ISSN 0370-6583
es ia Revista do Jardim Botânico do Rio de Janeiro
Volume 61 Número 2 2010 13 0E 5)
Rodrigu BBJSl Revista do Jardim Botânico do Rio de Janeiro
Volume 61 (2): 1 57-352 Abril-Junho 2010 INSTITUTO DE PESQUISAS JARDIM BOTÂNICO DO RIO DE JANEIRO - Rua Jardim Botânico 1008 Jardim Botânico - Rio de Janeiro - RJ - CEP 22460-180 ©JBRJ ISSN 0370-6583
Presidência da República Rodriguésia LUÍS INÁCIO LULA DA SILVA A revista Rodriguésia é uma trimestral do Instituto Presidente publicação de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, a qual foi criada em 1935. A Revista publica artigos científicos originais, Ministério do Meio Ambiente de revisão, de opinião e notas científicas em diversas áreas IZABELLA MÔNICA VIEIRA TEIXEIRA da Biologia Vegetal (taxonomia, sistemática e evolução, Ministra fisiologia, fitoquímica, ultraestrutura, citologia, anatomia, palinologia, desenvolvimento, genética, biologia reprodutiva, JOSÉ MACHADO ecologia, etnobotànica e filogeografia), bem como em História Secretário-Executivo da Botânica e atividades ligadas a Jardins Botânicos.
Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro LISZT VIEIRA Presidente Ficha catalográfica Rodriguésia: revista do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. — Vol.l, n.l (1935) - .- Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rb de Janeiro, 1935- Indexação v. : il. ; 28 cm. DOAJ Trimestral Index of Botanical Publications (Harvard University Herbaria) Inclui resumos em português e inglês Latindex ISSN 0370-6583 Referativnyi Zhurnal 1. Botânica I. Instituto de Pesquisas Jardim Botânico Review of Plant Pathology do Rio de Janeiro Ulrich's International Periodicals Directory CDD - 580 - Esta publicação é afiliada à ABEC- Brasil CDU 58(01)
Corpo Editorial Editora-chefe Karen Lúcia Gama De Toni, Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ Editores -assistentes André Mantovani, Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ Daniela Zappi, Royal Botanic Gardens, Kew, Inglaterra Editores de Área Alessandra Rapini, Universidade Estadual de Feira de Santana, Feira de Santana, BA Francisca Soares de Araújo, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, CE Gilberto Menezes Amado Filho, Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ Giselda Durigan, Instituto Horestal do Estado de São Paulo, Assis, SP Lana da Silva Sylvestre, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Seropédica, RJ Marccus Vinícius Alves, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, PE Maria das Graças Sajo, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, SP Nivaldo Peroni, Universidade Federal de Santa Catarina, Horianópolis, SC Tânia Sampaio Pereira, Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ Tânia Wendt, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ
Editoração Edição on-line Carla Molinari Carla Molinari Simone Bittencourt Simone Bittencourt Dayanne Martins (bolsista CNCFlora)
Capa Edição eletrônica Simone Bittencourt http://rodriguesia.jbrj.gov.br SUMÁRIO/CONTENTS
Artigos
Crescimento
Initial
Marilda
Sistema
Breeding
Marina
Morfoanatomia
Morphoanatomy
Alessandra
significado
O
município
The cultural
Jeremoabo
Vanusa
Fungos causadores
Rust
Isadora
Samambaias
estado
Ferns
Jeferson
Additions
Adições
Massimiliano
Orchidaceae
Orchidaceae
Alessandro
Bromeliaceae
Bromeliaceae
Thiago
Chrysobalanaceae
Chrysobalanaceae
Paula Malvaceae
Flora
Revisão Rodriguesia 61(2): 157-165. 2010 http://rodriguesia.jbrj.gov.br
Crescimento inicial de plantas Euterpe edulis Mart. em diferentes condições de luz, água e nutrientes Initial growth of seedlings of Euterpe edulis Mart under different conditions of light, water and mineral nutrients
Marílda Neuburger1, Thaysi Ventura de Souza2 & Maria Terezinha Silveira Paulilo3
Resumo A introdução e manejo de plântulas de Euterpe edulis Mart. em florestas tem sido uma alternativa encontrada para não levar a espécie à extinção devido ao extrativismo desenfreado. O objetivo deste estudo é ampliar o conhecimento das exigências ecológicas das plântulas desta espécie, visando auxiliar sua conservação in situ. Frutos despolpados da espécie germinaram em casa de vegetação e as plântulas, ainda com os vestígios da semente ligados ao eixo embrionário, foram separadas em seis lotes. Cada lote recebeu os seguintes tratamentos: 2% de luminosidade, 50% de luminosidade, sem nutrição mineral, com nutrição mineral, irrigação a cada dois dias e irrigação a cada sete dias. Observou-se que o tempo de esgotamento das reservas das sementes não pareceu ser influenciado pela intensidade de luz e fertilidade do solo, como também o peso da matéria seca, área foliar e número de folhas das luz e fertilidade do plântulas, sugerindo que o crescimento da plântula parece ser independente da intensidade de solo enquanto há reservas na semente. Sob regime de menor disponibilidade de água, as plântulas apresentaram apresentaram aumento no teor de prolina da folha, indicando que a espécie apresenta regulação osmótica As plântulas inibição do crescimento a 2% de luz solar, indicando que o nível de luz solar que chega ao interior da floresta fechada pode ser limitante para o crescimento de plântulas desta espécie. Palavras-chave: água, Arecaceae, luz, nutrientes minerais, palmiteiro, plântula. Abstract The introduetion and management of Euterpe edulis seedlings in forests is an altemati ve that has been found to prevent the species' extinetion. The aim of this study is to increase our knowledge of the ecological demands of seedlings of this species in order to contribute to in situ conservation. Fruits of Euterpe edulis without pulp were germinated in the attached to the greenhouse, in veimiculite moistened with water. The seedlings obtained, still with some seed reserves embryonic axis, were separated in six groups. Each received the following treatment: 2% sunlight, 50% sunlight, without mineral nutrition, with mineral nutrition, irrigation every other day and irrigation every seven days. It was observed that the time of seed-reserve depletion did not seem to be influenced by light intensity or soil fertility, nor did dry mass, leaf área and number of leaves, which suggests that seedling growth is independem of these environmental factors while the seed reserves are present. Under decreasing water, seedlings showed an increase in proline content, indicating a mechanism of osmotic regulation. The plants showed growth inhibition under 2% sunlight. This result indicates that the levei of light intensity that rcaches the interior of a closed forest can limit seedling growth. Key words: water, Arecaceae, light, mineral nutrients, palmiteiro, seedling.
Introdução e manejo do palmiteiro em florestas naturais ou O palmiteiro (Euterpe edulis Mart.), espécie plantadas tem sido uma alternativa encontrada para climácica da floresta ombrófila densa (Conte et al. não levar a espécie à extinção devido ao extrativismo 2000), é de grande valor econômico, porém não se desenfreado (Reis et al. 2000). Tanto para a introdução adapta facilmente ao monoculti vo devido às suas quanto para o manejo de uma espécie, há a necessidade exigências ecológicas (Clement 2000). A introdução do conhecimento de suas exigências ecológicas,
' Mestre em Biologia Vegetal. Programa de Pós-Graduação cm Biologia Vegetal, UFSC !Mestranda em Biologia Vegetal. Programa de Pós-Graduação em Biologia Vegetal, UFSC. "Autor Centro de Ciências Biológicas, Depto. Botânica. Programa de Pós-Graduação em Biologia Vegetal. para correspondência: Universidade Federal de Santa Catarina, Campus Universitário, 88040-900. Florianópolis. SC Brasil, [email protected] 158 Neuburger, M., Souza, T.V. & Paulilo, M.T.S. ê principalmente na fase de estabelecimento de plântulas, Plantas com 135 dias, em número de 252, foram uma das fases do ciclo de vida dos vegetais mais retiradas das caixas de madeira com vermiculita e vulneráveis ao ambiente & Westoby 1991). (Haig O transplantadas para sacos plásticos pretos, furados ambiente florestal não é homogêneo em relação aos na base, de IL de volume, contendo areia, barro e recursos luminosos, hídricos e minerais, principalmente vermiculite na proporção 2:1:2. As plântulas foram ao nitrogênio e fósforo (Chapin et al. 1987), o quanto separadas em quatro lotes, 63 plantas por lote, cada que poderia afetar a colonização de plântulas num ou lote recebendo um dos seguintes tratamentos: noutro local da floresta. Algumas características Tratamento 1: 2% luz, com adubação; Tratamento apresentadas espécies, pelas como o tempo de duração 2: 2% luz, sem adubação; Tratamento 3: 50% luz, das reservas da semente (Houter & Steege 2000) e a com adubação; Tratamento 4: 50% luz, sem das em maximizar plasticidade plântulas a captação dos adubação. Cada tratamento constou de três recursos & Feleke 2001) favorecer (Fetene podem a unidades experimentais, cada unidade com 21 colonização numa maior de ambientes gama florestais, plantas. Nos tratamentos com adubação, as aumentando sua de regeneração. plantas probabilidade foram irrigadas mensalmente com 50 mL de solução Estudos anteriores com Euterpe edulis de NPK, na concentração de 1,4 mg mL1. A redução verificaram aspectos relacionados ao tempo de de luz solar foi obtida com tela de degradação de reservas et al. 1996; Venturi por (Andrade sombreamento de 50% ou 98% de redução de luz. & Paulilo 1998), à influência da variação da adubação A cada 30 dias após o início do experimento, foram (Venturi & Paulilo 1998) e da intensidade de luz coletadas nove plantas tratamento (Nakazono et al. 2001) no crescimento de O por para plantas. determinação do peso da matéria seca de órgãos objetivo deste trabalho, entretanto, é verificar a influência vegetais, da área foliar e do número de folhas, e, em da luz e adubação na velocidade de esgotamento das seguida, procedimento da análise de crescimento. reservas, a interação entre luz e adubação no Estes experimentos foram conduzidos dois anos crescimento inicial de bem como as respostas por plantas, em área aberta do Departamento de Botânica da de crescimento à variação da disponibilidade hídrica. Universidade Federal de Santa Catarina. O crescimento de Euterpe edulis sob diferentes Material e Métodos disponibilidades de água foi determinado para Para realização deste estudo foram utilizados indivíduos obtidos a partir da germinação de sementes, frutos oriundos de indivíduos de Euterpe edulis como descrita anteriormente. Para tanto foram escolhidas Mart., popularmente conhecido por palmiteiro ou 78 plantas com a primeira folha fotossintetizante Jussara, localizados no Parque Botânico do Morro em início de expansão, seis para a - análise de do Baú Ilhota/SC (experimentos de esgotamento prolina e 72 para as demais medidas, as quais foram transplantadas das reservas e de efeito de luz e nutrientes) ou no para sacos plásticos pretos, município de Florianópolis (experimento de furados na base, de 1,5 L de volume, contendo terra de mata disponibilidade hídrica). Logo após a coleta, os e compostagem termofílica na proporção de 1:1 e mesmo foram despolpados. colocadas sob tela de sombreamento de 50% de redução de luz. Metade Para obtenção de plântulas, frutos despolpados das plântulas foi irrigada até percolação, foram colocados para germinar em casa de vegetação, a cada dois dias, e a outra metade recebeu irrigação até utilizando-se caixas de madeira de 40 cm de percolação a cada sete dias. As plantas foram divididas em três unidades comprimento, 30 cm de largura e 6 cm de altura, experimentais com 12 plantas cada. contendo vermiculita umedecida com água. Após 85 e 170 dias, nove plântulas de cada tratamento hídrico foram Visando a verificação do tempo de esgotamento coletadas, medindo-se o teor de prolina das reservas foram separados visualmente 50 frutos da folha, o peso da matéria seca, a área foliar e despolpados de tamanho semelhante, as quais foram procedendo-se à análise de crescimento. separadas em embrião e restante do fruto e as partes A umidade do substrato em capacidade de campo levadas para estufa a 80°C até peso constante. Para foi calculada subtraindo-se a massa de sete amostras determinação do peso foi utilizada balança analítica de 1,5L de substrato irrigado até percolação da massa com três casas decimais. de peso da matéria seca (MS) destas amostras após Entre 15 e 135 dias após a semeadura, a cada 15 secagem em estufa até massa constante, sendo obtido dias, 15 plântulas de tamanho semelhante foram coletadas o valor de 0,29gH,0/gMS, que eqüivale a 100% da e separadas em eixo embrionário e restante da semente, água que o substrato pode reter. A umidade do sendo o peso da matéria seca avaliado para ambas as solo no tratamento de deficiência hídrica foi obtida partes, utilizando-se a mesmo procedimento acima. pesando-se o substrato após 30 dias sem irrigação.
Rodriguesia 61(2): 157-165.2010 Crescimento inicial de Euterpe edulis Mart. 159
Foram calculadas as taxas de crescimento plantas por coleta. Apenas para determinação do teor relativo em termos de peso de matéria seca (TCR) de prolina foram utilizadas três plantas por tratamento, e razão de área foliar (RAF), segundo Hunt (1982), uma por unidade amostrai. Os dados foram sendo TCR = In m2 - In nij /12 -1, e RAF = (a / m + inicialmente avaliados quanto à homogeneidade de a. / irij) / 2. Onde: m2 = peso da matéria seca da planta variância de acordo com o teste de Levene, e quando na coleta final; m: = peso da matéria seca da planta na necessário, houve transformação dos dados para coleta inicial; t-t, = intervalo de tempo entre as atender os pressupostos do teste estatístico coletas inicial e final; a, = área foliar da planta na paramétricos. Os dados foram avaliados em nível de coleta inicial; a2 = área foliar da planta na coleta final. 5% (p < 0,05) de probabilidade de erro, utilizando-se A área foliar foi obtida através da comparação análise de variância multifatorial (experimento 2), com do peso do contorno de folhas desenhadas em comparação de médias pelo teste Tukey, ou teste / de papel com o peso de áreas conhecidas do mesmo Student, no caso do experimento 3 (Banzatto & papel. O peso da matéria seca de raiz, caule e folhas Kronka 1989). Utilizou-se o programa estatístico foi obtido colocando-se as partes vegetais para Statistica, versão 6.0. secar em estufa a 80°C até peso constante, sendo pesadas após este período. A altura da planta foi Resultados medida utilizando-se régua plástica, medindo-se Verificação do tempo de desde a região de transição entre raiz e caule até a esgotamento das reservas base da folha mais nova. O da matéria seca do eixo embrionário e A determinação dos níveis de foi feita peso prolina dos restos da semente de 255 dias após segundo método de Bokhari & Trent Três pelo período (1985). a semeadura das sementes, mantidas a 2% e folhas recém expandidas de três (DAS) plântulas por 50% de luminosidade, ser observado na Figura tratamento foram misturadas e separadas pode picotadas, 1. Observa-se a maior das reservas das em três amostras de 500 mg de matéria fresca. Cada que parte sementes foi consumida até 135 DAS, época em amostra de folhas foi macerada em 10 mL de ácido já que as plantas apresentavam a primeira folha sulfosalicílico (solução aquosa a 3%). Os macerados fotossintetizante ainda enrolada. Até esta fase, as obtidos foram centrifugados a 3000g e alíquotas de sementes cerca de 70% de sua matéria seca 2 mL do sobrenadante alíquotas amostra) perderam (três por original. Assim, a maior das reservas foi foram retiradas e colocadas em tubos de ensaio parte gasta antes da apresentar a folha alíquota tubo), com 2 mL do planta primeira (uma por juntamente fotossintetizante completamente expandida. Os reagente nihidrina ácida de nihidrina a 20 (1,25 g restantes 33% das reservas foram até o dia 255 mL de ácido acético e a 20 mL de ácido acético gastos glacial DAS, as apresentavam duas folhas fosfórico a 6 M em banho-maria a 70°C) e 2 mL de quando plantas já fotossintetizantes expandidas. Este das reservas ácido acético Os tubos com a solução gasto glacial. restantes deu-se de maneira semelhante, resultante foram aquecidos em banho-maria a 100°C independentemente do tratamento de luz ou nutricional por 1 h e a reação interrompida colocando-se os tubos a que as plantas foram submetidas após 135 DAS. em banho de gelo. Foram, então, acrescentados a cada Observa-se a velocidade de de reservas tubo 4 ml de tolueno, agitando-se, que perda posteriormente, não foi sempre a mesma. Houve uma fase mais lenta mistura dos líquidos. Após repouso para para entre 15 e 105 DAS onde a da matéria seca foi separação das fases, a fração tolueno foi retirada e sua perda cerca de 2,0 mg dia"1, uma fase mais rápida entre os absorbância medida a 520 nm, em espectofotômetro. dias 105 e 165 DAS, com uma da matéria seca de A absorbância obtida foi comparada com a absorbância perda cerca de 5,0 mg dia"1 e novamente uma fase mais lenta, de soluções-padrão de em concentrações de prolina dos 165 até o término das reservas, 255 DAS, 0-2-4-6-8-'6ug mL-1, sendo utilizadas três aos onde a perda da matéria seca foi cerca de 0,7 mg dia1. repetições por concentração. O experimento para determinação do efeito de luz e nutrientes e o de disponibilidade hídrica foram Resposta da planta em diferentes arranjados em delineamento completamente intensidades de luz e disponibilidade casualizado e, no primeiro caso, em fatorial de 2 x 2 (2 de nutrientes luminosidades x 2 condições de nutrição do substrato). O peso da matéria seca total das plantas (Fig. 2) Cada experimento constou de três unidades amostrais. não foi afetado pelos tratamentos de luz e nutricional A cada coleta, de cada experimento, foram retiradas até 195 dias após a semeadura. A partir de 405 DAP, três plantas por unidade amostrai, perfazendo nove verifica-se que os nutrientes têm maior importância
Rodriguésia 61(2): 157-165.2010 160 Neuburger, M., Souza, T.V. & Paulilo. M.T.S.
—ir Eixo embrionário, com adubacão A Eixo embrionário, sem adubarão -Q— Semente, com adubacão L_0. Semente, sem adubaçào
-Q— Eixo embrionário, com adubaçào 1.2 ¦ —4— Eixo embrionário, sem adubacão ¦ 1 —Q-Sementes, com adubacão -0- Sementes, sem adubacão /í
90 135 0 15 30 45 60 75 105 165 195 225 255 0 15 30 45 60 75 90 105 135 165 195 225 255 Dias após semeadura a Dias após semeadura |^
- Figura 1 Médias do peso de matéria seca (g) do eixo embrionário e dos restos da semente de plântulas de Euterpe edulis submetidas a diferentes adubações do substrato - a. 50% de intensidade de luz; b. 2% de intensidade de luz. Figure 1 - Embryonic axis and remains of seed dry matter weight (g) of plants of Euterpe edulis submitted to different substrate fertilization - a. 50% of light intensity; b. 2% of light intensity.
no crescimento em peso de matéria seca que a luz, de folhas, observada neste período. A altura do sendo que plantas crescidas a 2% de luz com caule (Fig. 7) também foi limitada em alta intensidade nutriente apresentam maior peso de matéria seca de luz e na ausência de nutrientes. que plantas a 50% de luz sem nutrientes. As plantas A taxa média de crescimento relativo (TCR) com mais luz e mais nutrientes apresentaram a partir das plantas a 50% de luz com adição de nutrientes de 405 DAS significativo aumento do peso de manteve valores mais altos que plantas sob os matéria seca em relação aos demais tratamentos, demais tratamentos durante quase todo o tempo de experimentação mostrando o teste F para interação entre os fatores (Tab. 1) A razão de área foliar luz e nutrição, interação significativa entre estes foi maior em plantas sob menor intensidade de luz, não havendo influências da nutrição das dois fatores a partir desta data (< 0,05). 2). O resultado verificado para peso de matéria plantas (Tab. a de 405 DAP não foi devido ao seca total partir Resposta da da matéria seca da raiz (Fig. 3), mas sim da planta a diferentes peso disponibilidades de água parte aérea (Fig. 4). As não Em relação à área foliar total (Fig. 5), o efeito plantas irrigadas por 14 e 30 dias não apresentaram diferença no crescimento em massa dos tratamentos é mais marcante a partir dos 405 de peso da matéria seca, área foliar, número de folhas DAP, verificando-se que a área foliar total de plantas e comprimento do caule em relação com nutrientes é maior independentemente da às irrigadas (controle) e nem no teor de 3). O teor intensidade luminosa aplicada. A área foliar de prolina (Tab. de água do substrato após 30 dias sem irrigação foi em intensidade de luz mais alta e sem plantas de 0,039gH20/gMS, eqüivalendo a 13,5% da foi a mais baixa entre os tratamentos a nutrientes capacidade de campo. partir dos 405 DAP. Já o número de folhas (Fig. 6) foi semelhante para os tratamentos até 405 DAP, à Discussão exceção das plantas sob maior intensidade de luz e sem nutrientes. Os dados indicam que a ausência Verificação do tempo de de nutrientes prejudicou a área foliar e a emergência esgotamento das reservas de folhas, apontando que a nutrição é um fator mais As reservas da semente de Euterpe edulis se limitante que intensidade de luz para o crescimento esgotaram quando as plântulas apresentavam a segunda inicial de plantas de palmiteiro. A partir de 405 DAP, folha palmada bem expandida, independentemente mesmo tendo ocorrido anteriormente o aumento e da intensidade de luz ou adubacão aplicada. Cerca área foliar com adubacão, a área foliar começa a de 70% das reservas sendo gastas até a plântula diminuir em todos os tratamentos devido à queda apresentar o início do desenvolvimento da primeira
Rodriguésia 61(2): 157-165.2010 161 Crescimento inicial de Euterpe edulis Mart.
1.6 -, 50% de luminosidade, com adubação 50% de luminosidade, com adubação 50% de luminosidade, sem adubação í? M 50% de luminosidade, sem adubação com adubação O 2% de luminosidade, com adubação 2% de luminosidade, 12 2% de luminosidade, sem adubação g- 2% de luminosidade, sem adubação p—i i—o .A
405 465 615 0 165 195 225 255 405 465 615 165 195 225 255 Dias após semeadura Dias após semeadura - Figura 2 - Médias de peso de matéria seca (g) de plantas de Figura 3 Médias de peso de matéria seca (g) de raiz de Euterpe edulis submetidas a diferentes condições de luminosidade plantas de Euterpe edulis submetidas a diferentes condições de e adubação do substrato. luminosidade e adubação do substrato. - Figure 2 - Dry matter weight (g) of plants of Euterpe edulis Figure 3 Root dry matter weight (g) of plants of Euterpe submitted to different conditions of light intensity and substrate edulis submitted to different conditions of light intensity and fertilization. substrate fertilization.
50% de luminosidade, com adubação 50% de luminosidade, com adubação 50% de luminosidade, sem adubação 50% de luminosidade, sem adubação 2% de luminosidade, com adubação 2% de luminosidade, com adubação /" 3 2% de luminosidade, sem adubação B 2% de luminosidade, sem adubação (7- 2.0 Z-J £**»
Kf w^
^f^ Su
0 165 195 225 255 405 465 615 Dias após semeadura Dias após semeadura
Figura 4 - Médias de peso de matéria seca (g) de parte aérea de Figura 5 - Área foliar (cm2) de plantas de Euterpe edulis plantas de Euterpe edulis submetidas a diferentes condições de submetidas a diferentes condições de luminosidade e adubação luminosidade e adubação do substrato. do substrato. Figure 4 - Shoot dry matter weight (g) of plants of Euterpe Figure 5 - Leaf área (cm2) of plants oi Euterpe edulis submitted edulis submitted to different conditions of light intensity and to different conditions of light intensity and substrate fertilization. substrate fertilization.
50% de luminosidade, com adubação 50% de luminosidade, com adubação 50% de luminosidade, sem adubaç3o 50% de luminosidade, sem adubação 2% deluminosidade, com adubação 2% de luminosidade, com adubação 2% de luminosidade,YA sem adubação 2% de luminosidade, sem adubação
/ \
Dias após semeadura Dias após semeadura - Figura 6 Número de folhas de plantas de Euterpe edulis Figura 7 - Altura do caule (cm) de plantas de Euterpe edulis submetidas a diferentes condições de luminosidade e adubação submetidas a diferentes condições de luminosidade e adubação do substrato. do substrato. - - Figure 6 Number of leaves of plants of Euterpe edulis submitted Figure 7 Stem weight of plants of Euterpe edulis submitted to to different conditions of light intensity and substrate fertilization. different conditions of light intensity and substrate fertilization.
Rodriguésia 61(2): 157-165.2010 162 Neuburger, M., Souza, T.V. & Paulilo, M.T.S.
- Tabela 1 Taxa de crescimento relativo (TCR) de plantas de Euterpe edulis submetidas a diferentes condições de luminosidade e adubação do substrato. - Table 1 Relative growth rate (TCR) of plants of Euterpe edulis submitted to different conditions of light intensity and substrate fertilization " TCR (mg d-1) 2% de luz 50% de luz Intervalo de tempo (DAP) CN SN CN SN 195-165 0,009a 0,010a 0,011a 0,009a 225-195 0,001b 0,001b 0,011a 0,002b 255-225 0,004b 0,003b 0,014a 0,016a 405-225 0,007a 0,003b 0,006a 0,001c 465-405 (-) (-) o,002a (-) 615-465 0004a 0,0 0,006a (-)
= DAP Dias após a semeadura, (-) taxa negativa de crescimento relativo e CN= com adição dc nutrientes, SN = sem adição de nutrientes. Médias seguidas de mesma letra na linha não diferem entre si pelo teste de Tukey (p< 0,05). - = DAP=Days after sowing. (-) negalive relative growth rate and CN with addition of nutrients, SN without addilion of nutrients. Means followed by same letters in line are not significantly diffcrenl, according to lhe Tukey's test (p<0.05).
- Tabela 2 Razão de área foliar (RAF) de plantas de Euterpe edulis submetidas a diferentes condições de luminosidade e adubação do substrato. Table 2 - Leaf área rate (RAF) of plants of Euterpe edulis submitted to different conditions of light intensity and substrate fertilization.
RAF (cm2 mg') 2% de luz 50% de luz Intervalo de tempo (DAP) CN SN CN SN 195-165 0,119a 0,117a 0,96b 0,97b 225-195 0,147a 0,106b 0,96c 0,907c 255-225 0,143a 0,109b 0,84c 0,84c 405-225 0,132a 0,107b 0,82c 0,81c 465405 0,146a 0,82b 0,83b 0,65b 615465 0,100a 0,112a 0,70b 0,46c
= = nutrientes, SN " sem adição de nutrientes. Médias seguidas de DAP Dias após a semeadura, CN com adição de mesma letra na linha não diferem entre si pelo teste de Tukey (p<0,05). - ¦ DAP"Days after sowing, (-) negative relative growth rate and CN with addition of nutrients, SN without addition of nutrients. Means followed by same letters in line are not significantly different, according to the Tukey's test (p<0.05).
- Tabela 3 Médias de peso de matéria seca, área foliar, número de folhas e teor de prolina em plantas de Euterpe edulis, submetidas à baixa irrigação. Table 3 - Dry weight matter, leaf área, leaf number and proline content in plants of Euterpe edulis submitted to low water.
Tratamentos" Raiz(mg) Folha(mg) Parte Aérea(mg) Total(mg) Área Foliar(cm") N° Folha ug prolina mg-' Controle 329a 479b 781a 1110a 126,85a 3a 0,23a 14 dias sem 392a 517a 821a 1213a 135,96a 3a 0,22a irrigação Controle 705A 1058A 1841A 2682A 267A 5A 0,23A 30 dias sem 872A 1279A 2070A 2991A 275A 5A 0,26A irrigação
As letras minúsculas comparam controle e 14 dias sem irrigação e as maiúsculas, controle e 30 dias sem irrigação. Médias seguidas de mesma não diferem entre si pelo teste det(p<0,05). The small letters compare control and plants without irrigation during 14 days and the capital letters compare control and plants without irrigation during 30 days. Means followed by same letters are not significantly different, according to the / test (p< 0.05).
Rodriguésia 61 (2): 157-165. 2010 Crescimento inicial de Euterpe edulis Mart. 163 folha palmada, os 30% restantes foram gastos entre do que nos pouco férteis, mas sombreados. o estádio de desenvolvimento anterior e o estádio Entretanto, estas condições ambientais, a julgar pelos em que a planta jovem apresentou a segunda folha resultados encontrados no presente trabalho, não se palmada expandida, resultado semelhante ao fariam sentir nos primeiros meses de crescimento, mas encontrado por Andrade et ai. (1996) e Venturi & sim em plantas próximas ao primeiro ano de vida. Paulilo (1998), em condições de luz e nutrição de Em termos de sobrevivência de plantas, sob plantas diferentes das deste estudo. Isto parece a baixa intensidade de luz, em alta ou baixa indicar que enquanto há reservas nas sementes, o disponibilidade de nutrientes, não foi observado desenvolvimento da plântula independe das declínio de peso de matéria seca das plantas. Isto condições de luz e nutrição dadas e o estádio alcançado poderia indicar que ambientes mais sombreados, a ao fim do esgotamento das reservas é o de a planta possibilidade de sobrevivência de plantas, embora apresentar segunda folha palmada expandida. o crescimento fosse mais lento, seria maior que em Estes resultados são apoiados por Silva ambientes pouco férteis e bastante iluminados. Matos & Watkinson (1998), que observaram a Analisando o efeito dos tratamentos, tem-se grande mortalidade de plântulas de Euterpe edulis que a taxa de crescimento relativo em termos de peso em campo por volta do surgimento da terceira folha de matéria seca de plantas, TCR, é dependente da palmada, etapa do desenvolvimento em que a plântula, fotossíntese líquida (TAL) e da proporção de área de acordo com os resultados aqui encontrados, fotossintetizante, RAF, de maneira que o aumento passaria a sofrer influência do ambiente. O ambiente da TAL ou RAF leva a um aumento da TRC (Hunt de sub-bosque, onde as plântulas de E. edulis podem 1982). Em vista disto, observando-se o efeito da alta ser encontradas, chega a receber apenas 2% da e baixa intensidade de luz no crescimento de plantas radiação solar incidente (Januário et ai. 1992), o entre 225 e 405 DAS, período em que as respostas que poderia limitar o crescimento e a sobrevivência foram mais evidentes, tem-se que, em alta nutrição, a das plântulas. TCR em baixa e alta intensidade de luz foram semelhantes. Analisando em cada caso os valores Efeito da luz e nutrição no da RAF no período, tem-se que em alta luz a TCR foi crescimento de plantas influenciada pela TAL, já que a RAF apresentou menor valor em baixa intensidade de luz, e, em O crescimento das plantas foi favorecido pela que baixa luz a RAF influenciou a TCR, o valor da adubação sob maior quantidade de luz (50%), pois mostrando interação entre luz e nutrientes apenas RAF foi alto. Na ausência de nutrientes, a TCR foi mais alta em baixa intensidade de luz, e, neste caso, quando há nível mais elevado de luz. Este tipo de tem-se o valor da RAF influenciando a TCR, interação também foi encontrado parais, edulis por já que Illenseer & Paulilo (2002), trabalhando com o efeito foi mais alto em plantas mais sombreadas. da variação de nitrogênio e fósforo em diferentes Observou-se pelos resultados que a taxa de crescimento relativo, em termos de de matéria intensidades de luz no crescimento de plantas jovens peso desta espécie. A interação entre alta nutrição mineral seca, das plantas de E. edulis, foi de 0,016 mg d"1 em e alta intensidade de luz também foi encontrada em seu valor mais alto. Este valor é inferior ao encontrado outras espécies florestais por Elliot & White (1994), para outras espécies da Floresta Atlântica, crescidas Minolta & Pinzauti (1996), Gunatillekeeía/. (1997) e em condições similares e de idade similar, como Bungard et ai. (2000), considerando os autores que Cecropia glazioui Sneth., com TCR de 0,035 mg d"1 esta resposta é vantajosa na competição entre espécies (Duz et ai. 2004), Tabebuia avellanedae Lorentz ex quando há, por algum motivo, uma abertura no dossel Griseb., com TCR de 0,040 mg d"1 (Moratelli et ai. da floresta, possibilitando o aumento de luz. 2007), ColubrinaglandulosaPerk. e Peltophorum Em baixa nutrição, as plantas foram prejudicadas dubium (Spreng) Taub, com valor de TCR ao redor mais cedo quando em alta intensidade luminosa do de 0,60 mg.d'(Caus & Paulilo 2000). Estes dados que quando em baixa intensidade luminosa, confirmam os de Yamazoe (1973), os quais indicam provavelmente pelo crescimento mais acelerado, lento crescimento para E. edulis nos estádios utilizando os recursos nutricionais do substrato mais iniciais de crescimento e os de Pina-Rodrigues et rapidamente, como observado em outras espécies ai. (1990) que relatam crescimento mais lento de (Chapin et ai. 1987). Desta forma, em condições espécies que se estabelecem mais tarde na sucessão naturais, é possível que a sobrevivência de plantas florestal, como é o caso de E. edulis (Klein 1980) jovens de E. edulis seja mais baixa em locais em relação a espécies de sucessão inicial, como é o ensolarados com baixa disponibilidade de nutrientes caso das espécies citadas acima.
Rodriguésia 61(2): 157-165. 2010 164 Neuburger,'M., Souza, T.V. & Paulilo, M.T.S.
Os dados para crescimento de plantas em Duz, S.R.; Siminski, A.; Santos & M. & Paulilo, M.T.S. substrato bem irrigado e deficiente em água 2004. Crescimento de três espécies arbóreas da Floresta mostraram que o teor de água do substrato não Atlântica em resposta a variação na quantidade de luz. Revista Brasileira alterou o peso de matéria seca de raízes ou de parte de Botânica 27: 587-596. Elliot, K. aérea da planta. Esta resposta à diminuição de água & White, A.S. 1994. Effects of light, nitrogen and não era esperada face aos vários resultados de campo phosphorus on red pine seedling growth and nutrient use efficiency. Forest Science 40: 47-58. com a espécie, os quais têm relacionado a ocorrência Fetene, M. & Feleke, Y. 2001. Growth and de E. edulis a elevado teor de água no solo (Mattos photosynthesis of seedlings of four tree species from a dry tropical & Mattos 1972; Bovi 1987; Nogueira Júnior et al afromontane forest. Journal of Tropical Ecology 2003). Os estudos em condições controladas nem 17:269-283. sempre exprimem o observado em campo, em pois Gunatilleke, C.V.S.; Gunatilleke, I.A.U.N.; Pereira, campo há a ação de vários outros processos sobre G.A.D.; Burslen, D.F.R.P.; Ashton, P.M.S. & Ashton, os quais a água poderia agir como na decomposição P.S. 1997. Responses to nutrient addition among da serapilheira (Reissmann et al. 1990), ou no seedlings of eight closely related species oíShorea favorecimento da germinação (Nazário & Ferreira, in Sri Lanka. Journal of Ecology 85:301-311. 2010), o que poderia favorecer a ocorrência de E. Haig, D. & Westoby, M. 1991. Seed size, pollination edulis em locais úmidos. Estudos mais detalhados, costs and angiosperm success. Evolutionary Ecology 5: entretanto, são necessários para identificar a resposta 231-247. Houter, N. & de crescimento inicial de plantas de E. edulis à Steege, H. 2000. The importance of seed variação na disponibilidade de água no solo. mass and canopy openness for the early growth responses of tree seedlings of eight tropical rain forest species. In: Rose, S. (ed.). Seeds, seedlings Referências and gaps - size matters: a study in the tropical rain Andrade, A.C.S.; Venturi, S. & Paulilo, M.T.S. 1996. forest of Guyana. Georgetown, Tropenbos-Guyana Efeito do tamanho da semente de Euterpe edulis Series 9. Pp 19-39. Mart. sobre a germinação e crescimento inicial. Hunt, R. 1982. Plant growth curves: the functional Revista Brasileira de Sementes 18: 150-157. approach to plant growth analysis. Edward Arnold Banzato, D.A. & Kronka, S.N. 1989. Experimentação Ltd., London. 248p. agrícola. FUNEP, Jaboticabal. 247p. Illenseer, R. & Paulilo, M.T.S. 2002. Crescimento e Bokhari U.G. & Trent, J.D. 1985. Proline concentrations eficiência na utilização de nutrientes em plantas in water stressed grasses. 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Rodriguésia 61(2): 157-165.2010 Crescimento inicial de Euterpe edulis Mart. 165 Nakazono, E.M.; Costa, M.C; Futatsugi, K. & Paulilo. Reissmann, C.B.; Santos Filho, A. & Rocha, H.O. 1990. M.T.S. 2001. Crescimento inicial de Euterpe edulis Composição química foliar do palmito (Euterpe Mart. Em diferentes regimes de luz. Revista edulis Mart.) em quatro sítios distintos da Mata Brasileira de Botânica 24:173-179. Atlântica do Paraná. Anais do 6o Congresso Florestal Nogueira Júnior, L.R.;Fisch, S.T.V.& Ballestero, S.D. 2003. Brasileiro, Campos de Jordão. Pp. 662-663. Influência da umidade do solo no desenvolvimento inicial Silva Matos, D.M. & Watkinson, A.R. 1998. The de plantas do palmiteiro Euterpe edulis Mart. fecundity, seed and seedlings ecology of the edible em floresta nativa. Revista de Biociências 9: 7-13. palm Euterpe edulis in southeastern Brazil. Pinã-Rodrigues, F.C.M.; Costa, L.G.S. & Reis, A. 1990. Biotropica 30: 595-603. Estratégia de estabilidade de espécies arbóreas e Venturi, S. & Paulilo, M.T.S. 1998. Esgotamento nas manejo de florestas tropicais. Anais do 6° Congresso de Euterpe edulis Mart. e efeito Florestal Brasileiro, Campos do Jordão. Pp. 676-684. reservas da semente da nutrição mineral nas Acta Botânica Reis, M.S.; Fantini, A.C; Nodari, R.O; Reis, A.;Guerra, plàntulas. M.P. & Mantovani, A. 2000. Management and Brasilica 12: 215-220. conservation of natural populations in Atlantic Rain Yamazoe, G. 1973. Observações preliminares sobre a Forest: The case study of palm heart (Euterpe edulis altura de Euterpe edulis Mart. Boletim Técnico do Martius). Biotropica 32: 894-902. Instituto Florestal 6: 17-22.
Artigo recebido em 20/04/2009. Aceito para publicação em 04/12/2009.
Rodriguésia 61(2): 157-165.2010 m Rodriguésia 61(2): 167-179. 2010 httpV/rodriguesia.jbrj.gov.br
Sistema reprodutivo e polinização de Senna multijuga (Fabaceae) em Mata Atlântica Montana1 Breeding system andpollination of Senna multijuga (Fabaceae) in a montane A tlantic Forest
Marina Wolowski & Leandro Freitas
Resumo O conhecimento da biologia reprodutiva e polinização de árvores ncotropicais vêm aumentando nas últimas décadas. No entanto, ainda é incipiente para a Mata Atlântica e muitas questões persistem, por exemplo, sobre a prevalência de autoincompatibilidade. A biologia floral, o sistema reprodutivo e os visitantes florais de Senna multijuga foram estudados, com o objetivo de verificar a ocorrência de autoincompatibilidade e determinar seus polinizadores. A espécie apresenta características florais típicas do gênero, como flores assimétricas, enantiostilia, heteranteria e deiscência poricida. A antese é diurna e a viabilidade do pólen não diferiu entre os morfos de anteras. Os polinizadores foram abelhas dos gêneros Bombus, Epicharis, Centris e Xylocopa e abelhas menores atuaram como pilhadores de pólen. A reprodução sexual em 5. multijuga depende da transferência de pólen pelos polinizadores, pois não foram formados frutos por apomixia ou autopolinização. Este último resultado pode ser devido à depressão por endogamia ou a um mecanismo de autoincompatibilidade de ação tardia, uma vez que houve aborto uniforme de pistilos e penetração de tubos polínicos nos óvulos após autopolinização. Diferença na fecundidade após polinização manual e em condições naturais indica que a limitação polínica afeta o sucesso reprodutivo feminino, assim como a disponibilidade de recursos. Palavras-chave: autoincompatibilidade de ação tardia, depressão por endogamia, flor de pólen, polinização. Abstract Knowledge of reproduetive biology and pollination of Neotropical tree species has been increasing in recent decades. However, this is still incipient in the Atlantic Forest, and many questions remain, for instance, about the prevalence of self-incompatibility. We studied the floral biology, breeding system and floral visitors of Senna multijuga in order to verify the occurrence of self-incompatibility and determine its pollinators. This species bears the typical floral traits ofthe genus, such as asymmetry, enantiostily, heteranthery and poricid anthers. Anthesis is diurnal and pollen viability did not differ among the morphs of anthers. Pollinators were bees ofthe genera Bombus, Epicharis, Centris and Xylocopa and smaller bees acted as pollen thieves. Sexual reproduction of Senna multijuga depends on the transfer of pollen by pollinators, as no fruit was formed by either apomixis or self-pollination. The latter result may be due to inbreeding depression or by a mechanism of late-acting self- incompatibility, as we observed after self-pollination both penetration of pollen tubes in the ovules and uniform abortion of pistils. Differences on fertility after manual crossings and under natural conditions indicate that female fitness is affected by pollen limitation, as well as by the availability of resources. Key words: inbreeding depression, late-acting self-incompatibility, pollen flower, pollination.
Introdução espécies na América Central e do Sul (Bawa 1974; O conhecimento acerca da biologia reprodutiva Zapata & Arroyo 1978; Bawa et al. 1985a,b) e pelo e da polinização de espécies arbóreas neotropicais acúmulo de informações de diversos estudos pontuais vêm aumentando ao longo das últimas três décadas, (e.g. Gibbs & Sassaki 1998; Gribel etal. 1999; Dick a partir dos estudos pioneiros para conjunto de 2001; Freitas & Oliveira 2002; Carvalho & Oliveira
Parte da dissertação de Mestrado da primeira autora. 2Programa de Pós-Graduação em Botânica, Escola Nacional de Botânica Tropical, R. Pacheco Leão 2040,22460-030, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, [email protected] 'instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, R. Pacheco Leão 915,22460-030, Rio de Janeiro. RJ, Brasil, [email protected] 168 W Wolowski, M. & Freitas. L. 2003; Quesada etal. 2004). Para espécies arbóreas depressão por endogamia e não a mecanismos de de Mata Atlântica, os dados ainda são incipientes, autoincompatibilidade (Gibbs & Sassaki 1998; Hufford embora a quantidade de estudos seja crescente (e.g. &Hamrick2003). Sazima et al. 1985; Goldenberg & Varassin 2001; No gênero Senna há registros de Borges et al. 2008; Pires & Freitas 2008). autocompatibilidade e autoincompatibilidade de ação As questões que motivaram os primeiros estudos tardia (Silva et al 2002; Carvalho & Oliveira 2003; reprodutivos nas florestas tropicais surgiram em tomo Laporta 2005). Especificamente para Senna multijuga da alta riqueza de espécies de árvores e suas baixas (Rich.) Irwin & Barneby não foi realizado estudo densidades populacionais, da capacidade dos sobre sistema reprodutivo, porém em populações polinizadores se movimentarem entre as plantas e dos em áreas de pastagem e vegetação secundária, na níveis de autopolinização e polinização cruzada nas borda do Parque Estadual do Rio Doce, Minas Gerais, espécies (Fedorov 1966; Ashton 1969; Janzen 1971). foram observadas taxas de cruzamentos variáveis Nesses estudos pioneiros, a autoincompatibilidade através de marcadores moleculares, o que sugere foi registrada para a maioria (ca. 80%) das espécies ausência de autoincompatibilidade para a espécie hermafroditas estudadas (Bawa 1974; Bawa et al. (Ribeiro & Lovato 2004). 1985a). Alguns autores sugerem que a prevalência da Flores assimétricas, enantiostilia, heteranteria e autoincompatibilidade, que implica na necessidade deiscência poricida são características comuns às de fecundação cruzada, provavelmente está relacionada espécies da subtribo Cassiinae (Fabaceae) à pressões seletivas para a manutenção da variabilidade (Gottsberger & Silberbauer-Gottsberger 1988). A genética (Bawa 1974; Zapata & Arroyo 1978; Seavey enantiostilia evoluiu independentemente em pelo & Bawa 1986). Contudo, a autocompatibilidade menos dez famílias de angiospermas e normalmente ocorrente em espécies arbóreas (Sazima et al. 1985; está associada a outras características incluindo a Goldenberg & Varassin 2001; Pires & Freitas 2008) heteranteria, a coleta de pólen por vibração realizada abelhas, ausência pode também ser vantajosa como forma de aumentar por de nectários e a assimetria floral a chance de sucesso reprodutivo em espécies cujas (Barrett et al. 2000; Jesson et al. 2003). A presença desses caracteres em não-relacionados sugere populações têm baixa densidade ou em ambientes grupos a convergência com escassez de polinizadores. evolutiva para a qual a posição do Em Fabaceae, há uma tendência para maior polinizador durante a visita é importante para a freqüência de sistemas de autoincompatibilidade em dispersão do pólen e, consequentemente, para o sucesso reprodutivo masculino et al. 2000). grupos de arbóreas que em grupos de herbáceas, e (Barrett A deiscência é comum em espécies em para sistemas de autoincompatibilidade gametofítica poricida que o é o único recurso floral e a coleta de é (Arroyo 1981). Mais recentemente tem sido registrada pólen pólen ativa, realizada fêmeas autoincompatibilidade de ação tardia (LSI) em várias por de abelhas capazes de vibrações nas florais leguminosas tropicais (Seavey & Bawa 1986; Gibbs et promover peças (Gottsberger & Silberbauer-Gottsberger al. 1999; Lewis & Gibbs 1999; Carvalho &01iveira 2003; 1988). Contudo, nem todas as espécies visitam flores atuam Borges et al. 2008). Contudo, nos supostos casos de que de pólen como polinizadores e a relação de tamanho entre o LSI em que não se identificam barreiras pré-zigóticas, visitante e o e os estames longos é uma não é fácil distinguir sua ocorrência dos efeitos de gineceu característica importante para a polinização das depressão por endogamia isto é, a expressão de alelos espécies do gênero (Gottsberger & Silberbauer- recessivos deletérios que impedem o desenvolvimento Gottsberger 1988; Pinheiro & Sazima 2007). embrionário (Seavey & Bawa 1986; Sage et al. 1994; Neste estudo são descritos aspectos da biologia Husband & Schemske 1996). Por exemplo, em floral e do sistema reprodutivo e registrada a composição Epilobium obcordatum A.Gray (Onagraceae) foi de visitantes florais de Senna multijuga em uma área a ocorrência de LSI dada a proposta pós-zigótica, de Mata Atlântica, com o objetivo de verificar a esterilidade de algumas e aborto de embriões plantas existência de mecanismo de autoincompatibilidade e em estágio inicial de desenvolvimento (Seavey & Bawa determinar os polinizadores da espécie. 1986). Posteriormente, foi demonstrado que a variação e entre a produção de sementes de autopolinização Material e Métodos polinização cruzada nessa espécie era decorrente de depressão por endogamia (Seavey & Carter 1994). Em O estudo foi desenvolvido nos anos 2007 e algumas espécies de Fabaceae, a formação de progênie 2008 em área de floresta ombrófila densa montana Veloso et al 1991), predominante alógama também foi associada à (sensu entre 500 e 1000 m de
Rodriguésia 61(2): 167-179. 2010 Sistema reprodutivo de Senna multijuga 169 altitude, no Parque Nacional do Itatiaia (PNI) bolso. A viabilidade polínica foi estimada em 200 (22°27'S; 44°36'W). O clima nessa faixa altitudinal é grãos de pólen por antera em três anteras de tamanho do tipo Cwa e Cfb (classificação de Kõeppen) e distintos, corados com carmim acético, com auxílio apresenta duas estações bem marcadas: um período de microscópio óptico (Dafni 1992). O teste Qui- quente coincidindo com abundantes chuvas e um quadrado (X2) foi utilizado para analisar possíveis período frio associado à baixa pluviosidade diferenças na viabilidade entre os grãos de pólen (Segadas-Vianna & Dau 1965). Observações e provenientes desta anteras. O número de grãos de experimentos complementares foram realizados na pólen foi estimado em três anteras por tamanho, Área de Proteção Ambiental da Serrinha do utilizando a câmara de Neubauer, com auxílio de Alambari (APASA) (22°23'S; 44°32'W) que é microscópio óptico. A razão pólen/óvulo foi contígua ao PNI e localiza-se na sua zona de determinada de acordo com Cruden (1977). Outros amortecimento. Na área de estudo na APASA, a aspectos da biologia floral como coloração, odor, variação altitudinal é semelhante à do PNI e a horário da antese e duração da flor foram registrados vegetação se encontra em diferentes estágios de em observações diretas no campo (Dafni 1992). sucessão ecológica. O sistema reprodutivo foi determinado Senna multijuga (Rich.) Irwin & Barneby é através de testes de polinização controlados em uma espécie de hábito arbóreo, com 10 a 15 m de flores de inflorescéncias isoladas em sacos de "voile" altura, que apresenta distribuição ampla na América ainda em botões florais. Foram utilizados Central e do Sul, mas com variedades de distribuição três indivíduos em pico de floração em fevereiro e geográfica mais restrita (Irwin & Barneby 1982). Na março no PNI e dois indivíduos na APASA em área de estudo ocorre 5. multijuga subsp. abril de 2008. O acesso às flores foi feito a partir lindleyana (Gardner) H.S. Irwin & Barneby (Morim de escada e montagem de andaimes de construção & Barroso 2007), a qual se distribui do sul da Bahia civil (cf. Pires & Freitas 2008). As flores foram ao nordeste de Santa Catarina, nas cristas e submetidas aos seguintes tratamentos: i. apomixia declives da Mata Atlântica (Irwin & Barneby 1982). - flores em pré-antese foram emasculadas e Senna multijuga é comum entre 50 e 950 m de mantidas ensacadas na inflorescência; ii. altitude, em clareiras, bordas de floresta, matas autopolinização espontânea - flores em pré-antese ciliares e em áreas perturbadas e em regeneração, não manipuladas foram mantidas ensacadas na assim como pode ser preservada em pastagens e inflorescência; iii. autopolinização manual - flores plantações para sombrio (Irwin & Barneby 1982). em antese em que o conteúdo de pólen de uma Também é indicada para restauração de áreas antera da própria flor (autogamia) ou de outra flor degradadas, como espécie secundária inicial do mesmo indivíduo (geitonogamia) foi depositado (Moraes et ai. 2006), e é cultivada e utilizada para no estigma; iv. polinização cruzada manual - flores em arborização urbana em alguns estados brasileiros antese em que o conteúdo de pólen de uma antera de (Irwin & Barneby 1982; Rodrigues etal. 2005). No outro indivíduo foi depositado no estigma. O número PNI, a subespécie é freqüente na faixa entre 600 e de flores por tratamento consta na tabela 1. Os 900 m de altitude, em locais próximos ao rio Campo tratamentos foram distribuídos entre os indivíduos Belo, no interior da mata e em áreas de vegetação analisados. A autopolinização manual foi aplicada em alterada (Morim 2006; Morim & Barroso 2007). Na cinco indivíduos e os demais tratamentos, em quatro. APASA, indivíduos foram observados em bordas Nos tratamentos autopolinização manual e polinização de mata, áreas em regeneração e pastagens, bem cruzada, a antera foi dissecada sobre lâmina limpa e o como nos arredores de residências (Torres 2009). conteúdo depositado no estigma. Nesses tratamentos A floração dos indivíduos acompanhados no PNI foram realizados cruzamentos para os três diferentes e na APASA ocorreu entre janeiro e maio e a tamanhos de anteras citados acima. frutificação entre março e dezembro (Torres 2009). O crescimento dos tubos polínicos foi A dispersão das sementes é pelo vento. verificado utilizando a técnica de fluorescência de A biologia floral foi estudada a partir de material Martin (1959) em pistilos provenientes de fresco ou estocado em FAA 70%. A presença de tratamentos de autopolinização manual e de osmósforos foi verificada por meio de teste com polinização cruzada manual fixados em FAA 70% a vermelho neutro (Dafni 1992). A receptividade do intervalos de 12,24,48 e 72 horas após o tratamento. estigma foi determinada utilizando peróxido de Ainda, alguns pistilos autopolinizados foram hidrogênio (Zeisler 1938), com auxílio de lupa de fixados 24 horas após o tratamento e, então,
Rodriguesia 61(2): 167-179. 2010 170 Wolowski, M. & Freitas, L. desidratados em série etílica ascendente até etanol de óvulos. Sementes íntegras, com testa bem absoluto e incluídos em hidroxietilmetacrilato formada, foram consideradas desenvolvidas. (Gerrits & Smid 1983). Após inclusão e montagem Sementes com desenvolvimento interrompido e/ou dos blocos, estes foram seccionados longitudinalmente deformadas foram consideradas abortadas. O teste com auxílio de micrótomo de rotação com 3 pm de Kruskal-Wallis (H) foi utilizado para analisar espessura. As secções foram aderidas a lâminas de possíveis diferenças entre o número de óvulos, de vidro e coradas com azul de toluidina 0,05% (OTirien sementes desenvolvidas, de sementes abortadas, et al. 1965) e observadas em microscópio óptico a fecundidade e a taxa de aborto dos cruzamentos de campo claro. com anteras de diferentes tamanhos do tratamento A fim de estimar a produção de frutos em polinização cruzada manual. O teste Mann- condições naturais, flores em antese foram marcadas Whitnney (U) foi utilizado para analisar possíveis e mantidas expostas. O teste Qui-quadrado (X2) foi diferenças no número de óvulos, de sementes utilizado para avaliar possíveis diferenças na desenvolvidas, de sementes abortadas, na produção de frutos formados nos tratamentos (entre fecundidade e na taxa de aborto entre os tratamentos cruzamentos com anteras de diferentes tamanhos) e polinização cruzada e condições naturais. Os testes entre os tratamentos polinização cruzada e condições estatísticos foram realizados no software naturais. Os dados de condições naturais são STATISTICA 6.0 (Statsoft 2001). provenientes de um indivíduo do PNI. O outro Os visitantes florais foram coletados com puçá indivíduo que seria utilizado como controle sofreu e o comportamento de forrageio foi registrado. As forte florivoria por formigas do gênero Atta e não observações foram realizadas em dias com céu limpo pode ser utilizado para este fim. As flores desse ou parcialmente encoberto totalizando 12 horas indivíduo que estavam ensacadas não foram distribuídas entre 8:00 e 17:00h em três indivíduos danificadas e os dados dos outros tratamentos foram em fevereiro de 2008 no PNI. As espécies coletadas utilizados nas comparações. foram classificadas como polinizadores ou Foi feita a contagem de óvulos, sementes pilhadores com base na observação de contato do desenvolvidas e sementes abortadas de frutos corpo da abelha com o estigma, o que se deve ao provenientes do tratamento polinização cruzada (18 seu tamanho (Frankie et al. 1983) e comportamento frutos) e condições naturais (75 frutos) do PNI. A de forrageio (Pinheiro & Sazima 2007). fecundidade foi medida pela razão do número sementes desenvolvidas/ número de óvulos. A taxa Resultados de aborto foi medida pela razão sementes abortadas/ As flores de Senna multijuga, dispostas em óvulos. Os frutos foram abertos com e estilete pinça panículas terminais, são assimétricas e em prato, da e os óvulos e sementes contados com auxílio com 36,81 ± 2,56 mm (média ± desvio-padrão, em lupa. O número de câmeras seminíferas e cicatrizes todo o texto) (n = 10) de diâmetro. As sépalas de óvulos foram utilizados para estimar o número amarelas, em número de cinco, são livres. As pétalas, também de coloração amarela e em mesma quantidade, são desiguais Ia). O androceu é Tabela 1 - Produção de frutos (porcentagem do número (Fig. constituído dois estames um estame de frutos/número de flores) após tratamentos de por grandes, médio, quatro estames e três estaminóides controlados de Senna multijuga no Parque pequenos polinização (Fig. Ia). Os estames apresentam anteras Nacional de Itatiaia e na Área de Proteção Ambiental grandes curvas (7,50 ± 0,74 mm, n = 10) e filete alongado da Serrinha do Alambari. ± 0,94 mm, n = 10). O Table - Fruit (6,28 estame médio apresenta 1 production (percentage of fruit number/flower = number) after treatments of Senna multijuga in the antera curva (6,40 ±1,51 mm, n 10) e filete curto pollination = Itatiaia National Park and the Environmental Protection Área (2,08 ± 0,45 mm, n 10). Os estames pequenos of the Serrinha Alambari. apresentam anteras retas (4,56 ± 0,65 mm, n = 10) e n°de n°de filetes curtos (1,98 ± 0,20 mm, n = 1Q). As anteras flores frutos (%) apresentam deiscência poricida e o p<}fen é o único As Apomixia 15 0 (0) recurso floral. anteras reagiram ao testéiiim vermelho neutro e a dos osmóforos Autopolinização espontânea 15 0(0) presença foj Verificada da base ao ápice da antera em estruturas como Autopolinização manual 137 0(0) plinidas frisos longitudinais, os quais são con$Íff idos por um Polinização cruzada 104 55(53) maciço de células de origem epidérijSJúja e natureza
Rodriguésia 61(2): 167-179. 2010 Sistema reprodutivo de Senna multijuga 171 secretora (sensu Guimarães etal. 1984). O pistilo, com manual com pólen proveniente dos três tamanhos de + =10) nanteraM= 46> nan,eraG = 13,93 0,44 mm (n de comprimento (dabase ao a"16™ K».= 137; "antena 39' estigma), apresenta ovário supero e unilocular, com 52) (Tab. 1). A forma em foice dos pistilos abortados 45,07 ±6,14 (n= 75) óvulos de placentação sutural. O foi a mesma da observada nas flores em antese, estigma é circular, em forma de câmara e a abertura está independentemente do momento do aborto. Os pistilos voltada para a parte interna da flor. de polinização cruzada após cinco dias já adquiriram A viabilidade dos grãos de pólen foi de 96,33 forma ereta. O acompanhamento do desenvolvimento + 0,02% (n = 3) nas anteras pequenas, 98,17 ± 0,003% de 66 pistilos autopolinizados por até dez dias após o (n = 3) para as anteras médias e 97,33 ± 0,02% (n = 3) cruzamento mostrou que 91 % destes abortaram entre para as anteras grandes. Não houve diferença para cinco a nove dias após o autocruzamento. No viabilidade polínica do pólen proveniente dos três tratamento de polinização cruzada, não houve diferentes tamanhos de antéra (X* = 3,82, p = 0,15). diferença entre a produção de frutos (F) dos Anteras pequenas possuíam 11.789 ± 3.206 grãos de cruzamentos com pólen dos três tamanhos de antéra pólen, anteras médias 12.300 + 2.909 e anteras [^=0,94;p = 0,62F^F(o^0,53(55/104);FmteraP= grandes 20.178 ± 3.384. Desta forma, o número total 0,59(23/39),FMeraM=0,50(14^8),F_G=0,49(18/37)]. médio de grãos de pólen em uma flor foi estimado em Desta forma, esses dados foram agrupados (Tab. 1). 99.811 e a razão pólen/óvulo em 2.218. Tubos polínicos provenientes de tratamentos de Durante o desenvolvimento do botão floral, autopolinização manual e de polinização cruzada o pistilo desloca-se da posição central para posição manual foram observados penetrando no ovário ou lateral, à esquerda ou à direita, caracterizando a nos óvulos em flores fixadas 12 horas e 24 horas após enantiostilia. Flores de morfos opostos foram a polinização (Fig. lc-e). Não foram observadas encontradas na mesma inflorescência (Fig. lb). Os diferenças aparentes na taxa de crescimento de tubos estames de anteras grandes acompanham o polínicos provenientes de autopolinização e deslocamento do pistilo no sentido oposto, se polinização cruzada manual, nem de tratamentos com aproximando da pétala maior e a abertura do poro é pólen proveniente dos três diferentes tamanhos de direcionada no sentido da curvatura da pétala maior. anteras. Não foi observado, através microscopia de O estame médio acompanha o movimento do pistilo fluorescência, desenvolvimento dos óvulos e fica em posição oposta à pétala maior e o poro da autopolinizados e de polinização cruzada nos pistilos antéra é extrorso (Fig. 1 a). Os estames pequenos se fixados nos intervalos de tempo de 24,48 e 72h. dispõem no centro da flor e a abertura dos poros A produção de frutos após polinização também é direcionada ao centro da flor. Durante o cruzada foi significativamente maior que em deslocamento do pistilo e estames, a corola vai se condições naturais (Tab. 2). No tratamento abrindo. No botão em pré-antese, a corola já estava polinização cruzada, não houve diferença entre o totalmente aberta. O início da antese ocorreu no número de óvulos (H = 0,43, p = 0,81), de sementes início da manhã (por volta das 7:00h), quando o desenvolvidas (H - 0,10, p = 0,95), de sementes estigma estava receptivo e as anteras apresentavam abortadas (H = 1,69, p = 0,43), fecundidade (H = 0,18, coloração amarelo-esverdeada e os frisos p =0,92) e taxa de aborto (H = 1,45, p = 0,49) dos longitudinais alaranjados. Ao longo da manhã, os cruzamentos com pólen dos três tamanhos de antéra. frisos longitudinais das anteras liberaram odor, os Esses dados foram agrupados e comparados às poros se abriam e o pólen se tornava disponível, condições naturais (Tab. 2). A fecundidade no sendo liberado apenas por vibração. O estigma tratamento polinização cruzada foi significativamente permanecia receptivo por todo o dia. Ao final da maior em relação às condições naturais e a taxa de tarde, o odor não era mais perceptível e os frisos aborto não apresentou diferença (Tab. 2). adquiriam coloração amarronzada. A antese teve Os visitantes florais observados foram fêmeas duração de ca. 12 horas. Na manhã do segundo de abelhas (Hymenoptera: Apoidea), que coletaram dia, a maioria das flores já havia perdido os estames pólen. A coleta teve início por volta das 8:00h, ou eles estavam amarronzados e senescentes e, em permaneceu intensa até o início da tarde e diminuiu seguida, as pétalas começavam a cair. Na manhã do a partir das 14:00h. Foram consideradas pilhadoras terceiro dia, o pistilo e o cálice persistiam, podendo abelhas pequenas (< 12 mm) que durante a visita ter persistido também a pétala de maior tamanho. não contatavam o estigma e polinizadoras as Quanto ao sistema reprodutivo a espécie não é abelhas de tamanho médio e grande (> 12 mm) que apomítica (Tab. 1). Não houve formação de frutos a contatavam o estigma, como Euglossa iopoecila. partir dos tratamentos autopolinização espontânea e Das quatorze espécies coletadas, 64% foram
Rodriguésia 61(2): 167-179. 2010 172 Wobwski. M. & Freitas. L.
Figura 1 - Flor de Sewna multijuga e crescimento de tubos polínicos - a. disposição das pecas florais: pétala maior (Pm) e anteras grandes (G) opostas ao pistilo (Pi) e ao estame médio (M). Estames pequenos no centro da flor (P); b. inflorescência com flores dos dois morfos. c. penetração de tubos no ovário após autopolinização manual com pólen proveniente de antera pequena; d. tubo polínico penetrando em óvulo após autopolinização manual com pólen proveniente de antera grande; e. corte longitudinal de óvulo após autopolinização manual mostrando tubo polínico atravessando o tegumento e o nucelo (setas). Barras: a-b = 1 cm, c-e = 100 um. Figure 1 - Flower of Senna multijuga and pollen tube growth - a. arrangement of floral parts: Major petal (pm) and large anthers (G) in opposition to the pistil (Pi) and the médium stamen (M). Small stamens in the center ofthe flower (P); b. inflorescence with flowers of both morphs; c. penetration of tubes into the ovary 12 hours after manual self-pollination with pollen from a small anther; d. pollen tubes penetrating the ovary 12 hours after manual self-pollination with pollen from a major anther; e. longitudinal section of an ovule 24 hours after manual self-pollination showing pollen tube crossing the tegumcnt and the nucellus (arrows). Bars: a-b = lem, c-e = 100 um.
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Tabela 2 - Produção de frutos (porcentagem do número de frutos/número de flores), número de sementes desenvolvidas, de sementes abortadas e de óvulos, fecundidade (sementes desenvolvidas/óvulos) e taxa de aborto (sementes abortadas/ óvulos) de Senna multijuga, após polinização cruzada e em condições naturais. Dados são média ± desvio padrão (exceto produção de frutos em %). Table 2 - Production of fruits (pcrccntage of fruit number/flower number), number of seeds developed, seeds aborted and ovules, fecundity (seeds developed/ovules), and abortion rate (seeds aborted/ovules) of Senna multijuga after cross-pollination and natural conditions. Data are mean ± standard deviation (except for fruit production in %).
Polinização cruzada Controle Estatística p Produção de frutos (%) 53(55/104) 14(13/90) ^ = 31,32 <0,0001 Sementes desenvolvidas 31,44 ±6,57 27,29 ±7,20 U = 27,0 0,18 Sementes abortadas 3,61 ±3,52 6,47 ±2,68 U = 22,0 0,09 Óvulos 39,28 ±2,59 45,07 ±5,09 U=11,0 0,01 Fecundidade 0,80 ±0,16 0,60 ±0,09 U = 8,0 0,01 Taxa de aborto 0,09 ±0,09 0,15 ±0,07 U = 25,0 0J4
classificadas como polinizadores, pois foi possível em relação à polinização por vibração (Marazzi et observar o contato do corpo na região estigmática al. 2007). A diversidade e maior especialização das durante a visita (Tab. 3). Essas abelhas se anteras abaxiais em relação aos estames medianos aproximavam da flor e se prendiam pela mandíbula podem estar relacionadas à divisão funcional das e pernas dianteiras. A vibração produzida pelas anteras, em alimentação e polinização, e ao abelhas durante o vôo era transmitida às anteras comportamento de coleta de pólen pelas abelhas promovendo a liberação do pólen (cf. Buchman (Gottsberger & Silberbauer-Gottsberger 1988; Silva 1983). As partes ventrais do tórax e do abdômen et al. 2002; Marazzi et al. 2007). Contudo, não está ficavam sobre as anteras de tamanho pequeno e a claro se esta divisão implica em restrições lateral do tórax e do abdômen ficavam próximas às reprodutivas ao pólen proveniente de cada morfo outras anteras. As espécies de polinizadores mais (Marazzi etal. 2007). Dados sobre a viabilidade e freqüentes diferiram em relação ao comportamento fertilidade do pólen proveniente de cada morfo de de transferência de pólen entre as visitas. Bombas antera mostram que S. multijuga não apresentou restrição a reprodução, semelhante a S. morio permanecia pairado e transferia o pólen do para australis H.S. Irwin & Barneby et al. tórax e do abdômen para a corbícula, com auxílio (Vell.) (Silva 2002), outras espécies do a das pernas dianteiras e medianas, enquanto as porém, gênero apresentaram, tais como S. corymbosa H.S. espécies de Centridini se prendiam com as (Lam.) mandíbulas nas estruturas florais e transferiam o Irwin & Barneby e S. sylvestris (Vell.) H.S. Irwin & Barneby & Oliveira 2003; Laporta 2005). pólen do tórax e do abdômen para as escopas das (Carvalho A orientação dos afeta diretamente a pernas traseiras com auxílio das pernas dianteiras e poros direção de liberação do e a assimetria da medianas. De maneira geral, as visitas duravam até pólen corola tem um três segundos. As abelhas visitaram diversas flores papel importante durante a et al. 2007,2008). flor de 5. numa mesma inflorescência e diversas polinização (Marazzi Na multijuga, a maior é assimétrica, falcado- inflorescéncias de um mesmo indivíduo antes de pétala ovada e côncava et 1984). A deixarem a árvore. (Guimarães al. posição e a concavidade da pétala maior de S. multijuga ser uma característica Discussão parece importante para direcionar o pólen liberado das anteras grandes para Senna multijuga apresenta morfologia floral a parte lateral e dorsal do corpo das abelhas e reduzir semelhante à de outras espécies do gênero, por a perda de pólen, enquanto o pólen das anteras exemplo, pela assimetria da corola e androceu pequenas é liberado diretamente na região ventral (Marazzi et al. 2006,2007,2008). As peculiaridades do corpo das abelhas. A enantiostilia é outro das estruturas florais em Senna, como diferentes aspecto da assimetria floral de S. multijuga que tamanhos de estames e diferenças de orientação associado a heteranteria contribui na polinização. dos poros das anteras, provavelmente evoluíram Jesson e Barrett (2005) sugerem que a deflexão das
Rodriguésia 61(2): 167-179. 2010 174 Wolowski, M. & Freitas, L.
Tabela 3 - Espécies de abelhas (Hymenoptera: Apoidea) visitantes das flores de Senna multijuga. Legenda: Po polinizador e Pi = pilhador. - Table 3 Bees species (Hymenoptera: Apoidea) visitors of flowers oi Senna multijuga. Captions: Po - pollinator and Pi = theft.
Família Espécie Função Tribo
Apidae Euglossini Euglossa iopoecila Dressler, 1982 Pi Bombini Bombus (Fervidobombus) brasiliensis Lepeletier, 1836 Po Bombus morio Swederus, 1787 Po Centridini Epicharis fiava Friese, 1900 Po Epicharis dejeanii Lepeletier, 1841 Po Centris similis Fabricius, 1804 Po Centris (Melacentris) cf. discolor Smith, 1874 Po Centris (Melacentris) cf. conspersa Mocsáry, 1899 Po Centris varia Erichson, 1848 Po Meliponini Melipona rufiventris Lepeletier, 1836 Pi Melipona sp. Pi Xylocopini Xylocopa frontalis Olivier, 1789 Po Xylocopa subcyanea Pérez, 1901 Pi Halictidae Augochlorini Pseudaugochlora callaina Almeida, 2008 Pi
anteras grandes opostas ao pistilo pode aumentar planta e dos polinizadores, como diferenças nas a precisão de transferência de pólen cruzado e escolhas de forrageamento dos polinizadores, em reduzir a interferência do estigma e das anteras resposta à composição e à fenologia das espécies dentro ou entre flores da mesma planta. Desta forma, de cada área. a distinção dos visitantes florais de S. multijuga Senna multijuga não formou frutos por em pilhadores e polinizadores é determinada pela autopolinização, o que em geral é tido como indicativo combinação das características florais e a relação da presença de sistema de autoincompatibilidade. O de tamanho com o corpo das abelhas. Os polinizadores crescimento de tubos polínicos no ovário e a de S. multijuga na área de estudo pertencem aos penetração nos óvulos de pistilos autopolinizados mesmos gêneros (Xylocopa, Centris, Bombus e indicam que não se trata de sistema de Epicharis) dos polinizadores de outras espécies autoincompatibilidade gametofítico clássico (Gibbs do gênero (Gottsberger & Silberbauer-Gottsberger 1990). Assim, o desenvolvimento de frutos após 1988; Silva etal. 2002; Carvalho & Oliveira 2003; autopolinização pode estar sendo impedido por Laporta 2005; Pinheiro & Sazima 2007). Entretanto, mecanismo de autoincompatibilidade de ação tardia das nove espécies de polinizadores de S. multijuga (LSI). O termo LSI é utilizado para classificar no Itatiaia, apenas três (Bombus morio, Epicharis mecanismos de rejeição diferentes e com origem fiava e Xylocopafrontalis) atuaram também como independente, que essencialmente partilham a polinizadores desta espécie em área costeira em característica de não se enquadrarem nos mecanismos Ubatuba, São Paulo (Pinheiro & Sazima 2007), a de autoincompatibilidade tradicionais (Seavey & Bawa qual dista ca. 110 km do PNI. A composição de 1986). Os mecanismos de ação tardia são identificados polinizadores de uma planta pode variar ao longo basicamente pela inibição de tubos na camada do de sua área de ocorrência (Carvalho & Oliveira 2003; nucelo do óvulo ou a inibição da fusão dos gametas Devoto et al. 2006) e isto pode refletir tanto masculinos com a oosfera e núcleos polares nos casos divergências entre a distribuição geográfica da de rejeição prezigótica; e pelo aborto dos óvulos em
Rodriguésia 61(2): 167-179.2010 Sistema reprodutivo de Senna multijuga 175 estágio inicial de desenvolvimento ou a degeneração abortados, sementes maduras e plântulas) (Hufford & do endosperma nos casos de rejeição pós-zigótica Hamrick 2003). Neste estudo, houve diminuição da (Seavey & Bawa 1986). Apesar disso, nem todos os progênie autofertilizada ao longo dos estágios (expressa registros de LSI em Fabaceae tem diferenciado os pelo aumento da heterozigosidade observada a cada mecanismos de rejeição em pré- ou pós-zigótica. nível) e a maior expressão da depressão por endogamia Evidências para a rejeição pós-zigótica podem ser se deu entre o estágio de semente madura e o observadas em várias espécies da família, assim como, estabelecimento da plântula. Nesses casos, análises em espécies de Bignoniaceae (Bittencourt etal. 2003; de progênies em diferentes estágios de Bittencourt & Semir 2005, 2006). Em Hymenaea desenvolvimento seriam mais eficientes do que testes stigonocarpa Mart. ex Hayne, isso se deu pela evidência de polinização controlados para responder tal questão. de zigoto sem divisões com núcleos do endosperma As duas populações de S. multijuga estudadas (Gibbs et al. 1999), em Caesalpinia calycina Benth., por Ribeiro & Lovato (2004), no estado de Minas Gerais, pela evidência de penetração do tubo polínico no saco apresentaram diferentes taxas de cruzamento (t = 0,84 embrionário (Lewis & Gibbs 1999), além de outras na área de pastagem fora do Parque e t = 0,54 na área evidências para Dalbergia retusa Hemsl., Dipteryx de borda). A média das populações (t = 0,69) e a menor panamensis (Pittier) Record & Mell e Myrospermum taxa de cruzamento são inferiores às taxas registradas frutescens Jacq. (Seavey & Bawa 1986). Por outro lado, para a maioria das espécies arbóreas neotropicais com existe uma evidência para rejeição prezigótica em Acácia, predomínio de cruzamento cruzado (Dick 2001; Quesada retinodes Schltdl. (Kenrickef a/. 1986). etal. 2004; Mathiasen etal. 2007; Borges etal. 2008). A ausência de frutos por autopolinização em Portanto, Ribeiro & Lovato (2004) concluem que seus espécies descritas com LSI pós-zigótica pode ser resultados sugerem a ocorrência de autofecundação igualmente atribuída à depressão por endogamia, o que em S. multijuga, o que compromete a existência de LSI torna complicado diferenciar a presença de um nesta espécie, sugerida pelos nossos resultados no mecanismo de autoincompatibilidade dos efeitos da Itatiaia depressão por endogamia (Seavey & Bawa 1986; Sage Além disso, os resultados de Ribeiro & Lovato et al. 1994). Segundo Seavey & Bawa (1986), a (2004) apontam que S. multijuga deve apresentar autoincompatibilidade de ação tardia pode ser sistema de cruzamento misto, o que pode refletir distinguida da depressão por endogamia por três depressão endogâmica prematura e não critérios, a saber: 1) a rejeição por ação tardia ocorreria necessariamente um mecanismo de LSI em relação ao em um momento único, causando o aborto dos embriões aborto de frutos autopolinizados na espécie. Apenas em um estágio de desenvolvimento uniforme enquanto por meio de testes de polinização é difícil concluir qual na depressão por endogamia, o acúmulo de alelos é o processo (endogamia ou mecanismo LSI) que atua deletérios causaria o aborto progressivo de embriões para impedir a formação de frutos autopolinizados. De em diferentes estágios de desenvolvimento; 2) na ação um lado, os níveis variáveis de alogamia entre tardia, a maioria dos indivíduos da população deve ser populações mineiras de Senna multijuga sugerem autoestéril; 3) a ocorrência de autoincompatibilidade existência de depressão por endogamia mas por outro em espécies relacionadas indicaria a segregação de lado, o aborto uniforme de pistilos autopolinizados entre alelos de incompatibilidade dentro da família. O aborto indivíduos na população do Itatiaia sugere LSI. de pistilos autopolinizados após um curto período de Em muitas espécies, os mecanismos de tempo, a ausência de desenvolvimento inicial dos autoincompatibilidade não se expressam totalmente, óvulos autopolinizados e ausência de frutos nos cinco ou seja, parte dos autocruzamentos produz frutos com indivíduos que foram autopolinizados em S. multijuga sementes (Bawa 1974; Zapata & Arroyo 1978; Sage et sugerem a presença de um sistema de al. 2001). A expressão da autoincompatibilidade pode autoincompatibilidade de ação tardia. variar em função da composição de alelos, expressão Todavia, esíudos que sugerem LSI em de genes modificados, composição da carga de pólen, leguminosas não descartam a possibilidade de condições ambientais (e.g., temperatura) e condições ocorrência de depressão por endogamia (Gibbs et al. internas do pistilo, tais como idade da flor, época do 1999; Freitas & Oliveira 2002). Outra evidência que os ano e presença de frutos em desenvolvimento (revisão efeitos da depressão por endogamia podem imitar um em Stephenson et al. 2000). Gibbs et al. (2004) mecanismo de autoincompatibüidade foi demonstrada verificaram que a produção de sementes de Ceiba em Platypodium elegans Vogel com o uso de chodatii (Hassl.) Ravenna é inferior em frutos de marcadores moleculares utilizando progênies em cruzamentos com carga de pólen mista (auto e diferentes estágios de desenvolvimento (embriões cruzado) em relação à carga de pólen cruzado. Neste
Rodriguésia 61(2): 167-179. 2010 176 Wolowski. M. & Freitas, L. estudo, os autores sugerem que a polinização natural intensidade da seleção sexual mais do que na é resultante da mistura de pólen (auto e cruzado) disponibilidade de polinizadores e recursos. Nesse que chega ao estigma e que em espécies com LSI, sentido, a seleção para aumentar a dispersão de pólen essa carga de pólen mista pode resultar em uma seria o principal fator na produção de flores excedentes proporção de sementes de autofertilização. Assim, de S. multijuga, enquanto o sucesso feminino parece esses autores predizem que espécies com LSI ser regulado tanto pela limitação polínica como pela podem apresentar sistema de cruzamento misto. limitação por recursos. Outro aspecto relacionado a esta discussão é a Em resumo, embora nossos resultados não variação da expressão da autoincompatibilidade permitam concluir que Senna multijuga apresenta entre populações de uma espécie (Sage et ai. 2001; mecanismo de autoincompatibilidade, os testes de ver também Barrett et ai. 1989 e Pailler & Thompson polinização controlada (ausência de frutos por 1997 para heterostilia), esperada em particular para autoDolinização e aumento da frutificação e certas circunstâncias, como em populações com fecurididade após suplementação de pólen cruzado) tamanhos diferentes e nos limites geográficos de demonstram que sua reprodução é dependente da distribuição da espécie (Fausto et ai. 2001; Stone transferência de pólen entre indivíduos realizada et ai. 2006). Desta forma, apesar dos resultados de pelos polinizadores. Ribeiro & Lovato (2004) sugerirem sistema de cruzamento misto e efeito de endogamia, isto não Agradecimentos exclui a possibilidade de existir um mecanismo de A Paulo Eugênio A.M. Oliveira e Alexandra incompatibilidade de ação tardia combinado, desde P. Fernandez as sugestões em uma versão e que parcial, em que sua expressão varie tanto por prévia aos dois revisores anônimos as criticas e sugestões; diferenças entre a composição da carga de pólen a Leila Nunes Morgado e Maria Cristina Gaglianone transportada pelos polinizadores como por a identificação das abelhas; a Victor Silvestre e diferenças entre populações da espécie. Leandro Silva o auxílio no trabalho de campo; a O aumento significativo da produção de frutos Elaine Z. Souza, Rogério C. Figueiredo e Karen L.G. e da fecundidade após polinização cruzada manual De Toni o auxílio na e análise de material em relação às condições naturais pode indicar limitação preparação anatômico, respectivamente. Este estudo foi nos níveis de polinização natural (Stephenson 1981; financiado Petrobrás Mata Atlântica Burd 1995). Tal limitação poderia ser pela escassez pela (Programa - JBRJ). LF agradece ao CNPq a concessão de de polinizadores e/ou pelo transporte inadequado bolsa, modalidade PQ. de pólen compatível, visto que 30% das espécies visitantes apresentaram comportamento pilhador. Além disso, os visitantes legítimos visitam várias Referências flores no mesmo indivíduo, o que reduz o fluxo de Arroyo, M.T.K. 1981. Breeding systems and pollination pólen e favorece a geitonogamia. Contudo, a biology in Leguminosae. In: Polhill, R.M. & Raven, P.H. Advances produção de frutos (52%) e a fecundidade (0,80) em in Legume Systematics Part 2. Royal Botanical Garden, Kew. Pp. S. multijuga após a polinização cruzada manual foram 723-769. Ashton, P.S. 1969. Speciation inferiores aos seus potenciais máximos. Isto se reflete among tropical forest trees: some deduction in the light of recent evidence. Biological em uma quantidade muito superior de flores que de Journal of the Linnean Society 1: 155-196. frutos e indica outros fatores podem produzidos que Barrett, S.C.H.; Morgan, M.T. atuar concomitantemente à limitação tais & Husband. 1989. The polínica, dissolution of a complex the como a limitação recursos, é tida como um genetic polymorphism: por que evolution of self-fertilization in trustylous Eichornia dos fatores mais importantes na regulação da paniculata (Pontederiaceae). Evolution 43:1398-1416. de frutos e sementes nas produção plantas Barrett, S.C.H.; Jesson, L.K. & Baker, A.M. 2000. The 1981). No contexto da seleção sexual, o (Stephenson evolution and function of stylar polymorphism in sucesso reprodutivo masculino provavelmente é flowering plants. Annals of Botany 85(Supp.A): limitado pela capacidade dos gametas masculinos 253-265. garantirem o acesso aos gametas femininos, enquanto Bawa, K.S. 1974. 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Artigo recebido em 30/04/2009. Aceito para publicação em 12/02/2010.
Rodriguesia 61(2): 167-179.2010 Rodriguesia 61 (2): 181 -194. 2010 http: / /rodriguesia.jbrj.gov.br
Morfoanatomia do sistema subterrâneo de Smilax subsessiliflora (Smilacaceae)' Morphoanatomy ofthe underground system of Smilax subsessiliflora (Smilacaceae)
3'5 Alessandra Ribeiro Guimarães2, Cecília Gonçalves Costa & Regina Helena Potsch Andreata 4'5
Resumo Smilax subsessiliflora Duhamel, espécie exclusivamente brasileira, tem por habitat a floresta Atlântica, mesófila e as matas de restinga. Este trabalho tem por objetivo descrever a morfoanatomia do sistema subterrâneo de S. subsessiliflora. O sistema subterrâneo da espécie em questão é constituído pelo rizóforo, do qual partem os ramos caulinares e as raízes adventícias. O rizóforo apresenta epiderme uniestratificada com estômatos, córtex com células de paredes espessadas e lignifícadas, meristema de espessamento primário e cilindro vascular, integrado por feixes colaterais. Das raízes adventícias que partem do rizóforo originam-se outras que se distinguem pelo calibre e pela cor. Aquelas apresentam córtex externo, constituído por células parenquimáticas e córtex interno, constituído por esclereídes, que passam a exercer a função de revestimento, após a eliminação do córtex externo. O cilindro vascular é poliarco e sifonostélico. Grãos de amido ocorrem no periciclo e na medula. No córtex das raízes laterais detectaram-se endomicorrizas arbusculares. As características anatômicas observadas no sistema subterrâneo de S. subsessiliflora se assemelham às relatadas para o rizóforo de S. quinquenervia. Palavras-chaves: caule, monocotiledôneas, raiz, rizóforo, Smilacaceae. Abstract Smilax subsessiliflora Duhamel, a native Brazilian species, inhabits the Atlantic rain forest, Mesophytic forest and Restinga forest. This study aims to describe the morphoanatomy ofthe underground system of S. subsessiliflora and compare the results to literature data. The underground system of the analyzed species is composed of the rhizophore, which emits the shoots and adventitious roots. The rhizophore has unistratified epidermis with stomata, córtex with thick lignified cell walls, primary thickening meristem (MEP) and vascular cylinder composed of collateral bundles. In the adventitious roots emitted by the rhizophore, other roots are fomied, distinguished by thickness and color. These have externai córtex composed by parenchyma and inner córtex (composed of sclereids) that becomes the outermost part after the elimination ofthe externai córtex. The vascular cylinder is polyarch and siphonostelic. Starch grains are present in pericycle and pith. Arbuscular mycorrhizae were detected in the córtex ofthe lateral roots. The anatomical characters observed in the underground system of S. subsessiliflora are similar to those ofthe rhizophore of 5. quinquenervia. Key words: stem, monocotyledons, root, rhizophore, Smilacaceae.
Introdução Smilax é constituído por cerca de 300 espécies Smilacaceae, situada na ordem Liliales, tem das quais 32 ocorrem no Brasil e são conhecidas "salsaparilha" "japecanga" distribuição predominantemente tropical e popularmente como ou subtropical, com menor representatividade nas (Andreata 1997; 2009). Dentre estas, 15 são regiões temperadas (Andreata 2009). exclusivamente brasileiras, e sua distribuição varia de
Parte da dissertação de Mestrado da primeira autora, bolsista CAPES. - - Universidade Federal do Rio de Janeiro. Pós-Graduação Botânica, Museu Nacional, Quinta da Boa Vista s/n, 20940-040, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, [email protected] Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, R. Pacheco Leão 915,22460-030, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Instituto de Ciências Biológicas e Ambientais, Universidade Santa Úrsula, R. Fernando Ferrari, 75,22231 -040, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. 5 Bolsista de Produtividade CNPq. 182 Guimarães. A.R., Costa. CG. & Andreata. R.H.P. restrita a ampla no território nacional, sendo mais Menezes 1986; Rocha & Menezes 1997), comumente encontradas em formações florestais propuseram estender a designação de "rizóforo" (Andreata 1997). ao órgão homólogo de Smilax quinquenervia Vell. Na medicina popular há um extenso histórico Esse termo foi indicado por Menezes et ai. com relação ao gênero Smilax (Peckolt 1936; (1979), ao reinterpretarem o sistema subterrâneo de Medeiros et ai. 2007), sendo que várias espécies Vernonia psilophylla DC. e V. linearifolia Less. estão incorporadas em farmacopéias de diversos (Asteraceae). As autoras tomaram como base as países. A Farmacopéia Brasileira (1929), embora com observações de Goebel (1905 apud Menezes et ai, "que nomenclatura desatualizada, menciona quatro 1979) relacionou o órgão espessado de espécies indicadas empiricamente com base na Dioscorea com o órgão formador de raiz (rizóforo) coloração e no diâmetro da raiz (Martins & em Selaginella, sem usar o termo rizóforo". Foi, Appezzato-da-Gloria 2006). entretanto, Ogura (1938) quem primeiro utilizou a Muitos estudos têm sido desenvolvidos no palavra rizóforo para designar o órgão formador de campo da fitoquímica sobre espécies de Smilax raízes em Dioscorea (Menezes 2007). dada a sua riqueza em compostos secundários (Silva Andreata & Menezes (1999) observaram 2006). Dentre eles, cita-se o trabalho de Hongzhu que em S. quinquenervia o rizóforo se desenvolve a et ai. (2004), onde são assinalados dois novos partir das gemas cotiledonares, frisando que o órgão o sistema subterrâneo de Smilax glucosídeos para desempenha importante papel na ampliação da bockii Warb. Merecem também referência os rizosfera, nas funções de armazenamento, condução trabalhos de Rugna etal. 2005). No (2003; primeiro, de água e nutrientes e propagação vcgetativa. foi desenvolvido um estudo fitoquímico Tendo em vista as dúvidas ainda comparativo entre as folhas e o rizoma de Smilax que persistem sobre a estrutura interna da campestris Griseb., e no segundo, os autores porção caulinar do sistema subterrâneo das espécies de analisam os flavonóides ocorrentes em diferentes Smilax, propõe-se, neste trabalho, analisar a órgãos dessa planta. morfoanatomia desse sistema na espécie em Nos últimos anos houve um avanço S. grande subsessiliflora. Desta maneira, espera-se contribuir científico em relação aos estudos químicos e para ampliar os conhecimentos sobre os órgãos farmacológicos de plantas medicinais, visando obter subterrâneos das espécies de Smilax, que são as novos compostos com propriedades terapêuticas. partes utilizadas para fins medicinais. Entretanto, o sucesso dessa linha de pesquisa depende da integração entre os conhecimentos botânico, Material e Métodos químico e farmacológico. No âmbito da botânica, os estudos taxonômicos « anatômicos são de Foram coletados três espécimes de Smilax primordial importância dada a sua contribuição para subsessiliflora Duhamel em um fragmento de Mata a correta identificação das espécies medicinais, Atlântica, numa propriedade particular localizada no auxiliando desta forma, o controle de qualidade da município de Miguel Pereira, estado do Rio de Janeiro. matéria-prima utilizada nos fitoterápicos, o que O material foi identificado pela Dra. Regina H. proporciona maior confiabilidade ao usuário Potsch Andreata e as exsicatas confeccionadas foram (Anvisa2004). incorporadas ao Herbário RB: S. subsessiliflora, A.O. Conforme reportado por Silva (2006), as partes Dias Neto 47, 48, 51 (RB), com duplicatas nos utilizadas de Smilax para fins medicinais são as herbários RUSU eR. raízes e os rizomas, ou seja, o sistema subterrâneo. Para a análise anatômica foram coletados o O sistema subterrâneo das espécies de Smilax rizóforo, em sua porção mediana, as raízes adventícias tem sido estudado por diferentes autores que e suas laterais, nas regiões apical e subapical. divergem quanto à terminologia utilizada para O material coletado foi fixado em FAA em designar a parte caulinar desse sistema. Cunha etanol 50%, segundo Johansen (1940) e preservado (1937), Oliveira et ai. (1973), Guaglianone & Gattuso em etanol 70%. O rizóforo foi incluído em (1991) e, recentemente, Palhares & Silveira (2005) e polietilenoglicol (PEG) 1500 e seccionado em Silva (2006) utilizaram o termo rizoma. Andreata & micrótomo de deslize, na espessura média de 20 Menezes (1999), fundamentadas nas características (im. Após clarificação com hipoclorito de sódio a estruturais do órgão e em seu desenvolvimento, 50%, as secções foram lavadas em água destilada e assim como em estudos anteriores sobre o gênero coradas com safranina e azul de astra (Bukatsch Vernonia Screb. (Menezes et ai. 1979; Sajo & 1972). As amostras das raízes foram incluídas em
Rodriguésia 61(2): 181 -194. 2010 Sistema subterrâneo de Smilax subsessiliflora Duham. 183 historesina, segundo Gerrits & Smitd (1983), obtendo- estratos de células de parênquima (Fig. 2c), onde se secções com 2-5 um de espessura ao micrótomo ocorrem esclereides (Fig. 3a), idioblastos fenólicos rotativo Jung, posteriormente coradas com azul de e ráfides de oxalato de cálcio. A camada mais interna toluidina 0,05% em tampão fosfato de sódio pH 7,2 e do cortex é representada pela endoderme (Fig. 3a) e ácido cítrico pH 4,5 (Sakai 1973). a seguir, observa-se o periciclo que se apresenta Os testes histoquímicos foram realizados em como uma larga faixa celular. A endoderme material recém-coletado para detectar: substâncias acompanha a saída das raízes adventícias e neste vermelho de rutênio (Johansen 1940); nível apresenta células de paredes lignificadas com pécticas, pelo "O" amido, pelo lugol (Berlyn & Miksche 1976); lignina, espessamento em (Fig. 3a). por meio da floroglucina em meio ácido (Johansen A região do meristema de espessamento primário 1940) e por observação ao microscópio de (MEP) é extensa, constituída por uma faixa contínua fluorescência, usando a auramina (Considine & de 12-14 camadas celulares (Fig. 2c e 3b) que, no Knox 1979). As substâncias lipídicas foram curso da diferenciação, têm suas paredes evidenciadas pelo Sudan black B e Sudan IV gradativamente espessadas e lignificadas (Fig. 4a). (Jensen 1962); a natureza dos cristais foi testada Esse aspecto foi confirmado pelo teste da floroglucina pelo ácido clorídrico e por observação ao e por observação em microscopia de fluorescência. microscópio de luz polarizada (MP) e os compostos No cilindro vascular atactostélico ocorrem fenólicos, detectados pela reação nitrosa, referida feixes colaterais, visualizados nos sentidos por Jensen (1962). transversal e longitudinal, e que se apresentam do rizóforo Para observação da epiderme foram envoltos por bainha esclerenquimática (Fig. 2c, 3b utilizados fragmentos de aproximadamente 1 cm2, e 4a). Alguns desses feixes vão constituir os traços que foram submersos em solução de Jeffrey vasculares dos ramos aéreos e/ou das raízes corados (Johansen 1940), e em seguida com adventícias (Fig. 2c). 1972). safranina (Bukatsch No rizóforo, mesmo sem tratamento prévio, são A morfologia do rizóforo foi documentada por observados numerosos idioblastos fenólicos, assim com câmera digital. Os detalhes meio de fotografias como ráfides, gotas lipídicas e células contendo registrados com o auxílio de uma anatômicos foram grãos de amido no cilindro vascular (Fig. 4b-c). câmera digital Cool Snap Pro, acoplada ao BX50, microscópio óptico Olympus utilizando-se o Raiz Pro Plus Versão 4.0 Windows. software Image para No ápice de uma raiz adventícia observa-se, em secção longitudinal, a organização apical do tipo Resultados aberta (Fig. 5a, c). Nesta fase inicial de diferenciação, Morfologia externa já ocorrem idioblastos fenólicos e de ráfides, nas O sistema subterrâneo de Smilax regiões correspondentes ao cortex e à medula (Fig. subsessiliflora é constituído pelo rizóforo e pelas 5a-b). A cerca de 3 mm do ápice radicular, tem início raízes adventícias nele originadas. O rizóforo tem a zona pilífera. Os pêlos radiculares têm formato e consistência lenhosa, coloração marrom, dimensões variáveis, alguns com as paredes um ramificação simpodial e é constituído de artículos tanto espessadas. Neste nível, as células da cobertos por catáfilos dispostos disticamente (Fig. endoderme já apresentam todas as paredes la-b). Desta estrutura, conforme referido espessadas, não sendo possível visualizar as anteriormente, desenvolvem-se as raízes estrias de Caspary. adventícias (Fig. 1 a-c), de coloração marrom escuro, Numa raiz mais desenvolvida, observa-se a fibro-lenhosas na maturidade (Fig. Ib), que se epiderme uniestratificada com células alongadas no estendem horizontalmente, atingindo vários metros sentido anticlinal (Fig. 6a). O cortex é formado por de extensão. Quando jovens, são claras e de células parenquimáticas, algumas das quais se consistência macia. apresentam colapsadas nas proximidades da periferia. Abundantes idioblastos fenólicos são vistos nessa Morfologia interna região (Fig. 6a). As células parenquimáticas da porção Rizóforo mais interna do cortex diferenciaram-se, originando O rizóforo adulto apresenta epiderme uma faixa esclerenquimática, integrada por cerca uniestratificada com estômatos anomocíticos (Fig. de quatro estratos de esclereides (Fig. 6a-b). 2a-b) e cortex formado por aproximadamente 25-30 Numa fase posterior de desenvolvimento a
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- - Figura 1 Sistema subterrâneo de Smilaxsubsessiliflora a. rizóforo, raízes adventicias e caule em sua porção subterrânea; b. detalhe do rizóforo e das raízes adventicias e laterais, e porção do rizóforo evidenciando um artículo; c. secção transversal do = rizóforo, evidenciando a saída de raízes adventicias. Cs = caule porção subterrânea; Ra raiz adventícia; RI = raiz lateral; Ri = rizóforo; Art = artículo. Figure 1 - Undcrground system oi Smilax subsessiliflora - a. rhyzophore, adventitious roots and underground portion of stem; b. detail ofthe rhyzophore, adventitious and lateral roots, and a portion ofthe rhyzophore with an articlc; c. transvcrse section of lhe rhyzophore with the = = exit of adventitious roots. Cs = underground portion of stem; Ra adventitious root; RI lateral root; Ri = rhyzophore; Art = article.
de amido. A epiderme e a porção externa do córtex são eliminadas grãos medula é conspícua, formada células e essas camadas passam a exercer a função de por parenquimáticas com abundante reserva revestimento. Subjacente a essa faixa, visualiza-se amilífera (Fig. 6c). Nessa região observam-se ainda a endoderme uniestratificada cujas células têm idioblastos fenólicos (Fig. 6c). "O" espessamento em (Fig. 6 a-b). Na região pericíclica da raiz adventícia, as raízes O cilindro vascular é poliarco e sifonostélico. originam-se laterais. Estas, por sua vez, dão origem a outras raízes O periciclo é constituído por 3-4 camadas de células laterais, ampliando a ramificação radicular. com paredes pouco espessadas (Fig. 6a), contendo
Rodriguésia 61 (2): 181 -194. 2010 185 Sistema subterrâneo de Smilax subsessiliflora Duham.
- Figura 2 - Rizóforo de Smilax subsessiliflora. Secção transversal a. epiderme uniestratificada; b. vista frontal da epiderme; estômato anomocítico; c. evidencia-se o cortex com células de paredes espessadas e lignificadas, além da = região do meristema de espessamento primário (MEP) em várias camadas e traços vasculares (setas). Ep epiderme; Co = = cortex- MEP = meristema de espessamento primário; Cv cilindro vascular. Escalas: 10 um (a); 25 pm (b); 50 um (c). - Figure 2 - Rhyzophore of Smilax subsessiliflora. Transversal section a. unistratified epidermis; b. frontal view of epidermis; anomocytic stomate; c. showing the cortex with thick and lignified walls, besides the primary thickening meristem (MEP) région in = = = = several layers and vascular traces (arrows). Ep epidermis; Cor cortex; MEP primary thickening meristem; Cv vascular cylinder. Scales: 10 um (a); 25 um (b); 50 um (c).
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Figura 3 - Rizóforo de S/w7ax subsessiliflora. Secção transversal - a. observa-se saída de raiz adventícia e presença de córtex, com esclereides e endoderme; b. detalhe do rizóforo evidenciando a região do MEP. Algumas células em = orientação radial. Co = córtex; Es = esclereides; Cv = cilindro vascular; En endoderme; Ra = raiz adventícia; MEP = meristema de espessamento primário. Escalas: 50 pm (a); 25 pm (b). Figure 3 - Rhyzophore oi Smilax subsessiliflora. Transversal section - a. note the exit of adventitious root and córtex with sclereid band = = and endodermis; b. detail ofthe rhyzophore with MEP région. Some cells radially disposed. Co córtex; Es sclereids; Cv = vascular cylinder; En = endodermis; Ra = adventitious root; MEP = primary thickening meristem. Scales: 50 um (a); 25 um (b).
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Figura 4 - Rizóforo de Smilax subsessiliflora. Secção transversal - a. região do MEP com células de paredes espessadas e lignificadas (setas); b. detalhe do cilindro vascular; notam-se idioblastos fenólicos e diminuto feixe vascular; c. detalhe do cilindro vascular evidenciando grãos de amido (seta) em células do parênquima. MEP = meristema de espessamento primário; Id = idioblastos fenólicos; Co = córtex; Cv = cilindro vascular; Fv = feixe vascular. Escalas: 25 um (a); 50 um (b-c). Figure 4 - Rhizophorc oi Smilax subsessiliflora. Transversal section - a. MEP region with thick lignified walls (arrows); b. detail of the vascular cylinder; note phenolic idioblasts and small vascular bundle; c. detail of vascular cylinder with starch grains (arrow) in = = idioblasts; ¦ = ¦ parenchyma cells. MEP primary thickening meristem; Id phenolic Co córtex; Cv vascular cylinder; Fv vascular bundle. Scale: 25 um (a); 50 um (b-c).
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- Figura 5 - Raiz adventícia de Smilax subsessilijlora. Secções longitudinais a. aspecto geral da porção apical; b. detalhe da porção cortical evidenciando idioblastos de ráfides (em MP); c. detalhe da porção apical evidenciando a = região das células iniciais (setas). Id = idioblasto fenólico; Raf ráfides. Escalas: 100 pm (a-b); 25 pm (c). - Figure 5 - Adventitious root oi Smilax subsessilijlora. Longitudinal sections a. general view of apical portion; b. detail of cortical portion showing raphid idioblasts (in MP); c. detail of apical portion showing région of initial cells (arrows). Id = phenolic idioblasts; Raf = raphids. Scales: 100 um (a-b); 25 \im (c).
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Figura 6 - Raiz adventícia de Smilax subsessiliflora. Secção transversal - a. resquícios do córtex, onde se observam células epidérmicas, pêlos radiculares e córtex externo; córtex interno com esclereides, endoderme com espessamento "O"; em bem como periciclo em várias camadas celulares, xilema e floema alternados, e medula; b. detalhe da figura anterior, evidenciando o córtex interno e a endoderme; c. células da medula contendo grãos de amido. Pel = pêlo radicular; Cep = célula epidérmica; Co = córtex, porção externa; Ci = córtex, porção interna; En = endoderme; Per = = periciclo; Id = idioblasto fenólico; Me medula. Escalas: 100 \im (a); 25 um (b); 50 p.m (c). - Figure 6 - Adventitious root of Smilax subsessiliflora. Transversal section a. remains of the córtex, with epidermal cells, root hairs "O" and outer córtex; inner córtex with sclereids, endodermis with thickening. Besides the pericycle in several cell layers: altemated xylem and phloem, and pith; b. detail of the previous figure, showing inner córtex and thick-walled endodermis; c. pith cell with starch = » = Ci = inner córtex; = = = grains. Pel root hair; Cep epidermal cell; Co outer córtex; En endodermis; Per pericycle; Id phenolic idioblast; Me = pith. Scales: 100 um (a); 25 fim (b); 50 um (c).
Rodriguésia 61 (2): 181 -194. 2010 190 Guimarães, A.R.. Costa, CG. &. Andreata. R.H.P. A cerca de 1,7 mm do ápice da raiz lateral tem No presente trabalho, embora não tenham sido início a zona pilífera com pêlos radiculares de desenvolvidos estudos ontogenéticos, optou-se pelo paredes espessadas (Fig. 7a). Idioblastos fenólicos termo rizóforo para designar o sistema subterrâneo e outros portadores de ráfides são observados em de S. subsessiliflora, dadas as características todo o cortex. anatômicas observadas no órgão adulto, que se A região mais externa do cortex é constituída assemelham às relatadas para o rizóforo de 5. por quatro camadas de células parenquimáticas, onde quinquenervia - um sistema de ramificação bipolar, ocorrem endomicorrizas arbusculares (Fig. 7b). Mais constituído pelo caule subterrâneo, do qual partem internamente, observa-se uma camada de esclereides os ramos caulinares aéreos e o sistema radicular cujas paredes anticlinais, assim como as periclinais adventício. No entanto, fazem-se necessários internas são espessadas e pontoadas (Fig. 7c). O estudos morfoanatômicos e ontogenéticos para estrato mais interno do cortex é representado pela melhor esclarecimento do assunto. endoderme que é constituída por células com paredes Andreata (1997) comenta que o posicionamento irregularmente espessadas. Esse espessamento pode do rizóforo em relação ao solo pode variar de acordo se manifestar em todas as paredes da célula ou apenas com a espécie, dependendo do ambiente em que as nas anticlinais e nas periclinais externas (Fig. 7c). As mesmas ocorrem, apresentando-se vertical em 5. células de passagem, localizadas nas proximidades brasiliensis Spreng. e horizontal em S. quinquenervia. dos elementos de protoxilema, são desprovidas de Nos espécimes de S. subsessiliflora aqui analisados, espessamento. o rizóforo se posiciona horizontalmente. O cilindro vascular desta raiz é diarco e Análises anatômicas evidenciaram a ocorrência protostélico, e o periciclo é constituído por uma de estômatos na epiderme do rizóforo de S. camada de células com parenquimáticas paredes subsessiliflora, aspecto também mencionado por delgadas 7c). (Fig. Andreata & Menezes (1999) para S. quinquenervia e por Palhares & Silveira (2005) para S. goyazana. Discussão Andreata & Menezes (1999) e Appezzato-da-Glória O caule subterrâneo das espécies de Smilax (2003) consideraram que a presença de estômatos tem sido designado na literatura especializada ora na epiderme de rizóforos pode evidenciar que estes como rizóforo (Cunha 1937; Oliveira et al. 1973; órgãos derivam de um órgão ancestral aéreo. Guaglianone & Gattuso 1991; Palhares & Silveira 2005; Em S. subsessiliflora, na porção mediana do Silva 2006), ora como rizoma (Andreata & Menezes rizóforo, ocorre uma ampla região de meristema de 1999; Martins & Appezzato-da-Glória 2006), com espessamento primário (MEP), localizada ente o cortex e cilindro base, principalmente, nos aspectos morfológicos. o vascular, responsável pelo aumento Menezes etal. (1979), Sajo & Menezes (1986), Rocha do órgão em espessura, assim como pela formação de & Menezes (1997) e Andreata & Menezes (1999), novos elementos vasculares e das raízes adventícias. analisando estruturas subterrâneas similares aos Esses resultados corroboram as observações de DeMason em a autora rizomas, que se distinguiam destes por apresentarem (1980), que considera que a sistema bipolar de ramificação caulinar, adotaram zona situada entre o cortex e o cilindro vascular, o MEP, é responsável aumento uma nova interpretação para tais estruturas. Andreata pelo do caule em diâmetro. Rudall tem & Menezes (1999), acompanhando a ontogenia de (1991) o mesmo pensamento e acrescenta as conexões entre o sistema Smilax quinquenervia, verificaram que o sistema que vascular do caule, subterrâneo desta espécie apresenta características da raiz e das folhas também se originam no MEP. Andreata & Menezes de rizóforo, adotando assim este termo para (1999), acompanhando desginá-la. Martins & Appezzato-da-Gloria (2006), o desenvolvimento do rizóforo de S. quinquenervia, observaram uma região de MEP por sua vez, ao descreverem o sistema subterrâneo cujas características são semelhantes às citadas de Smilax polyantha Griseb. corroboraram a para o rizóforo de S. interpretação de Andreata & Menezes (1999), e subsessiliflora, aqui analisada. Já Martins & Appezzato-da-Glória estenderam também o termo rizóforo para esta espécie. (2006) argumentam que no Fundamentada nesses estudos, Appezzato-da-Glória rizóforo de 5. polyantha a produção do cortex secundário direção centrífuga) (2003) aponta critérios para distinguir rizoma e rizóforo. (na e de feixes vasculares, assim como de Segundo a autora, o rizoma tem origem na plúmula, parênquima, em direção centrípeta, é uma conseqüência enquanto o rizóforo se origina a partir de gemas da atividade de um de espessamento cotiledonares ou pelo espessamento do hipocótilo. meristema secundário (MES).
Rodriguésia 61(2): 181 -194. 2010 191 Sistema subterrâneo de Smilax subsessiliflora Duharn.
- Figura 7 - Raiz lateral de Smilax subsessiliflora. Secção transversal a. detalhe da epiderme e dos pêlos radiculares; b detalhe da região cortical, evidenciando as endomicorrizas arbusculares; c. região central, evidenciando camada uniestratificada = de esclereides endoderme com células de passagem, e cilindro vascular protostélico. Ea endomicorrizas arbusculares; = = = Per = = vascular. Pel = pêlo radicular; Es esclereides; En endoderme; Cp célula de passagem; periciclo; Cv cilindro Escalas: 100 p.m (a); 50 um (b-c). - Figure 7 - Lateral root oi Smilax subsessiliflora. Transversal section a. detail of epidermis and root hairs; b. detail of cortex région, showing arbuscular endomycorrhizae; c. central région, showing unistratified layer of sclereids, with thick pitted walls, endodermis = = = = with passage cell and protostelic vascular cylinder. Ea arbuscular endomycorrhizae; Pel root hair; Es sclereids; En endodermis; = = cylinder. Scales: 100 um 50 um Cp = passage cells; Per pericycle; Cv vascular (a); (b-c).
Rodriguésia 61(2): 181-194. 2010 192 Guimarães. A.R., Costa. CG. & Andreata, R.H.P.
De acordo com DeMason (1983), a distinção as principais responsáveis pela atividade entre MEP e MES é muito tênue, e alguns autores farmacológica do gênero Smilax (Rugna et al. 2003). divergem quanto à interpretação da extensão desses Segundo os autores a predominância de cumarinas. meristemas. Cheadle (1937) considera que o MES é flavonóides e esteróides (saponinas) no rizoma de análogo ao câmbio vascular das dicotiledôneas e S. campestris é um dado importante, que pode servir das gimnospermas. DeMason (l.c), ao contrário, como marcador quimiotaxonômico para a espécie. chama a atenção para o fato de que os tipos Nas raízes de maior calibre a substituição do secundários produzidos em ambos os meristemas córtex externo pela porção interna, que passa a são muito distintos e ressalta a necessidade de exercer a função de revestimento, foi também estudos mais acurados a respeito. Por outro lado, mencionada por Martins & Appezzato-da-Glória Menezes et al. (2005) discutem a atividade (2006) em S. polyantha. Oliveira et al. (1973) relatam meristemática da endoderme e do periciclo no igualmente a ocorrência de esclereídes no córtex espessamento primário de monocotiledôneas. interno da raiz de S. japecanga, comentando que Os resultados observados corroboram o nem sempre essas células estão presentes. A pensamento de De Mason (1983) no que diz endoderme de S. subsessiliflora apresenta células "O", respeito à dificuldade em separar os limites entre de paredes com espessamento em semelhante MEP e MES, e em relação à diversidade dos tipos ao relatado para a raiz de S. polyantha (Martins & secundários produzidos por esses dois meristemas Appezzato-da-Glória 2006) e para outras espécies e ressalta-se também a necessidade de estudos mais brasileiras do gênero Smilax (Cunha 1940). Esau acurados a respeito. Por outro lado, discorda-se de (1974) também relatou este tipo de espessamento Cheadle (1937) quanto à analogia entre o MES e o para S. herbácea L. e Eames & MacDaniels (1947), câmbio vascular das dicotiledôneas e das para S. rotundifolia L. gimnospermas. Outrossim, o que se refere ao reflexo Em S. subsessiliflora o cilindro vascular da raiz da atividade meristemática da endoderme e do adventícia é poliarco e sifonostélico, à semelhança periciclo no processo de espessamento primário, do que foi descrito para S. polyantha (Martins & referido por Menezes et al. (2005), não foi Appezzato-da-Glória 2006). O periciclo de S. observado no material aqui analisado. subsessiliflora é formado por 3^1 estratos de células O cilindro vascular do rizofóro de 5. com paredes ligeiramente espessadas e a região medular, subsessiliflora é integrado por feixes colaterais conspícua, difere da raiz de S. japeganga em que envoltos por bainha esclerenquimática, no que esta região é pouco desenvolvida (Oli veira et al. 1973). difere do que foi descrito por Palhares & Silveira Smilax subsessiliflora apresenta grande (2005) para o rizoma de S. goyazana A. DC., em que proporção de grãos de amido compostos no os autores relatam a presença de uma endoderme periciclo e na região medular. Já em S. polyantha o com estrias envolvendo cada feixe vascular. amido está presente apenas na medula radicular Martins & Appezzato-da-Glória (2006) assinalam (Martins & Appezzato-da-Glória 2006). A ocorrência também a ocorrência de feixes vasculares envoltos de amido nos órgãos subterrâneos indica que os por células com paredes espessadas e lignificadas mesmos exercem a função de armazenamento, e que acumulam amido, no rizóforo de S. polyantha. pode estar relacionada com a sobrevivência do No rizóforo de S. subsessiliflora foi observada vegetal em condições adversas (Kolb etal. 1998). grande quantidade de metabólitos secundários, Nas células corticais das raízes laterais em S. dispersos por todo o órgão, sendo a maioria subessiliflora constatou-se a presença de representada por idioblastos fenólicos. Martins & endomicorrizas arbusculares. Segundo Akiyama et Appezzato-da-Glória (2006) constataram a presença al. (2005), a maioria das plantas vive em simbiose de idioblastos fenólicos apenas no cilindro vascular com fungos ou em associações com bactérias que do rizóforo de 5. polyantha. A ocorrência de otimizam sua nutrição. Fungos endomicorrízicos metabólitos secundários no gênero Smilax foi arbusculares (FMA) estabelecem associações igualmente assinalada por Cunha (1937), Oliveira simbióticas com as raízes em mais de 809r das plantas et al. (1973), Andreata (1980), Guaglianone & terrestres. Pouco se sabe, porém, sobre os mecanismos Gattuso (1991), Rugna et al. (2003), Palhares & moleculares que regulam essas associações, assim Silveira (2005), Martins & Appezzato-da-Glória como a respeito do reconhecimento entre fungos e (2006), e Silva (2006). Dentre estes metabólitos plantas hospedeiras (Akiyama et al. 2005). Após a secundários, as saponinas são consideradas como entrada das endomicorrizas arbusculares numa
Rodriguésia 61 (2): 181 -194. 2010 Sistema subterrâneo de Smilax subsessiliflora Duham. 193 célula epidérmica, o fungo se desenvolve e coloniza rizóforo de Smilax quinquenervia Vell. Boletim de o meio intercelular das células corticais, sem penetrar Botânica da Universidade de São Paulo 18: 39-51. na endoderme (Reinhardt 2007). Tal situação foi Appezzato-da-Glória, B. 2003. Morfologia de sistemas também observada na espécie em estudo. subterrâneos: histórico e evolução dos conhecimentos no Brasil. A.S. Pinto, Ribeirão Preto. 80p. O cilindro vascular da raiz lateral em S. Berlyn, G.P. & J.P. Miksche. 1976. Botanical microtechnique subsessiliflora é diarco e protostélico, no que difere and cytochemistry. The Iowa State University Press, de ordem. Diferenças também da raiz primeira Ames. 336p. ocorrem com relação à endoderme, em algumas que Bukatsch, F. 1972. Bermerkungen zur Doppelfarbung espessamento nas células apresentam paredes Astrablau-Safranin. Mikrokosmos 61: 255. externas e nas anticlinais. Acredita-se periclinais Cheadle, V.l. 1937. Secondary growth by means of a que a raiz adventícia, portadora de grande proporção thickening ring in certain monocotyledons. Botanical de grãos de amido, desempenharia, preferencialmente, Gazette 98: 535-555. a função de armazenamento. Já a raiz lateral, por suas Considine, J.A. & Knox, R.B. 1979. Development and características estruturais e pela associação com histochemistry of the cells, cell walls, and cuticle of endomicorrízas arbusculares, teria como função the dermal system of fruit of the grape, Vitis vinifera principal a absorção de água e de nutrientes. L. Protoplasma 99: 347-365. Espera-se com este estudo contribuir para Cunha, N.S. 1937. Da salsaparrilha a japecanga. Tribuna estudos futuros, como a análise ontogenética do Farmacêutica 5: 145-150. rizóforo, a fim de acompanhar seu desenvolvimento Cunha, N.S. 1940. As salsaparrilhas em face da farmacopéia brasileira. Tribuna Farmacêutica 8:105-112. e verificar se o meristema responsável pelo Demason, D.A. 1980. Localization espessamento do órgão é de origem primária ou of cell division activity in the thickening meristem mAUium secundária; e futuras pesquisas fitoquímicas, a partir primary cepa L. American Journal of Botany 67: 393-399. das análises histoquímicas realizadas, como registro Demason, D. A. 1983. The thickening meristem: de idioblastos fenólicos e amilíferos no rizóforo, primary definition and function in monocotyledons. o do órgão. revelando potencial químico American Journal of Botany 70: 955-962. Eames, A.J. & MacDaniels, L.H. 1947. Introduction to plant Agradecimentos anatomy. 2 ed. Book Company Inc., New York. 427p. À Agência de fomento CAPES, a concessão da Esau, K. 1974. Anatomia das plantas com sementes. Blucher, bolsa de mestrado à primeira autora e ao CNPq as Edgard São Paulo. 293p. bolsas de Produtividade em Pesquisa das demais Gerrits, P.O. & Smitd, L. 1983. 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Artigo recebido em 12/08/2009. Aceito para publicação em 04/03/2010.
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O significado cultural do uso de plantas da caatinga pelos quilombolas do Raso da Catarina, município de Jeremoabo, Bahia, Brasil The cultural significance ofuse of caatinga plants by Quilombolas ofthe Raso Catarina, Jeremoabo distríct, Bahia, Brazil
Vanusa Sousa Almeida'z & Fábio Pedro Souza de Ferreira Bandeira'
Resumo Uma das formas que os negros no Brasil criaram para enfrentar o regime escravocrata foi a formação de quilombos, dos quais centenas estão localizados no estado da Bahia, e vêm mantendo ao longo dos séculos conhecimentos e práticas de manejo sobre a flora local, ainda pouco estudados. Esta pesquisa visou determinar o valor local das espécies vegetais utilizadas pelos quilombolas do município de Jeremoabo, na região nordeste da Bahia, principalmente aquelas da caatinga. A coleta de dados se deu através de entrevistas semi- estruturadas e lista livre. Os entrevistados citaram 86 espécies que estão distribuídas em dez categorias de uso: medicinal, ritual ou religioso, construção, alimentação, combustível, veterinário, melífera, forrageira, comercialização e artesanato. As cinco espécies que tiveram o maior valor local, em ordem decrescente, foram: Gochnatia oligocephala (candeia), Myrcia sp. (araçá), Schinus terebinlhifolius (aroeira), Hymenaea courbaril (jatobá). Mimosa tenuiflora (jurema-preta). Os resultados dessa pesquisa, sobretudo as espécies vegetais de maior valor local identificadas, podem ser aplicados em programas de recuperação de áreas degradadas, desenho de sistemas agroflorestais e educação ambiental nas escolas locais. Palavras-chave: conservação, etnobotânica, quilombos, significado cultural. Abstract "quilombos". One ofthe ways that blacks in Brazil created to confront the regime of slavery was the formation of "quilombolas" This study aimed to determine the value of local plant species used in the of Jeremoabo district located in northeastern Bahia, especially the Brazilian species from the caatinga environment. Data collection was made through semi-structured interviews and free lists. The people interviewed cited 86 species that are distributed in ten use categories: medicinal, ritual or religious, building, food, fuel, veterinarian, honey, fodder. marketing and handicrafts. The five espécies that had the largest local value in descending order were: Gochnatia oligocephala (candeia), Myrcia sp. (araçáÀ Schinus terebinthifolius (aroeira), Hymenaea courbaril (jatobá), Mimosa tenuiflora (jurema-preta). The results of this research, especially the plant species of highest local value identified. can be applied in environmental restoration programs of degraded áreas, agroforestry design and environmental education in the local schools. "quilombos". Kev words: conservation, cultural meaning, ethnobotany,
Introdução cultural oferece possibilidade de fazer inferências O termo significado cultural é definido por sobre sistemas de nomenclatura tradicionais, Berlin et al. (1973) como o valor prático que R utilização, apropriação e importância dos recursos conhecimento biológico tem para uma determinada naturais (Garibay-Orijel et al. 2007). Alguns cultura, enquanto Hunn (1982) utilizou o termo para pesquisadores, em diversas partes do mundo, têm designar a importância ou papel que um táxon avaliado o significado cultural do uso de plantas, apresenta dentro de uma cultura. O significado Por exemplo, Berlin et al. (1973) relacionaram o
' Universidade Estadual de Feira de Santana. Depto. Ciências Biológicas Programa de Pós-Graduação em Botânica, Av. Universitária s/n. 44031 -460. Feira-de-Santana. BA. Brasil. : Autor para correspondência: vansoaKnyahoo.com.br 196 Almeida. V.S. & Bandeira. F.P.S.F. significado cultural de plantas com a retenção léxica degradação ambiental e mudanças socioculturais e entre os Tzeltal-Tzotzil; Stoffle et al. (1990) econômicas por que vem passando o semi-árido calcularam o significado cultural das plantas em nordestino, onde se encontra esse Bioma. comunidades indígenas americanas; e Pieroni (2001) A região do semi-árido possui uma população avaliou o significado cultural de plantas alimentícias que expressa uma grande diversidade cultural, na Toscana, Itália. formada por grupos étnicos diferenciados, Seguindo o desenvolvimento desse campo principalmente indígenas, quilombolas e da Etnobiologia, diversos métodos quantitativos campesinos, com costumes e modo de vida vêm sendo criados e testados para avaliar a tradicionais, detentores de conhecimento sobre a importância cultural das plantas e seus usos. Muitos biodiversidade que precisam ser conhecidos e desses métodos têm utilizado índices, como o índice valorizados. Entretanto, devido à grande de significado cultural (ISC), criado por Turner concentração de terra e prática extrativista (1988). Este foi formulado para calcular o valor ou (madeireira, agrícola e pastoril), a caatinga configura i nportância das espécies vegetais dentro de um um cenário de enorme desigualdade ao acesso dos grupo humano, que posteriormente foi adaptado recursos pelas diversas populações rurais. por Stoffle et al. (1990) e modificado por Lajones & Associa-se assim negativamente: a um quadro de Lemas (2001) que o denominaram de índice de valor aumento da pobreza; uma forte modificação da de importância etnobotânica (IVIE). Entretanto Silva cobertura vegetal, conduzindo à degradação etal. (2006), a partir da crítica feita por Phillips (1996) ambiental, à perdas irrecuperáveis para a ao índice ISC de Turner (1988). propõem um novo diversidade da flora e da fauna, ao aumento do índice para calcular o significado cultural de plantas processo de erosão, declínio da fertilidade do solo acrescentam outros elementos como o consenso e qualidade da água, bem como a desigualdade do informante, tentando desta forma eliminar o social e perda cultural (Sampaio & Batista 2004). caráter subjetivo das técnicas anteriores que O conhecimento local sobre os recursos privilegiavam a visão do pesquisador em detrimento vegetais que quilombolas. indígenas e campesinos têm a do informante. Colaço (2006) adaptou o índice produzido e mantido por gerações; vem chamando desenvolvido por Pieroni (2001) para plantas muito a atenção dos pesquisadores brasileiros alimentícias para criar o ISCPF - índice do significado Monteles & Pinheiro (2007), que investigaram os cultural de plantas forrageiras. Além desses índices, recursos vegetais relacionados às práticas Lawrenceé-ía/. (2005) desenvolveram um método que terapêuticas no Quilombo Sangrador no Maranhão; calcula índices quantitativos utilizando interpretação Franco & Barros (2006) determinaram o valor de "Valor de informação qualitativa, denominado Local", uso das plantas medicinais em comunidades negras que é utilizado para medir o significado cultural de Olhos D'água dos Pires no Piauí; Nascimento etal. plantas. Este método é muito utilizado para explorar (2001) estudaram as formas de uso e manejo de diferenças de valores entre homens e mulheres, entre espécies vegetais destinadas à construção de cercas índios e imigrantes e o efeito do contexto geográfico e em comunidades rurais no Pernambuco; Morais et econômico sobre a informação. al. (2005) trabalharam com os índios Tapebas no A utilização crescente desses índices em Ceará, identificando o acervo de plantas medicinais estudos etnobotânicos quantitativos possibilita a usado na cura das doenças; Rufino et al. (2008) realização de estudos comparativos entres diferentes investigaram a importância das palmeiras [Syagrus culturas bem como tipos de vegetação, ampliando corona ta e Orbignya phalerata) em uma também as bases para o desenvolvimento teórico comunidade que vive próxima ao Parque Nacional desse campo do conhecimento a partir da Vale do Catimbau, em Pernambuco: Colaço (2006) e descoberta de padrões gerais no uso, manejo e Bandeira (1996) trabalharam com os índios valoração cultural das plantas. Pankararé do Raso da Catarina/Bahia, abordando o Apesar da importância do bioma Caatinga, significado cultural dos recursos vegetais, sua onde se concentra uma parte da biodiversidade etnopedologia e etno-ecografia, respectivamente: brasileira, com altos índices de endemismo (Giulietti Albuquerque & Andrade (2002a) investigaram o et al. 2004), e do crescente número de estudos conhecimento botânico tradicional, enfocando etnobotânicos realizados nos últimos dez anos. ainda aspectos da percepção e manejo desses recursos se faz necessário ampliar os esforços nesse campo no bioma da caatinga, em uma comunidade rural de pesquisa, tendo em vista as tendências de situada no município de Alagoinha/Pcrnambuco.
Rodriguésia 61(2): 195-209. 2010 197 O significado cultural do uso de plantas da caatinga
Muitas dessas pesquisas têm demonstrado a de Jeremoabo (10°04'29"S; 38o21'02"W) e ficam importância da etnobotânica para conservação de aproximadamente a 35 km e 24 km, respectivamente, recursos e gestão da vegetação nas regiões tropicais da sede municipal. Jeremoabo situa-se na região (Albuquerque et al. 2009). Nesse contexto, ainda nordeste do estado da Bahia, distante de Salvador são escassos os estudos sobre etnobotânica em 371 km. Faz limite com os seguintes municípios: comunidades quilombolas no nordeste, sobretudo Canudos, Macururé, Pedro Alexandre, Santa Brígida, na Bahia, estado que apresenta o maior número Paulo Afonso, Rodelas, Novo Triunfo, Coronel João dessas comunidades em todo o país (Anjos 2000). de Sá, Pedro Alexandre e Sítio do Quinto. A formação de quilombos no Brasil foi uma Esta região é uma das mais inóspitas do "Polígono das frentes de resistência contra o regime estado, estando inserida no chamado escravocrata, definido este como o sítio geográfico das Secas" ou Semi-árido, definido como região que onde se agrupavam povos negros que se rebelavam apresenta índice pluviométrico anual abaixo de 800 contra o sistema escravista da época, formando mm (PDRS 2000). O clima da região, portanto, é comunidades livres (Anjos 2000). Embora o termo caracterizado como semi-árido, predominantemente quilombo tenha sido uma manifestação de seco, com temperatura mediai anual de 24°C, máxima contrariedade ao regime escravista (Carvalho 1995), de 28°C e mínima de 20,2°C. A pluviosidade média é a partir do texto do artigo 68 da Constituição anual é de 654 mm, máxima de 2273 mm e mínima de Federal de 1988 que o termo assumiu um novo 276 mm. As chuvas ocorrem nos meses de maio a significado, pois o mesmo é usado para designar a julho (SEBRAE 1995). situação dos segmentos negros em diferentes A área é coberta por uma vegetação do tipo regiões e contextos do Brasil, que ocupam terras caatinga que não se apresenta homogênea, mas em que resultaram da compra por negros libertos; da um mosaico descontínuo, com predominância da posse pacífica por ex-escravos de terras vegetação de aspecto arbóreo aberto, às vezes mais abandonadas pelos proprietários em épocas de crise denso ou mais rarefeito e de menor porte (PDRS econômica; da ocupação e administração das terras 2000). Apresenta também áreas de contato entre doadas aos santos padroeiros ou de terras cerrado-caatinga-floresta estacionai; cerrado- antigos entregues ou adquiridas por escravos caatinga além de caatinga arbórea sem palmeiras, organizados em quilombos. caatinga arbórea densa sem palmeiras, caatinga Muitos estudiosos propõem uma arbórea aberta com palmeiras (CEI1994). ressemantização do termo. Conforme assinalado pela Associação Brasileira de Antropólogos Caracterização das comunidades seria comunidade rural (ABA), quilombo qualquer As comunidades quilombolas estudadas, de afro-descendentes com manifestações e urbana Casinhas e Baixa dos Quelés, têm respectivamente culturais ligadas ao e ao se passado que, 35 e 104 famílias. São formadas por pequenos como a constituir e autodefinir quilombo, passa agricultores rurais, que para sustentar suas famílias ser reconhecido como tal (Fiabani 2005). vivem dos cultivos de subsistência, principalmente ampliação do De modo a contribuir com a da Manihot esculenta Crantz (mandioca), Phaseolus da etnobotânica de comunidades de conhecimento vulgaris L. (feijão), Zea mays L. (milho) e Mangifera no Brasil, esta visou determinar quilombos pesquisa indica L. (manga). Cada família possui sua própria índice desenvolvido o valor local, com base no por área de cultivo ou roças. Para completar a renda familiar, Lawrence et al. (2005), das espécies vegetais algumas famílias criam animais como gado, galinhas e utilizadas do de Baixa pelos quilombolas povoado porcos em unidades afastadas de suas casas, dos e Casinhas, em uma região altamente Quelés enquanto outros utilizam os quintais. No povoado a conservação da biodiversidade prioritária para Baixa dos Quelés há um grupo de pequenos do Bioma Caatinga (MMA 2002), o Raso da apicultores que utilizam a mata de mel. avaliar as diferenças de valor para produção Catarina, bem como O artesanato se restringe à confecção de esteiras, local entre as duas comunidades e entre os gêneros. vassouras e panela de barro para uso doméstico. As vassouras e esteiras são feitas com palhas de Syagrus Material e Métodos coronata (Mart.) Becc (Licuri ou pindoba), atividade Área de estudo esta realizada principalmente pelas mulheres. As duas comunidades quilombolas estudadas. As comunidades mantêm algumas práticas Casinhas e Baixa dos Quelés, pertencem ao município tradicionais de manejo dos recursos naturais. Os
Rodriguésia 61(2): 195-209. 2010 198 Almeida. V.S. & Bandeira. F.P.S.F. quilombolas da Baixa dos Quelés, por exemplo, realizadas oito visitas às comunidades durante o fazem uso de adubação orgânica (principalmente ano de 2008, com duração de 15 dias para cada estéreo de gado), enquanto que na comunidade visita. Inicialmente, aplicou-se um questionário com Casinhas há uma combinação de adubação química as lideranças locais para a caracterização sócio- e orgânica. Durante a coleta de madeira para econômica das comunidades. A obtenção das produção de lenha, os galhos mortos são preferidos. informações etnobotânicas foi feita através de O feijão e milho são conservados sob uma forma entrevistas semi-estruturadas, nas se "ariá", quais bastante peculiar chamado que consiste em interrogava sobre o uso e restrições de uso das misturar esses grãos a um barro, retirado próximo ao plantas, parte usada, e os fatores culturais, "toá". povoado, chamado localmente de Segundo geográficos e históricos relacionados à escolha os quilombolas, essa técnica permite a conservação dessas espécies como recursos vegetais. Também dos grãos por um período de quase dez anos. O se utilizou a lista livre, por meio de uma pergunta plantio de algumas espécies frutíferas é baseado na chave sobre as dez espécies mais importantes passagem da lua, com base na crença local de que utilizadas nos últimos dez anos, em ordem de essa prática garantirá a produção naquele ano. preferência (Lawrence etal 2005). Esta técnica visa Nas comunidades há presença de buscar informações específicas sobre um domínio manifestações religiosas de origem católica, matriz cultural da comunidade estudada, ou seja, um afro-brasileira e evangélica. As principais elemento culturalmente relevante seja delineado festividades de Casinhas são a festa de São pelo próprio informante, em sua linguagem, dando Jerônimo, que é o padroeiro do povoado, realizado possibilidade de fazer inferências sobre a estrutura no dia 28 de setembro, e o caruru de Santa Bárbara cognitiva do mesmo a partir da ordem em que que ocorre no dia 4 de dezembro. Estas festas são recorda e coloca os elementos na lista envolvidas por cânticos e danças, como a do coco (Albuquerque & Lucena 2004). Desta forma foi e o principá, que acompanhadas pelos ritmos dos possível observar os itens mais salientes, melhores instrumentos musicais (gaita, flauta, zabumba e conhecidos ou mais importantes, através da posição bandeiro), os participantes vivenciam momentos em que aparecem nas listas de citações. A partir da lúdicos e de devoção aos seus santos. Baixa dos ordenação realizada pelos informantes, os dados Quelés tem como padroeiro Santo Antônio e sua foram convertidos em um rank. Desse modo, uma festividade ocorre no dia do santo 13 de junho. planta que foi colocada na primeira posição pelo Nos dois povoados existem escolas de informante recebe score igual a 10. a planta de rank primeira a quarta séries, enquanto as séries 2 recebe score igual a 9, e assim sucessivamente; seguintes são cursadas na sede município de os táxons não mencionados recebem score igual a Jeremoabo. Muitos adultos foram alfabetizados zero. Os dados calculados a partir da lista livre foram nos últimos anos, diminuindo o índice de sistematizados, tabulados e analisados com relação analfabetismo no povoado. ao significado cultural de uso das plantas. Para isso O acesso aos postos de saúde é difícil, muitas aplicou-se o índice de significado cultural (valor pessoas quando não fazem uso de remédios local) segundo Lawrence etal. (2005), levando-se alopáticos utilizam as plantas para curar suas em conta as diferenças de gênero. doenças, ou associam as duas práticas médicas. Para participar da pesquisa, os seguintes As principais doenças listadas pelas lideranças critérios de inclusão foram considerados: ser locais foram: problemas gastrointestinais, quilombola, maior de dezoito anos e viver no sobretudo altos índices de doenças parasitárias nas quilombo pelo menos há dez anos. As casas crianças, pois não há esgotamento sanitário em uma dos moradores foram enumeradas e a partir de das comunidades, problemas respiratórios, cefaléia, uma tabela numérica aleatória os entrevistados diabetes, pressão alta, infecção no aparelho foram selecionados conforme o número que urogenital e depressão. correspondesse à numeração das casas. Quarenta e seis colaboradores participaram da pesquisa (23 Coleta de dados na comunidade de Casinhas e 23 em Baixa dos Antes de iniciar a pesquisa houve a leitura, Quelés), sendo 16 mulheres e 7 homens em cada para os colaboradores, do Termo de Consentimento comunidade. Segundo Wcller& Romney (1988), de Livre e Esclarecido e só após a aprovação dos 20 a 30 informantes são suficientes para definir um envolvidos a coleta de dados foi iniciada. Foram domínio cultural e, a partir disto, as informações se
Rodriguésia 61(2): 195-209.2010 199 O significado cultural do uso de plantas da caatinga repetem, ou seja, os itens pouco mudam e as listas combustível (9,3%), veterinário (5,8%), melífera tomam-se estáveis. A saturação de respostas bem (5,8%), forrageira (4,6%), artesanato (1,2%) e como a aceitação em participar da pesquisa foram os comercialização (1,1%). No geral, a maioria das critérios para definir o número total de entrevistados. espécies possui de uma a cinco categorias de uso. Com auxílio dos colaboradores locais, o Cunha & Albuquerque (2006) encontraram seis a material botânico citado foi coletado, depositado dez usos para quinze espécies. no Herbário da Universidade Estadual de Feira de A categoria melífera está associada às plantas Santana (HUEFS) e identificado com ajuda de percebidas pelos entrevistados com potencial especialistas ou por meio de comparação com melífero, tais como: Gochnatia oligocephala exsicatas. O sistema adotado para a classificação (candeia), Pityrocarpa moniliformis (quipé), de famílias foi o de Cronquist (1988). Byrsonima vacciniifolia (murici), Mimosa tenuiflora (jurema-preta), Anacardium occidentale Análise dos dados (cajueiro branco), Croton tricolor (sacatinga), etc; A fórmula do valor local (Mulher/Homem) é e que são visitadas pelas abelhas Apis mellifera L. "Oropa") dada pela equação: VTxc = E Tx/nx, onde para cada (Italianas ou durante o período da floração táxon (T), é calculado o valor local das plantas sendo associadas pelos entrevistados com a atribuídas pelas mulheres ou pelos homens (x) de produção do mel, fato registrado por um grupo de cada uma das comunidades (c), dividido pelo apicultores da comunidade Baixa dos Quelés. número total de mulheres ou homens (nx). Essas plantas são retiradas da mata próxima A fórmula do valor local de cada comunidade é ao povoado ou cultivadas nos quintais ou nos dada pela equação: VTc b 1/2 (E Tm/nm +1 Tf/nf), campos de cultivo (roças). Os quintais apresentam onde para cada táxon (T) é calculado o valor local das uma diversidade de elementos manejados, que vão plantas atribuído pelos homens (m), somado ao valor desde espécies de plantas nativas e cultivadas até local das mulheres (f) de cada comunidade (c). a criação de animais de pequeno porte, como Os resultados obtidos pelo valor local foram galinhas e porcos. "afligem testados através do teste normalidade Shapiro-Wilk. Para curar as doenças que à alma", Posteriormente, aplicou-se o teste t (Student) para categoria própria do sistema etnomédico local, avaliar se houve diferenças significativas do valor local algumas pessoas procuram rezadores e benzedeiras das plantas, entre os gêneros e entre as comunidades. que além das rezas, usam diversas plantas em seus procedimentos de cura. As principais plantas Resultados e Discussão utilizadas para estes fins são: Gochnatia oligocephala (candeia), Commiphora Os quilombolas das duas comunidades citaram leptophloeos (imburana), Jatropha sp. 86 espécies de uso local, que estão distribuídas entre (pinhão- manso), Jatropha ribifolia (pinhão-roxo), Capparis 34 famílias e 60 gêneros (Tab. 1). As famílias com sp. número maior de representantes foram: Leguminosae, (quebra-mandinga), Vanilla sp. (bonia), Protium heptaphyllum Euphorbiaceae, Myrtaceae, Lamiaceae e (amesca). Lippia thymoides Scoparia dulcis Anacardiaceae. Resultado bem próximo foi (alecrim), (vassourinha), Petiveria alliacea (cambabá). encontrado por Franco & Barros (2006) ao pesquisar Embora o valor local a maioria das o uso e diversidade de plantas medicinais em uma para plantas relacionadas aos rituais tenha sido baixo, à exceção comunidade quilombola do Piauí, na área de transição mista de da candeia e do alecrim, a quantidade de plantas entre cerrado e floresta decidual (Mata "males Babaçu), onde foram identificadas 85 espécies. Para utilizadas nos rituais para a cura dos área de caatinga Albuquerque et ai (2002b) espirituais" é alto (22,1%), em comparação, por encontraram 75 espécies, sendo dessas, 14 exemplo, ao resultado encontrado em comunidades introduzidas e Colaço (2006) 64 plantas. negras do Mato Grosso do Sul, onde apenas 9% "paus-do-mato", das 189 espécies citadas foram usadas com esta As plantas ou termo finalidade, através de banhos e utilizado pelos quilombolas estudados para de descarrego designar os vegetais de uma forma geral, estão benzeduras (Schardong & Cervi 2000). Em uma das distribuídas em dez categorias de uso, sendo que comunidades até pouco tempo atrás existia uma casa de candomblé de matriz as plantas para fins medicinais foram as mais citadas: (religião afrobrasileira), medicinal (75,6%), ritual ou religioso (22,1%), no entanto, com o falecimento da mãe de santo, os construção (19,8%), alimentação (15,1%), rituais cessaram, e possivelmente, muitos dos
Rodriguésia 61(2): 195-209.2010 200 Almeida. V.S. & Bandeira. F.P.S.F. conhecimentos etnobotânicos disseminados pelo o conhecimento sobre o uso desta planta como culto ficaram sedimentados no interior das veterinário não se encontra completamente comunidades. Camargo (2007) cita o cambabá disseminado na comunidade. Por outro lado. (Petiveria alliacea), uma das espécies usadas candeia é referida pelos quilombolas como uma ritualmente nas comunidades estudadas, como uma planta de uso múltiplo. Como lenha, por exemplo, planta ligada ao universo místico-religioso africano essa espécie é identificada juntamente com Myrcia no Brasil. No período escravagista essa planta, sp. (araçá) e Eremanthus capitatus (Spreng.) "amansa-senhor", também chamada era preparada MacLeish (come-cherem), como sendo de grande numa porção mágica e usada pelos escravos para importância. É bastante comum as três espécies deixar os seus senhores em estado de debilidade serem utilizadas para combustão de maneira como uma forma de defesa das mulheres negras combinada, na comunidade de Baixa dos Quelés. aos assédios dos seus patrões. principalmente durante o verão quando se encontram mais secas. Outro aspecto da candeia é a qualidade "poços" Valor local de plantas da caatinga da madeira para construção de (cercas) das O valor local total dos táxons nas duas roças e casas. Segundo os entrevistados, sua comunidades variou de 0,03 a 5,49 (Tab. 2). As durabilidade permite um tempo maior de duração, interferindo na escolha desta em detrimento dez espécies que tiveram o maior valor local, por planta comunidade, em ordem decrescente foram: das outras. Embora sendo uma espécie importante Casinhas - Gochnatia oligocephala (candeia - com grande espectro de uso e preferência, se 5,49), Hymenaea courbaril (jatobá - 3,87), observou que sua disponibilidade ainda é alta no Poincianella microphylla (catingueira - 2,88), local, pois a forma de coleta e manejo da planta pelos Lippia thymoides (alecrim - 2,70). Schinus quilombolas se dá de forma aparentemente terebinthifolius (aroeira - 2.23), Maytenus sp. sustentável. Por exemplo, não são retirados galhos apenas "galhos mortos" e. existe uma (pau-de-colher - 2,13), Anacardium occidentale jovens quando - do araçá (cajueiro branco - 2,06), Myrcia sp. (araçá 1.89), maior quantidade no ambiente, essa espécie Mimosa tenuiflora (jurema-preta - 1,61). é a preferida. Contudo, essa observação precisa ser avaliada estudos de ecologia de da Libidibia férrea (pau-ferro 1,54) e Cordia sp. por populações espécie na área. (pau-santo - 0,03) planta de menor valor local. houve diferenças significativas valor Para Baixa dos Quelés tem-se: G. oligocephala Não do (candeia - 4.83). Myrcia sp. (araçá - 4,07), 5. local de espécies entre mulheres de comunidades = = terebinthifolius (aroeira - 3,09), M. tenuiflora diferentes (t 0,29, p 0,76), bem como entre os = = (jurema-preta - 2,66). Cordia curassavica homens (t 0,18, p 0,85 )o fato de que para algumas de citações (caatinga-de-cheiro - 2,59), Miconiaferruginata espécies, o número acompanhou a DC. (babatenão - 2,48). Croton sp. (quebra-fação magnitude do valor local, isso é devido à influência - 2,30), A. occidentale (cajueiro branco - 2,02), do mesmo no cálculo desse índice. Plantas que Pisonia laxa (bandola - 1,63), L. thymoides foram mais citadas, geralmente, têm maior valor local, (alecrim - 1,55). Nesta área os menores valores entretanto, a ordem de citação na lista livre também influencia no cálculo do valor local (Tab. 2). locais foram de 0,03 para Gossypium sp. (algodão- criolo), Scoparia dulcis (vassourinha), e As dez plantas, em ordem decrescente de valor local, citadas mulheres foram: Plectranthus sp. (malva grossa). pelas - Mesmo não havendo diferenças significativas Gochnatia oligocephala (candeia 4,81). Myrcia - terebinthifolius entre as comunidades (t ¦ 0.26, p = 0,79) e entre os sp. (araçá 3,53). Schinus (aroeira - - (t = 0.27. = 0.78) os diferentes táxons 3,25), Miconiaferruginata (babatenão 2,88), gêneros p para - (resultado semelhante encontrado Colaço. 2006). Lippia thymoides (alecrim 2,53), Anacardium por - verifica-se G. oligocephala (candeia) é a occidentale (cajueiro branco 2.44). Poincianella que - espécie de maior valor local dentro de cada microphylla (catingueira 2,19), Maytenus sp. (pau- - 1,84), Hyptis - comunidade, tanto para os homens quanto para as de-colher peetinata (sambacathá - mulheres. Gochnatia oligocephala (candeia) e 1,63) e Cordia curassavica (caatinga-de-cheiro hcptuphyllum iamesed). Gossypium Pitxrocarpa moniliformis (quipé) foram as plantas 1,38). Prolium sp. Plectranthus sp. que apresentaram o maior número de usos (5). Quipé (algodão-criolo), (malva Cordia sp. (pau-santo) tiveram o menor difere da candeia pelo uso veterinário, entretanto, grossa) e local (0,03). apenas uma pessoa o indicou, o que faz inferir que valor
Rodriguésia 61(2): 195-209.2010 Tabela 1 - Espécies citadas na lista livre usada no cálculo do VL (valor local) pelos Quilombolas de Baixa dos Quelés e Casinhas. Categorias e formas de uso: A-Alimento; ° M-Mcdicinal; Mc-Mclífcra; C-Combustívcl; R-Ritual/religioso; CT-Construção; Cm-Comcrcialização; F-Forrageira; V-Veterinário; Ar-Artesanato. Table 1 - Espécies cited in the free list used in the calculation of VL (local value) by the Quilombolas from Baixa dos Quelés and Casinhas. Categories and types of use: A- §_ 0> cdible, M-medicinal; Mc-melliferous; C-fuel; R-ritual/religion; CT-construction; Cm-commerce, F-forage; V-veterinary; Ar- handicraft. g_ N Forma de g Nome vernáculo Nome científico Família Uso preparo fr I M O Leguminosae 0 Xarope ou chá - Acançu Periandra mediterrânea (Vell.) Taub. * ro O Alecrim/alecrinho Lippia thyntoides Mart. & Scherer Verbenaceae M, 5 Chá, lambedor. banho, defumador Algodão-criolo Gossypium sp. Malvaceae 0 Sumo Amesca Protium heptaphyllum March. Burseraceae M, 5 Defumador, torrar £¦ Angico Anadenanthera colubrina var. Cebil (Griseb.) Altschul Leguminosae C, 0 Chá, uso direto, lambedor Araçá Myrcia sp. Myrtaceae C, Me, M, CT Chá, uso direto Araçá-dc-moça Eugenia sp. Myrtaceae $ Uso direto Araticum Annona sp. Annonaceae M. $ Infusão Aroeira Schinus terebinthifolius Raddi. Anacardiaceae M. 5 Chá, infusão, banho Babatenão/babatenã Miconia ferruginata DC. Melastomataceae 0 Infusão, banho Bambão/mclancia-da- praia Solanum sp. Solanaceae 0 Lambedor Bandola/pandola Pisonia laxa Netto Nyctaginaceae M, 9 Infusão Bom-pra-tudo Indeterminada 1 0 Chá Bonia Vanilla sp. Orchidaceae M, 5 Chá, cheiro Braúna Schinopsis brasiliensis Engl. Anacardiaceae M, CT Lambedor, chá Catinga-de-cheiro Cordia curassavica (Jacq.) Roem. & Schult. Boraginaceae 0 Chá, banho Café-bravo/cafezeiro Erythroxylum sp. Erythroxylaceae CT, &