Viaje Al Río De La Plata: As Fundações Espanholas Na Região Do Rio Da Prata E O Protagonismo Indígena Na Crônica De Ulrich Schmidel (1534-1554)

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Viaje Al Río De La Plata: As Fundações Espanholas Na Região Do Rio Da Prata E O Protagonismo Indígena Na Crônica De Ulrich Schmidel (1534-1554) Viaje al Río de La Plata: As fundações espanholas na região do Rio da Prata e o protagonismo indígena na crônica de Ulrich Schmidel (1534-1554) Viaje al Río de La Plata: Spanish foundations in the Rio de la Plata region and indigenous protagonism in Ulrich Schmidel’s chronic (1534-1554) José Alberto dos Santos Junior1 Resumo: A presente nota de pesquisa tem como objetivo apresentar e analisar brevemente uma das fontes utilizadas em minha pesquisa de iniciação científica voluntária que faço junto ao Departamento de História da UNIFESP. Nela estudo a relação entre indígenas Guarani e espanhóis nos anos iniciais de Assunção (1537-1556) e busco enfatizar a agência indígena, evidenciando sua importância na fundação e consolidação do núcleo colonial assuncenho. Neste texto, pretendo identificar o protagonismo indígena através das narrativas presentes nos relatos de Ulrich Schmidel, um dos membros da expedição de Pedro de Mendoza, cujo objetivo era explorar o Rio da Prata e fazer fundações na região para a consolidação do domínio espanhol no local. A obra em questão apresenta descrições interessantes a respeito dos grupos indígenas que a expedição de Mendoza encontrou ao longo da exploração, e denota como esses encontros tiveram influência nas ações tomadas pelos exploradores, indicando diversos momentos de dependência deles em relação aos indígenas. Sendo assim, buscarei evidenciar o protagonismo indígena nas fundações na região descritas na fonte, refletindo também a respeito da subjetividade presente na narrativa. Palavras-chave: Indígenas; Protagonismo; Agência; Aliança; Crônica. Abstract: This research note aims to briefly introduce and analyze one of the sources used in my voluntary research that i do with the Department of History of UNIFESP. In my research i study the relationship between Guarani indigenous and Spaniards in the early years of Asunción (1537-155) and seek to emphasize the indigenous agency, highlighting their importance in the foundation and consolidation of Asunción’s colonial nucleus. In this text, i intend to identify the indigenous protagonism through the narratives present on the reports of Ulrich Schmidel, one of the members of Pedro de Mendoza’s expedition, whose objetctive was to explore the Rio da Prata, and build foundations in the region in order to consolidate the Spanish dominance. The following work presents interesting descriptions about the indigenous groups met by the Mendoza expedition during their exploration and shows how these meetings influenced the actions taken by the explores, indicating many moments of their dependence on indigenous people. Therefore, i’ll try to show the indigenous protagonism in the foundations in the region, described in the source, also reflecting on the subjectivity present in the narrative. Keywords: Indigenous; Protagonism; Agency; Aliance; Chronicle. 1 Graduando em História (Bacharelado) na Escola de Letras, Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de São Paulo. Atualmente desenvolve um projeto de iniciação científica voluntária, intitulada “A ‘Conquista’ do Paraguai: Análise da relação hispano-guarani nos anos iniciais de Assunção (1537-1556)”, sob a orientação do Prof. Dr. José Carlos Vilardaga. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/7009119045857859. Revista Ensaios de História, v. XXI, n. 1, 2020 73 O mito da Serra da Prata e a expedição de Pedro de Mendoza Em 1513, o Oceano Pacífico foi descoberto, mostrando que a América era um continente separado das Índias, o que abriu uma nova rota para tal lugar, fazendo Dom Manuel I e Carlos V – reis de Portugal e Espanha, respectivamente – enviarem expedições para descoberta e controle da passagem interoceânica. Uma errônea conclusão portuguesa de 1514 assumia que o Rio da Prata era a passagem procurada, deixando a região platina em evidência e transformando-a em alvo de disputa entre as potências ibéricas (SOARES, 2001). Carlos V então contratou uma expedição liderada por Juan Díaz de Solís para explorar a região do Rio da Prata. Sua expedição acabou sendo dizimada pelos indígenas Charrúa e os sobreviventes decidiram voltar para a Espanha. Alguns homens acabaram naufragando na ilha de Santa Catarina e passaram a viver por lá. Neste lugar, eles ouviram dos Guarani notícias a respeito da Serra da Prata, “um império maravilhoso que existiria a ocidente, para além das selvas, com cidades de pedra e uma serra onde jorrava a prata - o Potoichi -, em que vivia um rei que, por se vestir de lâminas de prata, era chamado de Rei Branco” (SOARES, 2001, p. 39). Segundo algumas interpretações da historiografia, o mito da Serra da Prata tinha notória fama entre os indígenas da América do Sul. Sua localização seria na região dos Andes e sua riqueza chamava a atenção dos outros povos, sobretudo dos indígenas da região que corresponde atualmente ao Paraguai (BELLOTO; FERNÁNDEZ; SALMORA; et al., 1982). No entanto, há a possibilidade dessa interpretação ser baseada no imaginário europeu que a todo tempo buscava encontrar na América lugares paradisíacos e cheios de riqueza. Tendo suas expectativas alimentadas por histórias de aventureiros da Idade Média, os exploradores filtravam nos relatos de viagens fantásticas, tudo o que era visto no Novo Mundo, buscando muitas vezes a confirmação do que já sabiam, como Colombo, que foi capaz de enxergar a Índia na América (SOUZA, 1986). Isso fazia com que todas as coisas vistas e vividas no Novo Mundo, fossem magnificadas pelo imaginário europeu (HOLANDA, 1996) e que se criasse uma “tradição de projeções deslumbrantes que depositava tesouros inconcebíveis nos espaços inexplorados ou semiexplorados, que se consideravam afastados do eixo referencial dos europeus” (GIUCCI, 1992. p. 13). Sendo assim, há a possibilidade de a Serra da Prata ser uma interpretação europeia, Revista Ensaios de História, v. XXI, n. 1, 2020 74 carregada do desejo de encontrar riquezas, que se originou a partir de qualquer mínimo rumor. Especula-se que Aleixo Garcia, um dos sobreviventes da expedição de Solís, ao ouvir falar sobre esse reino, organizou por sua conta uma expedição em busca da Serra da Prata. Com a ajuda de inúmeros nativos, andou pelo interior do continente entre 1521 e 1525, passando pelo rio Paraguai, atravessando o Chaco e atingindo o que é atualmente o Peru, acreditando ter encontrado a Serra da Prata. No entanto, ele e seus homens foram mortos pelos indígenas Payaguá no caminho de volta (SOARES, 2001). Sua figura e história foram importantes para a fama do mito da Serra da Prata entre os espanhóis, que nomearam a região do Rio da Prata dessa forma, devido a crença de que ela seria o caminho mais rápido para atingir a Serra da Prata e não por ter prata e outros metais preciosos nela ou ao seu redor (KUPCHIK, 2008). Com a fama desse mito, a região do Rio da Prata ficou ainda mais em evidência. Carlos V e Dom Manuel I, portanto, intensificaram a contratação de expedições em direção à região platina, podendo citar as expedições de Diogo García Moguer e Martin Afonso de Souza. Nesse contexto, a fim de dominar definitivamente a região e evitar a expansão portuguesa, Carlos V firmou uma Capitulación (contrato) com um cavaleiro real chamado Pedro de Mendoza, “nomeando-o primeiro adelantado (governador) da Província do Rio da Prata, com a obrigação de armar uma expedição, às suas próprias custas, objetivando descobrir o caminho para o Peru e fundar três fortalezas para a defesa do território” (SOARES, 2001, p. 43). A frota de Mendoza, composta por diversos estrangeiros, incluindo Schmidel, atingiu o estuário do Rio da Prata em 1536. A obra de Ulrich Schmidel Viaje al Río de la Plata foi editada pela primeira vez em alemão no ano de 1567 na cidade de Frankfurt, e fazia parte de uma coleção de viagens organizada por Sigmund Feyerabend e Simon Hüters. Obteve notória fama e se difundiu rapidamente pela região germânica. A obra foi reeditada diversas vezes – cerca de 42 até meados do século XX – e a maior parte das publicações contaram com ilustrações e edições feitas pelas casas impressoras de Theodore de Bry e Levinus Hulsius (KALIL, 2008).2 2 É importante destacar também a obra “Viagem ao Rio da Prata: Ulrico Schmidl e sua crônica quinhentista”, publicação de Luís Guilherme Assis Kalil, Maria Cristina Bohn Martins e Franz Obermeier lançada em 2020 pela Revista Ensaios de História, v. XXI, n. 1, 2020 75 A obra de Schmidel, assim como muitas do século XVI, é alvo de discussões pela historiografia a respeito de seu caráter e veracidade. A partir do fim do século XIX e início do XX, publicações como a de Schmidel foram revisitadas pelos intelectuais e historiadores dos países platinos recém independentes, a fim de encontrar as suas origens, considerando essas fontes como descrições fidedignas do nascimento de suas nações (KALIL, 2008). Autores nacionalistas como Enrique de Gandía e Pedro de Angelis consideravam a completa veracidade da obra de Schmidel. “Durante muito tempo a crônica de Schmidel foi reconhecida na historiografia mundial como autoridade indiscutível para o conhecimento da história do Paraguai e do Rio da Prata” (CARDOZO, 1959, p. 166). No entanto, ao longo do século XX, essa visão de “relatos fidedignos” passou a ser questionada pela historiografia, usando como principal argumento, equívocos encontrados na descrição de nomes, datas e locais presentes na obra. Dentre os autores, pode-se citar Manuel Domínguez (s/d). No que diz respeito ao caráter da crônica de Schmidel, pode-se dizer que há uma rica descrição no que diz respeito aos grupos indígenas encontrados, em relação a sua demografia, costumes e outros aspectos, podendo ser considerada por muitos uma obra de caráter etnográfico. No entanto, muitos autores consideram um caráter teológico presente na obra de Schmidel. João Adolfo Hansen (1998) apresenta essa discussão, considerando que os elementos de descrição dos indígenas presentes na narrativa de Schmidel e de outros autores quinhentistas, buscavam trazer uma explicação para os questionamentos do período que se faziam a respeito dos indígenas em relação as suas concepções cristãs, como se eles possuíam ou não almas, ou se eram ou não humanos.
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