SIMULAÇÃO DA SECAGEM DE RESÍDUO DE ANDIROBA (Carapa guianensis) EM SECADOR TIPO TÚNEL

J. ALVES1, R. T. BAIA2, J. A. P. da SILVA3, M. R. da SILVA3 e K. B. OLIVEIRA4

1 Universidade Federal do Amapá, Faculdade de Ciências Biológicas 2 Universidade do Estado do Amapá, Departamento de Engenharia Química 3 Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Engenharia Química 4 Universidade Federal do Pará, Faculdade de Engenharia Química E-mail para contato: [email protected]

RESUMO – A espécie Carapa guianensis, conhecida na Amazônia como andiroba, é uma espécie florestal com capacidade de promover valorização e uso econômico da floresta, com aplicações em indústrias. A determinação de um modelo de secagem que represente os dados experimentais é de suma importância para minimizar alterações promovidas pelo processo, obtendo-se produtos de qualidade. Neste trabalho estudou-se a secagem do resíduo de andiroba através de simulação pelo software COMSOL Multiphysics, baseado no método de elementos finitos. Utilizando os princípios da 2ª Lei de Fick e a Lei de Fourier simulou-se a difusão de água e a transferência de calor nos corpos de testes. As secagens foram realizadas por convecção forçada nas temperaturas de 55 (±3) °C e 67(±3) °C com velocidade do ar de ±1m/s. A simulação obtida mostrou boa representação dos dados experimentais, podendo ser usada para predizer o comportamento de secagem em indústrias e como ferramenta para o ensino de fenômenos de transportes.

1. INTRODUÇÃO

A espécie Carapa guianensis, conhecida na Amazônia como andiroba, é uma espécie florestal com capacidade de promover valorização e uso econômico da floresta, com aplicações em indústrias. A extração do óleo de andiroba gera resíduos que podem ser utilizados para fabricar rações para animais, biomassa, dentre outros. Para isso, é necessário realizar a secagem desse material.

O termo secagem aplica-se à transferência de um líquido, que está em um sólido molhado, para uma fase gasosa não saturada (Foust, 2011). Neste processo, o calor é transferido por convecção do ar quente para o produto, aumentando a temperatura tanto deste quanto da água nele contida na forma de umidade (Michalewicz, 2003).

Durante a secagem por convecção dois mecanismos de transporte geralmente ocorrem de modo simultâneo: (1) transferência de calor do meio externo para a superfície do material, por convecção,

combinada com a transferência de calor no interior do material, por condução; e (2) transferência de massa no interior do material seguida por transporte externo da umidade para o meio (Perusselo, 2013).

A modelagem matemática da secagem é bastante complicada. Assim, uma série de hipóteses simplificativas deve ser criteriosamente tomada, a fim de se garantir a viabilidade da solução numérica do problema. Modelos de perda de água estão baseados na hipótese que a transferência de massa pode ser descrita pela equação de difusão de Fick (2ª lei) em regime não estacionário (Borsato, 2011) e a transferência de calor é regida pela Lei de Fourier (Curcio, 2010).

O objetivo deste trabalho foi desenvolver a simulação computacional do processo de secagem de resíduo de andiroba por intermédio do software COMSOL Multiphysics e promover a comparação destes dados com os resultados obtidos experimentalmente utilizando secador do tipo túnel.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

2.1. Procedimento Experimental

O resíduo da prensagem das sementes de andiroba foi conformado sob prensa de 8 toneladas por 3 horas em molde de aço de 10 cm de diâmetro e 1 cm de espessura. Foram realizados dois experimentos de secagem em túnel de leito fluidizado, com temperaturas médias de 55 ± 3 °C e 67 ± 3 °C e velocidade do ar de ± 1 m/s. Os procedimentos experimentais foram desenvolvidos no Laboratório de Materiais do Núcleo Tecnológico de Engenharia, na Universidade do Estado do Amapá. As simulações foram realizadas utilizando o software COMSOL Multiphysics® 4.4, baseado no método de elementos finitos, em regime transiente.

2.2. Transferência de Massa

Na secagem, a transferência de massa é regida pela 2ª Lei de Fick, conforme a equação 1 (Cremasco, 2002).

C i   DCR  (1) t iii

Onde Ci representa a concentração (mol/m³), Di é o coeficiente de difusão (m²/s). A expressão entre parênteses representa o fluxo, o qual descreve somente o transporte das partículas de água que se deslocam por difusão no resíduo de andiroba.

2.3. Transferência de Calor

A transferência de calor é analisada segundo a Lei de Fourier, que pode ser expressa conforme a equação 2. Sendo que, ρ é a massa específica do resíduo de andiroba (kg/m3), obtida através da

razão entre a massa e o volume da mesma; Cp é o calor específico (J/(Kg.K)), variável em função da temperatura, conforme a Equação 3; K é a condutividade térmica (W/(m.K)), variável em função da concentração.

T CCTKTQ    (2) ppt

23 cTTTp 3017,22,050,240,02     (3)

2.4. Geometria e Condições de Contorno

A geometria foi construída com simetria axial em 2D, como um retângulo de medidas r=50 mm e Z=10 mm, a malha gerada foi do tipo triangular livre, discretizada em 2017 elementos finitos. A Figura 1 mostra a geometria desenhada no software COMSOL Multiphysics® 4.4, a malha e os limites. Próximo aos limites 3 e 4 a malha é mais refinada devido a maior complexidade do fenômeno que ocorre nessas regiões da amostra. As condições de contorno usadas na simulação para os fluxos mássico e de calor em cada limite do domínio estudado se encontram na Tabela 1.

Figura 1 – Geometria desenhada, com seus limites especificados, e a malha gerada.

Tabela 1 – Condições de contorno adotadas

Limites Simetria Fluxo mássico (mol/(m².s)) Fluxo de calor (W/m²) 1 r = 0 - - 2 - - - 3 - nN. i (4) Dm lda  cz  hT T ar  T  (5)

4 - Dm lda  cr  hT T ar  T 

Na Equação 4 Ni é o fluxo mássico difusivo (Sandhu, 2010). Na Equação 5, Tar e T são as temperatura do ar de secagem e da amostra, cz e cx são as concentrações de água na direção z e na

direção x, lda é o calor latente de vaporização da água, Dm é a difusividade de água e hT é o coeficiente de transferência de calor (Chen et al., 1999).

Considerou-se que nos limites 1 e 2 não há fluxos de calor e massa, porém, sabe-se que há fluxo de calor 2 entre a amostra e a superfície de contato, no entanto, esse fluxo é bem menor do que nos limites 3 e 4, sendo desprezado durante a simulação computacional sem comprometer os resultados.

2.5. Propriedades Usadas na Simulação e Comparação com os Dados Experimentais

As propriedades utilizadas na simulação e seus respectivos valores estão reunidos na Tabela 2. Para calcular a razão de umidade (RU) experimental e a predita a partir dos resultados da simulação, utilizou-se a Equação 6.

UU RU  e (6) UUie

Tabela 2 – Valores das propriedades utilizadas na simulação para cada temperatura

Propriedade 55 ºC 67 ºC Densidade da andiroba* 1176 kg/m³ 1176 kg/m³ Densidade do ar* 1,073 kg/m³ 1,073 kg/m³ Densidade da água* 18 g/mol 18 g/mol Calor latente molar de vaporização da água** 41400 J/mol 43562 J/mol Condutividade térmica da água ** 9,28*10-9 kg/(m.s) 6,40*10-9 kg/(m.s) Calor específico* Equação 3 Equação 3 Coeficiente de difusão* 1,13*10-9 m2/s 1,56*10-9 m2/s Coeficiente convectivo de calor* 15,17 W/(m2.K) 15,11 W/(m2.K) Temperatura inicial* 28 °C 28 °C Velocidade do ar de secagem* 1,0 m/s 1,0 m/s Concentração inicial* 8081,4 mol/m3 6390 mol/m3 Raio (r)* 50 mm 50 mm Comprimento (z)* 7,49 mm 8,50 mm Fonte: * Os autores (2015); ** MALONEY (2008)

Para comparar as curvas de secagem simuladas com as experimentais, utilizou-se os valores de erro médio relativo (P), calculado através da Equação 7, e erro médio estimado (SE), obtido pela Equação 8. Nas quais, Y é o valor observado experimentalmente, 푌’ é o valor calculado pelo modelo e GLR representa os graus de liberdade do modelo.

100 YY  P  (7) NY

YY '² SE   (8) GLR

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES

A Figura 2 mostra a distribuição de concentração de água após 24600 segundos de secagem, foi escolhido esse tempo devido à umidade já se encontrar bem baixa e a razão de umidade variar pouco após esse tempo para temperatura de 67°C, Figura 2-b. A amostra do experimento realizado sob T=55°C ainda não estava com RU estável, Figura 2-a. Nota-se que próximo às extremidades da geometria, região de contato com o ar quente em escoamento, a concentração de água é menor do que no centro da amostra para ambos experimentos. Observa-se também que para a maior temperatura, nesse tempo, há grande diferença de concentração de água no centro da amostra, mostrando que o tempo de secagem requerido para T=55°C é superior ao necessário para T=67°C, devido a menor transferência de calor e massa.

Figura 2 – Distribuição da concentração de água em t= 24600 s para a) T=55°C e b) T=67°C.

A distribuição de temperatura e o fluxo de calor no resíduo de andiroba, obtidos nas simulações, podem ser vistos na Figura 3, para o tempo 24600 segundos de secagem. As linhas correspondem à temperatura e as setas ao fluxo de calor. Percebe-se que a distribuição segue o mesmo padrão, diferindo apenas nos valores de temperatura.

A comparação entre as curvas de secagem experimentais e as obtidas através de simulação pode ser feita observando a Figura 4. A razão de umidade no início da secagem é bem parecida nas duas curvas, apesar de se distanciarem um pouco no final.

a

b

Figura 3 – Distribuição da temperatura e o fluxo de calor em t= 24600 s para a) T=55°C e b) T=67°C.

a b

Figura 4 – Comparação das curvas experimentais e simuladas para a) T=55°C e b) T=67°C.

Os valores SE e P podem ser visualizados na Tabela 3. Os resultados sugerem boa predição do comportamento de secagem do resíduo de andiroba pelo software utilizado.

Tabela 3 – Valores de SE e P T (°C) P (%) SE 55 11,819 0,0482 67 12,938 0,0654

4. CONCLUSÕES

As comparações realizadas entre os dados experimentais e os dados obtidos por simulação mostraram que a razão de umidade sofreu mudanças no decorrer do tempo parecidas em ambos os casos, principalmente nos primeiros minutos de secagem. Contudo, a simulação apresentou algumas discrepâncias em relação aos dados experimentais, provavelmente decorrentes de resistências ao transporte difusivo dentro da amostra, devido à própria estrutura do material usado.

Os valores encontrados para a temperatura e a distribuição da mesma foram bem próximos ao esperado, assim como os resultados para distribuição de umidade dentro da amostra estudada, mostrando que ferramentas computacionais podem ser muito úteis para a disseminação de conhecimentos e melhor entendimento de fenômenos de transporte.

5. REFERÊNCIAS

BORSATO, D. et al. Modelagem e simulação da difusão multicomponente durante a desidratação osmótica em pedaços de melão. Alim. Nutr., v. 22, n. 3, p. 379-389, 2011. CHEN, H.; MARKS, B. P.; MURPHY, R. Y. Modeling coupled heat and mass transfer for convection cooking of chicken patties. J. Food Eng., v. 42, p. 139-146, 1999. CREMASCO, M. A. Transferência de Massa. 2a.ed. Campinas: UNICAMP, 2002. CURCIO, M. A. A Multiphase Model to Analyze Transport Phenomena in Convective Drying. Comsol Conference, Paris, 2010. FOUST, M. et al. Princípios das Operações Unitárias. 2ª ed. : LTC, 2011. MALONEY, J. O. Perry’s Chemical Enginners Handbook. 8. ed. McGraw-Hil, 2008. MICHALEWICZ, J. S. Estudo paramétrico da secagem de placas de gesso: desenvolvimento de um protótipo em escala laboratorial. 2003. Dissertação (Mestrado em Engenharia Mecânica) – Universidade Federal de Pernambuco. , 2003. PERUSSELO, C. A. Análise numérica e experimental da secagem osmo-convectiva do yacon. 2013. Tese (Doutorado em Engenharia de Alimentos) – Universidade Federal do Paraná. , 2013.

SANDHU, S. K. COMSOL assisted modeling of a climbing film evaporator. 2010. Dissertation (Bachelor of Science) – Worcester Polytechnic Institute, 2010.

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