Celso Furtado, Da Materialização Do Pensamento Ao Exílio Deijenane Santos; Jean De Mulder Fuentes1 Resumo O Presente Artigo T
Total Page:16
File Type:pdf, Size:1020Kb
Celso Furtado, da materialização do pensamento ao exílio Deijenane Santos; Jean De Mulder Fuentes1 Resumo O presente artigo tem como objetivo fazer um breve resumo de três momentos chave na vida de Celso Furtado: seus anos de formação, sua passagem pela Superintendência para o Desenvolvimento de Nordeste (Sudene), entre os anos de 1959 e 1964 e sua partida forçada ao exílio, o qual se inicia no Chile e se prolonga pelos Estados Unidos e pela França. A metodologia usada é descritiva e histórica, usando como fonte primária principalmente os textos biográficos de Celso Furtado. O artigo se divide em três partes: a primeira descreve sua etapa de formação e o contexto de criação e objetivos da Sudene; a segunda parte trata do período em que Celso esteve à frente da Sudene; e a terceira foca no momento do seu exílio, abordando o caminho percorrido por ele no Chile, Estados Unidos e Europa. Finalmente, são feitas algumas reflexões articulando as três etapas do artigo. Palavras-chave: Celso Furtado; exílio; Sudene. Abstract This paper aims to present a brief summary of three key moments in Celso Furtado’s life: his years of intellectual shaping, his time at the Superintendence for the Development of Northeast (Sudene), between 1959 and 1964 and his forced departure into exile, which initiates in Chile and prolongs itself in the United States and France. The methodology used is historic-descriptive, using as primary source, mainly Furtado’s biographic texts. The paper is divided into three parts: the first one describes his academic background and the context of creation and objectives of Sudene, the second part deals with the years Furtado was ahead of Sudene; and the last part focus on the moment of his exile, showing the path he has taken in Chile, the United States and in Europe. Finally, some reflections are presented articulating the three parts of the paper. Key-words: Celso Furtado; exile; Sudene Resumen El presente artículo tiene objetivo hacer un breve resumen de tres momentos claves en la vida de Celso Furtado: sus años de formación, su estadía por la superintendencia de Desarrollo de Nordeste (SUDENE) entre los años 1959 a 1964, y su partida forzada para el exilio, la que se inicia en Chile y se prolonga por los Estados Unidos y Europa. Finalmente, son realizadas algunas reflexiones articulando las tres etapas. Palabras-clave: Celso Furtado; exilio; Sudene. 1 Pesquisadores-bolsistas do Procondel e estudantes da pós-graduação em Ciência Política (UFPE), Jean De Mulder (doutorado) e Deijenane Santos (mestrado). O início grande filósofo é um poeta dotado de consciência intelectual”2, em outras palavras, é alguém capaz de enxergar as coisas por meio de um “O olhar aguçado, que atenta para a realidade, mas sem perder o entusiasmo do sonhar. O filósofo é antes de tudo um pensador, assim como os grandes intelectuais que o mundo tem visto ao longo de sua história, alguns conformados em permanecer à margem do mundo real, refugiados em suas redomas intelectuais, outros interessados em romper com os muros das instituições do saber e assim fazer uma ponte entre o refletir e o transformar. Poder-se-ia dizer que Celso Furtado faz parte do segundo grupo, uma vez que ele mostrou-se continuamente interessado tanto em compreender como transformar a realidade que o cercava. Logo após obter seu doutorado em economia, em 1948, pela Universidade de Sorbonne, com a tese L'économiebrésiliennecoloniale, o economista integra, como economista, a Organização das Nações Unidas na Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina e Caribe (Cepal), sediada no Chile. Em 1950, o diretor da Cepal, Raul Prebisch nomeou-o diretor da Divisão de Desenvolvimento, levando-o a ocupar cargos importantes em alguns países da América Latina, dentre os quais, Argentina, México, Venezuela, Peru e Equador. Na introdução de seu livro, A fantasia Organizada, decorre sobre a origem e a consolidação do "desenvolvimento", mostrando as ideias dos principais economistas e intelectuais da América Latina, onde converge a discussão entre o liberalismo econômico e a concepção keynesiana do Estado. O livro é dedicado a Juan Noyola, Jorge Ahumada, José AntonioMayobre, Juan Medina Echavarría y Oscar Soberón, companheiros da Ordem Cepalina do Desenvolvimento, e a RaúlPrebisch, “que guiou a todos". A Cepal, para Furtado, era certamente uma paixão em sua vida. Em 1957, ele deixa a Cepal e vai para a Inglaterra, aceitando o convite de Nicholas Kaldor, que integra a equipe de discussão teórica com outros economistas proeminentes, incluindo Amartya Sem. Furtado permanece por um ano no King’sCollege da Universidade de Cambridge e escreve sua magnum opusFormação Econômica do Brasil (FREIRE D’AGUIAR, 2013). 2 Walter Kaufmann. Disponível em: www.pensador.uol.com.br. Acesso em: 25 novembro 2014. 2 O Nordeste em questão Após seus anos de formação teórica, Celso Furtado optou por lançar-se à realidade, não apenas para entendê-la mais de perto, mas para transformá-la,“o economista, em verdade, escondia o pensador político e social”3. Essa era a essência dele como pensador, um estudioso da realidade que o cercava, a qual, segundo ele, não deveria apenas ser compreendida, mas modificada. Em 1958, ele retorna ao Brasil e assume a diretoria do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), conforme as palavras de Roberto Campos, ex-ministro de Planejamento do governo Castello Branco (1964-1967): Conseguimos contato com Celso Furtado e ele foi convidado por Juscelino para ser diretor do BNDE, onde ele não teria nenhuma outra função a não ser se concentrar no problema do Nordeste. Ele preparou, então, o relatório para o GENOR, tentando criar um tipo de solução permanente para o Nordeste, para evitarmos que cada crise gerasse uma busca angustiosa de soluções emergenciais. Daí nasceu a Sudene. Sette Câmara (Sub Chefe do Gabinete Civil da Presidência da República) era o representante do Palácio, ou seja, de Juscelino, no Grupo Executivo do Nordeste. Celso Furtado queria criar um Departamento Nacional no Nordeste para substituir o Departamento Nacional de Obras Contra a Seca. E, Sette Câmara teve a intuição política de que era necessário trazer os governadores, criar uma mobilização política regional, o que não seria possível com a criação de um simples departamento. Ele deu, então, a ideia de criar uma superintendência regional do desenvolvimento, que teria um conselho, do qual participariam os governadores. Haveria, então, uma infusão política, uma participação política dos governadores. Como Celso Furtado havia preparado um relatório e sugerido um departamento, suas ideias foram trabalhadas no Grupo Executivo e daí surgiu a Sudene que, a rigor, é mais do que um departamento, é uma superintendência regional dotada de um coeficiente político, dado por um conselho deliberativo com representação de governadores. Essa é a história original da Sudene (CAMPOS, 2009, p. 49-50). Ao assumir o cargo de diretor no BNDE, o presidente Juscelino Kubitschek(1956 – 1961) confia a Celso tarefa de coordenar o Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), que vinha estudando, desde a sua criação, em 1957, a elaboração de um plano de atividades para analisar os problemas do Nordeste e possíveis soluções para os mesmos. O GTDN apresentou o estudo “Uma Política de Desenvolvimento para o Nordeste”, cujo relatório e respectivas conclusões foram apresentados por ele ao presidente Juscelino Kubitschek em janeiro de 1959, no Palácio Rio Negro, em Petrópolis, Rio de Janeiro. O relatório 3Revista Pesquisa Fapesp, nº 106, p.86-89, dezembro de 2004. Disponível em: http://revistapesquisa.fapesp.br/. Acesso em 25 novembro 2014. 3 começa fazendo uma leitura dos adiamentos históricos do Nordeste, descrevendo disparidades regionais em relação à região centro-sul do país e as consequências da não implantação de políticas de desenvolvimento definitivas. Além disso, apresentou-se também um plano técnico e estratégico para o desenvolvimento do Nordeste. Na ocasião, o presidente encarrega o economista da tarefa de desenvolver o Plano de Política Econômica para o Nordeste. Quando perguntado, Furtado, que redigiu o relatório GTDN, respondeu: Eu fiz aquele informe sozinho. Como diretor do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico, guardei-o em meu poder e o GTDN só tomou conhecimento do documento depois de pronto. O GTDN não tinha economistas. Tinha um grupo de especialistas... não tinha nenhum economista. Eram engenheiros, especialistas em solo, principalmente, em clima... para fazer um diagnóstico sobre a situação do Nordeste. Onde havia economistas era no Banco do Nordeste. Mas o GTDN propriamente foi criado no Rio de Janeiro. A direção do GTDN estava na mão de um advogado, o Aluízio Campos, que era muito simpático, mas não sabia muito de economia. E foi organizado no Rio de Janeiro um grupo, com a ajuda das Nações Unidas. Quando cheguei para trabalhar no Banco, Juscelino me disse: “Esse grupo só quer estudar o Nordeste, só faz estudar, não quer passar para a ação...”. Com relação ao grupo, visitei-os, conversei com eles, perguntei quando terminariam os trabalhos, e encerramos o assunto. Paralelamente, constituí, eu mesmo, um pequeno grupo com gente minha lá do BNDE, para juntar dados e armar um estudo que pudesse ser finalizado mais rapidamente. E o nome do GTDN foi utilizado porque em realidade eu não ia publicar o trabalho como sendo do BNDE. Tinha que publicar como sendo um trabalho desse grupo, e além do mais porque o dinheiro era do GTDN, a verba alocada (THEODORO, 1996, p. 6-7). O fundamento teórico do GTDN é de inspiração cepalina no que se refere a disparidades regionais e teve um impacto importante, pois levou à criação do Conselho do Desenvolvimento do Nordeste (Codeno), do qual Furtado foi nomeado Secretário Executivo, sendo responsável por colocar em prática as propostas da GTDN. O objetivo do grupo era não apenas observar a realidade da região, mas modificá-la por meio de ações concretas, o que veio a acontecer com a criação da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), em 15 de dezembro de 1959, instituição pensada para tirar o Nordeste do atraso socioeconômico sob o qual a região padecia à época.