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Música Pop Audiovisualidade E Desdobramentos Contemporâneos

Música Pop Audiovisualidade E Desdobramentos Contemporâneos

UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE BELAS-ARTES

MÚSICA POP AUDIOVISUALIDADE E DESDOBRAMENTOS CONTEMPORÂNEOS

VASCO MADEIRA MORGADO

DISSERTAÇÃO

MESTRADO EM DESIGN DE COMUNICAÇÃO E NOVOS MEDIA

2015

UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE BELAS-ARTES

MÚSICA POP AUDIOVISUALIDADE E DESDOBRAMENTOS CONTEMPORÂNEOS

VASCO MADEIRA MORGADO

DISSERTAÇÃO ORIENTADA PELA PROF. DOUTORA LUÍSA RIBAS

MESTRADO EM DESIGN DE COMUNICAÇÃO E NOVOS MEDIA

2015

Resumo

Este trabalho visa identificar estratégias emergentes de veiculação da música pop no contexto contemporâneo. Neste âmbito, a investigação debruça-se sobre o estudo da música pop enquanto forma de expressão artística audiovisual. Examinam-se os pro- dutos e estratégias usados actualmente na sua produção e disseminação, atendendo às possibilidades dos media digitais e procurando evidenciar o tipo de envolvimento do público que promovem.

A investigação começa por proporcionar uma compreensão da música pop enquanto fenómeno simultaneamente sonoro e imagético, através de um enquadramento teórico que traça a sua expressão audiovisual ao longo do século XX até ao contexto contem- porâneo. Na sequência deste contexto histórico, proporciona-se uma visão dos desdo- bramentos contemporâneos da música pop, através da análise de diferentes produtos e estratégias utilizadas na sua veiculação. De acordo com esta análise, o estudo foca-se em aplicações interactivas para dispositivos móveis (apps) enquanto forma emergente de veiculação da música pop, contemplando o papel do público. Para tal, reúnem-se instrumentos teóricos que possibilitam uma análise das tipologias e funcionalidades das apps, bem como dos papéis interpretativo, exploratório e configurativo do público.

Os resultados deste estudo sugerem que as formas emergentes de veiculação da músi- ca pop, como as apps, reforçam uma concepção da música pop enquanto fenómeno audiovisual, potenciando a construção simultânea das suas dimensões sonoras e ima- géticas. Revelam igualmente como o envolvimento activo do público é promovido ao fomentar uma relação continuada entre o utilizador e a edição musical. Com esta análise, procurou-se contribuir para uma compreensão da música pop enquanto pro- jecto total, cujos desdobramentos exemplificam uma ligação permanente entre som e imagem, entre media áudio e visuais, e entre formas de expressão artística na cultura pop contemporânea.

Palavras-chave: música pop, audiovisualidade, media digitais, aplicações móveis.

Abstract

This work aims to identify emerging strategies for conveying pop music in the con- temporary context. In this scope, the research focuses on the study of pop music as an audiovisual form of artistic expression. It examines the products and strategies that are currently used in its production and dissemination, taking into account the possibi- lities of digital media and seeking to reveal the kind of involvement they promote on the part of the public.

The research begins by providing an understanding of pop music as a simultaneously sonorous and imagetic phenomenon, through a theoretical framework that traces its audiovisual expression throughout the twentieth century until the contemporary context. Following this historical context, it provides a vision of contemporary deve- lopments of pop music, through an analysis of different products and strategies used in its dissemination. According to this analysis, the study focuses on interactive mobile applications (apps) as an emergent form of pop music publication and dissemination, while contemplating the role of the public. To do this, we gather theoretical tools that enable an analysis of the apps’ typology and functionality, as well as the interpretive, exploratory and configurative roles of the public.

The results of this study suggest that the emerging forms of pop music dissemination, such as apps, reinforce a conception of pop music as an audiovisual phenomenon, enhancing the simultaneous construction of both its sound and image dimensions. They also reveal how the active involvement of the public is promoted by fostering an ongoing relationship between the user and the musical edition. With this analysis, we sought to contribute to an understanding of pop music as a total project, whose contemporary developments exemplify a permanent connection between sound and image, between audio and visual media, and between artistic forms of expression in contemporary pop culture.

Keywords: pop music, audiovisuality, digital media, mobile applications.

Agradecimentos

À professora Luísa Ribas pela incansável orientação, dedicação e apoio, sem os quais este trabalho não teria sido possível.

Aos meus amigos e família.

Mãe, pai, Mafalda.

Índice

Introdução 19 Propósito e metodologia de investigação 20 Estrutura da dissertação 21 1. Audiovisualidade na música pop 23 1.1. A música como mais do que som 23 1.1.1. Intermedialidade e trans-sensorialidade na música 24 1.1.2. Contaminação mútua de formas de expressão artística – musicalização e visualização 25 1.2. Música pop como fenómeno audiovisual 30 1.2.1. A gravação inicial e a dimensão visual 31 1.2.2. Diluição de fronteiras e expansão de contextos 32 1.2.3. Desdobramentos da música pop 34 1.3. Audiovisualidade da música pop ao longo do século XX 36 1.3.1. Assimilação das artes visuais pela música pop e vice-versa 38 1.3.2. Música pop como esforço colaborativo 40 1.3.3. Performance musical como correlação entre som e imagem 43 1.3.4. Envolvimento perceptivo do público 45 1.4. Convergência de media no meio digital 46 1.4.1. Hibridização de formas de expressão artística 47 1.4.2. Reforço do papel das colaborações na música pop 48 1.4.3. Reconfiguração da performance musical 50 1.4.4. Envolvimento interactivo do público 52 1.5. Conclusão 54 2. Veiculação da música pop 57 2.1. Selecção de exemplos 57 2.2. Análise 65 2.2.1. Tipologias de desdobramentos 67 2.2.2. Estratégias de disseminação 74 2.2.3. Plataformas 76 2.2.4. Colaborações 77 2.3. Conclusões 81 2.3.1. Investimento em desdobramentos 81 2.3.2. Diversificação de desdobramentos 83 2.3.3. Transversalidade das colaborações 84 2.3.4. Técnicas emergentes 84 2.3.5. Revalorização do suporte físico 85 2.3.6. Disseminação online 86 2.3.7. Compatibilidade de conteúdos 87 2.3.8. Papel do público na disseminação 88 2.3.9. Envolvimento do público 89 2.4. Estratégias emergentes 90 3. Apps 91 3.1. Selecção de exemplos 91 3.2. Análise 100 3.2.1. Projecto musical 100 3.2.2. Conteúdos musicais 101 3.2.3. Acessibilidade 102 3.2.4. Tipologias e funcionalidades 103 3.2.5. Actualização 104 3.2.6. Papel do público 104 3.3. Envolvimento do público 105 3.3.1. Selecção de exemplos 105 3.3.2. Parâmetros de análise 106 3.3.3. Análise 110 3.3.4. Conclusões 117 Conclusão 123 Discussão de Resultados 124 Limitações e investigação futura 126 Referências 129 Obras citadas 133 Apps citadas 135 Projectos musicais citados 137 Edições musicais citadas 139 Anexos 141

Índice de figuras

Fig. 1: Fugue in Rot (Paul Klee, 1921) 27 Fig. 2: Polyphon gefasstes Weiß (Paul Klee, 1930) 27 Fig. 3: Fotogramas de Synchromy No. 4: Escape (Mary Ellen Bute,1938) 28 Fig. 4: Liquid projections, Frank Zapa and the Mothers of Invention (Joshua Light Show, 1971) 29 Fig. 5: Capa do segundo álbum de Elvis Presley, Elvis (1956) 30 Fig. 6: Fotograma do videoclip de Thriller de Michael Jackson (John Landis, 1983) 30 Fig. 7: Fotogramas de Lichtspiel Opus Nr. 1 (Walter Ruttmann,1921) 33 Fig. 8: The Sensational Fix, Museion, Itália (2008) 35 Fig. 9 Fotograma do videoclip de Virtual Insanity dos Jamiroquai (Jonathan Glazer, 1996) 40 Fig. 10: Fotograma do videoclip de Around the World dos Daft Punk (Michel Gondry, 1997) 40 Fig. 11: Fotograma do videoclip de Criminal de Fiona Apple (Mark Romanek, 1997) 40 Fig. 12: Fotograma do videoclip de All is Full of Love de Björk (Chris Cunningham, 1999) 40 Fig. 13: Fotograma de Exploding Plastic Inevitable (Ronald Nameth, 1967) 41 Fig. 14: The Velvet Underground, com Nico, The Velvet Underground & Nico (1967) 41 Fig. 15: No Ow Now (USCO, 1962) 42 Fig. 16: Gerd Stern e a escultura Contact is the Only Love (USCO, 1963) 42 Fig. 17: The Who no 6th Jazz and Blues Festival (1966) 44 Fig. 18: Jimmy Hendrix no Monterey Pop Festival (1967) 44 Fig. 19: World Tour dos (© UVA, 2010) 49 Fig. 20: Speed of Light, instalação artística (UVA, 2010) 49 Fig. 21: Rave The Trip no Astoria em Londres (1988) 50 Fig. 22: Tour dos Massive Attack (UVA, 2003) 58 Fig. 23: Demon Days Live dos , Opera House (Zombie Flesh Eaters, 2005) 59 Fig. 24: Interface da app Gossamer dos Passion Pit (Scott Snibbe Studios, 2012) 60 Fig. 25: Varúð, The Valtari Film Experimentdos Sigur Rós (Ryan Mcginley, 2012) 61 Fig. 26: Varðeldur, The Valtari Film Experimentdos Sigur Rós (Melika Bass, 2012) 61 Fig. 27: Valtari, The Valtari Film Experimentdos Sigur Rós (Christian Larson, 2012) 61 Fig. 28: Just a Reflektordos Arcade Fire (Google Creative Lab, AATOAA, 2013) 62 Fig. 29: Modelos imprimíveis no videoclip de We Are Explorers dos Cut Copy (Party, 2014) 63 Fig. 30: Interface da app John Moose dos John Moose (2015) 64 Fig. 31: Interface do No Fun dos The Presets no Google Cube (Google Creative Lab, 2015) 64 Fig. 32: Esquema de observação do levantamento das edições musicais 66 Fig. 33: Fotograma do videoclip de Black Lake (Andrew Thomas Huang, 2015) 68 Fig. 34: Björk, MoMA, Nova Iorque, EUA (2015) 68 Fig. 35: Björk: Archives (Björk, Klaus Biesenbach, 2015) 68 Fig. 36: Hologramas dos Gorillaz, e , nos 48th Annual Grammy Awards (2006) 70 Fig. 37: Set-up da Biophilia Tour (2011) 70 Fig. 38: Interface do Neon Bible dos Arcade Fire (AATOAA, 2007) 72 Fig. 39: Interface do Sprawl II dos Arcade Fire (AATOAA, 2011) 72 Fig. 40: Synchronised artwork para o single The Suburbsdos Arcade Fire (AATOAA, 2011) 73 Fig. 41: The Wilderness Downtown (Google Creative Lab, Arcade Fire, Chris Milk, 2010) 75 Fig. 42: Fotograma do videoclip de Hidden Place de Björk (M/M Paris, Inez and Vinoodh, 2001) 79 Fig. 43: Capa do single Hidden Place de Björk (M/M Paris, Inez and Vinoodh, 2001) 79 Fig. 44: Capa do álbum Vespertine de Björk (M/M Paris, Inez and Vinoodh, 2001) 79 Fig. 45: Livro Björk (M/M Paris, 2001) 79 Fig. 46: Fotograma do videoclip de United Snakes dos Massive Attack (UVA, 2010) 80 Fig. 47: Massive Attack vs (Robert del Naja, Adam Curtis, UVA, 2013) 80 Fig. 48: Esquema de observação do levantamento dos desdobramentos 82 Fig. 49: Free Your Mind billboards dos Cut Copy (2013) 83 Fig. 50: Capa do vinil deluxe edition do álbum Vulnicura de Björk (2015) 85 Fig. 51: Variações da capa do álbum Why Make Sense? dos Hot Chip (2015) 86 Fig. 52: Interface da app Hollow, da Biophilia (Björk, Scott Snibbe Studios, M/M Paris, 2011) 88 Fig. 53: Set-up da Biophilia Tour (2011) 88 Fig. 54: Fotograma do videoclip de Hollow de Björk (Drew Berry, 2012) 88 Fig. 55: Símbolo Reflektor (Caroline Roberts, 2013) 89 Fig. 56: Esquema de observação do levantamento das 13 apps 93 Fig. 57: Interface da app Scape de Brian Eno (Generative Music, 2012) 94 Fig. 58: Interface principal da app The Bermuda Tapesde John Lennon (Design I/O, eyeball, 2012) 96 Fig. 59: Interface da app The Bermuda Tapesde John Lennon (Design I/O, eyeball, 2012) 96 Fig. 60: Interfaces da app Synthetica dos Metric (Scott Snibbe Studios, 2012) 98 Fig. 61: Interface da app Cosmogony, Biophilia (Björk, Scott Snibbe Studios, M/M Paris, 2011) 112 Fig. 62: Interface da app Crystalline, Biophilia (Björk, Scott Snibbe Studios, M/M Paris, 2011) 112 Fig. 63: Interface da app Moon, Biophilia (Björk, Scott Snibbe Studios, M/M Paris, 2011) 113 Fig. 64: Interface da app Virus, Biophilia (Björk, Scott Snibbe Studios, M/M Paris, 2011) 113 Fig. 65: Interface da app REWORK_, Beck (Philip Glass, Beck, Scott Snibbe Studios, 2012) 114 Fig. 66: Interface da app REWORK_, Amon Tobin (Philip Glass, Scott Snibbe Studios, 2012) 114 Fig. 67: Interface da app REWORK_, Nosaj Thing (Philip Glass, Scott Snibbe Studios, 2012) 115 Fig. 68: Glass Machine da app REWORK_, (Philip Glass, Scott Snibbe Studios, 2012) 115 Fig. 69: Interface da app Polyfauna (, Universal Everything, 2014) 116

19

Introdução

Traçando o percurso da música pop desde o seu início, nos anos 50 do século XX, até ao contexto contemporâneo, notamos uma transformação contínua de produtos e estratégias utilizados na sua veiculação. Podemos considerar que um álbum pop sempre existiu associado a uma dimensão visual, pelo menos durante a sua promoção, nunca separado de elementos gráficos como a capa. Ao longo do tempo, elementos promocionais como videoclips, posters, fotografias e entrevistas, entre outros, foram utilizados no sentido de completar uma dimensão musical. A maneira como a música se completa, no entanto, tende a mudar consoante a evolução das tecnologias utiliza- das para o fazer.

Win Butler, vocalista dos Arcade Fire, explica que a estratégia promocional do álbum Reflektor de 2013 da banda canadiana, mais do que mera promoção, foi um “projec- to artístico estranho”, que fez com que o lançamento do álbum fosse precedido por uma espera “longa e cheia de mistério” (Phillips, 2013). Associar o termo “projecto artístico” à promoção de um álbum pop faz com que consideremos, primeiro, que a dimensão visual associada à música pop, embora cimentada em intenções comerciais, pode ser construída através de estratégias artísticas. Por outro lado, torna-se evidente que a sua dimensão visual está inerentemente associada à dimensão musical, criando um fenómeno audiovisual enquanto projecto. Nesse sentido, no âmbito desta investi- gação, consideramos a música pop enquanto fenómeno que engloba tanto som como imagem, como um produto não só comercial mas sobretudo cultural.

Defendendo que a música pop, embora seja um fenómeno tanto musical como visual, é apresentada inicialmente incompleta, cabendo ao público “fornecer as peças que 20

faltam”, Diedrich Diederichsen afirma que a utilização de media digitais, nomeada- mente alguns dos seus efeitos como a “emergência de uma cultura de downloading e file sharing”, está a “enfraquecer a componente visual da música pop” (Diederichsen, 2011: 134). Isto porque a música é vendida em lojas online como o iTunes, partilha- da através de plataformas como o Spotify ou acedida em websites como o YouTube, suportando a proliferação da música enquanto ficheiro digital, contribuindo para a desvalorização do seu suporte físico. Neste âmbito, elementos gráficos associados ao álbum físico, como a capa do álbum ou o booklet com fotografias da banda e letras de músicas, tendem a desaparecer. Diederichsen acrescenta, no entanto, que essa mesma utilização de media digitais poderá levar à emergência de uma “forma interessante de incompletude” (Diederichsen, 2011: 134). Por exemplo, enquanto tag digital associa- do a um ficheiro de música, a capa do single The Suburbs, do álbum homónimo dos Arcade Fire de 2010, poderá perder as qualidades plásticas que mantinha enquanto produto impresso, mas encontra-se dinamizada no iPod, apresentando variações esté- ticas e parte da letra da música à medida que esta é reproduzida no dispositivo.

No contexto contemporâneo a música pop recorre a estratégias e produtos que se des- tacam dos utilizados anteriormente, tanto por explorarem novos meios de dissemina- ção (tais como plataformas e dispositivos digitais), como por se associarem a múltiplos desdobramentos ou a novas formas de veiculação. Isto porque a utilização de media digitais contribui para uma reconfiguração das dimensões musicais e visuais da música pop, apresentando novas possibilidades de produção e disseminação da mesma. Essas possibilidades, no entanto, encontram-se pouco sistematizadas pois assentam numa experimentação ainda relativamente recente. De acordo com esta ideia, propomos analisar formas de veiculação da música pop procurando identificar estratégias emer- gentese compreender o papel do público mediante estas mudanças, como receptor e consumidor da música enquanto produto cultural.

Propósito e metodologia de investigação

Esta investigação tem como propósito identificar estratégias emergentes de veiculação da música pop no contexto contemporâneo. Nesse sentido, realiza-se um estudo teó- rico da música pop enquanto expressão artística audiovisual, seguido de uma sistema- tização de estratégias e produtos usados actualmente na sua veiculação, culminando numa análise de aplicações para dipositivos móveis (apps) enquanto desdobramento emergente. 21

Para tal, procede-se à revisão da literatura relevante para a compreensão da música pop enquanto fenómeno simultaneamente sonoro e imagético. Nesse âmbito, são definidas quatro narrativas que se entrecruzam no sentido de tratar diferentes aspec- tos da audiovisualidade da música pop ao longo do século XX. Procura-se ilustrar, primeiramente, o desaparecimento de fronteiras entre a música pop e as artes visuais, aludindo à hibridização de ambas as práticas. Tal cruzamento de campos artísticos está associado a esforços colaborativos entre músicos, artistas visuais, designers, etc., fenómeno estudado na segunda narrativa. A terceira narrativa trata a reconfiguração da performance musical, entendida como resultado da construção de uma correlação entre som e imagem. Por fim, a quarta narrativa foca o possível envolvimento do público, nomeadamente segundo a forma como é promovida a sua participação ou interacção. As narrativas culminam no contexto contemporâneo, particularmente influenciado pela convergência dos media no meio digital no final do século XX.

Aborda-se, de seguida, o contexto contemporâneo seleccionando exemplos de formas de veiculação da música pop usados actualmente, nomeadamente desdobramentos que tomam partido dos media digitais, como videoclips interactivos (em plataformas online) ou apps. Para tal, sistematizam-se as suas tipologias, estratégias de disseminação, plataformas utilizadas e as suas possibilidades específicas, procurando também identi- ficar dinâmicas de colaboração. Por fim, o estudo debruça-se sobre as apps enquanto estratégia de veiculação emergente, definindo parâmetros para a sua análise. Recorre-se à taxonomia desenvolvida por Katja Kwastek (2009) sobre “arte interactiva”, referente “ao que a obra faz” e “ao que visitante faz”, reunindo instrumentos complementares para adaptar a análise ao universo específico das apps e para sistematizar os papéis interpretativo, exploratório e configurativo do público. Deste modo, este estudo pro- cura identificar desdobramentos da música pop, evidenciando produtos e estratégias emergentes que tendem a promover o envolvimento activo do público de acordo com as possibilidades dos media digitais.

Estrutura da dissertação

A dissertação é composta por três capítulos. No primeiro capítulo procuramos com- preender a música como mais do que apenas som através da exploração de conceitos como intermedialidade e trans-sensoraliedade. Exploramos igualmente a ideia de con- taminação mútua de formas de expressão artística, segundo as noções de musicalização das artes visuais e de visualização associada à produção musical. Focamos depois na 22

música pop enquanto fenómeno audiovisual, traçando o seu desenvolvimento ao longo do século XX, a fim de proporcionar um entendimento do contexto contemporâneo.

No segundo capítulo procedemos à análise de desdobramentos da música pop no contexto contemporâneo que se destacam das formas tradicionais de veiculação da mesma. Procurámos evidenciar tendências emergentes e para tal recolhemos um con- junto de estratégias e produtos, passando à sua descrição e procedendo à sua análise.

No terceiro capítulo dedicámo-nos à análise de apps, reunindo exemplos diversificados no sentido de construir um universo representativo do contexto actual, procedendo seguidamente à sua análise. Esta análise orienta a posterior selecção de três apps que procuramos estudar de forma mais aprofundada. Evidenciamos as suas intenções con- ceptuais, funcionamento, tipologia e papel do utilizador, procurando compreender o tipo de envolvimento do público que promovem. 23

1. Audiovisualidade na música pop

1.1. A música como mais do que som

“Even the earliest media that were important for music were not exclusively acoustic media (…) these media and dispositives articulate themselves and are handed down not only through sound, but to a large extent also by way of narrative/text-based representations; they are conveyed via the senses of touch, smell, and taste, but in particular through their visual manifestation.” (Föllmer e Gerlach, 2005)

A música não é só som, pois existe associada a media que não são exclusivamente acústicos. Segundo Golo Föllmer e Julia Gerlach a música, ao longo da história, nunca se manifestou sem estar associada a “qualquer instrumento musical, canto e técnicas instrumentais que acompanham danças ou outro tipo de rituais ou actividades sociais, notação escrita e gráfica, às indústrias de imprensa e publicação e às convenções da performance musical em variadas épocas”. Estes media não se articulam apenas através de som, mas também por “representações à base de texto”, envolvendo outros sentidos que não a audição, através de “manifestações visuais”. Como tal, a música não é um estímulo exclusivamente acústico, existindo no contexto da sua própria “génese e efei- to” enquanto fenómeno “intermedial” (Föllmer e Gerlach, 2005).1

1 Föllmer e Gerlach afirmam que “as soon as music is regarded not only as an acoustic stimulus structure, but within the context of its genesis and effect, in many ways it at the same time becomes intermedial” (Föllmer e Gerlach, 2005). 24

1.1.1. Intermedialidade e trans-sensorialidade na música

Embora a música seja cada vez mais influenciada pelos media a ela associados, dando “uso mais frequente às tecnologias dos media para a sua concepção e produção”, e reflectindo “cada vez mais o funcionamento e os efeitos dos media”, a sua interme- dialidade não é uma consequência dos media. Nesse sentido, a intermedialidade não resulta exclusivamente dos avanços da tecnologia, mas é sim um fenómeno inerente à música, que “com a ajuda dos media pode ser moldado de maneiras particulares eficazes e diversificadas”. A produção musical, o acto de fazer música, por si só, sempre abarcou uma série de estímulos visuais, como o “fluxo” da leitura de uma partitura, a observação da actividade motora de um instrumentalista, ou a coordenação entre vários músicos. O mesmo se verifica do lado do ouvinte que, a par com a música que ouve, vê os gestos e as expressões faciais do músico que “transmite informação ao ouvinte sobre contexto (por exemplo, a emoção pretendida), melodia, harmonia e ritmo” (Föllmer e Gerlach, 2005).

Se a música existe associada a media que não são exclusivamente acústicos, não se limi- ta então a um único modo sensorial. Segundo Simon Shaw-Miller a “habitual” suposi- ção de que a música e as artes visuais existem, respectivamente, no tempo e no espaço, dirigindo-se exclusivamente ao ouvido ou à visão, é uma ideia debatível (Shaw-Miller, 2001: 140). Recorrendo à noção de trans-sensorialidade, usada por Michel Chion, o autor sugere que grande parte da informação que processamos é trans-sensorial, não existindo nenhuma “divisão absoluta entre o olho e o ouvido” (2001: 141). Segundo Chion, no “modelo” trans-sensorial “não existe dado sensorial delimitado e isolado à partida: os sentidos são canais, vias de passagem, mais que domínios ou territórios”. Chion acrescenta que “se existe na visão uma dimensão especificamente visual, e na audição dimensões somente auditivas”, as mesmas são “minoritárias” e “localizadas” (Chion, 2008).

Ou seja, os sentidos (a audição, a visão, etc.) não existem somente enquanto domínios isolados, sendo que os estímulos sensoriais podem ser veiculados através de canais que envolvem mais do que um sentido simultaneamente. Shaw-Miller sugere que, de modo semelhante, também as artes visuais e a música não existem dentro de domínios isolados. Existem, por exemplo, elementos temporais na leitura de uma imagem e 1.1. A música como mais do que som 25

elementos espaciais na percepção do som.2 Não estando limitadas a um único sentido ou medium, tanto a música como as artes visuais podem ser consideradas “discursos”, sendo “actividades associadas a instituições, corpos, tecnologias e contextos” (Shaw- Miller, 2001: 141). O autor conclui que a música não deve ser entendida apenas através de som, mas sim através do som em concordância com “outros elementos que constroem o discurso musical” (2001: 143).3

1.1.2. Contaminação mútua de formas de expressão artística – musicalização e visualização

A música, assim como as outras formas de expressão artística, explora dimensões que não lhe são exclusivas, existindo entre os media enquanto forma de expressão intermedial. Originalmente, o conceito de intermedia, utilizado por Dick Higgins, descreve “obras que se enquadram conceptualmente entre media que já conhecemos” (Higgins e Higgins, 2001: 52).4 O conceito de Higgins é “mais ou menos universal” a todas as disciplinas das belas-artes e é aplicado também, paralelamente, à música. O autor oferece como exemplos as obras de John Cage, “que exploram os intermedia entre música e filosofia”, ou de Joe Jones, cujas obras “se enquadram no intermedium entre música e escultura” (2001: 50). Partindo desta noção, Shaw-Miller acrescenta que quando formas de expressão artística estão associadas aos espaços entre os media, no fundo, tendem a explorar o que os media já têm em comum (Shaw-Miller, 2010: 259). Por conseguinte as fronteiras entre formas de expressão artística diluem-se, num processo que o autor descreve segundo três vertentes: síntese, hibridação e conjunção entre as artes (Shaw-Miller, 2011: 32). Esta diluição de fronteiras acontece mesmo

2 Segundo Shaw-Miller, “if we adopt Chion’s view of the senses as carried via channels, rather than existing firmly within domains, we perceive sense data as transmittable in complex ways, where more than one sense can be evoked within a single channel (think of the work of the Cubists who, in their visual `language’, often sought to convey touch and hearing). Similarly, to regard visual art as strictly a spatial form and music as solely a sonoric one fails to recognize the temporal element of `reading’ an image, scanning its surface. In addition, many visual art works are an active record of the trace of the artist, the result of the choreography of mark-making. Music also has its fundamental spatial element. Musical space exists in notation (in a text) and the disposition of sounds (through a context and site)” (Shaw-Miller, 2001: 141). 3 Tradução livre de: “the issue of musical meaning is not to be understood as encoded in the heart of sound, but rather in the concert of sounds and other elements that make up musical discourse” (Shaw-Miller, 2001: 143). 4 O autor afirma que “the vehicle I chose, the word “intermedia”, appears in the writings of Samuel Taylor Coleridge in 1812 in exactly its contemporary sense--to define works which fall conceptually between media that are already known, and I had been using the term for several years in lectures and discussions before my little essay was written” (Higgins e Higgins, 2001: 52). 26

durante a vigência dos paradigmas de pureza e exclusividade de cada forma de arte. No Modernismo era exaltada a pureza das formas de expressão artística (a criação de fronteiras), em contraste com o Pós-Modernismo que dá lugar ao ideal da sua síntese e conjunção. O autor acrescenta, no entanto, que nenhum destes momentos existiu sem contaminação mútua (2011: 33).

Consequentemente, tal como a música pode ser entendida como um discurso trans- -sensorial (que transcende os sentidos entendidos como canais isolados) e intermedial (que existe e se manifesta entre os media), também as artes visuais exploram dimen- sões tradicionalmente associadas à música. Sandra Naumann explora esta perspectiva, segundo a ideia de uma “musicalização das artes visuais”5 ao longo do século XX, propondo o seu entendimento através de quatro momentos chave: o afastamento do mimetismo pictórico em favor de uma abordagem “não-representacional” ou abstrac- ta; a “temporalização” das artes visuais (adopção de métodos de composição associados à música, integrando uma dimensão temporal); a expansão da dimensão visual no espaço (espacialização); e a produção em tempo-real incluindo a improvisação (Nau- mann, 2011: 71).

No início do século XX, várias experiências adoptavam uma abordagem não-repre- sentacional, primando a abstracção pictórica, que tendiam a tomar a música como modelo. Na pintura dos anos 20, como exemplo, destacam-se as obras de Paul Klee, nas quais existiam “uma série de analogias entre harmonia e gradações de cor, entre regras de contraponto musical e a relação entre diferentes elementos pictóricos e entre sequências formais e arranjos composicionais na pintura”, servindo-se da “composição musical como uma orientação para o seu próprio sistema estrutural” (Naumann, 2011: 73).6 Esse esforço para integrar uma dimensão temporal nas artes visuais também se verificou no filme (nomeadamente no filme experimental), estando na base dos abso- lute films, cujo auge data dos anos 20 até meados dos anos 50. Estes filmes recorriam à sincronização de cores e formas explorando conceitos musicais (como ritmo e tom) mas aplicando-os, desta vez, a uma série de frames que construiriam depois o filme.

5 Segundo John Whitney, que usou primeiramente o termo “musicalization of visual art”, “the past decade has seen that direction lead many artists to cinema, exotic technology and experiments with cybernetics. Yet it has passed generally unnoticed that this preoccupation of the last one hundred years has been toward a musicalization of visual art. For the urge to produce abstract architectonic structures that possess fluid transformability in visual space is no less than a grand aspiration toward music’s double in the visible world” (Whitney, 1975). 6 Entre as obras de Klee nas quais isto é evidente estão incluídas, por exemplo, Fugue in Rot (1921) e Polyphon gefasstes Weiß (1930). 1.1. A música como mais do que som 27

Nos seus filmes Oskar Fischinger, por exemplo, “sincronizava os seus estudos a preto e branco e animações a cores com as medidas e batidas7 de composições românticas e clássicas, mas também com hit songs da altura”. Mary Ellen Bute, por outro lado, sincronizava os “eventos musicais e visuais” parcialmente,8 porque “estava menos in- teressada na visualização directa da música do que na criação de uma equivalência visual” (2011: 77).9

A

Fig. 1: Fugue in Rot (Paul Klee, 1921) Fig. 2: Polyphon gefasstes Weiß (Paul Klee, 1930)

Nos anos 60 a espacialização das artes visuais ganha notoriedade, como resultado da “crescente atenção dada a novas condições arquitectónicas” associadas à apresentação de filmes em espaços como, por exemplo, “o museu, o espaço público e a galeria” enquanto, simultaneamente, a “percepção e interacção entre imagem, espaço e recep- tor” ganham importância (Glöde, 2010).10 A expansão da imagem no espaço tornou- -se o “paradigma central do expanded cinema nos anos 60”, embora esta noção já se

7 Apresentamos “batidas” como tradução livre do termo “beat”. 8 Tal é evidente, por exemplo, no filme de Bute Synchromy No. 4: Escape (1938). 9 Segundo Naumann, “similar do Fischinger, [Mary Ellen] Bute created most of her visual worlds in combina- tion with and on the basis of classical and romantic music, but she also used modern melodies. Unlike Fischinger, however, she made only partially clear-cut and synchronous correspondences between the musical and visual events, for she was less interested in the direct visualization of music than in the creation of an equivalent counterpart (…) The visual and musical layers were first developed separately and only later joined together” (Naumann, 2011: 77). 10 Segundo Marc Glöde “after World War II, it was experimental film, Expanded Cinema, and film installations that advanced the discussion about spatial conditions. In the process, attention was increasingly given, on the one hand, to new architectural conditions of film presentation, such as, for example, the museum, public space, and the gallery. On the other hand, the aspects of perception and the interaction between image, space, and recipient clearly gained importance” (Glöde, 2010). 28

encontrasse na visual music e na light art dos anos 20. Naumann acrescenta que “a música como uma arte temporal sempre contrastou com a espacialidade das artes vi- suais”, mas a música (e o som em geral) “é na verdade não só uma experiência temporal mas também profundamente espacial”. Nesse sentido, o expanded cinema revela-se um exemplo da “expansão e fusão das artes”, criando não só uma “obra no espaço e no tempo”, mas “um tipo de percepção espacial-visual comparável com a percepção da música, particularmente através do uso de luz projectada” (Naumann, 2011: 79).

Fig. 3: Fotogramas de Synchromy No. 4: Escape (Mary Ellen Bute,1938)

Paralelamente, as dimensões de improvisação e produção em tempo-real foram sendo gradualmente acrescentadas à expansão da imagem no espaço, partilhando métodos de produção criativa associados à música. Também nos anos 60, os light shows, que eram maioritariamente “parte integral de concertos de música psicadélica”, emprega- vam uma “combinação de materiais visuais muito díspares e arte fílmica performativa” (Naumann, 2011: 85). Como forma de expanded cinema com mais “influência cultu- ral”, os light shows podiam ser “espectáculos psicadélicos multimédia de luz projectada nos concertos de rock n’ roll”, tendo como elemento central liquid projections (James, 2010), através das quais era construído um “correlativo visual” para as “improvisações irrepetíveis” associadas às bandas de rock n’ roll da altura (James, 2010).11

Os quatro momentos chave propostos por Naumann, relativos à musicalização das artes visuais, tendem a convergir nos media digitais. As técnicas digitais usadas na pro- dução de imagens e as suas aplicações no “contexto de VJing, live visuals, live cinema, e performances audiovisuais ao vivo”, podem ser vistas “tanto como um retorno e uma continuação, ou como um aprimoramento e consolidação” das estratégias associadas à “musicalização do visual”. A geração de imagens e sons através de improvisação e o uso

11 Nas liquid projections, “óleos de cores diferentes, tintas e outros líquidos não solúveis eram misturados” e projectados para um ecrã (Naumann, 2011: 85). 1.1. A música como mais do que som 29

de media em tempo-real são o resultado da “convergência de meios estéticos” e da “sua união na máquina universal que é o computador” (Naumann, 2011: 88).

Fig. 4: Liquid projections, Frank Zapa and the Mothers of Invention (Joshua Light Show, 1971)

Considerando o percurso relativo à musicalização das artes visuais ao longo do século XX, e retomando a ideia de Föllmer de que a música deve ser compreendida como parte de um contexto, podemos abordar o percurso paralelo da música que se ex- pressa através de dimensões normalmente associadas às artes visuais, segundo a ideia de “visualização” associada à produção musical. Como Föllmer afirma, a música é “um fenómeno claramente intermedial, e sobretudo audiovisual muito além do que poderíamos acreditar”, e acrescenta, de modo muito mais “extenso” do que acontece nas belas-artes (Föllmer e Gerlach, 2005).

Nesse sentido, a dimensão visual associada à música tende a reconfigurar-se segundo o seu contexto particular: dependendo da sua génese, efeitos, e media associados. De acordo com esta ideia podemos, por exemplo, evidenciar o contexto da música pop. Para Föllmer a “música popular” é “o momento em que a música deixa a partitura” e existe, consequentemente, uma “necessidade de interpretação renovada” que passa pela relação da música com o público através da sua “transmissão, armazenamento e síntese”. Várias formas de “visualização de informação do contexto musical” acon- teceram de acordo com a mudança dos paradigmas particulares de cada altura: nos anos 50 a imagem de “estrelas” como Elvis Presley12 tornam-se peças fundamentais no marketing de música pop; ao mesmo tempo as capas de álbuns são popularizadas (e associado a elas a sua “estética própria”); nos anos 60 e 70 as performances ao vivo tornaram-se espectáculos multimedia “acompanhados de luz e fumo”, onde a estrela

12 A imagem desenvolvida por Elvis Presley é evidente, por exemplo, nas capas dos seus álbuns, como se pode observar na capa do seu segundo álbum Elvis (1956). 30

é “engolida” pelo espectáculo mas surge, projectada, em ecrãs gigantes; nos anos 80 o videoclip torna-se um elemento inseparável de qualquer canção pop (Föllmer e Ger- lach, 2005).13 Através destes exemplos, Föllmer conclui que a dimensão intermedial da música se mantem constante enquanto as expressões visuais da música tendem a mudar, à medida que os media a ela associados se transformam.

Fig. 5: Capa do segundo álbum de Elvis Presley, Elvis (1956) Fig. 6: Fotograma do videoclip de Thriller de Michael Jackson (John Landis, 1983)

1.2. Música pop como fenómeno audiovisual

“The material of music (…) does not include musical or even acoustic phenomena alone. The material of music includes implicit concepts (attitudes, idea, and their physical consequences), poses, lived self-misconceptions, people, pictures, extramusi- cal communication and much more.” (Diederichsen, 2010: 11)

Assumindo que a música não existe isolada numa única dimensão medial nem num único modo sensorial, a música pop, em particular, também não se limita a uma dimensão exclusivamente acústica ou musical. Por música pop entende-se música que é produzida para ser vendida, enquanto produto, recorrendo a várias estratégias para chegar ao público14 e, segundo Diedrich Diederichsen, não pode ser descrita como

13 Notamos, como exemplo, o imensamente popular videoclip do single Thriller (1983) de Michael Jackson. 14 Assumindo que esta definição poderá ser vaga, Roy Shuker afirma que a música pop pode ser considerada como um híbrido de diferentes “tradições, estilos e influências” e que, ao mesmo tempo, é um “produto económico” no qual “os seus consumidores investem significação ideológica”. Como Shuker, consideramos o termo como é normalmente entendido na “prática académica”, que associa música pop aos “principais géneros musicais comercializados” nomeadamente num “contexto ocidental”, sendo que outros géneros musicais são abordados enquanto parte da “música popular mainstream contemporânea” (Shuker, 2002: viii). 1.2. Música pop como fenómeno audiovisual 31

“folclore”, nem simplesmente como um “produto cultural-industrial”, nem como arte, expressando-se através de “efeitos individuais mais próximos do logótipo do que de noções clássicas da música” (Diederichsen, 2010).15

1.2.1. A gravação inicial e a dimensão visual

Diederichsen afirma que a música pop sempre existiu associada a uma dimensão visual que lhe é, aliás, inerente, podendo ser considerada, como tal, um fenómeno intrinse- camente audiovisual. Segundo o autor, o “material da música” que evoca uma dimen- são palpável (no sentido de material, e consequentemente, visual), “não inclui apenas fenómenos musicais ou acústicos”, incluindo também “conceitos implícitos (atitudes, ideias e as suas consequências físicas), poses, pessoas, imagens e comunicação extra- musical” (Diederichsen, 2010: 11).16 Ou seja, o material da música refere a dimensão visual associada à produção da música, desde a presença física do performer (as suas atitudes, poses, etc.) ao resultante material gráfico (fotografias, vídeos, etc.) passando pelas várias peças que constituem (e, de certo modo, dão forma a) uma edição, desde a capa do álbum aos mais variados materiais promocionais (posters, flyers, etc.), que comunicam a música através de canais não-musicais. Por exemplo, embora a capa de um álbum não seja um elemento acústico nem musical, é construtiva da música pop enquanto fenómeno audiovisual, sendo “um dos agentes mais importantes de criação de contexto” (2010: 25).

No entanto, a música pop existe, primeiro, desagregada da dimensão visual que lhe é inerente, enquanto gravação (a faixa, a música), sendo, consequentemente, um fe- nómeno audiovisual incompleto. A “música gravada”, que segundo Diederichsen se torna “o foco da atenção”, longe de mostrar a perícia e capacidade artística da inter- pretação musical (exaltada na música clássica), oferece a presença de um “ser humano concreto” (Diederichsen, 2011: 121). A dimensão visual da música pop “responde” à “exigência pelo performer”, que constituía a “verdadeira atracção da música pop nos

15 Diederichsen afirma que “pop music as a form of industrially—as well as sub-industrially—produced music first emerged in the 1950s as something that could be described neither as folklore, nor as a purely cultural-industrial commodity, nor as art. It often finds its means through discrete, individual effects that are closer to the logo—the context-independent sign of advertising—than through classical notions of music” (Diederichsen, 2010). 16 Segundo o autor “the material of music – this is something that begins to emerge in the mid-1960s, advanced by free jazz on one hand and Fluxus on the other – does not include musical or even acoustic phenomena alone. The material of music includes implicit concepts (attitudes, idea, and their physical consequences), poses, lived self-misconceptions, people, pictures, extramusical communication and much more” (Diederichsen, 2010: 11). 32

seus primeiros anos”, sendo que “pelo menos, precisávamos de fotografias daquela pessoa, ou melhor ainda apresentações ao vivo” (2011: 122).17 Ou seja, a música pop é um fenómeno audiovisual incompleto porque oferece a voz, mas não a imagem, do performer. A gravação (feita em estúdio) funciona como o ponto de referência da música pop, e pode ser entendido como “trabalhado e polido”, no sentido de estar completo e finalizado na sua actual forma, como acontece com os “objectos das artes visuais” (Diederichsen, 2010: 13).

Para se completar, portanto, a música pop associa-se a dimensões não-musicais, que tendem a ser articuladas através das artes visuais. Como tal o mais importante não é distinguir áreas particulares de acção, ou segundo Christian Höller, definir uma imagem como sendo um “artefacto da cultura pop”, uma “peça artística moderna” ou uma “avant-garde statement”. O foco está, então, na maneira como som e imagem convergem, ou seja, a maneira como vão além das “suas esferas de influência” e fazem mais do que se interpolarem ou sobreporem (Höller, 2010: 200). Podemos entender, portanto, que as fronteiras entre a música pop e as artes visuais tendem a desaparecer, num processo de diluição mútua.

1.2.2. Diluição de fronteiras e expansão de contextos

Dentro desta diluição de fronteiras, a música pop foi-se transformando, gradual- mente, numa ferramenta para os artistas. Segundo Dirck Linck, durante os anos 60, de todos os “sectores nos quais as pessoas se conectavam”, para os “jovens artistas” a música pop destacava-se como “inquestionavelmente boa e relevante”. 18 Isto porque o acesso à música pop era “canalizado pelo corpo e pelas emoções” e como tal “mui- to menos regulamentado do que o acesso às artes”, e porque tendia a chegar a um público além do “campo das artes”. Consequentemente, a música pop “representa o momento histórico no qual o julgamento estético que constituía uma distância entre a arte enquanto instituição e a indústria da cultura não pode ser mantido” (Linck, 2010: 31). Os artistas começaram então a explorar a música pop como ferramenta artística e, paralelamente, a música pop começou a explorar as artes para comunicar as

17 Diederichsen afirma que “at the very least, one had to have pictures of that person, or even better live ap- pearances. The visual dimension of pop music thus responds initially to the question of – and demands for – the performer, who constituted the actual attraction of pop music in its early years”” (Diederichsen, 2011: 122). 18 Linck afirma que “In the sectors which people plugged into identificatorily, it was pop music that young artists saw as “unquestionably” good and relevant, as a structurally utopian and important business” (Linck, 2010: 31). 1.2. Música pop como fenómeno audiovisual 33

suas expressões visuais. Por exemplo, tanto na música visual (visual music)19 dos anos 20 como nos filmes experimentais abstractos (abstract films) dos anos 40, as “músicas populares” usadas, que podiam tanto ser peças de música clássica como de música pop, funcionavam como um esqueleto nos quais “mini narrativas, colagens experimentais e animações abstractas eram projectadas” (Höller, 2010: 201). Como tal, a música pop funcionava como um elemento basilar para a exploração de técnicas artísticas.

Fig. 7: Fotogramas de Lichtspiel Opus Nr. 1 (Walter Ruttmann,1921)

Diederichsen afirma que o progresso das artes visuais num contexto contemporâneo está associado à expansão dos contextos nos quais elas se inserem, que envolvem “cons- telações de media, objectos de diferentes domínios ontológicos, complicações locais e topográficas, e investimentos emocionais e intelectuais”. Estes “contextos maiores e mais complexos” podem ser vistos como “entidades completas, distintas e dispensá- veis”, sendo trabalhados como tal e consequentemente transformados em “objectos”. Nesse sentido é agora “possível nomear, adereçar, e manipular áreas de relações com o mundo cada vez maiores”, áreas que envolvem “recepção, extensão da obra artística na realidade, acaso, reacções fora do mundo da arte” e “aspectos psicológicos e físicos” (Diederichsen, 2010: 17). Ou seja, a diluição de fronteiras entre formas de expressão artística deve-se também às crescentes possibilidades dos media, que promovem a ex- pansão de contextos nos quais as artes visuais e a música pop estão incluídas.

O que resulta desta contínua diluição de fronteiras são “abordagens artísticas híbridas e múltiplas vezes misturadas”, que tornam distinções entre áreas de expressão artística impossíveis. Segundo Höller,20 a música pop é “multidimensional”, abarcando desde

19 Um dos exemplos mais paradigmáticos das práticas da visual music será o filme Lichtspiel Opus Nr.1 (1921) de Walter Ruttmann. 20 Höller afirma que “surviving throughout the years and decades are hybrid and multiply mixed artistic ap- proaches, for which (pop) music, with its multidimensionality – from aesthetic compositional dimensions to institutional and model-like political and social ones – presents a congenial object of investigation. It is by virtue of these hybrids that the cultural complexity of the music image, which was long hidden behind one-dimensional attributions, has come into view for the first time” (Höller, 2010: 204). 34

“dimensões de composição estética, a institucionais e politicas, a sociais” apresentan- do-se, portanto, “como um objecto de investigação adequado” (Höller, 2010: 204) enquanto prática artística híbrida. Podemos entender, consequentemente, a dimensão visual associada à música pop como parte intrínseca da sua expressão total, revertendo sempre para o momento inicial que será a gravação musical.

1.2.3. Desdobramentos da música pop

Existindo primeiramente enquanto som gravado, a música pop desdobra-se para se completar através de elementos visuais associados, que partem e estão agregados à mú- sica enquanto estratégias e/ou produtos que constroem determinada edição musical.21 Estes desdobramentos almejam a promoção, e consequentemente a venda, da música enquanto produto. No entanto, e embora a música pop seja “filha da indústria da cultura”, (Diederichsen, 2010: 19) as suas intenções não são puramente comerciais. Nesse sentido, a arte é o que dá forma à relação entre performer e medium, utilizan- do estratégias artísticas para comunicar essa relação ao público. Como reforça Dirck Linck, na música pop “o homem e o medium são a mesma coisa”, e a arte é “o que acontece enquanto processo criativo entre esses dois elementos inseparáveis” (Linck, 2010: 33).

A música pop nasceu nos anos 50, nos quais as suas intenções eram quase exclusi- vamente comerciais. Partindo da contracultura nos anos 60, no entanto, almejava ir além do que era esperado dela, “quebrando as fronteiras da consciência e percepção”, não se limitando “a um único paradigma de entretenimento”. Segundo Höller, som e imagem “estavam destinados a emanciparem-se da economia cujo objectivo era atingir o máximo efeito comercial com o mínimo esforço imaginativo” (Höller, 2010: 204). Ou seja, embora a música pop seja um produto comercial é, ao mesmo tempo, “uma criança incontrolável”. Isto porque, ao mesmo tempo que disfruta do “contexto forne- cido pela indústria da cultura”, constrói contextos próprios que surpreendem “muitos” (Diederichsen, 2010: 19).22

21 Entende-se a edição como um todo que inclui os elementos visuais associados a um produto particular, como a capa do álbum, a performance ao vivo, os videoclips, os posters, os flyers, etc. 22 O autor afirma que “pop music not only takes up the possibilities of combination and context and context formation that are provided by the culture industry; it also produces combinations of its own that are unantici- pated by many” (Diederichsen, 2010: 19). 1.2. Música pop como fenómeno audiovisual 35

Por conseguinte, a música pop existe entre o comércio e a cultura, balançando inten- ções comerciais e criativas. Como tal, as técnicas desenvolvidas nos abstract films nos anos 30 e 40 serão aplicadas nos videoclips nos anos 80 (Keazor e Wübbena, 2010). e nos anos 90 começarão a surgir exposições (em museus) construídas à volta de bandas pop. Por exemplo, na exposição curada pela banda Sonic Youth, The Sensational Fix (2008), todas as decisões visuais da banda, as capas dos álbuns, os vídeos, os flyers, as roupas, etc., são elevadas ao mesmo nível de importância das suas decisões musicais, sendo que o foco está “no próprio sujeito em toda a sua complexidade” sendo o sujeito, neste contexto, o projecto musical, a banda pop. Como explica Diederichsen, “em exposições como esta, fica estabelecido de uma vez por todas que a música pop sempre foi um género audiovisual” que, no entanto, “sempre foi veiculado incompleto”, ca- bendo ao público “fornecer as peças que faltam” (Diederichsen, 2011: 134).23

No entanto, mais do que tentar “concretizar uma utopia da fusão entre som e ima- gem”, os desdobramentos da música pop procuram essencialmente “completar o necessariamente incompleto evento musical pop” (Diederichsen, 2011: 128).

Fig. 8: The Sensational Fix, Museion, Itália (2008)

23 Segundo Diederichsen, “(…) the focus is being placed on the subject itself in all of its complexity, for example in exhibitions curated by bands in which all of their visual decisions (flyers, covers, videos, outfits, etc.) are presented as equal in importance to the musical decisions, as in the case of The Sensational Fix, an exhibition that was curated by the band Sonic Youth. (…) In exhibitions like these, i tis established once and for all that pop music has always been an audiovisual genre; the joke is that it has always been delivered incomplete – it is up to the recipient to assemble it and supply the missing pieces. This may be one reason for the emergence of a culture of downloading and file sharing that is once again weakening the visual component of pop music. Perhaps it will lead to the emergence of an an interesting form of incompleteness.” 36

1.3. Audiovisualidade da música pop ao longo do século XX

A música pop é um fenómeno intrinsecamente audiovisual e como tal possui dimen- sões visuais que lhe são inerentes. No entanto, e porque existe primeiro enquanto gravação sonora, é um fenómeno inicialmente incompleto que se desdobra para se completar. Atendendo à ideia de contaminação mútua de formas de expressão artística (Shaw-Miller, 2011: 33), associada às noções de musicalização das artes visuais (Nau- mann, 2011: 71) e de visualização da produção musical (Föllmer e Gerlach, 2005), podemos discernir que os desdobramentos da música pop tendem a ser articulados segundo práticas associadas às das artes visuais.

No sentido de compreender essas estratégias ao longo do século XX e qual a sua influência no contexto contemporâneo, partindo da diluição de fronteiras entre a música pop e as artes visuais, podemos delinear quatro narrativas interligadas: (1) A assimilação das artes visuais pela música pop e vice-versa; (2) A utilização de colabo- radores na construção das suas expressões visuais da música pop; (3) A reconfiguração da performance musical segundo mudanças nos métodos da construção de correlação entre som e imagem; (4) O envolvimento do público na produção e disseminação da música pop.

Segundo Höller, um estudo da música pop não poderá estar focado na distinção de áreas particulares de acção mas sim na convergência de som e imagem (Höller, 2010: 200)24, isto porque as fronteiras entre a música pop e as artes visuais tendem a desa- parecer, aludindo à hibridização de ambas as práticas (2010: 204)25. Ou seja, mais do que o mero desaparecimento de fronteiras, tende a existir uma assimilação de proces- sos, não se tratando apenas de uma coexistência de dimensões visuais e musicais, mas de uma mistura de práticas. Segundo esta noção de Höller, estudaremos a tendência da música pop assimilar as artes visuais e vice-versa.

Dado que a música pop é um fenómeno que não se limitada à produção musical, im- plica colaborações entre músicos, artistas, designers, etc., exercitando um cruzamento

24 Höller afirma que “(…) what is crucial, is the exact relations in which sound and image – against the backdrop of their initial spheres and spheres of influence – converge, how they mutually begin to go beyond strengthening, undermining, or overlapping one another” (Höller, 2010: 200). 25 O autor acrescenta “(…) surviving throughout the years and decades are hybrid and multiply mixed artistic approaches, for which (pop) music, with its multidimensionality (…) presents a congenial object of investigation. (Höller, 2010: 204). 1.3. Audiovisualidade da música pop ao longo do século XX 37

de domínios criativos. Atendendo à noção de que, a partir dos anos 60, a música pop começou a ser usada como ferramenta pelos artistas, que almejavam expandir a sua área de influência, chegando a um público além do campo das artes (Linck, 2010: 31)26, notamos que, paralelamente, também a música pop se associava a prá- ticas artísticas para comunicar as suas expressões visuais (Höller, 2010: 201).27 Por conseguinte, notamos que a música pop pode resultar de colaborações entre músicos e artistas visuais e, nesse sentido, através de uma das narrativas propostas, procuraremos entender esse esforço colaborativo.

Um dos factores que contribuiu para uma mistura de práticas, e resultantes métodos de produção colaborativos, foi a expansão dos contextos nos quais tanto a música pop como as artes visuais se inserem, e nos quais se interpolam e sobrepõem. Esta expansão de contextos, consequência dos avanços tecnológicos e crescentes possibilidades dos media, resultou também na alteração da forma como ambas as práticas são recebidas, como se “estendem na realidade” e a maneira como o público se relaciona com elas (Diederichsen, 2010: 17).28 Ou seja, a contínua evolução dos media (de produção musical e visual) tende a influenciar a forma como som e imagem se correlacionam, por um lado, e também a forma como essa relação é recebida pelo público. Nesse sentido, dedicaremos uma das narrativas às mudanças nos métodos da construção de correlação entre som e imagem, estudando a reconfiguração gradual da performance musical, e outra à forma como a música pop é recebida pelo público, identificando o seu possível envolvimento na produção e disseminação da música pop.

Focando-se em áreas particulares de estudo, estas narrativas não são, no entanto, mu- tuamente exclusivas, partilhando momentos em comum. Progridem paralelamente ao longo do século XX, particularmente entre os anos 60 e o final dos anos 90, e tendem a convergir no final do século. A partir do final do século XX, assistimos à

26 Segundo Linck, “pop music represented the historic moment in which the aesthetic judgment that had imposed a distance between art as an institution and the culture industry could no longer be maintained in all seriousness. (…) access to it was strongly channeled through the body and the emotions and therefore much less regulated than access to art” (Linck, 2010: 31). 27 Höller afirma que “(…) popular music pieces, whether taken from the area of classical or pop music, func- tioned as acoustic blue prints onto which mini narratives, experimental collages, and entirely abstract animations were projected” (Höller, 2010: 201). 28 Segundo Diederichsen “(…) it might be pointed out that if the last fifty years have seen any progress in the visual arts, that progress has consisted in regarding ever larger and more complex contexts (…). It has become possible to name, address, and manipulate ever larger areas of relationship with the world (…) and concatenations of the artwork’s various connections” (Diederichsen, 2010: 17). 38

convergência destas narrativas, potenciada pela convergência dos media no meio digi- tal, que irá influenciar tanto a música pop como as artes visuais, redefinindo dinâmicas colaborativas, os modos de apresentação da música numa performance ao vivo, e a maneira como o público se envolve na produção e disseminação da música pop.

1.3.1. Assimilação das artes visuais pela música pop e vice-versa

Atendendo à contínua diluição de fronteiras entre formas de expressão artística, e à consequente hibridização de práticas, a música pop tende a assimilar as artes visuais, e vice-versa. Segundo Justin Hoffmann e Sandra Naumann, durante o século XX, a “análise crítica às limitações das disciplinas estabelecidas (pintura, música e teatro)”, consequência dos paradigmas de exclusividade e separação de formas de expressão artística do Modernismo, associada ao surgimento de novos media visuais (fotografia, filme) e ao “interesse no universalismo e na sinestesia” resultaram no fortalecimento da “tendência para a actividade interdisciplinar” (Hoffmann e Naumann, 2010). Ou seja, durante o século XX, actividades artísticas tendiam a existir entre disciplinas.

Nas belas-artes, por exemplo, “foi desenvolvido um sistema particularmente experi- mental e integrativo”, em comparação com “outras disciplinas culturais”, que incluía uma “grande variedade de actividades culturais” como, por exemplo, o filme, o vídeo, a sound art e, também, a música pop (Hoffmann e Naumann, 2010). Por outro lado, também a música pop se associou a outras actividades artísticas satisfazendo, segundo Hoffmann e Naumann, “considerações económicas que requeriam uma função cul- tural dupla”.29 Isto porque, “ao dar a algo o rótulo arte ou pop”, independentemente de “decisões autónomas por artistas/músicos”, é criado valor simbólico e, consequen- temente, comercial (2010).30

Nos anos 60 explorações visuais e musicais influenciavam-se mutuamente, fomentadas pela “prática da contracultura” cujo “imperativo estético” era a “expansão constante

29 Segundo Hoffmann e Naumann “in addition, economic considerations that required a dual cultural func- tion may have entered into play. During some periods, it was easier to earn money with fine art, while at other times music was more lucrative” (Hoffmann e Naumann, 2010). 30 Os autores acrescentam que “irrespective of autonomous decisions by artists/musicians, PR strategies dem- onstrate how an artist or musician’s own cultural product can benefit from the adaptation of the respective other system. By giving something the label art or pop, it is possible to generate symbolic and, as a result, commercial capital” (Hoffmann e Naumann, 2010). 1.3. Audiovisualidade da música pop ao longo do século XX 39

de formas de percepção e de consciência” (Höller, 2010: 202).31 Como tal, mais do que enaltecer a dimensão musical ou a visual, eventos como os light shows visavam construir um ambiente imersivo, explorando tanto som como imagem. No Exploding Plastic Inevitable de Andy Warhol, por exemplo, eram projectados “até cinco” filmes simultaneamente, “eram apresentados slides, uma bola de espelhos manda feixes de luz em todas as direcções, estroboscópios lampejavam, os The Velvet Underground tocavam um set” ao mesmo tempo que ocorriam performances de outros artistas, “como o Gerard Malanga e a Ingrid Superstar”, sendo que a percepção “audiovisual” da audiência estava sobre “fogo constante” (Glöde, 2010). A banda pop (os The Velvet Underground), portanto, não era um elemento de destaque, mas sim um entre muitos elementos que se sobrepunham, todos eles projectados por Warhol enquanto autor. Como tal, este ambiente imersivo não resultou da mera utilização de vários métodos de produção associados a várias práticas segundo uma única actividade, mas sim da exploração de várias actividades em simultâneo, num projecto total.

Consequentemente, nos anos 80, muitos artistas “não se limitavam a uma única forma de expressão”, operando enquanto “realizadores, pintores, performance artists, arquitectos, músicos, autores, críticos, e teóricos, tudo ao mesmo tempo”, operando igualmente em várias áreas, tendo “Warhol como um importante ponto de referên- cia”, como sugerem Hoffmann e Naumann. O objectivo não era “ligar artes diferentes umas às outras”, mas sim “encontrar o modo de expressão apropriado para uma ideia em particular, testar conceitos noutra área”, ou para expandir a esfera de influência (Hoffmann e Naumann, 2010).

Nos anos 90, afastando-se desta sobreposição de actividades artísticas, associada aos projectos totais dos anos 60 e à ambivalência dos artistas nos anos 80, os artistas ten- diam a agir na sua área disciplinar através de práticas associadas a outras actividades. O videoclip, por exemplo, tornou-se um espaço popular para explorar as relações entre som e imagem, e também entre disciplinas, no qual “o realizador normalmente de- senha imagens com a música como guia”. Realizadores “desenvolveram um conjunto de práticas” nas quais a imagem abandona a sua autonomia e “alguns dos seus modos

31 Segundo Höller “(…) a constellation developed from two poles – one musical, which wanted to override al representativeness, and the other cinematic, which wanted to set up doors of perception beyond all know tonality – whose two sides were up to something similar (although in different media). Both were additionally marked by a common counter-culture practice, whose esthetic imperative compromised the constant expansion of forms of perception and consciousness.” (Höller, 2010: 202). 40

representacionais” ganhando, em troca, “flexibilidade” e “polivalência de significados” (Vernallis, 2004: X).32 Nesse sentido “o videoclip tornou-se uma área experimental na intersecção entre tecnologia e arte, inspirando numerosos realizadores e artistas visuais” (Keazor e Wübbena, 2010).33

Fig. 9 Fotograma do videoclip de Virtual Insanity dos Jamiroquai (Jonathan Glazer, 1996) Fig. 10: Fotograma do videoclip de Around the World dos Daft Punk (Michel Gondry, 1997) Fig. 11: Fotograma do videoclip de Criminal de Fiona Apple (Mark Romanek, 1997) Fig. 12: Fotograma do videoclip de All is Full of Love de Björk (Chris Cunningham, 1999)

1.3.2. Música pop como esforço colaborativo

Segundo as ideias da utilização da música pop como ferramenta pelos artistas, por um lado, e da utilização de práticas associadas às artes visuais no sentido de a

32 Evidenciando estas práticas, existiram, nos anos 90, vários realizadores dignos de nota. Destacamos, como exemplo, Anton Corbijn (Enjoy the Silence dos , 1990), Spike Jonze, (Sabotage dos Beastie Boys, 1994), Jonathan Glazer (Virtual Insanity dos Jamiroquai, 1996), Michel Gondry (Around the World dos Daft Punk, 1997), Mark Romanek, (Criminal de Fiona Apple, 1997) e Chris Cunningham (All is Full of Love de Björk, 1999). 33 Keazor acrescenta “(…) the technical possibilities made it easier to expand the pop cultural strategies of citation, sampling, and appropriation that had been developed in the context of mass media” (Keazor e Wübbena, 2010). 1.3. Audiovisualidade da música pop ao longo do século XX 41

completar, por outro, os projectos musicais pop envolvem colaborações com artistas, designers, programadores, etc.

Este esforço colaborativo é inerente à assimilação das artes visuais pela música pop, e vice-versa, ao longo do século XX, na qual diferentes actividades artísticas tendiam a associar-se a, existindo entre disciplinas (Hoffmann e Naumann, 2010). Nos anos 60, no Exploding Plastic Inevitable, por exemplo, músicos, artistas visuais, e outros par- ticipantes, eram colaboradores num projecto total, cuja autoria era de Andy Warhol (Glöde, 2010). Inversamente, Warhol desenhou a capa do primeiro álbum dos The Velvet Underground, o The Velvet Undergound & Nico de 1967, tendo também crédi- tos como produtor, servindo como colaborador num projecto cuja autoria é da banda pop. Também o videoclip, como uma área exploratória preferencial para realizadores e artistas visuais nos anos 90 (Keazor e Wübbena, 2010), aponta para o cruzamento de diferentes domínios criativos, nos quais realizadores, artistas visuais, músicos, etc., colaboram.

Fig. 13: Fotograma de Exploding Plastic Inevitable (Ronald Nameth, 1967) Fig. 14: The Velvet Underground, com Nico, The Velvet Underground & Nico (1967)

No início dos anos 60, antes do Exploding Plastic Inevitable, existiam esforços que ser- viram de precedente às práticas colaborativas dos light shows. Na USCO, um colectivo de media art, por exemplo, “Gerd Stern, um poeta de São Francisco que por volta de 1962 começara a colaborar com um pintor, Stephen Durkee, e depois com um técnico, Michael Callahan, em performances multimedia” (James, 2010).34 Conse- quentemente, os light shows eram ambientes fruto de um esforço colaborativo, fazendo com que um evento fosse construído através da influência mútua entre formas de

34 Exemplos das obras dos USCO resultantes da conjunção de diferentes práticas artísticas incluem o poema No Ow Now (1962) e a escultura Contact is the Only Love (1963). 42

expressão artística, e entre os artistas a elas associados. Sobre os light shows associados às performances ao vivo das bandas de rock n’ roll, David E. James afirma que, nor- malmente, “os light artists compunham em resposta à música, embora ocasionalmente o seu trabalho influenciasse reciprocamente as improvisações dos músicos”, tornando o concerto num “evento audiovisual espontaneamente improvisado” (James, 2010). Ou seja, mais do que apenas actuar numa área particular de acção (construindo uma componente de um projecto total), um colaborador tende a influenciar componentes associados a outras áreas de acção que o projecto integra, sendo também influenciado por elas.

Fig. 15: No Ow Now (USCO, 1962) Fig. 16: Gerd Stern e a escultura Contact is the Only Love (USCO, 1963)

Nesse sentido, os colaboradores tendem a participar activamente na música pop en- quanto fenómeno audiovisual. Isto porque, através da construção da dimensão visual, podem definir ou reforçar a intenção da edição musical, e criar “contexto” 35 para a mesma. Por exemplo, segundo Diederichsen, a partir dos anos 60, práticas como a fotografia, ilustração e design gráfico, que “prosperavam particularmente nas áreas de publicidade e relações públicas”, passaram a ser aplicadas na construção de capas de álbuns. Como tal, em vez de se dedicarem ao “serviço da intenção predeterminada de um produto”, através da música pop os fotógrafos, ilustradores, designers gráficos, etc., podiam “eles próprios, em grande medida, gerar intenção”, sem as restrições das “elites do gallery world” (Diederichsen, 2011: 130).36 Ou seja, construindo as expres-

35 Por exemplo, como afirma Diederichsen, as capas de álbuns são “um dos mais importantes elementos de criação de contexto” (Diederichsen, 2010: 25). 36 O autor afirma que “record covers provide photography, illustration, graphic design, and other genres that primarily flourish in the areas of advertising and public relations with a new field of activity. Instead of placing themselves in the service of themselves to the anointed elites of the gallery world” (Diederichsen, 2011: 130). 1.3. Audiovisualidade da música pop ao longo do século XX 43

sões visuais associadas à edição musical, os colaboradores exploram as suas disciplinas livremente, influenciando activamente a música pop, enquanto fenómeno audiovi- sual, com as suas próprias intenções.

1.3.3. Performance musical como correlação entre som e imagem

Atendendo às ideias tratadas nas narrativas anteriores, podemos considerar a correla- ção entre som e imagem como uma prática construtiva de uma performance musical, na qual as práticas musical e visual se influenciam mutuamente. A performance mu- sical através de instrumentos acústicos “tradicionais”, segundo Amy Alexander, “pode ser considerada audiovisual”, devido à “experiência da audiência ao ver os gestos do performer integrados na música” (Alexander, 2010). Podemos associar esta ideia à noção explorada por Föllmer, de que a produção musical sempre abarcou uma série de estímulos visuais, como a actividade motora de um músico numa performance ao vivo, sendo que o ouvinte não só ouve a música mas também vê os gestos e expressões faciais do músico (Föllmer e Gerlach, 2005). Ou seja, entendemos a performance como a visualização da produção musical, sendo que uma acção visual tem uma res- posta sonora.

No contexto da música pop, particularmente, podemos considerar que, numa perfor- mance ao vivo, o instrumento musical não serve apenas para fazer música, tendo uma dimensão visual enquanto elemento performativo. Suportando esta ideia, Shaw-Miller lembra que nos anos 60 Jimi Hendrix ou Pete Towshend (dos The Who) destruíam as suas guitarras em performances ao vivo como “o ponto alto dos seus stage acts tea- trais, confluindo destruição e criação” (Shaw-Miller, 2010). Este “ambiente cultual da música rock” seria também explorado em obras artísticas como a Block Guitar Piece de 1962, de Robin Page, que “requeria que o performer usasse os pés em vez das mãos para produzir som”, pontapeando “o instrumento para fora do palco” para, depois de “dar uma volta ao quarteirão”, trazê-lo de volta para o palco. “Tais abordagens”, segundo Shaw-Miller, “fazem dos instrumentos mais do que meros transmissores de música”, tornando-se “objectos esculturais, pontos de fixação e fetiche” (Shaw-Miller, 2010).37 Ou seja, numa performance ao vivo é importante não só a dimensão per- formativa inerentemente associada ao instrumento musical, mas sobretudo a relação entre instrumento e performer.

37 Segundo Shaw-Miller, “a more explicit connection with the cultic environment of rock music may be found in Robin Page’s 1962 Fluxus work Block Guitar Piece (…)”(Shaw-Miller, 2010). 44

Fig. 17: The Who no 6th Jazz and Blues Festival (1966) Fig. 18: Jimmy Hendrix no Monterey Pop Festival (1967)

Nos anos 60, técnicas associadas aos light shows como a liquid projection, eram usadas para construir um “correlativo visual “ para as “improvisações irrepetíveis que agora caracterizam as jams dos Jefferson Airplane, Grateful Dead, e outras bandas de rock ‘n’ roll da bay area” (James, 2010), potenciando a improvisação mútua de som e imagem em tempo-real. Sobre as mesmas bandas, e também referente às suas performances ao vivo nos anos 60, Diederichsen afirma que “na sua música, efeitos sonoros duravam quase o mesmo tempo que uma pessoa normalmente fica diante de um quadro numa galeria” e, como tal, “o ritmo da audição começa a assemelhar-se ao da visão”.38 O autor acrescenta que os light shows começaram a “responder” a uma “visualização da arquitectura da música pop”, e que, consequentemente, certos light shows “tornaram- -se conhecidos e diferenciavam-se uns dos outros estilisticamente” (Diederichsen, 2011: 127). Isto porque, considerando o rock psicadélico popular na altura, os “efeitos sonoros era tão poderosos, tão psicotrópicos, e tinham a mesma necessidade de se completar que a voz humana única”, sendo que da mesma maneira que “o som da voz exige ser completado pela imagem do seu originador sexy” as longas improvisações “exigiam imagens correspondentes que ajudassem a torná-las reconhecíveis” (2011: 128).39

A performance ao vivo, portanto, é influenciada pelos modos de produção mu- sical e visual em cima do palco, e como tal tende a reconfigurar-se segundo a sua

38 Diederichsen afirma que “(…) in their music, sound effects last about as long as one would normally stand before a painting in a gallery. The pace of listening begins to resemble that of seeing” (Diederichsen, 2011: 127). 39 Segundo o autor, “just as the sound of the voice demands to be completed by the image of its sexy originator, in the same way and endless wah-wah orgy calls for corresponding images that help to make it recognizable and that take something that would be an object of helpless fascination as pure sound and incorporate it into the world of the imaginary” (Diederichsen, 2011: 128). 1.3. Audiovisualidade da música pop ao longo do século XX 45

transformação. Essa transformação deve-se, em parte, a uma mudança nas ferramentas performativas, que no final do século serão afectadas, nomeadamente, pela convergên- cia dos media no meio digital.

1.3.4. Envolvimento perceptivo do público

No contexto da música pop, concretamente na segunda metade do século XX, o papel do público é sobretudo passivo, como receptor da música enquanto produto. Podemos considerar, no entanto, que determinadas formas de veiculação da música pop tendem a envolver o público, integrando-o num projecto total. Segundo Diederichsen, um “projecto total da música pop” tende a mobilizar “receptores como prosumers, persona- lizando antagonismos sociais, e requerendo que as pessoas desenhem as suas próprias vidas criativamente”, um imperativo aplicável “tanto na produção como na recepção” (Diederichsen, 2010: 26).40

Ou seja, a música pop tende a promover um papel de criação activa por parte do público, embora essa intenção não tenha sido realizada em pleno antes do surgimento e propagação dos media digitais. Nos light shows dos anos 60, por exemplo, os vários elementos visuais “sinestésicamente unidos” com a música criavam “um ambiente imersivo totalizante”, que “dissolvia as fronteiras entre a audiência e o performer, entre mente e corpo, entre os diferentes sentidos, e entre identidade individual e comunal” (James, 2010), procurando envolver o público através da activação da sua percepção. Esta participação do público através do seu envolvimento perceptivo será expandida, incluído uma interacção efectiva (e portanto física), segundo a digitalização dos me- dia, que irá influenciar exponencialmente o envolvimento do público na produção e disseminação da música pop.

40 O autor afirma que “today, nearly all sectors of the culture industry operate – at least partially and potentially – as the good total artwork of pop music used to: by mobilizing recipients as “prosumers”, personalizing social antagonisms, and requiring that people “creatively” design their own lives, an imperative which becomes a twofold resource for production as well as reception” (Diederichsen, 2010: 26). 46

1.4. Convergência de media no meio digital

“Digital media for image production (…) can be seen both as return to and con- tinuation, or as a further enhancement and consolidation of the strategies for the musicalization of the visual (…). It is both the convergence of aesthetic means and their union in the universal machine of the computer that enables simulation of the techniques and effects of visual composition and image-processing.” (Naumann, 2011: 88)

No final do século XX, afectando os modos de produção e recepção da música pop, a convergência digital dos media influenciou os vários aspectos tratados nas narrativas propostas. Segundo Naumann, os “media digitais para produção imagética e o seu uso no contexto de VJing, live visuals, live cinema e performances audiovisuais ao vivo” são simultaneamente um retorno e uma continuação da musicalização das artes visuais no século XX, sendo que a “convergência de meios estéticos” e a sua “união na máquina universal do computador” permitem a “simulação de técnicas e efeitos de composição visual e processamento de imagem” (Naumann, 2011: 88). Embora o vídeo tenha sido considerado, por Yvonne Spielmann, o primeiro medium realmente audiovisual devido à “equivalência entre os sinais de áudio e de vídeo”, Naumann conclui que “a possibilidade de representar qualquer tipo de informação” digitalmente resultou na “convergência total” de som e imagem. Nesse sentido, segundo Vilém Flusser, as “bases para os princípios organizacionais da música” podem ser reconhecidos como um “modelo” que governa “imagens computadas”, que dá continuidade à “tendência geral para a musicalização” (2011: 90).41

Segundo Tina Frank e Lia, “sons e imagens, que em termos de tecnologia dos media são fenómenos separados, são representados nos media digitais por um código biná- rio partilhado”, sendo que tal resulta numa “transformabilidade fundamental”, que contrasta com “transformação analógica” no sentido em que “permite uma tradução algorítmica de parâmetros auditivos e visuais” (Frank e Lia, 2010). Ou seja, atendendo à convergência total de som e imagem no computador, parâmetros sonoros podem ser

41 Naumann afirma que “(…) Vilém Flusser (…) recognizes the basics for music’s organizational principles in rules as the model governing media-based foundations of electronic and “computed” images, and thus as an indica- tor of a general trend toward musicalization. Whereas Yvonne Spielmann considered video to be the first really audiovisual medium because of the equivalence between the audio and video signals, the possibility to represent any kind of information in digital code has led to their total convergence” (Naumann, 2011: 90). 1.4. Convergência de media no meio digital 47

mapeados para criar imagens, e vice-versa. A forma como som a imagem se correlacio- nam num meio digital, consequentemente, é diferente da forma como o faziam num meio analógico, sendo que o computador é um emulador de diferentes “formas” de media, que podem ser representadas e manipuladas de modo semelhante.42 Manovi- ch afirma que “devíamos pensar no computador digital como um metamedium que contém todos os media que já existem e os que ainda não foram inventados”43, acres- centando, no computador, “diferentes media tornam-se compatíveis mas ao mesmo tempo podem preservar as suas identidades distintas” (Manovich, 2007: 19).

Por conseguinte, segundo Dieter Daniels e Sandra Naumann, “a hibridização das bases técnicas de todos os media audiovisuais é de uma importância fundamental tanto estética como economicamente”, sendo que “a fronteira técnica agora fluída entre imagem e som tem efeitos extensos em todos os géneros estabelecidos”, como por exemplo montagem de som e imagem no cinema e na televisão, concertos ao vivo com visuais, ambientes audiovisuais e instalações artísticas (Daniels e Naumann, 2010: 12). Portanto, com a “tecnologia digital”, “o óptico e o acústico tornaram-se de facto calculáveis, transformáveis e manipuláveis à nossa vontade” (2010: 8).44 Nesse sentido, a digitalização dos media possibilita também a facilitação da correlação entre som e imagem num ambiente performativo, agilizando a sua produção e manipulação em tempo-real, fomentando, por um lado, a reconfiguração da performance musical e, por outro lado, a introduzir a noção da possibilidade de interacção, promovendo o envolvimento do público.

1.4.1. Hibridização de formas de expressão artística

A convergência digital promove assim a diluição de fronteiras entre formas de ex- pressão artística, resultando numa “hibridização” que, tal como Shaw-Miller reforça, “será talvez a característica central da arte do início do século XXI” (Shaw-Miller,

42 Segundo Lev Manovich, os “computadores digitais permitem-nos representar qualquer fenómeno ou estru- tura como um conjunto de variáveis”, sendo que “todas as formas possíveis – visuais, temporais, espaciais, interac- tivas – são representadas de modo semelhante como um conjunto de variáveis que podem mudar continuamente” (Manovich, 2007: 13). 43 Foi o cientista computacional Alan Kay que propôs o termo “metamedium” nos anos 70. É segundo Kay, que Manovich cita, que “devíamos pensar no computador digital como um metamedium que contém todos os media que já existem e os que ainda não foram inventados” (Manovich, 2007: 19). 44 Daniels e Naumann afirmar que “(…) the mathematical models of correspondence that have been developed since classical antiquity are more relevant today than ever before because digital technology has rendered the optical and the acoustic de facto calculable, transformable, and manipulable at will” (Daniels e Naumann, 2010: 8). 48

2001: 145).45 Segundo Hoffman e Naumann, “com a digitalização dos media e a propagação do computador, métodos de trabalho visuais e musicais tornaram-se cada vez mais tecnicamente alinhados” (Hoffmann e Naumann, 2010).46 Como tal, formas de expressão artística tornam-se também conceptualmente alinhadas, ou seja, cum- prem intenções múltiplas que estariam, tradicionalmente, associadas a áreas de acção singulares. Nos anos 90 “a crescente intersecção entre belas-artes e música electrónica”, por exemplo, “era evidenciada por projectos que não eram somente apresentados em clubs mas também em museus e galerias” (Hoffmann e Naumann, 2010). Nesse sen- tido, o mesmo meio criativo, nomeadamente o computador, permite a realização de diferentes intenções, podendo assumir o papel de ferramenta artística ou de mediação, através do qual “a linha entre entretenimento e tudo o resto” se torna “muito vaga”, pois “os truques dos artistas” de hoje serão “as ferramentas comerciais de amanhã” (Rokeby, 1997: 2).

1.4.2. Reforço do papel das colaborações na música pop

A convergência de media e hibridização de formas de expressão artística promovem uma consolidação gradual da música pop enquanto fenómeno audiovisual, influen- ciando, ao mesmo tempo, o papel das colaborações na construção da dimensão visual de um projecto que tem a música como motor.

Segundo Christopher Alex McLean quem cria usando o computador deveria ser alvo das mesmas considerações reservadas para “pintores” no contexto das “belas-artes” (McLean, 2011: 14)47, e acrescenta, notando a sua ambivalência, que actuam tanto no âmbito das artes visuais como no da música pop. O autor afirma, por exemplo, que “os United Visual Artists (UVA), que começaram por criar stage visuals para acompa-

45 Shaw-Miller afirma que “the shifts signaled by recent nomenclature (`art history’ becoming `visual culture’, for example) ironically leave silent these inter-media territories, and hybridity is perhaps the central characteristic of early twenty-first-century art. In learning to sight sound we may find `art’ a broad enough term to encompass our inquiries as they expand, not just vertically, but also horizontally” (Shaw-Miller, 2001: 145). 46 Os autores dão o exemplo de Mark Leckey que, nos anos 90, “used the method of sampling — which had its roots in music — for processing not only sounds but also found footage, creating clips that were similar to music videos” (Hoffmann e Naumann, 2010). 47 O autor afirma que “the use of the term artist-programmer could be seen as over defensive. Alone, the word programmer is often used to imply a technician, tending a computing machine, or realizing a designer’s dream. We could be more assertive, and use the word programmer to establish a similar context effect to that which the word painter enjoys in the fine arts. But for the present thesis we keep the arts context explicit, while confronting the singular identity of the programmer as artist” (McLean, 2011: 14). 1.4. Convergência de media no meio digital 49

nhar e reagir a música ao vivo dos Massive Attack em 2003”, “desde então levaram o seu trabalho a galerias nacionais na forma de instalações artísticas interactivas” (2011: 37).48 Ao construir a dimensão visual associada à música pop os colaboradores defi- nem a forma como o público acede à música enquanto produto sendo, nesse sentido, o colaborador a construir a maneira como o público acede à música, dando forma e modificando “o ponto de vista subjectivo do utilizador” que é construído pelos seus sentidos em conjunção com as suas “memórias e experiências”. Como tal, ao “apre- sentar informação de uma maneira e num medium específico”, o colaborador define a maneira através da qual o público forma o seu “ponto de vista” (Rokeby, 1997: 10).49

Fig. 19: World Tour dos Massive Attack (© UVA, 2010) Fig. 20: Speed of Light, instalação artística (UVA, 2010)

A coexistência de métodos de produção no computador é também um factor im- portante na reconfiguração do papel dos colaboradores na música pop. Segundo Frank e Lia, o computador serve como ferramenta de produção musical e visual, onde “parâmetros de som e imagem” podem ser controlados “simultaneamente”, sendo que, enquanto alguns músicos “desenvolveram os seus próprios métodos“ de criação audiovisual, outros “começaram a colaborar com artistas visuais” (Frank e Lia, 2010). Nesse sentido, os media digitais reforçam o papel que os colaboradores têm no contex- to da música pop, especialmente considerando que “uma colaboração próxima entre músicos e artistas visuais” resulta num “alinhamento favorável de sistemas musicais e visuais, especialmente num contexto ao vivo” (Frank e Lia, 2010).

48 Podemos evidenciar a ambivalência do trabalho dos UVA notando o seu trabalho para a World Tour dos Massive Attack e a instalação artística Speed of Light, ambos realizados em 2010. 49 Segundo Rokeby “we are who we are, with a unique character and personal idiosyncracies, largely because of our individual subjective viewpoint. That viewpoint is formed by our windows out into the world (our senses), in conjunction with our memories and experiences. An interactive interface is a standardized extension that shapes and modifies the user’s subjective point of view. By presenting information in a specific manner or medium, the interface designer defines the way this interface shapes this point-of-view” ” (Rokeby, 1997: 10). 50

1.4.3. Reconfiguração da performance musical

Podemos considerar, portanto, que numa performance ao vivo é explorado o alinha- mento entre produção musical e visual, atendendo à semelhança e coexistência de métodos de produção no computador. Este metamedium possibilita novas formas de correlacionar som e imagem, promovendo a reconfiguração da performance musical pop. Por exemplo, os media digitais potenciaram “desenvolvimentos na eletronic dance music em meados dos anos 80” que levaram ao revival dos light shows no contexto da rave culture, sendo que os light shows não eram populares desde os anos 70 (James, 2010).50 Como tal, as várias práticas associadas aos light shows, como a produção simultânea de som e imagem em tempo-real, que promove a construção de um corre- lativo visual para as improvisações musicais, são restabelecidas na performance musical contemporânea. Segundo James, “nos meados dos anos 80, house, techno”, e outros géneros de eletronic house music, juntamente com “as possibilidades radicalmente expandidas da tecnologia digital”, muitas vezes “tomavam a forma de performance ao vivo audiovisuais conhecidas como VJing ou Live Visuals” (James, 2010).51 Con- sequentemente, estratégias visuais desenvolvidas ao longo do século XX “tornaram-se um componente integral de espectáculos de música popular, mas agora numa forma massivamente expandida” (James, 2010).

Fig. 21: Rave The Trip no Astoria em Londres (1988)

50 James afirma que “light shows declined in the 1970s, but developments in electronic dance music in the mid-1980s led to their revival in rave culture” (James, 2010). 51 James acresta que “by the mid-1980s, house, techno, and other electronic dance music, along with Ecstasy and other new drugs, the radically expanded possibilities of digital technology, and the extensive use of lasers, led to the revival of light shows as an essential component of rave culture, often taking the form of audiovisual live performances known as VJing or Live Visuals” (James, 2010). 1.4. Convergência de media no meio digital 51

Em meados dos anos 90 as ferramentas digitais, e o laptop em particular, tornaram-se simultaneamente instrumentos musicais e ferramentas de produção imagética. Aten- dendo à democratização do computador pessoal, nomeadamente dos laptops portáteis, “o laptop tornou-se um instrumento musical facilmente disponível que, como tal, não só revolucionou a performance mas também o mundo sonoro da música electrónica ao vivo” (Frank e Lia, 2010). Usar o laptop como instrumento musical afectou tam- bém a dimensão visual da performance, sendo que “ver um performer apenas a operar um computador” tornou difícil para as audiências “relacionarem-se ao acto musical de geração de som”, o que criou um “vácuo visual” (2010). Ao contrário dos instru- mentos acústicos “tradicionais”, cuja dimensão visual está associada à “experiência da audiência ao ver os gestos do performer integrados na música” (Alexander, 2010)52, na relação entre o performer e o laptop, esses gestos não transparecem tão claramen- te.53 Este vácuo visual, no entanto, pode ser preenchido igualmente através do laptop, podendo este ser “usado para manipular imagens em movimento em tempo-real”. Explorando essa possibilidade de produção, “alguns músicos começaram a colaborar com artistas visuais”, enquanto “outros desenvolveram os seus próprios métodos para preencher o vácuo visual em concertos” (Frank e Lia, 2010).

Segundo Alexander, uma prática recorrente na “performance visual dos anos 2000” é a “proliferação de ferramentas digitais para performance em tempo-real”, produ- zidas tanto comercialmente como por artistas (Alexander, 2010). Nesse sentido, a performance musical reconfigura-se, num contexto contemporâneo, segundo o uso de ferramentas digitais, que promovem uma dimensão visual que vai além da rela- ção de causalidade entre performer e instrumento. Esta dimensão visual resulta de “abordagens à visualização da música e à geração de imagens”, desenvolvidas “com a ajuda de uma grande variedade de aplicações e métodos” (Frank e Lia, 2010), como ferramentas que partem de material já existente ou que são criadas de raiz.54

52 Segundo Alexander, “musical performance on more traditional instruments might be considered audiovisual by nature, owing to the audience experience of watching the performers’ gestures integrated with the music” (Alexander, 2010). 53 Atendendo ao carácter estático do performer, segundo Alexander, alguns “músicos de laptop e performers vi- suais”, num esforço para “tornar a sua performance mais gestual”, recorrem a “teclados, ou interfaces performativos menos convencionais, como comandos da Wii e Tagtools” (Alexander, 2010). 54 Segundo Frank e Lia, alguns artistas “criam os seus próprios instrumentos para performances audiovisuais” usando “materiais pré-configurados”, como “módulos e bibliotecas”, “combinando-os de maneiras novas”, poden- do também “programá-los eles próprios”, sendo no entanto “essencial que estejam familiarizados com linguagem de programação” (Frank e Lia, 2010), remetendo novamente para o esforço colaborativo no sentido de preencher o vácuo visual. 52

Ou seja, a performance musical contemporânea é influenciada pela convergência de ferramentas no laptop, assente na conjunção de métodos de produção nos media digi- tais. Segundo Diederichsen, o laptop promove não apenas uma “conexão baseada na recepção” entre som e imagem, “mas acima de tudo uma conexão baseada na produ- ção”, acrescentando que “flyers e música digital são agora frequentemente produzidos nos mesmos computadores, usando programas com user interfaces muito semelhantes” (Diederichsen, 2011: 132). Produção musical e visual é, assim, simultânea e como tal os métodos de construção visual e musical aproximam-se, atendendo à semelhança de interfaces. Podemos considerar, portanto, como reforça Shaw-Miller, que “a ideia modernista de exclusividade dos media foi substituída por mixed media”, através dos quais “som, visão, performer e audiência muitas vezes se diluem” (Shaw-Miller, 2010).

1.4.4. Envolvimento interactivo do público

Diferenciando-se do tipo de envolvimento perceptivo do público promovido pelos light shows dos anos 60 mencionado anteriormente, a “promessa da interactividade”, como promotora do envolvimento no contexto contemporâneo de produção e disse- minação da música pop, alia-se à ideia de “que a experiência de cultura pode ser algo que é feito e não algo que é dado” (Rokeby, 1997: 1).55

Promovendo o envolvimento interactivo público, fomentando um feedback loop entre máquina e utilizador, os sistemas interactivos tendem a incorporar acções físicas hu- manas. Procurando abordar possibilidade de interacção no contexto da música pop, recorremos a Golan Levin, que define que estes sistemas interactivos podem ser tanto “produtos comercias” como “instalações artísticas”, acrescentando que “alguns projec- tos” existem “entre estas formas e contextos” (Levin, 2010). O que destacamos destas “aplicações”,56 independentemente do seu contexto, é o que têm tem em comum, ou

55 Rokeby afirma que “entertainment has traditionally involved heavily coded communication. It has predomi- nantly been delivered through words, sounds, symbols and gestures which stimulate the imagination to render an experience. The visual arts and theatre at various times in history, and film and television in the past century use the direct visual experience of images as a way to make the experience more immediate… to make the audience feel more “there.” But these experiences remain things that happen to you. Interactivity’s promise is that the experience of culture can be something you do rather than something you are given” (Rokeby, 1997: 1). 56 Segundo Levin, “some of these systems are commercial products; others are museum installations or browser- based Internet experiences; and some projects have moved back and forth between these forms and contexts. What these applications all share is a means by which a feedback loop can be established between the system and its user(s), allowing users or visitors to collaborate with the system’s author in exploring the possibility-space of an open work, and thereby to discover their own potential as actors” (Levin, 2010). 1.4. Convergência de media no meio digital 53

seja, a forma como estabelecem um “feedback loop entre o sistema e o seu utilizador, permitindo aos utilizadores ou visitantes colaborarem com o autor do sistema”, através do qual podem explorar “o seu potencial enquanto actores” (2010). Isto é evidente, por exemplo, em “videojogos musicais”, que “exploram a relação entre imagem, som e interacção do jogador”, e que podem ser tanto “produtos comerciais” como “instala- ções multimédia” num contexto artístico (Stockburger, 2010).

A acção física humana que estes sistemas incitam é evidente em “jogos musicais baseados num ecrã”, por exemplo, nos quais a “acção participativa humana” pode funcionar como “input primário para controlar ou gerar experiências audiovisuais” (Levin, 2010).57 Nesse sentido, a “relação interactiva” entre sistema e utilizador, que “geralmente envolve o controlo da – e a reacção à – geração ou animação digital de imagem e som”, está associada à atenção que é agora dada ao “papel preciso de gestos que controlam a interacção entre humano e computador” (Birringer, 2011: 45).58 Podemos considerar outro tipo de participação do público, atendendo às caracterís- ticas particulares dos media digitais, nomeadamente o seu envolvimento enquanto colaborador em contextos online. Estas possibilidades colaborativas estão assentes na distribuição de ferramentas e materiais de produção audiovisual através do computa- dor, partilhadas “pelos artistas nos seus websites”, possibilitando à audiência continuar com “experiências ou colaborações” (Stockburger, 2010).59

Por envolvimento interactivo do público consideramos, portanto, o papel do utiliza- dor promovido por sistemas interactivos, que podem ser, entre outras categorizações,

57 Levin afirma que “a variety of performative software systems use participatory human action as a primary input stream for controlling or generating audiovisual experiences. These systems range from screen-based musical games, to deeply expressive audiovisual instruments, to puzzling and mysterious audiovisual toys whose rule-sets must be decoded gradually through interaction” (Levin, 2010). 58 Segundo Johannes Birringer, “bodies provide data and wear sensors, and widespread attention now is given to the precise role of ‘gestures’ that control human-computer interaction. Performance interactivity refers to all programmed environments in which the interaction is emergent, dynamic; the interactive relationship generally involves the control of – and reaction to – digital image and sound generation or animation, the mutation of media forms” (Birringer, 2011: 45). 59 Axel Stockburger afirma que “(…) artists and programmers develop innovative and autonomous instal- lations and performance tools on the basis of existing hardware and software from the game industry. Unlike appropriation in modern art of the 20th century, this has less to do with a reference to the original context of the material used, but rather with the experimental transformation of existing software in an attempt to automatically generate new types of audiovisual situations. The modified code of all the aforementioned works is made available for download by the artists on their web sites, which affords the audience the possibility of further experiments or collaborations” (Stockburger, 2010). 54

tanto produtos comerciais como obras artísticas, nos quais o “papel activo da audiên- cia” dependerá das “possibilidades operativas e produtivas” que o sistema oferece “para a audiência explorar enquanto utilizador” (Ribas, 2014: 4). Podemos concluir que no contexto contemporâneo o envolvimento do público é promovido segundo as possi- bilidades inerentes aos media digitais, nomeadamente as possibilidades de interacção (segundo acção física humana) e as possibilidades de participação na disseminação online da música pop e dos seus desdobramentos. Nesse sentido, consideramos expe- riências interactivas online ou aplicações para dispositivos móveis como exemplos de sistemas cuja intenção é promover envolvimento ao explorar o papel activo do público.

1.5. Conclusão

Segundo as quatro narrativas propostas, observamos que a música pop se manifesta e dissemina, em todas as suas dimensões construtivas enquanto fenómeno audiovisual, através de media digitais. No contexto contemporâneo, essas dimensões reflectem uma convergência de linguagens de som e imagem, que se alia à integração de estratégias de produção e disseminação da música pop no computador enquanto metamedium. Consequentemente, é potenciada a construção musical e visual simultânea, e reforça- da a expressão audiovisual da música pop enquanto projecto total.

A música pop pode ser considerada um todo coeso. Como tal, não é apenas uma instância isolada de um projecto multidimensional, sendo que as suas dimensões mu- sicais e visuais partilham modos de produção (sonora e imagética), diluindo fronteiras rígidas e fomentando a hibridização de formas de expressão artística. Esta hibridização está assente na colaboração entre músicos e artistas visuais, designers, programadores, como mencionado anteriormente. Neste contexto, o computador assume o papel de um instrumento musical e de uma ferramenta de produção imagética, seja em simul- tâneo (por um mesmo criador) ou segundo uma articulação de componentes (através de colaboração). Isto porque, por um lado, músicos podem explorar as possibilidades de produção visual dos media digitais (Frank e Lia, 2010) e, por outro lado, tanto músicos como artistas visuais trabalham em estreita colaboração tirando partido da semelhança entre interfaces de produção musical e visual (Diederichsen, 2011: 132).

As ferramentas digitais, portanto, na sua ambivalência e emulação de media, contri- buem para agilizar a colaboração e articulação de diferentes campos criativos. Isto é especialmente evidente no contexto da performance ao vivo, em que, como afirma 1.5. Conclusão 55

Föllmer, os ouvintes, “esperam mais da música do que apenas som ordenado” (Föllmer e Gerlach, 2005). Neste contexto, o uso do computador como instrumento musical tende a subtrair à performance musical a percepção de causalidade da relação entre a acção do performer sobre o instrumento acústico. Potencialmente compensando essa subtracção, as ferramentas digitais oferecem possibilidades de produção imagética em estreita relação com a música, tanto através da apresentação simultânea de sons e imagens em tempo-real, da sua produção em simultâneo (ao vivo), ou da criação de uma interdependência assente no mapeamento de parâmetros de som em imagem e vice-versa.

Tal como Föllmer sugere, a solução para o “problema de comunicação” entre per- former e audiência, será um “novo tipo de configuração espacial”, no qual o públi- co pode deixar de prestar atenção ao palco “regularmente”, “vagueando pela sala” e concentrando-se “no que está a acontecer nela”. Por outro lado, no sentido de preen- cher o vácuo visual, a solução poderá passar pela “visualização” da música através de elementos visuais “mostrados paralelamente”, cujo “conteúdo ou estética possa tam- bém ser independente da música”. Tais aspectos associam-se igualmente à “inclusão interactiva da audiência” (Föllmer e Gerlach, 2005), promovendo o envolvimento do público além da mera contemplação passiva, que se verifica não só no contexto da performance como também em contextos exteriores à mesma. Podemos observar que, mediante as possibilidades das tecnologias digitais de veiculação da música pop, o público é gradualmente envolvido em processos de disseminação através de partilha ou participação, particularmente através de experiências online ou de aplicações para dispositivos móveis. Estes produtos e estratégias (que podem ser vistos como desdo- bramentos emergentes da música pop) evidenciam particularmente o envolvimento activo da audiência possibilitando a manipulação e exploração criativa de material so- noro associado a uma dimensão visual, reforçando uma acepção da música enquanto fenómeno não exclusivamente sonoro.

Segundo Daniels e Naumann a intermedialidade inerente à música (tal como explo- rada em práticas experimentais ao longo do século XX) é especialmente evidente no contexto contemporâneo na “cultura quotidiana” (Daniels e Naumann, 2010: 12). Nesse âmbito, os autores afirmam que “a arena áudio e visual está situada menos na high culture do que na cultura quotidiana permeada pelos mass media e nos hábi- tos perceptivos informados pela mesma”. Os autores acrescentam que, em oposição ao ideal de hibridez proposto pela gesamkunstwerk (ou obra de arte total), em que a 56

teorização deste ideal estético antecede a sua concretização prática, “hoje em dia” a prática antecede a teoria. Como tal o ideal de uma “enfâse programática, teórica e estética” foi substituído pela “ligação permanente entre imagem e som enquanto pro- duto”, que se prova como “mais uma forma de vida do que uma forma de arte” (2010: 12).60 Esta ubiquidade audiovisual contemporânea é um “feito técnico e cultural”, que se torna mais evidente na cultura quotidiana enquanto produto dos mass media do que como projecto artístico. Isto porque as experimentações técnicas e estéticas em torno da articulação entre som e imagem, tal como “as experiências de som e imagem artisticamente motivadas na música visual (visual music) durante 1920, a intermedia art durante 1960, e a media art durante 1980 entraram na cultura híbrida dos mass media digitais como procedimentos standard” (Daniels e Naumann, 2010: 8-12).

De acordo com esta ideia, procuramos com este estudo evidenciar como as formas de produção e recepção da música pop tendem a mudar. Nesse sentido, consideramos que os produtos e estratégias actualmente usados para a sua veiculação se prestam a um estudo mais aprofundado como exemplos particulares desta ligação permanente entre som e imagem, entre media áudio e visuais, e entre formas de expressão artística na cultura pop contemporânea.

60 Daniels e Naumann afirmam que, “unlike the gesamkunstwerk (total art work) of the nineteenth century, today praxis is forging far ahead of theory. Accordingly, the audio and visual arena is situated less in high culture, which in many places is again defending the specificity of its genres and focusing them aesthetically, and more in mass-media-permeated everyday culture and the perceptional habits informed by it. The utopia and praxis of a programmatic, theoretical, and aesthetic emphasis has been replaced by the permanent linkage of image and sound as a commodity, which proves itself to be, for good or for worse, more of a way of life than an art form” (Daniels e Naumann, 2010: 12). 57

2. Veiculação da música pop

Na sequência do estudo anterior, passamos à selecção e análise de exemplos que ilustram a convergência de linguagens de som e imagem e estratégias de produção e disseminação da música pop no contexto contemporâneo, potenciada pelo meio digital. Considerando a música pop como um projecto audiovisual total, procuramos evidenciar como os exemplos apresentados reflectem, e dão continuidade, aos aspectos anteriormente identificados relativos ao desdobramento da música pop em diferentes estratégias e produtos, implicando esforços colaborativos e revelando uma tendência para a promoção do envolvimento do público na sua produção e disseminação.

Para tal, foram primeiramente seleccionados exemplos de estratégias ou produtos que se destacam das formas tradicionais de veiculação da música pop no contexto contemporâneo, ou seja, que se diferenciam, pela forma como reforçam a natureza audiovisual da música pop e exploram a sua relação com o público. Numa segunda fase, segundo uma análise das várias edições dos projectos musicais associados aos exemplos escolhidos, procurámos evidenciar estratégias emergentes de veiculação da música actuais.

2.1. Selecção de exemplos

Para este levantamento, considera-se então a música pop como produto cultural e comercial, ou seja, música que é produzida para ser veiculada e vendida, implicando diversas estratégias para chegar ao público. Como mencionado ao longo deste estudo, tradicionalmente essas estratégias incluem a disseminação da música através de canais, como a rádio ou a televisão, recorrendo a estratégias promocionais associadas a singles, 58

videoclips e a todos os elementos gráficos clássicos, como a capa do álbum, booklet, flyers, posters, etc. Sendo que no contexto contemporâneo tanto os meios de produ- ção como os canais de divulgação e disseminação da música pop se expandem, estes destacam-se das estratégias tradicionais de veiculação da música, tanto por ocuparem novos meios de disseminação (tais como plataformas e dispositivos digitais, além da televisão ou rádio), como por se associarem a múltiplos desdobramentos ou novos produtos e estratégias de veiculação (associados a esses meios).

Por produto entenda-se um desdobramento autocontido, com por exemplo, um videoclip (offline ou online) ou uma aplicação para dispositivos móveis (app). Uma estratégia de veiculação, por sua vez, pode englobar vários componentes, como por exemplo o guerrilla marketing ou as colaborações por concurso, seja na disseminação da música por partilha ou pela promoção participativa (por exemplo, de videoclips). Atendendo à expansão de media e de canais de divulgação, os exemplos seleccionados foram desenvolvidos a partir dos anos 2000, sensivelmente quando a internet se torna um sistema viável de veiculação da música pop.

Passamos então à descrição sintética dos exemplos seleccionados nesta primeira fase.

Fig. 22: 100th Window Tour dos Massive Attack (UVA, 2003)

Os live visuals para a100th Window Tour (2003) dos Massive Attack, sendo generati- vos, exploram a “representação digital de informação, usando notícias em tempo-real”, enquanto promovem “sincronização perfeita entre a música e os visuais”, através do 2.1. Selecção de exemplos 59

hardware e software construído pelos United Visual Artists (United Visual Artists, 2008).61 Este exemplo destaca-se de devido à sua dimensão actualizável, sincronizando a música com elementos visuais, apresentados em tempo-real mediante informações relevantes relativas a cada um dos locais específicos nos quais as performances aconte- cem, e tendo sido reconstruído três vezes, em 2004, 2006 e 2008.

Fig. 23: Demon Days Live dos Gorillaz, Manchester Opera House (Zombie Flesh Eaters, 2005)

Dos live visuals para a performance ao vivo do Demon Days (2005) dos Gorillaz, fa- zem parte animações, marionetas, e outros componentes imagéticos para construir uma narração particular à volta dos personagens fictícios que compõe a banda62. Esta performance teve lugar em apenas dois locais, na Manchester Opera House em Manchester (Inglaterra), de 1 a 5 de Novembro de 2005, e no Apollo Theater em Harlem (Nova Iorque, EUA), de 2 a 6 de Abril de 2006. Sendo que a banda é virtual, este exemplo destaca-se porque os componentes da performance, os live visuals, se relacionam directamente com outros desdobramentos da banda, como os videoclips, o artwork do álbum ou os conteúdos do website.

61 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em http://uva.co.uk/work/massive-attack. 62 Enquanto , o único dos dois membros do projecto que participa na produção musical, era apenas uma silhueta negra a um canto do palco, cantando e tocando atrás de uma cortina translúcida, e Jamie Hewllet, o segundo dos dois elementos de carne e osso da banda, participava através dos componentes visuais de sua criação. 60

A app Biophilia (2011) de Björk é uma aplicação interactiva, na qual uma galáxia en- globa vários jogos que exploram a construção imagética e sonora de determinada faixa do álbum. Os M/M Paris são creditados como designers da aplicação, desenvolvida por Scott Snibbe Studios63, sendo os vários jogos individuais que compõem a app igualmente creditados a outros colaboradores. Este exemplo destaca-se das formas tra- dicionais de veiculação da música pop, nomeadamente do álbum físico clássico, por- que através dele as músicas podem ser alteradas segundo as acções do utilizador, sendo sempre acompanhadas por componentes visuais correspondentemente responsivas

Fig. 24: Interface da app Gossamer dos Passion Pit (Scott Snibbe Studios, 2012)

A app Gossamer (2012) é uma aplicação interactiva dos Passion Pit construída pelos Scott Snibbe Studios.64 De modo semelhante à Biophilia App, permite “quebrar” sons e imagens através do toque do utilizador, permitindo a alteração da componente visual e musical, através da interacção com o dispositivo móvel.

63 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em http://www.snibbe.com/biophilia/. 64 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em http://www.snibbe.com/passionpit. 2.1. Selecção de exemplos 61

Fig. 25: Varúð, The Valtari Film Experiment dos Sigur Rós (Ryan Mcginley, 2012) Fig. 26: Varðeldur, The Valtari Film Experiment dos Sigur Rós (Melika Bass, 2012) Fig. 27: Valtari, The Valtari Film Experiment dos Sigur Rós (Christian Larson, 2012) 62

A The Valtari Film Experiment (2012) dos Sigur Rós é uma estratégia promocional baseada num concurso, do qual resultaram dezasseis curtas-metragens que servem de videoclip a cada uma das músicas do álbum.65 Segundo o website da banda, “como não lhes apetecia muito falar sobre ele [o álbum] ”, “pediram a uma série de realizadores talentosos para fazer o que quisessem para acompanhar a sua música” (Sigur Rós, 2012). Este exemplo destaca-se porque foram feitos videoclips para todas as faixas do álbum, contrariando a lógica dos singles.66

Fig. 28: Just a Reflektor dos Arcade Fire (Google Creative Lab, AATOAA, 2013)

Just a Reflektor (2013) é um website, construído pelo estúdio AATOAA, que funcio- na como um videoclip interactivo para o single Reflektor dos Arcade Fire, e é uma das experiências do Google Creative Lab.67 Enquanto a música se ouve inalterada, o utilizador pode modificar a componente visual (ou seja, o videoclip) de diferentes ma- neiras ao longo da experiência. Por exemplo, em vários momentos pode ser controlada a posição e intensidade de um feixe de luz (como uma lens flare inicialmente, depois como uma reflexo de luz num espelho, por exemplo), enquanto noutras situações a acção do utilizador fragmenta uma série de feeds de vídeo, influenciando também

65 A descrição do projecto pelo projecto musical e os vários videoclips resultantes deste projecto podem ser consultados em http://www.sigur-ros.co.uk/valtari/videos/. 66 Um single é, tipicamente, uma música representativa de determinado álbum (sendo também expectável que seja a mais popular) lançado separadamente (embora normalmente faça parte) do álbum em si. Os formatos utili- zados para o seu lançamento são diversos (edição física, download digital) mas este é, normalmente, acompanhado por artwork próprio e por um videoclip. 67 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em http://www.aatoaa.com/. 2.1. Selecção de exemplos 63

níveis de saturação e luminosidade da imagem, ou comanda uma série de vectores opostos a vários vértices fixos numa figura dançante. Estas alterações são feitas através do toque (no iPad) ou de cliques e movimentos do rato (no computador).68

Polyfauna (2014) é uma aplicação interactiva fruto da “colaboração experimental” entre , Nigel Godrich, Stanley Donwood e Universal Everything (Uni- versal Everything, 2014), que permite explorar um ambiente virtual num dispositivo móvel.69 Destaca-se como exemplo de um produto associado ao universo conceptual de uma banda sem, no entanto, promover nenhuma edição musical em particular. A sua autoria é repartida entre o projecto musical e o estúdio que desenvolveu a app, assinada pela banda e pelos Universal Everything (quando normalmente é o projecto musical que detém os créditos).

Fig. 29: Modelos imprimíveis no videoclip de We Are Explorers dos Cut Copy (Party, 2014)

We Are Explorers (2014), dos Cut Copy, é um videoclip para o single homónimo, realizado por Aramique Krauthamer e Masa Kawamura, do estúdio Party.70 Este exemplo destaca-se porque toma partido da impressão 3D, sendo que os ficheiros para imprimir em 3D os modelos utilizados foram disponibilizados online (gratuitamente), encorajando os fãs a criar o seu próprio videoclip.71

68 O videoclip interactivo pode ser acedido em http://www.justareflektor.com/. 69 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em: http://www.universaleverything.com/projects/polyfauna/. 70 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em: http://prty.jp/project.html?p=cutcopy-weareexplorers. 71 Pode ser feito o download do bundle (que contém os os modelos imprimíveis) em: https://bundles.bittorrent.com/bundles/weareexplorers. 64

A capa do álbum Why Make Sense (2015) dos Hot Chip destaca-se como exemplo de um desdobramento que se destaca das formas tradicionais de disseminação da música pop devido à técnica inovadora utilizada na sua impressão, que faz com que existam cerca de 130,000 variações do artwork da capa, construída por Nick Relph, Matthew Cooper.72 A cada impressão a cor do fundo muda, e o padrão composto por dois elementos é reconfigurado, sendo um desses elementos realinhado.

Fig. 30: Interface da app John Moose dos John Moose (2015)

John Moose App (2015) dos John Moose, é uma aplicação interactiva através da qual o álbum homónimo pode ser ouvido gratuitamente apenas se o utilizador estiver na floresta.73 Este exemplo de desdobramento da música pop numa app destaca-se por- que, tendo sido desenvolvido para dispositivos móveis, segundo o universo conceptual construído pela banda, aplica restrições específicas à audição do álbum.

Fig. 31: Interface do No Fun dos The Presets no Google Cube (Google Creative Lab, 2015)

72 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em: http://thecreatorsproject.vice.com/blog/inside-hot-chips-100000-album-covers. 73 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em http://johnmoosemusic.com/prerelease/. 2.2. Análise 65

No Fun (2015) é um single dos The Presets lançado através da plataforma Google Cube, desenvolvida em colaboração com Google Play para o Google Chrome. Uma das experiências do Google Creative Lab, através da plataforma o utilizador “joga” com as faces diferentes do cubo.74 A cada face está associado um vídeo e uma das layers da música, fazendo com que a manipulação do cubo destaque determinados vídeos e layers. Ou seja, permite explorar os diferentes níveis de destaque do som e da imagem, construindo variações na música enquanto é reproduzida. Este é outro exemplo de um produto que explora canais de disseminação da música além dos tradicionais, tendo sido desenvolvido especificamente paraweb , nomeadamente para o browser Google Chrome, tanto em computadores como em dispositivos móveis.

2.2. Análise

No sentido de analisar os desdobramentos seleccionados, expandimos o contexto no qual se inserem estudando os diferentes produtos e estratégias utilizados pelos projec- tos musicais ao longo do tempo, de acordo com cada edição musical.

Para tal foram consideradas edições de projectos musicais, entendendo um projec- to musical como um todo, que inclui a pessoa singular ou conjunto de pessoas que normalmente detêm a autoria da edição musical, por exemplo Björk ou Philip Glass (pessoas singulares) ou Radiohead ou Massive Attack (colectivos). Uma edição musi- cal é a expressão total resultante dos esforços de produção musical e visual, creditada ao projecto musical, normalmente encabeçado pelo álbum físico ou digital (como produto principal da edição). Da edição faz parte a música veiculada pelo álbum e todos os desdobramentos que de alguma maneira revertem para o produto principal. Consideramos como edições, por exemplo, Biophilia (2011) de Björk, que engloba, nomeadamente, álbum físico, app e videoclips, ou The King of Limbs (2011) dos Ra- diohead, que engloba álbum físico, jornal promocional, videoclips.

74 A plataforma pode ser acedida através do link: http://nofun.thepresets.com/. 66

Arcade Fire Fig. 32: Esquema de observação do levantamento das edições musicais Neon Bible (2007) The Suburbs (2010) Reflektor (2013) Björk

Homogenic (1999) Vespertine (2001) Medúlla (2004) Volta (2007) Biophilia (2011) Vulnicura (2015) Cut Copy

Free Your Mind (2013) 1 Gorillaz 2 Demon Days (2005) 3 The Fall (2011) Hot Chip

Why Make Sense? (2015) 4 John Moose 5 John Moose (2015) 6 Massive Attack 7 100th Window (2003) 8 Heligoland (2010) 9 Passion Pit

Gossamer (2012) Radiohead 10 The Bends (1995) 11 OK Computer (1997) 12 Kid A (2000) 13 Amnesiac (2001) 14 Hail to the Thief (2003) In Rainbows (2007) The King of Limbs (2011) Sigur Rós

Valtari (2012) The Presets

No Fun (2015)

1. Dispositivo móvel 4. App 10. Colaboração por concurso (5 em 26) (4 em 26) (3 em 26) 2. Espaço expositivo 5. Live visuals 11. Distribuição de conteúdos online (3 em 26) (3 em 26) (3 em 26) 3. Online 6. Material impresso 12. File-sharing (9 em 26) (5 em 26) (2 em 26) 7. Tipo de video/filme 13. Guerrilla marketing (4 em 26) (2 em 26) 8. Website 14. Streaming (3 em 26) (3 em 26) 9. Videoclip interactivo (4 em 26) 2.2.1. Tipologias de desdobramentos 67

A análise incidiu, portanto, nas principais edições dos projectos musicais associados aos exemplos seleccionados anteriormente, no sentido de identificar:

(1) Quais as tipologias de desdobramentos (um videoclip, um livro, uma app).

(2) Quais as estratégias de disseminação (viral marketing, colaboração por concurso).

(3) Quais as plataformas utilizadas e as suas possibilidades (um browser, no geral, como o Google Chrome, ou um website, em particular, como o YouTube ou uma página com domínio próprio, ou um dispositivo como o iPad).

(4) Quais os colaboradores associados aos desdobramentos, particularmente no âmbi- to da sua reincidência.

2.2.1. Tipologias de desdobramentos

Produtos independentes

Identificamos produtos que dentro da edição musical, funcionam de forma indepen- dente (e como tal são normalmente pagos), a par com o álbum físico ou digital. Podem ser, por exemplo, exposições, livros ou edições especiais de singles físicos.

A exposição Björk (2015)75 no MoMA, por exemplo, partilha esforços promocionais com o álbum de Björk Vulnicura (2015), sendo que a edição e a exposição estão, nesse sentido, intrinsecamente associadas. Associada à mesma edição foi lançado também um livro, Björk: Archives (2015),76 que embora não seja um catálogo da exposição coincidiu com o lançamento do álbum e com a exposição, e foi supervisionado pela Björk e por Klaus Biesenbach, curador no MoMA. O lançamento do livro Björk (2001),77 de forma semelhante, coincide com o lançamento do álbum Vespertine (2001) partilhando, entre outras coisas, a colaboração dos M/M Paris.

75 A descrição da exposição pelo MoMA pode ser consultada em: https://www.moma.org/visit/calendar/exhibitions/1501. 76 O livro está disponível para compra em http://www.thamesandhudson.com/Bjork/9780500291948. 77 O livro pode ser consultado parcialmente em: http://www.mmparis.com/bjorkasabook/bjorkasabook01.html. 68

Fig. 33: Fotograma do videoclip de Black Lake (Andrew Thomas Huang, 2015) Fig. 34: Björk, MoMA, Nova Iorque, EUA (2015) Fig. 35: Björk: Archives (Björk, Klaus Biesenbach, 2015) 2.2.1. Tipologias de desdobramentos 69

Associado à edição The King of Limbs (2011), dos Radiohed, o jornal The Universal Sigh é também um produto que existe independentemente de outros desdobramentos (que se destaca por ser gratuito), contendo artwork, letras de músicas e contos referen- tes ao universo conceptual do álbum. Existem também exemplos de singles físicos que se destacam tanto quanto o álbum (enquanto produto “principal” da edição”), como o vinil cut-on-site de um single dos Cut Copy. Antes do lançamento do álbum, foram cortados, no local, 120 vinis do single Let Me Show You Love (na altura chamado Let Me Show You), que seria eventualmente incluído no álbum Free Your Mind (2013).78

Produtos documentais

Foram identificadas tipologias resultantes de um esforço de documentação dos proces- sos de produção e disseminação de determinada edição musical, como documentários ou concert films.

O documentário Meeting People Is Easy (1998) de Grant Gee, por exemplo, tem como base a world tour do OK Computer (1997) dos Radiohead, e o DVD The Most Gigantic Lying Mouth of All Time colecciona os conteúdos disponibilizados no website oficial da banda durante a promoção do Hail to the Thief (2003), como short films, videoclips e live webcasts, ou seja, elementos da produção e disseminação da edição. O documen- tário When Björk Met Attenborough (2013) no Channel 4, que estreou sensivelmente dois anos depois do lançamento da edição musical, figura Björk a conversar com David Attemborough sobre a composição, produção, e o universo conceptual do Biophilia. No concert film Björk: Biophilia Live (2014),79 realizado por Peter Strickland e Nick Fenton, podemos ver a performance ao vivo incluída na Biophilia Tour, no Alexandra Palace em Londres, a 3 de Setembro de 2013.

Live visuals

Destacamos também tipologias resultantes da exploração de novas possibilidades técnicas associadas à performance ao vivo. Essas tipologias podem ser live visuals, instrumentos que são simultaneamente esculturas, ou até hologramas. Os live visuals

78 Uma descrição desta estratégia pode ser consultada em: http://consequenceofsound.net/2013/07/listen-to-new-cut-copy-let-me-show-you/. 79 When Björk Met Attenborough e Björk: Biophilia Live estão disponíveis em: http://www.biophiliathefilm.com/#watch. 70

generativos da 100th Window Tour (2003) dos Massive Attack que já foram descritos, por exemplo, são um exemplo da geração de visuais sincronizados com a música em tempo real. Através de hologramas, produzidos pela Musion Eyeliner System, os Go- rillaz (uma banda virtual) actuaram “ao vivo” nos 48th Annual Grammy Awards em 2006,80 para promover a edição Demon Days (2005).

Fig. 36: Hologramas dos Gorillaz, e Madonna, nos 48th Annual Grammy Awards (2006) Fig. 37: Set-up da Biophilia Tour (2011)

Na edição Biophilia (2011) de Björk foram utilizados, na composição musical e consequente gravação, instrumentos criados especificamente para o projecto (como a gravity pendulum harp, criada por Andy Cavatorta), instrumentos raros que já existiam antes do projecto mas que nunca tinham sido utilizados no âmbito da música pop (como o sharpsichord, criado por Henry Dagg) e ferramentas reapropriadas enquanto instrumentos musicais (como o tesla coil, desenvolvido em 1891 por Nikola Tesla).81 Estes instrumentos foram também utilizados nas performances ao vivo. As performan- ces ao vivo da Biophilia Tour, quando em salas capazes de suportar todo o hardware necessário, eram compostas por um palco central circular, onde estavam dispostos os

80 A descrição da actuação no website oficial dos Grammys pode ser consultada em: http://www.grammy.com/awards/48th-annual-grammy-awards. 81 Descrições de alguns dos instrumentos desenvolvidos para Biophilia podem ser consultadas em: http://thecreatorsproject.vice.com/blog/a-guide-to-bj%C3%B6rks-custom-ibiophiliai-instruments. 2.2.1. Tipologias de desdobramentos 71

vários instrumentos, circunscrito por oito ecrãs flat-screen, onde se podiam ver vários componentes visuais associados às apps.

Tipologias online

Identificamos tipologias associadas à internet e às suas possibilidades, que podem ser tão gerais como um website ou tão específicos como blips, pequenos clips de existência exclusivamente online, usado pelos Radiohead para a promoção do Kid A (2000). Por exemplo, para a promoção do Hail to the Thief o website oficial dos Radiohead foi transformado no radiohead.tv, que disponibilizava conteúdos exclusivos referentes à produção e disseminação da edição segundo um horário, como um canal de televisão, tomando partido das possibilidades de actualização das plataformas online. O website oficial dos Gorillaz, durante a promoção do Demon Days e em concordância com o guerrila marketing dessa edição,82 funcionava como uma plataforma que permitia actualização de conteúdos, comunicações por parte da banda, e a colaboração do pú- blico. De acordo com outra estratégia, os dois modelos que figuram no videoclip do single We Are Explorers, da edição Free Your Mind dos Cut Copy, podem ser impressos em 3D atendendo ao download de um ficheiro digital disponibilizado pela banda.

Reconfiguração do videoclip

Destacamos tipos de videoclips cuja produção e recepção se destaca dos videoclips “tradicionais”, alemejando reconfigurar o papel do público de alguma maneira. Estes videoclips podem ter formatos inovadores e pouco usados, podem-se tornar ou partir de uma curta-metragem, ou ser uma das aplicações online conhecidas como “video- clips interactivos”. O videoclip para o single Wanderlust, do álbum Volta (2007) de Björk realizado por Encyclopedia Pictura, por exemplo, foi feito em stereoscopic 3D e, como tal, pode ser visto em 3D, com os óculos apropriados.83

O videoclip interactivo para o single Neon Bible,84 do álbum homónimo de 2007 dos Arcade Fire, permite a alteração do componente visual segundo cliques do rato, fun- cionando no browser da internet, como uma página web com domínio próprio.85 Para

82 Uma descrição deste guerrila marketing pode ser consultada em http://www.nme.com/reviews/gorillaz/7653. 83 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em http://encyclopediapictura.com/video/bjork/. 84 O videoclip interactivo pode ser acedido em http://www.beonlineb.com/. 85 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em http://www.aatoaa.com/. 72

o single We Used to Wait, da mesma banda, o videoclip interactivo foi uma experiência do Google Creative Lab, de nome The Wilderness Downtown (2010).86 Realizado por Chris Milk, o videoclip usa o Google Maps para justapor o vídeo que figura a banda com imagens de satélite de ruas (o objectivo será o utilizador partilhar qual a sua mora- da de infância).87 O videoclip interactivo realizado para o single Sprawl II (2011),88 do mesmo projecto musical, funciona através da webcam que, usando a imagem do utili- zador como input, faz com que este altere a componente visual do videoclip através de dança.89 O investimento dos Arcade Fire neste tipo de desdobramento culmina com o Just a Reflektor (2013), também uma experiência do Google Creative Lab um website que funciona como um videoclip interactivo para o single Reflektor do álbum homó- nimo.90 Também o videoclip do single No Fun dos The Presets, que não está ainda associado a nenhuma edição em particular, funciona como um videoclip interactivo a partir de uma plataforma online, desenvolvida também pelo Google Creative Lab.

Fig. 38: Interface do Neon Bible dos Arcade Fire (AATOAA, 2007) Fig. 39: Interface do Sprawl II dos Arcade Fire (AATOAA, 2011)

Os Sigur Rós recorreram a um projecto, titulado The Valtari Mistery Film Experiment, para promover o álbum Valtari (2012), segundo o qual foram realizados múltiplos videoclips para as várias faixas do álbum, pelo menos um para cada música (sendo que algumas músicas ficaram com mais do quem um videoclip). Fugindo à lógica do sin- gle, que normalmente resulta num número reduzido (entre três a cinco, normalmente) videoclips por edição musical, deste projecto resultaram dezasseis videoclips. Outro

86 O videoclip interactivo pode ser acedido em http://www.thewildernessdowntown.com/. 87 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em: https://www.chromeexperiments.com/experiment/the-wilderness-downtown. 88 O videoclip interactivo pode ser acedido em http://www.sprawl2.com/. 89 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em http://www.aatoaa.com/. 90 Ao contrário dos videoclips interactivos anteriores, no entanto, um videoclip clássico foi realizado por Anton Corbijn para o mesmo single. 2.2.1. Tipologias de desdobramentos 73

desdobramento que se destaca do videoclip clássico, a curta-metragem Scenes from the Suburbs (2011), realizada por Spike Jonze, é uma versão alargada do videoclip para o single The Suburbs (2010) do álbum homónimo dos Arcade Fire.

Aplicações móveis

Evidenciamos também desdobramentos optimizados para dispositivos móveis. As apps, por exemplo, tiram partido das possibilidades de actualização e geolocalização integradas nos dispositivos móveis. Como tal, através da app Biophilia de Björk, cada single foi lançado como uma expansão da app principal (a mother-app). As apps dos Radiohead e dos John Moose, a Polyfauna (2014) e a homónima John Moose (2015), recorreram à localização geográfica do utilizador, promovendo a exploração intui- tiva de um ambiente virtual e aplicando restrições específicas à audição do álbum, respectivamente.

Fig. 40: Synchronised artwork para o single The Suburbs dos Arcade Fire (AATOAA, 2011)

Para o single The Suburbs, do álbum homónimo dos Arcade Fire, foi desenvolvido um booklet digital (que o autor, Vincent Morisset, chamou de synchronised artwork) que recorre às características particulares do iPod. Ao ficheiro musical digital no dispositivo podem estar associadas imagens e, como tal, as faixas musicais que se ouvem através dele tendem a ser acompanhadas com artwork do álbum, normalmente, uma capa. Para este desdobramento, no entanto, a música foi quebrada em vários segmentos, cada um apresentando um artwork diferente (associado ao booklet físico) e a letra da música correspondente ao segmento áudio que se faz ouvir, criando um efeito 74

dinâmico tipo-karaoke.91 Noutro exemplo, foram espalhados billboards por várias cidades (Cidade do México, México; Santiago, Chile; Moora, Austrália; Blaina, Pais de Gales; Detroit, Michigan, EUA; e no deserto da Califórnia) através dos quais, usando um smartphone ou tablet, se tinha acesso ao single Free Your Mind, do álbum homónimo dos Cut Copy.92

2.2.2. Estratégias de disseminação

Disseminação online

Na disseminação das edições analisadas identificamos como prática recorrente, que se destaca de estratégias promocionais comummente empregadas, a utilização de estraté- gias online. Os Radiohead, por exemplo, recorreram à distribuição online de conteúdos na promoção de várias edições musicais. Para o álbum Kid A foram distribuídos online “blips”, pequenos clips associados a excertos de várias faixas do álbum93, e para o Hail to the Thief, o website oficial da banda foi alterado, mostrando animações associadas ao universo conceptual da edição. O website transformou-se depois no radiohead.tv, que continha short films, videoclips e live webcasts, ou seja, conteúdo criado pela banda que podia ser acedido pelo público.

Para promover a edição Volta de Björk, foi utlizado viral marketing, uma estratégia de marketing que usa plataformas online pré-existentes para distribuir elementos de curta-duração que se replicam incessantemente, espalhando-se por várias plataformas online, como um vírus. O primeiro elemento do viral marketing foi uma versão distor- cida da música Earth Intruders (que seria o primeiro single do álbum) no YouTube, que depois se expandiu também para o MySpace, bem como outras plataformas, chegando finalmente à rádio (onde se ouviu o single por inteiro pela primeira vez). O single ficou depois disponível online através de file sharing.

Algumas estratégias online têm como objectivo lançar uma plataforma, e fazem-no através de um single pop. Por exemplo, The Wilderness Downtown é um videoclip

91 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em http://www.aatoaa.com/. 92 Uma descrição desta estratégia pode ser consultada em: http://pitchfork.com/news/51984-cut-copy-share-new-single-free-your-mind-via-billboards-across-the-world/. 93 O projecto musical recorreu a esta estratégia, em parte, porque não queria lançar singles. Segundo a banda, não foi uma decisão artística, mas pessoal, vendo o sucesso do álbum anterior como uma experiência extenuante (Radiohead, 2008). 2.2.2. Estratégias de disseminação 75

interactivo single We Used to Wait, do álbum The Suburbs dos Arcade Fire, desenvolvido no sentido de promover o então novo Google Chrome, e consequentemente o Google Maps. O single No Fun (2015) dos The Presets foi lançado através de uma aplicação tipo-videoclip interactivo, que almejava promover não só a música mas também o Google Cube, que aspira a ser uma plataforma de disseminação de música e vídeo.

Fig. 41: The Wilderness Downtown (Google Creative Lab, Arcade Fire, Chris Milk, 2010)

Algumas estratégias online promovem o envolvimento do público. Para promover o álbum Demon Days, por exemplo, os Gorillaz recorreram ao guerrilla marketing, distri- buindo autocolantes e promovendo a disseminação de , incluindo também um concurso para que o público se tornasse colaborador. Também os Arcade Fire recorre- ram ao guerrilla marketing para promover o álbum Reflektor (2013),94 e na construção de desdobramentos do álbum In Rainbows (2007) dos Radiohead e do álbum Volta o público pôde participar através de concursos. Para a edição In Rainbows foi utilizada a estratégia online pay-what-you-want (onde o público podia decidir quanto queria pagar pelo álbum digital), e para o Kid A um java applet95, o “iblip”, permitia pre-order e streaming, promovendo a partilha do álbum.

94 Uma descrição desta estratégia pode ser consultada em: http://www.theguardian.com/global/2013/aug/06/arcade-fire-reflector-new--title. 95 Segundo Janet H. Murray, um applet é “a small application that runs on a mobile platform or other special- ized device and usually has highly focused functionality, such as a single game, an email program, or weather update” (Murray, 2011). 76

2.2.3. Plataformas

Espaços expositivos

Identificamos a utilização de espaços que não são comummente associados à músi- ca pop, como museus, festivais de cinema, e espaços expositivos afins. O MoMA (o Museu de Arte Moderna de Nova Iorque),96 por exemplo, aparece associado a vários desdobramentos durante quase duas décadas. O videoclip do single All is Full of Love (1999) do álbum Homogenic (1997) de Björk, realizado por Chris Cunningham, esteve em exposição permanente no MoMA,97 onde, em 2015, teve lugar a expo- sição Björk, cujos esforços promocionais estão alinhados com Vulnicura. Também o videoclip interactivo do single Neon Bible (2007), do álbum homónimo dos Arcade Fire, considerado o primeiro videoclip interactivo, foi exposto nesse museu. O Berlin International Film Festival98 e o Tribeca Film Festival99 são exemplos de festivais de cinema onde estrearam vídeos e filmes associados a edições musicais pop. Nestes festi- vais estrearam Scenes from the Suburbs e Björk: Biophilia Live, respectivamente.

Plataformas online

Existem plataformas online pré-existentes exploradas pela música pop, e plataformas novas que se associam à música pop para se promoverem. Em ambos os casos, estas plataformas estão normalmente incluídas num qualquer tipo de estratégias de disse- minação online.

Por exemplo, o viral marketing utilizado na promoção do Volta, começou no YouTube, passando para o MySpace, expandindo-se para outras plataformas online, tendo o single Wanderlust estreado no Yahoo Music, e o Declare Independence no AOL. Também os videoclips realizados para promover o álbum Valtari têm uma existência maioritaria- mente online, direccionados particularmente para plataformas onde se podem ouvir músicas inerentemente acompanhadas por uma secção vídeo, como o Vimeo e o You- tube. Ambas as plataformas oferecem possibilidades de partilha, promovendo uma

96 https://www.moma.org/. 97 É considerado o primeiro DVD single, de forma a suportar não só a faixa musical mas também o vídeo, enquanto produto audiovisual (Oldham, 2005). 98 https://www.berlinale.de/en/HomePage.html. 99 https://tribecafilm.com/festival/. 2.2.4. Colaborações 77

propagação dos vídeos por outro tipo de websites, como por exemplos blogs pessoais ou institucionais. Inversamente, por vezes plataformas online são promovidas através da música pop, como considerámos anteriormente segundo The Wilderness Downtown e No Fun.

Dispositivos móveis

Algumas plataformas resultam da exploração de dispositivos móveis, evidente, por exemplo, no booklet digital feito para o The Suburbs que funciona exclusivamente no iPod e iPhone. Este tipo de dispositivos oferece possibilidades tanto de produção como de disseminação da música pop, e promovem formas de veiculação específicas, como as apps. Exemplos de investimento nesta forma de veiculação incluem as apps Polyfauna, Biophilia, ou Gossamer (2012) dos Passion Pit, todas desenvolvidas exclusi- vamente para iPad. Existem, no entanto, apps para outro tipo de dispositivos móveis, com sistemas operativos tanto iOS como Android. O iPad pode também ser usado para produção musical, como é evidente no álbum The Fall(2011) 100 dos Gorillaz, gravado totalmente usando esse dispositivo.101 Os dispositivos móveis oferecem tam- bém possibilidades geolocalização, como considerado anteriormente em apps como John Moose ou Polyfauna.

2.2.4. Colaborações

Colaborações internas e externas

Sistematizámos, através das edições consideradas, dois tipos de colaborações: colabora- ções internas, quando o colaborador faz parte do projecto musical, e externas, quando o colaborador não faz parte do projecto musical. Normalmente, os projectos musicais recorrem a colaboradores fora da produção musical, e como tal as colaborações inter- nas tendem a ser uma minoria.

Exemplos de projectos musicais que recorrem a colaborações internas incluem os Go- rillaz, uma banda virtual constituída por Damon Albarn e Jamie Hewlett, responsáveis pela componente musical e visual do projecto musical, respectivamente. A imagem da

100 Embora seja o quarto álbum da banda não é, popularmente, considerado como tal, e os críticos tendem a chamar-lhe um um “pet project” (Rolli, 2015). 101 A banda partilhou com o público as apps utilizadas para o fazer. 78

banda é totalmente construída através de elementos gráficos, como desenhos, e por extensão animações de vários tipos, desenvolvendo a sua presença comercial e cultural através de biografias falsas, tanto na internet como em livros, que não se enquadram em nenhuma edição em particular. Como tal, para a promoção da edição Demon Days, todos os conteúdos do website, entrevistas e outro tipo de participação pela banda virtual foram desenvolvidas, quase exclusivamente por Jamie Hewlett e a sua companhia Zombie Flesh Eaters. A banda John Moose recorreu a este tipo de esforço colaborativo para desenvolver a sua app homónima, tendo sido feita pelo baterista da banda. As restantes colaborações identificadas, como tal, estão associadas a colabora- dores externos.

Destacamos também alguns exemplos de colaborações externas nas quais o público colabora com o projecto musical. Neste tipo de esforços colaborativos o público par- ticipa construindo elementos associados a uma edição musical particular, como por exemplo um videoclip. Exemplos de colaborações por concurso já mencionadas in- cluem as utilizadas na promoção do Demon Days, In Rainbows, ou Volta. Para promo- ver o Valtari os Sigur Rós ofereceram total liberdade criativa tanto aos colaboradores por eles escolhidos como aos colaboradores escolhidos por concurso. Isto deve-se, em parte, à evolução da tecnologia e à maior acessibilidade monetária e geográfica, que faz com que várias pessoas (o concurso contou com mais de 800 participantes) tenham o material necessário para construir videoclips para um projecto musical pop.

Recorrência

Evidenciamos que os projectos musicais tendem a recorrer a um colaborador externo particular na construção dos vários desdobramentos de uma edição musical específica. Acrescentamos também que, quando um colaborador é recorrente numa edição musi- cal particular, tende também a sê-lo noutras edições do projecto musical. Destacamos neste estudo, como exemplo, os esforços colaborativos dos Arcade Fire, Björk, Massive Attack e Radiohead.

Os Arcade Fire colaboraram pela primeira vez com o estúdio AATOAA102 no videoclip interactivo para o single Neon Bible, do álbum homónimo, tendo-o feito novamente na capa do álbum e elementos gráficos associados do The Suburbs,no booklet digital para o single com o mesmo nome, e no videoclip interactivo do single Sprawl II. A

102 http://www.aatoaa.com/. 2.2.4. Colaborações 79

capa do álbum e elementos gráficos associados do Reflektor são da autoria de Caroline Roberts,103 que também foi responsável pelo símbolo utilizado no guerrilla marketing e é creditada no videoclip interactivo Just a Reflektor, cujo autor é Vincent Morisset.104 Tanto Roberts como Morisset são ambos colaboradores do estúdio AATOAA.

Fig. 42: Fotograma do videoclip de Hidden Place de Björk (M/M Paris, Inez and Vinoodh, 2001) Fig. 43: Capa do single Hidden Place de Björk (M/M Paris, Inez and Vinoodh, 2001) Fig. 44: Capa do álbum Vespertine de Björk (M/M Paris, Inez and Vinoodh, 2001) Fig. 45: Livro Björk (M/M Paris, 2001)

O videoclip para o single Hidden Place, do Vespertine, marca a primeira colaboração de Björk com os Inez and Vinoodh105 e os M/M Paris106. Estes colaboradores fo- ram responsáveis pela capa do álbum e os elementos gráficos a ele relacionados, e os M/M Paris são autores do livro Björk, associado à mesma edição musical. Este esforço

103 http://caroline-robert.com/. 104 http://www.vincentmorisset.com/. 105 http://inezandvinoodh.com/. 106 http://www.mmparis.com/. 80

colaborativo foi repetido para as capas, e elementos gráficos associados, dos álbuns Volta, Biophilia e Vulnicura. Os M/M Paris também foram responsáveis pelo website oficial da artista islandesa durante a promoção do Biophilia, tal como pelo interface principal da app. David Attemborough, depois de ter colaborado no livro Björk, serve como narrador para a app Biophilia e para as performances ao vivo da Biophilia Tour, participando também no documentário When Björk Met Attenborough. Michael Gon- dry107 é também um colaborador recorrente nas edições de Björk, tendo colaborado pela primeira vez com a artista islandesa no videoclip para o single Human Behaviour, do álbum Debut (1993), e pela oitava (e até agora última) vez no videoclip do single Crystalline, do álbum Biophilia.

Os United Visual Artists108 colaboraram com os Massive Attack nos live visuals da- 100th Window Tour, e consequentes actualizações em 2004, 2006 e 2008, e da World Tour (2010), mantendo uma relação colaborativa continua, que se estende a outros desdobramentos. Realizaram também o videoclip para o single United Snakes, do ál- bum Heligoland (2010), e participaram no projecto artístico Massive Attack vs Adam Curtis (2013), partilhando a autoria com Robert del Naja dos (membro dos Massive Attack).

Fig. 46: Fotograma do videoclip de United Snakes dos Massive Attack (UVA, 2010) Fig. 47: Massive Attack vs Adam Curtis (Robert del Naja, Adam Curtis, UVA, 2013)

Começando com o The Bends (1995), Stanley Donwood109 irá ser responsável pela capa do álbum e os elementos gráficos associados de todos os álbuns dos Radiohead até ao mais recente The King of Limbs. Donwood é também responsável por todo universo visual da banda, contribuindo com os seus desenhos, participando tanto em

107 http://www.michelgondry.com/. 108 http://uva.co.uk/. 109 http://www.slowlydownward.com/. 2.3. Conclusões 81

componentes gráficos (livros, jornais, posters, etc.) como no ambiente virtual da app Polyfauna.

Evidenciamos também que certos autores são recorrentes entre edições de diferentes projectos musicais, particularmente porque a sua área de actividade está relacionada com fenómenos emergentes. Exemplo disso será Scott Snibbe110 que, através de Scott Snibbe Studios, desenvolveu uma série de apps, incluindo Biophilia e Gossamer.

2.3. Conclusões

Segundo o levantamento realizado das várias edições musicais e os desdobramentos a ela associados, procurámos sistematizar tipologias de desdobramentos, estratégias de disseminação, plataformas e esforços colaborativos que se destaquem das formas tradicionais de veiculação da música pop. Para tal comparámos as diferentes edições dos vários projectos, tirando as seguintes conclusões.

2.3.1. Investimento em desdobramentos

O crescente investimento em desdobramentos que se destacam das formas tradicionais de veiculação da música pop é especialmente evidente em bandas com um impacto comercial e cultural maior, como Björk, Radiohead, Massive Attack, ou Arcade Fire. Björk, por exemplo, a partir do Volta de 2007, usa a internet como plataforma de disseminação, investindo em viral marketing, desenvolvendo videoclips optimizados para plataformas online ou promovendo concursos online. Em 2011 investiu em dispositivos móveis, com a app Biophilia, associada a uma edição da qual fizeram parte, nomeadamente, uma tour, um filme sobre essa tour, um documentário sobre os processos criativos usados pelo projecto musical e colaboradores, e uma série de instrumentos criados propositadamente para a composição, gravação, e performance musical. Em 2015, associou ao álbum Vulnicura uma exposição, curtas-metragens, um livro, entre outros produtos.

Outros projectos musicais só recentemente, sensivelmente a partir de 2012, come- çaram a recorrer a estratégias e produtos semelhantes, especialmente devido à demo- cratização de ferramentas para o seu desenvolvimento. Evidenciando esse fenómeno, a banda John Moose desenvolveu um app para o álbum de estreia homónimo de

110 http://www.snibbe.com/. 82

Fig. 48: Esquema de observação do levantamento dos desdobramentos OK Computer (1997) Meeting People Is Easy (1998) Kid A (2000) radiohead.tv (2003) 100th Window Tour (2003) The Most Gigantic Lying Mouth of All Time (2004) Reject False Icons (2005) In Rainbows (2007) Neon Bible (2007) Volta (2007) Wanderlust (2007) The Suburbs (2010) Biophilia App (2011) 1 Biophilia Tour (2011) Scenes from the Suburbs (2011) Sprawl II (2011) 2 The Fall (2011) 3 The Universal Sigh (2011) 4 The Wilderness Downtown (2011) Gossamer App (2012) The Valtari Mistery Film Experiment (2012) 5 Free Your Mind (2013) Just a Reflektor (2013) Let Me Show You Love (2013) Reflektor (2013) We Are Explorers (2013) When Björk Met Attenborough (2013) Björk: Biophilia Live (2014) Polyfauna (2014) Björk (2015) Björk: Archives (2015) John Moose App (2015) No Fun (2015) Why Make Sense (2015)

1. Experimentação com 2. Disseminação online 5. Ocupa espaços associados aos (15 em 34) 5. técnicas emergentes 5. dispositivos móveis (10 em 34) 3. Participação do público na disseminação (5 em 34) (6 em 34) 4. Promove acção do público

4. além de ouvir e/ou ver (12 em 34) 2.3. Conclusões 83

2015 sem recorrer a colaboradores externos (a app foi feita pelo baterista do projecto musical). Os Cut Copy, cuja actividade começou em 2001, só recorrem a billboards que remetem para conteúdo online (através de dispositivos móveis), free streaming e file sharing de modelos para impressão 3D em 2013. Em actividade desde 2000, tendo assinado com uma editora oficialmente em 2003, os Hot Chip utilizaram a técnica de impressão inovadora na capa do álbum Why Make Sense? em 2015. De modo seme- lhante, os The Presets, em actividade desde 2003, apenas se associaram à plataforma online Google Cube com o single No Fun, em 2015, a convite do Google Creative Lab. A app Gossamer dos Passion Pit, do mesmo estúdio responsável por Biophilia, mostra alguma das intenções presentes na app de Björk, oferecendo possibilidades de criação numa escala mais reduzida. Por exemplo, Biophilia oferece um total de dez apps, cada uma associada a uma música do álbum, enquanto Gossamer oferece apenas uma app contendo duas músicas.

Fig. 49: Free Your Mind billboards dos Cut Copy (2013)

2.3.2. Diversificação de desdobramentos

As estratégias e produtos considerados para análise não se costumam repetir entre as edições do mesmo projecto musical, por exemplo, os vários dos desdobramentos usados pela Björk no Volta, como o viral marketing, o videoclip em stereoscopic 3D, ou as colaborações por concurso não foram repetidos em nenhuma das duas edições se- guintes. De modo semelhante, o lançamento do álbum através de uma app, usado no Biophilia, não foi repetido na edição que lhe sucedeu. Os blips utilizados na promoção do Kid A dos Radiohead não foram incluídos na promoção das seguintes edições da 84

banda, o website tipo canal televisivo radiohead.tv ficou unicamente associado aoHail to the Thief e nenhum álbum a seguir ao In Rainbows, foi lançado através do sistema online pay-what-you-want. Também os Arcade Fire não repetiram desdobramentos ao longo das edições. O booklet digital para iPod e iPhone foi desenvolvido apenas uma vez, e para promover Reflektor a banda investiu pela primeira vez em guerrilla marketing.

2.3.3. Transversalidade das colaborações

Relativamente às colaborações, internas e externas, e à sua recorrência ao longo das edições dos vários projectos musicais, concluímos que estas tendem a ser transversais. Ou seja, sensivelmente a partir do início do século XXI, destacam-se colaboradores que participaram em vários desdobramentos dentro de uma edição, ou em várias edições do mesmo projecto musical. Exemplos incluem Damon Albarn e Jamie Hewllett, que compõem a banda virtual Gorillaz, sendo Hewllet responsável pela dimensão visual em todas as edições do projecto musical, os Massive Attack e os United Visual Artistas, que colaboram desde 2003, ou os Arcade Fire e o estúdio AATOAA (e elementos as- sociados como Vincent Morisset e Caroline Roberts) que colaboraram nas três últimas edições da banda canadiana. Stanley Donwood é colaborador dos Radiohead desde 1995, quando desenhou a capa para o The Bends, tendo contribuído para a criação de vários desdobramentos da banda desde então, incluindo a app Polyfauna em 2014. A Björk colabora com os M/M Paris e os Inez and Vinoodh desde o Vespertine de 2001 até ao Vulnicura de 2015, tendo também colaborado inúmeras vezes com Michael Gondry e David Attenborough.

2.3.4. Técnicas emergentes

Podemos também destacar uma gradual experimentação com técnicas emergentes, no sentido em que são técnicas usadas pela primeira vez no contexto da música pop. Por exemplo, o videoclip do single Wanderlust (2007) de Björk foi o primeiro videoclip feito em stereoscopic 3D. Os Radiohead foram a primeira banda pop a lançar a tota- lidade de um álbum, mesmo antes de o mostrar à crítica, através do sistema online pay-what-you-want, o videoclip para o single Neon Bible (2007) dos Arcade Fire foi creditado como o “primeiro videoclip interactivo” (AATOAA, 2007). Posteriormente, os Gorillaz lançaram o The Fall(2011), o primeiro álbum cuja composição e gravação musical foram feitas exclusivamente no iPad. De modo semelhante, os Cut Copy 2.3. Conclusões 85

investiram em possibilidades associadas à impressão 3D, os Hot Chip numa técnica de impressão até então nunca usada no presente contexto, e os John Moose não recorrem a uma colaborador externo para desenvolver a sua app.

2.3.5. Revalorização do suporte físico

Identificamos igualmente esforços no sentido de revalorizar o suporte físico da música pop. Embora as edições especiais (que podem ser edições pré-venda assinadas, edições com conteúdos extra, bundles que contêm o álbum físico e outros artigos, etc.) sejam uma solução comum para a contínua desvalorização do suporte físico da música, potenciada pela música enquanto ficheiro digital vendida online, identificámos desdo- bramentos que procuram outras maneiras de adicionar valor aos formatos físicos que veiculam a música.

Fig. 50: Capa do vinil deluxe edition do álbum Vulnicura de Björk (2015)

Por exemplo, para promover o álbum Vulnicura de Björk, a capa do vinil deluxe edi- tion111 contava com a artwork standard e com uma segunda capa em acetato, cujo grafismo seria mais tarde transformado num videoclip para o single Family, da mesma edição. O lançamento do single físico Let Me Show You Love (na altura chamado Let Me

111 A descrição do produto pela editora pode ser consultada em : http://indian.co.uk/shop/vulnicura-coloured-vinyl.html. 86

Show You) dos Cut Copy, que seria eventualmente incluído no álbum Free Your Mind, foi feito através de vinis cortados no local, resultando num objecto coleccionável raro, através de uma técnica analógica reapropriada, fazendo com que o público faça parte de um ritual (impossível online) que normalmente não está associado à compra de um single. Para a capa do álbum Why Make Sense? dos Hot Chip, foi utilizada uma técnica de impressão inovadora que faz com que cada álbum físico tenha artwork único.

Fig. 51: Variações da capa do álbum Why Make Sense? dos Hot Chip (2015)

2.3.6. Disseminação online

Concluímos que a internet se tornou, gradualmente, um meio popular para dissemi- nar a música pop. Embora a televisão e a rádio ocupem um lugar de destaque no final do século XX, e continuem a guardar alguma relevância até aos dias de hoje, no virar do século a internet destaca-se como o espaço no qual os projectos musicais tendem a investir. Os Radiohead, por exemplo, foram um dos primeiros projectos musicais a explorar as possibilidades da internet quando promoveram o álbum Kid A em 2000 através de blips distribuídos online a par com um java applet que permitia o streaming e a compra do álbum, ou quando para promover o álbum Hail to the Thief três anos depois criaram o radiohead.tv, que almejava mimetizar um canal televisivo.

Este investimento começa sensivelmente na primeira década do século XXI. Os desdobramentos online desenvolvidos nesse período reflectem particularmente uma experimentação com várias estratégias online sem seguir intenções conceptuais parti- culares. Por exemplo, na disseminação do álbum Volta a Björk apostou tanto em viral marketing destinado a plataformas online, como num videoclip em stereoscopic 3D cujo visionamento era condicionado, como em concursos que promoviam a colaboração do público que funcionavam através do website oficial do projecto musical, por e-mail, e outro tipo de sistemas de comunicação online. Os Radiohead lançaram o álbum 2.3. Conclusões 87

In Rainbows através do sistema online pay-what-you-want, pela primeira, e até agora única, vez.

Na segunda década do século XXI, os projectos musicais começaram a optimizar os desdobramentos de acordo com as plataformas utilizadas, criando novas formas de disseminação online. Para promover o álbum Valtari os Sigur Rós recorreram a uma estratégia que toma partido das possibilidades particulares de plataformas como YouTube ou Vimeo, e os Cut Copy investiram nas possibilidades online inerentes aos smartphones no sentido de apresentar o álbum Free Your Mind de forma gradual. Os Arcade Fire, por outro lado, criaram uma nova experiência online, introduzindo o conceito de videoclip interactivo em 2007 com o single Neon Bible, voltando a fazê-lo para o The Suburbs em 2010 e para o Reflektor em 2013, sempre com funcionalidades ligeiramente diferentes.

2.3.7. Compatibilidade de conteúdos

Consideramos também a existência de um investimento em produtos e estratégias cujos formatos são adequados para mais do que meio de disseminação, atendendo à ideia de que os media digitais estão cada vez mais relacionados, nomeadamente segundo compatibilidade de conteúdos.

Por exemplo, o interface principal do website oficial de Björk durante a promoção do Biophilia (sensivelmente entre 2011 e 2015) desenhado pelos M/M Paris tornou-se depois o interface principal da app Cosmogony, a mother-app da Biophilia. Os visuais desenvolvidos para as diferentes apps que compõem o projecto foram também utili- zados como videoclips, e figuraram nas performances ao vivo enquanto live visuals. Os visuais da app Hollow, por exemplo, foram posteriormente utilizados no videoclip do single homónimo, e na Biophilia Tour, mostrados nos ecrãs flat-screen. De modo semelhante, os mesmos processos de produção visual aplicados por Andrew Thomas Huang na capa da deluxe edition do álbum Vulnicura foram também utilizados num short music video para o single Family, que serviu também como clip promocional para a exposição Björk. 88

Fig. 52: Interface da app Hollow, da Biophilia (Björk, Scott Snibbe Studios, M/M Paris, 2011) Fig. 53: Set-up da Biophilia Tour (2011) Fig. 54: Fotograma do videoclip de Hollow de Björk (Drew Berry, 2012)

2.3.8. Papel do público na disseminação

As estratégias de disseminação da música pop, na sua maioria, partem do projecto musical, veiculando a música através de videoclips, material promocional, posters, ou anúncios televisivos. No entanto, existem formas de disseminação da música pop executadas, parcialmente, pelo público, nomeadamente através do seu envolvimento enquanto colaborador e da partilha online. Os Radiohead investiram em colaborações por concurso para promover o In Rainbows, associando-se ao website de animação Aniboom para criar um concurso através do qual o público submetia um storyboard de um videoclip para uma das faixas do álbum. O mesmo foi feito para Volta de Björk, no sentido de fazer um videoclip para o single Innocence.

Os Gorillaz incorporaram um concurso para o público no seu guerrilla marketing do Demon Days. A banda virtual partilhou, através do videoclip do single Rock It, a frase 2.3. Conclusões 89

“Reject False Icons”, revelando-se mais tarde ser uma estratégia promocional. Segundo essa estratégia, o público propagava autocolantes (disponíveis por um tempo limita- do através do website) e graffitis, partilhando esta disseminação no website da banda, servindo também como base para um concurso para o público chamado Search for a Star. Através desse concurso, segundo voto público, os vencedores colaboraram com a banda na construção de conteúdos extra para o lançamento do single El Mañana/Kids with Guns. De modo semelhante, para descobrir qual o novo projecto dos Arcade Fire (que se veio a saber ser o Reflektor de 2013) era necessário partilhar um símbolo em particular, tendo sido distribuídos materiais para que fosse reproduzido em qualquer lado e posteriormente fotografado e partilhado em redes sociais (Twitter, Facebook, Instagram), tendo culminado no lançamento do single Reflektor.

Fig. 55: Símbolo Reflektor (Caroline Roberts, 2013)

Também a estratégia de disseminação do álbum Free Your Mind dos Cut Copy inclui esforços por parte do público, tendo sido espalhados billboards por várias cidades a ser encontrados pelo público, através dos quais, com o website aberto no smartphone, se tinha acesso ao single. O videoclip do single We Are Explorers, da mesma edição musical, promove a partilha de um objecto físico (ou que se tornará físico) através de file sharing, potenciando criação alheia que está, no entanto, directamente associada ao projecto musical (porque o modelo imprimível foi feito para o vídeo).

2.3.9. Envolvimento do público

Evidenciamos que existe uma tendência para envolver o público através de colabora- ções por concurso ou estratégias como guerrilla marketing, bem como segundo um papel activo através de produtos como as apps. Isto é evidente em apps musicais nas quais o ouvinte actua perante o componente visual ou musical, ou ambos, alterando-os consoante a sua interacção com o dispositivo móvel, como na Biophilia, Gossamer ou Polyfauna. Também em videoclips interactivos o ouvinte/observador passivo tende a transformar-se num utilizador activo, actuando perante a componente visual enquan- to ouve a música inalterada, como por exemplo nos vários esforços dos Arcade Fire (em 2007, 2010 e 2013) ou no No Fun dos The Presets.

O público também pode ser envolvido fazendo parte de um evento irrepetível. Os live visuals para as tours dos Massive Attack, por exemplo, fazem da performance ao vivo um momento único, sendo actualizados segundo o local do concerto. Disponibili- zando os ficheiros para imprimir em 3D os modelos que figuram no videoclip de We Are Explorers, os Cut Copy promoveram o envolvimento do público num fenómeno particular. Por outro lado, a estratégia utilizada pelos Cut Copy para a disseminação do single Let Me Show You Love, tornou-se única usando vinis de edição limitada cor- tados no local,112 no Pitchfork Music Festival em Chicago.113

2.4. Estratégias emergentes

Atendendo às conclusões evidenciadas notamos na veiculação da música pop um gra- dual investimento em plataformas online e dispositivos móveis. De acordo com um esforço colaborativo, transversal a várias disciplinas e áreas de acção, os projectos mu- sicais recorrem a múltiplos desdobramentos de diferentes tipologias, cujos formatos são adequados para mais do que meio de disseminação. Como tal, os desdobramentos da música pop exploram as convenções operativas inerentes, bem como eventuais possibilidades produtivas, dos meios que ocupam. Estas estratégias e produtos pro- curam assim promover o envolvimento do público, tanto através da sua participação enquanto colaborador como das suas acções enquanto utilizador. Exemplificando estes aspectos, destacamos as apps como desdobramento emergente. Nesse sentido, passamos ao seu estudo mais aprofundado.

112 Na CHIRP Record Fair entre 19 e 21 de Julho de 2013. 113 http://pitchforkmusicfestival.com/. 91

3. Apps

Considerando as apps como um desdobramento emergente da música pop no con- texto contemporâneo, procurámos identificar exemplos diversificados em relação às suas possibilidades operativas e produtivas e à forma como promovem o envolvimento activo do público.

Procurando reconhecer a abrangência desse universo, fizemos um levantamento de várias apps identificando exemplos passiveis de uma análise mais aprofundada, nomea- damente ao nível da sua funcionalidade e uso. Através do levantamento e análise destas apps procuramos identificar tendências referentes à relação com o projecto musical e com a edição musical, bem como as suas tipologias e funcionalidade, incluindo a sua acessibilidade.

3.1. Selecção de exemplos

Para reunir um conjunto diversificado de exemplos, consideramos apps associadas a uma edição musical pop enquanto álbum físico ou digital (que pode integrar outros desdobramentos). Disponíveis em meios acessíveis ao público, as apps seleccionadas promovem o envolvimento do público, implicando uma qualquer acção por parte do ouvinte/observador (que se pode tornar utilizador). 92

Nesse sentido, reunimos treze apps que analisámos tanto ao nível da produção como da disseminação da música, segundo:

(1) A relação com projecto musical, identificando autores e colaboradores.

(2) A relação com a edição, incluindo desdobramentos associados.

(3) Acessibilidade (como se encontra disponível, custo e vinculação de sistemas operativos).

(4) Tipologia e funcionalidade (o que é, e o que permite fazer).

Biophilia (2011) é uma app desenvolvida por Björk, Scott Snibbe Studios e M/M Paris, anunciada como um dos primeiros app album (Snibbe, 2011).114 É o produto principal da edição musical, estando no lugar normalmente ocupado pelo álbum fí- sico ou digital. A app está associada a quatro videoclips115, performances ao vivo, um documentário e um concert film. Inicialmente116, exclusiva para iOS (sistema operativo do iPad e iPhone).

Inicialmente incompleta, a app principal completa-se à medida que as diferentes apps associadas são compradas, como acontece com um álbum digital, cujas faixas podem ser compradas individualmente. Existem dez apps, cada uma associada a uma música, dentro da mother-app. As dez apps que compõem a mother-app têm diferentes interfa- ces e funcionalidades, mas todas elas permitem compor música, dentro das condições de cada uma. É possível compor com samples escolhidas pelo utilizador (em oposição às samples fornecidas pela app) através serviços online específicos117 (como na app Moon ou Thunderbolt, por exemplo). Algumas apps permitem “mexer” com a estrutura da música (por exemplo na app Crystaline, o utilizador joga com os versos e os refrões da música) ou compor, nota a nota, uma composição própria (como no app Moon, Virus, Sacrifice, Dark Matter, Thuderbolte Solstice). As “composições” criadas através de certas apps (como a app Moon ou Virus) podem ser gravadas, não existindo nenhuma função inerente que partilhe as composições em redes sociais.

114 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em http://www.snibbe.com/biophilia/. 115 Crystalline por Michel Gondry, Moon por Björk, Inez and Vinoodh, M/M Paris e James Merry, Hollow por Drew Berry e Mutual Core por Andrew Thomas Huang. 116 Cerca de um ano depois foi lançada uma versão para dispositivos Android, disponível no Google Play. 117 Por exemplo, através do GarageBand, app da Apple. 3.1. Selecção de exemplos 93

Fig. 56: Esquema de observação do levantamento das 13 apps

1

2 3 4

18 Months, Calvin Harris (2012) Artpop, Lady Gaga (2013) 5 Biophilia, Björk (2011) 6 Gossamer, Passion Pit (2012) 7 "I’m Aquarius” / Night Sky, Metronomy (2013) John Moose, John Moose (2015) Magna Carta Holy Grail, Jay Z (2013) 8 Polyfauna, Radiohead e Universal Everything (2014) 9 REWORK_ (Philip Glass Remixed), Philip Glass (2012) Scape, Brian Eno e Peter Chilvers (2012) Synthetica, Metric (2013) 10 The Bermuda Tapes, John Lennon (2013) 11 The National Mall, Bluebrain (2011) 12 13 14

Relação com o projecto musical Relação com a edição Tipologia Acessibilidade Funcionalidade

1. Projecto musical está envolvido 2. Produto autónomo 5. Instrumento 8. Gratuita 10. Ouvir música (10 em 13) (3 em 13) (3 em 13) (6 em 13) (7 em 13) 3. Produto isolado 6. Album app 9. Exclusiva para iOS 11. Compor música (3 em 13) (5 em 13) (7 em 13) (3 em 13) 4. Produto promocional 7. Companion app 12. Agir perante componente musical e visual (7 em 13) (3 em 13) (2 em 13) 13. Acesso a conteúdos promocionais e álbum digital (2 em 13) 14. Exploração de ambientes virtuais (2 em 13) 94

The National Mall (2011) é uma app desenvolvida pelos Bluebrain, que também são responsáveis pela parte musical do produto, anunciada como “o primeiro álbum ciente da sua localização” (Richards, 2011).118 É um produto autónomo sem desdobramen- tos associados, gratuito e exclusivo119 para iOS.

A app só funciona no National Mall, o espaço verde entre o Lincoln Memorial e o Capitólio dos Estados Unidos, em Washington, D.C, EUA. As músicas só podem ser ouvidas através da app, que só funciona na área geográfica particular, segundo a localização do utilizador, calculada pelo GPS do dispositivo. Cada secção geográfica corresponde a uma música do album app, tal como cada faixa de um CD corresponde a uma música de um álbum. A secção geográfica, no entanto, relaciona-se com a música (elementos cénicos, como fontes ou carrosséis, encontram correlativos sonoros nas músicas), e pode-se “misturar” a ordem das músicas segundo o “passeio” particular. Não permite compor música nem oferece possibilidades de partilha.

Fig. 57: Interface da app Scape de Brian Eno (Generative Music, 2012)

Scape (2012) é uma app criada por Brian Eno e Peter Chilvers (Generative Music), normalmente creditada a Brian Eno e descrita como uma app que “faz música que pensa por si mesma” e como uma “nova forma de álbum que oferece acesso aos seus elementos musicais”, que podem ser “infinitamente recombinados”, portando-se de forma “inteligente” (Generative Music, 2012).120 Não está associada a qualquer outro tipo de desdobramento, é paga e foi desenvolvida exclusivamente para iPad.

118 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em: http://bluebrainmusic.blogspot.pt/2011/03/national-mall.html. 119 Embora existam planos para desenvolver uma versão para dispositivos Android. 120 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em http://www.generativemusic.com/scape.html. 3.1. Selecção de exemplos 95

A função principal da app é a composição generativa de músicas, chamadas scapes. No entanto, Brian Eno considera-a um album app, sendo que inclui músicas feitas por ele e por Peter Chilvers, no sentido de mostrar as potencialidades da ferramenta, e para mostrar também, nesse sentido, “que não é preciso muito para se fazer boa música” (BBC News, 2012). As scapes guardadas podem ser utilizadas para construir playlists no dispositivo, e podem ser partilhadas por e-mail.

18 Months (2012) de Calvin Harris é uma app desenvolvida pelos We Make Awesome Sh. O único desdobramento associado à app é o álbum físico ou digital, que é gratuita e está disponível para iOS e Android. A app permite ao utilizador ouvir a totalidade do álbum gratuitamente, desde que comece a “dançar” (We Make Awesome Sh, 2012),121 que envolve qualquer tipo de actividade em que o dispositivo esteja em movimento constante. Se a dança pára, a música pára. Paralelamente, a app encoraja a compra do álbum.

A Gossamer (2012), dos Passion Pit é uma app desenvolvida pelos Scott Snibbe Studios, que serve como companion app da edição musical. O único desdobramento associado a esta app é o álbum físico ou digital, que é exclusiva para iOS. A app apresenta duas músicas do álbum, seguindo uma estratégia que pode ser considera uma quebra na lógica da compra de faixas individuais através do iTunes, mas sem ser no entanto uma album app completo (ou seja, uma app através da qual se tem acesso a todas as faixas que compõem o álbum). A app abrange “videoclips interactivos e remixer displays” (Snibbe, 2012),122 incluindo as música também na sua versão original inalte- rada, permitindo agir perante imagens (funcionando como um videoclip interactivo) e remisturar as músicas (dentro da estrutura e dos samples sonoros de cada uma da músicas). As composições podem ser partilhadas por e-mail e redes sociais (como o Facebook ou Twitter).

REWORK_ (Philip Glass Remixed) (2012) de Philip Glass é uma app desenvolvida pe- los Scott Snibbe Studios. O único desdobramento associado a esta app é o álbum físico ou digital, que é paga e exclusiva para iOS. O preço da app é o mesmo preço do álbum digital (no iTunes). Descrita como uma “tour interactiva” ao álbum homónimo, a app é composta por onze “visualizações interactivas” (Snibbe, 2012),123 que permitem ao

121 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em http://wemakeawesomesh.it/calvin-harris.html. 122 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em http://www.snibbe.com/passionpit. 123 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em http://www.snibbe.com/rework/. 96

utilizador interferir na componente visual, mantendo a música inalterada. A música, aliás, não pode ser parada, tocando do início ao fim sem interrupções (se a música for interrompida, volta ao inicio). Outro componente da app, a Glass Machine, permite ao utilizador compor a sua própria música, apresentando-se como um instrumento.

Magna Carta Holy Grail (2013), do Jay Z é uma app desenvolvida pela Samsung, e é gratuita e exclusiva para aparelhos da marca. O álbum físico ou digital é o único desdobramento associado à app. A app, que tornou Jay Z num “dos primeiros grandes artistas a testar uma app como modelo de distribuição” (m4tt, 2011), ofereceu con- teúdos exclusivos (antes do lançamento do álbum) e o download do álbum (aquando o seu lançamento dia 4 de Julho de 2013). A Samsung pagou ao projecto musical 1 milhão de cópias do álbum, no sentido de lançar o álbum através da app gratuitamen- te. Na app as letras das músicas (de faixas que ainda não tinham sido lançadas) eram apresentadas rasuradas, sendo preciso partilhá-las com amigos (via redes sociais) para que estas se revelassem gradualmente ao utilizador (Samsung e Jay Z, 2013).124

Fig. 58: Interface principal da app The Bermuda Tapes de John Lennon (Design I/O, eyeball, 2012) Fig. 59: Interface da app The Bermuda Tapes de John Lennon (Design I/O, eyeball, 2012)

The Bermuda Tapes (2013) é uma app desenvolvida pelos Design I/O e os eyeball, reali- zada por Michael Epstein e Mark Thompson, normalmente creditada à WhyHunger. É um produto isolado, sem quaisquer desdobramentos associados, exclusiva para iOS. Os conteúdos da app são em parte novos (os conteúdos visuais e alguns elementos, como efeitos sonoros), estando no entanto associados a gravações antigas (com mú- sicas e conversas) relacionadas com o último álbum de John Lennon, Double Fantasy (1980), “integrando excertos de demo tapes de Lennon gravadas nas Bermudas” (Why Hunger, 2013). Inclui jogos “inovadores” (2013) permite ao utilizador explorar am- bientes virtuais através do iPad. Os autores referem-se à exploração destes ambien- tes virtuais (narrados por John Lennon, Yoko Ono, The B52s, entre outros) como

124 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em http://www.magnacartaholygrail.com/. 3.1. Selecção de exemplos 97

immersive storytelling (Design I/O, 2013).125 O dinheiro feito com a app reverte a favor da WhyHunger.

ARTPOP (2013) de Lady Gaga é uma app desenvolvida pelos Relative Wave. O álbum físico ou digital é o único desdobramento associado à app, que é gratuita e esteve disponível para iOS e Android.126

Através da app, “os utilizadores partilham a adrenalina da fama enquanto constroem e partilha os seus próprios projectos” e “conversam uns com os outros” (Dredge, 2013).127 Serve como um companion app, encorajando a compra do álbum ou das músicas individualmente, em plataformas online (como o iTunes). A app propunha quatro componentes. Um permite a criação e partilha de elementos visuais (GIFs) que podem ser partilhados entre os utilizadores. Outro componente permite ouvir e editar (através de um interface tipo-vinil-num-gira-discos) uma das músicas do álbum. De origem, apenas uma música está disponível, sendo que para editar as outras músicas os utilizadores têm de as comprar. Os outros dois componentes não estavam activos quando a app foi lançada, apresentando uma contagem decrescente (dando a enten- der que estariam eventualmente disponíveis), mas o projecto foi abandonado, sendo que os conteúdos nunca foram lançados. A componente de composição visual da app funciona simultaneamente como uma comunidade para os fãs. Os utilizadores podem partilhar a imagens criadas através da app, podendo também desconstruir e editar imagens já criadas. É possível receber uma indicação de “seen by Gaga”, o que indica uma forma de comunicação com o projecto musical.

Synthetica (2013) dos Metric é uma app desenvolvida pelos Scott Snibbe Studios no sentido de “criar um interface para remisturar música que fosse directo, intuitivo e cativante” que eliminasse as “típicas barreiras do software unicamente destinado para profissionais de áudio” (Snibbe, 2013).128 É um produto associado ao álbum Syn- thetica (2012), tendo sido lançado ao mesmo tempo que o companion LP Synthetica Reflections (2013). O design da app foi inspirado na “obra surrealista do Superstudio, uma colectiva de arquitectura do final dos anos 60 encabeçada por Cristiano Toraldo

125 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em: http://design-io.com/projects/LennonBermudaTapes/. 126 Atendendo ao cancelamento do projecto, app já não se encontra disponível. 127 Uma descrição do projecto pode ser consultada em: http://www.theguardian.com/technology/2013/nov/11/hands-on-with-lady-gagas-artpop-album-app. 128 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em http://www.snibbe.com/metric/. 98

e Adolfo Natali” (Snibbe, 2013). O único desdobramento associado é o álbum físico ou digital. Pode ser experimentada gratuitamente com o single Lost Kitten (2012) e é exclusiva para iOS.

Através da app “paisagens surrealistas animadas produzem uma infinidade de sequen- cias musicais” (Snibbe, 2013), que permite ao utilizador remisturar as onze músicas que compõem a edição. Existem dois tipos de interfaces gráficos, e o total de onze músicas está separada entre eles.

Fig. 60: Interfaces da app Synthetica dos Metric (Scott Snibbe Studios, 2012)

A app Night Sky, não sendo uma app musical, funciona como um “guia astronómico” que, apontando o smartphone ao céu, informa sobre corpos celestes como estrelas, pla- netas, constelações, ou satélites (iTunes, 2015). Foi desenvolvida pela iCandi Apps. I’m Aquarius (2013) é um single dos Metronomy incluído (embora na altura de lançamen- to estivesse desassociado de qualquer edição) no álbum Love Letters (2014), revelado via a app Night Sky, uma app paga e disponível para iOS e Android. Nenhuma app foi criada especificamente para o single. Uma actualização, disponível dia 11 de No- vembro de 2013, à app Night Sky fez com que, encontrando a constelação Aquário, a música pudesse ser ouvida pela primeira vez, como estratégia de lançamento do single, estando disponível na app durante uma semana (Bychawski, 2013).129 Esta estratégia ocorreu isolada, desagregada de quaisquer outros desdobramentos.

129 Uma descrição da estratégia pode ser consultada em http://www.nme.com/news/metronomy/73609. 3.1. Selecção de exemplos 99

Polyfauna (2014) é uma app fruto da “colaboração experimental entre Thom Yorke, Nigel Godrich, Stanley Donwood e os Universal Everything” (Universal Everything, 2014),130 normalmente creditado aos Radiohead e aos Universal Everything. Embora chame atenção para o álbum e para o projecto musical, não está direccionado para a venda de um álbum ou single em particular. Os desdobramentos associados a esta app podem ser considerados os mesmos associados ao álbum The King of Limbs, mas a app funciona como um produto isolado. A app é gratuita, e foi desenvolvida inicialmente apenas para iOS, estando agora também disponível para Android.

Os Radiohead queriam uma “experiência digital para as suas sessões do The King of Limbs de 2011” que fosse diferente das “típicas apps musicais disponíveis, que ten- dem a dar enfâse na discográfica e datas de tour”, querendo, por contraste, “uma peça audiovisual que fosse mais arte digital” do que uma app que prestasse um serviço (Stinson, 2014). A segunda versão da Polyfauna, também de 2014, mantem a mesma autoria e funcionamento sendo, no entanto, “completamente novo” (iTunes, 2014), apresentando “novos visuais e sons atmosféricos” (Michaels, 2014). Contem excertos da música que viriam a aparecer, mais tarde, no álbum de Thom Yorke Tomorrow’s Modern Boxes (2014) (Universal Everything, 2014).

John Moose App (2015), dos John Moose, é uma app desenvolvida por Tobias Norén, o baterista da banda. Sendo uma pre-release app (John Moose, 2015)131 o álbum físico ou digital é um desdobramento da app, que é gratuita e disponível para iOS e Android.

Funcionando através das possibilidades de geolocalização do dispositivo, o álbum só está disponível se o utilizador estiver na floresta. É uma estratégia de lançamento, sendo que o álbum em suporte físico e digital (sem restrições geográficas) foi lançado posteriormente. Segundo a banda, o objectivo era sincronizar a audição do álbum com um local específico, neste caso a floresta, sendo por isso que a app é gratuita.

130 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em: http://www.universaleverything.com/projects/polyfauna/. 131 A descrição do projecto pelos autores pode ser consultada em http://johnmoosemusic.com/prerelease/. 100

3.2. Análise

3.2.1. Projecto musical

O projecto musical está sempre envolvido na produção das apps, exceptuando alguns exemplos pontuais como o I’m Aquarius (2013), dos Metronomy, via a app Night Sky. Nesse sentido, podemos concluir que os projectos musicais procuram veicular a música de uma maneira nova (ou pelo menos original). Tal é evidente, por exemplo, na Biophilia (2011) da Björk, descrita como um dos primeiros album apps (Snibbe, 2011), ou na The National Mall (2011) dos Bluebrain, o primeiro álbum ciente da sua localização (location aware) (Richards, 2011).

Certos projectos musicais disponibilizam a app gratuitamente antes do álbum, como estratégia de pré-lançamento, como a app Magna Carta Holy Grail (2013), através da qual Jay Z se tornou um dos primeiros músicos a usar uma app como meio de distribuição em massa de um álbum pop (m4tt, 2011), ou a John Moose (2015) dos John Moose, indicada pela própria banda como uma pre-release app (John Moose, 2015). Embora não sejam o produto principal da edição musical, através destas apps os projectos musicais pretendem também inovar, nomeadamente segundo uma estra- tégia de promoção.

Como tal, observamos que os projectos musicais, num contexto contemporâneo, procuram destacar as suas edições recorrendo a formas de distribuição e disseminação inovadores, articulando a sua música através de estratégias ou produtos poucas vezes usados no contexto da música pop.

A estratégia utilizada pelos Metronomy destaca-se das restantes analisadas porque o projecto musical não esteve envolvido na construção da app, tendo recorrido a uma já existente, originalmente desassociada de intenções de promoção de música pop. Partindo deste caso particular podemos evidenciar que formas de veiculação da mú- sica, no sentido de usar dispositivos móveis, promovem tanto a construção de apps originais como também a reapropriação de apps já existentes, tirando partido das suas funcionalidades e posicionamento (ou uso generalizado). 3.2. Análise 101

3.2.2. Conteúdos musicais

Podemos identificar apps que são a edição musical em si, como a Biophilia, REWORK_ (Philip Glass Remixed) (2012) de Philip Glass, ou Polyfauna (2014) dos Radiohead, sendo que a maior parte das apps analisadas são produtos acessórios à edição musical (como produto principal) ou produtos promocionais (que servem para a promover). A aplicação Gossamer (2012) dos Passion Pit e a ARTPOP (2013) de Lady Gaga são exemplos de produtos acessórios, sendo ambas companion apps. A aplicação 18 Months (2012) de Calvin Harris e a John Moose são exemplos de produtos promocionais132. Outros exemplos podem ser considerados mais como um projecto artístico do que como parte de uma edição pop (existindo à margem da comercialização que normal- mente lhe é associada), como The National Mall. Os Bluebrain, aliás, partindo deste primeiro esforço, desenvolveram outras location aware apps, bem como outro tipo de instalações artísticas audiovisuais.133

Enquanto edições musicais em si, certas apps seguem a lógica dos álbuns tradicionais (físicos ou digitais) oferecendo um conjunto de músicas novas, enquanto outras explo- ram outro tipo de conteúdos musicais. Björk, por exemplo, compôs músicas inéditas para a app Biophilia, associadas exclusivamente a essa edição musical, mas os conteúdos musicais da app The Bermuda Tapes (2013) de John Lennon, por outro lado, baseiam-se unicamente em gravações antigas relacionadas com a viagem do músico às Bermudas em Junho de 1980, sendo que composições musicais desse período resultariam no seu último álbum, Double Fantasy (1980) (Design I/O, 2013). A app REWORK_ oferece conteúdo musical novo através das remisturas dos vários artistas seleccionados (Beck, Nosaj Thing, Amon Tobin, entre outros), mas não oferece nenhuma composição nova de Philip Glass, e a Glass Machine permite compor música baseada na sua obra dos anos 70, reforçando a exploração do trabalho passado do músico.

A app Scape (2012) de Brian Eno possibilita a criação de música generativa que “pensa por si mesma”, aplicando “alguns dos sons, processos e regras de composição” que os autores têm vindo a utilizar “por muitos anos” (Generative Music, 2012). Como tal, Scape disponibiliza faixas que almejam ser meramente demonstrativas, procurando

132 Produtos promocionais não são exclusivamente produtos que dependem do contexto da edição musical, ou que apenas veiculam parte (ou nenhuma) das faixas do álbum. Cada um dos exemplos funciona como um produto autónomo, disponibilizando a totalidade do álbum segundo regras particulares. 133 A obra dos Bluebrain pode ser consultada em http://bluebrainmusic.blogspot.pt/. 102

apresentar as capacidades da app (BBC News, 2012). Destacamos ainda a app Polyfau- na, cujos conteúdos musicais, associados à gravação do The King of Limbs(2011), estão presentes na app como som ambiente, e não como um conjunto concreto de músicas.

3.2.3. Acessibilidade

A maior parte das apps foi desenvolvida exclusivamente para iPad e iPhone, como a Synthetica (2013) dos Metric ou a Gossamer, embora existam produtos desenvolvidos tanto para dispositivos com sistema operativo iOS como Android, por exemplo a 18 Months ou a ARTPOP. Algumas apps, no entanto, mesmo tendo sido desenvolvidas exclusivamente para iOS, acabaram por se expandir a outros sistemas operativos, por exemplo, a Biophilia ou Polyfauna.

Existem também casos particulares de apps desenvolvidas exclusivamente para um único dispositivo, como Scape, que funciona unicamente no iPad, ou a Magna Car- ta Holy Grail, apenas disponível para produtos da marca Samsung. Nesse sentido, evidenciamos que certos produtos são optimizados para um dispositivo ou sistema operativo particular, sendo os dispositivos com sistema operativo iOS (como o iPad e o iPhone) particularmente populares para o desenvolvimento de apps musicais,134 atendendo a que oito das treze apps analisadas foram construídas exclusivamente (ou primeiramente) para dispositivos com esse sistema operativo. Embora o propósito da maioria das apps analisadas seja a compra de música pop, existem estratégias inversas, como a presente na app de Jay Z. Através dessa app, o álbum digital é oferecido com a compra de um dispositivo móvel Samsung (sendo a app e consequente download do álbum gratuitos), aliciando assim a compra de um dispositivo móvel e não a compra de música.

As apps podem ser pagas ou gratuitas, e partindo do universo analisado nenhuma das tendências é mais recorrente. Embora as apps gratuitas sejam normalmente pro- dutos promocionais existem excepções, como The National Mall ou Polyfauna, que são produtos autónomos gratuitos. Apps que funcionam como produtos autónomos costumam ser pagas, custando aproximadamente o mesmo que um que um álbum

134 Notamos que, através do Google Creative Lab, vários produtos são também optimizados para o browser Google Chrome, disponível tanto para computadores como para dispositivos móveis com sistema operativo An- droid, não sendo, no entanto, exclusivos para esses dispositivos. Exemplos já estudados incluem The Wilderness Downtown (2010), Just a Reflektor (2013) e o Google Cube, lançando em 2015 com o single No Fun. 3.2. Análise 103

digital enquanto album apps, como Biophilia, REWORK_, ou Scape, ou outro tipo de produto isolado, como The Bermuda Tapes. No entanto, podem ser também compa- nion apps, como Gossamer.

Portanto, podemos considerar que as apps pagas oferecem uma experiência mais am- pla, segundo uma maior oferta de conteúdos e possibilidades operativas, concretizan- do efectivamente as intenções associadas ao termo album app. Notamos também que as apps gratuitas costumam ser produtos promocionais e tendem a estar disponíveis tanto para iOS como para Android, evidenciando uma disseminação mais ampla do que os produtos pagos. Exemplos de apps sem custos e disponíveis para a maioria dos dispositivos móveis incluem 18 Months, ARTPOP e John Moose.

3.2.4. Tipologias e funcionalidades

As apps consideradas tendem a funcionar como instrumentos musicais e/ou jogos. Certos exemplos têm exclusivamente uma tipologia ou outra, como a Scape que fun- ciona unicamente como instrumento ou a 18 Months que funciona como um jogo. Apps com uma única funcionalidade costumam ser promocionais, embora existam excepções pontuais. Por exemplo, a Scape é um produto autónomo (e portanto não promocional), destacando-se por ser um instrumento com autonomia criativa, não sendo, como tal, meramente um instrumento em que a música é criada pelo utilizador. Mesmo considerando estas excepções, as apps tendem a ter tipologias diversificadas e como tal diferentes funcionalidades. Por exemplo, a Biophilia é simultaneamente um jogo e um instrumento, e a REWORK_ é simultaneamente um visualizador e um instrumento. Outras apps têm como propósito principal a exploração de ambientes. Através da Polyfauna, por exemplo, o utilizador pode explorar um ambiente virtual, e na The National Mall ou John Moose, é potenciada a exploração de espaços físicos concretos135.

135 The National Mall apenas funciona no espaço verde entre o Lincoln Memorial e o Capitólio dos Estados Unidos, em Washington, D.C, EUA, e John Moose apenas funciona em florestas assinaladas como tal no Google Maps. 104

3.2.5. Actualização

Evidenciamos também como característica inerente às apps a sua dimensão actualizá- vel. Esta dimensão das apps está em parte associada à intenção dos projectos musicais de estarem constantemente actualizados, posicionando o seu trabalho segundo produ- tos e estratégias inovadores e/ou originais.

Os websites de projectos musicais com Björk, Massive Attack ou Radiohead tendem a ser constantemente renovados, nomeadamente segundo as edições promovidas. De modo semelhante, a Biophilia foi lançada apenas com a mother-app, tendo sido disponibilizadas gradualmente mais nove apps, expandido o produto inicial que se transforma ao longo do tempo. Também a Magna Carta Holy Grail disponibilizou conteúdos progressivamente, transformando-se por fim numa plataforma de distri- buição do álbum digital, e a ARTPOP almejava (embora não o tenha concretizado) expandir os seus serviços gradualmente, ao mesmo tempo que a “aura” do utilizador evoluiria a par com a app (Dredge, 2013).

A esta transformação progressiva das apps, evidente também nos websites dos projectos musicais, notamos uma dimensão efémera associada a este tipo de produtos, resultado das contínuas actualizações. O website da Björk desenvolvido pelos M/M Paris, que figurava uma galáxia semelhante à presenta na app Biophilia, já não pode ser visitado, estando presentemente reconstruído no sentido de promover Vulnicura. Como tal, a experiência particular do website pré-actualização esteve disponível entre 2011 e 2015, apelando à efemeridade latente a esta contínua transformação de conteúdos. A app Night Sky, utilizada pelos Metronomy, só perante uma actualização disponibilizou o single I’m Aquarius, e apenas durante uma semana em 2013. Também a app Polyfauna se transformou desde o seu lançamento, apresentando agora uma experiência estética totalmente diferente. A experiência anterior, como tal, já não está disponível. Como os websites, as apps não são produtos estáticos que se mantêm inalterados indefinidamen- te, como um álbum físico, transformando-se ao longo do tempo e como tal tornando certas experiências disponíveis apenas durante um intervalo de tempo particular.

3.2.6. Papel do público

Em todos os exemplos notámos a intenção de envolver activamente o público, pro- movendo um qualquer tipo de acção da sua parte no sentido de explorar elementos 3.3. Envolvimento do público 105

musicais e visuais, ou até manipulá-los com fins criativos. Por exemplo, certasapps promovem o envolvimento do público através do seu esforço criativo, como as apps Biophilia, Scape, Gossamer, REWORK_ e Synthetica, através das quais o utilizador pode compor música, ou como na app ARTPOP, através da qual o utilizador podia construir composições imagéticas. Outras apps promovem um tipo diferente de en- volvimento, nomeadamente segundo a exploração intuitiva de ambientes através de toque e movimento, como as apps The National Mall e John Moose (espaço físico), ou a Polyfauna (ambiente virtual). Evidenciamos também apps que promovem acções físicas concretas, como a 18 Months que funciona através de dança, ou a app Night Sky utilizada pelos Metronony, que para funcionar precisa que o utilizador explore o céu nocturno.

Nesse sentido, para compreender de que modo se relacionam as intenções conceptuais, a tipologia e funcionalidade das apps, e o que permitem ao utilizador fazer, passaremos a analisar mais profundamente um universo de apps mais restrito.

3.3. Envolvimento do público

3.3.1. Selecção de exemplos

A fim de estudar em maior profundidade o tipo de envolvimento do público promo- vido pelas apps, destacámos exemplos que:

(1) Embora façam parte de uma edição musical pop funcionam como um produto autónomo.

(2) São simultaneamente uma forma de veiculação, disseminação e promoção da mú- sica, edição ou projecto musical, sendo um suporte que funciona como um meio para ouvir, e também como uma estratégia para promover e divulgar, música.

(3) Promovem o envolvimento do público através de possibilidades de exploração e criação de composições musicais, segundo acções sobre os conteúdos disponibilizados pela edição musical pop, rearranjando material dado ou até criando material novo. 106

Como tal, identificámos as seguintes apps como exemplos paradigmáticos de des- dobramentos da música pop que promovem o envolvimento do público através da exploração das possibilidades operativas e produtivas facilitadas pelos interfaces dos dispositivos móveis:

(1) Biophilia (2011), de Björk.

(2) REWORK_ (Philip Glass Remixed) (2012), de Philip Glass.

(3) Polyfauna (2014), dos Radiohead.

Seleccionámos estas três apps por serem distintas a nível da sua tipologia e funcionali- dade, destacando-se de outras apps (como produtos promocionais ou companion apps) devido às possibilidades de criação e exploração que oferecem ao utilizador. Procede- mos de seguida à sua análise no sentido de compreender a sua especificidade, o que propõem ao público e a relação que promovem com o mesmo.

3.3.2. Parâmetros de análise

As apps são analisadas de acordo com a sua tipologia e experiência que promovem. Para aprofundar esses aspectos, foram sistematizados alguns instrumentos, nomeadamente a terminologia a ser aplicada.

Partimos da taxonomia desenvolvida por Katja Kwastek sobre “arte interactiva”, par- ticularmente direccionada para sistemas interactivos em contextos artísticos, porque consideramos que se encontra alinhada com o que propomos analisar, nomeadamente o que a app é e o que faz (ou seja, a sua tipologia e funcionalidade) e o que o utilizador faz ou pode fazer (o que a app lhe permite fazer, qual o papel que promove), sendo que Kwastek descreve a interacção segundo o que a obra faz e o que o “visitante” faz (Kwastek, 2009). No entanto, considerámos necessário adaptar a sua sistematização e circunscreve-la ao nosso universo específico, pelo que recorremos a outros autores, abordando, primeiramente, modelos que tratam o papel do utilizador, nomeadamente o seu papel interpretativo, exploratório e configurativo.

Segundo Espen J. Aarseth “para além da função interpretativa do utilizador” (Aars- eth, 2003: 768), que está associada a um objecto que é “individualmente recebido e 3.3. Envolvimento do público 107

compreendido” (2003: 763) podendo ser considerada “omnipresente”136 (Carvalhais, 2010: 372), existe a “função exploratória, na qual o utilizador decide qual o “caminho” a tomar” e a “função configurativa” na qual funções são “em parte escolhidas e/ou desenhadas pelo utilizador”137 (Aarseth, 2003: 768). Partindo do modelo de Aarseth, Miguel Carvalhais afirma que se torna difícil definir se os sistemas nos quais a interac- ção é “tipicamente reduzida a um único clique ou gesto para recomeçar o processo”, “deveriam ser classificados como interpretativos, como configurativos ou até como ex- ploratórios”, dado que “o input humano é tão reduzido”. No entanto, “mesmo que as acções no sistema sejam muito simples” elas poderão ter um “efeito visível” no sistema, “actualizando ou recomeçando o processo, por vezes alterando-o fundamentalmente”, considerando-se adequado “classificar a maioria destes sistemas como configurativos” (Carvalhais, 2010: 406).

Podemos associar o papel exploratório do utilizador, definido por Aarseth, ao que Michael Joyce define como o “uso exploratório” do texto. Tal refere-se à possibilidade do utilizador “controlar a transformação de um corpo de informação para atender às suas necessidades e interesses”, sendo que também deve ser capaz de “compreen- der os elementos que constroem um corpo de conhecimento em particular, traçar o progresso através desses elementos, e localizá-los segundo à sua vontade” (Joyce, 2003: 615). Marie-Laure Ryan acrescenta que “no modo exploratório” o utilizador “move-se” livremente, “mas a sua actividade não cria história nem altera o enredo”, e como tal “o utilizador não tem impacto no destino do mundo virtual” (Ryan, 2001). Por outro lado, a função configurativa pode se relacionada com o que Joyce define como “uso construtivo” que se refere à possibilidade do utilizador “desenvolver um corpo de informação mapeando-o segundo as suas necessidades, os seus interesses, e as

136 Segundo Miguel Carvalhais, “podemos considerar que o utilizador de um sistema estético computacional” tem sempre “uma função interpretativa, no sentido em que precisa de decifrar as unidades de superfície criadas pelo sistema”. No entanto, “se o input do utilizador for usado construtivamente” podemos identificar “uma função configurativa do utilizador”, e se as acções do utilizador forem “de navegação, acedendo a espaços de configurações que não são criados com a sua intervenção” identificamos “uma função exploratória do utilizador”. Aliás, “as funções do utilizador não são sempre dominadas por interesses e objectivos interpretativos”, como podemos notar em jogos “no geral” e em videojogos “em particular”, no qual o utilizador “interpreta” para que consiga “configurar” (Carvalhais, 2010: 373). 137 Partindo do modelo de Aarseth, em relação à função configurativa do utilizador, Noah Wardrip-Fruin acrescenta que mesmo que “o autor não sabia qual o resultado” exacto de uma acção do utilizador, sabe que esse resultado parte de uma escolha feita por ele, e embora “isto seja um tipo de indeterminação”, é muito diferente do “acaso”, de um “lançamento de dados” ou de “ um computador a empregar um número aleatório” (Wardrip-Fruin, 2006: 111). 108

transformações que descobrem enquanto inventam, coleccionam, e agem perante essa informação”. Joyce acrescenta que o uso construtivo “requere a capacidade para agir”, no sentido de criar e mudar (Joyce, 2003: 616).

Considerando o papel do utilizador, Janet Murray distingue a “mera interacção” de “agência”138 dependendo das “maneiras como as nossas acções estão alinhadas com efeitos tangíveis”. Como tal, agência está associada tanto à “possibilidade de aceder a diferentes espaços” como ao “papel construtivo” que o utilizador assume quando pode participar “de alguma maneira” na construção do conteúdo da obra (Ribas, 2012: 5). Nesse sentido, a agência do utilizador, como definida por Murray, está alinhada tanto com a função configurativa como com a função exploratória, pois o utilizador pode “explorar e agir dentro do mundo imersivo” sendo “recompensado pelas suas acções com respostas apropriadas” (Murray, 2011).

De acordo com estas observações, além da função interpretativa (omnipresente), con- sideramos a participação do utilizador segundo as funções exploratória e configurativa. Assumindo um papel exploratório, que também podemos entender como navega- cional, o utilizador “pode explorar a obra”, “navegar”, ou “seleccionar um caminho”, podendo “aceder a espaços ou configurações específicos (elementos, vistas, cenas) dentro da obra, que não são criadas com a sua intervenção”. Por outro lado, segundo um papel configurativo o utilizador “pode configurar a superfície audiovisual”, “mo- dificando, rearranjando ou criando explicitamente instâncias de superfície”, podendo “modificar (alterar, adicionar, mudar, apagar)” novas instâncias, ou alterar variáveis que resultam na sua reconfiguração (Ribas, 2012: 229). Cingimos portanto o papel activo do utilizador à função exploratória (associada à navegação de configurações) e à configurativa (associada à construção ou criação de configurações), assumindo a interpretativa como passiva.

Passamos de seguida a apresentar os termos referentes às tipologias e funcionalidades das apps, com base na sistematização proporcionada por Kwastek e por nós adaptada ao universo particular que procuramos analisar. Assumimos que, tal como as funções

138 Segundo Janet H. Murray, “agency is defined as an aesthetic pleasure characteristic of digital environments, which results from the well-formed exploitation of the procedural and participatory properties. When the behavior of the computer is coherent and the results of participation are clear and well motivated, the interactor experiences the pleasure of agency, of making something happen in a dynamically responsive world. The term is meant as a corrective to the inexact use of “interactive” as both a descriptive and an evaluative term” (Murray, 2011). 3.3. Envolvimento do público 109

do utilizador, estas são tipologias dominantes e que, como tal, não são mutuamente exclusivas.139

(1) Instrumento: permite a “manipulação de processos que geram sempre novos resultados”, sendo nesse sentido “comparáveis a”, mas diferentes de, instrumentos musicais” (Kwastek, 2009).140

(2) Jogo: oferece um jogo141, ou seja, permite agir mediante um processo interactivo com regras claramente definidas e um objectivo predeterminado.

(3) Ferramenta de narração: serve com instrumento narrativo, ilustrando uma história fictícia através de linguagem, texto ou imagens, numa narrativa142 “tematicamente unificada e logicamente coerente” que pode resultar da interacção do utilizador (Ryan, 2001).143

(4) Ferramenta de comunicação: promove situações e produz as pré-condições técni- cas que permitem comunicação entre utilizadores, e troca mútua de informação.

(5) Visualizador: apresenta uma tradução visual (através de informação imagética, por exemplo, vídeo, grafismos) da informação relativa a movimento, som, ou outros

139 Excepto quando referenciado em contrário, assume-se que os termos e descrições (referentes à tipologia das apps e ao papel do utilizador) partem da taxonomia desenvolvida por Katja Kwastek sobre “arte interactiva” (Kwastek, 2009). 140 Kwastek afirma que o funcionamento destes sistemas interactivos difere da “operação de um instrumento musical”, no entanto, sendo que “a relação entre acções corporais, aparelho e configuração audiovisuais não é ba- seada em efeitos de causalidade física, mas sim em definições determinadas pelo artista” e portanto, potencialmente novas e desconhecidas ao utilizador (Kwastek, 2009), embora frequentemente apoiadas em padrões de interacção e convecções conhecidas das interfaces dos dispositivos em causa. 141 Segundo Eric Zimmerman e Katie Salen, “a game is a system in which players engage in an artificial conflict, defined by rules, that results in a quantifiable outcome” (Zimmerman e Salen, 2004: 80). 142 Marie-Laure Ryan afirma, sobre a “narratividade de um texto”, que a narratividade deve ser definida “em termos semânticos”, sendo que “a definição deve ser livre de medium” (Ryan, 2001). 143 Segundo Ryan, uma “representação narrativa” deve ser “tematicamente unificada e logicamente coerente”, sendo que os seus elementos “não podem ser permutados livremente” porque estão organizados “numa sequência” segundo relações de causa-efeito, e porque “a ordem temporal é significativa”. Sendo que “no drama ou no cinema a história não é (normalmente) contada ao espectador, mas dramatizada pelos actores e reconstituída pelo espectador na base das acções observadas” em ambientes virtuais a história pode resultar da “interacção do utilizador com os objectos e cidadãos animados do mundo virtual” (Ryan, 2001). 110

dados. A transformação é sistemática e obedece a regras fixas, para que parâmetros sonoros e imagéticos possam corresponder de forma automática.

Relativamente ao papel do utilizador, completamos os parâmetros de análise que cimentámos anteriormente nas noções de interpretação, exploração e configuração, confrontando-os com os propostos por Kwastek.

(1) Interpretativo (observa): O utilizador apenas observa, não participando nem estan- do envolvido activamente num processo de interacção.

(2) Exploratório (descobre, navega configurações): O utilizador decide qual o caminho a seguir, acedendo a diferentes espaços como um padrão de exploração e descoberta, espaços que não são, no entanto, criados com a sua intervenção.

(3) Partilha (troca de informação): O utilizador comunica com outro utilizador, ou outros utilizadores, através das possibilidades do processo/sistema, segundo actos de comunicação.

(4) Configurativo (cria, constrói, deixa vestígios em configurações): O utilizador gera resultados (maioritariamente visuais ou auditivos) agindo sobre informação, modifi- cando, rearranjado ou criando configurações de superfície (outputs). Nesse sentido, constrói de alguma maneira o conteúdo da obra, que é em parte reconfigurado por ele.

3.3.3. Análise

Passamos à análise das três apps consideradas, pressupondo que reforçam o universo conceptual do projecto musical e/ou edição especifica e potenciam um tipo de envol- vimento que não é evidente nas outras nove apps analisadas, promovendo a explora- ção e criação por parte do utilizador enquanto álbuns ou experiências audiovisuais interactivas. Para tal, a análise estará focada nas intenções conceptuais, na tipologia e funcionalidade das apps e na experiência que promovem.

A dimensão conceptual refere-se ao conceito a que a app se vincula ou explora, ou seja os temas, tópicos, metáforas, e/ou ideias que usa e evidencia, e a forma como se associam ao universo musical. Por tipologia e funcionalidade referimo-nos ao que a app é e ao que “faz”, que se relaciona com o que proporciona ao utilizador (Kwastek, 3.3. Envolvimento do público 111

2009). Relativamente à experiência que as apps promovem, focamos o que o utilizador faz, mediante o que a app lhe permite fazer, enquanto experiência baseada em acção.

Atendendo ao que propomos analisar, passamos a descrever os exemplos.

Biophilia, Björk

A Biophilia (2011) de Björk é um produto actualizável e expansível, que parte da mother-app Cosmogony à qual se juntam outras nove apps. É uma “exploração multi- medial da música, natureza e tecnologia”, composta por “música original”, e “artworks interactivas e educacionais e artefactos musicais” (2011). Para tal, a app trata relações entre fenómenos naturais e conceitos musicais, promovendo a composição musical. Nesse sentido, a mother-app Cosmonogy “, que segura todas as dez apps e as dez canções” como uma “galáxia com planetas à sua volta” (Björk, 2012), está conceptualmente relacionada com a faixa homónima, que trata de corpos celestes e a sua disposição e relação no universo. Este tipo de relação conceptual foi usado tanto para a constru- ção das apps como para a composição musical. Na música Thunderbolt, por exemplo, foram usados arpejos como metáfora para o intervalo entre a visualização e audição de um relâmpago, e na Crystalline foi aplicada uma fórmula matemática baseada na construção de cristais para definir o ritmo da música.

Todas as apps proporcionam, simultaneamente, um jogo e um instrumento, no sen- tido de ensinar conceitos musicais144, tornando a interface acessível ao utilizador e demonstrando a relação entre dimensão visual e sonora. As apps funcionam também como visualizadores da música, embora a sua função principal seja de interface gráfica para actuar perante os elementos musicais e visuais. A mecânica construtiva das apps baseia-se em fenómenos naturais e procura ilustrar um conceito musical, tendo sido explorado “o universo e as suas forças físicas, processos e estruturas – dos quais a música faz parte” (iTunes, 2012).

144 Explorando as apps enquanto ferramentas didácticas, estas fizeram parte de uma série de workshops educati- vos (New York Public Library, 2012). 112

Fig. 61: Interface da app Cosmogony, Biophilia (Björk, Scott Snibbe Studios, M/M Paris, 2011) Fig. 62: Interface da app Crystalline, Biophilia (Björk, Scott Snibbe Studios, M/M Paris, 2011)

Na app Crystalline, por exemplo, a intenção é mostrar que “existem semelhanças entre a forma como cristais crescem e a estrutura musical comum” (Björk, 2012). O jogador conduz um cristal por um labirinto de túneis, segundo uma interface semelhante a um videojogo de corridas (de carros, por exemplo), onde o jogador conduz num qualquer tipo de circuito fechado. No entanto, o circuito é mutável, segundo o caminho esco- lhido pelo utilizador. As suas decisões influenciam o número de versos e refrões, sendo assim possível alterar a estrutura da música segundo o percurso percorrido.

A app Moon, por outro lado, é um instrumento que usa as fases da lua e as marés como metáfora construtiva, e que encoraja o utilizador a descobrir “padrões musicais” num “music sequencer que é mais orgânico que um music sequencer normal” (Björk, 2012). Ou seja, segundo uma intenção didáctica, procurou-se construir uma interface que permitisse uma composição musical através de um sequenciador mais intuitivo e simples do que um sequenciador normal. Como tal nesta app, que funciona como instrumento musical, o utilizador define quais as notas que quer tocar segundo o nível das marés e quantas vezes se vai ouvir cada nota segundo as fases da lua.

A app Virus é um jogo, no qual um vírus ataca células saudáveis, tendo o utilizador de usar os dedos no touch screen do iPad para que os vários elementos nocivos não in- fectem a célula saudável. Por outro lado, para poder usar a app enquanto instrumento musical, o utilizador tem de deixar o vírus infectar a célula na totalidade para poder produzir diferentes sons com a célula infectada e o vírus. O conceito musical é descrito pela Björk como “música generativa”, porque a “pequena música pop” é diferente consoante o número de células infectadas (Björk, 2012). 3.3. Envolvimento do público 113

Fig. 63: Interface da app Moon, Biophilia (Björk, Scott Snibbe Studios, M/M Paris, 2011) Fig. 64: Interface da app Virus, Biophilia (Björk, Scott Snibbe Studios, M/M Paris, 2011)

Os utilizadores podem usar a Biophilia para “fazer a aprender sobre música, para saber mais sobre fenómenos naturais, ou apenas para disfrutar a música da Björk” (Snibbe, 2011). Ness sentido, o papel do utilizador é configurativo, no sentido em que actua através dos componentes visuais e musicais da app, compondo e gravando as compo- sições, por um lado, e aprendendo sobre conceitos musicais, por outro. A app existe em dispositivos que os utilizadores já têm e usam, tomando partido do touch sceen que permite a alteração de componentes visuais e musicais através do toque. Através da interface gráfica das apps o utilizador pode também compor música com outros sons que não os inicialmente disponibilizados pela app, gerando resultados rearranjando material ou criando material novo.

REWORK_ (Philip Glass Remixed), Philip Glass

REWORK_ (Philip Glass Remixed) (2012) de Philip Glass é uma “tour interactiva” ao álbum homónimo de remisturas de músicas de Philip Glass, que inclui “onze visuali- zações interactivas das músicas remisturadas” e uma ferramenta “interactiva” que “per- mite às pessoas criarem a sua própria música” inspirando-se na obra de Glass (Snibbe, 2012). O conceito do álbum é a exploração da obra de Glass através de remisturas de músicas suas por músicos por ele influenciados. Dado que “as possibilidades de manipulação de som para a pessoa comum cresceram massivamente” (Saeed, 2012), a app propõe esta mesma possibilidade de composição ao público. Como tal “o ouvinte torna-se o artista” (Snibbe, 2013). 114

Fig. 65: Interface da app REWORK_, Beck (Philip Glass, Beck, Scott Snibbe Studios, 2012) Fig. 66: Interface da app REWORK_, Amon Tobin (Philip Glass, Scott Snibbe Studios, 2012)

A app tem dois componentes, um que consideramos um visualizador (de parâme- tros musicais) e outro um instrumento. O primeiro permite ouvir as remisturas dos músicos convidados acompanhadas por visuais sincronizados. Como cada música foi remisturada por um músico diferente, com sensibilidades e intenções divergentes, as visualizações seguem diferentes normas funcionais, embora todas reajam ao toque do utilizador.

Para a remistura de Beck NYC: 73-78, que dura 22 minutos e inclui fragmentos de 80 peças de Philip Glass, por exemplo, foi construído um “sistema dinâmico” no sentido de “capturar os sentimentos e humores complexos” da música. No modo de visualização de Amon Tobin foram usados os cubos que usou num outro projecto, a performance audiovisual ISAM, construindo uma matriz de cubos na qual se notam “ondulações 3D, fragmentações, rotações, e explosões” ao longo da reprodução da música. A remistura de Nosaj Thing, por outro lado, fez com que os criadores daapp “descobrissem o que poderiam fazer com um conjunto simples de linhas” no sentido de tornar o observador “sensível às diferentes dimensões da música”, funcionando simultaneamente como “uma metáfora para ondas sonoras, uma pauta musical tradi- cional, ou cordas de guitarra” (Saeed, 2012).

A Glass Machine permite ao utilizador compor música e consiste em quatro círculos manipuláveis que possibilitam a criação de “arpejos tipo-Glass segundo combinações intermináveis” de acordo com padrões musicais presentes na sua música nos anos 70 (Saeed, 2012). Ou seja, através desta ferramenta o projecto musical almeja tor- nar acessível a composição musical de Glass ao público geral e não apenas a músicos profissionais, podendo o utilizador compor de acordo com, e também visualizar, os métodos de composição do compositor americano. 3.3. Envolvimento do público 115

Fig. 67: Interface da app REWORK_, Nosaj Thing (Philip Glass, Scott Snibbe Studios, 2012) Fig. 68: Glass Machine da app REWORK_, (Philip Glass, Scott Snibbe Studios, 2012)

Cada componente é tipologicamente divergente, mesmo funcionando através da mesma app, promovendo tipos diferentes de envolvimento do público. Nos modos de visualização das remisturas o papel do utilizador é tendencialmente exploratório, sendo que este acede a configurações que foram definidas sem a sua intervenção e que, embora reajam ao toque, são sempre as mesmas. A Glass Machine promove um pa- pel configurativo do utilizador, que através dela cria respostas sonoras, ou seja, novos outputs.

Polyfauna, Radiohead

Na app Polyfauna (2014) dos Radiohead, o ecrã do dispositivo é “uma janela para um mundo em evolução” no qual o utilizador se move para “olhar à sua volta” (iTunes, 2014). O projecto musical pediu aos Universal Evertything para desenvolverem uma app gratuita que fosse “audiovisual e exploratória”, e que partisse das sessões de composição e gravação do álbum The King of Limbs (2011) e dos esboços de Stanley Donwood, responsável por todos os elementos visuais associados à edição musical. Como tal, o ambiente imersivo almeja expandir a obra do projecto musical, criando “versões abstractas, expandidas e explodidas da obra auditiva e visual da banda” (Uni- versal Everything, 2014).

A app poderá ser entendida como uma ferramenta de narração (abstracta). Por narra- tiva entenda-se a sequência de eventos que o projecto define através de som e imagem. Segundo um “calendário lunar, a app misteriosa e imersiva ganha vida através do toque e oferece um conjunto de experiências e encontros diferentes e únicos de cada vez que é usada” (Universal Everything, 2014). Compondo este “mundo imersivo e expansi- vo” existem “formas de vida primitiva, clima, pores-do-sol, montanhas e florestas”, 116

que partem do interesse em explorar “as criaturas imaginadas do nosso subconsciente”, inspiradas nas “pinturas de paisagens atmosféricas de J. W. Turner e Peter Doig” e nas “formas de vida computacionais de Karl Sims” (Universal Everything, 2014).

Como tal, a app não oferece várias faixas musicais mas sim um universo audiovisual completo em si mesmo, enquanto produto autónomo, cujos elementos musicais e visuais são explorados pelo utilizador em espaços navegáveis, construtivos do ambiente virtual. A dimensão visual e musical muda de acordo com as acções do utilizador, atra- vés do movimento do dispositivo e do toque. A exploração desse ambiente promove a comunicação entre utilizadores através da partilha de screenshots de locais encontrados através da app, incitando a sua exploração por outros utilizadores.

Fig. 69: Interface da app Polyfauna (Radiohead, Universal Everything, 2014)

O papel do utilizador é maioritariamente exploratório embora seja pontualmente configurativo. Tocando no touch screen, o utilizador pode deixar pequenos vestígios efémeros, podendo também mexer literalmente todo o dispositivo no sentido de ex- plorar o ambiente virtual da app, que faz com que decida o que vê e ouve. Como tal, o utilizador decide qual o percurso a seguir, podendo criar componentes efémeros, agindo portanto sobre o material que lhe é apresentado. 3.3. Envolvimento do público 117

3.3.4. Conclusões

Universo conceptual

As apps expandem o universo conceptual da edição, adicionando possibilidades que reforçam as intenções conceptuais dos seus autores, explorando conceitos presentes na composição e produção musical de uma maneira nova, não possível através de outros desdobramentos.

Consideremos a edição Biophilia, que almeja a exploração das relações entre fenó- menos naturais e conceitos musicais. Esta intenção conceptual está presente tanto na produção musical, sendo que a estrutura das músicas se baseia nos fenómenos naturais que descrevem, como nos desdobramentos da música, por exemplo nas imagens pro- mocionais (e também na capa do álbum) nas quais Björk segura cristais enquanto o seu vestido incorpora um instrumento musical tipo-arpa. A esta coerência temática a app acrescenta uma dimensão didáctica, apenas possível segundo as suas características operativas e produtivas, possibilitando a exploração interactiva por parte do público, que assim aprende sobre conceitos musicais, através de diferentes funcionalidades baseadas em fenómenos naturais.

O conceito da edição REWORK_, a exploração da obra de Philip Glass, resultou numa colecção de remisturas por músicos profissionais cuja produção musical foi influenciada por Glass. A este conjunto de remisturas, a app adiciona visualizações que procuram proporcionar um vislumbre da sua construção musical, facilitando a compreensão da sua composição pelo público. A app oferece também uma interface de produção musical que, embora baseada na música de Glass, é suficientemente simples para o público geral usar, evidenciando a maneira como a produção musical mudou desde a altura em que a música de Glass era pioneira nos anos 70.

Podemos evidenciar que através destas apps o universo conceptual da edição musical foi expandido no sentido de incluir o público, promovendo a criação de composições. A app Polyfauna, no entanto, não permite a criação de outputs de maneira tão eviden- te, concentrando-se na exploração de novas maneiras de relacionar som e imagem, revisitando a obra musical e visual da banda. Embora tenham sido utilizadas sessões de composição e gravação, bem como esboços feitos no sentindo de criar a dimensão 118

visual do The King of Limbs(2011), a maneira como se relacionam num ambiente audiovisual imersivo só é possível através da app.

Baseamos esta ideia na relação metafórica145 entre o conceito da edição musical e a experiência promovida pela app. Isto deve-se à mecânica construtiva das apps que as- sociamos à noção de Murray de “mecânica de jogo”, considerando nomeadamente a maneira como esta “pode mapear símbolos” em relação às “acções que representam”. De acordo com esta noção, “lançar um dado no jogo Dungeos and Dragons” equivale a fazer um feitiço no “mundo do jogo” (Murray, 2011). De modo semelhante, na app Moon (parte da Biophilia), o utilizador define quais as notas que quer tocar segundo o nível das marés e quantas vezes se vai ouvir cada nota segundo as fases da lua. Através da interface da aplicação o utilizador escorrega o dedo para cima no touchscreen para “subir a maré” e o oposto para baixar a maré, resultando respectivamente, em notas mais agudas e notas mais graves, sendo algo que o utilizador descobre intuitivamente segundo outros interfaces de produção musical. Neste caso a relação metafórica baseia- -se no conteúdo lírico da faixa musical associada, a par com as indicações gráficas que recebemos da app como a lua e o “líquido” azul que corre entre as notas. Não existe, no entanto, nenhuma representação gráfica da maré em si, como existe uma representação gráfica da lua. As acções do utilizador na lua, que está realisticamente representada, não estão associadas a resultados cientificamente alinhados com as suas diferentes fases. O utilizador, através do touchscreen, influencia o mundo particular da app, definindo o número de vezes que determinada nota se faz ouvir.

Tipologia

Ao contrário de outros desdobramentos da música pop, como o álbum físico (ou digital) ou o videoclip, as apps têm múltiplas tipologias, ou seja, têm diferentes funções que promovem diferentes tipos de relação com o utilizador. Como tal, são simulta- neamente jogos, instrumentos, visualizadores de parâmetros musicais, ferramentas de narração, etc., promovendo uma interpretação renovada a cada utilização.

Na Biophilia, a app Moon promove especialmente a composição musical, embora a sincronização de respostas musicais e visuais a tornem também um visualizador de

145 A metáfora pode ser enendida como “a fundamental strategy of human cognition, by which we understand one thing by mapping it onto something else, usually something drawn from concrete physical experience” (Mur- ray, 2011). 3.3. Envolvimento do público 119

parâmetros musicais. A Crystalline, por outro lado, é um jogo cuja resposta é também sonora, e como tal funciona simultaneamente como uma ferramenta para remistura musical. A tipologia dominante da app Virus é definida consoante cada visita, sendo que o utilizador pode jogar com o objectivo de salvar a célula, ou deixar a célula definhar, perdendo o jogo, e usar a célula infectada como instrumento musical. Atra- vés da REWORK_ o utilizador pode apenas ouvir a música acompanhada por visuais sincronizados, sem interferir, podendo também alterá-los momentaneamente através do toque. Pode, por outro lado, escolher uma secção inteiramente diferente da app e compor música.

A app Polyfauna foca-se na narração de um universo particular através do ambiente imersivo, atendendo à noção de que uma “representação narrativa” deve ser “temati- camente unificada e logicamente coerente” (Ryan, 2001). Esta narração é feita pelos excertos musicais que se fazem ouvir em cada um dos espaços, resultando numa assi- natura audiovisual particular a cada utilização, sendo que a app se reconfigura a cada visita. A app oferece também possibilidades de comunicação entre utilizadores, através da partilha de locais encontrados na app no website dos Radiohead. Como tal, consi- deramos que a app tem tipologias diversificadas não só pelas possibilidades de narração e comunicação, mas porque o ambiente é reconfigurável, e como tal não estático, não se apresentando sempre da mesma maneira.

Mesmo tendo tipologias diversificadas, explorando dimensões tanto musicais como visuais e as suas relações, notamos que as apps permitem predominantemente a com- posição musical. Por exemplo, o propósito predominante de oito146 das nove apps que compõem a Biophilia é a composição musical (embora em todas elas sejam criadas respostas visuais emparelhadas com a música). Na REWORK_ os outputs que podem ser criados pelo utilizador são também composições musicais. Esta função dominante é reforçada pelos visuais que acompanham as músicas, apenas momentaneamente alteráveis, que servem essencialmente para visualizar parâmetros musicais.

Atendendo ao propósito predominante das apps, estas procuram tornar a composição musical mais acessível ao utilizador, usando as convenções associadas ao touchscreen e consequentes gestos padrão. Nesse sentido, as interfaces de produção musical destas

146 As apps de Biophilia cujo propósito dominante é a composição musical excluem apenas as apps Cosmogony (a mother-app) e Crystalline. Elas são Solstice, Mutual Core, Moon, Virus, Hollow, Sacrifice, Dark Matter e Thunderbolt (Snibbe, 2011). 120

apps são mais simples e acessíveis do que as ferramentas que servem especificamente para produzir música, tanto porque estarem associadas a dispositivos que o público já tem como por serem mais baratas. Tal é evidente nas várias apps que compõem Biophilia, por exemplo na Moon e na Hollow, na qual Björk procurou simplificar a uti- lização de um sequenciador e de uma drum machine respectivamente. Também a app REWORK_ procura simplificar a composição musical, nomeadamente os métodos de composição musical de Philip Glass, tornando-os acessíveis ao público.

Agência

As apps permitem criação e exploração por parte do público, que age directamente no dispositivo através de toque e movimento, partindo de materiais associados à produ- ção musical, como por exemplo samples sonoros. Como tal, associamos a experiência imediata que a app proporciona à noção de agência como definida por Murray (Ri- bas, 2012: 5), no sentido em que as acções do utilizador resultam na criação de algo tangível.

Segundo Murray, deve ser feita a distinção entre “actividade” e “agência”, que não deve ser confundida com a “mera possibilidade de clicar no rato (Ribas, 2012: 222). Murray relaciona agência não só com a possibilidade de criar algo mas também com “a maneira como “alinhadas com efeitos tangíveis”, sendo agência, nesse sentido, “o poder satisfatório de realizar acções significativas e ver os resultados das nossas escolhas e decisões” (2012: 222). A criação de outputs tangíveis é particularmente evidente nas apps Biophilia e REWORK_, através das quais são criadas composições musicais, mas podemos também evidenciar a agência do utilizador na exploração de diferentes espaços virtuais, como acontece na app Polyfauna. Murray associa agência tanto aos “prazeres da navegação espacial, ou seja, à possibilidade de aceder a diferentes espaços”, e consequentemente aos “padrões de exploração e descoberta”, como ao “papel cons- trutivo que os utilizadores assumem quando podem construir de alguma maneira o próprio conteúdo da obra” (2012: 223).

Embora as apps tirem partido do que o utilizar já conhece em relação ao funcionamento dos dispositivos móveis, nomeadamente das suas interfaces, até uma relação imediata com o sistema interactivo exigirá um período de adaptação por parte do utilizador, no qual este aprende as especificidades do funcionamento da app. Nenhuma das três apps apresenta regras ao utilizador, nem disponibilizam guias de utilização, promovendo a 3.3. Envolvimento do público 121

exploração de ambientes organizacionais pouco familiares, como a galáxia de Biophilia ou o ambiente estilizado de Polyfauna. Cabe ao utilizador descobrir a diferença entre os elementos da interface gráfica e o seu funcionamento específico, no sentido de criar respostas musicais e visuais concretas.

Relação continuada

As apps promovem uma relação continuada147 entre o público e a edição musical, existindo num dispositivo acessível ao utilizador e potenciando a contínua e renova- da atenção do utilizador. Atendendo à experiência que as apps promovem podemos considerar, por um lado, as acções do utilizador e o seu “efeito imediato na superfície audiovisual”, e por outro, a “interactividade enquanto uma actividade relacional en- tre utilizador e sistema, ou seja, um processo que se desdobra no tempo implicando diferentes estados de exploração e envolvimento com o artefacto” (Ribas, 2012: 226). Como tal, uma relação continuada com uma app pressupõe que o utilizador a usou repetidamente e que aprendeu o seu funcionamento concreto, sendo que “apenas atra- vés de observação ou interacção repetida é que se pode entender as causas (ou regras) que levam a superfície a variar” (2012: 261).

Ficando a conhecer a app e as suas possibilidades, o utilizador tem a oportunidade de ganhar mestria em relação ao funcionamento concreto da aplicação. Ou seja, depois de um “encontro inicial com o sistema”, que levanta a questão “do que é que o sistema faz”, o utilizador foca-se “no que se pode fazer com ele” (Ribas, 2012: 263). A Biophi- lia, por exemplo, apresentando diferentes apps com diferentes funcionalidades, desafia a mestria do utilizador no sentido em que este terá de as usar repetidamente para saber exactamente como funcionam e que resultados produzem.

As apps analisadas, no entanto, fomentam uma relação continuada particularmente através da reconfiguração de respostas, ou seja, proporcionando novos resultados a cada utilização. Como tal, as “expectativas que o utilizador construiu gradualmente através de observação e interacção” são desafiadas por “respostas inesperadas”. Isto por- que “quando os utilizadores sentem que esgotaram todas as possibilidades oferecidas

147 Consideramos para a compreensão da relação continuada entre o utilizador e uma app os termos “at- tractors”, o que “encoraja a audiência a reparar no sistema em primeiro lugar”, “sustainers”, o que “mantêm a audiência envolvida durante um encontro inicial”, e “relators”, o que promove uma “relação continuada” para que “a audiência retorne à obra em ocasiões futuras” (Ribas, 2012: 262). 122

pelo sistema” tendem a terminar a relação que tinham estabelecido com ele (Ribas, 2012: 264).

Por exemplo, nas apps Biophilia e REWORK_, que apresentam ferramentas tipo-ins- trumento, a composição musical permite variações virtualmente inesgotáveis. Através da app Moon é possível definir notas, a sucessão dessas notas, pausas, e o número de vezes que cada nota (ou pausa) da sequência é repetida. O utilizador pode também explorar a “galáxia” onde estão as várias apps, optando por uma app tipo-instrumento (como a Moon) ou uma app tipo-jogo (como a Crystalline) ou uma app cuja tipologia depende da acção do utilizador (como a app Virus). Dentro de cada app, o utilizador pode também ouvir a música, acompanhada com a letra, ou com notação musical. Na app Polyfauna, por outro lado, o utilizador é continuamente surpreendido pela reconfiguração do ambiente virtual, que faz com que cada visita seja sempre (mesmo que por vezes apenas vagamente) diferente. Além disso, a maneira como o utilizador explora o ambiente intuitivamente, através do corpo, faz com que nenhum percurso escolhido seja exactamente igual ao anterior, potenciando experiências únicas a cada utilização. 123

Conclusão

Esta investigação procurou identificar estratégias emergentes de veiculação da música pop no contexto contemporâneo, contemplando as possibilidades dos media digitais e sua influência na produção e disseminação da música.

Procurou-se, primeiramente, proporcionar um entendimento da música pop enquan- to fenómeno audiovisual que se apresenta inicialmente incompleto, considerando as estratégias artísticas que ajudam a construir a sua dimensão visual. Para tal foram traçadas quatro narrativas entrecruzadas, focadas em diferentes aspectos que reforçam a audiovisualidade da música pop ao longo do século XX. Através destas narrativas tra- ta-se a assimilação das artes visuais pela música pop e vice-versa, o esforço colaborativo resultante desse cruzamento de campos artísticos, a reconfiguração da performance musical atendendo à transformação dos modos de correlacionar som e imagem, e por fim a promoção do envolvimento do público na produção e disseminação da música pop.

De seguida, focámos a convergência dos media no meio digital (no final do século XX), que tende a afectar tanto a produção como a recepção da música pop, influen- ciando os vários aspectos tratados nas narrativas propostas. Nesse sentido, evidencia-se como, no contexto contemporâneo, ferramentas digitais potenciam a articulação de diferentes campos criativos segundo a produção simultânea de som e imagem através do computador, envolvendo colaborações entre músicos e artistas visuais, designers, programadores, etc. O computador passa a assumir o papel tanto de instrumento musical como de ferramenta de produção imagética, promovendo também a reconfi- guração das performances ao vivo e o envolvimento (perceptivo e activo) do público. 124

A concepção da música pop enquanto projecto total é assim reforçada, atendendo à construção simultânea das suas dimensões musicais e visuais, implicando uma conver- gência de linguagens estéticas e de media no computador enquanto metamedium. De acordo com este enquadramento, considerámos produtos e estratégias actualmente usados na veiculação da música pop como fenómenos passíveis de estudo enquanto exemplos da ligação entre modos de produção sonoros e imagéticos e de uma expres- são artística audiovisual.

Foram seleccionados para análise desdobramentos contemporâneos da música pop, enquanto estratégias ou produtos utilizados na sua veiculação, procurando evidenciar tipologias, plataformas e estratégias de disseminação utilizadas, bem como colabo- rações associadas. Segundo esta análise, reconhecemos como estratégia emergente a utilização de plataformas online e dispositivos móveis como meios de disseminação. Evidenciámos também que tendem a ser exploradas as convenções operativas inerentes a estas plataformas e dispositivos, bem como eventuais possibilidades produtivas, no sentido de envolver activamente o público (tanto através da sua participação enquanto colaborador como da sua acção enquanto utilizador). Por fim, reconhecemos as apli- cações interactivas para dispositivos móveis (apps) como merecedoras de uma análise mais aprofundada enquanto desdobramentos emergentes de veiculação da música pop. Para tal, estudámos particularmente o envolvimento do público promovido pelas apps, examinando o que fazem e o que permitem ao utilizador fazer. Nesse sentido, foram analisadas as apps Biophilia (2011) de Björk, REWORK_ (Philip Glass Remixed) (2012) de Philip Glass e Polyfauna (2014) dos Radiohead e Universal Everything.

Discussão de Resultados

Concluímos que as apps podem ser entendidas como uma nova forma de álbum ou apenas como uma estratégia de disseminação do mesmo, reforçando as intenções con- ceptuais associadas à edição musical ao possibilitar a exploração de conceitos inerentes à composição e produção musical de uma maneira nova. Esta novidade, em relação a outros desdobramentos, incide sobretudo na exploração interactiva por parte do público, que relacionamos com a noção de agência, sendo que as acções do utilizador resultam na criação de algo tangível, de acordo com o seu papel exploratório e/ou configurativo. 125

Nesse sentido, por um lado, as apps oferecem uma experiência imediata ao público, que age directamente sobre materiais associados à produção musical (como por exem- plo samples sonoros) através de toque e movimento. Por outro lado, promovem uma relação continuada entre o utilizador e a edição musical, atendendo às possibilidades de exploração e criação aliadas às tipologias das apps enquanto jogos, instrumentos musicais ou visualizadores de música que possibilitam uma experiência renovada a cada visita ao sistema. Esta relação continuada é também substanciada pela possível reconfiguração, actualização e consequente expansão das apps, que proporcionam respostas diferentes a cada utilização e permitem ao público explorar as suas inúmeras variáveis. Por exemplo, o ambiente virtual da app Polyfauna é continuamente recon- figurado, fazendo com que cada visita ao sistema seja sempre diferente. Em apps que apresentam ferramentas tipo-instrumento o utilizador pode definir diferentes notas, pausas, ritmos, etc., bem como recorrer a diferentes samples sonoros, permitindo va- riações virtualmente inesgotáveis de composições musicais.

Consideramos que através das apps a música pop é concretizada enquanto fenómeno audiovisual de forma renovada. Embora outros desdobramentos almejem uma arti- culação simultânea entre som e imagem, como os videoclips (tanto clássicos como interactivos) que acompanham os singles ou as estratégias como o guerrilla marketing que antecedem o lançamento do álbum, estes servem ainda para completar a música pop enquanto fenómeno audiovisual, incompleto enquanto gravação sonora. Por sua vez, as apps promovem a exploração de determinado universo pop enquanto ambiente audiovisual, concretizando a intenção da veiculação simultânea das dimensões sono- ras e imagéticas associadas a determinada edição musical. Tal é evidente na ligação entre as músicas produzidas por Björk e as apps a elas associadas na edição Biophilia, onde relações entre fenómenos naturais e conceitos musicais são evidenciadas, ou no ambiente virtual imersivo de Polyfauna, uma colaboração entre os Radiohead e os Universal Everything, onde o utilizador explora simultaneamente o imaginário visual e musical da banda.

A exploração das possibilidades operativas e produtivas das apps promove um envolvi- mento activo do público, atribuindo-lhe um papel exploratório e configurativo. Nesse sentido, o público é tanto consumidor (passivo) de um produto como construtor (ac- tivo) de respostas através dele, tomando partido das possibilidades criativas que lhe são disponibilizadas. Fazendo mais do que apenas ouvir música, enquanto manipulador e criador de outputs, o público estabelece uma relação com a edição musical através de 126

um único produto capaz de articular em pleno o universo conceptual da edição pop. Esta relação é potenciada tanto pelas respostas que o utilizador pode criar, como pela actualização e expansão das apps ao longo do tempo. Como tal, a disseminação da música pop poderá passar do desenvolvimento de vários desdobramentos associados a uma edição musical (como o videoclip, o poster, as edições físicas especiais, etc.) para a expansão continuada de um só produto (como a app) segundo a actualização permanente de uma edição musical particular.

Limitações e investigação futura

Nesta investigação procurámos identificar desdobramentos actuais da música pop enquanto produto (sobretudo) cultural. Como tal, uma investigação futura poderia focar-se na análise do contexto actual do consumo de música enquanto produto comercial. Nesse sentido, seria produtivo analisar o consumo de música enquanto ficheiro digital, nomeadamente em lojas online (como o iTunes) associadas a dispo- sitivos móveis (como o iPod ou o iPhone), bem como o papel das plataformas de partilha de música (como o Spotify ou a Apple Music). Tal poderia contribuir para um entendimento da forma como estes fenómenos (potencialmente) influenciam o desenvolvimento de estratégias alternativas para promover música no meio digital (como as apps).

Relativamente aos desdobramentos analisados, optámos por incidir num universo restrito de exemplos a fim de identificar produtos e estratégias emergentes de veicu- lação da música pop. Portanto, uma análise mais vertical das apps poderia incidir no seu funcionamento e convenções (gameplay e carácter instrumental), expandindo o universo de exemplos a analisar a partir das conclusões tiradas neste estudo. Admiti- mos igualmente a possibilidade de aprofundar o papel exploratório e configurativo do utilizador, através de métodos como a análise estruturada do uso de apps, recorrendo a uma amostra de utilizadores. Atendendo a estes métodos, poderiam ser avaliadas as espectativas criadas sobre o uso das apps e a experiência que proporcionam numa relação continuada com o público.

Esta investigação visou estratégias e produtos utilizados na veiculação da música pop no contexto contemporâneo, reconhecendo que, neste âmbito, frequentemente, a prática antecede a teoria. Nesse sentido, assumimos este estudo como um ponto de partida para um entendimento de uma contínua expansão de contextos onde a música pop 127

se insere, em continuidade com a sua história associada à constante evolução e inter- -relação de media e formas de expressão. Procurámos, desta forma, contribuir para um olhar renovado sobre os desdobramentos contemporâneos da música pop enquanto exemplos paradigmáticos da ligação permanente entre som e imagem, entre media e entre formas de expressão artística que permeiam a cultura de massas contemporânea.

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Obras citadas

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Apps citadas

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Projectos musicais citados

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Edições musicais citadas

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Anexos

Anexo 1: Tabela de análise das edições musicais. Anexo 2: Tabela de análise dos desdobramentos. Anexo 3: Tabela de análise das apps. Tabela de análise das edições musicais

Arcade Fire Björk Cut Copy Gorillaz Hot Chip John Moose Massive Attack Passion Pit Radiohead Sigur Rós The Presets

1991

Debut Pablo Honey

1995 Post Protection The Bends Capa do álbum, elementos gráficos associados ao ábum “clássico” por Stanley Donwood

OK Computer Capa do álbum, elementos gráficos Von associados ao ábum “clássico” por Mezzanine Stanley Donwood. Campanha públicitária “não ortodoxa” Documentário, Grant Gee Homogenic All is Full of Love, videoclip por Chris Cunningham, Ágætis byrjun em exposição no MoMA 2000 Kid A Capa do álbum, elementos gráficos associados ao ábum “clássico” por Vespertine Capa do álbum, elementos gráficos associados ao Gorillaz Amnesiac Stanley Donwood. Blips online, ábum “clássico” por Inez and Vinnodh e M/M Paris iBlip java applet, para pre-order Hidden Place, videoclip por Inez and Vinnodh e streaming ( ) e M/M Paris 100th Window Live visuals para Hail to the Thief Capa do álbum, elementos gráficos Funeral Medúlla Bright Like Coming on Strong performances ao associados ao ábum “clássico” por Neon Love vivo por UVA Stanley Donwood. radiohead.tv, 2005 Demon Days Reject False Icons Três updates aos plataforma online com short films, Takk... Beams (guerrila marketing), live visuals, 2004, videoclips, live webcasts colaboração por concurso The Warning 2006, 2008 TMGLMOAT, conteúdos online Website, actuallização de conteúdos, comunicação Neon Bible Neon Bible, considerado o primeiro videoclip interactivo, Volta Pré-lançamento, virtual marketing, através do In Rainbows Capa do álbum, elementos gráficos entre utilizadores em exposição no MoMA, pelo estúdio AATOAA Youtube e Myspace. Capa do álbum, elementos associados ao ábum “clássico” por Hologramas gráficos associados ao ábum “clássico” por M/M Paris Made in the Dark Stanley Donwood. Lançado Með suð í Apocalypso Innocence, colaboração por concurso. Declare Independence, através de Pay-what-you-want, eyrum við spilum Michael Gondry, lançado no AOL (plataforma online) Manners online. Colaboração por concurso endalaust Wanderlust, Encyclopedia Pictura, lançado no Yahoo Music, videoclip em Stereoscopic 3D. The Dull Flame of Desire, 2010 The Suburbs Capa do álbum, elementos gráficos associados ao ábum “clássico” One Life Stand colaboração por concurso Plastic Beach Heligoland United Snakes, pelo estúdio AATOAA. We Use to Wait, videoclip interactivo, Google Maps, videoclip para promover GoogleMaps, Google. Scenes from the Suburbs, Biophilia Capa do álbum, elementos gráficos associados ao Zonoscope The Fall Composição e gravação por UVA The King of Limbs Capa do álbum, elementos gráficos curta metragem, Spike Jonze, Berlin International Film Festival. The Suburbs, ábum “clássico” por M/M Paris. Sessão fotográfica, musical no iPad associados ao ábum “clássico” por Spike Jonze, a partir da curta metragem. Booklet digital para iPod videoclip por Inez and Vinnodh. App ( Apps para composição Moon mother-app In Our Heads Gossamer App, para iPad, Stanley Donwood. Valtari The Valtari Mistery Film Experiment, Pacifica pelo estúdio AATOAA. Sprawl II, videoclip interactivo pelo estúdio AATOAA e gravação musical e single apps) para iPad, por M/M Paris e Scott Snibbe por Scott Snibbe The Universal Sigh, jornal colaboradores com liberdade criativa Documentário, When Björk Met Attenborough partilhadas online pela Polyfauna, app, iPad, Reflektor Capa do álbum, elementos gráficos associados ao ábum “clássico” Free Your Mind Let Me Show You Love, single, Kveikur videoclips para todas as músicas Instrumentos (para gravação e performance ao vivo) banda autoria partilhada, Radiohead por Caroline Roberts. Simbolo (guerrila marketing) Pitchfork Music Festival, do álbum fugindo á lógica do single Concert film, Tribeca Film Festival e Universal Everything por Caroline Roberts. Just a Reflektor, videoclip interactivo vinil cut-on-site. Billboards, (a par com um videoclip “clássico”) pelo estúdio AATOAA website, streaming We Are Explorers, videoclip, 2015 Vulnicura Capa do álbum, elementos gráficos associados ao Why Make Sense? Capa do álbum, John Moose App, permite ouvir Kindred ‘No Fun’ - Single Google Cube, Google file sharing, impressão 3D, ábum “clássico” por M/M Paris. Short films método de o álbum gratuitamente por Party! promocionais, com excertos das músicas impressão especial apenas na floresta, (promovem a exposição e o álbum). Exposição, feito pelo baterista MoMA. Livro da banda Tabela de análise das edições musicais Tabela de análise dos desdobramentos

Arcade Fire Björk Cut Copy Gorillaz Hot Chip John Moose Massive Attack Passion Pit Radiohead Sigur Rós The Presets Desdobramento Projecto Musical Tipologia Colaborador(es) Online / Offline O público faz mais além de ouvir e ver

Online Offline Sim Não

1991 Blue Lines OK Computer (1997) Radiohead Campanha públicitária “não ortodoxa” (objectos com letras de músicas, etc.) -

Debut Pablo Honey Meeting People Is Easy (1998) Radiohead Documentário Grant Gee

Kid A (2000) Radiohead “blips” (short films) distribuidos online, “iBlip” - java applet para pre-order, streaming -

1995 Post Protection The Bends Capa do álbum, elementos gráficos radiohead.tv (2003) Radiohead Website - associados ao ábum “clássico” por Stanley Donwood 100th Window Tour (2003) Massive Attack Live visuals actualizáveis (hardware e software) United Visual Artists

OK Computer Capa do álbum, elementos gráficos Von The Most Gigantic Lying Mouth of All Time (2004) Radiohead Colecção de conteúdos online - associados ao ábum “clássico” por Mezzanine Stanley Donwood. Campanha Reject False Icons (2005) Gorillaz Guerrilla marketing - públicitária “não ortodoxa” Documentário, Grant Gee Homogenic All is Full of Love, videoclip por Chris Cunningham, Ágætis byrjun In Rainbows (2007) Radiohead Pay-what-you-want - em exposição no MoMA 2000 Kid A Capa do álbum, elementos gráficos Neon Bible (2007) Arcade Fire Videoclip interactivo (clique) Studio AATOAA associados ao ábum “clássico” por Vespertine Capa do álbum, elementos gráficos associados ao Gorillaz Amnesiac Stanley Donwood. Blips online, Volta (2007) Björk Viral marketing, colaboração por concurso - ábum “clássico” por Inez and Vinnodh e M/M Paris iBlip java applet, para pre-order e streaming Hidden Place, videoclip por Inez and Vinnodh ( ) Wanderlust (2007) Björk Videoclip em stereoscopic 3D Encyclopedia Pictura e M/M Paris 100th Window Live visuals para Hail to the Thief Capa do álbum, elementos gráficos Funeral Medúlla Bright Like Coming on Strong performances ao associados ao ábum “clássico” por The Suburbs (2010) Arcade Fire Booklet digital (iPod) Studio AATOAA Neon Love vivo por UVA Stanley Donwood. radiohead.tv, 2005 Demon Days Reject False Icons Três updates aos plataforma online com short films, Takk... Beams Biophilia App (2011) Björk App Scott Snibbe, M/M Paris (guerrila marketing), live visuals, 2004, videoclips, live webcasts 2006, 2008 colaboração por concurso The Warning TMGLMOAT, conteúdos online Biophilia Tour (2011) Björk Performance ao vivo / instrumentos - Website, actuallização de conteúdos, comunicação Neon Bible Neon Bible, considerado o primeiro videoclip interactivo, Volta Pré-lançamento, virtual marketing, através do In Rainbows Capa do álbum, elementos gráficos Scenes from the Suburbs (2011) Arcade Fire Curta-metragem Spike Jonze entre utilizadores em exposição no MoMA, pelo estúdio AATOAA Youtube e Myspace. Capa do álbum, elementos associados ao ábum “clássico” por Hologramas gráficos associados ao ábum “clássico” por M/M Paris In Ghost Colours Made in the Dark Stanley Donwood. Lançado Með suð í Apocalypso Sprawl II (2011) Arcade Fire Videoclip interactivo (webcam) Studio AATOAA Innocence, colaboração por concurso. Declare Independence, através de Pay-what-you-want, eyrum við spilum Michael Gondry, lançado no AOL (plataforma online) online. Colaboração por concurso endalaust Manners The Fall (2011) Gorillaz Partilha de materiais de composição musical (iPad) - Wanderlust, Encyclopedia Pictura, lançado no Yahoo Music, videoclip em Stereoscopic 3D. The Dull Flame of Desire, 2010 The Suburbs Capa do álbum, elementos gráficos associados ao ábum “clássico” One Life Stand (2011) Radiohead colaboração por concurso Plastic Beach Heligoland United Snakes, The Universal Sigh Jornal Stanley Donwood pelo estúdio AATOAA. We Use to Wait, videoclip interactivo, Google Maps, videoclip para promover GoogleMaps, Google. Scenes from the Suburbs, Biophilia Capa do álbum, elementos gráficos associados ao Zonoscope The Fall Composição e gravação por UVA The King of Limbs Capa do álbum, elementos gráficos The Wilderness Downtown (2011) Arcade Fire Videoclip interactivo (Google Chrome + HTML5) Google curta metragem, Spike Jonze, Berlin International Film Festival. The Suburbs, ábum “clássico” por M/M Paris. Sessão fotográfica, musical no iPad associados ao ábum “clássico” por Spike Jonze, a partir da curta metragem. Booklet digital para iPod videoclip por Inez and Vinnodh. App ( Apps para composição Moon mother-app In Our Heads Gossamer App, para iPad, Stanley Donwood. Valtari The Valtari Mistery Film Experiment, Pacifica Gossamer App (2012) Passion Pit App Scott Snibbe pelo estúdio AATOAA. Sprawl II, videoclip interactivo pelo estúdio AATOAA e gravação musical e single apps) para iPad, por M/M Paris e Scott Snibbe por Scott Snibbe The Universal Sigh, jornal colaboradores com liberdade criativa Documentário, When Björk Met Attenborough partilhadas online pela Polyfauna, app, iPad, Reflektor Capa do álbum, elementos gráficos associados ao ábum “clássico” Free Your Mind Let Me Show You Love, single, Kveikur videoclips para todas as músicas The Valtari Mistery Film Experiment (2012) Sigur Rós Videoclips para todas as músicas do álbum - Instrumentos (para gravação e performance ao vivo) banda autoria partilhada, Radiohead por Caroline Roberts. Simbolo (guerrila marketing) Pitchfork Music Festival, do álbum fugindo á lógica do single Concert film, Tribeca Film Festival e Universal Everything por Caroline Roberts. Just a Reflektor, videoclip interactivo vinil cut-on-site. Billboards, Free Your Mind (2013) Cut Copy Billboards, Streaming - (a par com um videoclip “clássico”) pelo estúdio AATOAA website, streaming We Are Explorers, videoclip, 2015 Vulnicura Capa do álbum, elementos gráficos associados ao Why Make Sense? Capa do álbum, John Moose App, permite ouvir Kindred ‘No Fun’ - Single Google Cube, Google Just a Reflektor (2013) Arcade Fire Videoclip interactivo (toque) Studio AATOAA file sharing, impressão 3D, ábum “clássico” por M/M Paris. Short films método de o álbum gratuitamente por Party! promocionais, com excertos das músicas impressão especial apenas na floresta, Let Me Show You Love (2013) Cut Copy Vinil cut-on-site - (promovem a exposição e o álbum). Exposição, feito pelo baterista MoMA. Livro da banda Reflektor (2013) Arcade Fire Guerrilla marketing Caroline Roberts

We Are Explorers (2013) Cut Copy Videoclip, online bundle, impressão 3D Party!

When Björk Met Attenborough (2013) Björk Documentário Louise Hooper

Björk: Biophilia Live (2014) Björk Concert film Peter Strickland, Nick Fenton

Polyfauna (2014) Radiohead App Universal Everything

Björk (2015) Björk Exposição -

Björk: Archives (2015) Björk Livro Klaus Biesenbach

John Moose App (2015) John Moose App Tobias Norén

No Fun (2015) The Presets Plataforma interactiva (Google Cube) Google

Why Make Sense (2015) Hot Chip Método de impressão especial (capa do álbum) Nick Relph, Mathew Cooper Tabela de análise das apps

App Autor Relação Acessibilidade Tipologia Funcionalidade com a edição musical

Promocional Autónomo Isolado Gratuita Paga iOS Android Instrumento Album app Companion app

18 Months, Calvin Harris (2012) We Make Awesome Sh Ouvir música

Artpop, Lady Gaga (2013) Lady Gaga, Relative Wave Ouvir e comprar música. Criar e partilhar GIFs

Biophilia, Björk (2011) Björk, Scott Snibbe, M/M Paris Ouvir e compor música

Gossamer, Passion Pit (2012) Gossamer, Scott Snibbe Studios Agir perante componente musical e visual

"I’m Aquarius” / Night Sky, Metronomy (2013) - Ouvir música

John Moose, John Moose (2015) Tobias Norén Ouvir música

Magna Carta Holy Grail, Jay Z (2013) Jay Z, Samsung Acesso a conteúdos promocionais e ao álbum digital

Polyfauna, Radiohead e Universal Everything (2014) Thom Yorke, Nigel Godrich, Stanley Donwood, Universal Everything Exploração de ambientes virtuais

REWORK_ (Philip Glass Remixed), Philip Glass (2012) Philip Glass, Beck, Scott Snibbe Studios Ouvir e compor música

Scape, Brian Eno e Peter Chilvers (2012) Generative Music (Brian Eno e Peter Chilvers) Ouvir e compor música

Synthetica, Metric (2013) Metric, Scott Snibbe Studios Agir perante componente musical e visual

The Bermuda Tapes, John Lennon (2013) Design I/O e eyeball. Exploração de ambientes virtuais (immersive storytelling)

The National Mall, Bluebrain (2011) Bluebrain Ouvir música