onde a mudança e a insegurança tornam um componente intrínseco da cultura cabo- verdiana. O crente abandonado à própria sorte está convidado a empreender e lutar, se quiser conquistar o que deseja. A Igreja incita o fiel, único responsável do seu destino, a conquistar um lugar digno nessa nova sociedade. Nesse sentido, desenvolve um discurso liberal que pode ser qualificado de assimilacionista, na medida em que a autoestima - um dos objetivos preconizados pela Igreja - deveria conduzir à felicidade, concebida como um bem acessível a todos e definido como antídoto do sofrimento. Par a IURD do Cabo Verde, além da busca para uma saúde melhor, a felicidade equivale para os fiéis de ter acesso ao consumo430.

Outro fato que os autores sublinham, pois marca a IURD no Cabo Verde é a saída do pastor Marcelo Abrantes da Igreja para fundar a Igreja Mundial dos Milagres (IMM). Esse pastor trabalhou durante 24 anos na IURD. Depois de seu mandato como bispo em Cabo Verde, foi transferido para Portugal onde fazia parte da equipe missionária. Marcelo Abrantes foi para Portugal, mas não gostou da decisão, depois de alguns meses pediu demissão, voltou para Cabo Verde e fundou a Igreja Mundial dos Milagres (IMM). Ele pensou que estava sendo afastado porque era responsável pelo sucesso no crescimento extraordinário da IURD no país. Criticou a IURD de ser mais uma empresa que uma Igreja. A IURD visa os bens materiais e não espirituais. Com essa cisão, Marcelo Abrantes conseguiu arrancar 60 % dos adeptos iurdianos no Arquipélago. Ele administra a nova Igreja junto com os seus dois filhos, e possui a Rádio Cidade para as sua propaganda 431. O fundador se declarou Apóstolo e a sua esposa Vanessa, Bispa 432. Toda programação dessa Igreja é semelhante à IURD: segunda-feira: reunião de Prosperidade; terça-feira: Saúde; quarta-feira: Fortalecimento

430 C. FURTADO e P.J LAURENT, Op. Cit, p. 128. 431 P.J LAURENT, C. FURTADO e C. PLAIDEAU, Op. Cit, p.9-10. 432 Sobre a IMM http://igreja-apostolicamundial.blogspot.com.br/, acesso 26/06/2014. 160

espiritual; quinta-feira: novena da família; sexta-feira: ritual sagrado; sábado: prosperidade do lar e domingo: Espírito Santo.

1.2. A IURD na África de língua francesa

A África subsaariana francesa inclui as antigas colônias francesas da África de Oeste, Central e as ilhas do oceano Índico (Madagascar, Ilha Maurício, Seychelles). Dos 21 países dessas regiões do continente, a IURD está presente em 13, com 107 templos. A maior parte dos templos se encontra em Costa do Marfim (51), Gabão (11), Senegal (11) e Madagascar (11). Por falta de material e informações sobre esses países, será examinada somente a Costa do Marfim. Na África francófona, a IURD se implantou, primeiro na Costa do Marfim pelo bispo Flávio, depois se expandiu para os demais países como Congo Brazzaville, Camarões e Togo433. Segundo Paul Freston, a IURD entrou em Madagascar em 1997. Dois anos depois, tinha 5 templos 434.

Segundo Jean-Pierre Dozon, “a IURD se implantou em Costa do Marfim em 1995” 435. Depois da pesquisa de campo feita pelo autor em 2003, a maior parte de seu clero nesse país era brasileira e alguns eram marfinenses. E a maoir parte dos seus templos estava situada nas principais cidades do Sul. Ela se implanta no contexto de pobreza e de fortes tensões étnico-religiosas436. Depois de um longo regime de Houphouët-Boigny, marcado pela prosperidade econômica, que ficou conhecida como o “milagre marfinês” nos anos 60 e 70. A Costa do Marfim passou por várias situações como o regime autocrático de Houphouët-Boigny (1960-1993), a abertura política de 1990 acompanhada pela degradação sócio-econômica; o golpe de estado de 1999; o conflito étnico e sobre a identidade nacional (entre verdadeiros e falsos marfinenses), a guerra civil de 2002 e por último, em 2010, a guerra resultante das eleições.

A Costa do Marfim teve sua riqueza edificada na agricultura (produção e exportação de cacau) e na diversidade étnica (numerosas populações de origem estrangeira). Mas tudo isso foi destruído pelas sucessivas crises políticas e econômicas da era pós hufuenista. A crise política da Costa do Marfim é semelhante à crise de vários países da África ocidental (como por exemplo, a Nigéria), que tem por motivo

433 André MARY, Op. Cit., p. 464. 434Paul FRESTON, Op. Cit, p. 63. 435 Jean-Pierre DOZON, A Igreja Universal na Costa do Marfim, p. 105. 436 Ibid, p. 109. 161

econômico. A Costa do Marfim está dividida em duas partes, o norte de maioria muçulmana é pobre e sem infraestrutura e o sul de maioria cristã é rico com infraestrutura de base (estradas, escola, hospitais, mercado, etc). Os marfinenses do Norte são marginalizados, a maioria provém de Burkina Faso e são de religião islâmica. Os do sul se consideram mais aptos a dirigir o país. Esse conflito de identidade nacional estava à base da guerra civil que assolou o país.

Jean-Pierre Dozon fala de um aparente sucesso da IURD na Costa do Marfim devido a duas razões, isto é, apesar da realidade do país ser complexa e problemática. A primeira razão é que a Costa do Marfim (como a África do Sul) dispunha de importantes pólos e redes urbanas, lugares de fortes densidade da populacional, com vias de comunicação. É essa infra-estrutura encontrada que permitiu-lhe o crescimento e expansão, e para desenvolver também suas empreitadas para o proselitismo (cruzadas nos bairros, grupos de oração junto a doentes hospitalizados e presos, ações humanitárias por meio da ABC). A segunda razão é que o país vendeu em meados de 1990 a imagem acentuda de um país cosmopolita, onde coexistem populações de origens e “cores” diferentes, com imigrantes dos países vizinhos e de outros países da região437. Ainda segundo o autor, a IURD tem um aparente sucesso na Costa do Marfim, reaproveita da crise socioeconômica do país e atrai mais clientes do que fiéis, “a persistência do marasmo socioeconômico constitui para a IURD tanto um triunfo quanto uma deficiência. Mais precisamente, ela aparece conseguir chamar menos fiéis a seus templos do que atrair numerosos clientes, que experimentam, durante certo tempo, sua oferta pastoral e, após abandoná-la, denunciam sempre o seu caráter venal e sectário” 438.

1.3. A IURD na África de língua inglesa

A IURD está presente em 16 países da África anglófona: “Africa do Sul, Quênia, Zimbabué, Namíbia, Lesoto, Botsuana, Gana, Nigeria, Ruanda, Tanzânia, Zâmbia, Malauí, Serra Leoa, Swazilância e Gâmbia” 439. Ruanda fazia parte da África francesa, mas devido a questões políticas ligadas ao genocídio de 1994, mudou de língua oficial. A IURD inaugurou o seu primeiro templo na África do Sul em 1992, parecendo

437Ibid., p. 106. 438 Ibid., p. 112. 439 http://iurdenderecos.wordpress.com/, acesso 04/07/2014. 162

simplesmente seguir os passos dos migrantes de língua portuguesa”. Um ano depois, abre o primeiro templo anglófono, e o crescimento posterior é impressionante, pois um ano depois já contava com dezesseis templos e, em 1998, com 115. Em janeiro de 2001, o Universal News tinha uma tiragem de 100 mil exemplares, recenseia 181 templos (...). Em 1994, abre no Quênia e Uganda440.

Na Nova África do Sul, a IURD “encontrou um país com níveis de desenvolvimento e de desigualdades semelhantes, dentro do qual ela conseguiu preencher um nicho no campo religioso local, saído do Apartheid e iniciando o processo de sulafricanização” 441. Segundo Paul Freston, a “IURD tem 400 templos na África do Sul” 442, um novo fenômeno pentecostal que não é nem do primeiro mundo, nem de origem africana, ela faz parte da crescente transnacionalização do pentecostalismo no Terceiro Mundo.

A África do Sul é considerada um país acolhedor e aberto ao trabalho missionário. Na maior parte dos países da região (África austral) a IURD tem foco no trabalho social, um meio para ganhar a simpatia da população e de vez em quando se envolve com a política, uma estratégia para se opor a outros grupos religiosos e ganhar confiança dos dirigentes, ter mais espaço e visibilidade443. Se não tiver um envolvimento direto com a política, ela procura ao menos manter boas relações com o governo. Um dos problemas na região é a epidemia de Aids. Mais de 15% da população da África austral está contaminado pelo vírus. Quando moramos em Moçambique, entre 2006-2008, como missionário do Instituto Missões Consolata (uma congregação religiosa da Igreja Católica), visitamos vários albergues e orfanatos, cheios de crianças e jovens órfãos de pai e/ou de mãe que foram vítimados pelo Aids. As irmãs da Caridade (uma congregação da mãe Tereza de Calcuta) tinham orfanatos espalhados na periferia de Maputo tendo esse empenho pastoral.

440 Ari P. ORO, André CORTEN e J.P DOZON, Op. Cit., p. 101. 441 Paul FRESTON, The Universal Church of the Kingdom of God: A Brazilian Church Frinds Success in Southern Africa, p. 33. Trad. por Antoni Leh LESZEK. 442 Ibid, p. 33. 443 Ibid, p. 45. 163

1.3.1. A IURD na África do Sul

A IURD entra na República da África do Sul (RAS) no fim do Apartheid. De acordo com The ARDA, a África do Sul tem 81,99% de cristãos, 7,11% de adeptos das RTA, 5,39% de agnósticos, 2,38% de hindus, 1,72% de muçulmanos, e 1, 41% pertencentes a outras religiões444. O catolicismo e o protestantismo estão em declíno, enquanto que o pentecostalismo e as IIA estão em crescimento. Em 1991, um ano antes da chegada da IURD, a realidade da África do Sul parecia muito com a do Brasil: democracia formal, a sociedade civil atuante e alto índice de criminalidade e violência.

Se a maior parte dos países africanos conquistou a independência entre 1960 e 1975, a África do Sul viveu sob um regime segregacionista e racista (Apartheid) durante todo o século XX. No tempo colonial, e especialmente durante o Apatheid, todas as terras férteis pertenciam à minoria branca, as leis separavam brancos de negros em todos os espaços públicos, seja nos bairros, escolas, Igrejas, transporte público, justiça etc. Sendo que os primeiros tinham o poder, privilégios e empregos, e os segundos eram dicriminados, sem nenhuma assistência pública e eram vítimas da violência. As leis do Apartheid proporcianavam as melhores condições de vida à minoria branca dominante. Nelson Mandela foi libertado em 1994 e durante as primeiras eleições democráticas do país em 1994, foi eleito o primeiro presidente negro da África do Sul, marcando o fim oficial do Apartheid. “Não há dúvida de que o Apartheid econômico se mantém, capaz de provocar profundas perturbações sociais” 445. Na RSA, a população é composta por cerca de 80% de negros e outros 20% são brancos, mestiços e indianos. A RSA é um país de maioria protestante, diferente de outros países onde se implantou a IURD, como por exemplo, Cabo Verde, Angola e Uganda que são de maioria católica.

“O Apartheid reinava nas igrejas pentecostais. Algumas delas podiam até mesmo estar ligadas à extrema direita africâner. As figuras como Nicolas Mbenghu, se fazia respeitar como dirigente negro da Assembleia de Deus ou Frank Chicane, que ousou enfrentar a hierarquia de Igreja, AFM (Apostolic Faith Mission) são exceções” 446. Ainda segundo André Corten, as Igrejas pentecostais tinham uma tendência maior em seguir a linha da muito Africaner NGK (Igreja Holandesa Reformada), que pretendia

444 Veja Tabela 5, p.223-224. 445 André CORTEN, Igreja Universal na África do Sul, p.139. 446 Ibid., p.140. 164

encontrar na Bíblia um fundamento para o Apartheid, em vez de adotar as posições mais progressistas das Igrejas metodista, Anglicana e Católica447. As Igrejas etíopes, Sionistas e Apostólicas, que representam o terço da população sul-africana negra, preservavam a sua autonomia, mantendo uma atitude apolítica diante do Apartheid.

Na década de 1990, depois da Apartheid, a África do Sul precisava de se reconciliar com o seu passado e curar as feridas provocadas pelo regime racista. O discurso da reconciliação na verdade foi o marco do Mgr Desmond Tutu, primeiro arcebispo anglicano negro e nóbel da paz. E as Igrejas Sionistas, Apostólicas e Pentecostais tinham o discurso de cura pelo perdão448. Segundo a IURD, “a solução do Apartheid não pode vir da expropriação das propriedades de brancos, mas na luta espiritual e mudança de mentalidade”449. Em uma viagem na África, o Bispo Edir Macedo disse “Aqui, o povo pensa que o homem negro nasceu e gosta de morrer como um cachorro. Esta é a mentalidade deles. Vamos mudar isso. O africano não pode pensar desse jeito. Ele deve acreditar que nasceu para crescer” 450.

Marcelo Bezerra Crivella, sobrinho do fundador da IURD, ex-cantor religioso e bispo, hoje ministro da pesca no governo brasileiro, foi o pioneiro na implantação da IURD nesse país. Segundo Paul Freston, ele “chegou à África do Sul quando funcionava ainda o apartheid. Abriu igrejas para negros, pregou a igualdade entre todos os seres humanos e levou a palavra de Deus a lugares onde naquele momento, brancos não tinha acesso” 451. O primeiro grupo de missionários iurdianos que foi implantar a Igreja na RAS era composto por missionários de três nacionalidades diferentes: brasileiros, portugueses e apenas um americano chamado David Higginbotham. E a primeira implantação em 1992 aconteceu em meio aos “imigrantes angolanos e moçambicanos” 452.

Em 1993, a IURD abriu templos em Durban, Cape Town, Soweto, atingindo todas as capitais das provínvias sul-africanas e hoje está presente até em pequenas cidades do interior. Sengundo André Corten, em 2001, a IURD tinha 181 templos453. Atualmente,

447 Ibid., p.140. 448 Ibid, p.141. 449 P. FRESTON, Op. Cit., p. 47. 450 Ibid., p. 47. 451 Ibid., p. 48. 452 A. CORTEN, Op. Cit., p.138. 453 Ibid, p. 138. 165

segundo a própria Igreja, ela possui 330 templos. Eventos especiais como cruzadas de evangelização, virada de ano e milhares podem se realizam fora dos templos, normalmente em espaços abertos ou em estádios. Em 1998, foi a vez do estádio de rugby Ellid Park receber uma dessas cruzadas. Em 2004, conseguiu encher seis estádios consecutivamente.

Os negros sul-africanos aderem mais à IURD do que os brancos. Em uma visita feita por Paul Freston à catedral de Cape Town, em 2004, 100% de fiéis eram negros, desses 55% eram mulheres. Não havia brancos, nem mestiços. Durante a reunião, um jovem pastor negro sulafricano pregou em inglês, mas os cânticos eram em xhosa454. Os pastores iurdianos de outras nacionalidades (portugueses, latinos americanos e africanos) imitam a fala do fundador e sonham em conhecer o Brasil, onde surgiu a Igreja.

Com um número maior de pastores sul-africanos, esses são enviados como missionários aos de mais países africanos, a Inglaterra, Jamaica e EUA. A IURD da África do Sul é autônoma e ajuda financieramente outros países africanos. Afirma ter curado várias pessoas portadoras do vírus HIV. No campo social, ela tem uma Escola Dominical Universal School of the Kids of God, para a educação religiosa das crianças; uma Linha de Socorro 24 horas, Stop Suffering Help Centres (Centro de Ajuda Pare de sofrer) que existe desde 1996 para ajudar pessoas necessidadas; um Centro de Treinamento de Adultos, que é uma oportunidade para as pessoas aumentarem a chance de encontrar emprego através de curso de informática. A Igreja distribui o jornal Job Center (Centro de Emprego), um jornal secular que anuncia gratuitamente 4000 vagas de empregos por semana para as pessoas que não têm condições de comprar ou de acessar a internet455.

Relativo à mídia, “a licença para instalar a rádio em KwaZula Natal, lhe foi negada duas vezes. Mas ela tem duas emissoras de rádio: Rádio Cidade e Lotus FM, e aluga horas para seus programas em outras emissoras de rádio e televisão”456. Tem livrarias que exibem obras de evangelistas e teólogos da teologia da prosperidade como Max Lucado, T.L Osborn, Tim LaHaye. A principal obra é a do bispo Marcelo Crivella em

454 P. FRESTON, Op. Cit., p. 50. 455 Ibid., p. 51. 456 Ibid, p. 51. 166

1999, tendo o título, “Mutis, Sangomas and Nyangas: Tradition ou Witchraft?” 457 (Mutis, Sangomas e Nyangas: Tradição ou bruxaria?). Como Edir Macedo atacou as religiões afro-brasileiras em seu livro, Orixás, caboclos e guias: Deus ou Demônios? (1997), Marcelo Crivella também faz o mesmo atacando as Religiões Tradicionais sul- africanas. Coloca as RTA da África do Sul na lista de religiões de mentira. Outras religiões de mentira são Hinduísmo, Espiritismo Kardecista, Catolicismo, as Igrejas Sionistas. O elemento comum que as caracteriza é a incorporação dos espíritos.

Sendo que os africanos são pessoas muito supersticiosas e de fortes laços com as famílias, os espíritos (...) que se apresentam como (...) ancestrais. Esta é a maior mentira da África. Fotos de práticas religiosas não cristãs, africanas e estrangeiras permeiam o livro para enfatizar o chocante e o sujo, com trajes pretos sobre os olhos dos participantes, como se eles fossem criminosos que não podiam ser identificados458. Canções, comida, roupas africanas e respeito pelos anciões são (...) tradições belas que precisam ser respeitadas. Mas não as coisas como adorar o rabo de um animal, sacrificar crianças aos ídolos (...) orar em sepulturas459. Segundo o Ministério da Saúde sul-africano, 70% da população consultam os Sangonas, a medicina tradicional. É comum ouvir os pastores na África do Sul dizendo: “Deus vai tirar Tokoloshe dentro de vocês” (Yisha Sathane, yisha tokoloshe). Atacar e demonizar as práticas de Sangona é uma estratégia que a IURD faz para conseguir atrair as pessoas. Como a IURD atacava e demonizava a cultura local, os pastores sul- africanos de outras denominações religiosas se reuniram sob o Conselho Sul Africano de Igrejas e a Aliança Evangelical da África do Sul para denunciar a IURD e processá- la. Eles integraram a Comissão dos Direitos Humanos para a investigação.

Em 2000, denunciaram a IURD por crimes severos, como atrair as pessoas desequilibradas, praticar cultos satânicos e sacrifícios de crianças (ossos das vítimas foram moídos para fazer “sal” distribuído durante os cultos e os rins foram levados para o Brasil a fim de servir de transplante para o filho de um pastor), contrabando de drogas e racismo (dentro da Igreja, os pastores negros são discriminados, recebem um salário menor que seus colegas brancos) 460.

457 Ibid, p. 51. 458 Ibid., p. 52. 459 Ibid., p. 52. 460 Ibid., p.53. 167

A IURD da África do Sul é diferente de outras Igrejas neopentecostais. Se essas reúnem mais as pessoas da classe média e caracterizam-se por um gerenciamento da emoção, assegurado pela beleza da música e dos cultos. A IURD se diferencia com a sua composição social, mais popular, reúne pessoas de diferente classa social. Há também a questão da mobilidade social461.

A Igreja Universal é capaz de oferecer às populações frustradas a melhora tão esperada das condições de vida, um canal fantasmagórico de espera. O espírito de desafio e de risco, ensinado pela universal, reforça a confiança em si mesmo. Garante ser possível sair da condição de assistência, que a Igreja Universal assegura paralelamente por meio de suas obras, para atrair novos recrutas462. Segundo André Corten, a IURD adere ao discurso do renascemineto africano, feito pelo governo sul-africano. Esse renascimento é econômico463. Não significa governar de maneira diferente (africanização) e adotar uma atitude anticapitalista. Trata-se de um projeto de modernização, capaz de marcar o lugar da África do Sul na economia regional, continental e mundial. A África do Sul, além de fazer parte de BRICs, tem um papel fundamental no NEPAD (The New Partnership for Africa’s Developpment), plano de parceria entre a África e os países industrializados, co- patrocinado pela Argélia, Nigéria e Senegal464.

Através da Associação Beneficiente Cristã (ABC), a IURD luta contra a miséria na África do Sul:

Sua obra de beneficência – o Help Center (ABC) – tem como alvo categorias para as quais a Igreja indica o caminho de saída da dependência assistencial. O adepto da Universal é aquele que conseguiu livrar-se do ciclo infernal da miséria. Para a Universal, infernal não é apenas uma metáfora. É Satã que mantém a miséria; é necessário expulsar os demônios da miséria e da doença para poder gozar da prosperidade465. Paul Freston traz uma questão importante, “no pós-apartheid, momento em que as Igrejas históricas protestantes estão querendo apagar o seu passado que compactou com o regime, será que a IURD, autêncica representante do caldeirão brasileiro de

461 A. CORTEN, Op. Cit., p. 143. 462 Ibid., p.143. 463 Ibid., p. 144. 464 Ibid., p. 144. 465 Ibid., p. 144. 168

mistura de raça está em condição de preencher um vazio cultural sulafricano, construindo uma nova identidade?” 466 Como a IURD construirá uma nova identidade enquanto a questão da identidade brasileira está ainda em aberto (racimo e discriminação contra negros e indígenas)? No Brasil, reina ainda o racismo disfarçado. É por isso que a afirmação de Paul Freston é válida: “a IURD fracassou reproduzindo o padrão do racismo brasileiro na África do Sul” 467.

A África do Sul está longe de viver a realidade brasileira, da mistura de raças e casamentos inter-raciais. Segundo a própria Igreja, tanto pastores brancos como negros, são bem aceitos dentro da Igreja e que essa é um espaço neutro. O depoimento de Mario Justino, ex-pastor da IURD no seu livro Nos bastidores do Reino. A vida secreta na Igreja Universal do Reino de Deus (1995), nos mostra justamente o contrário. Há racismo e discriminação de pastores negros brasileiros dentro da Igreja. Resta saber da RSA e de outros países da África Subsaariana. Nota-se que a cúpula IURD na África é formada essencialmente por bispos brasileiros brancos, exceto os bispos responsáveis em Angola e Moçambique que são negros brasileiros.

Já que a IURD é uma Igreja multirracial, isto é, tem pastores brancos, mestiços e negros. A maior parte de seus bispos é branca e brasileira. Seria interessante uma análise antropológica e sociológica sobre a relação entre o clero iurdiano na África: entre brancos (brasileiros, portugueses e outros) e negros (brasileiros e africanos), entre os negros brasileiros e os negros da África de um lado e de outro lado a impressão que os fiéis tem do clero branco. Porque no imaginário africano, que é infelizmente a herança da colonização, as pessoas brancas estão sempre ligadas à riqueza, ao poder. Segundo Paul Freston, os negros sulafricanos têm uma boa impressão do clero branco brasileiro. Eles falam que os brancos brasileiros não são brancos, mas negros. Isto é, são diferentes de brancos sul-africanos e de outros brancos (europeus e estadunidenses). Eles têm a facilidade de se adaptarem à cultura africana e lidam de maneira diferente com os negros468. Em alguns vídeos que assistimos na internet sobre a IURD em Costa do Marfim, vimos o bispo Flávio, ex-líder iurdiano na Costa do Marfim abraçar marfineses, rir e impor as mãos sobre eles. O que mostra uma relação de proximidade e de adaptação com os nativos. As Igrejas Indepndentes sul-africanas (Sionistas e

466 P. FRESTON, Op. Cit., p.54. 467 Ibid, p.55. 468 P. FRESTON, Op. Cit., p. 55. 169

Etíopes) são os maiores rivais da IURD no país. Elas também pretendem resolver todos os problemas das pessoas: financeiro469, desemprego, sentimental, doença, depressão, vícios, insónia, dores de cabeça, homossexualidade, inveja, azar, bruxaria e todo tipo de maldição470.

1.3.2. A IURD na África austral

Além da África do Sul, Angola e Moçambique, a IURD está presente em todos os países da África Austral. Ela se implantou em Zimbabue em 1995, onde em 1998, possuía 4 templos. Chegando a 18 templos em 2003, isto é, depois de anos de luta e perseguições, atualmente possui 22 templos, incluindo a catedral de Harare, que é uma antiga discoteca reformada. De 1994 a 1999, ela se implantou ao restante dos países: Malaui (1994), Lesoto (1994), Botsuana (1998)471. A IURD está também presente em Suazilândia e em Namíbia. Na Suazilândia, ela foi acusada de bruxaria, o que atrasou o seu crescimento, até 2004, tinha somente dois templos. Em Malaui, chegou em 1994, quatro anos depois, tinha 7 templos, e atualmente tem somente 6. Não se sabe o motivo dessa diminuição.

A presença da IURD na Zâmbia é um caso singular. Entrou nesse país em 1995 por Lusaka, rapidamente se espalhou em outras cidades como Chililabombwe e Livingstone. Segundo Paul Freston, um ministro da casa civil do governo da era Kaunda, aderiu à Igreja472. Um fato que começou a dar-lhe visibilidade. Apesar de um servidor público de alto escalão aderir à IURD, em 1998, foi proibida de funcionar por dois motivos. Primeiro, porque “não era reconhecida legalmente pelo governo. Em segundo lugar, foi acusada de satanismo” 473. Alguns membros da Igreja que foram entrevistados afirmaram que as doações de sangue que faziam serviam para rituais satânicos para os pastores. Por esse motivo, o governo fechou os templos iurdianos e os pastores e bispos foram expulsos do país.

O presidente da Aliança Batista Mundial da Zâmbia, um pastor brasileiro, protestou contra a decisão, mas as Igrejas Evangélicas da Zâmbia, junto com o Bispo John Mambo da Church of God aprovaram, dizendo que apesar da lei do registro das Igrejas

470 Ibid, p. 43. 471 Ibid, p. 61-62. Para informação sobre o crescimento, veja a Tabela 3, p. 222. 472 Ibid, p. 61. 473 Ibid., p. 61. 170

promulgada ser rígida, os grupos que fazem parte da Federação Evangélica da Zâmbia são convidados a respeitá-la. A cúpula da Igreja interveio junto ao governo e quatro meses depois, suas atividades foram restauradas. Em 2003, pretendia alugar três locais com capacidade para 500 membros. Com doações vindas de outros países, conseguiu construir a Catedral da Fé em Lusaka, com capacidade para 1500 lugares. A mensagem de propaganda do templo foi “quem diz se você é pobre não pode prosperar?” 474.

A Namíbia fazia parte da África do Sul durante o Apartheid, mas com sua independência em 1990, se separou para se tornar um país independendente. O país é multirracial, composto por negros (cerca de 84%), brancos, mestiços e chineses (16%). O país tem 2 milhões de habitantes, a grande parte vive na miséria, 15% estão infectados pelo vírus HIV. A IURD foi implantada em 1999 e em 2014, possui 21 templos475. Em um evento organizado no estádio Sam Numoja, em Vinduque, o bispo Marcelo disse “Se você perder o emprego, então abre o teu próprio, se o esposo te deixou, então acredite que Deus tem alguém melhor para você” 476. O que mostra que a IURD acredita na recuperação do ser humanao, na restauração de sua vida sentimental e financeira.

Botsuana tem uma população de 2 milhões de pessoas, das quais 30% vivem abaixo da linha da pobreza e 25% estão contaminados pelo vírus HIV. É o mais alto índice de infecção do vírus de HIV na África austral. A IURD se implantou em 1999 e atualmente, tem 15 templos. A IURD luta contra a pobreza, promove saúde e educação, combate a exploração sexual e o suicídio. A Igreja tem um programa chamado “Back to School”, que incentiva os estudantes a se formarem, se prevenirem contra o vírus HIV e a não se envolver com as drogas e a criminalidade477.

474 Ibid, p.61. 475 Folha Universal, Ano 21, nº1146, 23 de março de 2014, p. B12. Mas segundo a nossa pesquisa, encontramos 23 templos (Veja Tabela 3, p. 220). 476 Ibid, p. B.12. 477 Folha Universal, 06 de julho de 2014, p. B12. Esse número da Folha Universal avança o de 15 templos e a implantação em 1998, enquanto Paul Freston, por sua vez, fala de 1999. E segundo a nossa pesquisa, a IURD tem 11 templos. Veja Tabela 3, p.222. 171

1.4. A IURD em outros países anglófonos

1.4.1. A IURD no Quênia

Diante da pluralidade e da exuberância das formas de pentecostalismo, a IURD tem um desenvolvimento lento e fraco478. Atualmente ela tem somente quatro templos. A IURD foi implantada no Quênia por um pastor português de origem russa, Vlademir, em 1999. Esse, apesar de ser pastor, tinha pouco conhecimento histórico e político do país. De Nairobi a IURD outras cidades do país como Mombaça. Implantou-se também nos países vizinhos do Quênia: Uganda e Tanzânia (na ilha de Zânzibar) 479. A reunião se fazia em inglês com tradução simultânea para swahili, o que atrapalhava a compreensão dos fiéis. Um novo diabo que a IURD descobriu no Quênia foi o Hinduísmo, a religião dos imigrantes indianos em Nairobi. Esses fugiram do regime ditatorial de Idi Amin Dada de Uganda. Os indianos do Quênia são comerciantes, banqueiros e têm relação muito estreita com a família do ex-presidente Arap Moi. A IURD não tem ligações com a política. Ela possui uma emissora de TV, apesar do controle severo do governo queniano480.

1.4.2. A IURD em Gana

Gana tem uma população de 25 milhões de habitantes e as religiões predominantes são o Cristianismo e o Islã. A IURD entrou nesse país da África ocidental em 1996. Depois de 18 anos, tem somente um templo, assim como na Nigéria. O seu decrescimento em Gana e na Nigéria pode ter como explicação uma forte presença das IIA e do pentecostalismo autóctone. O seu único templo se encontra perto de uma grande feira em Accra, conhecida como Adabraka Marquet, nesse local,

as pessoas vêm de longe em busca de mercadoria, muitos saem de outras cidades e passam dias até semanas no lugar até venderem tudo o que trazem. É lá que, acontece uma evangelização em massa da Universal, que inclui até a instalação de um telão em uma das ruas, onde o movimento de pessoas é intenso. Exibimos filmes cristãos e histórias de

478 Yvan DROZ, A Igreja Universal no Quênia, p. 115. 479 Ibid, p. 117. 480 Ibid, p. 122. 172

transformação de vida. Tudo isso para chamar atenção de quem precisa de ajuda481. A língua constitui um grande desafio que os pastores iurdianos enfrentam sempre. O testemunho do pastor brasileiro que a Folha Universal traz, é um dos exemplos. “Foram seis meses de luta constante para entender as pessoas e se fazer entender. Mas o pastor não desistiu: se qualificou, aprendeu o idioma em caráter emergencial e começou a fazer as reuniões” 482.

1.4.3. A IURD na Gâmbia

Gâmbia é um pequeno país da África ocidental, com 1,8 milhão de pessoas. 90% da população são muçulmanos. Em fevereiro de 2012, o pastor responsável pelo trabalho missionário no país começou o processo a autorização de funcionamento da Igreja. Depois de alguns meses, a Igreja recebeu os membros do Conselho Cristão de Gâmbia (CCG) que vieram verificar a seriedade do trabalho evangelístico e social da IURD. Depois dessa visita, a IURD recebeu a autorização do governo gambiano e começou a funcionar no mês de setembro de 2012 483. Antes desse processo, a Igreja abria as portas às quarta-feiras, sextas-feiras e aos domingos. Agora ela funciona todos os dias da semana com três reuniões por dia: uma de amanhã, outra a tarde e a última à noite. A IURD atende “vítimas da feitiçaria, pessoas com problemas familiares, enfermos, e outros” 484. O que é interessante aqui é que, no processo da legalização do funcionamento de uma denominação cristã no território nacional, o governo consultou e dividiu a responsabilidade com o Conselho das Instituições Cristãs. Este constitui a única presença da Igreja em um país de maioria muçulmana.

481 Folha Universal, Ano 21, nº1146, 23 de março 2014, p. B12. 482 Ibid, p. B12. 483 Folha Universal, Ano 21, nº1070, 7-13 de outubro de 2012, p.1i. 484 Ibid, p.2i. 173

2. Estratégias de implantação e expansão

As estratégias de implantação e expansão da IURD utilizadas na África subsaariana não são muito diferentes das utilizadas em outras partes do mundo, porém ocorre que essas estratégias são adaptadas ao contexto em que a IURD se encontra. A seguir serão analisadas algumas das estratégias utilizadas como: visibilidade social, política da discrição, exorcismo, corrente de libertação, relação com a política485, sincretismo e a relação com outros atores do campo religioso.

2.1. A visibilidade social

Quando a IURD chega num país africano, se instala principalmente na capital e só depois que se expande para o interior do país. No interior do país, ela se instala primeiramente na capital da provínvia ou estado e só depois que se estende para cidades pequenas chegando até às vilas. Essa estratégia se aplica a todas as suas implantações na África subsaariana. Se a IURD começou na cidade do Rio de Janeiro e se expandiu principalmente em cidades, isso mostra que a IURD é uma Igreja ou religião essencialemte urbana.

Na Costa do Marfim, a metade de seus templos da IURD está em Abidjan, outros estão em Bouaké e San Pedro. No Gabão, as primeiras implantações acontecem em Libreville; em Moçambique, ela se instala em Maputo, Xai-Xai, Inhambane, Beira, Nampula, Chimoio, etc.; em Angola, primeiro em Luanda, depois Benguela, Cabinda, Malange, etc; na África do Sul, primeiro em Joanesburgo, depois Pretória, Cap Town, etc.; na RDC, desde 2006, ela está somente em Kinshasa. Em Kinshasa, o seu templo principal se encontra na Praça Vitória (Rond-point Victoire) que é um antigo restaurante grego que ela está alugando.“Rond-point Victoire” é um lugar de grande circulação das pessoas, é o coração da cidade onde tem mercados, um grande terminal de ônibus e de táxi, lojas, etc.

Como falamos anteriormente, antes dela se instalar num país, estuda-o profundamente; pesquisa quais são os lugares de maior circulação de pessoas e de maior visibilidade. Só depois desse estudo é que decide se implantar. Ela deve ter a certeza

485 André MARY, Le pentecôtisme brésilien en terre africaine. L’universel abstrait du Royaume de Dieu , p. 464-467. Trad. Adrien Gyato B. O que André Mary percebeu na África ocidental, pode ser aplicado no restante dos países do continente. 174

que o negócio que quer iniciar, dará certo e vai render. Em Abidjan, por exemplo, a IURD está presente tanto no centro da cidade, quanto na periferia e nos bairros nobres como Riveira II. “A estratégia de ocupação intempestiva de espaços de grande visibilidade e os gastos elevados por aluguel causaram imediatamente grandes rumores sobre a origem do dinheiro arrecadado pela Igreja ou sobre os procedimentos de “vampirização de fiéis” 486. A IURD é comparada a algumas Igrejas pentecostais de Abidjan que são chamadas “Igrejas de milagres” ou “Igrejas mágicas”, frequentadas especialmente por nigerianos. Esses consideram a IURD como uma igreja de ricaços estrangeiros e uma oportunidade para fazer business 487.

Suas primeiras instalações são alugadas (os antigos cinemas, restaurantes, lojas, prédios abandonados). Escolhe os antigos cinemas onde eram exibidos filmes de terror, de violência, de prostituição, de consumo de drogas, da máfia, portanto lugar diabólico; é uma estratégia de reconquistar passso a passo o reino do Diabo a fim de assegurar a vitória de Cristo. Longe de questões financeiras, a ocupação de tais lugares é simbólica.

Essa visibilidade é perceptível também no uso da mídia (folhetos, jornais, rádio, TV e internet). O investimento na mídia é a chave do sucesso da IURD. Através da mídia a IURD se faz conhecer, expande a sua mensagem e atrai pessoas de dentro da sociedade. Esse investimento encontrou resistência ou facilidade dependendo de países. Resistência, nos países como Costa do Marfim (no regime de Laurent Gbagbo) e Gabão (Omar Bongo Ondimba), onde o governo proibia a privatização da televisão por confissões religiosas e facilidade, em país como Uganda, Moçambique, Cabo Verde e Quênia, onde a IURD tem uma emissora de TV e passam regularmente os programas da TV Record Internacional. A TV Record é captada também via satélite em vários países africanos. Os seus programas internacionais (entretenimento, novelas, notícias, programas religiosos) são retransmitidos ao vivo nas emissoras de televisão local.

Em Costa do Marfim, ela faz programas religiosos (testemunhos, depoimento e ensino bíblico) na Rádio Ngoua, na prefeitura de Koumassi, e em um bairro de Abidjan e em Libreville, na Rádio Fréquence 3 488. Apesar do seu insucesso no Quênia, ela possui uma emissora de TV. Na África do Sul, ela tem a Rádio Cidade e Lotus FM.

486 Ibid., p. 465. Vampirização é sinônimo de sanguessuga. A IURD é comparada à sanguessuga. Isto é que suga ou explora os bens materiais dos fiéis. 487 Ibid., p. 465. 488 Ibid, p. 466. 175

Aluga horários em outras emissoras de rádio e TV do país. Segundo André Corten, “apesar do crescimento iurdiano em número de templos, continua a ser considerada uma Igreja estrangeira e é sistematicamente descartada dos canais televisivos (...). A IURD ocupa a faixa de horários na Rádio Ukhosi e na Rádio Cidade, além de possuir sua própria rádio, a Kingdom Rádio” 489. Em Cabo Verde, ela possui a Rádio Crioula e em Moçambique, Rádio TV Miramar tem a cobertura quase nacional. Em Angola, ela possui Rádio LAC (Luanda Antena Comercial), que emite em todo território nacional, tem também a rádio Nzimbu e a TV Iurd online na internet.

A maioria de países tem jornais e revistas próprios. Em Angola, por exemplo, o jornal Folha Universal tem uma tiragem de 40.000 exemplares semanal, revista Plenitude Angola tem uma tiragem de 20.000 exemplares mensal, os livros e os folhetos são regularmente distribuídos nos templos e nos lugares de maior visibilidade. O investimento na mídia é uma estratégia de comunicação para atingir um número maior de pessoas. Na África do Sul, ela tem Universal News, um jornal com mais de 100.000 cópias de tiragem semanal490. Provavelmente em outros países que não temos informação, a IURD alugue horários de rádio e de TV e tenha foco na distribuição de folhetos em lugares de maior visibilidade.

Outra maneira de conseguir visibilidade é através de sua ação social, na Associação de Beneficiente Cristã (ABC) e em várias outras organizações. Ela oferece uma ajuda material a milhares de necessitados (produtos alimentares, de higienes pessoas, doação de sangue nos hospitais, visita nas cadeias e à terceira idade, visitas em orfanatos e albergues, etc.). Doravante, a política de beneficência vai junto com as promessas da libertação.

2.4. A política de discrição

Cada ser humano quer guardar a fama e dignidade, as instituições também fazem o mesmo. Por causa do seu passado recente, marcado pelas traições e acusações, a Igreja aprendeu a não expor a sua vida ao público. Qualquer informação é segredo.

Esta estratégia missionária de visibilidade constrasta com o que pode ser chamado de atitude “sectária” de desconfiança, de reserva e de fechamento que está na base de suas relações

489 A. CORTEN, Op. Cit, p.139. 490 Ibid., p.139. 176

cultivadas com o mundo exterior. O proselitismo de rua e a permanência de acolhida vão junto com a hostilidade de todo pedido de informação ou de sondagens sobre a Igreja vindo de jornalistas, repórters ou pesquisadores. Todo fiel, como pastor, tem como instruções de recusar qualquer troca de informação com um estrangeiro e de encaminhar todo pedido de entrevista ao responsável principal da Igreja 491. O fiel que entrega ou trai a Igreja ao estranho, é comparado a Cam, que viu a nudez de seu pai Noé, e foi amaldiçoado (Gênesis 9,18-29). Toda informação sobre a Igreja é segredo e deve se manter sigilosa.

A “política de rotatividade” praticada pela Igreja não favorece a inculturação (ancoragem local) e uma vida paroquial permanente. Não permite que o pastor se acostume com o ambiente e teça relações duradouras com pessoas, não pode ter vínculo com a cultura local. Alguns fiéis vivem mal esse modelo de Igreja “sem famílias”, “assembleias anônimas” que correspondem ao cotidiano de “Igrejas de brancos”, onde ninguém se conhece, e não se relacionam fora dos templos492. Para exemplificar, “num templo em Abidjan (Marcory), durante três anos, são seis pastores que se sucederam: dois pastores marfineses, um pastor angolano, dois pastores brasileiros e um pastor marfinês de origem burquina” 493. Paul Freston dá outro exemplo de rotatividade, um bispo brasileiro, de 32 anos que, nos últimos anos trabalhava no Quênia, foi pastor em pelo menos 11 templos de diferentes países494.

Junto com a estratégia de manter o segredo sobre a Igreja, há a questão da organização e do exercício do poder. O baixo clero (isto é, os pastores e alguns bispos) é constantemente transferido de uma região para outra, de um país para outro, de um continente para outro, para impedir o surgimento de personalidades carismáticas e o início das articulações para um poder local, uma autonomia local495. A rotatividade ou a destinação precoce e frequente de um religioso nas congregações missionárias católicas por exemplo tem várias razões ou esconde outras realidades: como questão de saúde, de inadaptação à cultura e ao ambiente, problemas pessoais, a degradação da relação com o superior local, ou por ter cometido escândalos (de ordem moral e financeira). Essa rotatividade é normal em algumas circunstâncias, mas se é costume na instituição

491 A. MARY, Op. Cit, p. 467. 492 Ibid., p. 469. 493 Ibid, p. 469. 494 P. FRESTON, Op. Cit, p. 40-41. 495 Ibid., p. 40-41. 177

religiosa, deve ser visto por outra perspectiva ou ser avaliada de outras maneiras. Segundo André Mary, o bispo Flávio, que trabalhava na Costa de Marfim, administrava todos 11 países da África francófona como uma única região, era responsável pela rotatividade intensiva de súditos (pastores) que não tinham autonomia na gestão dos fundos arrecadados.

2.3. O imaginário, rituais e discurso iurdianos

A respeito do imaginério, dos rituais e discursos iurdianos na África, pode-se notar que há uma interligação entre eles. Vejamos por parte:

2.3.1. O imaginário

Antes de analisar o trabalho da IURD na África, é preciso saber a visão que ela tem desse contintente. Se outros missionários brasileiros têm uma imagem positiva do continente africano, este não é o caso dos pastores iurdianos, que em sua grande maioria têm uma imagem negativa. Segundo Paul Freston, a representação do continente africano na mídia iurdiana é irresistivelmente negativa496. A África é um lugar privilegiado onde reinam as forças invisíveis (os espíritos de ancestrais), de superstição, bruxaria e feitiçaria497. A África é o contintente que foi invadido pelo Hinduísmo e pelo Islã, que são considerados forças do Diabo pela IURD. É onde o povo foi enganado por muitos séculos pelas forças malignas, onde a desgraça da bruxaria os transformou em escravos498.

Ainda de acordo com André Mary, “A África permanece no imaginário brasileiro um dos importantes lugares do feitichismo e das forças pagãs, mas pelo movimento pentecostal internacional constitui também uma frente de luta contra o perigo da expansão do Islã (do Norte para o Sul)” 499. No imaginário iurdiano, a África é um lugar de guerras civis e de violência. Isto fica claro quando se analisa as matérias publicadas pela Folha Universal. Em maio de 2012, o jornal publicou uma matéria intitulada “Ritual macabre em Uganda, sacrifício de crianças em atos de magia aterroriza famílias. Há tabela de preços para os corpos”, que foi destaque da semana e

496A. MARY, Op. Cit, p. 464. 497 Ibid., p. 464. 498 Ibid., p. 464. 499 Ibid., p. 464. 178

a matéria foi veiculada várias vezes no programa da TV Record. De acordo com a matéria, em Uganda milhares de crianças desaparecem, algumas são mortas, esquartejadas e tem as partes do corpo vendidas, para serem sacrificadas em rituais de feitiçaria500.

Sabe-se que existe uma rebelião ugandesa, especializada em sequestar crianças, o Exército de Resistência do Senhor (ERS), e tem como líder Joseph Kony que afirma ser possuído pelo Espírito Santo e seguir os Dez Mandamentos da Bíblia. Essa milícia pretende derrubar o governo atual de Uganda, eles caçam e sequestram crianças, sendo que meninos são usados como rebeldes e as meninas como escravas sexuais. O ERS foi expulso de Uganda, atualmente os seus integrantes estão espalhados em pequenos grupos nas selvas entre as fronteiras do Sudão do Sul, RCA e RDC, causando morte e aflições no meio da população. 501.

Outra matéria publicada pela Folha Universal, intitulada “Cadáveres de albinos são comercializados na Tanzânia” 502, mostra a difícil realidade de albinos naquele país. Segundo o relatório da ONU publicado em outubro de 2013, em seis anos, isto é, entre 2007 e 2013, 72 albinos foram assassinados503. Um cadáver de albino custa 75 mil reais. O país tem cerca de 200 mil albinos, o que representa 0,4% da população. Esses são caçados, assassinados, esquartejados e as partes do corpo são vendidas de maneira secreta. “Na Tanzânia, os albinos são vistos com estranheza e alguns habitantes ignorantemente acreditam que eles possuem poderes mágicos. Interessados nesses poderes, bruxos fazem rituais usando as partes dos corpos dessas pessoas em busca da riqueza ou sorte (...). 60% dos tanzanianos simpatizam com a magia” 504. Sengundo a IURD, a pobreza, a miséria e a desigualdade social na África são problemas políticos, isto é, o povo africano foi abandonado à própria sorte por seus dirigentes logo após as independências. A má gestão dos governos africanos causa corrupção, desigualdade e fome no meio da população.

Segundo o ex-bispo Marcelo Crivella, “Deus é família e se a África sofre com AIDS é porque não tem essa noção” 505. “Constituir uma família na África, não é levado a

500 Folha Universal, Ano 20, nº1051, 27 de maio 2012, pp. 12-15. 501 Ibid, p. 15. 502 Folha Universal, Ano 21, nº1124, de 20 a 26 de outubro de 2013, p. 9. 503 Ibid., p.9. 504 Ibid., p. 9. 505 P. FRESTON, Op.Cit., p. 47. 179

sério. Cada mulher tem o valor de doze vacas (dote). Isso reflete no nível do desenvolvimento do continente” 506. Em muitas étnias africanas patrilineares, é o homem que casa a mulher. A família do noivo prepara um conjunto de bens (uma soma de dinheiro, comida, roupas, etc) para dar simbolicamente à família da noiva. Isso significa que os filhos nascidos do casamento pertencerão à família do marido e não da esposa. O dote compensa o sague que a mulher derrama no parto. É também um aval da família da noiva para que essa engravide e tenha muitos filhos. Quem não dá o dote corre o risco da esterilidade. O dote não significa a venda de mulheres, apesar de ser mal interpretado. Claro que têm pessoas que aproveitam da situação para pedir mais bens e dinheiros, sobretudo quando a família da noiva percebe que o noivo é de uma família rica. Nesse caso o dote perde o seu sentido, a mulher vira simplesmente uma mercadoria.

Resumindo, segundo a IURD, a África tem dois problemas: espiritual e econômico. No campo espiritual, o povo africano, em sua grande maioria cultua os espíritos demoníacos. É o reino dos demónios, dos espíritos do mal, bruxaria e da feitiçaria. O africano tem medo da bruxaria porque pode causar a desgraça, doenças e até matar. No campo econômico, a África é um continente subdesenvolvido, onde há desigualdade social, pobreza, miséria, guerras civis, violências e doenças. O vírus do HIV e a malária estão assolando o contintente. A África é também um lugar de oportunidades. Alguns países africanos (Angola e África do Sul) estão a caminho do desenvolvimento, com um crescimento acelerado nos últimos anos. É nessa África, que a IURD tem principalmente a missão de “levar o povo africano à verdade e libertação da opressão espiritual” 507.

2.3.2. O exorcismo

Um dos rituais mais usados pela IURD na África é sem dúvida o ritual do exorscirmo. Sobre esse tema, escreveu André Mary:

As reuniões de exorcismo as sexta-feira são uma das tradições entre tantas outras do ministério da libertação, que constitui na África como no Brasil, um dos pontos mais altos da ação da IURD e do seu sucesso popular. A leitura demonológica do “caos do mundo” veiculada pelos tratados de E. Macedo,se

506 Ibid., p. 47. 507 Ibid., p. 46. 180

inspira tanto na demonologia fundamentalista estadunidense quanto na herança de cultos afro-brasileiros. Ela faz diretamente eco ao imaginário da bruxaria e da possessão que preside à interpretação da desgraça e da doença no contexto africano 508. Umas das prioridades dos pastores neopentecostais, especialistas em bruxaria, foi a redação de Tratados sobre a bruxaria e libertação. “A inculcação da existência confirmada do Diabo e o conhecimento exato de suas práticas são de fato a condição primeira de fé eficaz em solução a todos os problemas” 509. Como foi mencionado acima, o exorcismo não é uma exclusividade da IURD, muitas Igrejas proféticas (IIA), evangélicas e carismáticas o praticam. Algumas delas têm centros de tratamento e libertação, consideradas por estudioso como comunidades terapêuticas tradicionais. “A força do sucesso brasileiro como africano das práticas de libertação da Universal se encontra no jeito que os pastores colocam em cena e dão visibilidade no interior do templo aos espíritos bruxos ou gênios” 510.

Os pastores iurdianos fazem os espíritos de bruxos se manifestarem e dialogam com eles. O pastor ordena ao espírito do demônio que se revele que fale o nome e a razão de sua presença e a pessoa que o mandou e por que o mandou. Depois dessa entrevista, o pastor ora e ordena-o de sair em nome de Jesus. O espírito demoníaco sai da pessoa com gritos, rugidos, queda violenta na terra acompanhada por gestos estranhos. Se no Brasil a mediação se faz através dos orixas ou caboclos, o panteão afro-brasileiro; na África, são os espíritos dos ancestrais (ou Antepassados), os “maridos místicos”, as “mamy wata” (sereias) são também convocados. Tal consulta oracular e divinatória, praticada em “Nome de Jesus” combina com o dispositivo ritual dos cultos de possessão tradicionais onde a identidade do sujeito possuído se confunde justamente com aquela do gênio ou do deus que o habita e trata-se de nomeá-lo, não só para expulsar, mas afim de melhor domesticá-lo. O público participa fervorosamente da cena e está convidado a se mobilizar com força, gritos e gestos para expulsar os demônios amarrados. Nessa cena, a violência é simbólica, o pastor disse “nessa noite, vai ter guerra! Quem quer me matar, eu o mato, eu o extermino” 511 e a multidão repete freneticamente. A emoção coletiva está analisada por gestos ritualizados: estender as mãos em direção ao possuído, pisar forte no chão, gritar para esmagar os demônios.

508 A. MARY, Op. Cit, p. 470. 509 Ibid., p. 470. 510 Ibid., p. 470. 511 Ibid., p. 471. 181

2.3.3. O discurso da prosperidade

O discurso proferido pela IURD em Angola é encontrado em todos os países onde trabalha a Igreja. A ênfase está na prosperidade material. Um crente iurdiano deve próspero, isto é, sair da miséria, da dependência e da humilhação, para lutar e vencer.

Edir Macedo integrou mais rápido a mensagem das teologias da prosperidade que afirma que um bom cristão não deve ser pobre e é preciso lutar contra o espírito de pobreza. A generalização dessa mensagem, que completa aquela do anúncio da libertação em todo mundo evangélico e pentecostal, cria as condições de uma ruptura cultural decisiva em relação ao espírito de sacrifício inculcado pelo Cristianismo missionário. Acaba com a valorização do espírito da renúncia e de humildade dos fracos que perderam toda agressividade. Torna a dar todo lugar ao prestigio do homem forte que se bate para ganhar, de um empreendedor que consegue pelas próprias forças (ou graça a Jesus), um novo éthos que enfatiza o êxito individual e coloca em perigo as regras tradicionais de solidariedade e as obrigações de retribuição512. O crente iurdiano deve ser “águia”, devorador. Tem que ser agressivo na busca do emprego, na disputa para ter um espaço a fim de montar o próprio negócio. Nessa busca, ele deve sonhar coisas maiores, como uma empresa, fábrica própria, um supermercado e outras. Depois de montar o próprio negócio e começar a desfrutar dele, ele está chamado a fazer sacrifício, isto é, ser fiel no dízimo e nas ofertas. Para ser vitorioso, o crente deve vencer primeiro o medo, ter corragem, estar determinado e ter disciplina, ter convicção no que quer fazer. O crente deve evitar o pecado, o Diabo. A pobreza é vista como diabo. O crente iurdiano é o filho de Abraão, que obedeceu a Deus e foi abençoado tendo uma vida abundante (filhos e netos, e, sobretudo bens materiais). Ele é chamado a imitar o pai da fé.

A teologia da prosperidade pregada pela IURD coloca uma dupla ruptura, contra o catolicismo e a tradição africana. Em relação ao catolicismo, ela é contra o espírito de pobreza, de humildade, do sacrifício e sofrimento a exemplo de Jesus crucificado. Sua mensagem tem como ênfase a prosperidade da pessoa, a saúde, a alegria, a beleza do corpo. Um bom crente é rico e próspero. E em relação à cultura africana, ela é contra a ideia que valoriza o bem comum, a solidariedade, a partilha, o trabalho em conjunto

512 Ibid., p. 474. 182

colocando o ser humano no centro das atenções. Ela prega uma prosperidade individual, o interesse individual, egoísta e hedonista.

2.4. A IURD e a política

A preocupação de inserção na política nacional que se tornou um imperativo no Brasil não é ainda prioridade da IURD na África. No entanto, o clima político etno- nacionalista atual torna suspeita toda empresa religiosa que não respeita (que não lisonjea) as identidades nacionais (marfinesa ou gabonesa) e que se esconde atrás de uma rede internacional dispondo de grandes investimentos513. Se ela não participa diretamente na política partidária, ela apoia e tem relação amigável com partidos que governa os países africanos há décadas (como o MPLA de Angola, FRELIMO de Moçambique e ANC da África do Sul). O que chamou nossa atenção foi a produção e publicação de conteúdos no jornal Folha Universal e na revista Plenitude Angola sobre as atividades do governo angolano: lançamento da pedra fundamental, inauguração de diversas obras (estradas, parques, indústrias, barragem, escolas, moradias, hospitais, etc.), reuniões do governo, congressos, censo, etc. Ela convida membros do governo para a inauguração de seus templos. Divulga as ações do governo, como a Lei que luta contra a violência doméstica em Angola. Ela se declara parceira do governo na luta contra a pobreza extrema, no combate ao vírus de HIV (na África austral, especialmente em Angola e em Moçambique).

Um dos fatores do sucesso da IURD na África do Sul é sua relação com os políticos. Durante a campanha eleitoral de 2014, os bispos oraram e impuseram as mãos sobre o candidato à reeleição, Jacob Zuma. No dia do aniversário desse, convidou o bispo Marcelo Pires para orar sobre ele. Jacob Zuma esteve também presente no dia do lançamento do livro do Nada a perder II, de autoria de Edir Macedo, no estádio Ellis Park, que ficou lotado. O presidente da república agradeceu a IURD pelo trabalho que está fazendo no campo social e espiritual514. Essa relação com o presidente da atual potência econômica continental e com outros membros do governo, além de ser o reconhecimento do trabalho, proporciona confiança e segurança à Igreja em sua pretensão à hegemonia religiosa no nível nacional e talvez regional.

513 Ibid., p. 474-475. 514 Folha Universal , Ano 22, nº 11 de maio 2014, p.B12. 183

2.5. Uma Igreja episcopal

Na África subsaariana, as denominações cristãs têm estratégias de crescimento e de expansão diferentes. O destaque está na IURD que emprestou o modelo administrativo da Igreja Católica, onde o Papa e os bispos concentram todos os poderes religiosos e econômicos. O bispo Edir Macedo, juntamente com a cúpula da Igreja, composta por bispos responsáveis a nível nacional e continental, concentram também todos os poderes. É essa estratégia que se tornou muito eficaz que permite seu sucesso, isto é, seu o crescimento e expansão.

As igrejas evangélicas e pentecostais do Gana e Nigéria como (Church of Pentecost, Quadrangular, Winner’Chapel, Redeemed Church of Christ) e as IIA disputam o mercado de cura e libertação. Os pastores, doutores ou profetas sabem explorar os recursos simbólicos e financeiros que oferecem as redes das Igrejas e denominações internacionais, colocando-os a serviço de empresas transvesais, ministérios, centros ou institutos, que permitem de responder à preocupação de autonomia e da “política do ventre”. A expansão mundial das Igrejas protestantes se apoiou sempre na estratégia de segmentação, conjugando a universalidade e a cissiparidade. O modelo católico da IURD, o seu regime episcopal associado ao controle hierárquico de pastores intermutáveis, a colocam à margem das alianças e das federações do movimento evangélico e desanimam as vocações proféticas dos jovens pastores que desejam fundar sua própria empresa515. A concentração do poder à cúpula mundial da Igreja permite o controle dos membros e o desenvolvimento da política da discrição. Impede o surgimento de líderes carismáticos e proféticos, capazes no futuro, fazer a dissidência. Nesse ponto, a IURD parece à Igreja Pentecostal do Gana, que, através desse modelo administrativo impôs o inglês e o twi como línguas sagradas da Igreja no nível mundial.

2.6. O sincretismo iurdiano

A adaptação da IURD em diversos contextos culturais é uma estratégia muito eficaz para seu crescimento e expansão. Se no Brasil, ela é resultado do empréstimo da organização católica, da visão de mundo das religiões afro-brasileiras, do Espiritismo

515 A. MARY, Op. Cit, p. 475. 184

Kardecista, com a sensibilidade à realidade do mundo moderno à luz da inspiração bíblica; na África, ela incorpora alguns elementos da cultura africana em suas reuniões: o uso das línguas, cantos e danças no ritmo africano, roupas e decoração dos templos. Durante as manifestações e festas ligadas à Igreja, o templo é decorado em cores africanas (onde predomina a mistura de cores vermelho, azul, verde, branco, amarelo e preto), os fiéis se vestem do jeito africano, muitas vezes, as mulheres usam capulanas. Um exemplo típico do sincretismo é a foto do bispo Edir Macedo dançando junto com bispos na cerimônia de inauguração do Cenáculo da Fé em Moçambique em 2011516. O fato de a Igreja pedir aos cabo-verdianos de trazer as fotos de parentes imigrantes para que, a partir da oração e bênção do pastor, o laço seja restabelecido entre esses e as suas famílias, é um exemplo da contextualização de sua mensagem à realidade cabo verdiana.

A matéria publicada na revista Plenitude Angola, sobre a celebração do casamento de um casal chinês (Shang Jing e Liu Juan) pelo bispo Augusto Dias517, chamou nossa atenção. É um verdadeiro exemplo da transnacionalização e de sincretismo religiosos. A transnacionalização da IURD se explica pelo fato de ser uma Igreja neopentecostal brasileira que está no território africano, dirigida por um brasileiro, e esse atendendo a demanda religiosa de um casal também estrangeiro. E o seu sincretismo religioso se realiza na prática religiosa (reunião), respeitando os costumes do casal e negociando alguns de seus componentes. Os componentes da cultura chinesa nesse casamento eram: a cor vermelha que predominou na cerimônia, a data do casamento (sempre ao meio dia ou no dia de aniversário), o corte de cabelo (pentear e trançar cabelos do jeito chinês) e o dote.

Antes do casamento, a noiva se cerca de amigas para bater papo e lembrar-se de suas histórias de vida. O casamento chinês é pago e organizado pelo noivo. A família do noivo prepara e traz os presentes em caixas vermelhas até a casa da noiva. Uma das caixas contém “uang susus”, o dinheiro do leite (dote). A família do noivo compra uma cama nova para a noite de núpcias e cobre-a de lençóis vermelhos. O casal realiza a cerimônia de corte de cabelo (pentear e trançar) que simboliza a entrada na idade adulta. Ambos devem escovar o cabelo quatro vezes: a primeira vez simboliza a união do casal,

516 Folha Universal, de 27/03/ a 02/04 de 2011, p.5i. 517 Plenitude Angola, nº19, de setembro de 2012, p. 36-37. 185

a segunda, a harmonia na vida conjugal; a terceira, a descendência (filhos e netos); e a quarta, um casamento douradouro.

Na manhã da celebração, o noivo é vestido simbolicamente pelo pai e pelos parentes. Ele deve levar o presente em dinheiro embrulhado em tecido vermelho para, dessa vez, oferecer aos amigos da noiva, em retribuição por a ter deixado sair no meio deles e por a ter protegido. A noiva é carregada no colo por suas amigas mais próximas e só vai pisar no solo o local da cerimônia. Os nubentes são conduzidos ao altar, onde irão prestar homenagem ao Céu e Terra antes de começar a reunião da IURD518. A IURD respeitou todos esses costumes e procedimentos, só alterou o horário da cerimônia para 10h00 ao invés de 12h00. Isso mostra sua flexibilidade e diálogo com culturas distintas.

O sincretismo é entendido aqui como contato, encontro entre duas culturas. A adaptação ou a flexibilidade que observamos nessa celebração do matrimônio é consequência desse encontro. O sincretismo é a capacidade de conciliar elementos culturais que para os de fora pareceriam contraditórios e inconciliáveis519. É preciso notar que a IURD empresta alguns elementos de uma cultura para uma finalidade concreta. A adaptação não é simplesmente um dado observável, mas um processo sociocultural supõe compreensão e diálogo.

Um dos aspectos do sincretismo iurdiano é o Judaismo. Em seus discuros e reuniões, pode-se encontrar palavras e ideias ligadas ao Judaismo: a subida ao Monte Sinai, a luta entre Davi e Golias, a travessia do Mar Vermelho, a figura de Abraão, a sua fé; o sacrifício de Isaque, etc; na decoração: Menorá e Manto Sagrado. A construção do Templo de Salomão em São Paulo ao modelo do Antigo Israel é um exemplo típico. Nesse templo, encontram os elementos sagrados de um antigo templo de Israel ou de um templo do judaísmo moderno: Tabernáculo de Moisés, Arca de Aliança, Altar de sacrifícios, Menorá, Mesa de pães da Proposição, o altar do incenso e Mar de bronze520. A Arca de Aliança simboliza o lugar que o profeta Moisés colocou as tábuas dos Dez Mandamentos. O Altar de sacrifícios era usado para sacrificar animais ofertados a Deus. Menorá é o candelabro com sete braços de ouro, cujas chamas eram acesas pelos

518 Plenitude Angola, Op. Cit., p. 37. 519 Para o aprofundamento, Sergio Ferreti. Sincretismo e religião na festa do divino (2007) e Repensando o sincretismo (1995). 520 Folha Universal, Ano 22, nº1155, 25 de maio 2014, pp.18-19. 186

sacerdotes e eram mantidas pelo azeite puro de oliva, servia para iluminar o Templo, símbolo da presença de Deus. Em todas as catedrais da IURD, tem um Menorá. A IURD tem uma forte ligação com o atual Israel. Tanto pastores quanto alguns fiéis organizam peregrinações para visitar os antigos lugares sagrados, trazendo objetos como pedras, areias e água. O que é surpreendente, algumas pedras que serviram à construção do Templo de Salomão de São Paulo, foram trazidas de Israel. Antes da inauguração do Templo, a IURD convidou o embaixador israelense para ver a conclusão das obras. “O Templo de Salomão foi inaugurado no dia 31 de julho de 2014, com a presença das autoridades brasileiras: presidenta Dilma Rusself, o vice-presidente Michel Temer, o ministro da Casa Civil, Aloizo Mercadante, o governador de São Paulo, Geraldo Alckimin, do PSDB e o vice-presidente da câmara Arlindo Chinaglia, do PT” 521. Seria interessante estudar a relação entre a IURD e o judaísmo atual, a origem da necessidade de formar o imaginário de seus fiéis no mundo inteiro voltado a Israel, considerado Terra Santa não somente por seu passado, mas também por seu presente. De vez em quando a liderança iurdiana da África do Sul organiza também peregrinações para Israel.

2.7. A IURD e outros atores religiosos

A relação com outros grupos religiosos é de conflito. A IURD é atacada por outros grupos porque esses consideram que as práticas empregadas por ela não são cristãs ou são menos religiosas, típico de empresas seculares. A IURD dá liberdade de fazer algumas coisas e atende algumas demandas da população que outros grupos religiosos não podem e se ousarem, correm o risco de perder sua legitimidade e credibilidade522. A estratégia de demonização foi globalizada. No Brasil, os seus inimigos são o Catolicismo e as Religiões afro-brasileiras (Candomblé, Umbanda, Tambor de Minas), na África, são as Religiões Tradicionais Africanas, na Inglaterra é o Anglicanismo, na Rússia é a Igreja Ortodoxa, no Japão, as superstições japonesas e na Índia, o politeísmo523. No caso da África, em geral, ela tem como inimigo principal das RTA, mas dependendo dos países, ela tem inimigos específicos. Na África do Sul, ela luta também contra as Igrejas Sionistas e Etíopes; no Quênia, contra o Hinduismo; na África ocidental, contra o Islã.

521 Carta Capital, Ano XX, nº811, 6 de agosto de 2014, p. 28. 522 P. FRESTON, Op. Cit, p.45. 523 Ibid., p.45. 187

Segundo Paul Freston, a demonização não é necessariamente anti-democrática, tal discurso só se torna um perigo à democracia se buscar forçosamente privar as atividades de outra religião ou provocar a violência. Sofreu o ataque de outros grupos religiosos como em Suazilância e Zâmbia. Em 2001, a IURD estava ausente das conferências organizadas na Costa do Marfim no quadro do Fórum das Religiões e da política da reconciliação nacional. O que demostra o seu caráter antiecumênico. Além disso, a IURD não participa de associações e federações de denominações pentecostais e evangélicas no continente.

Um dos inimigos da IURD na África é o Islã e seu ramo mais radical, mais fundamentalista. Com conflitos armados em países africanos, há surgimento e expansão de vários grupos fundamentalistas islâmicos e cristãos. Os países com presença de fundamentalistas islâmicos são Nigéria, Sudão, Somália, Egito, Líbia, RDC e Quênia. O fundamentalismo islâmico é mais conhecido por que é contra a cultura ocidental (Europa e EUA) e resiste ao neocolonialismo do continente. O fundamentalismo cristão ainda não atingiu proporções alarmantes como o islâmico. Portanto existem alguns países africanos que têm já grupos fundamentalistas que se declaram cristãos e são armados (RCA, Uganda). Não entraremos nesse assunto, mas podemos assinalar que atualmente há conflitos político-religiosos entre cristãos e muçulmanos na Nigéria e na RCA, causando destruição e mortes. Na RCA, por exemplo, tem um aspecto étnico. A ADF/Nalu (Forças Democráticas aliadas ao Exército Nacional pela libertação de Uganda) é uma milícia fundamentalista islâmica no leste da RDC que causa morte, crimes contra a humanidade no meio da população do Norte Kivu desde 1995.

A Igreja produz matérias criticando as ações do Boko Haran na Nigéria e condenações feitas pelo Islã no contintente. O Boko Haran é um movimento militaro- político-religioso que luta pela aplicação da charia no norte do país e pela formação de um Estado Islâmico na Nigéria. Comete vários crimes: sequestro das pessoas, assassinato, pilhagem, incêndio das casas, etc. Uma das últimas ações desse grupo que chamou a atenção da imprensa internacional foi o sequestro de 260 estudantes cristãs em abril deste ano. Obrigou-as a se converter ao Islã e afirmou querer vende-las em nome de Deus. Outro caso é de Meriam Ibrahim Ishaq de 27 anos, filha de pai muçulmano e de mãe cristã (católica) no Sudão. Foi condenada porque se converteu ao Cristianismo, corria o risco de ser condenada a morte. Mas depois de muita pressão

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ocidental, ela foi liberada. Segundo a IURD, nos países islâmicos, não há liberdade religiosa e tolerancia, mas há perseguições e assassinatos de cristãos524.

Apesar da estigmatização e diabolização das RTA pela IURD e outras Igrejas neopentecostais, há surgimento e avivamento das RTA (especialmente grupos neotradicionais) em vários países africanos, como Benim, Gabão e RDC. Nesse último país, existe um fortalecimento da Igreja dos negros de Simon Mpandi e do movimento político-religioso Budu Dia Kongo fundado por Ne Muanda Nsemi. Como foi afirmado acima, o sucesso da IURD está na luta contra a bruxaria e na diabolização da cultura africana de um lado, e na recuperação de alguns de seus elementos de outro lado. É a sua ambivalência, o que André Mary chama de “universal abstrato” 525.

Em relação à cultura local, a política de estigmatização e de diabolização das “seitas tradicionalistas” da IURD se choca com o avivamento identitário neotradicionalista e à suas tradições etnonacionalistas (Bwiti do Gabão, Vodu do Benim, etc.). A continuidade de esquemas de interpretação da desgraça e das técnicas do corpo mobilizados nas práticas de libertação em relação às culturas africanas da possessão e aos cultos antibruxaria é uma de suas forças no sucesso continental, mas nesse campo, as Igrejas Independentes Africanas, e mesmo os movimentos carismáticos católicos, seguem outra política de identidade, um trabalho de síntese e de inculturação que tratam com consideração o discurso tradicionalista e confortam as ilusões identitárias526.

524 Folha Universal, Ano 22, nº1161, 06 de julho de 2014, p. 3. 525 Veja André MARY, Le pentecôtisme brésilien en Terre Africaine. L’Universel Abstrait du Royaume de Dieu, 2002. 526 A. MARY, Op. Cit., p. 475. 189

3. Futuro da IURD na África Subsaariana

O Cristianismo dos séculos XX e XXI cresce em países pobres. Uma boa parte da clientela iurdiana é pobre.

Mundialmente falando, a Igreja Universal do Reino de Deus é quase exclusivamente um fenômeno da pobreza cristã. Quando não houver mais cristão pobre ou o pobre não for cristão, então passará mal. Nesse sentido, a sua expansão reflete a nova face global do Cristianismo que é cada vez mais uma religião de pobres no hemisfério Sul 527. Com certeza, o Cristianismo nos últimos anos está crescendo principalmente no hemisfério Sul (América Latina, África e Ásia). A explosão pentecostal se deu também nessa região. O futuro do Cristianismo e das Igrejas pentecostais não está no Norte (Europa e América do Norte), mas no Sul. O catolicismo deu um importante passo elegendo o primeiro Papa fora do continente europeu e do Norte, o argentino Jorge Bergoglio. Agora falta lhe a descentralização do poder. Em seu processo de transnacionalização, a IURD obteve sucesso em Portugal, país do Norte, mas ela está enraizada no Sul (Brasil, África do Sul, Angola e Moçambique). Seu futuro na África está em sua relação com a cultura local. Ela usa simbolicamente vários objetos que podem se relacionar com a cultura africana, mas se opõe aos ritos ancestrais e à poligamia 528.

Na África, a IURD teve sucesso na sua implantação somente em duas regiões. “Em primeiro, na região lusófona, onde a cultura brasileira e a herança linguística junto com o poder da mídia, lhe deram uma vantagem considerável; em segundo, em países africanos onde o nível de vida é alta, em países mais urbanizados e com uma razoável infraestrutura (África do Sul e Costa do Marfim)”529. Sendo uma Igreja essencialmente urbana, uma boa parte de africanos está morando ainda nas cidades do interior e nas vilas, o futuro da IURD dependerá de sua capacidade de adotar estratégias para a expansão nessas regiões e não se limitar somente as cidades.

O pentecostalismo brasileiro tem um papel fundamental no futuro do Cristianismo mundial; em termos étnico, cultural e econômico, é a ponte entre o

527 P. FRESTON, Op. Cit., p. 62. 528 Ibid., p. 62. 529 Ibid., p. 62. 190

primeiro e o terceiro mundo. Será que a cúpula brasileira da IURD permanecerá no controle total durante a sua expansão mundial e sua consolidação? Será que a Igreja permitirá a descentralização do poder para uma autonomia regional? Apesar da padronização da doutrina e das estratégias de expansão e crescimento, o problema da contextualização e indigenização permanecerá. Outra questão que Paul Freston levanta é a da formação da liderança (pastores e bispos). Chegará o tempo para avaliar a atuação da cúpula brasileira sobre o fenômeno cultural. A maior parte dos missionários iurdianos (pastores e bispos) tem pouca formação intelectual e não domina as línguas estrangeiras, o que dificulta o seu enraizamento e sua inculturação530.

Conclusão

A IURD é uma das Igrejas neopentecostais brasileiras presente no continente africano. Ela se coloca no movimento da transnacionalização e da globalização religiosa. Estando presente em 39 países, a IURD é a principal Igreja brasileira presente naquele continente. Entrou no continente em 1992 através de Angola e a sua última implantação foi Chade, em dezembro de 2013 no fechamento dessa pesquisa. Seu crescimento se deu de maneira extraordinária na África do Sul; de maneira relativa em Angola, Costa do Marfim e em Moçambique. Porém teve fracasso e estagnação no Quênia, Nigéria e Gana.

Se a Igreja tem uma imagem negativa da África, como lugar de forças invisíveis, demónios, bruxaria, miséria e várias doenças. Isso não significa que não queira trabalhar nesse continente ou tenha medo de ir lá. Ao contrário, muitos de seus missionários, a exemplo de Marcelo Crivella, depois de terem trabalhado nesse continente, estão com saudade e querem voltar. Atualmente como Ministro da Pesca do governo Brasileiro, o ex-bispo da IURD, Marcelo Crivella foi entrevistado sobre sua vida política, mas respondeu que gostaria de voltar para África. “O que eu sonhava era voltar para África, qualquer que fosse o país” 531.

O sucesso da IURD no continente africano se explica por vários fatores. Primeiro, a IURD foi capaz de adaptar sua mensagem a conjuntura africana. Se de um

530 Ibid, p. 64. 531 Folha Universal, Ano 22, nº1160, De 29 de junho aos 05 de julho de 2014, p. B11. 191

lado, demonizou a cultura africana, de outro lado recuperou alguns de seus aspectos (língua, canto, dança, roupas, decoração, etc.). Em muitos países, ela se contextualizou (a migração em Cabo Verde, a epidemia de HIV na África austral). O segundo fator é a sua urbanidade. A IURD é uma Igreja que tem receitas para todas as categorias de pessoas. Pretende ter resposta para todos os problemas que afligem os seres humanos. Estando essencialmente nas capitais e grandes cidades africanas, a IURD é uma Igreja que atende às necessidades da classe média africana. Os africanos que têm acesso ao mundo do consumo, aos novos meios de comunicação e ao novo estilo de vida (individualista e hedonista) encontram nela uma Igreja que os incentiva a permanecer nessa situação, a ser prósperos e buscar cada vez mais uma felicidade integral (espiritual e material). Muitos africanos escutam pela primeira vez na história, que é possível ser rico e ser cristão ou vice versa. Os excluídos do sistema capitalista neoliberal encontram nela a motivação para lutar e vencer na vida. A não se contentar com a sua situação e se engajar para uma mudança imediatamente.

Dando conselhos às mulheres viúvas, solteiras e vítimas de discriminação na cultura africana, para superar os seus problemas, suas angústias, montar o seu próprio negócio e serem independentes, restituindo-lhes a dignidade, a Igreja Universal do Reino de Deus se revela como uma Igreja libertadora e emancipadora. De outro lado, seu fracasso se dá em países com uma forte presença islâmica, de Igrejas pentecostais africanas e das Igrejas Independentes Africanas. Parece que ela encontra também barreiras culturas (em sociedades e culturas mais fechadas).

É uma Igreja que não critica os governos africanos, mas se acomoda ao sistema político vigente, caracterizado pela ditadura, regionalismo e corrupção. Tece relações de amizade com líderes africanos e se considera como parceiro no processo do desenvolvimento e da libertação espiritual do continente. É essa relação que lhe confere segurança no seu trabalho, acesso aos meios de comunicação e visibilidade social. O seu futuro está no dialogo com a cultura africana e na sua nacionalização (poder, economia e administração). Sem um diálogo autêntico e a descentralização do poder, ela vai engrossar a lista das denominações cristãs que faliram à sua missão, e têm como mérito a alienação do povo africano e a perpetuação colonização espiritual.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Falar de religião é falar de cultura, da vida de um povo, do que ele tem de mais profundo, do que o motiva para viver diante dos desafios da existência, isto é, o que dá sentido à sua existência. A religião é ao mesmo tempo um fenômeno humano e social. Ela existe desde que o ser humano existe. Não se pode encontrar a religião fora da vida e da comunidade humana. Ela é uma invenção humana. A religião é a tentativa do ser humano organizar a sua vida, já que essa está marcada pela desordem, desarmonia, conflitos, incertezas, medos, dúvidas e morte.

Todo povo tem religião. Toda cultura tem uma religião. Algumas sociedades humanas foram crescendo até produzir religiões ditas universais, isto é, que não se referem somente ao próprio grupo, mas que contemplam também outros grupos. A religião é um processo social que vai da etnia para a interretnia, de um grupo fechado para grupos cada vez mais abertos e mais amplos. Todas as religiões universais surgiram na Ásia: Budismo, Hinduísmo, Judaísmo, Cristianismo e Islã. Essas religiões marcaram profundamente a história da humanidade. O Cristianismo e o Islã desempenharam um papel fundamental na história da humanidade nos últimos séculos.

O primeiro capítulo tratou do Cristianismo na África antiga, não de toda antiguidade africana, mas daquela desde que surgiu o Cristianismo (século I ao século XIX da Era Cristã). O Cristianismo surgiu na Palestina, no Oriente Médio, há vinte e um séculos, da pregação de Jesus de Nazaré sobre o Reino de Deus, marcado pela justiça, pela misericórdia, pelo amor e pela verdade, segundo os Evangelhos. Sua pregação era uma crítica ao Judaísmo, e por isso foi preso, julgado, condenado e assassinado. Apesar de sua ausência física, os seus discípulos deram continuidade à mensagem. Nos primeiros anos, essa nova religião circulou somente na Palestina e nos povoados vizinhos. Quatro elementos foram decisivos para a expansão do movimento de Jesus fora da Palestina: o mandato missionário (Mateus 28,16-20), a missão de Paulo entre os gentios, a força do Espírito Santo que tiveram no Pentecostes e a destruição do Templo de Jerusalém em 70, pelo imperador romano Tito. Com a destruição completa do Templo, muitos judeus e os seguidores de Jesus fugiram da Palestina e se espalharam primeiro pelo Oriente Médio e depois nas regiões mais distantes.

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A história do Cristianismo está intimamente ligada à África. Maria e José fugiram com o menino Jesus para o Egito temendo a ordem dada por Herodes de matar todos os meninos de zero a dois anos de idade em toda Judeia (Mateus 2,13-23). Não tem documentos falando da expansão do movimento de Jesus na África do Norte ou de como se deu a formação das primeiras comunidades cristãs no primeiro século da Era Cristã. Se confiar em informações de Lucas nos Atos dos Apóstolos (2,1-13; 8,26-40), provavelmente foram alguns egípcios, líbios, habitantes da Cirene, presentes durante o Pentecostes e o eunuco etíope batizado por Filipe, que depois de voltarem em suas cidades, implantaram esse movimento.

As comunidades cristãs cresceram rapidamente naquelas regiões a ponto de formarem paróquias, dioceses e patriarcados. O patriarcado de Alexandria (Egito) era um dos cinco patriarcados mais importantes do Cristianismo primitivo. Entre os séculos II e IV o Cristianismo foi marcado pelo surgimento das heresias, o combate contra elas, a formação dos primeiros dogmas, a perseguição dos cristãos pelo Imperador romano e o surgimento da vida monástica com Santo Antão do Egito. A Escola Catequética de Alexandria foi o grande centro de produção do pensamento cristão na época. Foi nessa escola que começou o processo de colocar em diálogo o Cristianismo e o Neoplatonismo. O seu maior representante foi Orígenes. As figuras mais importantes do Cristianismo naquela época foram Tertuliano de Cartago e o bispo Agostino de Hipona, que tiveram o mérito de escrever os primeiros tratados sobre a teologia cristã. Com o advento do Islã no século VII d.C, o Cristianismo desapareceu totalmente naquela região, subsistindo na Núbia, Etiópia e Egito. A subsitência do Cristianismo na Núbia (entre os séculos VII e XIV) se deu a partir do acordo de “baqt” entre o rei núbio e o sultão do Egito. Ainda hoje podem-se encontrar Igrejas Coptas e Ortodoxas monofisitas na Etiópia e Egito.

A segunda implantação do Cristianismo se deu no século XV, na ocasião das viagens dos exploradores portugueses nas costas do continente, em busca de especiarias na Índia e em meio ao tráfico negreiro, que durou quatro séculos (século XV ao século XIX). O exemplo deste Cristianismo é aquele que se desenvolveu no reino Kongo, na África central, entre os séculos XVI e XVII. Desde a sua chegada, os missionários portugueses conseguiram converte o rei do Kongo e toda a corte, o que possibilitou a conversão dos demais.

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O Crisitanismo se implanta de fato na África a partir sua partilha e colonização no século XIX, o que constitui a terceira implantação. Os colonizadores europeus vieram à África junto com os missionários católicos e protestantes. O modelo do Cristianismo trazido naquela época era uma religião do dominador e opressor, que foi imposta aos africanos. Os missionários catequizaram os africanos ensinando-lhes a obediência à autoridade colonial, abandono dos costumes locais e adoção dos costumes ocidentais. Não se pode negar a contribuição dos missionários europeus na alfabetização dos africanos, na implantação dos primeiros hospitais, na introdução de novos produtos para agricultura (cacau, café, algodão e cana-de-açúcar). A cristianização da África caminhanou juntamente com a europenização e vice versa. Como essa religião estava ligada aos costumes europeus e à opressão, logo era preciso uma religião que favorecesse a paz e a liberdade e que se identificasse com a cultura africana e fosse adequada a ela, é nesse contexto que surgiram as Igrejas Independentes Africanas (IIA) em todo continente onde havia Igrejas missionárias. As IIA estiveram na base do surgimento do nacionalismo, que mais tarde se desenvolveu para derrubar o colonialismo. As IIA foram prioneiras a começar a africanização do Cristianismo. Têm por mérito de resitir e combater a colonização (no campo religioso e ideológico) e de valorizar a raça negra. As principais IIA são: a Igreja Harrista, Igreja do Cristianismo Celeste, Igreja Kimbanguista, Igrejas Sionistas, Igrejas Etíopes (África do Sul) e Igrejas Aladura (Nigéria).

A quarta implantação do Cristianismo se deu a partir da entrada dos missionários pentecostais estadunidenses e europeus no início do século XX. Depois da pregação desses missionários e da implantação de suas Igrejas, sugiram várias Igrejas pentecostais fundadas por africanos e estrangeiros. Há Igrejas pentecostais nacionais e Igrejas pentecostais com influência regional e internacional. As principais Igrejas pentecostais africanas são: Assembleias de Deus, Church of Pentecost de Gana e as Igrejas Sionistas sul-africanas de influência pentecostal. O fato do pentecostalismo clássico se implantar na África no início do século XX ao mesmo tempo em que surgem as IIA, cria confusão na classificação dos autores.

É preciso observar que existem as IIA com características similares ao pentecostalismo, mas seus fundadores não tiveram contato com o movimento pentecostal (Igreja Harrista e Igreja Kimbanguista). Há autores (como Walter Hollenweger, 1976, p.167; Ludovic Lado, 2008, p.63; André Corten e André Mary,

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2000, p.14) que afirmam que são pentecostais ou têm influência pentecostal. Essas características similares são o batismo do Espírito Santo e os dons do Espírito Santo: glossolalia, exorcismo e profecia. O pentecostalismo se caracteriza também pela emoção e espontaneidade. Ele teve sucesso na África como as IIA, porque os africanos se identificaram com suas práticas: emoção, espontaneidade, canto, dança e exorcismo. Um dos aspectos do mundo africano é a existência de espíritos do mal, dos bruxos. Uma religião que reconhece esse fato e tem uma prática direcionada à expulsão desses espíritos, à cura de doenças causadas por eles e à consolação das mortes causadas por eles, certamente encontrará a adesão maciça de africanos.

Em nossa opinião, o movimento pentecostal tem sua origem da necessidade de uma reforma e renovação dentro do Cristianismo entre o final do século XIX e o início do século XX. Portanto, esse desejo de reforma era sentido no meio de diferentes povos. É por isso que podemos afirmar que o pentecostalismo nasceu consecutivamente nos EUA, na Europa, na América Latina e na África. É nesse sentido que podemos perceber algumas características do pentecostalismo nas IIA. Além do desejo da reforma, os africanos queriam um Cristianismo que tivesse a cara da cultura africana e uma religião que os libertasse da opressão e humilhação coloniais. O que é comum entre o pentecostalismo clássico e as IIA é que surgiram a partir da ruptura com as Igrejas protestantes apesar de estarem em contextos culturais diferentes.

Além do pentecostalismo da cura divina, do movimento da renovação carismática, o último movimento cristão que se implantou na África é o neopentecostalismo, que surgiu especialmente nos EUA e de lá, se expandiu para o mundo. Se o neopentecostalismo entrou já na África do Sul, em 1979, ele se implantará na maior parte dos países somente entre o final da década de 1980 e início de 1990. O neopentecostalismo é caracterizado pela pregação da teologia da prosperidade, entrada na política partidária, uso da mídia e adaptação à sociedade de consumo. Aqui está a ruptura radical com o Cristianismo, especialmente com o catolicismo. Doravante, o cristão não será mais uma pessoa pobre, humilde, sofrido, coitado e que tem como referência o Cristo crucificado e morto, mas uma pessoa rica, poderosa e ambiciosa que sonha com coisas maiores, que gosta do seu corpo e cuida dele, que não está à espera do paraíso e da felicidade depois da morte, mas que os quer aqui e agora. É nessa ótica que surge a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) no Brasil. Essa cresce rapidamente no país e se expande para o mundo chegando à África em 1991, sua primeira

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implantação foi Angola e hoje está presente em 39 países. A IURD é a principal Igreja pentecostal brasileira no continente africano faz parte do fenômeno da transnacionalização religiosa.

A pesquisa tinha como hipótese que a IURD está crescendo e tem sucesso na África porque se adaptou à cultura africana. A IURD não tem o mesmo sucesso em 39 países onde está presente. Tem sucesso em alguns países (África do Sul, Angola, Moçambique, Cabo Verde e Costa do Marfim) e em outros não (Quênia, Nigéria e Gana). Certamente, a IURD tem um meio poderoso que é o “sincretismo”, que lhe permite se adaptar a distintas culturas. Na África, ela se adapta em dois aspectos. Primeiro, ela demoniza a cultura africana em seu conjunto. Nesse sentido, não somente condena a bruxaria e o feiticismo que constituem o mal para os próprios africanos, mas condena também as Religiões Tradicionais Africanas (RTA), que são o motor da existência dos africanos. Já em um segundo momento, ela recupera e seleciona alguns elementos da cultura africana (as línguas, o canto, a dança, as cores, etc.). Ela faz tudo isso em vários momentos de suas reuniões, mas especialmente no exorcismo. A adaptação iurdiana é contextual, isto é, não se adapta somente na cultura, como tradição de um povo, mas se adapta à atualidade, na realidade dos africanos (a questão da imigração no Cabo-Verde, a miséria em todo continente e a epidemia do vírus de HIV na África austral). Para cada situação, direciona práticas religiosas específicas (oração, bênção, aconselhamento e assistência social). Em nossa opinião, essa seleção que a IURD faz, se realiza ainda no nível litúrgico e estético, ela precisa ir mais longe para atingir a visão de mundo do africano e dialogar com ela. Fazendo assim, ela se tornará uma Igreja africana.

Existem vários fatores que permitem seu crescimento e expansão em muitas cidades africanas:

 A visibilidade geográfica midiática e assistencial, pois a IURD instala seus templos nas cidades em lugares de grande visibilidade (praça, na avenidade principal, perto de terminais e mercados, posto de gasolina, etc.). Além da visibilidade geográfica, há visibilidade midiática. Isto se dá através da publicação de diversas matérias (especialmente a propaganda do seu proselitismo) e convite nos folhetos, jornais, revistas, rádio e televisão e internet. E, por último, a visibilidade nas obras sociais: através da ajuda material aos

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necessitados, visita a hospitais (doação de sangue), as cadeias e as pessoas da terceira idade. Tudo o que ela faz é fotografado e filmado para ser utilizado em sua própria propaganda e marketing. Divulgam-se as vitórias e conquistas da Igreja (especialmente sua expansão mundial) durante as reuniões e na mídia, mas seus fracassos e escândalos são mantidos em segredo. Qualquer outra informação sobre a Igreja é sigilosa.  As suas práticas rituais são o exorcismo (cura e libertação) e o discurso sobre a prosperidade tanto material quanto espiritual. No exorcismo, a IURD expulsa demônios (doença física, psíquica e espiritual). Na África austral, a Igreja afirma ter curado pessoas com o vírus de HIV. Seria possível uma comprovação empírica de tais afirmações. A pobreza é considerada de demônio. A IURD insiste sobre a prosperidade material, isto é, o crente deve mudar de vida, sair da pobreza, da miséria e das humilhações para uma vida rica e digna. A classe média urbana africana, que é uma minoria, se identificou com esse discurso e os africanos em situação de pobreza e miséria, doenças e sofrendo humilhações, encontraram nela um motivo para lutar e sair dessa situação, de superar suas dificuldades. O discurso que liga a bênção divina com a prosperidade material é uma grande novidade para os africanos.  Não se percebe o envolvimento da IURD na política partidária na África, mas sim um relacionamento de amizade e de parceria com governos e políticos africanos. A IURD se declara colaboradora e parceira dos governos africanos no processo de desenvolvimento econômico (luta contra a pobreza extrema). Essa amizade lhe dá segurança em seu trabalho e visibilidade social. Em nossa opinião a IURD participará efetivamente no desenvolvimento econômico não somente por assistência social, mas especialmente na vontade de apoiar o processo da democratização do continente, promovendo a justiça social e a cultura de paz e reconciliação, na constituição de um Estado de direito, lutando contra a corrupção, a ditadura e o regionalismo, que são males intimamente ligados à política africana. Só assim que ela se colocará nas sendas da libertação dos africanos e do desenvolvimento autêntico e integral.

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219

ANEXOS

Tabela 1: Igrejas Independentes Africanas

País Nome Fundador Ano África do Sul Igreja de Cristo - - pela União dos Bantos e Proteção dos costumes bantos África do Sul Igreja Tembu Nehemiah Tile 1884 África do Sul Igreja Etiópica Mangena M. 1892 Mokone Benim Cristianismo Joseph Oschoffa 1947 Celeste Costa do Marfim Apostolowa Fé - - Dedefia Habobo Gabão Igreja dos Banzie - - Gana Twelve Apostles Seguidores de - Church Harris Gana Igreja Musama Jemisimiham Jehu- 1919 Disco Christo Appiah Quênia Igreja Ortodoxa - - Quêniana Quênia Didi ya Roho Jakobo Baluku e - Daniel Sande Quênia Didi ya Nsambwe - - Libéria-Costa do Igreja Harrista William Wade 1910 Marfim Harris Malauí Movimento Elliot Kamwana 1908 Kitawala

220

Namíbia Igreja Herero - - Nigéria Igrejas Aladura - 1920 Nigéria Negro Church of - - Christ RDC Igreja Simon Kimbangu 1921 Kimbanguista RDC Missão dos Negros Simon Pandi 1964 Uganda Exército de - - Cristãos para a Salvação de Uganda Uganda África Progressive Ruben Spartas - Association Mukasa Zâmbia Lumpa Church Alise Leshina 1955 Zimbabué Igreja do Pássaro - - Branco

221

Tabela 2: Pentecostalismo brasileiro na África 532

País AD CCB IEQ IPBC IPDA IURD IIGD IPRC IMPD ICM África d. Sul P P P P P P P Angola P P P P P P P Benim P Botsuana P P P Burkina P P P Faso Burundi P Cabo Verde P P P P P Camarões P P Costa do P P Mar. Chade P Etiópia P Gabão P P Gâmbia P P Gana P P P Guiné P P P Bissau Guiné Equat. P P Ilhas P P Maurício Lesoto P P Madagascar P Malaui P P Moçambique P P P P P P P Namíbia P P Nigéria P P P Quênia P P R.C. P Africana Rep. Congo P P P R.D. Congo P P P Ruanda P São Tomé e P P P Príncipe Senegal P P P P Serra Leoa P

532 Essas informações foram encontradas nos sites oficiais dessas Igrejas: 1. http://www.ipda.org.br/, acesso 02/02/2014. 2. Congregação Cristã no Brasil. Relatório, São Paulo, Edição 2013/2014, nº77, p.738-748. 3. http://www.impd.org.br/portal/index.php?link=igrejasnomundo, acesso 02/02/2014. . E também http://www.convencaosp.com.br/2014/component/k2/item/23-batismo-em-burkina-faso- africa.html, acesso 02/02/2014. 4. http://missionariosmafra.blogspot.com.br/, acesso 02/02/2014. 5. http://www.igrejacristamaranata.org.br/?p=3239, acesso 02/02/2014.

222

Sudão do S. P Suazilândia P P Tanzânia P P P Togo P P Uganda P P Zâmbia P P Zimbábue P P P

Total 3 15 4 5 26 39 1 1 4 1

Igreja Número de países IURD 39 IPDA 26 CCB 12 IPBC 5 IMPD 4 IEQ 4 AD 3 IIGD 1 IPRC 1 ICM 1

223

Tabela 3: Pentecostalismo brasileiro e o número de templo533

PAÍS IURD CCB IPDA África do Sul 330 1 3 Angola 57 21 1 Benim 1 Botsuana 11 1 Burkina Faso 1 1 Cabo Verde 22 1 1 Camarões 4 1 Costa do Marfim 51 1 Chade 1 Etiópia 1 Gabão 11 1 Gâmbia 1 1 Gana 1 2 2 Guiné Bissau 17 3 1 Guiné Equatorial 2 1 Ilha Maurício 2 1 Lesoto 19 1 Madagascar 11 Malauí 6 39 Moçambique 41 402 18 Namíbia 23 1 Nigéria 1 2 1 Quênia 4 1 República Centro Africana 2 República do Congo 5 10 1 República Dem. do 5 57 1 Congo Ruanda 1 São Tomé Príncipe 8 13 1 Senegal 11 1 Serra Leoa 2 Sudão do Sul 1 Suazilândia 4 1 Tanzânia 4 15 1 Togo 2 1 Uganda 11 Zâmbia 4 1 Zimbabué 22 1 1 Total 700 568 46

533 Pesquisa realizada no site oficial de respetivas Igrejas no dia 02/02/2014. Mas para a CCB, usamos o Relatório, Edição 2013/2014, nº77, pp. 782-795. 224

Tabela 4: IURD, CCB e IPDA em porcentagem

IURD na África534

África do Sul 47,14% Angola 8,14% Costa do Marfim 7,28% Moçambique 5,85% Namíbia 3,28% Total de outros países 28.31%

CCB na África

Moçambique 70,77% RDC 10,03% Malauí 6,86% Angola 3,69% Total de outros países 9.65%

IPDA na África

Moçambique 39,13% África do Sul 6,52% Gana 4,34% Total de outros países 50,01%

534 Calculamos a porcentagem dessas Igrejas a partir da média do número de templos nesses países. Podemos observar que o pentecostalismo brasileiro está mais presente na África subsaariana em países como Moçambique, África do Sul e Angola. 225

Tabela 5: Religiões na África (ARDA) 535

PAIS CRIST. ISLÃ RTA R. ORIEN. BAHAI AGNÓST. OUTROS África do S. 81,99% 19,85% 15,68% 2,38% - 5,04% 1,41% Angola 93,28% 1,09% 4,62% - 0,79% 0,02% Argélia 0,17% 98,50% - - - 1,25% 0,07% Benim 43,77% 25,46% 30,38% - 0,13 0,19% 0,24% Botswana 68,67% 0,27% 29,84% - 0,82% 0,16% 0,24% Burkina F. 22,41% 53,69% 23,38% - - 0,50% 0,02% Burundi 92,16% 2,11% 5,51% 0,08% 0,08% - 0,06% Cabo Verde 95,05% 2,77% 1,13% - 0,15% 0,89% 0,01% Camarões 58,07% 20,04% 20,87% - 0,25% 0,56% 0,21% Chade 34,78% 55,92% 8,30% - 0,06% 0,09% 0,09 Comores 0,48% 98,34% 0,97% - 0,01% 0,12% 0,09% Costa do M. 34,31% 40,58% 24,51% - 0,15% 0,36% 0,09% Djibuti 1,74% 96,93% - - 0,09% 1,15% 0.09% Egito 10,09% 89,29% - - - 0,05% 0,01% Eritreia 47,91% 50,15% 0,62% - - 1,27% 0,05% Etiópia 59,88% 33,90% 6,05% - - 0,10% 0,07% Gabão 84,52% 10,22% 3,23% - - 1,35% 0,07% Gâmbia 4,35% 88,68% 5,52% - 0.82% 0.60% 0,02% Gana 63,96% 19,85% 15,68% - - 0,30% 0,10% Guiné 3,65% 84,81% 11,26% 0,09% - - 0,05% Guiné B. 12,20% 44,47% 42,01% - - 1,22% 0,02% Guiné Eq. 88,68% 4,05% 1,72% - - 3,17% 0,56% Lesoto 91,75% - 7,04% 0,06% 0,88% 0,20% 0,07% Libéria 40,53% 16,04% 41,62% - 0,28% 1,51% 0,01% Líbia 2,70% 96,63% - 0,41% - 0,17% 0,10% Madagascar 56,91% 2,11% 40, 41% 0,09% 0,28% 0,20% Malauí 79,76% 13,19% 6,32% - 0,23% 0,26% 0,23% Mali 3,24% 87,14% 9,50% - - 0,10% 0,02% Marrocos 0,10% 99,65% - - 0,10% 0,13% 0,02% Maurício 33,17% 16,85% - 44,21% 1,83% 1,77% 2,18% Mauritânia 0,26% 99,10% 0.52% - - 0.10% 0.02% Moçambique 52,45% 17,47% 29,44% 0,16% - 0,36% 0,12% Namíbia 91,19% 0,34% 5,94% - 0,34% 1,91% 0,14% Níger 0,35% 95,41% 4,11% - - 0,06% 0,66% Nigéria 46,45% 45,53% 7,67% - - 0,25% 0,09% Quênia 81,27% 7,95% 8,86% 0,50% 1,04% - 0,38% RDC 95% 1,47% 2,51% 0,02% 0.43% 0,39% 0,19% R. do Congo 89,76% 1,39% 4,756 - 0,64% 2,97% 0,47% RCA 71,3% 13,7% 14% - 0,25% 0,68% 0,01% Ruanda 91,51% 4,78% 3,32% - 0,18% 0,2% 0,01% São Tomé e P. 96,10% - 0,24% - 2,38% 1,24% 0,04% Suazilândia 87,64% 0,65% 9,92% 0,45% - 1,16% 0,18% Seychelles 94,76% 0,90% - 1,46% 0,42% 2,15% 0,31% Sudão 19,03% 69,77% 10,27% 0,13% - 0,77% 0,02%

535 The ARDA em http://www.thearda.com/Archive/browse.asp, acesso 17/07/2014. Os dados do Sudão do Sul estão junto com os de Sudão porque a pesquisa foi feita em 2010, antes da criação de Sudão do Sul. As religiões apresentadas são: Cristianismo, Islã, Religiões Tradicionais Africanas, Bahai, Agnósticos e Outras religiões. 226

Senegal 5,49% 90,64% 3,48% - 0,19% 0,14% 0,05% Serra Leoa 13,26% 64,64% 20,56% - 0,23% 1,22% 0,08% Tanzânia 54,76% 31,62% 11,85% 0,87% 0,42% - 0,48% Tunísia 0,22% 99,52% - - - 0,20% 0,06% Togo 46,97% 18,36% 33,88% - 0,50% 0,22% 0,08% Uganda 84,44% 11,72% 2,29% 0,80% - 0,39% 0,37% Zâmbia 85,47% 1,07% 11,19% - 1,84% 0,15% 0,27% Zimbabwe 81,66% 0,73% 15,86% - 0,32% 1,01% 0,42

227

228

MAPAS DA ÁFRICA

1. ÁFRICA SUBSAARIANA

229

2. RELIGIÕES NA ÁFRICA

230

3. ISLÃ NA ÁFRICA

231