R. Ra’e Ga DOI: 10.5380/raega Curitiba, v.46, N. 2, p. 07 - 28, Jun/2019 eISSN: 2177-2738

MIRANDA DO , : TERRITÓRIO DE BAIXA DENSIDADE COM ELEVADO POTENCIAL PARA O TURISMO , PORTUGAL: LOW DENSITY TERRITORY WITH HIGH POTENTIAL FOR TOURISM Josefina Olívia Salvado1, Alcides António Meirinhos2

RESUMO O território de Miranda do Douro – Portugal poderá ser visto como um espaço geográfico onde existe uma forte articulação entre as políticas e as estratégias de desenvolvimento e o turismo. A identidade deste território de baixa densidade3, está ancorada no património4, na língua autóctone (o mirandês), na singularidade da paisagem (em sentido lato)5, nas tradições e na memória coletiva6 do seu povo. Estes predicados revelam um posicionamento competitivo privilegiado na criação de experiencias turísticas autênticas, diferenciadoras e sustentáveis. Como output deste “estudo de caso” é apresentado um modelo de inventariação de recursos endógenos (MIRE) que visa identificar os patrimónios do planalto mirandês e servir de alicerce à atividade turística na sua preservação e salvaguarda. Palavras-chave: Paisagem, Turismo Cultural; Miranda Douro; Património. ABSTRACT The territory of Miranda do Douro - Portugal can be seen as a space where local development policies and strategies are linked with tourism, aiming to build authentic, differentiating and sustainable experiences. This low- density territory identity is based on cultural heritage, in the indigenous language (Mirandês), in the singularity of the landscape, in the traditions and in the collective memory of its people. As a result of this "case study", an inventory of endogenous resources model (MIRE) will be presented, which aims to identify the heritage of the Mirandese plateau and serve as a foundation for tourism in its preservation and safeguard. Key-words: Landscape; Cultural Tourism; Miranda Douro; Patrimony & Heritage. Recebido em: 22/02/2017 Aceito em: 13/04/2019

1 Investigadora na GOVCOPP- Unidade de Investigação em Governança, Competitividade e Políticas Públicas - Universidade de Aveiro, Portugal, e-mail: [email protected] 2 Investigador e Vice-presidente da Associaçon de la Lhéngua i Cultura Mirandesa,Portugal, e-mail: [email protected] 3 Para mais detalhe consultar “Territórios de baixa densidade. Territórios de elevado potencial”. Relatório final/ Setembro 2014 e Deliberação da CIC Portugal (Comissão Interministerial de Coordenação) 2020 in https://www.portugal2020.pt/...CIC/Db-CIC-Terr- Baixa-Densidade-26Mar2015.pdf 4 Ver mais informação acerca do conceito de Património (material e imaterial) em ICOMOS (2016), UNESCO (2003) e UNESCO-BKK, (2015). 5 Em Portugal, o conceito “paisagem” vem definido na Lei de Bases do Ambiente (1987) e na Lei da Política de Ordenamento do Território e Urbanização (1998) e ainda na Constituição da República (1976), mostrando ser um sistema complexo que pode ser especificado em diferentes ângulos. Cancela D’Abreu, Correia & Oliveira, (2004, p.5) referem paisagem “(…) como um bem dinâmico, reflexo das relações entre o homem e o território (…) não cristalizando no tempo”, sendo reforçada pela Convenção Europeia da Paisagem (Conselho da Europa, 2000), como património cultural, natural e científico e a base da identidade territorial. 6 Para mais informação acerca do conceito “memória coletiva” ver Halbwachs (1990).

Salvado, J. O.; Meirinhos, A. A. MIRANDA DO DOURO, PORTUGAL: TERRITÓRIO DE BAIXA DENSIDADE COM ELEVADO POTENCIAL PARA O TURISMO 1. INTRODUÇÃO inovações. A função do “costume” é dar a Portugal é uma nação, que ao pôr em qualquer mudança desejada, continuidade evidência uma variedade de sentidos e uma histórica e direitos naturais conforme o multiplicidade de representações dos expresso na história, devendo parecer territórios, garante a sua originalidade quanto a compatível ou idêntico com a “tradição”. O cultura, tradição e costumes. Branco (1999)7 “costume” não pode ser invariável, porque a alega que o conceito de “ Nação” determina vida está em constante mutação, mesmo nas que a identidade nacional apela a um discurso sociedades tradicionais. assente na unidade e singularidade do coletivo. No seguimento destas ideias, Sabourin Para explicar este conceito complexo, Oliveira (2002) apelida a valorização coletiva e Martins (1882)8 foca nos marcadores negociada das potencialidades das localidades, geográficos, considerando a diversidade de das coletividades ou das regiões, de atributos relevo, a existência de rios e a sua locais ou de ativos específicos. navegabilidade, a relação litoral vs interior, As questões da personalidade e do como atributos nucleares da definição e caracter do povo português foram abordadas geração de perfis identitários culturais por Braga (1885)10 que teoriza sobre a singulares. Martins (1882, p.26) reforça dizendo produção dos símbolos e dos rituais nacionais, que “Quando se percorre de norte a sul a partindo da noção de construção cultural da estreita facha da nação ocidental da Hespanha, Nação. Em 1885 dedicou-se à investigação dos encontram-se os sucessivos prolongamentos usos e costumes populares sistematizados na das cordilheiras peninsulares, galgando uns até obra “O Povo Português nos seus Costumes, ao mar, terminando outros mais distante da Crenças e Tradições”, para estabelecer aquilo costa (sic.) ” e que o caracter das pessoas, os que designava como “bases positivas da seus hábitos alimentares, de sociabilidade, nacionalidade”. Segundo este autor existem capacidade de relacionamento e atividades elos de continuidade (a cultura popular é o desenvolvidas (…), são influenciados pelo meio testemunho ‘científico’ da remota antiguidade físico onde habitam. e da originalidade) entre os antepassados que Silva (1997, p.39)9 por seu turno uniria e daria um caráter próprio à Nação atual. destaca os marcadores sociais apoiando-se na O tema da religião enquanto determinante matriz simbólica oitocentista que coloca a cultural é destacado por Geertz (1926, p.68)11 tónica no Povo apresentando-o como a “coluna que a considera um sistema de símbolos que vertebral da Nação”, a trave-mestra da atua para estabelecer poderosas, penetrantes e “identidade coletiva” geradora de tradições e duradouras disposições e motivações nos costumes. Neste contexto de tradições e homens através da formulação de conceitos de costumes, Hobsbawm & Ranger (1984) uma ordem de existência geral e vestindo essas consideram que a “tradição” se qualifica pela conceções com tal aura de factualidade que as sua invariabilidade, diferenciando-a do disposições e motivações parecem “costume” que tem uma dupla função de singularmente realistas. motor e de volante, não impedindo as Após a contextualização supra, o objetivo deste trabalho é explorar o potencial

7 Ver artigo de Jorge Freitas Branco (1999, p.25-27), “A do território de baixa densidade de Miranda do fluidez dos limites: Discurso etnográfico e movimento Douro em diversas dimensões (geográfica, folclórico em Portugal “ em http://ceas.iscte.pt/etnografica/docs/vol_03/N1/Vol_iii_N1 identitária, emocional, caracter/personalidade _23-48.pdf. 8 Para mais detalhe, consulte Oliveira Martins, J.P. (1882, 10 Braga, Teófilo, (1885), “O Povo Português nos seus p.22-31), História de Portugal. 3ª Edição, Livraria Bertrand. Costumes, Crenças e Tradições”. 9 Para mais detalhes consultar Silva, António Santos, (1997), 11 Geertz, Clifford (1926), “A interpretação das culturas “ Palavras para um país: estudos incompletos sobre o século 1ª.ed, reimpresso 1989 por LTC — Livros Técnicos e XIX português, Oeiras, Celta Editores Científicos Editora S.A., Rio de Janeiro. 8

Salvado, J. O.; Meirinhos, A. A. MIRANDA DO DOURO, PORTUGAL: TERRITÓRIO DE BAIXA DENSIDADE COM ELEVADO POTENCIAL PARA O TURISMO e religiosa), manifestações (naturais, políticos, Ribeiro, Lautensach e Daveau (1987-1991)15 económicos, sociais, culturais) e atributos, para que focam num dos volumes a divisão regional a atividade turística. A estratégia de pesquisa e sub-regional; Gaspar (1993)16 em “As regiões alinhou-se num Estudo de Caso assente em três portuguesas” que destaca o ajustamento das pilares: Território/Paisagem, Património e regiões e sub-regiões aos diferentes níveis de Turismo. Aplicaram-se técnicas de triangulação NUTS; e as Unidades de Paisagem do Planalto de métodos, fontes e dados e foram usados Mirandês segundo Cancela D’Abreu, Correia & processos de observação quanto a aspetos: Oliveira, (coords), (2004)17 que foca a espaciais (Território nacional – do diversidade da paisagem, considerada “(…)um Concelho de Miranda do Douro); temporais bem dinâmico, reflexo das relações entre o (observação e trabalho de campo realizados homem e o território (…) não cristalizando no entre março e julho de 2015) e de recolha “in tempo”. No respeitante ao património e ao loco” de dados (Património material e perfil cultural de Miranda do Douro e das suas Imaterial) através do preenchimento da especificidades etnográficas, musicais, rituais e MatrizPCI12, que por sua vez irá alimentar o em especial linguísticas foram estudadas obras MIRE (Modelo de Inventariação de Recursos de Meirinhos, (2000)18; Merlan, (2009)19 e Endógenos). Mourinho (1991 e 1993)20. Quanto ao Turismo, O trabalho (escrito em português de a abordagem focou o seu efeito catalisador no Portugal) articulou abordagens quantitativas desenvolvimento sustentável das regiões e o como metodologia de investigação (com a papel do planeamento como ferramenta de quantificação dos recursos endógenos do salvaguarda dos recursos naturais e histórico- território e com a utilização de dados culturais. O Turismo enquanto atividade estatísticos secundários – INE – Instituto transversal, e geograficamente complexa Nacional de Estatística) e qualitativas (envolveu (Pearce, 1989)21, interage com diversas analise documental e trabalho de campo), disciplinas, designadamente, a economia, a sendo em simultâneo exploratória (com gestão, a sociologia, a geografia, a levantamento bibliográfico) e descritiva antropologia, o ambiente e outras ciências (levantamento, descrição, classificação e interpretação dos factos associados ao património material e imaterial do território de 15 Para mais informação consultar Ribeiro, O., Lautensach, Miranda do Douro). H., & Daveau, S. (1988-1991). Geografia de Portugal. Lisboa: Edições João Sá da Costa. Da revisão de literatura específica do 16 Para mais detalhe consultar Gaspar, J. (1993). As Regiões território, foram examinadas as obras de: Portuguesas. Lisboa: Ministério do Planeamento e da Administração Territorial- Secretaria de Estado do Taborda (1932)13 para caraterizar a região de Planeamento e Desenvolvimento Regional. Trás-os-Montes que conjuga os aspetos da 17 Para mais detalhe consultar Cancela D’Abreu, A., Correia, Geografia Física e da Geografia Humana; de T. & Oliveira, R. (Coords)(2004). Contributos para a identificação e caracterização da paisagem em Portugal Girão (1960)14 que inclui diversos documentos continental. Colecção estudos 10. europress, editores e cartográficos e informações diversificadas distribuidores de publicações Lda. ISBN 972-8569-28-9 18 Para mais informação consultar Meirinhos, J. F. (2000). sobre a Terra de Miranda; os trabalhos de Estudos Mirandeses: Balanço e Orentações. : Granito, Editores e Livreiros. 19 Para mais detalhes ver Merlan, A. (2009). EL MIRANDÉS Situación sociolinguística de uma lengua minoritaria en la zona fronteriza Portugueso-Española. Uviéu: Academia de 12 Para informação mais detalhada consultar la LLingua Asturiana. 20 http://www.patrimoniocultural.gov.pt/static/data/patrimonio_imat Para mais informação ver Mourinho, A. M. (1991). Terra erial/matrizpci_manualdeutilizacao_2014certo.pdf de Miranda coisas e factos da nossa vida e da nossa alma 13 Para mais detalhe da obra ver Taborda, V. (1987). Alto mirandesa. Miranda do Douro: Edição da Camara Municipal Trás-os-Montes: Estudo Geográfico (2ª Edição ed.). Lisboa: de Miranda do Douro. Livros Horizonte. 21 Para mais informação consultar Pearce, D., (1989). 14 Para mais detalhe consultar Girão, A. A. (1960). Geografia Tourist Development, 2nd ed., Longman Scientific & de Portugal 3ª Edição. Porto: Portucalense Editora. Technical, Essex. 9

Salvado, J. O.; Meirinhos, A. A. MIRANDA DO DOURO, PORTUGAL: TERRITÓRIO DE BAIXA DENSIDADE COM ELEVADO POTENCIAL PARA O TURISMO (Jafari, 1990)22. Para aplicação destes entre eles. Mais tarde Tizon (1995) reforça esta princípios foram seguidos os contributos ideia, com a apropriação da ação social de metodológicos de Inskeep (1991) na construção diferentes atores na construção de uma do Modelo de Inventariação de Recursos identidade. Por seu turno, Pecqueur (2000) Endógenos (MIRE), onde se enfatizam os reconhece dois tipos de territórios, um espaço- recursos primários e complementares, como lugar resultante de políticas de organização do motores de atração turística e geradores de território e outro formado a partir do encontro sustentabilidade e desenvolvimento. de atores sociais, que procuram identificar e O desenho deste “Estudo de Caso” resolver um problema comum. compreende as temáticas: do Território na O espaço geográfico onde se integra o perspetiva da paisagem, das políticas e concelho de Miranda do Douro pertence à estratégias de desenvolvimento de Miranda do Região Norte (NUT II)23 e à Sub-região Alto Douro; dos Patrimónios e do Turismo, onde é Trás-os-Montes (NUTS III). Conforme mostra a proposto um Modelo de Inventariação de Figura 1, esta sub-região engloba os concelhos Recursos Endógenos (MIRE), sustentado de Alfândega da Fé, Bragança, Macedo de conceptualmente pelo modelo sistémico de Cavaleiros, Miranda do Douro, , turismo de Inskeep (1991). Como conclusão, o , , e . O rio estudo do território de Miranda do Douro Douro forma a fronteira natural entre Miranda mostra um vasto património (material e do Douro e Espanha. Miranda do Douro é sede imaterial), uma cultura e uma identidade que de um município com 487,18 km² de área24 e 7 devem ser valorizados e preservados pelo 482 habitantes (2011)25, subdividido em 13 turismo. Os resultados mostraram que o 26 turismo pode ser um agente catalisador do freguesias , cujo nome se indica nas duas desenvolvimento e da sustentabilidade do línguas oficiais existentes em Portugal (o território de baixa densidade de Miranda do Português e o Mirandês): Constantim e Douro, ao incluir na experiencia turística os (Custantin i Cicuiro), Duas Igrejas (Dues recursos endógenos (tangíveis e intangíveis), as Eigreijas), Genísio (Zenízio), e Paradela atracões regionais, os equipamentos e (Anfainç i Paradela), Malhadas (Malhadas), infraestruturas de apoio, as atividades de Miranda do Douro (Miranda de l Douro), entretenimento, os valores e as imagens Palaçoulo (Palaçuolo), Picote (Picuote), Póvoa simbólicas dos territórios. (Pruoba), São Martinho de (San Martino de Angueira), Sendim e Atenor (Sendin 2. Materiais e métodos

23 NUT = Nomenclatura das Unidades Territoriais (para fins 2.1. O território de Miranda do Douro Estatísticos) foi criada pelo EUROSTAT com os Institutos O conceito de território tem vindo a Nacionais de Estatística dos diferentes países da União evoluir, iniciando nas ciências naturais, estando Europeia (UE) para efeitos de análise estatística de dados, com base numa divisão coerente e estruturada do território relacionado com o património natural, como económico comunitário. A NUT é composta por níveis observa Raffestin (1993). Brunet (1990) hierárquicos (NUT I, II e III), servindo de suporte a toda a recolha, organização e difusão de informação estatística considera o território como um espaço de ação regional harmonizada a nível europeu. A NUT constitui coletivo, englobando relações sociais entre ainda referência para a determinação da elegibilidade das regiões europeias à Política de Coesão da EU e foi instituída atores locais, que permitem o desenvolvimento pela primeira vez em Portugal através da Resolução de de um sentimento de pertença à identidade Conselho de Ministros nº 34/86 na sequência da adesão de regional, produzindo laços de solidariedade Portugal à Comunidade Económica Europeia. 24 Instituto Geográfico Português, Carta Administrativa Oficial de Portugal (CAOP), versão 2013. 25 INE (2012) – "Censos 2011” 22 Para mais detalhes consultar Jafar, J., (1990). Research 26 Diário da República, Reorganização administrativa do and Scholarship. The Basis of Education, Journal of Tourism território das freguesias, Lei n.º 11-A/2013, de 28 de Studies, 1, 1, pp. 33-41. janeiro. 10

Salvado, J. O.; Meirinhos, A. A. MIRANDA DO DOURO, PORTUGAL: TERRITÓRIO DE BAIXA DENSIDADE COM ELEVADO POTENCIAL PARA O TURISMO i Atanor), Silva e Águas Vivas (Silba i Augas disponibilidade hídrica ou as características do Bibas), Vila Chã de Braciosa (Bila Chana de solo e de fatores humanos como os históricos, Barceosa). os sociais e os económicos, movimentos No que respeita à distribuição da migratórios e redes de comunicações. população no território, ela depende de fatores naturais como o clima, o relevo, a

Figura 1 - Localização do Concelho Miranda do Douro e das suas Freguesias. Fonte: Produção própria com base informação da ferramenta QGIS2.18.1.

Em 2011 residiam no concelho de de estudo é o envelhecimento27 da população Miranda do Douro 7482 habitantes (Gráfico 1), residente. O Índice de envelhecimento segundo o que significa, uma densidade populacional de os Censos (Rácio - %), do concelho de Miranda 15,6 hab/km2. Quando comparamos esta do Douro é de 331,9, quando em 1960 era de densidade com a de Portugal ou com a do Alto 15,0 (Meirinhos, 2014, p.31). Em 2011 este Trás-os-Montes - 114,5 hab/km2, e 25,0 concelho contabilizava um total de 2618 hab/km2 respetivamente- compreendemos indivíduos economicamente ativos (35% da que estamos perante uma das densidades população). populacionais mais baixas do País. Analisando a densidade populacional das freguesias do Concelho de Miranda do 27 Relação entre a população idosa e a população jovem, Douro (Gráfico 2) os valores são igualmente definida habitualmente como o quociente entre o número de pessoas com 65 ou mais anos e o número de pessoas reduzidos, com exceção da sede de concelho. com idades compreendidas entre os 0 e os 14 anos. Outra das características demográficas da área Número de pessoas idosas por cada 100 jovens. 11

Salvado, J. O.; Meirinhos, A. A. MIRANDA DO DOURO, PORTUGAL: TERRITÓRIO DE BAIXA DENSIDADE COM ELEVADO POTENCIAL PARA O TURISMO

Figura 2 - Gráfico 1 – Evolução demográfica de Miranda do Douro (nº habitantes). Fonte: Produção própria com base em dados do INE – Instituto Nacional de Estatística (2012) - Censos de 2011- população total.

O setor terciário empregava 1771 tendo a proximidade com Espanha contribuído indivíduos (68%); o setor secundário para o desenvolvimento de relações comerciais empregava 561 (21%), enquanto o setor nas zonas de fronteira. Com a construção das primário empregava 286 (11%) da população barragens de Picote e Miranda, no século XX, a ativa (Meirinhos, 2014, p.32). A agricultura ou a região desenvolveu-se e a cidade emergiu pecuária continuam a não ser atrativas, nem como um ponto comercial, que ainda hoje se estão a contribuir para fixar população jovem, mantém. Muitos são os espanhóis que pois grande parte dessas mesmas atividades é atravessam frequentemente a fronteira em feita pela população envelhecida, de uma busca dos têxteis, calçado, ourivesaria e forma tradicional, complementando gastronomia mirandeses. Colchas feitas nos rendimentos provenientes de outras fontes. O teares tradicionais, tecidos de Saragoça e aumento de população ativa no setor terciário Buréis, bordados, gaitas de foles, flautas, (de 13% em 1960 até 68% em 2011), nas castanholas e rocas são alguns dos produtos últimas décadas, em detrimento do setor artesanais característicos da região e com primário, deve-se, sobretudo, aos empregos na admiradores em todo o país. administração pública e à atividade comercial,

Figura 3 – Gráfico 2 – Densidade Populacional nas freguesias do Concelho de Miranda do Douro. Fonte: Produção própria com base no Censos 2011 (INE). 12

Salvado, J. O.; Meirinhos, A. A. MIRANDA DO DOURO, PORTUGAL: TERRITÓRIO DE BAIXA DENSIDADE COM ELEVADO POTENCIAL PARA O TURISMO A atividade económica principal nas para a revitalização destes territórios de baixa diversas freguesias é agricultura, pecuária, densidade? carpintaria, artesanato e construção civil, o Uma resposta poderá estar na comércio e alguma indústria: Tecelagem integração das Políticas e Estratégias Regionais (fabricantes de lã), alfaiates, sapateiros, de Especialização Inteligente28, com o Turismo, carpinteiros e ferradores. As Indústrias visando alavancar os recursos distintivos da artesanais: forjas, os teares, os lagares de vinho região e potenciar a “construção de vantagens e azeite, os fornos de cozer o pão, os competitivas na produção de bens e serviços alambiques, os pombais, bem como uma diferenciadores”(EREI-Norte, 2014, p.107)29. dezena de moinhos de água ao longo do curso Para a concretização da estratégia de da Ribeira que corre para o Douro; fabrico de especialização inteligente da Região Norte telha de barro e a cultura do bicho-da-seda; (EREI-Norte), é sugerido a exploração do Capital cestaria, a preparação do linho e da lã para a Simbólico, Tecnologias e Serviços do Turismo, tecelagem; o trabalho agrícola, feito em base integrando e qualificando as diferentes familiar e com recurso a animais de tração, componentes da oferta turística e valorizando sempre contou com a colaboração dos vizinhos os recursos culturais dos territórios. De notar num sistema de troca de trabalho (“torno a que o capital simbólico está enraizado na geira”). A exploração mineira do volfrâmio; cultura de uma região, no património transformação de carnes e produção de arquitetónico, natural e cultural, constituindo fumeiro tem alguma importância em Águas uma oportunidade de valorização económica Vivas. por um conjunto alargado de atividades Perante este enquadramento e económicas (como o Turismo). Portanto uma segundo os dados do Portal de Estatísticas das respostas possíveis à questão supra, será Oficiais (www.ine.pt), incluídos na edição de em primeiro lugar elencar os patrimónios 2016 dos Anuários Estatísticos Regionais, identitários de Miranda do Douro, seguindo-se (estruturados segundo a Nomenclatura das a construção de um MRE – Modelo de Recursos Unidades Territoriais -- NUTS), é revelado que Endógenos com potencial aplicação no desenho 2/3 do território nacional (especialmente de experiencias turísticas. municípios do Interior do País) são designados como Territórios de Baixa Densidade, pois 2.2. Patrimónios Identitários de Miranda estão ameaçados de despovoamento e das do Douro suas inevitáveis consequências. Em Miranda do O território onde se localiza Miranda Douro esses efeitos são visíveis no do Douro foi desde há mais de dois mil anos um despovoamento provocado pelo abandono de território de fronteira, gerador de influências terras e dos ofícios produtivos conexos; no dos povos vizinhos e daqueles que para lá se declínio das atividades económicas e na perda deslocavam. A fundação do município de de talentos que possam facilitar a viabilização Miranda do Douro ocorreu em 1136, mas o de investimentos; no acréscimo significativo território era habitado já desde a Idade do dos custos de funcionamento de Bronze. Segundo Sasportes (1983) a cultura da infraestruturas e de equipamentos de uso coletivo; na redução de serviços públicos 28 Para informação detalhada das Politicas e estratégias de fundamentais e na correspondente degradação especialização inteligente consultar https://www.portugal2020.pt/Portal2020/Media/Default/D da igualdade de oportunidades e de condições ocs/EstrategiasEInteligente/EREI%20Norte.pdf de vida. 29 Estratégia de Especialização Inteligente - COMISSÃO DE Uma questão se pode colocar: que COOORDENAÇÃO E DESENVOLVIMENTO REGIONAL DO NORTE, in políticas e estratégias se podem implementar https://www.portugal2020.pt/Portal2020/Media/Default/D ocs/EstrategiasEInteligente/EREI%20Norte.pdf. Acesso em 3-10-2015. 13

Salvado, J. O.; Meirinhos, A. A. MIRANDA DO DOURO, PORTUGAL: TERRITÓRIO DE BAIXA DENSIDADE COM ELEVADO POTENCIAL PARA O TURISMO península ibérica teve a sua origem numa reconhecida pela Constituição da República combinação de estruturas de Celtas, Suevos, Portuguesa de 1976 e legitimada oficialmente Visigodos, Iberos, Romanas, cristãs, judaicas, como língua em 1999. Mateus e Villalva (2007) árabes e mesmo francesas. Estas marcas consideram a língua oficial a que é usada na identitárias permanecem ainda hoje num escolarização e nos contactos administrativos, território outrora Celta da tribo dos Zoelas, oficiais e internacionais dos constituintes de encaminhando-nos para raízes culturais muito uma sociedade. Armando Jorge Lopes (1998) mais profundas do que o simples marco da refere o conceito de língua maioritária por criação de Portugal enquanto Reino e que estar normalmente associada à de língua resistiram à ocupação Romana e Árabe. materna, reforçando a ideia de que a Encontram-se vários marcos identitários deste terminologia usada apenas indica que existe território de Miranda do Douro: a língua, a uma ordem de aquisição no sentido social. cultura, os saber-fazer locais e os patrimónios Outros marcos identitários são a materiais, imateriais, móveis. cultura e os saberes-fazer locais, dando Um dos marcos identitários mais identidade aos territórios. Ostrom (1995) agregadores deste espaço geográfico é o aponta o conhecimento e o saber-fazer local, idioma local, o mirandês (língua oficial em como a capacidade dos autoctones de Portugal em conjunto com o português), com promoverem um desenvolvimento com raízes no asturo-leonês, tendo sido o idioma características endógenas, a partir do sentido falado no reino de Leão, desde a sua origem, de territorialidade presente entre os atores com exceção da zona galaico-portuguesa. Era locais. Featherstone (1993) associa a cultura uma língua de cultura (falada na corte), jurídica local às relações sociais existentes em espaços (escrita em milhares de documentos até aos delimitados e pequenos, onde se estabelecem séculos XIII-XIV) e seguida pelas instituições formas específicas de representação, usando monásticas (com destaque para o Mosteiro de códigos comuns. Ao longo dos tempos Moreruela, junto a Zamora, e de San Martin de manteve-se uma unidade social e cultural entre Castañeda em Sanábria). Assim, Portugal nasce as Terras de Miranda e as regiões espanholas da separação do Reino de Leão, ficando de Aliste e Sayago (Zamora), destacando-se um bilingue. Do mesmo modo, como todos os dialeto semelhante, as mesmas canções e filhos falam a língua das mães, Afonso melodias, a utilização de instrumentos Henriques (1º Rei de Portugal) não será idênticos, um património material e imaterial exceção e falará leonês porque D. Teresa era de raiz comum, os costumes festivos, e as leonesa de nascimento (filha de Alfonso VI de danças, como a “danza de palos” (Matellán, Leão). 1987). Atualmente os fatores identitários e de Portanto a identidade constrói-se por interculturalidade de Miranda do Douro meio da língua e da cultura. Existe uma (Portugal) e Castela / Leão (Espanha), apenas interdependência entre os conceitos de língua, estão separados pela barreira física do rio cultura e identidade, salientando que a língua Douro. Encontram-se traços de atravessa tanto a cultura quanto a identidade e heterogeneidade linguística e cultural, é também por elas trespassada. Neste alicerçados em tradições e numa memória contexto, Terry Eagleton (2005) define cultura coletiva comum, o que implica aproveitar a como um conjunto complexo de valores, fronteira para torná-la o ponto de encontro costumes, crenças e práticas que constituem o entre diferenças e semelhanças. modo de vida de um grupo específico. Esse Portugal mantem-se bilingue (o conjunto possibilita ao indivíduo inserir-se e português e o mirandês como línguas oficiais), interagir no seu grupo social permitindo-lhe tendo o mirandês sido formalmente negociar maneiras apropriadas de agir em

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Salvado, J. O.; Meirinhos, A. A. MIRANDA DO DOURO, PORTUGAL: TERRITÓRIO DE BAIXA DENSIDADE COM ELEVADO POTENCIAL PARA O TURISMO contextos específicos, incluindo afeto, territoriais, cujas identidades estão formadas relacionamento, memória, parentesco, lugar, com base em relações histórico-culturais. comunidade, satisfação emocional, prazer Outro marco identitário do território intelectual. Sendo a cultura acumulativa, ela de Miranda do Douro, são os seus patrimónios reúne conhecimentos e experiências ao longo (material e imaterial), cuja inventariação é uma das gerações, numa espiral de produção e etapa indispensável ao encorajamento da construção de conhecimentos. No tocante à exploração do legado histórico e cultural de um construção da identidade, Cuche, (2001) afirma povo. O quadro 1 mostra a diversidade de que esta é antecedida da construção da patrimónios de Miranda do Douro. diferenciação, a partir de fronteiras que os grupos determinam, chamadas de fronteiras sociais simbólicas. Na construção territorial, essa fronteira simbólica ganha limites Património Natural: Em Paradela a Paisagem sobre o Douro no Miradouro da Penha das Torres (onde o rio Douro entra em Portugal). No Parque Natural do Douro Internacional existe diversos Miradouros: São João das Arribas; Castrilhouço; Senhora da Luz; Fraga do Puio; Fraga Amarela; Castelo; Freixiosa; Chapéu; Sé Catedral; Penha das Torres; Teixeira; Cabecito da Vinha; Carreirão das Arribas; Capela de São Paulo; Capela de Santa Ana; Centro de Interpretação Turístico e Ambiental. Monumentos existentes nas diversas freguesias: Aldeia Nova: Igreja Matriz; Castro de S. João das Arribas; Capela de São João das Arribas; Fontes; Lagar recuperado; Arquitetura Tradicional. Vale d`Águia: Igreja Matriz; Castro; Moinho água recuperado; Fontes: Arquitetura tradicional Aldeia de Constantim: Igreja Matriz de Nossa Senhora da Assunção; Vestígios de castro Romanizado; Fontes e Fontanários; Capela da Sra. da Luz; Capela da Santíssima Trindade; Casa do Gaiteiro; Cruzeiros; Museu da Associação Cultural e Recreativa; Capela de Nossa Senhora das Dores; Vestígios de um castro; Parque de Lazer dos Lagonalhos. Picote: Igreja Matriz; Arquitetura tradicional e popular; Capela de Sto. Cristo; Capela de Santa Cruz; Cruzeiros e Fontes; Lagares de Azeite; Vestígios arqueológicos da existência de três castros; Esculturas rupestres e esculturas em pedra; Ecomuseu da Terra de Miranda – “ Terra Mater”; Moinho recuperado. Barrocal do Douro: Igreja Matiz; Arquitetura própria – “ Moderno escondido”; Empreendimento Hidroelétrico do Douro Internacional – conjunto de interesse público. Picote: Igreja Matriz; Arquitetura tradicional e popular; Capela de Sto. Cristo; Capela de Santa Cruz; Cruzeiros e Fontes; Lagares de Azeite; Vestígios arqueológicos da existência de três castros; Esculturas rupestres e esculturas em pedra; Ecomuseu da Terra de Miranda – “ Terra Mater”; Moinho recuperado Vila Chã de Braciosa: Igreja Matriz de São Cristóvão – Classificada como Imóvel de Interesse público; Casa Paroquial; Capela de Sta. Cruz; Capela da Santíssima Trindade; Capela de Santo Albino; Capela de São Domingos; Vestígios arqueológicos da existência de dois castros; Vestígios rupestres: Lagares rupestres, altar de sacrifícios, sepulturas; Casa da frágua; Forja Comunitária; Vários Parques de merendas; Estrada e calçada Romana. Aldeia de Palçoulo: Capela da Sra. do Carrasco; Vestígios de um castro Romanizado; Vestígios de um povoado romano; Fraga do Barroco Pardo; Igreja e capela Santo Cristo; Ruínas da capela de Macieiras; Ribeira de tortulhas; Fabricas de Tanoaria e Cutelaria; Fraga da Moura. Freixiosa: Igreja Matriz; Duas capelas; Fontanários; Parque de merendas. Cércio: Igreja Matriz; Fontanários, de salientar a Fonte a Baixo; Capela de Sta. Marinha; Castro de Cércio e Sta. Marinha, povoado romano medieval; Ruínas da capela de santo André; Árvore de interesse público – Zimbro; Capela do Divino Espírito Santo; Poço do Inferno. Paradela: Igreja Matriz; Capela de S. Martinho; Capela do Cemitério; Cruz do Pendonico; Fonte da

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Salvado, J. O.; Meirinhos, A. A. MIRANDA DO DOURO, PORTUGAL: TERRITÓRIO DE BAIXA DENSIDADE COM ELEVADO POTENCIAL PARA O TURISMO Pregriça; Casa do Dízima; Penha do Mouro; Moinhos de água; Vestígios de um castro. Miranda do Douro: Sé Catedral; Museu da Terra de Miranda; Igreja da Misericórdia; Igreja de Sta Cruz; Solar dos Ordazes; Rua da Costanilha; Casa das quatro esquinas; Ruínas do Paço Episcopal; Casa da Música Mirandesa; Casa da Cultura Mirandesa; Cabanais do Castelo; Castelo e Muralhas Pré Românicas; Casa dos Sarmentos e Vasconcelos; Biblioteca Municipal – Convento dos Frades Trinos; Fonte dos canos; Aqueduto do Vilarinho; Parque Urbano do Rio Fresno; Capela de Sta Luzia; Capela de Santa Catarina; Postigo da Barca; Solar Buiças; Antiga Hospedaria Zambeira; Antigo Quartel de S. José; Centro Interpretação Turístico e Ambiental. Atenor: Igreja Matriz de N. Sra. da Purificação; Capela de Santo Cristo; Arte Rupestre – Fraga da Lapa; Afloramentos Rochosos; Abrigos Rupestres; Sede da Associação AEPGA; Fonte do cabo do Lugar; Vestígios de um Castro – Ervideiros; Povoado Romano; Associação Lérias. Teixeira: Igreja Matriz; Capela de Sto. Cristo; Vestígios de um castro e povoado romano; Arte Rupestre; Afloramentos Rochosos; Parque de lazer junto ao rio Angueira; Cruzeiro. Sendim: Arquitetura civil, tradicional e popular; Igreja Matriz; Capela de Nosso Senhor da Boa Morte; Capela de Nossa Senhora dos Remédios; Vários Cruzeiros; Esculturas e sepulturas em pedra (Santos); Ruínas da capela de S. Paulo - Arribas do Douro; Carreirão das Arribas; Casa do Pauliteiro; Casa da Cultura; Centro Música Tradicional “ Sons da Terra”; Fontanários e fontes; Pisões – Espaço de lazer junto ao rio Douro; Casa do Artesanato; Capela de S. Sebastião. Vila Chã de Braciosa: Igreja Matriz de São Cristóvão – Classificada como Imóvel de Interesse público; Casa Paroquial; Capela de Sta. Cruz; Capela da Santíssima Trindade; Capela de Santo Albino; Capela de São Domingos; Vestígios arqueológicos da existência de dois castros; Vestígios rupestres: Lagares rupestres, altar de sacrifícios, sepulturas; Casa da frágua; Forja Comunitária; Vários Parques de merendas; Estrada e calçada Romana. Granja: Igreja Matriz; Capela de Santa Ana; Estátua Menir; Fontanários. São Pedro da Silva: Igreja Matriz; Capela do Divino espírito Santo; Dois Cruzeiros; Grutas de santo Adrião (ocupação Pré-histórica); Capela da Sra. do Rosário; Parque de merendas. Património Etnográfico e artístico Museus: Constantin: museu das tradições; Genízio: Museu rural (Lagar); Miranda: Museu da terra de Miranda. Etnografia: Trajes Regionais (capa de Honras, os coletes, o traje da mulher Mirandesa e o traje de Pauliteiros); Colchas (confeção de colchas, tapetes, carpetes, alforges, tapetes e rendas; Gaita de foles; Trabalhos em madeira (arados, rocas, carros de bois em ponto pequeno e outros objetos tradicionais); Ferro forjado; Cestaria (vime e a verga); Cobre, zinco e cutelaria; Pendões; máscara; Os Dançadores. Casas: Casas para guardar rebanhos; chebiteiros; pombais; fontes de mergulho; pontes; castros; moinhos de água. Atividades desenhadas para os visitantes: Percursos: De Miranda do Douro ao S. João das Arribas; Póvoa: É atravessada por uma antiga estrada romana, conhecida como estrada mourisca; Cruzeiros Ambientais no Douro Internacional; Passeios de Burro. Culturais: Desfile de capas de honra; Desfile de pendões; A língua – A fala; As Festas - Festas do solstício de inverno; O entrudo; Representações e procissões na semana santa; O Teatro popular (Quelóquios); Festas das colheitas; Festas de raiz pagã; Rituais da iniciação; O culto da fertilidade; Festa dos rapazes; Rituais de iniciação; Ceia comunitária. Eventos diversos: Feiras e Festas: Constantin: São João; Romaria de Nossa Senhora da Luz (último domingo de abril); Festa do Mono e da Mona (3º domingo de setembro); Ceia das morcelas (29 de dezembro); Festa dos Moços (28 de dezembro). Cicouro: St.º António (10 janeiro); S. João (24 junho); St.º Amaro (Dom. próx. 15 agosto); N.

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Salvado, J. O.; Meirinhos, A. A. MIRANDA DO DOURO, PORTUGAL: TERRITÓRIO DE BAIXA DENSIDADE COM ELEVADO POTENCIAL PARA O TURISMO Sr.ª Fátima (maio e outubro); N. Sr.ª Rosário (últ. Dom. Outubro). Santo Amaro: (15 de Jan.); São Gregório (início de Ago.); N. Srª da Conceição (8 de Dez.). Genísio: N. Srª das Candeias (2 Fev. ou fim de semana mais próximo); Santa Bárbara e São Bartolomeu (início de Ago.). Ifanes: S. Sebastião (3º fim de semana janeiro); N. Sr. Piedade (últ. Dom. Maio); Stª Catarina (25 Nov.). Paradela: Festa em honra de S. Sebastião (20 de janeiro); Festa em honra a Nossa Senhora da Ascensão (último Domingo de agosto). S. Sebastião (22 Jan); N. Srª dos Remédios (15 Mai); Santa Bárbara (3º Dom. de Ago). Palaçoulo: S. Sebastião (20 Jan); S. Miguel (8 Mai); N. Sr.ª do Carrasco (15 Ago); Srª Rosário (2 Set); Stª Bárbara (20 Set ou no Dom a seguir);Prado-Gatão: Stª Isabel (7 Jul); Stª Bárbara (8 Ago); Srª do Rosário (16 Ago); Póvoa: N. Srª do Rosário (1º Dom. Out.), Stª Estevão (soltei.-26 Dez), Santo Amaro (casados 15 Jan). Romaria: N. Srª do Naso (6,7 e 8 Set). Feiras: Mensal (22 de cada mês), Anual no Naso (6,7 e 8 Set); Dias 6, 7 e 8 de setembro romaria miradouro; teatro Popular Mirandês ou “Colóquios”, as danças de pauliteiros e os tocadores de gaitas de foles. Sendim: Nossa Senhora da Purificação e de Santa Bárbara (entre o dia 15 e 20 de agosto). Silva e Aguas Vivas: Festas: Festa dos Reis (6 de janeiro); Festa de Nossa Senhora do Rosário (1º domingo de maio); Festa de São Pedro (29 de junho); Festa de Santa Bárbara (1º domingo de agosto); Festa de Santa Marinha (agosto). Celebrações Culturais: Dia da Geminação Miranda- ; Festas: Festa da Bola Doce e Produtos da Terra; Trail Running Miranda do Douro; Festa dos Sartigalhos; Festa em Honra de Santíssima Trindade. Patrimónios alimentares: Gastronomia e vinhos: Posta mirandesa; folar de carne; Bola doce mirandesa; fumeiro; Caça e Pesca: Perdiz; Coelho; Lebre; Javali; Rola. Lagostim de água doce; Carpa; Barbo. Quadro 1 – Diversidade de patrimónios de Miranda do Douro. Fonte: Produção própria com base em recolha bibliográfica, trabalho de campo e observação.

Integrando estes marcos identitários uma interação entre as culturas externas com na experiencia turística, eles são transmitidos as culturas locais cujo resultado se diferencia aos visitantes através da socialização dos entre territórios (podendo gerar aculturação). indivíduos. Portanto, seguindo a ideia de Segundo Kuper (1999), as diferentes culturas Lacour (1985) a construção social do território são convenções transmitidas socialmente, depende do capital social existente, abarcando dinâmicas e mutáveis, e refletem conjuntos de um espaço de desenvolvimento ideias e valores. Mas a presença da cultura local multidimensional. persiste importante na formação da identidade do território, dando-lhe contornos específicos. 2.3. Turismo: Valorização da identidade e Jollivet (1984) considera que uma região tem o Promoção do território poder de se manifestar permanentemente a O turismo é hoje a mais importante partir da memória coletiva e das relações atividade de serviços à escala global com uma sociais que são formadas pelas interações locais 30 forte dimensão cultural . Constata-se que o e externas. desejo de viajar, de conhecer novos povos e Na opinião de Melo (2002, p.11), “A novas culturas gerou a globalização cultural. Há globalização não é um processo de supressão das diferenças – segmentação, e hierarquização 30 Para mais detalhes consultar – mas sim de reprodução, reestruturação e http://cf.cdn.unwto.org/sites/all/files/pdf/1.1.-wtc-2016- john-kester-tourism-future-trends-beyond-2030.pdf e sobre determinação dessas mesmas https://www.e- diferenças”. É esta aproximação entre “eus” de unwto.org/doi/pdf/10.18111/9789284419876 17

Salvado, J. O.; Meirinhos, A. A. MIRANDA DO DOURO, PORTUGAL: TERRITÓRIO DE BAIXA DENSIDADE COM ELEVADO POTENCIAL PARA O TURISMO culturas distintas que possibilita a promoção de integrar de forma coerente diversidades e práticas interculturais, colocando vários diferenças, através de «políticas regionais desafios nas esferas social, económica, política fortes». e cultural (Abdallah-Pretceille, 1996), Importa que o diagnóstico em turismo conferindo-lhe forte potencial de para o território de Miranda do Douro seja feito desenvolvimento regional. Por isso, a larga de forma colaborativa entre diversas instâncias: maioria dos países da OCDE (Organização para Organizações internacionais ligadas ao setor, (a a Cooperação e Desenvolvimento Económico) Organização Mundial do Turismo e a Comissão possui um setor do turismo forte e a quase Europeia), Entidades nacionais (a Secretaria de totalidade dos países em vias de Estado do Turismo e o Turismo de Portugal), desenvolvimento elegeu esta atividade como Entidades Regionais e Locais (Comissão de estratégica, sendo essencial para alavancar o Coordenação e Desenvolvimento Regional do seu futuro. No mesmo sentido, a UNESCO Norte (CCDR Norte) e Câmara Municipal de (Organização das Nações Unidas para a Miranda do Douro), bem como as diferentes Educação, a Ciência e a Cultura) admite que o perspetivas e stakeholders da análise do desenvolvimento não poderá ser sustentável Turismo (Oferta turística; Procura Turística; sem uma forte componente cultural (UNESCO- Comunidades Locais; Análise Económica; BKK, 2015). Seguindo o mesmo pensamento, a Análise de stakeholders; Marketing Territorial; Estratégia para o Turismo 2027 evidencia dez Eventos e Comunicação), como se detalha no ativos primordiais no eixo “Valorizar o território Quadro 2. e as comunidades” (TP 2017, p.55). Já num passado próximo, o Governo tinha estabelecido no seu programa a necessidade de adotar um Política Nacional de Turismo (PENT), capaz de Perspetiva Ferramentas de diagnóstico Oferta turística; Caracterização do território do município e a sua integração na região envolvente; Inventariação dos recursos turísticos primários e complementares; Evolução da oferta turística do território; Identificação dos elementos competitivos e de diferenciação do território; Definição dos produtos turísticos estratégicos e complementares; Construção de uma base de dados de recursos, que será disponibilizada à autarquia para promoção/comunicação online. Procura Turística; Avaliação das tendências globais do setor do turismo (procura turística); Identificação dos fatores críticos de evolução do mercado (análise crítica da procura potencial); Avaliação do efeito da sazonalidade na estrutura do setor do turismo local; Caracterização do perfil dos visitantes e definição de segmentos de mercado específicos; Realização de inquéritos aos visitantes e de entrevistas aos principais players locais do setor. Comunidades Operacionalização de um processo de diálogo com famílias residentes no Locais concelho, e aos naturais de Miranda do Douro residentes noutras geografias nacionais e mundiais; Identificação dos hábitos de lazer e recreio e dos comportamentos de compra e consumo; Avaliação das iniciativas/ eventos do concelho com maior notoriedade; Identificação de investimentos estratégicos – materiais e imateriais. Análise Identificação e organização dos investimentos e respetivas oportunidades Económica percebidas; Análise da atividade económica local (estrutura empresarial do concelho); Avaliação da importância e do impacto económico do turismo no município; Identificação de novas oportunidades de financiamento e de realização de candidaturas.

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Salvado, J. O.; Meirinhos, A. A. MIRANDA DO DOURO, PORTUGAL: TERRITÓRIO DE BAIXA DENSIDADE COM ELEVADO POTENCIAL PARA O TURISMO Análise de Dinamização de redes de cooperação municipal com parceiros locais na criação de stakeholders dinâmicas no setor do turismo; Definição e construção de um modelo de gestão e promoção do setor do turismo; Estruturação e organização de um órgão de gestão municipal; Reuniões com os principais agentes municipais (capacitação institucional); Definição de uma estrutura de governo e monitorização da política e estratégia. Marketing Avaliação prévia das propostas de valor – programas de ação e linhas de ação; Territorial Estruturação da logomarca e respetivo manual de normas (imagem específica para o turismo); Consolidação do plano de ação e programa de monitorização; Identificação de sistemas de incentivos para a operacionalização do Plano; Definição dos canais de distribuição e promoção/ comunicação a privilegiar; Desenvolvimento de novas soluções de comunicação eficientes e eficazes. Eventos e Organização de diversas reuniões temáticas, desconcentrados no território; informação Cooperação com os diferentes organismos locais da administração, das empresas (enfoque nas empresas do setor do turismo) e do movimento associativo local; Validação da informação produzida previamente (informação secundária e primária), e resultado da participação pública alargada. Quadro 2 – Turismo: Perspetivas e ferramentas de diagnóstico. Fonte: produção própria

O inventário de recursos endógenos centra no aproveitamento do potencial (Quadro 3) em colaboração com as diferentes patrimonial do espaço geográfico de Miranda perspetivas dos stakeholders (Quadro 4) do Douro, para gerar oportunidades ímpares de constitui a Matéria-Prima do MIRE (Modelo de criação de experiências turísticas singulares, de Inventariação Recursos Endógenos). Esta dinamização das regiões, de encorajamento ferramenta de planeamento em turismo visa dos players a explorar o legado da área promover um desenvolvimento turístico histórica e cultural e de realização de cross- sustentável, seguindo a filosofia de Inskeep selling com os produtos endógenos (1991, p.16) «good planning and careful (valorizando a sua identidade e autenticidade) management of tourism are crucial to optimise de uma forma sustentável. Este modelo the benefits of tourism and prevent or at least permite às organizações locais a coordenação e attenuate any problems that might be caused defesa dos interesses turísticos do território, by the tourism industry». O modelo sistémico através da disponibilização de informação e de Inskeep (1991) integra parte de um núcleo serviços aos visitantes; do engajamento dos central que é o território (composto pelos stakeholders no desenvolvimento turístico da ambientes natural, cultural, económico e social) localidade/ município; da sensibilização para a ao qual associa componentes da Oferta importância do turismo local e da preservação (Atrações turísticas e atividades, Alojamento, e conservação dos seus recursos endogenos; da Transportes, Outras facilidades e serviços realização de ações de promoção e de turísticos, Elementos institucionais e Outras animação turístico-cultural; e da Infraestruturas) e da Procura (mercados implementação de medidas conducentes ao turísticos domésticos e internacionais; uso das desenvolvimento turístico local. Partindo desta facilidades e atrações pelos residentes). estratégia e cientes de que é ao nível regional e local/municipal que se constituem espaços de 3. Resultados e Discussão excelência para intervir sobre o 3.1. MIRE - Modelo de Inventariação desenvolvimento turístico, será possível Recursos Endógenos construir e avaliar as áreas de crescimento Seguindo a filosofia base de Inskeep economicamente sustentáveis com que o (1991), foi desenhado o modelo MIRE (Modelo município se possa envolver no futuro. de Inventariação Recursos Endógenos) que se 19

Salvado, J. O.; Meirinhos, A. A. MIRANDA DO DOURO, PORTUGAL: TERRITÓRIO DE BAIXA DENSIDADE COM ELEVADO POTENCIAL PARA O TURISMO Assim os elementos principais do MIRE modo a poderem ser aplicados a um território, - Modelo de Inventariação Recursos Endógenos de serem transformados em motores de (Figura 4) consideraram em detalhe os recursos atração turístico e drivers de desenvolvimento endógenos Primários (património natural, sustentável daqueles espaços geográficos, património cultural, equipamentos culturais, garantindo assim a sua preservação para que recreativos e de lazer e Eventos) e Recursos não dependa apenas da memória das pessoas e Secundários (equipamentos e atividades). Estes permaneça acessível às gerações futuras. recursos estão detalhados no Quadro 3 de

Figura 4 - Modelo de inventariação de recursos Endógenos (organograma). Fonte: Produção própria.

Recursos Primários Nº Unidades Ria Lagos / Lagoas Quedas de Água Rios / Ribeiras Praias Marítimas Praias Fluviais Serras / Vales / Montes Manchas Florestais

PatrimónioNatural Áreas de Proteção da Natureza Miradouros Paisagem Espaços Naturais de Recreio e Lazer

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Albufeiras / Barragens Fauna / Flora Árvores com interesse relevante Recursos Piscícolas e Cinegéticos Outros não Especificados Total Património Natural Estações e Vestígios Arqueológicos Igrejas / Capelas / Ermidas Aldeias Típicas / Históricas Palácios / Solares Pelouros / Cruzeiros / Obeliscos

Torres/Castelos/Castros Monumentos Fontes / Chafarizes / Aquedutos

Edifícios c/ Valor Arquitetónico Relevante Monumental Casas de interesse Aglomerações Urbanas c/ Valor Arquitetónico Alminhas Conventos / Mosteiros Outros não especificados - Rua

Total Património Monumental Museus

Arte Sacra Bandas

Grupos de Teatro e teatro popular Artístico

Grupos Corais PatrimónioCultural Total Património Artístico Artesanato

Ranchos Folclóricos Trajes Regionais Jogos Populares

Etnográfico Outros não especificados – instrumentos musica

Total Património Etnográfico

Moinhos Lagares de Azeite Embarcações Tradicionais Canastros Outros não especificados – forja comunitária

ArqueologiaIndustrial Total Património Arqueologia Industrial

Edifícios de Interesse Relevante

ompl

ares C ement Pontes

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Coretos Parques temáticos Parques/Jardins públicos Percursos Outros não especificados Total Património Complementar Recursos Secundários (Equipamentos & Atividades) Recursos Secundários Nº Unidades Gastronomia e Vinhos

Percursos

Desfiles

Feiras /Festas populares/Romarias

Eventos Atividades Teatro Total Gastronomia Estabelecimentos Hoteleiros Meios complementar de alojamento Turístico Outras formas de alojamento Turismo em Espaço Rural Parques de Campismo Conjunto Turístico Subtotal Alojamento Restaurantes Cafés, Pastelarias, Gelatarias, Casas de chá e Cervejarias,

Turismo Pubs e Bares

Subtotal Estabelecimentos de bebidas

Agências de Viagem Rent-a-car Empresas de animação

Equipamentos Postos de Turismo Caves / Adegas / Quintas Total Equipamentos de Turismo

Serviços de transporte rodoviário

Serviços de transporte fluvial/marítimo Serviços de transporte

Outros não especificados Transportes

Total Equipamentos Transportes

Estradas Portos Estaleiros

Infraestruturas Aeródromos/Heliportos

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Terminais Fluviais/marítimo Terminais Rodoviários Terminais Ferroviários Total Equipamentos Infraestruturas Saúde

Segurança

Escolas

Sociais Financeiros Outros não especificados Total Equipamentos Sociais Quadro 3 - Lista geral de Recursos Primários & Secundários do MIRE. Produção própria com base em Inskeep (1991).

Portanto, conhecer os valores e do Douro (não de forma exaustiva), resultando tradições que integram o património fazem assim no Gráfico 3 uma visão do elevado parte da história e da cultura dos territórios, potencial do território para a criação de uma dando um sentido de pertença a uma Oferta turística criativa, integrando todos os comunidade. A salvaguarda desta simbologia stakeholders e visando a sustentabilidade do procura manter a continuidade das tradições território. A Figura 5 mostra que no pequeno ao longo das gerações. espaço geográfico das freguesias do concelho de Miranda do Douro existem especificidades 3.2. Discussão culturais, etnográficas, zoológicas e em especial Através do preenchimento do Quadro linguísticas, que se podem articular com os 3 foi possível elencar e compilar os recursos produtos turísticos. endógenos primários do território de Miranda

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Figura 5 - Recursos endógenos Primários de Miranda do Douro. Fonte: Produção própria.

Alguns pontos fortes deste território 2. No recurso associado a “Aldeias típicas”, podem ser destacados: todas as 13 freguesias possuem heranças 1. O relevante património monumental históricas e culturais dignas de integrar as arqueológico, com importantes vestígios narrativas do turismo. A título de da ocupação romana, incluindo lápides exemplo, seria interessante focar a funerárias e militares e eixos viários. Um estrutura da organização do espaço onde exemplo deste último é o designado se implantaram as aldeias, realçando que “Carril Mourisco”, que foi durante a Idade muitas “das aldeias da Terra de Miranda, Média uma via importante de ligação da alinham-se ao longo da fronteira, Terra de Miranda com as terras leonesas e sugerindo a poderosa força atrativa dos o norte do planalto ao extremo sul. Esta limites político-administrativos na fixação via mostra grande potencial turístico, destas povoações” (Afonso, 1997, p.43). através de um roteiro/percurso, 3. O atributo etnográfico que confere explorando não só a paisagem envolvente singularidade ao território é o vestuário mas ainda os elementos da identidade dos seus habitantes, que tem como cultural transfronteiriça. Segundo Taborda símbolo máximo a capa de honras (Figura (1987, p.30) a “Terra de Miranda sempre 6): “É lá a terra da capa-d’honras, que manteve relações mais estreitas com Leão parece, de burel, a capa d’asperges do que com as regiões Portuguesas d’algum bispo da Idade-Media” limítrofes”, devido às necessidades (Vasconcellos,1993, p.43). existentes, afinidades culturais, passado histórico e pelas características geográficas do território.

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Figura 6 - Capa de Honras. Fonte: Produção própria.

A Capa de Honras Mirandesa, (Alves, 1929, p.24). A participação nestas confecionada com lã de ovelha, depois de fiada, danças e a sua aprendizagem aportariam urdida, tecida e pisoada (burel), tinha como valor às dinâmicas de turismo criativo. finalidade proteger os guardadores de gado do Muitos outros exemplos se poderiam frio. O valor da Capa de Honras mede-se ou destacar para integrar a oferta turística. Além avalia-se pelo seu feitio e pelos dias que o da preciosa gastronomia, das tradições e artesão demora a confecioná-la. As pessoas artesanato, da ruralidade e paisagem dos mais ricas e nobres eram consideradas planaltos de Trás-os-Montes. Como refere honradas ao ter o privilégio de usar uma capa Girão (1960, p.388) “As Terras de Miranda mais trabalhada e que demorava mais tempo a apresentam uma forte personalidade regional, fazer. A história e modos de confeção destas com as suas capas de honras e os seus peças emblemáticas de Miranda do Douro pauliteiros, os próprios ditados populares têm poderiam ser integrados em dinâmicas de variantes locais e rezam ao invés do que se turismo criativo. verifica nas outras regiões portuguesas.” 4. Do ponto de vista do património cultural Os pontos passíveis de melhoria artístico, é marcantes “uma célebre dança apontam para a necessidade de aumentar a chamada dos paulitos (…)” (Vasconcellos, oferta de atividades de animação/ espetáculos 1993, p.43-45), desempenhada apenas e exposições; incrementar a qualidade de por homens. Os grupos de pauliteiros são serviço prestado aos visitantes, com: formação compostos por dezasseis homens quando dos recursos humanos; melhoria na sinalética; “a dança é completa e oito na meia divulgação regional e entre regiões, entre dança” (Alves, 1929, p.24). Os diferentes outros. Assinalam-se também algumas bailados são apelidados de “laços”, que ameaças: degradação do património construido são executados “ao som do tamboril e da e esquecimento dos costumes, tradições e gaita-de-foles, tangendo ao mesmo tempo práticas ancestrais; abandono rural e natural castanholas e batendo a compasso no com o consequente risco de incêndio florestal; momento próprio com os paulitos uns nos falta de capacidade dos agentes locais para outros nas diversas voltas que fazem.” atividades de animação. As oportunidades têm

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Salvado, J. O.; Meirinhos, A. A. MIRANDA DO DOURO, PORTUGAL: TERRITÓRIO DE BAIXA DENSIDADE COM ELEVADO POTENCIAL PARA O TURISMO mostrado: uma preocupação do Estado em (Sendim, 1944-1994). Universidade Nova de melhorar as acessibilidades desses territórios e Lisboa Faculdade de Ciências Socias e Humanas. a implementação de estratégias de Lisboa: Edição de Autor, 1997. desenvolvimento do território; uma procura Alves, F. M. Portugal: Trás-os-Montes. Lisboa: turistica focada em experiencias culturais e de Imprensa Nacional de Lisboa, 1929. natureza com reduzida sazonalidade; Braga, Teófilo. O Povo Português nos seus emergência de tipos de procura turística Costumes, Crenças e Tradições. Lisboa: Livraria diferenciadas; reforço na cooperação da Região Ferreira, 1885. Norte com as regiões de Castela/Leão. Branco, j. F. A fluidez dos limites: Discurso etnográfico e movimento folclórico em 4. Conclusão Portugal. Etnográfica, Vol. III (1), 1999, pp. 23- O conhecimento da diversidade 48. em cultural constitui um elemento fundamental http://ceas.iscte.pt/etnografica/docs/vol_03/N para o entendimento da sociedade do século 1/Vol_iii_N1_23-48.pdf. Acesso 10-10-2016. XXI. Neste sentido, e partindo do pressuposto Cancela D’Abreu, A., Correia, T. & Oliveira, R. de que o turismo é, por excelência, uma (Coords). Contributos para a identificação e atividade cultural, verifica-se que as viagens são caracterização da paisagem em Portugal um meio promotor de encontros interculturais, continental. Coleção estudos 10. europress, proporcionando contactos entre “Eus” e editores e distribuidores de publicações Lda, “Outros”, com visões e características diversas. 2004. ISBN 972-8569-28-9 É neste contexto que, aproveitando a CIC Portugal 2020 – Comissão Interministerial paisagem, a heterogeneidade linguístico- de Coordenação. cultural da região de Miranda do Douro bem Deliberação_cic_pt2020_01072015_territorios_ como o seu património (material e imaterial), baixa_densidade, 2015. In pretendemos promover experiências turísticas https://poseur.portugal2020.pt/media/37819/ únicas baseadas em trocas interculturais. O delibera%C3%A7%C3%A3o_cic_pt2020_010720 15_territorios_baixa_densidade.pdf. acesso em quadro 3 constitui um referencial que poderá 11-07-2016 apoiar a criação de produtos turísticos inovadores e criativos, considerando atividades Conselho da Europa. Convenção Europeia da lúdicas, desportivas, culturais/ eventos e Paisagem (2000). https://rm.coe.int/16802f3fb7. Acesso 10-10- workshops/ visitas ao Património etnográfico e 2016 artístico, complementados com os patrimónios alimentares do território. Será uma aposta que Constituição da República Portuguesa (1976). valoriza os princípios da interculturalidade, https://www.parlamento.pt/parlamento/docu possibilitando a salvaguarda histórica, cultural e ments/crp1976.pdf. Acesso 1-10-2015. da memória coletiva de territórios de baixa Cuche, D. La notion de culture dans la sciences densidade. Além disso, é uma forma de sociales. Paris. Editions la Découverte, 2001. proporcionar aproximações culturais, Eagleton, T. A ideia de cultura. São Paulo: Ed. disseminando a identidade de um determinado Unesp, 2005. povo. EREI (Estratégia Regional de Especialização Inteligente) Norte 2020, (2014) 5. REFERÊNCIAS Abdallah-Pretceille, M. & Porcher, L. Éducation Featherstone, M. Global and local cultures. In: et communication interculturelle. Paris: BIRD, J. et al. Mapping the futures: local Presses Universitaires de France, 1996. cultures, global change. London: Routledge, 1993. Afonso, A. I. Terra, Casa e Familía: Valores em mudança numa aldeia de Terras de Miranda Gaspar, J. As Regiões Portuguesas. Lisboa: 26

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