Verso e Reverso, XXVII(66):187-195, setembro-dezembro 2013 © 2013 by Unisinos – doi: 10.4013/ver.2013.27.66.05 ISSN 1806-6925

Tele-Visão, Imagem-Duração e o Tempo Reality de TV na Internet

Tele-Vision, Image-Duration and the Reality Time Of Tv On The Internet

Suzana Kilpp Universidade do Vale do Rio dos Sinos Avenida Unisinos, 950, São João Batista, 93022-000, RS, Brasil [email protected]

Resumo. O artigo problematiza o conceito de tele- Abstract. The article it puts in check the television visão comparando a natureza precípua da TV off - concept comparing the main nature of the off -line line com à da TV on-line a partir da metodologia TV with the main nature of on-line TV under the das molduras. Essa natureza havia sido formulada methodology of the frames. This nature had been anteriormente como relacionada, no caso da TV formulated previously as related, in the case of the off -line, a uma imagem média que chamamos de off -line TV, to an average image that we call dura- imagem-duração, relacionada à sua vez com tem- tion-image, related to its time with times that we pos performáticos que chamamos de tempo reality. call reality time. In this check, the article empha- Na problematização, o artigo enfatiza, no escopo da sizes, in the target of the methodology, the virtual- metodologia, o misto virtual-atual (conforme pro- current compound (as considered by Bergson) and posto por Bergson) e a dissecação dos empíricos the technical analyze of the empiricists (as proposal (conforme proposta por Kilpp). Face às diferenças by Kilpp). Face to the notarized diff erences of na- de natureza autenticadas, sugerimos, como alter- ture we accounted, we suggest, as alternative, the nativa, o conceito (mais largo) de tele-visão para concept (wider) tele-vision to think its updates in pensar suas atualizações tanto off -line quanto on- an off -line way almost in an on-line way. Around line. Quanto à metodologia, o artigo aponta para os the methodology, the article points with respect to bastidores da pesquisa, nos quais, em se tratando the embroidery frames of the research, in which, in de Internet, há muito já disponível e muito ainda if treating to Internet, it has already very available a inventar (ou a tornar mais conhecido) quanto a and very still to invent (or to become more known) ferramentas ou procedimentos técnicos para fazer how much the tools or procedures technician to uma boa dissecação dos materiais que se pretende make a good technical analyze of the materials that analisar. if it intends to analyze.

Palavras-chave: tele-visão, televisão na Internet, Key words: tele-vision, television on Internet, real- tempo reality ity time

Introdução ferir seu espraiamento por diferentes telas que hoje compartilham a exibição de imagens ditas Especular sobre a tele-visão em suas atua- televisivas. lizações no atual estágio da técnica demanda A nosso ver, esses conceitos não aderem ao olhar criticamente para o conceito sexagenário fenômeno audiovisual a que estamos assistin- de televisão, especialmente quando se propõe, do: primeiro, porque reduz a tele-visão à TV; como alguns, que ele pudesse ser estendido ao segundo, porque entende as novas aparições que chamam de televisão expandida para re- de imagens que lembram a TV como se fossem Suzana Kilpp

meramente tentáculos da televisão off -line, em venta noções historicamente anteriores e mais um mesmo ambiente ou em outros ambientes, largas do que as a que os estudos das mídias quando se trata de fato de um ponto zero do se restringiram em meados do século passado. aparecer fenomenológico (Derrida, 1998) da Neste artigo trataremos apenas da primeira tele-visão no dispositivo contemporâneo, cujas questão: O que distingue as emissoras de TV urgências (Tucherman e Saint-Clair, 2008) são na Internet das (mesmas) off -line? outras que as do dispositivo que originou a À primeira vista, tratar-se-iam de duas atu- mídia TV. alizações de uma (mesma) televisão que difere Como extensão humana, a televisão par- apenas em grau2 quando migra para a Inter- ticipa hoje de uma ecologia (McLuhan, 1999) net, e se poderia dizer que aí ocorre uma reme- que não é mais a da eletricidade, ou só dela, diação da TV off -line para sua versão on-line; e mas também a do código binário. Por outro se poderia dizer também, com muita proprie- lado, pensar o audiovisual e a tele-visão hoje dade, tratar-se de uma televisão expandida, também passa pela compreensão do software por exemplo. cultural e pela cultura do software (Manovich); No entanto, se aceitarmos, na esteira de e pela multiplicidade de telas que permitem Derrida (1998), de que a cada vez (ou a cada hoje a tele-visão em múltiplos hardwares fi xos suposta remediação) inaugura-se um ponto e móveis. (zero) fenomenológico e signifi cante da ima- Desde tal perspectiva iniciamos uma pro- gem (áudio) visível, já não estaremos mais blematização mais pontual, mas também crí- diante de diferenças de grau da televisão, mas tica, acerca da remediação (Bolter e Grusin, diante de diferenças de naturezas entre a TV 1999) da TV na Internet, problematização essa off -line e a on-line. E se, então, ainda entender- que pode ser assim resumida: O que distingue mos que se trata de outro objeto de pesquisa as TVs na Internet das TVs off -line? O que dis- (outra virtualidade durante) - a tele-visão du- tingue, na Internet, as TVs on-line das web TVs, rante e não a televisão durante - todas as pre- umas das outras e da TV off -line? O que há missas anteriores são abaladas pelo simples de comum, virtualmente falando, entre elas? fato de se admitir a existência desse objeto e Como e em quê as semelhanças e diferenças pela fabulação que faremos sobre ele. impactam sobre o que se tem concertado acer- ca da tele-visão como televisão? São questões Das imagens do tempo na TV à formuladas a partir da intuição de que, pri- imagem-duração meiro, há uma tele-visão durante, cujo devir (ou tendência) vem sendo atualizado hoje em Inicialmente chamou-nos a atenção o fato qualquer plataforma ou mídia, mas cuja gene- de que o tempo é entendido por vários estu- alogia, se feita nessa perspectiva, autenticaria diosos da mídia como essencial para a com- atualizações muito mais antigas, heterogêneas preensão da imagem de TV, por diferentes e fi sicamente realizadas de transmissões a dis- razões de cada autor. Nenhuma dessas razões tância de imagens que puderam ser vistas em nos aquietava; entretanto, buscando entender telas muito diversas.1 o ponto zero do aparecimento das imagens na Reinventamos nossos problemas e objetos televisão brasileira, a pesquisa que fi zemos le- de pesquisa com vistas a prospectar críticas e vou-nos a certa altura a perscrutar justamente alternativas de pesquisa que dêem conta do uma eventual ingerência do tempo sobre sua conceito de tele-visão a partir da memória dos natureza precípua. meios que a atualizam multifacetadamente na Isso ocorreu, porém, não tanto pelo que os tecnocultura contemporânea e de um design autores diziam e mais porque, enquanto moni- que é marcado por visadas tecno-estéticas do torávamos seus modos de agir off -line, encon- que ainda se tem como tele-visão homóloga à tramos em todas as emissoras analisadas, e em televisão. Nesse viés, a pesquisa também rein- toda a programação de cada uma, uma multi-

1 Com isso, na esteira de Bergson (1999), enfatizamos nossa compreensão de que a tele-visão é uma virtualidade que se atualiza em diferentes suportes, dentre os quais, o mais sólido e contemporâneo, chamamos de TV ou televisão. E que uma genealogia cartografaria essas atualizações segundo seu gene memorial, e não segundo uma história de sucedâneos da qual se descarta os não vitoriosos, os quais, no entanto, duram, na memória, enquanto devir (Bergson, 1999) ou como potência (Benjamin, 1985). 2 Para Bergson (1999), as coisas diferem em grau ou em natureza, sendo verdadeiras apenas as diferenças de natureza, porquanto apenas essas se relacionam à duração, cuja realidade é mover-se dos atuais aos virtuais e vice-versa.

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plicidade de práticas enunciativas de tempora- mente infl acionárias em termos de informa- lidades fi xas ou moventes, sobrepostas ou jus- ção. Tantas informações avolumando-se no tapostas, sucessivas ou coalescentes, nas quais, mesmo espaço de tempo acabam impondo ainda assim, algo recorria e devinha em todas ritmos mais acelerados à programação em elas. E, dissecando as molduras e moldura- fl uxo nesses horários, o que também leva à ções nas quais tais ethicidades foram assim compactação das imagens em seqüências sin- ofertadas aos sentidos (os quais, ultimamente, tagmáticas, pois as emissoras têm em conta são agenciados entre emissão e recepção)3, e a que a TV e o canal são conectados e desconec- partir de nossos afectos, acabamos levados à tados a qualquer instante e que o espectador percepção4 de imagens de vários tempos es- precisa situar-se ou envolver-se rapidamente pacializados e performáticos (reality) e, daí, de sob pena de a emissora perdê-lo para outro novo à intuição de um construto televisivo de canal. Na perspectiva estratégica das emisso- tempo virtual, em devir. ras, cada instante audiovisual veiculado deve Já havíamos tratado antes desse tema, conter indicialmente o todo de que é parte apontando algumas funções do tempo na TV, para que o espectador se situe no fl uxo tele- e outras do tempo enunciado pela TV na orga- visivo daquela emissora. E a emissora deve nização de nossa vida em sociedade, e sobre estar o tempo todo produzindo instantes au- nosso entendimento do que seja o tempo. Mas, diovisuais envolventes no teor ou na estética nos estudos que realizamos desde 1996 fomos - no mais das vezes relacionados a ditos inte- gradativamente levados a pensar que a natu- ressantes acontecimentos6 por acontecer - que reza precípua das audiovisualidades de TV no mantenham ou tragam de volta o espectador atual estágio das técnicas poderia ser substan- que navega entre os canais e emissoras. ciada por uma imagem-duração, uma imagem Decorre que a centralidade do tempo na nunca antes assim conceituada nas epistemo- televisão relaciona-se assim também às con- logias do audiovisual, mas sempre à espreita dições da produção (e de seus apelos) e da na vizinhança de outros conceitos. recepção (conforme nossos discernimentos e Tempo, tempos enunciados e imagens do motivações pessoais). Nesse jogo entabulado, tempo são de fato, como disseram, caracte- e em seu decurso, nós assistimos de fato a tem- rísticas decisivas das audiovisualidades de pos de TV, dos quais participam recortes au- TV: é impossível compreender a natureza da diovisuais da programação em fl uxo de uma imagem televisual sem compreender como o ou mais emissoras que são articulados em fl u- tempo é constitutivo dela. Tudo a que assisti- xos imagéticos exclusivos de cada espectador, mos na telinha relaciona-se a medidas (quan- impactados ainda pelas condições da recepção tidades) de algo (qualidade), dentre as quais do espectador, que, enquanto assiste à televi- as medidas de tempo. Isso ocorre em grande são, faz inúmeras outras coisas. parte porque as emissoras, sustentadas dire- No decurso de nosso monitoramento de tamente pela publicidade e indiretamente pe- práticas enunciativas foi-se tornando cada vez las audiências, comercializam quantidades de mais evidente a ingerência do tempo sobre tempo5, situadas em horários da programação a natureza precípua das audiovisualidades em fl uxo que têm determinadas qualidades de TV de qualquer emissora analisada. Nos éticas e estéticas, sejam as dos programas ou as diferentes panoramas televisivos sempre se dos inter-programas que incluem “intervalos moviam simultaneamente coisas e ações (prin- comerciais”, vinhetas da emissora e dos pro- cipalmente) situadas em fl uxos temporais dis- gramas e promos. tintos e que se justapunham tensamente no de- Algumas dessas quantidades de tempo, senrolar do tempo da programação em fl uxo em geral justamente as mais caras, são alta- das emissoras.

3 Os conceitos de dissecação, molduras, moldurações, ethicidades e agenciamento são alguns operadores da metodologia das molduras. Sucintamente, no que importa entender aqui, ethicidades são construtos midiáticos de fatos, pessoas, coisas etc. cujos sentidos são compreensíveis a partir das molduras e moldurações praticadas pelas mídias para ensejar tais senti- dos, e que são dissecadas pelo pesquisador para fins de análise. Para mais detalhes, ver A traição das imagens (Kilpp, 2010). 4 As noções de afecção e percepção aqui empregadas orientam-se pelas formulações de Bergson acerca da intuição, as quais, como método, foram sistematizadas por Deleuze (2004). 5 Nos termos de Bourdieu (1996) diríamos que o tempo – ou melhor, o preço do tempo linear na televisão – corresponde à verdade da troca, que é sempre recalcada no jogo da troca em qualquer economia de bens simbólicos. 6 O acontecimento, no caso da TV, refere-se não apenas ao acontecimento histórico habitualmente agendado pelas mídias, mas também a acontecimentos no interior de mundos televisivos.

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Ora, esses fl uxos desenrolando-se simulta- Nos dois primeiros exemplos o relógio estava neamente na macromontagem televisiva lem- programado para medir um intervalo de tem- bram por demais a noção bergsoniana de du- po se desenrolando; no terceiro, para indicar ração, na qual o tempo tem múltiplas direções, instantâneos de tempo já desenrolado. em que o que se entende por antes e depois Mas, além desses, havia relógios que per- perde o sentido, em que tudo é presente co- duravam ou permaneciam no écran de alguns alescente, em que o tempo histórico torna-se canais independentemente da programação uma qualidade densa, intensa e espessa, sendo que ia ao ar. Neles (e também nos outros), o todos eles indícios de seu devir ou virtualida- tempo visível desenrolava-se como em nossos de. Por conta disso chamamos esse construto próprios relógios (e cronômetros). Essa fi gura- televisivo de imagem-duração. E por ser um ção do “tempo real”8 corresponde à sua sim- construto (uma ethicidade), de caráter perfor- bólica mais geral, inclusive a de nossa própria mático, não lhe conferimos o estatuto de real, duração, e se tornou, então, por defi nição de mas reality. Frisamos aqui, portanto, que o que nosso pensamento, o sistema imóvel do ob- estamos chamando de imagem-duração é uma servatório (nos termos propostos por Bergson, ethicidade que participa de um conjunto de 2006, já referido). Assumir este tempo como enunciações televisivas sobre o real, o qual é, real implica, entretanto, assumir o caráter per- também, um construto de real (uma ethicida- formático do real na TV. de) performático – um real reality. Muitas vezes antes discorremos sobre o Conscientes e deliberadamente circuns- realismo na TV como uma estética. Mas tal- critos a tais limites conceituais, para avançar vez não tenhamos enfatizado o sufi ciente que a pesquisa empírica e para fi ns de análise esse realismo performático refere-se a ser e desses diferentes móveis simultâneos precisá- agir conforme a lógica da TV, a ser real como vamos imobilizar um deles pelo pensamento construto televisivo. Por exemplo, prestemos para que, a partir dele, pudéssemos observar atenção ao fato de que o tempo medido por o movimento dos demais: para fi ns de análi- relógios digitais simbolizados no écran não se, precisávamos criar um sistema, imóvel, de se desenrola exatamente como em nossos re- referência7. Assim, o sistema de referência que lógios, pois está sujeitado à lógica do fl uxo escolhemos foi pontuado pelo relógio digital televisivo. Primeiro, a imagem do tempo de- presente no panorama das emissoras anali- senrolando é suprimida da vista do especta- sadas, simbolizado na tela por números visí- dor sempre que no fl uxo os programas são veis separados por dois pontos: à esquerda, a interrompidos pela publicidade. Segundo, ela quantidade das horas; à direita, a quantidade se relaciona, a cada vez, a diferentes molduras, dos minutos. Nesta simbolização, “18:23”, por inclusive às de outros tempos também visí- exemplo, signifi ca que estamos assistindo ao veis, como os dos cronômetros, e às de outros, que se passa na TV às 18 horas e 23 minutos de invisíveis, mas presumidos. um tempo métrico consentâneo ao que obser- Tais lógicas conferem ao tempo indicado no vamos em qualquer relógio. écran um sentido performático, portanto, o que Enquanto monitoramos as emissoras do autoriza chamá-lo de um tempo reality. E é assim corpus esse relógio encontrava-se inserido, que o trataremos daqui em diante: estaremos como graphic, em um dos cantos do écran do sempre nos referindo a um construto televisivo aparelho de TV por ocasião da transmissão de tempo real que é mais bem defi nido desde a “ao vivo” de determinados acontecimentos: perspectiva que adotamos como tempo reality. em eventos esportivos, para cronometrar o Quando existiam esses relógios nos pano- tempo dos jogos; em debates políticos, para ramas o graphic do tempo encontrava-se cola- cronometrar o tempo de cada intervenção dos do, aderido, era parte intrínseca da duração participantes; em edições de reality shows, para dos canais (que são concedidos a determina- indicar a hora em que acontecera o que estava das emissoras pelo poder público para veicu- sendo mostrado nas edições que iam ao ar, etc. larem neles sua programação). Como propu-

7 Bergson (2006) propõe a adoção de um sistema de referência quando se pretende observar movimentos simultâneos. Trata-se de imobilizar pelo pensamento um dos moventes, a partir do qual, então, observam-se os demais. 8 De um lado lembramos que a noção “tempo real” difundiu-se com o sentido a ela atribuído por enunciações televisivas quando da transmissão de eventos simultânea ao tempo real dos eventos, também enunciadas como transmissões “ao vivo”. Por outro lado lembramos tratar-se de uma ethicidade, e de que essa noção nada tem a ver com o entendimento de Bergson sobre o tempo real.

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semos em 2010, canais são molduras de emissoras sa de então. Nas primeiras semanas observa- e de programas; como tais, os canais (e sua duração, mos o conteúdo on-line disponível no portal visivelmente desenrolando-se) conferem sentidos de cada uma destas emissoras para identifi car de tempo às imagens da programação em fl uxo in- quais delas exibiam vídeos da programação dependentemente das efetivas durações9 nela mol- off -line nos quais apareciam marcadores de duradas. É desses fl uxos simultâneos que emergem, tempo como o relógio ou o “ao vivo”, e como dentre eles e na opacidade dos panoramas, as mais estes se relacionavam com o relógio apresenta- interessantes novas fi guras do tempo. do no computador de qualquer usuário. Sob a forma de imagens-duração, elas se rela- Depois de identifi cadas quais eram as emis- cionariam em tese às que deveriam emergir da TV soras que utilizavam marcadores de tempo em digital de outros modos (diferentes em grau). Nas suas transmissões audiovisuais via Internet, TVs on-line - que podem estar sendo ainda um ter- passamos a salvar com a tecla Print Screen ritório de experimentação das emissoras acerca de do teclado (ela captura telas da web abertas sua re-fundação como TV digital -, nos dispusemos, no monitor) todo o trajeto, que percorremos por isso, a analisar os modos através dos quais tal desde a página inicial do portal das emissoras transição vem sendo operada pelas emissoras, e a (a homepage) até a página (a watchpage) em que refl etir sobre no quê uma presumida remediação se encontra o player, no qual, fi nalmente, ro- estaria afetando (ou não) a natureza das audiovisu- dam vídeos da programação off -line da emis- alidades de TV. sora disponíveis no site. No entanto encontra- mos uma limitação técnica na hora de capturar O tempo reality na TV on-line as telas do computador quando no player acon- teciam transmissões simultâneas às da TV off - Ao migrarmos nosso observatório para a Inter- line porque, nessas telas, a imagem que rodava net, de imediato colocou-se um problema, novo, no player não se conseguia capturar, aparecen- de ordem metodologicamente estratégica: como do em seu lugar apenas um fundo, negro, ou realizar a observação e sua documentação com vis- seja, ausência de imagem de TV. Apenas as tas à análise pretendida? As antigas e já familiares imagens dos vídeos de arquivo eram perfeita- operações técnicas de monitoramento e cartografi a mente capturadas por este processo. off -line (fl anar, gravar, rever e dissecar a partir de Como precisávamos contornar este contra- suportes como o videocassete, o CD e o DVD) não tempo e para nossa pesquisa apenas os Print funcionavam on-line, porque não é assim que se Screen da tela não eram o sufi ciente, procura- captura (e retira) as imagens do fl uxo da Internet mos por softwares que nos permitissem gravar com vistas à sua dissecação. em vídeo o caminho que antes havíamos regis- A partir dos rígidos princípios adotados ao lon- trado através de frames. Testamos inicialmente go da pesquisa, perscrutamos então alternativas o programa Camtasia Studio, que também se metodológicas fl exíveis que dessem conta daquilo mostrou inefi ciente, pois resultava no mesmo que os observáveis demandavam para que fossem problema: todo o entorno do player era salvo, minimamente compreensíveis. No caso em questão, mas as imagens que rolavam no player, não. tratava-se, antes de tudo, de verifi car a efi cácia da Ou seja, a tela do player, na qual as imagens ro- dissecação de molduras e moldurações nos termos lavam na ocasião do acesso on-line, na captura técnicos em que ela havia sido praticada na análise tornava-se, em fl uxo, uma tela sempre preta, da da TV off -line. Na Internet seria possível, desejável e qual, portanto, se ausentavam todas as imagens. produtivo praticar as mesmas operações? Chegamos a testar os programas Real Player e GameCam, mas estes salvavam ape- Dissecação das imagens veiculadas no nas a tela do player e não toda a tela do com- putador (interface) como necessitávamos. player: procedimentos para a captura de Partimos então para o CamStudio, que apre- telas sentou o mesmo problema do Camtasia. Por fi m, quando já estávamos pensando em gravar Durante três meses de 2008 monitoramos nossas ações utilizando uma câmera de vídeo as transmissões via Internet das emissoras de ligada em frente ao monitor, fomos alertados televisão que compunham o corpus da pesqui- de que o Camtasia e o CamStudio poderiam

9 Cada coisa, fato, persona, acontecimento etc. audiovisual tem sua própria duração (virtual) atualizada em seus modos de agir no espaço em que se dá a perceber ao espectador, usuário ou pesquisador.

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funcionar de forma diferente em cada com- No período do monitoramento não foi en- putador que fossem testados, uma vez que os contrado nenhum audiovisual de TV nas pá- codecs (codifi cadores de som ou imagem para ginas da NetTV e da TV Pampa. Na webpage comprimir arquivos, com ou sem perda em re- da NetTV (htt p://nett v.globo.com/NETServ/ lação à imagem e som originais) presentes em br/home/html/1.jsp) não havia watchpages. Tal- cada máquina determinam como estes progra- vez por tratar-se de um sistema de transmissão mas entendem e gravam as transmissões. e não de uma emissora, no site parecia que o Testamos novamente o Camtasia e o Cam sistema não tinha interesse em disponibilizar Studio, e o primeiro funcionou quando de- conteúdo televisivo gratuitamente. Além dis- saceleramos a gravação para capturas em so, se, na TV, a Net veiculava conteúdo audio- apenas 2 quadros por segundo (o padrão de visual (promocional de si), é possível imaginar transmissão da televisão é de 30 quadros por que a Internet oferece aos sistemas formatos segundo). Excetuando o áudio (que não pode considerados mais interessantes para essas nunca ser capturado porque, ao pararmos o mesmas promoções. fl uxo, o som sempre desaparece), consegui- Já a Rede Pampa (uma emissora, sitiada em mos assim capturar vídeos da maioria das htt p://www.pampa.com.br) também não tinha emissoras que interessavam à pesquisa, e watchpages, e preferia dar um destaque maior apenas o canal NBR continuou apresentando para o conteúdo do jornal O Sul, pertencente o problema do quadrado preto no lugar da ao grupo. imagem em movimento. ● Emissoras cuja exibição audiovisual na In- ternet não pode ser comprovada Comportamento das emissoras quanto Este é um caso à parte, em que se anunciava à exibição do relógio em panoramas a veiculação, mas que não pudemos verifi car se e como ocorria. É o caso da Ulbra TV (sitia- veiculados no player da em www.ulbratv.com.br), que anunciava transmissões e apresentava em sua home um Equacionados os problemas de ordem téc- link para conteúdo audiovisual. No entanto, nica, pudemos observar os diversos compor- na página seguinte era pedido um download de 10 tamentos on-line das emissoras do corpus Quicktime, que sempre travava no meio do pro- (TVCom, TV Justiça, Siete, , Bloom- cedimento. O player aparecia, mas em branco. berg, NET, TV Câmara, Record, Pampa, Assem- ● Emissoras que não exibiam relógios nos pa- 11 12 bléia, NBR , Ulbra TV, , Globo , noramas remidiados 13 14 Rit TV e Band News ) quando apresentavam Durante o monitoramento da TV Justiça seus conteúdos audiovisuais na Internet. Não e da TV Bloomberg percebemos as seguintes havia um padrão para a disposição dos conteú- práticas das duas emissoras, diferentes das dos audiovisuais dentro dos portais, mas havia transmissões off -line. tendências que podem ser formuladas em dois Na home da TV Justiça (sitiada em htt p:// grandes conjuntos: o das emissoras que não uti- www.tvjustica.jus.br) havia um link “assista lizavam o relógio na Internet e o das emissoras on line”, que remetia a uma watchpage. Em vá- que utilizavam relógio nos panoramas on-line. rios momentos encontramos, nela e no pano- rama das imagens que rodavam no player, a Emissoras que não exibiam o relógio inscrição do termo “GRAVADO” e a inscrição da data em que o programa havia sido veicu- Verifi camos que as emissoras que não usa- lado off -line; mas, nas imagens rodadas na In- vam o relógio na Internet se encontravam nas ternet nunca encontramos o relógio. Quando seguintes situações: não aparecia o “gravado”, supusemos tratar- ● Emissoras que não veiculavam audiovisuais se de transmissões simultâneas on-line e off - na Internet line, o que, para ser comprovado, requereria

10 Faziam parte do corpus as emissoras que, no sistema a cabo NET, sempre ou em algum momento de sua programação em fluxo, inseriam um graphic de relógio de marcar o tempo nos panoramas. 11 Na ocasião, a NBR era veiculada pela Uni TV. 12 Na Rede Globo, encontramos o programa Mais Você, aparentemente o único que inseria um relógio no panorama. 13 A Rit TV veiculava sua programação na Band durante a madrugada. 14 Inicialmente, a Band News não fazia parte do corpus; entretanto, foi acrescentada quando passou a ser veiculada pela NET, no canal 99, com um relógio inserido no panorama.

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um procedimento de espectação simultânea querda, encontramos um outro relógio digital que não fi zemos. informando o horário, sendo que o relógio da Já na versão on-line da Bloomberg (htt p:// wathpage fi cava ao lado do graphic da tempe- www.bloomberg.com) notamos as seguintes ratura, no canto direito inferior do panorama, situações: nunca aparecia o relógio, mas às descolado da logomarca do canal/emissora. vezes aparecia o “ao vivo”. É uma prática in- O canal/emissora Shoptime, na página versa à da TV Justiça. Similarmente, podería- htt p://www.shoptime.com.br, era acessado mos inferir que a não indicação do “ao vivo” através do link “TV Shoptime” e apresentava remetia a programas gravados. Não é possí- o relógio na watchpage, ao lado da logomarca vel concluir, no entanto, se em um, nos dois do canal. Nesse caso pudemos entender que o ou em nenhum caso as transmissões on-line relógio era estratégico, pois as ofertas e pro- eram simultâneas às da TV off -line. A não ser, moções só valiam em determinados dias e ho- de novo, que tivéssemos feito uma espectação rários por certo tempo. simultânea, o que não fi zemos. Nas imagens da RIT TV (Rede Internacio- nal de Televisão)16, que eram veiculadas em Emissoras que exibiam o relógio nos pa- site próprio (htt p://ritt v.com/index.html), o re- noramas remidiados lógio esteve sempre presente e o horário mos- trado era enunciado como o ofi cial de Brasília. Grande parte das emissoras do corpus Na grande maioria das vezes, encontramos mostrava o relógio presente nos panoramas nos panoramas, junto ao relógio, a indicação off -line também nos panoramas no interior “ao vivo”; a watchpage era a própria homepage; dos players da watchpage, mas de modos distin- e, várias vezes, o relógio indicou a hora em de- tos, dentre os quais destacamos os praticados sacordo com a hora ofi cial do Brasil, produzin- nas seguintes situações: do certa confusão. ● Emissoras que transmitiam simultaneamen- Já a página principal da TV Assembléia era te off -line e on-line o portal htt p://www.al.rs.gov.br. Dentro dela, Nessa situação, encontramos: TVCom, Sie- à esquerda, havia um link para o site da TV As- te, Shoptime, Rit TV, TV Assembléia e NBR. sembléia, que por sua vez oferecia a opção de Em alguns momentos, devido ao delay (que transmissão ao vivo. Quando clicada, abria-se depende da velocidade de conexão do usu- uma nova janela, com um player, cujas imagens ário) ou a problemas no ajuste do relógio do não pudemos capturar por Print Screen. No computador, a hora marcada pelo relógio nas Camtasia foi possível capturar a transmissão, imagens do player não correspondeu à hora in- mostrada na última tela abaixo, sendo que as dicada no relógio do computador. imagens veiculadas incluíam um relógio e a Na home da TVCom (htt p://www.clicrbs. inscrição “ao vivo”. com.br/tvcom) encontramos o link “assista Para assistir à NBR na Internet a porta ao vivo a tvcom” que remetia à watchpage da de entrada principal era o site da Radiobrás emissora on-line. Em todos os horários e dias (htt p://www.radiobras.gov.br/estatico). Lá, observados havia relógio nos panoramas vei- no menu lateral, aparecia o link para a NBR, culados no player e somente o programa Falan- e, nesta nova página havia uma opção de do exibia um “ao vivo” (junto ao relógio), sen- “transmissão ao vivo”. Ao clicar no item, sur- do que o relógio situava-se ao lado do graphic gia um player, no qual rodavam os mesmos da temperatura, no canto superior direito, não panoramas que haviam sido veiculados pela estando junto da logomarca da emissora. televisão off -line, ou seja, que, entre outras Já no caso do canal Siete15, assistido pela pá- coisas, incluíam o relógio. Mas as imagens gina htt p://www.canal7.com.ar/canal7, no link não puderam ser capturadas, nem por Print “vivo”, na maioria das observações o relógio Screen nem pelo programa Camtasia, a exem- esteve presente no panorama; ou seja, toda vez plo da TV Assembléia. que “vivo” apareceu no panorama, o relógio ● Emissoras que exibiam imagens de arquivo também esteve presente. A partir do dia 10 de Durante a observação das emissoras Re- dezembro daquele ano, notamos que a watchpa- cord, Record News e Globo on-line detecta- ge se encontrava na webpage. Na webpage, à es- mos que elas colocavam no ar vídeos grava-

15 A televisão pública Argentina. 16 Canal televisivo brasileiro concessionado à Igreja Internacional da Graça de Deus.

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dos que apresentavam em seus panoramas os do site dos programas, que estavam linkados relógios, e o tempo neles marcado - nos mes- na capa do Globo.com. mos termos como foram transmitidos off -line. Nestes casos, porém, havia um descompasso Confi guração do tempo reality na TV entre os tempos medidos no relógio dos pa- on-line noramas mostrados no player e os mostrados no do computador, que, é óbvio, só seriam os Destacamos a seguir as diferenças obser- mesmos por puro acaso. vadas na enunciação do tempo real, que, no Embora fosse o portal da Rede Record, o entanto, decorriam no mais das vezes apenas site htt p://www.rederecord.com.br remetia o por inércia ou desconsideração das emissoras usuário a uma página da TV Record on-line, quanto às lógicas operativas de uma das mí- que não tinha transmissão simultânea, mas dias e às da outra. fazia uma oferta de vídeos gravados da pro- ● O relógio em transmissões em “tempo real” gramação recém exibida off -line, sendo que, Trata-se aqui da ocorrência percebida de ha- em geral, o programa era colocado na Internet ver duas transmissões em “tempo real” de uma menos de duas horas depois de ter ido ao ar. mesma emissora off -line e on-line simultanea- Na moldura/link “Mundo Record” havia uma mente: a que estava sendo acessada via monitor oferta de vídeos em uma interface que emula- de TV e a que se estava acessando pela Internet. va a televisão. Quando se clicava em um dos Na tela da televisão off -line o relógio encon- vídeos, um player começava a exibi-lo, e todos trado nos panoramas sempre exibia um sentido os vídeos mostravam a mesma hora em que de horário que se podia estender aos panora- haviam sido exibidos originalmente e o “ao mas de todas as imagens veiculadas por aquela vivo” quando a transmissão original também emissora, mesmo quando o relógio não apare- o exibia; ou seja, as imagens eram arquivadas cia, porque na transmissão só um relógio era e acessadas exatamente como haviam ido ao visível e enunciativo da passagem de tempo. ar off -line. Na Internet esse sentido “único e univer- O site www.recordnewstv.com.br, da emis- sal” era tensionado por conta de um segundo sora Record News, oferecia um modo de nave- relógio visível e enunciativo da passagem de gação idêntico ao da TV Record. No entanto, tempo: o do Windows (sistema operacional o programa não estava linkado a nada na home usado) do computador. Não eram apenas do portal da rede. Para navegar nos vídeos molduras sobrepostas, mas telas diferentes so- da Record News devia-se clicar em “Mundo brepostas, cada uma suportada por uma tele- Record News” e seguir os mesmos passos da- visão própria, uma sua atualização inaugural. dos na Record. Quando assistidos no player, Na maioria dos casos analisados a hora do todos os vídeos de arquivo exibiam em seus relógio do Windows (que, inclusive, pode ser panoramas exatamente a hora em que haviam ajustada pelo usuário do computador) esteve ido ao ar originalmente, e o “ao vivo” quando indicada diferentemente à hora exibida no pa- na transmissão original as imagens possuíam norama quando a emissora transmitiu “simul- essa indicação. taneamente” ao vivo off -line e on-line. Qual Também foi o caso da Rede Globo, cujo dessas duas horas medidas poderia ser entendi- site (www.globo.com) disponibilizava víde- da enunciativamente como a “real”, ou reality? os de arquivo. Nesta webpage não se trans- Nós nos faríamos a mesma pergunta se ti- mitia simultaneamente à TV, ao menos para véssemos encontrado uma maior coincidência quem não era assinante17. Através da página entre o “tempo real” da transmissão off -line e inicial chegava-se à página Globo Vídeos, e, a da transmissão on-line porque, mesmo que por ela, aos vídeos do programa Mais Você, hoje haja uma enorme precisão, tecnologica- que eventualmente apresentava relógio, e, mente possível, na hora medida em todos os como pôde ser comprovado, o relógio se relógios do mundo - regulados pela hora do mantinha com a hora original dos vídeos Big Bem londrino ou pelo chamado “horário de gravados. Brasília” - assumimos tratar-se sempre, quando Além do caminho até aqui indicado, tam- falamos em sua midiatização, de uma hora per- bém foi possível entrar nos vídeos através formática e construída midiaticamente.

17 Se havia transmissão para assinantes ela estava oculta para o usuário comum. E, como não nos cadastramos como “as- sinantes”, não foi possível verificar se, nesse caso, ela ocorria ou não.

194 Verso e Reverso, vol. XXVII, n. 66, setembro-dezembro 2013 Tele-Visão, Imagem-Duração e o Tempo Reality de TV na Internet

● O relógio em imagens de arquivo rante da imagem televisiva, e concluímos ser, Essa importante diferença observada se sim, ela, a imagem que mais bem dizia da na- deu quando as emissoras mantiveram nos ar- tureza precípua da televisão. quivos de seu portal na Internet imagens de Quando, porém, projetamos o conceito programas que foram ao ar com um relógio para práticas enunciativas do tempo reality no écran, e não o retiraram ao arquivá-los. Por da TV off -line na Internet o conceito mostrou- isso, a hora exibida no panorama do player di- se improdutivo, inadequado, improcedente; fi cilmente seria compatível com a hora exibi- ou seja, a TV on-line não poderia ser pensa- da pelo computador. Se fosse, teria sido uma da nem como remediação da TV off -line, nem fantástica coincidência, um acaso, ou até, um como uma sua atualização. verdadeiro acontecimento. Teríamos nos enganado quanto ao que se- ● O graphic “ao vivo” ria precípuo da televisão (a imagem-duração)? A terceira situação encontrada nos portais Estaríamos diante de um novo ponto zero do das emissoras que compuseram nosso corpus aparecer fenomenológico de uma imagem, que não se relacionava à existência de um relógio não é a televisiva, mas, sim, web televisiva? na tela, e sim à presença da inscrição “ao vivo” No estágio de nossa pesquisa tendemos a nos panoramas, a partir da qual se subenten- de estar havendo uma transmissão em “tem- concluir que as imagens da TV on-line distin- po real”. Talvez essa seja a enunciação que guem-se em natureza e não apenas em grau mais pode confundir o espectador-usuário, das imagens da TV off -line. porquanto, havendo apenas uma inscrição de Haveria entre elas, no entanto, apenas dife- horário visível - a do Windows no computa- renças de grau se fossem pensadas, as off -line dor - tudo leva a crer que aquelas imagens de e as on-line, como atualizações da tele-visão. arquivo estão no ar ao vivo e em tempo real Ou seja, se nosso objeto de pesquisa se tornas- (simultâneo ao do espectador) no momento de se a tele-visão, as incongruências da televisão sua espectação. expandida talvez se resolvessem epistemo- Ou seja, nessa prática das emissoras - a logicamente. E poderíamos fazer avançar a nosso ver puramente incidental – há uma li- pesquisa em Comunicação acerca da televisão, quefação de todos os sentidos e fi gurações de principalmente em direção às audiovisualida- tempo como os temos entendido até então em des contemporâneas, nas quais as fronteiras sociedade. conhecidas entre uma mídia e outra tendem a dissolver-se em passagens por umas e outras. Considerações fi nais Referências Ao longo de nossas pesquisas sobre a tele- visão fomos levados a investigar mais especifi - BENJAMIN, W. 1985. Magia e técnica, arte e política. camente a natureza precípua das imagens por São Paulo, Brasiliense, 256 p. BERGSON, H. 1999. Matéria e memória. 2. ed. São ela veiculadas, e acabamos fabulando acerca Paulo, Martins Fontes, 292 p. de uma imagem-duração que provavelmente BERGSON, H. 2006. Duração e simultaneidade. São Paulo: Martins Fontes, 242 p. explicaria seu ponto zero de aparecer, sendo BOLTER, J.D.; GRUSIN, R. 1999. Remediation: Under- que o paradigma para tal proposição alicer- standing new media. Cambridge, The MIT Press, çou-se em um tempo enunciado pelas emisso- 307 p. BOURDIEU, P. 1996. Razões práticas: sobre a teoria da ras como real e ao qual, por ser performático ação. Campinas, Papirus, 224 p. e televisualmente construído, chamamos de DELEUZE, G. 2004. Bergsonismo. São Paulo, Editora 34, 144 p. reality. Esse tempo reality - dado a ver grafi ca- DERRIDA, J. 1998. Ecografi as de la televisión. Entre- mente nos panoramas em relógios de marcar vistas fi lmadas a Bernard Stiegler. Buenos Aires, (e medir) o tempo desenrolando-se como em Eudeba, 203 p. KILPP, S. 2010. A traição das imagens. Espelhos, câ- nossos próprios relógios (sugerindo haver um meras e imagens especulares. , Entre- tempo único e universal) - foi metodologica- meios, 124 p. MANOVICH, L. 2001. The language of new media. mente imobilizado pelo pensamento com vis- Massachusett s, The MIT Press, 394 p. tas à percepção de outros moventes nos fl uxos McLUHAN, M. 1999. Os meios de comunicação como consentâneos de imagens televisivas. extensões do homem. São Paulo, Cultrix, 407 p. TUCHERMAN, I.; SAINT-CLAIR, E. 2008. O corpo Em todos os monitoramentos que fi ze- transparente: dispositivos de visibilidade e mu- mos em diferentes emissoras e fl uxos, mesmo tações do olhar. Intexto, 2(19):1-17. quando atravessados pelo zapping do especta- Submetido: 03/11/2013 dor, autenticamos essa mesma tendência du- Aceito: 22/11/2013

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