Políticas De Comunicação E Contexto Mediático Cabo-Verdiano∗

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Políticas De Comunicação E Contexto Mediático Cabo-Verdiano∗ Políticas de comunicação e contexto mediático cabo-verdiano∗ Silvino Lopes Évora Índice informação que os cidadãos tinham, os meios de comunicação – maioritariamente 1 Introdução 1 públicos – serviam o poder instalado. Com 2 Enquadramento histórico-político dos a abertura política, esperava-se a abolição media em Cabo Verde 2 completa de todas as restrições ao exercício 3 Contextualização histórica do Direito das liberdades cívicas. No entanto, a liber- Cabo-verdiano 6 dade de imprensa ainda não é total e vários 4 As decisões comunicativas em Cabo mecanismos políticos são accionados para o Verde: análise da problemática 7 controlo dos media. 5 Discussão do problema 23 6 Conclusão 25 Palavras-Chaves: Políticas da comunica- 7 Bibliografia 26 ção, liberdade de imprensa, visão histórica do jornalismo, serviço público e regime jurí- Resumo dico dos media. Este trabalho propõe traçar uma pers- pectiva sobre a evolução das Políticas de 1 Introdução Comunicação em Cabo Verde. Partindo do Em primeiro lugar, devemos avançar que o fim do Monopartidarismo, vai elucidar os nosso projecto de investigação procura lan- trajectos que levaram à actual configuração çar uma visão panorâmica sobre as políti- do espaço mediático cabo-verdiano. Assim, cas de comunicação em Cabo Verde. Resu- este estudo mostra-nos que as políticas de mindo numa frase, queremos saber qual é o comunicação, em Cabo Verde, na última impacto da chegada da democracia na comu- quinzena, têm sido levadas a cabo, através nicação cabo-verdiana. Explicando de uma de decisões de avanços e recuos. O regime outra forma: tendo evoluído do regime mo- de partido único era visto como sinônimo nopartidário para o multipartidarismo, tenta- da falta de liberdade, onde, antes de servir mos um retracto das posições que os diferen- o interesse público e as necessidades de tes Governos tomaram em relação ao sector ∗Trabalho desenvolvido no âmbito do Mestrado da comunicação social. Que evoluções regis- em Ciências da Comunicação, área de Informação e taram? Houve algum retrocesso? Jornalismo, da Universidade do Minho. 2 Silvino Lopes Évora Uma vez que os estudos na área da co- poder parece ter sido transferido das mãos municação social, em Cabo Verde, ainda não de Deus para o domínio de homens déspotas, ocuparam “o seu berço”, toda a análise que que fixam as suas palavras acima de qualquer vamos fazer não deixa de ser um trabalho norma jurídica que assegura o direito dos ci- muito exploratório. É por isso que acha- dadãos. Assim, ao comemorar a sua vitó- mos que faz todo o sentido fazer, tanto o ria nas eleições de Março de 2005, em Zim- enquadramento histórico e político dos me- babwe, o Presidente Robert Mugab, líder da dia em Cabo Verde, como a contextualização ZANU – Frente Patriótica, deixou claro que do Direito Cabo-verdiano, focando as princi- tenciona ficar no poder até aos 100 anos de pais diferenças entre o ordenamento jurídico idade. O próprio Estados Unidos da Amé- cabo-verdiano e a forma como outros países rica, pela voz da Secretária de Estado, Con- africanos construíram as suas bases jurídi- doleezza Rice, classificaram as eleições de cas. Isto será, de alguma forma, importante injustas, pedindo ao Governo do Zimbabwe para esse projecto, uma vez que o principal “que (reconhecesse) a legitimidade da opo- objecto, que vai servir de base à nossa inves- sição e que (abandonasse) qualquer prática tigação, são as leis e o programa do Governo. destinada a reprimir, esmagar e de qualquer Também, para a realização deste trabalho, outra forma impedir as expressões de diver- entrevistamos alguns jornalistas, recolhemos gência” (PÚBLICO: 04/04/2005). outros dados e falamos com o Secretário de Integrado num quadro político-cultural Estado Adjunto do Primeiro Ministro, que, completamente diferente, está Cabo Verde, para além de ter a tutela da Comunicação So- que foi descoberto em 1460 por navegado- cial, está profundamente envolvido na nova res portugueses, tendo sido colonizado pela política de comunicação que o Governo pre- então Coroa Portuguesa até à data de 19751. tende levar a cabo e que, inclusive, incorpora A governação conjunta com a Guiné-bissau, um processo de revisão constitucional. O Se- sob a alçada do partido libertador (PAIGC cretário de Estado entende que esta iniciativa – Partido Africano para a Independência da vai tentar resgatar alguns direitos importan- Guiné e Cabo Verde), que sucedeu à inde- tes dos jornalistas, que a revisão constitucio- pendência do arquipélago, acabou por des- nal de 1999, fez desaparecer. moronar em 1980, tendo por base um golpe de estado que teve lugar na Guiné. A partir 2 Enquadramento de então, Cabo Verde entendeu que seria me- lhor continuar a sua caminhada política inde- histórico-político dos media em 1 Com o 25 de Abril, em Portugal (1974), o regime Cabo Verde opressor e castrante entra definitivamente em colapso, Se olharmos para certas monarquias autori- mas não caíram todas as barreiras e, por outro lado, novos projectos se fizeram para dar razão de existên- tárias que são perpetradas no continente afri- cia a algumas rançosas gavetas do “Terreiro de Paço”. cano, tenderemos a pensar que, em certas No entanto, a Revolução de Abril acabou por desem- partes do mundo, o poder tem uma dimensão bocar, em África, nas múltiplas revoluções indepen- quase divina. Países como Congo ou Tchade dentistas, que culminaram com a autonomia de Cabo são exemplos de regimes políticos em que o Verde, enquanto país independente, em 1975. www.bocc.ubi.pt Políticas de comunicação e contexto mediático 3 pendente da Guiné, tendo, assim, formado o A história da comunicação cabo-verdiana PAICV – Partido Africano para a Indepen- não nos remete a um passado tão distante dência de Cabo Verde –, que continuou a go- como a própria história do país. Olhando vernar o país num contexto político mono- para a imprensa cabo-verdiana, uma data partidário até ao início dos anos 90. É desta afigura-se como absolutamente importante: forma que se explica o colapso do plano tra- no ano 1836, o Governo português, atra- çado por Amílcar Cabral, que concebia uma vés da Pasta que tutelava a Marinha e o Ul- administração conjunta para os dois países, tramar, ordenou, pelo Decreto de 7 de De- que acabaram por seguir percursos histórico- zembro de 1836, Artigo n.o 13, “que nas políticos completamente diferentes. Antó- províncias ultramarinas “se imprimisse um nio Soares Lopes, perspectivando o conti- Boletim, que teria como redactor o secretá- nente com uma visão guineense, salienta que rio do Governo”” (OLIVEIRA: 1998, 17). “a questão dos regimes de Partido único em Esta prescritiva jurídica, também, acabou África levanta uma cordilheira de reflexões por abranger as colónias asiáticas, uma vez que viajam até ao interior de muitas cliva- que já tinham instalado, nesses territórios, gens étnicas e socio-económicas, elaboradas as tipografias. O referido decreto era com- ao longo de muitos anos de colonialismo”2 pletamente obsoleto para o contexto cabo- (LOPES: 1988, 108). verdiano, uma vez que, em África, as con- A 13 de Janeiro de 1991, realizaram-se as dições técnicas para a prática da impressão, primeiras eleições livres, em que, ao povo, ainda, tinham que ser criadas. foi assegurado o direito de poder escolher Em 1842, começou-se a imprimir o Bole- quem governa o país. O MPD (Movimento tim Oficial, em Cabo Verde, tendo este país para a Democracia), partido que mais se aflo- sido o primeiro da África Lusófona a rece- rou com a chegada da democracia, acabou ber a prediosa invenção de Gutenberg, de- por triunfar-se como vitorioso. vido à proximidade geográfica em relação à antiga metrópole. “Destinadas a imprimir os 2 Neste caso, como em tudo na vida, há excep- ções à regra. A contextualização cabo-verdiana dessa primeiros periódicos das Colónias – os Bole- matéria faz-se, de uma forma bem diferente. A ques- tins Oficiais –, essas tipografias colocavam- tão, da forma como o autor a coloca, é compreensí- se ao serviço da Monarquia e do Governo, vel, do ponto de vista de outros contextos culturais, para defender explicitamente os seus inte- como o da Guiné-Bissau, Angola ou Moçambique. A resses comerciais e industriais” (LARAN- cabo-verdianidade é um conceito que surgiu recente- mente para encerrar definitivamente todo o contexto JEIRA: 1988, 103). No entanto, os referi- político-etno-cultural do país. Das dez ilhas que cons- dos boletins incluíam, também, gazetilhas, tituem o arquipélago, nove são habitadas. E a língua charadas e outros divertimentos inocentes, crioula surge como dois lados da mesma moeda: Uni- como forma de diluir o carácter corporativo fica o povo cabo-verdiano, Diversificando-se segundo das informações que veiculavam. Qual era as variações geográficas. Cada ilha tem o seu vari- ante do crioulo, mas as diferenças nunca chegam ao o objectivo aqui? Com certeza, camuflar ponto de dificultar a comunicação entre os cidadãos. as práticas arbitrárias que estavam subjacen- Assim, as questões étnicas e linguísticas são liminar- tes à produção dos periódicos, tornando, aos mente rejeitadas, quando se fala da língua, da política olhos dos leitores, mais ténue, a fronteira en- e da cultura cabo-verdianas. tre as informações que correspondem às ne- www.bocc.ubi.pt 4 Silvino Lopes Évora cessidades do público e as propagandas polí- tugal fez saber que, a fundação de novas pu- ticas. blicações, nas colónias, passava a estar de- No entanto, só em 1877 é que o país co- pendente de um depósito prévio, que ia até nheceu o seu primeiro jornal, de nome In- 50 mil escudos, à ordem da autoridade ju- dependente, que era imprimido na Cidade dicial. Com certeza, por aquilo que essa da Praia. É importante notar que, em Cabo quantia (50 mil escudos) representava, a me- Verde, circunstâncias múltiplas, dificultavam dida não era mais do que uma clara cen- a produção de jornais.
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