Paper Lucioliveira 38ºANPOCS
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38º Encontro Anual da ANPOCS GT18 - Instituições judiciais, agentes e repercussão pública 2º Sessão - Conflitos morais e lutas políticas nos tribunais Supremo Tribunal Federal – a dimensionalidade da votação Fabiana Luci de Oliveira Caxambu, 27 a 31 de Outubro de 2014 Processo decisório no Supremo Tribunal Federal – a dimensionalidade da votação Fabiana Luci de Oliveira1 Resumo O artigo discute a formação de grupos de votação no STF, enfocando as alterações de composição do tribunal, verificando o impacto da trajetória de carreira dos ministros na determinação da composição dos grupos e no processo decisório do STF. A discussão se insere no debate teórico sobre comportamento judicial e relações entre Judiciário e política. O cerne está na dinâmica decisória interna, visando mapear fatores capazes de explicar o comportamento de voto dos juízes. Três modelos teóricos estão em disputa: legal, atitudinal e estratégico, com a articulação de suas características principais nas abordagens neoinstitucionais. No Brasil, o modelo atitudinal é criticado a partir do questionamento de sua aplicabilidade à nossa realidade, e à dificuldade de operacionalização da ideologia dos juízes. O artigo se posiciona nesta discussão ao buscar responder se importa quem está sentado no STF no momento da decisão e se e como é possível testar o papel da ideologia dos ministros. Para isso, são analisadas ADIns decididas de forma majoritária entre 1995-2012, buscando explicar o dissenso, e entender o papel da trajetória de carreira dos ministros nessas divisões. Palavras-chave: Supremo Tribunal Federal, processo decisório, comportamento judicial, dissenso, ideologia, trajetória de carreira. Introdução O objetivo central do paper é discutir a formação de grupos e a constituição de redes de votação no Supremo Tribunal Federal, enfocando as alterações de composição da corte ao longo de dezessete anos (1995-2012), verificando o impacto da trajetória de carreira dos ministros (e de outras variáveis) na determinação da composição dos grupos (redes) e no processo decisório do STF. Essa discussão se insere em um debate teórico mais amplo sobre comportamento judicial e relações entre Poder Judiciário e política, pensando a forma pela qual os tribunais participam do processo decisório. O debate tem se constituído em pelo menos quatro âmbitos: do desenho institucional, focando as características e ferramentas que 1 Professora do Departamento e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de São Carlos. Bolsista Produtividade CNPq. O paper apresenta os resultados iniciais de pesquisa que conta com financiamento da FAPESP. A autora agradece as alunas de iniciação científica Sarah Pereira e Simone Braghin pela dedicação na coleta e codificação dos dados das ADIns. 1 possibilitam ao Judiciário ter impacto nas decisões políticas2; da mobilização dos tribunais por atores políticos diversos, e a consequente formação de uma agenda temática a partir da alçada de assuntos de impacto politico, econômico e social aos tribunais3; da dinâmica interna, ou seja, do processo de decisão e das respostas que os tribunais têm dado4; e da reação dos diversos atores às decisões do tribunal (compliance)5. Embora o projeto que dá origem ao paper passe por esses quatro âmbitos, o cerne aqui é a dinâmica decisória interna, inserindo-se em uma agenda de pesquisas empíricas que busca mapear os fatores e as características capazes de explicar o comportamento de voto dos juízes que integram os tribunais superiores. Esta agenda têm sido influenciada por três modelos teóricos principais, elaborados para entender o comportamento da Suprema Corte norte-americana: legal, atitudinal e estratégico, e pela articulação de características desses três modelos nas abordagens neoinstitucionais. No Brasil, o modelo atitudinal tem sido bastante criticado, a partir do questionamento da sua capacidade de ser aplicado à realidade jurídica e política do país, especialmente pela dificuldade de se operacionalizar sua variável central: a ideologia dos juízes. Uma vez que classificação da ideologia tem se dado a partir de posições liberais 2 Ver entre outros: ARANTES, Rogério Bastos (1997). Judiciário e Política no Brasil. São Paulo, Idesp: Sumaré: Fapesp: Educ. VIEIRA, Oscar Vilhena (1994). Supremo Tribunal Federal: Jurisprudência Política. São Paulo: Revista dos Tribunais. TAYLOR, Matthew (2008). Judging Policy – Courts and Policy Reform in Democratic Brazil. Stanford University Press. 3 Ver entre outros: TAYLOR, Matthew. (2007), “O Judiciário e as políticas públicas no Brasil”. Dados, 50 (2): 229-257. PACHECO, Cristina Carvalho. (2008), “Os estudos sobre judiciário e política no Brasil pós- 1988: uma revisão da literatura”. Pensar, Fortaleza, 13 (1): 75-86. MACIEL, Débora Alves & KOERNER, Andrei (2002). “Sentidos da Judicialização da política: duas análises”. Lua Nova: Revista de Cultura e Política, 57: 113-133. SADEK, Maria Tereza Aina (2011), “O Judiciário e a arena pública”, in Lourdes Sola e Maria Rita Loureiro, Democracia, mercado e Estado: o B de Brics, Rio de Janeiro, Editora FGV. CARVALHO NETO, Ernani (2009). Judicialização da política no Brasil: controle de constitucionalidade e racionalidade política. Análise Social, vol. XLIV (191), p. 315-335. 4 Ver entre outros: OLIVEIRA, Fabiana Luci de. (2012). Supremo Relator: Processo decisório e mudanças na composição do STF nos governos FHC e Lula. RBCS, vol. 27, n:80, p. 89-115. SUNDFELD, Carlos Ari et al (2010). Controle de constitucionalidade e judicialização: o STF frente à sociedade e aos Poderes - Belo Horizonte Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas. 5 Ver entre outros: KAPISZEWSKI, Diana and TAYLOR, Matthew M. (2008). Doing Courts Justice? Studying Judicial Politics in Latin America. Perspectives on Politics, , pp 741-767. OLIVEIRA, Vanessa Elias (2005). “Judiciário e Privatizações no Brasil: existe uma judicialização da política?” Revista de Ciências Sociais, vol. 48, n. 3, p. 559-587. 2 versus conversadoras, a opção no Brasil tem sido priorizar a filosofia judicial, classificada como ativismo versus contenção judicial6. Nos Estados Unidos, a classificação da ideologia dos juízes da Suprema Corte têm se dado de três formas principais – (i) pelo modelo de escalonamento desenvolvido por Schubert (1965) 7 , dimensionando o voto de juízes em decisões anteriores e verificando a tendência de cada juiz em manter percepções consistentes em seus votos em casos parecidos. Esse método foi criticado pela falta de independência em utilizar decisões anteriores para prever decisões futuras; (ii) pelo modelo de atributos (Ulmer, 19738; Tate e Handberg, 19919), que usa características pessoais dos juízes para predizer seus votos (como gênero, faculdade de formação, classe social, e também o partido político do governo de nomeação); e pela cobertura midiática (Segal e Cover, 198910), analisando editoriais de jornais acerca da vida pregressa dos juízes antes de ingressarem no tribunal. A pesquisa que dá origem ao paper testa estas diferentes formas de mensurar a ideologia dos ministros do Supremo Tribunal Federal, observando as clivagens entre os ministros do Supremo em casos de controle de constitucionalidade das leis, buscando responder se importa quem está sentado ao tribunal no momento da decisão desses casos. Para isso, analisamos as ADIns (Ações Diretas de Inconstitucionalidade) com decisão final no período de 1995 a 2012, com destaque para os casos que provocaram divisões no tribunal (decisões majoritárias). Buscamos identificar os motivos e as consequências do dissenso, discutindo se e como a trajetória de carreira dos ministros 6 Ver entre outros KAPISZEWSKI, Diana (2010). How Courts Work: Institutions, Culture, and the Brazilian Supremo Tribunal Federal.In: COUSO, Javier A. et ali (org). Cultures of Legality Judicialization and Political Activism in Latin America, Cambridge University Press. KOERNER, Andrei. Ativismo Judicial? Jurisprudência Constitucional e política no STF pós-88. Novos estud. - CEBRAP, São Paulo , n. 96, p. 69-85. 7 Schubert, Glendon. (1965). The Judicial Mind: the attitudes and ideology of Supreme Court Justices, 1946-1963. Evanston: Northwestern University Press. 8 Ulmer, Sidney. (1973). Social Background as an indicator of the votes of Supreme Court Justices in Criminal Cases: 1947-1956 terms. American Journal of Political Science, 17: p. 622-30. 9 Tate, N. e Handberg, R. (1991). Time Biding and theory building in personal attribute models of Supreme Court Behavior, 1916-1988. American Journal of Political Science, 35: p. 460-80. 10 Segal, J. A. e Cover, A. D. (1989). Ideological Values and the votes of US Supreme Court Justices. American Political Science Review, 83: p. 557-65. 3 influencia no grau de divergência entre eles, e quais outras características ajudam a entender tais divisões11. Como já ressaltado, aqui são apresentados e discutidos apenas os dados iniciais da pesquisa, estando assim os resultados e a discussão sujeitos a revisões significativas. O paper que segue está estruturado em três seções: a primeira cobrindo o perfil da agenda decisória do STF em controle de constitucionalidade no período analisado e o perfil dos atores que acionam o tribunal; a segunda voltada ao processo decisório interno, identificando os elementos que ajudam a entender o dissenso no Supremo; e a terceira enfocando a constituição das redes de votação no Supremo. I. Agenda decisória em controle de constitucionalidade no STF entre 1995-2012 A partir do trabalho de Falcão, Cerdeira e Arguelhes (2013) sabemos que o Supremo em