A Lupa E O Diário: História Natural, Viagens Científicas E Relatos Sobre a Capitania De Santa Catarina (1763-1822)
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LUCIANA ROSSATO A LUPA E O DIÁRIO: HISTÓRIA NATURAL, VIAGENS CIENTÍFICAS E RELATOS SOBRE A CAPITANIA DE SANTA CATARINA (1763-1822) PORTO ALEGRE 2005 Livros Grátis http://www.livrosgratis.com.br Milhares de livros grátis para download. 2 LUCIANA ROSSATO A LUPA E O DIÁRIO: HISTÓRIA NATURAL, VIAGENS CIENTÍFICAS E RELATOS SOBRE A CAPITANIA DE SANTA CATARINA (1763-1822) Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul para a obtenção do título de Doutor em História, sob a orientação da Profª. Drª. Susana Bleil de Souza. Porto Alegre 2005 3 SUMÁRIO Índice de Gravuras 4 Resumo 5 Resume 6 Agradecimentos 8 Introdução 9 1. Viagens científicas européias ao redor do mundo (séculos XVIII e XIX) 27 2. Os viajantes: alguns dados biográficos 44 3. O relato: diferentes olhares, diferentes perspectivas 65 4. A História Natural como um novo campo do conhecimento 87 4.1. Um novo olhar sobre a natureza 88 4.2. A natureza e os habitantes do Novo Mundo 99 5. Descrevendo a natureza de Santa Catarina 111 5.1. A natureza entre a razão e a emoção 129 6. Núcleos urbanos em meio a natureza 143 6.1. Do espaço urbano 143 6.2. Da população 159 7. Populações de origem africana 175 8. Trabalho e indolência: uma outra cultura 197 8.1. Natureza exuberante versus a pobreza e a indolência dos habitantes locais 209 9. Louis Choris: um artista viajante 223 Considerações Finais 248 Informações Gerais sobre os Viajantes 257 Referências Bibliográficas 258 4 ÍNDICE DE GRAVURAS Fig. 1 - Plano da Villa de N. S. do Desterro 147 Fig. 2 - Mapa da Vila de Desterro 153 Fig. 3 - Irís Gramínea 231 . Fig. 4 - Lophostachys publiflora Lindau 232 Fig. 5 – Brèsil 235 Fig. 6 - Vue dans l’intérieur de l’Ile de Stª. Catherine (Brèsil) 236 Fig. 7 - Ile de Stª Catherine (Brèsil) 239 Fig. 8 - Vue de la côte du Brèsil vis à vis de l’ile de Stª Catherine 240 Fig. 9 - Vista da vila de Desterro a partir do Hospital 242 5 RESUMO Este trabalho tem por objetivo analisar os discursos elaborados pelos cientistas viajantes sobre a Capitania de Santa Catarina, no período que compreende a segunda metade do século XVIII e a primeira metade do século XIX. Esse período é marcado pelo desenvolvimento científico, principalmente da História Natural, que vai influenciar na produção de imagens e representações sobre a América e seus habitantes. Entre os anos de 1763 e 1822, sete viajantes europeus passaram pelo litoral catarinense. Seis deles estavam vinculados aos estudos da História Natural (botânica, zoologia e mineralogia) e o sétimo era artista viajante, que integrava uma viagem marítima de estudos. A partir do estudo dos relatos de viagens, analisamos como os viajantes construíram seus discursos. Nesses relatos é descrita a natureza da região, suas características e seu aproveitamento pelas populações locais. Além disso, os cientistas viajantes tinham um olhar voltado para o todo, o que significa que se dedicaram a relatar também as características da população local, seu desenvolvimento tecnológico, suas relações de trabalho, entre outros aspectos. Nosso objetivo é perceber como essas descrições estão inseridas no contexto sócio-cultural de quem as produziu, neste caso, os viajantes, que eram cientistas, europeus, originários de sociedades urbanas e em processo de industrialização. Outro aspecto trabalhado foi a produção pictórica sobre a região, de autoria de Louis Choris, que, como outros que retrataram nossas paisagens, criou imagens que se caracterizam por estereótipos e lugares comuns. Esse é um aspecto que se aplica a todos os viajantes: seus relatos são marcados por representações, que de certa forma mostram muito mais sobre a cultura de quem os escreveu do que sobre a região que está sendo descrita. Palavras-chave: Viajantes, História Natural, Relatos de Viagem 6 RESUME Ce travail a pour objectif d’analyser les discours élaborés par les scientifiques-voyageurs dans la Capitania de Santa Catarina, pendant la période qui comprend la seconde moitié du XVIIIème siècle et la première du XIXème siècle. Cette période est marquée par le développement scientifique, surtout de l’Histoire Naturelle, laquelle va influencer la production d’images et les représentations de l’Amérique et de ses habitants. De 1763 à 1822, sept voyageurs européens sont passés sur le littoral du Santa Catarina. Six d’entre-eux étaient liés aux études de l’Histoire Naturelle (botanique, zoologie et minéralogie) et le septième était un artiste-voyageur qui faisait partie d’un voyage maritime d’études. A partir de l’étude des récits de voyages, nous analysons comment les voyageurs ont construit leurs discours. Dans ces récits, la nature de la région, ses caractéristiques et ce dont les populations locales en ont tiré sont décrits. De plus, les scientifiques-voyageurs portaient un regard sur le tout, ce qui signifie qu’ils se sont aussi consacrés à rapporter les caractéristiques de la population locale, son développement technologique, ses rapports de travail, parmi d’autres aspects. Notre objectif est de voir comment ces descriptions sont insérées dans le contexte socio-culturel de ceux qui les ont produites, dans ce cas, les voyageurs qui étaient des scientifiques européens, venus de sociétés urbaines bourgeoises et en phase d’industrialisation. Un autre aspect abordé a été la production picturale sur la région, de la part de Louis Choris. Ce peintre, comme d’autres qui ont peint nos paysages, a créé des images qui sont caractérisées par des stéréotypes et des lieux communs. Ceci est un aspect qui s’applique à tous les voyageurs : leurs récits sont marqués par des représentations qui, d’une certaine façon, en montrent beaucoup plus en ce qui concerne la culture de celui qui les a écrits que sur le région à l’étude. Mots-clés : Voyageurs, Histoire Naturelle, Récits de Voyage. 7 Ao Aldonei com quem compartilho o pão e os sonhos 8 AGRADECIMENTOS Inicialmente gostaria de registrar que, para desenvolver este trabalho, contei com o financiamento governamental, através da CAPES, que me concedeu bolsa durante o período de três anos, e também financiou o estágio de quatro meses junto a EHESS/França. Além disso, saliento que minha formação educacional, desde as primeiras letras até a conclusão do doutorado, somente foi possível devido ao ensino público e gratuito. À Profª Dr.ª Suzana Bleil de Souza pela orientação. Ao Paulo Rogério, amigo de tantos anos, que pacientemente me ajudou, lendo idéias mal esboçadas, desde o projeto até o texto final. Aos amigos que ajudaram a tornar esta caminhada menos penosa. Em especial: Kátia Renck, Vanderlei Machado, Carla Rodeghero, Viviani Poyer, Maria das Graças Maria, Claudia Zanella e Marco Aurélio. À Claudia Mortari, pela ajuda no que se refere as populações de origem africanas, e ao Reinaldo Lohn, pela leitura e sugestões. À Sílvia Arend, colega de doutorado e de viagens, amiga com quem dividi as angústias da escrita. À minha família que, mesmo distante, sempre me apoiou e me incentivou, e a minha sogra, Dona Maria Ana. À minha prima, Cristiane, pela correção ortográfica. Aos funcionários das várias instituições, museus, bibliotecas e arquivos, que contribuíram tornando acessível livros e outros materiais, bem como prestando informações. As professoras doutoras Sandra Jatahy Pesavento e Maria Angélica Zubaran, que contribuíram com este trabalho ao participarem da banca de qualificação. Aos professores e aos funcionários do departamento de Pós-graduação em História da UFRGS. Ao Profº Drº Jacques Leenhardt, que me recebeu durante 4 meses na EHESS/França. 9 INTRODUÇÃO Para Rousseau a botânica era a melhor distração para o homem elegante do século XVIII. Munido de uma lupa e de um manual contendo as denominações científicas das plantas, poderia se distrair com algo que lhe possibilitaria um contato mais profundo com a natureza, e desta forma, com o seu eu interior. Para o cientista viajante, além da lupa (e de outros instrumentos), o diário também era fundamental. Além de coletar espécimes, precisava nomear, descrever suas características e classificar. No diário eram registrados os locais visitados, as coisas e as pessoas que conheceu, bem como comentava sobre os mais diferentes temas, que iam desde as plantas, borboletas e minerais até a vestimenta usada pelas mulheres de determinada região ou país. A partir das anotações registradas no diário de viagem desenvolveria outros textos, tais como os relatórios, apresentados para seus pares em reuniões nas instituições científicas, e os relatos de viagens, que eram escritos para o público em geral. A lupa, mais do que um instrumento de trabalho, pode ser entendida como uma metáfora do olhar do viajante. Um olhar que tinha a pretensão de tudo ver, em seus mínimos detalhes, mas que, ao mesmo tempo, limitava seu foco à pequena circunferência da lente. Margarita Pierini comenta que “a Europa vê o que os olhos de Colombo vêem; Colombo vê com os olhos da Europa.”1 Esse trocadilho do olhar exprime a relação entre o Velho Mundo e os viajantes, que são seus olhos e ouvidos em terras distantes. A América, bem como outras regiões descobertas pela Europa, foram visitadas e observadas em diferentes momentos por viajantes europeus, os quais eram exploradores comerciais, membros de ordens 1 PIERINI, Margarita. La Mirada y el discurso: la literatura de viagens. In: PIZARRO, Ana (org.). América Latina: Palavra, literatura e cultura. São Paulo: Memorial/Ed. da Unicamp, 1993. p. 163. 10 religiosas ou cientistas. Posteriormente, muitos desses escreveriam sobre suas viagens, descrevendo o que tinham visto e vivido nestas regiões “exóticas” e completamente distintas daquilo que constituía a sua realidade. O viajante pode ser entendido como um elo de ligação entre dois mundos diferentes, o europeu, seu continente de origem, e o Novo Mundo. Esses viajantes, fossem cientistas do século XIX ou colonizadores do século XVI, possuíam algo em comum: a necessidade de conhecer, de obter informações e de possuir mapas detalhados das regiões que eram alvo de suas investidas.