Título: Merchandising – Entretenimento E Consumo De Mãos Dadas Para Fazer Sua Cabeça
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Título: Merchandising – entretenimento e consumo de mãos dadas para fazer sua cabeça PONTES, Débora Fajardo (Mestranda em Comunicação) Universidade Federal de Juiz de Fora/MG Resumo: O merchandising é um tema intrigante que tem chamado a atenção de diferentes áreas do conhecimento, entre elas o direito e a sociologia. A sua presença cada vez maior nas telenovelas brasileiras merece ser foco também nas investigações específicas da Comunicação. Traçamos um resumo da sua história no Brasil e dos meandros como são incluídos nas tramas, além de fazer considerações sobre a participação nos lucros de todos os envolvidos nas cenas, além das diferentes modalidades em que se constitui. O merchadising social, por exemplo, que não traz dividendos financeiros, mas tem sido usado de forma recorrente em nosso País. O perfil das personagens escolhidas para a exibição de produtos e marcas é outro quesito que merece atenção. Hoje, não só mocinhos (as), mas também vilões(ãs) têm seus objetos desejados por uma grande público, que provavelmente se identifica mais com personagens híbridas – nem tão más nem tão boas, mais comuns nas telas. A grande questão que muitos estudiosos colocam é até onde o telespectador/consumidor tem consciência sobre como está sendo induzido ao consumo na hora do seu entreteniento. Palavras-chave: merchandising; consumo; social; temas; atualidade GT: História da Mídia Audiovisual e Visual Verão carioca, final da década de 1970. Sol dos trópicos, turistas na orla, praias lotadas. Era um cenário e tanto para estender a prática do surf, o vôlei de praia ou o bronzeamento na areia. Mas havia uma moçada, naquela efervescência da Zona Sul, que devia ‘bater ponto’ em casa às seis da tarde. Era a hora de parar tudo e assistir Senhora, um clássico de José de Alencar, que cairia no vestibular daquele ano. Relato de quem viveu no Rio daqueles tempos. A novela exibida pela Rede Globo, cujo papel-título era vivido pela atriz Norma Blum, fez companhia a outras estórias de época, também clássicos da nossa literatura de outros séculos. A Moreninha, de Joaquim Manoel de Macedo; a trágica história de Helena, de Machado de Assis, e aquela que certamente se tornaria um dos maiores fenômenos da teledramaturgia brasileira – a Escrava Isaura, de Bernardo Guimarães. Os anos correram e o estilo caiu em desuso, principalmente nas produções da emissora líder de audiência no País, a Globo. Lamentavelmente. Era o tipo de produção, sem sombra de dúvida, afinada com a expressão cultura no seu melhor sentido. Disponibilizava-se para o grande público importantes obras da literatura nacional, estimulando o conhecimento de nossos autores e suas obras e alcançando pessoas que sequer tinham contato com livros. Outras emissoras, mais tarde, investiram no segmento. Chica da Silva e Dona Beija foram levadas ao ar pela extinta TV Manchete - do conglomerado de Adolpho Bloch. A primeira suspeita para o abandono do estilo recai sobre a impossibilidade de fazer merchandising. ‘Novelas de época são o túmulo do merchandising’, denuncia o texto de Ricardo Valladares para a site da Veja online, com a observação de que, apesar disso, elas ‘são altamente exportáveis’. (VALLADARES, 2005) Em recente produção, a Globo retomou a temática de época com a novela Lado a lado, exibida às 18h, depois de muitos anos sem investir nesse tipo de trama. Falar de novelas passadas produz uma inevitável e nostálgica sensação de defasagem no tempo. A mesma que nos provoca o jornal de uma semana atrás. Mas para a abordagem do tema escolhido – o merchandising - é essencial recorrer às tramas de outros tempos, a fim de entender melhor a sua evolução no mercado televisivo brasileiro e de se estabelecer referências e comparações com as novelas em andamento – estas, daqui a pouco, provocando a mesma sensação de ultrapassadas. O merchandising, por definição, é a aparição de determinada marca, produto ou serviço, sem as características explícitas de anúncio publicitário em programas de rádio, televisão, teatro ou cinema. Nas telenovelas brasileiras, a prática consolida-se na década de 1970. Um recorte no atual cenário das telenovelas ‘globais’ nos permite algumas observações pertinentes, mesmo sem a adoção de uma metodologia de pesquisa. Nossa abordagem refere- se a algumas das tramas levadas ao ar em 2012 e 2013. Uma das primeiras coisas que nos chama a atenção é a predileção pelas segundas- feiras para o merchandising. Em geral são ostensivos nesse dia da semana. Uma das suposições é que o capítulo das segundas exerça mais atração sobre o público, em função do suspense gerado pelo capítulo do sábado anterior. Há também a hipótese de que, às segundas, as pessoas estão mais propensas a ficar em casa. Nos meses de julho e agosto de 2012, acompanhamos as novelas Avenida Brasil e Cheias de Charme, para um trabalho da disciplina Televisão e Identidade Cultural do Mestrado em Comunicação da UFJF. A marca de meias Lupo virou estrela destacada em Avenida. Estampada na camiseta dos jogadores do Divino Futebol Clube, o time do subúrbio que revelou o craque Tufão, ela aparecia em angulações generosas. Os atores a exibiam na frente e nas costas da camisa, no campo e no vestiário. Havia também cenas que focalizavam atletas calçando meia. Do ponto de vista estético, pode-se considerar uma iniciativa bem sucedida. Afinal, meias e atletas têm tudo a ver. E, às segundas, as tomadas eram mais generosas. Em Cheias de Charme, a ‘empreguete’ Penha (Taís Araújo) exibia seu chamativo carro vermelho da Volks, também na segunda. O carro roubava a cena, mostrado em vários ângulos, sempre com o símbolo da Volks em destaque. O Banco Itaú é outro que marca presença, tanto na extinta Avenida Brasil, quanto agora, em Salve Jorge!. Montou até um caixa eletrônico no Morro do Alemão e as entradas e saídas das personagens virou rotina tanto em uma novela quanto na outra. A marca sorvetes Kibon também marca presença no morro. O quiosque serve de ponto de encontro dos moradores, que inclusive comentam os sabores e lançamentos da marca. Na trama de 2013, Guerra dos Sexos, das 19h, a grife de roupas Malwee é presença garantida nas lojas Sharlo's, com tomadas chamativas às segundas-feiras. Se alguém duvida do sucesso do mercado de ‘objetos de desejo’ criado e estimulado pela telinha, basta visitar lojas do comércio popular e prestar atenção nas ruas. Na época de exibição das duas novelas inciadas em 2012, estavam em alta o exagerado colar em forma de cobra de Shayene (Cláudia Abreu), de Cheias de Charme, e as roupas sensuais e brincos de Suelen (Ísis Valverde), a ‘periguete’ de Avenida. E o perfil das consumidoras independe da idade e do tipo de corpo. Mesmo com quilinhos a mais, ou se já entraram na idade dos ‘enta’, muitas mulheres se sentem à vontade para usar o que as personagens exibem na tela. Comportamento e merchandising na mesma trilha Em retrospectiva, citamos uma edição do Jornal Hoje, da Globo, de agosto do ano passado, que exibiu matéria sobre o comércio popular dos trajes de novela, e enfocou, mesmo sem pretender, um novo mote sobre o merchandising – os objetos de desejo não se restringem mais a personagens ‘boa gente’. No caso de personagens das novelas da época, os colares e pingentes de Nina (Deborah Falabella) e Carminha (Adriana Esteves), de Avenida Brasil, eram igualmente disputados. Assim como os acessórios de Shayene, de Cheias de Charme, esta - longe de ser um bom caráter. Ao que parece, vai longe o tempo em que mocinhos e vilões ficavam separados no quesito ‘suscitar desejos de consumo’. Nesta segunda década do terceiro milênio, personagens novelescos não são mais como os de antanho. Muda a vida, mudam os valores e costumes. E mudam as novelas. Difícil encontrar hoje personagens totalmente bons ou ruins. Típico exemplo desse novo formato pode ser citado ainda em Avenida Brasil, com a dupla antagonista Carminha e Nina. A última mostrou-se especialmente cruel ao engendrar sua vingança contra a primeira. Pode estar ai uma boa explicação para que os acessórios exibidos por ambas atraíssem o público. Personagens híbridos certamente permitem maior identificação com o telespectador. Em novelas mais antigas, quando a dicotomia mau/bom era mais delineada, os ‘malditos’ nem eram cogitados para propagandas. Mas houve casos em que, no correr da trama, alguns personagens ficaram marcados negativamente, e isso provocou rejeição aos objetos a eles associados. Foi o caso de O Rei do Gado (1996), quando uma campanha publicitária alavancou a venda de chapéus iguais ao do protagonista, vivido por Antônio Fagundes. Mas o personagem foi traído pela mulher, no meio da história, o que provocou a queda nas vendas e a retirada dos anunciantes. (VALLADARES, 2005) O autor de novelas da TV Globo, Alcides Nogueira, argumenta que há grande preocupação em colocar as ações de merchandising dentro da história da maneira mais discreta e natural possível. Quando isso não ocorre, provoca um estranhamento e o espectador percebe algo postiço no desenrolar da trama ou no diálogo. Em sua opinião, a experiência ajuda os autores a perceberem que dá para extrair desses contratos publicitários bons ‘plots’ (tramas), que acabam rendendo situações e momentos até enriquecedores para a história. (CORREIA, 2010) Pode ser. Mas quem ganha mesmo com essa aproximação da realidade, reforçada pela ausência de mocinhos e vilões absolutos, é o mercado publicitário. Um público mais identificado com as personagens certamente representa um terreno fértil para os anunciantes terem seus produtos aceitos. “No fundo o que as pessoas procuram não é comprar produtos, e sim, consumir desejos, sonhos, fantasias,...” (CASTRO: 2007, p. 125). Há um tipo de merchandising que não lida com cifrões, mas com idéias. Enquanto o merchandising comercial pode trazer dividendos materiais espantosos, o merchandising social se ocupa em difundir temas e defender causas.