UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS CURSO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS

ANÁLISE DA RELAÇÃO BRASIL-MÉXICO ATRAVÉS DA OBSERVAÇÃO DE CASOS: REFORMA DO CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU E ACE 55

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

Romário de Avilla Rodrigues

Santa Maria, RS, Brasil

2014

ANÁLISE DA RELAÇÃO BRASIL-MÉXICO ATRAVÉS DA OBSERVAÇÃO DE CASOS: REFORMA DO CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU E ACE 55

Romário de Avilla Rodrigues

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM, RS), como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Relações Internacionais.

Orientador: Prof. Dr. José Renato Ferraz da Silveira

Santa Maria, RS, Brasil

2014

Universidade Federal de Santa Maria Centro de Ciências Sociais e Humanas Departamento de Ciências Econômicas Curso de Relações Internacionais

A Comissão Examinadora, abaixo assinada, aprova o Trabalho de Conclusão de Curso

ANÁLISE DA RELAÇÃO BRASIL-MÉXICO ATRAVÉS DA OBSERVAÇÃO DE CASOS: REFORMA DO CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU E ACE 55

elaborada por Romário de Avilla Rodrigues

como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Relações Internacionais

COMISSÃO EXAMINADORA:

José Renato Ferraz da Silveira, Dr. (Presidente/Orientador)

Marcos Pascotto Palermo, Me. (FADISMA/UNIFRA)

Igor Castellano da Silva, Me. (UFSM)

Santa Maria, 13 de janeiro de 2014

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente à minha família, em especial aos meus pais, Breno e Marelaine, e ao meu irmão Diego, por tudo nesta vida: pelo apoio, amor, carinho, incentivo, companheirismo, compreensão e suporte. Ainda hão de criar uma palavra que possa resumir todas as coisas boas que a família nos proporciona. Se alcancei tantos objetivos em minha vida, se estou concluindo mais esta fase, tudo é devido a vocês, aos seus ensinamentos e aos valores transmitidos que são responsáveis por moldar a pessoa que me tornei hoje e tenho certeza que continuará sendo fator fundamental na pessoa que hei de me tornar amanhã. Agradeço também à Ana Julia pois cada dia que passo ao seu lado tenho o privilégio de aprender algo novo e me torno uma pessoa melhor. Símbolo de garra, luta, és minha guerreira. Teu apoio incondicional nas horas de “pânico” pelo TCC, ou diversos outros problemas foram determinantes para a conclusão deste trabalho. Tu és minha motivação, minha inspiração, meu chão, meu céu. Obrigado pelo companheirismo, obrigado pela confiança. Te amo cada vez mais e mais. Aos colegas e amigos da faculdade, muito obrigado pela amizade e pela parceria, seja na aula, seja nos botecos da cidade, seja passando a noite jogando conversa fora. Meu agradecimento especial, pela irmandade construída ao longo destes quatro anos, ao famigerado bond: Cristina, Fernanda, Júlia, Leonardo e Luize. Agradeço também aos amigos de Gravataí pelos vários momentos de descontração e risadas, proporcionada nas vezes que me fazia presente; e pela compreensão quando da minha ausência. Não nomearei cada um de vocês pois tenho certeza que alguém certamente seria esquecido. Gostaria também de dar meu muito obrigado a todos os meus professores: do Colégio Cenecista Nossa Senhora dos Anjos, da Universidade Federal de Santa Maria e da Universidad Autónoma de San Luis Potosi, tenho certeza que todos contribuíram para esta conquista. Em especial agradeço à professora Ivani Vassoler e ao Maestro Flávio Gonzalez (UASLP), ambos dedicaram parte de seu tempo e contribuíram de forma direta neste estudo. Por fim agradeço ao Professor/Orientador/Amigo José Renato, pelos inúmeros ensinamentos no decorrer do curso, através das diversas matérias lecionadas sempre com dedicação e sabedoria. Mas principalmente agradeço pela compreensão ao ler, reler, analisar, sugerir e contribuir na realização deste trabalho.

RESUMO

Trabalho de Conclusão de Curso Curso de Relações Internacionais Universidade Federal de Santa Maria

ANÁLISE DA RELAÇÃO BRASIL-MÉXICO ATRAVÉS DA OBSERVAÇÃO DE CASOS: REFORMA DO CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU E ACE 55

AUTOR: ROMÁRIO DE AVILLA RODRIGUES ORIENTADOR: JOSÉ RENATO FERRAZ DA SILVEIRA Data e Local da Defesa: Santa Maria, 13 de janeiro de 2014.

A notável e crescente interdependência que assola a sociedade internacional levanta diversas questões interessantes quanto aos frequentes conflitos nas relações bilaterais e multilaterais. Dentro do contexto da cooperação Sul-Sul, que foi utilizada desde o fim do regime militar, mas que se tornou prioridade e teve seu ápice somente no governo Lula; a relação do Brasil com os países em desenvolvimento, em especial com seus vizinhos latino- americanos, tem ganhado destaque. Por isto este estudo propõe-se a abordar a relação – que não é alvo frequente de análise por parte dos acadêmicos brasileiros – entre os dois Estados mais relevantes em termos econômicos e políticos da América Latina: Brasil e México. O México é peça chave na estratégia brasileira de maior integração com a região latino- americana, entretanto, historicamente as relações entre estes dois países nunca foram próximas e sempre apresentaram certo nível de desconfiança recíproca. A fim de analisar o nível de cooperação desta relação bilateral, dois casos são abordados: um político, a reforma do Conselho de Segurança da ONU; e outro econômico, a renegociação do Acordo de Complementação Econômica nº 55. O México apresenta fortes ressalvas quanto ao anseio brasileiro de tornar-se membro permanente do CSNU pois isto seria respaldar e reconhecer o Brasil como principal potência regional latino-americana. Já o Brasil, por ser menos competitivo que o México no setor automotivo, viu-se obrigado – e foi bem sucedido – a renegociar o ACE 55 com o intuito de proteger a indústria automobilística nacional, que é fator importante no desenvolvimento econômico brasileiro. Percebe-se, enfim, que apesar dos inúmeros discursos de ambas as partes ressaltando a necessidade de maior cooperação, a rivalidade velada ao posto de maior potência regional latino-americana segue ditando, mesmo que de forma sutil, as relações entre Brasil e México.

Palavras-chave: Acordo de Complementação Econômica nº 55. América Latina. Política Externa Brasileira. Reforma do Conselho de Segurança da ONU.

RESUMEN

Trabajo de Fin de Grado Curso de Relaciones Internacionales Universidad Federal de Santa Maria

ANÁLISIS DE LA RELACIÓN BRASIL-MÉXICO MEDIANTE LA OBSERVACIÓN DE CASOS: REFORMA DEL CONSEJO DE SEGURIDAD DE LAS NACIONES UNIDAS Y ACE 55

AUTOR: ROMÁRIO DE AVILLA RODRIGUES ORIENTACIÓN: JOSÉ RENATO FERRAZ DA SILVEIRA Fecha y Lugar de Defensa: Santa Maria, 13 de enero de 2014.

La notable y creciente interdependencia que hay en la sociedad internacional genera diversas cuestiones interesantes acerca de los frecuentes conflictos en las relaciones bilaterales y multilaterales. Dentro del contexto de la cooperación Sur-Sur, que fue utilizada desde el fin del régimen militar, pero que se ha convertido en prioridad y tuvo su ápice solamente en el gobierno Lula; la relación de Brasil con los países en desarrollo, en especial con sus vecinos latinoamericanos, ha ganado destaque. Por eso este estudio se propone a enfocar esta relación – que todavía no es objetivo común de análisis de los académicos brasileños – entre los dos Estados más relevantes en términos económicos y políticos de la América Latina: Brasil y México. México es una parte clave en la estrategia brasileña de mayor integración con la región latinoamericana, sin embargo, históricamente las relaciones entre los dos países nunca han sido próximas y siempre presentaran cierto nivel de desconfianza mutua. A fines de analizar el nivel de cooperación de esta relación bilateral, dos casos son abordados: un político, la reforma del Consejo de Seguridad de las Naciones Unidas; y otro económico, la renegociación del Acuerdo de Complementación Económica nº 55. México ha presentado fuertes reservas cuanto al deseo brasileño de ser un miembro permanente del CSNU porque eso significaría endosar y reconocer Brasil como la principal potencia regional de Latinoamérica. Ya Brasil, por tener menos competitividad que México en el sector automotriz, se ha visto obligado – y fue bien sucedido – a renegociar el ACE 55 con la intención de proteger la industria automovilística nacional, que es importante factor en el desarrollo económico brasileño. Se puede percibir, en fin, que a pesar de los numerosos discursos de ambas las partes destacando la necesidad de mayor cooperación, la rivalidad silenciosa al puesto de mayor potencia regional latinoamericana sigue dictando, aunque sutilmente, las relaciones entre Brasil y México.

Palabras clave: Acuerdo de Complementación Económica nº 55. América Latina. Política Exterior Brasileña. Reforma del Consejo de Seguridad de las Naciones Unidas.

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Comércio bilateral México-Brasil, 2001-2011 (em milhões de dólares) ...... 46 Gráfico 2 – Principais receptores de IED na América Latina (%) ...... 47 Gráfico 3 – Taxa de convergência em votações na Assembleia Geral da ONU ...... 58 Gráfico 4 – Principais produtos comercializados entre Brasil e México, 2011 (%)...... 75 Gráfico 5 – Balança Comercial do Setor Automotivo – Brasil e México (US$) ...... 77

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Índice de Desenvolvimento Humano no Brasil e no México em 2012 ...... 39

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – 10 maiores intercâmbios comerciais com o Brasil em bilhões de US$ ...... 41 Tabela 2 – Comércio Bilateral Brasil-México, 1970-2010 (proporcional) ...... 44 Tabela 3 – Principais empresas mexicanas com investimento fixo no Brasil ...... 48 Tabela 4 – Acordos Bilaterais México-Brasil ...... 50

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ACE Acordo de Complementação Econômica ALADI Associação Latino-americana de Integração BRICS Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul CALC Cúpula da América Latina e Caribe CELAC Comunidade dos Estados da América Latina e Caribe CEPAL Comissão Econômica para a América Latina CS/CSNU Conselho de Segurança das Nações Unidas EUA Estados Unidos da América FHC Fernando Henrique Cardoso G4 Alemanha, Brasil, Índia e Japão IBAS Índia, Brasil e África do Sul IED Investimento Estrangeiro Direto MINUSTAH Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti MERCOSUL Mercado Comum do Sul MRE Ministério de Relações Exteriores NAFTA/TLCAN Tratado Norte-Americano de Livre Comércio OEA Organização dos Estados Americanos OMC Organização Mundial do Comércio ONU Organização das Nações Unidas P5 China, Estados Unidos da América, França, Reino Unido e Rússia PAN Partido da Ação Nacional PEB Política Externa Brasileira PIB Produto Interno Bruto PRI Partido Revolucionário Institucional PT Partido dos Trabalhadores UE União Europeia UNASUL União de Nações Sul-Americanas URSS União das Repúblicas Socialistas Soviéticas

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...... 12 1. O MODELO BRASILEIRO DE INSERÇÃO INTERNACIONAL...... 16 1.1 Política exterior à época do Império Brasileiro ...... 17 1.2 O período de transição na política interna e na política exterior ...... 19 1.2.1 Barão do Rio Branco, o patrono da diplomacia brasileira...... 19 1.3 O início do americanismo ...... 21 1.4 Era Vargas e o americanismo pragmático ...... 22 1.5 O inicio da Guerra Fria e o posicionamento brasileiro ...... 23 1.6 Nasce um novo paradigma, o globalismo ...... 24 1.7 A política externa nos anos de chumbo ...... 25 1.7.1 Novamente o americanismo ...... 26 1.7.2 O retorno do globalismo ...... 27 1.8 Institucionalismo pragmático ...... 29 1.8.1 Política externa de Collor, Itamar e FHC ...... 30 1.8.2 Governo Lula, a questão regional e a diplomacia presidencial ...... 33 1.8.3 Governo Dilma, continuidade e adaptações na PEB ...... 36 2. HISTÓRICO DAS RELAÇÕES ENTRE BRASIL E MÉXICO ...... 39 2.1 Histórico das relações comerciais e econômicas ...... 42 2.2 Histórico das relações políticas ...... 49 3. BRASIL E MÉXICO: REFORMA DO CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU E ACE 55 ...... 56 3.1 Reforma do Conselho de Segurança da ONU ...... 56 3.1.1 Atual funcionamento do CSNU ...... 59 3.1.2 Proposta do G4 para a Reforma do Conselho ...... 62 3.1.2.1 Posicionamento do México quanto ao anseio brasileiro ...... 66 3.1.2.2 Outras Propostas de Reforma do Conselho de Segurança da ONU ...... 69 3.1.3 Brasil um novo membro permanente, sonho ou possibilidade? ...... 70 3.2 Imbróglio em torno do ACE 55 ...... 72 3.2.1 ACE 53 e ACE 55 ...... 74 3.2.1.1 Resultados dos acordos e renegociação do ACE 55 ...... 76 CONCLUSÃO ...... 81 REFERÊNCIAS ...... 84

12 INTRODUÇÃO

Um dos principais objetivos na questão da política externa brasileira (PEB) do fim do século XX – que ainda mantêm-se como de essencial importância – é a busca por tornar-se membro pleno do Conselho de Segurança das Nações Unidas. O principal ponto de inflexão nesta questão – onde o assunto realmente voltou com força à pauta brasileira de política externa – é caracterizado pela nomeação de Celso Amorim para Ministro das Relações Exteriores do Brasil em 1993 (AMORIM, 1995), mesmo que Fernando Henrique Cardoso (FHC), enquanto ministro das relações exteriores em 1992, já desse mostras de profundo apreço pela vaga permanente no conselho. Contudo vale ressaltar que esta aspiração brasileira nasceu junto com a criação da Organização das Nações Unidas (ONU). Para Garcia E.V (2011) o Brasil, que nesta época era caracterizado por uma política externa de cunho americanista, não conseguiu angariar consenso entre as outras grandes potências do P5 (cinco permanentes) – apesar do apreço e do apoio escancarado do então presidente americano Franklin Roosevelt (AMORIM, 2005; GARCIA E.V, 2011) – pois Churchill (Reino Unido) e Stálin (Rússia) fizeram grandes objeções à entrada de outro membro permanente: para eles, o Brasil não passava de uma potência média1 com futuro econômico e político incerto, cuja entrada no Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) certamente levantaria discussões a respeito da inserção de outras potências regionais no Conselho (GARCIA, 2010), algo que não era de interesse de nenhum dos países do P5, incluindo os Estados Unidos da América (EUA). É interessante perceber como paradoxalmente a política externa brasileira americanista foi a responsável por aproximar o Brasil do objetivo de ser um membro permanente do CSNU, através de Roosevelt; mas ao mesmo tempo gerou a rejeição das outras potências, visto que o Brasil apenas dobraria o voto norte-americano. Dentro deste contexto de construir a campanha para ser aceito como membro permanente do CSNU fundamentado principalmente no papel exercido como liderança

1 Existem inúmeros conceitos para que explicam o termo “potência média” (Ver LEITE, 2012, pp. 39-50), todos são convergentes em afirmar que potência média é um país que detém peso regional significativo em termos populacionais, territoriais e/ou econômicos, e que a partir de tais características diferencia-se dos demais Estados da sua região (LEITE, 2011). Carsten Holbraad (apud LEITE, 2011, p. 43) – cientista inglês, discípulo de Martin Wight e membro da teoria conhecida como “Escola Inglesa” ou “Sociedade Internacional” – elabora uma lista baseada em termos econômicos e demográficos, onde contabiliza 18 potências médias, seriam elas: África do Sul, Argentina, Alemanha, Austrália, Brasil, Canadá, China, Espanha, França, Índia, Indonésia, Irã, Itália, Japão, México, Nigéria, Polônia e Reino Unido.

13 regional latino-americana, não ignorar o maior “rival” brasileiro na América Latina: o México. Mas e por que o México? Além dos motivos financeiros e geográficos – PIB, população e território – o México representa o único Estado latino-americano capaz de fazer frente ao Brasil (pelo menos no curto/médio prazo) na questão econômica e o único que no viés político toma iniciativas independentes de apoio de outros grandes países latino- americanos, como o próprio Brasil. Para cumprir o objetivo de analisar as relações entre estes dois gigantes latino-americanos, serão observados dois casos de conflito entre Brasil e México: no âmbito político, o não apoio do governo mexicano à proposta de reforma do CSNU através do alinhamento com a proposta de “União pelo Consenso”, apelidado de Coffee Club; e no âmbito econômico, o conflito ocorrido devido à reformulação do Acordo de Complementação Econômica 55 (o ACE 55).

Ao passar de muitos anos, Brasil e México conseguiram construir relações corretas, cooperativas e pacíficas, ainda que de baixa intensidade, modestas e, em certos aspectos, irrelevantes. Em geral, esses países priorizaram suas relações com outros atores internacionais e terminaram adotando uma atitude negligente na sua agenda recíproca. Nos primeiros anos do século XXI, a tendência histórica de relações corretas, entretanto de baixa intensidade, começou a mudar. Essas tendências tem trazido consigo importantes consequências, tanto em questões estritamente bilaterais como em âmbitos multilaterais (hemisféricos e globais) (ÁVILA, 2009, p.45, tradução nossa)2.

Este fragmento ilustra exatamente a importância crescente que a relação Brasil– México está tendo na agenda de política externa de ambos os países. As relações tanto econômicas, quanto políticas, nunca tomaram forma tão significante quanto agora. Apesar de os números ainda estarem longe de apontar uma relação indispensável para ambos, o caminho traçado indica que num futuro não muito distante esta relação pode se tornar fundamental para o desenvolvimento econômico não só de ambos os países, mas de toda a América Latina. O principal ponto de reflexão do presente estudo é analisar como o objetivo brasileiro de ser a potência hegemônica regional na América Latina (se é que de fato ela existe) afeta as relações político-econômicas entre os dois global players3 da América Latina: Brasil e

2 A lo largo de muchos años, Brasil y México lograron construir relaciones correctas, cooperativas y pacíficas, aunque también de baja intensidad, modestas y, en ciertos aspectos, irrelevantes. En general, estos países priorizaron sus relaciones con otros actores internacionales y terminaron adoptando una actitud negligente para su agenda recíproca. En los primeros años del siglo XXI, la tendencia histórica de relaciones correctas, pero de baja intensidad, comenzó a cambiar. Estas tendencias han traído consigo importantes consecuencias, tanto en términos estrictamente bilaterales como en ámbitos multilaterales (hemisféricos y globales). 3 Conforme Reis (2013) destaca, o termo global player – jogador global em tradução literal – está ligado ao peso que empresas ou países possuem na esfera internacional. Este termo é utilizado para adjetivar as empresas e/ou países protagonistas que possuem destaque no mercado global como um todo ou em determinado segmento/setor. O maior exemplo de global player é a força estadunidense, porque possui destaque nas variadas faces existentes (política, econômica, cultural, militar, etc.). No presente estudo, o termo será utilizado para

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México. Concomitantemente alguns tópicos invariavelmente virão à tona e serão abordados; o tema da hegemonia consensual na região latino-americana, compreender qual a importância e influência do posicionamento mexicano quanto aos anseios brasileiros na ONU e discutir quais são as possibilidades brasileiras em alcançar o almejado posto de membro permanente do CSNU. O período a ser observado de modo mais detalhado será o do governo de Luis Inácio Lula da Silva (2003-2010), que junto a Celso Amorim – o Ministro das Relações Exteriores durante todo o governo – fizeram uma campanha intensa para a aquisição da vaga permanente, e foram indubitavelmente os que mais galgaram progresso neste objetivo (apesar de a presidente paulatinamente fazer declarações a respeito da ineficácia do CSNU, como no discurso de abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas em 24 de setembro de 2013). Também serão analisados alguns acontecimentos conflituosos da relação Brasil-México durante o governo de Dilma Rousseff, como é o caso da renegociação do ACE 55. Para elucidar e organizar da melhor forma possível a questão, este estudo estará dividido em três capítulos antes da exposição das conclusões finais. No primeiro capítulo será exposto de forma breve as condutas da política externa brasileira através da história, suas nuances e seus alinhamentos, utilizando como base bibliográfica o estudo de Leticia Pinheiro (2004) que analisa os rumos tomados pela política externa brasileira de 1889 até 2002, e a obra de Amado Luiz Cervo e Clodoaldo Bueno (2002) que faz uma análise mais ampla e detalhada da história da política exterior do Brasil. Obviamente também será abordado o período do governo do PT (Partido dos Trabalhadores), que é o que me proponho a estudar no presente trabalho, de forma mais cuidadosa e detalhada. Este capítulo tem grande importância para a compreensão do tema abordado já que é necessário entender como, porque e quais foram as consequências das mudanças empreendidas na política externa brasileira principalmente a partir do governo Fernando Henrique Cardoso e Luis Inácio “Lula” da Silva. Serão discutidos ainda alguns termos constantemente presentes nos estudos de política externa brasileira como a busca pela “autonomia” e os variados “alinhamentos” brasileiros. No segundo capítulo procurarei contextualizar historicamente a relação Brasil-México no aspecto político-econômico, focando em especial o alvo do estudo: as ideias e atuação de ambos os países junto a ONU, principalmente quanto à questão de reforma do CSNU; e a exemplificar a força político-econômica do Estado brasileiro e mexicano, que são de grande relevância no plano global.

15 relação comercial, com destaque especial ao setor automotivo. Como salientado anteriormente através do fragmento de Ávila4, apesar de a relação entre o estado brasileiro e mexicano ainda não significar nem de perto uma relação de dependência, os números e a importância crescente desta relação apontam que os dois maiores países da América Latina podem estar estreitando relações de uma maneira inédita. Já no terceiro capítulo finalmente abordarei os casos propostos para análise: o imbróglio envolvendo as renegociações do Acordo de Complementação Econômica número 55 e as divergências a respeito da reforma da ONU, principalmente o que concerne ao Conselho de Segurança. Também procurarei analisar como o Brasil busca apoio e/ou lida com as oposições na América Latina, além do México. Afinal, a questão regional é de extrema importância para dar base aos anseios brasileiros como membro permanente do Conselho de Segurança da ONU. É de suma relevância que o Brasil através da legitimação consensual como a maior potência regional da América Latina fortaleça sua candidatura ao Conselho de Segurança. Este estudo pretende contribuir na discussão de assuntos tão importantes na agenda de política externa brasileira como a questão regional e a atuação frente a ONU. Apesar de vários intelectuais se debruçarem sobre o tema da representação brasileira na ONU e as propostas de reforma do organismo – resultando em trabalhos de significativa importância –, o mesmo não ocorre quando tratamos da relação Brasil-América Latina, principalmente no que se refere à relação específica Brasil-México. Por isso o principal objetivo desta análise é elucidar um pouco mais a relação destes dois países tão importantes na América Latina e no cenário mundial.

4 Rever citação de Ávila (2009) na página 13 do presente estudo.

16 1 O MODELO BRASILEIRO DE INSERÇÃO INTERNACIONAL

Prontamente é preciso observar que a política externa brasileira é uma política de Estado, e não de governo. Os objetivos – desenvolvimento social, econômico e do Estado brasileiro – sempre foram os mesmos, as mudanças que ocorrem quando há câmbios no governo são apenas de método e modo de operacionalização e aplicação.

[...] primeiro, a implantação de um mesmo modelo de desenvolvimento não implica a adoção de uma única linha de política externa. Em outras palavras, os mesmos interesses podem ser alcançados por meio de estratégias e mesmo com base em princípios político-ideológicos distintos. Segundo, a mudança na natureza do regime político não determina uma mudança no conteúdo da política externa. Terceiro, e complementando a premissa anterior, a política externa pode ser objeto de uma profunda revisão sem que haja alteração substantiva no regime político. (PINHEIRO, 2004, p.10).

Ou seja, apesar de os meios por vezes se mostrarem distintos, os fins almejados sempre são os mesmos: desenvolvimento nacional e autonomia internacional. A mudança decorre normalmente da personalidade e características de três relevantes atores: presidente da república, ideologia do partido no poder e ministro das relações exteriores. O Brasil, segundo Pinheiro (2004), manteve o posicionamento de política externa americanista até o ano de 1974 quando se tornou globalista hobbesiano até o ano de 1990 (excetuando-se de 1961 a 1964 quando a abordagem de política externa seguiu um modelo globalista grotiano5). Assim, podemos observar que a construção do modelo institucionalista pragmático, que para Pinheiro (2000) é o que rege a política externa brasileira atualmente, começa com o abandono do americanismo em 1974, durante a ditadura militar no Brasil. Para Leticia Pinheiro, a partir de então, o Brasil partiu para outras abordagens de política externa, que não a americanista, pois percebeu que suas demandas não estavam sendo atendidas por completo – a não concessão de uma vaga permanente no Conselho de Segurança é um exemplo – e que outros posicionamentos poderiam ser mais vantajosos do que apenas seguir os ideais americanos. Enfim, relevou-se que se alinhando de forma automática ou até mesmo pragmática com os EUA, os custos de oportunidade eram maiores que os ganhos. Desta forma, o Brasil adotou políticas de cunho globalista, para que finalmente

5 Segundo Leticia Pinheiro (2004) os modelos globalista hobbesiano e grotiano se diferenciam de acordo com o objetivo no “jogo internacional”: no modelo hobbesiano, o Estado busca ganhos relativos, onde o ganho é relativo ao poder do Estado; já no modelo grotiano a busca é por ganhos absolutos, ou seja, ganhos iguais para ambas as partes.

17 em 1990, no governo Collor, se tornasse o institucionalismo pragmático o paradigma determinante (PINHEIRO, 2000). A fim de entender o posicionamento da política externa brasileira através do tempo, faz-se necessário uma breve análise dos caminhos percorridos pela PEB até o período em questão. Por isto este capítulo estará dividido em subcapítulos relativos às diretrizes dominantes de política externa, já que, relembrando, política externa é uma política de Estado e não de governo; desta forma procurarei analisar brevemente os pontos fundamentais de cada política.

1.1 Política exterior à época do Império Brasileiro

Obviamente a história da política exterior brasileira começou a partir da independência do Brasil de , em 7 de setembro de 1822. As primeiras e principais preocupações naturalmente eram manter os territórios (principalmente os fronteiriços) brasileiros resistindo às pressões externas e, é claro, apresentar o Brasil como Estado independente ao mundo. As relações que antes se davam via coroa portuguesa, agora teriam de ocorrer através de novos caminhos. Inicialmente a política exterior do Brasil foi extremamente pobre, praticamente passiva (CERVO e BUENO, 2002). O que se percebia era que devido aos vários tratados, alguns assinados antes mesmo da independência, a margem de manobra do império era praticamente nula, e o que se via era uma crescente influência e dependência do exterior: dividas com Inglaterra, problemas com Portugal, pressões na área do Prata e incertezas a cerca de uma série de tratados com Estados europeus. Contudo em 1844 com a extinção do sistema de tratados finalmente o Estado brasileiro se viu apto a desenvolver um projeto de política exterior. Este período que, segundo Cervo e Bueno (2002), vai até 1876 foi caracterizado pela ruptura com o sistema anterior e pelo fortalecimento da vontade nacional, orientando-se por quatro parâmetros e uma estratégia:

Em primeiro lugar, veio a decisão de controlar a política comercial, por meio da autonomia alfandegária. [...] Em segundo lugar, veio a decisão de equacionar o fortalecimento de mão de obra externa, pela extinção do tráfico de escravos e estímulos à imigração. A terceira decisão importante foi a de sustentar as posses territoriais, por meio de uma política de limites que regulamentasse em definitivo as fronteiras nacionais. [...] Optou-se, enfim, por uma presença decisiva nos destinos

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do subsistema platino de relações internacionais, tendo em vista interesses econômicos, políticos e de segurança. [...] definiu-se como estratégia de ação o uso intenso, inteligente e adequado da diplomacia, a fim de maximizar os ganhos externos, condicionando-se o uso da força a um recurso de ultima instancia, esgotada a ação diplomática, e somente em áreas onde seu emprego oferecesse garantias de sucesso. (CERVO e BUENO, 2002, p. 65-66).

A base estratégica para a manutenção das fronteiras consistia em duas ideias (CERVO e BUENO, 2002): primeiro o mito6 do nacionalismo, e segundo, as negociações acerca dos limites fronteiriços deveria se dar de forma bilateral. O nacionalismo e patriotismo são importantes neste caso porque o Estado não consegue vigiar as fronteiras, desta forma o “encarregado” em vigiar os limites é o próprio povo, e por isso a necessidade de criar a vontade e orgulho de ser brasileiro. Já a visão de que deveriam participar das negociações apenas os países envolvidos no pleito justifica-se porque o império acreditava que arbitragens não seriam favoráveis ao Brasil, pois o interesse pelas terras brasileiras não eram apenas de outros Estados recém independentes: EUA, França e Holanda tinham muito interesse na região amazônica e na navegação pelo rio amazonas. Também era percebido um principio de mudança no eixo Brasil-Europa (em especial Inglaterra) para Brasil-EUA, o comércio com os Estados Unidos da América – que estava cada vez maior em termos territoriais, pois subtraiu quase metade do território que pertencia ao México – estava em voraz ascendência, mesmo com o pequeno conflito de interesses acerca da região amazônica. Acredito que neste período destacam-se três situações onde o Estado brasileiro realmente preocupou-se acerca das fronteiras: a defesa da Amazônia do interesse internacional, em especial dos EUA; a discussão acerca de territórios no que hoje é o Amapá, com a França; e a questão do Prata, que esteve em tona duas vezes, na breve guerra contra a Argentina de 1851 a 1852 e posteriormente na maior guerra do continente sul americano: a guerra do Paraguai, ocorrida entre 1864 e 1870. Para Cervo (2002) as incursões brasileiras na região platina afirmaram o Brasil como potência periférica pelos seguintes motivos: comandou um sistema de acordos e alianças, via diplomacia, favoráveis para si; fez o uso da força quando esta se apresentava como última instância; submeteu os Estados “inimigos” à dependência financeira, por meio de empréstimos e contração de dívidas públicas; abriu os Estados à penetração econômica privada e garantiu o fornecimento de matérias primas necessárias para o sistema produtivo

6 O termo é usado por Amado Luiz Cervo (2002) por não ter emanado naturalmente do povo, e até porque o Brasil – diferentemente da maioria das outras colônias americanas – obteve sua independência sem a necessidade de guerra, e a guerra normalmente une o povo em torno de certos ideais, como o ideal pátrio.

19 brasileiro; e por fim, neutralizou a possibilidade do surgimento de uma hegemonia concorrente no período. É interessante observar que o Brasil a partir destas guerras, do uso da força e do hard power, acabou, além de proteger seus interesses, por transformar-se nessa época na potência hegemônica da região. Contudo, diferente da discussão que faremos ao longo do trabalho, ela não esteve nem próxima de exercer este posto via “consenso” e o alcançou pela imposição da força.

1.2 O período de transição na política interna e na política exterior

Nos primeiros anos de república no Brasil, em 1889, as mudanças foram poucas, tanto em sua política interna, como na externa. A visão dos monarquistas e dos republicanos sobre algumas questões centrais, como a questão do Prata e a consolidação das fronteiras, eram idênticas e por isso apenas seguiram o rumo determinado anteriormente (PINHEIRO, 2004). Entretanto uma mudança significativa ocorreu: o açúcar foi substituído pelo café como principal produto para a exportação, e isto acarretou em diversas modificações no sistema político brasileiro. Segundo Pinheiro (2004) este foi o principal fator de contribuição para o deslocamento do poder no Brasil: como a produção de açúcar ocorria no nordeste, era natural que agora a área de influência se deslocasse para a área de produção do café, que se situava no eixo centro-sul do país. A mudança no principal produto exportado também resultou numa maior aproximação com os EUA, grandes consumidores de café, e, por conseguinte, o distanciamento da Inglaterra: este foi o primeiro grande passo na mudança do eixo Brasil- Londres para Brasil-Washington.

1.2.1 Barão do Rio Branco, o patrono da diplomacia brasileira

José Maria da Silva Paranhos Júnior, o Barão do Rio Branco, representou um marco na política exterior brasileira e até hoje é um símbolo de sucesso para os diplomatas do nosso país, não por menos é aclamado como o patrono da diplomacia brasileira e tem seu nome gravado no instituto de preparação para a carreira diplomática: o Instituto Rio Branco.

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Rio Branco era um grande estrategista, assim como seu pai, o Visconde do Rio Branco, que passou por diversos ministérios na época imperial. O grande motivo pelo qual o Barão do Rio Branco foi tão bem sucedido é que ele traçou – e ele tinha carta branca para agir da forma que bem entendesse devido ao seu enorme prestígio – objetivos que ademais de terem prioridade na agenda brasileira, eram alcançáveis. Cervo e Bueno (2002) afirmam que as grandes linhas por ele seguidas eram: a busca de uma supremacia compartilhada na região sul-americana, restauração do prestígio internacional do Brasil, reafirmação da soberania do país, defesa da agro exportação e resolução de problemas iminentes. Podemos perceber que os objetivos em si eram relativamente simples, de fácil entendimento; contudo o nível de complexidade que as negociações exigiam era alto. O governo brasileiro, tanto no império como na república (através de Roosevelt), não percebia a Doutrina Monroe7 como uma ameaça a soberania dos países americanos; a visão era que este se mostrava um recurso defensivo contra o imperialismo europeu (PINHEIRO, 2004). Tanto Amado Luiz Cervo e Clodoaldo Bueno (2002), como Leticia Pinheiro (2004) convergem na opinião de que o sucesso das políticas implantadas por Rio Branco deve-se ao ajuste fino obtido junto aos EUA, que reafirmavam cada vez mais seu posto de potência a nível mundial. O Brasil solucionou os casos do e do Amapá, com Bolívia (em menor escala Peru) e França, respectivamente, não devido ao apoio escancarado estadunidense, muito longe disso, nesse caso o interesse dos EUA poderia ir contra aos interesses brasileiros. O que ocorreu foi que o Barão do Rio Branco conseguiu, através de diversas negociações, que os EUA tomassem uma posição relativamente neutra quanto às questões territoriais e que ajudasse a isolar o caso de possíveis intervenções europeias e de arbitragens internacionais: desta forma o Brasil negociou bilateralmente com Bolívia, e logo depois com o Peru, acertando a “compra” do Acre (CERVO e BUENO, 2002). Podemos perceber que Rio Branco atingiu basicamente todos os objetivos propostos por ele. Mas o que realmente o faz ser lembrado até hoje é a questão dos limites territoriais. Além de antes de ser Ministro das Relações Exteriores ter participado de duas arbitragens com decisões favoráveis ao Brasil (questão de Palmas com Argentina, e questão do Amapá com a França), teve exímia atuação na questão do Acre e na assinatura de tratados sobre

7 Esta concepção foi idealizada pelo ex-presidente dos Estados Unidos da América James Monroe. A Doutrina Monroe se refere à ideia de “América para os americanos”, frase proferida em 1823 por James Monroe e que se tornou símbolo da doutrina que se baseava em basicamente três linhas: não intervenção em assuntos internos de países americanos; não intervenção dos EUA em conflitos europeus; e por fim, não intervenção dos europeus em assuntos de países americanos.

21 limites territoriais com basicamente todos os países que faziam fronteira com o Brasil na época.

1.3 O início do americanismo

Com a saída de Rio Branco do Ministério das Relações Exteriores (MRE) devido ao seu falecimento em 1912, assume Lauro Müller (após Enéias Martins, que ficou no posto de forma interina por apenas quatro dias). Tanto Müller quanto outros ministros da república velha, seguem a herança de política externa deixada por Rio Branco: maior integração com Estados Unidos e maior aproximação com antigos rivais latino-americanos. Em 1914 inicia-se a 1ª Guerra Mundial, fato histórico que desencadeou uma série de acontecimentos que culminariam com os EUA obtendo o posto de potência hegemônica mundial. Obviamente muitas ocorrências dessa série tiveram reflexos poderosos na política interna e externa do Brasil, principalmente na observação que era não só necessária, mas também benéfica ao país, a aproximação cada vez maior com os EUA, o alinhamento com seus pensamentos e suas políticas, uma espécie de almejada dependência: o Brasil buscava galgar seu desenvolvimento a reboque do crescimento norte americano, por isso nesta fase diz-se que a política exterior era de alinhamento americanista automático8. Mesmo que com atuação praticamente nula na 1ª Guerra Mundial, afinal grande parte do exército brasileiro – que entrou na guerra após o suposto bombardeio de navios brasileiros no oceano atlântico pela marinha alemã – enviado à Europa nem chegou a participar do conflito, devido a fortes doenças que atingiram o contingente; o Brasil tentou de várias formas participar dos concertos que definiriam o rumo dos países derrotados, através da Liga das Nações e da Conferência da Paz de Paris, contudo, não obteve sucesso.

8 A maioria dos estudiosos de PEB dividem as linhas de política externa de 1902 até 1961 em basicamente duas: o alinhamento americanista automático e o alinhamento americanista pragmático. A diferença entre eles é que se no alinhamento automático o governo apoia todas as decisões e manobras dos EUA, com a crença de que a melhor opção ao país é “pegar carona” no crescimento e desenvolvimento da economia estadunidense; no alinhamento pragmático há uma pequena margem de manobra na tentativa de conciliar os interesses nacionais aos interesses estadunidenses, já que nesta visão há a percepção de que nem sempre os interesses estadunidenses devem convergir com os anseios brasileiros.

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1.4 Era Vargas e o americanismo pragmático

Com o fim da república velha e o advento da Era Vargas ocorrem profundas mudanças em todas as áreas do governo brasileiro. Um dos primeiros pontos de ruptura ocorreu no campo da política: com os militares tomando o poder, a elite café com leite ( e São Paulo) viu terminado o período de revezamento no governo federal, apesar de que todavia constituíam fonte inegável de poder. No campo econômico, conforme Pinheiro (2004), foram iniciados os movimentos para trocar o modelo agrário-exportador pelo modelo de industrialização através da substituição das importações. O cenário mundial anunciava esta necessidade visto que o preço dos produtos agrários vinha em acentuada queda após a crise de 1929: “paradoxalmente, a crise do capitalismo mergulhou a América Latina em um processo de modernização rápida, ardentemente desejada pelos novos dirigentes políticos” (CERVO, 2008, p. 44). Desta forma, a substituição do modelo era sine qua non para o desenvolvimento da indústria nacional. A partir de 1929 muitos países fecharam seu comércio internacional devido à crise, era a tentativa de aquecer o mercado interno e obter uma espécie de subsistência econômica; vantagem para os países que possuíam colônia(s), onde poderiam buscar matérias primas e riquezas, desvantagem para os que não possuíam territórios coloniais. Estes países desprovidos de colônias não se tardaram muito em perceber que fechar totalmente o comércio era insustentável economicamente, neste bloco de países encontravam-se especialmente dois Estados que galgavam cada vez maior protagonismo no cenário mundial: Alemanha e Estados Unidos da América. Por isso a política exterior do Brasil, principalmente no que concerne a questão comercial, esteve orientada por três princípios:

[...] primeiro, tirar proveito da rivalidade entre os blocos antagônicos que dividiam o mundo com o intuito de aumentar a competição interna e o poder de barganha externo; segundo, manter o comércio liberal com os Estados Unidos, levando esse país a decisões que aquele poder de barganha requeria; terceiro, realizar o comércio compensado com Alemanha e Itália, mais adequado à expansão industrial. (CERVO, 2008, p. 45).

Ou seja, o americanismo já não era mais automático e sim pragmático, pois a conjuntura internacional apresentava novas opções – leia-se Alemanha – aos anseios brasileiros de industrialização. O Brasil sabiamente fez uso do crescimento econômico

23 apoteótico alemão, que a elevou a grande potência mundial, para complementar os desejos não sanados através da relação com Washington. Na Segunda Guerra Mundial – pelo menos até a entrada dos EUA na guerra em fevereiro de 1942, que foi quando se tornou necessária uma posição clara do Brasil quanto a questão – este jogo foi ainda mais evidente. O governo de Vargas, que tinha semelhanças com o modelo alemão, fazia uso da “equidistância pragmática” (GERSON MOURA apud PINHEIRO, 2004, p. 23) em relação a EUA e Alemanha; apoiando ambos, nenhum, ou o que mais o favorece. A parceria com a Alemanha não foi afetada nem com os primeiros anos de guerra, o Brasil inclusive acatou alguns pedidos de extradição expedidos pela Alemanha. Enquanto os EUA se mantinham neutros, o Brasil também podia se dar ao luxo de manter essa posição, negociando normalmente com alemães e italianos. Contudo a situação começou a tornar-se insustentável com a descoberta das atrocidades nazistas, o ataque a Pearl Harbor, e por fim o bombardeio de navios brasileiros no atlântico, respectivamente, que culminou com a entrada do Brasil na 2ª Guerra Mundial. O Brasil entrou na guerra ao lado dos aliados, não antes de obter diversas promessas do governo norte americano, a principal delas: a criação da indústria siderúrgica nacional e ajuda para reequipar as forças armadas brasileiras. Desta vez o Brasil teve participação ativa no conflito (CERVO e BUENO, 2002), mais de 20 mil militares brasileiros participaram do conflito, por terra (principalmente na Itália), mar (defesa do Oceano Atlântico), e ar (defesa do Oceano Atlântico e ações no Mar Mediterrâneo). Contudo, a contradição do governo autoritário de Vargas ter apoiado a democracia norte americana e lutado contra o nazismo de Hitler faz enfraquecer seu governo – interna e externamente – que acaba deposto em 1945, movimento este apoiado pelos EUA.

1.5 O inicio da Guerra Fria e o posicionamento brasileiro

A contribuição brasileira aos aliados na guerra com certeza alavancou a representatividade brasileira no sistema mundial, o Brasil tinha a impressão de ter adquirido o direito de participar dos arranjos de paz que ditariam os rumos do novo sistema mundial e se via como um aliado especial dos EUA. Porém os benefícios não vieram na escala esperada: o Brasil não participou do 1º escalão de Estados nos concertos de paz, principalmente no que

24 concerne a criação da ONU, e os objetivos brasileiros não foram nem de perto alcançados. Entretanto é inegável que os ganhos foram muito maiores que as perdas com a ação na 2ª Guerra Mundial; o Brasil agora ganhava grande vantagem de projeção internacional em relação aos seus rivais sul americanos. A Guerra Fria foi um período marcado por muita tensão nas relações internacionais, esta tensão gerava imensa movimentação nas sedes diplomáticas e governamentais sem, contudo, a presença de manobras que levassem a câmbios no sistema internacional: a Guerra Fria foi um período de imensa movimentação para manter as coisas como estavam, manter o status quo. , que assumiu o poder após o golpe, trouxe de volta o alinhamento automático com os Estados Unidos como pauta da política externa brasileira, já seus sucessores, Getúlio Vargas – agora eleito democraticamente – e , optaram pelo alinhamento pragmático. É bem verdade que o alinhamento pragmático desta época foi muito mais limitado do que o utilizado no primeiro governo de Vargas, afinal a única opção existente para substituir os EUA era a Rússia, o que estava descartado devido ao “pavor” do comunismo, visto que a Europa estava destruída (CERVO, 2008). Neste período de ajuste do sistema internacional devido a dois blocos gigantescos diametralmente opostos, o poder de barganha – não só do Brasil, mas de grande parte de países da América Latina – ocorria na forma de leves inclinações ao comunismo, o que rapidamente chamava a atenção dos EUA, que buscavam manter o “bloco capitalista”. Conforme Leticia Pinheiro (2004) ressalta, a falta de desenvolvimento e a miséria foram apontados como principais fatores de contribuição para surgimento e alinhamento aos ideais comunistas.

1.6 Nasce um novo paradigma, o globalismo

Com o passar dos primeiros anos de Guerra Fria, muitos países passaram a adotar posições neutras quanto à disputa das duas mega potências, Rússia e EUA: o Brasil foi um destes países. Com a independência de diversas colônias europeias na África, o terceiro mundo estava mais forte que nunca, pois agora eram mais numerosos e disputados pelas duas grandes potências, o que lhes conferia certo poder de barganha.

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O Brasil passou a ver a relação estreita com os EUA não mais como um ponto de partida, e sim como consequência da obtenção de certo nível de poder de barganha na esfera mundial (PINHEIRO, 2004). Com a criação das teses de CEPAL, a crítica ao americanismo sendo cada vez maior internamente, e o surgimento de novos Estados, é apresentado um novo paradigma de política externa: o globalismo. No globalismo abandona-se a ideia de que a maior aproximação com os EUA elevaria os recursos de poder brasileiros; no globalismo preza-se pela diversificação das relações exteriores com outros Estados – sem preconceitos ideológicos (CERVO e BUENO, 2002) – como condição para aumentar o poder de barganha do país, até mesmo junto aos EUA (PINHEIRO, 2004). O globalismo foi implantado no Brasil através da chamada Política Externa Independente, nos governos Jânio Quadros (1961) e João Goulart (1961-1964), e buscou não determinar as relações mundiais entre relações leste-oeste mas sim relações norte-sul, o que mais uma vez demonstra a vertente cepalina do pensamento globalista. Ademais da mudança de paradigma, e por conta disso, o período teve significativa importância para o futuro das relações internacionais brasileiras. Finalmente o Brasil buscou dissociar-se da política colonialista de Portugal, adotou posições independentes da relação de disputa do mundo bipolar ao apoiar a manutenção de Cuba no sistema interamericano, se aproximou de países asiáticos e do leste europeu e denunciou discrepâncias nas regras de comércio internacional que desfavoreciam os países do terceiro mundo: era o principio do pensamento autônomo nas relações internacionais brasileiras.

1.7 A política externa nos anos de chumbo

Não é exagero dizer que com as políticas empregadas através de seu tempo de governo, João Goulart se distanciava dos EUA e se aproximava da URSS; a população também percebia esta mudança de rumo, e até apoiava a certo ponto, devido ao crescente antiamericanismo existente na sociedade brasileira (CERVO e BUENO, 2002). Obviamente estes movimentos chamaram atenção da grande potência capitalista, que não queria “perder” mais uma potência regional para o lado socialista da bipolar divisão mundial. Cervo e Bueno (2002) também ressaltam que apesar de os estadunidenses não terem participado de forma direta do golpe armado que reimplantou a ditadura no Brasil em 1964, é evidente que sua

26 participação foi indireta, contribuindo com inteligência e estando de prontidão caso reforços fossem necessários. Por fim o golpe ocorre apenas com o uso de forças brasileiras, e os EUA logo declaram seu apoio ao novo governo de Castelo Branco. Com o principio do regime militar o Brasil passou inclusive a observar de forma mais atenta a América Latina, engana-se, todavia, quem acredita que isto ocorria devido à intenção de estreitar relações (PINHEIRO, 2004); o Brasil olhava a América Latina pois acreditava que qualquer alteração política ou ideológica poderia vir a interferir de forma prejudicial à estabilidade do novo regime, por isso o rompimento das relações diplomáticas com Cuba, o envio de tropas brasileiras a Santo Domingo e o apoio a criação da Força Interamericana de Paz na Organização dos Estados Americanos (OEA).

1.7.1 Novamente o americanismo

Neste primeiro momento de regime militar o Itamaraty se viu obrigado a sujeitar-se às ordens militares e deixar de lado seus conceitos, este era o único modo de manter sua integridade institucional, pelo menos para resistir a “faxina” que estava sendo feita nos ministérios. Conforme frisa Leticia Pinheiro (2004) desta vez a mudança na política interna geraria mudanças na política externa brasileira: a deposição de Goulart fez voltar os militares ao poder, e os militares viam o paradigma americanista como parte fundamental da luta interna contra a ameaça comunista, já que a visão de mundo dos militares era bipolar, nada mais natural que escolher um lado, no caso, o lado capitalista (CERVO e BUENO, 2002). Agora motivado pela Guerra Fria e pela consequente ameaça socialista, o binômio segurança- desenvolvimento9 seria o definidor das prioridades da política interna e externa, para Castelo Branco, não havia como alcançar um sem o outro. Foi implantada a “correção de rumos” (CERVO e BUENO, 2002, p. 369) na política externa brasileira. Devido a todos estes fatores, a crença de que o Brasil poderia ser um “aliado especial” dos EUA voltou à tona, contudo novamente o sonho não se tornou realidade. Afinal, o que estava em andamento era justamente o contrário, o enfraquecimento da bipolaridade. Por isso,

9 Neste caso segurança não se refere apenas a segurança individual ou coletiva. Refere-se principalmente a segurança do sistema, a segurança do regime de governo brasileiro, ou seja: estar seguro da ameaça representada pela URSS e os ideais comunistas.

27 já no governo Costa e Silva (1967 a 1969), embora não fosse colocado em xeque o alinhamento com os EUA, ocorreram mudanças significativas, a principal delas: a incorporação do eixo norte-sul na definição da política exterior. Esta mudança de pensamento do governo militar fez com que fosse possível uma reaproximação com o Itamaraty, que a partir deste momento começou a reconquistar a sua autonomia, através de uma relação de confiança mútua (PINHEIRO, 2004). No governo Médici (1969 – 1974) volta-se ao paradigma americanista automático, mesmo que todas as tendências apontassem para a volta do globalismo devido às mudanças implementadas por Costa e Silva e apesar de o milagre econômico fazer aumentar as divergências com os EUA sobre questões econômicas, isto continuava sendo contornado através da proximidade dos interesses políticos e de segurança. Mesmo com essa visão, conforme destacam Cervo e Bueno (2002), a presença brasileira nos foros internacional foi aumentada substancialmente com o objetivo de atingir as metas nacionais de desenvolvimento e segurança, obter informações para atuar nos foros multilaterais e nas relações bilaterais, e tentar ter influência sobre a reforma da ordem mundial, desta forma o Brasil pretendia confirmar sua posição de “potência intermediária” (Cervo e Bueno, 2002, p. 400).

1.7.2 O retorno do globalismo

Apesar da tendência que o sistema mundial apresentava ao Brasil para seguir o modelo globalista de inserção internacional, esta continuidade foi interrompida pelo conjunto determinado pelo principio do regime militar no Brasil e da Guerra Fria no mundo. Contudo com a saída de Médici do governo para a entrada de (1974-1979) e posteriormente João Batista Figueiredo (1979-1985), novamente o Brasil muda seus conceitos de política exterior, agora seguindo a tendência mundial e optando pelo globalismo (PINHEIRO, 2004). Desta vez, além das pressões externas para a abertura do comércio e de relações com a maior quantidade de mercados possível, um fator determinante foi o fim do crescimento brasileiro oriundo do milagre econômico (CERVO e BUENO, 2002). Para manter a taxa em níveis altos era necessário aquecer o mercado interno e o de exportações: um dos meios mais eficazes para aumentar o nível de exportações é multipolarizando as relações econômicas ao máximo. Destarte se explica o reestabelecimento das relações com a República Popular da

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China, com a União Soviética, com os vizinhos latino-americanos – antes o que definia esta relação era majoritariamente o tema de preocupação com a segurança dos regimes militares–, e a aproximação com a África, rasgando a camisa de força ideológica, com o reconhecimento da independência da Angola sob governo socialista, por exemplo; assim retomava-se a busca pela autonomia através do afastamento das potências hegemônicas (PINHEIRO, 2004). Com o fim do regime militar em 1985 e a proclamação de José Sarney como novo presidente eleito por votação indireta, inicia-se uma mudança interessante no modelo econômico brasileiro, além das mudanças políticas, é claro. Segundo Leticia Pinheiro (2004) há opiniões divergentes sobre quando ocorreu a chamada “crise de paradigmas”, alguns autores dizem que esta crise já vinha ocorrendo desde o governo Figueiredo – este é o caso de Amado Luiz Cervo e Clodoaldo Bueno (2002) –, outros, contudo, afirmam que isto somente ocorreu no governo de Fernando Collor, na década de 90 – esta, a visão compartilhada por Pinheiro (2004). Fato é que houve crise, afinal os paradigmas (americanismo e globalismo) se alternavam para sustentar o regime político e econômico que agora tinha ruído. Por isso, conforme Cervo (2008) afirma, o governo de Sarney é considerado um período de ajustes que vão além da política interna e econômica: a política externa também estava sendo redefinida, era necessário um novo meio de inserção internacional. Neste momento brasileiro de criação de um novo modelo de inserção, a primeira constatação é o abandono da condição de “carona” nas relações multilaterais, o Brasil passa a tentar criar os mecanismos e não somente aproveitar-se deles (PINHEIRO, 2004). As premissas do globalismo foram mantidas, embora tenha sido reforçada a necessidade da criação de uma agenda positiva com os EUA. Cria-se, também, uma nova modalidade de diplomacia: a diplomacia presidencial que teve seu principio no governo de José Sarney com a assinatura de diversos tratados e protocolos de cooperação acerca de temas energéticos (Declaração de Iguaçu e Protocolo de Cooperação Nuclear). Mais tarde esta diplomacia foi responsável direta pelo sucesso nas negociações com a Argentina, iniciadas entre José Sarney e Raúl Alfonsín (então presidente argentino), que culminaram na criação do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL) em dezembro de 1994, sendo que as tratativas foram iniciadas por Collor em 1991. Apesar de os fatos apontarem para o contrário, Pinheiro (2004) destaca que o período de governo de José Sarney, e também o de e Fernando Collor, não foi um divisor de águas na mudança da política externa brasileira. Na verdade tratou-se de uma perda

29 constante de legitimidade e eficácia do paradigma até então em vigor, juntamente com a crise do modelo desenvolvimentista herdado do governo militar.

1.8 Institucionalismo pragmático

O institucionalismo pragmático não é um modelo de política externa exclusiva e/ou excludente quanto a outros paradigmas (americanismo, globalismo e etc.). O institucionalismo pragmático deve ser visto mais como uma ferramenta, do que como um paradigma de relações internacionais, pois ele pode ser utilizado junto com outro paradigma; contudo não podemos descartar completamente sua força como paradigma, pois ele também pode ser utilizado como tal. A principal característica do institucionalismo pragmático brasileiro é a procura por maior participação nos fóruns globais a fim de exponenciar as possibilidades de ganhos absolutos (PINHEIRO, 2000). Outro ponto que o Brasil busca usar em seu favor é o posicionamento em bloco, quer seja como bloco regional, quer seja com o uso de um posicionamento comum junto com países que estão elevando sua representatividade no cenário internacional, como os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) e IBAS (Índia, Brasil e África do Sul).

[...] foros multilaterais, que são para o Brasil, pelo jogo das alianças de geometria variável, possibilitadas por um mundo de polaridades indefinidas, o melhor tabuleiro para o país exercitar a sua competência na defesa dos interesses nacionais. É neste tipo de tabuleiro que podemos desenvolver o melhor do nosso potencial para atuar na elaboração das normas e pautas de conduta de gestão do espaço da globalização em todos os campos de interesse para o Brasil (LAFER, 2009, p.118).

É importante ressaltar, contudo, que o Estado brasileiro não toma posicionamentos em prol apenas da sociedade internacional, ou em prol de ganhos absolutos; a política externa brasileira é voltada a buscar o maior ganho possível para o país, por isso a política externa em questão – institucionalista – é pragmática, ou seja: é moldada de acordo com os interesses nacionais (PINHEIRO, 2000). O Brasil almeja um alto grau de institucionalidade nos fóruns globais, leia-se aumento da burocracia e poder horizontalizado, para conseguir diminuir as diferenças de poder com os países centrais e assim ter uma maior representatividade no sistema internacional. Este posicionamento, entretanto, é diferente se tomarmos como base organismos regionais como o

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MERCOSUL, onde o Brasil é considerado a principal potência de forma praticamente unânime. Por ter maior representatividade e poder na região, o Brasil opta por vezes em abster-se ou até mesmo vota contra propostas que poderiam tornar esta organização mais horizontal:

Ocorre que, tendo a busca de autonomia maior peso na diplomacia brasileira que a busca de justiça, se admite que aquela possa ser buscada tanto mediante arranjos de cooperação com alto grau de institucionalização, quanto por outros, cujo grau de institucionalização é mantido propositalmente baixo a fim de garantir a posição de liderança do país. (PINHEIRO, 2000, p. 326).

No mesmo sentido de Leticia Pinheiro (2000), Burges (2008) afirma que o uso do termo hegemonia regional não é bem aceito pelos policy makers10 brasileiros porque o Estado brasileiro busca usufruir dos benefícios de ser a hegemonia regional, mas não quer arcar com os custos que esta posição traz consigo: como a responsabilidade intrínseca de ser um dos motores de desenvolvimento para os outros Estados da América Latina.

1.8.1 Política externa de Collor, Itamar e FHC

Com a volta do regime democrático na política brasileira, a criação de uma nova constituição e, por conseguinte, a volta das eleições diretas para a presidência da república, é eleito Fernando Collor de Mello para assumir o cargo em 1990. A política externa do governo Collor flutuou entre o americanismo e o globalismo, sempre, no entanto, apresentando uma nova ferramenta de aproximação com o sistema mundial: a busca pela autonomia através da participação (PINHEIRO, 2004). Neste período o Brasil aderiu a diversos tratados acerca do comércio internacional, cooperação tecnológica, compromisso com meio-ambiente e com direitos humanos. Na primeira fase de seu governo, a adoção do paradigma americanista acabou por afastar o Itamaraty dos processos decisórios de política externa, visto que o Itamaraty vinha mantendo a visão globalista desde antes do inicio da ditadura militar no Brasil, visão esta que era incompatível com as ideias dos formuladores de política de Collor (PINHEIRO, 2004). Mais tarde, ainda no governo Collor, o americanismo é abandonado em troca do globalismo.

10 Policy makers é o termo utilizado academicamente para referir-se aos que ditam os rumos da política em um país, os pensadores e estrategistas do governo. São representantes do mais alto escalão do governo, onde as decisões são construídas e tomadas. Normalmente atuam diretamente junto a presidência e aos ministérios.

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Tanto o americanismo como o globalismo, este segundo explicado em grande parte pela presença de como Ministro das Relações Exteriores e a consequente recuperação do Itamaraty, não obtém os resultados esperados neste novo cenário mundial. O primeiro porque a relação especial Brasil-EUA já deixara de existir a anos, e o segundo porque apesar de ainda haver o conflito Norte-Sul, o sul apresentava-se fragmentado, sem possibilidade de juntar forças para ações coletivas e coordenadas em busca do bem comum. Devido ao de Collor, Itamar Franco até então vice-presidente assume o seu lugar em 1992 para encerrar o mandato presidencial. Segundo Pinheiro (2004), com a nomeação de Fernando Henrique Cardoso e depois Celso Amorim para o MRE o processo de adaptação da realidade brasileira a nova realidade mundial continuou, sem, no entanto, a adoção explícita de um novo paradigma de política externa. Cardoso e Amorim direcionaram suas forças para que a “diplomacia brasileira buscasse se adaptar as circunstâncias internacionais sem que deixasse de lado sua histórica prioridade à promoção do desenvolvimento e a busca de autonomia” (PINHEIRO, 2004, p. 58). Desta forma percebemos o Brasil atuando mais nas organizações internacionais, buscando exercer um papel de protagonista: por exemplo, foi nesta época que Celso Amorim fez voltar à discussão sobre a reforma da ONU candidatando o Brasil como possível membro permanente. Além da participação em diversos fóruns internacionais, o governo brasileiro procurou ampliar a participação nas operações de paz promovidas pela ONU, muito provavelmente com a intenção de dar corpo às ideias de Celso Amorim. Já com FHC assumindo a presidência em 1995 (seu mandato estende-se até 2002), há um reforço do que já estava sendo implantado desde o governo Collor: além da liberalização econômica, a pró-atividade em questões de participação internacional. O próprio Fernando Henrique Cardoso (2001) destaca três mudanças e uma consequência, oriunda destas mudanças, na política externa brasileira. As três mudanças seriam a maior transparência, alcançada através do processo de democratização; a abertura econômica, obtida através das manobras do seu governo; e a estabilização da moeda. A consequência destes movimentos seria que o Brasil agora era um país mais aberto e suscetível a acontecimentos internacionais, sejam econômicos ou políticos, o que exigia do país uma maior presença e participação internacional, com objetivo de assegurar seus direitos. A importância dada pelo governo à questão de integração e participação na política externa era tanta que o então Ministro das Relações Exteriores, Luiz Felipe Lampreia, admite que este novo paradigma poderia ser chamado de paradigma pela integração (VIGEVANI, OLIVEIRA e CINTRA, 2003).

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Em texto publicado enquanto ainda era presidente, FHC externava preocupação com a falta de uma governança global, mais uma vez mostrando a inconformidade quanto ao sistema internacional, para ele era preocupante o fato que os “ganhos que resultam do processo de globalização podem desperdiçar-se – ou, se não desperdiçar-se, serem distribuídos de forma desigual – em virtude da insuficiência da cooperação e da coordenação no plano internacional” (CARDOSO, 2001, p. 8). Cardoso (2001) ainda ressalta que esta governança global não deve ser construída baseada no poder, ficando na mão dos mais poderosos, mas que deve ser construída com base na legitimidade e responsabilidade que só pode ser alcançada através da participação e do diálogo. Por isso, para Leticia Pinheiro (2004), apenas com Fernando Henrique como presidente e Luiz Felipe Lampreia como Ministro das Relações Exteriores, é que o institucionalismo pragmático é inaugurado como condutor principal da política externa. Destaca-se ainda a diplomacia presidencial também utilizada por FHC, no entanto esta abordagem – que apesar de relevante, não teve papel de protagonismo como veremos a seguir no governo Lula – foi utilizada, segundo Celso Lafer (2009), muito mais num processo de “internalização” do mundo na visão brasileira. As opiniões acerca do sucesso da política exterior no governo FHC são antagonicamente divergentes. Celso Lafer (2009, p.135), que foi chanceler deste governo nos anos de 2001 e 2002, é categórico ao afirmar que com Fernando Henrique Cardoso “o patamar da presença do Brasil no mundo teve um salto qualitativo [...]. Esta elevação [...] exprimiu a percepção pelo sistema internacional de uma evolução do país para melhor, derivada de significativas mudanças no âmbito interno”. Já Amado Luiz Cervo (2008) caracteriza a política externa utilizada pelo governo FHC como subserviente, destrutiva e regressiva, ressaltando inclusive quatro equívocos estratégicos da ação externa, seriam eles: subjugar a estabilidade de preços ao comportamento do comércio exterior, revertendo a tendência histórica de manutenção de saldos favoráveis; juros reais elevados e privatização com alienação de ativos nacionais a empreendimentos estrangeiros; dependência empresarial, tecnológica, e abandono/perda do setor de serviços de comunicação; e por fim, ter tornado a abertura econômica uma estratégia de inserção internacional (CERVO, 2008, p. 54 e 55). Para Cervo (2008), FHC teria padecido da ilusão kantiana.

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1.8.2 Governo Lula, a questão regional e a diplomacia presidencial

Após concorrer três vezes à eleição presidencial, sempre acabando com o segundo maior numero de votos e sendo derrotado, respectivamente, por Collor e FHC (este em 1994 e 1998, quando da sua reeleição). Lula é eleito presidente da república em 2002, assumindo em 2003, e iniciando a transição do modelo neoliberalista híbrido de FHC, para o modelo de esquerda híbrida (CERVO, 2008). A vitória de Lula surpreendeu grande parte do mundo e dos analistas políticos brasileiros, afinal o ultimo governo com traços esquerdistas havia ocorrido com João Goulart, quase 60 anos antes. Após o anúncio da vitória de Lula pairou sobre o Brasil uma nuvem de incerteza quanto ao destino do empresariado nacional e internacional, tanto isso é verdade que, sabiamente, Lula e o PT divulgaram uma nota oficial nas mídias com intuito de tranquilizar investidores nacionais e internacionais ressaltando que os contratos seriam cumpridos sem nenhuma mudança. Alguns ainda tinham medo que Lula fizesse reviver seu espírito radical da época do sindicalismo, e há tempos adormecido, ao assumir o poder: isto, obviamente, não aconteceu, o PT já havia abandonado há anos diversas ideias comunistas.

Deve-se recordar que o Governo de Lula mudou substancialmente a imagem da política externa brasileira. O enfoque econômico-comercial predominante durante o Governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2003) foi renovado por um enfoque mais político, ou inclusive ideologizado segundo alguns observadores. O novo projeto de política exterior de Lula apostou em um mundo multipolar onde o Brasil deveria ter mais projeção e influência através do fortalecimento do multilateralismo, da consolidação da integração regional na América do Sul, da construção de uma identidade brasileira de potência média emergente e do impulso da diplomacia presidencial com base no enorme carisma de Lula (SORIANO, 2012, p. 138 e 139, tradução nossa)11.

Neste trecho, Juan Pablo Soriano apresenta as bases da política exterior do governo petista: multilateralismo, consolidação da integração regional na América do Sul, construção de uma identidade de potência média emergente e diplomacia presidencial apoiada no forte carisma de Lula. Na mesma direção segue Cervo (2008, p. 56) ao afirmar que Lula empreendeu uma correção de rumos na PEB a partir de três linhas de ação: tirar a política exterior das ilusões da harmonia kantiana, saindo do multilateralismo utópico para o

11 Hay que recordar que durante el Gobierno de Lula cambió substancialmente la imagen de la política externa brasileña. El enfoque económico-comercial predominante durante el Gobierno de Fernando Henrique Cardoso (1995-2003) fue renovado con un enfoque más político, o incluso ideologizado según algunos observadores. El nuevo proyecto de política exterior de Lula apostó por un mundo multipolar en el que Brasil debía tener más proyección e influencia a través del fortalecimiento del multilateralismo, la consolidación de la integración regional en América del Sur, la construcción de una identidad de potencia media emergente para Brasil y el impulso de la diplomacia presidencial basada en el enorme carisma de Lula.

34 multilateralismo de reciprocidade; enfrentar as dependências estruturais (financeira, empresarial e tecnológica); e reforçar a América do Sul como polo de poder. Com estas manobras busca-se maior aproximação da interdependência real da era da globalização. Na questão de multilateralidade podemos destacar a busca de parcerias estratégicas com países em similar nível de desenvolvimento em todos os continentes; reaproximação com os países subdesenvolvidos, em especial com a África; manutenção das relações com países desenvolvidos; manutenção da utilização dos fóruns internacionais; e por fim, uma ativa ofensiva diplomática na tentativa de adicionar na agenda global temas sociais, com a “exportação” de modelos que obtiveram sucesso internamente como o “Fome Zero”, o “Bolsa Família” e suas ramificações (SILVA, 2010). No campo de política externa da integração, Lula deixou claro suas intenções desde o discurso de posse onde afirmou que “a grande prioridade da política externa durante o meu governo será a construção de uma América do Sul politicamente estável, próspera e unida” (SILVA, 2003). Além disso, foi, talvez, o presidente que mais se esforçou para a criação da UNASUL (União de Nações Sul-Americanas), um organismo muito mais político que econômico. Já a construção da identidade nacional através do discurso de que o Brasil era uma potência média, emergente, e que tinha direitos de ter maior representatividade internacionalmente – esta postura “ativa e altiva” (ALMEIDA, 2006, p.99) ficou caracterizada como busca da autonomia pela assertividade (EIRAS, 2013a) – deveu-se muito à figura de Lula e Celso Amorim. Aliás, a política externa do governo Lula sempre esteve muito centralizada nestes dois atores. Ambos em seus pronunciamentos, seja no Brasil ou no exterior, sempre exaltaram o Brasil como o país do futuro e nunca hesitaram em criticar as grandes potências de forma enfática, muito pelo contrário, esta era uma prática habitual. Um dos grandes movimentos para que esta identidade fosse construída no pensamento do povo brasileiro foi a postulação ao posto de membro permanente do CSNU, desta forma dava-se a entender de forma subjetiva que o Brasil estava pronto para assumir maiores responsabilidades sobre o sistema mundial e que estaria no mesmo nível de “poder” das outras grandes potências. A diplomacia presidencial foi outro fator que apresentou certa continuidade no governo Lula, entretanto, como destacam Lafer (2009) e Cervo (2008), Lula levou a diplomacia presidencial a outro nível, as estimativas apontam que ele passou 100 dias a mais que seu antecessor FHC no exterior, superando a marca de, no total, ter ficado mais de um ano fora do país durante seu mandato de oito anos. Muitos analistas políticos, entre eles até

35 mesmo Celso Lafer, criticam esta postura que creem ser exagerada. Mas o fato é que, sem nenhuma dúvida, Luis Inácio Lula da Silva foi o presidente brasileiro que mais esteve em evidência internacionalmente dos últimos mandatos, e talvez, de todos os tempos. Apesar de ter mantido certa distancia em relação aos EUA, que poderia nos levar a crer que Lula tenha buscado a autonomia através da distância do poder hegemônico, as relações com os EUA seguiram sendo de grande valia para o Brasil (EIRAS, 2013a). A questão conflituosa de Lula e do governo brasileiro com os EUA quase sempre ocorreu no âmbito da política internacional, excetuando-se alguns fatos isolados como o dos subsídios estadunidenses para os produtores de algodão, que acabavam prejudicando os produtores brasileiros; este caso foi levado a Organização Mundial do Comércio (OMC), com decisão favorável ao Brasil (WORLD TRADE ORGANIZATION, 2009). A atenção dada às relações regionais no desenvolvimento da região sul americana e até mesmo a política Sul-Sul, também poderiam nos levar a pensar erroneamente que a busca pela autonomia ocorreu através da integração ou diversificação. A escolha por algum destes paradigmas seria apenas uma meia verdade. De fato o Brasil deu uma atenção muito maior a esta questão que os governos anteriores, mas isto não significa que esta linha de atuação tenha sido uma prioridade ou uma novidade: a procura pela diversificação de parceiros ocorria desde os anos 50 e a integração regional era uma constante desde o princípio do processo de democratização em 1985 (EIRAS, 2013b). Teve sim uma relativa importância, mas fez parte de uma frente de atuação junto a outras linhas com igual ou maior importância. Em ambos os casos, relação com os EUA e integração, pode-se perceber o pragmatismo das escolhas brasileiras e a procura pelas instituições internacionais. Isto reflete a política exterior brasileira neste período: sempre ter como objetivo a maior possibilidade de ganho possível para o país sem se engessar em posições ideológicas, políticas ou de afinidades, ou seja, pragmatismo; e utilizar, quando fosse conveniente, o meio mais adequado para ser ouvido pelo sistema internacional ou para diminuir as diferenças de poder em conflitos a forma mais horizontal possível quando fosse de interesse nacional, ou seja, fazer amplo uso das instituições internacionais. Enfim, esta análise nos ajuda a compreender porque o paradigma utilizado era o institucionalismo pragmático, sendo que a este paradigma ainda podemos adicionar características de busca da autonomia pela assertividade (EIRAS, 2013a) e a diplomacia presidencial. As análises acerca da política externa do governo Lula também são as mais variadas possíveis, tão variadas que chegaram ao nível de possibilitar um artigo científico abordando as diferentes opiniões de jornalistas e cientistas, algo inédito na política externa brasileira que

36 nunca recebera muita atenção da mídia nacional. Foi o que Almeida (2006) fez, um artigo onde analisa estes diversos posicionamentos, para isto divide os analistas em três grupos: vozes autorizadas, que seria o grupo que está no poder; os apoiadores externos, que seriam os intelectuais que simpatizam com as políticas implantadas; e por fim os independentes/críticos. Celso Lafer (2009), que certamente se encaixaria no grupo dos “independentes”, é crítico quanto à intensa influência ideológico-partidária que em sua opinião é imposta pelo governo petista na política externa brasileira, para ele o que ocorre é a tentativa de propiciar uma “política espetáculo”, ou seja, a preocupação em atuar bem (utilizando o sentido artístico, uma atuação para ser aprovada pelo povo) que, no entanto, dificilmente fará com que surtam efeitos positivos para o Estado. Em seu entendimento, a política externa brasileira de Lula vai contra o princípio de que a diplomacia deve ser “inteligente, sem vaidade; franca, sem indiscrição; enérgica, sem arrogância” (LAFER, 2009, p. 142). É importante salientar também que para alguns autores, como Saraiva (2010), o institucionalismo pragmático foi abandonado no governo Lula em troca do que chamam de paradigma autonomista. Particularmente discordo em parte com esta ideia, já que percebo que o institucionalismo pragmático não foi abandonado no governo petista, mas sim foram adicionadas algumas ferramentas de atuação (diplomacia presidencial, integração regional, cooperação sul-sul) com o intuito de alcançar o objetivo de maior inserção internacional.

1.8.3 Governo Dilma, continuidade e adaptações na PEB

Com a eleição de Dilma Rousseff a transição no poder se deu de forma tranquila, afinal Lula foi o padrinho de Dilma na política e ambos pertencem ao mesmo partido, o que faz convergirem em questões ideológicas. Dilma promove mudanças praticamente em todos os ministérios, um deles o Ministério de Relações Exteriores que fora assumido por Antônio Patriota, diplomata que atuou por muitos anos como embaixador nos EUA, antes mesmo da posse oficial de Dilma. Mesmo com a mudança no MRE, o que se percebe é a continuidade nos temas de política externa, claro que devido a questões ideológicas do PT e dos próprios governantes que apresentam pensamentos muito semelhantes (GARCIA R.T, 2011). Contudo alguns

37 pontos são adaptados devido a nova dupla Dilma/Patriota, já que ambos apresentam uma personalidade mais low profile12 que Lula/Amorim (PECEQUILO apud OJEDA, 2013). O discurso de posse de Patriota é cheio de elogios ao modo como fora conduzida a política externa durante o governo Lula.

A política externa tem conseguido conciliar um forte engajamento com o nosso entorno sul-americano e uma vocação universal para o diálogo; uma pauta econômica com um numero crescente de parceiros e uma atenção especializada em matéria de comercio internacional com uma participação ativa nos grandes debates políticos contemporâneos: a defesa de interesses nacionais específicos e a busca de uma governança global mais legítima e eficaz. (PATRIOTA, 2009, p.6).

E segue:

Na era do fim dos dogmas não se trata de escolher entre o Norte e o Sul, entre o comercial ou o político. O desafio que nos apresenta é o de trabalharmos em parceria com nossos vizinhos, em um esforço comum de melhoria das condições de vida de nossas sociedades, em ambiente de paz e democracia, multiplicando contatos com todas as regiões e atores. (PATRIOTA, 2009, p.6).

Percebe-se que as linhas de ação são mantidas fielmente apesar de que com o tempo se perceba que a intensidade de atuação foi reduzida devido às características de personalidade de seus atores centrais. Mesmo discreta, Dilma Rousseff “exportou” um de seus traços mais marcantes de personalidade para a política externa: a rigidez (OJEDA, 2013). A presidente mostrou-se firme quando da deposição do então presidente paraguaio Fernando Lugo caracterizando a ação como golpe (e convencendo os outros países integrantes do MERCOSUL a agirem da mesma forma), fazendo assim com que automaticamente o Paraguai fosse suspenso dos processos decisórios do MERCOSUL, onde era a voz contra a entrada da Venezuela. Sem as travas impostas pelo Paraguai, a Venezuela foi aprovada como novo membro do MERCOSUL em um processo administrativo relâmpago. Uma das grandes críticas feitas ao governo Lula foi sua aproximação com Irã através de Mahmoud Ahmadinejad. Com Dilma, uma presidente muito menos tolerante quanto aos desrespeitos aos Direitos Humanos e regimes autoritários, esta posição modificou-se a partir do momento que o Brasil, inesperadamente, votou a favor de uma das disposições da ONU que iam contra as vontades iranianas (GARCIA R.T, 2011; OJEDA, 2013). Este posicionamento, aliado ao perfil de Antônio Patriota foi interpretado por muitos analistas como uma reaproximação com os EUA, inclusive sendo uma possibilidade destacada por Garcia R.T (2011). Entretanto, logo este pensamento mostrou-se equivocado

12 Low profile significa ter um perfil baixo. Diz-se isso de pessoas que não gostam tanto de aparecer na mídia, são mais reservadas, e não são adeptas a fazer afirmações categóricas.

38 pois Dilma além de tratar a questão dos Direitos Humanos com rigidez, também foi mais racional que seu antecessor ao afirmar que “o mundo precisa se comprometer em geral, e não é possível fazer da política de Direitos Humanos só uma arma de combate político- ideológico” (ROUSSEFF, 2012). Neste discurso Dilma salientou que “todos os países” têm problemas de Direitos Humanos, inclusive citou a base de Guantánamo para mostrar que mesmo os EUA, que se proclama como um Estado defensor da liberdade e dos Direitos Humanos também tem campo para melhoras. Outro traço de mudança foi a questão da diplomacia presidencial, como Dilma não dispõe de carisma tão elevado quanto Lula, foi natural que este artifício tenha sido menos usado, implicando em menos viagens e passando menos tempo no exterior que Lula e FHC. Portanto a PEB empreendida por Dilma mantém praticamente todas as linhas de atuação do governo anterior, com algumas adaptações devido a sua personalidade.

39 2 HISTÓRICO DAS RELAÇÕES ENTRE BRASIL E MÉXICO

Se por um lado Brasil e México ocupam hemisférios diferentes, tamanha a distância geográfica existente entre eles, e falam línguas que, apesar de terem a mesma origem latina, são distintas. Por outro, são inúmeros os fatores que aproximam estes dois gigantes: desde o amor de seus povos pelo futebol, até a ambição de seus governantes em tornar-se uma potência mundial ou participar de modo decisivo na conformação de uma sociedade mundial. É interessante perceber que México e Brasil passaram por basicamente as mesmas etapas de desenvolvimento no transcorrer de suas histórias (ROSAS, 2008). O período colonial foi quase o mesmo: o México conseguiu sua independência em 1821; já o Brasil teve sua independência em 1822, inclusive sendo o México o segundo país a reconhecer sua soberania (ROSAS, 2008). Ambos passaram por diversos regimes militares. Utilizaram o método da industrialização através da substituição das importações por muitos anos. Apresentam enorme desigualdade social, e também histórico de corrupção. O resultado de todas essas etapas em comum, que vai muito além do que foi citado acima, pode ser mostrado através do quadro a seguir.

Quadro 1 – Índice de Desenvolvimento Humano no Brasil e no México em 2012

Fonte: Carta Capital (2013)

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Este quadro ilustra, através do IDH e de outras informações, quão próximos Brasil e México são. Ambos vêm se mantendo estáveis em sua posição no ranking de IDH, sempre próximos: atualmente, como podemos conferir na segunda coluna, o México na 61ª posição e o Brasil em 85º. Tanto para o Brasil, quanto para o México, um dos principais motivos que faz com que o IDH se mantenha em níveis baixos é a desigualdade social e econômica: juntos, os dois países são residência de metade da população de pobres da América Latina (ROSAS, 2008). Economicamente Brasil e México também são muito semelhantes, são economias gigantes, diversificadas e exportadoras, todavia a economia mexicana se destaca pela maior dependência do fluxo de exportações do que a brasileira, principalmente no que concerne a exportação aos demais países integrantes do Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (NAFTA), EUA e Canadá, que representam mais de 80% do volume total de exportações mexicanas (MORALES et al., 2012). Esta é uma faca de dois gumes para a economia mexicana, pois ao mesmo tempo em que pode destacar-se frente à economia brasileira, e mundial, em caso de boom de consumo nos EUA; também pode sofrer com forte crise se o mercado estadunidense não estiver aquecido13. Já o Brasil por apresentar um comércio mais diversificado, um caso de crise ou de eventual boom de consumo americano, afetaria o Brasil em menor escala que a economia mexicana, tanto negativamente em caso de crise, quanto positivamente em caso de aumento do consumo. O Brasil não tem um parceiro comercial de tamanha importância e grandeza quanto os EUA para o México – vide tabela 1, abaixo –, contudo, é claro que há alguns que conjuntamente desempenham este papel, são eles: a região latina, em especial o MERCOSUL; a União Europeia; a China; e, também, os Estados Unidos da América (MORALES et al., 2012). É impensável analisar a tabela 1 e ignorar o crescimento do intercâmbio com a China. Em 2002 a China apresentava participação de apenas 4% no intercâmbio com Brasil, inclusive uma participação próxima à mexicana. A partir de então o gigante chinês teve crescimento apoteótico e hoje é responsável por mais de 16% do comércio exterior do Brasil, um aumento de quase 2000% na participação comercial. Enquanto isso podemos observar que o México apesar de ter apresentado crescimento de 243% ao longo de 10 anos, se manteve abaixo da média de crescimento do comércio que foi de 332%.

13 Isto foi exatamente o que aconteceu após a crise de 2008 desencadeada pelos EUA. O PIB mexicano teve retração de -6,1%, enquanto o Brasil apresentou retração de “apenas” -0,2%, na relação de 2008-2009 (SORIANO, 2012).

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Tabela 1 – 10 maiores intercâmbios comerciais14 com o Brasil em bilhões de US$

Fonte: MRE (2013, p. 8).

Já politicamente se o Brasil é o Estado mais representativo da UNASUL e do MERCOSUL; o México pode ser considerado o arquiteto da Aliança do Pacífico (SORIANO, 2012), formada além do próprio México, por Colômbia, Peru e Chile (Costa Rica está em processo de aprovação). Estes quatro países juntos representam quase 40% do PIB latino, e a aliança vem angariando progressos exponenciais e significativos que, além de cada vez mais ofuscar o MERCOSUL, que caminha morosamente em se tratando de evolução, têm chamado a atenção de seu principal alvo: o mercado asiático. Afinal, conforme destaca Juan Pablo Soriano (2012, p. 142, tradução nossa), “A Aliança do Pacífico é a grande aposta da política exterior mexicana para consolidar sua presença na América do Sul e aproveitar os benefícios econômicos do auge econômico da região Ásia-Pacífico”15.

As relações econômicas vigentes entre Brasil e México incluem principalmente fluxos comerciais e, recentemente, investimentos produtivos em ambos os sentidos. Também se incluem aspectos de cooperação técnica horizontal e de transferência de tecnologia. Convém agregar que tais relações são influenciadas pelas transformações globais e hemisféricas, cujas tendências são favoráveis a uma crescente

14 Intercâmbio comercial, balança comercial ou saldo comercial é obtido a partir da soma das exportações e importações. 15 La Alianza del Pacífico es la gran apuesta de la política exterior mexicana para consolidar su presencia en América del Sur y para aprovechar los beneficios económicos del auge económico de la región de Asia-Pacífico.

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interdependência, liberalização comercial e cooperação entre países em desenvolvimento (ÁVILA, 2009, p. 46, tradução nossa)16.

Neste pequeno trecho percebemos que as relações políticas e econômicas, apesar de recentes em alguns aspectos, estão em crescimento entre estes dois gigantes americanos. E a tendência é que se nenhum fato inesperado externo ou interno ocorra, a relação só tenha a gerar bons frutos para os envolvidos diretos e indiretos, leia-se América Latina, já que existe muito “campo” disponível para o aumento desta cooperação.

2.1 Histórico das relações comerciais e econômicas

As relações comerciais entre México e Brasil historicamente enfrentaram uma série de inconvenientes que vão desde as dificuldades associadas a distância geográfica, até a forte dependência do mercado estadunidense no caso do México, e a preferência pelo intercâmbio comercial com países latino-americanos por parte do Brasil. Até mesmo nos anos 60 e 70, quando a América Latina instrumentava a substituição das importações, assim como a integração regional e a diversificação de seus mercados, México mostrava intensos nexos comerciais com os Estados Unidos da América, e vínculos decrescentes com a América Latina (MORALES et al., 2012, p.119, tradução nossa)17.

Os modelos de inserção econômica de Brasil e México ainda são distintos atualmente (MORALES et al., 2012). O México é mais liberal e – devido ao tipo de produção existente no país18, que faz com que o custo de produção seja baixo, resultando em produtos baratos – busca aumentar sua competitividade depreciando o câmbio e fazendo acordos de livre comércio com o maior número de países19: é um modelo de desenvolvimento com a indústria direcionada em grande parte às exportações. Já o Brasil dos governos Lula (2003-2010) e Dilma (2011-2014) pautam-se por uma cautela e moderação na celebração de acordos de livre

16 Las relaciones económicas vigentes entre Brasil y México incluyen principalmente flujos comerciales y, en fechas recientes, inversiones productivas en ambos sentidos. También se incluyen aspectos de cooperación técnica horizontal y de transferencia de tecnología. Conviene agregar que tales relaciones son influenciadas por las transformaciones globales y hemisféricas, cuyas tendencias son favorables a una creciente interdependencia, liberalización comercial y cooperación entre países en desarrollo. 17 Las relaciones comerciales entre México y Brasil históricamente han enfrentado una serie de inconvenientes que van desde las dificultades asociadas a la lejanía geográfica, hasta la fuerte dependencia del mercado estadounidense en el caso de México, y la preferencia por el intercambio comercial con países latinoamericanos por parte de Brasil. Aun en los años sesenta y setenta, cuando América Latina instrumentaba la sustitución de importaciones así como la integración económica regional y diversificada de sus mercados, México mostraba intensos nexos comerciales con Estados Unidos, y vínculos decrecientes con América Latina. 18 Grande parte da produção voltada à exportação no México é feita utilizando o método das Maquiladoras. Maquiladoras são empresas as quais é permitida a importação de matérias-primas sem incidência de nenhuma taxa de importação desde que 100% do que for produzido seja exportado. 19 Atualmente o México possui tratados de livre comércio com 45 países (SECRETARÍA DE ECONOMÍA, 2013).

43 comércio que tenham como objetivo o aumento das exportações. Em grande medida, o Brasil é um país protecionista, por isso cada possibilidade de acordo de liberalização comercial é analisada cuidadosamente com o intuito de não prejudicar a produção nacional: afinal este tipo de acordo também tem o poder de aumentar significativamente o nível das importações como efeito colateral. Este posicionamento brasileiro pôde ser observado claramente na negativa à ALCA. Esta grande diferença na política comercial afeta diretamente a economia do país e têm impacto significativo sobre o PIB. Morales et al. (2012) ressalta que as exportações variaram entre 15 a 32% do PIB mexicano no período das décadas de 90 e 00, no mesmo período no Brasil as exportações foram responsáveis por apenas 7 a 16% do PIB. Em estudo elaborado para a CEPAL, Batista (2000) já observava através de análise mercadológica20 que a maior demanda do mercado mexicano na época, onde o Brasil poderia contribuir, era por veículos leves. Percebe-se de acordo com a tabela abaixo que o Brasil fez crescer seu comércio (tanto exportações, quanto importações) com a maioria dos países da lista, enquanto o México manteve alguns níveis, como é o caso dos países da ALADI e da Índia, praticamente nos mesmos níveis no passar destas quatro décadas. Nitidamente o Brasil teve mais êxito em diversificar o seu comércio exterior do que seu rival latino-americano. Apesar do aumento dos valores absolutos, destaca-se também a baixa variação e a baixa representatividade do comércio bilateral em comparação com o total de exportações e importações (Tabela 2), por exemplo: na década de 70 as exportações mexicanas ao Brasil representavam 2,64% do total, e passaram a representar apenas 0,56% na última década, é claro que tudo isto decorre do aumento em 20% nas exportações direcionadas aos EUA (ROSAS, 2008; ÁVILA, 2009; MORALES et al., 2012). Este crescimento expressivo das exportações mexicanas direcionadas aos EUA tem um motivo bem claro: o acordo de livre comércio assinado pelo México em conjunto com Canadá e EUA no ano de 1992. A partir deste momento, o México não poderia ignorar ter preferência comercial com o maior mercado de consumo do mundo, logo, o movimento das exportações ocorreu de forma totalmente natural. Estes movimentos, tanto do mercado mexicano, quanto do mercado brasileiro, podem ser percebidos na tabela 2, abaixo.

20 Para mais detalhes ver “Mercado Potencial das Exportações Brasileiras para o México” (BATISTA, 2000, p. 98, Tabela 6.1).

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Tabela 2 – Comércio Bilateral Brasil-México, 1970-2010 (proporcional)21

Fonte: Morales et al. (2012, p. 121)

Para Rosas (2008), enquanto México optou por ser um sócio menor de um dos maiores blocos econômicos do mundo, o Brasil escolheu ser a o sócio majoritário de um bloco intermediário. Em uma analogia, o México optou por ressaltar sua opção pela divisão geográfica da América, onde pertence a América do Norte; e não da divisão política, onde é mais um dos Estados latino-americanos.

A frase impactante de Santos Neves, que era o responsável por acompanhar desde a embaixada brasileira no México as negociações para a incorporação deste país no bloco formado por Canadá e Estados Unidos, merece ser recordada, ainda que deva ser lida lembrando-se do momento contextual tenso em que foi escrita: “o NAFTA equivale a um divisor histórico, é a liquidação do conceito econômico da América Latina, o que nos obriga a retornar ao conceito geográfico da América do Sul” (PALACIOS apud ROSAS, 2008, p. 90, tradução nossa)22.

21 A tabela encontra-se em espanhol, logo, a sigla “EE.UU” representa os Estados Unidos da América. 22 La frase lapidaria de Santos Neves, a quien le tocó acompañar desde la embajada de Brasil en México las negociaciones para la incorporación de este país al bloque conformado por Canadá y Estados Unidos, merece ser recordada, aunque debe ser leída a la luz de las tensiones del momento en que fue escrita: “el TLCAN equivale a un divisor histórico, a la liquidación del concepto económico de América Latina, lo que nos obliga a retornar al concepto geográfico de América del sur.

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Nesta mesma época, se estavam findando as negociações para a criação do bloco do MERCOSUL, uma resposta imediata a criação do NAFTA, embora seja difícil precisar qual dos dois blocos econômicos teve suas negociações iniciadas primeiro. Ao falar destes dois blocos econômicos devemos atentar para o fato que “O NAFTA e o MERCOSUL são projetos econômicos distintos. O primeiro se limita a criar uma zona de livre comércio, enquanto o segundo é uma união aduaneira” (ROSAS, 2008, p. 95, tradução nossa)23. Mais do que isso, NAFTA e MERCOSUL são blocos opostos. Prova disto é a declaração de FHC (apud BANDEIRA, 2009, p. 56) quando ressaltou que o “MERCOSUL é mais que um mercado, o MERCOSUL é, para o Brasil, um destino”. Desta forma reforçou-se o aspecto político do MERCOSUL, enquanto a ALCA era tratada apenas como mais uma opção, e ai sim, de mercado. Percebendo o perigo de depender inteira e exclusivamente dos EUA, o governo mexicano logo tratou de tentar a realização de outros acordos comerciais no intuito de diversificar seu mercado. Foram acordados alguns tratados de livre comércio com países de pequeno e médio porte econômico, mas a negociação com UE, Japão e outros países asiáticos – que são os maiores objetivos do governo mexicano – ainda não foi bem sucedida (MORALES et al, 2012). Pelo lado das exportações brasileiras, como podemos ver também pela tabela 2, os EUA perdeu ainda mais força em relação à UE como principal mercado destinatário das exportações, apesar de ambos terem apresentado queda em números proporcionais. Sublinha- se desta forma que a estratégia de inserção multilateral dos governos brasileiros conseguiu abrir novos mercados, sem nunca, no entanto, ter abandonado os grandes centros de consumo representados por EUA e UE. Já o gráfico abaixo mostra que o comércio bilateral aumentou significativamente a partir da entrada em vigor do ACE 5324 em 2002 e do ACE 5525 em 2003. A economia brasileira pareceu adaptar-se mais rapidamente ao acordo, já que é perceptível o crescimento das importações mexicanas de produtos brasileiros a partir de 2002. Em contrapartida a exportação de produtos mexicanos ao Brasil somente começou a alavancar-se de maneira mais expressiva a partir de 2006.

23 el TLCAN y el son proyectos económicos distintos. El primero se limita a crear una zona de libre comercio, mientras que el segundo es una unión aduanera. 24 Acordo de Complementação Econômica nº 53, que reduz taxas de importação de mais de 700 produtos no comércio bilateral Brasil-México. 25 Acordo de Complementação Econômica nº 55, que extingue taxas de importação para carros no comércio Brasil-México, desde que sejam seguidas diversas regras de produção.

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Gráfico 1 – Comércio bilateral México-Brasil, 2001-2011 (em milhões de dólares)

Fonte: Martins R. (2012, p. 4)

O comércio entre os países aumentou 13 vezes de 1990 a 2006, no primeiro momento podemos pensar que isto significou um grande avanço na relação, mas não (ROSAS, 2008). Explico: neste mesmo período as exportações brasileiras, a nível mundial, aumentaram 18 vezes e as mexicanas, 6 vezes; assim podemos perceber que o crescimento do comércio bilateral ocorreu “apenas” em valores absolutos, mantendo a relação de proporcionalidade. O motivo pelo qual a balança comercial entre esses dois países representa fluxo de comércio aquém das expectativas pelo tamanho de suas economias, por volta de 10 bilhões de dólares, seria segundo Rosas (2008), Ávila (2009) e Morales et. al. (2012) que os produtos comercializados entre ambos não são complementares e sim competitivos – ou seja, os produtos atualmente comercializados teriam como objetivo apenas complementar a demanda não alcançada pela produção nacional ou oriunda de outros países. A quantidade de produtos comercializada entre Brasil e México não é alta, mas conforme Rosas (2008) destaca, o que pesa a favor do nível de valor da balança comercial é que os produtos – principalmente acessórios para a indústria automobilística, veículos e máquinas industriais – apresentam alto valor agregado. O fato do fluxo de comércio atualmente não apresentar dados de complementaridade, e sim de economias competitivas, não significa absolutamente que elas não possam ser

47 complementares. Brasil e México têm produção industrial variada e haveria espaço para aumento dos níveis de comércio bilateral; se isto fosse aproveitado, certamente o nível das exportações poderia aumentar de ambos os lados. O problema é que a rivalidade regional influi em certas ocasiões de forma negativa, a partir do momento que ou Brasil, ou México, preferem dar preferências arancelárias a um terceiro país do que negociar taxas preferenciais com seu vizinho latino. No gráfico apresentado abaixo podemos perceber que o Brasil é o país latino- americano que recebe o maior volume de investimento estrangeiro direto (IED), responsável por mais de 40% de todo o IED na América Latina, com quase 20% de vantagem sobre o segundo colocado, que atualmente é o México, seguido de perto pelo Chile (SIMÕES, 2012, p. 66). O montante de IED no Brasil em 2011 foi calculado em cerca de 48 bilhões de dólares, enquanto no México este número não chega a 20 bilhões (PROMÉXICO, 2012). Muito disso deve-se a estabilidade econômica brasileira, que apesar de ter sofrido quedas proporcionais durante o segundo mandato de FHC e o primeiro de Lula, voltou a manter níveis altos de receptação de investimentos a partir de 2006.

Gráfico 2 – Principais receptores de IED na América Latina (%)

Fonte: Morales et al. (2012, p. 129)

Se no Brasil a situação dos investimentos estrangeiros teve altos e baixos, no México a queda foi vertiginosa a partir de 2000. Não por coincidência foi o ano em que Vicente Fox assumiu a presidência, filiado ao PAN (Partido da Ação Nacional), fora do poder há mais de 70 anos de pleno domínio do PRI (Partido da Revolução Institucional). A incerteza quanto ao futuro político-econômico mexicano foi determinante para frear o IED. Com Felipe Calderón

48 assumindo o poder em 200626, mantendo o PAN no poder, e decretando “guerra ao crime organizado” (no caso, aos cartéis de drogas) a situação do IED no México piora ainda mais devido aos altos índices de insegurança e homicídios. A situação ainda se tornaria mais difícil com a crise econômica estadunidense, que eram responsáveis por mais de 50% do IED presente no México. O IED também é assunto que cada vez tem mais importância na agenda Brasil- México. Na tabela abaixo apresento algumas das empresas, de origem mexicana, que fizeram investimentos volumosos em nosso país durante o governo FHC.

Tabela 3 – Principais empresas mexicanas com investimento fixo no Brasil

Fonte: Rosas (2008, p. 98)

26 Importante salientar que o mandato presidencial no México é de 6 anos, sem direito a reeleição.

49

Em 2011 o Estado brasileiro foi o sétimo país que mais investiu no México em termos mundiais, alcançando a cifra de mais de 300 milhões de dólares. Dados do governo mexicano estipulam que cerca de 520 empresas contam com capital originário do Brasil (PROMÉXICO, 2012), algumas dessas empresas são: Braskem, , Gerdau, Marcopolo, Natura, Vale e etc.. Destaca-se também a importância do México nos investimentos no Brasil já que os mexicanos se mantiveram entre os 10 maiores investidores do mundo no Brasil durante a década de 1995 a 2005 (MORALES et al., 2012). A maior parte do investimento de origem mexicana recebido pelo Brasil deve-se a gigante “Claro”, que faz aportes financeiros constantes tanto para manutenção quanto para a ampliação da rede de telecomunicações (ÁVILA, 2009). Ademais, outras empresas também são importantes, como a Bimbo que se inseriu ainda mais no mercado brasileiro após o período abordado na tabela através da aquisição de marcas consagradas como Pullman e Nutrella, hoje estando presente em quase todo território nacional e sendo responsável pela maior participação de mercado no segmento de pães industrializados.

2.2 Histórico das relações políticas

Apesar das inúmeras semelhanças, Brasil e México pareceram pré-determinados a ter dificuldades em suas relações. Rosas (2008) levanta os quatro motivos para que as relações fossem conturbadas desde o princípio, e que inclusive continuam a interferir negativamente: distância geográfica, interferência dos EUA nas relações bilaterais, dificuldade em reconhecerem-se mutuamente como lideranças regionais, e por fim, o fato de suas economias não serem complementares. A distância geográfica obviamente ainda existe, mas esta situação foi amenizada com o avanço tecnológico das comunicações e dos meios de transporte: este não é o único dos motivos que persiste até hoje. Os outros três pontos seguem conturbando as relações: a relação estreita entre México e EUA impossibilita uma maior inserção brasileira no mercado mexicano além de ter influência também sobre as exportações brasileiras com destino aos Estados Unidos; a rivalidade não assumida segue existindo; e, as economias permanecem sendo competitivas entre si.

50

Percebe-se através da tabela 4 que as relações políticas foram escassas até os anos 60, quando houve a primeira declaração oficial sobre assuntos comerciais. Antes houvera apenas acordos de cunho exclusivamente político.

Tabela 4 – Acordos Bilaterais México-Brasil

Fonte: Rosas (2008, p. 94)

Com Getúlio Vargas e Lázaro Cárdenas como presidentes, respectivamente, de Brasil e México na década de 30, é que pela primeira vez os países começam a ter relações de algum significado comercial, sem, no entanto, algum acordo. Esta época favoreceu a aproximação porque ambos os governos rechaçavam os dogmas da doutrina Monroe que tentava ser imposta pelos EUA (ROSAS, 2008). Neste ínterim o Brasil se tornou o principal parceiro comercial do México na América do Sul, até a queda de Getúlio. Com a queda de Getúlio, e o fim da 2ª Guerra Mundial, ambos os governos optam pelo método da industrialização através da substituição das importações, o que resulta em mercados mais fechados com altas taxas para a importação e por consequência uma diminuição das relações comerciais. Desta forma as relações econômicas e políticas tornam-se cada vez mais escassas, retornando a tona de forma significativa apenas nos anos 70, com Geisel, e nos anos 80, quando a crise do petróleo favoreceu uma ação conjunta para a renegociação das dívidas que assolavam os dois países (ROSAS, 2008). Em princípios do ano de 1962, Jango visita diversos países chave da América para reafirmar as intenções políticas convergentes entre os latino-americanos: uma das principais

51 preocupações brasileiras era quanto à possibilidade de uma corrida armamentista na América Latina (LEITE, 2011). Desta viagem resulta a Declaração conjunta, arquitetada por Jango, com México, Bolívia, Chile e Equador, em abril de 1963, onde estes países firmam o compromisso de não fabricar armas nucleares (FRANCO, 2008). O governo Geisel, de 1974 a 1979, também foi significativo na cooperação Brasil- México. Em visita ao México ele foi responsável pela assinatura de cinco convênios nas áreas de cooperação técnico/tecnológica; também foi firmado um acordo para estudo de cooperação entre Braspetro e Petróleos Mexicanos (PEMEX). Ainda assim, o mais significativo neste período foi o aumento das exportações, que passou de 50 milhões em 1973, para quase 300 milhões de dólares em 1979, um crescimento de quase 6 vezes (LEITE, 2011). Durante os primeiros anos do governo FHC ocorre um desvio de foco na PEB da América Latina para a América do Sul segundo Leite (2011). Isto foi decorrente do maior alinhamento que México (através do NAFTA) e os países da América Central e Caribe apresentaram com a economia estadunidense. A partir dos anos 2000 é que se reinicia uma aproximação importante na relação Brasil–México, devido basicamente às mudanças ocorridas no âmbito interno de ambos os países. Pelo lado brasileiro, por exemplo, destaco a mudança do paradigma de inserção internacional, que já vinha em processo de transição desde o fim do regime militar27. Esta mudança de rumos foi intensificada quando transformações políticas da relação bilateral ocorreram principalmente pela visão de mundo de seus novos governantes – Lula e Vicente Fox – que Gatica (2012) classifica como históricas. Isto decorre do fato que tanto Lula quanto Vicente Fox eram filiados a partidos que não possuíam tradição no poder: o PT tinha, em sua origem, ideais radicais do comunismo e sempre havia sido oposição ao governo federal; já no caso mexicano, o PAN não governava o México há mais de 70 anos de hegemonia absoluta do PRI. Isto fez com que o futuro de ambos os países se tornasse incerto: havia expectativas de mudança na vida política interna e externa, visto que os novos partidos no poder poderiam ter outra visão sobre o papel que o país deveria exercer no sistema mundial (GATICA, 2012). Na visão de Lula, o México provavelmente estaria incluído no terceiro escalão de prioridades de relacionamento com países americanos, de acordo com a teoria dos círculos concêntricos que explicarei adiante.

27 Processo transitório que culminou na adoção do institucionalismo pragmático como paradigma de política externa brasileira.

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Em 2007, foi criada a Comissão Nacional Brasil-México cujo propósito era intensificar as relações bilaterais em todos os sentidos. Contudo os objetivos principais, conforme Ávila (2009) destaca, eram: preservar e fortalecer a democracia, tanto no aspecto interno quanto nas instituições internacionais; promover e proteger os Direitos Humanos; lutar pela erradicação da pobreza e da exclusão social proteger o meio-ambiente e promover o desenvolvimento sustentável; conservar a paz e a segurança internacional, fazendo cumprir as diretrizes do Direito Internacional; e por fim, aperfeiçoar os mecanismos de integração e coordenação regional e global. Porém, ainda em 2007 o governo mexicano cancelou, inesperadamente, o acordo bilateral que previa a dispensa de visto aos brasileiros em visita ao México, isto causou um pouco de tensão nas relações – que vinham apresentando maior grau de afinidade. Dessa forma, o Brasil utilizando-se da premissa do princípio da reciprocidade agiu da mesma forma: exigindo visto aos mexicanos (ÁVILA, 2009) em visita ao território brasileiro. Com as relações um pouco turbulentas, o então presidente mexicano Felipe Calderón convidou Lula para um encontro no México. Deste encontro, resultou a emissão de um comunicado de forma conjunta por parte de ambos os governos. Neste documento foram abordados 24 temas onde Brasil e México reafirmavam suas posições convergentes (ITAMARATY, 2007), alguns deles foram: interesse em elevar a relação bilateral a um novo patamar, aprofundando o relacionamento nos âmbitos econômicos, comerciais, jurídicos, culturais, acadêmicos, técnicos e científicos; reconheceram o papel importante que ambos desempenham no âmbito regional e mundial, reafirmando suas raízes latino-americanas; comprometeram-se no combate a pobreza; ressaltaram a importância da recente instalação da comissão Binacional Brasil-México; comentaram com satisfação os avanços alcançados nas negociações para a ampliação do ACE 53 e do ACE 55; se comprometeram em fomentar a cooperação em matéria de mudanças climáticas e todas suas ramificações; e, entre outros, admitiram e destacaram a necessidade de reforma existente na ONU, em especial em seu Conselho de Segurança, carente de legitimidade. Torna-se evidente que a agenda de política externa dos dois países, a este ponto, é sim convergente, apesar de suas nuances particulares. Em maio de 2008, o Brasil recebeu os Chefes de Estado e de Governo da América do Sul em Brasília para adotar o Tratado Constitutivo da União Sul-Americana de Nações (UNASUL). Esta foi a coroação de um projeto articulado por Lula desde que assumiu a presidência em 2003, projeto este, baseado na ideia que a América do Sul era sim uma prioridade para a política externa brasileira (SIMÕES, 2012).

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No mesmo ano de 2008, mas já em dezembro, o Brasil organizou a 1ª Cúpula da América Latina e do Caribe (CALC). Tratou-se da primeira reunião da história que reuniu chefes de estado de todos os 33 países da região latino-americana para tratar de uma agenda regional própria (SIMÕES, 2012). A agenda abordada por esta cúpula foi de temas e prioridades específicas da região com o intuito da discussão de problemas regionais e aumento da cooperação. A CALC foi a pedra fundamental para a criação da CELAC (Comunidade de Estados da América Latina e Caribe) no ano seguinte. Para explicar estes dois grandes movimentos, voltados à integração regional, do Estado brasileiro no ano de 2008, Simões (2012, p. 77 e 78) faz uso da teoria dos círculos concêntricos:

Da ótica da sub-região em que está situado o Brasil, o primeiro círculo da integração corresponde à zona geográfica em que ela é mais densa. Trata-se dos países do MERCOSUL, âmbito de integração caracterizado por elevado grau de profundidade – como a existência de intenso comércio, alto grau de liberalização, tarifa externa comum, harmonização de normativas técnicas nos mais diversos âmbitos. O segundo círculo concêntrico corresponde aos países da América do Sul, espaço de integração em processo de desenvolvimento, a partir da identificação, por meio da UNASUL, de denominadores comuns aos 12 países da região. O terceiro círculo é a América Latina e o Caribe como um todo, espaço que abrange 33 Estados (quase o triplo de Estados da UNASUL).

Dando continuidade à integração em nível de “3º círculo concêntrico”, ou seja, como forma de dar continuidade a CALC, foi criada a CELAC em 2010, em cúpula sediada pelo México. O regulamento da CELAC reconhece que os países da região são parte de uma mesma comunidade, e isto reflete a ideia de Brasil e México em relação à América Latina. A CELAC, caracterizando a tentativa de inserção brasileira na América Central, pode ser analisada a partir de uma visão realista e “pessimista” das Relações Internacionais como uma expansão do modelo usado na África pelo governo Lula. Simões (2012, p. 81) ressalta que esse modelo consiste num maior crescimento do intercâmbio comercial e presença de empresas brasileiras nestas regiões, principalmente em obras de infraestrutura; ao mesmo tempo em que há solidariedade por parte de iniciativas de assistência humanitária, cooperação técnica, educacional e financiamentos. Como resultado destes esforços, surge uma economia amplificada, mais dinâmica e forte, em uma região mais próspera que acaba retornando os investimentos feitos pelo Brasil, no longo prazo, em forma de uma relação bilateral mais consolidada no âmbito político, econômico e comercial. Num primeiro momento, pode-se ter a perspectiva que na atuação brasileira na América Central predomina a vertente solidária na política externa, contudo um olhar mais atento revela que a ação solidária é combinada a ações concretas que trazem benefícios

54 econômicos e/ou sociais reais (SIMÕES, 2012, p. 85). Desta forma o governo brasileiro (através de estatais ou empresas privadas) se insere efetivamente em regiões que antes não tinham importância para o Brasil, contribui com o desenvolvimento desta região, e por consequência ganha destaque global como um país solidário e ativo. Por sua parte, o México focou nos países sul-americanos que não faziam parte do MERCOSUL para ampliar seu campo de influência e equiparar poderes econômicos com o bloco rival. Com isto constitui-se a partir da Cúpula de Lima, em 2011, a “Alianza del Pacifico” junto com Chile, Colômbia e Peru. Esta organização regional é muito similar ao MERCOSUL, tendo basicamente os mesmos objetivos pois seus membros buscam alcançar progressivamente “a livre circulação de bens, serviços, capitais e pessoas” (ALIANZA DEL PACÍFICO, 2011, tradução nossa)28. Outro ponto interessante e que deve ser destacado é que ao passo que o MERCOSUL prioriza e busca atualmente um acordo de livre comércio com a União Europeia, o foco da Aliança do Pacífico é totalmente oposto pois é direcionado ao mercado asiático. Deve-se isso ao fato que os países que constituem a Aliança têm comércio intenso com a Ásia, e todos são beneficiados por possuírem saída ao Oceano Pacífico, enquanto nos países do MERCOSUL a única opção marítima é de saída através do Oceano Atlântico. Em discurso proferido em 2011, mas que poderia muito bem refletir a história deste relacionamento difícil, Lula (apud SORIANO, 2012, p. 136, tradução nossa), compara a relação Brasil-México com uma relação humana: “temos um problema, e é a certa desconfiança que existe entre Brasil e México... Falta um olhar mais generoso entre ambos”29. É claro, este discurso foi feito após seu período no poder, o que ameniza um pouco o fato que seria no mínimo inusitado de um presidente admitir publicamente que exista desconfiança nas relações com outro país, mesmo que todos saibam que de fato ela existe. Ao Kuribreña (2013), então Secretário das Relações Exteriores do México, anunciar a eliminação do requisito de visto para a entrada de brasileiros no território mexicano, é destacado mais uma vez que o diálogo entre Brasil e México deveria ser a pedra fundamental do nascimento de uma América Latina e Caribe fortalecido e renovado, em um ambiente de paz e maior projeção internacional. Percebemos que discursos em prol de uma maior integração entre os dois países existem em grandes quantidades. Também se percebe que ambos os Estados realmente por

28 La libre circulación de bienes, servicios, capitales y personas. 29 Tenemos un problema, y es la cierta desconfianza que existe entre México y Brasil... Hace falta una mirada más generosa entre ambos.

55 vezes se esforçam em contribuir para o bom funcionamento da relação bilateral, este esforço, no entanto, detém-se mais no campo das ideias e vontades do que da ação e da prática. Gatica (2012) tem uma teoria interessante para responder o porquê de dois países tão semelhantes optarem por escolhas tão distintas: ele a chama de análise “realista-culturalista”. Para ele, mesmo que Brasil e México apresentem inúmeros fatores que poderiam vir a favorecer uma conversão de ideias e maior integração, há um aspecto na política externa chamado de “cultura estratégica” (GATICA, 2012, p. 26) que faz com que as decisões desses dois países sejam por vezes antagônicas. E esta cultura estratégica decorreria de um fator cultural intrínseco e lapidado na política externa através da história, onde quaisquer diferenças, de um Estado para o outro, podem significar um resultado final – seja um paradigma de inserção internacional ou modelo de desenvolvimento econômico – totalmente diferente30.

30 Não há como não comparar esta teoria de Gatica (2012) com a teoria do caos, onde se originou a famosa frase “o simples bater de asas de uma borboleta na China, pode causar um furacão na América”, ao passo que sua análise infere que pequenos personagens ou acontecimentos históricos específicos e de caráter localmente reduzido podem influenciar de forma determinante os rumos da política-econômica/internacional de um Estado.

56 3 BRASIL E MÉXICO: REFORMA DO CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU E ACE 55

Brasil e México evidentemente são global players, e como “jogadores” eles competem entre si em busca do maior ganho possível nas suas relações de poder. Prova disto são dois casos que aqui me proponho a analisar: as divergências políticas entre as propostas de reforma da ONU, em especial do CSNU; e o conflito econômico gerado pela reformulação do Acordo de Complementação Econômica de número 55 por parte do governo brasileiro de forma unilateral. Estes dois conflitos são interessantes pois são casos que refletem bem a relação Brasil- México, relação esta recheada de rivalidades onde poderemos perceber que normalmente a cooperação só se vê presente quando traz benefícios equilibrados para os dois lados. Ambos os temas têm importância significativa em seus respectivos âmbitos: o político, no caso da reforma do CSNU; e o econômico, no caso da renegociação do ACE 55. A busca pela reforma do Conselho de Segurança, apesar de estar presente desde os tempos de FHC, foi elevada a ser um dos carros chefe da política externa do governo Lula, dividindo atenções com a cooperação Sul-Sul. Para o México, permitir a ascensão brasileira ao posto de membro permanente significaria admitir o Brasil como a potência regional dominante na América Latina, algo que historicamente é contestado por Argentina e México. Já o caso do ACE 55 aborda questão importantíssima não só comercial, mas econômica, pois trata de uma das indústrias que mais gera empregos, renda, dividendos, necessidade de abastecimento interno e exportações, que é a indústria automobilística. Esta indústria foi, e continuará sendo, vital no desenvolvimento econômico alcançado até aqui por Brasil e México.

3.1 Reforma do Conselho de Segurança da ONU

Sobre a necessidade de reforma do CS, Cardoso (2001) enquanto ainda estava no poder, é enfático: não há como um órgão criado a partir de eventos ocorridos há mais de 55 anos continuar refletindo de forma admissível o sistema internacional, seria improvável que

57 nenhuma mudança significativa ocorrera. O modelo de inserção internacional de seu governo, baseado no institucionalismo pragmático, buscava a diminuição dos chamados “déficits de governança” na política internacional, e a atribuição de poder no CSNU definitivamente apresentava um déficit. A reforma do órgão mais poderoso da ONU não se trata de poder, mas de legitimidade. Por isso, Cardoso (2001, p. 11), minimiza a questão militar ao afirmar que “a questão não é saber se os países do Conselho de Segurança terão os meios necessários para responder às ameaças à paz e à segurança. A questão é: em nome de quem o Conselho estará agindo, quando agir?”. Só existe uma resposta a essa pergunta que não leve a falência das Nações Unidas: o Conselho deve agir de forma a representar a comunidade internacional como um todo. Quando, e se, o CSNU passar a representar apenas os interesses das grandes potências, a ONU já terá perdido sua razão e o CS seu papel nas crises internacionais; afinal, as mesmas decisões poderiam ser tomadas em uma reunião do P5. Celso Amorim (2005) é partidário da mesma posição de FHC e ressalta que não se trata do futuro da ONU, mas do futuro das relações multilaterais em si:

Existe uma crescente consciência de que a ONU corre o risco de ver sua influência erodida na ausência de uma reforma. Ao permanecer como está, a Organização está sujeita a perder dinamismo ou, pior, a se tornar irrelevante. A escolha que a comunidade internacional tem diante de si, portanto, não é simplesmente uma escolha entre fazer ou não a reforma. Trata-se de decidir se é do interesse da maioria dos Estados que uma organização como as Nações Unidas siga funcionando como garantia de uma ordem internacional estável e capaz de promover o desenvolvimento de todos os seus membros, em condições de liberdade. (AMORIM, 2005, p. 9).

Em um estudo muito interessante que nos ajuda a entender o problema de legitimidade do CSNU, Silva (2013), faz um levantamento acerca das votações na Assembleia Geral da ONU. O objetivo do estudo é ver o nível de convergência dos votos de Brasil, China e EUA, com o grupo Next Eleven31. Conforme o gráfico apresentado abaixo, o resultado da pesquisa é esclarecedor: das 79632 votações ocorridas no período 2000-2010, Brasil e China apresentaram taxa de convergência acima de 80% com o grupo Next Eleven; enquanto os EUA convergiram em menos de 20% das votações com esses países.

31 “Next Eleven”, em tradução literal, “próximos onze”, é o grupo de países em desenvolvimento com melhores perspectivas econômicas após os BRICS. O Next Eleven é composto por: Bangladesh, Coréia do Sul, Egito, Filipinas, Indonésia, Irã, México, Nigéria, Paquistão, Turquia e Vietnã (SILVA, 2013). 32 Os tópicos em votação foram diversos: comércio mundial e protecionismo, governança econômica global, terrorismo e direitos humanos, multipolaridade, modelos de desenvolvimento econômico, desarmamento nuclear, segurança e desarmamento, questão palestina e etc.

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Gráfico 3 – Taxa de convergência em votações na Assembleia Geral da ONU Brasil, China e EUA x Next Eleven (2000-2010)

Fonte: Silva (2013, p. 11).

O fato de a pesquisa ter ocorrido sobre as votações em Assembleia Geral reforça que os interesses dos países em ascensão não é equivalente, e sim muitas vezes oposto aos interesses dos Estados desenvolvidos, ilustrado no caso pelos EUA. Este é apenas mais um fator que pode ser apresentado para provar que a presença brasileira no CSNU traria mais legitimidade para as decisões deste fórum, uma vez que o Brasil apresenta-se fortemente alinhado aos anseios dos países em desenvolvimento. Brasil e China mostram-se mais alinhados até com a Coréia do Sul, que é assumidamente um forte parceiro estratégico dos EUA na Ásia. Lula, então presidente, em discurso realizado na 61ª Assembleia Geral em 19 de novembro 2006 deu uma declaração interessante sobre a falta de democracia no âmbito interno da ONU direcionada aos países do P5 e, talvez, em especial aos EUA: “nós andamos pelo mundo ensinando a democracia aos outros, chegou a hora de aplicá-la a nós mesmos e mostrar que existe representação efetiva nos fóruns políticos das Nações Unidas” (CORRÊA, 2012, p. 907). A primeira vitória brasileira na campanha pró reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas ocorreu em fins do século XX, com o fracasso do chamado “quick fix”, que seria o ajuste do CSNU através da inclusão de somente Alemanha e Japão. Segundo Sardenberg (2010), é importante perceber que esta vitória não se deu pelo fracasso da proposta, mas sim pela construção do consenso de que a reforma do CSNU não passava apenas pela inclusão de “velhas potências”, mas que deveria abranger também potências

59 emergentes como Brasil e Índia: hoje já não há como projetar cenários de reforma do CS sem a presença destes dois países.

3.1.1 Atual funcionamento do CSNU

Antes de tratarmos do assunto da reforma do Conselho de Segurança propriamente dita, é necessário entendermos primeiramente as competências e responsabilidades do Conselho, para depois disso, desmembrarmos as nuances de seu funcionamento original e atual.

O Capítulo VII da Carta da ONU atribui ao Conselho de Segurança o monopólio sobre a autorização da coerção militar e não militar, excetuado o direito individual ou coletivo à legítima defesa previsto pelo Artigo 51. As decisões inspiradas nos dispositivos do Capítulo VII se distinguem das demais decisões do CSNU essencialmente por não requererem o consentimento da parte às quais elas se aplicam. As possibilidades de ação oferecidas pelo Capítulo VII podem ser consideradas como manifestações de dois enfoques distintos para restabelecer a paz: o do isolamento e o da intervenção. O primeiro seria o das sanções, previstas pelo Artigo 41, que podem assumir feições variadas, indo do isolamento diplomático, passando pelos embargos de armas até chegar às sanções abrangentes, inclusive econômicas e comerciais. O segundo seria o da ação coercitiva armada contemplada pelo Artigo 42 (PATRIOTA, 2010, p. 25).

Em teoria, como podemos perceber através da citação acima, a nenhum Estado, exceto em casos de legítima defesa, é permitido a utilização da coerção militar (uso de forças armadas) ou não militar (sanções econômicas e/ou comerciais) frente a outro Estado sem a autorização prévia do CSNU. Patriota (2010) ainda ressalta que ambos os tipos de sanções, militares ou não, vão de encontro com os preceitos de igualdade e não intervenção da ONU, portanto o CSNU tem o poder, e a responsabilidade, de adotar decisões que desconsideram a soberania em prol do sistema internacional e/ou Direitos Humanos. Com a criação da ONU e o estabelecimento do Conselho de Segurança, em 1945, ficou definido que os países com assentos permanentes seriam os vencedores da Segunda Guerra Mundial (EUA, Rússia, França, Reino Unido e China) e outros seis países seriam eleitos através de eleições na Assembleia Geral periodicamente (AMORIM, 2005). Segundo Patriota (2010), os arquitetos do CSNU foram URSS, Reino Unido e os EUA, e inicialmente apenas a China faria parte do grupo permanente, apesar das ressalvas soviéticas. Porém por pressões do Reino Unido, a França também recebeu assento permanente, completando desta forma os P5. A esta altura, a ideia da criação de uma força

60 militar internacional também já tinha sido abandonada, afinal todos os membros permanentes tinham ressalvas quanto a criação de exército transnacional. A questão do veto também foi tratada apenas pelos três arquitetos e idealizadores do CSNU. A proposta estadunidense era de que um voto de membro permanente em dissonância com os outros não seria obstáculo para as decisões do CS, ou seja, os EUA não tinham interesse no veto por questões óbvias: naquele momento, o único prejudicado com tal regra seria a URSS (PATRIOTA, 2012). A URSS não aceitou a proposta – afinal seria a única prejudicada, pois a aliança EUA-Inglaterra-França era provável – e assim o mecanismo de veto foi criado pois desta forma é necessária a unanimidade do P5 para dar validade às questões de procedimento (PATRIOTA, 2012, p. 22). Em 1963, a partir da inclusão de quatro novos assentos não permanentes, o Conselho de Segurança foi ampliado para um total de 15 membros, formato este que permanece até hoje (AMORIM, 2005). Com esta ampliação, o número mínimo de votos necessários para aprovar uma resolução ou procedimento passou para 9, o que diminuiu, muito pouco é verdade, o poder dos P5. Uziel (2010) ressalta que existem dois tipos de vetos: o veto individual e o veto coletivo. O veto individual ocorre quando uma das potências do P5 decide não aprovar alguma demanda, e como a aprovação de todos os membros permanentes é necessária, a demanda acaba por ser vetada. A outra possibilidade de veto pode ser alcançada através de ação conjunta dos membros não permanentes: como o número mínimo para a aprovação são de 9 votos e cada país tem direito a um voto, a convergência de 7 dos 10 membros não permanentes contra alguma proposta é suficiente para vetá-la de forma coletiva. Um mecanismo interessante utilizado pelos membros permanentes para pautar as reuniões de modo a não permitir discussões idealistas é a do “veto sugerido”. Como explica Uziel (2010), o veto sugerido é utilizado como um limitador da discussão: os membros permanentes ao principio de uma agenda admitem quais tópicos são admissíveis de discussão, deixando claro que qualquer discussão fora dos limites que venha a culminar em propostas, será vetada na votação. Em 1947, poucos anos após a criação da ONU, o então Embaixador brasileiro João Carlos Muniz (apud CORRÊA, 2012, p. 64) já percebera os problemas do mecanismo de poder de veto no Conselho de Segurança:

O processo de votação, que requer unanimidade dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança para a tomada de decisões a respeito de questões de substância, constitui, sem dúvida alguma, um sério obstáculo à solução pacífica de controvérsias e torna impossível qualquer ação destinada a garantir a segurança,

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quando uma grande potência, ou mesmo um Estado que tenha o apoio de uma grande potência, opuser-se a ela. O veto, diga-se de passagem, não foi contemplado inicialmente como um elemento negativo para permitir a qualquer das grandes potências se opor a decisões do Conselho de Segurança. Foi projetado mais como um fator positivo e como elemento de equilíbrio para garantir a solidariedade entre as grandes potências, que arcam com as maiores responsabilidades para a manutenção da paz. Acreditou-se, em Yalta, que a regra de unanimidade, criteriosamente aplicada a decisões importantes tomadas pelas grandes potências, serviria para manter a solidariedade entre as mesmas para que a paz mundial pudesse ser garantida. No entanto, essa solidariedade entre as grandes potências não se materializou e, como resultado das divergências entre as mesmas, o veto foi transformado em um instrumento negativo que está frustrando todos os esforços do Conselho de Segurança em direção à paz. Ele tem sido empregado indiscriminadamente como um meio de frustrar métodos de resolução pacífica e impedir a admissão de novos membros à Organização.

Mesmo assim, a partir do ano de 2001 não houve mais de dois vetos por ano em todos os anos subsequentes (UZIEL, 2010), e isto tem uma explicação fácil: o uso do mecanismo de veto sugerido. Contudo o veto sugerido não pode ser ignorado como a utilização do poder de veto para a não utilização do próprio veto, ou seja, nas entrelinhas sabemos que muitas outras propostas foram vetadas já na sua raiz, sem nem a possibilidade de discussão de ideias. O primeiro representante brasileiro no Conselho de Segurança, Araujo Castro (2012), em artigo publicado em 1976 foi além da análise ilustrada pela citação acima do Embaixador João Carlos Muniz. Para Castro (2012) era basicamente unânime a ideia de que as Nações Unidas eram capazes de atuar na solução de conflitos em pequenas nações e que sofria entraves na resolução de conflitos de médias e grandes potências, pela questão de interesses conflituosos do P5. Porém na verdade nem os conflitos “pequenos” estavam a salvo, pois logo as potências do P5 perceberam que até mesmo estes “pequenos” conflitos envolvem geralmente interesses externos. Também se percebeu que estabelecer uma linha divisória entre grandes e pequenos conflitos era perigoso, pois em um mundo dividido até então bilateralmente, os pequenos conflitos tendiam a inserir-se no contexto Leste-Oeste (CASTRO, 2012, p. 86)

3.1.2 Proposta do G4 para a Reforma do Conselho

Em primeiro lugar, é preciso ter claro que a reforma do Conselho não pode ser tratada apenas como questão técnica ou burocrática, ou que diga respeito só as peculiaridades da diplomacia onusiana: é, na verdade, uma proposta política profunda, com implicações não apenas para o que acontece em Nova York, mas para a política internacional como um todo. Trata-se de um dos temais mais sensíveis da área política multilateral na agenda diplomática das mais ativas chancelarias, pois

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simboliza uma seria tentativa de reorganizar a ordem internacional. No presente ordenamento mundial, obter a condição de membro permanente do Conselho tem, a despeito de quaisquer críticas, incomensurável valor político e diplomático. Reformar o Conselho de Segurança corresponderia a enterrar os últimos resquícios da ordem estabelecida ao final da Segunda Guerra Mundial – há muito anacrônica – e reconhecer uma mutação fundamental no que significa ser “potência” internacional nos dias de hoje (SARDENBERG, 2010).

A mudança no significado de ser potência seria uma das primeiras e drásticas alterações decorrentes da reforma do CSNU. Reconhecidamente, as então potências internacionais, que detém os assentos permanentes, são caracterizadas por possuírem armamento nuclear e poderio militar avassalador. A inserção do Brasil ao posto de potência internacional, concedendo-lhe um assento permanente, seria inédita ao elevar um país de caráter pacifista, sem poderio militar gigantesco e obviamente sem armamentos de destruição em massa, a uma condição de membro permanente do órgão mais importante da ONU. Isto seria o reconhecimento que nesta nova ordem internacional, no mundo globalizado; potência internacional não seria sinônimo de potência bélica/nuclear (SARDENBERG, 2010). Um dos principais objetivos do recente posicionamento de inserção internacional brasileira – que seria um dos fatores a dar ao Brasil maior poder na esfera internacional – é a derradeira busca pela obtenção de um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, através da reforma da organização, que vem sendo questão de debate desde o fim da Guerra Fria (HERZ, 1999). Como o Brasil não obteve êxito através do alinhamento americanista33, o institucionalismo pragmático aparece como uma alternativa viável para alcançar tal objetivo. Tomando este rumo de política externa – o do institucionalismo pragmático – o Brasil pode buscar a almejada reforma da ONU através de maior participação nos fóruns internacionais posicionando-se a favor apenas dos seus interesses quanto nação, sem preocupações com alianças infrutíferas. Desta forma não há necessidade de convergência com a atuação estadunidense, o que ocasionou, inclusive, posicionamentos opostos entre os dois países nos últimos anos. O caso da invasão ao Iraque34 ou na discussão sobre a questão nuclear iraniana35 são exemplos de quando o Brasil confrontou abertamente a maior potência mundial.

33 Ver página 12 do presente estudo. 34 Os EUA julgava ser necessário uma intervenção no Iraque pois segundo a Casa Branca, a inteligência militar estadunidense havia descoberto a localização de possíveis armas químicas, e suspeitava do envolvimento do regime de Saddam Hussein com organizações terroristas. O pedido de intervenção foi negado pelo Conselho de Segurança, o que não impediu os EUA de invadirem o Iraque, mostrando mais uma vez a insuficiência do CSNU (GARCIA, 2012). 35 Brasil e Turquia se posicionaram de forma a defender que o programa nuclear iraniano tinha fins pacíficos e que a negociação e o diálogo eram a melhor solução, o contrário do posicionamento dos EUA que exigia o uso

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É nítido que este tipo de posicionamento brasileiro Brasil tem como objetivo aumentar seu poder de barganha frente às tradicionais potências para provar que é um forte, e natural, candidato a uma possível e, provavelmente, inevitável reforma da ONU. Logo após ser substituído por Luiz Felipe Lampreia no cargo de Ministro das Relações Exteriores do governo Fernando Henrique Cardoso, Celso Amorim (1995) publica uma lista de pelo menos dezesseis motivos pelos quais o Estado brasileiro seria um candidato legítimo a ser membro permanente do Conselho de Segurança. As credenciais são, em sua maioria, de embasamento idealista wilsoniano: o Brasil é um país dedicado à cooperação, que convive harmoniosamente com todos os atores do sistema internacional, tendo recentemente expandido suas relações à África, sempre com propósitos pacíficos e de não proliferação nuclear; o Brasil tem participação ativa na ONU – participando, por exemplo, de diversas missões de paz – e em sua formação, não apenas sendo um dos signatários originais da Carta de São Francisco, mas também ajudando a definir princípios que regeriam o organismo. Há, ainda, credenciais geoestratégicas (o tamanho, a população e a localização do país), econômicas (o Brasil é um dos maiores contribuintes para o orçamento da ONU) e políticas (o fato de o país ser uma democracia plenamente estabelecida). Destas constatações feitas por Amorim em 1995, apenas uma sofreu alteração significativa, que é a questão da contribuição financeira à ONU: em 2001 o Brasil mantinha o 7º maior aporte financeiro na organização (ROSAS, 2008), já em 2011 a posição ocupada foi a de 15º (ONU, 2011). Podemos destacar ainda outros fatores que ajudam a sustentar o anseio brasileiro: o Brasil foi o país que mais participou das reuniões do Conselho de Segurança como membro rotativo (junto com o Japão), mediou diversas questões de conflito, conduziu de forma exemplar a missão de paz no Haiti, e, é um país caracterizado pelo seu caráter pacifista. Segundo Amorim (2007), o Brasil participou ativamente de mais de 30 missões de paz da ONU, e em 2007 participava de nada menos que 10 das 18 operações de paz em andamento. No total, o Brasil já cedeu mais de 17mil homens para estas operações. A participação mais representativa, pelo sucesso da operação e pela liderança desempenhada, é a presença brasileira na Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti (MINUSTAH), que foi uma ação determinada por raro consenso político dentro do CSNU, e é um dos pontos-chave para provar que o Brasil tem os requisitos necessários para ser membro permanente do CSNU. Para Celso Amorim (2004), o sucesso da ação no Haiti é a de sanções contra os iranianos. Para Brant et al. (2012), o Brasil, nesta questão, novamente mostrou-se coerente com seu histórico de política exterior ao tentar resolver os conflitos de forma diplomática através da negociação.

64 prova que o Brasil está pronto para assumir maiores responsabilidades sobre o sistema internacional.

Nossa participação na Missão da ONU no Haiti, ademais, parte do princípio de que a paz não é um bem internacional livre: a manutenção da paz tem um preço. Esse preço é o da participação. Ausentar-se ou eximir-se de opinar ou agir diante de uma situação de crise pode significar a exclusão do processo de tomada de decisões, ou, pior, a dependência em relação a outros países ou regiões. (AMORIM, 2004, p. 46).

De acordo com Amorim (2004), um dos arquitetos da presença brasileira no Caribe, a atuação do Brasil em território haitiano foi calçada em três pilares: criação de um ambiente de segurança; promoção do diálogo entre as forças políticas, objetivando uma verdadeira e sustentável transição democrática; e, apoio para a reconstrução social e econômica do Haiti. Um pensamento interessante da diplomacia brasileira revelado por Celso Amorim (2005) é a constatação que atualmente as guerras não são mais geradas por países poderosos, com arsenais gigantescos e meios econômicos abundantes; hoje as guerras são mais suscetíveis a ocorrer nos chamados Estados Falidos36, através da possibilidade de guerras civis, infiltrações terroristas e/ou perda do poder do Estado. As guerras interestatais tornaram- se mais raras para dar lugar às guerras intraestatais (guerras civis), esta é a conclusão que chega Nye (2009, p. 197) ao observar que dos 116 conflitos que ocorreram entre o fim da Guerra Fria e o começo do século XXI, 89 foram puramente intraestatais e apenas 20 foram interestatais com intervenção estrangeira. Por isso a atuação brasileira na ONU sublinha a importância da criação da Comissão de Construção da Paz, que estaria imbuída de arquitetar ações conjuntas entre o CSNU e o Conselho Econômico e Social, de modo a possibilitar desenvolvimento econômico e social que é o pilar fundamental para manter a estabilidade, já que em países organizados e estáveis a probabilidade de paz é substancialmente elevada. Indubitavelmente não significa que o CSNU deva anexar o Conselho Econômico e Social, mas sim considerar fortemente as recomendações feitas por este órgão. Afinal a paz não pode ser imposta, somente construída. A revitalização da Assembleia Geral, transformando-a em um órgão com poder decisório e não só consultivo, também é ponto relevante na futura reforma das Nações Unidas.

36 Nasser (2009) utiliza o termo Estados Falidos para ilustrar os países que devido à pobreza, instituições frágeis e corrupção seriam mais vulneráveis às infiltrações de redes terroristas e de cartéis de drogas. Este tipo de Estado não possui controle sobre o próprio território e população e acaba se sujeitando a organizações que se tornam maiores e mais organizadas que o próprio Estado. Outra resultante da falência estatal é a possibilidade de acirramento da competição entre as grandes potências pelo poder no território, já que o Estado Falido pode ser abrigo de recursos naturais valiosos. Conforme Nasser (2009) ressalta, a mudança na percepção de “quem é a ameaça” foi a grande inflexão da questão de segurança no novo milênio: a ameaça não é mais a grande potência rival, mas sim um inimigo (terroristas) que não tem interesse na defesa de qualquer território ou população e que por isso não pode ser dissuadido, contido ou apaziguado.

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Sobre a questão da reforma no Conselho de Segurança, o Brasil não almeja alcançar o assento permanente de forma solitária, nem haveria como levantar essa bandeira sem aliados de poder e reputação inquestionável.

Nenhuma organização resiste ao tempo se não souber se adaptar às novas realidades. O processo de reforma da ONU, atualmente em curso, precisa avançar. O aperfeiçoamento do sistema multilateral é a contraparte necessária do convívio democrático no interior das nações. Daí o imperativo de tornar as instâncias decisórias internacionais mais representativas, legítimas e transparentes. Isso vale em especial para o Conselho de Segurança, que mantém congelada desde 1945 a composição de seu quadro permanente, apesar do notável crescimento no número de Estados-membros de 51 para 191 (AMORIM, 2008, p. 10).

O argumento do G4 é que há a necessidade evidente de incorporar países desenvolvidos e em desenvolvimento ao CSNU – em função de sua carência de legitimidade, como destacado por Amorim (2008) na citação acima – que tenham credenciais territoriais e demográficas, capacidade diplomática e contribuição consistente e significativa para a paz (AMORIM, 2005). Por isso apresenta a seguinte proposta:

O projeto de resolução apresentado pelo Grupo à Assembleia Geral da ONU no último dia 11 de julho propõe a expansão do Conselho de Segurança de 15 para 25 membros, com a inclusão de seis novos membros permanentes (dois da África, dois da Ásia, um da América Latina e do Caribe e outro da Europa Ocidental e outros) e quatro não permanentes (um para a África, um para a Ásia, um para a América Latina e Caribe e um para a Europa Oriental). [...] O projeto do G-4 também determina que a delicada questão do direito de veto seja discutida em um momento futuro, e sugere uma revisão da reforma em quinze anos. (AMORIM, 2005, p.8).

As seis novas vagas permanentes seriam designadas para Alemanha, Índia, Japão, e claro, o próprio Brasil; além de um país africano e outro do Oriente Médio, provavelmente seriam África do Sul e Egito. O grande desafio destes países é angariar a simpatia dos Estados que atualmente detêm este posto permanente (PECEQUILO, 2009). A proposta do G4 originalmente demandava o poder de veto para estas seis novas vagas permanentes, mas devido à irredutibilidade do P5 quanto a esta questão, a demanda foi retirada e criou-se apenas uma cláusula onde costa que este assunto (poder de veto) deveria ser discutido após os 15 primeiros anos da expansão do Conselho de Segurança. Logo, esta proposta consiste na criação de uma nova modalidade no CSNU: os assentos permanentes sem poder de veto, além dos quatro assentos rotativos eleitos pela assembleia geral. Deste modo totalizariam 25 países no conselho de segurança sempre com 14 países presentes de forma rotativa e 11 permanentes, sendo 5 destes com poder de veto (DUARTE, 2008). Para Vargas (2008), a maior “arma” utilizada pelo Brasil, particularmente, para convencer o sistema internacional de que tem as ferramentas necessárias para participar de órgão tão importante é a persuasão. Persuasão esta baseada em quatro argumentos centrais: o

66 primeiro argumento é de que a presença brasileira no CSNU não traria benefícios unicamente para o Brasil, mas para todo o sistema internacional; o segundo é explicar por que o Brasil tem este interesse, que é o desejo de contribuir para o bom funcionamento do sistema internacional; o terceiro é que o Brasil têm as credenciais diferenciadas necessárias para assumir o posto; e por último, o argumento regional, que o Brasil no Conselho de Segurança não vai assumir um papel egoísta e sim procurar ser um representante das demandas latino- americanas como um todo. É provável que pela argumentação bem feita e as credenciais bem expostas, o postulante dentre o G4 que sofra menos rejeição internacional seja o Brasil. Isto pode levar a crer erroneamente que se o Brasil buscasse o assento permanente de maneira unilateral obteria mais êxito. Este pensamento mostra-se equivocado pois seria improvável que o país conseguisse angariar tanta atenção da sociedade internacional como logrou ao aliar-se às demais potências do G4. A aliança com o G4 é inevitável, mesmo que outros membros, principalmente Índia e Japão, sofram com rejeições fortes, principalmente oriundas da China que deseja o status de potência asiática (ilustrada pelo poder de veto e assento permanente no CSNU) apenas para si. Para termos ideia da importância do G4 para o sistema internacional, se os países do G4 fossem efetivados como membros plenos, os nove Estados que teriam cadeiras permanentes no conselho de segurança estariam entre os dez Estados que mais gastam em defesa; e representariam, em 2015, as nove maiores economias do globo: uma aliança assim não é nada desprezível.

3.1.2.1 Posicionamento do México quanto ao anseio brasileiro

Muitos são os estudiosos que criticam a posição brasileira de não exercer abertamente o papel de liderança frente à América Latina. Para estes analistas, o Brasil foge do rótulo de líder regional latino-americano pois não quer arcar com o ônus proveniente deste posicionamento, que é o de ser responsável indireto pelo desenvolvimento desta região; porém a possibilidade de ser um ator protagonista a nível internacional passa exatamente por adquirir essa responsabilidade e lidar com ela de forma satisfatória. Carlos Eduardo Martins (2012, p. 5) converge com esta ideia, ao destacar que “qualquer possibilidade de o Brasil vir a ser um ator relevante na definição dos rumos do século XXI dependerá de sua capacidade de

67 articular um polo dinâmico democrático e sustentável de desenvolvimento na América do Sul”. Já Ouriques (2012), ressalta o grande interesse que dos EUA em o Brasil se revelar como a potência hegemônica regional na América Latina desde que ao mesmo tempo mantenha-se na faixa de potências intermediárias. Outro fator importante destacado por este autor é o pragmatismo da política brasileira recente para a região:

O Brasil deixou para trás sua histórica distância dos temas latino-americanos e se esforça para ganhar um papel de protagonista no processo em curso. Mas é fácil observar que o súbito interesse pela América Latina não incluiu esforço na direção de consolidar o Banco do Sul, a Telesur ou o Sistema Único de Compensação Regional (Sucre), projetos recebidos sempre com desdém ou aberto ceticismo pelo mundo acadêmico, empresarial e grande parte da diplomacia (OURIQUES, 2012, p. 7).

Este pragmatismo brasileiro, estes conflitos de interesse, são as razões por qual nosso país não consegue cativar a confiança e o apoio dos demais Estados latino-americanos acerca de suas pretensões hegemônicas. Fica nítido em discursos como o de Amorim (2007) que o Brasil prioriza as relações na América do Sul, age como um líder criando organismos regionais, se utiliza destes feitos para reforçar sua candidatura à vaga permanente no CSNU, mas apresenta receio ao se proclamar oficialmente como líder da região. Agora para tratar da relação Brasil-México em si, focalizando na discussão acerca da reforma do CSNU, primeiramente devemos lembrar que a política exterior de Brasil e México é divergente (GATICA, 2012). A política exterior do Brasil, como ressaltado anteriormente, é pragmática, defende interesses globais e busca uma maior influência internacional: a capacidade material e a vontade de liderança intrínseca na diplomacia brasileira seriam os elementos chave para explicar este tipo de pensamento. Já o México tem uma postura claramente defensiva, passiva e ideologizada nas suas relações internacionais, nem mesmo internamente há consenso de que lugar o México deve ocupar na sociedade internacional e o grande elemento explicativo para isto seria a posição geográfica do México: ao lado dos EUA, que acaba constrangendo atuações de maior protagonismo no cenário internacional. Os governos mexicanos parecem não ter grandes interesses globais – em se tratando de assuntos políticos ou sociais – nem vontade e vocação de ser uma liderança internacional. Apesar disso, o México enquanto não apresenta anseios de ser uma liderança regional, também demonstra com seus atos que não aceitará sem manifestar sua oposição, que o Brasil seja o líder latino-americano, no caso deste se tornar membro permanente do CSNU (BARRETO, 2012b).

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Porém se observarmos nas entrelinhas, tanto a oposição mexicana quanto a Argentina, não são oposições declaradas à liderança regional e global que desempenharia o Brasil na ONU, e sim externam um receio de que este seja o primeiro passo de um futuro imperialismo brasileiro na América Latina. Para Candeas (2010) há duas posições na Argentina sobre o desejo brasileiro no CSNU: a primeira é francamente negativa, já a segunda é realista-pragmática. Na primeira posição, a francamente negativa, que é majoritária nos círculos decisórios do governo, tem seu primeiro argumento na defesa da igualdade entre Estados: isto implica em criticar não só a possibilidade do Brasil como membro permanente, mas também os membros permanentes atuais que possuem o poder de veto, outro fator que amplia a desigualdade interestatal. Para esta corrente, aceitar e apoiar a candidatura do Brasil seria o equivalente a renunciar ao sonho de recuperação da grandeza e do prestigio internacional que desfrutara a Argentina em outros tempos. Ainda há o outro fator, o da “tentação hegemônica” (CANDEAS, 2010, p. 249) que poderia atingir o Brasil caso lhe fosse concedido o status de membro permanente, fazendo com que fosse construída uma relação desigual entre os dois Estados, o que seria algo nocivo à relação bilateral Brasil-Argentina. Já a segunda posição, a realista-pragmática, representa setores minoritários da opinião pública argentina que crê que a Argentina não tem mais possibilidades de aspirar ao posto de membro permanente e que nada tem a ganhar com a oposição ao Brasil, pelo contrário, seria um Estado no órgão máximo da ONU que representaria valores muito mais alinhados com a Argentina do que a França ou os EUA. A posição que se percebe no México, através das palavras de Rosas (2008), é basicamente idêntica a esta apresentada por Candeas (2010) em relação à Argentina: o grupo governamental, pela histórica rivalidade nas relações bilaterais, crê que a possibilidade de perdas na esfera internacional é maior que a possibilidade de ganhos com o Brasil tendo tamanho protagonismo internacional; outros grupos mais de esquerda acreditam que o tema deve ser tratado com no mínimo indiferença, se não com apoio, por tratar-se de um país que tem um histórico de boas relações com seus vizinhos e que uma liderança regional no CS traria mais segurança ainda na América Latina, região pacífica há décadas. Para amenizar as preocupações destes grupos contrários ao Brasil como membro permanente do CSNU na Argentina e no México, um dos principais focos da estratégia brasileira é tranquilizar seus vizinhos latinos. Desta forma, a política externa brasileira tem dado especial atenção ao argumento de que um eventual assento permanente brasileiro não viria a causar desequilíbrio no sistema regional que há tanto tempo vive estado de cooperação,

69 pelo contrário, o Brasil no CSNU seria benéfico à toda América Latina, pois seu principal objetivo seria dar voz aos desejos da região latino-americana (VARGAS, 2008). O gráfico 3 do presente estudo é um grande indício que, no âmbito da ONU, o Brasil é um parceiro bem mais interessante para o México que o próprio Estados Unidos, já que se observa que o nível de convergência dos votos entre Brasil e México chega quase aos 90%, enquanto o nível de convergência EUA-México não chega a 20%. Mesmo que o México mantenha-se reticente quanto à oposição ao Brasil como membro permanente no CS, não parece razoável que a oposição mexicana venha a tornar-se ferrenha e/ou que seja capaz de frear o Brasil com suas próprias forças. Também não parece provável que o México seja capaz de procurar e convencer os EUA a utilizar seu poder de veto para não permitir a ascensão brasileira ao posto permanente: é nítido que os EUA apenas faria uso de seu poder de veto nesta questão em prol de seus interesses próprios.

3.1.2.2 Outras Propostas de Reforma do Conselho de Segurança da ONU

Conforme Pecequilo (2009) explana, existem mais duas propostas de reforma do CSNU: são elas a proposta da União Africana37 e a proposta do grupo Unidos pelo Consenso. É importante ressaltar que a União Africana representa quase 25% da Assembleia Geral da ONU e por isso é importantíssima para a aprovação de qualquer reforma, pois a reforma para ser aprovada no âmbito da Assembleia necessita de ao menos 75% (três quartos) de votos a favor. A proposta da União Africana prevê a ampliação do conselho para 26 novos membros. Desta forma estariam criados 11 novos assentos, distribuídos da seguinte forma: seis novos membros permanentes aos quais seria concedido automaticamente o poder de veto (distribuídos em duas vagas para a África, duas para a Ásia, uma para a América Latina e uma para a Europa Ocidental), e mais 5 vagas rotativas para membros não permanentes (DUARTE, 2008).

Os Ministros [do G4] reiteraram sua disposição de continuar a dialogar com a União Africana, com a Caricom e com os co-patrocinadores do projeto de resolução, bem como com os demais membros da ONU. Os Ministros das Relações Exteriores

37 A União Africana foi fundada em 2002 e é composta atualmente por 54 membros, o que engloba praticamente todos os países situados na África.

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mantêm-se comprometidos com a reforma da ONU, especialmente com a reforma do Conselho de Segurança (BRASIL, 2007, p. 201).

Segundo Duarte (2008), apesar de haver um esforço muito grande dos países do G4 para unir a proposta da União Africana com a proposta do G4 e para convencer os numerosos países do Caribe a votar a favor da proposta a fim de garantir os 2/3 de votos necessários para a aprovação na Assembleia Geral, a União Africana têm se mostrado pouco flexível quanto a negociar a necessidade do poder de veto para os novos assentos permanentes, que é o grande posto de divergência entre os dois pensamentos quanto ao futuro do CSNU. Já a proposta de reforma denominada de União pelo Consenso (criada por Paquistão, Argentina, Canadá, México e Itália), também chamada de Coffee Club, defende um conselho com o total de 25 assentos, sendo apenas adicionadas dez vagas de caráter não permanente; ou seja, sem mudanças no número de cadeiras permanentes e no poder de veto, apesar de estes Estados também apresentarem-se contra o poder de veto. Desta forma seria mantido o status quo no CSNU. Ressalta-se que essa proposta tem como objetivo maior demonstrar a rejeição com as outras propostas (a da União Africana e principalmente a do G4) e não propor mudanças reais no órgão de maior importância estratégica das Nações Unidas. O real objetivo é frear as intenções de rivais regionais quanto ao assento permanente – principalmente contra Brasil, Alemanha e Índia – do que propriamente mudar o funcionamento ou dar maior legitimidade ao Conselho de Segurança.

3.1.3 Brasil um novo membro permanente, sonho ou possibilidade?

Regionalmente a maior oposição à candidatura brasileira é representada por Argentina e México, e não há no sistema internacional outro país que se oponha ferrenhamente a concessão do assento permanente para o Brasil. Por outro lado podemos destacar rejeições dos vizinhos europeus, em especial Itália e Espanha, à Alemanha, da China e da Coréia do Sul à entrada do Japão, e também a oposição chinesa e paquistanesa à Índia, como maiores empecilhos à demanda do G4 (SARDENBERG, 2010). Na perspectiva sul-americana, quatro países de relativa representatividade regional já se manifestaram de maneira oficial acerca da posição brasileira diante de uma possível reforma da ONU. Argentina e Colômbia se manifestaram publicamente e abordaram a questão de forma conservadora, não sendo diametralmente oposta a proposta brasileira, mas avaliando

71 que há propostas “melhores” para os interesses destes dois respectivos Estados, inclusive a Argentina é um dos Estados criadores da outra proposta de reforma chamada de “União pelo Consenso”. Já a Venezuela e, de forma surpreendente, o Chile38 manifestaram estar de acordo à proposta de reforma do Brasil em conjunto com o G4, apoiando inclusive o Estado brasileiro como membro permanente do CSNU. A atual lista de apoio – que tenha sido declarado de forma oficial, através de discursos, documentos ou notas de governo – à candidatura brasileira encontra-se do seguinte modo: A- Dos países do P5: França, Reino Unido e Rússia apoiam integralmente a entrada do Brasil (LEITE, 2011), a China por sua parte ainda não deu declarações afirmativas oficiais sobre o caso, apenas mensagens subjetivas de apoio, já os EUA dá apenas a entender que quando chegado o momento (de Reforma) não vai opor-se à candidatura brasileira – ou seja, não pretende utilizar seu poder de veto – mas que ainda não é o momento ideal para reformar a ONU e o CSNU. Apesar de ter afirmado que não era o momento de reformar o CSNU, a Índia recebeu o apoio como futuro membro permanente em discurso oficial do presidente Obama alguns meses antes de o mesmo vir ao Brasil, em março de 2011, quando havia grande expectativa, do governo e da opinião pública, quanto ao seu pronunciamento de apoio também ao Brasil, que acabou por não se realizar (SORIANO, 2012). B- Demais países dos BRICS, IBAS e G4. C- Outros que já declararam seu apreço e apoio abertamente ao desejo brasileiro: Comunidade de Países de Língua Portuguesa (Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor Leste), Bélgica, Chile, Indonésia, Finlândia, Austrália, África do Sul, Guatemala, Paraguai, Uruguai, Vietnã, Venezuela e Filipinas. Outra questão abordada por Leite (2011) é que há receio em aceitar o Brasil como membro permanente do Conselho de Segurança por não saber se o país tem os recursos necessários para respaldar suas próprias decisões e posicionamentos, angariar respeito das demais grandes e não ser cooptado pelos Estados mais poderosos a convergir com suas ideias. Para o grupo da “União pelo Consenso”, a reforma da ONU deveria ser realizada de forma consensual, e por consenso também deveriam ser os meios pelos quais as resoluções são aprovadas. Quanto a isso, Amorim (2005, p. 8) é enfático:

É irrealista pensar que uma questão de tamanha transcendência possa ser resolvida por consenso. Já em sua criação, dispositivos importantes das Nações Unidas, como o direito de veto dos membros permanentes do Conselho, não foram adotados por consenso. A ampliação do Conselho de onze para quinze membros em 1963

38 Ver Valenzuela (2004, p. 57).

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tampouco logrou apoio universal. Apesar de folgada maioria a favor, a Resolução 1991 (XVIII) recebeu onze votos contrários [no âmbito da Assembleia Geral], entre os quais os de dois membros permanentes, a França e a então União Soviética. Os Estados Unidos e o Reino Unido abstiveram-se. Isto não impediu que fosse posteriormente ratificada pelos Parlamentos dos cinco membros permanentes.

Há uma minoria de pensadores, entre eles Pfeifer (2012), que acreditam que a reforma do CSNU não seria interessante para os BRICS. Eles partem do princípio que a reforma pretendida pelo G4 – que mantém o poder de veto e, por conseguinte o status quo – apenas legitimaria o poder das potências decadentes. Para estes estudiosos, o ideal seria a criação de uma nova instituição que reflita fielmente o papel de cada país atualmente no cenário internacional e suas perspectivas para o futuro, sem levar em conta o que ocorreu no passado e com possibilidades periódicas de rever seus membros em posição de destaque. Enfim, não há como saber se um dia o Brasil alcançará o tão almejado posto de membro permanente do Conselho de Segurança da ONU, se contará ou não com o apoio de México e Argentina em prol de uma América Latina mais forte e unida. Apenas sabemos que o Brasil, atualmente, não está mais afastado de seu objetivo quanto no passado, pelo contrário. A reforma da ONU é uma realidade que depende apenas de tempo para ocorrer, do contrário presenciaremos o ruir da maior instituição multilateral existente.

3.2 Imbróglio em torno do ACE 55

Para entender este caso, inicialmente é importante, além de ressaltar as diferenças de um acordo de complementação econômica para um tratado de livre comércio, também explicar as etapas da integração econômica que, segundo Accioly (2010), são quatro: o estabelecimento da zona de livre comércio, a união aduaneira, a criação do mercado comum e, por último, a união econômica e monetária. O acordo de complementação econômica é um acordo feito entre dois ou mais países que decidem livrar uma “cesta” de produtos produzidos por estas nações de taxas arancelárias, entretanto, Accioly (2010) não destaca este passo como uma etapa de integração. Normalmente este tipo de acordo é feito com um prazo para revisão ou renovação, muitas vezes os ACE são o primeiro passo para assinatura de um tratado de livre comércio (GONZÁLEZ, 2012).

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Por sua vez, o tratado de livre comércio que estabelece a zona de livre comércio, é celebrado entre dois ou mais países e livra todos os produtos – de acordo com as regras estabelecidas para os certificados de origem – produzidos pelas nações signatárias do tratado de taxas para importação ao outro, ou outros, país signatário; normalmente este tipo de tratado não tem prazo para se encerrar (GONZÁLEZ, 2012). A criação de uma união aduaneira é a segunda etapa de integração econômica. Na união aduaneira, os países em questão decidem impor uma Tarifa Externa Comum (TEC) para importação de terceiros países, o que faz com que se crie uma livre circulação de bens entre os países do acordo. Como a taxa de importação agora se torna comum aos países do acordo, as negociações sobre a política comercial passam a ser feitas em bloco (ACCIOLY, 2010). O mercado comum caracteriza-se, além da livre circulação de bens, pela criação de mais três liberdades: a livre circulação de pessoas, de capitais e de serviços. Por fim, a última etapa da integração econômica é a união econômica e monetária. A união econômica e monetária tem apenas mais um acréscimo na questão do bloco, mas que influencia diretamente a política econômica de todos os envolvidos para que a moeda mantenha-se estável: a criação de uma moeda comum. A partir do momento que se cria uma moeda comum, obrigam-se os países a seguirem diversas outras regras como: controles de déficits, manutenção da inflação em certa margem estabelecida, controles de dívidas públicas e taxas de câmbio iguais. Ainda antes da etapa do acordo de complementação econômica, onde as taxas de certos produtos se tornam zeradas, ainda pode existir a área de preferências econômicas. Este é o objetivo da ALADI, criada na década de 80 através do Tratado de Montevidéu (ALADI, 1980), que constrói uma área preferencial de comércio na região americana onde as taxas de importação sejam reduzidas entre seus membros, o que apesar de não criar uma área de livre comércio, cria uma vantagem para o mercado de produtos americanos comercializados entre países membros do acordo (ROSAS, 2008). O artigo 25 da ALADI regula que toda e qualquer vantagem concedida por um país membro a outro país não membro se estenderia automaticamente para todos demais países membros “de menor desenvolvimento econômico relativo”39 (ALADI, 1980, tradução nossa), com o intuito de deixar a competição comercial da forma mais horizontal possível e não prejudicar economias fracas da região americana. Ocorre que o México ao tornar-se membro do NAFTA simplesmente decidiu ignorar este regulamento, o que causou a ira especialmente

39 [...] de menor desarrollo económico relativo.

74 do Brasil, já que o aumento do comércio México-EUA também afetou diretamente o comércio Brasil-EUA40, que sugeriu a expulsão do México do acordo (ROSAS, 2008).

3.2.1 ACE 53 e ACE 55

Passados estes atritos, no ano de 2002 foi celebrado o ACE 53 entre MERCOSUL e México, com o objetivo de ir além da ALADI, entrando em vigor no Brasil posteriormente no ano de 2003 (BRASIL, 2002a). O ACE 53 foi um belo avanço na questão de uma maior integração econômica do MERCOSUL com o país que detém o segundo maior PIB da América Latina, o México. O acordo abarcou uma cesta de 796 produtos do setor industrial, que poderiam ser comercializados livremente entre os cinco países envolvidos (GONZÁLEZ, 2012), as preferências arancelárias apresentam reduções de 20% a 100% nas taxas de importação. É importante salientar que desde então há interesse dos dois lados de expandir o ACE 53. O Brasil quer maior liberdade na comercialização de produtos agroindustriais, o que não é apreciado por este setor do México; já o México quer maior liberalização na entrada de produtos oriundos do setor químico e automotivo, o que por sua vez é uma ideia não apreciada pelo governo brasileiro (PROMEXICO, 2012). Aproveitando o bom momento nas negociações, no mesmo ano de 2002, MERCOSUL e México decidiram fazer outro acordo, o ACE 55 (BRASIL, 2002b), exclusivamente sobre o comércio de veículos e autopeças um dos maiores motores de crescimento industrial tanto no México, quanto nos países do MERCOSUL. O Brasil logicamente apoiou esta iniciativa pois esta é uma das mais importantes indústrias tanto para o movimento da economia brasileira, quanto para a mexicana. Desta forma, o acordo foi celebrado com o intuito de que trouxesse benefícios para ambas as partes. Como pode ser observado a partir do gráfico 141 o ACE 53 e o ACE 55 foram os propulsores do crescimento do comércio bilateral no princípio do século XXI. O acesso brasileiro ao mercado mexicano é importante para o Brasil diante de sua ideia econômica de diversificação de mercados e da aproximação Sul-Sul. Para o México, o mercado brasileiro

40 Como dito anteriormente (na seção 2.1) a produção da indústria brasileira é muito semelhante à produção mexicana. Cerca de 47% dos produtos brasileiros exportados aos EUA também são exportados pelo México com o mesmo destino (BARRETO, 2012a, p. 278). 41 Ver página 46.

75 pode tornar-se fundamental na perspectiva mexicana de desvencilhar-se da dependência quase que total existente com o mercado estadunidense. No gráfico abaixo podemos perceber que enquanto para o Brasil, por ter uma cesta de exportação para o México mais diversificada, o ACE 53 pode ser mais importante; para o México, o ACE 55 é que detém este posto.

Gráfico 4 – Principais produtos comercializados entre Brasil e México, 2011 (%)

Fonte: ProMéxico (2012, p. 3)

Ao analisarmos as cestas de produtos exportados por ambos os países salta aos olhos a importância do setor industrial de automóveis no comércio bilateral, especialmente no caso mexicano. A produção brasileira neste setor é basicamente voltada ao mercado interno, alguns modelos são exportados, que têm se mostrado em constante aquecimento, já a produção no México abastece além do mercado interno, a exportação. Morales et al. (2012) afirma que 90% da produção latino-americana de veículos está localizada nestes dois países, as empresas que atuam também são praticamente as mesmas, o que difere são especializações produtivas e normas que devem ser cumpridas de acordo com o destino do automóvel. Em geral os veículos exportados ao Brasil são de médio e grande porte, de alto valor agregado; enquanto os automóveis exportados pelo Brasil são compactos fabricados normalmente por filiais de origem europeia como Volkswagen, Renault, Peugeot e Fiat.

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3.2.1.1 Resultados dos acordos e renegociação do ACE 55

Uma análise de longo prazo é capaz de mostrar que a concentração das exportações manufaturadas em três setores têm se mantido, ainda que sua importância relativa tenha se alterado com o passar do tempo: no caso do México, o setor de maior participação em 1995 foi o de máquinas e equipamentos (25,1%), seguido do setor de equipamentos para transporte (22,8%) e da indústria química (22,3%). Já com o ACE 55, percebemos o crescimento da importância relativa do setor de produção de veículos automotores, que cresceu de 31,5% em 2006 para 38,5% em 2009 (MORALES et al., 2012).

Em somente cinco anos, derivados da perda de competitividade do real e do dinamismo da demanda interna, o valor das exportações do setor automotor [mexicano] para o mercado brasileiro multiplicou-se por vinte e seis ao passar de 35 milhões de dólares em 2004, a 938 milhões de dólares em 2008, para alcançar seu máximo valor em 2009 com 1518 milhões de dólares (MORALES et al., 2012, p. 126, tradução nossa)42.

Em 2010, mais de 30 mil unidades de carros produzidos no México foram vendidas no Brasil, isso representa quase 10% do total de vendas de veículos de passeio (PROMEXICO, 2012). Contudo é relevante perceber que mesmo sendo o setor automotivo tão importante para ambas as economias e até mesmo para a economia mundial, nem Brasil nem México possuem companhias automotivas próprias, de origem nacional43. A balança comercial do setor automotivo – que representa em grande parte a balança comercial geral entre Brasil e México – ilustrada abaixo, foi a grande responsável tanto pelo crescimento do fluxo de comércio entre esses dois países, quanto pelo fim do superávit brasileiro nesta relação comercial e consequente renegociação do ACE 55. Percebe-se nitidamente que o México passou por um período de adaptação após a assinatura do ACE 55, processo este que durou até 2006, e por isso manteve seus níveis de exportação ao Brasil em níveis baixos e estáveis; enquanto o Brasil já estava adaptado às regras impostas pelo acordo, isto se deve exclusivamente ao método de produção mexicano que faz amplo uso de produtos importados44, enquanto o Brasil sempre produziu automóveis com larga porcentagem de conteúdo nacional.

42 En tan sólo cinco años, derivado de la pérdida de competitividad del real y del dinamismo de la demanda interna, el valor de las exportaciones del sector automotor [mexicano] hacia el mercado brasileño se multiplicó por veintiséis al pasar, de 35 mdd en 2004, a 938 mdd en 2009, para alcanzar su máximo valor en 2008 con 1518 mdd. 43 Houve algumas tentativas nos dois países para a criação de uma indústria nacional de produção automotiva, inclusive com a comercialização de alguns modelos, porém nunca obtiveram êxito. 44 Esta afirmação será analisada de forma mais detalhada na página 79 do presente estudo.

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Gráfico 5 – Balança Comercial do Setor Automotivo – Brasil e México (US$)

Fonte: Martins R. (2012, p.5)

Martins R. (2012) ainda destaca que de 2007 a 2011, conforme pode ser observado também através do gráfico acima, o crescimento na importação de veículos leves de origem mexicana no Brasil foi de 257%, enquanto o movimento contrário sofreu redução de 56%. Em 2008 foi firmado um protocolo adicional ao ACE 55 onde foram incorporados mais de 100 novos produtos automotivos. Ainda derivado deste documento, se previa para 2011 a eliminação total das taxas de comércio exterior no setor automotivo entre MERCOSUL e México, e para o ano de 2020 pretendia-se liberar completamente também o comércio de veículos pesados, como tratores, caminhões, maquinário agrícola e etc. (MORALES et al., 2012). Contudo este protocolo adicional não se mostrou eficiente para o Brasil, e por isso a partir do ano de 2011 o governo brasileiro começou a alinhavar mudanças para o ACE 55 de forma bilateral (em negociações diretas com o México, de forma independente do MERCOSUL). A movimentação brasileira foi vista com maus olhos pelos demais integrantes do MERCOSUL, principalmente pela Argentina que é outra grande produtora de automóveis, e que foi ignorada desta nova rodada de negociações e mudanças do ACE 55. Para os argentinos, o passo de integração solitária do Brasil com o México foi visto como mais um retrocesso na direção de maior integração do MERCOSUL: não que o Brasil não devesse buscar uma relação mais estreita com o México, mas que deveria dar sequência ao estreitamento de relações com este Estado de forma conjunta ao MERCOSUL.

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Para termos ideia da importância do comércio automotriz entre Brasil e México, a balança comercial entre os dois países movimentou cerca de 8,5 bilhões em 2011, dos quais 40%, cerca de 4 bilhões, são respectivos ao comércio de automóveis ou autopartes (GONZÁLEZ, 2012). Ambos os governos dão grande atenção a estas transações visto que pela magnitude e valores envolvidos neste setor específico, qualquer conflito deixa de ser um conflito comercial para tornar-se um assunto econômico. Qualquer decisão equivocada nesta ordem pode representar a falência de uma indústria que move muito dinheiro, traz muita tecnologia, emprega muitas pessoas, e por consequência, aumenta a renda e qualidade de vida, tanto da população brasileira, como da mexicana. O Brasil agiu unilateralmente para a renegociação do ACE 55 porque as importações de carros mexicanos estavam em uma crescente fora de controle e, com isso, passaram a influenciar o mercado das indústrias automotoras instaladas no território brasileiro. Os acordos feitos entre MERCOSUL e México, pelo menos nos seus primeiros 10 anos, foram mais benéficos ao Estado mexicano; já que segundo dados apresentados pelo governo mexicano pode-se perceber que as importações provenientes do MERCOSUL, que representavam 35% em 2003, em 2010 passaram a representar apenas 24% do total de importações, enquanto as exportações oriundas do México apresentaram crescimento. Por este fator, em fevereiro de 2012, a presidente Dilma Rousseff, percebendo que a balança comercial Brasil-México começava a tornar-se desfavorável para os interesses brasileiros, convocou representantes mexicanos para virem ao Brasil renegociar o ACE 55, o que foi divulgado em uma coletiva concedida pelo então Ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Fernando Pimentel e por Antônio Patriota, que ainda era o Ministro das Relações Exteriores. Segundo González (2012), o principal objetivo dos mexicanos que vieram ao Brasil era o de não renegociar absolutamente nada do ACE 55, visto que uma balança comercial negativa brasileira significa obrigatoriamente que a balança comercial mexicana está positiva. Mas o Brasil, através do depoimento de seus ministros (PATRIOTA e PIMENTEL, 2012), deixou claro que havia apenas duas opções possíveis para a resolução deste conflito de interesses: a renegociação do acordo em termos satisfatórios ao padrão brasileiro ou a utilização da cláusula de saída, com o fim das preferências arancelárias. O desejo brasileiro era o de negociar a inserção do aumento da exigência de conteúdo nacional na produção para 65% do automóvel e autopartes e também incorporar outros tipos de veículos – como caminhões, ônibus e veículos utilitários – no acordo, pois até aquele momento a isenção de

79 taxas estava destinada apenas a veículos de passeio (GONZÁLEZ, 2012; PATRIOTA e PIMENTEL, 2012) ou que não ultrapassassem certo limite de peso. O aumento na obrigatoriedade de conteúdo nacional nos automóveis causou desconforto nos mexicanos, afinal no México a produção de automóveis recebe partes oriundas de diversos países pois o volume de produção é grande, já que 50% dos carros produzidos são exportados, e não há como o mercado nacional suprir a demanda de suprimentos de todas as montadoras. No Brasil o caso é diferente, basicamente todas as peças necessárias para a montagem do carro são produzidas no entorno da montadora, poucas peças são importadas. Isto faz com que a regra do mínimo de conteúdo nacional seja fácil de ser adotada pelo Brasil e difícil de ser contornada pelo México, devido ao seu modelo de produção intenso e voltado à exportação. Patriota e Pimentel justificaram que o movimento de retrocesso brasileiro no livre comércio com o México ocorreu porque o acordo era “desequilibrado” e incompatível com a política anticrise na qual o Brasil estava inserido (PATRIOTA e PIMENTEL, 2012). Naquele momento era preciso fomentar a produção e a demanda nacional, com o objetivo da economia brasileira não entrar em recessão, e o ACE 55 não estava contribuindo para isto, pelo contrário, estava enfraquecendo a indústria nacional. Segundo Mares (2012), o México inicialmente não estava satisfeito com as justificativas brasileiras, e as negociações apesar de rápidas (duraram apenas dois meses) foram tensas. O governo mexicano acusava o Brasil de querer mudar as regras do jogo apenas quando estava “perdendo”, e realmente não estavam errados pois enquanto a balança comercial foi positiva para o Brasil, durante os primeiros anos após a implantação do ACE 55, nenhum movimento ou interesse no sentido de reformulação do acordo foi feito pelo governo brasileiro (MARES, 2012). Mesmo com fortes ressalvas, o governo mexicano mostrou-se apto a ouvir as propostas brasileiras, apesar de afirmar que o problema brasileiro não era o ACE 55, e sim a política monetária que estava sendo implantada no país que supervalorizava o real (MARES, 2012). O Brasil rebateu as afirmações mexicanas salientando que, além de a política brasileira não dizer respeito ao México, o governo mexicano prega e defende o livre comércio na questão automotriz de forma feroz, mas toma rapidamente outro posicionamento quando a questão volta-se à proteção à agricultura e as inúmeras restrições aos produtos oriundos do agronegócio brasileiro (GONZÁLEZ, 2012). As restrições à importação de produtos agrícolas oriundos do Brasil é inclusive um dos principais motivos, pelo lado mexicano, para que seja

80 inviável um acordo de livre comércio entre Brasil e México no curto prazo (SORIANO, 2012). Enfim após algumas semanas de negociações, ambos os governos chegaram a um denominador comum: acertou-se que para o ano de 2012, 2013 e 2014, haveria um limite de exportações mexicanas de automóveis para o Brasil, os limites são, respectivamente, 1,45, 1,56 e 1,64 bilhões de dólares, sendo que a partir de 2015 seria retornado ao sistema de livre comércio entre as partes no que concerne ao segmento de automóveis de passeio (BRASIL, 2012). É importante salientar que a liberalização ocorrerá no sentido de não haver mais limites de entrada de automóveis originários do México, desde que cumpram as exigências estabelecidas: leia-se, o percentual mínimo de produção nacional. Evidentemente para o México nenhuma destas mudanças era desejada, mas o governo mexicano não teve escolha, afinal, caso fosse irredutível nas negociações o governo brasileiro renunciaria o acordo sem nenhum efeito colateral, o que seria prejudicial à ambos e levaria a uma queda que poderia deixar próximo de zero o número de exportações de veículos mexicanos ao Brasil. O México preferiu manter o comércio de veículos, mesmo que em volume inferior ao desejado, pensando no futuro promissor do acordo, do que não manter comércio algum neste segmento.

81 CONCLUSÃO

É consensual entre os analistas das relações internacionais – e pode ser percebido até mesmo nos pronunciamentos oficiais dos dois Estados – que Brasil e México necessitam criar um laço interdependente para assumirem a liderança da região latino-americana, e que ações equilibradas podem levar a avanços significativos em prol do desenvolvimento de toda esta região. A cautela na relação bilateral existe naturalmente porque ambos sabem que alguma ação equivocada possivelmente pode vir a subjugar um país ao outro economicamente. Ou seja, ao mesmo tempo em que os dois principais países da América Latina juntos têm potencial de crescer de forma conjunta, trazendo desenvolvimento para a região; também há a possibilidade de crescimento de forma desigual, o que certamente deixaria um dos dois em grande vantagem frente ao outro, isto só seria interessante para um dos lados, visto que decidiria definitivamente o poder hegemônico da região. Torna-se claro que qualquer análise que pretenda se debruçar sobre esta relação bilateral deve levar em conta que as relações políticas e comerciais destes dois Estados passaram por uma bifurcação na década de 90, quando o Brasil optou por ser o motor da integração econômica e política da América do Sul, enquanto o México atrelou seu destino econômico aos Estados Unidos da América, e desde então se distanciou paulatinamente da América Latina. Mesmo optando por caminhos opostos, Brasil e México hoje apresentam desafios muito semelhantes: atingir grau de protagonismo internacional, fortalecer a educação, combater a violência e o tráfico de drogas, melhorar a infraestrutura e, por fim e talvez mais importante, reduzir as desigualdades sociais. Para Soriano (2012) é evidente que México e Brasil possuem projetos de inserção internacional distintos, contudo isto não é sinônimo de que os projetos de inserção são incompatíveis. Durante o primeiro ano de governo Dilma, as relações Brasil-México refletiram que era possível superar a desconfiança que ainda existe, apesar dos atritos ocorridos recentemente. Superar as diferenças nas relações de forma pacífica será benéfico para todo o continente, que na conjuntura atual, de iminente mudança no cenário global, tem a oportunidade de afirmar a sua presença internacional. Caso a aproximação não seja exitosa – com o avanço da Aliança do Pacífico e a manutenção do MERCOSUL – é possível que os conflitos hoje enfrentados em âmbito bilateral sejam redimensionados a conflitos entre os dois

82 blocos, sendo o Brasil o líder da América Latina do Atlântico, e o México o líder da América Latina do Pacífico. Quanto à proposta brasileira, orquestrada junto ao G4, visando à reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas, o México não parece ter um posicionamento de oposição firme e claro, pelo contrário, as características de oposição podem ser observadas apenas nas entrelinhas dos discursos de seus representantes. O Brasil, por sua vez, tenta amenizar as principais oposições regionais (leia-se Argentina e México) através do discurso de que além de ser o candidato natural latino-americano a tal posto, buscará não apenas representar a América Latina no CSNU, mas que através do Brasil, a América Latina terá finalmente representatividade frente ao Conselho de Segurança. É claro que Argentina e México gostariam de ter para si o assento permanente no principal órgão da maior organização multilateral de todos os tempos, mas dentre as possibilidades e perspectivas, o Brasil é o que se encaixa de forma mais fluida ao posto; tanto que nenhum destes Estados sequer apresenta ambição de assumir tal posição de destaque na ONU. Desta forma o debate não é pautado sobre qual Estado latino deveria ocupar a cadeira permanente, mas sim sobre qual nível de reforma deve ocorrer nas Nações Unidas (com adição de membros rotativos e/ou não rotativos, e mudanças no poder de veto, ou não) e se o Estado está disposto a apoiar o Brasil como membro permanente na vaga cedida ao representante latino-americano. Para todos os Estados latino-americanos, seguramente, um cenário em que o Brasil seja membro permanente do CSNU trará mais benefícios que outro cenário onde não haja nenhum latino dentre os membros permanentes (CANDEAS, 2010), esta ideia ainda pode ser sustentada através da constatação da alta convergência, ilustrada através do gráfico 3 (página 58), na porcentagem de votos do Brasil com os países em desenvolvimento na Assembleia Geral da ONU. Já a renegociação do ACE 55, apesar de não poder ser tratada como exitosa, não pode ser taxada de totalmente fracassada. Afinal mesmo que tenha freado a integração bilateral, impondo novas travas ao comércio de automóveis e adiando o estado de livre comércio neste setor; não houve, por nenhuma das partes envolvidas, a denúncia do acordo, o que significaria a volta à estaca zero ao menos no comércio automotivo e grandes efeitos colaterais no campo diplomático. Gosto de acreditar que este imbróglio foi apenas uma correção de rumos, visto que ambos os governos seguem admitindo ter planos futuros de assinar um acordo de livre comércio. Analisando este caso friamente, portanto, chega-se a conclusão que este fato foi um mal necessário e racional – que ocorreu de forma natural – dentro da perspectiva do modelo econômico protecionista brasileiro e a forte crise econômica que assolava o mundo à época.

83

As grandes empresas estatais destes dois países PEMEX, pelo lado mexicano, e , pelo lado brasileiro, também vêm apresentando intenção de aumentar seu nível de cooperação. Ambas as empresas são referência no que concerne a extração marítima de petróleo e seus derivados. Segundo Ávila (2009) os dois governos têm instruído os diretores destas respectivas empresas a avaliar a viabilidade da realização de investimentos de forma conjunta – principalmente no que se refere à exploração em águas profundas (pré-sal), que é reconhecidamente a principal especialidade da empresa brasileira – em terceiros países. O que podemos perceber após a realização desta pesquisa é que apesar da palavra oficial ser de apoio irrestrito à cooperação bilateral em todas as áreas (segurança, política, econômica, social) – o que é evidenciado através dos diversos discursos e notas governamentais oficiais apresentadas no decorrer deste estudo – na prática a realidade é mais “realista”, no sentido teórico das Relações Internacionais. Brasil e México são países solidários, e não caridosos ou filantrópicos, pois a solidariedade ocorre somente quando convém aos interesses nacionais, por exemplo: é de interesse de ambos, desde que mantenham suas posições de liderança, que a América Latina torne-se uma região cada vez mais próspera porque isso virá a render frutos em âmbito nacional nas mais diversas áreas. O aumento da cooperação bilateral não significaria apenas uma maior aproximação entre estes dois países, pois a partir do momento que se cria um forte fluxo de comércio com certo Estado, é natural que aumentem as relações com os Estados adjacentes. Ou seja, o aumento da cooperação Brasil-México viria a reforçar uma maior aproximação do México com a América do Sul e do Brasil com a América Central e Caribe, mesmo que de forma indireta. Por isso é fundamental não só para ambos, mas para todos os Estados latino- americanos que estes dois países sejam os líderes do desenvolvimento tardio da América Latina. Isto só poderá ocorrer de fato quando Brasil e México decidirem colocar as diferenças, que realmente existem, à parte, deixarem de olhar um para o outro como rivais ao posto de potência hegemônica latino-americana e mergulharem em uma maior integração econômica e política, sem a utopia de que haja um equilíbrio imutável e de soma zero nas relações políticas, comerciais e econômicas. Pelo bem da América.

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