Armando Rocha

Aos meus netos, Diogo e Mariana, para que se lembrem do seu avô Armando, com os votos de que venham a ser, pela vida fora, cidadão honestos, de carácter e úteis a Portugal. A minha opinião Índice

Introdução...... 9 Postal de Lisboa …...... 11 Recordando Cuba...... 13 Marcello Caetano recordado...... 15 Prisão preventiva...... 17 O basquetebol na escola...... 18 Professor Leite Pinto...... 20 Lembrando Amália...... 22 A gare do Oriente...... 25 Uma morte prematura em Aveiro...... 26 Os gabinetes ministeriais...... 28 O jornalismo desportivo e a história...... 30 Câmara Aberta...... 32 75 anos de basquetebol a falar português!...... 34 Morreu um grande patriota...... 36 Mais vale tarde do que nunca...... 38 Carros, motoristas, despesas...... 40 Humberto Coelho – treinador português é respeitado e admirado na Coreia do Sul...... 42 Outras terras, outras gentes – a Coreia do Sul...... 44 Desperdícios...... 48 A demissão de Pedro Lynce...... 50 Pode abusar-se da Liberdade?...... 52 As propinas - Quem acode aos nossos impostos?...... 53 Crime sem castigo?...... 55 A propósito de dinheiros autárquicos…...... 56 Dinheiros públicos…...... 58 Águeda em passeio...... 60 O desporto antes e depois do 25 de Abril...... 62 Cientista português a trabalhar em Portugal...... 65 Vasco Pinto de Magalhães*...... 67 O EURO 2004 em Águeda...... 69 Apagar memórias...... 71 A verdade vem ao de cima?...... 73 Milhões para viagens...... 75 O hino nacional no desporto...... 77 Parabéns... Os 77 anos de idade...... 79 A morte de um líder - Yasser Arafat...... 82 A Tomada da Bastilha...... 84 Progresso? Retrocesso?...... 87 Catástrofes naturais...... 90 Desemprego e Programa do Governo...... 92 Iniciação desportiva na Escola...... 94 Viagens de políticos e da Igreja...... 96 É bom sonhar, mas com os pés no chão…...... 98 Forças Armadas e a Universidade...... 100 Um “charro” no Dubai …...... 102 O défice…...... 103 Postal de Lisboa - o 10 de Junho…...... 106 Ainda o défice…...... 108 Postal de Lisboa - travessia aérea e vitórias internacionais...... 110 Cantar o hino e contestar o governo...... 112 Transparência e rigor...... 114 Privilégios de candidatos...... 116 Falar português…...... 118 Universidades e mordomias...... 120 O republicano que quer ser Rei...... 122 A falta de público no futebol...... 124 Antunes Varela - um português de eleição...... 126 Cultura e subsídios...... 128 Políticos insaciáveis...... 130 Ter memória / Hino Nacional / O Ensino Universitário...... 132 Candidaturas presidenciais...... 134 O Crucifixo...... 137 Notas soltas...... 140 Valores, Académica de Coimbra, censura…...... 142 A Constituição da República...... 144 Reconhecimento do mérito, campanha eleitoral...... 146 A Burocracia e a Banca Portuguesa...... 148 Eventos culturais...... 150 Desporto e cultura...... 152 Quem não deve não teme...... 154 Fair play, procura-se...... 156 Um Artista sem ambição...... 158 Pensamento em José Novo...... 161 O basquetebol na Bairrada...... 163 As reformas das pessoas...... 165 Povo sem memória é povo sem futuro...... 167 Português em Roland Garros...... 169 O abuso sindical…...... 171 Que País é este?...... 173 Para reflexão… ou talvez não…...... 176 Os 100 anos de Marcello Caetano...... 179 A outra face da moeda...... 182 Progresso!...... 184 Ainda Eusébio e Salazar / Linguagem Desbragada...... 187 Escutas, Panteão Nacional e Música no Coração...... 190 Serviço Nacional de Saúde / Empresa Privada...... 193 Doutoramentos e Grandes Portugueses...... 196 Timor. Não há falta de dinheiro…...... 198 O poder dos burocratas...... 201 Entrevistas...... 205 Entrevista à revista “A Briosa”...... 206 Artigo publicado na revista “Espaço de União”, da SONAE, após entrevista ao Provedor do Grupo...... 213 Entrevista ao jornal “Soberania do Povo”...... 216 Entrevista à revista Magazine da Associação de Ténis de Lisboa...... 221 Entrevista ao jornal “Região de Águeda”...... 223 Entrevista para o Estádio Universitário de Lisboa...... 227 Intervenções Públicas...... 235 Desporto Universitário...... 236 Resenha histórica...... 236 Desporto em Portugal. Que futuro?...... 241 Rua Alberto Martins, em Coimbra...... 247

“Palavras sem obras são tiro sem bala; atroam mas não ferem.” Padre António Vieira, 1655

“A Mocidade Portuguesa é um movimento de formação integral da juventude que procura dar à gente moça vigor físico, saúde moral e uma consciência cívica inspirada no mais alto ideal patriótico e traduzida com sentido prático.” Marcello Caetano, 1942

“Aos ânimos fortes, os maus tempos não destroem, antes redobram as energias; e como tanto para as empresas como para os indivíduos a vida é luta. Os que desistem de lutar são indignos de viver, mas isso não se dirá de nós.” Salazar, 1964 Armando Rocha A Minha Opinião

Introdução

Ao longo dos tempos, desde estudante da Universidade de Coim- bra, sempre tive preocupações com os jovens, designadamente, através do desporto e da acção cívica. Tenho intervido muito, até hoje, na área desportiva, quer como praticante, quer como dirigente. Na política, nunca me liguei a qualquer partido, mas não enjeito a intervenção cívica, nomeadamente em actos eleitorias. Até hoje, em ditadura e nesta democracia que temos, sempre exerci o meu direito de voto em total liberdade de consciência. Por vezes, embora reconhecendo as minhas deficiências de co- municação, abalancei-me a transmitir algumas ideias, através de entrevistas e da publicação de textos em jornais como “O Norte Desportivo” que foram transcritos no meu livro “Reflexões sobre Desporto Universitário”, publicado em 1969. Outros jornais, espe- cialmente em tempo de democracia, foram indiferentes aos meus escritos. Mas os jornais da minha terra de nascimento - Águeda - abriram as suas colunas e, nos últimos anos, os meus textos têm aparecido, com alguma frequência, no jornal “Soberania do Povo” (o semanário mais antigo do País) e no jornal “Região de Águe- da”. Sem outra pretensão que não seja a de exercitar o meu direito de cidadania, esses artigos ficam agora registados neste livro.

Armando Rocha Dezembro de 2006

9 10 Armando Rocha A Minha Opinião

Postal de Lisboa …

Nestes dias de calor que têm flagelado Lisboa, sabe bem viajar para os lados dos Estoris. Os transportes são baratos, cómodos, rápidos e contínuos; portan- to, não há dificuldade, antes grande prazer, em se abandonar por umas horas o bulício desta grande capital europeia. Supomos que todo o forasteiro, que visita Lisboa, se não coíbe de tomar o comboio eléctrico do Cais do Sodré para distrair um pouco os olhos com a paisagem ribeirinha de tantos encantos que oferece o nosso belo Tejo. Mesmo os seus habitantes, sempre que podem, fogem para aquelas paragens. Uns para mais longe, lá para Cascais, outros para mais perto, ali para Algés, uns e outros suspiram por respirar um pouco os ares da Costa do Sol. Também nós o fazemos amiúde e, há dias, embarcámos no Cais do Sodré para uma viagem das mais curtas. Na nossa frente, dois meninos com os seus 8 anos de idade, frequentadores da classe primária de um dos principais colégios de Lisboa, como se de- preendia pelos livros que ostentavam. Aproveitavam o tempo da viagem a resolver problemas o que, para nós, que sempre lidamos com a matemática, nos dava grande prazer espiritual, até pela entreajuda que verificamos em resolverem ambos as dificuldades que surgiam. O comboio galgava os quilómetros rapidamente mas, a certa al- tura, mesmo em frente dos Jerónimos, os freios contiveram aquela marcha para se parar fora de qualquer estação. Os passageiros entreolharam-se! Qualquer coisa de anormal se adivinhava nos seus rostos! Assomando à janela, pudemos ver uma mulherzinha estendida no solo, devido à sua imprevidência, certamente! Seja como for, ela sofria com os ferimentos e os passageiros do comboio sofriam com os seus sofrimentos, pensávamos nós! Nada mais natural!

11 Entretanto, retomámos o nosso lugar, o comboio a sua marcha, e um dos dois meninos que seguiam na nossa frente disse para o outro, encolhendo os ombros: “perderem-se cinco minutos com esta paragem”!... Um sentimento de repulsa nos invadiu ao escutar estas palavras e, quando já fora do comboio, o vimos continuar a marcha com os dois meninos continuando a resolver problemas, aos nossos ouvi- dos ecoavam aquelas palavras: “perderam-se cinco minutos com esta paragem”!…

06/1954 Publicado no jornal “Soberania do Povo”

12 Armando Rocha A Minha Opinião

Recordando Cuba Onde se fala de Raul Castro e de Che Guevara

Em Outubro de 1962 realizaram-se, em Havana, os primeiros Jo- gos Desportivos Universitários Latino-Americanos. Estava-se nas vésperas do bloqueio económico dos EUA a Cuba. Em representa- ção da Federação Internacional do Desporto Universitário fui de- signado para a eles assistir, o que me permitiu conhecer aquele país, com tão belas praias, e seus dirigentes. Conto dois episódios passados nesses jogos. 1º - Na cerimónia inaugural que teve lugar num estádio de base- bol, estavam as equipas dos diferentes países alinhadas no relvado frente à bancada central. À sua frente, num pequeno pódio, encontrava-se o Ministro da Defesa de Cuba, Comandante Raul Castro (irmão de Fidel) e eu próprio. Ambos pronunciámos as alocuções da praxe. A do Ministro era uma alocução de carácter essencialmente político, com ataques seguidos aos americanos, os quais eram correspondidos por gran- des ovações por parte da assistência. A minha foi curta, de carácter essencialmente desportivo. Quando terminaram as alocuções e foram declarados abertos os jogos, dirigimo-nos ambos para a tribuna, onde fiquei colocado ao lado da simpática esposa do ministro Raul Castro, de seu nome D. Wilma. Foi então que ela me observou: “Não gostou nada do discurso do meu marido!”. Ao que retorqui: “Porque diz isso?” “É que nunca bateu palmas durante o discurso!”, disse ela. Tive então que lhe dizer: “É que não aprecio a intromissão política des- pudorada no desporto”. E ela sorriu… 2º - Resolvi ir assistir ao jogo de basquetebol Brasil-Cuba e, pouco depois de ter chegado à tribuna do Pavilhão, foi-me apresentado nem mais nem menos que o ministro da Indústria, de nome Che Guevara. Estava fardado e armado, com um ar muito simpático, de

13 idealista. Da apresentação passámos à conversa que se prolongou durante todo o jogo que, afinal, mal apreciámos. Retenho dessa conversa três apontamentos: a) referi-lhe que tinha verificado que havia muitos mestiços em Cuba. E como os mestiços, ao que parece, não eram bem amados quer por negros quer por brancos, e vice-versa, pressentia que, mais tarde ou mais cedo, iriam surgir problemas com eles, na ilha. Che fitou-me com um ar determinado e respondeu-me: “Se isso vier a suceder, nós exportamo-los… ” Constata-se agora que Áfri- ca está com uns tantos… b) referi-lhe que as casas dos estudantes universitários eram anti- gas luxuosas moradias dos americanos que haviam abandonado a ilha. Daí que as comodidades de que usufruíam não poderiam ser mantidas, quando abandonassem as Universidades. Che retorquiu-me muito secamente: “Sabe o que é o corte da cana?”, ao que respondi negativamente. “É que todos os universi- tários têm de passar nas férias um período no corte da cana que, pela sua dureza, os faz pensar que as comodidades referidas são apenas efémeras”... c) referiu-me ainda que os recém-licenciados em Medicina eram obrigados a prestar serviço na província durante dois anos. Nesses dois anos, uns tantos casavam por lá, outros habituavam-se à vida provinciana e radicavam-se nessas novas paragens, a ponto de haver uma razoável cobertura médica nessas regiões afastadas da capital...

Lisboa, 30/12/1988 Publicado no jornal “Diário Popular” de 09/05/98

14 Armando Rocha A Minha Opinião

Marcello Caetano recordado

Marcello Caetano foi um emérito docente da Universidade Portu- guesa, um político de alta craveira e um homem bom que foi, na- turalmente, admirado, adulado e bajulado por muitos e criticado por outros. Só é criticado quem faz alguma coisa... Morreu e não quis que os seus restos voltassem para Portugal. Os seus sentimentos têm sido respeitados e lá repousa no Brasil, longe dos familiares e dos amigos. Recusou-se a dar “cambalhotas”. Se as tivesse dado, arriscava-se a ir parar ao Panteão... Em 26 passado, a família anunciou uma missa por sua alma na igreja de S. João de Brito. Lá encontrámos os seus irmãos e os seus filhos, todos. E poucos mais, mesmo muito poucos. Duas dezenas? Talvez. Da sua Faculdade, 2 Professores, sendo um acompanhado pela mãe, viúva de um seu colega e ex-Ministro. Do seu Governo, 3 Ministros e um Secretário de Estado. Da sua Administração, um Secretário-Geral e três Directores Ge- rais. Presentes também um Secretário de Estado do actual Governo (seu aluno? Alarcão Troni), um locutor da RTP e um ex-Presidente da Federação Portuguesa de Futebol. Certamente que só por não terem lido o anúncio da cerimónia religiosa é que lá não estiveram presentes os outros seus colegas da Faculdade, os seus assistentes, os seus outros Ministros e Secre- tários de Estado, os políticos e os “amigos” que o apoiaram, etc., etc.. “Sic transit. Gloria mundi.” Paz à sua alma

Lisboa, 27/10/1990 Texto não aceite para publicação no jornal “Público”.

15 Campeonato do Mundo de “Snipes” (1969) - cumprimentos dos Presi- dentes das Federações Internacional e Portuguesa, a Marcello Caetano

16 Armando Rocha A Minha Opinião

Prisão preventiva

Os órgãos de comunicação social dedicaram largo noticiário à de- tenção de alguns funcionários do INDESP. Entre os detidos encontra-se o Prof. Mirandela da Costa, com quem sempre mantive cordiais relações desde o tempo em que exerci o cargo de director geral dos Desportos e ele era docente na antiga Escola de Instrutores de Educação Física. Naturalmente que deploro a situação em que se encontra o Prof. Mirandela, a quem gostaria de manifestar a solidariedade humana que o desporto nos ensina e deve ser cultivada. Certamente que muitos dos que beneficiaram dos seus serviços, através de contratos-programa, subsídios, empregos, etc., não dei- xarão de o ir visitar ao Estabelecimento Prisional de Lisboa. Por mim, que dele nada recebi a não ser consideração e estima, procurei fazer essa visita. E telefonei antes para saber em que dias e a que horas a podia realizar. E veio um chuveiro de água muito fria através da senhora telefo- nista: teria de lá ir em qualquer manhã de dia útil, com o B.I. e 2 fotografias, para preencher um impresso que me daria acesso a um cartão de entrada com direito a uma visita por mês... Santo Deus! Tanta burocracia para uma simples pretensão de mani- festar apenas e só solidariedade humana! Logo que possua a documentação exigida lá irei, embora com as limitações de tempo de quem tem mais que fazer do que alimentar a máquina burocrática do Estado Democrático. Até lá, e porque penso que o Prof. Mirandela continua a ler o Públi- co, aqui deixo estas linhas de um desportista para outro desportista que deve estar a passar um mau bocado. Será que V.Exa., Sr. Director, quererá ter a amabilidade de mandar publicar esta carta? Lisboa, 06/09/1995 Texto não aceite para publicação no jornal “Público”.

17 O basquetebol na escola

Vão distantes os tempos em que comecei a ensaiar os primeiros cestos, na década de ‘40. Primeiro, no Liceu de José Estêvão, em Aveiro e, depois, no Clube dos Galitos e na Associação Académica de Coimbra… Os campos de terra batida, ao ar livre; os balneários sem água morna sequer; o amadorismo dos atletas, dos treinado- res, dos dirigentes, dos árbitros… Tudo isso fazia com que o bas- quetebol, e não só, fosse praticado por verdadeiros carenciados, como ora se diz… mas que eram de grande dedicação e amor às camisolas… Mesmo nessas circunstâncias, havia jogadores – abstenho-me de citar nomes para, não ferir quem o não merece – que pareciam vindos de outra galáxia… As deficientes condições logísticas que enfrentavam eram largamente compensadas pela habilidade e be- leza dos seus gestos na luta “contra” o cesto… Tive ocasião de ver o contraste entre aquilo que havia de melhor no planeta – os americanos dos Globetrotters’1950 – que assentava em estruturas adequadas e aquilo que a Pátria lusitana oferecia… E, logo aí, me interroguei sobre essa diferença abissal. A conclusão tirada na altura foi a de que os inúmeros “globetrotters” america- nos se faziam na escola, na universidade… Precisamente ao con- trário do nosso caso em que é o Clube – e que Clubes fantásticos nós temos - que tem de substituir a Escola… Ainda hoje, infeliz- mente… Lembro-me de o Prof. José Esteves, que treinou gratuitamente (como sucedeu aliás com tantos outros) a Académica de Coimbra, no início dos anos ’50, contar esta pequena história do basquete- bol americano: Tinha sido realizado o último encontro do campeonato nacional universitário dos EUA. A equipa vencedora regressou a casa, de comboio, durante a noite. Durante a viagem o treinador da equi-

18 Armando Rocha A Minha Opinião pa recordou ao seu melhor encestador que ele tinha falhado uns tantos cestos de certa posição do campo… O campeonato acabara naquela noite! Pois bem, chegada a equipa ao seu destino pelas 4h da madrugada, o certo é que esse jogador universitário, às 9h dessa manhã, já estava no ginásio a fazer 500 (quinhentos) lança- mentos do local onde falhara durante o jogo, que até vencera… Devemos dizer que, nas últimas décadas, muito se tem feito para melhorar as instalações, para se formarem bons agentes de ensi- no, para se divulgar a modalidade. O contraste é evidente quando se fazem comparações com os anos ’50, 60’. Há que sublinhá-lo. Mas falta um “click” ao desporto português. E esse “click”, em meu modesto entender, consiste em decretar-se efectivamente, e não só em meros actos de propaganda, que o DESPORTO ESCOLAR está na base do desporto verdadeiramente nacional. Enquanto cada Escola não dispuser de instalações gimnodespor- tivas adequadas e de agentes de ensino práticos e competentes, com horários aceitáveis, não nos poderemos queixar de não trazer mais medalhas dos Jogos Olímpicos… Já muito têm feito alguns profissionais que têm representado o País além fronteiras… Sem base sólida, qualquer edifício pode abanar… Os dinheiros públicos devem ser sagrados e não deviam ser des- baratados, ano após ano, em falsas miragens… Temos para nós que é tudo uma questão de prioridades… Mais! - é tudo uma questão de coragem e de desapego às glórias vãs do mundo… político.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 27/10/2000 e na “Revista do Basquetebol” – Out. 2000

19 Professor Leite Pinto

O Círculo Eça de Queiroz é uma renomada instituição lisboeta do Chiado. Nele se reúnem, desde há muito tempo, algumas figuras da in- telectualidade portuguesa, com regularidade, constituindo-se em “Grupo das 4ªs feiras”. Aos 97 anos, a lei da vida afastou desse grupo, há um ano, um dos seus mais destacados membros – o Prof. Eng. Francisco de Paula Leite Pinto. Prestei-lhe alguma modesta colaboração nos idos anos ’50, em especial durante a crise académica que ficou conhecida pela crise do 40.900 (nº do decreto-lei de 1956 que acabou por não ser aplicado às Associações de Estudantes depois de debate na As- sembleia Nacional). Nela andaram profundamente envolvidos es- tudantes como Jorge Sampaio, João Cravinho, Prostes da Fonseca, José Bernardino, Sérgio Ribeiro... Possuidor de uma vasta cultura, era muito humano, descontraído e cheio de humor. Na casa dos vinte anos, eu procurava estabelecer a “ponte” entre o Ministério da Educação e aquelas Associações. Fiquei muito feliz quando o Ministro aceitou a reivindicação da AAC – que eu patrocinei como pude - ao considerar o dia da To- mada da Bastilha como feriado académico. Certa manhã, fui ao seu encontro no Campo de Sant’Ana, tendo- -me parecido muito abatido. Explicou-me que de facto assim era, porque nessa manhã se esquecera de ler a página da necrologia do Diário de Notícias. Daí não se ter apercebido do falecimento de um seu grande amigo, a cujo funeral não pudera entretanto assistir. E logo me recomendou que procedesse sempre a esse tipo de leitura… Talvez por isso, quando a sua hora se aproximava, dispôs no sen- tido de se não dar público conhecimento do passamento a não ser

20 Armando Rocha A Minha Opinião

30 dias depois. Assim sucedeu, pelo que me limitei então a chorar uma lágrima na missa do 30º dia, no Estoril. O Grupo das 4ªs feiras evocou a memória desse Homem Bom, desse Grande Senhor, há dias, no Círculo. Também lá estive a con- vite do Dr. Novais de Paula. Onde encontrei velhos amigos e co- nhecidos, como o Dr. Baltazar Rebelo de Sousa e Senhora, o Reitor Justino Mendes de Almeida, os Conselheiros Lúcio Vidal e Alcindo Costa, o Dr. Seabra Lopes, o Eng. João Paulo Castelo Branco e também o eterno representante do Brasil em terras lusas, o Em- baixador Dário Castro Alves. Ouvi palavras muito bonitas e pensa- mentos de autêntica poesia proferidas pelos Profs. Soares Martinez e Bigotte Chorão. Com o pensamento arejado pela memória de um Grande Senhor do nosso País que foi o Prof. Leite Pinto, deixei-me vaguear uns tempos pelo Chiado de tantas tradições.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 25/05/2001

21 Lembrando Amália

“Povo que lavas no rio que talhas com teu machado as tábuas do meu caixão…” Pedro Homem de Mello

A Associação dos Naturais da Colónia de Moçambique, em 1951, convidou a equipa de basquetebol da Associação Académica de Coimbra, que era a campeã nacional absoluta, a deslocar-se àquela parcela de Portugal, para disputar onze jogos em Lourenço Marques e na Beira. Quando aguardávamos o embarque no aeroporto da Portela de Sacavém, apercebemo-nos de que teríamos como companhia a grande fadista Amália Rodrigues, uma jovem de 30 anos que via- java com os seus instrumentistas, Raul Néry e Santos Moreira. E os jornalistas presentes no aeroporto logo nos convidaram para fazermos uma fotografia com ela! Só que, pouco tempo antes, tinha sido exibido em Coimbra o filme “Capas Negras” em que ela contracenava com o Alberto Ribeiro. E a Academia não gostou... e “proibiu” a exibição... do filme, qual Autoridade Administrativa! Assim, reunidos todos os jogadores, deliberou-se não fazer a foto para não nos colocarmos à margem das leis académicas... o que naturalmente não agradou à Amália... nem mesmo a nós próprios… E lá embarcámos para a 1ª etapa até Dakar, durante a qual fizemos as pazes, em especial, graças ao sentido de humor do Paulo Cardoso (já falecido). Seguiram-se as paragens em Monróvia, Accra, Robertsfield e Leopoldville até chegar a Joanesburgo, depois de 26 h de viagem. Durante as escalas tivemos ocasião de ver o quanto era apreciada a Amália por terras africanas, já que havia sempre comitivas a recebê-la e a prendá-la com flores, chocolates, etc.. Naturalmen-

22 Armando Rocha A Minha Opinião te, também beneficiámos dessas recepções na medida em que os chocolates acabavam sempre por ser recolhidos por nós, até por- que entendíamos que a Amália não devia engordar... Em Joanesburgo, a Amália foi para o hotel Carlton e nós fomos para uma pensão modesta, pela simples razão de que um dos nos- sos jogadores não era branco - o simpático e bom rapaz de alma límpida, Luís de Sousa (hoje cirurgião em Guimarães). Na Beira, numa das noites depois do jogo, fomos até uma “boite” nos arredores, onde nos juntámos com a Amália e com... oh felici- dade!... o Dr. António Menano (que residia em Inhaminga). A certa altura, chegou o manager da Amália que esta apresentou ao Paulo Cardoso, já muito bem bebido e “enterrado” num maple. Quando ela referiu o nome Ricardo Ovelha, o Zé Paulo Cardoso mirou-o de baixo para cima e comentou: “Não parece!...” Foi uma noite de encanto com aquelas duas estrelas a cantar ao som da guitarra e da viola... Recordo que, no regresso para a Bei- ra, o Dr. Menano me cantarolou esta quadra:

Tenho sede de mais alto Sou como a Mãe de Deus Que tendo Jesus nos braços Ainda olhava para os Céus...

Normalmente, a Amália assistia aos nossos jogos e nós íamos aplaudi-la nos seus espectáculos. Algumas vezes, por simpatia dela, a fui buscar ao hotel Polana, onde lhe lia os telegramas que ela recebia de Lisboa! Numa dessas vezes, entrei com ela de braço dado no camarote do campo de futebol do Sporting e o meu avô, que residia em Vila João Belo, ao ver-me assim acompanhado, não resistiu a tamanha emoção e desmaiou... Para ele a Amália era um mito... não acessível ao seu neto… Ao assistir, hoje, à passagem da urna com o corpo de Amália em Campo de Ourique e ao ouvir pela televisão o coro dos Antigos Orfeonistas da Universidade de Coimbra, a que também perten- ci nos finais dos anos ’40, recordei essa viagem com lágrimas!… Glória à AMALIA!…

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 28/09/2001

23 Amália Rodrigues, acompanhada por Raul Nery e Santos Moreira (1950)

24 Armando Rocha A Minha Opinião

A gare do Oriente

Há 11 anos que tenho necessidade profissional de viajar entre o e Lisboa. E optei pelo comboio. Que até nem é caro, em especial para a terceira idade. Evito o avião e o automóvel, este por causa do stress, da segurança e do preço das portagens... que equivale ao preço do bilhete. Recentemente, com a entrada em serviço dos alfa pendulares, a viagem tornou-se muito mais aliciante: melhores carruagens, pos- sibilidade de uso de computador, etc. Pode-se assim trabalhar, ler, descansar, conversar… durante as 3 horas do percurso. Nessas viagens, sem dias certos nem comboios certos, encontro muitos Juizes Superiores, com os seus muitos processos, e gesto- res, com os seus computadores e telemóveis em serviço, sempre a tocar... Há dias, pela 1ª vez encontrei um Secretário de Estado, com bar- ba bem aparada, simpático, acompanhado por 2 assessores que fizeram aquilo que qualquer pessoa de bom gosto faz. Antes de embarcar no alfa, às 14 h, foram ao Aleixo comer os filetes com arroz de polvo que são do melhor que se faz na nossa Terra… e nem são caros… A viagem ficou barata para os cofres do Estado (até se dispensou o motorista), o governante pôde trabalhar no comboio e nunca perdeu o contacto com o Ministério através do telemóvel. Oxalá este exemplo frutifique entre aqueles que adoram andar de avião e helicóptero nas suas andanças ministeriais. Sem se preo- cupar com os custos… que os contribuintes pagam! Parabéns Senhor Secretário de Estado da Segurança Social (Rui Cunha) e desculpe-me a indiscrição!

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 21/12/2001

25 Uma morte prematura em Aveiro

Há dias, no novo Pavilhão do Galitos de Aveiro, sucedeu a tragé- dia!... Num período de interrupção do jogo de basquetebol em que jo- gava o Aveiro Basket para o campeonato da Liga Profissional dos Clubes de Basquetebol, o atleta/médico Paulo Pinto deixou cair a garrafa de água no banco e... acabou por falecer! Com um médico do Benfica a assisti-lo competentemente, mas impotente... Estamos a falar do basquetebolista português com maior projecção internacional. Era um atleta de eleição, um Homem íntegro, no dizer de quem bem o conhecia. A sua “força” era tal que, mesmo sendo atleta de alta competição, com tantos treinos nas pernas e tantas deslocações para fora e dentro do País, conseguiu tempo e ânimo para concluir a licencia- tura em Medicina. E sabe-se bem quão exigente é essa licencia- tura... Até por ser dirigente da Federação Portuguesa de Basquetebol mas, acima de tudo, como seu admirador, fui a S. João da Madeira assistir ao funeral do Paulo. A Família, com a Mãe e o Pai à frente, também ele dirigente de basquetebol, estava completamente destroçada por ver partir um dos seus filhos na flor da vida. Mas sentiram à sua volta um mar de gente que adorava o Paulo. Via-se no rosto das pessoas que elas estavam ali, fora dos seus trabalhos, por devoção e admiração. A Igreja, que não é pequena, estava a abarrotar de pessoas e de flores... Cá fora, era um mar de gente... O seu treinador, o Carlos Lisboa, estava a meu lado a rezar o Padre Nosso com uma lágrima a correr no rosto... Os seus colegas dos outros Clubes, e estariam lá todos, vindos dos diversos cantos do País, bem como os muitos dirigentes da Federação, da Liga de Clubes, das Associações Re-

26 Armando Rocha A Minha Opinião gionais e dos Clubes onde e com quem o Paulo competiu, segui- ram emocionados as cerimónias fúnebres. Foram os seus colegas de equipa que transportaram a urna, com a emoção estampada nos rostos... E ninguém arredava pé... até lhe prestarem a última homenagem já no cemitério, com uma impressionante salva de palmas como se ele estivesse a meter mais um dos seus belos triplos... Vi lá políticos, até por dever de ofício. Mas não resisto a dizer que o Presidente da Câmara Municipal de Aveiro, Dr. Alberto Souto, também ele antigo basquetebolista do Galitos, como eu fui muitos anos atrás, estava lá, acima de tudo, nessa qualidade. Foi o que eu senti das suas palavras. Paz à tua alma, Paulo! Continuaremos a recordar-te cá em bai- xo...

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 14/03/2002 e na “Revista do Basquetebol” – Fev. 2002

Paulo Pinto

27 Os gabinetes ministeriais

Por vezes entretenho-me a ler o Diário da República, especialmen- te a 2ª série. Esse jornal é um manancial de informação importan- te e até interessante... Agora, com a chegada de um novo Governo, foi altura de se ver quem entra e também quem saiu dos gabinetes de Suas Excelên- cias. Há dias, dei comigo a ler os louvores que o Primeiro-Ministro An- tónio Guterres concedeu aos que com ele trabalharam mais de perto. Diz ele que “foi com imensa gratidão pela inestimável ajuda” que dá público louvor a 168, reparem bem, 168 colabo- radores. Tenho para mim que lhe devem ter prestado directamente serviço uns tantos mais que não terão sido louvados... Caso contrário, o louvor expresso perderia sentido... Se é que o não perdeu já com tantas linhas do Diário da República ocupadas com esse objecti- vo... Dias depois, deparo com um Secretário de Estado (dos Transportes) a louvar 30 pessoas do seu gabinete... Ao Secretário de Estado Dr. José Magalhães coube em especial salientar a elevada afabilidade dos seus colaboradores, o que se regista com agrado, naturalmente. E dou comigo a perguntar: será que um Primeiro-Ministro precisa de 124 colaboradores directos? Será que um Secretário de Estado precisa de 30 colaboradores directos? Quanto custam? Quanto espaço é necessário para os alojar? E quantos carros para os trans- portar? etc., etc.. O que fazem então as Direcções Gerais? E os Institutos? Para já não falar da Presidência da República que tem, só nos seus quadros cerca de 300 funcionários... para além dos que estão da- dos à Casa Civil e à Casa Militar...

28 Armando Rocha A Minha Opinião

A política é uma arte muito nobre mas não pode justificar tanto despesismo, normalmente clientelar... Julgam, porém, que eu acredito que o novo Poder vai ter menos pessoal nos seus gabinetes? E julgam que acredito que alguma vez vamos ter uma Assembleia da República com uns 100 deputados, mas bem pagos, para terem qualidade indiscutível? Oxalá! Mas não acredito... Ao menos que todos tenham boas férias.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” em 26/07/2002

29 O jornalismo desportivo e a história Fontes Inquinadas

A responsabilidade dos jornalistas em termos de feitura de história é muito grande. Estou em crer que eles, ao darem uma notícia, investigaram sempre as fontes, devidamente. Só que, de algumas fontes, por vezes, sai água inquinada, a maio- ria das vezes sem ser por mal, certamente. Isto vem a propósito de peça que a TVI, no seu jornal da noite de 8 de Setembro de 2002, pôs no ar acerca das candidaturas às próxi- mas eleições na Federação de Futebol. Nessa peça foi afirmado que: • O agora candidato Artur Jorge jogara pela Académica de Coim- bra a final da Taça de Portugal em 1969 – ano da célebre contes- tação académica ao Ministro José Saraiva; • O Almirante Thomaz presidiu a esse encontro no Estádio Nacio- nal; • A Académica equipou de branco, em sinal de luto. Ouvi a notícia com estupefacção pela falta de rigor que ela de- monstra. Intencional? Não sei. Das 3 afirmações referidas só posso dizer, em verdade, que de facto a final da Taça de Portugal de 1969 foi disputada sob o signo da contestação da academia de Coimbra. Quanto ao resto, posso afirmar e documentar que: • O excelente avançado centro Artur Jorge não jogou pela Acadé- mica. Estava já no Belenenses? No Benfica? No FC do Porto?... O avançado centro da Académica foi sim o Manuel António que foi “bola de prata” nesse ano e hoje é o director do IPO de Coimbra; • Por indicação expressa de Marcello Caetano fui eu, na altura a exercer as funções de director geral dos Desportos, quem presidiu ao encontro, e não o Almirante Thomaz (aliás, não se encontrava presente qualquer membro do Governo na tribuna); • A Académica manifestou o seu luto, mas não através do equipa-

30 Armando Rocha A Minha Opinião mento (branco?) que foi o habitual (de negro). É mais uma notícia que me trouxe à lembrança a outra relativa ao Eusébio em que ele diz que o ditador (Salazar) o chamou a S. Bento, por 6 vezes, para lhe dizer que o Conselho de Ministros o considerava património nacional, pelo que não era autorizada a sua transferência para o estrangeiro... Enfim um puro delírio do grande Embaixador Eusébio... que tem sido glosado de formas várias... A bem de quê? Não dele certa- mente, que não precisa dessas deturpações para continuar a ser o melhor jogador português, para mim.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 20/09/2002

31 Câmara Aberta Ginásio

Da leitura do artigo “Habitação, Ponte, Estádio e Ginásio”, publicado neste jornal, fiquei com a sensação de que a Câmara de Águeda se prepara para terminar as negociações com o GICA para aquisição do pavilhão. E mais se adianta que o futuro pavilhão municipal poderá ser localiza- do na zona de Assequins, no Ninho de Águia ou junto à Feira Nova. Estando, pelos vistos, tudo em aberto não posso deixar de opinar sobre tema que me é muito caro. Nos idos anos de 60, em que me ocupava de matéria desportiva, re- cordo que a Alemanha do Leste era o país que tinha maior densidade de pavilhões desportivos face à sua população. Certamente por isso, e não só... (as hormonas, a gravidez, etc...) tratava-se de uma potência desportiva de 1º plano a nível mundial. Verificava-se, então, que a localização desses pavilhões era determi- nante, e ainda o é, para as práticas desportivas. Eles situavam-se nas escolas ou junto às escolas. Tão simples como isso. É que cada escola é um manancial inesgotável de juventude ávida de praticar desporto. E os pavilhões, garantidamente, estão ocupados du- rante todo o dia. Sim, porque ao fim da tarde/noite também não fal- tam os praticantes dos Clubes/Associações. Ou seja, dessa forma os pavilhões são usados sem parar. Caso contrário, como acontece com o Pavilhão de Travassô que, embora construído com muita carolice e dedicação, certamente não pode ter essa ocupação maximizada. Senhores Autarcas! Pensem mais nas crianças em geral do que no des- porto de competição! Este vem naturalmente, por arrastamento. Mas, em primeiro lugar, deve estar toda a juventude escolar. Sei que por vezes é difícil inventar “terrenos” mas a vontade move montanhas!.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 27/10/2002

32 Armando Rocha A Minha Opinião

Fachada do Prédio onde nasceu e viveu o autor, em Águeda

33 75 anos de basquetebol a falar português!

É bom chegar a esta idade, depois de muito, mas mesmo muito e difícil, caminho percorrido! E é bonito ter chegado com a pujança para que os ideais aponta- vam e que os factos agora demonstram no panorama desportivo nacional! A partir dos meus 15 anos de vida federativa, vim a conhecer mui- tos dirigentes dedicados, esclarecidos e apaixonados pela bola ao cesto! E convivi com muitos atletas de eleição que treinavam e disputa- vam com alegria os jogos ao sol, à chuva, ao vento, em campos cimentados e de terra batida e com balneários sem água quente! E que nem sequer se queixavam dessas condições! Fui um deles, dos mais modestos embora, mas que sempre acredi- tei em que melhores tempos acabariam por chegar! Já lá vão 52 anos, quando, jovem dirigente da AAC, contratámos o 1º jogo dos Globetrotters realizado na Europa, mais precisamente em Coimbra, no velho campo de Santa Cruz, por Esc. 25.000$00! Naturalmente que tenho saudades desses tempos, mas em especial das amizades com que o basquetebol me brindou e ainda perdu- ram no Galitos de Aveiro, na Associação Académica de Coimbra, no Vasco da Gama, no S.L. e Benfica, no Queluz, na Federação... Mas hoje tenho orgulho em verificar que as condições da prática do basquetebol são abissalmente diferentes, para melhor! Quer em Jogos Olímpicos, quer nas Universíadas, nunca perdi um bom jogo de basquetebol, tal como em Havana, há precisamente 40 anos, nos I Jogos Desportivos Universitários Latino Americanos, ao lado de Che Guevara – fiel amante da modalidade! É que o basquetebol, para além do mais, é um jogo muito bonito! A Federação Portuguesa de Basquetebol e os seus devotados e competentes dirigentes estão naturalmente de parabéns!

34 Armando Rocha A Minha Opinião

Um voto: Que o basquetebol seja, na Escola, o que o sal é para a comida!

Publicado na “Revista do Basquetebol” alusiva ao 75º aniversário da FPB – 17/11/2002

35 Morreu um grande patriota Baltazar Rebelo de Sousa

Acabo de assistir ao funeral do Dr. Baltazar Rebelo de Sousa. Tinha almoçado com ele e com a Esposa há 8 dias. A saúde estava abalada, bem se via! Mas foi com grande comoção que ouvi a TV dar a notícia do seu falecimento, logo no dia 1 de Dezembro! Era uma data que lhe era muito cara! E, tal como nos tempos em que militou na Mocidade Portuguesa, não deixava nunca de par- ticipar, como agora sucedeu, nas comemorações dessa data que, hoje, já poucos celebram… Todos os Valores se vão indo… na vora- gem do sensacionalismo que as televisões nos vão impingindo… Entre a missa em S. Domingos, a que assistiu, e o desfile respecti- vo, porém, Baltazar tombou para sempre! Numa última homenagem, a bela igreja de Santa Isabel encheu- -se de gente dos mais variados quadrantes. Uns pelos filhos, mas muitos certamente pelo próprio falecido, todos ouviram uma boni- ta missa celebrada pelo Sr. Bispo de Portalegre. Disse ele que convivera com Baltazar em Moçambique, aquando da sua governação naquela Província Ultramarina. E contou que, um dia, no seio da família, Baltazar observou aos filhos que “não estava em Moçambique para mandar mas sim em missão!…” Que bela lição de serviço público! As leituras foram feitas pelos filhos Marcelo e António. E as preces – que belas – foram feitas pelo filho Pedro e pelos 7 netos. Baltazar foi um grande Patriota que soube servir a res publica sem- pre e acima de tudo, estivesse onde estivesse. Tinha uma postura de Estado que, nele, era simplesmente natural. Mesmo exilado durante 17 anos no Brasil, sempre viveu intensa- mente as coisas lusófonas. E ultimamente, com a vida a apagar-se, era uma delícia ver ainda o seu apego às coisas sociais e ao bem comum. Gostei muito de ver que a sua urna estava coberta pela Ban-

36 Armando Rocha A Minha Opinião deira Nacional. Prestou-se justiça a quem serviu bem Portugal. Paz à sua alma.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 06/12/2002

Baltazar Rebelo de Sousa em visita ao Estádio Universitário de Lisboa (1957)

37 Mais vale tarde do que nunca...

Há dias recebi em Lisboa um telefonema de um antigo funcionário da Casa do Desporto do Porto. Depois da minha saída da Direcção Geral dos Desportos, em mea- dos de 1973, já lá vão 30 anos, nunca mais tivera contacto com ele. O telefonema era para me dizer que acabara de saber que eu, certamente em romagem de saudade, tinha passado pela Casa do Desporto num fim de tarde e que um funcionário me reconhecera e lhe terá que eu vinha todas as semanas ao Porto. Na verda- de tive o maior gosto em dinamizar, nos anos ’60, a implementa- ção de um programa de infra estruturas desportivas que ainda se encontram de pé... bem à vista. E sempre que posso, sozinho, gosto de passar uns momentos a observar cada uma delas – e foram muitas, e que agora até estão com melhor aspecto, dadas as beneficiações nelas introduzidas entretanto. Quis esse funcionário visitar-me na Av. da Boavista, logo a seguir ao referido telefonema. Veio para me cumprimentar pessoalmente, dizer-me umas tantas palavras amáveis e... para me trazer uma fotografia encaixilhada. Era, nem mais, a minha fotografia assinada pelos respectivos Pre- sidentes, que as Associações Desportivas do Porto tinham em lugar de destaque na Casa do Desporto, desde a sua inauguração, em sinal de reconhecimento. Ele tinha ficado fiel depositário da mesma, logo após a entrada em funções do novo delegado da DGD, pós 25 de Abril, porque este teria dito que já não era o tempo próprio para exibir esse tipo de recordações... Não precisei de lhe perguntar quem era esse delegado, cujo per- curso político foi bem marcado pelas ruas da chamada esquerda

38 Armando Rocha A Minha Opinião revolucionária. E agora, uma vez que esse Delegado já faleceu, ele sentiu coragem para me entregar a fotografia, em nome de Valores... Obrigado, Menezes! E Paz à alma do Delegado!

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 07/02/2003

39 Carros, motoristas, despesas

Toda a gente sabe que o País atravessa uma grave crise económica que não será fácil vencer. Essa crise, em parte, é devida ao despesismo que se apoderou da máquina do Estado, a partir mesmo de cima. Os órgãos de soberania não estão isentos, todos eles, de colabora- rem, talvez sem se aperceberem bem, nesse despesismo. Uma coisa é a dignidade dos Altos Cargos do Estado, outra bem diferente é a despesa supérflua ou desnecessária. Os Gabinetes da Alta Administração do Estado estão cheios de gente. São secretárias, são adjuntos, são assessores, são consul- tores... Pelo menos, quanto ao Governo actual, tenho a sensação de que terão sido tomadas medidas para aliviar o espaço antes ocupado com pessoas, certamente muito competentes, mas dispensáveis. Há uns anos atrás, pessoa amiga estava a instalar mais uma em- presa pública e telefonou-me para saber como se passavam as coi- sas em termos de automóveis, motoristas e contínuos no Grupo em que colaboro. E trata-se do maior Grupo empresarial português. Fiz-lhe o retrato da situação, que o deixou muito desiludido, quan- do lhe referi que no Grupo não há motoristas nem contínuos. O próprio presidente do Grupo não tem às suas ordens um motorista sequer. Como é conhecido do povo, não é assim que os organismos do Estado procedem. Mas aceitemos que alguns cargos, pela sua relevância, merecem esse tratamento. Só que esse tratamento deveria ser feito por ex- cepção e não por regra. Há certamente muitas outras funções que aqueles dedicados mo- toristas e contínuos poderiam desempenhar com bastante produti- vidade para o País e não só para uns tantos senhores. Mas o facto

40 Armando Rocha A Minha Opinião

é que a cultura própria dos nossos dirigentes não está disposta a ser mudada. Não estará? Ainda há dias tomei parte num funeral de pessoa bem conhecida, num domingo à tarde. E lá encontrei um destacado parlamentar com o BMW da Assem- bleia da República, conduzido por um motorista. Será que esse alto dignatário, nesse dia feriado, não poderia con- duzir ele próprio a viatura oficial, deixando o motorista repousar com a família? Para além de que o Estado deixava de processar as horas extraordinárias respectivas...

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 28/03/2003

41 Humberto Coelho – treinador português é respeitado e admirado na Coreia do Sul

Desloquei-me recentemente à Coreia do Sul, mais propriamente a Daegu, 3ª cidade do país, com 2,7 milhões de habitantes. Fui lá assistir à UNIVERSÍADA de 2003, os Jogos Mundiais Universitários, a que Portugal concorreu com uma delegação de 70 atletas e di- rigentes. Certo dia, estava no hall do Hotel Inter-Burgo (de raiz espanho- la) quando vejo dirigir-se-me uma pessoa de braços abertos. Era nem mais nem menos que o seleccionador nacional de futebol da Coreia do Sul: o nosso bem conhecido Humberto Coelho, com quem contactei bastante quando ele era jogador/capitão do S. L. e Benfica e internacional de méritos consagrados, em fins dos anos 60 e princípios dos anos 70. Era ele o defesa central do Benfica que venceu a Taça de Portugal de ’69. Não lhe entreguei essa Taça porque o lugar de capitão ainda estava tapado pelo grande Mário Coluna. Jantámos ambos e muito conversámos sobre as coisas da nossa Terra a que ele continua bem ligado até porque a Federação de Futebol coreana lhe instalou, no seu magnífico apartamento, a RTP Internacional. E apercebi-me de que está mesmo muito bem cotado na sociedade coreana. À sua volta estava sempre uma “chusma” de admiradores a pedir-lhe autógrafos que ele dava com simpatia, e outros a quererem apertar-lhe a mão. Na sala ao lado do Hotel jantavam os dirigentes da Esgrima do top mundial e da Coreia. No final do jantar, ao passarem por nós, quiseram mesmo prestar a sua homenagem ao homem em quem a Coreia confia para uns brilharetes internacionais do seu futebol. O que não será fácil, diga-se. Pelo seu adjunto, o Prof. Dr. José Augusto, dragão assumido, fiquei a saber que ele não pode sair à rua… tal o envolvimento que os passantes lhe dedicam… Era uma autêntica loucura, que eu ava-

42 Armando Rocha A Minha Opinião liei bem pelo que me foi dado assistir no hotel em Daegu. Ele é um autêntico embaixador de Portugal na Coreia, que o próprio Embaixador Dr. Carlos Frota muito respeita e admira. E eu fiquei muito satisfeito por ver que, também no longínquo Oriente, há um português que respira sucesso. Parabéns, Humberto Coelho

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 19/09/2003

O autor, acompanhado pelo Presidente e pelo Tesoureiro da FISU, na Universíada de 2003 - em Daegu, Coreia do Sul

43 Outras terras, outras gentes – a Coreia do Sul

Voltando à minha recente deslocação à Coreia do Sul, tivemos a ale- gria de ser recebidos, à chegada a Seoul, pelo embaixador Dr. Carlos Frota que veio mesmo a deslocar-se, dias depois, a Daegu para viver de perto a vida da nossa Delegação. Fez-me lembrar o embaixador Dr. José Nosolini, em S. Sebastian, nos Jogos Internacionais da FISU de 1955. O que é raro nas relações entre as Embaixadas e o Desporto no estrangeiro, a não ser talvez no futebol… Quando chegámos ao aeroporto de Daegu, tinha uma escolta de 4 polícias até ao carro que me foi distribuído e o meu intérprete era um estudante a prestar serviço militar. Dali até ao hotel tive escolta de um polícia de moto. E no hotel só se entrava depois de revistado, tendo em cada andar a companhia de um segurança, aliás sempre amável. E havia tropas que circulavam bem armados e com cães pelos corredo- res e vizinhança do hotel. A segurança dos jogos tinha um orçamento de 15 milhões de contos… Lá fui encontrar velhos amigos das lides do desporto universitário in- ternacional: entre eles o Scarpiello, com os seus 80 anos, de cadeira de rodas. Perante a minha admiração por se ter sujeitado, naquelas circunstâncias, a uma viagem aérea de mais de 11 horas, sem escala, ele respondeu-me que preferia morrer ali entre os desportistas em competição do que numa cama de hospital mesmo que muito bem tra- tado! Força, “Pilo”! Tive ocasião de assistir à assembleia-geral da FISU em que foram eleitos os órgãos sociais para o próximo quadriénio. A luta de blocos veio ao de cima com que força… com a China e a Fran- ça muito bem “organizadas” a “dominarem” os cordelinhos de África e Ásia. Resultado, não foram eleitos quaisquer representantes quer de Itália (a “mãe” das Universíadas) nem da América Latina. Quanto a nós tivemos a felicidade de ver eleito o representante português, Pedro Dias, que teve de enfrentar várias voltas de votação. Mas, também com a preciosa ajuda de Carlos Lopes (Angola) junto de países africa-

44 Armando Rocha A Minha Opinião nos, passou a integrar o Comité Executivo, coisa que já não sucedia desde 1973, ano em que eu próprio fui reeleito em Moscovo, mas de que fui saneado pelo governo de então, após a revolução de Abril. De Nebiolo, apenas já só foram feitas breves referências pelo Roch Campana, Roberto Outeiriño e Constantin Annastassov… “Sic gloria transit mundi…”. Nos jogos participaram 174 países, com 4.500 atletas e 3.500 oficiais que estavam alojados numa “Vila de Atletas” construída para o efeito e que, depois dos jogos, seria vendida em largas centenas de aparta- mentos. A organização era apoiada por 10.000 voluntários que eram de uma solicitude e amabilidade inexcedíveis. A cerimónia de inauguração dos jogos, a que presidiu o Presidente Roo Moo-hyun, teve lugar num belo estádio para 66.500 espectadores construído para o campeonato do mundo de futebol de 2002, e foi rodeada de fortes medidas de segurança. Foram mesmo deslocados para Daegu 4.000 polícias. E o espaço aéreo foi fechado, até porque constou que se aguardava um atentado químico por parte de terroris- tas. O planeamento dos jogos era tão pormenorizado que as 2 Coreias desfilaram em conjunto com os mesmos trajes. Isto, embora a presen- ça da Coreia do Norte só tenha sido decidida sobre a hora da abertura dos jogos. O pormenor desse planeamento expressava-se mesmo na existência em cada lugar do estádio de um bonito saco contendo um abanador (o calor húmido apertava) e uma pequena lanterna. Essas lanternas, todas acesas, proporcionavam um ambiente lindíssimo. E em pontos estratégicos, as cores dessas luzes desenhavam mensagens muito bonitas. A coreografia das cerimónias de abertura e encerramento dos jogos era deslumbrante. As cores dos fatos dos milhares de rapazes e ra- parigas que entravam e saíam do estádio proporcionavam, nas suas cambiantes, quadros de rara beleza. O início do espectáculo foi de grande simplicidade: do centro do relvado foi disparado um foguete que projectou no ar uma nuvem que era nem mais nem menos que o desenho do conjunto das 2 Coreias. Houve uma ordem expressa da Organização para que os voluntários não falassem com os seus “irmãos” do norte nem lhes tirassem foto- grafias, a fim de evitar eventuais conflitos diplomáticos. O bilhete de ingresso no estádio para a cerimónia inaugural custava,

45 nos melhores lugares, cerca de 26 contos. Diga-se que o nível de vida lá é muito alto. Mas também se observava que se trabalhava muitíssi- mo. O comércio estava aberto noite dentro, mesmo aos sábados. E ter férias, era considerado um luxo… A dificuldade da língua só era atenuada com os intérpretes que nos acompanhavam. Mas sucedeu um caso interessante com um dos por- tugueses participantes e um motorista de táxi que o conduzia. Este, a certa altura, apercebeu-se da nacionalidade do passageiro e logo lhe falou de Amália Rodrigues, dizendo que tinha uma cassete com os seus fados… Desde a nossa chegada à Coreia que se respirava Universíada, tal a profusão de cartazes, bandeiras e táxis engalanados. Era toda uma comunidade que aderia aos jogos. Os nossos atletas tiveram um comportamento digno. As medalhas, em algumas disciplinas, não ficaram longe. Só que as nossas melhores atletas optaram por ir aos Campeonatos do Mundo de Paris que se realizaram na mesma altura. Acompanhei de perto a nossa equipa de voleibol e os jogadores de té- nis que tiveram uma boa prestação. Jogou-se quase sempre no mag- nífico pavilhão da Universidade Católica. Não esqueço o jogo contra a China a quem vencemos por 3-1. As claques das nossas equipas, com cartazes e bandeiras, eram constituídas por jovens de uma igreja coreana ou de escolas que cantavam e lançavam mensagens de apoio com entusiasmo durante todos os jogos. Mas a claque que mais me impressionou foi a da Coreia do Norte, com 300 jovens muito bem vestidos e com canções lindíssimas e sem descanso. Nas provas de natação, em que fui convidado a entregar várias meda- lhas aos vencedores das provas, convivi de perto com o actual presi- dente da Federação Japonesa de Natação, Furuashi, que foi campeão olímpico nos Jogos de 1952, em Helsínquia. A emoção que denuncia- va durante as provas dos seus conterrâneos era bem visível na face… Na Vila dos Atletas a sua maior diversão era a internet. Fazia-se bicha para alcançar lugar ao computador. Os transportes funcionavam muito bem. Não nos esqueçamos que a Coreia do Sul é um grande fabricante de viaturas ligeiras e pesadas através da Daewoo, Hyundai, Kya. Esses transportes foram a chave do sucesso da organização. Lembremos que, para assistir à final de

46 Armando Rocha A Minha Opinião basquetebol, entre a Rússia e a Sérvia-Montenegro tivemos de andar 80 kms. Perguntei a vários elementos da delegação se tinham assistido a al- gum “toque”, acidente de viação. Que não, foi a resposta. Nas auto estradas o limite de velocidade é de 100 kms/h o qual é normalmente respeitado já que há muitas câmaras de vídeo à espreita… À primeira vista, parece haver grande civismo. Os espaços verdes estão muito bem cuidados e não se vêem sequer papéis nas ruas e jardins. Che- gam a levar “lixo” para casa para ser depositado nos respectivos reci- pientes. A cidade é atravessada por um longo rio que deu origem a vários canais. Nas suas margens, muito bem cuidadas, estão implantados recintos de jogos e parques de lazer para crianças e adultos, tudo gra- tuito. Aos domingos os carros circulam alternadamente conforme se trate de matrícula par ou ímpar. Não é obrigatória essa medida mas, de uma maneira geral, ela é respeitada. Os motoristas oficiais estavam sempre muito bem vestidos, com fato e camisa impecáveis e muitos usavam luvas brancas. O hotel Inter-Burgo é propriedade de espanhóis. Talvez por esse facto, nele se pode ver a TVE com as suas telenovelas. A Junta de Castilla y Leon montou no hall do hotel uma grande banca onde se podiam apreciar o bom presunto pata negra, a tortilla e alguns bons vinhos espanhóis, numa promoção muito bem organizada e bem apreciada pelos hóspedes e passantes do hotel. Foi aí que encontrei o seleccionador nacional de futebol da Coreia do Sul, o conceituadíssimo, entre os coreanos, Humberto Coelho. Os seus “fãs” eram numerosíssimos. A todos atendia com a maior simpatia.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 10/10/2003

47 Desperdícios

A nossa vida de cada dia é feita de pequenas coisas às quais, mui- tas vezes, não damos qualquer atenção. As famílias vivem de um orçamento familiar, na maioria dos casos, bastante apertado. E há famílias e seres humanos isolados que não têm sequer dinheiro para se alimentar. Isto passa-se mesmo à nossa porta… não é preciso ir longe. Esta é a triste realidade dos dias de hoje e que bem gostaríamos de ver alterada. Os orçamentos familiares são alimentados, de uma maneira geral, pelo Estado e pelas empresas, quaisquer que elas sejam. E as despesas das famílias devem comportar-se dentro de parâme- tros exigentes de satisfação de necessidades indispensáveis. Os luxos, os desperdícios, quando existem e, infelizmente, estão por aí e vêem-se à vista desarmada, deverão ser uma excepção só própria de ricos. E mesmo desses… bom seria que os luxos fossem trocados por outras coisas mais necessárias. Isto para chegar à conclusão de que, quanto maiores forem as receitas dos agregados familiares e menores as suas despesas cor- rentes, mais eles podem distribuir pelos seus membros. O mesmo se aplica ao Estado e às empresas de quem depende o dia a dia da maioria dos nossos concidadãos. Vejamos então o que podemos fazer apenas e só para nosso bem. Podemos começar por apagar as luzes que não estão a ser necessárias. Até porque a electricidade que consumimos é em grande parte importada do estrangeiro e produzida também nas centrais termo- eléctricas que consomem enormes quantidades de fuel que Portu- gal tem de comprar no exterior. Na verdade, o que se passa, em especial nas empresas, escritórios

48 Armando Rocha A Minha Opinião e serviços do Estado é o seguinte: a brigada da limpeza chega muito cedo para fazer o seu serviço e começa naturalmente por acender as luzes. Ficam todas elas acesas. E ao fim da tarde os empregados e funcionários e mesmo chefias abandonam os seus postos de trabalho mas não apagam as luzes. Até que vem, já noite alta, o Segurança que, espera-se, se preocupe com o apagar das mesmas. Façam-se umas simples contas e chegar-se-á à conclusão de que os milhões de pontos de luz acesos, sem necessidade, custam a todos nós muitos milhões de euros. Se és amigo de ti próprio poupa na energia eléctrica e aconselha os outros, em especial os teus filhos, a fazerem o mesmo.

Publicado no jornal “Região de Águeda” de 10/10/2003

49 A demissão de Pedro Lynce

Os órgãos de informação trataram exaustivamente do caso da de- missão do Prof. Pedro Lynce. Do que se leu e ouviu bate-se sempre na mesma tecla: o Ministro cometeu uma ilegalidade. De boa fé? Não interessa. Porém, não tenho visto referências ao comportamento do director geral do Ensino Superior que foi, em meu entender, quem propor- cionou todo este imbróglio. Porquê? Apenas e só porque ele não terá usado a sua competência para indeferir pura e simplesmente o requerimento da candidata Diana. E, uma vez que levou o processo a despacho do Ministro (será que o Ministro o avocou?), devia ter-se limitado a informar, sem mais considerações, que a lei não permitia o seu deferimento. Ao que parece, o director geral quis ser simpático, ou quis, também ele, fazer “política”. Ora isso é incompatível com o seu estatuto de funcionário, que não de político. Escrevi em 1980 que o novo regime de provimento dos directores gerais os transformava em meras “mulheres a dias”. Isto sem ofen- sa para essas serviçais dignas de consideração. Esse regime faz com que qualquer director geral – haverá ex- cepções, naturalmente – queira agradar ao seu ministro para se aguentar no cargo. Nem que para isso se tenha de menosprezar a Lei. Há uns tantos anos atrás, em que os directores gerais da função pública eram vitalícios, como em França aliás, a situação em causa era impensável. O director geral que actuasse contra a Lei, tinha os dias contados, mesmo sendo vitalício! Pelos vistos, aqui e agora não é assim, mas mal. Sei do que falo, na medida em que exerci aquele tipo de funções, em regime vitalício, durante 10 anos, e posteriormente, em regime de comissão, durante 3 anos, quer em ditadura quer em democra-

50 Armando Rocha A Minha Opinião cia. Por estas e por outras é que se vem reclamando de há muito a Reforma da Administração Pública. Só que os políticos têm de aceitar o domínio da Lei sobre as suas conveniências partidárias ocasionais. Até porque são os políticos afinal que fazem as leis…

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 17/10/2003

51 Pode abusar-se da Liberdade?

Há dias, na entrada para uma comemoração dos 170 anos no Supremo Tribunal de Justiça, em Lisboa, passou-se uma cena que me impressionou fortemente. Essa cena teve larga difusão na imprensa escrita, nas rádios e nas televisões. A maioria dos órgãos de comunicação verberou a ati- tude de um magistrado judicial que é, nem mais nem menos, o presidente do Tribunal da Relação de Lisboa. O mesmo que foi chamado a intervir num recurso apresentado pela defesa de um político detido preventivamente, não mais do que isso, que é mui- to, por causa do processo da pedofilia. Ele excedeu-se usando termos menos próprios, porquê? Apenas porque não queria ser filmado nem prestar declarações naquele lugar e àquela hora. Ora não será isto um direito do cidadão magistrado como aliás de qualquer outro cidadão? E o homem não é de ferro… Será que a liberdade de informação pode violentar esse direito a seu belo prazer e que eu julgava sagrado - o direito à privacidade? Parece que não. As câmaras filmam quem querem, onde querem, contra vontade dos próprios, e depois achincalham-nos na praça pública com maior ou menor crueldade… Senhor Magistrado: não o conheço. Fiquei a saber quem era pela TV. Lamento que tenha usado o termo que usou para qualificar uma máquina de filmar, mas compreendo a sua reacção já que quem se não sente não é filho de boa gente. Para além de que se não presta um grande serviço ao poder judi- cial andar a mostrar os seus rostos que, depois, têm de ser prote- gidos por seguranças especiais que o Povo tem de pagar através dos seus impostos. Tudo em nome da liberdade.

Publicado no jornal “Região de Águeda” de 17/10/2003

52 Armando Rocha A Minha Opinião

As propinas - Quem acode aos nossos impostos?

Todos nós, os que pagamos impostos e que não fugimos a eles, sabemos que os mesmos se destinam a suportar encargos da so- ciedade civil e militar. Tudo bem!. Na sociedade civil, por exemplo, esses impostos contemplam a es- colaridade obrigatória e não obrigatória. Nesta se inclui o ensino superior universitário e politécnico. Tudo bem! Como, graças a Deus, na vida profissional activa que vou termi- nar em breve, sou dos que têm vindo a ser sobrecarregados com um IRS que se aproxima dos 40%, isso significa que, de cada mil contos que a entidade patronal me pague, 400 contos vão para impostos. Naturalmente que me não queixo desses descontos na condição de que eles sejam bem aplicados em favor dos que mais precisam. Mas não em favor dos que menos precisam e até, em muitos ca- sos, nem sequer pagam impostos ou então são taxados pelo salá- rio mínimo nacional, ainda que se desloquem de helicóptero para reuniões de carácter social. Assiste-se, nesta altura, a um movimento estudantil sem preceden- tes contra as propinas. E vai daí, toca a encerrar as escolas a cade- ado! O que suponho ser crime. E invade-se o Senado e insulta-se o Reitor ou Presidente de Instituto. E corta-se o trânsito… etc., etc.. Calculo eu que os Senhores Professores se sintam indignados com esta situação já que não podem fazer aquilo de que tanto gostam certamente: dar aulas que, afinal, são pagas pelo erário público, ou seja, pelos impostos de quem os paga. Os estudantes não se queixam de que faltem professores e isso seria gravíssimo. Eles até serão demais em alguns Departamentos ou Faculdades.

53 A falta de instalações, designadamente para a acção social, é um outro problema a que somos naturalmente sensíveis. É preciso é saber para quê? Não será para arrumar turmas de cursos sem alu- nos, ou de reduzidíssimo número de alunos, que os há e não são poucos, ou então para alojar alunos que não tenham mérito. Enfim tudo isto para dizer que bem gostaria que qualquer aluno com mérito não fique privado de estudar por falta de condi- ções económicas. Mas também gostaria que os impostos que pago não se destinem a um sistema que permite a um qualquer dirigente acadé- mico manter-se durante 8 anos a estudar (?) na Faculdade, tendo ainda à sua frente mais 3 anos, se tiver sempre apro- veitamento, para concluir o curso. Isso não! A autonomia da Universidade deveria atalhar casos como este, que não são tão excepcionais como possa parecer. Uma avaliação independente da situação seria bem acolhida pela sociedade civil...

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 14/11/2003

54 Armando Rocha A Minha Opinião

Crime sem castigo?

O conhecido processo das viagens feitas por três dezenas de ex- deputados chegou finalmente ao seu termo. E teve um triste fim, direi mesmo. Desde logo, confesso que me não repugnam as viagens de eleitos da Nação, desde que feitas com são critério e parcimónia. Ao que parece, o sistema que permitiu esses desvarios durante largos anos já terá sido ultrapassado com um novo regulamento mais aperta- do. Ainda bem. Só que desse processo não saíram bem nem a Assembleia da Re- pública, donde deveria vir o exemplo para os seus eleitores, nem a Procuradoria Geral da República que terá deixado prescrever os processos de que se ocupou, ou melhor, não se ocupou com o empenho minimamente exigível. Essa mesma Procuradoria que agora deu luz verde ao arquivamen- to dos processos!... Em termos jurídicos, o que se passou nesse domínio não é classi- ficado de crime? Se é, e parece nisso não haver dúvidas, o crime ficou sem castigo. E o erário público ficou desfalcado de mais de 45 mil contos relati- vamente a 25 desses senhores deputados… Mas, para que servem afinal os impostos? Também para suprir estes crimes… certamen- te. Se eu pudesse exigir alguma coisa, nesta matéria, sabem o que era? Que, simplesmente, fossem divulgados os nomes dos tais de- putados que faltaram às suas obrigações a fim de que o Povo pu- desse pensar duas vezes se eles se voltassem a apresentar a votos. Apenas isto, ao menos isto. Sei que para isso seria preciso haver coragem… e ela anda arredia da nossa vida política…

Publicado no jornal “Região de Águeda” de 21/11/2003

55 A propósito de dinheiros autárquicos…

O Diário de Notícias (Lisboa) de 11 do corrente mês, no sector da necrologia, tinha estampados 7 anúncios relativos ao falecimento do pai de um badalado presidente de Câmara da área metropoli- tana do Porto. Esses anúncios ocupavam 3 páginas inteiras de publicidade paga – um, da Câmara, de página inteira, dois de meia página cada, da Assembleia Municipal e do SMAS, dois de um quarto de página de 2 empresas municipais, mais dois também de um quarto de página cada, de 2 Associações ligadas ao presidente da Câmara. A Câmara repetiu o anúncio no mesmo jornal no dia seguinte ago- ra já só num quarto de página. Se isto se passou com um jornal de Lisboa, o que se não terá pas- sado com os jornais do Porto… pensei eu. Pois bem, nem de pro- pósito, dias depois, em reunião de gestores de empresas da zona norte, assisti aos comentários indignados de vários deles face ao que se passou com os jornais da Invicta. Um escândalo, dizia-se. Só num deles cada página de publicidade custa a módica quantia de 2.000 contos, ou seja € 10.000. Obviamente que considero legítimas estas manifestações de pesar pelos entes queridos, por parte dos seus amigos, correligionários e simples concidadãos. E que gastem todo o seu próprio dinheiro que entendam nas mesmas. Agora que o façam à custa do erário público/autárquico em over- doses é que me parece despropositado e anti-social. Quando se ouvem os discursos de certos políticos locais e regionais bem conhecidos, a conversa é sempre a mesma: coitados dos de- sempregados, as autarquias precisam de mais meios da adminis- tração central para combater esse e outros flagelos, para dar me- lhores condições de vida para os munícipes, etc.. Todos os gestores da res publica têm obrigação de dar o exemplo de parcimónia nos

56 Armando Rocha A Minha Opinião gastos dos dinheiros que o povo lhes confia através dos impostos. Em especial, os mais altos dirigentes partidários que se apresen- tam permanentemente como defensores da justiça social. A solidariedade social pratica-se, não se propagandeia a propósito de tudo e de nada! A vida também é feita de pequenas coisas que, somadas, fazem ou não fazem grandes coisas. Finalmente, fico com curiosidade em saber se algum deputado mu- nicipal teve ou terá coragem para questionar o executivo camará- rio sobre este tipo de gastos. Como acontece e bem, em Águeda.

Publicado no jornal “Região de Águeda” de 02/04/2004

57 Dinheiros públicos…

Existem grandes empresas de capitais públicos e também alguns privados que encerram os seus exercícios com muitos milhões de lucros. A razão dessa situação fica a dever-se, entre outras, à natu- reza da empresa (monopólios…em alguns casos), a uma razoável gestão e ao mercado que as aprecia. Esta é uma realidade a que não podemos fechar os olhos. E ainda bem que há quem gere lucros. Esses lucros, porém, não devem dar o direito a quem dirige essas empresas de esbanjarem parte desses lucros em sinecuras escan- dalosas. Não é de hoje, não é de ontem, não sei é até quando, mas ainda tenho esperança em que a justiça e a vergonha desçam à Terra. Isto vem a propósito de uma situação que me foi relatada como segue: Os gestores desse tipo de empresas são eleitos em assembleias- gerais em que o Estado se faz representar e com um peso grande nas decisões. Os gestores são eleitos para mandatos normalmente de 3 anos. E são usualmente recrutados entre os “barões” dos principais partidos políticos que têm uma “bolsa” de emprego bem recheada de pessoas muito válidas e também com pouca ou ne- nhuma qualidade. No fim dos mandatos, naturalmente eles são reconduzidos ou são substituídos, consoante as correntes partidá- rias estão no poder ou passam à oposição. Pouco interessa a aná- lise das performances alcançadas. Mesmo assim eles são sempre os mesmos. Só mudam é de empresa ou de lugar na mesma em- presa. Há uma espécie de acordo tácito entre as várias correntes políticas nesse sentido. Quando o eng. Guterres decidiu abandonar o barco português para se dedicar à política internacional socialista, a coligação PSD/ PP conquistou as rédeas do poder. Daí que, na altura, a classe dos

58 Armando Rocha A Minha Opinião gestores públicos se tenha agitado a pensar no seu futuro…dese- nhando-se logo uma onda de solidariedade pessoal/institucional. Alguém falou em solidariedade social? Claro que essa é para os carenciados, cada vez mais carenciados… Um desses gestores estava a escassos, repito, escassos meses do fim do mandato e seria daqueles que não sobreviveria à mudança de rumo político do País. Ele pertencia ao clube de Guterres e ti- nha sido “recrutado” para as funções por um ex-ministro socialista, agora presidente da empresa. Foi então que a solidariedade partidária funcionou. Como? Antes que o mandato chegasse ao fim, e o gestor sairia de mãos a abanar, o seu correligionário “despediu-o” com direito, natural- mente a ser indemnizado. Com quanto? Umas migalhas de cerca de 800.000 euros… E quando me relatavam essa situação logo outrem, que estava por dentro da situação, referiu que havia outra situação idêntica na mesma empresa em que outro gestor recebeu “apenas” cerca de 2.400.000 mais o carro… E nós perguntamo-nos: em nome de quê? Da democracia, não! Da transparência, nunca! Da competência, quem diria! Da solidarie- dade política, isso sim! E bastou. Finalmente fiz umas pequenas contas para saber: quantos- por tugueses da classe média conseguirão ganhar durante toda uma vida de trabalho esses € 800.000 ou os mais de 2 milhões de €? Cada um também as pode fazer. Será que ninguém quer saber destas pequenas coisas do nosso dia a dia? E depois não há dinheiro para apetrechar escolas e hospitais…Pois é! Ele não chega para tantos desmandos…”Quousque tandem…”

Publicado no jornal Soberania do Povo de 2/04 /2004

59 Águeda em passeio

A ANATA organizou recentemente um passeio para as bandas do sul, em que incluiu Sintra, Cascais, Aveiras, Tomar e Fátima, a que aderiram umas 60 pessoas, todas imbuídas do espírito eterno da Águeda a Linda. Por esse motivo, foram feitos convites a aguedenses residentes na Capital do ex-Império que se associaram gostosamente a essa jor- nada de confraternização também, e essencialmente gastronómi- ca, através de um almoço que teve lugar numa magnífica Quinta em Aveiras de Cima, propriedade de um aguedense de sucesso - à custa de muito trabalho, certamente - que é o José Henriques da Silva, do Sardão. Ele e sua Mulher foram uns excepcionais an- fitriões. Também eu quis marcar presença e devo dizer que me não ar- rependi de ter trocado o meu passeio/conversa dominical no CIF pela estrada que percorri para chegar a esse local bem aprazível, a que não faltava sol nem a sombra necessária ao repasto. Antes pelo contrário! Em regime de pic-nic de que já tinha tantas saudades (como o tempo voa...), lá se comeu do bom e do melhor (os rojões...) que se “fabrica” (não é afinal Águeda uma floresta de fábricas autênti- cas?) na nossa Terra. E bebeu a “pinga” que sabe a qualquer coisa de muito especial (com que me delicio no Ribeirinho quando vou a Águeda)... E os doces?...Os seus ataques variados ao estômago até pareciam feitos de sensações de prazer há muito desejadas. Eram todos excelentes porque feitos por mãos carinhosas e sábias que seguiram as receitas caseiras de datas já distantes: era a ale- tria que o António Sucena dizia que era receita de minha avó Elisa, era a barriga de freira, era o arroz doce, era o pão de ló, eram os sequilhos, eram... Tudo era muito bom e, curiosamente, graças a Deus, nem sequer deixaram sequelas... a não ser saudades.

60 Armando Rocha A Minha Opinião

O Silva Pinto foi um autêntico “maestro”, com uma voz que bem poderia passar em S. Carlos. Os seus dotes de “cavador” (agora que ninguém quer trabalhar a terra) ficaram bem demonstrados na plantação de uma árvore a significarem que a ANATA não mor- rerá. O “fadista” viola veio recordar-me os tempos de Coimbra e a voz do António Bernardino de Ois da Ribeira... A Luciana parece que cada vez está mais nova... é uma autêntica força da natureza. Enfim, uma jornada muito agradável que me leva a agradecer os mimos gastronómicos que me deliciaram e a felicitar a ANATA pelo êxito alcançado. Quando se diz que a sociedade anda tão deprimida, só se fala em desgraças, em pedofilia, em ataques terroristas, em dúvidas sobre o Euro 2004, que se pense também que ainda há coisas boas entre nós – a amizade, a fraternidade, a saudade e a esperança num futuro melhor em paz.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” em 16/04/2004

A Direcção da ANATA - 2007

61 O desporto antes e depois do 25 de Abril

Eu deixei a Direcção Geral dos Desportos e a Inspecção Nacional do Desporto Universitário em Agosto de 1973. Tinha sucedido na DGD ao Dr. Valadão Chagas, em 1963. Fiz parte dos órgãos sociais da Federação Internacional do Des- porto Universitário (FISU) de 1955 a 1973 (Portugal só voltou a estar representado no seu Comité Executivo 30 anos depois), tendo o Ministério da Educação promovido o meu saneamento dessas funções, logo após a Revolução de Abril. O Estado português nun- ca quis servir-se da minha experiência desportiva internacional e nacional para o que quer que fosse até hoje... Não obstante isso, já depois de Abril, fui eleito presidente da Fede- ração Portuguesa de Ténis e dirigente da Federação Portuguesa de Basquetebol e Associação de Ténis de Lisboa. E a FISU atribuiu-me, em 1997, a categoria de Membro Honorário. Daí que tenha continuado a acompanhar o fenómeno desportivo, agora já não tanto por dentro, como antes de Abril, mas sempre interessadamente. Vou aos jogos de futebol, em especial, no Res- telo e acompanho a Sport TV assiduamente. E tenho assistido ao deturpar da história recente com grande per- plexidade e alguma tristeza. É que as mentiras de tanto repetidas passam a ser verdades... Como foi o caso, por exemplo, do Eusébio dizer, ou alguém dizer por ele, que o Conselho de Ministros presi- dido por Salazar o tinha considerado património nacional para o impedir de se transferir para o estrangeiro..., que a selecção de fu- tebol, em 1966, tinha feito a viagem de Manchester para Londres, de autocarro... (viemos todos num excelente combóio). Em 1973, o Desporto nacional era, no seu todo, subsidiado pelo Estado (DGD-FFD) com 68 mil contos ou seja, ao câm- bio de hoje, cerca de 3 milhões de contos. Hoje, esse número atinge, certamente, muitos mais milhões. O que significa que

62 Armando Rocha A Minha Opinião

é possível fazerem-se muitas mais coisas. Nos anos ’60, com o advento dos dinheiros do Totobola, a política era a de se construírem instalações desportivas modestas, mas opera- cionais para a prática desportiva, sem preocupações com as necessidades do desporto-espectáculo. Foi o caso das largas dezenas de pavilhões gimnodesportivos e dos tanques de aprendizagem de natação construídos nas escolas ou junto às escolas. Considero um desastre a interrupção dessa polí- tica. Hoje, a grande preocupação é a de se construírem infra es- truturas para a comodidade dos atletas (tudo bem) e do pú- blico, o supérfluo. As largas somas investidas têm um repro- dutividade limitada. O Estado descura a sua obrigação de facultar instalações mí- nimas às Escolas e, por outro lado, consome largos recursos em actividades e eventos que têm mais a ver com o espec- táculo, o efémero. O Desporto Escolar parece que só agora entrou na agenda política. Ainda bem. Sem desporto esco- lar não há verdadeiramente desporto nacional (disse-o em 7/5/1963). Em termos de dirigentes sempre houve e continua a haver muitos e bons, só que os tempos mudaram e, agora, também, muitos deles pensam, legitimamente aliás (a vida está difícil) em compensações. O dirigismo, presentemente, está muito profissionalizado, em detrimento da carolice. Para o bem? Talvez. Vejamos o sector da arbitragem. Antes, esse sector era indepen- dente das Federações e tinha autonomia. As Comissões de árbitros tinham representantes das Federações e dos próprios árbitros e eram presididas por alguém designado pela DGD. Está-se agora melhor com o actual sistema? Parece que não, a avaliar pelo que a PJ está a fazer. Reconheço que tenho saudades do tempo do Eng. Sousa Loureiro que deve estar tão triste quanto eu por ver a arbi- tragem abrir os tele-jornais. Em termos de atletas, a alta competição passou a ser o grande objectivo, com um profissionalismo escandaloso, deixando-se para segundo plano o amadorismo que existia antes. Mesmo o anterior profissionalismo corresponderia ao amadorismo de hoje. Quem bem o pode dizer é o Eusébio.

63 No caso do atletismo, por exemplo, houve uma estratégia delinea- da pela DGD, em finais dos anos ’60, que foi a de se investir no fundo e meio fundo. Os resultados falaram por si, e de que manei- ra, logo a médio prazo! No ténis, por exemplo, há muitos mais praticantes em termos de lazer. E na alta competição o panorama é fraco, não obstante o esforço do João Lagos em trazer grandes eventos para Portugal que deveriam despertar ambições... Mas não. Ao fim de 15 anos de Open do Estoril, o que ficou? Uma série de jornadas tenísticas de bastante nível (não tanto como o do Open de Portugal de 1983, em que a final foi disputada pelos osn 2 e 5 do mundo – Willander e Y. Noha – e não como recentemente, em que a final já não é disputada, normalmente, por jogadores de topo, com custos eleva- díssimos e que de muito positivo tem a ver com a feira de vaidades que se passeia pelas tendas... Mas há quem aprecie e promova mediaticamente esse tipo de actividade “desportiva”. Em termos de agentes de ensino tem de se reconhecer uma evo- lução enorme, a todos os níveis. Desde logo, no número de licen- ciados, mestres e doutores. Diria porém que gostaria de os ver a todos mais no campo do que nos gabinetes... Em resumo, do antes para o depois houve muitas melhorias no panorama desportivo nacional. O que é absolutamente natural, até por consequência da adesão à EU, com bateladas de dinheiro a entrarem nos cofres portugueses. Porém, fica no ar uma interroga- ção: com os volumes de dinheiros que foram afectados ao Despor- to nos últimos 30 anos, será que não teria sido possível fazer muito mais e muito melhor? Os estudiosos do tema têm a palavra. Eu acredito no futuro que está nas mãos dos nossos jovens despor- tistas a quem saúdo.

Este texto foi escrito a pedido do jornalista Norberto Santos, do Record, tendo o jornal aproveitado apenas a parte que está a “bold” e em itálico (25/04/2004 - pág. 29)

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Cientista português a trabalhar em Portugal

Assisti há dias à comemoração do aniversário da Delegação do Porto da Cruz Vermelha Portuguesa que teve lugar no Museu Soa- res dos Reis, instituição que honra o Porto mas que se projecta para além da Invicta, dado o notável acervo de obras artísticas que expõe. Aconselho vivamente uma visita para quem aprecia a Cultura. Por esse motivo, tive ocasião de abraçar um velho (sou eu) amigo das lides académicas coimbrãs, agora Presidente da CVP, o Dr. José Luís Nogueira de Brito. Também lá encontrei a campeoníssima Rosa Mota, sempre franzina e modesta, mas uma grande Mulher que conversa tão bem quanto corre a maratona... Mas, acima de tudo, tive o privilégio de escutar uma lição do Prof. Doutor Sobrinho Simões, renomado cientista internacional que trabalha presentemente no Porto em dedicação exclusiva à investi- gação. Nem tudo é mau, afinal, no nosso País! O tema desenvolvido focava “A Medicina no Século XXI”. Para além do encanto irradiado pelo ilustre Professor, à laia de conversa terra a terra, com explicações e diapositivos simples e compreensíveis por leigos como eu, sobre genoma, ADN, etc., re- gistei algumas passagens, tais como: • A medicina enfrenta hoje dois grandes problemas, a saber, o erro e o conflito de interesses, os mais variados. • Ao contrário do que alguns intitulados “pedagogos” apregoam, deve utilizar-se a memória. Mais, a memória deve ser muscula- da. • Deve pôr-se uma forte ênfase na prevenção da doença. • Está na ordem do dia a patologia do envelhecimento. A comunicação terminou com a enunciação dos grandes desafios que hoje se colocam à Medicina: • CURAR – onde se tem obtido grandes progressos;

65 • PREVENIR – começa a dar-se atenção ao tema; • CUIDAR – a problemática da 3ª idade está pouco tratada. Enfim, uma sessão que foi um encanto que até contou com a mú- sica alegre e bem disposta da Tuna do Instituto Superior de Enge- nharia do Porto. Parabéns à Cruz Vermelha Portuguesa, pela obra notável que tem vindo a desenvolver, há mais de 100 anos.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” em 07/05/2004

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Vasco Pinto de Magalhães*

O Estádio Universitário de Lisboa foi inaugurado pelo Ministro Lei- te Pinto, em 1956. Já lá vão quase 50 anos. Ao General Jorge Oom, esgrimista internacional de mérito e pri- meiro Inspector do Desporto Universitário, sucedeu o Eng. Vasco Pinto de Magalhães, rugbista de reconhecida categoria. Tratava-se de um desportista de excelente fibra, que não era nada meigo em jogo, a que aliava preocupações didácticas que muito o marcaram. Viveu, com o Eng. Nobre Guedes, o espírito olímpico de Pierre de Coubertain na teoria e na prática. Era um daqueles que sabia o que queria. E que realizava. E que deixou obra feita para ficar, como está aqui bem patente. Foi ele que idealizou e criou o CDUL, um clube que, para além de ser uma escola de formação, pudesse acolher todos aqueles estudantes que se distinguissem nas práticas desportivas. Nem que para tanto tivesse que lutar por uma regulamentação que permitis- se a transferência de atletas consagrados que militassem noutros, mesmo que grandes, clubes. Ainda estará na memória de uns tan- tos esse período agitado. O CDUL foi mais um dos seus filhos que ainda hoje marca posição de relevo no desporto. E que até já festejou as suas bodas de ouro, através de um percurso certamente nem sempre fácil para os seus dirigentes. Nessa altura, punha-se-lhe um problema de difícil solução: as ins- talações para o CDUL desenvolver a sua actividade. Foi aí que, uma vez mais, Vasco Pinto de Magalhães pensou gran- de. E lutou pela construção de um verdadeiro estádio universitário, numa altura em que o Estado apostava na criação de instalações modernas para as Universidades. Foi em Coimbra, foi no Porto e, naturalmente, também em Lisboa. Aqui, onde existia o bairro da

67 lata da Quinta da Calçada. Por feliz coincidência, o Eng. Vasco Pinto de Magalhães tinha uma relação privilegiada com o então Subsecretário de Estado das Obras Públicas, Eng. Alberto Saraiva e Sousa, felizmente aqui entre nós. Daí que, o chegar ao grande Ministro dos anos 50 que foi o Eng. Arantes e Oliveira, tenha sido um pequeno passo. O Ministro apadrinhou o projecto e não regateou meios para que Lisboa, Porto e Coimbra fossem dotados dos seus estádios univer- sitários que, ainda hoje, cumprem a sua missão. Na altura, a vida profissional do Eng. Vasco Pinto de Magalhães era muito intensa, com frequentes deslocações a Angola, mas ele sabia escolher os seus colaboradores. No caso em apreço, um de- les acompanhava o dia a dia do projecto que foi tomando corpo até ao dia em que o Ministro da Educação Nacional inaugurou estas magníficas instalações para os desportistas universitários lis- boetas. Por aqui têm passado milhares de universitários, e não só, que pela vida fora não esquecem certamente os bons momentos vivi- dos em treinos, competições e simples lazer. Não é verdade Prof. Pedro Lynce? Coube mesmo a um desses atletas - Cavaco Silva - , então já na qualidade de Primeiro-Ministro, proporcionar os meios para a recuperação integral deste Estádio. O Desporto Universitário, acima de tudo, deve ser uma fonte de saúde, de civismo e de democracia. Como é sabido as regras de jogo são iguais para todos. E, se os governantes tiverem passado por essa Escola competitiva, tanto melhor. Não esqueçamos que os estudantes de hoje serão os dirigentes de amanhã. E quanto mais bem formados eles forem, tanto melhor para Portugal. O Eng. Vasco Pinto de Magalhães legou um projecto que nunca estará acabado. A Família, a quem saudamos respeitosamente, os seus muitos pupilos e os que foram seus amigos bem o sabem. Em nome do Governo, OBRIGADO, Eng. VASCO PINTO DE MA- GALHÃES.

* Elementos para a homenagem ao Eng. Vasco Pinto de Magalhães, no Estádio Universitário de Lisboa, em 10/06/2004

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O EURO 2004 em Águeda

Há anos atrás, alguém disse no Parlamento: Águeda é o País! Virada a página do século XX, mais precisamente no passado sá- bado, Águeda encarnou o País. Na verdade, devem ter sido milhões os telespectadores que viram e reviram imagens do jogo treino da selecção nacional de futebol contra a selecção do Luxemburgo, tendo como pano de fundo a cidade de Águeda centrada, no caso, no seu bonito e funcional estádio. Foi a primeira vez que a equipa das quinas pisou um campo de futebol em Águeda. O que ficará a marcar a história do desporto aguedense. Na impossibilidade de assistir pessoalmente, como bem gostaria, também estive pregado à televisão para ver em acção os nossos artistas da bola. Eles são, todos eles são, na verdade muito bons executantes. Quando querem e estão inspirados, eles enchem o olho mesmo dos que dizem que não gostam de futebol. E em Águeda gostei de os ver em acção, especialmente na 1ª parte, antes da avalanche de substituições que este tipo de jogos proporciona, para que o seleccionador possa afinar a estratégia e melhor conhecer os jogadores. As gentes de Águeda, que tiveram o privilégio de estar presentes no Estádio, em dia primaveril, devem ter tido uma tarde em cheio, até porque Portugal ganhou, aliás, com todo o mérito. Na minha idade, este tipo de acontecimentos traz-me à recorda- ção, naturalmente, outros eventos também relevantes. Não posso deixar de lembrar os “magriços” de 1966 cuja saga vivi por den- tro. Eles obtiveram, até hoje, a melhor classificação de sempre em campeonatos do Mundo. Como não os recordar agora que esta- mos numa caminhada rumo à vitória no EURO? Não vai ser nada fácil, embora tenhamos valor para alcançar essa

69 meta. Scolari é apenas um treinador campeão do mundo. Isso diz tudo. Só é pena que ele não tenha disposto dos jogadores em pleno durante mais tempo. Todos eles são do melhor que há no mundo, mas eles têm de jogar em equipa. E uma equipa não se afina em escassas 2/3 semanas... Lembro que para Londres’66, a dupla Luz Afonso e Otto Glória tiveram todos os jogadores à dis- posição durante 2 meses. E porque não lembrar também esse grande Hernâni, da Venda Nova, que passeou a sua classe pelo mundo fora, ao serviço da selecção nacional? Os tempos são outros e Águeda não tem hoje um sucessor à altura. Mas há-de vir a ter, se Deus quiser. Em compensação tive o grato prazer de ver na televisão um ague- dense também equipado, junto da selecção, este na qualidade de assessor de imprensa – cargo muito delicado e de grande respon- sabilidade – de que se há-de sair bem. Força Afonso de Melo. Por Filipe Scolari, por todos os jogadores e por Gilberto Madaíl, com todos os portugueses que amam a sua Pátria, eu vou fazer força do princípio ao fim do campeonato.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” em 04/06/2004

Figo, no Euro 2004 em Águeda

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Apagar memórias

Nem de propósito. Li na última Soberania uma nota de CV sobre o apagar de memórias em que é referido o querido amigo Horácio Marçal, a propósito da retirada da placa de inauguração do está- dio de Águeda, cerimónia a que presidira como Governador Civil. E não é que verifiquei o mesmo no estádio universitário de Lisboa, quando fui assistir, no dia 10 de Junho, ao jogo de rugby entre a selecção nacional e os Barbarians? E resolvi, então, escrever ao actual director daquele estádio a se- guinte carta:

Meu caro João Roquette, Tenho por hábito não voltar amiúde aos locais onde exerci funções de direcção. Mantenho, porém, laços sentimentais muito profundos com aqueles que foram meus colaboradores activos. E guardo deles a memória do que fizemos juntos. Assim, ao longo dos tempos, várias vezes fui ao EUL mas ficava-me pelo edifício do Centro de Medicina Desportiva para aí ser atendido pelos excelentes médicos e fisioterapeutas que me tratavam das ma- leitas que a prática do ténis me provocava. E fui uma vez apenas à tribuna de honra do EUL, já depois das obras de beneficiação estarem concluídas, durante o Campeonato do Mundo de Juniores de Atletismo, nos anos ‘90. Fui lá para dar um abraço ao meu querido amigo Primo Nebiolo que era ao tempo presidente da IAAF. A convite da Federação Portuguesa de Rugby, voltei lá agora para assistir às comemorações do seu aniversário. E tive tempo para olhar as paredes do edifício principal do estádio, tendo reparado que ha- via nelas algumas placas. Mas não estava lá, nem mais nem menos do que a placa alusiva à inauguração do EUL, em 1956. pelo Ministro da Educação, Profes-

71 sor Leite Pinto. Naturalmente, fiquei triste com esse apagar memó- rias porque isso ofende a história e a identidade comum. Calculo que nas obras de beneficiação a que aludi tenha sido ne- cessário retirar a placa. Mas onde está ela? O director do estádio, ao tempo, ficou indiferente a esse gesto? Se o fez deliberadamente não merece o meu respeito. Se isso sucedeu por distracção desse director, ele não merecia ocupar o lugar. Caro Amigo, Daqui me permito sugerir que mande repor a placa que, ou está guardada numa arrecadação, ou foi no entulho das obras. Faça justiça agora, ainda que tarde. A história deve corresponder só e apenas à VERDADE. Um abraço amigo do Armando Rocha

Nota: O meu nome também foi riscado do Pavilhão Gimnodespor- tivo de Valença, a seguir à revolução de Abril. Quem o fez certa- mente que ficou feliz e a mim não me fez diferença...

Publicado no jornal “Soberania do Povo” em 18/06/2004

72 Armando Rocha A Minha Opinião

A verdade vem ao de cima?

Estive há dias num casamento em Albufeira que começou pelas 16h e se foi prolongando noite dentro. Houve, assim, muito tempo para conversas com pessoas simpáti- cas mais ou menos conhecidas. Entre elas, estavam dois antigos Ministros de áreas políticas diferentes, mas com quem se podem abordar os mais variados temas políticos civilizadamente. Falou-se bastante dos tempos revolucionários de Abril em que se evidenciaram as várias perspectivas de abordagem do assunto. Numa coisa se estava de acordo: a degradação da vida política portuguesa. Falou-se, por exemplo, no caso dos alunos que frequentavam o Instituto Superior Técnico e que logo de início se mostravam in- capazes de vencer a matemática que se lhes deparava, a ponto de começarem a “patinar”. Daí até à desistência do curso era um pequeno passo. E então apareciam os “pescadores” dos partidos políticos, todos eles, a aproveitar a maré e a levá-los para uma carreira política, sem grande necessidade de estudo. Certamente que o mesmo se passaria noutras Escolas. E o resulta- do está já à vista. A classe política, onde pontificaram nomes como Álvaro Cunhal, Sá Carneiro, Amaro da Costa, Vital Moreira, Veiga Simão, entre outros, é hoje uma sombra do que gostaríamos de ter a comandar os destinos do País. E cada vez será pior, não se tenha dúvidas. Não me referindo já aos homens de carácter que começam a contar-se com dificuldade. Há episódios da vida de conhecidos políticos que envergonham quem alguma vez neles votou, mesmo a coberto de anonimato partidário. Para bem deles, oxalá esses episódios só continuem no conhecimento de uns tantos “amigos”. Uma das figuras que veio à baila foi o Torres Campos que foi direc- tor geral dos Serviços Industriais, no governo de Marcello Caetano

73 e procurador à Câmara Corporativa, durante a Ditadura. A propó- sito de quê? Um dos presentes, antigo governante (anti-salazarista de sempre) e gestor de empresas privadas de sucesso, a propósito da falta de carácter de algumas pessoas, contou que em Julho de 1974 tinha sido convidado pelo Torres Campos, Secretário de Estado da Indústria, no governo de Vasco Gonçalves, para assumir a administração de uma delas com a intenção de dela sanear um colega engenheiro (João Paulo Castelo Branco) que lá se encontra- va há algum tempo. Esse convite foi de imediato rejeitado. Porquê? Porque o gestor em causa era e é um homem de carácter, sério e competente. O interessante nesta história é que, conforme escrevi no livro que publiquei, Memória (pág. 211), o Torres Campos me dissera em 1995 que ele próprio tinha procurado salvar de ser saneado pre- cisamente o eng. João Paulo Castelo Branco... que, aliás, já me tinha desmentido a versão do político que chegou a ser governo e administrador de empresas públicas de enorme peso na socie- dade... Comentários para quê? Ainda a propósito, li há tempos na revista Science (Março 2001) e recentemente na Visão (Fevereiro’2004) que o político Mariano Gago estava exilado em Paris aquando do 25 de Abril e que, se- gundo ele, se não podia ensinar Psicologia no tempo de Salazar. Ora bem!. Esse senhor - que chegou a ser ministro de Guterres - estava nessa altura em Paris pela simples razão de que era bol- seiro do Instituto de Alta Cultura (a que se juntava o salário de assistente no I.S.T.), no tempo em que Veiga Simão foi Ministro da Educação Nacional. Não consta que a Ditadura concedesse bolsas de estudo (de valor apreciável) para as pessoas se exilarem... Além de que até funcio- nava ao tempo o Instituto Superior de Psicologia Aplicada... Onde está afinal a noção de carácter desses ditos democratas dissi- mulados que por aí se pavoneiam e enriquecem à custa do Povo?

Publicado no jornal “Soberania do Povo” em 06/08/2004

74 Armando Rocha A Minha Opinião

Milhões para viagens Na Assembleia da República

É o tempo de se prepararem os orçamentos para 2005 nas empre- sas, no Estado e na Assembleia da República, os quais, para o bem e para o mal, se virão a reflectir no bolso de cada um de nós. Uma coisa é certa: quanto mais o Estado gastar, mais a população tem de pagar em impostos e em maus serviços por ele prestados. É notório o esforço que tem vindo a ser feito por alguns governan- tes, e que se louva, para inverter a situação em que o País caiu com tanto despesismo - nem sequer reprodutivo. Porém, começam a surgir sinais que me deixam preocupado. Um deles decorre da leitura que fiz num recente número do Diário de Notícias que escreveu a toda a largura da página: Assembleia vai gastar 2,2 milhões de euros em visitas ao estrangeiro. Não dá para acreditar! Então a contenção orçamental tem de ser feita apenas pelo Governo e pelas Famílias? E pela Assembleia da República, não? Para além disso, a imprensa diária tem vindo a referir que os depu- tados podem desdobrar os bilhetes de avião de forma a, com uma passagem de 1ª classe, poderem viajar 2 pessoas em turística. É a esposa, é o médico, é o amigo... acompanhante de idosos e não idosos... Enfim um fartote. Será que não ficaria bem aos deputados reconhecerem que tam- bém eles têm de fazer alguns sacrifícios e passarem a viajar na Europa (viagens de menos de 3 horas) em turística? Ficava-lhes bem e essa atitude até ajudava a melhorarem a ima- gem que têm perante a população, tão em baixo ela anda. Para além de que deve haver alguns deputados que fizeram o seu baptismo de vôo nessa qualidade. Estarei enganado? Nesses ca- sos, não sabem nem saberão o que custa a vida... a não ser quan- do forem desalojados do parlamento. Acreditem que quem não faz sacrifícios não tem autoridade moral

75 para os pedir aos que pagam os seus impostos e sofrem no dia a dia as dificuldades de manter com dignidade uma família. Não pretendo aqui analisar o mérito das viagens dos parlamen- tares. Mas o certo é que se desconhece a razão por que há tantos deles a viajar e outro tanto se desconhece a utilidade de muitas dessas viagens, para além do encanto das visitas a outras terras e outras gentes. Pensem em reduzir drasticamente o número de viajantes e de mis- sões, limitando-as ao essencialmente necessário para o País. Po- nham de lado o apregoado prestígio do País que tanto despesismo tem gerado! Prestígio são as medalhas dos Jogos Olímpicos! Mas pensem nisto, de alto a baixo. Em termos de viagens presidenciais então, a partir do Dr. Soares, é ver quem mais quilómetros faz por esse mundo fora... Não resisto a reflectir ainda sobre o caso de um ex-Primeiro-Minis- tro que declarava mesmo que o seu maior prazer era o de viajar! E, então, orientou a sua vida nesse sentido! Abandonou o barco a meio do mandato, “encaixou-se” na Caixa como assessor (figura que dá para tudo e mais alguma coisa) para receber um alto salá- rio e aí vai ele através da Internacional Socialista por esse mundo fora... Seria interessante saber quantos dias de trabalho efectivo o Eng. Guterres dá à Caixa por ano! Ou será que a I.S. tem a facul- dade de poder ter como “destacado” ou em comissão de serviço esse alto funcionário? E, como nesta nossa terra já tudo é possível, também não se pode- rá estranhar que um conhecido fundador do CDS, agora conver- tido à “esquerda” se tenha “galpelizado”, até porque a idade da reforma começa a espreitar... Continuo a dizer que a política é uma actividade tão nobre como qualquer outra actividade profissional, mas não se deve esticar a corda....

Publicado no jornal “Soberania do Povo” em 03/09/2004

76 Armando Rocha A Minha Opinião

O hino nacional no desporto

Naturalmente, segui com grande atenção o desenrolar dos Jogos Olímpicos de Atenas 2004. Uma vez mais, o mundo assistiu a dois espectáculos de grande nível cultural, por ocasião das cerimónias de abertura e de encer- ramento dos Jogos. Não fosse a Grécia detentora de uma cultura milenária riquíssima... Foram eles, na verdade, uma delícia para os nossos olhos que an- dam encharcados em “lágrimas” com tantas desgraças que asso- lam o mundo e que nos entram diariamente em casa, através das várias televisões nacionais e estrangeiras. Em termos de competições, a caixa mágica proporcionou-nos mo- mentos de rara beleza na ginástica, de grande competitividade nas modalidades de equipa, no atletismo, na natação (que monstros a fazerem tempos inimagináveis), na canoagem, etc., etc.. Foi pena o que se passou com a equipa nacional de futebol, recheada de estrelas que, talvez pela sua juventude, se tenham esquecido de que há outras estrelas no mundo... O resultado viu-se: regressa- ram a casa mais cedo e sem honra. Mas esperemos que tenham aprendido a lição, os jogadores e os dirigentes! As medalhas alcançadas representam muito trabalho e uma fé in- domável só própria de campeões que foram os que as receberam e aqueles a quem foram atribuídos diplomas de mérito. Parabéns para esses bravos rapazes. Não passou despercebida a ninguém a cena do “rapto” feito na ponta final da maratona ao nosso irmão do Brasil que a poderia ter vencido, não fosse o tresloucado do irlandês. E, tanto quanto li, o Vanderley Lima nem sequer se mostrou amar- gurado com o facto de ter sido prejudicado na sua classificação. A sua humildade deve ser realçada tal como a dos nossos Obikwelu, Sérgio Paulinho e Rui Silva que não precisaram de hotéis de 5 es-

77 trelas como algumas estrelas americanas e se contentaram com o refeitório da aldeia olímpica, para demonstrar a sua grande classe mundial. Não esqueço a alegria com que aquele deu a volta ao Estádio com a nossa bandeira nacional. Ele que nasceu na Nigé- ria!... Há sempre, neste tipo de competições de alto rendimento, um por- menor que me chama a atenção e que é a cerimónia, sempre digna, do hino que é tocado com a proclamação dos vencedores das provas. Como disse atrás fiquei triste com o sucedido na maratona com o Lima. Mas, Deus é grande: quando se entoava o hino de Itália, a consagrar o vencedor dessa extenuante prova, era ver o medalha- do com o ouro, Stefano Baldini, cantar o seu hino com uma garra fora do comum... Via-se que ele sabia a letra do hino e que tinha boa voz. Que diferença essa, em relação à maioria dos nossos internacio- nais de futebol!... E eles têm tido tantas oportunidades de demons- trar o seu amor à terra que os viu nascer!... Mas, diga-se, não lhes deve ser atribuída a culpa. Serão antes os professores, na escola, que se deverão preocupar com isso? Parece que sim.

Publicado no jornal “Região de Águeda” em 03/09/2004

78 Armando Rocha A Minha Opinião

Parabéns... Os 77 anos de idade...

Aos 6 anos de idade, a criança prepara-se para entrar na escola primária e assim começar uma vida de estudo e de afirmação. O jornal Região de Águeda afirmou-se logo como adulto. Para- béns pois ao dinamizador do projecto – um empresário de referên- cia no difícil e exigente mundo da indústria, o Eng. Adolfo Roque -, à Direcção e a todos os seus colaboradores, pelo muito que deram em favor da divulgação cultural, empresarial e desportiva de tudo o que gira à volta de Águeda que tanto amamos. Há dias, a lei da vida fez com que completasse mais um ano - já são 77, que eu procuro levar de consciência tranquila. E resolvi “convocar” os meus filhos, noras e netos para um encontro fami- liar, precisamente na terra que me viu nascer, e que passou pelo excelente leitão do Vidal... Aproveitei assim a data para relembrar tempos idos, já que a se- guir à escola do Adro, comecei a peregrinar por Aveiro, Coimbra e Lisboa. Quis mostrar aos meus netos, o Diogo e a Mariana, a escola onde aprendi a ler, escrever e contar com professores exigentes e muito competentes. A escola agora virou Biblioteca e Junta de Fregue- sia. E assisti à missa das 11h30, na igreja matriz, onde há cerca de 70 anos eu, com o Afonso Guerra, ajudávamos monsenhor Bernardi- no nas celebrações eucarísticas. Fui, naturalmente, ao cemitério rezar uma oração pela minha Avó e pelos meus Pais. E percorri as ruas onde repousam tantos amigos com quem convivi, mais ou menos esporadicamente, ao longo do tempo. Fui ao cais das Laranjeiras recordar um rio onde até se podiam disputar provas de natação e se podia lavar a roupa (“Povo que lavas no rio...” escreveu Pedro Homem de Mello) tal a limpidez das

79 águas. Hoje, mete dó o estado dessas águas. Será que o Homem não é capaz de modificar esse estado de coisas? Gasta-se tanto di- nheiro em coisas supérfluas... Já se não podem beber as “águas do Botaréu”. Passei pelo Hospital Conde de Sucena e recordei as figu- ras do Senhor Dr. Breda e do Dr. Mateus que, com outros distintos clínicos, tantas vidas salvaram e fizeram do mesmo um hospital de referência no País. Passei junto à Câmara Municipal e não pude deixar de recordar o velho campo de S. Sebastião, onde deram os primeiros pontapés na bola o Hernâni e o Adolfo... Hoje, o novo Estádio Municipal dá um ar de modernidade à cidade com o que nos devemos congratular. Passei pela Rua de Baixo e demorei-me algum tempo em frente do local onde o artesão e assumido benfiquista Xico Balreira fazia prodígios da madeira. E a ele associei a memória do notabilíssimo pintor João Breda. De passagem, olhei com desgosto para o local que serviu de sede ao Orfeão onde actuei no seu Rancho Infantil. Prédio em completa degradação. Até me pareceu que estava em Lisboa, onde existem muitos prédios nesse mesmo estado. Que saudades senti dos pastéis da Gininha do Candeeiro no cami- nho para o Palácio da Justiça que o Conselheiro Orlando Gomes da Costa fez construir em Águeda para substituir instalações muito degradadas ao tempo e que não prestigiavam a Justiça! Obrigado Orlando. Era lá que se situava a muito conceituada Escola Técnica que tan- tos profissionais competentíssimos “produziu”. Hoje, há mais esco- las secundárias. Sinal de progresso. Só espero que o seu nível seja conforme as necessidades do exigente mercado de trabalho. Águeda sempre marcou pontos no mapa industrial português. Va- lente de Almeida, Silva & Irmão, etc., etc. não podem ser esque- cidos. Mas hoje, basta dar uma volta pelo raso de Paredes, Asse- quins, Vale de Grou, para se ver a pujança do sector. Pode dizer-se que, em Águeda, se faz de tudo para uma casa. E eu sempre fiz questão de ter em minhas casas os materiais made in Águeda que mostro com orgulho aos que me visitam. Dizer que gostava mais da Águeda do meu tempo do que da de agora não digo. Mas que tenho saudades dela, lá isso tenho. Continuam os aguedenses a ser essencialmente individualistas?

80 Armando Rocha A Minha Opinião

Isso não pode dar bons frutos. Há quanto tempo não há um Presi- dente da Câmara, de Águeda? Sem que isso desmereça quem de- votadamente exerce as funções. Longe de mim esse sentimento.

Publicado no jornal “Região de Águeda” de 29/10/2004

81 A morte de um líder - Yasser Arafat

O Mundo assistiu à agonia de um líder que muito se distinguiu nas lutas, terroristas e diplomáticas, por um Estado independente – a Palestina. A comunicação social dedicou horas e horas, em especial a realçar as virtudes do cidadão, não sem deixar de aflorar uma ou outra mancha devida às actividades terroristas, a que também se dedicou. Uma coisa é a luta democrática em que vale quase tudo desde a argumentação mais ou menos séria até à própria mentira. Pode não se concordar com isso, mas é assim mesmo. Outra coisa é lutar-se com tiros, desvio de aviões e bombas que atinjam ino- centes quer se trate de crianças quer de adultos. Sem querer entrar na discussão do que é legítimo ou não é, em termos de luta pelo poder, designadamente por uma independên- cia, confesso que detesto a luta armada onde quer que ela se pra- tique, a não ser em defesa dos sagrados interesses da Pátria. Pois bem. Morreu Yasser Arafat que eu vi de perto. Sentados na tribuna do Estádio Lenine, em Moscovo, em 1973, a assistirmos à cerimónia de inauguração da Universíada (Jogos Mundiais Universitários), ficamos a 1m de distância conforme se vê na foto junta. Ele não falou com ninguém à sua volta a não ser com o seu assessor (ao seu lado). Aparentava ser o mais pacífico dos cidadãos. Da outra vez que dei pela sua “presença”, estava eu no aparta- mento da Delegação portuguesa na Aldeia Olímpica de Munique, nos Jogos de 1972, que ficava a uns 50 m do apartamento da De- legação israelita. E assisti, por fora, ao desenrolar do drama que levou ao assassínio de uma dúzia de atletas de Israel e a que se associou, na altura, o braço do agora celebrado falecido. Não mais esqueci essas imagens. Que Arafat descanse em Paz.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 26/11/2004

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Arafat na Universíada de Moscovo - 1973

83 A Tomada da Bastilha

Em 25 de Novembro de 1920, um grupo de bravos estudantes de Coimbra tomou de assalto a Casa dos Lentes, em plena Alta da cidade, e dela fez a sede da Associação Académica de que tenho gratas recordações. Em Lisboa, todos os anos se comemora essa data, com a presença de umas boas centenas de antigos estudantes que tomam por sua conta o Casino do Estoril, através da Associação presidida pela dinâmica Drª Fátima Lencastre. No passado sábado assim foi também. É a altura de se reverem velhas amizades e de se recordarem cenas de outros tempos a maioria das quais nos fazem parecer que ainda somos jovens. Pelo menos de espírito. Tive por companhia, na mesa 34, os Professores Almeida Costa e Veiga Simão, com as suas simpáticas Senhoras, uma delas, a Zinha, nossa conterrânea com quem tive ocasião de recordar os tempos de escola primária, dos passeios no Botaréu, dos lanches na Pauliceia. Ouvir o Prof. Veiga Simão falar de temas universi- tários, de alta tecnologia, da política americana, etc., etc. é uma delícia. Ouvir o Prof. Almeida Costa falar de coisas que ele bem conheceu por dentro fez com que a noite fosse curta para tanto saber feito de experiência e estudo Sim, porque hoje ouvem-se acima de tudo “bocas”, pouca coisa sustentada em estudos rigorosos e credíveis. Só que essas “bocas” alimentam a sofreguidão das lutas partidárias, mas não fazem es- cola - até porque já há muita gente que está farta da ignorância e, até, da má fé de muitos palradores que pululam na sociedade portuguesa. Falar com gente que sabe, que tem conhecimentos baseados em estudos independentes e sérios, constitui um privilégio para quem tem essa sorte, como é o meu caso.

84 Armando Rocha A Minha Opinião

O espectáculo com que a Associação brindou os seus sócios teve por base os Antigos Tunos da Universidade de Coimbra que, sob a batuta do Maestro Augusto Mesquita, interpretaram lindos trechos musicais, tendo mesmo a sua Orquestra de Tangos trazido para o palco “La Cumparsita” e outras melodias tão do agrado da vetusta assistência. A Tuna, que muito deve ao Prof. Políbio Serra e Silva, grande mé- dico e cientista, era composta por algumas dezenas de antigos e actuais estudantes da Universidade de Coimbra, com idades com- preendidas entre os 18 e os 80 anos!... Foi justa a homenagem que a Associação dos Antigos Estudantes de Coimbra em Lisboa prestou, na ocasião, àquele distinto Profes- sor. Durante o espectáculo, retive uma historieta contada pelo Tito Costa Santos. Lembrou ele que, enquanto caloiro dos anos ‘50, estava com vários colegas na Alta, com as obras em curso para os novos edifícios universitários, quando se aperceberam de que es- tava a chegar um Governante, no caso, o Subsecretário de Estado das Obras Públicas, Eng. Alberto Saraiva e Sousa. Com ele vinham outros dignitários do Estado, cujos motoristas ali ficaram, junto aos carros, à espera que a visita às obras terminasse. Logo houve um estudante que se apercebeu de que, no automóvel do membro do Governo, estava no banco da frente uma caixa com charutos... Era pois uma presa com bastante interesse... Assim, um dos estudantes convidou os motoristas para tomarem uma bica, o que foi recusado, uma vez que eles não se podiam afastar das viaturas. Só que, em tom convincente, a malta compro- meteu-se a mobilizar ali mesmo uns caloiros para tomarem conta dos carros enquanto eles fossem tomar a bica. E lá os convence- ram. Escusado será dizer que os charutos foram parar a boas mãos, tendo sido substituídos, numa prova de boa vontade, por uns ci- garritos. Quando o Eng. Saraiva e Sousa chegou ao automóvel logo se apercebeu da situação. Mas, com grande fair play, gracejando, ofereceu uma outra caixa de charutos aos estudantes que o ha- viam “roubado”... Essa caixa (só a caixa) ainda hoje está na posse do Tito!

85 Assim se divertiam os estudantes nesses recuados anos ’50. Hoje divertem-se a fechar a Universidade a cadeado, a invadir o Sena- do e a insultarem o Magnífico Reitor... Saímos do Casino do Estoril, alta madrugada, com as belas vozes – já no outono embora – do Luiz Goes, Almeida Santos, Alcindo Costa... a recordarem-nos as serenatas do nosso tempo.

Publicado no jornal “Região de Águeda” de 26/11/2004 e no boletim de Dezembro de 2004, “Capa e Batina”.

Comemoração da Tomada da Bastilha - 1990

86 Armando Rocha A Minha Opinião

Progresso? Retrocesso?

A democracia está instalada no nosso País já lá vão 30 anos. Reco- nhece-se que, de uma maneira geral, a maioria das pessoas não põe em causa a liberdade de que goza. Quanto ao resto, os analistas e os fazedores de opinião debruçam- -se a fazer os seus raciocínios sobre se o País está ou não melhor do que no tempo da ditadura. Normalmente, aqueles que só vêem virtudes na democracia – e tem muitas – apregoam que o País está muito melhor. Falam em auto-estradas, em novos hospitais, em muitas universidades e po- litécnicos, em mais dinheiro na carteira, etc., etc. Mesmo os que não são fervorosamente democratas, ainda que a contra gosto, compreendem que assim é. Mas será que o acesso à saúde melhorou nestes 30 anos? Parece que sim. Será que nas escolas básicas e secundárias se ensina melhor? Te- mos dúvidas. Será que temos mais licenciados? Não resta qualquer dúvida, mas para quê, se bastantes estão desempregados e até há cursos que estão desertos por falta de procura e sem relação com o traba- lho? Será que os professores são melhores e que estão mais bem pre- parados? Uns tantos, certamente, outros obtêm créditos de promo- ção que nada têm a ver com o seu curso. “Fabricam-se” mestrados e doutoramentos só para se justificarem cursos que depois ficam desertos de alunos. Mas, apesar disso, os professores têm de ser pagos. Será que, em termos de solidariedade social, se melhorou? Indu- bitavelmente, e especialmente quanto à classe política, autárquica e sindical. Seria impensável atribuir reformas, pela totalidade, a políticos com apenas 4, 8 ou 12 anos de “serviço público”. O mes- mo se diria relativamente a autarcas a quem basta terem exercido

87 funções durante 20 anos, para terem a reforma por inteiro. Para essas reformas por inteiro, pagas à custa do erário público, ou seja, com o dinheiro de todos nós, não se torna necessário fazer os descontos durante os 36/40 anos e que são obrigatórios para outro qualquer vulgar cidadão deste País. Será que o País lucra alguma coisa com o despesismo, com tantas viagens ao estrangeiro de tantos políticos, a começar pelos últimos PR’s, que se consolaram certamente, muitas das quais de duvido- sa utilidade para Portugal, cada vez mais afastado do pelotão da frente? Aos mais altos ex-dignitários do Estado, com mandatos completos ou não (?), concedem-se-lhes mordomias de viatura, motorista, secretária e gabinete. Como compaginar isso com os elogios aos intérpretes da primeira República? Para já não falar num Primei- ro-Ministro que, depois de abandonar o barco, é anichado, devi- damente motorizado, pelo seu sucessor, no banco estatal, onde pouco deve pôr os pés, na medida em que a família política em que está inserido reclama a sua presença na estranja. E a que cor- responde um salário de alguns milhares de euros... e, mais tarde, uma reforma das tais que envergonham Bagão Félix. Os funcionários públicos viram melhoradas as suas condições re- muneratórias? Certamente hoje recebem bastante mais, mas tam- bém gastam mais e até têm de pagar o IRS, o que não sucedia antes. A justiça está melhor? Não obstante os magistrados terem passado a ser os “funcionários” mais bem pagos relativamente aos outros, com a emancipação do ministério público da magistratura judicial, e a continuarem todos a ter direito a 3 meses de férias, nem sequer me atrevo a dar opinião. Comparemos o que é comparável. Ao fim e ao cabo, com os pro- gressos verificados, e são muitos e variados, seria natural que a conclusão a tirar do curso dos 30 anos de democracia colocasse Portugal, ao menos, na mesma escala de valores de 1974, ou seja, a par com a Espanha, e acima da Irlanda e da Finlândia e muito acima da Grécia... A realidade, porém, mostra-nos que apenas a Grécia oscila connosco no último lugar da Europa dos 15, tendo os outros países “descolado” há muito. E há países do Leste que também já estão à nossa frente, caso da Eslovénia, por exemplo.

88 Armando Rocha A Minha Opinião

Para exemplificar o nosso afastamento da Europa autêntica, apesar de nela integrados, refiro que estive há dias em Bruxelas, a convite de uma organização internacional. No hotel onde fiquei instalado, que não era de topo de gama, só o quarto custava, por dia, um valor que apenas permitiria que eu só lá estivesse alojado durante 5 dias num mês, se o tivesse de pagar com a minha pensão de reforma que, diga-se, é das mais altas do antigo funcionalismo de carreira. Será bom que todos nós reflictamos na situação grave por que passa o País – que está doente – para ver se se consegue dar a volta... O português médio é bom trabalhador desde que os exemplos venham de cima e o entusiasmem. Por isso, sou dos que acreditam que, com trabalho sério e sem corrupção, se poderá avançar!...

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 24/12/2004

89 Catástrofes naturais

Ao longo dos tempos, desde que o mundo é mundo, sempre houve catástrofes naturais com maior ou menor dimensão. Normalmente, delas resultaram vítimas humanas e prejuízos ma- teriais incalculáveis O buraco do ozono tem sido responsabilizado, nos últimos tem- pos, por grandes inundações, furacões, etc. que tudo arrasam nas mais variadas regiões do globo. Os media, com destaque para as televisões, dão-nos hoje em dia, o retrato dessas situações que nós consideramos tanto mais dramáticas quanto mais perto de nós elas se passam. O que se passou recentemente no sudoeste asiático, com muitos milhares de mortos e desaparecidos, despertou pelo mundo fora uma onda de solidariedade notável, a par de alguns comporta- mentos indignos da pessoa humana. Louvavelmente, Portugal também lá está a actuar, no sentido de ajudar a minorar os estragos causados naquelas populações inde- fesas. Ainda bem. Louvemos os voluntários que estão a dar o seu melhor. Qualquer cidadão responsável pára um bocado no seu dia a dia e fica a pensar na desgraça dos outros e também no que em Portugal sucedeu de muito gravoso, no domínio das forças da natureza. O terramoto de 1755 não pode deixar de ser associado às ima- gens que, agora, as televisões nos oferecem em doses maciças. E, mais recentemente, quem não se lembra das inundações na zona de Odivelas no inverno de 1967/68? Quantas desgraças sucede- ram só nesses dois fenómenos naturais!... Sobre esta última catástrofe, um ex-Ministro de Salazar contou-me que, em reunião do Conselho de Ministros dedicada ao assunto, o Ministro da Economia, Dr. Correia de Oliveira, fez uma exposição de tal forma dramática sobre as vítimas das enxurradas que se co-

90 Armando Rocha A Minha Opinião moveu fortemente! E mais disse que estavam a ser recebidas bas- tantes manifestações de solidariedade por parte de outros países amigos, com promessas de auxílio às vítimas e à reconstrução. Salazar, no final dessa exposição, virou-se para o Ministro das Fi- nanças, Dr. Ulisses Cortez, e perguntou-lhe se, não obstante o es- forço de guerra que era muito pesado, as finanças públicas tinham capacidade para resolver, por si só, a situação. Tendo a resposta sido afirmativa, Salazar recomendou que, sem qualquer ponta de arrogância, o governo português agradecesse esses apoios, mas que entendia que eles seriam bem mais neces- sários noutros países muito carenciados… Curiosamente, a poderosa Índia acaba de tomar idêntica postura face às consequências do tsounami que também a atingiu! É caso para nos interrogarmos sobre se seria possível, a Portugal, tomar hoje essa mesma posição face a uma calamidade parecida com a da década de ’60.

Publicado no jornal “Região de Águeda” de 14/01/2005

91 Desemprego e Programa do Governo

1. O desemprego… Ouvi há dias, na rádio, parte de uma entrevista feita a um jovem deputado eleito recentemente para S. Bento, não sei por que par- tido. Disse ele:”acabei agora o meu curso de geologia, andava à pro- cura de emprego e desafiaram-me para integrar a lista de depu- tados o que eu aceitei.” Eu nem queria acreditar no que estava a ouvir… Assim, aí temos um deputado à AR sem qualquer experiência sobre o que é trabalhar no dia a dia, ainda que não por culpa dele. Certo é que o desemprego que grassa na juventude com estu- dos superiores, devido em especial a uma demagogia enorme na criação de cursos, muitos deles sem interesse algum para o mer- cado de trabalho, se deve essencialmente ao sistema corporativo em que se transformaram algumas classes profissionais. Como a dos professores doutores: quanto mais alunos houver, mais e mais professores são necessários e mais financiamento o Estado terá de assegurar, sem se cuidar de saber qual o impacto que esse finan- ciamento terá na economia real do País. E que não será brilhante certamente. Pois bem, não se deve é combater o desemprego sem olhar a meios. E o desemprego só se combate com a criação de novos postos de trabalho produtivo o que, naturalmente, cabe às empre- sas fazer e de que temos excelentes exemplos Pelos vistos, porém, a política continua a ser um excelente e ren- doso empregador. E quem paga estes “estágios”, sem retorno para o bem público, na AR? O contribuinte, claro está. Ao menos, este deputado vai experimentar a sensação de pagar uma bica por me- tade do preço que se paga ao balcão de qualquer estabelecimento de restauração… Para começar não é mau de todo. 2. A avaliação do desempenho … Cada vez vejo menos televisão, recheada que está de lugares co- muns e exploração da miséria alheia e sensacionalismos como são

92 Armando Rocha A Minha Opinião muitos dos telejornais. Refugio-me nas transmissões de eventos desportivos internacionais, em programas musicais e culturais bem como numa ou noutra telenovela portuguesa. E como gosto de recordar matérias que estudei quando jovem e de aprender mais alguma coisa, vejo com regularidade o concurso “Um contra to- dos” da RTP1. Um destes dias dou com uma senhora professora de físico-quí- micas a ter de escolher uma de três respostas para a pergunta: quantos graus tem um ângulo recto? 90, 180 ou 0 graus? E não é que a senhora não acertou!... Assim, como é que se pode exigir mais aos alunos que são ensina- dos por professores com este nível científico/cultural? Felizmente, porém, que existem muitos belíssimos professores no ramo das ciências. Só que ganham todos o mesmo, quer sejam competentes quer sejam menos competentes. A avaliação do mérito tem de ser considerada um meio essencial para se alcançar o objectivo da excelência. O tempo do salário igual para trabalho igual deve ser substituído pelo tempo do salário igual para desempenho igual, nas diferentes gradações organizacionais. 3. Programa de Governo… Acabo de ouvir o discurso de José Sócrates de apresentação do programa de governo. Foi feito em estilo tenso, de quem parecia estar zangado com a vida, mas com muita convicção. Nele se con- tém uma catadupa de boas ambições e uma fartura de promes- sas de interesse. Tratou-se de um discurso destinado a um povo adulto, civilizado e não corporativo. Bom sinal. Dele destaco a in- tenção de redução das férias judiciais pelo impacto que pode ter no andamento da justiça. Aguardemos pela resposta da respectiva corporação. Em suma, gostei de quase tudo o que ouvi. Agora aguardo pelos desenvolvimentos com esperança de que o País melhore sem frac- turas.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” em 01/04/2005

93 Iniciação desportiva na Escola

Participei há dias numa cerimónia, realizada na sede do Comité Olímpico de Portugal, de grande significado para a iniciação des- portiva na Escola. Tratou-se da assinatura de um Protocolo estabelecido entre a Fe- deração Portuguesa de Basquetebol e a COMPAL. Nessa parceria que foi apadrinhada pelo novo Secretário de Esta- do da Juventude e Desporto, Dr. Laurentino Dias, na sua primeira intervenção pública como governante, e pelo Presidente do COP, Com.te Vicente de Moura, os Presidentes da COMPAL, Dr. A. Pires de Lima, e da Federação de Basquetebol, Mário Saldanha, foi fir- mado um compromisso do maior interesse para a juventude. Nele, aponta-se para a mobilização, em 2005 e 2006, de 639 escolas espalhadas pelo País onde se fará a movimentação de 500.000 alunos, com idades entre os 10 e os 17 anos, enquadra- dos por 5.000 agentes de ensino, tudo à volta do basquetebol 3 contra 3. O envolvimento do Departamento do Desporto Escolar do Ministé- rio da Educação é fundamental para o êxito deste projecto. É com acções desta magnitude que o desporto português se pode desenvolver, até porque da quantidade, naturalmente, sai a qua- lidade. Mas, acima de tudo, o 3 contra 3 é uma excelente forma de se ter a juventude ocupada numa actividade sã e não ocupada com muitos dos deseducativos programas que a TV lhe proporcio- na no dia a dia em que ela, a maioria das vezes, está só em casa enquanto os pais ou estão no trabalho ou a fazer compras. É claro que as condições para a boa prática do basquetebol passam pela existência de pavilhões gimnodesportivos. E sabemos que, in- felizmente, nem todas as escolas os possuem. Mas tem-se progre- dido alguma coisa nesse domínio. Esperamos que este projecto contribua também para levar os governantes a proporcionar boas

94 Armando Rocha A Minha Opinião condições para a prática desportiva aos jovens que frequentam as escolas públicas. Seguindo aliás o exemplo das escolas privadas. Temos esperança nos resultados desta acção de massificação do basquetebol. Força para os coordenadores da acção!

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 15/04/2005

95 Viagens de políticos e da Igreja

A situação económico-financeira do País é deveras preocupante de há uns anos para cá. E, pelos vistos, o remédio não vai ser encon- trado com facilidade pelo ministro das Finanças. Para se chegar a esta situação, muito contribuíram os políticos que nos têm vindo a governar, muitos autarcas incluídos. Na medida em que não souberam resistir à ideia do despesismo fácil e, por- que não, irresponsável. Tem de se reconhecer que nem todas as despesas públicas impli- cam um retorno económico imediato. É o caso das despesas sociais com a pobreza reconhecida factualmente e não fraudulenta, como continuam a surgir notícias nesse sentido. O Estado não se coíbe de distribuir fontes de despesa como é o caso das viaturas de alta cilindrada em situações cuja justificação é mais que duvidosa. É agora o caso dos conselheiros do Tribunal Constitucional. Perguntar não ofende. Mas talvez haja uma respos- ta convincente para esta dúvida. Só que ninguém se digna dá-la. E os carros dos “ex-qualquer coisa” continuam… Bom seria que o Estado procedesse à avaliação dos custos/benefí- cios das acções que promove. A começar pela Presidência da República. Com Mário Soares e Jorge Sampaio, as despesas com viagens ao estrangeiro dispara- ram em flecha. Mesmo as viagens com empresários às dezenas suscitam reservas até porque nem todos, pelo seu comportamento empresarial, mereceriam sequer embarcar no avião. Uma coisa é certa: não é por falta de acções de relações públicas dos PR’s que o País não devia estar melhor situado nos índices de consideração internacional e que, infelizmente, são cada vez mais arrasadores. Já alguma vez um PR pensou em fazer um balanço sério sobre a utilidade dos gastos que cada viagem proporcionou ao Povo português? Talvez chegasse, com facilidade, à conclusão

96 Armando Rocha A Minha Opinião de que esses gastos foram desproporcionados relativamente à in- tenção de afirmação de Portugal no mundo. Ser miserabilista, nunca! Ser gastador, para mais em demasia, é pecado. Mas não sei se o agnosticismo entende o que é pecar. É que custa bastante pagar impostos; e mais custa saber que parte deles é esbanjada com falsas vaidades, designadamente com os Falcon’s sempre no ar… Como aquela de que acaba de ser “vítima” o Senhor Cardeal Poli- carpo! Eu explico: com a morte do Santo Padre João Paulo II – um Papa cuja acção será difícil esquecer nos tempos que aí vêm – era natural que D. José tivesse de se deslocar ao Vaticano. Mas, pelos vistos, nem houve urgência nessa deslocação. Pois bem, o nosso venerando PR J. Sampaio estendeu-lhe o tapete que foi a oferta de uma viagem especial num Falcon da Força Aérea. Eu ainda com- preendia que o PR o convidasse para o acompanhar nessa viagem. Mas não foi esse o caso. Não gosto de confusões! E a Igreja de- veria saber resistir a “esmolas” destas… Diariamente há carreiras aéreas para Roma e uma passagem em classe executiva serviria perfeitamente ao Senhor Cardeal… Quanto custou aos contribuintes esta viagem de falso prestígio do Falcon? Registe-se, contudo, a magnanimidade de um PR laico e agnóstico para com o seu opositor na questão do aborto! O Senhor Cardeal deveria ter presente que, com políticos, não há almoços grátis… Não resisto aqui a relatar o que observei acerca de 2 conhecidos Bispos portugueses. Nas minhas deslocações semanais entre Lis- boa e Porto, ao longo de anos, cruzei-me com gente de todas as condições sociais. Numa delas, a caminho do Porto, ao percorrer o Alfa-Pendular, para esticar as pernas, dou com o emérito Bispo de Setúbal sentado numa carruagem Turística. Passados alguns dias, no mesmo percurso, deparei-me com o Bispo das Forças Armadas numa carruagem Conforto. Não se trata de uma crítica, apenas do registo de comportamentos.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 22/04/2005

97 É bom sonhar, mas com os pés no chão…

Portugal tem vindo a ser citado, em termos estatísticos relativos aos diversos índices, nos últimos lugares dos países europeus. O que se lamenta naturalmente. E se fica a dever, em grande parte, aos governos que temos tido, todos eles, ainda que a uns mais do que a outros, na medida em que não têm conseguido alterar a mentalidade dos portugueses em geral, para além das asneiras praticadas, quer por incompetência, quer por uma certa mediocri- dade política. Não obstante esta realidade, os portugueses não desperdiçam uma oportunidade para se considerarem “os maiores”: vai haver eleição para Presidente do Parlamento Europeu, logo se perfila um político polivalente sempre à tona de água - o Dr. Soares – mas o certo é que acaba por ser eleita uma francesa (de quem Soares, depreciativamente, disse que seria uma boa dona de casa…); vai vagar o lugar de secretário-geral da NATO, logo se perfila um por- tuguês, de real mérito – o Dr. Vitorino - mas o certo é que acaba por ser escolhido um inglês; morre um grande Papa, João Paulo II, logo uns tantos perfilam D. José Policarpo, como o candidato ideal, mas o certo é que foi eleito um outro Cardeal, precisamente o alemão D. J. Ratzinger. Está em aberto a escolha do novo Alto Comissário para os Refugiados, logo se perfila um político que en- tregara à oposição o pântano em que deixou o País – o Eng. Guter- res. Como português, espero que ele vença esta competição que tem mais 7 candidatos. Para quem tem a ambição de uma carreira internacional que permite muitas viagens à borla, não compreen- demos a razão que o levou a recusar (?) o lugar de Presidente da Comissão Europeia. Ou seria porque, na altura, o candidato favo- rito era, sem dúvida, o espanhol Aznar? Neste lugar, de desistência em desistência, acabou por se sentar um português – Dr. Barroso – a quem naturalmente desejo boa sorte.

98 Armando Rocha A Minha Opinião

Já agora, não posso deixar de registar o bom desempenho que teve o Dr. Cutileiro à frente da OSCE, assim como me lembro da passagem do doutor Amaral pela presidência da Assembleia Geral das Nações Unidas, em que ele tudo terá feito para tentar “refun- dar” a ONU, convencido de que era ele o Secretário Geral. Enfim mania das grandezas que, a somar a outras atitudes anti-Bush, deram como resultado que, em recente visita a Portugal do Subse- cretário de Estado americano, este recusou deslocar-se ao Ministé- rio dos Negócios Estrangeiros… e foi só a S. Bento onde o doutor Amaral teve de se deslocar. Acabo de ter conhecimento da rápida eleição do novo Papa Bento XVI ao 2º dia de votações no Conclave. E logo tive de ouvir as opiniões de uns tantos laicos / agnósticos / não crentes, a começar por Soares, Louçã e Sousa Tavares. Este, bem acolitado pela pivot da TVI, Moura Guedes, parecia estar a “julgar” o Cónego Rêgo que não partilhava dos ataques de Tava- res/M.Guedes à figura do Cardeal Ratzinger. Mas quem julgam que são estes senhores não crentes perante a dimensão intelec- tual, cultural e mundial do novo Papa? O novo Pontífice, bem auxiliado pela Cúria Romana, saberá certa- mente retomar em mãos o legado de João Paulo II, para bem da humanidade. Assim o esperamos.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 29/04/2005

99 Forças Armadas e a Universidade

Lembro-me de ter tido uma conversa com o Prof. Veiga Simão, quando ele desempenhava as funções de Ministro da Defesa, lá para 1998, em que me referiu que estava a trabalhar num projecto de que resultaria a criação da Universidade das Forças Armadas. Esse projecto implicaria naturalmente uma racionalização de re- cursos humanos e logísticos existentes, na medida em que essa futura Universidade coordenaria o, aliás notável, “espólio” do Ins- tituto dos Altos Estudos Militares (Exército) e dos Institutos Superior Naval de Guerra e de Altos Estudos da Força Aérea, bem como das Academias Militar e da Força Aérea e da Escola Naval. O que essa racionalização induziria em termos de capacidades, de eficiência, de melhoria de qualidade e de custos é bem fácil de avaliar. E se alguém tinha competência e autoridade intelectual para de- sencadear e implementar um projecto dessa importância esse al- guém era, sem dúvida, o responsável pela criação da Universidade de Lourenço Marques nos idos anos de ’60, aliás contra a corrente política dominante ao tempo, mas que, ao contrário, teve o aval final de Salazar. Ele acreditou no jovem professor doutorado em Física em Cambridge e com 20 valores em Coimbra. E Moçam- bique, sabe-se, muito reconhecida está ao primeiro Reitor da sua Universidade, como o demonstrou ainda recentemente. Para além de ser uma autoridade reconhecida nos domínios da Educação, quer a nível nacional quer a nível internacional, Veiga Simão viu esse sonho, mais um, que tão útil seria certamente para as Forças Armadas, adiado e mandado para a gaveta com a sua substituição no Ministério da Defesa, por Jaime Gama. O curioso é que esse projecto foi mesmo aprovado em Conselho de Ministros que depois o enviou para a Assembleia da República onde ficou “sepultado”. Ao falar aqui da figura do Prof. Veiga Simão, bom seria que o primeiro-ministro Guterres explicasse seriamente as

100 Armando Rocha A Minha Opinião razões por que deixou cair o Prof. Veiga Simão e que só uma co- bardia sem nome e uma partidarite aguda de gente medíocre pro- curaram e procuram esconder ao País. Espero bem que em breve a acção desenvolvida ao tempo pela Procuradoria Geral da Repú- blica possa ver a luz do dia… Mas adiante! Acabo de ler que o tal projecto estará a ser recuperado pelo actual Ministro da Defesa. Assim sendo, bom será que ele seja capaz de o pôr de pé em boas condições e com a dignidade que o assunto merece. Tudo isto para dizer que há Homens com visão estratégica escla- recida e competência que, por vezes, até parece que incomodam a mediocridade que grassa na política caseira. Veiga Simão é um deles!

Publicado no jornal “Soberania do Povo” em 20/05/2005

O Ministro da Educação, Veiga Simão (ao centro), em visita à Casa do Desporto, no Porto, em 1972

101 Um “charro” no Dubai …

Há um Homem de que nos devemos orgulhar que é o Embaixador António Monteiro, que foi ministro dos Negócios Estrangeiros do governo cessante e que, pelos vistos, está actualmente na “prate- leira” daquele ministério. As suas qualidades de diplomata de eleição, amplamente demons- tradas ao longo da sua carreira (Angola, Nações Unidas…) vieram uma vez mais ao de cima na tentativa, bem sucedida, de libertar um português, I. Ferreira – pelos vistos actor/cineasta de enormes méritos, mas que eu e muitos dos meus amigos desconhecíamos – o qual, não sendo já sequer um adolescente, cometeu um crime em país de rigorosos costumes no domínio das drogas. As relações pessoais estabelecidas pelo Embaixador por esse mun- do fora contribuíram decisivamente para o “milagre” da libertação, em escassas semanas, da detenção daquele consumidor de droga que, por muito importante que seja no mundo do cinema, não pode constituir exemplo a seguir pela nossa juventude. Diga-se ainda que o prestígio de António Monteiro por aquelas bandas subiu tão alto que nem sequer o deixaram pagar o hotel, a viatura e o motorista usados durante a estada no Golfo. E, já agora, ocorre perguntar porque razão o Doutor Amaral não apela a um dos seus diplomatas de confiança para tratar do caso do piloto ainda retido na Venezuela. Dado que o actual governo é de esquerda certamente que tem boas condições para pressionar o também de esquerda, e talvez democrático, governo de Hugo Chavez…

Publicado no jornal “Região de Águeda” em 20/5/2005

102 Armando Rocha A Minha Opinião

O défice…

Escrevo estas linhas em data marcada ainda por uma prudente e acertada gestão do silêncio à volta das contas públicas, por parte do PM Sócrates, sem ter anunciado qualquer medida concreta que irá tomar. Só que o sol não pode ser escondido por uma peneira e o défice das contas públicas aí está, calculado até à centésima (que pre- ciosismo): 6,83%. O que deve assustar os economistas que, sendo reconhecidos como autênticos “barras” da matéria, têm sido os maiores responsáveis pela gestão do orçamento geral do Estado e apêndices, ao longo dos 31 anos que já leva a democracia portu- guesa. Os ministros das Finanças dos sucessivos governos devem estar, nesta altura, a fazer o acto de contrição pois o resultado das suas políticas está, agora, bem à vista. De todos eles, ressalvo ape- nas o Prof. Hernâni Lopes e a Drª Manuela Ferreira Leite que mos- traram ter a coragem de remar contra a maré… Os outros “sábios” não devem ter tido força política, porque competência não lhes faltava certamente… Para além deles, uma figura é incontornável – a do governador do Banco de Portugal, nomeado à esquerda e à direita. Deveria ser ele o guardião do templo até porque é uma personalidade benquista nos meios políticos e económicos. Para minha grande surpresa, ele afirmou no passado dia 15: “Reco- nheço que a situação era ainda pior do que eu temia e, na ver- dade, o País está confrontado com uma crise orçamental grave”. E eu tenho o direito de perguntar: então o Dr. V. Constâncio está à frente do Banco de Portugal há mais de 10 anos (até teve como administrador o actual ministro das Finanças) e sai-se agora com esta afirmação espantosa? O que andou ele lá a fazer estes anos todos? Será que justifica assim as suas mordomias que, corre na internet, atingem largos milhares de euros mensais? Ouviu-se, também, o Dr. J. Sampaio dizer que “há vida para

103 além do défice” a propósito da luta que então travava a Drª Fer- reira Leite… E, agora, do longínquo Japão, apela à auto-estima dos portugueses… nos quais se incluem os que lutam diariamente para arranjar sustento para a sua família, sabe Deus com que sa- crifício! A este apelo o país benfiquista já respondeu com a emotiva vitó- ria no campeonato da Liga que levou a uma mobilização impres- sionante de milhões de portugueses e outros lusófonos por esse mundo fora, a saírem à rua a vitoriar os seus heróis. Essa causa de facto foi mobilizadora. Tenho, porém, as mais sérias dúvidas sobre idêntica resposta ao apelo do Dr. Sampaio, em relação aos sacrifícios que as classes mais desprotegidas vão ser inevitavelmente obrigadas a fazer. Até porque lêem com frequência que as grandes empresas, tais como a PT, a EDP, a Galp e a Banca, por exemplo, têm vindo a apresen- tar lucros de milhões e mais milhões, sem que isso se reflicta nos preços a pagar pelo consumidor… Em minha casa, anos ’80, foram recebidas 2 cartas a convidar à passagem à reforma pelo simples facto de que a idade dos visados era de 60 anos. E quantas delas não emanaram do então ministro das Finanças, Dr. Cadilhe? Milhares… 20 anos depois reconhece-se que a idade de reforma tem de ser aumentada. Aqui está um simples exemplo de curta visão estraté- gica do então ministro… O actual Governo tem uma tarefa difícil na sua frente o que, aliás, é comum a uns tantos outros governos ocidentais. Portugal, porém, na cauda das estatísticas do mundo dito civiliza- do, vai ter muito mais dificuldade em encontrar remédio para as suas maleitas do que outros mais ricos. Confia-se em que as medi- das a tomar sejam baseadas também no bom senso. Bom senso esse que leva, naturalmente, a fazer reformas estrutu- rais e não só conjunturais. Agora digo: há mais vida para além das eleições… Não se poderá exigir sacrifícios a uma população que já os passa em larga medida, se o exemplo não vier de cima. A começar pelas reformas dos políticos. Continuarão elas a ser concedidas, pelo máximo, ao fim de 12 anos em S. Bento? Con- tinuarão elas a ser acumuláveis com outras reformas a que o po-

104 Armando Rocha A Minha Opinião lítico tenha direito? Continuar-se-á a contar em dobro o tempo de serviço dos autarcas, sem que lhes corresponda o respectivo desconto para a CGA? Continuarão a ser pagas reformas de 20 mil euros a personalidades que serviram em autênticas empresas públicas, ainda que com o estatuto de sociedades anónimas? Continuarão a ser gastos, em viagens dos políticos de S. Bento, mi- lhões e milhões de euros? Para quê duzentos e tal deputados? Não ficaríamos mais bem servidos com apenas uma centena? Continua- rão os Serviços da Presidência da República a necessitar de cerca de 300 funcionários? Precisará um Primeiro-Ministro de centena e meia de colaboradores (vid. Guterres)? Necessitarão os gabinetes dos ministros e dos secretários de Estado das dezenas (cada gabi- nete) de adjuntos, assessores, secretárias, motoristas, etc.? Ainda recentemente, um Secretário de Estado requisitou mais 3 viaturas (já dispõe de 3) para o seu “staff”e um outro governante quis uma viatura da mais alta cilindrada… A impressão que tenho é que Sócrates é avesso a esse tipo de vaidades. E ainda bem. Ouvi o doutor Amaral dizer que a sua categoria e de mais 2 outros doutores esmagava os ministros do anterior Governo. Vaidade e ambição não lhe faltam. Mas estou em crer que não é com gen- te que esmaga, em especial macro economistas, que Portugal se salvará. Acredito, nisso sim, que precisamos de bons micro econo- mistas competentes, em termos latos, que tenham trabalhado nas empresas e saibam o que é o dia a dia das mesmas. Os engenhei- ros fazem falta, mas para já temos um que até é o PM, a quem desejamos boa sorte. Senhores governantes: se o exemplo não for dado por vós, não esperem que a auto-estima se solte dos corações do povo.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” em 10/06/2005

105 Postal de Lisboa O 10 de Junho…

1. O 10 de Junho dos antigos combatentes no Ultramar Num magnífico dia de sol desci até à beira rio, na aprazível zona da Torre de Belém, esta cada vez mais bonita, a apontar os mares da aventura que os portugueses de antanho abraçaram numa epopeia sem par na história da humanidade… E que Luiz Vaz de Camões cantou, para delícia dos vindouros que continuam a lê-lo… Já lá não encontrei alguns dos que, em anos interiores, costumava ver, nesta cerimónia de recordação dos companheiros caídos nas terras africanas e no oriente. Também esses já partiram. Reconheci o general Ricardo Durão, com o mesmo porte atlético com que desfilou em 1956, levando o estandarte, na inauguração do Estádio Universitário de Lisboa. Continua em boa forma. Em toda aquela gente se notava uma saudade e uma alegria incon- tidas quando se abraçavam efusivamente e recordavam episódios passados nos idos anos de ’60 e princípios de ’70. Curiosamente, não descortinei nessa cerimónia nenhuma das ve- detas da tropa que enchem os écrans das Televisões e as colunas dos jornais. E interroguei-me: será que essa gente não combateu de facto em Angola, Guiné, Moçambique? Não têm camaradas que derramaram o seu sangue, sob as suas ordens nas antigas colónias? Parece que não… Uns tantos desertaram das fileiras, é certo, mas não eram esses que esperava lá ver… Tal como os políticos gerados pela nova democracia, também esses altos militares devem estar a gozar de uma vida confortável fora das fileiras, nas suas reformas ou negócios… Não obstante essas ausências, o fervor patriótico daquele povo anónimo era deveras contagiante mesmo para os jovens, que eram muitos, no decorrer da cerimónia que, sendo muito simples, foi mui- to bonita. Os discursos feitos por pessoas que amam e acreditam na Pátria, a entrega das coroas de flores na base do monumento,

106 Armando Rocha A Minha Opinião a cerimónia inter religiosa celebrada por 2 sacerdotes (onde estaria o Bispo das Forças Armadas?), as marchas militares, a cargo da magnífica Banda do Exército e o toque emotivo dos clarins não me deixaram indiferente. E reflecti sobre se, com gente desta têmpera, a Pátria alguma vez pode morrer… Acredito que, com mais ou menos dificuldades, e elas serão muitas nos tempos próximos, os nossos vindouros hão-de saber dar a volta por cima… Como português, estou grato a todos aqueles que, ao longo dos anos, comemoram o 10 de Junho desta maneira simples e genuína, mesmo sem apoios oficiais porque esses, este ano, foram todos para Guimarães onde a anual cerimónia despesista foi mais uma feira de vaidades, com condecorações a esmo, algumas delas de duvidosa justificação. A política devia ter limites. 2. A auto estima dos portugueses Ultimamente o PR Sampaio tem vindo, e bem, a apelar, à auto esti- ma dos portugueses para se vencer a crise que desabou sobre nós. Nem de propósito, o Benfica ganhou o campeonato da Liga, depois de um jejum de mais de 10 anos. E, como os benfiquistas são mi- lhões, logo saíram à rua, não só em Portugal, como no estrangeiro, por esse mundo fora. Foi bonito ver essa onda de solidariedade desportiva… Mas, que ouvi eu, na altura, na SIC-Notícias, da boca do seu cor- respondente, um tal José Milhases? Apenas isto: “Os portugueses, aqui, em Moscovo são meia dúzia de gatos pingados”. Será que o Dr. Balsemão reconhece a “qualidade” deste seu funcionário mos- covita que deve desconhecer o significado da expressão auto esti- ma? Ou será ele também um gato pingado a pedir transferência de capital? 3. O barbeiro Foram já anunciados os aumentos dos impostos – IVA, combustíveis, IRS, etc.. Pois bem, em consequência do clima gerado com esses anúncios, o meu barbeiro já tomou a iniciativa de aumentar em 13% o custo do seu serviço de corte de cabelo… Para onde vamos?…

Publicado no jornal “Região de Águeda” em 17/06/2005

107 Ainda o défice…

1. Ainda o défice… Tem estado na ordem das preocupações dos portugueses a situação calamitosa a que chegaram as contas públicas. Até parece que os economistas andam divertidos com simulações de mais décima menos décima. Uns puxando para cima, outros para baixo, conforme a cor da camisola… Esta crise, desde logo, teve o grande mérito de, entre outras coisas, pôr a nu a situação escandalosa de que tem vindo a beneficiar a classe política de uma maneira geral. Até aqui, quem se atrevia a pôr em causa as suas reformas e acumulações das mesmas, os seus subsídios de reintegração, os tempos a dobrar dos autarcas, os sa- lários e as reformas elevadíssimas de gestores públicos sob a capa de empresas/sociedades anónimas de que, afinal, todos nós somos “accionistas” etc., etc.? E vieram ao de cima valores de euros que, até agora, estavam no segredo dos bolsos de uns tantos, em que, aliás, se não pode toca, face ao estafado excesso de garantias de direitos adquiridos… Ao mesmo tempo que se não ousa falar ou se fala pouco em deveres de cidadania… Deve reconhecer-se ao PM Sócrates e ao Ministro das Finanças o mérito corajoso de dizerem que vão afrontar essas situações de privilégios injustificáveis. Podiam ter ido mais longe? Certamente, como no caso do exagerado número de deputados com assento em S. Bento que apenas constitui fonte de despesa sem retorno. Mas aceita-se que se não pode fazer tudo de uma vez só. Lá chegare- mos… Com esta palavra de aplauso e de estímulo não posso, porém, dei- xar de pensar que os lobbies são muito fortes e que tudo farão por tentar, se não inutilizar, pelo menos amaciar as medidas entretanto anunciadas. Na verdade, muita gente será atingida pela austerida- de e sacrifícios que estão a caminho. Simplesmente, se essa situação

108 Armando Rocha A Minha Opinião for acompanhada por exemplos que venham dos mais poderosos (vid. classe política) não haverá razões para contestação de maior, a qual se cingirá às ultrapassadas centrais sindicais cuja linguagem parou no tempo. À primeira cedência por parte do PM Sócrates, a caixa de Pandora abrir-se-á com consequências imprevisíveis. Isto, a propósito do que já se ouve e lê acerca da reivindicação de umas 2 a 3 dezenas de deputados que se sentem atingidos nos seus direitos ditos adquiridos… para o futuro… A sensibilidade da ques- tão, acima de tudo moral, não permite, a meu ver, transigências. Ou seja, ou comem todos ou… há-de ser o que Deus quiser… Aguardemos pois, com paciência, pela implementação das medidas entretanto anunciadas, independentemente do facto de os Partidos terem de enfrentar as urnas em Outubro próximo e deverem, acima de tudo, pensar no País. Porque uma coisa é o anúncio de medidas corajosas e moralizadoras, outra coisa é pô-las em prática. 2. Investimento público Consideramos que o investimento público, dentro do limite do pos- sível, deve ser estimulado, em parceria com o investimento privado, porque daí resultará a criação de riqueza e de postos de trabalho que tão necessários são para um adequado equilíbrio social. Já li, porém, uma notícia que me deixou perplexo. Numa altura de contenção de despesas como aquela que atravessamos, aponta-se para a construção de mais um edifício em S. Bento. Para quê? Para que possam ser atribuídos gabinetes individuais a todos os 230 de- putados. Ao que parece, actualmente, eles ocupam gabinetes para 2 eleitos cada um. Será isto um investimento? Ou antes um desperdício fora do tem- po? Que mais valia trará esse “investimento” ao povo português? Nenhum, direi eu, face à qualidade de grande parte dos eleitos: Para além de que se terá de destruir uma área verde bonita e que, como todas as áreas verdes, devem ser, isso sim, preservadas. A este respeito, não li nem ouvi nada da parte dos ecologistas, que também os há na própria Assembleia da República… Devem estar apertados!...

Publicado no jornal “Soberania do Povo” em 24/07/2005

109 Postal de Lisboa Travessia aérea e vitórias internacionais

1. A Primeira Travessia Aérea do Atlântico Sul Foi em 1922 que dois ilustres oficiais aviadores da Marinha portu- guesa levaram a efeito a primeira travessia aérea do Atlântico Sul. Iniciada em Lisboa, em 30 de Março, teve escalas em Las Palmas, S. Vicente, Porto-Praia, Penedos de São Pedro e São Paulo, Fernan- do Noronha, Recife, Bahia, Porto Seguro e Vitória; terminou no Rio de Janeiro, em 17 de Junho seguinte. O sucesso da viagem ficou a dever-se, naturalmente, à grande coragem e sabedoria de Gago Coutinho e Sacadura Cabral que conduziram os 3 aviões utilizados na viagem, e foi suportada nos métodos científicos de navegação aérea nocturna a grande distân- cia e num sextante especialmente concebido pelo primeiro. Com essa viagem, uma vez mais se manifestou a vontade indómita dos portugueses na descoberta de novos caminhos a ligar povos distantes. Porque se tratou de um feito notável, a Casa da América Latina, dirigida pelo diplomata Dr. Mário Quartin Graça, fez bem em or- ganizar uma exposição alusiva àquela travessia, quando passa o 83º aniversário da mesma. Um professor de História fez o relato circunstanciado da travessia e das suas vicissitudes, perante uma assistência em que se desta- cavam algumas altas patentes da Armada e da Aeronáutica, bem como o sempre presente Embaixador Dário Castro Alves. Lá en- contrei, entre outros, o António Luís Sucena Ribeiro de Melo, meu companheiro na Escola do Adro, com quem recordei tempos idos do Botaréu. O agrado com que visitei a exposição veio a ser redobrado quando me apercebi de que muitas das peças e dos livros expostos faziam parte da colecção carinhosamente construída por um aguedense que, da Borralha partiu para o Brasil onde teve êxito, nos muitos

110 Armando Rocha A Minha Opinião anos que lá passou. Trata-se do Comendador José da Silva Hen- riques a quem felicito pela sua bela iniciativa que fez com que a história fosse recordada e não postergada como se faz muito por aí… 2. Vitórias internacionais O andebol português acaba de se qualificar para o campeonato do Mundo. Fiquei naturalmente satisfeito com essa vitória. Mas mais satisfeito fiquei pelo facto de ter ouvido da boca de um dos principais artífices dessa vitória, um atleta com mais de 250 inter- nacionalizações, que iria sacrificar o seu ritmo de participação na selecção nacional “ porque era chegada a hora de tratar de com- pletar a sua formação académica no ISMAI – Gestão do Desporto”. Parabéns Carlos Resende. Se todos os desportistas pensassem da mesma forma, não haveria tantas situações de grandes atletas em dificuldades após o término das suas carreiras, especialmente no futebol. Tiago Monteiro, numa prova de competitividade reduzida, subiu ao pódio em Indianápolis. Não obstante a desistência de uns tantos carros de grande categoria, o seu 3º lugar entre 6 concorrentes, é de saudar vivamente. O que talvez não devesse ter acontecido foi o facto de dois governantes terem enviado as saudações da praxe. Não bastaria a do Secretário de Estado dos Desportos? Enfim, so- mos uns exagerados… Para o bem e para o mal…

Publicado no jornal “Região de Águeda” em 24/06/2005

111 Cantar o hino e contestar o governo

1. Cantar o hino nacional em público Acabo de assistir pela TV ao encontro entre as selecções nacionais de râguebi da África do Sul e da França, para o Torneio das 6 Na- ções. O enorme estádio em que foi disputado o jogo estava repleto de um público entusiasta. Uma imagem desse evento impressionou-me fortemente. Foi a do momento em que se tocaram os hinos nacionais respectivos. Ambos foram cantados por uma sul-africana com uma excelente voz. E ela foi acompanhada pelas vozes dos jogadores africanos e europeus perfilados no terreno que, salvo um ou outro, cantavam com fervor e bem alto. Bem gostaria de ver a mesma atitude em todos, mas todos, os jo- gadores que envergam as cores nacionais, ainda que muitos deles radicados em clubes estrangeiros. Mas fica-me uma dúvida: será que nas escolas de ensino básico e secundário as nossas crianças são motivadas no canto coral pelos seus professores?... Que saudades eu tenho do meu professor des- sa disciplina no Liceu de Aveiro, o Pe. António… 2. A contestação ao governo Os últimos dias foram agitados pelas anunciadas greves dos pro- fessores em dias de exames do secundário que vieram a ter uma resposta pronta e firme, com sucesso, por parte da Ministra da Edu- cação. Não podemos nem devemos deixar de realçar o comporta- mento digno de muitos professores que obstaculizaram, a contra gosto ou não, aos graves prejuízos que os sindicatos pretenderam desferir, em última análise, aos indefesos alunos e suas famílias. Mesmo assim, ainda houve uns tantos alunos que ficaram à espera dos seus “educadores”. A agitação provocada pelas medidas que o Governo tem vindo a tentar implementar com vista à redução da

112 Armando Rocha A Minha Opinião despesa do Estado, e que deveria ser compreendida por todos os portugueses, põe-nos uma interrogação: será que as medidas de austeridade só devem ser acatadas por uns tantos, sem poder rei- vindicativo? As classes especiais, mais favorecidas por privilégios conquistados antes, nada terão a ver com a situação do País? O certo é que foi o laxismo do Estado em que todos, mas todos, desde os governos provisórios, tiveram a sua culpa, nos conduzi- ram à actual situação, não obstante o manancial de dinheiros da Europa que nos afogou numa onda despesista, muitas das vezes, com reduzido controlo estatal ou autárquico. Fez-se muita coisa boa, é certo, mas, com o mesmo dinheiro, sem desvario nem cor- rupção, poder-se-ia ter feito muito mais… Alguém tem dúvidas? Acabamos de entrar no verão, pelo que é natural que os ânimos tendam a “arrefecer”, com o calor, os ímpetos dos sindicatos das magistraturas, das polícias, dos médicos, dos enfermeiros, nova- mente dos professores, etc. etc. Mas seria interessante que o Governo, para além dos sinais muito positivos que já deu, no sentido da moralização do sistema polí- tico, se não esqueça de dar mais um: que diga (sim ou não) se já fez com que os regulamentos das reformas do Banco de Portugal, Caixa Geral dos Depósitos, EDP e GALP fossem alterados, acaban- do-se com o desaforo das reformas milionárias dos seus adminis- tradores que as conquistam com uns escassos anos de trabalho. Acabar com essa afronta a quem luta no dia a dia pela sua sobre- vivência não poderá nunca ser considerado demagogia. A não ser assim, fica-se com a ideia de que não se quererá prejudicar, no futuro, a reforma de Vítor Constâncio e de mais uns tantos… que se juntarão aos Mira Amaral, Campos e Cunha… Aguarda-se por esse sinal inequívoco das intenções do governo, já que ninguém entende que apenas se limita o montante dessas reformas quando acumuladas com o exercício de outras funções públicas…

Publicado no jornal “Soberania do Povo“ de 24/06/2005

113 Transparência e rigor

1. Transparência “Transparência” é uma das palavras que têm vindo a ser usadas a esmo, em especial pelos nossos políticos. Por tudo e por nada se apregoam as atitudes transparentes na gestão da coisa pública. Tratam-se de boas intenções que todos os responsáveis políticos, e não só, deveriam levar à prática. Só que a prática deixa muito a desejar em relação a uns tantos. Outros há, sim senhor, que são bem transparentes nos seus actos públicos, o que é justo reconhe- cer. Mas, infelizmente, o que deveria ser regra quase aparece como excepção. Em termos de transparência, basta ler os jornais em que todos os dias surgem notícias de situações menos claras, em espe- cial no domínio autárquico, com os tribunais a contas, quer com falta de tempo e condições para produzirem sentenças atempadas, quer com prescrições. Há dias, o DN titulava uma página inteira assim: «TC arrasa con- tabilidade dos partidos políticos. Tribunal abre processos contra di- rigentes por existência de “dolo”. PS, PSD e CDS/PP repetem irre- gularidades». Este exemplo de falta de transparência na gestão de dinheiros de todos nós tem de levar a uma interrogação: com que moral se pretende aumentar o financiamento dos Partidos Políticos à custa do erário (exaurido) público, como ciclicamente se vem falando? Será uma heresia “democrática”dizê-lo, mas atrevo-me a apontar para que os Partidos assentem a sua base financeira nas quotas dos seus filiados, até porque são eles que virão a ser os mais beneficiados quando o seu Partido ganhar… Talvez seja de estudar o caso do kit do Benfica… e encarar de vez a redução do número de deputados para 100, esses pagos devidamente desde que escolhidos com base nos seus curricula, mas em que o simples mas trabalhoso colar de cartazes tenha um peso reduzido…

114 Armando Rocha A Minha Opinião

2. Rigor Outra das palavras que está na moda e se aplica a torto e a di- reito é a palavra “rigor”. Pois bem, quando ouço um político usar o termo para reforçar a credibilidade das suas propostas perante o povo, recuo no tempo 55 anos e logo me vem à mente a figura de um Catedrático da Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra – o Doutor Manuel dos Reis. Ele foi meu Professor de Astronomia e Mecânica Celeste. Para além de ser um sábio da matemática, tinha umas excepcionais qualidades de expositor que lhe permitiam tratar uma matéria tão complexa como a da ciência dos astros de uma forma extraordinariamente simples e aliciante para os seus alunos. Uma das características desse Professor con- sistia no rigor posto em tudo o que era feito no Observatório As- tronómico da Universidade e que era o prolongamento do que se passava nos exames das suas cadeiras. Ele não admitia um erro de uma centésima num cálculo das coordenadas de uma estrela. Esse erro, aparentemente sem relevância, era sinónimo de reprovação. Assim se passou com o meu velho amigo e grande glória da Aca- démica, o interior esquerdo, Nana. Um ofício que o dactilógrafo tivesse de rasurar era sinónimo de novo ofício até não ter erros… Essa preocupação de rigor ainda hoje a mantenho. Os tempos de agora são outros e muitos dos que me lerem acha- rão ridículas estas preocupações de rigor a sério. Porque o rigor hoje apregoado aos sete ventos é um rigor a brincar. A tal ponto que, ainda bem recentemente, um conceituado econo- mista da nossa praça errou as contas do défice, não numa centé- sima, mas em muitos milhões de euros, não obstante contar com uma equipa de excelência que deve apoiá-lo no Banco de Portugal – um organismo que devia primar pelo rigor… E, logo a seguir, o próprio Ministro das Finanças, também conceituado economista, mandou para Bruxelas umas contas do PEC igualmente erradas em muitos milhões… Há 55 anos o aluno que errasse por uma centésima era reprovado. Hoje, ao economista que erra em muitos milhões de euros, nada acontece… a não ser obter uma reforma sumptuária… Quousque tandem abutere Catilina patientia nostra?

Publicado no jornal “Soberania do Povo” em 22/07/2005

115 Privilégios de candidatos

1. Coragem Não é a primeira vez que aqui registo, com surpresa, aliás, mas com agrado, a coragem com que o PM Sócrates tem actuado nes- tes primeiros meses de governação. Efectivamente, ele destapou a panela onde se acomodam as mais variadas situações de privi- légios e sinecuras de que uns tantos, que são muitos afinal, têm beneficiado, nestes 31 anos pós revolução. Pelo que se tem ouvido, o PM parece estar disposto a corrigir o rumo dessas situações, o que não será fácil, dados os interesses instalados, alguns deles em Corporações bem poderosas. Com o aproximar das eleições autárquicas, surgiu agora mais uma situação que, no mínimo, se tem de considerar escandalosa. Trata- -se de quê, afinal? Vejamos: A lei actual prevê que os candidatos a autarcas tenham dispen- sa de actividade profissional durante os 30 dias que precedem a campanha respectiva. Mais informou o PM de que estarão nessa situação cerca de 5.000 candidatos… Sim, são 5.000. Considerando que o mês de férias por excelência é o de Agosto, essa situação levará a que, uma semana após o regresso a casa, vindos das férias, muitos desses milhares de veraneantes entrarão novamente em férias, pois já se sabe que o trabalho das cam- panhas cai sempre nos mesmos que são alguns deles. Quando o discurso oficial vai no sentido da produtividade como umdos meios por excelência para se combater o nosso atraso, o sistema político português com isso não se preocupa. Mas pede sacrifícios aos trabalhadores… Com estes exemplos não acredito que a mo- bilização da mão de obra portuguesa corresponda aos apelos que lhe são feitos. O Senhor PM tem aqui uma boa oportunidade para promover a revogação do referido dispositivo legal. Se o fizer já, isso será um sinal bem positivo da governação.

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2. Venezuela Sabe-se que o piloto Luís Santos, que se encontra detido na Vene- zuela como arguido num processo de tráfico de droga, lá continua a “apodrecer” à ordem da justiça (?) de Hugo Chávez. Essa situa- ção, a avaliar pelo que a nossa prestigiada Polícia Judiciária e a própria Procuradoria-Geral da República disseram, será intolerável num estado de direito. Não sei qual tem sido o empenho do Doutor Amaral no caso. Será ele capaz de repetir o êxito do Embaixador António Monteiro no Dubai? Para já, tarda… Porém, haverá uma cartada que poderia ser jogada, se é que o não foi já. O Senhor Presidente Jorge Sampaio tem corrido mundo a afirmar o prestígio de Portugal. Ainda agora regressou do Chile (onde teve de reconhecer que o seu crescimento económico tem sido notável, mas só a partir da ditadura de Pinochet – que praticou muitas maldades condenáveis, é certo) e do Paraguai que devem ter um interesse estratégico muito grande para Portugal, dada a sua proximidade… Numa dessas viagens ficou-me a impressão de que o Dr. Sampaio estabeleceu bons contactos com o ditador Fidel Castro que, seguramente, é amigo de Chávez. Não seria de tentar a sorte por essa via? 3. Estímulos presidenciais Ainda a propósito de visitas do PR, é sempre com agrado que vejo o Dr. Sampaio por esse País fora em visitas temáticas a chamar a atenção para o que de bom se faz com mão de obra portuguesa e empresários de grande categoria que os há e não são poucos. Sabe-se, porém, que há muitíssimas empresas que enfrentam grandes dificuldades para sobreviverem, grande parte delas tam- bém por culpa de patrões menos escrupulosos… Pois bem, mesmo que já esteja a dobrar a última esquina do seu percurso presidencial, não seria de vermos o PR fazer uma visita a um conjunto dessas empresas em dificuldade para injectar um pouco de ânimo aos seus sacrificados trabalhadores? Quem sabe se, com esse estímulo, elas não dariam a volta por cima… É mais agradável ser recebido em ombros do que em ambientes adversos, mas há ossos do ofício a que se não deve fugir…

Publicado no jornal “Soberania do Povo” em 29/07/2005

117 Falar português…

1. Quem reprova ? O professor ou o aluno ? A simpática Drª Edite Estrela, que suponho ser professora do ensi- no secundário, de formação, embora agora seja política no activo, tem um programa na Rádio Renascença com muito interesse. Ela ensina a falar/escrever bom português, com exemplos sugestivos que escolhe com bom critério. Devo dizer que eu próprio, embora tenha tido excelentes profes- sores de português na Escola Primária de Águeda e no Liceu de Aveiro, tenho aprendido muito com as suas lições radiofónicas. Trago este tema para o jornal porque, na semana em que foram divulgados os resultados dos exames de matemática do ensino se- cundário, os jornais (até em editorial e em manchete), as rádios e as televisões (em horário nobre) agrediram os nossos ouvidos e os nossos olhos com notícias e comentários em que se propalava que 70% dos alunos reprovaram ou chumbaram. Não é assim. Quem reprova é o professor e não o aluno. É o aluno que é reprovado pelo professor. A maioria dos jornalistas que assim falava é gente nova que deve ter tido professores não exigentes ou não competentes. Nunca é tarde para se aprender. Que tal umas lições de bom português nas redacções dos órgãos de comunicação social? É que não é só na Escola que se aprende. E a Comunicação Social tem um papel importantíssimo neste domínio, pela penetração que tem na po- pulação. Bom seria não termos de ser confrontados, constantemente, com discursos feitos em mau português. A Língua é o maior património cultural de um povo, pelo que deve ser bem tratada pelos cida- dãos. Assim se evitaria ouvir dizer ou ler, por parte de gente estimá- vel mas com especiais responsabilidades, por exemplo: “estamos

118 Armando Rocha A Minha Opinião cientes que…” em vez de “estamos cientes de que…” (J. Sócra- tes); “póssamos…” em vez de “possamos…” ministro Jaime Silva); “cidadões…” em vez de “cidadãos” (vídeo do professor da Fac. Letras, M. Carrilho), etc. etc. Muitos outros exemplos poderiam ser citados, infelizmente, até porque quem é que não caiu já numa dessas “gaffes”? A tarefa não é fácil. Cabe aos professores na Escola, ao Sindicato dos Jornalistas, entre outros, fazer alguma coisa para inverter esta situação. 2. Corrupção na Justiça? A corrupção é um fenómeno universal disseminado por todo o mundo e que está presente nos mais variados domínios da activi- dade económica e não só. Usa meios sofisticadíssimos para alcan- çar os seus objectivos, normalmente consubstanciados em lucros avultados mas ilícitos. Já ouvimos falar de corrupção nas autarquias, nos governos, nas escolas, no desporto, em cooperativas, etc. etc.. Mas estávamos longe de pensar que essa praga tinha chegado também à Justiça portuguesa. Pois bem, o Diário de Notícias fez manchete no pas- sado dia 12 com “PJ investiga corrupção no Tribunal de Comércio de Lisboa”. Quero acreditar que se trata de uma brincadeira de mau gosto pois uma democracia consolidada como a nossa não tem espaço para uma tal situação.

Publicado no jornal “Região de Águeda” em 29/07/2005

119 Universidades e mordomias

1. Universidade em família A última função que exerci no Estado, antes de me aposentar e de rumar para a Sonae, foi na Inspecção Geral de Educação. Natural- mente que sou sensível às notícias que dela (agora desdobrada na Inspecção Geral do Ensino Superior) emanam. Ficou-se a saber não há muito tempo que numa Universidade – mais precisamente a UTAD – serão raros os membros da equipa reitoral ou do pessoal dirigente administrativo que não tenham elementos familiares a trabalhar na instituição. Só o administrador da Universidade terá uma quota (docentes incluídos) em que en- trarão a mulher, filhos, nora, cunhados e primos por afinidade. A Universidade teria ao seu serviço uma frota automóvel consti- tuída por 32 viaturas operacionais, além de 19 alugadas. Dessas, a Reitoria dispunha de 19. E limite de gastos, ao que parece, não havia. Com cerca de 30 telemóveis distribuídos pela equipa reitoral, di- rectores de serviço e motoristas não existiria controlo de chama- das. Certamente que a UTAD não será a única nessa situação. Ou será? Lembro-me, a propósito, dos tempos em que o Reitor da Universi- dade de Coimbra se deslocava no seu automóvel. E o seu prestígio era enorme. E a Universidade cumpria o seu papel com escassos recursos. Não estamos nos meados do século XX, é certo. Mas tenho a sensação de que se caiu no exagero do facilitismo e do despesismo. E dou comigo a perguntar-me: foi para isto que a Assembleia da República queimou as pestanas dos deputados a discutir e a apro- var acaloradamente a Lei da Autonomia Universitária que se en- contra em vigor?

120 Armando Rocha A Minha Opinião

Mas o pior é que todos, ministros, secretários de estado, deputados, assobiam para o ar… como se fossem alheios ao que fizeram… desde o período revolucionário. E ninguém lhes pede contas. O “Zé pagode” que pague a factura que começa só agora a preocu- par alguns dos senhores reitores que terão ajudado ao descalabro e estão na contingência de só virem a ter dinheiro para pagarem os salários… nos tempos próximos. Se é que o terão mesmo?... Lição a tirar: as Universidades estão pobres financeiramente mas quem legislou, se calhar, entrou na política com uma mão à fren- te e outra atrás e hoje está bem na vida… sem nenhum peso na consciência. 2. Universidades e Tecnologias Felizmente que existem em algumas Universidades núcleos de in- vestigadores que têm trazido para o mercado produtos de excelên- cia. Foi o caso de que a RTP nos deu conta recentemente com a presença nos ecrãs do Prof. Epifânio da Franca (IST). Com alguns dos seus colaboradores universitários criou a Chipidea cujo negó- cio consiste na concepção de circuitos integrados analógicos e di- gitais que se espalham por Paris, Leuven, Gdansk, Suzhou, Tóquio, Macau, New Jersey, Texas e que já facturou em 2004 mais de € 20 milhões. Refiro ainda o caso da Enabler que nasceu na Sonae com o Eng. António Murta (Universidade do Minho) e que atingiu € 28 milhões de facturação em Inglaterra, Alemanha e Brasil. Recentemente, tive ocasião de saber que, em Izmir (Turquia), a equipa do Eng. Murta esteve ocupada a montar os sistemas informáticos necessá- rios à organização da Universíada que teve a presença de 8.300 participantes. Isto para dizer que massa cinzenta não falta a Portugal. Ela pre- cisa, isso sim, de ser estimulada em prejuízo de gastos que só os políticos da nossa terra conseguem desbaratar, muitas vezes em proveito próprio.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” em 16/09/2005

121 O republicano que quer ser Rei

Quando se nasce, o percurso de vida das pessoas, de uma maneira geral, é uma incógnita. Por vezes, nasce-se pobre e o futuro torna- -se risonho. Outras vezes nasce-se rico e o futuro torna-se negro. O sucesso ou insucesso na vida dependem, em grande parte, da vontade das pessoas. Há as que lutam, estudam, trabalham e se esforçam por alcançar o sucesso e há ainda as que nada disso fazem e acabam na mediania, se não mesmo na pobreza. Para não falar de uma boa saúde, sem a qual nada feito. Claro está que há quem nasça em berço de ouro e que só precisará de não fazer muitas asneiras para seguir uma vida de opulência e mesmo de ociosidade. Em relação a esses, há quem desenvolva um sentimento de inveja, o que não é o meu caso. Tenho é pena da sua condição de inutilidade perante a sociedade que os rodeia. E há excepções: são aqueles que, tendo nascido nesse berço, actuam como seres normais na sociedade competitiva que nos envolve. E, felizmente, são muitos. Numa sociedade profundamente (não em termos quantitativos) po- litizada, como está a sociedade portuguesa, dou comigo a pensar muitas vezes nas carreiras dos nossos políticos: o que fizeram ou não fizeram ao longo da vida? Qual o seu percurso profissional? Os testemunhos de carácter ou falta dele de que deram provas? As de- rivas em que se deixaram enredar? Enfim, como chegaram tão alto (alguns com os bolsos cheios por enriquecimento súbito)? Com perto de 100 anos de República, o País tem assistido a evo- luções interessantes e menos interessantes, a um pouco de tudo. Agora que estamos no século XXI, parece que uma certa Monarquia está a espreitar… E está a espreitar de uma forma sofisticada – ou não estivéssemos nós na era da alta tecnologia… Os monarcas são pessoas como as outras mas que, em regra, nasce- ram num berço de ouro. Foram educados em boas Escolas e Univer-

122 Armando Rocha A Minha Opinião sidades. Aprenderam as boas maneiras da convivência, mas nunca souberam o que era ter de entrar ao serviço de uma empresa, do Estado ou de uma instituição, a hora certa, manter-se lá a trabalhar até às tantas e só depois ir para casa tratar da mesma, por vezes, sem a garantia do salário devido. É justo prestar homenagem àqueles monarcas, e houve muitos na nossa história, que exerceram as suas funções com dignidade e alto sentimento do amor à Pátria. E ainda os há por esse mundo fora, felizmente. Só que a ambição de certos plebeus deixou de conhecer limites. Querem ser monarcas e, para isso, há que estudar formas de lá chegar por via democrática… Olhemos ao nosso redor. Temos um candidato a PR que se assume de republicano, e de outras coi- sas, que nasceu no seio de uma família honrada que conseguiu um estatuto económico de certo relevo, por via da educação, durante o Estado Novo. Não lhe faltaram condições para cursar a Universi- dade. Teve sempre condições para desenvolver actividade política, sem pensar no dinheiro que tinha de ganhar exercendo profissão concreta. Teve a maior sorte de ter ao seu lado uma Senhora que se encarregava, sabe Deus com que esforço, de gerir, com sucesso, o negócio herdado. E, quando a política activa em que se envolveu com determinação, vendo as ideologias não como um meio mas como um fim, o levou ao exílio em França (onde vagamente leccio- nou…), teve sempre o apoio financeiro da retaguarda familiar e de capitalista com larga visão estratégica… Enfim, mesmo na adversi- dade, viveu sempre à grande e à francesa. O trabalho puro e duro nunca foi o seu forte… Com o 25 de Abril a sua vida passou a ser uma vida de sucesso político pessoal e familiar. Fez coisas boas como o combate ao totalitarismo que os revolu- cionários do MFA nos quiseram impingir. Sujou o seu nome com a descolonização que aceitou, subscreveu (não só ele) e de vez em quando defende, nos termos em que foi feita. Bem ou mal, foi tudo neste País, mesmo sem ler dossiers... E agora, com idade a merecer repouso, o seu instinto monárquico-democrata leva-o a lutar por um 3º mandato… Até para ajudar o delfim João a manter-se no poder, por agora só autárquico… Os monárquicos que se cuidem! Como sou republicano, não votarei em Soares.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” em 23/09/2005

123 A falta de público no futebol

No dia do meu aniversário, resolvi levar o meu neto Diogo ao fu- tebol. Jogava nesse dia, no estádio do Bessa, o clube a que estou ligado sentimentalmente há 60 anos – a Associação Académica de Coimbra. Assim, depois de soprar as muitas velinhas do bolo feito pela mi- nha nora Marta, lá fomos os dois conduzidos pelo meu filho Fer- nando. Dirigi-me à bilheteira para comprar os bilhetes de ingres- so. “Quanto custa cada bilhete?”, perguntei eu. “Vinte euros, cada um e a criança de 11 anos também paga”, foi a resposta… Fomos para a bancada da claque da Académica que disparava “gritos” próprios de gente sem qualquer formação… Uma triste- za… Com bastante sofrimento lá foram passando os 90 minutos de jogo. Por sinal, um jogo fraco, sem grande nível técnico, e que terminou com a vitória do Boavista por 2-1. Nesta era dos novos estádios do Euro 2004, foi a primeira vez que visitei o estádio do Bessa que me deixou boa impressão, de uma maneira geral. Só que, para se entrar para as cabeceiras, tem de se subir uma centena de degraus que nem são suaves. São mesmo de tirar o fôlego a um maratonista. Não sei se alguma vez o estádio encheu completamente, a ava- liar pelos números divulgados semana a semana. No jogo a que assisti, estariam umas escassas 2.000 pessoas – o que dá um as- pecto desolador ao recinto, só compensado pela policromia das cadeiras. O mesmo se está passando na maioria dos outros campos de fute- bol. As excepções à regra situam-se, naturalmente, no Dragão, na Luz e em Alvalade e nem sempre. O certo é que a comodidade dos estádios novos é convidativa para os espectadores. Então porque é que eles não acorrem aos jogos?

124 Armando Rocha A Minha Opinião

Uma das razões é, sem dúvida, o preço dos ingressos. Na verdade, numa época de aflições económicas nos lares de muitos portugueses, quem pode dispor facilmente de 20 euros/pessoa, crianças incluídas, para assistir ao espectáculo? Que, nem sempre é de fino recorte técnico, proporcionado por clubes em situação de falência técnica e por atletas pagos a níveis escandalosos. E, pela amostra, os clubes nem sequer se preocupam em semear para colher frutos mais tarde, escancarando as portas dos estádios às crianças em jogos que sabem que vão ter muito mais lugares não vendidos do que lugares vendidos. Oxalá o bom senso venha a imperar na política de preços da Liga de Clubes.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” em 07/10/2005

125 Antunes Varela - um português de eleição

Filho de Pais simples e humildes, sem meios de fortuna, foi aluno brilhante da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, tendo sido Presidente da Associação Académica de Coimbra. Foi assistente do Prof. Pires de Lima e doutorou-se com distinção. Foi orador oficial do Orfeão Académico de Coimbra, na sua digres- são a Madrid e Salamanca. Nessa qualidade, proferiu um discurso perante o Ministro da Educação de Espanha, Prof. Ibañez Martin, que este, anos depois, já como Embaixador em Portugal, recorda- va com grande emoção. Nesse discurso, de belo recorte literário e muito bem dito, Varela comparava Coimbra a Salamanca citando Unamuno: “…onde cada pedra é uma alma e cada alma um se- gredo…”. Dedicou a sua vida ao Direito Civil e ao Direito Processual Civil. O Código Civil de 1966, que substituiu o de 1867, do Visconde de Seabra, deve ser considerada uma obra que não desmerece no confronto com as melhores codificações estrangeiras. Os trabalhos preparatórios e o ante projecto foram elaborados por uma Comis- são presidida pelo Prof. Vaz Serra, tendo a sua revisão final cabido a Pires de Lima e Antunes Varela. Sem se esquecer a colaboração dada naturalmente por outros professores da Faculdade de Direito de Lisboa, pode dizer-se que a Universidade de Coimbra, através dos seus Professores, Salazar, presidente do Conselho de Ministros, Vaz Serra, presidente da Comissão, e Antunes Varela, ministro da Justiça, ficou para sempre ligada a essa obra jurídica. Como um dos maiores civilistas portugueses contemporâneos, An- tunes Varela, à frente do Ministério da Justiça, no consulado de Salazar, produziu legislação de largo alcance (lembre-se o regime da propriedade horizontal, entre muitos outros). Grande publicista e notável conferencista, Varela foi director da centenária “Revista de Legislação e de Jurisprudência” que é a

126 Armando Rocha A Minha Opinião mais antiga da especialidade e fora fundada por Chaves e Castro. Nessa Revista publicou notáveis anotações a Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça. Para se ver da qualidade desse Professor bas- tará citar, entre muitas outras obras da maior qualidade técnica, o “Direito das Obrigações”, o “Código Civil anotado” (c/ Pires de Lima), as “Lições de Processo Civil”, as “Lições de Direito de Famí- lia”. Cristão convicto, de inultrapassável coerência ideológica, muito empenhado no progresso económico e social, Antunes Varela não escapou aos ventos abrilistas, em que suportou enormes dificul- dades, pelo que teve de se exilar no Brasil, mais propriamente na Bahia, onde se instalou como um vulgar advogado, sem meios de fortuna, que ia mesmo à barra dos tribunais, onde naturalmente alcançou grande prestígio. Lá publicou também um livro sobre “Di- reito das Obrigações”. Após a sua jubilação na Universidade de Coimbra, passou a lec- cionar noutras Universidades portuguesas e brasileiras, onde era especialmente apreciado. Fui seu adjunto na direcção do Centro Universitário de Coimbra, nos anos 50, e depois acompanhei-o na administração da SONAP onde ele era o presidente do conselho de administração. Daí que estas palavras revelem alguma emoção. Tenho porém a certeza de que existirá um consenso generalizado de admiração por esse grande português que acaba de partir… Paz a sua alma!

Publicado no jornal “Região de Águeda” de 21/10/2005

127 Cultura e subsídios

De vez em quando, para não dizer, com alguma frequência, assis- te-se a debates sobre o financiamento da cultura, nas suas mais variadas formas de expressão: teatro, música, cinema, etc. Normalmente, está de um dos lados o produtor dos actos consi- derados culturais e do outro lado está o financiador ou não finan- ciador. Raro se chega a uma conclusão diversa daquela que leva o espectador a concluir que o dinheiro gasto nunca é suficiente para os desejos dos artistas/produtores. Sinceramente não sei de que lado estará a razão. Mas lá que nesse campo existe a ideia de uma subsidiodependência muito grande parece que é indiscutível. Tenho o maior respeito, mesmo admiração, por todos aqueles que dedicam a sua vida a criar, sejam poemas/prosa, sejam coreo- grafias, seja música, enfim todo e qualquer espectáculo/programa que não atente contra os princípios e valores da sociedade em que vivemos. Ao contrário, tenho um solene desprezo pelos progra- mas, e muitos são, que ofendem o desenvolvimento harmonioso das crianças e a decência, e que nos entram pela casa dentro, todos os dias, através da “caixa mágica”. As boas vontades que por aí imperam não podem, porém, evitar que se faça uma avaliação da qualidade do que elas oferecem ao público consumidor. A forma mais simples de fazer essa avaliação consiste em registar a adesão, ou falta dela, aos produtos oferecidos. E essa avaliação é inexorável, num ou noutro dos sentidos. Pois bem, tive ocasião de assistir em Lisboa a dois espectáculos culturais de que gostei francamente. Um foi a revista à portuguesa “A Canção de Lisboa”. Trata-se de mais uma excelente produção de Filipe La Féria que consegue, sem subsídios estatais, segundo julgo saber, atrair o público que acorre

128 Armando Rocha A Minha Opinião ao Politeama vindo em excursão dos mais variados pontos do País. Porque é que ele consegue essa grande adesão da população? Só encontro uma palavra para a classificar: qualidade! O outro espectáculo a que acabo de assistir foi a ópera “Carmen” de Bizet, no Coliseu dos Recreios. A comprovar o que digo atrás, até tive o grato prazer de lá encontrar um conterrâneo que hoje exerce medicina em Aveiro e que já não via há muito tempo – o Jorge Pinho e Melo - e que também ele se integrou numa dessas excursões culturais periódicas, em autocarro, organizadas pela D. Manuela Maia. O Coliseu tinha a plateia completamente cheia, tal como nos ou- tros quatro espectáculos que proporcionou em Lisboa, depois de ter actuado no Porto e na Figueira da Foz. Todos estes espectáculos foram integrados na digressão europeia da Grande Ópera de Ka- zan, em celebração dos 1.000 anos dessa cidade da Tartária. Mesmo com preços que não são muito modestos para a época que atravessamos, o público não faltou para ovacionar os mais de 100 artistas e músicos em palco. Porquê? De novo encontro a palavra adequada: qualidade! Curiosamente, à mesma hora, realizava-se também no Politeama, em frente do Coliseu, o espectáculo “A Canção de Lisboa”. E assim se cruzaram duas autênticas multidões que tinham em comum o desejo de apreciar produtos de qualidade, que são naturalmente fruto de muito trabalho e suor.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 04/11/2005

129 Políticos insaciáveis

Continuo a pensar que o Eng. Sócrates tem demonstrado, nas suas intenções, um espírito reformista que é de louvar. Será que ele está sofrendo muitas resistências para levar a cabo as suas ideias, designadamente quando se trata de medidas moraliza- doras da classe política que temos tido desde Abril’74? Não preten- do dizer que não haja e não tenha havido gente séria nessa classe. Mas a maioria… deixa muito a desejar. Ainda agora o que se passou com a entrada em vigor do diploma da Assembleia da República relativo às benesses (citando M. So- ares) de que usufruíam os autarcas foi simplesmente lamentável. O que a certamente programada burocracia dos senhores deputa- dos fez para que os recentes eleitos pudessem ficar fora da alçada da Lei só deve envergonhar quem assim procedeu. Mas nada disso os envergonha porque, afinal, essa situação não era mais do que uma manifestação de solidariedade para com os seus camaradas autarcas. E assim sendo, vamos ter de continuar a olhar para esses senhores como uns privilegiados que trabalham 4 anos como se tivessem trabalhado 8 anos, para efeitos de reforma. E assim foi Sócrates desfeiteado. E tudo isto se passa precisamente numa época em que o governo está a aumentar a idade da reforma para os funcionários públicos. A desgraça destes é não serem nem políticos, nem tão pouco órgão de soberania. A situação financeira e económica do País impõe sacrifícios que to- dos temos de compreender, mesmo que a contra gosto. Mas que sejam todos a contribuir nessa cruzada que Sócrates está a empreender, e bem! Essas benesses, a que muitos chamam “direitos adquiridos”, estão a criar grandes dificuldades ao governo, com os sindicalistas na pri- meira linha de fogo, como era de prever. Outra coisa não seria de

130 Armando Rocha A Minha Opinião esperar. Eles também andam nisto há 30 anos… sem saber o que significa a palavra renovação! E eu pergunto-me: será que a política de redução / eliminação de benesses / direitos adquiridos só vai atingir os mais fracos? E deixa de fora os poderosos? Aponto 2 exemplos: O dos ex-Presidentes da República e o dos ex- -Presidentes da Assembleia da República. Reconheço o melindre da situação, mas não será que, em democracia, todos os cidadãos são iguais perante as leis? Não está em causa, como é óbvio, nem o nome nem a dignidade das pessoas. Mas, por alma de quem é que os contribuintes têm de pagar as mordomias desses senhores, por mais respeitáveis que sejam e por melhor ou pior que tenham de- sempenhado os seus cargos, depois de abandonarem os mesmos? Compreende-se que se lhes criem condições para terem uma refor- ma digna, como deve suceder, aliás, a todos os trabalhadores que efectuaram os seus descontos para a segurança social ao longo da vida. Agora, para além dessa reforma, que já de si é excepcional e sufi- cientemente confortável, atribuir aos ex-PR uma instalação num imó- vel, uma secretária, um assessor(a), viatura de cilindrada elevada (e sua manutenção) e motorista, tenho de considerar uma verdadeira afronta que será própria de países ricos, o que não é decididamente o nosso caso. O mesmo direi relativamente aos ex-Presidentes da AR, embora só com viatura, motorista e pouco mais… Quanto custa tudo isso?... Segundo a imprensa acaba de relatar, o antigo palacete da Tapada das Necessidades, com 250 m2, que vai ser a nova “casa” de Jorge Sampaio, quando ele também passar à situação de “ex”, está a ser objecto de uma recuperação cujo custo estará estimado em 120 mil contos. Será que esse dinheiro não seria mais bem utilizado, por exemplo, num Hospital ou num Centro de Saúde ou numa Escola? Alguém se preocupa, por exemplo, em fazer a avaliação dos gastos dos Chefes de Estado em viagens ao estrangeiro face ao eventual retorno em prestígio e negócios para o País? Só M. Soares terá à sua conta o equivalente a 22 voltas ao mundo… Contudo, as esta- tísticas internacionais colocam Portugal cada vez em pior lugar no ranking dos países da UE… Valha-nos Deus.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 11/11/2005

131 Ter memória / Hino Nacional / O Ensino Universitário

1. Ter memória - A inexorável lei da vida não deixará certamen- te de se manifestar, mais cedo do que mais tarde, talvez mesmo através duma coisa… chamada próstata, por muito que se não queira admitir essa situação. Não tenhamos dúvidas. A idade não perdoa! Até lá, porém, procurarei exercitar a memória. É o que vou fazer agora, uma vez mais. Lembro-me de, em miúdo, ir com minha mãe à consulta do Sr. Dr. Breda, ao Hospital de Águeda. Não mais me saiu da memória o conselho dado no sentido de que me faria bem uma colher de vinho tinto para me estimular o apetite… Ainda hoje sigo o conse- lho, já não, porém, à colher… O Hospital era um local de excelência, reconhecido mesmo como o melhor do distrito de Aveiro. Desde os médicos, todos, às enfer- meiras Irmãs religiosas, tudo funcionava bem e atempadamente. Tenho para mim que esse clima era devido, em grande parte, ao timoneiro que, diariamente e sem olhar a horários, vinha de Bar- rô. A seu lado, muito chegado, estava o Dr. Mateus Barbas dos Anjos. Quem, de Águeda, até aos anos 70, não passou pelas competen- tíssimas mãos clínicas de ambos? Quando Deus levou o Sr. Dr. Brêda logo Águeda sabia que o Hos- pital se mantinha em boas mãos: o novo Director, Dr. Mateus, era o natural sucessor do mestre. E assim continuou, gozando do mesmo prestígio, agora já com novas técnicas cirúrgicas próprias de quem se continuava a actualizar, em especial no contacto com os lentes da Universidade do Porto, dado o bom relacionamento dispensado sempre ao seu antigo aluno. Oposicionista ao antigo regime, nunca deixou de ser respeitado por todos, mas todos, os aguedenses.

132 Armando Rocha A Minha Opinião

Qualquer doente do foro oncológico que fosse enviado pelo Hos- pital Conde de Sucena para o IPO de Lisboa levava com ele uma recomendação do Dr. Mateus o que significava um acompanha- mento desvelado do Prof. Gentil, designadamente através de uma enfermeira estagiária que, por acaso, também era de Águeda, de nome Esmeralda Pais Gomes. E o Dr. Mateus telefonava assidua- mente para saber da evolução da doença. Creio sinceramente que só por manifesto esquecimento dos autar- cas de Águeda é que, ao calcorriarem-se as ruas da cidade, se não encontra uma com o nome de Dr. Mateus Barbas dos Anjos. 2. Hino nacional – Já por diversas vezes manifestei a minha es- tranheza pelo facto de a maioria dos jogadores da selecção nacio- nal de futebol não cantarem o hino nacional no início dos jogos internacionais. Pois bem nos 2 últimos jogos a situação alterou-se de tal maneira que apenas o brasileiro naturalizado ficou de boca fechada. Fiquei muito contente com a atitude dos jogadores. Que seja para manter! 3. O ensino umiversitário – Através de recente entrevista dada pelo Reitor da Universidade de Lisboa ao jornal Público/Rádio Re- nascença, ficou-se a saber que as despesas associadas ao seu pes- soal “comem” 99,7% do seu orçamento. As Universidades não lutaram pela total autonomia? Souberam usá-la bem? Então de quem é a culpa desse desvario? Não é dos contribuintes certamen- te… Pobres contribuintes… Apurar responsabilidades é que não se usa…

Publicado no jornal “Região de Águeda” de 11/11/2005

133 Candidaturas presidenciais

Têm estado na ordem do dia da comunicação social as candidatu- ras presidenciais. São as apresentações das candidaturas, são as apresentações dos programas dos candidatos, são as entrevistas às televisões, são as entrevistas às rádios, são os sites da Internet, são os almoços, são os jantares, são as visitas cirúrgicas a hospitais, a faculdades, a feiras, a ruas e vielas… Mesmo que se não queira, somos bombardeados diariamente com notícias mais ou menos interessantes sobre o assunto. Devo dizer que, das apresentações dos programas a que assisti pela televisão, o mais bem conseguido foi o de Alegre: bem estru- turado, bem lido, bem dito. O apelo a favor da Pátria comoveu- me… a fazer esquecer comportamentos dos princípios da década de ’70! Sem querer menosprezar qualquer das candidaturas que estão no terreno, começo por dizer que só há três delas que são para levar a sério. A do simpático e coerente Jerónimo e a do eloquente agi- tador de ideias Louça são candidaturas que apenas têm duas preo- cupações: por um lado usarem tempo de antena de 1ª categoria… e, por outro lado, atacarem o, por eles, denominado candidato da direita… Na verdade, com hipóteses de disputarem o lugar de Presidente da República, apenas se perfilam Soares, Alegre e Cavaco. Chegado aqui, das actuações de todos eles, até agora, começo a aperceber-me de que há um candidato e dois (ou quatro) “anti candidatos”e que pouco mais acrescentam aos seus discursos. Ca- vaco não tem respondido aos ataques (entrevistadoras incluídas) e faz bem. Os jogos ganham-se a meter golos limpos e não só a fazer anti-joga no meio campo, a fazer faltas, até maldosas! Sim, porque a dureza dos golpes, por vezes, leva à amostragem do

134 Armando Rocha A Minha Opinião cartão vermelho… No caso, esse cartão está no povo que não é estúpido. Estamos, pois, perante dois sexagenários e um octoge- nário. Até pela minha idade, ficar-me-ia muito mal, desprezar a experiência e o saber dos idosos. Sempre os respeitei e assim faço. Se o cargo em disputa fosse o de Rei de Inglaterra, considerava-os a todos em igualdade de circunstâncias. Mas não é. O esforço financeiro que o Estado vai exigir aos contribuintes para pagar este tipo de eleições representa algumas dezenas de mi- lhões de euros, ou seja largos milhões de contos. Isto é, quanto menos eleições presidenciais se realizarem, menos menos sofrerão os contribuintes nos seus bolsos. Significa isto que, por força das leis da vida, os dois sexagenários mereçam a minha escolha, não obstante Soares estar convencido (estará?) que tem uma saúde de ferro. Ele merece, isso sim, um descanso por longos anos, entre todos os que o admiram… Chegado aqui e, embora nada contando a minha opinião para o caso, constato que não tenho a possibilidade de eleger pessoa com um perfil de um Guilherme Braga da Cruz, de um Daniel Ser- rão, de um Hernâni Lopes ou de um Medina Carreira. Tenho assim de me limitar a analisar os “curricula” dos dois sexagenários. E faço a opção a favor de quem se apresenta com obra feita (mes- mo com algumas asneiras pelo caminho) e um percurso acadé- mico e profissional mais adequado ao que o País precisa. Acho que Cavaco não tem o dom da simpatia, mas penso que é sério, honesto, trabalhador e sólido intelectualmente - e está na idade adequada!... Assim, é nele que espero votar, face à “ementa” que os políticos nos põem à disposição em 22 de Janeiro próximo. Já agora, acrescento duas pequenas notas: 1. Considero lamentável a sugestão lançada por deputados do PS ao seu não-candidato para que suspendesse o mandato, por ra- zões éticas. Qual ética? Que Deus me perdoe, mas penso que essa auto-suspensão teria um efeito único: o de retirar a mordomia do carro e motorista ao seu não-candidato, durante o período da suspensão do mandato. Não seria isso que daria gozo aos seus camaradas? 2. Muito apreciaria ouvir de todos os candidatos a Presidente, uma declaração no sentido de que, se forem eleitos, renunciarão ao direito a uma casa e sua manutenção, uma viatura, um motorista,

135 combustível, secretária, assessor, etc., quando saírem do cargo e outra explicitando quantas voltas ao mundo esperam dar, durante o mandato, em Falcon ou AirBus. 3. Ao menos honrem os Homens da I República!

Publicado no Jornal “Soberania do Povo” de 09/12/2005

136 Armando Rocha A Minha Opinião

O Crucifixo

Portugal tem uma História de muitos séculos, não de alguns lus- tres! Tentar apagar essa história, pejada de acontecimentos herói- cos e dificilmente imagináveis nos dias de hoje, a par de algumas passagens menos felizes, tem sido o objectivo de uns tantos que pululam por aí como erva daninha! Felizmente, porém, que ainda há quem galhardamente procure remar contra essa maré de águas sujas. Um dos que mais se tem distinguido nessa é o Prof. José Hermano Saraiva que, há mais de 30 anos, nos entra em casa semanalmente, pela TV, com progra- mas inultrapassáveis em comunicabilidade e transmissão da ideia de Pátria. Faz gosto ouvi-lo. Tudo serve para se tentar apagar as raízes e os factos – sim, factos – que, mesmo mais recentes, marcaram a nossa sociedade. Nem que para isso se tenha de usar o argumento da bomba (como foi o caso da destruição da estátua a Salazar, em Santa Comba Dão) ou o argumento da Constituição, em cujas bases marxistas se fixou logo a seguir ao 25 de Abril. Tenho sérias dúvidas que, em refe- rendo, o povo português viesse alguma vez a dizer que concorda- va em que o Estado fosse considerado laico, tal como está a ser entendida essa laicidade. Sim, porque quem votou a Constituição foram os políticos que, mesmo amedrontados e com má consciên- cia, se viram arrastados pelas chamadas forças de esquerda mais radicais… a quem não tiveram a coragem de dizer basta! Aceita-se, naturalmente, que essa laicidade apenas garanta a li- berdade religiosa numa sociedade que todos gostaríamos que fos- se tolerante, aberta e plural! Isto vem a propósito da retirada dos crucifixos das Escolas. Na ver- dade, o País está mergulhado numa crise sem precedentes, e não só em termos económico-financeiros, mas parece que apostou em matérias que só servem para dividir ainda mais a sociedade civil.

137 Primeiro, é o aborto que, para além de agitar muito naturalmente as consciências dos que nele se envolvem, tem sido tema recorren- te discutido na rua, com deputada actriz a dar espectáculo… Agora, pelo facto de a Constituição dizer que Portugal é um Estado laico, toca a remover, mesmo silenciosamente, os símbolos cristãos que os estudantes viam nas paredes das salas de aula. Ainda não há muito tempo, os tínhamos visto substituídos por “posters” do Che Guevara, do Mao Tsé Tung, etc… E agora, as paredes vão ficar nuas? Ou lá porão as fotos dos sucessores de Thomaz e Salazar? Já viram quanto isso vai custar aos contribuintes? Sai Soares, entra Sampaio, sai Sampaio entra não sei quem… e por aí fora, lá se vão gastando mais uns milhões com figuras terrenas e passageiras. Por mais que os laicos e os agnósticos façam em contrário, CRISTO viverá sempre entre nós. Há 2 mil anos, pode dizer-se que também teve de viver em clandestinidade… Hoje tal não se passará porque o bom povo cristão de Portugal o não consentirá… Os senhores políticos devem tratar bem da res publica e deixar-se de perseguir o que na história está já registado como patrimó- nio cultural e moral da Nação centenária, herdada de D. Afonso Henriques. Curiosamente, este ataque sem nome aos cristãos e à igreja católica não é compaginável com a atitude que os políticos laicos, agnósticos ou maçons de destaque assumem quando lhes dá jeito comparecerem em Igrejas para funerais de um dos seus ou onde se celebram Te Deum’s que arrastam as televisões… e lá ficam, muito bem comportadinhos na fotografia… Suprema hipo- crisia… Será que eles pensaram alguma vez na figura que fazem com essas presenças só para uso externo?... Por ironia do destino, ou propositadamente, este tema não poderia mesmo ter sido levantado em melhor momento – a época natalícia - para ser executado!...

138 Armando Rocha A Minha Opinião

Sem valores e sem símbolos históricos bem ensinados na Escola, Portugal não passará de uma aldeia periférica da Europa. É NATAL, meus amigos! Por isso desejo Boas Festas a todos!

Publicado no Jornal “Região de Águeda” em 30/12/2005

139 Notas soltas

1. Burocracia – Há dias fui à Conservatória do Registo Automóvel em Lisboa. Fiquei com boa impressão das instalações e da organi- zação dos serviços com muitos “guichets” e funcionários amáveis. Mas… uma senhora, com ar desesperado, sentou-se ao meu lado e desabafou: Eu e meu marido somos emigrantes na Suiça. É a 2ª vez que nos fazem vir a estes Serviços para tratar de um assunto que, na Suiça, leva 5 minutos a resolver… Será assim? 2. À mulher de César não basta… - Numa altura em que a crise que assola os bolsos dos portugueses trabalhadores, tenho de estar de acordo que é preciso fazer sacrifícios. O Governo não tem outra alternativa que não seja a de prosseguir também com o emagrecimento do Estado devorador dos impostos que todos paga- mos. Essa política, para ser razoavelmente aceite pela população, tem naturalmente de começar pelos políticos que nos governam. O exemplo tem de vir de cima. Se não, está tudo estragado! Pois bem, neste final do ano fiquei triste ao saber que o Eng. Sócrates tinha ido de férias para as neves suíças… Já não lhe chegaram as férias de verão no Kénia, quando o País estava a arder… Espero bem, ao menos, que não se tenha feito deslocar em Falcon, para os pilotos fazerem horas de voo… 3. O Europeu de Futebol dos Sub-21 – Fiquei muito contente por saber que o campeonato vai ser disputado em Portugal, sendo o Estádio de Águeda um dos a utilizar na prova. Uma boa notícia para os aguedenses! Oxalá a cidade saiba aproveitar essa dádiva da F.P. Futebol, potenciando a sua imagem. 4. Desemprego – Um dos maiores flagelos que atormenta as fa- mílias é o desemprego. Para os que já estão nessa situação, sem o desejarem, para os que poderão vir a cair nessa situação e para os jovens que tiraram os seus cursos… para nada… O Governo prometeu a criação de largas dezenas de milhares de

140 Armando Rocha A Minha Opinião postos de trabalho. Só que, quem pode criar esses postos, são as empresas e a economia está praticamente estagnada… Mesmo as- sim, o grande empregador, o desmesurado empregador, continua a ser o Estado que é dirigido por políticos, entre os quais muitos há bem intencionados, mas outros há, que nem tanto. Vejamos! No Diário da República de 17 de Agosto último, li que um político de 1º plano – vice-presidente da A.R. (não bebeu a água do Botaréu) nomeou seu motorista um funcionário aposentado que será, natu- ralmente, uma pessoa muito estimável e competente. A esse mo- torista será creditada uma remuneração correspondente a 1/3 do 8º escalão da sua carreira, acrescida da remuneração suplementar que as mordomias (LOFAR) da A.R. contêm e mais o subsídio de risco, subsídio de refeição, subsídio de lavagem da viatura, bem como a compensação por trabalho prestado em dia de descanso semanal ou complementar ou feriado… Isto só com os políticos!... De acordo com a política de combate ao desemprego, não seria mais curial e moral contratar um dos cidadãos que se debatem com a falta de trabalho?... Bem prega Frei Tomaz… Com políticos destes, bem pode o povo berrar!... 5. O Voto – Por estas e por outras é que se depara hoje em dia com caixotes do lixo da cidade de Lisboa exibindo autocolantes que dizem simplesmente isto: “Votar é mijar contra o vento”. 6. O Desporto em Democracia – Ao ler o livro “Académica Sem- pre – a poética do futebol” da autoria do Professor, poeta e cantor de baladas de Coimbra, Carlos Carranca, deparei com esta passa- gem: “…No Portugal da Ditadura o futebol servia como factor de congregação, aproximava as classes, era o espaço da democracia possível. Hoje é o espelho da segregação, da democracia que te- mos…” O autor é considerado um homem de esquerda mas, acima de tudo, é um homem de carácter, um homem sério.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 06/01/2006

141 Valores, Académica de Coimbra, censura…

1. Valores e Publicidade – Já aqui escrevi sobre o défice existente em termos de hino nacional no meio futebolístico. É costume atirar sempre as culpas para a Escola que não dedicará agora o tempo suficiente para ensinar a cantar o hino aos jovens. Mas será? O certo é que, nos recintos desportivos, em jogos internacionais, nós assistimos ao povo a cantá-lo a plenos pulmões, o que é salutar e demonstra que os Pais passaram aos filhos essa mensagem… Recentemente, uma grande empresa – a PT – resolveu dar uma mão à causa do hino nacional. Da melhor maneira? Talvez não seja, na medida em que a PT se aproveita do hino para, simples- mente, publicitar os seus produtos… Onde estão os Valores por que Portugal se deve pautar? A publicidade não tem limites! Vende tudo! É o corpo da mulher, é o corpo do homem, etc. etc.. Por este andar, não poderei estranhar que, amanhã, venha a ouvir o hino nacional a publicitar a Coca-Cola… com o Presidente Bush colocando a mão no coração… 2. Académica de Coimbra – É o clube de futebol da minha paixão de há 60 anos para cá. Sempre vivi intensamente as suas vitórias (não foram muitas, é certo) e sofro em silêncio quando não joga bem. Uma das razões para a minha paixão está baseada no facto de os jogadores da Académica, de uma maneira geral, serem tam- bém estudantes, com grande sucesso profissional, alguns. Quan- tos médicos, advogados, engenheiros, professores, etc. tiraram os seus cursos, enquanto envergavam a camisola negra!... Conheço e sou amigo de tantos!... Os tempos mudaram e a Académica teve de se adaptar, com algu- ma dor, certamente, para quem a tem no coração. Hoje, a Académica está abrasileirada demais para o meu gosto. Nem por isso deixo de ir ao campo vê-la jogar: para ganhar como foi o caso do último Sporting/Académica e para perder como foi

142 Armando Rocha A Minha Opinião o caso do recente Boavista/Académica. Mas nem tudo são triste- zas. O Marcelo acaba de concluir, na Universidade de Coimbra, a licenciatura em Engenharia Civil e o Nuno Piloto a de Bioquímica (esta com 19 valores). Estes atletas mostram assim que o espírito da Académica não morreu. É pena as excepções serem poucas. E também se espera que a elas se venha a juntar mais uma – a do estudante da Faculdade de Letras, jovem José Castro, que está es- colhido para o Europeu de Esperanças, a lembrar o Alberto Gomes e o Bentes! 3. A censura – Não é segredo para ninguém que existia censura nos jornais durante a Ditadura que foi substituída pela Democra- cia. Havia, porém, um sector onde essa censura se não fazia sentir: o desporto! Pois bem, ouvi há dias dizer a um historiador de mé- ritos reconhecidos – José Pacheco Pereira – que “…a censura não permitia que se dissesse mal dos árbitros…”. Será que o nome de Calabote não figurava nas notícias dos jornais? Também os his- toriadores, por vezes, não devem ser levados a sério… Ser-se de esquerda, por si só, não dá direito a dizer-se que a Ditadura só cometeu crimes e nenhuma virtude teve… Sei bem o que sofri com a liberdade de imprensa existente na actividade desportiva nesse tempo!... Pelo menos, nesse tempo, não existiram processos com a extensão do “Apito Dourado” que, estou em crer, vai dar em nada… a avaliar pelo estado a que a justiça chegou. Não resisto a transcrever aqui uma opinião do Professor de histó- ria, Carlos Carranca, homem de esquerda, que escreveu: “…No Portugal da Ditadura o futebol servia como factor de congregação, aproximava as classes, era o espaço da democracia possível. Hoje é o espelho da segregação, da democracia que temos…”.

Publicado no jornal “Região de Águeda”, de 13/01/2006

143 A Constituição da República

A chamada esquerda tem sempre invocado a Constituição da Repú- blica como sendo o garante primeiro do progresso e do desenvol- vimento do nosso País. Por outro lado, a chamada direita invoca-a para dizer que ela, para além de muitas virtualidades que encerra, tem dispositivos que impedem esse progresso e desenvolvimento. Em que ficamos, afinal? Constatamos que, à sombra da Constituição, nos últimos 30 anos, foram constituídos 17 Governos, presididos por 12 Primeiros Mi- nistros. Em pastas-chaves, tivemos 19 ministros das Finanças e, na Economia/Indústria e Energia, os mesmos 19, e na Educação mais um – 20. Com tanta variedade de figuras à frente da governação, o resultado está à vista. Ninguém se entende e o povo sofre. A linha política comum aos partidos que nos têm governado tem- -se consubstanciado numa subsidio-dependência tremenda e numa incapacidade objectiva de resposta ao desafio que é a inte- gração de Portugal na Europa. Embora dizendo que defendem po- líticas diferentes, os partidos têm permitido – sem quererem, talvez – a instalação de uma corrupção generalizada no Estado, e não só, a qual afronta o comum dos cidadãos. A começar por cima, não é segredo para ninguém que, mesmo na Assembleia da República, alguns há que, protegidos pelos partidos e pela imunidade parlamentar, fazem a sua vidinha enriquecendo de uma forma surpreendente. Cite-se o exemplo do mais conhe- cido dirigente do partido que apoia o governo e continua a falar grosso que, segundo a revista SÁBADO (11/11/05), em 2004, terá declarado às Finanças rendimentos de mais de 180 mil euros e no Tribunal Constitucional mais de 460 mil euros. Desses tantos milhares de euros o político em causa apenas terá ganho cerca de 55 mil euros como deputado, o que, convenhamos, de facto, é muito pouco!!! E por isso se ouvem vozes importantes reclamarem

144 Armando Rocha A Minha Opinião aumentos de ordenados para os políticos… a maioria, trabalham por conta de outrem… Haja decência! De todos os políticos conhecidos do bloco central que têm andado na engrenagem, quantos é que não aumentaram substancialmen- te os seus activos patrimoniais e financeiros? Se se fizesse uma lis- tagem dos que, ao contrário, pouco ou nada retiraram do facto de terem usado a política, o seu número não seria grande, certamen- te. Sim, porque também há políticos que se preocupam, apenas e só, em servirem a res publica, há que reconhecê-lo e que louvar. Tudo isto para dizer que, sem partidos políticos, não há democracia possível. Mas que os partidos, dada a sua actuação no terreno, terão falhado redondamente a sua missão, disso tenho poucas dú- vidas. Até no campo da formação da juventude que anda deso- rientada mas que, creiam, sabe o que quer! Precisamos de menos deputados, mas bem qualificados (e não car- reiristas), que dêem voz ao interior nas suas legítimas aspirações a uma vida melhor e sem sobressaltos; ao interior que empobrece dia a dia e se espanta com o enriquecimento de uns tantos instala- dos no ar condicionado dos palácios onde nada falta. Será que a culpa dos nossos atrasos está na Constituição? Ou nos (todos) que a louvam e dizem defendê-la a todo o custo, sem olhar para o futuro que está à nossa frente?...

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 20/01/2006

145 Reconhecimento do mérito, campanha eleitoral

1. Condecoração – Há dias, em cerimónia simples realizada no Palácio de Belém, o Sr. Presidente da República condecorou o Eng. Belmiro de Azevedo com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Hen- rique. Tive a honra de ser convidado para o efeito e assim me juntei aos seus familiares e amigos mais próximos, onde predominavam os seus colaboradores e ex-colaboradores directos na Sonae, bem como os maiorais da COTEC. Fiquei enternecido, especialmente com as manifestações de afecto dos seus netos que, muito compostinhos, enriqueceram a cerimó- nia, como que a dizer que acreditam nas instituições e nos homens que as servem! Foi muito bonito! A Pátria reconheceu assim, finalmente, o que o homenageado tem feito a criar riqueza por esse mundo fora (14 países), com dezenas de grandes prestigiadas empresas, sem salários em atraso para os seus cerca de 60.000 trabalhadores… Mas, até aqui, tal como em tantos outros domínios, Portugal se atrasou, na medida em que já antes, o Rei de Espanha o tinha condecorado em cerimónia de alto nível… Parabéns, Belmiro e Margarida! 2. Campanha eleitoral – Finalmente, chega ao fim a campanha eleitoral para a Presidência da República. E dou comigo a pensar se as pessoas não terão ficado fartas de tão prolongada e arrasta- da campanha ao longo de vários meses… Foram horas e horas de rádio e televisão e páginas e páginas de jornais com pouquíssimas novidades. Os candidatos bem se es- forçaram por fazer passar as suas mensagens. Eu devo ter estado muito desatento, mas o que ouvi e li foi mais ou menos o seguinte: Cavaco a dizer que respeitará a Constituição, estará atento aos problemas do País e ajudará o governo a levar o seu mandato até ao fim; e os outros candidatos, fundamentalmente, a provocarem

146 Armando Rocha A Minha Opinião doentiamente Cavaco, chegando mesmo o candidato mais velho a ser insultuoso para com o Professor de Economia que foi primei- ro-ministro. Ideias novas, talvez, só Louçã as tentou lançar… ao vento. O que não custaram estes tempos de antena e os outros encar- gos? O que parece ser de ciência certa é que o erário público – os impostos pagos pelo povo – vai ter de liquidar uma factura de 12 milhões de euros… Na verdade, quem diz que somos pobres está muito enganado. Somos antes um País rico que aguenta com luxos como estes… Uma eleição a que correspondesse uma campanha de apenas 2 semanas e em que só tivesse direito a subvenção do Estado quem alcançasse pelo menos 25% dos votos seria suficiente para se ava- liar das capacidades dos candidatos, evitando-se um folclore como aquele a que vimos de assistir, e um grande desperdício de tempo e de dinheiros públicos… tão necessários à melhoria das condições de vida dos mais desfavorecidos. Já agora, ao menos que ninguém fique sem votar no dia 22.

Publicado no jornal “Região de Águeda” de 20/01/2006

147 A Burocracia e a Banca Portuguesa

1.Burocracia - Tem vindo a lume o anúncio de muitas medidas que visam eliminar/atenuar o monstro da burocracia que afecta a vida dos cidadãos. Só quem tem necessidade de se abeirar dos serviços públicos, para obter uma simples certidão ou uma auto- rização para um mero acto administrativo, se apercebe das horas perdidas, dos transportes necessários às deslocações, do dinheiro gasto, etc.. Há pois que felicitar sinceramente José Sócrates, pela coragem que tem vindo a revelar no combate a esse e outros monstros. Oxalá que os executantes dessa política tenham o mesmo “élan” que o Primeiro-Ministro para pôr de pé essas medidas que, certamente, não agradam aos actuais detentores desse poder na Administra- ção… Até porque, nesse poder, reside, em grande parte, a corrup- ção que grassa ao nível do Estado, segundo é voz corrente! A propósito da burocracia, que não é de agora, é de sempre, não resisto a contar um episódio que vivi por dentro, na minha quali- dade de director geral dos Desportos. Isto passou-se em 1969. Os dirigentes eleitos para os corpos gerentes dos organismos despor- tivos (clubes, associações regionais e federações nacionais) eram obrigados, por lei, a subscrever uma Declaração prevista no De- creto-Lei nº 27 003 – a repudiar o comunismo – mas que se reco- nhecia ser uma mera formalidade burocrática, sem outro alcance que não fosse a de complicar a vida desses organismos. Assim sendo, mesmo sem se ter alterado a legislação aplicável, propus ao Subsecretário de Estado da Juventude e Desportos, Dr. Francis- co Elmano Alves, que se eliminasse a referida exigência, o que foi aceite sem relutância. Outra medida burocrática que me parecia merecer revisão era a que obrigava o director geral dos Desportos a consultar a Direc- ção Geral de Segurança sobre a idoneidade política dos indivíduos

148 Armando Rocha A Minha Opinião referidos atrás. Como não tinha ideia de que essa medida, por mim, tivesse alguma vez sido aplicada em casos – que os houve – de informação negativa por parte da DGS, também propus a sua abolição, o que igualmente foi aceite pelo Governo de Marcello Caetano. Ou seja, o combate à burocracia vem de longe e nunca estará concluído. E quanto maior for a máquina funcional do Esta- do mais difícil se torna acabar com ela… 2. Lucros da banca e das grandes empresas com capitais públicos – Desde o princípio de Janeiro que não há dia em que se não anunciem novos aumentos de preços dos produtos indispen- sáveis à vida comezinha dos cidadãos que constituem o povo. É a electricidade, é o gás, é a água, são os combustíveis, os transportes e as portagens; são os IMI’s, é o IRS, são as comissões bancárias, enfim, é um ver se te avias… Muitos dos aumentos são superio- res à inflacção prevista para 2006. E, quanto a aumentos salariais e de reformas/ aposentações, o panorama é simplesmente mau para quem serve ou serviu o Estado e não tem poder reivindicativo. Como exemplo, dizem-me que, nos últimos anos, a minha pensão de aposentação já perdeu 8 pontos de poder de compra! Ao mesmo tempo, começam a aparecer na imprensa os resultados das grandes empresas e da Banca. Só os 3 maiores bancos portu- gueses somaram lucros, em 2005, de mil e 300 milhões de euros. Então esses fabulosos lucros não permitiriam ser utilizados de for- ma a não causticar tanto os Clientes desses bancos e empresas? Esperar-se-ia, digo eu, em relação à banca, uma intervenção mo- deradora do Banco de Portugal! Mas não, nada disso. O Gover- nador do Banco deve estar mais preocupado com o esquema de reformas da instituição! Sim, porque, a seguir à oportuna inter- venção de José Sócrates em termos de reformas escandalosas, até agora, ao que parece, não se passou nada, a não ser a nomeação de uma comissão… E segue-se a escandalosa reforma do presi- dente da PT… Aproveito para dizer que não gostei da atitude do Primeiro-Minis- tro, ao renovar o mandato do adulado Governador, precisamente no dia seguinte à eleição de Cavaco Silva. Foi, no mínimo, dese- legante.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 10/02/2006

149 Eventos culturais

Lisboa tem sido palco de manifestações culturais muito boas. No passado mês de Janeiro, tivemos oportunidade de ouvir no Cen- tro Cultural de Belém, com casa esgotada, o excelente concerto “Wiener Gala Strauss”, interpretado pela orquestra austríaca “K&K Philharmoniker”. No Coliseu, ainda está em cena o musical “Miss Saigon”, que tem tido enorme audiência nos grandes palcos mundiais. Lá estava, uma vez mais, um “autocarro” de aveirenses que não faltam a estes grandes eventos musicais. E assistimos, também no CCB, com lotação esgotada igualmente, à exibição do “Ballet Nacional de España”. Confesso que, sempre que tenho oportunidade, não falto a uma exibição desse Ballet. No decurso do espectáculo, revivi algumas deslocações que fiz a Espanha onde tenho boas amizades, especialmente feitas no des- porto. E veio-me à memória um episódio que não resisto a con- tar. No ano 1948, era eu estudante em Coimbra, tive o ensejo de as- sistir na Universidade ao doutoramento honoris causa do Chefe de Estado espanhol Generalíssimo Francisco Franco que se fez trans- portar num Mercedes blindado, coisa rara ao tempo. Sim, porque agora, até um presidente de câmara não hesitou em comprar um topo de gama com essa característica… O povo que pague… O programa da visita de Franco incluía um espectáculo no Tea- tro de S. Carlos. Para ele, pensou-se no “Verde Gaio” que era o melhor de que Portugal dispunha nessa altura. Só que o Caudi- lho estava habituado a um nível mais elevado de cultura… Para resolver o problema, o Dr. José Figueiredo, director do S. Carlos, lembrou-se de recorrer ao talento de Guilhermina Suggia, que era então considerada a melhor violoncelista do mundo! Como se vê, sempre houve grandes talentos na Pátria portuguesa!

150 Armando Rocha A Minha Opinião

Foi com grande dificuldade que a Senhora se deixou convencer a fazer um recital, cujas peças escolheu, não sem logo ter estabele- cido o seu preço – 25 contos, uma autêntica fortuna em 1948. Preocupado com o preço, o Dr. Figueiredo transmitiu o teor da conversa havida com a artista ao Ministro da Educação, Prof. Dr. Fernando Pires de Lima que, também tendo achado elevada a ver- ba exigida, levou o tema ao Doutor Salazar. Curiosamente, con- trariamente ao que esperava ser a reacção do Presidente do Con- selho, este limitou-se a comentar: “O senhor Ministro sabe tocar rabecão?…”. Perante a resposta: “Eu não sei!...!”, Salazar rema- tou: “Então…pague…”. Isto foi no tempo em que não entravam diariamente em Portugal milhões de euros da União Europeia… para serem gastos sabe Deus como, infelizmente. A par desses milhões, os portugueses também vão importando práticas políticas menos saudáveis. Veja-se o alarido que o ex-mi- nistro e actual deputado do PS, Pina Moura, tem provocado pela situa-ção, quanto a mim, reprovável de misturar política com ne- gócios… Mas já ninguém fala do também socialista senhor Schro- der, ex-Chanceler da Alemanha que, mal se viu apeado do go- verno e com mau perder nas eleições, tratou logo de se gaseificar por pipe-line… Exemplos não faltam, mas estas democracias tudo suportam…

Publicado no jornal “Região de Águeda” de 17/02/2006

151 Desporto e cultura

Há dias, o canal de televisão “Eurosport” proporcionou a uns tan- tos milhões de espectadores um espectáculo de enorme beleza, ao transmitir a cerimónia inaugural dos Jogos Olímpicos de Inverno que teve lugar nos Estádio Comunal de Torino (não como cá, nele jogam a Juventus e o Torino…). Nos jogos estão inscritos 83 países, com alguns milhares de atletas que competem durante 17 dias. Portugal também lá está com um único atleta, Danny Silva, que participa na prova de cross. Para além do desfile das delegações dos diferentes continentes, os cenários apresentados tinham como pano de fundo a história de Itália ao longo dos séculos, não esquecendo a evolução da maqui- naria industrial, desde a simples bigorna até às motorizadas e aos Fórmula 1. Colaboraram na organização 25.000 voluntários!!! Aos equipamentos multicolores dos e das atletas, juntaram-se os trajes dos intervenientes dos diferentes quadros que compunham o espectáculo de luz e cor. O dedo de G. Armani também lá estava em peças determinadas… O design arrojado e tecnologicamen- te futurista e bem concebido em todos os pormenores não pas- sou despercebido. Tratava-se de um guarda-roupa belíssimo e de luxo. O apoio dado, especialmente, pela FIAT e a família Agnelli foram, certamente, decisivos para esta realização que envolve muitos mi- lhões, quase tantos como os da OPA sobre a PT!!! Só uma cidade rica como é Torino se podia dar ao luxo de se abalançar a tão elevados gastos. Os efeitos de luzes e som, com verdadeiros artistas a interpretar alguns números do programa que decorreu sempre em bom ritmo, impressionaram fortemente. Um grande actor italiano fez ouvir a sua voz a declamar uma peça de intenso significado. Os e as nu- merosas bailarinas executaram peças de belíssimo efeito, ao som

152 Armando Rocha A Minha Opinião de coros e orquestra de grande categoria. O desenho dos anéis olímpicos e do skiador, com figuras humanas, em diversas posições competitivas, na pista, não são esquecíveis. E que dizer dos acro- batas que desenharam a pomba da Paz em posição vertical, como que a realçar o espírito da Paz entre os povos. Foi simplesmente assombroso! Tal como o acender da chama olímpica que foi trans- portada por grandes nomes italianos medalhados nas competições dos desportos de Inverno, também deslumbrou! Comoveu-me ouvir a saudação feita emotivamente pela mulher do Beatle John Lennon, bem como a evocação, feita por Peter Gabriel, que deu voz à canção “Imagine” (imaginem todos vós um mundo a viver em paz…). O transporte da bandeira olímpica foi feita por 8 mulheres famo- sas no mundo, tais como Sofia Loren, Susan Sarandan, Isabel Al- lende e a atleta olímpica moçambicana Maria Mutola, tudo sob o olhar de 21 Chefes de Estado e 15 Chefes de Governo, não es- quecendo o nosso amigo, com aspecto de comovido, Juan António Samaranch. Como não podia deixar de ser - está-se em Itália - ainda se ouviu a voz inconfundível desse “monstro” que é Luciano Pavarotti…, que não tem o direito de se reformar, digo eu. Nos tempos conturbados que vivemos, registe-se, com agrado, o facto de não se ter verificado qualquer incidente a toldar o am- biente fraterno dos jogos, talvez porque o dispositivo de segurança funcionou bem. Finalmente, será que a compra dos direitos televisivos desta ceri- mónia custaria mais do que alguns programas, sem qualquer in- teresse ou mesmo de duvidoso interesse, que as nossas TV’s nos proporcionam?... PS: Como pude ouvir ao locutor da televisão, confunde-se muitas vezes a expressão “Jogos Olímpicos” com “Olimpíadas”. Pois bem, os Jogos realizam-se de 4 em 4 anos; e a palavra Olimpíada sig- nifica o período que medeia entre os Jogos.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 17/02/2006

153 Quem não deve não teme

Se bem me lembro, até há pouco mais de 30 anos, o licenciado em direito que pretendesse seguir a carreira da magistratura, tinha de se apresentar a um concurso de admissão. Uma vez aprovado, era colocado numa comarca de 3ª classe para exercer as funções de delegado do Ministério Público. Ao fim de 3 a 6 anos, normal- mente, mudava para comarca de 2ª e de 1ª (cidades capitais de distrito). Ou seja, andava uma década a participar nos julgamen- tos dos tribunais, mas não com a competência de julgar. Isso cabia aos Juízes. Depois desta longa caminhada a “aprender” a julgar, fazia um concurso para Juiz. Se aprovado, era colocado numa das comarcas de 3ª classe por onde tinha já andado mas, agora, com a suprema responsabilidade de julgar as causas a dirimir. E assim ia prosseguindo a sua carreira, até chegar aos Tribunais da Relação e ao Supremo Tribunal de Justiça. Havia um respeito generalizado da população pelos magistrados, alicerçado, certamente, em carreiras muito trabalhadas e exigentes interpretadas por homens (não me lembro de ouvir falar então em Senhoras juízes) competentes, sérios, honestos e incorruptíveis. Com a implantação da nossa democracia, muitas coisas muda- ram no País. Umas para melhor, outras para pior! O Ministério da Justiça passou a ser comandado por advogados, cuja formação profissional é, naturalmente, muito diversa da dos Professores de Direito e dos próprios Juízes. O novo poder político operou então uma mudança, com largos reflexos no futuro, nas carreiras judiciá- rias, em que se separaram a magistratura judicial da do Ministério Público. Cada uma foi para seu lado. Como consequência, os julgamentos em tribunal passaram a ser feitos, desde logo, por juízes jovens licenciado(a)s a quem foi pro- porcionado um curso acelerado no Centro de Estudos Judiciários… e não por juízes que tiveram de colher a experiência que era obri-

154 Armando Rocha A Minha Opinião gatória no anterior regime, durante 10 anos, ao lado de juízes de carreira… Sejamos justos: muitos desses jovens têm certamente reais méritos e qualidades. O certo é que, ao fim de 30 anos com o novo sistema a funcionar, toda a gente fala na crise da Justiça. Essa crise atingiu tal ponto que os senhores políticos, a começar pelo Dr. Jorge Sampaio, começam a agitar-se por causa das escu- tas telefónicas, que só podem ser autorizadas por um juíz, mes- mo de 1ª instância. O que significa que os senhores políticos não acreditam na competência e seriedade de todos os juízes. O que é gravíssimo! E, então, parece apontar-se para uma solução que iria no senti- do de as escutas aos telefones dos senhores políticos só poderem ser feitas com autorização de juízes de tribunais superiores ou de uma Comissão Especial que, no fundo, iria fiscalizar os actos dos próprios Juízes! Eu pensava que, em democracia, todos os cidadãos gozavam dos mesmos direitos. Em Portugal, pelos vistos, não! Os senhores políticos terão direito a julgamento de tribunal su- perior e os outros cidadãos terão direito a julgamento em tribu- nal vulgar?... As notícias dos jornais são fartas a denunciar actos de corrupção entre políticos eleitos democraticamente e tutelados desses políticos!... Então quer-se um regime de excepção para os senhores políticos? O povo exige que as polícias investiguem os crimes, designada- mente os económicos, de pedofilia, etc.. Como é que elas podem investigar se não tiverem, em tempo útil, os meios necessários, como as escutas telefónicas para actuarem? Quem não deve, não teme!... Meus Senhores!... Eu não tenho formação jurídica, mas tenho a impressão, que sei de antemão não ser politicamente correcta, de que bom seria repor a situação existente há 30 anos, acabando-se com as carreiras pa- ralelas da magistratura e do Ministério Público. Será que o advo- gado, aliás ilustre e inteligente, que comandou essa reforma ainda nela se reverá? Não acredito que, passados todos estes anos, ain- da nela se reveja.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 10/03/2006

155 Fair play, procura-se

Assisti hoje, pela tv, às cerimónias de investidura do Prof. Cava- co Silva como Presidente da República. A cerimónia seguiu-se a um frenesim enorme de protagonismo do Presidente Sampaio nos últimos dias em que deteve o poder. Foram visitas e mais visitas, até aos continentes asiático e africano, foram mensagens, foram recados que foi espalhando pelo País! A cerimónia decorreu com grande elevação, embora com porme- nores que me merecem uns comentários breves: por uma questão de bom senso, não seria de ter usado uma forma simples de dar a conhecer à enorme plateia da Assembleia da República o teor da acta de validação dos resultados eleitorais? A senhora deputa- da encarregada de ler o fastidioso texto até referiu os «númaros» (sic) dos artigos da lei! A Drª Edite Estrela deve ter-se arrepiado… Quem não sentiu frio foram certamente alguns bloquistas (Rosas, foi excepção) que usaram a gola alta em vez da gravata que até Jerónimo usou! Ouvi com muita atenção os bons discursos de Jai- me Gama e de Cavaco Silva. Em especial o do novo Presidente pareceu-me muito bem estruturado e tocando os pontos essenciais que urge encarar de frente e resolver, não esquecendo o sentido de uma “estabilidade dinâmica e reformista”, rigor, exigência e excelência que devem nortear todos os portugueses. Tenho para mim que Sócrates não poderia ter agora melhor aliado! Que não esmoreça a sua onda reformadora, são os meus desejos. Os aplausos da chamada direita foram a demonstração de que se continua a viver para o espectáculo em que a esquerda (mas não toda) prefere distinguir-se pelo afastamento das regras de uma convivência civilizada. Foi pena que os seus silêncios representem, afinal, a sua “aversão” ao espírito democrático que se devia ter afirmado, ao menos, pela boa educação, numa cerimónia especial como aquela da posse do PR. Que democratas são estes, afinal?

156 Armando Rocha A Minha Opinião

Mas, para mim, a maior surpresa (?) foi a atitude do considerado “pai da democracia” que, encontrando-se a escassos 100 metros da Fun- dação Mário Soares, onde passa o seu tempo, se escapuliu do Palácio de São Bento, sem se preocupar em dar um simples e formal aperto de mão ao seu adversário na campanha eleitoral. Foi feio! Esta falta de fair play ficou-lhe muito mal! É ele, afinal de contas, um autêntico democrata?... Em resumo, imperou em São Bento a falta de fair play para além do povo que se viu impedido, por razões de segurança, certamente, de participar naquilo que deveria ser uma festa popular, uma vez que Cavaco foi para Belém porque o povo assim decidiu. Sou dos que entendem que Jorge Sampaio, homem sério e honesto, depois da experiência que teve, poderia ser bem aproveitado, por exemplo, em missões no estrangeiro. Para além de outras qualida- des, ele domina admiravelmente as línguas mais faladas no mundo! Na hora da saída de Belém, o Estado, e muito bem, atribui-lhe uma reforma de valor compatível com as funções que exerceu ao longo de 10 anos. E que devia ser suficiente para poder levar uma vida digna, sem necessidade de outras fontes de rendimento. Mas não é assim! O actual Estado, gastador, resolveu atribuir-lhe ainda um palacete nas Necessidades (disse a comunicação social que as obras de beneficia- ção foram orçadas em 120 mil contos) cuja manutenção passa a ser suportada pelos nossos impostos que também suportarão as despesas com o potente AUDI e com o motorista. O cidadão Jorge Sampaio, enquanto Presidente, optou por utilizar a sua casa particular. Que deve ser de bom nível. Se assim não fosse, não teria nela recebido em visita particular os… Reis de Espanha… Caberá perguntar: então agora, que abandona o poder, essa casa já não serve para fazer a sua vida de simples cidadão?... Mudando de assunto. A vitória do Benfica sobre o Liverpool foi notá- vel, porque se verificou no campo do adversário e nos proporcionou as belas imagens dos dois golos, magníficos em qualquer estádio do mundo. Parabéns e boa sorte, Benfica! Além do mais, foi um jogo em que, nele sim, imperou o fair play, com a claque inglesa a incitar a sua equipa, mesmo a perder, e a aplaudir, no final da partida, os jogadores benfiquistas! Foi bonito!...

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 17/03/2006

157 Um Artista sem ambição

Participei, há dias, numa homenagem a uma figura que deixou marcas indeléveis na academia de Coimbra. Os livros de quintanistas da Universidade, nos tempos em que essa figura calcorreava as vielas e tascas de Coimbra, têm neles regis- tadas as linhas firmes de artistas que caricaturava os estudantes como ninguém. Talvez que 50% dessas caricaturas eram da sua autoria. Com o produto desse trabalho – 50 escudos - lá ia viven- do… A sua passagem pelo Teatro de Estudantes da Universidade de Coimbra ficou assinalada com excelentes cenários que só ele era capaz de idealizar e que correram mundo com sucesso. Com um simples guardanapo de papel, ele fazia desenhos que en- cantavam crianças e adultos. De traço firme, sem interrupções, ele produziu quadros notáveis, imbuídos de arte e significado. Tenho alguns deles que guardo com o maior carinho. Era um actor de enorme talento, cuja intervenção no célebre “Zip- Zip” ficou na memória dos tele-espectadores. Fialho Gouveia, Raul Solnado e Carlos Cruz revelaram ao País um actor de excelência mas que nunca abraçou a profissão porque era extremamente mo- desto e desprovido de qualquer ambição. Em palco era um gigan- te! Não tinha o culto do dinheiro. Vivia o dia a dia com os poucos escudos que ganhava a fazer as caricaturas e um ou outro quadro e uma outra decoração. Foi ele o responsável pela decoração do Itamaraty de Brasília, tal a qualidade dos seus trabalhos. Contava anedotas como ninguém. E, como actor de enorme ga- barito, acompanhava as anedotas com a interpretação fiel de um bêbedo, de uma criança, de um gato, de um cão. Publicou mesmo um livrinho – “Cãopêndio” – pondo a cabeça de um cão nas mais variadas figuras…

158 Armando Rocha A Minha Opinião

De uma simples palavra compunha um poema interessantíssimo. Lembro-me daquele que, num jantar entre antigos estudantes, ele fez num guardanapo de papel branco, a propósito do pimento. É que, na altura, se estava a falar de sardinhas assadas… que, claro, necessitam desse fruto da terra, para melhor serem saboreadas. Ele escreveu:

O Pimento o pimento é filho do pimenteiro e irmão do pimentão verde o primeiro o segundo não o primeiro já era verde antes da legião o segundo vermelho antes da revolução alguns mudaram de cor e outros... de opinião!

Um dia, em 1976, no meio de uma confraternização coimbrã, aper- cebi-me de que ele não tinha qualquer retaguarda em termos de saúde, para além de não ter bens de fortuna. E ele era uma pessoa a quem, enquanto jovem, tinha sido retirado um pulmão!... Estava também presente o Dr. António Almeida Santos, ao tempo Ministro da Comunicação Social, a quem pus o problema. E logo ali o ministro – o amigo – prometeu resolver o problema, através da nomeação como director de serviços, o que lhe dava acesso aos benefícios da ADSE. Quando se desencadeou o processo, ve- rificou-se que o Tóssan não tinha sequer o 5º ano! Mas, para que serve a amizade? O Dr. Almeida Santos pediu ao Tóssan que lhe apresentasse todos os documentos que atestassem os seus traba- lhos artísticos realizados. E falou ao Ministro da Educação, Ten.

159 Cor. Victor Alves, para se encontrar uma solução. Com esses pa- péis, o Tóssan conseguiu uma equivalência que lhe valeu o acesso à função pública. Oh sorte, no meio do azar!... Meses depois fui visitá-lo ao Hospital Santa Maria, onde esteve internado durante 6 meses a tratar uma gravíssima infecção respiratória… Continuas presente entre nós, Tóssan!

Publicado no jornal “Região de Águeda“ de 31/03/2006

160 Armando Rocha A Minha Opinião

Pensamento em José Novo

Já vão passados 53 anos sobre a minha fixação em Lisboa. Aluga- da casa, era necessário fazer os contratos da água, da luz e do gás. Essa tarefa não era simples: alguma papelada e muita espera… Meu Pai sugeriu-me que procurasse um ilustre aguedense que vi- via no Rossio, no hotel Metropole, salvo erro. Era o velho Conde Águeda que meu Pai acompanhara, ainda jovem, em campanhas políticas, até porque era dos poucos que, ao tempo, possuía carta de condução… Lá fui, apresentei-me como filho do João Rocha, de Águeda, e logo os braços se abriram… Expliquei-lhe ao que ia… e ele, que era administrador das C.R.G.E., logo me tranquilizou, dizendo que o assunto teria rápida solução… No dia seguinte, apareceu em minha casa, em Campo de Ouri- que, um diligente funcionário da Companhia que, fazendo ras- gados elogios ao Senhor Conde, me resolveu o problema com a maior simplicidade! Não esqueço esse episódio! E fiquei na altura a pensar na importância de se ter alguém, com poder, na capital… Ainda hoje! Passaram-se os anos e um dia, apareceu-me no Campo dos Márti- res da Pátria, onde tinha o meu gabinete, um antigo companheiro de escola primária. Ia pedir-me ajuda para a sua pretensão de ter um alvará de agência de viagens na Mourisca do Vouga. Ele aguardava essa concessão havia já 2 anos, não obstante as reite- radas promessas de um deputado à Assembleia Nacional, também aguedense, mas sem êxito… Lembrei-me, na altura, da diligência que fizera no hotel Metro- pole!... Fui com o amigo ao SNI e, no dia seguinte, o José Novo recebeu a notícia da concessão do alvará… Fiquei muito contente por ter ajudado um aguedense a que me ligava uma forte amizade cimentada nas brincadeiras de escola e

161 na garagem além da Ponte… Ele era um rapaz voluntarioso, deste- mido, mesmo atrevido, sem medo, e com um coração de pomba. Naturalmente fui acompanhando, pela vida fora, a sua actividade e não estranhei que tivesse assumido com garbo e competência o cargo de comandante dos Bombeiros Voluntários de Águeda, de que meu Pai foi um dos fundadores. Os seus méritos, que eram muitos, já foram reconhecidos, ainda em vida, pelos seus concidadãos, das mais variadas formas. Afastado, há muitos anos, da cidade onde nasci, nunca a esqueci e, sempre que preciso de algo em Águeda, socorro-me do velho amigo João Resende da Fonseca e, até há poucos dias, também do José Novo… Fiquei mais pobre, agora… O seu falecimento, em sofrimento, comoveu-me profundamente. Paz à sua alma!

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 07/04/2006

162 Armando Rocha A Minha Opinião

O basquetebol na Bairrada

Disputou-se, há dias, o torneio da Final 8 da Taça de Portugal de Basquetebol. O palco do torneio foi o novo pavilhão de Anadia. A prova foi disputada pelos gigantes, especialmente americanos, do Aveiro Basket, Belenenses, Benfica, CAB Madeira, Ginásio Fi- gueirense, Lusitânia dos Açores, FC Porto e Queluz-Sintra. Esses artistas deliciaram a numerosa assistência que encheu sempre o novo e magnífico pavilhão, ao longo dos 4 dias de prova. Com larga visão da autarquia presidida pelo dinâmico Prof. Litério Marques, uma vasta área da cidade foi destinada a parque des- portivo de que já fazem parte 2 campos de futebol relvados com iluminação artificial, piscinas e 2 pavilhões gimnodesportivos. E… já está terreno reservado para a implantação de uma zona escolar que vai da infância até ao 12º ano. Quer dizer, estão a ser criadas condições para a juventude de Ana- dia poder crescer e aprender sadiamente. A prova começou com a assistência a acompanhar o bairradino José Cid a cantar o hino nacional, o que foi comovente. Os jogos foram todos eles disputadíssimos até aos últimos segun- dos, com as claques bem afinadas e entusiásticas e muito correc- tas, a darem um exemplo de como se devem apoiar as equipas. Especialmente, na final, entre o FC Porto e o SL Benfica, que os nortenhos venceram bem, o DESPORTO saiu como o grande ven- cedor… até porque o pavilhão estava super lotado com mais de 1500 espectadores, e muita gente lá fora… por razões de segu- rança. A arbitragem coube à fina flor dos homens do apito, alguns deles internacionais. E, no meio deles, estava uma flor: uma árbitra, a Sónia Teixeira (economista), que actuou de tal forma que, enquan- to aqui e ali se ouviam protestos dos jogadores calmeirões contra decisões masculinas, a colega era obedecida sem reticências…

163 Será caso para dizer: mulheres ao apito!... Parabéns Sónia! Lá, se despediu das lides um dos melhores árbitros portugueses de todos os tempos: obrigado, António Pimentel! À margem dos jogos, a Câmara de Anadia procurou cativar os seus hóspedes, tendo proporcionado uma visita, acompanhada de um bom leitão e não inferior espumante, ao Museu do Vinho. Aí, perante essa estrutura, eu pensei, não sei se a sério se a brincar: não seria de entregar a gestão hospitalar às autarquias? Por essa via, talvez os doentes tivessem melhores condições em termos de infra estruturas para se curarem… Ao abandonar Anadia, no domingo, fiquei com a sensação de que o investimento feito pela Autarquia nesta prova, que teve a Sport TV presente nos 4 dias, vai ter um bom retorno. Foi o que pressenti de algumas opiniões de quem é estranho à Bairrada… e que par- ticiparam nesta excelente organização da Federação Portuguesa de Basquetebol. Aproveitando a presença dos elementos directivos da Federação em terras bairradinas, foi celebrado um protocolo entre a Câmara Municipal de Cantanhede e aquela Federação. Estive presente e também gostei muito do que ouvi, em termos de preocupações, por parte do Presidente, Prof. Dr. João Moura, relativamente à ocu- pação dos tempos livres da “sua” juventude que muito está a bene- ficiar da presença do meu “velho” júnior da AAC, Amoroso Lopes.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 03/04/2006

164 Armando Rocha A Minha Opinião

As reformas das pessoas

Está na ordem do dia a sustentabilidade do regime de segurança social que veio inquietar, de que maneira, as pessoas já reforma- das e aquelas que aguardam pela sua vez… Caberá perguntar porque se chegou a uma situação tão delicada, para não dizer dramática? Os políticos que chegaram ao governo deixaram entrar no sistema milhares de pessoas que nunca tinham descontado para a segu- rança social, para além de terem criado condições para que políti- cos se pudessem reformar por inteiro com apenas 4 anos de traba- lho como presidentes da Assembleia da República, ou 8 anos para os deputados (entretanto esses períodos foram alargados para 8 e 12 anos). A juntar a isto, aos autarcas contaram-lhes o tempo de serviço a dobrar… E os médicos, por exemplo, que no final da car- reira requeressem a passagem à exclusividade, passaram a poder reformar-se com o valor que auferem à data da reforma… Todos eles, como se depreende facilmente, não contribuíram ao longo do tempo, como deviam, com os descontos adequados que deveriam sustentar as suas reformas… Daí até ao colapso finan- ceiro do sistema era uma questão de mais ou menos tempo… Foi o próprio Estado que legislou levianamente. Mas há culpados? Já não falo do escândalo das reformas do Banco de Portugal (para quando a revisão do regime para a qual foi criada uma comissão especial? Mais uma comissão...) e da Caixa Geral dos Depósitos. José Sócrates teve coragem em denunciar a situação de pré-falên- cia da Segurança Social procurando enfrentá-la com medidas que são dolorosas, mas necessárias, para se evitarem maiores desgra- ças para as gerações futuras. Só não tenho a certeza de que essas medidas atinjam TODOS, mas mesmo TODOS… É que, há dias, um Juiz sindicalista, na televisão, ressalvava a hipótese de deter- minadas especificidades virem a ser tidas em conta na anunciada

165 reforma do sistema… Estou a pensar nos políticos, magistraturas, etc…. Se houver essas especificidades, não conte o governo com a compreensão da generalidade da população… Quanto aos autarcas, já algo foi feito recentemente quando se acabou com o escândalo do tempo contar a dobrar… mesmo descontando a demora propositada (?) do diploma na própria AR …que se não esquece. Parabéns, Sócrates! Quem quiser dar-se ao trabalho de consultar o Diário da República, II série, nº 208, de 28 de Outubro último, pode constatar uma série de situações que urge serem reconsideradas: a) Há reformas (em euros) que fazem pensar no conceito de jus- tiça social: uma técnica especialista com €7.327, dois Juízes com €5.663 e mais quatro com €5.498, um investigador com €4.491, 12 médicos com mais de €4.200, um professor com €5.015 e mais cinco com mais de €4.491; b) Impressiona a quantidade de autarcas que se reformaram, com o tempo a contar a dobrar. Mas como são ainda novos, eis que ve- mos alguns deles novamente eleitos para novo mandato… É sinal que, não obstante o desgaste da actividade autárquica, eles estão ainda em boa forma física… Sem nos preocupar-nos com os ve- readores e presidentes de Juntas de freguesia, que foram muitos, citam-se apenas os Presidentes das Câmaras de: Alcoutim, Aljezur, Amadora, Ansião, Arraiolos, Belmonte, Castanheira de Pêra, Cas- tro Marim, Constância, Fafe, Lagoa-Algarve, Lamego, Lousada, Marco de Canaveses, Marinha Grande, Marvão, Moita, Monção, Montijo, Mora, Moura, Nazaré, Odemira, Oliveira do Hospital, Ovar, Penacova, Ponte de Sôr, Póvoa de Varzim, Sesimbra, Soure, Torres Novas, Vendas Novas, Vila Franca de Xira e Vila Nova de Paiva. Na verdade, a situação actual é insustentável e bem anda José Sócrates na sua caminhada reformista, mas que tem de ir mais fundo. Para quê, por exemplo, 230 deputados à AR, que tem orça- mentada para despesas correntes, em 2006, a módica quantia de mais de 90 milhões de euros! Será que a democracia portuguesa não se bastaria com 100 deputados, até mais bem pagos, para não terem mesmo pretexto para se furtarem às votações?...

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 12/05/2006

166 Armando Rocha A Minha Opinião

Povo sem memória é povo sem futuro

Em Lisboa, junto à Torre de Belém, está implantado o Forte do Bom Sucesso. Aí foi construído, em 1994, o Monumento aos Com- batentes do Ultramar que procura traduzir, através de um simples pórtico de grande dimensão e enorme simplicidade, a ligação en- tre todos os povos envolvidos na guerra do ex-Ultramar português, sem constrangimentos nem ressentimentos. Com ele se homena- geam aqueles que serviram Portugal como simples combatentes. A homenagem é feita através das lápides colocadas na própria parede do Forte, por iniciativa do Ministro da Defesa Veiga Simão, onde estão gravados os nomes de todos os que morreram ao ser- viço da Pátria. O Forte foi recentemente recuperado por decisão do Ministro da Defesa Paulo Portas e, de tal forma ficou, que merece ser visitado, até pelas vistas que dele se desfrutam. Foi nesse local que, uma vez mais, no passado dia 10, compa- receram mais de 1.000 antigos combatentes (naturalmente, os desertores e a nomenklatura do poder político abrilista não com- pareceram) para recordar os camaradas caídos na guerra. Muitos ostentavam orgulhosamente as condecorações conquistadas por actos heróicos, designadamente o Comandante Alpoim Calvão, o mais condecorado de todos. Daqueles rostos com quem nos cruzámos, já um tanto marcados pelo tempo, jorravam saudades e mais saudades do período passa- do em África, e não esconderam uma lágrima ao toque dos clarins. As suas conversas recordavam as terras que foram abandonadas devido, designadamente, segundo José António Saraiva in Diário de Notícias de 26/01/1979, à desintegração da hierarquia militar a que a insurreição dos capitães deu início e que o MFA, infiltrado pelo PCP no Exército, explorou ao máximo, indo ao encontro, afi- nal, da estratégia africana da URSS. Não posso deixar de lembrar que, ainda com Salazar no poder,

167 havia negociações secretas com o Presidente da Zâmbia, K. Kaun- da, através do Eng. Jorge Jardim, com vista a encontrar-se uma solução pacífica e honrosa para o problema. Pena foi que, com a chegada de Marcello Caetano ao poder, aquele negociador tenha perdido força e tudo foi por água abaixo… Perguntei a um daqueles combatentes desconhecidos se achava que tinha valido a pena o sacrifício feito quando era jovem. A res- posta veio pronta: por Portugal, sim!... Será que nós, aqui na Metrópole, merecemos tanto sacrifício da- queles homens? Tenho dúvidas… O reconhecido patriota general Heitor Almendra justificou o en- contro do passado dia 10. E o Dr. Teixeira Pinto fez um interessan- te discurso virado para o multiculturalismo tendo afirmado, entre outras coisas, que “Portugal significa o contrário de racismo e xe- nofobia”. Fiquei reconfortado com o banho de portugalidade autêntica a que assisti. Por acaso, no dia seguinte, no programa da RTP2 dessa noite em que, ao recordar-se o 1º da Maio de 1975, se via o povo – Mário Soares incluído – a cantar a plenos pulmões o hino nacio- nal, um cidadão de primeiro plano manteve-se de boca fechada: Álvaro Cunhal, nem mais!

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 16/06/2006

168 Armando Rocha A Minha Opinião

Português em Roland Garros

Disputou-se, recentemente, em França o célebre torneio de ténis do circuito ATP, no caso em terra batida, que leva até Paris os maio- res nomes do ténis mundial. A par do torneio para os melhores, também lá se disputa o torneio de juniores. A este torneio só têm acesso os 73 melhores jogadores do mundo, dessa categoria. O “ranking” é fundamental para as aspirações dos jovens. Pois bem, em Portugal, o campeão nacional figurava em 35º lugar desse “ranking”, conquistado, aliás, em bastantes torneios por esse mundo fora. E, por isso, teve a possibilidade de se apresentar com a elite mundial júnior em Roland Garros. Humildemente, mas com ambição, entrou em campo e conseguiu resultados notáveis, ao derrotar o nº 2 da Austrália, o nº 2 de Fran- ça e o nº 1 dos Estados Unidos. Acabou por ser eliminado apenas nos quartos de final, às mãos do júnior eslovaco que acabou por ser o vencedor do torneio. O atleta de que falamos é o Pedro Sousa, filho de grandes tenistas e empresários de sucesso (no CIF e no Centro de Ténis de Monsan- to), nem mais que a Graça Cardoso e o Manecas de Sousa. O jovem, além de ser um bom tenista, não descura os estudos, pois está no 12º ano. Para quem diz que o desporto de competi- ção é antagónico dos estudos, aqui está um exemplo do contrário dessa ideia. É tudo uma questão de programação do tempo… e força de vontade. Até agora tem sido o próprio pai que o tem treinado. Se ele chegou onde chegou, tudo leva a crer que possa ainda progredir na sua carreira tenística. Estou em crer, porém, que, a partir de agora, ele terá de partir para o estrangeiro (Espanha? Estados Unidos?) para poder vir a dar muitas mais alegrias aos portugueses amantes do ténis.

169 Caso por cá continue a treinar, será mais um caso de sucesso re- lativo, como foram, por exemplo, os casos notáveis, para nós, do Nuno Marques e do Cunha e Silva, a quem não faltavam condi- ções naturais para serem dos melhores… Num País em estado de depressão, exemplos como o do Pedro Sousa fazem-nos bem! Pedro Sousa é um exemplo de muito trabalho, muito trabalho, muito trabalho e de dedicação a uma causa! Parabéns!

Publicado no jornal “Região de Águeda” de 23/06/2006

170 Armando Rocha A Minha Opinião

O abuso sindical…

É um dado adquirido que os sindicatos são indispensáveis a uma verdadeira democracia. Tem de se reconhecer que o mundo sindi- cal é complexo e exige a servi-lo pessoas empenhadas, conhece- doras do meio e, acima de tudo, esclarecidas. A prosa que se segue vem a propósito da forma de recrutamento das pessoas que integram as direcções dos sindicatos que eu, aliás, desconheço. Chegou, porém, até mim, pelo menos um caso, que dá para pensar, mesmo que não se deva fazer generalizações. Um rapaz, filho de família séria e honesta, vivendo com algumas dificuldades, lutou desde novo por ser alguém entre os seus con- cidadãos. Possuindo inegáveis qualidades de trabalho e aplicação e dotado de boas aptidões para uma determinada área de ensino, alcançou as habilitações para ser professor de escola preparatória. Concorreu, de seguida, às vagas do Ministério da Educação, tendo sido colocado numa escola da capital. Em pouco tempo se efecti- vou e deu azo às suas qualificações com sucesso. Mas ele tinha ambição, o que é louvável, e, não querendo ficar por ali, matriculou-se na Faculdade de Medicina, o que significou um esforço enorme para a sua vida no dia a dia… Chega entretanto o 25 de Abril. E logo o mundo sindical se agitou e de que maneira!... Criaram-se muitos sindicatos, nomeadamen- te no âmbito da Educação, para os quais era necessário encontrar dirigentes. Um dos fundadores de um determinado sindicato na área dos pro- fessores, seu colega, procurou-o e disse-lhe que precisava dele para integrar a lista dos corpos sociais do mesmo para o que seria requisitado ao Ministério. E mais lhe terá dito que o seu trabalho consistiria apenas em fazer umas assinaturas e em participar numa ou noutra reunião… Essa requisição permitia-lhe dedicar-se ao curso de Medicina, com

171 mais tempo, mantendo o salário de professor, sem ter que exercer efectivamente na escola. Daí que aceitou o convite. O tempo foi passando, o curso foi terminado com êxito e, logo a seguir, tirou uma especialidade, daquelas onde se ganha muito dinheiro, e montou consultório. Como ele era bom profissional, um hospital central também o contratou, em regime de avença. Lá tem estado até que o Governo, agora, através da Ministra da Educação, resolveu pôr cobro a muitas situações consideradas in- toleráveis. Vai daí, o número de professores requisitados está a ser drasticamente diminuído (em 2002, só na Educação, eles eram cerca de 3.000 e, nessa altura, a Profª Drª Mariana Cascais, do CDS, começou a cortar…) vindo agora para cerca de 450, pelo que os sindicatos tiveram que se adaptar às novas disponibilidades do Ministério… A pessoa que tenho vindo a referir, talvez por não fazer falta ao sindicato, foi das “sacrificadas” e teve de optar por continuar a ser professor do quadro ou a ser médico, mesmo deixando o Hospital. Feitas as contas, optou por continuar a ser professor, onde ganha mais do que ganhava no Hospital, e a ter consultório médico. Ou seja, este senhor esteve mais de 30 anos ausente da Escola, a ser pago pelo Orçamento de Estado, para, afinal, fazer a vida aqui descrita. Isto não será um abuso sindical?... E será um caso excepcional?... Claro está que ninguém tem culpa disto… porque julgo que a Constituição terá lá um artigo a dizer que a culpa deve morrer solteira!... Adenda: Acabo de ver o jogo de Portugal com a Holanda. Ganhámos! É o que interessa. Felipão e os seus jogadores estão de parabéns! Agora há que pensar no próximo jogo com a Inglaterra, com sere- nidade, fé e cabeça fria!

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 30/06/2006

172 Armando Rocha A Minha Opinião

Que País é este?...

Acabamos de passar por um salutar portuguesismo frenético que atravessou toda a sociedade por causa do futebol. Veio à baila a célebre equipa dos “Magriços” de 1966 que só caiu aos pés da Inglaterra nas meias finais desse campeonato do Mun- do, em jogo que teve lugar em Londres contra a Rússia, do Yaschin, e que venceu para se classificar em 3º lugar. Na altura eu desempenhava as funções de director geral dos Des- portos, tendo acompanhado por dentro a preparação da selecção nacional. Testemunhei o trabalho exaustivo realizado pela Federa- ção, presidida pelo benfiquista Justino Pinheiro Machado, através do seu secretário-geral, o Afonso Lacerda. O seleccionador, Ma- nuel da Luz Afonso, o treinador, Otto Glória, e a equipa médica, chefiada pelo Dr. Silva Rocha, deram aos “Magriços” tudo o que sabiam para que eles realizassem em campo grandes exibições, algumas delas até à exaustão. Não havia grandes somas de dinheiro em jogo, mas o apego à luta por parte dos jogadores era o mesmo, como se essas somas estivessem em jogo. Em termos de apoios, o governo deu o possível, como atrasar a in- corporação no Exército de alguns jogadores que estavam em risco de serem mobilizados para Angola. Este apoio durou apenas os dois meses de estágio e de participação no campeonato. O Chefe de Estado e o Governo, enquanto a equipa esteve em Inglaterra, naturalmente que seguiam com o maior interesse a sua progressão a caminho das meias finais… Mas, não mais do que isso. Coube-me, a mim, em representação do Governo, deslocar- -me a Liverpool, para assistir ao Portugal-Coreia, já o campeonato ia nos quartos de final. Passaram 40 anos e, agora, na Alemanha, não faltou o apoio institucional e mesmo pessoal dos mais altos dignitários do Estado à selecção nacional. Constatámos as presen-

173 ças em terras germânicas do Presidente da República, do Primeiro Ministro (3 vezes e sem gravata…), do Ministro da Presidência, do Secretário de Estado dos Desportos e do próprio ex-Chefe de Es- tado Jorge Sampaio. Eles encabeçaram afinal o fortíssimo apoio popular traduzido em manifestações difíceis de igualar por qual- quer outra actividade. Os rapazes portaram-se muito bem pois é preciso ver que no campeonato do mundo estava a elite do futebol global. Regista-se que até ficaram pelo caminho selecções como a Espanha, a Inglaterra, a Argentina e… o Brasil… Para alegria de todos nós, a equipa de Scolari quase que igualou a façanha dos “Magriços” de 1966. Tal como nessa altura, Portugal morreu ape- nas na praia… de Munique. Ficou desta vez em 4º lugar o que é muitíssimo bom para o “ego” de um pequeno País. Devo confessar que me emocionei sempre que via os nossos atle- tas, com excepção do luso-brasileiro Deco, a cantarem sentida- mente o hino nacional, o que não era costume há uns tempos atrás… E, não sei porquê, vem-me à memória a Amália Rodrigues que foi, na verdade, uma artista de reputado nível internacional, passe- ando (e encantando) a sua voz inconfundível pelos grandes palcos mundiais, a começar pelo Olympia (1956), de Paris, por N.York, Roma, Tóquio… A sua vida de glória acabaria por vir a ser amesquinhada pelos pseudo democratas de Abril que chegaram a apelidá-la de fascis- ta… Mas os tempos foram passando e foi a própria democracia que acabou por fazer justiça ao colocá-la no Panteão Nacional… depois do versátil Mário Soares a ter condecorado com a Ordem Militar de Santiago de Espada. E continuam hoje a aparecer gran- des revelações que cantam o fado por esse mundo fora… e que a juventude adora. E Fátima? Sempre teve na Cova da Iria milhares e milhares de fieis devotos, desde que os pastorinhos, já todos a repousarem no Céu, revelaram as aparições numa azinheira, em 1917. Com ditadura ou com democracia, o santuário de Fátima continua a “encher” e cada vez mais… São centenas de milhares de fiéis que, com sacrifício enorme, lá se deslocam mensalmente, muitos deles, de longe e a pé… num supremo sacrifício… Fátima foi, é e será sempre Fátima.

174 Armando Rocha A Minha Opinião

Pois bem, também agora, uns tantos trouxeram à baila o apoio ao Estado Novo dos 3 FFF – Fado, Fátima e Futebol. Quer queiram quer não, é assim, agora e ontem, com os 3 FFF, que o Portugal mais profundo vibra. Não é certamente com a justiça, com a saú- de, com a segurança social, com o ensino, com o ambiente ou com a segurança que o País vibra! Afinal que País é este em que não existem VALORES que estejam acima da política? Só há valores que andam ao sabor das marés? É triste!

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 14/07/2006

175 Para reflexão… ou talvez não…

1. Publicidade - Para além de frequentes “spots” publicitários na televisão, de há uns tempos para cá, a cidade de Lisboa foi inva- dida por um sem número de cartazes de publicidade de grande dimensão da responsabilidade da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, focando a sua notável obra assistencial. Deve dizer-se que essa obra tem vindo a ser realizada ao longo de centenas de anos em favor dos mais desfavorecidos. Naturalmente que os recursos financeiros para ajudar os mais desfavorecidos nunca são demais. Antes, são sempre escassos. Daí que gastar mal esses recursos deve ser evitado e reprovado. Ora a Santa Casa tem, entre outras, uma fonte de rendimento que lhe permite essas ajudas e que são os Jogos de apostas e lotaria que não têm concorrência legal. Tenho para mim que a Santa Casa, como instituição, não necessita do tipo de publicidade a que me estou referindo, já que o seu De- partamento de Jogos, esse sim, publicita e bem os seus produtos para atrair os apostadores, numa lógica de mercado. Ou seja, como instituição, considero que a publicidade à institui- ção é desajustada pelo volume de verbas que envolverá. Outro tanto não digo relativamente à publicidade aos jogos de azar. A não ser que aquela queira significar, das duas, uma coisa: a) que a instituição, agora, está a ser muito bem dirigida o que não sucedia antes; b) ou então não tem onde gastar melhor esse dinheiro. Quanto a a) lembro a gestão do Dr. José Guilherme de Melo e Castro, nos anos ’60, que viu longe, ao investir com as verbas do Totobola, na construção do Centro de Recuperação do Alcoitão que, passados 40 anos, ainda é hoje um centro especializado de referência. E muitos outros que lhe sucederam também fizeram boa obra. Não há muito tempo, também uma empresa pública ou de capitais públicos se fartou de investir em publicidade institucional em tudo

176 Armando Rocha A Minha Opinião que era sítio. Sucede que essa empresa era e é monopolista, sem possibilidade de concorrência, na sua actividade, nem mais nem menos que na aviação. Quem não se lembrará de tantos “spots” da ANA? Será que as companhias aéreas de transporte de passa- geiros tinham hipótese de utilizar outros aeroportos que não os de Lisboa, Porto, Faro, Funchal, etc.? Claro que não. Então, para quê os rios de dinheiro a escorrerem para as agências de publicidade? Pessoas conhecedoras do meio quiseram fazer-me crer que esse tipo de negócio implica normalmente comissões para os bolsos de uns tantos. Mas eu não acredito. Não é que me não tenham contado que, no início dos anos ’80, houve um sindicalista muito ligado ao Poder que quis influenciar a nomeação de uns determinados gestores para uma empresa pú- blica “apetitosa” para os partidos políticos. Com o argumento “es- condido” de que assim essa empresa poderia “financiar” o partido em que eles militavam. Graças a Deus que o Ministro da tutela, Veiga Simão, se opôs a esse “negócio”, apenas e só porque era um homem sério. Passados anos, esse Ministro acabou mesmo por abandonar o tal partido, desiludido… 2. CPLP - Com a pompa e circunstância possíveis, ajudadas pelos bólidos emprestados pela Líbia, realizou-se em Bissau mais uma cimeira da CPLP. Lá se encontraram os Chefes de Estado e de Go- verno, com excepção de Lula. Estarei enganado ou os nossos representantes efectuaram as suas deslocações em aviões separados? A ser assim, quanto custaram as viagens de 2 “Falcon’s”? Se aqueles altos dignitários quises- sem (mas, ao que parece, não quiseram), os custos tinham sido reduzidos a… metade. E até aproveitavam as horas de voo para falarem… Na verdade, os sacrifícios pedidos ao povo limitam-se mesmo ao povo sem poder reivindicativo… Para os políticos, os sacrifícios... não contam… Já agora, para que serve afinal a CPLP? Só cria despesa!... 3. Timor – Tenho para mim que Timor não tem, ainda, condições para ser um Estado independente, contrariamente ao que pen- saram alguns dos políticos portugueses de referência, tais como, Guterres, Sampaio, Melícias e outros. Passaram poucos anos e a que se assiste? Lembram-se que foi a Fretilin que assumiu o poder

177 em Timor, nem que para o efeito tenha assassinado militares por- tugueses, logo após Abril de 74. Alkatiri foi um deles, que ajudou a escorraçar os portugueses daquele território. Agora, a contas com a justiça, esse mesmo Alkatiri contratou uma série de bons ad- vogados portugueses, indonésios, etc., para o defenderem. Onde é que ele ganhou tanto dinheiro que lhe permite essa defesa de luxo? Os políticos, onde quer que se encontrem, de uma maneira geral, pensam neles, neles e só neles…

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 18/08/2006

178 Armando Rocha A Minha Opinião

Os 100 anos de Marcello Caetano

No passado dia 18, assisti na Basílica da Estrela, em Lisboa, a uma missa de acção de graças por alma do Professor Marcello Caetano. A Basílica estava repleta de cidadãos que quiseram pres- tar mais uma homenagem a esse grande Homem e Patriota, que a história não vai esquecer certamente, não obstante os esforços da esquerda activa que tudo faz para mostrar o político derrotado pelo 25 de Abril e nada mostra ou refere do muito que ele fez pelo povo português. Sabem quem criou a ADSE? Sabem quem criou o salário para os rurais? Sabem quem deu uma machadada no condicionamento industrial? Sabem quem fez a Reforma Educativa (sob a batuta de Veiga Simão)? Sabem quem lançou os Planos de Fomento? Já se esqueceram… Eu lembro: foi o governante Mar- cello Caetano. Não posso esquecer que Marcello Caetano, quando desembarcou, ido do Funchal, em S. Paulo, foi alojado num hotel, sem que ele tivesse possibilidade de pagar a conta! E foi um antigo aluno que o fez por ele e o foi buscar para o alojar em sua casa. Considerado pela esquerda como um “ditador”, não tinha amealhado fortuna, enquanto governante, como outros verdadeiros ditadores o têm feito ao longo dos tempos e se pavoneiam mesmo nas democra- cias avançadas que os recebem com todas as honras! Ou seja, afinal há “ditadores” e ditadores… Veio depois a fixar-se no Rio de Janeiro, onde passou os 6 anos de exílio. Quando chegou a essa cidade, solicitou ao seu colega Pedro Calmon, que intercedesse no sentido de ele se poder alojar numa cela de um convento beneditino, onde passou os primeiros 26 dias cariocas. Depois, instalou-se em apartamento onde viveu até terminar os seus dias, em 1980, sustentado pelo salário dig- no que a prestigiada Universidade Gama Filho lhe proporcionava. Marcello retribuiu à Universidade com aulas magistrais que eram

179 muito disputadas pelos alunos e, finalmente, com o notável acervo bibliográfico (25.000 obras) que conseguira fazer transportar para o Brasil. E lá está a atestar a obra científica de um dos maiores professores de Direito que Portugal alguma vez teve. Recusou-se a regressar a Portugal porque lhe era exigido um requerimento para o efeito. “Requerer um direito? Nunca”. A imprensa portuguesa dedicou algumas colunas ao evento. Li-as com toda a atenção até porque a história se vai escrevendo com esses textos, muitos deles enviesados pelas canetas canhotas… E não pude deixar de verificar que algo se escreveu que não cor- responde à verdade. Por exemplo, a citação de uma expressão de Francisco Sousa Tavares que dizia que os lusitos e os chefes de quina da Mocidade Portuguesa usavam um cinto adornado pela “serpente salazarista na fivela”, apenas serviu para denegrir essa Organização a que pertenci e servi com o maior agrado até por- que me proporcionou, e aos rapazes e raparigas da altura, uma formação desportiva e cívica que, hoje, não é proporcionada por qualquer partido político… A verdade é que esse “S” colocado na fivela do cinto tinha um simples significado: “Servir”. Li também um artigo do ex-presidente Sampaio em que refere que, durante a greve académica de 1962, tinha visto Marcello Caeta- no “(…) em cima de um carro, no estádio universitário, a prestar esclarecimentos aos estudantes… e a convidar-nos para jantar no Castanheira de Moura (…)”. Sucede que eu era responsável pelo Estádio Universitário de Lisboa e também lá estava, a receber o Reitor Marcello Caetano quando ele chegou. O que eu vi foi di- ferente do agora relatado pelo antigo dirigente associativo Jorge Sampaio. O que eu vi foi o Reitor, logo que saiu da viatura, começar a dialogar com os estudantes (que já estavam de saída do Estádio), mas não em cima do carro. Alguém está a ver o Professor Marcello Caetano empoleirado num carro? Sampaio viu. Eu não vi. Quem se empoleirou na guarita de acesso ao estádio foi, sim, o Prof. de Letras Lindley Cintra que perorou aos estudantes dizendo, ele sim, que o Reitor os convidava para jantarem no restaurante Casta- nheira de Moura, ao Lumiar. Sucede também que eu, que estava próximo do Reitor, não o ouvi delegar naquele Prof. esse convite. O certo é que, quando os estudantes chegaram ao restaurante, não havia jantar para ninguém… Ainda a propósito do que escreveu J.

180 Armando Rocha A Minha Opinião

Sampaio sobre as forças económicas autoritárias e conservadoras que “(…) se afundaram, felizmente, em 1974, com o 25 de Abril.” (o sublinhado é meu), não posso deixar de recordar o trabalho que foi feito pela economista Aurora Murteira, em 1985, sobre o Sector Empresarial do Estado, no domínio da Indústria e da Energia, em que se diz que os revolucionários de Abril fizeram investimentos nessas áreas, sem terem levado em conta as consequências do choque petrolífero de 1973. E assim se investiram, a preços de 1985, 2 biliões de contos, ou seja, o equivalente a 10 biliões de euros… irrecuperáveis, sem falar nas indemnizações compensató- rias… Foi, pelos vistos, uma felicidade para J. Sampaio… Também é certo que li dois outros artigos dignos de quem os es- creveu: foram eles dos Professores Veiga Simão e Adriano Moreira, curiosamente, duas personalidades que, em fases diferentes, esti- veram em ruptura com Marcello Caetano. Mas a sua inteligência esteve acima dos arrufos… Parabéns! Estou certo que daqui a mais cem anos, ainda se falará do Profes- sor Doutor Marcello Caetano. Ao contrário do que sucederá com quem o derrubou!...

Publicado no jornal “Soberania do Povo”

181 A outra face da moeda

1. Tecnologias – Os calores do verão amolecem as pessoas. Toda a gente sabe que os povos do norte são mais produtivos do que os do sul. Mesmo em Portugal se diz que o trabalhador nortenho trabalha mais do que o algarvio. Claro que o calor não é estranho a essa apreciação. Trabalhar com 20-25 graus ou menos é muito diferente de trabalhar com mais de 30 graus à sombra. O corpo amolece com essas altas temperaturas… Lembro-me dos tempos em que trabalhei na Tabaqueira e me tive de confrontar com os sindicatos e Comissão de Trabalhadores, bastante activos, que reclamavam por tudo e por nada! Diziam, na altura, que as condições de trabalho da fábrica não eram boas… E eu pensava que, trabalhando em ambiente com ar condicionado, como era o caso, seria bem melhor do que na maioria das fábricas que o não tinham… Mas a insatisfação dos homens é uma coisa natural e até desejável, embora por vezes toque o irracional… Pois bem, estamos agora no tempo de se incensar a aplicação das novas tecnologias a tudo e todos. Ainda bem que o conhecimento tem evoluído de uma forma fantástica para bem da humanidade. E tem havido portugueses (muitos? poucos?) que têm ajudado a esse progresso, trabalhando em centros de investigação renomados por esse mundo fora. Sim, porque os portugueses não são piores do que os outros. Direi que eles apenas precisam de bom enquadra- mento que, a existir, os revela da melhor maneira. De entre as tecnologias hoje mais vulgares, destaca-se, pela sua divulgação, a informática. Não há escola que não tenha já com- putadores e internet! Não há Junta de Freguesia que não propor- cione cursos de informática aos seus cidadãos! O Governo não se tem poupado a esforços para proporcionar o acesso a esses meios a toda a gente. E, ao fazê-lo, tem consciência que até está a criar

182 Armando Rocha A Minha Opinião postos de trabalho, na medida em que todas as máquinas acabam por sofrer avarias que é preciso reparar… por alguém qualificado que saiba fazê-lo. As crianças adoram ter o seu computador e os pais – os que podem – não lhos regateiam. Para seu bem? Ou para seu mal?... Aqui falo com a experiência de ter já netos que, nos seus 9-12 anos, têm o privilégio de possuir essas máquinas em casa. E que vejo eu? Tenho a humildade de afirmar que o de 12 anos é mais expedito do que eu. Sabem porquê? Simplesmente porque não tem receio de fazer asneiras informáticas, talvez por inconsciência!... E eu tenho… Nas coisas da vida, diz-se que não há bela sem senão!... Assim: 2. O estudo do Português - Com aquelas ferramentas, as crian- ças desenvolvem o espírito de pesquisa, mas viciam-se na “nave- gação” do cíber espaço ao ponto de deixarem de ler livros. Quan- do acordam, não dispensam a televisão com o canal Panda! E se vão para a escola de manhã, quando regressam a casa, atiram a mochila com quilos e quilos de livros para o chão e vão direitos ao computador (ou à Play-Station), onde se começam a distrair com as “mensagens”… (sabe Deus a sua qualidade) e com a “descoberta” de sensações por vezes pouco recomendáveis… Neste ambiente, como é que se consegue tempo para a leitura de livros educativos que exercitem o português? Isto, para mim, é um drama de difícil solução. Sim, porque, sem leitura e redacção de textos, as crianças ficam com um défice enorme no capítulo do raciocínio para bem exporem as suas ideias. Dir-se-á que é aos Pais que cabe a tremenda tarefa de acompanhar as crianças no seu desenvolvimento corporal e intelectual. Só que, na sociedade hodierna, com quotas ou sem quotas, os Pais têm que ganhar o sustento da Família e não lhes sobra tempo para esse real acom- panhamento. Será que um esforço adicional dos Pais, no sentido de “obrigarem” os filhos pequenos a fazerem uma redacção diária e a ler umas tantas páginas de um livro de bom autor é possível? Direi mesmo que se, efectivamente, não lhes for possível, os re- sultados, a prazo, são irremediáveis e que, quem vai sofrer, são os futuros adultos! Pensem nisto. E não falo sequer da matemática!!!

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 01/09/2006

183 Progresso!...

1. Acessibilidades – Depois de umas semanas passadas com a família à beira mar, no Algarve, que estava cheio como um ovo, com “bichas” por todo o lado, especialmente nas caixas Multibanco (muitas vezes sem dinheiro, deixando os clientes desesperados…), resolvi dar uma volta pelo interior. A pretexto de ir ver um jogo de basquetebol de qualificação do campeonato da Europa, fui de abalada até Trancoso, terra que eu não conhecia. Segui por Torres Novas, Castelo Branco e Guarda. Sempre em auto-estrada. Resultado: não cheguei a entrar em ne- nhuma dessas cidades. O progresso também implica sacrifícios, naturalmente. Neste caso, para a actividade económica dessas ci- dades. Quem fica a ganhar são as estações de serviço gasolinei- ras… A viagem demorou cerca de 4 horas para fazer os 400 quilómetros do percurso. De todos eles, só tive de pagar portagem entre Al- verca e a saída da A1 para Torres Novas. Pude apreciar a obra de engenharia que são os túneis da Gardunha que, uma vez abertos, facilitaram enormemente o trânsito automóvel. Graças ao concei- to das SCUTS, vias sem portagem, as pessoas até pensam que elas não custam dinheiro! Mas só aparentemente! É agradável não pagar portagem mas, se pensarmos um bocadinho, chegamos à conclusão meridiana de que as “portagens virtuais” foram e são pagas com os nossos impostos. Que cada vez doem mais. Isso só se nota quando se recebe a factura do IRS – estamos na altura de isso suceder – e a comparamos com a do ano anterior!... Chegado a Trancoso, deparei com uma vila pacata, muito limpa, com o casario junto à muralha do castelo, a recordar a batalha contra os castelhanos (em número muito superior) em 1385, um largo enorme onde ainda hoje se realiza a feira franca criada por Dom Diniz, completamente cheia de feirantes e de povo, como

184 Armando Rocha A Minha Opinião pude comprovar. É nesse largo que está implantada uma capelinha erigida para comemorar o casamento daquele Rei com Isabel – a Rainha Santa. As novas construções foram desenhadas por quem sabe respeitar a tradição pelo que aos contrastes não falta harmonia em Tranco- so… a quem D. Afonso Henriques concedeu foral, entre 1157 e 1169, já lá vão muitos anos… Fiquei instalado num hotel de Turismo excelente, de construção recente, muito acolhedor e a que não falta uma piscina coberta, aparelhos de fitness e um belo solário, com um pessoal atencio- síssimo. E que dizer do local onde se disputou o jogo entre as selecções nacionais de Portugal e da Macedónia? Direi apenas que se trata de um bonito pavilhão, com os topos envidraçados, de estrutura de madeira nórdica, com capacidade para cerca de 1.000 pessoas (chega muito bem) e que estava completamente cheio. A minha curiosidade não resistiu a perguntar ao presidente da Câmara o nome do autor do projecto. Claro, trata-se de um dos nomes so- nantes da arquitectura portuguesa, Arq. Gonçalo Birne. Acrescento que, naquele belo ambiente, com muita juventude a cantar o hino nacional e a gritar por PORTUGAL, os nossos atletas levaram de vencida os macedónios, o que naturalmente deixou felizes os trancosenses e não só. E perdoe-se-me o desabafo! Por motivo da minha dedicação ao basquetebol, tenho assistido em variadas cidades de província – cito só Anadia e Tondela – a jogos disputados em pavilhões com qualidade e que convidam à sua frequência. Recordo que nos ’70 dei o meu contributo para que a escola Preparatória de Águeda fosse construída com um pavilhão gimnodesportivo, que ainda lá está. Depois disso apareceu o pavilhão do Ginásio que não satis- faz, segundo ouço dizer, as necessidades do desporto aguedense. Tantos anos passados, será que Águeda não merece ser dotada de uma infra-estrutura mais digna, em termos de desportos de salão? Não esqueço e até relevo a mais valia que representou para a ter- ra o Estádio de futebol em que a autarquia meteu a cabeça. Voltando à viagem, direi que optei por regressar pela IP5, que está muito melhor, quase toda transformada em auto-estrada. E, na saída para as Talhadas, não hesitei e virei para Águeda… É que

185 não podia deixar de ir dar um abraço ao meu colega e amigo dos tempos da Escola do Adro, João Resende, e, outrossim, não podia regressar a Lisboa sem trazer uns folares e uns pastéis da Casa Brás. Como pormenor, insignificante talvez para muitos, apreciei a atitu- de da Câmara de Águeda, ao colocar umas placas na subida para o Tribunal a permitir o estacionamento de viaturas até 15 m. O tempo suficiente para uma pessoa poder resolver um assunto ligei- ro na Baixa da cidade. A vida também é feita de pequenos nadas! À laia de conclusão: sem querer pôr em dúvida a forma discutível como os dinheiros da UE têm sido gastos, o País está muito bem servido de vias de comunicação para longas distâncias. Houve um enorme progresso, não há dúvidas. 2. Gare do Oriente – há anos escrevi aqui a verberar a falta de uma sala de espera na gare do Oriente, em Lisboa. Acabei de verificar que, finalmente, ela está a ser montada e até é bonita e funcional: Parabéns à REFER.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 02/09/2006

186 Armando Rocha A Minha Opinião

Ainda Eusébio e Salazar / Linguagem Desbragada

Tenho sido leitor assíduo do jornal Diário de Notícias. Esse jor- nal está a promover agora uma colecção de moedas dedicadas a Grandes Figuras Portuguesas. Como não podia deixar de ser, uma dessas figuras é a lenda do fu- tebol, Eusébio, felizmente ainda hoje celebrado justamente como o maior jogador português de futebol de todos os tempos. Na minha qualidade de director geral dos Desportos, tive o prazer de acompanhar de perto a sua carreira, nos anos ’60 e princípios de ’70, para poder testemunhar o seu enorme valor em campo, só suplantado pela sua humildade como homem. A sua figura tem sido tratada exaustivamente na imprensa, na rá- dio e na televisão. Foi-lhe erigida uma estátua no estádio da Luz e foi-lhe feita uma biografia, pelo Sr. João Malheiro. Tudo bem! Só que, nessa biografia, o seu autor, certamente por razões de ordem não desportiva, introduziu abusivamente uma ideia que é uma pura falsidade. Na verdade, nela se inculca que Salazar inviabilizou a ida de Eusébio para o estrangeiro, considerando-o património nacional. Feita essa afirmação, logo o jornalismo desportivo, e não só, se encarregou de passar a mensagem, de tal forma que, a propósito, agora, da referida moeda do DN, na sua página 39, em sub-título, essa mensagem é repetida dizendo mesmo que a transferência do jogador seria para a Juventus (Itália). Ora, uma mentira, muitas vezes repetida, passa a ser uma verdade… Só do meu conheci- mento, isso sucedeu com o Expresso, com o Público e na TV. Exis- tem mesmo vídeo cassetes da SIC, que passavam nos Alfas Pendu- lares, em que se diz que Salazar chamou Eusébio a S. Bento por 6 vezes, o que também não é verdadeiro. Posso afirmar que Eusébio se encontrou com Salazar uma única vez e que foi no regresso de

187 Londres, do campeonato do mundo de 1966. Tenho procurado fa- zer a rectificação desses escritos, mas sem êxito. Já o escrevi, como me competia, por amor à verdade, no meu livro de “memórias”. Até que, no jornal “A Capital” de 28-09-2004, em resultado de um trabalho de investigação da Profª Ana Santos para uma tese de doutoramento, está escrito em título de 1ª página: “Novas in- vestigações colocam em causa um dos mitos portugueses do século XX – foi o Benfica e não Salazar a impedir Eusébio de jogar no estrangeiro”. Aí se encontram os testemunhos do, ao tempo, advogado de Eusébio, Dr. Silva Resende que foi presidente da FPF e do histórico jornalista, Sr. Alfredo Farinha, a contrariarem frontalmente a tese de J. Malheiro. Felizmente, ainda estão vivos antigos dirigentes do glorioso S. L. e Benfica que poderão testemunhar em desfavor da tese que o DN volta a trazer à liça. Graças a Deus, os 2 últimos ministros da Edu- cação de Salazar (de 1962 a 1968), Inocêncio Galvão Telles e José H. Saraiva, ainda estão vivos e poderão negar peremptoriamente, como inclusivamente se chegou a dizer, que o assunto da transfe- rência de Eusébio alguma vez tenha sido discutido em Conselho de Ministros! Tenho para mim que os senhores jornalistas, quando escrevem, é para dizer a verdade, só que, se as suas fontes são de “águas inquinadas”, essa verdade acaba por ser atraiçoada. Só dando voz a todos os que conhecem os assuntos se pode escla- recer a opinião pública. E, neste caso concreto, eu até estava por dentro… Linguagem desbragada - Alguns políticos usam, por vezes, uma linguagem que me faz interrogar sobre se estou a viver numa de- mocracia que se diz avançada! Há dias, li no Expresso que o mediático bloquista Dr. Francisco Lou- çã terá dito “Temos o Carrapatoso Corleone, o Belmiro Corleone e o Paulo Corleone”. Assim se terá pretendido afirmar uma prática/ tendência mafiosa àqueles gestores que são do melhor que existe no País. Se eu pudesse dar um conselho àquele professor univer- sitário, dir-lhe-ia que lançasse uma empresa e que a gerisse de forma a criar, ao menos, 0,1% dos postos de trabalho existentes, por exemplo, no Grupo de Belmiro de Azevedo. Por mim eu ficaria feliz, porque haveria mais 39 trabalhadores com salários em dia.

188 Armando Rocha A Minha Opinião

Só assim se terá autoridade moral absoluta para falar de temas sociais agudos. Especialmente quem vive à sombra do orçamento de Estado, como é o caso dos políticos, deve ter mais contenção na linguagem, que chega a atingir o insulto, mesmo o gratuito. Também li no Diário de Notícias que um dirigente sindical do sec- tor da educação (!), de Coimbra, se terá referido ao Primeiro-Mi- nistro e à Ministra da Educação como “canalha”. Esse dirigente é certamente um dos ainda muitos professores requisitados para exercerem funções sindicais, que recebem o vencimento do Minis- tério. E os governantes não reagem a estes insultos? Na negativa, será caso para dizer que o País está mesmo doente.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 22/09/2006. A parte relativa a «Eusébio e Salazar» também foi publicada no jornal “Diário de Notícias” de14/09/2006.

189 Escutas, Panteão Nacional e Música no Coração

No Diário de Notícias de 5 do corrente mês, na página 17, em caixa, está a transcrição de algumas escutas telefónicas feitas a pessoal político, em 24 de Maio de 2003, a propósito do processo da Casa Pia: “JS – Quer dizer, o teu nome anda por lá, não é? Nos depoimen- tos. FR – Exactamente. Tá metido na m…(omito a palavra), na lama (…) FR – Mas como isto, pá, tá tudo a ser registado, pá, acho melhor, pá, teres cuidado com a língua, pá! JS – Ó, eu tenho o c… (omito a palavra), pá! Tu desculpa lá, é que a mim não me intimidam, nem… FR – Depois, dizem que tu, pá, que tu não defendes o Estado de direito, pá. Que não sabes o… JS – Pois, eu não conheço o Estado de direito! FR – Que não conheces a separação de poderes… JS – P… que os p… (omito as palavras)… os poderes… FR – Tá bem!” Ao ler esta transcrição, e a ser assim, eu nem queria acreditar no que estava debaixo dos meus olhos! É com este tipo de políticos que as camadas jovens aprendem a falar bom português? Creio, sinceramente, que não! Começo agora a perceber as razões que têm levado uns tantos políticos com altas responsabilidades a defenderem a tese de que há que limitar as escutas, das mais sinuosas formas, porque, dizem eles estão, em causa os direitos, as liberdades e as garantias… Tal como já escrevi neste jornal, o meu comentário é apenas o de que quem não deve, não teme! E se alguns dos senhores políticos temem será porque, lá no fundo, devem alguma coisa? Panteão Nacional - Há dias o Panteão - local destinado ao re- pouso daqueles que por obras de excelência se foram da lei da

190 Armando Rocha A Minha Opinião morte libertando - foi palco de cerimónia que reuniu as mais altas figuras do Estado que entenderam prestar uma homenagem a um militar que tem no seu currículo o facto de ter captado a inteira confiança de Salazar, a ponto de este o ter nomeado adido militar português em Washington e director-geral da Aviação Civil. Foi um homem que tinha a ambição de ser designado como 1º Subsecre- tário de Estado da Aeronáutica, mas que viu o lugar ser ocupado por outro oficial, não sei se melhor ou pior do que ele. Esse militar zangou-se com o Estado Novo, que até ali servira certamente com o maior empenho, e passou-se para a oposição de onde partiu em campanha eleitoral para a Presidência da República. Nela decla- rou alto e bom som que, se fosse eleito, “obviamente demitia Sa- lazar”. Como não ganhou as eleições, não teve essa oportunidade e partiu para o exílio, onde acabou mesmo por ser deixado à sua sorte pelo PCP. Até que, ao encontrar-se com uma brigada da PIDE, na fronteira espanhola, foi lamentavelmente abatido. Humberto Delgado, quando se demitiu de Director-Geral da Avia- ção Civil, para iniciar a sua carreira política na oposição, foi deixar um cartão de cumprimentos ao Ministro das Comunicações. Por acaso, eu estava no gabinete, e fui eu que recebi o cartão… Sem querer opinar sobre a circunstância da colocação de Hum- berto Delgado no Panteão, limitei-me a constatar que não faltou à referida homenagem aos seus 100 anos um largo número de políticos do mais alto nível. Só lá faltou o Povo, que respondeu com o seu alheamento… a avaliar pelas fotos e pelas transmissões televisivas… Tal como sucedeu aliás na cerimónia no Largo do Mu- nicípio no passado dia 5 de Outubro. Música no coração - Uma vez mais, Filipe La Féria teve a gene- rosidade de me convidar para uma estreia, agora, do “Música no Coração”. Sem subsídios do Estado, ele conseguiu montar um espectáculo de enorme qualidade que, julgo, se irá manter em palco por muito tempo, como aliás tem sucedido com as suas anteriores criações: “Passa por mim no Rossio”, “Maldita Cocaína”, “My Fair Lady”, “Amália”… Digo isto porque os desempenhos de Anabela/Lúcia Moniz, Carlos Quintas e Joel Branco, a par do coro de “freiras” - onde pontificam as vozes excelentes de Lia Altavila, Helena Vieira, Helena Afonso…

191 e de um conjunto de crianças – que prenunciam que o futuro está aí – , são a garantia de um êxito total no panorama cultural por- tuguês, onde há muitas vozes a queixar-se da falta de apoios do Estado!... Creio que a ANATA prestaria um bom serviço aos aguedenses se organizasse uma excursão a Lisboa para assistirem a um agradá- vel evento, a exemplo do que, aliás, já foi anunciado por outras terras, mesmo de Espanha… Afinal, também há coisas muito boas em Portugal! Aproveitemo- -las!

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 19/10/2006

192 Armando Rocha A Minha Opinião

Serviço Nacional de Saúde / Empresa Privada

Há uns anos atrás, dirigi-me ao meu Centro de Saúde, em Lisboa, para uma consulta médica que me proporcionaria a passagem de uma receita. Marcada previamente, lá me dirigi no dia e hora fixa- dos pelo Centro. Às 14h, com mais 29 outros “doentes”, começou a espera pelo Senhor Doutor. Uma hora depois, eram 15h, ele entrou em passo estugado… Logo veio uma Enfermeira (?) dizer aos doentes que o Senhor Doutor só atenderia 15 dos 30 que aguardavam a sua vez… Achei que os doentes não tinham culpa do atraso do médico e resolvi dizer à Senhora Enfermeira (?) que o Senhor Doutor teria de proporcionar a consulta aos 30 previamente marcados… Fez- se um silêncio de chumbo na sala de espera e as pessoas ficaram a olhar umas para as outras, incrédulas quanto à sua sorte… em serem efectivamente atendidas ou não… Foi chamado o 1º, de- pois o 2º e por aí adiante, até chegar a minha vez. Fui o 30º… Mas fiquei satisfeito por toda aquela gente bem humilde ter sido atendida! Quanto à qualidade do atendimento das pessoas, nada posso dizer, naturalmente. Desde criança que me habituei a utilizar os serviços médicos pre- ventivos. Fui, pois, umas tantas vezes ao consultório desse grande médico e Homem que foi o Sr. Dr. António Breda, pela mão de mi- nha Mãe. Passaram os anos e, de há um tempo a esta parte, tenho ido ao IPO, para consultas regulares de prevenção. Quando iniciei essas consultas, ainda estava com uma actividade profissional in- tensa. Assim, levava o computador para o Hospital, onde sabia que teria de esperar umas 3 horas pela minha vez, dado que todas as pessoas eram convocadas para a mesma hora - 9h da manhã… A observação que eu fazia da forma como o sistema funcionava levou-me a, muito respeitosamente, perante o médico especialis- ta, pôr em causa esse sistema. Ele ouviu os meus comentários e

193 achou-os pertinentes… tendo prometido pensar neles. A minha sugestão era muito simples: (a) dividir o período da consulta (4 horas por exemplo) em 4 partes; (b) a cada hora corresponderiam x consultas; (c) as pessoas seriam convocadas pelo hospital para o início de cada hora, com uma folga adequada para as eventuais faltas… Pois bem, mais uma vez, a semana passada fui a Palhavã, com uma marcação para a 11h10m. Fui atendido às 11h15m! E como isto tem vindo a suceder nas últimas consultas (e se a consulta tiver de ser adiada, recebe-se em casa um postal a marcar o novo dia da mesma), tenho para mim que o actual sistema funciona bem. Parabéns, Dr. João Amaro! Numa altura em que tanto mal se diz do Serviço Nacional de Saú- de, umas vezes com razão outras talvez não, é com satisfação que relato esta experiência. Está, também, nas nossas mãos contribuir pela introdução de melhorias no funcionamento dos serviços pú- blicos, não nos devendo resignar perante situações injustificáveis. É que, melhor organização não implica necessariamente maiores custos. Antes pelo contrário. Ao fazer este elogio merecido não posso no entanto deixar de registar o espectáculo dado por algu- mas senhoras de bata branca, funcionárias do hospital, a fumarem à saída das portas… esquecendo que o exemplo é fundamental para se evitar o cancro do pulmão… E elas estão no IPO… Empresa Pública Há alguns meses atrás, nos meus passeios diários na zona do Restelo, reparei numa viatura dos CTT-Expresso, “estacionada” no parque onde a PSP tem as viaturas que vai rebocando por mau estacionamento na cidade. Estranhei o facto, mas as semanas iam passando e ela lá continuava. Resolvi enviar, no passado mês de Agosto, uma mensagem ao pre- sidente dos CTT, que tenho por pessoa competente e empenhada, a dar conhecimento da situação, o que ele agradeceu prometendo ir averiguar o que se passava. Até hoje, porém, a referida viatura não foi removida de lá… Costumo dizer que a unidade de medida do tempo em Portugal passou a ser, desde há muito, o semestre… Empresa Privada Soube há dias que uma empresa privada instalada nos arredores

194 Armando Rocha A Minha Opinião de Lisboa fabrica um produto que lhe custa € 0,80/milheiro. Essa empresa tem uma outra fábrica na Roménia a quem esse custo é de € 0,25/milheiro. Lá, nas máquinas, operam engenheiros, aqui operam pessoas com a 4ª classe… Lá, trabalha-se aos fins de se- mana e em 3 turnos, sem alcavalas. Aqui, o sábado custa mais 175%... etc., etc. e o posto de trabalho tem um seguro de vida… que os sindicatos garantem… Sem, de forma alguma, querer dizer que os romenos estão a ser bem pagos, o que acho é que a corda tanto estica que o fenómeno da “globalização” acabará por mais e mais “deslocalizações”…

Publicado no jornal “Diário de Notícias” de 02 e 06/11/2006 e no jornal “Soberania do Povo” de 10/11/2006

195 Doutoramentos e Grandes Portugueses

1- Doutoramentos - Praticamente desconhecido do grande público, um oficial do Exército, não de elevada patente, foi projectado no meio castrense pós 25 de Abril para as mais altas funções do Estado, depois de corajosamente ter encabeçado a luta contra o totalitarismo que as forças da esquerda extremista impuseram, durante alguns meses, ao povo português mas que, embora derrotadas, deixaram raízes bem fundas na sociedade de que ainda hoje, especialmente as organiza- ções económica e educativa sofrem as respectivas consequências. Faz agora precisamente 31 anos que esse oficial deu o peito às balas que, porém, e ainda bem, não foram disparadas pelos seus antagonistas. Estou a falar do General António Ramalho Eanes que, durante 10 anos, exerceu o alto cargo de Presidente da República. Nunca tive relações com ele, a não ser as que decorriam de um cum- primento de circunstância a que não era alheia a sua Mulher. Independentemente de qualquer apreciação que se possa fazer à sua conduta política e partidária, emerge sempre, a ideia de um Homem Sério e de Carácter. Trago hoje aqui a sua figura pelo facto, para mim relevante, de ao longo do seu percurso pós presidencial e partidário se ter remetido a uma vida discreta, longe dos holofotes, sem andar à procura de notoriedade balofa, nem de instalações sumptuárias para o seu “mu- nus”. Ele resolveu, pura e simplesmente, dedicar-se ao estudo de um período da nossa história civil muito rica em acontecimentos que não devem ser esquecidos, mas tratados com verdade! E vai daí, em vez de procurar dar azo à sua vaidade, embrenhou-se numa tarefa delicada e de grande risco, na medida em que não é fá- cil alcançar um doutoramento numa Universidade de prestígio, para mais estrangeira. Estudou, investigou e, aos 72 anos, submeteu-se a provas públicas na Universidade de Navarra, tendo como arguentes notáveis mestres dessa e das nossas universidades (Jorge Miranda

196 Armando Rocha A Minha Opinião e Manuel Braga da Cruz). Teve a acompanhá-lo durante as provas pouca gente, segundo os relatos que li. Do actual Poder Político, não tive registos de monta! Poucas personalidades se dignaram dar-lhe os parabéns, o que é triste! Em todo o caso, na defesa da sua tese sobre Ciência Política, lá estava a sua Família, ou seja, estava a instituição mais nobre que hoje a sociedade possui. No final, o júri, por unani- midade, deliberou aprová-lo com distinção. E os poucos que o acom- panharam em Navarra ficaram certamente muito satisfeitos. Diz-se que por trás de um grande Homem está sempre uma grande Mulher: é o caso! Por isso, este texto também consubstancia uma cordial sau- dação à Drª Manuela Eanes, que era filha de um Amigo que muito me honrou e de quem sou admirador pela Obra que tem realizado a favor das crianças. O facto de que falo trouxe-me à lembrança a atitude de outra alta individualidade que optou por receber (não sei se a pedido?) doutora- mentos “honoris causa” por tudo quanto é sítio. Até consta que mes- mo sem unanimidade. Parabéns Senhor General Ramalho Eanes! 2 - Grandes Portugueses – Com grande espavento, a regressada apresentadora da RTP, Maria Elisa, lançou um concurso para se saber quem é o maior Português da nossa história, a exemplo aliás do que já foi feito noutros países. E para “ajudar” foram feitas sugestões públicas de nomes, os mais diversos e controversos. Até se chegou a exigir que não se esquecesse o Doutor Salazar! Como se ele pudesse ser riscado da história recente do nosso País… Contrariamente ao que pode suceder com uma está- tua ou com o nome de uma Ponte ou de uma Avenida, o espírito e o pensamento nem à bomba serão destruídos!... Pois bem, não mais tive notícias desse concurso. No tempo das avan- çadas tecnologias em que, cá e por esse mundo fora, uma hora de- pois do encerramento das urnas de uma qualquer eleição, já é possí- vel conhecer o seu resultado, o que se passará com este concurso? Tenho para mim que o resultado do mesmo não agrada mesmo nada à “intelectualite” portuguesa dominante. Estarei enganado? Se fosse Saramago o “eleito”, de certeza que já era conhecido esse resultado! Tem a palavra, Senhora Dona Maria Elisa. E não demore muito!

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 15/12/2006 O ponto 2 também foi publicado no “Diário de Notícias”, de 27/12/2006

197 Timor. Não há falta de dinheiro…

Tenho para mim que há novos países que não têm condições para se aguentarem sozinhos. Eles nasceram fundamentalmente na ca- beça de uns tantos naturais desses territórios para quem a ambição de poder não tem limites. No fundo, eles almejam ser presidentes de república, ministros, deputados, embaixadores, intermediários de negociatas… E dirão lá para consigo que, depois, alguém, de fora, há-de pagar esse delírios… Por outro lado, a Organização das Nações Unidas fica contentíssi- ma quando é criado mais um país, mesmo que seja artificial. Por essa razão, a sua máquina engorda, aumentam os seus empregos, há quem passe a viajar mais e a ter uma influência que antes não tinha… É claro que, para pagar os custos desta megaloestrutura, há que ir buscar o dinheiro a algum sítio… E esse sítio só poderá ser o bolso dos contribuintes de uns tantos países ricos e menos ricos… alguns deles sem cheta para mandar cantar um cego… Poderia dizer-se que todo este folclore vale a pena em nome da democracia que varre os espíritos desde o século passado. Só que, de democratas, pouco têm grande número de países. De tal forma que, com uma grande frequência, rebentam conflitos étnicos por esse mundo fora, em especial em África. E lá terão de prestar as- sistência os capacetes azuis… que custam muito dinheiro… e pou- co ou nada resolvem… Os conflitos no médio oriente já há muito que praticamente “dispensam” os serviços das Nações Unidas… Com toda esta ineficiência, a máquina da ONU continua impávida e serena a alimentar vaidades que mais tarde ou mais cedo se te- rão de extinguir. E só não acabam mais cedo do que seria de dese- jar porque os EUA vão despejando para os cofres da Organização milhões de dólares. Sei bem que estas ideias são próprias de um discurso politicamente incorrecto, nos tempos que correm, para o

198 Armando Rocha A Minha Opinião enxame de democratas que governam o mundo… Isto vem a pro- pósito de um simples facto que os órgãos de informação trouxeram ao conhecimento público: 6 senhores deputados – seis - da nossa Assembleia da República deslocaram-se a… Timor para significar o apoio da veneranda Assembleia ao povo timorense e, natural- mente, aos seus órgãos de poder! E porquê? Pela simples razão de que o povo de Timor se não entende e entrou, há muito, numa balbúrdia que nem as forças internacionais, GNR incluída, conse- guem dominar! Como é possível tanta falta de humildade demo- crática que leva ao confronto nas ruas, ao incêndio de casas, ao assassínio sem piedade de naturais, às violações, aos roubos?... Seria preciso fazer deslocar 6, logo 6, ilustres deputados a Timor para deixar uma palavra de solidariedade? As viagens não são ba- ratas, as ajudas de custo aumentam a despesa e o tempo “perdi- do” por eles poderia ser mais bem empregue, em defesa dos seus próprios eleitores portugueses… E diz o Governo, com propriedade aliás, que não há dinheiro para satisfazer necessidades básicas das populações continentais e in- sulares… Lamenta-se ter de dizer que não há dinheiro para matar a fome a quem precisa mas, para viajatas à meia dúzia, sempre se arranjam uns tostões… Sou dos que louvo sem reservas a atitude reformista de José Sócra- tes. Não deve ter dependido dele essa deslocação. Estou mesmo em crer que ele foi um autêntico achado para impor alguma or- dem nas finanças públicas. Outros políticos com “folhas de (menos bom) serviço” prolongadas e mais recheadas em democracia não seriam capazes de ter a coragem de enfrentar os muitos lobies que estão implantados na sociedade! Para ser honesto, porém, não gostei que as famigeradas reformas dos administradores do Banco de Portugal levassem tanto tempo, mais de um ano, a serem “reformadas”! Termino, interrogando-me: será que Portugal deveria ter “fugido” de Timor, nos termos em que o fez em 1974, sem ao menos termos feito uma consulta ao seu povo? O próprio Mário Soares defendeu a integração na Indonésia dessa ex-província ultramarina. E agora, até o jurista descolonizador, Almeida Santos, teve necessidade de justificar a descolonização de Timor com 125 páginas do seu mais recente livro (II volume) “Da Descolonização de cada Território em

199 particular”, de 416 páginas, ou seja com 28% do texto!… Seria bom lembrarmo-nos de que, se a “inteligência revolucionária de 1974” tivesse deixado Timor entregue a Portugal, esse território seria hoje, a exemplo do que sucedeu com os Departamentos Ul- tramarinos franceses como a Martinica, Reunião, etc., considerado região ultra-periférica da União Europeia com todas as vantagens daí inerentes… Os revolucionários portugueses optaram por criar antes um simulacro de país independente… que, ainda por cima, nos consome recursos e sacrifícios humanos não despiciendos

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 22/12/2006

200 Armando Rocha A Minha Opinião

O poder dos burocratas

Em geral, toda a gente diz que a máquina estatal tem funcionários a mais. Os sindicatos dizem precisamente o contrário. Talvez nos devêssemos fixar no meio termo… Tivemos uma longa vivência na função pública e lá encontrámos funcionários competentes e diligentes a par, naturalmente, de ou- tros menos competentes e menos diligentes. Em certa medida, o poder político, que sofre de uma doença que se pode apelidar de diarreia legislativa, tem grande culpa nos defi- cientes serviços que o Estado presta aos contribuintes ao enxamear esses serviços com gente em número descabido que tem como recomendação mais a sua filiação partidária do que a sua com- petência. Mas em regime parlamentar, nada se pode fazer contra essa “invasão”… À parte muitas e honrosas excepções, dignas do maior apreço, todo e qualquer funcionário que se senta atrás de uma secretária (de madeira ou de aço) tem um pendor enorme para se assumir detentor de poder. E quantos mais funcionários houver a tratar de um qualquer assunto numa repartição pública maior resistência esse assunto terá de vencer, para desespero do impetrante. Na verdade, a burocracia é um autêntico polvo consumidor de ener- gias e de custos legais e de pequena (?) corrupção… Através da imprensa tive há dias conhecimento de uma situação que é paradigmática e que se conta numa dúzia de linhas. Tratou- se de um dos milhões de contribuintes deste País que foi posto perante uma execução fiscal que resultaria de não lhe ter chegado ao conhecimento a notificação do imposto devido. Como confiar nos CTT que atravessam um período de enorme turbulência?... Esse contribuinte opôs-se à execução propondo-se prestar uma hipoteca sobre imóveis, para o que se dirigiu à Conservatória do Registo Predial indicada na caderneta respectiva. Lá, foi informado

201 que a Conservatória se situava noutro edifício… não sem receber os impressos necessários bem como a informação errada de que os modelos constantes da Internet já não eram válidos… Na nova Conservatória tem de esperar uma hora para ser atendido por uma burocrata que rejeitou os documentos e as informações da- das na outra Conservatória e recusou a hipoteca. Porém, mediante insistência do contribuinte, o Chefe entendeu que a hipoteca podia ser registada… Vai agora ao Serviço Fiscal que resolve pequenos problemas entretanto surgidos com os impressos… de forma céle- re… Nem tudo é mau, afinal! Volta à Conservatória, tira a senha e fica à espera uma hora. En- tretanto, outras pessoas tiravam senhas mais baixas para outros guichets, mas acabavam por ser atendidas no guichet dos regis- tos, uma vez que conheciam a funcionária… Chegada a sua vez, o contribuinte ouviu, da funcionária que o atendera duas horas antes, o contrário de tudo o que esta lhe dissera e por isso lhe re- cusava o registo da hipoteca… Então, na sua dupla qualidade de contribuinte mas também de advogado, argumentou de forma que a funcionária acabou por dar o dito por não dito e cedeu… Para esse tipo de serviço, sem qualidade, o contribuinte pagou centenas de euros e ainda teve de ouvir que a certidão não lhe seria entre- gue antes de três semanas a um mês… Nestas diligências o con- tribuinte gastou horas com a ineficiência do Estado, desembolsou muitos euros e foi pessimamente servido… Será que isto vai continuar assim, não obstante estar em vigor o “espírito” do SIMPLEX? Ou será que o SIMPLEX emigrou? Ou afinal ainda está para chegar?... Termino com uma pergunta: Não seria de experimentar mandar para casa, com os respectivos vencimentos em dia, um terço dos funcionários que, em princípio, só servirão para criar entropia nos Serviços? Os outros dois terços que ficassem teriam naturalmente a tendência para simplificar a vida dos cidadãos eliminando diligên- cias escusadas ou supérfluas e que levam por vezes (?) à pequena corrupção... E talvez se pudesse começar pelos Registos…Tentar não custa… Cabe ao Poder Político a obrigação de legislar no sentido daque- las eliminações. Mas as chefias, ao menos, têm a obrigação de apresentar sugestões construtivas e não serem apenas agentes

202 Armando Rocha A Minha Opinião passivos do Estado… Lembro-me que, em funções directivas no Estado, propus ao Governo a abolição da entrega das célebres de- clarações anti-comunistas previstas no Decreto-Lei nº 27003 para os dirigentes desportivos. Marcello Caetano aceitou a sugestão e assim foram eliminados muitos milhares de folhas de papel selado, de registos e de tempo perdido… Isto foi em 1970! Termino fazendo votos por que os aguedenses festejem em Paz e Amor o Natal de Jesus.

Lisboa, 12/12/2006 Publicado no jornal Soberania do Povo

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Entrevistas

205 Entrevista à revista “A Briosa”

A Briosa: Gostaria que nos falasse sobre a actividade da Secção de Basquetebol da Associação Académica de Coim- bra, enquanto seu atleta e dirigente, designadamente, so- bre a deslocação da equipa a África, em 1951. AR - De forma alguma podia rejeitar o convite de “A Briosa” para falar sobre a Secção de Basquetebol da Associação Académica. Todo aquele que envergou a capa e batina na Lusa-Atenas leva consigo uma chama que, bem viva, os tempos não conseguem apagar: os anos passam, a Académica continua!... Por toda a parte, quer seja no Continente, quer no Ultramar, quer mesmo no estrangeiro, o “estudante de Coimbra” não fica indife- rente às manifestações da sua Academia. Os organismos culturais e as secções desportivas têm-no verificado através dos tempos, nos seus contactos com os meios a onde têm levado a sua arte e a sua graça. Quantos quilómetros não têm andado muitos que aban- donaram Coimbra por força das exigências da vida actual (duvido que não preferissem prolonga a sua vida académica eternamen- te…) para irem aplaudir, com a sua presença, aqueles que, dentro da sua capa e batina ou da sua equipa, são os seus “descenden- tes”… Quantos, curvados ao peso dos anos, emblema na lapela, nos dizem que Coimbra não morreu para eles… Que momentos de felicidade o verem-se de novo rodeados pelo ambiente que já lhes pertenceu também!... Quantos exemplos de dedicação à Academia Coimbrã, se não po- diam citar!... Sem ferir susceptibilidades, permito-me lembrar dois nomes: - Um que já não pertence ao reino dos vivos – o Capitão Pina Cabral. Quem haverá que o não conheça ou, pelo menos, não tenha ouvido falar nele? Quem haverá além disso, que duvide que tivesse sido a A. Académica a ditar a sua sentença final?... Outro, que a geração actual não viu, por certo, mas que, supe-

206 Armando Rocha A Minha Opinião rior ao rolar dos anos, ficará para sempre, como sendo “o maior cantor dos fados de Coimbra” – o Dr. António Menano. Para os representantes da A. Académica em terras africanas, a quando da visita da secção de Basquetebol, no ano passado, a par de tantas recordações inolvidáveis, a que mais se gravou no nosso espírito foi precisamente aquele em que Menano, solicitado pelas várias dezenas de “estudantes de Coimbra”, no Choupal da Beira, em plena floresta, se dispôs a pegar na guitarra e a cantar os “seus fados…” Quando um colega lhe colocou a capa aos ombros, vi-o apalpar carinhosamente o tecido com os seus dedos delicados, de verdadeiro artista, e rolarem-lhe as lágrimas pelas faces em que se vêem as rugas dos anos e dos climas africanos. Que momento esse!... Indescritível!... De novo se ouviram os trinados daquele que passeou a sua arte por esse mundo além… Oh! Mas quanto ele sofria, a cantar os versos que todos nós conhecemos… Que suavidade tinha a sua voz ao pronunciar: Tenho sede de mais alto Sou como a Mãe de Deus Que, tendo Jesus nos braços, Ainda olhava pr’ós céus… Ele que, um anos antes, se tinha furtado à emoção do contacto com o Orfeão Académico, organismo a que pertencera e a quem dera tantos louros!... Mas, como é caprichoso o destino: perante a embaixada desportiva académica, não pudera isolar-se… A pró- pria saudade chamava-o, vencendo-o a ele próprio. Nas horas em que conviveu com a “malta”, cada palavra sua era uma conta do rosário das suas recordações!... Era o eco da sua voz moça e dis- tante, repercutindo-se pelas ruas da cidade-doutora, em noites de luar, no silêncio manso das brancas madrugadas… A sua dedicação à Academia chega ao ponto de ter manifestado como o seu maior desejo o ser levado aos ombros de estudantes para a Conchada, na sua viagem derradeira…

A Briosa: Qual o percurso da Secção até ao Campeonato Na- cional? Falando desta visita que a Secção de Basquetebol da A. Acadé- mica fez a África, ostentando o título de Campeão Nacional da

207 modalidade, perguntar-se-á: como conseguiu a referida secção guindar-se a essa posição máxima? É o que, a traços largos, vou tentar contar. Deixarei passar muitos factos em claro?! – A minha memória não é imensa. Procurarei, no entanto, ser o mais fiel pos- sível à História da Secção que começou no tempo em que os Drs. Carlos Gonsalves, Escobar, Arruda, Alberto Ferreira, no ginásio do A.C.E., passavam algumas das suas horas livres. Foi no advento do basquetebol em Portugal que essa equipa alcançou posição de relevo. Outros não menos valorosos atletas envergaram a camisola negra, sem conseguirem, no entanto, as melhores classificações nos cam- peonatos que disputaram. No ano de 1947 pensou-se, numa espécie de “Congresso da Sec- ção”, em rever o trabalho anterior. Por que razão não se ganham campeonatos? (Embora não considere este o fim primário do des- portista, é agradável que tal se verifique). Posto assim o problema, chegou-se facilmente à conclusão de que era indispensável a ilu- minação do campo de Santa Cruz e a vinda de um técnico para preparar as equipas. Um obstáculo se erguia: a falta de dinheiro… Sim pois se nem equipamentos havia – quantas vezes se treinava descalço e os cal- ções eram improvisados com…camisolas; não havia com que com- prar petróleo para os atletas tomarem um banho quente, nos dias invernosos…Assistiam, portanto, à Secção de Basquetebol as pio- res condições materiais. Os que hoje presenciam as exibições da Académica não calculam o que foram esses anos de luta árdua por parte dos seus elementos, aliás de uma dedicação sem limites. Só uma vontade indómita de vencer, tornar realidade o sonho de ser “campeão”, ao qual se associavam aqueles outros dois sonhos - iluminação e técnico - era pertença da Secção… Com a colaboração preciosa da Câmara Municipal (presidida pelo Brig. Correia Cardoso que era assessorado pelo eng.téc. Baga- nha), pode hoje treinar-se, à noite, no campo de Santa Cruz. As- sim, enquanto muitos colegas se divertem nos cinemas, a passear, ou recostados nos belos “maples” nas suas casas, trabalhava-se quase todas as noites naquele recinto, desde a hora em que foi re- alizada a 1ª condição para o progresso da modalidade… Pensa-se então na vinda de um técnico competente. Vários foram aborda-

208 Armando Rocha A Minha Opinião dos mas chegou-se à triste conclusão de que…não havia dinheiro para a manutenção dum compromisso nesse sentido. O desânimo, no entanto, não penetrava na família basquetista e optou-se por que tal cargo fosse desempenhado por um atleta da Secção que, estudando, conseguiu pôr-se a par dos pormenores do basque- tebol moderno. Deve reconhecer-se que a missão era espinhosa para o eleito cujo nome se impunha para um desempenho cabal: Cerveira (presentemente, como médico, está a especializar-se em Londres). De um momento para o outro, aqueles atletas que costumavam entrar em campo sem saberem bem qual o seu papel na equi- pa, ouviam atentamente o que rezavam os livros sobre as técnicas americanas, arrastados pela forma como o Cerveira se dispôs ao trabalho. Hoje como ontem, no ginásio do A.C.E. se efectuava a leitura… e se punham em prática os conceitos extraídos das publicações mais modernas em que até a tradução era difícil… Uma era nova havia começado: a ginástica, considerada funda- mental, era ministrada pelo prof. José de Sousa Esteves, gratuita- mente. Todos os pormenores do Basquetebol, os mais elementares, foram atendidos: a corrida com e sem bola, a rotação, os passes mais variados, os lançamentos, etc., etc.. Apurada assim a técnica individual, passou-se à parte táctica em que, como se sabe, a A. Académica passou a jogar consistentemente à zona… Com um trabalho desta natureza, em profundidade, os resultados práticos não se podiam esperar. Toda a época de1947-48 serviu para “assentar ideias” e, em 1948-49, começando-se por vencer o Campeonato Regional, alcançou-se o título máximo, sem qual- quer derrota!... Os que tiveram a felicidade de presenciar o últi- mo encontro contra o Vasco da Gama, no Porto, em plena época de exames, puderam verificar o quanto pode a vontade de servir a camisola negra! As lágrimas que, fora e dentro do rectângulo, se derramaram, eram bem a prova da satisfação íntima do dever cumprido, depois de tanto trabalho…nem sempre devidamente compreendido… Igualmente em 1949-50, a A. Académica alcançou o título máxi- mo. Desta vez, ainda em período de exames, o Vasco da Gama serviu de adversário na “final” que teve por palco o campo do

209 Olivais. Num ambiente escaldante, em que se temia a derrota pois havia meses que os estudos não permitiam a realização de um único treino, esses briosos atletas repetiram a façanha do ano an- terior, nas piores condições… Só o muito amor à camisola os levou a fazer das fraquezas forças para subjugar um adversário que se preparou diariamente para o referido jogo. Embora não seja pessoa indicada para falar da técnica da Acadé- mica, devo dizer que considero como fundamental para se terem alcançado os dois Campeonatos de Portugal, o facto de existirem na “Briosa” jogadores com características especiais. O “quadro” base recaia em Paulo Cardoso, Luís de Sousa, Aníbal Costa, Araújo e Sá e A. Serra e Moura. Sem melindre para aqueles outros que ajudaram às vitórias da Académica com Travanca, A.Godinho, F. Serra e Moura, José Manuel, Lúcio, Alberto Martins, Morgado, Brás dos Santos, etc., desejava apreciar aqueles cinco individualmente. Paulo Cardoso, o “capitão”, duma calma impressionante, era a mola-real de todos os contra-ataques; que melhor para o definir se disser que a nossa principal “arma” era o contra-ataque? Luís de Sousa, jogador feito nos juniores, cedo se impôs a toda a crítica e se guindou à posição máxima entre os defesas nacionais (presentemente está na carreira ascendente…ainda…) Aníbal Costa, com uma velocidade extraordinária, uma ameaça constante para o adversário, pois das suas mãos saiam normal- mente 2 pontos, o que o levou a ser considerado o melhor en- cestador português. – Passe rápido de Paulo Cardoso, “cesto” de Aníbal! Araújo e Sá era aquele jogador de grande sobriedade que conse- guia desbaratar por completo uma defesa, perigosíssimo na área do lance-livre. Por último, A. Serra e Moura, o nosso “Toninho”, era o jogador do tipo fino, sem poder físico para se impor, conseguia, no entanto, por meio de “fintas” desconcertantes, ser o principal colaborador do Aníbal e do Araújo, quando não era ele próprio que enviava o adversário para fora do seu caminho e realiza magistralmente as cestas, verdadeiramente dignas de “olés”. Considero-o, salvo o devido respeito por outras opiniões, o melhor jogador português dos últimos tempos. Como se vê, tratava-se de jogadores que, com características diversas uns dos outros, se completavam admira-

210 Armando Rocha A Minha Opinião velmente, constituindo a equipa mais homogénea que deve ter pisado os campos de Portugal e que praticavam a defesa à zona com uma precisão cronométrica, como os internacionais espanhóis Galindez, Imédio, Barceñas e outros tiveram ocasião de verificar em Madrid e o seleccionador de Castela, Borrero, acentuou na sua crítica ao jogo que a Académica realizou em 10-12-1950 no Frontón Recoletos. Não podia deixar de olhar agora para o “banco” onde se sofre… para o local donde emanam as ordens preciosas para os jogado- res. Os meus olhos fixam-se em Alberto P. Valejo, o orientador- treinador que, seguindo o caminho trilhado pelo Cerveira, levou a Académica aos 2 títulos máximos, chegando mesmo a tomar parte activa nos prélios finais dos referidos campeonatos. A sua obra, dentro da Secção de Basquetebol, pode apelidar-se de grande. Como estudante, tem prejudicado a sua vida acadé- mica – o seu único senão – para se consagrar de alma e coração ao desporto. Se todos os jogadores são dignos dos mais rasgados elogios, pois que têm vencido muitos obstáculos e incompreensões de toda a natureza por parte até de quem lhes devia prestar o seu mais incondicional auxílio… nesses elogios se deve envolver Alberto Valejo…. Para aqueles que dizem não ser possível praticar desporto sem com isso prejudicar os estudos, aponta-se-lhes o exemplo dos jo- gadores da Secção de Basquetebol que não só são bons atletas como também óptimos estudantes (cite-se a percentagem elevada dos que estão hoje formados…). E para aqueles outros que não concebem atletas amadores dos me- lhores em apuro técnico, apontam-se-lhes os mesmo exemplos, que levam o seu amadorismo ao extremo de comprarem os próprios equipamentos… com que representam a nossa A. Académica… A Associação Académica de Coimbra já pensou alguma vez no que deve a esses briosos atletas da Secção de Basquetebol?!!! Muito mais havia para dizer mas… fiquemos por aqui… A paciên- cia dos leitores não é imensa…

Lisboa, 05/05/1952 Entrevista de: Pedro Homero (Director da revista “A Briosa”)

211 Académica - equipa Campeã Nacional de Basquetebol, em 1949/50

A equipa da Académica escutando o Dr. António Menano

212 Armando Rocha A Minha Opinião

Artigo publicado na revista “Espaço de União”, da SONAE, após entrevista ao Provedor do Grupo

“O meu conhecimento do estilo de actuação do Grupo e a minha experiência nas empresas da Sonae dão-me a convicção profunda de que o seu estilo de actuação é bastante correcto e leal. A função do Provedor é detectar desvios a este estilo de actuação, ajudar a corrigi-los. De preferência, prevenir. Ao fim e ao cabo, é garantir o respeito pelas regras do jogo.” É com estas palavras que o Provedor do Grupo Sonae, o Dr. Arman- do Rocha, caracteriza as funções que desempenha desde Janeiro, depois de, no final de 1996, o então Conselho de Presidentes ter instituído a Provedoria do Grupo Sonae. Como salienta o primeiro titular do cargo, a criação da figura do Provedor, num grupo privado de tão grande dimensão, com um importantíssimo volume de negócios e uma vasta malha de cola- boradores, clientes e fornecedores é uma “demonstração de cora- gem”. “Não creio que alguém pense que um grupo que cria, por vontade própria, uma função como esta, com as atribuições que lhe estão conferidas por Estatuto, o faz porque tem problemas. Fá-lo porque acredita que o seu estilo de actuação se pauta pelas regras da lealdade e da transparência das relações e porque não quer to- lerar entorses a este estilo”, diz o Dr. Armando Rocha, depois de lembrar que normalmente a ideia do “provedor do cliente” está associada às empresas concessionárias de serviços públicos. Nos termos do Estatuto, são três as atribuições da Provedoria do Grupo Sonae ( a designação é anterior à reorganização da Sonae Investimentos e à criação Inparsa): a “afirmação e promoção pela via apropriada dos direitos e interesses legalmente protegidos dos clientes, utentes ou fornecedores das empresas”; a “reposição da justiça e da regularidade violadas” e a “melhoria da qualidade e eficiência dos serviços prestados pelas empresas”. Genericamente, o Estatuto confere poderes ao Provedor para dar

213 o andamento que entender oportuno a “reclamações, queixas ou sugestões que lhe sejam dirigidas por clientes, fornecedores e co- laboradores das empresas do universo Sonae.” O Provedor tem a faculdade de proceder à “investigação oficiosa” de qualquer as- sunto que, pela sua importância ou reflexo na imagem numa qual- quer empresa ou no Grupo, “imponha uma tomada de posição interna ou pública”, naturalmente sem prejuízo dos procedimentos legais que a situação exigir. O Provedor pode também propor a adopção de quaisquer medidas que tenham por objectivo ou efei- to “melhorar as condições de relacionamento das empresas com colaboradores, investidores, clientes ou fornecedores”. É caso para dizer que a função é indissociável do titular do cargo. O próprio Estatuto o reconhece quando indica que a escolha do Provedor – que é nomeado pelo Presidente da Direcção da Sonae Investimentos – “deve recair sobre cidadão de reconhecida integri- dade, probidade e independência” e determina que ele goze de “total autonomia no desenvolvimento da sua actividade”, o que torna o exercício do cargo incompatível com quaisquer funções em empresas do Grupo. A imagem pública do primeiro Provedor e o seu currículo profissio- nal atestam a preocupação de ajustar a personalidade do titular do cargo à função que lhe está cometida. O Dr. Armando Rocha goza de um indesmentível prestígio pessoal e, quem o conhece, associa facilmente o seu temperamento sereno e prudente com uma pos- tura ética exigente e um rigor técnico incontestável. Desempenhou cargos de destaque no Estado – foi, nomeadamente, director-geral da Educação Física e dos Desportos e inspector-geral do Ministério da Educação e liderou o Gabinete Coordenador do Combate à Droga – e foi administrador de empresas. Antes da sua ligação ao Grupo Sonae, iniciada em 1989, foi administrador, entre outras, da Sonap, da Companhia Mineira do Lobito, da Tabaqueira e da União de Bancos Portugueses. Instituída há tão pouco tempo, a Provedoria não tem ainda um historial. “Verdadeiramente, tive um processo importante, desenca- deado pelo eng. Belmiro de Azevedo, suponho que a partir de uma queixa que chegou ao seu conhecimento”. Mas o balanço é “muito positivo”. “Tive a melhor colaboração da empresa em causa”, con- ta. “De tal modo que, mesmo enquanto o processo decorria, foram

214 Armando Rocha A Minha Opinião introduzidas correcções aos procedimentos instituídos para prevenir mais situações irregulares”. Obrigado ao dever e sigilo, relativa- mente a cada processo em fase de instrução, o Provedor faz um relatório de cada caso, que envia para a empresa em causa, para a administração da “sub-holding” e para a Direcção do Grupo. Das conclusões é sempre dado conhecimento ao reclamante. No final de cada ano, o Provedor fará também um relatório da sua actividade, com divulgação num órgão interno do Grupo, a que juntará as recomendações que a experiência lhe aconselhar. “Pen- so que a minha actuação se dirige tanto para dentro como para fora das empresas, mas admito que a sua importância estará mais nas recomendações que eu possa fazer no sentido de se corrigirem pro- cedimentos. A actuação da Provedoria tende mais a ter um carácter preventivo”, diz o Dr. Armando Rocha. “Como lhe disse, o conhecimento que tenho do estilo de actuação do Grupo diz-me que o seu estilo de actuação é genericamente cor- recto e leal. Por isso confio plenamente em que, também da parte das hierarquias, e de um modo geral de todos os colaboradores, esta é não só uma convicção generalizada mas igualmente uma preocupação assumida no dia a dia. Há vontade de melhorar. E é sempre possível melhorar”.

Junho ‘1997 Autor: Dr. Duarte Calvão (Jornalista)

215 Entrevista ao jornal “Soberania do Povo”

SPD - Como nasceu este seu entusiamo pelo dirigismo des- portivo e que dura até hoje? AR - Lembro-me de, ainda criança de tenra idade, ir acompanhar o meu Pai aos campos de futebol para apoiar o Recreio Desportivo de Águeda. Ele que fora um seu pundonoroso defesa, conforme consta de fotografia publicada neste jornal, recentemente. Depois ia para a Alta Vila apanhar bolas de ténis, quando o meu Pai lá jogava com alguns alunos da Escola Central de Sargentos. E, no Liceu de Aveiro, com 15 anos, já era o seu chefe da secção despor- tiva. Regresso uns anos atrás e vejo-me, de bicicleta, a passar pela Mourisca, pela casa do Dr. Costa e Melo e lá íamos para Albergaria a Velha jogar o ténis, por falta de campo público em Águeda… SPD - E que diferenças fundamentais encontra nestes anos em que tem vivido esse dirigismo tão por dentro? AR - As diferenças são profundas. Destaco o amadorismo de antes, em que se jogava apenas por amor à camisola, e o profissiona- lismo de agora, em que só se vêem cifrões… e que cifrões! Antes, tratava-se - de uma maneira geral - de uma actividade lúdica e agora estamos perante um negócio das actividades atléticas. SPD- Já não há carolas… AR - Estão em vias de extinção… Já poucos, e que são honrosas excepções, estão dispostos a doar o seu tempo graciosamente ao desporto de competição… Hoje, há muita gente a viver apenas, ou por acrescento, do dirigismo desportivo. Ou são ordenados, ou são cartões de crédito, ou são negócios à margem… Não pretendo, com isto, condenar quem quer que seja! Até porque eu próprio fui profissional do desporto, quando exerci as funções de director geral da Educação Física e dos Desportos. SPD- Como assim? AR - Limito-me apenas, isso sim, a constatar factos.

216 Armando Rocha A Minha Opinião

SPD- Tem acompanhado, ao longo dos anos, a participação de atletas aguedenses nas provas desportivas nacionais? AR - Especialmente, através da “Soberania do Povo”, agora com um excelente suplemento, tenho acompanhado de longe os êxitos do desporto da nossa terra. SPD- Que nomes é que destacaria? AR - Haveria muitos a destacar, certamente. Mas limito-me a um que foi quase da minha geração: o Hernâni, um internacional de futebol que foi um atleta simplesmente fabuloso! E ainda é um Homem com “H” grande! SPD- Como tem visto a figura do desportista de Águeda no conjunto do desporto português? AR - Algumas excepções, como o Hernâni, o Raúl Ribeiro, na ar- bitragem, o Carlos Ala, no motociclismo, o Bério, na natação, ombreiam com o que de melhor existia ou existe no País. Tenho dúvidas em considerar Águeda uma cidade desportiva ou de des- portistas. É que lhe faltam mais estruturas adequadas a um desen- volvimento desportivo de alto rendimento. SPD- Como é que comenta isso? AR - Devo dizer-lhe que, por força das minhas funções actuais na Federação Portuguesa de Basquetebol, tenho vindo a apreciar o muito que nesse domínio se tem feito pelo País fora… E, quando entro num dos Pavilhões de Desportos, para assistir a um jogo internacional – ainda há dias o palco foi Vale de Cambra -, eu interrogo-me: porque razão Águeda não tem uma coisa destas? E lembro-me do tempo (anos ’70) em que influenciei a construção da Escola Preparatória por cima da fábrica da telha, para nela ser implantado um modesto pavilhão… Ao tempo, o dinheiro era escasso. Digo-lhe que em 1973, último ano em que estive à frente da DGD, o orçamento do Estado para todo o desporto federado foi de 68 mil contos… Agora, suponho que se pode falar em 17 milhões de contos… SPD- Quem foi, e porquê, a seu ver, a grande figura ague- dense de todos os tempos, em termos desportivos? AR - Falei atrás num atleta de eleição, o Hernâni. Agora refiro o nome do Eng. Carlos Rodrigues, um dirigente também de eleição. Houve alguns outros, sem dúvida. SPD- Que sente que tem faltado a Águeda, para acompa-

217 nhar o resto do País em termos de evolução desportiva? AR - Já referi que sem infra-estruturas adequadas, localizadas nas escolas ou junto às escolas, não se pode ir longe. As potencialida- des escolares de Águeda são excelentes. Só há que saber aprovei- tá-las, pondo à sua disposição técnicos competentes, horários es- colares adequados e recintos convidativos às práticas desportivas… O resto vem por si… Da quantidade é que surge a qualidade… SPD- Que grandes acontecimentos desportivos destacaria que tiveram Águeda como palco ou como cidade protago- nista? AR - Apenas me lembro das chegadas da Volta a Portugal em bici- cleta e dos campeonatos mundiais de motocross. SPD- Muito pouco como se vê… E que cidadãos aguedenses nomearia, na sua qualidade de dirigente desportivo? AR - O Neca Carneiro foi, seguramente, um dos maiores. Deixo aqui uma palavra de muito apreço ao Dr. Horácio Marçal, pelo muito que tem feito, especialmente em termos de apoio médico desportivo, no concelho e clubes de Águeda. SPD- Que obras ou acontecimentos destacaria nos seus man- datos como dirigente desportivo? AR - A conquista do campeonato nacional escolar de ginástica (1943), a conquista do Campeonato Nacional de Basquetebol, como chefe da secção da A. Académica de Coimbra (1950), a 1ª exibição dos Globetrotters na Europa (Coimbra), o início da parti- cipação de Portugal nas Universíadas (1955), a construção dos Es- tádios Universitários de Lisboa e Coimbra, de numerosos pavilhões gimno-desportivos e de tanques de aprendizagem de natação e das primeiras residências para estudantes universitários construí- das de raiz (no INEF). SPD- Há mais? AR - Sim, por exemplo, o Centro de Estágio de Desportistas, no Es- tádio Nacional, a Casa do Desporto do Porto, o Centro de Medici- na Desportiva e Saúde Escolar em Lisboa e no Porto, a elaboração dos Planos de Fomento Gimno-desportivos e da I Carta Desportiva Nacional, a criação das Escolas de Instrutores de Educação Física de Lisboa e do Porto, a cobertura médico desportiva do País, o acompanhamento da preparação da selecção nacional de futebol, no Campeonato do Mundo de 1966, a realização do I Open de

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Portugal de Ténis para jogadores do circuito profissional (1982) e os Torneios de Ténis Sport Goofy… SPD- Que balanço faz dos últimos 20 anos do desporto ague- dense? AR - Suponho que foi feito muito nesses anos mas que muito mais seria desejável ter-se feito. Em qualquer caso, as instalações do C. Ténis e a abertura da Piscina às Escolas são exemplos a seguir. SPD- Algum deles o ligou de alguma forma a Águeda? AR - Apenas e só alguma influência para se construir o pavilhão gimnodesportivo na Escola Preparatória. Para àlém de ter disponi- bilizado um subsídio do Fundo de Fomento do Desporto de 1000 contos para a construção da piscina municipal, que se terá perdido pela inoperância de quem estava à frente da Autarquia, na altu- ra. SPD- Quais foram os episódios mais marcantes da sua longa carreira de dirigente desportivo nacional? AR - Destaco a possibilidade que me foi oferecida de colaborar, ao mais alto nível, no desenvolvimento do desporto universitá- rio e do desporto federado. E de ter ocupado funções dirigentes, por eleição, ao longo de mais de 20 anos no Comité Executivo da Federação Internacional do Desporto Universitário (FISU). Nessa qualidade, tive a rara oportunidade de, em 1962, me deslocar a Cuba, para presidir aos I Jogos Desportivos Universitários Latino- Americanos, e em que mantive duas conversas de 1 hora e 30m cada, com Che Guevara… SPD- Trabalhou com Salazar… AR - E não esqueço o episódio em que o Doutor Salazar, quando confrontado com as opiniões divergentes de dois Ministros sobre a criação da Confederação da Educação Física e Desportos, terá referido que o Desporto tem de se considerar como uma coisa muito séria – que não é para rir. “Porque ao Director Geral dos Desportos nem os dentes se lhe vêem”… E já agora permito-me referir a tristeza que me provoca o grande Eusébio, esquecido/ influenciado/… andar a propagar que Salazar o chamou várias vezes a S. Bento para lhe comunicar que o Con- selho de Ministros o “nacionalizara”… para não poder jogar fora de Portugal… SPD- Não foi assim?

219 AR - Felizmente que ainda há pessoas vivas que podem testemu- nhar que o Conselho de Ministros da altura nunca se pronunciou sobre a sua carreira futebolística e que só a Direcção do S.L.Benfica poderia obstaculizar a sua ida para o estrangeiro… Eusébio não precisa destes “devaneios” para continuar a ser considerado o maior futebolista português! SPD- Como vê o futuro do Desporto em Águeda? AR - Continuo a ser optimista! E aguardo por uma sapatada des- portiva na nossa Águeda como parece vai ser o caso do Estádio Municipal.

Publicado no jornal “Soberania do Povo” de 05/01/2001 Jornalista: Afonso Melo

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Entrevista à revista Magazine da Associação de Ténis de Lisboa

RM- Quando é que se começou a interessar pelo ténis? AR - Desde muito novo que acompanhava o meu pai ao cam- po de ténis da Alta Vila, em Águeda. Recordo-me que, ainda não frequentava a escola primária, já assistia aos jogos, apanhava as bolas e foi nessa altura que ganhei gosto pelo ténis. Quando fui para o liceu em Aveiro jogava com os meus amigos e na universidade também. Tive sempre muito interesse pela moda- lidade e esta atitude manteve-se pela vida fora. Já na idade adulta tive o prazer de criar a Escola de Ténis do Jamor, com a colabora- ção do Prof. Alfredo Vaz Pinto e do Raul Peralta, projecto esse que formou muitos campeões portugueses. Tenho acompanhado a evolução do ténis e tenho jogado em bas- tantes torneios sociais, desde o de Vale de Lobo, organizado pelo Sr. Appleton Figueira, nos anos 70. Nesse torneio tive a honra de fazer par com a nº 1 de Espanha, Ana Maria Estalella. Hoje vou dando umas bolas, mas mais ocasionalmente. Tenho a noção das minhas capacidades físicas pelo que já só jogo pares. O ténis para mim é um divertimento, um passatempo, uma forma de procurar e adquirir saúde. RM- Acha que o ténis tem condições para se transformar num desporto rei? AR - Chegar ao nível do futebol é praticamente impossível. Trans- formar o ténis num desporto espectáculo no nosso País, onde não há grande tradição da modalidade, é muito difícil. É claro que, noutros países, reconheço que o ténis tem uma expressão diferen- te, mas em Portugal há relativamente poucas pessoas a interes- sarem-se por um ténis de massas. Por isso mesmo, considero que não estão criadas as condições para fazer do ténis um desporto rei. RM - Qual a melhor política para o desenvolvimento do ténis?

221 AR - Para mim não há desporto verdadeiramente nacional sem haver desporto escolar. A escola está na base de tudo e, por isso mesmo defendo que o ténis tem que ser leccionado nas escolas. Caso contrário, nunca vamos conseguir enraizar o ténis nas cama- das mais jovens. É preciso muito treino e uma estrutura sólida e sustentada para formar os futuros campeões. É óbvio que podemos constituir equipas de uns tantos bons joga- dores. Basta para isso que haja dinheiro. A realidade é que nem todos os miúdos têm acesso ao ténis. Futuramente gostaria de ver o ténis com maior expressão. Para que tal aconteça é preciso que se unam esforços, os dirigentes dêem as mãos e que o dinheiro disponível seja bem gasto, estabe- lecendo-se prioridades bem objectivas e realistas. De contrário, o ténis continuará a arrastar-se com uns fogachos de vez em quan- do, num mar de vaidades não sustentadas. RM - Que diferenças existem entre o ténis praticado há 30 anos e o actual? AR - As diferenças são evidentes. Há agora muitas mais pessoas a praticar e os jogos são mais competitivos. No entanto, nos anos 60 assistimos a uma explosão de jogadores para o que muito con- tribuiu a Escola de Ténis do Jamor. Daí saíram grandes jogadores, alguns que vieram a ser competentes treinadores. Será que, anti- gamente, a formação era mais estruturada e sustentada? Como amante da modalidade, assisti a momentos de ténis ines- quecíveis. O balanço é naturalmente positivo e ao longo destes anos vivi muitas emoções, não esquecendo a final do 1º Open de Portugal, em 1982, que foi disputada pelo Matts Willander e o Y. Noah que aquele venceu. Do Sport Goofy guardo as melhores re- cordações pelo que representou em termos de divulgação do ténis nas camadas jovens.

Dezembro ‘2003 Jornalista: Drª. Joana Taveira

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Entrevista ao jornal “Região de Águeda”

Região de Águeda - Ainda em criança acompanhava o seu Pai, defesa do Recreio Desportivo de Águeda, aos campos de fute- bol e de ténis. Pode dizer-se que começou aí a sua relação com o desporto? AR - Efectivamente, desde muito novo que acompanhava o meu Pai ao campo de ténis (de terra batida) da Alta Vila, em Águeda. Ele disputava partidas animadas com, entre outros, o Neca Carnei- ro e uns tantos cadetes da Escola Central de Sargentos. Recordo- me que, ainda não frequentava a escola primária, já assistia aos jogos e apanhava as bolas. Foi nessa altura que ganhei o gosto pelo ténis que comecei a praticar já no Liceu de Aveiro (no campo do Parque, de cimento) e que continuei, na Universidade de Coim- bra (no Clube Tiro e Sport) e pela vida fora, até hoje. RA - Acaba de receber mais uma distinção “Prémio Mérito Des- portivo/Personalidade do século XX, da Confederação do Des- porto de Portugal”. O que é que representou para si essa dis- tinção? AR - Para mim o que mais me sensibilizou nessa distinção da CDP foi, acima de tudo, a iniciativa da proposta ter partido da Federa- ção Académica do Desporto Universitário. Porquê? Na verdade, o primeiro saneamento que sofri depois do 25 de Abril foi o de dirigente, a nível internacional, da Federação Inter- nacional do Desporto Universitário. Os novos Poderes, de Avelãs Nunes, etc. quiseram afastar-me dessa actividade que eu exercia graciosamente. E conseguiram… com grande mágoa minha. O facto de serem os dirigentes actuais do Desporto Universitário que quiseram testemunhar o seu apreço pelo que fiz em prol des- sa causa, durante largos anos, foi muito gratificante. O resto já esqueci. RA - Entre as várias distinções, louvores e condecorações que

223 recebeu, há alguma mais especial para si? AR - Todas elas têm, naturalmente, muito significado, pois repre- sentam afinal apreço por parte de meus concidadãos. Mas posso realçar duas: a outorga pelo Chefe de Estado, Almirante Américo Thomaz, de Grande Oficial da Ordem de Instrução Pública e a atri- buição do grau de Membro Honorário da Federação Internacional do Desporto Universitário, pela mão do saudoso Primo Nebiolo, em Palermo. RA - Foi praticante de várias modalidades e ajudou à conquista de alguns campeonatos nacionais, até que foi forçado a afas- tar-se por motivos de doença. Foi certamente uma fase difícil da sua vida… AR - Já passaram mais de 50 anos em que tive de renunciar às práticas desportivas, por um período de cerca de 15 anos. Nessa altura comecei a ter a noção do que é a solidariedade de colegas desportistas que me visitavam amiúde. Solidariedade que eu tenho procurado cultivar pela vida fora. Lembro-me, como se fosse hoje, que se realizou em 1951 um concurso para Professor Catedráti- co de Medicina na Universidade de Coimbra, sendo candidatos ao lugar o Prof. Almeida Lima e o Prof. Diogo Furtado, ambos de Lisboa. O meio médico mobilizou-se à volta desse concurso. E eu, estudante de Coimbra, também não quis faltar ao acontecimen- to, numa altura em que já me encontrava em fase adiantada de convalescença. Eis que alguém me chama: era, nem mais, o Sr. Dr. António Breda! E ele mostrou a vários colegas o símbolo do milagre da estreptomicina. Esse milagre era eu, que tive a ajuda do também, aguedense, Eng. Albano de Mello, então Subsecretá- rio de Estado do Governo de Salazar, e que fora guarda redes do Recreio, no tempo do meu Pai que conseguira mandar vir da Suiça esse medicamento ainda raro no mercado. RA - Visita Águeda com frequência? Como é que vê o seu cres- cimento? AR - Fiz o Liceu em Aveiro, a Universidade em Coimbra e a minha vida profissional começou praticamente em Lisboa, em 1952. Como vê, vivi muito tempo fora de Águeda. Vinha a Águeda nas férias, enquanto meus Pais eram vivos e, também eles, lá passa- vam férias. Venho esporadicamente a Águeda, para dar um abraço ao João

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Resende e ao José Morais e pouco mais. Uma vez, já a trabalhar na Sonae, coube-me organizar um jogo de futebol entre colabo- radores. E eu escolhi o campo do Recreio e o ex-internacional Raul Ribeiro, para arbitrar o jogo. Tive, então, uma agradável surpresa, quando entrei nas instalações do Clube e lá vi uma fotografia da equipa antiga que meu Pai integrava… Que ternura! Naturalmente, a terra tem-se desenvolvido, no bom sentido, estou em crer. Mas haverá sempre descontentes com o tipo de desenvol- vimento que se queira analisar. Eu, porque não vivo cá, não tenho que me queixar. Em todo o caso, o desenvolvimento em termos escolares é digno de nota, dado o número de estabelecimentos de ensino básico, se- cundário e politécnico que operam em Águeda. A Escola tem uma enorme responsabilidade na formação das gerações futuras. RA – Quando vem a Águeda gosta do que vê? AR - Gosto de ver tudo o que represente progresso. E há muitas coisas nesse sentido. Outras há de que não gosto tanto. Mas a vida é assim... RA – Que memórias guarda de Águeda? AR - De passagem por Águeda, nunca deixo de dar um salto ao Botaréu, ao Adro da Igreja, à Rua de Cima (aí para comprar os fo- lares e os pastéis feitos com a receita da Gininha do Candeeiro…). E gosto de recordar... os meus ascendentes e outros amigos, o con- tacto com o rio, a primeira comunhão, as cerimónias da Semana Santa, com padres que eram extraordinários oradores e música sacra da melhor qualidade, as procissões com as bandas de músi- ca a alegrar as ruas, etc, etc.. RA – Costuma acompanhar os resultados do Recreio Desportivo de Águeda? AR - À segunda-feira, costumo ler o noticiário relativo aos jogos de fim de semana. E uma das minhas preocupações é a de saber como se comportou o Recreio. Sei que não está em perigo de des- cida. Já não é mau. Mas calculo que a sua vida é difícil num mundo competitivo com regras por vezes adulteradas... Lembro-me de, há anos, ter ido a Peniche, com o Dr. Orlando Cos- ta, ver uma sua vitória que muito me alegrou. RA – Fale-me agora um pouco da sua vida empresarial. AR - Tenho uma vida dedicada ao Estado, com uma carreira cons-

225 truída degrau a degrau. Mas também o sector empresarial me não passou ao lado. Assim, ajudei a criar empresas como a SONERO que se dedicava ao transporte de emigrantes para a Europa evo- luída. Quando abandonei, em 1973, a Direcção Geral dos Des- portos, passei à SONAP, como administrador por parte do Estado, e mais tarde, já depois de saneado pelo Torres Campos, tive uma passagem pela Companhia Mineira do Lobito. Entretanto, ajudei à criação, a pedido do Dr. Almeida Santos, do Centro de Estudos e Profilaxia da Droga. Voltei à actividade empresarial na TABAQUEI- RA, em 1980. Em Coimbra, com o Dr. Mendes Silva e outros ami- gos, ajudei à criação da EUROBUS que se destinava à construção de autocarros de passageiros (hoje opera nas suas instalações a MARCOPOLO). Depois, foi a vez da Clínica de Serviços Médicos Computorizados, onde vim a encontrar o nosso conterrâneo Dr. Henrique de Melo. À FAMEL dei uma boa ajuda, junto do Governo, a pedido do saudoso Augusto Valente de Almeida. Desde 1989 que tenho vindo a prestar colaboração nesse mundo fantástico que é a SONAE que tem à sua frente um Homem que será, nem mais, o arquétipo dos empresários portugueses, com quem ainda muito aprendi.

02/01/2004 Jornalista: Drª Isabel Moreira

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Entrevista para o Estádio Universitário de Lisboa

Dr. João Roquette - Gostava de esclarecer consigo algumas coisas sobre o Estádio Universitário de Lisboa. Em primei- ro lugar, quais as razões que levaram à construção deste equipamento desportivo no seio da cidade universitária? Depois, quem foi o principal responsável pela ideia e pela sua construção? AR - Numa carta escrita pelo Eng. Vasco Pinto de Magalhães, em 1954, ao então Ministro das Obras Públicas, Eng. Eduardo Aran- tes e Oliveira, o assunto foi despoletado. Essa carta reflecte bem as preocupações que existiam na altura pela falta de instalações desportivas. Ainda me lembro bem que, quando vim de Coimbra para Lisboa e ajudei a criar a secção de basquetebol do CDUL, nós íamos jogar em terrenos de piso cimentado, ao ar livre, em Xabregas, no Rio Seco... sem um mínimo de condições para a sua prática. Então para o rugby, que era a menina bonita do Eng. Pinto de Maga- lhães, só havia campos pelados... JR - A minha dúvida reside em saber se a construção des- te equipamento não teria sido originariamente idealizada tendo em vista os estudantes da Universidade Clássica. AR - Antes de existir a Cidade Universitária, aqui, onde hoje estão algumas das suas Faculdades, também já existia a Universidade Técnica. Aparte uma ou outra Faculdade/Instituto que dispunham de algumas infra-estruturas desportivas, a generalidade das esco- las não as possuía. Assim sendo, quando foi feito o plano da Cida- de Universitária, este espaço, onde nos encontramos, foi destinado ao EUL para servir todos os estudantes universitários de Lisboa. Aqui estava implantado o “bairro de lata” da Quinta da Calçada. Tratava-se de um bairro muito degradado que implicou ter de se vencerem muitas dificuldades para se proceder ao realojamento

227 das famílias que nele viviam. Lembro-me de o Eng. Arantes e Oli- veira, que pretendia que as obras de construção do estádio avan- çassem rapidamente, me ter pedido ajuda para a deslocação das pessoas, que não queriam sair daqui. Tratou-se de um problema social de grande complexidade. JR - São quase contemporâneos os estádios universitários de Lisboa, Coimbra e Porto, embora os anos das suas inau- gurações sejam diferentes. Primeiro foi o do Porto, depois o de Lisboa e só depois o de Coimbra. AR - Os contextos eram diferentes. Em Coimbra, a Universidade concentrava-se toda na alta da cidade, onde naturalmente não era possível construir-se um estádio. No Porto, as faculdades não dispunham de terrenos que pudessem albergar o seu estádio, só que, com a construção da ponte da Arrábida, ficaram libertos os terrenos de acesso que foi possível afectar ao estádio universitá- rio. A determinação e visão estratégica do Eng. Vasco Pinto de Magalhães, como inspector do Desporto Universitário, no seio da Mocidade Portuguesa, e que acompanhei de perto como sub-ins- pector, apontava para a existência de um estádio em cada uma das cidades de Lisboa, Porto e Coimbra. Aqui, na capital, tivemos a felicidade de ter estes muitos hectares de terreno para construir este belíssimo espaço desportivo que ain- da hoje honra a cidade, como excepcional fonte de saúde... Em Coimbra, teve de se ir para uma das margens do Mondego. Tratou-se de uma construção deveras complicada, com as funda- ções em estacaria, que implicaram elevados custos. Ainda que lon- ge da Universidade, para encurtar distâncias, sonhámos mesmo com a implantação de um teleférico a ligar o pátio da Universidade ao estádio... Mas isso não passou de um sonho... JR - Deixe-me fazer-lhe outra pergunta: o estádio do Porto ocupa 7 hectares, o de Coimbra 14 e o de Lisboa 40. Vim a descobrir que a inauguração do EUL, em 27 de Maio de 1956, foi feita num ano em que estes terrenos ainda eram propriedade municipal. Através do Decreto-Lei nº 41.545/58, o Ministério das Finanças fez a transferência dos 40 hecta- res para o Património do Estado, por 22.000 contos. O que significa que, em 1956, quando é inaugurado o estádio, os terrenos eram municipais. É a seguir à inauguração ou terá

228 Armando Rocha A Minha Opinião sido preparada antes, que é feita aquela transferência? AR - A obra nasceu muito do voluntarismo das pessoas... O Eng. Pinto de Magalhães tinha uma vantagem... a de ser cunhado do Subsecretário de Estado das Obras Públicas... A mobilização de boas vontades foi decisiva para juntar a Câmara Municipal de Lis- boa, o Governo e a Mocidade Portuguesa... Na altura, estavam na ordem do dia as cidades universitárias. Lembro-me de o Co- missário Nacional da Mocidade Portuguesa ter enviado, em visitas de estudo, o Dr. Francisco Alambre dos Santos e o Arq. Norberto Correia, pela Europa fora, para trazerem as novidades no domínio das actividades circum-escolares. Eu próprio me interessei pelo as- sunto quando, no período de 1953 a 1955, acompanhei os Jogos Internacionais da FISU. Assim, o que aqui está é o produto de uma reflexão do que foi feito na altura, noutras paragens. Em àparte, direi que, nesse período, as pistas de atletismo na Alemanha evoluíram para os 500 me- tros... o que nos levou a implantar aqui inicialmente uma pista com essa metragem... Nem se queira saber as dificuldades que tivemos de vencer para arranjar jorra para as pistas! Tudo avançava a grande velocidade para que se chegasse ao fim da obra. Depois houve que regularizar algumas coisas que de- pendiam do Ministério das Finanças, como a troca/afectação de património. Diga-se que foram mesmo criadas a CANIU - Comissão Adminis- trativa das Novas Instalações Universitárias para o Porto e Lisboa e a CAPOCUC - Comissão Administrativa do Plano de Obras da Cidade Universitária de Coimbra, sendo eu, nelas, o delegado do Ministério da Educação. JR - Temos uma dúvida: quem administrou o EUL, numa pri- meira fase, foi o Armando Rocha? AR - Efectivamente, fui o primeiro director do EUL, de 1956 a 1960. JR - Isso significa que em 1956 a administração do estádio foi entregue à Mocidade Portuguesa, através do Armando Rocha... AR - Assim foi, por nomeação do Comissário Nacional da Mocida- de Portuguesa, Prof. Dr. Gonçalves Rodrigues. JR - E foi nomeado como tal... ou na altura não existia essa

229 figura...? AR - Nessa altura, foi criado, em Ordem de Serviço da Mocidade Portuguesa, o lugar de director do EUL. Era um hobby. Era o meu hobby na altura. Não existia qualquer remuneração... JR - Nós temos um problema. É que só conseguimos saber quem foram os directores a partir da publicação da lei or- gânica, ou seja, a partir de 1989, e que foram: o Miranda Ferreira, o Vasco Lynce, o Dr. Lemos, o Prof. Mil-Homens e, a seguir, eu próprio... De antes do Miranda Ferreira não te- mos qualquer testemunho das pessoas que geriram o EUL... Consegue dar-nos uma ajuda? AR - Vamos lá ver... Tudo o que era desporto universitário depen- dia da Mocidade Portuguesa, através da Direcção de Serviços Uni- versitários, a cargo do Prof. Dr. Guilherme Braga da Cruz que foi Reitor da Universidade de Coimbra. Como sabe, em 1962, houve uma crise académica em Lisboa, que se desenrolou essencialmen- te aqui mesmo na cidade universitária. Como director do EUL, eu próprio, fui confrontado com uma manifestação de estudantes no estádio, que consegui desmobilizar pelo facto de ter obtido, do co- mandante da força policial que havia sido destacada, a libertação de 3 estudantes que estavam detidos junto à cantina. Logo após, essa manifestação, veio a redobrar de intensidade com a chegada aqui do Reitor da Universidade Clássica, Prof. Dr. Marcello Cae- tano... mas isso é história que não vem agora ao caso! Pois bem! Uma das consequências dessa crise foi a criação informal, por par- te do Ministro da Educação Nacional, Prof. Dr. Francisco Leite Pin- to, da Inspecção Nacional do Desporto Universitário. Era assunto que tinha sido abordado, pela primeira vez, no II Congresso da Mocidade Portuguesa, em 1958, em que o Eng. Pinto de Maga- lhães e eu próprio apresentámos teses defendendo a independên- cia do desporto universitário da tutela da Mocidade Portuguesa. A nomeação do primeiro Inspector - também como hobby - recaiu na minha pessoa. Acumulei essas funções com as de director do EUL até 1960, altura em que as passei ao Eng. João Lopes Raimundo. Colaborava também na direcção do EUL o Trovão do Rosário que era estudante do INEF e que veio a estar à frente do estádio du- rante vários anos. O agora Prof. Dr. Alberto Trovão do Rosário é a pessoa que lhe

230 Armando Rocha A Minha Opinião poderá dar a pista a seguir. JR - Ele doutorou-se... AR - Com uma tese sobre a Organização do Desporto em Portu- gal. JR - O Dr. Vasco Lynce, quando cá esteve como director do EUL, tinha um coordenador dos serviços técnico-desportivos que era o Trovão do Rosário... sem funções de direcção... A seguir ao Trovão do Rosário, houve comissões... AR - Já antes do 25 de Abril havia uma comissão administrativa do EUL, com um responsável pelas contas... JR - Depois, temos vários nomes, por exemplo, o Nuno Bar- ros... AR - Se a memória me não atraiçoa, o Prof. Nuno Barros não foi director do EUL. Foi, isso sim, secretário-geral do CDUL que tinha a sua sede no estádio. JR - Há aqui uma questão... O Prof. José Esteves, do Estádio Nacional, diz-me que foi director do EUL, antes do 25 de Abril... AR - Talvez... Se foi... só se foi depois de Agosto de 1973, altura em que deixei as funções de director geral dos Desportos. JR - Eu sei que o José Esteves esteve em Macau e foi também director do estádio. Os próprios encarregados o confirmam. Depois houve 2 ou 3 pessoas a seguir... O Trovão do Rosário poderá ajudar-nos... Deixe-me pôr-lhe uma última questão, que tem a ver com o CDUL, e que é sempre uma questão histórica, importante e sensível. Ainda hoje, há muitas pessoas que, quando fa- lam do estádio universitário, fazem uma ligação ao CDUL... Quando vêm aqui, julgam que vêm ao CDUL... Mesmo pes- soas com cargos importantes...Há uma série de conotações em que o CDUL eo EUL quase que se confundem... AR - O CDUL é anterior ao Estádio... No CDUL é que nasceu a ideia... O fundador do CDUL, Eng. Vasco Pinto de Magalhães, para ter o “seu” CDUL a funcionar em pleno, precisava de instalações próprias... Era um sonho que foi acalentado e desenvolvido por toda aquela gente do CDUL, no sentido da construção de um está- dio universitário junto às Faculdades. Assim, quando a ideia forte da construção da cidade universitária aqui toma forma, a ideia

231 lançada pelas gentes do CDUL estava subjacente àquela outra. O próprio Comissário Nacional da M.P., que era Professor na Facul- dade de Letras, foi um grande entusiasta da ideia. Sem receio de desmentido, pode dizer-se que o CDUL está na génese do EUL. JR - O que está a querer dizer é que os centros desportivos universitários estão na génese dos estádios universitários... AR - Exactamente, no que diz respeito a Lisboa e ao Porto (neste caso foi importante a acção do presidente do CDUP, Prof. Dr. Jaime Rios de Sousa). Em Coimbra, a situação era diferente... porque já existia a Associação Académica. Mas foram esses núcleos desporti- vos universitários que, de facto, levaram a ideia em frente... Na altura, sem a existência do CDUL, tenho dúvidas de que se construísse o EUL... tal como aqui está... JR - Deixe-me pôr-lhe uma questão provocatória... Hoje, es- tamos num momento em que a “governance” do EUL está a ser equacionada... E não gostava de terminar esta conver- sa sem lhe perguntar: o Armando Rocha, que acompanhou e tem acompanhado todo este percurso de 50 anos, o que acha que pode ajudar a manter este ideal do EUL, como equipamento desportivo único? O que pode ajudar a man- ter esta ideia com enorme êxito? AR - Quanto a mim, este estádio tem tido um grande sucesso por- que se tem mantido fora da alçada da autoridade universitária... que não tem, naturalmente, vocação para gerir este tipo de equi- pamentos... É certo que o EUL não deve estar afastado das Univer- sidades, mas a sua gestão deve ser independente das autoridades académicas. Numa sociedade aberta como é a nossa, a gestão deve caber a pessoas que vivem o desporto... que gostam do des- porto... De contrário, passará a ser mais uma peça da infernal e muitas vezes improdutiva máquina burocrática que vem afogando os cidadãos... no caso os desportistas... que a procurem...

Lisboa, 25 de Março de 2006 Entrevista feita pelo Dr. João Roquete, director do EUL, à data

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Intervenções Públicas

235 Desporto Universitário Resenha histórica

Comecei a dar o meu contributo ao desporto universitário quando, em 1945, entrei na Universidade de Coimbra, o mesmo é dizer na Associação Académica de Coimbra. Ambas recordo com saudade e com gratidão pelo muito que deram de formação e espírito de solidariedade. Nunca recusei o meu modesto contributo em acções de valoriza- ção do desporto universitário. E já esqueci mesmo a ofensa que em 1974 me foi feita pelo Governo português quando, pressio- nado por uns tantos extremistas, mandou eliminar-me dos corpos directivos da Federação Internacional do Desporto Universitário (FISU) para que havia sido eleito democraticamente, pelo conjunto de algumas dezenas de delegações dos países filiados nessa fede- ração. Integrei os corpos sociais da FISU, de 1955 a 1974. Desde essa data, não mais houve um português no executivo da FISU... Não era agora que recusava o amável convite que a Federação Académica do Desporto Universitário (FADU) me formulou para falar sobre o passado do desporto universitário. Aqui estou, pois, para dar o meu testemunho independente, como sempre o fiz, so- bre tema tão do meu agrado. Não prometo, porém, ficar apenas pela história, dentro dos 15 minutos que me foram reservados, já que aproveito para focar alguns temas apenas pela rama, natu- ralmente. Desde que existem universidades em Portugal sempre se praticou desporto. Eram poucos os praticantes? Eram muitos? O que se pode afirmar é que o desporto praticado o era a título individual, não organizado. Haverá, contudo, que referir os casos da AAC e das Associações de Estudantes do I.S. Técnico e do I. S. Agronomia como sendo o embrião do desporto universitário organizado. A Mocidade Portuguesa, nos anos 40, começou a organizar os Jo- gos Desportivos Universitários com estudantes das Universidades

236 Armando Rocha A Minha Opinião de Coimbra, Lisboa e Porto, os quais não tinham que ser filiados naquela Organização. Participei neles em 1946, 1950 e 1951. Era então Inspector do Desporto Universitário o General Jorge Oom, a que sucedeu o Eng. Vasco Pinto de Magalhães, ambos falecidos recentemente. Em Coimbra, a AAC, com nome sonante nos mundos do futebol e do basquetebol, não se ocupava do desporto inter-Faculdades. Em 1952, o Prof. Guilherme Braga da Cruz desafiou-me para, no âmbito do Centro Universitário da MP, organizar os 1os Torneios Inter-Faculdades, o que foi levado a cabo com bastante interesse por parte dos estudantes. Entretanto, o CDUP (1949) e o CDUL (1952) davam os primeiros passos na organização do desporto nas Universidades do Porto e de Lisboa, com uma forte vertente federada. Por outro lado, o movimento académico lisboeta, com a criação da R.I.A., começou a pôr em causa a organização do desporto uni- versitário sob a égide da MP. No II Congresso Nacional da MP, em 1956, as posições assumidas pelo Eng. Vasco Pinto de Magalhães e por mim próprio agitaram as águas a tal ponto que levaram o Ministro da Educação, Prof. Leite Pinto, a criar, em 1957, a Inspec- ção Nacional do Desporto Universitário para a qual me convidou e que aceitei com duas condições: despachar com o próprio Ministro e exercer o cargo graciosamente, em acumulação com as minhas funções profissionais no Ministério das Comunicações. Já como INDU preparei, com uma equipa de que faziam parte, entre outros, o ex-presidente da AEIST, Eng. Prostes da Fonseca, e o Prof. Eduardo Trigo, o I plano de Fomento do Desporto Universi- tário. Documento simples mas objectivo e realista e que foi muito bem aceite pelo Ministro Galvão Telles. Foi esse Plano o embrião dos futuros Planos de Fomento do Desporto Nacional elaborados ao tempo em que exerci o cargo de director geral dos Desportos (1963-73). A construção de infra-estruturas desportivas foi uma preocupação grande da equipa que tinha responsabilidades no DU e que teve eco, em especial, junto do Ministro das Obras Públicas, Arantes e Oliveira. Eu próprio representei o Ministro da Educação na CANIU e na CA- POCUC em que dediquei muitas horas de reflexão aos projectos dos Estádios Universitários de Lisboa e de Coimbra e da nova sede da AAC.

237 Os referidos estádios bem como o do Porto, para além do pavilhão da Tapada da Ajuda, a piscina do IST e os Centros de Medicina Desportiva são marcos que não esqueço pela satisfação que me proporcionaram. Sem essas instalações, o DU seria o que é hoje? Foi entretanto promulgada, nos anos ’60, legislação que criou um lugar de professor de educação física nas Universidades do Porto e de Coimbra. É que, sem agentes com formação no campo da educação física, não se pode pensar a sério em desporto, como forma de cultura. Na nossa terra, o desporto é, em grande medida, considerado como um simples divertimento do povo. Divertimento que, tantas vezes, toca as raias da alienação! Como se vê... ontem como hoje. Só uma mudança radical de mentalidade poderia modificar essa maneira de estar no desporto. Daí que tenha defendido a obriga- toriedade da educação física na Universidade, já em 1958. Conse- guiu-se apenas que, nas Reformas das Faculdades de Engenharia e de Medicina, de 1960, se tenha consagrado o princípio de se libertar uma tarde semanal para o desporto, a insistência do Prof. Guilherme Braga da Cruz. E advoguei, também, em 1960, a cria- ção do seguro desportivo, em parte substituído pela assistência médica desportiva gratuita que era facultada aos praticantes uni- versitários. Com base nos campeonatos regionais, organizados em Lisboa pela COCRUL, passaram a realizar-se os CNU – um deles em Lourenço Marques, em 1968 (o Reitor Prof. Veiga Simão tinha sido atleta da AAC) – onde se revelaram alguns excelentes praticantes. E a AAC, o CDUL e o CDUP marcavam posição de relevo em algumas Federações Nacionais e em contactos internacionais, como ainda hoje sucede. E das provas nacionais, em 1955, deu-se o salto para o palco in- ternacional. S. Sebastian (1955), Paris (1957), Turim (1959), So- fia (1961), Porto Alegre (1963), Budapeste (1965), Tóquio (1967) (Lisboa’69 viu cancelada a Universíada), Turim e Sestrière (1970) e Moscovo (1973) foram Universíadas em que atletas portugue- ses participaram, tendo o Prof. Fernando Almada conquistado a medalha de bronze, em judo, em Tóquio. Outras provas houve – como o campeonato do mundo de Judo (Lisboa’68) que Portugal

238 Armando Rocha A Minha Opinião até organizou. Sempre considerei o amadorismo como um estado de espírito em que a noção do lucro está arredada. Tenho a consciência de que pensar assim é considerado errado pela nova vaga do dirigismo desportivo. O movimento olímpico é o exemplo acabado da hi- pocrisia desportiva. Este comentário é feito apenas para significar que, apreciando embora o desporto espectáculo e os seus artistas, como homens que são, nunca me deixei inebriar pelos resultados que são fruto de meios de pagamento, no âmbito do desporto universitário. Alguém escreveu um dia: “homens forte, homens sadios, sem dú- vida por patriotismo, por valorização económica, por defesa or- çamental, mas homens saudáveis com juízo claro, carácter forte, consciência recta”. Não sei se os presentes alguma vez se interrogaram como eu o fiz: não será começar pelo telhado a construção de um edifício, dedicando esforços e dinheiro ao DU? E a resposta que dei a mim mesmo foi esta: quer se queira quer não, os futuros dirigentes da Nação – em sentido amplo – são os universitários de hoje. Serão eles que, amanhã, terão as alavancas do poder. Serão, pois, eles, que poderão facilitar/criar as condições para que o desporto seja visto como uma forma essencial de cultura que une os homens, ricos, remediados e pobres. Todos eles, misturados, a praticar uma modalidade desportiva, têm de obedecer às mesmas regras. Em que outras actividades funciona de facto esse princípio da igualda- de perante a lei? Conscientemente, dediquei todas, mas todas, as minhas horas de lazer à causa desportiva universitária. E acreditei em que uma nova geração dirigente poderia dar a volta ao problema. Temos um Primeiro-Ministro que foi atleta do CDUL. Como ele, muitos outros atletas e dirigentes da AAC, do CDUL e do CDUP foram, de há 15 anos para cá, e ainda são, Ministros, Secretários de Estado, Directores Gerais e Empresários de sucesso. Deixo a Vós a resposta à pergunta: fizeram eles o que deles se esperava em termos de Desporto? Oxalá este Congresso possa contribuir para alertar as consciências de quem tem as rédeas do poder. Tal como em1963 continuo a pensar que sem desporto escolar não

239 há desporto verdadeiramente nacional. Esse é para mim, o cerne da questão. E, enquanto se não dotarem todas as escolas secundá- rias de instalações adequadas – refiro-me em especial a pavilhões gimnodesportivos – e de professores de campo (não de gabinete), uma acusação forte impende sobre quem tem poder de decisão e decide quer obras necessárias sim, mas sumptuárias para quem é pobre (caso da nave do Estádio Nacional que custará vários mi- lhões de contos1) quer “bolsas” a acrescer a prémios chorudos, ainda que merecidos. E mais não digo. Direi, isso sim, que, nesta minha caminhada no DU, para além de muito ter aprendido com Jorge Oom e Vasco Pinto de Magalhães, fui sempre acompanhado por uma pleiade de rapazes formidáveis em competência e em dedicação: Prostes da Fonseca, Eduardo Tri- go, Vieira de Carvalho, Borges de Araújo, Sá Lima, Paulo Jorge, foram alguns desses muitos. Termino com uma sugestão. A de que se preste justiça póstuma ao muito que o Eng. Vasco Pinto de Magalhães2 fez pela causa do Desporto Universitário em Portugal. E que homenagem mais justa do que a de dar o seu nome ao Estádio Universitário de Lisboa? Disse.

Esta palestra foi proferida no Congresso da Federação Académica do Desporto Universitário realizado na Universidade de Trás-os- Montes e Alto Douro – Vila Real – 24/11/1990

1 O Ministro Couto dos Santos deu-me conhecimento, pouco tempo depois de ter proferido estas palavras, de que o PM Cavaco Silva resolvera abandonar a ideia da construção da nave, tendo optado antes pela construção no local de uma piscina olímpica.

2 A homenagem proposta veio a ter lugar, 14 anos mais tarde, em 05/10/2004, sob a presidência da Ministra da Ciência e Ensino Superior, Profª Graça Carvalho e com a presença do ex.Ministro Pedro Lynce que esteve presente no Congresso de 1990 na qualidade de Director Geral do Ensino Superior.

240 Armando Rocha A Minha Opinião

Desporto em Portugal. Que futuro?

O amigo Dr. Carlos Gonçalves desafiou-me a trazer aqui alguma da minha vivência no campo desportivo que começou no Liceu de Aveiro, com o falecido Prof. João Infante, e seguiu seu caminho na Associação Académica de Coimbra e depois na organização do Desporto Universitário pela mão do saudoso Prof. Guilherme Braga da Cruz. Desporto Universitário esse que me facultou uma rede de conhecimentos fabulosa. Depois, foi a fase mais intensa e mais gratificante que pude viver, levado pelo Prof. Inocêncio Gal- vão Telles, com quem muito aprendi. A minha falta de paciência, nesta idade avançada em que me en- contro, já não dá para grandes pesquisas. Neste velhinho Palácio da Independência passei excelentes horas de convívio com esclarecidos Dirigentes da Mocidade Portuguesa. Mas agora, neste regresso, tenho de pedir perdão pelo facto de certamente não saber corresponder já àquilo que minimamente me é exigido. Fica-me, a mim, porém, a consolação de rever pessoas ilustres e amigas. Muito obrigado pela Vossa presença. Para se falar de Desporto não se pode deixar de começar por dar umas pinceladas sobre o olimpismo. E, desde logo, recordo com saudade o Eng. Francisco Nobre Guedes que muito me ensinou sobre o mesmo. As raízes do olimpismo - Está a começar uma nova Olimpíada – período de 4 anos compreendido entre os Jogos Olímpicos. Abor- demos pois essa matéria, terminados há pouco tempo os Jogos de Atenas. Nas sociedades mais antigas, a competição assentava na ideia de domínio, de luta selvagem. Mais tarde, na Grécia antiga, o espírito competitivo passou a assen- tar na lealdade e no respeito por regras bem precisas. E aí nasceu

241 o Olimpismo na sua fase inicial. Foi num contexto de amadorismo elitista que o desporto moderno conheceu o seu desenvolvimento, em especial na América do Norte e na Europa industrializada. Foi então que o Barão Pierre de Coubertin, em 1894, estabeleceu um novo quadro baseado na ética, assente em valores do jogo e do risco, no exemplo digno e no respeito absoluto pelas regras. As regras são iguais para todos: quer sejam ricos quer sejam pobres, operários ou doutores... O Olimpismo não é mais do que um projecto acima de tudo edu- cativo, apelando à virilidade, à emancipação dos jovens, à própria higiene e saúde pública. Os segundos Jogos Olímpicos, da era moderna, fizeram salientar, em termos de imagem corporal, a vitória do Homem criador e mestre dele próprio sobre o Homem indivíduo. A educação e o desporto estão indissociavelmente ligados desde o princípio do século XX. Como? Em primeiro lugar como escola de cidadania, quer com a adapta- ção dos jovens ao sistema político-cultural dominante (fim do sécu- lo XIX), quer dando aos jovens os conhecimentos e as capacidades de compreensão que lhes permitam emancipar-se do sistema ou mesmo de o transformar a prazo. A primeira guerra mundial marcou o fim de uma época tendo o desporto passado a ser, depois de 1925, uma escola de não dis- criminação. Espalhou-se por todo o mundo e passou a ter uma dimensão económica de relevância com o advento do profissio- nalismo. Os valores humanistas e educativos consagrados pelo olimpismo foram-se adaptando às sucessivas alterações das próprias socie- dades. E agora? - Nos finais do século XX, essas alterações foram tão ra- dicais no domínio do conhecimento e das tecnologias que se pode dizer que se passou à escola dos decisores em que se vive num mundo sectário, identitário em que os grupos sociais, desprovidos de referências sólidas e de valores, se sentem marginalizados e procuram cerrar fileiras à volta da sua “corporação”. Hoje em dia, vemo-nos confrontados com a escola dos media gra- ças ao poder da televisão, dos telefones celulares e da internet que ultrapassaram o quadro da escola tradicional e a família, ver-

242 Armando Rocha A Minha Opinião dadeira célula de qualquer sociedade digna. A escola dos media transforma os desportistas de elite em heróis e referências para a juventude. Do olimpismo de Coubertin ficou a palavra. A realidade é esta: o amadorismo deu lugar ao profissionalismo desenfreado. Mas uma coisa é certa: ainda há muita gente que pratica o des- porto pelo desporto. A escola tradicional e a Universidade devem continuar a fomentar a prática desportiva entre os estudantes, sem se deixarem abater pelos fogachos de uma medalha, ainda que muito apetecida e bem vinda. A actividade desportiva pura, aos poucos, foi evoluindo num sen- tido único passando a ter foros de indústria (um negócio afinal...) que movimenta somas astronómicas (com corrupção à mistura) com a entrada da Televisão em força. Os contratos publicitários que envolvem os Jogos Olímpicos e os Campeonatos Mundiais, Europeus e de Clubes de futebol e de atletismo são negociados por especialistas de alto nível. Daí resultam espectáculos que são vistos por milhões e milhões de tele-espectadores nos cinco continentes. E ainda bem. Pergunta-se: e para onde vai todo esse dinheiro? Até se constata que os dirigentes desportivos da alta roda mundial vivem desafogadamente, deslocam-se em classe executiva, são hospedados em hotéis topo de gama e recebem pocket money di- ário de fazer inveja a um quadro superior da nossa administração. Os artistas, treinadores incluídos, são pagos principescamente. Fa- zem autênticas fortunas em pouco tempo. Nem que para isso se deixem tentar pelo falseamento de resultados através do doping. Mas, como se trata de uma profissão de desgaste rápido, logo o governo lhes atribui benefícios fiscais de que outros bem necessi- tados não usufruem. Aos clubes, que são o suporte essencial do fenómeno desportivo, a política é muito sensível e perdoa dívidas, até inventa toto-negó- cios que não são correspondidos por aqueles. E, quando o Estado tem o arrojo de mandar cobrar as dívidas, o clamor que se levanta nos meios de comunicação social faz temer o pior para a integrida- de física do político que se atreveu a suscitar a questão. Há estudiosos que dizem que os clubes portugueses de futebol de

243 nomeada – que são os que nos interessam – não cumprem as suas obrigações fiscais e nem sempre têm os salários em dia. Salários que são uma afronta para quem trabalha no dia a dia no duro, ou mesmo com a mente. E sabe-se que bastantes desses salários são pagos a estrangeiros muitos deles de duvidosa valia técnica. Mas, contra isso nada se pode fazer pois então cairia o Carmo e a Trindade. E até parece que no futebol nacional o mercado não funciona na medida em que não se vêem clubes a encerrar portas como sucede com as empresas que não vingam. O problema vai sendo adiado porque há sempre alguém que, mesmo sabendo que o Clube não tem viabilidade económica, sacrifica tudo a uma eventual efémera notoriedade que passa pela aparição nos écrans da televisão e nas páginas dos jornais. Mas que também pode levar à barra dos tribunais. Não devo porém deixar de referir o quanto me orgulha o facto de termos jogadores de primeiro plano, não só no futebol mas tam- bém no hóquei em patins, no basquetebol e no rugby, para já não falar do Mourinho e outros colegas como Humberto Coelho, por esse mundo fora, a alimentar a nossa auto estima elevando bem alto o nome de Portugal! Esses emigrantes de luxo formaram-se aqui e constituem alimento para muitos outros jovens seguirem as suas pisadas. É como se fosse mercadoria a exportar... o que naturalmente interessa à balança de pagamentos... Bem gostaria de ter um outro discurso, mas a minha consciência não deixa. Já cheguei a ter uma intervenção pessoal que levou um Governo a mandar parar um projecto que estava em fase de lançamento, em 1990 e em que se tinham gasto verbas da ordem dos 2 milhões de contos... O governo anunciou que iria mandar construir uma nave desporti- va no Estádio Nacional que custaria 13 milhões de contos... Elevei a minha voz contra esse despudor argumentando com o facto de o Estado dizer que não dispunha de verbas para dotar todas as es- colas de Portugal de modestos pavilhões gimnodesportivos... Então se era assim como é que esse mesmo Estado se dispunha a gastar os 13 milhões numa única instalação? Alguém fez chegar este meu protesto, desenvolvido num congres-

244 Armando Rocha A Minha Opinião so do Desporto Universitário que teve lugar na UTAD, em Vila Real, ao Chefe do Governo que achou que eu tinha razão. Só que a simples anulação da empreitada, não evitou que os referidos 2 milhões de contos entretanto despendidos, nos preliminares, tives- sem levado uns tantos à barra do tribunal!... Que absolveu alguns mas condenou outros... Se me perguntam: mas é ou não essencial haver futebol? Basque- tebol? Andebol? Rugby? etc.? A minha resposta só pode ser uma: SIM, sem dúvida, mas não a qualquer preço. Aceita-se que os clubes cometam as loucuras que entenderem... Só se não deve aceitar é que o façam sem regras e sem equidade, antes com benefícios que podem, em última análise, prejudicar terceiros.

Algumas histórias passadas Para amenizar um pouco esta intervenção, vou contar algumas passagens da minha vida desportiva que julgo de interesse trans- mitir, e de que destaco as relativas a: 1. Final da Taça de Portugal 1969; 2. Criação da Corporação dos Desportos; 3. Ministro – só se anuncia a inauguração, não a intenção; 4. Eusébio – património nacional? 5. Greve dos árbitros futebol em Maio de 1974; 6. Ministro, Rosa Mota e CNID.

Finalmente, Que futuro? - O Estado não deve ser interventivo no desporto associativo, mas não pode deixar de ter uma atitude de vigilância. Porém, deve caber-lhe intervir quando os superiores interesses nacionais o imponham. Não compreendo mesmo como não foi já autonomizado o sector da arbitragem que tanta polémica tem dado desde que, depois da revolução dos cravos, o integraram nas federações. Se se quiser falar seriamente, há que centrar na escola o desen- volvimento do desporto nacional. Lá “residem” largas centenas de milhares de potenciais desportistas. Sem querer ofuscar minima- mente o trabalho dos clubes desportivos na formação de atletas, deve caber à escola o trabalho de base nesse como noutros domí-

245 nios da educação. Mais instalações desportivas nas escolas, mais agentes de ensino no terreno, mesmo que se tenham de sacrificar as legítimas ambições quanto a mestrados e doutoramentos, são metas a que só o Estado e o Poder Local podem dar resposta. Para isso, há que saber o que se quer (o que não é tão fácil as- sim...), de seguida estabelecer prioridades, calendarizá-las e exe- cutá-las sem intuitos puramente eleitorais. Os recursos financeiros são naturalmente escassos, mas com eles pode fazer-se muita coisa, desde que se afaste o supérfluo e o luxo. Mas até parece que somos um país rico, a avaliar, entre ou- tras iniciativas, pela construção dos 10 bonitos e funcionais es- tádios de futebol para o Euro 2004, onde o espectador goza de comodidade nunca antes vista. Portugal merece caminhar no sentido do progresso e bem estar da sua juventude!

Palestra proferida em 20/01/2005 na SOCIEDADE HISTÓRICA DA INDEPENDÊNCIA DA PORTUGAL Publicada no jornal “Soberania do Povo” de 28/01/2005

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Rua Alberto Martins, em Coimbra

A Câmara Municipal de Coimbra deliberou perpetuar a figura de um dos seus concidadãos ilustres, dando o nome de Alberto Mar- tins a uma rua da cidade. E encarregou-me de dizer umas palavras nesta simples, mas muito significativa cerimónia. Obrigado pela honra que esse convite representa para mim, um velho académi- co coimbrão que nunca voltou costas à cidade onde estudou e se preparou para a vida! Conheci o Alberto da Cunha Martins nos finais da década de ‘40, quando ele ingressou na equipa de basquetebol da Associação Académica de Coimbra e começou a dar nas vistas, ainda como júnior. Atleta com habilidade e físico adequado para a modalidade, no velho campo de Santa Cruz, ainda em terra batida e com balne- ários sem água quente…, ele era dos mais assíduos aos treinos. E os treinadores com quem trabalhou, primeiro com o Alberto Va- lejo – para quem a Académica era tudo na vida – e depois com o Professor José Esteves, souberam bem aproveitar as suas exce- lentes capacidades para o levarem até à equipa principal onde se firmou por mérito próprio. Com a equipa, foi jogar a Madrid, em 1950, a convite da Frente de Juventudes, numa deslocação feita em autocarro dos Oliveiras que foi custeado pelos acompanhantes, adeptos da equipa. Lembro- me dos Drs. Oliveira Martins, José Simões e José Barata. Ele foi um dos grandes animadores dessa excursão à capital espa- nhola, sempre com o microfone do autocarro na mão… a irradiar simpatia e boa disposição… Sucede, porém, que chegados a Madrid, as saudades de sua Mãe irromperam noite alta no hotel e vai daí ele querer regressar. É que ele estava profundamente arreigado à sua cidade, não apreciando dela estar longe. Continuou a treinar como atleta, com o maior

247 interesse e empenho, mas sem nunca descurar os estudos que o levaram mesmo à respeitada carreira do professorado primário, onde exerceu o seu magistério com grande dignidade e profissio- nalismo. Começou, então, a estudar o basquetebol, com muitas leituras es- pecializadas e frequentando cursos de actualização. Assim se fez um treinador competente e respeitado quer pelos seus muitos pu- pilos quer pelos dirigentes regionais e nacionais do basquetebol. Nessa qualidade, levou a sua e nossa Académica a conquistar, com todo o mérito, campeonatos nacionais absolutos de basque- tebol e Taças de Portugal nos anos ’50 e ‘60. Foi um treinador da Académica, por quem passaram, aliás, suces- sivas gerações que, ainda hoje, recordam com saudade as quali- dades humanas do grande pedagogo que foi o Alberto Martins. Treinou também o Olivais, o Sport e o Sangalhos. Já depois de abandonar Coimbra por razões profissionais, tive oportunidade de o acompanhar especialmente, quando se deslo- cava ao Ultramar em que ele fazia questão de me visitar na Direc- ção Geral dos Desportos, com a condição de eu o acompanhar até ao avião que o levava a África. Tal como seu irmão Augusto, também ele era uma memória viva das coisas desportivas. Não havia equipa antiga que ele não sou- besse relembrar; não havia resultado de jogo de que ele se não lembrasse… Os seus escritos na imprensa regional e as suas intervenções na rádio eram muito apreciadas pelos seus inúmeros leitores e ouvin- tes que lhe reconheciam, também aí, grande capacidade de co- municação. Outra faceta não menos digna de destaque era a sua vasta cultura geral e a sua memória poética. Era uma delícia ouvi-lo recitar poe- sia, da melhor. Também ele foi tocado, na verdade, por essa arte tão própria desta cidade de Coimbra, que teve enormes poetas que a imortalizaram para todo o sempre!... Ao longo da vida, temos de reconhecer que a saúde lhe foi ma- drasta em demasia, mas ele nunca desistiu de lutar, muitas das vezes com um ou outro poema a balbuciar-lhe nos lábios... Até por isso, constitui, em certa medida, uma lição para os seus compa- nheiros que ainda cá estão dos quais alguns deles o acompanham

248 Armando Rocha A Minha Opinião nesta justa e atempada homenagem. Homenagem que é prestada a uma figura que se impôs à consideração da sociedade conimbri- cense, por boas razões. Duvido de que, aqui em Coimbra, alguém não soubesse quem era o Alberto Martins. Por todas as razões, a Câmara lhe outorgara já a Medalha de Ouro da Cidade e o Go- verno a Medalha de Mérito Desportivo. Se havia quem adorasse a Académica, Alberto Martins era um de- les. Se há homens bons ao cimo da terra, Alberto Martins era um deles. Se há conimbricense que merece ser homenageado por esta Coim- bra que todos amamos, é Alberto Martins. Como amigo de longa data do Alberto, agradeço à Câmara desta cidade estar aqui, a comungar num mesmo sentimento de BEM HAJA, com todos os seus amigos. Esta Rua será, de ora avante, local de peregrinação para todos nós.

Palavras proferidas na cerimónia de inauguração da Rua Alberto Martins, em Coimbra, em 09/07/2005.

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