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Dissertação apresentada para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em História Contemporânea, realizada sob a orientação científica de Maria Fernanda Fernandes Garcia Rollo

AGRADECIMENTOS

«As palavras são boas. As palavras são más. As palavras ofendem. As palavras pedem desculpas. As palavras queimam. As palavras acariciam. As palavras são dadas, trocadas, oferecidas, vendidas e inventadas. As palavras estão ausentes. Algumas palavras sugam-nos, não nos largam: são como carraças: vêm nos livros, nos jornais, nos slogans publicitários, nas legendas dos filmes, nas cartas e nos cartazes. As palavras aconselham, sugerem, insinuam, ordenam, impõem, segregam, eliminam. São melífluas ou azedas. O mundo gira sobre palavras lubrificadas com óleo de paciência. Os cérebros estão cheios de palavras que vivem em boa paz com as suas contrárias e inimigas. Por isso as pessoas fazem o contrário do que pensam, julgando pensar o que fazem. Há muitas palavras.

E há os discursos, que são palavras encostadas umas às outras, em equilíbrio instável graças a uma precária sintaxe, até ao prego final do Disse ou Tenho dito. Com discursos se comemora, se inaugura, se abrem e fecham sessões, se lançam cortinas de fumo ou dispõem bambinelas de veludo. São brindes, orações, palestras e conferências. Pelos discursos se transmitem louvores, agradecimentos, programas e fantasias. E depois as palavras dos discursos aparecem deitadas em papéis, são pintadas de tinta de impressão – e por essa via entram na imortalidade do Verbo. Ao lado de Sócrates, o presidente da junta afixa o discurso que abriu a torneira do marco fontanário. E as palavras escorrem tão fluidas como o "precioso líquido". Escorrem interminavelmente, alagam o chão, sobem aos joelhos, chegam à cintura, aos ombros, ao pescoço. É o dilúvio universal, um coro desafinado que jorra de milhões de bocas. A terra segue o seu caminho envolta num clamor de loucos, aos gritos, aos uivos, envoltos também num murmúrio manso, represo e conciliador. Há de tudo no orfeão: tenores e tenorinos, baixos cantantes, sopranos de dó de peito fácil, barítonos enchumaçados, contraltos de voz surpresa. Nos intervalos, ouve-se o ponto. E tudo isso atordoa as estrelas e perturba as comunicações, como as tempestades solares.

Porque as palavras deixaram de comunicar. Cada palavra é dita para que não se oiça outra palavra. A palavra, mesmo quando não afirma, afirma-se. A palavra não responde nem pergunta: amassa. A palavra é a erva fresca e verde que cobre os dentes do pântano. A palavra é poeira nos olhos e olhos furados. A palavra não mostra. A palavra disfarça.

Daí que seja urgente mondar as palavras para que a sementeira se mude em seara. Daí que as palavras sejam instrumento de morte – ou de salvação. Daí que a palavra só valha o que valer o silêncio do acto.

Há também o silêncio. O silêncio, por definição, é o que não se ouve. O silêncio escuta, examina, observa, pesa e analisa. O silêncio é fecundo. O silêncio é a terra negra e fértil, o húmus do ser, a melodia calada sob a luz solar. Caem sobre ele as palavras. Todas as palavras. As palavras boas e as más. O trigo e o joio. Mas só o trigo dá pão.»

(Saramago, José, in Deste Mundo e do Outro. Lisboa: Editorial Caminho, 1997)

Porque as palavras simples não atraiçoam:

um singelo obrigado a todos os aqui se encontram presentes.

“A nacionalização que se deseja”

Notas para uma breve História da indústria cervejeira nacional: do às nacionalizações revolucionárias

Filipe Guimarães da Silva

RESUMO

PALAVRAS-CHAVE: indústria cervejeira, desenvolvimento industrial, nacionalizações, revolução portuguesa.

A presente dissertação enquadra teoricamente a análise da história da indústria cervejeira portuguesa numa visão sistémica das políticas de desenvolvimento à escala nacional, tendo em conta os contornos políticos e as opções essenciais. Esta indústria assume um papel de relevo, desde logo pela componente tecnológica e pelo tecido modernizador que lhe é conferido no contexto da indústria portuguesa de dimensão mais reduzida. Os impactos da industrialização tardia, insertos num quadro internacional no qual progredia a contraciclo, tiveram certamente o pendão contraproducente de exacerbar alguns problemas estruturais da economia portuguesa, sendo que o sector cervejeiro, apesar de se encontrar parcialmente desenquadrado desta realidade, carece de uma visão estratégica global. O papel do Estado enquanto agente económico merece uma atenção especial, tendo em conta os dois grandes períodos em análise – o Estado Novo e o PREC.

“A nacionalização que se deseja” Notes for a brief history of the portuguese brewing industry: from “Estado Novo” to the revolutionary nationalizations

ABSTRACT

KEYWORDS: brewing Industry, industrial development, nationalizations, portuguese revolution.

This dissertation fits theoretically the analysis of the portuguese brewing industry’s history in a systemic view of the development policies at national level, taking into account the political contours and the main options. This industry plays a major role for its technological component and modernizing industrial fabric which is given by the portuguese industry, although on an smaller scale. The impacts of late industrialization, inserted in an international framework in which Portugal counter-cyclically progressed, certainly had the counterproductive effect to exacerbate structural problems of the portuguese economy. The brewing industry, despite being partially unframed from this reality, lacks a strategic global vision. The role of the State as an economic agent deserves special attention, regarding the two great periods under review – “Estado Novo” and “PREC”.

Índice

Introdução ...... 1 1. As “cervejas de Salazar e Caetano” ...... 6 1.1. O longo “século XIX” ...... 6 1.2. Da concentração aos anos 50 ...... 9 1.2.1. A II Guerra Mundial, a abertura de mercados externos e o problema da cevada ...... 11 1.3. Reapetrechamento sectorial, actualização técnica e expansão dos anos 50 ...... 15 1.3.1. A indústria cervejeira e a lavoura nacional ...... 18 1.3.2. O potencial produtivo vs. consumo ...... 19 1.3.3. Industrialização ou surto industrial. O II Congresso da Indústria Portuguesa e o sector cervejeiro em equação ...... 21 1.4. A reorganização forçada por um convite inesperado: o sector cervejeiro e a abertura externa ...... 24 1.4.1. Na senda da investigação. As novas unidades industriais ...... 27 1.4.2. Balanço da indústria cervejeira no final da década e a nova abertura do condicionamento industrial ...... 29 1.5. Uma estabilidade relativa: os efeitos de um crescimento ilusório ...... 33 1.5.1. Diagnóstico sectorial de 1974. O IV Plano de Fomento ...... 34 1.5.2. Redes de interesses, grupos e monopolismo ...... 35 1.5.3. O sector cervejeiro e a economia portuguesa nas vésperas da Revolução .... 37 2. Economia da Revolução: contextualização ...... 42 2.1. Revolução e transformações ...... 42 2.2. Conclusões e indicadores económicos ...... 52 3. As nacionalizações ...... 55 3.1. Que plano de nacionalizações? ...... 56 3.2. As fases das nacionalizações ...... 59 3.2.1. Setembro de 1974 ...... 59 3.2.2. Março de 1975 ...... 60 3.2.3. Abril de 1975 ...... 63 4. A nacionalização da indústria cervejeira ...... 66 4.1. O processo reivindicativo e os conflitos sociais ...... 68

4.1.1. Do movimento reivindicativo de 31 de Janeiro ao pedido de nacionalização ...... 68 4.1.2. Guerra de comunicados ...... 72 4.1.3. As sequelas do 11 de Março ...... 76 4.2. Sobre o controlo operário na SCC ...... 80 4.3. A Comissão Administrativa ...... 83 4.4. Comissão de Análise e Inquérito ...... 85 4.4.1. Congelamento das contas bancárias – a primeira grande medida da Comissão de Análise e Inquérito ...... 87 4.4.2. As cervejas na hora da nacionalização. Os resultados do inquérito oficial ... 89 4.4.3. “Um capitalismo bem tirado”. A Sociedade Central de Cervejas como cabeça do grupo ...... 91 4.4.4. “Receita para um monopólio”. Os meandros das “operações” ...... 94 4.5.5. Outras situações ...... 100 4.5. Os trabalhos do Ministério da Indústria e Tecnologia ...... 104 4.6. Os processos nas restantes empresas ...... 107 4.7. A “nacionalização que se deseja” sempre se realiza ...... 110 4.8. Breve síntese do processo de reestruturação do sector ...... 112 Conclusão ...... 118 Fontes e bibliografia ...... 120 Fontes Primárias e Secundárias ...... 120 1. Arquivos e bibliotecas ...... 120 2. Publicações periódicas – boletins, jornais e revistas ...... 120

3. Documentação dos órgãos de soberania, da Administração Central e de departamentos governamentais ...... 122 4. Congressos ...... 124 5. Documentação empresarial ...... 124 6. Relatórios, balanços e contas ...... 125 7. Memórias, entrevistas, intervenções e livros de militares e políticos civis ...... 125 8. Outras fontes ...... 127 Fontes Orais ...... 128 Bibliografia ...... 128 1. Bibliografias, cronologias, dicionários e estatísticas ...... 128 2. Obras gerais e de enquadramento ...... 128

3. A indústria/industrialização portuguesa durante o Estado Novo ...... 129 4. Obras e estudos sobre o Processo Revolucionário Português ...... 131 5. Economia da Revolução ...... 133 6. Nacionalizações ...... 136 7. Movimentos sociais, sindicalismo e partidos ...... 138 8. Questões jurídicas e constitucionais ...... 138 9. Outra bibliografia ...... 138 10. Vídeo ...... 139

LISTA DE ABREVIATURAS

AICP – Associação da Indústria Cervejeira Portuguesa

BdP – Banco de Portugal

BESCL / BES – Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa / Banco Espírito Santo

BIRD – Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento / Banco Mundial

BPA – Banco Português do Atlântico

BTC – Balança de Transacções Corrente

CDS – Centro Democrático e Social

CERCOPIM – junção da Cergal, Copeja e Imperial

CIP – Confederação da Indústria Portuguesa

COPCON – Comando Operacional do Continente

CP – Caminhos de Ferro Portugueses

CRP – Constituição da República Portuguesa

CRSC – Comissão de Reestruturação do Sector Cervejeiro

CT – Comissão de Trabalhadores

CUCA – Companhia União de Cervejas de Angola

CUF – Companhia União Fabril

CUFP – Companhia União Fabril Portuense

D.L. – Decreto-Lei

DGCI – Direcção-Geral do Comércio Interno

EBC – European Brewery Convention

EBIC – EFTA Brewery Industry Council

EBWP – EFTA Brewers Working Party

EFTA – Associação Europeia de Livre Comércio

EKA – Empresa Angolana de Cervejas

FMI – Fundo Monetário Internacional

GATT – Acordo Geral de Tarifas e Comércio

GP – Grupo Cervejeiro Português

JSN – Junta de Salvação Nacional

MCI – Ministério do Comércio Interno

MDE/S – Movimento Dinamizador Empresa/Sociedade

MDP – Movimento Democrático Português

MES – Movimento Esquerda Socialista

MFA – Movimento das Forças Armadas

MIT – Ministério da Indústria e Tecnologia

MPLA – Movimento Popular de Libertação de Angola

MRPP – Movimento Reorganizativo do Partido Proletário

NOCAL – Nova Empresa de Cervejas de Angola

OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico

PCP – Partido Comunista Português

PIB – Produto Interno Bruto

PPD – Partido Popular Democrático

PREC – Processo Revolucionário em Curso

PRP – Partido Revolucionário do Proletariado

PS – Partido Socialista

SCC – Sociedade Central de Cervejas / Central de Cervejas

SEE – Sector Empresarial do Estado

SIL – Skol International

SIPSA – Skol International de Participações

TAP – Transportes Aéreos Portugueses

TLP – Empresa Pública de Telefones de Lisboa e Porto

TVR – Taxa de Variação Real

UDP – União Democrática Popular

VAB – Valor Acrescentado Bruto

FBCF – Formação Bruta de Capital Fixo

Introdução

Como as investigações são feitas de avanços e recuos, de constantes amadurecimentos intelectuais, com honestidade assumo o irrealismo operacional do estudo que me propus fazer na etapa inicial. De facto, a primeira hipótese levantada para o início dos trabalhos procurava analisar o processo das nacionalizações enquanto um todo, na óptica das relações, com um único sujeito colectivo – o Conselho da Revolução.

Iniciado o primeiro contacto com as fontes disponíveis, caí abruptamente numa realidade que me parecia imensa e ainda por desbravar no campo historiográfico. O que seria mais importante? Uma análise superficial das nacionalizações, que fizesse o levantamento da literatura existente complementada pela análise do Arquivo do Conselho da Revolução? Talvez não passasse de uma síntese, por muito conveniente que pudesse ser. Uma análise do impacto das nacionalizações nas estruturas laborais portuguesas da época, sob o prisma da História Social? Seria um desafio interessante, mas certamente inoperante para uma tese de mestrado. Ora, decidimos pela análise de um sector que fosse fortemente representativo da estrutura capitalista portuguesa num duplo sentido: primeiro, necessitava de estar imbuído das idiossincrasias do regime salazarista. E se o estava! A indústria cervejeira – objecto de estudo – era um dos principais potentados industriais do Estado Novo, na sua vertente monopolista e na sua relação com o poder político. Em segundo lugar, era ponto obrigatório constituir-se como fidedigno representante do processo nacionalizador de 1974-76. E aqui, também o era, fazendo uma ponte interessante entre o Estado Novo e a revolução que eclodiu no pós-25 de Abril, numa escala que o associava aos principais sectores nacionalizados, ainda que a sua nacionalização ocorresse apenas a 30 de Agosto de 1975.

Curioso, porém, é que a indústria cervejeira portuguesa terá sido a única indústria deste tipo a ser nacionalizada em todo o mundo até aos dias de hoje. Qual a racionalidade económica? Quais as razões por detrás desta decisão? Estas são algumas das perguntas que orientaram a investigação, mas que só podiam ser compreendidas se se realizasse uma contextualização estruturada do Estado Novo e do Processo Revolucionário em Curso.

O Estado da Arte, relevando as questões relacionadas com o desenvolvimento económico (estruturação industrial, ciência, tecnologia e inovação, internacionalização,

1 papel do Estado e modelos económicos) organiza-se em três grandes temáticas: (i) a industrialização durante o Estado Novo; (ii) as nacionalizações no contexto social, político e económico do período revolucionário português; (iii) a evolução/história do sector cervejeiro em Portugal.

A historiografia em torno do Estado Novo encontra-se, actualmente, bastante desenvolvida, ainda que na vertente económica escasseiem estudos sólidos de cariz sectorial, apesar dos excelentes trabalhos realizados sobre a industrialização e os seus mecanismos (Francisco Pereira de Moura1, José Maria Freire Brandão de Brito2, Maria Fernanda Rollo3), e no que diz respeito à génese e evolução dos grupos económico- financeiros (Américo Ramos dos Santos e outros4).

Para o período revolucionário, a literatura subdivide-se em quatro níveis: um primeiro, que comporta os textos de enquadramento, onde se incluem as secções relativas às nacionalizações, dos quais destacam-se a obras de António Reis (Portugal Contemporâneo e História de Portugal Contemporâneo) e José Mattoso (volume Portugal em Transe, de José Medeiros Ferreira), bem como o livro coordenado por Fernando Rosas sobre a transição portuguesa (Portugal e a transição para a democracia, 1974-1976), e outro coordenado por José Maria Brandão de Brito (O País em Revolução); de um segundo nível, consta a historiografia de contextualização político-social que examina as relações de natureza institucional, destacando-se as

1 MOURA, Francisco Pereira de et al. Estrutura da economia portuguesa. Sep. da Revista do Centro de Estudos Económicos, n.o 14. Lisboa: INE - Centro de Estudos Económicos, 1954; MOURA, Francisco Pereira de et al., Estudo Sobre a Indústria Portuguesa. II Congresso da Indústria Portuguesa. Lisboa: Bertrand, 1957; MOURA, Francisco Pereira de. Reorganização das Indústrias, Estudos de economia aplicada 14. Lisboa: Associação Industrial Portuguesa, 1960; MOURA, Francisco Pereira de. Planeamento Industrial e Desenvolvimento Regional, 2 vols. Lisboa: A.E. ISCEF, 1967; MOURA, Francisco Pereira de. Por onde vai a economia portuguesa? Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1969. 2 BRITO, José Maria Brandão de. Industrialização portuguesa no pós-guerra (1948-1965): o condicionamento industrial. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1989; BRITO, José Maria Brandão de (coord). Do marcelismo ao fim do império. Lisboa: Editorial Notícias, 1999; BRITO, José Maria Brandão de (coord.). Engenho e Obra. Uma abordagem à História da Engenharia em Portugal do século XX. Lisboa: Dom Quixote, 2002). 3 ROLLO, Maria Fernanda. “A Indústria Nacional”, in História de Portugal: o Estado Novo (1926-1974), ed. José MATTOSO, vol. 7, 8 vols. Lisboa: Estampa, 1998; ROLLO, Maria Fernanda. “A industrialização e os seus impasses”, in História de Portugal: o Estado Novo (1926-1974), ed. José MATTOSO, vol. 7, 8 vols. Lisboa: Estampa, 1998; BRITO, José Maria Brandão de e ROLLO, Maria Fernanda. “Ferreira Dias e a Constituição Da Companhia Nacional De Electricidade”, in Análise Social xxxi, n.º 130–137 (1996): 343–354. 4 SANTOS, Américo Ramos dos. “Abertura e bloqueamento da economia portuguesa”, in Portugal Contemporâneo, 1958-1974, ed. REIS, António, vol. V. Lisboa: Publicações Alfa, 1989; SANTOS, Américo Ramos dos. “Desenvolvimento monopolista em Portugal: estruturas fundamentais”, in Análise Social XIII, n.º 49 (1977): 69–95; RIBEIRO, José Félix et al. “Grande indústria, banca e grupos financeiros”, in Análise Social XXIII, n.º 99 (1987): 945–1018; LISBOA, Manuel. A Indústria Portuguesa e os seus dirigentes. Lisboa: Educa, 2002.

2 excelentes investigações de Kenneth Maxwell5 e, mais recentemente, de Maria Inácia Rezola6; no domínio económico, salientam-se Augusto Mateus7, José da Silva Lopes8 e Ernâni Rodrigues Lopes9, com trabalhos de dimensão temporal alargados e, numa perspectiva de compreensão da estrutura capitalista portuguesa, surgem necessariamente os trabalhos de Maria Belmira Martins10; por fim, a questão das nacionalizações encontra-se ainda por explorar na sua multitude de domínios (história social11, história empresarial, história dos organismos ministeriais), o que se comprova pela escassa produção historiográfica neste sentido (apenas secções de livros em obras gerais12, e uma obra de natureza sociológica de José Manuel Leite Viegas13). Só a recente tese de doutoramento de Ricardo Noronha (2011), sobre a nacionalização da banca, veio reabrir as linhas de investigação neste domínio.

A existência de diversas obras de memórias e depoimentos enriquece a historiografia em torno da revolução portuguesa. No entanto, há que distingui-las em dois grupos: memórias e/ou depoimentos de participantes ou observadores primários do

5 MAXWELL, Kenneth. A construção da democracia em Portugal. Lisboa: Presença, 1999. 6 REZOLA, Maria Inácia. Os militares na revolução de Abril: o Conselho da Revolução e a transição para a democracia em Portugal, 1974-1976. Lisboa: Campo da Comunicação, 2006. 7 MATEUS, Augusto. “O 25 de Abril, a transição política e as transformações económicas”, in O País em Revolução. Lisboa: Editorial Notícias, 2001. 8 LOPES, José da Silva. A economia portuguesa desde 1960. Lisboa: Gradiva, 1996; LOPES, José da Silva. “Portugal e a transição para a democracia: que modelo económico?”, in Portugal e a Transição para a Democracia (1974-1976). Lisboa: Colibri, 1999. 9 LOPES, Ernâni Rodrigues. “O desenvolvimento económico-social desde o pós-guerra 45 e a integração europeia. Dilemas portugueses”, in Portugal e a Europa: 50 anos de integração. Lisboa: Verbo, 1996. 10 MARTINS, Maria Belmira. Sociedades e grupos em Portugal. Lisboa: Estampa, 1973; MARTINS, Maria Belmira e ROSA, José Chaves. O grupo Estado: análise e listagem completa das sociedades do sector público empresarial. Lisboa: Edições Jornal Expresso, 1979. 11 SANTOS, Maria de Lourdes Lima dos, LIMA, Marinús Pires de e FERREIRA, Vítor Matias. O 25 de Abril e as lutas sociais nas empresas. Lisboa: Afrontamento, 1977; LIMA, Marinús Pires de et al. “Controlo operário em Portugal (I)”, in Análise Social, n.º 47, 1999: 765–817; LIMA, Marinús Pires de et al. “Controlo operário em Portugal (II)”, in Análise Social, n.º 48, 1999: 1049–1146; PATRIARCA, Fátima. “Que justiça social’”, in Portugal e a Transição para a Democracia (1974-1976). Lisboa: Colibri, 1999. Resurgiu, recentemente, o interesse por estas linhas de investigação, como provam as teses de Miguel Ángel Pérez Suárez (Contra a exploração capitalista. Comissões de trabalhadores e luta operária na revolução portuguesa, 1974-1975) e de Diego Palacio Cerezales (O poder caiu na rua: crise de Estado e acções colectivas na revolução portuguesa). 12 LEÃO, Emanuel Reis. “Das transformações revolucionárias à dinâmica europeia”, in Portugal Contemporâneo, 1974-1992, vol. 6, ed. REIS, António. Lisboa: Publicações Alfa, 1990, pp. 173–183; FERREIRA, José Medeiros. Portugal em Transe, vol. VIII História de Portugal, dir. José Mattoso. Lisboa: Editorial Estampa, 1994; FRANCO, António de Sousa. “Economia,” in Portugal, 20 anos de Democracia, ed. REIS, António. Lisboa: Círculo de Leitores, 1994. 13 VIEGAS, José Manuel Leite. Nacionalizações e privatizações, Elites e cultura política na história recente de Portugal. Oeiras: Celta, 1996.

3 25 de Abril de teor ensaístico; e a recolha de testemunhos de natureza historiográfica, nomeadamente a que foi conduzida por Maria Manuela Cruzeiro14.

A presente investigação segue uma estratégia multidisciplinar (porque o objecto assim o compele) de utilização sistemática de fontes primárias em várias frentes e que interceptam segmentos analíticos de várias ordens – história industrial/empresarial, história do movimento operário e dos conflitos sociais, história dos organismos oficiais estatais e militares, história da ciência, inovação e tecnologia e história das relações internacionais/política internacional –, naquilo que pretende ser uma história de dinâmicas, não tão preocupada com as correntes interpretativas teleológicas. Feita esta declaração de princípios, não significa, naturalmente, que a análise e interpretação do objecto em questão não esteja marcada por factores inerentes à evolução intelectual do investigador no decorrer deste período.

Uma breve referência para os arquivos consultados, que foram da maior relevância no intuito de obter informações sobre o processo de nacionalização. Cita-se aqui o Arquivo do Conselho da Revolução, essencial para a recolha de documentação associada às Comissões de Trabalhadores e à Comissão de Análise e Inquérito; também o Arquivo Central da Secretaria da Presidência do Conselho de Ministros e o Arquivo Contemporâneo do Ministério das Finanças. Outros fundos documentais existentes na Associação Industrial Portuguesa, na Direcção-Geral das Actividades Económicas e no Departamento de Prospectiva e Planeamento, foram proveitosos para a realização da tese.

Realizado, de forma sucinta, o estado da questão, é perfeitamente observável a carência de investigações científicas sobre a temática no domínio da História. Este trabalho procura constituir, declaradamente, um ponto de partida e uma proposta teórica de pesquisa (em aberto) para a realização, a longo prazo, de uma História das nacionalizações em Portugal durante o PREC, que carece ainda de investigações científicas estruturadas, num projecto que defendo ser urgente realizar ao nível sectorial e numa dialéctica não autocentrada nas nacionalizações.

***

14 CRUZEIRO, Maria Manuela. Costa Gomes: o último marechal. Lisboa: Editorial Notícias, 1998; CRUZEIRO, Maria Manuela. Vasco Gonçalves: um general na Revolução. Lisboa: Notícias editorial, 2002; CRUZEIRO, Maria Manuela. Melo Antunes: o sonhador pragmático. Lisboa: Notícias, 2004; CRUZEIRO, Maria Manuela. Vasco Lourenço: do interior da Revolução. Lisboa: Âncora Editora, 2009.

4 A estrutura da tese é necessariamente cronológica, dividida em quatro capítulos temáticos. O primeiro faz uma retrospectiva que, dadas as limitações da tese, é incompleta, da indústria cervejeira durante o Estado (entre 1934, data da concentração industrial, e 1974). Aqui será abordada a génese desta indústria em Portugal e o seu desenvolvimento no contexto da evolução da economia nacional. A análise radica em quatro pontos-chave: (i) concentração industrial; (ii) investimento/reapetrechamento; (iii) reorganização sectorial e (iv) expansão.

No segundo capítulo é apresentada, num formato de síntese, a evolução dos acontecimentos fundamentais do período revolucionário português e os movimentos de continuidade e de ruptura, suportados pela utilização de dados estatísticos. Entretanto, no capítulo 3, entramos num campo de análise mais exclusivo – nacionalizações –, antecâmara do 4º capítulo, onde se analisa de forma mais particularizada o objecto de estudo, através da exposição do processo reivindicativo na Sociedade Central de Cervejas e das suas consequências imediatas – intervenção estatal e processos análogos – e a longo prazo – nacionalização e reestruturação do sector cervejeiro.

5 1. As “cervejas de Salazar e Caetano”

1.1. O longo “século XIX” A indústria cervejeira em Portugal – em moldes modernos – remonta ao início do século XIX, sendo indicada a Real Fábrica de Cerveja e Genebra do Valle Pereiro, pertencente a Claude Sauvinet, como a primeira digna de registo. As primeiras unidades de fabrico de cerveja caracterizavam-se pela sua reduzida dimensão, descapitalização, produção local e pelo uso de equipamento rudimentar e obsoleto, cujas propriedades pertenciam, de forma geral, a cidadãos estrangeiros. Reconhecem-se as seguintes fábricas no século XIX15:

i. Fábrica pertencente a Jacques Maillard: rua Flor da Murta (1833); ii. Fábrica da Cerveja Trindade, de Manuel Moreira Garcia: Lisboa (1834); iii. Michael Gerards & C.ª: rua do Tesouro Velho (1855). Mais tarde transferida para terreno da Casa de Bragança, alugada a John Henri Jansen, sócio de Michael Gerards, passando a denominar-se Fábrica de Cerveja Jansen; iv. Fábrica de Cerveja Leão, propriedade de José Varela e Jacinto Franco (ex- empregados da Jansen) e de António Monteiro: interior de um pátio de Arroios (1878); v. Fábrica da Piedade, de Maximiliano Schreck e Frederico Vintchel: rua da Piedade, Porto (1883).

A situação de concorrência verificada era prejudicial para as empresas, daí que algumas fábricas da zona do Porto tenham concordado a concentração das mesmas, formando a Companhia União Fabril Portuense, SARL a 7 de Março de 1890, com um capital inicial de 125 contos de réis. A sociedade é o resultado da fusão de seis fábricas cervejeiras da região do Porto – Fábrica Piedade (fábrica central), Fábrica do Melo, M. Achvek & C.ª, J.J. Chentrino & C.ª, J.J. Persival & C.ª, M. Schreck – e a Fábrica de Ponte da Barca. Em 1889, o inquérito industrial registava um capital fixo de sete contos de réis, treze trabalhadores, com produção anual de cerveja e gasosa de 90 mil dúzias e 4 mil litros de licores e outras bebidas. A facturação seria cerca de 9 contos e 200 mil réis, sendo que os salários oscilavam entre os 240 e os 400 réis por dia, com o número

15 II CONGRESSO DA INDÚSTRIA PORTUGUESA. II Congresso da Indústria Portuguesa, Relatórios de Sectores Industriais 0/3, vol. 4, 9 vols. Lisboa: s.n, 1957.

6 médio de 200 dias/ano de trabalho e cerca de 13 horas/dia no Verão e 10 horas/dia no Inverno. Há que destacar, ainda, a existência de duas fábricas de cerveja nas ilhas: uma na Madeira, Empresa de Cervejas da Madeira, que surgiu em 1872 pela mão de Henry Price Miles; e a Fábrica de Cervejas e Refrigerantes João de Melo Abreu, criada em 4 de Maio de 1892, nos Açores.

Logo no início do século é fundada a Companhia de Cervejas (1903), para onde entra a Fábrica Leão que, em 1912, passa a denominar-se Germânia e, em 1916, Portugália (já nas instalações da Almirante Reis). Em 1921, após a construção de uma malteria destinada à produção de malte a partir de cevadas nacionais, adopta o nome de Companhia Produtora de Malte e Cerveja Portugália, com capital social de 3 500 contos. Em 1922, a própria Portugália decide a criação da Empresa Produtora de Garrafas, preconizando já o tipo de política que mais adiante encontraremos.

A CUFP vai, entretanto, reorganizando o seu funcionamento, nomeadamente através do encerramento de algumas fábricas, como a da Ponte da Barca e sobretudo com a incorporação de técnicos alemães na empresa. Já no regime republicano, a Fábrica da Piedade e a Fábrica do Leão acordam a repartição do capital social, passando a CUFP a possuir duas fábricas em regime de concorrência, ainda que a última estivesse destinada a produzir para Marrocos. Por esta altura, os lucros com a exportação para as colónias representavam cerca de 20 865$00.

Em 1919, forma-se a Sociedade de Cervejas (capital social de 100 contos), sucedida posteriormente pela Companhia de Cervejas Estrela (capital social de 720 contos). A fabricação de cerveja fica a cargo de um anterior técnico da Portugália, Richard Eisen. Em 1923, a Companhia de Cervejas Estrela coloca na rua, de forma inédita, os novos carros de distribuição que são puxados por três muares16.

No campo social, realça-se a admissão da mão-de-obra feminina no rescaldo da I Guerra Mundial, em 1920, embora ainda a título experimental, num contexto de expansão da CUFP, que acabará por entrar em concorrência na zona norte do país com o sector cervejeiro de Lisboa a partir de 1926. Noutro âmbito, esta data marca a distinção internacional da indústria cervejeira, pela vitória do Grand Prix, e a conquista de três medalhas de ouro. Segue-se, em 1927, o lançamento da Super Bock. Finalmente, em Março de 1922, é formada a Companhia de Cervejas de (capital social de 300

16 MARTINS, Américo. Central de Cervejas: 50 Anos de actividade. Lisboa: Central de Cervejas, 1985.

7 contos), na avenida Navarro, que inicia a laboração dois anos mais tarde. Contabilizam- se as seguintes unidades fabris no ano de 1925:

i. Companhia Produtora de Malte e Cerveja Portugália ii. Companhia de Cervejas Estrela iii. Fábrica de Cervejas Trindade iv. Fábrica de Cerveja Jansen v. Companhia de Cervejas de Coimbra vi. Companhia União Fabril Portuense

Através de um relatório apresentado ao II Congresso da Indústria Portuguesa em 1957 por Sebastião José de Oliveira – engenheiro da SCC –, ficamos a conhecer as principais dificuldades que o sector enfrentava no início dos anos 30:

“[O] mercado português era demasiado pequeno para tanta fábrica, e baixas as possibilidades de todos os produtores de cerveja para a poderem exportar, tendo-se tornado, por isso, muito forte a concorrência entre eles”, sendo que os clientes aproveitavam-se exigindo descontos sobre descontos sem que o consumidor ganhasse algo. Além do mais, “a diferença entre o preço do custo da cerveja e o da venda ao público era absorvido, quase por completo, pelos intermediários”, daí a necessidade urgente de crédito por parte das empresas17.

Parece, no entanto, que esta afirmação acaba por absorver desde o seu início a explicação dogmática dos benefícios da concentração, ainda para mais veiculada por alguém que representava os interesses da maior e principal produtora de cervejas nacional. Os problemas não se cingiam apenas a questões concorrenciais conjunturais, mas sim a uma questão estrutural mais complexa, explicada também pelo atraso tecnológico das fábricas em questão e da não articulação com sectores agrícolas essenciais à produção, aliada ao problema crónico do mercado nacional e à falta de consumidores (até pela novidade do produto e pela preferência por bebidas vinícolas). A própria depressão económica destes anos agravou a situação, daí que se tivesse estabelecido um convénio, em 1930, para evitar a concorrência desleal, cuja duração foi muito fugaz. Assim, em 1933, as fábricas estavam às portas da falência, com excepção da Portugália que havia realizado uma série de negócios durante a I Guerra Mundial, granjeando-lhe algumas reservas financeiras.

17 II CONGRESSO DA INDÚSTRIA PORTUGUESA. II Congresso da Indústria Portuguesa, Relatórios de Sectores Industriais 0/3,4. Lisboa: s.n, 1957, pp. 5-6.

8 1.2. Da concentração aos anos 50 É a imagem de uma guerra suicida que é necessário ter em conta e que explica, por um lado, a necessidade de concentração empresarial que ocorre a 21 de Junho de 1934, marcando um ponto de viragem no seio do sector cervejeiro português. Da lista de fábricas anteriormente apresentada, só a Companhia União Fabril Portuense recusava este cenário, sendo que todas as outras se associaram na Sociedade Central de Cervejas (onde se impõem os interesses da família Vinhas, detentora da Portugália), apesar de a Fábrica Trindade ser desmantelada e a Jansen cessar o fabrico, encerrando em 1936. No fundo, o tipo de funcionamento é um modelo aperfeiçoado das várias tentativas de convénios que haviam sido testadas e que assentavam na divisão regional do mercado e fixação de preços, numa espécie de regime cartelizado ou até monopolista.

O primeiro Conselho de Administração da Sociedade Central de Cervejas é eleito em Julho do mesmo ano, com a seguinte composição: António Marques de Freitas (Portugália), Camilo Infante de la Cerda (Jansen), Cândido Sotto Mayor (Coimbra), Estolano Dias Ribeiro, José Maria Dias Ferrão e M. H. de Carvalho Ltd.ª (Estrela). O capital inicial perfilhava os 100 000 escudos, divido do seguinte modo: Portugália e Estrela com 40,9%, Jansen com 10,2% e Coimbra com 8%18.

O mesmo Sebastião José de Oliveira, seguindo a lógica do seu discurso, vangloria o tipo de concentração efectuado, por ter sido consumado livremente e sem a intervenção do Estado, “numa época em que poucas pessoas consideravam necessário o condicionamento da indústria e muito menos a concentração”19. De facto, o grau de concentração na indústria transformadora no final da década de 30 era insignificante, constituindo o sector cervejeiro uma das excepções – juntamente com as indústrias de base e tabacos, que por sinal registavam os valores de formação bruta de capital fixo mais elevados –, servindo, inclusive, como exemplo a seguir para futuras concentrações industriais (cf. tabelas seguintes).

Grau de concentração da indústria cervejeira (1937-1939) N.º de N.º de N.º de operários por Valor do equipamento industrial (1938; fábricas operários fábrica 103 escudos) 5 707 141 7 000

18 MARTINS, Américo. Central de Cervejas: 50 Anos de actividade. Lisboa: Central de Cervejas, 1985, p 27. 19 II CONGRESSO DA INDÚSTRIA PORTUGUESA, II Congresso da Indústria Portuguesa, Relatórios de Sectores Industriais 0/3,4. Lisboa: s.n, 1957, p. 7.

9 Grau de concentração da indústria transformadora (1937-1939) Grupos segundo o n.º de operários por N.º de Percentagem do n.º de fábricas no fábrica fábricas total Mais de 400 6 0,14 De 200 a 399 28 0,65 De 100 a 199 598 13,86 De 50 a 99 156 3,62 De 20 a 49 1 299 30,11 De 10 a 19 1.599 37,07 Menos de 10 628 14,56 Totais 4 314 100

Nota: Tabelas adaptadas de ROLLO, Maria Fernanda. “A indústria nacional”, in História de Portugal: o Estado Novo (1926-1974), ed. José Mattoso, vol. 7, 8 vols. Lisboa: Estampa, 1998

Curiosamente, a indústria da cerveja, à semelhança de outros sectores que caminhavam na direcção da monopolização industrial, não tinham, de todo, a chancela de organismos corporativos, sendo justificado, de acordo com Fernanda Rollo, pelo facto de a organização corporativa apresentar-se como um “instrumento fundamental para a cartelização da «infantaria empresarial»”20, onde o Estado teria urgência de tratar dos vários conflitos nas indústrias menos concentradas.

As informações sobre o sector cervejeiro nesta fase inicial são ainda muito escassas, tal como a existência de dados estatísticos. Ainda assim, no tocante à produção é possível observar os números relativos aos anos de 1932-1934 e de 1938, percebendo, desde logo, a natureza incipiente da produção no início da década e a grande alteração que o ano de 1938 nos dá a conhecer.

Ano Produção continental (litros) 1932 203 957 1933 184 800 1934 176 402 1938 6 528 381

Nota: Tabela construída com base nos dados da Indústria Portuguesa (n.º 85, VIII, Março de 1935, p. 60; n.º 143, XIII, Janeiro de 1940, pp. 51-53)

A Lei n.º 1956 do Condicionamento Industrial, de 1937, veio reforçar a política de concentração e a limitação da concorrência, pela capacidade do poder estatal autorizar ou recusar a implantação de novas indústrias e a introdução ou substituição de maquinaria, fazendo notar a corporatização como produto do Estado. Não negligenciando as suas lógicas diferenciadas, nos sectores industriais com maior grau de

20 ROLLO, Maria Fernanda. “A Indústria Nacional,” in História de Portugal: o Estado Novo (1926- 1974), ed. António Reis, vol. 7, 8 vols. Lisboa: Estampa, 1998.

10 concentração, a política de condicionamento industrial constituiu, segundo Fernanda Rollo, “um estímulo real à implementação ou defesa da concentração”21. O grau de consensualidade é geral neste período, apenas surgindo uma ou outra voz de fundo, que se insurge em algumas matérias. A validação destes argumentos é perfeitamente justificada pela análise do condicionamento industrial na indústria cervejeira portuguesa, seguindo de perto a evolução que Brandão de Brito propõe22. Assim, para o final do decénio de 30, surge apenas um pedido de instalação, prontamente recusado pela Direcção-Geral da Indústria:

Ano Empresa Motivo Informações Boletim António Vahia de Castro (representante Pedido de Fabrica de cerveja e 15-09-1937 de grupo financeiro) instalação refrigerantes Portugália, Estrela, Coimbra, Jansen e Contra António Reclamação 20-10-1937 1937- CUFP Vahia de Castro 1938 António Vahia de Castro (representante Despacho Indeferido 29-06-1938 de grupo financeiro) ministerial Despacho Deferido (laboração Portugália 29-06-1938 ministerial na Almirante Reis)

Nota: tabela construída com base nos dados do Boletim da Direcção-Geral da Indústria

Contudo, a luta pelo mercado interno continuou entre a Sociedade Central de Cervejas e a Companhia União Fabril Portuense, a primeira situada a Norte e a segunda no Centro e Sul do país, não impedindo, porém, que estabelecessem um acordo comercial sobre os preços e condições de venda, bem como o regime de permuta de informações técnicas.

1.2.1. A II Guerra Mundial, a abertura de mercados externos e o problema da cevada

A II Guerra Mundial veio pôr a nu as dificuldades que se faziam sentir na indústria nacional, e o sector cervejeiro não escapou. Por outro lado, abriu um novo horizonte aos industriais do sector no que diz respeito às novas possibilidades de exportação. A Guerra obrigou a indústria da cerveja a recorrer a sucedâneos, como a farinha de pau, trinca e o mosto de vinho, que exigiam vários tratamentos correctivos, sendo para esse efeito criada a marca Nevália, com o intuito de proteger as outras

21 Ibid. 22 BRITO, José Maria Brandão de BRITO. Industrialização portuguesa no pós-guerra (1948-1965): o condicionamento industrial. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1989.

11 marcas relativamente à fraca qualidade das matérias-primas. Os efeitos da guerra foram também visíveis na indústria vidreira nacional, arrastando consigo o sector das cervejas, dada a sua ligação. No campo legislativo promulgaram-se, durante o período, despachos que autorizaram a exportação temporária de garrafas de vidro normais acondicionando cerveja (D. L. n.º 31.983, de 27-4-1942; n.º 32.601, de 30-12-1942; n.º 33.449, de 27- 12-1943, n.º 33.740, de 28.06.1944; n.º 34.341, de 28-12-1944). As cevadas nacionais, quando usadas, eram irregulares e de má qualidade e a importação das mesmas sofreu restrições muito fortes durante o período balizado pela guerra, como comprova o estudo de alguns documentos da época. É o que nos mostra uma carta enviada pela direcção da Associação Industrial Portuguesa ao ministro das Finanças, após a análise de um pedido da Portugália:

“Carece aquela Empresa para a laboração da sua fábrica, de cerca de 1.000 toneladas de malte que habitualmente importava da Checoslováquia e da Dinamarca, em períodos normais (...). Dadas as dificuldades presentes em consequência do estado de guerra na Europa, contava aquela empresa, no corrente ano, proceder à maltagem na sua fábrica, de cerca de 1.000 toneladas de cevada nacional. Acontece, porém, que chegada agora a época das colheitas se verifica que a produção de cevada no país foi insignificante, não chegando sequer para as necessidades mais urgentes da lavoura e da pecuária (...).

“[Solicitou a interferência da AIP junto do Governo] no sentido de vir a ser permitida em face das circunstâncias apontadas, e ter de adquirir aquele produto em países muito distantes, o que muito o onera, em virtude do agravamento dos preços dos fretes marítimos e seguros de guerra, visto não poder importá-lo de onde habitualmente o fazia – a sua importação isenta de direito ou, na impossibilidade de ser obtida essa concessão, apenas com a aplicação de um simples direito estatístico mínimo”. 23

Esta carta remete ainda para um velho problema da indústria cervejeira – a produção nacional de cevada –, problema este que começa já a ser pensado nesta época, mas cujos avanços só se darão após o término da guerra e, de forma mais vincada, na década de 60. Já em 1936, os representantes das fábricas de cervejas tinham refutado as alegações de uma comissão de agricultores que exigia a adopção de medidas que obrigassem a indústria da cerveja a consumir cevada nacional, justificando a rejeição pelo simples facto de que a qualidade das cevadas nacionais era muito baixa devido ao excesso de matérias azotadas e que, consequentemente, a importação de maltes

23 Indústria Portuguesa, n.º 150, XIII, Agosto de 1940, p. 34.

12 estrangeiros era necessária, apesar de economicamente ser menos rentável. Fazia-se referência à necessidade de estudo do clima, do terreno e de outros factores para a produção de cevada de boa qualidade para a indústria cervejeira, mas eram apenas ideias não materializadas24.

Quanto à produção de cerveja, ela quase triplicou desde 1938 a 1945, passando de 6 500 000 litros em 1938 para cerca de 15 milhões, em 1945, consequência natural da exportação durante o período de guerra. Os destinos das exportações variavam geograficamente, mas tinham como ponto convergente as zonas onde se encontravam operações militares. Surge, deste modo, Gibraltar, onde a frota inglesa se abastecia, Marrocos, pela importância das suas bases e, claro está, as colónias portuguesas. Os valores detalhados da exportação da Sociedade Central de Cervejas para este período podem ser observados na tabela 1 do anexo A. Salienta-se, por mera curiosidade, que a Sociedade Central de Cervejas criou uma marca especial – Victory – cujo destino era Gibraltar.

Os números recolhidos sobre as vendas da cerveja para o continente e para o exterior (ver tabela 2, anexo A) permitem comprovar a novidade dos mercados estrangeiros e o impacto nas estratégias das empresas mas, ao mesmo tempo, deixam transparecer a ideia de que esta ilusão assentava em bases muito volúveis e pouco estruturadas. O próprio Araújo Correia, entre 1946 e 1949, em artigos publicados na Revista do Centro de Estudos Económicos, afirma que a produção de cerveja iria certamente diminuir, ora pela falta de mercados importadores de cevada, ora pelo desaparecimento dos mercados exportadores, regressando “à proximidade dos números antigos”25. A verdade é que, até ao final da década, a produção e a exportação vão crescendo a um ritmo constante, notando-se, no entanto, em 1949 uma descida de ambos os níveis. O início dos anos 50 reflecte aquilo que Araújo Correia vinha anunciando, mas a situação não permaneceu assim durante muito tempo, como teremos oportunidade de ver. Uma análise para o período de 1943-1952 indica-nos mais claramente a realidade que os números anteriores trouxeram, concluindo-se que o valor absoluto da exportação cervejeira portuguesa é insignificante comparativamente ao consumo nacional:

24 cf. Indústria Portuguesa, n.º 98, IX, Abril de 1936, p. 26. 25 Araújo Correia, in Revista do Centro de Estudos Económicos, n.º 3, 1946.

13 Vendas anos 1943-1952 Continente Exportação Total 127 920 705 8 070 528 135 991 233

Nota: tabela construída com base nos dados de MARTINS, Américo. Central de Cervejas: 50 anos de actividades. Lisboa: Central de Cervejas, 1985

Outro dos pontos centrais é o fosso que divide o volume de produção da Sociedade Central de Cervejas e a Companhia União Fabril Portuense, com a primeira a produzir cerca de quatro vezes mais do que a segunda. O poder hegemónico da Sociedade Central de Cervejas aglutina praticamente todos os interesses da indústria cervejeira nacional, dominando o mercado interno.

Assinala-se, para concluir, o início da presença da indústria cervejeira em África, em 1947, através da criação da Companhia União de Cervejas de Angola (Cuca), fruto da parceria entre a Sociedade Central de Cervejas e a Companhia União Fabril Portuense, que surge como resultado da compra de 51% de capital da CUFP pela SCC. A partir desta data, a empresa sedeada no Porto dá início a um novo ciclo de expansão, com a entrada do engenheiro João Talone (que criará, mais tarde, uma equipa de projectos de novas instalações em Portugal e nas colónias), nomeadamente com o plano de renovação tecnológica iniciado nos anos 50.

14 1.3. Reapetrechamento sectorial, actualização técnica e expansão dos anos 50 Entramos em 1950 e uma das grandes preocupações do sector cervejeiro era a defesa do condicionamento industrial contra qualquer possível entrada no ramo. É interessante observar o comportamento dos vários actores neste complexo processo e a forma como foi evoluindo ao longo dos anos, nomeadamente através da pressão constante e do desmontar de argumentos daqueles que pretendiam instalar novas unidades fabris de produção de cerveja. Através da tabela 1 do anexo B torna-se perceptível esta evolução. Importa, para que a análise seja coerente com o contexto do Estado Novo, definir dois grandes marcos temporais: um primeiro que decorre desde 1937 a 1956, marcado pela rejeição de qualquer nova fábrica; o segundo período inicia- se, simbolicamente, em 1956, data da autorização concedida a José Joaquim Gonçalves de Oliveira para a construção de uma fábrica de cerveja, refrigerantes e gelo no distrito do Porto.

De 1937 a 1956 dão entrada na Direcção-Geral da Indústria/Serviços Industriais um total de 22 pedidos de instalação de fábricas de cerveja (com ou sem variante de refrigerantes e gelo). Todos obtêm a mesma resposta por parte das autoridades oficiais: “negada autorização...”. Pelo contrário, os pedidos das empresas já existentes recebem, na sua maioria, despachos favoráveis, ainda que incidam essencialmente sobre introdução ou substituição de maquinaria. Porém, o processo não se fica por aqui, uma vez que os argumentos utilizados pelas várias empresas a laborar merecem um tratamento especial neste campo, pois reflectem as ambições, as pressões existentes e a estratégia, que, por vezes, é concertada em várias frentes (interempresarial e até com o próprio Estado). Destaco, de seguida, as principais conclusões:

i. “Capacidade de produção existente é suficiente para as necessidades de consumo nacional e para a exportação; ii. Esforço de investimento/reapetrechamento exigido ao sector não deve ser perturbado pela concorrência indisciplinada e ambiciosa; iii. Características de indústria supercapitalizada, com unidades a mais e dimensões desproporcionadas para a capacidade de consumo; iv. Inexistência de monopólio no sector; v. Sazonalidade do consumo;

15 vi. Variação climatérica”26.

Existem, decerto, outros argumentos, mais específicos, designadamente os que surgiram por reacção aos pedidos de instalações no final da guerra, com a justificação da abundância do mercado externo. A estes, por exemplo, a CUFP afirmava que tais mercados não “oferecem possibilidades de futuro por serem destituídos de condições de estabilidade” e porque em situação de normalidade económica não iriam “querer mais a cerveja portuguesa”27.

Relativamente à modernização tecnológica, os anos 50 significaram o início da mudança de paradigma neste sector, com o lançamento de planos de reapetrechamento – resposta final à notificação que o governo havia dado em 1948 no sentido da indústria se “equipar para o fabrico de todo o malte que ela necessitasse”28 – que, no caso, da Sociedade Central de Cervejas atingiram os 100 000 contos (ver tabela 1 do anexo C), alterando profundamente o panorama das instalações industriais no ramo da cerveja, com grande destaque para a malteria da Portugália. Na SCC coloca-se como objectivo a renovação da fábrica Estrela, a criação de uma nova fábrica em Coimbra (1959), na zona de Loreto, e uma nova fábrica da Portugália para a produção de malte e outra para cerveja, realizada por fases, entre 1954-1959. Considerada umas das mais modernas instalações de maltagem da Europa, a malteria da Portugália, obra de técnicos portugueses liderados pelo engenheiro Sebastião de Oliveira e com a colaboração do subsecretário de Estado da Agricultura, Vitória Pires, ficou com uma capacidade de produção suficiente para satisfazer “todas as necessidades impostas pelo desenvolvimento industrial da cerveja”, ainda que na dependência daquilo que a lavoura nacional conseguisse produzir29. Este último ponto será fruto de uma abordagem pormenorizada mais adiante por se tratar de um assunto essencial na construção desta

26 INDÚSTRIA CONTINENTAL DE CERVEJA, Memorial: 1953. Lisboa: Bertrand, 1953; SCC, Condicionamento Industrial: oposição da Sociedade Central de Cervejas S.A.R.L... ao pedido de Manuel António Flor Alves da Silva e outros para a instalação de uma nova Fábrica de Cervejas. Lisboa: s.n, 1966; PELÁGIO, Humberto José Pereira, Vinculação e discricionariedade no exercício dos poderes de condicionamento industrial: a propósito do despacho de autorização de uma nova fábrica de cerveja. Lisboa: s.n, 1958; SCC, Condicionamento industrial: oposição da Sociedade Central de Cervejas... ao pedido da Companhia de Cervejas e Refrigerantes Mac-Mahon para a instalação de uma nova Fábrica de Cerveja. Lisboa: s.n, 1967; SCC. Condicionamento industrial: oposição da Sociedade Central de Cervejas… ao pedido da Empresas Garrafeiras para a instalação de uma nova Fábrica de Cerveja. Lisboa: s.n, 1966. 27 CUFP. Da Indústria nacional de cerveja. Reclamações apresentadas pela Companhia União Fabril Portuense. Porto: s.n, 1946. 28 Cerveja, n.º 3, II, Março de 1956. 29 Indústria Portuguesa, n.º 335, XXIX, Janeiro de 1956, p. 25.

16 nova estratégia industrial, assente na nacionalização da cerveja portuguesa e na política de substituição de importações. Fica no ar a frase que, lançada na inauguração da malteria da Portugália, espelhava o novo olhar sobre a indústria e sobre o papel da tecnologia e da modernização:

“a clássica letargia nacional foi forçada a dobrar a cerviz; ou, por outras palavras, a ceder perante uma vontade que ignora o desfalecimento e a tibieza de ânimo”30.

Mudou-se o paradigma, porque também se alteraram algumas coisas ao nível dos mercados tradicionais, como era o caso das colónias. Uma nova unidade fabril começa a ser montada em Luanda no ano de 1951 e já existiam outras fábricas em Lourenço Marques, locais onde a concorrência das marcas estrangeiras começava a fortalecer-se. Resulta daqui uma das principais críticas dos industrias (papel relevante de Humberto Pelágio, presidente do Conselho de Administração da SCC), que consideravam que a indústria cervejeira nacional não possuía protecção suficiente por forma a defender-se contra a concorrência externa nos mercados ultramarinos31.

Por outro lado, paralelamente à renovação das instalações e do equipamento, empreendeu-se um forte incentivo à formação técnica e ao recrutamento de técnicos cervejeiros qualificados (ver tabela de mestres cervejeiros, n.º 2, do anexo C), promovendo-se o estágio de especialistas portugueses em universidades estrangeiras, como a de Lovaina, a École de Brasserie de Nancy e a Versuchts und Lehrenstalt für Brauereu (Berlim). A lista de todos os técnicos portugueses que frequentaram estes cursos encontra-se ordenada cronologicamente na tabela 3 (anexo C). Assiste-se, consequentemente, à modificação da estruturação das empresas no sentido da intensificação em capital e redução da mão-de-obra.

Iniciou-se, em 1954, o primeiro Curso de Tiradores de Cerveja, sucessor da Escola de Tiradores de Cerveja da SCC (1951), dirigido pelo engenheiro António Alberto Martins da Fonseca, que se ampliou a todo o país (cf. tabela 4, anexo C); criaram-se circulares informativas; formou-se a Equipa Técnica Externa, composta por duas unidades automóveis que visitavam diariamente os estabelecimentos de Lisboa, realizando ainda deslocações periódicas à Província para fazer a revisão e a afinação da aparelhagem e prestar ensinamentos básicos; organizou-se a primeira reunião de agentes

30 Cerveja, n.º 3, II, Março de 1956, p. 2. 31 Relatório da Direcção e das Secções da AIP, 1955, p. 105.

17 e sub-agentes da SCC, em Junho de 1955, estrutura fundamental, mas também motivo de algumas confrontações com a própria companhia; por último, saiu o boletim/jornal da Sociedade Central de Cervejas, que se destinava aos agentes, sub-agentes e revendedores da mesma, órgão essencial e um dos muitos meios de propaganda que se intensificaram na altura32. Já em 1956, a Sociedade Central de Cervejas organizou o I Congresso da Cerveja, realizado entre 14 a 21 de Maio no salão nobre da Câmara do Comércio – Associação Comercial de Lisboa, contando com a presença de 310 congressistas e assistentes, com o objectivo de discutir formas de aumentar o consumo de cerveja.

1.3.1. A indústria cervejeira e a lavoura nacional

A questão da inovação, ciência e tecnologia é uma das pedras angulares deste arranque, da renovação da indústria de maltagem de cevadas, com o principal objectivo de criar em Portugal a espécie de cereal própria para o consumo de cerveja, à imagem do que já acontecia noutros países, numa óptica de colaboração com os Serviços Oficiais do Estado (Direcção-Geral dos Serviços Agrícolas do Ministério da Economia, Federação Nacional do Trigo e Comissão de Cevadas, nomeada oficiosamente), destacando-se o papel de Vitória Pires com o programa de valorização da cultura cerealífera. Esta ideia não era nova, remontava, aliás, a 1944/45, aos trabalhos de melhoramentos de cevadas realizados pelos engenheiros agrónomos Domingos Rosado Vitória Pires e Luís Aníbal Valente Almeida, na Revista Agronómica. Começava a ganhar terreno a concepção de que a subida do consumo só poderia ser conseguida através da melhoria da qualidade dos produtos.

Na prática, com o apoio do Comité de Cevadas da European Brewery Convention (Barley Committee), foram criados campos experimentais pelo país, onde eram testadas várias qualidades de sementes de acordo com a terra e o clima. Para tal, foi contratado um técnico de renome, Pierre Bergal, pioneiro do mesmo projecto em França. Os resultados dos testes permitiram recolher informações sobre as zonas com as características mais indicadas, bem como o tipo de semente dística ideal para a produção de cerveja, regulamentando-se a sua produção, com o controlo dos Serviços Oficiais (D. L. n.º 38.153) e com a estreita colaboração, material e financeira, da

32 Cerveja, n.º 1, I, Outubro de 1955

18 Sociedade Central de Cervejas33. Em 1961 existiam as seguintes infra-estruturas e brigadas:

Campos de ensaio permanentes Brigadas Técnicas Agrícolas Elvas – Estação de Melhoramento de Plantas Brigada de Santarém – 2 campos Tapada da Ajuda – Estação de Ensaio de Sementes Brigadas de Elvas – 2 campos Vila Franca de Xira – Sociedade Central de Cervejas Brigada de Évora – 1 campo Brigada de Beja – 3 campos

Os excelentes desenvolvimentos nesta área acabaram por se traduzir em resultados concretos e satisfatórios: obtenção de prémios internacionais – da European Brewery Convention – nas cevadas portuguesas ensaiadas Aurore e Beka em 1957, 1958 e em 1960. Outra das amostras com bom resultado foi a Lima Monteiro34. O aumento da qualidade reflectiu-se, igualmente no aumento da produção, da superfície cultivada e no aumento do número de produtores35, contribuindo para a obtenção da primeira classificação da cerveja Sagres na classe de cervejas Dortmund no Concurso Internacional de Gand, em 16 de Maio 1958. No entanto, este investimento vem tarde para a indústria cervejeira colonial que, em 1961, não laborava com qualquer tipo de malte nacional, contrariamente à situação de quase auto-suficiência na produção da metrópole.

No que diz respeito à produção de lúpulo, foi criado um plano semelhante ao das cevadas, mas apenas na década de 60, sob o impulso da Sociedade Central de Cervejas, que constituiu, para estes efeitos, a Lupulex.

1.3.2. O potencial produtivo vs. consumo

Com a melhoria das instalações, agudiza-se nestes anos a questão da relação entre o potencial produtivo da indústria cervejeira e o consumo no mercado continental, bem como as potencialidades de exportação. É claro para este período, como também pode ser para outras fases, que esta indústria possui uma capacidade de produção muito superior ao que são os dados do consumo, chegando a ser cerca de três vezes mais.

33 Relatório da Direcção e das Secções da AIP, 1958, p. 165. 34 BANCO NACIONAL ULTRAMARINO. “Da indústria cervejeira em Portugal,” Boletim trimestral dos Serviços de Estudos Económicos do B.N.U, 31 de Dezembro de 1961. 35 Ibid.

19 Numa perspectiva comparada, com base na produção mundial e no consumo, os números indicam-nos que o consumo anual per capita é muito mais reduzido em Portugal do que na maioria dos países da Europa, com a excepção da Grécia (ver tabela 3, anexo A). O mesmo panorama pode ser observado na produção, dado o valor absoluto reduzido da produção portuguesa em termos comparativos, apesar de aqui a produção metropolitana ter aumentado 160,3% entre 1951-1959, enquanto a produção mundial aumentou cerca de 28,8%36. Neste cenário, há que colocar, para contrabalançar, os dados sobre o consumo de vinho, que, contrariamente aos da cerveja, só são batidos por países como a França e a Itália. A capitação portuguesa de cerveja seria, no final da década de 50, de 3,51, de acordo com Humberto Pelágio37, mas mantinha-se a mais baixa do mundo.

A partir de dados recolhidos no boletim Cerveja, da SCC, foi possível construir uma tabela com os dados relativos à capitação de consumo de cerveja em Portugal, por distritos, para o ano de 1955, apesar da inexistência de informação para algumas regiões:

Capitação de cerveja por distritos em 1955 Distrito Habitantes Capitação de consumo de cerveja Beja 278 215 1,172 Portalegre 189 044 1,156 Setúbal 260 328 3,3 Faro 284 993 1,744 Leiria 358 015 1,682 Santarém 421 450 2,583 Porto Braga 0,577 (p/ cervejas do Sul e Centro) 2 194 603 Viana do Castelo 1,065 (p/ cervejas da concorrência) Vila Real Bragança Viseu 441 579 - Guarda 295 664 - Castelo branco - - Aveiro 433 395 0,656 Coimbra 415 827 1,729

Fonte: SOCIEDADE CENTRAL DE CERVEJAS. Cerveja. Ano I, n.º 1, 31 de Outubro de 1955

36 Ibid. 37 PELÁGIO, Humberto José Pereira. A Indústria da Cerveja e o Agro Nacional. Lisboa: s.n, 1961.

20 Este quadro torna evidente as assimetrias existentes e os números fornecem uma visão realista das dificuldades de penetração em algumas regiões. Ao mesmo tempo, com base neles, a Sociedade Central de Cervejas iniciou um processo de expansão para o Norte do país, através de um trabalho muito forte com os seus agentes e sub-agentes, reorganizando a distribuição comercial e estabelecendo acordos com a CP e outras transportadoras para baixar o custo e expandir o produto para locais mais distantes. Uma das realidades que poderia vir a ser importante para o aumento do consumo era a questão do preço da cerveja, que permanecia inalterável desde 1947.

No II Congresso da Indústria Portuguesa foi apresentada uma tabela sobre a indústria portuguesa, fruto do trabalho de Francisco Pereira de Moura. Para o sector cervejeiro, mostra-nos o seguinte quadro, que elucida sinteticamente o que aqui foi anteriormente exposto (talvez com base nos números de 1954):

Número de unidades 4 Número de operários 739 Capacidade produtiva em 300 dias de 24 horas 33 420 000 1 Consumo 18 361 000 1 Relação entre capacidade produtiva e consumo 1,8 Percentagem de maquinismo antiquado 25

Fonte: II CONGRESSO DA INDÚSTRIA PORTUGUESA. Comunicação 1 a 74. Volume 1. Lisboa: s.n, 1957 Dados com base previsível no ano de 1954

1.3.3. Industrialização ou surto industrial. O II Congresso da Indústria Portuguesa e o sector cervejeiro em equação

É de fulcral importância ligar estas últimas alterações no sector cervejeiro com a realidade industrial portuguesa e com as acções políticas que foram adoptadas, desde logo com o surgimento do planeamento económico, através dos planos de fomento, e com a necessidade de uma estruturação industrial mais séria e mais profunda, que alguns sectores da sociedade vinham proclamando há algum tempo, mas que o regime havia negligenciado na sua ânsia gritante de assegurar estabilidade em pontos-chave da área financeira, mas sobretudo no campo social (veja-se a estratégia do I Plano de Fomento e a aposta em sectores-motores, mas a imprudência para com algumas condições a montante). O sector cervejeiro absorvia todos estes “vícios”. Veja-se: preparava a modernização das infra-estruturas e dos equipamentos, mas a origem de tais máquinas era estrangeira, dada a inexistência de uma indústria de bens de equipamentos em Portugal. De certa forma, podemos concluir que, pela análise efectuada, a indústria

21 cervejeira assume-se como um sector que, em certo sentido, vai remando contra algumas marés, chamando a si o processo de inovação e modernização tecnológica, ainda que sem os pressupostos necessários à competitividade internacional. Mas, não seriam já os reflexos das novidades de cooperação europeia a ditar algumas das posições?

É no II Congresso da Indústria Portuguesa e dos Economistas que todas estas questões vão ganhar forma e respostas concretas e coerentes, aparecendo em cima da mesa, pelo próprio Marcello Caetano, a questão da integração europeia, a preocupação com a competitividade internacional e o papel da iniciativa privada. Uma série de conclusões vai depois ganhar corpo na economia e na sociedade portuguesa, com especial relevância no II Plano de Fomento (industrialização e reorganização industrial), se bem que a sua forma não constituísse ainda o projecto mais elaborado relativamente à indústria, vendo-se ultrapassado pelos acontecimentos na cena internacional e pela adesão de Portugal à EFTA, colocando um ponto final, uma ruptura, não total, dos comportamentos e práticas que subsistiam do passado.

Os dois primeiros planos de fomento nada indicam quanto à situação do sector cervejeiro, negligenciando por completo uma indústria que estava numa fase importante de modernização. Existe apenas uma pequena menção – num relatório preparatório do II Plano de Fomento para as indústrias transformadoras – à relação entre a capacidade produtiva e o consumo que é bastante baixa – 1,838. Nesta posição de falta de informação não se encontra apenas a indústria da cerveja, mas todo o sector das bebidas, não esquecendo, naturalmente, a pouca informação estatística existente, que segue os traços daquilo que foi desenhado por altura do II Congresso da Indústria, cujo papel de Pereira de Moura foi fundamental, como arauto da reorganização industrial, da interdependência industrial e do efeito motor sobre as regiões39.

Após a autorização concedida, em 1956, para a instalação de uma fábrica de cerveja no Porto, vão surgindo as primeiras grandes críticas ao condicionamento industrial, expressas de forma vincada no II Congresso da Indústria, mais precisamente na sessão 32, sobre a indústria de cerveja, presidida por Manuel Vinhas. Apresentaram-

38 PRESIDÊNCIA DO CONSELHO. INSPECÇÃO SUPERIOR DO PLANO DE FOMENTO, Relatório final preparatório do II Plano de Fomento. III) Pesca IV) Minas. V) Indústrias transformadoras. VI) Electricidade. Lisboa: Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1958. 39 c.f Estrutura da Economia Portuguesa, 1954; Estudo sobre a Indústria Portuguesa, 1957; Reorganização das Indústrias, 1960.

22 se algumas conclusões que representam com bastante nitidez a dupla concepção que existia em torno do condicionamento industrial, que mais não é do que um simples instrumento de interesses, variando conforme as acções que se vão tomando. Assim, percebe-se a defesa quase incessante do condicionamento industrial, como factor-chave da modernização da indústria cervejeira, resultante da concentração, mas também a discordância para com o “poder discricionário ministerial, por poder quebrar uma determinada linha de rumo e progresso”, por ter criado uma “vida difícil com o licenciamento de novas fábricas”40 a um sector que estaria bem considerado na própria proposta de Lei de Fomento e Reorganização Industrial, e que até concedeu assistência “voluntária ao seu pessoal, mais do dobro do que lhe foi exigido”41, ou pela falsa questão da concorrência que o governo entendeu introduzir, entre outros argumentos.

O despacho ministerial de 20 de Fevereiro de 1956 ao pedido de José Joaquim Gonçalves de Oliveira (de 13 de Maio de 1952) surge numa altura em que, aparentemente, nada fazia prever a sua autorização, até pela situação em que se encontravam as fábricas do sector. As razões invocadas prendem-se com a necessidade de se “alcançar, outra vez, um nível mínimo de saudável concorrência de que a respectiva indústria parece ter-se afastado”, nunca colocando em causa a sua crescente importância para a economia portuguesa42. O despacho indicava ainda uma série de condições a que a instalação estava sujeita e que traduziam as evoluções recentes na área científica, como a obrigatoriedade de possuir um laboratório e técnicos devidamente qualificados. A empresa, posteriormente denominada de Nacerel – Sociedade Nacional de Cerveja e Refrigerantes, nunca chegou a entrar em funcionamento, acabando por se concentrar na CUFP em 1960.

40 II CONGRESSO DA INDÚSTRIA PORTUGUESA. II Congresso da Indústria Portuguesa. Actas das sessões, vol. 3, 9 vols. Lisboa: s.n, 1957. 41 Cerveja, n.º 3, II, Março de 1956. 42 Boletim n.º 375 da Direcção-Geral dos Serviços Industriais, Ano VIII, 7 de Março de 1956.

23 1.4. A reorganização forçada por um convite inesperado: o sector cervejeiro e a abertura externa Os anos 60 caracterizam-se pela continuidade das renovações industriais – veja- se, a título de exemplo, a fábrica da Leça do Balio (CUFP) e a de Vialonga (SCC) –, mas também pelo arranque do consumo e da exportação da cerveja portuguesa, apenas possível num contexto recente de abertura ao exterior, consubstanciado na integração de Portugal na EFTA, em 1960, e noutros organismos de cooperação internacional (BIRD, FMI, GATT), que alteraram substancialmente a política económica portuguesa, com a inserção de um novo elemento na política económica e industrial – a exportação –, concluindo que o caminho da substituição de importações, per si, não tinha presenteado bons resultados à economia. Será esta uma das principais linhas condutoras que guiará a estratégia da indústria cervejeira a partir do início da década, mas agora com a preocupação acrescida da mudança de orientação da política de condicionamento industrial para o sector, pautada nos despachos ministeriais de 8 de Setembro de 1960 e de 19 de Março de 1968, inaugurando uma fase de entrada de novas empresas, sob o pressuposto da regularização da concorrência, ainda que continuassem os esforços no sentido de fomentar o crescimento das empresas já existentes.

Este crescimento, associado ao todo nacional, é possível, para além de razões internas, porque todos os países da OCDE vivem nesta altura os anos de ouro da economia, num balizamento temporal mais alargado que ficou conhecido como os 30 anos gloriosos. No entanto, o desenvolvimento da década de 60 acontece simultaneamente com uma verdadeira quebra ou crise na agricultura, evidenciada no êxodo rural, bem como no aumento da emigração para países europeus. Como refere Sousa Franco, “o crescimento económico destes anos 60, produzindo inegáveis efeitos no domínio da riqueza e do próprio bem-estar social, acusa, para além das limitações apontadas, deficiências e limites evidentes”43.

A iniciativa do despacho de 8 de Setembro de 1960 – reorganização sectorial da indústria cervejeira – coube a Ferreira Dias, então ministro da Economia, e surge como consequência previsível das alterações que o sector vinha sofrendo no final da década de 50, nomeadamente com a questão da produção de cevada. No entanto, revela já uma noção cuidada da importância que os mercados externos poderão ter para o sector, desde

43 FRANCO, António de Sousa. “Economia,” in Portugal, 20 anos de Democracia, ed. António REIS. Lisboa: Círculo de Leitores, 1994, p. 173.

24 que haja uma correcta análise dos custos de produção e uma consequente estruturação do sector no sentido de o tornar competitivo à escala internacional:

“A indústria portuguesa da cerveja, apesar das aparências, que levam tanta gente a conclusões erradas, não atingiu ainda entre nós o nível de concentração industrial que lhe permita chegar a custos de concorrência internacional”44.

Desta forma, os serviços industriais viram-se na necessidade de traçar a curva de variação do custo de produção das fábricas existentes no continente, concluindo que o custo de produção baixaria automaticamente com o aumento da mesma. O despacho chega mesmo a referir a possibilidade de encerrar todas as fábricas com capacidade produtiva abaixo dos 100 000 000 litros. As indicações recolhidas mostram que existiam quatro fábricas em Portugal, cuja capacidade anual, em milhões de litros seria a seguinte: “Coimbra com 4,5; Porto com 7,2; Lisboa (duas fábricas) com 18 e 21”45. Objectivamente, o despacho ministerial traçou os seguintes objectivos:

i. Remodelação das fábricas com vista à colocação de cerveja nos mercados internacionais; ii. Potenciar a cevada nacional através da criação de meios de transformação; iii. Dar garantias aos capitais a investir na remodelação; iv. Impedir a venda de cervejas que pudessem fomentar a concorrência com o vinho.

De forma a atingir estes objectivos, seguindo um parecer da Sociedade Central de Cervejas, o despacho propõe a promoção da concentração das duas fábricas de Lisboa numa unidade, com capacidade de 110 000 000 litros/ano; montagem de uma fábrica no Porto com capacidade anual de 25 000 000 litros; cooperação entre produtores de cerveja e produtores de cevada para a instalação de fábricas de malte; e re-equipamento das unidades fabris com vista à diversificação da produção. A ideia por detrás deste plano assentava no parecer da SCC, que estabelecia a meta de 110 milhões de litros/ano como pré-requisito de entrada nos mercados externos em concorrência igual, enquanto a capacidade anual de 25 milhões de litros asseguraria condições marginais de exportação. O despacho encerrou com a afirmação de que o Governo não

44 SECRETARIA DE ESTADO DA INDÚSTRIA. Reorganização das Indústrias de Cerveja e Malte. Lisboa: Direcção-Geral Serviços Industriais, 1969. 45 Ibid.

25 iria permitir a instalação de novas unidades se estas metas fossem cumpridas. Veremos, mais à frente, que este ponto será vital no desenvolvimento do sector no final da década.

Por outro lado, as reacções dos industriais cervejeiros com interesses instalados foram naturalmente positivas e reveladoras da nova disposição portuguesa face aos movimentos de integração europeia, até porque, como refere Kenneth Maxwel, “os industriais sabiam que o isolamento de Portugal era mais um estado de espírito do que uma realidade económica”46. Humberto Pelágio, administrador da SCC, atesta a lucidez e a actualidade do despacho, porque alerta a indústria para a “compreensão dos problemas e realidades que a economia dum Ocidente em perigo nos impõe considerar resolver”47. Interessante é também o seguinte excerto de um discurso de Humberto Pelágio no lançamento da primeira pedra da fábrica de Leça do Balio, em Abril de 1962, pois permite observar, por um lado, o elogio da abertura à Europa realizado pelo Governo mas, por outro, não deixa de lançar criticas severas à essência da política económica salazarista:

“(...) as economias nacionais que se encerram hermeticamente nas suas fronteiras geográficas estão irremediavelmente condenadas pelo próprio isolacionismo a que se remeterem. O auto- abastecimento (...) é uma figura de retórica económica que o ultrapassado dirigismo cultivou, e na base do qual está, afinal, a razão de ser do seu aparatoso malogro”48.

João Salgado, também da SCC, partilha a mesma opinião, tocando no problema da exportação como uma questão que urge ser resolvida, só possível de ser concretizada através da dilatação do mercado cervejeiro para além do Continente e das Províncias Ultramarinas49.

Estas duas problemáticas não podem ser analisadas separadamente, pois esta aparente vaga de entusiasmo com a “integração” esconde a bipolaridade que então se fazia sentir e que opunha os mercados coloniais aos mercados ocidentais/europeus, como espelha o relatório do Conselho de Administração da SCC no balanço de 1960: “O Mercado Nacional (Continente e Ultramar), tem que deixar de ser uma aspiração política, para se transformar em curto prazo numa realidade económica tangível”. Creio que, pela investigação efectuada, a nata do sector cervejeiro fosse tendencialmente

46 MAXWELL, Kenneth. A construção da democracia em Portugal. Lisboa: Presença, 1999, p. 44. 47 PELÁGIO, Humberto. A Indústria da Cerveja e o Agro Nacional. Lisboa: s.n, 1961, p. 11. 48 Indústria Portuguesa, n.º 441, XXXV, Maio de 1962, p. 155. 49 Cerveja, n.º 23, VII, Março de 1961.

26 favorável à nova abertura ao exterior, até porque a situação do sector nas colónias não era propriamente favorável. Todavia, estes sinais de entusiasmo não anulam por completo, nem extravasam o discurso oficial do regime, como se depreende pelas declarações de Humberto Pelágio no rescaldo a Conferência dos Sete, em Novembro de 1960: “se é à integração que devemos ir buscar a certeza duma continuidade, - há necessariamente, que a cultivar em toda a sua plenitude e extensão”50. No fundo, são discursos que representam posições de interesses e luta pela hegemonia, e que se coadunam facilmente em contextos, por vezes, contraditórios.

A adaptação do tecido empresarial português face ao novo paradigma espelha-se primorosamente na criação da Associação da Indústria Cervejeira Portuguesa (AICP), em 1961, e na participação portuguesa na fundação da EFTA – Brewers Working Party (EBWP) e na EFTA Brewery Industry Council (EBIC), cujos fabricantes de cerveja haviam reunido a 3 e 4 de Maio de 1961 em Lisboa. No entanto, esta não era a primeira experiência de cooperação do sector, já que a Sociedade Central de Cervejas era membro do European Brewery Convention (EBC) desde 1954, braço científico e tecnológico da Brewers of Europe. Da primeira associação nacional, cuja promoção coube à Sociedade Central de Cervejas, faziam parte as empresas licenciadas do continente, das ilhas e das colónias, que reuniam mensalmente.

1.4.1. Na senda da investigação. As novas unidades industriais

A aproximação à Europa contribuiu decisivamente para quebrar os resquícios de amadorismo da indústria cervejeira portuguesa, apostando de forma brutal na investigação tecnológica, no marketing – a título de exemplo, a SCC inicia a prática de campanhas publicitárias em 1963, em parte como consequência das quedas das vendas originada pelo aumento de imposto de consumo em 1961, e funda em 1967 a Cinevoz (empresa de publicidade) –, na prospecção de mercados, ou seja, numa panóplia de recursos indispensáveis à integração económica. Humberto Pelágio, no fragmento sequente, relata de forma transparente esta realidade:

“[A investigação científica] tomou então o seu lugar; os métodos da organização passaram a viver em paralelo com a programação económica; o conhecimento universitário iluminou a Empresa; a tecnologia aumentou a sua rentabilidade qualitativa e quantitativa; as previsões

50 Cerveja, n.º 23, VII, Março de 1961.

27 tornaram-se possíveis, e a identificação dos custos marginais operaram o resto que se impunha atingir para bussolar e orientar com consciência e eficiência os destinos da indústria, dotando-a de crédito e de indispensável segurança”.51

As duas grandes obras que resultam do diploma da reorganização industrial nascem nesta década, sustentadas pelo aumento da produção (ver tabela 4, anexo A) e do consumo, ainda que no final da década a capitação seja inferior a 10 litros por pessoa, enquanto na Espanha, com características análogas, os valores cifravam-se na ordem dos 30 litros. A CUFP muda as suas instalações para a Via Norte, na Leça do Balio, em 28 de Setembro de 1964, cuja produção anual passa a 25 milhões de litros. Na inauguração da fábrica, que contou com a presença do Presidente da República, o presidente da AICP – Humberto Pelágio – exaltou a jornada da integração europeia e o papel da empresa no desenvolvimento económico. Elogiou a CUFP e o tecido empresarial português por se adaptar a esta nova etapa, mas também por “vontade e programação expressa do Governo da Nação”52.

“Esta unidade denuncia o grau de desenvolvimento atingido pelo produto nacional, mercê da assimilação crescente das técnicas mais evoluídas que se está felizmente operando no nosso País, concretizada numa saudável e criadora confiança do investimento nacional no capital técnico utilizado e a aproximação progressiva, portanto, do nível ideal daquilo que a ciência económica chama relação capital-produto”53

“Esta nova unidade traduz uma marcada e salutar viragem da mentalidade empresarial no nosso País, uma vez que a sua implantação se está a dever ao financiamento interno, expresso no concurso da poupança portuguesa e do crédito concedido pelas instituições bancárias portuguesas, uma e, outras, apostadas em revelar espírito de iniciativa, e mostrar presença e confiança.”54

“É, com efeito, na diversificação de mercados que está a chave da sua [Estado] política económica e dos seus destinos.”55

A produção da Sociedade Central de Cervejas transfere-se para as novas instalações de Vialonga a 22 de Junho de 1968, data da inauguração da maior unidade

51 PELÁGIO, Humberto. A Indústria da Cerveja e o Agro Nacional. Lisboa: s.n, 1961, p. 11. 52 PELÁGIO, Humberto José Pereira. A Fábrica de Cerveja de Leça do Balio da Companhia União Fabril Portuense. Lisboa: s.n, 1964, p. 8. 53 Ibid, p. 13. 54 Ibid, p. 14. 55 Ibid, p. 18.

28 fabril cervejeira do país, garantindo, desde logo, a cobertura dos mercados interno e externo, dada a totalidade de produção de 110 milhões de litros de cerveja por ano, acrescida de 21 milhões de litros de refrigerantes e 50 mil toneladas de malte. No global, o total dos investimentos relativos às novas fábricas não deveriam ser inferiores a 600 000 contos, como nos indica o despacho ministerial de 19 de Março de 1968, e contam com o financiamento, em grande escala, da banca nacional (Banco Espírito Santo, Banco Português do Atlântico, etc.), que fará parte do capital social das empresas. Ambas as obras foram levadas a cabo por corpos técnicos portugueses, a primeira dirigida pelo engenheiro João Talone.

1.4.2. Balanço da indústria cervejeira no final da década e a nova abertura do condicionamento industrial

Importa, para contextualizar esta realidade, transmitir as dificuldades que o tecido empresarial do sector cervejeiro diagnosticava. Para tal, foi imprescindível a leitura de um relatório sobre a indústria das bebidas, realizado por uma comissão composta por Bernardo Lancastre Mendes de Almeida (conde de Caria), Humberto Pelágio e Abilino Vicente, com o apoio da Corporação da Indústria e da Direcção-Geral de Minas e Serviços Geológicos, que fez parte de um relatório preparatório do Plano de Investimentos para 1965-6756. É um dos poucos documentos em que é realizada uma análise mais detalhada da evolução deste sector, com apreciação crítica dos problemas das indústrias em questão, propondo, inclusive, caminhos a seguir. Incompreensível é, no entanto, a quase nulidade de informações sobre a indústria cervejeira no Plano Intercalar de Fomento, apesar do despacho de 1960 se incorporar nele, sobretudo por este ter sido, de todos os planos, aquele que verdadeiramente ensaiou o planeamento económico global, com estruturação sectorial. São, sobretudo, os relatórios preparatórios – da corporação da indústria e o do Ministério da Economia – que nos elucidam acerca das matérias dominantes em torno do debate sobre o sector: a questão da promoção da cultura de cevada dística e lúpulo face à necessidade urgente de reduzir o seu custo; o regime de aplicação do imposto de consumo, que havia subido em 1961 para 2$10/litro com o início da guerra em Angola, “verdadeiro travão à expansão dos

56 O Plano de Investimentos para 1965-67 constitui um dos vários relatórios preparatórios para o III Plano de Fomento (1968-1973), que compunha estudos elaborados por diversos grupos de trabalho da Comissão Interministerial do Planeamento e Integração Económica, nos vários sectores da economia portuguesa.

29 consumos continentais e possibilidades de exportação”57; bem como o problema da indústria de embalagens e garrafas, visto como um “sério embaraço para a Indústria Portuguesa”58, mas cuja solução estava já em andamento, com a montagem de uma nova fábrica de garrafas (constituição da Cive – Companhia Industrial Vidreira que agrupava a Empresa Produtora de Garrafas, a Guilherme Pereira Roldão, a Ivima e a Crisal), resultado da política de diversificação iniciada pela SCC com base em dois eixos: «o mercado da sede», que a levara aos refrigerantes, ao vinho comum e às águas minerais, e a indústria de embalagens, nomeadamente de vidro”59. Falava-se, de igual modo, da carência de uma regulamentação dos preços praticados pelo comércio retalhista, que “estrangulava a indústria”, e da abolição dos direitos de exportação para a cerveja, “1,5% do valor médio por grosso”60. Afigurava-se já um novo receio: a provável concorrência do produto estrangeiro, então expresso nas conclusões do relatório preparatório do plano de investimentos para 1965-67, onde se rejeitavam as alternativas do crescimento lento, pois as únicas vias que se poderiam percorrer eram a do “crescimento rápido que aproveite eficazmente os factores até agora sub-empregados (...) ou a crescente absorção desses factores pelas economias estrangeiras”61. Consequentemente, vemos do lado dos industriais o desejo de serem estabelecidos prémios de exportação, bónus à navegação nacional para fretes internacionais e seguros, como já se observava em alguns países. Ainda assim, há que considerar a existência do anexo G da Convenção de Estocolmo, que salvaguardava a indústria portuguesa no que tocava às pautas aduaneiras.

As direcções que a indústria apontou remetem para dois conjuntos de ideias, que confluem nos seus propósitos, isto é, o cumprimento do despacho ministerial de 1960, que asseguraria a não concessão de novos alvarás e o papel da Associação de Cervejeiros, que seria o esteio desta mesma luta, como grupo de pressão, ainda que justificando tais opções pelo projecto animador da exportação e do desarmamento

57 PORTUGAL. CORPORAÇÃO DA INDÚSTRIA. Plano Intercalar de Fomento 1965-1967. Acções de política industrial na indústria transformadora. Lisboa: s.n, 1964, p. 29. 58 MINISTÉRIO DA ECONOMIA. Indústria da Alimentação e das Bebidas (classes 20 a 21): Relatório Preparatório do Plano de Investimentos para 1965-67. Lisboa: Ministério da Economia, 1964, p. 4. 59 RIBEIRO, José Félix et al. “Grande indústria, banca e grupos financeiros,” Análise Social XXIII, n.º 99 (1987): 945-1018, p. 1004. 60 MINISTÉRIO DA ECONOMIA. Indústria da Alimentação e das Bebidas (classes 20 a 21): Relatório Preparatório do Plano de Investimentos para 1965-67. Lisboa: Ministério da Economia, 1964. 61 PORTUGAL. PRESIDÊNCIA DO CONSELHO. SECRETARIADO TÉCNICO DA PRESIDÊNCIA DO CONSELHO, Relatório preparatório do plano de investimentos para 1965-1967. Estudos gerais (Metrópole), 2a parte. Caracterização presente da economia portuguesa e projecções do seu desenvolvimento no período de 1965-1973. Lisboa: Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1964, p. 382.

30 aduaneiro. Como era referido no final deste relatório, não se esperavam obstáculos. “A indústria arrancou já para o objectivo Exportação. E não pode voltar atrás”62.

Para mais rapidamente atingir os mercados externos, a SCC e a CUFP criaram, em 1966, um Gabinete Comum de Exportação, cuja estratégia inicial passava pela entrada em mercados específicos, nomeadamente onde existiam grandes comunidades de emigrantes portugueses. Nos moldes da cooperação, acreditavam que resolveriam eficazmente os problemas que assolavam a indústria com acções concertadas no campo da publicidade, da investigação de novos produtos e da prospecção e estudo de mercados. Iniciaram, no mesmo ano, a exportação para Gibraltar e para os Estados Unidos. O relatório do Conselho de Administração da CUFP relativo a 1970 referia que “a concorrência pela inovação é mais importante do que a concorrência de preços e quantidades”.

O quadro que se segue dá-nos uma panorâmica comparativa do sector em 1953 e em 1962:

Sector cervejeiro em 1953 e 1962 1953 1962 Estabelecimentos em actividade 4 4 Valor da produção em contos (preços de venda ao retalhista) 79 750 203 500 Pessoal operário remunerado 716 848 Materiais consumidos (contos) 35 216 68 961 Valor acrescentado (contos) = valor da produção aos preços de venda (custo 66 075 161 406 industria - mão-de-obra) Capital fixo (contos) 172 000 320 000 Lisboa 49 198 123 641 Distribuição regional da produção a preços de venda ao retalhista 11 000 33 000 (contos) Coimbra Porto 19 552 46 859

Fonte: Tabela retirada de MINISTÉRIO DA ECONOMIA, Indústria da Alimentação e das Bebidas (classes 20 a 21): Relatório Preparatório do Plano de Investimentos para 1965-67 (Lisboa: Ministério da Economia, 1964), p. 8.

O balanço desta década não pode ficar concluído sem que se decomponha detalhadamente o despacho de 1968, a confirmação final da mudança de estratégia governamental no que toca ao sector cervejeiro, isto é, “utilizar o condicionamento industrial, [através da autorização de instalação de novas empresas], para romper os

62 MINISTÉRIO DA ECONOMIA. Indústria da Alimentação e das Bebidas (classes 20 a 21): Relatório Preparatório do Plano de Investimentos para 1965-67. Lisboa: Ministério da Economia, 1964, p. 8.

31 equilíbrios estabelecidos há décadas em sectores fortemente concentrados”63. Desde a orientação de Ferreira Dias, em 1960, até à data de promulgação deste novo despacho, não há uma evolução unívoca quanto aos pedidos de instalações. Em 1963, Lúcio Tomé Feteira requer a autorização para instalação de uma unidade fabril de cerveja, mas esta é rejeitada. A partir daqui, só em 1966/67, como mostra a tabela 1 do anexo B, se dá uma renovada afluência de pedidos, com o argumentário comum da existência de posições monopolistas no sector, que estarão na base de discussão do referido documento.

O despacho parece, na sua essência, sofrer de um problema de coerência, uma vez que desconsidera as críticas encetadas por alguns industriais acerca do monopolismo, dizendo que esta situação pode ser corrigida por ajustes pautais, não implicando necessariamente o licenciamento de novas fábricas, cujos investimentos poderiam ser nefastos para o sector. Mas, simultaneamente, com base na capacidade nominal de produção do sector, estabelecida em 170 milhões de litros/ano, e dadas as previsões de alcance desse número em 1972, no que toca ao consumo, considera-se proveitosa a entrada de uma ou várias empresas no mercado cervejeiro, desde que obedeçam às exigências emanadas do anterior despacho e que produzam refrigerantes e garrafas (apenas um dos requerentes cumpria estes objectivos – Supersumos). No entanto, a entrada em laboração da nova fábrica só estaria prevista para o ano de 1972, face às recentes previsões da produção e do consumo. No fundo, este despacho reflecte uma certa abertura à iniciativa privada, através de uma tentativa de liberalização económica, que pretendia enfrentar os problemas decorrentes da concorrência externa.

Entretanto, em 1969, a Supersumos, juntamente com outros accionistas, incluindo a Mahou, sociedade espanhola de assistência técnica, e a influência do Conde de Caria com o apoio do Banco Pinto e Sotto Mayor, constitui, a 27 de Março de 1969, a Cergal – Cervejas de Portugal (capital social de 60 000 contos), que fixa a localização da sua fábrica no distrito de Lisboa (Venda Seca, Belas), com uma produção anual de 25 000 000 litros.

63 RIBEIRO, José Félix et al. “Grande indústria, banca e grupos financeiros,” Análise Social XXIII, n.º 99 (1987): 945-1018, p. 1002.

32 1.5. Uma estabilidade relativa: os efeitos de um crescimento ilusório Nos anos 70 prosseguem os esforços no sentido de incrementar a internacionalização das cervejas portuguesas, já num quadro sectorial nacional mais alargado, com o início da comercialização da cerveja Cergal em 1972, após ter obtido a aprovação do plano de expansão da empresa. Os dados sobre as vendas do sector em 1970 revelam uma diminuta importância dos mercados externos, como se pode comprovar seguidamente:

Destino das vendas do sector cervejeiro em 1970 Metrópole 94% Ultramar 5,75% Estrangeiro 0,25% Total 100%

Nota: Tabela retirada da Indústria Portuguesa, n.º 523, XVLIV, Setembro de 1971

Apesar das anteriores indicações pessimistas no segmento da exportação, as recentes programações para o sector previam a alteração deste quadro num espaço temporal curto, daí a concessão de alvarás a duas novas empresas nos primeiros anos deste decénio (ver tabela 1, anexo B). Em 1972, face aos resultados do consumo de cerveja, os serviços industriais respondem positivamente aos pedidos de António Vítor de Almeida Saraiva, da Refriplás e de José Nunes Rodrigues. Na Guiné, a SCC e a CUFP participam na fundação da Cicer – Companhia Industrial de Cervejas e refrigerantes da Guiné, oficialmente inaugurada em Janeiro de 1974.

António Vítor de Almeida Saraiva, com o apoio da Interbrew e da Heineken, constitui a Copeja – Companhia Portuguesa de Cervejas, em 2 de Agosto de 1972, tendo a unidade fabril uma capacidade de laboração anual de 30 000 000 litros. Idêntica autorização foi concedida a José Nunes Rodrigues e à Refriplás – Indústrias Reunidas de Refrigerantes e Plásticos. Através de um novo despacho ministerial, em Maio de 1973, é autorizada a junção, numa única unidade (Imperial), localizada no distrito de Faro (Loulé), com uma capacidade de laboração anual de 60 000 000 litros, podendo, no entanto, arrancar com 30 000 000 de litros de capacidade.

É este o cenário da indústria cervejeira nas vésperas da revolução:

33 Continente e Ilhas Adjacentes Províncias Ultramarinas Sociedade Central de Cervejas Cuca – Companhia União de Cervejas de Angola Companhia União Fabril Portuense Nocal – Nova Empresa de Cervejas de Angola Cergal – Cervejas de Portugal Sogere – Sociedade Geral de Cervejas e Refrigerantes de Moçambique ! Companhia da Fábrica de Cerveja Reunidas de Moçambique ! Fábrica de Cerveja da Beira ! Companhia de Cervejas e Refrigerantes Mac-Mahon – Moçambique Copeja – Companhia Portuguesa de Cicer – Companhia Industrial de Cervejas e Refrigerantes da Cervejas Guiné Imperial – União Cervejeira Portuguesa Empresa de Cervejas da Madeira Fábrica de Cervejas e Refrigerantes João de Melo Abreu

1.5.1. Diagnóstico sectorial de 1974. O IV Plano de Fomento

Com a preparação do IV Plano de Fomento, diagnosticou-se um conjunto de problemas que subsistiam no sector. Trata-se fundamentalmente do aumento do custo da mão-de-obra, das matérias-primas, do problema dos combustíveis e da água, tal como a constante necessidade de modernização tecnológica. Quanto ao primeiro problema, aconselha-se o “estudo da evolução para efectivos de pessoal proporcionalmente mais reduzidos embora de maior qualificação, pelo recurso à automatização e pela adopção de métodos de trabalho mais evoluídos”64. Através do relatório e contas da SCC de 1972 e 1973, a questão do proteccionismo e da legislação aplicada à cevada é alvo de fortes críticas, uma vez que obriga a indústria cervejeira a “adquirir, em curto espaço de tempo, no final de cada campanha agrícola, a um preço oficialmente fixado, todas as quantidades que lhe sejam entregues pela Lavoura”, tendo que “pagar preços que se distanciam dos que são praticados internacionalmente”, o que coloca sérios problemas em situações de excedente na produção de cevada. Por outro lado, a subida do imposto de transacções de 2$10 para 2$80/litro reflecte-se num coro de protestos por parte dos industriais, que esperavam medidas de fomento do consumo e da exportação.

Num relatório preparatório do IV Plano de Fomento, elaborado pela Corporação da Indústria, a Companhia União Fabril Portuense dá conta dos problemas que se lhe colocam: o abastecimento de água na zona de Matosinhos, que causa graves perturbações ao funcionamento da empresa; a necessidade de redução do custo das

64 Boletim da Sociedade Central de Cervejas, n.º 1, 1974.

34 cevadas nacionais, uma vez que as cevadas importadas acabam por ser menos dispendiosas; as deficiências dos meios de comunicação na zona Norte; critica aos novos licenciamentos que poderão arrastar a indústria cervejeira para o caos, pois o total da capacidade produtiva – 225 milhões de litros/ano (com estimativa de capitação de 28,1 litros/pessoa) – ultrapassa em larga escala o consumo nacional – capitação de 14,1 litros/pessoa65.

1.5.2. Redes de interesses, grupos e monopolismo

O sector cervejeiro, tal como os principais sectores concentrados em Portugal, constituía um autêntico jogo de relações e interesses, por vezes difícil de destrinçar. Através do diagrama e da tabela presentes no anexo D, é realizada uma viagem desde 1934 até 1974, onde procuramos encontrar e relacionar os principais actores entre si, tornando visível aquilo que poderia parecer um jogo de sombras. Veremos, à medida que avançamos temporalmente, a entrada de interesses e capitais financeiros no sector, através de “participações cruzadas entre os bancos e as grandes empresas, cujos principais accionistas eram accionistas minoritários dos bancos”66, que ajudam a prolongar o monopólio existente, assente sobretudo entre a Sociedade Central de Cervejas e a Companhia União Fabril Portuense, ainda que com uma relevância muito maior da primeira, até porque, como já foi referido, a SCC vai tomar parte de 51% do capital social da CUFP, em 1947.

Um dos protagonistas fulcral neste enredo é Manuel Vinhas, cervejeiro e vidreiro, industrial-banqueiro (um dos representantes do Banco Português do Atlântico) e um dos donos da Portugália. É através desta empresa que, em 1934, procede à concentração da indústria cervejeira na Sociedade Central de Cervejas, com excepção da Companhia União Fabril Portuense. Importante nestas relações era a ligação do sector cervejeiro à indústria de vidro e garrafas, onde a Portugália detinha a Empresa Produtora de Garrafas. A família Lancastre de Freitas e Carvalho Martins assumem um papel de igual respeito no seio da Sociedade Central de Cervejas. Surgem recorrentemente, numa espécie de evolução hereditária, apelidos familiares similares

65 PORTUGAL. CORPORAÇÃO DA INDÚSTRIA. IV Plano de Fomento. Anexo: Questões sectoriais. Lisboa: s.n, 1972, pp. 44-48. 66 RIBEIRO, José Félix et al. “Grande indústria, banca e grupos financeiros,” Análise Social XXIII, n.º 99 (1987): 945-1018, p. 1015.

35 nos cargos mais importantes – Lancastre de Freitas, Sttau Monteiro, Moniz Galvão, Carvalho Martins, Homem de Mello, Miles (na Madeira), Beirão da Veiga etc. – indicando a estrutura fechada, característica do patronato português.

Estas relações íntimas entre o industrial e o financeiro ganham relevo a partir da década de 60, até pela necessidade de investimento necessário para se proceder à modernização das instalações na indústria. Esta realidade é facilmente percepcionada na leitura dos relatórios e contas, por exemplo, da CUFP, ao encontrar o Banco Português do Atlântico no Conselho de Administração em 1961, representado por Alberto Pires de Lima (e depois Cupertino de Miranda), ou descobrir a presença de Manuel Ricardo Espírito Santo Silva no mesmo Conselho de Administração, como delegado da Companhia de Cervejas Estrela. O próprio engenheiro João Talone, responsável pelo projecto de desenvolvimento da empresa neste período e, mais tarde, administrador da Cuca, exerceu as funções de administrador executivo do Banco Português do Atlântico entre 1972 e a nacionalização do mesmo. Na Sociedade Central de Cervejas, o Banco Português do Atlântico e o Banco Espírito Santo (através da Estrela) surgem igualmente pelas mesmas razões, enquanto o Banco Borges & Irmão ganha força mais tardiamente, apesar de deter o capital da Fábrica de Coimbra (participação com a SCC na formação da Sogere – Sociedade Geral de Cervejas e Refrigerantes de Moçambique). Encontram- se ainda na SCC nomes como Fernando Moniz Galvão, Manuel Ricardo Espírito Santo, entre outros com ligações a grupos financeiros.

Os trusts não se encerram à indústria cervejeira. Criam, por seu turno, uma teia complexa de participações financeiras que merecem ser cuidadosamente examinadas. No vidro, a Empresa Produtora de Garrafas, da SCC, dá lugar, em 1968, à Cive, que engloba, para além daquela empresa, a Guilherme Pereira Roldão e duas empresas de cristalaria, a Ivima e a Crisal. A SCC empreende ainda integrações verticais nos plásticos – Síntex (1972) –, nas águas, no vinho e nos refrigerantes – Adegas Camillo Alves, Sociedade de Água de Luso, por exemplo – e até em empresas de publicidade, como a Cinevoz (1967) e supermercados (Nutripol). A CUFP detinha algumas participações financeiras relevantes e diversas, que iam desde as empresas cervejeiras nas colónias, a empresas de alimentação, como a Gelex, e águas – Empresa das Águas Medicinais Castelo de Vide –, passando pelo sector agrícola, mormente na Lupulex – Sociedade Portuguesa de Cultura de Lúpulo, entre muitas outras.

36 Todavia, a década de 70 vai inaugurar uma nova fase da monopolização através do sector financeiro e de sociedades de investimento. É o que acontece na Portugália onde, através da Sociedade de Investimentos São Ciro, os interesses da família Vinhas vão-se estendendo67 (na Estrela sucede-se o mesmo com a Progredior, controlada pela família Carvalho Martins). Em 1973, os principais accionistas da SCC constituem uma sociedade de controlo, a Parfil – Sociedade de gestão de Participações Financeiras, cujo objectivo “é a gestão de participações noutras sociedades”68.

O grupo do Conde de Caria está também ligado à indústria de bebidas, sempre numa relação estreita com o grupo Champalimaud e o grupo CUF, bem como ao sector financeiro, através do Banco Pinto e Sotto Mayor. Destacam-se aqui as empresas Vidago, Melgaço & Pedras Salgadas e Supersumos, sendo esta última a fundadora da Cergal, empresa que concentra os interesses dos grandes industriais vidreiros (Santos Galo e Santos Barosa). Na Copeja, assiste-se, da mesma forma, à presença da banca, com o Banco Espírito Santo, aliado à família Guedes de Sousa e ao grupo Comundo – “sociedade mãe de muitas sociedades luso-estrangeiras”69 (um dos representantes do BPA). Os accionistas da Imperial, segundo Maria Belmira Martins, não diferem muito dos da Copeja. O Banco Espírito Santo participava ainda na Nocal, em Angola.

1.5.3. O sector cervejeiro e a economia portuguesa nas vésperas da Revolução

Compreender a economia da Revolução pressupõe um conhecimento enquadrado dos sinais, das características, das mudanças que marcaram o período pré- revolucionário. A evolução dos acontecimentos nos mais variados domínios permite- nos identificar alguns traços que considero marcantes, e que, na área económica, se podem dividir em duas fases, com um ponto de ruptura em 1957, após a realização do II Congresso da Indústria Portuguesa. Se na primeira fase tínhamos um modelo económico assente na estabilidade financeira, no planeamento a médio prazo, privilegiando o sector agrícola e algumas indústrias complementares e que sacrificava a modernização pela estabilidade social, o final da década de 50 vai significar uma recusa deste modelo de transição, fundando as bases do crescimento e desenvolvimento

67 MARTNS, Maria Belmira. Sociedades e grupos em Portugal. Lisboa: Estampa, 1973. 68 MARTINS, Américo Central De Cervejas: 50 anos de actividade. Lisboa: Central de Cervejas, 1985. 69 MARTNS, Maria Belmira. Sociedades e grupos em Portugal. Lisboa: Estampa, 1973, p. 45.

37 económico numa nova política industrial, que remetia para a exportação os novos horizontes, procurando contrariar a política de substituição de importações. Entre as variáveis em jogo podem ainda destacar-se a guerra colonial que marcou os anos 60 e 70, bem como os ventos de mudança que se faziam sentir no contexto internacional relativamente à descolonização; a adesão a estruturas internacionais e de cooperação, como a NATO, a ONU e a EFTA, não negligenciando os motivos de tais adesões; a crise petrolífera de 1973, entre uma série de outros leitmotivs.

A importância destas questões, por vezes aparentemente residuais, só é correctamente formulada quando analisadas a longo prazo, enquadradas no contexto mais abrangente da situação económica que assinalou todo o período revolucionário português, até porque muitos destes pontos estarão presentes e constituirão focos de tensões e discussões económico-políticas durante o PREC (cf. dicotomias: estabilidade- desenvolvimento, intervencionismo-liberalismo, isolamento-abertura, africanismo- europeísmo, agricultura-indústria, etc.). Assim sendo, a questão da estabilidade financeira, que se insere num campo de debate maior entre finanças (percepcionada como conservadora) e economia (numa óptica de transformação), tornou-se peça-chave da política económica salazarista, que se foi alicerçando e transformando “em algo para além do campo da opção política circunstancial, adquirindo um estatuto virtualmente mítico”70, conduzindo ao atraso do desenvolvimento económico e industrial do país.

Augusto Mateus fala da importância das relações entre as dinâmicas interna e externa para se perceber a evolução estrutural da economia portuguesa. Deste modo, a internacionalização da economia portuguesa neste período de análise pode ser descrita como limitada, pois era dominada por “movimentos de mercadorias com base em vantagens comparativas limitadas”, no quadro da EFTA. Esta situação coexistia com a “manutenção da relevância do comércio colonial”, num sistema fechado ao investimento estrangeiro71. No plano interno, à manutenção de salários reais baixos, somou-se a debilidade da estrutura económica e a pouca apetência para assumir riscos, podendo ser observado pelo peso das várias actividades industriais. O bloqueamento a estratégias e planos de desenvolvimento económicos ousados é das questões mais

70 LOPES, Ernâni Rodrigues. “O desenvolvimento económico-social desde o pós-guerra 45 e a integração europeia. Dilemas portugueses.”, in Portugal e a Europa: 50 anos de integração. Lisboa: Verbo, 1996, p. 27. 71 MATEUS, Augusto. “O 25 de Abril, a transição política e as transformações económicas", in O País em Revolução. Lisboa: Editorial Notícias, 2001, p. 263.

38 interessantes, que terá consequências não só nesse período, mas também durante o processo revolucionário em curso. Ainda assim, e contrariamente ao discurso ruralista de Salazar nos anos 50, houve uma tendência, que Silva Lopes considera natural, para a industrialização, mas nos moldes que os capítulos anteriores foram demonstrando.

O crescimento económico português na década de 60 foi notável em termos absolutos, mas em termos relativos a espectacularidade do mesmo é minimizada. Na realidade, o desenvolvimento da década de 60 acontece simultaneamente com uma verdadeira quebra ou crise na agricultura, evidenciada no êxodo rural, bem como no aumento da emigração para países europeus (ex. França), caso único por toda a Europa devido à quebra de população na metrópole, que baixa de “8,89 para 8,61 milhões (- 3,1%) nos anos 60”72. António de Sousa Franco, de forma bastante sistemática, aponta os sinais de crise que se começam a evidenciar a partir de 1967 (com base em dados do Banco de Portugal), e se podem representar do seguinte modo:

i. “Atenuação das taxas de crescimento das exportações e dificuldades de continuar a tradicional política de substituição de importações; ii. Incremento do défice comercial, compensado, na balança de pagamentos correntes, pelas remessas de emigrantes; iii. Afrouxamento do ritmo de crescimento do investimento industrial; iv. Aparecimento de taxas de inflação progressivamente mais fortes; v. Dificuldade de o Estado suportar os gastos de infra-estrutura, devido ao peso das despesas da guerra, com deterioração da qualidade e eficiência do aparelho do Estado; vi. Diminuição dos salários reais em 1971, 1972 e 1973”73.

Os indícios de uma crise complexa do modelo económico do Estado Novo também não surgem isoladamente. Pelo contrário, eclodem acompanhando a evolução europeia, já se fazendo sentir algumas mudança sociais em Portugal, nomeadamente com a emergência de uma nova classe média, que rejeitava o carácter rural do Estado e “não desejava mais do que ser «europeia»”74. Apesar deste “período glorioso” em termos económicos, José da Silva Lopes diz-nos que Portugal encontrava-se na cauda da Europa75. Todas as alterações no tecido económico que aqui tenho dado conta, estão

72 LOFF, Manuel. “Fim do colonialismo, ruptura política e transformação social em Portugal nos anos setenta", in Portugal: 30 anos de democracia (1974-2004). Porto: Editora UP, 2006, p. 155. 73 FRANCO, António de Sousa. “Economia", in Portugal, 20 anos de Democracia, ed. António Reis. Lisboa: Círculos de Leitores, 1994, pp. 173-174). 74 MAXWELL, Kenneth. A construção da democracia em Portugal. Lisboa: Presença, 1999, p. 40. 75 LOPES, José da Silva. A economia portuguesa desde 1960. Lisboa: Gradiva, 1996, p. 15.

39 bem perceptíveis no quadro relativo à evolução do emprego em Portugal elaborado por Américo Ramos dos Santos76:

1960 1973 Emprego Total 3 112 000 3 124 300 Emprego PIB Emprego PIB Sector primário 43,6% 25,1% 26% 12,2% Sector secundário 28,7% 36,5% 36,7% 51,7% Sector terciário 27,7% 38,4% 37,3% 36,1%

A crise petrolífera de 1973, que conduziu ao aumento exponencial do preço do crude (quadruplicou, aumentando de três para doze dólares/barril), a par da contracção económica, da pressão inflacionista e da desregulamentação do sistema monetário internacional, colocou um ponto final na época áurea do crescimento económico europeu, com implicações para a economia portuguesa.

As sucessivas tentativas dos elementos tecnocratas77 do governo de Marcello Caetano não conseguiram suster a degradação do regime e do modelo económico subjacente, sobretudo pela acção da velha guarda salazarista, os ultras do regime. As palavras que se seguem, de Fernando Rosas, traduzem na perfeição o fracasso da mudança política – a última evolução na continuidade, a última transição falhada:

“o marcelismo era, na realidade, a expressão do triunfo tardio de uma corrente reformista dentro do Estado Novo, surgida no rescaldo da II Guerra Mundial, e que, em 1968, após acidentes vários e algumas oportunidades ingloriamente perdidas, chegava finalmente ao poder. Iria deixar fugir, também, desta feita, como veremos, a última chance de conduzir o regime por um processo de transição”78.

O processo de industrialização que ocorreu nos anos 60 acabou por se tornar, de certa forma, disfuncional e desarticulado da realidade, por não conseguir ultrapassar alguns obstáculos e imobilismos que se mantinham do passado, não querendo com isto negligenciar todas as transformações essenciais que gerou na sociedade portuguesa. Mas, que industrialização seria esta que vivia de mãos dadas com o condicionamento industrial? Como modernizar com um processo de industrialização que parece rejeitar a competitividade interna e externa, num sistema fechado e com condições de produção

76 SANTOS, Américo Ramos dos. “Abertura e bloqueamento da economia portuguesa", in Portugal Contemporâneo, 1958-1974, ed. António Reis, vol. V. Lisboa: Publicações Alfa, 1989, p. 131. 77 Tais como Rogério Martins, Xavier Pintado, João Salgueiro e Vasco Leónidas. 78 ROSAS, Fernando. “O Marcelismo ou a falência da política de transição no Estado Novo", in Do Marcelismo ao Fim do Império, ed. José Maria Brandão de Brito. Lisboa: Editorial Notícias, 2001, p. 16.

40 artificiais? Nesta conjuntura global, realça-se o surgimento de um número reduzido de grupos económico-financeiros hegemónicos que, fazendo uso das palavras de Ernâni Rodrigues Lopes, “[constituem] a base organizacional dos segmentos dinâmicos da economia portuguesa”79 – são os chamados sete magníficos, que controlavam os sectores industriais de maior produtividade, taxa de lucro e capacidade tecnológica, bem como os sectores básicos e a banca80.

Enquadrada neste cenário, a indústria cervejeira portuguesa, sendo um sector com forte contribuição para o crescimento industrial do país81, sobretudo a partir dos anos 60, em que engrossa os cofres do Estado com largos montantes de capital provenientes do imposto sobre o produto, parece representar minimamente as aparentes contradições da(s) política(s) económica(s) do Estado Novo, apesar de se encontrar, não raras vezes, em posições de vanguarda em vários domínios – veja-se a investigação científica, o marketing, a formação técnica, etc. No fundo, tal como a economia portuguesa, o crescimento deste sector, em termos absolutos é relevante, mas em termos comparativos acaba por ficar aquém da evolução da indústria cervejeira mundial, sobretudo no que diz respeito ao volume de produção e à exportação. No plano do crescimento, contrariamente à situação de outros sectores, a indústria da cerveja não conheceu uma situação de real declínio ou desaceleração no final da década de 60 / início de 70, mas na vertente financeira a situação não é a mesma, como teremos oportunidade ver. O sector cervejeiro – e praticamente toda a indústria de processos – constitui-se como um dos principais núcleos de desenvolvimento industrial, não ultrapassando alguns vícios e problemas estruturais da indústria portuguesa, nomeadamente a exploração de mão-de-obra pouco qualificada e a recusa da tecnologia e inovação.

79 LOPES, Ernâni Rodrigues. “O desenvolvimento económico-social desde o pós-guerra 45 e a integração europeia. Dilemas portugueses,” Portugal e a Europa - 50 Anos de Integração (1995): 25-45, p. 32. 80 ROLLO, Maria Fernanda. “A industrialização e os seus impasses,” in História de Portugal: o Estado Novo (1926-1974), ed. José Mattoso, vol. 7, 8 vols. Lisboa: Estampa, 1998, p. 421. 81 LISBOA, Manuel. A Indústria Portuguesa e os seus dirigentes. Lisboa: Educa, 2002.

41 2. Economia da Revolução: contextualização

2.1. Revolução e transformações A revolução que eclodiu na madrugada de 25 de Abril de 1974 e que pôs fim a 48 anos de ditadura deve ser analisada sob várias perspectivas, sobretudo relacionadas com a crise definitiva do paradigma colonial e todas as questões envolventes (desde o cansaço acumulado, às demissões de altas patentes e a percepção militar da derrota na Guiné, bem como a entrada de oficiais milicianos no quadro). O golpe militar que fez cair o regime, não implicou o colapsar imediato do Estado, mas sim “das características fascistas do velho regime: partido único, a polícia política, as milícias paramilitares, o tribunal plenário, os presos políticos, a repressão da liberdade de expressão e de associação”82. Considero que o processo revolucionário que se seguiu foi o dínamo das transformações destes anos (1974-1976), com grande participação social, ainda que num movimento amplamente assimétrico e multipolar, com linhas temporais razoavelmente demarcadas.

Descrever a economia da revolução, os seus indicadores económicos, as linhas de orientação, as transformações operadas e as especificidades desta época é um trabalho aliciante, maciço e, acima de tudo, ainda muito mitificado. Deste modo, procurarei analisar e explicitar os objectivos económicos iniciais e toda a sua evolução num quadro político-militar governamental, mas também na esfera não-governamental. Consequentemente, sublinharei as tensões existentes e as principais políticas aplicadas, com particular enfoque para a questão das nacionalizações (sobretudo no capítulo 3 e 4).

O programa do Movimento das Forças Armadas (MFA), sobre a égide dos três D’s – descolonizar, democratizar e desenvolver – é aparentemente muito vago no que diz respeito aos seus fundamentos económicos e sociais:

“a) Uma nova política económica, posta ao serviço do Povo Português, em particular das camadas da população até agora mais desfavorecidas, tendo como preocupação imediata a luta contra a inflação e a alta excessiva do custo de vida, o que necessariamente implicará uma estratégia antimonopolista”.

82 SANTOS, Boaventura de Sousa. O Estado e a Sociedade em Portugal (1974-1988). Porto: Afrontamento, 1998, p. 27.

42 “b) Uma política social que, em todos os domínios, terá essencialmente como objectivo a defesa dos interesses das classes trabalhadoras e o aumento progressivo, mas acelerado, da qualidade da vida de todos os Portugueses”83.

Não deixa, no entanto, de ser relevante a preocupação com a crise que se fazia sentir, especialmente o receio da inflação. Por outro lado, estabelece-se formalmente o inimigo da revolução – classe capitalista, financeira, e outros ramos de actividades análogos –, surgindo o interesse dos trabalhadores como uma das referências capitais.

A Junta de Salvação Nacional, com Spínola como principal figura, vai promover uma série de acções conducentes à desestruturação do antigo regime, nomeadamente ilegalizar a Acção Nacional Popular, permitir a liberdade sindical e destituir a Assembleia Nacional. Em 14 de Maio de 1974, a Junta de Salvação Nacional decreta a estrutura constitucional transitória (Lei n.º 3/74), que revoga a Constituição de 1933 naquilo que era contrário às disposições constitucionais anteriores – Leis n.os 1/74 e 2/74 – e estabelece as principais normas, medidas e órgãos que devem vigorar até à concretização de uma nova Constituição. António de Spínola é o militar escolhido para a Presidência da República, que coexistirá com um conjunto de organismos84.

Neste mesmo mês, a 16 de Maio, é formado o I Governo Provisório, liderado pelo liberal independente Adelino da Palma Carlos, integrando representantes dos principais partidos políticos (Partido Comunista, Partido Socialista, Partido Popular Democrático, CDS e MDP) e militares. O programa do governo é uma peça de estudo fulcral, uma vez que esclarece as clivagens existentes, as esperanças e as linhas de rumo que se colocavam, mas demonstra as limitações que os próprios sentiam pela simples constatação de que o carácter transitório não permitia “grandes reformas de fundo, nem alterações que afectem o foro íntimo da consciência dos Portugueses, em particular das suas convicções morais e religiosas” (D. L. n.º 203/74, in S.a, 1975, p. 5/24). No quadro que se segue, adaptado do Programa do Governo Provisório, apresentarei as medidas centrais e os objectivos da política económica e financeira:

! “Combate à inflação, através de medidas de carácter global;

83 s.a, Programa do Movimento das Forças Armadas. E vários decretos e leis publicados pelo Governo Provisório. Lisboa: Rei dos Livros, 1975, p. 5/20. 84 A concepção de duplo poder emerge naturalmente: Governo Provisório, Junta de Salvação Nacional, Conselho de Estado.

43 ! Revisão da orgânica e dos métodos de administração económica, de modo a dotá-los de eficiência e celeridade de decisão; ! Eliminação dos proteccionismos, condicionalismos e favoritismos que restrinjam a igualdade de oportunidades e afectem o desenvolvimento económico do País; ! Criação de estímulos à poupança e ao investimento privado – interno e externo –, com salvaguarda do interesse nacional; ! Adopção de novas providências de intervenção do Estado nos sectores básicos da vida económica, designadamente junto de actividades de interesse nacional, sem menosprezo dos legítimos interesses da iniciativa privada; ! Intensificação do investimento público, designadamente no domínio dos equipamentos colectivos de natureza económica, social e educativa; ! Liberalização – em conformidade com os interesses do País – das relações económicas internacionais, no domínio das trocas comerciais e dos movimentos de capitais; ! Apoio e fomento de sociedades cooperativas. Revisão dos circuitos de comercialização, de molde a libertá-los de intervenções e encargos não justificados; ! Reforma do sistema tributário, tendente à sua racionalização e à atenuação da carga fiscal sobre as classes desfavorecidas, com vista a uma equitativa distribuição do rendimento; ! Adopção de medidas excepcionais destinadas a combater a especulação e a fraude fiscal; ! Reforma do sistema de crédito e da estrutura bancária, visando, em especial, as exigências do desenvolvimento económico acelerado; ! Nacionalização dos bancos emissores; ! Dinamização da agricultura e reforma gradual da estrutura agrária; ! Auxílio às pequenas e médias empresas; ! Protecção das participações minoritárias no capital das sociedades”85.

Numa série de alterações a que se propõe, o I Governo Provisório não fecha as portas da intervenção estatal, pelo contrário, expande até a possibilidade de actuação em alguns sectores essenciais, falando da nacionalização dos bancos emissores e do eterno problema da questão agrícola. Note-se também a presença de um pensamento anti- monopolista e a importância concedida às pequenas e médias empresas. Deixo ainda um breve apontamento para a presença de Vasco Vieira de Almeida à frente do Ministério da Coordenação Económica, que se ocupa das seguintes áreas: finanças, planeamento económico, indústria e energia, agricultura, comércio externo e turismo e abastecimento e preços. Nos tempos iniciais, a actuação do Governo Provisório cingiu-se sobretudo a políticas de emergência, a

85 Ibid, pp. 5/26 e 5/27, sublinhado nosso.

44 “tentativas de articulação [...] de medidas imediatas que evitassem as consequências negativas de qualquer situação anárquica ou revolucionária (especulação, açambarcamento de bens, escassez de abastecimentos, fuga de capitais ou de bens de património, incerteza, insegurança, instabilidade social) com algumas providências que marcassem a propriedade de um certo sentido social (em geral socializante ou mesmo socialista)”86.

Foi nesta óptica – sobretudo com o D.L. n.º 217/74 (27 Maio) – que se procedeu ao congelamento dos preços de bens essenciais, à fixação do Salário Mínimo Nacional (3 300$00), ao aumento do abono de família, ao congelamento das rendas urbanas, à criação da Comissão de Apoio às Pequenas e Médias Empresas, ao encerramento das Bolsas de Valores de Lisboa e do Porto e ao controlo das contas bancárias para evitar fugas de capitais (em parceria com o sindicato). Este período conheceu, de igual modo, um enorme movimento social espontâneo, fonte geradora de enormes conflitos sociais e laborais, começando a definir-se os vários pólos e agentes da revolução: destacam-se as ocupações de casas de habitação por vários pontos urbanos, mas em especial no centro e sul do país (Lisboa, Setúbal); a ocupação da Companhia das Águas de Lisboa (21 de Maio de 1974); a explosão de movimentos grevistas e a criação das comissões de trabalhadores e das comissões de moradores, com larga experiência acumulada antes do 25 de Abril87, bem como a emergência de sindicatos fortes e organizados. No fundo, a execução das medidas que estavam previstas no programa do Governo não foi realizada totalmente e é esta situação que permanece até ao 11 de Março de 1975, uma vez que num programa de feições socialista e liberais, num quadro revolucionário sem posições totalmente clarificadas, seria muito difícil o cumprimento destas linhas programáticas. Anexa-se a isto o facto de a prioridade política estar centrada na descolonização, na “desfascização” dos organismos estatais e das entidades públicas, e no controlo da situação social.

O I Governo Provisório vai acabar por ter uma vida curta, caindo a 11 de Julho de 1974, fruto das propostas de Palma Carlos de realizar, ao mesmo tempo, eleições presidenciais e um referendo para uma Constituição provisória. Como estas propostas contrariavam o programa do MFA e propunham o reforço do poder do Presidente da República, elas foram rejeitadas e Palma Carlos pede a demissão a 09 de Julho. A 12 de Julho, Vasco Gonçalves, da facção militar mais próxima do PCP, é indigitado por

86 FRANCO, António de. “Economia, in Portugal, 20 anos de Democracia, ed. António Reis. Lisboa: Círculo de Leitores, 1994, p. 177. 87 cf. O 25 de Abril e as lutas sociais nas empresas

45 Spínola para ocupar o cargo de Primeiro-ministro. As posições começam a definir-se em torno de outro foco de tensão entre o MFA e Spínola: a questão da descolonização e da autodeterminação dos povos. Este problema será formalmente resolvido com o esclarecimento ao Programa do MFA, que afirma “o reconhecimento [...] do direito dos povos à autodeterminação”88.

Os traços definidores da política económica do novo governo não se encontram ordenados no programa do governo, mas estão, curiosamente, presentes no discurso da tomada de posse de Vasco Gonçalves. Este dá continuidade à concepção de uma economia ao serviço do povo e dos trabalhadores, num tempo de grandes dificuldades. Fala de um apoio à iniciativa privada desde que esta adira “sem ambiguidades ao esforço de reconstrução nacional” e coexista com as “potencialidades do Estado”, num caminho de modernização económica89. Mais importante que estas chamadas de atenção, é a explicação dada relativamente à questão das reformas de fundo:

“[...] o Programa do Movimento das Forças Armadas não permite a efectivação de transformações radicais ou revolucionárias da estrutura sócio-económica da sociedade portuguesa; contudo, nem da letra nem do espírito do referido Programa se pode concluir que não possam desde já ser adoptadas as medidas que se julguem necessárias para acelerar o progresso económico-social, melhorar as condições de vida do Povo Português e aproximá-lo dos níveis dos outros povos da Europa”90.

O Ministério da Coordenação Económica é extinto a 18 de Julho e em seu lugar é criado o Ministério da Economia, sob a orientação de Emílio Rui Vilar, e o Ministério das Finanças, cuja liderança coube a José da Silva Lopes.

Face aos conflitos latentes entre spínolistas e o MFA, não tardou a que começassem a surgir tentativas golpistas. Foi o que aconteceu a 28 de Setembro, com a manifestação da maioria silenciosa, que, contudo, acabou por fracassar e conduziu à demissão de Spínola. Costa Gomes é então nomeado Presidente da República e é formado o III Governo Provisório, chefiado por Vasco Gonçalves, com reforço da posição do MFA no governo. Nos quadros do MFA é reformulada a Junta de Salvação Nacional, com o afastamento dos spínolistas, e é criado o Conselho dos Vinte (Conselho

88 s.a, Programa do Movimento das Forças Armadas. E vários decretos e leis publicados pelo Governo Provisório. Lisboa: Reis dos Livros, 1975, p. 5/53. 89 GONÇALVES, Vasco. Programa do II Governo Provisório. S.l: s.n, 1974, p. 10. 90 Ibid.

46 Superior do MFA), um órgão que teria como objectivo “coordenar a actividade de todos os militares, [...] tendo em vista uma maior integração das hierarquias no processo revolucionário e o estabelecimento real e eficaz de um fluxo de informação a todos os níveis militares”91. Foi ainda criada a Assembleia do MFA (ou Assembleia dos Duzentos), como espécie de órgão consultivo, que vai acentuar a predominância do MFA em relação aos demais.

O período que decorre de Outubro a Março de 1975 é especialmente um período de definição do modelo político e económico, com largo protagonismo para o MFA e para o crescimento das forças de esquerda. Os restantes partidos políticos encontram-se numa fase organizativa, de realização de congressos e divulgação dos programas. Como refere Inácia Rezola, o “tom geral é de moderação”92, e de subalternização do poder civil ao militar. Ao mesmo tempo, no interior do MFA fazem-se sentir algumas vozes dissonantes com o rumo dos acontecimentos, e isto é manifestado na divisão em três frentes: “a moderada, a gonçalvista e a populista”93. Inicia-se, apesar da fractura ideológica, o processo de institucionalização do MFA na vida política, que verá o seu auge na sequência dos acontecimentos de 11 de Março, mas que passou pelo beneplácito do espectro partidário em finais de 1974, e com a reunião de um relativo consenso quanto a uma via socialista ou socializante (a definir), anti-monopolista e mais activa, como se depreende pela prisão de alguns administradores da Torralta e de instituições bancárias, acusados de sabotagem económica (13 de Dezembro de 1975).

Quanto às intervenções do Estado, a 12 de Outubro é publicado o D. L. n.º 540- A/74, que garante a possibilidade de intervenção do Estado na banca “em situações específicas em relação a determinadas situações”, através de delegados e/ou administradores do Governo. Isto surge na sequência da nacionalização dos bancos emissores (Banco de Angola; Banco Nacional Ultramarino e Banco de Portugal) que ocorreu a 13 de Setembro, e que será tratada de forma mais cuidada no capítulo 3. O D. L. n.º 671/74 (21 de Novembro) reforça esta posição e a capacidade de coordenação do Banco Central junto das instituições de crédito. Já a 25 de Novembro, através do D. L. n.º 660/74, fica prevista a intervenção directa do Estado nas empresas privadas sempre

91 REZOLA, Maria Inácia. Os militares na revolução de Abril: o Conselho da Revolução e a transição para a democracia em Portugal, 1974-1976. Lisboa: Campo da Comunicação, 2006, p. 51. 92 Ibid, p. 54. 93 Cervelló, cit. por Ibid, p. 55.

47 que for necessária a regulação, nomeadamente por motivos de sabotagem económica, disciplinados pelo seguinte índice:

i. “Encerramento ou ameaça de despedimento total ou de secções significativas da empresa, ou despedimentos efectivos ou eminentes da parte importante do pessoal sem justa causa; ii. Abandono de instalações ou estabelecimentos; iii. Descapitalização ou desinvestimento significativos e injustificados; iv. Incumprimento ou mora no cumprimento, de forma reiterada, das obrigações da empresa; v. Desvio de fundos da actividade corrente da empresa; vi. Redução dos volumes de produção não justificada em termos de mercado; vii. Empolamento injustificado das despesas gerais e de administração; viii. Outras situações emergentes de conduta dolosa ou gravemente negligente na condução da actividade económica”94.

Abre-se a possibilidade do Estado intervir directamente, mas ainda não se fala em nacionalização. Outros decretos importantes neste contexto são os D.L. n.os 1/75 e 51/75: o primeiro tem que ver com o financiamento bancário e as movimentações e créditos, enquanto o segundo se traduz na criação do Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas Industriais (IAPMEI).

O Plano de Melo Antunes (PPES) foi aprovado a 07 de Fevereiro pelo Conselho de Ministros, mas nunca chega a entrar em vigor. Elaborado pelo ministro sem pasta, Ernesto Melo Antunes, e por alguns especialistas como Rui Vilar, José da Silva Lopes, Maria de Lourdes Pintasilgo, Vítor Constâncio e outros, o PPES é, sem dúvida, o primeiro grande programa económico-social de fundo para a sociedade portuguesa, de definição das grandes opções e linhas programáticas, não apenas num sentido de colmatar a situação vigente, mas com perspectivas mais ambiciosas. Preparado desde Outubro de 1974, o Programa reflecte uma certa cisão entre os oficiais progressistas (atente-se às constantes alterações introduzidas), mas parece estar desenquadrado da realidade do momento, que conhece a ascensão de uma via mais revolucionária e socialista. Podem ser observadas algumas das suas medidas e objectivos no quadro sequente:

! “Melhoria do nível de vida da população; ! Criação de novos empregos e incentivo ao investimento;

94 s.a, Programa do Movimento das Forças Armadas. E vários decretos e leis publicados pelo Governo Provisório. Lisboa: Reis dos Livros, 1975, pp. 5/55 e 5/56.

48 ! Controlo pelo Estado dos sectores-chave da economia, nomeadamente das indústrias extractivas e transformadoras; ! Controlo do Crédito Predial Português pelo sector público; ! Criação de uma única empresa de transportes marítimos, na qual o Estado tomará 51% do capital social; ! Criação de empresas públicas de comercialização interna de produtos de primeira necessidade; ! Política de participação dos trabalhadores em órgãos de fiscalização e vigilância das empresas; ! Criação de um instituto nacional de promoção industrial e de um Instituto de Gestão das participações financeiras do Estado; ! Ampla reforma fiscal; ! Apoio ao investimento privado; ! Não ingerência do Estado na vida das empresas (a não ser em casos extremos)”95.

Apesar de não ter entrado em funcionamento, na minha perspectiva, o PPES inaugura uma nova etapa no que concerne às política económicas, particularmente no sentido de instaurar um socialismo de tipo único, que procura romper com “o sistema capitalista ou modelos neocapitalistas, ou modelos de social-democracia da Europa Ocidental, [ou] das chamadas democracias populares”96. O que se sucede após a tentativa golpista de Spínola e dos sectores conservadores no dia 11 de Março é a radicalização destas propostas, levando até aos limites possíveis os ideais presentes no quadro inicial do MFA e de algumas posições partidárias. Desta forma, extingue-se a Junta de Salvação Nacional, o Conselho dos Vinte e o Conselho de Estado, e é criado, por sua vez, o Conselho Superior da Revolução (12 de Março), o mega-órgão orientador/executivo de todo o processo, que contará, até às eleições para a Constituinte, com o apoio dos partidos, como o prova o Pacto MFA-Partidos, bem como o reconhecimento do poder legislativo para a reforma estrutural da economia portuguesa que lhe é concedido a 21 de Março. Nos dias imediatamente a seguir ao 11 de Março lançam-se as primeiras nacionalizações de fundo, nomeadamente sobre as instituições bancárias e as companhias de seguros. Outro caso que, por seu lado, trará grandes confrontações ideológicas e sociais é a problemática da unicidade sindical.

95 PPES, in REZOLA, Maria Inácia. Os militares na revolução de Abril: o Conselho da Revolução e a transição para a democracia em Portugal, 1974-1976. Lisboa: Campo da Comunicação, 2006, p. 74, sublinhado nosso. 96 Melo Antunes, cit. por Ibid, p. 76.

49 Nas ruas, nas fábricas e nos campos os movimentos sociais são constantes e diversificados, com ocupações de empresas pelos trabalhadores, estabelecimento de sistemas de autogestão, etc. Surge um novo governo na sequência destes acontecimentos, a 26 de Março, com Vasco Gonçalves como Primeiro-ministro, mas com a redução de sectores mais à direita. Assim, não são de estranhar as novas linhas de orientação da política económica, aprovadas a 10 de Abril e que se consubstanciam no D.L. n.º 203-C/75 de 15 de Abril, o qual define o modelo económico e as bases gerais do programa de medidas económicas de emergência (mais nacionalizações e reforma agrária). Mário Murteira é o elemento escolhido para a pasta do Planeamento e Coordenação Económica, José Joaquim Fragoso para a pasta das Finanças e João Cravinho fica responsável pelo Ministério da Indústria e Tecnologia. A política de nacionalizações está verdadeiramente em marcha, num processo de “construção de uma sociedade socialista”, como previa o Plano de Acção política (espécie de segundo Programa do MFA, apresentado em Junho), mas não deixa de contar com sucessivas crises, como as do 1º de Maio, o caso República e o caso Renascença, e até com a perda de poder da esquerda radical nas eleições para a Constituinte, nas quais o PS obtém a maioria (cerca de 38%), seguido do PPD (25%). No seio do MFA as divisões acentuam- se e parecem cristalizar num trinómio: extrema-esquerda-PCP-moderados. Este enredo permanece no chamado Verão Quente, levando inclusive à saída do PS e do PPD do governo, à consequente queda e remodelação do governo em Agosto, e também à tentativa de interferência dos Estados Unidos em Portugal – que, segundo Eugénio Rosa, fez parte de um esquema maior de “boicote [dos] países capitalistas à Revolução Portuguesa”, pelo menos até à queda do V Governo Provisório97. É esta a fase das campanhas de dinamização cultural promovidas pela 5ª Divisão – ou “processo de missionação cultural do povo”98 – e do reforço de poder do COPCON, como braço armado do MFA. É, acima de tudo, um período que poder ser descrito como uma “epidemia de planos”99: Plano de Acção Política (Junho), Documento-Guia de Aliança Povo-MFA (Julho), Documento dos Nove (Agosto).

97 ROSA, Eugénio. Portugal, dois anos de revolução na economia. Lisboa: Diabril, 1976, p. 182. 98 ALMEIDA, Sónia Vespeira de. Camponeses, cultura e revolução: campanhas de dinamização cultural e acção cívica do MFA, 1974-1975. Lisboa: Edições Colibri, 2009, p. 21. 99 Vasco Gonçalves, cit. por REZOLA, Maria Inácia. Os militares na revolução de Abril: o Conselho da Revolução e a transição para a democracia em Portugal, 1974-1976. Lisboa: Campo da Comunicação, 2006, p. 253.

50 O V Governo Provisório encontra-se numa posição bastante fragilizada, como se constata pela sua curta duração (08 de Agosto a 19 de Setembro), e o MFA vai tentando, de várias formas, eliminar os diferendos internos, prova dada pela constituição de um Directório político-militar já em finais de Julho. Este governo é marcadamente de esquerda, expresso de forma incontestável no seu programa – talvez o programa mais radical de todos –, onde se assume

“a construção de uma sociedade socialista [...] sem classes, obtida pela colectivização dos meios de produção, eliminando todas as formas de exploração do homem pelo homem e na qual serão dadas a todos os indivíduos iguais oportunidade de educação, trabalho e promoção, sem distinção de nascimento, sexo, credo religioso ou ideologia”100.

Algumas medidas em jogo focam-se em torno da descentralização político- administrativa, da batalha da economia (ou produção), da socialização dos meios de produção, da imediata delimitação do sector privado e apoio ao movimento cooperativo, sempre com a política de austeridade como pano de fundo. O movimento autogestionário e cooperativista foi, de facto espantoso, ao ponto de se falar num número de aproximadamente 2666 cooperativas e 1200 empresas em regime de autogestão para o ano de 1976101.

Em Setembro, a correlação de forças dentro do Conselho da Revolução inverte- se, podendo-se falar de uma vitória “da linha dos Nove sobre os Gonçalvistas”102. Na formação do VI Governo, Vasco Gonçalves é substituído pelo almirante Pinheiro de Azevedo e a composição assinala já a recusa dos partidos de esquerda em assumir algumas responsabilidades governamentais. É a via eleitoralista que vence, contando com empréstimos no valor de 272 milhões de dólares por parte dos Estados Unidos e da CEE103. Resumindo o período até aos acontecimentos de 25 de Novembro, o que se observa é um verdadeiro estado de sítio, marcado pelos desentendimentos nas forças armadas, nos partidos políticos e o aproveitamento oportuno da extrema-esquerda, tal como a sua parcial ruptura com alguns movimentos sociais.

100 Programa do V Governo Provisório, 1975, p. 5. 101 LEÃO, Emanuel Reis. “Das transformações revolucionárias à dinâmica europeia,” in Portugal Contemporâneo, 1974-1992, vol. 6, ed. António Reis. Lisboa: Publicações Alfa, 1990, p. 176. 102 REZOLA, Maria Inácia. Os militares na revolução de Abril: o Conselho da Revolução e a transição para a democracia em Portugal. Lisboa: Campo da Comunicação, 2006, p. 393. 103 MAXWELL, Kenneth. A construção da democracia em Portugal. Lisboa: Presença, 1999, p. 174.

51 2.2. Conclusões e indicadores económicos Concluindo a análise deste período, quero apenas salientar algumas das questões que considero estruturais, recorrendo para isso a alguns indicadores económicos que, certamente, espelharão melhor a realidade.

As transformações económicas conjunturais e estruturais portuguesas inserem-se numa panorâmica de rupturas mais alargada, como indica Augusto Mateus. Neste cenário é preciso não esquecer a ruptura energética, a ruptura monetária e financeira, a ruptura do tipo de crescimento industrial e a ruptura da estabilidade das formas e relações de dependência, dominação e interdependência104. Houve, portanto, uma degradação dos termos de troca e aumento da inflação com associações múltiplas e com consequências severas para as economias importadoras. Por outro lado, os sectores financeiros saíram prejudicados com a desagregação do sistema monetário internacional, com o aumento das taxas de juro e a sobrevalorização do dólar. Estas mutações afectaram as economias semi-periféricas, com características de dependência e com uma industrialização atrasada. Acrescente-se a isto a conjuntura político-social portuguesa, mergulhada no caos e na indefinição económica, que se vê de repente com um aumento de cerca de meio milhão de retornados e assiste à derrocada das trocas comerciais com as ex-colónias e a uma diminuição das exportações para o mercado europeu. Estar num limbo político-económico, que se vai assumindo progressivamente como socialista, mas que não se desliga dos mecanismos liberais da economia de mercado é, no mínimo, bastante exigente.

As transformações evidenciaram-se sobretudo no mercado de trabalho, nas políticas sociais, na distribuição dos rendimentos e na regulação económica. A alteração das relações de força entre os trabalhadores e os empregadores é um dos principais destaques e efeito dos movimentos sociais que irromperam logo após a revolução, com incidência nas empresas, mas também nos campos. Já aqui referi as vitórias conseguidas no domínio da liberdade sindical, da regulamentação da greve, dos aumentos salariais, ao que se pode agregar o “alargamento do direito a férias pagas, o subsídio de desemprego, a redução do máximo semanal do tempo de trabalho”, entre muitas outras

104 MATEUS, “O 25 de Abril, a transição política e as transformações económicas", in O País em Revolução, ed. José Maria Brandão de Brito, 2001, pp. 254-255.”

52 mudanças105. Não deve ser menorizado o alcance destas medidas e o trabalho de vários agentes sociais, como as comissões de trabalhadores e de moradores, os sindicatos, os partidos políticos e até o patronato. O melhoramento das políticas sociais na área da educação, da saúde e da segurança social estão estreitamente relacionados com estes aspectos, constituindo as bases da construção de um verdadeiro Estado-Providência. Quanto ao tema da distribuição dos rendimentos, podemos falar numa política de aumentos salariais até 1976, que ocorre simultaneamente com a imposição de um tecto salarial e com a introdução do salário mínimo.

No entanto, vários autores consideram que estas medidas, ligadas ao controlo dos preços, tiveram um efeito negativo para a competitividade das empresas no contexto de problemas que já aqui tratei (recessão, inflação, desemprego, mão-de-obra pouco qualificada, balança comercial negativa, juros elevados, diminuição de remessas). Reflecte-se neste ponto a velha questão das políticas orçamentais e monetárias expansionistas ou contraccionistas. Parece, neste caso, existir uma clara política orçamental expansionista – uma das principais inovações face ao regime anterior –, que pretendia impulsionar a procura interna, mas, ao mesmo tempo, convivia com a aplicação de uma certa política de austeridade, que procurava conter a inflação e proteger os consumidores através do controle dos preços. Os resultados estão longe de ser consensuais: se, por um lado, evitaram quedas mais acentuadas na actividade económica e uma maior igualdade económica e social, por outro, poderão ter conduzido a um ciclo vicioso de impedimento de competitividade106. A reforma agrária assentou particularmente numa base volúvel, com unidades colectivas de produção efémeras, já para não falar da insustentabilidade de um clima verdadeiramente hostil nestas regiões. Emanuel Reis Leão refere que “este movimento [...] se desenvolveu à margem de qualquer projecto delineado pelo poder político, tendo a sua cobertura surgido já na fase final do processo”107.

105 LOPES, José da Silva. “Portugal e a transição para a democracia: que modelo económico?", in Portugal e a Transição para a Democracia (1974-1976), ed. Fernando Rosas. Lisboa: Colibri, 1999, pp. 176-177. 106 Ibid, pp. 179-180.; LOPES, José da Silva Lopes. A economia portuguesa desde 1960. Lisboa: Gradiva, 1996, pp. 25-26. 107 LEÃO, Emanuel Reis. “Das transformações revolucionárias à dinâmica europeia", in Portugal Contemporâneo, 1976-1992, vol V. Lisboa: Publicações Alfa, 1990, p. 175.

53 A conjuntura macroeconómica do período em análise encontra-se resumida no seguinte quadro108:

1973 1974 1975 1976 Consumo privado (taxa de variação real, em %) 10,5 6,2 3,7 4,3 Consumo público (tvr em %) 7,8 17,3 6,6 7 Investimento (tvr em %) 8,4 7,7 -12,3 0,1 Exportações (tvr em %) 11,7 -12 -14,1 -0,8 Importações (tvr em %) 11 6,2 -22,7 6,2 PIB (tvr em %) 11,2 1,1 -4,3 6,2 Taxa de inflação (em %) 7,8 27,9 20,5 18,2 Salários/rendimento (em %) 50,3 55,6 68,6 67,6 Défice do Orçamento Geral do Estado (% do PIB) -0,9 2,1 3,8 6,2 Saldo da balança de transacções correntes - BTC (milhões de dólares) 349 -882 -817 -1289 Saldo da BTC (em % do PIB) 3 -6 -5,5 -8,2 Taxa de desemprego (em%) - 2,2 5,6 6,7 Salários reais (tvr em %) - 12 9 -1,5 Taxa de desvalorização do escudo (em %) - 3,3 2,3 9,1 Taxa de crescimento M2 (em %) - 13,7 12,3 16,7 Dívida externa (milhões de dólares) - - - 2892 Dívida externa (tvr em %) - - - -

A maioria dos indicadores conhece maus resultados no ano de 1974 e 1975, surgindo uma ligeira melhoria a partir de 1976. De facto, os números são impressionantes: a inflação dispara, acompanhada do decréscimo e até quebra no produto, motivada pela “desorganização na produção e pela quebra verificada na procura agregada”109; há também um decréscimo das exportações, fruto de factor exógenos, como a recessão mundial, mas também consequência de fracos resultados em algumas áreas, nomeadamente no turismo e na relações comerciais com as ex-colónias; o investimento conhece, da mesma maneira, resultados negativos, explicados por várias causas: “perda de confiança da classe empresarial; crise do sector exportador; aumento [...] dos custos de produção”110; desequilíbrio da balança de transacções correntes, onde a fuga de capitais é um objecto a ter em conta; são evidentes ainda os deficits orçamentais e o aumento do desemprego.

108 Adaptados de Ibid, p. 177 e 182. 109 Ibid, p. 178. 110 Ibid.

54 3. As nacionalizações

O conceito de nacionalização pode ser caracterizado como um acto político – governamental –, fundado num diploma legislativo e que implica a transferência de empresas para a propriedade pública, pertencente exclusivamente ao Estado111. As nacionalizações podem ser efectuadas sobre explorações agrícolas, industriais, comerciais ou explorações de certos recursos naturais, fazendo-se valer de justificações tendencialmente nacionalistas, de melhoramento de alguns sectores/serviços ou para evitar constrangimentos maiores, como a falência. Estes processos podem modificar a estrutura do poder económico em níveis diferentes, desde intervenções pontuais com vista a regular algumas estruturas, até à transformação total do sistema económico e produtivo.

A Constituição da República Portuguesa de 1976 (CRP), redigida pela Assembleia Constituinte, entrou em vigor a 25 de Abril de 1976, consagrando juridicamente, na generalidade das matérias, as opções político-ideológicas referentes ao PREC, ainda que nesta fase se encontrasse numa situação de “arrefecimento” revolucionário. Fruto do contexto, com especial incidência para o pós-11 de Março de 1975, a CRP previa já em 1976 a possibilidade de não indemnização aos grandes proprietários e empresários que viram os seus bens nacionalizados (artigo 82.º, n.º 1). Noutro artigo (83.º), estava presente a irreversibilidade das nacionalizações – “conquistas irreversíveis das classe trabalhadoras”112 –, apenas abolido em 1989. Já a questão das indemnizações foi alterada em 1982, sendo revogado o n.º 2 do artigo 82.º. É sobretudo a ideia de interesse público/interesse nacional que constitui a pedra angular dos processos de nacionalização. No entanto, não deixa de ser curioso que este mesmo preceito abonou em favor das reprivatizações. É necessário deixar ainda uma nota para o facto de o Estado ser o único actor com legitimidade para nacionalizar, sendo que aqui não é incluída qualquer entidade pública, como os municípios ou regiões autónomas.

111 SANTOS, António Carlos dos, GONÇALVES, Maria Eduarda e MARQUES, Maria Manuel Leitão. Direito económico. Coimbra: Almedina, 2001. 112 Constituição da República Portuguesa de 1976, in NEVES, Orlando . E agora que fazer? Lisboa: Diabril, 1976, p. 202.

55 3.1. Que plano de nacionalizações? O processo de nacionalizações de 1974-1976 não é fruto de uma política planificada, parecendo até seguir alguns impulsos mais ou menos espontâneos, nomeadamente quanto à acção das comissões de trabalhadores e, mais tarde, das associações sindicais e alguns partidos políticos, ainda que nestes últimos nada esteja completamente clarificado até aos acontecimentos de Março de 1975.

É a resposta política às revoltas sociais, laborais e sindicais que vai marcar toda a diferença, facilitada pela posição defensiva que o patronato inicialmente assume, com excepção de algumas intervenções pontuais, como o caso da formação do M.D.E/S. Há, nas fases iniciais deste processo um progressivo reconhecimento dos adversários, com realce para dois momentos importantes: Maio a Junho de 1974 – período de “descompressão política e ideológica”113; Janeiro a Março de 1975 – período de luta ideológica radicalizada.

Compreender o porquê das nacionalizações implica um olhar atento sobre as pressões sociais, as formas de luta e os conteúdos das mesmas, bem como os interesses particulares e colectivos. É perceber que os trabalhadores reclamavam por melhores condições de vida, de trabalho e aumentos salariais, da mesma forma que exigiam o saneamento dos sabotadores económicos (sinónimo de patronato), que exerciam o controlo operário e ocupavam as empresas, numa “batalha pela produção”, dirigidos por partidos ou sindicatos, mas muitas vezes fugindo à tutela destes. Sendo a primeira fase marcadamente espontânea, a segunda já revela a luta pelo poder e a tentativa de presença hegemónica da Intersindical. Relativamente às formas de luta empregadas, José Medeiros Ferreira elenca algumas: manifestações de rua, sequestro de pessoas e bens, ameaça de greve, declaração parcial de greve, greve total e ocupação das empresas114.

O ideal anti-monopolista, principalmente dirigido contra os sete magníficos, – CUF, Espírito Santo, Banco Português do Atlântico, Champalimaud, Banco Fonsecas & Burnay, Banco Nacional Ultramarino e Banco Borges & Irmão – reuniu um relativo consenso na sociedade, desde trabalhadores a alguns sectores industriais e comerciais.

113 SANTOS, Maria de Lourdes Lima dos, LIMA, Marinús Pires de e FERREIRA, Vítor Matias. O 25 de Abril e as lutas sociais nas empresas, 3 vols. Lisboa: Afrontamento, 1977, p. 56. 114 FERREIRA, José Medeiros. Portugal em Transe, vol. VIII História de Portugal, dir. José Mattoso. Lisboa: Editorial Estampa, 1994, p. 108.

56 No debate ininterrupto sobre modelos de modernização económica para o país, as diferenças sobressaem de forma muita complexa no interior das forças armadas, sendo certo que o apoio às nacionalizações ocorreu sobretudo por razões políticas. Órfão de qualquer orientação, o processo de nacionalizações não conhece “um mero plano a médio prazo ou de reformas sectoriais”115, podendo apenas ser detectadas algumas linhas de actuação, que serão esmiuçadas no capítulo posterior, numa abordagem trifásica.

O intervencionismo estatal nas empresas e toda a lógica que está por detrás não é completamente inovadora. Aliás, o sector empresarial do Estado (SEE) já existia antes da Revolução de Abril, com algumas empresas de capital púbico – a Caixa Geral de Depósitos, Águas de Lisboa, Carris, Gás de Lisboa, TLP e Correios116. Por outro lado, detinha ainda algumas participações em empresas mistas, como o Banco de Fomento Nacional, TAP, CP, Siderurgia Nacional, empresas de electricidade e de transportes marítimos.117 Com o objectivo anti-monopolista e, mais tarde, de centralização da economia portuguesa nas mãos do Estado, era previsível que o sector financeiro e as indústrias de base (detidos pelos grandes grupos financeiros) fossem os principais alvos.

Seguindo os diplomas insertos no Diário da República, em 24 números do mesmo nacionalizaram-se 244 empresas, que se traduziram num “sem-número de participações indirectas. Directa ou indirectamente, o Estado nacionalizou, expropriou ou interveio em quase duas mil empresas”118. Com as nacionalizações, o sector empresarial do Estado conheceu uma larga expansão (cf. tabela 1, anexo E), próxima da média dos países da OCDE (cf. tabela 2, anexo E): o peso do sector público empresarial no VAB quase triplicou (7,8% para 22,9%), atingindo-se crescimento semelhante do peso público empresarial na FBCF (41,6% contra 15,8%)119, passando o sector público a

115 Ibid, p. 114. 116 LEÃO, Emanuel Reis. “Das transformações revolucionárias à dinâmica europeia", in Portugal Contemporâneo, 1974-1992, vol. 6, ed. António Reis, Lisboa: Publicações Alfa, 1990, p. 174. 117 ALPALHÃO, Rui Manuel Meireles dos Anjos. O toque da mão visível. Nacionalizações, indemnizações e privatizações em Portugal, 1975-2003. Lisboa: ISCTE, 2007. 118 GRUPO DE TRABALHO INTERMINISTERIAL PARA A ANÁLISE E AVALIAÇÃO DA SITUAÇÃO E DAS PERSPECTIVAS DE EVOLUÇÃO DO SECTOR EMPRESARIAL DO ESTADO, Livro branco do sector empresarial do Estado. Lisboa: Ministério das Finanças, 1998, p. 4. 119 ALPALHÃO, O toque da mão visível. Nacionalizações, indemnizações e privatizações em Portugal, 1975-2003, pp. 25-26.

57 ser composto por empresas que já eram do Estado antes do 25 de Abril, por empresas nacionalizadas, por empresas controladas e por empresas participadas120.

Como foi explicado no capítulo anterior, as nacionalizações foram efectuadas por Decretos-Lei, sem qualquer planeamento, empresa a empresa, com a sequente fusão em grandes empresas públicas por sector, sob três critérios básicos: aniquilação dos grande grupos económicos portugueses; cobertura de sectores básicos ou estratégicos e assegurar a sobrevivência de empresas em risco de falência ou abandonadas pelos patrões. Há, contudo, uma clara política de não nacionalizar os capitais estrangeiros, motivada pelo receio de perda de confiança dos investidores externos e para não prejudicar as relações económicas existentes. Outra singularidade tem que ver com a geografia das nacionalizações, uma vez que algumas empresas de grande dimensão que se localizavam no norte do país não foram sequer intervencionadas (têxteis, cortiça, vinho, refinação de açúcar, etc.), constituindo-se, algumas delas, nos grandes grupos económicos e financeiros do pós-25 de Abril.

A falta de quadros técnicos qualificados para ocupar os vários cargos inerentes à burocratização processual revelou-se um obstáculo à criação de equipas competentes: “a primeira linha [de quadros técnicos] foi quase toda para o Brasil; na segunda linha, uns ficaram, outros partiram, e foi a terceira linha que forneceu a matéria-prima e atingiu maior valorização”121. Por outro lado, a falta de uma estratégia única teve algumas consequências caricatas, por exemplo, o facto de a Sociedade Mineira de Santiago ter sido nacionalizada três vezes, primeiro directamente, depois por via da CUF e ulteriormente através da Sogefi. Como referia um quadro da CUF, esta situação advinha do plano de nacionalizações nacionalizar “as holdings, depois as sub-holdings e, nalguns casos, talvez por inércia, as próprias filiadas das sub-holdings” 122.

120 PINHO, Ivo. “Sector Público Empresarial - antes e depois do 11 de Março”, in Análise Social XII, n.º 47, 1976: 733–747. 121 Ibid, p. 90. 122 Ibid, p. 90.

58 3.2. As fases das nacionalizações 3.2.1. Setembro de 1974

Não estando enquadrada neste espaço temporal, é preciso falar da primeira acção sobre a Companhia das Águas que havia sido ocupada logo a 21 de Maio de 1974 pelos trabalhadores, exigindo a sua nacionalização. Com as transformações operadas, passa a denominar-se Empresa Pública das Águas de Lisboa (em Outubro de 1974). Todavia, só após a promulgação da lei que defendia a independência das colónias (Lei n.º 7/74), no Verão de 1974, é que o tema das nacionalizações volta ao debate público, com a questão dos bancos emissores. É através dos Decretos-Lei n.os 450, 451 e 452/74, de 13 Setembro, que são nacionalizados os seguintes bancos emissores: Banco de Angola, Banco Nacional Ultramarino e o Banco de Portugal. Estas nacionalizações decorrem directamente do processo descolonizador, “o primeiro passo para o Estado ocupar o único lugar do lado português na gestão das consequências financeiras da descolonização”123.

A partir de Outubro, inicia-se a regulação do papel do Estado em algumas matérias, como as intervenções na banca e outras instituições paralelas. Os partidos políticos não se manifestavam contra esta evolução: Sá Carneiro já havia defendido, em Junho, “a nacionalização dos monopólios quando comprometem o interesse nacional”124; posteriormente, a 12 de Dezembro, o PS pede a intervenção directa do Estado na gestão das empresas. Mas não se pode falar, ainda, numa “teoria sobre o papel do Estado na organização económica”125. Deve ser relembrado o acentuar da conflituosidade laboral por todo o país em vários sectores económicos, com o encerramento de empresas e despedimentos elevados em algumas regiões. São tomadas, por isso, algumas decisões dentro das empresas por parte dos trabalhadores e das comissões, destacando-se a primeira experiência de controlo operário que foi decidida pelos trabalhadores da Siderurgia Nacional a 17 de Dezembro. O Estado passa a exercer um papel mais activo neste meio, nomeadamente para evitar o encerramento de empresas-chave, como o caso da CIFA (têxtil), em Valongo, e para nomear comissões administrativas para algumas empresas (ex. Metalúrgica Duarte Ferreira).

123 FERREIRA, José Medeiros. Portugal em Transe, vol. VIII História de Portugal, dir. José Mattoso. Lisboa: Editorial Estampa, 1994, p. 92. 124 Sá Carneiro, cit. por FRANCO, António de Sousa. “Economia,” in Portugal, 20 anos de Democracia, ed. REIS, António. Lisboa: Círculo de Leitores, 1994, p. 182. 125 FRANCO, António de Sousa. “Economia,” in Portugal, 20 anos de Democracia, ed. REIS, António. Lisboa: Círculo de Leitores, 1994, p. 114.

59 Curiosamente, é no sector mais visado pelas várias leis que iam sendo promulgadas que surgem vozes a exigir a nacionalização da banca. Destaca-se, aqui, o Sindicato dos Bancários de Lisboa, um dos mais activos e interventivos das fases que se seguem. No primeiro trimestre de 1975, o apelo às nacionalizações começa a ser ouvido com mais frequência em vários sectores económicos (para além da banca, surge também a reivindicação dos trabalhadores da SCC).

3.2.2. Março de 1975

A partir de 11 de Março, com a radicalização da situação, a orientação económica vai assentar na reforma agrária e na intervenção sistemática do Estado nas empresas, consubstanciada numa aparente política de nacionalizações. As ocupações de empresas que se acentuam logo a partir de 12 de Março fazem acelerar a tomada de decisão, sob a batuta do recente Conselho Superior da Revolução.

Na reunião do Conselho da Revolução de 13 de Março, começou logo a discussão das grandes opções da política económica portuguesa. No que toca às nacionalizações, José da Silva Lopes (ministro das Finanças), Jacinto Nunes (Governador do Banco de Portugal) e Medina Carreira tinham preparado um projecto pseudo-revolucionário126 para a banca, que deveria ser apresentado na reunião. O plano previa a intervenção temporária, com duração de seis meses, através da substituição das administrações por administradores nomeados pelo Estado127. Os autores do documento referem que se tratava de uma “intervenção de emergência do Estado na banca, por forma a evitar a fuga de capitais em massa. Era uma intervenção temporária, que retirava a gestão aos accionistas privados”, mas o projecto não foi aprovado pelo CR128. E não o foi porque se encontrava irremediavelmente ultrapassado pelos acontecimentos. Já estava em cima da mesa um plano de nacionalização da banca, sem texto de projecto de lei, que parecia agregar os vários elementos, até porque nesse momento era esse o projecto e a luta dos trabalhadores da banca, e evitava o risco de fuga de capitais, pois, como referiu Silva Lopes (segundo palavras de Vasco Lourenço), “ou se nacionalizava

126 Mas que no fundo pretendia apenas a abertura da banca, que havia sido ocupada pelos trabalhadores. 127 Filipe S. FERNANDES e Hermínio SANTOS. Os excomungados de Abril: os empresários na Revolução. Lisboa: Dom Quixote, 2005, p. 86. 128 GOMES, Adelino e CASTANHEIRA, José Pedro. Os dias loucos do PREC. Lisboa: Expresso- Público, 2006, p. 23.

60 já ou, daqui a oito dias, arriscávamo-nos nacionalizar apenas as paredes...”129. No seguimento da nomeação de administradores do Estado para a banca, Silva Lopes apresenta a sua demissão, percebendo que “quem mandava naquilo não era eu, eram os sindicatos”130, ou como referiu Mário Murteira: “nós éramos mais espectadores numa grande movimentação popular do que actores”131.

Alguns dos nomes que devem ser retidos no âmbito das nacionalizações são: Francisco Pereira de Moura, Mário Murteira, José Joaquim Fragoso (com apoio de Costa Leal e Mário Brandão Ferreira), para além de João Cravinho e João Martins Pereira, “paladinos das nacionalizações”132.

Nesta sequência, no dia 14 de Março, o Conselho da Revolução antecipa-se à decisão dos bancários e promulga o Decreto-Lei n.º 132-A/75133, que estabelece a nacionalização das instituições de crédito – “mais de vinte milhões de contos em carteira de títulos, mais de cento e sessenta milhões de contos em carteira comercial e mais de duzentos e trinta milhões de contos em depósitos”134 – e, no dia seguinte, através do Decreto-Lei n.º 135-A/75, são nacionalizadas as companhias de seguros – “trinta e duas companhias, a que correspondem três quartos do mercado, e a parte nacional de oito outras”135. Apenas as pequenas instituições não capitalistas e as de capital estrangeiro não são abrangidas pelos decretos. Ficam de fora as seguintes instituições de créditos: Crédit Franco-Portugais e os departamentos portugueses do Bank of London & South América e do Banco do Brasil. Já as seguintes companhias de seguros não são nacionalizadas: Europeia, Metrópole, Portugal, Portugal Previdente, A Social, Sociedade Portuguesa de Seguros e O Trabalho. O caso da banca e dos seguros é ainda especial pelo facto de os diplomas nacionalizadores referirem-se a um sistema bancário como um todo, “não identificando, uma a uma, as empresas que se queriam nacionalizar”136.

129 Ibid. 130 FERNANDES, Filipe S. e SANTOS, Hermínio. Os excomungados de Abril: os empresários na Revolução.Lisboa: Dom Quixote, 2005, p. 86. 131 Ibid, p. 88. 132 Ibid, p. 90. 133 “A lei revolucionárioa jamais promulgada”, segundo Costa Gomes. 134 MARTINS, Maria Belmira e ROSA, José Chaves. O grupo Estado: análise e listagem completa das sociedades do sector público empresarial. Lisboa: Edições Jornal Expresso, 1979, p. 9. 135 Ibid, p. 9. 136 NUNES, A. J. Avelãs, A garantia das nacionalizações e a delimitação dos sectores público e privado no contexto da Constituição Económica Portuguesa. Coimbra: Coimbra Editora, 1975, p. 6.

61 Não há como entender esta mudança de fundo, se não forem compreendidos os principais elementos que estão presentes nos decretos. Assim, é possível elencar alguns considerandos. Os primeiros dizem respeito à nacionalização da banca137, enquanto o segundo grupo faz alusão à nacionalização das companhias de seguros138:

! “Necessidade de concretizar uma política económica antimonopolista que sirva as classes trabalhadoras e as camadas mais desfavorecidas; ! Sistema bancário, na sua função privada, se tem caracterizado como um elemento ao serviço dos grandes grupos monopolistas; ! Sistema bancário constitui a alavanca fundamental de comando da economia, e que é por meio dela que se pode dinamizar a actividade económica; ! Recentes acontecimentos de 11 de Março vieram pôr em evidência os perigos que [...] existem se não forem tomadas medidas imediatas no campo de controle efectivo do poder económico; ! [...] Atenção [à] realidade nacional e [à] capacidade demonstrada pelos trabalhadores da banca na fiscalização e controle do respectivo sector de actividade”.

! “Elevado volume de poupança privada retido pelas sociedades de seguros e que tem sido aplicado não em benefício das classes trabalhadoras mas com fins especulativos e em manifesto proveito dos grande grupos económicos; ! Proliferação de sociedades de seguros constituídas, que têm conduzido a uma concorrência desleal; ! Necessidade de proporcionar maior segurança aos capitais confiados às sociedades de seguros; ! As elevadas somas de capital em poder das sociedades de seguros devem ser aplicadas em investimentos com interesse nacional; ! Necessidade de tais medidas terem em atenção a realidade nacional e a capacidade demonstrada pelos trabalhadores de seguros na apreciação de situações irregulares no domínio da gestão que já haviam imposto até a intervenção do Estado”.

Com os processos em marcha, são nomeadas, pelo Governo, comissões administrativas para as empresas nacionalizadas e delegados governamentais para as restantes companhias que tinham participação expressiva de capitais estrangeiros, com base nos Decretos-Lei anteriores, especialmente o de 25 de Novembro (660/74).

137 NEVES, Orlando. Textos históricos da revolução. Lisboa: Diabril, 1975, p. 301. 138 Ibid, p. 304.

62 Os elogios partidários às nacionalizações reproduzem-se em todos os quadrantes políticos, mas já com alguma moderação nos sectores mais à direita. O PS fala numa decisão que, fazendo já parte do seu programa, criava condições para a “construção do socialismo”139; o PCP realça a vitória da “aliança Povo-MFA”140; já o PPD, defendendo um caminho rumo ao socialismo, coloca algumas reservas, pois “substituir um capitalismo liberal por um capitalismo de Estado não resolve as contradições com que se debate hoje a sociedade portuguesa”141. Enfim, a transição para o socialismo está definitivamente na ordem do dia.

3.2.3. Abril de 1975

A última – e maior – fase de nacionalizações, inicia-se com a promulgação do Decreto-Lei n.º 203-C/75 (nota oficiosa do Conselho de Ministros), no dia 15 de Abril de 1975, cinco dias após a reunião do Conselho de Revolução que havia estipulado o modelo económico para a sociedade portuguesa – transição para o socialismo – e as medidas económicas de emergência. Destaco seguidamente as principais orientações definidas (adaptado do D. L. n.º 203-C/75, 1975, sublinhado nosso):

i. “É necessário que os trabalhadores sintam que a economia já não lhes é estranha, ou seja, que a construção socialista da economia é tarefa deles e para eles. Isto implica a afirmação clara do princípio do controle organizado da produção pelos trabalhadores para objectivos de produção e eficiência, coordenados pelos órgãos centrais de planeamento [...]; ii. É indispensável estabelecer uma limitação dos consumos a partir de um princípio de máximo nacional de rendimento disponível [...]; iii. Igualmente se torna indispensável garantir a contenção dos preços de bens essenciais, sobretudo alimentares; iv. Deverão ser completados os passos já dados no sentido da nacionalização dos sectores básicos da actividade económica (indústria, transportes e comunicações); v. Deverá ser aplicado um programa progressivo de reforma agrária, integrado num todo coerente de medidas de política económica; vi. Verificadas as condições anteriores, será legítimo fazer apelo à mobilização dos trabalhadores para um emprego produtivo, mobilização necessária à construção da sociedade desejada pelo povo português”.

139 Mário Soares cit. por REZOLA, Maria Inácia. Os militares na revolução de Abril: o Conselho da Revolução e a transição para a democracia em Portugal. Lisboa: Campo da Comunicação, 2006, p. 150. 140 Ibid, p. 151. 141 Ibid.

63 Uma série de Decretos-Lei são publicados no dia 16 de Abril – D. L. n.os 205-A, B, C, D, E, F, G/75 – prevendo a nacionalização de inúmeros sectores estratégicos: empresas refinadoras e distribuidoras de petróleo, empresas de transportes marítimos, transportes aéreos e ferroviários, empresas produtoras, transformadoras e distribuidoras de electricidade e a siderurgia (cf. quadro 1, do anexo F, para uma análise mais detalhada). Cabe ainda dizer que as nacionalizações têm lugar em pleno período eleitoral, numa base de pleno consenso partidário. São nomeadas, no final de Abril, algumas comissões administrativas para as empresas Indústria Alimentar e Cimentos de Leiria, e cerca de 21 comissões para empresas rodoviárias. Contudo, só após as eleições para a Constituinte se desenvolvem novas nacionalizações – a chamada 2ª fase. O início é fulgurante (a partir de Maio), conhecendo algum abrandamento a partir de Outubro. De forma a simplificar e tornar este conjunto de nacionalizações perceptível, organizei- as de forma cronológica, presente no quadro 1 do anexo F. Os sectores são bastante diversificados: cimento, celulose, tabaco, transportes, química, cervejas, indústria ligeira, holdings, etc.

O trabalho de Maria Belmira Martins e José Chaves Rosa é indispensável para qualquer análise dos sectores envolvidos e dos números que apresentavam. Contrariamente, alguns dados que o Ministério do Trabalho, através do Gabinete de Estudos, Planeamento e Organização, conseguiu reunir relativamente às nacionalizações até Setembro de 1975 mostram o verdadeiro estado de desorganização institucional e a lógica, ou falta dela, existente neste processo:

“Todos os números têm carácter provisório, pois são de admitir inexactidões em face das inúmeras dificuldades que se encontram na elaboração do referido ficheiro com um mínimo de elementos essenciais”142.

É possível, em jeito de resumo, denominar cada mês com um título adequado:

Maio Cimento, celuloses e Setembro CUF e estaleiros navais (s/ a Lisnave) tabaco Junho Transportes rodoviários Outubro Holdings e urbanos Julho Carris Novembro Sociedade agrícola Agosto Vidro, minas, químicas e Dezembro Televisão, rádio, transportes fluviais e serviços cervejas auxiliares de transportes por água

142 AAVV, Nacionalização e outras intervenções até 22 de Setembro de 1975. Representatividade social do número de empresas e do pessoal abrangido. (Lisboa: Gabinete de Estudos, Planeamento e Organização do Ministério do Trabalho, 1975), p. 1.

64 Com o VI Governo Provisório as nacionalizações continuaram, como se depreende pelo quadro anterior, mas há um refrear de toda a situação. Em 1976, são ainda nacionalizados alguns sectores, como as principais empresas de pesca (conservação, produção, serviço, transformação e comercialização), através do Decreto- Lei n.º 572/76, e ainda alguns jornais diários (D. L. n.º 639/76, de 29 de Julho). Por outro lado, são aprovados os estatutos das novas empresas públicas (Petróleos de Portugal EP, CIMPOR, Electricidade de Portugal EP, A Tabaqueira, Empresa Industrial de Tabacos EP, etc.) e empreende-se uma reestruturação do sector empresarial do Estado no seio do Instituto de Participações do Estado, ainda que de forma muito ténue.

65 4. A nacionalização da indústria cervejeira

Como ponto de partida da descrição e interpretação do processo nacionalizador ocorrido na indústria cervejeira, assume-se a existência de uma corporização teórica assente em cinco vectores:

i. Multiplicidade e complexidade de actores em espaços temporais que, na maioria dos casos, se cruzam, estabelecendo um processo de avanços e recuos (operariado, patronato e classe dirigente, comissões de trabalhadores, partidos políticos, sindicatos, estruturas militares e governamentais); ii. Recusa da primazia de um sujeito colectivo; iii. Nacionalização enquanto processo essencialmente político-social, mas não como desígnio estratégico politicamente articulado; iv. Nacionalização sui generis no quadro internacional, quer ao nível sectorial, quer numa visão macroeconómica; v. Processo de luta hegemónica que procura transformar a estrutura social portuguesa sob vários prismas: e.g., relações laborais, relações económico- financeiras.

Relembrando a imagem sectorial apresentada no capítulo 1, há necessariamente que justificar a falta de documentação encontrada para o período que decorre entre 25 de Abril de 1974 e Janeiro de 1975. Mea culpa, em primeiro lugar, pela impossibilidade de recolher documentação no seio da estrutura empresarial; por outro lado, acrescentam- se problemas de economia de tempo e escala a que a tese de mestrado deve estar sujeita, associados à pluralidade e dispersão geográfica de fundos/acervos documentais para o período em análise. A análise da nacionalização do sector cervejeiro centra-se fundamentalmente no processo ocorrido na Sociedade Central de Cervejas, por se tratar da empresa que monopolizava o sector e por ter chamado a si, por obra dos seus trabalhadores, a quase totalidade do processo reivindicativo e a intervenção do Estado.

A queda do regime fascista não significou a emergência automática de um movimento reivindicativo, ou de outra espécie, na Sociedade Central de Cervejas. Vítor Tomás, da Comissão de Trabalhadores, diz que o 25 de Abril “pouca mossa fez”, porque a Administração soube adaptar-se eficazmente à nova situação, concebendo um plano de contenção de conflitos baseado no aumento das regalias (salário mínimo de 6

66 000 escudos, jantares em casa dos patrões, desporto, etc.), isto é, o tipo de acções para “manter a malta entretida sem ser na política”143. Esta estratégia assentava também, segundo este, numa política de dividir para reinar, acentuando as disparidades salariais internas (não apenas entre o sector comercial e produtivo; os valores salariais oscilavam entre os 6 000 e os 30 000 contos dentro de 16 categoriais).

Em Outubro de 1974, um grupo de trabalhadores, composto por técnicos de todos os sectores e representantes dos trabalhadores, elaborou um diagnóstico da empresa, apresentando algumas propostas para o futuro, que foram entregues no dia 30 de Janeiro de 1975 ao Conselho de Administração144, na véspera das eleições para a Comissão de Trabalhadores e na véspera do movimento reivindicativo e consequente conflito laboral.

143 A Gazeta da Semana, 06-12/05/1976, p. 10. 144 MARTINS, Américo. Central De Cervejas: 50 anos de actividade. Lisboa: Central de Cervejas, 1985.

67 4.1. O processo reivindicativo e os conflitos sociais 4.1.1. Do movimento reivindicativo de 31 de Janeiro ao pedido de nacionalização

Os conflitos sociais na Sociedade Central de Cervejas, desencadeados a 31 de Janeiro de 1975, tiveram como leitmotiv o aumento salarial, com retroactivos desde Janeiro de 1974 assente num processo de qualificação de funções, de uma categoria profissional recém-criada – “operador de flash” (operário de enchimento) –, fazendo aumentar as desigualdades salariais existentes145. Iniciado em Vialonga, pela Comissão de Trabalhadores, o movimento – que logo se tornou reivindicativo – espalhou-se rapidamente para a fábrica em Coimbra e para os entrepostos comerciais e escritórios que a empresa possuía em Lisboa e no Porto. Segundo comunicados da Comissão de Trabalhadores, a justificação do movimento reivindicativo residia essencialmente em duas razões: (i) aumento das desigualdades salariais existentes, com predomínio para chefes e encarregados; (ii) desconhecimento dos operários face a tais medidas:

“[...] beneficiando claramente um grupo em que sobressaem os chefes e encarregados. Estas promoções não foram pedidas pelos operários nem eram do seu conhecimento, e podem ser identificadas como uma tentativa de divisão dos operários do enchimento [ao que se associa o facto] de a retroactividade contar a partir de Janeiro de 1974, uma vez que alguns dos contemplados nessa data ainda não desempenhavam as funções actuais”146.

Os trabalhadores marcaram um plenário para o início dessa tarde, solicitando a presença do Movimento das Forças Armadas – que acompanhará este processo com dois delegados, dirigidos pelo capitão-tenente Silva Nunes – e exigindo a comparência da Administração para o processo de negociações que iria tomar lugar. Contando com a presença de 800 trabalhadores (de um total de 2 700), a prioridade recaiu nos seguintes pontos:

i. “Suspensão imediata das promoções com reembolso imediato das importância recebidas; ii. Congelamento de promoções e não alteração de vencimentos sem prévia aprovação dos trabalhadores;

145 Reinvindicações espoletadas do tipo “surdas” (gratificações, vencimentos elevados, etc.), segundo o esquema de Fátima Patriarca, in PATRIARCA, Fátima. “A Revolução e a questão social. Que justiça social?”, in Portugal e a Transição para a Democracia (1974-1976). Lisboa: Colibri, 1999. 146 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Correspondência não classificada do Secretariado Coordenador, Vol. 73, n.º 206, Assuntos Económicos e Sociais e Empresas, Processo 73/15, Comunicado n.º 1 da Comissão de Trabalhadores da Sociedade Central de Cervejas.

68 iii. Fim de todos os privilégios de alguns grupos; iv. Redução do número de administradores de treze para o máximo de cinco; v. Remunerações dos administradores e dos funcionários não superiores às remunerações dos ministros; vi. Exigência da não distribuição de lucros aos accionistas nem de gratificações aos administradores libertando fundos para autofinanciamento”147.

A Administração – ou os três administradores presentes – aceitou todas as reivindicações que envolviam os trabalhadores, mas adiou para uma posterior decisão – 2.ª feira seguinte, dia 02 de Fevereiro – as questões que diziam respeito aos administradores e accionistas, pelo facto de a resolução ter que ser tomada em Assembleia Geral de Accionistas. Como resposta, não escondendo a satisfação pelos pontos alcançados, a Comissão de Trabalhadores proibiu a entrada da administração na empresa até que as reivindicações que haviam ficado em suspenso tivessem uma resposta afirmativa. Para tal, ocuparam a empresa e organizaram piquetes de vigilância permanentes, exercendo um controlo apertado sobre entradas e saídas de pessoas, mas também de documentação crucial. No mesmo plenário foram eleitas comissões de saneamento para a fábrica de Vialonga e para a Sede (Avenida Almirante Reis).

O caderno reivindicativo surgiu de forma imediata, no seguimento das reivindicações lançadas durante o plenário, estruturando-se em 19 pontos:

1) “Suspensão imediata das promoções com reembolso imediato das já recebidas; 2) Congelamento de promoções a partir do nível 6 e qualquer alteração de vencimento não se pode processar sem prévia aprovação dos trabalhadores; 3) Fim de todos os privilégios tais como: isenção e horário de trabalho, 300 litros de gasolina por mês, 1.000$00 de subsídio de transporte, envelopes mistério; 4) Fim do trabalhado extraordinário e do trabalho eventual, para possibilitar a criação de novos postos de trabalho; 5) Assistência social igualizada para todos os trabalhadores independentemente do seu nível ou antiguidade; 6) Uniformização das ajudas de custo pelas mais elevadas; 7) Melhoria imediata do meio/ambiente e condições de trabalho, nomeadamente: a. Condições de transporte dos operários dentro da fábrica; b. Criação de uma Comissão de Segurança.

147 Ibid.

69 8) Melhoria da remuneração do trabalho nocturno; 9) Programa de produção tendente a diminuir o trabalho por turnos; 10) Pagamento do 13º mês a todos os contratados; 11) Igualização de salários de todas as operárias até ao nível 3; secções abrangidas: refeitório, limpezas, laboratório, enchimento e movimento; 12) Vencimento da Administração e dos Funcionários não podem ultrapassar o de Ministro; 13) Que não haja distribuição de lucros aos accionistas, nem de gratificações à Administração referente ao ano de 1974; 14) O número de Administradores não deve ultrapassar 5; 15) Acabar com as comissões sobre as vendas e criar vencimentos fixos para os trabalhadores que as recebem; 16) Diuturnidades para todo o Pessoal; 17) Não aos prémios de trabalho; 18) Distribuição equitativa da verba destinada à gratificação da Páscoa, independentemente do nível de vencimento; 19) Não aos despedimentos nem represálias sobre os trabalhadores que têm conduzido este processo, nem qualquer tipo de despedimento sem aprovação dos trabalhadores”148.

A temática reivindicativa inicial assemelha-se à tipologia referenciada por Fátima Patriarca149 para o sector metalúrgico e metalomecânico, mas não se coaduna aos espaços temporais por ela definidos. Assim sendo, diagnosticam-se reivindicações de natureza salarial, sem exigência de aumento salarial, a procura de melhoria das condições laborais, associada, por exemplo, ao 13.º e 14.º mês, ao horário e duração do tempo de trabalho e ao subsídio de férias. Luta-se ainda pela distribuição equitativa de regalias e pela extinção dos privilégios existentes em algumas categoriais profissionais, sobretudo na classe dirigente, complementada pelo saneamento da administração. É o princípio da estratégia anti-monopolista que se coloca em jogo: “a acumulação de lucros provenientes do trabalho [deve destinar-se] ao robustecimento não só da empresa como da economia do País”150.

Um dos pontos cruciais que é necessário reter em todo este período é a total rejeição dos trabalhadores quanto à gestão da empresa, expressa de forma vincada num dos comunicados da Comissão de Trabalhadores. Daí que inicialmente se tenha

148 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Correspondência não classificada do Secretariado Coordenador, Vol. 73, n.º 206, Assuntos Económicos e Sociais e Empresas, Processo 73/15, Comunicado n.º 2 da Comissão de Trabalhadores da Sociedade Central de Cervejas 149 PATRIARCA, Fátima. "Que justiça social?", in Portugal e a Transição para a Democracia (1974- 1976). Lisboa: Colibri, 1999. 150 Ibid.

70 estabelecido um acordo com dois dos administradores que se colocaram à disposição dos trabalhadores, no intuito de despacharem os assuntos que careciam obrigatoriamente da sua intervenção.

“Os Trabalhadores não querem de forma alguma assumir qualquer espécie de poder na gestão da empresa, e por isso reafirmam uma vez mais que a administração continua a ser a única responsável pela sua gestão”151.

Na sequência do incumprimento do compromisso assumido pelos administradores no plenário de 31 de Janeiro – que o Conselho de Administração vem mais tarde desmentir ter existido – a Comissão de Trabalhadores convoca os trabalhadores para um novo plenário a realizar no dia 08 de Fevereiro, na fábrica de Vialonga. Aquele que poderá ser descrito como o plenário mais emotivo de todos, contou com a presença de mais de mil trabalhadores e viu ser aprovada a moção que apoiava a nacionalização da empresa (com 5 votos contra e 21 abstenções), segundo uma série de considerandos que, entre vários ataques, se dirigiam essencialmente contra a posição actual e antiga da Administração.

“Considerando todos os factos apresentados em Plenário sobre a incapacidade de gestão demonstrada pela administração da empresa, Considerando que em completo desrespeito por aquilo que foi acordado em Plenário entre os Trabalhadores e a administração da Sociedade Central de Cervejas, esta afirma agora que se recusa a comparecer em plenário, Considerando que a administração se recusou desde terça-feira passada a assumir as suas responsabilidades de gestão, criando problemas a fornecedores e entrando portanto num processo de sabotagem económica, Considerando a vontade firme dos Trabalhadores da Sociedade Central de Cervejas em que os frutos do seu trabalho beneficiem todos os portugueses, e não só uma minoria de privilegiados que têm esbanjado fortunas adquiridas com o suor dos Trabalhadores, Considerando que é necessário acabar definitivamente com as injustiças sociais que existem em Portugal, onde a maioria da população vive em condições económicas deploráveis”152.

151 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Correspondência não classificada do Secretariado Coordenador, Vol. 73, n.º 206, Assuntos Económicos e Sociais e Empresas, Processo 73/15, Comunicado n.º 5 da Comissão de Trabalhadores da Sociedade Central de Cervejas. 152 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Correspondência não classificada do Secretariado Coordenador, Vol. 73, n.º 206, Assuntos Económicos e Sociais e Empresas, Processo 73/15, Comunicado n.º 8 da Comissão de Trabalhadores da Sociedade Central de Cervejas.

71 O plenário concedeu representação às Comissões de Trabalhadores para, através do MFA, solicitar ao Governo a nacionalização da empresa ao abrigo do Decreto-Lei n.º 660/74. Porém, a decisão não foi pacífica. Dois dias depois, a 10 de Fevereiro, a Comissão de Trabalhadores do Prior Velho, apoiada pelos Entrepostos do Porto e da Cervejaria Trindade (sector comercial), apresentou publicamente a sua contestação face à decisão tomada, apesar de apoiar o caderno reivindicativo de 31 de Janeiro, originando ou recuperando uma guerra interna que colocava em cima da mesa questões muito mais complexas do que a nacionalização do sector153. Os trabalhadores do Entreposto do Prior-Velho – cerca de 300 que defendiam a via da negociação com os patrões – punham em causa a legitimidade do plenário poder aprovar essa moção, por não constar da ordem de trabalhos, mas também pela diminuta representatividade e pela necessidade da votação se realizar por voto secreto, dada a “verdadeira pressão psicológica e política existente”154.

No fundo eram duas “culturas” de operariado que se antagonizavam – sector produtivo e sector de distribuição/comercial – e que espelhavam sobejamente as contradições que se faziam sentir na sociedade portuguesa. Esta situação é mais complexa quando se constata a dispersão geográfica das empresas e a existência de diversas comissões de trabalhadores, completamente desarticuladas.

4.1.2. Guerra de comunicados

O mês de Fevereiro inaugura uma troca de comunicados/acusações entre a Administração da SCC e as Comissões de Trabalhadores que se estenderá até Março, patente em grande parte da imprensa escrita da época (Diário de Lisboa; A Capital; O Primeiro de Janeiro; Jornal do Comércio; O Comércio do Porto; Jornal de Notícias; Diário Popular; República; Diário de Notícias e Século). Neste espaço, procurarei dar a conhecer os principais argumentos de ambas as partes, utilizando para o efeito as notícias recolhidas na imprensa, as principais fontes para compreender a forma como decorreram as negociações.

Aos comunicados da Comissão de Trabalhadores, literalmente vertidos nos jornais, segue-se a resposta da Administração, datada de 10 de Fevereiro, que circula

153 Esta guerra era a representação singela da luta na sociedade entre o programa de Melo Antunes e um programa mais à esquerda, ainda que por definir. 154 Vida Mundial, 20/02/1975, p. 22.

72 pela imprensa nos dias subsequentes. Esta vem contrariar as posições dos trabalhadores, assentando a sua argumentação em cinco vectores essenciais: (i) condições de trabalho, remunerações e regalias da empresa estão acima da média nacional; (ii) processo reivindicativo orquestrado, similar ao que ocorreu noutras empresas; (iii) ilegalidade da ocupação e acesso a documentos privados; (iv) rejeição de diálogo por parte dos trabalhadores; (iv) desresponsabilização pela gestão155.

As Comissões de Trabalhadores da Sede, da Trindade, de Vialonga, de Coimbra e do Porto, de forma conjunta, reagem prontamente e violentamente ao comunicado da Administração. Pela primeira vez, os trabalhadores recorrem a provas factuais como forma de ataque ao patronato: desde a questão do levantamento, em 1974, de 100 mil contos a título de honorários, gratificações e dividendos, às regalias pessoais (crédito ilimitado no supermercado da empresa, combustível para o sistema de condicionamento de ar das casas, os 18 750$00 por mês para gasolina, etc.)156. Rejeita-se a ideia de que os administradores estavam privados da sua actividade normal, e que a situação poderia ser completamente regularizada logo que estes dessem seguimento ao compromisso estabelecido quanto aos três pontos em falta (vencimentos dos administradores, redução do número de administradores e a não distribuição de lucros e gratificações de 1974). Relativamente à possibilidade de esta situação danificar a política de investimentos da empresa, a Comissão recorda que a generalidade dos investimentos efectuados à data não correspondeu aos interesses dos trabalhadores, constituindo mais uma das faces da “má gestão”. A sabotagem económica começa a ganhar forma segundo os trabalhadores, desde logo pela tentativa de “assustar os fornecedores” e pela coacção nos bastidores157. O comunicado finaliza com o reforço da necessidade de nacionalização:

“Passemos em claro o atestado de incompetência que a Administração concedeu ao Governo Provisório, aos Governo de Inglaterra, da França e de tantos outros Países do Mundo “ocidental” e “oriental” ao considerar a nacionalização como negativa.

155 O Primeiro de Janeiro, 11/02/1075, p. 5. 156 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Correspondência não classificada do Secretariado Coordenador, Vol. 73, n.º 206, Assuntos Económicos e Sociais e Empresas, Processo 73/15, Comunicado n.º 12 da Comissão de Trabalhadores da Sociedade Central de Cervejas. 157 Ibid.

73 As recentes nacionalizações em Portugal provam o contrário e estão a dar lugar a um crescente pedido dos Trabalhadores de importantes empresas, como garantia que é de sobrevivência e de fortalecimento”158.

A Administração reforça as suas constatações num novo comunicado que vem a público no dia 14 de Fevereiro, logo depois de o Diário Popular ter difundido uma notícia que indicava que alguns elementos das comissões de trabalhadores haviam recebido ameaças de morte através de chamadas anónimas159. Este episódio é confirmado na Vida Mundial, ao que se anexam excertos de postais do mesmo teor:

“Vocês empregados burgueses revisionistas têm 6000$00 de ordenado mínimo e portanto a barriguinha cheia e querem atirar poeira aos olhos do povo português indo para a TV reclamar que nem macacos a nacionalização da S.C.C. que vos enche a barriga. Tenham é vergonha e repartam connosco o que ganham imediatamente”.

“Para p... como você vai este aviso: se algum trabalhador desta fábrica for despedido é por sua causa, sua p... Prepara-se para apanhar um enxerto de porrada, porque vai apanhá-la, disso esteja certa, seu coiro. Dizer mal dos patrões que melhor pagam neste país, desavergonhada. O teres ido à televisão dizeres mentiras fica-te caro”.160

O Conselho de Administração reitera o carácter exemplar da Sociedade Central de Cervejas, assente num equilíbrio financeiro e numa política de investimento sustentado, defendendo a teoria de que o conflito se havia desencadeado porque o sector cervejeiro não estava referenciado no Plano Melo Antunes. Por outro lado, faz uma retrospectiva dos benefícios concedidos aos trabalhadores no período anterior ao 25 de Abril, nos quais as comissões de trabalhadores tiveram uma participação importante. É retomada, agora de forma mais vincada, a tese de que o movimento que emergiu no dia 31 de Janeiro se enquadrava numa estratégia montada por sectores afectos ao PCP, desiludidos pela moderação do Programa Económico, aprovado no dia anterior aos conflitos na SCC, e que não previa a nacionalização do sector cervejeiro, bem como de outros sectores onde vieram desabrochar situações idênticas.

Numa entrevista concedida à Vida Mundial, um elemento da Comissão de Trabalhadores aborda todo o processo reivindicativo em torno da SCC. No eixo central da análise centra-se a posição dos trabalhadores relativamente às nacionalizações: “o

158 Ibid. 159 Diário Popular, 14/02/1975, p. 11. 160 Vida Mundial, 20/02/1975, p. 23.

74 Estado deve intervir nas grandes empresas lucrativas e atacar os monopólios”161. Noutra frente, um representante do sector comercial refuta esta mesma concepção, porque a nacionalização acarretaria uma “baixa de produção”, já que se o funcionário “se sentir na pele de funcionário público, faz como ele, isto é, como recebe pouco, pouco faz”162. O sector comercial é contra a nacionalização da empresa, mas a favor do controlo desta pelos trabalhadores, em moldes que não foi possível apurar durante a investigação.

A posição da Sociedade Central de Cervejas na estrutura económica do Estado Novo é também analisada. Salienta-se o facto de a situação de monopólio ter concedido à SCC benefícios de economia de escala, isto é, com uma produção de 240 milhões de litros, obtinha custos de produção baixos. Os avultados lucros eram investidos noutras empresas, contribuindo para a degradação financeira da SCC, que ia assim incrementando a sua dependência face à banca nacional.

A Comissão Coordenadora anuncia, pela primeira vez, a intenção de promover um “saneamento político e de competência”, afastando os trabalhadores que estavam comprometidos com o antigo regime, e desmobilizando a rede policial existente, consubstanciada na ligação à PIDE. Neste sentido, a ajuda concedida pelo MFA, que envia técnicos para fazer uma análise à SCC, é extremamente fulcral, como teremos oportunidade de ver.

Maria Antónia Palla, jornalista que conduz a entrevista, encerra o debate em torno da Central de Cervejas com uma curiosa interrogação/afirmação: “Abolir a propriedade privada ou controlá-la? A resposta ultrapassa em muito os trabalhadores da Sociedade Central de Cervejas”163. Mas será que ultrapassa?

O arrastar da situação – tanto do ponto de vista da actuação da administração como da posição “divisionista” do sector comercial – provocou a marcação de um novo plenário, para o primeiro dia de Março, que teve lugar em Sacavém, a pedido da Comissão do Prior Velho. As principais decisões emanadas dessa Assembleia – que, segundo a Comissão de Trabalhadores de Vialonga, contou com a presença de elementos provocatórios – postulavam uma lógica de continuidade reivindicativa sem inversões dramáticas no seu discurso. A Administração deveria outorgar poder a dois administradores, que seriam autorizados a entrar na empresa até uma posterior decisão

161 Ibid, p. 19. 162 Ibid. 163 Vida Mundial, 20/02/1975, p. 24.

75 da Junta de Salvação Nacional sobre a intervenção estatal, que vinha sendo trabalhada por uma comissão de inquérito nomeada a 20 de Fevereiro. Via-se obrigada a apresentar o relatório da gestão referente a 1974 e a proceder aos actos de gestão necessários ao normal funcionamento da empresa. Os trabalhadores definiram o dia 06 de Março como data final para uma resposta da Administração, caso contrário seriam automaticamente saneados164. Num comunicado lançado a 04 de Março, a Administração mostra-se favorável ao diálogo, rejeitando todas as acusações, colocando-se no papel de vítima de um embuste de maiores dimensões, que iria conduzir a empresa “a uma crise irreversível e irrecuperável”, desde logo pela impossibilidade de execução do plano de investimentos previsto para 1975165.

Durante esta constante troca de acusações, desde 20 de Fevereiro que se encontrava em funcionamento uma Comissão de Inquérito Oficial à SCC, pedida pelos trabalhadores à Junta de Salvação Nacional. Foi através desta que a JSN apresentou às comissões de trabalhadores uma proposta de gestão temporária para a empresa, que previa a formação de uma administração formada por representantes dos accionistas e elementos de confiança dos trabalhadores. Após a reunião entre as Comissões de Trabalhadores de Vialonga, Sede, Trindade, Coimbra e Porto, estes contrapropõem: Administração provisória composta por dois representantes dos actuais accionistas – sendo que um destes pode ter a confiança do Banco Espírito Santo – e três representantes da JSN; o Conselho Fiscal contaria com três representantes eleitos pelos trabalhadores, que funcionaria paralelamente com um órgão de controlo e fiscalização nomeado pela JSN. O caderno reivindicativo serviria de guia-base para todos os órgãos que viessem a ser criados.

4.1.3. As sequelas do 11 de Março

Imediatamente após as confrontações do 11 de Março as Comissões de Trabalhadores vêm saudar a nova viragem revolucionária, convocando à “unidade de todos os trabalhadores”, de forma a alcançar os objectivos propostos “contra a

164 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Serviços de Apoio ao Conselho da Revolução, Vol. 73, Assuntos Económicos e Sociais, Processo 73/15, Comunicado n.º 20 da Comissão de Trabalhadores da Sociedade Central de Cervejas. 165 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Correspondência não classificada do Secretariado Coordenador, Vol. 73, n.º 206, Assuntos Económicos e Sociais e Empresas, Processo 73/15, Comunicado da Administração da Sociedade Central de Cervejas, 04/03/1975.

76 exploração capitalista”166. Logo no dia 12 as CT’s de Vialonga, Trindade, Sede e Coimbra endereçam um telegrama à Junta de Salvação Nacional apoiando a “acção enérgica do MFA na luta contra a reacção”, pedindo “punição severa aos responsáveis pela tentativa do golpe”167. Porque a revolução também se faz nas/através das palavras, as Comissões de Trabalhadores passam para a dianteira no ataque ao patronato, estabelecendo uma colaboração activa, ainda que informal, entre as Comissões de Trabalhadores e a Comissão de Inquérito. Atente-se às seguintes interrogações colocadas pelas CT’s, constituindo, no essencial, as problemáticas investigadas pela Comissão de Inquérito:

“Como é que os trabalhadores podem aceitar administradores sobre os quais fundadas suspeitas de exportação ilícita de capitais? Como é que os trabalhadores podem admitir administradores que prestam falsas declarações ao Banco de Portugal? Como é que os trabalhadores podem permitir que administradores solicitem empréstimos externos a taxas de juro próximas de 14%; que pedem autorizações às entidades oficiais declarando que o dinheiro se destina a financiamento e, depois, se desviam verbas para pagamento de dividendos dos accionistas? Como é que os trabalhadores podem ter confiança em administradores que acordam entre si contactarem empresas concorrentes no sentido de alterarem a apresentação de balanços, de forma a justificar pedidos de aumento de preços de cerveja? Que confiança podem ter os trabalhadores em administradores que, em vez de investir em Portugal, desviam várias centenas de milhares de contos para o Brasil (e outros países?) com lucros que jamais regressam ao nosso País? Como é que os trabalhadores podem admitir que administradores solicitem e levantem, só no ano de 1974, cerca de 2.000 contos para.... gasolina? Isto sem falar ainda das ligações de administradores à PIDE/DGS, à Legião Portuguesa, e aos governos fascistas de Salazar, Tomás e Marcelo”168.

No mesmo comunicado, a par de uma descrição sumária da luta empreendida até ao momento, acentua-se a tónica no divisionismo interno, na “fascização” do sector comercial, presente nas seguintes palavras: “estranha posição esta, a de trabalhadores

166 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Correspondência não classificada do Secretariado Coordenador, Vol. 73, n.º 206, Assuntos Económicos e Sociais e Empresas, Processo 73/15, Comunicado n.º 27 da Comissão de Trabalhadores da Sociedade Central de Cervejas, 12/03/1975. 167 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Documentação Económica e Social, Junta de Salvação Nacional, caixa 2, n.º 116, doc. 231, Sociedade Central de Cervejas. 168 Ibid.

77 atacarem trabalhadores para defenderem capitalistas!...”169. Estas Comissões acusavam frontalmente o sector de distribuição de participar numa manifestação contra- revolucionária, na manhã de 11 de Março, utilizando “dezenas de camionetas a boicotar o acesso ao Instituto da Defesa Nacional”170, deixando no ar a ideia de que existiam relações próximas entre certos quadros e os autores do golpe de 11 de Março. Sobre a localização actual dos administradores – entre acusações de participação nos acontecimentos de 28 de Setembro e de 11 de Março ao lado dos contra-revolucionários –, o mesmo documento informa que: (i) Manuel José Carvalho Martins e Manuel Vinhas estão há vários meses fora de Portugal; (ii) Mário Vinhas, Caetano Beirão da Veiga e José Manuel Martins não estão no país desde o início de Fevereiro.

No dia anterior à nacionalização da banca, um dos administradores da Sociedade Central de Cervejas, Miguel Sttau Monteiro – dirigente da CIP; o administrador da SCC que mais rapidamente se adaptou ao contexto revolucionário – responde, através da «Vida Mundial» à argumentação da Comissão de Trabalhadores, deixando bem claro que “as cervejas não serão nacionalizadas”171. Com um discurso centrado no auto-elogio ao nível da gestão, plasmado no elevado crescimento da empresa desde 1934, Miguel Sttau Monteiro refere que uma das estratégias empresariais passava pela compra de empresas “em más condições para as transformar depois”172, dando o exemplo da Empresa de Cervejas da Madeira e da Água do Luso. Por outro lado, assume a clara dependência bancária pelo facto de a empresa não ter capacidade de se autofinanciar, mas que esta dependência é positiva pois permite que se atinja um elevado grau de investimento, necessário nos mercados internacionais. Sobre a colaboração com as antigas estruturas do Estado Novo, Sttau Monteiro refere o pagamento mensal de 3 contos à PIDE/DGS, mais como uma forma de “coacção” do que colaboração activa, apesar da investigação levada a cabo nos arquivos da PIDE ter revelado essa mesma ligação sob a forma de investigação e controlo dos funcionário da fábrica de Coimbra pelos serviços da polícia, que contavam com o apoio da Administração, designadamente pelo envio de memorandos com as alterações na estrutura dos funcionários (entradas, saídas, etc.). É mencionada, também, a existência de três funcionários que, “a pedido da

169 Ibid. 170 Ibid. 171 Vida Mundial, 13/03/1975, p. 31. 172 Ibid, p. 32

78 Legião Portuguesa desta cidade, frequentaram um curso de anti-sabotagem”173. Quanto à natureza do movimento que se desencadeou no dia 31 de Janeiro, este administrador considera que o problema ultrapassa o conflito laboral: é sobretudo um conflito de teor político. Para mais, acrescenta que não se opõe à nacionalização da indústria se este for o caminho que o país decidir escolher, ainda que não preveja um acontecimento desta índole, por quatro razões: (i) o Plano Económico não prevê a nacionalização; (ii) o Decreto-Lei n.º 660/74 não constitui um atentado aos empresários, mas uma forma de assistência a empresas em risco de falência; (iii) o Estado não possuí meios para gerir um elevado número de empresas; (iv) a maioria dos trabalhadores da empresa não subscreve os projectos das Comissões de Trabalhadores.

De facto, os acontecimentos do 11 de Março e a inversão de forças que se sucedeu explicam a resolução que foi dada a esta empresa, imediatamente extrapolada para as restantes ocorrências similares. A Comissão de Trabalhadores dirigiu uma exposição ao Conselho da Revolução no dia 20 de Março. Neste documento, dando conhecimento da situação da empresa e da evolução dos acontecimentos, é solicitada a intervenção do Estado através da nomeação de uma Comissão Administrativa – à semelhança do que havia sucedido na Banca – fundamentada no já referido D. L. de Novembro de 1974, na situação periclitante de uma empresa que não possuía uma administração desde 31 de Janeiro e cujas dívidas à Banca se estimavam na ordem dos 896 418 mil contos, montante já superior ao capital social e às reservas da empresa (850 mil contos). Acresce a este valor as garantias e avales prestados, num montante de 147 798 558$29, que perfaz um total de 1 044 216 558$29 (para uma análise discriminada ver tabela 1, no anexo G).

Como refere Ricardo Noronha, na sua tese de doutoramento sobre a nacionalização da banca, “a economia tornava-se incontornavelmente política”174, seguindo aquilo que Medeiros Ferreira denomina de circunstancialismo revolucionário. – é a primeira grande vitória dos trabalhadores das cervejas.

173 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo da PIDE/DGS, Del C, UI: 10627, Relatório n.º 1.528/72-4ª. Sec. S. Inf. – Ambiente na Fábrica da Cerveja – Coimbra, 03/08/1972. 174 NORONHA, Ricardo. A nacionalização da banca no contexto do processo revolcuionário português (1974-1975). Tese de doutoramento. Lisboa: FCSH, 2011, p. 416.

79 4.2. Sobre o controlo operário na SCC O tema aqui abordado sobre a questão do controlo operário divide-se em duas vertentes: uma primeira, de carácter selectivo, com base na experiência das Comissões de Trabalhadores da fábrica de Vialonga; a segunda vertente, parte dessa mesma experiência, mas teoriza em traços gerais sobre a concepção de controlo operário.

A Comissão de Trabalhadores de Vialonga, eleita no dia 31 de Janeiro, era composta por dez elementos, tendo sido reeleita três vezes desde então. Segundo relato de um membro da Comissão, nesta existiam quatro militantes do PCP e seis independente de esquerda (à esquerda do PS)175, que espelhavam razoavelmente a realidade fabril: mais militantes e simpatizantes do PS e do PCP, apesar da actividade partidária ser maior nos elementos afectos ao Partido Comunista; e alguns militantes do PRP, do MES e da UDP. Sobre a organização das CT’s, o referido elemento afirma a falta de articulação destas176, apesar da sua forte organização de base, como já havia sido comprovado no decorrer da tese177. Desde cedo, a Comissão de Trabalhadores manifestou-se contra o controlo operário na sua vertente de gestão da produção e gestão financeira, por considerar que não devia multiplicar as suas funções quando existia uma comissão administrativa competente, pedida por estes e legitimada pelo MFA. Na prática, o controlo operário realizou-se inicialmente através da fiscalização da contabilidade da empresa e da vigilância dos arquivos, que permitiu a descoberta de várias irregularidades pela Comissão de Análise e Inquérito nomeada pela JSN. Porém, esta situação não impediu que se discutissem, num campo teórico, as questões ligadas ao controlo operário e a sua aplicação no conjunto das empresas da SCC. É com base em três documentos, que estão literalmente disponíveis em dois excelentes artigos sobre o controlo operário em Portugal178, que esta análise se debruça.

175 A Gazeta da Semana, 6-13/05/1976, p. 11. 176 MAILER, Phil e BRINTON, Maurice. Portugal: a revolução impossível. Porto: Edições Afrontamento, 1978. Segundo Mailer e Brinton, este tipo de problemas era comum às CT’s, sobretudo quando existia uma assinalável dispersão geográfica das empresas. Outro tipo de problemas poderia ser também impeditivo ao normal funcionamento das CT’s: encontrar local de reunião; tendências políticas; assimetrias da própria classe (posições sociais, sexo, idade); autogestão; saneamento e a tecnologia. 177 Na SCC existe uma comissão de trabalhadores por cada fábrica: fábrica 1 (Vialonga), fábrica 2 (Coimbra), fábrica 3 (Catujal), entrepostos 1 e 2 (Prior Velho), entreposto 3 (Porto), sede (Lisboa) e cervejaria Trindade (Lisboa). A sua coordenação faz-se através de reuniões inter-comissões (RIC), mas não há uma Inter-Comissão à escala da empresa. 178 LIMA, Marinús Pires de et al. “Controlo operário em Portugal (I)", in Análise Social, n.º 47, 1999: 765–817; LIMA, Marinús Pires de et al. “Controlo operário em Portugal (II)", in Análise Social, n.º 48, 1999: 1049–1146.

80 O primeiro documento, intitulado «Sobre o Controlo Operário na Sociedade Central de Cervejas» (Junho/Julho de 1975), da autoria de um grupo de trabalhadores da empresa serviu de base à proposta concreta de controlo operário para a SCC. Fazendo um balanço das nacionalizações, os trabalhadores deixam no ar duas questões prementes: quem passa a mandar na economia? Quem controla o processo de transformação em curso?179 Ora, o que os trabalhadores concluem é que na maioria das empresas o poder ainda se encontra do lado do capital, pelo que urge atacar esse mesmo poder. E, esse contra-poder, terá que ser necessariamente o “poder operário”, através do controlo dos processos de transformação, através do controlo operário, que é “a expressão do poder dos trabalhadores sobre as decisões que lhes dizem respeito” e é a expressão de um duplo poder180. Os trabalhadores reconhecem que o controlo da empresa é importante, mas é apenas uma parte do controlo. Este só existe na sua plenitude quando enquadrado num controlo global (ao nível sectorial, regional e nacional), pois permite a reorientação da economia, o combate ao imperialismo e a coordenação da luta económica e política dos vários trabalhadores. Neste sentido, o documento fala numa coordenação real entre as comissões de trabalhadores e o movimento sindical e na possibilidade de criar um sindicato vertical na empresa, que albergue os operários e os empregados de escritórios, mas que saneie os quadros comprometidos com a exploração. O controlo operário só deveria responder aos plenários e nunca aos órgãos de Estado ou aos sindicatos, porque o iria burocratizar e retirar-lhe a função de órgão de poder operário181.

“O controlo operário nos sectores nacionalizados deve ser uma arma de ataque aos critérios de gestão capitalista e não deve ser dado lugar a perspectivas «autogestionárias», que tendem a fazer dos trabalhadores os patrões da sua própria empresa; estas perspectivas, normalmente, ocultam posições que querem reintroduzir a lógica capitalista, atacando para isso, ainda que de forma «disfarçada» neste momento, as nacionalizações, o controlo a nível global e os seus órgãos”182.

Esta constatação distancia desde logo os conceitos de autogestão e de cogestão, porque, como bem referiu Raquel Varela, o controlo operário surgiu como medida de transição para a colectivização (não num meio-termo) e apesar de ser menos que a

179 LIMA et al, “Controlo operário em Portugal (I)”, in Análise Social, n.º 47, 1999: 765-817, p. 776. 180 Ibid. 181 Ibid, p. 778. 182 Ibid.

81 autogestão em termos de gestão, é politicamente ajustado ao processo de transição para o socialismo, uma vez que rompe obrigatoriamente com o processo de acumulação capitalista183. Paralelemente, ocorrem várias tentativas de aproveitamento e manipulação destas características do controlo operário por parte do PCP, dos sindicatos e dos governos provisórios (cf. a batalha de produção). Um dos exemplos que sustenta esta percepção é a teoria desenvolvida por Mário Murteira, subjacente no desenho do Plano Económico de Transição, que defende a necessidade de “combinar forte e eficaz coordenação central de macro-decisões com progressiva estruturação descentralizada e desconcentrada do sistema económico-social, apoiada em órgãos diversos de poder popular”184, isto é, o controlo operário deveria existir num espaço restrito (empresas), coexistindo com as funções macroeconómicas do governo e demais instituições.

Sob um dos modelos teóricos mais maduros, o trabalho das CT’s deveria estabelecer-se na (i) luta contra a sabotagem económica e contra a desorganização capitalista da economia (controlando o abastecimento e fiscalizando a gestão), na (ii) luta contra os efeitos da crise económica capitalista sobre os trabalhadores, e na (iii) luta contra os critérios burgueses de organização do trabalho na empresa (contra os privilégios, contra a separação entre o trabalho intelectual e o trabalho manual e pela implantação do poder colectivo). O documento-guia, de finais de Julho, discutido pelos trabalhadores da fábrica de Vialonga e da fábrica de Catujal, apesar de demonstrar uma reflexão teórica estruturada, nunca chega a ser concretizado, o que traduz a dificuldade do movimento operário em unificar-se em torno de uma alternativa política que se enquadrasse no contexto de radicalização social. São agora especificados os modos concretos de actuação, que deveriam ser exercidos pelas CT’s (podiam incluir delegados sindicais), coadjuvados por subcomissões sectoriais, e encimados por um plenário empresarial. A proposta de reestruturação passava pela criação de um Conselho de Trabalhadores (órgão coordenador), de um Secretariado, e de uma variedade de órgãos de controlo (actividade comercial, produção, manutenção, finanças, gestão de pessoal e

183 VARELA, Raquel. A História Do PCP Na Revolução Dos Cravos. Lisboa: Bertrand, 2011; VARELA, Raquel. “O Partido Comunista Português, as Nacionalizações, o controlo operário e a ‘batalha da produção’. Estudo de caso na Revolução Portuguesa (1974-1975)", in Debat, n.º 6, 2011: 38–59. 184 MURTEIRA, Mário. “Sobre o conceito de independência económica,” in Análise Social XI, n.º 41 (n.d.), p. 533.

82 informação e actividade sindical). Previa ainda comissões de trabalhadores de estabelecimento (base do esquema)185.

4.3. A Comissão Administrativa Na reunião plenária do Conselho da Revolução, de 21 de Março, examinada a situação da Sociedade Central de Cervejas com base nas resultados preliminares da Comissão de Análise e Inquérito, o Conselho resolveu “recomendar ao Governo a nomeação imediata de uma comissão administrativa”186, ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 660/74, para assegurar a regular gestão da referida empresa. Num despacho do mesmo dia (4º Spl. D.G, 1ª Série, n.º 68, de 21/03/1975), a Presidência do Conselho de Ministros, ao abrigo da resolução do Conselho da Revolução e das alíneas c), e), g) e h) do n.º 2, do art.º 1. do Decreto-Lei n.º 660/74, nomeou uma comissão administrativa para a Sociedade Central de Cervejas composta pelos seguintes elementos:

! Armando da Fonseca Marques (51 anos, licenciado em Ciências Económicas e Financeiras, Director dos Serviços Comerciais); ! Leontino Raimundo Aleixo (41 anos, licenciado em Finanças, Director dos Serviços Financeiros); ! Luís Alberto Caldeira Deslandes (33 anos, curso de Engenharia Química do I.S.T., Director da Fábrica n.º 1 da SCC); ! Amílcar Soares Martins (engenheiro); ! José Manuel da Silva Nunes (capitão-tenente AN)187.

Esta modalidade de intervenção estatal nas empresas ilustra na perfeição a concepção de duplo poder – quer ao nível institucional, entre Conselho da Revolução e Governo, quer ao nível da legitimação, que se verifica entre as Comissões de Trabalhadores e os órgãos institucionais – então vigente e que constitui, desde logo, o primeiro entrave à realização de uma política de nacionalizações estruturada.

O mandato da Comissão Administrativa cingiu-se inicialmente à Sociedade Central de Cervejas, de forma isolada. Contudo, com o prosseguimento das

185 LIMA, Marinús Pires de et al. “Controlo operário em Portugal (II)", in Análise Social, n.º 48, 1999: 1049–114, pp. 1059-1064. 186 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Reuniões, Resoluções do Conselho da Revolução, n.º 81, Resolução de 21/03/1975. 187 Arquivo da Presidência do Conselho de Ministros, Caixa 393 EAD Proc. Colectivos, E8.93, Gabinete do Primeiro Ministro, 24/03/1975.

83 investigações, propôs-se que o mandato fosse alargado à Companhia de Cervejas Estrela, à Companhia da Fábrica de Cervejas Jansen e à Companhia Produtora de Malte e Cerveja Portugália188, pelas razões que aqui são transcritas:

i. “Muitos dos membros dos Conselhos de Administração são comuns às várias empresas [cf. anexo H, tabela 1]; ii. Existe estreita interpenetração de interesses entre as empresas do Grupo; iii. A maioria dos problemas que têm surgido resultam da ausência dos administradores ou do seu desinteresse; iv. Existe a possibilidade do funcionamento de muitas empresas do Grupo ser entravado pela actuação de alguns dos administradores ainda presentes no País; v. Foram já detectadas irregularidades várias nessas empresas (desvio de fundos, transacção ilegal de acções)”189.

188 A 30 de Maio o Conselho de Ministros suspende os órgãos das empresas acima mencionadas, com excepção do Conselho de Gerência da Companhia de Cervejas de Coimbra, constituído por representantes do Banco Borges & Irmão, Banco do Alentejo e Borges & Irmão Comercial (Diário de Governo, 1ª Série, n.º 138, de 18/06/1975). 189 Arquivo da Presidência do Conselho de Ministros, Caixa 393 EAD Proc. Colectivos, E8.93, Gabinete do Primeiro Ministro, 06/05/1975.

84 4.4. Comissão de Análise e Inquérito Nomeada a 20 de Fevereiro por despacho da Junta de Salvação Nacional, a «Comissão de Análise e Inquérito ao grupo de que faz parte a Sociedade Central de Cervejas» (denominação oficial), inicia os trabalhos ainda nesse mês. Abrangida posteriormente pelo n.º 2 do art.º 4.º do Decreto-Lei n.º 129-A/75, de 13 de Março, segundo o qual as comissões nomeadas dentro dos campos da Lei n.º 3/75 usufruíam “das prerrogativas comuns de agentes da polícia judiciária militar e inspectores de finanças”190, a estrutura dividia-se em dois grupos: um primeiro, oficial, que trabalhava mais activamente, sob a liderança do capitão Silva Nunes, em representação do MFA; e um grupo de apoio ou de vogais, responsável por uma variedade de trabalhos, nomeadamente a realização de entrevistas, redacção de documentos, numa vertente de back office. O trabalho realizado pela comissão, à imagem dos procedimentos legais que eram tomados aquando da intervenção estatal, assentou numa parceria de facto entre esta comissão e as Comissões de Trabalhadores, com maior destaque para a de Vialonga e para a da Sede, onde se situavam os escritórios.

Entre Março e Maio, a Comissão de Análise e Inquérito procedeu ao levantamento e análise dos documentos que haviam sido salvaguardados pelas Comissões de Trabalhadores, ao mesmo tempo que começavam a vir a público, na imprensa, as primeiras acusações pessoais aos anteriores elementos da Administração – na sequência do plenário de trabalhadores de 12 de Abril. O primeiro envolvido foi Manuel Vinhas, um dos mais emblemáticos administradores da empresa, sobretudo pela sua actividade nas colónias – ligado e investigado pela PIDE, a partir de 1963, por possíveis ligações ao MPLA –, pelo associativismo e dirigismo desportivo – ex- dirigente do Sporting Clube de Portugal – e pela sua actividade de apoio a artistas portugueses como Júlio Pomar, Luiz Pacheco, entre muitos outros. Figura sui generis, Vinhas constava da lista de procurados pelo COPCON na antecâmara do 28 de Setembro, mas conseguiu fugir a 03 de Outubro e exilar-se no Brasil, não obstante ter passado em vários momentos por Paris e Madrid. No Diário de Lisboa, de 14 de Abril de 1975, um ex-motorista de Vinhas, que o acompanhou nessa fuga, recupera as palavras que o patrão havia dado no período que antecedeu o 28 de Setembro. Eram, essencialmente, mensagens de cautela: “não saias de casa no próximo fim-de-semana

190 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Reuniões, Documentos apresentados ao CR, caixa n.º 1, n.º 319, doc. 29, Projecto e Resolução do CR, 09/02/1976.

85 porque vai haver um grande banho de sangue”191. Surgem também notícias que acusam Manuel Vinhas de mandar destruir papéis da empresa antes da sua viagem para o Brasil, e de ligações ao 11 de Março, dada a sua relação íntima com Spínola e a entrega de uma carta a este, em finais de Fevereiro. As Comissões de Trabalhadores, num do seus comunicados, acusam ainda Manuel Vinhas de ligações neocoloniais, através dos órgãos de comunicação que este controlava em Angola - Notícias e o Comércio. Comprovam esta situação com a análise de telegramas enviados a João Fernandes, do Notícias, onde era reprovada a “maneira como as autoridades portuguesas tratavam os representantes dos movimentos de libertação (como chefes vitoriosos) e apoiavam e impulsionavam os partidos fantoches como a União Nacionalista Angolana”. Noutro telex, Vinhas assume-se como elemento de pressão contrária à política de descolonização, referindo ser “indispensável que associações económicas tomem posição pedindo obediência a princípios formulados em Portugal e o Futuro”192, daí que Vinhas tenha indicado o nome de Silvino Silvério Marques para Angola, como aparece noutro telegrama.

O segundo visado nestas relações foi Artur Alves Conde – ex-secretário de Estado do Tesouro e, naquele momento, secretário de Estado do Turismo, com anterior ligações na SCC193 –, associado às ligações neocoloniais de Manuel Vinhas e às fraudes que iam sendo encontradas no interior da SCC. “Ponta-de-lança do grande capital introduzido pelo 1.º Governo Provisório”, Alves Conde é acusado de, juntamente com João Pedro Homem de Mello, incentivar as empresas cervejeiras a investir no Brasil e desinvestir em Portugal, um país com uma “ditadura equilibrada” que permitia reduzir riscos políticos e tornar os “prejuízos fictícios” rentáveis194. Quanto às relações com Vinhas, o documento indica a instrução dada a Alves Conde para falsear os balanços da CUCA e das associadas, e “fazer parte do 4.º Governo Provisório como secretário de Estado do Turismo”195. O Plenário de 12 de Abril aprova uma moção que apela ao afastamento do Governo de Alves Conde e à suspensão de qualquer nomeação sua para cargos de relevância.196

191 Diário de Lisboa, 14/04/1975, p. 3. 192 Diário Popular, 10/04/1975, p. 10 (mesma notícia no Esquerda Socialista). 193 Ex-administrador da CUCA, mas também da Siderurgia. 194 Diário Popular, 10/04/1975, p. 10 (mesma notícia no Esquerda Socialista). 195 Ibid. 196 República, 15/04/1975, p. 13.

86 4.4.1. Congelamento das contas bancárias – a primeira grande medida da Comissão de Análise e Inquérito

Por despacho emanado do Conselho da Revolução, Rosa Coutinho mandou congelar, por indicação da Comissão de Análise e Inquérito que encontrou irregularidades administrativas que justificavam procedimentos judiciais, os bens móveis e imóveis de:

i. Miguel Infante de la Cerda Sttau Monteiro; ii. Caetano Sanguinetti Beirão da Veiga; iii. Manuel Carvalho Pereira Martins; iv. Manuel José de Carvalho Martins; v. Mário de Carvalho Brito das Vinhas197.

Esta medida, de carácter temporário (até ao término do inquérito oficial), visava impedir a saída de capitais do país, uma vez que a maioria dos administradores encontrava-se no estrangeiro e as notícias de tentativas de transacção de posições das empresas vinham criando uma síndrome de pânico na economia nacional. Entre os bens congelados encontram-se empreendimentos de construção civil, propriedades rústicas em regime de exploração agrícola e pecuária, etc., cuja actividade não pode ser gerida pela Comissão de Análise e Inquérito dadas as suas limitações materiais e humanas.198 Este problema remete-nos para a questão da movimentação de contas, congeladas ou não, pelos titulares ou familiares. De facto, o dilema da gestão dos bens congelados não é solucionado de forma rápida e eficaz, até porque o “Banco de Portugal não se encontra apetrechado para o exercício de tais funções, bem como não parece existir departamento do Estado que disponha de condições para a execução de tais tarefas”199. Por outro lado, já em Julho, a comissão pede ao Conselho da Revolução que conceda à administração da SCC a faculdade de usufruir dos bens congelados, dada a necessidade de os

197 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Serviço de Vigilância Económica e Social, Caixa 2, n.º 118, doc. 46, 13/05/1975. 198 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Reuniões, Documentos apresentados ao CR, caixa n.º 1, n.º 319, doc. 29, Nota da Comissão de Análise e Inquérito encerrando a primeira fase dos trabalhos – Anexo D, 09/07/1975. 199 Arquivo Contemporâneo do Ministério das Finanças, Arquivo/SETF/SET/038/0039, Sociedade Central de Cervejas, Carta do Banco de Portugal ao Chefe de Gabinete do Secretário de Estado do Tesouro, 24/05/1976.

87 movimentar “sob pena de paralisação de sectores a eles ligados, o que pode impedir pagamentos de salários e dificultar certas actividades industriais”200.

Foram tomadas providências cautelares solicitadas ao COPCON que impediam temporariamente a saída do país de algumas pessoas implicadas nas regularidades que a Comissão de Análise e Inquérito inventariou (a listagem completa das pessoas implicadas nas irregularidades detectadas pode ser encontrada no anexo H, tabela 3). Ainda assim, a lista que se segue, não confirma a presença destas pessoas em território nacional, até porque algumas das pessoas indicadas (sublinhado no inventário abaixo) nunca chegaram a prestar declarações à Comissão de Inquérito, presumindo-se a sua ausência do país.

i. Alexandre Braz Nunes Sequeira; ii. Pedro Infante de la Cerda Ribeiro da Cunha; iii. José Afonso de Carvalho Martins; iv. Miguel Infante de la Cerda de Sttau Monteiro; v. Carlos João da Silva Moreira Rato; vi. Caetano Sanguinetti Beirão da Veiga; vii. Mário de Carvalho Brito das Vinhas; viii. João Gaudy de Matto Chaves; ix. Manuel Miguel Dinis; x. Fernando Afonso Tavares; xi. António Carlos Ahrens Esteves; xii. Tereza Gubert Mundet Gomes; xiii. Maria Tereza Gubert Mundet Gomes Carvalho Martins201.

Uma referência final para duas reuniões realizadas no início de Maio que contaram com a presença das representações das indústrias cervejeiras localizadas em Portugal Continental. A primeira decorreu em 07 de Maio, em Lisboa, com o objectivo de discutir a situação sectorial; a segunda – Reunião do Secretariado das Comissões de Trabalhadores do Sector Cervejeiro – teve lugar no Porto, nas instalações da CUFP, no dia 15 de Maio, e veio afirmar publicamente que a Cergal encontrava-se em laboração

200 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Reuniões, Documentos apresentados ao CR, caixa n.º 1, n.º 319, doc. 29, Nota da Comissão de Análise e Inquérito encerrando a primeira fase dos trabalhos, 14/08/1975 201 Ibid (sublinhado nosso).

88 normal, “sem qualquer alteração ao seu programa de produção anual”, contrariando os boatos de falência económica que vinham surgindo202.

4.4.2. As cervejas na hora da nacionalização. Os resultados do inquérito oficial

Os relatórios conclusivos do inquérito levado a cabo pela Comissão de Análise e Inquérito foram entregues no dia 30 de Julho ao Conselho da Revolução e ao Ministério da Indústria e Tecnologia, ainda que já se tivesse informado o Ministério, a 24 de Maio, sobre as principais irregularidades detectadas203. A entrega dos documentos às Comissões de Trabalhadores deu-se a 06 de Agosto – 2 exemplares a cada comissão. É sob a perspectiva dos resultados apurados que este capítulo incide, procurando demonstrar as razões que estiveram por detrás da nacionalização da indústria cervejeira. O objectivo da Comissão de Análise e Inquérito é explícito quanto ao seu tom ideológico: “levantamento e subsequente desmantelamento das ligações que o desenvolvimento da política de controle da economia nacional mostrou como mais aconselhável”204.

Importa salientar as dificuldades que a Comissão enfrentou na realização dos trabalhos e que residem em dois pontos: (i) composição da comissão; (ii) quantidade e complexidade da documentação. A composição mostrou-se constantemente flutuante, com persistentes entradas e saídas de vogais, para além da dificuldade de encontrar técnicos qualificados e disponíveis. Considera o relatório que mesmo alguns dos elementos mais activos não “puderam dar uma assistência total porquanto permaneceram ligados aos seus locais de trabalho”205. A imensidão de documentação existente tornou “fisicamente impossível a sua compulsão e análise”206, por culpa da escassez de meios humanos, mas também pela complexidade das matérias em questão e pela necessidade de uma conclusão rápida. O grupo elaborou 14 sub-relatórios que compõem as várias irregularidades encontradas. Sucintamente, os resultados dos

202 Diário Popular, 19/05/1975, p. 12. 203 Arquivo da Presidência do Conselho de Ministros, Comissão de Inquérito, Informação da Comissão de Inquérito relativa à intervenção do Estado no Grupo da Sociedade Central de Cervejas, 24/05/1975. 204 Relatórios da Comissão de Análise e Inquérito ao Grupo de que faz parte a Sociedade Central de Cervejas, Nota prévia, p. 3. 205 Relatórios da Comissão de Análise e Inquérito ao Grupo de que faz parte a Sociedade Central de Cervejas, Nota prévia, p. 2. 206 Ibid.

89 trabalhos organizam-se formalmente na seguinte temática, apesar dos pontos não serem estanques em si mesmos:

1. A SCC e o Grupo SCC 8. Portugália/Estrela 2. Operação Nó 9. Improve 3. Operação Brasil 10. Jansen 4. Sub-operação Vita Finance 11. Gastos confidenciais 5. Contrato SCC/Carlsberg 12. Sobrefacturações Moçambique 6. Distribuição indevida de 13. Sobrefacturações Cuca resultados 14. Transferências de capitais de 7. Fusão das Vidreiras Angola

A lógica de análise que adoptei segue de perto os pontos acima evocados, ainda que procure acrescentar e comparar com dados do Ministério da Indústria e Tecnologia, trazendo igualmente o eco que os relatórios repercutiram na imprensa escrita207, que haviam sido cuidadosamente enviados (na versão resumida, em formato de comunicado) pelo Ministério da Comunicação Social para os jornais, como indica o «Comércio do Porto»208. As comissões de delegados sindicais da banca estão atentas aos resultados da investigação, procurando relacionar o seu trabalhado de fiscalização com estas comissões, como é o caso do BESCL209. As principais conclusões a que o grupo chegou destacam-se em dez pontos:

i. “Utilização sistemática da SCC como fonte de financiamento de outras empresas, com manifesto prejuízo da SCC; ii. Empolamento exagerado das remunerações e gastos com os accionistas-administradores; iii. Descapitalização da SCC em proveito próprio de administradores (ou quotistas); iv. Exportação ilícita de capitais; v. Abuso de confiança, burla e furto, nomeadamente desvio de participações das empresas do grupo em empresas cervejeiras no Brasil ultrapassando os 150 mil contos; vi. Irregularidades fiscais e falsas declarações a organismos do Estado; vii. Transacção ilegal de acções; viii. Elevada dependência da banca;

207 De forma maciça nas duas primeiras semanas do mês de Agosto, sobretudo no Jornal do Comércio, A Capital, Expresso, O Jornal, República, Jornal Novo e Comércio do Porto. No início de 1976, com o recrudescimento do debate em torno da nacionalização das distribuidoras, alguns jornais retomam estes assuntos, nomeadamente o Diário de Lisboa e o Gazeta da Semana. 208 Comércio do Porto, 14/08/1975, p. 6. 209 COMISSÕES DE DELEGADOS SINDICAIS DO BANCO ESPÍRITO SANTO E COMERCIAL DE LISBOA, Sabotagem económica. “Dossier” Banco Espírito Santo. Lisboa: Diabril, 1975.

90 ix. Má gestão e outros procedimentos gravemente negligentes na condução da actividade empresarial; x. Desvio de fundos da actividade corrente de algumas empresas”210.

4.4.3. “Um capitalismo bem tirado”211. A Sociedade Central de Cervejas como cabeça do grupo

Pela análise até agora efectuada, com especial incidência para o capítulo 1.5.2. e para o digrama apresentado, parece redundante uma afirmação como a que intitula esta secção. Mas, vale a pena acrescentar alguns indicadores que elucidam na perfeição a situação financeira do grupo entre 1965 e 1974. A debilidade financeira é uma das principais características do capitalismo português nesse período, e o grupo SCC não foge à regra. De acordo com Soares Bento, são vários os canais pelos quais as empresas eram sugadas da parte da mais-valia produzida: (i) dividendos; (ii) encargos financeiros; (iii) remunerações especiais ao Conselho de Administração212. Veja-se o caso da Central de Cervejas: os accionistas-administradores absorviam 450 000 contos, dos quais 237 096 sob a forma de dividendos e 216 317 em remunerações213; as participações financeiras subiram, neste período, de 1 660 para 347 413 contos, sem qualquer entrada de rendimento nesta empresa; o passivo aumentou igualmente de 94 173 para 1 387 473 contos, dos quais 961 815 correspondiam ao passivo a curto prazo. Estes números correspondem a constatações muito simples, mas significativas da estrutura financeira da empresa: mais de 70% dos lucros foram distribuídos – rendimentos ou remunerações (a distribuição de dividendos e de remunerações era das mais elevadas das empresas que entretanto foram nacionalizadas, como se comprova na primeira tabela); autofinanciamento muito reduzido e investimento forte noutros sectores, provocando endividamento elevado (cerca de 165 mil contos de prejuízo); situação financeira perigosa (cf. segunda tabela)214. No anexo I, as tabelas 1, 2 e 3 reflectem a panorâmica geral do sector segundo os dados que aqui apresentei.

210 Relatórios da Comissão de Análise e Inquérito ao Grupo de que faz parte a Sociedade Central de Cervejas, Nota prévia, pp. 4-6. 211 Jornal do Comércio, 06/08/1975, p. 8. 212 BENTO, Soares. “Os prejuízos das empresas nacionalizadas - algumas causas (conclusão)", in Economia e Socialismo, n.º 12–13, Março de 1977: 70–77. 213 Os dividendos referentes a 1973, no valor de 54.296 contos foram pagos à custa de um empréstimo externo mediado pelo BESCL, com prejuízo claro para a amortização da dívida à banca. 214 Como muito bem descreve o Jornal do Comércio a 08 de Agosto de 1975, “perder dinheiro significava o aumentar os lucros dos acionistas administradores.

91 Dividendos/Capitais próprios x 100 Tabaco 11% Celulose 6,7% Covina 5,2% Cerveja 4,7% Siderurgia 4,1% CUF 1,6% Cimento 1,0% Adubos 0,4%

Fonte: BENTO, Soares. “Os prejuízos das empresas nacionalizadas - algumas causas (conclusão)", in Economia e Socialismo, n.º 12–13, Março de 1977: 70–77.

Encargos financeiros/Capital próprio Siderurgia 12,7% Adubos 8,6% Celulose 8,5% Cerveja 6,8% CUF 1,6% Tabaco 3,5% Cimentos 0,9% Covina 0,6%

Fonte: BENTO, Soares. “Os prejuízos das empresas nacionalizadas - algumas causas (conclusão)", in Economia e Socialismo, n.º 12–13, Março de 1977: 70–77.

Esta imagem ampliada de uma realidade que parecia perfeita mostra ainda a necessidade de recurso ao crédito para fazer face aos investimentos, aumentando a dependência face à banca nacional e estrangeira, bem como o autêntico sorvedouro que esta empresa constituía para os accionistas, que raramente injectavam capital (excepção no ano de 1973, com a entrada de 150 000 contos). Os capitais próprios são, na sua maioria, resultantes de autofinanciamento – limitado – ou de incorporações, o que capitaliza ainda mais a imagem da Sociedade Central de Cervejas como «banco» do grupo, concedendo créditos e adiantamentos sem juros ou com juros muito reduzidos às empresas associadas e accionistas (na ordem dos 307 000 contos entre 1965-1974 como se extrai da análise da seguinte tabela). Uma das consequências directas desta estratégia reside no aumento crescente das imobilizações (cerca de 680 000 contos em 1974).

92 “[Os accionistas] partiam do princípio que o desenvolvimento da empresa se poderia basear no auto-financiamento, mas, ao mesmo tempo, esqueciam essa hipótese e absorviam, em dividendos e remunerações, somas muito mais avultadas do que as atribuídas para reservas”215.

Empresas Dívida em 1974 (contos) Adegas Camilo Alves* 12 500 Companhia Indústria de Cervejas e Refrigerantes da Guiné* 55 784 Companhia União Fabril Portuense 19 619 Companhia de Cervejas Jansen 2 491 Companhia Vidreira de Moçambique 1 139 Empresa Cervejas da Madeira* 7 089 Fábrica de Cervejas e Refrigerantes João de Melo Abreu 4 235 Fábrica de Cervejas Reunidas Moçambique 1 520 Sociedade Águas do Luso* 2 936 Urfil* 13 875 Empresa Águas do Vimeiro 4 443 Lemoc 5 520

Nota: Relatórios da Comissão de Análise e Inquérito ao Grupo de que faz parte a Sociedade Central de Cervejas, A SCC e o Grupo SCC, p. 12.

*SCC com participação directa.

É sobre este assunto que transcrevo alguns excertos da Acta n.º 590 de uma reunião do Conselho de Administração realizada em 31 de Janeiro de 1972 e da Acta n.º 606, de 26 de Outubro de 1972 (sobre a posição na Skol Brasil), bem como de uma reunião privada datada de 06 de Março de 1967, com a presença dos homens fortes da empresa, que decidiu a requisição de um pedido de empréstimo ao Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa no valor de 105 milhões de contos. Existia, da parte dos administradores, a clara consciência de que a estratégia empreendida se traduzia na degradação contínua da empresa, como se pode comprovar:

Acta n.º 590

“O Snr. Eng. Moniz Galvão, no uso da palavra diz: [...] o problema que defrontamos [situação financeira da empresa] é muitíssimo grave e pode, mesmo, conduzir ao desaparecimento da Empresa (...). Esse problema já não é de hoje mas já de há muito tempo (...). Cada um de nós, sejam quais forem os interesses que tem em jogo, deve pensar e dar primazia aos interesses conjuntos (...). Juntemos os trapinhos para salvar a SCC.”216

215 Relatórios da Comissão de Análise e Inquérito ao Grupo de que faz parte a Sociedade Central de Cervejas, A SCC e o Grupo SCC.

93 Acta n.º 606

“(...) o Snr. Dr. Moreira Rato diz que, talvez sem grande base, sempre se pensou que o problema da SKOL era uma troca de posição que não viria trazer – como em termos monetários globais não traz – encargos financeiros. A verdade é que assim não é, e que a prazo muito curto – questão de dias – se torna necessário encontrar os meios financeiros para pagar mais de 50.000 contos à SIL.” O Snr. Comandante Matoso: [...] de há muito tempo que nós vimos insistindo nas responsabilidades que a SCC estava a tomar, sem termos feito previamente um planeamento geral.”217

Reunião privada

“continua a movimentar-se ou a gravitar sobre si própria, o que tanto significa dizer, sobre uma estrutura em que os seus sócios se mantêm estáticos no que interessa ao apoio ou auxílio imediato de tesouraria e, no que interessa à rentabilidade anualmente auferida, no que respeita às verbas distribuídas e arrecadadas”.218

Para além de alguns privilégios já aqui referidos, os administradores tinham ainda direito a uma verba anual de 100 contos que substituía a obrigatoriedade de compra de automóvel, enquanto os administradores-adjuntos recebiam 50 contos de crédito anual e uma viatura paga pela empresa.

A principal crítica para o estado da situação da empresa, em 1974, residia na política desproporcionada de aumento de participações financeiras em empresas sem qualquer tipo de rentabilidade. O ano de 1974 marcou, por outro lado, o início da deterioração da situação económica, como se depreende pelo prejuízo de 90 750 contos (cf. tabela 1 do anexo I), ainda que a empresa continuasse em expansão.

4.4.4. “Receita para um monopólio”219. Os meandros das “operações”

Para compreender as irregularidades encontradas neste tipo de esquemas, é necessário extrapolar as questões técnicas específicas para um “nível de crítica política

216 Relatórios da Comissão de Análise e Inquérito ao Grupo de que faz parte a Sociedade Central de Cervejas, A SCC e o Grupo SCC, doc. n.º 3 em anexo. 217 Ibid. 218 Ibid. 219 A Capital, 09/08/1975, p. 15.

94 aos critérios e objectivos postos em prática”220. São, essencialmente, dois os casos que apresentarei – a Operação Brasil e a Operação Nó – mas que têm características muito semelhantes e entrecruzam dinâmicas e actores com objectivos comuns. Os pressupostos delineadores continuam a inserir-se na dicotomia interesse do grupo vs. interesse da nação, que se resume a outro binómio: financiamento para expansão vs. limitações estruturais do país (dependência económica, burocracia, entrada e saída de divisas, etc.). Só assim se percebem os vários pagamentos no estrangeiro sem autorização oficial das entidades competentes, porque esta seria demorada ou negada, encarecendo o negócio. Estes processos demonstram com bastante nitidez a dinâmica de dois mecanismos fundamentais numa sociedade capitalista: a banca e a lei. A primeira, neste tipo de relações, canaliza o dinheiro e dirige-o de acordo com a estratégia concertada entre os grandes grupos (fornece o caminho para a saída do dinheiro, oferece garantias de crédito externo para as operações ilegais, etc.); a lei é constantemente ultrapassada pela sua complexa interpretação. A Operação Brasil é um caso paradigmático do uso conveniente da lei e da banca por parte dos administradores.

Em 1967, o Grupo Cervejeiro Português (GP ou SCC) tomou posição no capital de duas empresas cervejeiras brasileiras – Cayrú e a Londrina – que passou a controlar com a Sipsa (holding da Skol International). Este investimento foi, contudo, pago em Lisboa e Luanda sob duas formas, em dinheiro, pela Portugália, Estrela e Jansen, e o restante através de 8 600 acções da Cuca após venda fictícia e sobrefacturações (relações com a Operação Nó). No ano seguinte, os irmãos Vinhas compraram o lote de 8 600 acções aos irmãos Scarpa, após empréstimo da banca comercial (papel decisivo do Banco Português do Atlântico) e cederam metade das mesmas à Cuca.

Noutro ponto do tabuleiro, em 1966, a SCC havia investido na Skol International (SIL), com as devidas autorizações do Banco de Portugal (BdP), mas nunca chegou a existir retorno desse investimento. Esta mesma empresa detinha a Sipsa (Skol Internacional de Participações SA), que por sua vez detinha uma posição na Skol Caracú SA, que controlava, juntamente com o GP. Em 1972, a SCC decidiu tomar posição no Brasil, trocando a sua posição na Skol International (com sede nas Bermudas) pela que esta detinha no Brasil (Sipsa). O Banco Espírito Santo prestou os devidos serviços quanto à ajuda da banca estrangeira, conseguindo um empréstimo do

220 Relatórios da Comissão de Análise e Inquérito ao Grupo de que faz parte a Sociedade Central de Cervejas, “Operação Brasil”.

95 Manufacturers Hannover Trust, que posteriormente foi pago com o envio de remessas não autorizadas. No entanto, o valor da Sipsa – 2 600 000 dólares – acabou por não corresponder ao que a SCC pagou na realidade – 3 071 587,42 dólares (pelo acréscimo dos empréstimos). Na transferência não houve transparência com o BdP ao nível das autorizações e de informação. A SCC exportou apenas 1 803 000 dólares, não precisando da autorização oficial, sendo que o restante foi enviado por praças estrangeiras. O presidente da SCC, Moreira Rato, fala mesmo num “mau negócio”221. Outras ilegalidades estão relacionadas com a necessidade de explicar a saída de 18 368 552$10 contos, que equivale ao empréstimo conseguido junto do Manufacturers Hanover Trust (saída de Caixa mediante “recibo forjado” por cinco administradores e lançado na rubrica “Contas Transitórias – SIP”).

A SCC cedeu ainda royalties pelas vendas no Brasil da cerveja Skol e Sagres à Sipsa, sem que isso resultasse na entrada de dividendos em Portugal, considerada fuga de divisas, de forma encoberta. Ainda em 1972, a Portugália, Estrela, Jansen e alguns administradores da SCC e da Cuca reforçaram as posições na Skol Caracú, através da constituição, no Brasil, da Sociedade Intercontinental de Participações (holding). O investimento foi realizado, na sua quase totalidade, pelo Grupo Cervejeiro Português (empresas e pessoas fictícias), que teria que exportar cerca de 52 000 contos para o Brasil. A parte dos particulares foi liquidada pela Cuca, mas esta não podia participar, por não ter obtido autorização em Angola para exportar capitais. Não deixa de ser interessante perceber a tipologia destes processos, pois esta operação veio apenas cobrir o que havia sido feito anteriormente, uma vez que Hans Monna já havia subscrito as acções em nome do Grupo Cervejeiro (com empréstimos junto de bancos brasileiros), facto que se considera grave, pois o GP omitiu esta situação junto do BdP. Umas das principais dificuldades encontradas foi descobrir os verdadeiros titulares das posições no Brasil, pelo seu desdobramento em três entidades: (i) entidades que realizaram as operações; (ii) entidades em nome de quem são realizadas; (iii) entidades que efectivamente pagavam as despesas/investimentos.

Estas operações fizeram parte de um esquema, já no período revolucionário, de tentativa de “apropriação pessoal dos bens das empresas do grupo cervejeiro no Brasil,

221 Ibid.

96 sob forma aparentemente regular e equitativa”222, através da criação da Vita Finance (sede no Panamá, mas escritório em Genebra). A sociedade era titular de lotes de acções da SCC e da Portugália, que os utilizou para “pagar” à SCC, Portugália, Estrela e Jansen as posições que detinham no Brasil, enviando cartas – que a Comissão de Inquérito considerou como sendo falsas, com base nas declarações de administradores – que falavam na aceitação de um negócio que as referidas empresas haviam proposto. A responsabilidade é imputada a Manuel Vinhas, Mário Vinhas, José Manuel Martins e António Esteves (o advogado da SCC entregou as suas acções – ou as posições que as empresas detinham em seu nome – a pessoas indeterminadas), ainda que outros administradores possam estar envolvidos (todos ausentes do país). A Comissão procurou impedir a alienação das posições do grupo no Brasil, mas não teve sucesso.

As principais conclusões que resultaram da investigação desta operação são: (i) desvio de fundos da actividade corrente da empresa; (ii) transferência ilegal de divisas de Angola para o Brasil e para outros países; (iii) balanço falsificado em 1973; (iv) exportação ilegal de capitais. Refere-se também o enquadramento jurídico preparado pelo grupo que se pode observar pelo simples facto de os pedidos de exportação de capitais privados junto do Banco de Portugal terem sido requeridos por Joaquim Luís Gomes, filho do administrador do BdP, António Luís Gomes.

Associada a esta operação surge a Operação Nó – “ao pescoço de Angola”223 – (diminutivo de Nocal, empresa cervejeira angolana), fundamental para perceber o funcionamento do capitalismo português na sua vertente colonial, como fonte de acumulação, através da exportação de capitais (colocações rentáveis no estrangeiro), das sobrefacturações e do monopólio. Com um investimento inicial na ordem dos 9 000 000$00, realizado pela SCC, em 1958/59, a Portugália, Estrela e Jansen, sem que tivessem investido qualquer soma, tiveram uma rentabilidade significativa até Junho de 1974: 36 000 contos, recebidos em Lisboa e o restante enviado para Luanda, e 23 000 contos em investimentos no Brasil e em Angola (EKA). Os administradores utilizaram mais tarde as acções da Nocal para indemnizarem as empresas das entregas feitas para a participação no capital inicial da Copeja e da Imperial.

222 Relatórios da Comissão de Análise e Inquérito ao Grupo de que faz parte a Sociedade Central de Cervejas, “Sub-operação Vita Finance”. 223 Jornal do Comércio, 07/08/1975, p. 1.

97 A formação de um fundo de investimento fantasma – Unidade Atlântica, SA – alimentou este tipo de exploração colonial. Aquando da criação da Nocal, foi imposto pelo governo a condição de não participarem no capital outras empresas ligadas ao ramo. Contudo, o grupo que detinha a Cuca conseguiu entrar na Nocal, com participação adquirida através de mecanismos de diversão (empresa no Panamá), pela mão de José Guedes de Sousa (ou Guedal), representante do Grupo Cervejeiro. O principal objectivo desta empresa era permitir à Portugália, Estrela e Jansen participarem no capital da Nocal, então vedada legalmente. Foi a SCC quem desembolsou o dinheiro para a participação (cuja posição aproximou-se dos 30%), como já atrás referi, sendo que a empresa foi transferida para as empresas-mãe (nem a Nocal, nem a Unidade Atlântica existem nas participações financeiras destas empresas). A circulação do dinheiro estava bem definida: movimentava-se de Guedes de Sousa para Caetano Beirão da Veiga, com conta no «Banco Comercial de Angola», no «Pancada, Moraes e Cª» e no «Almeida, Bato e Piombino e Cª, Lda».

Os rendimentos desta operação foram aplicados em várias frentes: na compra de títulos do fundo IOS (Suíça); na já aqui tratada Operação Brasil; e no grupo cervejeiro angolano EKA, que passou a contar com uma posição de 13,5% da Cuca. Noutra modalidade distinta, foram entregues às empresas ou emprestados à Cuca, em nome das empresas: ora entregues a Guedes de Sousa/Guedal-Beirão da Veiga, ora emprestados à Cuca, com juro de 7% ao ano.

Em 1973 e 1974, o Grupo Cervejeiro, através da Estrela e da Portugália, realizou uma série de pagamentos para liquidar a sua participação no capital inicial da Imperial e da Copeja. No fundo, a participação do grupo nestas novas empresas

“insere-se num acordo mais geral de cartelização do mercado angolano entre a Cuca, Nocal e, episodicamente, a EkA e, por outro lado, na formação de um sindicato de voto entre o grupo cervejeiro e os grupos Abecassis e Guedes de Sousa, no sentido de controlarem a Nocal”224.

Este sindicato de votos reflectia-se, do mesmo modo, no mercado metropolitano, como se expressa num documento que o jornal «A Capital» identifica:

224 Relatórios da Comissão de Análise e Inquérito ao Grupo de que faz parte a Sociedade Central de Cervejas, “Operação Nó”.

98 “(...) presente às partes interessadas um projecto de protocolo em que se propunha que as duas partes concertarão a política de voto a adoptar nas Assembleias Gerais daquelas sociedades, e bem assim, a política de gestão industrial e comercial a adoptar pelos respectivos conselhos de administração” “Não sendo juridicamente válida, à face das novas disposições legais sobre sociedades de controlo, a sociedade civil com tal objecto, os signatários julgam ser muito oportuno retomar as conversações sobre aquela matéria em ordem a estabelecerem-se os desejados acordos e a fórmula válida para a sua celebração”225.

As participações nas duas novas empresas cervejeiras foram pagas pelas Estrela e pela Portugália, mas atribuídas posteriormente a José Manuel Martins e a Caetano Beirão da Veiga, e em troca foram-lhes entregues 2 000 acções da Nocal, que já pertenciam ao Grupo Cervejeiro. Daquilo que o relatório desfecha convém extrair alguns pontos essenciais: a operação está ligada a todos os grandes estratagemas do grupo, mormente os investimentos no Brasil, as transferências para o estrangeiro e a monopolização do mercado cervejeiro continental e colonial (Angola226 e Moçambique, na última com o acordo entre o grupo e a Mac-Mahon/grupo Quina); mais uma vez, a SCC aparece como fonte de financiamento, mas sem dele obter qualquer dividendo; transferência ilegal de acções; utilização de “figuras de palha” que actuam em nome do Grupo Cervejeiro e que conduzem os esquemas de circulação do dinheiro para fora do país.

Alguns dos mecanismos que alimentavam estes negócios estavam directamente relacionados com a questão das sobrefacturações na Cuca e em Moçambique (Fábrica de Cervejas Reunidas de Moçambique, Companhia de Cervejas e Refrigerantes Mac-

225 A Capital, 09/08/1975, p. 15 226 Em Angola a Cuca constituía o maior grupo económico-financeiro, controlando cerca de 1/3 da capacidade de produção, através de uma gama diversificada de empresas associadas (cf. tabela 1 do anexo D). Com o aparecimento da Nocal, que na sua génese procurava reajustar a concorrência, a Cuca vê-se obrigada a acordar a divisão de mercado, em forma de cartel (e de forma ilegal), como o demonstra um documento que o O Jornal publica em 22 de Agosto de 1975 na segunda página: «(...) A Cuca, desde o primeiro dia, entendeu, fazendo realisticamente as contas, que para conseguir eventualmente destruir um grupo como aquele que constituiria a Nocal teria de deixar de ganhar muito e muito dinheiro, a que se acrescentaria o que também lhe era devido como grande accionista da empresa (...) Passemos agora a relembrar as vantagens maiores do acordo que propomos. 1 – Assentemos, em primeiro lugar, que em conjunto será fácil à Cuca e à Nocal impor a lei do mercado e criar um ambiente que evite os apetites de novas concorrências (...) Os inconvenientes possíveis que esta decisão teria aos olhos do público são contrabalançados por dois aspectos a considerar de, também relevante importância. a – Estar a concorrência assegurada por existirem mais grupos cervejeiros. b – Desencorajar novas iniciativas impressionadas pelo gigantismo de uma associação Cuca/Nocal...».

99 Mahon e Fábrica de Cervejas da Beira). As importações da Cuca estavam sedeadas na delegação da mesma em Lisboa, onde se encontrava, de igual forma, o Conselho de Administração, sendo responsáveis pelas negociações Caetano Beirão da Veiga, João Mattos Chaves e Albano Martins da Costa. O inquérito conduzido pela Comissão apurou a existência de fundos consideráveis por parte destes indivíduos, através de “vias de créditos em contas particulares em bancos estrangeiros e por entregas directas em Lisboa”227, que deviam ajudar a fazer face às despesas da delegação (de acordo com as declarações que Alves Conde, Manuel Dinis e outros indivíduos prestaram à Comissão). Os relatórios sobre esta matéria transportam uma quantidade assinalável de documentos, em que se prova o acordo na sobrefacturação das matérias-primas e dos produtos importados, falando-se em “overprice”, “suprix”, “majoration”, etc. A forma tomada era simples: os fornecedores debitavam pelo valor bruto da factura na Sede da Cuca, em Luanda, e creditavam pelo valor do acréscimo sobrefacturado na delegação em Lisboa, sem que fosse escriturado na contabilidade da Cuca, mas sim numa escritura particular controlada por Fernando Afonso Tavares (Secretário-Geral da SCC). Para o período de 1962-1974, a Comissão dá a conhecer o montante acumulado de 31 740 422$40 de sobrefacturações, sendo que estas continuaram no ano de 1974/75 (mais 9 875 854$00). Em Moçambique, os dados recolhidos não são tão significativos, mas permitem perceber as relações estruturais estabelecidas com as transportadoras, nomeadamente a Companhia Nacional de Navegação (estas forneciam descontos que eram depois devolvidos em Portugal). A Comissão averigua cerca de 9 600 000$00 em sobrefacturações, descontos e outros que são transferidos para fora de Moçambique, no período de 1972-1974 (existência de documentos que comprovam os pedidos de sobre- preço de 15 dólares/toneladas, através de João Pedro Homem de Mello).

4.5.5. Outras situações

Em traços muito gerais, outros exemplos dão conta da verdadeira situação da Sociedade Central de Cervejas. Um deles é a natureza contratual efectuada entre a SCC e o grupo The United Breweries Limited, com vista à fabricação, em Portugal, da Carlsberg e Tuborg, assinado em Setembro de 1972. Visto na altura como um acontecimento marcante, o relatório desmistifica algumas dessas ideias, ainda que

227 Relatórios da Comissão de Análise e Inquérito ao Grupo de que faz parte a Sociedade Central de Cervejas, “Sobrefacturações Cuca.

100 utilize argumentação de teor moral em alguns dos casos (fala de imperialismo tecnológico, da qualidade da cerveja portuguesa, entre outros). As críticas gravitam em torno da saída de divisas que o contrato provocou, uma vez que a aquisição tecnológica era “irrisória”228, se bem que pudesse trazer vantagens concorrenciais, dada a entrada em funcionamento da Cergal. As condições implantadas escravizavam económica e financeiramente a SCC: (i) fixação de royalties a pagar pelas empresas portuguesas; (ii) a royaltie (0,20 dólares/hectolitro) incide sobre a totalidade dos produtos fabricados; (iii) saída de 9 700 contos a pretexto de assistência técnica que se avalia em 1 500 contos; (iv) proibição de relações entre o grupo SCC e empresas cervejeiras internacionais. A Comissão conclui pela inépcia dos negociadores ou pela instalação de interesses não identificados.

Sobre a questão da distribuição indevida de resultados não acrescentarei mais informações, já que o assunto foi previamente descrito no capítulo 4.4.2. De referir apenas que, em 1974, a SCC não possuía uma correcta provisão para impostos, que deveria ser da ordem dos 90 366 contos, quando o provisionamento se cifrava nos 35 392, indiciando a falsificação dos lucros do exercício de 1973 e dos anos anteriores. Não obstante, os dividendos terem sido pagos com recurso a um empréstimo do Manufacturers Hanover Trust, contribuindo para a descapitalização da empresa.

A Comissão indica dificuldades na investigação da fusão das empresas vidreiras que pertenciam ao grupo, pela “não disponibilidade de meios humanos”229, ainda que fosse possível concluir que esta se efectuou de forma ilegal. No final de 1974, foi pedida uma autorização ao Governo para a fusão da Empresa Produtora de Garrafas, da Companhia Indústria Vidreira e da Guilherme Pereira Roldão na Companhia Indústria Vidreira (CIVE). A autorização ministerial foi concedida no dia 28 de Dezembro, mas nessa data a fusão já havia sido efectivamente consumada, como se deduz pela troca de acções anteriores a esta data e pelas declarações de Alves Conde que confirmaram que a “autorização Governamental [teria sido] dada na convicção de que a operação ainda se iria realizar”230. As principais irregularidades detectadas sujeitam-se ao não

228 Relatórios da Comissão de Análise e Inquérito ao Grupo de que faz parte a Sociedade Central de Cervejas, “Contrato SCC-Carlsberg”. 229 Relatórios da Comissão de Análise e Inquérito ao Grupo de que faz parte a Sociedade Central de Cervejas, “Fusão das empresas vidreiras pertencentes ao grupo cervejeiro”. 230 Ibid.

101 cumprimento das determinações da JSN que tinha suspendido este tipo de operações, bem como à prestação de falsas declarações a organismos estatais.

A análise das principais companhias sócias da SCC – Portugália, Estrela e Jansen – trouxe à luz do dia a verdadeira situação financeira das empresas, bem como as relações existentes com a Copeja e a Imperial. As Caixas das empresas contavam com elevados valores de vales que, segundo os técnicos de contas, eram utilizados pelos administradores para os seus próprios negócios e para uso pessoal. Mais grave, porém, é a acusação de compra ilegal de acções no pós-25 de Abril, porquanto estas tinham sido suspensas pela Junta de Salvação Nacional. A Portugália e a Estrela adquiriram acções da Somarisco (devedora da Portugália), da Carpe (empresa falida, em vias de liquidação), da Nocal, da Libra e de outras com menos importância. A Estrela comprou ainda 21 acções da SCC em Junho, sendo que só 13 dessas acções se mantiveram na posse da Estrela.

A situação destas duas empresas era muito precária, pelo que as relações estabelecidas com as empresas acima indicadas tiveram o pendor de agudizar ainda mais o estado financeiro. A Portugália e a Estrela continuaram os empréstimos e avales a estas empresas, apesar de se encontrarem tecnicamente falidas ou sem actividade comercial, como era o caso da Libra. Financeiramente, a Companhia de Cervejas Estrela encontrava-se numa posição desastrosa, como se antevê pela necessidade de emitir uma livrança do Banco Espírito Santo (cheque emitido a descoberto) para pagar os impostos. As operações delineadas junto da Copeja e Imperial são o exemplo singular desta situação: a empresa efectuou o pagamento de 11 700 contos entre Fevereiro e Julho de 1974, quando dispunha somente de 2 500 contos, segundo dados do balanço. Contudo, as participações foram desviadas por José Manuel Martins e Caetano Beirão da Veiga, tendo a empresa adquirido acções da Nocal (2 000 acções, se bem que se depreenda, pelas relações existentes, que estas acções já lhes pertenciam) para regularizar a situação.

O Grupo SCC/GP participou em 15% do capital social da Copeja, representado pela Portugália e pela Estrela (ou melhor, por Guedes de Sousa e António Esteves, que subscrevem inicialmente), com divisão equitativa para ambas. As acções eram nominativas para 10 anos e não podiam ser transaccionadas sem autorização governamental, como era apanágio da política industrial do final do Estado Novo. Na Imperial, a participação e o processo é equivalente ao da Copeja.

102 O relatório sobre a Improve, sociedade por quotas, detida por Manuel José Carvalho Martins, indica a forma como os accionistas-administradores conseguiam obter lucros superiores aos que recebiam. Esta sociedade recebia alguns dos rendimentos deste indivíduo, que correspondiam à administração da Portugália e da Promalte, que Manuel José Martins desempenhava em nome da Improve, sendo esta designada pela firma Carvalho & Martins. Manuel José Martins conseguia uma redução substancial dos impostos porque os rendimentos eram debitados aos vários sócios a título de ordenado ou gratificações. Referem-se ainda alguns episódios de sobrefacturações associados à Improve, pela sua dedicação às importações.

O último ponto recai na questão dos gastos confidenciais e reservados, que deverá ser analisado conjuntamente com as remunerações dos administradores, superficialmente abordada na tese (ver tabela 1, anexo I). A dimensão dos números é clara, o que permite constatar que entre 1965 e 1973, 31,5% dos pagamentos feitos pela SCC à Administração foram pela via de “Gastos Confidenciais”, enquanto a Portugália regista um valor de 53% para o período 1970/74. No seio desta rubrica, incluem-se os pagamentos de impostos aos administradores (perfaz 63,3% do total) e despesas com bens pessoais que, com a divulgação dos relatórios ao público, originarão um conjunto de títulos jornalísticos originais: “Para gerir a S. C. de Cervejas o Conselho de Administração precisava de iates e coutadas”231. A Comissão de Análise e Inquérito invoca razões de natureza política como causas primárias do problema, numa crítica à burguesia:

i. Função niveladora da tributação: quantias astronómicas com que as empresas indemnizavam os administradores pelas despesas com impostos; ii. Sacrifício do empresário: existência do lucro como forma de pagamento do consumo de que este se priva para investir, logicamente explicado pelas despesas com iates, coutadas e carros; iii. Independência do poder político e do poder económico: ilustrada pelo pagamento de verbas confidenciais a pessoas politicamente bem colocadas; iv. Democratização do capital e apelo à poupança popular: esclarecido pelo facto de as benesses serem reservas apenas aos grandes accionistas232.

231 República, 16/08/1975, pp. 8-9. 232 Relatórios da Comissão de Análise e Inquérito ao Grupo de que faz parte a Sociedade Central de Cervejas, “Gastos Confidenciais e Reservados na SCC, Estrela e Portugália”.

103 4.5. Os trabalhos do Ministério da Indústria e Tecnologia Um estudo efectuado pelo Ministério da Indústria e Tecnologia – Estudo da Nacionalização do Sector Cervejeiro (Indústria e Distribuição) –, datado de Junho de 1975, complementou, não no sentido da procura de irregularidades, o inquérito oficial da Comissão de Análise e Inquérito. A interpretação aqui seguida é a de que o estudo surgiu na sequência da nota oficiosa do Conselho de Ministros de 15 de Abril de 1975, que formulou o Programa de Controle dos Sectores Básicos da Indústria e Energia, nomeadamente as nacionalizações que ocorreram a 16 de Abril, e desenvolveu-se paralelamente com os trabalhos da Comissão de Análise e Inquérito (mas não pela mesma equipa):

“[Previa-se o] estudo e subsequente aplicação das medidas de controlo, incluindo a nacionalização, quando apropriada, dos principais jazigos de minério e das indústrias de tabacos, cerveja, celulose, adubos, produtos sódicos e clorados, petroquímica, cimentos, metalomecânicos pesados, construção naval e farmacêutica”233.

Legitimado pela estratégia anti-monopolista de neutralizar as fontes de acumulação capitalista e “assegurar a melhor articulação com outros sectores”234, o estudo toca em alguns elementos já aqui examinados, quanto à caracterização sectorial, pelo que aproveitarei a sequência da narrativa para transmitir a radiografia do sector cervejeiro no seu todo (e não apenas da SCC) aquando da nacionalização.

Com cinco empresas em laboração no continente e duas nas ilhas, num total de 423 milhões de litros de capacidade de produção no continente, a Sociedade Central de Cervejas e a Companhia União Fabril Portuense (dominadas por um grupo comum de accionistas) detinham 323 mihões de potencial produtivo, que aliada à rede de distribuição hegemónica, têm praticamente assegurada a totalidade das produções (em 1974 venderam 91% do total de cerveja consumido no país; cf. tabela 2, anexo I e tabelas 1 e 2 do anexo J, para uma reflexão mais detalhada)235. Era indispensável controlar a comercialização da cerveja, no âmbito de uma estratégia mais alargada de controlo da comercialização dos bens essenciais, por impedir tentativas de boicote ou

233 Nota oficiosa do Conselho de Ministros, 15/04/1975. 234 Centro de Documentação 25 de Abril, Espólio Macaísta Malheiros, Legislação, Projectos de Leis, doc. n.º 27, Ministério da Indústria e Tecnologia? Diploma sobre a nacionalização do sector cervejeiro, Junho de 1975. 235 Não venderam mais porque não tiveram oportunidade de abastecer a totalidade dos segmentos de mercado que dominavam.

104 açambarcamento e por possibilitar o controlo da inflação e do aumento do custo de vida, mas, igualmente, pela dispersão geográfica da rede de distribuição do sector, que se encontrava subutilizada (sobreposição de várias redes). O número de empresas, como foi possível observar na primeira parte da tese, foi crescendo, mas nunca se ultrapassou o simulacro de concorrência, impedindo o funcionamento sustentável das novas empresas, como era o caso da Cergal, que em 1974 tinha já “prejuízos acumulados de 101 640 contos e cerca de 440 000 contos de dívidas, dos quais 240 000 a curto prazo, para um capital de 250 000 contos”236. De facto, as previsões de consumo apontavam para a saturação nos 40 litros anuais per capita (310 milhões de litros), enquanto a capacidade instalada superiorizava-se a estes valores. No entanto, convém ressaltar que as previsões de consumo, a médio prazo, acabaram por ser irrealistas (o consumo seguiu a um ritmo muito mais elevado do que o previsto). Face a estes considerandos, o estudo conclui pela (i) irracionalidade do sistema capitalista (desperdício de recursos; saída de divisas para a compra de equipamentos desnecessários) e pela (ii) irracionalidade dos capitalistas, que investiram em empreedimentos de rentabilidade duvidosa.

Através da consulta do quadro 2 do anexo H, confirma-se o rápido crescimento do sector bancário (BESCL) no interior do sector cervejeiro. Este é accionista, directa ou indirectamente, nas principais empresas, embora a participação na Cergal seja insignificante. Há que conciliar com esta observação o facto de o banco ser o principal credor da Sociedade Central de Cervejas, em cerca de um milhão de contos, o que levantou, desde logo, dúvidas quanto à estratégia do BESCL: “(...) será que essa aparente irracionalidade era a via que a estratégia do grupo Espírito Santo tinha escolhido para conquistar posição dominante do sector?”237

“é lícito supor que o grupo tivesse sido forçado a desenha uma estratégia que, passando pelo controle de outras empresas, lhe permitisse pressionar e mesmo enfraquecer a SCC em alguns pontos, e lhe proporcionasse a oportunidade de passar a controlar a SCC como empresa dominante do sector”238.

236 Centro de Documentação 25 de Abril, Espólio Macaísta Malheiros, Legislação, Projectos de Leis, doc. n.º 27, Ministério da Indústria e Tecnologia? Diploma sobre a nacionalização do sector cervejeiro, Junho de 1975, p. 2. 237 Centro de Documentação 25 de Abril, Espólio Macaísta Malheiros, Legislação, Projectos de Leis, doc. n.º 27, Ministério da Indústria e Tecnologia? Diploma sobre a nacionalização do sector cervejeiro, Junho de 1975, p. 4. 238 Ibid.

105 Ao longo do trabalho não foi possível recolher dados concretos que sustentassem esta hipótese, sobretudo pela dificuldade de recolha de informação junto do Arquivo Histórico do BES, que refere a inexistência de qualquer ligação da família ou do banco com as indústrias cervejeiras para os períodos em análise. Há, de facto, acções que denotam um tipo de relação estranha entre a banca e a Sociedade Central de Cervejas, como o facto de ter concedido créditos a curto prazo que funcionavam como créditos a longo prazo (dadas as facilidades concedidas) e ter permitido saques a descoberto, atingindo 180 000 contos em Fevereiro de 1975.

As razões para a nacionalização explicam-se, no final do estudo, pela seguinte ordem de razões:

i. Ordem política: desmantelar os monopólios substituindo-os pelo poder dos trabalhadores; ii. Ordem económica: optimização dos recursos disponíveis possibilitada pelo planeamento integrado; iii. Ordem social: manter o número de postos de trabalho239

239 Centro de Documentação 25 de Abril, Espólio Macaísta Malheiros, Legislação, Projectos de Leis, doc. n.º 27, Ministério da Indústria e Tecnologia? Diploma sobre a nacionalização do sector cervejeiro, Junho de 1975, p. 6.

106 4.6. Os processos nas restantes empresas A investigação permitiu a recolha e o tratamento de informação sobre a evolução de outras empresas cervejeiras em Portugal – Cergal, Imperial, Copeja, Empresa de Cervejas da Madeira – que poderá ser útil ao nível comparativo, com o grande processo da Central de Cervejas (apesar dos materiais disponíveis serem pouco representativos).

A tese de mestrado de Miguel Pérez Suárez240, sobre as comissões de trabalhadores durante o PREC, traz um sucinto relato dos acontecimentos da Cergal – Cervejas de Portugal, onde o surgimento de uma comissão com tendência de extrema- esquerda anima todo o processo reivindicativo. Logo na sequência do 25 de Abril é organizado um plenário de trabalhadores com participação maciça, sendo eleito um grupo de trabalho com poderes para criar uma Comissão de Trabalhadores (sete elementos). O caderno reivindicativo apresentado reclama a melhoria salarial e a redução do número de horas de trabalho241, sendo acompanhado por um processo voraz de saneamento dos quadros superiores, marcado fortemente pela prisão do Conde de Caria (Bernardo Mendes de Almeida), em Outubro de 1974, na sequência do 28 de Setembro242. Em Setembro de 1974 a CT cria o órgão de comunicação «A Luta», influenciado pela ideologia de extrema-esquerda, anti-imperialista e anti-PCP (Manuel Monteiro, um dos elementos da CT vai ser depois deputado da União Democrática Popular na Assembleia da República). A Comissão de Trabalhadores tomou parte activa na manifestação anti-Nato a 7 de Fevereiro de 1975, chegando a paralisar o trabalho durante a visita dos militares da Nato à fábrica, no dia 10, afirmando que se tratava de uma “provocação”243. O grande celeuma da Cergal prende-se com a questão financeira e a participação, em moldes complexos, de António Champalimaud e do Banco Pinto & Sotto Mayor, na elevação do capital social aos 250 000 contos nos finais de 1974244. A questão financeira reveste-se da maior gravidade. Com um passivo superior ao capital

240 SUÁREZ, Miguel Ángel Pérez, Contra a exploração capitalista. Comissões de trabalhadores e luta operária na revolução portuguesa (1974-1975). Tese de mestrado. Lisboa: FCSH, 2008. 241 Ibid, p. 85. 242 Diário Popular, 04/10/1974, p. 21. 243 Diário Popular, 12/02/1975, p. 19. 244 Champalimaud, apesar do acordo estabelecido sob a forma de sindicato de empresas tomador de acções – por força de proibições legais, mas que nunca chegou a existir –, em que o Banco seria utilizado apenas como fonte de pagamento, sugere um administrador para a Cergal que se vai auto-representar, ao invés de representar o referido Banco. O que é certo é que após a nacionalização da banca e com a mudança de corpos gerentes, o banco passa a ser confundido com o tal sindicato por parte da Administração e dos trabalhadores da Cergal, que lançam ataques violentos à instituição, ameaçando com uma manifestação em frente à sede do mesmo (clamando pela nomeação de um administrador-delegado do Banco para o Conselho de Administração).

107 social, a empresa não tinha capacidade para cumprir os compromissos a curto prazo e carecia urgentemente de financiamento, que não vinha sendo facilitado :

“Os salários dos trabalhadores são pagos com o produto das vendas que, se neste momento é suficiente, nos meses de Inverno não chega nem para satisfazer metade das pessoas. Não se pagou o imposto de Transacções referente a Janeiro; não se pagam fornecedores; não se pagam as contribuições para a Previdência; reforma-se letras por inteiro”245

Relativamente à Imperial – União Cervejeira Portuguesa e à Copeja – Companhia Portuguesa de Cervejas (ligada tecnicamente à Heineken), os dados são muito limitados no que diz respeito ao processo de luta no pós-25 de Abril (ambas iniciam a actividade comercial em 1975, sendo que a primeira produz a cerveja Marina e a segunda coloca no mercado a Clok). 14 de Agosto de 1975 marcou o início da luta dos trabalhadores da fábrica da Imperial, em Loulé, que reivindicavam o pagamento de salários, melhores condições laborais e manifestavam-se contra a existência de trabalho eventual. A evolução da situação económica e financeira da Imperial, entre 1973 e 1977, resumida nos quadros seguintes (em complemento com as tabelas 2 e 3 no anexo I) indica o estado desastroso da empresa logo no primeiro ano de comercialização (a insuficiência do seu capital próprio dificultou o suporte dos elevados encargos financeiros):

1973 1974 1975 1976 1977 Produção em unidades físicas - - - 8 063 964 (Prev) 3 Receitas (exploração e outras, 10 contos) - - 103 163 192 517 3 Despesas (10 contos) - - 140 225 251 520 3 Resultado (10 contos) - - 37 062 -59 003 Subsídios O.G.E. ou outros - - - - Despesas c/ pessoal em % de receitas - - 28,3 40,3 Remuneração média mensal (contos) - - 7,7 9,2 Receita média por trabalhador - - 238,5 364 Despesas c/ Pessoal - - 39 822 77 629 N.º de trabalhadores 85 151 432 529 Remunerações base - - - 58 429 Horas extraordinárias - - - 3 131 Prestações suplementares - - - 2 149

245 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Serviço de Vigilância Económica e Social, Caixa 6, n.º 122, doc. 119, Cergal, documento manuscrito sobre a situação financeira da Cergal.

108 1973 1974 1975 1976 1977 Capital - - 75 000 75 000 (Prev) Reservas - - 29 910 20 910 Resultados - - -40 689 -59 003 Situação líquida - - 35 221 36 907 Endividamento total - - 301 285 466 447 Dívidas à Previdência - - - - Dívidas ao Estado - - - - Endividamento externo - - - 29 461 Avales do Estado - - - -

Fonte: Arquivo Contemporâneo do Ministério das Finanças, Arquivo/SETF/GSEF/037008/001/0065, Imperial

Na Empresa de Cervejas da Madeira, detida parcialmente pela Sociedade Central de Cervejas e por capitais estrangeiros (cf. quadro 2, anexo H), as notícias que indicavam a nacionalização da empresa não caíram bem junto dos trabalhadores. O próprio governador do Distrito do Funchal enviou um telegrama ao ministro do Comércio Interno, a 20 de Agosto, comunicando esse descontentamento246:

“(...) TRABALHADORES EMPRESA CERVEJAS MADEIRA DAR PARTE GRANDE DESCONTENTAMENTO DO PESSOAL RELATIVAMENTE A NACIONALIZACAO DA EMPRESA QUE NAO TINHA PROBLEMAS E EM QUE A PRODUCAO ATINJIU BOM NIVEL STOP GOVERNADOR CIVIL STOP INFORMA QUE ASPECTO NACIONALIZACAO PODE REFORCAR IDEIAS CONTRA CONTINENTE (...)”247.

A guerra no mercado cervejeiro reabriu-se no início de 1975 com a entrada em funcionamento da Copeja e da Imperial, mas era uma guerra com características suicidas para estas novas empresas. Os custos da produção e da distribuição, os investimentos realizados e o domínio total da Central de Cervejas cortavam todos os canais de respiração possíveis, abrindo dois pólos no mercado – um orientado para a expansão lucrativa (com todas as dificuldades e problemas já aqui referenciados), que era liderado pela SCC (em conjunto com a CUFP); e outro seguindo uma estratégia (que não o era enquanto estratégia) de sobrevivência, que só a espaços – por motivos de falha de abastecimento por parte daquelas duas ou por ponta de consumo prolongada –, conseguia utilizar a totalidade da capacidade produtiva instalada.

246 Após a nacionalização o conflito adensa-se, chegando os trabalhadores a pedir a desnacionalização da mesma. 247 Arquivo da Presidência do Conselho de Ministros, Caixa 1138 EAD, Processos Colectivos, E8.34, Empresa de Cervejas da Madeira.

109 4.7. A “nacionalização que se deseja” sempre se realiza248

“A guerra das cervejas vai ficar sem pressão. Sem a pressão da concorrência. Beber esta ou aquela cerveja vai deixar de ser uma questão de personalidade, de qualidade humana, de inteligência, de classe... Optar por uma ou outra marca de cerveja será muito simplesmente um caso de... gosto. 249 Todas as cervejas passarão a ser... as suas cervejas. Todas as cervejas serão cervejas... bem portuguesa”

O sector cervejeiro foi formalmente nacionalizado pelo Decreto-Lei n.º 474/75, de 30 de Agosto (promulgado a 20 de Agosto), na vigência do V Governo Provisório. Numa sucessão de considerandos que caracterizavam o sector cervejeiro como um sector lucrativo, sob o domínio de um grupo de pressão político-económico que havia explorado, em regime de monopólio e de forma desordenada, sob o beneplácito do Estado, o mercado cervejeiro até ao 25 de Abril, o decreto colocava no centro da questão a necessidade de conjugar a política cervejeira com a vinícola, no quadro de uma economia planificada de transição para o socialismo, que sirva o interesse nacional250.

São, deste modo, nacionalizadas as empresas no continente – Sociedade Central de Cervejas, SARL; CUFP – Companhia União Fabril Portuense, SARL; Cergal – Cervejas de Portugal, SARL; Copeja – Companhia Portuguesa de Cervejas, SARL; Imperial – União Cervejeira de Portugal, SARL – e as quotas portuguesas da Empresa de Cervejas da Madeira, Lda e da Fábrica de Cervejas e Refrigerantes João de Melo Abreu, Lda. As empresas nacionalizadas assumiam também a posição social que detinham nas sociedades em que eram sócias. Previa-se ainda o pagamento, a definir posteriormente (no prazo de 180 dias), das indemnizações a atribuir aos titulares das acções. Com as nacionalizações, o Estado apoderou-se de posições relevantes na indústria de refrigerantes, uma vez que a SCC e a CUFP eram importantes fabricantes (Invicta e Schweppes), e noutras indústrias (vinho, água e algumas empresas de distribuição). O ministro da Indústria e Tecnologia, por despacho do Primeiro-ministro, devia nomear para cada uma das sociedades nacionalizadas uma comissão administrativa composta por três a cinco elementos, mas as suas competências poderiam expandir-se a mais do que uma empresa, caso fosse conveniente ao nível da gestão. As funções das comissões consistiam na gerência das remunerações e das regalias dos

248 O Jornal, 11/07/1975, p. 20 (em alusão ao slogan criado por Ary dos Santos em 1967 “Cerveja Sagres, a sede que se deseja”). 249 O Jornal, 11/07/1975, p. 20. 250 Decreto-Lei n.º 474/75, de 30 de Agosto.

110 trabalhadores e na prática de actos directamente relacionados com as necessidades de gestão corrente.

Um dos pontos centrais inserido no decreto resultava da política de reestruturação para o sector251, conduzida pela nomeação de uma comissão de reestruturação, sob a alçada do Ministério da Indústria e Tecnologia, com as seguintes funções:

i. “Proceder aos estudos organizatórios, técnicos, económicos, financeiros e jurídicos indispensáveis, bem como realizar as diligências que se mostrarem convenientes; ii. Realizar os estudos necessários para a elaboração de um estatuto unificado do pessoal e para a sua aplicação escalonada aos trabalhadores, tendo em conta a situação actual estes e a política global de salários e rendimentos definida pelo Governo; iii. Estudar e propor as medidas legislativas ou de outra natureza requeridas pela execução útil das nacionalizações decretadas neste diploma”252.

Os trabalhadores regozijaram-se com a decisão tomada, mas o nível de contentamento não foi equivalente nas várias empresas. Mais uma vez, na Empresa de Cervejas da Madeira as reacções são de ataque à nova medida, como se comprova pela tomada de posição contra a nacionalização da empresa no plenário de 04 de Setembro (semelhante à atitude tomada no plenário de 14 de Agosto), e ainda pela notícias publicada no Diário de Lisboa, a 10 de Setembro:

“Deploraram também o facto de se pretender impor às suas empresas e à região da Madeira , um diploma legal totalmente alheio às realidade insulares, pois nenhum dos considerandos com que se pretende fundamentar o referido Decreto-Lei tem naquelas cabimento (...). Manifestaram também a intenção de não acatar qualquer medida legislativa, administrativa o de outra natureza, que pretenda impor a nacionalização, ou mesmo a simples alteração da Administração e quadros, bem como a sua firme determinação de impedi-las, por quaisquer meios ao seu alcance Tal nacionalização, que se pretende impor às nossas empresas, é manifestamente contrária ao desejo de todos os trabalhadores, bem como ao espírito autonomista das populações insulares (...)”253. “Acontece na Madeira. Os trabalhadores não dispensam patrões”254

251 O diploma previa a reestruturação sectorial num prazo de 90 dias. 252 Decreto-Lei n.º 474/75, de 30 de Agosto. 253 Arquivo da Presidência do Conselho de Ministros, Caixa 1138 EAD, Processos Colectivos, E8.34, Empresa de Cervejas da Madeira. 254 Diário de Lisboa, 10/09/1975, p. 8.

111 4.8. Breve síntese do processo de reestruturação do sector O processo de reestruturação do sector cervejeiro, previsto para 90 dias, mas cuja duração foi muito superior255, confunde-se com a luta pela nacionalização do sector de distribuição256 (que se arrastou num processo muito conflituoso e burocrático257). Não sendo este porém o principal âmbito do trabalho, considero importante fazer uma breve viagem ao “mundo” pós-nacionalizado, para perceber, inclusive, algumas decisões que haviam sido tomadas; mas, também, porque nele se reflecte o pressuposto inicialmente levantado, de que a nacionalização do sector teria ocorrido de forma desordenada, desestruturada de qualquer orientação económica geral (que também não considero existir enquanto fórmula coerente e hegemónica).

A Comissão de Reestruturação do Sector Cervejeiro (CRSC), constituída com base no artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 474/75, de 30 de Agosto e nomeada por despacho do Conselho de Ministros de 13 de Fevereiro de 1976, era composta por quatro representantes do Ministério da Indústria e Tecnologia, um representante do Ministério das Finanças e três representantes dos trabalhadores (eleitos pelos membros da Comissão Consultiva258; a listagem completa pode ser vista no anexo K , tabela 1), sendo apoiada por vários grupos de trabalho, que tratavam das seguintes áreas: Organização Global, Comercialização, Produção, Pessoal, Administrativa e Investigação e Desenvolvimento. O seu mandato, marcado pelo início dos trabalhos a 19 de Fevereiro de 1976, englobava, para além das cervejas, os refrigerantes e todos os restantes produtos que correspondiam às empresas nacionalizadas259.

O secretário de Estado da Indústria Ligeira, aquando dos inícios dos trabalhos, desmentiu qualquer orientação governamental condicionante da proposta final, mas assegurou a urgência de uma conclusão no prazo de 60, o que não veio a acontecer. Mesmo assim, o plano de trabalhos dividia-se em quatros fases: (i) fase de levantamentos com visitas às fábricas; (ii) estudo da organização das políticas e

255 A fusão em Empresas Públicas só acontece no final de 1977. 256 O diploma nacionalizador diz respeito apenas ao sector da produção, apesar de o V Governo Provisório ter aprovado o Projecto de Decreto-Lei que nacionalizava a o sector comercial. 257 Os relatórios da Comissão de Análise e Inquérito só foram devidamente analisados no Conselho da Revolução em 1976, já após a nacionalização do sector, sendo que as medidas previstas de actuação judicial sobre alguns elementos nunca chegaram a concretizar-se. Há vários relatos na imprensa destas situações, denunciadas pelas Comissões de Trabalhadores. 258 A Comissão Consultiva era constituída por três representantes de cada empresa nacionalizada e com funções de apoio aos representantes dos trabalhadores da CRSC. 259 Ministério da Economia, Centro de Documentação da Direcção-Geral das Actividades Económicas, Relatórios da Comissão de Reestruturação do Sector Cervejeiro.

112 objectivos; (iii) auscultação dos trabalhadores e audição dos Conselhos de Administração; (iv) elaboração da proposta afinal. O que é certo é que a 06 de Julho, no seguimento de uma reunião da comissão com o Ministério da Indústria e Tecnologia, os pressupostos iniciais são completamente alterados, surgindo uma nova orientação no sentido da reestruturação em Empresa Pública Única260, causando consequentemente mais divisões no interior da comissão e das comissões de trabalhadores do sector de produção e comercial (há uma clara divergência em duas frentes: entre a classe trabalhadora, não necessariamente entre sector produtivo e sector comercial; e entre a classe trabalhadora e a comissão de reestruturação, quanto ao modelo de organização a adoptar)261.

Os trabalhos decorreram, portanto, num ambiente desfavorável à construção de um modelo teórico consensual para as várias partes262. A comissão critica a falta de articulação com outros organismos ministeriais, sobretudo com o Ministério do Comércio Interno, responsável pela definição das linhas orientadoras do sector da distribuição da cervejeira, ainda em equação quanto ao seu futuro (com ou sem nacionalização). Relata, por outro lado, a impossibilidade de se proceder a estudos económicos e financeiros completos, uma vez que os sistemas de informação das empresas eram diferenciados, com graves deficiências ao nível da contabilidade. Relativamente ao Estatuto Unificado, a comissão re-transfere o seu poder para o Ministério, por considerar não possuir capacidades para realizar tal operação.

Sobre os modelos teóricos de organização sectorial, antes da orientação do Ministério da Indústria e Tecnologia no sentido de formar uma Empresa Única263, a

260 Confirmado a posteriori pelo despacho de 09 de Julho, que também limitava o tempo dos trabalhos ao final desse mês. 261 A 13 de Julho a Comissão Consultiva suspendeu a representação na comissão, após a recente orientação ministerial, e um dos representantes acabou mesmo por apresentar a demissão (sem que alguém o substituísse). A 22 de Julho os representantes dos trabalhadores retomaram as suas posições na comissão após a realização dos plenários de trabalhadores nas várias empresas (voto contra dos Entrepostos Comerciais da SCC). Os representantes ministeriais aceitaram prosseguir os trabalhos com base nas novas orientações, mas com reservas que foram incluídas no relatório final. 262 A título de exemplo, no plenário de 08 de Abril de 1976 os trabalhadores de Vialonga aprovaram uma moção contra o não pronunciamento por parte do Ministério da Indústria e Tecnologia sobre a Proposta Única (reformulação da política salarial para um único nível salarial), com possível recurso à greve caso a resposta tardasse. 263 Empresa Única: agrupamento das cinco empresas com funcionamento descentralizado e articulação das estruturas existentes.

113 comissão havia proposto inicialmente sete tipos, mais tarde reduzidas aos cinco que se seguem264:

i. “Uma Empresa Pública com descentralização na gestão; ii. Cinco Empresas Públicas encimadas por uma sexta visando orientação e coordenação vinculativas das políticas gerais para o sector; iii. Três empresas públicas (SCC c/ refrigerantes; CUFP c/ refrigerantes e Cercopim c/ refrigerantes) encimadas por uma quarta entidade visando orientação e coordenação vinculativas das políticas gerais para o sector; iv. Duas Empresas Públicas (CUFP c/ refrigerantes e SCC + Cercopim c/ refrigerantes) encimadas por uma terceira unidade visando orientação e coordenação vinculativas das políticas gerais para o sector; v. Duas Empresas Públicas (Porto + Coimbra + Santarém c/ refrigerantes e Belas + Vialonga + Loulé c/ refrigerantes) encimadas por uma terceira entidade visando orientação e coordenação vinculativas das políticas gerais para o sector”265.

Para o sector comercial, na senda do modelo adoptado266, previa-se a criação de dois ramos dentro da Empresa Pública, cada um dispondo de um “catálogo completo de produtos (cerveja, água, refrigerantes) e de uma rede de comercialização (própria e de Agentes) cobrindo todo o território”267. Esta problemática foi uma das mais relevantes em todo o processo, como é fácil de perceber pela abundante documentação encontrada referente a vários ministérios268, onde a palavra de ordem é a da nacionalização imediata, dada a situação periclitante da maioria das empresas de distribuição, como nos mostra um estudo realizado por um grupo de trabalho nomeado pelo Ministério do Comércio Interno, em 27 de Outubro de 1975269, com o objectivo de fundamentar o projecto de diploma que propunha a nacionalização do sector de distribuição. Todavia, os objectivos não foram cumpridos por dificuldades de várias ordens: (i) obtenção de dados fidedignos; (ii) composição do grupo de trabalho. Ainda assim, possibilitou o levantamento e a análise superficial dos fundamentos para a nacionalização, que se

264 Após a rejeição de modelos que previssem a manutenção do sector como tal e de modelos demasiado centralizados e centralizadores – modelo de uma Empresa Pública – por cortarem a motivação e iniciativa na gestão. 265 Ministério da Economia, Centro de Documentação da Direcção-Geral das Actividades Económicas, Relatórios da Comissão de Reestruturação do Sector Cervejeiro. 266 O relatório final estabelece um Projecto de Decreto-Lei que prevê a criação da CEPAL – Cervejeira de Portugal, EP. 267 Ibid. 268 Várias cartas, moções e estudos das comissões de trabalhadores dos sectores de comercialização a pedir a nacionalização do sector; alguns transformam-se em Comissões de Luta. 269 Constituído por José Maria Brandão de Brito, Armando Augusto de Morais e Castro, Eduardo Salviano Harris Cruz (estes três representando a DGCI) e pelo Secretariado do Sector Comercial dos Produtos da SCC.

114 estabeleciam do seguinte modo: (i) Decreto-Lei n.º 769/74 de 31 de Dezembro que estabelecia as condições de assistência a equipamentos públicos (directamente nas fábricas), como cantinas e cooperativas de consumo, prejudicando as vendas das sociedades distribuidoras; (ii) tendência para eliminar intermediários inúteis; (iii) formação de cooperativas e outras associações que vão beneficiar do ponto 1; (iv) eliminação do problema dos abastecimentos, acabando com a intranquilidade dos trabalhadores das distribuidoras quanto ao seu futuro; (v) possibilidade de vender o produto a preço único a nível nacional, o que beneficiaria o consumidor; (vi) eliminação do sistema concorrencial existente, que origina gastos supérfluos; (vii) insuficiência de quadros; (viii) redução dos custos de distribuição através do reordenamento geográfico, diferenciado da divisão distrital; (ix) obrigatoriedade de venda exclusiva dos produtos da marca; (x) possibilidade, após a nacionalização, de vendas da fábrica mais próxima; (xi) reorganizar o capital social das distribuidoras e minorar o grau de dependência do capital alheio270. Com estes dados, o grupo de trabalho conclui pela nacionalização, por constituir a

“hipótese socialmente mais rentável, não só em termos de garantir de emprego [...], mas também em dotar o Estado de uma rede distribuidora de ampla cobertura geográfica, instrumento essencial para uma política de regularização do abastecimento em bens essenciais não perecíveis, à escala de todo o território continental, bem como da racionalização dos circuitos de distribuição correspondentes”271.

Na reunião de Conselho de Ministros de 09 de Janeiro de 1976, o secretário de Estado do Ministério do Comércio Interno leva a debate o Projecto de Decreto-Lei que nacionalizava as distribuidoras e que não tinha sido aprovado pela Presidência da República272 aquando da nacionalização da indústria cervejeira. O secretário de Estado afirma que o Ministério do Comércio Interno era favorável à nacionalização, porque garantia “uma rede polivalente de distribuição controlada pelo Estado”273. Contudo, o Ministério não era favorável à proposta de nacionalização considerada nesse projecto. Os restantes ministros mostraram-se particularmente renitentes quanto à proposta, tendo o ministro da Educação e Investigação Científica, Vítor Alves, afirmado que parecia

270 Arquivo da Presidência do Conselho de Ministros, Caixa 393 EAD, Processos Colectivos, Sociedade Central de Cervejas. 271 Ibid. 272 Por discordar do montante das indemnizações e da composição das Comissões Administrativas. 273 Arquivo da Presidência do Conselho de Ministros, Súmula da Reunião do Conselho de Ministros de 09 de Janeiro de 1976, p. 15.

115 estar a pensar-se em mais uma “nacionalização apressada”274. O projecto foi retirado por depender de uma “política de nacionalizações a definir”275, o que ilustra bem a completa inoperância governamental no tocante a uma política coordenada no campo das nacionalizações (veja-se que já nos encontramos em 1976).

Em Junho de 1977, já na vigência do I Governo Constitucional, a Presidência do Conselho de Ministros aprova uma Resolução (n.º 140/77) que, desconsiderando o relatório final da CRSC, por não ser “suficientemente conclusivo quanto à forma a adoptar para a reestruturação do sector”276, e a proposta de empresa única, por eliminar totalmente a concorrência, cria, sob a tutela do MIT, a empresa pública Central de Cervejas, EP (integra a Sociedade Central de Cervejas e a Cergal) e a União Cervejeira, EP (incorpora a Companhia União Fabril Portuense, a Copeja e a Imperial). Estas duas empresas – Centralcer e Unicer – são efectivamente criadas (com aprovação dos estatutos) pelo Decreto-Lei n.º 531/77 de 30 de Dezembro, no culminar de um complexo processo, cuja evolução se apresenta no diagrama seguinte:

274 Ibid, p. 16. 275 Ibid, p. 17 276 Resolução n.º 140/77, de 20 de Junho

116

Legenda

CA Comissão Administrativa

CAI Comissão de Análise e Inquérito

CRSC Comissão de Reestruturação do Sector Cervejeiro

CT Comissão de Trabalhadores

MCI Ministério do Comércio Interno

MF Ministério das Finanças

MFA Movimento das Forças Armadas

MIT Ministério da Indústria e Tecnologia

Rep. Representantes

SCC Sociedade Central de Cervejas

117 Conclusão

As conclusões desta tese, como referido na introdução, procuram constituir um ponto de partida para a investigação das nacionalizações numa perspectiva mais alargada, sempre numa óptica de transformação da sociedade portuguesa: de ruptura do tipo de relações existente; de completa mutação do espaço “fábrica”, com todas as consequências que daí advém; da ruptura, ou pelo menos, da tentativa de ruptura, das relações de poder.

A análise dos modelos de industrialização, numa malha sectorial mais fina, mas perspectivada a longo prazo, permitiu confirmar algumas das principais conclusões que a historiografia em torno do Estado Novo tem vindo a divulgar. O sector cervejeiro insere-se no segmento industrial pioneiro no que toca à modernização tecnológica, à inovação e à abertura ao exterior, ainda que com resultados decepcionantes neste último ponto. Altamente concentrado, numa situação de verdadeiro monopólio, a introdução de uma concorrência forte só se vislumbra a partir da década de 70, permitindo um desenvolvimento desregulado e a tomada de acções controversas por parte do restrito núcleo de administradores (e accionistas), que convive de perto com as principais estruturas do regime salazarista.

A revolução coloca a nu as fragilidades deste aparente crescimento. Financeiramente, o sector cervejeiro encontrava-se num verdadeiro caos, pondo em causa o futuro próximo da indústria. A mobilização social, que chega rapidamente às estruturas da indústria cervejeira, permite a alteração de todas as variáveis em jogo, de forma rápida, brusca e participada. É, pois, um processo que, pela sua celeridade, foge, pelo menos numa primeira fase, da hegemonia do PCP e da Intersindical. E é esta confrontação sublime entre CT’s-sindicatos-partidos que é necessário ter em conta para uma análise cuidada deste período. O movimento não é unívoco, nem segue necessariamente as crises do aparelho de Estado277, e a investigação efectuada dá uma imagem dessa mesma realidade: na Sociedade Central de Cervejas, empresa que reúne as principais características do tecido industrial de ponta português do Estado Novo, o movimento reivindicativo nasce de forma organizada (reivindicação do tipo “Estado-

277 Como parecem sugerir alguns autores, por exemplo LOUÇÃ, Francisco. “Balanço da revolução portuguesa”, in Acção Comunista, 1976. Ele vai, por seu turno, conduzir às crise do Estado.

118 Maior”278, também como espécie de ajuste de contas com o patronato), e a sua evolução constitui-se como um verdadeiro case study do processo de nacionalizações que se desencadeia no pós-11 de Março.

Apesar da divisão interna dos trabalhadores quanto às estratégias a usar, o modelo adoptado só é possível num panorama de transição para o socialismo, porque pressupõe a desorganização de toda a lógica capitalista. Os debates e discussões em torno da questão do controlo operário tem como pano de fundo – consciente ou inconscientemente – a escolha de um paradigma de organização da sociedade, pois a reconstrução da economia nesses termos não se podia limitar à transferência da propriedade e dos meios de produção para as mãos do Estado. É este o grande paradigma das nacionalizações: só por si elas não significam a luta dos trabalhadores neste período, uma vez que esta luta ultrapassa em larga escala as questões processuais e o bloqueamento estratégico dirigido pelas grandes estruturas partidárias e sindicais. É esta a dicotomia que se verifica na SCC: por um lado, a estratégia anti-monopolista de abolição do poder das mãos dos antigos donos, assente numa concepção de transição para o socialismo que rejeita o controlo total da produção e da gestão; por outro, a ideia de que o controlo operário não se podia ajustar aos mecanismos de organização capitalista. Daí se explica que, em 1977, já numa fase de arrefecimento revolucionário, a indústria cervejeira prossiga a sua reestruturação sob a forma de duopólio, ao invés de se recuar na nacionalização.

Não parecem ter sido as nacionalizações a principal causa do enfraquecimento do sector cervejeiro em Portugal nos anos subsequentes, uma vez que estas possibilitaram, na teoria, o repensar de um modelo de desenvolvimento que estava esgotado e viciado. São as circunstâncias que definem a evolução do processo e as tomadas de posição. O que estava em causa não era apenas a estruturação de um sector, mas antes a reformulação da economia. Efectivou-se porém a primeira premissa, enquanto se debatia selvaticamente um modelo de sociedade, que acabou por lhe parecer estranho.

278 PATRIARCA, Fátima. “Que justiça social?”, in Portugal e a Transição para a Democracia (1974- 1976). Lisboa: Colibri, 1999, p. 148.

119 Fontes e bibliografia

Fontes Primárias e Secundárias

1. Arquivos e bibliotecas

Arquivo & Biblioteca da Fundação Mário Soares

Arquivo Central da Secretaria da Presidência do Conselho de Ministros

Arquivo Contemporâneo do Ministério das Finanças

Arquivo Nacional da Torre do Tombo:

! Arquivo do Conselho da Revolução

! Arquivo Oliveira Salazar

! Arquivo da PIDE

Arquivo Particular Eng.º Rui Neves

Centro de Arquivo e Documentação da CGTP-IN

Centro de Documentação 25 de Abril

Centro de Documentação da Associação Industrial Portuguesa

Centro de Documentação da Direcção-Geral das Actividades Económicas

Centro de Documentação do Departamento de Prospectiva e Planeamento

Centro de Documentação do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social

Biblioteca Nacional

Hemeroteca Municipal

2. Publicações periódicas – boletins, jornais e revistas

Cerveja

Boletim da Sociedade Central de Cervejas

Alavanca

120 Boletim CIP

Boletim da Direcção-Geral da Indústria

Boletim da Direcção-Geral dos Serviços Industriais

Boletim Semanal da Direcção-Geral dos Serviços Industriais

Capital (A)

Comércio do Porto (O)

Diário de Lisboa

Diário Popular

Economia e Socialismo

Esquerda Socialista

Expresso

Flama

Gazeta da Semana (A)

Indústria Portuguesa

Jornal (O)

Jornal do Comércio

Jornal Português de Economia e Finanças

Luta (A)

Movimento – Boletim Informativo das Forças Armadas

Poder Popular

Primeiro de Janeiro (O)

República

Revista do Centro de Estudos Económicos

Seara Nova

Século Ilustrado (O)

Tempo

121 Tempo e o Modo (O)

Tempo Económico

Time

Vida Mundial

Visão História

3. Documentação dos órgãos de soberania, da Administração Central e de departamentos governamentais

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———. III Plano de Fomento para 1968-1973, vol. 1. Proposta de lei e projecto para o continente e ilhas. Lisboa: s.n, 1967.

———. III Plano de Fomento para 1968-1973, vol. 4. Pareceres da Câmara Corporativa. Continentes e Ilhas. Lisboa: s.n, 1968.

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SOUTELO, Luciana. A memória do 25 de Abril nos Anos do cavaquismo. Porto: FLUP, 2009.

CRUZ, Manuel Braga da. “A Igreja na Transição Democrática Portuguesa”, in Lusitania Sacra, 1996: 519–536.

FRANCO, António de Sousa. “A Igreja e o Poder (1974-1987)”, in Portugal e o Sistema Político e Constitucional (1974-1987). Lisboa: ICS, 1995.

10. Vídeo

SCC. Na Minha Aldeia, Cerveja a Copo, 1966 (com Raul Solnado). http://www.youtube.com/watch?v=oQQDRxmohnI&feature=youtube_gdata_player.

139

ANEXOS

I

Índice

! Anexo A ! tabelas relativas a dados sobre a produção, consumo e venda da cerveja. ! Anexo B ! tabela do condicionamento industrial na indústria cervejeira. ! Anexo C ! informações sobre o reapetrechamento, a investigação e a formação técnica. ! Anexo D ! quadro e diagrama das relações dos grupos do sector cervejeiro. ! Anexo E ! tabelas relativas ao sector empresarial do Estado em Portugal e na Europa. ! Anexo F ! calendário das nacionalizações, entre 1974 e 1976. ! Anexo G ! tabelas relativas ao endividamento da Sociedade Central de Cervejas. ! Anexo H ! tabelas com a estrutura capitalista da indústria cervejeira em 1974/75 e listagem dos elementos implicados nas irregularidade identificadas. ! Anexo I ! tabelas relativas à caracterização geral da indústria cervejeira em 1974/75. ! Anexo J ! rede de distribuição comercial. ! Anexo K ! informações sobre a composição de diversas comissões. ! Anexo L ! cronologia.

II

ANEXO A

III Tabela 1: Exportação da Sociedade Central de Cervejas entre 1943-1959:

Exportação da SCC (litros) Anos Açores Angola Brasil Cabo Verde Gibraltar Goa Guiné Macau Moçambique S. Tomé e Príncipe Timor Vapores Total 1943 8 136 117 662 2 326 785 994 18 374 2 880 30 519 965 891 1944 41 508 143 935 11 702 101 283 30 305 13 701 56 571 399 005 1945 47 851 430 128 9 036 7 164 20 146 17 359 14 400 78 909 629 313 1946 7 049 562 074 6 480 11 181 95 616 28 951 7 417 11 513 792 80 145 811 217 1947 4 061 724 953 7 200 4 918 39 744 22 593 3 240 22 334 4 795 85 826 919 664 1948 10 224 707 420 3 247 22 680 32 090 3 837 39 607 8 597 96 148 923 850 1949 4 716 591 760 13 478 55 598 26 240 2 952 50 584 745 328 1950 9 590 635 488 3 564 28 696 7 722 10 714 67 668 705 774 1951 2 .401 606 398 3 888 26 741 9 893 16 427 70 753 759 501 1952 25 272 394 740 10 368 19 699 7 441 13 791 75 214 546 525 1953 1954 1955 766 748 3 394 5 508 2 653 4 623 1956 139 799 2 255 65 454 2 467 1 671 1957 3 935 67 966 2 611 2 097 1958 1 499 3 859 83 758 2 666 1959 980 3 154 60 732 1 940

Fonte: INDÚSTRIA CONTINENTAL DE CERVEJA. Memorial: 1953. Lisboa: Bertrand, 1953 e BNU. "Da Indústria cervejeira em Portugal". Boletim trimestral dos Serviços de Estudos Económicos do B.N.U., 31 de Dezembro de 1961.

IV Tabela 2: Vendas da indústria cervejeira portuguesa (1943-1952):

Vendas da indústria cervejeira portuguesa (litros) Anos Empresas Continente Exportação Total 1943 SCC 10 278 911 965 891 11 244 802 CUFP 1 682 953 76 908 1 758 961 1944 SCC 9 805 79,5 399 005 10 204 802,5 CUFP 1 41 .963 200 097 1 612 060 1945 SCC 11 367 318 629 313 11 996 631 CUFP 1 454 107 328 394 1 782 501 1946 SCC 11 723 311 811 217 12 534 528 CUFP 1 628 972 59 061 1 688 033 1947 SCC 12 397 305 919 664 13 316 969 CUFP 1 581 197 - 1 581 197 1948 SCC 14 252 719 923 850 15 176 569 CUFP 1 970 703 - 1 970 703 1949 SCC 12 296 253,5 745 328 13 041 591,5 CUFP 1 835 577 - 1 835 577 1950 SCC 9 599 800 705 774 10 405 574 CUFP 1 526 551 - 1 526 551 1951 SCC 9 204 350 759 501 9 963 851 CUFP 1 629 996 - 1 629 996 1952 SCC 10 146 109 546 525 10 692 634 CUFP 2 027 702 - 2 027 702

Fonte: INDÚSTRIA CONTINENTAL DE CERVEJA. Memorial: 1953. Lisboa: Bertrand, 1953.

Tabela 3: Comparação do consumo anual per capita em alguns países europeus para o período de 1950-1958:

Consumo anual per capita de cerveja Países Antes da guerra 1950-1953 1956-1958 Áustria 37 48,4 69,8 Bélgica-Luxemburgo - - 134,1 Dinamarca 57,1 68,2 63,9 França 41,4 17,8 30,6 Alemanha 75 47,7 85,5 Grécia - - - Irlanda 38,4 61,6 50,4 Itália 1 2,9 3,8 Holanda 14,8 11 19,3 Noruega 17,4 18,9 22,6 Portugal 0,9 1,6 2,7 Suécia 25,5 25,4 27,3 Suíça 54,6 47,2 57,7 V Tabela 4: Produção da indústria cervejeira portuguesa:

Produção da indústria cervejeira portuguesa (litros) Ano SCC CUFP Total 1932 - - 203 957 1933 - - 184 800 1934 - - 176 402 1935 - - - 1936 - - - 1937 - - - 1938 - - 6 528 381 1939 - - - 1940 - - - 1941 - - - 1942 - - - 1943 11 498 100 1 732 960 12 231 060 1944 12 698 000 1 568 374 14 266 374 1945 12 907 000 1 979 083 14 886 083 1946 12 931 240 1 628 886 14 560 126 1947 14 981 400 1 615 617 16 597 017 1948 16 121 270 1 878 127 17 999 397 1949 14 225 165 1 872 603 16 097 768 1950 11 406 300 1 515 019 12 921 319 1951 10 894 840 1 743 442 12 638 282 1952 11 469 905 1 989 111 13 459 016 1953 - - 14 500 000 1954 - - 16 000 000 1955 - - 20 000 000 1956 - - 20 000 000 1957 - - 24 000 000 1958 - - 28 000 000 1959 - - 32 000 000 1960 - - 37 000 000 1961 - - 40 000 000 1962 - - 37 000 000 1963 - - 36 000 000 1964 - - 50 000 000 1965 - - 50 000 000 1966 - - 65 000 000 1967 - - 75 000 000

Fonte: Tabela construída com base em dados da INDÚSTRIA CONTINENTAL DE CERVEJA. Memoria: 1953. Lisboa, Bertrand, 1953; PORTUGAL. MINISTÉRIO DA ECONOMIA. Indústria da Alimentação e das Bebidas (classes 20 a 21): Relatório Preparatório do Plano de Investimentos para 1965-1967. Lisboa: Ministério da Economia, 1964; AIP. "Uma fábrica de cerveja à escala mundial". Indústria Portuguesa, n.º 411, XXV, Maio de 1962, p. 473; AIP. "A actividade industrial portuguesa em 1934". Indústria Portuguesa, n.º 85, VIII, Março de 1935, p. 60; e AIP. A actividade industrial portuguesa. Índices e números estatísticos". Industria Portuguesa, n.º 143, XIII, Janeiro de 1940, pp. 51-53.

VI

ANEXO B

VII Tabela 1: Condicionamento industrial – indústria cervejeira

Condicionamento Industrial Ano Empresa Motivo Informações Boletim 15-09- António Vahia de Castro (representa grupo financeiro) PI Fabrica de cerveja e refrigerantes 1937 1937- 29-06- António Vahia de Castro (representa grupo financeiro) DM Indeferido 1938 1938 29-06- Portugália DM Deferido (laboração na Almirante Reis) 1938 10-04- Portugália PI Instalação de maquinismo 1939- 1940 1940 10-07- Portugália DM Deferido 1940 23-10- Portugália PI Instalação de maquinismo 1940- 1940 1941 19-03- Portugália DM Deferido 1941 03-06- António Dias PI Pequeno fabrico de cerveja (Cano, Souzel) 1941- 1942 1942 03-12- Portugália DM Instalação de maquinismo 1941 Fábrica de cerveja, refrigerantes e gelo (unidade de reserva / 14-08- Portugália, Estrela, Coimbra e Jansen PI nova) 1946 25-06- Francisco António dos Reis PI Secção de fabrico de cerveja (Ribeira Brava, Funchal) 1946 30-01- João Machado da Rocha PI Fábrica de cerveja (Angra do Heroísmo) 1945- 1946 1946 24-10- Manuel Pestana PI Fábrica de cerveja (Ribeira Brava, Funchal 1945 31-07- Várias firmas (em nome de sociedade a constituir) PI Fábrica de cerveja e refrigerantes (Lisboa) 1946 07-08- Manuel Pestana DM Indeferido 1946 26-03- Abel Magalhães Castela PI Fábrica de cerveja e gelo (Coimbra) 1946- 1947 1947 03-09- António Garcia Roseiro PI Fábrica de cerveja (Mortágua) 1947 VIII 23-10- António Vahia de Castro (representa grupo financeiro) PI Fábrica de cerveja e refrigerantes 1946 30-07- Carlos Mário Duarte PI Fábrica de cerveja (Porto) 1947 18-06- Santos Ferreira & C.ª, Ltd.ª PI Fábrica de cerveja e gelo (Ribeira de Frades, Coimbra) 1947 18-09- João Machado da Rocha DM Indeferido 1946 22-09- Companhia União Fabril Portuense PI Substituição de maquinismo 1948 09-06- Portugália PI Instalação de maquinismo 1948 25-02- Francisco Bento Gouveia PI Fabrico de nova cerveja ("vínica") 1948 29-09- Mesquitas, Ltd.ª PI Fábrica de cerveja (Mãe de Água, Nogueiró - Braga) 1948 15-12- Abel Magalhães Castela DM Indeferido 1948 15-12- António Garcia Roseiro DM Indeferido 1948 António Vahia de Castro (representante de grupo 15-12- DM Indeferido 1947- financeiro) 1948 1948 15-12- Carlos Mário Duarte DM Indeferido 1948 27-10- Portugália DM Deferido 1948 10-11- Portugália, Estrela, Coimbra e Jansen DM Indeferido (pedido de 1945-1946) 1948 15-12- Companhia União Fabril Portuense DM Deferido 1948 10-11- Francisco António dos Reis DM Indeferido 1948 10-11- Lagos & Irmão e outros DM Indeferido 1948 10-11- Santos Ferreira & C.ª, Ltd.ª DM Indeferido 1948 05-01- 1949 António Martins Ferreira PI Fábrica de cerveja, laranjadas e gelo (Coimbra) 1949

IX 09-02- Companhia de Cervejas de Coimbra PI Substituição de maquinismo 1949 12-10- Emanuel Durão PI Fábrica de cerveja (Viseu) 1949 08-06- Empresa Transmontana de Cervejas, Ltd.ª PI Fábrica de cervejas e refrigerantes (Castelo Branco) 1949 08-06- António Martins Ferreira DM Indeferido 1949 08-06- Companhia de Cervejas de Coimbra DM Deferido 1949 02-02- Companhia União Fabril Portuense DM Deferido 1949 21-09- Companhia União Fabril Portuense DM Prorrogação de 3 meses (9-11-48) 1949 16-02- Mesquitas, Ltd.ª DM Indeferido 1949 05-04- Manuel de Freitas Mariano PI Fábrica de cerveja (Angra do Heroísmo) 1950 08-03- União Industrial, Ltd.ª PI Fábrica de cerveja, refrigerantes e gelo (Odivelas) 1950 15-03- Companhia Produtora de Malte e Cerveja Portugália DM Prorrogação de 12 meses (10-9-48) 1950 1950 15-03- Emanuel Durão DM Indeferido 1950 20-09- Manuel de Freitas Mariano DM Indeferido 1950 23-08- União Industrial, Ltd.ª DM Indeferido 1950 31-01- Abílio Ferreira Borges PI Fábrica de cerveja (Póvoa de Varzim) 1951 18-07- Abílio Ferreira Borges PI Fábrica de cerveja (Póvoa de Varzim) 1951 09-05- 1951 Companhia União Fabril Portuense PI Substituição de maquinismo 1951 31-10- Abílio Ferreira Borges DM Indeferido 1951 03-10- Companhia de Cervejas de Coimbra DM Prorrogação de 24 meses (10-3-49) 1951

X 03-10- Companhia Produtora de Malte e Cerveja Portugália DM Prorrogação de 15 meses (10-9-48) 1951 03-10- Companhia União Fabril Portuense DM Deferido 1951 31-10- Companhia Produtora de Malte e Cerveja Portugália DDG Deferido 1951 21-03- Abílio Ferreira Borges PA Arquivado por desinteresses do requerente 1951 03-09- António Martins Ferreira PI Fábrica de cerveja e gelo (Coimbra) 1952 04-06- 1952 José Joaquim Gonçalves de Oliveira PI Fábrica de cerveja, refrigerantes e gelo (Porto) 1952 24-09- António Martins Ferreira PA Arquivado por desinteresses do requerente 1952 27-05- 1953 Companhia Produtora de Malte e Cerveja Portugália DM Prorrogação de 18 meses (19-9-51) 1953 07-03- 1956 José Joaquim Gonçalves de Oliveira DM Deferido – Nacerel / Reorganização sectorial 1956 02-09- José Manuel Rodrigues Brás PI Fábrica de cerveja (Calheta, Funchal) 1959 1959 18-03- Nacerel - Sociedade Naconal de Cerveja e Refrigerantes DM Prorrogação de 3 anos (20-2-56) 1959 Fábrica de cerveja, gelo e refrigerantes (S. Miguel, Ponta 30-03- Albert Emile José Bensaúde Oulman e outro PI Delgada) 1960 21-12- 1960 Companhia União Fabril Portuense e Nacerel PI Concentração 1960 03-02- José Manuel Rodrigues Brás DM Indeferido 1960 12-04- Sociedade Central de Cervejas PI Concentração 1961 31-05- Albert Emile José Bensaúde Oulman e outro DM Indeferido 1961 1961 22-03- Companhia União Fabril Portuense DM Deferido 1961 16-08- Sociedade Central de Cervejas DM Deferido 1961 17-10- 1962 Companhia União de Cervejas de Angola, Cuca PI Fábrica de cerveja (Luanda) 1962

XI 17-10- Nova Empresa de Cervejas de Angola, Nocal PI Ampliação de fábrica (Luanda 1962 18-12- 1963 Lúcio Tomé Feteira PI Fábrica de cerveja (Lisboa) 1963 17-08- 1966 Manuel António Flor Alves da Silva e outros PI Fábrica de cerveja (Setúbal) 1966 01-02- António Gouveia Pedro de Jesus PI Fábrica de cerveja (Porto) 1967 01-02- Banco Pinschof & C.ª PI Fábrica de cerveja (Faro) 1967 15-02- 1967 Ciable - Comércio e Indústria de Alimento e Bebidas PI Fábrica de cerveja (Faro) 1967 12-04- Corporel - Companhia de Refrigerantes PI Fábrica de cerveja 1967 31-05- Supersumos, Ltd.ª e outras firmas PI Fábrica de cerveja (Lisboa) 1967 17-07- Supersumos, Ltd.ª e outras firmas DM Deferido / Reorganização sectorial 1968 1968 04-12- Supersumos, Ltd.ª e outras firmas DM Prorrogação de 60 dias (26-6-68) 1968 27-08- 1969 Cergal - Cervejas de Portugal DM Deferido – Constituição da Cergal 1969 03-06- 1970 Cergal - Cervejas de Portugal DM Atribuição de acções à Mahou 1970 07-04- António Vítor de Almeida Saraiva (c/ Heineken e Interbra) PI Fábrica de cerveja (Setúbal) 1971 1971 24-11- Cergal - Cervejas de Portugal PI Plano de desenvolvimento 1971 01-03- Refriplás - Indústrias Reunidas Refrigerantes e Plásticos PI Fábrica de cerveja, levedura seca, gás carbónico e gelo (Faro) 1972 03-05- José Nunes Rodrigues PI Fábrica de cerveja, gás carbónico e gelo (Faro) 1972 António Vítor de Almeida Saraiva (c/ Heineken e 24-01- 1972 DM Deferido – Copeja Interbrew) 1972 29-03- Cergal - Cervejas de Portugal DM Indeferido 1972 02-08- Cergal - Cervejas de Portugal DM Deferido (capital social) 1972

XII 30-08- António Vítor de Almeida Saraiva DM Aprovação de estatutos 1972 29-11- Cergal - Cervejas de Portugal DM Deferido (aumento de produção) 1972 29-11- José Nunes Rodrigues DM Deferido 1972 29-11- Refriplás - Indústrias Reunidas Refrigerantes e Plásticos DM Deferido 1972 26-09- António Coutinho Ramos PI Fábrica de cerveja e gás carbónico (Setúbal) 1973 15-08- Companhia União Fabril Portuense PI Ampliação de produção 1973 26-09- 1973 Fernando da Costa Borges Ventura PI Fábrica de cerveja, gás carbónico e gelo (Viseu) 1973 11-04- Sociedade Central de Cervejas PI Ampliação de produção 1973 16-05- Refriplás - Indústrias Reunidas Refrigerantes e Plásticos DM Concentração – Imperial 1973

Legenda Autorizações concedidas a novas empresas PI Pedido de Instalação DM Despacho Ministerial DDG Despacho do Director-Geral PA Processo Arquivado

Fonte: Fonte: Boletim da Direcção-Geral da Indústria; Boletim da Direcção-Geral dos Serviços Industriais; Boletim Semanal da Direcção-Geral dos Serviços Industriais.

XIII

A NEXO C

XIV Tabela 1: Valores estimados do reapetrechamento/investimento efectuado na Sociedade Central de

Cervejas na para a década de 50:

Reapetrechamento na Sociedade Central de Cervejas Empresas Montante

Companhia de Cerveja Estrela 27 330 000$00

Companhia Produtora de Malte e Cerveja Portugália 43 630 000$00

Companhia de Cerveja Coimbra 5 340 000$00

Diverso nas 3 fábricas (por fora da SCC) 23 700 000$00

Total 100 000 000$00

Fonte: INDÚSTRIA CONTINENTAL DE CERVEJA. Memorial: 1953. Lisboa: Bertrand, 1953.

Tabela 2: Mestres cervejeiros da indústria cervejeira nacional:

Mestres cervejeiros Nome Nacionalidade Empresa Richard Eisen Alemã Germânia; Estrela Anton Dürrer Alemã CUFP; Coimbra Albert Lourtie Belga Portugália; SCC Gerard Eisen Alemã Estrela – SCC Fernand N. Lourtie Coimbra - SCC; Cuca António da Fonseca Portuguesa SCC Alfred Joseph Bury Portugália – SCC Américo Martins Portuguesa Portugália – SCC Gustave Emile Michies Belga SCC

Fonte: MARTINS, Américo. Central de Cervejas: 50 Anos de actividade. Lisboa: Central de Cervejas, 1985.

XV Tabela 3: Técnicos portugueses graduados por universidades estrangeiras:

Sociedade Central de Cervejas École de Brasserie de Versuchts und Lehrenstalt für Ano Louvain Nancy Bruereu (Berlim) 1949- António Alberto Martins da João Pedro Homem de Mello (s/d) 1950 Fonseca (FEUP) 1953- Francisco Pinto Teixeira (IST) 1954 Fernando Henrique Gaspar

Pereira 1954- Américo Antunes Martins 1955 João Carlos M. Rocha dos

Santos (IST) José Navarro (ISA) 1955- 1956 João Pedro Homem de Mello

(ISA) 1960- Nuno Ernesto Pestana 1961 1961- Jorge Manuel Massadas Rino 1962 1962- T.A. José Vasconcelos de

1963 Sousa Lino António Gorjão Lancastre de

1965- Freitas 1966 Jorge Ferreira 1966- Luís Caldeira Deslandes 1967 Fernando A. Martins Gil 1967- 1968 Luís Mattos Chaves Pedro José de Almeida Mello e

1970- Castro 1971 José Aragão 1973- Manuel Batista Rodrigues 1974 Alfredo Freire 1978- 1979 José Sobral 1982- José Castro 1983

XVI Companhia União Fabril Portuense

Ano Louvain

1947-1948 João Sanguinetti Talone (IST)

1954-1955 José Manuel Bustorff Guerra (ISA)

Companhia União de Cervejas de Angola

Ano Louvain

1952-1953 Henrique Mazanares Abecassis (ISA)

Fernando Henrique Gaspar Pereira (IST)

1954-1955 Francisco A. Gago da Silva (ISA)

Américo Antunes Martins (IST)

Fonte: MARTINS, Américo. Central de Cervejas: 50 Anos de actividade. Lisboa: Central de Cervejas, 1985 e SCC, Cerveja.

Tabela 4: Listagem dos Cursos de Tiradores de Cerveja da Sociedade Central de Cervejas:

Curso de Tiradores de Cerveja da SCC

Data Local Candidatos

30/08/1954 Lisboa 60

03/1955 Lisboa 142

Lisboa - 1956 Coimbra -

22/04/1957 Lisboa 86

29/94/1957 Coimbra 79

06/06/1957 Lisboa 92

13/05/1957 Coimbra 83

1-4/11/1959 Funchal -

1960 Beja 94

1972 Madeira -

Fonte: SCC. Cerveja.

XVII

A NEXO D

XVIII Tabela 1: Quadro de ligações intra/inter-sectoriais da indústria cervejeira:

Portugália Estrela Coimbra Jansen Sociedade Central de Cervejas (SCC) SCC Cuca SCC SCC SCC Portugália (c/ BPA) Imperial Estrela Nocal Coimbra CUFP Coimbra Estrela (c/ BESCL) Emp. Cerv. Madeira CUFP Sogere CUFP Grupo Borges CUFP Coimbra João de Melo Abreu Vinhas (c/ BPA) Parfil Nocal Parfil Cuca Jansen Cicer Lancastre de Freitas São Ciro Cuca Lupulex Sogere Copeja Parfil Soc. Int. Carvalho Martins Sogere Urfil Cuca Cinevoz Socajú Participações Lupulex Promalte Carvalho Martins Cive Infante de la Cerda Camillo Alves Liogal Urfil – Soc. de Comp. Vid. Iniciativas Sapla Elísio Vilaça Avilez Síntex Construções Moçambique Ultramarinas Cive Somarisco Braz Nunes Sequeira Perestrelo Águas do Luso Cervisul (distrib.) Cive (ligação c/ Soc. Dist. Cerv. Uniturismo Carpe Grupo Espírito Santo Parfil Cergal) Vouga Iniciativas Soc. Int. Margeste Parfil Nutripol Soc. Dist. Portalegre Ultramarinas Participações Comp. Vid. Soc. Int. Libra Progredior Lupulex Uniturismo Moçambique Participações Soc. Int. Ribadouro Urfil Urfil Participações Lupulex Uniturismo A Capital (Gráfica) Iniciativas Urfil Serte Ultramarinas Comp. Vid. Cive Sege Moçambique Uniturismo El aguila Iniciativas

Ultramarinas Comp. Vid.

Moçambique XIX

Empresa Cervejas da Ind. Cerv. João Melo CUFP Cergal Copeja Imperial Madeira Abreu Guilherme Pereira Empresa Cervejas da Portugália (c/ BPA) Roldão + Água do Luso António Esteves (SCC) António Esteves (SCC) SCC Madeira (SCC) Conde de Caria Estrela (c/ BESCL) Guedes de Sousa Guedes de Sousa João de Melo Abreu SCC (Supersumos + Vidago) Jansen Barbosa e Almeida Abecassis Abecassis Miles António Vítor Almeida Distribuidora Cervejas Cuca Ricardo dos Santos Galo Grupo Espírito Santo Saraiva Madeira Sogere Santos Barosa Grupo Espírito Santo Refriplás Banco Pinto e Sotto Cicer Interbrew e Heineken Comundo Mayor Banco Português do Mahou SA Comundo Cialbe Atlântico Castelo de Vide Fundus

Gelex

Agropor

Ytong Portuguesa

Lupulex

Iniciativas Económicas Comp. Vid.

Moçambique

XX Cuca Nocal Mac-Mahon Grupo Reunidas Sogere Cicer Estrela (c/ Portugália CUFP Grupo Reunidas SCC SCC SCC BESCL) Estrela (c/ Banco Borges & Cicer Portugália CUFP Fab. Cerv. Reunidas CUFP BESCL) Irmão Interbrew e Jansen Sofanco Fábrica de Cerveja da Beira Mac-Mahon Cuca Heineken Angolana de Fab. Cerv. Frifar Fábrica de Cerveja de Nampula BNU Refrigerantes Reunidas Vitória IPA Sogere Banco Borges & irmão Banco de Crédito Comercial e Cahombo Protangue Mac-Mahon Industrial Fábrica de Refrigerantes de Real Iforang Companhia de Seguros Atlas Gaza Passicuca Copa União Fabril de Refrigerantes Lisinur Fábrica de Maltes de Vega ANA Alcácer Moçambique Unitécnica Camang Nutresco Mabor Empresa de Águas de Caju-Monado SEPA Montemor EGI Capsul Vimoc

NEA Vidrul Unifar

VEGA Cuca-Protector

RCA Avicuca

Passi-cuca Sofap

API Distribuidoras

Uniplásticos Neográfica Ango- Listas Telefónicas Comence XXI XXII

A NEXO E

XXIII Tabela 1: Evolução do Sector Público Empresarial do Estado

Peso do sector público empresarial antes e depois das nacionalizações (em %) Depois das nacionalizações Indicadores globais Antes das nacionalizações Total EP Participações VAB 7,8 22,9 13,6 1,5 FBCF 15,8 41,6 25,6 1,6 Emprego 12,4 19,3 6,0 0,5

Fonte: FRANCO, António Sousa. Finanças do Sector Público – Introdução aos Subsectores Institucionais. Lisboa, AAFDL, 1991.

Tabela 2: Evolução do Sector Público Empresarial do Estado em Portugal e em alguns países da Europa

Comparação do sector público empresarial em alguns países Países Volume de emprego FBCF Volume de vendas Índice médio Alemanha 8,7 22,7 7,2 12,9 Áustria - - 22,3 - Bélgica 8 13,5 4,5 8,7 França 11,2 33,5 10 18,2 Holanda 8,1 21 8,7 12,6 Inglaterra 7,5 18 19 11,8 Irlanda - - 8 - Itália 11,6 28 8,1 15,9 Luxemburgo 5,6 15 3,7 8,1 Portugal 11,5 33,6 14,0 19,7

Fonte: PINHO, Ivo. “Sector Público Empresarial – antes e depois do 11 de Março”, in Análise Social XII, n.º 47, 1976, p. 745.

XXIV

A NEXO F

XXV Quadro 1: Calendário das nacionalizações 13 de Setembro 74 D.L. n.º 450/74 Banco de Angola 13 de Setembro 74 D.L. n.º 451/74 Banco Nacional Ultramarino 13 de Setembro 74 D.L. n.º 452/74 Banco de Portugal 14 de Março 1975 D.L. n.º 132-A/75 Instituições de crédito 15 de Março D.L. n.º 135-A/75 Companhias de seguros 16 de Abril D. L. n.º 205-A/75 Empresas refinadoras e distribuidoras de petróleo: • Sacor • Petrosul • Sonap • Cidla 16 de Abril D. L. n.º 205-B/75 Companhia de Caminhos de Ferro (CP) 16 de Abril D. L. n.º 205-C/75 Empresas de transportes marítimos: • Companhia Nacional de Navegação (CNN) • Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos (205-D?) 16 de Abril D. L. n.º 205-E/75 Transportes Aéreos Portugueses (TAP) 16 de Abril D. L. n.º 205-F/75 Empresas de siderurgia: • Siderurgia Nacional 16 de Abril D. L. n.º 205-G/75 Empresas produtoras, transformadoras e distribuidoras de electricidade (até c/ participações estrangeiras): • Aliança Eléctrica do Sul • Companhia Eléctrica do Alentejo e Algarve • Companhia Eléctrica das Beiras • Companhia Hidroeléctrica do Norte de Portugal • Companhias Reunidas Gás e Electricidade • Companhia Portuguesa de Electricidade • Eléctrica Duriense • Empresa Hidroeléctrica do Coura • Empresa Hidroeléctrica da Serra da Estrela • Empresa Insular de Electricidade • Hidroeléctrica do Alto Alentejo • Hidroeléctrica Portuguesa • Sociedade Eléctrica do Oeste • União Eléctrica Portuguesa 09 de Maio D. L. n.º 221-A/75 Cimentos: • Cisul • Cisnorte • Empresa de Cimento de Leiria • Companhia de Cimentos do Tejo • Companhia de Carvões e Cimento do Cabo Mondego • Sagres • Cibra 09 de Maio D. L. n.º 221-B/75 Celulose – unem-se depois na Portucel, em Julho: • Companhia Portuguesa de Celulose • Sociedade Industrial de Celulose • Celulose do Tejo • Celulose do Norte • Celulose do Guadiana 13 de Maio D. L. n.º 228-A/75 A Tabaqueira INTAR Empresa Madeirense de Tabacos Fábrica de Tabacos Micaelense 05 de Junho D. L. n.º 280-A/75 Metropolitano de Lisboa 05 de Junho D. L. n.º 280-B/75 Empresa Geral de Transportes 05 de Junho D. L. n.º 280-C/75 Transportes colectivos de passageiros: • João Belo • Claras • Cernache • Eduardo Jorge

XXVI • Empresa de Viação Algarve • António Magalhães e C.ª • Boa Viagem • Pereira Marques • Arboricultura • Transul 03 de Julho D. L. n.º 346/75 Carris 13 de Agosto D. L. n.º 432/75 Covina (excepto acções estrangeiras) 14 de Agosto D. L. n.º 434/75 Pirites de Aljustrel (parte portuguesa) Sociedade Mineira de Santiago 21de Agosto D. L. n.o 453/75 Companhia Nacional de Petroquímica 22 de Agosto D. L. n.o 457/75 Química pesada: • Sociedade Portuguesa de Petroquímica • Amoníaco Português • Nitratos de Portugal 30 de Agosto D. L. nº 474/75 Empresas cervejeiras do Continente, Açores e Madeira: • Cergal – Cerveja de Portugal • Copeja – Comp. Portuguesa de Cervejas • Cufp – Comp. União Fabril Portuense • Imperial – União Cervejeira de Portugal • Sociedade Central de Cervejas • Fábrica de Cervejas e Refrigerantes João Mello Abreu • Empresa de Cervejas da Madeira 01 de Setembro D. L. n.º 478/75 Estaleiros Navais de Viana do Castelo Setenave – Estaleiros Navais de Setúbal 25 de Setembro D. L. n.º 532/75 CUF 02 de Outubro D. L. n.º 561/75 Sogefi – Sociedade de Gestão e Financiamentos Sogeral – Sociedade Geral do Comércio, Indústria e Transportes 13 de Novembro D. L. n.º 628/75 Companhia das Lezírias do Tejo e Sado 02 de Dezembro D. L. n.º 674-C/75 Televisão e rádio (criada a Empresa Pública de Radiodifusão): • Alfabeta – Rádio e Publicidade • EAL – Emissores Associados de Lisboa • J. Ferreira & C.a • Rádio Clube Português • Sociedade Portuguesa de Radiodifusão • Rádio Radiofónico de Portugal • Rádio Graça • Rádio Peninsular • Rádio Voz de Lisboa 02 de Dezembro D. L. n.º 674-D/75 RTP – Rádio Televisão Portuguesa 17 de Dezembro D. L. n.º 701-C/75 Empresas auxiliares de transportes de água: • Sofamar – Sociedade de Fainas do Mar e do Rio 17 de Dezembro D. L. n.º 701-D/75 Empresas de transportes fluviais do Tejo – criação da Transtejo 17 de Dezembro D. L. n.º 701-E/75 Serviços auxiliares de transporte por água: • Socarmar – Sociedade de Cargas e Descargas Marítimas 20 de Julho de 1976 D. L. n.º 572/76 Empresas de pesca: • SNAPA – Sociedade Nacional dos Armadores de Pesca do Arrasto • SNAB – Sociedade Nacional dos Armadores do Bacalhau • CPP – Companhia Portuguesa de Pescas • Pescrul – Sociedade de Pesca de Crustáceos • Frigarve – Empresa Frigorífica do Algarve • Docapesca – Sociedade Concessionária da Doca de Pesca • Gelmar – Empresa Distribuidora de Produtos Alimentares • Friantarticus – Frigoríficos de Cascais 26 de Julho de 1976 D. L. n.º 639/76 Comunicação social escrita: • Sociedade Nacional de Tipografia • Empresa Nacional de Publicidade • Sociedade Industrial de Imprensa • Sociedade Gráfica de A Capital XXVII

A NEXO G

XXVIII Tabela 1: Dívidas da Sociedade Central de Cervejas

Banca A curto prazo (- 1 ano) Valores (contos) - Banco Espírito Santo Deficit de tesouraria 178 670 Livranças 45 000 Aceites bancários 210 000 Aceites bancários 100 000 - Caixa Geral de Depósitos Amortizações + Juros 48 374 Total 582 044 A longo prazo (+ 1 ano) Valores - Banco Espírito Santo Plafond 55 000 - Banco Borges & Irmão Aceite bancário 17 500 - Caixa Geral de Depósitos Amortização + Juros 241 874 Total 314 374 Total curto e longo prazo 896 418

Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Serviços de Apoio ao Conselho da Revolução, Vol. 73, n.º 206, Assuntos Económicos e Sociais e Empresas, Processo 73/15, Exposição ao Conselho Superior da Revolução. Processo n.º 2165, 20/03/1975.

Avales e garantias Devedores Valor Companhia União de Cervejas Angola “CUCA” 4 500 000 00 Pedro Paulo Rocha Nunes e Esposa 29 500 00 CIVE – Companhia Industrial Vidreira 67 500 000 00 CIVE – Companhia Industrial Vidreira 67 500 000 00 Companhia Iniciativas Económicas Ultramarinas 1 384 889 19 Adegas Camilo Alves, SARL. 4 000 000 00 José Francisco Tirano 1 009 169 10 NUTRIPOL – Soc. Portuguesa de Supermercados 1 875 000 00 Total 147 798 558 29

Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Serviços de Apoio ao Conselho da Revolução, Vol. 73, n.º 206, Assuntos Económicos e Sociais e Empresas, Processo 73/15, Exposição ao Conselho Superior da Revolução. Processo n.º 2165, 20/03/1975.

XXIX

A NEXO H

XXX Tabela 1: Composição dos Conselhos de Administração, em 15 de Janeiro de 1975

Jansen PARFL (Conselho de SCC Estrela Portugália (Conselho de Coimbra (Conselho de Gerência) Gerência) Gerência) Progredior, representada Carlos João da Silva Moreira José Manuel Miguel de Sttau Banco Borges & Irmão, representado Carlos João da Silva por Caetano Sanguinetti Rato (presidente) Martins Monteiro por Manuel Cortes Rosa (presidente) Moreira Rato (presidente) Beirão da Veiga Portugália, representada pela Banco do Alentejo, representado por Domingos Portugália, representada Imobiliária do Restelo e esta por SAPA Mário Vinhas Alberto Alves de Oliveira Pinto Avilez por Manuel Vinhas João Lancastre de Freitas (administrador-delegado) Estrela, representada por João de Borges & Irmão Comercial, Estrela, representada por Alexandre Brás Nunes António Eduardo Progedior e esta por Caetano Lancastre representado por António da Cruz Caetano Sanguinetti Sequeira Borges Coutinho Sanguinetti Beirão da Veiga Freitas Neves da Costa (vogal) Beirão da Veiga Coimbra, representada por Coimbra, representada por José António de Carvalho Carvalho & Alberto Alves de Oliveira Alberto Alves de Oliveira Pinto Martins Martins Pinto Carvalho & Martins, Carvalho & Martins, representada Barbosa e Almeida S. Ciro representada por José por José Manuel Martins Manuel Martins SAPA, representada por Fernando Espírito Santo Moniz Ricardo dos Santos Galo Fernando Santo Moniz Galvão Galvão

Fonte: Arquivo da Presidência do Conselho de Ministros, Caixa 393 EAD, Processos Colectivos, E8.93, Gabinete do Primeiro-Ministro, 06/05/1975.

XXXI Quadro 2: Estrutura do capital accionista do sector cervejeiro em 1975

SCC PARFL Estrela Jansen Portugália Coimbra Infante de la Cerda Parfil Espírito Santo (grupo José Manuel Martins Grupo 60% Portugália 42% 32,7% (família) 30,0% 41,6% 100% e família) (família) Borges

Portugália Alexandre Brás Nunes 12,6% Estrela 42% 27,9% Avilez (família) 30,0% Manuel Vinhas (família) 22,8% Sequeira José Manuel Martins João Lancastre de Freitas Estrela 12,6% Coimbra 10% 17,0% Perestrelo (família) 29,2% 13,6% (família) (família) Coimbra 3,0% Jansen 6,0% Diversos 22,4% Daniel Mendonça e Costa 7,5% Diversos 10,8%

Jansen Alexandre Brás Nunes 1,8% 1,7% Sequeira (família) Público + 10,0% Diversos 12,8% pessoal

XXXII Empresa Cervejas Fábrica João Melo CUFP Cergal Copeja Imperial Madeira Abreu Empresa de Portugália Banco Pinto & Sotto José Guedes de Espírito Santo Água do Porto 30,5% 40,7% 27,6% 27,6 32% Cervejas da 80% Mayor Sousa (família) (grupo e família) Santo Madeira Estrela Espírito Santo 30,5% Refrigerantes + águas 34,3% 19,5% Comundo 26,9% H.P. Miles 32% Outros 20% (grupo e família) Supersumos + Vidago & Sociedade Pedras Salgadas + António Vítor Jansen 8,0% 7,9% 11,3% Perestrelo (família) 29,2% Central de 30% Vidago Sallus (Conde de Almeida Saraiva Cervejas Caria) António Carlos Banco Guilherme Pereira António Carlos Ahrens Teixeira Português do Ahrens Teixeira 7,3% Roldão + Sociedade 6,3% 8,6% 19,6% Leacock & C.ª 6,0% Atlântico Esteves (ex- Esteves (ex- Água do Luso (SCC) Comundo; SCC) Comundo; SCC) Alexandre Brás Diversos José Guedes de 23,7% Empresas vidreiras 5,4% Abecassis (família) 6,8% 7,3% Nunes Sequeira 1,7% Sousa (família) (família) Mahou SA (espanhol) 3,1% Diversos 26,2% Fundus 6,3%

Diversos 2,3% Cialbe 4,7%

Abecassis (família) 3,0%

Diversos 4,6%

Fonte: Centro de Documentação 25 de Abril, Espólio Macaísta Malheiros, Legislação, Projectos de Leis, doc. n.º 27, Ministério da Indústria e Tecnologia? Diploma sobre a nacionalização do sector cervejeiro, Junho de 1975,

XXXIII

Tabela 3: Relação das pessoas implicadas nas irregularidades detectadas pela Comissão de Análise e Inquérito

1. Fernando Alberto de Oliveira (Brigadeiro): a. Exportação ilícita de capitais de terceiros, cumulada com falsas declarações; exportação ilícita de capitais cumuladas com falsas declarações; exportação ilícita de capitais. 2. Artur Luís Alves Conde: a. exportação ilícita de capitais de terceiros cumulada com falsas declarações; exportação ilícita de capitais cumulada com abuso de confiança; exportação ilícita de capitais. 3. José António Carvalho Martins: a. exportação ilícita de capitais de terceiros cumulada com falsas declarações; irregularidades fiscais, transacção ilegal de acções e actos de gestão ruinosa: exportação ilícita de capitais cumulada com abuso de confiança; exportação ilícita de capitais. 4. Manuel Ricardo Pinheiro Espírito Santo Silva: a. exportação ilícita de capitais de terceiros cumulada com falsas declarações; exportação ilícita de capitais cumulada com abuso de confiança; exportação ilícita de capitais. 5. João Gaudy de Mattos Chaves: a. exportação ilícita de capitais de terceiros cumulada com falsas declarações; exportação ilícita de capitais cumulada com abuso de confiança; exportação ilícita de capitais. 6. Comandante José Francisco Correa Mattoso: a. Falsas declarações; exportação ilícita de capitais de terceiros; exportação ilícita de capitais de terceiros cumulada com falsas declarações. 7. Miguel Infante de la Cerda Sttau Monteiro: a. Falsas declarações; exportação ilícita de capitais de terceiros; exportação ilícita de capitais de terceiros cumulada com falsas declarações; falsas declarações fiscais; abuso de confiança; desvio de fundos. 8. Manuel José Carvalho Martins: a. Falsas declarações; exportação ilícita de capitais de terceiros; exportação ilícita de capitais de terceiros cumulada com falsas declarações; falsas declarações fiscais; abuso de confiança.

XXXIV 9. Manuel Carvalho Brito das Vinhas: a. exportação ilícita de capitais de terceiros cumulada com falsas declarações; burla, furto e abuso de confiança; exportação ilícita de capitais. 10. José Manuel Pereira Martins: a. exportação ilícita de capitais de terceiros cumulada com falsas declarações; burla, furto e abuso de confiança; simulação; exportação ilícita de capitais cumulada com abuso de confiança; exportação ilícita de capitais. 11. Carlos João da Silva Moreira Rato: a. crime de falsas declarações na Operação Brasil; exportação ilícita de capitais de terceiros na Operação Brasil; exportação ilícita de capitais de terceiros na Operação Brasil cumulada com falsas declarações; falsas declarações fiscais; abuso de confiança; transacção ilegal de acções. 12. João Lancastre de Freitas: a. falsas declarações na Operação Brasil; exportação ilícita de capitais de terceiros; exportação ilícita de capitais de terceiros na Operação Brasil cumulada com falsas declarações; falsas declarações fiscais; abuso de confiança; irregularidades fiscais, transacção ilegal de acções e actos de gestão ruinosa. 13. Caetano Sanguinetti Beirão da Veiga: a. falsas declarações; exportação ilícita de capitais de terceiros; exportação ilícita de capitais cumulada com falsas declarações; falsas declarações fiscais; abuso de confiança; irregularidades fiscais, transacção ilegal de acções e actos de gestão ruinosa; exportação ilícita de capitais cumulada com abuso de confiança. 14. Albano Martins da Costa: a. exportação ilícita de capitais de terceiros cumulada com falsas declarações; exportação ilícita de capitais cumulada com abuso de confiança; exportação ilícita de capitais. 15. José Luís Fernandes de Moura: a. exportação ilícita de capitais de terceiros cumulada com falsas declarações; exportação ilícita de capitais cumulada com abuso de confiança; exportação ilícita de capitais. 16. Gonçalo Rodrigo Santos Lima de Faria: a. exportação ilícita de capitais de terceiros cumulada com falsas declarações; exportação ilícita de capitais cumulada com abuso de confiança; exportação ilícita de capitais. 17. Alexandre Braz Nunes Sequeira:

XXXV a. exportação ilícita de capitais de terceiros cumulada com falsas declarações; irregularidades fiscais, transacção ilegal de acções, actos de gestão ruinosa e simulação. 18. [Repetido do Miguel Sttau Monteiro] 19. Mário de Carvalho Brito das Vinhas: a. Exportação ilícita de capitais cumulada com falsas declarações. 20. Domingos Maria de Avillez Lobo de Almeida Melo e Castro: a. Exportação ilícita de capitais cumulada com falsas declarações; desvio de fundos. 21. Alberto de Oliveira Pinto: a. Abuso de confiança. 22. Fernando Cardote: a. Transacção ilegal de acções e falsas declarações 23. Marino Martins: a. Transacção ilegal de acções e falsas declarações. 24. Vasco da Gama Pinto Basto: a. Irregularidades fiscais, transacção ilegal de acções e actos de gestão ruinosa. 25. António Gorjão de Lancastre Freitas: a. Irregularidades fiscais, transacção ilegal de acções e actos de gestão ruinosa. 26. António Esteves: a. Simulação. 27. Guedes de Sousa: a. Simulação. 28. Eduardo António Perestrelo de Vasconcelos: a. Desvio de fundos. 29. João Pedro Homem de Mello: a. Exportação ilegal de divisas e abuso de confiança. 30. Jorge Rino: a. Exportação ilegal de divisas e abuso de confiança (G). 31. Eduardo Vaz de Oliveira: a. Exportação ilegal de divisas e abuso de confiança. 32. João Mexia Alves: a. Exportação ilícita de capitais.

Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo do Conselho da Revolução, Reuniões, Documentos apresentados ao CR, caixa n.º 1, n.º 319,, Nota da Comissão de Análise e Inquérito encerrando a primeira fase dos trabalhos – Anexo E.

XXXVI

A NEXO I

XXXVII Tabela 1: Panorama geral da Sociedade Central de Cervejas em Dezembro de 1974 (em contos)

Designação/anos 1934 1948 1964 1965 1966 1967 1968 1969 1970 1971 1972 1973 1974 Capital social 100 100 10.000 170 000 - - - - 300 000 - - 550 000 550 000 Produção de cerveja (a) 5 9 35 39 - - - - 86 - - 158 177 Vendas 9 689 100 857 234 770 297 550 - - - - 628 350 - - 1 273 635 1 438 759 Pessoal (b) 760 800 886 903 - - - - 1 309 - - 1 934 2 211 Pessoal (encargos) 13 700 19 800 28 746 33 600 - - - - 91 187 - - 262 240 412 612 Participações financeiras (PF) - - 1 639 1 660 - - - - 93 285 - - 280 473 347 413 Rendimentos das PF ------1 211 1 559 923 2 265 1 105 Dividendos - - - 10 200 24 650 10 200 - 29 750 36 000 36 000 36 000 54 296 - Dividendos acumulados - - - 10 200 34 859 45 050 45 050 74 800 110 800 146 800 182 800 237 096 237 096 Resultados anuais - - - 31 084 46 265 48 338 27 596 43 391 87 938 75 584 78 062 92 392 -90 570 Resultados acumulados - - - 31 084 77 349 125 687 153 283 196 674 284 612 360 196 438 258 530 650 440 080 Ordenados e gratificações - - - 7 395 8 435 10 587 12 930 14 203 17 136 5 076 5 475 6 123 10 215 Gratificações especiais ------14 100 28 878 8 000 - Despesas confidenciais - - - 8 773 9 824 2 162 4 072 8 392 9 024 3 700 9 347 8 385 4 084 Total anual de remunerações - - - 16 169 18 259 12 749 17 002 22 595 16 160 2 .876 43 700 22 508 14 299 Remunerações acumuladas - - - 16 169 34 428 47 177 64 179 86 774 112 934 135 810 179 510 202 018 216 317

a) Milhões de litros. b) B) Efectivo. Fonte: Adaptado dos Relatórios da Comissão de Análise e Inquérito ao Grupo de que faz parte a Sociedade Central de Cervejas.

XXXVIII Tabela 2: Situação da indústria cervejeira em 1975

Capital + reservas Capacidade de produção Efectivos Volume salarial anual Localização Designação/empresa Início da actividade (1.000 contos) (milhões de litros) totais (1.000 contos) fabril CUFP 1889 261 65 876 120 Porto Copeja 1975 75 45 282 34 Santarém SCC 1934 846 240/18 2.607 407 Vialonga/Coimbra Cergal 1972 250 35 500 67 Belas Imperial 1975 95 20 273 35 Loulé Total do sector - 1.527 423 4.538 663 -

Fonte: Centro de Documentação 25 de Abril, Espólio Macaísta Malheiros, Legislação, Projectos de Leis, doc. n.º 27, Ministério da Indústria e Tecnologia? Diploma sobre a nacionalização do sector cervejeiro, Junho de 1975.

Tabela 3: Situação financeira do sector em 31 de Dezembro de 1974

Activo Passivo Empresas / elementos Capital + Reservas Dívidas a Bancos Disponíveis + realizável Total Curto prazo Longo prazo Total SCC 846 270 597 296 2 143 668 961 815 425 658 1 387 473 906 226

CUFP 260 939 100 207 666 298 87 408 194 836 282 244 194 836

Cergal 250 000 126 879 295 379 240 507 203 861 444 368 106 150

Copeja 75 000 10 652 204 455 67 412 51 896 119 308 50 000

Imperial 95 910 61 780 180 585 87 140 ? 87 585 11 680

Total 1 528 119 896 814 3 790 385 1 444 282 876 251 2 320 978 1 368 892

Fonte: Centro de Documentação 25 de Abril, Espólio Macaísta Malheiros, Legislação, Projectos de Leis, doc. n.º 27, Ministério da Indústria e Tecnologia? Diploma sobre a nacionalização do sector cervejeiro, Junho de 1975.

XXXIX

A NEXO J

XL Tabela 1: Rede de distribuição da cerveja - global

Designação / Zona de distribuição N.º de viaturas Efectivos Agentes empresa (c/ frota própria) utilizadas Lisboa 13 46 CUFP Porto 55 179 133 Total 68 225 Copeja Lisboa 20 62 31 Lisboa 140 480 1 por distrito; SCC Porto 43 91 exclusivos Total 183 571 para produtos SCC Lisboa 45 176 Cergal Porto 7 28 98 Total 56 220 Lisboa 30 106 Imperial Algarve 6 21 A definir Total 36 127 Totais - 363 1.205 -

Fonte: Centro de Documentação 25 de Abril, Espólio Macaísta Malheiros, Legislação, Projectos de Leis, doc. n.º 27, Ministério da Indústria e Tecnologia? Diploma sobre a nacionalização do sector cervejeiro, Junho de 1975.

XLI Tabela 2: Rede de distribuição da cerveja – Sociedade Central de Cervejas

Venda de cerveja (milhões de litros) Distribuidoras/distritos / designação N.º de pontos de venda N.º de viaturas Efectivos Nacionalização 1974 Previsão 1975 Aveiro (Vouga) 2 900 15 42 4,4 5,4 31% Beja (Cerbibel) 1 500 14 26 6,0 8,4 - Castelo Branco (Dibeira) 2 300 11 22 4,4 6,0 - Coimbra (Unacel) 4 000 30 77 7,6 11,3 50% Évora (Fomento Éborense) 1 900 14 45 6,8 8,6 - Faro (Cervisul) 3 400 24 78 12,6 16,3 100% Guarda (Arcorel) 1 900 7 14 2,9 3,5 5,2% Leiria (Sodicel) 4 400 32 64 9,8 13,7 - Pinheiro de Loures (Discer) 5 100 41 117 - - 52% Portalegre (Refrigel) 1 500 12 28 4,5 5,3 90% Santarém (Cervinal) 4 400 27 54 12,6 15,7 - Setúbal (Unicervi) 4 400 43 129 20,7 31,7 - Viseu (Cervinhal) 2 800 13 29 4,6 5,4 3,57% Braga (Vilope) 3 500 - - 0,7 (a) 1,9 - Bragança (Sedinorte) 1 200 5 10 1,1 (a) 3,7 - Vila Real (Sedental) 1 500 6 12 1,1 (a) 3,5 - Viana do Castelo (Sopigal) 1 110 4 8 0,7 (a) 1,9 - Total 7,7%

a) de Maio a Dezembro Fonte: Centro de Documentação 25 de Abril, Espólio Macaísta Malheiros, Legislação, Projectos de Leis, doc. n.º 27, Ministério da Indústria e Tecnologia? Diploma sobre a nacionalização do sector cervejeiro, Junho de 1975 Arquivo da Presidência do Conselho de Ministros, Caixa 393 EAD Processos Colectivos, Grupo de Trabalho Operacional para o estudo da nacionalização do sector de distribuição, 12/12/1975.

XLII

A NEXO K

XLIII Tabela 1: Listagem dos elementos que compõem a Comissão de Reestruturação do Sector Cervejeiro

Comissão de Reestruturação do Sector Cervejeiro (posse 19/02/1976) Manuel Pires

Amílcar Martins Representante do Ministério da Indústria e Tecnologia João Talone Américo Martins Armando Vieira Representante do Ministério das Finanças Luís Mattos Chaves Representantes dos trabalhadores Lousada Soares

Carlos Soares Catarino

XLIV

A NEXO L

XLV Tabela 1: Cronologia

Data Acontecimento 1833 Fábrica de Jacques Maillard. 1834 Fábrica da Cerveja Trindade. 1855 Michael Gerards & C.ª - Fábrica de Cerveja Jansen. 1872 Empresa de Cervejas da Madeira. 1878 Fábrica de Cerveja Leão. 1883 Fábrica da Piedade. 1890.07.03 Companhia União Fabril Portuense, SARL (fusão de seis fábricas cervejeiras da região do Porto – Fábrica Piedade , Fábrica do Melo, M. Achvek & C.ª, J.J. Chentrino & C.ª, J.J. Persival & C.ª, M. Schreck – e a Fábrica de Ponte da Barca. Lançamento da cerveja Cristal. 1892.05.04 Fábrica de Cervejas e Refrigerantes João de Melo Abreu. 1903 É constituída a Companhia Portuguesa de Cervejas, na qual entra a Fábrica Leão. 1912.03 Germânia, Lda (ex-Companhia de Cervejas; após incorporação da Fábrica Leão). 1916 Portugália (ex-Germânia). 1919 Sociedade de Cervejas, Lda, posteriormente denominada Companhia de Cervejas Estrela. 1921 Após construção da malteria, a Portugália passou a denominar-se Companhia Produtora de Malte e Cerveja Portugália (ex-Portugália). 1922 É criada a Empresa Produtora de Garrafas pela Companhia Produtora de Malte e Cerveja Portugália. 1922.03 Companhia de Cervejas de Coimbra . 1923 Entrada em circulação, pela Companhia de Cervejas Estrela, dos carros de distribuição puxados por muares. 1925 É criada a Cervejaria Portugália. 1926 Prémios internacionais no Grand Prix. 1927 Lançamento da Super Bock, pela CUFP. 1930 Convénio de concertação de preços e de informação técnica entre as empresas. 1934.06.21 Concentração das empresas cervejeiras na Sociedade Central de Cervejas, com excepção da CUFP e das indústrias existentes nas ilhas. A Fábrica Trindade desmantelada e Jansen cessa fabrico. Distribuição do capital: Portugália, 40,9%; Estrela, 40,9%; Jansen, 10,2% e Coimbra, 8%. 1934.07 Primeiro Conselho de Administração: António Marques de Freitas (Portugália), Camilo Infante de la Cerda (Jansen), Cândido Sotto Mayor (Coimbra), Estolano Dias Ribeiro, José Maria Dias Ferrão e M. H. de Carvalho, Lda (Estrela). 1936.05 A Fábrica de Cerveja Jansen é encerrada. 1939 CUFP celebra os seus primeiros contratos de “exclusive dealing” com alguns cafés e restaurantes. 1940 Lançamento da cerveja Sagres, pela SCC. 1940 Lançamento da cerveja Nevália, criada para o período de guerra. 1941 Lançamento da cerveja Vitória, pela CUFP. 1941 Lançamento da cerveja Imperial, pela SCC

XLVI 1943 Início da exportação de cerveja para os cenários de guerra e para as colónias. 1946 Humberto Pelágio, em representação da Companhia de Cerveja Coimbra, preside a administração da Sociedade Central de Cervejas até à sua morte, em 1967. 1947 SCC entrou no capital social da CUFP (51%). 1947 É iniciado o plano de reapetrechamento da CUFP. 1947.03.20 CUCA – Companhia União de Cervejas de Angola, SARL (com capital da SCC e CUFP). 1950 Reapetrechamento sectorial, modernização tecnológica e expansão técnica. 1950.08 É constituída a Companhia MacMahon, em Moçambique. 1951 Escola de Tiradores de Cerveja (SCC). 1952.02 Iniciou-se o processo de reorganização na SCC, animado por Caetano Beirão da Veiga. 1953 É iniciada a construção da nova malteria da Portugália, por uma equipa liderada por Sebastião de Oliveira (engenheiro da SCC), com apoio de Vitória Pires, subsecretário de Estado da Agricultura 1953 Constituiu-se a Fábrica de Cerveja Reunidas de Moçambique (produção da cerveja Laurentina), resultante da fusão de duas fábricas de Lourenços Marques (Vitória e Dicca). 1954 A SCC requereu a adesão à EBC – European Brewery Convention. 1954.08.30 1º Curso de Tiradores de Cerveja (SCC) 1955 Criação do boletim Cerveja, pela SCC. 1955 Iniciou-se o plano de valorização da cultura cerealífera para o sector cervejeiro, sob a orientação do subsecretário de Estado da Agricultura, Vitória Pires, com a colaboração dos serviços oficiais do Estado, organismos internacionais (Barley Committe da EBC) e das empresas. É iniciada a criação de campos experimentais de cevadas dísticas pelo país. 1955.06 1ª Reunião de Agentes e Sub-agentes da SCC 1955.09 Constituiu-se a Fábrica de Cervejas da Beira, em Moçambique. 1956 Iniciou-se a laboração da nova malteria da Portugália. 1956 É renovada a fábrica da Estrela. 1956.02.20 Primeira autorização do condicionamento industrial à construção de nova fábrica de cerveja, concedida a José Joaquim Gonçalves de Oliveira (Nacerel; incorporada na CUFP em 1961) 1956.05.14-21 I Congresso da Cerveja, na Câmara do Comércio – Associação Comercial de Lisboa. 1957 Prémio internacional da EBC nas cevadas ensaiadas Aurora e Beka. 1957 A SCC estabelece pareceria com a Schweppes. 1958 Prémio internacional da EBC nas cevadas ensaiadas Aurora e Beka. 1958 Início da comercialização da Pepsi Cola pela SCC, suspensa 5 dias depois. 1958 Reorganização comercial da SCC. 1958.05.16 Primeira classificação da cerveja Sagres na classe de cervejas Dortmund no Concurso Internacional de Gand. 1959 A Companhia de Cervejas de Coimbra iniciou o seu reapetrechamento, culminando na criação da nova fábrica na zona do Loreto. Especializa-se nas marcas regionais Onix e Topázio. 1960 Prémio internacional da EBC nas cevadas ensaiadas Aurora e Beka. XLVII 1960 A SCC comprou a Água do Luso. 1960 A SCC e a CUFP participaram na constituição da Companhia de Iniciativas Económicas Ultramarinas. 1960.09.08 Despacho ministerial de Ferreira Dias sobre a reorganização sectorial da indústria cervejeira, propõe a concentração com vista à exportação. 1961 AICP – Associação da Indústria Cervejeira Portuguesa. 1961 Organizadas pela Sociedade Central de Cervejas, realizam-se as I Jornadas de Cevada. 1961 A SCC aderiu à EBIC – EFTA Brewery Industry Council e à EFTA Brewers Working Party (EBWP) 1963 Início das campanhas publicitárias da SCC, marcada pelo slogan “Cerveja Sagres, a sede que se deseja”, criado por Ary dos Santos, 1963 É criada a Lupulex. 1964 Diagnóstico do sector cervejeiro, realizado no âmbito do Relatório Preparatório do Plano de Investimentos para 1965-67. 1964.09.28 É inaugurada a fábrica de cerveja da CUFP na Leça do Balio. 1965 A exploração das associadas da SCC passa a ser exercida directamente pela SCC, com distribuição de resultados aos accionistas sob a forma de dividendos. Início dos projectos de construção de uma nova fábrica, liderados por Caetano Beirão da Veiga. 1965 A SCC associou-se à Skol International. 1965 A SCC adquiriu participação na Empresa de Cervejas da Madeira, Lda e na Fábrica de Cervejas e Refrigerantes João de Melo Abreu, Lda. 1965 É criado o “Gabinete de Estudos João Talone”, com o objectivo de desenvolver projectos para o sector cervejeiro. 1965 Lançamento da cerveja Balla e Da Gama (esta para exportação), pela CUFP. 1966 É criado o Gabinete de Exportação, numa associação entre a SCC e a CUFP. 1967 A SCC funda a Cinevoz (empresa de publicidade). 1968 A posição da SCC na Empresa Produtora de Garrafas evolui para a constituição da CIVE – Companhia Industrial Vidreira, SARL (agrupamento Empresas Produtora de Garrafas, a Guilherme Pereira Roldão, a IVIMA e a CRISAL). 1968.03.19 Despacho ministerial de Rogério Martins que consubstancia a abertura do condicionamento industrial no sector. 1968.06.22 Foi inaugurada da fábrica de Vialonga (com fachada projectada por Eduardo Nery), pertencente à SCC. 1968.06.22 Foi inaugurada a fábrica de cerveja de Vialonga 1968.07.17 Concedido alvará a uma sociedade liderada pela Supersumos para instalação de unidade fabril de cerveja e refrigerantes. 1969 Carlos Moreira Rato é eleito presidente do Conselho de Administração da SCC. 1969 Lançamento da cerveja Coral, pela Empresa de Cervejas da Madeira. 1969.08.27 É constituída a Cergal – Cervejas de Portugal, SARL. 1970 A Cergal estabeleceu um contrato de assistência técnica com a Mahou, SA (capital espanhol). 1970 A SCC adquiriu participação na empresa Adegas Camillo Alves, e aumentou a participação no capital social da Água do Luso. 1971 Entrou em funcionamento o Entreposto n.º 1, no Prior Velho XLVIII 1971 A SCC adquiriu a Empresa de Águas Alcalinas e Medicinais de Castelo de Vide e importante participação na Gelex. 1971 Organização de Encontros de Técnicos Cervejeiros, pela SCC. 1972 É inaugurada a rede de distribuição da Super Bock em Lisboa. 1972 A SCC tomou posição na empresa de plásticos Síntex. 1972 A capacidade produtiva da Companhia de Cervejas de Coimbra (Fábrica n.º 2) é ampliada para 10 milhões de litros de cerveja. 1972 Entrou em funcionamento o Entreposto Comercial n.º 3, no Porto. 1972 Acordo entre a SCC e a CUFP e a The United Breweries, passando a Carlsberg a ser comercializada pela primeira e a Tuborg pela CUFP. 1972 Participação da SCC e da CUFP no capital da CICER – Companhia de Cervejas e Refrigerantes da Guiné. 1972 A SCC adquiriu posição na Cervejarias Reunidas Skol-Caracú (Brasil), após cedência de posições com a Skol International. 1972.01.24 Por despacho ministerial, é deferida a constituição de uma unidade fabril de cerveja, ao proponente António Vítor de Almeida Saraiva (representando a Interbrew e Heineken). Constituiu-se, deste modo, a Copeja – Companhia Portuguesa de Cervejas. 1972.08 Inicia-se a comercialização da cerveja Cergal. 1972.08 Inicia-se a comercialização da cerveja Cergal. 1972.10 Constituição da Sogere – Sociedade Geral de Cervejas e Refrigerantes de Moçambique, que agrupou a MacMahon, a Fábrica da Beira e a Fábrica de Cerveja Reunidas de Moçambique. 1972.11.29 São deferidos os pedidos de instalação de unidades fabris de cerveja a José Nunes Rodrigues e à Refriplás. 1973 É constituída a Parfil pelos principais accionistas da SCC, com o objectivo de gerir as participações nas outras empresas do grupo. 1973 SCC apta a ser cotada na Bolsa. 1973.05.16 A Refriplás e José Nunes Rodrigues concentraram-se numa única unidade, constituindo a Imperial – União Cervejeira Portuguesa. 1974.01 Inauguração da fábrica da CICER em Bissau. 1974.09 A Comissão de Trabalhadores da Cergal criou o órgão de comunicação A Luta. 1974.10 Diagnóstico da Empresa, elaborado por um grupo de trabalhadores da SCC. 1974.10 Bernardo Mendes de Almeida (Conde de Caria), administrador da Cergal, é preso na sequência do 28 de Setembro. 1975 Lançamento da cerveja Clok. 1975 Entrou em funcionamento a fábrica do Catujal, passando a produzir os refrigerantes da SCC. 1975.01.30 Entrega-se as propostas resultantes do diagnóstico dos trabalhadores. 1975.01.31 É iniciado o processo reivindicativo na SCC, com a ocupação da empresa e realização de um plenário de trabalhadores, com a supervisão de elementos do MFA. A Comissão de Trabalhadores divulgou o caderno reivindicativo com 19 pontos. 1975.02.07 A Comissão de Trabalhadores da Cergal participou na manifestação anti-Nato. 1975.02.08 É realizado um novo plenário na fábrica de Vialonga, que aprovou a moção que defende a nacionalização da empresa. XLIX 1975.08.14 Iniciou-se a luta dos trabalhadores da Imperial, em Loulé. 1975.02.10 A Comissão de Trabalhadores do Prior Velho (sector comercial) contestou a decisão tomada no plenário de 8 de Fevereiro, defendendo a via negocial, ao invés da nacionalização. A Administração da SCC lançou um comunicado repudiando as acções tomadas pela Comissão de Trabalhadores, que se reproduziam na imprensa. Seguiu-se uma guerra aberta de comunicados entre o Conselho de Administração da SCC e a Comissão de Trabalhadores, que preencheu as páginas dos jornais durante o mês de Fevereiro. Na Cergal, os trabalhadores paralisaram o trabalho na sequência da visita de militares da Nato à fábrica. 1975.02.20 É nomeada a Comissão de Análise e Inquérito ao grupo SCC, pela Junta de Salvação Nacional. 1975.03.01 Realização do plenário de Sacavém, que reitera as reivindicações e estipula a data de 6 de Março para uma resposta do Conselho de Administração. 1975.03.12 As Comissões de Trabalhadores de Vialonga, Trindade, Sede e Coimbra enviaram um telegrama à Junta de Salvação Nacional apoiando a “acção enérgica do MFA na luta contra a reacção”. 1975.03.13 Miguel Sttau Monteiro, ex-administrador da SCC concedeu uma entrevista à Vida Mundial. 1975.03.20 A Comissão de Trabalhadores enviou uma exposição ao Conselho da Revolução sobre a situação da empresa, solicitando a intervenção do Estado através da nomeação de uma comissão administrativa. 1975.03.21 É nomeada uma Comissão Administrativa para a SCC pelo Conselho da Revolução, sob a liderança do capitão-tenente Silva Nunes. Na CUFP a gestão é assumida por um Conselho Executivo, constituído por dois administradores: João Talone e Alberto Martins da Fonseca. 1975.04.10 Numa notícia publicada pelo Diário Popular, Artur Luís Alves Conde é associado às ligações neocolónias de Manuel Vinhas e às fraudes encontradas no decorrer da investigação levada a cabo pela Comissão de Análise e Inquérito. 1975.04.12 Novo plenário dos trabalhadores da SCC, que apelou ao afastamento de Artur Luís Alves Conde do cargo governamental. 1975.04.14 O Diário de Lisboa publicou uma notícia que associava Manuel Vinhas, ex- administrador da SCC, aos golpes contra-revolucionários de 28 de Setembro de 1974 e de apoio ao 11 de Março. 1975.05/06 Um grupo de trabalhadores da SCC publicou o documento «Sobre o Controlo Operário na Sociedade Central de Cervejas». 1975.05.07 Reunião com os representantes das indústrias cervejeiras, em Lisboa, para discutir o situação sectorial. 1975.05.13 Por despacho do Conselho da Revolução, são congelados os bens móveis e imóveis de Miguel Sttau Monteiro, Caetano Beirão da Veiga, Manuel Pereira Martins, Manuel Carvalho Martins e Mário Vinhas. 1975.05.15 Reunião do Secretariado das Comissões de Trabalhadores do Sector Cervejeiro, nas instalações da CUFP. 1975.07.30 A Comissão de Análise e Inquérito procedeu à entrega dos relatórios conclusivos junto do Conselho da Revolução e do Ministério da Indústria e Tecnologia.

L 1975.08.06 Os relatórios da Comissão de Análise e Inquérito são entregues às Comissões de Trabalhadores. 1975.08.06 O Ministério da Indústria e Tecnologia realizou o Estudo da Nacionalização do Sector Cervejeiro (Indústria e Distribuição). 1975.08.20 Num telegrama enviado pelo governador do Distrito do Funchal ao ministro do Comércio Interno, é comunicado o descontentamento dos trabalhadores face às notícias da nacionalização da empresa. 1975.08.30 A indústria cervejeira portuguesa é nacionalizada pelo D.L. n.º 474/75, exceptuando as participações estrangeiras. 1975.09.04 No plenário dos trabalhadores da Empresa de Cervejas da Madeira é criticada a nacionalização da empresa. 1975.09.14 Novo plenário da Empresa de Cervejas da Madeira, reiterando o descontentamento da nova medida. 1975.19.27 É nomeado, por despacho do Ministério do Comércio Interno, um grupo de trabalho operacional com vista ao estudo da nacionalização do sector de distribuição da indústria cervejeira. 1976.02.19 São iniciados os trabalhos da Comissão de Reestruturação do Sector Cervejeiro, 1976.07.06 Reunião entre a Comissão de Reestruturação do Sector Cervejeiro e o Ministério da Indústria e Tecnologia, resulta na orientação do MIT no sentido de reestruturação em Empresa Única. 1977.01.09 Reunião do Conselho de Ministros, onde é discutido o Projecto de Decreto-Lei que nacionalizava as distribuidoras, sendo rejeitada a sua aplicação. 1977.06 A Presidência do Conselho de Ministros aprovou uma Resolução (n.º 140/77) que, desconsiderando o relatório final da Comissão de Reestruturação do Sector Cervejeiro, criou, sob a tutela do Ministério da Indústria e Tecnologia, a empresa pública Central de Cervejas, EP e a União Cervejeira, EP. 1977.12.30 É criada, pelo Decreto-Lei n.º 531/77, a Centralcer - Central de Cervejas, EP englobando a Sociedade Central de Cervejas e a Cergal, e a Unicer, EP, que incorpora a CUFP, a Imperial e a Copeja.

LI