Sexta-feira 18 Dezembro 2009 www.ipsilon.pt

Para ver um mundo novo é preciso usar óculos Porque é que “Avatar” é a esperança de Hollywood? ESTE SUPLEMENTO FAZ PARTE INTEGRANTE DA EDIÇÃO Nº 7199 DO PÚBLICO, E NÃO PODE SER VENDIDO SEPARADAMENTE DO PÚBLICO, EDIÇÃO Nº 7199 INTEGRANTE DA PARTE FAZ ESTE SUPLEMENTO

João Ubaldo Ribeiro Vincent Delerm Albert Watson Endless Boogie J. Rentes de Carvalho

Nas próximas duas semanas, o Ípsilon chega às bancas um dia mais cedo, à quinta-feira: as edições de Natal e de Ano Novo do suplemento saem, respectivamente, dias 24 e 31 de Dezembro, umama vez que o PÚBLICO não é distribuído nos feriados das duas sextas-tas- feiras que aí vêm. É pôr um lembrete no telemóvel, já.

Mulheres ao ataque

Lourdes Castro, Jane e colaboradores na vida e nnaa Louise Wilson, Joana arte; e uma mostra de “The Eternal”, o 17.º álbum dos Sonic Youth, sai para o ano Vasconcelos, Marlene filmes e partes do arquivovo Dumas, Dara Birbaum, pessoal de Dara Birnbaumm Annemarie Schwarzenbach (Nova Iorque, 1946), e Ana Vidigal. Sim, é uma artista que se destacou nnaa lista de mulheres. Mas não é apropriação crítica das uma lista qualquer. Nela imagens televisivas. Outroro figura uma boa parte dos nome confirmado é o de Flash nomes com exposições Marlene Dumas ( Julho), programadas para 2010 nas numa exposição de obras instituições de arte mais recentes onde o público relevantes do país. poderá confrontar-se com queercore canadiano. É com uma 2010 em cheio para série de filmes dele - “The Coincidência? outras formas de ver/ fazer os Sonic Youth Raspberry Reich”, “No Skin of My Provavelmente, ou então pintura. Finalmente, em Ass”, “Give Piece of Ass a Chance” e nem por isso. Uma coisa é Outubro, “Às Artes Os Sonic Youth vão ter um 2010 em “Skin Flick” - que as comemorações evidente: no próximo ano, o Cidadãos!”, colectiva grande: são vários projectos em começam, já esta noite, no King panorama expositivo comissariada pelo director simultâneo, como uma banda (domingo há mais: “Otto: Or Up Sumário sonora para um filme francês, um With Dead People”, “Super 8 1/2” e promete ser bem mais do museu, João Fernandes, DVD e um novo álbum. “Hustler White”). Seguem-se dois “feminino”. sobre a interacção entre a Avatar 4 O álbum vai chamar-se “The dias de filmes a dois euros, No Museu de Serralves, arte e o activismo cívico e O futuro num par de óculos Eternal” e será o 17º da banda, que distribuídos pelo King e pelo inauguram em Março duas político. está quase a festejar o 30.º Monumental; do programa constam exposições importantes: No Museu Berardo João Ubaldo Ribeiro 10 aniversário (o primeiro álbum saiu uma homenagem a Joaquim Pinto, em 1981), contou à BBC Lee técnico, produtor e realizador de uma antológica que reúne salientam-se, em Fevereiro, Um grande livro sobre a pela primeira vez os uma retrospectiva de morte, aos 69 anos Ranaldo, vocalista e guitarrista dos alguns dos mais Sonic Youth: “Em princípio, vamos marcantes filmes nacionais e trabalhos de Lourdes Castro Robert Longo, com voltar ao estúdio no próximo ano.” internacionais do último quarto de e de Manuel Zimbro, passagem obrigatória pela José Carlos Barros 18 Antes de “The Eternal”, os Sonic século (com a exibição, por companheiros e “downton” nova-iorquina Ressuscitou o folhetim, com Youth estarão a trabalhar na banda exemplo, de “O Rei das Rosas”, de “O Prazer e o Tédio” sonora de um “teen movie” francês. Werner Schroeter, e de Apesar de não revelar nomes, “Recordações da Casa Amarela”, de Ranaldo admite estar muito César Monteiro, várias antestreias Resnais), um programa de Tudo sobre os Velvet Albert Watson 20 entusiasmado com este projecto: gordas (“Um Profeta”, de Jacques redescobertas que tanto passa por O fotógrafo de um olho só “Encontrámo-nos com o realizador Audiard, “OO Sítio das Coisas SySylvesterlvester Stallone como poporr Underground explica-se em entrevista em Paris e gostámos do que vimos.” SSelvagens”,elvagens”, ddee SpiSpikeke Jonze, “Sou“Soull Jacques Tati, e tratrabalhosbalhos ddosos Um DVD será igualmente lançado KitcKitchen”,hen”, ddee FatiFatihh AAkin,kin, “Cinzas e portugueses RoRodrigodrigo Primeiro foi “White Light/White Vincent Delerm 24 em breve com as gravações ao vivo SSangue”,angue”, ddee Fanny ArArdant,dant, “Non AAreias,reias, Bruno ddee AAlmeidalmeida Heat – The Velvet Underground Day- Um tipo normal (mas as da mítica digressão de “Daydream Ma Fille, Tu N’Iras Pas Danser”, e Rita Azevedo Gomes, By-Day”, um livro de Richie Nation”. O DVD incluirá também ddee Christophe Honoré”, “O entre outros. No Porto, a Unterberger lançado há uns meses canções são extraordinárias) filmagens de arquivo de gravações Laço Branco”, de Michael festafesta é sábado e domingo e que colecciona informações e históricas, algumas datadas de 1988. HaneHaneke,ke, “Vincere”“Vincere”,, ddee Marco nosnos cinemascinemas CidadeCidade do momentos da vida do grupo mítico Francisco Ribeiro 26 “Estamos a fazer uma grande BeBellocchio”,llocchio”, e “Les HerHerbesbes Porto e Teatro ddoo dos anos 60 e 70. Agora que se O fi m dos Madredeus não o limpeza aos nossos arquivos. Temos FoFolles”,lles”, dede AAlainlain Campo Alegre.Alegre. comemoram os 45 anos da sua matou, fê-lo mais forte uma enorme quantidade de fundação, surgem duas novas obras documentos de som e vídeo no dedicadas à banda que marcou a nosso estúdio em Hoboken. cena musical nova-iorquina. “The José Montalvo Contratámos uma pessoa para Velvet Underground – An Illustrated e Dominique Hervieu 28 organizar todos os arquivos e fazer History of a Walk on the Wild Side”, Com Gershwin pela história uma base de dados. Em breve, do conhecido crítico Jim DeRogatis, da América fora vamos começar a digitalizar e “The Velvet Underground”, do algumas cópias, porque muitas têm escritor e curador de museus Johan agora 30 anos.” Com tantos Kugelberg, têm registos bem Ficha Técnica arquivos, talvez os novos projectos diferentes mas ambos retratam o da banda não fiquem por aqui. percurso da banda com muitas Director Bárbara Reis imagens e alguns textos sobre Editor Vasco Câmara, Inês Nadais aqueles que são, para a “Time Out”, (adjunta) Bruce LaBruce os “maiores músicos de Nova Conselho editorial Isabel nos 2O anos da Iorque de sempre”. É uma Coutinho, Óscar Faria, Cristina homenagem susceptível de Fernandes, Vítor Belanciano Medeia (mas não em reacender o fascínio pelo grupo de Design Mark Porter, Simon Lou Reed e John Cale. carne e osso) “Otto: Or Up With Esterson, Kuchar Swara “The Velvet Underground – An Dead People”, Directora de arte Sónia Matos A rapariga do poster é Catherine Illustrated History of a Walk on the de Bruce LaBruce, Designers Ana Carvalho, Carla Deneuve, mas o acontecimento Wild Side” é uma história ilustrada passa no domingo Noronha, Mariana Soares mais extravagante do programa das do percurso do grupo, juntando à meia-noite Editor de fotografi a Miguel festas dos 20 anos da Medeia Filmes excertos de raras entrevistas e Madeira é mesmo Bruce LaBruce, o famoso explicando a importância da banda E-mail: [email protected] “pornógrafo relutante” do em textos que acompanham

2 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon Dizem a “Pitchfork”, o Bastou uma canção, conversações “Guardian”, Spike Jonze, “Crown On The Ground”: com diversas centenas de blogues o silvo da guitarra a editoras e Aposta e um par de vídeos no anunciar o que aí vem, as o primeiro site da “ABC News” palmas e os sintetizadores álbum deve que os Sleigh Bells, a a distorcer como volume sair até à vocalista Alexis Krauss nos “phones” acima do Primavera. e o guitarrista e produtor recomendável, a senhora Até lá, Derek Miller, serão um Krauss a dar-nos conversa temos isto: Alexandre Estrela vai estar na Culturgest e na Zé dos Bois dos acontecimentos como M.I.A. do rock’n’roll, http://www. do próximo ano. Alison Mosshart do myspace.com/ Desconfi ados com o R&B e, voilà, já ninguém sleighbellsmusic. entusiasmo, investigámos quer saber dos Crystal e juntamo-nos à euforia. Castles. A banda está em

nas exposições do ano que aí vem

comissariado de Miguel trabalhos de Vasco Araújo e (Outubro) são outros nomes Amado, e em Julho, depois de Javier Téllez, artista com exposições de uma exposição da dupla venezuelano radicado em programadas. brasileira de grafitti Os Nova Iorque, e uma mostra Nota final para a Galeria Zé Gémeos, as incursões antológica da obra de Ana dos Bois que prepara para televisivas do autor de Vidigal ( Julho) 2010 exposições de “Sleep” serão reveladas em Na Culturgest de Lisboa, em Alexandre Estrela, Gonçalo “Warhol TV”. Fevereiro, estão previstas Pena, Eduardo Matos e uma O Centro de Arte Moderna exposições do belga mostra de desenhos e (CAM) da Fundação Calouste Koenraad Dedobbeleer e do ilustrações de Emory Gulbenkian abre o ano com basco Asier Mendizabal. A Douglas, antigo membro dos uma exposição individual primeira é a apresentação Black Panther Party. José das irmãs britânicas Jane e mais extensa da obra de um Marmeleira Louise Wilson. É artista que trabalha de considerada a mais vasta da forma minuciosa e reflexiva,a, “Unfolding Aryan Papers”, das gémeas Jane dupla e inclui a muito com esculturas, objectos e e Louise Wilson, na Gulbenkian comentada “Unfolding fotografia, o contexto Aryan Papers”, que utiliza expositivo. Já Asier “stills” de um arquivo de Mendizabal articula o Stanley Kubrick e evoca um estético com o político a filme que este deixou por partir de legados como os realizar. Da nova temporada das vanguardas artísticas e do CAM, a primeira de da música punk. Alexandre Isabel Carlos enquanto Estrela e Cornelius Cardew dos anos 80, e “Auto- Schwarzenbach. Um mês directora, assinalam-se na Culturgest do Porto retratos do mundo”, depois inaugura “Sem ainda outros (Fevereiro e Maio, A fotógrafa Annemarie dedicada à produção Rede”, primeira antológica acontecimentos: “Mais que a respectivamente) e João Schwarzenbach é um dos fotográfica de Annemarie de Joana Vasconcelos, com o Vida”, que junta em Maio Queiroz em Lisboa nomes do ano no Museu Berardo posters, trabalhos artísticos e monografia inclui uma colecção de grande fã dos Velvet Underground. chamou-lhe o Kafka português e peças de teatro, de arte e fotografias. O livro é sobretudo objectos raros (fotos inéditas do Será, provavelmente, o mais perguntava: “Irá Gonçalo M. arquitectura, filmes de animação, visual e um verdadeiro regalo para primeiro concerto do grupo, completo retrato dos Velvet Tavares transformar-se num teses académicas, etc., e em vários os olhos, dizem os críticos. desenhos de Andy Warhol, notas Underground alguma vez realizado produto de exportação ao nível do países”, sublinha Gonçalo M. O entusiasmo com “The Velvet manuscritas de Lou Reed, – com algumas partes pungentes,ngentes, VinhoVinho do PortoP ou da Tavares ao Ípsilon. Underground”, de Kugelberg, ainda partituras de John Cale, excertos de como as que mostram queue esestestes saudade?”.saudade? Damos a resposta: A Dalkey Archive - a editora literária é maior: é um livro “monumental”, artigos de jornal) e abre com um deuses do rock são afinall sim,sim, GoGonçalon M. Tavares já independente de referência que digno de Picasso, escreve a revista prefácio do ex-Presidente da simples mortais. estáestá a tornar-seto um produto tem no seu catálogo alguns dos francesa “Les Inrockuptibles”. A República checa Vaclav Havel, um de expoexportação.r Nos próximos principais autores europeus – acaba anosanos teterár nove dos seus de editar “Jerusalém” e o livro foi Gonçalo M. livroslivros traduzidos nos recenseado na última edição do Tavares de mercadosme inglês e “The Times Literary Supplement”. americanoam – Assinada por Toby Lichtig, a crítica exportação Nove livros conhecidosc por serem fala de um livro “irónico”, de Gonçalo quase impenetráveis “opressivo” e “comovente”. E diz “Gonçalo M. Tavares M. Tavares para autores que não que a editora devia ser louvada por criou um Bairro a caminho do escrevem em língua ter levado “este pequeno livro portátil, um mercado de inglesa. “Agrada-me poderoso” até ao povo anglófono. maravilhoso Chiado língua inglesa o facto de todos os Na América e no Reino Unido serão literário – que jamais meus livros, mesmo também publicados os outros três arderá – onde compram os mais estranhos e romances do Reino – “Um Homem: pão e tomam aperitivos difíceis, estarem a ser Klaus Klump”, “A Máquina de ‘O Senhor Valéry’, ‘O traduzidos.tr Também Joseph Walser” e “Aprender a Rezar Senhor Juarroz’, ‘O Senhoror é importante sairem na Era da Técnica” (este já no Walser’, ‘O Senhor Henri’i’ váriosvá livros no mesmo próximo ano). Os direitos de cinco (Michaux), ‘O Senhor país.paí Esta continuidade Senhores da colecção Bairro Calvino’, ‘O Senhor Brecht’,ht’, é importanteim pois só também foram vendidos para entre outros. O seu Bairroo é assimassim os leitores podem editoras britânicas e norte- de uma originalidade estabilizarestab e conhecer o americanas. Mais dois livros, nos 45 anos da banda de Lou Reed e John Cale impressionante”, escreveueu trabalhotrab com alguma Os livros de Gonçalo M. Tavares têm Enrique Vila-Matas. Um ooutroutro profundidade.pro A reacção sido publicados em algumas das escritor, Alberto Manguel,el, ddiziz temtem sido óptima, a mais prestigiadas editoras de todo o que “cada um dos seus livrosvros diferentesdife níveis. Para mundo (a Feltrinelli de Itália, a (...) é um caleidoscópio qqueue alémalé da recepção aos Mondadori de Espanha e a manipula a realidade parara livroslivr - algumas de Companhia das Letras do Brasil) “a melhor a observar.” Na revistaevista pessoaspes que admiro um ritmo mesmo muito do “Figaro”, Elisabeth Barilléarillé muitomu - já aparecem surpreendente”, diz o escritor.

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 3 4 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon Este fi lme vai salvar Hollywood? “Avatar” está a ser escrutinado como poucos fi lmes o foram na História do cinema: porque é o primeiro de James Cameron desde “Titanic”; porque é o primeiro “blockbuster” sério a explorar a fundo o 3D digital. E há até quem coloque nos seus ombros o manto da salvação da indústria em crise. Jorge Mourinha

James Cameron e Sam Wothington, que interpreta Jake Skully, um ex-Marine paraplégico que descobre uma razão para viver através do “avatar” que controla no distante planeta Pandora A pergunta não tem sido posta des- ta maneira tão óbvia. Mas é essa a questão na cabeça dos observado- res: será o novo filme de James Ca- meron o “oráculo” que pode apontar a saída para a crise que Hollywood enfrenta? E porque o seria? Primeiro, porque é a primeira longa-metragem do rea- Capa lizador canadiano em doze anos, des- de “Titanic” (1997) que, com quase dois milhares de milhões de dólares de receitas, se tornou no filme de maior sucesso de sempre. Porque, depois, é o filme mais am- bicioso a tirar partido da nova tecno- logia de 3D digital — e o primeiro, que não é uma animação nem um filme de género, a pretender usar a técnica como algo mais do que simples “tru- que” de feira para chamar audiên-

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 5 James Cameron contra o mund Talvez apenas George Lucas se lhe possa equiparar. Mas onde Lucas é um visionário cerebral que delega a execução sempre que for possível, Cameron abraça d

É o próprio quem o diz: a um visionário cerebral que audiência natural de James delega a execução sempre que Cameron são os “fanboys” possível, Cameron abraça de obsessivos, os “nerds” corpo e alma esse estatuto, engenhocas, os “info-freaks” procurando ultrapassar-se com que acumulam montanhas cada novo projecto. O actor Bill de dados minuciosamente Paxton, cúmplice de longa data cruzados e inter- do realizador, disse à “New relacionados. Não é por Yorker” que há palavras acaso: os fi lmes que que não fazem parte fi zeram a sua reputação do seu vocabulário: são pedras-de-toques do Perfil “‘não’, ‘isso é impossível’ manual do culto do fi lme e ‘não pode ser feito’ de género, com atenção dão-lhe ponta”. O fi lme Mantém-se criou de raiz a linguagem aplicar ele próprio retoques simultânea à tecnologia e à que deu vontade a Cameron falada pelos alienígenas Na’vi de maquilhagem no plateau humanidade das personagens, de fazer cinema foi “2001: na estratosfera e uma cientista botânica que e conceber as criaturas numa dicotomia improvável Odisseia no Espaço” de Kubrick supervisionou a criação da fl ora que surgem nos fi lmes. mas equilibrada entre a emoção (1968), graças aos seus efeitos hollywoodiana mas do planeta – e supervisionou Consequência de ser alguém a e a ciência. especiais. E George Lucas lê a uma enciclopédia de 500 quem o trabalho manual nunca Recordemo-nos que a imagem criação de Pandora, o mundo vive fora da indústria; páginas que esmiuça os meteu medo — trabalhou como que guardamos pelo meio da extra-terrestre onde “Avatar” pormenores deste planeta que camionista, teve empregos tecnologia militarista de “Aliens decorre, como tentativa de é um dos raros capaz não existe. manuais para sustentar – O Recontro Final” (1986) é a desafi ar o universo criado para de impor a sua São bons exemplos do modo a primeira das suas cinco de Ripley fazendo-se à rainha “A Guerra das Estrelas” (1977). como se investe pessoalmente mulheres, e começou no cinema alien para defender a órfã que Para “Avatar”, o realizador vontade aos estúdios em cada um dos fi lmes, ao na linha de montagem de série B adoptou (“Get away from her, recrutou um linguista que ponto de manusear câmaras, de Roger Corman como técnico you bitch!”). Recordemo-nos que o centro emocional de “O Abismo” (1989) é o casamento em vias de desintegração de Mary Elizabeth Mastrantonio e Ed Harris. Recordemo-nos que por trás das viagens no tempo e das máquinas indestrutíveis dos dois “Exterminadores Implacáveis” (1984 e 1991) esteve sempre o ímpeto emocional de uma mãe que procura proteger o seu fi lho. Visionário determinado que se mantém no “loop” da rarefeita estratosfera hollywoodiana mas vive fora da indústria, é um dos muito raros cineastas capaz de impor a sua vontade aos estúdios nas suas próprias condições. Talvez apenas George Lucas se lhe possa equiparar. Mas onde Lucas é

Hollywood espera que “Avatar” seja um filme tão abrangente como “Titanic” do sistema, que exigia um sincronismo reduzindo o cansaço da vista e permitindo salas entre 1952 e 1955: os velhos óculos de perfeito entre dois projectores e facilmente que a experiência seja mais confortável para o plástico colorido que faziam doer a cabeça era desestabilizada, foi um dos factores que espectador. foram hoje substituídos por um “pastiche” contribuiu para o rápido desaparecimento do Há, no entanto, problemas a resolver: os óculos de óculos escuros sobredimensionados em formato, embora ressurgimentos posteriores absorvem parte da luminosidade da imagem, pelo Formato plástico preto, e a projecção digital permite eliminassem a necessidade de dois projectores que a qualidade da projecção será tanto melhor de relevo uma defi nição e um alinhamento de através de uma justaposição das duas quanto mais forte for a lâmpada do projector e imagem que só em condições felizes era imagens na mesma película. mais refl ector for o material da tela da sala. E, a Se a sua única memória do 3D é a possível encontrar nos anos 1950. O actual modelo digital permite que as naturalmente, o 3D presta-se mais a fi lmes de célebre transmissão televisiva do “Monstro Trocando por miúdos: o 3D digital tem pouco duas imagens, fi lmadas em simultâneo de grande espectáculo do que a histórias intimistas, da Lagoa Negra” na RTP-1, há 25 anos, a ver com o velho modelo “analógico”, que ângulos diferentes, sejam projectadas numa levantando dúvidas sobre as afi rmações de alguns podemos parafrasear os Monty Python: “E implicava a projecção sincronizada sobre um alternância hiper-rápida por um projector único entusiastas do formato que, um dia, todos os agora algo de completamente diferente”. écrã refl ector de duas películas rodadas e descodifi cadas pelos óculos polarizados, fi lmes serão feitos em 3D. Joe Dante, que rodou O 3D digital que a indústria promove hoje em simultâneo com ângulos e fi ltros recentemente em 3D o fi lme de terror “The Hole”, como formato salvador não tem nada diferentes para criar a ilusão de “Up- Altamente”, um dos filmes dizia aos “Cahiers du Cinéma” que não achava a ver com o formato que fez furor nas profundidade. A complexidade mais vistos em Portugal que todos os fi lmes ganhassem em 3D. Opinião

6 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon do a de corpo e alma esse estatuto.

Tecnologia e humanidade, uma dicotomia improvável mas equilibrada entre a emoção e a ciência: “Exterminador”, “O Abismo”, “Alien 3”

de efeitos especiais e decorador. Corman fi cou tão impressionado que o encarregou da concepção das naves em “Batalha para Além das Estrelas” (Jimmy T. Murakami, 1980), e daí para a frente Cameron subiu a pulso, dirigindo os seus dois primeiros fi lmes. O segundo chamou-se “O Exterminador Implacável” e nasceu de um sonho que tivera durante uma pós-produção catastrófi ca em Itália; custou cia, mas antes como uma janela Sigourney seis milhões a rodar e rendeu, à para um universo criativo. Weaver tem estreia, 80. Porque, enfim, Cameron é um vi- uma Claro que, depois, não se é sionário que, de cada vez que filma, participação visionário impunemente. A expande as fronteiras do que a tecno- especial num “cobra de água” de “O Abismo” logia permite (bem como a dimensão filme que não e o robot de metal líquido de das úlceras dos estúdios). Para “Ava- tem nomes de “Exterminador Implacável tar” criou um novo sistema de câma- estrelas a 2” forçaram a programação ras tridimensionais e refinou a tecno- suportá-lo de efeitos especiais para lá logia de “performance capture” que do que era possível até então, permite transformar em animação valendo em ambos os casos o digital o registo do movimento e da Óscar à equipa de Cameron; expressão facial dos actores – chutan- “Titanic” exigiu a construção do para canto as tentativas de Robert de um estúdio sufi cientemente Zemeckis em “Polar Express”, “Beo- grande para albergar a réplica wulf” ou “Um Conto de Natal”. do paquete; “Avatar” necessitou Mas, sobretudo, porque Hollywood, de 18 meses de trabalho ela própria, não sabe bem para onde para a criação do sistema de se virar para manter o seu estatuto de “performance capture” que é fábrica de sonhos. E, ao entregar-se nas dos comentadores entre a previsão central ao universo visual do mãos de Cameron, cineasta gloriosa- Cameron esperou da catástrofe e os elogios triunfalistas, fi lme. E ai de quem se atravesse mente incontrolável que escreveu “Ava- todos os anos se batem recordes de no caminho de Cameron – Dana tar” há quinze anos e preferiu guardá- 15 anos para poder receitas e de espectadores. Goodyear, na “New Yorker”, fala lo na gaveta até a tecnologia lhe permi- ter a tecnologia que Mas, por trás dos triunfos globais do pesadelo que foi a rodagem tir cumprir a sua visão, não há garantias de “blockbusters” descartáveis como subaquática de “O Abismo” que a salvação que procura esteja ao lhe permitisse filmar “2012” ou “Transformers: Retaliação”, (referenciada por aqueles que seu alcance. Porque, como o próprio ou dos êxitos de produções modestas a viveram como “O Abuso”...), disse à Associated Press, quanto mais “Avatar” como “A Ressaca”, “Distrito 9” ou conta o modo como Cameron alto for elevada a fasquia das expecta- deitou abaixo o trabalho de tivas, maior pode ser a desilusão. pré-mistura de som numa cena de “Avatar”, refere a postura “eu- Crise 2009 contra-o-mundo” que é quase Dizer que Hollywood precisa de ser conversa quando Coppola esteve em Portugal em automática sempre que entra em salva parece uma afirmação lírica. Os Outubro para apresentar “Tetro” no Estoril Film produção de um fi lme. números de bilheteira americanos são Festival, e debateu o que considera ser a situação Faz pensar como é que um escrutinados meticulosamente ao lon- periclitante em que Hollywood se encontra estúdio se sujeita a estas go do ano e, apesar da oscilação “devido à concorrência de outras formas de coisas – a resposta é simples: entretenimento.” Coppola não tem hesitações na esperança de terem o Santo 505 mil espectadores, rendeu apenas 2 milhões em declarar que, para os estúdios, o 3D é “uma Graal do cinema. E até os e 340 mil euros - menos 280 mil euros que “Up”, mais-valia para convencer o público a sair de estúdios, com a sua proverbial apesar de ter feito quase mais 50 mil espectadores. casa e ir ao cinema, mas sobretudo um modo mentalidade de merceeiros, dados do Instituto E “Força-G”, com nove mil espectadores a menos de travar a pirataria, que é uma coisa que eles percebem que é preciso alguém do Cinema e do que o 20º fi lme da lista, “À Noite no Museu 2”, não sabem como resolver — e não vão resolver.” sufi cientemente visionário Audiovisual, foram rendeu mais 200 mil euros do que este... Para Coppola, o formato é a mais recente “tábua de para o fazer. J. M. duas animações Não surpreende, por isso, que “Avatar” estreie salvação” de uma Hollywood “desesperada e em má 3D: “A Idade do com mais cópias em 3D: segundo informação da forma”, que procura uma solução que lhe permita Gelo 3: Despertar distribuidora Castello Lopes, o fi lme vai ser lançado manter o “status quo”. “Quando se lê que tal fi lme dos Dinossauros”, com 50 cópias em 3D digital contra 37 em formato rendeu 150 milhões de dólares isso não inclui o que partilhada até certo ponto por David de Carlos Saldanha e convencional... eles gastaram em publicidade em ‘marketing’, que Cronenberg que, quando esteve no Estoril Michael Thurmeier, e “Up muitas vezes é três quartos desse valor, já para não Film Festival em Novembro, admitia que a – Altamente!”, de Pete Docter falar do que têm de partilhar com a mão-cheia de alta defi nição é um formato excitante e que e Bob Petersen. “A Idade do Gelo 3” reuniu 665 “O 3D é um modo de actores. Se os estúdios continuarem como estão, o 3D original, nos anos 50, era um “truque mil espectadores para uma receita bruta de 3 travar a pirataria” daqui a uns anos estão acabados. O mercado do desastrado”, razão pela qual não durou. Mas milhões e 758 mil euros, enquanto “Up” fez 459 vídeo salvou-os – porque eles recebiam directamente o canadiano acredita que “Avatar” pode fazer mil espectadores e 2 milhões e 620 mil de euros. a Não deixa de ser irónico que um dos grandes 80 por cento dos lucros e admitiram que, se não a diferença entre a tecnologia pela tecnologia e o A lista dos 20 fi lmes mais vistos até fi nais de visionários do cinema americano, Francis Coppola, tivessem tido esse benefício no que era na altura formato como ferramenta. Outubro inclui ainda duas outras estreias 3D – em seja hoje um céptico da tecnologia. Mas a ambição o VHS e mais tarde o DVD, não poderiam ter Para já, alguns fi lmes produzidos tradicionalmente 7º lugar a animação “Monstros vs Aliens” (299 do “cinema electrónico” (elaborado sobrevivido. Agora o mercado do vídeo e têm sido “redimensionalizados” digitalmente para mil espectadores, 1 milhão e 708 mil euros) e, em processo de pré-visualização à frente do DVD veio abaixo e a pirataria e os 3D – os dois primeiros “Toy Story” da Pixar e o 13º, a aventura “Força-G” (161 mil espectadores, do seu tempo) do realizador de “Do descarregamentos estão a comer “Estranho Mundo de Jack” de Tim Burton – com 955 mil euros, e que continuava em exibição Fundo do Coração” contribuiu muito desse lucro. Pessoalmente, vista a um relançamento em sala e a mais alguns em Novembro). Todos eles estrearam numa em parte para o descalabro não vejo como é que eles lucros fi nanceiros... combinação de cópias tradicionais em 35mm e fi nanceiro que afundou a sua conseguem sobreviver. E não sei cópias digitais em 3D – há ainda muitas salas do produtora Zoetrope no início de nenhum grande estúdio que circuito português que não estão equipadas em da década de 1980, e as suas faz fi lmes comerciais que não se O efeito 3-D por cá... digital - mas o efeito do preço mais caro do bilhete experiências dão-lhe uma visão pergunte como vai sobreviver. É a Os dois fi lmes mais vistos em Portugal 3D demonstra-se num instante. O terceiro fi lme privilegiada da indústria. por isso que eles falam tanto do entre Janeiro e Outubro de 2009, segundo os mais visto da lista é “Anjos e Demónios”, que, com O 3D surgiu naturalmente na 3D...” J. M.

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 7 “Actividade Paranormal”, a crise não passou ao lado da indústria. Os fundos de investimento globais, uma das mais fiáveis fontes de finan- ciamento nos últimos anos, reduzi- ram o investimento ou fecharam a torneira. O mercado do DVD, uma das maiores fontes de receitas, entrou em queda e a transição para o formato Blu-Ray está longe de compensar o dinheiro perdido. As seis grandes “majors” hollywoodianas reduziram o seu volume de estreias anuais, fe- charam ou venderam divisões espe- cializadas ou menos rentáveis, entra- zas naturais do planeta. O 3D introduz de duas cores que davam uma dor de mes de terror, usada como truque ram em contenção de despesas e fi- Cameron usa apenas uma dimensão extra no uni- cabeça desgraçada ao espectador. A visual. Se, na animação, “A Idade do zeram despedimentos em larga verso visual que justifica em absoluto técnica foi abandonada ao fim de um Gelo 3” e “Altamente” confirmaram escala. E, pior, os “blockbusters” têm- o 3D como janela o deslumbramento. par de anos. Até que a tecnologia de que a técnica, bem usada, pode ser se estampado. 2009 foi um ano negro para o Mas, por outro prisma, “Avatar” é projecção digital permitiu resolver o mais do que isso, “Avatar” é a primei- para duas das seis grandes, a Univer- o pior pesadelo de qualquer estúdio: problema: hoje, o 3D é mais agradá- ra tentativa de aplicar a tecnologia a sal e a Disney, que substituiram pron- universo não tem uma estrela de primeira vel para o espectador, que adiciona um filme “sério” – e o seu sucesso po- tamente as suas direcções criativas. grandeza a transportá-lo (Sigourney alguns milhões de dólares ao orça- derá abrir as portas à utilização da O que complica tudo é que, hoje, a de Pandora, como Weaver tem apenas participação es- mento de um filme mas permite técnica como mais uma ferramenta regra é um filme de Hollywood lucrar pecial), não é uma sequela, não se igualmente aos estúdios e aos exibi- na caixa dos realizadores em vez de um terço da sua receita em sala, um um modo de reforçar baseia numa personagem de BD, e dores cobrar uma sobretaxa no bi- um “gimmick” visual de vida efémera terço no circuito internacional e um custou tão caro que é legítimo per- lhete para cobrir o aluguer e manu- ou uma técnica limitada a géneros terço em DVD, fora os valores astro- os seus cuidadíssimos guntar se alguma vez recuperará o seamento dos óculos. Ou seja: como específicos. Cameron usa o 3D como nómicos investidos no “marketing”. efeitos visuais; investimento (fala-se de 500 milhões o bilhete é mais caro, o estúdio e o janela para o universo de Pandora, Se o terço do DVD se vem abaixo e e de dólares entre rodagem, pós-pro- exibidor ganham mais e, por conse- como um modo de reforçar os seus se o filme não rende em sala? Hous- mais do que “épater dução e “marketing”, número que a guinte, lucram mais. cuidadíssimos efeitos visuais; mais do ton, temos um problema. Twentieth Century-Fox já desmentiu É esse lado pragmático, financeiro, que “épater le bourgeois”, a ideia é Ainda não começámos sequer a fa- le bourgeois”, como “ridículo” e que fontes põem que explica porque é que a indústria tornar este universo tão fotorrealista lar da oferta televisiva entre canais mais próximo dos 250 milhões). E é está tão interessada em impôr o 3D: como o mundo lá fora. E, no proces- generalistas e de cabo e a disponibi- a ideia é tornar este este filme que vai salvar uma fonte de receitas que pode re- so, possibilitar um retorno ao ponto lização de programas online, do “ho- Hollywood? presentar a diferença entre ganhar zero do maravilhamento que o cine- me cinema” (apesar de tudo, é mais universo tão ou perder dinheiro – razão pela qual ma criou nos inícios. barato ficar em casa a ver um DVD no fotorrealista como Armas secretas Francis Coppola é um céptico do for- Cameron é a primeira pessoa a ad- LCD do que meter-se no carro para ir A “arma secreta” de “Avatar” são du- mato [ver caixa]. miti-lo, como disse a Dana Goodyear, ver um filme ao multiplex), ou da par- o mundo lá fora as. Uma chama-se “3D digital”. A ou- No entanto, até agora, a tecnologia da “The New Yorker”: “A ironia é que tilha de ficheiros online que tanto tra chama-se “fé”. tem sido maioritariamente restrin- as pessoas pensam [em “Avatar”] co- disponibiliza clássicos que não se vê- O cinema em 3D ainda gida a produções específicas, fil- mo um filme em 3D e a discussão não em nas salas ou encontram em DVD tem a reputação de tru- mes-concerto, animação e fil- passa daí. Mas penso que, quando o como versões pirateadas dos novos que de feira que ga- virem, essa discussão desaparece. A lançamentos em sala. nhou quando surgiu tecnologia é suficientemente avança- No meio desta paisagem, “Avatar” pela primeira vez da para desaparecer sozinha” — e ape- é, visto por um prisma, o sonho de nos anos 1950, com nas ficar a história que ela serve. E tem qualquer estúdio: uma experiência os óculos baratos razão: a proeza técnica esbate-se à cinematográfica que não é possível medida que o filme avança. viver a não ser numa sala de cinema. Um filme realizado por um cineasta Fé de sucesso garantido, que inventou É isso que justifica a “fé” como arma uma nova maneira de criar efeitos vi- secreta — fé da Fox em que Cameron suais, que força os limites da tecnolo- seja capaz de cumprir o que prome- gia. Em rigor, a narrativa de “Avatar” teu: fazer um filme capaz de recupe- não precisa do 3D para nada: um ex- rar esse deslumbramento primordial Marine paraplégico descobre uma ra- de ver qualquer coisa que nunca se zão para viver através do “avatar” que conseguira ver antes. E, sobretudo, controla no distante planeta Pandora também fé em que Cameron consiga junto dos Na’vi, povo que vive em har- com “Avatar” um novo “Titanic”, um monia com a natureza e que ele acaba filme de tal maneira abrangente no por liderar numa revolta contra os hu- seu “código genético” que toda a gen- manos que querem explorar as rique- te o queira ir ver.

8 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon Comen- tário 3D (or not 3D)

ollywood é uma vítima do seu sucesso. Luís Miguel Andou um século a formar o imaginário de Oliveira um planeta inteiro e, mal pôde, com a Hinvenção dos “downloads” ilegais, o planeta pôs-se a pirateá-la sem dores de alma. São milhões de espectadores a menos e a ameaça de uma crise sem precedentes na indústria é bem real. Para convencer as pessoas de uma coisa de que elas há muito deixaram de querer ser convencidas - que ver um fi lme numa sala de cinema não é o mesmo que vê-lo num ecrã de computador ou num televisor - os cérebros de Hollywood lembraram- se de ir buscar a ideia das 3 D. Parece que não “passa” nos “downloads” e fi ca como Estou a ser mais exclusivo da sala. Quer dizer: há muita coisa que não passa “enganado” a olhar para nos “downloads” mas para explicar isso a uma geração o filme com os óculos ou educada nos ecrãzinhos do sem os óculos? YouTube (“the pictures got smaller”, dizia a Norma Desmond de Billy Wilder, sem saber da missa a metade) nada melhor do que encontrar uma “saliência” que entre pelos olhos adentro. Como as três dimensões. Eis-nos, portanto, perante o que se anuncia como o “cinema do futuro”. Convém ser cauteloso. O melhor é esperar uns anos para se perceber o que o futuro foi. Aliás, e neste caso, também se pode dizer que se trata do “cinema do passado”. As 3 D não são uma invenção nova, antes a recuperação de uma das respostas da indústria quando, nos anos 50, sentiu o embate provocado pela TV. Vieram daí também o “cinemascope” e os 70mm, coisas que “engrandeciam” os fi lmes e os afastavam dos tamanhos dos televisores. A aposta nas três dimensões foi, então, a mais residual, rapidamente abandonada sem muitos fi lmes memoráveis. O melhor foi “Dial M Murder”, um óptimo Hitchcock (que se vê perfeitamente na versão “2D”); mas também toda a gente se lembra do “acontecimento” que foi a passagem na TV portuguesa, em fi nais dos anos 80, de outro destes fi lmes, o “Monstro da Lagoa Negra” de Jack Arnold, que implicou a distribuição em massa de óculos de cartão Não é, por isso, casual que o pró- galómanos (“As Portas do Céu”, de com lentes coloridas. E também toda a gente se lembra prio Cameron, numa entrevista com “Avatar” é o sonho Michael Cimino, “enterrou” a United do anti-climax: se a intenção era mostrar porque é que as Geoff Boucher, do “Los Angeles Ti- de qualquer estúdio: Artists em 1980) não se pode sentir à 3D tinham sido postas de lado não se podia ter escolhido mes”, tenha alinhado “Avatar” com vontade ao colocar uma aposta tão melhor. filmes como “Danças com Lobos” uma experiência forte como “Avatar” nas mãos de um Em “Avatar” estamos longe da técnica rudimentar (Kevin Costner, 1990), “A Floresta Es- dos raros cineastas que é impossível do fi lme de Arnold mas não nos livrámos dos óculos. É meralda” ( John Boorman, 1985) e “A que não é possível controlar. uma razão para torcer o nariz ao “cinema do futuro”: Brincar nos Campos do Senhor” (Hec- Sejamos honestos: com toda a aten- isto é ainda demasiado incómodo. Tenho a sorte de tor Babenco, 1991), ou invocado o no- viver a não ser numa ção que tem gerado, dificilmente (por enquanto) não precisar de usar óculos, e nunca me me de escritores clássicos como Ru- “Avatar” será um desastre de bilhe- habituei sequer a usar óculos de sol. Para quem for como dyard Kipling, Edgar Rice Burroughs sala de cinema. teira, e convirá não esquecer que eu, passar duas horas e três quartos com aquelas coisas ou Joseph Conrad. O que filmou, na Um filme realizado 2009 tem provado ser um ano de ou- penduradas na cara implica sofrimento: comichões nas realidade, é a história de uma viagem ro para a ficção científica – a “space orelhas, e a desconfi ança de que aquilo me está a fazer iniciática numa outra cultura dobrada por um cineasta de opera” pós-moderna de “Star Trek” mal à vista. Mas se dou por mim a tirar os óculos de vez de redenção e redescoberta – Jake ( J. J. Abrams, 2009) e a sátira socio- em quando há outra razão para além do desconforto. É Sully, o Marine interpretado por Sam sucesso, que inventou política de “Distrito 9” (Neill para ver como é “aquilo” sem os óculos (há planos que Worthington, transita da cultura guer- Blomkamp, 2009) ressoaram com são autênticos borrões), numa indecisão quanto ao que é reira humana para a cultura guerrei- uma nova maneira audiências globais de modos impro- mais “real”: é o fi lme, tal qual está a ser projectado, ou é ra Na’vi através de uma série de ritu- váveis. “Avatar” cruza esses ângulos o efeito criado pelas lentes? Estou a ser mais “enganado” ais de passagem claramente inspira- de criar efeitos e mais, numa espécie de “megamix” a olhar para o fi lme com os óculos ou sem os óculos? Esta dos pelas aventuras exóticas que visuais. Mas, por dos “greatest hits” dos filmes de aven- leve angústia é uma sensação nova numa sala de cinema, fizeram sensação nos primeiros tem- turas siderais. e não deve ser descartada. pos do cinema. outro prisma, Mas, como se costuma dizer, “cada As 3 D são o melhor de “Avatar”, que é o pior fi lme de A esse nível, então, “Avatar” é uma caso é um caso”. E convém sempre Quem se Cameron. Em certos planos, a impressão de nunca ser jogada triplamente arriscada. Não pode ser o pior recordar as palavras sábias do grande lembra da ter visto nada “assim” é fortíssima, um “frisson” sensorial apenas usa uma técnica de um modo argumentista William Goldman: em passagem (bem a calhar num fi lme tão chocho) que muda algo, de como nunca foi usada antes como o pesadelo Hollywood, ninguém sabe nada. Só na TV facto, na experiência. É o “futuro”? faz num filme que invoca uma heran- acham que sabem. E é por isso que portuguesa, Sobre isso, três coisas. Primeiro, isto ainda é o mais ça criativa esquecida, e, sobretudo, “Avatar” pode não salvar Hollywood. em finais dos velho truque do mundo, um “comboio dos Lumière” implica um colossal investimento fi- Mas da reputação já ninguém o li- anos 80, do para um espectador que, cento e tal anos depois, já nanceiro que repousa nos ombros de vra. “Monstro da se tornou “blasé” perante as imagens convencionais. um cineasta incontrolável. Cameron E as expectativas? Talvez seja me- Lagoa Negra” Segundo, ainda não é uma mudança de paradigma: trabalha dentro de Hollywood, sim, lhor deixá-las em casa. que implicou a apesar das “nuances” na percepção do espaço e do mas nos seus termos: “Exterminador O avatar de distribuição relevo, a experiência continua a ser contemplativa, a Implacável 2” (1991) foi o primeiro Jake Skully Ver crítica de óculos de “quarta parede” ainda está bem defi nida (não há imersão filme a ultrapassar os 100 milhões de vai liderar os de ffilmesilmes pápág.g. 4444 cartão com do espectador, nem confusão quanto ao seu lugar). dólares de orçamento, “Titanic” o Na’vi, povo lentes Terceiro, num dos canais servidos no cabo apanhei há primeiro a passar os 200 milhões - de que vive em coloridas? tempos um programa sobre as maravilhas tecnológicas tal maneira que a Fox se viu obrigada harmonia com que nos esperam. Uma dessas “maravilhas” era um a encontrar um parceiro de financia- a natureza, sistema que visa arrancar a televisão ao televisor e mento e Cameron abdicou do seu numa revolta espalhá-la pelas quatro paredes, chão e tecto, com o salário para garantir controle criativo contra os espectador no meio. Se isto for verdade, parece que, (depois do êxito, a Fox restituiu-lhe o humanos que lamentavelmente para Hollywood, o “cinema do futuro” dinheiro). querem se vai passar longe das salas de cinema. Mas, dúvida: Depois do triunfo de “Titanic”, ne- explorar as nesse futuro, a que é que chamaremos cinema, e o que é nhum estúdio ousaria restringir Ca- riquezas do que chamaremos ao cinema? meron. Mas uma indústria com his- planeta tórias de horror de realizadores me- Pandora

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 9 A MIRAND O DE ADRIAN S RAFIA OG T O FOTOGRAFIAS DE ADRIANO MIRANDA FOTOGRAFIAS F

CadaCada llivroivro nnovoovo de JJoãooão UbUbaldoaldo RRi-i-i um livroliivro comcom muitomuito ddee seu, das suas beirobeiro deviadevia ser mmotivootivo nnãoão dizemdizemosos memóriasmemórias de família.família. É também uma ded feriadoferiai ddo mmasas ppeloello memenosnos ded ffesta.estat . formafforma ded ddarar umauma “olhadinha”“ollh na sua PorPor váriosvários motivos, quantoquanto mais nnãoão própriaprópria morte, conconfessa.fes E é, em úl- fossefosse pporor esse portentoportento da literaturaliteratura timatima instânciainstância,, um livroliv sobre essa queque era “Viva o Povo BraBrasileiro”,sileiro”, de sagezasageza que só o tempotempo traz: a consci- 1984,1984, um dosdos poucos livros editadoseditados ência de que, como admitea Ubaldo nono pós-guerrapós-guerra a memerecerrecer sesemm a mamaisis RibeiroRibeiro nestnestaa “conversa”“convers em tom con- pequenapequena dúvidadúvida o epíteto ddee oobra-bra- fessional,fessional, não sabemossabemo nada. Bem, prima.prima. E quandoquando dizemosdizemos “um dosdos uma coisa sabemos: asas perguntas fo- poucospoucos livros (…) a merecer”, não ramram enviadas pporor ememail,a mas as res- estamos a cingir-noscingir-nos ao Brasil, antes postaspostas vieram em qquatrou longos fi- a referir-nosreferir-nos a este mundomundo inteirointeiro de cheiroscheiros áudio.áudio. TentámosTentá editar o livroslivros medíocresmedíocres semsemanalmenteanalmente llau-au- menosmenos possível, parapara que se tenha dadosdados ccomom cinccincoo enteentediadasdiadas estreestrelaslas acessoacesso ao humorhumor e à humildadeh des- porpor críticos e lleitoreseitores memedíocres.díocres. tete extraorextraordináriodinário escritor.escr Assim sendo, “O Albatroz Azul”, DemorouDemorou muitos aanosn a voltar primeira obra de Ubaldo Ribeiro em à edição.edição. Alguma razãora em sete anos merece toda a atenção, pa-pa- particular?particular? rara mais sensendodo a sua primeira obraobra IssoIsso se deveudeveu a uma ssérie de peque- desdedesde o Prémio Camões (atribuído(atribuído nosnos incidentes. É meimeioo ridículo dizer no ano passado).passado). É semsemprepre difícil isso, mas a maior ppartearte deles ocorreu vencervencer a barreira de um pprémiorémio comcom os meus computadorescomputa – só ago- ded consagração, mas este exex-- rara estou com compcomputadoru estável. jornalistajoj rnalista e ex-guionista nascido Mas isso é história mmuitou comprida e háh qquaseuase 69 anos em ItaItaparica,parica, podepode haverhaver gente que se sinta acusa- localllocal ondeonde decorredecorre a acção,acção, sai- dada com a minhaminha revelação,revel por isso ses porpor cima: a obra é um como- nãonão qquerouero sesequerquer falfalara disso [risos]. ventevente solilóquio de um velho, SeSe a autor abandona o romance no TertulianoTeT rtuliano Jaburu, que intui, começo, é comum quequ aconteça o contraccontra o senso comum, que o que Zé RubemRubem Fonseca,Fonsec meu amigo seuses u neto nascerá com o cu vivi-- e grangrandede escritor, cchamaha de desan- radorrado pparaara a llua,ua, o qqueue reredimi-dimi- dar:dar: o romance desandadesan e perde-se rár a sua vida. Daí parte-separte-se o contactocontacto com os pepersonagens,r aca- parappara uma sasagaga familiar em ba-se perdendo o romance.rom Acabou quequq e se descobre o grande acontecendo isso comigo.com Eu devia segredosegredo dodo bastardobastardo Tertu-Tertu- umum livrolivro à NovaNova Fronteira.Fronte Fiz um ro- lianoliano - é,é, em úúltimaltima instân- mancemance para entregar e esse romance cia, a análise de um tempotempo desandou – não esse, queq publiquei, que passou, do cruza-cruza- mas vários romancesromances desandaram. mento dos povos brasilei- Antes de “O AlbatrozAlbatroz AAzul” veio todo ror e portuguportuguês.ês. umum cemitéricemitérioo ddee emembriõesbr de roman- “O“O AAlbatrozlbatroz AzuAzul”l” éé,, as- ces. Esta entrevista vvai-sea prolongar, sumessuume JJoãooão Ubaldo Ribeiro, masmas a culpaculpa não é minha,min é sua. Uma ol

O novo rromanceo do e ppoucasouca páginas. É No meio do caminho, não sei porquê, [este livro] começou a parecer um livro pequeno. Eu sou “O Albatroz Azul” tem como proporções semelhantes a “Viva o Po- livro. E assim se perdeu o nome da epígrafe a frase “Ninguém um escritor muito vo Brasileiro”, mas no meio do cami- família com os casamentos. Os genes sabe”. No livro, ninguém nho, não sei porquê, ele começou a permanecem, mas o nome desapa- sabe nada. Só o protagonista, assim, vou muito parecer um livro pequeno. Eu sou um receu. Seguramente há coisas na mi- Tertuliano Jaburu, sabe uma escritor muito assim, vou muito pelo nha história familiar ou de gente pró- coisa e ainda por cima uma coisa pelo embalo do embalo do momento, não sei o que é xima que estão no livro. improvável. A epígrafe serve que acontece. Basta dizer que como Aquela comadre do avô de como programa literário do que momento, não sei sempre pus o título ao começar a es- Tertuliano, que educa o pai de se vai seguir, ou é a sua visão crever mas até meados do livro eu não Tertuliano, é uma figuração sobre o mundo? sabia que albatroz azul era esse. O tí- matriarcal que pode ser vista As minhas epígrafes são sempre mi- o que é que tulo foi ditado por algum fantasma do como universal (a fêmea Livros nhas mesmo, não tomo emprestado inconsciente. Aconteceu dessa forma enquanto guardadora a todo o de ninguém. Até sei porquê, mas é acontece. Basta que para mim é misteriosa, não sei se custo do ninho)? Ou isso não lhe uma história comprida que não deve para os outros é costumeira. importou para nada? interessar a ninguém. Eu pus essa dizer que como Que percentagem de ficção Não me importou. O que eu [quis], epígrafe porque realmente acho que há na história da família certamente baseado no que já vivi ou no livro transparece que nem mesmo sempre pus o portuguesa de onde vem me contaram, foi imaginar o que se- a sabedoria de Tertuliano, que de Tertuliano? Até que ponto ria uma brasileira dessa época, ainda certa forma é venerada pelos seus título ao começar o grau de tragédia que há não de todo desvinculada das suas contemporâneos, porque ele é sábio, nesta família corresponde ao raízes portuguesas, ainda com uma um velho vivido e equilibrado, chega que conhece dessas famílias linguagem alusitanada – não sei se dá a esclarecer verdade alguma – nem a escrever mas até instaladas no Brasil? para um leitor português sentir essa sei se essa verdade é esclarecida no Ah, histórias que eu conheço há cer- linguagem, mas o brasileiro certa- romance. Mas eu acho que o roman- meados do livro eu tamente. Há histórias, episódios, per- mente sente. ce mostra o que a epígrafe diz: que sonagens, mais ou menos tirados da Podemos dizer que “o Mal” é ninguém sabe, que não é dado ao ho- não sabia que vida real. Acho que nesse caso há representado pela comadre mem saber a resposta a essas indaga- constantemente e bastante conscien- do avô de Tertuliano, que ções, não importa quão antigas. Re- albatroz azul era temente referência à minha própria está próxima de uma visão firo-me a indagações sobre a existên- família. O meu pai, Manuel Ribeiro, antiga em que a mulher era cia, a vida e a morte, o tempo, esse. O título foi era filho do português João Ribeiro e portadora da desgraça? Não há questões que se diriam filosóficas, à da brasileira Amália Ribeiro. Essa fa- aqui a denúncia de um mundo falta de melhor palavra. mília portuguesa não tem nada a ver tremendamente machista? Fica-se com a ideia de que, se ditado por algum com o livro, que eu saiba, mas a fa- Não acho que ela personifique “o quisesse, poderia prolongar mília da minha mãe também é de Mal”, nem acho que “o Mal” seja uma indefinidamente o passado de fantasma do origem portuguesa - mais remota, presença no livro. Eu não quero – ou Tertuliano Jaburu, criando um visto estarem há séculos em Itapari- o narrador não quer – mal algum à livro da dimensão de “Viva o inconsciente ca, Eu não conheci esses meus ances- senhora. O narrador a compreende. Povo Brasileiro”. Quis optar trais portugueses – a família da minha Ela é fruto daquela época. É uma mu- pelo poder da narração concisa, mãe é o meu ramo itaparicano. O seu lher que poderia ter existido, e como em vez de soltar a narrativa e ascendente português, Osório Pimen- ela certamente muitas outras existi- correr o risco de ser massivo?. tel, acabou pelo ramo legítimo, ou ram. Era a esperteza daquela época: É uma pergunta perspicaz, porque assim chamado, porque os homens inteligente, loquaz, é pelo menos este livro começou com embocadura Osórios Pimentel só geraram mulhe- uma mulher que tem as suas más qua- de livro grande, vamos dizer que de res; são gala feminil como se diz no lidades [risos]. Isso aí já é acto fa- olhadinha na morte de João Ubaldo Ribeiro o escritor brasileiro, “O Albatroz Azul”, tem “embocadura de livro grande”, mas resolve-se em 200 e . É uma refl exão sobre a morte digna dos maiores, com saga familiar em fundo. João Bonifácio

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 11 lhado. Ela raciocina sob uma ópti- Achei que não era relevante para o gueses – do lado paterno certamente é, por vezes, arrepiante com a À beira dos 69 ca torta, mas comum na época, ma- desenrolar do romance, então ficou tenho sangue negro e dizem que ín- mãe adoptiva. Estas alterações anos, Ubaldo chista, de submissão feminina, da assim. dio, mas pelo lado materno não –, de tom foram propositadas Ribeiro acha mulher que trabalha por dissimula- Diga-me se concorda: Tertuliano contemporâneo dela, seu Didi: era ou ditadas pelo instinto? Era possível que ção, por insídia. As mulheres apren- redime o “Mal” herdado, mas respeitadíssimo e homenageado por importante que se notassem “O Albatroz diam essas armas na época, e isso isso custou-lhe uma vida de toda a comunidade, que o tinha em essas nuances na voz do Azul” tenha sobreviveu até aos nossos tempos, se silêncio e, talvez, de solidão. A alta conta, em grande deferência. narrador? sido uma bem que muitíssimo enfraquecido. paga dele pela sua liberdade é a Então não era ser rebaixado conviver Não quis ser sarcástico em relação maneira de Não quis denunciar – isso talvez seja culpa, a vergonha? com mulatos e negros, era natural. A aos negros que enganam. Se resultou olhar para a uma palavra demasiado forte – um Não sei. Mas de facto a vida dele foi maioria dos leitores há-de ver como nisso também não foi intencional. É morte: “Pensei mundo machista, mas talvez mostrar meio cerceada – ele seria outra pes- você viu, mas não é assim. Eu dou a curioso como conversar com um lei- que a história lembrar esse mundo, mostrá-lo. soa se houvesse concordado em ne- esse negócio a importância que é de- tor atento traz informações para um seria sobre o A relação do pai de Tertuliano gar a mãe e fazer o que se esperava vida: nenhuma. Eu odeio racismo. autor, porque eu não tinha visto isso. menino que com as “irmastras”, as filhas da dele. Ele teve a virtude de uma re- Racismo é um sintoma do atraso da Eu imaginei que o tom que eu dava à estava comadre do seu pai, pode ser núncia dramática, não diria trágica humanidade, uma coisa repelente, conversa dos negros que embrulha- nascendo, considerada incestuosa? mas dramática, de grande conteúdo uma perda de tempo grotesca. ram a comadre era somente para go- mas acabou Não acho que seja incestuosa, não. na sua vida psíquica. Parece a mesma pergunta mas zar com a cara dos brancos. De qual- por não ser. Elas não eram parentes de sangue Tertuliano é branco e acaba, não é: Tertuliano diz várias quer modo, muito obrigado pela Não sei dele, eram filhas do padrinho com a parece-me, no meio dos vezes que lhe roubaram a observação, vou prestar atenção, te- porquê” madrinha. O facto de serem criados mulatos. Uma parte do respeito vida, por isso podemos inferir nho de reler o livro. Agora, que é im- juntos não quer dizer nada. Relações que a comunidade tem por ele que para ele foi mesmo um portante que notem a nuance com a que podem ser inequivocamente cha- parece vir daí, do silêncio com rebaixamento social? voz do narrador sim, porque apesar madas incestuosas sempre existiram que aceitou ser socialmente Rebaixamento social só com o nome de eu dizer que não quero ser anti- e ainda existem, mas não foi o caso, rebaixado. Concorda? [de família], aí sim. A decisão dele pático com a comadre, certamente não quis falar de incesto. Tenho im- Essa pergunta tem uma percepção acarretou isso. Ele passou a ser um também não aprovo o que ela diz, pressão que essa realidade, a de Ia- errónea, talvez por você não estar representante oficial da linha bastar- por isso queria que isso transpare- censinha e de Juvenal, teria sido acei- familiarizado com certos padrões de da da família. Mas ele escolheu isso cesse na voz do narrador. te como normal em várias famílias no convivência do lugar onde se passa por uma questão de lealdade, de Queria retratar o universo tempo da juventude da minha mãe. o livro. Porque o livro dá total desim- amor ao ventre materno que queriam do protagonista como muito Há uma espécie de buraco entre portância à cor dos personagens. Ver que renegasse – e pagou o preço dis- promíscuo (e o mesmo para o o passado de Tertuliano e o seu Tertuliano como socialmente rebai- so, passando a ser bastardo. universo branco e português presente. Achou que não era xado por conviver com mulatos e A voz do narrador é simpática de que ascende) ou isto necessário explorar o que lhe negros é uma visão falsa do que acon- para com o protagonista, depois corresponde mesmo ao universo aconteceu entretanto, ou que tece. Recentemente em Itaparica toma tons quase sarcásticos brasileiro? o livro ficava mais eficaz se o morreu um senhor amigo de minha com os negros que enganam a Queria, mas não escandalizando. Es- leitor tivesse de adivinhar? mãe, branca, descendente de portu- comadre do avô de Tertuliano e tá vendo?, aí já apareceu uma ligação

12 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon com a famosa vida real. Acabo de me hipótese. Você não perguntou mas lembrar de meu tio-avô Neco, que era eu digo: vou fazer 69 anos em Janeiro. de um ramo bastardo da família de Não é descabido imaginar que arran- minha mãe, e segundo o que se diz jei um jeito de dar uma olhadinha na deixou 200 filhos. Hoje são cada vez minha morte através de Tertuliano. menos os que ouviram falar de meu Eu inicialmente pensei, como o leitor tio Neco. pensa, que a história seria sobre o Nota-se-lhe um apuradíssimo menino que estava nascendo, mas ouvido para a linguagem do acabou por não ser. Não sei porquê. povo, mais exacta do que nunca. O livro dá total Se assim for, que balanço faz de As frases feitas, o ritmo da tudo isto, da vidinha? linguagem, estão-lhe na cabeça, desimportância Digo como diz a epígrafe do meu li- ouve com atenção, aponta-as? vro: não sei. Não sei. Mas a vida tem Acho que sou meio papagaio. Desen- à cor dos sido boa comigo e não tenho queixa, volvi, com o tempo, a capacidade de não. Vivo do jeito que quero, tenho fazer com que a palavra escrita pare- personagens. Ver o que eu preciso, não tenho maiores ça a palavra falada – o que na realida- cobiças em bens materiais, estou fe- de nunca é. Sou um papagaio atento, liz, sou um escritor que tem alguns nunca tomo nota dessas coisas, tomo Tertuliano como leitores, então o balanço da minha tudo de ouvido. vida é positivo, tenho muito de que Para quem não conhece João socialmente estar grato. Ubaldo Ribeiro, “O Albatroz Há pouco tempo, em Portugal, Azul” é um festival de grande rebaixado por uma cadeia de supermercados escrita. Mas para quem leu, voltou a censurar “A Casa dos por exemplo, “Viva o Povo conviver com Budas Ditosos”. Acha que o ser Brasileiro”, nota-se uma maior humano está condenado a ser contenção no “barroco” da mulatos e negros é estúpido? escrita. Já não lhe apetece fazer Quem usou a palavra foi você, eu não da escrita um festival, limpou-a quero usar nenhuma palavra mais propositadamente? uma visão falsa forte. Em primeiro lugar, qualquer Muito obrigado pelo elogio. A razão censura é estranha. Mas depois eu é simples: o “Viva o Povo Brasileiro” (...). Eu dou a esse soube, através de um blogue portu- dava mais oportunidade para isso e guês, de um homem que foi a uma n’“O Albatroz Azul” essa oportunida- negócio [do dessas grandes superfícies e que en- de não é tão vasta, os falantes não são controu livros e filmes pornográficos tão sofisticados, a época é diferente racismo] a da mais baixa categoria. Tenho im- dos [anos] 1600. Se eu estivesse fa- pressão que houve uma dose de pre- zendo um livro semelhante em esco- importância que é conceito nisso e fiquei chateado por- po ao “Viva o Povo Brasileiro”, pro- que era Portugal. Na altura um blogue vavelmente caía no barroco de novo. português me criticou pelo que eu Eu gosto um pouco de barroco como devida: nenhuma. disse depois de receber o Prémio Ca- motivo, faz parte de minha herança: mões, disse que eu recebi o Prémio sou baiano e então cresci vendo isso. Eu odeio racismo. Camões deseducadamente. A única Sou todo abarrocado, ainda me emo- falta de educação que cometi foi não ciono quando entro na Igreja de São Racismo é um dizer mentirosamente que achava Francisco na Baía, que é um primor que não merecia. Se eu achasse que de arte barroca. Em tudo quanto é sintoma do atraso não merecia não teria aceitado. As sítio o barroco fascina-me. pessoas esperavam ouvir a habitual As primeiras 70 e tal páginas da humanidade, declaração hipócrita: “Não, na mo- dos livro passam-se quase todas déstia dos meus dotes, na humildade dentro da cabeça de Tertuliano. da minha contribuição…”. Não cum- Não conseguiu parar de entrar uma coisa pri o guião habitual. Ele disse que eu na cabeça dele? teria dito que o Camões não tinha Você mesmo respondeu à pergunta: repelente, uma importância porque era um prémio não consegui parar de entrar na ca- de língua portuguesa. O que eu disse beça dele. perda de tempo foi o contrário: eu disse que no Brasil Tertuliano acha que vai morrer se dá importância a qualquer premio- e este é um livro sobre a morte. grotesca zeco americano, em lugar de dar im- Perdoe a indelicadeza: a sua portância às coisas daqui, da nossa idade levou-o a identificar-se língua. No Brasil não se dá a impor- com Tertuliano? Tertuliano tância devida ao Prémio Camões, que é uma forma de João Ubaldo devia ser a consagração de um autor. Ribeiro rondar a sua própria Foi isso que eu quis dizer. Um abraço morte sem ter de a olhar de e tudo de bom. frente? É meio possível. Não descarto esta Ver crítica de livros na pág. 40 e segs.

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 13

“Os vagões tristes transportaram-me vid. Quando pisam essa rua de areia para este lugar. Vêm de toda a parte: branca, as pessoas devem correr, são de leste e de oeste, do norte e do sul. chicoteadas e matraqueadas. Nesse De dia como de noite, em todas as caminho da morte, homens e mulhe- estações: Primavera, Verão, Outono, res voltam a encontrar-se, nus. Os SS, Inverno. Os comboios chegam sem postados à porta, empurram as pes- percalços, incessantemente, e Tre- soas para dentro, ao mesmo tempo blinka prospera a cada dia que passa. que gritam, “Schneller, schneller” Quantos mais chegam, mais Treblinka [mais depressa, mais depressa]. consegue absorver.” Até à chegada do próximo com-

Livros Assim começa o relato deixado pe- boio, Chil Rajchman passou o tempo lo judeu polaco Chil Rajchman, nas- a escolher roupas; sempre que endi- cido em 1914, um de entre as poucas reitava as costas era chicoteado. En- dezenas que conseguiram sobreviver tretanto, um SS pergunta se há entre ao inferno do campo de extermínio eles um cabeleireiro. Ele diz que sim, nazi de Treblinka, a menos de cem apesar de nunca o ter sido. Mais tarde quilómetros a norte de Varsóvia. “Sou é colocado no corredor que leva às o Último Judeu”, agora publicado pe- câmaras de gás; a sua tarefa: em cin- la Teorema, foi o título dado aos apon- co tesouradas deve conseguir cortar tamentos de Rajchman, que narram os cabelos da cabeça de uma mulher, os dez meses passados no campo e que se sentará à sua frente, e enfiá-los foram publicados apenas depois da dentro de uma mala, que tem ao lado, sua morte, em Montevideu, no Uru- sem que nenhum cabelo toque o guai, país para onde emigrou e onde chão. Depois de as portas das câmaras fez o resto da sua vida até 2004. estarem fechadas, os cabeleireiros são Rajchman chegou a Treblinka em obrigados a cantar. Outubro de 1942 (o campo entrara em funcionamento em Junho desse ano) O matadouro com uma das suas irmãs, da qual se Treblinka estava dividido em duas separa para sempre assim que saem áreas, uma antes das câmaras, e outra do vagão que os transportara. Ho- para lá delas. Os trabalhadores das mens e mulheres são apartados e des- duas áreas não comunicavam entre pidos de todas as roupas. Formam em si para que não soubessem o que se fila, e os alemães escolhem cerca de passava no denominado “campo uma centena de homens novos – Ra- nº2”, que Rajchman (que para lá foi jchman está entre os seleccionados. transferido) descreve como “bem pior As mulheres são levadas. A partir des- do que as câmaras de gás”. chega um SS para aperfeiçoar a cre- se momento começa a correria para O primeiro trabalho de Chil é car- Em cinco tesouradas, mação de centenas de milhar de cor- aquela centena que foi escolhida: se- regar areia de um monte para outro, Rajchman deve cortar pos em putrefacção e inventar, a par- parar dos montes as bagagens, as rou- ao mesmo tempo que os compridos tir de carris ferroviários, o engenhoso pas, os lençóis, as malas, os sapatos, chicotes dos guardas ucranianos gi- os cabelos à mulher sistema do “grelhador”. Chil ocupar- os vestidos das mulheres. Os mais len- ram por cima das cabeças e das costas se-á igualmente da tarefa de carregar tos são chicoteados pelos guardas de todos. Há fossas abertas. Numa e enfiá-los numa mala para a fogueira os membros e corpos ucranianos que serviam os alemães delas, dois judeus alinham corpos. desenterrados, em adiantada decom- das SS. Próxima tarefa: retirar das câmaras sem que nenhum posição, ao mesmo tempo que três “Treblinka foi concebido de um de gás os corpos e transportá-los nu- cabelo toque o chão. escavadoras gigantescas trabalham modo profissional”: não era um cam- ma padiola. Tudo é feito a correr. Pe- 12 horas por dia. Rajchman po de concentração mas um campo lo caminho há que parar no “dentis- Depois de as portas A revolta e consequente fuga dos sobreviveu ao de extermínio. Os que chegavam mor- ta”, o prisioneiro encarregue de com prisioneiros dá-se a 2 de Agosto de Holocausto e riam em poucas horas, depois de en- um alicate extrair aos mortos os den- das câmaras de gás 1943, com a morte de muitos. Chil Ra- emigrou para caminhados para as câmaras de gás tes de ouro, as pontes e coroas de jchman consegue esconder-se e che- o Uruguai, através do “Schlauch” [corredor]. prata e platina. Rajchman também irá estarem fechadas, gar meses depois a Varsóvia, onde onde morreu “Com arbustos plantados, parece desempenhar essa função. permanecerá até ao final da guerra e em 2004; não uma rua de um jardim público” - uma Mais tarde, já com várias valas de os cabeleireiros são onde escreverá o caderno “para dar quis publicar rua em ângulo recto para que não se dez metros de profundidade cheias obrigados a cantar testemunho do matadouro”. O campo as suas vissem logo as câmaras, um edifício de cadáveres (Rajchman chega a esti- de Treblinka foi encerrado e desman- memórias em branco marcado com a estrela de Da- mar cerca de dez mil mortos por dia), telado meses depoispois ddaa ffuga.uga. vidavida Chil Rajchman, a herança de Treblinka Cortou o cabelo às mulheres antes de entrarem nas câmaras de gás, arrancou dentes de ouro aos cadáveres, carregou corpos em decomposição.ão. Mas sobreviveu para dar testemunho, em “Sou o Último Judeu”, desse grande matadouro que foi Treblinka. José Riço Direitinho MATTIAS ENWALL MATTIAS Livros

O Natal fez de Camilla Läckberg escritora

É sueca e uma das mais jovens autoras de sucesso do “policial nórdico”. Foi economista mas o último Natal do milénio trouxe-lhe uma surpresa. “A Princesa de Gelo”, acabado de publicar por cá, estava para nascer. José Riço Direitinho

Fjällbacka é uma vila picaresca da ro- Camilla Läckberg recebeu já por cemos com ele ou se o aprende- Camilla fragilidades na própria história. “Foco- chosa e agreste costa oeste da Suécia, duas vezes o título de “escritor sue- mos.” Läckberg me muito nas personagens, nas pes- a norte de Gotemburgo, onde as an- co do ano”, em 2004 e 2005. E o seu precisou de soas envolvidas na trama. E acho que tigas actividades piscatórias são já primeiro romance, “A Princesa de Além do sangue sair de o grande sucesso dos meus livros vem quase só uma lembrança. O mar cal- Gelo” (recentemente por cá publi- Desde há já algumas décadas que o Fjällbacka, a de eu contar uma história de pessoas mo diante do pequeno e sossegado cado pela Oceanos), foi considerado romance policial escandinavo (e isto pequena vila normais, mas que foram apanhadas lugarejo turístico é pontuado por mui- o melhor policial publicado em Fran- em clara oposição ao de raiz anglo- da costa em situações extraordinárias.” Em “A tas ilhas pedregosas, algumas das ça. Antes do êxito, Camilla licenciou- saxónica, “hard-boiled”) se caracteri- ocidental Princesa do Gelo”, as personagens quais são agora habitadas apenas du- se em Economia na Universidade de za pela sobreposição de uma vertente sueca onde principais, a escritora de biografias e rante os meses de Verão. Camilla Gotemburgo, e depois mudou-se pa- social ao indivíduo, ao criminoso, ao nasceu em o jovem e inexperiente polícia que Läckberg, uma das mais recentes e ra Estocolmo onde trabalhou vários voyeurismo e ao sensacionalismo do 1974, para segue as pistas apontadas quase sem- meteóricas estrelas do romance es- anos como economista. Até ao dia sangue presente na cena do crime. conseguir pre por Erica, não têm os tiques de- candinavo, lá nascida em 1974, colo- em que tudo mudou. Ela conta. “Em Läckberg também não se desvia da escrever tectivescos que o cinema americano cou Fjällbacka no mapa literário dos 1999, o meu ex-marido ofereceu-me, tradição nórdica. “O sangue não é in- sobre ela ou britânico imortalizaram. “Erica policiais nórdicos ao fazê-la cenário por brincadeira, o melhor de todos teressante, interessam-me mais os tem muito de mim e da minha vida; dos seus livros. Que são seis, até ago- os presentes de Natal, a frequência efeitos do crime em quem o comete, apesar de não sermos idênticas temos ra, e já traduzidos por toda a Europa de um curso de escrita criativa cha- e como é que a comunidade reage, ou muito em comum. O polícia Patrick é e Estados Unidos. mado ‘Como escrever um policial’. como é que a comunidade se compor- o meu ex-marido.” “Não sei se seria capaz de escrever ‘A Princesa de Gelo’ nasceu nesse tou antes, o que é que escondia du- Para além das razões por ela já apon- sobre Fjällbacka se ainda lá vivesse”, curso, depois passaram uns anos até rante tanto tempo. Quando há um tadas para o êxito doméstico, está ain- diz ela. “Para mim, o lugar é como uma ser publicado. Eu sempre tinha pen- grupo grande de pessoas que vivem da por esclarecer a razão do actual personagem, e talvez a mais importan- sado em escrever, mas ao mesmo juntas durante muitos anos, como nu- “Somos todos capazes sucesso internacional dos policiais nór- te de todas. Mas como vivo em Estocol- tempo achava que isso não me era ma vila, há quase sempre qualquer dicos, por vezes autênticas séries de mo desde há dez anos, isso dá-me uma possível. Por isso, estudei Economia. coisa do passado que querem esque- de matar alguém, culto como a trilogia “Millenium”, do outra perspectiva da vila, um afasta- Mas desde muito cedo que me inte- cer, esconder. Por vezes, são coisas malogrado Stieg Larsson. “Há uma mento necessário para ficcionar. E fico ressava pelos romances policiais. Há que se passaram só com um ou dois mas diferimos grande tradição de policiais na Suécia. muito contente porque as pessoas de qualquer coisa de escuro, que me dos seus elementos, mas todos se jun- muito, de pessoa E os primeiros a escrevê-los colocaram lá têm orgulho nos meus livros, a tal interessa, na natureza humana. Eu tam para o proteger. Interessa-me a fasquia da qualidade já muito eleva- ponto que já organizaram percursos acho que somos todos capazes de descobrir esses mecanismos”, subli- para pessoa, nas da, Per Wahlöö e Maj Sjöwall [por cá turísticos para mostrar os lugares onde matar alguém, mas diferimos muito, nha. Por isso, Camilla Läckberg – que tiveram há muitos anos um livro publi- ‘vivem’ Erica e Patrik [os dois investi- de pessoa para pessoa, nas circuns- começa cada livro a partir de “uma circunstâncias que cado pela Editorial Caminho]. Daí pa- gadores, ela escritora e ele um simpá- tâncias que nos levariam a ser capa- espécie de fotografia” que tem na ca- ra a frente, só o que se lhes equiparava tico polícia subalterno] e todos os ou- zes de o fazer. Sempre me interessei beça – dá tanta importância à psico- nos levariam a ser é que sobrevivia. Mas também penso tros que de vez em quando vão asso- pelas dinâmicas do mal e sobre a sua logia das personagens, a fazer delas que a sociedade sueca e a natureza que mando às minhas histórias.” natureza, em perceber se nós nas- credíveis, deixando por vezes algumas capazes de o fazer” nos envolve dão um bom cenário.”

16 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon “Na Holanda a tolerância é o álibi da indiferença” Nasceu português este holandês errante de quase 80 anos, J. Rentes de Carvalho. Dois livros recentes, “Com os Holandeses” e “Ernestina”, permitem que Portugal descubra a obra de um autor popular na Holanda. Rui Lagartinho

Quando, no início dos anos 50 do sé- juntos, já um milhão) no seu exíguo deria ter um futuro alternativo à ruí- sos avós, com o seu cheiro a terra. culo passado, J. Rentes de Carvalho território. O ensino oficial está a ser na. Corresponde à paisagem trans- “Sou um homem de duas pátrias, resolveu abandonar Portugal por mo- nivelado por baixo sem que isso se montana que encontramos em “Er- com uma vida cheia de acasos extra- tivos políticos, as cidades onde foi reflicta no aumento dos níveis de in- nestina”, romance que percorre a ordinários. E assim continuará. En- vivendo eram urbes de horizontes tegração. A tolerância foi durante biografia dos seus primeiros 15 anos quanto puder, vou manter este trân- largos: Nova Iorque, Paris, Rio de Ja- muitos anos um álibi para a indiferen- de vida e que também salva da erosão sito entre as minhas duas pátrias. Não neiro, São Paulo. Por causa de uma ça. Agora essa indiferença está a che- do tempo as três primeiras décadas deixa de ser irónico que seja um velho história de cafés desembarcou em gar ao fim arrastando consigo a mis- do século XX: “ A minha avó era uma casal a trazer nova vida a Estevais. Amesterdão. Corria o ano de 1956 e tificada tolerância”. contadora de histórias inata. Foi uma Mas é assim. É uma esperança, numa da Holanda só conhecia “Rembrandt, grande escritora sem o saber.” A vida terra onde as searas abandonadas pe- Van Gogh, o queijo, e os turistas ba- Testamento biográfi co dura de avós e pais e de uma mãe cha- la emigração cederam lugar aos eu- Livros rulhentos que os autocarros despeja- Conversamos no 20.º andar de um mada Ernestina enchem as páginas caliptos que, agora arrancados, dei- vam na Côte D’Azur. “No departamen- hotel em que o horizonte de Lisboa do livro a que chamou testamento xam de novo a paisagem despida.” to comercial da embaixada brasileira se expande em água. Um território biográfico. Na Holanda já vai na séti- Em “Ernestina” não existe nem es- onde escrevia relatórios, a descrição neutro, entre a Holanda e Estevais, a ma edição. Os holandeses renderam- paço para a saudade, nem espaço que os colegas faziam dos autóctones aldeia no de Mogadouro onde, já nes- se à música desta aguarela de gentes, para um libelo contra a pobreza. É era sumária, básica e confirmava te século, o autor decidiu que casa costumes e tradições das paisagens uma evocação “poética, mas sincera, ideias feitas. As holandesas dividiam- onde o seu avô materno nasceu po- da aldeia, da vida no Porto ou em com os pés na terra”: “A memória de se em duas categorias: as mulheres Gaia: “Passava um homem a vender um território que possa substituir no com quem se tinha ido para a cama e água, outro a apregoar grelhas. O imaginário dos outros a mulher com as mulheres com quem se estava para amolador anunciava-se como uma bigode de xaile negro pelos om- ir; os holandeses numa categoria só: flauta. Havia bêbedos e pedintes, bros”. a dos bananas. O país, uma maçada. “Na Holanda, por guardas, mulheres a fazer compras, Graças ao empenho da Quetzal, A comida, um nojo.” Mas a verdade velhos que andavam por ali às voltas abre-se agora um tempo em que Por- é que quando Rentes de Carvalho as- questões de educação porque não tinham outras distrac- tugal pode começar a descobrir a obra sim recorda estas impressões holan- ções, gente vergada sob o peso que de J. Rentes de Carvalho. desas em 1972, já tinham passado 15 mas também por levava às costas ou às cabeças.” Pe- Abandonamos a torre de vidro on- largos anos, e ele continuava a viver inexistência física, daços de memórias iniciáticas: “Em de conversámos. Cá fora, ainda antes J. Rentes de na mesma cidade onde entretanto ‘Ernestina’ cabem os meus primeiros de se fazer à estrada que o levará em Carvalho casara e onde ensinava literatura por- é impossível atirar um 15 anos, porque a partir daí achei que quatro horas a Estevais, talvez J. Ren- continua a tuguesa na universidade onde tam- ninguém tinha nada que ver com a tes de Carvalho ainda se cruze com alternar os bém se formara. calhau a alguém. minha vida”. Outra vez uma catarse, algum holandês com um “Portugal, seus É que às ideias feitas e às decep- mais uma crise de adolescência que um guia para amigos” debaixo do bra- trimestres ções já se juntara uma sincera admi- Imagine o que isso chega ao fim: “Quem me conhece me- ço. Não seria a primeira vez. Com entre ração pela tenacidade dos holande- lhor encontrará nesta leitura traços mais de 20 anos, o livro ainda se ven- Estevais, em ses: “Vi um prédio em ruínas, e, co- representa para uma que ainda hoje, quase com 80 anos, de como pão quente a qualquer via- Trás-os- mo na Alemanha ainda havia vestígios pessoa de se mantêm no meu carácter.” jante holandês. Montes, e da guerra, perguntei se o local tinha Os holandeses que se continuem a Mas o que esperamos é que, na pró- Amesterdão: sido bombardeado. Não. Tinha sido ascendência entreter com o pitoresco, porque o xima visita de Rentes de Carvalho, “Sou um apenas um acidente. Em 56, na Ho- que “Ernestina” nos oferece é bem “Ernestina” já passeie na rua com os homem de landa, já não havia ruínas da Segunda transmontana” mais profundo: é a biografia dos nos- lisboetas. duas pátrias” Guerra.” Escreveu um livro sobre es- se país, “Com os Holandeses” (que este ano teve finalmente edição em Portugal, na Quetzal), por causa de uma zanga: “Estava a viver o fim da minha adolescência holandesa e es- tava na hora de perder a teimosia portuguesa e de aceitar um certo or- denamento e um certo rigor. Vinha de um país autoritário e ainda não tinha percebido que ali não precisava de me defender da autoridade nem da sociedade porque fazia parte dela. O livro ajudou-me a virar a página. Na Holanda, por questões de educa- ção mas também por inexistência física, é impossível atirar um calhau a alguém. Imagine o que isso repre- senta para uma pessoa de ascendên- cia transmontana”, sublinha. O livro lá saiu: a capa retratava um homem com o dedo espetado e talvez por isso o primeiro sítio em que Ren- tes de Carvalho viu o seu livro à venda foi uma sex-shop. “Com os Holande- ses” tem descrições intemporais, co- mo o elegante e equilibrado bailado que permite manter uma população inteira em cima de uma bicicleta, mas outras foram sendo actualizadas por causa da evolução da sociedade: “Ho- je em dia a Holanda vive o dilema de ser um país que não sabe como inte- grar as grandes comunidades imigran- tes (os turcos e os marroquinos são

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 17 Estamos à porta do grande auditório ver já com a ideia de procurar o fio junto à qual estive a fumar um cigar- da Gulbenkian, em Lisboa. José Carlos narrativo. Este texto foi escrito com ro é um negrilho. No livro o negrilho, Barros chega de uma viagem de mais a ideia antiga dos folhetins – não tinha ou ulmeiro, é uma metáfora muito de 300 quilómetros. Não de Trás-os- um plano e procurava, depois de ca- forte. Há uma doença que está a afec- CUNHA PEDRO Montes, onde nasceu, mas de Vila da fragmento, o que iria acontecer a tar esta espécie há alguns anos, uma Nova de Cacela, Algarve, onde vive há seguir. das árvores mais imponentes deste muito. O arquitecto paisagista de 46 Escreveu “O Prazer e o Tédio” território ficou doente. Isto serve de anos sente-se bem no meio do verde, em 11 meses. Impôs-se mesmo metáfora do mundo rural, que é como comenta o jardim, fuma um cigarro. alguma disciplina? uma árvore doente, ao abandono. “O Prazer e o Tédio” (Oficina do À noite, em vez de ver televisão, ia Mas este livro não é um elogio do Livro), a primeira incursão de fôlego para o computador e escrevia mais mundo rural e de qualquer superio- na prosa por parte deste poeta pre- uma entrada. Como se fosse uma en- ridade relativamente ao urbano, até miado (também vice-presidente da trada de blogue mas com a preocupa- porque há uma interdependência en- Câmara de Vila Real de Santo Antó- ção de procurar esse fio narrativo. tre ambos. nio) é um livro surpreendente. Parte Muitos textos foram escritos em toa- O livro arranca em tom quase de Aline, uma mulher contemporânea lhas de papel de restaurantes, alguns ensaístico. Mas a dada altura há e carnal, que demorou a compreen- directamente no editor do blogue. uma referência aos romances der “a diferença entre o prazer e o Nunca são versões muito acabadas. sul-americanos e entramos sexo, a pele e o corpo”. E de uma re- Às vezes fico insatisfeito com o resul- noutro registo. É propositado? gião, Trás-os-Montes, aqui concentra- tado do que acabo de escrever, mas Senti-me sempre como um primeiro da na força de uma vila e de uma casa é quase como se tivesse um compro- leitor e essas reflexões, do género “is- que, como em “Cem Anos de Soli- misso com os 10 ou 15 leitores que vão to já parece um romance sul-ameri- dão”, atravessa gerações. Como em seguindo o blogue. cano”, resultam de às tantas olhar “O Delfim”, de Cardoso Pires, temos Como funciona essa interacção? para o que estava a escrever e me in- um engenheiro e longas descrições Alguns dão-me sugestões para a con- trometer, alertando: “Cuidado que do território, fruto de um conheci- tinuação da história, que às vezes isto não vai por bom caminho.” Em mento profundo da região e de “uma aceito. Certas entradas foram escritas vez de corrigir aquilo que por vezes deformação profissional”. Mas o que como respostas a provocações de lei- me parecia descuido ou desatenção, está no subtexto desta história com tores, uma ou outra até como respos- o próprio leitor que eu era chamava contornos fantásticos, que recua até ta a comentários que ficaram na caixa a atenção do autor. 1921, é a degradação da paisagem, o do blogue. Há elementos, como a casa abandono do interior do país e a “im- No livro, há um território real da família, que fazem lembrar possibilidade da narrativa”, de qual- mas não é nomeado... “Cem Anos de Solidão”. E, quer narrativa. O resultado é um tex- O livro passa-se em Trás-os-Montes, noutro sentido, descrições que to quase inclassificável, escrito aos que chegou a ter a maior mancha con- remetem para “O Delfim”. Que solavancos num blogue (casa-de-ca- tínua de pinheiro bravo da Europa. cruzamento de géneros é este? cela.blogspot.com) e seguido por lei- Em finais do século XIX começam as Li ambos os livros. De propositado tores desde o começo. primeiras experiências de plantação, não há nada, mas Macondo é um lu- José Carlos Barros trabalhou em uma intervenção do Estado no mun- gar mágico onde todas as coisas pa- cada fragmento partindo do anterior, do rural. Depois, um plano do Estado recem possíveis e desse ponto de vis- teve em atenção as opiniões dos que Novo recupera a plantação do pinhei- ta o território de que falo tem muitas o liam, escreveu atendendo às reac- ro, alterando a paisagem e os modos semelhanças. A casa é verdadeira, ções. E fez regressar o folhetim, gé- de vida de uma maneira muito nega- conheço-a desde a infância, ainda nero por muitos anos cultivado na tiva. Há, ao longo do livro, um lamen- com pessoas dentro. Agora vi-a já em imprensa portuguesa, agora via Inter- to sobre a intervenção da administra- ruínas, como no livro. É uma metáfo- net, para nos dizer aquilo que já sabí- ção central nestes territórios, que ra da passagem do tempo, que fun- amos: “Sei lá que lhe diga. A vida é o parece sempre baseada em princípios ciona como material romanesco inte- caralho.” (p.27) do bem comum mas que é prejudicial ressante: imaginarmos o que nela se Antes do livro, criou um blogue para quem lá está. Isto desemboca na passou, a vida que teve. E essa casa onde foi escrevendo textos com última intromissão do Estado: ir lá dar vai mesmo ficar submersa. Só anteci- regularidade. Porquê? cabo dos recursos endógenos, mais po a realidade, até porque este deve Escrevi seis ou sete textos sem a me- uma vez em favor do “bem comum”. ser o primeiro livro sobre o plano das nor ideia de que se tornariam uma Falo do actual programa nacional de barragens com elevado potencial hi- coisa de maior fôlego. Eram à volta barragens com elevado potencial hi- droeléctrico (risos). de uma mulher chamada Aline, pe- droeléctrico, um nome fabuloso. Quanto a “O Delfim”, a escrita do quenas reflexões sobre o prazer, a A sua relação com essa José Cardoso Pires é das que mais melancolia. Os blogues têm esta coisa ruralidade é forte. Mal chegou aprecio e tenho-o na conta dos gran- engraçada da comunicação e comecei disse que os jardins são sempre des livros da literatura portuguesa do a receber e comentários e emails a agradáveis para qualquer rural. século XX. Desse ponto de vista, se perguntarem: “Isto é uma história ou É uma causa? me disserem que há coisas que se pa- não?” Eu próprio fui confrontado com Estava aqui a ver [tira uma pequena recem no meu livro, fico muito orgu- essa interrogação e continuei a escre- folha de árvore da mala] que a árvore lhoso. O mundo rural é uma árvore doente “O Prazer e o Tédio” começou como folhetim no blogue Casa de Cacela e acabou em livro. José C escrita no mundo da I

18 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon “Há, ao longo do livro, Sim, palavras e expressões, como à poesia, venceu o prémio “águas sesserigas”, que está logo na Sebastião da Gama este ano com um lamento sobre primeira página. As águas sesserigas “Os Sete Epígonos de Tebas”. É são águas que vão alimentar os moi- mais poeta do que prosador? a intervenção nhos e desde criança que ouvia um A poesia permite a indisciplina que tio falar disto. Talvez seja importante a prosa não permite, e julgo que a da administração acrescentar que algumas destas his- escrevi sempre com vontade de con- tórias nascem da leitura de um jornal tar histórias. Pode-se escrever um central no mundo local que foi publicado no primeiro poema praticamente em qualquer rural, que parece quartel do século XX. altura ou estar uns tempos sem es- Que jornal? crever e essa é uma grande diferença sempre baseada “Echos de Boticas”. em relação à prosa. Procurou-o propositadamente? E o folhetim, é um género que em princípios do bem Veio parar-me às mãos em fotocópias aprecia enquanto leitor? e vi ali coisas que me levaram a usá-lo. Apesar de já ter uma certa idade não comum mas é Conta histórias das primeiras experi- sou da época dos folhetins. Curiosa- ências com o pinheiro bravo e serviu mente, o Francisco [José Viegas], que prejudicial para de clique para escrever sobre isso. assina o prefácio, diz que ele próprio quem lá está. A última Tem outro projecto em escreveu folhetins e eu li-os. Só que andamento no blogue. Qual foi o esta ideia não veio tanto do contacto intromissão do clique desta vez? com o género mas de uma coisa do Gostaria de falar novamente sobre a nosso tempo que é a Internet. Acabei Estado é ir lá dar cabo passagem do tempo. Do real só me por escrever num blogue como se interessa o ponto de partida: uma da- escrevia antigamente nos jornais. dos recursos quelas coisas muito rurais, em que O Francisco José Viegas alguém mata alguém e o filho do as- compara-o a alguns autores endógenos, [através sassino se vai apresentar às autorida- consagrados. do] actual programa des para que o pai não seja preso. Sobre isso custa-me falar. Acho curio- Interessa-me perceber o que aconte- so que refira o Camilo [Castelo Bran- nacional ce a uma pessoa que tem 20 anos e, co], o meu escritor preferido, um por uma coisa de que não é respon- contador de histórias fabuloso. Fala de barragens sável, altera totalmente o curso da sua do Machado de Assis, que me agrada vida. Mas não estou a escrever um imenso, e de um nome que hoje é com elevado potencial livro, estou a escrever entradas num capaz de ser desconhecido, o João de blogue… Araújo Correia, um dos meus heróis hidroeléctrico, Que poderão vir a dar um livro. literários do fim da infância. um nome fabuloso” Com uma estrutura narrativa que po- Paremos no Camilo, que teve derá dar ou não um livro, mas sem de escrever àquele ritmo que obsessões. Nem no primeiro caso ti- sabemos. Isto terá algo que nha essa intenção. Uma amiga gostou ver com o seu compromisso muito dos textos e pediu-me para os de chegar ao blogue e sentir a Nota-se uma preocupação enviar a editores. Rapidamente apa- mesma urgência? intensa com a linguagem e o uso receu a Oficina do Livro a contratar- O Camilo escrevia contra o tempo por de recursos menos comuns como me. Foi uma grande surpresa, ainda razões de sobrevivência. Eu não es- a repetição, levada ao extremo por cima através do [editor] Marcelo tava a escrever contra o editor, mas num dos capítulos. Tentou criar Teixeira, que teve uma boa interven- o facto de ser seguido por leitores um novo estilo? ção no livro. Falou-me das fragilida- dava-me uma certa responsabilidade. Ficaria muito contente se algumas des do texto, deu-me tempo para fa- Tive períodos em que não tinha tem- pessoas sentissem isso. Têm-me dito zer correcções. po e mesmo assim sentia a obrigação que ao nível da linguagem há qual- Trabalhou então sobrebre o que já dede escrever, comoc se tivesse es- quer coisa de novo. Agrada-me ima- tinha escrito? tabelecidotabelecido uum acordo. Nunca ginar que sim, porque se isso aconte- Sim, embora não fossese um tratra-- tinhatinha pensadopen nisso mas, ce é porque ela está muito próxima balho profundo. No eessencialssencial salvaguardadassalvaguar as distân- das coisas que narra. Posso afastar o que está no livro é o queque fuifui cias,cias, estavaestav a escrever um leitores quando escrevo palavras ou escrevendo, mas altereierei algu-algu- bocadinhobocadinh como o Camilo. frases que não são habituais. Algumas mas coisas. O editor desafiou-meesafiou-me NãoNão ppelaselas mesmas razões, palavras não as encontrei no dicioná- a começá-lo de formama dife- masmas tatambémm pela neces- rio, para grande desespero meu. Há rente e acabou por sserer sidadesid de dar res- quem diga que deveria ter uma espé- um processo interes-- pposta a pessoas cie de glossário. sante. que estavam à es- São palavras usadas em Trás-os- O seu percurso pera de histó- Montes? está mais ligado rias. José Carlos Barros escreveu “um bocadinho como o Camilo”

Depois de “O Prazer e o Tédio”, já tem outro projecto em andamento: “Gostaria de falar novamente sobre a passagem do tempo. Mas não estou a escrever um livro, estou a escrever entradas num

blogue” Livros Carlos Barros, arquitecto paisagista, refl ecte sobre a intervenção estatal no mundo rural e sobre a a Internet. Hélder Beja

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 19 Pode nunca ter ouvido falar em Albert pronta prosseguimos com a sessão de O resultado de Watson mas já viu uma das suas fotos. fotos. Quando fui revelar e vi como dupla Alfred Hitchcock foi a primeira cele- as fotos tinham ficado (tive muita sor- exposição: bridade capturada pelas lentes da te porque os olhos encaixaram per- Mick Jagger e câmara deste escocês de Edimburgo WATSON ALBERT feitamente e a parte de cima dos lá- um leopardo radicado em Nova Iorque. Foi em 1973 bios também), revelei uma e mandei (à direita); o para a capa da “Harper’s Bazaar”. A para a revista. Toda a gente adorou. resultado de imagem do cineasta britânico, que E qual foi a reacção de Mick oito espelhos: também era um grande “gourmet”, a Jagger? Michael segurar um ganso morto representou Tivemos um pequeno problema. Man- Jackson (ao uma viragem na carreira de Watson, dámos a foto para Mick, que estava lado); em que se mudara anos antes para os EUA em Los Angeles. Ele viu rapidamente baixo: o com a mulher e os dois filhos. Mais de e deu o OK. Na manhã seguinte tinha fotógrafo 40 anos depois, a questão é: quem é três chamadas dele, eu só pensava que ainda não foi fotografado por Al- “será que ele mudou de ideias?” Afi- bert Watson? nal, queria usar a foto para a capa do Bill Clinton, Kate Moss, Clint Eas- novo álbum, mas era tarde de mais. twood, Michael Jackson, Uma Thur- A fotografia já tinha sido enviada pa- man, Mick Jagger, Andy Warhol, Ni- ra a revista. Exposições cole Kidman, David Lynch, Naomi Existe alguma diferença entre Campbell, Jack Nicholson, David Bo- fotografar Mick Jagger ou wie, Cate Blanchett, Spike Lee, Scar- Kate Moss, ou aquela rapariga lett Johansson, a Rainha Isabel II (Wat- desconhecida que está nesta son foi o fotógrafo oficial do casamen- foto atrás de si [na parede, uma to do Príncipe André e Sarah foto recente de uma menina Ferguson). A lista parece infindável. num jardim]? São mais de 250 capas da “Vogue”. Não. Trato todos de modo igual. Há Sem contar com os trabalhos para a mais “stress” quando se trata de uma “Rolling Stone”, a “Vanity Fair”, a celebridade. Por mais amigável, sim- “Time”, a “Harper’s Bazaar”... E ain- pática, maravilhosa e fácil que uma da 600 anúncios para TV. Mas o con- celebridade seja [imita “uma celebri- vívio com tantas celebidades não pa- dade” com gestos, mexe os braços: rece ter alterado uma das maiores “O que quer que eu faça, que eu sor- características do fotógrafo: a simpli- ria?”], há mais “stress”. Ainda que cidade. São 18h30 de uma noite fria hoje para mim não faça diferença. em Manhattan e Watson chega atra- Olhe aqui este livro sobre Marrocos sado ao seu estúdio em Tribeca. Veio [folheia o seu livro de fotos sobre o de um “casting” para um novo traba- país]: trato estas pessoas do mesmo lho. Pede desculpas. Não gosta de modo que as “celebridades”. Não im- chegar atrasado. porta se é uma criança no meio da A foto de Kate MoMoss, nua, agachada, rua. Estou completamente com ela tiradatirada em MMarrocosarroco está numa das como estou com um “famoso”. Foto- paredes.paredes. Watson explica que esta grafo tudo: paisagens, carros, celebri- grandegrande sala vai ser transformada em dades, desconhecidos... Fotografar galeria.galeria. Sentamo-Sentamo-nosn à mesa onde o uma celebridade tem uma grande

Z filhofilho AAaronaron deixdeixouou os três livros do vantagem e uma grande desvanta- GUE

Í paipai e publicações comc algumas das gem: uma fotografia de Kate Moss é fotosfotos tiradas ao lonlongog das últimas dé- logo reconhecida porque é a Kate cadas.cadas. Nas sasalaslas de trás estão arma- surreal e estranho. Estava tudo com- “Olhe aqui este livro Moss, mas quando fotografo o rosto LORIA RODR zenadoszenados milhares ded negativos. Co- binado mas no momento o treinador de uma mulher mais velha, como es- G GLORIA RODRÍGUEZ meçamosmeçamos a conversarconvers sobre a fotogra- do leopardo achou perigoso e decidiu sobre Marrocos [o seu ta em Marrocos, quem vê a foto pres- fiafif a de Mick JJaggera em que o que era melhor arranjar uma divisória ta atenção à textura, à composi- vocalistavocalista ddosos RRolling Stones apa- de vidro para separar os dois. En- livro de fotos sobre ção... recerece como umum leopardo. A foto quanto esperávamos tive a ideia de E quando é que a fotografia se integra a exexposiçãop do Museu fazer uma dupla exposição. Perguntei o país]: trato estas transforma em arte? [Albert dede BrooklBrooklynyn “Who Shot Rock ao Mick, já o tinha fotografado outras Watson, com Richard Avedon e & Roll: A PhotographicP His- vezes, e ele concordou. Primeiro fo- pessoas do mesmo Irving Penn, fez a transição das tory,tory, 1955 tto the Present”. tografei o leopardo. 12 poses. Fiz vá- modo que as capas de revistas de moda para Nos últúltimosim 17 anos já rias exposições, muita luz, menos luz, os livros de arte...] falou ininúmerasú vezes normal, pouca luz. E anotei cada uma. ‘celebridades’. Não A fotografia pode percorrer viagens sobre estaest foto de Mick A cor que prevalece no rosto do leo- distintas. Uma fotografia pode ser pa- Jagger masma é inevitável pardo é o branco, claro, com as pintas importa se é uma ra uma revista, para um livro, para perguntar,perguntar, principalmente negras. A pele de Jagger também é uma galeria e para um museu. Eu en- nnosos diasdias de hojeho em que muito branca. Depois marquei no criança no meio da trei logo para este mundo da moda, todostodos acachamham que tudo é “viewfinder” o contorno do animal, das revistas, da “Vogue”, da“Vanity obraobra do PhPhotoshop:o como o formato dos olhos, nariz, boca. Re- rua. Estou Fair”, às vezes da “Rolling Stone”; fiz tevetet ve a ideiaideia?? bobinei o filme e fotografei Jagger na completamente posters de filmes como “Kill Bill”, O mais inteinteressanter é que esta mesma posição, com exposições con- “Memórias de uma Gueisha”, “O Có- não era a iintençãon inicial. A trárias às que fizera com o leopardo. com ela como estou digo Da Vinci”... mas no fundo fui, ideiaideia era fotografarf Mick a Das 12, quatro ficaram boas, três per- sou e serei sempre fotógrafo. Não um conduzirconduzir um Corvette com feitas. Mas só vim a saber depois. com um ‘famoso’” fotógrafo de moda mas um fotógrafo umum leopleopardoa ao lado. Algo Quando a divisória do carro ficou que tira também fotos de moda. Às Profi ssão: fotógrafo

É difícil acreditar que Albert Watson é cego de um olho desde que nasceu. mais mediáticas das últimas quatro décadas. Quem é que

20 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon ALBERT WATSON ALBERT

. Considerado um dos 20 fotógrafos mais infl uentes de todos os tempos, fez algumas das imagens e ainda não foi fotografado por ele? Simone Duarte, em Nova Iorque

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 21 vezes os editores das revistas recla- mam que as minhas fotos têm força a mais. E talvez tenham razão. Quando comecei, nos anos 70, andava com a minha Nikon na mão, tirava fotos das raparigas a sorrirem [volta a gesticu- Jimi antes de ser Hen lar e a imitar], a segurarem o gelado, a cairem na piscina, a olharem para a câmara, a beijarem um rapaz... Nos Museu de Brooklyn com salas cheias para uma anos 80 o meu trabalho mudou. Lem- bro-me de uma capa para a “Vogue” italiana, a foto da modelo com a cara coberta por um pano. O editor per- guntou-me se eu não podia mostrar o rosto dela. Não foi chegar um dia e dizer: “tchum, tchum, tchum... Sou um fotógrafo”. Quando eu tirava as fotos das jovens modelos com gela- dos, gostava de ver o meu nome na foto mas depois deixou de ter impor- tância e as fotos foram ficando mais definidas, mais fortes, mais expressi- vas e mais monumentais – não “mo- numentalmente” boas mas “monu- mentalmente” mais fortes, mais po- derosas, mais pesadas... O que faz uma fotografia transformar-se em ar- te? A sua longevidade. Ela pode ser vista em Julho, em Outubro ou daqui a anos e ainda tem a mesma força. Outra foto com destaque na exposição é a de Michael Jackson. De novo nada de Photoshop... Curioso. Noutro dia num blogue al- guém comentou que não gostava da foto porque criava uma ilusão óptica, mas foi justamente por isso que fiz a foto. O meu trabalho é resultado dos meus quatro anos de desenho gráfico e de três anos na escola de cinema. Nesta foto usei oito espelhos para fo- tografar Mickael Jackson. Era para a Bob Dylan with kids, Liverpool, 1966 O fotógrafo Barry Feinstein acompanhou Dylan na disgressão ao capa do “Invincible” mas não chegou Reino Unido em 1966. Esta zona de Liverpool era perfeita para as suas fotografi as: a dimensão, os edifícios em a ser usada. tijolo, as crianças, as pedras. E Dylan a contemplar tudo com o horizonte ao fundo. O que significa ter sido Foto: Barry Feinstein considerado um dos 20 fotógrafos mais influentes de todos os tempos? Sempre tive e tenho uma enorme pai- xão por fotografia. É uma obsessão. Aliás só resulta se formos obcecados. Noutro dia um jovem fotógrafo disse que queria ser igual a mim. Posso ter à minha frente uma mulher ou uma paisagem: as imagens têm a mesma força e o mesmo interesse. O seu gra- vador, por exemplo: fotografá-lo-ia

Wilson Pickett e Jimi Hendrix, Nova Io desconhecido Jimi, um ano de “Sempre tive e tenho uma enorme paixão por fotografia. “Who Shot Rock & É uma obsessão. Roll...” reúne 175 Aliás só resulta trabalhos, alguns se formos nunca antes exibidos, obcecados” Amy Winehouse, Miami, 2007 Amy Winehouse na cama no dia do seu casamento, de 105 fotógrafos, vestida e não menos sedutora. A “Rolling Stone” publicou a foto de Max Vadukal em página muitos deles nomes dupla na edição de 14 de Junho de 2007 com o título “A diva e seus demónios” sobre uma superfície de aço, você po- Foto: Max Vadukal desconhecidos do deria preferir que eu o colocasse so- bre uma toalha vermelha com flores. público. Uma frase do Eu até poderia tentar mas não deixa- ria de fazer o que tem sentido e é ver- Imagens tiradas nos bastidores trabalhos, alguns nunca antes historiador William dadeiro para mim. dos concertos, fotografi as do exibidos, de 105 fotógrafos, muitos Porque decidiu ser fotógrafo? início da carreira de jovens deles nomes desconhecidos do M. Ivins alerta: “Uma Tinha um certo interesse por fotogra- músicos que se tornaram público. Uma frase do historiador revolução militar fia. A primeira vez que segurei uma famosos, capas de álbums que William M. Ivins ainda no início câmara e olhei pelo “viewfinder” fez fi zeram época, fotos de fãs em da mostra alerta: “Uma revolução ou musical precisa sentido. As minhas mãos deslizaram delírio, retratos que conseguem militar ou musical precisa de ser pela máquina e tudo pareceu fácil [in- ultrapassar a superfície da fama fotografada para existir”. de ser fotografada terrompe e sorri]. Não escreva, por e revelar a intimidade de estrelas Até ao fi m de Janeiro, quem favor, que fotografar para mim é fácil. do rock. A exposição “Who Shot for a Nova Iorque vai poder para existir” O que quero dizer é que sempre tive Rock & Roll: A Photographic comprovar que a revolução o desejo de tirar grandes fotos. E History, 1955 to the Present”, do rock’n’roll existiu. Entre as quando tive a câmara pela primeira organizada pelo Museu de “provas”, nunca ou raramente vez nas mãos, tudo pareceu natural. Brooklyn, reúne cerca de 175 exibidas está a sequência Fez sentido. Mas como qualquer tra- balho solitário tem de ser praticado todos os dias da nossa vida.

22 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon endrix, Bob antes de ser Dylan

a exposição dedicada aos fotógrafos que fi zeram, por dentro e por fora, a revolução do rock’n’roll.

à intimidade de gente que tem fumar dentro do carro a caminho “A música precisa a fama como estilo de vida é do concerto no Royal Albert fascinante”. Hall, com fãs à janela, Dylan na de imagens para Intimidade e fragilidade é o que conferência de imprensa com transparece nas sete fotografi as uma marioneta que comprara comunicar de Barry Feinstein, que na feira da ladra pela manhã. A acompanhou Bob Dylan na sua cada pergunta dos jornalistas, a sua mensagem disgressão pelo Reino Unido em Dylan dirigia-se ao boneco “em de liberdade e 1966. Os dois eram amigos antes busca’ da resposta. “Os jornalistas de Bob se transformar em Dylan. não perceberam nada”, escreve reinvenção pessoal. Feinstein queria captar momentos Feinstein. E fi nalmente Dylan reais como Dylan na rua em sentado sozinho na plateia do A foto fica depois da Liverpool com crianças, Dylan a Royal Albert Hall, durante o “soundcheck”, fotografi a que para música acabar” Feinstein representa “a solidão e o isolamento de ser Bob Dylan”. Gail Buckland, Mas o que impressionaria um curadora da mostra fotógrafo que tem seus trabalhos expostos na mostra do Brooklyn e que passou os últimos 40 anos a fotografar John Lennon, Tina Turner, Sex Pistols, Bob Dylan, Led Zeppelin, Kiss, Prince, Lou Reed, Elvis Presley? O Ípsilon fez esta pergunta ao veterano

Tina Turner, Los Angeles, 1985 Como não sentir o poder de Tina Turner nesta foto de Henry Diltz que é o cartaz e a capa do catálogo da exposição? Diltz não cumpria a regra de que só se pode fotografar até a terceira música antes do suor estragar a maquilhagem da estrela. Foto: Henry Diltz

Mick Jagger, Filadélfi a, 1982 Quem será capaz de olhar va Iorque, 1966 Advinhe onde está Jimi Hendrix? Sim, de “tuxedo” a tocar guitarra. O inocentemente para o microfone no depois, largaria o “tuxedo” e incendiaria a guitarra e toda uma geração nos EUA e na Europa em 1982. de novo? O fotógrafo “ofi cial” Foto: William “Popsie” Randolph Fotógrafo desde os 16 anos, fez da disgressão dos Rolling Stones, as fotos mais sensuais e suadas em 1982, “apanhou” de Mick Jagger no palco. À Mick Jagger em Filadélfi a. provocante imagem do cantor Foto: Michael Putland completa de Jimi Hendrix a dinâmica de grupo que é o rock. A com o microfone dentro das calças queimar a guitarra no Festival de música precisa de imagens para segue-se a inevitável pergunta: Monterey em 1967 (do fotógrafo comunicar a sua mensagem de “Quem será capaz de olhar Ed Caraeff ), lado a lado com uma liberdade e reinvenção pessoal. inocentemente para um microfone Bob Gruen, que não hesitou: imagem tirada anos antes por A foto fi ca depois da música de novo?” “A foto da plateia em azul. É William “Popsie” Randolph de acabar”, escreve Gail Buckland, diferente. É fascinante pela um guitarrista chamado Jimi curadora da mostra. É justamente Solidão e pertença simplicidade e pela força.” A foto Hendrix, ainda desconhecido, isso que revela o “close-up” de Dana Sammond tem 20 anos. é de Ryan McGinley e o concerto a vestir um “tuxedo”. A prova Tina Turner num concerto em Los Andrew Hargrove 21. Não eram é de Morrissey. McGiley é fã de de contacto da famosa foto de Angeles em 1985, tirada por Henry nascidos quando a maior parte Morrissey desde os 16 anos. Já John Lennon num telhado de Diltz, fotógrafo ofi cial dos festivais das fotos que cobrem as paredes tinha ido a centenas de concertos. Manhattan com a camisola “New de Woodstock e de Monterey, ou a do Museu do Brooklyn foram Começou a tirar fotos das York”, capturada por Bob Gruen imagem de 1969 de Little Richard, tiradas. “Vemos o artista de uma apresentações do ex-Smiths em em 1974, também se mostra aqui assinada por Baron Wolman, forma que nunca víramos antes” 2004. As suas fotos são da plateia pela primeira vez. Já Max Vadukul primeiro director de fotografi a da dizem os dois em coro ao Ípsilon. Little Richard, São iluminada pelas luzes do palco. leva os fãs de Amy Winehouse “Rolling Stone”. Contrariaram a “Vemo-los a suar, a chorar [“Kurt Francisco, 1969 O suor, Lilás, laranja, azul. A técnica de para a cama da cantora em Miami, regra de que só se pode fotografar Cobain crying”, foto de Ian Titlon, concerto em Filmore West. saturação unifi ca a multidão. no dia do seu casamento, 18 de um cantor até à terceira música, 1990], vemo-los vulneráveis, Palavras de Baron Wolman, Aos 32 anos, o norte-americano maio de 2007. A pergunta fi ca antes de o suor começar a vemo-los antes mesmo de eles primeiro director de fotografi a de Nova Jersey foi o artista no ar: quanto querem revelar as estragar a maquilhagem. “Procuro se tornarem estrelas”, continua da “Rolling Stone”: “Foi a época mais jovem a ter uma exposição pop stars deste século e quanto a harmonia visual defi nitiva, Dana. “Mas ao mesmo tempo”, em que a música, o rock & roll individual no Whitney Museum querem proteger? Mais clássicos uma única fotografi a que traga completa Andrew, “é tão em particular, emergiu como o of Art em Nova Iorque (tinha 26 são os retratos de Lennon, Paul a essência do concerto para o provocador ver a vida intensa que meio e a mensagem tornou-se um anos na altura). Nesse concerto, McCartney, George Harrison e papel impresso. Escuto o som mas eles tiveram ou têm ser fi xada de enorme e fotogénico espectáculo só queria captar “o sentimento Ringo Starr fotografados em 1967 consigo ver a música”, resumiu forma tão apaixonada e rara”. de pessoas...de repente metáfora de pertença”. Conseguiu, garante por Richard Avedon. Baron Wolman na introdução A intimidade revelada em de mudança de atitudes” Bob Gruen: “Os rostos dos fãs “A música não é sufi ciente para do seu livro “I Saw the Music”. fotos tão francas é o que também Foto: Baron Wolman irradiam brilho, estão todos a expressar o grau de rebelião, Já Michael Putland fotografou impressionou a norte-americana olhar para a mesma direcção, a libertação, êxtase, diversão e a digressão dos Rolling Stones Kathryn Walters. “Este acesso sentir a mesma energia.” S.D.

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 23 Vincent Delerm erudito e mundano O novo disco de Vincent Delerm, estrela maior da pop francesa, é mais um compêndio na nobre a daquela voz de “clown” “blasé” está um tipo normal q

“Tenho grande influência dessa música antiga, música do espectáculo. Em França há agora um regresso ao passado, um interesse na Durante anos, o homem ocidental co, uma personagem com um suave transpiração como da inspiração”, música do passado, culto era, independentemente da sua acabamento clownesco, que refina a sublinha. Já teve mais confiança na nacionalidade, francês por adopção: nobre arte da música de entreteni- Musa, mas como escreve canções talvez para nos lia-se em francês, vestia-se em fran- mento popular. Ele é, em toda a sua para teatro descobriu que “escrever cês, comia-se em francês e se mais erudição, o cantor preferido dos bur- de forma regular também funciona”. assegurarmos do houvesse mais se faria em francês. gueses franceses. Numa canção, conta, “quando se en- Não perdendo excessivo tempo com Claro que é sempre preciso ter cui- contra a melodia é tudo fácil”. O di- que somos, penso detalhes e em jeito de brutal elipse dado quando se chama burguês a um fícil “é o tempo que se perde até che- que acomoda no lombo décadas de francês. Delerm apresta-se de imedia- gar lá”, pelo que o trabalho é indis- que por causa dos história, podemos anunciar que a hu- to a corrigir: “Em França definimo- pensável. Sarkozys deste país” manidade chegou agora a um glorio- nos muito pela classe de onde vimos. Com uma certa culpa – a que não so momento em que os intelectuais Os meus pais são professores, por is- chamaremos burguesa – Delerm con-

Música ocidentais se pelam mais por Beyon- so não sou bem burguês mas sim in- fessa que anda preguiçoso: já não cé do que por Julien Gracq. telectual burguês”. toca há três semanas. “Neste momen- Podemos sempre pôr a hipótese: Há aqui uma ligeira omissão: os pais to não consigo tocar”, diz. É que de- se calhar os franciús contemporâneos não são apenas professores, são es- pois dos concertos de “Quinze Chan- última da hora não pôde aparecer”. não fazem boa música. Podemos pôr critores. Optamos por não dizer nada sons” (que já saiu há algum tempo Delerm considera que Newman “é a hipótese mas isso demonstraria a e ele continua a explicar-se: “Mas em França), Delerm tem agora de único”, e gaba-lhe o “trabalho entre nossa nulidade. Porque neste exacto todos os cantores são burgueses, não promover um DVD ao vivo que é piano e voz”.“Ao início eu tentava instante os dois maiores criadores de dormem nas ruas. Não faço uma tra- acompanhado por um livro da sua fazer o mesmo”, admite. canções franceses, Benjamin Biolay dição cultural de ser burguês. Ser autoria, com fotos, “sobre a vida em Randy Newman é um tolinho do e Vincent Delerm, lançam novos dis- burguês também tem a ver com a for- digressão”. Pelo que está no seu ple- music-hall e da música de New Orle- cos, respectivamente “La Superbe” e ma como lidamos ou nos aproveita- no direito à preguiça. ans, e sendo Delerm admirador de “Quinze Chansons”. mos desta indústria e eu tento passar Pesem embora todo o seu imenso Newman é natural que esses géneros Biolay, que representa o lado deca- ao lado disso”. conhecimento musical e a auto-cons- tenham acabado por surgir em “Quin- dente da “chanson”, mantém-se in- ciência que tem em relação à sua ze Chansons”. Isto poderia indiciar contactável. Já Delerm, o escritor re- Um tipo normal obra, Vincent Delerm não gosta mui- que Delerm é mais americano nas ferencial e erudito, atende o telefone, É possível que ele esteja a dizer a ver- to de exercícios de análise aos discos. suas influências do que francês, mas para nossa surpresa, bem cedo de dade. Ao contrário do que é habitual Prefere não ser obrigado a pensar em ele não concorda. “É uma questão manhã e revela-se afável, educado e nos músicos, a Delerm não se conhe- “mudanças”. engraçada. No libreto do disco tenho conversador. cem histórias de exageros etílicos ou Mudança, para ele, parece coisa umas fotos a ler livros americanos, “Sou um homem das manhãs”, tóxicos, muito menos escândalos de slogan publicitário: “Os media mas não sou americano. Há coisas confessa. “Tenho um filho de dois amorosos. Ele parece gostar de arte querem mudanças e surpresas”, o dos EUA que me dizem muito, mas anos e meio, o Sasha – é impossível pelo simples facto de ter crescido que leva “as pessoas comuns” a tam- gosto mais das canções dos filmes de não acordar cedo”. com ela por todo o lado. E parece ter bém “quererem grandes surpresas e Jacques Demy, sou mais francês”. Vincent Delerm, 33 anos, está, des- os pés bem assentes na terra, o que mudanças”, enquanto ele adora O seu amor pelas velhas canções de 2005, no Olimpo musical francês. faz sentido, se pensarmos que nas “pessoas que foram sempre muito do cinema francês leva-o ao ponto Nesse ano editou “Kensington Squa- suas canções adopta muitas vezes o coerentes”. Não está “contra fazer de dizer que “cada vez mais, muitas re”, o segundo disco, refinando aqui- ponto de vista de um observador coisas diferentes”. Só acha que “não das [suas] melodias são discretas” e lo a que se pode chamar a sua lingua- atento da mundanidade, que tanto há necessidade de provocar a mudan- “servem apenas para acentuar a Randy gem: sumptuosas cordas, de remota pode ser venenoso como caloroso ça artificialmente porque a vida ocu- emoção da canção”. É raro vermos Newman, um ascensão cinematográfica, a condu- com o que vê – ou as duas coisas ao pa-se de nos mudar”. E, para provar um cantor pop desmerecer a melo- dos heróis de zirem canções de charme literatas e mesmo tempo. o seu ponto, cita Serge Daney: “Infe- dia. Mas ele pode fazê-lo porque ca- Delerm, era multi-referenciais. Se “Kensington “Há um pouco a ideia de que um lizmente somos modernos, por isso da vez mais aposta noutro elemento: para tocar Square” acertou no alvo, “Quinze artista é alguém que passa o dia a não vale a pena tentar sê-lo”. os arranjos de cordas. “Por vezes as neste disco, Chansons” fura o alvo e vai por aí afo- olhar para os passarinhos”, afirma a Mesmo assim ele dá-se ao trabalho cordas são o principal motivo da can- mas à última ra, reconfirmando-o como um escri- dada altura da conversa. “Eu não sou de apontar as diferentes direcções ção. Eu acho mesmo que [essas can- ddaa horahora nãonão tortor llapidar,apidar, de voz que assim. Não faço mais de três concertos que foi seguindo: “O primeiro disco”, ções soam] quase [a] música de fil- pôpôdede aaparecerparecer sese fingefinge cínicac para por semana e não toco aos sábados homónimo, de 2004, “era apenas um me”. Para este disco contratou um ser maismai eficaz na para ter um quotidiano normal de conjunto de canções que tinha há arranjador; Rémy Galichet ia a casa susuaa sisinceridade:n família, sair com a minha companhei- cinco ou seus anos”. No segundo ha- dele e improvisava. O objectivo? quemquq em maism é capaz ra, estar com o meu filho”. via “uma dominante, as orquestra- “Queria coisas à Sinatra: as cordas a de numanum canção Por tudo o que nos vai dizendo, pe- ções”. Ao terceiro, “Les Piqûres levarem a emoção” nosnon s fazefazerr sorrir mes- lo à-vontade que o leva a confessar d’Araignée”, “quis fazer algo mais É um nostálgico – ou pelo menos a mom quandoquand nos con- que costuma passar férias em Portu- pop”. “Quinze Chansons”, diz. “é sua música tem nostalgia por géneros duz à comoção?comoç gal e prefere o Porto a Lisboa, é difícil uma espécie de simbiose entre as populares caídos no esquecimento. DelermDelerm é uma es- não ficar com a ideia de estarmos a vertentes dos discos anteriores”. O vaudeville, o music-hall, a música péciepécie de Nanni Mo- lidar com um tipo normal que gosta de New Orleans, a música de “salo- rettirer tti ddaa ccanção (mas de ser normal. Regresso ao passado on”, as canções do cinema francês, eme maisma bonito), Ele é o primeiro a admitir que não Quando Delerm começou, o seu herói tudo géneros que ele percorre com a umu WoodyW Allen tem uma cartola sem fundo de onde era Randy Newman – que aliás “era pátine dos conhecedores, insuflando- menosmem n narcísi- saem coelhos: “Preciso tanto da para cantar neste disco mas depois à os de um humor desconcertante para

24 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon o (como as pessoas) e arte de reciclar o music-hall, o vaudeville e as canções dos fi lmes de Jacques Demy. Mas por trás l que quer chegar às pessoas. João Bonifácio É MÉLANIE ELBAZ

Delerm, 33 anos, é um rapaz normal: “Não faço mais de três concertos por semana e não toco aos sábados para ter um quotidiano normal de família, sair com a minha companheira, estar com o meu filho”

falar das coisas pequeninas. “Tenho muito presente na [sua] música”. Usa não se encontra apenas na parte ins- a erudição e a mundanidade. Sempre grande influência dessa música anti- isso “para falar das coisas de hoje”. trumental, mas também nos textos e tínhamos visto essa mistura como ga, música do espectáculo”, admite, Há uma razão para o amor de De- na forma como a voz os trabalha tex- questão de pose “blasé”, mas Delerm não sem aventar uma curiosa teoria lerm pela música vinda do mundo do tos, modulando o tom para ter mais vê-as da forma exactamente oposta. para justificar o apreço que os fran- espectáculo: ele foi “actor amador na humor aqui, mais melancolia acolá. “Se há razão pela qual eu escrevo ceses sentem pela sua música: “Em universidade”. “Já na altura fazia can- A sua cultura musical, garante, sobre o erudito e o mundano é por- França há agora um regresso ao pas- ções”, conta. Pareceu-nos sentir-lhe “não é a dos cantores com bela voz, que as pessoas na sua vida misturam sado, um interesse na música do pas- uma pontinha de orgulho quando é a dos que dizem bem as palavras, esses dois lados: lêem um livro e a sado, talvez para nos assegurarmos disse que as canções que então escre- que encarnam bem, é a de uma tra- seguir vêem futebol”. Dito isto atira do que somos, penso que por causa via “eram usadas nas peças”. Muitos dição de personalidade”. A voz, para de forma veemente: “E eu escrevo dos Sarkozys deste país”. anos depois ainda faz, de certa forma, ele, serve apenas para dar forma às sobre pessoas” O que atrai no music-hall é ser são o mesmo: “Ainda escrevo para teatro palavras que, grosso modo, são re- Por mais clownesco, erudito, “bla- os códigos: “Há códigos no music-hall, e ainda escrevo para os outros”. tratos de desamores, observações sé” ou literato que ele seja, acredita-se no teatro e essa influência, diz, “está O lado teatral da música de Delerm quotidianas, exercícios que cruzam em cada palavra de Vincent Delerm.

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 25 Francisco Ribeiro andou desapareci- apagada. Só tive de acender o pavio nho que percorri é o do autoconheci- “Os Madredeus foram ler, que em “Ritual novo” explorou as do 12 anos. Desaparecido do olhar outra vez”. Ou seja, compôs. Durante mento. Foi isso que tive de fazer quan- notas de uma raga indiana, para de- público, entenda-se. Violoncelista, quatro meses, disciplinado: “Acorda- do me retirei do país. Quase um reti- uma odisseia e pois se firmar em território rock: fundador dos Madredeus, acompa- va, trabalhava de manhã, almoçava, ro espiritual que a música reflecte”. “Apareceu tanta música nova a partir nhou-os até 1997. Depois disso, dei- tomava café e voltava a casa. Traba- Com um ponto comum: “o amor”, a formaram-me em de 2000. Foi tão bom, tão generoso”. xámos de o ver. Passara os “vintes” lhava durante a tarde e, à noite, saía palavra mais repetida ao longo do dis- Que música? “Pós-rock, só estou a fa- com a banda de “Espírito da Paz”, um bocado, via amigos, punha-me em co, “que é realmente a linguagem uni- muitos aspectos, mas lar de pós-rock”, esclarece peremp- compondo, gravando e tocando mun- contacto com a realidade”. Tudo mui- versal” e surge reflectido nas suas tório. “Do resto, para mim, já chega. do fora. Durante esses anos, a vida to metódico: “Nem pensar em gran- diversas formas. “A mais baixa de to- tinha de parar. Houve Já nem se pode ouvir”. Prossegue: dele foi aquela banda. Não havia tem- des festas. Isso é um mito. Além disso, das, a obsessão”, a “tristeza da rejei- mesmo zanga. Egos, “Neste disco, em termos de estrutura, po para mais nada. Com “Desiderata já o fiz no passado e não me interessa. ção”, “o amor do perdão como acto fui buscar muitas influências ao pós- A Junção do Bem”, a sua estreia a so- Já tive a fase rock’n’roll e muita eufo- de compaixão” e a “‘Junção do Bem’, dinheiros, escolhas rock de A Silver Mt. Zion, aos Gods- lo, agora editada, acontece precisa- ria com os Madredeus”. Ouvimos “De- que é o título do álbum e que repre- peed You! Black Emperor, que adoro, mente o contrário. Digamos que o siderata A Junção do Bem” e não du- senta a verdadeira comunhão”. Fran- musicais diferentes... mesmo aos Sigur Rós. Experiências álbum é filho destes últimos 12 anos, vidamos. cisco Ribeiro juntará outro a estes musicais que de certa forma já vivi que é filho do tempo. amores: “O amor sacro, quase monás- Parecíamos nos anos 1970 com os Genesis. Esta é Que aconteceu entretanto? Fran- Mesquita e casa de fados tico”. Fá-lo para acrescentar, como uma segunda vaga dessas ideias, mas cisco Ribeiro foi para Bath. Recome- Gravado com a Orquestra Nacional que em aparte, “que Portugal é um os Beatles. Adorei, melhor pela variedade e com mais çou os estudos: “Música e tecnologia”, do Porto, dirigida pelo maestro britâ- país de expiação, que andamos a ex- mas ainda bem que qualidade de som”. uma especialização em “violoncelo e nico Mark Stephenson, “Desiderata” piar pecados há muitas gerações e por Se há algo que lhe agrada no novo composição”. Chegou lá “miúdo com conta com a participação das cantoras isso é que isto não muda”. acabou. Pude seguir século é precisamente “a diluição de talento”, descreve ao Ípsilon numa Filipa Pais, Natália Casanova e Tanya Aqueles apartes são habituais na fronteiras e o cruzamento de estilos”. esplanada lisboeta, absorveu “a ra- Tagaq (intérprete canadiana de “thro- entrevista. Esteve 12 anos distante, o meu caminho” O disco é precisamente isso. Falou- cionalidade, o método e a coerência at singing” celebrizada pelas colabo- está entusiasmado com este recome- nos antes do pós-rock, fala-nos agora dos ingleses” e chega-nos agora “mu- rações com Björk), do fadista José ço e tem muito que contar. Por isso, de “Desiderata” como uma mescla de nido de técnicas e formação” que lhe Perdigão e do guitarrista José Peixoto, a conversa salta de um assunto para “instrumentos clássicos com uma so- permitem explorar melhor o tal ta- também ele um ex-Madredeus. É um o outro e ganha rumos inesperados. “Desiderata” mistura noridade mediterrânica”, onde ca- lento que tinha em miúdo. “Voltei em álbum de digressões interiores, grito Como quando nos diz que “Entrega” instrumentos clássicos com bem “modos portugueses e ibéricos”. 2006 e foi como se uma vela estivesse íntimo que ecoa à distância: “O cami- segue a tradição dos adágios de Mah- uma sonoridade mediterrânica Porque Francisco Ribeiro conta-nos de druidas e de peregrinações a Glas- tonbury, da ideia de “saudade” como a “necessidade de voltar ao descanso materno, à fonte” mas, quando dize- mos que a forma como canta está al- SUSANA PEREIRA SUSANA gures entre minarete de mesquita e casa de fados de Alfama, sorri: “Tem o gargarejo moçárabe, não é? Há uma intenção de ter presente esse lado mediterrânico, também pela língua portuguesa, mas nesse caso é para onde me dirijo naturalmente. Não há nada a fazer, são as minhas raízes al- garvias”. “Desiderata” tem como mote o po- ema homónimo, única obra do ame- ricano Max Ehrmann. Francisco Ri- beiro inscreveu os primeiros versos no CD: “Vai placidamente no meio do barulho e da confusão, lembrando-te de quanta paz existe no silêncio”. Pla- cidamente, metodicamente, Francis- co Ribeiro regressou 12anos depois. Sem saudades do passado: “Os Ma- dredeus foram uma odisseia e forma- ram-me em muitos aspectos, mas naquela altura tinha de parar. Houve mesmo zanga. Egos, dinheiros, esco- lhas musicais diferentes... Parecíamos os Beatles. Adorei, mas ainda bem que acabou. Pude seguir o meu cami- nho, pude aprofundar-me”. Eis então “Desiderata”, o primeiro ponto de paragem no longo caminho percorrido por Francisco Ribeiro des- de que, no século passado, deixámos de ouvir falar dele. Música Ver crítica de discos na pág. 31 e segs. A longa caminhada de Francisco Ribeiro depois dos Madredeus Em 1997, o violoncelista dos Madredeus foi para Inglaterra formar-se como autor com voz própria. “Desiderata A Junção do Bem”, álbum de digressões interiores, é o resultado desse processo. Mário Lopes

26 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon Duzentos anos de rock nas barbas dos Endless Boogie Formaram-se em 1997 mas não tinham a mínima intenção de sair da sala de ensaios. Foi preciso esperar sete anos para o primeiro álbum. O segredo mais bem guardado do rock’n’roll nova-iorquino revela-se. Mário Lopes JEFF WINTERBERG

Os Endless Boogie formaram-se em 1997 e foram durante muitos anos uma banda reticente. Os poucos que os conheciam consideravam-nos um achado que urgia partilhar com o mundo. Quando dizemos poucos, não pensamos nos poucos que uma banda obscura reúne num par de me- ses numa conta MySpace, mas dos que lhes apareciam sala de ensaios dentro ou que conseguiam pôr as mãos numa cassete com uma grava-

Música ção. Esses, dizíamos, ouviam ali um interminável fluxo rock’n’roll, com John Lee Hooker como figura tutelar (o nome da banda é retirado do ál- bum de 1971 do mítico bluesman), uma secção rítmica operária, infati- gável, e guitarras encaminhando-se até ao infinito. Tudo muito bonito - mas eles, muito simplesmente, não como um Captain Beefheart sem pla- dos Television, para Nova Iorque. Somadas as estavam interessados. “Não pensamos. no fonético a cumprir – ou “em regis- Chegou atrasado: “os Television e os idades de Top Podem ter começado como qual- Fazemos to ‘spoken-word’ de maluquinho da outros já estavam a fazer digressões Dollar, The quer banda de garagem adolescente: rua”, como era sabiamente descrito nacionais, mas ainda deu para umas Governor, um grupo de amigos que queria tocar, simplesmente. no blogue da loja e distribuidora Flur. jams com o Johnny Thunders”. Era Grease um espaço disponível para ensaiar. Top Dollar, Paul Major no mundo ci- uma banda a contracorrente: “Cha- Control e O pormenor é que os Endless Boogie Aparecemos vil, é o tio que qualquer adolescente mávamo-nos Sorcerers e éramos mui- Memories não eram adolescentes. Somadas as de bom gosto desejaria ter, é um ho- to influenciados pelos Hawkwind”. From Reno, idades de Top Dollar, The Governor, e tocamos as canções” mem que adoraríamos encontrar Ou seja, encaixavam na cena por uma aproximamo- Grease Control e Memories From Re- atrás do balcão de uma discoteca bem simples razão, a mais antiga de todas: nos dos 200 no (sim, não há cá nomes reais, só Top Dollar apetrechada. Atende-nos o telefone “Éramos uma banda de guitarras e anos pseudónimos), aproximamo-nos he- e, pouco depois, está a falar-nos de isso era suficiente”. roicamente de uma quantia a rondar raridades do psicadelismo e de como Depois dos Sorcerers, deixou de as duas centenas. Formados por três são cada vez mais difíceis de obter. tocar durante vários anos. Quando, funcionários da editora Matador e um “O garage-rock do período psicadéli- em 1997, redescobriu um velho amigo coleccionador profissional de vinil, co já foi tão explorado por várias ge- com um óptimo espaço para ensaiar, isto era pessoal que não tinha sonhos rações que é difícil encontrar grandes não havia grandes objectivos a cum- de grandeza. O “boogie” estava na tesouros”. Nos anos 80, Major passa- prir. “Púnhamos a cassete a gravar e garagem e, por eles, na garagem fica- va por uma epifania em regime sema- ‘jamávamos’”. Isto, até Stephen Malk- ria. nal. Actualmente, “temos sorte se as mus se lhes atravessar no caminho e Mas os poucos que os conheciam tivermos uma vez por ano.” Solta uma eles darem o primeiro concerto. insistiram e um deles apresentou um gargalhada: “O filão está tão explora- Nessa altura, não subiam a um pal- argumento de peso. Nome: Stephen do que há tipos a colocar discos de co mais do que uma dezena de vezes Malkmus, mestre rock’n’roll nos Pa- jazz locais, editados nos anos 1960, por ano – e, fora de Nova Iorque, só vement. Em 2001, quando se estreou na prateleira ‘psicadelismo’”. em cidades dela perto o suficiente a solo, sabia perfeitamente quem que- camos, no único longa duração que Paul Major, cinquentão cool, tem para poderem regressar no mesmo ria a assegurar as primeiras partes da editaram até ao momento. uma óptima história para contar. dia. Agora, já percorreram vários es- digressão subsequente. Endless Boo- Intitulado “Focus Level”, surgiu em Imaginamo-lo, há décadas, como um tados americanos, já participam em gie, insistiu ele. Com um pedido des- 2008 e começou a ser distribuído há romântico “freakzinho” dos discos, festivais na Europa, até já têm um ál- tes, como resistir? Não houve escapa- alguns meses em Portugal. 79 minutos indiferente àquilo que deveria ser fei- bum distribuído no mundo inteiro. tória. Na sala de ensaios nova-iorqui- de “boogie” tão inspirado quanto alu- to para, expressão feia, “construir Processo de gravação: “Montámo-lo na, perguntaram uns aos outros: cinado, credível se nos garantissem uma carreira”. Se não vejamos. Co- a partir das cassetes dos ensaios. Cin- “Como é que vamos fazer isto?”. A ser obra de uma banda obscura do meçou a tocar nos anos 1970, quando co horas de gravações. Pegávamos resposta surgiu rápida, óbvia. “Não Nebraska, ano 1972, credibilíssimo vivia em St. Louis. À sua volta, andava num riff e víamos até onde o conse- pensamos. Fazemos simplesmente. neste 2009 de Comets On Fire ou tudo entusiasmado com ácidos e com guíamos levar”. Aparecemos e tocamos as canções”, Wooden Shjips. os Grateful Dead. Ele preferia ouvir “Focus Level” é um diamante recorda desde Nova Iorque Top Dollar. os Beatles e os Kinks e estava numa rock’n’roll por polir, como o devem É ele o coleccionador profissional No princípio banda chamada Moby Dogs: “Éramos ser os diamantes rock’n’roll. Daqui a (diz-se que o mais famoso da Costa um duo acid-folk e fazíamos versões umas décadas, talvez o encontremos Leste americana), e “fazemo-lo sim- eram as guitarras dos Stooges e dos Velvets”. Mais à perdido numa velha e poeirenta loja plesmente, aparecemos e tocamos as Top Dollar é, genericamente, o maior. frente na década, mudou-se para Los de discos. Secção de jazz. canções” é aquilo que os Endless Boo- Não só pelos solos monumentais de Angeles e, depois, com a boa nova do gie têm feito até hoje - ao vivo e, arris- fuzz e wah-wah, não só por cantar punk de Ramones, de Patti Smith ou Ver crítica de discos na pág. 31 e segs.

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 27 L. PHILIPPE

José Montalvo lembra-se de adorme- cer ao som de Cole Porter, Irving Ber- lin e George Gershwin nas sessões contínuas dos cinemas de província espanhóis onde a mãe o levava quan- do era miúdo. A memória das comé- dias musicais americanas desses anos a meio do século está no sangue de “Good Morning, Mr. Gershwin”, peça com que a companhia Montalvo-Her- vieu se apresenta, hoje, amanhã e depois, pela segunda vez na Cultur- Dança gest, em Lisboa. Depois de em 2005 ter trazido “On Danse”, o regresso faz-se agora não com as composições de Rameau enfeitando os longos sa- lões dourados de Versalhes, mas per- correndo a história de duas Américas que são só uma, tal como foi fixada pelas disruptivas composições de Ger- shwin, génio do jazz. Gershwin morreu em 1937 de um tumor cerebral, aos 39 anos, não sem antes deixar terminadas “página mu- sicais de uma felicidade excepcional”. A “complexidade deste homem” que, no final da vida, conta o coreógrafo, perguntava a si mesmo “sou rico e famoso, mas porque sou triste?”, é a base para recordar essa “joie de vivre” popularmente americana, diz-nos, pelo telefone, José Montalvo, que em 1981 criou a companhia com a baila- rina francesa Dominique Hervieu. Ter sido contemporâneo, em miú- do, dessa alegria faz com que “Good Morning, Mr. Gershwin” lhe seja uma peça particularmente cara. Os imagi- nários fantasiosos, característicos dos seus vídeos (em “On Danse” eram animais; aqui são sereias e panorâmi- cas sobre os céus cintilantes de néons dos teatros), querem ir “para lá da paixão” e cruzar-se com o mundo de hoje-. E os corpos em palco convivem saudavelmente com o formalismo clássico e a não menos formal des- montagem contemporânea proposta pelas danças urbanas. Por isso, e com a ópera “Porgy and Bess”, também As duas de Gershwin, criada para a Opera de Américas do Lyon em 2008, esta peça forma um princípio do díptico não apenas sobre a obra de século Gershwin mas também sobre a histó- encontram-se ria da América. na nova peça “Good Morning, Mr. Gershwin” co- de José meça com uma fantasia cujas sereias Montalvo e nos lembram Esther Williams e os Dominique seus bailados aquáticos. Mas a “fée- Hervieu, tal rie” dos anos 20, com os seus vícios como se públicos e virtudes privadas, dá lugar encontravam a uma reflexão – não sem leveza e mui- nas to menos sem esperança – sobre o que composições escondem as “girls” voluptuosas e as de Gershwin suas músicas inebriantes. São barcos (em baixo)

A festa antes da tragédia A música de George Gershwin é toda uma metáfora do início do século XX norte- americano. É este fi m de semana, na Culturgest, em “Good Morning, Mr. Gershwin”, dos franceses José Montalvo e Dominique Hervieu. Tiago Bartolomeu Costa

28 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon “Está [aqui] a Os néons são só a fachada

ligeireza de Gershwin, L. PHILIPPE de uma história cujos mas está também fundos estão cheios de a angústia e o sentido imigrantes do trágico. Começa com o Gershwin apinhados de imigrantes negros que quer americano se pode rever, mas querem da América mais do que fan- ligeiro dos anos com que qualquer parisiense se iden- tasia e que remetem para as mesmas tifica também”. O trabalho deste co- rotas de migração que agora chegam 20 mas, como todos reógrafo parte dessa colecção de à Europa. E, como pano de fundo, imagens feitas e repetidas, amplia-a toda uma história social e política que os castelos de fadas, sob a lente de uma gigante lupa e explora não só a loucura antes da cri- espalha-a num palco onde o que não se mas também a ascensão dos regi- este também couber no corpo se mostra no vídeo. mes fascistas na Europa. Montalvo se desmorona” É também a isso que se refere Vincent lembra permanentemente que está a os são aqui não apenas o artifício cé- “A economia da dança é diferente da Rafis, no programa: “Desmantelando reportar-se a uma época já longínqua José Montalvo nico mas o cavalo de Tróia onde um economia do cinema. Nós não faze- as lógicas canónicas, transgredindo na história, mas sublinha que quis discurso de pesquisa sobre “o espaço mos cinema, mas dança que surge no as hierarquias convencionais dos re- guardar “o lado luminoso e kitsch” e que o corpo ocupa actualmente” en- palco e nos vídeos”, acrescenta. O gistos e dos discursos, a sua arte, em- vincar “a perda de consciência colec- contra margem para, em diferentes “poema visual” que daí resulta existe bora pautada pela precisão, troça dos tiva que ensombra os nossos dias”. planos, “expandir a sua relação com para “inspirar o espectador”, deixan- códigos, das convenções e da conve- Programa vasto e complexo para o espectador”. do aberta a porta da interpretação. niência. Através dela desenha-se um uma peça que parece tão pouco pre- Os vídeos não existem independen- Montalvo fala de “uma leitura a mosaico de estilos e de intérpretes, ocupada com uma mensagem e me- temente da coreografia, explica ao partir de imagens conhecidas” e cita vestidos com as cores do mundo em nos ainda com uma intencionalidade Ípsilon: “Eu crio um ‘storyboard’ com o exemplo de “Um Americano em que hoje vivemos.” mas que, por trás da ilusão coreográ- todas as sequências e quando filma- Paris”, filme com Gene Kelly e músi- fica e visual, pretende traçar linhas mos já sabemos o que vamos usar”. ca de George Gershwin, “onde qual- Ver agenda de dança na pág. 30 claras entre o que é a vida real e o que a arte faz com isso. José Montalvo diz- nos que não se conta uma história sem a outra e revela que a peça foi concebida como se de um poema em três partes de tratasse. “Está lá a ligei- reza de Gershwin, mas está também a angústia e o sentido do trágico. Co- meça com o Gershwin ligeiro dos anos 20 mas, como todos os castelos de fadas, este também se desmorona”. A leitura é literal. Há um castelo de areia que se desfaz com a chuva e o ambiente da peça muda, porque o mundo mudou. As cores do mundo As peças da companhia Montalvo- Hervieu são conhecidas, há anos, pe- la combinação que fazem da tecnolo- gia com a dança, não num plano que poderia resumir-se a uma manipula- ção utilitária de um e de outro ele- mento, mas com vontade de “encon- trar novas formas de expressão para uma arte que deve produzir uma res- sonância com o mundo de hoje”. Não foi sempre assim. Quando José Mon- talvo, de origem espanhola, encon- trou a bailarina francesa Dominique Hervieu e com ela começou a traba- lhar, as peças, na sua maioria solos, funcionavam sobretudo como “afo- rismos coreográficos”, apostando numa “gestualidade particular feita de fluidez, rapidez e precisão”. Em 1993, com a colaboração do videasta Michel Coste, criam “Double Trou- ble”, onde fazem a imagem tecnoló- gica dialogar com a presença física dos bailarinos, e o paradigma da com- panhia muda. Escreve Vincent Rafis nos textos do programa de “Good Morning, Mr. Ger- shwin”shwin qqueue “háhá mmaisai de 20 anos que José MontaMontalvol e Dominique HervieuHervieu desenvolvem o projecto de uma dança ju- bilatóriabilatória e iconoclasta, abundanteabundan de imagens, queque falafala dod prazer dos cor- pospos em movimentom e do tumulto dad sua mistura”. MontalvoMontalv conta-nos que “as“as fronteirasfr da arte nãonão são claras e hoje háhá eencenadores que trabalhamtra o corpo e coreógrafos que usamu o texto”. A suasu dança também é assim,a “porosa”, “ambígua”,“am “procu- randoran existir num mundo invadidoin pela ima- gem tecntecnológica”.o Os víde-

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 29 aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

“Retalhos em Viagem”, do Teatro do Frio, em Vila Real

Agenda

Porto. Teatro Carlos Alberto. R. Oliveiras, 43. Até Teatro 20/12. 3ª a Sáb. às 21h30. Dom. às 16h. Tel.: 223401905. 5€ a 15€. Estreiam O Ano do Pensamento Mágico Hannah e Martin De Joan Didion. Encenação de Diogo A Mala Voadora retoma as vozes de Salazar, De Kate Fodor. Encenação de João Infante. Com Eunice Muñoz. Mussolini, Napoleão e Salvador Allende Lisboa. Teatro Nacional D. Maria II - Sala Garrett. Lourenço. Pelo Teatro Aberto. Com Pç. D. Pedro IV. Até 20/12. 4ª a Sáb. às 21h30. Dom. num espectáculo na periferia do político Ana Padrão, Irene Cruz, Rui Mendes, às 16h. Tel.: 213250835. 7,5€ a 16€. entre outros. Lisboa. Teatro Aberto - Sala Vermelha. Pç. Vulcão Espanha. Até 31/12. 4ª a Sáb. às 21h30. Dom. às 16h. De Abel Neves. Encenação de João Tel.: 213880089. 7,5€ a 15€ Grosso. Com Custódia Gallego. Lisboa. Teatro Nacional D. Maria II - Sala Estúdio. Continuam Pç. D. Pedro IV. Até 20/12. 4ª a Sáb. às 21h45. Dom. às 16h15. Tel.: 213250835. 12€. Manifesto Num Dia Qualquer + Contos De e com Mónica Calle. Lisboa. Casa Conveniente. R. Nova do Carvalho, 11. Kafkianos Até 20/12. 5ª a dom., às 21h30. Tel.: 963511971/91 De Luís Mestre, Franz Kafka. Foi a partir da sua crítica que recebeu 7705762. 8€ a 10€. Encenação de Renata Portas. Com Pedro Jorge Ribeiro, Olinda Favas, O discurso o convite da companhia para refazer Jardim Zoológico de Cristal Renata Portas, Xana Miranda. a peça. “Não havia gozo, nem censura De Tennessee Williams. Encenação Águas Santas. Quinta da Caverneira. Até 19/12. 5ª a nem cinismo perante os discursos. de Nuno Cardoso. Pelo Ao Cabo Sáb. às 21h30. Tel.: 960209730. 5€ a 7,5€. do silêncio Teatro. Com Maria do Céu Ribeiro, Eram distribuídos à audiência Mironescópio: A Máquina do conforme estavam no papel”, Micaela Cardoso, Luís Araújo, Romeu Costa. Amor Miguel Loureiro viu uma aponta. Em “Spitx”, o encenador Aveiro. Teatro Aveirense. Pç. República. Dia 19/12. Encenação de Luís Vieira e Rute peça da Mala Voadora, limpou a retórica da peça original e Sáb. às 21h30. Tel.: 234400922. 10€ a 8€. Ribeiro. Pela Tarumba - Teatro de explorou o lado ficcional dos autores Marionetas. Com Rute Ribeiro, Nómadas em 2008, e não gostou. dos textos. Dos 40 discursos, extraiu Catarina Côdea e Luís Vieira. De Joana Craveiro. Encenação de Lisboa. C.A.Ma - Centro de Artes da Marioneta. Rua Convidado pela companhia, quatro personalidades: Salazar (1933- Joana Craveiro. Pelo Teatro do da Esperança, 152 - Convento das Bernardas. Até pegou no mesmo texto e fez 1974), Mussolini (1883-1945), Vestido. Com Gonçalo Alegria, 19/12. 5ª a Sáb. às 21h30, 22h, 22h30 e 23h. Tel.: Napoleão Bonaparte (1769-1821) e 212427621. 5€. uma outra peça. Cláudia Milton Lopes, Pedro Caeiro. Salvador Allende (1908- 1973). O Lisboa. O Negócio. R. do O Século, 9 - Páteo de O Café interessante para Miguel Loureiro era Santa Clara Ptª 5. Até 19/12. 4ª a Sáb. às 22h. Tel.: Silva 213430205. 7,5€. De Rainer Werner Fassbinder. focar as “questões domésticas, Encenação de João Rosa. Pela Rosencrantz e Guildenstern Spitx periféricas ao discurso [político]”. A Barraca. Com Artur Assunção, Delfina Estão Mortos Costa, Helena Duarte, entre outros. Encenação de Miguel Loureiro. Pela que altura do dia Salazar escreveu o seu discurso, em que parte da casa De Tom Stoppard. Encenação de Lisboa. A Barraca - Teatro Cinearte. Lg Santos, 2. Até Mala Voadora. Com Jorge Andrade e Carlos Avilez. Pelo Teatro 19/12. 4ª a Sáb. às 22h. Tel.: 213965360. 5€ a 7,5€. estava e com quem? Neste sentido, Vera Kalantrupmann. Experimental de Cascais. Com “Spitx” surge como um conjunto de Fernando Luís, António Marques, Dança Lisboa. Teatro Municipal Maria Matos - Sala de “biografias alternativas” dos quatros Joana Castro, entre outros. Ensaios. Av. Frei Miguel Contreiras, 52. De 18/12 a políticos, explica. Cascais. Auditório Fernando Lopes Graça. Av. 21/12. 6ª a 2ª às 21h30. Tel.: 218438801. 5€ a 12€. Estreiam Ao contrário da peça encenada Marginal (junto ao Hotel Estoril Sol). Até 20/12. 4ª a Dom. às 21h. Tel.: 214825447. 6€ a 12,5€. Antes de os espectadores entrarem em 2008 por Jorge Andrade, em que Good Morning, Mr. Gershwin na Sala de Ensaios do Teatro os discursos se fundiam, nesta a Retalhos em Viagem De José Montalvo e Dominique Municipal Maria Matos para ver transição entre uma personalidade e Encenação de Catarina Lacerda. Hervieu. Com Mansour Abdessadok, “Spitx”, a nova criação da Mala outra é bem marcada pela luz, pelos Pelo Teatro do Frio. Com Rodrigo Arthur Benhamou, Franz Cadiche, Katia Charmeaux, Emeline Colonna, Voadora com encenação de Miguel toques biográficos, pelo figurino e Malvar, Inês Lua, Vasco Gomes, entre outros. Clarisse Doukpe, Nicolas Fayol, Blaise Loureiro, terão de calçar uma pelos textos, projectados numa das Vila Real. Teatro de Vila Real. Alameda de Grasse. Kouakou, Mélanie Lomoff, Christelle pantufa de plástico. A sala está toda paredes. Há também, neste “Spitx”, Dia 18/12. 6ª às 22h. Tel.: 259320000. 5€ a 7€. Nazarin, Sabine Novel, P. Lock, Karla branca, inclusive o chão, coberto de uma figura feminina que acompanha Otelo Pollux, Marie-Priska Caillet, Alex Tuy vinil. O ar angelical do cenário Jorge Andrade em todas cenas. Pode De William Shakespeare. Encenação dit Rotha e Renaud Pion. remete-nos para vários signos: céu, ser uma governanta, uma secretária, Lisboa. Culturgest - Grande Auditório. R. Arco do de Kuniaki Ida. Pela ACE/Teatro do Cego - Edifício da CGD. De 18/12 a 20/12. 6ª e Sáb. às limpeza, santuário, hospital. Mas uma assessora de imprensa ou até Bolhão. Com António Capelo, João 21h30. Dom. às 17h. Tel.: 217905155. 5€ a 20€. pode ser o contrário disso tudo. É uma acompanhante. Paulo Costa, Rita Lello, António Ver texto na pág. 28 e segs. uma sensação de ilusão e vertigem. Outra diferença marcante é a Júlio, entre outros. O cenário é repetido: a Mala ausência do discurso. Nos primeiros Porto. Teatro do Bolhão. Pç. Coronel Pacheco, 1. Até 20/12. 4ª a Sáb. às 21h30. Dom. às 16h. Tel.: Continuam Voadora já esteve aqui em “O minutos de “Spitx”, não se ouve 222089007. Decisivo na Política Não é o uma palavra. Miguel Loureiro quer Che Cosa Pensamento Individual, Mas a Arte que se sinta o silenciar do discurso: Breve Sumário da História de de Pensar a Cabeça dos Outros (disse “Li todos os discursos escolhidos Deus De Gil Vicente. Encenação de Nuno Brecht)”, peça estreada em 2008 com por Jorge Andrade. Percebi que em Carinhas. Com Alberto Magassela, direcção e interpretação de Jorge todos eles falavam de uma Alexandra Gabriel, António Durães, Andrade. Cerca de 40 discursos de desistência do próprio discurso. Daniel Pinto, entre outros. Gandhi, Dalai Lama, Mussolini e Salazar fala da dificuldade de falar, Porto. Teatro Nacional São João. Pç. Batalha. Até Hitler, entre outros, compunham o diz que cada vez é mais difícil falar (e 20/12. 3ª a Sáb. às 21h30. Dom. às 16h. Tel.: 223401910. 3,5€ a 15€. espectáculo que tinha por intenção por isso não discursa)”. O discurso De Elsa Aleluia. Com Ana Moreira, persuadir o público por meio da de Mussolini representa o momento O Avarento Miguel Ramos, Elsa Aleluia.

Teatro/Dança retórica, da música e da alienação. em que abdica da palavra e parte De Molière. EncenaçãoE de Aveiro. Performas - Estúdio de Artes Performativas. Intencionalmente, os discursos eram para a violência. Bonaparte faz o RogérioRogério de Carvalho.C Largo do Mercado, 1 - Teatro Avenida. Até 19/12. 5ª a Sáb. às 22h. Tel.: 234192331. de tal forma misturados que não se discurso do exílio, sem direito a PeloPelo EnsemEnsembleb - Sociedade ded Actores. percebia quem era o autor, palanque. E Allende ensaia uma Giselle CComom JorgeJorge Pinto,P Emília De Georges Garcia. Pela Companhia confundindo o espectador. retirada triunfal (clara figuração do SilvesSilvestre,t Cláudia Miguel Loureiro, que já tinha golpe de estado que o depôs, e do Nacional de Bailado. CChéu,hé Miguel Lisboa. Teatro Camões. Pq. das Nações. Até 23/12. colaborado com a Mala Voadora, viu qual não saiu vivo, em 1973), que Eloy,Elo entre 3ª a 6ª. às 21h; Sáb. e Dom. às 16h. Tel.: 218923470. o espectáculo como um comum pode ser entendida, literalmente, O Teatro do Vestido está ooutros.u 5€ a 35€. espectador e não conseguiu “aderir”. como uma saída de cena. na Zdb com “Nómadas”

30 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon Imaginem Noé perdido First Days of Spring”, o perda, abandono e solidão. de amores por uma segundoo longalonga-duração-duração Como se a ddepressão baleia que, ao saber que dos Noahh andand ththee WhalWhalee, tivessetivesse umum poder não tem lugar na arca não pretendeende s serer especialespecial parap nos gigante construida para um “remake”make” fazer fl utuar salvar a Animália, parte musical depoisdepo de Espaço destroçada para águas alternativoivo do tempotet mp de longínquas enfrentando clássico de lágrimas,llágr Público todos os Ahabs do planeta. Melville,, suspirossusp e No fi nal da sua demanda mas é ddesabafos.esab quixotesca, Noé põe toda a um discoo Pedro MMiguel gente na rua e, arrependido, habitadoo SSilvailva enche a arca de água para de uma 3355 anoanoss fi car eternamente à espera ponta à TTécnicoécnico de do regresso da sua baleia. outra pelaslas comuncomunicaçãoi Fiquem descansados. “The ideias dee

Jazz de que Holiday viveu realmente hiper-competitivohi i i estéril.é i Com a preciosa colaboração aqueles versos. Ouçam-se as versões do jazz nova- de quatro dos mais criativos músicos de “I cover the waterfront”, “Good iorquino. O seu da nova geração – o trompetista Nate Pura magia! morning heartache” ou “God bless enorme talento Wooley, o saxofonista Matt Bauder, o the child”. A opção de deixar de fora como compositor e vibrafonista Chris Dingman e o os “takes” alternativos funciona aqui arranjador, contrabaixista Eivind Opsvik -, Um par de edições de luxo, na perfeição, afirmando este informado não só por uma sólida Eisenstadt contrói um álbum notável bem características desta conjunto de três CD como uma formação jazzística como também em que a solidez e a elegância da compilação de referência a par de por uma curiosidade sem limites, dá composição funciona como base época, celebra o talento de “Lady Day: The Master Takes and aqui origem a um registo que evoca para inspiradas e inventivas duas das maiores cantoras Singles” (Columbia/Legacy) e “The os mais interessantes projectosp j dos improvisações,p ç , particularmentep de de jazz de sempre. Rodrigo Complete Verve Studio Master anos de ouro da Blue NNote,ote, WooleyWooley e Takes” (Verve). agregando-lhe simultaneamenteaneamente Bauder, Amado Outra edição verdadeiramente elementos característicosicos do jjazzazz ocasiõesocasiões queque Billie Holiday especial é “Twelve Nights in contemporâneo e da novanova tornam mmaisais Hollywood”, em que assistimos a improvisação, num projectorojecto que visíveis osos Complete uma Ella Fitzgerald em tipo de forma consegue a surpreendentedente proeza ddee contributoscontributos Commodore & no Crescendo, o famoso clube do esbater fronteiras entrere estéticestéticasas dede umauma Decca Masters Verve, distri. Sunset Strip. Há alguns anos, escutei habitualmente opostas.as. Pensem linguagem Universal uma gravação ao vivo de Ella Wayne Shorter, Bobbyy Hutcherson, modernamoderna Fitzgerald, no festival de jazz de Dave Douglas, Sam Riversvers e mmmmm Newport, que me deixou sem Eric Dolphy, evocadoss num Discos palavras. Sentia-se a vibração e a projecto que nada temm ddee Ella Fitzgerald excitação no ar, como se fosse algo pastiche ou revisitaçãoo de físico, e a cantora conduzia a Twelve Nights in audiência e a banda procurando Hollywood dominar os acontecimentos e Os anos de ouro da Blue Note e a nova improvisação cruzam-se Verve, distri. no projecto transfronteiriço de Harris Eisenstadt Universal impondo os andamentos a uma secção rítmica que integrava Jo Jones mmmmm na bateria. Surge então um solo vocal, em “Air mail special”, que faz Quando soam as primeiras notas do disparar os níveis de energia, trompete de Frankie Newton na obrigando literalmente as pessoas a introdução a “Strange fruit”, soltarem expressões de percebemos de imediato que foi descompressão perante os “chorus” totalmente conseguido o trabalho de consecutivos de pura invenção e restauro áudio destas faixas de Billie magia. Nesta nova edição, passa-se Holiday, sendo as mais antigas sensivelmente o mesmo, em tom datadas de 1939 e as mais recentes bastante mais relaxado. Um de 1950. A importância mítica e o comando vocal impressionante, a estatuto da cantora são, há muito, capacidade para swingar como inabaláveis, tendo originado ninguém, um “scat” dos diabos e um centenas de compilações dedicadas enorme sentido de humor fazem das ao repertório que gravou para as suas actuações um espectáculo editoras Columbia, Verve, inesquecível. Mas aquilo que Commodore e Decca, muitas delas distingue esta edição de quatro CD é de qualidade e relevância duvidosas. o facto de Norman Granz ter Estas sessões, realizadas para a decidido gravar todas as noites, de 11 Commodore e a Decca, surgem a 21 de Maio de 1961, com um dia de muitas vezes desvalorizadas pelo descanso (acrescem duas noites de facto de os instrumentais servirem 62), proporcionando-nos um olhar A excepcional voz de Billie quase exclusivamente a voz de privilegiado sobre o fenómeno que é Holiday documentada num Holiday. No entanto, a sua voz está Ella Fitzgerald em palco, sobretudo registo que cobre sessões aqui excepcionalmente quente e tendo em conta que a banda realizadas entre 1939 e 1950 profunda, projectada pela sensação raramente repete uma canção ao longo das dez noites consecutivas. Sentimos subtis diferenças de dia para dia, sentimos a cantora e o público a “aquecerem” ao longo de cada “set”. Embora a acompanhe um quarteto – nas duas noites de 62 um trio –, o foco é quase totalmente na voz de Fitzgerald, destacando-se um sobrenatural “scat” de sete minutos em “Take the A train”.

O dia de Eisenstadt

Harris Eisenstadt Canada Day Clean Feed, distri. Trem Azul mmmmn

Há já alguns anos que o baterista canadiano Harris Eisenstadt tem vindo a chamar a atenção no meio

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 31 Discos

Chiara Banchini foi atrás do verdadeiro Albinoni, para além do “Adagio”

e depurada bradando “porquê deus A Fanfare Ciocarlia de 2004 , num concerto em Berlim para este projecto. meu?”, desesperados por Impressiona ainda a vermos perder-se mais uma forma como a banda banda nas garras da se move como um todo, “normalidade”. unida em torno de um som “III” é um grande disco, único que faz com que as magnificamente equilibrado entre a complexas estruturas de Eisenstadt tempo no gravidade da folk britânica (via soem como a coisa mais simples do domínio do Fairport Convention, como nos mundo. Um bop moderno que é emergente concerto para solista e recorda a voz de Meg Baird) e a livre, se não na forma, absolutamente orquestra. As “Sinfonie a Cinque” liberdade opiácea do psicadelismo no espírito. R. A. distinguem-se pela sua inspiração californiano (o borbulhante rasto melódica e por uma elegante escrita ácido das guitarras desemboca em contrapontística (com vários Barry Melton, mago dos Country Joe Clássica andamentos fugados), mas & The Fish). incorporam também pontuais É um disco clássico, mas apenas influências da dança. Não são peças no sentido em que expõe O verdadeiro espectaculares, mas antes páginas devidamente as referências, outrora subtis, em que o rigor da escrita se transgressoras (ainda Albinoni combina com a fantasia. O mesmo se transgressoras?), que lhe dão forma: pode dizer da interpretação de Pentangle, Jefferson Airplane, Amon Chiara Banchini e dos seus Düul. O resto, contudo, faz-se do As “Sinfonie a Cinque” op. 2, parceiros, entre os quais se prazer óbvio em procurar nas numa poética interpretação encontram consumados solistas canções aquilo que as pode de Chiara Banchini e do internacionais como o violoncelista engrandecer: os violoncelos Gaetano Nasillo e a alaúdista zumbindo em “Colony”, o mellotron Ensemble 415. Cristina Evangelina Mascardi. A sintonia do de “Another mood song”, o órgão Fernandes conjunto é perfeita na respiração Rhodes vogando com a guitarra que conduz cada frase musical, na indefinida, aquática, de “The road to Albinoni transparência polifónica e no golden dust”, com violinos equilíbrio dos timbres e das irrompendo no final e as duas vozes, Sinfonie a Cinque op. 2 dinâmicas, proporcionando uma de Meg Baird e Greg Weeks, a Ensemble 415 leitura poética e envolvente deste complementar-se na criação deste e do perfume ébrio da música cigana da aldeia de Zece Prajini, traduzindo Chiara Banchini (direcção) Zig-Zag Territoires repertório. belíssimo universo onírico para - vem esta história a propósito do esse milagroso paradoxo que é a onde os Espers, apesar das formas novo lançamento da Fanfare festa transbordante induzida por mmmmn mais definidas de “III”, continuam a Ciocarlia, os arqui-rivais dos Taraf uma fanfarra impassível, de um rigor Pop transportar-nos. no topo das bandas ciganas romenas e de uma concentração mais Tomaso Albinoni de exportação. O formato é próximos da música de câmara. (1671-1751) é um exactamente o mesmo: um DVD Leva-se para casa como novo um dos mais famosos Belíssima Uma ciganada da gravado em concerto, acompanhado DVD que saiu em 2004, mais o compositores do Fanfare Ciocarlia de um CD com o respectivo registo bónus de um CD que não adianta barroco italiano viagem folk áudio. A diferença é que o DVD, nada, mas é isso que faz um devido a uma obra Fanfare Ciocarlia gravado ao vivo em Berlim em Abril verdadeiro fã de música cigana. Luís que... não escreveu! O famoso de 2004, já tinha sido lançado na Maio Um disco clássico, mas um Live “Adagio” em Sol menor, objecto de Asphalt Tango, distri. Megamúsica altura. Ou seja, o que a presente dezenas de gravações e tantas vezes grande disco dos Espers. edição lhe acrescenta é apenas um difundido em versões arrastadas a Mário Lopes mmmmn CD com a correspondente Mundo de sombras puxar para o romantismo lamechas, transcrição áudio, o que é foi composto no século XX pelo Espers Há um par de redundante. Claro que o “golpe” é Francisco Ribeiro musicólogo italiano Remo Giazotto a anos, os Taraf da editora alemã, não da banda, mas III Desiderata A Junção do Bem partir de um fragmento de baixo Wichita; distri. Popstock Haidouks não deixa de ser uma “ciganada” Multidisc cifrado e alguns compassos de lançaram um DVD que tem tudo a ver com a música dos violino do compositor. mmmmn com a gravação de Ciocarlia. Talvez tenha sido pelo mmmnn Paradoxalmente, a verdadeira um concerto em melhor, porque o DVD lançado há produção de Albinoni é pouco O terceiro álbum Londres. Entre as muitas histórias cinco anos passou despercebido, Neste álbum em que conhecida. Este veneziano, que no dos Espers, nome rocambolescas que aí relatam está a sendo hoje impossível de encontrar. é evidente um início da sua carreira se identificava destacado entre da vendada de cassetes em concertos,concertos, Faz todo o sentido rrepô-lo:epô-lo: o sentido de cena, em como “diletante” já que não aqueles que nos seuss iníciosinícios de carreiracarreira - osos concertoconcerto é um retratoretrato que “amor” é a precisava de compor para viver (era Devendra Banhart “cachets”s” eram baixos e eles, parapara fantásticofantástico dada palavra mais filho de um próspero comerciante caucionou na fazeremm mais uns trocos, gravavamgravavam banda repetida (surge de papel), foi autor de meia centena compilação “Golden Apples Of The cassetess que venvendiamdiam ao públicopúblico no origináriaooriginária como refúgiore salvador e de óperas e de várias dezenas de Sun”, dando assim definitiva fim dos espectáculos. Até aí tudo perperdiçãodiçã regeneradora), peças instrumentais ainda por visibilidade ao que se definiu então normal,, só queque também contam FrFFranciscoanci Ribeiro criou um divulgar. como “free folk”, não é o que deles que numama dessas digressões ficaram uuniversoniver a contra-ciclo dos O presente CD da violinista Chiara conhecíamos antes. Por uma simples sem cassetessetes gravadas,gravadas, de modo que aactuaisctuais ritmos quotidianos. A Banchini e do seu Ensemble 415 razão: sendo mais produzido, mais continuaramaram a venvendê-lasdê-las sem eestreiastreia a solosolo dod ex-violoncelista dos constitui precioso contributo para límpido, não tem as vozes e os música lálá dentro.dentro. QuandoQuando um MaMadredeusdredeus coconvida-nosn a caminhar conhecer o verdadeiro Albinoni. instrumentos rodeados pela bruma espectadordor foi reclamar, recusaram pporor elaela serenamente,serenam arredados do Foram registadas as seis “Sinfonie a misteriosa que nos transmitia uma a devoluçãoução argumentando que sim, bbulícioulício e libertoslibert da voragem Cinque” op. 2 (1700), obras ilusão de ancestralidade. Se a cassetee nnãoão ccontinhaontinha músicamúsica eenciclopédicanciclopédica que tantas vezes publicadas em parceria com seis juntarmos a isso o facto de, em “III”, deles... mas,mas, pelopelo menos, tinha sido papautauta hoje a experiência musical. concertos. Enquanto as primeiras as canções, concisas na estrutura, vendidaa por eeles.les. PPrecisamosrecisa de tempo para obedecem ao modelo da antiga curtas em duração, não se É inegávelgável que esta eestasstas cançõesc em que o peso sonata “da chiesa” (com a sucessão prolongarem em feitiçarias folk, dir- costela ddee mammajestosojes da orquestra se de andamentos lento-rápido-lento- se-á então que os Espers se trafulhicece eneencontrac com o rápido), os concertos demonstram renderam ao convencional. Não tambémm ffazaz rerendilhadon bucólico da que Albinoni estava consciente dos negamos a evidência, mas também parte doo O universo pessoalíssimo de Francisco guguitarra e a voz se Ribeiro num disco que exige tempo novos rumos da música do seu não lançamos os braços aos céus espectáculoculo eespraia pelo PEREIRA SUSANA

32 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

O novo disco de Américo “low-tech”, feito com o Américo Rodrigues a Rodrigues - actor, auxílio de tecnologias partir de elementos da Lança- encenador, performer e rudimentares como tradição oral portuguesa. ainda director do Teatro telefones, megafones, A edição é da Bosq- mento Municipal da Guarda -, transístores e walkie- iman:os records, com o “Cicatrizando (Acção talkies, de uma apoio da Luzlinar e do Poética e Sonora”), vai ser série de Instituto de Estudos da lançado segunda-feira na acções Literatura Tradicional Luzlinar (Feital, Guarda) poéticas da Universidade Nova de “Cicatrizando” é o registo de Lisboa.

Mediterrâneo em cadência fadisto- Apenas isto: R.E.M. uma frescura e inquietação que desvantagens são a menor qualidade magrebina (principalmente a de “Endless B-O-O-G- definiu a música indie americana. do material novo e um certo Live at the Olympia Francisco Ribeiro, mas também a de I-E” – e um “yeah!” Warner Certo é que em fases posteriores a aburguesamento do som: se as José Perdigão, um dos convidados). no final para banda só alcançou esse frémito guitarras dos R.E.M durante os anos Só assim, abertos a ele, poderemos assegurar que sim, mmmnn quando em “Up” mudou de som à em que estiveram na editora I.R.S descobrir verdadeiramente “endless boogie” conta da transformação do quarteto exultavam de trepidação e “Desiderata”. E dessa forma, muito faz bem ao corpo. Não é uma má em trio, por causa da saída do irrequietude, hoje são, na melhor há a descobrir. O primeiro álbum da banda de prenda a que os baterista de sempre, Bill Berry. A das hipóteses, saborosas. E isso, Fruto da visão e do temperamento veteranos nova-iorquinos, obscura R.E.M oferecem aos vantagem de “This Is Not A Show” é, para quem fez tanto, sabe sempre a estético do seu autor, é música até Stephen Malkmus os convencer a fãs pelo trigésimo portanto, a “pedagogia” que pode pouco. João Bonifácio erudita contemporânea e música abandonar a garagem e saltar para o aniversário da exercerexercer sosobrebre a popular e música do mundo. Por “E palco, um pouco menos obscura banda: um duplo miudagem.miudagem. mais será revelado...” passa uma depois disso, tem dez canções e 70 e CD ao vivo que recolhe material de AlémAlém disso, angústia e um tom grandiloquente tal minutos. Cada canção é um riff todas as fases da carreira, ao qual é MichaelMichael que descreveríamos toscamente que se prolonga até nada mais existir aposto um DVD, “This is Not a StipeStipe atéaté como uns Madredeus em queda – no mundo do que aquela cadência Show”, espécie de documentário pareceparece sasabebe tem fado na voz de José Perdigão e de guitarra e um ritmo que mergulha cujo público alvo será os fanáticos cantar.cantar. AAss dimensão imagética de clímax de no hipnotismo do blues para do grupo de Athens. O melhor do banda sonora. Em “A todas as reemergir transformado, branco disco são as recuperações de florestas moribundas”, por sua vez, como uns Canned Heat sem canções que os fãs de segunda e Um “digest” cria-se um fortíssimo contraste entre pachorra para gravar discos. terceira hora dos R.E.M nunca dos R.E.M. a placidez da orquestra e a cavalgada Dez canções, dez jams blues-rock ouviram, como “Letter never sent” que esclarece expressiva do “throat singing” de sem rabo de cavalo à vista. Extenso, (do magnífico “Reckoning”) ou o contributo Tanya Tagaq – é impossível ficar-lhe excessivo, prolongado até ao limite “Disturbance at the heron house” da banda indiferente. A central “A junção do de saturação para quem não partilha (“Document”): nessa altura os R.E.M de Michael bem”, mais à frente, surge como o fascínio pela coisa rock’n’roll. Os ainda estavam a descobrir como Stipe para mancha sonora que se espalha lenta solos de guitarra, que são aqui escrever canções e cada tema tem o património e harmoniosamente: quando surgem matéria livre e espontânea, vida própria, truques, ganchos e indie as vozes de Francisco Ribeiro e de cumprem a mesma função da americano Filipa Pais, não há surpresa, nada se motorika dos Neu! – são a voz e o altera – como se aquele fosse o seu discurso de toda esta música. A voz espaço, como se tivessem de estar ela mesma é coisa tresloucada, como ali, naturalmente. que um grasnar de palavras sem Neste disco gravado com a sentido aparente, qual “Captain Orquestra Nacional do Porto, Beefheart meets George Romero” – dirigida por Mark Stephenson, onde forma de nos dizer que isto, que é encontramos dedicatória a Carlos música séria, não deve ser levado Paredes (“Alma do mar”) e se ouve a demasiado a sério. guitarra de José Peixoto, Francisco Como escrevemos, o álbum divide- Ribeiro definiu um universo se em dez canções, mas a verdade é pessoalíssimo, um mundo de que nem são propriamente canções: sombras em busca de uma luz maior apenas um som registado em fita. que o ilumine. Teremos hoje tempo Que já soava antes de o gravador o para acompanhar a viagem? M.L. captar e que continuou a ouvir-se quando um dedo decidiu carregar Endless Boogie no stop. “Endless boogie”, de facto, e felizmente.felizmente. M.L.M.L. FFocusocus LeveLevell NNoo Quarter;Quarter; ddistri.istri. MMbaribari Solos de guitarra prolongados mmmnn até ao limite da saturação, para o bem e paraparaa o mal:mal: eiseis os A crítica a este álbum podiapodia EEndlessndless BooBoogiegie resumir-seresumir-se ao nome da banda.banda. JEFF WINTERBERG

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 33 Clássica Criação”, sob a direcção de William A begena está viva nas mãos de Alèmu Aga, hoje no Porto Christie, e tem sido dirigido por maestros tão importantes como A luminosa Harnoncourt, Gardiner, Herreweghe, Jacobs ou Kent Nagano. Trata-se de um simbólico “Criação” encerramento para o Ano Haydn, mas o CCB terá ainda outros eventos de Haydn dedicados ao compositor. No dia 23, a Orquestra de Câmara Portuguesa apresenta o segundo concerto da A mais célebre das oratórias série “Caderno de Viagens”, de Haydn pela Orquestra dedicado a Londres, cujo programa Metropolitana de Lisboa, inclui a Sinfonia nº 104, de Haydn, e até dia 30 poderá ainda ser vista a num concerto que inclui o exposição “Haydn on Tour” na grande barítono Dietrich galeria Mário Cesariny. Henschel. Cristina Inspirada na Bíblia (“Génesis”) e Fernandes no “Paraíso Perdido”, de Milton, “A Criação” constitui uma feliz união Coro Sinfónico Lisboa Cantat entre a tradição da oratória e Orquestra Metropolitana handeliana, a missa vienense e o de Lisboa estilo sinfónico de Haydn, servindo Direcção Musical de Theodor de veículo a uma música de Guschlbauer. Com Marlis Petersen transbordante imaginação, que faz (soprano), Thomas Walker (tenor), viver as ricas imagens do texto. Dietrich Henschel (barítono). Depois de uma primeira audição privada, no palácio do príncipe Lisboa. Centro Cultural de Belém - Grande Auditório. Praça do Império. Dom., 20, às 17h. Tel.: Schwarzenberg em 1798, foi estreada 213612400. 8€ a 30€. no Burgtheater de Viena em Março de 1799 com um êxito estrondoso. O Para além dos quartetos e das público esgotou a sala e a receita sinfonias, “A Criação” é a obra que ultrapassou os 4000 florins, uma mais contribuiu para o quantia jamais alcançada por um reconhecimento do génio de Joseph teatro vienense. Em 1808 foi reposta HayHaydndn ((1732-2009).1732-2009). Esta em Viena, sob a direcção de Salieri, exextraordináriatrraoa rdinária viagem musical entre numa gala destinada a celebrar o 76º o caoscaoss e a ordem,ordem, evocadoraevocadora ddaa aniversário de Haydn. O compositor criaçãocrc iação dodo mundo,mundo, será chegou na carruagem do príncipe dirigidadid rigida pelopelo maestro Esterházy e foi recebido por uma TheodorTTheodor GuschlbauerGuschlbauer multidão, no meio da qual se instrumento mais velho tocado na Escola de Música Nacional da Etiópia no ppróximoróximo encontravam Beethoven e Hummel. Etiópia”, escreve Francis Falceto, – abriu uma loja de “souvenirs” em domingo,dod mingo, às 17h, As ousadias harmonicas da produtor francês, num texto de Adis Abeba, a capital etíope. Com o no CentroCentro “Representação do Caos” na apresentação da série de discos que fim do regime, Aga voltaria a tocar

Concertos CulturalCuC ltural ddee Abertura da obra não têm paralelo dirige, “Ethiopiques” (o 11º volume em público e a ensinar, tornando-se Belém.BBelém. São na música do século XVIII e apenas dessa série é dedicado a Alèmu Aga). um dos maiores embaixadores da intérpretesintérpretes a seriam retomadas pelo Romantismo Diz a lenda que o instrumento terá música etíope no mundo. A begena OrquestraOrqquestra tardio. Na poderosa passagem “E servido, há três milénios, para tem poucos executantes, mas, MetropolitanaMettropolitana fez-se luz”, que marca o final do caos contornar a insónia de Saul, meio- recentemente, Alèmu afirmou-se de LLisboa,isboa, o com um luminoso acorde de Dó irmão de David. A ligação à religião satisfeito por ver cada vez mais CoroCCoror Sinfónico Maior em fortíssimo, a sala veio terá surgido por volta do século IV. jovens a pegar no instrumento. LisboaLLisboa CantatCantat abaixo com palmas. Até ao século XX, a begena foi Nascido em 1950 nas terras altas à e umu conjuntoconjunto tocada sobretudo nos círculos volta de Adis Abeba, Alèmu canta de solistas de religiosos e entre os nobres. Por canções religiosas, fábulas, histórias prestígioprestígio Pop causa destas origens, a ditadura de e os seus próprios poemas, internacionalinternacional contornos anticlericais instalada em enquanto dedilha o instrumento, queque incluiinclui a 1974 baniu o instrumento da rádio e que toca desde os 12 anos. sopranosoprano As cordas da televisão, confinando-o ao uso Problemas sociais e outras MarlisMarlis doméstico.doméstico. preocupações são expressas com Peterson,Peterson, o de Deus Também Alèmu Aga foifoi forçadoforçado a recursorecurso a referênciasreferências veladas – alalgogo tenor TThomashomas abandonarabandonar as aulasaulas dede begenabegena na habitualhabitual no pensamento etíope, WalkerWalker e o grandegrande barítono Alèmu Aga leva a harpa do alemãoalemão Dietrich Rei David ao Porto. Pedro Henschel. Rios ConceituadoConceituado intérpreteintérprete no campo Alèmu Aga dada oratória para aalémlém Porto. Culturgest. Avenida dos Aliados, 104 - Edifício da óperaópera e do Lied, da CGD. Hoje, às 22h. Tel.: 222098116. 5€. Henschel gravou “A Alèmu Aga é um dos grandes executantes da begena, que se crê que seja usada na Etiópia há cerca de três mil anos. Apesar de ser conhecida como a “harpa do Rei David”, a begena não é uma harpa, O grande barítono alemão Dietrich Henschel mas uma grande lira com dez Nathan Williams, o rapaz , vem à Zdb no encerramento do Ano Haydn do CCB cordas. “É provavelmente o e traz os Teengirl Fantasy debaixo do braço

34 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon fruto das várias ditaduras da história depois de o músico ter cancelado a do país. presença no mesmo espaço em Agenda A música de Alèmu, que hoje Maio, por motivos de saúde – Hill actua na Culturgest do Porto, é não vem porque partiu a mão. sexta 18 meditativa (é normal nesta tradição Na primeira parte estarão os 0s Golpes continuam na estrada com Os Tornados que uma peça dure várias horas), Teengirl Fantasy (que também Os Golpes + Os Tornados repetitiva, hipnótica, impondo um actuam hoje, no Plano B, no Porto, à Lisboa. Café Teatro Santiago Alquimista. R. Santiago, 19, às 21h30. Tel.: 218884503. 8€. ritmo seu, distante do corre-corre meia-noite). O duo lembra ocidental. Vale a pena ouvi-la. vagamente os Lucky Dragons (pelo Orquestra Nacional do Porto prazer em brincar com os sons e os Direcção Musical de Neil Thomson. Porto. Casa da Música - Sala Suggia. Pç. Mouzinho João Mota. Av. Liberdade, 46, às 21h30. Tel.: “loops”) num contexto mais dado ao de Albuquerque, às 21h. Tel.: 220120220. 16€. 212288715. 10€. Coisas boas do tédio ritmo e à pop. Logan Takahashi e Gotta Dance! Obras de Strauss II, Nick Weiss fazem música dançante e Lowe, Brown, Rosza e Gershwin. Orquestra de Jazz de Matosinhos sonhadora (apresentam-se algures António Matosinhos. Cine-Teatro Constantino Nery - Sala Wavves + Teengirl Fantasy Lisbon Film Orchestra Principal. Avenida Serpa Pinto, às 22h. Tel.: entre a música cósmica dos Zambujo em 229392320. 10€. Direcção musical de Nuno de Sá. Lisboa. Galeria Zé dos Bois. Rua da Barroca, 59. Harmonia e o R&B de CeCe Peniston Guimarães, Uma Viagem pelos Tempos do Jazz Sáb., 19, às 23h. Tel.: 213430205. 10€. Com Coro do Conservatório de Estarreja IV: “As Big Bands e o Jazz Moderno”. – é uma piada, mas até faz sentido), Música D. Dinis. e Oeiras Ninguém saberá muito bem explicar que recorre a “samples”, teclados e Lisboa. Aula Magna. Alam. Universidade, às Orquestra Nacional do Porto 21h30. Tel.: 217967624. 20€ a 35€. como é que Nathan Williams, o ritmos básicos, e que tem Direcção Musical de Neil Thomson. rapaz Wavves, de um momento para impressionado publicações e Jacinta Porto. Casa da Música - Sala Suggia. Pç. Mouzinho o outro saltou para a primeira liga blogues atentos às novidades. P.R. Lisboa. Centro Cultural de Belém de Albuquerque, às 18h. Tel.: 220120220. 16€. indie. Mas, em 2009, coisas destas já - Grande Auditório. Praça do Gotta Dance! Obras de Strauss II, Império, às 21h. Tel.: Av. Luís Bívar, 91, às Lowe, Brown, Rosza e Gershwin. não deviam surpreender. E o melhor 213612400. 17€ a 37. 21h. Tel.: 213111400. 10€. que temos a fazer é deixar-nos Jazz Assobio contagiar. Tiguana Bibles Orquestra Vila Real. Teatro de Vila Real - Pequeno Auditório. Portalegre. Centro de Filarmonia das Alameda de Grasse, às 22h. Tel.: 259320000. 7€. “Contagiar” porque essa é a Artes do Espectáculo de Beiras Descentra- Portalegre - Café-concerto. Susana Santos Silva Quinteto melhor forma de entrar na música Direcção musical de Wavves. Não inventa nada, mas Praça da Republica, 39, às Porto. Casa da Música - Sala 2. Pç. Mouzinho de 23h. Tel.: 245307498. 3€. de António Albuquerque, às 12h. cativa pela forma descomprometida lização! Vassalo Tel.: 220120220. 5€. como se lança a bons velhos Monstro Mau Jacinta no CCB Lourenço. conhecidos (o punk, o som Braga. Theatro Circo - Pequeno Com Isabel Concerto de Hugo Alves e a Orquestra Auditório. Av. Liberdade, 697, às Natal carcomido das guitarras, com o 22h. Tel.: 253203800. 5€. Alcobia (soprano), Com Mariza, “fuzz” como camada extra de Jazz de Lagos num concerto Rui Veloso, significado em cima de acordes e Pedro Carneiro Fernando Guimarães de Natal. Rodrigo Amado Ovar. Centro de Arte de Ovar. Rua Arquitecto Carminho, melodias simples, o tédio como (tenor), Nuno Dias Januário Godinho, às 21h30. Tel.: 256585451. 3€. (baixo) e o Coro do Ricardo rastilho criativo). “Wavvves”, o Festivais de Outono - Aveiro’09. Domingos Orquestra de Jazz de Lagos Departamento de António em álbum que lançou este ano, situa-se Comunicação e Com Hugo Alves, Jay Corre, entre Mikado Lab Bragança na linha que une punk, ruído e pop, outros. Lisboa. Galeria Zé dos Bois. Rua da Barroca, 59 - Arte da os Nirvana, os Wipers e os Beach Bairro Alto, às 23h. Tel.: 213430205. 6€. Universidade de Lagos. Centro Cultural de Lagos. Rua Lançarote de Boys - “So Bored”, entre os Ramones Freitas, 7. 4ª, 23, às 21h30. Tel.: 282770450. Aveiro. Teengirl Fantasy Figueira da Foz. Centro de Artes e a memória etilizada da história dos Entrada gratuita. Porto. Plano B. R. Cândido dos Reis, 30, às 23h. e Espectáculos - Grande Tel.: 222012500. concertos punk em caves duvidosas, Auditório. R. Abade Pedro, às 21h30. é um dos hinos rock’n’roll de 2009. Hugo Alves não pára. Trompetista de Tel.: 233407200. 10€. Noiserv Irmãos Catita no Porto “Wavvves” e “Wavves” (o excepção, educador e Portimão. Teatro Municipal de Portimão - Café- Atyss + Brayn Tek + Bunker e em antecessor, com um “v” agitador incansável, concerto. Largo 1.º de Dezembro, às 22h. Tel.: Jack + Kafar + Midigate & Kebba 282402475. Entrada gratuita. Estarreja a menos no título, desdobra-se numa Porto. Porto-Rio. Rua do Ouro - Barco Gandufe, às lançado quatro multiplicidade de António Zambujo 0h. Tel.: 917871912. 5€. meses antes) projectos dos Guimarães. Centro Cultural Vila Flor - Café- Zeca Medeiros elevaram quais a Orquestra concerto. Avenida D. Afonso Henriques, 701, às 23h. Tel.: 253424700. 2,5€. Seixal. Bar Tambor Q Fala. Rua José Vicente Williams da Jazz de Lagos é a Gonçalves, 8J - Parque Industrial do Seixal, às 22h. condição de Hugo face mais visível. Domingos António Tel.: 212269090. 5€. Alves Bragança. Teatro Municipal de Bragança. Pç músico de Com três discos 14.º Aniversário B.Leza Ribeiro, num Cavaleiro Ferreira, às 21h30. Tel.: 273302740. 5€. quarto, gravados – Obras de Liszt, Prokofiev, Scriabin e Com Calú Moreira, Dany Silva, Maria Paulo Gonzo, aborrecido com a concerto “Estranha Mozart. M/6. Alice, Ana Firmino, Guto Pires, Shout. vida, a estrela de cheio de Natureza”, “Taksi André Cabaço, Nancy Vieira, Rui Lisboa. Praça de Touros do Campo Pequeno. Campo uma pequena convidados Trio” e “Given Soul” Táxi Cruz, Rita Lobo. Pequeno, 22h. Tel.: 217820575. 18€ a 60€. Matosinhos. Blá Blá. Rua Brito Capelo, 1085,085, às LisboaLisboa.. MaximeMaxime.. PçPç.. AlegriaAlegria,, 5858,, às 23h3023h30.. TelTel.:.: multidão. E já há –, Alves dá 23h. Tel.: 965662596. 5€. 2213467090.13467090. 12€.12€. NoiservNoiserv sucessor no prelo, continuidade a um Rádio Nova Live Sessions. Porto.Porto. CDGO (Jo-Jo’s Music). R. de Cedofeita, 509, às 1616h.h. TeTel.:l.: 222058410. EntraEntradada gratuita. gravado com o baterista percurso notável que tem Andrew Thorn ssábadoábado 1199 EEstarreja.starreja. Cine-Teatro Municipal. R. do Zach Hill, ainda sem data de edição. feito mais pela cultura algarvia do Visconde de ValdemouroValdemouro,, às 23h. Tel.: Maia.Maia. Tertúlia Castelense.Castelense. RR.. Augusto NoNogueiraggueira da Anabela DuartDuartee O concerto ddee amanamanhãhã que os milhões gastos em concertoss SilvSilva,a,, 7779,79, às 23h30. Tel.: 229829425. 5€. 234811300.234811300. 2€. SSesimbra.esimbra. Cine-Teatro Municipal na ZDB aconteceacontece de gosto duvidoso para turistas de OutonalidadesOutonalidades 009.9. BelaBeB la NafNafaa passagem. Lisboa.Lisboa. Instituto Franco-PFranco-Português.ortuguês. Na próxima quarta-feira, os espíritos de Duke Ellington e Count Basie invadem o Centro Cultural de Lagos, no tipo de celebração natalícia que vale mesmo a pena. Pedro Temas do cancioneiro tradicional dee Carneiro com Natal norte-americano são a Orquestra interpretados pela Orquestra Jazz dee de Câmara Lagos numa ocasião que conta comm Portuguesa a participação especial de Jay Corre,e, em Portimão um saxofonista tenor que fez a sua e Lisboa carreira nas bandas de Raymond Andrew Thorn, Scott, Buddy Rich, Harry James ou o novo projecto Benny Goodman, entre muitas de JP Coimbra, outras. dos Mesa

ÍpsilonÍÍpsililolon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 35 Concertos

O’queStrada no Teatro Viriato, em Viseu

António Simões Zambujo (soprano). Estarreja. Cine- Portimão. Teatro Teatro Municipal de Municipal de Estarreja. Rua do Portimão - Grande Visconde de Auditório. Largo Valdemouro, às 1.º de Dezembro, 21h30. Tel.: às 21h30. Tel.: 234811300. 12€ a 15€. 282402475. 10€. Caderno de Concerto de Viagens: Natal Londres. Direcção Obras de Musical de Benjamin, Sérgio Fontão. Haydn e Com João Vaz Mendelssohn. (órgão), Rui Paiva (órgão), António António Duarte Zambujo (órgão), António Esteireiro (órgão), Oeiras. Auditório Municipal Eunice Muñoz. R. Isabel Albergaria (órgão), Margarida Mestre de Aviz, às 21h30. Tel.: 214408411. 10€. Oliveira (órgão) e o Coro Voces Caelestes. quarta 23 Mafra. Palácio e Convento de Mafra - Basílica. Terreiro de D. João V, às 21h. Tel.: 261817550. Coro Infantil do CPO Obras de Mozart, Gruber, Frei José Direcção Musical de Palmira Troufa. Marques e Silva e Francisco Porto. Casa da Música - Sala Suggia. Pç. Mouzinho Olivares. de Albuquerque, às 19h30. Tel.: 220120220. 10€. Música de Natal. Bad Company Porto. Porto-Rio. Rua do Ouro - Barco Gandufe, às Orquestra de Câmara 0h. Tel.: 917871912. Portuguesa Direcção musical de Pedro O’queStrada Carneiro. Com Sara Braga Simões Viseu. Teatro Viriato. Lg. Mouzinho Albuquerque, (soprano). às 21h30. Tel.: 232480110. 5€ a 10€. Lisboa. Centro Cultural de Belém - Grande Auditório. Praça do Império, às 21h. Tel.: domingo 20 213612400. 5€ a 10€. Caderno de Viagens: Londres. Júlia Teixeira de Azevedo Obras de Benjamin, Haydn e Lisboa. Museu do Oriente - Auditório. Av. Brasília - Mendelssohn. Edifício Pedro Álvares Cabral - Doca de Alcântara Norte, às 18h00. Tel.: 213585200. 5€. Os Azeitonas Porto. Passos Manuel. Rua Passos Manuel, 137, às Coro e Orquestra Barroca Casa 23h. Tel.: 222058351. da Música Direcção Musical de Laurence Miguel Fernandes e Paulo Cummings. Pacheco Porto. Casa da Música - Sala Suggia. Pç. Mouzinho Lisboa. Instituto Franco-Português. Av. Luís Bívar, de Albuquerque, às 18h. Tel.: 220120220. 11€. 91, às 19h. Tel.: 213111400. Entrada gratuita. Obras de Purcell e Häendel. Concertos Antena 2. Obras de Brahms, Fauré e Rachmaninov. Vozes da Rádio Aveiro. Teatro Aveirense - Sala Principal. Pç. República, às 18h. Tel.: 234400922. 5€. quinta 24 Orquestra Sinfónica da Ucrânia One Man Hand Direcção Musical de Volodymyrlodymyr Porto. ArmaArmazémzém do Chá. Khanas. Com Malgorzatata Dugosz RuaRua José Falcão, 180, às 0h.0h. Tel.:Tel.: 22.2444223. (soprano). NatalNatal CComix.omix. Almada. Teatro Municipal de Almadamada - SaSalala Principal. Av. Professor Egas Moniz,niz, às 16h. Tel.: 212739360. 15€. Shout! + Mafalda Arnauthnauth Lisboa. Igreja de São Domingos. LLg.g. S. Domingos, às 16h. Tel.: 213428275. Entrada ggratuita.ratuita. Natal em Lisboa - Concertosertos em Igrejas. terça 22 Remix Ensemble Direcção Musical de Ilan Volkov. Porto. Casa da Música - Sala Suggia. Pç. Mouzinho de Albuquerque, às 19h30. Tel.: 220120220. 10€. Ulisses em Copacabana.. Obras de Gilberto Mendes,des, Tinoco, Chico Mello, Revueltas e Nancarrow. Living Colour Lisboa. Café Teatro Santiago Alquimista.uimista. R. Santiago, 19. 3ª às 22h00. Tel.: 218884503.8884503. 25€. Orquestra de Câmaraa Portuguesa Mafalda Arnauth gratuita Direcção musical de Pedrodro com os Shout!, na Igreja Carneiro. Com Sara Bragaga de São Domingos, Lisboa

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“Cousa”, na Fundação Carmona e grafite e expostas à erosão, ao experiência visual e plástica. Em Depois Costa, em 2006) e colectivas (a título desgaste, ao desaparecimento. É a “Desenho”, uma das peças mais de exemplo: “Antena 1”, no Fórum partir desta meditação introdutória notáveis de “Diferido”, uma série de Eugénio de Almeida, Évora, em ao processo e ao tempo que o fósforos colados à parede desenhou do corpo do 2006, ou ainda este ano “Congrès à espectador vive em “Diferido” uma com o fogo uma linha; em géometrie inverse”, no Grand Palais, relação que se faz entre os corpos do “Profundidade e Altura”, um pau de desenho em Paris) e a selecção em 2004 para artista e do desenho e o repto madeira traça com a sombra um os Prémios EDP. discreto, embora frágil, à percepção triângulo no espaço e, no chão, Não estamos, portanto, diante de do espaço e da matéria. aparas de lápis compõem simples e “Diferido”, de Diogo um nome debutante, mas de um O gesto e o corpo assinalam-se em comoventes superfícies quadradas. Pimentão, é uma exposição artista com um corpo de trabalho “Suspensão”, uma “frottage” sobre a Vestígios, suspensões, linhas, que abre o corpo de uma construído, representado em superfície das roupas, no fazer formas. Lugares transitórios, obra ao espectador. Pelo colecções como as da Fundação de intensivo de “Monocromo (amarelo, diferidos do desenho. De um Serralves ou da Fundação EDP. É, no azul, vermelho)”, onde se escuta desenho que o artista oferece à seu rigor e imaginação entanto, justo afirmar que uma “conversa” com a pintura, ou deambulação do espírito, à conceptuais, é também uma “Diferido”, a primeira individual de nos desenhos “Centrípeto”, “Foco”, descoberta do espectador. das melhores do ano. José Diogo Pimentão na Marz, surge “Centrífugo”, que resultam da agitar como o momento mais assertivo da de pó de grafite no interior de uma Marmeleira sua produção. Trata-se, aliás, de estrutura de papel, (um processo On the road Expos uma das melhores exposições de que Diogo Pimentão utilizou em Diferido galeria deste ano; daquelas – raras – “Fracção”, trabalho exposto em De Diogo Pimentão onde é possível assistir à “abertura” “Cousa”). São obras produzidas pelo A viagem e a descoberta da de uma obra. esforço físico do corpo, por uma América de Rodrigo Amado. Lisboa. Marz Galeria. Rua Reinaldo Ferreira 20A. Os trabalhos presentes surgem no repetição de gestos que – como Tel.: 218464446. Até 9/01. 3ª a Sáb. das 12h às 20h. seguimento de várias experiências e acontece nos três desenhos – abalam Luísa Soares de Oliveira Escultura, Desenho. “descobertas” na fábrica de lápis o princípio e o fim da imagem. East Coasting Series Viarco, numa floresta próxima da Constituindo-se como uma De Rodrigo Amado mmmmn cidade francesa de Chateau-Landon actividade tão directa como mediada ou no quintal do próprio artista. por superfícies ou apenas por uma Lisboa. Módulo - Centro Difusor de Arte. Calçada dos Mestres, 34-A. Tel.: 213885570. Até 2/01. 3ª a Diogo Pimentão (Lisboa, 1973) Nestes locais, Diogo Pimentão acção, o desenho de Diogo Pimentão Sáb. das 15h às 20h. desenvolve há uma década um recolheu pedras e rochas pode tornar-se objecto e lugar de trabalho motivado pela prática do (instrumentos possíveis, uma respiração, de uma fala nas Fotografia. desenho, explorando as imaginados, de desenho), objectos esculturas feitas de grafite (“Ar”) e possibilidades performativas da de grafite e desenhos de acções. em “Livro Horizontal” e “Livro mmmmn disciplina e dos seus materiais, ou Encontramo-los reunidos em Vertical”; ou ser evocado, na “transformando-a” em escultura por “Ergonomia”, as pedras mostrando matéria-prima, no pigmento da terra A América que Rodrigo Amado Diogo Pimentão oferece ao meio de uma acção sobre o papel. as suas faces cruas, incisivas, de “Mão”. E diante desta imaginação fotografa nas imagens da sua mais espectador uma experiência Do seu percurso constam várias violentas (assim indicia o rasgar do e deste rigor conceptuais, nem por recente exposição, “East Coasting diferida do desenho numa das exposições individuais (Galeria grafite nos cartões), embora isso o espectador deixa de ser Series”, pouco tem a ver com aquela exposições mais notáveis do ano Presença, em 2004 e 2008, e delicadas, ao lado das “mãos” de confrontado com uma (maravilhosa) que o imaginário comum, feito de referências do cinema ou mesmo da fotografia norte-americana, divulgam. Trata-se de uma América descuidada, suja, híbrida e fissurada, que está mais próxima de uma pobreza que não se vê quase nunca – a dos bairros de “roulottes”, ou a dos excluídos que o desastre de Nova Orleães revelou – e que não se associa nunca à ideologia da terra das mil oportunidades que todos os meios de comunicação, da TV à Internet, continuam a veicular maciçamente. No campo da fotografia, Rodrigo Amado (n. 1964) tem no seu currículo um segundo lugar nos Encontros da Imagem de Braga de 2009, na secção Portfólios. Além do Módulo, expôs também nas galerias Kameraphoto e Espaço T. É também um saxofonista reconhecido internacionalmente, e a exposição que vemos agora resulta da recolha de imagens feitas durante uma digressão na costa leste dos Estados Unidos. As fotografias, surpreendentemente, foram captadas em Dallas, Nova Orleães, Greensboro, Filadélfia e Nova Iorque. O nome da exposição retoma o título de um disco do contrabaixista Charles Mingus que, segundo o texto de apresentação de “East Coasting Series”, tenta equilibrar “aquilo que nos é familiar com a magia do que está por explorar, o desconhecido”. As

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 37 aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Pedro Tudela na colectiva “Constelações Afectivas III”, da Graça Brandão Exposições

O trabalho de campo de Manuela Barile em Vila Nova de Cerveira

imagens desta série possuem, por norte-americana, sobretudo do A América de Rodrigo Amado afasta-se dos estereótipos visuais se mede a imensidão do Novo isso, uma relação estreita com a Oeste, acompanha o de um país mais do que nenhum outro fabricado pelas imagens Mundo, já não tão novo: um música, e sobretudo com a estabelecimento de comunidades universo feito à desmedida da dicotomia entre interpretação e migrantes, e foi feita com ambição e que a fraca medida do criação que está sempre implícita na frequência por encomenda do homem não consegue conter. expressão musical. próprio governo, inclusive em finais Quintais atulhados de lixo, No que se refere à imagem, a do século XIX. O espaço fotografado restaurantes de comida indiana interpretação constitui sempre uma era idealizado: vastas extensões de sobre vermelhos vivos e desfocados, revisitação de géneros e autorias terra virgem e desabitada, um um jovem desencantado sentado anteriores. Quase todas estas autêntico El Dorado que se instituiu num banco: a digressão, que estas imagens se podem integrar na rapidamente como paradigma deste fotografias documentam nunca se dá categoria da paisagem. Ora, uma género. Ansel Adams, já no século a ver como tal – não há uma única digressão é sempre uma viagem de XX, confirmou e reforçou este fotografia de um palco, de um descoberta. E a viagem está na paradigma, que só foi quebrado no espectáculo –, mas sim como uma própria raiz da identidade norte- momento da Grande Depressão outra viagem, interior e íntima, de americana: a viagem em direcção ao pelas imagens dos migrantes de quem refaz os passos, os Oeste por colonizar é Walker Evans. quilómetros ou as milhas que simultaneamente a fundação de uma As fotografias de Rodrigo Amado milhões de outros fizeram antes de nação e a refundação de uma remetem-nos justamente para este si. A sedução que elas possuem identidade que se abandonou no último referente. Uma das imagens reside precisamente neste olhar velho mundo. Esta viagem, a viagem mais marcantes de toda a série edifícios de betão. Mas o pára-brisas conjuntamente com a sujidade e o novo, longe de todos os estereótipos, da descoberta da América, povoa a mostra uma paisagem vista do do automóvel, que acaba por pó que se interpõem entre os nossos sobre um país que foi justamente mitologia e a iconografia deste país: interior de um automóvel. A coincidir com a objectiva do olhos e a paisagem, acaba por fabricado pelas imagens. É uma a fotografia sistemática da paisagem paisagem é feita de viadutos e aparelho, está rachado. Esta racha, condicionar a perspectiva pela qual excelente exposição.

Agenda Inauguram Paolini, Roberto Matta, entre outros. Festival Temps d’Images. Vídeo, Coimbra. Centro de Artes Visuais - CAV. Pátio da Instalação, Performance, Som, Outros. Lisboa. MUDE - Museu do Design e da Moda. R. Instalação. Inquisição, 10. Tel.: 239826178. Até 28/02. 3ª a Dom. Augusta 24. T. 218886117. Até 31/1. 3ª a 5ª e dom. Das das 14h às 19h. Linhas Paralelas Locus In Quo 10h às 20h. 6ª e sáb. Das 10h às 22h. A Interpretação dos Sonhos Vídeo. De Alexandra Côrte Real, Eduardo De Manuela Barile. Design, Objectos, Outros. De Jorge Molder. Nery. Vila Nova De Cerveira. Fórum Cultural. R. Lisboa. Centro de Arte Moderna - José de Azeredo Obras de Referência dos Museus Lisboa. Ermida de Nossa Senhora da Conceição. Comunidades Portuguesas. Tel.: 251794633. Até BES Revelação 2009 Perdigão. R. Dr. Nicolau Bettencourt. Tel.: 217823474. da Madeira: 500 Anos De Trav. do Marta Pinto, 12. Tel.: 213637700. Até 20/12. 16/01. 3ª a 6ª das 15h às 18h. Sáb. e Feriados das 10h De Susana Pedrosa, Ana Braga, Inês Até 27/12. 3ª a Dom. das 10h às 18h. História De Um Arquipélago 3ª a 6ª das 11h às 17h. Sáb. e Dom. das 14h às 18h. às 18h. Inaugura 18/12 às 21h. Lisboa. Galeria de Pintura do Rei D. Luís I. Calçada Instalação, Som. Moura. Fotografia. Joalharia, Desenho. Porto. Museu de Serralves. R. Dom João de Castro, da Ajuda - Palácio Nacional da Ajuda. Tel.: 213633917. Até 28/02. Sáb. das 11h às 20h. 2ª a 6ª e S.A. Marionetas - 12 Anos a 210. Tel.: 226156500. Até 07/01. 3ª a 6ª das 10h às Matar o Tempo Colectiva 2009/2010 17h. Sáb., Dom. e Feriados das 10h às 19h. Dom. das 11h às 18h. Trabalhar Para o Boneco De Ana Vidigal. De David de Almeida, Carlos Barão, Lisboa. Galeria 111. Campo Grande, 113 / R. Doutor Pintura, Escultura, Objectos, Alcobaça. Mosteiro - Galeria de Exposições Fotografia, Outros. Manuel Baptista, Jean-Marie João Soares, 5B. T. 217977418. Até 31/12. 3ª a Sáb. Das Fotografia, Outros. Temporárias. Abadia de Santa Maria de Alcobaça. Boomputte, Saskia Bremer, T, entre Emissores Reunidos - Episódio II: 10h às 19h. Tel.: 262505120. De 19/12 a 19/02. 2ª a Dom. das 10h Iniciativa X outros. às 17h. Senhor Fantasma, Vamos Falar Pintura, Outros. São Lourenço. CC São Lourenço. R. Igreja. Tel.: De Marcelo Cidade, Renato Ferrão. Lisboa. Arte Contempo. R. dos Navegantes, 46A. Tel.: Marionetas, Objectos. Diogo Evangelista 213958006. Até 23/12. 2ª a Dom. das 14h30 às 19h30. 289395475. Até 31/03. 3ª a Dom. das 10h às 19h. Porto. Radiodifusão Portuguesa (Antiga RDP). R. Pintura, Escultura, Outros. Cândido dos Reis, 74. Até 24/01. 3ª e 4ª das 17h às Lisboa. Galeria 111. Campo Grande, 113 / R. Doutor Pintura, Outros. Continuam 20h. 5ª e 6ª das 17h às 01h. Sáb. das 15h às 01h. Dom. João Soares, 5B. T. 217977418. Até 31/12. 3ª a Sáb. Das 10h às 19h. Les Planches Courbes e Outras Encontrei Pessoas Que Nunca das 15h às 20h. Conheci/I Found People I Never She is a Femme Fatale Objectos, Outros. Pintura. Histórias De Louise Bourgeois, Paula Rego, De Paula Rego. Had Met Before Cindy Sherman, Helena Almeida, Brrrrain Moby Dick Igreja. Galeria dos Prazeres - Quinta Pedagógica dos De José Budha. Lisboa. Rentagallery #24. R. da Esperança, 24. Tel.: Nan Goldin, Hannah Villiger, De António Olaio. De João Pedro Vale. Prazeres. Sítio da Igreja. Tel.: 291822204. Até 31/01. Lisboa. Galeria Filomena Soares. R. da Manutenção, 3ª a Dom. das 10h às 19h. 214010437. Até 30/12. 2ª a Dom. das 15h às 21h. Francesca Woodman, Aino Lisboa. Culturgest. R. Arco do Cego - Edifício da CGD. Tel.: 217905155. Até 23/12. 2ª, 4ª, 5ª e 6ª das 11h às 80. Tel.: 218624122. Até 16/01. 3ª a Sáb. das 10h às 20h. Obra Gráfica, Outros. Pintura, Vídeo, Som, Outros. Kannisto, entre outros. 19h. Sáb., Dom. e Feriados das 14h às 20h. Outros. Duplicadores Lisboa. Museu Colecção Berardo. Pç. do Império - O Plano Atravessado CCB. Tel.: 213612878. Até 31/01. Sáb. das 10h às 22h. Pintura, Vídeo. De José Spaniol. A State of Aff airs De Fernando Lanhas, Ângelo de Lisboa. 3 + 1 Arte Contemporânea. R. António Maria 2ª a 6ª e Dom. das 10h às 19h. Jos De Gruyter e Harald Thys De Alexandre Almeida, Guillaume Cardoso, 31. Tel.: 210170765. Até 20/02. 3ª a Sáb. das Pintura, Escultura, Fotografia, Sousa, António Palolo, Helena Lisboa. Culturgest. R. Arco do Cego - Ed. da CGD. Pazat, Pedro Letria, Pauliana Valente Almeida, Júlio Pomar, Nikias 12h30 às 20h. Desenho, Vídeo, Outros. Tel.: 217905155. Até 23/12. 2ª, 4ª, 5ª e 6ª das 11h às Pimental, João Pina, entre outros. Fotografia, Escultura. 19h. Sáb., Dom. e Feriados das 14h00 às 20h. Skapinakis, entre outros. David Claerbout Lisboa. Plataforma Revólver. R. da Boavista, 84 - 3º. Ovar. Centro de Arte de Ovar. R. Arquitecto Januário Vídeo, Escultura, Fotografia. Tel.: 213433259. Até 31/12. 2ª a Sáb. das 14h às 19h30. Godinho. Tel.: 256585451. Até 27/02. 3ª a 6ª das 10h Thomas Helbig Fotografia. às 18h. Sáb. das 10h às 18h. Braga. Galeria Mário Sequeira - Parada de Tibães. Batia Suter Quinta da Igreja (Parada de Tibães). Tel.: Pintura, Outros. Porto. Culturgest. Av. dos Aliados, 104 - Ed. da CGD. Constelações Afectivas III 253602550. Até 31/12. 2ª a 6ª das 10h às 19h. Sáb. das Tel.: 222098116. De 30/10 a 09/01. 2ª, 4ª, 5ª e 6ª das De Albuquerque Mendes, João Maria #4 Um Projecto das Galerias 15h às 19h. 11h às 19h. Sáb., Dom. e Feriados das 14h às 20h. Pintura, Escultura. Outros. Gusmão & Pedro Paiva, João Tabarra, De Alexandre Farto, André Cepeda, Lygia Pape, Mauro Cerqueira, Miguel Augusto Alves da Silva, Daniel Gustav Ínsulas Sem Saída, Ensaio Sobre o Soares, Pedro Tudela, Rui Chafes, Cramer, Daniel Malhão, Gabriela De João Margalha. Optimismo entre outros. Albergaria, entre outros. Porto. Centro Português de Fotografia - Cadeia da De Augusto Alves da Silva. Lisboa. Galeria Graça Brandão. R. dos Caetanos, 26. Lisboa. BES Arte & Finança. Pç. Marquês de Pombal, Relação do Porto. Campo Mártires da Pátria. Tel.: Porto. Museu de Serralves. R. Dom João de Castro, Tel.: 213469183/4. Até 9/02. 3ª a Sáb. das 11h às 20h. 3-B. Tel.: 218839000. Até 22/01. 2ª a 6ª das 09h às 21h. 222076310. Até 16/02. 3ª a 6ª das 10h às 18h. Sáb. 210. Tel.: 226156500. De 23/10 a 31/01. 3ª a 6ª das Escultura, Fotografia, Vídeo. das 15h às 18h. 10h às 17h. Sáb., Dom. e Feriados das 10h às 19h. Crying My Brains Out Fotografia. Fotografia. De António Olaio. João Abel Manta 1991-2009 Lisboa. Galeria Filomena Soares. R. da Manutenção, Lisboa. Galeria do Palácio Galveias. Campo Korda - Conhecido Desconhecido Anos 70 - Atravessar 80. Tel.: 218624122. Até 16/01. 3ª a Sáb. das 10h às 20h. Pequeno, 53 - Edifício do Palácio Galveias. Tel.: De Alberto Korda. Fronteiras Pintura. 218170534. Até 17/01. 3ª a 6ª das 10h às 19h. Sáb. e Lisboa. Galeria Torreão Nascente da Cordoaria Lisboa. Centro de Arte Moderna - José de Azeredo Dom. das 14h às 19h. Nacional. Av. da Índia - Edifício da Cordoaria Lisboa. MNAC - Museu do Chiado. R. Serpa Pinto, 4. Perdigão. R. Dr. Nicolau Bettencourt. Tel.: 217823474. The Hustler Pintura. Nacional. Tel.: 213642909. Até 31/01. 3ª a 6ª das 10h Tel.: 213432148. Até 28/02. 3ª a Dom. das 10h às 18h. Até 03/01. 3ª a Dom. das 10h às 18h. De João Louro. às 19h. Sáb. e Dom. das 14h às 19h. Festival Temps d’Images 09. Pintura, Escultura, Fotografia, Coimbra. Centro de Artes Visuais - CAV. Pátio da Assault Fotografia. Instalação, Vídeo, Fotografia. Instalação, Outros. Inquisição, 10. Tel.: 239826178. Até 28/02. 3ª a Dom. De Mário Pires Cordeiro, João Lima das 14h às 19h. Duque. Fireworks É Proibido Proibir! Jesper Just Instalação. Lisboa. Museu Nacional de História Natural. R. da De Pedro Cabral Santo. De Archizoom Associati, Studio 65, Lisboa. Centro de Arte Moderna - José de Azeredo Escola Politécnica, 58. Tel.: 213921800. Até 03/01. 3ª Lisboa. VPFCream Arte. R. da Boavista, 84 - 2º. Tel.: Grupo Sturm, Superstudio, Pierre Perdigão. R. Dr. Nicolau Bettencourt. Tel.: 217823474. Pronounciations a 6ª das 10h às 17h. Sáb. e Dom. das 11h às 18h. Na 213433259. Até 31/12. 2ª a Sáb. das 14h às 19h30. Paulin, Verner Panton, Cesare Até 18/01. 3ª a Dom. das 10h às 18h. De Katarina Zdjelar. Sala do Veado. Desenho.

38 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon ESTÚDIO Nuno Ramalho & Renato Ferrão

Exposição de 11 de Novembro até 22 de Janeiro de 2010 Horário: de quarta-feira a sábado, das 15h às 20h

Visita guiada com os Artistas e com Bruno Marchand (autor do texto do catálogo) 11 de Dezembro, sexta-feira, às 18h30

fundação carmona e costa

Edifício Soeiro Pereira Gomes (antigo Edifício da Bolsa Nova de Lisboa) Rua Soeiro Pereira Gomes, Lte 1- 6.º D 1600-196 Lisboa (Bairro do Rego / Bairro Santos) Tel. 217 803 003 / 4 www.fundacaocarmonaecosta.pt

Autocarro: 31 Metro: Sete Rios / Praça de Espanha / / Cidade Universitária aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Ficção vista, de Homero a Pacheco Pereiro, menino. Para Jaburu a graça do cuja moral está mais próxima da entreter tem um carácter nobre. cachopo pode determinar o futuro exibida pela comadre que educara Exemplificar, porém, exemplificar do pequeno, por um sem número de seu pai (e que fora, portanto, O que é em acto, é o melhor que a melhor razões, manias e crenças que causadora da sua desgraça pessoal) literatura consegue fazer: dizer “Isto imediata e subtilmente colocam a do que da sua própria moral. É como foi assim” e fazer-nos crer que, de personagem mais velha num se Tertuliano soubesse que para que vai facto, pode ou podia bem ter sido universo bem determinado, baiano, redimir o mal que sobre si recaíra assim. Contar uma história é, sub- socialmente-povo. A sua atenção à tivesse de usar as armas que não acontecer? repticiamente, emular um universo opinião dos outros denota uma possuía, as mesmas armas da de valores morais, exibir os escolhos nobreza de carácter, a sua obsessão mencionada comadre. Tudo isto que um homem pode enfrentar, denuncia que há mais história do resulta numa espécie de miniatura Em “O Albatroz Azul” o enfim, mostrar que a identidade não que o que até então lemos. Aí de tragédia, um drama feito de prazer de seguir a narrativa é um dado adquirido e uma bênção, aparece o vidente, que vê uma vida silêncios e espaços em branco que funciona de forma quase mas sim potencialmente uma boa para o neto e uma vida vazia a escondem uma aguda reflexão sobre infantil. João Bonifácio granada. A melhor literatura será seu lado. Jaburu percebe que tem de a morte, sobre o poder que esta tem aquela que entretenha e morrer, mas não sem antes assegurar de levar um homem a fazer o O Albatroz Azul exemplifique sem cair na tentação da o futuro do neto. É aí que o livro dá balanço de si mesmo. João Ubaldo Ribeiro pregação aborrecida. São uma volta: numa segunda parte Simultaneamente, e sem que Edições Nelson de Matos exactamente estas qualidades que ficamos a conhecer o passado de Ubaldo faça gala disso, “O Albatroz tornam João Ubaldo Ribeiro Tertuliano, a razão da sua obsessão Azul” é um requiem por um universo

Livros mmmmn verdadeiro escritor maior nestes com o neto macho. machista, de crendices e saberes de tempos em que parecem nascer A história retorna ao avô rua. E por último, ao ater-se sobre as Histórica e escritores maiores ao segundo. Em português de Jaburu, que pela morte coisas que não esquecemos mas sociologicamente a “O Albatroz Azul” o prazer de seguir da sua mulher deixa o filho entregue calamos, é uma reflexão sobre a literatura a narrativa funciona de forma quase à comadre. Esta encarrega-se de o identidade. desempenha infantil. Um suicida que calhasse de tratar como filho de seu próprio Importa ainda assinalar o essencialmente ler “O Albatroz Azul” era capaz de ventre e permite-lhe dispor de tudo o extraordinário trabalho de duas funções: adiar a morte apenas para ver que há na sua casa. (Este tudo é linguagem de João Ubaldo, o ouvido entreter e respondida a pergunta que encerra o mesmo tudo, mas convém não para a fala do povo, a concisão exemplificar. Isto prazer de toda a literatura: “O que é avançar demasiado nos dados para narrativa (que segura com rédea bem pode parecer que vai acontecer?” não retirar as surpresas ao leitor.) curta), a extrema sagacidade no menosprezo pela mais nobre das No início temos apenas um velho, Exemplar de uma época, essa tempo de entrega da informação artes, mas entreter e exemplificar Tertuliano Jaburu, que sabe (sabe-se comadre protege o rapaz de toda a (exacta e medida como num policial) Um suicida que calhasse são tarefas de imensa grandeza. O lá como) que o neto que aí vem será forma, recorrendo a expedientes e o amor extremo mas cheio de de ler “O Albatroz Azul” era tempo é a questão existencial por finalmente um macho, isto contra menos morais – e a voz do narrador pudor que há por estas gentes e por capaz de adiar a morte apenas natureza: o homem tem consciência todas as opiniões abalizadas. altera-se, denunciando não alinhar estes tempos idos, denunciado pela para ver respondida a pergunta da sua mortalidade e, não fora a Durante dezenas de páginas apenas pela bitola moral dessa época. Essa forma como a voz do narrador se que encerra o prazer de toda capacidade de se alienar desse temos acesso ao processo mental de segunda parte poderia durar três ou altera e modula. De Ubaldo foi dito a literatura: “O que é que vai destino, todos os seus segundos Tertuliano, por exemplo, a sua quatro vezes mais, e devora-se a uma que era herdeiro de Guimarães Rosa. acontecer?” seriam insuportáveis. Sob este ponto procura do nome certo para o velocidade vertiginosa. É nela que Não sei se o herdeiro não estará hoje chega o momento fulcral do livro, mais que à altura do mestre. quando o avô de Tertuliano morre. O pai de Tertuliano tinha filhos de várias mulheres, mas, como era de A fi sionomia BERENICE RIBEIRO tradição, queria que oficialmente o filho varão fosse um homem. O filho varão era um homem, Tertuliano, da natureza que não era filho da esposa oficial. Pelo que o pai e a comadre do avô Uma magnífica meditação propõem a Tertuliano renunciar à sua mãe. (A bem da narrativa, não sobre a representação devemos esclarecer mais que isto.) estética do mundo. José Se o fizer permanecerá varão oficial, Riço Direitinho continuará na família e terá riqueza; não o fazendo corre o risco de ser Um Episódio na Vida do Pintor posto fora da família. Viajante Isto é um esquema aparentado da César Aira tragédia: nesta o protagonista (trad. José Agostinho Baptista) provoca, sem saber, a sua própria Assírio & Alvim desgraça; aqui Jaburu, sabendo, provoca a sua desgraça e arca com mmmmm ela até ao dia do nascimento do seu neto macho. Pelo que quando o livro De César Aira (n. volta ao “hoje” sabemos que 1949), um dos Tertuliano viu a sua vida coarctada, escritores mais sabemos que se tornou um bastardo originais, deserdado pela família e que subversivos e carregou essa cruz que todos prolíficos das letras conhecem e de que ninguém fala. hispânicas nas Daí que o neto macho tenha últimas duas importância acrescida. décadas, alguém Jaburu trata então de arranjar um disse um dia ser “o segredo mais padrinho para o seu neto. Este é um bem guardado da Argentina”. Pode dos momentos que tornam “O bem ser. Autor de cerca de cinquenta Albatroz Azul” um livro maior: livros (entre romances, novelas, Jaburu entrega o neto a um negro colectâneas de contos e ensaios), Cé bem posto na vida, sobrevivente à tinha até agora apenas um romance so custa de trambiques, ou seja, alguém publicado em Portugal, “Como Me m

40 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon “Poemas Portuguesesgueses ediçãoediçã da Porto baseia-se num grande - Antologia da PPoesiaoesia EditoraEdito e um dos conhecimento da Portuguesa do SSéc.éc. fortesforte candidatos literatura portuguesa e em Edição XIII ao Séc. XXI”XI” a livrolivr do ano. opções de gosto seguras, com selecção, VascoVasc Graça Moura recupera autores que, por organização, assinaasa sin o prefácio vezes, não se encontram introdução e ondeond escreve: facilmente disponíveis notas de Jorge “Não“N vamos (...) no mercado editorial, Reis-Sá e Rui perderp tempo percorre um arco de Lage já está a discutir tempo que vem dos nas livrarias. critérios e cancioneiros medievais Inclui 267 inclusões. até aos nossos dias, autores e Este é um permite cruzamentos, mais de 2000 trabalhotra sério correlações e derivas”. poemas. É umaa e iimportante,m

Tornei Monja” (2007). Faz parte fronteiras do seu estilo. Como num dito tudo e o seu mesmo passo, atribui nomes autobiografia, é francamente daquela geração de escritores latino- pressentimento, sabia que isso contrário. Em paródicos a personagens obscena, e vamos queimá-la, americanos (com Roberto Bolaño, aconteceria no “vazio misterioso Portugal nem por secundárias: Perseverança Criadora, percebe? [...] a minha subsistência Horacio Castellanos Moya, e outros) que estava no ponto equidistante isso, talvez porque Walter Vexame, Mrs. Blackwater, depende de impedir que livros como que já nem pertence ao chamado dos horizontes sobre as planícies o seu nome esteja Fanny Throbbing e outros. este entrem no país. E agora ponha- período “pós-boom” (Álvaro Mutis, imensas”. Por esta altura, começara associado à Cinquenta anos mais tarde, o se a mexer depressa, se não quer ir a por exemplo); eles sempre estiveram já a fazer esboços e estudos a óleo, tradução desastrosa expediente seria utilizado por Dinis um tribunal de polícia.” À época, o mais perto dos espanhóis Vila-Matas os seus procedimentos alteravam-se. de “Brideshead Machado, que o adaptou ao grupo fascista de Oswald Mosley e Javier Marias (com as suas (Note-se que Aira criou num dos Revisited” (1945), imaginário lisboeta em “O Que Diz tinha considerável eco na opinião influências centro-europeias) do que seus ensaios o conceito de romance que chegou às livrarias Molero”. Voltando a Waugh, não pública inglesa. É de supor que o de García Márquez ou de Vargas “procedimento”, que ele diz ser a portuguesas no início dos anos 1980, percebo o motivo que levou Miguel tom “soft” esteja relacionado com os Llosa. Apesar de não terem em ferramenta básica de todas as a reboque da adaptação que Charles Serras Pereira, o tradutor, a manter “critérios moralmente aceitáveis do comum um estilo, ou tão-pouco uma vanguardas.) Sturridge e Michael Lindsay-Hogg alguns desses nomes no original. dia”. Lá onde os neo-realistas ideia orientadora, o que acaba por os O momento alto da narrativa é, de fizeram para a ITV. Com excepção Exemplos: Blackwater, Throbbing, italianos arrancavam as vestes, aproximar é esse evidente (por vezes facto, o que ocorre nessa pampa de um pequeno grupo de iniciados, etc. Cronista por excelência do Waugh, conservador por natureza, declarado) afastamento da tradição desértica. Durante uma tempestade, a obra de Waugh (como, pelas decadentismo dos “thirties”, Waugh ironiza de perfil. sul-americana e a capacidade, cada o pintor é atingido por dois raios que mesmas razões, a de P. G. faz o retrato a traço grosso da Evelyn Waugh quis, mas não um à sua maneira, de ser capaz de lhe deixam a face desfigurada e lhe Wodehouse) choca com o atavismo Londres pós-vitoriana. Em grande conseguiu, ser professor numa construir o seu próprio cânone. provocam enxaquecas crónicas. Na indígena. A “snobbery” deste parte, o sucesso deve-se ao ritmo “public school”. Em 1917, o irmão O curto romance “Um Episódio na sua escrita perfeita e elegante, Aira conservador heterodoxo, que fixou cinematográfico da escrita, então mais velho, Alec Waugh, publicou Vida do Pintor Viajante” é dos textos quase esboça uma espécie de como nenhum outro as uma novidade. “The Loom of Youth”, romance que menos experimentais (ou exóticos) “pintura holográfica”: “Como uma idiossincrasias da “upper class”, Adam Fenwick-Symes, o põe a nu as práticas homossexuais de Aira. Apesar de as páginas iniciais estátua de níquel, homem e animal continua a suscitar preconceito protagonista, é um jovem escritor a dos alunos de Sherborne, um dos poderem dar ao leitor a sensação de acenderam-se de electricidade. numa sociedade como a nossa, quem os funcionários da alfândega colégios ingleses mais exclusivos. A que está perante uma biografia no Rugendas viu-se brilhar, espectador ainda hoje avessa à ilustração das de Dover queimam o manuscrito boa sociedade não esqueceu. Ele sentido canónico do termo, essa de si mesmo num instante de horror, clivagens sociais. que transporta consigo: “Pode levar desforrou-se da hipocrisia com a ilusão depressa se extingue. Os que lamentavelmente se repetiria. A Com acção centrada nos anos estes livros de arquitectura e o língua de prata e o alto dados biográficos do pintor Johann crina do cavalo estava parada, como entre as duas Grandes Guerras, dicionário [...] quanto a esta conseguimento da obra literária. Moritz Rugendas (1802-1858) mais a barbatana de um espadarte. A “Corpos Vis” (1930) foi escrito não servem do que para nos partir desse momento tornou-se depois de Waugh ver anulado o introduzirem nessa ideia de uma visão estranha para si próprio.” primeiro casamento. A intriga gira “geografia artística” criada pelo Mais tarde, montado no mesmo em torno do denominado “Bright TEMPORADA 2009|2010 sábio alemão Alexander van cavalo que entretanto fora Young People”, grupo de jovens METROPOLITANA 18 Anos – Idade Maior Humboldt (1769-1859), que defendia rebaptizado de Rayo, o pintor, aristocratas de que faziam parte, direcção artística Cesário Costa que “só nos trópicos se encontrava o durante um ataque de índios ao entre outros, além do próprio excesso necessário de formas lugar onde se encontra hospedado, Waugh, a romancista Nancy Mitford, primárias para caracterizar uma com a cara coberta por uma o fotógrafo Cecil Beaton e o paisagem”, e que essa caracterização transparente mantilha preta, esboça historiador Patrick Balfour. A fluidez Haydn | Wagner | Schumann teria de vir da “soma das imagens freneticamente e em desenhos da narrativa é idêntica à de um guião coordenadas num quadro sucessivos todos os movimentos de pronto a ser filmado. E reúne os abarcador”. O pintor Rugendas, homens e animais, tentando ingredientes que singularizam personagem principal desta história capturar uma batalha em tempo Waugh: quotidiano das classes altas de César Aira, foi o mestre dessa arte real. Mas o autor sabe que a reescrita britânicas, sarcasmo, mordacidade, pictórica da “fisionomia da de acontecimentos passados é humor, “gossip” e ambiguidade natureza”. E é na segunda das duas sempre artificial. Na sua escrita auto- sexual. O título remete para a “Carta viagens de estudo que fez ao reflexiva, César Aira cria uma aos Filipenses” (Paulo: 3.21, “corpo Francine Romain soprano continente sul-americano – espécie de discurso duplo, pois ao miserável”), o que não é de admirar, Jean-Marc Burfin direcção musical principalmente num episódio que mesmo tempo que há um narrador dada a sua conversão ao catolicismo. Orquestra Académica Metropolitana tem lugar na pampa argentina em que descreve os procedimentos Logo no primeiro capítulo, a 1837 – que o leitor o encontra. artísticos, acontece a descrição dos descrição da travessia do Canal é um SEXTAFEIRA 18 DE DEZEMBRO, 21H30 Rugendas procurava algo (uma conflitos criativos. prodígio de modernidade. Sirva de CINEMA TEATRO JOAQUIM D’ALMEIDA, MONTIJO revelação?) que fizesse com que Este curto romance, inteligente e exemplo e lição a quem julga estar a utultrapassasseapassasse ass ooriginal,g a,éu é uma a magnífica ag ca meditação descobrir coisas descobertas há SÁBADO 19 DE DEZEMBRO, 21H00 sobre a representação estéticaestét do muito. O modo como trata os mais UNIVERSIDADE NOVA CAMPUS DE CAMPOLIDE mmundo,undo, sobresobre o papelpapel dada arteart na novos é um reflexo do seu desprezo vivida.da. pelas crianças (a quem chamava “adultos defeituosos”, embora isso a criação de haydn não tenha impedido que tivesse sete A lelevezaveza dosd filhos da segunda mulher). Do ““thirties”thirties”

A história do BrightBright YYoung PeoPeopleple contadacontada sem Marlis Peterson soprano Thomas Walker tenor compcomplacêncialacência e muitomu Dietrich Henschel barítono sarcassarcasmo.mo. EEduardoduardo Pitta Theodor Guschlbauer direcção musical Orquestra Metropolitana de Lisboa Corpos VisVis EveEvelynlyn WaugWaughh DOMINGO 20 DE DEZEMBRO, 17H00 ((Trad.Trad. Miguel Serras Pereira)Pereira GRANDE AUDITÓRIO DO CCB co-produção CCB Metropolitana Relógio d’Água A “snobbery” de Evelyn Waugh mmmmnmmm mmn continua a suscitar preconceito César Aira: uma magnífi ca meditação numa sociedade como a nossa, sobre a representação estética do SobreSobre o escritor inginglêslê Evelyn ainda avessa à ilustração mundo, sobre o papel da arte na vida Waugh (1903-1966) (1903-1966) tem sido das clivagens sociais

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 41 Chama-se True Team portugueses Publishing & Design, nascidos na década Arqui- é uma nova editora de de 60) e “Habitar a tectura livros de arquitectura, Cidade” (centrado dirigida por José na reabilitação Livros Manuel das Neves, de habitações e chega ao mercado unifamiliares), e quatro editando nada menos monografi as de autor do que seis livros de dedicadas a Carvalho uma vez: dois álbuns Araújo, Miguel Saraiva, temáticos, “Archibook Daciano da Costa The 60’” (sobre a geração New Generation e de arquitectos ARIPA arquitectos.

Ensaio Manuel Gusmão: um aturado “close reading” de “Finisterra”, de Carlos de Oliveira, e que retoma a estratégia do próprio romance, Descrições acumular descrições de descrições

Uma excelente leitura do romance português que mais se decide nos modos de o ler. Pedro Mexia

Finisterra – O Trabalho do Fim: reCitar a Origem Manuel Gusmão Angelus Novus mmmmm

Herberto Helder incluiu Carlos de Oliveira na antologia poética “Edoi Lelia Doura” (1985) e escreveu o seguinte: “‘Finisterra’ (1978), proposto como romance, é antes uma alegoria ficcionalmente articulada que pode ser lida na perspectiva de uma espécie de cartografia imaginária do autor, constituindo assim a melhor introdução ou o melhor comentário à sua obra.” Manuel Gusmão parte desta breve nota para uma leitura de “Finisterra” que dá especial atenção aos três elementos que Herberto menciona: a questão do género, a poética autoral e a condição de súmula. É que “Finisterra”, último fotografias, desenhos. O próprio generalizada, que implica uma teoria romance de Carlos de Oliveira e obra subtítulo do romance, “Paisagem e crítica da mimese (…)” (pág. 112). notoriamente difícil, culmina todo o povoamento”, descreve um processo Em segundo lugar, o processo que fez do escritor um dos dialéctico, ou duplamente dialéctico. “povoamento” cumpre, pelo menos casos mais notáveis da literatura Em primeiro lugar, grande parte em tese, o que a “paisagem” impede. portuguesa. Tratou-se, como é de “Finisterra” é a descrição de uma Ou seja: se “Finisterra” retrata o fim sabido, de uma reescrita integral da paisagem; mas o escritor confunde de uma história, quem sabe se esse obra ficcional e poética, que propositadamente o que é paisagem suposto “fim da História” também laboriosamente reviu e alterou e o que é representação da paisagem espalha indícios de que a História romances e poemas, no mais nos tais artefactos, de modo que a afinal não termina. É aliás assim que extremo e extremoso trabalho questão da sobrevivência é uma Gusmão, ensaísta marxista, oficinal da nossa questão de representação, de responde à ideia de que Oliveira se contemporaneidade. “Casa na mimese. O carácter auto-reflexivo do afastou do marxismo. “Finisterra” Duna”, por exemplo, publicado em romance (num registo irónico que revela um entendimento geológico, 1943, é totalmente revisto em 1964, e substitui o registo trágico de “Casa na ou seja, materialista, do universo. E “Casa na Duna” está na origem de Duna”) exprime-se por exemplo por isso está aberto a migrações, “Finisterra”, até pelo “tema” numa magnífica hipótese levantada alterações, refluxos. Como diz comum: a decadência de uma casa e por Gusmão, de umas aves brancas Gusmão: Oliveira pode ter desistido de uma família da burguesia rural. que aparecem no romance reescrito do carácter teleológico do Mas enquanto “Casa na Duna”, em 1964 como aves “reais” materialismo histórico, mas ainda mesmo na versão de 1964, ainda é reaparecerem em 1978 já como aves acreditava numa dialéctica da um romance facilmente reconhecível num desenho (como se fosse um natureza. como tal, “Finisterra” torna tudo Magritte). É por isso que Gusmão Vemos então que a escassez e a abstracto, geométrico, alegórico. escreve: “‘Finisterra’ enquanto texto finitude, que são a paisagem mental Trata-se, diz Gusmão, da não pode ser reduzido ao que nele é e material de Carlos de Oliveira, “configuração narrativa de uma narrativa, nem a cada um, ou aparecem neste seu romance final poética”, e nisso o “enredo” já só um mesmo, à soma dos constructos como o término de um processo material entre outros. “Finisterra”, narrativos em que se auto-reflecte. poético a que ele submeteu toda a romance textual por excelência, é Dito de outro modo, representação sua escrita e o seu entendimento do uma acumulação de coisas e de representações, a sua estratégia mundo. Um tempo ondulatório, uma artefactos. O tal “tema” – o fim de não pode ser esgotada por qualquer elipse narrativa, uma montagem de uma linhagem e a possível superação dos artefactos miméticos ou das cenas, um ouvido musical. E um dessa infecundidade – é trabalhado teorias da mimese que em torno testemunho de persistência que com base em objectos que deles gravitam. Ele é antes um texto Gusmão lê como uma metamorfose. representam outros objectos. Mapas, que supõe uma mimese Ou, mais ousado ainda para um

42 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

O sociólogo Gilberto Pareceu à curadoria desta ser reeditada pela Global Freyrere é o homenageado festa que era prepreciso um que publicará em Julho Home- da 8ª edição da eescritorscritor queque “tivesse “De menino a homem”. nagem Festa LiteráriaLiterária feitofef ito ddaa reflrefl exão É a segunda parte das Internacionalnacional sobressobre o papaís a razão memórias do autor de de Paratyraty ((FLIP)FLIP) ded ser da ssua obra”. “Casa-Grande & Senzala”, – de 4 a 8 de No BrasiBrasill a obra do Agostoto de 2010. sociólogosociólog está a

marxista, como um messianismo do escreve; o leitor ou o crítico devem peregrinam por exemplo até Illiers, Ciberescritas estético. poder passar sem isso: não vivas ou hoje Illiers-Combray – justaposição É uma leitura excelente porque se faças como ele viveu (na cama por ter sido esta a embeber a Acabadinhos de sair trata do romance português que tolhido pela asma, ou circulando infância do autor da “Recherche..”. talvez mais se decida nos modos de o pelos salões), mas vê à tua volta Aí, Meca de tantos turistas, as ler. Manuel Gusmão tem regressado como está implícito na maneira padarias disputam a feitura da do laboratório vezes sem conta a estes textos, que como ele vê e sente a partir de um verdadeira “madeleine” do pequeno também ensinou como professor, e indício insignificante do mundo cuja Marcel. Faz-nos rir a “Cuisine omo é que uma comunidade de amigos se continua fascinado com o seu materialidade desfaz e refaz pela Retrouvée”, obra que dá receitas comportaria em frente à televisão? Foi a partir carácter resistente e interpelante. “O linguagem. Exemplificando o que (quantidades e ingredientes de vários desta ideia de “trazer uma rede social para o Trabalho do Fim” é um trabalho sem está em causa. No livro, Proust é pratos) da “Recherche...”. Claro que Cambiente da televisão” que nasceu o WeOnTV. fim, que se faz de um aturado “close analítico e cerebral no que observa, a “bouillabaisse” que Mme Verdurin Permite a quem está a ver televisão comunicar reading” e que retoma a estratégia sem ilusões quanto ao mundo. Ao serviu podia ser igualmente com os amigos enviando mensagens escritas, do próprio romance: acumular mesmo tempo, na vida relevante se fosse uma recomendando programas, ver quais os canais a que os descrições. E é impossível esquecer “real” presenteava “paella” ou uma tigela de outros amigos estão a assistir (se não tiverem optado por que um dos mais agudos marxistas generosa e muesli... A Isabel deixarem essa informação em privado e ocultarem o italianos tem um livro de ensaios insensatamente homenagem ao Coutinho canal que está a ser visto). Com o WeOnTV aquilo a que já chamado “Descrições de os amigos, escritor seria se assiste no Twitter – em que um grupo de pessoas Descrições”. tecia os “vermos o ligadas entre si através desta rede social está muitas vezes maiores nosso mundo sentada em frente a um televisor, com um telemóvel ou elogios aos através dos um computador ligado à Internet, e envia comentários Proustinar piores seus olhos e sobre o que está a ver -, vai ser possível sem termos nas textos, não olhar mãos mais nada além do comando da televisão. numa para o A WeOnTV é um serviço de integração de redes Olhar o nosso mundo sede mundo dele sociais, ferramentas de comunicação em tempo real através dos olhos de Proust... incessante com os e promoção de conteúdos televisivos; uma aplicação de afecto. nossos”. Só que permite a comunicação entre amigos à volta de Programa inteligente Alertas isso pode um canal e um dos projectos nascidos no Sapo Labs da e divertido de alguém conclusivos só mudar Universidade de Aveiro e que que conhece Marcel – na aparência irreparavelmente a foi apresentado no Codebits visceralmente. Maria paradoxais: nossa vida (para Em que região do país (dedicado à programação Proust, ele mesmo, muito melhor, se informática), Cordoaria Conceição Caleiro antes de iniciar a obra, é estivermos à altura). Como: é que se busca mais Nacional, Lisboa. Nunca exemplo, contra todos os lugares amar a vida hoje, lermos para nós determinada palavra? é excessivo lembrar que Como Proust Pode Mudar comuns em contrário, dos benefícios mesmos, levar o tempo necessário, aquele que começou por ser a Sua Vida da leitura a despeito dos temores dos sofrer com êxito, exprimir as o Servidor de Apontadores Alain Botton que aspiram a devir escritores e emoções, ser um bom amigo, abrir Portugueses, o Sapo, nasceu da cabeça de cinco alunos (trad. Sónia Oliveira) desatam cedo a escrevinhar. Foi os olhos, ser feliz no amor, pousar o da Universidade de Aveiro (Celso Martinho, Benjamin D. Quixote adepto e praticante da leitura de livro. Esta é a travessia temática por Júnior, Helder Bernardo, Sérgio Bernardo e João Luís) outros autores. Entre outros, Ruskin Proust e o que dele emana, vida e e do responsável na altura pelo Centro Informático mmmmn é prova disso. Mergulhou nele obra, ensinamento da vida com a (Fernando Cozinheiro). Por isso o regresso do Sapo à durante seis anos, bebeu nele as obra; ensinamento da obra apesar da Academia para apoiar talento, “encontrar pessoas chave “Como Proust pode virtualidades do mundo sensível, da vida. Botton entrelaça as duas, nas universidades que se identifi cam com aquilo que mudar a sua vida” é arte e da arquitectura (a beleza das sublinhando a diferença, reiterando nós fazemos”, como explica Celso Martinho, director um livro inteligente, grandes catedrais do Norte de a crítica a Saint Beuve, mas não de Tecnologia de Produto no Sapo, parece óbvio. divertido, França). Alain Botton citando Proust: deixando de apontar o cenário, físico Patrocinam bolsas de estudo e dão os meios técnicos borboletante, fino. “‘Os medíocres imaginam até, em que aquela vinga. para que seja possível criar projectos-piloto (nas tais Ensaio contra todos geralmente que deixarmo-nos guiar A questão do tempo é, como se salas, “labs”, que criam nas universidades) que depois os clichés, de pelos livros que admiramos rouba à sabe, nuclear. Avançar devagar, com possam ser explorados comercialmente no Sapo. alguém que nossa faculdade de julgar parte da menos afã parece ser o lema. Em Desses projectos saiu também da Universidade de conhece Proust – sua independência’. Não existe tudo. Exposição de um sentimento, Aveiro o Sapo Campus, plataforma integrada de serviços visceralmente –, sem pôr de parte a melhor forma de termos consciência comportamento, personagem, Web 2.0 ou, trocando por miúdos, uma ferramenta que sensibilidade e o humor anglo- daquilo que nós próprios sentimos objecto... compreensão permite aos professores e alunos usarem os serviços na saxónicos. Delicioso até na escolha do que tentando recriar em nós o caleidoscópica de tudo. net como instrumento auxiliar na sala de aula – para já das ilustrações: desde as posturas que um mestre sentiu. Neste esforço Compreensão diferente daquela de só funciona naquela universidade. físicas do acto de ler e bordar profundo é o nosso pensamento que que são capazes os homens Mas desde há um ano que a Faculdade de Engenharia estudada pelo Doutor Proust, pai de trazemos para a luz, juntamente com “ocupados” – por muito idiota que da Universidade do Porto também está ligada ao Sapo Marcel Proust, até à espiral o dele”. seja a sua actividade –, homens que Labs e lançou no Codebits dois projectos. encaracolada de uma longa frase do O “mestre” aprendeu com Ruskin se auto-comprazem por não terem WeOnTV O Verbatim, com a ajuda de algoritmos, pega em autor em que qualquer um, mesmo a sentir e a fazer reverberar o tempo para fazer “o que nós http: /labs.sapo. citações publicadas na imprensa portuguesa e organiza- com tempo, ou pousa o livro ou mínimo, fosse a banalidade de uma fazemos”, isto é, ler uma notícia de pt/ua/socialitv/ as por tópicos ou pelas personalidades que fi zeram lentamente relê fruindo a fundo a notícia de jornal algures individuada jornal como se fosse a ponta de um o-projecto/ essas afi rmações. É possível, depois, aceder às notícias letra. e posta mais tarde pela memória romance. Proust usou o sofrimento onde a citação aparece. Embora esteja ainda em fase “Como Proust pode mudar a sua (voluntária e involuntária) a vibrar físico da melhor maneira, Verbatim experimental percebe-se o potencial. Bem como vida” está povoado de diálogos em (realmente o “Figaro” era observando-o, como se de outrem se http: /verbatim. se percebe o que Tendências, outro projecto desta jeito de entrevista, de pergunta- minuciosamente dedilhado todas as tratasse, escrevendo a obra infinita labs.sapo.pt/ faculdade no Sapo Labs, nos pode vir a oferecer: usa resposta. Pergunta ou subtítulo em manhãs, os horários dos comboios que não cessa de ser lida e (re) a informação das pesquisas que vão sendo feitas no itálico que Botton imagina poder ser examinados em viagens que nunca escrita. Porém, quantos de nós não Tendências Sapo e trabalha-as grafi camente de maneira a dar-nos a de um leitor “qualquer”, resposta foram feitas entre Paris e Le Havre, a prefeririam ser Robert Proust, o http: /tendencias. informações. Por exemplo, em que região do país é que que explora e devolve o que está em descrição de um dia das Comissões, irmão, forte como um touro, médico labs.sapo.pt/ se busca mais determinada palavra. Ou: se colocarmos jogo na “Recherche...” exposto por Nicholson, diplomata como o pai por quem Marcel sofreu o nome de José Saramago fi camos a saber que no último Este livro atesta a razão de Proust inglês, em 1919, a pedido de Proust por não conseguir agradar? mês foi em Évora que mais se fi zeram pesquisas no Sapo contra o crítico Saint Beuve (1804 numa festa no Ritz, dia que poderia Irresistível apontar que no seu livro a (Ciberescritas sobre o Nobel da Literatura – e que no mesmo período -1869), isto é, a dispensabilidade do ser resumido em dois tempos não representação dos médicos é já é um blogue foi em Coimbra que mais se pesquisou o nome de conhecimento da vida de um autor, fosse Proust pedir sabor e vagar). predominantemente negativa, talvez http://blogs. António Lobo Antunes. embora Botton a conheça e Botton troça ainda, na senda de por estes não terem experimentado publico.pt/cibe- manipule e apresente e (com)prove o Proust, da idolatria artística, do em si os males de que falam rescritas) [email protected] quanto diferem da obra genial que se espírito de veneração daqueles que e tratam.

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 43 Jorge Luís M. Mário Vasco As estrelas do público Mourinha Oliveira J. Torres Câmara Actividade Paranormal mmmnn nnnnn mnnnn nnnnn Ágora mmmnn mnnnn mmnnn nnnnn Avatar mmmnn mnnnn nnnnn mmnnn Bem-vindo à Zombieland mmmnn nnnnn nnnnn nnnnn Capitalismo: uma História de Amor mmmnn nnnnn mmnnn mmnnn Depois das Aulas mmmmn mmmmn mmmmn mmmmm Jogo mmnnn nnnnn nnnnn mnnnn Lua Nova mnnnn nnnnn A mnnnn Ne Change Rien mmmmn mmmmm mmmmm mmmmn Uns Belos Rapazes mmnnn mmnnn nnnnn nnnnn

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 17h15, 21h, 3ª 4ª 14h, 17h30, 21h, 00h20 (3D); ZON Lusomundo “Jogo”: um objecto que Estreiam 00h15; UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 9: 5ª 6ª Dolce Vita Porto: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, 17h20, 21h05, 13h05, 16h30, 21h, 00h30 (3D); ZON Lusomundo orgulhosamente se assume 00h20; UCI Dolce Vita Tejo: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Ferrara Plaza: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 15h, 18h10, como feio, mal-encarado, O novo Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 17h, 20h45, 24h; UCI 21h20 (3D) 6ª Sábado 15h, 18h10, 21h20, 00h35 mal-disposto, violento Dolce Vita Tejo: Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª (3D); ZON Lusomundo GaiaShopping: 5ª 6ª 2ª 3ª 3ª 4ª 13h45, 17h15, 21h, 00h15 (3D); ZON 4ª 14h, 17h30, 21h, 00h30 (3D) Sábado Domingo Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 10h45, 14h, 17h30, 21h, 00h30 (3D); ZON mundo 3ª 4ª 13h30, 16h50, 21h10, 00h30 3D; ZON Lusomundo MaiaShopping: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª Lusomundo Amoreiras: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 13h30, 17h10, 20h50 (3D) 6ª Sábado 13h30, 17h10, 3ª 4ª 14h, 17h30, 21h, 00h15 3D; ZON Lusomundo 20h50, 00h35 (3D); ZON Lusomundo Marshopping: O longamente aguardado CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 10h30, 13h40, 13h, 17h, 21h, 23h30, 00h20 3D; ZON Lusomundo 17h10, 21h30, 00h50 3D; ZON Lusomundo épico 3D de James Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h40, Marshopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15, 16h, 17h, 21h, 21h15, 00h15, 00h30 3D; ZON 12h50, 16h20, 21h10, 00h40 3D; ZON Lusomundo Cameron é um espantoso Lusomundo Dolce Vita Miraflores: 5ª 6ª Sábado NorteShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª exercício visual onde Domingo 2ª 3ª 4ª 15h, 18h30, 22h; ZON 12h30, 16h20, 20h40, 00h20 3D; ZON Lusomundo Lusomundo Odivelas Parque: 5ª Domingo 2ª 3ª NorteShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª a demiurgia ganha aos 4ª 13h30, 17h, 21h 6ª Sábado 13h30, 17h, 21h, 13h, 17h, 21h, 00h40; ZON Lusomundo Parque 00h15; ZON Lusomundo Oeiras Parque: 5ª 6ª Nascente: 5ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 10h35, pontos à dramaturgia. Jorge Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h25, 17h, 20h50, 21h, 14h, 17h30, 21h10, 00h40 6ª 14h, 17h30, 21h10, 00h20, 00h30 3D; ZON Lusomundo Torres Vedras: 00h40; Castello Lopes - 8ª Avenida: Sala 1: 5ª 6ª Mourinha 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 17h30, 2ª 3ª 4ª 14h, 17h30, 21h30 Sábado Domingo 13h, 21h, 00h20 3D; ZON Lusomundo Vasco da Gama: 16h30, 21h30; Cinema Paraíso - Dolce Vita 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15, 17h, Ovar: Sala 1: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 18h15, 21h45 Sábado Avatar 20h30, 21h, 24h, 00h25 3D; Auditório Charlot: Sala Domingo 15h, 18h15, 21h45; ZON Lusomundo Fórum De James Cameron, 1: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 21h30 Sábado Domingo 16h, Aveiro: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, com Sam Worthington, Zoe Saldana, 21h30; Castello Lopes - C. C. Jumbo: Sala 1: 5ª 6ª 2ª 17h15, 20h50, 00h25 (3D); 3ª 4ª 14h, 17h30, 21h30 Sábado Domingo 13h, Sigourney Weaver, Stephen Lang. 16h30, 21h30; Castello Lopes - Fórum Barreiro: Sala Vamos começar pelo paradoxo: M/12 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 16h30, 21h20, 00h40 (3D); Castello Lopes - Rio Sul “Avatar” não precisa do 3D para MMMnn Shopping: Sala 4: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 14h, 17h30, nada, mas não seria nada sem ele. 21h20, 00h40 Sábado Domingo 13h, 16h30, 21h20, Ou seja: a história que Cameron 00h40; UCI Freeport: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Lisboa: Atlântida-Cine: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h10, 18h20, 21h50; ZON quer contar – a redenção de um os efeitos visuais impecáveis de Domingo 2ª 3ª 4ª 15h30, 21h30; Castello Lopes - Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado soldado humano como líder de um “Avatar” justificariam a visão Cascais Villa: Sala 1: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 14h, 17h30, Domingo 2ª 3ª 4ª 13h25, 17h, 21h, 00h20; ZON povo alienígena – é herdada de “normal”. No entanto, percebemos 21h30 Sábado Domingo 13h, 16h30, 21h30; Castello Lusomundo Fórum Montijo: 5ª 6ª Sábado Lopes - Londres: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª Cinema Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 17h, 21h, 00h20 3D; séculos de histórias de aventuras rapidamente o que é que atraiu 3ª 4ª 13h, 16h30, 21h30; Castello Lopes - Loures exóticas (veio-nos à cabeça, vá-se lá Cameron no uso do 3D – a Shopping: Sala 5: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª Porto: Arrábida 20: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 4ª 13h, 16h30, 21h20, 00h40 (3D); CinemaCity 2ª 3ª 4ª 13h45, 17h15, 21h, 00h30 (3D); Arrábida saber porquê, “As Quatro Penas possibilidade de imergir o AlegroAlegro Alfragide:Alfragide: Sala 2: 5ª 6ª Sábado DomingoDomingo 20: SalaSala 115:5: 55ªª 6ª SSábadoábado DoDomingomingnggo2o 22ªª Brancas”),Brancas”), resresisteiste iintactantacta a espectadorespectador num ununiversoiverso fificcional,ccional, 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h45, 21h, 00h15 (3D); CinemaCitCinemaCityy 3ª3ª 4ª 13h50,13h50, 17h20,17h20, 21h10,21h10, qualquerqualquer tecnotecnologialogia mais ou dede susubirbir ao patamar superior dada Alegro Alfragide: Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo 00h35;00h35; ArrábidaArrábida 20: SalaSala 2ª 3ª 4ª 2121h15,h15, 0000h30;h30; CinemaCity AAlegrolegro 20: 5ª 6ª Sábado memmenosnos avançada.avançada. É verdade criação,criação, dede ser, em suma, uma AlAlfragide:fragide: Cinemax: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 11h35, Domingo 2ª 3ª 4ª quqque,e, porpor si espécie de “demiurgo 1515h,h, 18h15,18h15, 2121h30h30 (3D) Domingo 1515h,h, 1818h15,h15, 2121h30h30 14h10,14h10, 17h45,17h45, 21h25,21h25,5,5, só, sofisticado”,sofisticado”, batendo a (3D); CinemaCity BelouraBeloura Shopping:Shopping: SalaSala 2: 5ª 6ª 00h50;00h50; Cinemax Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h45, 21h, - Penafiel: Sala 2: galáxiagaláxia longínqualongínqua dede 0000h15;h15; CinemaCitCinemaCityy BeBelouraloura Shopping:Shopping: Cinemax: 5ª 5ª 2ª 3ª 4ª GeorgeGeorge Lucas aos 6ª 2ª 3ª 4ª 15h,15h, 1818h15,h15, 2121h25h25 SáSábadobado DominDomingogo 15h30,15h30, pontosppontos no seu 11h30, 15h, 18h15, 21h25; CinemaCity Campo 21h4021h40 Pequeno PraçaPraça dede Touros: SalaSala 3: 5ª 6ª SáSábadobado (3D)(3D) 6ª próprioppróprio terreno. DomingoDomingo 2ª 3ª 4ª 1111h45,h45, 1515h,h, 1818h15,h15, 15h30,15h30, MasMaM s não o fazfaz,, de 21h30; CinemaCity Campo Pequeno Praça de 21h40,21h40, todo,ttodo, de modo Poder-se-ia dizer que é um fi lme TTouros:ouros: SalaSala 4: 5ª 6ª SáSábadobado Domingo 2ª 3ª 4ª 00h1500h15 ((3D)3D) de um director artístico mais 1313h30,h30, 16h45,16h45, 21h,21h, 00h15;00h15; CinemaCity Campo Sábado sobranceirosos branceiro ou do que um realizador, mas isso Pequeno Praça de Touros: Sala 6: 5ª 6ª Sábado 14h50,14h50, 1717h50,h50, altaneiroaltaneiro – Domingo 2ª 3ª 4ª 2121h15,h15, 0000h25;h25; CinemaCitCinemaCityy 21h30,21h30, 00h1500h15 antesantes comcom o é negar que Cameron sempre ClClassicassic Alvalade:Alvalade: SaSalala 3: 5ª DominDomingogo 2ª 3ª 4ª (3D)(3D) Domingo procurou que as suas epopeias 13h3013h30,, 16h45,16h45, 21h 6ª Sábado 13h30,13h30, 16h4516h45,, 21h21h,, 14h50,14h50, 17h50,17h50, prazerprp azer tecnológicas tivessem alma 0000h15;h15; MedeiaMedeia Fonte Nova: SaSalala 1: 5ª 6ª SáSábadobado 21h3021h30 arregalado DominDomingogo 2ª 3ª 4ª 14h30,14h30, 18h,18h, 21h30;21h30; MedeiaMedeia (3D);(3D); Medeia humana MonMonumental:umental: Sala 4 - Cine Teatro: 5ª 6ª Sábado CidadeCidade ddoo Domingo 2ª 3ª 4ª 12h30,12h30, 15h40,15h40, 18h50,18h50, Porto:Porto: SalaSala 1: 5ª 6ª 2222h;h; MedeiaMedeia SaSaldanhaldanha ResiResidence:dence: SaSalala 6: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, 17h30, 21h, 00h100h155 3ª3ª 4ª 14h30,14h30, 17h45,17h45, (3D)((3D);; UCI Cinemas - ElEl Corte Inglés:Inglés: SaSalala 6: 5ª 6ª 21h15;21h15; VivacinVivacinee - Maia: Sala 1: 5ª 6ª SábadoSábado Domingo 2ª

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“Uns Belos Rapazes”: um fi lme de um estupendo director de actores

stop e uma boa ideia explorada para assume com um orgulho quase lá do cansaço, literalmente a esgotar inconsciente como “Jogo” é qualquer o espectador – mas, aqui, esse coisa digna de registo. J. M. virtuosismo hiperactivo cola-se a uma excelente ideia como um “shot” de adrenalina que se estica para lá do Continuam que é aceitável e revela como quem não quer a coisa o lado negro da Ágora emoção barata. Tudo se passa num Agora futuro próximo onde os jogadores, De Alejandro Amenábar, em vez de controlarem avatares com Rachel Weisz, Max Minghella, virtuais, controlam seres humanos Oscar Isaac. M/12 verdadeiros através de nano- tecnologia implantada no cérebro, MMnnn numa espécie de circo romano global declinado nas versões “gladiador” e Lisboa: Castello Lopes - Cascais Villa: Sala 4: 5ª 2ª “bordel”. Neveldine e Taylor instalam 3ª 4ª 16h, 18h40, 21h20 6ª 16h, 18h40, 21h20, 00h10 Sábado 13h20, 16h, 18h40, 21h20, 00h10 neste universo sórdido e hipócrita Domingo 13h20, 16h, 18h40, 21h20; Castello Lopes (que é suposto evocar o nosso - Londres: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª mundo) uma espécie de “remake” 4ª 14h15, 16h45, 19h15, 21h45; Castello Lopes - Loures Shopping: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo xunga do “Gladiador” de Ridley Scott 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h, 18h30, 21h15, sobre um militar otário falsamente 23h50; CinemaCity Alegro Alfragide: Sala 7: 5ª 6ª condenado (Gerard “Leónidas” Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h15, 18h55, 21h30, 00h05; CinemaCity Classic Alvalade: Sala 2: Butler), obrigado a matar ou morrer 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 16h20, 19h05, 21h35 e disposto a tudo para escapar ao 6ª Sábado 13h50, 16h20, 19h05, 21h35, controle do mestre-marionetista 00h05; Medeia Monumental: Sala 1: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 13h45, 16h20, 19h10, 21h45, 00h20 Sábado de um contador de histórias que perde progressivamente gás em Jogo (Michael “Dexter” Hall) e salvar a 13h45, 16h20, 19h10, 00h20; UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 12: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h, 16h35, convida os que o rodeiam a entrar direcção a um final que se adivinha à Gamer esposa e a filha. O que torna “Jogo” no jogo, com a entrega de um miúdo distância, a sensação que fica é a de de simples exercício inane de “trash” 19h10, 21h45, 00h20 Domingo 11h30, 14h, 16h35, De Mark Neveldine , Brian Taylor, 19h10, 21h45, 00h20; ZON Lusomundo Alvaláxia: a brincar ao faz-de-conta e que quer uma versão extra-terrestre da luta com Gerard Butler, Amber Valletta, derivativo-descartável num dos mais 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h25, 16h10, 18h55, 21h40, 00h25; ZON Lusomundo Amoreiras: que os outros vejam o mundo que das tribos nativas contra a Michael C. Hall. M/16 intrigantes objectos saídos do cinema ele está a criar e desfrutem dele civilização ocidental, que abre americano recente é a força niilista 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20, 16h10, 18h50, 21h40, 00h30; ZON Lusomundo como ele o faz. portas e pistas que nunca mais MMnnn de uma premissa que vai directa aos CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª É por essa “démarche” de acabam mas que fica sempre aquém extremos e não modera nem adoça a 12h45, 15h25, 18h30, 21h30, 00h15; ZON Lusomundo sedução e convite que Cameron do que podia ser — que nunca ganha Lisboa: UCI Dolce Vita Tejo: Sala 10: 5ª 6ª Sábado sua escuridão, que tem tanto de Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h40, 18h30, 21h25, 00h15; ZON Lusomundo Oeiras ganha “Avatar”, durante as suas verdadeiramente espessura para lá Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h05, 19h15, 21h20, sátira escuríssima à sociedade do 24h; ZON Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado Parque: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h55, primeiras duas horas, como um guia do arquétipo porque o realizador se Domingo 2ª 3ª 4ª 13h55, 16h30, 19h10, 22h, espectáculo como de “voyeurismo” 15h40, 18h25, 21h15, 00h05; ZON Lusomundo turístico que leva o seu tempo a distraiu com a caixa de brinquedos 00h10; ZON Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª gratuito e perturbante, como quem Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h40, 15h25, 18h15, 21h10, 23h55; mostrar as belezas naturais de visual que ele próprio criou. Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h15, 17h40, quer jogar ao mesmo tempo em dois 21h35, 23h55; Pandora ao visitante. E, inteligência A verdade é que o percebemos. tabuleiros incompatíveis e se Porto: Arrábida 20: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo Porto: Arrábida 20: Sala 13: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h55, 16h35, 19h20, 22h05, 00h50; ZON suprema, faz o espectador vê-lo Raras vezes conseguimos olhar para Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 16h55, 19h20, 21h45, marimba se a coisa corre bem desde Lusomundo NorteShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo através dos olhos de Jake Sully, o um filme e sentir que estamos a ver 00h20; ZON Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª que se tenha tentado. Digamos que 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h50, 18h50, 21h50, 00h45; ZON Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h10, 18h40, Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª Sábado Domingo soldado paraplégico projectado qualquer coisa, outra coisa, alguma nos faz um bocado confusão como é 2ª 3ª 4ª 12h30, 15h30, 18h20, 21h30, 00h30; sensorialmente num corpo coisa que vai para lá daquilo a que 21h, 23h50; que um filme pode ser tão geneticamente construído, estamos habituados, e que não se Imaginemos o ciberpunk vintage de deliberadamente estúpido – a não ser Deslocar os mecanismos misto de ADN humano e alienígena, quer limitar a pintar quadros mas William Gibson (fase “Neuromante”) que essa estupidez seja apenas uma celebratórios do “peplum” para tal como a sua história é um misto quer que esses quadros ganhem vida revisto e regurgitado em 16ª mão por fachada deliberada. E talvez territórios insuspeitados de crítica de ficção científica futurista e mito e nos toquem da mesma maneira um filtro misto de “trash” e estejamos a (tres)ler mais do que ao triunfo do cristianismo, dando tribal primitivo, tal como o seu filme que o tocaram a ele. Cameron “exploitation” de baixo orçamento de “Jogo” tenha para dar. Mas num lugar a arrogantes posições de é uma combinação de imagem real conseguiu fazê-lo em todos os seus Hong Kong e desconstruído pela momento em que a comédia se afina intolerância religiosa e ideológica, tradicional e virtual “state of filmes anteriores, mas a pulsão câmara virtual de um video-jogo de cada vez mais pelo diapasão do possui os seus méritos. Por isso, the art”. criativa de “Avatar” é esmagadora, luxo — e nem assim chegamos perto humor aparentemente desengraçado “Ágora”, apesar do seu lado “Avatar” é um híbrido — e essa é a até mesmo alucinogénica no grau de do absoluto esgrouviamento xunga- e desconfortável e em que as fitas de demonstrativo e da excessiva sua grande força e a sua principal detalhe com que todo este universo ultra-violento de “Jogo”. A dupla acção mainstream estão cada vez extensão, assume-se como uma fraqueza. Cameron não é o extra-terrestre é concebido, e no Neveldine/Taylor, vinda da mais sanitizadas e edulcoradas, um metáfora de outros argumentista mais inventivo do modo como Cameron o usa como publicidade, já tinha avisado ao que objecto feio, mal-encarado, mal- fundamentalismos, invertendo os mundo e nunca primou pela reflexo e ressonância da história que vinha em “Veneno no Sangue” disposto, violento e que não só não habituais épicos cristãos – o que é subtileza, pelo que a sua história conta. Poder-se-ia dizer que é um (2006): misto de acção cinética non- pede desculpa de o ser como o interessante. No entanto, Amenábar parece um “megamix” de ideias filme de um director artístico mais parece deslumbrar-se com a recicladas de outros e melhores do que um realizador, mas isso é grandeza dos meios de produção e filmes (alguns deles até seus), sem o negar que Cameron sempre perde-se numa narrativa complexa e distanciamento meta-narrativo ou procurou que as suas epopeias dispersa, sem atingir em pleno os pós-moderno que a tornaria tecnológicas tivessem uma alma seus objectivos fundamentais. Basta contemporânea. Ao mesmo tempo, humana; e, mesmo que nem tudo lembrar a clareza de um filme como a sua concepção psicadélico- esteja no ponto em “Avatar”, há “O Destino” (1997), de Youssef fluorescente do povo alienígena emoção e arte e vida em Pandora. Chahine, para entender a questão. Na’vi está demasiado próxima da Que existiria mesmo sem o 3D, mas M.J.T. visão tradicional do “bom que, com a tecnologia, faz a selvagem”, abraçando os lugares- diferença entre a admiração distante Uns Belos Rapazes comuns bocejantes de uma boa e a partilha. Les Beaux Gosses consciência ecológica que James Cameron criou um universo De Riad Sattouf, encontram o seu oposto ideal na dentro da sua cabeça e quis-nos com Vincent Lacoste, Anthony Sonigo, vilania de papelão do militar convidar a visitá-lo, sem segundas Alice Trémolière. M/12 mercenário. Não é preciso muito intenções que não a de nos mostrar para perceber que, sim, Cameron um espectáculo que nunca vimos MMnnn gosta do melodrama clássico, antes. Quando foi a última vez que básico, simples, e não há nada de um cineasta nos fez um convite Lisboa: Medeia King: Sala 1: 5ª 6ª 3ª 4ª 14h15, mal nisso. Mas, no modo como tudo destes? “Ágora”: uma metáfora de vários fundamentalismos 16h45, 19h15, 21h45 2ª 14h15, 16h45, 19h15, 21h45,

Ípsilon • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • 45

“Habemus Papam” e um “papa” do cinema missão que lhe foi dada, assim temos italiano, Nanni Moretti. em busca um psicanalista. novo Que coloca um Papa Será um dos fi lmes só Rodagem fi lme deprimido, porque não para 2010. Com Moretti e de se considera à altura da Michel Piccoli. Cinema

“Depois das Aulas” interroga o cinema como manipulação “O Capacete Dourado” na Cinemateca

00h15; Medeia Saldanha Residence: Sala 7: 5ª 6ª traços mais evidentes dos gagues de Deve contextualizar-se este “Depois Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, 16h, 18h, 20h, 22h desenvolvimento lento do formato. das Aulas” com o facto de se tratar Cinemateca Portuguesa R. Barata Salgueiro, 39 Lisboa. Tel. 213596200 Porto: Medeia Cidade do Porto: Sala 3: 5ª 6ª Sattouf revela-se, de caminho, um de uma primeira longa-metragem de Sábado 2ª 3ª 4ª 14h, 16h30, 19h30, 22h; estupendo director de actores – não um jovem cineasta de 26 anos, com sexta, 18 Victor, Olga Baclanova, Wallace Ford. Ah, como é difícil ser adolescente no há uma performance dos miúdos uma visão complexa da adolescência 64 min. liceu quando se tem aparelho nos que soe falsa, e Noémie Lvovsky é e das suas inquietações. Por outro Anatomia de um Crime 21h30 - Sala Félix Ribeiro dentes, se traz vestida roupa que brilhante na mãe pseudo-deprimida lado, o modo como articula Anatomy of a Murder Máscaras de Cera parece herdada do irmão mais velho – mas, infelizmente, falha na influências (muito se falou das bem Mystery of the Wax Museum e um penteado que já não se usa, estrutura narrativa: era preciso um digeridas reverências a Kubrick e, De Michael Curtiz. Com Lionel não se faz parte da trupe fixe do andaime menos amorfo e mais num outro plano, a Haneke) e como Atwill. 72 min. recreio e se sonha construído que combatesse a integra, com inteira inteligência a 19h - Sala Félix Ribeiro desesperadamente com o primeiro sensação desagradável de estarmos estética do “videoclip”, sem fazer Os Inocentes beijo e a primeira queca com a a ver uma série de gagues soltos, “audiovisual”, deixa prever um The Innocents miúda da turma que parece filmados mais funcionalmente que universo conceptual a seguir com a De Jack Clayton. Com Deborah Kerr, inalcançável. O que diferencia “Uns com inspiração. Mesmo que alguns maior atenção. Entre o realismo Pamela Franklin, Martin Stephens. Belos Rapazes” do normalíssimo dos gagues sejam muito, provável e o “impossível” filme de 99 min. filme de liceu (para lá, muito bons. J. M. terror quotidiano, “Depois das 15h30 - Sala Félix Ribeiro evidentemente, da nacionalidade Aulas” percorre um território que Aluga-se Esta Arma francesa) é um olhar que, sem nunca Afterschool - Depois das Aulas interroga o cinema como This Gun For Hire cair na condescendência, está atento Afterschool manipulação e como forma de De Frank Tuttle. Com Veronica Lake, aos pormenores mais ínfimos do De Antonio Campos, representar a modernidade e as suas Robert Preston, Laird Cregar. 80 min. comportamento e do habitat natural com Danielle Baum, Byrdie Bell, contradições. Uma boa surpresa de 19h30 - Sala Luís de Pina do macho e da fêmea adolescentes Emory Cohen. M/0 um ano particularmente rico em médios e um humor de fuso lento grandes filmes. Mário Jorge Torres De Otto Preminger. Com Ben A Loucura do Charleston paredes-meias com o desconforto MMMMn Gazzara, James Stewart, Lee Remick. So This is Paris 161 min. M12. – o que não é surpreendente se se Capitalismo: Uma História de De Ernst Lubitsch. Com Monte Blue, Lisboa: UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 1: 5ª 6ª 21h30 - Sala Félix Ribeiro souber que o realizador e Amor Patsy Ruth Miller, André Béranger. Sábado 2ª 3ª 4ª 14h05, 16h40, 19h25, 21h45, 65 min. argumentista Riad Sattouf é 00h05 Domingo 11h30, 14h05, 16h40, 19h25, 21h45, Capitalism: A Love Story Lobos do Mar 22h - Sala Luís de Pina desenhador de BD e o filme tem 00h05; De Michael Moore, Captains Courageous com . M/12 De Victor Fleming. Com Freddie Bartholomew, Mickey Rooney, segunda, 21 MMnnn Spencer Tracy, Lionel Barrymore, John Carradine, Melvyn Douglas. 116 A Passagem do Noroeste min. Northwest Passage Lisboa: CinemaCity Classic Alvalade: Sala 4: 5ª De King Vidor. Com Robert Young, 15h30 - Sala Félix Ribeiro Domingo 2ª 3ª 4ª 19h, 21h40 6ª Sábado 19h, Ruth Hussey, Spencer Tracy, Walter 21h40, 00h10; Medeia Monumental: Sala 3: 5ª 6ª Domingo 2ª 3ª 4ª 14h15,16h40, 19h10, 21h40, O Tirano da Cidade Brennan. 125 min.M16. 00h15 Sábado 14h15,16h40, 19h10, 00h15; UCI The Great McGinty 15h30 - Sala Félix Ribeiro Cinemas - El Corte Inglés: Sala 8: 5ª 6ª Sábado De Preston Sturges. Com Brian Domingo 2ª 3ª 4ª 16h20, 21h55, 00h30; ZON Donlevy, Muriel Angelus, Akim Cotton Club Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado De Francis Ford Coppola. Com Diane Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 17h10, 20h50, 23h40; Tamiroff. 82 min. 19h - Sala Félix Ribeiro Lane, Gregory Hines, Lonette Porto: Arrábida 20: Sala 18: 5ª 6ª Sábado McKee, Richard Gere. 127 min. Domingo 3ª 4ª 13h55, 16h35, 21h10 2ª 13h55, As Três Noites de Eva 21h30 - Sala Félix Ribeiro 16h35; Medeia Cine Estúdio do Teatro Campo The Lady Eve Alegre: Cine-Estúdio: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 18h30, De Preston SturgesSturges.. Com BarbBarbara Fantasmas 22h; ZON Lusomundo Marshopping:g: 5ª 6ª Sábado Gespenster Domingo 2ª 3ª 4ª 21h20, 00h10; StanwycStanwyck,k, Henry Fonda.Fonda. 9797 min. 22h22h - SalaSala Luís dede Pina De Christian Petzold. Com Julia Michael Moore continua, com Hummer, Sabine Timoteo, Marianne inteira coerência, na sua cruzadacruzada O Capacete Dourado Basler. 85 min. contra uma certa ideia daa De Jorge Cramez. Com EEduardodu 19h - Sala Félix Ribeiro América, sem recear a FraFFrazão,zão, Ana MoreirMoreira,a Child of Manhattan demagogia e sem enjeitarr RogRRogérioério Samora. 83 De Edward Buzzell. Com Nancy o lado espectacular do min.min. M12M12.. 119h309h30 - SalaSala Luís ddee Pina Carroll, John Boles, Buck Jones. seu cinema documental. 70 min. Podemos até detectar sábado,sábado, 119 22h - Sala Luís de Pina um certo esgotamento pela insistência em A ParadaParada de O Tirano da Cidade fórmulas provocatórias e MoMonstrosnstros The Great McGinty interrogar os limites destaa FrFreakseaks De Preston Sturges. Com Brian Donlevy, Muriel Angelus, Akim sua intervenção, mas nãoo De Tod BrowBrowning.n Com Harry Tamiroff. 82 min. podemos negar que se EEarles,arles, HenryHenry 19h30 - Sala Luís de Pina trata de uma voz incómoda, colocando a tónica na decadência do capitalismo selvagem e naa morte progressiva de umaa classe média, central na organização do estado mais poderoso (e contraditório) do mundo.. E o que é facto é que os seusus filmes vendem e desafiamm o sistema, apesar de tudo. M.J.T.

Michael Moore continua, com inteira coerência, na sua cruzada contra uma certa ideia da América “A Parada de Monstros”

46 • Sexta-feira 18 Dezembro 2009 • Ípsilon aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente

Cinema (1948), mais um mestre de “O Anjo Azul”, o melodrama rural, para que não deixa de servir a popularidade levantar curiosas Mitchum inesperada de Loretta questões à “política Young, dos autores”. “ressuscitada” após Recheado de em criação o seu período áureo sombras e de na década anterior “véus” (espantosos Um período particularmente com um Óscar de planos filmados melhor actriz em entre redes e DVD importante da criação da “A Filha do cenários exóticos imagem do actor, entre o Lavrador” (H.C. de estúdio), com fi nal da década de 40 e o Potter, 1947), do diálogos início da de 50. Mário Jorge que propriamente artificiosos, cheios um “western”, de duplos sentidos, Torres insere, contudo, na e uma esplêndida Raquel, a Escrava trama a ameaça “femme fatale”, a que Branca omnipresente dos Jane Russell confere de Norman Foster “Injuns” (que a uma intensa carnalidade, legendagem portuguesa, o filme triunfa dos mmnnn apenas regular, não identifica disparates do argumento, como corruptela popular de oferecendo a Mitchum um dos sem extras “Indians”) e uns parcos minutos seus papéis paradigmáticos de herói Céu Vermelho finais do ataque à cabana: um solitário (“só entre a multidão de de Robert Wise pioneiro viúvo (William Holden, “Holliday Affair” (Don Hartman, Times Square, em véspera de Ano ainda antes do estrelato pleno) 1949) que teve em português o Novo”), ambíguo e rico de mmmnn compra uma escrava no forte vizinho título pateta de “Quando as Viúvas cambiantes, quer na química que para o ajudar nas tarefas domésticas Querem Casar” é uma comédia estabelece com Russell, quer na sem extras e na educação do filho ainda criança romântica sem grande brilho, em contracena dada à “frágil” anti- Quando as Viúvas e disputa o seu amor com um amigo que Mitchum representa, de novo, o heroína de Gloria Grahame, Querem Casar aventureiro, Mitchum, o forasteiro papel de “outsider” num triângulo sempre misterioso e económico de de Don Hartman do título original, “Rachel and the amoroso, embora desta vez gestos ou expressões faciais, mas a Stranger”, que canta enquanto figura central, um atingir grandezas só antes afloradas mmnnn acompanhando-se à guitarra (a sonhador inveterado que conquista por Bogart. prenunciar a sua curta carreira como o coração de uma viúva de guerra Numa colecção de grande sem extras cantor de baladas e calipsos) e exibe (uma muito jovem e ingénua Janet qualidade de imagem e som, quase Macau a sua habitual fleuma e neutralidade Leigh) e o afecto do filho desta, ao sem extras, se exceptuarmos as Josef von Sternberg expressiva. Fita sem grandes oferecer-lhe um comboio eléctrico, costumeiras excelentes filmografias pretensões, realizada com em contraponto à segurança social da editora a fornecerem os títulos mmmmm profissionalismo, mas sem chama, garantida pelo outro pretendente, portugueses (o que se torna por Norman Foster, pouco um advogado em ascensão (Wendell utilíssimo), embora com um erro de Extras acrescenta ao carisma do actor Corey). Independentemente de datação, precisamente no que mmnnn (terceiro nome do genérico), depois revelar estereótipos de produção, respeita a “Holiday Affair”, e a do ano fulcral de 1947 em que este filmezinho de Natal sublinha a hipótese de visionar os três Costa do Castelo protagonizara três obras-primas, extrema dificuldade de integrar a primeiros filmes em versões impondo-se como estrela maior: corpulência sonâmbula do actor em colorizadas (com os rostos das “Núpcias Trágicas”, o “western” veículos medianos, que não tirem personagens a oscilarem entre a psicanalítico de Raoul Walsh; partido das suas geniais doença de fígado e o ataque de Falar de Robert Mitchum significa “Encruzilhada” de Edward Dmytrik; especificidades. sarampo), o DVD de “Macau” tocar num dos mitos mais complexos e um dos mais paradigmáticos “films “Macau” (1952) constitui-se como oferece um pequeno documentário do cinema americano: mestre do noirs”, o genial “O Arrependido a “jóia da coroa” desta antologia, biográfico de Mitchum, da série “underacting”, aparentemente igual Out of the Past” de Jacques contrastado e delirante “film noir”, “Hollywood Remembers”, como a si próprio com uma máscara Tourneur. Apenas avulta a sua rábula última obra americana de Von sempre recomposto a partir de impenetrável de duro e uma de galã ambíguo, vestido de negro, Sternberg, embora retocado por “trailers”, que possui um certo particular e indecifrável como um pastor, especialmente Nicholas Ray, a respeitar o estilo do interesse contextualizante. vulnerabilidade, o actor mereceu, ao curioso se o tomarmos como estudo longo da sua longuíssima carreira premonitório para o futuro religioso (entre 1943 e 1995), classificações assassino de “A Noite do Caçador” opostas e quase irreconciliáveis – de (Charles Laughton, 1955). supremo representante de uma “Céu Vermelho” (1948) assume-se forma invisível de encarnar todo o já como um “western” à séria, bem tipo de personagens, em quase todos construído, atmosférico, recheado os géneros, a máximo canastrão de acção e de elementos incapaz de exprimir sentimentos ou inconfundíveis do género, desde a emoções. paisagem rochosa, a lembrar A caixa editada pela Costa do Monument Valley, até aos conflitos Castelo, explorando o extenso entre rancheiros honestos e catálogo da RKO, revisita um período aventureiros sem escrúpulos. particularmente importante da Seguramente dirigido por Robert criação da sua imagem, entre o final Wise, o filme encena grandes da década de 40 e o início da de 50, movimentos de gado e credíveis oferecendo-nos uma visão da sua cenas de violência, embora sem versatilidade genológica, embora nunca fugir aos previsíveis sobretudo em veículos de estereótipos: vilões excessivos, relativamente modestas proporções, amores abnegados ou perseguições pequenas curiosidades sem grande na neve, tudo com um Mitchum dimensão histórica. dominador e ambíguo, como “Raquel, a Escrava Branca” convinha à sua “persona”. “Macau”, é “a jóia da coroa” desta antologia

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