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Pontifícia Universidade Católica De São Paulo Programa De Estudos Pós-Graduados Em Ciências Sociais

Pontifícia Universidade Católica De São Paulo Programa De Estudos Pós-Graduados Em Ciências Sociais

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM CIÊNCIAS SOCIAIS

STELLA VALENTINI KHAYAT

JOGO DE FUTEBOL OU FUTEBOL DO JOGO? A CPI do Futebol (2015) como ilustração da dinâmica política do futebol brasileiro

MESTRADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

São Paulo 2020

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM CIÊNCIAS SOCIAIS

STELLA VALENTINI KHAYAT

JOGO DE FUTEBOL OU FUTEBOL DO JOGO? A CPI do Futebol (2015) como ilustração da dinâmica política do futebol brasileiro

Dissertação apresentada à Banca Examinadora do Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Ciências Sociais, na área de concentração Ciência Política, sob orientação da professora doutora Vera Lúcia Michalany Chaia.

São Paulo 2020

BANCA EXAMINADORA

______Prof. Dra. Vera Lúcia Michalany Chaia (orientadora) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

______Prof. Dr. Bernardo Borges Buarque de Hollanda (examinador) Fundação Getúlio Vargas

______Prof. Dr. José Paulo Florenzano (examinador) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

______1º suplente

______2º suplente

Com saudades, ao cara que me ensinou a ser são-paulina.

CNPQ PROJETO 830880/1999-2 PROCESSO 168922/2018-5

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiro e enormemente minha querida orientadora, professora doutora Vera Chaia, são-paulina, por ter embarcado comigo neste projeto que tanto sou apaixonada. E que embarquemos em mais projetos apaixonantes juntas! Também, aos membros da Banca, professor doutor Bernardo Borges Buarque de Hollanda, da Fundação Getúlio Vargas, professor doutor José Paulo Florenzano, desta casa, minha imensa gratidão por aceitarem nosso convite às bancas, pelas valiosas e essenciais ponderações e indicações na Banca de Qualificação. Aos professores que participaram da minha jornada, doutora Maura Véras, doutora Carmem Junqueira, doutor Lúcio Flavio de Almeida, doutora Maria Celeste Mira, doutor Rafael Araújo e doutora Rosemary Segurado, agradeço pelas aulas, pelas indicações e pelo entusiasmo com meu tema. E, à coordenação do Programa, à secretaria e aos funcionários da Universidade, obrigada pelo incondicional e imprescindível apoio. Grandes apoiadores deste meu projeto desde a graduação, agradeço eternamente aos professores da Fundação Armando Álvares Penteado, doutora Mônica Rugai Bastos e doutor Roberto Bertani, pelo entusiasmo, pelas portas que me apresentaram e me ajudaram a abrir. Agradeço também ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico pelo incentivo à esta pesquisa. Àqueles que contribuíram para esta pesquisa, os senadores Romário, do Partido Socialista Brasileiro do , e Rodrigo Pacheco do Democratas de Minas Gerais, por terem respondido tão prontamente minhas questões; ao jornalista Kfouri, pela contribuição histórica à crítica da gestão futebol brasileiro e às palavras concedidas para este trabalho; ao professor doutor Carlos Górios, meu ortopedista, pelas tão esclarecedoras conversas; e aos funcionários, conselheiros e diretores do São Paulo Futebol Clube, que sempre abriram as portas para me receber. Não menos importe, eternamente obrigada e meu incondicional amor à minha família e meus amigos, pelas conversas, os jogos, os momentos e principalmente pelo refúgio – mesmo que, numa esmagadora maioria tricolor, tenham uns palmeirenses, corinthianos e santistas. Em especial, agradeço Bianca Raposo, Bruno Arci, Carla Valentini, Diego Petrini Pinheiro, Isabela Abuassi, Larissa Nishiwaki, Michel Khayat, Pedro Paulo Arci, Thaís Grencevicius e Vitória Borges, por tudo!

RESUMO

Esta dissertação objetivou explorar a estrutura patrimonialista e conservadora da dinâmica política do futebol brasileiro circunscrita na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Futebol em 2015 no Senado Federal. A partir de revisão bibliográfica sobre a história política, a conjuntura política econômica e a legislação, contextualizou-se as problemáticas que regem o futebol no Brasil. Adentrando nas discussões da CPI do Futebol, avaliou-se como se deram as discussões e os resultados da investigação, dando enfoque à dinâmica parlamentar e aos interesses do estamento do futebol – a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), as federações estaduais e os clubes da elite do esporte. Ao destrinchar os documentos da Comissão, demonstrou-se a relação e as manobras parlamentares para garantir os interesses do grupo dominante. Conclui-se que a estrutura política do futebol brasileiro é patrimonialista e conservador e permite que o esporte seja organizado de forma ambígua amadora-profissional, privilegiando interesses privados e particulares.

PALAVRAS-CHAVE: futebol brasileiro; história política do futebol; dinâmica política brasileira; CPI do Futebol; Confederação Brasileira do Futebol (CBF); Senado Federal.

ABSTRACT

This dissertation aimed to explore the patrimonialist and conservative structure of the political dynamics of Brazilian soccer circumscribed in the CPI do Futebol in 2015, an investigation held by the Brazilian Senate following FBI’s Fifagate. Based on a bibliographic review of political history, the economic political situation and legislation, the problems that govern soccer in were contextualized. Entering the discussions of the CPI do Futebol, it was evaluated how the discussions and the results of the investigation took place, focusing on the parliamentary dynamics and the interests of the football establishment – the Confederação Brasileira de Futebol (CBF), the state federations of soccer and the elite clubs. In unraveling the investigation's documents, the relationship and parliamentary maneuvers were demonstrated, in order to guarantee the interests of the dominant group. It is concluded that the political structure of Brazilian soccer is patrimonial and conservative and allows the sport to be organized in an ambiguous amateur-professional way, privileging private interests.

KEY WORDS: Brazilian soccer; political history of soccer; Brazilian political dynamics; CPI do Futebol; Confederação Brasileira de Futebol (CBF); Brazilian Senate.

RESUMEN

Esta disertación tuvo como objetivo explorar la estructura patrimonialista y conservadora de la dinámica política del fútbol brasileño circunscrita en el CPI do Futebol en 2015, una investigación realizada por el Senado brasileño después del Fifagate del govierno de los Estados Unidos. Con base en una revisión bibliográfica de la historia política, la situación política económica y la legislación, se contextualizaron los problemas que rigen el fútbol en Brasil. Al ingresar a las discusiones del CPI do Futebol, se evaluó cómo se llevaron a cabo las discusiones y los resultados de la investigación, centrándose en la dinámica parlamentaria y los intereses del establecimiento de fútbol: la Confederação Brasileira de Futebol (CBF), las federaciones estatales del fútbol y los clubes de élite. Al desentrañar los documentos de la investigación, se demostraron la relación y las maniobras parlamentarias para garantizar los intereses del grupo dominante. Se concluye que la estructura política del fútbol brasileño es patrimonial y conservadora, y permite que el deporte se organice de una manera ambigua amateur-profesional, privilegiando los intereses privados.

PALABRAS CLAVE: fútbol brasileño; historia política del fútbol; dinámica política brasileña; CPI do Futebol; Confederação Brasileira de Futebol (CBF); Senado brasileño.

SUMÁRIO

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS...... xiii

LISTA DE TABELAS...... xiv

LISTA DE GRÁFICOS E INFOGRÁFICOS...... xv

INTRODUÇÃO...... 16

1 FUTEBOL SE JOGA DE TERNO (LITERALMENTE!)...... 21

2 SE CPI TERMINA EM PIZZA,...... 61

3 ...OS RELATÓRIOS SÃO A CONTA A PAGAR...... 94

3.1 COMENTÁRIOS SOBRE AS REUNIÕES...... 97

3.2 COMENTÁRIOS SOBRE OS RELATÓRIOS...... 113

CONSIDERAÇÕES FINAIS...... 130

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...... 139

APÊNDICE 1: ANÁLISE DAS PRESIDÊNCIAS DOS CLUBES DAS SÉRIE A E B DO CAMPEONATO BRASILEIRO 2018 E 2019...... 159

APÊNDICE 2: ANÁLISE DAS PRESIDÊNCIAS DAS FEDERAÇÕES DE FUTEBOL BRASILEIRAS...... 166

APÊNDICE 3: ANÁLISE DO TERMO CPI DO FUTEBOL NOS JORNAIS O ESTADO DE S. PAULO E O GLOBO EM 2015 E 2016...... 172

ANEXO 1: ELEPHANT HOLDING S.A. – COMPROVANTE DE INSCRIÇÃO E DE SITUAÇÃO CADASTRAL...... 179 xiii

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CBF – Confederação Brasileira de Futebol CONMEBOL – Confederação Sul-Americana COL – Comitê Organizador Local de Futebol CONCACAF – Confederação de Futebol da CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito América do Norte, Central e Caribe DEM – Democratas FAF – Federação Alagoana de Futebol FBF – Federação Bahiana de Futebol FES – Federação de Futebol do Estado do FBI – Federal Bureau of Investigation Espírito Santo FES – Federação de Futebol do Espírito Santo FFA – Federação de Futebol do Acre PMDB – Partido do Movimento Democrático FFERJ – Federação de Futebol do Estado do Brasileiro Rio de Janeiro PMN – Partido da Mobilização Nacional FGF – Federação Gaúcha de Futebol PODE – Podemos Fifa – Federação Internacional de Futebol PP – Partido Progressista FMF – Federação Mineira de Futebol PPB – Partido Progressista Brasileiro FPF – Federação Paulista de Futebol PPS – Partido Popular Socialista MDB – Movimento Democrático Brasileiro PR – Partido da República PCdoB – Partido Comunista do Brasil PRB – Partido Republicano Brasileiro PDT – Partido Democrata Trabalhista Profut – Programa de Modernização da PFL – Partido da Frente Liberal Gestão de Responsabilidade Fiscal do PL – Partido Liberal Futebol Brasileiro PSB – Partido Socialista Brasileiro PTB – Partido Trabalhista Brasileiro PSD – Partido Social Democrático PTC – Partido Trabalhista Cristão PSDB – Partido da Social Democracia PTN – Partido Trabalhista Nacional Brasileira PV – Partido Verde PSL – Partido Social Liberal REDE – Rede Sustentabilidade PST – Partido Social Trabalhista UEFA – Union of European Football PT – Partido dos Trabalhadores Association

xiv

LISTA DE TABELAS

TABELA 1 Pontos principais da Lei nº 8.672, de 6 de julho de 1993...... p.40 TABELA 2 Pontos principais da Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998...... p.44 TABELA 3 Comparativo dos projetos de lei para novo modelo de gestão do futebol brasileiro...... p.48 TABELA 4 Composição parlamentar da CPI CBF/Nike (2001) na Câmara dos Deputados...... p.69 TABELA 5 Resultado resumido da investigação da CPI CBF/Nike (2001)...... p.70 TABELA 6 Composição da CPI do Futebol (2015)...... p.80 TABELA 7 Comparativo das gestões Coronel Nunes (2017-2019) e Rogério Caboclo...... p.82 TABELA 8 Pontos principais do Código de Ética da Confederação Brasileira de Futebol...... p.87 TABELA 9 Configuração dos atos ilícitos das operações da CBF, segundo o Fifagate...... p.122 TABELA 10 Sugestões de indiciamento à Procuradoria-Geral da União, segundo relatório alternativo da CPI do Futebol (2015)...... p.127

xv

LISTA DE GRÁFICOS E INFOGRÁFICOS

GRÁFICO 1 Densidade de menções a esporte (em azul) e futebol (em vermelho) em publicações de língua inglesa entre 1501 e 2018...... p.23 GRÁFICO 2 Evolução da renda bruta da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) entre 2012 e 2018, em milhares de reais...... p.28 GRÁFICO 3 Mutações do patrimônio líquido da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) entre 2012 e 2018, em milhares de reais...... p.28 GRÁFICO 4 Custos de futebol da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) entre 2014 e 2018, em milhares de reais...... p.29 GRÁFICO 5 Comparativo da situação financeira do Palmeiras e Corinthians em 2017, em milhões de reais, segundo o Itaú BBA...... p.33 GRÁFICO 6 Composição e evolução da receita dos clubes de São Paulo em 2018, em porcentagem (PRATA, 2019a)...... p.34 GRAFICO 7 Comparativo da captação de recursos dos clubes de São Paulo, em reais...... p.34 GRÁFICO 8 Valor de negociações do Brasil para o exterior, em milhões de reais (CAMPOS, 2019)...... p.52 GRÁFICO 9 Número de jogadores negociados (CAMPOS, 2019)...... p.52 INFOGRÁFICO 1 Linhagem da presidência da CBF...... p.83 GRÁFICO 10 Relação presença e ausência dos senadores nas reuniões da CPI do Futebol (2015)...... p.95 16

INTRODUÇÃO

Marco a vida pelo futebol. Os domingos são contados com as rodadas do Campeonato Brasileiro. Os anos, pelas Libertadores, os Mundiais, pelas Copa América, pelas Eurocopa, pelas eliminatórias para a próxima Copa, pelas Copas das Confederações e pelas Copas do Mundo. O futebol é muito mais para mim do que uma paixão, um espetáculo, um assunto. É uma escola. O ano em que aprendi a torcer foi 2002, ano do pentacampeonato da seleção brasileira – Felipão ganhou os sete jogos com oito gols de Fenômeno no Japão e na Coréia. Eu não sabia o que era futebol antes dessa Copa. Eu era criança e na manhã após a final, estava eu, meu pai e minha avó na avenida Faria Lima, com bandeiras, buzinas e tinta no rosto comemorando a vitória. Por outro lado, o ano que eu aprendi a sofrer foi 2005. Um pouco mais velha, vi meu São Paulo ser foi campeão do mundo, contra o Liverpool, no dia 18 de dezembro, no magro de um a zero, gol do meia Mineiro no primeiro tempo – que, por sinal, faz aniversário no mesmo dia que eu (só que vinte e um anos mais velho). Ganhar a Libertadores contra o Atlético Paranaense por cinco a um no placar agregado não foi doído, mas aquele jogo no Japão me fez entender o velho chavão da tradicional voz dos jogos importantes da televisão brasileira – haja coração... Em 2014, o futebol me ensinou a repensar. Até então, eu via o jogo nas quatro linhas, nos noventa minutos, em onze jogadores de cada lado; eu via pela derrota, pelo empate, pela vitória; via pela venda milionária de jogadores, as demissões dos técnicos, pelos estádios, os campeonatos internacionais, os canais da tevê... Eu sabia que era uma indústria e um mercado globalizado que sentia fortes impactos das superestruturas. Não sabia, de todo modo, o que de fato movia o futebol. Lembro-me, em 2007, quando assistindo Jornal Nacional com a minha mãe, foi anunciado que a Copa de 2014 seria sediada pelo Brasil. É forte a memória do orgulhoso presidente Lula na cerimônia da Federação Internacional de Futebol (Fifa) na qual anunciaram a sede de 2014. A Copa do Mundo, o evento mais esperado de todos para mim, seria sediado no meu país. Foi um inimaginável sonho realizado! Mas de 2007 até 2014, eu mudei de ideia. Existia a pré-noção que de o brasileiro gosta de futebol, de cerveja, de uma roda de samba e uma boa conversa fiada com os amigos. Brasileiro presa pelo lazer, pelas boas amizades, pela risada. Brasileiro inclusive acha que futebol, política e religião não podem ser 17

discutidos à mesa, para não estragar o sagrado momento da refeição. Depois dos anos de ditadura militar, a política brasileira parecia entrar nos prumos com a redemocratização, com a redação de uma constituição cidadã, e até mesmo com o impeachment de Fernando Collor de Mello. Veja, se um presidente estava descumprindo com seu primeiro dever de servir aos interesses do povo e do Brasil, não é seu lugar à presidência da República. Tudo ia bem no país do futebol. Conhecido internacionalmente pelo sorriso e receptividade, o brasileiro não gostava de discutir temas polêmicos – nem dentro, nem fora de casa. Não existia necessidade de transformar a agradável cerveja do final do dia no bar da esquina de casa em uma arena de discussão política. O camisa 9 fazia gols, o presidente era popular, a cerveja estava barata... Algo mudou. Desde 2013, o povo brasileiro resolveu tomar suas próprias dores, ir as ruas e, pela primeira vez em mais de vinte anos, toma consciência de que política é feita pelos eleitos, os elegíveis, mas, principalmente, aqueles que elegem. Tomar uma posição e discutir no bar sobre a crise política no país virou cotidiano. A discussão tomou forma bipolar quando começou a ser levantada a possibilidade do impeachment da então presidente Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores (PT). Havia aqueles que vestiam verde e amarelo – e frequentemente via-se camisas da seleção brasileira nas ruas em dias de manifestação pró impeachment – e aqueles que usavam vermelho e erguiam a bandeira do PT. Porém, antes da bipolarização da discussão política, o brasileiro tomou para si um sentimento de justiça e nacionalismo esquecido nos anos 1990. Até a Copa do Mundo que seria realizada entre junho e julho de 2014 – muito comemorada pela pequena torcedora da seleção que mal entendia o que se passava pelo mundo – começou a ser questionada. Os grandes gastos públicos, a má gestão dos recursos dos estados que sediaram a Copa, o atraso nas próprias obras, uma lista interminável de questionamentos sobre a maior festa do futebol internacional. O ano de 2013 foi um furacão no país tropical: as jornadas de junho foram um movimento cívico, apartidário, desconexo e inconsistente que revelou o descontentamento do povo com, admira-se, ele mesmo. Não houve pauta única, reivindicação política, manifestação ideológica ou partidária; foi um emaranhado de jovens descontentes com uma realidade imposta por outra geração; foi uma mistura de bandeiras que representaram uma só, uma nova força cívica brasileira. Ao se aproximar do grande evento sediado em doze cidades brasileiras, com forte apelo da grande mídia, o povo se acalmou e começou a sonhar com o hexacampeonato. O sentimento nacionalista fundado em um questionamento político legítimo feito no ano anterior voltou-se para a seleção brasileira. Toda vez que a seleção entrava em campo, o hino nacional era cantado em alto e bom tom, inclusive a segunda parte a capela – episódio que se repetiu na Copa da Rússia, em 2018. 18

A Copa acabou e o hexa não veio. Pouco tempo depois, os relatórios da Fifa demonstraram que a Copa sediada pelo Brasil foi a mais cara e a mais lucrativa de todos os tempos. Muito cara só para o Brasil e muito mais lucrativa para a Fifa. Para o país, restaram as dívidas, os elefantes brancos e a dura memória do 7 a 1, o Mineirazo. Como um ato premonitório de protesto, fui a nenhum jogo da Copa do Mundo. Antes, parecia que era uma grande confusão e que tudo estava fora do lugar. Depois, percebi que tinha me ausentado do maior exemplo de malandragem da política e do futebol dos últimos tempos. Demorou para que eu entendesse o que move o futebol. Julgava, ingenuamente, que era o dinheiro dos patrocinadores e o talento dos jogadores. É também. É principalmente a ganância de alguns homens que superfaturam os grandes espetáculos e fazem da paixão do torcedor, mera coincidência. Foi a tentativa de Romário (PODE-RJ1), eleito deputado federal e depois senador pelo Rio de Janeiro, que tentou demonstrar e, em última instância, punir esse malandro grupo que joga um jogo mais sujo do que chuteira em dia chuvoso. A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) presidida pelo ex-jogador tetracampeão do mundo foi a segunda tentativa – a primeira não aprovada na Câmara Federal – de investigação dos cartolas e dos contratos que circulam mundialmente por conta da celebridade da camisa canarinho. Um grande pivô para a aprovação da constituição da comissão por Renan Calheiros (MDB), então presidente do Senado, foi o Fifagate, apelido dado pela imprensa dos Estados Unidos para a investigação do Federal Bureau of Investigation (FBI) e da justiça americana sobre as negociatas de dirigentes da Fifa, da Confederação de Futebol da América do Norte, Central e Caribe (CONCACAF), da Confederação Sul-Americana de Futebol (CONMEBOL) e, pasme (!), da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). A CPI do Futebol foi uma tentativa de demonstrar um antigo esquema que domina o futebol brasileiro e que teve seu ápice na Copa do Mundo sediada pelo Brasil. João Havelange, Ricardo Teixeira, José Maria Marin, Marco Polo Del Nero e toda a turma de cartolas envolvidos com a gestão do futebol brasileiro aumentaram suas fortunas, seu poder político e seus privilégios com o maior espetáculo da bola do mundo. Mesmo que, no final das contas, o relatório redigido por Jucá, relator da Comissão, e aprovado pela CPI não prove nada, não indicie ninguém, não deixou o esforço do senador Romário de, pelo menos, tornar público o

1 À época, era filiado ao Partido Socialista Brasileiro (PSB); em 2017, passou a ser membro do Podemos (PODE). Seu mandato como senador do Rio de Janeiro teve início em 2015. Antes disso, foi eleito deputado federal pelo mesmo estado nas eleições gerais de 2010. Na descrição dos fatos ao longo do texto, será retratado o partido da época do senador, assim como em outros casos. 19

esquema corruptivo da CBF e da Fifa, nem de mostrar quem realmente perdeu com a Copa do Mundo: o povo brasileiro. De nada seria o poder político e simbólico destes homens sem o esporte que os fazem tão poderosos. São muitas as óticas para discutir o futebol – pela financeira e mercadológica, pelo espetáculo, pela psicologia social, pela gestão, etc. – e aqui escolhe-se pela história política do futebol. Isto porque, pela dimensão do esporte no Brasil, é a melhor forma de observar o fenômeno de forma mais abrangente e explicativa. Entender o fenômeno futebol ajuda a compreender a imensidão da abstração que realmente é o jogo. Não se trata, nunca, de uma bola rolando, de dois times e torcidas. É um complexo e amorfo conceito que constitui parte da identidade brasileira, apresentado no primeiro capítulo. Essa atmosfera é necessária para criar o simulacro da dinâmica política do futebol. A primorosa investigação de Romário e sua equipe apresentou a perfeita ilustração do de uma estrutura tóxica da política brasileira. A estrutura política estamental, advinda da herança patrimonialista consolidada desde a época da colônia portuguesa no nosso território, recorta como se dão as manobras, os processos e as negociações das organizações gestoras do futebol no Brasil. As duas principais CPIs que investigaram o futebol, em 2001 e 2015, refletem esta dinâmica, assim como a legislação que subjetivamente tenta modernizar o esporte no Brasil, são tratadas no capítulo 2. O zero a zero da CPI do Futebol de 2015 atinge seu cúmulo na produção de dois relatórios, de conteúdos praticamente opostos; a aprovação daquele que promove a manutenção da estrutura política da CBF denota com maestria tal estrutura – temática do capítulo 3. Para tal, pretende-se realizar pesquisa exploratória por dados secundários, levantamento bibliográfico e discussão teórica, assim como pesquisa exploratória por dados primários: pesquisa quantitativa com o perfil dos cartolas nos clubes de futebol brasileiros e da Confederação Brasileira de Futebol (CBF); pesquisa qualitativa por entrevista em profundidade com personagens relevantes que ilustrem a relação corruptiva entre a política e o futebol. Estas pesquisas são essenciais para criar paralelos e responder às questões sobre o fracasso da CPI, a manutenção da estrutura política do futebol e como se dão as conexões do poder público com a cartolagem. Importante ressaltar que não se pretende esgotar a bibliografia sobre nenhuma das temáticas aqui discutidas; a revisão teórica da história política do futebol e do patrimonialismo foram pautadas nos autores e publicações que melhor consolidavam a microesfera do futebol atual no país. Aborda-se o resultado de forma comparativa e avaliativa. Com base nas pesquisas quantitativa e qualitativa, pretende-se ilustrar e polemizar a CPI do Futebol, sua composição e seu resultado. Com isso, o episódio servirá como imagem para a 20

hipótese do trabalho – de que política no nosso país é feita de determinada forma devido às questões histórico político sociais –, criando correlações com a política, o futebol e a sociedade no Brasil. Dessa forma, a discussão da dinâmica política brasileira, a partir da problematização da CPI do Futebol pode demonstrar a perenidade da corrupção na classe política. A identificação dos elementos históricos da sociedade brasileira é necessária para explicar costumes e traços culturais e práticas da classe política brasileira, assim como a discussão sociológica do futebol. Adentrar as articulações da CBF e da cúpula do futebol expande o perímetro do fenômeno futebol. Algumas terminologias e personagens do futebol merecem atenção especial, e por isso ganharam breve descritivo nas notas de rodapé, considerando que ajudam a melhor arredondar a conjuntura tratada aqui. É preciso entender que existe o futebol e o futebol. O futebol é aquele que eu joguei na escola com a camisa 2 como lateral-esquerda, que discuto com meus primos palmeirenses, que assisto no Morumbi. O futebol é o jogo feito a porta fechadas por engravatados em bonitos prédios na Barra da Tijuca, que tentam se blindar com motoristas e seguranças de uma parte da mídia faminta por mais podres, que constrói os estádios mais caros do mundo, que lucra com o talento inigualável dos craques. Esse segundo tipo é resultado de um processo construído desde o início do século XX como resultado do tédio da burguesia, que sofreu a automação de uma tática da política brasileira. E, no final dos noventa minutos, o futebol é que manda no futebol. E é desse inescrupuloso futebol que trato aqui.

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1 FUTEBOL SE JOGA DE TERNO (LITERALMENTE!)

Na gíria do futebol, quando se fala que alguém joga de terno, leva-se como um grande elogio. Um jogador que joga liso, com classe; poucas faltas, carrega a bola e faz fila de adversários. É peça rara. É mais que craque, é majestade. É jogador que ensina como se joga. Mas, quando se coloca literalmente que se joga de terno, faço diferença entre o futebol e o futebol. O futebol é aquele que jogamos aos domingos, que as crianças jogam na escola, aquele que discutimos na mesa do bar, os clássicos que vemos no estádio, que produz jogadores de talento imensurável. O futebol é o jogo feito a porta fechadas por aqueles homens que trabalham em escritórios fresquinhos com ar condicionado, dirigem carros que custam inúmeras cifras e viajam o mundo de jatinho particular. Esse segundo tipo é resultado de um processo construído desde o início do século XX como resultado do tédio da burguesia. E, mesmo durante os noventa minutos, o futebol é que manda no futebol. Todo esporte tem sua origem com o contraponto ao trabalho; diz Norbert Elias (1992, pp. 157-159) que a aristocracia inglesa foi responsável por difundir o esporte como lazer. Acompanhando o processo nacionalista capitalista inglês durante os séculos XIX e XX, os esportes se difundiram. Além do mais, a popularização diz respeito à alteração dos modos de controle da violência da sociedade moderna. A profissionalização do futebol, no sentindo regulador – logo, o futebol –, tira a sua característica marginal e transforma-se em um elemento nacional, necessários para a solidificação dos Estados europeus no final do século XIX e início do século passado (1992, pp. 163-167). Tudo isso se torna evidente quando, em 1904, há a criação da Federação Internacional do Futebol (Fifa) e em 1908, o futebol torna-se esporte olímpico (1992, p. 159). O início do século XX foi de extrema importância para a profissionalização do futebol. A classe burguesa, na incansável busca de ascensão do capital, ajudou na popularização e consolidação do futebol como elemento constituinte do imaginário nacional da sociedade, pois a popularização “espalha a ideologia organizacional” e o essencial elemento competitivo do capitalismo (BROHN, 1978, p. 77 apud DUNNING, 1999, p. 107). A profissionalização do futebol é um fenômeno da sociedade inglesa do final do século XIX e início do século XX com o investimento burguês na sua organização (DUNNING, 1999, pp. 117-118). Eric Dunning (1999, pp. 114 – 115) define futebol profissional é todo aquele que gera lucro e é organizado para tal. 22

Sendo assim, o futebol é um resultado direto de uma atividade aristocrática popularizada para fins burgueses. Claro, ambos futebóis são, na verdade, o mesmo: são duzentos e doze federações nacionais associadas à Fifa; são mais de setecentos clubes na Confederação Brasileira de Futebol (CBF); são dez os canais da tevê paga especializados em esporte, mas com programação majoritária sobre futebol; e são milhões pagos a garotos suburbanos com talentos sobrenaturais com a bola nos pés que acabam saindo dos endividados clubes brasileiros para a Europa e a China, ganhando mais e mais cifras. Há quem diga que o negócio do futebol ficou maior do que os sagrados noventa minutos de domingo à tarde; mas o que seria do futebol sem a beleza e a paixão do futebol? Aqui, trata-se do futebol como um composto dos noventa minutos mais as vinte e duas horas e meia do dia. A complexidade do futebol está no alto nível dos atletas e seus altíssimos salários, a superprofissionalização das comissões técnicas, médicas, jurídica, de comunicação, etc., a midiatização das competições nacionais e internacionais e, inegavelmente, as articulações políticas dos clubes, entre muitas outras características. O quadro diretivo das agremiações parece cada vez mais inflado, com conselho diretivo e societário que posicionam mais de uma centena de cartolas numa grande cesta de interesses, os quais se diversificam em organizacionais e particulares. Considerando apenas aqueles que sejam apenas em prol dos clubes, os interesses não se resumem, nem de perto, a vencer o Campeonato Brasileiro, conseguir a classificação para a Copa Libertadores da América, ganhar o Mundial de Clubes, e assim por diante. Há uma procura constante, assim como daquela burguesia que profissionalizou o futebol, de maiores valores de direito de imagem, patrocinadores mais entusiasmados e generosos, jogadores mais talentosos em campo e na zona mista, enfim, de uma valorização do clube em termos financeiros e midiáticos. Se tudo gira em torno desses interesses, a cada vez que um pequeno impasse agrida ou apenas ameace agredir essa estrutura, há um forte movimento dos cartolas para barrá-los – árbitros que prejudicam um time, ao ver dos dirigentes de forma proposital e conspiracional, polêmicas publicações de jogadores nas redes sociais, contradições sobre a convocação de jogadores para a seleção brasileira e qualidade duvidosa dos gramados dos campos alheios. Esse fenômeno não foi construído de um dia para a noite. Ao analisar as palavras esporte e futebol em publicações britânicas desde o início do século XVI até os dias atuais, vê-se que as linhas de popularidade aparecem em momentos distintos, como ilustrado pelo gráfico 1. Depois da metade do século XVI até a metade do seguinte, esporte não só começa a aparecer em publicações, mas tem um número significativo de textos – o máximo, em 1592, a densidade 23

era de 0,0051%, quer dizer, em média cinco publicações a cada mil continham esporte. Ao passar dos séculos, percebe-se que a densidade se mantém muito menor do ano ressaltando anteriormente, e que a curva se acentua apenas em 1989; o pico na contemporaneidade se dá em 2003, com densidade de 0,0025% - metade da maior já registrada. GRÁFICO 1 Densidade de menções a esporte (em azul) e futebol (em vermelho) em publicações de língua inglesa entre 1501 e 2018

Gráfico produzido pela autora através do Google Ngram Viewer2.

Já a palavra futebol aparece pela primeira vez em 1593 com densidade de 0,00021%, que significa de dez mil publicações lançadas naquele ano, pouco mais de duas continham futebol no texto. Após tal ano, raras aparições continuaram até 1709. Entre 1710 e 1862, a densidade foi, em média, nula. Só em 1863 a densidade começa a subir gradativamente até 1989, quando a curva se acentua e chega no auge em 2004, com 0,0017% - pouco menos de duas publicações por cada mil publicações no ano. Em 1989, não houve popularização do esporte ou do futebol, em termos de criação de ligas, competições, times, etc. na Inglaterra, mas iniciou-se um processo de acentuação do número de publicações. Se analisado outros dois conjuntos de palavras – food e restaurant; library e book – uma, se não as duas, tem saltos de densidade no mesmo ano. Isso deve-se muito provavelmente pelo aumento de publicações a partir deste ano em termos gerais, devido à World Wide Web.

2 O gráfico 1 foi desenvolvido pela plataforma Google Ngram Viewer pela busca das palavras sport e football, analisando publicações no período de 1501 e 2018 na língua inglesa do Reino Unido (British English) com margem de erro (“with smoothing of”) de 3 pontos. Foi utilizado a busca em inglês da Inglaterra por conta da origem do esporte e da possível dificuldade em diferenciação entre o American football e o soccer, caso fosse escolhida a versão americana da língua. A plataforma não disponibiliza versão para busca em português. Disponível em: < https://books.google.com/ngrams/graph?content=sport%2Cfootball&year_start=1501&year_end=2008&corpus= 18&smoothing=3&share=&direct_url=t1%3B%2Csport%3B%2Cc0%3B.t1%3B%2Cfootball%3B%2Cc0#t1%3 B%2Csport%3B%2Cc1%3B.t1%3B%2Cfootball%3B%2Cc0>. Acesso em: 21 jan. 2018. 24

Sendo assim, o futebol é um fenômeno essencialmente contemporâneo, que toma forma como conhecemos hoje, por causa dos muitos movimentos tecnológicos, comunicacionais, espetaculares, políticos e econômicos. Estes fenômenos tomam forma especial no futebol, tem características peculiares e são reflexo claro de transformações do nosso mundo. Esse esporte é não só o mais globalizado, mas o mais globalizador. Não há país do mundo onde não se jogue futebol, independente da popularidade. Repare: não há subúrbio ou periferia que não tenha um campinho, uma bola e crianças jogando. O campinho pode ser um chão batido e linhas marcadas no chão com um graveto, e a bola pode ser muito velha ou um improviso com meias. Mas, o futebol está lá. Se a identificação de futebol é como fenômeno incontestável, ingenuidade seria pensar que a proporção se deu pelo gosto popular pelo jogo – caso assim fosse, a queimada (brincadeira muito bem conhecida por crianças das Américas e da Europa) também seria paixão mundial. A aura que envolve o futebol é reflexo de um esforço intenso desde a década de 1970 de mitificar não só o esporte, mas seus jogadores como ídolos, os clubes como instituições, as seleções nacionais como símbolos patrióticos, as competições como lugar-sagrado. A comunicação que envolve o futebol é fator constituinte desta aura. De nada seria Marilyn Monroe sem Hollywood, assim como o futebol sem ativos de marketing. Entre as décadas de 1930 e 1940 na América do Sul e na Europa, o futebol profissional ganha volume com a radiodifusão e impõe à população, mesmo aquela que não frequentava os estádios, o esporte como parte da cultura popular (SEBRELI, 1981, pp. 127 –128). Entretanto, Proni (2000, p. 36) faz ressalva quando aponta que o rádio refletia a cultura popular à época, ao invés de pautá-la. Logo, a popularização do futebol profissional tem cunho mais orgânico do que midiático: se, mesmo influenciando, o rádio pouco impactou na criação da aura futebolística, mas na sua difusão, o apreço pelo esporte aparece no vácuo tedioso do período. Obviamente, se comparado com as décadas seguintes, o avanço da indústria do entretenimento inverte as ideias de ócio e tédio; então, pode-se pensar o futebol nas décadas de 1930 e 1940 como uma forma embrionária de entretenimento. Todavia, não se deve ignorar o impacto dos meios de comunicação, mesmo que, nesta época, seja secundária: em 1927, a BBC transmitiu pela primeira vez uma partida ao vivo, Arsenal e Sheffield United; em 1933, na final da Copa da Inglaterra, Everton e Manchester City colocaram números nas camisas para facilitar a narração; em 1934, a Copa do Mundo seria narrada ao vivo para os doze países participantes; e em 1937, graças ao fascínio da imagem e do jogo, a partida Arsenal e Everton foi filmada e posteriormente transmitida na BBC (FRANCO JR., 2007, pp. 54 – 55). 25

Mais à frente, Proni (2000, p. 37) levanta o argumento de que a indústria do futebol é reflexo da transição da sociedade moderna para a contemporânea, na qual o esporte deixa de ser passatempo da nobreza para ser válvula de escape da classe trabalhadora. Da ideia de Mandell (1984, p. 157 apud PRONI, 2000, p. 37),

[...] o futebol só pode ser jogado, apresentado na forma de espetáculo e assistido jubilosamente em sociedades que têm sido pelo menos parcialmente desenraizadas, parcialmente domesticadas, e parcialmente reguladas pela moderna produção industrial de mercado. Pois a vida moderna requer segmentação rígida e anotação do tempo, valoriza e recompensa realizações notáveis, e demanda a sublimação da agressão. Dessa forma, a classe operária que nasce no século XX tornou-se consumidora apaixonada de um novo gênero de teatro que se desenvolve dinamicamente e que santifica e reforça tanto nossas restrições sociais como aquisições materiais.

Mesmo que, nas décadas de 1930 e 1940, a sociedade de consumo não existisse com as características clássicas na América do Sul e na Europa – que surgiriam entre 1950 e 1960 – (PRONI, 2000, p. 38), inegável é a popularização do esporte futebol. O real impacto da comunicação, da mídia e do marketing no futebol ocorre com a popularização da televisão, na adequação da grade para inserir campeonatos inteiros e, no cerne, o entendimento de que é um negócio. Neste sentido, o futebol é um fenômeno muito recente que rapidamente se expande com os canais de tevê fechada e pay-per-view, internet, streaming, ligas fantasy3 e os inúmeros produtos extraídos dele. Faz-se, dessa forma, diferença entre o esporte e o negócio, o futebol e o futebol. Retomando o período de estabelecimento da cultura de consumo, não é possível cravar o futebol como fenômeno da época. As organizações do futebol participavam poder político sobre as decisões e recebiam forte influência de públicos da sociedade civil, dificultando a firmação de carácter comercial (2000, pp. 39 – 40). Assim, antes da década de 1970, “a simples existência do regime profissional, a venda de ingressos e a negociação do ‘passe’ de jogadores não implicava a existência de relações tipicamente capitalistas” (2000, p. 42). O principal responsável pela transformação do futebol em mercado é o brasileiro João Havelange. Quando no comando da Confederação Brasileira de Desportos (CBD) desde 1958, foram três títulos mundiais – 1958, 1962, 1970 – e uma marca internacional chamada Seleção

3 Fantasy é um tipo de jogo online no qual os participantes escalam jogadores dos diferentes times da modalidade e campeonato em questão e pontuam conforme a atuação e resultados das partidas reais. A brincadeira foi criada nos Estados Unidos com os times da Major League Baseball e replicado o modelo em outros esportes, campeonatos e países. No Brasil, a maior liga do tipo é o Cartola F.C., do Grupo Globo, que se renova anualmente com o Campeonato Brasileiro. 26

Brasileira de Futebol. Guardadas as proporções do inchaço do mercado do entretenimento, do alcance da mídia esportiva, das cifras dos jogadores, clubes e competições, Havelange instaurou embrionariamente a aura do esquadrão canarinho, essencial nas décadas seguintes para alavancar como negócio a posterior Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Em 1975, quando pleiteou a presidência da Fifa, articulou os votos dos países asiáticos e africanos, prometendo mais vagas em Copas do Mundo – incluindo representantes destas regiões, marginais no futebol mundial até então – um mundial para categorias de base, recursos para estádios, profissionalização da arbitragem, equipe médica e técnicos e a criação de mais ligas internacionais interclubes (SIMSON; JENNINGS, 1992, p. 59 apud PRONI, 2000, pp. 47 – 48). Para pagar o volumoso projeto de Havelange, (PRONI, 2000, p. 48) foram firmados acordos comerciais com a Adidas – que já pautava sua estratégia de comunicação nos esportes de alto rendimento e muito se beneficiaria em desenvolver os uniformes das seleções nacionais e material esportivo para os mundiais – e a Coca-Cola – que já patrocinava as Olimpíadas e concordou numa estratégia global de desenvolver o futebol em países nos quais o esporte tinha secundária relevância. Depois do sucesso da estratégia, mais empresas enxergaram o futebol como mercado e cifras mais robustas começaram a financiar eventos da Fifa: as Copas de 1990, 1994 e 1998 tiveram seus direitos de transmissão dos jogos para a “ISL (empresa de representação comercial criada pela Adidas) por mais de US$ 240 milhões com um consórcio internacional de emissoras de televisão” (SIMSON; JENNINGS, 1992, p. 66 apud PRONI, 2000, p. 48). No Brasil, a partir da administração de Ricardo Teixeira, em 1989, contratos comerciais começaram a bancar o modelo de negócios da CBF, reflexo das práticas da Fifa. A marca seleção brasileira cresceu sem precedentes. O jornalista Jamil Chade (2015, pp. 9 – 10) conta que, ao ser encomendado uma reportagem sobre a população negligenciada no interior da Tanzânia, “num bar miserável, um pôster na parede mostrava, com um orgulho surreal, a imagem de Cafu levantando a taça da Copa de 2002”; na fronteira entre Jordânia e Iraque em 2003, o pai de um pequeno refugiado, usando o brilhante uniforme amarelo da seleção brasileira, contou orgulhosamente que o filho chamava-se Ahmadinho; na Etiópia, um time que mal tinha bola para jogar, os jogadores usavam todos a dez de Ronaldinho. Contratos foram firmados com empresas que pagam fortunas para poderem ter sua marca estampada na camisa de treino da seleção brasileira, para produzirem o material esportivo, comercializar os direitos dos amistosos, bilheteria dos jogos e a polêmica escolha dos adversários destes jogos. A Pitch, empresa que comercializa os direitos dos amistosos, paga, 27

em média, R$ 12 milhões para a CBF por partida. Leva a seleção para jogar em outubro de 2019 na Coréia do Sul contra Senegal e Nigéria – ambas partidas terminaram 1 a 1, com atuação muito abaixo da Copa América, terminada em julho do mesmo ano – ou para Miami, durante a passagem do furação Dorian, por arquibancadas vazias, estádios com gramados ruins ou sintéticos, iluminação de segunda mão (ALMEIDA; CHADE, 2019). O acordo com a Nike demanda inclusive que jogadores de alto nível no mercado joguem as partidas, independente das escolhas técnicas. Este acordo será discutido em maior profundidade nos capítulos 2 e 3. O gráfico 2, Evolução da renda bruta da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) entre 2012 e 2018, representa os valores recebidos pela organização nas categorias patrocínio, direito de transmissão e direitos comerciais, bilheteria e premiações da seleção principal, registros e transferências, programas para o desenvolvimento do futebol (a partir de 2017) e outros valores. Percebe-se oscilação nos valores, sendo menores do que o exercício anterior os anos de 2015 e 2017, quando os valores de patrocínio também foram menores em relação ao ano anterior. Em relação ao gráfico 3, Mutações no patrimônio líquido da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) entre 2012 e 2018, vê-se que há curva de crescimento, mesmo com as oscilações de receita bruta, demonstrados no gráfico anterior. 28

GRÁFICO 2 Evolução da renda bruta da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) entre 2012 e 2018, em milhares de reais

450.000 700.000

400.000 600.000 350.000 500.000 300.000 250.000 400.000 200.000 300.000 150.000 200.000 100.000 50.000 100.000 0 0 2012 2013 2014 2015* 2016 2017 2018* Patrocínio 235.572 278.106 359.416 339.604 410.988 353.379 318.858 Direitos de transmissão e 235.572 278.106 359.416 339.604 410.988 353.379 318.858 comerciais Bilheteria e premiações 16.584 31.969 43.825 30.988 43.342 56.748 92.017 Registro e transferência 9.121 9.416 8.760 12.082 15.172 15.766 15.494 Programas de 0 0 0 0 0 9.810 15.816 desenvolvimento Eventuais 7.164 3.747 9.401 23.718 10.912 12.881 18.860 Receita bruta 360.131 436.467 519.103 518.874 597.678 544.472 616.921

Patrocínio Direitos de transmissão e comerciais Bilheteria e premiações Registro e transferência Programas de desenvolvimento Eventuais Receita bruta

*: valores reclassificados não disponíveis. Gráfico produzido pela autora. Fonte: Demonstrativo Financeiro CBF 2012 à 2018. Ver referências bibliográficas. GRÁFICO 3 Mutações do patrimônio líquido4 da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) entre 2012 e 2018, em milhares de reais

700.000 645.848 593.758 600.000 543.054 499.332 500.000 427.251 376.241 400.000 320.674 300.000 200.000 100.000 0 2012 2013 2014 2015* 2016 2017 2018*

*: valores reclassificados não disponíveis. Gráfico produzido pela autora. Fonte: Demonstrativo Financeiro CBF 2012 à 2018. Ver referências bibliográficas.

4 Patrimônio líquido de uma organização corresponde, em termos gerais, a diferença entre o patrimônio passivo (as obrigações com terceiros) e o patrimônio ativo (bens e direitos) representa a riqueza líquida de uma organização. 29

O gráfico 4, Custos de futebol da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) entre 2014 e 2018, apresenta os custos de futebol, divididos por categoria praticada. Escolheu-se descartar os anos de 2012 e 2013, analisados nos últimos dois gráficos, pela não descrição precisa nos relatórios divulgados. Observa-se clareza no maior investimento na seleção principal às de base e feminina. Relevante apontar que os valores das últimas categorias estão representados agregados: nos demonstrativos de 2014 e 2015, os valores estavam descritos separadamente, com ressalva ao valor destinado à seleção feminina exponencialmente mais baixo do que a masculina. Em 2014, a seleção feminina recebeu apenas R$ 9.583; em 2015, R$ 18.258. Isso representa 16,46% e 29,58%, respectivamente, do total gasto com a seleção principal. Quanto às seleções de base, em 2014 foi gasto 22,68% e em 2015, 36,88% do valor despendido com a seleção principal. GRÁFICO 4 Custos de futebol da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) entre 2014 e 2018, em milhares de reais

400.000

347.668 350.000

300.000 288.172 281.709

250.000 226.015

188.725 200.000 178.335 158.775 140.901 132.658 150.000 123.280 107.740 98.575 95.582 100.000 58.201 61.717 48.696 41.018 36.675 50.000 22.784 27.352

0 2014 2015* 2016 2017 2018*

Custo total Seleção principal Seleções de base e feminina Fomento nos estados e competições

*: valores reclassificados não disponíveis. Gráfico produzido pela autora. Fonte: Demonstrativo Financeiro CBF 2012 à 2018. Ver referências bibliográficas. Vale aqui uma lúcida ressalva ao viciado clichê Brasil, país do futebol. As enormes cifras não correspondem à excelência, principalmente se ignorado a CBF e a seleção principal. O historiador Hilário Franco Jr. (2017, pp. 125-135) pontua dez razões para questionar tal afirmação: (1) o Brasil não é o país que mais pratica futebol de forma amadora e, (2) observando o futebol profissional, nenhuma grande cidade aglomera número expressivo de grande times como outros de grande apreço pelo futebol; (3) as médias do público são muito mais baixas do 30

que de outros países, principalmente comparando o tamanho da população; (4) dados de uma pesquisa pós-Copa de 2002 mostram que 25% dos brasileiros não têm preferência por clube e (5) outra de 2013 provam que o torcedor pouco entende das regras e táticas do jogo, assim como desconhece grandes competições internacionais; (6) hoje, não existe nenhum periódico impresso sobre o tema de grande circulação; (7) o nível técnico das temporadas disputadas por clubes brasileiros são baixos ou medianos, tem baixa média de gols e raras são as vezes nas quais campeonatos de pontos corridos têm disputa acirrada pelos primeiros postos; (8) mesmo com a exportação de grandes jogadores para as grandes ligas da Europa – motivo geralmente tomado para justificar o baixo nível dos campeonatos nacionais – a balança fica desfavorável para o Brasil, considerando que outros países exportam mais jogadores em relação ao contingente de atletas atuantes no esporte e tamanho da população, como no Uruguai; (9) o Brasil pouco exporta técnicos, principalmente se avaliado para os grandes clubes europeus; (10) por fim, o Brasil tem cerca de 25% de aproveitamento em Copas do Mundo, mesmo sendo a única seleção que participou de todas as competições – dado que agrava mais o quadro, considerando que a classificação para as competições pouco tem relação com a qualidade do time, historicamente – e ganhou mais títulos do que qualquer outra seleção. Algumas dessas pontuações serão amplamente discutidas neste texto, visto que traçam um real perfil da verdadeira face do tal país do futebol. O futebol brasileiro é pequeno perto do inglês, do espanhol, do italiano. Pouco importam os cinco títulos mundiais da seleção brasileiro se, internamente, os clubes enormes dificuldades financeiras e se depreciam a cada campeonato com atuações piores. Segundo o levantamento do Apêndice 1, Análise das presidências dos clubes das série A e B do Campeonato Brasileiro em 2018 e 2019, 60% dos clubes tinham como patrocinador máster a Caixa Econômica Federal. Entre 2012 e 2018, o governo federal apostou nos patrocínios aos clubes; com o pequeno retorno dos mais de R$ 660 milhões no período, grande parte dos contratos não serão renovados. O Flamengo recebia a maior cota de patrocínio da Caixa, R$ 32 milhões em 2018, mas o clube mais dependente do contrato é o Ceará: os quase R$ 7 milhões correspondia a quase 25% do orçamento anual do clube, que tem caminhado entre a série A e B nos últimos anos (QUE TIME PERDE..., 2019). A dependência pelos patrocínios e, principalmente, a má gestão dos recursos muito se clarifica pela estrutura político-administrativa dos clubes brasileiros. No mesmo levantamento, de todos os presidentes dos clubes, 43% deles são filiados à partidos políticos. A maior parte das agremiações proíbe em seus regulamentos que aqueles que ocupam o cargo máximo no clube ocupe um cargo político, mas não os impede de alavancar suas carreiras políticas. 31

Analogamente, Eduardo Carvalho Bandeira de Mello, presidente do Flamengo em 2018, candidatou-se a deputado federal pela Rede Sustentabilidade (REDE), mas não conseguiu se eleger – muito provavelmente devido sua gestão contraditória e pouco vitoriosa no clube. Os presidentes continuam todos da elite, apresentando-se como economistas, engenheiros, administradores, empresários, médicos e advogados, enquanto um dos maiores benefícios de compor o grupo de um grande time de futebol é a possibilidade de escalação sócio econômica de meninos da periferia e pequenas cidades do interior. A relação dos cartolas e a política perpassa nos interesses da CBF. A bancada da bola é um conjunto de parlamentares na Câmara e no Senado que defende, sem medo de cartão vermelho, os interesses da Confederação. Nos episódios investigativos em 2001 e 2015, discutidos nos próximos capítulos, foram estes parlamentares que conseguiram limitar os impactos das descobertas. Parte da estratégia de Ricardo Teixeira, a CBF conseguia este apoio pelas generosas doações de campanha: nas eleições majoritárias de 1998, somou-se pouco mais de R$ 1,885 milhões em doações de campanha; em 2000, ano de eleições municipais, gastou- se quase R$ 2,180 milhões (BRASIL, 2001, pp. 158 – 170). Por exemplo, Eurico Miranda, histórico cartola, falecido presidente do Vasco da Gama e deputado federal, recebeu R$ 50 mil reais em 1998 para as eleições majoritárias (BRASIL, 2001, p. 159). Ele também compôs a vice-presidência da CPI que investigava o contrato entre a Nike e a CBF em 2001. Vale ressaltar a impossibilidade de um candidato receber recursos em dinheiro ou estimável em dinheiro presente no descrito artigo 24 da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, que dispõe sobre o estabelecimento das regras eleitorais, de “VII – pessoa jurídica sem fins lucrativos que receba recursos do exterior; [...] IX – entidades esportivas” e no artigo 24 da Lei nº 11.300, de 10 de maio de 2006, que dispõe sobre propaganda, financiamento e prestação de contas das despesas com campanhas eleitorais, que altera a Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, de “IX – entidades esportivas que recebam recursos públicos”. A discussão sobre as investigações parlamentares e a bancada da bola será aprofundada no capítulo 2. Se as cifras de patrocínio e publicidade são imensas, outras também demonstram alta – na maioria das vezes, de forma negativa. Numa análise do preço médio do ingresso mais barato do Campeonato Brasileiro entre 2004 e 2013, o valor subiu 241%, segundo o estudo da Bigbomb (BBO) (GONÇALVES, 2014); após a imposição do padrão Fifa nos estádios reformados e construídos para a Copa do Mundo, o valor subiu ainda mais. A renda bruta dos jogos nas arenas pós Copa são duas vezes maior do que nos estádios antigos ou inutilizados para a competição, não pelo número de público, mas pelo valor do ingresso. Por exemplo, o ticket médio do Palmeiras em 2018 no Allianz Parque (inaugurado em novembro de 2014) é de 32

R$67, e o da Arena Corinthians (construída para receber a abertura do megaevento) é R$52 (MANIAUDET; SILVA, 2018). A métrica de maior renda bruta e maiores médias de público não é tão simples: o Flamengo, mesmo tendo a maior média de público (37.549 pagantes) ganhou quase R$40 milhões a menos do que o Palmeiras (32.006 pagantes) devido ao ticket médio mais alto da competição; o Corinthians, que ficou logo atrás do adversário paulistano com média de 31.552 pagantes, ganhou cerca de R$20 milhões a menos do que aquele. O lucro palmeirense permanece imensamente maior, considerando apenas a inexistência de dívidas da construção do estádio. O Itaú BBA lança anualmente um estudo comparativo das finanças dos maiores clubes brasileiros. Segundo o estudo de 2018 sobre o ano anterior (ANÁLISE ITAÚ..., 2018a, 2018b) – e mantendo a comparação alvinegra e alviverde –, o Palmeiras teve a maior receita entre os times, de R$504 milhões e o custo de futebol5, R$267 milhões. O Corinthians teve receita bem menor, de R$345 milhões, e foram gastos R$189 milhões com o futebol. A grande diferença entre as finanças dos dois clubes, na verdade, deve ser medida pelo tamanho da dívida e sua oscilação: o primeiro tem dívida de R$304 milhões, menor do que em 2016 – principalmente pelo pagamento de parte substancial da dívida bancária e de multa devida ao ex-presidente Paulo Nobre –, e o segundo de R$372 milhões, maior do que a de 2016. Estes números, principalmente frente às cifras da receita, colocam o Palmeiras em uma situação muito mais confortável, mesmo que os especialistas alertem o perigo de ser generoso demais com os gastos com o futebol.

5 Custo de futebol diz respeito às despesas referentes ao extremamente ligado à prática esportiva. Levando em consideração que os clubes têm outros custos com outros esportes e atividades, custo de futebol quer dizer, popularmente, quanto custou para manter um time durante uma temporada. Isto é, as contratações, os salários e as competições. Os gastos médicos, de infraestrutura dos centros de treinamento, de viagens, da diretoria, de eventos, de comunicação, entram na conta de infraestrutura e administração do clube, não de custo de futebol. 33

GRÁFICO 5 Comparativo da situação financeira do Palmeiras e Corinthians em 2017, em milhões de reais, segundo o Itaú BBA

600

500 504 400 372 300 345 361 312 304 200 267 189 100

0 Receita Custo de futebol Dívida, em 2016 Dívida, em 2017

Palmeiras Corinthians

Gráfico produzido pela autora.

A composição da receita dos clubes é especialmente interessante, principalmente se analisada as mudanças do mercado ao longo dos anos. Numa pesquisa encomendada pel’O Estado de S. Paulo para a EY, que presta consultoria especializada em gestão do futebol para doze dos vinte clubes da série A do Brasileirão, sem contar como grandes potências como Barcelona e Real Madrid, comparou as cifras dos quatros principais clubes de São Paulo (PRATA, 2019a). Foi analisado entre 2009 e 2018 como se compõe a receita: a maior parte fica por conta das cotas de tevê e das transferências dos jogadores, seguido de bilheteria, patrocínio e publicidade e o clube social, além de pequena porcentagem de outras receitas não especificadas. O mais expressivo é a evolução do montante: de R$ 549 mil reais em 2009, os quatro grandes do estado hoje computam R$ 1,76 bilhões. Os clubes, todavia, tem perfis de captação de recursos diferentes, descaracterizando qualquer tipo de fórmula: enquanto o São Paulo segue disparado nos valores de transferência de jogadores e o Palmeiras na lanterna, quando se trata de patrocínio e publicidade, o segundo tem quase R$ 70 mil a mais do que o primeiro. O Corinthians, assim como o Flamengo, tem acordo maior com a Rede Globo, e ganha R$ 1,2 bilhões pelos direitos de transmissão, enquanto São Paulo e Palmeiras tem cifras similares, e o Santos mais a trás com R$ 100 mil a menos. A bilheteria também é um número expressivo, como já comentado anteriormente, para Palmeiras e Corinthians. Os dados apresentados seguem ilustrados nos gráficos que seguem.

34

GRÁFICO 6 Composição e evolução da receita dos clubes de São Paulo em 2018, em porcentagem

7% 9% Cotas de TV 32% Transferências 12% Bilheteria Patrocínio e Publicidade Outras receitas Clube social 13%

27%

Fonte: PRATA, 2019a. GRAFICO 7 Comparativo da captação de recursos dos clubes de São Paulo, em reais

1400 1200 1200

1000 867 888 850 762 800 681 600 365 398 400

200 101 116 33 43 27 31 61 27 0 Transferências Cotas de tevê Patrocínio e Bilheteria (em milhões) (em milhões) publicidade (em milhares) (em milhares) São Paulo Palmeiras Corinthians Santos

Gráfico produzido pela autora. Fonte: PRATA, 2019a. Nenhum desses números mostra mais do que a óbvia e imensa popularidade do esporte no país. Segundo Franco Jr. (2007, pp. 62 – 64), o futebol se popularizou no Brasil por seguir duas tendências: a do amadorismo, que encantava a elite paulistana e carioca, quem perseguia a modernidade europeia e jogar futebol representava um distintivo social; e a do mimetismo das classes médias e operárias interessadas no novo passatempo da elite, que logo formaram times ligados à comunidades de imigrantes – os times formados por alemães, portugueses, italianos donos de pequenos comércios, como o Vasco da Gama – e às industrias – como o Bangu. Com o passar do século XX, as duas tendências de popularização se misturaram em um modelo de gestão dependente da organização nacional do futebol. Entre as décadas de 1930 e 35

1940, com a ocorrência do jogador profissional de futebol, um mercado prematuro do futebol se funde. Mesmo sem uma competição em nível nacional aos moldes do atual Campeonato Brasileiro, os clubes começaram a participar de competições com clubes e seleções nacionais. A prática do passe aos jogadores, que significa a detenção do direito de exercício da profissão do jogador ao clube, instaurou-se internacionalmente. A venda do passe de jogadores foi o primeiro grande fluxo de recursos aos clubes. No Brasil, a quantidade de clubes hoje considerados nanicos remonta o período. Enquanto algumas agremiações começaram a se organizar para volume de jogadores e competições, recebendo doações de sócios, compondo conselhos administrativos e deliberativos, outros continuaram amadores e, com o passar das décadas, marginais ao futebol. O movimento de globalização do futebol como mercado ainda demoraria muito, mas a formação da elite do futebol começa com o folego de alguns clubes que se aproveitaram de suas raízes para fundar bases (semi) sólidas para as mudanças das décadas seguintes. O real mercado do futebol, como explorado nas páginas anteriores, surge com o boom do mercado do entretenimento na década de 1980. É extremamente relevante o papel da mídia para o espetáculo futebol. Mesmo com a popularização orgânica do jogo – seja o apresso popular pela facilidade de mímica do esporte, seja o alívio da frustração e violência do proletário na sociedade capitalista, ou seja qualquer outra razão – o levante futebol espetáculo pouco se explica com o talento do melhor do mundo, a cor da camisa nacional, quantos títulos mundiais tem um clube, se a Copa Libertadores tem final única ou jogo de ida e outro de volta... Nada disso seria possível se as organizações do futebol não tivessem financiado o futebol marginal – como a Fifa com João Havelange com as federações africanas e asiáticas e a CBF nos anos da ditadura com as federações fora do eixo Sul e Sudeste – e não tivessem criado a aura e a marca Copa do Mundo e seleção brasileira. Franco Jr. (2007, p. 112) aponta a questão sociocultural do período como condição primeira para a mudança do entendimento do esporte:

o espetáculo esportivo [...] “é um comentário de alcance universal sobre a vida social moderna”. É espetáculo que fala de vencedor e vencido mutáveis e resolve assim um dilema central da democracia, “a contradição entre a igualdade de princípio dos homens e sua desigualdade de fato”6.

O sucesso futebolístico também dependeria de uma fórmula de sucesso largamente aplicado na Europa desde a década de 1970 – “a solidez institucional e econômica” (FRANCO

6 ENRENBERB, A.; CHARTIER, R.; AUGÉ, M. Sport, religion et violence. Espirit, nº 125. Paris, 1987, pp. 63 – 70. 36

JR., 2007, p. 112). De fato, a política liberal na reforma estrutural do futebol começou na Inglaterra (PRONI, 2000, p. 64): pelo discurso da então primeira-ministra Margaret Thatcher (1979-1990) de incentivo à atividades autossustentáveis, a imprensa esportiva comprou o discurso de modernização do futebol, ressaltando o livre-mercado e o fortalecimento das finanças em bases da nova política de austeridade fiscal. O mesmo modelo, com ou sem influência da política econômica nacional, foi aplicado na Espanha, na Itália, na Franca e na Alemanha. A instauração de uma política econômica neoliberal entre os governos de F. Collor de Melo (1990-1992) e Fernando Henrique Cardoso (1994-2002) ressaltou o caminho inglês e as próprias transformações do futebol como mercado de entretenimento

para [...] ser efetivado como um esporte liberal, que seja amparado por leis e regulamentos que garantem a liberdade de trabalho dos atletas, equiparando-se a trabalhadores comuns, e que procuram dar aos clubes uma estrutura empresarial, sob justificativa de que tal medida resolveria o problema de uma suposta desorganização administrativa [...], que ocasionaria diversas perdas financeiras, dividas com o governo, falta de pagamentos a jogadores e, consequentemente campeonatos deficitários e fracos tecnicamente. (BELMAR, 2016, pp. 36-37)

A política de esportes comentada acima levanta hipóteses sobre a gestão do futebol nacional que, até então tratado como patrimônio público (PRONI, 2000, p. 147), pagava o preço da gestão amadora. Vale ressaltar que, mesmo com a promulgação de leis nos termos de tal política de esportes, os problemas levantados seguem, mesmo com a mudança ideológica do governo, com maior circulação de valores no futebol brasileiro, com a crescente do mercado global do esporte, pela nova tecnologia empregada nos meios de comunicação e nos novos produtos. Enquanto o futebol europeu se modernizou e acompanhou as mudanças do mercado mundial – quando se tratava de qualquer ativo, não do esporte isoladamente – a América do Sul, mesmo reconhecida pelo futebol extraordinário e diversos títulos mundiais, na avaliação de Proni (2000, p. 148), manteve a administração “voluntarista” dos clubes, acrescido das “receitas oscilantes”, além de federações e campeonatos desorganizados. O autor continua (2000, p. 153), sobre a estrutura vulnerável do futebol brasileiro:

[...] a precária organização administrativa da maioria dos clubes e as características da frágil estrutura do “mercado futebolístico” (baixo poder de comprados consumidores, dificuldades de financiamento, instabilidade nas receitas ao longo do ano) configuram uma condição de permanente “vulnerabilidade externa”. Não devemos estranhar, portanto perante essa gestão imediatista e as oscilações do mercado, que as desvalorizações cambiais tenham feito aumentar também o grau de vulnerabilidade das equipes brasileiras à concorrência internacional, 37

pois não havia condições de cobrir as propostas feitas pelas equipes estrangeiras para contratar os astros do espetáculo.

O período liberal no futebol ficou marcado por duas legislações. Ambas tiveram impacto relativo na estrutura do futebol: quando comparada aos principais problemas da época e de hoje, vê-se pequeno impacto das leis supostamente modernizadoras do futebol brasileiro. Manhães (2002, pp. 109 – 110) conclui antecipadamente às mudanças legislativas que

[...] a ordem corporativa deu lugar a uma oligarquia desportiva que se confunde com as elites partidárias e políticas conservadoras, constituindo-se no bloco social que resiste às modernizações que apontem para o fim do estado patrimonialista, fonte privilegiada de recursos ilegítimos de poder tradicionais. Esse é o contexto determinante da formação de um mundo desportivo em que a ética e o discurso político são instrumentos de ocultação de interesses menores e particulares inconfessáveis.

A influência exercida por grupos opostos em momentos diferentes da formação da atual legislação do desporto, que privilegia o futebol pelo apresso e relevância nacional e internacional, é evidente e alterou o rumo da modernização do esporte. Ver-se-á que as ideias fundamentais dos projetos são distorcidas para garantir o interesse do grupo conservador, que sacrifica o desenvolvimento saudável da atividade esportiva e comercial em função dos privilégios e manutenção do poder concedido pelas organizações do futebol. A Lei nº 8.672, de 6 de julho de 1993, foi idealizada pelo então Secretário de Esportes do governo de Collor de Melo, Artur Antunes Coimbra, o Zico. Carioca, ambidestro, ídolo do Flamengo e parte do esquadrão de 1978, o ex-jogador convidado para ocupar o cargo propôs, durante um fórum em em 1990 a modernização do futebol brasileiro, segundo os pilares:

i) regulamentar a presença de empresas e as formas de comercialização no futebol profissional, ii) rever a participação nos recursos da Loteria Esportiva, iii) extinguir a “lei do passe”7 e estabelecer uma nova norma para o contrato de trabalho do atleta profissional, iv) redefinir os mecanismos de supervisão e assegurar a autonomia estatuária dos clubes, assim como v) buscar mecanismos mais democráticos e transparentes de representação e de administração das federações e da CBF. (PRONI, 2000, p. 165)

7 Nota centésima de Proni (2000, p. 165): “A ‘lei do passe’, regulamentada em 1976, dizia que um atleta teria direito ao ‘passe livre’ depois dos 32 anos e caso tivesse permanecido por mais de 10 anos vinculado ao mesmo time. Em 1986, o CND [Conselho Nacional dos Desportos, extinto em 1993 com a promulgação da lei referida no parágrafo] reviu essa regulamentação e estipulou que a partir dos 28 anos o atleta teria direito, gradualmente, a uma parcela do ‘passe’ (30% aos 28, 45% aos 29, 60% aos 30 e 90% aos 32).” 38

De fato, o projeto apresentava todas as características pilares do futebol como negócio. A imposição da transformação dos clubes em sociedades comerciais transformaria os contratos que envolvem patrocínio, financiamento, tributação e outras questões que impactam diretamente a saúde financeiras dos clubes brasileiros. O término de incentivo por parte da Loteria Esportiva finalizaria com a ideia de patrimônio público sobre o futebol. O fim do passe sobre o jogador traria maior profissionalização para o atleta e tornaria o mercado mais competitivo. As mudanças estatutárias para a política dos clubes, federações e Confederação Brasileira transformaria a conduta dos dirigentes para a ordem ética e moral, paralela à mudança para sociedade comercial. Na prática, os clubes de menor porte e os setores conservadores entre os dirigentes dos clubes, federações e da CBF viram as mudanças como afronta à tradição do futebol brasileiro, desfavorável aos clubes de menor expressão. Eurico Miranda, à época deputado federal pelo Partido Liberal (PL) do Rio de Janeiro e vice-presidente do Vasco da Gama, foi a cara do movimento contrário. Enquanto o movimento modernizante do futebol, liderado pelo Clube dos 138, queria um campeonato nacional mais forte e competitivo, forçava os clubes a fortalecerem suas instituições com políticas condizentes aos preceitos de conformidade às boas práticas de governança e saúde financeira para atrair investimentos, o movimento conservador pregou o fortalecimento dos campeonatos regionais e estaduais e política fiscal mais branda para os clubes de menor expressão (BELMAR, 2016, p. 38). As mudanças estatutárias na CBF, nas federações e a própria transformação em sociedade comercial dos clubes ameaçavam a estrutura política dos conselhos deliberativos dos últimos e a hegemonia política de João Havelange e seus sucessores. O futebol no Brasil, pela dimensão do país e pelas diferenças regionais, organizou-se nos estados desde seu início. Aproveitando-se disso, a Confederação Brasileira de Futebol foi fundada num modelo único no mundo: nenhuma outra organização nacional para o futebol é uma confederação, todas são federações – nenhum outro país tem a federações estaduais como o Brasil. Na Itália, não existe a Federazione Fiorentina di Calccio, nem a Federazione Sarda, nem a Piomontese; apenas nas nossas terras existe a Federação Paulista de Futebol (FPF), a do Estado do Rio de Janeiro (FERJ), a Maranhense (FMF) e assim por diante. Esta estrutura dá a autonomia para a criação de ligas – por exemplo, o começa em janeiro de cada ano, tem fase de

8 (C-13) ou União dos Grandes Clubes Brasileiros foi uma organização fundada em 1987 pelos clubes de maior expressão do futebol brasileiro (São Paulo, Flamengo, Corinthians, Palmeiras, Santos, Fluminense, Botafogo, Vasco, Cruzeiro, Atlético Mineiro, Grêmio, Internacional e Bahia) para confrontar a CBF nas decisões sobre organização de campeonatos e negociar com emissoras de tevê seus interesses. Perdeu paulatinamente importância após alterações no Campeonato Brasileiro em 2001 e, em 2011, perdeu seus membros fundadores. 39

grupos e depois segue para o mata-mata, e vai contar com árbitro assistente de vídeo (VAR)9 nesta segunda etapa a partir de 2019, enquanto o começa em dezembro, é divido em duas partes, a Taça Guanabara e a Taça Rio, e não contou com a tecnologia do VAR como o Campeonato Paulista – e mantém vivo o futebol nada glamoroso que está no interior dos estados – times como o Mirassol, o Ferroviária, o Volta Redonda, e o Resende não tem três ou quatro grandes campeonatos para jogar com elencos que custam grandes fortunas como Corinthians e São Paulo, Flamengo e Fluminense. Para a CBF, todavia, a importância da cara e complicada estrutura das federações estaduais – porque é incomparável a situação da de São Paulo com a do Maranhão – é seu papel político na composição diretiva da Confederação: cada federação representa um voto, mesmo que não haja proporcionalidade nisso. Para a manutenção do esquema de João Havelange e seus sucessores, basta que a entidade repasse recursos e mordomias suficientes para agradar as federações de estados menos relevantes no futebol nacional. O movimento conservador para a manutenção da estrutura política do futebol foi vitorioso. A Lei nº 8.672, de 1993, foi aprovada após extensa alteração do projeto inicial. Os cinco pontos principais para a garantia de uma nova estrutura moderna para o esporte foram retorcidos para que ainda houvesse espaço para os cartolas e políticos continuassem com o sistema que lhes garante o poder e influência. Em 1993, no governo de Itamar Franco (1992- 1994), a lei idealizada por Zico e promulgada pela cartolagem deram a possibilidade de modernização do futebol, mas não sua obrigatoriedade. Da sua totalidade, ressaltam-se os artigos na tabela abaixo.

9 Árbitro assistente de vídeo, ou Video Assistant Referee (VAR) é um mecanismo tecnológico implementado pela Fifa pela primeira vez no Mundial de Clubes em 2016, depois de ter sido usado na United Soccer League, campeonato de futebol masculino canadense e americano, no mesmo ano. Inspirado nos modelos de arbitragem do futebol americano, um grupo de árbitros analisam imagens em tempo real e podem avisar o árbitro principal de irregularidades. Este, em campo, escolhe ou não rever as imagens indicadas pelo assistente de vídeo no monitor de campo e decide frente a situação apresentada com autonomia, independente do que for apontado pelo VAR. Foi usado pela primeira vez em uma grande competição em 2018, na Copa do Mundo. A Libertadores da América e a já usaram da tecnologia nas fases de eliminatórias no mesmo ano e o Campeonato Brasileiro passa a adotar dela em 2019. A The International Football Association Board (IFAB), organização independente e responsável pelas regras do esporte homologou a implementação do VAR como obrigatória para ligas que apresentem as qualificações necessárias para a temporada 2019-2020. 40

TABELA 1 Pontos principais da Lei nº 8.672, de 6 de julho de 1993 Diz respeito ao cunho do desporto brasileiro, sendo este educacional, a ser incluído no sistema educacional para promover desenvolvimento integra do cidadão; de participação e voluntário, agregando o esporte amador como parte da vida social do Art. 3º cidadão e o semiprofissional, com o incentivo ou remuneração derivada de contratos profissionais; de rendimento, delimitando o esporte profissional e obrigando-o a sua configuração às leis nacionais e internacionais Refere-se à constituição como pessoas jurídicas do direito privado as organizações Art. 9º federais de organização do desporto, com autonomia para definir suas competências, assim como filiar as organizações estaduais, subordinadas à federal. Expõe às possibilidades de administração do esporte profissional, facultando a sua forma de constituição, com ou sem fins lucrativos, como sociedade comercial com Art. 11 finalidade desportiva, sociedade comercial com finalidade desportiva com maioria do capital com direito a voto ou contratação de sociedade comercial para administrar as atividades ligadas ao desporto. Descreve o dever sobre os mandatos dos dirigentes das organizações descritas o ajuste à periodicidade das competições internacionais da modalidade e são causas de Art. 13 e 14 inelegibilidade eletiva ou livre nomeação dos cargos e funções, assim como a perda de tal mandato, a condenação por crime doloso e a inadimplência na prestação de contas Cita as características da atividade profissional do atleta, pelo contrato entre o profissional e a pessoa jurídica registrado na organização federal competente, assim Art. 22 como a aplicação ao atleta profissional a legislação trabalhista e da seguridade social, levando em consideração as ressalvas expressas nesta lei ou no contrato entre as partes Diz respeito à regulamentação da Lei nº 8.028, de 12 de abril de 1990, que dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios, e dá outras Art. 33 e 34 providências, e aos parágrafos 1º e 2º do artigo 217 da Constituição Federal, sobre a organização, funcionamento e atribuições da Justiça Desportiva Refere-se à criação de comissões disciplinares para os esportes e competições como Art. 36 primeira instância do julgamento das transgressões das normas estabelecidas pelas organizações federais Expõe a Política Nacional do Deporto e define as possibilidades de retenção de recursos pelas organizações desportivas. Define a criação do Fundo Nacional de Art. 39 e 42 Desenvolvimento Desportivo (Fundesp) para unificar o orçamento designado ao fomento do esporte que se enquadram na referida Política Nacional Descreve a possibilidade de formação de organização independente para a arbitragem dos desportos com o objetivo de recrutar, formar e prestar os serviços de arbitragem Art. 58 às organizações desportivas, não subscrevendo vínculo empregatício entre as entidades de arbitragem e esportivas Cita a extinção do Conselho Nacional dos Desportos, criado em 1941 com objetivo Art. 65 de regular e regulamentar o desporto e suas organizações federais Fonte: Lei nº 8.672, de 6 de julho de 1993. Ver Referências bibliográficas. Pela avaliação do advogado especialista em direito desportivo Álvaro Melo Filho (2006), o conceito de desporto alterou-se em função de bases modernas para o desporto, em contraste ao modelo do século XX: 41

[...] a Justiça Desportiva ganhou uma estruturação mais consistente; facultou-se o clube profissional transformar-se, constituir-se ou contratar sociedade comercial; em síntese, reduziu-se drasticamente a interferência do Estado fortalecendo a iniciativa privada e o exercício da autonomia no âmbito desportivo, exemplificada, ainda, pela extinção do velho Conselho Nacional de Desportos, criado no Estado Novo e que nunca perdeu o estigma de órgão burocratizado, com atuação cartorial e policialesca no sistema desportivo, além de cumular funções normativas, executivas e judiciais. Ou seja, removeu-se com a ‘Lei Zico’ todo o entulho autoritário desportivo, munindo-se de instrumentos legais que visavam a facilitar a operacionalidade e funcionalidade do ordenamento jurídico-desportivo, onde a proibição cedeu lugar à indução.

As bases e os problemas da legislação seguinte realmente foram nivelados pela lei inicialmente proposta por Zico. Durante o primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso (1994-1998), Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, foi convidado ao cargo de Ministro do Esporte e prometeu renovar a esperança de modernização do futebol. Mineiro, ambidestro, ídolo do Santos, dono dos mil gols e tri campeão mundial com a seleção brasileira, ocupou o cargo de ministro entre 1995 e 1998. O maior legado é, sem dúvida, a lei apelidada em sua homenagem. De modo geral, o objetivo da lei era rever a forma de respaldo do esporte de forma liberal e profissional, alterando a relação de trabalho entre o atleta e o clube e a forma de administração dos clubes. O projeto de lei original (nº 3.633, de 199710) propunha, no que se refere às relações trabalhistas entre jogador e clube, a extinção da lei do passe em dois anos, reformulação do tempo mínimo de contrato para seis meses, multa referente à rescisão contratual equivalente à metade do valor do restante acordado e nova idade mínima para profissionalização, 15 anos. Quanto à administração dos clubes, propôs-se a transformação obrigatória dos departamentos de futebol dos clubes em sociedade comercial. Os deputados da Câmara ligados aos interesses da CBF, liderados pelo já citado Eurico Miranda (PL-RJ), fizeram cento e vinte e sete emendas ao projeto (BELMAR, 2016, p. 51) – só Eurico fez dezesseis delas (PRONI, 2000, p. 199) – e retiraram o caráter de urgência11. Esta última manobra permitiu que tais parlamentares tivessem tempo de negociar o afrouxamento do projeto inicial. O principal empecilho era a extinção da lei do passe, e desta vez, os clubes

10 Projeto de Lei nº 3.633, de 17 de setembro de 1997. Institui normas gerais sobre deporto e dá outras providências. Autoria: Poder Executivo. Disponível em: . Acesso em: 16 nov. 2019. 11 Requerimento 1.324/1997: mensagem de cancelamento de urgência. Apresentado em 3/11/1997. Solicita o cancelamento do pedido de urgência para apreciação do Projeto de Lei nº 3.633, de 1997, que “Institui normas gerais sobre o desporto e dá outras providências”. Disponível em: . Acesso em: 16 nov. 2019. 42

se posicionaram publicamente contrários ao projeto. Em carta assinada pelo Clube dos 13, Associação Brasileira dos Clubes de Futebol (Abracef) e os clubes da primeira divisão (PRONI, 2000, pp. 198 – 199), declarou-se o repudio ao projeto pela ineficiência da tentativa anterior, e classificou como estatizante e autoritário. Usou-se o modelo espanhol de modernização do futebol,

que combinava forte ingerência do poder público, principalmente na fiscalização do esporte profissional, com autonomia para os clubes se organizarem e se autogerirem, e ao mesmo tempo assegurando a independência dos tribunais de justiça esportiva em relação às federações e à CBF. (PRONI, 2000, p. 198)

Deste modo, os clubes seriam obrigados à administrarem seus departamentos de futebol em conformidade às normas fiscais aplicadas às empresas brasileiras não só pela forte fiscalização, mas também pela necessidade de organização das competições – o equivalente espanhol ao Campeonato Brasileiro, a La Liga, é administrada e organizada pelos clubes de forma deliberativa. Ao ganhar mais autonomia, os clubes brasileiros também teriam que arcar com ônus da desorganização voluntária. De certo, há comodismo em conferir a responsabilidade de organização e administração da principal competição nacional à Confederação Brasileira: os clubes, sejam eles da elite ou da margem do futebol brasileiro, se dissolvem da responsabilidade e da cobrança de um campeonato mais competitivo, de maior rendimento, sem erros de arbitragem, com melhor organização do calendário, entre inúmeros outros problemas, por poderem culpar a CBF pelo raso futebol nacional – mesmo que a responsabilidade de contratação, venda e gestão de atletas, técnicos, equipe médica e outros envolvidos no rendimento dos times sejam de exclusividade única dos clubes. Parece haver determinado alívio por parte dos clubes em dividir a culpa do baixo rendimento do futebol com a CBF, ao invés de tomarem a responsabilidade (e arcarem com ela), modernizando de fato o futebol brasileiro. Com a obrigatoriedade dos clubes em transformar seus departamentos de futebol em pessoas jurídicas, cria-se um modelo de administração facultativo do clube-empresa. Sem transformar a estrutura dos conselhos administrativos e deliberativos, mas alterando a natureza do departamento de futebol, a nova lei deu liberdade para que o futebol oligárquico conversasse com o moderno e se mantivesse até hoje em solo movediço. Proni (2000, p. 202) conclui que “ao remeter para o mercado a construção do modelo brasileiro de futebol-empresa, a legislação aprovada acabou permitindo que novos desequilíbrios e uma ética estranha ao esporte fossem introduzidos”. 43

A legislação proposta em 1997 copiou, segundo Melo Filho (2006), 58% da anterior. Ainda, sofreu embate direto, demonstrado pelas quase cento e trinta emendas, pelos parlamentares aliados à CBF. O maior embate, para ambas principais mudanças, era o tempo que estas entrariam em vigor. A lei que extinguia o passe, no projeto de lei, entraria em vigor após dois anos de sua promulgação; para a alteração de clube para empresa, o prazo seria de um ano. O relator do projeto, Antônio Geraldo (PFL-PE), em entrevista à Belmar (2016, p. 60) conta que “O prazo para que a Lei entrasse em vigor foi fator determinante. Conversei com Pelé e disse a ele que só era possível aprovarmos o Relatório se concedêssemos um prazo razoável para que a Lei entrasse em vigor” 12, assim concordado pelo Ministro dos Esportes de FHC. A lei, aprovada no Senado Federal, determinava então que o prazo seria de dois anos para alteração para sociedade comercial do departamento de futebol dos clubes (ver art. 27 na Tabela 2), permitindo a manutenção do sistema oligárquico dos clubes, acima descrito. O contrato do jogador teria como principal vínculo o trabalhista, não o desportivo (ver art. 28 na Tabela 2) – que significa a existência do passe desde que haja vigência do contrato; inclui-se, então, indenizações e multa rescisória, respaldando o clube, mas permitindo a saída do jogador, perante pagamento do devido. O passe só seria extinto três anos após a promulgação da lei. A profissionalização do atleta formado nas categorias de base só se concretizaria exclusivamente após assinatura de contrato profissional com o clube formador (ver art. 29 na Tabela 2). Outros pontos relevantes desta lei, que são novidade frente à lei promulgada em 1993, estão apresentados na tabela abaixo.

12 Grifo da autora. 44

TABELA 2 Pontos principais da Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998 Cria o Instituto Nacional do Desenvolvimento Desportivo (Indesp), com o objetivo de promover e desenvolver o esporte, incluindo o desenvolvimento do Plano Art. 5º Nacional do Deporto, com auxílio do Conselho do Desenvolvimento do Desporto Brasileiro (CDDB), criado e descrito no art. 11 desta lei Dá, pelo Sistema Nacional do Desporto, a possibilidade de organização de ligas, Art. 20 campeonatos e competições por parte dos clubes, sem interferência ou dependência das autarquias regionais, estaduais ou federal do esporte Obriga, pelo Sistema Nacional do Desporto, a prestação de contas, anualmente, assim Art. 24 como a possibilidade de acesso irrestrito de documentação e outras informações pelos membros das assembleias-gerais Possibilita às entidades de prática profissional em competições de transformarem-se em sociedade civil sem fins econômicos, em sociedade comercial ou constituir ou Art. 27 contratar sociedade comercial para administrar a atividade comercial. A redação deste artigo se deu pela Lei nº 9.981, de 14 de julho de 200013 Define o principal vínculo contratual do atleta e o clube como trabalhista, e não desportivo, desfigurando juridicamente o passe. A instauração de multa rescisória e Art. 28 outros valores de cunho indenizatório às partes estão descritos nos parágrafos 2º ao 6º, também no que se refere à transferências internacionais dos atletas Estabelece o vínculo necessário para profissionalização do atleta, a partir dos Art. 29 dezesseis anos, com o clube formador. A redação deste artigo se deu pela Medida Provisória nº 2.193-6, de 23 de agosto de 200114 Explicita a possibilidade do atleta não participar de competição, em caso de atraso de Art. 32 salário igual ou superior à dois meses Descreve as regras de exploração de casas de apostas (bingo) pelas organizações do Cap. IX esporte, revogado pela Lei nº 9.981, de 14 de julho de 200015 Define prazo de três anos para adequação legal ao fim do passe, como disposto no Art. 93 parágrafo 2º do art. 28, incluído pela Lei nº 9.981, de 14 de julho de 200016 Define prazo de dois anos para adequação da constituição dos departamentos Art. 94 profissionais de esporte dos clubes em sociedade jurídica, incluído pela Lei nº 9.981, de 14 de julho de 200017 Fonte: Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998. Ver Referências bibliográficas. Melo Filho (2006) comenta a Lei introduzida inicialmente por Pelé quando ministro como

[...] produto de confronto e não de consenso, com ditames que usaram a exceção para fazer a regra, restabelece, de forma velada e sub- reptícia, o intervencionismo estatal no desporto, dissimulada pela

13 BRASIL. Lei nº 9.981, de 14 de julho de 2000. Altera dispositivos da Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998, e dá outras providências. Brasília: Senado Federal, 2000. Disponível em: . Acesso em: 16 nov. 2019. 14 BRASIL. Medida Provisória nº 2.196-3, de 24 de agosto de 2001. Estabelece o Programa de Fortalecimento das Instituições Financeiras Federais e autoriza a criação da Empresa Gestora de Ativos – EMGEA. Brasília: Casa Civil: 2001. Disponível em: . Acesso em: 16 nov. 2019. 15 Ver nota 14. 16 Idem. 17 Idem. 45

retórica da modernização, da proteção e do “elevado interesse social” da organização desportiva do país. Certamente, em razão dos vícios de inconstitucionalidades e de irrealidades que continha, a Lei nº 9.615/98 foi objeto de várias e sucessivas alterações legislativas decorrentes da Lei nº 9.981/0018, da Lei nº 10.264/0119 e da Lei nº 10.672/0320, que a modificaram, ora minorando efeitos nocivos, ora aumentando danos colaterais, tanto que, da versão original, remanesce apenas 6% Lei Pelé, ainda pendente de substanciais reparos e indispensáveis ajustes.

Levantado por esta legislação, o conceito de clube-empresa tem sido questionado quanto seu real impacto na modernização e, em última instância, melhora quando se trata da qualidade de gestão dos times brasileiros. Ao longo dos mais de dez anos passados da Lei nº 9.615, de 1998, alguns clubes optaram por adotar o modelo de gestão mais moderno, desfazendo-se da estrutura reflexo do modelo do início do século XX. Mesmo ainda distante da gestão europeia do futebol, na qual os clubes tornaram-se empresas de capital aberto, o modelo foi adotado ao longo dos anos seria opção para os clubes que quisessem reformular sua política interna para melhor gestão. Vê-se, todavia, como um modelo mais propício à má gestão, pela manutenção do restante da estrutura oligárquica dos clubes brasileiros. O Figueirense Futebol Clube de Florianópolis, Santa Catarina, optou em 2017 por transformar-se em clube-empresa. O clube, que flutuou pelas séries A e B do Campeonato Brasileiro nos anos 2000 e permaneceu na segunda divisão nos anos 2010, pela decisão de seu conselho deliberativo, contratou a Elephant Holding S.A. para cogestão por 20 anos (BISPO, 2019), visando administrar de forma moderna e, com melhor saúde financeira, alcançar mais espaço no futebol nacional. O estatuto social do Figueirense, de 2013, no capítulo XI, Da constituição e integração em sociedades, artigo 163 afirma a possibilidade de

constituir [...] sociedade empresarial ou entidade de propósito específico para gerir suas atividades próprias, diretamente ou em parceria, administrar as atividades relacionadas ao futebol profissional e de suas categorias de base e demais modalidades esportivas, ou para explorar seus bens e direitos21

em conformidade à lei exposta anteriormente. No capítulo XII, Da cogestão e parcerias, artigos 166 e 167, destaca-se a possibilidade

18 Idem. 19 BRASIL. Lei nº 10.264, de 16 de julho de 2001. Acrescenta inciso e parágrafos ao art. 56 na Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998, que institui normais gerais sobre o desporto. Brasília: Senado, 2001. Disponível em: . Acesso em: 18 nov. 2019. 20 BRASIL. Lei nº 10.672, de 15 de maio de 2003. Altera dispositivos da Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998, e dá outras providências. Brasília: Senado, 2003. Disponível em: . Acesso em: 18 nov. 2019. 21 Grifo feito pela autora. 46

[...] de contrato ou convênio para cogestão do Clube ou atuação em parceira, mediante serviços de assessoramento, consultoria, auditoria e desenvolvimento de programas e projetos específicos. Parágrafo único. Os limites de atuação e partilha de responsabilidades, assim como a distribuição de eventuais recursos financeiros, deverão ser aprovados pelo Conselho Administrativo e pelo Conselho Deliberativo do Figueirense, ambos pela maioria absoluta de seus membros, ouvido previamente o Conselho Fiscal. Art. 167 Em nenhuma hipótese será deslocada a administração geral do Figueirense ao cogestor ou parceiro, a qual é privativa dos Poderes constituídos do Clube.22

Todavia, em 20 de setembro de 2019 o contrato foi desfeito, visto a má gestão de recursos: ao assumir o clube em 2017, a dívida passiva do Figueirense era de R$ 77 milhões, incorporada pela Elephant; em 2019, esta passou para R$ 100 milhões. Ademais, os jogadores do time optaram por não jogar contra o Cuiabá, pela décima sétima rodada da série B do Campeonato Brasileiro 2019, por não receberem salários e outros valores acordados (BISPO, 2019). Como consta no artigo 32 da Lei nº 9.615, de 1998, “É lícito ao atleta profissional recusar competir por entidade de prática desportiva quando seus salários, no todo ou em parte, estiverem atrasados em dois ou mais meses”. Pela consulta na Receita Federal23, a Elephant Holding S.A., inscrita no CNPJ 09.361.233/0001-94, foi constituída em 2008 e tem por atividade principal “holdings de instituições não-financeiras” e é domiciliada em Nanterre, na França. Cláudio Honingmann é sócio majoritário da Elephant (BISPO, 2019) (POLIDORO JR., 2019) e também ocupava cargo de presidente do Conselho Administrativo do Figueirense, mesmo que no estatuto social do clube, no parágrafo 1º do artigo 74, no parágrafo 1º do artigo 80 e no artigo 140, com destaque neste, fique expresso a impossibilidade de ocupação de cargo nos conselhos deliberativos e administrativos e ter sociedade em empresa que preste serviços, faça cogestão ou tenha parceria com o clube: “Art. 140 É vedada a nomeação de sócios e empregados de empresas e entidades admitidas para o exercício de cogestão, ou que apresentem em parceria, às chefias executivas do Figueirense”. A ilustração do Figueirense ajuda a pintar a modernização amadora do futebol brasileiro dos últimos anos. Proni (2000, pp. 69 – 74) coloca que as consequências positivas da adoção do modelo Futebol S.A. e as transformações que viriam com ela são o fim do passe – que de fato ocorreu, mesmo com entraves e morosidade de transição, como visto na Lei nº 9.615, de

22 Grifo da autora. 23 Informações obtidas pela Emissão de Comprovante de Inscrição e de Situação Cadastral da Receita Federal. Ver Anexo 1. 47

1998 – e maior poder simbólico dos clubes e autonomia frente às federações e a Confederação Brasileira de Futebol, que culminariam na organização associativa dos clubes e, posteriormente, a criação de ligas administradas sem interferência federativa. Como já levantado, a distribuição do ônus do futebol brasileiro parece mais vantajosa do que o real esforço para a modernização. Visto isso, o autor (2000, p. 172) pontua que “Se essas tradicionais (e ultrapassadas) formas de organização de futebol ‘profissional’ sobrevivem, é porque interagem de algum modo, com o segmento moderno”. Avalia-se os gráficos 5 e 6 deste capítulo: a captação de recursos dos clubes, mesmo que recortado à elite do futebol paulista, são dependentes em mais de 30% das cotas de televisão, indicativo de complacência pelo modelo vigente; a transferência de jogadores, com pouco menos do mesmo valor, corresponde o segundo maior fonte de recursos. O sistema amadoramente moderno do futebol brasileiro sobrevive exatamente por sua fluidez. O clube-empresa entrou em pauta nas casas legislativas federais com força maior em 2019. Há projetos dispares tramitando na Câmara dos Deputados e no Senado Federal sobre a alteração do modelo de gestão dos clubes. Com divergências, dos vinte clubes que compõe a série A em 2019, quatorze expressaram interesse em um dos modelos propostos (CAMPOS; JUNIOR, 2019). Na Câmara, redigido pelo deputado Hugo Leal (PSB-RJ) e apoiado pelo presidente da casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), os clubes interessados em constituir-se como entidades sem fins lucrativos como sociedade anônima (S.A.) ou sociedade limitada (LTDA) receberiam ajuda para sanar suas dívidas por dispositivos de recuperação judicial para renegociar as dívidas do clube. Mesmo com o Programa de Modernização da Gestão de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro (Profut), incluso na Lei nº 13.155, de 4 de agosto de 2015, o valor passivo da dívida dos clubes, segundo o relator do projeto, deputado Pedro Paulo (MDB-RJ) aumentou de R$ 5 bilhões para R$ 7 bilhões desde a criação do programa; sendo assim, o incentivo fiscal aos clubes traria benefícios para a administração profissional e revisão de dívidas com a união (PETROCILO, 2019a). No Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) propõe a criação da Sociedade Anônima do Futebol (S.A.F) e não prevê renegociação das dívidas, mesmo que, ao se tornar empresa, os clubes teriam automaticamente possibilidade de pedido de recuperação judicial. Há obrigatoriedade, enquanto o clube for o único acionista da empresa, da presença de membros independentes nos conselhos administrativos e fiscal (PETROCILO, 2019b). Desta forma, o projeto pressupõe que os clubes, ao se transformarem em S.A.F, criem estruturas robustas de grandes empresas, com departamentos estruturados de compliance. 48

TABELA 3 Comparativo dos projetos de lei para novo modelo de gestão do futebol brasileiro PROJETO APRESENTADO NA PROJETO APRESENTADO TÓPICO CÂMARA DOS DEPUTADOS NO SENADO FEDERAL Aprovado em plenária com 246 votos favoráveis, 94 contrários e 2 Status do projeto, em abstenções em 27/11/2019; no Senado, Em tramitação novembro de 2019 a relatoria ficará a cardo do senador Romário (PODE-RJ) Obrigatoriedade de Não há obrigatoriedade Não há obrigatoriedade adesão Tipo de pessoa Sociedade Anônima (S.A.) ou Sociedade Anônima do Futebol jurídica Sociedade Limitada (LTDA) (S.A.F) Possibilidade de obtenção de título de Cotas e ações Controle por duas ações ordinárias capital aberto Refinanciamento das dívidas com a Dívidas União em 240 meses e redução de 50% Não prevê refinanciamento dos juros Há possibilidade, como previsto à Automática para refinanciamento da Recuperação judicial todas modalidades de pessoa dívida jurídica Com duas opções – equiparação tributária aos modelos vigentes ou Recolhimento de 5% do tributação especial, devido ao alto faturamento mensal como cobrança Tributação endividamento dos clubes e incentivo única para IR, PIS/Pasep, CLL e à investimentos – acatou-se a emenda Confins da alíquota simplificada de 5% em relação ao lucro Contratos como pessoa jurídica para Contratos jogadores com salário igual ou duas Não prevê alterações à Lei nº 9.615, trabalhistas vezes maior que o teto da Previdência de 1998 (R$ 11,6 mil) Tabela produzida pela autora. Fonte: PETROCILO, 2019c. CAMPOS; PRATA; JUNIOR; AMARO, 2019. PRATA, 2019b. Ver Referências bibliográficas. Como apontado por Campos e Júnior (2019), os clubes da elite apresentam interesse nas mudanças da legislação sobre o modelo de gestão. Vê-se que o projeto da Câmara privilegia a inserção dos clubes brasileiros num modelo de negócio que abriria para o mercado internacional, enquanto a do Senado ressalta os conselhos já existentes no modelo atual de gestão. De todo modo, os clubes aguardam as alterações na legislação para prosseguirem com as alterações internas. O São Paulo Futebol Clube (SPFC), por exemplo, aprovou o novo estatuto em 2017 e conduz estudo de viabilidade de divisão total do clube social dos departamentos esportivos profissionais, para posteriormente alterar o modelo de gestão do 49

esporte profissional, como consta no capítulo XXI, Das disposições transitórias, seção II, Da constituição de sociedade empresária e do estudo de viabilidade, artigo 170:

O Presidente Eleito deverá, no prazo improrrogável de 12 (doze) meses contados da posse dos membros do Conselho de Administração, elaborar, com a assessoria de terceiros especialistas de notável reputação profissional em suas áreas, um estudo de viabilidade visando à separação societária do futebol (profissional e categorias de base), das demais atividades praticadas pelo SPFC. Parágrafo único. O estudo poderá contemplar qualquer estrutura que viabilize a separação, incluindo a constituição, pelo SPFC, de uma sociedade empresária que detenha os direitos relacionados ao futebol profissional e que opere as suas atividades.

A morosidade da aprovação de um novo modelo de gestão acaba por beneficiar aqueles que entendem que a estrutura dos conselhos deliberativos e administrativos apresentam mais vantagem à administração. Carlos Augusto de Barros e Silva, presidente do São Paulo com mandato até 2020, explicitou preferência pelo modelo apresentado pelo senador Rodrigo Pacheco por apresentar “elementos saudáveis para modernização do clube e se ajusta a juridicidade”, enquanto o projeto relatado pelo deputado Pedro Paulo precisaria de “mais análises” (PETROCILO, 2019b). Retoma-se o argumento de Proni (2000, p. 172) sobre a fluidez do modelo amador- profissional do futebol no Brasil. Não há dúvidas de que outros esportes tenham problemas semelhantes ou de mesma gravidade do que o futebol no país – seja pela falta de incentivo, popularidade, falta de recursos, má gestão, instituições frágeis, etc. Mas, de fato, o futebol ganha folego na discussão aqui e no mundo todo pela crescente espetacularização desse a década de 1980. O futebol já era um fenômeno midiático espetacularizado há algum tempo e são diversos os fatores, se contarmos apenas os futebolísticos, que impulsionam. O futebol passou a fazer parte das trocas simbólicas paulatinamente com o avanço das mídias de massa. Este, como parte essencial da programação da grande mídia, não seria um fenômeno social se não fosse o papel de difusão da mídia massiva. Não se pretende aqui discutir o papel da televisão, do rádio e do cinema em relação ao futebol e a construção deste como fenômeno social; a pretensão centra-se no pensamento social do futebol, seus impactos sociais como fenômeno cultural, como vem sendo apresentado. Para Pierre Bourdieu, em Programa para uma sociologia do esporte (2004), o estudo das ciências sociais para o esporte deveria ser conduzido a partir de duas reflexões. A primeira delas e a percepção do “espaço das práticas esportivas como um sistema no qual cada elemento recebe seu valor distintivo” a partir do conjunto de indicadores; a outra reflexão diz respeito às 50

relações espaciais entre esporte e sociedade para “evitar os erros ligados ao estabelecimento de uma relação direta entre um esporte e um grupo que a intuição comum sugere” (2004, p. 208). Aqui tem se intencionado apresentar as ideias sobre o futebol sob estas duas reflexões para que se entenda tal esporte com sua devida complexidade. A figuração deste esporte como parte do imaginário cultural é extremamente forte no Brasil: determinado jogador é o ídolo das crianças e a irreal meta de vida de um jovem adulto; um dirigente de um clube ou federação é tão – ou até mais importante – do que um político de longa data; o jornalismo esportivo detém horário significativo na programação da televisão aberta, e dez canais na televisão paga. O status que o futebol concede às pessoas é imensurável, tanto que cada vez mais novo os jogadores entram nas categorias profissionais dos times da série A do Campeonato Brasileiro, e cada vez mais novos buscam a tão sonhada venda para um time europeu – o ápice da geralmente breve carreira desses atletas. O futebol seria uma aura imaginaria de sucesso e prosperidade que, na materialidade, não tem. Tomemos um pequeno torcedor do Palmeiras, morador do Jardim Peri, em São Paulo, estudante de uma escola pública sucateada, morador de uma comunidade pobre com problemas de saneamento básico e segurança, filho de uma família com mais três irmãos e sem pai. Agora, analisemos a situação do time paulista: o vasto e caro elenco foi treinado por um dos homens consolidados no hall da fama do futebol mundial, que joga num dos melhores estádios do mundo, que participou de quatro campeonatos e ganhou um em 2018. O menino sente-se preenchido pela vitória de seu time por dois a zero no Morumbi, no Campeonato Brasileiro, e esquece sua materialidade e sua realidade minimamente desfavorável. Este mesmo menino provavelmente não conhece o Allianz Parque e tem como seu maior ídolo Gabriel Jesus24, ex- jogador do Palmeiras, descoberto na base e antigo morador do Jardim Peri de uma família grande sem pai, que hoje ganha inimagináveis libras jogando hoje Manchester City, na Inglaterra. Bellos (2002) discute a questão da forte migração de jogadores brasileiros para a Europa por dois pontos de vista complementares: a do status social e a financeira. Na mentalidade dos atletas e dos empresários, jogar na Inglaterra, na Itália, na Espanha, em Portugal, na Holanda,

24 Gabriel Fernando de Jesus nasceu no bairro do Limão, na capital paulista, mas passou toda sua infância e adolescência no Jardim Peri. Jogou desde pequeno nos times do bairro, mas teve o gosto do estrelato a primeira vez com a Associação Atlética Anhanguera quando, em 2012, foi artilheiro da Copa São Paulo de Futebol Júnior – a mais importante competição de futebol de base do Brasil – e recebeu a oferta do Palmeiras para integrar a base e, em 2015, o time principal. Em 2017, assinou com o Manchester City, da Inglaterra, por 27 milhões de libras; hoje, seu valor de mercado é de 70 milhões de euros. É um dos integrantes do grupo que foi ouro nos Jogos Olímpicos do Rio, em 2016; foi destaque nas partidas eliminatórias para a Copa do Mundo de 2018, mas teve desempenho muito abaixo das expectativas durante o campeonato. 51

na Bélgica e até nas Ilhas Faroe é melhor do que jogar por aqui, como o curioso caso de Marcelo Marcolino. Jogador carioca que se mudou para as Ilhas Faroe, minúsculo protetorado dinamarquês, passou pela base do Botafogo e do Fluminense, mas consagrou-se no B68, time da primeira divisão faroense. Mesmo reclamando do frio, da língua, da falta de entretenimento, da saudade da família e a solidão na pequena ilha da Dinamarca, Marcolino escolheu ficar no B68. O motivo? Ele explica que

Quando eu volto para o Rio, as pessoas me tratam diferente [...]. É como ser da realeza. As pessoas pensam que você é uma pessoa importante. Ninguém do meu bairro jogou na Europa. Se você fala que joga por um time pequeno da cidade, as pessoas tiram sarro de você, como se o time fosse um nada. Os brasileiros respeitam mais quem joga na Europa. As pessoas veem com outros olhos25 (BELLOS, 2002, pp. 7 – 8).

São muitos os jogadores que saem das segundas divisões estaduais para jogar nos desconhecidos clubes europeus, nos países de menor relevância competitiva no cenário internacional. Pouco divulgado e muito menos discutido, são poucos os Neymar Jr. que saem do Santos Futebol Clube para o Futbol Club Barcelona de uma das ligas mais competitivas e visadas do mundo por cinquenta e sete milhões de euros. Um bom jogador de base de bons clubes é bem treinado e bem cuidado para chega no time profissional: menino de Mogi das Cruzes, Neymar Jr. jogou desde criança na base do Santos, participou de Copas do Mundo das categorias de base da seleção brasileira e depois vendido para a Europa. Marcolino, assim como Marcelo Vieira, do clube espanhol Real Madrid, e Thiago Silva, hoje do francês Paris Saint-Germain, mas transferido originalmente para o Milan, da Itália, poderia ter saído das categorias de base do Fluminense para a Europa. Por esta associação, Marcolino não era tão promissor para ter investimento pesado dos clubes que passou. A primeira transferência de jogador na história do futebol aconteceu em 1905 na Inglaterra, entre o Sunderland e o Midlesbourg (FRANCO JR., 2007, pp. 43 – 44). O futebol ainda se formava como profissional, e mais importante, como negócio. A venda do passe de Alf Common por mil libras – valor de devida importância para a época – é significativo para como se moldou o futebol mundial e contemporâneo, o grande negócio de muitas cifras que entretém altamente o público.

25 Tradução livre feita pela autora. Texto original: “When I go back to Rio people treat me differently […]. It’s like I’m royalty. People realise you are an important person. No one else from my neighbourhood has played in Europe. If you say you play for a small local club, people make fun of you, as if the team is nothing. Brazilians respect you more if you are playing in Europe. People see you with different eyes.” 52

A exportação do talento brasileiro é tão importante para o esporte que a própria profissionalização teve como um dos grandes pivôs a tentativa de manter os atletas brasileiros nos seus clubes. Em 1933, os times de São Paulo e do Rio de Janeiro fundaram as ligas profissionais e a questão racial deixou de ser importante e o futebol perdeu pela primeira vez seu carácter elitista (BELLOS, 2002, p. 33). Segundo o Balanço de Registro e Transferências da CBF sobre 2017, foram mil seiscentos e trinta brasileiros transferidos para o exterior, entre atletas profissionais e amadores. Este expressivo número é facilmente entendido quando se considera a relação entre número de clubes e oportunidade de ascensão na carreira: apenas 13% dos times profissionais registrado na CBF jogam nas séries A, B, C e D do Campeonato Brasileiro: são 776 clubes profissionais, 435 amadores e 27 apenas formadores de atletas, as escolinhas. Além do mais, 82,4% de todos os jogadores ganham menos do que mil reais mensais como jogador profissional – e provavelmente apenas nos primeiros meses do ano, quando os campeonatos estaduais são jogados e empregam estes atletas, que estão fora das quatro divisões da principal competição do futebol profissional brasileiro. E mesmo os que estão entre as divisões do Brasileirão, 15% de todos os atletas ganham entre mil e dez mil reais por mês, que são provavelmente aqueles que estão nas séries B, C e D e nos clubes de menor capacidade financeira, mesmo aqueles da série A. Os jogadores brasileiros são valorizados a tempos no mercado internacional da bola. Para atualizar os dados, ao ser analisado os dados divulgados sobre transferências entre clubes brasileiros e estrangeiros entre 2015 e 2018, fica claro que ao longo dos anos os muitos atletas brasileiros continuam sendo negociados por altas cifras. GRÁFICO 8 Valor de negociações do GRÁFICO 9 Número de jogadores Brasil para o exterior, em milhões de reais negociados

1.443,3

792 774 760 916,3 657

679,7 654,1

2015 2016 2017 2018 2015 2016 2017 2018 Fonte: CAMPOS, 2019. Vale destaque especial aos anos de 2017 e 2018. Este, em comparação aos outro três outros, teve o maior número de jogadores transferidos pelo maior valor – cada atleta foi negociado, na 53

média, por 1 milhão e 822 mil reais. Entretanto, em 2017 foi negociado menos profissionais do que qualquer outro ano (cento e dezessete a menos do que em 2015, cento e três em 2016 e cento e trinta e cinco em 2018) por valor próximo ao do ano seguinte: cada jogador foi negociado por, em média 1 milhão e 395 mil reais, valores apenas 427 mil reais de diferença para a venda de 135 atletas. São mais Marcolinos nas Ilhas Faroe que podemos contar. Jogadores menos estrelados e menos promissores concordam em jogar em países e ligas menos importantes na Europa. Acabam ganhando menos do que no clube anterior no Brasil e muitas vezes não há nem cumprimento do contrato assinado anteriormente a ida do atleta. O Ministério das Relações Exteriores tem recebido aumento de reclamações de atletas brasileiros que não tem problemas trabalhistas e na cartilha Orientações para o trabalho no Exterior26, há tópico especial para jogadores de futebol e levantamento de casos abusivos em determinados países na profissão (JUNIOR, 2019). As movimentações de compra e venda internacional de jogadores brasileiros traz um dado interessante em 2019. Pela primeira vez desde 2016, as repatriações dos atletas superaram as vendas (AMARO; RAMOS, 2019). Foi o ano de retorno de alguns grandes jogadores – Daniel Alves, do Paris Saint Germain para o São Paulo, Rafinha, do Bayern de Munique e Filipe Luís, do Atlético de Madrid, para o Flamengo – e de venda de talentos das bases e estrelas de times, como Renan Lodi, vendido por € 20 milhões do Club Athletico Paranaense para o Atlético de Madrid. Como sempre, não se fala dos pontos fora da curva, aqueles que jogaram em grandes clubes europeus, tiveram carreiras explosivas e são multimilionários. Até 31 de julho, foram 745 atletas contratados do exterior e 635 vendido ao exterior; no ano anterior, foram 677 jogadores retornando do mercado internacional e 832 vendidos. Segundo Marcelo Robalinho, grande empresário de jogadores,

No geral, a maioria dos jogadores que retorna ao Brasil é porque não tem mercado na Europa ou na Ásia suficientemente atrativo. Entre ganhar o mesmo salário na China ou em São Paulo, o atleta prefere voltar. Esse tipo de situação pesa na hora de o jogador tomar sua decisão. Quem tem um bom mercado em alto nível não volta para o Brasil. Com exceção das grandes estrelas, normalmente quem resolve voltar é um atleta em transição na carreira, que saiu da categoria de base e foi tentar a sorte na Europa, não fez sucesso e retornou. Depois da Copa São Paulo de Futebol Júnior [que termina em janeiro de cada ano],

26 MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES. Orientações para o trabalho no exterior. Modelos, jogadores de futebol e outros profissionais brasileiros. Disponível em: . Acesso em: 19 nov. 2019. 54

centenas de jovens vão para mercados secundários e acabam retornando no meio do ano, quando termina a temporada lá. Ele bate e volta porque se desilude. Muitas vezes são vendidos a eles sonhos longe de se tornarem realidade. Esse movimento se repete no ano seguinte com os mesmos atletas, seguindo a vocação do futebol brasileiro [de exportar mais atletas do que importar ou segurar no mercado nacional]. (AMARO; RAMOS, 2019)

Os dados apresentados são a comprovação da regra de exceção do futebol. A idealização de mobilidade social que é difundida pela mídia sobre a pseudorrealidade do atleta – a fama, as cifras, os grandes clubes – estão reservadas a um grupo muito seleto. Franco Jr. (2017, pp.191 – 192) aponta que a qualidade e talento dos jogadores brasileiros são reflexo da violência social. A maior parte dos jovens que sofrem com a criminalidade e as comentem são homens, pobres, negros ou pardos, pouco escolarizados e fora do mercado formal de trabalho; e assim é o perfil dos jogadores profissionais. Existe, então, dois tipos de vínculo com o futebol, na perspectiva do atleta profissional – aquele que precisa do futebol e aquele que o futebol precisa. O primeiro ainda busca a mobilidade socioeconômica e o estrelato; o segundo, move o espetáculo mascarado de esporte, como aponta Caldas (1994, p. 48):

[existe a] realidade do jogador famoso que já consolidou seu status de craque, e por isso mesmo ‘virou o jogo’ mudando a relação de dependência. Nesse estágio ele já não precisa do clube grande. Ao contrário, o clube é que precisa dele, do seu prestígio profissional, da sua popularidade, do seu talento e dos seus gols para aumentar as glórias e o lucro.

Por isso, vemos tantos jogadores que, depois de consolidada carreira na Europa, voltam ao Brasil para se aposentar. Kaká, Robinho, Ronaldo Fenômeno, Ronaldinho Gaúcho, para dizer alguns, não precisam do São Paulo, do Santos, do Corinthians, do Flamengo para pagar as contas e marcar seu nome na história do futebol. Jogam porque querem, porque foi oferecido a camisa 10, porque torcem pelo time, porque tem gratidão pelo clube que ajudou a lançar sua carreira. Para os clubes, aposentar jogadores pode ser um ótimo ou um péssimo negócio: é um salário alto, um jogador cansado ou lesionado e cheio de pormenores no contrato; é um jogador que levanta a moral do time, traz visibilidade e vende mais ingressos e camisas. Sem dúvidas, o único gol de Kaká contra o Goiás valeu mais, mesmo perdendo por 2 a 1, do que todas as outras partidas que não marcou nenhum gol, na sua breve passagem pelo São Paulo, de julho a novembro de 2014, por empréstimo do clube americano Orlando City. O clube, se monetizasse apenas os custos de futebol do melhor do mundo de 2007 e ex-jogador da seleção brasileira, com certeza não teria o contratado. Mas, do que seria o espetáculo sem seus mais ilustres atores? 55

O tal grupo distinto, nos últimos anos, são majoritariamente os jogadores convocados para usar a camisa verde-amarela. Existe um padrão das convocações que, mais uma vez, corrobora com a decadência da gestão do futebol brasileiro: avaliando os últimos sessenta e nove convocados para os três últimos campeonatos mundiais, apenas dez jogavam em algum time brasileiro, três em cada esquadrão em 2018 e 2010, e quatro em 2014. Se apenas um a cada seis jogadores que vestiram a camisa da seleção jogam em algum clube brasileiro, a opulenta vida de jogador de futebol está, impreterivelmente, fora do Brasil. Especificamente, na Europa, e uma minoria da China e na Rússia, as quais tem ligas irrelevantes para o futebol mundial, mas tem cofres muito cheios e muito generosos. Outro dado que comprova a falha estrutura futebolística do país é a distribuição destes dez jogares pelos times, que atesta a hegemonia dos maiores clubes brasileiros em poucas cidades, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Porto Alegre. Dos 776 clubes profissionais, apenas oito eram vagamente – considerando que, na maior parte das vezes, tais atletas não foram titulares do time – representados na seleção brasileira. Por mais que seja uma comparação esdrúxula em termos técnicos e estruturais de futebol, e muito questionada pelos torcedores e pela mídia, a comissão técnica da seleção inglesa optou por convocar apenas os atletas que atuam em clubes daquele país para a Copa da Rússia. E, se compararmos o desempenho do Brasil e da Inglaterra, o time brasileiro vale 718 milhões de euros, enquanto o inglês vale 1 bilhão e 129 milhões de euros. O Brasil foi eliminado nas quartas de final contra a Bélgica por 2 a 1, mas ganhou do México nas oitavas e, na fase de grupos empatou com a Suíça, ganhou da Costa Rica e da Sérvia. A Inglaterra terminou em quarto lugar na competição – que perdeu o jogo do terceiro lugar para a Bélgica por 2 a 0 e antes, foi eliminada pela vice-campeã Croácia na semifinal –, ganhou as quartas e as oitavas nos pênaltis da dona da casa e da Colômbia, respectivamente, e na fase de grupos, ganhou da Tunísia, goleou o Panamá, perdeu para a Bélgica. O time inglês vale mais e desempenhou melhor do que o brasileiro, que desmancha a lógica da necessidade das grandes estrelas do time canarinho, que fatalmente jogam em clubes europeus, ganham salários altíssimos e investem grande parte da sua carreira também em publicidade. Tal decisão da comissão técnica da Inglaterra levanta uma questão quase inerente aos campeonatos internacionais e a própria existência das seleções nacionais. Antes da presença nacional, os confrontos internacionais eram entre clubes, e a maioria deles como amistosos. A formação de uma seleção brasileira não foi tarefa fácil, principalmente pela constante e vibrante rivalidade entre os estados de São Paulo e do Rio de Janeiro – e por isso a criação da Taça Rio- São Paulo, hoje extinta – e a falta de sentimento nacionalista brasileiro. 56

O futebol chegou num momento que o Brasil, o qual tinha proclamado a República em 1889, buscava por sua própria identidade. A rápida disseminação do jogo trouxe para a população urbana, da qual sentia falta de símbolos nacionais, uma experiencia comum. O futebol teve seu uso político, ao ser percebida a possibilidade de construção de orgulho nacional. O presidente Getúlio Vargas […] tomou o esporte para alimentar seus ideais de nacionalismo e harmonia social27 (BELLOS, 2002, p. 38).

Mesmo com uma já consolidada importância das Copas do Mundo, os amistosos até 1958 foram contra clubes. Por exemplo, a seleção campeã do mesmo ano realizou dois jogos amistosos antes de chegar na Suécia, contra a Fiorentina e a Internazionale (FRANCO JR., 2007, p. 134). A grande identificação com as seleções nacionais é um fenômeno simbólico midiático. Uma das grandes referências de qualquer país após a televisão em cores é o uniforme da seleção principal. A nossa camisa verde-amarela foi criada pelo jornalista gaúcho Aldyr Schlee após a derrota na final da Copa de 1950 contra o Uruguai, no Maracanã. Sem dúvidas, se a televisão e a fotografia ainda hoje tivessem imagens preto e branco, pouco importaria a cor da camisa das seleções nas Copas – assim como pouco importaria a cor do cabelo do Neymar. É um cenário inimaginável, até porque se não fosse a força massiva da televisão, o futebol não seria o espetáculo que sustenta uma ideia de esporte. A apropriação do esporte como identidade nacional brasileira é inevitável. Afirmar que o Brasil é o país do futebol, como levantado anteriormente, pouco tem relação com desempenho ou estrutura futebolístico, e sim com a construção, manutenção e afirmação de um símbolo que, por acaso, é uma prática esportiva.

Reconhecido no domínio público – inclusive por outros povos – como uma manifestação cultural que revela nosso jeito, malícia, alegria ou ginga, o futebol protagonizou os contornos de um processo de identificação construído e engendrado por esses diferentes agentes sociais em interação. [...] Se hoje o futebol tem a possibilidade de ser percebido e vivido como um relevante índice de identificação de grupos sociais distintos, mobilizando um grande sentimento coletivo a cada Copa do Mundo, isso foi resultado da apropriação inventiva, negociada, confrontada e conquistada pelos diversos agentes mobilizados em torno de sua prática, ritual e cotidiana. (TOLEDO, 2000, p. 8)

Não é um movimento singular brasileiro. Internacionalmente, o futebol vinculou-se aos símbolos nacionais e conquistas patrióticas. As estações de rádio de Lisboa, por exemplo,

27 Tradução livre feita pela autora. Texto original: “Football arrived at a time when Brazil, which had only become a republic in 1889, was searching for its own identity. The game’s rapid dissemination gave the urban population, lacking in national symbols, a common experience. Football was also seized on by politicians, who saw in how it could build national pride. President Getúlio Vargas […] used the sport to feed his ideals of nationalism and social harmony.” 57

noticiam com grande pompa os “gols portugueses” em outras ligas europeias, em especial a , da Inglaterra. E tais feitos heroicos tem personagens bem destacados – especialmente os jogadores que estão incluídos nas escalações da seleção portuguesa. Todavia, Cristiano Ronaldo, eleito o melhor jogador do mundo pela Fifa por cinco vezes, tem atenção mais do que especial. Após nove anos – e quatrocentos e cinquenta gols – no Real Madrid, Ronaldo aceitou a proposta de la vecchia signora, a Juventus, time italiano de Torino, na temporada de 2018 e 2019. O “presente de natal” dos fãs portugueses chegou atrasado, com o gol de empate que garantiu ao time a invencibilidade desde o início da primeira divisão do campeonato italiano, contra o Atalanta, de Bergamo. O curioso é o destaque ao gol, e não o campeonato – a Serie A não tem a menor importância, nem o time adversário, nem os outros gols marcados na partida pela Juventus. O gol de Ronaldo, contudo, merece tanto destaque quanto o clássico lisboeta Sporting – time que foi o início da carreira do astro – e Benfica, que aconteceria algumas rodadas daquele dia. O uso político do futebol faz parte da própria história dele. A supremacia inglesa no esporte no início do século passado foi sendo desfeita paulatinamente com o crescente respaldo da Fifa – em trinta anos de existência, já contava com cinquenta países (FRANCO JR., 2007, p. 48). A Copa de 1934 na Itália, já no comando de Mussolini, os eventos servem para cumprir agendas políticas dos governos; Jules Rimet, presidente da Fifa da época, afirmou que “conforme o regime do país organizador, a competição se desenvolverá em atmosfera sobretudo esportiva ou sobretudo política” (2007, pp. 50 – 51). Atualmente, a situação é um pouco mais complexa. A máquina do futebol, por mais que esteja geograficamente na Europa, é movida por recursos pautados em uma clara ambição política de ascensão internacional:

Sem Exército e sentado em uma das maiores reservas de petróleo do planeta, o Catar escolheu o futebol para comprar seu lugar no mundo, garantir-se politicamente e projetar-se no cenário internacional. Nos últimos anos, o Catar comprou clubes de futebol e redes de televisão, abriu sua marca de artigos esportivos, [...] e em 2022 culminará a estratégia com a realização da primeira Copa no Oriente Médio. Esse investimento não é apenas uma loucura de príncipes árabes que não sabem o que fazer com tanto dinheiro. Faz parte de um plano para criar uma rede de dependência no mundo que, em uma eventual invasão ou em qualquer questionamento ao regime, afetaria a estrutura mundial do esporte de forma tal que o Barcelona, por exemplo, não teria mais como pagar o salário de Lionel Messi [...] (CHADE, 2015, pp.147-148).

Franco Jr. (2007, pp. 175 – 176) levanta que o difuso nacionalismo brasileiro está largamente associado com a imagem da seleção brasileira de futebol masculino, assim como orgulho nacional com as vitórias e derrotas em Copas do Mundo. Não à toa, os recentes 58

movimentos cívicos, que embrionariamente usaram camisas do esquadrão brasileiro e levantaram bandeiras em 2013, estão vinculados aos símbolos produzidos pela Nike.

Ao longo de um ano comum poucas vezes se vê a bandeira ou se ouve o hino nacional. Em ano de Copa do Mundo, bandeiras são numerosas tanto em edifícios e casas luxuosas quanto em construções humildes e barracos de favelas. [...] Diferentemente da distinção que muitos povos fazem entre sua seleção de futebol e o país – Azzurra, Bleus, Mannschaft, Fúria, Celeste, etc. – entre nós a equipe nacional é chamada simplesmente de “Brasil”. [...] Em país historicamente maltratado por seus dirigentes, país de pequena consciência de cidadania, pátria é abstração sem muito sentido, a não ser quando se materializa na seleção. [...] Por isso os abusos políticos ao longo do tempo não têm a mesma repercussão popular que as convocações dos técnicos da seleção.

Claro, bandeiras italianas são levadas aos jogos da seleção nacional, assim como a portuguesa, a , a mexicana, a americana. Existe, todavia, um claro uso político do esquadrão brasileiro para construção de um sentimento nacional pautado em convocações de vinte e três jovens adultos, milionários e residentes europeus, por uma instituição privada que lida frivolamente com uma imaculada emoção de grande parte dos brasileiros e enche os bolsos dos dirigentes às custas de uma imaginária vontade de ser uma grande nação. Basta saber o que isso realmente tem a ver com o futebol. A atual estrutura de gestão do futebol brasileiro é reflexo de uma junção de fatores e dinâmicas políticas apegadas a uma forma de pensar. Antes da CBF, a Confederação Brasileira de Desportos (CBD) era quem comandava o futebol. Curioso é, todavia, que a forma pela qual a CBF alargou seus cofres e manteve sua hegemonia política desde a década de 1990 vem dos tempos de CBD. Isto porque João Havelange dirigiu a CBD antes de se tornar presidente da Fifa, e instaurou o modelo que se mantem até hoje. O outro pilar estruturante do modelo de gestão de Havelange está na negociação econômica da seleção brasileira. Para a Copa da Inglaterra, em 1966, a comissão técnica da seleção convocou um número exorbitante de atletas e realizou onze partidas amistosas antes da competição (FRANCO JR., 2007, p. 139). Muito antes de existirem contratos de intermediação de amistosos, Havelange foi, ao mesmo tempo, inescrupuloso e visionário ao programar amistosos contra outras seleções e clubes, usando a camisa verde-amarela como um grande outdoor. Tornar a seleção brasileira em um grande negócio foi a manobra que transformou a equipe em um dos símbolos mais valiosos do mundo. Foi construído um véu mágico com a camisa verde-amarela, com ajuda de jogadores de memorável talento e, sem dúvidas, os cinco 59

títulos mundiais. Romário (2017, p. 53) descreve, em seu relato sobre a CPI do Futebol, a dinâmica das negociatas:

Esse potencial econômico ligado ao jogo, cujas cifras cresciam exponencialmente, acabou por gerar uma rede de interesses que conectava dirigentes e propiciava o surgimento de empresas ligadas ao marketing esportivo cuja principal atividade era intermediar a venda desses direitos de imagem ligados ao futebol e suas principais competições e atletas.

Desde 2006, com Ricardo Teixeira na presidência da CBF (que, não por acaso, é genro de João Havelange), foi firmado um contrato valido até 2022 com a ISE, empresa sediada nas Ilhas Cayman, que intermedia todos os jogos amistosos da seleção brasileira de futebol. Ficou estabelecido que o valor dos ingressos, adversários e o local das partidas é definido ou passa pelo crivo a ISE; toda a bilheteria também é de direito da empresa, com um valor fixo pago para a CBF por jogo. A escalação do time também tem uma regra muito clara: os jogadores com maior valor de marketing devem ser convocados e devem entrar em campo, salvo por exceções devido a lesões comprovadas por laudos médicos. Dessa forma, a ISE escolhe jogos como Brasil e El Salvador, em Maryland, Brasil e Arábia Saudita, em Riyadh, Brasil e Panamá, no Porto; a ISE também obriga o técnico, qualquer um que seja, repetir escalações e dar menos espaço para novos talentos; distancia e elitiza ainda mais a seleção do seu grande público, que obviamente está no Brasil. A pergunta que se repete, desde 2006, é para quem foi proveitoso tal contrato. Claramente, não foi para o futebol brasileiro: são, na maior parte, adversários aquém à seleção, estádios medianos em países longínquos, jogadores já testados pela comissão técnica e partidas desinteressantes. Franco Jr. (2007, 2017) aponta que seria deficiente entender a conjuntura moderna e contemporânea ignorando o futebol. Este é, sem dúvidas, um fenômeno sócio político econômico cultural que não só ilustra eventos do nosso tempo, mas o constrói. O Brasil é referência mundial para o esporte, mas fica claro que grande parte dessa aura mágica da camisa verde-amarela são derivados de aspectos formulados por esforços organizacionais e midiáticos – por esta lógica, o que acontece historicamente entre as linhas do campo se tornam secundárias. O esporte, que tem raízes elitistas e continua a ser conduzido por ela, ilude as camadas populares com a imagem de sucesso de um grupo seleto de jogadores, assim como envolve os torcedores em uma comunidade imaginária de suposto interesse comum. Todavia, mesmo sendo cotidiano e parte das paixões, o futebol foi cair na ceara das insatisfações políticas do brasileiro, devido à própria agenda política. É disso que o capítulo seguinte tratará. O palco chama sim Maracanã, mas pode chamar Arena Corinthians, Mineirão, 60

Arena Pantanal; o palhaço chama sim Neymar, e também , Phelippe Coutinho, Marcelo Vieira; o circo máximo do futebol chama sim Confederação Brasileira de Futebol (CBF), mas pode ser a Federação Paulista de Futebol (FPF), a Confederação Sul-Americana de Futebol (COMEBOL), Federação Internacional de Futebol (Fifa) e por que não Senado Federal. A convivência entre política e futebol é antiga e não é malévola – qualquer aspecto sócio cultural de uma sociedade tem implicações políticas. Deve-se analisar, entretanto, a dinâmica política que propicia a conservação de uma lógica de administração do futebol para interesses privados e muitas vezes escusos. Observar alguns aspectos, como apresentados neste capítulo, moldam o espectro do futebol que permite a longevidade da política patrimonialista das instituições do futebol no país, assim como os agentes políticos que permitem a permanência que os cartolas controlem uma das maiores figuras da sociedade brasileira. 61

2 SE CPI TERMINA EM PIZZA,...

Na década de 1960, o antigo Palestra Itália começava a ser reformado novamente para dobrar a capacidade. O estádio era motivo de intensas discussões da diretoria do Palmeiras. Cronista e torcedor alviverde, Milton Peruzzi28 relatou que, certa vez, os conselheiros do clube tiveram reunião com duração de quatorze horas; estafados, continuaram a discussão num restaurante próximo e, resguardando a tradição dos imigrantes italianos que fundaram o clube, resolveram a questão na base do chope, do vinho e da pizza. Peruzzi, no dia seguinte, estampou a Gazeta Esportiva com “Crise do Palmeiras termina em pizza” – a questão estava resolvida. Três décadas depois, quando a expressão foi usada na CPI do PC Farias29, que contribuiu com as investigações do processo de impeachment de Fernando Collor de Mello, terminar em pizza ganhou outra conotação. Paulista de Araraquara e promotora de Justiça, Sandra Fernandes de Oliveira disse que “se isso realmente acabar em pizza, como alguns querem, acho que é o fim do país” – de nada adiantaria se a investigação não encontrasse culpados e os responsabilizassem, ela quis dizer. Será apresentado nas páginas a seguir duas recentes passagens da história política do futebol brasileiro. De certa forma, ambos terminaram em pizza nos dois sentidos apresentados acima. Para uns, de fato, a questão foi resolvida; já outros consideram que o futebol seguiu tudo como dantes no quartel de Abrantes. Objeto central deste estudo, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Futebol no Senado Federal em 2015 apresenta, assim como sua predecessora, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da CBF/Nike na Câmara dos Deputados em 2001, dinâmica política conservadora dos interesses patrimonialistas de um grupo de parlamentares, dirigentes, empresários e, em última instância, criminosos, que alçaram o futebol brasileiro como máquina de riqueza própria. Pelas composições das Comissões, como se dividiram os interesses e os grupos atuantes em prol destes, vê-se a estrutura patrimonialista, estamental e conservadora do futebol brasileiro. Como aponta Manhães (2002, p. 123), “essa estarrecedora realidade deve ser compreendida a partir de um contexto construído pela interface da ordem desportiva

28 Milton Primo Pierini Peruzzo Peruzzi (1913-2001) foi jornalista. Comandou o Mesa Redonda da TV Gazeta e acompanhou o Palmeiras, seu clube do coração, para A Gazeta Esportiva. 29 O empresário Paulo César Farias, conhecido por PC Farias, foi tesoureiro da campanha à presidência de Fernando Collor de Mello, eleito em 1990. Compunha o governo e usava de sua influência para articular movimentos que o beneficiariam. Foi acusado de formação de quadrilha, extorsão e cumplicidade de concussão. Envolvido no escândalo, o presidente teria recebido recursos financeiros do empresário para o favorecer em licitações e dinâmica financeira do Banco Central. A investigação de PC Farias foi um dos grandes fatores para movimentar o processo de impeachment contra Collor de Mello. 62

internacional, elitista e cartelizada, com a ordem social brasileira [...] corporativa e patrimonialista”. Observa-se que, de maneira geral, inicialmente, a necessidade de busca da manutenção da própria estrutura de poder do Estado capitalista e a existência da classe dominante. De forma menos generalista, tal dinâmica é reflexo de uma conjuntura política de Portugal, construída lá a partir do século XIII, que possibilitou uma estrutura de governo que impulsionou econômica e politicamente para a expansão das riquezas (SKIDMORE, 1999). A colonização do território brasileiro, o quadro político português é transplantado e assenta sua fundação na cultura política brasileira. Estes elementos são o patrimonialismo e o estamento político (FAORO, 2012). O estamento político é fixado no distanciamento de um grupo, calcado na desigualdade, do resto dos grupos sociais, que se une para garantir seus privilégios. Para isso, além da manutenção do poder do Estado, difunde-se a ideologia do grupo (FAORO, 1991). O pensamento do estamento diz respeito, em grande parte, na manutenção daquilo que é validado tradicionalmente, do domínio tradicional do corpo político sobre o resto da sociedade, a qual age politicamente de forma eventual e aleatória (WEBER, 1979, 2011). O grupo vive da política (WEBER, 2011) e, de modo complementar, pela introdução da cultura política única e exclusivamente da oligarquia nos períodos de estruturação deste quadro, considerado aqui a Colônia e a República Velha, os homens políticos são todos economicamente disponíveis. A não separação da coisa pública e privada (HOLANDA, 2014) é, consequentemente, um dos aspectos basilares dos homens que compõe o estamento, homens estes que vivem da política e tornam-se mais disponíveis ainda para o exercício dos cargos pelo vasto leque de privilégios imbuídos na função política pretendida por eles. Este traço brasileiro pode ser interpretado como mecanismo de manutenção da dinâmica de não-separação da coisa pública e da privada (HOLANDA, 2014, p. 177), a fim de dar continuidade no sistema vigente de preservação do estamento. Como apresentou Faoro (1994, 2012) existe uma profunda necessidade de perpetuação do pensamento da comunidade amorfa que compõe o poder político para manter o status quo, e consequentemente, a dinâmica política. Para Mercadante (1980, p. 230), esse pensamento consolida-se na restauração, desenvolvido especificamente pela origem social; no século XVIII e XIX “Procediam, geralmente, do domínio rural ou da incipiente burguesia urbana vinculada aos interesses de exportação. Os modos de pensamento existentes, por isso mesmo, nunca seriam alheios ao contexto da ação coletivo principal”. Schwartzman (1982) apresenta a ideia de neopatrimonialismo para caracterizar a dinâmica político social brasileira. Condizendo com as características do patrimonialismo, 63

principalmente do estamento burocrático, apresentando anteriormente por Faoro (2012), o neopatrimonialismo é uma “forma bastante atual de dominação política por um ‘estrato sem propriedades e que não tem honra social por mérito próprio’ (EISENSTADT, 1973), ou seja, pela burocracia e a chamada classe política”30 (SCHWARTZMAN, 1982, pp. 45-46). A classe política tem que dialogar com dois conflitos crescentes para manter a estrutura neopatrimonialismo: a centralização do poder e a participação política das massas. Em contraste com o patrimonialismo ligado ao feudalismo, o poder era centralizado, mas a participação política era limitada aos homens de honra. O patrimonialismo colonial e imperial não é mais o mesmo praticado atualmente, pelo simples motivo da existência da participação universal dos brasileiros e eleições diretos. Para lidar com os conflitos, segundo Schwartzman (1982, p. 47) “a dominação racional-legal é filha do casamento perfeito entre o patrimonialismo dos regimes absolutistas e a burguesia emergente: é uma forma de dominação de base contratual, base eficiente e adequado às necessidades do capitalismo moderno”. Dessa forma,

[...] na medida em que vastas camadas da população estão engajadas no plano micro ou mesmo macro nesse tipo de prática, sem prejuízo de outros elementos típicos do Estado racional-legal e de ampla participação política, sem que isso exclua uma tensão forte entre essas duas lógicas de funcionamento societário e estatal. Na verdade, em parte, no que tange ao indivíduo, o neopatrimonialismo tem grau de legitimidade muitas vezes alto, embora isso não signifique necessariamente que ele aceite de bom grado que outros o pratiquem, sobretudo quando envolve funcionários públicos de alto escalão e políticos eleitos. (DOMINGUES, 2012, p. 162)

À vista disso, Proni (2000, p. 143) ressalta, sobre a estrutura patrimonialista da gestão do futebol

que as formas de dominação encontradas nos times de futebol talvez estivessem entre as mais ambíguas do mundo moderno, porque conciliavam os valores liberais da sociedade industrial [...] com os valores patriarcais e patrimonialistas [...]. E é preciso entender que essa ambiguidade – possibilitada pela introdução de valores utilitaristas próprios da economia mercantil, que transformaram o espetáculo futebolístico em produto consumido por amplos segmentos populares – estava presente também nas estruturas políticas brasileiras.

30 Grifo original do autor. 64

Neste espectro, agregado à discussão apresentada no capítulo anterior, Manhães (2002, p. 125) reflete que o impacto socioeconômico do futebol brasileiro, revelado pela sua ordem e organização, está

comprometida com o insucesso, que vive da exploração da transferência de atletas e não do espetáculo. [...] Espetáculo rentável gera recurso para entidade. Transferência de atleta é oportunidade de negócio para dirigente. Assim, o calendário e as competições são organizadas para atender apenas a interesses fisiológicos e para contribuir para a manutenção do poder das oligarquias dirigentes. Ao final do ano os balanços negativos são reequilibrados com a negociação de atletas. [...] O Brasil fornece mercadoria e abre mão de explorar produtos acabados, embora tenha infraestrutura de estádio, de comunicação, enfim, know-how e matéria-prima para fornecer produtos da indústria do lazer de interesse globalizado. Mas isso não interessa ao segmento desportivo dirigente dominante, embora possa interessas a seus principais parceiros, os meios de comunicação, com potencial para negociar verba publicitária globalizada.

Esta estrutura de gestão e, acima de tudo, a dinâmica política instaurada nas relações entre os dirigentes de clubes, federações e Confederação pode ser demonstrada por dois episódios, abaixo descritos. Em 2001, a CPI CBF/Nike falhou com o objetivo de remodelar a estrutura, em última instância, falhou por conta da força conservadora com as forças do futebol brasileiro presente na própria composição, assim como a CPI do Futebol, em 2015. Quando analisado os polos políticos de ambas comissões e suas intenções, fica claro que a solidez de um dos polos políticos, ligado à CBF e largo praticante da estrutura patrimonialista conservadora. Afirma-se falido o intuito das CPIs não pela ineficiência de cumprir o princípio primeiro de tomar informações para arredondar determinada situação e, com a redação e aprovação de um relatório, encaminhar o caso ao Ministério Público, mas sim pelas manobras realizadas durante sua realização, que resultaram na reprovação do relatório em 2001 e na aprovação de um relatório que, em ambas situações, mantiveram a estrutura patrimonialista da CBF e do futebol brasileiro. As Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) são um mecanismo das casas legislativas brasileiras dispostos na Lei nº 1.579, de 18 de março de 1952 e alterados pela Lei nº 13.367, de 5 de dezembro de 2016. Segundo o artigo 58 da Constituição Federal, “O Congresso Nacional e suas Casas terão comissões permanentes e temporárias, constituídas na forma e com as atribuições previsto no respectivo regimento ou no ato de que resultar sua criação”. As CPIs são comissões de caráter temporário que desempenham segundo o projeto apresentado com cunho investigativo, como descrito no parágrafo 3º do mesmo artigo:

65

As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.31

Os dispositivos da Lei nº 1.579, de 1952, e suas alterações pela Lei nº 13.367, de 2016, conferem o exercício investigativo a possibilidade de convocação de quaisquer membros da sociedade, incluindo autoridades federais, estaduais e municipais e aqueles que interferem na administração pública direta ou indiretamente (art. 2º), os quais serão intimados sob a prescrição estabelecida pelo Código Penal (art. 3º). Para garantir a prescrição do objetivo das comissões, constitui crime a oposição à execução de legal (art. 4º, inc. I) e testemunhar em falsidade, assim como negar-se ou calar-se como participante da investigação (art. 4º, inc. II). Há possibilidade de prorrogação do prazo estipulado incialmente para que se cumpra o objetivo proposto na Comissão (art. 5º, § 2º) e, quando concluir-se as investigações, como já disposto na Constituição Federal, encaminhar o relatório, produto final da CPI, ao Ministério Público, à Advocacia-Geral da União e outros órgãos competentes e interessados para promover a responsabilização civil e criminal e outras medidas pertinentes (art. 6º-A). Seguindo então as premissas acima, os deputados Silvio Torres32 (PSDB-SP), o relator, e Aldo Rebelo33 (PCdoB-SP), o presidente, foram responsáveis pela instauração da Comissão conhecida como CBF/Nike: Comissão Parlamentar de Inquérito destina a apurar a regularidade do contrato celebrado entre a CBF e a Nike. No livro de autoria daqueles parlamentares com objetivo de divulgar e marcar o episódio na história, Torres e Rebelo (2001, p. 18) introduzem com o seguinte questionamento: “tanta coisa importante para resolver, vamos perder tempo com o futebol?”. Com argumentação similar à problemática apresentada no capítulo 1, considera-se a importância das cifras do esporte no Brasil e no mundo globalizado, além da expressão cultural e social do futebol no cenário popular brasileiro, como ressalta o artigo 4º da Lei nº 9.615, de 1998, proposta inicialmente por Pelé, então Ministro dos Esportes. Como relatado pela CPI (2001), o burburinho crescia já há alguns anos sobre a administração da Confederação Brasileira de Futebol. Em 1993, Pelé relatou que, como sócio-

31 Grifos da autora. 32 Sílvio França Torres é cientista social, jornalista e deputado federal por oito vezes. Não concorreu a nenhum cargo nas eleições gerais de 2018, mas segue filiado ao PSDB. 33 José Aldo Rebelo Figueiredo é jornalista e filiado ao Solidariedade desde 2018. Foi deputado federal por São Paulo de 1991 a 2011 e Ministro dos Esportes entre 2011 e 2015, no governo Dilma Rousseff. 66

diretor da Pelé Sports – empresa de marketing esportivo – tentou comprar os direitos do Campeonato Brasileiro de 1994 por US$ 5 milhões, a serem somados à propina de mais US$ 1 milhão José Carlos Salim, então diretor financeiro da CBF. Depois disso, descobriu-se que a Traffic levava vantagem nessas negociações, por aceitar pagar valores escusos para a manutenção do bom relacionamento da empresa de marketing esportivo e a CBF. Em 1996, a CBF anunciou euforicamente o contrato milionário entre o futebol brasileiro e a Nike como patrocinadora da seleção brasileira, junto com a Coca-Cola, numa negociação intermediada pela Traffic. Um ano depois, durante a discussão legislativa sobre a gestão do futebol, aparece o escândalo da arbitragem, caso que envolvia o presidente da Comissão Nacional de Arbitragem de Futebol, Ivens Mendes, pedindo recursos para sua campanha a deputado federal pelo estado de Minas Gerais à presidentes e diretores do Corinthians e o Atlético Paranaense (O ESCÂNDALO..., 1997). Na Copa de 1998, na França, o Brasil foi derrotado pelos donos da casa. Ao desembarcar no Brasil, os jogadores foram recebidos com atmosfera de protesto:

A maneira como nossa seleção se comportou na maioria dos jogos, e como foi derrotada, levantou indignação contra os métodos usados na seleção e sobre os critérios de administração da CBF. A Nação torcedora teve o vislumbre de que os dirigentes da CBF estavam por demais ocupados com grandes negócios. Para eles, o futebol era o que menos importava. (BRASIL, 2001, p. 13)

O desconforto com o futebol nacional partia do seguinte questionamento: como um futebol milionário, com os melhores jogadores do mundo, amargava em dívidas dos clubes e da própria Confederação e afundava o Campeonato Brasileiro? Com a divulgação na mídia do contrato entre a Nike e a CBF em 1999, Aldo Rebelo formalizou o pedido de abertura da Comissão Parlamentar de Inquérito. O parecer do então presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB- SP), foi favorável pelas

‘cláusulas contratuais que asseguram à Nike a organização dos jogos e escolha dos times que competirão com a seleção brasileira e limitam o poder de decisão da CBF sobre os jogos amistosos destinados à preparação técnica e tática do time’. Argumentava que tais cláusulas podiam significar o desrespeito aos princípios fundamentais inscritos no artigo 2º da Lei Geral do Desporto34, entre os quais os da soberania,

34 A Lei Geral do Desporto refere-se à Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998, que “institui normas gerais sobre desporto e dá outras providências”. Há projeto de Lei (nº 68, de 2017), assim como os da alteração do modelo de gestão do futebol mencionados no capítulo 1, para modernização da legislação, de autoria da Comissão Diretora do Senado Federal, que “institui a Lei Geral do Esporte, que dispõe sobre o Sistema Nacional do Esporte, a Ordem Econômica Esportiva, a Integridade Esportiva, o Plano Nacional para a Cultura e Paz no Esporte”. Na data de acesso, constava-se em tramitação, com relatoria do senador Roberto Rocha. Disponível em: . Acesso em: 25 nov. 2019. 67

da autonomia e da identidade nacional; e o art. 4º, § 2º da mesma Lei, que dispõe que “a organização desportiva do País, fundada na liberdade de associação, integra o patrimônio cultural é considerada de elevado interesse social”.35

A CBF foi contraria a formação da Comissão para investigação e demonstrou seu poder de influência mais uma vez nas decisões parlamentares. De forma bastante direta, Mario Zagallo e Wanderley Luxemburgo, ambos ex-técnicos da seleção, assinaram cartas aos deputados negando envolvimento da Nike nas decisões. Mesmo assim, o requerimento contou com 206 assinaturas, trinta e cinco a mais do que o número mínimo para aprovação. Em mais uma tentativa de barrar a CPI, a operação-abafa, como apelidado pelo redator do relatório (2001, p. 14) desarquivou CPIs aprovadas na legislatura anterior, mas ainda não instauradas. Como há no regimento parlamentar para a possibilidade de criação de apenas cinco Comissões paralelas, a que investigaria a CBF esperaria até 17 de outubro de 2000 para ser instalada. Esta compôs-se da forma descrita na Tabela 4. Alguns nomes devem ser ressaltados, os quais influenciaram negativamente o resultado das investigações e formaram a bancada da bola no período. José Lourenço36 (PMDB-BA) liderou a aliança de parlamentares que defendia os interesses da CBF e a manutenção da dinâmica conservadora do futebol brasileiro. Além dele, faziam parte: Luciano Bivar37 (PSL- PE), à época da instauração da CPI, já estava na presidência do Sport Club do há alguns mandatos – o primeiro começou em 1989 e o último terminou em 2013; José Rocha38 (PFL- BA), ex-presidente do Esporte Clube Vitória, time bahiano atualmente na segunda divisão; José Mendonça39 (PFL-PE), então presidente do Santa Cruz Futebol Clube de Recife, que foi rebaixado à série B do Brasileirão naquele ano; Darcísio Perondi40 (PMDB-RS), irmão do então presidente da Federação Gaúcha de Futebol (FGF); Eurico Miranda41 (PPB-RJ), então

35 Grifos originais do autor. 36 José Lourenço Morais da Silva (1933-2018) foi economista e empresário. Terminou seu último mandato como deputado em 2002 e continuou atuando no partido como conselheiro. 37 Luciano Bivar é presidente nacional do Partido Social Liberal (PSL) desde 2018 e deputado federal por . Não está mais na presidência do Sport Club Recife, mas compõe o quadro de conselheiros do clube. 38 José Rocha Alves é médico anestesiologista e está no sexto mandato consecutivo como deputado federal pela Bahia, hoje filiado ao Republicanos. Participa no quadro de conselheiros do Esporte Clube Vitória, que presidiu entre 1983 e 1986 e foi responsável pela construção do Estádio Manoel Barradas, o Barradão. 39 José Mendonça Bezerra (1936-2011) foi advogado e pecuarista. Seu último mandato como deputado federal terminou no ano de seu falecimento e foi responsável pelo acesso à série A do Campeonato Brasileiro em 2005 do Santa Cruz Futebol Clube. 40 Darcísio Perondi é médico e filiado ao MDB desde 1993. Cumpre mandado como deputado federal pelo desde 2015. Nunca teve relação direta com o futebol, apenas via seu irmão, ex-presidente da Federação Gaúcha de Futebol (FGF). 41 Eurico Ângelo Miranda (1944-2019) foi jurista e dirigente esportivo. Foi duas vezes presidente do Vasco da Gama, de 2003 a 2008 e 2015 a 2017, e vice-presidente entre 1990 e 2002 do clube. Foi deputado federal pelo Rio de Janeiro entre 1995 e 2002. 68

presidente do Club de Regatas Vasco da Gama, tradicional clube do Rio de Janeiro que contou com o artilheiro do campeonato, Romário, em 2001; Nello Rodolfo42 (PMDB-SP), conselheiro da Sociedade Esportiva Palmeiras, que foi rebaixada à série B no ano seguinte; José Janene43 (PPB-PR), conselheiro do Londrina Esporte Clube, do Paraná que participou pela última vez da série A do Campeonato Brasileiro em 1982 (MELLO, BOMBIG, 2001). Foram realizadas cinquenta e nove reuniões e duas mil, cento e sessenta perguntas feitas pelos seiscentos e cinquenta e quatro parlamentares participantes à cento e vinte e cinco depoentes, nas duzentas e trinta e sete horas e dezesseis minutos de sessão da CPI. O relatório apresentado por Silvio Torres é composto por extensa discussão sobre a realidade social, política, legislativa, econômica e cultura do futebol no Brasil; esmiuçada descrição do contrato entre a CBF e a Nike, e outros contratos de origem e motivadores suspeitos; exposição do modelo de gestão de administração da Confederação, incluindo as doações políticas para a formulação de uma rede de influência nas casas legislativas; debate sobre a relevância da atuação das Federações estatuais; discussão sobre a exportação de jogadores e tráfico de pessoas; e indicações para a formulação do Estatuto do Torcedor. De forma resumida, descreve- se as descobertas da investigação na Tabela 5. O relatório acabou não aprovado pela Comissão. Silvio Torres (PSDB-SP) (2001) escreve após o encerramento das investigações que o funcionamento da CPI foi penosa em seus oito meses pela forte oposição, maioria dos deputados, e que a não aprovação do texto final é reflexo daqueles que estiveram, desde o início, estavam contrários à modernização do futebol para garantir que não se continuasse com as investigações no Ministério Público, garantindo a permanência do poder para o grupo protegido pela bancada da bola. O relator considera que o maior ganho da CPI, mesmo sem seu relatório aprovado, é a formulação de uma legislação para modernização do esporte de maneira bastante abrangente.

42 Nello Rodolfo é jornalista, foi deputado federal por São Paulo entre 1999 e 2003 e vereador na capital eleito em 1992, 1996 e 2016. Atualmente é filiado ao Partido Social Democrático (PSD) e continua como conselheiro do Palmeiras. 43 José Janene (1955-2010) foi empresário e pecuarista. Foi filiado ao Partido Progressista (PP) e teve visibilidade no escândalo do mensalão e na cassação do ex-prefeito de Londrina, Antonio Belinati. Manteve seu cargo de conselheiro do Londrina Esporte Clube até seu falecimento, em 2010. 69

TABELA 4 Composição parlamentar da CPI CBF/Nike (2001) na Câmara dos Deputados44 Alex Canziani (PSDB-PR) Titular Alexandre Santos (PSBD-RJ) Titular Iris Simões (PSDB-CE) Titular Max Rosenmann (PSDB-PR) Titular Silvio Torres (PSDB-SP) Relator Bloco PSDB, PTB Basílio Villani (PSDB-PR) Suplente Fernando Gonçalvez (PTB-RJ) Suplente Juquinha (PSBD-GO) Suplente Raimundo Gomes de Matos (PSDB-CE) Suplente Sérgio Reis (PSDB-SE) Suplente Yeda Crusius (PSDB-RS) Suplente Darcísio Perondi (PMDB-RS) Titular Geovan Freitas (PMDB-GO) Titular José Lourenço (PMDB-BA) Titular Jurandil Juarez (PMDB-AP) Titular Nelo Rodolfo (PMDB-SP) 1º vice-presidente Bloco PMDB, PST, PTN Antônio do Valle (PMDB-MG) Suplente João Magalhães (PMDB-MG) Suplente Jorge Pinheiro (PMDB-DF) Suplente José Borba (PMDB-PR) Suplente Pedro Chaves (PMDB-GO) Suplente Chico Sardelli (PFL-SP) Titular Corauci Sobrinho (PFL-SP) Titular Jaime Martins (PFL-MG) Titular José Mendonça Bezerra (PFL-PE) Titular Partido da Frente Liberal José Rocha (PFL-BA) Titular (PFL) Expedito Júnior (PFL-RO) Suplente Ildefonço Cordeiro (PFL-AC) Suplente José Múcio Monteiro (PFL-PE) Suplente Luis Barbosa (PFL-RR) Suplente Roberto Pessoa (PFL-CE) Suplente Dr. Rosinha (PT-PR) Titular Eduardo Campos (PSB-PE) Titular Partido dos Trabalhadores Pedro Celso (PT-DF) 2º vice-presidente (PT) Geraldo Magela (PT-DF) Suplente José Genoíno (PT-SP) Suplente Tânia Soares (PCdoB-SE) Suplente Eurico Miranda (PPB-RJ) 3º vice-presidente Partido Progressista José Janene (PPB-PR) Titular Brasileiro (PPB) Herculano Anghinetti (PPB-MG) Suplente Telmo Kirst (PPB-RS) Suplente Partido Democrático Olimpio Pires (PDT-MG) Titular Trabalhista (PDT) João Sampaio (PDT-RJ) Suplente Bloco PSB, PCdoB Aldo Rebelo (PCdoB-SP) Presidente Luciano Bivar (PSL-PE) Titular Bloco PL, PSL Valdeci Paiva (PSL-RJ) Suplente Partido Popular Socialista Rubens Furlan (PPS-SP) Titular (PPS) Regis Cavalcante (PPS-AL) Suplente Tabela produzida pela autora. Fonte: BRASIL, 2001. Ver Referências bibliográficas.

44 Descreve-se a filiação partidária dos deputados, assim como as siglas dos partidos, como no relatório apresentado. Ver Referências bibliográficas. 70

TABELA 5 Resultado resumido da investigação da CPI CBF/Nike (2001) Apresenta-se no relatório (2001, pp. 56 – 77) a invalidade do contrato firmado entre a CBF e a Nike devido à quebra de independência da Confederação frente às decisões, as quais a multinacional teve voz atuante Sobre o contrato e indevida, descumprindo também a Lei nº 8.137, de 27 de novembro de firmado entre a CBF e 1990, que define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as a Nike, e outros relações de consumo, e dá outras providencias, pela possibilidade de quebra contratos. unilateral do contrato, por parte da Nike, em caso de não notificação prévia de retenção de impostos relativos aos pagamentos à CBF; discute-se (2001, pp. 78 – 90) outros contratos firmados pela organização com outras marcas, todos intermediados pela Traffic, que também enquadram-se na ilegalidade O relatório (2001, pp. 191 – 405) descreve as Federações estado a estado e sua relação com a gestão do futebol nacional dentro e fora do território Sobre a corrupção nas brasileiro e conclui-se a “deterioração da organização confederativa e [...] Federações estatuais transformação das entidades em casas de negócios, sujeitas ao continuísmo, nepotismo e corrupção” (REBELO; TORRES, 2001, p. 27) É descrito no relatório (2001, pp. 91 – 129; pp. 156 – 190) o empenho dos Sobre a administração recursos da CBF em despesas não justificadas, salários desproporcionais e da CBF indevidos e doações políticas ilegais Apresenta-se (2001, pp. 130 – 155) o empréstimo tomado pela CBF no Sobre os empréstimos Delta Bank com juros extorsivos e condições desfavoráveis e questiona-se tomados pela CBF e o interesse escuso de tal decisão por parte da diretoria da Confederação, suas dívidas mas principalmente por seu presidente, Ricardo Teixeira Sobre a remuneração Há, em desacordo com o estatuto da CBF vigente à época, remuneração da diretoria da CBF ilegal dos dirigentes da Confederação (2001, pp. 91 – 129) Sobre o uso indevido Ricardo Teixeira usou dos recursos da Confederação Brasileira de Futebol dos recursos da CBF para seu enriquecimento ilícito e pagamento dos honorários de seus pelo seu presidente advogados em questões pessoais (2001, pp. 175 – 190) Indicou-se (2001, pp. 543 - 566) o indiciamento de trinta e quatro pessoas, a dar destaque à Ricardo Teixeira, por doze delitos diferentes, somado ao Sobre os que inclui Marco Antônio Teixeira, José Carlos Salim e Antônio Osório da indiciamentos Costa, como membros diretores da CBF; Hélio Viana e Juan Finger, empresários do ramo, com cinco indicações respectivamente; à gestão das federações do futebol em vinte e um estados brasileiros. Propõe-se o projeto de lei 4.87445, de 19 de junho de 2001, autoria do deputado Silvio Torres (PSDB-SP), também relator da CPI, que institui o Estatuto do Desporto, o qual propõe “a definição do papel do Estado em relação ao esporte, integrando o dispositivo constitucional; o conceito de clube formados de atleta; a regulamentação sobre patrocínio e o Sobre a formulação de disciplinamento da atuação de agentes e empresários; medidas nova legislação protecionistas para a formação das categorias de base; a responsabilidade dos dirigentes esportivos; e o detalhamento nas condições contratuais trabalhistas dos agentes desportivos” (BELMAR, 2016, p. 79), adicionados da premissa de uma gestão solida e moderna, que prestasse contas à sociedade Tabela feita pela autora. Fonte: REBELO; TORRES, 2001, pp. 26 – 28. BRASIL, 2001. BELMAR, 2016. Ver Referências bibliográficas. A CPI do Futebol, instalada em 2015, levanta uma série de precedentes sobre os métodos escusos de conduzir a política e os negócios da Confederação Brasileira de Futebol, alguns

45 BRASIL. Projeto de lei nº 4.874, de 19 de junho de 2001. Institui o Estatuto do Desporto. Autoria: Silvio Torres. Brasília: Câmara dos Deputados, 2001. Disponível em: . Acesso em: 27 nov. 2019. 71

deles já tratados nos parágrafos anteriores, sobre a CPI de 2001. Existe, de todo modo, a necessidade neste estudo de realizar um recorte preciso nos fatos históricos que devidamente envolvem a CPI do Futebol. Certamente, todos os eventos ocorridos desde a fundação da Fifa e da Confederação Brasileira de Desportos (CBD) – que antecede a CBF, mas que desencadeia a política de João Havelange – seriam relevantes para explicar como se deram as negociações para a Copa de 2014 e para desmontar a força anticorruptiva da CPI do Futebol; do mesmo modo, um enorme conjunto de eventos seria considerável para explicar a intenção do governo brasileiro para o pleito de megaeventos esportivos – que se inicia em 2007 com os Jogos Pan- Americanos no Rio de Janeiro, depois a Copa do Mundo Fifa, em 2014, e por fim os Jogos Olímpicos de 2016, também na capital fluminense – e o largo investimento para a realização destes. Todavia, não se pretende neste estudo apresentar um completo apanhado histórico de todos os fatos que remontam a conjuntura da política do futebol, apenas aqueles que diretamente interferem no compreendimento total da estrutura polarizada da CPI do Futebol. Sendo assim, os dirigentes da Fifa que foram investigados, presos e desligados da instituição têm, de forma inegável, relação direta com a gestão do Comitê Organizador Local (COL) de 2014 e a própria definição do Brasil como sede de tal Copa. Alguns destes foram e serão citados, mas os eventos que desenrolam o desmanche de uma gestão inteira da Fifa não cabem ser discutidos aqui. Como citado, o Brasil foi palco de megaeventos esportivos. A discussão da agenda política que os trouxe exige valioso cuidado; não se intende apresentá-la aqui, mas vale ressaltar pontos levantados por Chade (2015), que constroem a atmosfera da projeção internacional brasileira durante estes períodos e justificaria o dispêndio de recursos públicos. O jornalista relata como o então chanceler brasileiro Luiz Figueiredo e a presidente usaram os camarotes para articular o Brasil internacionalmente; Rousseff inclusive alterou a data da reunião do BRICS para coincidir com a final da Copa (CHADE, 2015, pp. 267 – 268). A finalidade dos esforços mostrava

ao mundo que [...] o país era o centro das atenções do planeta. Isso apesar de ter uma diplomacia de anões, um comportamento de avestruz em debates internacionais. O futebol e a Copa resumiam, de modo conveniente, algumas das imagens que o Brasil tentava passar para o mundo: um país multicultural, aberto, democrático e capaz de assumir grandes desafios. [...] No Itamaraty, ninguém nega que essa ofensiva tenha objetivos que vão além do esporte [...]. Em um e-mail enviado a mim, o Itamaraty explicou que considera a iniciativa esportiva “relativamente barata, tecnicamente simples e extremamente simpática” (CHADE, 2015, pp. 267; 269). 72

Talvez aos olhos diplomáticos, um evento que reúne dirigentes seja pouco custoso para negociações políticas. Entretanto, como o governo brasileiro foi o maior financiador destes eventos, é inegável questionar a afirmação que uma Copa do Mundo ou os Jogos Olímpicos são relativamente baratos – vide a situação da dívida do estado do Rio de Janeiro depois de 2016. Igualmente à dinâmica corruptiva na Fifa, os eventos ocorridos em 2015 nos Estados Unidos e na Suíça, na investigação do Federal Bureau of Investigation (FBI) chamada de Fifagate, que envolve dirigentes e empresários brasileiros – José Maria Marin, ex-presidente da CBF, José Hawilla, fundador do Grupo Traffic, e José Marguilles, diretor da Traffic no Brasil – serão apontados aqui como secundários. A investigação foi centrada nos crimes de fraude eletrônica, extorsão e lavagem de dinheiro e, segundo o senador Romário (PODE-RJ), autor do pedido de abertura da Comissão e depois, presidente desta, foi um dos principais precedentes para a abertura da CPI do Futebol: numa primeira tentativa, o então presidente do Senado, Renan Calheiros (MDB-AL) pediu para que o carioca esperasse “‘[...]um fato importante e relevante’, que justificasse a investigações sobre as suspeitas de corrupção na CBF e no Comitê Organizador Local” da Copa do Mundo no Brasil. Com o Fifagate, três meses após o primeiro pedido, tal fato foi suficientemente significativo para a aprovação da CPI, somado às preocupações de Calheiros com a Operação Lava Jato46 (ROMÁRIO, 2017, pp. 62 – 63). Romário de Souza Faria, o Baixinho, morador de bairros periféricos do Rio de Janeiro, nasceu em 1966 e iniciou sua carreira profissional no futebol em 1985 no Vasco da Gama, clube que teve quatro passagens. É o jogador brasileiro com carreira mais longa, se aposentando aos 41 anos. Passou pelo clube holandês PSV Eindhoven e pelo catalão Barcelona; jogou pela seleção brasileira nas Olímpiadas de Seoul, em 1988, ganhando a medalha de prata, foi vencedor das Copa América de 1989 e 1997, a Copa das Confederações de 1997 e a Copa do Mundo de 1994, nos Estados Unidos. Ganhou diversos prêmios individuais, sendo os mais relevantes a Ballon d’Or e Melhor Jogador Fifa da Copa do Mundo, ambos em 1994. É considerado o terceiro maior artilheiro do mundo, atrás de Arthur Friedenreich e Pelé. Após a aposentadoria dos gramados, filiou-se ao Partido Socialista Brasileiro (PSB) em 2009 e no ano seguinte foi eleito deputado federal pelo estado do Rio de Janeiro; em 2014, eleito senador pelo mesmo estado. Em 2017, transfere-se para o Podemos (PODE) e se candidata ao governo do Rio, terminando em quarto lugar, com 8,7% dos votos validos. Em 2019, tornou-se presidente estadual de seu partido.

46 A Operação Lava Jato é um conjunto de investigações conduzido pela Polícia Federal que pretende apurar um largo esquema de lavagem de dinheiro movimentado em forma de propina, iniciada em 2014. 73

Vê-se, da instalação da Comissão e sua composição, a polarização da dinâmica política do futebol, de forma bastante similar àquela de 2001. Todavia, como inflexão, a polarização da discussão existiu, primeiramente, pelo posicionamento do senador Romário. Em 2001, a mídia esportiva salientava e induzia a opinião pública contra a CBF, mesmo que na dissolução da CPI, o relatório foi rejeitado, resultado da forte influência da Confederação. Em 2015, mesmo após o grande fiasco da seleção brasileira no ano anterior – que foi eliminada pela Alemanha na semifinal pelo histórico placar de 7 a 1 – e as manifestações civis durante a Copa e a Copa das Confederações, em 2013, o cenário era muito mais ameno para as articulações da CBF. Sem título de comparação entre CPIs – considerando os números de circulação dos jornais impressos e as diferenças do consumo de informação entre os anos, com a popularização da internet e aparecimento das mídias sociais – percebe-se que, como apresentado em maior detalhe no Apêndice 3, Análise do termo CPI do Futebol nos jornais O Estado de S. Paulo e o Globo em 2015 e 2016, as notícias sobre a CPI do Futebol ficaram restritas ao caderno de esportes de ambos jornais; ademais, vê-se que a presença escandalosa dos fatos ficou circunscrita ao Fifagate e principalmente às prisões na Suíça, em maio de 2015. De modo geral, não houve grande atenção aos fatos e certamente influenciaram o andamento da Comissão e seu resultado. A CPI do Futebol foi instalada em 14 de julho de 2015 e o prazo final era 22 de dezembro do mesmo ano; houve prorrogação e o prazo final prorrogado foi 22 de dezembro de 2016. Os picos de incidência do temo CPI do Futebol são equipares às datas citadas. A editoria de Esportes é a que conta com maior número de aparições do termo em ambos jornais e anos de pesquisa: no O Estado de S. Paulo 75% e 60%, respectivamente em 2015 e 2016, e no O Globo 71% e 87%, nos respectivos anos. A editoria de política (Política, no O Estado de S. Paulo e País, no O Globo) fica em segundo lugar com o maior número de menções em 2015 e 2016 no jornal paulista – 8% e 13% -, e em 2015 no jornal carioca, com 8%. A segunda maior frequência do Globo em 2016 foi a editoria de Opinião, com 13%. Mostra-se claro que as manchetes referentes à CPI do Futebol ficaram concentradas na editoria esportiva, mesmo que fosse um processo político no Senado Federal. Dessa forma, é possível presumir que o evento não foi tratado como escândalo político, mas como esportivo – mesmo que integrasse agentes do poder público, fosse conduzido no parlamento e envolvesse uma investigação maior sobre corrupção 74

no país, a Operação Lava Jato da Polícia Federal que, posterior ao encerramento da CPI, averiguou que a construção da Arena Corinthians feita pela Odebrecht tem contratos ilícitos47. A frequência de manchetes que aparecem na primeira página do O Estado de S. Paulo vai de 5% em 2015 para 2% no ano seguinte; no O Globo, em 2015 e 2016, CPI do Futebol conta com 6% de frequência. No jornal paulista, a frequência do termo nos editoriais vai de 2% em 2015 para 6% no ano seguinte; já no carioca, a Segunda Página conta com 6% em 2015, e 0% em 2016, com ressalva de presença substancial nos textos dos articulistas, em Opinião. Ser ou não escândalo política implicaria no impacto real de uma CPI sobre o esporte. Em 2001, a má atuação da seleção brasileira nas eliminatórias da Copa de 2002, um escândalo nas contratações de jogadores, envolvendo o treinador Luxemburgo, e um súbito mal-estar de Ronaldo Fenômeno, segundo Bellos (2001, p. 322), foi a base necessária para a CPI da CBF/Nike. Resume-se este modelo pelo péssimo desempenho da seleção e um escândalo corruptivo que envolva, claro, o futebol. Para 2015, o 7 a 1 do ano anterior, em casa, é suficiente para motivar um profundo descontentamento; com a prisão de Joseph Blatter, José Maria Marin e vários outros importantes dirigentes em maio de 2015 pela operação americana Fifagate, o escândalo corruptivo futebolístico também se define. Se o Brasil tivesse levado o hexacampeonato em 2014, dificilmente uma investigação pública seria aberta e, da mesma forma, sem o Fifagate, como já mencionado anteriormente, a CPI do Futebol não teria aval do presidente da casa legislativa. Desse modo, a fórmula proposta por Bellos (2001, p. 322) para que uma investigação envolvendo o futebol tivesse real efetividade considera os fatos políticos que dominaram a grande mídia um dos maiores fatores para a falência do projeto da CPI. A falta de repercussão mesmo que na imprensa especializada – principalmente os canais de tevê pago e as editorias de esportes dos grandes jornais – teria inibido, de certo modo, pressão da opinião pública. De forma similar a este pressuposto, Jennings (2014, p. 45) aponta que as grandes cifras do futebol brasileiro alargam a expectativa com o futebol por parte dos torcedores, mas também infla a frustração após o fiasco – ocorrido tanto em 1998 e 2014, anos de Copa do Mundo antecedentes à instalação das CPIs –, devido à gestão duvidosa da CBF. Sendo assim, mostra-se relevante apresentar o conceito de escândalo, segundo J. Thompson (2000, p.13): “escândalo refere-se a ações ou eventos envolvendo certos tipos de

47 DANTAS, Tiago. Justiça manda Corinthians e Odebrecht devolverem R$400 milhões por Itaquerão. O Globo. 15/02/2018. Disponível em: . Acesso em: 6 jun. 2019. 75

transgressões que se tornaram conhecidos e são suficientemente sérios para suscitar uma resposta pública”48. Fatores essenciais para a ocorrência do escândalo é são

(a) um grau de conhecimento público de ações ou eventos, (b) um público de não envolvidos que os conhecem, e (c) um processo publicidade ou visibilidade através do qual as ações ou eventos se tornaram conhecidos pelos outros. Se as atividades permanecem invisíveis, estas não podem, ipso facto, se tornar um escândalo.49 (THOMPSON, 2000, p.19)

A partir desta pontuação, vê-se o papel central das mídias de massa para a transformação de um episódio em escândalo. Foram diversos as questões que impediram a transformação da CPI do Futebol e a prisão de alguns importantes cartolas a capa dos jornais e a principal chamada do telejornal e torna-se é relevante pontuar a falta de percepção por parte dos torcedores das questões políticas da CBF. A direção da Confederação não parece ser o cerne das preocupações das articulações para o time de um torcedor: ingenuamente, o torcedor se pergunta se a prisão de José Maria Marin vai mudar a má fase de seu clube, por exemplo. O brasileiro comum pouco se dá conta que os dois principais campeonatos do país em cada temporada – o Campeonato Brasileiro, vigente por quase nove meses, e a Copa do Brasil, que tem a maior premiação – é de posse da CBF e que a prisão de um dirigente afeta toda a estrutura de futebol. Realmente, uma má fase, uma lesão, a perda de um jogo importante são preocupações de um clube e dos cartolas deste; inevitável é refletir que sem um campeonato bem estruturado, nem má fase há para os clubes. A distância imaginária criada pelo torcedor pode ser identificada em mais um fator para a não caracterização de um episódio como escandaloso. Thompson (2000, pp. 88-89) descreve que, a partir da experiencia mediada dos escândalos, todos eles têm naturalmente papel periférico na vida das pessoas comuns, “e mais periférica quando o escândalo está distante, espacial e culturalmente de seus próprios contextos de vida”50. Se os dirigentes da CBF se postam em determinado lugar pelo poder simbólico que os foi concedido paulatinamente pela incorporação e assentamento da estrutura patrimonialista conservadora, o presidente da organização e os demais diretores estão mais próximos ao céu do que os meros mortais que

48 Grifo original do autor. Tradução livre feita pela autora. Texto original: “scandal refers to actions or events involving certain kinds of transgressions which became known to others and are sufficiently serious to elicit a public response”. 49 Grifo original do autor. Tradução livre feita pela autora. Texto original: “(a) a degree of public knowledge of actions or events, (b) a public of non-participants who know about them, and (c) a process of making public or making visible through which the actions or events became known by others. Activities that remain invisible to non-participants cannot, ipso facto, be scandalous.” 50 Tradução livre feita pela autora. Texto original: “and more peripheral when the scandal is far removed, spatially and culturally from their own life contexts”. 76

comparecem religiosamente aos jogos do seu time – mesmo que os cartolas estejam muito longe de terem ficha limpa para entrar no paraíso. Ao avaliar o quadro da CPI do Futebol, o Senado Federal e a CBF, a tentativa de Romário é frustrada, em síntese, porque a estrutura política da Confederação é suficientemente larga para não precisar de uma única e forte liderança, como em 2001. A constituição de uma confederação de futebol nacional com federações estaduais dissolve lideranças regionais que permitem a eleição seguida de gestores que permeiam a estrutura patrimonialista conservadora de tal modo a qual se molda numa entidade que se retroalimenta. De um lado, o próprio futebol como negócio já se moldou para continuar se articulando para benefício dos cartolas; de outro, a política que envolve o esporte nacional defende a manutenção de lideranças com vasto poder simbólico. A liderança do senador Romário teve devido poder simbólico para conceder devida importância à investigação que tentou punir os dirigentes da CBF pela gestão do futebol brasileiro e seu maior espetáculo, a Copa do Mundo. O tetracampeão descende de uma linhagem de jogadores rebeldes, do sentido da indisciplina e da preguiça – e neste caso, ambos se enquadram – que, após a artilharia da seleção e o título mundial por ele entregue à torcida nacional, o transforma de vilão à herói, “uma trajetória na direção de uma liderança, na qual incorpora seu papel simbólico (cf. Klapp, 196851), libertando-se dos limites do campo de futebol” (GUEDES, 1994, p. 33). A precedente fama dos treinos lânguidos e postura negligente nas concentrações de Romário foi desmontada pelo homem de família, trajetória profissional irregular – “caixeiro de armazém, vendedor de roupas, operário de fábrica de tintas” – e a valorização das raízes na favela do Jacarezinho (1994, p. 35). Ademais, a classe dirigente, a comissão técnica e a mídia insistiam na imaturidade e irresponsabilidade do jogador acabam por reforçar a liderança conquistada por Romário dentro do grupo de selecionados e entre os torcedores (1994, p. 31). Quando, nas palavras do então jogador, dedica o tetracampeonato “ao povo sofrido”52, e antes mesmo da vitória afirma a necessidade de levar alegria ao povo brasileiro sem “esconder nossos problemas, como a fome, a miséria, as pessoas abandonadas”53, traveste a imagem de indômita para patriota; com isso, segundo a autora, “fala do povo para o povo, a partir da sustentação de sua posição como alguém do povo54” (1994, p. 39). A postura de Romário,

51 KLAPP, Orin. Symbolic leaders: public dreams and public men. Minerva Press, 1990. 52 JORNAL DO BRASIL. Romário. 13/07/1994. p. 11. In: GUEDES, 1994, pp. 1; 39. 53 Idem. 54 Grifos originais de Guedes, 1994. 77

segundo Guedes (1994, p. 39), desafia a ordem das posições sociais no futebol pela simples emissão de opinião:

O jogador coloca-se, portanto, como o sujeito de um discurso no qual sempre foi o objeto. Guarda, por conseguinte, potencial subversivo, não tanto pelo que diz, mas por ser dita. Desta forma, pode subverter as normas da divisão de trabalho tanto no interior do campo esportivo quanto em outros campos. No futebol brasileiro, a distinção entre trabalho físico e mental foi sempre operante, expressando-se, inclusive na máxima muito conhecida de que “jogador pensa com os pés”.

Dessa forma, no ano do tetra, Romário formulou sua agenda política precocemente, que o levaria primeiro ao Congresso, em 2011, depois ao Senado. No livro em que conta sobre a comissão parlamentar, ele explica:

me realizei como jogador, enquanto percebia que havia muita coisa estranha, principalmente entre os cartolas. Aos poucos, tomei consciência de que o jogador tinha a obrigação de lutar para tentar mudar aquela situação. Foi esse incentivo que [...] me levou ao mundo da política e [...] a presidir uma CPI do Futebol [...]55 (ROMÁRIO, 2017, p. 20).

No grifo, fica evidente a dinâmica apresentada por Guedes (1994). Outro fator relevante da declaração é a experiência pessoal como fator determinante para a formação de sua agenda – que se duplica com a preocupação do senador com pessoas com deficiência, doenças graves e raras, motivado pela filha caçula do ex-jogador, portadora de síndrome de Down – que constrói ainda mais a relação para o povo do homem simples que consolida sua imagem de político honesto, em comparação ao outro polo da CPI. Vale delinear o uso do termo cartola para referir-se aos dirigentes do futebol brasileiro, usado com desatenção até aqui. Bellos (2002, p. 289), que escreve para o leitor inglês, explica que o termo é usado como sinônimo para os dirigentes, os club bosses, ou os top hats, e remete à origem destes homens – as elites que, no início do século passado, usavam cartolas como símbolo do distintivo econômico e possuidor dos meios industriais, the lofty origin. É interessante discutir o uso de palavras do autor para determinar a condição de classes: lofty pode ser traduzido como “elevado”, significando uma classe elevada, a elite; também pode ser traduzido como “arrogante” ou “soberbo”, o que cunha a elite como caldada num distintivo social que é marcado pelo com quem é que você acha que está falando?. O cartola brasileiro não é apenas o administrador do clube de futebol, é principalmente um homem que adquire

55 Grifos feitos pela autora. 78

status prepotente por um poder simbólico imposto pela posição cultural do futebol e reafirmado pela classe política. A CPI do Futebol formou dois polos políticos: um, encabeçado na Comissão pelo senador Romário (PODE-RJ), presidente da CPI, e o outro pelo senador Romero Jucá (MDB- RR), relator da Comissão. O maior contraste entre as CPIs é sobre a relatoria das comissões: o relator é o parlamentar responsável pela redação do relatório final da investigação, assim como o plano de trabalho da comissão, assim que instaurada. Na CPI em 2001, Silvio Torres foi o relator e um dos mais ativos e fervorosos parlamentares contrários à política da CBF; em 2015, Romero Jucá tomou o posto de relator e pode ser considerado o líder da bancada da bola na comissão. Romário (2017, p. 65) explica que sua prioridade era ser relator, mas via o plano com dificuldade “porque o PMDB tinha a maior bancada, com o PT em segundo lugar, enquanto o meu então partido, o PSB, estava apenas na sexta colocação do ranking. E essa colocação é decisiva para a indicação dos membros de uma CPI: quando maior a bancada, mas representantes”, sendo que a composição das Comissões Parlamentares corresponde à proporção da casa legislativa a qual aquela pertence. Foram apresentados dois relatórios ao final das investigações da CPI do Futebol. A bancada da bola em 2015 tinha estrutura similar à de 2001. Segundo o levantamento de Romário (2017, pp. 66 – 67), os senadores que lutaram favoravelmente à CBF usaram de ferramentas para atrasar e dificultar a tramitação das investigações. A primeira dessas manobras foi a ampliação do número de parlamentares a compor a comissão, para que a banca da bola tivesse mais quórum. Esta, que seria composta pelos “mais obedientes à ordens superiores” (2017, p. 66), ou que seguiriam as orientações da CBF para garantir a permanência da estrutura política criada e sustentada por ela há muitos anos, compôs-se da seguinte forma: Romero Jucá56 (PMDB-RR), relator da CPI, garantiu a morosidade e impediu parte da investigação, inclusive omitindo e destorcendo o conteúdo do relatório final (que será discutido em profundidade no próximo capítulo), e está sob investigação dentro da Operação Lava Jato, da Polícia Federal; o senador Eunício Oliveira57 (PMDB-CE); Humberto Costa58 (PT-CE),

56 Romero Jucá (MDB-RR) segue sob investigação da Operação Lava Jato e foi denunciado pelo Ministério Público do Paraná pelo envolvimento no esquema de corrupção numa subsidiária da Petrobrás. Nas eleições gerais de 2018, não conseguiu a reeleição ao Senado e, sem foro privilegiado, foi preso em 2019. Desde que Michel Temer assumiu a presidência em 2016 após o impeachment de Dilma Rousseff, Jucá assumiu a presidência do MDB. 57 Eunício Oliveira (MDB-CE) é empresário e agropecuarista cearense. Foi presidente do Senado Federal entre 2017 e 2019, antecedido por Renan Calheiros e sucedido por Davi Alcolumbre. Não conseguiu reeleição ao mandato parlamentar nas eleições gerais de 2018. 58 Humberto Costa (PT-PE) é médico e jornalista, na vida pública desde 1990. Foi Ministro da Saúde durante primeiro mandato do governo Lula da Silva, entre 2003 e 2005. Hoje cumpre seu segundo mandato como senador, reeleito em 2018. 79

também investigado na Operação Lava Jato; Fernando Collor de Mello59 (PTC-AL), o ex- presidente que sofreu processo de impeachment por corrupção ativa, também ex-presidente do Centro Sportivo Alagoano entre 1970 e 1974 – levando o time a disputar pela primeira vez a primeira divisão do Campeonato Brasileiro no final do quadriênio – e réu na Operação Lava Jato; Ciro Nogueira60 (PP-PI), mais um dos investigados na Operação Lava Jato; o senador Omar Aziz61 (PSD-AM); e Zezé Perrella62 (PTB-MG), deputado por Minas Gerais por dois mandatos e presidente do , primeiro durante três mandatos entre 1995 e 2002, quando Alvimar Perrella, seu irmão assumiu o cargo, depois em 2011 por mais um mandato e, por último, em 2017 eleito por aclamação como presidente do conselho deliberativo, além de contar com seu filho, Gustavo Perrella – que foi deputado estadual entre 2011 e 2015, secretário nacional de Futebol e Defesa dos Direitos do Torcedor no Ministério do Esporte do governo Michel Temer, e vice-presidente do Cruzeiro – no corpo dirigente da CBF desde 2018 (ver Tabela 7).

59 Fernando Collor de Mello (PROS-AL) é senador desde as eleições gerais de 2006. É o único ex-presidente brasileiro a começar sua carreira política num clube de futebol. Ao longo dos anos, distanciou-se da política do CSA, mas seu filho, Arnon de Mello, e seu primo, Euclides Mello, já ocuparam a presidência da agremiação. 60 Ciro Nogueira (PP-PI) é advogado e empresário, como senador desde 2011. Por causa do foro privilegiado, seu caso corre no Superior Tribunal Federal (STF) para decisão final sobre o indiciamento pelos crimes de formação de organização criminosa num esquema de desvios de ativos da Petrobrás. 61 Omar Aziz (PSD-AM) é engenheiro e senador desde 2015, presidente da sua sigla na casa. Foi governador do estado do Amazonas em 2010 e já passou por sete partidos desde o início da sua carreira pública em 1989. Sua mulher, Nejmi Aziz é vice-presidente do PSD no estado do casal e foi presa pela Polícia Federal em julho de 2019, acusada de ocultação de capital via contratos de compra e venda de imóveis. 62 José Perrella de Oliveira Costa (MDB-MG) é empresário e histórico dirigente do Cruzeiro Esporte Clube, filiado ao partido desde 2017. Presidiu o clube entre 1995 e 2002, depois entre 2009 e 2011 e em 2017, foi aclamado presidente do conselho deliberativo. No recente escândalo de corrupção envolvendo dirigentes da administração de Wagner Pires de Sá, envolvendo suspeitas de lavagem de dinheiro, falsificação de documentos, falsidade ideológica, entre outros crimes, Zezé tomou posição de destaque para gerenciar a crise política, financeira e da bola. O Cruzeiro começou 2019 invicto na fase de grupos da Copa Libertadores e campeão do e terminou o ano rebaixado para a série B do Campeonato Brasileiro. Seu papel de destaque foi inflado pelas trocas de técnico do time principal e o áudio do ex-jogador do time Thiago Neves, que pedia o pagamento de salários e outros valores atrasados para rescindir seu contrato com o clube – “Fala Zezé, bom dia cara. Deixa eu te falar uma coisa”. 80

TABELA 6 Composição da CPI do Futebol (2015) 63 Parlamentar da Resistência Ciro Nogueira (PP-PI) Titular Democrática (PDT, PT) Gladson Cameli (PP-AC) Titular Randolfe Rodrigues (REDE-AP) Titular Zezé Perrella (PTB-MG) Titular Humberto Costa (PT-PE) Suplente Telmário Mota (PDT-RR) Suplente Bloco da Maioria (MDB) João Alberto Souza (PMDB-MA) Titular Osmar Aziz (PSD-AM) Titular Romero Jucá (PMDB-RR) Relator Eunício Oliveira (PMDB-CE) Suplente Hélio José (PMDB-DF) Suplente Bloco Social Democrata (PSDB, Davi Alcolumbre (DEM-AP) Titular PV, DEM) Paulo Bauer (PSDB-SC) Vice-presidente Bloco Socialismo e Democracia Roberto Rocha (PSB-MA) Suplente (PPS, PSB, PC do B, REDE) Romário (PSB-RJ) Presidente Bloco Moderador (PTB, PSC, Fernando Collor de Mello (PTC-AL) Titular PRB, PR, PTC) Wellington Fagundes (PR-MT) Suplente Fonte: BRASIL. Relatório alternativo (voto em separado). 2016a. Ver referências bibliográficas. Ao serem analisadas as transcrições das sessões da CPI e a presença dos senadores, principalmente pelo relato de Romário (2017), observa-se que o polo mais ativo e empenhado nas investigações são aqueles contrários aos processos da CBF – limitado à Romário (PSB-RJ), Paulo Bauer64 (PSDB-SC), vice-presidente da Comissão e Randolfe Rodrigues65 (REDE-AP). Em contraste, aqueles senadores que se colocaram no polo liderado por Jucá se mantinham apáticos às discussões, muitas vezes ausentes – inclusive ressaltado pelo presidente da CPI em seu livro que Collor de Mello (PTC-AL) nunca apareceu em nenhuma sessão (2017, p. 67). Não seria, dessa forma, intencional a discussão sobre o modelo de administração e cooperação política da CBF com o poder público. O principal defensor da CBF na CPI do Futebol, todavia, não compôs legalmente a comissão: Vandenbergue dos Santos Sobreira Machado é o principal articulador político da CBF e descrito como “amarra-cachorro de Renan” Calheiros, segundo as gravações de Delcídio do Amaral durante a Operação Lava Jato (GASPAR, 2016). É um dos homens de confiança de Renan Calheiros e desde 2002, nomeado por Ricardo Teixeira, ocupa o cargo de diretor de assessoria legislativa (ver Tabela 7). É funcionário aposentado do Senado Federal desde 1997,

63 Na tabela 6, foi usado a configuração original da composição da CPI do Futebol; desta forma, os senadores estão acunhados com a filiação partidária do período. 64 Paulo Bauer (PSDB-SC) é empresário e seu último mandato terminou em 2019, sem conseguir reeleição nas eleições gerais de 2018. Durante seu mandato, foi líder da sigla no Senado. Iniciou sua carreira política em 1980 e já passou por cinco partidos. 65 Randolph Frederich Rodrigues Alves (REDE-AP) é professor de história e foi o senador mais votado na história do Amapá nas eleições de 2010. É líder da oposição ao governo, reeleito senador nas eleições gerais de 2018. Iniciou sua carreira política em 1990 no PT, passando para o PSOL em 2005 e desde 2015 está na Rede Sustentabilidade. 81

nomeado conselheiro consultivo da Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) em 2010 pelo presidente Lula e recebeu mais de R$ 6,5 milhões até 2013 pelos serviços prestados à CBF (PRADO, 2013). Vandenbergue não é o único diretor da CBF que se mantém por longa data no cargo. Não foi possível reaver a composição de gestões passadas da organização por falta de cooperação da Confederação com esta pesquisa66, mas se analisado apenas a composição da última gestão e da atual, vê-se que a sustentação política da CBF é bem zelada pelos mesmos homens. A Tabela 7 apresenta as gestões Coronel Nunes, empossado presidente em 2017 depois que Marco Polo Del Nero foi impedido pela Fifa de participar de qualquer organização do futebol, e a Rogério Caboclo, eleito presidente da CBF em 2018 e empossado dia 9 de abril do ano seguinte. Del Nero, que assumiu a presidência da CBF após a prisão de José Maria Marin67 em 2015 e eleito em 2016 (ver Infográfico 1), foi investigado pelo Fifagate, e foi absolvido por falta de provas; a Fifa, todavia, em nova administração, quis moralizar práticas políticas e limpar os vínculos da organização com investigados pela operação americana. Mesmo assim, o cartola continua ocupando o cargo vitalício no Conselho Deliberativo do Palmeiras. No início de 2019, a Fifa anunciou ao clube paulistano que tomasse as providencias para desligar Del Nero, ou seriam rebaixados para a segunda divisão do Campeonato Brasileiro e uma multa seria sancionada (CAMPOS; RAMOS, 2019a); outros 33 conselheiros pressionaram o presidente do Conselho, Seraphim del Grande, para que Del Nero fosse expulso (CAMPOS; RAMOS, 2019b). Como desfecho, o ex-presidente da CBF apelou novamente pelo seu afastamento do clube por sete meses, até que haja a revisão de seu banimento pelo Conselho de Ética da Fifa (CAMPOS; RAMOS, 2019c). Outro ex-dirigente da CBF que está impedido de exercer qualquer cargo nas organizações do futebol é Ricardo Teixeira, investigado e preso no caso Fifagate, da justiça americana, e réu na justiça suíça por receber propina durante 2006 e 2012, como presidente da CBF, no valor de US$ 600 mil anuais nas negociações da Copa Libertadores. Ademais, recebeu indevidamente US$ 1 milhão em 2010 pelo intermédio do contrato entre a Conmebol e outra empresa não identificada na documentação de domínio público. O Conselho de Ética da Fifa conclui, a partir das provas produzidas pela investigação dos Estados Unidos a infração do

66 A autora entrou em contato quatro vezes por e-mail e duas pelo telefone com o responsável do acervo da CBF e da seleção brasileira quatro vezes, no intuito de reaver os diretores de gestões passadas. Entretanto, não foi autorizado a disponibilização de tais dados pela organização para esta pesquisa. 67 Assim como o caso de Del Nero, Marin está impedido de ocupar qualquer cargo de dirigente no futebol, decisão tomada pelo Comitê de Ética da Fifa em 15 de abril de 2019 (FAVERO, 2019). 82

artigo 27, que diz respeito sobre recebimento de propina e corrupção. O advogado de Teixeira ainda tenta absolvição perante a justiça suíça, alegando circunstancialidade das provas obtidas pela investigação americana, considerando que os procuradores nos Estados Unidos teriam concluído envolvimento, sem evidência clara das infrações (CAMPOS; MENDES, 2019). O desfecho da CPI do Futebol (2015) é mais complexo do que a da de 2001. Foram protocolados dois relatórios, o final de autoria de Romero Jucá, e outro que seria votado separadamente, caso o primeiro fosse rechaçado, de autoria do presidente da Comissão, o senador Romário e Randolfe Rodrigues. Como o primeiro foi aceito, o segundo foi automaticamente descartado. Em vista da complexidade e disparidade do conteúdo dos textos, o terceiro capítulo será destinado à tal discussão. TABELA 7 Comparativo das gestões Coronel Nunes (2017-2019) e Rogério Caboclo (2019-) CORONEL NUNES (2017- ROGÉRIO CABOCLO

2019) (2019-) Presidente Antônio C. Nunes de Lima Rogério Langanke Caboclo Antônio C. Nunes de Lima Fernando Sarney Antônio Aquino Castellar Modesto Neto Ednaldo Rodrigues Vice-presidentes Gustavo Feijó Fernando Sarney Francisco Noveletto Gustavo Feijó Marcus Vicente Marcus Vicente Secretário-geral Walter Feldman Walter Feldman Diretor executivo de gestão Rogério Langanke Caboclo Cargo extinto Diretor jurídico Carlos Eugenio Lopes Carlos Eugenio Lopes Diretoria de desenvolvimento do Cargo inexistente Juninho Paulista futebol Diretor de assessoria legislativa Vandenbergue Machado Vandenbergue Machado Diretor de coordenação - série D André Pitta André Pitta Diretor de competições Manoel Flores Manoel Flores Diretor de comunicações Douglas Lunardi Douglas Lunardi Diretor de desenvolvimento e Gustavo Perrella Cargo extinto projetos Diretor de projetos estratégicos Cargo inexistente Gustavo Perrella Diretor de relações institucionais Marcelo Aro Marcelo Aro Diretor financeiro Gilnei Botrel Gilnei Botrel Diretor de governança e André Megale André Megale conformidade Diretor de marketing Gilberto Ratto Gilberto Ratto Diretor de patrimônio Oswaldo Gentille Oswaldo Gentille Diretor de registro e transferência Reynaldo Buzzoni Reynaldo Buzzoni Diretor de tecnologia da informação Fernando França Fernando França Tabela produzida pela autora. Fonte: CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL. Diretoria. Acessos em 2018 e 2019. Ver referências bibliográficas. 83

INFOGRÁFICO 1 Linhagem da presidência da CBF

LEGENDA* Confederação Brasileira  de Desportes (CBD) 2002: Seleção é pentacampeã na Confederação Brasileira  Copa do Japão e de Futebol (CBF) Coreia do Sul 15/12/2017: Fifa proíbe que Del Nero 27/5/2015: Marin 1962: Seleção é ocupe qualquer é preso na Suíça bicampeã na cargo como dirigente como parte da Copa do Chile de futebol e Nunes operação Fifagate assume novamente Presidência de João Havelange na Fifa (1975-1998)

1979: A CBD 1994: Seleção é 9/4/2019: Eleito 1958: Seleção é Coronel Nunes em 2018, Caboclo passa a ser CBF* tetracampeã na assume campeã da Copa toma posse da Copa dos figurativamente a da Suécia presidência da Estados Unidos presidência da CBF Del Nero CBF após um pelo temor de Del 1970: Seleção assume ano, como manda Nero de ser preso é tricampeã na interinamente a o regulamento do exterior Copa do México presidência da CBF até novas

eleições Infográfico produzido pela autora.

*: Por determinação da Fifa, todas as organizações mundiais representantes do futebol deveriam ter caráter exclusivo para tal esporte. Heleno de B. Nunes, com consentimento das Federações estaduais, manteve-se presidente até a finalização da transição CBD – CBF e, consecutivamente, novas eleições. 84

Quando comparado o quadro diretivo da CBF (Tabela 7), observa-se pouca diferença entre as composições. Ressalta-se a inserção de quatro novos vice-presidentes – Antônio Aquino, ex-presidente da Federação de Futebol do Acre (FFA), Castellar Modesto Neto, ex- presidente da Federação Mineira de Futebol (FMF), Ednaldo Rodrigues, ex-presidente da Federação Bahiana de Futebol (FBF) e Francisco Noveletto, ex-presidente da Federação Gaúcha de Futebol e anteriormente opositor da CBF – e a criação de uma nova diretoria, a de Desenvolvimento do Futebol, a ser discutida a seguir, que originalmente foi ocupada pelo ex- jogador Juninho Paulista. Dos outros vice-presidentes, Marcus Vicente foi presidente da Federação de Futebol do Espírito Santo (FES), Gustavo Feijó, ex-presidente da Federação Alagoana de Futebol (FAF) e Fernando Sarney, filho do ex-presidente José Sarney. Gustavo Perrella, citado anteriormente no texto como filho de Zezé Perrella, senador que compôs a bancada da bola, ocupava a diretoria de Desenvolvimento e Projetos na gestão de Coronel Nunes; na gestão de Caboclo, a diretoria sofreu alteração de nome, transformando-o em diretor de Projetos Estratégicos. O presidente da gestão anterior entrou na vigente como vice-presidente e Rogério Caboclo era diretor executivo de gestão. O cargo, na prática, o conferia autonomia para presidir a CBF antes da oficialização de seu mandato. Tanto que, na entrega da taça de campeão brasileiro em 2018 para o Palmeiras, a representação da CBF foi feita por Coronel Nunes e Rogério Caboclo. Originalmente, o cargo foi estipulado para que Caboclo tivesse autonomia administrativa junto ao cargo de presidente do Comitê Organizador Local da Copa América, sediada no Brasil em 2019. Nunes, à época, tinha 80 anos e recorrentemente se afastava das atividades da CBF por problemas de saúde, além de evitar de viajar longas distancias, o que impedia sua presença em importantes eventos e reuniões. Ele entrou no lugar de Del Nero ambas as vezes por ser o vice-presidente mais velho, como manda o código da CBF. Desde a presidência de Ricardo Teixeira, instaurou-se uma base gestora na CBF para manter a modo proposto primeiro por João Havelange. Andrew Jennings (2014, pp. 26 – 27), jornalista que acompanha os movimentos políticos e métodos escusos da Fifa, conta que Havelange moldou por anos a imprensa sul-americana e europeia para vê-lo como visionário, idealista, o homem que, por conta de suas qualidades, fez a Fifa enriquecer. Na opinião do jornalista, Havelange

assumiu as rédeas do futebol internacional quando as redes de televisão e os patrocinadores estavam dispostos a pagar cada vez mais e mais dinheiro para dirigentes iguais a ele, pessoas que estavam felizes de, na surdina, privatizar o jogo do povo. A verdade nua e crua é que um presidente da Fifa honesto teria sido mais duro na mesa de negociações 85

e lutado para obter acordos mais rentáveis para o futebol. As prioridades de Havelange eram suas propinas e suas comissões sobre os contratos, o autoenriquecimento em vez do enriquecimento do esporte. (JENNINGS, 2011, p. 26)

Entre 1958 e 1975, quando esteve à frente da Confederação Brasileira de Desportos (CBD) – que equivalia à Confederação Brasileira de Futebol (CBF), respondendo sobre outros esportes mas concentrava seus esforços no futebol – articulou para que a seleção brasileira de futebol percorresse o mundo, criando a aura mágica do futebol dessas terras, mas deixou a organização com uma dívida de US$ 6,6 milhões, segundo Jennings (2014, p. 26). Antes de ser empossado presidente da Fifa, o governo brasileiro buscou investigar as transações da CDB e averiguar o real motivo para tamanho rombo. Todavia, os militares “viram-se diante de um dilema, pois em junho de 1974 ele era uma figura mundial, o chefão do esporte mais popular do planeta” (2014, p. 26), aliado ao interesse federal de manter o futebol brasileiro entretendo o povo. Percebe-se, pelo Infográfico 1, que há mandatos tem longíssima duração no esporte brasileiro na presidência da CBF – João Havelange ficou por 17 anos à frente da CBD e seu genro, Ricardo Teixeira, 23 anos – e na presidência da Fifa – Havelange presidiu a organização até 1998, completando 23 anos, e seu sucessor, Joseph Blatter, 17 anos. Segundo o levantamento descrito no Apêndice 2, Análise das presidências das federações de futebol brasileiras, dos vinte e sete presidentes, doze deles têm mandato superior a dez anos; destes, quatro têm mais de vinte anos de presidência – ressaltando o presidente da Federação Maranhense de Futebol, Carlos Alberto Ferreira, que tomou posse do cargo em 1986. Sobre esta característica dos dirigentes das organizações do futebol, o senador Romário (2017, p. 35) explica e exemplifica que a

longevidade no mesmo cargo é característica da máfia que se formou na CBF: são chefões que assumem a cadeira presidencial por décadas e ali usam o prestígio da Seleção Brasileira para comprar aliados, conquistar políticos e esmagar desafetos. Assim tivemos Havelange, que colocou Teixeira, seu genro, na CBF, e Teixeira, que nomeou Joana, neta de João Havelange, no Comitê Organizador da Copa de 2014, do qual ele era, também, o presidente.

José Maria Marin dava continuidade ao projeto de Teixeira, assim como Marco Polo Del Nero. Coronel Nunes cumpriu importante função de manter o sistema funcionando. Juca Kfouri, jornalista e importante crítico da CBF, coloca que “não houve gestão do Coronel, mas sim a 86

continuidade da gestão de Del Nero. Nunes aceitou ser marionete”68. Como já levantado pela Tabela 7, na gestão do recém empossado presidente da CBF, o Coronel segue como vice- presidente. A colocação de Romário acima demonstra a estrutura patrimonialista conservadora: o senador, ao descrever a longevidade das lideranças e calcam seu poder no prestígio da instituição e seu maior produto, a seleção brasileira, pontua características essenciais das gestões da CBF. João Havelange foi responsável por criar a aura mística da seleção brasileira. Durante sua gestão, o Brasil foi três vezes campeão mundial – 1958, 1962 e 1970; claramente, o bom desempenho do esquadrão estabelece a seleção num patamar técnico imponente, mas de nada seria tantas conquistas sem os esforços de mercantilizar a seleção brasileira. Da mesma forma, a gestão de seu genro, Ricardo Teixeira, trouxe mais dois títulos mundiais – 1994 e 2002 – e aproveitou do mercado dinâmico e complexo da época para elevar ainda mais o status da seleção. Os tours de amistosos contra times duvidosamente aquém e os grandes talentos publicitários mantém e injetam paulatinamente mais transcendência à seleção, mesmo que esta não tenha mais cara, nem tática, nem conquistas. E, não à toa, a camisa amarela é um dos símbolos mais conhecidos do mundo. Como exemplo, Romário (2017, p.159) relata a família Feijó na Federação de Alagoas:

[Gustavo] Feijó é cartola histórico. Ele ocupou por muitos anos a presidência da Federação Alagoana de Futebol (FAF) e foi vice- presidente da CBF em 2015 [...]. E, como ocorre em muitas entidades do esporte, a FAF tornou-se capitania hereditária da família do cartola. Quando Feijó saiu da Federação Alagoana, o comando passou às mãos de seu filho, Felipe Omena Feijó que segue na presidência do estado (ver Apêndice 2), assim como o pai, na vice-presidência da CBF. Já destacado no capítulo primeiro, estas figuras traiçoeiras do futebol nacional dependem das federações estaduais para se perpetuar no poder e manter as decisões distantes dos clubes. A relação entre as federações e a Confederação é, segundo Jennings (2014, p. 52) “de dependência, subordinação e cumplicidade”, considerando que aquelas não pagam anuidade teoricamente devida à esta e não prestam conta sobre os recursos destinados ao desenvolvimento do futebol nos estados. As federações estaduais seriam então “distribuidoras de mordomias e redutos do nepotismo, cujo propósito essencial era servir de suporte a projetos pessoais e políticos de dirigentes que se elegem indefinidamente” (2014, p. 52).

68 Entrevista concedida à autora em 11 de abril de 2019, via e-mail. 87

Após os escândalos dos dirigentes da CBF veicularem na mídia internacional, a Fifa pressionou para que, além do afastamento, uma nova forma de administração fosse usada no futebol brasileiro. Ademais, a CPI do Futebol auxiliou para que novas medidas fossem tomadas, mesmo o relatório aprovado não delinear todos os pontos necessários para uma real reforma na Confederação e nos clubes, punindo aqueles que denegriram o esporte. Uma das considerações do relatório aprovado – o qual será detalhado no capítulo seguinte – foi a implementação de um cursor ético para as atividades da CBF. Em 2017, após o afastamento de Del Nero, publicou-se o Código de Ética da Confederação Brasileira de Futebol, feita pelos dirigentes da gestão de Coronel Nunes, ilustrado na Tabela 7. O documento, do qual os pontos essenciais estão demonstrados na Tabela 8, apresenta preceitos de atuação bastante genéricos. TABELA 8 Pontos principais do Código de Ética da Confederação Brasileira de Futebol O documento se aplica às entidades de prática, de administração do futebol, às ligas e à Confederação e seus membros, pessoas naturais e jurídicas, com vínculos comerciais Art. 1º e empregatícios, para “orientar as condutas éticas [...] e rigorosa manutenção de alto padrão de moralidade e definir responsabilidades” (2017, p. 4) A gestão do futebol deve ser voltada ao “desenvolvimento social e a redução de desigualdades econômicas e regionais”, comprometer-se “com o repúdio ao racismo, à xenofobia” e outras formas de discriminação e à cooperação com as autoridades para Art. 2º diminuir a violência nos estádios, e promover “padrões elevados de profissionalismo, transparência, planejamento, probidade, eficiência e participação social” (2017, pp. 4 – 5) Sobre as condutas imperativas da gestão, reitera-se a necessidade de um modelo que Art. 4º se embasa nos princípios morais e a promoção da transparência, descritos no art. 5º; o descumprimento dos princípios fica sujeito à sanções Da conduta dos dirigentes, especifica-se que estes devem, entre outros, promover o tratamento isonômico dos filiados, a transparência de processos orçamentários, Art. 6º financeiros, contábeis políticos e eleitorais, não empregar familiares, cooperar com as autoridades públicas, não favorecer interesses particulares Explicita-se a imperatividade na conformidade com a Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013, que dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, e dá outras providências e a Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998, que dispõe sobre os crimes de Art. 10 lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos previstos nesta Lei; cria os Conselho de Atividades Financeiras - COAF, e dá outras providências; nos artigos 11, 13, 14, 15, 16 e 17 explicitam-se os pontos cabíveis da legislação exposta Lista-se as sanções aplicáveis aos delitos descritos nos artigos anteriores, podendo ser Art. 21, 22, cumulativas ou não, cabível ao Conselho de Ética aplicá-las e encaminhar os casos às 23, 28 e 34 autoridades competentes, sendo que os fatos ocorridos delituosos prescrevem em dois anos Descreve as responsabilidades do Conselho de Ética que é formada e renovada a cada Art. 35 e 41 dois anos, e tem caráter independente da administração da Confederação em suas decisões Tabela produzida pela autora. Fonte: CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL, 2017. Ver Referências bibliográficas. O conteúdo é bastante claro e descreve sem detalhes que a conduta dos dirigentes ligados ao futebol brasileiro deve ser ética e moral, enquadrando-se na legislação brasileira. Na 88

avaliação do jornalista Juca Kfouri69, essas medidas expressas documentalmente demonstram apenas “a atitude mais cuidadosa para que a corrupção não seja tão escandalosa. As medidas de compliance tanto da FIFA quanto da Conmebol e da CBF são meramente para inglês ver”. O novo presidente eleito e empossado da Confederação Brasileira de Futebol não é novos ares ao esporte no Brasil. Como já visto, ele já participava da gestão anterior com maior poder efetivo que o próprio presidente. Entende-se, portanto, que a atual gestão da CBF é redundante àquelas que pretejaram o futebol nacional e a seleção principal. O Lance! questionou se o recém empossado Rogério Caboclo traria “transparência ou continuidade” (TEIXEIRA; NEVES, 2019). Vê-se um problema semântico no questionamento: transparência deveria ser contrastado com corrupção; continuidade, com modernização. Todavia, uma característica não excluí a outra: a gestão Caboclo pode ser marcada pela modernização, assim como continuar (e aí sim faz sentido o uso da palavra) a usar métodos escusos para obter vantagens pessoais e institucionais. No discurso de posse (DISCURSO DE..., 2019), Caboclo afirmou que é

um inconformado. Sempre acredito que podemos fazer mais e melhor. Também sou um bom ouvinte, aberto a boas ideias, capaz de acolher críticas e envolver mais gente no processo de decisão. Essas serão duas marcas da minha gestão: a vontade de fazer sempre mais e melhor e a abertura para que pessoas qualificadas participem das decisões da CBF [...]. Reitero aqui o que disse no dia da minha eleição: nossa gestão será construída sobre os pilares da integridade e da eficiência.

Sobre a corrupção na organização, objetiva ser mais transparente, implantando mais “controles de governança, risco e conformidade”, além de publicizar “uma enorme gama de informações sobre o funcionamento da CBF e do futebol brasileiro”. “Não vou tolerar nenhuma prática duvidosa, ou desvio de conduta”, afirmou o presidente. Em correlação, Romário afirma que

Caboclo representa o continuísmo do grupo comandado por Marco Polo Del Nero na entidade. Mesmo com um perfil mais executivo e menos político, a vitória de Caboclo significou uma garantia para o banido Del Nero de que a caixa-preta das transações nebulosas envolvendo a entidade continuará fechada. Há alguns avanços administrativos, mas o arranjo político continua o mesmo. 70

Uma das grandes plataformas de modernização do futebol brasileiro é a criação da diretoria de desenvolvimento do futebol. Após ter afirmado que “Os clubes brasileiros vivem uma fase de eficiência e profissionalismo”, anunciou Juninho Paulista, pentacampeão com a

69 Entrevista concedida à autora em 11 de abril de 2019, via e-mail. 70 Entrevista concedida à autora em 6 de maio de 2019, via e-mail. 89

seleção brasileira e então dirigente do Ituano, clube do interior que disputa a primeira divisão do Campeonato Paulista. Ex-jogador do São Paulo, Juninho assumiu o Ituano em 2009 enquanto o time estava “em crise financeira, estrutural e administrativa. No futebol, o clube vinha em queda livre nas divisões nacionais [...]. [...] as dívidas [do Ituano] foram pagas pelo próprio Juninho, que reativou as categorias de base em 2011” (NETO; BOTTA, 2019), da qual faz parte da sua formação como jogador. Caboclo o descreveu como “um vencedor, dentro e fora de campo. E um exemplo de seriedade e profissionalismo” (DISCURSO DE..., 2019). O desafio de Juninho é corrigir os problemas de calendário das competições brasileiras e que envolvem clubes do país e incentivar as categorias de base. Na mesma toada, Caboclo anunciou um complexo de 100 mil metros quadrados na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, o Centro de Desenvolvimento do Futebol do Brasil. Projeto que une “formação de excelência e responsabilidade social”, as atividades serão voltadas para o desenvolvimento da arbitragem, futebol feminino, beachsoccer e futsal, além de uma escola de ensino fundamental em período integral para crianças residentes da região, com ensino do futebol no período vespertino (DISCURSO DE..., 2019). A criação do Conselho de Craques é outra medida do presidente para reunir novas lideranças para a administração do futebol brasileiro. Além do diretor de desenvolvimento de futebol, Juninho Paulista, Cafu, Ricardo Rocha, Jairzinho, Careca, , , Zinho, Gilberto Silva, e as ex-jogadoras da seleção feminina Pretinha e Michael Jackson foram o conselho que “será um órgão consultivo técnico e independente. [...] vai analisar e repensar, com profundidade, todas as áreas do futebol, com o objetivo de melhorar as práticas e as normas do esporte no Brasil” (DISCURSO DE..., 2019). Além de ressaltar a presença do árbitro de vídeo em todas as partidas do Brasileirão daquele ano, investimento integral da CBF, e anunciar a – jogo entre os campeões da Copa do Brasil e do Brasileirão –, anunciou também André Jardine, ex-técnico vitorioso da base do São Paulo para a direção técnica da seleção sub-20 (que foi recentemente eliminada na fase de grupos) e para a seleção olímpica, a sub-23, que já trabalha ao lado de na seleção principal. Continuou apresentando a renovada camisa branca, uma homenagem aos 100 anos da primeira conquista de uma Copa América pelo Brasil, e divulgou o brasão reformado da CBF. A mudança de marca, vigente a partir de 2020, foi motivada pela “busca permanente pela evolução e pela inovação. Refletir, com modernidade, os novos conceitos de aplicação visual de cores e nuances. Uma nova marca para novas mídias e novos tempos. Nosso compromisso é fazer com que a nossa marca reflita a melhor brasilidade” (DISCURSO DE..., 2019). 90

Rogério Caboclo é advogado de 46 anos e tem seu mandato até 2023; aos 28 anos já compunha a gestão do São Paulo Futebol Clube e passou treze anos na Federação Paulista de Futebol (FPF) em diferentes diretorias. Seu pai também foi dirigente do time do Morumbi. Foi apadrinhado por Marco Polo Del Nero, que presidiu da FPF nos mesmos anos que Caboclo estava lá (LEITE, 2019). Juca Kfouri projeta que a gestão seja “mais do mesmo, com investimento maior em marketing para aparentar o que não é”71; de fato, há uma grande preocupação do dirigente em cortar arestas e promover uma imagem impecável da seleção brasileira e da CBF. Para anunciar a remodelada camisa branca, Vinícius Jr. foi o escolhido, jogador do Real Madrid de 18 anos, promessa do Flamengo vendida por 45 milhões de euros. A preocupação com as novas mídias, as mídias digitais, levaram a remodelação do brasão da CBF. A criação de um conselho com grandes nomes do futebol, alguns ligados à Confederação há tempos, como Parreira, e outros recentemente ocupando lugar de opinião no futebol, como Muricy Ramalho, ex-jogador e técnico aposentado, hoje comentarista de televisão, atrai grande atenção para uma ideia de diálogo na CBF. Romário aponta que

o discurso de posse de Caboclo tenta passar uma imagem de modernidade administrativa [e] [...] há de fato alguns avanços operacionais, mas que se sustentam no mesmo modus operandi de sempre: ‘compra’ do apoio político das federações e enfraquecimento dos clubes.72

Numa tentativa frustrada, o senador Romário (PODE-RJ) quis barrar a posse de Caboclo na presidência da CBF. Na avaliação de Kfouri, “O senador dá murro em ponta de faca. Não havia a menor possibilidade de sucesso e ele sabe disso”73. A primeira tentativa de impugnação foi no Ministério Público do estado do Rio de Janeiro, que se apresentou incapaz de manifestação sobre o caso; mesmo com sede na capital do estado, a CBF responde por uma organização de importância nacional. A segunda foi no Ministério Público Federal (ALMEIDA; PERRONE, 2019). Sem tempo hábil, Caboclo tomou posse da presidência da CBF na terça-feira, 9 de abril de 2019. Em uma rede social, Romário dividiu seu repúdio ao presidente da Confederação:

Rogério Caboclo é a continuidade das últimas gestões, que foram marcadas por acusações de corrupção, prisão e banimento do esporte. O “novo presidente” foi diretor financeiro da CBF nas gestões do José Maria Marin e do Marco Polo Del Nero, além de diretor executivo do Comitê Organizador Local (COL) da Copa do Mundo (2014). [...] Para

71 Entrevista concedida à autora em 11 de abril de 2019, via e-mail. 72 Entrevista concedida à autora em 6 de maio de 2019, via e-mail. 73 Entrevista concedida à autora em 11 de abril de 2019, via e-mail. 91

se ter noção. Agora há pouco um jornalista noticiou que declinaram do convite da posse de Caboclo, o presidente Bolsonaro; os presidentes do Senado e da Câmara, Davi Alcolumbre e Rodrigo Maia; a procuradora- geral, Raquel Dodge; o presidente do STF, Dias Toffoli; além de outras autoridades, assim como representantes dos patrocinadores. Ninguém quer ter sua imagem vinculada a entidade. O esporte perde com isso.74

Entretanto, no dia seguinte à sua posse e acompanhado do presidente da Fifa, Gianni Infantino, Caboclo foi recebido pelo presidente Jair Bolsonaro no Palácio do Planalto. Siqueira (2019) avalia a mudança gradual do presidente da CBF, de “controlador do fluxo de dinheiro e das práticas empresariais da entidade” à político desenvolto com discurso de posse de mais de 30 minutos e bom articulador entre a CBF, as federações estaduais e a CONMEBOL. A articulação política da entidade máxima do futebol brasileiro era responsabilidade de Walter Feldman, secretário-geral: O instinto apaziguador e a oratória envolvente desse médico que foi político profissional por décadas não demandavam de Caboclo uma exposição grande. Quando era necessário negociar posições dos clubes em determinados assuntos, Feldman intervia. Se o tema era Fifa, como a liberação do fundo de legado, o secretário-geral tentava costurar. Até que o bloco político liderado por Del Nero enxergou em Caboclo um potencial sucessor (SIQUEIRA, 2019).

Esta aproximação se iniciou no final de 2018, na entrega da taça ao Palmeiras pelo Campeonato Brasileiro, no dia 2 de dezembro daquele ano. Convidado pela CBF a premiar o time campeão, Jair Bolsonaro, Rogério Caboclo e Coronel Nunes posaram juntos com o esquadrão do Palmeiras. O então diretor executivo comemorou o encontro entre a Confederação e o presidente eleito, cujo discurso de moralidade e anticorrupção foi bastante enfático durante a campanha (GARCIA; RANGEL, 2019). Mais recentemente, Bolsonaro, que compareceu com frequência nos estádios em 2019 para assistir jogos do Campeonato Brasileiro e da Copa América sediada no Brasil, oficializou o bom relacionamento diplomático entre o executivo e a CBF, entregando a homenagem de Dia Nacional do Futebol, a ser comemorado todo 19 de julho. A aproximação entre a organização e o presidente não existia desde o final do governo Lula (2002-2010). Walter Feldman, secretário-geral da Confederação, ex-vereador e ex-deputado que pulou do PSDB para o PSB e ajudou a fundar a REDE, comentou que “o Governo, através do próprio presidente, homenageia instituições como a CBF. Um tratamento exemplar, mostrando que a boa relação institucional pode fazer tudo para que o futebol brasileiro seja cada vez maior” (PIRES, 2019).

74 Parte de legenda de foto postada na conta oficial do senador Romário no Instagram em 10/04/2019. Disponível em: . Acesso em: 13 abr. 2019. 92

Esta aproximação com a presidência da República é especialmente importante para a CBF, após a renovação de 85% do Senado Federal75 e de 48% da Câmara dos Deputados76. Na opinião do senador Romário, a bancada da bola perdeu força, mas ainda há quem defenda os processos duvidosos da CBF nas casas legislativas:

A bancada da bola, ou da CBF, desidratou nas últimas eleições, com a saída de Vicente Cândido, Marcus Vicente (dois integrantes formais da entidade), Zezé Perrella e Romero Jucá. Mas ainda há nomes de peso que trabalham pela Confederação, casos de Marcelo Aro (outro diretor), José Rocha, Renan Calheiros e Ciro Nogueira.77

O exemplo mais recente da renovação da estrutura política da CBF ilustra o projeto feito por João Havelange e permeado ao longo de muitas gestões. Clarifica-se que as gestões da CBF estabeleceram um habitus, uma disposição duradoura das práticas sociais que embasam as políticas e econômicas da organização. Segundo Bourdieu (2017, pp. 162-163),

o habitus é [...] princípio gerador de práticas objetivamente classificáveis e, ao mesmo tempo, sistema de classificação [...] de tais práticas. Na relação entre duas capacidades que definem o habitus, ou seja, capacidade de produzir práticas e obras classificáveis, além da capacidade de diferenciar e de apreciar essas práticas e esses produtos [...], é que se constitui o mundo social representado [...]. [...] o habitus, enquanto disposição geral e transponível, realiza uma aplicação sistemática e universal, estendida para além dos limites do que foi com que o conjunto das práticas de um agente – ou do conjunto dos agentes que são o produto de condições semelhantes – são sistemáticas por serem o produto da aplicação de esquemas idênticos [...] e, ao mesmo tempo, sistematicamente distintas das práticas constitutivas de um outro estilo de vida.78

O habitus da Confederação permite, sem que seja necessária a presença de uma figura específica, a manutenção deste, como se vê na CPI do Futebol. Os cartolas estavam presos, sob investigação no Brasil, nos Estados Unidos, na Suíça; havia certa desarticulação política, considerando os eventos da época. E mesmo assim, após todos os esforços, se mantém a forma de conduzir a CBF.

75 ELEIÇÕES: SENADO tem maior renovação da sua história. Senado. 08/10/2018. Disponível em: . Acesso em: 3 dez. 2019. 76 CÂMARA TEM 243 deputados novos e renovação de 47,3%. Câmara dos Deputados 08/10/2018. Disponível em: . Acesso em: 3 dez. 2019. 77 Entrevista concedida à autora em 11 de abril de 2019, via e-mail. 78 Grifos originais do autor. 93

Ao ser questionado sobre uma renovação de verdade, e principalmente se há possibilidade de pleitear a liderança da Confederação, o senador Romário79 descreveu pontos genéricos para melhora no futebol brasileiro, mas descartou entrar na briga da presidência da CBF por estar comprometido com seus compromissos políticos e ressaltou a impossibilidade de aponto das federações e clubes, necessárias para lançar uma candidatura.

Como ex-jogador que conheceu os bastidores do futebol e conviveu em clubes brasileiros e no exterior, acredito que tenha boa contribuição a dar para a melhoria desse esporte, na gestão, na dinamização das competições e, principalmente, no fim da corrupção que se instalou nas décadas na CBF. Porém, desde 2011 estou político e tenho compromisso no Senado Federal até 2022. Ainda assim, mesmo fora do Congresso, há um empecilho para que eu me candidate à CBF, como qualquer outra pessoa fora dos quadros da entidade, pois o seu estatuto exige que o candidato apresente o apoio de oito federações e cinco clubes no ato da inscrição de chapas. Como se sabe, a CBF paga mesada aos presidentes das federações, espécie de “mensalinho” para manter a fidelidade dos cartolas estaduais. Segundo a imprensa, atualmente são repassados R$ 75 mil mensais a cada federação, para as suas despesas administrativas, e mais R$ 25 mil como verba de representação para cada um dos presidentes. Como um candidato fora dessa estrutura pode derrotar o candidato oficial? É por isso que a CBF se tornou uma espécie de “ação entre amigos”, cujos presidentes se sucedem sem perder a influência no esquema revelado pela CPI.80

Desse modo, o habitus da Confederação Brasileira de Futebol e as federações estaduais têm se perpetuado, afundando o futebol nacional e vendendo a seleção principal para garantir a manutenção da estrutura patrimonialista instaurada durante os anos. Os relatórios desenvolvidos a partir da apuração dos fatos pela CPI do Futebol em 2015 apresentam resultado díspar que, em última instância, pintam a bancada da bola e a frustrada tentativa de transformação do futebol. A legislação supostamente modernizante que vem sendo feita desde a década de 1990 não é suficiente para desgastar os processos e manobras das organizações gestoras do futebol brasileiro. A aura mágica do futebol brasileiro jogado em noventa minutos – se é que isso ainda existe – transcende o gramado e se transforma na aura traiçoeira dos esquemas da CBF, das federações, dos clubes e da política. Os relatórios da CPI de 2015, tanto o aprovado quanto o descartado, refletem a conjuntura com maestria.

79 Entrevista concedida à autora em 11 de abril de 2019, via e-mail. 80 Grifos feitos pela autora. 94

3 ...OS RELATÓRIOS SÃO A CONTA A PAGAR

Lembro-me que toda tarde meu avô, são-paulino e bonachão, tomava café num boteco numa esquina perto da sua floricultura. Certa vez, eu perguntei o que era o papelzinho que fica de baixo do pires: “É a conta”. Foi a primeira vez, com uns cinco anos de idade, que percebi que aquilo que se pagava num restaurante tinha um preço. Quase vinte anos depois, conversando com um garçom em Cascais, em Portugal, soube que seu chefe ganhou muito dinheiro de seus clientes no século passado somando o garrancho da conta com a data daquele dia. “Ninguém sabia o que estava escrito, se não soubesse quantos itens havia pedido, o cliente não saberia que o primeiro valor era a data”, ele contou, dando risada. Se no boteco da esquisa meu avô pagava o mesmo valor todos os dias pelo café que tomava à tarde – e mesmo assim vinha a comanda –, o chefe do garçom em Cascais somava todos os dias um número novo para ganhar centavos dos clientes desatentos. Se a CPI do Futebol terminou em pizza, vieram duas comandas a pagar: uma, seguiu a risca o pedido do cliente, a outra, adicionou algo a mais. Mas, quem fez o pedido e pagou a conta? O Gráfico 10 demonstra quantitativamente a presença dos senadores titulares e suplentes nas vinte e seis reuniões da CPI do Futebol. A partir da listagem final dos componentes da Comissão e a descrição de presença nas atas das reuniões, verificou-se que apenas cinco senadores tem presença maior do que ausência – o presidente, Romário (PSB-RJ), o vice- presidente, Paulo Bauer (PSDB-SC), o relator, Romero Jucá (PMDB-RR), e os titulares Wellington Fagundes (PT-MT) e Zezé Perrella (PDT-MG); os senadores Ciro Nogueira (PP- PI) e Omar Aziz (PSB-AM) faltaram o mesmo número de reuniões que estiveram presentes. Todos os outros senadores estiveram ausentes a maior parte das reuniões, com destaque ao senador Fernando Collor de Mello (PTC-AL), titular da Comissão, que esteve presente apenas em uma reunião, assim como o senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), suplente na CPI, seguido dos senadores titulares Gladson Cameli (PP-AC), com seis presenças e João Alberto Souza, com sete. Se avaliado qualitativamente, pela amostra das atas anteiormente apresentadas neste capítulo, mesmo com dezesseis ausências e dez presenças, vê-se que o senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP), suplente na Comissão, teve papel determinante para a produção do relatório junto com o presidente e empenhou-se contrario à bancada da bola. Paulo Bauer (PSDB-SC), com dezoito presenças, durante as reuniões apresentou pouco, mesmo que em seu livro (2017), o senador Romário tenha agradecido enormemente o trabalho do colega na CPI. 95

O relator, senador Romero Jucá (PMDB-RR) faltou nove vezes nas reuniões e, na grande parte, o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) relatou em seu lugar – quem esteve presente em dez reuniões. GRÁFICO 10 Relação presença e ausência dos senadores nas reuniões da CPI do Futebol (2015)

Ciro Nogueira (PP-PI) Davi Alcolumbre (DEM-AP) Donizete Nogueira (PT-TO) Eunício Oliveira (PMDB-CE)* Fernando Collor (PTC-AL) Gladson Cameli (PP-AC) Hélio José (PMDB-DF)* Humberto Costa (PT-PE)* João Alberto Souza (PMDB-MA) Omar Aziz (PSB-AM) Paulo Bauer (PSDB-SC) Randolfe Rodrigues (REDE-AP)* Roberto Rocha (PSB-MA)* Romário (PSB-RJ) Romero Jucá (PMDB-RR) Wellington Fagundes (PT-MT) Zezé Perrella (PDT-MG) 0 5 10 15 20 25 30

Reuniões ausente Reuniões presente

*: senadores suplentes. Gráfico produzido pela autora. Fonte: Atas – CPI do Futebol (2015). Ver Referências bibliográficas. O Plano de Trabalho aprovado para a CPI do Futebol (2015), em 11 de agosto, previa que a comissão objetivou

investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL), em especial, quanto a possíveis irregularidades em contratos feitos para a realização de partidas da seleção brasileira e de campeonatos organizados pela CBF, assim como para a realização da Copa das Confederações Fifa 2013 e da Copa do Mundo Fifa 2014 (2015, p. 1) e teve como fatores considerados motivadores à instauração da comissão “a prisão do então vice-presidente da CBF, José Maria Marin”, “o suposto recebimento de propina de empresas de marketing para a realização de campeonatos no valor de [...] US$ 150 milhões”, as “denúncias de cessão de direitos de transmissão da Copa do Brasil envolvendo uma empresa de material esportivo americana”, os “subornos pagos por executivos de marketing esportivo relacionados à comercialização de direitos de mídia e marketing de diversas partidas da seleção brasileira e de torneios organizados pela entidade” e as “suspeitas de suborno envolvendo 96

contratos assinados para a realização da Copa das Confederações Fifa 2013 e da Copa do Mundo Fifa 2014” (2015, pp. 1 – 2). Ao ser observado o objetivo primário, propôs-se como objetivos secundários (1) o esclarecimento sobre a organização e funcionamento das federações estaduais do futebol, (2) o conhecimento da realidade financeira dos clubes brasileiros, (3) e das ponderações sobre o futebol por parte dos atletas, (4) treinadores e (5) árbitros, o convite de (6) Pelé e (7) Zico para comentarem sobre os intuitos de modernização do esporte nos anos 1990, (8) a discussão dos paradigmas da CBF sobre a gestão da seleção brasileira e (9) as controvérsias sobre a Copa do Mundo de 2014, ouvindo, a convite, (10) Ricardo Teixeira, ex-presidente da Confederação, e (11) Marco Polo Del Nero, à época presidente daquela (2015, pp. 3 – 8) culminando na redação de um relatório final. A avaliação dos objetivos primário e secundários realizar-se-á pelo contraste de ambos relatórios apresentados ao final da CPI, assim como as notas taquigráficas das sessões realizadas. Percebe-se, de antemão, que o relatório aprovado e relatado pelo senador Romero Jucá é incoerente com o objetivo primário e provoca direcionamento para a proposição de soluções para os problemas recorrentes da gestão do futebol brasileiro, abrindo mão de questionar a estrutura política do esporte na CBF e nas federações. De outra forma, o relatório produzido pelo presidente da Comissão, senador Romário (PSB-RJ), que se aprofunda nas provas sobre ilicitudes cometidas pela CBF e seus dirigentes, demonstra irreais expectativas sobre o poder realizador e de concretização de uma comissão parlamentar, em grande parte explicitadas pelo ex-jogador em seu livro relato do período (2017). Desse modo, reconsiderando a proposição do início do capítulo anterior, ambos relatórios apresentam validade expressiva e avessa para o futebol brasileiro. Após a publicação do relatório, vê-se tímida mudança em alguns aspectos da gestão de seleções, principalmente pela valorização do futebol feminino a partir de 2019 e das competições das categorias de base. A própria iniciativa de mudança da legislação sobre o modelo de gestão dos clubes brasileiros pela Câmara e pelo Senado (ver Tabela 3) também atende pedidos do relatório final. A ressalva que se faz, considerando o apresentado nos capítulos anteriores e o relatório paralelo da CPI a ser discutido, é que as propostas e mudanças dos últimos anos são superficiais quando se percebe a estrutura patrimonialista e corrupta da CBF e das federações. Para explicar as ponderações brevemente apresentadas nos parágrafos anteriores, opta-se em apresentar resumidamente o conteúdo de ambos relatórios para que, com auxílio das notas taquigráficas, discuta-se os caminhos tomados e concretização das recomendações, encaminhamentos e proposições legislativas dos relatórios. Não se pretende, de todo modo, recontar ou reproduzir 97

todos os fatos das reuniões, depoimentos, material recebido pela CPI e relatórios, e sim demonstrar a dinâmica instituída durante o período de vigência da Comissão e tentar apreciar o desenvolvimento decorrente da finalização dos trabalhos parlamentares. O relatório aprovado, de autoria do senador Romero Jucá, explicita o distanciamento de qualquer caráter fiscalizador por parte da Comissão. De modo geral, trata sobre os problemas do esporte, a estrutura autônoma das instituições desportivas brasileiras, o clube-empresa, os modelos de gestão europeus e as boas práticas de gestão, revisão dos aparelhos legais vigentes, apresentação e discussão dos crimes cometidos pela CBF e larga discussão sobre violência nos estádios e revisão do Estatuto do Torcedor. Conclui-se pela recomendação relativa aos tópicos discutidos no relatório, majoritariamente sobre gestão do futebol por parte dos clubes e da CBF, quando se trata da organização de campeonatos e da condição do atleta, além da apresentação de falhas legislativas sobre a punição de crimes de lavagem de dinheiro e reformulação do Estatuto do Torcedor. Não pede indiciamentos e encaminha o relatório para a Confederação Brasileira de Futebol, o Ministério dos Esportes, o Ministério Público Federal, a Controladoria- Geral da União, a Receita Federal, o Conselho de Atividades Financeiras (COAF), o Banco Central, a Polícia Federal e a Comissão de Juristas do Senado Federal. O relatório apresentado pelo senador Romário é mais extenso e detalhista do que o anteriormente descrito, e tem tom militante e literário. Faz-se longo apanhado histórico, discute- se com certa profundidade o Fifagate e demonstra em cinco categorias como a CBF agia ilicitamente, assim como aprofundada discussão sobre os achados da Operação Durkheim, da Polícia Federal, que envolveu dirigentes da Confederação e empresários ligados às suas atividades. Ademais, contrasta-se a legislação vigente à época da Copa do Mundo Fifa de 2014 e as práticas do Comitê Organizador Local (COL). As recomendações são diversas e abrangem a maior parte das questões problemáticas e ambíguas do futebol brasileiro; pede indiciamento de nove dirigentes da CBF, empresários e partes interessadas e endereça, para continuidade da investigação, o relatório ao Ministério Público Federal, a Procuradoria-Geral da União e o Comitê de Ética da Fifa.

3.1 COMENTÁRIOS SOBRE AS REUNIÕES Ficou definido na primeira reunião da Comissão, no dia 14 de julho de 2015, que esta seria presidida pelo senador Romário, então no PSB do Rio de Janeiro, e relatada pelo senador Romero Jucá do PMDB de Roraima que, ao aceitar o convite da relatoria, remontou a fórmula proposta por Bellos (2001, p. 322) e Jennings (2014, p. 45) descritas no capítulo 2, afirmando que 98

a ‘ponta do iceberg’ são os resultados que tem envergonhado o País: é o 7x1, é essa questão agora da Copa América81. Tudo isso tem nos envergonhado, mas isso é consequência de todo um processo de corrosão, de todo um processo de problemas em cima de problemas que redundam, efetivamente, na desvalorização da estrutura do futebol e, consequentemente, desestruturando a estrutura do futebol, se desestrutura o próprio futebol e o resultado.82

Na passagem, o relator deixa claro que há profundo incômodo com o desempenho ruim da seleção brasileira na Copa do Mundo de 2014 no Brasil no ano anterior e a Copa América, evento recente à reunião parlamentar, agregado às denúncias de corrupção e prisões dos dirigentes da CBF nos Estados Unidos. Mesmo que sem expressão literal no objetivo da Comissão, como apresentado no Plano de Trabalho, as goleadas e os maus jogos da seleção brasileira foram fatores determinantes para determinar pressão necessária, munido da comoção da opinião pública, para a investigação parlamentar. Na reunião seguinte, o presidente propõe quinze requerimentos para iniciar as investigações com depoimento dos envolvidos no Fifagate e autoridades as quais auxiliariam na investigação como membros do corpo profissional temporário da Comissão. O senador Donizete Nogueira83 (PT-TO) se opõe à votação dos requerimentos pois ainda não havia sido apresentado pelo relator o Plano de Trabalho e, em seguida, concorda o senador Omar Aziz (PSD-AM): “nós tínhamos que ter uma estratégia sobre o que nós vamos fazer na CPI para depois tomarmos a iniciativa de convidar, convocar pessoas”. Ele continua ressaltando os fatores que motivaram a instituição da Comissão e questiona a validade do requerimento apresentado, como Item 14 – “Requer sejam convidados os presidentes das entidades regionais de administração do desporto da modalidade futebol das 26 federações estaduais de futebol e da Federação Brasiliense de Futebol (FBF)” – pela falta de clareza dos objetivos da investigação sem o plano de trabalho. Explica também que o relator da CPI esteve ausente por ter “uma reunião marcada e atrasou, mas deve estar chegando” (o senador Romero Jucá consta como

81 Aqui o Senador refere-se sobre a eliminação considerada precoce e do desempenho abaixo do esperado da seleção brasileira da Copa América Centenário em 2015 nos Estados Unidos, edição comemorativa dos cem anos do campeonato continental, o mais antigo da história do futebol mundial. 82 Refere-se à página 3 da ata da 1ª reunião, realizada em 14 de julho de 2015, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 83 Divino Donizeti Borges Nogueira (PT-TO) é administrador e foi senador entre 2015, do dia da sua posse, até 12 de maio do ano seguinte como suplente da senadora e pecuarista Kátia Abreu (à época PMDB-TO, hoje PDT-TO), afastada do parlamento para estar à frente do Ministério da Agricultura no segundo mantado de Dilma Rousseff. 99

ausente na ata). O senador Ciro Nogueira (PP-PI) acompanha os colegas na exigência do Plano de Trabalho para que os requerimentos tenham validade para a condução dos trabalhos.84 O mesmo questionamento sobre o convite aos presidentes das 27 federações de futebol depois de aprovado por unanimidade foi realizado na terceira reunião, partindo agora dos senadores Davi Alcolumbre85 (DEM-AP) e Zezé Perrella (PDT-MG) sobre uma data para receber os dirigentes pelo número de convidados e relevância dos comentários. O senador Romero Jucá explica que, pela visibilidade que a CPI tomou junto à opinião pública, foi necessário atentar-se à questões para produzir proposições positivas ao futebol:

Qual era a minha ideia? Era chamar as federações para a gente conhecer os problemas dos Estados da base. Depois chamar os jogadores, chamar os clubes, para se ter uma visão geral. A partir daí, a gente vai ter informações. E eu acho que a gente pode chamar os jornalistas antes de chamar a CBF. Porque, na verdade, pelo que tenho acompanhado, as denúncias são muito mais em cima de questões da gestão da CBF do que mesmo da questão de clubes ou de federações estaduais.86

Mesmo com o distanciamento das questões de gestão dos clubes neste momento da CPI, o relatório aprovado tem diversos tópicos que interessam em maior grau o gestor dos clubes, em contraste à gestão das federações e Confederação, quando se apresenta o modelo de gestão europeu, a discussão sobre a legislação vigente e proposições sobre a pertinência do clube- empresa para o cenário brasileiro. De todo modo, nas proposições legislativas apresentadas no relatório, quando se trata da alteração da Lei nº 9.615 de 1998 (ver Tabela 2), o artigo que colocaria a obrigatoriedade da transformação em sociedade comercial ou retira a possibilidade de ser sociedade civil sem fins econômicos não é alterado (2015, pp. 253 – 260). Assim como o entrave para o convite dos presidentes das federações – os quais compareceram como convidados apenas os dirigentes da Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (FFERJ) e a Federação Mineira de Futebol (FMF) na 11ª reunião, enquanto os outros foram convocados à comparecer – houve discussão sobre a validade do requerimento 91/2015 apresentado na 10ª reunião de autoria do senador Romário, sobre o convite dos

84 Refere-se às páginas 7, 8 e 9 da ata da 2ª reunião, realizada em 4 de agosto de 2015, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 85 David Samuel Alcolumbre Tobelem (DEM-AM) foi eleito ao Senado Federal nas eleições gerais de 2014 e é o 67º Presidente da casa no biênio 2019-2020, antecedido por Eunício Oliveira (MDB-CE) que também compôs a CPI do Futebol. 86 Refere-se às páginas 7 e 8 da ata da 3ª reunião, realizada em 11 de agosto de 2015, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 100

presidentes dos clubes da série A do Campeonato Brasileiro. O autor do requerimento explica que “o [...] Relator tinha feito um requerimento sugerindo seis ou sete nomes de presidentes de Clubes. Eu estou [...] abrindo o leque para a possibilidade de a gente poder chamar um dos 20 presidentes dos clubes da primeira divisão”87. O senador João Alberto Souza88 (PMDB-MA) questiona a justificativa para o convite, e o presidente da CPI responde que são estes os detentores de grande interesse na discussão sobre a melhoria do futebol. O senador maranhense questiona se houve contato prévio com os dirigentes e se há interesse por parte deles de contribuir com a CPI. Com resposta negativa, o senador pontua a possibilidade de exposição negativa para os clubes. O senador Romário insiste em dizer que seria um convite aos dirigentes e, comicamente, os senadores repetem diversas vezes que se trata de uma participação voluntária:

O SR. JOÃO ALBERTO SOUZA (Bloco Maioria/PMDB - MA) – Mas eu quero que fique bem claro que ele vem se quiser vir. O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Convite é isso. Em princípio, é isso. O SR. JOÃO ALBERTO SOUZA (Bloco Maioria/PMDB - MA) – Está bom, se é um convite para vir apenas se quiser, se tiver alguma coisa a esclarecer... Não é isso? O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Não querer vir é um direito deles. Dependerá desta Comissão tomar outras providências ou não. O SR. JOÃO ALBERTO SOUZA (Bloco Maioria/PMDB - MA) – Está bem. Eu concordo, Presidente. O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Algum outro Senador? O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO) – Eu estava com essa dúvida, mas foi esclarecida. É convite. O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Claro. O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO) – Se ele quiser vir... O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Ampliar o convite, no mínimo, para todos os presidentes dos clubes.

87 Refere-se à página 2 da ata da 10ª reunião, realizada em 23 de setembro de 2015, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 88 João Alberto Souza (MDB-MA) é economista e cumpriu dois mandatos como Senador da República entre 1999 e 2007 e 2011 e 2019, não perseguindo a reeleição nas eleições gerais de 2018. É próximo do clã Sarney, foi presidente do Conselho de Ética da casa, votou contra a prisão de Delcídio Amaral (à época, PT-MS, hoje, PTB- MS) em 2015 , arquivou o pedido de cassação de Aécio Neves (PSDB-MG) e votou favoravelmente à manutenção do mandato do tucano em 2017. 101

O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO) – Agora ficou claro, Presidente. A dúvida foi esclarecida.89

Aquilo que se sobressai do diálogo é a necessidade de garantia da participação voluntária dos presidentes dos clubes, de forma bastante parecida com a discussão dos dirigentes das federações. As manobras da bancada da bola são repetitivas. Na 12ª reunião, o senador Romário propõe requerimento para convocar os presidentes das federações os quais não tinham comparecido pelo convite. Na ocasião, o mesmo senador João Alberto Souza (PMDB-MA) explicitou não entender sobre os requerimentos lidos e a serem votados em globo sobre a pertinência do requerimento de informações fiscais de Marco Polo Del Nero, das informações bancárias e fiscais da Zayad Empreendimentos e de sua responsável, assim como da D’Araújo Incorporação por não ter recebido a pauta e documentos que motivam os requerimentos. O senador Romário indica que os documentos foram distribuídos aos gabinetes no dia 5 de outubro de 2015, mas os senadores João Alberto Souza e Omar Aziz (PSD-AM) expressaram não ter recebido.90 Na mesma reunião, o senador Zezé Perrella (PDT-MG) expressa desagrado com o uso do termo convocação em detrimento à convite, argumentando que “não estamos fazendo aqui uma CPI dos clubes, é a CPI da CBF. [...] a palavra ‘convocar’ em si talvez dique parecendo que os clubes estão com explicações a dar”. O senador Romário argumenta que, por terem recusado o convite, torna-se pertinente convocar os dirigentes das federações.

O SR. JOÃO ALBERTO SOUZA (Bloco Maioria/PMDB - MA) – E declinaram por quê, Presidente? Eles afirmaram que foi o veto da Confederação? O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Alguns não responderam. E outros, como dizem in off, não puderam aparecer por forças maiores. O SR. OMAR AZIZ (Bloco Maioria/PSD - AM) – Sr. Presidente, eu tenho uma sugestão. Aqueles presidentes, independentemente de estarem presidindo um clube, que votaram na última eleição para presidente da CBF têm que ser convidados a vir à CPI. [...] O SR. OMAR AZIZ (Bloco Maioria/PSD - AM) – Aqueles que votaram são obrigados a vir aqui. Esses não têm que ser convidados, não. Presidente de federação que votou no presidente da CBF ou presidente de clube que votou no presidente da CBF não tem que ser convidado,

89 Grifos da autora. Refere-se à página 3 da ata da 10ª reunião, realizada em 23 de setembro de 2015, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 90 Refere-se à página 7 da ata da 12ª reunião, realizada em 7 de outubro de 2015, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 102

tem que ser convocado. As outras pessoas que não estão afins à eleição da entidade serão convidadas, porque eu acho que existe, Senador Zezé Perrella, uma diferença entre ser eleitor e votar e você ser um participante, como a maioria dos clubes da série C e D, que são participantes do campeonato brasileiro. Eles não têm responsabilidade nenhuma, nem ouvidos são pela CBF. Agora, presidente de federação que elegeu essa diretoria da CBF ou outras diretorias ou presidentes de clubes que são também corresponsáveis pela eleição do presidente têm que estar aqui, têm que discutir com a gente, sim. [...] O SR. ZEZE PERRELLA (Bloco Apoio Governo/PDT - MG) – Presidente Romário, deixe-me só complementar. Eu fiz a colocação porque eu não sabia que eles tinham declinado do convite. Era possivelmente para evitar algum tipo de constrangimento. Na época, como presidente de clube que fui, se eu recebo uma convocação, às vezes pode passar a impressão de que eu também estou sendo investigado. E isso, para o clube em si, não é bom. [...] Para mim, estava tudo correto, não tenho nenhuma preocupação com isso, mas não deixa de causar algum constrangimento para o dirigente, quando ele se vê, obviamente, investigado sem... Porque a CPI da época era uma CPI da Nike. [...] Mas acabou que causou um constrangimento, em termos de patrocínio e tudo o mais para os clubes, sabe? Por isso a minha preocupação. Obviamente, eu não estou querendo aqui proteger ninguém, e acho que é muito salutar que as pessoas venham aqui dar as suas explicações.91

Mais adiante, o motivo do declínio do convite volta a ser contestado pelo senador Ciro Nogueira (PP-PI):

O SR. CIRO NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PP - PI) – Eu tenho que me posicionar contra. Eu não vejo como essas pessoas podem ser convocadas sem ser votação nominal de um por um. Mas, se esse é o entendimento dessa Presidência, eu não entendo dessa forma e eu não vejo como essas pessoas, que não estão querendo vir, vão vir aqui para contribuir com o quê? O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Ah, terão muita contribuição... O SR. CIRO NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PP - PI) – Eu não vejo, se elas não estarão querendo prestar esses esclarecimentos. E V. Exª já as coloca de uma forma, Sr. Presidente, como se elas fossem investigadas. No fundo, o que vai acontecer é isso. O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Não, mas eu acabei de citar para V. Exª que elas serão testemunhas aqui. Na verdade, Senador, elas não estão vindo porque elas não querem. O SR. CIRO NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PP - PI) – E elas estão vindo pelo quê, Presidente?

91 Refere-se às páginas 11 e 12 da ata da 12ª reunião, realizada em 7 de outubro de 2015, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 103

O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Eu acabei de dizer para V. Exª. O que elas dizem para todos nós, que fazemos esse contato com eles, é que, por força maior, eles infelizmente não podem comparecer a esta Comissão. O SR. CIRO NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PP - PI) – Sim, Presidente, mas de qualquer forma, eles não vêm porque não querem. Ninguém está os impedindo de vir ou não vir, não é verdade? O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Na verdade é o seguinte: por exemplo, esses dois senhores que estão aqui ao nosso lado são presidentes de dois clubes que não fazem parte desse... Vamos citar...92

Na reunião, estavam presentes os então presidentes do São Paulo Futebol Clube, Carlos Miguel Aidar, e do Santos Futebol Clube, Modesto Roma Júnior. Ambos, quando questionados, refutaram a proposição do presidente da CPI sobre pressão por parte da CBF para declínio do convite. Carlos Miguel Aidar, quando questionado pelo senador Ciro Nogueira, afirmou categoricamente que não recebeu nenhum tipo de pressão para declinar o convite da Comissão; Modesto Roma Júnior explanou que

em momento algum, fui pressionado, instado a não vir ou qualquer coisa nesse sentido. Conversei diversas vezes, nesta semana, com o presidente da minha federação. Ele sabe normalmente que eu e o Presidente Aidar estamos aqui e, em momento algum, nenhuma, nenhuma pressão sofremos. Eu não sofri nada, nenhum "Não vá", "Cuidado", "Não fale", nada! Em momento algum, e este testemunho eu quero deixar a bem da verdade.93

Na 13ª reunião, responderam ao convite positivamente os então presidentes do Sport Club Corinthians, Roberto de Andrade, e do Clube de Regatas Vasco da Gama, Eurico Miranda. O deputado Andres Sanchez94 (PT-SP), que à época compunha a base do governo na Câmara dos Deputados, já havia sido presidente do Corinthians e foi razoavelmente presente nas reuniões

92 Refere-se à página 14 da ata da 12ª reunião, realizada em 7 de outubro de 2015, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 93 Refere-se às páginas 15 e 22 da ata da 12ª reunião, realizada em 7 de outubro de 2015, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 94 Andres Navarro Sanchez (PT-SP) é empresário e dirigente de futebol, cumprindo um único mandato como deputado federal entre 2015 e 2019. Foi convido especial do Senado para comparecer às sessões da CPI do Futebol. Foi presidente do Sport Club Corinthians entre 2007 e 2011 e eleito novamente em 2018, sobrepondo seu mandato como deputado durante um ano com a presidência do clube. Em 2014, foi denunciado pelo Ministério Público Federal por evasão e sonegação fiscal e em 2017 foi citado no esquema de corrupção envolvendo a construção da Arena Corinthians pela construtora Odebrecht. Sanchez teria recebido R$ 2,5 milhões em caixa dois; o Procurador- Geral da República Rodrigo Janot pediu abertura de inquérito no âmbito da Operação Lava Jato. Próximo de Ricardo Teixeira, foi um dos responsáveis por enfraquecer o Clube dos 13, opondo-se ao falecido presidente do São Paulo Futebol Clube Juvenal Juvêncio e apoiando a candidatura de Kléber Leite, sócio da Klefer, investigado e preso nos Estados Unidos na Fifagate. 104

da CPI desse período, questiona aos convidados sobre a suposta pressão da CBF para ausência na Comissão Parlamentar.

O SR. ANDRES SANCHEZ (PT - SP) – É só porque eu estive na última reunião aqui e foi muito debatido – eu tenho certeza de que o Vasco e o Corinthians jamais fizeram isso, mas queria perguntar –: a CBF, quando soube que vocês foram convidados a vir, ela pediu, ela exigiu, ela comentou alguma coisa para vocês não virem, para deixarem de vir, alguma coisa do gênero? Só por desencargo de consciência. O SR. ROBERTO DE ANDRADE – Não, comigo... O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Por favor, presidente. O SR. ROBERTO DE ANDRADE – Não, não. Com o Corinthians, de forma alguma, não houve manifestação nenhuma e também não teria nem por que, não é? O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Dr. Eurico? O SR. EURICO MIRANDA – Me pedir? Como se isso adiantasse alguma coisa! Eu já disse aqui que eu vim... A mim, não iam me pedir nada. Ninguém me pediu nada. [...]95

Retornando à 10ª reunião, o senador João Alberto Souza (PMDB-MA) faz declarações importantes que norteiam o perfil daqueles que compõe da bancada da bola. Explicita ser dirigente de futebol há mais de 30 anos. Como exposto no capítulo anterior, muitos dos componentes desta CPI tem ligação com a gestão do futebol brasileiro. Em sua fala, ainda tratando da convocação de dirigentes, opina que

o futebol brasileiro é um dos mais organizados do mundo. Daí essas conquistas sucessivas do Brasil. E quando saímos de uma Copa do Mundo em quarto lugar, achamos que fomos os grandes derrotados, porque nós já nos acostumamos a ser os primeiros. Eu estou aqui para colaborar. Eu acho que um convite às pessoas é interessante, porque elas vêm aqui dar o seu conhecimento para melhorarmos o nosso futebol, mas nós nos pautarmos por notícias de jornais? V. Exª me desculpe, Presidente, mas eu não aceito isso jamais se não houver uma comprovação.96

Em contrapartida, o senador Romário (PSB-RJ) responde que o futebol brasileiro é um dos mais desorganizados, que os dirigentes são todos ruins ou péssimos e que são irrefutáveis as

95 Grifo da autora. Refere-se à página 17 da ata da 13ª reunião, realizada em 14 de outubro de 2015, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 96 Refere-se às páginas 6 e 7 da ata da 10ª reunião, realizada em 23 de setembro de 2015, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 105

acusações noticiadas sobre os dirigentes da CBF. O senador maranhense, sentindo ofendido pela forma incisiva das afirmações repetitivas do presidente da Comissão ao referir-se a Marco Polo Del Nero como “ladrão”, “safado”, “desonesto” e “corrupto”, explicita a necessidade de imparcialidade na condução dos trabalhos da CPI, misturando papéis dos poderes Legislativo e Judiciário:

O SR. JOÃO ALBERTO SOUZA (Bloco Maioria/PMDB - MA) – Presidente, o senhor me desculpe – eu louvo V. Exª, já torci muito por V. Exª – ... [...] O SR. JOÃO ALBERTO SOUZA (Bloco Maioria/PMDB - MA) – ..., mas nós estamos na CPI. Somo juízes aqui. V. Exª não pode externar a opinião que está externando. O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Já externei. O SR. JOÃO ALBERTO SOUZA (Bloco Maioria/PMDB - MA) – Mas V. Exª, então... O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – É porque V. Exª vem aqui pela primeira vez, mas eu já externo isso desde que cheguei a Brasília. O SR. JOÃO ALBERTO SOUZA (Bloco Maioria/PMDB - MA) – Mas V. Exª não pode! Aqui, nesta CPI, V. Exª é juiz! Nós somos juízes! Nós vamos julgar, Presidente! V. Exª está extrapolando! Nenhum de nós aqui pode dar a opinião que V. Exª está dando! O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Todos podem dar sua opinião, sim. O SR. JOÃO ALBERTO SOUZA (Bloco Maioria/PMDB - MA) – Não, Presidente! O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Podemos, sim. O SR. JOÃO ALBERTO SOUZA (Bloco Maioria/PMDB - MA) – Nós vamos julgar! O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Isso não é opinião, não, Senador. O SR. JOÃO ALBERTO SOUZA (Bloco Maioria/PMDB - MA) – Com que isenção V. Exª vai julgar? [...] O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Eu respeito todas as opiniões que as pessoas têm, principalmente a de V. Exª, mas essa é realmente a minha opinião, é o que eu penso desde que esse senhor assumiu a CBF. Nada vai me fazer retirar essas palavras. O SR. JOÃO ALBERTO SOUZA (Bloco Maioria/PMDB - MA) – Então, V. Exª é suspeito para ser Presidente desta Comissão. O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – [...] Quero dizer a V. Exª que, independentemente do tempo em que eu estou aqui ou da minha idade, eu me sinto um verdadeiro representante e com total autonomia para estar onde estou. Com todo respeito a V. Exª e ao que o senhor pensa em relação às minhas atitudes e às minhas palavras, 106

eu chego em casa e vou dormir tranquilo quando boto a minha cabeça no travesseiro. Só para o senhor saber.97

Relevante observar a distorção dos procedimentos de uma Comissão Parlamentar que objetiva uma investigação. O senador João Alberto Souza (PMDB-MA) repetidas vezes coloca a necessidade de isenção pois os parlamentares ali presentes seriam responsáveis em julgar o ocorrido quando, na realidade, o objetivo é investigar o ocorrido e encaminhar as ponderações, conclusões, recomendações para os órgãos competentes – argumento do qual será usado pela bancada da bola para não indicar indiciamentos no relatório aprovado, apresentado mais adiante neste capítulo. Nas 14ª e 15ª reuniões, os presidentes das federações de quatorze estados comparecem à CPI e ponderam sobre diversos tópicos da gestão do futebol. Gestão dos clubes, das próprias federações, os campeonatos estaduais e a participação dos “clubes emergentes e sobreviventes” – como nomeado pelo presidente da Federação Cearense de Futebol (FCF), Mauro Carmélio Costa Júnior –, o legado da Copa do Mundo de 2014, a criação de ligas independentes, o relacionamento com a CBF que foram, em quase toda sua totalidade, pontos que foram discutidos no relatório aprovado pela CPI. A última reunião do ano de 2015 da Comissão contou com a presença do então presidente licenciado Marco Polo Del Nero. Em sua exposição inicial, apresenta medidas tomadas em sua gestão para minimizar, mitigar e melhorar a gestão do futebol brasileiro e, assegurado pelo senador Romário de que a CPI tinha como “objetivo [...] reorganizar o futebol e, principalmente, moralizá-lo”98 – expressão da qual é usada com frequência durante as reuniões por diversos parlamentares –, Del Nero respondeu de forma vazia, incoerente e marginal aos questionamentos referentes às acusações de ilicitudes da CBF e seus dirigentes. Na 19ª reunião, já em 17 de fevereiro de 2016, o senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP) – do qual teve participação imperceptível até o final do ano anterior – declarou sobre o ex-presidente da CBF: O Sr. Marco Polo Del Nero, no triste depoimento que prestou a esta CPI, não só não esclareceu nada, como aqui, diante dos Senadores, em vários momentos, faltou escandalosamente com a verdade. Isso contrasta, Sr. Presidente, com os dados que o senhor já apresentou aos

97 Grifos da autora. Refere-se às páginas 8 e 9 da ata da 10ª reunião, realizada em 23 de setembro de 2015, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 98 Grifos da autora. Refere-se às páginas 1 à 5 e 9 da ata da 18ª reunião, realizada em 16 de dezembro de 2015, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 107

membros desta CPI em reunião reservada, em reunião administrativa. Os dados e o que essa investigação já tem por onde avançar já provam que esta Comissão tem a necessidade de aprofundar as investigações, não somente em relação ao Sr. Del Nero, mas também em relação a todos aqueles que estabeleceram diálogo ou relação com o Sr. Del Nero.99

O pronunciamento do senador amapaense retifica o pedido do presidente da Comissão de prorrogação. O número de documentos recebidos, demonstrado pelo volume de anexos em ambos relatórios, aponta a densidade da investigação proposta pelo senador Romário. O tom da CPI do Futebol em 2016 foi bastante diferente do ano anterior. Mesmo considerando a influência negativa da CBF e das federações estatuais de futebol levantado por Romário em diversas oportunidades, havia cooperação por parte dos senadores na presença das reuniões, aprovação de requerimentos e questionamento dos convidados e testemunhas. Com o afastamento de Del Nero da presidência da CBF, o movimento da bancada da bola tornou-se mais contundente. A 21ª reunião, em 9 de março, teve número regimental suficiente para ser aberta, mas insuficiente para deliberação. A seguinte, em 16 de março, os oito requerimentos apresentados pelo senador Romário foram rejeitados. Todos deles diziam respeito à quebra de sigilo de dirigentes da CBF, pessoas envolvidas em esquemas de corrupção e documentos sigilosos do Comitê Organizador Local da Copa do Mundo de 2014. O relator da Comissão senador Romero Jucá (PMDB-RR), foi o proponente da invalidade dos requerimentos, afirmando que já havia sido rejeitado pelo Supremo Tribunal Federal quatro dos requerimentos sobre quebra de sigilo e documentação sigilosa e que as rejeições afetam negativamente o andamento da CPI.

O SR. ROMERO JUCÁ (PMDB - RR) – Sr. Presidente, eu quero, como Relator, explicar o que vou fazer, para que fique bem claro. Eu vou encaminhar contrariamente a esse requerimento e a todos os outros requerimentos por uma razão muito simples: nós já tivemos quatro decisões do Supremo Tribunal Federal rejeitando determinações tomadas aqui, no plenário, exatamente por falta de fundamentação, e acho que esta CPI não pode ficar exposta a esse tipo de questão. [...] O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) – Senador, eu gostaria que V. Exª dissesse para mim e para esta Comissão, por favor, quais foram os quatro que não foram aceitos. O SR. ROMERO JUCÁ (PMDB - RR) – Digo.

99 Refere-se às páginas 4 e 5 da ata da 19ª reunião, realizada em 17 de fevereiro de 2016, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 108

Mandado de Segurança nº 34.036. Rogério Caboclo, Diretor Executivo. Liminar deferida pela Ministra Rosa Weber suspendendo os efeitos do requerimento que aprovou a quebra do sigilo do Sr. Rogério Caboclo. Mandado de Segurança nº 33.750. Medida Cautelar. Ministro Marco Aurélio. Suspendendo os efeitos da aprovação do Requerimento nº 31, de 2015, no âmbito da CPI, destinado à obtenção de contratos relacionados a patrocínio e publicidade. Mandado de Segurança nº 33.772. Confederação Brasileira de Futebol. Ministro Marco Aurélio. Deferiu a liminar suspendendo a relação impetrante, os efeitos e a aprovação do Requerimento nº 43 da Comissão Parlamentar de Inquérito. Envio de dados relativos à movimentação de recursos financeiros da CBF. HC 133.341. Antônio Carlos Nunes de Lima, Presidente da CBF. Ministro Teori Zavascki. Deferiu para garantir ao paciente o direito de ser assistido por um advogado não obrigado a assinar termo. [...]100

Vê-se que os requerimentos foram rejeitados por três ministros diferentes e que interrompem um curso de investigação aprofundada na gestão da CBF, principalmente a que se referia àquela época, da qual Antônio Carlos Nunes de Lima, o Coronel Nunes, presidia a Confederação e Rogério Caboclo era diretor executivo de gestão (ver Tabela 7). A mesma reunião contou com a presença do Coronel Nunes, que diversas vezes não tratou de assuntos das gestões anteriores, afirmou não ter “nenhum fato concreto em [...] mãos que comprove corrupção na CBF”, reforçou ser presidente por apenas sessenta dias e leu documentos para argumentar em favor próprio e da Confederação – ato que fora proibido pelo presidente da CPI por desrespeitar o Regimento do Senado101. Os pronunciamentos no início da 24ª reunião do senador Romário (PSB-RJ) e do senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP) colocam às claras a insatisfação com os resultados da atuação da bancada da bola, mas principalmente evidenciam quão influente é a CBF e seus dirigentes. Primeiro, após abrir a reunião segundo o protocolo do Regimento, o presidente da CPI explica que havia sido informado no dia anterior de duas denúncias protocoladas no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar sobre sua atuação na Comissão. O senador, citando o art. 53 da Constituição Federal102, pede que o senador João Alberto Souza (PMDB-MA), na condição de presidente do Conselho de Ética, arquive as denúncias – ocorrido de fato em maio

100 Grifo da autora. Refere-se à página 3 da ata da 22ª reunião, realizada em 16 de março de 2016, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 101 Refere-se às páginas 9 a 12 da ata da 22ª reunião, realizada em 16 de março de 2016, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 102 Do art. 53 citado: “Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.” BRASIL, 1989. Ver Referências bibliográficas. 109

pela a Advocacia do Senado. Depois, Romário apresenta que vinte e sete requerimentos para quebra de sigilo foram aprovados na CPI e que, todas as vezes que o Supremo Tribunal Federal contestou as decisões, foram revertidas favoravelmente à quebra do sigilo. A exceção refere-se à quebra do sigilo do então diretor executivo de gestão e atual presidente da CBF, Rogério Caboclo, negada pela alegação de falta de acesso à justificativa do requerimento, mesmo sem pedido expresso à Secretaria da Comissão para acessar a documentação em inteiro teor103. Por fim, neste mesmo momento introdutório da reunião, o senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP) afirma que a Comissão “está sendo hoje vítima de um processo de boicote e sabotagem, porque não querem aprofundar as investigações e não querem que o Brasil tenha conhecimento do conjunto de documentos que já chegou a esta CPI.” Apresenta também que, se na 21ª reunião o relator, senador Romero Jucá (PMDB-RR), afirmou não haver justificativa para aprovar requerimentos de quebra de sigilo e convocação de dirigentes e outros ligados à CBF, agora existem, e pergunta:

[...] o que temem os membros da CPI que obstruem a investigação? Não dão quórum, sabotam a investigação, não querem que esta reunião ocorra e tome deliberações? Qual é o temor? Qual é o receio? Eu acrescento mais uma pergunta, [...]: por que tanto receio e temor de que venham a público as informações que esta CPI já tem? Temor que leva o todo-poderoso COI a querer intimidar, inclusive, o Congresso Nacional e os membros desta Comissão Parlamentar de Inquérito, tentando mover representações no Conselho de Ética ou na Procuradoria-Geral da República. Representações essas que nós dizemos aqui em alto e bom som, Romário, e você já destacou aqui no começo desta reunião: nós não só a refutamos como não a tememos. Não tememos nenhum dos coronéis que se apossaram e montaram no futebol brasileiro o maior esquema de corrupção de toda a história do nosso principal esporte nacional.104

Mais a diante na 24ª reunião, requerimentos para a convocação, na condição de testemunha, de Marco Polo Del Nero, Marco Polo Del Nero Filho, Wagner José Abrahão, Gustavo Dantas Feijó e Ricardo Teixeira foram aprovados. Todavia, não consta entre as atas das reuniões subsequentes a presença das testemunhas. A 25ª reunião ocorre no final de

103 Refere-se às páginas 2 e 3 da ata da 24ª reunião, realizada em 6 de abril de 2016, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 104 Refere-se às páginas 3 e 4 da ata da 24ª reunião, realizada em 6 de abril de 2016, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 110

novembro de 2016, enquanto a 24ª data 6 de abril do mesmo ano. A presença destas testemunhas, se ocorreu, foram durante reuniões administrativas e fechadas. Na penúltima reunião, a vigésima quinta, em 23 de novembro, foram apresentados os relatórios. Primeiro, o relator senador Romero Jucá (PMDB-RR) apresentou os pontos chave de seu texto, finalizado em abril, como informado e ressaltado por ele e pelo senador Romário (PSB-RJ). Considerando a data informada, se houveram reuniões fechadas e administrativas no período entre a 24ª e a 25ª reunião, as informações levantadas pelas testemunhas e documentos referentes aos requerimentos aprovados em abril provavelmente foram desconsideradas do relatório final. O principal argumento sobre o teor do relatório de autoria de Romero Jucá (PMDB-RR) é que

[...] a CPI investiga, mas a função do Congresso Nacional não é só investigar, senão, ia para a Polícia Federal. Então, nós investigamos, nós descobrimos os erros e propomos correção para que não aconteçam mais os crimes que são descobertos. Então, para nós não resolve só prender o José Maria Marin; resolve corrigir os erros do futebol brasileiro para que, efetivamente, essas coisas que aconteceram não aconteçam novamente.105

De certo, o argumento do relator é palpável e, como será considerado posteriormente neste capítulo, tal relatório contribui positivamente para novos caminhos da gestão do futebol, tanto por parte do Governo federal, quanto das instituições privadas que dão rumo para o esporte no Brasil. De toda forma, a grande crítica encabeçada pelos senadores Romário (PSB-RJ) e Randolfe Rodrigues (REDE-AP) é que o relatório aprovado não foi certeiro em apontar as ilicitudes que levaram a corrosão da gestão do futebol brasileiro e seus responsáveis. Na exposição do relatório paralelo, o senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP) critica o texto produzido pela relatoria pela omissão do caráter investigatório claro dos relatórios finais a serem produzidos pelas Comissões Parlamentares do gênero da discutida:

Em primeiro lugar, tivemos a inusitada situação de, no relatório ainda há pouco apresentado, não ter sido claramente dita a necessidade de investigar. “Investigar e indiciar, a rigor, são funções jurisdicionais que a nossa Lei Maior atribui a outros órgãos, mais capacitados e mais eficientes nessa tarefa.” Data venia, com a devida permissão de S. Exª, o Relator, discordo totalmente dessa afirmação. Todos aqui conhecem uma investigação de Comissão Parlamentar de Inquérito. Todos aqui sabem que a Comissão Parlamentar de Inquérito provoca a ação dos outros órgãos. Todos aqui sabem que a CPI, como

105 Refere-se à página 8 da ata da 25ª reunião, realizada em 23 de novembro de 2016, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 111

diz a Constituição, no seu art. 58106, tem poderes de investigação próprios de autoridades jurisdicionais.107

Outra crítica do coautor do relatório paralelo é tecida pelo contraste dos textos. Como apontado no início deste capítulo, o documento produzido por Romero Jucá (PMDB-RR) tem tom propositivo para a gestão do futebol brasileiro e falha imensamente quando se trata do objetivo primeiro de investigação das ilicitudes na CBF e no COL. Pelo contrário, Romário (PSB-RJ) e Randolfe (REDE-AP) se debruçam nesta seara e contribuem para identificar as formas pelas quais as ilicitudes foram realizadas e indicavam os responsáveis, propondo também melhorias ao futebol brasileiro, porém de forma menos extensa.

De um lado, temos um relatório chapa-branca, que apenas traz sugestões genéricas e indolores para a grave crise que se abate sobre o nosso esporte mais popular, sem investigação, sem relatos, sem crimes, sem qualquer sugestão de indiciamento. Do nosso lado, podemos afirmar que se trata de um documento produzido como resultado do trabalho desta CPI, que contou com a ajuda de alguns dos senhores e de uma equipe técnica competente e dedicada, a quem reiteramos, eu e o Senador Romário, aqui, os nossos mais sinceros agradecimentos. Neste relatório estão descritos, com riqueza de detalhes, diversos crimes e a forma como foram praticados, gerando prejuízos milionários, o que resultou na sugestão de indiciamento de nove investigados, entre eles os ex-presidentes da CBF Ricardo Teixeira e José Maria Marin e o atual presidente Marco Polo Del Nero. [...] Não falamos apenas de crimes. Avançamos também nas propostas para melhorar e modernizar a organização do futebol. As propostas deste relatório abrangem, por exemplo, a reformulação do Código Eleitoral da CBF; a criação de uma Liga Nacional e a autonomia da Justiça Desportiva.108

A afirmação acima do expositor do relatório paralelo, senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP), sobre o conteúdo genérico e indolor ao futebol é uma meia verdade. As proposições são válidas à gestão do futebol. O peso negativo está, de fato, na falta de expressão

106 Sobre o texto citado pelo senador do art. 58, faz-se respeito do § 3º: “As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.” BRASIL, 1989. Ver Referências bibliográficas. 107 Grifo da autora. Refere-se à página 9 da ata da 25ª reunião, realizada em 23 de novembro de 2016, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 108 Grifos da autora. Refere-se às páginas 9 e 10 da ata da 25ª reunião, realizada em 23 de novembro de 2016, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 112

e até irrelevância das ilicitudes cometidas pelos dirigentes da Confederação Brasileira de Futebol. Tanto que, na última reunião da CPI, na qual foi conduzida a votação para aprovação do relatório final e a prescrição do voto em separado do relatório paralelo, o presidente da CPI propôs que os relatórios se tornassem apenas um.

Antes de colocar o relatório em votação, gostaria de expor aqui uma ideia, colocar para o Relator, Senador Romero Jucá, e todos os Senadores presentes. Todos sabemos que foram feitos dois relatórios: o relatório do Senador Romero Jucá, que eu particularmente, como um relatório propositivo, considero que foi um relatório até muito interessante; e, por minha parte e por parte do Senador Randolfe Rodrigues, nós fizemos um relatório, vamos chamar, mais investigativo. E eu gostaria de pedir ao Senador e aos Senadores a possibilidade de juntarmos esse relatório que seria, na minha opinião e na opinião do Senador Randolfe Rodrigues, eu acredito, em geral, uma situação para uma melhora no nosso futebol ideal para o final desta CPI.109 O relator argumenta contrário a proposição, devido à alteração na Lei exposta no capítulo 2 pela Lei 13.367, de 5 de dezembro de 2016110, que expressa ao que se refere às proposições de um relatório final de uma Comissão Parlamentar e o encaminhamento dos documentos ao Ministério Público Federal e outros órgãos competentes para que haja a responsabilização civil e criminal de infratores.

Eu queria só fazer uma observação, que é a seguinte: recentemente, no dia 5 de dezembro, alteramos a Lei nº 13.367, que alterou a anacrônica lei das CPIs de 1952. Até então, a lei que regia as CPIs era uma lei de 1952. A nova lei [...], entre outras alterações, acrescentou um artigo, que é o art. 6º-A ao texto, estabelecendo expressamente que: "A Comissão Parlamentar de Inquérito encaminhará [o seu] relatório [final] [...], entre outros órgãos, ao Ministério Público [...], com cópia da documentação [levantada] [...], para que promovam [o Ministério Público Federal] a responsabilidade civil ou criminal [de quem quer que seja]." Portanto é precisamente o que faz esse relatório meu da CPI. Então, eu mantenho meu texto do relatório, todas as questões levantadas por V. Exª no relatório estão anexadas, vão com sigilo para o Ministério Público, a Receita Federal, o Coaf e o Banco Central. Qual é a diferença de um relatório para o outro? É que no meu relatório não estamos indiciando ninguém, nós estamos encaminhando ao Ministério Público

109 Refere-se às páginas 1 e 2 da ata da 26ª reunião, realizada em 7 de dezembro de 2016, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 110 A Lei 13.367, de 5 de dezembro de 2016, altera a Lei nº 1.579, de 18 de março de 1952, que dispõe sobre as Comissões Parlamentares de Inquérito. Brasília: Senado Federal, 2016. Disponível em: . Acesso em: 12 jan. 2020. 113

para que o Ministério Público entenda se deve indiciar ou não, de acordo com a nova lei.111

Vê-se que, os senadores Humberto Costa (PT-PE), Omar Aziz (PSD-AM) e Hélio José112 (PMDB-DF) reiteram que há possibilidade, assim como o senador Romário havia dito que o faria, de encaminhamento do texto de sua coautoria para os órgãos competentes. Ao contrário do que foi proposto pelo senador João Alberto Souza na 10ª reunião, quando criticou o posicionamento do presidente da CPI e afirmou que ali os senadores deveriam agir como juízes e com imparcialidade, nas últimas duas reuniões da Comissão, foi ressaltado que não era lugar dos senadores indiciar ninguém e que a investigação de nada servia caso não se concluísse em proposições para o cenário discutido. O movimento da bancada da bola de amenizar o caráter investigativo caminha devidamente para minimizar os possíveis danos à imagem da CBF que, consequentemente, com o passar dos meses de investigação, teve seus ocorridos noticiados em decréscimo (ver Apêndice 3).

3.2 COMENTÁRIOS SOBRE OS RELATÓRIOS Como apresentado no início deste capítulo, não se pretende reproduzir de maneira integral os relatórios produzidos na CPI do Futebol e breve resumo introduziu este texto. Torna- se interessante, todavia, ressaltar pontos dos quais, em contraste com as reuniões e falas ressaltadas no subcapítulo anterior, convergem ou destoam do objetivo da CPI, dos pronunciamentos dos parlamentares e com as manobras da bancada da bola. O relatório aprovado e relatado pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR) introduz quatro fatos motivadores para a os trabalhos da Comissão, somados ao objetivo apresentado no Plano de Trabalho: (1) a falta de investimento nas categorias de base; (2) o assédio extremado à privacidade de jogadores e o intermédio de terceiros; (3) a exportação precoce de talentos como recurso dos clubes de evitar ou minimizar o endividamento; e (4) a falta de melhores práticas de gestão e compliance (2016b, pp. 9 – 10). Tais fatores norteiam o caráter propositivo do relatório.

111 Grifo da autora. Refere-se à página 2 da ata da 26ª reunião, realizada em 7 de dezembro de 2016, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 112 Hélio José da Silva Lima é engenheiro e cumpriu um mandato como senador. Nas eleições gerais de 2018, pleiteou a Câmara dos Deputados pelo Partido Republicado da Ordem Social (PROS) pelo Distrito Federal. Foi nomeado como assistente parlamentar pelo presidente do Senado Davi Alcolumbre (DEM-AP) em 2019. 114

Para embasar a discussão proposta subsequentemente, o relatório contém breve revisão da legislação referente ao esporte (2016b, pp. 11 – 15) e da ênfase à autonomia prevista na Constituição Federal para as entidades organizadoras do esporte:

Os instrumentos normativos anteriores à Constituição de 1988 determinavam uma forte intervenção estatal no esporte. Com o fim do regime militar, a presença do Estado foi-se limitando às áreas que efetivamente demandavam essa tutela estatal. Assim, as entidades desportivas conquistaram importante autonomia, que lhes permitia organizarem-se sem que, nesse aspecto, o Estado pudesse intervir. (2016b, pp. 15 – 16)

O argumento apresentado, mesmo que limitado pelo jurista especialista em direito esportivo Álvaro Melo Filho (1995, p. 48 apud 2016b, p. 16) quando aponta que “autonomia não quer dizer anárquica inexistência de normas, nem significa independência e insubordinação às normas gerais fixadas na legislação desportiva [...]”, acaba por nortear o próprio conteúdo do relatório. O documento propõe sugestões para a modernização do futebol nos termos de sua gestão nos clubes e organização do calendário dos campeonatos (de responsabilidade da CBF), sobre a formação de atletas e incentivo às categorias de base e alterações legislativas sobre a definição de atleta profissional, o Estatuto do Torcedor nos termos da garantia da segurança e integridade do patrimônio e dos participantes dos eventos esportivos. As sugestões, que são indubitavelmente pertinentes e tornariam o futebol brasileiro mais bem organizado, mais saudável e bem atualizado, vão na contramão dos objetivos apresentados no Plano de Trabalho, principalmente o primário que dizia respeito à investigação de possíveis irregularidades de contratos da CBF sobre a realização das partidas da seleção principal e campeonatos organizados pela entidade, entre eles a Copa das Confederações em 2013 e a Copa do Mundo em 2014. De forma introdutória aos problemas do futebol brasileiro, tanto sobre organização, quanto sobre gestão, faz intensa comparação com o futebol europeu. Há intensa discussão sobre a extinção do passe e a proibição de intermédio de terceiro na negociação dos direitos de jogadores, principalmente por ser fator financeiramente impactante nas finanças dos clubes. Parte-se do princípio de que o investimento nas categorias de base é fundamental para a criação de uma cultura e estilo de jogo para a seleção principal – como a seleção alemã fez e resultou na conquista da Copa em 2014 –, igualmente a permanência de talentos no futebol brasileiro. Sobre este último apontamento, a má gestão dos clubes forçaria, como única opção, vender os jogadores no início de suas carreiras para a Europa e para a Ásia. E, como solução às questões de gestão dos clubes, sugere-se o clube-empresa. 115

Faz-se denso levantamento dos modelos de gestão em vários países da Europa, apontando o procedimento jurídico-legal, as principais características e vantagens do modelo. Para que seja possível a transição do atual modelo para o clube-empresa, discute-se a necessidade de alteração legislativa e é levantado que a frequente alteração desde a década de 1990 cria instabilidade e desmotiva a alteração voluntária da presença jurídico-estatutária dos clubes. Mais uma comparação europeia é sobre as práticas de boa governança que se pondera aplicáveis à variadas conjunturas: “(a) autonomia (nos limites previsto na lei); (b) democracia; (c) transparência; (d) assunção de responsabilidades no processo de tomada de decisão; e (e) inclusão da representatividade das partes interessadas” (2016b, p. 93). O 2007 White Paper on Sport, documento redigido pelo Conselho Europeu destaca “a autonomia das organizações desportivas das estruturas do deporto, assim como [...] a responsabilidade da gestão incumbe [...] aos organismos que tutelam o desporto e, em certa medida, ao Estado e seus parceiros sociais” (2016b, p. 91), considerando os aspectos econômicos e o fluxo financeiro envolvendo a transferência de jogadores e suas intermediações, o sistema de licenciamento de clubes e os direitos de transmissão dos eventos esportivos (2016b, p. 92). Ainda tomando como modelo o futebol europeu, estudou-se as práticas de governança e fair-play financeiro da UEFA, que foi implementado na década de 1990. Atesta-se os efeitos da implantação “foram a redução expressiva de litígios em relação a débitos [...] e o incremento do grau de transparência financeira”, auditadas conforme normas internacionais. Quanto ao fair-play financeiro, foi efetivado em 2011 e a partir de 2013 obrigatório para todos os clubes, os quais devem “respeitar uma gestão equilibrada em break-even, que pressupõe não gastar mais do que o disponível, restringindo a acumulação de dívidas” (2016b, p. 114). Conclui-se que o modelo fomentado pela UEFA pode ser usado para formatar os preceitos de boa governança no futebol brasileiro. Todavia, importante ressaltar que os apontamentos beiram o obvio de uma gestão responsável e só tem validade se a organização que a impõe tem poder simbólico e efetivo para cercear os clubes que não cumprirem a cartilha. Nesta toada, em 2016 a Fifa apresentou mudanças para boa governança (2016b, pp. 116 – 117), considerada na leitura do relatório “reativa aos recentes escândalos. A entidade internacional de futebol é a maior interessada em manter os padrões de governança em alto nível, sob o risco de afugentar recursos de investidores e perder espaço no cenário internacional” (2016b, p. 118). Levando em consideração os depoimentos de Marco Polo Del Nero, na 18ª reunião da CPI do Futebol, e a de Coronel Nunes, na 22ª reunião, foi apresentado mudanças e dispositivos para melhor governança. No relatório de Jucá (PMDB-RR), o depoimento de Del Nero 116

esclarece o suficiente sobre “questões referentes às investigações em curso”, sem mencioná- las. O dirigente teria apresentado que desde o início de seu mandato propôs a “modernização do futebol”, “com destaque para a adoção do programa de Governança, Risco e Conformidade”, em parceria com a Ernest & Young, da qual concretizou-se no Código de Ética da CBF (ver Tabela 8) (2016b, p. 118). Citam-se outras medidas: (1) criação de um portal da transparência; (2) a limitação do mandato presidencial para quatro anos com possibilidade de única reeleição; (3) a realização de seminários; (4) a criação do Centro de Estudos Avançados do Futebol; (5) a implantação de plano de saúde vitalício para jogadores campeões mundiais; (6) a realização de um estudo para plano de previdência para jogadores e árbitros (2016b, pp. 118 – 119). O depoimento do Coronel Nunes, seguindo a linha deste relatório, foi importante para ressaltar a “continuidade àquilo que já havia sido programado”, com a instituição do Comitê de Reformas para as alterações competentes visando “a transparência, a organização, a modernização, a gestão e a melhoria do próprio sistema, incluindo a reforma do Estatuto da CBF e a implementação do Código de Ética e do Comitê Disciplinar do Futebol” (2016b, pp. 119 – 120). Sendo assim, o relatório conclui que “a lei já oferece as diretrizes gerais, cabendo aos clubes, federações e confederação internalizarem os procedimentos e adotarem as melhores práticas disponíveis hoje no mundo” (2016b, p. 122). Importante ressaltar aquilo apresentado no início sobre a autonomia das organizações do esporte, segundo Álvaro Melo Filho (1995, 2006), descrito no tópico 2.1, Autonomia das entidades desportivas no Brasil (2016b, p. 15). O jurista citado também participa do Comitê de Reformas, comissão anunciada pelo então presidente da CBF, Coronel Nunes113. Nota-se que o relatório faz longas retomadas teóricas, históricas e conjunturais, mesmo que defasadas e fluídas quando se trata de questões chave da delimitação dos problemas de gestão do futebol brasileiro. Ilustra-se, no tópico 1.2, Fatos motivadores:

Para que se mude algo, primeiramente é necessário identificar-se o que há de errado, para que depois sejam encontradas as soluções. No caso de nosso futebol, não é tão simples a tarefa de identificação dos erros. Não por eles serem muitos (e talvez o sejam), mas porque as variáveis envolvidas não podem ser mensuradas com precisão matemática. (2016b, p. 9)

O tópico 10, Futebol e crime, inicia-se a discussão sobre lavagem de dinheiro e outros crimes contra o sistema financeiro relacionados aos contratos da CBF e do COL. A Fifagate é

113 Refere-se à página 10 da ata da 22ª reunião, realizada em 16 de março de 2016, da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Regimento do Senado Federal nº 616, de 2015, destinada a investigar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL). Ver Referências bibliográficas. 117

citada e é principalmente destacado o estudo de 2009 do Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI) sobre lavagem de dinheiro e futebol114. José Maria Marin, ex-presidente da CBF, e José Hawilla, dono da Traffic Group, ambos presos durante a operação americana no país, são citados brevemente (2016b, p. 132). No relatório, destaca-se a análise de alguns dos documentos recebidos pela CPI: o documento recebido nº 5 identifica como fraudulento o contrato entre a CBF e a ISE, segundo a regulamentação do COAF (2016b, pp. 141 – 142); o documento recebido nº 7 é o contrato firmado entre a CBF e a Nike que, mesmo estando de acordo com a lei, discute-se a modificação da legislação vigente para maior transparência (2016, pp. 145 – 148); o documento recebido nº 21 descreve empresa em nome de Marco Polo Del Nero Filho nas Ilhas Virgens Britânicas, a Finview Real Estate LLC, com endereço na Flórida, onde o pai tem seu escritório de advocacia, para que haja a intermediação das negociações de jogadores de futebol (2016b, p. 143). Nota-se que, mesmo estes três em destaque, os documentos recebidos pela CPI são sempre brevemente citados e fazem parte efetiva do texto do relatório. Com demasiada frequência, o relatório apresenta dispositivos legais para afastar a responsabilidade da CPI do Futebol e indiciar dirigentes, empresários e outros personagens do futebol que teriam cometido ilicitudes. Em Corrupção, o tópico 10.4, inicia-se a discussão sobre as práticas corruptivas nas instituições do futebol no Brasil (2016, pp. 169 – 170) e mais uma vez é retomado o argumento de que, por conta da natureza estatutária da Confederação Brasileira de Futebol, a lei brasileira não tem jurisprudência para interferir entre contratos firmados entre duas pessoas jurídicas. As contas da Copa das Confederações em 2013 e da Copa do Mundo Fifa em 2014, o uso do dinheiro público para a construção da infraestrutura dos eventos, as práticas do COL, da CBF e da Fifa é discursão inteiramente excluída. Apresenta-se os “procedimentos de controle de riscos” (2016b, pp. 175 – 177), de autoria do Prof. Dr. Mark Pieth no relatório Governing Fifa: concept paper and report115 de 2011, considerando que “para garantir que os pagamentos efetuados por uma organização em favor de terceiros não promovam corrupção, há que se prever mecanismos de controle em diferentes níveis” (2016b, p. 174). O texto relatado por Jucá (PMDB-RR) conclui que os mecanismos apresentados

vão além dos critérios utilizado pelo COAF para identificar transações suspeitas, assim como demandam um código de conduta claro, que

114 Financial Action Task Force. Money laundering through the football sector. 01/07/2009. Disponível em: . Acesso em: 16 jan. 2020. 115 PIETH, Mark. Governing Fifa: concept paper and report. 19/09/2011. Faculty of Law. Universität Basel, 2011. Disponível em: . Acesso em: 16 jan. 2020. 118

aborde questões de valor e de integridade, com base nos riscos de corrupção. (2016b, p. 177)

Naquilo que se refere à corrupção privada, é apresentado a Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996, que “regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial”, e define concorrência desleal no capítulo VI, Dos crimes de concorrência desleal, artigos 195 e 209. Tal lei cumpre o artigo 196-A do Código Penal, no capítulo IV do título III, da parte especial sobre concorrência desleal. Ademais, a Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013, que “dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas [...]”, mesmo sem fazer referência direta ao esporte e duas organizações, promoveu mudanças à Lei Geral do Desporto, a Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998 (ver Tabela 2). Das conclusões e recomendações do relatório de Jucá (PMDB-RR), resume-se em seis pontos (2016b, pp. 246 – 264), nenhum deles tratando sobre contratos ilícitos da CBF e do COL. A primeira delas diz respeito à (1) formação de atletas de futebol: seria necessária nova definição legal para que se evite enquadramento no crime de trabalho infantil, aumentar o repasse obrigatório de recursos dos clubes para os programas das categorias de base, ampliar o programa de formação de treinadores da CBF, tornar obrigatório aos clubes das séries A e B do Campeonato Brasileiro a manutenção ou criação de categorias de base, construir centros federativos de formação de atletas e criar competições de vigência anual às categorias de base. Sobre (2) gestão, sugere a proibição de agentes ligados às organizações do futebol, assim como parentes até terceiro grau, de terem contratos de prestação de serviços, a alteração da tributação dos clubes para incentivar a transição voluntária para clube-empresa, incentivo fiscal para os clubes das séries C e D até 2022 e postergar a obrigatoriedade, incluída no programa Profut, da Certidão Negativa de Débito para 2018. Sobre a (3) definição legal de atleta profissional, vê-se necessidade de alteração na legislação para atualização. Outros pontos de alteração legislativa sobre (4) aspectos criminais, vê-se necessidade de alteração da legislação competente ao COAF sobre lavagem de dinheiro, o Código Penal sobre corrupção privada e o Estatuto do Torcedor, para melhor assegurar a integridade do patrimônio e participantes dos eventos esportivos. Especificamente sobre o (5) Estatuto do Torcedor, sugere-se a adoção do cartão do torcedor em âmbito federal, como forma de segurança e base de dados para combater a violência nos estádios e a fixação de valores para todos os jogos, para incluir mais espectadores e diminuir a diferença de arrecadação dos clubes. Por fim, sobre os (6) campeonatos organizados pela CBF, ampliar o calendário para incluir clubes de menor expressão, criação de uma liga nacional formada pelos clubes para organizar o Campeonato Brasileiro e outras competições nacionais, 119

para que a CBF possa voltar seus esforços na administração, fomento e organização das seleções principais e de base. Mesmo que as ponderações e discussão sobre a modernização do futebol brasileiro seja pertinente e importante, é possível ponderar que a maior contribuição deste relatório são suas proposições legislativas. Nenhuma delas ainda, todavia, tornou-se Lei. A primeira diz respeito à alteração da Lei nº 9.615, de 1998, a Lei Geral do Desporto para dar nova definição ao desporto de formação, regular os casos de dispensa motivada do atleta, aumentar o percentual a ser pago à entidade formadora do atleta em caso de transferência, determinar a contratação de seguro para o responsável técnico das entidades de prática desportiva, instituir regime especial de tributação para as Sociedades Empresárias Desportivas e conceder incentivos a clubes de futebol [...].116 (2016b, p. 253)

O grifo ressalta aquilo que foi discutido em densidade no texto do relatório, principalmente ao que se refere à formação e transferência de atletas, na tentativa de maior equilíbrio das contas dos clubes. Também, aqueles que, à época, fossem clube-empresa, teriam sistema de tributação especial, como incentivo à modificação estatutária das agremiações. Tornou-se o projeto de Lei do Senado nº 454 em 2016 e está na Comissão de Assuntos Sociais sob relatoria da Senadora Leila Barros desde 21 de fevereiro de 2019117. A segunda proposição – “Altera o Código Penal para prever o crime de corrupção privada” (2016b, p. 261) – concretizou-se no projeto de Lei do Senado nº 455 em 2016 e está aguardando leitura em Plenária desde 30 de outubro de 2019, relatada pelo senador Rodrigo Pacheco118. A terceira proposta diz respeito sobre a alteração do inciso XV do art. 9º Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998, para

que se sujeitam às obrigações de identificação do cliente e de comunicação de operações suspeitas as pessoas físicas e jurídicas que tenham como atividade a promoção, intermediação, comercialização, agenciamento ou negociação de direitos de atletas ou artistas, assim como de direitos e serviços relativos a feiras, exposições, competições esportivas ou eventos similares.119 (2016b, p. 262)

O projeto de Lei está aguardando deliberação do Plenário120.

116 Grifos da autora. 117 Atividade legislativa – projeto de Lei do Senado nº 454, de 2016. Acesso em 16 de janeiro de 2020. Ver Referências bibliográficas. 118 Atividade legislativa – projeto de Lei do Senado nº 455, de 2016. Acesso em 16 de janeiro de 2020. Ver Referências bibliográficas. 119 Grifo da autora. 120 Atividade legislativa – projeto de Lei do Senado nº 456, de 2016. Acesso em 16 de janeiro de 2020. Ver Referências bibliográficas. 120

A última proposição do relatório tornou-se o projeto de Lei no Senado nº 457 em 2016 e atualmente está pronta para discussão na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, relatada pela senadora Leila Barros121. Confere alterações no Estatuto do Torcedor para distribuir, organizar e alteração os procedimentos de segurança nos locais que recebem eventos esportivos, sejam estes espaços geridos pelo poder público ou privado (2016b, pp. 263 – 264). O relatório redigido pelos senadores Romário (PSD-RJ) e Randolfe Rodrigues (REDE- AP) foi formatado de maneira diferente daquele relatado pelo senador Romero Jucá (PMDB- RR). Há cuidado em contextualizar e remontar historicamente os fatos, em tom até literário, tomando como exemplo alguns títulos de subcapítulos: 1.2, Entre o luxo e o lixo e 1.3, O lobista e a bancada da CBF. Introduz-se, de forma pertinente à discussão do relatório, as dificuldades enfrentadas para a condução da investigação pela atuação da bancada da bola. Primeiro, pontua-se o desinteresse do relator da Comissão. Em seguida, apresenta-se o lobista da CBF, Vandenbergue dos Santos Sobreira Machado, quem representava os interesses da Confederação aos senadores que se alinhavam aos interesses dela (2016a, pp. 14 – 19). Também, descreve-se as tentativas de impedimento de avaliação por parte dos membros da CPI de documentos sigilosos. Os pareceres do ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin reforçam a ideia de patrimônio nacional e que a investigação conduzida pela CPI teve relevância para a opinião pública e é de interesse popular. Em uma das decisões, o ministro afirma que

os atos na esfera privada não são imunes à investigação parlamentar [...]. [...] os fatos apurados têm abrangência nacional ao estarem relacionados ao futebol, esporte de inegável predileção nacional. Reconhecendo que o tema está inserido nas competências legislativas do Congresso Nacional de fomentar o esporte e lazer como instrumentos de promoção social, a investigação não incorreu em devassa desprovida de interesse público que desborde da competência constitucional das CPIs.122 (2016a, p. 20)

Ademais, ressalta que a “criação de comissões parlamentares que tenham quase total liberdade à investigação é fundamental para o exercício da democracia e para sua manutenção, além da preservação do próprio Estado” (2016a, p. 20). Dessa forma, é pertinente a comparação entre aquilo apresentado como argumento principal de afastamento da atividade parlamentar às atividades da CBF no relatório aprovado sobre a autonomia da entidade. Faz-se ressalva que não houve tentativa deliberada de enfraquecer institucionalmente a Confederação Brasileira de

121 Atividade legislativa – projeto de Lei do Senado nº 457, de 2016. Acesso em 16 de janeiro de 2020. Ver Referências bibliográficas. 122 Grifos da autora. 121

Futebol, mas sim seus dirigentes e players influentes. Entretanto, de forma nada cautelosa, afirma-se categoricamente a existência de

uma organização criminosa dentro da Confederação Brasileira de Futebol a comandar um grande esquema de desvio de recursos que deveriam ser alocados no desenvolvimento do nosso futebol, mas foram parar no bolso de cartolas e empresários do ramo de publicidade esportiva, cujo conluio acabou por drenar investimentos e gerar a maior crise de nossa história esportiva, dentro e fora do campo.123 (2016a, p. 22)

O recorte histórico feito pelo relatório merece atenção. Ricardo Teixeira e João Havelange, ambos ex-presidentes vitoriosos à frente da CBF, durante as décadas de 1980 e 1990, inflaram os contratos publicitários e de patrocínio da organização brasileira e da Fifa, quando Havelange estava na presidência. O primeiro desvinculou os repasses federais da Loteria Esportiva para poder manobrar saída da malha fina estatal (2016a, p. 31). A CPI em 2001, tratada anteriormente no capítulo 2, investigou exatamente está manobra de Teixeira que, por intermediação de José Hawilla, dono da Traffic, superfaturou o contrato com a Nike e distribuiu ilicitamente recursos. O relatório aponta que graças à atuação da bancada da bola em 2001, o relatório foi impedido de publicação por não ser aprovado na última reunião da Comissão (2016a, pp. 34 – 35). O principal levantado sobre João Havelange é sua história na presidência da Confederação Brasileira de Desportos (CBD). A entidade predecessora da CBF e as outras confederações desportivas brasileiras foi criada em 1916 para ter grande “intervenção estatal que marca o seu DNA constituinte, demonstrando como a sua formação e o seu espoco estão visceralmente conectados à representação nacional e aos interesses do Estado e do povo brasileiro” (2016a, p. 36), com o objetivo de unir as ligas estaduais e, com a criação do órgão de representação nacional, organizar a seleção brasileira para a também recém-criada Copa América. Havelange esteve à frente da CBD entre 1958 e 1975 (ver Infográfico 1) e, ao perceber a instrumentalização do esporte pelos políticos após a formação do Campeonato Brasileiro em 1971, articulou influência suficiente até a Suíça para tornar-se presidente da Fifa. O modelo de cooperação instaurado por Havelange é longínquo e tomou folego com seu sucessor, Almirante Heleno Nunes que inflou o campeonato nacional para manter a popularidade da Arena, partido dos militares no poder: onde a Arena vai mal, mais um time no nacional (2016a, pp. 40 – 44).

123 Grifo original dos autores. 122

Giulite Coutinho, durante sua presidência na CBF entre 1980 e 1986, firmou os primeiros contratos de publicidade e patrocínio, aos moldes dos de João Havelange na Fifa (2016a, p. 46). O apanhado histórico feito no relatório ajuda a entender os achados do Fifagate, operação americana que desvendou a configuração de repetidos atos ilícitos de “suborno de dirigentes e pagamento de propinas e comissões pela intermediação de contratos de patrocínio, publicidade e direitos de transmissão” (2016a, pp. 55 – 56). Tal configuração foi dividida em cinco categorias, descritas abaixo. Em comum entre todas elas, apenas a forma de entrega dos ativos: através de dinheiro em espécie, depósitos no exterior, simulação de empréstimos, bem como compra e venda de bens móveis e imóveis, com emprego de pessoas físicas ou jurídicas interpostas.

123

TABELA 9 Configuração dos atos ilícitos das operações da CBF, segundo o Fifagate MEDIAÇÃO TIPO DE FORMA DE DE ESPECIFICIDADES CONTRATO ORGANIZAÇÃO TERCEIROS Contratos para aquisição de bens e serviços, previamente Não combinados com sobrepreço Contratos para captação de patrocínio Sim da CBF Dirigentes e funcionários da Direitos comerciais de CBF, com poderes inerentes marketing esportivo, aos cargos que ocupam, se para transmissão de Sim associam a empresários, de eventos organizados forma estruturada e com pela CBF divisão de tarefas, com o objetivo de obter vantagens O alto valor das propinas indevidas torna os valores dos Direitos comerciais de contratos praticados abaixo marketing esportivo do mercado, provocando para realização de Sim enormes prejuízos à CBF e jogos amistosos da aos seus objetivos seleção estatutários, dentre eles o desenvolvimento do futebol no Brasil

O presidente da CBF Os desvios de conduta posiciona diretores e resultam em enormes funcionários em cargos prejuízos a terceiros, em estratégicos da entidade, especial aos clubes de Não se aplica Não se aplica para que, no exercício de futebol, os quais empregam suas funções e de maneira os atletas, e em última fraudulenta, obtenham instância, à CBF como vantagens indevidas em instituição proveito do grupo criminoso

Tabela produzida pela autora. Fonte: BRASIL. Relatório (voto em separado). 2016a, pp. 59 – 64. Ver Referências bibliográficas. Sobre o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014 (COL), foi levantado que foi constituída como uma sociedade limitada entre a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e seu presidente à época, Ricardo Teixeira. Todos os documentos eram, consequentemente, assinados duas vezes pela mesma pessoa – ou por procuração, um dos advogados de Teixeira o fazia (2016a, pp. 124 – 125). Quando José Maria Marin tornou-se presidente da CBF, a prática continuou. E assim com os outros presidentes que seguiram, considerando que a sociedade só seria destituída após finalização de todos os contratos e operação, seguindo prazo do contrato social. O COL resistiu à presença de um representante do governo, como havia sido requerido pelo então ministro dos Esportes Aldo Rebelo (2016a, pp. 124

126 – 127). O Comitê apenas reportava à Fifa sobre contratos firmados e os gastos, e o nível de transparência durante o tempo de operação verificou-se como aquém às determinações da Lei nº 12.350, de 2010, que diz respeito às isenções fiscais recebidas pelo COL e seus deveres (2016a, p. 132). Os relatórios de auditoria externa encomendados pelo Comitê foram feitos pela Ernest & Young, mas não foram entregues à CPI para análise. Recomendou-se, portanto, que o Ministério Público continuasse à investigação para verificar a existência e conteúdo dos relatórios (2016a, pp. 132 – 134). A Lei nº 12.350, de 20 de dezembro de 2010, prevê a isenção fiscal para a organização da Copa das Confederações de 2013 e da Copa do Mundo Fifa de 2014. Para que se consolide tal benefício, o COL deveria apresentar demonstrativos, relatórios e outros documentos para garantir a licitude e transparência dos contratos firmados e operações realizadas. Na segunda alteração do contrato social do Comitê Organizador dos eventos consta declinação de qualquer benefício ou isenção fiscal.

Cláusula Décima Nona. A Sociedade não usufruirá de qualquer isenção de tributos que lhe venha ser concedida em caráter específico, comprometendo-se a recolher todos os tributos de que for contribuinte ou responsável tributária. (2016a, p. 136)

Todavia, foi solicitado à Receita Federal que o COL desfrutasse da isenção fiscal determinada na Lei referida. Na ata da reunião de sócios de 16 de outubro de 2012, pede-se alteração do contrato social para anulação da cláusula exposta e, em 29 de novembro, a Receita habilitou a isenção através do processo 18470-731.643/2012-70 (2016a, p. 137). Curioso é que se verificou que a Fifa, oficialmente através de seu portal online, clarifica que “não faz nenhuma demanda de isenção geral de impostos para seus patrocinadores ou fornecedores, ou para qualquer atividade comercial no país sede”124 (2016a, p. 138). Fora do escopo da Copa do Mundo, do COL e dos contratos referentes à seleção brasileira e campeonatos organizados pela CBF, levantou-se denúncias sobre um acordo entre o Superior Tribunal de Justiça, a Federação de Futebol do Estado do Espírito Santo (FES) e um clube, sobre fraude no registro de jogadores quando se trata de sonegação de capitais e descumprimento de acordos com a Justiça do Trabalho (2016a, pp. 194 – 198), lavagem de dinheiro em paraísos fiscais por parte dos dirigentes da CBF (2016a, pp. 198 – 206), lavagem de dinheiro pela compra de imóveis e outros bens de luxo e infrações penais contra o patrimônio

124 Tradução livre dos autores. 125

da CBF, os quais contradizem a ordem tributária e econômica pela dissimulação de valores (2016a, pp. 223 – 236). Ademais, levanta-se as informações sobre a Operação Durkeim, da Polícia Federal, a qual verificou que uma ex-namorada de Marco Polo Del Nero, Carolina Galan dos Santos, filha de Vandenbergue dos Santos Sobreira Machado, lobista da CBF, como laranja para lavar dinheiro, ocultar bens, entre outros crimes. Outros dirigentes da CBF foram citados na investigação da Polícia Federal, como Gustavo Feijó, vice-presidente da Confederação, assim como empresários do marketing esportivo, como Luis Claudio Lula da Silva, conhecido como Lulinha, dono da LFT e da Sport Promotion (2016a, pp. 206 – 223) – esta última tendo firmado contrato em março de 2019 com a CBF, que negociará as placas de publicidade dos jogos das várias séries do Campeonato Brasileiro (GARCIA; PASSOS, 2019). O relatório designou capítulo exclusivo para recomendações, as quais observam pontos variados. De maneira introdutória, assim como em momentos durante as reuniões da CPI e no relatório de autoria de Romero Jucá (PMDB-RR), os senadores coautores deste relatório, Romário (PSB-RJ) e Randolfe Rodrigues (REDE-AP), concordam com o modelo motivador apresentado por Bellos (2001, p. 322) e Jennings (2014, p. 45) quando afirmam que

os catastróficos 7 x 1 a favor da Alemanha e os 3 x 0 a favor da Holanda, nos jogos finais do Brasil na Copa 2014, agravaram a crise de gestão na CBF, em particular, e de desmandos no futebol, em geral. Fora do campo, o futebol nacional ganhou foro internacional em maio de 2015 com a prisão do então presidente José Maria Marin, até hoje, um ano depois, sob a custódia da Justiça norte-americana. (2016a, p. 300)

Sobre o Profut, avaliou-se como projeto generoso por parte do governo, que se baseou na premissa de que a exorbitante dívida dos clubes era o principal problema do futebol (2016a, pp. 302 – 304). A opinião do senador Romário perseverou com os anos. Em dezembro de 2019, o ex-jogador colocou-se contrário à decisão do Supremo Tribunal de Justiça ao derrubar exigências (estar em dia contribuições ao FGTS, contratos de trabalho, direitos de imagem e débitos federais) e punições (ser rebaixado, ser multado, entre outros) estabelecidas aos clubes, mantendo a generosidade do programa. Em uma rede social, o senador publicou que

Eu votei contra o Profut e fui duramente criticado por isso. Disse a época que nenhum time seria rebaixado por não pagar dívida trabalhista. A CBF não teria peito de fazer isso e não haveria nenhuma sanção para a entidade. Assim sendo, a exigência de apresentar uma Certidão Negativa de Débitos para disputar um campeonato seria inócua. 126

Em resumo, o Profut ofereceu benefícios em troca do cumprimento de obrigações. A decisão do STF mantém os benefícios e retira as obrigações. [...] O relator do processo no STF, ministro Alexandre de Moraes, sustentou que a exigência da regularidade fiscal fere a autonomia das entidades, além de constituir forma indireta de coerção estatal ao pagamento de tributos. Os maus gestores do futebol comemoram.125

A questão da organização política da CBF começa a ser discutida pela dependência financeira entre as federações estaduais e a Confederação. Compara-se a pertinência do custeio de, em média, R$ 4,5 milhões mensais por federação com o investimento total om a seleção principal: são R$ 123 milhões para as federações, contra R$ 61,7 milhões para a seleção, pelos balanços de 2015 (2016a, pp. 308 – 309). Para que os recursos da CBF sejam mais bem distribuídos e utilizado, pondera-se: (i) a natureza jurídica da Confederação, permitida pelo exposto da Lei, apresenta suas premissas de atuação e circulação de recursos; (ii) não há interferência no estatuto social quais órgãos serão responsáveis pela fiscalização; (iii) por ser uma organização que detém monopólio do futebol brasileiro e é destinatária final dos recursos do esporte, entende-se que as atividades da CBF “possuem fortes traços de interesse público”, sendo prudente avaliar sua natureza “como uma associação privada de interesse coletivo, com nítida simbiose de empreendimento particular com poderes, prerrogativas e finalidades públicas, em razão dos bens de domínio público tutelados por ela”. Faz-se leitura que há inclinação para a criação de uma política de interferência estatal na CBF, pela responsabilidade conferida a ela de gestão de patrimônio cultural brasileiro. Explicita-se que, a partir das premissas da natureza jurídica da CBF – “associação privada de interesse público” –, seria coerente a fiscalização da entidade por parte do Ministério Público e o Tribunal de Contas, considerando a relevância do serviço prestado segundo o inciso III do artigo 129 da Constituição Federal126 (2016a, pp. 309 – 330). A quebra da estrutura de interdependência entre as instituições passa pela remodelação da composição da assembleia e colégio eleitoral da CBF. Atualmente, o processo eleitoral é composto pelos 27 presidentes das federações estaduais e os representantes indicados dos clubes das séries A e B, configurando 67 membros – ou pouco menos de 10% da totalidade das organizações do futebol brasileiras. Propõe-se agregar os representantes das séries C e D,

125 Grifos da autora. Parte de legenda de foto postada na conta oficial do senador Romário no Instagram em 19/12/2019. Disponível em: . Acesso em: 19 jan. 2020. 126 “Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: [...] III – promover inquérito civil e a ação civil pública do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”. BRASIL, 1989. Ver Referências bibliográficas. 127

fazendo diferença no peso dos votos para que não haja estados com maior representatividade (como seria o caso de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e o Rio Grande do Sul), totalizando 107 membros – pouco mais de 15% das entidades. Também se considera relevante convidar membros da arbitragem e do futebol feminino. Objetiva-se democratizar as decisões do futebol pela pluralização de seus membros, evitando que os interesses representados estejam circunscritos pelos benefícios e repasses financeiros da Confederação (2016a, pp. 331 – 332). Das competências da CBF, defende-se que seja mantido apenas a gestão das seleções masculinas e femininas, delegando a organização dos campeonatos nacionais aos clubes. Essa ideia tem circulado desde a década de 1990 e a criação das ligas independentes está prevista na Lei nº 9.615, de 1998 (ver Tabela 2) (2016a, pp. 332 – 335). Tal medida diminuiria os gastos das CBF e os recursos poderiam ser destinados às categorias de base a ao futebol feminino, o qual recebeu menos de 10% dos custos diretos do futebol em 2015 (ver Gráfico 2) e, com maior investimento, teria maior relevância no cenário nacional, sendo mais interessante ao público e consequentemente mais rentável. Também, fala-se sobre a importância de criação de uma organização com reais poderes independentes da CBF para a arbitragem, evitando a manipulação de resultados (como o caso de 2005, a Máfia do Apito127) e promovendo a real profissionalização da categoria (2016a, pp. 336 – 338). Da mesma forma, reitera-se a necessidade de autonomia e não interferência nas instâncias da Justiça Desportiva por parte das federações e da Confederação. Por fim, frente à discussão do calendário de jogos, considerando os campeonatos estaduais, regionais, nacionais e continentais, propõe-se readequação das competições e organização do ano pela Secretaria de Futebol do Ministério dos Esportes (2016a, pp. 341 – 342). À Procuradoria-Geral da União, sugeriu-se indiciamento de nove pessoas envolvidas nas operações da CBF, descritas na Tabela 10. Ao Ministério Público Federal, pediu-se o término das investigações iniciadas durante o curso da CPI do Futebol, as quais foram inconclusivas em sua totalidade por limitações política e temporal. E, ao Comitê de Ética da Fifa, requereu-se a análise das investigações tangentes aos dirigentes do futebol brasileiro e que, a partir disso, sejam tomadas as medidas cabíveis para afastamento e impedimento destes das organizações do futebol (2016a, pp. 351 – 353).

127 A Máfia do Apito foi o esquema de manipulação de resultado para alteração da classificação do Campeonato Brasileiro em 2005, após remarcação de partidas apitadas por Edilson Pereira de Carvalho. Fonte: HÁ 10 ANOS, futebol era abalado pelo escândalo da Máfia do Apito; relembre. GloboEsporte.com. 23/09/2015. Disponível em: . Acesso em: 19 jan. 2020. 128

TABELA 10 Sugestões de indiciamento à Procuradoria-Geral da União, segundo relatório alternativo da CPI do Futebol (2015) INDICIADO Carlos Antonio Marcus Marco Polo José Maria Ricardo Kleber F. de Gustavo Feijó Eugênio José Hawilla Osório R. L. Antonio Del Nero Marin Teixeira S. Leite Lopes da Costa Vicente Ex-diretor Ex-presidente da Ex-presidente da Ex-presidente da Vice-presidente Ex-diretor Ex-presidente da Empresário Empresário financeiro da CRIME CBF CBF CBF da CBF jurídico da CBF FES CBF

Estelionato

Contra ordem tributária

Contra o Sistema Financeiro Nacional

Lavagem de dinheiro

Organização criminosa

Crime eleitoral

Falsidade ideológica

Tabela produzida pela autora. Fonte: BRASIL, Relatório (voto em separado). 2016a, pp. 348 – 350. Ver Referências bibliográficas. 129

Como pontuado anteriormente, ambos relatórios têm contribuição positiva para o futebol brasileiro. A sensação de que sobra, todavia, é que o conteúdo recebido pelo relator da CPI do Futebol é outro ao recebido pelo presidente da Comissão. Ademais, nota-se que enquanto um relatório reafirma o caráter liberal das legislações dos anos 1990, o outro caminha com as proposições dos governos da época de maior intervenção. Cabe ponderar que as proposições liberal e intervencionista aparentam reais soluções para o imbróglio que se tornou o futebol brasileiro. Ao refutar o modelo anterior, principalmente do período militar, de intersecção marcante do governo federal e pactuação do futebol com os interesses do presidente da nação, a razão liberal que fundou o modelo de gestão da CBF com Ricardo Teixeira tomou proporções anárquicas e superiores à legislação brasileira. A contrapartida intervencionista do relatório alternativo da CPI do Futebol ignora aspectos substancialmente relevantes à organização do esporte. Primeiro, observa-se que a falência do projeto Clube dos 13 e a aparente falta de interesse por parte dos clubes de criação de uma liga para organização da competição nacional; depois, testemunhou-se tamanha mudança do curso político após o impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT), em 2016, nos governos de Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PSL), com a desorganização de uma política de esportes em virtude a outra – como os projetos de Lei sobre clube-empresa e a anexação da pasta de esportes ao Ministério da Cidadania. Por fim, a proposta de Romário (PSB-RJ) de unir ambos relatórios para encaminhamento conjunto vai na contramão dos esforços da bancada da bola, financiada, apoiada e influenciada pela CBF e seus interesses, de afastar os perigos de perda de poder simbólico, econômico e político da Confederação. Percebe-se que a conta chegou, mas logo foi passada adiante: a matriz conservadora e patrimonialista da CBF está de mãos dadas com muitos dos parlamentares brasileiros, dirigentes dos clubes e federações estaduais.

130

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo dos capítulos, tentou-se explorar a ideia de que a política e legislação brasileira, especificamente sobre futebol, é continuísta e moldada historicamente pelas questões político sociais. Não se intencionou esgotar a discussão, nem abranger todos os aspectos que envolvem a dinâmica política do futebol. A perenidade da corrupção e das manobras conservadoras da classe política em parte descritas nas páginas anteriores é questão muito mais complexa e abrangente do que episódios pontuais em períodos de questionamento da estrutura de gestão e desempenho do futebol brasileiro. Essa discussão é largamente facetada nas formas de pensar a estrutura histórica política do Brasil. Ao recortar a CPI do Futebol instaurada em 2015, fez-se necessário avaliar outros episódios anteriores à Comissão. As legislações modernizantes do futebol de cunho liberal dos anos 1990 são importantes marcadores históricos na reflexão sobre o esporte: ao mesmo tempo que legitima uma estrutura empresarial de condução de negócios e tenta adequar-se aos novos rumos do mercado da bola, mantém a estrutura política dos clubes, das federações estaduais e da Confederação Brasileira de Futebol. A bancada da bola trabalhou para conservar a condição amadora-profissional do futebol, não desfazendo o poder simbólico construído ao longo das mais de dez décadas de esporte no Brasil. Qualquer fôlego reestruturante seria podado para que a grossa margem de trânsito entre uma estrutura de poder simbólico dos cartolas e as cifras do mercado globalizado do futebol se mantivesse. Sem dúvida, a melhor ilustração é a manutenção da estrutura política e modelo jurídico dos clubes e a extinção do passe. No mesmo paradigma, como fruto das discussões da CPI em 2015, a nova legislação em tramitação para alteração do modelo jurídico dos clubes para clube-empresa, revendo as premissas do programa federal de renegociação de dívidas com a União, o Profut, revê falhas da legislação de quase trinta anos – muitas delas causadas pelas manobras e negociações da bancada da bola –, mas reforça um movimento já iniciado pelos clubes. À época das legislações liberais, o mercado brasileiro não parecia estar pronto para grandes mudanças na forma de condução político financeira, em grande parte por falta de interesse dos clubes. Ao longo dos anos 2000 e principalmente 2010, as agremiações brasileiras foram obrigadas a sair da uma zona de conforto, em termos de gestão dos departamentos de futebol, pela paulatina perda de força de negociação com a Europa e a Ásia e a queda de rendimento das equipes em campeonatos sul-americanos. 131

O São Paulo Futebol Clube, que se auto intitulou soberano na década de 2000, era visto como modelo de gestão, como clube endinheirado e poderoso. Ao passar dos anos, a permanência num modelo datado de gestão levou a grandes problemas dentro e fora de campo. Enquanto isso, o rival Palmeiras, por exemplo, se reestruturou financeiramente com capital privado128 para refazer o departamento de futebol e substituiu o Palestra Itália, estádio velho e decadente com capacidade de pouco menos de 28 mil torcedores depois de várias reformas, pelo Allianz Parque, moderna e bem estruturada arena para mais de 43 mil torcedores. Enquanto o Palmeiras, na década de 2000, foi rebaixado e não foi campeão de nenhuma competição de relevância nacional ou continental, na década de 2010, foi campeão duas vezes do Campeonato Brasileiro, duas vezes da Copa do Brasil, fez boas Libertadores e tem sido competitivo nos campeonatos dos quais não venceu, principalmente depois do acesso à série A em 2013. O São Paulo, com o inédito tricampeonato brasileiro em 2006, 2007 e 2008, campeão da Libertadores em 2005 e campeão mundial no mesmo ano, caiu em rendimento bruscamente, com apenas um título na década inteira, a Copa Sul-Americana em 2012, e fez péssimos campeonatos, como a série A do Brasileiro em 2017. Mesmo com o jejum de títulos, o São Paulo não perdeu a pose de time grande, protagonista, favorito. Isso se deve em grande parte pela transformação do futebol desde a década de 1990 como um produto publicitário, espetacular e midiático. A festa em homenagem à carreira de vinte e cinco anos do goleiro multicampeão Rogério Ceni e de recepção do lateral Daniel Alves, ambas no Morumbi, são exemplos de performances primariamente publicitárias e midiáticas que movimentaram o clube muito mais do que as poucas conquistas. A CBF orquestrou a publicidade da seleção brasileira desde a década de 1980. A marca milionária que Neymar Jr. e outros repetitivamente convocados para a seleção brasileira valem imensamente mais do que a vitória da Copa América em 2019, os cinco títulos mundiais, o sete a um, os escândalos da CBF e todos os outros imbróglios do time nacional. Esse futebol- negócio, o futebol-mercado, na conjuntura e na estrutura do futebol hoje no Brasil, beneficia as instituições imensamente mais do que o campo. A aura mágica da publicidade, os jogadores- estrela, os patrocínios milionários contribuem para compor o poder efetivo da CBF. O poder simbólico da Confederação inegavelmente se legitima pelo poder econômico, que se estrutura,

128 A Crefisa, empresa de crédito pessoal, e a WTorre, empreiteira e construtora, foram as principais responsáveis pelo impulso financeiro do Palmeiras na última década pela injeção de recursos. No departamento de futebol, a Crefisa disponibilizou R$ 400 milhões em três anos, os quais caracterizam 35% da receita do clube. A infraestrutura e reconstrução do estádio alviverde ficou por conta da WTorre, que detém a concessão da Arena por trinta anos. 132

se cerca e se relaciona para garantir seu poder político, resultado de anos de convergência dos interesses dos governos aos da organização. A atuação da bancada da bola nos episódios apresentados anteriormente, a CPI da CBF/Nike em 2001 e principalmente a CPI do Futebol em 2015, beneficiam a Confederação e todas as outras organizações do futebol por manter a estrutura vigente. Quando se apresenta os conceitos de patrimonialismo e neopatrimonialismo, reforça-se exatamente as características de fundação simbólica de poder, de estamento e de status político, que se articula para a manutenção de interesses particulares acima do bem público e ilustrados brilhantemente no modo de coordenação do futebol. A relação de interdependência entre a CBF e as federações estaduais demonstra-se claramente pela articulação política entre os presidentes: cada federação, que recebe repasses mensais e não equivalentes entre elas, tem um voto e, para que alguém se candidate, deve ter apoio de oito federações e cinco clubes dos componentes dessa assembleia. A omissão dos clubes nas decisões é uma forma de delegar os problemas do futebol brasileiro, que está em grande parte dentro dos clubes, não só na Confederação. A união de interesses entre a Confederação, federação e clubes se traduz pela morosidade das transformações legislativas e principalmente a vigência do modelo amador-profissional. O objetivo do senador Romário (PODE-RJ) com a CPI do Futebol (2015) de reestruturar o futebol brasileiro e a CBF é ambicioso, ingênuo e solitário. A bancada da bola formou-se naquela comissão pela maioria dos parlamentares. Diferentemente da CPI instaurada em 2001, a de 2015 não precisou de uma liderança única, mesmo que o relator, Romero Jucá (PMDB- RR) tenha exercido controle, especialmente pelo cargo na Comissão. A CBF tem estrutura e influência política larga o suficiente para que os interesses estejam enraizados nas colocações e propostas dos parlamentares. Vê-se que estes geralmente estão ou já estiveram ligados à administração das federações ou dos clubes. Não é de se estranhar que os cargos no futebol e no parlamento se sobreponham – são lideranças regionais que escolheram o futebol como forma de exercício do poder simbólico. Dessa forma, o esporte como negócio fez-se para articular os benefícios dos cartolas e a política do futebol para manter tais lideranças. O ex-atacante e senador considera a bancada da bola desidratada desde 2015129. Vicente Cândido, Marcus Vicente, ambos à época da CPI compunham quadro da CBF, Zezé Perrella e Romero Jucá não fazem mais parte do Senado Federal. Entretanto, Marcelo Aro, diretor de relações institucionais da Confederação na gestão de Rogério Caboclo (ver Tabela 7), José Rocha, Renan Calheiros e Ciro Nogueira ainda compõe a bancada da bola na casa.

129 Entrevista concedida à autora em 6 de maio de 2019, via e-mail. 133

Desta forma, vale reconsiderar, mais uma vez, o poder simbólico e efetivo da CBF. Mesmo com as alterações de legislatura no parlamento, os interesses da Confederação são garantidos pela vasta rede de influência visto a própria forma de organização do esporte no nosso território em federações estaduais que interdependem da CBF. No capítulo 2, listou-se os parlamentares com relação à gestão de clubes, federações e Confederação. O poder efetivo – em termos políticos e econômicos – está intimamente ligado ao poder simbólico da organização, fundado ao longo dos anos. E, de certa forma, o poder simbólico é inegavelmente garantido pelos cofres cheios da CBF. A CPI do Futebol em 2015 foi composta na sua maioria por parlamentares que defenderam e garantiram os interesses da CBF. Suas manobras são repetitivas, tanto ao longo das reuniões, quanto em contraste à CPI CBF/Nike (2001). O esvaziamento de reuniões, o desinteresse no depoimento das testemunhas e convidados, a não-aprovação de requerimentos, a falta de ciência de documentos, entre outras práticas foram eficazes, mesmo que não apresentem surpresa na avaliação de um quadro político conservador, patrimonialista e corruptível. Importante ressaltar também que a bancada da bola contou com a cooperação dos atores do futebol que compõe a gestão das federações, dos clubes e, obviamente, da CBF. Para blindar a CBF na conjuntura de 2015, principalmente pelos documentos e a investigação americana que procurava dirigentes brasileiros, a bancada da bola escolheu olhar as questões de administração do futebol. Dessa forma, privilegiou-se estudos sobre o clube- empresa, finanças dos clubes e o Estatuto do Torcedor. Ao ignorar questões sobre gestão do futebol, que diz respeito da organização política dos clubes, das federações e da Confederação, todas as questões pertinentes de análise, mas principalmente, de indiciamento por atos corruptos na gestão são descartados, garantindo a estrutura política da CBF. Enquanto isso, seguindo esta ponderação, os senadores Romário (PSB-RJ) e Randolfe Rodrigues (REDE-AP), os quais produziram um relatório alterativo, escolheram analisar a gestão do futebol por um olhar político, investigativo e punitivo. Ressaltaram a forma de operar da Confederação com seus parceiros em negociações da seleção brasileira, campeonatos, compra de bens e organização de eventos para provar que o problema de gestão do futebol brasileiro está acima dos problemas de administração. Pensando assim, se os gestores não fossem corruptos ou corruptíveis, não estabelecessem relações de interdependência, de troca de favores e interesses, se não estruturassem os mandatos numa forma amadora-profissional tipicamente brasileira de fazer futebol, nenhum problema administrativo seria enfrentado pelas organizações do esporte. Os problemas administrativos – o modelo jurídico, as finanças, os 134

balanços, etc. – seriam facilmente resolvidos caso a gestão fosse compromissada com projetos fiéis ao ideal de bom futebol. É utópico categorizar boa administração reduzida à europeia, como ambos relatórios (e muitos textos usados aqui como bibliografia). De fato, as mudanças ocorridas com a globalização do futebol europeu desde o século passado dão ótimos frutos. Não significa que não haja problemas: um dos investigados pelo Fifagate foi Sandro Rossell, ex-presidente do Barcelona, um dos clubes mais ilustres da atualidade. Rossell também foi investigado pela justiça espanhola por lavagem de dinheiro numa negociação entre sua empresa e a CBF pelos direitos de transmissão de vinte e quatro jogos da seleção brasileira em 2006. Vê-se, todavia, uma superestrutura no clube que impede a destruição da instituição Barcelona em virtude da atuação corrupta e desleal de um dirigente. Neste sentido, um modelo de gestão sólido traria uma estrutura sólida, o qual ratificaria problemas de administração. Parece que no Brasil as instituições do e para o futebol consolidaram um modelo de gestão interdependente e patrimonial. Mesmo com os recentes projetos de lei da Câmara e do Senado para alteração do modelo jurídico dos clubes, vê-se a articulação de interesses e principalmente aval da CBF. Em agosto de 2019, a Confederação aprovou que clubes brasileiros fossem vendidos para o capital internacional, prática comum e bem-sucedida na Europa (MATTOS, 2019). Tal aprovação caminha ao par da alteração da Lei Geral do Desporto, quando se trata do clube-empresa. Pode-se inferir, portanto, que o movimento liberal e de abertura do mercado brasileiro não só tem a benção da CBF, como faz parte do seu próprio interesse. A gestão de Rogério Caboclo, na prática, começou quando o dirigente ocupava o cargo de diretor executivo durante o mandato de Coronel Nunes. O atual presidente da CBF foi blindado pela bancada da bola e não testemunhou, não teve seu sigilo quebrado. A tentativa de afastamento de Caboclo da CPI em 2015 indicava desde então que o futuro dependia dele. A modernização prometida por ele, o investimento em novas estruturas, em marketing e tecnologia só se valem pela manutenção da estrutura política, garantida pela bancada da bola e pelo quadro diretor da Confederação, como visto nas páginas anteriores. A aprovação da legislação de clube-empresa certamente terá impacto interessante no mercado brasileiro. A atuação de Romário como relator do projeto no Senado será interessante, assim como observar os movimentos contrários e favoráveis da bancada da bola. E, depois da possível aprovação, uma imensidão de questionamentos tornam-se realidade. Como os clubes vão renegociar (novamente, depois do falido projeto do Profut) suas dívidas? Quais clubes prontamente aderirão ao clube-empresa? Qual clube vai receber investimento estrangeiro e 135

como isso alterará a gestão, a administração e até os esquadrões? Será que a discrepância dos clubes brasileiros, entre elite, sobreviventes e marginais, aumentará? Ou o mercado internacional teria interesse no Brusque, na Ponte Preta e no América Mineiro? Haverá alteração na negociação dos direitos da tevê com a entrada de capital internacional? Os campeonatos nacionais e continentais se valorizarão? Como os clubes que já aderem modelos de gestão mais próximos ao clube-empresa, como o Bragantino e o Botafogo, reagirão? E os clubes, como o São Paulo, que já tem previsão de alteração do modelo jurídico no novo estatuto? Será que a renovação legislativa acompanha o momento do mercado ou o mercado é complexo suficiente para nos deixar sempre alguns passos para trás? A dinâmica legislativa do futebol desde a última CPI tem sido mais intensa. Entretanto, talvez o movimento mais expressivo de modernização esteja na legislação do novo clube- empresa. Sendo ou não solução dos problemas da gestão e administração do futebol brasileiro, faz-se pensar que a estrutura política seguirá e, em última instância, é signatária deste novo fôlego de modernização. Se este processo manterá a relação amadora-profissional, só o tempo irá dizer – principalmente porque o futebol tem sido feito a partir de questões político sociais bem fundadas no conservadorismo e patrimonialismo. A oligarquia do futebol parece se manter de diferentes formas através do tempo, das mudanças do esporte e do mercado, em todas as instituições. Se a CBF representa a ilustração mais pitoresca da estrutura do futebol brasileiro, os clubes são microcosmos que manifestam ao longo dos anos por momentos de sucesso e insucesso a prologada gestão amadora-profissional. Quem viu o gol de Mineiro no Mundial de 2005 cresceu com seu time soberano e depois passou a adolescência com uma decadência histórica de seu time. Em 2017, quando o mesmo São Paulo patinava na zona de rebaixamento, o grito ao final do campeonato de “time grande não cai” não foi de felicidade, e sim de alívio. Como um clube tão vitorioso por uma década pode ser tão decadente na seguinte? A resposta pode facilmente resumir-se no tipo de gestão que vem sendo explorada neste texto, mas está longe de ser uma explicação que define em si mesma. A discussão proposta ao longo do texto levou minha inquietação para a minha primeira paixão futebolística. O meu tricolor tem curiosa história conciliadora de interesses na sua fundação em 25 de janeiro e grito revolucionário na década de 1930; venceu o Campeonato Paulista um ano após sua fundação e foi vice da extinta Taça Rio-São Paulo em 1933. Fecha e é refundado em 16 de dezembro de 1935 – data que se tornou Dia Tricolor pela Lei Municipal nº 14.229, de 11 de outubro de 2006. 136

O clube mais querido130, em 1942, fez a mais cara contratação do futebol brasileiro até então ao comprar o passe de Leônidas da Silva, o Diamante Negro, do Flamengo. O Morumbi, o Cícero Pompeu de Toledo, começou a ser construído em 1953 e foi parcialmente inaugurado sete anos depois; as obras só terminaram em 1970, década do primeiro título nacional. Em 1990, Telê Santana, mítico técnico tricolor de duas décadas depois, conquistou o tricampeonato brasileiro, mais três títulos do Campeonato Paulista, cinco continentais, duas Copa Libertadores e os dois primeiros Mundiais do São Paulo. A década seguinte foi soberana: 2005 conquistou mais um título paulista, a Copa Libertadores e o terceiro Mundial de Clubes; 2006, 2007 e 2008, o inédito tricampeonato do Brasileiro. Depois, a triste escassez de conquistas, com uma Copa Sul-Americana em 2012 e um vice-campeonato Brasileiro em 2014; muitas dívidas, muitos craques vendidos precipitadamente, alguns presidentes, muitos técnicos e temporadas amargas. O São Paulo Futebol Clube é o único brasileiro entre os cinquenta maiores clubes em valores de mercado (SÃO PAULO SUPERA..., 2015) e é a terceira maior marca do futebol nacional (GONÇALVES, 2015). O ano de 2020 é o último ano de vigência do antigo estatuto do tricolor e as eleições estão revirando intensamente a política do clube. Pode ser uma nova fase para o São Paulo, ou pode ser a incansável repetição de ciclos de sorte e azar, políticas públicas, gestões amadoras-profissionais que ocorrem no tricolor paulista e em todos os outros clubes. Percebi, ao longo deste texto, das reflexões e das inquietações criadas ao longo deste processo, que o futebol brasileiro é uma esfera que se replica em microuniversos dentro dos clubes. Se o futebol como instituição precisa do campo, o campo precisa das instituições. Se o São Paulo precisou do Mineiro131 em 2005 e do Profeta132 em 2017, eles também precisam do São Paulo para serem Mineiro e Profeta. Ao considerar que o futebol brasileiro é conservador, e patrimonialista, há uma imensidão de aspectos num microuniverso que podem ser exploradas.

130 O São Paulo Futebol Clube ganhou apelido de clube mais querido em 1940, na inauguração do Pacaembu, pelo então prefeito da capital, Adhemar de Barros. No evento comemorativo, os presentes empolgaram-se exponencialmente mais durante o desfile do time tricolor do que nos dos rivais. 131 Carlos Luciano da Silva, o Mineiro, foi volante do São Paulo entre 2005 e 2007. Gaúcho de nascimento e formado na base do Internacional de Porto Alegre, recebeu o apelido por ser parecido com o jogador Cláudio Mineiro, que compôs o esquadrão colorado na campanha vitoriosa de 1979 no Campeonato Brasileiro. Mineiro tem sete gols vestindo a camisa são-paulina, entre eles o único contra o Liverpool na final do Mundial de Clubes em 2005. Fez vinte e cinco partidas pela seleção brasileira entre 2001 e 2008. 132 Anderson de Carvalho Viana Lima, o Profeta, é meio-campista formado na base do São Paulo Futebol Clube, onde iniciou sua carreira profissional. Passou por clubes italianos antes de ser vendido ao futebol chinês. Em 2017, por empréstimo, jogou a temporada do tricolor e foi um dos jogadores fundamentais para recuperar o time da zona de rebaixamento do Campeonato Brasileiro. Naquele ano, o São Paulo terminou na décima terceira posição. Voltou à China no final daquele ano e em 2019 retornou ao esquadrão são-paulino. Fez parte da seleção olímpica de futebol masculino em 2008, na qual marcou dois gols e ganhou a medalha de bronze, e da seleção principal entre 2008 e 2014, com vinte e sete jogos e outros dois gols. 137

Estas considerações foram iniciadas aqui e não tem fim. A conjuntura do futebol brasileiro tem sido alterada frequentemente por decisões da Fifa, da Conmebol, da CBF, dos clubes, do parlamento, por influência da mídia esportiva, dos torcedores, do presidente... Ao recortar um episódio, almejou-se analisar a política do futebol como resultado de um conjunto perene de formas de pensar e de agir, de histórias e de pessoas. Marco a vida pelo futebol. A primeira segunda-feira de fevereiro de dois mil e vinte foi marcada pelas mais de quatorze mil pessoas e a queda momentânea de luz no Morumbi, dois gols injustamente anulados de Alexandre Pato, dois pênaltis não marcados – que teriam sido cobrados pelo lateral esquerdo, Reinaldo – e o empate pelo cruzamento de e a finalização de Brenner no um a um de São Paulo e Novorizontino. Este ano é ano de Paulista, Brasileiro, Copa do Brasil e Libertadores. Mas, depois destas reflexões, não é só ano de campeonato no São Paulo. É ano de eleições, de estatuto novo, de clube-empresa. Ano que o clube pode se soltar das amarras amadoras-profissionais. Ano que pretendo marcar a vida pelo futebol do São Paulo. O universo levantado neste texto, a dinâmica política tão bem apresentada pela CPI do Futebol e seus parlamentares, os números do negócio da bola, da composição das cifras, da publicidade e do patrocínio, fez-me refletir as glórias do passado, como já diria o hino, do tricolor. Quão próximo estão os ciclos de sucesso das boas gestões, das boas presidências? Será que métodos escusos de fazer futebol ajudaram estes os anos soberanos, e os últimos anos inglórios são retroativos deste período? Da história da formação do clube, da fundação, da reabertura, da construção do Morumbi, dos Centros de Treinamento, há um padrão de gestão? E o Conselho Deliberativo? E a influência do clube social e seus sócios? A política do São Paulo – e de qualquer clube, em qualquer período – pode muito bem ser o encaixe perfeito do molde do futebol brasileiro. A estrutura das federações e da Confederação é inegavelmente chancelado pelas agremiações, e vice-versa. Todos os momentos de mudança do futebol brasileiro, principalmente de sua organização, tiveram aprovação do conjunto de instituições que formam o futebol. E quando trato deste, trato do negócio, dos engravatados no escritório com ar condicionado, da elite do futebol, das ricas federações que exportam seus dirigentes para a CBF, do prédio da Barra da Confederação e todos os outros bens luxuosos do futebol. A transformação do futebol em futebol foi um processo turbinado desde a década de 1990 pela injeção de dinheiro na mídia, nas competições, nos próprios clubes e seleções nacionais. Eu só conheci este futebol. E a aura que o circunda me encantou e me enganou. Sorte 138

a minha que sou tão apaixonada por algo tão maravilhoso. Sorte maior que posso cada vez cavar mais fundo no futebol. Que esta paixão não pare por aqui.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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159

APÊNDICE 1: ANÁLISE DAS PRESIDÊNCIAS DOS CLUBES DAS SÉRIE A E B DO CAMPEONATO BRASILEIRO EM 2018 E 2019

Foram levantados dados gerais sobre os quarenta clubes que compõe as séries A e B do Campeonato Brasileiro no ano de 2018, e os clubes que se classificaram pela série C para participar do campeonato de 2019, além das doze outras flutuações dos times pelas divisões do campeonato, assim como dados dos presidentes das organizações a partir dos dados disponibilizados pelos portais online oficiais dos clubes. Foi selecionado ambas séries do campeonato para que seja analisado os clubes de maior torcida, relevância televisa e existência de patrocínio tipo máster. As informações foram retiradas dos portais online dos clubes entre novembro de 2018 e janeiro de 2019. Das organizações, foi categorizado, a partir de ordem alfabética, a série na qual os clubes participam no campeonato do ano de 2018, a data de fundação, o patrocinador máster (aquele que investiu maior recurso no clube, que frequentemente estão representados na parte da frente da camisa do time abaixo do peito) e sua categorização. Sobre as presidências, foram levantados os nomes, o sexo, a profissão e se há filiação partidária dos presidentes dos clubes. Apresentam- se os dados brutos e algumas análises quantitativas. Os gráficos foram numerados a partir da sigla A1, para Apêndice 1, e o número que aparece na sequência deste texto específico. Sobre a localização e o ano de fundação dos clubes, vê-se que São Paulo tem maior número de representantes, seguido por outros estados do Sudeste e do Sul do país (Gráfico A1.1) e que o período de 1895 a 1919 configura o maior número de clubes fundados, com uma linha decrescente até 2015 (Gráfico A1.2). Seguindo pelos dados sobre patrocínio máster, 72,5% dos clubes tem nessa categoria um banco (Gráfico A1.3), e 60% de todos os clubes tem como patrocinador máster a Caixa Econômica Federal. Já as presidências são dominadas em sua totalidade por homens. Dos quarenta pesquisados, a maioria identifica-se como administrador (29%) e empresário (19%), representado no Gráfico A1.4. Não foram encontradas as profissões de nove presidentes dos clubes recortados na pesquisa. Em números reais, e segundo o Tribunal Superior Eleitoral, 19 presidentes são filiados à algum partido político, frente à 25 não filiados. No Gráfico A1.5, vê- se a distribuição dos presidentes nas agremiações brasileiras: são doze partidos representados, sendo quatro presidentes filiados ao Partido Progressista (PP), três ao Democratas (DEM), dois no Partido Democrático Trabalhista (PDT) e dois no Partido da República (PR); os outros partidos aparecem com um presidente filiado. 160

PATROCINADOR SÉRIE CLUBE ESTADO FUNDAÇÃO CATEGORIA PRESIDENTE SEXO PROFISSÃO PARTIDO MÁSTER

A133 América Futebol Clube Minas Gerais 1912 Caixa Banco Marcus Vinicius Salum Masculino Engenheiro Associação Chapecoense Indústria de A de Futebol Santa Catarina 1973 Aurora alimentos Plínio David de Nês Filho Masculino Empresário DEM

B Atlético Clube Goianiense Goiás 1937 Caixa Banco Maurício Borges Sampaio Masculino Empresário PMN

B134 Avaí Futebol Clube Santa Catarina 1923 Caixa Banco Francisco José Battistotti Masculino PP

B135 Boa Esporte Clube Minas Gerais 1947 Não se aplica Não se aplica Rone Moraes da Costa Masculino PP

B136 Botafogo Futebol Clube São Paulo 1918 SICOOB Banco Gerson Engracia Garcia Masculino Engenheiro Botafogo de Futebol e A Regatas Rio de Janeiro 1904 Caixa Banco Nelson Mufarrej Filho Masculino Advogado PR

A Ceará Sporting Club Ceará 1914 Caixa Banco Robinson de Castro Masculino Advogado DEM Indústria de B137 Centro Sportivo Alagoano Alagoas 1913 Camponesa alimentos Cícero Tenório Rafael da Silva Masculino Empresário Club de Regatas Vasco da A Gama Rio de Janeiro 1898 Não se aplica Não se aplica Alexandre Campello138 Masculino Médico PDT

A Clube Atlético Mineiro Minas Gerais 1908 Caixa Banco Sérgio Sette Câmara Masculino Advogado

nA Clube Atlético Paranaese Paraná 1924 Caixa Banco Luiz Sallim Emed Masculino Médico PV Marcos Antônio de Oliveira B Clube de Regatas Brasil Alagoas 1912 Caixa Banco Barbosa Masculino Advogado PRB Clube de Regatas do Eduardo Carvalho Bandeira de A Flamengo Rio de Janeiro 1895 Caixa Banco Mello Masculino Administrador REDE

B Coritiba Foot Ball Club Paraná 1909 Caixa Banco Samir Namur Masculino Advogado

B Criciúma Esporte Clube Santa Catarina 1947 Caixa Banco Jaime Dal Farra Masculino Empresário

A Cruzeiro Esporte Clube Minas Gerais 1921 Caixa Banco Wágner Pires de Sá139 Masculino Economista

133 O América jogou a série A em 2018 e ao final do Campeonato Brasileiro pontuou apenas 40 pontos. Sendo assim, em 2019 joga a série B. 134 O Avaí jogou a série B e subiu para a série A do Brasileirão com 61 pontos. 135 Em 2018, após ficar com 30 pontos na série B, o Boa Esporte caiu para a série C no campeonato de 2019. 136 O Botafogo do interior paulista joga a série B em 2019 após a classificação pela terceira liga do Campeonato Brasileiro. 137 O CSA conseguiu 62 pontos na série B do Brasileirão em 2018 e subiu para a série A em 2019. 138 A larga disputa política impede a posse efetiva da presidência e as eleições se repetem com incoerente frequência. Não se considera o cargo ocupado em 2018 de forma efetiva. O presidente listado nesta pesquisa constava oficialmente no site do Vasco em setembro de 2018. 139 Mesmo sem vínculo político-partidário, o presidente é aposentado pela Secretaria da Fazenda de Minas Gerias. 161

PATROCINADOR SÉRIE CLUBE ESTADO FUNDAÇÃO CATEGORIA PRESIDENTE SEXO PROFISSÃO PARTIDO MÁSTER

B140 Cuiabá Esporte Clube Mato Grosso 2001 Drebor Agronegócio Alessandro Dresch Masculino Engenheiro

A Bahia 1931 Caixa Banco Guilherme Bellintani Masculino Empresário DEM Rio Grande do B141 Sul 1913 Banrisul Banco Roberto Tonietto Masculino Empresário Multimarcas Serviços B Esporte Clube São Bento São Paulo 1918 Consórcios financeiros Márcio Rogério Dias Masculino Advogado PP

A142 Esporte Clube Vitória Bahia 1899 Caixa Banco Ricardo David Masculino Engenheiro PP Franquia de B Figueirense Futebol Clube Santa Catarina 1921 Saladices alimentos Cládio Vernalha Masculino Empresário Serviços A Fluminense Football Club Rio de Janeiro 1902 Valle Express financeiros Pedro Abad Masculino Engenheiro

B143 Ceará 1918 Caixa Banco Marcelo Cunha da Paz Masculino

B144 Goiás Esporte Clube Goiás 1943 Caixa Banco Marcelo Gonçalves Almeida Masculino Médico Rio Grande do B Grêmio Esportivo Brasil Sul 1911 Banrisul Banco Ricardo Moreira da Fonseca Masculino Grêmio Foot-Ball Porto Rio Grande do A Alegrense Sul 1903 Banrisul Banco Romildo Bolzan Júnior Masculino Advogado PDT Instituição de B Guarani Futebol Clube São Paulo 1911 IESCAMP ensino Palmeron Mendes Filho Masculino

B Londrina Esporte Clube Paraná 1956 Caixa Banco Claudio Canuto Masculino Advogado PSDB Distribuidora de B São Paulo 1921 Consigaz gás Ernesto Francisco Garcia Masculino PTB Mato Grosso do B145 Operário Futebol Clube Sul 1938 HVM Construtora Estevão Petrallas Masculino Operário Ferroviário B146 Esporte Clube Paraná 1912 GMAD Madeireira David Aroldo Nascimento Masculino

A147 Paraná Clube Paraná 1989 Caixa Banco Leonardo de Oliveira Masculino

140 O Cuiabá conseguiu a classificação para jogar a série B do Brasileirão para 2019 após a boa campanha na série C em 2018. 141 O Juventude, em 2019, joga a série C do Campeonato Brasileiro após jogar a série B em 2018 e terminar com 35 pontos. 142 O Vitória em 2018 jogou a série A do Brasileirão e pontuou 37, não sendo suficiente para permanecer na liga para 2019. Sendo assim, joga a série B. 143 O Fortaleza foi campeão da série B do Campeonato Brasileiro e joga a série A em 2019. 144 O Goiás ficou com 60 pontos na série B em 2018 e classificou para a série A do Brasileirão no campeonato de 2019. 145 O Operário jogou em 2018 a série C do Campeonato Brasileiro e conseguiu a classificação para a série B em 2019. 146 O Operário do Paraná conseguiu a classificação para a série B de 2019 após a classificação pela série C do Brasileirão. 147 O Paraná Clube jogou em 2018 a série A do Campeonato Brasileiro e atingiu apenas 23 pontos, voltando para a série B em 2019. 162

PATROCINADOR SÉRIE CLUBE ESTADO FUNDAÇÃO CATEGORIA PRESIDENTE SEXO PROFISSÃO PARTIDO MÁSTER Governo do Estado do Governo B148 Pará 1914 Pará estadual Antônio Valério Couceiro Masculino Engenheiro Ponte Preta Sumaré B Futebol Clube São Paulo 2001 Caixa Banco José Armando Abdalla Júnior Masculino Sampaio Corrêa Futebol B149 Clube Maranhão 1923 Caixa Banco Sérgio Barbosa Frota Masculino PR

A Santos Futebol Clube São Paulo 1912 Caixa Banco José Carlos Peres150 Masculino Administrador

A São Paulo Futebol Clube São Paulo 1930 Banco Inter Banco Carlos Augusto de Barros e Silva Masculino Advogado Sociedade Esportiva Empresa de A Palmeiras São Paulo 1914 Crefisa crédito pessoal Maurício Precivalle Galiotte Masculino Administrador Sport Club Corinthians A Paulista São Paulo 1910 Caixa Banco Andrés Navarro Sanchez151 Masculino Empresário PT

A152 Pernambuco 1905 Caixa Banco Arnaldo Barros Júnior Masculino Advogado Rio Grande do A Sul 1909 Banrisul Banco Marcelo Feijó de Medeiros Masculino Advogado

B Vila Nova Futebol Clube Goiás 1943 Caixa Banco Ecival Martins Masculino Empresário MDB

148 O Paysandu fez 43 pontos na série B em 2018 e caiu para a terceira liga do Campeonato Brasileiro em 2019. 149 O Sampaio Corrêa caiu para a série C em 2019 após pontuar 38 pontos na série B em 2018. 150 Devido a disputas de conchavos políticos rivais, o presidente sofreu processo de impeachment, mas teve recurso aprovado em setembro de 2018, mantendo seu mandato. 151 Foi citado na Operação Lava Jato da Polícia Federal. 152 O Sport pontuou 42 pontos no Brasileirão série A em 2018, e caiu para a série B em 2019. 163

Gráfico A1.1 Distribuição estadual dos clubes das séries A e B

São Paulo Santa Catarina Rio Grande do Sul Rio de Janeiro Pernambuco Paraná Pará Minas Gerais Mato Grosso do Sul Mato Grosso Maranhão Goiás Ceará Bahia Alagoas 0 2 4 6 8 10

Gráfico A1.2 Distribuição dos clubes por ano de fundação

164

Gráfico A1.3 Categorização dos patrocinadores máster, em números reais

Serviços financeiros Não se aplica Instituição de ensino Indústria de alimentos Governo estadual Franquia de alimentos Empresa de crédito pessoal Distribuidora de gás Construtora ConstruçãoMadeireira Banco Agronegócio 0 5 10 15 20 25 30 35

Gráfico A1.4 Profissão dos presidentes dos clubes das séries A e B

Economista 3% Administrador 9%

Advogado 34%

Engenheiro 18%

Médico 9%

Empresário 27%

165

Gráfico A1.5 Distribuição por partido político de presidentes, em números reais

4

3

2 2

1 1 1 1 1 1 1 1

166

APÊNDICE 2: ANÁLISE DAS PRESIDÊNCIAS DAS FEDERAÇÕES DE FUTEBOL BRASILEIRAS

Foi levantado informações relativas à presidência das federações de futebol de cada estado brasileiro partindo das informações disponíveis no site oficial das organizações. Os dados foram colhidos em abril de 2019. Listou-se o ano de fundação, quem está na presidência, a filiação partidária do(a) presidente e o início do primeiro mandato. A Federação Roraimense de Futebol (FRF) não disponibiliza o quadro diretivo da organização e não prestou declarações quando consultada pela autora, por telefone e por e-mail. Apresenta-se os dados brutos e análises ilustrativas quantitativas. Para melhor designação dos gráficos, estes foram nomeados como A2, para Apêndice 2, seguido do número sequencial. Verificou-se que a vasta maioria das federações foram fundadas até 1963, como demonstrado pelo Gráfico A2.1. Existem quatro exceções, que podem ser caracterizadas em três questões: a Federação de Futebol do Mato Grosso do Sul (FFMS), fundada em 1978, e a Federação Tocantinense de Futebol (FTF), fundada em 1990, tem datas mais recentes do início de atuação devido à separação de outros territórios nacionais – o Mato Grosso do Sul concretizou-se estado em 1977, e o Tocantins em 1989; a Federação Paraense de Futebol (FPF) foi fundada em 1969 e acompanha o ritmo de urbanização do estado, mas principalmente de sua capital, Belém; a Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro foi fundada em 1978 após a fusão de três outras organizações que partilhavam a organização do futebol no estado, a Federação Fluminense de Futebol e a Federação Carioca de Futebol, do extinto estado da Guanabara. Analisando as presidências das federações, vê-se a presença de uma mulher no comando da Federação Paraibana de Futebol (FPF). Michelle Ramalho foi auditora do Supremo Tribunal de Justiça dos Desportes (STJD), eleita em 2018 para presidir a federação. Ela dá continuidade ao trabalho de outras duas gestões, Nosman Barreiro e Rosilene Gomes, muito criticado pela chapa contraria à de Ramalho153. Outro aspecto analisado foi a filiação partidária, da mesma forma que a avaliação feita sobre as presidências dos clubes no Apêndice 1. Percebe-se que mais da metade dos presidentes das federações não é filiado a nenhum partido. O Partido Republicano Progressista (PRP), o Partido Democrático Trabalhista (PDT) e o Movimento

153 ALVES, Pedro; NOBRE, Cisco. Michelle Ramalho vence eleição, e Paraíba volta a ter uma mulher no comando do futebol. Globo Esporte.com. Paraíba. 29/09/2018. Disponível em: . Acesso em: 20 abr. 2018. 167

Democrático Brasileiro (MDB) contam com dois filiados respectivamente, e demonstram a maior incidência de filiação, como demonstrado no Gráfico A2.2. Em comparação aos dados totais representados no Gráfico A1.5, são 43,2% dos presidentes dos clubes filiados à partidos, contra 33,4% dos presidentes das federações. O outro ponto analisado e ilustrado pelo Gráfico A2.3 é o ano de início de mandato dos presidentes das federações. Treze das vinte e sete presidências foram empossadas entre 2019 e 2015; os outros quatorze presidentes tiveram seu mandato iniciado antes entre 2011 e 1986. Se comparado esta última fração de mandatos, treze delas foram iniciadas durante o mandato de Ricardo Teixeira na CBF, entre 1989 e 2012, como ilustrado pelo Infográfico 1.

168

ESTADO FEDERAÇÃO DE FUTEBOL FUNDAÇÃO PRESIDENTE SEXO PARTIDO INÍCIO DO MANTADO

Acre Federação de Futebol do Estado do Acre FFAC 1947 Antonio Aquino Lopes Masculino PRP 2019

Alagoas Federação Alagoana de Futebol FAF 1927 Felipe Omena Feijó Masculino 2015

Amapá Federação Amapaense de Futebol FAF 1945 Antônio Roberto Rodrigues Góes da Silva Masculino PDT 2002

Amazonas Federação Amazonense de Futebol FAF 1960 Dissica Valério Tomaz Masculino MDB 1990

Bahia Federação Bahiana de Futebol FBF 1913 Ednaldo Rodrigues Masculino 2001

Ceará Federação Cearense de Futebol FCF 1920 Mauro Carmélio Masculino 2017

Distrito Federal Federação de Futebol do Distrito Federal FFDF 1959 Daniel Vasconcelos Masculino PSDB 2017

Espírito Santo Federação de Futebol do Estado do Espírito Santo FES 1917 Gustavo Oliveira Vieira Masculino 2017

Goiás Federação Goiana de Futebol FGF 1939 André Luiz Pitta Pires Masculino 2007

Maranhão Federação Maranhense de Futebol FMF 1918 Carlos Alberto Ferreira Masculino 1986

Mato Grosso Federação Mato-Grossense de Futebol FMF 1942 Aron Dresch Masculino 2017

Mato Grosso do Sul Federação de Futebol do Mato Grosso do Sul FFMS 1978 Francisco Cezário de Oliveira Masculino PSC 2010

Minas Gerais Federação Mineira de Futebol FMF 1915 Paulo Sérgio Mirand Schettino Masculino PV 2004

Pará Federação Paraense de Futebol FPF 1969 Adelcio Magalhães Torres Masculino 2018

Paraíba Federação Paraibana de Futebol FPF 1947 Michelle Ramalho Feminino 2019

Paraná Federação Paranaense de Futebol FPF 1937 Hélio Pereira Cury Masculino PDT 2007

Pernambuco Federação Pernambucana de Futebol FPF 1915 Evandro Carvalho Masculino PMN 2011

Piauí Federação de Futebol do Piauí FFP 1941 Robert Brown Carcará da Silva154 Masculino 2018

Rio de Janeiro Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro FERJ 1978 Rubens Lopes da Costa Filho Masculino 2006

Rio Grande do Norte Federação Norte-Rio-Grandense de Futebol FNF 1918 José Vanildo da Silva Masculino 2008

Rio Grande do Sul Federação Gaúcha de Futebol FGF 1918 Francisco Novelletto Neto Masculino 2004

154 Robert Brown Carcará da Silva assumiu a presidência da FFP após a morte de Cesarino de Oliveira, presidente eleito em 2012. 169

ESTADO FEDERAÇÃO DE FUTEBOL FUNDAÇÃO PRESIDENTE SEXO PARTIDO INÍCIO DO MANTADO

Rondônia Federação de Futebol do Estado de Rondônia FFER 1944 Heitor Luiz da Costa Junior Masculino PP 1994

Roraima Federação Roraimense de Futebol155 FRF 1948

Santa Catarina Federação Catarinense de Futebol FCF 1924 Rubens Renato Angelotti156 Masculino 2016

São Paulo Federação Paulista de Futebol FPF 1941 Reinaldo Carneiro Bastos157 Masculino 2015

Sergipe Federação Sergipana de Futebol FSF 1926 Milton Dantas de Farias Junior Masculino PRB 2016

Tocantins Federação Tocantinense de Futebol FTF 1990 Leomar Quintanilha Masculino MDB 1990

155 A Federação Roraimense de Futebol não disponibilizou no site oficial o quadro diretivo. Contatou-se a FRF por e-mail e por telefone e mesmo assim, não foi possível obter tais informações por falta de esclarecimentos da entidade. 156 Rubens Renato Angelotti assumiu a presidência da FCF após a morte de Delfim de Pádua Peixoto, presidente eleito em 1985, que faleceu na queda do avião que levava a delegação da Chapecoense para o jogo da final da Copa Sul Americana em novembro de 2016, na Colômbia. 157 Reinaldo Carneiro Bastos assumiu a presidência da FPF após a indicação de Marco Polo Del Nero para a presidência da CBF. 170

GRÁFICO A2.1 Distribuição da fundação das federações de futebol, por ano

GRÁFICO A2.2 Distribuição dos presidentes por partido político

Não filiados

PP

PMN

PV

PSC

PSDB

MDB

PDT

PRP

0 2 4 6 8 10 12 14 16 18

171

GRÁFICO A2.3 Distribuição do início dos mandatos dos presidentes das federações, por ano

4,5 4 3,5 3 2,5 2 1,5 1 0,5 0 2019 2018 2017 2016 2015 2011 2010 2008 2007 2006 2004 2002 2001 1994 1990 1986

172

APÊNDICE 3: ANÁLISE DO TERMO CPI DO FUTEBOL NOS JORNAIS O ESTADO DE S. PAULO E O GLOBO EM 2015 E 2016

A partir do acervo dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo, foi analisado a aparição e emprego do termo CPI do Futebol nos anos de 2015 e 2016. Foram analisados os meses da vigência da Comissão, entre julho de 2015 a dezembro de 2016, e os anteriores ao início das sessões, pelos eventos ocorridos internacionalmente com os dirigentes da Fifa e da CBF, como apresentado no capítulo 2. O mecanismo de busca dos jornais é diferente e as análises foram feitas separadamente. Constam 174 menções ao termo CPI do Futebol no O Estado de S. Paulo em 2015 e Paulo em 2015 e 85 menções em 2016. No O Globo, constam 35 páginas com um total de 64 menções do termo CPI do Futebol em 2015 e 8 páginas, totalizando 17 menções, em 2016. Estes dados foram ilustrados nos gráficos A3.1 a A3.8 na distribuição da frequência nos meses do ano e nas editorias de ambos jornais. Nos gráficos que ilustram a disposição do termo nas editorias, aquelas que não constam no gráfico, apenas elencadas na legenda, significam que não há presença do termo no período em questão. A incidência de aparição do termo CPI do Futebol pelos meses de 2015 e 2016 não apresentam equiparações no O Estado de S. Paulo e no O Globo, como ilustrado nos gráficos A3.1, A3.3, A3.5 e A3.7. Vê-se, em comparação do jornal paulista e do carioca em 2015, o mês de julho apresenta grande densidade no paulista, e no carioca não; o mês de dezembro apresenta grande densidade em ambos jornais (ver Gráficos A3.1 para O Estado de S. Paulo e A3.5 para o Globo). No ano de 2016, mostra-se equiparável o mês de dezembro, no qual houve a votação do relatório da CPI, sendo que ambos jornais apresentam relativa densidade da aparição dos termos. Mostra-se relevante que o ano de 2016 apresentou menor frequência do que o de 2015 em ambos jornais. A CPI do Futebol foi instalada em 14 de julho de 2015 e o prazo final era 22 de dezembro do mesmo ano; houve prorrogação e o prazo final prorrogado foi 22 de dezembro de 2016. Os picos de incidência do temo CPI do Futebol são equipares às datas citadas. Como ilustrado pelos gráficos A3.2, A3.4, A3.6 e A3.8, em ambos jornais e anos, a editoria de Esportes em a maior quantidade de aparições do termo: no O Estado de S. Paulo 75% e 60%, respectivamente em 2015 e 2016, e no O Globo 71% e 87%, nos respectivos anos. A editoria de política (Política, no O Estado de S. Paulo e País, no O Globo) fica em segundo lugar com o maior número de menções em 2015 e 2016 no jornal paulista – 8% e 13% -, e em 173

2015 no jornal carioca, com 8%. A segunda maior frequência do Globo em 2016 foi a editoria de Opinião, com 13%. Mostra-se claro que as manchetes referentes à CPI do Futebol ficaram concentradas na editoria esportiva, mesmo que fosse um processo político no Senado Federal. Dessa forma, é possível presumir que o evento não foi tratado como escândalo político, mas como esportivo – mesmo que integrasse agentes do poder público, fosse conduzido no parlamento e envolvesse uma investigação maior sobre corrupção no país, a Operação Lava Jato da Polícia Federal que, posterior ao encerramento da CPI, averiguou que a construção da Arena Corinthians feita pela Odebrecht tem contratos ilícitos158. Correlacionando o levantamento quantitativo sobre a frequência de aparição do termo e a distribuição por editorias, vê-se que a frequência de aparição noutro caderno, fora de Esportes, é alterada. Em 2015, no O Estado de S. Paulo, o caderno Política contou com 8% da aparição de CPI do Futebol (ver Gráfico A3.2), enquanto em 2016, 13% (ver Gráfico A3.4); já no O Globo, o caderno País contou com 8% de aparição do termo em 2015 (ver Gráfico A3.6) e, em 2016, não há frequência de uso da expressão (ver Gráfico A3.8). A frequência de manchetes que aparecem na primeira página do O Estado de S. Paulo vai de 5% em 2015 para 2% no ano seguinte; no O Globo, em 2015 e 2016, CPI do Futebol conta com 6% de frequência. No jornal paulista, a frequência do termo nos editoriais vai de 2% em 2015 para 6% no ano seguinte; já no carioca, a Segunda Página conta com 6% em 2015, e 0% em 2016, com ressalva de presença substancial nos textos dos articulistas, em Opinião. Para uma avaliação qualitativa, será avaliado as manchetes de primeira página dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo. No jornal paulista, são quatro as ocorrências entre maio e agosto. Em 28 de maio de 2015, a principal manchete da primeira página estampava Marin e mais seis dirigentes da Fifa são presos na Suíça159; no dia seguinte, PF vai investigar corrupção e evasão de divisas no futebol160; em 19 de agosto, o destaque do caderno Esportes na primeira página foi CPI quer lista de contratos da CBF161. Nas duas primeiras manchetes citadas, a pauta se enquadra nas investigações do Fifagate e é citada a articulação da CPI do

158 DANTAS, Tiago. Justiça manda Corinthians e Odebrecht devolverem R$400 milhões por Itaquerão. O Globo. 15/02/2018. Disponível em: . Acesso em: 6 jun. 2019. 159 O ESTADO DE S. PAULO. Edição de 28 de maio de 2015. Disponível em: . Acesso em: 11 jun. 2019. 160 O ESTADO DE S. PAULO. Edição de 29 de maio de 2015. Disponível em: . Acesso em: 11 jun. 2019. 161 O ESTADO DE S. PAULO. Edição de 19 de agosto de 2015. Disponível em: . Acesso em: 11 jun. 2019. 174

Futebol – no dia 28 de maio, “O senador Romário diz já ter assinaturas para pedir CPI”, e no dia seguinte, “[...] CPI no Senado deve ser instalada na próxima semana” e também destaque sobre o depoimento de Hawilla, nos Estados Unidos, contribuindo para as investigações do Fifagate162. O destaque de agosto, com as sessões da CPI já em andamento, é para a progressão dos fatos. Todas as manchetes são de notícias do caderno de Esportes. Em 2016, não há aparições do termo na primeira página do O Estado de S. Paulo. N’O Globo, em 2015 há uma única aparição do termo, em 30 de março, em reportagem especial do SwissLeaks163 sobre as investigações do Fifagate164; trata-se de uma especulação de fatos e como estes afetariam o cenário político do futebol no Brasil. No ano seguinte, não há aparições na primeira página do jornal carioca. Sendo assim, mostra-se que as notícias sobre a CPI do Futebol ficaram restritas ao caderno de esportes de ambos jornais; ademais, vê-se que a presença escandalosa dos fatos ficou circunscrita ao Fifagate e principalmente às prisões na Suíça, em maio de 2015. De modo geral, não houve grande atenção aos fatos e certamente influenciaram o andamento da Comissão e seu resultado.

162 LEITE, Almir. Pressão do fisco levou J. Hawilla a confessar crimes. O Estado de S. Paulo. 29/05/15. Esportes. Disponível em: . Acesso em: 11 jun. 2019. 163 O SwissLeaks foi uma investigação jornalística sobre um esquema de evasão fiscal que envolveu a filial suíça do banco HSBC. A investigação contribuiu com informações para a investigação do Fifagate, nos Estados Unidos. 164 O GLOBO. Edição de 30 de março de 2015. Disponível em: . Acesso em: 11 jun. 2019. 175

GRÁFICO A3.1 Distribuição em meses da menção de CPI do Futebol no O Estado de S. Paulo em 2015, em números absolutos

30 25 23 24

14 14 10 8 6 6 2 2

Fonte: Acervo O Estado de S. Paulo (2015). Ver Referências Bibliográficas.

GRÁFICO A3.2 Distribuição em editorias do termo CPI do Futebol no O Estado de S. Paulo em 2015, em porcentagem

Primeira Opinião Economia & Aliás Página 2% Negócios 1% 5% 1% Editorial 2% Esportes

Política Carderno 2 Metrópole 8% Metrópole 2% Política Carderno 2 4% Editorial Aliás Primeira Página Esportes Opinião 75% Economia & Negócios

Fonte: Acervo O Estado de S. Paulo (2015). Ver Referências Bibliográficas.

176

GRÁFICO A3. 3 Distribuição em meses da menção de CPI do Futebol no O Estado de S. Paulo em 2016, em números absolutos

18

10 10 10 7 7 7 6 4 2 2 2

Fonte: Acervo O Estado de S. Paulo (2016). Ver Referências Bibliográficas.

GRÁFICO A3.4 Distribuição em editorias do termo CPI do Futebol no O Estado de S. Paulo em 2016, em porcentagem

Primeira Página Economia & 2% Negócios 2%

Editorial Aliás 5% 7% Esportes Carderno 2 Metrópole

Política Política 13% Editorial Aliás Esportes Metrópole 60% Primeira Página 8% Opinião Economia & Negócios

Carderno 2 3%

Fonte: Acervo O Estado de S. Paulo (2016). Ver Referências Bibliográficas.

177

GRÁFICO A3. 5 Distribuição em meses da menção de CPI do Futebol no O Globo em 2015, em número de páginas

12

6

3 3 3 2 2 2 2 0 0 0

Fonte: Acervo O Globo (2015). Ver Referências Bibliográficas.

GRÁFICO A3.6 Distribuição em editorias do termo CPI do Futebol no O Globo em 2015, em porcentagem

Primeira Página Segunda Página 6% 6% Opinião Ciência 3% Cultura

Rio Economia 6% Esportes Mundo País 8% País Rio Opinião Esportes 71% Primeira Página Segunda Página Revista O Globo

Fonte: Acervo O Globo (2015). Ver Referências Bibliográficas.

178

GRÁFICO A3. 7 Distribuição em meses da menção de CPI do Futebol no O Globo em 2016, em número de páginas

2 2

1 1 1 1

0 0 0 0 0 0

Fonte: Acervo O Globo (2016). Ver Referências Bibliográficas.

GRÁFICO A3.8 Distribuição em editorias do termo CPI do Futebol no O Globo em 2016, em porcentagem

Opinião Ciência 13% Cultura Economia Esportes Mundo País Rio Opinião Primeira Página Esportes Segunda Página 87% Revista O Globo

Fonte: Acervo O Globo (2016). Ver Referências Bibliográficas.

179

ANEXO 1: ELEPHANT HOLDING S.A. – COMPROVANTE DE INSCRIÇÃO E SITUAÇÃO CADASTRAL

Aprovado pela Instrução Normativa RFB nº 1.863, de 27 de dezembro de 2018.

Emitido no dia 18/11/2019 às 17:18:23 (data e hora de Brasília). Página: 1/1