Transcrição

FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS

CENTRO DE PESQUISA E DOCUMENTAÇÃO DE HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA DO BRASIL (CPDOC)

Proibida a publicação no todo ou em parte; permitida a citação. A citação deve ser textual, com indicação de fonte conforme abaixo.

FONSECA JUNIOR, Alcides. Alcides Fonseca Junior (depoimento, 2012). Rio de Janeiro, CPDOC/FGV, 2012. 50 p.

ALCIDES FONSECA JUNIOR

(depoimento, 2012)

Rio de Janeiro

2013 Transcrição

Nome do entrevistado: Alcides Fonseca Junior

Local da entrevista: São Paulo, SP

Data da entrevista: 06 de novembro 2012

Nome do projeto: Futebol, Memória e Patrimônio: Projeto de constituição de um acervo de entrevistas em História Oral.

Entrevistadores: Bernardo Buarque, Bruna Gottardo e Felipe dos Santos

Câmera: Thomas Dreux

Transcrição: Fernanda Antunes

Data da transcrição: 26 de novembro de 2012

Conferência da transcrição : Felipe Santos

Data da conferência: 27 de novembro de 2012

** O texto abaixo reproduz na íntegra a entrevista concedida por Alcides Fonseca Junior em 06/11/2012. As partes destacadas em vermelho correspondem aos trechos excluídos da edição disponibilizada no portal CPDOC. A consulta à gravação integral da entrevista pode ser feita na sala de consulta do CPDOC.

Alcides Junior – Nós vamos dar sequência, não é?

Bernardi Buarque – Isso.

A. J. – Dá uma lembrada para mim onde que nós estávamos, 82?

Felipe Santos – A gente tinha parado em 82, você estava falando um pouco da Copa, mas não ainda completo. A gente falou com o Falcão semana passada.

Transcrição

A. J. – O Bernardo me falou. Ele me ligou lá, você sabe o que ele falou para mim? – “Eu não estou jogando de terno não” [risos]. Eu falei: - “Pô, os caras sabem que você está jogando de terno”. Falcão é muito bacana. Falcão...

B. B. – Ele fala muito bem. Tem uma desenvoltura... Foi apresentador de programa na Itália...

A. J. – Opa, deixa eu arrumar meu microfone aqui, gente. Ficou sobrando aqui. Está bom o microfone aqui?

[Voz masculina] - Está.

A. J. – Eu posso tomar água durante o processo?

B. G. – Pode, claro, à vontade. Se quiser mais café, alguma coisa...

A. J. – Não. Depois você traz um outro café, para animar.

B. B. – Qual foi a data da primeira?

A. J. – Foi 14 dias atrás, não foi?

B. G. – Foi quinta-feira, dia 15.

A. J. – Ah, foi quinta-feira.

Bruna Gottardo – Dia 18.

A. J. – Então vamos, manda bala!

B. G. – A gente parou na Copa, não é? Transcrição

B. B. – Boa tarde, juninho, Alcides Fonseca Junior. Continuação do depoimento do ex jogador da Seleção Brasileira para o projeto Futebol, Memória e Patrimônio. Agradecer ao Juninho mais uma vez pelo seu deslocamento. Tão gentilmente acolher nosso convite para estar aqui. Parece que foi combinado quando encerramos a primeira parte, parece que terminando aqui o intervalo, segundo tempo desse depoimento. Estávamos falando sobre suas origens, cidade de Olímpia, como começou, na sua cidade natal, do futebol amador, escola, clube...

A. J. – Família...

B. B. – Família. Se afirmando no futebol, os primeiros testes na cidade de Campinas, na Ponte Preta...

A. J. – Ponte Preta.

B. B. – Depois aquela efervescência do finalzinho dos anos 70, que a própria cidade de Campinas é muito influenciada pelo titulo do Guarani, a rivalidade...

A. J. – Isso.

B. B. – E paralelamente a isso, sua afirmação no futebol profissional. E encerramos com a rememoração dos fatos da suas lembranças da Copa de 1982, que é um dos focos principais da nossa entrevista. Juninho, foi muito interessante que você encerrou o seu depoimento falando do trajeto de ônibus...

A. J. – Isso.

B. B. – Para o jogo contra a equipe da Itália, quando o Brasil foi...

Transcrição

A. J. – É uma das coisas que eu guardo bem, pelo fato de que nós, a turma que fica no fundo do ônibus – sabe a turma que fica no fundo da classe? Fundo do ônibus, aqueles caras lá. E tinha o samba, que os meninos do Rio de Janeiro têm um domínio do samba muito bacana, o Junior, Edevaldo e tal... E o samba cansou. O samba cansou, porque da escolha que, em função da segurança... O trajeto sorteado foi o trajeto, acidentalmente, o mais comprido de todos, e eu acho que isso... Sempre esteve na minha cabeça que é um fator desgastante. Hoje, por exemplo, quando eu trabalho com futebol, eu estou em uma delegação que eu vou dar alguma opinião a respeito de distância, eu digo: “Olha, qualquer coisa mais que 45 minutos poderá mexer com a pessoa. Mexer na concentração, mexer no foco, mexer nas suas próprias lembranças. O que uma pessoa fica pensando uma hora antes do jogo? Pensando nos parentes, no irmão, na mãe, no filho, em tudo isso”. É uma coisa que hoje eu tenho certeza, porque os clubes tratam de chegar no local do jogo uma hora e quinze minutos antes. Por exemplo, jogo no Pacaembu, às cinco horas, você chega três e quarenta e cinco. Só que o trajeto dos clubes aqui em São Paulo... Veja, tem batedor, tudo bonitinho. O cara demora 15 minutos. E lá, mesmo com o batedor, com toda a segurança, foi muito desgastante. É uma coisa que eu acho que pesou no quesito concentração, foco. Que é uma coisa que é muito importante em um jogo de altíssimo nível, um jogo decisivo, que nós tínhamos até a vantagem do empate, mas contra uma seleção também muito forte. Eu não sei se naquele momento eu falei com vocês: sete jogadores que tinham jogado em 78 pela Itália, estavam jogando, estavam em campo, estavam na reserva e não entraram. Eu acho que isso pesa muito também a favor da Itália. A gente também tem que colocar o mérito na Itália, afinal de contas, não só porque foram campeões, não só porque o Paolo Rossi foi artilheiro, mas porque a Itália, naturalmente, ela é bem competitiva.

B. B. – E teria algum outro aspecto dessa Copa, extra-campo, como você está trazendo... Se não decidem, influenciam...

A. J. – A contusão do , no final do jogo da Argentina, estão lembrados?

F. S. – Com uma entrada do Passarella. Transcrição

A. J. – Com uma entrada que gerou uma expulsão, qualquer coisa assim. É muito complexo eu dizer, hoje, que eu acho que o Zico poderia ter sido melhor aproveitado naquele jogo. Estou falando em uma época que eram duas substituições, ainda eram duas. Mas o Zico se contundiu muito, o Zico treinou muito pouco. Eu não lembro qual a distância de dias do jogo da Argentina para o jogo do...

F. S. – Três dias.

A. J. – Três dias?

F. S. – O jogo da Argentina foi em uma sexta, o da Itália foi em uma segunda...

A. J. – Foi em uma segunda, é. Que aquele jornal que nós fizemos saiu aqui no Brasil no domingo, à noite. E eu acho que o Batista não ter ficado no banco, por contusão... Isso, eu não tenho essa certeza, mas eu não sei porque o Batista não ficou no banco. Eu fiquei no banco porque o Edinho se contundiu nesse período, nessa semana. Mas o Batista não ficar no banco... Porque o Batista era um recurso interessante que a Seleção tinha - e usou várias vezes - quando adotava uma posição mais defensiva, que não era a ideia do Telê, que a ideia do Telê era ter um volume muito grande da parte ofensiva, mas o Batista era categoricamente um ótimo marcador, tanto é que teve ótimas [inaudível]. E o Batista não ficou no banco. Eu acho que poderia ser uma arma o Batista no banco. Eu imagino, dois a dois, apertado como foi dois a dois, um golaço do Falcão, driblou, um passou para lá... Eles faziam uma triangulação pelo lado direito ali muito bonita, muito perfeita. Além de treinamento, era no dom deles. O Sócrates, o Zico e o Falcão faziam aquilo. Então eu imagino que se o Telê tem o Batista no banco, que já era maduro, Batista também vinha de uma Copa do Mundo, e com o desempenho ótimo aqui no Brasil. Nessa época, acho que ele já estava no Grêmio. Eu acho que o Batista poderia entrar nesse um, dois minutos, faz o dois a dois, poderia estar em campo e teoricamente ajudaria? Eu acho que ajudaria.

Transcrição

B. B. – Então, no seu caso, o fato de estar no banco nesse jogo mudava um pouco a sua própria adrenalina em relação ao jogo, a expectativa de poder vir a entrar em campo? Isso...

A. J. – Nossa Senhora! Isso é uma coisa que provoca a gente no aspecto emocional. Eu estou lá, porque eu tinha uma condição bem tranquila. Eu sabia, evidentemente, que nós tínhamos o Luizinho, o Oscar e o Edinho em uma condição acima, é claro. Do mesmo jeito que eu me colocava acima de alguns atletas, tinham outros que eram acima, e realmente com vantagens. Quando possibilitou-se a minha entrada no banco por causa da contusão do Edinho, você fica que nem onça na jaula [risos]. Nossa Senhora, se eu entrar, o que eu tenho que fazer mesmo? Deixa eu lembrar... Tem que fazer isso, fazer aquilo, com quem eu posso entrar... A primeira coisa que eu pensei: - “Bom, se eu entrar no lado direito – que eu podia entrar nos dois lados – se eu entrar do lado direito, é que o Luizinho está desse lado, se eu entrar do lado esquerdo, é porque o Oscar está desse lado”. Pensei comigo: - “Tomara que seja o Luizinho que saia”. Porque eu tinha mais contato com o Oscar, que nós fomos muito tempo juntos na Ponte Preta, jogamos juntos um período interessante. Mas mexe com a gente demais. Você passa o tempo todo... Nossa Senhora! - “Nós estamos perto, eu estou no jogo, estou no campo”. Com 24 anos – acho que com 24 anos, naquela época, não sei se representa uma coisa impactante como hoje, não dá para comparar as idades. Mas para a minha carreira era um marco super importante. Era mais uma etapa que eu vinha... Eu vinha lá de seleções amadoras e tal, sempre jogando, e uma possibilidade de entrar em um jogo que marca a história da gente. Você joga uma partida em uma Copa do Mundo, isso aí está perpetuado. De toda forma, para mim, foi super interessante. No final do jogo fiz uma piadinha lá no ônibus, eu fui agraciado com a camisa do Paolo Rossi acidentalmente. Está lá na minha casa. Se alguém quiser comprar... [risos]. Mas começa a oferecer bastante [risos]. Acabou o jogo, naquela troca natural, depois daquele momento, aquela síncope, todo mundo vai lá para baixo. Eu fui no vestiário – que os vestiários eram próprios lá: - “Pessoal, quero trocar uma camisa”. Eu nem vi quem deu a camisa. Alguém passou: - “Pega essa aqui, leva aquela lá, o italiano”. Na hora que eu abri, 20. - “Nem vou mostrar para ninguém, podem tacar fogo na camisa.” [risos]. E o Transcrição

Paolo Rossi também era um cara maduro, esse detalhe é importante. Paolo Rossi já tinha passado por problemas no Totocalcio lá, tinha sido punido, já tinha voltado.

F. S. – Era um dos que vinham de 78.

A. J. – Vinha de 78. O futebol italiano é especial, porque lá acontece de tudo. Até zero a zero [risos]. Um monte de zero a zero acontece lá, os dois times são interessados. Claro, estou falando de brincadeira, não posso provar. Na verdade, a Itália, ela ressurgiu no primeiro jogo contra a Argentina. Que aquele acidente de cair três campeões do mundo em uma etapa que seria “quartas”... Três campeões do mundo, com competição, com país, com história... O Brasil e a Itália vindo de um terceiro e quarto, há quatro anos atrás. E a Argentina já com Maradona... Argentina campeã do mundo anterior. Aquilo foi um acidente de tabela, porque a Argentina não foi bem. Perdeu o primeiro jogo para a Bélgica, todo mundo assistiu. E aí caíram os três grandes... A Itália, quando ganhou da Argentina, dava para perceber que a Itália... - “Opa, espera aí. Não é tão complexo, a partir daí faltam três partidas para ser campeão do mundo.” Que a Itália teve dificuldade clara de passar na primeira fase, coisa que o Brasil não teve. Apesar de o Brasil ter muitos gols a favor, tinha gols contra. O Brasil sempre fez gol e só em um jogo, acho, que ele não tomou gol. No meu entendimento é um acidente de percurso que aconteceu. O Brasil não venceria aquele jogo se tivesse um tempo extra, acho que o Brasil dificilmente venceria, e o descuido da organização. Esse regulamento durou só dois anos, só em duas Copas, se não me engano. Porque você sair da possibilidade de ter um grupo... Se é eliminatória, é outra coisa. Porque eliminatória é o seguinte: vai acabar o jogo e alguém vai para o empate e vai bater pênalti. Depois até que surgiu aquele “gol de ouro”, que acho que teve um ano só, uma Copa só. Mas eu acho que o Brasil fez o máximo que podia, tanto é que... O Falcão que mesmo disse outra vez para a gente, que nós fomos lá na Itália, que ele desceu do pedestal para tomar uma cerveja com os caras [risos], e o Falcão falou: - “Olha, é uma Seleção que não foi campeã, mas é famosa. É famosa internacionalmente”. Todo mundo fala: - “Pô, aquela Seleção de 82, e tal...”. E para todos, de alguma maneira, é um privilégio fazer parte, sempre... Imaginar que você vai conseguir chegar é complexo. Você vai ganhar um prêmio, mas Transcrição

que horas que sai a documentação que você vai ganhar o prêmio? Então foi muito bom, foi uma experiência... Negativa, ruim, no final daquele ano, nossa, quando passou os gols nesses...

B. B. – Retrospectiva?

A. J. – Retrospectiva. Nossa, você fica desesperado... você fala “Não!”. Por quê? Porque, na verdade, as oportunidades da vida são complexas. Quantas vezes alguém vai chegar em uma final de Copa do Mundo? Tem gente que disputa... O Cafu, para ele sobra experiência [risos]. Mas para mim foi muito bom, enquanto pessoa, profissional do futebol, foi muito bacana.

B. B. – Os últimos dias antes de regressar ao Brasil, aquela alegria, a união que parecia contagiar o grupo se manteve mesmo com a eliminação, ou... ?

A. J. – Nós tivemos... Eu me lembro que nós tivemos algumas discussões entre nós, que eu percebi mais entre o pessoal - como eu falava para o Sócrates, os “caciques”... Tinha os “caciques” e tinha os “índios”, eu estou nos “índios”, pode ter certeza. Os que carregam piano e os que pintam, fazem desenho... Tudo bem. E houveram (sic) algumas discussões porque o degelo da derrota, ele não vem na hora. Quando a Itália voltou a ganhar, jogou novamente e ganhou da Polônia de dois a zero, e depois caminhou para a final, você vai percebendo que nós perdemos para alguém, não foi para ninguém. Mesmo assim houve algumas pequenas discussões entre nós, porque cada um controla o amargor de uma forma. Mas todos nós, quando temos contato, nós somos muito receptivos, de um para outro. A turma mais velha – como eu falei – tem uma turma de 54 e uma turma de 58. Todas, depois, continuam cruzando em jogos. Os brasileiros tiraram muito proveito, porque logo em seguida teve uma debandada para a Itália, foi a primeira grande debandada... Todos nós tiramos proveito disso. Eu, por exemplo, jogava na Ponte Preta, tive a possibilidade de ir tanto para o Palmeiras quanto para o Corinthians. Então, de alguma forma, a população entendeu que a gente representava bem o país, que é uma coisa diferente de hoje, que os atletas estão fora. O Transcrição

cara ia torcer para nós, ele estava ali: - “Aquele cara ali é o Juninho, aquele cara é o Sócrates...”. Ele está perto, está próximo. Acho que isso era um marketing, era uma Seleção próxima, um período em que a política também pesava muito. Já tinha uma ideia do que seria democracia, do que poderia ser. Eu acho que marcou bem, como o Falcão disse: - “Não fomos campeões de nada” – acho que ficamos em quinto lugar, em uma ordem aí, e marcou muito, acho que isso é bacana. Para o mundo, para a nossa história, é bacana.

F. S. – Você falou principalmente dos jogos da segunda fase, e os jogos da primeira fase, que eram aquela festa toda? Que o Brasil ganha sofrido da União Soviética, depois ganha...

A. J. – Eu diria para você o seguinte: para todos nós foi uma surpresa o Telê colocar o no primeiro jogo. Outros poderão dizer, eu estou dizendo aqui porque eu vivi, não vim aqui contar uma história que me contaram. Para mim foi uma surpresa, porque eu imaginava que, para o lugar do Cerezo – que tinha sido expulso, punido, tal – seria o Paulo Isidoro, só que no intervalo ele já refez. Então nós tivemos um acidente de percurso que foi um gol, que o Valdir não tomava, não era imaginado que o Valdir, já com uma experiência também, outro dos experientes, esse um pouquinho mais velho, acho que o Valdir é de 52, 51... Um dos mais velhos, ele e o Paulo Isidoro, um dos mais velhos mesmo, e o Dirceu “Borboleta”. E o Brasil conseguiu uma virada com dois gols de talento. O Brasil não ganhou da Rússia pelo conjunto. O Brasil ganhou pelo talento. Apesar que nós tínhamos um conjunto muito bacana. Isso nos trouxe um alerta, e nos trouxe também a confiança de que o Brasil poderia surgir... Não era um grupo difícil, era um grupo que tinha, por exemplo, Nova Zelândia. Você perder para Nova Zelândia tem que fazer um esforço terrível [risos]. O Brasil perder para a Nova Zelândia... Nova Zelândia tinha um jogador bom, número cinco - não lembro, um Mc não sei o que lá da vida aí -, mas o Brasil impôs o jogo, jogou da forma que vinha jogando, como jogava aqui no Brasil, com a entrada depois do Isidoro, e o Brasil criou aquele modo de jogar que, para o estudioso do futebol, ele, de alguma forma, fica estabelecido que tem uma coisa montada. Atacava para a direita de um jeito e atacava com a esquerda de outro. Transcrição

Para estudioso, não sei se a Itália estudou, se alguém estudou, não é complexo estudar aquilo. Porque a jogada nascia, o Leandro avançava, o Sócrates encostava, o Falcão encostava, o Zico encostava. Fazia o ataque daquela forma, e o outro ataque pela esquerda, que geraram vários gols, várias jogadas de perigo. E o Brasil, acho que uma coisa que... Não sei se foi prejudicial, mas o Brasil fez uns gols muito bonitos. Uns gols assim... Éder, Zico, de virada... Os caras eram fazedores de gol mesmo. Então, para nós, não era nenhuma novidade, mas para o mundo era uma novidade. Um time ter tanto volume, chegou na segunda fase com 10 gols em três jogos. Hoje um time passa para a segunda fase com quatro gols. Teve um ano aí, não sei que time, passou com três empates, pouquíssimos gols, e isso vai contagiando. Mas dentro do grupo eu não lembro que isso nos permitia um relaxamento. Eu lembro que nós continuávamos treinando, nós cumpríamos as folgas que tinha, foi uma folguinha menor, que eu saiba não teve muito exagero, debandada. Tinha aquela turma que saía junto, aqueles caras saíam junto, mas bem controladinho. Eu digo: a contusão do Zico, a não presença do Batista, e essa viagem desgastante, para mim são três pontos que eu gostaria até de comentar com os meninos da Seleção, para saber se eles perceberam isso também. Do Zico é claro. Eu acho que o Zico deveria ficar para o segundo tempo, porque, por exemplo, naquele momento você teria um Renato para colocar - que estava no banco – que não ia fazer muita diferença, que o Zico ficou um período machucado, e sempre que o Renato jogou, ele deu resposta. Mais em amistosos do que em jogos oficiais. Porque não mexia muito no time, era um time que o Telê chegou em um ponto, que ele não mexia muito no time. Isso deu cancha para o time. Só não jogou o Cerezo no primeiro jogo porque, acidentalmente, foi expulso contra... acho que a Bolívia. Dois gigantes do futebol, já eram gigantes, a Itália já era bicampeã do mundo, que ela ganhou o segundo e depois...

B. B. – Trinta e oito...

A. J. – É, ganhou seguido, o primeiro bicampeão do mundo, e a Itália tem uma presença. Os números da Itália, até hoje, em Copa do Mundo, são absurdamente grandes. Não tão impactantes quanto o Brasil, mas eu diria que três grandões: Brasil. Alemanha e Itália. Depois entraria a Argentina, em quarto lugar. De números contínuos. Transcrição

Temos que discutir a Itália com um goleiro que já tinha ido na Copa de 70! Pelo amor de Deus! Você imagina o quanto de experiência que eles têm, de competição internacional. Se não me engano, a Itália, dos grandes, é o que menos gol toma. Que eles tem aquele inferno lá, resolvem marcar todo mundo, puxa, dá murro, fazem de tudo e falam que não foi nada [risos]. Que nem os caras do Palmeiras fizeram outro dia aí: - “Foi gol de mão, mas não foi nada!”. Rapaz! [risos]. Para garoto explicar isso aí, que o cara está fazendo uma coisa irregular que vale! Rapaz, nessa hora que o futebol é perigoso para a educação, Nossa Senhora! Um perigo.

B. B. – Você tinha falado de estudar o adversário. A Seleção Brasileira a cada jogo...

A. J. – Estudava o adversário... Como é que chamava o cara que fazia isso para a Seleção brasileira?

F. S. – ?

A. J. – Não. Era uma pessoa que nós víamos muito pouco. Era uma pessoa tradicional da CBF, que era o captador das informações do adversário. Ele vinha... Nossa Senhora, gente! Esse nome vai pintar aqui. Ele vinha, fechava com o Tim, com o Vavá e o Telê, e o professor Valdir de Morais...

F. S. – Sim, sim.

A. J. – Era o treinador de goleiro. Eles quatro fechavam lá, traçavam, aí... Eu não... Apesar de há muito tempo atrás, mas eu não consigo perceber uma falha pesada no que antecedeu o jogo. Na palestra, que nós estávamos todos na palestra – a palestra da Seleção - para todos, mesmo que fiquem todos no banco, hoje em dia fica mais gente no banco, é um pouco mais entendível isso. Mas na palestra foi dito da importância da Itália enquanto isso que eu disse, enquanto história, enquanto o último mundial, que tinha seis, sete jogadores... Nós Transcrição

também tínhamos bastantes jogadores. Que ela não chegou por acaso... Que um time, passar uma fase de Copa do Mundo não é assim simples: - “Eu vou passar uma fase!”. Teve um ano aí que a França, se não me engano, disputou três partidas, não fez um gol. Acho que foi isso, depois que ela foi campeã. A Argentina, logo depois teve o negócio, no outro ano... Então é muito difícil o jogo. E lá foi sempre tratado positivamente: - “Olha, tem Antonioni, tem Altobelli, tem Paolo Rossi, tem...

F.S. – Bruno Conti... A.J. - Bruno Conti... Eu lembro até que o Falcão sempre falava: - “O Bruno, no meu time, joga de outro lado, na Seleção ele joga no outro lado”. Nós tínhamos a presença do Dirceu e do Falcão, que já eram jogadores do exterior... Então, as informações eram muito pertinentes. Eu não lembro de ter um erro grave de afirmar: - “Isso aqui não foi feito e poderia mexer com o resultado”. Não acredito nisso.

B. G. – Que tipo de material que era usado nessa preleção? Vocês assistiam vídeos, jogos, nada?

A. J. – Não tinham vídeos. Os vídeos eram só os gols. Os gols dos últimos jogos, os gols que o país fez... A Itália tinha feito quantos gols? Eu não lembro... Acho que a Itália tinha feito quatro ou cinco gols.

F. S. – Antes do jogo contra o Brasil, quatro.

A. J. – É, ela classificou porque empatou dois jogos de um a um. Classificou por número de gols feitos. Só que você tem um histórico do... Você pega o histórico da Itália, por exemplo, em eliminatórias. Nossa Senhora, ela passa por cima. Isso que aconteceu com a Alemanha outro dia, que está ganhando de tanto e empatar, isso não existe, em eliminatória. Apesar que o Brasil, de vez em quando, tem uma derrota besta, que nem aquela que foi para a Bolívia lá, que está louco! Aquilo não existe. Mas o impacto... Paolo Rossi era o atacante, não tem como ignorar. O Antonioni é o meia; o Transcrição

Altobelli é o grandão lá que fez o terceiro gol. Então, as informações que eram passadas para a comissão técnica, elas eram direcionadas para nós, e o expediente de acompanhamento era com o vídeo. Era o momento de ver os gols... Hoje em dia é muito mais estabelecido esse modo, o clube chega, à noite ele apresenta o vídeo, hoje já é incluído um vídeo de 20/ 30 minutos. Naquela época não era tão grande não. Mas eu digo que a preocupação da comissão técnica foi parecida, apesar que dessa ideia de que ter a vantagem de empate, ela só é perpetuada no último minuto. Apitou, está valendo. Porque até quando vale o empate? O empate vale até quando? E quanto que é mais pesado para o time, que é uma coisa interessante? O time que precisa ganhar, qual o expediente que ele usa para... ? Ele só precisa ganhar. Então, para o que precisa ganhar, é mais interessante, tem a vantagem, porque tem dois resultados. Mas durante o jogo isso não reflete, reflete quando faltam 15 minutos: - “Peraí, faltam 15 minutos!”. Por isso que eu falei para vocês: a entrada do Batista, para fazer uma marcação especial em um meia, não sei o que lá, poderia ter sido interessante.

B. B. – Juninho, o seu sentimento na volta para o Brasil? Se você tinha sido convocado pela primeira vez nos anos 80, estava disputando uma Copa do Mundo, como é que era a sua relação como Brasil, a sua sensação em relação à Seleção Brasileira no retorno? Você acreditava que voltaria, que aquela passagem tinha te credenciado para outras convocações? Você...

A. J. – Eu acreditava que eu... Na verdade, eu sabia que eu tinha condições para ir para outra Copa do Mundo. Eu sabia que eu ia correr o perigo de ir para um clube grande, eu já tinha um ótimo relacionamento com o Sócrates e com o Adílson Monteiro Alves, pelo fato de eles estarem aqui já criando um oportunismo – não oportunismo do mal, oportunismo do bem...

F. S. – Aproveitar a oportunidade.

A. J. – É, porque o país estava vivendo aquele momento político, abrindo um pouco mais, e o jogador de futebol, naquela época, tinha um espaço superinteressante, o Transcrição

cara vinha fazer uma pergunta para ele. Que às vezes a gente responde o que quer, não o que o cara pergunta [risos]. Quem não faz isso? - “Ah, Juninho, banana?”. - “Bom, a laranja que eu comprei...” [risos]. Estou falando de fruta também. Então, eu sabia que eu tinha todos os recursos pelo meu histórico de jovem, de sequência de seleções de base, profissional, e tal... Para mim é uma derrotinha que eu tenho na minha carreira, eu estar no Corinthians e não ir para a Copa de 86. Para mim foi um passo negativo, talvez um resultado negativo, porque eu tinha condições... Apesar que o Júlio César, que veio nessa Copa do Mundo, tinha uma condição muito boa, jogou, foi titular... Inclusive foi o titular. E eu imaginava que eu seria abordado para ser contratado, quando eu chegasse na Ponte Preta, a Ponte Preta seria pressionada para vender, mas o que mais me passou pela cabeça foi a oportunidade perdida. Isso aí é impagável. Você vai a uma Copa do Mundo... Esse ciclo todo que você vive todo dia, que é pai, irmão, amigo, parente... Que eu sou do interior, eu tenho que reportar a amizade que eu tenho com 20 caras que, até hoje, “nego” me encontra: - “Juninho, vamos falar da Copa de 82”. - “Perai, abre uma aí para relaxar!” [risos]. Porque os caras gostam. Eu sou uma pessoa do interior, sou razoavelmente comunicativo, e eu tenho esse contato... Imagina você chegar de uma Copa do Mundo campeão do mundo. Então é assim, para a cidade, para a família, para o parente, para mim, para todo mundo... Eu tenho um amigo lá em Ribeirão, de vez quando ele me encontra ele fala para os caras: - “Eu estudei com o Juninho”. Rapaz, isso representa para mim. Ele deve achar que, para ele, não é interessante, para mim é interessante. Por quê? Ele olha para mim e fala assim: - “Ele não mudou muito”. Porque é facinho a gente mudar, porque vem muita informação, vem muito dinheiro, vem muito poder, é um perigo danado. Essa velocidade que entra o dinheiro na sua vida, a sua exposição. Porque para mim era o mais importante, para a minha família, para mim. Acho que mais para a minha família, o pai, a mãe, e tal. E a cidade em si, um cara da cidade faz aquela coisa toda. E foi uma coisa que eu senti muito. Quando nós voltamos para o Brasil, voltava pelo Rio de Janeiro, não voltava por São Paulo. Aí paramos lá no Rio, desceu uma turma, não deu nem para despedir dos caras. “Nego” desceu, foi uma choradeira. Acho que foi o pior momento de todos. Eu me lembro que o Magrão ficou desesperado, Sócrates, que era um cara bem maduro. O Magrão, ele nunca expressou muito sentimento, muita emoção. Eu já sou diferente, me emociona, o bicho pega Transcrição

[risos]. E você percebe que os maduros sentiram muito também. Nós, os jovens, sentimos, e de alguma forma você imagina que vai para uma outra Copa do Mundo, mas os mais velhos, será que teriam outra oportunidade? Uma coisa que marcou muito foi o silêncio do avião da volta. Durou aquele treco [risos]. Parece que a Europa ficou mais longe ainda. Eu não lembro, nós saímos de Madri, acho que foi direto para o Rio, que deve demorar umas seis, sete horas, foi aquele silêncio. Nada a ver com aquela alegria que nós tínhamos, que fazia dois anos que o Serginho cantava a Dona Ivone Lara [risos], o Junior cantava todas as músicas de escola de samba... Eu, paulista do interior, sabia as músicas de escola de samba de tanto que os caras cantavam. Mas não foi nada disso, foi muito triste, muito ruim.

B. B. – Juninho, a sua contratação, então, para o Corinthians, ela foi costurada durante a Copa...

A. J. – Foi.

B. B. – Ou já antes ela estava em processo?

A. J. – O principal sinal foi que, acidentalmente, naquele timão de 82, tinha dois da PontePreta. Estava eu e Carlos lá, dois reservas, não tem importância, depois ele foi titular. Cada um titular que foi da Ponte representa todos nós [risos]. E você vê que eu fui para o Corinthians, depois o Carlos foi. Eu vim primeiro. Aí, começamos: - “Magrão, olha, o que vocês fazem lá no Corinthians? Porque lá na Ponte nós fazemos o seguinte: vai contratar um jogador? Espera, vai contratar quem? Indica um cara de nós e vamos formar uma comissão. – ‘Pessoal, esse cara aqui, aquele ‘nego’ ali conhece.’ Não seria interessante?”. Então, lá na PontePreta – isso é bem possível que o Polozzi diga também, o Carlos pode dizer, o Oscar pode dizer, o Éder, uns cinco, seis que foram em Copa do Mundo – que lá no PontePreta nós tínhamos uma participação enquanto alguns procedimentos. Porque criou-se a democracia, dava a impressão que ela era, por um lado, levado para baderna, por causa das bebidas, da noitada, e por causa da ação política. Mas a ação, na verdade, era política e esportiva. Por quê? Você tem condição Transcrição

de indicar... Eu sou o dono de um jornal, e um diretor meu indica um jornalista. Por que não? Melhor do que eu ir procurar. Porque é muito sensível a entrada de uma pessoa em um grupo. O cara entra, um grupo de homens, cerca território, ele faz xixi... [risos]. Aqui é meu território! E o cara chega no clube, ele está amparado por um braço já pra trazer ele para dentro do território. Então isso pesa muito no mistério “homens juntos”. Pesa muito, porque o cara está chegando, vai tomar o lugar de alguém,. Nós estamos indicando um para tomar o lugar dos nossos. Vê o perigo que é isso, que poucos que dizem por ai. - “Espera aí, vamos contratar um goleiro”. - “Olha, vou indicar o Carlos”. Eu estou dizendo para o Solito: - “Solito, eu estou te botando fora”. É um perigo danado. Tanto é que tem muitas críticas a respeito da democracia. E isso foi costurado lá, quando eu cheguei em São Paulo, que nós passamos no aeroporto pequenininho, o Adílson foi lá falar um “oi” para mim, o Magrão, tal, tal... - “Olha, a ideia está plantada, eu acho que o Magrão e o Adílson deviam se falar pelo telefone, a ideia está plantada, e esse ano mesmo nós vamos tentar”. Criou a possibilidade. E quando foram, realmente, falar comigo, que não existia empresário, era direto, falei: - “Olha, mas é o seguinte: eu acho que tem dois aqui que dá para levar, o Carlos e o Abobrão”. Aí foi o Carlos e depois, em seguida, foi o Abobrão. E em seguida foi o Jair Picerni, que veio, abreviou um pedaço, que ele foi para a Olimpíada de 84. Então começou a costurar lá, mas costurar mesmo, uma agulhada boa, não era retalho não, era coisa boa. E aí resultou que eu vim para o Corinthians um dia, foi muito interessante também.

F. S. – E aí que você chega, no início de 83...

A. J. – Isso.

F. S. – E como é que foi a sua inclusão ali dentro daquele ambiente onde os jogadores tinham tanta participação nos destinos do time quanto o diretor e o presidente? Foi uma coisa que você se adaptou rapidamente?

A. J. – Não foi, foi na “marra”. Na “marra” pelo seguinte: eu tinha um status lá, não era o status que eu entrava aqui. Isso é uma coisa também que o atleta... Entrar no Transcrição

grupo... Eu saí de um grupo que eu tinha uma presença, eu tinha uma responsabilidade... Eu lembro que eu estava jogando na Ponte, intervalo do jogo eu falava assim: - “Você está morto – dizendo para mim – mas por que estou morto? Você não falou nada, você não reclamou, você não meteu o pé em ninguém, você não fez nada. O que você está fazendo?”. Os jogadores cobravam. Que a defesa da Ponte Preta sempre foi famosa, de não tomar muito gol, e tal. Então você chega aqui no Corinthians, e não é você que é o famoso, você faz parte de um grupo de famosos. Tem o Sócrates, tem o Vladimir, o Casagrande, o Zenon, os seus companheiros da posição também contam. Então, eu demorei muito para me ajustar. Para mim ficou muito grande. Para mim, o impacto do Corinthians foi muito grande. Porque, poxa, estou falando da Ponte Preta. Hoje, no mundo, a Ponte Preta deve ter quantos milhões de torcedores? O Corinthians tem uns 35 milhões. Eles são loucos, e cada dia vai aumentando mais, ficando mais loucos [risos], e aumentando o número. E foi muito diferente para mim, eu sofri muito. Eu lembro que eu dizia para a minha esposa Cláudia: - “Olha, isso aqui não vai dar certo”. Porque eu tinha um status lá razoável para caramba. Chegava lá, o primeiro a fazer contrato? Juninho. Aí os caras falavam: - “Juninho, não conta para ninguém quanto você ganha”. - “Vamos lá, é você”. - “Pede tanto que os caras vão dar. Se não der, você não assina”. Então nós tínhamos tudo isso na Ponte Preta. Um assessorava o outro, nós tínhamos uma coisa bonitinha lá. E quando eu vim para cá, era o que tinha aqui. Aí eu demorei um pouco até pra jogar. Eu lembro que nós jogamos um jogo contra o Palmeiras, nós perdemos de dois a um, o Morumbi estava reformando pra um show. Eu lembro que eu estava marcando o Wagner Bacharel, aquele que morreu. E ele fez o segundo gol, Nossa Senhora! Cheguei na minha casa com aquela pressão, Nossa Senhora! O cara fez o segundo gol, eu que estava marcando o cara, meu Deus do céu! Porque era Corinthians. E é muito impactante na nossa vida. Tão impactante, ou mais, do que o primeiro jogo que você faz, a primeira vez que você vai para a Seleção, porque o Corinthians... E aquele momento político, Nossa Senhora! Foi uma experiência assim, eu demorei uns quatro, cinco meses para me ajustar, até dentro do campo, encontrar o parceiro ideal. Que eu tinha um parceirão lá. Eu tinha um parceiro que jogava do meu lado há cinco anos. - “Nenê, você está vendo que você está uma merda?” (Desculpe). - “Você está vendo que você está todo torto? Dá para você ficar um pouquinho mais para cá?” Transcrição

[risos]. Você sabe que o cara está a meio metro para frente, você está olhando para a bola e o cara está meio metro para frente, você não pode ficar meio metro para frente, você tem que ajeitar o cara. Isso a gente tinha como um comando. No Corinthians era um pouco menos exposto, as cobranças. Porque você está lidando com um outro cara grandão, ou com um cara que ainda não te conhece. Eu demorei demais para entender o ambiente do Corinthians. Demais. Demorei seis meses, com certeza.

B. B. – Então você já tinha jogado, nas finais, 77, contra o Corinthians, e jogar com a torcida, como é que era isso? É pressão, ou é o apoio...?

A. J. – Isso é a coisa mais bacana que tem. Porque quando eles resolvem torcer a favor, fica a descida. Rapaz, se eles resolverem torcer contra, se prepare, que se você pegar na bola, o cara te vaia. Só que é o seguinte: o corintiano vai no jogo. O corintiano, ele vive o jogo. Ele é aquele torcedor que percebe logo se você colocou todo o teu entusiasmo na disputa de bola. Se chega aqui, eu vim da minha condição física, de ser um jogador com muita dedicação, com ótimo condicionamento físico, para mim, a adaptação com a torcida do Corinthians foi a mais fácil de todas. Porque eu corria para caramba, eu lutava, metia os pés nos caras quando não dava, fazia falta, ia expulso... Aquela presepada que era obrigado a fazer por causa da posição. Agora, chegou um dia que... o jogo de 84 contra o Flamengo, que acidentalmente eu comecei a fazer movimento para a torcida, e aquilo refletiu. Garanto para vocês que aquilo não foi preestabelecido, não foi. Porque eu achava que era muito difícil reverter o processo e ganhar do Flamengo. Quando nós fomos lá, o Magrão resolveu fazer o jogo com os irmãos dele lá, com os irmãos do Hélio Rubens lá em Franca, ele se contundiu... É isso, não é? Ele se contundiu, veio para o jogo e não jogou o primeiro jogo, nós jogamos em uma retranca desgraçada, mas perdemos de dois a zero, gol do Bebeto e um gol do Élder, qualquer coisa assim. Quando nós chegamos no Morumbi, nós sabíamos o tamanho que era a dificuldade. Você vai jogar contra o Flamengo, o Flamengo que, há pouco tempo campeão da Libertadores, campeão do mundo. O Zico não estava mais. Mas era o Flamengo. E você precisa ganhar do cara de dois a zero. “Peraí, pô, não é qualquer coisa!”. E aí criou esse negócio, por alguma razão eu manifestei uma posição Transcrição

com a torcida, a torcida refletiu, aí virou aquela febre. Que usou, que virou o maestro de não sei o que lá... Mas puro acidente aquilo, não foi uma coisa...

B. B. – Foi instintivo aquilo?

A. J. – Talvez fruto da emoção, é bem provável que tenha sido fruto da emoção. Porque eu sabia o quanto era difícil, eu sei o quanto que é difícil ganhar um jogo de futebol. - “Ah, vamos jogar contra aquele time, eu vou ganhar”. Você avisou ao cara? [risos]. Eu vou correr 100 metros rasos, eu posso correr mais que o Usain Bolt, porque ele corre lá e eu corro aqui, aí eu tenho a minha meta. - “Agora, eu vou ganhar aquele time lá”. - “Duvido”. Está bom, qualquer um ganha do time . [risos] Entendeu? Então é complexo você falar “Eu vou ganhar de alguém”, em futebol. Pô, espera aí. Se os caras ficarem em linha, eu tenho que passar por 11. E ganhar de dois a zero. Agora, a torcida contribuiu muito. Porque a torcida... a hora que fez um a zero, eles fizeram uma gritaria lá no Morumbi, rapaz! Aquilo parecia... Que o som, acho que o som não sai, fica rodando lá, fazendo um monte de eco lá, e aquele barulho, nossa! A gente fez dois a zero... Na hora que o Paulinho fez o gol contra, que acho que estava três a zero e ficou três a um, aí já não podia tomar um segundo gol, você percebe que você tem dois minutos assim... Rapaz, espera aí, eu estava indo tudo bem, e agora? Mas é um jogo que marca a minha vida, com certeza. Um jogo muito bacana, e eu tinha sido campeão em 83, mas em campeonato brasileiro... E aquela época, Campeonato Brasileiro classificava dois times para a Libertadores. Nossa Senhora, você ir para a final, já era, assim, um impacto muito grande. Nós sabíamos que depois nós tínhamos que enfrentar outras equipes fortes, depois perdemos para o Fluminense, mas foi muito bacana. O jogo anterior, que nós ganhamos do Atlético... Nós cometemos um erro besta em um jogo de campeonato, que o Magrão foi se meter a falar que nós estávamos classificados, perdemos de cinco a um para o Náutico que deu uma febre. Os caras ligando lá do hotel: - “Em que lugar que nós vamos classificar?”. Rapaz, nós fomos para a imprensa, meu Deus. Foi um perigo danado. Mas foi um jogo que marcou minha vida, bacana.

Transcrição

F. S. – E nessa época, o Corinthians acaba virando um pouco o time da moda, com essa coisa de Democracia Corinthiana, e você acaba até participando um pouco disso, por exemplo, as imagens do Sócrates aparecendo no comício das Diretas...

A. J. – É, nós fomos lá.

F. S. – Como é que foi esse processo de você ir também...

A. J. – A verdade é que eu passei a me interessar pelo que é o Brasil... Porque lembra, eu convivi em um período que tinha a ditadura militar, só que eu não sofri essa retaliação, nada. Porque eu era um desportista razoavelzinho na minha escola – eu já contei para vocês – eu tinha privilégio. Juninho corre, pula, salta, faz de tudo. Então eu não senti aquele peso. Mas quando eu cheguei aqui, quando eu vi São Paulo desse tamanho – que já era essa coisa grande – que eu comecei a perceber: - “Mas espera aí, tem um monte de gente muito pior, tem uma condição muito pior”. Eu comecei a entender da política. Na verdade eu virei... Algum entendimento político, por causa daquele período. Aí que eu fui entender que em sessenta e pouco, deportados, os caras que foram exilados... Aí que eu fui entender, nos encontramos com o presidente Lula, o PT... Comecei a entender tudo aquilo, as greves... Culturalmente, foi um período muito interessante na minha vida. Não tanto agora quanto o período agora que eu voltei a estudar. Estudar é chique, muito bacana [risos]. Mas, no meu caso, o entendimento pessoal foi muito interessante, porque nós ficamos assim: - “Pô, nós podemos dizer alguma coisa”. E é interessante que o cara já nos conhece. Você imagina, vai lá naquele palanque tinha uns 10 “negos” que eram os caras mais importantes do Brasil. Da política contra a situação. Esses caras tudo viraram presidente, senador, e eram já. E nós, jogadores... O Sócrates foi lá, acho que ele exagerou, que ele disse que não ia embora, botou em risco a confiança, tal. Mas acho que era o momento que tinha. Porque foi um movimento exclusivamente paulista e corintiano. Você não viu pipocar isso, pelo menos eu não lembro. O Adílson contou uma coisa interessante para nós, algum tempo atrás, sobre a pressão que eles tomaram na segunda-feira, que eles fizeram a camisa “Vote dia 15”. Eu não sabia disso. Ele me contou agora, em um evento que teve aqui. Transcrição

Falei: - “Adilson, conta aí pra mim, que eu não lembro”. - “Juninho, aquele jogo, tal... Depois do jogo nós fomos lá para o CND – acho que era CND – e lá tinham dois militares que falaram: 'Você está ficando louco, rapaz? Você está fazendo confusão, você vai arrumar briga'”. Porque, o que me parece, que a preocupação era fomentar briga. Um milhão de pessoas no local, e com certeza a policia de São Paulo não tinha condição de estar controlando tantas pessoas. E se vira uma debandada lá? Com certeza era uma preocupação pertinente, com relação à segurança. Agora, com relação à posição, foi muito bacana. Um dia que eu vi um livro com a minha fotografia lá na frente. Nossa Senhora! [risos]. Os caras vão dizer: - “O que o Juninho está fazendo ali no meio? Está ficando louco”. Foi uma coisa bacana, que alguns do Corinthians participaram muito, outros não. Todo mundo sabe disso, o Leão não participou, tinha uma turma... Mas eu acho que a divergência que foi que criou um ambiente legal. “Olha, tem gente que não concorda com isso que nós estamos fazendo.” Muito embora nós tenhamos votado no Leão pra ser contratado. Eu votei no Leão para ser contratado sem jogar no Corinthians. Eles ligaram para mim lá em Olímpia, para a casa do meu sogro: - “Olha, Juninho, nós estamos querendo contratar o Leão”. - “E daí? Você segura a bucha?” Porque no campo, pelo amor de Deus! No campo, inclusive nessas finais de 83, ele jogou bem para caramba. Com aquela meia inventada, aquela febre zebrada que ele inventou. Então acho que a divergência de um grupo contra o outro, na verdade, eu acho que subiu. Ele melhorou, colocou uma média melhor nas discussões entre nós, para depois refletir fora.

B. B. – Essas circunstâncias contribuíram para uma politização ali naquele momento, desde então isso continuou a ser uma preocupação sua, ou passada a Democracia…?

A. J. – Não, hoje eu tenho um entendimento mais bacana, mais pertinente, mais politizado, como é das populações que eu conheci no Brasil, o gaúcho. Eu fui trabalhar no Rio Grande do Sul como técnico, e eu percebi o tanto que eles têm uma condição especial de política. A política está vivendo, da situação, a pontualidade. Só que eles caminham junto com um entendimento político muito bacana. Então hoje eu tenho, por Transcrição

exemplo, quando tem... Eu assisto debate, eu acho interessante. Assisti um debate na minha cidade agora, foi péssimo [risos]. - “Porque você falou isso...”. Rapaz, os caras não conseguiram falar assim: - “Meu amigo, eu vou fazer isso. Se você está achando que eu não vou fazer, o problema é seu”. Eu acho que o Brasil, ele ainda engatinha politicamente. Porque os debates não são bem disponibilizados, falta alguma coisa. Não estou comparando com nada, nem com Estados Unidos, com nada, estamos comparando conosco mesmo. Nós já temos maturidade para saber fazer uma coisa mais bacana. E o Brasil está crescendo, infelizmente tem vários políticos daquela época que ainda estão hoje, que é uma coisa que... é claro que nós temos um mundo novo hoje, nós temos um monte de jovens, mulheres... Olha que bacana, nós temos uma mulher de presidente. Ribeirão tem uma mulher de prefeita. Hoje o país está avançado, mas, em termos do que poderia ser politicamente... Disso que eu aprendi a estudar, a ler, porque eu leio editorial, eu vou atrás de coisa para saber. O que os caras estão falando dos candidatos? O julgamento do “mensalão” é coisa chique para caramba [risos]. Vai consagrar uns quatro, cinco “negos” lá. E “nego” vai dizer: - “Aquele ali votou a favor daquele...”. Mas foi um momento bacana. O entendimento político, para nós, eu julgo que é uma coisa muito importante. Eu fui secretário de esportes, sem competência nenhuma, em Ribeirão Preto. Eu demorei seis meses para entender. Você tem o entendimento político, financeiro e administrativo, coisa que para nós parece que é fácil... Dificílimo.

F. S. – Outro aspecto dessa popularização do Corinthians foi a aparição na mídia, por exemplo, a novela Vereda Tropical...

A. J. – Vereda Tropical.

F. S. – Como é que foi isso?

A. J. – Vereda Tropical foi um acidente [risos]. Outro dia a Globo falou que tinha a ver com o Casagrande... Balela. O Silvio de Abreu enviou um auxiliar dele lá, como chama?

Transcrição

F. S. – Colaborador.

A. J. – Como é que chama aquele cara? Carlos não sei o que lá.

F. S. – Carlos Lombardi?

A. J. – Carlos Lombardi. Que fez parte... Nós nos concentrávamos, aqui em São Paulo, no mesmo hotel. E vários artistas, foi lá que nós conhecemos Cazuza, a musiquinha dele, “Bete Balanço”, ele tocou uma música para nós lá, eu falei: - “Rapaz, esse é o Cazuza!” [risos]. E aquela roupinha que ele estava usando lá, eu falei: - “Nossa, que bacana!” [risos]. E lá no hotel a gente conhecia as pessoas, estavam lá e tal, e nessa oportunidade... que fato que foi importante, que eu me perdi?

B. B. – No contexto da novela?

A. J. – É. O Carlos Lombardi ficou duas, três concentrações conosco. Aí o Magrão, o Adilson: - “Ah, o Juninho teve uma contusão, que depois da contusão ele melhorou, que ele não jogava nada, e passou a jogar um pouquinho mais...”. Aquelas piadinhas. Não é muito piada, é mais para verdade [risos]. – “E o Juninho se recuperou...” Realmente eu tive uma contusão muito séria, e uma contusão... Bem provável que ela tenha mexido tanto no meu aspecto físico quanto no meu aspecto intelectual. Eu devo ter melhorado alguma coisa daquelas frescuras que eu tinha. E ai ele se interessou com aquilo: – “Mas como, Juninho?” – “Eu realmente me contundi, tive um sinal positivo de uma parte da medicina, um sinal negativo, e deu positivo e tal”. Aí ele falou: - “Eu vou colocar isso no Luquinha”. Eu falei: - “Quem é o tal do Luquinha?” – “Mário Gomes.” Eu falei: - “Eu posso participar com o quê?” – “Você vai participar com algumas coisas que você me disser, eu vou tentar introduzir, e é bem provável que a gente venha aqui, faça uma gravação, e tal.” No final, Luquinha realmente foi um atleta, que teve uma contusão... Muito do que eu falei o Silvio de Abreu colocou na novela. Isso é uma coisa muito bacana. E aí nós fizemos uma participação no Morumbi, uma participação lá na Fazendinha ainda, no campo antigo, Transcrição

não estava tão bacana como é agora. Foi uma experiência... Não tem nada a ver. É muito mais fácil jogar futebol do que ser ator [risos]. “Gravando!” Ih, cadê a bola?! [risos]. Não, foi muito difícil. Mas muito bacana também, porque foi um conhecimento artístico. Talvez depois disso eu tenha até me interessado mais por música, que é uma coisa que depois de adulto eu passei a me interessar, por cinema, por teatro. Passei a me interessar justamente nessa época. Que para mim foi um presente, levar um pouquinho da minha história para um personagem... E novela no Brasil, que pelo jeito, é bem feita. Que toda hora dá Ibope... Não sei se é comprado esse Ibope, mas deixa para lá [risos]. É o mesmo Ibope que os caras falam antes do cara ser eleito, meu Deus do céu, isso é um perigo!

B. B. – Mas, na época, fez bastante sucesso a novela, não sei se dá para comparar com essa de agora que terminou, que também tem um...

A. J. – Tem um expediente esportivo, é legal.

B. B. – Um jogador de futebol. Mas as pessoas associaram a você o personagem?

A. J. – No período? Nossa Senhora, eu era sempre abordado: - “Ah, mas você não tem a ver com aquele cara lá, que é o Luquinha...” Não lembro quem que era... Acho que a Aracy Balabanian que era a mãe dele, ele tinha dois, três irmãos, não lembro bem.

B. B. – Se passava em uma cantina italiana...

A. J. – Isso. Assim, foi a maior exposição que eu tive. Porque, por ser falador, ter facilidade para explicar as coisas, não ter medo de explicar as coisas, meio louco assim, e aí o Silvio de Abreu... Hoje, inclusive, eu vi uma revista, eu falei: - “Nossa Senhora, isso aqui eu preciso botar em um lugar para ‘nego’ ver: o Juninho participou até na...”. Foi muito bacana, enquanto pessoa. Acho que para a minha vida esportiva não... Valorizou, pelo fato de eu ter tido uma contusão muito séria, eu acho que é até um exemplo para os jovens, quando tem uma contusão. Esse expediente foi muito legal. Transcrição

B. B. – No fim desse ciclo no Corinthians...

F. S. – A saída do Sócrates já dá uma baqueada na Democracia?

A. J. – Foi. No campo, o Corinthians contratou quatro caras para substituir o Sócrates: Paulo César Capeta, Arturzinho, Lima e João Paulo. Quatro caras para substituir ele. O Sócrates e o Casagrande. Porque a saída do Casagrande tem tanto impacto para o que era o jogo – estou falando só de jogo, futebol -, a saída do Casagrande e do Sócrates fez o impacto no expediente que o Corinthians tinha, desde 80 o Corinthians está se recuperando, que ele foi para a série de prata, não é?

F. S. – De Prata.

A. J. – Era a chamada segunda divisão, e depois voltou e tal. A saída do Sócrates, e saiu um grande de um escudo. O anteparo e, ao mesmo tempo, porta-voz. Que ele tinha aquelas explicações políticas que ele dava lá, que acho que nem ele entendia [risos], falava: - “Magrão, fala aí. Traduz para o português. Para de Grunhar aí”, que ele falava de um jeito estranho lá. E a saída dele foi, realmente, foi o primeiro passo... Porque, quando eu vim para o Corinthians, eu perguntei: - “Isso aí que vocês estão fazendo tem a ver com resultado?”. -”Não, isso aqui que nós estamos fazendo não tem a ver com resultado.”Não é assim a vida. A vida, no esporte, é resultado. Eu também não entendia isso, porque pelo fato de jogar na Ponte Preta e os resultados virem em menor número, os que vinham já até que satisfaziam. Ser segundo colocado jogando pela Ponte Preta, eu acho que é muito bacana. Agora, ser segundo colocado no Corinthians... Tem hora que não vale nada. E, naquela época, valia muito pouco. Então, a saída do Sócrates foi assim: abriu a porteira. Aí veio uma eleição que o pai do Bolacheiro – Bolacheiro, Adílson Monteiro Alves , que eles tinham fábrica lá, o seu Orlando – a derrota do seu Orlando foi um impacto. A hora que ele perdeu eu falei: - “Gente, se prepara porque isso aqui não vai durar muito.” Aí no final desse ano ele ligou para mim e falou assim: - “Juninho, você nem vem treinar.” Eu já sabia que isso ia acontecer, porque você se Transcrição

expõe. No momento que você está em um clube intenso, como é o Corinthians, você começa a dar opinião, criticar, a ter concentração... Nós discutíamos por tudo: - “Ah, vai ter concentração.” - “Por quê? Qual o motivo? Se concentração fosse bom, o time da cadeia era campeão!” Aquelas frases bestas que você usa para explicar as coisas, que, às vezes não têm nem pé nem cabeça. Mas a saída do Sócrates foi o primeiro sinal. Vermelho, não ficou nem amarelo. Ou então ficou laranja, andando para o vermelho. No final, acho que, coisa de oito meses depois, eu, Vladimir, uma turma aí, foi tudo embora.

F. S. – Você chega a conviver com o que se chamou de “seleção de papel”, que com o dinheiro da saída do Sócrates, o Corinthians constrói um time com a vinda do De León...

A. J. – O Serginho. Esse foi o segundo Corinthians.

F. S. – Sim.

A. J. – O primeiro Corinthians foi esse com esses quatro. Depois, para tentar trazer um status melhor, porque nós tínhamos... Apesar que o campeonato de 84, que nós perdemos para o Santos no último jogo, nós tivemos uma recuperação muito bacana no período, jogamos... de 10 partidas, acho que ganhamos nove, oito. Uma recuperação que acho que nem estava tabulada. Eu lembro que o Eduardo Amorim falou -nós fizemos uma reunião: - “Gente, acho que não dá mais.” Faltavam 10 partidas. Ele falou: - “Pô, nós estamos no Corinthians, dá para ganhar 10 partidas seguidas”. Rapaz, que pressão! Você vai ganhando e um a zero, dois a um, apertado, Nossa Senhora! Aí no último jogo, acho que nós cometemos um erro lá – deixa eu falar desse jogo, é interessante. Ponte Preta e Corinthians jogando, XV de Piracicaba e Santos jogando. Está empatado lá – nessa época era por rádio –, está empatado lá. Se nós perdêssemos para a Ponte, nós nem iríamos disputar, porque a diferença era 54 a 55, se não me engano. Então, no intervalo do jogo, nós falamos: - “Gente, lá está empatado, nós não podemos perder de jeito nenhum.” Depois disso, nós percebemos que, se nós Transcrição

ganhássemos o jogo, nós íamos, por causa do número de vitórias, com a vantagem do empate aqui. E como eu falei, a vantagem do empate, é melhor entrar com a vantagem do empate. Pode ser que você perca, mas é melhor entrar com a vantagem do empate, porque você contorna o jogo melhor. E aí um jogo dificílimo, o Santos um time maduro também. O Santos tinha entrado com uma proposta de brigar se tomasse gol. Aquilo foi uma “zebra”. O dia que os caras falaram isso na segunda-feira, na terça-feira, nós entramos para bater nos caras, deu um mal-estar, que durante o jogo eu resolvi brigar com o Rodolfo Rodríguez, que era um uruguaio que tinha uns seis metros de altura [risos]. Discuti lá, subi de cabeça, e tal.

B. B. – Goleiro?

A. J. – É. Só que o que os caras falaram na segunda-feira foi péssimo. Deu a impressão que nós perdemos na força, foi péssimo. Até hoje nenhum deles se retratou. Mas a gente pode dizer: - “Gente, nós estamos fazendo só pose, porque nós fomos campeões.” Não sei se aquilo foi estabelecido mesmo, mas foi muito ruim. Essa derrota... E em seguida, uma coisa que aconteceu, o Corinthians marcou uma reapresentação, e nós discutimos. Uma turma veio em um dia e a outra turma veio no outro. Nossa Senhora, o grupo entrou rachado. Não tinha a liderança que tinha. Que se o Magrão estava lá, falava: - “Peraí, vocês não sabem nada, pega a bola e dá para mim.” Que era o que nós fazíamos, pegávamos a bola e dávamos para o Magrão. No campo, fora do campo ele segura, ele ampara. Aí começou a rachar. O que rachou mesmo em 85, começou a rachar, na verdade, não foi por causa que o De León veio. Quando ele veio para o grupo, já estava rachado, com certeza absoluta.

B. B. – E sua ida para o Vasco...

[Voz masculina] - Bernardo, só um segundo que vou trocar a fita.

A. J. – E o café, tem chance?

Transcrição

B. G. – Vou providenciar ele agora.

A. J. – Nossa, tem tanto detalhe que a gente tem que falar, cara [risos]. Tem “nego” que vai ver isso e vai falar: - “O Juninho é louco, ele fala...”. Eu falo mesmo. É para falar a verdade, ou é para inventar? Para inventar uma coisa para daqui 10 minutos vai perguntar e vou falar que é mentira? [risos]. Mas eu lembro, o Eduardo Amorim falou – que o Eduardo, ele é um cara que não era, assim, um líder de muita palavra. Ele era um líder de maturidade, ele era o mais velho de todos nós. Mais velho que o Magrão... E o Eduardo era mais velho mesmo, que ele veio daquele Cruzeiro de 70, aquele Cruzeiraço lá, era daquela turma. E ele falou: - “Gente... Ou a gente abafa logo, junta todo mundo e fala: Olha, esquece o que aconteceu, porque veio uma turma em um dia e outra turma no outro”. E alguns – não lembro onde que eu estava – trataram uma coisa e fizeram outra. Para grupo isso é terrível. Aí quando o De León chegou, já estava... O Serginho, e aí... Foi o maior time ruim que eu joguei [risos]

[FINAL DO ARQUIVO I]

B. B. – Então, você estava nos contando, falando do final do ciclo no Corinthians, já da desintegração do grupo. Como é que se deu a sua ida, a transferência para o Vasco da Gama?

A. J. – Eu fui para o Juventus...

B. B. – Antes do Vasco?

A. J. – Antes do Vasco eu vim para o Juventus que, como eu falei, eu fui colocado à disponibilidade. Eu não lembro como eram as leis, especificamente, mas tinha que fazer um documento para o cara ficar treinando em casa, alguma coisa assim. Naquela Transcrição

época não era obrigado a dar treinamento que nem hoje, você vai afastar o jogador. Perdão, você tem que dar o treinamento... Uns procedimentos jurídicos aí. E eu fiquei na minha casa. Aí, o que aconteceu? Eu estava à venda, tinha aquele negócio: o passe do Juninho está à venda. Meu contrato terminaria no meio do ano, que era o ano de 86. O pessoal do Juventus me ligou, eu morava aqui em São Paulo, na capital, me ligou e falou: - “Olha, nós vamos fazer um time com uma turma mais velha.” O que é turma mais velha? Isso foi em 86, acho que fazia 28 anos. E tinha um negócio da lei, tinha um aditivo lá, que passava a ganhar um percentual do passe. E achei interessante esse expediente, que já fazia três anos que eu tinha vindo para o Corinthians, eu já tinha direito aos 15% de novo. E aí nós fomos para o Juventus, fizemos um time lá bacaninha, com uns oito ou nove jogadores vindos de times grandes, do São Paulo, do Palmeiras, e tal, aí eu fui para o Vasco. Mas no Vasco, eu não andei bem, por quê? O dia que o Eurico Miranda me contratou, ele falou assim: - “Filho, lá não tem esse negócio de democracia não.” Eu falei: - “Rapaz!” [risos]. Eurico Miranda. Me contratou em um hotel aqui, em São Paulo. - “Lá não tem democracia não.” Eu falava: - “Gente!” [risos]. Aí eu fui jogar no Vasco, eu consegui, em algum período, ser titular, até joguei razoavelmente bem, mas não criou o expediente de ficar no Vasco não. Como eu falei para vocês, algum descuido na carreira aí, eu comecei a ter um recuo da carreira. Que deu uma levantada quando eu fui para o Cruzeiro. Quando eu fui para o Cruzeiro, que eu, bem maduro, tinha nascido minha filha Helena, ela nasceu nesse período, eu lembro que eu tinha... Eu quebrei o quinto metatarso... Essa contusão atrapalhou muito mais do que a contusão do joelho. Porque eu já era titular do Cruzeiro, isso foi no ano da Copa União.

F. S. –87.

A. J. – É, da Copa União, 87. Aquela briga do Flamengo com não sei quem lá é desse ano.

B. B. – Sport.

Transcrição

A. J. – Isso. Eu estava no Cruzeiro, Cruzeiro com um time bom, rapaz. Ademir Kaefer jogou no meio de campo.

F. S. – Semifinalista, não é?

A. J. – Isso. Perdeu para o …

F. S. – Para o Inter.

A. J. – É, para o Internacional, gol do Amarildo lá. E no dia anterior o Flamengo tinha ganho do Atlético. Os dois mineiros perderam lá. E o Cruzeiro é um timão, cara. Até porque já tinha concentração, e tal. Então, eu investi tudo quando eu fui para o Cruzeiro, e tinha... Eu já era titular do Cruzeiro, eu era capitão do time, no período que eu joguei, quebrei o quinto metatarso. Nossa Senhora, isso foi a derrocada.

B. B. – Foi no início?

A. J. – É, foi no sexto ou sétimo jogo que eu estava jogando. Eu estava jogando com o Heraldo, que é um zagueiro que jogou comigo em uma seleção de novos, eu e Heraldão. O homem parecia um poste. - “Heraldão, você sai caçando...” Nós adotamos até um jeito de jogar lá diferente, o Jair Pereira era o nosso treinador, falei: - “Jair, vamos fazer um negócio assim, que nós fizemos...” Eu e Heraldo já tínhamos feito na Seleção, no primeiro mundial de junior. Nossa! Tanto é que o Heraldo ficou, logo em seguida começou a ter a Recopa, uns campeonatos internacionais. E aí, realmente, eu acho que foi a última oportunidade que eu tive de me manter em um estágio, já com 30 anos. Que, naquela época, 30 anos é assim, um paradoxo: 30 anos, alguns, outros, a maioria, não passa. Aí, infelizmente, foi o marco, aí eu voltei para o Juventus, joguei no Nacional, aqui da capital, também. Muito mais por acomodação, tinha um time aqui... Aí fui jogar em Olímpia, que foi uma experiência muito bacana. Eu voltei a jogar na minha cidade...

Transcrição

B. B. – Jogou pelo XV de Piracicaba?

A. J. – Joguei pelo XV de Piracicaba, logo depois que eu voltei do Cruzeiro. Mas no XVeu também não consegui. A única coisa de bom que eu fiz no XVfoi ganhar um Gol [risos]. Fizemos uma mutreta lá, ficamos sabendo... Tinha um expediente, Gol. Quem fazia Gol ganhavao carro. Falava assim: - “Saiu o pênalti, Juninho. O sorteio é o número três”. Falei: - “Deixa com o velho” [risos]. Foi XV de Piracicaba e Palmeiras, foi três a três o jogo. Dois jogadores ganharam o Gol, que ganhava um jogador e um torcedor. Mas eu fui para o XV de Piracicaba com o pé, Nossa Senhora... Tinha um calo no meu pé esquerdo, isso me atrapalhou muito. Na verdade, como eu disse, é uma contusão que me atrapalhou muito. Aí eu joguei no XV, participei de um jogo interessante, foi um jogo da Portuguesa, que apagou a luz. Estava um a zero para nós. Descobriram que tinha um gato que entrou lá. O gato entrou certinho na casinha de energia elétrica [risos]. O gato chegou, abriu a porta, entrou e morreu, e apagou a luz [risos]. Rapaz! Se a Brigitte Bardot ficar sabendo disso ela vai falar: - “Pô, mas meu gatinho!”. Essa foi duas coisas interessantes que aconteceram no XV de Piracicaba. Foi interessante porque nós trabalhamos com o seu Mário. Seu Mário Travaglini, que era da turma da Democracia, foi nosso técnico na época, falava: - “Juninho, viver é um ato político”. Falei: - “Nossa, seu Mário!” [risos]. Na hora que a bola rola, esqueço de política, esqueço de tudo.

F. S. – Você também chega a passar pelo Atlético Paranaense?

A. J. – Aí foi um lugar legal que eu passei. Foi um lugar legal, porque o Atlético é muito grande e, na época, ele tinha um time bom, Nelsinho Baptista estava começando a ser treinador, foi um expediente interessante... Foi a primeira vez que eu senti que eu poderia fazer parte de comissão técnica, ser treinador, auxiliar. Foi muito bacana, uma experiência muito bacana, fizemos amizade... Era um time maduro. Carlinhos, Marolla, o Adílson, que é...

F. S. – O Adílson Batista? Transcrição

A. J. – O Adílson Batista. Ele era o “piá”, tão novinho que ele era, mas jogava bem para caramba. O Miranda, que era do Guarani. Tinha um time bom. Depois alguns garotos de lá foram para times grandes. Foi um campeonato que tinha pênalti no final do jogo... Ocorreu uma coisa interessante no Atlético Paranaense, foi o seguinte: eles tinham sido campeões com pênalti, só que, assim, 10 batidas e ganhou de dois a um. Todo mundo errou [risos]. Começou o campeonato, os caras criaram o expediente de pênalti, todo mundo falou assim: - “Eu não bato de jeito nenhum”, sobrou para mim. Eu que batia o pênalti. Imagina beque central batendo pênalti! Nossa Senhora! Mas foi uma experiência muito bacana em função de conhecer algumas pessoas, até conhecer o Nelsinho, que depois seguiu com uma carreira muito bacana. Eu vim para o São José, no São José fiz uma campanha boa também, que também tinha um time maduro... Os times pequenos daquela época, eles adotavam o expediente de contratar uma sequência de jogadores maduros para dar uma segurança, e foi o último ano que o Magrão jogou, se não me engano.

F. S. – 89?

A. J. – Isso. Eu joguei pelo São José. Nós jogamos contra, em um jogo lá em São José, no Martins Pereira lá, que foi zero a zero, e nós fomos vice-campeões paulistas, cara. Foi uma experiência interessante, foi uma experiência de vida interessante. Eu tive uma discussão com um treinador, que era um ex-jogador, Ademir Melo, morreu há pouco tempo. E essa discussão gerou uma incompatibilidade. Aí o São José classificou e veio enfrentar o Corinthians aqui – eu morava em São Paulo – veio enfrentar o Corinthians aqui no Morumbi. Perdeu de dois a zero. Um zagueiro machucou, e o outro zagueiro tomou o terceiro cartão amarelo. Eu fiquei acordado a noite inteira esperando alguém me ligar: - “Juninho, volta”. Falei: – “Eu vou voltar, vou chegar xingando todo mundo aí”. E realmente aconteceu isso, foi uma obra de Deus [risos]. A meu favor, contra meus amigos, porque... O gozado que, quando eu fui liberado, ele falou assim:- “Juninho, você não precisa voltar mais.” O Luiz Henrique, que era um dos goleiros da Ponte que jogava no São José, era da nossa turma, o Luiz Henrique falou: – “Juninho... Transcrição

– ‘espertão’, era o meu apelido. Você imagina o que eu era na Ponte Preta, o que eu aprontava com os caras. Era sacanagem o tempo todo -. Juninho, e se alguém se contundir?”. Ele falou isso para mim, eu falei: - “Como se alguém se contundir? Se vira.” “E se contundir dois?”. Que a gente tem que ter cuidado quando a gente mexe com esporte, que o cara de uma hora para outra machuca e demora dois meses para sarar. E era assim, ele veio jogar contra o Corinthians, jogou na quinta-feira, e no domingo jogava lá em São José. Rapaz, os caras me chamaram, no sábado de manhã. Rapaz, o tanto que eu discuti com aqueles caras, eu era muito louco. Aí, conseguimos ganhar do Corinthians, ganhamos de dois a zero no jogo, e depois ganhamos de um a zero na prorrogação. Eu lembro que o Toni foi um dos artilheiros do campeonato, era um dos maduros que jogavam lá, mas tinha um time bom. O Donizete, o Pantera, era reserva daquele time. Acho que era o último estágio que eu consegui aqui no , foi ser vice-campeão. Que o São Paulo já tinha Raí, tinha Bobô, eu lembro do Bobô. São Paulo tinha um time bom. Gilmar, tinha Adílson, zagueiro. Cafu já jogava, era um São Paulo bom. Telê era o treinador.

F. S. – Não.

A. J. – Não?

F. S. – Acho que era o , se não me engano.

A. J. – É. Mas foi assim, acho que foi uma passagem bacana que eu tive na carreira, já bem maduro, e aí depois eu joguei no Nacional, que foi uma coisinha pequenininha, o Aragão era meu treinador. Briguei com ele de cara [risos]. Rapaz, o Aragão... Enquanto o time titular não ganhava o treinamento coletivo, ele não acabava o jogo. Eu lembro que os caras falavam: - “Vocês estão de sacanagem?”, os reservas. Deixa nós fazermos três, quatro gols aí que senão o cara [risos]... Evidente que estou falando com todo respeito, não estou aqui criticando. Depois eu joguei em Olímpia, que foi muito bacana, acho que foi um presente familiar que eu ganhei, porque eu tive contato com meu pai, com minha mãe, ainda vivos. Uma coisa muito bonitinha, muito Transcrição

bacaninha, sabe. Inaugurou o campo lá, foi o Palmeiras, esse Palmeiras aí. Esse Palmeiras aí foi lá, lotou o campo lá... Foi uma experiência muito bacana, familiar. Para mim, para minha esposa, que também é de Olímpia, nós moramos lá entre os pais, visitávamos... Nossa, é um período muito bacana da minha vida, que aí culminou que, no final desse ano, eu fui para o Japão. Que também foi uma experiência muito bacana, eu fui para o Japão às cegas, eu falei para o cara: - “Aluga uma casa para mim e para a minha mulher e para as minhas filhas.” Ainda não tinha o Matheus, era Marina e Helena. No primeiro momento, eu cheguei no Japão, os brasileiros que são “malas”... Os brasileiros são “malas”. Em vez deles trazerem os brasileiros, quando chega brasileiros eles fazem a rodinha, cercam o território e não deixam brasileiro entrar. Aí falei para os caras: - “Vocês vão saber quem sou eu. Eu sou isso, eu sou isso... Dá para vocês deixarem eu fazer parte? Dá?” [risos]. Eu peguei o Ruy Ramos, falei: - “Ruy, dá para você perceber que eu sou um brasileiro igual a todo mundo? Apesar de eu ter jogado na Seleção...”. Porque fica aquele negócio: o cara era “mala”, mas eu sou uma mala suportável, dá para carregar [risos]. Aí eu me enquadrei lá no Japão, com o seu Pepe, seu Pepe foi muito bacana...

B. B. – Mas por que Japão? Foi a oportunidade para...?

A. J. – Na verdade, Bernardo, o seu Pepe, ele iria levar o Pereira. Na verdade, ele iria levar o Davi, que era lá do Santos, formado no Santos, era um bom zagueiro. E como o Davi não conseguiria ser liberado, o seu Pepe procurou um cara maduro para levar. Podia jogar dois, podia inscrever três. Então, não tinha como eu fazer parte do contexto sem mexer com brasileiro, porque o ideal seria que um brasileiro fosse reserva do outro. Só que nós tínhamos o Toninho, o Toninho, da Portuguesa, que é uma família de atletas também, ex-atletas. Toninho fez um campeonato maravilhoso, o número de gols recorde, o Péricles, era um volante de Goiás, e eu de zagueiro. Não tinha como ajustar isso. Tanto é que, quando o seu Pepe criou o primeiro sinal que eu seria titular, que eu cheguei lá e ele falou: - “Juninho, seu Fonseca, você vai ser reserva”. Por que não? Reserva não está morto. Vai que entra e faz alguma coisa! Só que aí, um dia, o Péricles foi expulso, e o seu Pepe trouxe o Ramos para volante – que era a posição do Transcrição

Péricles – criou um expediente na defesa e eu virei titular. Joguei um jogo, seu Pepe falou: - “Você não sai mais”. Nossa Senhora! O Péricles brigou com ele até hoje, é brigado com ele até hoje. E aí eu virei titular lá, nós fomos campeões do Campeonato Japonês, que foi o último que antecedeu o profissionalismo. O Zico jogava no Sumitomo, não era naquele outro time que ele jogou, que era...

F. S. – .

A. J. – Isso, exatamente. Já tinham vários brasileiros lá, alguns que eu conhecia...

B. B. – Para você ir devagar, para a transcrição conseguir captar [risos].

A. J. – Essa foi uma experiência muito bacana de vida. Porque a minha família, eles se parecem comigo. Vamos em um lugar, vamos conhecer tudo. A primeira vez que eu fui para a França, eu sozinho – que nós fomos lá, que eu contei para vocês – eu sozinho saí do hotel, fui na Torre Eiffel. Eu nem sabia o que era metrô, só sei que eu mudava de um lado para o outro e voltava para o mesmo lugar [risos]. Rodava para cá e ia para o mesmo lugar. Eu falei para um cara: - “Meu amigo – com meu inglês de estudante de terceiro colegial - Meu amigo, eu quero ir na torre Eiffel”. – “Meu filho, aqui tem cinco linhas de trem. É um em cima da outra, lá embaixo vai para lá”. E com a minha família, nós fizemos isso. Nós fomos para o Japão, e eu ligava para a Cláudia: - “Cláudia...”. Nós acordávamos lá 10 horas da manhã, por causa do inverno terrível. O treinamento era uma hora da tarde, e às três horas da tarde eu estava liberado. Das três às cinco ainda dava para andar pela cidade, porque às 7 horas da noite era aquela escuridão... Que o céu era pertinho. Nossa, o céu é mais pertinho que em Olímpia [risos]. O céu lá é pertinho. Não sei se é porque o sol roda para o lado errado, aquela festa [risos]. E aí, o que nós fazíamos: - “Cláudia, vamos sair”. A Cláudia vinha, porque eu pedi para ficar em uma casa perto do metrô, que tinha um metrô do Yomiuri Land, que era o time que eu jogava. Então nós fazíamos pelo metrô. É claro que eu roubei uma bicicleta de um japonês que estava lá [risos], andava de bicicleta... Eu perguntei para os caras: - “Aquele papelzinho na bicicleta que está parada, o que é?”. – “A policia Transcrição

vai levar”. Eu falei: - “Eu sou polícia.” [risos] É, eu perguntava as coisas, porque só brasileiro que pergunta. Chegava para o japonês: - “Kazu, tem um papelzinho branco, tem amarelo e tem azul claro. O branco?”. Estava pertinho dos caras... é que a bicicleta não pode ficar estacionada no mesmo lugar por um tempo sem fim, então o cara botava o papelzinho. A bicicleta novinha, eu, brasileiro... Brasileiro faz coisa. Levei a bicicleta para a minha casa. Minha mulher falou: - “Juninho, comprou uma bicicleta?” – “Comprei uma bicicleta”. Palhaçada, mas fiz mesmo. Agora, a minha família aproveitou muito. Fomos lá visitar, Disneylândia de Tóquio, fomos esquiar, Nossa Senhora! Todos os dias nós íamos passear, eu e a Cláudia, que podia. Aí nós passamos o primeiro terremoto, que é bacana para caramba [risos]. Brasileiro, tem o domínio de terremoto. Aí cheguei no outro dia, fui contar para os caras: - “Gente, o terremoto, sai para a rua”. O cara disse assim: - “Juninho, é o último lugar que você corre. Tem um lugar lá que você fica debaixo do batente da tal da porta”. – “Gente, porque vocês não avisam antes? Eu sou brasileiro, cara”. Ah, porque as casas tem lustres? Porque a balançadinha do lustre é o sinal que o terremoto... O terremoto foi terrível. Eu dormi encostado em uma parede – que era a parede que eu devia ficar para não cair a casa -, porque a casa lá não cai direto, ela deita, por causa das coisas que tem lá dentro – eu fui ver as construções lá, com gesso, com tela dentro, para ela não cair direto. Aí, o que aconteceu? Eu estava dormindo – isso foi duas, três horas da manhã – e eu tenho certeza que estava passando um trem do lado da minha cama. Quando eu acordei, falei: - “Cláudia, tem um trem aí?” – “Não.” [risos]. – “Então levanta que é terremoto.” Rapaz, fomos lá, peguei a Marina e a Helena, que eram menores, peguei e fui para a rua. Aí, no outro dia que eu contei para os caras, falaram: - “Juninho! Tem um lugar certo para ficar lá.” Você acha que eu sabia o lugar certo para ficar? Isso faz parte de uma experiência interessante. Você está em um lugar, para quem você vai recorrer? Eu vou recorrer e correr, para onde que eu vou? Aí que depois os caras falaram assim: - “Não, esse brasileiro aí.. - eles me chamavam de gaijin, que é o estrangeiro. Eu falava para os caras: -“Cuidado com o estrangeiro”, que era eu mesmo. Os caras me deram uma aula lá, que isso que é o interessante, um aula cultural. – “Olha, isso é assim, aquilo é assado, a buzina toca, não sei o que lá. O metrô, tempurá, que é a flor que vai virar, acabou o inverno...”. Outro dia apareceu uma flor, falei assim: – “Onde que ela estava? [risos]. Onde estava aquela flor em uma árvore Transcrição

seca?” Não tinha nada na árvore, no outro dia ela surgiu, falei: - “Rapaz!”. Por causa da diferença do inverno. Então, assim, culturalmente eu tive sete meses como se fosse uma despedida – e realmente foi – foi uma despedida de jogar futebol. E joguei muito bem. Um pedaço do livro que eu vou escrever, uma das folhas iniciais, eu vou contar a historinha de uma confusão que eu arrumei lá no Japão. Posso contar?

F. S. – Claro!

A. J. – Aí estava jogando lá. Eu marcava o melhor atacante do adversário, tiro de meta. Seu Pepe falava: - “Seu Fonseca, você que marca”. Eu e o [inaudível 01:15:03]. [inaudível 01:15:05], era o senpai, um dos caras maiores na hierarquia lá do jogo. [inaudível 01:15:10] decidia tudo. E falava um pouquinho de português que [inaudível 01:15:13] para a direita, para a esquerda, [inaudível 01:15:15]vem perto e tal. – “[inaudível 01:15:17], quantas partidas você jogou na vida?” – “Duzentas”. Eu no Corinthians joguei duzentas [risos]. Você vê a distância que tinha da cultura esportiva. Não estou falando do expediente técnico. Aí eu estava lá no balão. Quando deu balão, eu estava na reta do quarto zagueiro. Eu calculei – brasileiro está esperto, está ligado – a bola vai passar e vai para o goleiro. Ou o [inaudível 01:15:36] está lá atrás. Quando eu olhei, [inaudível 01:15:38] não estava mais lá. Estava comendo aquelas coisinhas que eles comem. Alguma coisa [inaudível 01:15:43] estava fazendo. E aí sobrou um atacante entrando, eu mal colocado demais, que eu tinha abandonado a jogada, eu falei: - “Já foi, a bola vai para o goleiro”. Eu, desesperado, comecei a correr atrás do cara. Era um estrangeiro, um negro, não lembro o nome dele. E ele fez a diagonal para dentro, para chutar, e eu fui correndo do lado dele e pensei comigo: rapaz, é gol. É certeza que o cara vai chutar, que ele está em velocidade. Quanto mais próximo eu me aproximei dele, eu cai, e ele caiu também [risos]. O juiz... Sabe quando você cai e dá aquela olhadinha para o bandeirinha? [risos]. Ele ficou parado, eu falei: - “Bom sinal”. Você dá uma olhadinha para o juiz, ele não está assim. Se ele está assim, dançou. Nada, seguiu. Cheguei no vestiário, seu Pepe: - “Você está ficando louco? Como é que você faz um negócio desse?”. – “Pepe, você está reclamando do quê?”. – “Você fez pênalti no cara”. – “Fiz pênalti não, ele caiu porque ele quis. Eu também caí porque eu quis, mas ele Transcrição

também caiu porque quis”. Quer dizer, toda a minha experiência ficou acessível, que eu simulei que eu caí para que ele, ou prestasse atenção na minha queda, ou se ele atrasasse alguém chegava... Alguma coisa eu tentei fazer para simular que... Atrapalhar o atacante. E ele se atrapalhou. Isso eu vou escrever. Eu simulei uma história, tal... Muito bacana.

B. B. – Estávamos conversando na semana passada com o Falcão, e ele ressaltou como, embora não pareça, é difícil definir o momento de encerrar a carreira de um jogador de futebol. Embora seja uma carreira precoce, que hoje cada vez mais o jogador tem que terminar antes, porque a velocidade aumenta a cada temporada...

A. J. – É verdade.

B. B. – Quando que, para você, configurou que chegou o seu limite, chegou a hora de parar?

A. J. – Pô, mas não chegou ainda [risos]. Você imagine que eu sonho que estou jogando. Não lembro de sonho que estou fazendo outra coisa, é sonho que... Quando eu voltei do Japão, não tinha... O mundo ainda era aquele mundo antes da velocidade e da comunicabilidade que temos hoje, então os contatos eram feitos de forma mais lenta, mais demorada, e não tinha essa disponibilidade de clubes. Hoje tem vários clubes, em volta da capital tem 20 clubes, pode jogar na A-1, A-2, na A-3... Antigamente não, tinham duas, três divisões só. Então, de alguma forma, eu não consegui o status de manter jogando mais um ano – eu fiquei um ano em Olímpia quando voltei do Japão – aí eu percebi que se eu tinha ideia de alguma coisa esportiva, eu tinha que mudar de centro. Em Olímpia é um ambiente que tem menos recursos de esporte e tal. Aí eu voltei para Campinas – o lugar onde eu mais morei na minha vida foi em Campinas – no intuito de tentar um time lá, quem sabe uma Ponte Preta, um time ali, mas não tive nenhum convite. De uma hora para outra, percebi que tinha acabado, não pensei em fazer festa... Foi uma depressão violenta. Eu não sei se todos os atletas que vêm aqui, eles dizem mesmo a verdade... É um inferno parar o talde jogar futebol. Porque, quem é Transcrição

você no contexto? Eu conto para os meus amigos: eu comecei a ser atleta aqui, aí eu virei profissional aqui, aí eu parei de jogar bola, onde eu estou? Aqui ou aqui? Quem sou eu aqui, se aqui só chegou o atleta? Isso é muito complicado. Eu, de vez em quando, procuro pesquisas aí, você percebe claramente: ex-jogador, o cara tem uma tristeza profunda, porque o personagem jogador é muito bacana. Personagem assim: de todos os cargos que eu tive no esporte, nada se compara em você fazer para você aquilo que você sabe que você é capaz e se prepara para fazer, que era meu caso, eu sempre me preparei para jogar. Eu nunca joguei com o meu talento. Um pouquinho do meu talento que eu tinha estava amparado no meu condicionamento físico. E esse personagem teu morreu, e não se esqueça: foi você que matou. Então, são cinco, seis anos que eu tenho na minha vida que eu não tenho muita memória, e eu tenho uma memória ótima. Só que para esses cinco, seis anos, ela está perdida. - “Aquela coisa aconteceu quando?” É uma das poucas vezes que eu recorro a minha mulher e meus filhos, porque eles se recorrem a mim. – “Ah, papai, Juninho, aconteceu quando aquilo?” “Foi tal época.” – “Ah, foi tal música, foi tal cor...”, porque eu tenho uma memória muito bacana, só que nesse período, é a pior coisa que acontece na vida de uma pessoa, largar de jogar futebol. É talvez por isso que aqueles que largam e já estão em um clube, e começam em um cargo, uma transferência, uma transposição, uma ultrapassagem, ela aparenta ser menos dolorosa. Porque é muito dolorida. Você fica simplesmente perdido. Aí que, por acaso, um dia, a Ponte Preta me convidou para ser treinador, e eu... Na verdade, eu tinha a ideia de ir para o jornalismo. Sempre tive essa ideia. Para o jornalismo, que é uma coisa que eu acho que parece comigo.

B. B. – Mas o jornalismo esportivo ou atividade de jornalista?

A. J. – Não, atividade de jornalista. Talvez poderia ser até com esporte, mas eu acho interessante eu perguntar para as pessoas. Fazer uma pergunta: “Zé Dirceu, vem cá. Fazer uma pergunta, mas responde olhando para mim, vamos falar para a população...”. Entendeu? Eu acho que é interessante isso. Não com tanta agressividade, que esses entrevistadores, do ambiente humorístico, fazem. Não é uma critica, é minha opinião. Mas o investigar, o estudar para investigar, eu não acredito que o ambiente Transcrição

jornalístico não deva ter diploma. Também pode ter, mas o cara tem que ter dom. Então, era uma tendência que eu tinha, que provavelmente ficou escondida pela oferta de um espaço como treinador. Eu abracei e falei: “Pô...”. Voltei a estudar, naquele período. Também não consegui ter continuidade, também não acabei. E aí fiquei nesse estágio de treinador, e eu sou um pouco de cada coisa. Se você perguntar para mim o que eu estou, eu estou de dirigente. Hoje eu estou de dirigente. Mas é uma experiência interessante ser treinador também. Da base talvez um pouco mais interessante, porque você mexe com o seu garoto, você consegue passar uma mensagem para ele. Direta, que demora um pouco mais para virar. Profissional não, faz ou não faz.

B. B. – E aí você ficou, então, na Ponte Preta...?

A. J. – Eu comecei a trabalhar como treinador lá, depois tivemos um campeonato muito bacana lá, da Taça São Paulo, fomos vice-campeões. Fui crescendo, vim para a Portuguesa, dali a pouco fui para um time profissional, e fui andando nessa coisa de 10, 12 anos aí. Mas aqueles cinco anos... Está não sei aonde.

B. B. – E a estruturação do seu time, como treinador, tinha a ver também com a sua posição no campo, você trouxe essa experiência e armava a equipe... Como é que era...?

A. J. – No meu período de atleta, eu compartilhava muito com os treinadores aquilo que eu achava, para o expediente defensivo. Jogar na defesa aparenta ser mais fácil. Vai lá jogar para você ver se é fácil! Vai lá marcar o Romário, marcar o Ronaldinho, vai lá [risos]. Aquele gol que o Ronaldinho fez contra o Santos lá. Vai lá tampar! Entendeu? Então, tudo que eu faço como treinador, provavelmente tem a ver com o inicio da minha formação esportiva. Provavelmente tem a ver com a turma da Ponte Preta... Aquela turma de 77, quantos estiveram como treinador? Quase todos. Carlos, Jair, Oscar, Polozzi e Odirlei. Só Odirlei que não. Vanderlei, Marco Aurélio e Dicá. Só o Dicá foi supervisor. Lucio não, Rui Rei não, Tuta foi, Parraga foi, eu fui, o Rafael Cammarota, que era reserva... Então aquele time tinha vários pequenos Transcrição

treinadores. E a participação dos atletas, naquela época, era mais clara. Treinador compartilhava, porque os jogadores eram mais maduros. O que eu acho que eu sou como treinador, deve ter nascido na época que eu virei jogador da Ponte Preta.

B. B. – Hoje a sua relação com o futebol é uma relação de distância, de acompanhamento contínuo, ou são as relações que ficaram na sua experiência... Como é que você lida com isso?

A. J. – Eu gosto muito quando eu encontro com os ex-amigos, ex-atletas, a gente curte muito, lembra das histórias, do momento, muito bom. Melhor personagem: jogador. Depois de pai, talvez. Jogador. Esse personagem é impactante. E eu trabalho com futebol, trabalho no Botafogo, minha atuação lá é chamada de gerente de futebol, da base. E eu compartilho muito, eu participo muito, eu estou muito próximo. Lá nós estamos tentando criar um... Nós já pensamos em protocolo, já pensamos em método, mas é provável que chegue um manual de treinamento que nós vamos criar, junto com a USP, porque eu estou fazendo pós-graduação, já tenho contato feito, a gente vai criar, tentar criar alguma coisa que dê um pouco mais de segurança no clube, na formação. Estamos estudando quais são os métodos que tem aí conhecidos, o método tecnicista, o método de jogos formais, tem uma coisa assim que nós estamos... Eu achei, quando eu voltei a estudar, nesse período meu de treinador, achei um período muito bacana, foi o meu novo entendimento com a escola. Eu achei que a escola trouxe para mim uma satisfação diferente, massageou meu ego... E um monte de questionamento que eu tinha, por que treina, por que não treina... E aí, hoje eu vivo em uma condição assim: a escola é uma prioridade para mim, estudar... E eu quero fazer essa transferência. Dessas perguntas todas que eu tenho, da gente criar um melhor atleta, criar uma melhor pessoa, sabendo dos resultados positivos e negativos que irão acontecer. Eu acho que os clubes grandes já têm alguma coisinha nova acontecendo aí e eu quero participar disso.

F. S. – A última vez que você foi muito falado foi quando você treinou o Corinthians principal, entre 2003 e inicio de 2004.

Transcrição

A. J. – Foi.

F. S. – Fala um pouco mais sobre essa experiência.

A. J. – Olha, foi uma experiência que eu diria para você que eu não queria. E o pessoal do Corinthians sabe, o Andrés já era dirigente lá, o Andrés e o Fran já eram dirigentes, e eu fui para a base, não sei porque eu fui para a base, talvez pelo fato da base do Corinthians ter jogado contra o Primavera, de Indaiatuba. Naquela Taça São Paulo, que o Fred fez aquele golaço, eu trabalhei naquele grupo. Eu vi, eu presenciei aquela maravilha que o Fred fez lá. Aquilo é histórico, eu tenho prazer de contar para os outros, eu vi aquele moleque fazer aquilo. E eu trabalhei no Primavera, e nós fizemos um amistoso contra a base do Corinthians. E por alguma razão, chegou essa informação até o Corinthians. Eu cheguei lá no Corinthians, eu me lembro bem, era o Dualib: - “Juninho, e tal, muito prazer revê-lo...”. Falei: - “Presidente, eu quero ser técnico 10 anos, na base”. – “Como 10 anos?” – “Eu quero trabalhar em um clube que eu tenha identificação;” Eu imagino que não adianta você ficar trocando, pulando de galho em galho, o clube e o profissional – para a base, estou falando da base. Aí chegou a oportunidade de trabalhar no profissional, que o saiu, o Júnior veio e não gostou, aí me indicaram para tomar conta, em um período. Eu falei: - “Eu não quero ir, porque eu vou cair”. Passados três, quatro... o impacto inicial, normalmente vem uma vitória, o chamado treinador que fica por um tempo, “tampão”, sei lá.

B. B. – Interino.

A. J. – Interino. Dei o sinal para eles: - “Olha, vocês não vão conseguir ficar comigo porque eu sou jovem para esse cargo tão alto, e depois eu vou perder o cargo da base”, porque eu queria o cargo da base, quero ficar no junior. Eu tinha até o contrato maior com a base, porque eu sabia. E aí, o que resultou: o Corinthians, em um momento terrível, financeiro, eu estava com a turma do professor , ficaram comigo, Moraci, professor Jairo Leal.... Sempre me ajudaram muito, o Corinthians tinha um status já, esse status de ter todas as informações... O Corinthians tinha um status lá Transcrição

que o Parreira deve ter pesado muito para que o Corinthians tenha tido esse crescimento, que foi um crescimento que o Corinthians teve que não refletiu direto no campo - apesar que foi campeão em uma e de um Paulista, foi nesse período -, mas quando eu cheguei no profissional, que eu fiquei de férias durante 15 dias – eu lembro que eu tive um problema na vista, fiz uma operação – eu tinha certeza que eu não ia durar mais que dois meses. Contratação não era do porte, nós contratamos, por exemplo, um jogador da Ponte Preta, o [dúvida 01:28:27] Adrianinho, que eu fui treinador dele “dente- de- leite”. Ele não era titular lá. Você vai trazer um menino que não está titular em um time para jogar no Corinthians? Então, o Corinthians tinha uma dificuldade financeira que refletiu no campo, tranquilamente. No último jogo que eu trabalhei, se vocês... Talvez você lembre, você parece ter uma memória muito boa, muito especial para... Rapaz, se você olhar e falar assim: Corinthians e São Paulo. Quem do Corinthians joga no São Paulo? Que é uma coisa que eu faço. Eu vou assistir um jogo, eu falo: - “Ali tem um time “X” e um time “Y”. Quem do “Y” joga lá? Se tiver mais que joga aqui, um dos times é muito melhor que o outro. Tem três jogadores que jogam naquele time lá, quer dizer que lá tem oito melhores que esse aqui. Rapaz, o São Paulo tinha um monte de “nego” bom, e vários que a gente queria ter contratado. São Paulo tinha... Esse menino que joga aí no Corinthians agora, o meia, grandão...

F. S. – Danilo?

A. J. – Danilo, estava indicado para nós. O ponta-direita lá que brigou com o argentino, que foi na Copa do Mundo...

F. S. – Grafite?

A. J. – Grafite. E vários outros jogadores... Que o Goiás tinha feito um campeonato bom, uma recuperação de campeonato bom, e nós indicamos, eu e o professor Jairo Leal. E aí tentamos evitar a contratação de alguns veteranos, porque o Corinthians gostava do Rincón. Nós tentamos evitar isso aí. Não conseguimos, e o Corinthians não contratou um time, um grupo de atletas, suficiente para suportar a Transcrição

pressão... Que nós tínhamos Copa do Brasil, tínhamos Campeonato Paulista com seis, sete jogos... Um Campeonato Paulista perigosíssimo, tanto é que o Corinthians ficou até o último jogo brigando para não cair, em uma divisão paulista. Eu já tinha certeza que não ia dar certo. Não com pessimismo. Eu tentei fazer o melhor trabalho possível, mas eu sabia que era uma coisa estéril, com certeza.

B. B. – E relação com imprensa, ser técnico de um clube tão grande como o Corinthians...

A. J. – Não, é pesado. A relação com imprensa é pesado. Porque os seus companheiros... Eu tinha vários entrevistadores que me conheciam de jovem. É uma época em que – não agora, que tem muito mais jovem trabalhando no jornalismo. Antigamente ainda tinha – antigamente eu digo 10 anos atrás – era uma turma de pessoas que tinha mais ou menos a minha idade, eu encontro os caras hoje e falo: - “Opa, você é tal pessoa!”. Inclusive eles me atendem muito bem, só que a exposição... O clube ainda não tinha essa maturidade que hoje tem... “Peraí, é uma entrevista por semana”. Hoje o técnico está mais protegido. Porque o jornalista, ele tem que fazer uma pergunta besta [risos]. Ele não vai fazer uma pergunta redondinha para o cara responder. Vai responder banana. Não, vai responder suco de fruta, salada de fruta, seja o que Deus quiser. Mas o treinador, naquela época, não era tão bem protegido, e eu acho certo o clube proteger hoje o treinador. Porque a missão do jornalista é descobrir o que ninguém viu, ou que verá. Então, eu me senti muito desprotegido, mas era o momento que o futebol tinha, esse momento. Hoje, acho que o Corinthians tem três assessores de imprensa. Que ampara, que hoje tem: “O cara vai te perguntar tal coisa...”. Eu achei interessante a primeira vez que um dos meninos que trabalha na comunicação falou: - “Juninho, eles vão te perguntar...”. Eu me lembro que era uma vez que o Rivelino criticou alguma coisa que eu fiz no jogo na Paraíba. Criticou aqui, porque ele não foi de avião, porque ele não gostava de avião, ele ficou aqui. Eu encontrei com ele e falei: - “Você reclamou de mim na televisão?”. – “Mas como?”. – “O cara lá me falou que você reclamou de mim” [risos]. Hoje, o técnico, ele é um Deus até virar humano. Ele chega no clube, ele é Deus. O cara fala: - “Não, peraí, ele é humano”. A hora que ele vira Transcrição

humano está fácil de ser mandado embora. E não pode mais. Hoje a gente vê que a durabilidade, a manutenção do treinador vai te facilitar errar menos. Você vê que, hoje, nós temos times grandes caindo para a segunda divisão do Campeonato Brasileiro. E caiu tigre, caiu tiranossauro rex. O time do Vasco caiu, Grêmio caiu... Meu Deus do céu! Corinthians caiu, Palmeiras está passando por um momento apertado. Não estou dizendo isso como desculpa não. Acho que o trabalho que eu fiz foi o melhor possível, gostaria de ter alongado mais, que talvez me permitisse até ficar mais tempo atuando como treinador. Isso é uma derrota também na minha vida, enquanto treinador. Acho que isso me atrapalhou muito.

B. B. – Ainda em relação com a imprensa, comandar um grupo de 11, 22...

A. J. – Não me pareceu ser muito complexo não. Pareceu que tinha respeito, tinha entendimento. Mas não tinha atleta que, entre nós do futebol, falamos... O que o clube não pode deixar de ter? Atleta. Sem atleta de... Você fala ai de algumas contratações que nós podemos dizer hoje, o Sócrates veio para jogar no Corinthians, aguentou. O Raí veio para jogar no São Paulo, aguentou. Esses detalhes da contratação, acho que a contratação, para a comissão técnica, é uma coisa muito complexa, talvez o maior problema que tenha são as contratações. Porque às vezes você pede “X”, e o cara te oferece um “X” muito abaixo. E você não está falando só, necessariamente, do jogador. Estou falando do homem. O homem vai aguentar? Ele é reserva de um time “X”, lá em um estado menor. Ele é reserva de um time “X”, ele vai jogar aqui? É difícil para caramba, é muito difícil. Hoje mais difícil que antigamente, porque hoje tem mais como você descobrir onde está o jogador. Como o Corinthians descobriu esse goleiro aí? Esse goleiro que ajudou o Corinthians ser campeão da Libertadores, para caramba. Como é que ele descobriu? E tirou o único garoto que era formado aqui na base, que foi meu goleiro, inclusive, o Júlio. Então hoje, nos times grandes, eles estão sabendo cuidar mais do que é um treinador. Como o Coritiba fez com o Marcelo, ficou um tempão, e agora foi para o Vasco, já não deu certo. É só resultado. Então, o que eu gostaria de ter feito no Corinthians? Ter feito um trabalho bom, mesmo com um resultado ruim. Eu não tive tempo. Eu mostrei um trabalho que não influenciou o resultado, ou não direcionou o Transcrição

resultado, e eu fiquei só com a impressão que o trabalho e o resultado foi ruim. Isso para quem é treinador é péssimo, você perde a continuidade. Eu fiquei seis, sete meses sem trabalhar. Aí é outro inferno que cria na sua vida, você fica desempregado e não se emprega rapidamente. Rapaz, perigoso!

B. G. – Mas você continuou como técnico depois?

A. J. – Eu trabalhei mais em dois clubes. Eu trabalhei no Caxias do Sul, que foi um lugar bacana que eu conheci, uma cidade interessante, um clube interessante, aqui que eu falei da política. Só que eu saí do Caxias por problemas pessoais. A Cláudia, ela criou uma possibilidade de mudar de agência mudando de cidade. Criou um expediente no banco, naquela época era Nossa Caixa, que podia fazer uma permuta direta: - “Se você for para Ribeirão e alguém vier para cá, nós aceitamos”. Ela chegou em Caxias, ela falou: - “Juninho, vou mudar”. Falei: - “Mas eu estou no contexto? [risos]. Eu estou indo?”. – “Não, você está indo também.” Aí eu sai do Caxias, depois eu trabalhei no Noroeste, aí praticamente não tive muito convite. Recebi um convite para ser secretário de esportes lá, achei que era um novo ganho cultural, um novo entendimento da política, que é uma coisa que eu criei um gosto um pouco maior por isso, nesse período, e aí, praticamente, sempre que trabalho com futebol, trabalho na parte administrativa. Ainda não está no lugar que eu gostaria. Eu gostaria de estar bem próximo da comissão, tipo um auxiliar permanente, alguma coisa assim, que eu estou lançando ideia lá no Botafogo, talvez mais à frente eu consiga, porque, até agosto do ano que vem, eu não posso trabalhar. Porque o trabalho da base, no campo, ele é executado aos sábados, e eu estou fazendo pós-graduação até agosto do ano que vem, eu não posso me comprometer. Não tem como ser treinador a semana inteira e não ir no jogo, é impensável isso.

B. B. – Juninho, como essa série para o Museu do Futebol, ela tem por foco a experiência dos jogadores que viveram em Copa do Mundo, a gente costuma encerrar perguntando o feeling, a intuição, as suas expectativas em relação à Copa de 2014, daqui há menos de dois anos, que vai ser realizada aqui no Brasil, do ponto de vista da Transcrição

organização, o fato do Brasil ser país sede, mas também do seu sentimento em relação à Seleção, à equipe que vai jogar e vai disputar esse torneio.

A. J. – Com relação à infraestrutura, eu acho que o Brasil, como sempre, demorou. No dia que ele foi... Que estava todo mundo lá, o presidente da República, o governador do Rio de Janeiro, o governador de Brasília, um bacana que tem lá que de vez em quando aparece aí na televisão, fazendo coisa lá... Aqueles caras estavam tudo lá. Demoraram muito para começar.

B. B. – 2007 que...

A. J. – 2007, demoraram muito para começar. Por quê? Que nós corremos perigo do “jeitinho brasileiro”, que é a dica do Gerson, não cabe mais, não combina mais. Então, eu tenho preocupação da infraestrutura, acho que nós vamos cometer uns erros ali, dois ou três campos... – “Rola a bola, deixa eu marcar a área, peraí!” [risos]. Evidentemente que o brasileiro vai se ajustar, estou dizendo isso tecnicamente. Estou dizendo isso positivamente. Deixar claro que eu estou dizendo positivo. Eu acho que, no campo, tem condições de fazer uma coisa boa. Nós temos sinais positivos aí muito claros, de jogadores muito experientes, jogadores maduros, mesmo jovens. Neymar tem uma condição boa, o Fred, o Lucas, o Oscar. O garoto que é do Fluminense, o defensor, Thiago não sei o que lá, é bom. Acho que o Brasil tem elemento para fazer uma Copa do Mundo, tem. Vão viver uma pressão que eu acho que deveria ser bem administrada. Essa pressão que eles vão sofrer, que nós já estamos fazendo, eles conseguirem aliviar, disputar a Copa das Competições bem próximo do que quer, e não mal feito como o fez... Ele fez um time que ele não sabia o que aquele time mesmo não daria... Porque não disputar as eliminatórias é um fato que eu acho que pesa. Que a eliminatória te cobra. As eliminatórias, que todo mundo treinou pequenininho em algum lugar... O Paraguai todo ano estava classificando antes de todo mundo, aí ficava Brasil, Argentina, Uruguai e mais um outro competindo. Só que isso trazia para cima a qualidade do jogador e do treinador da comissão. O Felipão fez uma coisa interessante lá quando ele resolveu, depois de uma derrota, dar uma mexida lá. Eu acho que o Brasil tem Transcrição

condições, eu só estou dizendo que a comissão - que é uma comissão experiente - a CBF é uma entidade muito experiente em Copa do Mundo, ela tem todo um Know How de informação, os caras vão antes, o Américo Faria vai antes, faz tudo direitinho, tudo bonitinho. Acho que é facilitado para os grandes países, as escolhas. O Brasil vai estar aqui, mas vai ter uma pressão muito grande. Me preocupo com essa pressão que não estará visível. É uma pressão que estará assim: - “Estou no Brasil, vou assistir Brasil e não sei quem lá, um pangaré” [riso], 20 minutos do segundo tempo, está zero a zero. Acho que o brasileiro talvez saiba, que o brasileiro hoje domina muito bem o futebol e sabe que a maioria dos gols sai no final. Tem tudo escrito. Se você entrar no site da FIFA você sabe: os gols saem no fim do jogo. O futebol, ele é muito imprevisível depois que tem matemática. Acho que o Brasil tem todas as condições de disputar bem disputado, e vamos dizer, ficar entre os quatro. No momento que escapar, nós estamos ai repetidamente ficando em quinto lugar, quase, quase. Acho que o Brasil, está na hora dele voltar. Faz duas Copas do Mundo que nós não ficamos entre os quatro, ou três? 2006 e 2010, duas. Eu acho que está na hora do Brasil mostrar: “Pessoal, eu estou aqui de novo!”. Mesmo que seja no Brasil, repetir é uma coisa muito bacana, mas eu acho que o Brasil é um candidato para um os quatro sim. Acho que dá para fazer um bom bacana. E estarei lá, estarei assistindo. Ou na televisão ou no bar [risos].

B. B. – Em alto estilo chegamos ao final do depoimento de Alcides Fonseca Junior, no seu segundo dia de depoimento. A Fundação Getúlio Vargas e o Museu do Futebol agradecem imensamente, Juninho, pela sua disposição em conversar conosco, em contar, rememorar e nos divertir também...

A. J. – Eu também me diverti muito. E aqueles que estão vendo, valeu [risos].

B. B. – Muito bom.

B. G. – No estádio, não é, Juninho. Você não vai no estádio?

Transcrição

A. J. – Meus parentes falaram para mim: - “Juninho, o que você vai dar no carteado?”. Falei: - “Filha...”. Minha cunhada, mulher do meu cunhado - eu tenho um cunhado mais novo, tem acho que trinta e poucos anos -: “Juninho, o que nós vamos fazer?”. – “Primeira coisa: ter dinheiro. Porque influência acho que não tem como. E tem uma coisa: melhor assistir Copa do Mundo sentado vendo televisão.

B. B. – Hoje em dia é mais cômodo...

[FINAL DO DEPOIMENTO]