1240

A RENUNCIA DE JÂNIO QUADROS NAS PÁGINAS DOS JORNAIS ÚLTIMA HORA (PORTO ALEGRE) E A RAZÃO (SANTA MARIA). Tamiris Carvalho Mestranda em História do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Santa Maria Email: [email protected]

Carlos Henrique Armani Professor Orientador da Universidade Federal de Santa Maria Email: [email protected]

RESUMO: Este artigo apresenta como os jornais abordaram o impacto da renuncia de Jânio Quadros, em agosto de 1961, nos jornais Última Hora de Porto Alegre e A Razão de Santa Maria. O Última Hora apresentando como alguns países e seus lideres reagiram frente a este momento político no Brasil, já no jornal A Razão são reportagens mais interioranas, mostrando como foi a reação no município e como os vereadores, prefeito entre outros reagiram frente a este momento histórico.

PALAVRAS-CHAVE: Campanha da Legalidade; A Razão; Última Hora.

REFLEXÃO TEÓRICA. O presente projeto está inserido na linha de pesquisa Integração, Política e Fronteira do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Santa Maria, que compreende questões referentes à história política. O estudo conceitual do político visa analisar os sistemas de representações que comandam a maneira pelo qual, uma época, um país ou grupos sociais, conduzem sua ação e encaram seu futuro. Dentro dessa linha, a história das ideias analisa “a imprensa, e os movimentos de opinião, os panfletos e os discursos de circunstâncias, os emblemas e os signos” (ROSANVALLON, 1995:09). Esta perspectiva vem ao encontro de nosso projeto que analisará os discursos produzidos na sociedade de Porto Alegre e Santa Maria, em resposta ao movimento legalista. Este trabalho contribuirá para o avanço científico, pois entendemos que existem algumas lacunas referentes a esse tema. Levando em conta esse fator, percebemos que não existem trabalhos que tratem especificadamente desta região, nem da história dos discursos políticos sobre esse tema. Primeiramente realizamos uma breve análise histórica da história política, apresentando as críticas que a mesma sofreu e o seu retorno a partir dos anos de 1970. Nas tendências historiográficas contemporâneas, os historiadores questionam 1240 1241

paradigmas referentes ao papel do Estado, ao sentido dos conceitos como Pátria, Nação e identidade nacional, assim como o significado do político, enquanto dimensão que afeta o cotidiano. Desta forma, ao destacar o cotidiano e as relações sociais, mais que narrar o passado, o historiador considera-se como agente modificador da sociedade, alimentando as discussões sobre as diferentes manifestações coletivas no campo político. Além disso, a racionalidade instrumental deixou de ser eixo explicativo das ações humanas, o que levou os historiadores a romperem com os paradigmas de cientificidade com base em uma racionalidade, puramente objetiva, em crise desde o final do século XIX. Todas essas transformações possibilitaram uma renovada história política, desde o abandono da história tradicional em 1929, até a retomada do interesse pelo político em 1970. René Remond (1994) e Jacques Julliad, (1988), são autores que representam essa retomada do político, onde possibilitaram o alargamento do campo da história política, devido à interdisciplinaridade, pois utilizaram-se de outras áreas do conhecimento para se ter uma melhor compreensão da mesma. Ampliou-se o entendimento do político que pôde ser compreendido como o comportamento dos cidadãos responsáveis por seus rumos. A história do político recebeu influências da psicologia social, da ciência política, da linguística e da filosofia, sendo que o seu casamento com a antropologia trouxe à luz uma história dos costumes. Como se percebe, houve uma mudança na forma de pensar história, com novos objetos de estudo, que não apenas os fatos políticos tradicionais ligados ao Estado, brindando-lhes um olhar diferenciado. No Brasil, essa história constituída por acontecimentos associados aos grandes líderes e às questões do Estado, marcada pela linearidade e pelos critérios positivistas, marcou boa parte da historiografia até a década de 1960, claro que tivemos algumas exceções como Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Florestan Fernandes que em suas obras trazem um olhar diferenciado para a sociedade em relação a política. Jacques Julliard, em 1974, foi um dos historiadores a pedir a reversão desse quadro e apontou os vícios e defeitos de que era acusada a história política, A história política é psicológica e ignora condicionamentos: é elitista, biográfica mesmo, e ignora a sociedade global e as massas que a compõem; é qualitativa e ignora o serial; visa o particular e ignora a comparação; é narrativa e ignora a análise; é materialista e ignora o material; é ideológica e não tem disso consciência; é parcial e não sabe o que é; atém-se ao consciente e ignora o inconsciente; é pontual e ignora o longo prazo; numa palavra, porque esta palavra resume tudo na gíria dos historiadores é factual. Em suma, a história política confunde-se com a visão ingênua das coisas, visão que atribui a causa dos fenômenos ao seu agente mais evidente, mais elevado na escala, e que avalia a sua importância real de acordo com a repercussão na consciência imediata do espectador. (JULLIARD, 1988:57).

Julliard lembra que a história política “não desapareceu, sob a forma narrativa, 1242

bigráfica e psicológica, ela continua a representar, quantitativamente, uma fração importante, possivelmente dominante da produção livresca” (1988:181). Por algum tempo ela deixou de produzir uma problemática e de trazer a luz trabalhos inovadores. René Remond, também apresenta suas críticas, que a história política sofreu. “Ela reunia todos os defeitos contra os quais as novas gerações de historiadores desejavam definir-se, reagindo a uma negligência demasiado prolongada dos historiadores mais velhos frente às outras realidades não menos importantes...” (1994:04). Porém, há uma retomada na história política que René Rémond chama de “retorno do político”, o próprio autor não gosta deste termo,

porque ela faz pensar que se trata de uma volta atrás ou de uma restauração, quando na verdade trata-se de algo bem diferente, de uma outra história, que se beneficiou do enriquecimento de todas as gerações anteriores e trouxe, não resta dúvida, o político para a frente do palco (RÉMOND, 1994:04).

Julliard ainda propõe que pensemos a volta do político ligada ao seu crescimento nas sociedades modernas definindo “a história política como a história da intervenção consciente e voluntária dos homens em todos os domínios onde são resolvidos os seus destinos, uma extensão do papel e do campo de aplicação do político” (1988:183). O autor acrescenta que os meios de comunicação modernos e as informações tornam imediatamente político um grande número de acontecimentos, onde estes ganham uma repercussão pública enorme. Seguindo Julliard nos coloca que o “o historiador político deverá fazer cada vez mais apelo ao longo prazo” (1988:187), ou seja, devemos trabalhar com a permanência e não apenas com a mudança. E também não devemos considerar esse tempo homogêneo, mas sim “reunir por meio da comparação, os elementos de uma estrutura que o acontecimento oculta, atrás de singularidade” (JULLIARD, 1988:186). Essa abertura, ou melhor, a renovação da história política permitiu o surgimento de novos objetos como já mencionamos. Podemos citar a geografia eleitoral, a opinião pública, a imprensa, os discursos entre outros objetos, a partir de diversas fontes. Nesse caso utilizaremos como fonte os jornais. A construção do inimigo foi algo recorrente, é possível perceber em alguns jornais Última Hora dos primeiros dias da Campanha da Legalidade onde já criava-se a ideia de que o Brasil poderia vir a ser um inimigo. Devido à relação que havia entre Fidel Castro e Jânio Quadros, que eram considerados “melhores amigos”, o que para o EUA era motivo de alerta em certos círculos norte-americanos. Brizola tomou a posição de líder para que a Constituição fosse validada, com isso contou com seu carisma, que aderiu milhares de pessoas em torno da Praça da Matriz, em Porto Alegre, durante a Campanha da Legalidade. Havia uma lealdade entre ele e seus 1242 1243

seguidores, porque até mesmo em outros municípios do estado do houve mobilização, através do rádio Brizola também se fez ser ouvido pela população gaúcha. A seguir traremos como os jornais abordaram a renuncia de Jânio Quadros e a forma como essa notícia repercutiu nos jornais Última Hora (Porto Alegre) e A Razão (Santa Maria).

Os Jornais. Os jornais escolhidos foram Última Hora de Porto Alegre e A Razão de Santa Maria, por serem fontes que abordaram a Campanha da Legalidade em suas páginas e trazem os discursos que foram produzidos durante este período e por se tratar de um jornal de circulação na capital do Estado e outro no município, mais regional. Portanto, foram fontes que delinearam o projeto de mestrado. A seguir trataremos um breve histórico dos jornais, tendo em vista que o projeto se encontra em andamento, ainda não realizamos a analise das fontes, mas sim o levantamento das mesmas. O jornal Última Hora foi criado em 1951, no Rio de Janeiro, pelo empresário Samuel Wainer, o mesmo foi criado com o apoio do então presidente na época Getúlio Vargas, este seria um jornal de apoio ao governo. O jornal foi então, o porta-voz do governo, através dele medidas, programas e ideias do governo circulavam, mostrava-se alinhado ao presidente. Em 1952, foram abertas edições regionais, em outras localidades do país. Primeiro foi criado à edição em São Paulo, logo depois no Paraná, e em 1958 em Porto Alegre. O jornal criado na capital gaúcha era partidário, foi criado inicialmente como experiência em formato tabloide, enquanto os outros eram em formato “standard”. Segundo Jefferson Barros (1999), “o Última Hora gaúcho foi a mais radical das Últimas Horas”, inclusive a ponto de discordar das orientações que Samuel Wainer dava à rede nacional. Um exemplo foi a posição que o Última Hora gaúcho tomou frente à renúncia do presidente Jânio Quadros em 1961, onde o jornal apoiou a posse de Jango, enquanto a orientação nacional era acatar o parlamentarismo. O Última Hora gaúcho rejeitou o parlamentarismo e posicionou-se a favor na posse de Jango e manifestou-se editorialmente. Por tomar atitudes ousadas o jornal adquiriu certa autonomia. Segundo Jefferson Barros (1999:55), durante a Campanha da Legalidade liderada por Brizola para garantir a posse de João Goulart, o UH gaúcho tomou posição clara, não questionando a posse do então vice-presidente. Jango era tratado, nas notícias, como o “novo presidente”. O que garantiu ao jornal uma consolidação de tiragem.

O sucesso de vendas se consolidou com a oposição do jornal ao governo de Ildo Meneghetti em 1963, mas sofreu sérias represálias em 1964 com o golpe militar. Wainer 1244

só vendeu o jornal em 1972, após o endurecimento da repressão e a censura do Ato Institucional Nº 5 que tornou inviável a permanência do jornal. O jornal A Razão de Santa Maria, foi fundado em 9 de outubro de 1934, pelo jornalista Clarimundo Flores. Em 1943, o jornal passou a pertencer à Cadeia de Diários e Emissoras Associados, de propriedade de Assis Chateaubriand. Em 1982 o jornal foi adquirido pelo jornalista Luizinho de Grandi, com a sua morte em 1988, sua esposa Maria Zaira de Grandi assumiu a direção do jornal. Em 1961, o jornal A Razão noticiava a incompatibilidade do governo Jânio/Jango. Durante a Campanha da Legalidade em 1961, o jornal A Razão, divulgou inúmeras cartas de apoio a Constituição que chegavam até a redação. Segundo Daniela Vallandro de Carvalho, Rapidamente, a sociedade santa-mariense passou a se organizar, em defesa da Legalidade, após o manifesto do Marechal Lott. As incitações do governador Brizola redundavam diretamente em Santa Maria, onde ferroviários reuniram-se em assembléia permanente até a posse de Goulart. A imprensa teve um papel de destaque, sendo a porta-voz de diversas manifestações em prol da Constituição. Os mais variados setores começavam a se posicionar enviando cartas de apoio ao Jornal A Razão, em defesa da legalidade. O prefeito municipal declarou-se favorável à posse do vice-presidente João Goulart, ao lado da Brigada Militar, sob o comando de Benjamim Ávila Prado, do capitão João Machado e do Major Paiva. Os estudantes universitários de medicina declaravam: “o nosso patrono é a constituição”, unindo-se ao III Exército e a Brigada Militar do Estado. Da mesma forma que “juízes e populares mostraram-se dispostos a defender o Estado caso de uma revolução civil” (2001:57).

Líderes de diversas categorias trabalhadoras de Santa Maria uniram-se fazendo, da cidade um polo aglutinador das forças legalistas, somando-se a Porto Alegre foco irradiador do movimento. Criaram o Comando de Resistência Democrática que aglutinava estudantes de diversos cursos, telegrafistas, Forças Armadas, ferroviários, membros do Movimento Tradicionalista Gaúcho que se alistavam em diversos pontos da cidade como voluntários. Paralelamente criaram o Comitê Central Universitário Pró-Legalidade e Ala Feminina Pró-Legalidade com o apoio de diversas outras entidades, dessa forma Santa Maria somou-se a outros municípios gaúchos no combate a ação golpista. Porém havia também oposição como o vereador Nelson Marchesan, que não perdia a oportunidade para atacar o presidente João Goulart e Brizola onde tentava aproximá-los de uma conspiração comunista. Santa Maria desde os anos de 1940 possuía um contingente muito grande de militares. Quando surge a ideia de comunização da cidade santa-mariense o General Mourão Filho percebe o perigo que se aproxima do país e parte para Porto Alegre, São Paulo e Rio de Janeiro onde manteve diversos contatos com diversas autoridades sobre o possível golpe que Brizola estaria planejando. 1244 1245

Os jornais Última Hora, abordam a mobilização no interior do Estado, em Caxias houve reuniões com o prefeito e com vários representantes da sociedade civil dentre eles “líderes sindicais, diretores de escola, responsáveis pela segurança publica, e bispo diocesano e demais autoridades”. Em que trataram da criação de um núcleo central para mobilização da opinião pública em Caxias, “a fim de ser mantida uma constante vigilância contra qualquer atentado golpista”. Assim também como os ex- pracinhas de Pelotas e Rio Grande formularam um manifesto “adesão ao movimento para a manutenção da legalidade e observação da Constituição de 1946” na mesma reunião resolveram “repudiar qualquer tentativa de golpe para derrubar o regime democrático”. É possível perceber que Caxias, Rio Grande e Pelotas tinham certa preocupação em combater qualquer tentativa de golpe. Naquele momento era necessário estar em alerta, pois não se sabia o que poderia acontecer. Diante da crise que apresentava-se e que percorria as rádios e jornais, alguns líderes pronunciaram-se diante do acontecido. Jóvito Villalba, presidente do Partido União Republicana Democrática da Venezuela manifestou –se “o governo venezuelano não reconhecerá como representante do povo brasileiro a uma ditadura imposta pelas Forças Armadas, em manifesta contrariedade à Ordem Constitucional” na sequência Villalba declarou “o diretório nacional encaminhou ao governo uma solicitação para que assuma uma atitude firme e resoluta frente ao intento dos fascistas brasileiros de pisotear a Constituição daquele país e desconhecer a vontade soberana do povo brasileiro”. Assim como Villalba demonstrava seu apoio ao Brasil, a Federação dos Centros Universitários de Caracas promoveu manifestação de apoio aos estudantes brasileiros a ao povo que “em luta contra a ditadura fascista de Denys e Lacerda, foi para as ruas defender a vigência do mandato popular”. Na Argentina a renuncia de Jânio Quadros repercutiu de tal maneira que deixou a polícia em prontidão, pois temiam lutas entre grupos que se formaram entre simpatizantes e adversários do ex-presidente brasileiro. O presidente argentino Frondizi não ocultou sua emoção ante ao fato, porém não fez nenhum pronunciamento diante do acontecido. A embaixada brasileira nada revelou de novidades, a chegada de novas informações reuniu multidões em frente aos “placards” dos jornais, aguardando notícias da situação no Brasil. Em a notícia causou sensação em Havana, onde se difundiu como “rastilho de pólvora”. As rádios cubanas limitaram-se a dar qualquer notícia que procedesse de Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro. , negou-se a fazer qualquer comentário, mas nos bastidores comentou-se que não passaria de uma manobra do ex-presidente para que ele voltasse mais fortalecido. 1246

O governo “teme que a posse de Jango venha desencadear uma firmeza maior na luta contra o colonialismo, o que poderia prejudicar os interesses de Portugal nas províncias africanas”. O mundo financeiro de Wall Street manifestou apreensão e temor pelo futuro das relações entre Brasil e Estados Unidos. Isso se deve ao fato que João Goulart substituto pela Constituição, era considerado como “ainda mais simpático às esquerdas do que o próprio Jânio”. Jango desde o início de sua carreira, em 1952, como Ministro do Trabalho no governo de Getúlio Vargas era “marcado” pelos EUA. Suas declarações em Moscou e Pequim, “favoráveis ao comércio com todos os povos, provocaram certo mal-estar e até mesmo alguma ira entre os homens que de Wall Street, conduzem a política do mundo ocidental”. Assim como havia aqueles que apoiavam a posse de Jango, havia por outro lado aqueles que eram contrários como o prefeito de Porto Alegre que declarou estar ao lado de Jânio Quadros, “por dever de consciência, por formação, por lealdade, por amizade, devo estar, como estou, ao lado do presidente Jânio Quadros. Mesmo porque a vida não é feita só de egoísmos. É de retribuições também”. Na Câmara de Vereadores o impacto também foi grande, os vereadores às pressas retiraram documentos particulares, receosos de algum golpe. Alberto Schoroeter líder republicano declarou “não tenho dúvida em afirmar que a renuncia do Sr. Jânio Quadros a exemplo da morte de Getúlio Vargas, tem os mesmo causadores, apoia –se nos mesmos motivos e tem os mesmos porta-vozes: o que há de mais reacionário e retrógrado em nosso país”. O vereador Revoredo Ribeiro, do PTB, por sua vez declarou que “a Constituição prevê solução para o ato do Sr, Jânio Quadros. Creio, assim, não haver motivo para se alarmar, não porque pensar em calamidade pública”. O senhor Geraldo Stédile revelou estar traumatizado “e que o Brasil merecia um melhor destino”. Diferentemente de Porto Alegre, onde o prefeito negava-se a aceitar Jango como presidente, em Santa Maria, o prefeito Miguel Servi Viero, afirmou “a situação é grave. Entretanto não tenho nenhum outro elemento”. Alguns líderes com assento na Câmara também fizeram suas declarações. O presidente da Câmara, senhor Pantaleão Lopes: neste momento de tristeza do povo brasileiro, com a renuncia do presidente Jânio Quadros, tenho eu, a impressão, que é mais uma manobra do inimigo número um do nosso povo que é que a sete anos atrás matou o maior estadista de todas as épocas o presidente Getúlio Vargas (Jornal A RAZÃO, 1961).

Realizou-se ainda em Santa Maria, uma passeata, onde participaram classes trabalhadoras, profissionais, estudantes, numa verdadeira demonstração de patriotismo e 1246 1247

de liberdade democrática. Um grande contingente de cavalarianos apoiou o movimento, e as bandas do Colégio Santa Maria e Manoel Ribas estariam presentes no movimento da legalidade. Estes são alguns pontos possíveis de serem analisados durante o trabalho, pois estamos na fase inicial realizando o levantamento das fontes. O que é possível perceber são a presença de alguns termos que estão presentes em vários dos discursos citados ao longo do texto. A palavra “legalidade” é uma constante, pois naquele momento almejava-se a ordem legal onde seria a posse do vice-presidente Jango conforme a Constituição, outro termo muito presente nos discursos. A construção do inimigo também perpassa, pois a população foi tomada de surpresa, fazendo com que todos ficassem em alerta. As autoridades acreditavam ser este um momento grave, de extrema tensão, onde era preciso estar atento aos acontecimentos, pois a morte de Getúlio Vargas, em 1954, onde já se conspirava um golpe fazia com que houvesse total atenção. O golpe havia sido planejado em 1954, mas com o suicídio do presidente e toda a repercussão que causou no país, foi necessário esperar e aí sim em 1961 com renuncia do presidente Jânio era o momento para que os militares subissem ao poder. Porém ainda não foi em 1961, o parlamentarismo mascarou o golpe mais uma vez, porém quando Jango adere os poderes legais através do plebiscito, então começa uma conspiração para tirar Jango do poder, que ocorre então em 1964. Ainda podemos citar o perigo do comunismo, o fato de Jango encontrar-se na , criava um clima de apreensão, acredita-se que ele iria tornar o Brasil num país comunista, porque ele era aliado às esquerdas. E como já havia o exemplo de Cuba em 1959, e o clima da Guerra Fria, todos os olhares neste momento voltaram-se para Jango e o Brasil. Por esse fato havia no Brasil uma forte oposição a posse de Jango. Porém, Brizola reuniu no Rio Grande do Sul a população para que validasse a Constituição e apoio de que se manifestou apoiando o movimento, como veremos a seguir,

Tomei conhecimento nesta data, da decisão do Sr. Ministro da Guerra, Marechal Odílio Denys, manifestando ao representante do governo do Rio Grande do Sul, deputado Ruy Ramos de não permitir que o atual presidente da Republica, Sr. João Goulart, entre no exercício de sua função e ainda, de detê-lo no momento que pise em território nacional. Mediante ligação telefônica, tentei demover aquele eminente colega de pratica de semelhante violência, sem obter resultado. Embora afastado das atividades militares, mantenho compromissos de honra com a minha classe, com a minha pátria e com as instituições democráticas e institucionais. E por isso sinto-me no indeclinável dever de manifestar o meu repúdio a solução anormal e arbitrária que se pretende impor a Nação. Dentro dessa orientação, conclamo todas as forças vivas no país, as forças da produção 1248

e do pensamento, aos estudantes e intelectuais, aos operários e ao povo em geral para tomar posição decisiva e energética pelo respeito à Constituição e preservação integral do regime democrático brasileiro, certo ainda que meus nobres camaradas das forças armadas saberão portar-se à altura das tradições legalistas que maream a sua história nos destinos da Pátria.

Assim também manifestou-se o ex-presidente do Brasil, Juscelino Kubitsehek em apoio a legalidade, Calar diante da perspectiva de que o Sr, João Goulart não seja empossado, será relegar todo o meu passado, destruir os resultados de impaciente e construtivo esforço empreendido as duras penas, durante cinco anos de governo a favor da paz, concórdia, da obediência à Lei e a Constituição e em prol da civilização brasileira [...].

Conforme nossos objetivos iniciais abordaram como os jornais aqui escolhidos relataram a repercussão que a renuncia de Jânio Quadros teve tanto no meio internacional como no Brasil, e no município de Santa Maria e região. A forma como alguns reagiram frente a esse momento histórico, mostrando assim os discursos que foram produzidos em defesa e em oposição a posse a Jango como presidente do Brasil. 1248 1249

Referências Bibliográficas: AMARAL, F. Anselmo. Brizola e a Legalidade. Editora: Intermédio – 1986. BANDEIRA, Muniz. Brizola e o Trabalhismo. Editora: Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 1979. BARROS, Jefferson. Golpe mata jornal. Porto Alegre: Já, 1999. CARVALHO, Daniela Vallandro de. A comunidade santa-mariense e o resgate da memória: história e política (1954-1964). In: Disciplinarum Scientia. Série: Ciências Sociais e Humanas, Santa Maria, V.2, n.1, p.49-64, 2001. FALCON, Francisco. História e Poder. In: CARDOSO, Ciro Flamarion; VAINFAS, Ronaldo (orgs.). Domínios da História. – 2ª ed. – Rio de Janeiro: Elsevier, 2011, p. 55 - 83. FELIZARDO, Joaquim José. A Legalidade: o último levante gaúcho. 4ª Ed – Porto Alegre: Ed. Da UFRGS, 2003. FERREIRA, JORGE; DELGADO, Lucília de Almeida Neves (org.). O governo Goulart e o golpe civil-militar de 1964. In: O Brasil Republicano: O tempo da experiência democrática de 1945 ao golpe civil-militar de 1964. 4ª Ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011, v.3. FICO, Carlos. Além do Golpe: a tomada do poder em 31 de março de 1964 e a ditadura militar. Rio de Janeiro: Record, 2004. FIGUEIREDO, Argelina Cheirub. Democracia ou reformas? Alternativas democráticas à crise política: 1961-1964. São Paulo: Paz e Terra, 1993. GOMES, Angela de Castro; D’ARAÚJO, Maria Celina. Getulismo e Trabalhismo. São Paulo: Ática, 1989. JANES, Andréia Rezende Peres. O PTB: entre o estado e as massas. Dissertação (Mestrado em História), Universidade Federal do Espírito Santo, 2007, 190f. JULLIARD. Jacques. “A política”. In: LE GOFF, Jacques; NORA, Pierre (dir.). História: novas abordagens. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1988. p. 180-196. KUHN, Dione. Brizola: da Legalidade ao exílio. Porto Alegre: RBS Publicações, 2004. LEITE FILHO, Francisco das Chagas. El Caudillo: : um perfil biográfico. 1ª Ed. São Paulo: Aquariana, 2008. PERELMAN, Chaïm. Tratado da argumentação: a nova retórica. 2ª Ed.: São Paulo: Martins Fontes, 2005. RÉMOND, René. Uma história presente. In: RÉMOND, René (Org.) Por uma história política. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1996, p. 02-15. RODEGHERO, Simone. Regime Militar e oposição. In: BOEIRA, Nelson; GOLIN, Tau. (orgs.). República: da revolução de 1930 à Ditadura Militar (1930-1985). Passo 1250

Fundo: Méritos, 2007. V.4. ROSANVALLON, Pierre. Por uma história conceitual do político. Revista Brasileira de História. Tradução de Paulo Martinez. S. Paulo: v. 15, nº 30, PP. 9-22, 1995. THOMPSON, John. Ideologia. In: Ideologia e cultura moderna. Petrópolis: Vozes, 1995. SENTO-SÉ, João Trajano. O discurso brizolista e a cultura política carioca. In: Varia História. 2002, nº 28, dez. p. 01-20. SKIDMORE, Thomas. Brasil: de Getúlio a Castelo. Rio de Janeiro: Saga, 1982. WEBER, Max . “Textos selecionados”. Seleção e tradução de Maurício Tragtenberg. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural.