A Construção Da Rebeldia No Jogo Persona 5
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SBC { Proceedings of SBGames 2019 | ISSN: 2179-2259 Culture Track { Full Papers A Construção da Rebeldia no Jogo Persona 5 Ana Raquel R. Aguiar, Ricardo Jorge de L. Lucas Glaudiney Moreira Mendonça Junior Departamento de Comunicação Instituto UFC Virtual Universidade Federal do Ceará Universidade Federal do Ceará Fortaleza, Ceará Fortaleza, Ceará [email protected], [email protected] [email protected] Resumo— Esse trabalho busca analisar a construção da abril de 2017. Ele foi escolhido porque, nos últimos três rebeldia no jogo Persona 5, lançado em 2016 no Japão e em jogos da franquia Persona, toda a história era desenvolvida 2017 no Ocidente, através de uma análise narrativa e em torno de um tema específico. Em Persona 5, esse tema arquetípica. Primeiramente, é feito um estudo de como uma foi a “rebeldia”. narrativa pode ser construída e que elementos são essenciais. O jogo se passa em Tóquio, Japão, onde o jogador Em seguida, são listados os arquétipos mais importantes no interpreta um adolescente do segundo ano do ensino médio âmbito geral e os mais específicos para esse artigo. Na que foi injustamente preso por tentar evitar que uma análise, procuramos responder como o rebelde é apresentado mulher fosse assediada por um político influente. Por no início do jogo, os momentos em que é mais evidente e se é causa disso, ele foi expulso da escola antiga em que criada uma imagem positiva ou negativa durante partes do estudava no interior. Ao ir para Tóquio, em liberdade jogo. condicional, vai morar com Sojiro Sakura, dono de um Palavras-chave - Arquétipo; Narrativa; Persona 5; Rebeldia café, e estudar na Shujin Academy. Durante um sonho, o protagonista é convocado a um lugar chamado Velvet Room, onde encontra um I. INTRODUÇÃO personagem chamado Igor, que lhe dá acesso a um Passou-se o tempo de quando jogos eram restritos ao aplicativo de celular chamado Metaverse. No dia seguinte, entretenimento e à experiência lúdica. Muitos se a caminho da nova escola e, com o colega Ryuji adaptaram a outras mídias (quadrinhos, séries, filmes), se Sakamoto, são enviados a um castelo e, ao adentrar, tornaram uma forma de tratamento na “gameterapia” descobrem que é do professor de educação física deles, (utilização de jogos na área da saúde e reabilitação), além Kamoshida. do mercado de trabalho ter crescido com a ascensão dos e- Pouco tempo depois, descobre-se que esses lugares, sports (esportes eletrônicos). chamados palaces, são de origem cognitiva e são criados Videogames também estão se tornando cada vez mais quando há algum desejo e memória corrompidos ou um objeto de pesquisa, mas ainda de uma forma limitada. distorcidos. Além disso, se o tesouro desses palaces for Depois de um levantamento bibliográfico, percebemos que roubado, uma mudança ocorrerá em seu dono, que a maioria dos estudos de jogos eletrônicos na academia assumirá a culpa pelos atos errados que praticou. Com envolvem os jogadores [1, 2, 3]. isso, o jogador e outros estudantes formam o grupo Os exemplos mais comuns encontram-se no uso de intitulado “Phantom Thieves”, com o objetivo de acabar jogos para a saúde e a educação, mostrando seus com a corrupção da cidade e reformar a sociedade. benefícios: seu auxílio no desenvolvimento cognitivo de O trabalho procura responder algumas perguntas: Que crianças [4], sua contribuição na realização de atividades elementos foram utilizados para a construção e o físicas [5], sua utilização para ensinar algum conteúdo desenvolvimento do arquétipo do rebelde no jogo? Como específico, como aprender regras de futebol jogando um identificar esse arquétipo na narrativa? Que personagens videogame desse esporte [6]. podem ser considerados rebeldes? Esse rebelde é visto de Porém, alguns trabalhos analisam seu efeito oposto: a forma positiva ou negativa ao longo do jogo? relação entre jogos e violência. Muitos estudos da área de Para isso, o artigo responderá as perguntas através da psicologia pesquisam se jogos com maior dose de narrativa e da arquetipia em certas partes do jogo. violência podem proporcionar comportamentos agressivos [7]. Com menos frequência, aparecem as pesquisas que II. ELEMENTOS DA NARRATIVA relacionam videogames e cinema, sobre como as narrativas A narrativa está presente em todos os momentos da se conectam e se influenciam, entre outros exemplos [8]. nossa vida. Segundo Porter [10], o ser humano se envolve Para além dos estudos de recepção, aparecem estudos inconscientemente com a narrativa tão frequentemente e específicos sobre jogos e seus gêneros. Esses estudos facilmente que se tornou seu direito nato. podem focar em análise comparativa de gêneros de A narrativa pode ser construída de diversas maneiras, e videogame, um gênero específico e na comparação dos o modo que ela é construída afeta as nossas ações e principais jogos desse gênero. Há até casos de análise de reações. Por exemplo, é mais provável que uma pessoa um único jogo, muitas vezes focando em algum elemento sinta tristeza ao ouvir “o menino tropeçou e torceu o pé” (design de personagem, história, estereótipos, música, do que “o menino tropeçou, mas não caiu”. entre outros). Um dos métodos mais usados para se elaborar uma Este artigo, derivado do estudo [9], encaixa-se no história é a estrutura em três atos: começo, meio e último caso. Será analisado o jogo Persona 5, lançado em desfecho. No começo, introduz-se a história, personagens, XVIII SBGames { Rio de Janeiro { RJ { Brazil, October 28th { 31th, 2019 637 SBC { Proceedings of SBGames 2019 | ISSN: 2179-2259 Culture Track { Full Papers espaço e tempo até o ponto onde se inicia algum conflito; do presente e futuro (flashforward ou prolepse), podendo no meio, apresentam-se ações que os personagens fazem coexistir numa mesma história. para sair do conflito, sendo, normalmente, a maior parte da A distância indica se o espaço temporal (geralmente história; no desfecho, é onde ocorre o embate final, o analepses e prolepses) do trecho em questão se encaixa na clímax, o fim do conflito e as consequências que esse narrativa principal. Se sim, é considerada interna, se não, é conflito causou de forma geral na história. considerada externa. Para complementar a narrativa, são usadas algumas O alcance diz respeito sobre o quanto a direção é técnicas, como o suspense e a surpresa [10, p. 57]. A “esticada”: alcances pontuais cobrem um evento em história passa por momentos de alta tensão e de baixa particular, enquanto alcances completos cobrem um grande tensão de forma equilibrada, para que o consumidor se e completo período. Por exemplo, há um caso de analepse interesse pela história, mas sem sobrecarregá-lo com na história onde um personagem precisa explicar o que excesso de informação. Em finais de episódios de séries e aconteceu no dia anterior: se o personagem apenas contar animações, por exemplo, podem acabar no chamado como foi seu almoço, seria um caso de alcance pontual; se cliffhanger: alguma ação é cortada no meio de sua ele contar o dia inteiro, de quando acordou até quando realização e se torna uma chamada para o próximo dormiu, é um caso de alcance completo. episódio, devido ao suspense causado no espectador. Em relação ao foco em primeira pessoa, Herman e Porter [10, p.13] define narrativa como “a Vervaeck [11, p. 80] dividem os tipos de narradores em representação de um evento ou de uma série de eventos”. duas categorias: nível e envolvimento. Quanto ao nível, o Apesar de não existir um consenso entre autores de que um narrador pode ser extradiegético (conta a história de um evento é o suficiente para que se haja uma narrativa, ou se ponto mais distante, observador) ou intradiegético (conta a os eventos existentes precisam ser relacionados ou não, história ao mesmo tempo que se inclui nela). Quanto ao uma narrativa precisa de uma história (o que é contado) e envolvimento, há narradores heterodiegéticos (não teve um discurso (como esses eventos são contados). No experiência do que está narrando) e homodiegéticos (teve entanto, não importa como a narrativa é construída, esses experiência do que está narrando). elementos estão sempre presentes: espaço, tempo, foco em Ainda há outros pontos para se considerar em relação primeira pessoa e personagem. ao narrador: ele pode ser “covert” (evita usar a primeira A escolha do ambiente em que ocorrerá a história é pessoa e frequentemente faz uso de citações) e “overt” essencial para seu desenvolvimento, mas é preciso tomar (mais uso de paráfrase e se referenciando em primeira cuidado para não entrar em contradição. Por exemplo, em pessoa), além de poder ser confiável ou não (unreliable condições normais, não faria sentido dizer que um narrator), dependendo do quão contraditório parecem ser personagem estava passeando pelo Brasil à tarde para suas histórias. Um exemplo de narrador não confiável aparecer na China à noite, a menos que alguma conhecido é o Bentinho, da obra “Dom Casmurro” de justificativa tenha sido dada anteriormente. Machado de Assis, que narra a história do seu ponto de Porter [10, p.169] afirma que toda narrativa tem, ao vista evidentemente repleto de paranoias. menos, dois mundos: aquele onde os personagens estão e Já os personagens são definidos por Porter [10, p. 230] os eventos ocorrem, e aquele onde a narração ocorre. como entidades humanas ou com a psiquê humana que Muitas vezes, o segundo mundo é oculto. Há casos em que estão envolvidos na ação, sendo muitas vezes, os autores esses dois mundos se encontram, e acontece a chamada dessa ação. O autor inclui animais, robôs, extraterrestres e metalepse narrativa. coisas animadas nessa definição. Em relação ao tempo, é necessário mostrar a diferença Field afirma que são justamente as ações que definem o entre tempo narrado (narrated time) e tempo de narração personagem [12]. Mesmo que dois personagens possuam (time of narration) [11, p. 63]: tempo narrado é o tempo da objetivos idênticos, as ações que irão realizar para história, enquanto tempo de narração é o tempo que se leva conquistar seu objetivo podem ser diferentes de acordo para narrar a história.