o
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Revista Brasileira de Ensino de Fsica, vol. 18, n 3, setembro, 1996 181
A Cr^onica do Calculo:
II. A Ep o ca de Newton e Leibniz
Jose Maria Filardo Bassalo
Departamento de Fsica da UniversidadeFederal do Para
66075-900, Belem, Para, Brasil
Trabalho recebido em 30 de outubro de 1995
Nesta Cr^onica vamos mostrar como se desenvolveu o que ho je conhecemos como Calculo
Diferencial e Integral. Nesta segunda parte, estudaremos o desenvolvimento desse Calculo
devido, principalmente, aos trabalhos de Newton e Leibniz.
Abstract
In this Chronicle weshowhowwas developp ed what to day means Integral and Di e-
rential Calculus. In this second part, we study the development of this Calculus due,
mainly, to the Newton's and Leibniz's works.
1. Intro duc~ao ritmos. Assim, entusiasmado com a descob erta, ele cal-
culou diversos logaritmos das areas sob uma hiperb ole
1
Na primeira parte da Cr^onica, vimos como se de-
equilatera ate 55 casas decimais. Na primavera de 1665,
senvolveu o Calculo Diferencial e Integral desde a
Newton demonstrou que o problema das tangentes (di-
Antiguidade ate os trabalhos que antecederam aos de
ferenciac~ao, na linguagem atual) e o das quadraturas
2
Newton e Leibniz. Nesta segunda parte, estudaremos
(integrac~ao, tambem na linguagem atual) apresentavam
os trabalhos de Newton e de Leibniz e de seus contem-
entre si uma relac~ao inversa, relac~ao que constitui o Te-
p or^aneos.
orema Fundamental do Calculo.
As principais contribuic~oes do fsico e matematico
ingl^es Sir Isaac Newton (1642-1727) para o desenvolvi-
Na primavera-ver~ao de 1665, Newton descobriu um
mento do Calculo,aconteceram no p ero do entre 1664
novo asp ecto para tratar o problema das tangentes e
e 1676, quando estudou os principais livros escritos, ate
quadraturas. Ateent~ao, conforme vimos, ele havia con-
3
ent~ao, sobre Matematica. Vejamos essas contribuic~oes.
siderado as areas como somas estaticas de in nitesi-
Newton havia aprendido, no livro de Wallis, mais, no mesmo estilo de Wallis. No entanto, naquela
como este realizavaocalculo de areas sob curvas, o casi~ao, passou a tratar as areas cinematicamente,
considerando-as como soma estatica de in nitesimais. como se fossem varridas p or uma linha movel. No ou-
Para esse calculo, Wallis utilizava-se de induc~oes, inter- tono de 1665, estendeu essa ab ordagem cinematica a
p olac~oes, aproximac~oes e logaritmos, trabalhando no gerac~ao de curvas, e tratou-as como o lugar geometrico
4
domnio do in nito, isto e, com series in nitas. Ent~ao, (lo cus)deumponto que se deslo cava em condic~oes
no inverno de 1664-1665, estendeu o meto do de Wallis determinadas. Com essa ideia de movimento, passou a
5
usando expans~oes binomiais em termos dessas series. considerar suas variaveis como geradas p or movimentos
Com a expans~ao (teorema) binomial, Newton obser- contnuos de p ontos, linhas e planos, o que lhe p ermitiu
vou que p o deria encontrar a area abaixo de pratica- derivar o termo uxional esuasvariantes. Assim, a
mente qualquer curvaalgebrica, e expressa-la em loga- essas variaveis (p or exemplo, x e y) denominou-as de
Este artigo e em homenagem ao meu amigo PAULO RENATO BENTIVEGNA, medico paulista, estudioso e entusiasta do Calculo.
182 J. M. Filardo Bassalo
uentes eas suas velo cidades chamou-as de ux~oes, geral e inverso ao utilizado para se tracar tangentes a
e denotadas p or p e q, resp ectivamente. Ainda nesse curvas. Com efeito, Newton demonstrou que aarea z
m + n
m
n
n n
ax estudo baseado no movimento, Newton a rmou que \as e dada p or .Para sob a curvay=ax
m + n
linhas in nitamente p equenas" descritas p elos corp os a fazer a demonstrac~ao, Newton considerou um acrescimo
cada momento eram as velo cidades com que eles as des- in nitesimal da variavel x (denominado p or ele de mo-
creviam, e que a raz~ao entre as velo cidades de y e x em mento de x e denotado p or o), com o corresp ondente
12
qualquer p onto de uma curva, de nia a tangente nesse aumento oy (momento da area) para a area z. Com
6
ponto. isso, obteveaarea aumentada na forma: z + oy=
m + n
n
n
a(x + o) . Em seguida, aplicou a expans~ao
Ometo do baseado no movimento foi tambem ex-
m + n
binomial ao lado direito dessa equac~ao, cancelou termos
plorado p or Newton em tr^es outras o casi~oes: 13 de No-
semelhantes, dividiu tudo p or o, desprezou termos que
vembro de 1665, 14 e 16 de Maio de 1666. Por m,
m
13
n
ainda continham o, e obteve nalmentequey=ax .
em Outubro de 1666, em um manuscrito intitulado To
Resolve Problems by Motion (ParaResolver Problemas
Uma exp osic~ao mais completa sobre o meto do do
pelo Movimento), Newton apresentou a exp osic~ao de
calculo de tangentes e de quadraturas (p or intermedio
7
seu meto do das ux~oes, emb ora com uma notac~ao
de uentes e ux~oes), desenvolvido entre 1665 e 1666,
provisoria e ainda complicada.
foi apresentada p or Newton no manuscrito Tractatus de
Methodis Serierum et Fluxionum (Tratado dos Metodos A partir do nal de 1666, Newton afastou-se um
das Series e Flux~oes), manuscrito iniciado no inverno p ouco da matematica e passou a se dedicar ao estudo
14
de 1670-1671 e que, contudo, nunca foi concludo. do movimento dos corp os, da luz e das cores, temas
Ainda nesse manuscrito, Newton apresentou um grande que jahavia questionado (juntamente com alguns te-
numero de aplicac~oes das ux~oes, tais como, diferen- mas matematicos), enquanto aluno do Trinity College
8
ciac~oes de func~oes implcitas, calculos de tangentes, de da Universidade de Cambridge, e que os havia regis-
maximos e mnimos, de p ontos de in ex~ao, e de curva- trado em um caderno de ap ontamentos, com o ttulo de
turas de curvas, chegando, nesteultimo caso, a calcular Quaestiones quaedam Philosophicae, escrito, provavel-
15 9
corretamente os seus raios de curvatura, dado p or (na mente, p or volta de 1664.
3
2
2
(1 +y _ )
16
. notac~ao de ho je): R =
A publicac~ao dos livros do matematico esco c^es Ja-
y
mes Gregory (1638-1675), De VeraCirculi et Hyper-
Quando o matematico alem~ao Gottfried Wilhelm
bolae Quadratura, em 1667, Geometriae Pars Univer-
Leibniz (1646-1716) comecou a publicar seu trabalho
salis e Exercitationes Geometricae,em1668,edoli-
sobre o Calculo Diferencial, em Outubro de 1684, no
vro Logarithmotechnia do matematico alem~ao Nikolaus
Acta Eruditorum Lipsiensium (Ata dos Eruditos de
Mercator (Kau mann) (1620-1687), tambem em 1668,
Lpsia (Leipzig)), Newton considerou a hipotese de
fez com que Newton voltasse novamente sua atenc~ao
tambem publicar seus trabalhos sobre Matematica. As-
para a Matematica. Nesses livros, hao calculo de qua-
sim, em meados de 1691, resolveu dar continuidade
10
draturas p or intermedio de representac~oes em serie.
aummanuscrito que comecara em 1676, intitulado
Como, anteriormente, Newton jahavia obtido quadra-
De Quadratura Curvarum (SobreaQuadraturadas
17
turas, usando um meto do que desenvolvera e envol-
Curvas), escrevendo ent~ao um novomanuscrito, no
vendo, tambem, representac~oes em series, conforme vi-
qual apresentou um conjunto de problemas resolvidos
mos acima, resolveu ent~ao exp or esse meto do no ma-
pelo meto do das ux~oes, problemas semelhantes aos
nuscrito intitulado De Analysi per Aequationes Numero
que Leibniz havia resolvido com o seu proprio meto do.
Terminorum In nitas (SobreaAnalise de Equac~oes
Alem disso, considerou um sistema de notac~oes como
11
com Numer o Ilimitado de Termos), escrito em 1669.
alternativa ao apresentado p or Leibniz. Portanto, foi
no De Quadratura que adotou, em de nitivo, a notac~ao Ometo do usado p or Newton e descrito no De Anal-
x_ para representar a ux~ao de x, assim como a notac~ao ysi, consistia em obter quadraturas p or um pro cesso
o
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tentativa de de nir limite de uma func~ao. Por outro x' para representar o uente cuja ux~ao e x,alem de
lado, no Lema VI I, ele demonstrou que a secante a um exp erimentar o Q (de quadratura) como substituto
R
arco transforma-se em uma tangente, quando se usam de usado p or Leibniz. E mais ainda, dobrando os
20
\asultimas raz~oes". pontos (.) e as linhas ('), Newton representou, resp ec-
tivamente, ux~oes de ux~oes e uentes de uentes.
Muito emb ora Newton ha ja utilizado o meto do das
raz~oes na demonstrac~ao de alguns Lemas do Livro I, Ainda no De Quadratura, Newton abandonou a
conforme registramos acima, somente no Livro I I do ideia de acrescimos in nitesimais e explicou o meto do
Principia, apresentou os algortimos de seu meto do de das ux~oes em termos de raz~oes: primeira raz~ao
21
calculo. Por exemplo, no Lema I I do Livro, escreveu: de quantidade nita nascente e ultima raz~ao de
- \O momento de qualquer genitum e igual aos momen- quantidade n ma.Vejamos como Newton intro du-
tos de cada um dos lados geradores, multiplicado p elos ziu esses conceitos, ao calcular, p or exemplo, a ux~ao
n 18
ndices das p ot^encias desses lados, e p or seus co e cien- da func~aoy=x . Assim, para encontrar a ux~ao de
tes continuamente". Para demonstrar esse Lema, New- y, Newton deixou x \ uir", isto e, tornar-se x + o e,
22 n
ton primeiro de niu o genitum e seu momento. Em p ortanto, x tornar-se-ia:
2
n n
2 n 2 n n n 1
seguida, designando p or a, b, c os momentos resp ecti- o x + ... . New- (x + o) =x +nox +
2
vos de A, B, C, calculou o momento de alguns genita. ton observou ent~ao que os aumentos de x e y, a sab er,
2
n n
2 n 2 3 4 2 n 1
o x + ... estavam relaciona- Por exemplo, para o genitum A B C ,obteveose- oenox +
2
2
n n
n 1 n 2 2 4 2 3 3 2 3 4
dos entre si como 1 e nx + ox + ... que, guinte momento: 3aA B C +4bA B C + 2cA B C,
2
3 2
para ele, signi cavaa primeira raz~ao. Ao fazer nesta assim como para o genitum A B ,omomento resp ec-
2 2 3 3
raz~ao o desaparecer, encontrou a ultima raz~ao,isto tivo obtido p or Newton foi 3aA B -2bA B .Por
n 1
e: 1: nx .Portanto, concluiu que a ux~ao da quan- essas express~oes, v^e-se que os momentos intro duzidos
n
tidade x esta relacionadaa ux~ao da quantidade x . p or Newton, signi cam os diferenciais de ho je.
n
Na linguagem de ho je, teriamos: Se y = x ,ent~ao
Novas contribuic~oes para o desenvolvimento do
o 1 x_
lim ( )= = . Em vista disso,
o ! 0 n n n 1
Calculo,porem, diferentemente das de Newton, foram
(x+o) x nx y_
o meto do de raz~oes e ho je reconhecido como o pre-
apresentadas p or Leibniz no p ero do de 1672 a 1676,
cursor da Teoria dos Limites.
quando se encontravaemParis, cumprindo uma miss~ao
diplomatica, e a partir de 1676, quando tornou-se bibli- Newton conseguiu publicar suas ideias sobre o
otecario e conselheiro do Elector de Hanover. Logo que Calculo em seu famoso livro Philosophiae Naturalis
chegou a Paris, em 1672, encontrou-se com o fsico ho- Principia Mathematica (Princpios Matematicos de Fi-
19
land^es Christiaan Huygens (1629-1695), que trabalhava loso a Natural), editado em 1687. Emb ora esse livro
na Academia Francesa de Ci^encias. Como Leibniz ja seja bastante conhecido como aquele em que apresentou
23
havia feito alguns trabalhos envolvendo Matematica, os fundamentos da Fsica e da Astronomia em lingua-
nesse encontro, mostrou desejo de tornar-se um ma- gem de geometria pura, em algumas partes do mesmo,
24
tematico, o que motivou Huygens a recomendar- Newton lancou m~ao de meto dos analticos. Com efeito,
lhe, principalmente, a leitura dos trabalhos dos ma- o meto do de raz~oes que havia desenvolvido no De
tematicos, os franceses Rene Descartes (1596-1650) e Quadratura, ele o utilizou para a demonstrac~ao de di-
Pascal, o b elga Rene-Francois Sluse (1622-1685), o es- versos Lemas do Livro I, intitulado O Movimento do
co c^es Gregory e o italiano Bonaventura Cavalieri (1598- Corpos.Por exemplo, o Lema I, diz que: - \As quan-
1647). Assim, em 1673, ao estudar o \tri^angulo" dos tidades, e as raz~oes de quantidades, que em qualquer
acrescimos nos trabalhos de Pascal (ao qual deu o temp o nito convergem continuamente para a igual-
nome de caracterstico,conformeja dissemos), Leib- dade, e antes do m daquele temp o aproximam-se mais
niz apresentou sua regra de transmutac~ao: - \A area de uma da outra do que p or qualquer diferenca dada,
sob uma curva p o de ser considerada como sendo a soma tornando-se nalmente iguais". Isto e, certamente, uma
184 J. M. Filardo Bassalo
uma soma e d uma diferenca. Desse mo do, passou a das areas de ret^angulos p equenos, mas tambem como
usar dy, e comecou a pro curar regras para o smbolo d, a soma das areas de tri^angulos p equenos". Ao aplicar
u
) p ois estava convencido de que d(uv) 6= du . dv e d( essa regra a um grande numero de curvas, p^ode dedu-
v
du
. 6= zir facilmente a quadratura da parab ola e da hiperb ole.
dv
Por outro lado, ao aplica-la \a quadratura aritmetica
Novos resultados para o desenvolvimento de seu
1 1
=1 - + - do crculo", encontrou a famosa serie:
Calculo, Leibniz os obteve a partir de 1676, jaemHa-
4 3 5
1 1 1
25
+ - +....
nover. Por exemplo, em um manuscrito de 26 de Ju-
7 9 11
nho desse ano, demonstrou que a melhor maneira de
Ainda em 1673, Leibniz foi a Londres onde se en-
dy
encontrar tangentes a curvas e obter , onde dy e
controu com cientistas ingleses (dentre eles, Boyle, Co-
dx
dy
dx s~ao diferencas e representa um quo ciente. Para
llins e Ho oke) e, tambem, com Oldenburg, que era
dx
chegar a esse resultado, considerou (sem nenhuma ex-
secretario da Royal So ciety, conforme ja referimos.
plicac~ao) que o pro duto dy.dx e p ot^encias mais altas de
Nessa o casi~ao, tomou contato com os trabalhos de Bar-
dx deveriam ser despresados. Em manuscrito escrito
rowedeGregory, e p erceb eu que havia redescob erto
em Novembro daquele mesmo ano, Leibniz encontrou
tecnicas que ja eram conhecidas p or esses dois ma-
R
n+1
x
n n 1 n
regras gerais para dx =nx dx e x = ,com
tematicos, tecnicas essas que indicavam que as deter-
n+1
n inteiro ou fracionario, assim como obtevearegra
minac~oes de areas e de tangentes s~ao op erac~oes inver-
da cadeia ao escrever: - \Para diferenciar a express~ao
sas.
p
2
2
a + bz + cz , facamos a + bz + cz = x, diferen-
De volta aFranca, Leibniz comecou a preparar os
p
dx
ciemos x emultipliquemos o resultado p or ".
famosos manuscritos de 1675 (datados de 25, 26 e 29
dz
Em um manuscrito datado de 11 de Julho de 1677,
de Outubro e 1 e 11 de Novembro) que constituem suas
Leibniz apresentou as regras corretas para se obter a
principais contribuic~oes ao Calculo. Assim, nos manus-
diferencial da soma, do pro duto e do quo ciente de duas
critos de 25 e 26 de Outubro, iniciou seus estudos sobre
func~oes, p orem, sem demonstra-las. Em 1680, atribuiu
ocalculo de areas, usando o simb olismo intro duzido p or
para dx e dy os signi cados, resp ectivos, de diferencas
Cavalieri, quer dizer, ele escreveu \omn.`", como abre-
de ab cissas e de ordenadas, sendo que para dy nomeou
viac~ao para \omnes `" (\to dos os `), para indicar aarea
esp eci camente de diferenca moment^anea. Ainda
de uma curva cujas ordenadas s~ao `.Nomanuscrito de
nesse mesmo ano, mostrou que para se obter a area sob
29 de Outubro, inicialmente, Leibniz apresentou a re-
uma curva, bastaria somar ret^angulos de altura y ede
gra de integrac~ao p or partes: omn. x` u x omn. ` -
R
3
x
2
base dx,istoe, bastaria calcular y dx; apresentou,
omn.omn. ` e, com ela, mostrou que omn. x = .No
3
tambem, a formula para calcular o elemento de arco (ds
entanto, ainda nesse manuscrito, Leibniz decidiu, re-
p
R
2 2
= dx + dy )eovolume de um solido de revoluc~ao
pentinamente, substituir omn. p elo smbolo , que e
obtido p ela revoluc~ao de uma curva em torno do eixo
o s estilizado de calgrafo, que signi ca suma (soma).
R
2
dos x:V= y dx.
Ainda nesse manuscrito, Leibniz encontrou regras para
R R R
op erar com : a ` =a `,sea for uma constante Ocalculo desenvolvido p or Leibniz em manuscri-
R R R
e (y+z)= y+ z, b em como intro duziu o tos, conforme vimos ate aqui, foi nalmente publicado
smb olo d para denotar a diferenciac~ao como op erac~ao no Acta Eruditorum o primeiro p eriodico cient co da
26
inversa de tomar a quadratura; p orem, esse smbolo Alemanha, criado em 1682. Assim, em Outubro de
27
atuava como um denominador, conforme se p o de ver 1684, esse p eriodico trouxe um artigo de Leibniz, no
R
segundo escreveu nesse manuscrito: -\Sup onha que qual as regras de op erac~ao de d, apresentadas em 1677,
R
ya
28
,ent~ao, assim como aumenta, ` u ya. Seja ` u foram ent~ao demonstradas. Ainda nesse artigo, Leib-
d
d diminui as dimens~oes". Mais tarde, no manuscrito niz fez aplicac~oes de seu meto do ao demonstrar como se
R
de 11 de Novembro observou que nem aumenta a di- calcula tangentes, maximos e mnimos (dv = 0), conca-
R
signi ca mens~ao, e nem d diminui, e que, realmente, vidade e convexidade, e p ontosdein ex~ao (d dv = 0),
o
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Revista Brasileira de Ensino de Fsica, vol. 18, n 3, setembro, 1996 185
com o conceito de variac~ao daquelas quantidades. New- para diversas curvas.
ton tratou a taxa de variac~ao de uma variavel atraves
Leibniz continuou apresentando, no Acta,novos re-
do conceito de ux~ao. Leibniz, p or sua vez, tratou-a
sultados decorrentes da aplicac~ao de seu meto do de
por intermedio do conceito de diferencial. A terceira
calculo. Para mostrar que, em algumas situac~oes, o
diferenca esta ligada ao conceito de integrac~ao. Para
seu meto do era melhor, no artigo publicado no Acta de
Newton, esta tinha como tarefa ap enas a func~ao de en-
Junho de 1686, obteve a equac~ao da cicloide na forma y
R
p
dx
contrar os uentes para as ux~oes dadas. Ja Leibniz
p
. Ainda nesse trabalho, Leibniz 2x xx + =
2x xx
interpretou-a como um somatorio. Os in nitesimais
estudou a curvatura e o crculo osculatriz de uma curva
29
constituem a quarta diferenca. Newton considerou-
em um dado p onto, b em como apresentou a celebre
os ap enas como mecanismo de encontrar as ux~oes.
formula para calcular a derivada enesima do pro duto de
30
Leibniz, contudo, tratou-os realmente como p equenos
duas func~oes. Nos Acta de 1692, 1693 e 1694, Leibniz
33
acrescimos.
encontrou um meto do geral para se obter o envelop e
31
A quinta diferenca entre as contribuic~oes de Newton
de uma famlia de curvas, como, tambem, mencionou
e Leibniz ao desenvolvimento do Calculo, diz resp eito
regras para a diferenciac~ao de func~oes trigonometricas,
32
ao uso de series para representar as func~oes resultantes
logartmicas e exp onenciais.
da soluc~ao das equac~oes diferenciais. Newton usou-as
Asultimas contribuic~oes de Leibniz para o desen-
sistematicamente, enquanto Leibniz preferiu a forma fe-
volvimento do calculo, apareceram em cartas que es-
chada. Por m, a maneira de trabalhar com o Calculo
creveu a Johnn Bernoulli, em 1697. Nelas, apresen-
constitui a sexta diferenca. Newton era emprico e con-
tou a diferenciac~ao de uma integral, com relac~aoaum
creto, Leibniz era esp eculativo e generalista. Por exem-
determinado par^ametro. Tambem, apresentou a ideia
plo, enquanto Leibniz usou notac~oes para representar a
de que muitas integrais inde nidas p o deriam ser re-
R
diferenciac~ao (d) e a integrac~ao ( ), e obteve regras
solvidas se fossem reduzidas a formas conhecidas, as-
para essas op erac~oes, Newton usou ap enas a notac~ao
sim como p ensou num mo do de preparar tab elas para
(.) para representar as ux~oes e n~ao se preo cup ou em
tais reduc~oes, isto e, tab elas de integrais. Pro curou
34
obter regras para aquelas op erac~oes.
ainda de nir diferenciais de ordens mais altas, tais como
ddy e dddy, pro curando encontrar, sem muito ^exito,
Notas e Refer^encias Bibliogra cas
um signi cado para d y, onde e qualquer numero
real. Por m, em 1714, dois anos antes de sua morte,
Leibniz escreveu Historia e Origo Calculi Di erentia-
1. BASSALO, J. M. F. 1995. ACr^onicadoCalculo:
lis (Historia e Origem do Calculo Diferencial) no qual
I. Antes de Newton e Leibniz. CCEN-DF-005/95.
relatou o desenvolvimento de seu proprio p ensamento
sobre o Calculo. Nesse livro, Leibniz usou a palavra
2. Para escrever este artigo, nos baseamos nos se-
func~ao para representar quantidades que dep endem de
guintes textos: BARON, M. E. 1985. Curso de
uma variavel.
Historia da Matematica: Origens e Desenvolvi-
mento do Calculo, Unidades 1 e 2; BARON, M. Ao concluirmos essa segunda parte da Cr^onica
E. e BOS, H. J. M. 1985. idem Unidade 3; BOS, do Calculo na qual estudamos as principais contri-
H. J. M. 1985. idem Unidades4e5,daOpen buic~oes de Newton e Leibniz para o seu desenvolvi-
University. Editora da Universidade de Braslia; mento, vejamos as principais diferencas entre essas
BOYER, C. B. 1968. A History of Mathematics. contribuic~oes. A primeira delas refere-se as quan-
John Wiley and Sons; CASINI, P.1995. New- tidades variaveis. Enquanto Newton considerou-
ton e a Consci^encia Europeia. Editora UNESP; as como dep endentes do temp o, Leibniz tomou-as
KLINE, M. 1974. Mathematical Thought from como p ercorrendo sequ ^encias de valores in ni-
Ancient to Modern Times. Oxford University tamente proximos. A segunda diferenca relaciona-se
186 J. M. Filardo Bassalo
negativo), Newton se baseou num outro conceito Press; PLA, C. 1945. Isaac Newton. Espasa-
novo, a frac~ao decimal, que p o dia ser usada para Calp e Argentina, S.A.; RONAN, C. A. 1987.
calcular, p or exemplo, o valor de ,t~ao rigoro- Historia Ilustrada da Ci^encia. Jorge Zahar Edi-
samente quanto se quisesse, bastando para isso tor; SEDGWICK, W. T., TYLER, H. W. e BIGE-
aumentar o numero de casas decimais. Essa ex- LOW, R. P.1950. Historia da Ci^encia. Editora
pans~ao binomial foi descrita p or Newton em duas Glob o; STRUIK, D. J. (Editor) 1969. A Source
cartas que enviou, em 13 de Junho e 24 de Ou- Book in Mathematics, 1200-1800.Harvard Uni-
tubro de 1676, a Henry Oldenburg (c.1615-1677), versity Press; WESTFALL, R. S. 1995. A Vida
secretario da Royal So ciety, e que, p or sua vez, de Isaac Newton. Editora NovaFronteira.
as enviou a Leibniz. (Note-se que a expans~ao bi-
3. Segundo seu proprio dep oimento, Newton estu-
nomial para m inteiro, ja era conhecida p elos tra-
dou o Elementos de Geometria do matematico
balhos dos matematicos, o p ersa Omar Khayyam
grego Euclides de Alexandria (323-285); o
(c.1050-1123), o chin^es Yang Hui (f.c.1261-1275),
Exercitationes Mathematicae (Exerccios de Ma-
o alem~ao Peter Apian (1495-1552), o italiano Nic-
tematica)(1657)eoGeometria a Renato Des
coloFontana de Brescia (Tartaglia) (c.1550-1557),
Cartes (Geometria de Rene Descartes) (1659) do
e o franc^es Blaise Pascal (1623-1662).)
matematico holand^es Frans van Scho oten (1615-
1660); o Clavis Mathematicae (A Chave da Ma-
6. A ideia de velo cidade considerada p or Newton es-
tematica) (1631) do matematico ingl^es William
condia uma outra variavel, invisvel: o temp o.
Oughtred (1574-1660); o Arithmetica In nitorum
Desse mo do, parece que e neste p onto que o
(Aritmetica do In nito) (1655) do matematico
conceito de temp o absoluto entrou como fun-
ingl^es John Wallis (1616-1703); e o In Artem
damentac~ao logica no p ensamento newtoniano.
Analyticem Isagoge (Introduc~ao aArte Analtica)
(WESTFALL, op. cit.)
(1591) do matematico franc^es Francois Viete
(1540-1603). Essas leituras, p ossivelmente, leva-
7. Esses trabalhos de Newton so foram organiza-
ram Newton a escreverparaofsico Rob ert Ho oke
dos e publicados em 1962, p or A. Rup ert Hall e
(1635-1703), sua famosa frase: - \Se vi mais longe
M. Boas Hall, p ela Cambridge UniversityPress,
do que Descartes, foi p orque subi em ombros de
com o ttulo: Unpublished Scienti c Papers of Sir
gigantes".
Isaac Newton.
4. Em seu Arithmetica In nitorum,Wallis chegou a
P
p
r
1
demonstrar que ,ondep pode as- !
p+1
n p +1
8. Newton foi matriculado nesse Colegio no dia 5 de
sumir qualquer valor, p ositivo, negativo, ou fra-
Junho de 1661, como p ensionista p obre (subsi-
cionario. Usando seu meto do, Wallis tentou resol-
zar), e p ercorreu regularmente to das as etapas do
ver o problema da quadratura do crculo expan-
currculo: Scholar em 1664, Bachelor of Arts
p
2
1 x em serie e, para dep ois, integra- dindo
em 1665, Ma jor Fellow e Master of Arts em
la termo a termo. N~ao obteve sucesso, p orem
1668.
conseguiu encontrar o valor de por intermedio
2:2:4:4:6:6:8:8:10:10:::
= . de um pro duto in nito:
2 1:3:3:5:5:7:7:9:9:::
9. Essas Questiones resultaram de re ex~oes que
Observe-se que esse problema foi resolvido p or
Newton fez sobre a leitura de varios autores, den-
Newton, ao descobrir a expans~ao binomial, con-
tre os quais se destacam o qumico ingl^es Rob ert
forme veremos a seguir.
Boyle (1627-1691), o losofo franc^es Pierre Gas-
sendi (1592-1655), o p o eta e losofo ingl^es Henry 5. Para chegar a expans~ao ou teorema binomial ((x
m
More (1614-1687), alem de Descartes e Ho oke. +y) ,comm inteiro ou fracionario, p ositivoou
o
.
Revista Brasileira de Ensino de Fsica, vol. 18, n 3, setembro, 1996 187
para tratar este assunto". Somente em agosto de 10. No De VeraCirculi, Gregory apresentou uma
1669, Collins soub e que \esse amigo de Barrow", serie de calculos de quadraturas usando o meto do
era Newton. Collins, p or sua vez, fez circular dos in nitesimais. Ainda nesse livro, Gregory de-
esse manuscrito de Newton entre os maiores ma- niu uma func~ao como uma quantidade obtida
tematicos europ eus (menos a Wallis, devido sua de outras quantidades p or intermedio de uma su-
fama de plagiador), sendo nalmente editado p elo cess~ao de op erac~oes algebricas ou p or um outro
matematico ingl^es William Jones (1675-1749), em tip o de op erac~ao inimaginavel, sendo estaultima
1711. Alias, e op ortuno destacar que foi esse uma especie de passagem ao limite. Nos ou-
matematico quem intro duziu o smbolo , para tros dois livros, Gregory obteve a representac~ao
representar a relac~ao entre o comprimento e o em serie de algumas func~oes, p or intermedio do
di^ametro da circunfer^encia, em 1706, no livro Sy- meto do de quadraturas. Por exemplo, ele encon-
nopsis Palmariorum Matheseos (Nova Introduc~ao trou a representac~ao em serie da func~ao arctgx,
2
a Matematica). dividindo 1 p or 1 + x e aplicando o meto do da
quadratura a cada termo da serie resultante dessa
12. Antes de escrever o De Analysi, Newton usava
divis~ao. Na linguagem atual, essa serie de Gre-
R
a notac~ao o que representava p equeno intervalo x
dx
gory,e obtida da seguinte maneira:
2
o 1+x
R
de temp o e as notac~oes op e oq para represen-
x
2 4 6
= (1 x + x x + ::::) dx =
o
3 5 7
tar as p equenas variac~oes exp erimentadas p or x
x x x
x- + - + ... = arctg x. Gregory
3 5 7
e y durante esse mesmo intervalo de temp o. Por
tambem obteve a representac~ao em serie de outras
n m
exemplo, a tangente a curvay =x , era calcu-
func~oes trigonometricas, mais tarde obtidas p elos
n
lada p or Newton, da seguinte maneira: (y + o q)
matematicos, o ingl^es Bro ok Taylor (1685-1731)
m
= (x + op) . Em seguida, expandia ambos os
e o esco c^es Colin Maclaurin (1698-1746). Em
termos p elo teorema binomial, dividia tudo p or
seus trabalhos, Gregory observouqueocalculo
o, desprezava os termos que ainda continham o
de quadraturas e de reti cac~ao de curvas, era in-
m
q
m