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Sistema Aquífero: Quaternário De Aveiro (O1)

Sistema Aquífero: Quaternário De Aveiro (O1)

Sistemas Aquíferos de Continental

SISTEMA AQUÍFERO: QUATERNÁRIO DE AVEIRO (O1)

Figura O1.1 – Enquadramento litoestratigráfico do sistema aquífero Quaternário de Aveiro

Sistema Aquífero: Quaternário de Aveiro (O1) 157 Sistemas Aquíferos de Portugal Continental

Identificação

Unidade Hidrogeológica: Orla Ocidental Bacias Hidrográficas: Vouga, Mondego, Ribeiras da Costa e Mangas das Ribeiras da Costa Distritos: Aveiro e Coimbra Concelhos: Águeda, Albergaria-A-Velha, Anadia, Aveiro, Cantanhede, Espinho, , Figueira da Foz, Ílhavo, Mira, Montemor-O-Velho, , , ,

Enquadramento Cartográfico

Folhas 143, 153, 162-A, 163, 173, 174, 184, 185, 186, 195, 196, 197, 206, 207, 208, 217, 218, 227-B e 228 da Carta Topográfica na escala 1:25 000 do IGeoE Folhas 13-A, 13-C, 16-A, 16-B, 16-C, 16-D e 19-A do Mapa Corográfico de Portugal na escala 1:50 000 do IPCC Folhas 13-A, 13-C, 16-A, 16-C e 19-A da Carta Geológica de Portugal na escala 1:50 000 do IGM

ESPINHO 143 13A

153

OVAR 13C 162-A 163 ESTARREJA MURTOSA

ALBERGARIA 173 174 -A-VELHA 16A 16B 184 AVEIRO ÁGUEDA ÍLHAVO 185 186

195 196 197 VAGOS OLIVEIRA DO BAIRRO 16C 16D 206 207 ANADIA MIRA 208

217 218 CANTANHEDE 19A 227-B 228 MONTEMOR FIGUEIRA -O-VELHO DA FOZ Figura O1.2 - Enquadramento geográfico do sistema aquífero Quaternário de Aveiro

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Enquadramento Geológico

Estratigrafia e Litologia

As formações que constituem o suporte deste sistema são todas de natureza detrítica, podendo ser individualizadas em três grandes unidades: terraços fluviais e praias antigas, de idade pliocénica, uma sequência granodecrescente, cascalhenta, e quase sempre coberta por uma ou mais camadas de lodos orgânicos, conhecida por formação de base do quaternário, manto dunar e aluviões modernos. Os terraços pliocénicos normalmente apresentam-se com composição muito grosseira, conglomerática a arenosa, com calhaus mais ou menos rolados e frequentes intercalações argilosas, enquanto que os terraços fluviais costumam apresentar granulometria mais fina. Assentam, quer sobre os xistos paleozóicos, a Norte, nomeadamente desde Esmoriz, Ovar até Estarreja e Salreu, quer sobre o Cretácico superior, como acontece nas extensas plataformas de Cacia, Aveiro, Oliveirinha, até ao Sul de Vagos, ou, mesmo, sobre o Jurássico, já nas regiões da Bairrada e da Gândara - Arazede, Cantanhede, etc. Estes depósitos apresentam uma grande extensão de afloramento mas espessura pequena, geralmente situada entre 10 e 20 metros, raramente chegando a valores próximos de 30 metros. Os depósitos da Base do Quaternário estão representados por uma sequência granodecrescente, muito grosseira na base, por vezes com clastos de xistos, granitos, grauvaques e liditos, de dimensões superiores a 20 cm, passando, na parte superior, a areões e areias, cada vez mais finas e argilosas. Esta sequência é coberta por uma ou duas camadas de lodos orgânicos, por vezes com conchas ou restos vegetais. Estes depósitos apresentam uma maior espessura a norte, nomeadamente a Oeste de Ovar e de Estarreja, assim como na área de Cacia e Gafanha da Nazaré, onde podem alcançar mais de 25 metros, raramente ultrapassando 30 metros. Mais para Sul, nomeadamente nos concelhos de Ílhavo, Aveiro, Vagos e Mira, as espessuras são menores: entre a base, em regra constituída pelo Cretácico superior argiloso, e as camadas de lodos que a confinam a tecto, esta sequência raramente tem mais de 15 metros de espessura. No entanto, em toda a região as espessuras são sempre mais reduzidas em toda a faixa litoral e na parte oriental, onde os depósitos vão adelgaçando até desaparecerem, no contacto com o substrato. Toda a região litoral, desde a zona de Espinho até à serra da Boa Viagem, encontra-se coberta por um manto arenoso, dunar. Estas areias, que na parte do litoral setentrional da Bacia do Vouga cobrem directamente os xistos antigos, desenvolvem-se mais para o interior até às cercanias de Estarreja, sendo interrompidas pela ria de Aveiro e respectivos canais e áreas intermareais (juncais, nateiros, etc.). Nesta área, as areias eólicas já cobrem lodos orgânicos, escuros, ora conquíferos, ora turfosos que constituem o tecto da formação da base do Quaternário. Na parte a Sul da ria, o manto eólico penetra ainda mais para o interior e alcança o paralelo de Cantanhede, já a cerca de 20 km da costa, assentando sobre o Cretácico e o Jurássico ou sobre outras formações quaternárias mais antigas. A espessura situa-se frequentemente em torno dos 10 metros, mas há casos, embora raros, de dunas com mais de 30 metros de espessura. Trata-se, em geral, de areias finas, limpas, onde a fracção silto-argilosa é praticamente sempre inferior a 10%, muito bem calibradas. Em quase toda a região ocorre um horizonte

Sistema Aquífero: Quaternário de Aveiro (O1) 159 Sistemas Aquíferos de Portugal Continental ferro-húmico que se localiza na zona de variação do nível freático e é formado por precipitados de óxidos e hidróxidos de ferro, que agregam as partículas arenosas, constituindo uma couraça dura, com aspecto laterítico.

Tectónica

Os depósitos plio-quaternários apresentam-se praticamente indeformados, pelo menos aparentemente, sem deslocações tectónicas evidentes. Na parte Norte, contudo, onde o substrato é constituído pelos xistos antigos, os entalhes da acção da erosão provocados pela instalação das linhas de água, evidenciam duas direcções predominantes e que resultam de acções tectónicas anteriores à deposição do Plistocénico. Essas direcções, quase normais entre si, são aproximadamente NW-SE e NE-SW.

Hidrogeologia

Características Gerais

O Sistema Quaternário de Aveiro é constituído por três unidades: um aquífero freático instalado em depósitos pliocénicos, um aquífero, em grande parte confinado ou semiconfinado, intalado nos depósitos da base do quaternário e um aquífero freático instalado em dunas e aluviões modernos. O aquífero nos depósitos pliocénicos tem interesse reduzido devido à sua fraca permeabilidade, sendo explorado, fundamentalmente, através de poços de grande diâmetro, para abastecimentos particulares e pequenos regadios. Apenas se conhecem três aproveitamentos para abastecimento público em que são usados poços com drenos horizontais: Vale das Maias, situado na parte Norte do concelho de Vagos mas que abastece Aveiro; Vale da Castelhana, também construído na área de Vagos, com um caudal da ordem de 12 L/s que abastece Ílhavo; Sosa, Vagos, com um caudal de 5 L/s, que abastece uma pequena parte daquela localidade. O aquífero instalado na base do quaternário assumiu um papel importante, quer no abastecimento urbano, quer no abastecimento de várias unidades industriais. Trata-se de um aquífero confinado, na maior parte da sua extensão, repuxante nalgumas áreas aquando da construção das primeiras captações. Um dos principais problemas para a sua utilização é a excessiva concentração em ferro, o que obriga a efectuar tratamento adequado. Também são conhecidos casos de aumento excessivo da concentração em cloretos, atribuídos à drenância da camada confinante, constituída por lodos contendo água salgada, em resultado de uma exploração excessiva. Contudo, algumas zonas, por exemplo a região Furadouro-Ovar e Esmoriz, são caracterizadas por uma água de boa qualidade. O aquífero freático instalado nas dunas é explorado por numerosas captações particulares, entre os quais predominam os poços de grande diâmetro tradicionais, bem como para abastecimentos urbanos e industriais. Além do já referido tipo de captação, existem também furos de pequeno diâmetro, poços com drenos radiais e poços pontuais (well-points). A área total do sistema aquífero é de 931 km2.

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Parâmetros Hidráulicos e Produtividade

Não se dispõe de dados que permitam estimar as produtividades típicas dos depósitos pliocénicos, nem dos respectivos parâmetros hidráulicos. É provável que a condutividade hidráulica se situe no intervalo 0,5 a 2 m/dia. Em relação à formação da base do Quaternário calcularam-se as estatísticas dos caudais de exploração, a partir de 86 dados, que se apresentam no quadro (O1.1) e figura (O1.3) seguintes:

Média Desvio Mínimo Q1 Mediana Q3 Máximo padrão 13,9 10,8 0,1 3,0 14,5 23,8 23,8 Quadro O1.1 – Principais estatísticas dos caudais para a base do Quaternário

Figura O1.3 - Distribuição cumulativa de caudais para a base do Quaternário

No âmbito dos trabalhos do plano de Bacia do Vouga foram interpretados vários ensaios de bombagem realizados em captações da base do quaternário que permitem fazer uma caracterização da distribuição estatística das transmissividades. Os ensaios interpretados foram quase todos realizados na área de Estarreja-Veiros-Pardilhó, provavelmente um dos sectores onde a Base do Quaternário se apresenta com maiores valores de transmissividade. No quadro O1.2 apresentam-se as estatísticas principais relativas a 56 ensaios de bombagem.

Média Desvio Mínimo Q1 Mediana Q3 Máximo Padrão 432 117 190 360 428 500 750 Quadro O1.2 – Principais estatísticas das transmissividades para a Base do Quaternário

Os ensaios interpretados foram realizados quase todos na área de Estarreja-Veiros- Pardilhó, provavelmente um dos sectores onde a Base do Quaternário se apresenta com

Sistema Aquífero: Quaternário de Aveiro (O1) 161 Sistemas Aquíferos de Portugal Continental maiores valores de transmissividade. Alguns dos ensaios de bombagem também permitiram obter valores de coeficiente de armazenamento (28 dados), cujas estatísticas principais se apresentam no quadro seguinte (O1.3).

Média Desvio Mínimo Q1 Mediana Q3 Máximo Padrão 2?10-3 2,6?10-3 1?10-4 3?10-3 1,7?10-3 3?10-3 9,4?10-3 Quadro O1.3 – Principais estatísticas do coeficiente de armazenamento para a Base do Quaternário

Para captações implantadas nas dunas apenas se dispõe de um número reduzido de ensaios onde foi possível estimar a transmissividade, cujos valores se distribuem entre 50 e 370 m2/dia. Os valores da condutividade hidráulica situam-se entre 20 e 49 m/d sendo os valores extremos pouco frequentes. Análise Espaço-temporal da Piezometria

Nos depósitos pliocénicos a superfície piezométrica segue de perto a superfície topográfica, com escoamentos dirigidos para os cursos de água que são efluentes na maior parte do ano, podendo ser alguns troços ser ocasionalmente influentes. O gradiente hidráulico é pequeno, da ordem de 1/1000, e as oscilações internuais poderão ser da ordem dos 5 metros, embora nalguns locais possam assumir valores mais elevados. Em grande parte da sua extensão o aquífero na base do Quaternário apresenta-se como confinado, ou semi-confinado, com níveis piezométricos situados acima do tecto da camada de lodos, ou, mesmo, acima do terreno. Para oriente a camada confinante desaparece, passando o aquífero à condição de livre. A partir do início da intensa exploração deste aquífero, sobretudo para uso de várias indústrias, verificou-se um rebaixamento excessivo dos níveis piezométricos nalgumas áreas, nalguns casos seguidos de mudanças na qualidade da água. O abandono de muitas captações, substituídas por origens superficiais de água, deu lugar a alguma recuperação dos níveis, em todo o caso lenta, o que pode ser atribuído a uma deficiente recarga do aquífero. Para caracterizar a superfície piezométrica do aquífero da base do Quaternário dispõe-se de medidas em duas áreas separada pela Ria de Aveiro: Murtosa-Cortegaça e Tojeira. De acordo com os medições de níveis efectuados pela DRAOT-Centro, observam-se níveis elevados na área da Tojeira, alguns ultrapassando 50 m (no piezómetro 196/100 chega a atingir valores próximos dos 60 metros). A partir deste empolamento na superfície piezométrica, o escoamento diverge de forma centrífuga, tanto na direcção da costa como para o interior. No entanto, a ausência de uma rede de observações mais densa e bem distribuída leva a que se encarem com alguma reserva as extrapolações espaciais que se possam fazer com os dados disponíveis. As oscilações sazonais são pequenas, entre 1 a 2 metros, o que confirma a dificuldade de entrada da recarga. No aquífero dunar as isopiezas seguem aproximadamente a direcção da costa, para a qual se dirige, no essencial, o escoamento subterrâneo. Na região a Oeste de Estarreja o fluxo tem

Sistema Aquífero: Quaternário de Aveiro (O1) 162 Sistemas Aquíferos de Portugal Continental uma direcção geral para ocidente, ou seja, a favor da Ria ou de alguns dos seus esteiros, mas também se nota a influência da topografia. O gradiente hidráulico é da ordem de 1/1000. Balanço Hídrico

A partir da informação disponível torna-se difícil fazer uma quantificação separada do balanço hídrico para os três aquíferos do sistema. De facto, para efectuar essa quantificação seria necessário, não só dispor de estimativas das taxas de recarga específicas de cada aquífero, mas também das suas áreas de afloramento. Peixinho de Cristo (1985) estima para o conjunto dos três aquíferos uma recarga anual média situada entre 200 e 250 hm3. No entanto, apenas uma fracção deste total será susceptível, na prática, de aproveitamente, nomeadamente no que diz respeito aos depósitos pliocénicos e dunas, devido à reduzida espessura da zona saturada e reduzida permeabilidade, no caso dos primeiros. Por outro lado, a grande vulnerabilidade do aquífero das dunas origina uma relativa degradação da qualidade da água pelo que, no presente, é utilizado, quase exclusivamente, apenas para regadio (Serrano e Garcia, 1997). Quanto às saídas, Peixinho de Cristo (1985) estima em 170 hm3/ano as extracções para rega, em 4,5 hm3/ano as extracções para abastecimento público e 4 a 5 hm3/ano as extracções para a indústria. Na situação actual, é provável que, tanto as extracções para a indústria como para abastecimento público, sejam inferiores àqueles valores devido à entrada em funcionamento do sistema de captação do Carvoeiro. Com base nestas estimativas, mesmo considerando as incertezas inerentes, verifica-se que o sistema é excedentário, mantendo-se o equilíbrio através das saídas naturais para a rede de drenagem. Qualidade

Considerações Gerais

Apresenta-se em seguida a caracterização química para cada uma das formações aquíferas, uma vez que se dispõe de dados que permitem fazer essa separação.

Plistocénico

Os dados referentes à qualidade da água subterrânea destes depósitos, são escassos, principalmente porque não são explorados por captações para abastecimento público. Uma caracterização sumária pode ser feita com base nalgumas análises realizadas por Carreira Paquete (1998). Dado o número reduzido de dados apenas se apresentam os valores médios e extremos (Quadro O1.4).

n Média Mínimo Máximo Condutividade (µS/cm) 8 547 447 675 pH 8 5,53 4,99 7,01 Bicarbonato (mg/L) 6 25,1 6,1 89,8 Cloreto (mg/L) 6 51,5 37,5 64,8

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Potássio (mg/L) 6 15,9 3,6 32 Nitrato (mg/L) 6 94,6 61,6 128,2 Sulfato (mg/L) 5 82,1 64,6 89,1 Sódio (mg/L) 6 34,4 22,3 56,9 Cálcio (mg/L) 6 40,5 28,5 48,5 Magnésio (mg/L) 6 17,4 11,4 34,4 Quadro O1. 4 - Médias e extremos das águas do Plistocénico do sistema aquífero Quaternário de Aveiro

De todos os iões, são os nitratos os que apresentam valores mais elevados, em todas as amostras, sendo este o parâmetro que mais se evidencia negativamente na qualidade destas águas. Outro ião que apresenta teores algo elevados, para algumas das amostras, é o potássio, o que pode significar, tendo em conta os valores dos nitratos, contaminação de origem agrícola.

Base do Quaternário

A caracterização geral da qualidade da água deste aquífero será feita com base em 34 análises de águas, cujas estatísticas principais de apresentam no quadro O1.5. Neste conjunto não estão incluídas análises de captações abandonadas por salgamento, depois de se ter iniciado a exploração, ou por se detectarem teores elevados de cloretos ou de ferro durante os trabalhos de construção.

n Média Desvio Mínimo Q1 Mediana Q3 Máximo Padrão Condutividade (µS/cm) 32 334 146 80 190 374 463 590 pH 34 6,7 0,9 4,55 5,9 6,98 7,33 8,8 Cloreto (mg/L) 34 34 11,3 15,9 23,6 35,5 42,6 59,1 Ferro (mg/L) 24 4,9 12,9 0,02 0,5 1,5 3,1 64,2 Sulfato (mg/L) 19 18 18 2,2 5,9 10,7 22,9 73 Dureza Total (ºF) 34 12 8,3 1 2,9 11,8 19,8 27,3 Alcalinidade (ºF) 31 13,4 8,7 1 2,3 18 20,5 25,6 Cálcio (mg/L) 32 37,1 27,7 1,6 5,7 32,2 62 84,8 Magnésio (mg/L) 32 7,3 4,9 0,9 2,9 6,5 10,7 21,1 Bicarbonato (mg/L) 31 29,4 16,3 6 18,5 26 34 79

Nitrato (mg/L) 17 2,2 3,5 0,01 0,04 0,8 2,3 12

Nitrito (mg/L) 7 0,1 0,2 0,001 0,001 0,01 0,08 0,5 Quadro O1. 5 - Principais estatísticas das águas da Base do Quaternário

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Os factos mais importantes a assinalar são as concentrações baixas de nitratos e nitritos, que se podem atribuir às características de confinamento do aquífero, e os valores elevados de ferro. Outros problemas que afectam a qualidade da água deste aquífero, e que não se encontram reflectidas no quadro acima, são o salgamento de captações e as contaminações industriais. Os valores mais elevados de ferro, estão associados a valores baixos de pH e à presença de condições redutoras induzidas pela matéria orgânica presente nas camadas de lodos que confinam o aquífero. Como já foi referido, este problema obriga ao tratamento da água. Os valores mais comuns situam-se entre 5 e 10 mg/L de ferro total, mas há alturas, quando o pH baixa para valores da ordem de 5, que os teores em ferro sobem para concentrações superiores a 50 mg/L. O salgamento de captações pode-se dar devido ao avanço da interface água doce/água salgada, ou devido a processos ainda mal esclarecidos, mas que provavelmente se relacionam com a drenância através das camadas lodosas contendo água salgada. Vários trabalhos de investigação têm abordado a problemática da contaminação industrial do aquífero, destacando-se os de Barradas (1992), Inácio (1993), Senos Matias et al. (1994), Ferreira (1996), Silva (1998), entre outros.

Dunas

A caracterização da qualidade da água deste aquífero será baseada em 60 análises de água provenientes de poços de grande diâmetro e de pequenos furos de captação, comuns em toda a "zona das areias" e designados por "sondas" ou "filtros" e retirados de Silva (1989). Alguns dos pontos amostrados situam-se perto do Complexo Químico de Estarreja e os resultados traduzem a influência dos efluentes industriais dessa estrutura. As estatísticas principais deste conjunto apresentam-se no quadro O1.6.

n Média Desvio Mínimo Q1 Mediana Q3 Máximo Padrão Condutividade 60 574 350 143 354 470 667 1785 (µS/cm) pH 60 6,0 0,7 3,8 5,8 6,2 6,4 7,3 Fluoreto (mg/L) 60 0,5 0,6 0,05 0,13 0,25 0,59 2,5 Bicarbonato (mg/L) 58 81 71 1 38,3 68 103,5 366 Cloreto (mg/L) 60 90 60 17 44 68 119 237 Ferro (mg/L) 60 0,59 1,61 0,065 0,118 0,163 0,242 11 Potássio (mg/L) 60 13 15 0,6 5,9 9,8 14,4 111

Nitrito (mg/L) 60 0,061 0,139 0,0034 0,012 0,0215 0,047 1 Nitrato (mg/L) 60 63 38 0,5 36 66 84 140 Fósforo (mg/L P) 60 0,87 1,61 0,03 0,1 0,25 1,04 10,4 Sulfato (mg/L) 60 82,5 56 10 45 69 98 297 Sódio (mg/L) 60 56 38 8 26 46 79 146

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Cálcio (mg/L) 60 40 19 2,9 33 44 49 95 Magnésio (mg/L) 60 10,6 12 1,4 4,9 6,9 8,9 76,6 Cobre (mg/L) 60 0,038 0,108 0,005 0,012 0,0175 0,024 0,834 Chumbo (mg/L) 60 0,062 0,0175 0,027 0,051 0,060 0,070 0,111 Zinco (mg/L) 60 0,234 0,629 0,012 0,026 0,065 0,15 4,0 Cádmio (mg/L) 60 0,005 0,003 0,001 0,003 0,004 0,006 0,021 Cobalto (mg/L) 60 0,053 0,022 0,01 0,04 0,05 0,06 0,142 Níquel (mg/L) 60 0,016 0,031 0,005 0,005 0,005 0,016 0,228 Manganês (mg/L) 60 0,108 0,141 0,006 0,018 0,052 0,124 0,710 Estrôncio (mg/L) 60 0,082 0,045 0,025 0,045 0,083 0,103 0,255 Quadro O1.6 - Principais estatísticas das águas de Dunas do sistema aquífero Quaternário de Aveiro

As características hidrogeológicas desta unidade aquífera, conferem-lhe condições de alta vulnerabilidade a fenómenos de contaminação. E este aspecto pode ser verificado de forma concreta, quer junto à Zona Industrial de Estarreja, quer em toda a bordadura da ria e do mar onde existe contacto entre o aquífero das dunas e esses corpos de água salgada. Assim, na região a Oeste de Estarreja, vários trabalhos demostraram altos níveis de contaminação com vários tipos de poluentes como metais pesados e produtos químicos orgânicos e não orgânicos. Junto ao mar e à ria também foram reveladas altas concentrações em cloretos como resultado da influência natural da interface água doce/água salgada. Deve acrescentar-se que campanhas geofísicas realizadas ao longo de grande extensão na zona costeira permitiram definir de forma clara a posição desse contacto entre a água doce e a água salgada (Figueiredo e Matias, 1998). Por outro lado, também se tem verificado, em amostragens avulsas levadas a cabo em certas zonas onde se pratica agricultura intensiva, que há igualmente contaminação resultante dessa actividade, notando-se nomeadamente altos valores de nitratos. Algumas concentrações de cloretos ultrapassam 200 mg/L, limite acima do qual podem ser consideradas nocivas. Certamente que estes valores elevados se deverão relacionar com a existência da ria e do mar. Os teores de nitratos são bastante elevados, havendo, como é óbvio, contaminação destas águas, que pode ser de origem agrícola ou industrial, pois um dos produtos fabricados no Complexo Químico de Estarreja eram precisamente compostos nitratados. Os valores mais elevados de potássio devem resultar de contaminações. O ferro, quase sempre associado ao manganês, é um dos problemas das águas do aquífero das dunas, uma vez que muitos dos valores estão acima do VMA. As concentrações elevadas destes metais estão relacionadas com condições redutoras, consequência da existência das formações lodosas muito ricas em matéria orgânica, fenómeno que também afecta o aquífero da Base do Quaternário. Outras anomalias nas concentrações de metais pesados, nomeadamente chumbo, relacionam-se com a perigosa contaminação industrial.

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Figura O1.4 - Diagrama de Piper relativo às águas das dunas (a branco) e do Plistocénico (a azul) do sistema aquífero Quaternário de Aveiro

Qualidade para Consumo Humano

Para caracterizar este aspecto da qualidade química das águas, foram usadas de preferência análises recentes. No entanto, para alguns parâmetros apenas se dispunha de análises antigas tendo-se, neste caso, usado estas. Nas tabelas seguintes faz-se uma síntese da qualidade, por aquífero, tendo como referência os anexos I, para a categoria A1 e o anexo VI, do Decreto-Lei N.º 236/98, de 1 de Agosto. Os resultados apresentam-se em percentagens.

Plistocénico

Anexo VI Anexo I -Categoria A1 Parâmetro VMR >VMA VMR >VMA pH 100 0 0 100 0 Condutividade 0 100 100 0 Cloretos 0 100 100 0 Sulfatos 0 100 0 100 0 0

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Cálcio 100 0 Magnésio 83 17 0 Sódio 0 100 0 Potássio 33 67 67 Nitratos 0 100 100 0 100 100 Quadro O1.7 – Apreciação da qualidade das águas do Plistocénico, face aos valores normativos

Da análise do Quadro O1.7, verifica-se que os nitratos e o potássio são os parâmetros que mais excedem o VMA, com destaque para os nitratos, em que todos os valores determinados estão acima daquele limite. Este facto está relacionado com contaminação proveniente da agricultura, denotando más práticas agrícolas.

Base do Quaternário

Anexo VI Anexo I -Categoria A1 Parâmetro VMR >VMA VMR >VMA pH 97 3 0 97 3 Condutividade 56 44 100 0 Cloretos 32 68 100 0 Dureza total 0 Sulfatos 68 18 0 86 0 0 Cálcio 100 0 Magnésio 100 0 0 Sódio 100 0 0 Nitratos 76 0 0 76 0 0 Nitritos 14 Ferro 4 96 79 8 88 75 Quadro O1.8 – Apreciação da qualidade das águas da Base do Quaternário, face aos valores normativos

Como já foi referido o principal problema de qualidade da água é a presença de ferro, verificando-se uma percentagem de violações do VMA de 79%. Outro parâmetro que apresenta alguma frequência de violações do mesmo limite é o nitrito. Quanto ao cloreto, apenas 32% destes valores são inferiores ao VMR, mas reitera-se a falta de significado global desta amostragem, já que não considera as captações localizadas em zonas onde o aquífero tem valores elevados de cloretos.

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Dunas

Anexo VI Anexo I -Categoria A1 Parâmetro VMR >VMA VMR >VMA pH 100 0 0 100 0 Condutividade 33 67 90 10 Cloretos 5 95 90 10 Sulfatos 8 92 2 90 10 2 Cálcio 100 0 Magnésio 95 5 2 Sódio 17 82 0 Potássio 52 48 38 Nitratos 22 77 67 22 77 67 Nitritos 15 Ferro 0 100 32 10 88 22 Manganês 27 73 52 48 52 Cobre 96 0 58 33 10 Chumbo 75 75 Cádmio 30 0 95 30 Níquel 3 Zinco 63 36 90 10 2 Fosfatos 62 38 3 62 37 Quadro O1.9 – Apreciação da qualidade da água das Dunas, face aos valores normativos

Como se pode verificar a partir da análise do quadro O1.9, a água deste aquífero é de muito má qualidade, pois os VMAs de numerosos parâmetros são ultrapassados com uma frequência elevada. Em grande parte, estas condições são devidas à grande vulnerabilidade do aquífero, e à presença de indústrias e duma intensa actividade agrícola. As concentrações elevadas de alguns parâmetros, nomeadamente cloreto e sódio, devem-se à proximidade da interface água doce/água salgada.

Uso Agrícola

Quanto às águas provenientes das Dunas a sua distribuição pelas classes definidas pela USSSL é a seguinte: C1S1 (6,9%); C2S1 (70,7%); C2S2 (3,4%); C3S1 (17,2%) e C3S2 (1,7%), como se observa na figura O1.5, o que significa que apresentam um perigo de salinização baixo a alto e um perigo de alcalinização baixo a médio.

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As águas do Plistocénico distribuem-se todas pela classe C2S1, pelo que representam um perigo de salinização do solo médio e um perigo de alcalinização baixo, como se confirma na figura O1.5.

Figura O1.5 - Diagrama de classificação da qualidade para uso agrícola (a azul as águas do Plistocénico; a branco as águas das dunas)

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